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Terça-feira, 7 de maio de 2024 II Série-B — Número 8
XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)
SUPLEMENTO
S U M Á R I O
Inquérito Parlamentar n.º 4/XVI/1.ª (CH):
Comissão Parlamentar de Inquérito para verificação da legalidade e da conduta dos responsáveis políticos alegadamente envolvidos na prestação de cuidados de saúde a duas crianças (gémeas) tratadas com o medicamento Zolgensma:
— Texto inicial; — Alteração do texto inicial do inquérito parlamentar; — Segunda alteração do texto inicial do inquérito parlamentar.
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INQUÉRITO PARLAMENTAR N.º 4/XVI/1.ª
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO PARA VERIFICAÇÃO DA LEGALIDADE E DA CONDUTA
DOS RESPONSÁVEIS POLÍTICOS ALEGADAMENTE ENVOLVIDOS NA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE
SAÚDE A DUAS CRIANÇAS (GÉMEAS) TRATADAS COM O MEDICAMENTO ZOLGENSMA
(Texto inicial)
No passado dia 4 de abril, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) emitiu uma nota à comunicação
social1 intitulada «Processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças tratadas com o
medicamento Zolgensma». Esta nota à comunicação social dá conta das conclusões do relatório (REL-2024-
000057) que versa, segundo a IGAS, o processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças
tratadas com o medicamento Zolgensma, que corresponde ao Processo de Inspeção 061/2023-INS, instaurado
a 5 de novembro de 2023.
O referido relatório foi remetido às seguintes pessoas, órgãos e entidades:
• Gabinete da Secretária de Estado da Promoção da Saúde;
• Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde de Santa Maria, EPE;
• Conselho Diretivo do Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP;
• Secretária-Geral da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde;
• Secretário de Estado da Saúde do XXII Governo Constitucional, à data dos factos inspecionados;
• Diretor Clínico do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, à data dos factos inspecionados;
• Ministério Público, Departamento de Investigação e Ação Penal Regional de Lisboa, 1.ª Secção – Lisboa.
O já citado processo de inspeção focou-se na seguinte formulação: «O Centro Hospitalar Universitário Lisboa
Norte, EPE, cumpriu as normas técnicas e a legalidade no acesso e na prestação de cuidados de saúde a duas
crianças, referidas em notícias publicadas na comunicação social, com atrofia muscular espinal tratadas com o
medicamento Zolgensma?»
Para responder a esta questão, a IGAS refere que «os factos foram analisados em duas linhas de
investigação, ou seja, a referenciação das crianças para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a prestação de
cuidados de saúde após a marcação da consulta».
Neste sentido, e segundo o jornal Expresso que teve acesso ao relatório2, este conclui que «todos os
intervenientes no caso das gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinal tratadas no Hospital de Santa
Maria, em Lisboa, com o medicamento Zolgensma, com um custo inicial de dois milhões de euros por criança,
favoreceram ou cometeram irregularidades para facilitar o acesso das bebés à terapêutica».
Deste modo, e através do referido relatório da IGAS, são confirmadas inúmeras dúvidas levantadas por várias
investigações jornalísticas e audições na Assembleia da República, quanto às várias irregularidades de um
processo que teve início com uma investigação do programa Exclusivo da jornalista Sandra Felgueiras, emitido
pela estação televisiva TVI, no dia 3 de novembro de 20233.
Estas dúvidas passavam pela possível influência ou interferência da Presidência da República, membros do
Governo e outros funcionários e organismos do Estado no favorecimento e desenrolar de todo este processo,
com evidente prejuízo para o erário público (estão em causa mais de quatro milhões euros) e em claro
contraponto a outros casos semelhantes que não obtiveram a mesma resposta e que são referidos na já aludida
investigação jornalística da TVI.
De forma clara, o relatório da IGAS, e segundo o Expresso, é perentório na sequência e conclusão das
principais irregularidades detetadas: «No que respeita à questão principal da inspeção, concluiu-se que não
foram cumpridos os requisitos de legalidade no acesso das duas crianças à consulta de neuropediatria
no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) (…)», objetivamente as normas do «sistema integrado
1 Nota à Comunicação Social IGAS, 4 de abril 2024. 2 Relatório IGAS a que o Expresso teve acesso. 3 Marcelo suspeito de «cunha» para tratamento de duas gémeas no Santa Maria.
