O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 31

Sábado, 15 de Junho de 2002 II Série-B - Número 7

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

S U M Á R I O

Inquérito parlamentar n.º 5/IX:
Apreciação dos actos do Governo referentes ao processo de aceitação pelo Estado de acções da SAD do Benfica como garantia de dívidas fiscais em execução (apresentado pelo PS).

Página 32

0032 | II Série-B - Número 007 | 15 de Junho de 2002

 

INQUÉRITO PARLAMENTAR N.º 5/IX
APRECIAÇÃO DOS ACTOS DO GOVERNO REFERENTES AO PROCESSO DE ACEITAÇÃO PELO ESTADO DE ACÇÕES DA SAD DO BENFICA COMO GARANTIA DE DÍVIDAS FISCAIS EM EXECUÇÃO

1 - No debate mensal com a Assembleia da República a bancada do PS, através dos Deputados Jaime Gama, Jorge Coelho e António Costa, interpelou directamente o Primeiro-Ministro sobre a conduta do Governo no caso das acções do Benfica.
A transcrição da acta da sessão revela inequivocamente como o Primeiro-Ministro faltou à verdade:
A - Na sua pergunta, o Deputado Jaime Gama referiu:
"(...) O Sr. Primeiro-Ministro veio vangloriar-se de ter introduzido um rigor profundo nas contas públicas e de ter recuperado a credibilidade, mas não é essa a opinião dos observadores consistentes e também não é essa a opinião da Comissão Europeia, nem o orçamento rectificativo é o alfa e o ómega da política financeira em Portugal - é uma pequena parte que, aliás, demonstrou muitas vacilações do Governo de V. Ex.ª em cortar a despesa corrente primária.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - (...) Vamos ver o que será feito no orçamento para o próximo ano. Esse é que será um verdadeiro teste do rigor, da capacidade de resistir às influências e da determinação para cumprir o Pacto de Estabilidade. Aliás, a credibilidade financeira do Governo é também vista à luz do facto de o Governo - penso que aqui em contradição com a lógica de rigor - ter admitido o ressarcimento de dívidas fiscais dos clubes de futebol com acções das sociedades desportivas (...)

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... o que é, seguramente, uma opção inédita na Europa em matéria dê rigor nas finanças públicas.

O Sr. António Costa (PS): - Essa é que é essa!

O Sr. José Sócrates (PS): - É preciso explicar essa!

Aplausos do PS."

B - Na sua pergunta, o Deputado Jorge Coelho questionou o Primeiro-Ministro nos termos seguintes:

"O Sr. Jorge Coelho (PS) - (...) não quero acreditar no artigo que está hoje publicado no Diário de Notícias com o título "Ministra das Finanças aceitou acções da SAD benfiquista". Repito, não acredito que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças tenha aceite isto, por tudo aquilo que a ouvi dizer no passado e por tudo aquilo que os senhores disseram no passado, portanto, pergunto-lhe: isto é verdade, Sr. Primeiro-Ministro? O que é aconteceu? O que é que vai acontecer? Estas respostas são fundamentais para o País e para os portugueses saberem se também há uma política para estes que são mais fortes relativamente a todos os cidadãos (...)."

C - Em resposta, o Primeiro-Ministro afirmou:

"O Primeiro-Ministro: - Sr. Deputado Jorge Coelho, em relação à questão fiscal que referiu, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças informou-me - porque, como V. Ex.ª deve saber, não compete ao Primeiro-Ministro ...

Vozes do PS: - Ah!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam silêncio para que possamos ouvir o orador.

O - Orador: - Não compete ao Primeiro-Ministro seguir processos individuais de contribuintes, pelos vistos VV. Ex.as faziam-no e nós não.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Por isso digo-lhe que, segundo informação da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, não foi feito por este Governo, pela Ministra de Estado e das Finanças, ou pelo Secretário de Estado das Finanças, qualquer acordo com qualquer contribuinte individual para qualquer perdão.

Vozes do PS: - Não é perdão, são acções!

O Orador: - Portanto, não é verdade a informação que referiu e tenho de dizer-lhe que se houver algum acordo, foi um acordo feito ainda no Governo de V. Ex.ª, pois, repito, não há qualquer acordo feito por este Governo.
Este Governo não fez qualquer acordo individual com qualquer contribuinte para qualquer perdão ou regime especial, nem fará, porque este Governo aplica a lei igual para todos ao contrário de VV. Ex.as que quando estiveram no governo se vergaram sempre aos lobbies dos mais fortes e dos mais poderosos".

