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Quarta-feira, 30 de Novembro de 1988

II Série-C — Número 4

DIÁRIO

da Assembleia da República

V LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO Acta da reunião de 29 de Novembro de 1988

SUMÁRIO

Acta da reunião de 29 de Novembro de ¡988: início do debate, na especialidade, das propostas de lei n.05 74/V — Orçamento do Estado para 1989 e 75/V— Grandes Opções do Plano para 1989-1992 e Grandes Opções do Plano para 1989 (Ministérios da Saúde, da Administração Interna, do Comércio e Turismo, do Planeamento e da Administração do Território e da Educação). ,

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O Sr. Presidente (Rui Machete): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Vamos iniciar os trabalhos de análise, na especialidade, do Orçamento do Estado para 1989. Nesse sentido, peço à Sr.a Ministra da Saúde para fazer uma exposição inicial, certamente sucinta, acerca do orçamento do seu Ministério.

Tem a palavra, Sr." Ministra.

A Sr.a Ministra da Saúde (Leonor Beleza): — Sr. Presidente, vou aproveitar para dizer algumas coisas que caracterizam fundamentalmente, do meu ponto de vista, aquilo que é o orçamento proposto à Assembleia da República para o Ministério da Saúde.

Em primeiro lugar vou fazer algumas considerações sobre o orçamento para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e, em segundo lugar, sobre o PIDDAC.

Quanto ao orçamento do Serviço Nacional de Saúde sublinho que há basicamente três zonas críticas de despesa que têm uma relevância muito importante em termos de verbas globais. Essas três zonas críticas são as dos medicamentos, das convenções e dos gastos dos hospitais. Um dos grandes objectivos que temos para 1989 é o de introduzir algum reequilíbrio nos gastos entre cuidados de saúde primários e hospitais, considerando para este efeito os cuidados de saúde primários incluídos nos gastos como medicamentos e como convenções — aliás, nos termos em que os Srs. Deputados dispõem e que estão expressos na proposta de lei do Orçamento. Como sabem, esta é uma divisão algo artificiosa mas é aquela que tem vindo a ser feita. Aliás, como também sabem, o peso relativo dos medicamentos e das convenções no orçamento global do Serviço Nacional de Saúde tem vindo a crescer, embora em relação aos medicamentos este ano esteja já, por efeito de medidas que foram tomadas, a conhecer alguma inflexão. Entendemos que essa inflexão tem de continuar em relação aos medicamentos em 1989, por forma a permitir que, lentamente, a factura de medicamentos se situe a níveis semelhantes, em termos de verbas globais para a saúde, àquilo que se passa nos países europeus. Neste sentido, devo dizer que o peso relativo das verbas de medicamentos no orçamento do Serviço Nacional de Saúde é perto do dobro da média europeia como, aliás, também o é em relação ao produto interno bruto comparado com alguns países da Europa.

Por outro lado, relativamente às convenções, é de referir que o nosso objectivo é o de introduzir em 1989 também alguma inflexão no peso relativo que têm vindo a adquirir. Em relação a este ponto não conseguimos ainda grandes resultados em 1988. No que respeita ainda às convenções e, portanto, às medidas que neste domínio terão de ser tomadas fundamentalmente com o objectivo de introduzir algum equilíbrio, e que não têm nada a ver — pelo menos neste momento não me vou reportar a isso — com concepções sobre se elas são ou não uma forma adequada e desejável de prestação de cuidados de saúde, a verdade é que algumas das regras que têm sido utilizadas têm favorecido, em termos que não considero muito positivos, o crescimento de facturas com convenções.

Neste âmbito, refiro-me substancialmente a duas questões: em primeiro lugar, a questão do estatuto das

pessoas com quem o Ministério da Saúde convenciona a prestação de cuidados médicos, nomeadamente o facto de em muitos casos se tratar de funcionários do Serviço Nacional de Saúde. Devo dizer que, já há algum tempo, não há nenhuma convenção nova com funcionários do Serviço Nacional de Saúde ou com entidades que empreguem esses funcionários, mas há um contencioso passado que ainda está por resolver.

Um dos outros pontos que tem a ver substancialmente com aquilo que é prestado a nível convencionado, sobretudo a nível de meios auxiliares de diagnóstico, tem naturalmente relação com o que se passa nos hospitais e com os serviços que eles prestam, designadamente a entidades exteriores. Os hospitais têm vindo a ser incentivados fortemente a prestar cada vez, mais serviços para fora e a abastarem-se cada vez mais a si próprios, com o objectivo de rentabilizar suficientemente os equipamentos hospitalares que são pagos pelo contribuinte e que ainda não estão a funcionar plenamente.

Devo dizer que neste momento tenho alguns indícios, extremamente animadores, de que esta política está a dar resultado, nomeadamente de um relacionamento mais intenso entre as administrações regionais de saúde (ARS) e os hospitais e da celebração de entendimentos entre os dois lados com o objectivo de serem prioritariamente os hospitais a prestar serviços nestas áreas, até esgotarem as suas capacidades, aos utentes do Serviço Nacional de Saúde, mesmo quando a requisição desses meios auxiliares de diagnóstico foi feita em ambulatório.

Por outro lado, apostamos fortemente na capacidade de aumento da produtividade dos serviços de saúde, nomeadamente dos hospitais. Há aqui alguns pontos importantes que têm a ver com a reorganização de como as coisas se processam neste momento e que já vos referirei. Um deles tem a ver com uma regra que vamos adoptar a partir do início de 1989 e que assenta na ideia de que cada hospital deve pagar as despesas que gera. Isto hoje não acontece totalmente dado que há despesas geradas em hospitais e que são de facto pagas a nível de cuidados de saúde primários. Isso significa que quem paga não tem controle na geração da despesa e que quem tem controle na geração da despesa não paga, o que naturalmente produz despesas em condições que talvez não devessem, pura e simplesmente, existir.

Por outro lado e a par daquilo que disse sobre as convenções, insistiremos largamente na rentabilização dos equipamentos hospitalares. Já disse publicamente e repito que neste momento já conseguimos que mais de 500 mil contos de equipamento que estava parado em determinados hospitais tenha sido colocado em hospitais onde agora está a funcionar, e naturalmente com capacidade de aumentar significativamente a produção dos próprios hospitais.

Para além disso, vimos cada vez mais incentivando hospitais a prestar serviços para fora e a rentabilizar totalmente o equipamento que têm.

Ao nível das administrações regionais de saúde esperamos fundamentalmente resultados novos e positivos mediante a criação de um regime novo para um certo número de médicos de clínica geral durante o ano de 1989. Isso traduz-se — neste caso sim! — por passar funcionários do Serviço Nacional de Saúde (médicos) ao regime convencionado, com um sistema que in-

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centiva esses médicos, por um lado, a produzirem mais do que aquilo que neste momento acontece e que, por outro lado, cria uma relação mais directa e mais humanizada entre o utente do Serviço Nacional de Saúde e o médico, o que do nosso ponto de vista é absolutamente essencial a nível de cuidados de saúde primários.

Em relação ao plano de investimentos no domínio da saúde há algumas regras gerais, alguns parâmetros com base nos quais elaborámos o PIDDAC de que vos quero falar. Em primeiro lugar, pretendemos terminar as obras em curso o mais depressa possível. Em segundo lugar, fazemos uma aposta evidente nos hospitais distritais e numa medida importante nos hospitais distritais situados nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto. Conforme já tive ocasião de dizer algumas vezes aos Srs. Deputados, considero que as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto mereciam e merecem uma atenção muito especial na medida em que foram relativamente esquecidas — isto no que respeita ao que se passou no resto do Pais — durante muitos anos, o que significou e significa ainda uma pressão extremamente violenta sobre os hospitais centrais situados em Lisboa e no Porto, muitas vezes por efeito do acesso a esses hospitais de cidadãos que, com proveito e maior rentabilidade a todos os níveis, deveriam ser tratados noutras zonas.

Como sabem, entre os hospitais distritais em curso ou programados está um número importante de obras nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto com o objectivo de apetrechar essas duas grandes cidades de estabelecimentos hospitalares que impeçam, de facto, o acesso sistemático aos hospitais da cidade propriamente dita. Assim, em Lisboa está neste momento em construção o Hospital de Almada, vai arrancar dentro de pouco tempo o Hospital da Amadora e já está a funcionar em termos plenos o Hospital do Barreiro. Em relação ao Porto, posso informar que arrancará a breve trecho — está já adjudicado — o Hospital de Matosinhos, prevendo-se uma grande remodelação do Hospital de Vila Nova de Gaia, com o objectivo de torná-lo mais funcional e simultaneamente de transformá-lo num verdadeiro hospital central, com tudo o que isso implica, concentrando todos os seus serviços na mesma zona.

Por outro lado, e também relativamente a hospitais distritais, estão em curso e vão avançar a um ritmo rápido os Hospitais de Vila Real e de Guimarães, está em curso o concurso para o lançamento do Hospital de Leiria e algumas outras obras em relação a hospitais distritais novos vão ser lançadas durante o ano de 1989. Há também algumas grandes ampliações de hospitais distritais que vão começar, nomeadamente em Torres Vedras, Elvas e Portimão. Quanto a hospitais centrais, já tive ocasião de fazer referência ao Hospital Distrital de Vila Nova de Gaia, isso a propósito da cintura e da área metropolitana da cidade do Porto, mas há também obras importantes a iniciar em alguns hospitais centrais, nomeadamente Santo António, Santa Cruz e São Francisco Xavier.

Também há um programa de centros de saúde que vai avançar durante o ano de 1989, mas não vou agora referir pormenores.

De qualquer modo, em relação ao PIDDAC há ainda dois pontos particularmente importantes que gostaria de referir: um é a prossecução do programa de saúde materno-infantil durante o ano de 1989, com o objec-

tivo de que no final desse ano todas as maternidades do País que entendemos que devem funcionar tenham condições, que consideramos mínimas, de segurança para aquilo que é exigível num país como o nosso — e estou a referir-me a serviços de obstetrícia e de neo-natalogia, em relação aos quais já está em curso neste

momento, e continuará durante o próximo ano, um programa de investimentos e de dotação de meios humanos que assegure suficientemente o funcionamento dessas maternidades, que, repito, são as que entendemos que devem funcionar em todo o país.

Finalmente, gostaria de dizer que prosseguiremos em 1989 o esforço de automatização dos serviços como iniciativa indispensável de modernização na gestão dos serviços de saúde.

Sr. Presidente, são estas linhas fundamentais que entendo dever referir neste momento e fico à disposição dos Srs. Deputados para fazer quaiquer considerações acessórias.

O Sr. Presidente: — Sr." Ministra, iremos agora passar à fase dos pedidos de esclarecimento, pelo que peço aos Srs. Deputados que desejam formular perguntas que solicitem a palavra. Peço-lhes também que, antes de formularem as perguntas, se identifiquem para efeios de registo de gravação.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr." Ministra, começarei exactamente, como fez V. Ex.a, por distinguir e falar nos dois orçamentos: o do Serviço Nacional de Saúde e o do PIDDAC.

Numa primeira apreciação, embora a Sr.a Ministra tivesse referido três pontos críticos, considero que há mais, porque — e estes são os números fornecidos pelo seu Ministério — o aumento do orçamento para o SNS é apenas de 7,26 %. Todos nós sabemos que a inflação, ainda que seja cumprida, no campo da saúde é sempre muito superior à inflação prevista. Os gastos em medicamentos e nos hospitais são sempre superiores aos previstos, pelo que a inflação neste sector é sempre superior à normal.

Além disso, Sr.a Ministra, gostaria de colocar-lhe um problema: para o ano não vai haver novas carreiras e novas admissões? Será que os médicos não vão ser aumentados? A Sr.8 Ministra não prevê que haja uma alteração nas carreiras médicas? Isso não vai originar mais despesas? Este era um dos aspectos que gostaria de colocar-lhe em relação a todo o problema do Serviço Nacional de Saúde.

A Sr.4 Ministra diz-nos também que vai poupar, porque vai aumentar a produtividade. Já o ano passado ouvimos isso e, inclusivamente, um técnico do seu Ministério, o Sr. Dr. Urbano, fez-nos uma exposição do assunto. Aliás, gostaríamos de saber em que ponto é que está todo esse programa do Sr. Dr. Urbano, que nos veio cá dizer que resolveria o problema com o aumento da produtividade e que iria poupar. O que è certo, Sr.a Ministra, é que os números demonstram que tínhamos razão o ano passado: este ano gastaram-se mais 11 milhões de contos em relação ao orçamento previsto para o SNS. É um facto! E todos os anos, sistematicamente, denunciamos aqui a situação e dizemos que o orçamento não é suficiente; e todos os anos, quando chegamos ao final do ano, verificamos que temos razão. O ano passado foram despendidos mais

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11 milhões de contos do que o previsto — o défice só aumentou 5 milhões de contos porque foram injectados 6 milhões de contos no orçamento suplementar para 1988.

Por outro lado, pareceu-me que a Sr.8 Ministra ao longo da sua exposição tinha dito que as administrações regionais de saúde seriam favorecidas, que os cuidados primários de saúde seriam favorecidos em relação aos hospitais. Ora verifico precisamente o contrário, porque precisamente todo o funcionamento das ARS é que sofre uma quebra, nomeadamente no seu funcionamento: os serviços próprios só sobem 6 °7o, o que seguramente vai ser inferior à inflação, as convenções sobem 3 % e os medicamentos 2,36 %. Portanto, creio que, contrariamente ao que foi dito, são os cuidados primários de saúde que ficam com menos dinheiro.

Mas estes são números que só poderemos comparar com o ano passado. Evidentemente, a Sr." Ministra vai dizer-me que estes montantes são suficientes, quando, se daqui a um ano estivermos cá°todos, vamos verificar que os valores foram insuficientes e que o défice se agravou.

Em relação ao PIDDAC, gostaria de dizer o seguinte: as palavras são bonitas e a Sr.8 Ministra apresentou aqui uma série de obras, mas o certo é que a verba correspondente ao PIDDAC deste ano é inferior à do ano passado. Isto é um facto! São os números fornecidos pelo Ministério! Há menos dinheiro este ano para investimentos no plano da saúde do que o que houve no ano passado.

Além disso, a Sr.8 Ministra fala-nos numa série de hospitais. Volto a perguntar, e gostaria de ver este aspecto de uma vez por todas esclarecido: como é que vão construir os hospitais da Amadora-Sintra e de Matosinhos se não há uma verba inscrita no PIDDAC para esse efeito? A Sr.4 Ministra deve dizer-nos aqui como é que vai fazer isso. A Sr.8 Ministra vai contrair uma dívida para pagar depois? Como é que estes dois hospitais vão ser feitos? A Sr.8 Ministra fala-nos também numa série de hospitais só mesmo por falar. Posso dizer-lhe quais as verbas que estão inscritas ... Menciona o Hospital de Leiria, mas estão previstos este ano para esse hospital apenas 17 SOO contos, o que não dá para nada! Para o Hospital de Viseu fala em 20 mil contos, para o de Tomar 4 mil contos, para o de Vale do Sousa 4500 contos. Sr.8 Ministra, isto não chega quase para pagar o papel para fazer o projecto.

De maneira que a Sr.8 Ministra não pode sistematicamente vir aqui dizer, bem como nos meios de comunicação social, que se vão lançar todos estes hospitais, porque isso é apenas um desejo. Não há verbas inscritas no Orçamento. Se o Ministério vai fazer estas obras, fá-las com que dinheiro?

Nesta primeira fase gostaria de perguntar uma outra coisa à Sr.a Ministra: ouvi ontem na televisão um extracto da conferência de imprensa que deu e em que se faiava do problema da saúde mental. Ora depois de consultar este orçamento não vejo cá verbas algumas destinadas à construção de centros de saúde mental. A Sr.8 Ministra falou em 7 milhões de contos, mas se o total do PIDDAC são 6 milhões de contos...!? A verba de 5 milhões de contos refere-se a serviços de saúde mental, mas é para gastos próprios, é para uso corrente. Onde é que a Sr.8 Ministra vê, então, esses 7 milhões de contos para a construção de centros de saúde mental?

E mais, Sr.8 Ministra: V. Ex.a fala novamente na alienação do Hospital de Júlio de Matos. Onde é que

essas verbas estão previstas como receitas no Orçamento do Estado? Se a Sr.8 Ministra vende tem de ter receita, se gasta tem de fazer despesa, e isso tem de estar inscrito no Orçamento, mas nós não vemos 1...

São estas as perguntas que gostaria de ver respondidas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): — Sr.8 Ministra da Saúde, independentemente da filosofia e da discussão política que se possa levantar em relação àquilo que V. Ex.a enunciou como alteração, isto é, ao facto de os médicos do Serviço Nacional de Saúde passarem para o regime de medicina convencionada, independentemente do que terá de discutir-se acerca disso, sobre a adequação ou não à Lei do Serviço Nacional de Saúde, etc., etc. — neste momento não nos encontramos nesse tipo de discussão —, gostaria de saber que cálculos é que a Sr.8 Ministra possui neste momento para apontar esssa modificação como uma economia de meios. De facto, experiências conhecidas e afirmações de ministros anteriores apresentavam como razões impeditivas da aplicação desse sistema as razões económicas. Portanto, gostaria de saber que cálculos é que a Sr.8 Ministra possui neste momento para poder afirmar, como fez há pouco, que essa modificação iria trazer economias nos cuidados primários de saúde.

No que respeita ao PIDDAC, vários aspectos me preocupam. É vulgar — até o próprio Ministério já o faz — dizer que o País tem uma grande carência de profissionais de enfermagem. Assim, era previsível que, no que se refere a escolas de enfermagem, o investimento fosse uma prioridade. No entanto, comparando o PIDDAC de 1988 com o de 1989 verifica-se que nos investimentos previstos para 1989 há uma redução de 61 mil contos, o que se traduz em 21,6 % do previsto para 1988, com alguns aspectos que não me parecem muito regulares.

Por exemplo, há uma alteração ao investimento na Escola de Enfermagem de Ana Guedes, isto é, gastou-•se mais 16 329 contos do que o previsto para 1988, mas reduziu-se o crédito global em 254 271 contos. Há também uma alteração ao investimento na Escola de Enfermagem de Bissaia Barreto: executou-se 100 contos dos 15 mil contos, mas reduziu-se o crédito global em 159 900 contos. Depois apareceu-nos igualmente uma coisa estranha, que tem a ver com um projecto que tem referenciado o seu início em 1988 mas que não consta do PIDDAC do corrente ano. No que diz respeito a esse projecto já foram gastos — são estes os números publicados — 135 mil contos, abrangendo um crédito global de 300 mil contos (estou a reportar-me à Escola de Enfermagem Pós-Básica de Lisboa.

Por outro lado, desaparece um projecto — ele nem consta como conjunto de verbas a desagregar do PIDDAC de 1988 — cujo serviço executor era o SUCH — mais adiante falaremos de outros projectos deste tipo —, projecto esse que previa 150 mil contos para 1988 e um crédito global de 312 mil contos, montantes não expressos no PIDDAC como verbas a desagregar.

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Quanto a projectos considerados prioridades nas GOPs ou a que, pelo menos, se dá um grande reforço de verba, e para os quais se chama muito a atenção referindo-os como «programas específicos», «cuidados de saúde», «[...] destaque-se o reforço da protecção a alguns grupos vulneráveis nas áreas da saúde nvatenvoinfantil (250 mil contos), saúde mental (224 mil contos), recuperação e protecção de toxicodependência [...]», os números, infelizmente, parecem não ser esses. No PIDDAC de 1988 a previsão relativa ao ano de 1989 apontava para 278 160 contos, enquanto agora o PIDDAC prevê para 1989 uma verba de 1853 contos. Portanto, prevê menos 276 307 contos, para quem considera como uma prioridade a recuperação dos toxicómanos.

Em relação ao projecto de saúde materno-infantil, é de sublinhar que no PIDDAC de 1988 previam-se 501 185 contos para 1989 e no PIDDAC deste ano prevê-se um montante de 250 mil contos, ou seja, menos 251 185 contos. Como é que é possível dizer-se que

isto é uma prioridade?

Por último, e nesta ronda de perguntas, gostaria que a Sr.11 Ministra nos elucidasse acerca de aspectos pelo menos estranhos que se referem a oito projectos que no PIDDAC do ano passado apareciam tendo como serviço executor o SUCH — que eu saiba não é uma entidade oficial — e que tinham várias designações e várias verbas — alguns projectos estão referenciados com o mesmo nome, verifica-se alguma correspondência, mas outros não. Reporto-me, por exemplo, ao projecto de recuperação dos toxicómanos, que aparece com a mesma designação e com verbas diminutas que já indiquei. Falo, por exemplo, no projecto de saúde materno-infantil, que aparece desta vez com mais três projectos, um deles tendo já tido início em 1988 e que não constava do PIDDAC, relativo ao Hospital Distrital de Viseu e com uma verba de 10 mil contos. Neste âmbito, menciono também o Hospital de São Francisco Xavier, que constava do PIDDAC do ano passado como tendo por serviço executor o SUCH, com valores que não correspondem de forma alguma a um projecto que aparece agora com data de início em 1989 e em que o serviço executor é a Direcção-Geral de Instalações e Equipamentos de Saúde. E não se sabe onde é que estão inscritas essas verbas, se são verbas a desagregar ou não.

Sr.a Ministra, quero chamar-lhe a atenção para o facto de que o total destas verbas previstas para 1989 ascendia a 2215 mil contos. Portanto, não se trata propriamente de verbas «insignificantes»! ...

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Cunha.

O Sr. Jorge Cunba (PSD): — Sr." Ministra, gostaria de colocar-lhe três questões que têm a ver com este Orçamento do Estado.

A primeira refere-se às verbas adstritas ao combate à droga. Contrariamente àquilo que aqui foi dito, neste Orçamento, e não somente nos montantes destinados ao Ministério da Saúde, elas sofreram um aumento significativo e importante.

Em relação aos gabinetes de planeamento e de coordenação do combate à droga, penso que os aspectos de prevenção e de tratamento irão, segundo julgo a muito breve prazo e finalmente, transitar para a área

do Ministério da Saúde. Assim sendo, coloco-lhe a seguinte questão: o que é que estará este ano previsto para investimento nos gabinetes de coordenação do combate à droga e nos centros de profilaxia da droga (CEPD)7 E eu sei que terá de pensar-se numa estrutura ligeiramente diferente daquela que existe hoje ...

Além disso, há um segundo aspecto que tem a ver com a questão da previsibilidade de alteração das carreiras, quer a nível médico quer a nível de enfermagem, nomeadamente com a eventual equiparação dos cursos de enfermagem a licenciatura. Assim, pergunto--Ihe se está previsto durante este ano, em termos de médicos fundamentalmente, o alargamento da noção de exclusividade a um conjunto diferente dos vários graus da carreira. Mais: pode a Sr." Ministra dar-nos nesta sede uma previsão, em termos de custos, de quanto é que a implementação do anteprojecto das carreiras de clínica geral poderá implicar para o seu Ministério, designadamente no campo da despesa? Naturalmente, se funcionar como se pretende também se vai

poupar a montante, nomeadamente nos hospitais 1 ...

Finalmente, pergunto-lhe se em termos de receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde — porque também entendo que é nesse campo que se deve fazer um grande esforço de rentabilização dos hospitais — é previsível este ano um aumento substancial da sua percentagem no «bolo» do Ministério, uma vez que neste momento ela é quase inexistente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Meneses.

O Sr. Luís Filipe Meneses (PSD): — Sr." Ministra da Saúde, contrariamente à opinião dos partidos da oposição, a nossa é a de que este Orçamento é aceitável. Não é o ideal, mas, repito, é aceitável. Parece-me, aliás, claro que em termos relativos a saúde bem como a educação são privilegiadas neste Orçamento.

É evidente que algumas das metas definidas pela Sr.a Ministra da Saúde, a atingir em 1989 com as verbas que estão consignadas neste Orçamento, dependem da concretização de determinado tipo de pressupostos. E acredito que se possam cumprir!

Gostaria, assim, que a Sr." Ministra da Saúde nos dissesse, se tiver dados suficientes para nos informar, até que ponto a atitude do Ministério em relação à política de medicamentos e à gestão hospitalar, em particular desde Abril até agora, nos pode dar a esperança de que as verbas que estão consignadas para essas rubricas no Orçamento para 1989 são suficientes.

Penso que V. Ex.a, Sr." Ministra, já tem os resultados daquilo que se passou de Maio até agora e seria importante que fôssemos informados agora sobre esses resultados.

Em relação às convenções, é com alguma perplexidade que vejo o Partido Comunista Português preocupado com o facto de o aumento para o sector convencionado, que ele tanto critica, ser tão reduzido para 1989. Ao contrário da opinião expressa pelo PCP, penso que ele deve ser reduzido.

Gostaria de fazer-lhe algumas perguntas concretas em relação ao distrito do Porto. Para os próximos anos o PIDDAC aponta para um investimento de 1 milhão de contos no Hospital Maria Pia. Já por várias vezes manifestámos a opinião de que temos algumas dúvidas sobre a inevitabilidade de investir naquele hospital

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1 milhão de contos. O sector da pediatria no norte do Pais é algo que nos preocupa; os grandes serviços de pediatria do norte do Pais estão ligados a hospitais gerais e que, portanto, têm grande dificuldade em projectar as especialidades pediátricas nos termos que hoje são reconhecidos como necessários em todo o mundo. É, portanto, indispensável que exista um grande hospital pediátrico, onde essas especializações se façam.

O Hospital Maria Pia, pela sua localização, pelas características do seu corpo clínico e, inclusivamente, do seu pessoal paramédico e de enfermagem que lá trabalha, não nos parece que possa ser reconvertível no tal grande hospital pediátrico de que o Norte necessita. A nossa questão é, pois, a seguinte: até que ponto está o Ministério aberto a rever a possibilidade de construir um hospital pediátrico no Porto, abdicando desse investimento, que, parece-nos, não seria bem aplicado no Hospital Maria Pia?

A segunda questão que gostaria de colocar-lhe diz respeito ao seguinte: para os próximos anos prevê-se um investimento de cerca de 2 milhões de contos no Hospital de Santo António. Gostaria de saber o que é que o Ministério pensa que deverá ser o Hospital de Santo António enquanto hospital central da região do Grande Porto. Temos de atender ao facto de o Hospital de São João, o Hospital de Vila Nova de Gaia — este só depois das obras de ampliação — e o Hospital de Matosinhos fazerem um cordão circundante que responderá à maior parte das necessidades, em termos de hospitais centrais, da região do Grande Porto. Pensa reconverter o Hospital de Santo António num hospital de especialidades muito sectoriais e mais virado para a consulta externa do que propriamente para o internamento hospitalar?

A terceira e última questão diz respeito à implementação do projecto para a saúde materno-infantil de que a Sr." Ministra da Saúde falou na sua exposição e cujo ponto de situação eu gostaria que V. Ex.a fizesse.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Ministra da Saúde.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, vou responder às perguntas que me foram feitas, mas, em primeiro lugar, gostaria de fazer duas considerações, que, aliás, se vão repetindo sempre que discutimos verbas para o Serviço Nacional de Saúde.

A primeira dessas considerações tem a ver com a suficiência global das verbas e com a questão de saber se elas chegam ou não para fazer tudo o que uma pessoa gostaria de fazer. O que vou dizer todos os Srs. Deputados já o sabem, mas, apesar de tudo, vale a pena fazê-lo porque há sempre inúmeras considerações que são feitas à volta dessa questão e eu gosto de deixar aqui as coisas perfeitamente claras.

É evidente que não tenho, aliás nem nunca poderia ter, todo o dinheiro que gostaria para fazer face àquilo que é necessário no âmbito da saúde em Portugal. Este é um ponto que é evidente! A questão nunca se põe em termos de saber se cada um tem tudo o que quer ou se cada sector vai ter tudo o que poderia gastar; a questão coloca-se em termos de saber se a verba global de que se dispõe, que é atribuída a cada um dos sectores, que, obviamente, está subordinada ao cumprimento de uma estratégia global do Governo e que,

nomeadamente, tem a ver com a contenção do défice das despesas públicas, é ou não razoável em termos de prioridades relativas. A segunda consideração tem a ver com o PIDDAC

e com as observações que sempre são feitas em relação ao cumprimento rigoroso do que que foi previsto num determinado ano com o PIDDAC e com aquiío que nesse ano e no Orçamento que foi apresentado na Assembleia da República estava previsto como verbas a realizar nos anos seguintes. Disse já que, neste momento, não temos um sistema tão aperfeiçoado e tão minucioso que faça com que, em cada ano, aquilo que está rigorosamente previsto para esse ano e para os seguintes seja, de facto, cumprido. Os Srs. Deputados sabem-no e isso já não é uma questão recente.

Parece-me que seria completamente inaceitável se, quando verificássemos que uma previsão feita de uma determinada forma não era a mais conveniente ou não poderia ser cumprida, não fôssemos capazes de introduzir os mecanismos suficientes para, por um lado, adoptar a melhor solução possível e para, por outro lado, aproveitar o melhor possível as verbas que foram atribuídas à saúde, nomeadamente utilizando até ao fim essas verbas no âmbito dos mecanismos de substituição que ao Governo são reconhecidos nos termos em que a Assembleia da República vota cada um dos orçamentos.

Vou agora responder às questões concretas que foram colocadas, embora algumas delas tenham a ver com estas duas considerações que acabei de referir.

O Sr. Deputado Vidigal Amaro disse aqui que era diminuto o aumento do Orçamento. Essa questão, do meu ponto de vista, já esta respondida.

Quanto ao problema das novas carreiras que vão haver, nomeadamente das carreiras médicas — e compreendo a sua preocupação pessoal em relação ao problema —, o que acontece é que está previsto, e vai ser feito com esta verba, um ajustamento da carreira médica a essa carreira técnica superior. Aliás, o Governo, quando modificou a carreira técnica superior, já o tinha dito. De facto, há, neste momento, uma situação que, em termos relativos, não é a que deveria ser, embora, como todos os Srs. Deputados sabem, as duas carreiras nunca tenham sido, de facto, postas a par e tenham, como sempre tiveram, diferenças substanciais. Enfim, uma foi modificada numa determinada altura

e a carreira técnica superior foi-o mais tarde. Neste momento há, de facto, alguns ajustamentos que devem ser introduzidos.

A outra questão de fundo, que é a relativa à remuneração dos funcionários públicos, está a ser estudada em termos globais no âmbito do chamado «Relatório Sousa Franco». Ela também será resolvida em termos globais e isto vale tanto para os médicos como para todos os outros profissionais que são funcionários públicos.

Por outro lado e quanto à questão do aumento da produtividade, já temos mecanismos para a sua medição. Os Srs. Deputados tiveram ocasião de assistir à explicação dada pelo Sr. Dr. João Urbano sobre a utilização de uma série de mecanismos com esse objectivo. Posso dizer ao Sr. Deputado que a produtividade aumentou nos hospitais, em termos globais e em termos de doentes saídos, cerca de 12%. Ora, a verificação de que isso é possível é motivo de satisfação. E se

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os Srs. Deputados ouviram aquilo que o Sr. Dr. João Urbano disse terão verificado que muitas mais melhorias serão possíveis com os meios humanos e materiais de que dispomos. Isso é perfeitamente possível!

Quanto ao «programa do Sr. Dr. João Urbano», como o Sr. Deputado lhe chamou, e à pergunta que fez sobre o que é que se está a passar, o que posso dizer-lhe é que os GDH (grupos de diagnóstico homogéneo) já estão em aplicação em alguns hospitais e serão aplicados à sua totalidade durante o ano de 1989. Como sabem, este é um instrumento extremamente rigoroso de medição da forma como são rentabilizados os meios existentes nos hospitais e de verificação da razoabilidade da despesa que cada um dos hospitais faz com o tratamento dos doentes internados e só em relação a estes porque neste momento o mecanismo está aplicado apenas aos internamentos.

Quanto à questão que colocou dos gastos relativos das administrações regionais de saúde e dos hospitais tenho a impressão de que o Sr. Deputado entendeu mal o que eu disse. O que eu disse foi que haveria um reequilíbrio no sentido de beneficiar os hospitais e que estava nesse caso a considerar como verbas de cuidados de saúde primários as dos medicamentos e as das convenções. Era a esses dois aspectos que me referia e não aos serviços próprios das administrações regionais 'de saúde.

Em relação aos medicamentos, às convenções e ao peso relativo que eles têm assumido na verba global do Serviço Nacional de Saúde, gostaria de dizer o seguinte: entendemos que deve haver um reequilíbrio e que o mesmo deve favorecer os hospitais que têm, em termos relativos, visto aumentar menos a sua capacidade de despesa por efeito da compressão que produz — o aumento, em termos dificilmente aceitáveis, das despesas com convenções e com medicamentos. Em relação a estes, desde meados deste ano foi, notavelmente, travado, através de determinadas medidas que entretanto foram introduzidas, o aumento da factura dos medicamentos.

O PIDDAC não é, de facto, inferior em 1988 e basta comparar os números deste ano com os de 1989 para o verificar.

Em relação às questões concretas que me colocou, gostaria de dizer o seguinte: quanto à Amadora e a Matosinhos a história já é velha, já vem do ano passado, e a resposta é precisamente igual à do ano passado, só que agora com mais precisão. As adjudicações respectivas estão num processo extremamente adiantado. Portanto, quando previmos as verbas e o momento em que as mesmas serão pagas somos infinitamente mais precisos do que éramos no ano passado porque, nessa altura, não conhecíamos, em pormenor, a forma como os respectivos concursos iriam ser adjudicados. Aliás, esse é um dos pontos para que também já chamei a atenção. Quando se prevêem verbas em relação a empreendimentos que não estão ainda concursados ou adjudicados é evidente que é completamente impossível prever, com a maior das precisões, qual vai ser o montante do pagamento das verbas respectivas, porque a melhor oferta é determinante para saber a quem e em que termos é adjudicado.

Repito: quanto à Amadora e a Matosinhos está lá previsto em que termos e em que anos é que as respectivas verbas serão pagas. E isso é aquilo que hoje sabemos através das ofertas que nos foram feitas pe-

las entidades adjudicatárias dos dois hospitais. Portanto, ninguém está a funcionar «no escuro» ou no que quer que seja. O Sr. Deputado pode estar tranquilo porque as populações que habitam as zonas aonde esses hospitais vão começar a ser construídos verão que, de facto, a respectiva construção vai arrancar imediatamente.

O Sr. Deputado disse que eu falei nalguns hospitais em que, por acaso, não falei, embora me seja possível dizer o que se passa em relação a eles. De facto, não falei em alguns dos hospitais que citou. Falei na Amadora, em Matosinhos e em Leiria. Em Leiria está, neste momento, aberto e em curso o respectivo concurso. Veremos também no momento da adjudicação os termos exactos em que vai ser pago. O Sr. Deputado esteja descansado porque no momento em que for preciso pagar vai haver verba para o Hospital de Leiria. Aliás, aqui a história também não é nova. É a mesma história do ano passado e a resposta é exactamente igual.

Quanto aos Hospitais da Amadora e de Matosinhos já conhecemos os termos exactos em que a adjudicação de cada um é feita.

Em relação aos centros de saúde mental, gostaria de dizer o seguinte: sei que o Hospital de Júlio de Matos e a questão que anda à volta da sua alienação polarizaram muitas atenções em matéria de saúde mental. Aliás, tiveram a grande vantagem de despertar no País o interesse pela saúde mental, que é um sector extremamente importante de prestação de cuidados de saúde e que, curiosamente, é trazido para o centro das atenções não pela importância e pela seriedade que nos deveria merecer mas à volta de uma história de alienação de um terreno que, embora tenha alguma ligação, porque é nele que está implantado um hospital psiquiátrico, é uma questão lateral em relação a saber qual é a política de saúde mental.

Sr. Deputado, já disse e volto a dizer o seguinte: como os Srs. Deputados sabem faltam centros de saúde mental, sobretudo nas áreas metropolitanas da Grande Lisboa, Porto e Coimbra. No resto do País há dezoito centros de saúde mental. No entanto, nas três zonas onde há hospitais psiquiátricos esse processo não foi levado para a frente. Os centros de saúde mental da área metropolitana da Grande Lisboa serão construídos com o produto da alienação do Hospital de Júlio de Matos. Falo em alienação, Sr. Deputado, e não em venda, o que não é rigorosamente a mesma coisa. Neste momento as coisas ainda não estão totalmente definidas e acabadas, mas na altura em que o estiverem o País terá conhecimento exacto dos termos em que as coisas se irão processar, com a maior transparência, através de concurso público.

O Sr. Deputado Fernando Gomes falou aqui da medicina convencionada e fez uma referência à respectiva adequação à Lei do Serviço Nacional de Saúde. Até hoje não vi muito discutida essa adequação nem sequer vi que, eventualmente, tivesse travado o que aconteceu e acontece com a medicina convencionada noutros domínios. Em todo o caso, essa é uma questão importante. Penso não ser necessário dizer que a posição do Governo não é contra a medicina privada. Em todo o caso, em relação à medicina convencionada no âmbito dos cuidados de saúde primários o Sr. Deputado pergunta onde é que está a economia de meios. Por acaso referi a questão da medicina convencionada a nível dos cuidados de saúde primários a propósito não

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tanto da economia de meios mas sim de outros factores que para mim são extremamente importantes. Não vivo só preocupada com o dinheiro que tenho para gastar; vivo preocupada também com outras coisas, porque não é esse o único objectivo do Ministério da Saúde. Há outras coisas que são importantes! Não é apenas ou sobretudo por razões financeiras que, a nível de cuidados de saúde primários, é preciso fazer uma inflexão na forma em que se tem traduzido o estatuto dos médicos prestadores de cuidados.

Sr. Deputado, não estou satisfeita com a situação actuai da prestação de cuidados a nível de cuidados de saúde primários e o problema não é, como VV. Ex.1" todos sabem, a falta de médicos. Há cerca de 7 mil médicos que prestam medicina a esse nível; há 1 médico de clinica geral para 1200 habitantes, o que, em termos internacionais, é mais do que é preciso. Mas a situação está longe de satisfazer os utentes e a mim. Se chegarmos à conclusão de que as regras não servem, então teremos de mudá-las. Não vale a pena insistir com um esquema que é excessivamente complicado. A razão da mudança reside muito mais em tentar criar um sistema mais satisfatório para os utentes e para os profissionais de saúde, que leve a uma relação mais imediata e mais directa entre os dois e que não exija a introdução de tantas barreiras entre uns e outros. As barreiras existem e têm a ver com um mecanismo burocrático excessivamente complicado em que, muitas vezes, se traduz o funcionamento dos centros de saúde. Entendo que deve haver uma relação mais directa, mais satisfatória para os dois lados e que torne mais interessante a produtividade do trabalho que fazem os profissionais de saúde. É com esses objectivos que vamos, de facto, introduzir algumas modificações.

O Sr. Deputado perguntou ainda se há ou não economia de meios. Sr. Deputado, quando conseguirmos ter em Portugal números aproximados com os de alguns paises europeus, onde, a nível de cuidados de saúde primários, há médicos com estatuto semelhante àquele que pretendemos criar entre nós, quando, repito, conseguirmos números minimamente aproximados, em termos de equilíbrio, entre o que é resolvido a nível ambulatório de cuidados de saúde primários ou o que é resolvido através do recurso aos hospitais teremos certamente feito grandes economias de meios.

Em outros países da Europa, onde a medicina a nível de cuidados de saúde primários é feita fundamentalmente em termos convencionados — conceito agora utilizado em termos amplos —, o acesso real aos hospitais é muito inferior àquele que existe em Portugal. É porque, a nível de cuidados de saúde primários, a enorme maioria dos problemas é desde logo resolvida. Se conseguirmos, de facto, uma relação diferente entre os utentes e os médicos de família, em que haja maior confiança por parte dos utentes no sistema de cuidados de saúde primários, e se por essa via eles sentirem menos a necessidade de se dirigirem aos cuidados hospitalares, o Sr. Deputado pode ter a certeza de que teremos feito uma enorme economia de meios e alcançado resultados que têm muito mais a ver com a satisfação dos utentes que se dirigem aos centros de saúde e que hoje vezes de mais têm de esperar na «bicha», a horas totalmente inaceitáveis, através de uma burocracia extremamente complicada, o acesso ao médico. Quando lá chegam as duas partes já não podem

deixar de estar suficientemente irritadas para que a relação não se possa processar com a qualidade que seria desejável.

O Sr. Deputado fez referência ao PIDDAC, às escolas de enfermagem e à necessidade de formar enfermeiros. Como sabe, o esforço que estamos a fazer de formação de mais enfermeiros tem sobretudo a ver com o facto de se exigir às escolas, que têm respondido em termos extremamente satisfatórios, uma formação mais alargada de enfermeiros. Este ano, por exemplo, houve uma entrada dupla nas escolas de enfermagem. Entendemos que é sobretudo através de medidas deste tipo que devemos tentar recuperar o atraso que o nosso país tem em relação à formação de enfermeiros. Se criarmos um sistema permanente de formação de muito mais enfermeiros, o que qualquer dia acontece è aquilo que hoje já sucede com os médicos e que é, de facto, uma sobrecapacidade de formação de profissionais em relação às necessidades do País. Não vejo qualquer necessidade de reproduzir, a nível de outros profissionais de saúde, a situação em que hoje se encontram os médicos, que é, repito, de sobrecapacidade manifesta de formação de profissionais de que o País necessita. Entendo que o problema deve ser sobretudo resolvido através de medidas de emergência ou excepcionais, a adoptar durante um número de anos suficiente até o problema estar resolvido. Mas quando o problema estiver resolvido não será necessário manter muito mais escolas do que aquelas que produzem os profissionais que numa situação normal são necessários para substituir todos aqueles que abandonam o sistema em cada um dos anos.

Os casos concretos que referiu de previsões que, feitas de uma determinada maneira e que passaram a ser feitas de uma outra, caem naquela consideração geral que fiz anteriormente. Por vezes, durante a execução do PIDDAC verificamos que há uma solução melhor, porventura mais barata, para resolver o problema. É o caso típico do que aconteceu com a Escola de Enfermagem de Ana Guedes, para a qual se previa uma construção nova. Para esta escola de enfermagem encontrámos instalações do Ministério da Saúde, que foram adaptadas e que puderam ser utilizadas. As coisas ficaram mais baratas e resolvidas em termos mais satisfatórios.

Em relação às prioridades de planeamento e às verbas que entende que não são suficientes para resolver os problemas, posso dizer-lhe o seguinte: em relação aos toxicodependentes o esforço maior de investimento — e refiro-me às despesas dos serviços que estão ou que foram criados no âmbito do Ministério da Saúde e não aos que estão no Ministério da Justiça — foi feito sobretudo durante este ano e o ano passado. Como sabem, foi feito um investimento grande no Centro das Taipas, que já está em pleno funcionamento; foi feito também um investimento no Porto, onde também utilizámos uma casa que era nossa, e as coisas ficaram mais baratas do que se tivéssemos construído uma outra ou comprado uma que não fosse nossa; em relação ao Algarve, esses investimentos também já foram feitos.

Portanto, em relação aos serviços que estão no âmbito do Ministério da Saúde não há previsão de grandes investimentos em matéria de tratamento de toxicodependentes a fazer para o ano que vem.

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Quando falamos de prioridades não estamos apenas a referir-nos ao investimento mas também, por exemplo, a despesas correntes ou de outro tipo. Em relação a investimentos no âmbito do Ministério da Saúde entendemos que o esforço fundamental já foi feito, embora no futuro se preveja fazer mais coisas. Para o ano de 1989 não estamos a prever que no âmbito do Ministério da Saúde haja novos serviços a ser lançados e que necessitem de grandes investimentos.

Relativamente ao programa materno-infantil eu referi apenas os investimentos em serviços de obstetrícia e de neonatalogia. É um programa que foi, de alguma maneira, autonomizado de tudo o resto que temos vindo a fazer em termos de promoção da saúde materno-infantil. O Sr. Deputado falou dos 250 mil contos do ano que vem. Sr. Deputado, quando falamos em prioridades estamos sempre a pensar que se vai gastar mais no ano que vem do que aquilo que se gastou no ano anterior. O que interessa saber é se as coisas estão ou não feitas. Este ano foram gastos 450 mil contos e pensamos que até ao fim do ano que vem os problemas básicos que se colocam a nível de serviços de obstetrícia e de neonatalogia nas maternidades que entendemos que devem funcionar em todo o país estarão resolvidos. Se vamos fazer isso com 250 mil contos não sei por que é que para satisfazer a ideia de que as grandes prioridades supõem muitos mais investimentos eu deveria lá pôr mais do que isso que aí está. Aliás, essas obras — e eu poderia responder-lhe com mais detalhe — têm corrido e continuarão a correr pelos hospitais de todo o país. Porventura não são coisas espectaculares, que se vejam cá de fora, mas são obras de uma enorme relevância, porque, repito, vão permitir-nos dizer no fim do ano que vem que nascer em Portugal e nos sítios onde os nascimentos devem ocorrer passa a ser seguro em relação às nossas capacidades actuais e à tecnologia existente.

Posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que há muitas outras coisas que têm a ver com a saúde materno-infantil, que não são apenas os serviços de obstetrícia e de neonatalogia, que têm vindo a ser feitas. Neste momento já se encontra a funcionar, tanto na zona da Grande Lisboa como na zona do Grande Porto, um subsistema de emergência para recém-nascidos de alto risco, subsistema que permite trazer para os serviços de neonatalogia de Lisboa'e do Porto Tecém-nascidos que se encontram em outros hospitais ou em outos sítios e que precisam de uma atenção extremamente diferenciada a nível de cuidados de neonatalogia. Esse projecto, que já está em curso, já salvou centenas de crianças da morte e, em muitos casos, de doenças que as afectariam para o resto da vida.

O Sr. Deputado fez referência a outros investimentos incluídos no PIDDAC, nomeadamente ao serviço executor. Não percebi bem se V. Ex.a dá importância especial ao facto de aparecer uma entidade ou outra como serviço executor ...

Em determinados momentos podemos entender que há métodos mais concretos ou melhores de funcionamento e quando entendemos isso mudamos. Não vemos por que é que havemos de manter as coisas exactamente como estavam só porque num determinado momento as coisas foram previstas de uma determinada maneira!...

Em relação ao Hospital de São Francisco Xavier, anoto que o Sr. Deputado referiu que não foi feito

aquilo que estava previsto para o ano de 1988. Talvez isso contribua para que os Srs. Deputados deixem de pensar que o Ministério da Saúde vive particularmente preocupado com esse hospital. Mesmo em relação a este as coisas nem sempre correm com a rapidez e no momento que desejaríamos.

Sr. Deputado Jorge Cunha, em relação aos serviços operacionais, que estão neste momento no Ministério da Justiça e que vão transitar para o Ministério da Saúde, eu não queria neste momento dizer quais são as previsões que existem, porque há um colega meu que é responsável por esse sector enquanto a transição não se verificar.

Em relação aos enfermeiros e à repercussão que tem a integração da enfermagem no ensino superior, gostaria de dizer o seguinte: como sabe, esse diploma visa, num primeiro momento, fazer a justiça que deve ser feita a profissionais cujo nível e exigência de formação são semelhantes aos do ensino superior politécnico. A integração do ensino de enfermagem no ensino superior politécnico tem como primeiro objectivo fazer essa justiça, que é razoável, e reconhecer o nível escolar de um diploma, que, de facto, tem uma exigência semelhante. Quanto à repercussão em carreiras, enfim ..., esse será um momento diferente, que tem sobretudo a ver com os casos em que haverá equiparação a licenciatura. Esse é um processo longo. Como sabe, as equiparações, tal como estão previstas no diploma, supõem um sistema extremamente cuidadoso e exigente de verificação e não estão neste momento previstas alterações de carreiras imediatas na respectiva sequência. É um processo que, do nosso ponto de vista, tem a ver com outras questões e não tanto com as respectivas carreiras.

O Sr. Deputado levantou aqui o problema da exclusividade dos médicos e perguntou qual era a previsão do Ministério da Saúde em relação a esse tipo de questões. Penso que essa é uma questão básica em relação à politica de saúde e que eu já referi várias vezes, designadamente na Assembleia da República. Como sabem, hoje essa política apenas existe para sectores determinados. É, de alguma maneira, a questão que está por detrás, por exemplo, do regime convencionado e da necessidade de garantir que os médicos que estão nesse regime não sejam médicos do Serviço Nacional de Saúde. No entanto, esta questão não é a única que se coloca em termos de exclusividade, porque o problema levanta-se com a prática da medicina livre não convencionada.

Essa, repito, é uma questão essencial e durante o ano de 1989 pretendemos alargar a exigência de exclusividade em termos que ainda não estão completamente determinados.

Provavelmente procederemos, dentro de pouco tempo, à possibilidade de regime de dedicação exclusiva em relação aos internos do complementar que não foram abrangidos pela determinação de exclusividade, o que, como sabe, só abrange, neste momento, os internos do curso complementar que estão no 1.° ano. Mas, por agora, não estou ainda em condições de avançar muito mais em relação a este ponto.

Quanto aos custos que referiu das carreiras de clínica geral e da modificação não propriamente da carreira mas da passagem dos médicos da carreira de clínica geral a um sistema diferente, julgo que as vantagens que poderemos obter noutros momentos do

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sistema, nomeadamente através de um mais razoável acesso aos cuidados hospitalares, mais do que compensarão aquilo que nos vai custar a mais o pagamento aos médicos que ficarem de facto em regime convencionado; naturalmente, teremos de encontrar um sistema que seja interessante para os médicos que queiram fazer essa transição de regimes.

Quanto à previsão do aumento de receitas próprias, devo referir que esta consta dos documentos que foram entregues aos Srs. Deputados e que, de facto, têm algum aumento previsto entre 1988 e 1989. Em relação a 1989, prevemos que as receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde alcancem um montante de 15 milhões e tal de contos, embora haja certamente aqui algum esforço a fazer, porque, como disse, entendemos também que o Serviço Nacional de Saúde tem de encontrar formas de obter receitas próprias e de não viver, como vive hoje, na dependência quase exclusiva do Orçamento do Estado.