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de gestão de acesso dos utentes ao SNS, que exigem a referenciação prévia por um médico do SNS ou do
setor privado».
No que toca à Presidência da República, o relatório aborda a intervenção de Nuno Rebelo de Sousa, que
solicitou no dia 21 de outubro de 2019 a intervenção do Presidente da República, «tendo sido realizadas várias
diligências que culminaram com a remessa do ofício (…), de 31 de outubro de 2019, dirigido ao Chefe do
Gabinete do Primeiro-Ministro, Dr. Francisco André, tendo o Dr. Nuno Rebelo de Sousa sido informado desta
remessa». De seguida, o ofício foi enviado para a Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, Marta Temido.
Em relação ao Ministério da Saúde, o relatório afirma que «Não há evidências da tramitação da comunicação
em análise intra e intergabinetes do Ministério da Saúde, uma vez que a mesma não foi levada ao conhecimento
da Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, nem objeto de despacho, tendo sido remetida pelo Gabinete
de Apoio à Secretaria-Geral. A Ministra da Saúde, a sua Chefe do Gabinete, o Secretário de Estado da Saúde
(SES) e o seu Chefe de Gabinete, à data, afirmaram desconhecer tal comunicação.» Para os inspetores, esta
ausência de tramitação de comunicação não terá impedido que a situação tivesse chegado ao conhecimento de
pelo menos o Secretário de Estado da Saúde (SES), António Lacerda Sales. «O SES teve conhecimento do
caso após reunião realizada no dia 7 de novembro de 2019» com o filho do Presidente da República, Nuno
Rebelo de Sousa, «na qual lhe foi solicitada a colaboração para a obtenção de tratamento com o medicamento
Zolgensma».
Neste seguimento, «Em data por apurar, mas situada entre 7 e 20 de novembro de 2019, o SES solicitou à
sua então secretária pessoal que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa, que pretendia que
fosse marcada uma consulta para duas crianças no Hospital de Santa Maria, tendo-lhe fornecido o número
telefónico para o efeito. Na sequência deste contacto, a secretária pessoal do SES obteve informação, que
remeteu para o CHULN de acordo com as orientações do SES, quanto à identidade das crianças, data de
nascimento, diagnóstico e datas em que os pais poderiam estar presentes no referido hospital». E ainda «para
marcação de consulta, não se descortina como a sua secretária pessoal, atento o seu grau de autonomia,
poderia ter tido conhecimento do caso das duas crianças gémeas e da sua informação pessoal, e comunicado
com o CHULN, que não fosse através do modo e contactos referidos» (o pedido do SES à sua então secretária
pessoal para que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa).
Já no Hospital de Santa Maria, o relatório afirma que «A diretora do Departamento de Pediatria do CHULN
confirmou a receção do referido e-mail, remetido no dia 20 de novembro de 2019 pela secretária pessoal do
SES a solicitar ajuda para o agendamento de uma consulta e avaliação por neuropediatra, tendo, nesse mesmo
dia, feito chegar o pedido ao diretor clínico do CHULN, Dr. Luís Pinheiro.» Apesar do clínico ter negado uma
intervenção direta no caso, os inspetores atestam que «A diretora do Departamento de Pediatria informou a Dr.ª
Teresa Moreno da indicação do diretor clínico para a marcação das consultas de patologia neuromuscular para
duas gémeas, até ao final do ano de 2019.» Apesar dos alertas da Dr.ª Teresa Moreno, a neuropediatra que
acompanharia as gémeas, de que o intuito da família não era conseguir um diagnóstico, mas só aceder ao
fármaco mais prometedor para a doença das bebés, orçado à data em dois milhões de euros por tratamento e
que já lhes tinha sido recusado no Brasil, «o diretor clínico manteve as instruções de marcação das primeiras
consultas da especialidade para as gémeas, que foram agendadas para o dia 5 de dezembro de 2019». Assim,
a IGAS conclui que «Deste modo, o acesso das crianças à primeira consulta hospitalar desrespeitou a
disciplina constante (…) aplicável à data dos factos, uma vez que o diretor clínico autorizou o
agendamento das consultas, o que merece reparo.»