D - As declarações do Primeiro-Ministro geraram imediato pedido de defesa da honra da bancada socialista, na sequência das quais foram dadas explicações:

"O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, com muita serenidade, porque quero acreditar que o Sr. Primeiro-Ministro não terá ouvido os precisos termos da questão que lhe foi colocada pelo Sr. Deputado Jaime Gama, e a que não respondeu, e que foi retomada agora pelo Sr. Deputado Jorge Coelho a que o Sr. Primeiro-Ministro, mais uma vez, também não respondeu.
O que diz o Diário de Notícias de hoje é que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças aceitou como garantia de uma dívida fiscal da sociedade anónima desportiva Sport Lisboa e Benfica acções dessa sociedade desportiva que fazem o Estado ser - a ser verdade a notícia - detentor de 20% do capital social da SAD do Benfica.
A questão que foi colocada a V. Ex.ª é se V. Ex.ª desmente, ou não, este facto, não fica bem, naturalmente, a nenhum Primeiro-Ministro retirar o "tapete" a um membro de Governo, escudando-se que não sabe e que não acompanha um dossier, refugiando-se e remetendo as responsabilidades para a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e desse ponto de vista a Sr.ª Ministra ...

Página 33

0033 | II Série-B - Número 007 | 15 de Junho de 2002

 

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, chamo-lhe a atenção para o seguinte: até agora não ouvi na sua intervenção qualquer expressão que signifique defesa da honra, por favor, vamos conter-nos ao Regimento.

Aplausos do PSD.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, essa sua intervenção foi indiscutivelmente oportuna, todos ouviram o Sr. Primeiro-Ministro acusar a bancada do PS e o anterior governo de terem feito não sei o quê em matéria fiscal.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, para lhe dar a palavra imediatamente nem precisei de saber em que é que a sua bancada se sente ofendido,...

O Orador (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - ... porque ouvi as acusações feitas, portanto era natural que respondesse a elas. Peço-lhe, no entanto, que se contenha dentro das regras do Regimento.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, ainda bem que ficou claro para V. Ex.ª qual foi a ofensa.
Sr. Primeiro-Ministro, tem de esclarecer muito claramente se é verdade ou não que o Estado se tornou detentor de acções correspondentes a 20% do capital da SAD do Benfica; se entende, em nome da igualdade que aqui disse querer assumir, que qualquer clube caloteiro passará para as mãos do Estado, porque ele fará a todos os outros clubes aquilo que fez ao Benfica; e se este é o entendimento do rigor, do combate à fraude e à evasão fiscais e da igualdade de que este Governo é portador.
É isso que V. Ex.ª tem de esclarecer muito claramente, e, por favor, não se refugie atrás da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, porque V. Ex.ª, como chefe do Governo, tem, naturalmente, de assumir a responsabilidade por tudo aquilo que faz e não faz o conjunto do Governo.

Aplausos do PS.

E - Intervindo para dar explicações, o Primeiro-Ministro declarou:

"O Sr. Primeiro-Ministro: - Vou ser extremamente claro, Sr. Deputado António Costa. Não há, feito por este Governo, qualquer acordo com o contribuinte a que V. Ex.ª se referiu na sua intervenção. É claro? É! Não existe qualquer acordo feito por este Governo com o contribuinte que V. Ex.ª referiu.
Em relação à notícia que V. Ex.ª refere, e que eu não conheço, o que lhe posso dizer, baseado na informação que me é transmitida pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, é que qualquer acordo que tenha havido é do governo anterior, é do governo de V. Ex.ª.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É claro? É!
Mais: Sr. Deputado, o Governo, através das Finanças, vai enviar à sua bancada o texto, a cópia, desse acordo...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Afinal, há acordo!

O Orador: - ... e a cópia dos pareceres dos serviços. Vai enviar todo o dossier para sua bancada. E mais lhe digo, Sr. Deputado, vamos também enviar-lhe cópia de todos os processos de execução fiscal que VV. Ex.as fizeram contra clubes de futebol, ou seja, nenhum! VV. Ex.as não foram capazes de levar a cabo qualquer processo de instrução fiscal contra os mais fortes e contra os mais poderosos!

Aplausos do PSD e do CDS-PP"

F - Na sequência, o Presidente do Grupo Parlamentar do PS prestou o seguinte esclarecimento:

"O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, como o Sr. Primeiro-Ministro invocou desconhecer a notícia a que me referi, eu irei entregá-la à Mesa, solicitando-lhe que lha faça chegar visto que ela é muito clara quanto ao facto de não ter havido qualquer decisão do anterior governo sobre a proposta apresentada pelo então advogado do Benfica Dr. Vasco Valdez e de a mesma, segundo a notícia, ter sido decidida pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, por o actual Secretário de Estado Vasco Valdez se ter considerado impedido de despachar o pedido que ele próprio formulara enquanto advogado.
Irei, portanto, entregá-la à Mesa, para que esta a faça distribuir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de a fazer chegar à Mesa, que a Mesa distribuí-la-á imediatamente".