O Sr. Deputado Luís Meneses referiu que muito daquilo que o Ministério da Saúde propõe em termos de verbas a atribuir a determinados sectores supõe, naturalmente, um esforço extremamente grande de gestão melhorada e de racionalização de meios. É evidente que é assim e, como referi há momentos, há já hoje resultados concretos em relação a medicamentos. Posso dizer-lhe que a factura de medicamentos, em Janeiro deste ano sobre Janeiro do ano passado, cresceu 26 % e que, neste momento, está a crescer à volta de 4 "7o, ou qualquer coisa do género, o que significa que, de facto, as medidas que foram introduzidas produziram resultados em termos de controle efectivo da factura e em termos de salvaguardar, como é óbvio — e esse era um ponto essencial —, o acesso dos cidadãos aos medicamentos de que de facto necessitam. Esse é um ponto de honra, como é óbvio, e não foi minimamente posto em causa.

Relativamente à gestão hospitalar e às melhorias que por essa via podem ser obtidas, naturalmente o tempo de experiência é ainda curto, mas é, do nosso ponto de vista, extremamente satisfatório em termos dessas mesmas melhorias que podem ser introduzidas na gestão dos meios nos hospitais. E refiro-lhes, a título de exemplo, um desses pontos: a gestão de medicamentos ingeridos nos hospitais, através da introdução de um sistema sistemático de unidose —e há hospitais que neste momento já fizeram essa experiência— e de um controle cuidadoso dos antibióticos e dos citostáticos, pode produzir notáveis poupanças sem o mais pequeno prejuízo para a forma como. os doentes são tratados. Temos, neste momento, dados concretos de que é assim e de que há imensas coisas que podem e devem ser fei^ tas e que já se estão a verificar numa série de hospitais.

Outro ponto crítico é o fornecimento de refeições aos hospitais. Sabemos já, com números concretos, que a obtenção do fornecimento de refeições fora dos hospitais produz economias brutais em relação à forma como as refeições hoje estão a ser pagas — isso por variadíssimas razões — e as orientações que transmiti aos conselhos de administração dos hospitais vão no sentido de que, sistematicamente e nos locais do País onde isso é possível, aliviem a produção dos hospitais da prestação directa dos serviços que podem ser obtidos fora e que não têm a ver com a prestação de cuidados médicos, uma vez que os hospitais existem para

tratar os doentes e não para fazer comida e tratar da roupa, nem para garantir a segurança exterior dos mesmos, etc. Há numerosas actividades que podem e devem — porque, do nosso ponto de vista, os serviços podem ser eficazes e mais baratos — ser prestadas por outra forma. Como já disse, as orientações que os conselhos de administração dos hospitais têm vão no sentido de recorrerem, sistematicamente, a este tipo de serviços prestados fora, pois é mais barato, alivia a gestão do hospital e, por outro lado, pode dar, em muitos casos, um nível de satisfação superior aos doentes que estão internados.

Há ainda outras coisas que os Srs. Deputados conhecem também como eu, mas que valerá a pena referir: as salas de operações a funcionar como deve ser, os tempos das mesmas aumentados e os doentes sem precisarem de esperar dez dias ou coisa que o valha antes de serem operados. Tudo isto são experiências que, neste momento, estão em curso de melhoria a este nível e que vão produzir, obviamente, resultados. Não tenho a mais pequena dúvida de que há muita coisa que já foi feita e que vai continuar a sê-lo.

Outra coisa elementar é a utilização do pessoal que trabalha nos hospitais nas horas em que esse mesmo pessoal deve trabalhar. Os Srs. Deputados conhecem, por acaso, qual é a média de consultas por dia, por médico, nos hospitais portugueses? É de pouco mais de onze, Srs. Deputados! É evidente que isto não pode ser, porque não faz o mais pequeno sentido e que basta pôr as coisas a funcionar como deve ser — e para isso são precisos conselhos de administração que tenham de facto força, determinação e capacidade de fazer as coisas — para que exista uma rentabilização espantosa dos recursos que se encontram nos hospitais. É que, de facto, estamos numa situação que às vezes até me é difícil descrever, pois há muitas coisas que se passam e que não fazem o mais pequeno sentido, mas, se tudo isso for posto a funcionar como dever ser — e há muitos hospitais onde, neste momento, já vi essas coisas acontecerem por efeito de novas regras introduzidas na gestão — vamos com certeza ser capazes de cumprir o orçamento que temos. Aliás, é surpreendente aquilo que os actuais conselhos de administração estão a encontrar nos hospitais, no sentido da libertação possível de verbas para atendimento aos doentes em melhores condições do que aquelas que estes têm tido até agora. E isto para não falar daquilo que, há momentos, referi quanto ao facto de já termos colocado mais de 500 mil contos de equipamento não utilizado em determinados hospitais noutros hospitais onde, neste momento,'já está a ser utilizado. Se os Srs. Deputados quiserem, também lhes posso referir que um equipamento que custou 350 mil contos e que esteve um ano parado num determinado hospital de Lisboa —cuja administração, aliás, já foi substituída— está, neste momento, a funcionar.

Relativamente ao Porto e às questões que me foram colocadas sobre dois hospitais dessa cidade, devo dizer, quanto ao Hospital Maria Pia, que não quero, neste momento, referir qual a posição definitiva do Ministério da Saúde porque temos dúvidas quanto à melhor forma de procecer e estamos a estudar alternativas. No entanto, partilhamos da preocupação em relação àquele que é o único hospital pediátrico do norte do País e à necessidade de que na cidade do Porto exista um hospital pediátrico com capacidade

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para desenvolver adequadamente todas as especialidades pediátricas, se é que posso falar nestes termos — e provavelmente em termos técnicos não será uma linguagem muito correcta —, havendo de facto a necessidade de que, nos mais variados domínios, haja especialistas em crianças, desenvolvimento esse que o Hospital Maria Pia tem tentado fazer e que queremos desenvolver.

Em relação ao Hospital de Santo António, como referiu, os três hospitais — o de São João, por um lado, o de Vila Nova de Gaia, remodelado, e o novo Hospital de Matosinhos — têm a ver com a estratégia de rodear a cidade do Porto de estabelecimentos hospitalares de alta qualidade que impeçam a entrada sistemática nessa cidade de muitas situações que poderiam ser tratadas cá fora. Isso, obviamente, põe a questão de saber qual o papel do Hospital de Santo António que, de facto, ficará no futuro, de alguma maneira, como o hospital da cidade e em relação ao qual prevemos uma remodelação que não aumenta o número de camas — e isto, de certa forma, responde à sua pergunta sobre a importância do ambulatório versus internamento —, pretendendo-se melhorar a respectiva qualidade.

Suponho que todos saberão quais as condições em que funciona actualmente o Hospital de Santo António e que reconhecerão com facilidade que seria bom dispormos de melhores condições logísticas relativamente a esse hospital. Trata-se, basicamente, de melhorar a qualidade das camas, mantendo e melhorando as suas condições de hospital de alta tecnologia e desenvolvendo significativamente o serviço ambulatório — aliás, nos termos que de facto referiu —, tratando--o como um hospital da cidade do Porto.

E, já que se falou no Porto e nos hospitais dessa cidade, desculpar-me-ão que não perca a oportunidade de referir o Hospital da Prelada, que nenhum dos Srs. Deputados referiu, onde teve lugar uma melhoria extremamente significativa e recente, neste momento a funcionar na cidade do Porto, o que aumenta muitíssimo, em quantidade e em qualidade, a capacidade de resposta dessa cidade e do norte do País nas especialidades de ortopedia, de medicina física e reabilitação, de medicina plástica e reconstrutiva e, dentro de muito pouco tempo, do tratamento de queimados. Ninguém me fez perguntas sobre isto, mas entendi que devia dizer alguma coisa sobre o assunto.

Relativamente ao programa de saúde materno-infantil que o Sr. Deputado referiu, suponho que já terei dado as respostas fundamentais quanto aos investimentos em serviços de obstetrícia e de neonatalogia, mas repito: o esforço maior já foi feito durante o decurso deste áno e aquilo que resta para o ano que vem e para os próximos anos já é um esforço inferior relativamente àquele que já foi feito.

Referi também o subsistema de transporte de recém--nascidos de alto risco que está neste momento a dar resultados, havendo muitos outros esforços que estamos a fazer, nomeadamente a nível de cuidados de saúde primários, porque este domínio é extremamente amplo. Como os Srs. Deputados sabem, o sector crítico hoje, em termos de índices de saúde, é a mortalidade perinatal e apesar de termos vindo, sucessivamente, a obter melhores índices de mortalidade perinatal, a verdade é que este é o sector em que é mais difícil conseguir melhorias, sendo aquele em que estamos a apostar mais.

Aliás, os serviços de obstetrícia, neonatalogia, ambulâncias, etc, têm a ver com este sector, mas há uma parte extremamente importante que tem a ver com a assistência à mulher grávida e, nomeadamente, com o funcionamento dos cuidados de saúde primários, domínios em que estamos a apostar fortemente porque é, em larga medida, na detecção, tanto quanto possível, das situações de gravidezes de risco que hoje muito do esforço tem de ser feito. Isso tem a ver com os cuidados de saúde primários, com a articulação entre eles e com os serviços de obstetrícia dos hospitais, por forma que a referência seja feita a tempo e horas, nos casos em que esta deve ser feita antes do parto, o que, como sabem, constitui a maioria dos casos das gravidezes de risco ou de partos de risco, embora alguns deles só possam ser detectados no próprio momento do parto e por isso mesmo é que é importante que o parto só ocorra em locais onde a assistência necessária possa ser prestada, quando for caso disso. Em todo o caso, é extremamente importante que as situações em que o parto é de risco e que podem ser detectadas antes o sejam de facto. Por consequência, estamos também a fazer um esforço muito grande a nível de seguimento das gravidezes.

Outro sector que tem a ver com a saúde materna e com a saúde infantil é o do planeamento familiar. Um esforço enorme tem vindo a ser feito no País neste domínio e estamos a atingir níveis de cobertura extremamente satisfatórios, sendo este um largo sector ao qual o Ministério da Saúde tem dedicado a maior atenção, com a convicção de que ele é vital para qualquer sistema de saúde e, sobretudo, para os cidadãos futuros do nosso país.

O Sr. Presidente: — Há ainda alguns Srs. Deputados inscritos para perguntas, mas gostaria, antes de dar--Ihes a palavra, de referir que temos de administrar o nosso tempo de uma forma rigorosa e produtiva, visto que, por responsabilidade da Comissão, os nossos trabalhos começaram mais tarde do que o previsto e que às 12 horas temos marcada a vinda do Sr. Ministro da Administração Interna. De resto, a Sr." Ministra, muito logicamente, previu também compromissos para essa altura, pois apenas lhe tínhamos pedido para estar aqui presente das 10 às 12 horas e, consequentemente, vamos ter de aproveitar o tempo com eficácia.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr.8 Ministra, obviamente não vou fazer-lhe perguntas sobre a matéria específica do seu sector, do ponto de vista técnico. O que queria pedir-lhe era o seguinte: a Sr.8 Ministra referiu, ao longo da sua exposição, várias experiências que tem em curso no seu Ministério, no sentido de controlar a despesa, de medi-la e, portanto, de actuar sobre a eficácia da mesma. Julgo que essa matéria é da maior importância em qualquer domínio e que ela tem estado fundamentalmente esquecida da Administração Portuguesa em geral. E não me refiro apenas a este governo; esse tem sido um fenómeno geral e, pode dizer-se, no caso da saúde esta ganhou um relevo absolutamente excepcional. Os custos de saúde crescem explosivamente não só em Portugal como por toda a Europa e por todos os países que atingiram um nível de desenvolvimento elevado, e toda a gente reconhece que essa progressão da despesa na saúde não pode continuar.

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No entanto, ao mesmo tempo que sucede isto, verifica-se que a procura de cuidados de saúde nas suas diversas formas —preventivas ou já actuando sobre casos de manifesta disfuncionalidade— também não pode ter por limite uma noção economicista de custo. Não há valor para a vida e toda a gente sente isso, sobretudo quando está doente. Nesta condições, é fundamen-talíssimo que haja um cuidado extremo na administração das despesas de saúde, no seu controle, na luta contra o desperdício ou na busca de formas de atingir uma maior eficácia.

Devo dizer que fiquei muito satisfeito por ver que essa preocupação parece existir no seu Ministério e julgo que a Comissão de Economia, Finanças e Plano — e não só a da Saúde — teria o maior interesse em conhecer com profundidade as metodologias que estão sendo utilizadas, os resultados que estão sendo obtidos, as aplicações ou ilações que se tiram das diversas experiências em curso e que futuro é que elas poderão ter, por forma que a contenção de custos jogue a par de um crescimento da oferta de serviços efectivamente prestados à população portuguesa.

Consequentemente, queria pedir que essa documentação fosse remetida e queria solicitar também ao Sr. Presidente que a Comissão de Economia, Finanças e Plano se dedicasse um dia a discutir este problema, visto que ele tem, com certeza, a maior relevância para a preparação orçamental. Nós discutimos orçamentos, nunca discutimos conta, defeito gravíssimo em que temos incorrido.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estamos plenamente de acordo quando ao segundo ponto. Iremos tratar disso oportunamente, mas depois da discussão do Orçamento do Estado e desta maratona.

Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr.a Ministra, começarei dizendo que julgo não haver razão para a Sr." Ministra estar admirada por não se ter falado no Hospital da Prelada. Tanto quanto se sabe, o Hospital da Prelada é um hospital privado e, por conseguinte, não consta do Orçamento. Por essa razão não tem de ser discutido aqui, uma vez que estamos a discutir o Orçamento do Estado.

A segunda questão que queria colocar-lhe — e vou fazê-lo sem ser em termos acintosos, embora não seja também uma blague— é a seguinte: a Sr." Ministra conhece o Orçamento que deu entrada na Assembleia da República, designadamente o orçamento da saúde? É que admito, por algumas das afirmações que a Sr." Ministra fez, que, de facto, o orçamento que Sr.a Ministra tem para o seu Ministério não seja igual ao texto do orçamento que deu entrada na Assembleia da República.

E explico-lhe porquê, dando um exemplo que me parece ser flagrante e que é o do PIDDAC. A Sr." Ministra afirmou: «O PIDDAC, independentemente daquilo que os Srs. Deputados possam dizer, aumenta.» De facto, segundo o Orçamento que deu entrada na Assembleia da República, O PIDDAC não aumenta em termos do seu Ministério e, concretamente, os valores orçamentados em 1988 foram de 8834 mil contos e este &tao são de. S945 mil corttos. Há aqui uma diferença de 100 mil contos, o que, em termos reais, é um decréscimo significativo. Eventualmente, dir-se-á que no

ano passado houve a dotação concorrencial e, de facto, no ano passado a dotação concorrencial foi menos 900 mil contos para o Ministério da Saúde. Ou seja, a dotação concorrencial também «tratou bem» os sectores prioritários, quer o da saúde quer o da educação — tirou-lhes dinheiro 1

No entanto este ano há um congelamento do 10 %1 São os mesmos 900 mil contos e, em termos funcionais — sector da saúde —, aí a diferença é loucal É substancial! O ano passado a saúde, em termos funcionais, tinha no Orçamento 8461 mil contos e este ano tem 6805 mil contos. São menos cerca de 2 milhões de contos, diferença que se explica, em grande parte, com a questão das OID. Mas, em termos do Ministério da Saúde, é claro que não há aumento, a não ser que a Sr." Ministra considere que um decrescimento real significa aumento de dotação — mas esse é outro tipo de questões, que não valerá a pena agora discutir.

Por conseguinte, ou há um segundo orçamento ou o Orçamento que nos é apresentado, de facto, não condiz com aquilo que a Sr.8 Ministra refere em termos de reforço de dotações.

Uma segunda questão que me parece muito importante é a seguinte: o Orçamento do Estado é aprovado pela Assembleia da República. A Sr.8 Ministra há pouco referiu vários hospitais —o da Amadora-Sintra, o Hospital de Matosinhos, etc.— e utilizou sempre a mesma expressão: «0 Srs. Deputados, não se preocupem, porque o dinheiro há-de aparecer.» Ora, esse problema não é um problema que interesse à Assembleia da República. À Assembleia da República o que interessa, porque tem de aprovar o Orçamento, é saber onde é que está o dinheiro. Isto é: há obras ou não há? A Sr.8 Ministra diz que sim! Então, onde é que está o dinheiro?

A Sr.8 Ministra diz: «Não se preocupem!» Mas nós temos de saber de onde vem o financiamento para as obras que se vão executar e isso tem de ser clarificado, porque senão a Assembleia da República não está em condições de votar o Orçamento.

Em terceiro lugar, e ainda relacionado com este problema das instalações e equipamentos para a prestação de cuidados de saúde, devo dizer que admito — e não vejo outra hipótese— que o Ministério da Saúde tenha um planning de necessidades, de instalações e de equipamentos para a prestação desses cuidados. Pergunto, pois, se não seria possível que esse planning fosse fornecido à Assembleia da República para que possamos saber as previsões do Ministério em termos de avançar com equipamentos, com instalações, qual a sua programação. E isto não quer dizer que a programação não possa vir a ser alterada, pois é evidente que as prioridades se podem alterar de um momento para o outro por razões as mais diversas. Agora isso nunca é aqui apresentado e quando se diz que esta ou aquela obra saiu do PIDDAC, que este projecto também saiu e que desapareceu um outro, etc, a Assembleia da República constata isso, não tendo a mínima ideia, porque não lhe é explicado, do porquê, das alterações e do que está ou não programado.

Por último, refiro-me à questão dos medicamentos. De acordo com o orçamento do Serviço Nacional de Saúde, que a Sr." Ministra fez o favor de entregar à Assembleia, em 1988 terá havido um aumento, em termos monetários, de consumo de medicamentos da or-

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dem dos 10 "Io. Ora a Sr.1 Ministra diz que para 1989 esse aumento será apenas de 2,36 "Io. Ou seja, vai ter um decrescimento real de 5,5 "Io.

A questão concreta que lhe coloco é a seguinte: isso dever-se-á a quê? Ao facto de se reduzirem as doses de medicamentos, ou a quaisquer outras coisas, ou será porque vão aumentar os encargos dos utentes com o pagamento de medicamentos? E porque produtividade em termos de medicamentos é uma coisa muito complicada e convém que sejamos esclarecidos sobre isto.

Sào estas as questões que lhe deixo, Sr.a Ministra.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, colocarei a questão dos compromissos da Sr.a Ministra para saber se realmente haverá possibilidades de fazer a pergunta, pois é já quase meio-dia.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, formule a sua pergunta, embora, como é evidente, os horários devam cumprir-se!...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, referia-me ao tempo para a resposta e não para a pergunta. Mas, enfim!...

Sr." Ministra, a primeira questão que lhe coloco é uma questão clássica na discussão do seu orçamento, ou seja, a questão do défice que passa de um ano para o outro. Esse défice sobe este ano em 2900 mil contos e a explicação que temos encontrado normalmente da parte do Ministério da Saúde para a sua existência é a identificação do mesmo défice com o deslizamento normal no pagamento de facturação por parte dos vários serviços integrantes do Serviço Nacional de Saúde. Isso acontecia nos hospitais, onde havia um desfasamento de três meses, se não estou em erro, acontecia na assistência medicamentosa, onde o desfasamento era de dois, nas convenções, onde era também de dois, e isto, efectivamente, explicava o défice.

Já chamámos algumas vezes a atenção para o que porventura isto pode significar de menos correcto na técnica da orçamentação e da conta, simplesmente este ano verifico algumas coisas curiosas. Verifico, por exemplo, que este crescimento global de 2 milhões de contos significa um crescimento muito menos que proporcional, em sede de administrações regionais de saúde (ARS), convenções e medicamentos, onde nem sequer chega a crescer o montante do défice que passou de 1988 para 1989; o que passará de 1989 para 1990 nem sequer chega a corresponder à inflação esperada pelo Governo, que é de 6 °7o, o que também acontece nos hospitais centrais, onde, pelo contrário, esta verba decresce.

E a minha questão é a seguinte: a explicação mantém-se? Isto é: continua a tratar-se aqui de um deslizamento no pagamento de facturação, ou realmente esta evolução fornece uma outra explicação?

Devo dizer que estou a guiar-me por um papel que foi distribuído e onde verifico, por exemplo, que em «Medicamentos ARS» o défice previsto para 1988 era de 7244 mil contos e o previsto para 1989 será de 7679 mil contos. Os hospitais centrais tinham uma facturação complicada e com um atraso superior —segundo nos era sempre dito— e o défice era de 7193 mil contos, passando para 6650 mil contos.

Esta é a primeira questão, que é normal e que tenho colocado, por via de regra, na discussão do orçamento da saúde.

A segunda questão que queria colocar-lhe é uma questão de carácter geral e tem a ver realmente com o Hospital da Prelada, na consciência de que estamos a discutir o orçamento do Ministério da Saúde. Isto é: o caso do Hospital da Prelada, com as várias informações que V. Ex.* nos deu — e com as quais me congratulo— sobre os progressos na eficiência da gestão hospitalar conjugados, significa ou não que há um modelo novo para a gestão dos estabelecimentos públicos de saúde em Portugal?

É porque no Hospital da Prelada, curiosamente, verifica-se uma gestão privada de segunda via, ou seja, uma gestão privada de interesses privados. Quer dizer, o Hospital da Prelada é um hospital devolvido à Santa Casa da Misericórdia do Porto, circunstância com a qual o CDS se congratulou oportunamente, como V. Ex." sabe, e agora é um hospital gerido privadamente «em segunda via», pois a Santa Casa da Misericórdia, pelos vistos, não é considerada com suficiente capacidade para gerir, havendo uma entidade privada que vai gerir o hospital.

E pergunto, Sr." Ministra: na linha da sua preocupação de eficência —muito louvável—, e sem pôr em causa, em última análise, a prestação dos serviços para a qual existem já serviços, por que é que não se encara essa modalidade em relação aos próprios serviços públicos e com maior extensão? Por que é que V. Ex.a não concede largamente a gestão dos seus serviços públicos, que se gerem tão mal, que não sabem preparar as refeições (e devo dizer-lhe que acredito nisso piamente)? Por que é que não entrega essa gestão mais largamente a serviços privados? Isso significará, em última análise, o quê? Apenas gestão privada de serviços públicos? E por que não, mais extensamente, serviços privativos a gerirem-se a si próprios, sistema que, em nosso entender, seria, porventura, o sistema mais eficiente para lidar com esta matéria?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Bacelar.

O Sr. António Bacelar (PSD): — Sr." Ministra da Saúde, é sempre com muito prazer que ouço V. Ex.\ porque é uma pessoa que tem ideias claras, arrumadas e concretas sobre muitos assuntos. Entre eles, focarei alguns. Ao fim e ao cabo, não farei propriamente perguntas: apenas procurarei saber a sua opinião.

Devo dizer que, em relação à hotelaria dos hospitais, acho perfeitamente normal que se utilizem, como há pouco a Sr." Ministra referiu, outros sistemas que não sejam aquela velha cozinha onde uma série de pessoas trabalha, às vezes sabe-se lá em que condições ..., por certo não as melhores! Em relação às lavandarias dos hospitais, por que é que não há-de haver uma lavandaria que possa servir a três ou quatro hospitais? Por que é que cada hospital há-de ter uma só lavandaria., com gastos brutais? Por exemplo, em Londres, três ou quatro hospitais são servidos por uma só lavandaria.

Quanto à rentabilidade dos serviços —e não vou ficar com problema algum de ética por referir este assunto, porque fui encarregado pela própria Comissão de Saúde de fazê-lo—, tenho comigo dois documentos

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subscritos por um director e por um director clínico de um hospital do Porto — o Dr. Luís de Carvalho e o Dr. Paulo Mendo— em que, só para ver o que é a gestão de um hospital e o que esta pode ou não ser, darei o seguinte exemplo: há um serviço que tem um número de médicos de dez, é um serviço pequeno, que

fez, por exemplo, 4500 consultas num ano — número que diminuiu 23% relativamente ao ano de 1986—, com dezasseis camas, com uma demora em média de internamento de 30,8 dias (o que significa que houve um aumento em relação a 1986 de 24%) e com uma taxa de ocupação de 80,6%, em que o director do hospital diz ao director do serviço que o movimento das consultas se situa em valores inadmissíveis e baixos para um quadro médico de quatro médicos e de seis internos, quando, ainda por cima, baixou em relação ao ano de 1986.

Devo dizer que estes documentos depois vão ser entregues na Comissão de Saúde, e é por isso que não estou a fazer segredo disto. Penso que não há razão para o fazer e que isto significa apenas que um hospital bem gerido, em que os directores dos serviços são não digo controlados mas orientados ou alertados para problemas desses, automaticamente vai aumentar a rentabilidade do hospital e diminuir os gastos que, com certeza, os serviços têm.

Em relação aos medicamentos, por acaso tive oportunidade de ir à Embaixada da República Democrática da Alemanha, onde me deram um livrinho sobre o sistema de saúde na RDA, em que se diz apenas isto: «Em relação aos medicamentos, conseguimos um catálogo de medicamentos na RDA que abrange somente 1500 medicamentos [...]», quando em Portugal, Srs. Deputados, temos um «Simposium terapêutico» com, mais ou menos, 30 000! ... E diz mais: «[...], medicamentos cuja prescrição é feita exclusivamente por especialistas». Diz ainda, por exemplo, que «entraram 233 novos produtos, mas foram retirados 179» e não admitem produtos que não tenham capacidade terapêutica, o que, aliás, está a pretender fazer-se neste país.

Há uma outra coisa que eu queria também referir, já que se falou no Porto e porque quando se fala no Porto há sempre qualquer coisa que me toca muito. E toca-me muito por dois motivos: não é que se trate propriamente de uma nação — ainda não é, pode vir a ser ...

Risos.

... — mas é um baluarte que muito prezo, e como sou nascido e criado naquela cidade, com responsabilidades até a nível autárquico, o problema do Hospital da Prelada sempre me tocou muito, pelo facto de ser mais um hospital —e não me interessa saber se é uva hospital privado ou se é um hospital do Estado— que tem hipóteses de ter mais 350 camas, que vão servir, e bem, a população do norte do País; o resto não me interessa! São mais 350 camas que vão servir milhares e milhares de pessoas que necessitam de tratamento na zona norte, principalmente no distrito do Porto. Em relação aos queimados é o único serviço que conheço com categoria, por ter sido construído exactamente com o objectivo de tratar queimados. É porque tratar queimados não pode ser feito de qualquer maneira, tem de haver condições, e o Hospital da Prelada tem essas condições.

Para além disso, no que se refere ao problema da gestão do Hosptital, acho que são profissionais que a fazem. Quanto ao resto só profissionalizando os médicos, em termos de exclusividade, pagando-lhes bem e dando-lhes condições de trabalho, é que as coisas funcionam. Nesse hospital as coisas funcionam; tive o cm-dade de ir vê-lo, não só no dia da inauguração —em que tive o prazer de estar presente— mas fora desse dia, perguntei aos doentes como eram tratados e a resposta foi a de que se sentiam humanamente tratados. Os doentes entram no Hospital, marcam a consulta e não precisam de andar a mendigar, nem de estar à chuva, como víamos em bichas brutais, à porta dos estabelecimentos hospitalares, à espera que abrisse a porta para poderem marcar uma consulta. Hoje no Hospital da Prelada podem marcar uma consulta pelo telefone, são bem atendidos, são atendidos com humanidade e depois são tratados rapidamente. São consultados num dia, fazem análises nesse mesmo dia e passados dois ou três dias estão a ser operados, se for caso disso, e rapidamente são restituídos as suas actividades. Quando se fala em rentabilidade dos serviços de saúde, toda a gente pensa —ou julga-se que se pensa...— que um hospital tem de dar lucro no aspecto de dinheiro, ou seja, que entram cem e aquilo que vai de lá sair são duzentos. Mas a rentabilidade de um hospital —é assim que eu e certamente muita mais gente pensamos, todos pensam ou devem pensar—: traduz--se no restituir saúde a um doente que entra no hospital. Isso é que é a rentabilidade de um hospital. O ter uma série de aparelhos, muito bonitos, encaixilhados e que não funcionam, isso não dá!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Gomes.

O Sr. Fernando Gomes (PCP): — Vou ser muito rápido, tipo telegrama, dada a escassez de tempo.

Efectivamente, a Sr." Ministra não entendeu, quando falei no início, que não estaríamos aqui para discutir política de saúde em geral, e estendeu-se bastante. Só tenho pena de o tempo não ser suficiente para poder contraditar algumas das afirmações que a Sr.8 Ministra fez. Em relação ao caso concreto do Orçamento do Estado e à modificação na carreira de clínica geral aumentando a convenção —contrariando, aliás, uma lei que existe neste país e que, penso, o Ministério está obrigado a cumprir, lei essa que considera as convenções como excepção ao Serviço Nacional de Saúde, não como via prioritária—, constato que a Sr.' Ministra não tem estudos de planificação em relação a custos dessas inovações que pretende introduzir na carreira de clínica geral.

Não entro agora na filosofia política em causa, embora efectivamente estejamos em profundo desacordo — e há afirmações que não são só minhas mas sim da Organização Mundial de Saúde —, porque teremos outra oportunidade de discuti-las. Lamento que tenha entrado por esse caminho, sem possibilitar a contradita.

De qualquer das maneiras, quero chamar a atenção para alguns aspectos, e o meu camarada Octávio Teixeira já chamou a atenção para um deles: é que parece estarmos aqui a discutir coisas diferentes: um documento que é um documento oficial proposto à Assembleia da República para discutir, de que os deputados têm informação, e outro documento que é,

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efectivamente, aquele que contém os números a que a Sr.a Ministra se refere. Já tivemos oportunidade, na Comissão Parlamentar de Saúde, de referir isso em relação ao cumprimento do PIDDAC e continuamos, até hoje, a aguardar que as alterações de que a Sr." Ministra falava e que foram anunciadas como de 90 % de cumprimento do PIDDAC chegassem a esta Assembleia. Hoje mesmo não temos essas alterações e dos números de que dispomos não há cumprimento do PIDDAC do ano passado em 42 São estes os números de que dispomos neste momento, Sr." Ministra.

Chamo ainda a atenção para o seguinte: V. Ex.a disse que os aumentos em relação aos médicos e os encargos que isso traria em termos de orçamento deveriam ser discutidos e que iria fazer-se o reajustamento em relação às carreiras dos técnicos superiores, etc., etc. Quero só chamar a atenção de V. Ex.a para o facto de que o que está orçamentado, o que está previsto no Orçamento e no Ministério das Finanças são 10 milhões de contos para todo o funcionalismo público. Ora bem: só a subida de uma letra a todos os médicos é um encargo da ordem dos 2500 mil contos. Não é isso de certeza que os médicos reivindicam e não é com isso que os médicos atingem salários europeus ou parecidos.

Por outro lado constato que houve a preocupação de aumentar as entradas em relação à enfermagem, mas em relação às instalações há, efectivamente, uma redução concreta nessas instalações no que diz respeito a investimentos. Não é de multiplicar escolas, não é de nada disso que se trata; é em relação às obras existentes! Estamos a falar do PIDDAC e dos números de que dispomos.

Além disso, a Sr.8 Ministra afirma que foram gastos 450 mil contos em saúde materno-infantil. Os números que nós, deputados, dispomos são exactamente o contrário: são de 10 mil contos para o Hospital de Torres Vedras; 10 mil contos para o Hospital de Viseu —isto gastos este ano—, 2700 contos para a Maternidade de Alfredo da Costa e 11 500 contos do PIDRE entre Mira e Guadiana, tudo num total de 34 200 contos. Devemos estar a falar de verbas diferentes, Sr.a Ministra. Em relação a 1989, para estas mesmas entidades estão previstos 105 mil contos —com certeza não está a referir-se ao que o Ministério gasta com os serviços de neonatalogia, de obstetrícia dos hospitais em geral. Estou a falar em relação ao programa de saúde materno-infantil, e estes são os números existentes.

Por outro lado, devo dizer que já estava na dúvida sobre onde é que me encontrava neste momento situado, se na Assembleia da República, se numa assembleia de accionistas de uma qualquer empresa ... só não percebo por que é que aqui não se falou ainda no novo hospital privado do Porto, que já é anunciado na rádio. Ouvi falar no Hospital da Prelada variadíssimas vezes, mas que eu saiba neste as contas seriam outras e nada têm a ver com o Orçamento do Estado.

Já aqui foram afirmadas várias coisas —uma delas pela Sr.4 Ministra e, por isso é que ponho esta questão— que não me parecem de forma alguma correctas. A Sr." Ministra tem na sua posse, já há bastante tempo, um estudo feito por especialistas em dietética e administração hospitalar que aponta, comparando, os custos das refeições nos Hospitais de São Francisco Xavier, do Barreiro, do Hospital da Universidade de Coimbra e, suponho, de um outro em

que esse custo é inferior; e mais, não é só a questão do custo que é inferior; é também a questão da qualidade da comida e da sua diversidade. E quem quiser comprovar pode ir neste momento ao Hospital da Universidade de Coimbra —eu já lá estive internado como doente e posso testemunhá-lo— e verificar que a.qualidade e a diversidade da comida são efectivamente outras. Os custos são muito inferiores aos das empresas privadas.

A Sr.* Ministra tem este estudo na sua posse mas se o não tivesse, quando teve lugar a interpelação ao Governo sobre política de saúde, nós distribuímo-lo a todos os Srs. Deputados que o quiseram ver. Portanto, falar na generalidade, dizendo que os custos das refeições são menores quando o serviço é prestado por empresas privadas, isso não está de forma alguma comprovado, muito pelo contrário! Quem quiser defender interesses desses tem de arranjar outros estudos e não os estudos reais existentes.

Em relação a estas questões, era tudo o que eu queria dizer, até porque temos de aproveitar o tempo.

O Sr. Presidente: — A penúltima inscrição é a do Sr. Deputado Vidigal Amaro, a quem concedo a palavra.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por lamentar um remoque, que achei de muito mau gosto, da Sr.a Ministra. Quando falei nas carreiras médicas — e falei também nas outras carreiras— a Sr.8 Ministra entendeu que se tratava de uma coisa pessoal. Achei isso, ditado para a acta da reunião, uma coisa de muito mau gosto e não posso deixar de lamentá-lo.

Em relação ao aumento da produtividade — e todos nós lutamos pelo aumento da produtividade! ... —, porque apesar de o aumento da produtividade no ano passado ter sido de 12 % o défice aumentou 11 milhões, eu pergunto se a Sr.8 Ministra continua a pensar que com o aumento da produtividade deste ano o défice previsto vai ser cumprido. Estes dois números é que têm de ser relacionados, Sr." Ministra. Houve um aumento de produtividade? Sem dúvida alguma deve haver mais! O problema é que o défice continua a subir. Todos os anos sobe!

Em relação ao Hospital de Júlio de Matos, diz a Sr.8 Ministra que a localização é um problema lateral. Sr.8 Ministra, eu não estou a dizer que a alienação dos serviços de saúde é para se fazer ou não; o que eu digo é que em Lisboa temos o Hospital de Miguel Bombarda, que está muito mais degradado. Então, se os terrenos são assim uma «parte lateral», por que é que não se pensou antes na alienação do Hospital de Miguel Bombarda? Se calhar não é assim «tão lateral» a questão da localização dos terrenos, Sr.8 Ministra! ...

Só mais uma coisa: a Sr.8 Ministra falou do Hospital da Prelada — e já todos disseram que é um hospital privado—, mas, já agora, também digo que há outro, o Hospital do Patrocínio. Em relação a este tive oportunidade de verificar que ainda este ano se fizeram lá obras. A Sr.8 Ministra entregou-o à Misericórdia, fez um protocolo e foi o Ministério da Saúde que suportou verbas dessas obras. Ora eu gostaria de saber onde é que isso está inscrito no PIDDAC do ano passado. Não encontrei aí verba alguma que tenha sido

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gasta com esse objectivo; não está inscrita nenhuma verba gasta, mas o que é certo é que as obras foram feitas. E para o ano, que vem —as obras nesta altura estão paradas— é o Ministério da Saúde ou quem é que vai acabar as obras?

O Sr. Presidente: — Por último, tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madail.

O Sr. Gilberto Madall (PSD): — Muito rapidamente, Sr. Presidente e Sr. * Ministra, para fazer apenas duas considerações.

Relativamente ao distrito de Aveiro, em particular, é com agrado que vemos o lançamento de algumas obras, das quais gostava de salientar o arranque do Hospital da Feira, que é uma velha reivindicação das gentes das «Terras de Santa Maria».

Por outro lado, Sr.* Ministra, com a abertura da IP 5 (via rápida de Aveiro para a Europa), toda aquela zona interior vai ficar servida por uma via de comunicação com acesso a Aveiro muito rápido. Ora, uma das preocupações em Aveiro e a de que, mau grado as obras que têm vindo a ser feitas no Hospital de Aveiro, não existe ali um centro de reanimação. Queria, pois, perguntar à Sr.* Ministra se, efectivamente, está prevista alguma coisa nessa área ou se alguma coisa poderá vir a ser feita.

Uma outra questão, que repito apenas a título de curiosidade e que, penso, já foi falada no debate do orçamento travado no ano passado, é a da existência, em Estarreja, de um parque industrial de produtos muito perigosos. Ora, eu penso que, em caso de catástrofe, não existe nada na zona no sentido de poder responder com rapidez e eficiência a qualquer acidente que, eventualmente, ocorra. Existe agora no Porto o Hospital da Prelada que presta cuidados especiais a queimados, mas penso que seria talvez de pensar em algo que, na zona de Aveiro, pudesse dar resposta a uma catástrofe. É porque aí não há meios técnicos capazes de responder com rapidez, nem que seja prestando uns primeiros cuidados.

Era só isto que queria dizer, Sr.* Ministra.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.a Ministra da Saúde.

A Sr." Ministra da Saúde:—Perdoar-me-ão, Srs. Deputados, que responda em termos telegráficos ... De facto, tinha acreditado no horário que me foi dado e que já está um pouco ultrapassado.

O Sr. Deputado João Cravinho referiu a necessidade de controle das despesas —não posso deixar de estar mais de acordo com isso— e chamou a atenção para o facto de o mesmo se passar um pouco por todos os países. Se os Srs. Deputados tiverem o cuidado de ver o que se passa nos países da CEE, seja qual for o tipo de governo que esses países têm há uma «comunidade» de preocupações e de forma de resolver os problemas notável, em relação a todas estas questões.

É evidente que tentámos rentabilizar ao máximo os recursos, mas prestando melhores cuidados aos doentes e aos utentes dos serviços. Para nós, é ponto de honra fazer o máximo que pudermos com os meios que temos. Só que continuo a julgar que os meios que temos ainda não estão suficientemente utilizados e rentabilizados. Só para dar-lhe dois pequenos exemplos

dir-lhe-ei que, em relação às camas hospitalares, os dias de internamento correctos utilizados são SI % em relação ao total. Isto significa que utilizamos 49 % de dias de internamento que não são correctos. Só isto significaria, em termos de correcção das coisas, o dobro das camas ou a possibilidade de tratar o dobro dos utentes, o que obviamente dá uma margem de manobra enorme de capacidade de desenvolver aquilo que temos.

Por outro lado, Sr. Deputado, devo dizer-lhe, tenho o maior interesse em possibilitar que a Comissão de Economia e Finanças, com a maior rapidez possível, contacte as pessoas ou os documentos do meu Ministério e que se relacionem com tudo aquilo que o Sr. Deputado referiu, nomeadamente o Dr. João Urbano, do projecto de controle de custos hospitalares que já uma vez veio à Comissão de Saúde e que voltará cá para fazer a mesma coisa se VV. Ex." o desejarem em relação à Comissão de Economia, Finanças e Plano. Poderemos também fornecer informações sobre tudo aquilo que foi feito em relação aos medicamentos e a tudo o que aconteceu neste ano. É só discutirmos a forma e a via e isso será feito imediatamente. Tenho nisso todo o interesse.

O Sr. Deputado Octávio Teixeira não deixou de fazer uma observação ao facto de eu ter falado no Hospital da Prelada; e fê-lo dizendo que não tinha nada a ver com o que estamos a discutir, porque é um hospital privado. Sabe que eu gosto de dizer que não sou a Ministra do Serviço Nacional de Saúde mas sim a Ministra da Saúde do Pais, portanto também me interessa e também tenho a ver com o sector privado da prestação de cuidados.

Mas, além do mais, não é verdade que o Hospital da Prelada não tem nada a ver com o Orçamento. Os Srs. Deputados estão enganados e por uma razão muito simples: é porque eu disse à Misericórdia do Porto que tinha de ser assegurado aos utentes do Serviço Nacional de Saúde o acesso àquele Hospital. Obviamente que para os utentes do Serviço Nacional de Saúde que vão ao Hospital da Prelada é o Serviço Nacional de Saúde que paga nos mesmos termos em que eles vão a outro hospital. Talvez o Sr. Deputado fique contente por saber que vou pagar metade do que pago no outro hospital central.

Quanto às observações que fez sobre o PIDDAC e sobre o respectivo montante, o Sr. Deputado mesmo disse que não incluía, nos primeiros números que referiu, os PIDRE e OID e que, portanto, isso conduzia a um valor diferente. Mas, Sr. Deputado, se quer que diga que não tenho no PIDDAC todo o dinheiro que gostaria de ter, volto a dizer o que disse há momentos. Não vou estar a discutir se cresceu ou não, a única coisa que vou dizer é que usarei o «melhor possível» o dinheiro que foi «possível» atribuir à saúde para fazer investimentos.

No entanto, eu não disse, Sr. Deputado, «não se preocupem que as obras logo se vêem», pois respeito, como todo o Governo respeita, que é a Assembleia da República que vota o Orçamento do Estado e a Assembleia da República tem na proposta de lei do Orçamento todos os dados que são necessários para saber como vão ser feitas aquelas obras, nomeadamente as que foram especificamente referidas.

Em relação ao plano de necessidades de instalações e equipamentos e às respectivas prioridades, no PID-

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DAC obviamente transparece aquilo que nós pensamos em relação ao que é. Tentei dizer aqui quais eram as respectivas prioridades e não tenho problema algum em discutir isso com os Srs. Deputados se o quiserem fazer. É, no entanto, perfeitamente claro que por detrás daquilo que foi proposto há uma política que assenta em determinados cuidados, como, por exemplo, cobrir as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, como inú-meras vezes disse, e assegurar um certo número de outras coisas. Eu disse isso e, portanto, temos, obviamente, um plano de instalações e de equipamento e ele transparece nos documentos que foram fornecidos, bem como das informações que já dei.

Em relação aos medicamentos pode estar sossegado, Sr. Deputado, porque a indústria farmacêutica não terá-em 1989 todos os benefícios que eventualmente gostaria de ter; houve uma inflexão nas suas previsões em relação a 1988, inflexão que está perfeitamente clara na evolução da factura de medicamentos. Pode, pois, estar descansado, Sr. Deputado; não é aos utentes que vamos pedir um esforço acrescido neste domínio, mas a indústria farmacêutica também terá, decerto, algumas limitações naquilo que, porventura, podia prever em Janeiro de 1988, quando a factura cresceu 26 % em relação a 1987.

Sr. Deputado Nogueira de Brito, quanto à história do défice, não é só «atrasar»; é obviamente o volume da despesa que está em causa.

Em relação aos três pontos que referiu, quanto a convenções e medicamentos, o défice não cresce à taxa de inflação porque a própria factura de medicamentos e de convenções há-de crescer menos, portanto, está em proporção. Há um prazo normal de pagamento de despesa nesses dois sectores e é esse prazo que se vai observar no fim de 1989. Quanto aos hospitais, há alguma recuperação no atraso de dívidas que, de facto, neste momento está para além daquilo que gostaríamos que estivesse e que seria de desejar que estivesse.

Quanto ao Hospital da Prelada e às observações que fez, o Sr. Deputado certamente compreenderá que o Ministério da Saúde não gere os hospitais das entidades privadas, nem sequer deseja fazê-lo, e também não é responsável pelo modo como as entidades privadas gerem os hospitais. Isso vale para o Hospital da Prelada como vale para todos os hospitais e clínicas privados que existem. Aliás, devo dizer-lhe que a Prelada é, talvez, o único verdadeiro hospital privado que hoje existe vivendo de meios seus e não de meios em sobreposição com outras entidades. De qualquer maneira, Sr. Deputado, é rigorosamente da exclusiva competência da Misericórdia do Porto saber como é que gere o seu hospital. O Ministério da Saúde não tem nada a ver com isso e não pode inferir coisíssima alguma da forma como o Hospital da Prelada é gerido em relação à forma como o Ministério da Saúde gere os seus hospitais. Se V. Ex." quer que eu lhe faça alguma referência sobre as vantagens ou desvantagens do recurso a entidades privadas, dir-lhe-ei que não tenho nada contra as entidades privadas ao contrário, porventura, do que outros terão. Mas, de facto, não é problema meu a forma como o Hospital da Prelada é gerido. Aliás, talvez uma das grandes vantagens dos hospitais privados, como o da Prelada, seja a de que o Ministério da Saúde não tem nada que se meter nisso.

Sr. Deputado António Bacelar, em relação às considerações que fez sobre a entrega de serviços a outras

entidades, já agora vou dar-lhe uma notícia que talvez seja agradável: não é só em Londres que as lavandarias são aproveitadas por outros hospitais, já que as do Hospital Universitário de Coimbra e as do Magalhães de Lemos estão neste momento a prestar serviços a outros hospitais. Portanto, também entre nós isso já acontece!

Quanto a esse documento que leu, de dois membros do conselho de administração de um hospital, não o conhecia, mas ainda bem que os conselhos de administração dos hospitais estão a exercer os poderes legais que de facto têm.

Quanto àquilo que leu no documento que lhe foi facultado pela Embaixada da República Democrática Alemã, direi que, pelos vistos, há outros que são muitíssimo mais restritivos do que nós em relação à lista de medicamentos comparticipados. Afinal os problemas de contenção de meios andam um pouco por todo o lado.

Sr. Deputado, nós estamos a falar de um sistema di-referente. Em Portugal tratamos as coisas um pouco de outra maneira, mas isso não tem grande problema nem adianta o que quer que seja para aquilo que estamos a discutir ... E porque nós vivemos num espaço em que o Estado não limita tanto aquilo que se vende.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — A crítica não foi minha mas, sim, do Sr. Deputado António Bacelar, Sr.° Ministra!

A Sr." Ministra da Saúde: — Não ouvi crítica; ouvi dizer que era um exemplo. Mas isso também não é problema ...!

O Sr. Presidente: — Não vamos discutir agora a República Democrática Alemã ...

Risos.

A Oradora: — Sr. Deputado Fernando Gomes, em relação à questão da execução do PIDDAC laborei em erro na Comissão de Saúde, porque julgava que os critérios que o Ministério do Planeamento e da Administração do Território tinha utilizado em relação aos dados que tinha fornecido eram outros. Tenho comigo um documento, que, suponho, foi também enviado à Assembleia da República dizendo que os critérios que o Ministério do Planeamento tinha utilizado para referir o nível de execução do PIDDAC não eram aqueles que eu julgava. Vou ler: «[...] o valor previsto no mapa vil do Orçamento para 1989, para a execução em 1988 dos investimentos a cargo do Ministério da Saúde ou de qualquer outro ministério, é certamente inferior à execução total do Ministério para 1988, uma vez que se refere apenas aos projectos cuja execução continua em 1989, não incluindo portanto os montantes despendidos em projectos que terminam em 1988. Acresce que alguns projectos que se encontravam previstos até 1988 na programação sectorial são em 1989 transferidos para a OID de Setúbal, pelo que deverão ser tomados em conta na avaliação da execução global do Ministério.»

De facto estávamos a referir-nos a um critério completamente diferente daquele que julgávamos e daí decorrerá a diferença dos números que os Srs. Deputados tinham e aqueles que eu própria tinha.

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Em relação às escolas de enfermagem suponho que expliquei por que é que num dos casos havia uma redução do investimento. Há uma redução de investimento, mas há uma maxtmalização dos meios, nomeadamente em relação à Escola de Enfermagem de Ana Guedes e noutros casos serão factores semelhantes. Não há diminuição de capacidade, em relação àquilo que estava previsto, quanto à prestação do ensino de enfermagem; há sim, repito, uma política do Ministério no sentido do obter, durante os anos próximos, os enfermeiros de que necessitamos para recuperar o atraso, mas não vamos aumentar definitivamente a capacidade das escolas de enfermagem com o objectivo de, permanentemente, produzir mais enfermeiros, do que aqueles de que dentro de algum tempo vamos necessitar. ij .

O plano materno-infantil estava numa verba que não estava desagregada em 1988. Para que não pensem que os investimentos foram tão poucos, ou visaram tão poucos hospitais, vou ler muito rapidamente uma lista: «Foram feitos investimentos neste domínio nos seguintes hospitais: Vila Nova de Famalicão, Braga, Guimarães, Chaves, Mirandela, Vila Real, Bragança, Santo Tirso, Póvoa de Varzim, Vale do Sousa, Amarante, Aveiro, Figueira da Foz, Ovar, Aveiro Norte, Guarda, Viseu, Covilhã, Maternidade do Dr. Alfredo da Costa, Castelo Branco e Maternidade de Júlio Dinis.»

Ainda não temos serviços de obstetrícia e de neona-talogia fora dos hospitais, graças a Deus!, nem vamos ter. Vamos é concentrar esses meios nos hospitais onde eles devem existir. Estava a referir-me, quando falava em programa de saúde materno-infantil, neste domínio, àquilo que é feito em serviços de obstetrícia e de neonatalogia.