No que diz respeito à aprovação do Zolgensma por parte do Infarmed, o relatório assevera que «Os pedidos
não seguiram o circuito de aprovação e validação dos pedidos de autorizações de utilização excecional (AUE)
(…) que se encontra transposto para o SIATS (Sistema de Informação para Avaliação de Tecnologias de Saúde),
uma vez que foram remetidos por e-mail ao Infarmed, em 29 de fevereiro de 2020, e avaliados pela perita em
momento anterior à sua submissão no SIATS, que apenas ocorreu em 2 de março de 2020.»
Pelo exposto, entende o Grupo Parlamentar do Chega que, apesar das conclusões contundentes do relatório
da IGAS, existem outras situações relacionadas com este caso que continuam por esclarecer, que é necessário
investigar. Outras, já contempladas no relatório, carecem de uma investigação mais aprofundada. Neste sentido,
entendemos que devemos questionar e averiguar também a inusual celeridade no processo de atribuição de
nacionalidade portuguesa às duas crianças, na altura, de nacionalidade brasileira, assim como a aquisição de
quatro cadeiras de rodas elétricas, topo de gama, pelas quais o Estado pagou mais de € 58 000 e que até hoje
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não foram levantadas. Da mesma forma, importa indagar se já existiram outros casos semelhantes a este, dado
que o chamado «turismo de saúde» é cada vez mais uma realidade referenciada e denunciada dentro do Serviço
Nacional de Saúde, o que necessariamente desvia recursos fundamentais para a prestação de serviços de
saúde aos portugueses, tão fustigados pelo estado calamitoso que o SNS atingiu.
Desta forma, entende o Chega que apenas uma comissão parlamentar de inquérito permitirá realizar todas
as indagações necessárias para descobrir todos os envolvidos neste caso de favorecimento, quais foram as
irregularidades cometidas e se existiram outros casos semelhantes a este num passado recente. Importa
sobretudo que o poder político não fique impune e que haja escrutínio independentemente dos decisores
políticos envolvidos.
Assim:
– Considerando que compete ao Parlamento escrutinar os atos do Governo e da Administração e que as
comissões parlamentares de inquérito são o instrumento mais adequado para esse fim;
– Considerando que os Deputados têm o dever de procurar a verdade e os portugueses têm o direito de a
conhecer;
– Considerando que o escrutínio dos atos do Governo e da Administração é um direito inalienável e um dever
dos Deputados;
Os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Chega requerem, ao abrigo do disposto na alínea
a) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 5/93, de 1 de março, republicada pela Lei n.º 15/2007, de 3 de abril, a
constituição imediata de uma comissão parlamentar de inquérito, com o objetivo de:
• Apurar, independentemente dos decisores políticos envolvidos, todas as responsabilidades no
favorecimento à prestação de cuidados de saúde às duas crianças luso-brasileiras tratadas com o
medicamento Zolgensma (um dos mais caros do mundo), bem assim como na obtenção de nacionalidade;
• Desvendar as possíveis irregularidades cometidas em todo o processo;
• Calcular os custos para o erário público;
• Investigar a existência de outros casos semelhantes num passado recente.
Palácio de São Bento, 10 de abril de 2024.
(Substituição do texto inicial do inquérito parlamentar, a pedido do autor)
No passado dia 4 de abril, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) emitiu uma nota à comunicação
social1 intitulada «Processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças tratadas com o
medicamento Zolgensma». Esta nota à comunicação social dá conta das conclusões do relatório (REL-2024-
000057) que versa, segundo a IGAS, o processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças
tratadas com o medicamento Zolgensma, que corresponde ao Processo de Inspeção 061/2023-INS, instaurado
a 5 de novembro de 2023.
O referido relatório foi remetido às seguintes pessoas, órgãos e entidades:
• Gabinete da Secretária de Estado da Promoção da Saúde;
• Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde de Santa Maria, EPE;
• Conselho Diretivo do Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP;
• Secretária-Geral da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde;
• Secretário de Estado da Saúde do XXII Governo Constitucional, à data dos factos inspecionados;
• Diretor Clínico do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, à data dos factos inspecionados;
1 Nota à Comunicação Social IGAS, 4 de abril 2024.
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• Ministério Público, Departamento de Investigação e Ação Penal Regional de Lisboa, 1.ª Secção – Lisboa.