G - Por fim o Deputado Guilherme d'Oliveira Martins precisou:

"O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa, no sentido de lhe dar a informação de que, relativamente a esta questão, que estava pendente no Ministério das Finanças quando eu cessei funções, não foi dado qualquer despacho da minha responsabilidade, tendo-a transmitido ao Governo actual".

2 - No decurso do debate, o Primeiro-Ministro assumiu o compromisso de enviar à Assembleia da República todo o dossier informativo sobre o caso:

"O Governo, através das Finanças, vai enviar à sua bancada o texto, a cópia, desse acordo e a cópia dos pareceres dos serviços. Vai enviar todo o dossier para sua bancada."

Por sua vez, o Ministro dos Assuntos Parlamentares asseverou:

"Reafirmando o que o Sr. Primeiro-Ministro sobre esta questão já disse em resposta ao Sr. Deputado António Costa, quero dizer que, por um lado, o Governo está disponível para enviar todo o dossier sobre esta matéria a todas as bancadas e, por outro, o Governo aceita, desde já, que, na Comissão de Economia prevista para a próxima quarta-feira a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e a sua equipa estejam totalmente disponíveis para abordar esta questão. Assim, fica já tudo decidido a esse respeito e quanto ao resto fica tudo reafirmado".

Página 34

0034 | II Série-B - Número 007 | 15 de Junho de 2002

 

3 - Não tendo ocorrido até segunda-feira qualquer entrega de elementos, o Presidente do Grupo Parlamentar do PS alertou, através de ofício, para a urgência da transmissão dos documentos prometidos.
Ao fim da tarde do dia 4 de Junho o Governo limitou-se a remeter três páginas, contendo, em papel timbrado da Direcção de Serviços de Justiça Tributária da Direcção-Geral dos Impostos, nota não assinada relativa ao processo 691/11355 atinente ao Sport Lisboa e Benfica.
No ofício que capeava a nota o Ministro dos Assuntos Parlamentares solicitou ao Presidente da Assembleia da República bons ofícios no sentido de a nota em causa "ser tratada com todo o grau de confidencialidade", por a matéria fiscal em apreço estar "abrangida pelos requisitos legais atinentes ao segredo fiscal".
4 - Comparecendo perante a Comissão de Economia e Finanças, a Ministra de Estado e das Finanças confirmou ter assinado despacho em 11 de Abril de 2002, sancionando a avaliação das acções oferecidas pelo Benfica como garantia de dívidas fiscais. Recusou-se, porém, a responder às questões que lhe foram colocadas, invocando sigilo fiscal. Insolitamente, pretendendo manipular dados fiscais a que tem acesso privilegiado, não se coibiu de produzir insinuações sobre concretas situações tributárias, deixando envoltos em dúvida os termos e contornos precisos daquilo mesmo que evocou.
Trata-se de procedimentos inaceitáveis, perante os quais o Parlamento deve exercer plenamente as competências de que está investido, utilizando para tal, como meio mais adequado, a figura do inquérito parlamentar.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista vem requerer, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito para apreciação dos actos do Governo referentes ao processo de aceitação pelo Estado de acções da SAD Benfica como garantia de dívidas fiscais em execução, tendo como objectivo:

a) Esclarecer o sentido e alcance das declarações do Sr. Primeiro-Ministro no debate mensal de 31 de Maio sobre a questão fiscal do Benfica e o acordo sobre tal matéria estabelecido;
b) Apreciar os termos e fundamentos em que foi sancionado pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, por despacho de 11 de Abril de 2002, o pedido de instruções feito pelos serviços tributários sobre a idoneidade das garantias oferecidas pelo Benfica;
c) Conhecer da intervenção neste processo do actual Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Dr. Vasco Valdez Matias, ex-advogado do Sport Lisboa e Benfica;
d) Esclarecer se o comportamento do Governo em todo o processo resulta do cumprimento das garantias que, segundo declarações públicas dos Srs. Presidentes da Direcção e do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica, lhes terão sido dadas pelo PSD aquando da sua manifestação de apoio ao partido do Governo no decurso da campanha eleitoral;
e) Apurar a legalidade do reconhecimento pelo Governo de idoneidade, para todos os efeitos fiscais e legais, às garantias apresentadas pelo Benfica.

Palácio de São Bento, 12 de Junho de 2002. Os Deputados do PS: António Costa - Guilherme d'Oliveira Martins - Joel Hasse Ferreira - José Magalhães - Eduardo Cabrita - mais uma assinatura ilegível.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×