Quanto àquilo que referiu sobre o preço das refeições. Em relação aos hospitais da Universidade de Coimbra a conta que foi feita não foi com base em contabilidade analítica suficientemente detalhada para termos a certeza total da fiabilidade dos números dados, mas há muitos outros números que lhe poderiam ser dados ... E, depois, há uma coisa que não está lá contada e que é aquilo que entra nos hospitais em géneros e que depois não é comido pelos doentes. Isso não estava lá, nas contas! E há muitos hospitais, infelizmente, onde isso acontece. No entanto, isso desaparece quando passa a ser uma entidade exterior a prestar serviços ao hospital e não o hospital directamente a fazer esse serviço. Quanto aos interesses que o Sr. Deputado insinuou que eu pretenderia defender por via da entrega da prestação de serviços a entidades terceiras, Sr. Deputado, e para que conste do Diário, informo que os interesses que defendo são os interesses dos utentes dos serviços e dos contribuintes, mais nenhuns!

Sr. Deputado Vidigal Amaro, lamento, mas eu não tinha objectivo algum de ofendê-lo quando fiz notar a sua qualidade de médico. Lamento que tenha entendido que era esse o meu objectivo, que de facto não era.

Quanto às considerações que fez sobre os Hospitais de Júlio de Matos e de Miguel Bombarda não percebi se estava a sugerir-me que alienasse o Hospital de Miguel Bombarda. Não tenho nenhuma intenção de fazê-lo neste momento. Não é verdade que esteja mais degradado que o Hospital de Júlio de Matos. O que eu disse foi que a questão da alienação dos terrentos é

lateral em relação à questão da saúde mental e à forma como ela deve ser tratada. Entendo que o modelo dos hospitais psiquiátricos é um modelo ultrapassado e que o modelo certo é o que foi aplicado, que tem vindo

a ser aplicado no País, fora de Lisboa, Porto e Coimbra e que é o modelo assente em centro de saúde mental. Entendo também que deve ser através dos centros de saúde mental e das equipas que neles trabalham que devemos resolver a generalidade dos problemas de saúde mental, com apoio para internamento de agudos nos hospitais gerais e tudo o mais que neste momento não tenho tempo para explicar.

Naturalmente, quando isso acontecer, os hospitais psiquiátricos ficarão sem ter que fazer; nessa altura poder-se-á pôr a questão de saber o que acontece ao terreno do hospital, o que é uma questão diferente, não é a mesma questão, e foi nesse sentido que eu disse tratar-se de uma questão lateral.

Em relação ao Hospital do Patrocínio, em Évora, vão ser concluídas as obras nos temos que foram combinados entre o Ministério e a Misericórdia de Évora. Pode V. Ex.a estar descansado porque não vai haver nenhuma lesão, para o Estado, por aquilo que este tenha despendido ou venha a despender com o Hospital do Patrocínio. Dentro de algum tempo certamente todos conhecerão os termos em que a Misericórdia de Évora e o Estado resolverão, globalmente, o problema, complicado, do respectivo relacionamento em Évora e que não diz apenas respeito, como sabe, ao Hospital do Patrocínio.

Sr. Deputado Gilbeto Madail, em relação à questão do Hospital de Aveiro, dir-lhe-ei que está já encomendado o equipamento para o centro de reanimação para esse Hospital. O problema que focou estará resolvido dentro de muito pouco tempo e quanto à questão de Estarreja a situação está devidamente estudada, há localmente o equipamento necessário de emergência e a funcionar como retaguarda o Hospital de Aveiro e os Hospitais da Universidade de Coimbra. Portanto, as coisas estão devidamente estudadas e asseguradas, o que talvez possa acalmar um pouco as preocupações que as populações residentes poderiam ter.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado a todos pelas intervenções produzidas ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — V. Ex.a pretende ainda fazer alguma intervenção, Sr. Deputado?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Presidente, é só para que fique registado em acta, vou entregar na Mesa uma série de propostas, no valor global de 1 milhão e 850 mil contos, para o sector da saúde.

O Sr. Presidente: — Sr." Ministra da Saúde e Sr. Secretário de Estado da Administração da Saúde, agradeço-vos muito a amabilidade das vossas presença e exposição.

Faremos agora uma breve pausa para reiniciarmos os nossos trabalhos com a apreciação do orçamento para o Ministéro da Administração Interna.

Está interrrompida a reunião.

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Eram 12 horas e 30 minutos. Está reaberta a reunião. Eram 12 horas e 34 minutos.

Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão do orçamento do Ministério da Administração Interna.

Começo por pedir ao Sr. Ministro da Administração Interna que faça uma curta exposição sobre o orçamento do seu Ministério.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Silveira Godinho): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Administração Interna para 1989 tem um aumento, em relação ao orçamento inicial de 1988, de cerca de 21 % ou, mais precisamente de 20,6%. Isso resulta fundamentalmente de quatro ou cinco departamentos do Ministério que, por razões específicas, têm, para o ano de 1989, aumentos substanciais.

Em primeiro lugar, e em valores absolutos, as duas forças de segurança (GNR e PSP), que, por razões de aumentos de efectivos —GNR para a brigada de trânsito e na PSP para a missão normal que lhe está atribuída constitucional e legalmente—, têm aumentos de, respectivamente, 4 milhões de contos para a GNR e 3,9 milhões de contos para a PSP.

Por outro lado, o STAPE tem um aumento de cerca de 350 000 contos pelo facto de, em 1989, irem ocorrer duas eleições —as do Parlamento Europeu, em 18 de Junho, e as autárquicas, no final do ano—, o que não aconteceu no ano de 1988 e justifica este aumento de cerca de 350 000 contos.

Em terceiro lugar, o Serviço de Informações de Segurança (SIS), que está na fase final de montagem e que terá, em 1989, a admissão do último grupo de técnicos. Isso e a compra de algum equipamento dá origem ao aumento de 109 000 contos previsto.

Finalmente, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras tem o maior aumento percentual, cerca de 40% — 300 000 contos, 294 000 contos—, que resulta do facto de, apesar de a sua Lei Orgânica ter sido publicada no final de 1986 princípio de 1987, só agora se estar a processar a transferência das missões que, em matéria de fiscalização de estrangeiros nas fronterias, têm estado cometidas à Guarda Fiscal. Este ano celebrámos um protocolo entre a Guarda Fiscal e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e gradualmente, num período de um ano e meio, dois anos, vão ser transferidas essas missões que têm estado cometidas à Guarda Fiscal, pelo que, em 1989, uma boa parte delas passará a ser desempenhada pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o que leva a um aumento, em quantidade e qualidade, do pessoal do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para ter esta nova vertente «fronteiras», o que se traduz no Orçamento inicial de 1989 por mais 294 000 contos em relação ao ano de 1988.

Quanto ao PIDDAC, o Ministério da Administração Interna tem também um aumento substancial. O PIDDAC inicial de 1988 era de 644 000 contos; para 1989 estão previstos 760 000 contos. Como os Srs. Deputados sabem, um dos objectivos que presidiu à elaboração do PIDDAC foi uma maior absorção possível dos recursos comunitários e, infelizmente, o Ministério da Administração Interna é dos poucos que não tem

possibilidade de recorrer aos fundos comunitários (ou que não tem tido possibilidade de recorrer aos fundos comunitários). Apesar disso, o aumento percentual do PIDDAC do Ministério da Administração Interna é bastante grande e vai permitir fazer face às carências que, em termos quer de instalações quer de equipamentos, as forças e os serviços de segurança vêm evidenciando.

Um departamento que não pertencendo formalmente ao Ministério da Administração Interna lhe está atribuído por delegação do Sr. Primeiro-Ministro é o Serviço Nacional de Protecção Civil, que tem também pela primeira vez uma verba no PIDDAC de 130 000 contos (até agora não havia qualquer montante para o Serviço Nacional de Protecção Civil) e tem no- seu orçamento próprio de fundo privativo também um aumento substancial.

Estes são os aspectos mais importantes, em termos quantitativos do orçamento do MAI mais Serviço Nacional de Protecção Civil, para o ano de 1989.

Estou à disposição dos Srs. Deputados para as perguntas de pormenor e de por maior que queiram fazer.

O Sr. Presidente: — Algum dos Srs. Deputados quer formular perguntas sobre o orçamento do Ministério da Administração Interna?

Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): — O Sr. Ministro referiu aqui um aumento de verbas no seu Ministério, significativas algumas; mas outras, nomeadamente uma que é muito importante no País e que se relaciona com os bombeiros portugueses apenas tem um aumento de 1080 contos. Gostava que o Sr. Ministro explicasse qual a razão —quando está estimado que os bombeiros portugueses dão ao País mais de 14 milhões de contos por ano em trabalho voluntário— por que esta verba tem apenas um aumento de 1080 contos.

Segunda questão: poderia o Sr. Ministro explicar também por que é que, quanto aos governos civis, há um aumento de 100 000 contos? A que é que se destinam essas verbas? É porque aquilo que se tem verificado, em termos dos governos civis, é a continuação dos «sacos azuis» e isto é um verdadeiro «saco azul» para distribuir benesses nas alturas próprias. Que pensa o Governo em relação a isto? Quando pensa acabar com esta situação?

Congratulamo-nos com o facto de o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras ter um aumento nas suas verbas, mas a que se deve a falta de fiscalização a nível do País quanto à instalação de estrangeiros por todo o lado? E porque isso está a causar grandes problemas, nomeadamente na zona de Monchique, Aljezur e Odemira, onde, segundo um requerimento que fizemos ao Governo, foi feita uma acção de fiscalização, tendo sido detectados imensos estrangeiros a viver clandestinamente (há mais de quatro anos) ali, naquela zona, e que estão a trazer grandes problemas relacionados com a droga, prostituição e outras situações. Por que não intensificar esta acção? O que é que está previsto para o ano de 1989, em termos dessa intensificação?

O Sr. Ministro tem, como referiu, por delegação do Sr. Primeiro-Ministro, à sua responsabilidade o Serviço Nacional de Protecção Civil para o qual está prevista uma verba de 130 000 contos. Consideramos que esta

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verba é insuficiente e gostávamos de saber a que é que ela se destina. E pergunto isto porque têm sido feitas acções de protecção civil, mas não tem havido compensação ou a indemnização em relação às situações de calamidade. Já discutimos esta matéria numa outra reunião e trago aqui um dossier, que vou entregar ao Sr. Ministro, sobre a situação da calamidade ocorrida na Cabeça Gorda, em que o seu Ministério respondeu que já tinham estimado as despesas em 19 000 contos, mas até hoje ninguém foi indemnizado. Fala-se que, por intermédio da Segurança Social, o Sr. Governador Civil vai atribuir algumas benesses, mas o que é facto é que, até hoje, o dinheiro não foi distribuído a nin-gém. Aliás, e tenho também aqui para entregar ao Sr. Ministro o dossier das verbas despendidas pela autarquia de Beja (não só a de Beja como as outras todas que entregaram os materiais gratuitamente), que, além do que entregou gratuitamente, despendeu milhares de contos e está à espera de ser indemnizada. Gostava que o Sr. Ministro também esclarecesse o ponto da situação sobre isto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em relação ao Serviço Nacional de Bombeiros, responderei telegraficamente.

O Sr. Deputado diz que a diferença em relação ao ano de 1988 é de 1800 contos e eu não concordo. Se tiver a amabilidade de somar todas as verbas atribuídas ao Serviço Nacional de Bombeiros não só as que constam da transferência do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Bombeiros, mais as contas de ordem, que são receitas depois postas à disposição do Serviço Nacional de Bombeiros para fazer face às suas despesas, mais as verbas do PIDDAC, quer no Ministério da Administração Interna quer no Ministério do Planeamento e da Administração do Território, chegará à conclusão de que os «seus» 1800 contos são transformados em 184 975 contos de diferença.

Quanto aos governos civis acontece um pouco o contrário: não são 100 000 contos de diferença, como o Sr. Deputado disse, mas 142 000 contos de diferença, o que, num montante global do Orçamento inicial de 1988 de 1 milhão e 600 mil contos, é uma diferença de 7,4 % em relação ao ano anterior — penso que não é uma diferença relevante. Não se trata de nenhum «saco azul» nem de nenhum «saco cor de laranja» — periodicamente (penso que mensalmente) os governos civis publicam a listagem. de_todos os subsídios que concedem, não há nenhum secretismo nessa atribuição de subsídios por parte dos governadores civis. E, repito, o montante global dos orçamentos privativos dos governos civis em 1989 é apenas superior em 7,4 % ao montante homólogo de 1988.

Quanto ao Serviço de-Estrangeiros e de Fronteiras, como o Sr. Deputado referiu, há algumas zonas, particularmente uma parte que cabe no seu distrito .eleitoral, onde tem havido manifestações de criminalidade por parte de estrangeiros. Como V. Ex.a segue atentamente os problemas do seu círculo eleitoral, creio que notou que foram feitas várias operações de fiscalização conjuntas entre o-Serviço de Estrangeiros, a Guarda Republicana, a Inspecção-Geral do Trabalho do Ministério e Emprego e a Polícia Judiciária com esse

objectivo de intensificar a fiscalização sobre determinadas «comunidades» de estrangeiros e também sobre casos isolados de estrangeiros que estão em situação

menos regular em Portugal. O objectivo para o próximo ano que está subjacente a esse aumento orçamental é intensificar a fiscalização interna no Pais, mas logo desde o momento em que os estrangeiros passam as nossas fronteiras. E estamos a preparar-nos, também nessa matéria, para o Mercado Ünico Europeu, visto que, a partir de 1993, final de 1992, a situação será bastante diferente, porque, com o desaparecimento das fronteiras internas, a filosofia de fiscalização de estrangeiros terá de ser completamente diferente.

Quanto ao Serviço Nacional de Protecção Civil, também não são 130 000 contos — esse é o montante do PIDDAC, que é uma das parcelas de um total de 508 000 contos que representa mais 43,6 % em relação ao montante deste ano. Tive oportunidade de trocar impressões com o Sr. Deputado na l.a Comissão e disse-lhe que estes montantes são para o funcionamento normal do Serviço de Protecção Civil e para o seu investimento de instalações e de equipamento de telecomunicações; em caso de catástrofes haverá, com certeza, outras verbas que o Ministério das Finanças porá à disposição do Serviço Nacional de Protecção Civil ou da entidade que, em resolução de Conselho de Ministros, for indicada para gerir as situações de catástrofe.

Quanto à situação de Cabeça Gorda, que já se prolonga há cerca de um ano, o Ministério do Emprego e da Segurança Social, através da Segurança Social, informou-me que pôs à disposição das vítimas desse tornado (ou minitornado) da Cabeça Gorda os montantes considerados adequados. O Serviço Nacional de Protecção Civil intervém nas áreas que não são cobertas pelos outros ministérios; no caso de calamidade há vários subsectores que são atingidos (a agricultura, as vítimas individuais, as vias de comunicação) e são os vários ministérios sectoriais que têm tido a preocupação de compensar esses prejuízos.

No caso concreto de Cabeça Gorda, repito, tenho a informação do Ministério do Emprego e da Segurança Social que, pela via da Segurança Social, foram atribuídos subsídios para compensar os prejuízos resultantes dessa minicatástrofe que, no ano passado, assolou a freguesia de Cabeça Gorda e que já tem sido objecto de conversas verbais e escritas com o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madail.

O Sr. Gilberto Madail (PSD): — Pretendia somente formular uma breve pergunta ao Sr. Ministro, que não sei se me poderá responder. Queria também e além disso congratular-me com o esforço que está a ser feito em termos do equipamento das forças de segurança no distrito de Aveiro, nomeadamente agora com o início da construção do quartel distrital da PSP em Aveiro, que é extremamente importante.

Pergunto, pois, ao Sr. Ministro se me poderia dizer alguma coisa sobre o que se passa relativamente à construção de um posto da GNR na zona da Costa Nova

e Barra, que são zonas, como o Sr. Ministro sabe, de alta criminalidade, onde até recentemente se passaram

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acontecimentos do conhecimento público, e que é uma das reivindicações dessas populações já há bastante tempo e que se torna extremamente necessária.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna:—Sr. Deputado, a construção de postos para a GNR e de esquadras para a PSP obedece a uma dupla restrição ou a uma dupla prioridade: por um lado, há um montante que nós conseguimos financeira e fisicamente gastar ao longo do ano, visto que não são obras que se comprem de uma só vez (há um processo que passa pelas câmaras e que tem aspectos burocráticos a preencher) e também de acordo com as prioridades das forças de segurança em causa (neste caso concreto, da GNR). Nos casos em que não é considerada tão prioritária a construção de uma determinada instalação, temos apostado, simultaneamente com a construção de instalações, na maior mobilidade das forças de segurança. Não é viável, e penso que operacionalmente (eu não sou militar, mas, creio, nenhum dos Srs. Deputados também o é) não é aconselhável, «quadricular» o País com postos fixos de forças de segurança, mas, pelo contrário, reforçar a capacidade, a mobilidade, dessas forças de segurança. Isso é o que se faz no caso da GNR que tem uma área geográfica mais espalhada de intervenção; há um conjunto de localizações geográficas que são julgadas adequadas e, nos espaços entre essas instalações, aposta-se na mobilidade dos meios humanos da GNR. No caso concreto, penso que se tem, em determinadas épocas, reforçado a fiscalização com um posto alugado pela câmara (não sei se é a esse que o Sr. Deputado se está a referir); de qualquer maneira, não tencionamos cobrir o País com postos fixos, nem da GNR nem da Guarda Fiscal, porque não é rentável nem suportável pelo Orçamento.

O Sr. Gilberto Madail (PSD): — Sr. Ministro, se me permite a interrupção, gostaria apenas de reforçar que a construção desse posto foi considerada, pelo general Tomé Pinto, já em 1985, como prioritária. É porque se poderão existir outros postos na zona que podem ser desactivados, esse não pode. De facto, Sr. Ministro, é uma necessidade, na medida em que toda aquela zona é (e agora, com a instalação da Judiciária, isso veio ao de cima) uma zona de alta criminalidade, para além de ser uma zona atingida por uma série de problemas inerentes ao facto de ter uma extensão de costa bastante grande e de fácil acesso, o que, como é óbvio, não será da responsabilidade da GNR ...'.

O Orador: — 0 Sr. Deputado, mas o Sr. General Tomé Pinto não é membro do Governo; se ele em 1985 considerou prioritária a construção, já houve vários governos, ou pelo mais um governo, depois de 1985, que eventualmente não a considerou tão prioritária. Mas, enfim, há prioridades absolutas e relativas.

No caso concreto que aponta, V. Ex.a também referiu que a Polícia Judiciária tal como a Guarda Fiscal já lá estão e, como temos de encarar globalmente a actuação das forças de segurança, não vamos instalar as três ou quatro forças de segurança na mesma localidade.

Penso que o distrito de Aveiro, embora tenha especificidades, também tem uma cobertura global razoável, em termos das quatro forças de segurança (forças e serviços, incluindo a Polícia Judiciária), quando, repito, consideradas em globo e não isoladamente. Gostaria de ter um banco, um quartel da GNR, outro da Guarda Fiscal, a Polícia Judiciária, a PSP e um tribunal, pois .... mas, de facto, isso é impossível. E, repito, o que nós temos como preocupação é tentar assegurar uma cobertura física equilibrada e cobrir, com acréscimo de mobilidade dessas forças de segurança, essas zonas que, fisicamente, não podem ser, de maneira fixa, cobertas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da exposição inicial que o Sr. Ministro fez ressaltam dois ou três aspectos em relação aos quais eu gostaria de pedir-lhe o favor de dar mais algumas indicações, nomeadamente em relação ao acréscimo de verbas (e são muitos milhões de contos) para a GNR e para a PSP. Referiu o Sr. Ministro que o acréscimo para a GNR se°destina fundamentalmente à Brigada de Trânsito e o da PSP ao aumento de efectivos. Ora, eu gostaria que o Sr. Ministro, se pudesse, desse mais alguns pormenores relativamente a isso, quer no que diz respeito à Brigada de Trânsito da GNR (o que é que se pretende com este aumento de mais de 4 milhões de contos) quer no que respeita aos efectivos da PSP (se tem alguma previsão relativamente ao número de efectivos que se vão recrutar). Já agora, um pormenor a latere, que não deixa de ser relevante (embora possa não ser esta a sede própria para fazer este tipo de discussão), relativamente ao universo de recrutamento do pessoal da PSP. Penso que esta questão é extremamente importante e, por isso, agradeço que o Sr. Ministro nos dê alguns elementos de informação, se os tiver. É porque este universo de recrutamento de pessoal para forças de segurança como a GNR e a PSP deve ser feito com cuidado extremo para que, eventualmente, casos como aquele que recentemente se passou na GNR não possam ter lugar. Digo isto porque penso que o recrutamento de forças especiais — caso dos pára-quedistas, «comandos» e outros —, para forças com a função cívica que tem a GNR e a PSP, deve ser reduzido ao mínimo.

Outra questão que lhe queria colocar diz respeito ao Serviço de Informação de Segurança (SIS): pretende--se com esta nova admissão de pessoal completar os quadros previstos do SIS ou será que ainda não se prevê, para o ano de 1989, completar os quadros do SIS?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Começo pelo aspecto que acho mais lamentável: a ligação que se faz ao universo ou ao subuniverso do recrutamento deste incidente que ocorreu quarta-feira passada na GNR. Ironicamente, o causador do acidente cumpriu o serviço militar nos pára-quedistas, mas o tenente--coronel que morreu era «comando» e o tenente-aluno que morreu tinha feito o serviço militar nos fuzileiros.

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Desculpe-me que lhe diga, Sr. Deputado, mas acho lamentável que se estabeleça uma ligação entre a Arma e a unidade especial onde se fez o serviço militar e que isso constitua um estigma para a vida restante das pessoas. Penso que seria até pelo menos inconstitucional, senão lamentável, que se evitasse que pessoas que fizerem o serviço militar em unidades especiais, depois, na sua vida profissional, quer ela se desenvolva numa força de segurança quer na vida civil, ficassem marcadas por esse facto e isso provocasse um enviesamento na sua vida.

Quanto ao aumento de 4 milhões de contos para a GNR, o aumento de cerca de 100 unidades da Brigada de Trânsito é responsável por cerca de 300 000 contos desses 4 milhões e resulta do reconhecimento que os mortos e feridos por desastres rodoviários são uma percentagem importante dos mortos no nosso país. Nós queremos, para além de medidas de natureza legislativa, reforçar a presença da GNR na estrada para tornar mais efectiva a fiscalização rodoviária.

Quanto à PSP, em termos de aumentos de efectivos, este ano, pela primeira vez, conseguimos preencher a dotação de vagas. No «ano lectivo» 1987-1988 foram abertas 800 vagas e apenas 600 foram preenchidas porque os restantes condidatos^não preenchiam as condições do concurso; no «ano lectivo» 1988-1989 foram abertas 900 vagas e todas foram preenchidas. Portanto, não lhe poderei dizer, em termos líquidos, qual será o aumento dos efectivos da PSP, porque, enquanto controlamos uma das variáveis, que são as entradas, não controlamos a das saídas, já que, como sabe, Sr. Deputado, a partir de determinada idade e de determinadas condições, os agentes da PSP (tal como na Forças Armadas e nas forças de segurança acontece) podem pedir a passagem à reserva. No caso das Forças Armadas, da GNR e da Guarda Fiscal há uma situação de pré-aposentação e, portanto, há critérios definidos, e nós não podemos impedir que as pessoas preencham essas condições passem à pré-aposentaçâo do caso da PSP. Portanto, só lhe poderei dizer que vão entrar 900 novos guardas provisórios para a Escola Prática da PSP e que, provavelmente todos, ou a grande maioria, serão aprovados. Quantos saem, por razões de idade ou de doença ou razões disciplinares, não lhe poderei dizer, mas espero que o aumento líquido de efectivos da PSP em 1989 seja substancial.

Em relação ao SIS, pensa-se que esta «fornada» a admitir será a última para os próximos tempos, embora não fique completamente preenchido o quadro aprovado por lei, mas, em termos operacionais, no SIS não se pensa fazer uma admissão não pontual como aquela que irá ser feita em 1989. Portanto, respondendo à sua pergunta, penso que será a última tranche de um processo gradual que o Sr. Deputado, como membro da Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informação, conhece em pormenor.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): — Pedi ao Sr. Ministro para me deixar interromper, mas, uma vez que não me deixou fazê-lo, gostaria agora de fazer algumas observações à. sua intervenção.

Não quis estabelecer ligação alguma com os incidentes que ocorreram na GNR, ou sequer considerá-la uma

questão relevante; o que eu quis foi dar exclusivamente, um exemplo; foi só esse o sentido. Creio que a própria GNR conhece e reconhece —aliás, todos nós reconhecemos— o cuidado que há e tem de haver no recrutamento deste pessoal para a PSP e para a GNR.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — E para as Forças Armadas.

O Orador: — Não, Sr. Ministro. Nós estamos a falar da PSP e da GNR relativamente ao universo do seu recrutamento, que é diferente, naturalmente, do universo de recrutamento para o pessoal do serviço militar obrigatório e para as Forças Armadas; e estamos a falar de coisas distintas.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Digamos que é um universo menos universal o das forças de segurança!

O Orador: — Ó Sr. Ministro, mas é um universo específico.

Normalmente, o recrutamento da PSP e da GNR é feito a partir de elementos que fizeram o serviço militar. Penso que isto não é «uma coisa do outro mundo»; é um coisa estudada, considerada e tem, provavelmente, uma importância (ou vai ter, o Sr. Ministro vais ver que a curto prazo terá) muito maior do que aquela que, normalmente, lhe é dada. Refiro-me ao facto de, no caso de elementos que desempenharam a sua actividade militar normal em forças especiais como os «comandos», pára-quedistas e fuzileiros —e, repito, não digo que devam ser impedidos de ser recrutados para a PSP ou para a GNR, não disse nem quis dizer isso—, dever ter-se cuidado muito especial no seu recrutamento, porque a sua formação militar não é uma formação militar normal, é uma formação especial, onde se desenvolvem determinado tipo de características, que, eventualmente, podem não ser as mais ajustadas ao recrutamento, nomeadamente em termos de um determinado clima psicológico, para forças que têm a função cívica da PSP e da GNR.

Não disse que esse universo deva ser excluído; disse que ele deve ser estudado, ponderado e, se o Sr. Ministro verificar, ao nível da própria GNR, os psicólogos da GNR que trabalham nestas áreas são capazes de dar-lhe a mesma informação que estou a dar-lhe. Chamei a atenção para o cuidado que deve ser tomado porque se tratava de recrutamento; portanto, seria um elemento para consideração, que, apesar de tudo, seria um elemento a considerar a latere na discussão que estávamos a ter em termos de manifestação de alguma preocupação; só isso, nada mais!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, se me é permitido continuar uma análise marginal, ou a latere, como o Sr. Deputado referiu, diria que penso ser do conhecimento geral que as pessoas que são admitidas nas forças de segurança são sujeitas a testes à entrada e quando estão em condições de promoção e nem todas as pessoas têm o serviço militar obrigatório concluído. No caso dos 900 candidatos que vão entrar na Escola Prática da PSP, uma boa parte deles (que até vão entrar mais cedo) não tem o serviço militar obrigatório feito. Portanto, há essa preocupação, quer à entrada quer periodicamente, ao longo da

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vida militar ou militarizada (no caso da PSP), de essas pessoas irem fazendo testes psicotécnicos. No caso concreto, não sei se será esta a sede adequada para analisarmos na especialidade o incidente desagradável de quarta-feira ...

O Sr. Presidente: — Não é, não!

O Orador: — ..., mas eu não queria que fosse interpretada a ausência de resposta em pormenor como querendo eximir-me a esse facto.

O Sr. Presidente: — Em todo o caso, penso que algum dissenso aparente foi esclarecido e não vale a pena prolongarmos a discusão nesta matéria.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nesta fase do debate gostava só de introduzir algumas interrogações na sequência do debate que foi feito na Comissão de Assuntos Constitucionais.

O primeiro bloco de questões diz respeito às condições de estruturação do próprio orçamento do Ministério e à resolução de alguns velhos problemas de transparência que todos os anos vimos abordando, procurando, com alguma ansiedade, algum progresso que, por acaso não se tem verificado.

Um dos aspectos, que já foi abordado pelo meu camarada Cláudio Percheiro, é a famosa questão da projecção no Orçamento do Estado das receitas e despesas dos cofres dos governos civis que são um dos «grandes mistérios».

Sabe-se que o Ministro pratica todos os actos em relação a isso, como é óbvio; sabe-se que na Secretaria de Estado do Orçamento deve haver alguma ideia da verbas co-envolvidas; em todo o caso, não dei conta que tivessem sido cumpridas as disposições legais e constitucionais e até a resolução do Conselho de Ministros que mandava inscrever todas as receitas de todas as estruturas, incluindo aquelas que têm o «maldito» nome de cofres, etc., no que, por acaso, estão incluídos os cofres dos governos civis. «Misteriosamente» no mapa anexo ao Orçamento em que os ditos cujos cofres deveriam ter projecção não têm, o que é uma coisa que provavelmente o Sr. Ministro não pode dilucidar, talvez o Sr. Ministro das Finanças o possa fazer, ou o Sr. Secretário de Estado do Orçamento ... Esse é um primeiro aspecto.

O segundo aspecto relacionado com isto, para atalhar e abreviar, é o relacionado com a aplicação da famosa dotação concorrencial em relação ao Ministério da Administração Interna. O Sr. Ministro, no ano passado e como se vê no Diário da Assembleia da República, 2." série, n.° 33, p. 157, previa qualquer coisa como isto: «Lamento que o MAI não tenha acesso às verbas comunitárias, mas isso não faz com que não tenha esperança de que os nossos projectos tenham mérito para abranger uma boa parte (não direi 100 %) das verbas dos nossos PIDDAC.

Repito: vou tentar fazer esforços para que nas despesas correntes se façam poupanças para se poder acomodar —desculpe o anglicismo— a dotação concorrencial», etc., etc Pelos vistos, esses esforços não foram coroados de êxito.

Ora, segundo a nota 15, anexo ao ofício n.° 3488/88, processo n.° 32.2, do Ministério das Finanças e do Plano, o Ministério da Administração Interna sofreu um corte de 1 062 517 contos, a título de dotação concorrencial. Contudo, não sabemos em que é que se verificou esse corte, ou seja, que despesas é que foram suprimidas. Sabemos que 1 milhão saiu do orçamento do Ministério mas não sabemos em que rubricas. Não obstante, sabemos outra coisa, isto é, que no orçamento dito rectificativo e realmente suplementar o MAI teve uma dotação de 1 milhão de contos correspondente às necessidades de aumento dos vencimentos no quadro das disposições legais que são do conhecimento de todos. Sai 1 milhão, entra 1 milhão, não se sabe de onde é que é rigorosamente o milhão saído, mas sabe--se para onde é que é o milhão entrado! Talvez fosse esta a boa oportunidade para tentarmos perceber o que é que está a acontecer no orçamento do Ministério da Administração Interna nestas áreas.

A terceira área de transparência respeita ao facto de se saber o que é que vai acontecer em relação aos desinvestimentos. De facto, no ano passado o tema dos desinvestimentos foi um dos fulcrais no debate do orçamento do Ministério da Administração Interna. Aí se esperava a possibilidade de obtenção de certas receitas. Discutimos nesta sede, com pormenores que a esta hora não repetiremos seguramente, qual era a entrada orçamental que permitiria essa operação. Neste momento, o que nos importa é saber o que é que aconteceu em matéria de desinvestimentos, ou seja, no respeitante a instalações de forças de segurança o que é que foi feito, onde é que se ganhou, onde é que se perdeu e para onde é que foi esse dinheiro. No fundo, qual foi a sua gestão? E formulo estas questões porque não há vestígio nenhum disso no orçamento do Ministério da Administração Interna. São, pois, estas as questões em relação aos aspectos estruturais e de transparência. Posteriormente, formularei algumas outras de carácter específico.

O Sr. Ministro da Administração Interna:—Sr. Deputado, começando pela sua última pergunta dir-lhe-ia que não foi feito, em 1988, nenhum desinvestimento. Portanto, não se efectuou a alienação de nenhuma das instalações das forças e serviços de segurança e portanto não há receitas a contabilizar no orçamento das receitas.

Quanto à dotação concorrencial, esse ofício, cuja identificação não apanhei em pormenor, refere que o Ministério da Administração Interna sofreu um montante de cativação, mas a título provisório. Logo, não é um corte.

Seguidamente, V. Ex." disse que, com um erro de 10 %, no orçamento rectificativo o Ministério da Administração Interna tinha recebido 1 milhão e 100 mH contos. Portanto, a diferença que há entre os dois valores, ou seja cerca de 71 000 contos, resulta de cativações feitas em serviços que não as forças de segurança. Assim, o gabinete dos membros do Governo, a secretaria-geral e a auditoria jurídica tiveram as cativações que resultam da diferença entre os dois valores, ou seja, cerca de 71 000 contos, se não me engano.

Quanto às questões de falta de transferência do Orçamento do Estado, o valor acrescentado que lhe posso fornecer em relação à última conversa que tivemos sobre esta matéria é zero. Como lhedisse, os elementos

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relativos aos governos civis —e considero louvável a preocupação do Sr. Deputado pelo cumprimento de resoluções do Conselho de Ministros— foram fornecidos ao Ministério das Finanças ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — É constitucional, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não

digo o contrário, Sr. Deputado, não disse que era inconstitucional mas, sim, que considerava louvável a preocupação de V. Ex.a porque se referiu só ao Conselho de Ministros e não à Constituição. E esses elementos foram fornecidos ao Ministério das Finanças já em termos globais e individuais ...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Uma implica a outra! O cumprimento da Constituição existia!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Mas

não disse que a Constituição tinha de ser cumprida. Referi-me somente à explicitação expressa que o Sr. Deputado José Magalhães fez.

Portanto, em relação ao Sr. Deputado Cláudio Per-cheiro, tive oportunidade de, em resposta a uma pergunta por ele formulada, informar que o montante global dos orçamentos dos cofres privativos dos governos civis era superior em 7,4 % aos de 1988. Se, entretanto, o Sr. Deputado Cláudio Percheiro quiser, poderei dar os valores de cada uma das parcelas que foram enviadas ao Ministério das Finanças. E se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento quiser ter a amabilidade de acrescentar mais alguma coisa, poderá então fazê-lo. E digo isto na medida em que a feitura formal do último diploma não cabe ainda ao Ministério da Administração Interna.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, não vou colocar nenhuma das questões relacionadas com outros aspectos que não os estritamente orçamentais, designadamente não vou referir a situação dos corpos especiais existentes nas forças de segurança, as questões relacionadas com certas anomalias no funcionamento dos serviços de informações, de segurança, questões relacionadas com o sindicalismo policial ou, até, do próprio sindicalismo dos bombeiros. Como V. Ex.a sabe, estas são questões candentes que teremos ocasião de discutir noutra sede.

Entretanto, gostaria somente de referir um aspecto que creio que o Sr. Ministro ainda não referiu. E esse aspecto relaciona-se com a própria perspectivação do PIDDAC do Ministério.

Vou agora citar um outro aspecto que será, com ceT-teza, grato ao Sr. Ministro, na sequência da resolução do Conselho de Ministros. Refiro-me ao facto de V. Ex. • ter anunciado nesta sede isto, que se transcreve singelamente:

Estamos a montar gradualmente esse gabinete [o gabinete relacionado com as construções) para, por um lado, evitar desperdícios e aplicações de recursos humanos e materiais, que são bem escassos, e à medida que o formos construindo vamos passar projectos que estavam na DGEM para o MAI.

Este ano aparecem não 7 mas 52 projectos no MAI, dado o facto de já termos uma capacidade técnica para gerir alguns desses projectos, o que não acontecia no passado. Esperamos que em 1989 consigamos trazer mais projectos sem querer criar uma nova DGEM no MAI.

É este último aspecto que importa. Esta promessa não pôde ser cumprida. Há 52 projectos no PIDDAC do Ministério. O grau de execução é razoavelmente baixo em relação aos projectos integrados nos outros dois ministérios sempre referidos.

Sucede que a ideia de unificação não se concretizou também. E quanto aos níveis de execução parecem-nos francamente baixos, em particular no que respeita à construção de instalações para forças de segurança. Isso encontra talvez explicação na alusão que o Sr. Ministro fez há pouco à ideia da motorização.

O problema da motorização é que, segundo o que a GNR pôde anunciar a meio do ano em conferência de imprensa, a certa altura não há combustível para essas motorizações se efectivarem, nem há veículos em estado decente para fazerem a motorização adequada, nem existe pessoal em condições bastantes para se meter nos veículos, que, aliás, também não há ou não estão em condições de se movimentarem. Essa conferência de imprensa da GNR, de que V. Ex.a não tem provavelmente conhecimento, corre o risco de se repetir este ano ou não? É esta a pergunta que lhe deixo.

Em relação aos PIDDACs pergunto-lhe também qual é o juízo que o Sr. Ministro faz sobre a sua execução no ano em curso e sobre os seus montantes para o próximo ano.

Para concluir, formulo-lhe uma pergunta quanto aos serviços de informações. De facto, V. Ex.a fez uma alusão a alguns dos aspectos do Conselho Superior de Informações e do Conselho Superior de Segurança Interna, cuja verba não lobriguei. Em todo o caso, pode ser defeito nosso, como é evidente.

Qual é o juízo sobre o estado de implementação da aplicação dos serviços e, designadamente, quanto à componente informática e às componentes de apoio aos serviços de fiscalização que não correm por conta da Assembleia da República e refiro-me à Comissão de Controlo do Banco de Dados? Onde é que está a verba para isso? Serão 479 557 contos?

O Sr. Ministro da Administração Interna:—Sr. Deputado, em relação às últimas perguntas que formulou, a resposta é não.

De facto, quer o Conselho Superior de Segurança Interna, quer o Conselho Superior de Informações não funcionam no âmbito do Ministério da Administração Interna. São, de facto, órgãos consultivos do Sr. Primeiro-Ministro e, portanto, não serei eu a dar--Ihe a resposta. De qualquer modo, não é o orçamento do MAI a suportar essas despesas.

Quanto à Comissão de Fiscalização dos Centros de Dados, ela não funciona também no Ministério da Administração Interna, na medida em que apenas um dos serviços de informações é da responsabilidade do Ministro da Administração Interna. Essa Comissão é constituída por magistrados e foi nomeada pelo Sr. Procurador-Geral da República. Portanto, as respectivas despesas de funcionamento não são cobertas pelo orçamento do Ministério da Administração Interna, nem pelo do SIS.

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O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, acontece que o problema está em tentar localizar essa verba e quem é que a cobre. Talvez o Sr. Secretário de Estado possa ter algum préstimo nessa matéria. E formulo essa questão porque W. Ex." negam. Assim, estamos à procura de alguém que o afirme.

O St. Ministro da Administração Interna: — Penso que é uma situação semelhante à Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informações que não têm despesas. De facto, no Orçamento do Estado não há despesas com os dois conselhos, ou seja, com o Conselho Superior de Informações ou com o de Segurança Interna, nem no orçamento de vários departamentos ministeriais com a Comissão de Controle dos Centros de Dados.

Quanto à informatização dessas três entidades — e posso acrescentar a Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informações — devo dizer que não têm suportes informáticos. Pelo menos não nos foi solicitado qualquer apoio informático. Uma delas destina-se mesmo a controlar a utilização de informática pelos serviços de informações.

Em relação aos empreendimentos do PIDDAC do MAI continuo a não perceber como é que os Srs. Deputados do PCP fazem contas. Vejo muito mais do que 52 empreendimentos na listagem do PIDDAC do MAI para 1989.

O Sr. José Magalhães (PCP): — V. Ex.a deve ter uma edição do Orçamento do Estado diferente da nossa.

De facto, na edição do Diário da Assembleia da República, 2." série-A, suplemento ao n.° 1, de 19 de Outubro de 1988, p. 2-(143), contam-se nas rubricas «Segurança e ordem pública» e «Instalações das forças e serviços de segurança» 52 projectos. Contando-se fielmente verifica-se que o computador só injectou de projectos. A não ser que o Sr. Ministro esteja a fazer contas também com os projectos que estão nos outros ministérios. Contudo, é óbvio que há 21 projectos no MHOP e há 3 ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: — É óbvio que não estou a contar com os dos outros ministérios, porque a filosofia subjacente à sua pergunta era saber quando é que outros vinham para cá. Portanto, por mais distraído que eu estivesse, não contava com os outros ministérios.

Portanto, essa filosofia mantém-se. Repito, tenho uma listagem de 67 a 68 projectos e, aliás, posso confirmar se os que constam do Diário da Assembleia da República correspondem aos que se encontram na lista informática que recebi. Reitero, pois, a afirmação que produzi no ano passado, ou seja, o objectivo é passar gradualmente os projectos que são geridos pela DGEM e pela DGOT, no caso dos bombeiros, para o Ministério da Administração Interna, à medida que se tenha capacidade física para o fazer.

Ora, o facto de, em 1989, termos 760 000 contos e não 640 000 contos como no PIDDAC/88, é sintoma dessa vinda gradual de projectos geridos por outros ministérios que interessam às forças de segurança para o nosso Ministério. Não é também, e apenas, uma alteração quantitativa. Há determinados tipos de projectos que passam a ser incluídos no PIDDAC e que exi-

gem uma tenacidade de apreciação nova. Se V. Ex.a quiser ter a amabilidade de reparar, há projectos que se referem às telecomunicações e transmissões da PSP que aparecem pela primeira vez e surge igualmente no PIDDAC um projecto de informática para o Serviço de Estrangeiros.

Portanto, o objectivo é ir transferindo projectos e incluindo projectos novos, em termos de qualidade, geridos pelo próprio MAI através do tal gabinete de estudos e planeamento de instalações. De facto, o montante aumentou, bem como o número de projectos.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, permita-me mais uma pergunta complementar a esse respeito: é que os dados de que dispomos, e que são, no fundo, a presente proposta governamental — é evidente que V. Ex.a terá muitos documentos preparatórios e, provavelmente, indicações sobre a forma de execução e os projectos a executar —, revelam que para projectos novos, estritamente no PIDDAC do MAI, estão previstas verbas que não excedem 248 000 contos. De facto, em termos de execução, aquilo que está previsto para 1988 é 196 958 contos.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Vejo que acontece o contrário, Sr. Deputado, pois V. Ex.a tem mais elementos do que eu.

Na verdade, estamos em finais de Novembro e ainda não temos a execução do PIDDAC referente ao total do ano. Acontece, porém, que ele é bastante superior a esses montantes que o Sr. Deputado refere. Não sei onde vai buscar esse grau de execução do PIDDAC no final do ano!... V. Ex.a está a fazer futurologia, mas espero que' não acerte!...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Não, Sr. Ministro. O problema é que, desgraçadamente, os dados que o Governo nos fornece ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Estamos em Novembro, Sr. Deputado, e o documento que V. Ex.a está a ler foi elaborado em Outubro e o grau de execução é evidenciado a partir do dia 1 de Janeiro de 1989. Assim, só a partir desse momento é que o Sr. Deputado terá a legitimidade para dizer que o grau de execução foi baixo, o que espero que não aconteça.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, este é um diálogo eterno, pelo que não vale a pena procurar acabá-lo agora. No entanto, há dois factos inquestionáveis na minha opinião.

O primeiro facto é evidente que o Governo fornece determinados elementos à Assembleia da República e nós procuramos que eles possam ser concretizados. Por exemplo, o Sr. Ministro não arriscou uma previsão sobre a taxa de concretização do PIDDAC do Ministério. Ficaríamos, aliás, seguramente contentes que o Sr. Ministro dissesse: «Os Srs. Deputados podem estar tranquilos que não haverá uma execução prevista de 196 958 contos, ao contrário do que anuncia o Ministério das Finanças, pois a execução vai ser muito superior.» Ficaríamos muito contentes se tal acontecesse.

Porém, a verdade é que V. Ex." não faz. O Sr. Ministro refere antes que estas contas se fazem a 1 de Janeiro e logo se verá!...

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Sucede que essa não é uma posição razoável perante a Assembleia da República, porque, de contrário, não podemos exercer nenhum controle.

O segundo facto é que, quanto aos montantes inscritos para 1989, temos os dados singelamente entregues pelo Governo, que, desgraçadamente, são os que vão ser votados, e neles o que se prevê é 248 000 contos para projectos novos.

Entretanto, verifica-se que V. Ex.a, em vez de ter alargado substancialmente o número de projectos inscritos no orçamento do MAI para serem geridos, na parte do PIDDAC, pelo tal gabinete novo e segundo a tal perspectiva, estagnou-o, ou seja, eles são no mesmo número. Quanto às execuções, refere-nos que em Janeiro saberemos, se o Governo fornecer os números, em que é que ficamos em termos de dados reais.

Devo dizer que em termos de transparência, V. Ex." não sai daqui com parabéns!...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Magalhães, V. Ex.a não estava presente mas há pouco houve uma discussão, a propósito da execução do PIDDAC do Ministério da Saúde, em que se colocou um problema similar quanto à diferença entre os dados fornecidos pelo planeamento e dos dados que tinha o ministério sectorial, visto que a óptica do Ministério e a do planeamento foi diferente, isto é, o planeamento não incluía os projectos que finalizavam neste ano de 1988; assim, é provável que haja nessa discrepância uma diferença de critérios, a exemplo do que aconteceu com o Ministério da Saúde.

Tem, de novo, a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Independentemente da questão de eu pensar que a Assembleia da República não vai votar a execução prevista do PIDDAC de 1988, penso que a existência de 248 000 contos de projectos novos, comparados com o total de 644 000 contos deste ano, o que equivale a um aumento de 40 %, não é tão mau como isso. Embora não esteja fishing for os parabéns do Sr. Deputado, penso que 40 % de projectos novos não é muito mau. De facto, este ano tínhamos 644 000 contos e para o ano dispomos de 248 000 contos só de projectos novos, o que significa mais de 40 % em relação ao ano em causa. Portanto, se V. Ex." não me quiser dar os parabéns, não ficarei muito triste!

O Sr. José Magalhães (PCP): — Não dou, Sr. Ministro. No entanto, aproveito para informar que, atendendo à análise dos projectos inscritos, qualquer que seja o seu valor — e se são ou não para ser executados não sabemos, logo se verá para o ano —, a verdade é que nenhum deles está previsto que se conclua em 1988. Digo isto a propósito da afirmação feita pelo Sr. Presidente.

É um facto que não estão inscritos projectos cuja conclusão não seja deferida para 1990 e, sobretudo, para 1991!

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Penso que não há nenhum impedimento em relação aos projectos para acabar em 1991. No entanto, não tivemos essa restrição em vista.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): — Sr. Ministro, devo dizer-lhe que V. Ex." não respondeu concretamente às questões que lhe coloquei. E digo isto porque, em relação aos bombeiros, V. Ex." vem dizer que há muito mais dinheiro no orçamento a atribuir ao Serviço Nacional de Bombeiros. Isto é um facto!

No entanto, pergunto-lhe: qual é a verba que vai ser entregue às associações de bombeiros? Creio que esta apenas tem mais 1080 contos, quando o Sr. Ministro sabe perfeitamente que esta transferência do Orçamento do Estado não vai suportar o aumento dos encargos que os bombeiros vão ter com a proposta do Ministério das Finanças. E neste ponto, já verifiquei que, de facto, o Sr. Ministro tem uma atitude e o Ministério das Finanças tem outra diferente! O Ministério das Finanças lança a tributação do IVA dos equipamentos dos bombeiros e o Sr. Ministro não acautelou esta situação, pois apenas lhes atribuiu mais 1080 contos. Isto é ou não verdade, Sr. Ministro?

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não é

verdade, Sr. Deputado.

Devo dizer-lhe que não descubro, nas verbas parcelares atribuídas ao Serviço Nacional de Bombeiros, a diferença de 1080 contos entre os dois anos. Em algumas verifico que o montante é exactamente igual; no PIDDAC do MAI a verba é de 4000 contos em ambos os anos e noutras verbas a diferença é maior.

Além disso, contrariamente àquilo que as palavras do Sr. Deputado podem dar a entender, a verba que é transferida do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Bombeiros não se destina a ser transferida integralmente para as corporações de bombeiros, destina-se também à gestão do Serviço Nacional de Bombeiros.

A verba substancial do Serviço Nacional de Bombeiros é das «Contas de ordem», que resulta de receitas consignadas a determinadas finalidades, sobretudo e na esmagadora maioria a serem transferidas para as corporações de bombeiros. E nesse campo a diferença é de 306 000 contos. Repito, não encontro, assim, os 1080 contos de diferença em nenhuma das verbas parcelares: nem nos quartéis a serem construídos, nem nas «Contas de ordem», que são receitas do Serviço Nacional de Bombeiros e alvo de transferência para as corporações de bombeiros, nem na verba da transferência do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Bombeiros, que se destina a fazer face também às despesas de administração do próprio Serviço Nacional de Bombeiros.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): — Com certeza, Sr. Ministro. Tenha em atenção a p. 462/49, respeitante à rubrica «Serviço Nacional de Bombeiros», cuja verba é de 1 138 217 contos e também de 1 393 300 contos. Portanto, na p. 2-(103), existe a verba de 1 139 297 contos a entregar das transferências do Orçamento do Estado, e 1 697 474 contos de outras receitas, derivadas do totobola e do totoloto. Conclui-se, pois, que esta verba é reforçada apenas em 1080 contos, sendo, aliás, esta a que normalmente é transferida do Serviço Nacional de Bombeiros para as diversas corporações de bombeiros.

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O Sr. Ministro da Administração Interna: — Repito, Sr. Deputado, a verba substancial das transferências do Serviço Nacional de Bombeiros para as corporações de bombeiros resulta das «Contas de ordem» que também estão previstas expressamente no Orçamento do Estado, sendo o aumento de 306 000 contos, ou seja de 1 milhão e 200 000 para 1 milhão e 506 000 contos.