O já citado processo de inspeção focou-se na seguinte formulação: «O Centro Hospitalar Universitário Lisboa
Norte, EPE, cumpriu as normas técnicas e a legalidade no acesso e na prestação de cuidados de saúde a duas
crianças, referidas em notícias publicadas na comunicação social, com atrofia muscular espinal tratadas com o
medicamento Zolgensma?»
Para responder a esta questão, a IGAS refere que «os factos foram analisados em duas linhas de
investigação, ou seja, a referenciação das crianças para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a prestação de
cuidados de saúde após a marcação da consulta».
Neste sentido, e segundo o jornal Expresso que teve acesso ao relatório2, este conclui que «todos os
intervenientes no caso das gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinal tratadas no Hospital de Santa
Maria, em Lisboa, com o medicamento Zolgensma, com um custo inicial de dois milhões de euros por criança,
favoreceram ou cometeram irregularidades para facilitar o acesso das bebés à terapêutica».
Deste modo, e através do referido relatório da IGAS, são confirmadas inúmeras dúvidas levantadas por várias
investigações jornalísticas e audições na Assembleia da República, quanto às várias irregularidades de um
processo que teve início com uma investigação do programa Exclusivo da jornalista Sandra Felgueiras, emitido
pela estação televisiva TVI, no dia 3 de novembro de 20233.
Estas dúvidas passavam pela possível influência ou interferência da Presidência da República, membros do
Governo, e outros funcionários e organismos do Estado, no favorecimento e desenrolar de todo este processo,
com evidente prejuízo para o erário público (estão em causa mais de quatro milhões euros) e em claro
contraponto a outros casos semelhantes que não obtiveram a mesma resposta e que são referidos na já aludida
investigação jornalística da TVI.
De forma clara, o relatório da IGAS, e segundo o Expresso, é perentório na sequência e conclusão das
principais irregularidades detetadas: «No que respeita à questão principal da inspeção, concluiu-se que não
foram cumpridos os requisitos de legalidade no acesso das duas crianças à consulta de neuropediatria
no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) (…)», objetivamente as normas do «sistema integrado
de gestão de acesso dos utentes ao SNS, que exigem a referenciação prévia por um médico do SNS ou do
setor privado».
No que toca à Presidência da República, o relatório aborda a intervenção de Nuno Rebelo de Sousa, que
solicitou no dia 21 de outubro de 2019, a intervenção do Presidente da República, «tendo sido realizadas várias
diligências que culminaram com a remessa do ofício (…), de 31 de outubro de 2019, dirigido ao chefe do gabinete
do Primeiro-Ministro, Dr. Francisco André, tendo o Dr. Nuno Rebelo de Sousa sido informado desta remessa».
De seguida, o ofício foi enviado para a Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, Marta Temido.
Em relação ao Ministério da Saúde, o relatório afirma que «Não há evidências da tramitação da comunicação
em análise intra e intergabinetes do Ministério da Saúde, uma vez que a mesma não foi levada ao conhecimento
da Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, nem objeto de despacho, tendo sido remetida pelo Gabinete
de Apoio à Secretaria-Geral. A Ministra da Saúde, a sua Chefe do Gabinete, o Secretário de Estado da Saúde
(SES) e o seu Chefe de Gabinete, à data, afirmaram desconhecer tal comunicação.» Para os inspetores, esta
ausência de tramitação de comunicação não terá impedido que a situação tivesse chegado ao conhecimento de
pelo menos o Secretário de Estado da Saúde (SES), António Lacerda Sales. «O SES teve conhecimento do
caso após reunião realizada no dia 7 de novembro de 2019» com o filho do Presidente da República, Nuno
Rebelo de Sousa, «na qual lhe foi solicitada a colaboração para a obtenção de tratamento com o medicamento
Zolgensma».
Neste seguimento «Em data por apurar, mas situada entre 7 e 20 de novembro de 2019, o SES solicitou à
sua então secretária pessoal que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa, que pretendia que
fosse marcada uma consulta para duas crianças no Hospital de Santa Maria, tendo-lhe fornecido o número
telefónico para o efeito. Na sequência deste contacto, a secretária pessoal do SES obteve informação, que
remeteu para o CHULN de acordo com as orientações do SES, quanto à identidade das crianças, data de
nascimento, diagnóstico e datas em que os pais poderiam estar presentes no referido hospital». E ainda «para
marcação de consulta, não se descortina como a sua secretária pessoal, atento o seu grau de autonomia,
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poderia ter tido conhecimento do caso das duas crianças gémeas e da sua informação pessoal, e comunicado
com o CHULN, que não fosse através do modo e contactos referidos» (o pedido do SES à sua então secretária
pessoal para que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa).