Se V. Ex.a quiser ter a amabilidade de ver as «Contas de ordem» do Ministério da Administração Interna verificará que o Serviço Nacional de Bombeiros tem um aumento, se os comparar com as contas de ordem de 1988. Não compare apenas um fundo privativo, que é uma parte das receitas do Serviço Nacional de Bombeiros, mas sim o conjunto total das receitas do Serviço Nacional de Bombeiros, tirando apenas a construção de quartéis, que é PIDDAC. Portanto, não são despesas correntes.

E essa comparação global que V. Ex.a tem de fazer e aí chegará à tal diferença de 185 000 contos que referi inicialmente.

O Sr. Cláudio Percbeiro (PCP): — Diferença essa que não vai chegar para os equipamentos, tendo apenas em conta o aumento da carga fiscal ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Penso que chegarão, Sr. Deputado. Além disso, julgo que não devemos continuar a pensar que todos os anos todas as corporações de bombeiros vão receber um equipamento novo! De facto, nem todas necessitam deles e o que tem sido atribuído, tanto quanto sei e pelas conversas que tenho tido as corporações de bombeiros não se queixam com deficiências de equipamento. Basta ir, por exemplo, à celebração anual do «Dia dos Bombeiros» e assistir ao desfile dos seus carros ...

O Sr.. Cláudio Percbeiro (PCP): — Se o Sr. Ministro considera que os bombeiros portugueses estão muito bem equipados ... V. Ex.a fica com a sua ideia que eu fico com a minha ...

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, no ano do incêndio do Chiado, no ano em que as corporações de bombeiros foram obrigadas a exibir ao País a penúria de equipamentos, no ano em que o País descobriu que há mangueiras corroídas, que há viaturas que não andam ou que para andarem têm de ser objecto de autênticas ressurreições de tipo cardíaco, que há problemas e dramas imensos para conseguir os equipamentos mais mesquinhos e ridículos para se atacar um fogo, que se diga, com um ar peremptório, na Assembleia da República, que as corporações de bombeiros não têm carências de equipamento, mesmo dado o adiantado da hora, não é razoável, porque basta que o Ministério leia os jornais, e não precisa de ser todos os dias, basta que os leia ao fim-de-semana, para encontrar, como no passado fim-de-semana, a descrição tabeliónica das reclamações dos Sapadores Bombeiros. E já não falo da reclamação de que eles não sejam objecto de regras que lhes proíbam a sindicalização mas, sim, que possam ter equipamentos básicos para atacarem os fogos que precisam de combater, morrendo de vez em quando: isso também acontece e, em alguns casos, não morrem por acaso, mas antes porque há penúria de equipamentos.

O Sr. Ministro da Administração Interna:—Sr. Deputado ... (Por deficiência técnica, não foi possível registar as palavras iniciais do orador.)

Portanto, não foi por insuficiência dos equipamentos —e neste ponto, estou a citar as palavras retiradas do relatório elaborado por bombeiros— que o incêndio teve as consequências que teve e que faleceu um bombeiro no incêndio tão trágico do dia 25 de Agosto.

O Sr. Cláudio Percbeiro (PCP): — O Sr. Ministro disse que este dinheiro para os governos civis não equivale a sacos azuis. Assim, solicito a V. Ex." que me diga, uma vez que não a conheço, qual é a lei que regulamenta a forma de distribuição destes dinheiros.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — É a legislação que regulamenta a actividade dos governadores civis; o montante e o destinatário dos subsídios concedidos periodicamente pelos governos civis são transparentemente comunicados através de uma publicação oficial.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, não lhe formularia esta pergunta se V. Ex.a não tivesse dito o que acabou de dizer.

E mau que a questão dos cofres fique por aqui, sobretudo porque nunca é discutida com a extensão, com a profundidade e com os dados em cima da mesa que nesta matéria se exigiriam. Provavelmente, uma das coisas que poderemos fazer um dia destes é examinar esta questão com mais detalhe na comissão competente.

Em todo o caso, gostaria de lhe chamar a atenção para um aspecto: ano após ano é feita a menção oral, que umas vezes fica, outras não, a que as receitas dos cofres são x. Os leitores do Diário da República podem acompanhar —é verdade— a distribuição de subsídios, mas o que não podem fazer é acompanhar a percepção das receitas. Mais: o que os leitores do Diário da República também não podem acompanhar é a efectivação das outras despesas.

Assim, V. Ex.a não considera um bocadinho estranho — uma vez que tem a competência inconstitucional, usurpada, de aprovar os orçamentos dos fundos e também dos cofres — que aquelas receitas fiquem estáveis, sejam tão incrivelmente estáveis e as despesas igualmente tão incrivelmente estáveis? Isto é, quem é que controla verdadeiramente toda aquela estabilidade? Quem é que controla que as entradas são efectivamente entradas e as despesas são efectivamente despesas? E devo dizer que as receitas aumentaram, designadamente com os dinheiros dos flippers. A análise da evolução dos montantes recebidos a esse título é feita poT quem e como? Qual é a imagen que o Sr. Ministro e nós próprios temos disso?

Na verdade, tratam-se de receitas do Estado, como é óbvio, não são dinheiros para um cofre ou para um saco amarelo, azul ou laranja dos governos civis ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: —

Sr. Deputado, quis mencionar uma receita particular dos cofres dos governos civis, ou seja, a que adveio dos flippers que, como se sabe, aumentou em 1988. Porém, em 1989 não vai aumentar tanto como no ano corrente porque foi no Orçamento de 1988 que se alterou uma disposição legal que permitiu que a totalidade, e não apenas um terço como acontecia num pas-

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sado recente, dessas receitas passasse para o governo civil. Portanto, ai há uma causa de estabilidade. Não sei, todavia, se, para si, instabilidade é sinónimo de bondade. De facto, se as receitas aumentam muito, aqui-d'el-rei porque aumentaram muito as receitas ou as despesas; se elas são quase estáveis, aqui-d'el-rei porque elas são estáveis!

O controle a que são sujeitas as receitas e as despesas, sobretudo as despesas dos governos civis, é a mesma dos outros fundos e serviços privativos do Ministério da Adminstração Interna. São elaborados orçamentos suplementares, que são por mim vistos, não aprovados, e enviados aos Ministério das Finanças, como os outros orçamentos dos restantes fundos e serviços privativos do Minstério da Administração Interna. Portanto, o controle e o acompanhamento é exactamente o mesmo dos outros fundos, para além de, nesse caso concreto dos subsídios que não são concedidos pelos outros fundos privativos, os governos civis virem expressamente indicados no Diário da República.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, o problema para que vimos alertando nesta matéria é mais grave do que isso tudo. É o problema do controle das próprias inscrições, da garantia de que as receitas efectivamente percebidas são inscritas, de que essa evolução corresponde à verdade. Aliás, o Sr. Ministro conhecerá o exemplo de outros cofres e de outros serviços em que, não por acaso, foi necessário fazer a determinação da necessidade de inscrição de todas as receitas e das receitas brutas. Não é por acaso que isto acontece e que o próprio Governo, que tem o apego que se sabe à Constituição, mas que deveria ter o mínimo de apego às suas próprias resoluções ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em matéria de Orçamento é grande!

O Sr. José Magalhães (PCP): — Em matéria de Orçamento não tem nenhum apego, tem todo o desapego e mesmo uma atitude de violação sistemática, como o recente Acórdão do Tribunal Constitucional provou, entre outros.

De qualquer modo, neste ponto há um risco de inverdade nos orçamentos, tanto mais, como o Sr. Ministro acabou de afirmar, que há sucessivos orçamentos suplementares. Isto quer dizer que o primeiro Orçamento é uma charada e o resultado final é incógnito, desigandamente pela Assembleia da República, que, coitada, nem sequer sabe quais são as receitas e despesas, se V. Ex.a não tiver a gentileza de as ditar para a acta onde ficam e mais nada!...

A Assembleia da República não tem nada a ver com um volume, que ninguém controla em bom rigor, de dinheiros que são percebidos pelo erário público, e que deveriam ter um controle e até uma deliberação por parte do órgão a quem cabe a responsabilidade suprema nessa matéria, a qual na prática é de zero. É este o ponto, é esta a questão ...

O Sr. Ministro da Administração Interna: —

Sr. Deputado, quanto à qualificação de charada relativamente aos orçamentos inicial e suplementar dos governos civis, ela vem de V. Ex." e não fui eu que a fiz! Repito, o tratamento dos orçamentos inicial e suplementar — e pode haver dois, três ou quatro não só

nos governos civis como em qualquer fundo ou serviço privativo — é exactamente igual nos governos civis e nos outros fundos e serviços privativos do Ministério da Administração Interna, e penso que o mesmo acontece nos outros ministérios.

Como V. Ex.a sabe, o calendário de elaboração dos orçamentos dos fundos privativos é antecipado em relação ao calendário de elaboração do Orçamento do Estado. Isto significa que têm de ser apresentadas as previsões até Agosto do ano anterior e a falibilidade é com certeza maior do que uma previsão feita em Outubro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Sr. Deputado José Magalhães, V. Ex.a refere-se nesta sede a uma medida, e quer ser o patrono dela, de que este governo tem todo o mérito, assumindo-a, aliás, com toda a coragem. Essa medida foi a de inscrever no Orçamento do Estado todas as receitas e despesas de serviços que constituem a administração central.

Aliás, o próprio Sr. Deputado José Magalhães, noutros debates do Orçamento, até elogiou esta acção do Governo, que é difícil, que é muito mais difícil em termos técnicos, políticos.e mesmo culturais, na perspectiva da própria Administração Pública, do que possa parecer à primeira vista.

Foi o Governo que assumiu a responsabilidade de integrar no Orçamento, de uma forma gradual, os cofres do Ministério da Justiça e que tem estado a extinguir serviços com autonomia financeira ou a criar normas de transparência e de controle rigoroso desses fundos e serviços autónomos. Refiro-me àqueles que ainda subsistem nos termos da Constituição e da Lei de Enquadramento Orçamental. E a propósito deste problema dos cofres dos governos civis, recordo que no artigo 14.° da proposta de lei que o Governo enviou à Assembleia da República consta expressamente, no seu n.° 1, que o Governo tomará as medidas necessárias ao rigoroso controle da gestão das receitas de todos os serviços da administração central, incluindo os que se designem por instituto, cofre, gabinete ou comissão, de modo a garantir o respeito pelas regras da unidade, da universalidade e do orçamento bruto. O que é que isso significa? Significa que há, de facto, aqui uma vontade expressa, repetida e confirmada pelo Governo, quer em resoluções do Conselho de Ministros, quer as próprias propostas de lei, de integrar todas as receitas, nos seus montantes brutos e não líquidos, relativamente aos cofres dos governos civis.

Portanto, o que se passou foi que houve juristas que interpretaram que a resolução do Conselho de Ministros não tinha força legal para integrar todas as receitas dos cofres, dos gabinetes ou de comissões, e daí que o Governo tivesse expressamente incluído na Lei do Orçamento, para evitar mais quaisquer equívocos, que todas estas receitas vão ser inscritas.

Nos casos dos governos civis, o Ministério da Administração Interna, com o apoio do Ministério das Finanças, pediu o levantamenteo de todas as receitas próprias dos governos civis. Simplesmente, ouve uma alteração da lei sobre as receitas próprias dos governos civis, que consubstanciam as tais máquinas auto-

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máticas, mecânicas, eléctricas ou electrónicas de diversão, vulgo flippers — é o que consta no artigo 58.° da Lei do Orçamento para 1988. De facto, os governos civis fizeram contas, disseram que os valores eram maiores e o próprio Ministério da Administração Interna mandou refazer as contas, apurando-as rigorosamente. Esse apuramento das contas foi feito, está a ser concluído, quase todos os governos civis mandaram já as contas das receitas totais dos seus orçamentos privativos e se não estão incritos na Lei do Orçamento é porque tal não era obrigatório, pois a lei não determina isso. No entanto, serão incluídas no decurso da execução orçamental para 1989 todas receitas de todos os fundos e cofres dos governos civis, de modo a assegurar a plena transparência.

No decurso da execução orçamental de 1989 serão incluídas todas as receitas. Portanto, serão estabelecidos, nos termos da própria lei, os fundos autónomos; o regime de autonomia financeira permite orçamentos ordinários e depois os seis orçamentos extraordinários ou suplementares.

Ora, o que é que se vai passar? Serão inscritas, mediante orçamentos suplementares, todas as receitas que formos apurando. Porque a vontade expressa do Governo é precisamente a de incluir todas as receitas dos fundos, ou seja, que não haja qualquer tipo de receitas públicas, tais como as parafiscais, etc:, que não estejam inscritas em orçamentos, que não tenham depois expressão legal clara. De facto, se alguém tem interesse em cumprir a regra da universalidade e do orçamento bruto é o Governo e regozijo-me que a Assembleia da República o acompanhe nessa matéria.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, se me permite, gostaria apenas de fazer uma pequena observação.

O Sr. Presidente: — Faça favor, mas pedia-lhe o favor de ser breve.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Secretário de Estado, neste ponto estamos inteiramente de acordo com o Governo porque o Governo está de acordo com a Constituição. Mas a questão não é essa, a questão é que gostaríamos de ter a certeza de que isto é assim. E que essa norma do artigo 14.° que o Sr. Secretário de Estado citou, contrariamente àquilo que se poderia julgar, é tudo menos uma norma líquida.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — É uma

norma «bruta»!

O Orador: — Não me arrisco a dizer que é uma norma «bruta», porque há normas brutas no Orçamento e essa não será a maior.

Neste caso concreto a dificuldade é a de saber como é que o Governo vai materializar isto. O aspecto para o qual chamou a atenção, designadamente o da inverdade na inscrição das receitas, é um aspecto que ressalta aos olhos de qualquer leitor desses orçamentos. Isto é, conhecendo-se a realidade de determinados distritos, a natureza das actividades que aí se desenvolvem e o número de licenças que são emitidas, qualquer um, utilizando uma máquina de somar normal, percebe que aquelas receitas não podem ser assim.

Sendo assim, esse facto origina até, como sabe, responsabilidade, ao abrigo de várias leis. E isto não é, evidentemente, despido de consequências.

Mas o que acho espantoso é, em primeiro lugar, que o titular da pasta não se pronuncie sobre a matéria e guarde sobre isso, mais do que um imenso silêncio, uma atitude de completa reserva.

O Sr. Ministro da Administração Interna:—Sr. Deputado, não posso deixar passar em claro essa sua afirmação.

Em que é que se baseia para dizer que não me pronunciei sobre essa matéria? Eu disse-lhe que as receitas e as despesas dos governos civis são objecto de orçamentos que seguem o mesmo processo que os orçamentos dos outros fundos e serviços privativos. Não vejo por que razão é que o Sr. Deputado insiste na desconfiança da não contabilização da cobrança ou da realização de algumas despesas dos governos civis, e afirma, sem qualquer fundamento, que eu não me pronuncio sobre essa matéria. Posso não me pronunciar na direcção que o Sr. Deputado desejaria, mas penso que é uma afirmação gratuita dizer que não me pronunciei de todo acerca dessa questão das receitas e das despesas dos governos civis. Peço desculpa, mas discordo frontalmente com aquilo que o Sr. Deputado acaba de afirmar.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Compreendo, Sr. Ministro. Em todo o caso, aquilo que eu pretendi sublinhar está evidenciado pela acta. Isto é, foi necessário o Ministério das Finanças mandar refazer contas em relação a determinadas receitas dos governos civis e esse refazer de contas é perfeitamente justo na medida em que a primeira versão das contas era incorrecta.

O Sr. Ministro da Administração Interna:— Sr. Deputado, deixe-me pôr os pontos nos jotas.

A alteração da legislação que fez reverter a totalidade, e não apenas uma parte, das receitas das máquinas abreviadamente denominadas de flippers ocorreu no final do ano passado, com a aprovação do Orçamento do Estado para 1988. Os projectos de orçamento dos governos civis para 1988 são entregues até Agosto do ano anterior. Portanto, até Agosto de 1987 os governos civis entregaram os seus projectos de orçamento. A alteração da legislação que teve impacte numa das principais receitas ocorreu após aquela data. Para evitar a estabilidade que tanto repugna o Sr. Deputado, foram elaborados orçamentos suplementares. Ora esse refazer de contas e elaborar de orçamentos suplementares —perceptível, julgo eu, pelo facto de ter ocorrido entre a elaboração do orçamento inicial e a do primeiro orçamento suplementar— foi devido a um fenómeno importante que foi o aumento de uma das principais receitas, o qual levou à elaboração de orçamentos suplementares que ocorrem não apenas nos governos civis mas em todos os fundos e serviços privativos.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Veremos isso no próximo Orçamento de Estado.

O Sr. Presidente: — Terminado que está este debate, só me resta agradecer aos Srs. Ministro-e Secretário de

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Estado e informar a Comissão que recomeçaremos os nossos trabalhos às 15 horas e que, de acordo com a nossa previsão, o debate relativo ao Ministério da Educação terá lugar apenas às 21 horas. Está suspensa a reunião.

Eram 13 horas e 45 minutos.

Após o intervalo assumiu a presidência o Sr. Vice--Presidente da Comissão Octávio Teixeira.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, embora não estejam presentes o PS e o PRD, vamos dar início à reunião da tarde com a presença do Sr. Ministro do Comércio e Turismo e dos Srs. Secretários de Estado do Comércio Interno, do Turismo e do Comércio Externo. Como já passam 25 minutos da hora prevista, penso que não devemos fazer esperar mais tempo os membros do Governo, que chegaram à hora aprazada.

Agradecendo, em primeiro lugar, a presença dos ^ membros do Governo, pergunto ao Sr. Ministro se pretende, como tem sido norma, fazer uma breve apresentação do orçamento do seu Ministério para depois os Srs. Deputados poderem colocar as questões que entenderem.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo (Ferreira do Amaral): — Com certeza, Sr. Presidente.

Começo por lamentar não ter tido a capacidade de ter a Comissão toda reunida, está só «meia casa», ... mas, enfim, tenho de me contentar com esta modéstia. Em todo o caso, é com todo o gosto que faço a apresentação do orçamento do Ministério do Comércio e Turismo.

Este orçamento é reduzido, como podem ver, e tem, à parte das verbas destinadas ao funcionamento do Ministério, três grandes rubricas que correspondem, talvez, a três dos vectores mais importantes de actuação do Ministério do Comércio e Turismo: a primeira refere-se à verba a transferir para o Instituto do Comércio Externo de Portugal, que, como sabem e é já tradicional, está locada ao Gabinete do Ministro; a segunda refere-se às verbas para a promoção turística, que representam uma grande percentagem do orçamento do Ministério e que se destinam não só ao funcionamento dos centros de turismo no exterior como também a acções de promoção turística, e a terceira refere-se às verbas destinadas ao Instituto de Formação Turística, verbas essas que se encontram claramente consignadas no orçamento do Ministério. Quanto ao resto, são verbas destinadas ao funcionamento.

O Fundo de Turismo, como organismo autónomo, um dos quatro organismos autónomos do Ministério, apresenta um orçamento que tem receitas empoladas por força das contrapartidas da zona de jogo, e do lado das despesas tem o que está previsto.

Julgo que é esta a súmula possível da descrição do orçamento do Ministério do Comércio e Turismo. Penso que o orçamento deste Ministério é fácil de entender, uma vez que as verbas, além de serem simples, estão perfeitamente definidas nos seus objectivos, pelo que não \A muito mais a apresentar. Se o Sr. Presidente estiver de acordo, vou agora esperar pelas dúvidas que eventualmente possam ser levantadas.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra do Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): — Sr. Ministro do Co-mérco e Turismo, em termos quantitativos, no que toca às transferências de verbas para o ICEP e para a promoção turística, em relação ao orçamento do ano passado, gostaria de saber como é que este orçamento se comporta.

Tendo em conta a importância que certamente têm, no seu Ministério, qualquer destas duas rubricas, em termos de promoção do comércio externo e, obviamente, em termos de promoção turística, as verbas disponíveis aumentam, são as mesmas ou diminuem, quer em termos absolutos quer em termos reais?

O Sr. Presidente: — Já agora, Sr. Minstro, se me permite, gostaria também de lhe pedir um esclarecimento.

O Sr. Ministro referiu há pouco que o orçamento do Ministério do Comércio e Turismo era extremamente fácil de analisar. Julgo que é o inverso, ou seja, que é difícil, por uma questão que me parece que não é um problema específico do Ministério mas global, de orçamentação, e que, nos últimos tempos, tem sido bastante debatido nesta Assembleia: é que, de facto, verficamos que as dotações do Ministério do Comércio e Turismo se circunscrevem, no essencial, a transferências para institutos e fundos, cujos orçamentos não são analisados pela Assembleia da República.

Embora seja um orçamento fácil de entender na perspectiva que o Sr. Ministro referiu, nós, Assembleia da República, julgamos que é difícil, precisamente porque o essencial — essencial em termos numéricos, enten-damo-nos — do orçamento do Ministério diz respeito a transferências para orçamentos que nós não discutimos. É evidente que temos alguma informação em termos de anexo ao Orçamento do Estado, mas a discussão desses orçamentos não tem cabido à Assembleia da República. Porém, isso é, repito, uma dificuldade global, que talvez se note mais neste Ministério porque a dimensão, em termos percentuais, é extremamente grande.

É esta referência fundamental que gostaria de fazer acerca do orçamento deste Ministério neste momento, na medida em que, há pouco tempo, noutra sede, tivemos oportunidade de discutir as análises possíveis.

Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro do Comércio e Turismo.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Presidente, começo por responder à segunda questão levantada pelo Sr. Deputado Basilio Horta, uma vez que estou à espera de dados para dar uma resposta certa à primeira questão.

Relativamente aos orçamentos dos organismos e fundos autónomos — e recordo no ano passado, aquando da discussão do Orçamento, este problema foi levantado também pelo Sr. Deputado —, julgo que este ano a situação melhorou bastante, uma vez que pudemos fornecer a tempo o orçamento previsto (digo «previsto», porque ele só poderá ser aceite após a aprovação do Orçamento do Estado) do Instituto do Comércio Externo de Portugal, bem como dos outros organismos e fundos autónomos. Julgo que é um or-

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çamento claro, que contém rubricas suficientemente detalhadas para poder ser apreciado pela Assembleia.

Quanto à comparação entre os orçamentos do ano passado e deste ano do ICEP e do Fundo de Turismo, estou só à espera que me dêem os dados correctos, mas gostaria de acrescentar que o orçamento do ICEP não representa, na totalidade, o que vai ser a actividade deste Instituto no próximo ano. Isto porque parte da verba do PEDIP, como certamente o Sr. Ministro da Indústria e Energia terá ocasião de explicar, é para apoio a acções de exportação (actividade que normalmente o ICEP vinha a fazer), que vão ser desenvolvidas também em colaboração com o Instituto do Comércio Externo de Portugal. Isto significa que não foi necessário sobrecarregar o orçamento do ICEP com essas verbas, uma vez que parte da sua actividade vai ser financiada pelo PEDIP, como aliás consta do próprio regulamento do PEDIP. Não faria sentido estar a financiar essas acções com o PEDIP, por um lado, e com o Orçamento do Estado, por outro lado.

Quanto à promoção do turismo, embora este ano tenha havido um aumento de verba — e já vou dizer ao certo qual foi —, a verdade é que para o ano ela terá de ser substancialmente reforçada, uma vez que foi possível concluir com êxito as negociações na comunidade no sentido de o FEDER vir a apoiar as acções do Instituto de Promoção Turística na promoção turística fora dos países da CEE. Isto significa que também a actividade do Instituto vai ser bastante maior do que aqui está orçamentado, uma vez que parte da promoção do turismo irá ser financiada pelo FEDER através de uma verba específica que, há uma semana, acabou de ser locada para esse efeito. Embora essa verba se destine a países fora da CEE, a verdade é que as verbas disponíveis para esses países passam a estar disponíveis para os países da CEE.

Portanto, o Instituto vai ter mais actividade do que a que o próprio Orçamento do Estado indica. Concretamente, em relação ao ano passado, este ano houve um aumento de 8,8 % nas verbas de funcionamento do Instituto de Promoção Turística e as verbas de promoção tiveram um aumento de 2,5 % no que se refere às verbas do PIDDAC.

Quanto ao Instituto do Comércio Externo de Portugal, houve uma baixa de 12 °7o, sendo este ano o orçamento deste Instituto de 4 milhões de contos. Isto por duas razões, sendo a primeira o facto que anunciei de o PEDIP vir a financiar parte das acções que o ICEP financiava e a segunda o facto de no ano passado ter havido uma verba que foi locada especificamente para pagar os excedentes de pessoal que se geraram por força da reestruturação do ICEP, não havendo este ano necessidade de se fazer esse financiamento. Julgo que essa verba, da ordem dos 300 000 contos.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro do Comércio e Turismo, a minha colega Helena Torres Marques já teve oportunidade de lhe colocar alguns problemas relativos àquelas verbas que estão destinadas a financiar a campanha da imagem de Portugal. Ela não

pode estar aqui por motivo de doença e, portanto, retomo o assunto que já foi uma vez objecto de troca de impressões.

Trata-se de uma verba significativa, não evidentemente na sua expressão absoluta mas na sua expressão relativa, isto é, 1 500 000 contos para financiar uma campanha de publicidade e de relações públicas é, de facto, uma verba muito significativa. Isso leva-nos a pensar que deveria ser reunido um certo número de condições para acautelar o bom uso dessa verba.

Em primeiro lugar, espanta-nos um bocado que essa campanha seja financiada por um processo duplo de desorçamentacão. Há um organismo em extinção que faz um empréstimo sem juro, faz no fundo, uma transferência, digamos assim, não se trata de um empréstimo, é talvez mais um donativo, uma vez que as condições em que as coisas se passam são em termos de donativo e não propriamente de empréstimo, e seria curial que essas verbas revertessem para o Orçamento do Estado e depois houvesse uma transferência. Suponho que esta seria a técnica normal, ou, pelo menos, a boa técnica. Assim, sob a figura de empréstimo, o que há é uma afectação à margem do Orçamento.

Em segundo lugar, pelo conhecimento que temos, a campanha é, no fundo, dirigida por uma comissão, mas há uma interferência nominal, ou, pelo menos, não orgânica, do Instituto de Investimento Estrangeiro, que subscreve e se responsabiliza pela campanha que é, na realidade, executada fora desse Instituto. Desse ponto de vista, também me parece que não há uma técnica que se possa considerar desejável.

Em terceiro lugar, quanto à campanha em si mesma, tratando-se de uma verba tão significativa e sabendo--se como é delicado o manejo da mesma, não me parece que existam garantias suficientes de bom uso profissional. Havendo um Instituto de Investimento Estrangeiro, um ICEP e vários organismos no Estado cuja função, dentro das suas leis orgânicas, é com certeza a de promover a imagem de Portugal, vemos uma rede de operações de entrada e saída, de afectação e reafectação de responsabilidades que tem algo de fictício, como não pode deixar de se reconhecer. Para além de problemas de legalidade estrita, há problemas de bom ordenamento substantivo.

Gostaria de obter da parte do Sr. Ministro os esclarecimentos que entender necessários para vermos claro nesta situação.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Comércio e Turismo.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Deputado João Cravinho, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que essa operação que referiu se reporta ao exercício deste ano, uma vez que o empréstimo foi feito este ano. Não se trata de uma operação que esteja programada para o ano que vem.

Vou explicar isto da seguinte forma: em meu entender — e julgo que não é só meu, é de muita gente —, existe alguma falta de unidade na promoção de Portugal no estrangeiro. Temos vários organismos que estão interessados na promoção de Portugal como parceiro económico — não propriamente na promoção do turismo, do investimento estrangeiro ou do comércio mas na promoção de Portugal como parceiro económico —, uma vez que é notado, em cada um destes

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organismos, que se torna muito mais difícil ou, pelo menos, têm maior dificuldade em fazer negócio, vender, atrair turistas ou atrair investimento estrangeiro a um país que é anónimo, na comunidade internacional, como parceiro económico.

Recordo sempre que um dos espectáculos que mais confrange na nossa actividade comercial é ver, por exemplo, uma campanha para venda, noutros países, do vinho do Porto, realizada por uma multinacional que opere no nosso país, ser lançada com a grande preocupação de esconder a origem do produto. E isto não propriamente porque haja uma embirração — as multinacionais não têm efectividades — mas, sim, porque têm a noção do que é melhor para o seu negócio e sabem que juntar o nome de Portugal ao produto nada acrescenta, porque este nome não é um activo no negócio internacional.

Este problema é sentido por todos esses organismos, nomeadamente pelo Instituto de Investimento Estrangeiro, pelo Instituto do Comércio Externo de Portugal, pelo Instituto de Promoção Turística e também pelos nossos serviços diplomáticos que, em larga medida, se encarregam dessa promoção.

Por isso é que, logo no início deste Governo, foi pensada a necessidade de juntar esses três organismos (pelo menos esses três organismos) e os nossos serviços diplomáticos, na tentativa de reunir esforços para fazer uma campanha de promoção de Portugal.

Isto acabou por levar a este sistema: havendo um organismo autónomo que tinha disponibilidades financeiras mas que não tinha vocação para fazer a campanha, ele próprio passaria a herança, através de um empréstimo, a estes três orgnismos que, no fim de contas, se iriam organizar para fazer a campanha. Foi com este cuidado que o Governo procurou organizar a campanha, que será lançada no próximo ano.

A ideia foi a de reunir um conselho de administração, a Comissão de Acompanhamento, que é constituído pelos presidentes deste três organismos. Não se trata, de maneira alguma, de criar mais um quarto organismo encarregado da promoção de Portugal no estrangeiro; pelo contrário, trata-se de juntar os três organismos que fazem essa promoção de Portugal numa só campanha.

Foi então criada uma Comissão de Acompanhamento — que é constituída pelos presidentes do Instituto do Comércio Externo de Portugal, do Instituto de Investimento Estrangeiro e do Instituto de Promoção Turística e ainda por um representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros — que se encarregará de gizar e fazer a proposta de uma campanha para lançar o nome de Portugal.

A campanha encontra-se neste momento em elaboração e, .assim que esteja feita, será aprovada pelo Governo e depois executada, de acordo com o que estiver orçamentado e estabelecido. Mais, essa Comissão de Acompanhamento nomeou já um secretário-geral que, no fim de contas, desempenhará um papel executivo e, assim, julgo que da maneira como está organizada se conseguem duas coisas muito importantes — e aí comungo da opinião do Sr. Deputado — que eram talvez os maiores problemas de uma campanha deste tipo: por um lado, saber como é que se gasta o dinheiro, uma vez que estão reunidas todas as entidades que farão uma apreciação sobre o assunto e o Governo, por seu lado, aprova a campanha; por outro, evitar que

se arranjasse um quarto organismo para fazer a promoção, provavelmente até contrariando a promoção feita pelos três organismos. Julgo que dessa forma resolvemos o assunto.

A razão da existência deste organismo teve a ver com a necessidade de uma gestão contabilística das despesas — meramente contabilística, uma vez que as ordens de despesa só podem ser aprovadas pela Comissão de Acompanhamento, portanto, pelos três presidentes, em conjunto —, para o que se escolheu o Instituto de Investimento Estrangeiro porque era, talvez, o que tivesse maior disponibilidade material nesta altura, e não por outra qualquer razão. Assim, o Instituto de Investimento Estrangeiro vai meramente fazer a gestão contabilística das despesas da campanha.

Temos uma grande esperança nesta campanha — aliás, temos um exemplo muito claro de uma campanha similar lançada com grande sucesso pela Espanha, embora com um slogan que é duvidoso. Vamos ter a preocupação de lançar um slogan a respeito de Portugal e, de propósito, não vamos registar os direitos, porque pretendemos que as empresas, os nossos exportadores, os nossos promotores turísticos se aproveitem desse slogan para dar maior volume e massa crítica à campanha. O dinheiro que está locado e que, como sabe, corresponde a 1 500 000 contos, embora possa parecer muito, é limitado. Não é possível fazer em todos os cantos do mundo uma campanha com esta verba, mas julgo que é inteiramente justificado que ela se faça. É esta a explicação dessa campanha.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro, agradeço--lhe os esclarecimentos que prestou e gostaria de acrescentar que 1 500 000 contos não é uma verba elevada. Não contesto a dimensão da verba, porventura poder--se-ia dizer que se justificaria uma verba maior, atendendo à finalidade e ao que se sabe sobre investimentos deste tipo.

Agora, o que não percebi bem foi o seguinte: tratando-se embora de um empréstimo que teve lugar este ano, a execução da campanha será no próximo ano e julgo que a campanha terá continuidade; isto é, suponho que se trata de um tipo de investimento que terá de ser feito todos os anos, pelo que uma verba considerável terá de ser afectada, sob as mais diversas facetas, à promoção do nosso país. Digamos que se trata de um encargo normal, corrente, que deve estar previsto em termos orçamentais, numa característica de normalidade.

O início da campanha poderá, porventura, ter uma maior dimensão, poderá envolver maiores gastos na sua fase de lançamento, mas todos os anos ter-se-á, com certeza, de gastar verbas, que, porventura, crescerão.

Há, pois, que orçamentar, «orçamentalizar», normalizar e o processo adoptado não garante isso. Não sendo curial, por que razão é que a Comissão Reguladora dos Produtos Químicos há-de financiar esta campanha? Que isto seja um encargo geral, que seja um encargo das receitas do País, que seja um encargo orçamental, muitíssimo bem; que a Comissão Reguladora dos Produtos Químicos transfira saldos para o Orçamento do Estado, excelente; agora, por que razão é que essa Comissão há-de financiar esta campanha? Simples-

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mente porque há dinheiro disponível? Isso não pode ser critério, porque senão temos n orçamentos à parte do Orçamento do Estado.

Em segundo lugar, tratando-se de um encargo normal, também não me parece curial que todos os anos se faça a reunião de três presidentes, com um secretariado, que certamente vai institucionalizar-se como um quarto organismo. Todos nós sabemos como estas coisas são ... Não há nada que dure mais do que o provisório! Quando se trata de coisas desta natureza, lança-se uma estrutura, e quando há necessidade repetida e corrente, cria-se automaticamente um quarto organismo, embora ele possa não ter lei orgânica!...

Por outro lado, o Governo tem anunciado, repetidas vezes, a reorganização deste tipo de serviços, nomeadamente do Instituto de Investimento Estrangeiro, de que tão depressa se diz que se extingue como se diz que se desenvolve. Aliás, encomendou-se um estudo à Mackinsey, que chegou a determinadas conclusões. Esse estudo está para ser executado? As suas recomendações são ou não para serem executadas?

Bom, mas o que tiro daqui não é a ideia de que não há necessidade destes investimentos, bem pelo contrário: havendo necessidade destes investimentos, porventura até o aumento do volume de investimentos neste tipo de actividade, há que lhes dar um quadro institucional, normal e regular, no âmbito orçamental. Não vejo que isso tivesse sido feito em 1988 — não foi feito, de certeza! — e não vejo que venha a ser feito em 1989. Quando é que entramos, então, na normalidade? O problema é também esse.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Comércio e Turismo.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Deputado João Cravinho, a ideia é a de que a campanha não tenha sequência nestes termos, ou, pelo menos, é duvidoso que o venha a ter.

Pensamos que, neste momento, precisamos de lançar uma unidade nas campanhas dos três organismos, que têm, todos eles, verbas disponíveis, na nossa opinião suficientes, para fazer a sua própria promoção.

A ideia é, pois, a de procurar uma unidade, à sombra da qual, depois, cada organismo fará a sua própria campanha de promoção. A campanha está desenhada para demorar um ano. Vamos esperar que esse efeito se produza e, evidentemente, se assim não acontecer, se for necessário pensar em redobrar ou prolongar os esforços, nessa altura ter-se-á de encontrar uma forma de o fazer. Estamos convencidos, em todo o caso, de que não será necesssário.

A ideia é, como já disse, a de lançar o nome de Portugal como parceiro económico, provavelmente com um logotipo e um slogan próprio, e depois serão os organismos que vão fazer a promoção que se vão meter dentro da campanha que foi lançada e continuar a sua própria promoção, embora ao abrigo da unidade. O que pretendemos é esta unidade no nome de Portugal como parceiro económico e isto não vai acontecer só com os organismos públicos. Temos esperanças de que também as empresas exportadoras, toda a actividade exportadora, venha ela própria, por sentir benefício nisso, a pôr-se debaixo deste «guarda-chuva» da promoção de Portugal, como, aliás, julgo que está a suceder em Espanha, onde neste momento já há interesse

em pôr aquele desenho de Miró, que todos conhecem, nas promoções espanholas, mesmo que não sejam financiadas pela campanha espanhola, que, aliás, é muitíssimo cara.

A nossa ideia não é propriamente a de fazer uma continuação deste tipo de promoção, mas, com o custo que está pensado, lançar uma unidade para a campanha de Portugal e é esta junção de esforços que pensamos que é o activo que vamos tirar disto.

Quanto à Comissão Reguladora dos Produtos Químicos, pensamos que ela podia fazer o empréstimo, e fê-lo — aliás, é um procedimento inteiramente legal, na medida em que foi autorizada pelos membros do Governo, por quem responde. Julgamos que foi o método mais expedito para poder resolver o assunto ainda durante este ano e que no ano que vem não vamos ter necessidade de enfrentar o mesmo problema. Julgo, pois, que a solução encontrada foi simples, expedita e legal.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro, como é que se vai fazer a amortização do empréstimo? Com que verbas?

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Deputado, as condições do empréstimo serão determinadas pelo Ministro das Finanças.

Há pouco, o Sr. Deputado perguntou-me — e eu não respondi — se o Instituto de Investimento Estrangeiro ia ser extinto. Independentemente da reestruturação dos serviços, que terá ou não de ser feita, a verdade é que reunimos todas as instituições que neste momento fazem promoção. Se no próximo ano houver mais, juntá--las-emos, com certeza, à Comissão de Acompanhamento; se houver menos, retiraremos.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basilio Horta (CDS): — Sr. Ministro do Comércio e Turismo, agradeço-lhe os esclarecimentos que há pouco me prestou, que, aliás, vieram confirmar aquilo que já se pressentia e que era, manifestamente, a redução, em termos relativos, das verbas para a promoção turística e uma redução drástica das verbas para

0 ICEP. Isto tem a ver com a filosofia que o Sr. Ministro agora apresentou, no que toca à campanha para a promoção do nome de Portugal.

Também não me parece excessiva a verba de

1 500 000 contos atribuída a essa campanha, tendo em conta a sua natureza, mas já me parece uma verba elevada se não for convenientemente aproveitada. E não ser «convenientemente aproveitada» é não dotar os organismos que têm responsabilidade directa no aproveitamento dessa campanha dos meios mínimos indispensáveis para poderem cumprir a sua missão. Não vejo que, com um aumento de 2,5 %, a promoção turística possa cumprir a sua missão e ainda vejo menos em relação ao ICEP com uma diminuição de 12 %. Não sei qual é a influência que tem o problema das despesas correntes de funcionamento do antigo ICEP em termos de pessoal com a actividade promocional — essa distinção não foi feita — e, por isso, não vejo que o ICEP possa cumprir a sua missão com uma redução de tal maneira drástica nas verbas disponíveis.

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Parece que há aqui uma descoordenação entre aquilo que se quer, por um lado, e os meios que não se dão, por outro.

Por outro lado, o Sr. Ministro referiu duas verbas que são coadjuvantes destas iniciativas: uma resultante do PEDIP; outra, do FEDER. Isso coloca outro problema, mais político, que é o da responsabilidade. No fundo, se se trata de verbas do FEDER e do PEDIP, será que a responsabilidade das acções de promoção deixa de estar no seu Ministério, passando para o Ministério da Indústria, no que se refere às verbas do PEDIP, epara outro ministério, no que se refere às do FEDER? Essas verbas são contabilizadas para que o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado possam, desde já, fazer a programação das iniciativas políticas que têm à sua frente? É que, em termos orçamentais, o que vemos é um aumento de 2,5 % nas verbas para a promoção turística, que, com franqueza, considero ridículo. E mais grave é se essas verbas saírem para o FEDER, acabando por não haver uma unidade, havendo mais um canal paralelo aos muitos que já existem a fazer promoção no exterior!

Estou de acordo consigo quando diz que a falta de unidade de pomoção no exterior tem vindo a afectar, nos últimos anos, a nossa representação externa, nomeadamente a ligação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros e outra problemática que não vem aqui ao caso.

Mas neste momento o que me parece — não sei se terei razão ou não, o Sr. Ministro o dirá — é que se esta verba de 1 500 000 contos para promover a imagem de Portugal no exterior não for, depois, devidamente acompanhada com o reforço, que neste Orçamento deveria estar muito claro, das verbas de promoção turística, nomeadamente para os mercados fundamentais para o nosso turismo, corremos o risco de vir a ter uma competitividade a que não seremos capazes de responder.

Por outro lado, a diminuição, tão drástica, das verbas da promoção do comércio externo parece-me não ser compatível. Há aqui qualquer coisa que não é pre-ceptível.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, se desejar responder, faça o favor de o fazer.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Deputado, estou o mais possível de acordo consigo quando diz que seria uma pena desaproveitar este balanço _que, julgamos, vamos constituir se diminuíssemos o esforço de promoção nas entidades que, institucionalmente, têm obrigação de o fazer.

Em todo o caso, como tinha referido na introdução, não há uma redução desse esforço. Pelo contrário, vai haver uma forte acentuação desse esforço, que não é, como eu disse, traduzido exclusivamente pelo Orçamento de Estado, como está aqui referido.

No caso do Instituto do Comércio Externo de Portugal, as relações com o PEDIP vão fazer-se da seguinte forma (aliás, julgo que não haveria outra maneira de as fazer): tendo o PEDIP como um dos seus programas exactamente acções que estejam no âmbito de actividades institucionais normais do Instituto do Comércio Externo de Portugal, a própria gestão do PEDIP contrata, por assim dizer, entre aspas, o Instituto

do Comércio Externo de Portugal para fazer essas acções, visto que não faria sentido montar, ele próprio, uma estrutura que já existe.

Trata-se, praticamente, de uma transferência para o ICEP de certas acções, embora o problema não possa ser colocado nesses termos uma vez que não há propriamente transferência. Existe, isso sim, um contrato feito com o Instituto do Comércio Externo de Portugal, que é pago ao Instituto do Comércio Externo de Portugal, no sentido de ser ele a realizar determinadas acções, tais como a participação em feiras, exposições e outras actividades que o ICEP normalmente desenvolve.

Isso representa já um reforço substancial da verba do Instituto do Comércio Externo de Portugal no esforço real que ele vai fazer para o ano.

O Sr. Basilio Horta (CDS): — Dá licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Basílio Horta (CDS): — Muito obrigado, Sr. Ministro. É só para um pequeno esclarecimento.

Aceito que haja realmente esse contrato. No entanto, o que eu gostaria de saber é se esse contrato é feito sob a responsabilização do Ministério de V. Ex.a e, portanto, de acordo com a sua perspectiva, com as suas prioridades, ou se é necessário negociá-lo de acordo com outras perspectivas que não são, necessária e seguramente, coincidentes com as do Ministério, nessa unidade de promoção dos produtos portugueses.

O Orador: — Sr. Deputado, evidentemente que essa unidade está mais do que assegurada, uma vez que os serviços contratados não se afastarão muito da actividade normal do Instituto do Comércio Externo de Portugal.

Normalmente nós não vendemos aquilo que entendemos que é bom para a indústria, mas sim aquilo que a indústria pensa que é bom para ela. E quem fala em indústria fala em serviços, fala em outros tipos de exportação.

O Instituto do Comércio Externo de Portugal pergunta, normalmente, quais são — e esta forma de perguntar tem muitas nuances — os produtos que devem ser promovidos e encarrega-se depois de fazer essa promoção. No que respeita às relações com o PEDIP, isto vai processar-se da melhor forma. O Ministério da Indústria e Energia dir-nos-á certamente quais são os sectores em que se aposta no desenvolvimento da exportação e nós encarregar-nos-emos de fazer a venda desses produtos. Essa é a actividade normal do Instituto do Comércio Externo de Portugal e, portanto, não haverá propriamente uma alteração do figurino das relações do Instituto do Comércio Externo de Portugal com a indústria. Quem diz com a indústria, diz com os serviços, com a agricultura ou com qualquer outra actividade exportadora. Evidentemente que «vendemos» aquilo que produzimos ou o que estamos convencidos que somos capazes de vir a produzir. Por isso a nossa interface com a indústria é uma interface normalmente fácil. Não temos nenhum problema a esse propósito, como também o não temos em relação a qualquer outra actividade exportadora.

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Gostaria, no entanto, de chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de estes 2,5 % de aumento previstos no Orçamento do Estado para o Instituto do Comércio Externo de Portugal não traduzirem o reforço da actividade desse Instituto no próximo ano. Pelo contrário, julgo que o programa do PEDIP, tal como está para ser aprovado, é de qualquer coisa como cerca de 1 milhão de contos para o próximo ano. Haverá, portanto, uma actividade reforçada do ICEP equivalente ao montante de 1 milhão de contos que se encontra previsto no PEDIP.

Não se trata de dizer «o Instituto só vai fazer apenas menos 12,5 %». Isso não corresponde à realidade, pois, de facto, vamos fazer mais do que isso. Só que esse «mais» que vamos fazer não tem tradução real no Orçamento, por força do PEDIP.

Quanto à promoção turística, a diferença entre aquilo que está orçamentado e aquilo que vai ser realmente a acção de promoção é ainda mais gritante, uma vez que as verbas do FEDER são dadas liquidamente ao Instituto de Promoção Turística para que ele faça essa promoção como muito bem entender. Trata-se de uma transferência pura e simples, feita por intermédio do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, que será entregue normalmente para este fim, segundo um programa que acabou de ser aprovado. Devo dizer também que o reforço dessa verba para o próximo ano é qualquer coisa como 1 milhão de contos, o que significa, praticamente, duplicar as acções de promoção em relação ao que se vinha fazendo no ano passado.

Também aí se ficará folgadamente com capacidade para fazer uma promoção própria, que, na minha opinião, será potenciada — tanto no caso do Instituto do Comércio Externo de Portugal como no do Instituto de Investimento Estrangeiro — em virtude de haver esta cúpula de unidade que vai, com certeza, juntar mais massa crítica a todas estas campanhas parcelares.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Anastácio Filipe.

O Sr. Manuel Anastácio Filipe (PCP): — Sr. Ministro, já que de números pouco temos a falar, pois, nesse aspecto, segundo parece, o Ministério tem pouco espaço de maneio, queria colocar-lhe algumas questões que me parecem estar intrinsecamente ligadas ao turismo, embora o não pareçam.

Penso que o Governo deveria ter uma política global, contando com os vários vectores da economia, entre os quais o turismo.

Mas antes de continuar queria referir que as minhas observações são meros reparos que pedia ao Sr. Ministro o favor de, depois, comentar.

Nos nossos aeroportos, por exemplo, não existem sistemas que permitam a aterragem de aviões quando o tempo é de nevoeiro. Esse tipo de sistema não existe sequer na capital do País, o qué, segundo me parece, é caso único na Europa.

Por outro lado, o estado das nossas estradas continua a ser mau. Há ruas com pavimentos degradados e o Algarve é disso uma boa mostra.

Não sei também que incentivos reais existem para a recuperação de núcleos históricos de inegável interesse turístico.

Finalmente, gostaria de saber o que significa a aquisição de terras e de prédios rústicos e urbanos, principalmente no litoral português, por cidadãos estrangeiros.

Certamente que o Governo terá uma ideia sobre estas questões.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, se quiser responder, pode fazê-lo.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Deputado, se me autorizar e antes de lhe responder, gostaria de acrescentar algo ao que antes disse ao Sr. Deputado Basílio Horta.

Na verdade esqueci-me de referir, ainda relativamente às verbas destinadas à promoção, a promoção que é feita e paga pelas comissões regionais de turismo. O que se passa a nível regional é também aquilo que pretendemos que se passe a nível nacional. O nosso esforço aí vai no sentido de tentar unificar a campanha, para que não haja —já não digo uma campanha descoordenada— uma campanha contraditória. Não gostaríamos que a imagem de Portugal — neste caso concreto quanto ao turismo — viesse a sofrer a existência de «tiros» disparados em direcções opostas.

Há, pois, uma verba muito substancial que é gasta pelas comissões regionais, as quais têm o seu orçamento próprio, cuja coordenação procuramos fazer e fazemo--la. Julgo que isso vem acrescer substancialmente a promoção turística que se faz.

Relativamente aos problemas que foram colocados pelo Sr. Deputado Anastácio Filipe, provavelmente a eles não irei responder concretamente. E não irei pelas razões que vou explicar.

Devo dizer que, apesar dos grandes inconvenientes a que se referiu, vamos ter este ano qualquer coisa como 16 milhões de visitantes. Tomaram muitos países da Europa ter também esses inconvenientes!... Afinal de contas, se com esses inconvenientes temos mais visitantes do que população no País, não sei o que se passaria se não tivéssemos tais inconvenientes!

A verdade é que temos inquéritos feitos aos turistas, que são depois publicados. São inquéritos bastante interessantes, que nos permitem prever as campanhas que iremos fazer nos anos seguintes. Fazemos inquéritos não só quando da entrada no nosso país desses turistas, como os fazemos também quando da sua saída, para sabermos aquilo que gostaram e aquilo que não gostaram de Portugal.

Normalmente tem-se uma noção talvez um pouco negativa do nosso próprio turismo e as críticas que se ouvem são, algumas delas, muito injustas. Enfermam, sobretudo, de falta de objectividade, uma vez que não se baseiam em dados ou em inquéritos sólidos como os que nós fazemos.