Já no Hospital de Santa Maria, o relatório afirma que «A diretora do Departamento de Pediatria do CHULN
confirmou a receção do referido e-mail, remetido no dia 20 de novembro de 2019 pela secretária pessoal do
SES a solicitar ajuda para o agendamento de uma consulta e avaliação por neuropediatra, tendo, nesse mesmo
dia, feito chegar o pedido ao diretor clínico do CHULN, Dr. Luís Pinheiro.» Apesar do clínico ter negado uma
intervenção direta no caso, os inspetores atestam que «A diretora do Departamento de Pediatria informou a Dr.ª
Teresa Moreno da indicação do diretor clínico para a marcação das consultas de patologia neuromuscular para
duas gémeas, até ao final do ano de 2019.» Apesar dos alertas da Dr.ª Teresa Moreno, a neuropediatra que
acompanharia as gémeas, de que o intuito da família não era conseguir um diagnóstico, mas só aceder ao
fármaco mais prometedor para a doença das bebés, orçado à data em dois milhões de euros por tratamento e
que já lhes tinha sido recusado no Brasil, «o diretor clínico manteve as instruções de marcação das primeiras
consultas da especialidade para as gémeas, que foram agendadas para o dia 5 de dezembro de 2019». Assim,
a IGAS conclui que «Deste modo, o acesso das crianças à primeira consulta hospitalar desrespeitou a
disciplina constante (…) aplicável à data dos factos, uma vez que o diretor clínico autorizou o
agendamento das consultas, o que merece reparo.»
No que diz respeito à aprovação do Zolgensma por parte do Infarmed, o relatório assevera que «Os pedidos
não seguiram o circuito de aprovação e validação dos pedidos de autorizações de utilização excecional (AUE)
(…) que se encontra transposto para o SIATS (Sistema de Informação para Avaliação de Tecnologias de Saúde),
uma vez que foram remetidos por e-mail ao Infarmed, em 29 de fevereiro de 2020, e avaliados pela perita em
momento anterior à sua submissão no SIATS, que apenas ocorreu em 2 de março de 2020.»
Pelo exposto, entende o Grupo Parlamentar do Chega que, apesar das conclusões contundentes do relatório
da IGAS, existem outras situações relacionadas com este caso que continuam por esclarecer, que é necessário
investigar. Outras, já contempladas no relatório, carecem de uma investigação mais aprofundada. Neste sentido,
entendemos que devemos questionar e averiguar também, a inusual celeridade no processo de atribuição de
nacionalidade portuguesa às duas crianças, na altura, de nacionalidade brasileira, assim como a aquisição de
quatro cadeiras de rodas elétricas, topo de gama, pelas quais o Estado pagou mais de €58 000 e que até hoje
não foram levantadas. Da mesma forma, importa indagar se já existiram outros casos semelhantes a este, dado
que o chamado «turismo de saúde» é cada vez mais uma realidade referenciada e denunciada dentro do Serviço
Nacional de Saúde, o que necessariamente desvia recursos fundamentais para a prestação de serviços de
saúde aos portugueses, tão fustigados pelo estado calamitoso que o SNS atingiu.
Desta forma, entende o Chega que apenas uma comissão parlamentar de inquérito permitirá realizar todas
as indagações necessárias para descobrir todos os envolvidos neste caso de favorecimento, quais foram as
irregularidades cometidas e se existiram outros casos semelhantes a este num passado recente. Importa
sobretudo que o poder político não fique impune e que haja escrutínio independentemente dos decisores
políticos envolvidos.
Assim:
– Considerando que compete ao Parlamento escrutinar os atos do Governo e da Administração e que as
comissões parlamentares de inquérito são o instrumento mais adequado para esse fim;
– Considerando que os Deputados têm o dever de procurar a verdade e os portugueses têm o direito de a
conhecer;
– Considerando que o escrutínio dos atos do Governo e da Administração é um direito inalienável e um dever
dos Deputados;
Os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Chega requerem, ao abrigo do disposto na alínea
b) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 5/93, de 1 de março, republicada pela Lei n.º 15/2007, de 3 de abril, a
constituição imediata de uma comissão parlamentar de inquérito, com o objetivo de:
• Apurar, independentemente dos decisores políticos envolvidos, todas as responsabilidades no
favorecimento à prestação de cuidados de saúde às duas crianças luso-brasileiras tratadas com o
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medicamento Zolgensma (um dos mais caros do mundo), bem assim como na obtenção de nacionalidade;
• Desvendar as possíveis irregularidades cometidas em todo o processo;
• Calcular os custos para o erário público;
• Investigar a existência de outros casos semelhantes num passado recente.
Palácio de São Bento, 10 de abril de 2024.
(Segunda substituição do texto inicial, a pedido do autor)
No passado dia 4 de abril, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) emitiu uma nota à comunicação
social1 intitulada «Processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças tratadas com o
medicamento Zolgensma». Esta nota à comunicação social dá conta das conclusões do relatório (REL-2024-
000057) que versa, segundo a IGAS, o processo de inspeção sobre a prestação de cuidados a duas crianças
tratadas com o medicamento Zolgensma, que corresponde ao Processo de Inspeção 061/2023-INS, instaurado
a 5 de novembro de 2023.
O referido relatório foi remetido às seguintes pessoas, órgãos e entidades:
• Gabinete da Secretária de Estado da Promoção da Saúde;
• Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde de Santa Maria, EPE;
• Conselho Diretivo do Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP;
• Secretária-Geral da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde;
• Secretário de Estado da Saúde do XXII Governo Constitucional, à data dos factos inspecionados;
• Diretor Clínico do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, à data dos factos inspecionados;
• Ministério Público, Departamento de Investigação e Ação Penal Regional de Lisboa, 1.ª Secção – Lisboa.
O já citado processo de inspeção focou-se na seguinte formulação: «O Centro Hospitalar Universitário Lisboa
Norte, EPE, cumpriu as normas técnicas e a legalidade no acesso e na prestação de cuidados de saúde a duas
crianças, referidas em notícias publicadas na comunicação social, com atrofia muscular espinal tratadas com o
medicamento Zolgensma?»
Para responder a esta questão, a IGAS refere que «os factos foram analisados em duas linhas de
investigação, ou seja, a referenciação das crianças para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a prestação de
cuidados de saúde após a marcação da consulta».
Neste sentido, e segundo o jornal Expresso que teve acesso ao relatório2, este conclui que «todos os
intervenientes no caso das gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinal tratadas no Hospital de Santa
Maria, em Lisboa, com o medicamento Zolgensma, com um custo inicial de dois milhões de euros por criança,
favoreceram ou cometeram irregularidades para facilitar o acesso das bebés à terapêutica».
Deste modo, e através do referido relatório da IGAS, são confirmadas inúmeras dúvidas levantadas por várias
investigações jornalísticas e audições na Assembleia da República, quanto às várias irregularidades de um
processo que teve início com uma investigação do programa Exclusivo da jornalista Sandra Felgueiras, emitido
pela estação televisiva TVI, no dia 3 de novembro de 20233.
Estas dúvidas passavam pela possível influência ou interferência da Presidência da República, membros do
Governo e outros funcionários e organismos do Estado no favorecimento e desenrolar de todo este processo,
com evidente prejuízo para o erário público (estão em causa mais de quatro milhões euros) e em claro
contraponto a outros casos semelhantes que não obtiveram a mesma resposta e que são referidos na já aludida
investigação jornalística da TVI.
De forma clara, o relatório da IGAS, e segundo o Expresso, é perentório na sequência e conclusão das
principais irregularidades detetadas: «No que respeita à questão principal da inspeção, concluiu-se que não
1 Nota à Comunicação Social IGAS, 4 de abril 2024. 2 Relatório IGAS a que o Expresso teve acesso 3 Marcelo suspeito de «cunha» para tratamento de duas gémeas no Santa Maria.
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foram cumpridos os requisitos de legalidade no acesso das duas crianças à consulta de neuropediatria
no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) (…)», objetivamente as normas do «sistema integrado
de gestão de acesso dos utentes ao SNS, que exigem a referenciação prévia por um médico do SNS ou do
setor privado».