Ora, através desse trabalho verifica-se que o número de opiniões positivas sobre Portugal — isto porque as respostas aos inquéritos dividem-se em positivas e negativas — têm vindo a aumentar constantemente. Devo dizer que — e isso está publicado — o número de respostas positivas atinge neste momento 84 %, o que é uma percentagem extraordinária em qualquer destino turístico.

Isto não significa que não tenhamos consciência de que existem dificuldades — as que mencionou são algumas — a serem ultrapassadas. Em todo o caso, até

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me anteciparia e diria que a pior delas todas é, neste momento, a questão do ordenamento, uma vez que, a longo prazo, poderá pôr em causa o turismo. Por isso o Governo irá tomar medidas apertadas a esse propósito, mas com isto não quero dizer que não existam as dificuldades de que falou.

Porém, não gostaria de falar directamente dessas dificuldades porque existe muito, entre nós, a preocupação de julgar que tudo é turismo — numa percepção lata do que é o turismo — e a ideia de que qualquer fenómeno que se passe no nosso país, qualquer que seja a sua natureza, pode vir a afectar o turismo.

Por exemplo, a falta de recolha de lixo é naturalmente um problema que afecta o turismo!...

Mas temos de parar em algum lado! Não podemos, como costumo dizer, estar preocupados com inventar ou em construir Portugal para o turismo. Portugal constrói-se para os cidadãos portugueses e o turismo é disso uma consequência.

Não podemos também estar preocupados em fazer a recolha do lixo só por causa dos turistas! Temos de estar preocupados em fazer a recolha de lixo por causa dos Portugueses.

E isto embora saibamos, naturalmente, que determinados problemas são tão graves para o turismo que temos mesmo de nos preocupar especialmente com eles! Um desses casos típicos foi o do saneamento básico da Costa do Estoril. Verificou-se aí que essa falta de saneamento, para além de afectar a população, afectava também, definitivamente, o turismo da região. Por isso o Ministério do Comércio e Turismo se interessou especialmente por esse caso.

Não temos, no entanto, a preocupação de tentar resolver todos os problemas do País em nome do turismo.

Não estou a par dos problemas que referiu e não serei a pessoa capaz de a eles responder, embora também lhe diga que, no que respeita ao estado da estrada, esse é de facto o ponto número um de respostas negativas nos inquéritos que levamos a cabo junto dos turistas. Quando falo em respostas negativas estou a referir-me aos tais 16 % constantes dos inquéritos, dos quais 5 °Io incidem sobre o mau estado das estradas.

Em todo o caso não pesa a consciência do Governo a esse propósito pois julgo que em nenhuma época da nossa história se investiu tanto em estradas como se está a investir agora.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Basílo Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): — Pretendo fazer apenas uma brevíssima intervenção final para agradecer ao Sr. Ministro os dados adicionais que me deu e para dizer que penso não ser esta a sede própria para discutirmos estes problemas, uma vez que verificamos que a promoção turística tem um aumento de 2,5 °7o neste Orçamento, o que significa um decréscimo, em termos reais, de cerca de 3 %, mas que, no entanto, vai-do-brar a sua actividade. Vai dobrá-la com verbas que, necessariamente, vêm de outro lado!... Não daqui, mas de outro lado.

Em relação às verbas do comércio externo ainda mais notório isso se torna. Aí, embora havendo um acréscimo de 12,5 <% em valores absolutos, o Sr. Ministro assegurou que o esforço de promoção dos nossos pro-

dutos no estrangeiro vai ser também reforçado «como nunca» — penso que foi esta a expressão utilizada.

Assim sendo, então vamos aguardar a discussão das verbas do PEDIP em sede de indústria e as do FEDER em sede de administração interna para colocar outros problemas que aqui não podemos colocar, uma vez que este orçamento não reflecte sectorialmente o esforço que vai ser feito, quer em termos turísticos, quer em termos de promoção do comércio externo. Não é esta a sede própria.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, não sei se quererá fazer algum comentário em relação ao que o Sr. Deputado Basílio Horta acabou de dizer, ...

O Sr. Ministro do Comércio Externo: — Não tenho nada a dizer, Sr. Presidente.

O Orador: — ... mas eu queria pôr-lhe uma questão relativamente à qual não estou muito clarificado e que gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse.

Falou-se há pouco tempo — e o Sr. Ministro já hoje aqui o referiu — em verbas que a CEE terá aprovado para a promoção do turismo fora da zona da CEE. Se bem entendo, essas verbas serão aquelas que virão do FEDER. E este é o meu primeiro ponto de interrogação. São essas verbas que virão do FEDER ou são outras?

A segunda questão prende-se com o facto de estas verbas não estarem inscritas tanto no orçamento do Ministério com nas receitas do Instituto de Promoção Turística. Se provierem do FEDER, elas estarão inscritas no Ministério do Planeamento e da Administração do Território e a dúvida que se me suscita relaciona-se com a sua inscrição orçamental. Mesmo que essas verbas estejam inscritas no orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, constato, pelo articulado do orçamento, que este Ministério pede autorização para fazer determinadas transferências de verbas para outros organismos ao longo do ano e nelas

não constam estas da promoção turística.

Admito perfeitamente, uma vez que a resolução foi tomada há cerca de dez dias, que, na altura, não fosse possível aí incluí-las. Julgo, no entanto, que, se a situação é esta, estamos ainda em tempo oportuno de regularizá-la, fazendo a sua inscrição directa no orçamento do Ministério do Comércio e Turismo ou no do Instituto de Promoção Turística'ou, então, pelo menos, juntá-la àquele articulado do Ministério do Planeamento e da Administração do Território —independentemente dos problemas de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, que debateremos em devido tempo— para que, pelo menos, houvesse essa indicação, tal como existe para outros programas.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Tem razão, Sr. Deputado. Julgo que isso acontece porque essa matéria nem sequer ainda foi publicada no Jornal das Comunidades.

A decisão já foi tomada mas não era possível, nesta fase, incluí-la no orçamento. No entanto, vai ser, com certeza, necessário proceder a alterações no orçamento do Instituto de Promoção Turística de forma a poder acumular essas verbas.

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A razão de elas não figurarem no orçamento apresentado deve-se ao facto de não estarem ainda aprovadas oficialmente, embora, como disse, a decisão sobre a sua atribuição já tenha sido tomada.

O Sr. Presidente: — Não sei se mais algum Sr. Deputado deseja colocar qualquer questão ao Sr. Ministro ou se o Sr. Ministro ou algum dos seus Secretários de Estado deseja acrescentar algo.

Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: — Sr. Presidente, só queria acrescentar que não gostaria que as últimas palavras do Sr. Deputado Basílio Horta fossem tidas como conclusão que eu pudesse aceitar. A verdade é que a não aceito.

O Sr. Deputado está a partir, evidentemente, do princípio de que a actividade do Ministério é reflectida exactamente pelo seu orçamento e eu não partilho dessa opinião. Embora o orçamento indique a forma como se gasta o dinheiro do Estado em determinada actividade, ele não é o tradutor exacto e fiel das actividades dos organismos.

Neste caso, como procurei demonstrar, não o é, por razões que julgo inamovíveis. Não podia ser de outra forma.

Reafirmo que, quer a promoção a cargo do Instituto do Comércio Externo de Portugal, quer a promoção a cargo do Instituto de Promoção Turística, vão ser bastante aumentadas no próximo ano, pelas razões que expliquei.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.

O Sr. Basílio Horta (CDS): — Sr. Ministro, só queria referir que eu não disse que a promoção não vai ser aumentada ou que deixa de o ser. O que eu disse foi que não é esta a sede própria para analisar este assunto, uma vez que V. Ex.a reconheceu que o grosso das verbas para esse efeito não está so seu orçamento. Esta é que é a constatação e foi só isso o que eu quis dizer.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate relativo ao orçamento do Ministério do Comércio e Turismo. Agradecemos a presença do Sr. Ministro e dos Srs. Secretário de Estado e aproveito para relembrar os Srs. Deputados de que às 17 horas teremos uma reunião com o Ministério do Planeamento e da Administração do Território.

A reunião está suspensa até às 17 horas.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados, vamos reiniciar a reunião. Eram 16 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início ao debate do orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território.

Começo por agradecer a presença do Ministro do Planeamento e da Administração do Território e dos

Srs. Secretários de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, do Planeamento e do Desenvolvimento Regional, do Ambiente e dos Recursos Naturais e da Ciência e Tecnologia.

Srs. Deputados, antes de entrarmos propriamente no debate, gostaria de informar que se encontram presentes nas galerias alunos da Universidade Portucalense.

Não sei se o Sr. Ministro ou algum dos Srs. Secretários de Estado deseja fazer uma intervenção inicial de apresentação do orçamento ficará ao critério do Sr. Ministro, mas normalmente é isso o que tem sido feito. De qualquer modo, informo os Srs. Deputados que o Sr. Ministro teria interesse em que, na primeira fase, digamos assim, as questões colocadas fossem relativas à Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, na medida em que o Sr. Secretário de Estado terá de se ausentar por compromissos já assumidos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira): — Srs. Deputados, tendo já feito na Comissão de Economia, Finanças e Plano uma apresentação relativamente longa acerca das Grandes Opções do Plano e do próprio orçamento do Ministério, talvez se não justifique agora que faça uma longa exposição acerca das mesmas propostas de lei.

Devo dizer que fico muito grato por permitirem que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais seja o primeiro a discutir e a analisar o seu próprio orçamento referindo, muito brevemente, quais são as suas orientações gerais.

No entanto, gostaria de referir, como introdução àquilo que o Sr. Secretário de Estado vai dizer, que, efectivamente, há uma grande preocupação por parte do Governo quanto ao orçamento desta Secretaria de Estado, nomeadamente em relação aos recursos hídricos. Como já uma vez tive ocasião de dizer, Portugal é um país com recursos hídricos abundantes mas caros, porque, efectivamente, é preciso fazer muito investimento para deles se tirar beneficio e, portanto, a verba dominante do orçamento desta Secretaria de Estado é naturalmente a que diz respeito aos recursos hídricos.

Como também é sabido, a nossa preocupação actual está em pôr rapidamente esses recursos ao serviço das utilizações múltiplas que têm, ou seja, fazer as ligações especialmente com a agricultura, onde há uma inércia maior na adaptação e na mobilização dos recursos.

Por outro lado, continuar-se-á a fazer um esforço no campo da preservação do património natural. A educação ambiental merece-nos o maior dos relevos e vamos continuar, pois temos agora mais meios humanos para fazer a preservação das zonas naturais, a reabilitação de muitos dos lugares que precisam de uma atenção especial e ainda as ligações com o ordenamento do território. As ligações dos recursos naturais, do património natural, com o ordenamento do território, embora não façam propriamente parte do orçamento, preocupam-nos particularmente.

Suponho que, no que respeita a esta Secretaria de Estado — e depois farei uma breve referência a cada uma das outras secretarias à medida que for falando —, e no caso dos recursos naturais, os recursos hídricos, a preocupação da educação ambiental e a pre-

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servãção da natureza são os pontos fundamentais. É evidente que o ambiente e tudo aquilo que são acções de concretização do princípio do poluidor/pagador têm também um lugar no orçamento, especialmente naquilo que vem a ser a assunção de responsabilidades pelos poluidores e em especial pelos grandes poluidores, que efectivamente num ou noutro lado têm mais a ver com a qualidade dos efluentes, ou melhor, com a má qualidade dos efluentes. Na verdade, esses poluidores estão a assumir responsabilidades que são compartilhadas pela Secretaria de Estado e que vão continuar a ser os nossos pontos de atenção. Mas, se me dessem licença, o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais vai reflectir um pouco mais sobre os números e traduzi-los antes de ouvirmos as perguntas que os Srs. Deputados queiram fazer.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais (Macário Correia): — Srs. Deputados, vou ser muito breve, até porque o Sr. Ministro já enunciou muito claramente a filosofia e os objectivos que temos. De qualquer modo, desejo dizer apenas duas palavras mais e depois ficarei à vossa disposição para responder às questões que entenderem colocar.

Devo dizer que, naturalmente, temos prioridades e uma delas é, de facto, a questão dos recursos hídricos, conforme o Sr. Ministro disse.

A gestão dos recursos hídricos, na perspectiva da quantidade, ou seja, na perspectiva de disponibilizar água em quantidade para as populações, leva a que tenhamos em curso pelo País, neste momento, sete obras de grande vulto. Estão em curso barragens para abastecimento de água desde Peniche a Alijó, no Algarve, as de Beliche e Funcho; estão ao mesmo tempo em curso obras para abastecimento de água a sistemas hi-droagrícolas, como, por exemplo, na Cova da Beira, em Trás-os-Montes e no Mondego, tendo sido inaugurado há poucos dias pelo Sr. Primeiro-Ministro o canal condutor geral que vai regar mais 15 000 ha; e, em relação ao aspecto da gestão da qualidade do efluente, há também várias obras em curso que mobilizam uma soma considerável de dinheiros públicos. A obra em curso mais próxima e significativa, em termos de montante, é o saneamento básico da Costa do Estoril, que mobiliza cerca de 3 milhões de contos por ano em recursos públicos directos ou sob empréstimo no Banco Europeu de Investimento, que, neste momento, já foi feito.

Uma outra área em que a intervenção é muito clara tem a ver com a recuperação do litoral que temos vindo a fazer de algum tempo a esta parte e que é do conhecimento de todos, pelo que não vou desenvolver muito esta questão, mas gostaria de dizer que também ela mobiliza umas centenas largas de milhares de contos em cada ano, através da fase mais positiva, ou seja, da fase da localização e da construção de infra-estruturas, que, neste momento, temos em mão. Como se sabe, durante dois anos, têm-se retirado muitas contruções clandestinas situadas no litoral, mas é preciso introduzir novas infra-estruturas de modo que os cidadãos que aí passam a sua época balnear o possam fazer em devidas condições e isso também mobiliza alguns recursos que naturalmente estão em curso.

Srs. Deputados, penso que não se deve ver a política do ambiente tendo como fonte de financiamento apenas o dinheiro público, porque quanto mais assim for pior e mais injusto será o sistema. A política do ambiente não deve ter apenas como fonte de financiamento o sistema fiscal, isto é, os contribuintes, mas sim os utilizadores e poluidores.

Seria injusto que mobilizássemos dinheiros públicos para resolver os problemas da poluição de um dado rio, quando o que importa fazer, em termos de justiça, é que o poluidor ou o utilizador dessa água seja responsabilizado pela qualidade dos efluentes que gera. É isso que temos de fazer, porque senão haveria uma distorção do sistema com a alocação de dinheiros dos contribuintes em geral, para resolver problemas particulares de uma área, de uma zona, onde são identificáveis os prevaricadores dessa circunstância. E deixo esta referência para reflexão.

Por outro lado, devemos ter a noção muito clara de que hoje em dia há muitos instrumentos financeiros, muitos sistemas de incentivos, que possibilitam acções de investimento na área do ambiente.

Esta é a filosofia que temos desenvolvido em Portugal e que é, de resto, a que vem sendo desenvolvida a nível comunitário. Neste momento, há, pela primeira vez, na reforma dos fundos comunitários que estão em curso, quer no âmbito do FEDER quer no âmbito do FEOGA, uma alusão muito concreta às acções na área do ambiente como acções ilegíveis no sentido de que, naturalmente no âmbito desse fundos, não é necessário criar mais fundos para as questões do ambiente; é necessário que, de uma forma integrada, os fundos existentes contemplem à partida essa preocupação.

Eu disse algumas vezes como exemplo, e repito-o à laia de reflexão muito rápida, que nós, pelo facto de o nosso ciclo de desenvolvimento ter algum atraso em relação ao de alguns países da Comunidade, podemos beneficiar da experiência a fim de não cometermos os mesmos erros. Por exemplo, devo dizer que conheço, tanto na Dinamarca como na Holanda, situações muito complicadas em que hoje em dia se estão a mobilizar dinheiros públicos, para se combaterem excessos provocados por alguma política agrícola e industrial.

Ora bem, nós, em Portugal, com os programas do PEDIP para a indústria e do PEDAP para a agricultura, podemos incorporar essas preocupações a montante e fazer que as unidades agro-industriais, agrícolas, pecuárias e outras venham a ter logo à partida, no seu investimento, no seu projecto, a estação de tratamento de águas residuais, a estação de tratamento dos resíduos químicos perigosos, ou seja, de tudo o que tem de ser feito à partida.

Não se pode mobilizar dinheiro apenas para aumentar a produção, aumentando simultaneamente a poluição, porque mais tarde vai ter de se mobilizar um outro fundo antagónico a este a fim de combater aquilo que alguém não teve como preocupação de partida. É esta a filosofia que devemos ter bem presente para que esta dissintonia e desarticulação das mãos do próprio o Estado não aconteça. Penso que, neste momento, em Portugal, o Governo é muito claro nessa matéria. Há preocupações ambientais na política industrial, na política agrícola e obviamente nas outras e, portanto, esta filosofia integrada existe claramente para que essa contradição não se venha a verificar.

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É esta a informação genérica que vos queria deixar, em termos de orientação.

Quanto a números, poderei dizer que a Secretaría de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais mobiliza, grosso modo, 10 milhões de contos por ano, através de fontes varias. Neste momento, temos grandes obras em curso com empréstimos do Banco Europeu de Investimento, com empréstimos do KfW (Kreditanstalt für Wíederaufbau), obras que mobilizam directamente fundos comunitarios e muitas outras em contrato--programa com as autarquias.

As obras em curso que mobilizam directamente dinheiros próprios da Secretaria de Estado, em concreto do PIDDAC, são, grosso modo, cerca de 10 milhões de contos por ano. Mas este é um orçamento ao qual se associa dinheiro de outras fontes, como referi, em que o fermento é o dinheiro da Secretaria de Estado, é ò dinheiro do PIDDAC, mobilizando globalmente investimentos da ordem dos 30 milhões de contos por ano.

Devo dizer, em termos finais, que, tal como consta no Diário da Assembleia da República, os quadros destes montantes que referi têm uma desagregação que não permite uma leitura muito fácil. Por vezes, fica-se com a noção de que as acções na área do ambiente são de 2 milhões e pouco de contos quando na prática não é verdade, porque as acções da nossa política de ambiente e recursos naturais são classificadas em agricultura, em recuperação de património natural e construído, como o Sr. Ministro disse há pouco, em infra-estruturas e em acções várias. Aquilo que está titulado como ambiente é apenas uma fatia do global e não tem, por exemplo, estas acções da política dos recursos hídricos e da política dos recursos naturais, em geral, que é aquela que mais mobiliza os recursos.

Esta é a introdução que, de uma forma muito sintética e clara, posso fazer e tanto eu como o Sr. Ministro ficaremos à vossa disposição.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, se não houver inconveniente e correspondendo ao interesse manifestado pelo Sr. Ministro e pelo Sr. Secretário de Estado, começaremos pelas questões do ambiente.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr." Deputada Maria Santos.

A Sr.8 Maria Santos (Os Verdes): — Numa anterior reunião com o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e com o Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais tive oportunidade de levantar questões que considerávamos fundamentais para a abordagem deste Orçamento do Estado. De qualquer maneira, parece-me importante, em relação as verbas, retomar algumas das questões que na altura não foram abordadas, porque certamente não houve possibilidade de responder, e colocar-lhe outras que tivemos oportunidade de aprofundar depois da análise do PIDDAC e das respostas que nos foram dadas na anterior reunião.

Quanto ao problema das verbas, e V. Ex." acabou de referir que elas existem, é evidente que estou de acordo em que o mais importante é sabê-las gerir. De qualquer forma, e retomando uma das frases que costuma dizer, ou seja, que «ainda temos a galinha dos ovos de ouro», embora concorde com ela, penso que não podemos fazer omeletas sem ovos. Podemos gerir

muito bem as verbas que temos, mas é impossível resolver muitos dos problemas que afectam o ambiente em Portugal se não tivermos, de facto, os «ovos» para fazer as tais «omeletas», resolvendo assim alguns dos muitos problemas pelos quais ainda somos afectados.

Penso que é importante a coordenação e a planificação, mas, de qualquer maneira, penso também que é necessário inscrever verbas para a resolução de muitos problemas.

E começo já por lhe colocar a questão do Instituto do Ambiente. Recebemos a comissão directiva do Instituto do Ambiente, que teve a oportunidade de saber das questões relativas às verbas consignadas para esse Instituto que, segundo a própria comissão directiva, de facto, não preenchem os requisitos que se exigem a uma instituição com o carácter desta; de facto, neste momento, existindo já as instalações e mantido o pla-fond, que é cerca de 60 000 contos, não é possível dar continuidade aos muitos programas que o próprio Instituto tem e nesse sentido Os Verdes vão apresentar um reforço de inscrição de verba para o Instituto do Ambiente de modo a levar à prática os projectos consignados no seu plano de actividades, não só em termos de processo de instalação mas de toda a actividade que se exige deste Instituto do Ambiente.

Cingindo-me agora ao PIDDAC, gostaria de lhe colocar duas questões. Estivemos a fazer uma análise dos programas que foram definidos em 1988 e daqueles que agora são consignados para 1989 e constatamos que nem sempre aquilo que estava estabelecido para 1988 coincide hoje com as projecções do PIDDAC, em termos temporais e de verbas, quer para 1989, quer para a conclusão dos diferentes programas.

Se em 1988 estava definida uma determinada perspectiva de implementação dos programas e dos projectos e se hoje há uma alteração — para 1989 há uma série de projectos que foram alterados em termos do horizonte de execução e de verbas, mesmo as consignadas para 1989, e depois passar-lhe-ia a dar exemplos —, isto leva-nos a crer que não há aqui uma coordenação e clarificação que disse ter de existir. Depois da leitura do PIDDAC ficámos com o sentimento de que se definiu para 1988 uma série de projectos que agora sofrem uma outra organização, o que nos leva muitas vezes a não saber se a implementação dos projectos consignados para 1988 vão de facto ser levados à prática em 1989 e anos seguintes.

Portanto, posso dizer que há programas definidos anteriormente e que este ano são redefinidos, e vou dizer-lhe quais são. Quanto às próprias verbas a consignar, umas diminuem e outras aumentam, como, por exemplo, o programa de defesa contra as cheias, e não percebemos porquê.

Se fosse possível, clarificava as projecções feitas, que são muito diferenciadas. Por exemplo, no Orçamento do Estado para 1988 estava consignada a verba de 2 650 000 contos, prevista para a execução do programa até 1991 e há agora uma alteração que é dilatada não só na verba, porque se inscreveu mais 1 725 000 contos, como também em termos de tempo. Ou seja, não há uma planificação, definiu-se e agora redefiniu-se. Gostaria de saber onde é que assentam essas novas redefinições. Por exemplo, sente-se o mesmo quanto aos contratos-programa na área do saneamento básico e à reabilitação de infra-estruturas

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de saneamento básico, acções diversas que se encontram em fase de negociação. Foi uma das questões que levantei e que certamente não teve oportunidade de esclarecer.

Gostaria de saber quais são, de facto, os objectivos deste programa, que não estão muito claros, porque nestas acções, em fase de negociação, não se entende a que se destina a verba de 82 000 contos consignada, de 1982 a 1992, para a conclusão do projecto.

Um outro aspecto que gostaria que clarificasse é o dos estudos e despesas comuns: objectivamente, estes 15 000 contos são para quê?

Quanto ao programa de protecção e melhoria da qualidade da água —e já hoje o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado referiram a sua importância para a resolução de muitos dos problemas que afectam as populações, em termos de poluição e mesmo de gestão dos recuros hídricos—, goataria de saber se, neste programa, com a inscrição da verba de 15 000 contos, está contida a avaliação da situação do saneamento básico do País, pois, também neste caso, não entendo para que se destina este dinheiro. Isto é um levantamento? O levantamento não está feito? Para que é que serve este programa?

O programa de defesa do ambiente e protecção da natureza tem consignado um projecto de ampliação e modernização de infra-estruturas com uma verba de 42 800 contos para 1989, mas para que se destina concretamente esta verba?

Quanto ao projecto de conservação dos recursos hídricos, estudos e acções diversas, não se percebe por que é que se fazem estes programas, pelo que lhe pedia que clarificasse esta questão.

Outro dos problemas com que nos defrontamos é o de que há uma certa dificuldade nessa aferição, uma vez que se disse aqui que há uma certa dispersão de verbas do ambiente por outros ministérios.

De qualquer maneira, um dos grandes problemas é a resolução do saneamento da ria de Aveiro. É que andámos à procura das verbas inscritas para o próprio Gabinete e não as encontrámos.

Por outro lado, e relativamente à cooperação técnica e financeira com os municípios da bacia do Ave, o total do projecto mantém-se, mas há um dilatamento do horizonte da sua conclusão. Portanto, porquê esta nova readaptação do programa e do projecto?

Assenta em preocupações ou em que é que assenta? Houve alteração de tempos também para a realização deste projecto, o que nos demonstra que há uma alteração da planificação do que estava projectado e, portanto, há de facto uma orientação diferente mesmo do ponto de vista das acções, seguindo a vossa linha política de actuação, depois da implementação das acções.

Houve assim um mexer muito grande, o que nos leva a dizer, à laia de ser um bocadinho chata, o que também convém, ...

Risos.

... que o Governo, nomeadamente a área da Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, tinha primeiro definido uma coisa e um ano depois define outra coisa. Como é que isto se rearranja?

Quanto à questão da implementação das futuras administrações de bacias, devo dizer que o Orçamento do Estado de 1988 lhe consignava, salvo erro, cerca de

1 490 000 contos e o horizonte de execução do projecto

era até 1991. Porém, prevê-se agora apenas um aumento de cerca de 1500 contos e o horizonte do projecto é dilatado.

Ora, nós sabemos —são os próprios técnicos que o dizem— que não existe ainda a implementação das competências e, como são também por todos reconhecidas as dificuldades no seu estabelecimento, gostaríamos que nos dissesse como é possível datarem-se estas administrações de bacias de cerca de um terço do Orçamento do Estado, não havendo, depois, uma correspondência do traçado político a objectivar as verbas em determinantes da aplicação e da própria organização destas administrações.

Finalmente, uma pergunta sobre o estabelecimento da Carta da Qualidade da Água. Não percebemos para onde é que foram estas verbas, comparando o orçamento em 1988 com o orçamento em 1989. Há um investimento e já foram gastos 26,5 % das verbas consignadas para o total do projecto. Mas onde é que está a Carta da Qualidade da Água? No entanto, foi já gasto um terço das verbas consignadas.

A última questão tem a ver com o programa da contaminação dos solos. Gostava que me dissesse, no âmbito deste programa, quais são os projectos e as verbas que estão inscritas, porque, passado um ano, há uma redução em menos de 50 % de verbas consignadas neste projecto e uma alteração do seu horizonte de execução.

Fico por aqui e só lhe peço que me esclareça em relação ao artigo 18.° da proposta de lei do Orçamento do Estado, que permite ao Governo a transferência de verbas, nomeadamente as do projecto VALOREN, que é o projecto das energias alternativas, como é que o Sr. Secretário de Estado aceita que o Governo possa transferir e canalizar verbas deste projecto, que nos é tão caro, tendo em conta a importância da investigação e do estudo na área das energias alternativas.

O Sr. Secretário de Estado não respondeu da outra vez, ou seja, quando na reunião anterior lhe coloquei a questão, mas gostaria que hoje ficasse registado o seu parecer enquanto responsável pela pasta do Ambiente e dos Recursos Naturais.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Secretário de Estado de Ambiente e dos Recursos Naturais: — Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Começando pela questão do Instituto Nacional do Ambiente, gostaria de colocar ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais ou ao Sr. Ministro uma questão. A Comissão recebeu o conselho directivo do Instituto Nacional do Ambiente, que, de facto, levantou problemas quanto às verbas inscritas no Orçamento do Estado e no PIDDAC para este Instituto, dizendo que estas não correspondem às propostas por ele apresentadas, não correspondem ao decreto regulamentar que está pronto e ao quadro de pessoal, que prevêem ser de 100 pessoas.

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As verbas previstas no Orçamento e aprovadas pelo Ministério do Planeamento e da Administração do Território dão apenas para a continuação do trabalho realizado em 1988, não permitindo a admissão de mais pessoas, ou seja, não premitindo o desenvolvimento das

acções que possam vir a ser realizadas pelo Instituto Nacional do Ambiente, nos termos da Lei de Bases do Ambiente, que criou este Instituto, assim como não permitem, de acordo com o conselho directivo, dar satisfação aos novos programas ou projectos, que, aliás, também não teriam sido considerados pelo Ministério.

Sendo assim, gostaria que o Sr. Secretário de Estado ou o Sr. Ministro se pronunciassem sobre este problema, na medida em que a Lei de Bases do Ambiente ao criar o Instituto Nacional do Ambiente clarificou as suas competências e os seus objectivos, que, na opinião do seu conselho directivo, com estas verbas é impossível pôr em prática.

Portanto, gostaria, numa primeira fase, que esta questão fosse esclarecida por parte do Sr. Secretário de Estado ou do Sr. Ministro.

Em relação a outros aspectos, que têm a ver com os problemas do ambiente, e alguns deles já aqui foram levantados pela deputada Maria Santos, gostaria de os clarificar.

O problema do ambiente não tem a ver apenas com a questão dos recursos hídricos, de que o Sr. Ministro já falou bastante, quer numa intervenção feita no Plenário, quer há pouco, quando voltou a citar este problema. De facto, a questão do ambiente é um problema muito mais vasto e a sua problemática está bem definida na Lei de Bases do Ambiente; pena é que ela não tenha sido devidamente regulamentada.

Já na outra reunião da Comissão da Administração do Território, Poder Local e Ambiente se havia falado sobre estes problemas, sobre a necessidade urgente da regulamentação da Lei de Bases do Ambiente em todos os seus aspectos e do envio a esta Casa de um documento —que já devia ter sido enviado, mas foi-nos dito que irá ser brevemente, pois está a ser ultimado— relacionado com toda a questão do património natural e da natureza, ou seja, com a definição da conservação da natureza e com a estatégia nacional da conservação da natureza, referida no artigo 28.° dessa Lei de Bases, que, como se sabe, devia ter sido submetida à aprovação da Assembleia da República no prazo de um ano após a publicação da Lei de Bases do Ambiente.

Fiz esta introdução apenas para clarificar que a questão do ambiente é muito mais vasta do que aquela que foi aqui apresentada pelo Sr. Ministro, que, como é natural, depois, reflecte essa visão na expressão orçamental, porque faltam programas e projectos importantes que deveriam ter sido considerados. Aliás, mesmo nos que foram considerados, há, em alguns casos, diminuição de verbas e em outros não foram considerados aspectos importantes que têm vindo a ser debatidos, desde o problema da bacia do Ave até à questão do Vouga, passando por toda a zona do Douro. Em suma, em alguns casos as verbas existem mas são insuficientes, porque em outros casos nem existem.

No entanto, o problema da bacia do Douro é um problema muito importante, pois há a necessidade de se despoluir toda aquela bacia; os problemas de saneamento básico têm de ser encarados de uma forma in-

tegrada e isso não está a acontecer. Conhecemos os graves problemas existentes em toda a zona da área metropolitana do Porto, em termos de abastecimento de água, de esgotos e do lixo, que não têm sido devidamente encarados por parte da Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais.

Já aqui se falou na questão das cheias, nomeadamente na zona da área metropolitana de Lisboa devido ao rio Tejo, e este problema precisava de ser visto com mais atenção. Por outro lado, aparecem, quando aparecem, verbas diminutas destinadas à questão das reservas naturais.

Foi criada recentemente a Reserva Natural do Paul de Arzila. Devo dizer que tínhamos um projecto de lei sobre a criação desta Reserva Natural, mas o Governo antecipou-se à Assembleia da República e decidiu criá--la. Quando a Assembleia da República tem projectos de lei para apresentar, nomeadamente quando são da parte do PCP, o Governo costuma fazer sair, entretanto, um decreto-lei. Mas gostaria de perguntar ao Sr. Ministro ou ao Sr. Secretário de Estado onde é que estão as verbas para o Paul de Arzila, porque de facto não vi nada no PIDDAC; pode ser que existam em alguma dotação agregada. Porém, gostaria que me dissesse que verbas é que existem para o Paul de Arzila.

Para a resolução do problema da necessidade de se construir uma estação de tratamento de águas residuais em Coimbra, não sei se foram ou não afectadas verbas porque há aqui verbas que estão agregadas e admito que em alguma delas possa haver algo que lhe diga respeito. Por isso, pergunto se existe ou não alguma verba destinada a esta questão.

Referindo-me agora ao distrito de Santarém, gostaria de saber se está prevista alguma verba para a limpeza e desobstrução das ribeiras de Muge, do Choute de Ulme e dos canais da Azambuja e de Alpiarça.

Algumas questões que levanto têm a ver, de facto, com a forma agregada. Em anos anteriores era habitual a Secretaria de Estado dar-nos um desenvolvimento destas verbas. Este ano não deu e, portanto, temos muita dificuldade em saber se há ou não algumas verbas que tenham em conta estes projectos.

Para já, fico por aqui, podendo vir, eventualmente, depois das respostas, a colocar outras questões.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.

O Sr. Mendes Costa (PSD): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Também desejamos compartilhar de algumas preocupações manifestadas pelas Sr." Deputadas Maria Santos e Ilda Figueiredo no tocante às verbas consignadas para o Instituto Nacional do Ambiente.

Nesse sentido, entendemos que os 60 000 contos consignados ao referido Instituto são insuficientes, na medida em que nos foi dito que 47 000 contos são para despesas correntes. Ora, se dos 60 000 contos 47 000. são para despesas correntes, apenas ficam 13 000 contos para acções de formação no campo da política de educação ambiental.

Como é que este Instituto, criado pela Assembleia da República, pode apoiar e coordenar as acções com centenas de associações e grupos ecológicos ao longo do País?

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Consideramos, consequentemente, que se verifica um

desfasamento muito grande entre as despesas correntes e a verba restante para acções de formação no âmbito das competências do Instituto Nacional do Ambiente. E, por isso, parece-nos que aqui deverá haver um cuidado maior quanto à verba atribuída, pois se se gastam 47 000 contos em despesas correntes, o pessoal pouco poderá trabalhar na implantação de acções pedagógicas na política de educação ambiental. Esta a primeira questão.

A segunda questão prende-se com a acção das comissões de gestão do ar, nomeadamente a daquela que mais me sensibiliza, pois também sou vítima de poluição no Barreiro. Refiro-me, portanto e muito especialmente, à Comissão de Gestão do Ar do Barreiro-Seixal, para a qual estão consignados 3500 contos.

Considero que com esta verba não se vai fazer praticamente nada para a diminuição da poluição do Barreiro-Seixal e nesse sentido pergunto ao Sr. Secretário de Estado, relativamente à poluição do Barreiro--Seixal —que, como sabe melhor do que eu, aflige centenas de milhares de residentes da zona—, quando é que iremos ter um ar melhor, quando é que haverá tratamento de efluentes, nomeadamente da QUIMIGAL, que contribuem de maneira assustadora para a poluição do rio Tejo. É uma das preocupações prementes das populações daquela zona que a questão ambiental se faça sentir, nomeadamente ao agente poluidor.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Percheiro.

O Sr. Cláudio Percheiro (PCP): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Rápida e telegraficamente, vou colocar três questões.

Primeira questão: no orçamento da Secretaria de Estado do Ambiente não vi qualquer tipo de verbas

— provavelmente estarão agregadas — relativas ao problema da poluição atmosférica em Alhandra. Pergunto se isto se encontra nalgum programa, dado que o Ministério e a Secretaria de Estado não nos enviaram o desagregamento das verbas.

Segunda questão: em relação aos recursos hídricos é filosofia do Governo e um dos seus objectivos fazer avançar rapidamente tudo o que diz respeito a barragens. Ora, Sr. Secretário de Estado, é estranho que uma obra que estava prevista com 621 298 contos

— a barragem da Gema — apareça neste orçamento sem verba. Neste caso, pergunto: o que se passa?

A terceira e última questão refere-se ao Gabinete da Área de Sines.

O Sr. Secrtetário de Estado disse que as negociações em relação a esta matéria estavam a andar e que o projecto de decreto-lei estava acordado. Pergunto: onde está inscrita a verba para realizar as obras em falta, como, por exemplo, a escola, o parque desportivo, arruamentos, estradas, etc, do centro urbano de Santo André, o saneamento dos Brescos, da costa de Santo André, de Deixa-o-Resto, do Giz, do Azinhal, etc? É que, em 1988, a verba para o Gabinete da Área de Sines era de 1 222 000 contos e para 1989 figura apenas a verba de 359 000 contos. Pergunto: como se vai resolvei este problema? Vai o Governo fazer sair o decreto-lei sem se comprometer com as autarquias da área relativamente a estes problemas?

Esta é uma pergunta sobre a qual, até hoje, ainda

não obtivemos uma resposta!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Sr. Ministro, Sr. Secrertário de Estado, Srs. Deputados: A questão que vou apresentar não diz exclusiva nem fundamentalmente respeito à política do ambiente, mas vou colocá-la porque o Sr. Secretário de Estado falou no aproveitamento dos recursos hídricos. Deixo-a, portanto, no ar e o Sr. Secretário de Estado ou o Sr. Ministro responderão se assim entenderem.

A questão que coloco tem a ver com o projecto de aproveitamento hidráulico para fins múltiplos do rio Guadiana e particularmente com o seu primeiro escalão — Alqueva.

Trata-se de um projecto que se arrasta há bastantes anos, que faz que anda e não anda, que pára e arranca e sobre o qual vários argumentos têm sido avançados no sentido de evitar que vá para a frente. Entre esses argumentos figura o das disponibilidades hídricas, problema que hoje parece estar praticamente ultrapassado, pois é unânime o consenso de que existem disponibilidades mais que suficientes para Alqueva, mesmo com as barragens que a Espanha já está a construir, com as lagoas ou albufeiras acima das barragens de Sejuar, na zona de Badajoz, e mais a mais já foi feito pela EDP um novo estudo sobre a altura da barragem.

Colocou-se, depois, a questão da sua rentabilidade, que parece estar, igualmente, ultrapassada, pois o último estudo da EDP — ao que se conhece e que se fosse possível agradecíamos que nos fosse fornecido — aponta no sentido de que só o aproveitamento hidroeléctrico paga a manutenção da barragem.

Para além das questões apresentadas, as opiniões que têm vindo a opor-se a Alqueva, por variadíssimas razões, estão hoje cada vez mais reduzidas, o que até ficou demonstrado, recentemente, no colóquio que se realizou na Sociedade de Ciências Agrárias, em que diversas direcções-gerais de diversos ministérios estiveram de acordo em que as condições estavam criadas para Alqueva ir para a frente.

Á última objecção tinha sido colocada pelo Sr. Primeiro-Ministro, quando o Sr. Presidente da República foi a Beja, dizendo que Alqueva só se faria depois de resolvida a estrutura fundiária. Bom, temos já a nova Lei da Reforma Agrária e a verdade é que no PIDDAC ele aparece, de novo, com 50 000 contos, o que na prática só permite prosseguir alguns intermináveis estudos, que não têm sido mais do que um travão e um pretexto para que o projecto não avance.

Sendo certo também que o empreendimento para fins múltiplos do aproveitamento do rio Guadiana pode, inclusivamente, ser algo de financiamento comunitário através dos PNICs ou de outros programas —o Sr. Ministro dirá!—, a questão que se coloca é a seguinte: por que é que o empreendimento não avança, sabendo-se que ele é decisivo para o desenvolvimento da região, com efeitos directos e indirectos não só na questão agrícola mas também na indústria, no abastecimento de água às populações, no turismo, etc?

Trata-se de uma questão vital para uma região, que tem como perspectiva um processo de desertificação e

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de despovoamento, que tem de ser travado, e Alqueva é um elemento fundamental para a sua travagem e para a inversão dessas tendências.

Colocamos esta questão até porque o nosso grupo parlamentar tem intenção de apresentar uma proposta em tal sentido.

Gostaria ainda de fazer duas perguntas mais globais, que não dizem respeito ao Sr. Secretário de Estado, mas ao Sr. Ministro, e pergunto ao Sr. Presidente, uma vez que estou no uso da palavra, se as posso fazer agora ou depois, quanto voltar a intervir. Isto é: as perguntas são para o Sr. Ministro e não para o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, as perguntas têm a ver com matéria do ambiente?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Não, não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Então, se não se importasse, fá--las-ia depois, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Srs. Deputados: Todos nós sabemos que um processo de rápida modernização económica tem sempre consequências sobre os homens, tendendo à marginalização de alguns, e sobre a natureza que, naturalmente, tende a ser degradada. Logo, uma política de ambiente deve acompanhar — todos o sabemos — qualquer projecto de rápida e intensa modernização económica e as verbas devem ser sempre escassas para o responsável da política do ambiente.

Surpreendeu-me, por isso, o facto de o Sr. Secretário de Estado considerar as verbas da sua Secretaria de Estado como suficientes ou como razoáveis. Eu considero-as absolutamente insuficientes e mais que medíocres; o seu crescimento tem sido tão lento e tão pouco sensível que, até por esse lado, elas são criticáveis!

Mas não era, evidentemente, sobre esse tema que eu queria fazer duas ou três perguntas.

A primeira pergunta que faço ao Sr. Secretário de Estado é a seguinte: quais os dispositivos técnicos que estão a ser financiados pela Secretaria de Estado para dar algum sentido ao Regulamento Geral do Ruído?

E isto porque, tendo o mesmo entrado em vigor no princípio do ano, até à data não se sentiu qualquer influência desse regulamento sobre a produção do ruído em Portugal. Creio até que, em consequência da sua vigência, não baixou sequer um decibel de ruído.

Segundo tenho lido nos jornais, os sistemas técnicos são insuficientes, os responsáveis queixam-se de não ter aparelhagem adequada para medir o ruído, contrariando a sua produção, que, em Portugal, é verdadeiramente insuportável. As motorizadas continuam a fazer o mesmo barulho e as máquinas industriais continuam a produzir a mesma agressão sonora, não se notando qualquer diminuição.

Ora, uma política de ambiente, para além de alguma tradução orçamental, deve ter como preocupação pelo menos fazer aplicar as leis para que elas não se desacreditem completamente perante os cidadãos.

Falaram também, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado, na protecção da paisagem e na defesa da

natureza. Estou de acordo e felicito o Sr. Secretário de Estado por ter tido a coragem de combater a construção clandestina na orla marítima e até de ordenar a sua demolição a caterpillar e por outras formas igualmente violentas. Houve quem, em nome dos pobres que habitaram as casas demolidas, se opusesse a isso. Porém, eu nunca alinhei nessa «lamechice» nacional e considero que o Sr. Secretário de Estado fez muito bem e que deve prosseguir.

A segunda questão que desejava colocar é sobre este tema, pois há certas zonas do País, certos trechos da orla marítima, que estão a ser «clandestinizados» legalmente — passe o paradoxo — e apresento aqui como exemplo um dos mais vivos, os 4 km que ficam entre a Póvoa, passando por A Ver-o-Mar, até à pousada de Santo André. São quilómetros de praia magnífica, areais ainda hoje extensos, onde se pode correr e contemplar o mar. Simplesmente, uma espantosa e estranha lei do domínio público marítimo, permitiu a uns senhores reivindicar a posse em termos de propriedade sobre esses areais e sobre essas, posse que nunca comprovaram, visto que não davam nenhuma utilização a esses terrenos e, com base nisso, está hoje a ser urbanizada toda essa linha costeira, legalmente e com apoio, pelos vistos, da Câmara da Póvoa de Varzim.

É melhor prevenir que remediar, porque, depois, se forem construídos, o Sr. Secretário de Estado não pode destruir a caterpillar estes «clandestinos legais». Talvez só o mar, que fica tão perto, será capaz de fazer esssa obra pelo Sr. Secretário de Estado!

O que pensa fazer a Secretaria de Estado do Ambiente e o Sr. Ministro — que, tal como eu, é um potencial usufrutuário desses areais, já que por ali vivemos — para combater esse atentado estético, paisagístico, brutal, inqualificável, que ali se está a levar a efeito, com corrupção pelo meio — dinheiros a circular, o que não se pode provar mas é quase evidente?

Lamento não ter lido os documentos sistematicamente, estou a lê-los em diagonal, mas eles dizem a certa altura: «[...] há que implementar e gerir a reserva ecológica nacional» — e há muito tempo que se fala nisso —, «reformular o processo de gestão de solos de alta qualidade da reserva agrícola nacional [...]» Considero que estas são as medidas de carácter preventivo fundamentais, isto é, fazer aplicar a lei sobre a reserva ecológica nacional e a lei sobre a reserva agrícola nacional.

Neste sentido, pergunta-se o que é o Ministério e a Secretaria de Estado do Ambiente preparam nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr. Presidente, de facto, poucas questões tenho a colocar, pois, praticamente, os problemas que queria levantar já o foram. Porém, a questão de fundo que desejo apresentar prende-se com a forma como o PIDDAC vem apresentado na proposta de lei para 1989. É que, com efeito, temos dificuldade em precisar se certos projectos vão ser levados a cabo em 1989 porque, infelizmente, usou-se e abusou-se das obras a desagregar, quer sejam obras em curso quer sejam obras novas.

Portanto, muitas das questões que os Srs. Deputados vão aqui colocar, porventura não seriam colocadas se,

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de facto, esse procedimento não tivesse sido" adoptado pelo Governo ou, então, se tivesse prestado os esclarecimentos que foram solicitados praticamente em todas as comissões aquando da discussão na generalidade.

Uma das questões que desejava colocar prende-se com o vale do Tejo e é, de certo modo, complicada. Na verdade, tem-se feito, infelizmente, muito poucas obras de manutenção, designadamente no que concerne à limpeza das valas; os diques, como o Sr. Secretário de Estado sabe, muitos deles estão em estado deplorável, praticamente não se tem feito nada nos diques, o que nos permite pensar o que poderá acontecer no Ribatejo em caso de se registar um cheia. Felizmente que não temos tido cheias nos últimos anos.'

Quer isto dizer que o problema do Ribatejo não se resolve enquanto se não pensar a sério na regularização do vale do Tejo e num programa integrado para aquela zona. E o que, ano após ano, se tem vindo a verificar é que, de facto, quase se não fala nisto. Porém, agora, na proposta do Orçamento do Estado para 1989, aparece uma referência a uma operação integrada de desenvolvimento para o Ribatejo, onde, embora em números mais baixos do que para o Instituto Nacional do Ambiente, aparece uma verba de 4000 contos, se a memória me não atraiçoou.

Ora bem, desenvolvimento regional do Ribatejo para quando? Regularização do vale do Tejo para quando? Gostaria de obter resposta a estas questões.

Uma outra questão que, muito rapidamente, vou colocar prende-se com o Institutio Nacional do Ambiente, ignorando se o mesmo se encontra ainda na fase de instalação. Com efeito, o conselho directivo diz que não, que já passou a fase da instalação. No entanto, na altura em que o Sr. Ministro do Plano esteve na Comissão disse que não, que ainda estava na fase de instalação. Porém, o que é um facto é que na reunião que tivemos com o conselho directivo, do qual fazem parte membros dos diversos partidos políticos eleitos pela Assembleia da República, ouvimos um desses representantes da Assembleia da República — curiosa-mento até do PSD — fazer a seguinte afirmação: «[...] que era uma autêntica frustração estar no Instituto Nacional do Ambiente sem saber para fazer o quê, pois as verbas são tão ridículas que, se calhar, era preferível mantê-lo em instalação mais não sei quanto tempo.»

Julga o Sr. Secretário de Estado que o Instituto Nacional do Ambiente, nos termos em que foi criado, pode funcionar com um orçamento deste tipo?

Eram estas as questões que desejava apresentar.

O Sr. Presidente: —Se-o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado permitissem, o Sr. Deputado Gilberto Madail gostaria de colocar uma questão.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gilberto Madail (PSD): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: As minhas desculpas por ter chegado um bocado atrasado.

Muito rapidamente e em primeiro lugar, desejava congratular-me com o inicio das obras — chamemos--lhe assim — de defesa da pateira de Fermentelos. Penso que era, de facto, uma situação que já se vinha impondo há bastante tempo e vejo, com muito agrado, a sua contemplação no Orçamento.

Desejava aproveitar a ocasião para perguntar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, muito rapidamente também, se, relativamente à barrinha de Esmoriz, estará prevista alguma coisa, ainda que não tenha início no imediato.

Por último, obviamente que tenho de falar no problema da ria de Aveiro, pois também não vejo nada expresso sobre o assunto.

Por outro lado, queria também congratular-me pela existência — e já tínhamos falado sobre isso — nos PIDDACs de obras de protecção à costa, desde Espinho até Ílhavo, que são fundamentais àquela zona. Porém, não vejo nada referente àquela zona que vai de Vagos até ao limite do distrito. Ignoro, por isso, se esta zona estará contemplada em termos do PIDDAC para Mira. Com efeito, de Vagos para o Sul trata-se de uma zona agrícola — como já tive oportunidade de dizer ao Sr. Ministro — e as águas estão a penetrar e a salini-zar os campos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Planeamento e Administração do Território: — Vou dar uma resposta global e o Sr. Secretário de Estado depois virá naturalmente a pormenorizar muitas das coisas.

Sr." Deputada Maria Santos, evidentemente que temos a consciência de que o processo de industrialização tardia do País nos faz estar numa posição privilegiada para vir a não cometer os erros que outros cometeram.

Estamos interessados em fazê-lo e devo dizer que, no quadro das reuniões do Conselho de Ministros do Ambiente em que tanto o Sr. Secretário de Estado como eu próprio temos participado, se generalizou a impressão de que somos um país com consciência ambientalista, participando em todas as medidas. Algumas vezes o antagonismo que, efectivamente, existe entre a necessidade de industrializar «a qualquer custo» e a necessidade de industrializar de uma maneira moderna e sem poluição tem sido observado entre nós, tomando a segunda posição, e sempre dissemos — e temo-lo feito — que aquilo que neste momento está instalado como indústrias poluidoras tem de ser reconvertido, tendo em atenção o nosso caso particular, e aquilo que se instalar de novo tem de ser exigente no aspecto de respeitar as normas comunitárias que se vão afeiçoando aqui e acolá.

Passando ao ponto seguinte, que é comum a muitos dos Srs. Deputados que intervieram, é evidente que o Secretário de Estado não viu atribuídas todas as verbas de que gostaria — tanto ele como o Ministro têm capacidade e imaginação para gastar isto e muito mais —, pois, como sempre acontece, um orçamento é um resultado de uma agregação de solicitações, de um agregado devidamente distribuído de muitas procuras e de muitas formas de vir a realizar aquilo que um orçamento e um plano procura fazer, o que, ao fim e ao cabo, se traduz numa maneira de contribuir para o desenvolvimento do País, dando satisfação e contribuindo também para o bem-estar dos cidadãos. Ora, tudo isto nos leva a ter de nos acomodar com um corte geral resultante de uma compactação das verbas, de acordo com o tecto geral, sobre o que não vale a pena falar agora, porquanto, tanto nas nossas reuniões anteriores como no debate na generalidade, já foi de-

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vidamente esclarecida a preocupação dos equilibrios macroeconómicos gerais que nos impedem, efectivamente, de vir a generalizar os gastos, especialmente a despesa pública.

Quanto à planificação e coordenação, efectivamente, Sr.a Deputada, temos a coordenação como preocupação maior e a planificação como actividade permanente. Até agora não dei por que tivessem havido desmandos ou descarrilamentos que nos colocassem em posição desconfortável do ponto de vista de uma inflexão completa relativamente àquilo que foi previsto. Bem pelo contrário! Temos acompanhado e temos visto que cada vez mais as funções da nossa direcção-geral de acompanhamento e avaliação estão a ser reforçadas. Há, efectivamente, necessidade de esse acompanhamento ser feito em condições muito rigorosas e, como disse, não tenho notado a existência de indicadores alarmantes, como V. Ex.a teve ocasião de sublinhar; pelo contrário, o que tenho visto é, cada vez mais, uma gestão muito rigorosa e um acompanhamento sistemático da situação.

Quase todos os Srs. Deputados que intervieram se referiram ao Instituto Nacional do Ambiente. Tenho a dizer-lhes que se trata de uma instituição nascente, que já viu a sua lei orgânica aprovada, que viu já as suas instalações compradas, as quais estão presentemente em obras.

Eu próprio tive ocasião de, há uma semana, visitar essas instalações, com o Sr. Secretário de Estado, e verifiquei que vão ficar mais que dignamente instalados quando, efectivamente, for possível reabilitar o edifício.

Suponho ter sido um excesso de zelo que levou o conselho directivo a vir dizer «estamos cheios de ambição, estamos com o coração cheio de vontade e o espírito cheio de ideias para mudar a paisagem em Portugal no que respeita ao ambiente e queríamos mais dinheiro», pois não vejo a verba como irrealista nem vejo qualquer espécie de intenção de cercear a actividade deste Instituto, e até seria ridículo pensar que há subjacente uma intenção desse género quando comprámos para o Instituto as mais adequadas — ia dizer quase luxuosas — instalações, apesar de necessitarem de reabilitação. Vamos contribuir para a reabilitação de uma construção interessante de Lisboa, pertencente a uma época que é preciso preservar, e só atribuo essa insatisfação à necessidade que o conselho directivo teve de dizer «nós somos capazes de fazer mais».

Não podem VV. Ex.35 tirar nenhuma outra conclusão das verbas presentes porque foram dados todos os passos para a efectivação do Instituto, como por exemplo o da aprovação da lei orgânica — que custa pouco dinheiro, se quiserem —, que foi definida em termos muito correctos, na medida em que tudo o que for possível ser transferido «com a mochila às costas» daquilo que virá a ser o seu orçamento pessoal poderá ser transferido. Portanto, vamos dar sequência ao Instituto, naturalmente, não com a abundância que um órgão nascente, cheio de ambições, poderia crer, mas eu não sei de nenhum órgão nascente que disponha de todo o dinheiro necessário para satisfazer todas as suas ambições.

Assim, peço-lhes para não darem essa interpretação aos factos — que, aliás, não chegaram a formular especificamente —, pois, afirmo-o solenemente, não há nenhuma intenção de cercear a actividade do Instituto Nacional do Ambiente; demos-lhe as verbas necessá-

rias, tendo em conta que é um órgão que está na fase de arranque, dotámo-lo com uma lei orgânica eficaz, arranjámos as mais confortáveis instalações e, portanto, o Instituto não tem de que se queixar. No que respeita às defesas contra as cheias, a

Sr.a Deputada sabe quanto isso nos preocupou já no X Governo e quantas coisas tentámos fazer dentro de um plano que foi traçado. O plano está a ser cumprido e eu próprio terei ocasião, ainda este ano, de visitar uma zona na parte norte de Lisboa e no princípio do ano que vem na parte poente de Lisboa.

Os trabalhos prosseguiram, suponho que foram feitas muitas coisas relevantes, mas há aqui um aspecto que temos que articular e para o qual tive ocasião de chamar a atenção, há cerca de oito dias, na abertura de um seminário que teve lugar em Lisboa relativo à disciplina de utilização dos leitos de cheias com construções e uma outra disciplina — que não existe —, que é a da condução e reposição de lixo nas próprias ribeiras.

Se aparece um acidente qualquer causado por uma chuvada maior do que aquelas que são habituais, e desde que as ribeiras estejam sujas, é evidente que qualquer obstáculo — e se elas estivessem limpas isso não constituiria obstáculo, ou melhor, ele seria rapidamente colmatado —, logo de seguida, provoca a situação que todos conhecemos.

Devo dizer que esta área não é fácil, porque é necessária disciplina e nós somos avessos às actuações muito constantes. Mas, de qualquer das formas, já foi gasto muito dinheiro nas zonas mais vulneráveis a chuvas torrenciais que não têm por trás de si reservas grandes como a que significa a barragem da Aguieira, que' pode alojar no seu bojo muitas pontas de cheias e estas podem, naturalmente, vir a proteger tudo quanto está a jusante.

O Sr. Secretário de Estado certamente fará algum comentário relativamente às questões dos programas de reabilitação e dos aspectos que estão directamente ligados aos números; no entanto, gostava de voltar a um tema já referido.

É evidente, Sr.a Deputada Ilda Figueiredo, que o ambiente não tem só a ver com os recursos hídricos mas também com muitos outros aspectos. Estas reuniões não permitem ir até ao fundo das questões em vários domínios mas a verdade é que, no que respeita à malha da detecção da poluição atmosférica, estamos com resultados positivos e a acompanhar de perto tudo aquilo que se está a passar. No entanto, há duas ou três zonas que nos dão mais cuidados, como seja Estarreja e Barreiro-Seixal, e foi por isso que já se fez um exercício em Estarreja, que foi concludente, evidenciando muitos aspectos negativos, de tal forma que vamos repetir brevemente o mesmo tipo de exercícios.

A Sr.8 Deputada referiu-se às bacias do Vouga, do Ave e do Douro e à necessidade de despoluição desta última. Devo dizer-lhe — e o Sr. Secretário de Estado referirá muitas coisas acerca desta matéria — que a bacia do Douro é uma das menos poluídas. A área metropolitana do Porto tem, felizmente, beneficiado, por uma acção em que o Governo teve a maior das determinações, da captação de novas fontes, no próprio rio Douro, de aluviões que interessam explorar do ponto de vista técnico, e no próximo sábado vai ser posta ao serviço a conduta de Lever-Jovim. Portanto, suponho que muita coisa se está a fazer.

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A Sr.a Deputada falou também da ET AR de Coimbra e, quanto a este assunto, devo dizer-lhe, com muita

satisfação, que os serviços comunitários já nos referiram, tendo por base o que se passou no Comité de Política Regional que reuniu neste mês de Novembro, que a ET AR de Coimbra já está incluída na próxima fatia de contribuições para Portugal através do FEDER.

Sn. Deputado Lino de Carvallho, o Alqueva e o aproveitamento do rio Guadiana é para nós muito importante e gostaríamos, porque se trata de montantes elevados, de avançar com este projecto com a convicção da sua relevância. Não temos nenhuma reserva mental contra o Alqueva, antes pelo contrário, só que eu próprio, já no Governo anterior, vi descer a valia eléctrica do Alqueva de 60 % para 39 %. Entretanto, a solução das três abóbadas passou para uma solução de uma só abóbada e em vez dos seis grupos já temos só três, de maneira que estamos a acompanhar todo este processo, e o facto de se fazerem mais estudos significa que estamos, por via de investimento de matéria cinzenta, a tratar de salvar ou de poupar algum investimento de dinheiro que não temos.

Se tivéssemos a certeza de que os restantes 40 % ou 60 %, conforme a variação — que agora é capaz de se situar em 50 % —, seriam completamente aproveitados a jusante (e este é o ponto fundamental de todas as nossas dúvidas), se tivéssemos a certeza de que aí não havia dúvidas, então trataríamos de avançar com mais determinação. Pessoalmente, gostaria de avançar com mais determinação, porque também estou convencido de que está ali um recurso que nós podemos, de-,vemos e temos que aproveitar; simplesmente, em face de muitos maus aproveitamentos na ligação da mobilização do recurso e da sua utilização, temos que rodear esse aproveitamento de cautelas e é isso que temos vindo a fazer.

Sr. Deputado Carlos Lage, também nós estamos insatisfeitos com a maneira como tem sido aplicada a Lei do Ruído, de tal forma que já está em circulação um decreto-lei que torna muito mais simples a sua aplicação. A lei é muito perfeita e muito adequada, do ponto de vista da sua contrução, mas temos que institucionalizar mecanismos simples, porque, tal como o Sr. Deputado referiu, desta forma não se vai lá. Não temos sondmetros suficientes para medir os decibéis e não temos gente suficientemente adequada para o fazer; portanto, temos que utilizar processos expeditos para dizer «aqui pára a música, os altifalantes, os berros, ou o que quer que seja que esteja a agredir o cidadão, e pára a horas».

Portanto, é isto que se irá fazer, porque não temos a possibilidade de aplicar a lei tal como gostaríamos e então temos que substituir processos de medida científicos e técnicos, muito rigorosos, por processos administrativos mais simples mas que, se calhar, nesta época e sem a possibilidade de investir muito nesse domínio, é a única forma de fazer cumprir os nossos propósitos.

Sr. Deputado Gameiro dos Santos, tenho muita satisfação em dizer-lhe que o estudo da Organização Internacional para o Desenvolvimento (OID) para o vale do Tejo foi aprovado na semana passada em Bruxelas. Pottanto, as verbas «ridículas» a que se refere são-no se pensar na implementação do grande esquema de protecção dos diques, etc, mas devo esclarecê-lo

— e isso foi também uma preocupação minha já no X Governo — que os diques cuja ruína era iminente

foram reconstruídos.

O Sr. Deputado que conhece bem a área sabe que isso é verdade; basta ir a Vila Franca de Xira, onde havia uma zona em relação à qual se dizia que se houvesse uma cheia aquilo seria uma coisa horrorosa, em termos de estragos e malefícios. Ora, as verbas para essa protecção foram orientadas a tempo, a obra foi bem feita e conseguiu-se desta forma a protecção em termos convenientes.

Estamos a conciliar aquilo que é muito urgente com as medidas de longo prazo e o Sr. Deputado sabe bem qual é a adesão que os autarcas de toda a zona manifestaram relativamente ao projecto. Tal como tenho referido, muitas vezes, só avanço quando tenho a expressão dessa adesão e isto foi determinante para, em Bruxelas, apresentarmos e nos empenharmos na defesa deste projecto. Portanto, é com agrado que recebemos a noticia de que isto foi aprovado.

Penso que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente poderá dar mais alguns esclarecimentos sobre estas matérias.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Macário Correia): — Srs. Deputados, tenho um compromisso na Sociedade de Geografia de Lisboa, onde, segundo me informaram agora pelo telefone, tenho dezenas de pessoas à minha espera. Não obstante esta reunião ter sito marcada para as 17 horas e os membros do Governo estarem presentes, a reunião só começou alguns momentos depois, por razões que não são imputáveis ao nosso atraso. Tenho nove Srs. Deputados que me colocaram 39 questões e estou 30 minutos atrasado em relação à hora a que deveria estar presente na referida reunião.

Penso que o Sr. Ministro fez uma boa síntese, respondendo de uma forma muito clara à maior parte da questões que lhe foram colocadas, sendo a maior parte delas articuláveis.

Porém, de uma forma muito rápida e em relação às preocupações que alguns Srs. Deputados manifestaram quanto ao Instituto Nacional do Ambiente, direi ainda que, do conjunto de serviços que dependem da Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, este Instituto tem um crescimento que é da ordem dos 37 °7o e é o maior de todos, portanto acima de qualquer dos serviços desta Secretaria de Estado, que tem um plafond global igual ao do ano anterior. Assim, é perfeitamente injusta e infundada a observação que aqui foi feita por vários Srs. Deputados.

Relativamente à reabilitação das infra-estruturas de saneamento básico, devo dizer-lhe que isso está previsto que se faça ao longo dos próximos anos, porque há, neste momento, cerca de 100 ETARs que não funcionam por razões várias de deficiência de projecto, por falta de pessoal e de peças e são cerca de 10 milhões de contos que estão empatados sem rentabilização, os quais, naturalmente, queremos recuperar em articulação com as autarquias.

Para a ria de Aveiro criou-se um gabinete especial que está a trabalhar, e bem, e com o qual tive ocasião de há poucos dias ter uma reunião onde também estiveram presentes as autarquias, os empresários e demais entidades da Administração que têm que ver com a ria de Aveiro. O problema da ria resolve-se não com um

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investimento público grande mas com iniciativa e investimento que tem que pertencer às autarquias e às empresas. Se em Aveiro há tanto dinamismo económico e se se criam tantas empresas para poluir, por que razão não se criam empresas para despoluir e por que razão não investem as empresas desta região na despoluição?

Já comecei a tomar as medidas adequadas ao aplicar algumas multas que já publicitei e outras estão na calha, pois penso que esta é a solução, e não a utilização do dinheiro dos contribuintes, que serve, certamente, para outras coisas.

Quanto à preocupação manifestada pela Sr.a Deputada em relação ao Programa VALOREN, devo dizer--lhe que o Governo tem nesta matéria uma articulação exemplar e que as acções do VALOREN são acções de desenvolvimento regional na interface da energia com o meio ambiente (com fins múltiplos), com a agricultura, com as autarquias envolvidas nesse processo, com as escolas e com as mais variadas entidades. A reflexi-bilidade orçamental permite que assim seja e é exemplar o que se está a fazer com o Programa VALOREN.

A Sr." Deputada Ilda Figueiredo referiu que o rio Douro estava poluído. De facto, fiquei preocupadíssima com aquilo que disse, porque não tenho qualquer notícia de poluição neste rio.

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr.8 Deputada.

A Sr.8 Dda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, foram feitas uma série de análises na zona do Grande Porto ...

O Orador: — Ah, já sei!

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — O senhor sabe que é aí que o problema se coloca. Hoje há problemas muito sérios de poluição, nomeadamente na zona de Gaia, do Porto e de Gondomar. Essas análises existem e o senhor conhece-as ...

O Orador: — Sim, conheço-as, mas quando me fala da bacia do Douro fico preocupado, porque abrange desde Barca de Alva até ao Porto.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Pois, mas é aí que vive cerca de 1 milhão de pessoas, como o Sr. Secretário de Estado sabe.

O Orador: — E vive muito mais do que 1 milhão na outra área!

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Não, não vive. A maior parte da população está concentrada na zona do Grande Porto, onde há poluição do rio Douro.

O Orador: — Relativamente às outras questões que foram colocadas, penso que elas já foram respondidas pelo Sr. Ministro. No entanto, quero acrescentar que a extinção do GAS vai ser um facto dentro de poucos dias, tal como o Sr. Deputado terá ocasião de ver na legislação. Aliás, se tivesse tido ocasião de ter conver-

sado nos últimos dias com os presidentes das Câmaras Municipais de Sines ou de Santiago do Cacém ...

Uma voz do PCP: — Tive, tive!

O Orador: — Então, não lhe disseram a verdade! Em relação a esse assunto estou descansado, pois no projecto de diploma, que é do conhecimento dos autarcas, está contemplado o mecanismo financeiro adequado para concluir as obras que estão em curso e, portanto, não é necessário que as verbas apareçam de novo no PIDDAC, pois isso seria incorrecto.

Penso que algumas das outras questões têm a ver com áreas de interface com o ordenamento do território a que o meu colega se referirá, nomeadamente no que toca às questões do litoral, aos solos e outras. De resto, as preocupações pontuais que o Sr. Deputado Gilberto Madail levantou estão, de algum modo, esclarecidas.

Peço muita desculpa aos Srs. Deputados pela brevidade da resposta, agradeço imenso as questões colocadas, que provam o vosso interesse e o vosso empenhamento pelas questões do ambiente, estou à vossa disposição para, em qualquer momento, responder a questões complementares que me queiram colocar, mas, de momento e pelas razões que já expliquei, se me derem licença, ausentar-me-ei.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos continuar os nossos trabalhos e propunha que se abrisse o âmbito do debate, se o Sr. Ministro não visse qualquer inconveniente.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, como já foi feita a apresentação geral da proposta, se os Srs. Deputados quiserem fazer perguntas, peço-lhes que comecem pela Secretaria de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território ou pela Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia, uma vez que a Sr.8 Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional teve que se ausentar por uns momentos. Penso, pois, que poderemos organizar os trabalhos desta forma.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): — Sr. Ministro, ainda está na memória de toda a gente os recentes temporais que atingiram o Barlavento Algarvio. Houve prejuízos muito elevados em vias de comunicação, pontes e pontões, houve casas que ruíram, estabelecimentos comerciais inundados com graves prejuízos, barcos de pesca destruídos, ... enfim, não vale a pena alongar-me muito, porque os factos são conhecidos.

Para uma primeira solução do problema as câmaras municipais mobilizaram os poucos recursos de que dispunham e acorreram como puderam a esta situação, mas o que é facto é que a solução definitiva destes graves prejuízos não está no âmbito da capacidade financeira das câmaras municipais dos concelhos atingidos. Por esta razão, venho anunciar que acabei de entregar uma proposta que visa a transferência de uma verba de 500 000 contos para as respectivas autarquias locais com vista a fazer face a estes graves prejuízos.

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Poder-se-á perguntar porquê 500 000 contos. Como estive no local tenho informação do que se passou; de qualquer modo, julgo que os prejuízos irão muito além desta verba e, portanto, ela seria apenas um primeiro sinal e um primeiro arranque para a solução destas questões.

Certamente que V. Ex.a tem informações sobre o que se passou e portanto gostaria de saber qual a sua posição relativamente a esta questão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Fazemos nossas as preocupações do Sr. Deputado que acabou de intervir em relação aos prejuízos causados pelos temporais no Algarve e gostaríamos também de ter uma informação do Governo sobre o que pensa fazer em relação a esta matéria.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Isso não é Orçamento nem PIDDAC, é uma questão geral!

O Orador: — Exacto!

Para além disso, gostaria de colocar duas questões de fundo que são as seguintes: primeiro, em relação ...

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Apesar de não ser PIDDAC nem Orçamento, pode transformar-se em PIDDAC e Orçamento! Mas é uma questão de conjuntura ...

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — É a situação actual que se vive!

O Orador: — Bom, mas a primeira questão que lhe quero colocar tem a ver com os critérios que se estão a seguir para a elaboração de programas ou operações integradas de desenvolvimento a apresentar à Comunidade para efeitos de financiamento.

Não partilho da ideia de que é preciso ou de que se vai polvilhar o País de operações integradas de desenvolvimento, mas há critérios que para mim são obscuros e, portanto, gostaria de os ver mais clarificados, nomeadamente os que dizem relação ao Alentejo, zona que conheço directamente.

Há vários planos e operações integradas de desenvolvimento, alguns dos quais já foram financiados, outros estão em curso, outros ainda estão em estudo. Estas operações são sectorizadas, parceladas: uma, para a zona crítica; outra — de que entretanto nunca mais se ouviu falar e que estaria ligada ao Alqueva —, de intensificação rural; outra, para o Norte Alentejano e outra, ainda, para a costa litoral ...

A primeira questão concreta que lhe quero colocar é a seguinte: quais os critérios que estão a ser seguidos? Por que razão é que, avançando com estes programas sectoriais e parcelares, se deixa no centro uma área bastante ampla sem qualquer projecto de desenvolvimento integrado, como é o caso do distrito-de Évora? Isto é, o que se verifica da estratégia que se infere das diversas operações integradas — e se não é isto o Sr. Ministro certamente me esclarecerá — é que se está a dividir a região em fatias diversas, esvaziando

um pouco um distrito que é nuclear. Será que isto tem alguma coisa a ver com futuras concepções de regionalização?

A questão que se coloca é esta: por que razão é que em relação ao distrito que, em muitos aspectos, é central como dinamizador da região não está previsto nenhum programa integrado de desenvolvimento, tal como tivemos conhecimento através de reuniões havidas com a Comissão de Coordenação da Região do Alentejo que, aliás, também tem algumas preocupações em relação a esta matéria?

A outra questão que lhe quero colocar tem a ver com o problema dos centros históricos, nomeadamente com a conservação e preservação do Centro Histórico de Évora, que, como sabemos, foi recentemente declarado património mundial da UNESCO. A Câmara Municipal do respectivo concelho tem vindo a insistir junto do Ministério nalgumas acções de recuperação e, concretamente no quadro do programa de reabilitação urbana, existe um projecto de recuperação de, salvo erro, seis quarteirões em pleno centro histórico abrangendo 533 alojamentos e cerca de 1800 pessoas.

Depois de este projecto ter sido apresentado com programas concretos, segundo informação que tenho através da Direcção-Geral do Ordenamento do Território, teria sido dito que havia algumas verbas disponíveis, mas a verdade é que até hoje nada se sabe e não há qualquer resposta.

Tendo em conta que alguns centros históricos que não estão inscritos como património mundial têm vindo a ser financiados para obras de recuperação, por que razão é que não há resposta a projectos concretos, como, neste caso, o da reabilitação urbana, que são apresentados pela Câmara Municipal de Évora?

Estas são as questões globais que gostaria de colocar ao Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr. Ministro, queria colocar-lhe algumas questões relacionadas com o problema autárquico.

Verificámos que na proposta do Orçamento do Estado para 1989 o Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF) não está bem calculdao. O Sr. Ministro deve recordar--se deste aspecto, pois já colocámos esta questão aquando da discussão desta proposta de lei na generalidade.

Gostaria, pois, de saber se, de facto, o Governo vai ou não corrigir estas verbas, ou seja, se vai inscrever no Orçamento do Estado para 1989, não os 106 milhões de contos, mas sim os 107,6 milhões de contos.

A outra questão que quero colocar ao Sr. Ministro, e ainda relacionada com o Fundo de Equilíbrio Financeiro, é a de que me parece — embora admita que aquilo que vou dizer possa não ser muito certo — que na distribuição do FEF se vislumbram alterações significativas entre a distribuição dos diversos concelhos, ou seja, o crescimento que se verifica de um ano para o outro é muito díspar. Será que houve alterações tão grandes na aplicação da lei que permitam isto?

Analisei dois ou três casos e, portanto, parece-me —com o conhecimento que tenho da realidade— que as alterações não foram tão grandes como é, por exemplo, o caso do concelho de Constança, em que aumen-

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tou cerca de 30 %, quando aparentemente não me parece que a simples aplicação dos critérios o justificasse.

Gostaria ainda de perguntar ao Sr. Ministro se vamos continuar durante o ano de 1989 a não respeitar a Lei das Finanças Locais, isto porque esta Lei estipula no seu articulado que o Governo é obrigado a compensar as autarquias pela perda de receitas que lhe advêm do Orçamento do Estado. Ora, como todos sabemos, isso não aconteceu em 1988, nomeadamente em relação ao imposto para o serviço de incêndios, ou seja, foram retiradas às autarquias receitas municipais que, tal como se prevê na lei, não foram compensadas. Pensamos que em 1989 a situação se mantém, pois, tanto quanto me parece, não surge no Orçamento do Estado qualquer compensação. E referi-me a esta questão, já para não falar na célebre taxa devida pela primeira venda do pescado que já vem de há dois anos. De facto, o Governo continua a não cumprir a Lei das Finanças Locais e as autarquias vêem retirados aos seus orçamentos estas receitas, que têm algum significado.

Em 1988 as remunerações dos funcionários da Administração Local bem como as de todos os funcionários públicos foram corrigidas com o peso do imposto profissional, cujo valor não foi transferido directamente para as autarquias, ou seja, não foi incluído no valor do FEF, pelo que, tanto quanto sei, foi uma mera operação contabilística.

Com efeito, não se fez esta correcção em termos de FEF, ou seja, não se determinou, em 1988, o FEF corrigido de forma que, em 1989, não se verificasse a erosão que a aplicação do imposto profissional teve no aumento das remunerações. Na prática, em 1989 as autarquias vão ver reduzidas as suas verbas, não pela tributação em imposto profissional mas sim pela tributação em IRS. Gostaria, pois, de saber por que razão é que este critério foi adoptado.

Tal como vimos na discussão na generalidade, surgiram outros encargos, novas quotizações, o que, de facto, faz reduzir o crescimento das verbas do FEF para 1989, mas uma questão muito importante e que preocupa as autarquias tem a ver com a transferência de novas competências, designadamente a gestão do pessoal do ensino pré-primário, primário e preparatório TV.

Como é do conhecimento geral, muitos dos quadros de pessoal têm ainda muitos lugares para preencher pois, em muitos casos, tem-se recorrido aos tarefeiros, que não têm vínculo, e, portanto, os lugares do quadro continuam por preencher. Pensamos que as transferências das verbas inscritas no orçamento do Ministério da Educação para as autarquias podem, de facto, ser insuficientes, à semelhança do que aconteceu há tempos atrás com a transferência das competências relativas aos transportes escolares.

Portanto, gostaria de saber se neste domínio o Governo prevê que estas transferências sejam analisadas caso a caso por via da celebração de acordos entre cada uma das autarquias e o Governo por forma que as autarquias não sejam financeiramente penalizadas por esta transferência de competências.

Está previsto no Orçamento do Estado para 1989 uma verba de 250 000 contos para o cumprimento do n.° 2 do artigo 13.° da Lei das Finanças Locais (situações de calamidade). Ora, como é sabido, a grande

maioria das autarquias locais não dispõe de planos directores municipais e, se a memória não me atraiçoa, vão ter que os aprontar até 1992.

Como está também prevista a comparticipação da administração central no financimanto dos encargos com a elaboração destes planos directores, gostaria de saber se a verba de 250 000 contos será suficiente para apoiar estas iniciativas para além de outras que a própria lei configura.

Para já, Sr. Ministro, estas são as questões que gostaria de lhe colocar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr." nda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, gostaria de começar pelo capítulo v do Orçamento do Estado para 1989 referente à Lei das Finanças Locais, repetindo, naturalmente, algumas das questões que já aqui foram colocadas.

De qualquer modo, pode ter havido, entretanto, alguma evolução por parte do Ministério face às questões que têm vindo a ser levantadas não só na Assembleia mas também pelas autarquias locais e, eventualmente, o Sr. Ministro pode ter novas respostas a dar, o que seria certamente positivo.

Começando pelo artigo 45.°, referente ao Fundo de Equilíbrio Financeiro, mesmo não tendo em conta o problema do IVA e das receitas — e dado que essa questão irá ser discutida em Plenário — e, portanto, só com base no que está aqui, gostaria que o Sr. Ministro me dissesse se já fez as contas da aplicação da fórmula da Lei das Finanças Locais. E gostaria também de saber quanto é que lhe dá a aplicação directa da fórmula, feitas as contas.

Quanto ao artigo 46.°, relativo à regularização das dívidas dos municípios à EDP, como sabe, Sr. Ministro, o problema tem vindo a ser posto em causa pelas autarquias que conhecem os montantes que aparecem aqui no relatório indicados como dívidas. Julgo que este era um aspecto que o Sr. Ministro poderia ter alterado no relatório do orçamanto. Como V. Ex." bem sabe, há casos em que os montantes não estão clarificados porque ainda estão em fase de negociação. É o caso de Vila Nova de Gaia, para não falar de outros que o Sr. Ministro bem conhece. Mas para quê insistir no artigo 46.° e por que não fazer uma proposta no sentido de retirar do relatório do orçamento essa parte referente àqueles montantes de dívidas.

Quanto ao artigo 48.°, relativamente às juntas de freguesia e às verbas que aqui aparecem para a construção de sedes, como o Sr. Ministro sabe, as propostas existentes da parte dos municípios e até da parte das juntas de freguesia apontam para a necessidade de um reforço dessa verba. Gostaria de ouvir da sua parte, Sr. Ministro, uma resposta a esta questão.

Relativamente ao artigo 52.°, sobre a taxa do pescado — e já o ano passado tivemos esta discussão —, voltamos este ano a ter a mesma proposta, o que significa um não cumprimento, puro e simples, da Lei das Finanças Locais, como o Sr. Ministro sabe. Porquê então esta insistência?

No que diz respeito ao artigo 53.°, qual a evolução, desde a última reunião que tivemos com o Sr. Ministro, sobre o problema das reuniões com a Associação Nacional de Municípios, quais as diferenças que exis-

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tem quanto aos montantes das verbas a transferir para as autarquias relativamente ao pessoal auxiliar e qual é também o ponto da situação em relação aos eventuais contratos ou protocolos que venham a ser feitos com as autarquias locais relativamente ao apetrechamento, manutenção e gestão dos estabelecimentos no âmbito do ensino secundário, etc. Isto porque certamente o Sr. Ministro conhece o relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente neste âmbito, e sabe também o que é que vem aí indicado. Gostaria, pois, de saber o que pensa neste momento e qual é o ponto da situação relativamente à reunião com a Associação Nacional de Municípios. Sr. Ministro, quanto ao artigo 54.°, nos seus n.os 1,

2 e 3 j,sempre são as autarquias que vão ter de suportar estes novos encargos sem qualquer transferência do Orçamento do Estado, pondo, naturalmente, em causa o cumprimento da Lei das Finanças Locais?

É que, por exemplo, em relação ao n.° 4, que se refere às Câmaras de Lisboa e do Porto, não se percebe, pura e simplesmente, o que está aqui na proposta e o que é que o Governo pretende. Se estas Câmaras, ao contrário do que aconteceu com as outras, já estavam a suportar os encargos com a Caixa Geral de Aposentações, se, por exemplo, como é dito em relação à Câmara de Lisboa, os encargos com os aposentados foram da ordem dos 5 600 000 contos, se as receitas que a Câmara teve foram da ordem de 1 000 900 contos, se a Câmara teve de suportar uma diferença de

3 000 700 contos, como é que se entende agora que a Câmara ainda tenha de entregar, no prazo de seis meses, as receitas que teve, em vez de ser eventualmente ressarcida do que pagou?

Mas, mesmo que essa questão não se ponha, como é que se entende este n.° 4? Sinceramente, não consigo perceber! Não consigo perceber o que é que as Câmaras de Lisboa e do Porto vão ter de pagar no prazo de seis meses. E gostaria que esta questão fosse devidamente esclarecida.

Em relação ao n.° 5, quanto às transferências do Orçamento do Estado para as autarquias locais ou para as regiões autónomas, consoante os casos, diz-se «servirão de garantia relativamente às dívidas vencidas». Ora, não sei que dívidas vencidas são essas a que se refere o presente artigo, pelo que gostaria também de ser esclarecida em relação a este n.° 5.

Quero ainda colocar uma outra questão quanto aos novos encargos para as autarquias, que têm a ver com a parte de IRS que este ano foi suportada pelo Orçamento do Estado, ou seja, houve uma operação contabilística no sentido de que no próximo ano esse imposto seja, pura e simplesmente, suportado pelas autarquias. Ou não será assim?

Como está cá hoje o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, pode ser que, finalmente, esta questão seja devidamente clarificada. Mas o que aqui está e o que até hoje ficou claro para nós é que se pretende que as autarquias suportem um encargo da ordem dos 4 milhões de contos, mais precisamente da ordem dos 3 800 000 contos aproximadamente — isto somado com os novos encargos da Caixa Geral de Aposentações, com os encargos do IRS, enfim, com outros encargos. E, no caso de o artigo 53.° não ficar devidamente clarificado, isso significa que as autarquias vão ter de suportar muitos milhões de contos. Afinal, qual é o aumento do FEF, do FEF real, ou seja, descontando os

encargos que têm de ser descontados ao FEF? Esta é uma questão de fundo que gostaria muito de ver clarificada.

Tinha ainda mais algumas questões a colocar, mas não têm a ver com este problema das finanças locais. Talvez numa segunda volta as possa colocar.

O Sr, Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Vairinhos.

O Sr. António Vairinhos (PSD): — Sr. Ministro, não é propriamente uma questão relacionada com o Orçamento ou com as Grandes Opções do Plano, mas é uma questão de conjuntura. Relativamente ao problema do Algarve, tanto quanto sei, foram dadas, da parte do Gabinete do Sr. Primeiro-Ministro, directrizes muito precisas ao Sr. Governador Civil no sentido de as autarquias do Algarve procederem a um levantamento dos prejuízos que se verificaram ao nível dos diferentes sectores com o temporal que assolou o Algarve.

Tenho aqui a proposta do Partido Socialista —perdoe-me o Sr. Deputado António Esteves— e fiquei um pouco espantado pelo facto de só se referir ao Barlavento, uma vez que o Sotavento também teve problemas extremamente graves. O Sr. Ministro certamente estará informado da questão que houve com o problema da barragem de Beliche, em que se pôs até a hipótese de ter de se tirar as populações daquela zona, tendo havido problemas bastante graves, nomeadamente em termos de comércio e pesca relativamente a Vila Real de Santo António. Portanto, repito, espan-tou-me um pouco, Sr. Deputado —espero que não me leve a mal—, de ver aqui contemplada apenas a questão do Barlavento.

Desta forma, a pergunta que lhe faria, Sr. Ministro, era no sentido de saber se já há alguns resultados desse levantamento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): «- Sr. Ministro, qualquer política de descentralização financeira tem de ser medida pelo montante de recursos que são transferidos para as autarquias, a sua comparação temporal e com outros países. Creio bem que em Portugal tem prosseguido a baixa da parte que cabe às autarquias nas despesas públicas ou, se quisermos avaliar, em função do PIB. Julgo até que, nesse capítulo, Portugal é «lanterna» na Europa, exceptuando talvez a Grécia. Acho que a participação das autarquias portuguesas nas despesas públicas tem continuado a baixar. Não tenho os cálculos, mas deixo-lhe a questão.

Por outro lado, passando às questões das Grandes Opções do Plano, gostaria de sublinhar que — ao contrário de outros Srs. Deputados que não gostam nada das Grandes Opções —, eu acho que elas são interessantes. Acho que têm uma maneira de arrumar as questões relativamente sugestiva sob os três títulos: informar e mobilizar a sociedade, fortalecer o tecido social, modernizar a estrutura produtiva.

Mas aqui põem-se diversas questões. Primeiro, o problema da descentralização e das regiões administrativas nessa Grande Opção é incluído, segundo me parece, no título de informar o mobilizar a sociedade. Eu não concordo, porque penso que esta devia ser uma

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opção autónoma. E porquê? Porque sendo o desenvolvimento económico estrategicamente considerado por este Governo como desenvolvendo-se no espaço sob a forma de desenvolvimento regional, não faz sentido que não esteja articulado com uma Grande Opção, pela descentralização para as autarquias e para as regiões.

E aqui o Sr. Ministro está em falso. Aliás, ainda agora deve ter tido muitos embaraços ao participar numa conferência sobre regiões onde todos os estadistas presentes falaram em termos encomeásticos das regiões e o Sr. Ministro teve de iludir a questão, porque não tem regiões em Portugal. Tem a faca e o queijo na mão e não está a utilizá-la!

O Sr. Ministro e o PSD podiam perfeitamente criar as regiões no mais curto espaço de tempo. Mas aquilo que está a fazer-se em termos de regionalização é, na minha opinião, empatar. Veremos o que vai acontecer com todo este processo na Assembleia da República.

Mas se ponho aqui a questão não é só para aborrecer, é porque, havendo uma estratégia de desenvolvimento económico e de modernização para o País que tem em vista os espaços regionais, que toda ela se articula em planos de desenvolvimento regional segundo os espaços considerados como tendo alguma unidade para esse planeamento, não faz sentido que não haja instituições regionais que possam definir, acompanhar e reforçar esse desenvolvimento. Logo, quanto a mim, é uma grande deficiência destas Grandes Opções do Plano.

Relativamente à valorização dos recursos humanos e ao fortalecimento do tecido social, pois evidentemente que só com um povo educado, instruído, que desfrute de um nível de vida estimulante se pode falar em desenvolvimento. Mas o tecido social português é frágil. Penso que quaisquer opções deste tipo deviam pôr a ênfase na melhoria significativa e substancial do nível de vida, sobretudo das classes trabalhadoras, porque com salários baixissimos como aqueles que hoje usufruem os nossos trabalhadores — repito baixíssimos e não vale a pena estar aqui a tocar nesse ponto —, que fortalecimento de tecido social se pode imaginar? Nunca houve tanta exploração da mão-de-obra como há, neste momento, em Portugal. É que o discurso da exploração da mão-de-obra já se desgastou e já não se consegue fazer hoje, por banalização, mas, de facto, isso existe.

Ainda relativamente às prioridades — e fico-me por aqui —, acho bem as prioridades da educação, da formação profissional, e até reconheço que existe aqui, nestas Opções, alguma tentativa de quantificação quando se diz, se não estou em erro, que deve atingir--se, em 1992, o ensino superior com um acesso de 18%, 19% ou 20% dos potenciais candidatos. Enfim, faz alguma quantificação, mas não há verbas para isso. Sente-se que não existe a projecção das verbas e dos recursos ç tem, por isso, alguma inconsistência e alguma falta de credibilidade este tipo de opções.

Evidentemente que sei, por leitura, porque não sou, naturalmente, nem por formação profissional, nem por coisa alguma, um especialista nesta matéria, que, hoje, há desconfiança relativamente aos grandes objectivos quantificados e às verbas que devem ser distribuídas ao longo do tempo. Mas entre esse tipo de planeamento, que está ultrapassado, e o nada, acho que deve haver um ponto de equilíbrio que não existe nestas Opções.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro. Mas, se me permite e apenas por uma questão de tempo, gostaria de pedir que se ativessem o mais possível à matéria da sessão, que é a discussão do Orçamento na especialidade.

Tem, pois, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Sr. Presidente, vou acolher integralmente a sua sugestão e se não fosse a hipersensibilidade da Sr." Deputada Ilda Figueiredo nem iria intervir.

Farei uma intervenção muito curta que tem a ver com com o artigo 46.° da proposta de lei do Orçamento sobre a alusão às dívidas dos municípios à EDP.

Quero dizer à Sr." Deputada que, contrariamente àquilo que é a sua opinião, o PSD subscreve integralmente o teor do artigo e a alusão que se faz no Relatório quanto à questão da regularização das dívidas dos municípios à EDP. E porquê? Por uma razão muito simples. Trata-se de moralizar uma situação que não podia ser contemplada por mais tempo, pois já estava a tornar-se uma situação verdadeiramente intolerável. Chegou a altura de resolvê-la.

A Sr." Deputada não acha que se estava a estabelecer uma situação de injustiça relativa e extremamente grave entre os municípios que atempadamente pagam as suas facturas de electricidade à EDP e aqueles que reiteram em não cumprir esse dever?

Risos da deputada Ilda Figueiredo (PCP).

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr. Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Vou começar primeiramente por responder ao Sr. Deputado Vieira de Castro, passando depois a colocar mais algumas questões ao Sr. Ministro.

Sr. Deputado Vieira de Castro, já verificou que, face às supostas dívidas que são indicadas no Relatório do Orçamento e aquilo que é proposto no artigo 46.°, o Município do Porto, por exemplo, demoraria cerca de 200 anos a pagar aquilo que é referido como dívida eventual.

Acha, portanto, que este artigo 46.° tem algum cabimento?

Por outro lado, Sr. Deputado, esta questão é muito mais complexa do que a leitura que o Sr. Deputado fez. O problema em geral não diz respeito ao não pagamento das facturas, mas sim, à prática de tarifas abaixo do tarifário nacional. É esse o problema fundamental.

A questão é muito mais complexa do que aquilo que o Sr. Deputado pensa ou conhece. Eventualmente, por aquilo que disse, deve ter outro conhecimento, mas não o referiu.

Porque esta questão é muito mais complexa do que aquilo que o Sr. Deputado referiu, e porque também neste momento estão a decorrer negociações entre os municípios referidos e a EDP, é que não se entende o porquê da inclusão deste artigo no Orçamento do Estado e o porquê de não deixar que as autarquias tentem esses acordos, a fim de solucionar o problema que tem de ser resolvido. Também defendo que tem de ser resolvido, porém, há outras formas de o fazer.

Relativamente às perguntas que gostaria de colocar ao Sr. Ministro, devo dizer-lhe que, em termos de P1D-

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D AC, aparece uma verba de 200 000 contos expressamente para o programa de reabilitação urbana.

Sr. Ministro, gostaria de saber quais são os critérios e quais são os municípios a quem vão ser distribuídos esses 200 000 contos, sobretudo porque, tendo em conta uma recente declaração da Direcção-Geral de Ordenamento do Território, publicada no Diário da República em 24 de Novembro de 1988, relativa ao PIDDAC de 1988, onde são referidas distribuições de verbas do PIDDAC de 1988 por vários centros históricos de vários municípios com base no Decreto-Lei n.° 98/84, não têm sequer em conta a Lei das Finanças Locais.

Portanto, receio que se esteja a preparar algo do género para 1989, na medida em que não está clarificado no PIDDAC — e devia estar — quais são os municípios a quem vão ser distribuídos esses 200 000 contos.

Acho que é inadmissível que se continue a ignorar a Lei das Finanças Locais, pelo que gostaria que esta questão fosse devidamente clarificada.

Há ainda um outro problema relacionado com as indemnizações compensatórias quanto aos transportes colectivos municipalizados. Sei que este problema é fundamentalmente um problema do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, simplesmente tem razão de se colocar aqui esta questão ao Sr. Ministro, na medida em que estes municípios não estão a ser compensados, com base na aplicação da Lei das Finanças Locais. No entanto, esses municípios poderiam e deveriam ser compensados por um serviço especial, previsto nessa lei, no sentido de poderem continuar a receber as indemnizações compensatórias que habitualmente recebiam.

Uma outra questão que também já foi levantada por mim na Comissão de Administração do Teritório, Poder Local e Ambiente, tem a ver com a OID do Ave.

A Sr." Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional referiu que a segunda fase

dos estudos prévios estaria pronta e que iria ter uma reunião na CCR do Norte. Por isso, gostaria de saber qual é o ponto da situação sobre a OID do Ave e qual é o timing previsível para o seu andamento, na medida em que, como sabemos, no PIDDAC está apenas referida uma verba geral para estudos, e não para a sua implementação efectiva.

Por último, Sr." Secretária de Estado, tinha ficado assente que seriara fornecidos alguns elementos à Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente em termos de fundos, da sua distribuição, etc, que não chegaram. Pelo menos, eu não recebi.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Nós enviámos. Se calhar está na Comissão!

A Oradora: — Não recebemos. A Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente não recebeu nada. Mas se foi enviado, deve estar em qualquer lado. Nós vamos procurá-los.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Talvez estejam noutra Comissão. Foi enviado tudo o que tínhamos prometido.

A Oralow. — A semana passada mfoimei-me junto da Comissão de Assuntos Europeus e também não tinham chegado, mas vamos tentar saber.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro

do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Dado que ainda vai haver trabalho hoje à noite, vou tentar ser muito curto nas minhas respostas.

Foram dois os Srs. Deputados que se referiram aos temporais no Algarve.

Efectivamente, está a ser feito um levantamento de tudo quanto pode ser imputável a estes temporais. Devo dizer que foi um temporal muito estranho e muito pouco comum, porque especialmente na zona de Sotavento em seis horas choveu quase metade da pluviosidade média anual do Algarve, o que causou situações de tal maneira graves que, se olharmos para a barragem de Beliche com particular atenção, verificamos que o próprio afluxo de águas determinou o funcionamento em sobreposse — se assim o podemos chamar — do próprio descarregador.

Foi efectivamente um caso muito raro que reclama uma atenção especial. Ainda não temos valores, mas gostaria de fazer alguns comentários acerca disso, uma vez que houve três Srs. Deputados que o referiram.

Algumas das coisas que surgiram e as consequências negativas, que atingiram níveis muito inconvenientes, têm a ver com a grande indisciplina de ocupação dos leitos de cheia, da falta de limpeza, da manutenção de ribeiras e daquela confiança que existe muitas vezes quando pensamos que as chuvas ou as cheias não nos acontecem a nós mas só acontecem aos vizinhos.

Houve obstruções de canais que se se tivessem mantido sempre limpos não aconteceriam nos termos em que aconteceram. Houve, efectivamente, muito lixo acumulado que foi entupir os vazadores, os instrumentos de escoamento, que não funcionaram devidamente.

De qualquer das formas, apesar de tudo, isso foi quase uma ilustração dos perigos para os quais alertámos as populações e os autarcas. Eu próprio tive ocasião de falar nisso na segunda-feira da semana passada, fez ontem oito dias, e numa visita que fiz ao Algarve, ainda não há muitos meses, alertei para a inconveniência da construção em vales ou em zonas onde tive ocasião de testemunhar sapatas descalças por efeitos de águas, com muita indisciplina de ocupação. É evidente que, neste caso, a situação —e só para a caracterizar— fo: muito grave sob o ponto de vista da pluviosidade. Era quase certo que grande parte das coisas não estavam dimensionadas para este afluxo, durante seis horas, de uma quantidade de chuva que demora habitualmente meio ano a ocorrer.

Os efeitos foram mais nefastos do que poderão ser, porque tivemos a ilustração daquilo em que temos insistido há muito tempo. O ordenamento do território é a melhor defesa contra abusos da natureza e daquilo que devem ser as ocupações do espaço.

Apesar disso, o levantamento esta a ser feito, não está ainda concluído e é para isso que existem meios suplementares que vêm em socorro dos administradores e dos governantes nas ocasiões em que as calamidades se abatem sobre nós.

Sr. Deputado Adelino Carvalho, os critérios a seguir para a definição das OID têm sido muito claros até agora e pedia-lhe o favor de não presumir de intenções que, de maneira nenhuma, não temos, pois a ma-

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neira como o Sr. Deputado descreveu a situação quase que poderia levar-nos a pensar que existe alguma perseguição em relação ao distrito de Évora.

De facto, não existe qualquer perseguição e vou já ter oportunidade de esclarecer esse assunto, referindo um caso concreto.

Os critérios que adoptámos têm muito a ver com os seguintes aspectos: existência de problemas; existência de potencialidades e possibilidade de desencravamento e de actuação através de adopção de medidas que visem a construção de infra-estruturas que permitam tornar praticável a redução de economias externas e, como referi há pouco a propósito do vale do Tejo, possibilitem ainda uma expressão muito nítida e positiva da vontade de outros agentes, nomeadamente os autarcas, em participarem activamente na consecução da operação.

Devo até dizer que considero indispensável que os autarcas participem e, de uma forma clara e entusiasta, exprimam a sua adesão aos objectivos das operações integradas.

A descrição feita pelo Sr. Deputado levou-o a ter uma expressão de insatisfação em relação ao distrito de Évora, mas não, seguramente, em relação ao Alentejo, porque, como sabe, a nossa primeira preocupação, que foi totalmente apoiada, quer na sua fase de estudo, quer na sua consecução, dirigiu-se ao Alentejo.

No entanto, devo salientar que não é nada fácil — e foi-me dada a oportunidade de o verificar ao falar com o administrador dessa operação integrada — conseguir a adesão desses numerosos agentes. Em relação aos autarcas, por exemplo, foram despendidas pelo citado administrador 1200 horas de trabalho na conciliação das respectivas actividades, segundo cômputo que ele próprio fez.

Perante este critérios, podemos verificar que existem problemas, mas também existem potencialidades e, sobretudo, uma vontade determinada da maior parte dos agentes em prosseguir uma operação.

A manifestação clara de que não há qualquer má vontade para com o distrito de Évora está no anúncio de que vai ser feita uma grande operação nesse distrito, que vai ter repercussões.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — E os centros históricos, Sr. Ministro?

O Orador: — Sr. Deputado, gostaria que me deixasse concluir a minha intervenção.

Com efeito, os mármores vão ser desagregados do Norte Alentejano e uma grande parte do distrito de Évora vai ser envolvida numa operação já em curso, encontrando-se já vencidas muitas etapas.

Vai ser construída a barragem de Minutos, que é muito importante e que, situando-se no coração do distrito de Évora, vai ter as maiores repercussões em todo o distrito.

Assim, gostaria de salientar que não existe qualquer segregação do distrito de Évora ou de outro qualquer; antes pelo contrário, é nosso desejo que todas as regiões nacionais com potencialidades sejam envolvidas por acções determinadas.

Em relação aos centros históricos, o Sr. Secretário de Estado e da Administração Local e do Ordenamento do Território vai referir-se ao assunto, uma vez que o tem acompanhado bem de perto.

Sr. Deputado Gameiro dos Santos, em relação as transferências para as autarquias locais, gostaria de lhe dizer que contamos sistematicamente — e tem sido culpa nossa não a termos enfatisado na maneira mais adequada — com uma contribuição do FEDER, que é imensa e para a qual ainda não chamámos a vossa atenção. O ano passado, por exemplo, atingiu 8 milhões de contos. Este ano estão já pedidos 11 milhões de contos, o que se traduz em quase 20 milhões de contos que vão ser transferidos para as autarquias.