No que toca à Presidência da República, o relatório aborda a intervenção de Nuno Rebelo de Sousa, que
solicitou no dia 21 de outubro de 2019, a intervenção do Presidente da República, «tendo sido realizadas várias
diligências que culminaram com a remessa do ofício (…), de 31 de outubro de 2019, dirigido ao Chefe do
Gabinete do Primeiro-Ministro, Dr. Francisco André, tendo o Dr. Nuno Rebelo de Sousa sido informado desta
remessa». De seguida, o ofício foi enviado para a Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, Marta Temido.
Em relação ao Ministério da Saúde, o relatório afirma que «Não há evidências da tramitação da comunicação
em análise intra e intergabinetes do Ministério da Saúde, uma vez que a mesma não foi levada ao conhecimento
da Chefe do Gabinete da então Ministra da Saúde, nem objeto de despacho, tendo sido remetida pelo Gabinete
de Apoio à Secretaria-Geral. A Ministra da Saúde, a sua Chefe do Gabinete, o Secretário de Estado da Saúde
(SES) e o seu Chefe de Gabinete, à data, afirmaram desconhecer tal comunicação.» Para os inspetores, esta
ausência de tramitação de comunicação não terá impedido que a situação tivesse chegado ao conhecimento de
pelo menos o Secretário de Estado da Saúde (SES), António Lacerda Sales. «O SES teve conhecimento do
caso após reunião realizada no dia 7 de novembro de 2019» com o filho do Presidente da República, Nuno
Rebelo de Sousa, «na qual lhe foi solicitada a colaboração para a obtenção de tratamento com o medicamento
Zolgensma».
Neste seguimento «Em data por apurar, mas situada entre 7 e 20 de novembro de 2019, o SES solicitou à
sua então secretária pessoal que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa, que pretendia que
fosse marcada uma consulta para duas crianças no Hospital de Santa Maria, tendo-lhe fornecido o número
telefónico para o efeito. Na sequência deste contacto, a secretária pessoal do SES obteve informação, que
remeteu para o CHULN de acordo com as orientações do SES, quanto à identidade das crianças, data de
nascimento, diagnóstico e datas em que os pais poderiam estar presentes no referido hospital». E ainda «para
marcação de consulta, não se descortina como a sua secretária pessoal, atento o seu grau de autonomia,
poderia ter tido conhecimento do caso das duas crianças gémeas e da sua informação pessoal, e comunicado
com o CHULN, que não fosse através do modo e contactos referidos» (o pedido do SES à sua então secretária
pessoal para que contactasse telefonicamente o Dr. Nuno Rebelo de Sousa).
Já no Hospital de Santa Maria, o relatório afirma que «A diretora do Departamento de Pediatria do CHULN
confirmou a receção do referido e-mail, remetido no dia 20 de novembro de 2019 pela secretária pessoal do
SES a solicitar ajuda para o agendamento de uma consulta e avaliação por neuropediatra, tendo, nesse mesmo
dia, feito chegar o pedido ao diretor clínico do CHULN, Dr. Luís Pinheiro.» Apesar do clínico ter negado uma
intervenção direta no caso, os inspetores atestam que «A diretora do Departamento de Pediatria informou a Dr.ª
Teresa Moreno da indicação do diretor clínico para a marcação das consultas de patologia neuromuscular para
duas gémeas, até ao final do ano de 2019.» Apesar dos alertas da Dr.ª Teresa Moreno, a neuropediatra que
acompanharia as gémeas, de que o intuito da família não era conseguir um diagnóstico, mas só aceder ao
fármaco mais prometedor para a doença das bebés, orçado à data em dois milhões de euros por tratamento e
que já lhes tinha sido recusado no Brasil, «o diretor clínico manteve as instruções de marcação das primeiras
consultas da especialidade para as gémeas, que foram agendadas para o dia 5 de dezembro de 2019». Assim,
a IGAS conclui que «Deste modo, o acesso das crianças à primeira consulta hospitalar desrespeitou a
disciplina constante (…) aplicável à data dos factos, uma vez que o diretor clínico autorizou o
agendamento das consultas, o que merece reparo.»