Na verdade, 17 milhões de contos já estão aprovados e na passada quinta-feira tive oportunidade de submeter à apreciação do Conselho de Ministros a lista dos projectos autárquicos para 1989, que ascendem ao montante de 40 milhões de contos, o que significa um afluxo extraordinário e suplementar em relação a tudo o que já foi aqui referido e que tem de ser contabilizado e devidamente enaltecido.

Com efeito, verificou-se um acréscimo muito grande de meios, mas gostaríamos ainda de encontrar uma possibilidade de os aumentar. Assim, Sr." Deputada Ilda Figueiredo, ainda não estou em posição de lhe poder dizer se, efectivamente, é ou não possível obtermos um acréscimo das verbas, mas estamos a fazer todos os possíveis no sentido de acrescer o montante do FEF. Oxalá haja a possibilidade de o equilibrar e acomodar aos meios que temos.

Sr. Deputado Gameiro dos Santos, como V. Ex.a sabe, temos cinco anos para fazer a transição de um esquema para o outro; portanto, as perturbações a que se referiu não foram tão nítidas no ano passado, porque não se verificou um aumento dp FEF tão substancial como o que aconteceu este ano e as pessoas não deram muita importância à primeira fatia de transição, em primeiro lugar, porque o aumento foi pequeno e, em segundo lugar, porque foi a primeira vez que ocorreu a transição. Consequentemente, não foi tudo tão nítido como este ano, em que o aumento dos meios transferidos para as autarquias locais é muito elevado, ao contrário do que VV. Ex.as insinuam, e, por isso, tornam-se mais nítidos os desequilíbrios. Mas isso é resultado da lei que aprovámos, que, como já referi várias vezes em sede de Comissão, estou convencido que é uma excelente lei.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — É necessário é que seja cumprida!

O Orador: — E está a ser cumprida, Sr.a Deputada!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento vai, por certo, dar esclarecimentos sobre algumas destas matérias, mas gostaria ainda de referir-me a alguns aspectos que forma focados pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

Quanto à questão dos planos directores municipais, vou dar uma resposta genérica no sentido de esclarecer por que razão estamos tão preocupados e insistimos tanto em tê-los preparados.

Em nosso entender, um plano ou é um instrumento de decisão ou não serve para nada. Portanto, se há a possibilidade de dotar as câmaras com um instrumento de decisão que contenha um sentido de médio prazo, deslizando no tempo para ter sempre um horizonte que permita enquadrar uma acção com as infra-estruturas adequadas e com outras acções que sejam realmente determinantes do desenvolvimento das respectivas po-

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voacões, isso é excelente e é nesse sentido que vamos fazer todos os possíveis para apoiar a elaboração desses planos.

Devo dizer que as notícias que, directa ou indirectamente, me chegam são reconfortantes, porque muitos

municípios estão maciçamente a determinar a elaboração de planos directores municipais, o que significa que estamos em presença de um «sinal» — como diria o Sr. Deputado João Amaral se aqui estivesse — importante para conduzir as pessoas a fazer qualquer coisa, que, de resto, é para benefício delas.

Vamo-nos empenhar na consecução de planos directores municipais. Estamos a actuar no sentido de incentivar os municípios a associarem-se para, em conjunto, elaborarem os estudos preparatórios desses planos, com o objectivo de se conseguir uma elaboração mais barata.

Mas, na verdade, o que pretendemos é que os municípios disponham de um instrumento de decisão que lhes permita racionalizar os seus investimentos e ter um quadro de médio prazo para os orientar na acções que empreenderem.

Se considerarmos os novos regulamentos dos fundos comunitários, verificamos que esta actuação ainda se torna mais exigível e instante.

Devemos ter quadros integrados, em que se saiba bem qual é o calendário físico e financeiro das operações e, por isso, ainda mais rigorosa deve ser a aplicação de dinheiros.

Assim, vamos apoiar a elaboração dos planos directores municipais e nesse aspecto — e para utilizar as palavras do Sr. Deputado Lino de Carvalho — queremos ver o País coberto, de cima a baixo, com planos directores municipais.

A Sr. Deputada Ilda Figueiredo colocou várias questões e já tive oportunidade de responder a algumas delas.

Quanto à questão das dívidas à EDP, lembro-me já ter ouvido V. Ex.4 dizer — e penso não estar confundido — que acha muito bem que se façam boas contas e que elas sejam rigorosas.

O que o artigo 46." da proposta de lei n.° 74/V traduz é um pedido ao Parlamento de autorização no sentido de o Governo poder estabelecer, de uma forma estimuladora, os acordos que gostaríamos de ver celebrados de mote próprio, pois é sempre interessante que se consiga, de forma voluntária, alcançar um consenso acerca da forma de pagar, pois sabe-se — e a experiência demonstrou-o, infelizmente, ainda recentemente — que o incentivo, em determinadas ocasiões, estimula o acordo.

Deste modo, não devemos deixar deteriorar a situação financeira da empresa, que até para cumprir as suas obrigações corria já o perigo de se degradar ao ponto de não ser possível exigir-se-lhe o seu cumprimento. Assim, era urgente dizer «alto» e agora será excelente que se consiga um acordo com cada um dos municípios, que, por isso, devem medir as suas possibilidades. No entanto, é evidente que ninguém poderá pensar que tudo vai ser pago.

A Sr." Deputada fez as contas e diz que só a Câmara do Porto precisa de 200 anos para pagar a sua dívida à EDP, diz ainda — e muito bem — que o problema das tarifas è fulcral, mas é ptetiso acertar um calendário à mesa das negociações, quer para as tarifas quer para o pagamento das dívidas, quer para ava-

liação do património. E a Sr." Deputada sabe, perfeitamente, pois já referi em reuniões anteriores, que é necessário avaliar todos estes aspectos e para tal deve ser criada uma comissão independente capaz de avaliar o património e proceder ao aceno de contas.

Quanto à questão da construção de juntas de freguesia, penso que não vale a pena solicitar mais reforço de verbas para esse efeito, pois a que está considerada já é bastante grande, inclusivamente já foi aumentada e a experiência demonstra que havendo necessidade de uma iniciativa e de uma contraparte dos municípios acaba por ser possível construir-se tudo o que está na mente e na solicitação das pessoas.

Aliás, o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território tem gerido muito bem esta verba, dando satisfação generalizada a todas as construções.

Aliás, aquilo a que temos assistido em grande parte das freguesias é que elas pretendem pôr mais adereços do que aquilo que são as juntas propriamente ditas e gostaríamos de ver modificada esta actuação, no sentido de se evitar o dispêndio e a delapidação de muitos meios.

Assim, suponho que o reforço, agora feito, desta verba é mais do que suficiente para vir a alargar e a satisfazer as solicitações neste domínio, porque consideramos que não há muito mais predisposição do que aquela que tem sido albergada e acomodada pelos meios existentes.

Quanto à questão da taxa devida pela primeira venda do pescado, devo dizer-lhe, Sr.8 Deputada, que não se trata de qualquer embirração da nossa parte, pois não temos nada contra ou a favor dos municípios onde ela é ou não cobrada.

No entanto, devo esclarecer que esta taxa se destina a compensar os municípios onde ela era cobrada de alguns malefícios resultantes da existência de lotas. E, nesse sentido, o artigo 52.° da proposta de lei n.° 74/V consagra que essa taxa só não será canalizada para os municípios quando existir uma autoridade portuária autónoma, pois, nesse caso, é esta que vai sofrer grande parte dos custos inerentes ao funcionamento do Serviço de Lotas e Vendagens. Assim, a lógica desta disposição está no impacte daquilo que deve ser, numa preocupação de justiça, orientar para quem suporta os custos aquilo que vem a ser o resultado da aplicação das receitas.

O Sr. Secretário de Estado irá referir-se também às disposições dos artigos S4.° e seguintes da proposta de lei do Governo em análise.

Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado António Vairinhos, que, entretanto, se ausentou, já tive oportunidade de responder.

Sr. Deputado Carlos Lage, fico-lhe muito grato por enaltecer a qualidade e a boa arrumação das GOP, assim como a preocupação que temos em traduzir claramente objectivos bem específicos e a de fazer decorrer deles toda a nossa acção.

Depois de nos enaltecer, o Sr. Deputado fez também uma referência ao embaraço ou ao potencial desconforto que julgou ter sido sentido por mim ontem na reunião da Assembleia das Regiões da Europa, realizada no Funchal.

St. Deputado, devo esclarecê-lo que não me senti nada embaraçado, nem desconfortável, em primeiro lugar, porque fui um fundador da conferência que deu

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origem àquela reunião e também um fundador da Assembleia das Regiões da Europa e, desse modo, estava confortabilíssimo na minha posição de fundador de ambas as conferências, quer a da Região das Zonas Periféricas Marítimas,' quer a da Assembleia das Regiões da Europa. Assim, fui tratado com a deferência que, generosamente, os membros destas organizações atribuem aos fundadores.

Por outro lado, gostaria ainda de salientar que fui bem estimado, tendo em atenção a maneira como todos me trataram.

Em relação à presunção que V. Ex." admite de que, efectivamente, numa das duas regiões autónomas com mais autonomia no âmbito da Europa há que atender à variação de atributos que fazem das regiões e dos seus órgãos de administração aquilo em que se traduzem os seus problemas, gostaria de evidenciar que o próprio carácter insular das ilhas determina às regiões autónomas portuguesas uma forma de governo muito especial.

Nas outras regiões, o Sr. Deputado, pode ver que todos os dias se dão passos claros para se reforçar o conhecimento e o desenvolvimento, quer através de investimentos da administração central, quer por uma outra coisa que é muito mais difícil de fazer do que uma lei e que se traduz na prática da associação dos diferentes agentes em torno dos problemas de desenvolvimento. Esta prática está a tornar-se uma realidade e quando a lei surgir vai, naturalmente, coroar um hábito de trabalho de conjunto muito salutar.

O Sr. Deputado afirmou ainda: «o tecido social português é frágil!» Não posso estar mais em desacordo com esta afirmação. Em primeiro lugar, o tecido social português é robustíssimo e, por várias formas, podemos ver indicadores desse robustecimento quer através do vigor das associações que o constituem e da sua grande participação na vida comunitária, quer através de indicadores de desemprego, que são dos melhores destes últimos anos e demonstram que o desemprego, em Portugal, se situa em valores que traduzem aquele volante de desempregados que sempre existem nas sociedades e que permitem uma mutação entre diversos postos de trabalho ou a absorção de gente que aparece pela primeira vez a solicitar um posto de trabalho.

Sr. Deputado, não compartilho desta sua opinião nesta matéria porque, em meu entender, os tecidos sociais frágeis só existem quando há fissuras internas, étnicas, religiosas e políticas irredutíveis. Aí, sim, a situação é frágil.

Como nenhuma destas situações se verifica entre nós, os salários, o rendimento, o consumo e o investimento têm aumentado. Algumas destas variáveis até têm aumentado de mais para nosso gosto, como, por exemplo, o consumo privado, pois era bem melhor que não houvesse tanto consumo privado, mas um pouco mais de aforro para proporcionar maior investimento.

Mas a verdade é que me permite discordar dessa presunção de que o tecido social é frágil por via económica, assim como em relação em todos os outros aspectos que poderiam dar acolhimento à sua hipótese.

Quanto às outras questões que o Sr. Deputado me colocou, solicito ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território que se refira a toda a matéria relativa à reabilitação urbana, à administração local e aos municípios, a qual não abordei na minha exposição.

À Sr.a Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional solicito que se refira à questão da OID do Ave, no sentido de fazer o ponto da situação, como, aliás, estava previsto, e assim responde à questão colocada pela Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

Gostaria também de solicitar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento e obséquio de esclarecer a necessidade que sentimos de pôr alguma moralização nas quotizações das autarquias para a Caixa Nacional de Previdência e que estão previstas no artigo 54.° da nossa proposta de lei.

Sr. Presidente, se me permitisse, gostaria de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Liberato): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro respondeu à maior parte das questões que foram colocadas, portanto vou apenas referir-me aos centros históricos e à matéria relativa às finanças locais.

Em relação aos centros históricos, gostaria de salientar que, quando da tomada de posse deste governo, estava em vigor um despacho que regulamentava os apoios a dar às várias iniciativas de reabilitação urbana no País por parte das câmaras municipais.

Devo esclarecer, no entanto, que o Governo no caso concreto de Évora, que o Sr. Deputado Lino de Carvalho mencionou, apoiou e financiou a 100 %, durante dois anos, o funcionamento do gabinete técnico local e autorizou, a título excepcional, a prorrogação por mais um ano do contrato que havia sido estabelecido. Deste modo, deu um contributo significativo à reabilitação urbana do Centro Histórico de Évora, em relação ao qual e por muitas razões tem a maior consideração.

Contudo, talvez um dos erros desse despacho — que, aliás, foi assinado durante a vigência do IX Governo Constitucional — tenha sido o ter procurado dar resposta a mais de 30 intervenções, sem que, no entanto, tenha previsto quais as consequências que poderiam surgir do acumular de processos e de financiamentos que seriam necessários.

Muitos desses acordos foram estabelecidos já depois das eleições de 1985, portanto, já quando o Governo conhecia qual iria ser o seguimento de todo esse processo.

Ainda quanto ao caso de Évora —e estou a falar de cor porque não tenho elementos específicos sobre esse caso concreto— e respondendo também à Sr.a Deputada Ilda Figueiredo, gostaria de salientar que o Governo, no final de 1987, teve ocasião de despachar uma série de processos relativos a investimentos concretos propostos pelas autarquias. E, a propósito, recordo-me que no caso de Évora não se previa, nos contratos propostos ao Governo, qualquer verba específica para infra-estruturas.

Estou a recordar-me, por exemplo, de úm outro caso, de alguma forma análogo, relativo a outra capital de distrito da região do Alentejo, especificamente de Beja, que previu uma certa verba para financiamento de infra-estruturas e o Governo concedeu à Câmara Municipal de Beja um apoio substancial para a reabilitação urbana, nos termos da proposta que a própria Câmara Municipal havia feito.

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Entretanto, elaborei o Despacho n.° 1/88, que regulamenta as condições de apoio às operações de reabilitação urbana.

Este despacho está em vigor, estamos a analisar as várias propostas oriundas de várias câmaras municipais e não deixaremos de ter em conta alguns factores, tais como a importância do centro histórico e a da reabilitação urbana, que pode, ainda que não necessariamente, considerar os casos de centros históricos, e finalmente a capacidade financeira da própria autarquia de dar resposta aos problemas que se colocam.

Assim, é neste contexto que temos procurado dar resposta às várias situações, criando, entretanto, novos gabinetes, que têm sido sucessivamente apoiados, mas cujo número é muito mais limitado em comparação com o que aconteceu no passado, porque também não pretendemos multiplicar situações a que, depois, não seria possível dar uma resposta satisfatória.

Ainda no domínio do ordenamento do território, gostaria de fazer uma referência a uma questão que foi colocada, nomeadamente em relação a autorizações ilegais de câmaras municipais, no âmbito do litoral e, em especial, do litoral norte.

Com efeito, o Governo tem a maior atenção em relação a todas essas autorizações que, em alguns casos, têm sidos dadas de forma ilegal. Não estou a presumir que seja esta a situação do caso que estava na mente do Sr. Deputado, porque é um caso que estamos a analisar, mas, das informações de que disponho, sei que foi objecto de autorizações por parte da administração central concedidas antes do exercício do X Governo Constitucional. Por essa razão, não sei se será possível fazer-se uma intervenção como gostaríamos.

Nos casos muito graves, que são do domínio público e mesmo com autorização das câmaras municipais, se se verificar terem-se cometido infracções à legislação, em matéria do ordenamento do território, o Governo não vai deixar de intervir, custe o que custar, mesmo ultrapassando algumas decisões tomadas pelas autar-quidas de forma, em nosso entender, ilegal.

Naturalmente que, se for caso disso, os tribunais não deixarão de dirimir muitos dos conflitos que surgirem nessa matéria. Porém, estamos a preparar legislação que procure esclarecer muitas dessas situações, para que não haja lugar a quaisquer dúvidas.

No que diz respeito à lei das finanças locais e às suas implicações no Orçamento do Estado, gostaria de referir o pano de fundo em que decorre todo o Orçamento.

Penso que não merece a pena estar a repetir a argumentação que já foi expressa nas reuniões anteriores, mas gostaria de me referir a dois aspectos essenciais: primeiro, o Fundo de Equilíbrio Financeiro cresce substancialmente, é um dado objectivo e todos os outros artigos têm de ser sempre vistos com referência a esse ponto; segundo, o Orçamento do Estado consagra diversos artigos em que há alguma penalização dos municípios que têm como política o recurso a grandes contingentes de pessoal.

Em nosso entender, é negativo que as autarquias estejam condicionadas, em termos financeiros, pelo re-cutso a grandes contingentes de pessoal e, portanto, estas determinações que o Orçamento do Estado impõe têm consequências diferentes, consoante os municípios têm esse peso, em termos de pessoal, maior ou menor.

Trata-se de uma opção política que o Governo tomou, que apresenta à Assembleia da República e que espera ver considerada.

A terminar a minha intervenção, gostaria ainda de

me referir a uma questão que foi bastante enfatizada e, por isso, não a poderia deixar em claro, a dos transportes municipalizados, embora se trate de uma matéria que é da responsabilidade do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Na verdade, a Lei das Finanças Locais não fala em indemnizações compensatórias mas em bolqueamentos graves que podem ser ultrapassados em termos de apoio extraordinário dos municípios por parte da administração central. Porém, não se obriga a administração central a prestar esse apoio, prevê-se essa hipótese. E o Governo, no âmbito da legislação que, entretanto, aprovou, nomeadamente o Decreto-Lei n.° 373/88 — que pela primeira vez regulamenta o artigo 13.° da Lei de Finanças Locais, matéria até ao momento objecto de decisões perfeitamente arbitrárias —, prevê a possibilidade de os serviços municipais de transportes poderem recorrer, em igualdade de circunstâncias com as empresas privadas, aos apoios que o Governo dá a todo o sistema de transportes existentes no País.

Portanto, resta aos serviços municipalizados candidatarem-se aos apoios — nomeadamente a renovação de frota — previstos em termos das regras utilizadas pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações para o financiamento das empresas transportadoras em geral.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, se V. Ex.a assim o autorizar, a Sr.8 Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional iria agora responder à questão da OID do vale do Ave.

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Ministro. Tem então a palavra a Sr." Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.

A Sr.a Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota): — Sr.a Deputada Ilda Figueiredo, relativamente à questão da OID do vale do Ave, encontra-se concluído o estudo da 2.a fase, aliás conforme o que lhe tinha já referido na última sessão de trabalho que tivemos. Assim, haverá uma reunião na CCR do Norte, na primeira semana de Janeiro, na qual participarão, para além de eu própria, as autarquias envolvidas e elementos da Comunidade Económica Europeia.

Conto que nessa reunião fique aprovado o referido estudo, a fim de que, imediatamente a seguir, se possa passar à fase de programação no âmbito dos diferentes programas e para que o mesmo venha a ser submetido ao Comité FEDER seis meses depois. Penso que é o mais realista admitir para esta fase, isto é, a negociação e a submissão ao Comité. Para já, ficará incluído no Plano de Desenvolvimento Regional, com uma primeira indicação de fontes de fínancianamento e de verbas a afectar às diferentes iniciativas.

Gostaria ainda de fazer um comentário relativamente a uma observação produzida pelo Sr. Deputado Carlos Lage.

Do meu ponto de vista, se há inovação, em matéria de planeamento, nas GOP de 1989-1992, ela encontra-

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se precisamente na existência de metas financeiras. Aliás, devo dizer que lamento imenso que isso não tenha sido sublinhado e discutido.

Tais GOP contêm, de facto, metas financeiras com um rigor de programação que acho assinalável, o que

correspondeu a um esforço de programação muito

grande por parte de todos os sectores envolvidos. Aliás, o Sr. Deputado dispõe, neste momento, de um quadro claro de quais as opções do Governo até 1992 em matéria de investimentos, com taxas de crescimento bem diferenciadas para aqueles sectores que consubstanciam as grandes prioridades do Governo relativamente ao investimento público para os próximos anos.

Mais do que isso, V. Ex.a dispõe de um primeiro mapa de programação financeira dos recursos da CEE por grandes sectores, o que corresponde a um primeiro ensaio relativamente às exigências da Comunidade e às nossas próprias preocupações de, até 1992, saber onde é que irão ser prioritariamente afectados os recursos públicos.

Dispõe também de uma orientação para o sector privado relativamente às verbas que o Governo vai dedicar ao apoio da iniciativa proveniente desse sector, para além de encontrar, de igual modo, uma discriminação muito rigorosa daquilo que pensamos que irá ser a aplicação de fundos comunitários.

Como o Sr. Deputado sabe, a grande fase de programação rigorosa está agora a decorrer. Trata-se aqui de grandes opções, e não do Plano — há aqui uma diferenciação de conceitos que é preciso definir de uma vez por todas —, nas quais se encontram estabelecidas as grandes metas financeiras. Existe, por conseguinte, todo um trabalho de programação que constitui o quadro no qual nos vamos agora mover, com vista à negociação, designadamente com a Comunidade Económica Europeia, dos montantes que temos à disposição até 1992.

Gostaria de terminar apenas com uma breve referência à questão dos centros históricos — trata-se de um aspecto de pormenor, as que acho interessante referir. É que foi possível obter abertura da CEE para o financiamento de centros histórios. Como se recordam, foi um aspecto que começou a ser suscitado durante o ano anterior, ressaltando o interesse que comportavam acções dessa natureza. No entanto, o anterior Regulamento do FEDER não o permitia, já que se tratava de um tipo de infra-estruturas que constava da lista negativa de apoio ao FEDER. Contudo, com a reforma dos fundos estruturais, isso foi superado.

Assim, neste momento, temos previsto, no âmbito de uma acção que estamos a empreender conjuntamente com o Ministério do Comércio e Turismo, ou seja, um programa de infra-estruturas — chamamos-lhe assim — para o turismo, um subprograma de recuperação de centros históricos.

Este subprograma vai ser defendido junto da CEE numa perspectiva de fomento e de apoio ao nosso turismo, constando de um dos programas que vamos negociar, durante o próximo ano, com a CEE.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, se V. Ex.a o permitir, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento prestaria informações complementares.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Queria começar por agradecer ao Sr. Presidente e ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território a oportunidade que me dão para dar algum contributo nos esclarecimentos a prestar aos Srs. Deputados.

Referiu-se a questão de saber porque é que, na proposta de lei do Orçamento do Estado, surge o artigo 54.° relativo às quotizações das autarquias e das regiões autónomas para a Caixa Nacional de Previdência ou, como é vulgarmente conhecida, Caixa Geral de Aposentações e Montepio dos Servidores do Estado.

O Governo tem tido e tem provado uma grande preocupação pela solidez do sistema de financiamento das reformas, das pensões e dos diversos regimes que protegem a inactividade dos funcionários e agentes da Administração Pública, e tem aprovado uma série de medidas inéditas e bastante inovadoras no sentido de regularizar todas estas situações. Porém, simultaneamente, também tem assumido responsabilidades e aprovado legislação que permite a consolidação do financiamento da aposentação dos funcionários públicos e dos seus familiares — é o caso do Montepio dos Servidores do Estado. Assim, naturalmente que todos os funcionários, quer da administração central, quer da local, quer ainda das administrações regionais, beneficiam com esta solidez.

Por outro lado, considera-se que 1989 será um ano em que, em termos de financimanto, as autarquias locais vão ser beneficiadas — penso que isso é unânime.

Poderemos considerar sempre que as verbas são insuficientes e isso é natural, já que as necessidades e as aspirações de todos de quererem fazer melhor são sempre ilimitadas. No entanto, não há dúvida nenhuma de que vai haver um benefício substancial. Repare-se, aliás, que só em relação às verbas do Fundo de Equilíbrio Financeiro, já sem contar com os outros milhões de contos que se encontram no Orçamento do Estado, incluindo o PIDDAC para as autarquias, elas ultrapassam os 17 % relativamente a 1988. Portanto, se compulsarmos estas verbas com o aumento das despesas públicas — deduzindo naturalmente o serviço da dívida, que cresce 12,5 % —, elas são, de facto, significativas.

Nestes termos, na lógica da opinião pública, da disciplina das finanças públicas, na lógica da utilização cada vez mais racional dos recursos postos à disposição do Estado, cuja esmagadora maioria advém dos contribuintes, o Governo entendeu que seria uma boa altura para aplicar um regime de solidariedade de todos os entes públicos da Administração para consolidar financeiramente o regime da parte empregadora (o Estado) como contribuição para a aposentação dos seus trabalhadores.

Até esta altura, apenas o Estado comparticipava para a Caixa Geral de Aposentações e Montepio dos Servidores do Estado e, ainda em 1989 — recordo aos Srs. Deputados —, não obstante esta medida incluída no artigo 54.°, a transferência do Orçamento do Estado para a aposentação dos seus funcionários aumentará 17,3 %.

Trata-se, de facto, de um montante que ultrapassa todos os encargos e que resulta dos regimes especiais

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de aposentação antecipada executados nos últimos anos

e das admissões em massa de funcionários, infelizmente na última década — aliás, praticamente desde 1977.

Quanto a tudo isto, penso que não é só o Governo a entidade responsável. Na verdade, todos os órgãos de soberania são responsáveis para que o sistema de aposentação dos funcionários do Estado não entre nunca em ruptura. Portanto, todos aqueles que detêm alguma responsabilidade em matéria de Administração Pública têm de ser solidários. Ora, é exactamente isso e nada mais do que isso o que consta do artigo 54.°

A Sr.a Deputada Ilda Figueiredo levantou a questão do porquê destas medidas, se há algumas câmaras que já as suportam.

Não faria sentido, Sr.8 Deputada, haver regimes díspares no âmbito do subsector administração local.

Assim, o que pretendemos é que as autarquias retenham na fonte a comparticipação do trabalhador e a entreguem à Caixa Geral de Aposentações. Quanto àquelas que suportavam esses encargos, não faria muito sentido que estivessem a fazer reservas matemáticas, que estivessem a capitalizar reservas, cujo financiamento a Caixa Nacional de Previdência, nos termos do Estatuto da Aposentação, sempre teria de suportar.

Portanto, como dizia, o que pretendemos é que, a partir de 1989, tudo passe a estar uniformizado e que, ao mesmo tempo, haja uma comparticipação da entidade empregadora.

Ao contrário do Estado, exactamente para evitar quaisquer convulsões e para que seja um processo gradual, a própria proposta de lei do Orçamento do Estado, neste n.° 2 do artigo 54.°, diz que tal será progressivo e que o desconto para a Caixa Geral de Aposentações começará por 3,5%, enquanto que o desconto para o Montepio dos Servidores do Estado será de 0,5 °Io. Será pois um processo gradual, a prazo de três anos, em que ficarão então com um desconto igual ao realizado pelos trabalhadores.

Recordo, aliás, que este é o sistema que o Governo também aplicou para o caso dos docentes dos ensinos particular e cooperativo, os quais passaram, a partir deste ano, a estar igualmente abrangidos pelo regime da Caixa Geral de Aposentações, o que se fez para dar maior solidez, maior transparência e maior mobilidade dos docentes dos ensinos particular e cooperativo para o ensino público e vice-versa.

Em suma, esta medida é socialmente justa, financeiramente equilibrada e, em termos de gradualismo, também compatível com o crescimento das receitas a auferir em 1989 pelas autarquias locais.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, há neste momento três inscrições, e apenas solicitaria aos Srs. Deputados intervenientes, ainda que sem qualquer limitação, que tentássemos resolver estas questões em cerca de quinze ou vinte minutos, dado que ainda temos outro Ministério para ouvir.

Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, creio que até ao momento, nesta Comissão, nãojinha havido possibilidade de debater alguns aspectos relacionados com a área pela qual é responsável. De qualquer modo, procurarei ser breve nas questões a coiocar, não repetindo, natural-

mente, matérias que já tivemos oportunidade de apreciar no debate travado, há dias atrás, em sede de Comissão.

A primeira questão que creio ser de relevância prende-se com o facto de o Sr. Secretário de Estado ter facultado à Comissão um conjunto de elementos — anote-se o facto de não ter ainda sido enviada à Comissão uma série de dados, desagregados de um conjunto de áreas, que tínhamos, na ocasião, solicitado. De qualquer modo, e como ia dizendo, os elementos que nos apresentou revelam, antes de mais, uma profunda diferença face a outros dados que nos apresentou e que constam de um estudo elaborado a pedido de VV. Ex.as, o qual tinha em vista a aplicação da lei aprovada na Assembleia da República e referente a essa mesma matéria (investigação científica e desenvolvimento tecnológico). É que as metas anuais de crescimento das verbas destinadas à investigação e desenvolvimento, preconizadas nesse mesmo estudo, são, salvo melhor leitura dos dados, desmentidas e ficam bastante distantes daquelas que o Governo agora propõe no Orçamento do Estado para 1989.

Por conseguinte, o primeiro esclarecimento que gostaria de obter de W. Ex.as vai no sentido de saber se existem ou não alguns outros elementos que nos permitam avaliar o assunto de maneira diferente ou se o Sr. Secretário de Estado não assume, pura e simplesmente, o estudo que, aliás, teve a oportunidade de facultar — não na íntegra, mas somente algumas páginas — e que, de qualquer modo, já deixou de ter interesse para o nosso debate.

O segundo aspecto que gostaria de referir prende-se com a forma como podemos entender uma ou outra das verbas que nos apresentou — e vou referir sobretudo aquelas de maior significado.

Em primeiro lugar, focarei a questão da integração das verbas provenientes da Comunidade Económica no orçamento da sua área.

Parece-me particularmente difícil fazer, como VV. Ex.88 apresentam no orçamento referente à ciência e tecnologia, uma afirmação rigorosa, ao milímetro, das verbas, por exemplo, provenientes do PEDIP — 1 363 700 contos—, com uma precisão de tal ordem quanto a que nos é apresentada.

Portanto, na actual fase em que se encontra o tratamento desta matéria, de que elementos dispõe o Governo para poder apresentar cora tanta precisão as verbas que, neste caso, o LNETI receberá por via do PEDIP? Reflecte isso apenas o somatório dos projectos apresentados e, nesse caso, pode considerar-se que virão a ser aprovados na totalidade?

Assim, quanto a este aspecto das verbas da Comunidade, haveria todo o interesse em podermos ter uma noção rigorosa, dada a forma como os dados nos foram apresentados no que concerne à ciência e tecnologia, do que são, no Orçamento, verbas comunitárias, designadamente no âmbito do exemplo que referi.

Um outro elemento que gostaria que o Sr. Secretário de Estado me fornecesse prende-se com a explicação das receitas próprias dos organismos públicos encarregues da actividade de I & D (investigação e desenvolvimento).

Parece-nos particularmente difícil fazer uma leitura sem ter em consideração — e só para dar uma nota de alguma precisão a este respeito — a que é que se deve uma elevação do volume de verbas tão significa-

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tiva quanto aquela que, por exemplo, o Instituto Nacional de Investigação Agrária teve no último ano. Portanto, gostaria de saber o que é que se encontra aqui a ser considerado como receitas próprias. Serão, porventura, verbas do PEDAP? Trata-se de um dado que valeria a pena ter em consideração, já que, de outro modo, é impossível compreender o que são «receitas próprias», o que são «outras transferências» ou o que são «verbas de outra forma provenientes».

Uma quarta e última questão — obviamente com pena de não tratar outros assuntos, mas tentando corresponder ao apelo do Sr. Presidente — vai no sentido de saber de que forma entende o Sr. Secretário de Estado a necessidade ou não de a proposta de lei do Orçamento do Estado prever que a lei sobre a investigação e desenvolvimento, aprovada na Assembleia da República, define, no seu artigo 12.°, n.° 2, quanto aos «benefícios fiscais aduaneiros e financeiros que visem estimular as actividades de I & D». Estando este Orçamento, com todas as implicações que daí decorrem, longe de ser — e creio que é importante sublinhá--lo aqui no debate na especialidade — o Orçamento da ciência que a lei prevê (lei aprovada por unanimidade na Assembleia da República) e sendo esse um objectivo que certamente se terá de alcançar nos próximos anos de forma a podermos tratar deste assunto com a seriedade que ele próprio exige, porque é que o Governo não apresentou na presente proposta disposições que pudessem vir a contemplar este princípio estabelecido na lei e que é pena não ser ainda desta vez que irá ficar contemplado?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:—Tem então a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria de precisar melhor as questões a que V. Ex.8 tentou dar resposta.

O artigo 54.° da proposta de lei do Orçamento do Estado refere três problemas distintos.

Um deles foi aquele que o Sr. Secretário de Estado fundamentalmente tratou, isto é, o problema da uniformização no pagamento das quotas para a Caixa Nacional de Previdência ou, prefiro dizer, para a Caixa Geral de Aposentações e para o Montepio dos Servidores do Estado. Porém, tal não tem em conta o artigo 3.° da Lei das Finanças Locais.

Portanto, creio que seria bom que V. Ex.8 se referisse a este problema, consubstanciado nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 54.° referido, tendo em conta o artigo 3.° da Lei das Finanças Locais. Isto porque sem esse esclarecimento creio que a discussão não terá sentido.

O artigo 3.° da Lei das Finanças Locais diz expressamente: «Quando por lei for conferida qualquer nova atribuição ou competência aos municípios, o Orçamento do Estado deve prever a verba necessária para o seu exercício. A verba global será distribuída pelos municípios tendo em conta as despesas que se prevê realizar por cada município no exercício das suas novas atribuições ou competências.»

Sr. Secretário de Estado, é este problema que está em causa e é esta a verba que tem de ser revista. Isto quanto aos n.os 1, 2 e 3 do artigo 54.°

Quanto ao n." 4 do mesmo preceito, temos um outro problema, já que este n.° 4 obriga as Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto — porque é às duas que se aplica — a terem de pagar, num prazo de seis meses, uma verba cuja razão nem percebo muito bem. Serão as quotas que foram pagas pelos trabalhadores a essas Camaras Municipais?

Bem, mas então estas Câmaras estiveram durante anos a suportar os encargos com a aposentação! E tenho aqui alguns números — já os referi há pouco, mas se o Sr. Secretário de Estado quiser, mostro-lhos mais em concreto — referentes a estas Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto e que mostram que os encargos que elas tiveram com os aposentados foram muito superiores, em milhões de contos, às quotas que receberam! Então como é?! O que é que essas Câmaras vão ainda ter de pagar, uma vez que já pagaram muito mais do que aquilo que receberam?! Não entendo!...

Assim, era esta questão que pretendia ver esclarecida, já que, de facto, não se entendem estes números.

Quanto aon.° 5 do mesmo artigo 54.°, ele refere-se a outra questão de uma forma tão vaga que nem se percebe bem o que é. Por conseguinte, solicitava igualmente a V. Ex.8 um esclarecimento sobre este preceito.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Deputado Rogério Moreira, se V. Ex.8 tivesse estado cá no início deste debate teria ouvido uma afirmação geral minha acerca do esforço que fizemos para acomodar muitas vontades e muitos desejos de serviços, de secretarias de Estado, de direcções-gerais, de laboratórios, de universidades, etc, para fazer as mais interessantes coisas em tudo quanto vem a ser a sua capacidade de acção.

Posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que todo o Governo me acompanha na vontade que temos de, rapidamente, prever uma percentagem do PIB muito maior destinada à ciência e tecnologia. Porém, a verdade é que são muitas as vertentes que se têm de acomodar dentro do Orçamento e o «fato» não dá para tudo.

De qualquer modo, estamos, por um lado, a tentar encontrar meios por parte das empresas e por outro lado, estamos a despender um esforço enorme para nos mantermos sempre atentos a tudo quanto são verbas comunitárias que possam ser conduzidas para a nossa área. Aliás, posso, entre parêntesis, dizer-lhe que eu próprio, conjuntamente com o Sr. Secretário de Estado, vimos há quinze dias a exposição dos projectos portugueses da SPI (Sociedade Portuguesa de Inventores), onde os nossos parceiros internacionais teceram os maiores encómios à participação dos cientistas portugueses.

Portanto, como disse há pouco, estamos a tentar realizar muito daquilo que está ao nosso alcance para suprir uma coisa que não podemos fazer sem grave risco de desequilíbrio geral e que é aquilo que só se consegue com o acrescer do dinheiro.

Por conseguinte, aplicamo-nos em ir buscai todos os outros meios que estão ao nosso alcance e em ver o

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que se pode fazer por investimento de coordenação, de administração, de informação e que possa, efectivamente, fazer com que os meios que temos sejam os suficientes.

Com efeito, tenho de dizer que tais meios não são

abundantes, embora sejam os possíveis. Assim, se me

perguntar se estamos muito contentes com o orçamento

destinado à ciência e tecnologia, dir-lhe-ei que não, que nem estou satisfeito relativamente a este orçamento específico, nem em relação a qualquer outro do meu Ministério. Contudo, temos de acomodar as necessidades e as aspirações a tudo quanto será o conjunto das nossas possibilidades.

Quanto ao estudo que o Sr. Deputado refere, ele não é um estudo do Governo; na realidade, mandamos fazer dúzias de estudos ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Mas foi entregue!

O Orador: — Foram entregues parcelas desse relatório, Sr. Deputado. Na verdade, não tenho ainda o selo da aprovação completa do Governo e, portanto, apesar de este se tratar de um estudo que naturalmente nos mostra uma análise feita por entidades competentes, sabedoras e que nos aconselham bem, temos depois de, normalmente, fazer um juízo político acerca de tudo isso.

Portanto, quando aparecer cá fora um estudo que seja sancionado pelo Governo, com um preâmbulo assinado por mim ou pelo Sr. Secretário de Estado,

tratar-se-á de um estudo do Governo. Até lá, constituirá meramente um elemento que nos permite tomar decisões.

Se o Sr. Presidente autorizar, pediria agora ao Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia o favor de prestar os esclarecimentos solicitados relativamente aos dois pontos seguintes.

Quanto ao terceiro ponto, relativo aos encargos, taxas, isenções fiscais, etc, Sr. Deputado Rogério Moreira, volto a dizer-lhe que gostaríamos de facilitar tudo o máximo possível. Contudo, em determinadas ocasiões entramos em conflito com outras áreas ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Ou com a lei!...

O Orador: — Sr. Deputado, a lei constitui para nós, naturalmente, um objecto importante, mas não é possível, neste momento, aplicar todas as isenções com a amplitude que gostaríamos.

Portanto, Sr. Presidente, se V. Ex.a autorizasse, o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia responderia os dois pontos por esclarecer, passando, logo de seguida, a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para que também o faça em relação à última questão colocada.

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Ministro. Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia.

O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia

(Arantes e Oliveira): — Sr. Deputado Rogério Moreira, o Sr. Ministro já fez o enquadramento genérico em relação às questões que V. Ex." levantou.

No entanto, também gostaria de lhe dizer e aos Srs. Deputados aqui presentes que estes pontos tinham

já sido debatidos na nossa reunião anterior, em sede de Comissão especializada. Aliás, penso que tinham sido prestados nessa sede os esclarecimentos que agora são pedidos de novo. No entanto, gostaria de sublinhar, em relação á Lei

da Investigação Cientifica e Desenvolvimento Tecnológico aprovada pela Assembleia da República — e já na reunião da Comissão assumi inteiramente, em nome do Governo, esse diploma —, que a consideramos um marco extremamente importante no desenvolvimento da ciência e da tecnologia em Portugal.

O Governo tem a preocupação de utilizar, de acarinhar e de desenvolver a comunidade científica que temos, a qual comporta dimensões ainda reduzidas, embora seja muito jovem, dinâmica e que penso constituir um orgulho para o País.

Portanto, o Governo tem toda a intenção de desenvolver essa comunidade, proporcionando-lhe os meios necessários para que a mesma se empenhe — o que já está a fazer — no desenvolvimento científico e, por consequência, no desenvolvimento económico e social do País. É que, como bem sabe, hoje em dia encontra--se provado, sem margem para dúvidas, que existe um relacionamento estreito entre o desenvolvimento científico e tecnológico de um país ou região e o seu de-senvolviemento económico e social.

Por conseguinte, com este enquadramento, passaria a tecer algumas considerações acerca da questão das diferenças entre os dados do Orçamento e do tal relatório que mencionou.

O chamado orçamento de ciência e tecnologia é um documento de consulta que não integra, portanto, a proposta de lei de Orçamento do Estado. Como lhe expliquei, e o Sr. Deputado bem o sabe, ele destina-se a fazer um apuramento a posteriori das verbas que, nos diversos laboratórios e instituições de investigação do Estado, são colocadas à disposição da investigação e do desenvolvimento tecnológico. Aliás, como igualmente tive a oportunidade de explicar, algumas destas verbas são até estimadas, designadamente as destinadas à investigação e desenvolvimento nas universidades em que se considera apenas uma percentagem que se estima — é o que se faz em todos os países —, relativamente aos vencimentos dos professores, atribuindo determinadas percentagens dedicadas à investigação.

Por conseguinte este documento tem de ser tomado como documento de consulta, apenas indicativo, e é assim que tem vindo a ser feito deste 1986. É evidente que este ainda não é o orçamento de ciência e tecnologia que desejamos, como eu já disse na Comissão.

Efectivamente, temos já muito adiantada, praticamente em fase de assinatura, uma portaria que irá regulamentar um pouco melhor a questão do orçamento de ciência e tecnologia, tentando enquadrá-lo numa fase anterior da preparação do Orçamento do Estado e não o posteriori, como agora é efectivamente feito.

Relativamente àquele documento que eu distribuí e que já foi aqui referido pelo Sr. Ministro ao mencionar um relatório que o Governo encomendou, tendo sido nomeado para o efeito um grupo de trabalho, documento esse que ainda não assumiu inteiramente, mas que é um bom trabalho que iremos tomar muito em consideração, já tive ocasião de dizer o que acontece na Comissão especializada. O que estamos aqui a dis-

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cutir é o Orçamento para 1989 e aquele é um documento que faz perspectivas até 1992, que, aliás, estão em consonância com os números indicados nas Grandes Opções do Plano.

Nas Grandes Opções do Plano estão indicados 196 milhões de contos para a área de investigação e desenvolvimento tecnológico, se a memória não me falha. Bem, como é que se vão obter este valores? São obtidos através das verbas proporcionadas pelo Orçamento do Estado e através dos fundos comunitários.

Estamos a preparar um programa estrutural de desenvolvimento na investigação, a ser enquadrado no plano de desenvolvimento regional que vai ser apresentado em Bruxelas no próximo ano e são essas verbas que vão permitir atingir as metas que estão apontadas nesse documento e que nesta fase são apenas metas indicativas. Só quando tivermos esse programa inteiramente definido é que poderemos, numa perspectiva de planeamento a médio prazo, indicar valores seguros. Portanto, não há discrepância e eu penso que isso já tinha ficado claro da nossa anterior troca de impressões.

Relativamente à questão da integração das verbas da CEE, o PEDIP do LNETI é aquele que está aqui no Orçamento do Estado, são transferências do PEDIP que são inscritas no PIDDAC do LNETI para infra--estruturas tecnológicas; esse é um valor que, de facto, até nem é indicativo, esse é um valor ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Que está já eu vi, só queria,saber a forma como o atingem!

O Orador: — Este é o número que está inscrito.

Quanto às receitas próprias, e também já lhe tinha dito isso da outra vez. são valores estimados, como não pode deixar de ser. E impossível a uma instituição de I&D saber exactamente quanto é que vai receber de receitas próprias no ano seguinte e, assim, como, aliás, em todas as receitas próprias nos vários organismos do Estado, são valores indicativos.

Quanto ao INI A, está inscrita como receita própria uma transferência do PEDAP e isso é que lhe dá esta subida, que é significativa; aliás, em 1988 já tinha um valor elevado, passando a ser 1,9 milhões de contos em 1989. Portanto, o que se passa é que são efectivamente transferências do PEDAP.

Quanto à questão da Lei de Investigação Científica e do Desenvolvimento Tecnológico e porque é que não foi respeitada, é preciso ver que a lei saiu em Agosto e o Orçamento do Estado estava em preparação muito antes disso. De qualquer maneira, a lei não está a ser desrespeitada em ponto algum. O Governo vai apresentar, como é preconizado na lei, um planeamento a três anos, que está em preparação — aliás, com base neste tal relatório — e vai apresentar igualmente um planeamento a dez anos, conforme é também apontado na mesma lei; portanto, penso não haver qualquer desrespeito da lei nem podia haver, porque ela é uma lei que eu próprio e o Governo consideramos muito importante.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr." Deputada Ilda Figueiredo, fez uma observação

quando estava a questionar o Governo mas recordo--lhe que os deputados questionam o Governo, não o Secretário de Estado A, B ou C, e neste caso questionam o Ministro do Planeamento e da Administração do Território, que naturalmente depois dará a palavra, se assim o entender, aos Secretários de Estado que o acompanham. Portanto, é assim, é assim mesmo, e será assim! Se não se recorda em que termos regimentais é que isto funciona, é uma questão de fazer uma lavagem de memória!

Protestos da Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

Às vezes o vigário não se abre, ou pelo menos não tem esse «padre-nosso», numa linguagem católica bem aplicada ao Partido Comunista sobre esta matéria!

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Eu não faltei ao respeito a ninguém, Sr. Secretário de Estado, é inadmissível esse tipo de conversa!

O Orador: — Eu também não lhe faltei ao respeito, Sr.8 Deputada. Estou aqui mas não me podem obrigar a estar em posição marcial a olhar para os Srs. Deputados que estão a questionar com todo o respeito e a quem respondo com todo o respeito. Mas não me podem fazer uma observação dessas, ainda por cima se é publicado no Diário. Uma afirmação dessas tem de ter uma resposta regimental.

O Sr. Presidente: — Peço à Sr.8 Deputada e ao Sr. Secretário de Estado para nos cingirmos à matéria substancial.

O Orador: — Quanto ao problema que a Sr." Deputada colocou, francamente não consigo compreender a dúvida da Sr.8 Deputada, ou então está a levantar problemas que não surgem. O que se passa quanto ao artigo 54.° nos seus números finais é muito simplesmente isto: havia autarquias, Lisboa e Porto salvo erro, que suportavam os encargos relativos às pensões de aposentação dos que foram seus funcionários ou agentes. Com esta norma todos esses encargos passarão para a Caixa Geral de Aposentações e para o Montepio dos Servidores do Estado. Portanto, é natural que os descontos anteriormente arrecadados por essas autarquias passem para a entidade que vai suportar esses encargos. Não é nada de extravagante, è simplesmente assegurar a uniformidade do sistema do Estatuto da Aposentação!

Quanto à referência que a Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo faz à Lei das Finanças Locais não me parece feliz nem oportuna, porque não se trata de novas competências nem atribuições, até se trata de desatribuições ou redução de competências. Essas competências e atribuições, os encargos administrativos, o cálculo das pensões, todo esse processo de transferências, passa para a Caixa Geral de Aposentações. Portanto, há até uma diminuição de encargos para as autarquias, que é exactamente o contrário da referência que a Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo faz à Lei das Finanças Locais.

Além disso, o que nós pretendemos, quanto aos números finais, é precisamente salvaguardar uma situação que surgiu no passado e que passou, digamos assim, perdoe-se-me a expressão. Ainda recentemente o Governo teve de assumir encargos com situações de au-

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tarquias que retinham os descontos sobre os vencimentos dos seus próprios funcionários e não os entregavam à entidade que depois suporta a pensão de aposentação. Ora, essa norma final é cautelar, para que,

no futuro, não surjam autarquias que retenham os descontos para a Caixa Geral de Aposentações e não os entreguem à entidade que tem de gerir as pensões e reformas; portanto, julgamos que essa é uma norma cautelar, que neste momento não estava bem clara no Estatuto da Aposentação.

Por outro lado, queria ainda fazer uma observação relativamente à afirmação, que é mais genérica mas que também foi citada, de que o Governo não estava a cumprir a legislação. Percebo que há uma certa tendência, designadamente por alguns Srs. Deputados da oposição, em desvalorizar a Lei do Orçamento, como que se ela tivesse um mérito, uma dignidade, inferior a outra lei. Não é nada disso!

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — É o contrário!

O Orador: — É exactamente o contrário! A Lei do Orçamento precede as outras leis, é exactamente isso, e a Assembleia da República tem nas suas mãos uma Lei do Orçamento — aliás, já a aprovou na generalidade — que contém normas. Compete à Assembleia da República, agora na especialidade, confirmar essas normas que, uma vez confirmadas, têm tanta ou até mais dignidade do que as outras leis da mesma Assembleia da República. Sendo assim, não faz sentido dizer que o Governo, no que respeita à Lei do Orçamento, não cumpre a lei A, B ou C. O Governo cumpre a lei quando faz determinadas normas. E mais: neste caso até podia haver aqui alguma incoerência mas não há a menor incoerência, quer com a Lei das Finanças Locais quer com o Estatuto da Aposentação, bem pelo contrario!

Quanto ao Estatuto da Aposentação, o Governo, com esta norma, vai fechar o edifício de coerência do Estatuto da Aposentação, que entretanto está a se/ revisto para que se cumpra a Constituição, uma coisa muito prometida no passado e que é a revisão e a harmonização do Estatuto da Aposentação com o regime geral de segurança social de pensões. Já houve um relatório técnico sobre esse projecto e o Governo está a concluir esse mesmo trabalho, sem prejuízo de ter aprovado legislação no sentido sempre conducente à aproximação dos dois regimes de aposentação e de pensões de reforma que existem no quadro jurídico português.

Relativamente à Lei das Finanças Locais também não há aqui qualquer incoerência, qualquer atropelo à filosofia, ao modelo da Lei das Finanças Locais, porque isto é uma matéria que não tem nada a ver com competências, com atribuições, bem pelo contrário! Se nós queremos ir por aí, então vamos dizer que as autarquias passam a ter menos encargos, menos atribuições com as pensões dos seus trabalhadores.