No que diz respeito à aprovação do Zolgensma por parte do Infarmed, o relatório assevera que «Os pedidos
não seguiram o circuito de aprovação e validação dos pedidos de autorizações de utilização excecional (AUE)
(…) que se encontra transposto para o SIATS (Sistema de Informação para Avaliação de Tecnologias de Saúde),
uma vez que foram remetidos por e-mail ao Infarmed, em 29 de fevereiro de 2020, e avaliados pela perita em
momento anterior à sua submissão no SIATS, que apenas ocorreu em 2 de março de 2020.»
Pelo exposto, entende o Grupo Parlamentar do Chega que, apesar das conclusões contundentes do relatório
da IGAS, existem outras situações relacionadas com este caso que continuam por esclarecer, que é necessário
investigar. Outras, já contempladas no relatório, carecem de uma investigação mais aprofundada. Neste sentido,
entendemos que devemos questionar e averiguar também, a inusual celeridade no processo de atribuição de
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nacionalidade portuguesa às duas crianças, na altura, de nacionalidade brasileira, assim como a aquisição de
quatro cadeiras de rodas elétricas, topo de gama, pelas quais o Estado pagou mais de € 58 000 e que até hoje
não foram levantadas. Da mesma forma, importa indagar se já existiram outros casos semelhantes a este, dado
que o chamado «turismo de saúde» é cada vez mais uma realidade referenciada e denunciada dentro do Serviço
Nacional de Saúde, o que necessariamente desvia recursos fundamentais para a prestação de serviços de
saúde aos portugueses, tão fustigados pelo estado calamitoso que o SNS atingiu.
Desta forma, entende o Chega que apenas uma comissão parlamentar de inquérito permitirá realizar todas
as indagações necessárias para descobrir todos os envolvidos neste caso de favorecimento, quais foram as
irregularidades cometidas e se existiram outros casos semelhantes a este num passado recente. Importa
sobretudo que o poder político não fique impune e que haja escrutínio independentemente dos decisores
políticos envolvidos.
Assim:
– Considerando que compete ao Parlamento escrutinar os atos do Governo e da Administração e que as
comissões parlamentares de inquérito são o instrumento mais adequado para esse fim;
– Considerando que os Deputados têm o dever de procurar a verdade e os portugueses têm o direito de a
conhecer;
– Considerando que o escrutínio dos atos do Governo e da Administração é um direito inalienável e um dever
dos Deputados;
Os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Chega requerem, ao abrigo do disposto na alínea
b) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 5/93, de 1 de março, republicada pela Lei n.º 15/2007, de 3 de abril, a
constituição imediata de uma comissão parlamentar de inquérito, com o objetivo de:
• Apurar, independentemente dos decisores políticos envolvidos, todas as responsabilidades no
favorecimento à prestação de cuidados de saúde às duas crianças luso-brasileiras tratadas com o
medicamento Zolgensma (um dos mais caros do mundo), bem assim como na obtenção de nacionalidade;
• Verificar as questões suscitadas na nota informativa que remete para o relatório da Inspeção-Geral das
Atividades em Saúde (IGAS) sobre o referido processo e desvendar as possíveis irregularidades
cometidas em todo o processo;
• Calcular os custos para o erário público;
• Investigar a existência de outros casos semelhantes num passado recente.
Palácio de São Bento, 12 de abril de 2024.
Os Deputados do CH: André Ventura — António Pinto Pereira — Armando Grave — José Barreira Soares
— Bruno Nunes — Carlos Barbosa — Daniel Teixeira — Diogo Pacheco de Amorim — Diva Ribeiro — Eduardo
Teixeira — Eliseu Neves — Felicidade Vital — Filipe Melo — Francisco Gomes — Gabriel Mithá Ribeiro —
Henrique Rocha de Freitas — João Paulo Graça — João Ribeiro — João Tilly — Jorge Galveias — José Dias
Fernandes — José Carvalho — Luís Paulo Fernandes — Luísa Areosa — Madalena Cordeiro — Manuel Magno
— Manuela Tender — Maria José Aguiar — Marcus Santos — Marta Martins da Silva — Miguel Arruda — Nuno
Gabriel — Nuno Simões de Melo — Patrícia Carvalho — Pedro Correia — Pedro dos Santos Frazão — Pedro
Pessanha — Pedro Pinto — Raul Melo — Ricardo Dias Pinto — Rita Matias — Rui Cristina — Rui Paulo Sousa
— Sandra Ribeiro — Sónia Monteiro — Vanessa Barata.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.