O Sr.-Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, chegámos ao fim deste debate e naturalmente quero agradecer o interesse ...

A Sr.a lida Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada lida Figueiredo, se deseja fazer um protesto, peço-lhe que seja o mais breve possível.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP)-. — Muito obrigada,

Sr. Presidente, vou ser muito rápida.

Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado e Srs. Deputados: Penso que há limites para tudo e aquilo que se passou aqui neste momento, por parte do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, é, de facto, inadmissível, é inconcebível, nas relações entre o Governo e a Assembleia da República. Ninguém foi incorrecto com o Sr. Secretário de Estado e a forma como o Sr. Secretário de Estado aqui agiu neste momento é inconcebível e da minha parte o mais vivo protesto em relação a isso!

Mas há ainda uma outra questão que queria pôr-lhe. Sr. Secretário de Estado, também creio que há limites para tudo, nomeadamente para a leitura da legislação e para a interpretação do que os outros dizem.

O Sr. Secretário de Estado conhece o problema e sabe o que se passa nas Câmaras de Lisboa e do Porto ... Tenho aqui na minha frente dados da Câmara de Lisboa, onde vêm mencionados os encargos com os aposentados entre 1973 e 1987, no valor de 5 647 000 contos, tendo recebido 1 931 000 contos de quotas, ou seja, suportou encargos da ordem dos 3 700 000 contos. Sr. Secretário de Estado, como é que a Câmara vai ter de pagar ainda as quotas que recebeu?

Quanto à outra parte, pergunto-lhe: qual é a leitura do n.° 4 do artigo 54.°? Esta é a outra questão que se levanta e foi esse esclarecimento que ihè pedi.

O Sr. Secretário de Estado: — Sr.a Deputada, é evidente que essa situação só se verificará se o saldo líquido for positivo.

A Oradora: — Foi esse esclarecimento que lhe solicitei há pouco, Sr. Secretário de Estado, porque no texto da lei não é dito isso, não é isso que está cá escrito e só agora é que V. Ex.a deu esse esclarecimento. Nesse sentido, terá de ser clarificado o n.° 4 do artigo 54.°, de acordo com o esclarecimento que o Sr. Secretário de Estado acaba de dar.

Quanto aos novos encargos que as autarquias vão ter, de facto, não vão ficar com menos encargos, vão ficar com mais encargos porque vão ter de suportar, como o Sr. Ministro nos disse, um encargo de 2 milhões de contos por ano e essa questão, Sr. Secretário de Estado, não deve ser iludida.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, se deseja dizer mais alguma coisa, tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — De facto, o encargo será muito inferior a esse que a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo referiu, esse valor depende do montante dos encargos, das diuturnidades, da base, em termos de encargos administrativos, de cobrança, de liquidação e de capitalização das pensões. Outra coisa é o sistema de solidariedade interinstitucional e de uniformização do sistema das aposentações dos funcionários, e é evidente que aí a alternativa era esta. Por que é que só uma entidade, que é a administração central, tem de suportar esses encargos e todas as outras entidades não os suportam? Ora, é essa a

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questão e é essa a posição, a proposta que o Governo faz através desta Lei do Orçamento à Assembleia da República. Com todo o respeito que sempre merecem os Srs. Deputados, não queiramos confundir as coisas!

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, gostaria de lhe agradecer, em nome da Comissão de Economia, Finanças e Plano, a sua presença, bem com a dos Srs. Secretários de Estado, neste debate na especialidade relativo ao orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Esperamos, numa outra oportunidade, podermos continuar algumas das discussões que agora foram iniciadas.

Srs. Deputados, chegámos ao fim deste debate, pelo que vou interromper os trabalhos até às 21 horas e 30 minutos.

Está suspensa a reunião.

Eram 20 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: (Gameiro dos Santos): — Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 21 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados, vamos proceder ao debate, na especialidade, do Orçamento do Estado para 1989 na perspectiva do Ministério da Educação, saudando, desde já, o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado.

Como é normal nestas reuniões, em primeiro lugar dou a palavra ao Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Roberto Carneiro): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo muito boa noite a todos e desejo também que tenhamos aqui uma boa sessão de trabalho para benefício do esclarecimento mútuo, nomeadamente das importantes questões orçamentais cujos trabalhos decorrem neste momento nesta Assembleia da República.

Como eu e os Srs. Secretários de Estado já tivemos ocasião de afirmar — temos estado presentes nas comissões parlamentares especializadas, no Plenário e agora novamente aqui nesta Comissão de Economia, Finanças e Plano —, o Orçamento do Estado para 1989 representa um Orçamento essencialmente responsável. No caso concreto, o Ministério da Educação, que é o que está agora em apreciação, é evidentemente solidário, como já aqui afirmei várias vezes, com o Orçamento do Estado que foi apresentado e é solidário também com tudo o que lhe compete fazer para o grande objectivo nacional de conter a inflação das despesas públicas e de equilibrar o Orçamento, sem prejuízo, naturalmente, de considerar o sector da educação, como tem vindo a ser considerado desde o Programa do Governo, como uma grande prioridade nacional.

É neste sentido que, repito, dentro do equilíbrio tendencial das receitas e das despesas e da diminuição do défice do Orçamento do Estado em percentagem do PIB, o orçamento da educação volta a reflectir em 1989 uma prioridade clara do Governo, sendo nessa medida dotado das verbas necessárias e suficientes para fazer face às despesas indispensáveis do sector, bem como às reformas fundamentais da educação que se configuram no horizonte próximo, nomeadamente aquelas que têm de ser executadas em 1989.

Como também já tive ocasião de explicar várias vezes, a prioridade dentro da organização e da elaboração do orçamento vai claramente incidir sobre as despesas de investimento. O sector não pode continuar a ser um sector essencialmente de despesas de funcionamento, é evidentemente um sector de trabalho intensivo, mas não convém exagerar o peso das despesas de funcionamento no cômputo geral das despesas do Ministério, e por isso nós temos procurado, desde há algum tempo, reverter o quadro da acentuação percentual, a nosso ver negativa, das despesas correntes, das despesas de funcionamento no cômputo geral das despesas do Ministério. Por isso, claramente, a prioridade em matéria de elaboração orçamental e da proposta orçamental vai para as despesas de investimento, nomeadamente as despesas do PIDDAC.

O PIDDAC cresce acima de 20 %, na sua comparação com 1988, nomeadamente com a comparação daquilo que pensamos ser a execução real das despesas de investimento em 1988, e vem, portanto, na linha dessa tendência uma clara prioridade para a melhoria do parque escolar em tudo o que respeita a infra--estruturas físicas, despesas de materiais e equipamentos, material didáctico, reapetrechamento, etc. Há várias rubricas que aparecem contempladas e consagradas com verbas no Orçamento de 1989 que no passado não eram sequer contempladas. É o caso, repito, do reapetrechamento e da conservação do parque escolar, nomeadamente dos ensinos preparatório e secundário, que em 1989 recebe um enorme impulso na linha, aliás, do que vinha acontecendo em 1988 com verbas acima de 3 500 000 contos.

Todo o sector do ensino, desde os ensinos básico e secundário até ao ensino superior, é dotado de um conjunto de investimentos que vão permitir atender também às necessidades da expansão do parque em matérias de infra-estruturas para os ensinos básico e secundário, nomeadamente ensinos preparatório e secundário, segundo e terceiro ciclos do ensino básico e do ensino secundário, segundo a nomenclatura da nova Lei de Bases do Sistema Educativo, prevendo-se investimentos que permitirão durante o ano de 1989 executar cerca de 100 novos empreendimentos nos ensinos básico e secundário. Aliás, essa discriminação e essa relação já vos foi entregue. Tinha sido entregue uma discriminação bastante pormenorizada aos Srs. Deputados das Comissões de Educação, Ciência e Cultura e da Juventude, mas suponho que ainda durante o dia de hoje vos foi entregue uma discriminação ainda mais pormenorizada dos empreendimentos, de protocolos com as autarquias locais, etc, onde se pode verificar que estão cerca de 50 protocolos praticamente concluídos para a construção de novas escolas dos ensinos preparatório e secundário, que este ano estão em curso 44 empreendimentos e que vão continuar a ser concluídos em 1989, o que totaliza 94 empreendimentos, 3 projectos especiais que decorrem de situações deste ano e que vão ser lançados em 1989, o que totaliza cerca de 100 novos empreendimentos, o que me permite qualificar de esforço muito significativo para expandir a rede dos ensinos básico e secundário com propriedade, naturalmente, para o cumprimento da escolaridade obrigatória de nove anos, como resulta da Lei de Bases do Sistema Educativo, descongestionamento do parque nas zonas urbanas e de maior pressão demográfica e

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substituição de algumas instalações que têm de ser urgentemente substituídas em face da degradação material a que chegaram.

Na área do ensino superior, como sabem, os investimentos atingem também valores para cima dos 10 milhões de contos. É notório que neste caso não apenas as novas Universidades, que até há pouco tempo eram objecto de grandes investimentos, são contempladas, mas também são contempladas as chamadas antigas Universidades, sejam as de Lisboa — a Universidade Técnica de Lisboa — que, aliás, ultrapassa os 900 000 contos, pela primeira vez, no PIDDAC de 1989 — seja a Universidade de Coimbra ou a Universidade do Porto. Qualquer delas aproxima-se fortemente de 1 milhão de contos de investimento anual, o que significa, de facto, um esforço extremamente significativo da Nação e dos contribuintes que pagam os impostos e que viabilizam as receitas do Orçamento. Trata-se, pois, de um esforço sem precedentes para a expansão e a melhoria das condições materiais éte ensino superior.

Não querendo estar a demorar, pois penso que o interessante será passar à fase das questões concretas, das perguntas que queiram colocar e das respectivas respostas, no que se refere ao orçamento de funcionamento tive ocasião de sublinhar que as principais acções que têm a ver com zonas de justiça social de maior equidade no sistema, de atendimento a grupos especiais, de acções de segunda oportunidade de educação, nomeadamente educação de adultos, Acção Social Escolar e questões relativas à Reforma Educativa, aquilo que se coloca na reforma curricular, que, como sabem, vai ser implementado em regime experimental, a partir do próximo ano relativamente aos l.os e 5.os anos de escolaridade, e todas as acções ligadas ao desenvolvimento do programa interministerial, como será o do sucesso educativo, todas essas rubricas conhecem um crescimento bastante significativo das verbas, quer em termos absolutos, quer em termos percentuais relativamente ao ano anterior: é o caso da educação especial, é o caso da educação de adultos, qualquer dessas áreas com percentagens de crescimento que ultrapassam claramente a inflação prevista e, portanto, com crescimentos reais muito significativos; a acção social escolar, nomeadamente no caso do ensino não superior, cresce na ordem de 3 % a 6 % e é onde se denota uma preocupação muito nítida com o incremento e a expansão do programa interministerial de promoção do sucesso educativo que atinge 138 concelhos neste ano lectivo de 1988-1989, portanto o segundo ano de aplicação do programa; as acções ligadas à Reforma Educativa, que vêm designadas genericamente sob o título «Apoio e Desenvolvimento Pedagógico», crescem cerca de 50 %, dando-vos novamente, corno dizia há pouco, a garantia de que nas questões fundamentais da Reforma Educativa não haverá, a nosso ver, qualquer estrangulamento na natureza financeira.

Para terminar farei menção à investigação e ao desporto.

A investigação científica no Ministério da Educação conhece um nítido avanço, e um esforço que suponho

ser de justiça realçar, da ordem de 20 %, nomeadamente no caso do INIC onde as verbas de investigação aproximam-se já dos 4 milhões de contos representando um esforço bastante grande — no ano ainda em curso íoram da ordem dos 3 300 000 contos, que* no PIDDAC, quer no orçamento de funcionamento.

Esse esforço é notório e refiro que às verbas de investigação, como aliás a várias outras rubricas, ainda não estão aditados os valores do «A» (delta) salarial dos serviços autónomos que, como sabem, são sempre aditados mais tarde.

Na área do desporto o crescimento é da ordem de 20 %, também um crescimento muito significativo, embora feito à custa de verbas que não vêm directamente do Orçamento, mas sim por participação, nos termos da lei, do Totoloto, do Fundo de Fomento de Desporto. No entanto, é importante fazer notar que o essencial do crescimento das verbas aqui consignadas ao desporto vai ser afecto à implementação do Programa da Rede Integrada de Instalações Desportivas, que visa dotar, com elevada prioridade, todas aquelas escolas preparatórias e secundárias que estão incompletas (não dispõem de pavilhões desportivos ou de áreas para a prática desportiva) com as infra-estruturas necessárias para uma prática desportiva regular e saudável do desporto e da educação física.

Também segundo uma discriminação que, suponho eu, já vos foi entregue, foram já lançados novos empreendimentos, através de protocolos com as autarquias locais. É o caso de 46 escolas, cujos pavilhões, infra--estruturas desportivas ou piscinas estão em fase de adjudicação ou até de construção, onde se ultrapassaram 1 milhão de contos só nos últimos três meses, em que esse programa entrou em funcionamento. Até 31 de Dezembro deste ano prevê-se que, através desses mesmos protocolos, sejam beneficiadas mais 102 escolas, o que resultará em directo benefício para cerca de centena e meia de escolas através do Programa RIID, o qual é financiado, fundamentalmente, através dessas verbas que estão inscritas no Fundo de Fomento do Desporto e de uma dotação, que também vem no PIDDAC, da ordem dos 600 000 contos. Como sabem, o PIDDAC deste ano tinha 90 000 contos, o que representa sete vezes mais o valor que no orçamento do PIDDAC vinha afecto a esta área.

Como também sabem, o compromisso do Governo consiste em que, num prazo razoável, num horizonte de quatro anos, todas aquelas escolas que estão desprovidas de infra-estruturas desportivas venham a estar contempladas com essas mesmas infra-estruturas. Penso que o sinal está dado de que a vontade de cumprir esse horizonte de quatro anos é clara e que vai ser levada por diante sem qualquer hesitação.

Penso, que, a título de introdução, esta minha intervenção é suficiente, e como o Sr. Secretário de Estado Adjunto não tem nada de substantivo a acrescentar deixaria aos Srs. Deputados a iniciativa de colocar questões.

O Sr. Presidente: — Posto isto, vamos iniciar o debate.

Para formularem pedidos de esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados António Barreto, Lourdes Hespanhol, António Braga, Rogério Moreira, Julieta Sampaio, Carlos Coelho e Afonso Abrantes.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Irei tecer algumas considerações de carácter geral, enquanto que, em seguida, os meus camaradas farão um número considerável de perguntas, de comentários e de propostas. Não ficaria bem com

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a minha consciência se não repetisse nesta sede uma ou duas observações que fiz, há dias, no debate na generalidade.

Se teve ocasião de ser informado, o Sr. Ministro já sabe quanto nos chocou a sua ausência no Plenário. Dado possuirmos toda a informação que deveríamos ter sobre este assunto, o que pomos em causa não é a importância dos motivos que o levaram a estar ausente do País nessa altura, mas a hierarquia de prioridades quanto às matérias que estavam em causa.

Em certo sentido, dado que em Plenário se discutiu na generalidade, este nosso debate está, em parte, desvalorizado por causa da ausência prévia desse mesmo debate. Aliás, devo acrescentar que a sua presença ali até teria sido útil para esclarecer o próprio Sr. Secretário de Estado do Orçamento, Rui Carp, porque, quanto à parte que cabe à educação na despesa pública e no PIB, há uma divergência considerável entre os números fornecidos pelo Ministério das Finanças e os do Ministério da Educação. De facto, estes números denotam duas formas diferentes de fazer uma mesma contagem.

Sempre me disseram que as Finanças têm uma maneira especial de olhar para todos os problemas da vida. Também acho o mesmo, mas vou preferindo o prisma educativo de olhar para os problemas. Talvez tenhamos ocasião de o esclarecer hoje, num vivo e animado debate entre o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, para sabermos quem tem razão quanto à prioridade da educação ...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação (Alarcão Troni): — Perca as esperanças, Sr. Deputado.

O Orador: — Que pena! Estava convencido que iríamos ter uma noite animada!

Sr. Ministro, avaliámos, de um modo bastante diferente do seu, não só o Orçamento deste ano como também algumas das medidas que vêm dar corpo e significado político e doutrinário à política escolhida por este Orçamento. Mantém-se a nossa convicção quanto à perda de ritmo e de esforço no sector da Educação. Dado ser um seu fiel leitor, posso citar frases e pensamentos seus dos últimos doze meses. De facto, o Sr. Ministro disse que não basta continuar a despender somas anuais para continuar o gasto do ano anterior e que são necessários aumentos drásticos e constantes, tanto quantitativos como qualitativos, a fim de atingirmos níveis europeus dentro de quatro ou cinco anos.

Certamente o Sr. Ministro está recordado destes seus pensamentos passados, e não há maneira perversa de olharmos para este Orçamento que não seja a de constatarmos que se resvalou, que se deslizou e que esta necessidade não existe mais. Não sei se existirá para o ano, nem sei se, então, haverá «mundos e fundos» estruturais em contrário para compensar. Como sabe, sobre esse assunto a nossa ignorância é total, embora não sejamos responsáveis por ela. Mas, quanto ao que temos diante de nós, esta é a realidade e é insofismável.

As nossas diferenças não se situam apenas nos montantes, isto é, não se trata só de mais dinheiro que é necessário. Não estamos a «fazer o número» repetitivo e rebarbativo da oposição, que pede mais dinheiro. Aliás, esse «número», se o fizéssemos, teria sempre

algo de insólito pois seria a oposição a pedir mais dinheiro ao Governo para que este, ao gastar mais, «tivesse mais louros» e ficasse com melhor imagem perante a sociedade.

De facto, quando nos foi possível, respondemos favoravelmente a um apelo feito pelo Sr. Ministro no sentido de juntar alguns esforços — e quanto mais não seja, a um nível superior de reflexão — em relação ao carácter nacional de algumas componentes do projecto educativo. Apesar das nossas reticências quanto à consagração permanente desta ideia do nacional que pode omitir conflitos naturais da sociedade — o próprio Sr. Ministro elogiou várias vezes os conflitos em democracia e é bom que assim seja —, a verdade é que, para além da travagem de planos que estavam no ar quanto a necessidades reais existentes, agora, também há divergências de fundo mais reais em relação à orientação doutrinária de alguns projectos.

Tal como o próprio Ministro da Educação não ignorava quando, no ano passado, veio ao Parlamento, quer no debate do Programa do Governo, quer no do Orçamento do Estado, ninguém ignora que o mais grave problema de toda a educação portuguesa é a desigualdade social, é — se posso utilizar este termo — o «inacesso», por razões sociais, aos bens educativos, à instrução, à cultura, à formação profissional e científica. Ninguém ignora que a situação terrível em que se encontra uma parte do parque escolar tem sempre, e geralmente, uma fortíssima implicação social.

Ora, se atentarmos nas prioridades internas do Orçamento, na distribuição das verbas, na atenção prestada a certas rubricas em detrimento de outras, encontramos aquilo a que chamarei uma tendência seguramente modernizadora — não lhe nego esse esforço — mas parcial, parcelar e socialmente selectiva. Por exemplo, quanto ao acesso à universidade ou quanto aos empréstimos, se combinarmos as opções doutrinárias tomadas neste Orçamento com aquilo a que chamamos o espírito de comercialização em nome do espírito de concorrência dentro da escola ou de sucesso individual, notamos que, de facto, a política educativa está a tomar um rumo que não é o que estava escrito em «baixo relevo» ou em «filigrana» aquando da sua apresentação ou do diagnóstico feito há um ano. Diagnóstico esse que foi elogiado não só pelas bancadas do Parlamento como também pela opinião pública e por técnicos, e que criou uma espécie de interregno de paz na educação, de empenho e quase de entusiasmo em várias zonas do País.

Tal como já dissemos em Plenário, e que só repito pelas razões já referidas, após a conclusão dos trabalhos do primeiro ano e a passagem para o segundo e para algo que poderá ser mais ambicioso, dado existir, ao que parece, possibilidade de contarmos com os fundos estruturais da CEE, constatámos que, neste momento, há um enviesamento, uma distorção, uma reversão da política da educação nos seus aspectos doutrinários e nos seus objectivos.

Estamos muitíssimo preocupados e perplexos com o que parece ser a desatenção deste Orçamento relativamente à situação económica e social dos professores, excluindo a dos professores do ensino superior que já têm um regime diferente. Embora saiba que a comunicação social nem sempre transmite exactamente como são as coisas, o facto é que, através desse meio, tivemos ecos confirmados de que um membro do Governo

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terá dito a representantes dos professores que, em matéria de estatuto, de carreira docente e de nova tabela de vencimentos, nada seria de esperar antes de muitos meses e que só lá para Junho ou Outubro haveria qualquer coisa de mais seguro. Devo dizer que não quero acreditar, mas há vozes — e muitas! — que dizem que o motivo desse adiamento tão prolongado e tão longínquo tem algo a ver com momentos políticos eleitorais do ano que vem.

Embora possa não ter uma implicação directa no Orçamento, é necessário dizermos que há um processo legislativo que também nos dá alguma preocupação.

Foi criado o Conselho Nacional de Educação, que não foi ouvido pelo menos num caso importante que, entretanto, teve lugar. O Conselho Nacional de Educação recebe propostas do Ministério que não são entregues à Comissão Parlamentar de Educação, criando--se, portanto, um curto-circuito de concertação social que, há um ano, já temíamos. De facto, já nessa altura solicitávamos a atenção do Governo para que não se verificasse que por via de concertação social, que tem o seu lugar e dimensão próprios, o Conselho Nacional de Educação viesse substituir o processo do debate político e geral. Ora, a verdade é que tal aconteceu. O Conselho Nacional de Educação emite pareceres que não envia para a competente comissão parlamentar e criou-se uma «trombose» ou um «curto-circuito» que não nos agrada.

Continua a perplexidade relativamente à Comissão de Reforma do Sistema Educativo e não se sabe quais são as consequências reais dos trabalhos de reforma nem qual é a avaliação que o Ministério faz daqueles trabalhos. Quem foi que aprovou o programa curricular? Estão a ser elaborados programas e sobre tudo isso gostaríamos de saber se há uma entidade política — se o Conselho de Ministros, se a Assembleia da República — que se tenha debruçado sobre matérias tão importantes que são feitas em canais, por vezes não só paralelos ao próprio Ministério como também aos órgãos nacionais de decisão política.

Confirma-se o que hoje se diz em todo o sítio, ou seja, que o orçamento desta Comissão de Reforma atingiu os 300 000 contos? Parece-me exagerado, mas é o que se diz ... Tantas vezes pedimos ao Ministério da Educação que nos fornecesse informação sobre o essencial de um documento tão importante como esse e nunca tivemos uma resposta sobre as principais rubricas desse orçamento especial para a Comissão de Reforma.

O Sr. Ministro classifica o Orçamento de responsável. Não direi que é irresponsável, evidentemente, mas direi que está enviesado por uma opção política de fundo que é a do sacrifício ao défice. Não questiono e até o Ministro da Educação quando nos diz que este Orçamento tem como principal critério a redução do défice público, a manutenção ou a contenção das despesas públicas, etc. Percebo isso e acho que, se é esse o «contrato» existente no colégio ministerial, parece--me excelente que um colégio ministerial tenha responsabilidades recíprocas.

Mas a ser a prioridade das prioridades e a ser, talvez, a despesa pública com mais importância a médio e a longo prazo pelo menos no impedimento do reforço das desigualdades sociais, contestamos que a educação deva ser submetida à contenção do défice. Outros sectores o serão ou poderão sê-lo, mas este não! Para ser

uma real prioridade nacional, para traduzir uma real política de interesse e de colaboração nacional, este sector, ao contrário dos outros, não poderia estar submetido à contenção do défice. É esta a nossa divergência de fundo.

O Sr. Ministro classifica o Orçamento de suficiente e necessário. Notei bem que sublinhou a frase «para encarar e fazer face às despesas indispensáveis». Acho que é uma observação justa porque corresponde exactamente ao que o PS afirmou na declaração de voto: «é um orçamento de manutenção [...]» — despesa indispensável quer dizer isto mesmo — «[...] é um Orçamento de rotina e de estagnação [.. .J», isto é, não consagra o desenvolvimento potenciado e sustentado que foi anunciado no ano passado e que foi sublinhado e exigido no Plenário por si próprio, Sr. Ministro, quando disse que «[...] a seguir a isto, vamos continuar a subir até aos 6,5 % ou 7 %, que é a média europeia [...]»

Este orçamento contraria o pensamento do próprio Ministro da Educação e creio que isso é suficientemente evidente para todo o País e que não há ninguém que tenha ilusões sobre este facto.

Tenho dúvidas quanto à prioridade dada ao investimento. Já que o Sr. Ministro mencionou o investimento nas universidades, dir-lhe-ei que, como sabe, a despesa na universidade mantém aquela terrível equação entre despesas de vencimentos e despesas de investimento. Entretanto, contactámos praticamente todas as faculdades do País e verificámos que há casos em que o vencimento está em 94 % do total das despesas. Tive conhecimento de que diversas faculdades fizeram propostas que iriam alterar ligeiramente esta equação terrível da despesa cativa com as despesas indispensáveis aos vencimentos e foram justamente essas as propostas que foram chumbadas.

Sr. Ministro, estas são as obervações de carácter geral, no entanto não queria terminar sem lhe fazer ainda duas observações.

Em primeiro lugar, tçata-se de um pedido que venho fazendo há já três anos. Se, durante muitos mais anos, continuar como deputado da oposição ou mesmo de uma outra maioria...

(Risos).

... nunca me cansarei de pedir aos Ministros que tentem publicar relatórios de execução dos serviços. De facto, num país onde se gasta tanto dinheiro público e onde há tantos organismos públicos, não se percebe por que diabo — peço desculpa pelo calão — as diferentes instituições não nos enviam breves relatórios de execução, informando-nos do que fizeram, do que gastaram, para que o saibamos. Se se está a gastar mais dinheiro com um determinado serviço, com construções ou com uma universidade, por que não haveremos de saber, através desses próprios serviços, o que foi feito?

Há dez dias disse à Sr.* Secretária de Estado da Cultura que nunca sabemos o que foi gasto nem na Biblioteca Nacional, nem na Torre do Tombo, nem no Instituto Português de Cinema. No Ministério da Educação há serviços que têm suficiente autonomia de trabalho, de execução e de obra para chegarem a 30 de Novembro e poderem entregar pequenos e breves relatórios que até deveriam ser tornados públicos para poderem ser discutidos por todas as pessoas interessadas.

O que se pretende não é o envio de resmas de papel aos deputados. Aliás, a propósito disto, o Sr. Ministro conhecerá certamente o que se passou, há quinze

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dias, quando pedimos informações a um seu colega e até uma lista de telefones recebemos. Isto é, na confusão, também foram fotocopiados os números de telefone de uma série de clientes desse Ministério que nos foram enviados no meio dos outros papéis!

(Risos).

Portanto, não é papel que queremos nem fotocópias de papéis, pretendemos é relatórios responsáveis de actividades e de execução para que melhor possamos medir quais os procedimentos seguintes.

Sei que os meus colegas têm muito mais perguntas pertinentes para lhe fazer, mas, para terminar, ainda lhe queria pôr mais algumas questões.

Tendo em conta os múltiplos diagnósticos que o Sr. Ministro fez e tudo o que disse durante um ano, qual é a abertura do Governo e dos deputados da maioria para que se faça qualquer alteração ao orçamento da educação?

O PS tem várias propostas nesse sentido: gostaríamos de fazer aumentos nas universidades, seja dotando cada uma de verbas suplementares nominais, seja dotando-as de uma verba global. A lump sum. Esta dotação vai ser inevitável e daqui por seis meses o Ministro da Educação já sabe que vai ter «bicha à porta», lá na Avenida de 5 de Outubro. Então, porque não o fazemos agora para permitir às universidades um melhor planeamento? Talvez as nossas contas pequem por modéstia pois não gostamos muito de gastar o que não é nosso. Pensamos que a verba indispensabilíssima para as universidades será talvez a de 1 200 000 contos.

O Governo e a maioria estão abertos a encarar um aumento das verbas destinadas às bolsas de estudo na acção social escolar, sobretudo universitária, dado que as capitações se mantêm a um nível ridiculamente baixo. Isto significaria um aumento das capitações e das verbas ou, então, um aumento das verbas de modo a que as bolsas de estudo passassem a ser mais adequadas às necessidades.

Igualmente queremos propor um aumento das verbas destinadas ao ensino pré-escolar, isto é, aos apoios do Governo às autarquias no que toca ao alargamento da rede autárquica de estabelecimentos pré-escolares.

O Sr. Ministro e a maioria estão de acordo em que se elimine uma parte do artigo 15.° do Orçamento, na parte relativa à Lei n.° 103/88, isto é, o regime dos antigos regentes? Esta lei foi aprovada por unanimidade nesta Assembleia, mas a maioria mudou de opinião e já não a quer aplicar e o Governo, que na altura esteve de acordo, também já não a quer aplicar. Ao menos, diga-se de uma vez para sempre que foi um engano e que já não querem concedê-lo, apesar de representar muito pouco dispêndio.

Finalmente, Sr. Ministro, o Governo e a maioria estão ou não dispostos a encarar a introdução no orçamento do Ministério de uma verba importante que possa fazer face a uma reclassificação provisória, mas merecida, do vencimento dos professores, nomeadamente quanto a uma proposta de mudança de letra ou a outra equivalente?

Pensamos que esta reclassificação que lhe propomos é indispensável, pois os planos do Sr. Ministro, mesmo aqueles com que não concordamos, não serão levados a cabo se não tiverem a colaboração dos professores. E estes não serão capazes de colaborar se, pelo menos, não forem respeitados.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice--Presidente Octávio Teixeira.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Ministro sugere que tentemos ser o mais concisos possível para que os tempos possam ser respeitados.

Tem a palavra a Sr." Deputada Lourdes Hespanhol.

A Sr.' Lourdes Hespanhol (PCP): — Sr. Ministro, não esgotarei as questões a colocar pela minha bancada em matéria de educação, mas há duas que gostaria de abordar.

A primeira prende-se com o insucesso escolar ou, se preferir, com o programa de combate ao insucesso escolar.

O Orçamento do Estado para 1988 previa uma verba de 3 100 000 contos para este programa e esta verba destinava-se a cobrir 60 concelhos com forte incidência de insucesso escolar. Não querendo ser muito exaustiva, a fim de utilizar o mínimo tempo possível, gostaria de chamar a atenção para o que se passou relativamente às várias vertentes deste programa.

Dos 60 concelhos abrangidos, apenas se conhece o balanço relativo a 42 e nestes o panorama não é famoso. Assim, passarei a fazer uma análise, vertente a vertente.

Nos 42 concelhos, dos quais se conhece o balanço relativamente à vertente alimentação, nem todas as escolas foram subsidiadas a 100 °7o. Algumas receberam subsídios pagos pelas câmaras municipais e, na maioria dos casos, os programas só arrancaram a partir de 2 ou de 9 de Maio e, noutros casos, mais tarde ainda. Neste último trimestre de 1988, praticamente passados três meses sobre o início do novo ano escolar, continuam a ser as câmaras a suportar os pagamentos, pois ainda não lhes chegaram as verbas respectivas.

No campo da saúde, a vacinação foi geral e praticamente todas as crianças estavam vacinadas. Em muitos casos, o rastreio feito nos centros de saúde através dos serviços de saúde escolar já tinha sido iniciado antes do lançamento do programa.

Pela resposta dada a um requerimento nosso, também sabemos que alguns dos médicos adstritos a este programa tiveram que o abandonar, tendo tido que ir trabalhar para os centros de saúde devido à falta de médicos aí verificada. Neste aspecto, continuou a proceder-se como anteriormente durante este último trimestre.

No campo da educação pré-escolar, mais uma vez se diagnostica uma fraca percentagem de jardins-de--infância, mau grado o Sr. Ministro, aquando da discussão do Orçamento para 1987, ter afirmado que, para 1988, se previa a abertura de mais 800 jardins--de-infãncia — 300 públicos e 500 abrangidos pelo programa do insucesso escolar. No entanto, tudo está na mesma e não foram publicadas as portarias necessárias à criação destes jardins-de-infância.

No campo da educação especial, praticamente nada se fez no País, com excepção de Lisboa e de Santarém, de alguns casos em Viseu e Estarreja e de dois alunos em Vila Real. Neste último trimestre, as equipas de apoio ao ensino especial estão a funcionar nalguns casos.

No que respeita ao apoio a famílias, talvez se possa dizer que se tratou de um grande sonho do Sr. Ministro. De facto, este apoio só se verificou em Lisboa,

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através do Centro de Medicina Pedagógica, e em duas escolas de Viseu. De resto, não houve praticamente assistentes sociais a trabalharem nesta área durante o passado ano lectivo. Neste momento, nalguns casos, está--se em vias de contratar assistentes sociais para este fim.

Relativamente à ocupação de tempos livres, fizeram--se muitos levantamentos. Em Lisboa foram apoiados 268 alunos, no distrito de Vila Real foram 47 e, em alguns concelhos do País, também funcionaram alguns programas de apoio. Ora, gostaria de saber como é isto possível. Com que pedagogia e com que psicologia é que se vai promover o sucesso escolar através do trabalho com jovens nos programas OTL? Com que programas? E qual a sua duração?

Durante o trimestre que agora decorre, já há mais alguns concelhos com OTL e, que eu conheça, há dois concelhos onde a estrutura foi montada pelas próprias autarquias.

Relativamente à rede escolar e aos transportes, penso que constituem um falso problema, pois considero que apenas se poderá falar cesta questão nos casos das escolas com menos de dez alunos e que foram extintas: faz-se o que já se fazia. "Relativamente aos materiais escolares, o balanço do passado ano lectivo aponta para uma contínua falta de verbas, tal como se pode ler nos relatórios, onde se diz que «[...] não foi adquirido material por falta de verbas [... 1» Quanto ao trimestre que decorre, como não há levantamento, não se conhecem dados e, certamente, continuará a verificar-se a falta de verbas.

O apoio pedagógico-didáctico foi praticamente inexistente. Houve alguns directores escolares que participaram em acções de formação e, tanto quanto se sabe, o número destas acções não foi multiplicado.

A iniciação de cursos de profissionalização ou de pré--profissionalização também não obteve os êxitos que todos gostaríamos que tivesse tido. Foram feitos levantamentos e, no concelho de Redondo, houve oito alunos que começaram a frequentar o curso em 22 de Junho. No distrito de Castelo Branco, verificou-se uma boa implementação destes cursos mas, quanto ao resto do País, neste trimestre, ainda se encontra tudo em estudo.

Sr. Ministro, após esta pequena «radiografia», que não foi feita pelo nosso partido mas que é baseada nas informações dos serviços do Ministério da Educação, teremos que concluir que a verba de 3 100 000 contos não foi suficiente para um programa tão ambicioso.

Que dizer, então, este ano, a ima verba de 4 milhões de contos que, em sede de Comissão, o Sr. Ministro considerou avultada e que terá de ser suficiente para corresponder as necessidades, não de 60 concelhos, mas sim de 138? Como vai ser isto, se já sabemos que há 2 milhões de contos que são para pagamento do leite para as crianças? E o-resto,.Sr. Ministro?

A segunda questão que tenho para colocar-lhe prende-se com a participação do poder local na reforma educativa e com as novas competências que daí lhe advirão.

No domínio das construções de estabelecimentos dos 2.° e 3.° ciclos dos ensinos básico e secundário e escolas profissionais, há. 29 protocolos homologados e 21 em vias de celebração, o que perfaz um número de 50 escolas. E as outras 119, Sr. Ministro? Não são urgen-

tes? Será que não estão todas como Aljustrel, em que já 1986/1987 se. previa o seu lançamento e agora se prevê para 1989?

Uma outra questão prende-se com o n.° 2 do artigo 53.° do Orçamento do Estado, que diz: «A partir de 1989, o pessoal não docente dos estabelecimentos de educação pré-escolar, do ensino primário e do ciclo pre-pratório TV, bem como a respectiva gestão, são transferidos para os municípios.» Como é que isto será, Sr. Ministro? No ano passado o Sr. Ministro ainda nos forneceu dados para podermos analisar o quadro em que iriam ser feitas essas transferências, mas este ano nada nos forneceu. Onde é que podemos consultar os dados para podermos apreciar o alcance de uma medida deste tipo?

Prendendo-se com os problemas anteriores, queria aqui relembrar que o Sr. Ministro afirmou, na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, no dia 3 de Novembro próximo passado, que estas transferências não iriam ser feitas nas costas dos municípios e que, neste âmbito, havia protocolos assinados com a Associação Nacional de Municípios.

Pois bem, são passadas três semanas desde esse dia, e ainda não houve qualquer tipo de acordo entre aquele órgão representativo dos municípios portugueses e o Ministério da Educação. Como irão ser feitas as transferências município a município, apontadas no n.° 3 do artigo 53.°? Onde é que podemos analisar os critérios genéricos do ME? Como é que podemos analisar, sem ser no escuro, estas transferências?

Peço desculpa por ter lido, mas fi-lo para mais rapidamente apresentar o que disse.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Ministro da Educação, quanto ao PIPSE não vou entrar em pormenores sobre a consecução do programa em si, porque isso já foi objecto de uma posição pública tomada pelo meu grupo parlamentar — e, a esse propósito, devo dizer ao Sr. Ministro que aquilo que fizermos não era uma amostra mas, sim, o universo da Região Norte —, apenas focarei oa seus aspectos do ponto de vista económico e financeiro. Aliás, a esse propósito, amanhã, remeterei ao Sr. Ministro, com muito gosto, o nosso trabalho sobre esse universo da Região Norte para V. Ex." dele tomar conhecimento directo.

Quanto ao orçamento deste programa, gostaria d

Quanto à Lei 103/88, o meu camarada António Barreto já se referiu a ela, mas gostaria de conhecer a argumentação do Sr. Ministro e do Governo para propor a suspensão de uma lei que obteve unanimidade nesta Assembleia e que procurou, de um ponto de vista formal, cumprir tudo aquilo que estaria na exigência do seu enquadramento legal e, do ponto de vista político-partidario, evitar qualquer situação que pudesse ser apontada de aproveitamento por este ou por aquele agrupamento.

Foi feito um esforço — aliás, outros têm sido feitos noutros sentidos, de que é exemplo a lei de autonomia universitária — para se conseguir um consenso gene-

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ralizado em torno, neste caso concreto, da reposição de uma justiça profissional e social, que há cerca de doze anos não era reposta. Gostaríamos, pois, de conhecer a argumentação que levou à suspensão dessa lei.

Sobre os professores, também já aqui alguma coisa foi dita e eu gostaria de conhecer que tipo de formação continua vão ter os professores, uma vez que ela não se fez sem verbas. Que verbas para a formação contínua dos professores, uma vez que tanto se diz que os professores são essenciais para a reforma do sistema e para a alteração de atitudes do nosso sistema que, de facto, não vem cumprindo o que desejaríamos? Mas conquistar os professores como, se nem sequer formação contínua, ou pelo menos verbas para a formação contínua, se prevêem de forma eficaz?

A propósito, que tipo de incentivos se prevêem, por exemplo, para a fixação dos professores, nomeadamente em localidades de mais difícil acesso, uma vez que o Sr. Ministro sabe que aí radica uma das componentes que pode provocar o insucesso escolar? São escolas com dificuldades de acesso, com dificuldades de fixação de professores; são escolas com situação geográfica difícil onde passam dez, onze, quinze e, se calhar, mais professores durante o ano lectivo. Que incentivos para fixar os professores nestas escolas?

Quanto ao ensino pré-escolar, vai o Ministério privatizá-lo? Comercializar? Quem vai pagar? Isto é, sendo, neste momento, da competência das autarquias a criação ou, pelo menos, o ensino da criação do pré--escolar, não entende o Ministério útil dotar as autarquias de verbas suplementares no sentido de aumentar a criação desse ensino?

Sobre o apoio à frequência escolar, pergunto: que incentivos à frequência escolar? Já verificámos isto até no âmbito do trabalho, onde muitas vezes situações degradadas e de pouco estímulo à frequência escolar são devidas ao trabalho infantil. Que incentivos à frequência escolar?

Sobre o ensino primário, as contrapartidas para a transferência do pessoal para as autarquias estão definidas. Está feito um estudo não só dos actuais funcionários como dos que vão ser necessários para enquadrar responsavelmente as escolas e sabemos que há muitas escolas onde são os professores que fazem a limpeza da mesma, são os professores que limpam ...; enfim, eu ia dizer que fazem um serviço para o qual não estão vocacionados.

Por fim, sobre o desporto escolar, o que é que está previsto no âmbito do orçamento?

Por agora, é só isto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: O Sr. Ministro compreenderá que não vamos fazer, nesta sede, o debate na generalidade que deveríamos ter feito na sede própria.

Vozes do PSD: — Muito beml

O Orador: — Os «muito bem» do PSD só vêm confirmar algumas certezas que já tínhamos.

Rbos do PCP.

Diria que foi com enorme estanheza que pudemos verificar que, quando se anunciava a apresentação do Orçamento, era referida como entrada essencial prioritária a educação e constatar que, sendo uma prioridade, o Governo não tivesse considerado necessário que um seu representante apresentasse o orçamento do Ministério da Educação no debate na generalidade.

Considerar um sector prioritário e ignorá-lo num debate de generalidade é, no mínimo, estranho. Mas, obviamente, quem tomou essas opções tinha razão para as fazer, nós tirámos as necessárias ilações e, do nosso ponto de vista, a ilação mais genérica e que resulta dos próprios números é que, de facto, é uma prioridade em palavras que não em números, como tentarei demonstrar, quer através de números que citarei, quer através de perguntas que apresentarei.

E a primeira pergunta que coloco prende-se com a seguinte questão: como encara o Sr. Ministro as repercussões da recente decisão do Tribunal Constitucional no orçamento do seu Ministério, quer em termos do ano de 1988, quer em termos do ano de 1989? É uma questão essencial, como o Sr. Ministro compreenderá, porquanto teve oportunidade de referir na Comissão que acréscimos substanciais para o seu orçamento decorreriam de preceitos orçamentais que o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional, como sejam os fluxos financeiros das Comunidades e acréscimos de verbas decorrentes desses fluxos, designadamente no quadro do FEDER. É algo que temos de lhe colocar hoje com toda a franqueza. Poder-se-á dizer — creio, contudo, que é um argumento apenas formal — que, neste momento, o acórdão ainda não está publicado, portanto o Governo não está vinculado a cumpri-lo, mas o acórdão vai ser publicado e para o ano de 1989 estamos ainda a tempo de introduzir as necessárias correcções para que não tenhamos que voltar, em 1989, a repetir as inconstitucionalidades que já se verificaram em 1988.

E daqui passo para a primeira questão. O Sr. Ministro tem referido, pelos números que apresentou, que o P1DDAC do seu Ministério teria para o ano de 1989 um acréscimo de 20 %. Sr. Ministro, de acordo com um elemento enviado pelo seu Minstério, hoje à tarde (é pena que só hoje à tarde possamos ter recebido estes elementos), verifico que até ao fim do ano de 1988 se prevê uma execução do PIDDAC de 98 %, sem considerar a cativação da verba decorrente da dotação concorrencial. Ou seja, o Minstério da Educação não vai executar o PIDDAC que nos apresenta aqui como elemento comparativo, vai, isso sim, executar o PIDDAC que constava do orçamento, sem considerar a dotação concorrencial. Significa isto, Sr. Ministro da Educação — e as contas estão feitas — que não existe um acréscimo, como é referido, de 20 %; antes pelo contrário, verifica-se um acréscimo de, apenas, 5,6 o que, em termos reais, tendo em conta a taxa de inflação de 9 %, 9,5 % até ao final do ano, pode apontar para um decréscimo de 4 pontos em relação ao ano passado. Tenho os números comigo, Sr. Ministro. São eles: PIDDAC, em 1988, 26 800 000 contos; em 1989, 28 318 400$; diferencial: 1 518 400$; o ô (delta) de variação: 5,6 °Io, o que significa que, em termos de inflação, vai haver um decréscimo no investimento.

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Se o Sr. Ministro tiver outros dados que me possa apresentar, agradeço, pois estes são os que consegui recolher, com os materiais que o Governo me enviou.

Fico ainda mais preocupado quando verifico, ainda nesse documento que recebi hoje à tarde, que esta previsão de execução do PIDDAC é uma previsão até 30 de Novembro de 1988, ou seja, não é uma previsão até ao fim do mês de Dezembro.

Gostaria de perguntar se em Dezembro se prevê gastar mais alguma coisa.

Voz inaudível na gravação.

Pode ser um erro dactilográfico, mas no papel que recebi diz o seguinte: «Considerados os compromissos a assumir até 30 de Novembro de 1988», p. 6 do documento «Ministério da Educação, PIDDAC/88».

Vozes inaudíveis na gravação.

Estou certíssimo? Portanto, confirmamos, Sr. Ministro, que se trata de gastar os 26,8 milhões de contos e não o que vem apontado como elemento comparativo nos dados que inicialmente nos forneceu.

A segunda questão que me parece importante clarificar é a seguinte: no debate que tivemos aquando da discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 1988, o Sr. Ministro teve o cuidado de nos garantir que os investimentos na educação não iriam sofrer qualquer perturbação. Verificámos, durante o ano, a história da dotação concorrencial — que acabou por se notar agora que, afinal, não actuou e que vai ser executado todo o PIDDAC (é algo que depois vamos ter de saber como é que acertamos as contas, o Sr. Ministro há-de explicar isso!) — e está previsto que sejam cativados pelo Ministério das Finanças 10 °7o do PIDDAC. Pergunto: o Ministério da Educação também sofre desta cativação de 10 %? Esta cativação é para libertar ou, como é um sector prioritário, vai abrir-se uma excepção para o Ministério da Educação?

Uma terceira questão: o Sr. Ministro frisou que 1988 era o ano de arranque da reforma. Pergunto-lhe: em 1989, a reforma continua estagna ou retrocede? O Sr. Ministro diz que não pára, que avança, e eu pergunto-lhe: com o dinheiro que tem, como é que ela avança?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — (Voz inaudível na gravação.)

O Orador: — É o que vamos ver, Sr. Secretário de Estado Rui Carp. O senhor gosta muito de mexer nos números e depois há-de dizer-nos com os números como é que avança.

Gostaria também de saber, Sr. Ministro, o que pensa sobre a situação profissional, não apenas dos professores dos ensinos básico e secundário, mas também dos do ensino superior.

Como sabe, em termos universitários, um certo estrangulamento no orçamento de funcionamento está a impedir que possam subir na carreira um conjunto de docentes — é uma questão que nos tem sito colocada pela generalidade dos reitores das Universidades —, mas, quanto aos professores dos ensinos básico e secundário, creio que não me enganei se disser que foi V. Ex.4 que em determinado momento terá referido que a situação dos professores, em termos profissio-

nais, estava mais degradada do que há vinte anos atrás. Perante esta sua afirmação pergunto-lhe se está prevista alguma coisa para melhorar a situação profissional dos professores, nomeadamente em termos de reajustamento de letra.

Pergunto-lhe desde já se tenciona ou não o seu Ministério promover negociações com os sindicatos, de modo a garantir que, a partir do dia 1 de Janeiro de 1989, a situação desses professores seja revalorizada em termos de carreira. Esta pergunta é muito concreta e muito directa e, portanto, gostaria de ter também uma resposta concreta e directa.

Outro problema que não poderíamos deixar de abordar — aliás, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento abordou esta questão aquando do debate na generalidade — prende-se com as dívidas herdadas pelo Ministério da Educação quanto a empreiteiros. Será que em 1989 se salda completamente a dívida? ...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não

fui eu que referi isso.

O Orador — Foi o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação.

Sr. Secretário de Estado do Orçamento, desculpe uma certa fixação no senhor mas isso tem a ver com a sua precipitação em querer sempre falar, de tal forma que eu já confundo todos os Secretários de Estado.

Gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse qualquer coisa sobre ...

O Sr. Carlos Lélis (PSD): — Mas olhe que há vários!

O Orador: — Sim, mas parece que há uns que são mais Secretários de Estado do que outros, ...

Risos.

... pelo modo e pela fogosidade com que intervêm ...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Pelo modo como se empenham!...

O Orador: — Creio que transportam para a Assembleia da República certas lutas que têm lá fora, mas eu não queria chamar para aqui esta questão.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não, Sr. Deputado, o nervosismo deve ser mais da sua bancada e não daqui.

O Orador: — Isso é uma coisa que teremos tempo para ver!

Gostaria que o Sr. Ministro nos pudesse dizer qualquer coisa sobre os problemas decorrentes da compensação do imposto profissional. Esta matéria vai afectar o Ministério da Educção e, portanto, gostaríamos que nos pudesse dar alguns dados, designadamente paia termos uma ideia concreta sobre o problema.

Passarei de seguida a falar de alguns sectores do processo educativo. A minha colega Lourdes Hespanhol já aqui referenciou o facto de o Sr. Ministro ter prometido para o ano de 1988 o lançamento de 800 novos jardins-de-infância, 500 dos quais integrados no programa de combate ao insucesso escolar e 300 no alargamento da rede pública. No entanto, durante o ano de 1988 isso não se verificou e para o ano de 1989

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o Sr. Ministro foi omisso quanto a esta matéria. Gostaria, pois, de saber se o Sr. Ministro nos pode adiantar alguma coisa em relação a estes 800 jardins-de--infância: será que eles vão aguardar? Será que vão ser as autarquias a arrancar com eles?

Em relação às contruções escolares do ensino básico e secundário o Sr. Ministro tem avançado, nos encontros que temos tido, com a ideia de que há um grande impulso no reapetrechamento e conservação da rede escolar e que este é um dos sectores em que o Ministério, este ano, dá um grande salto.

Tive oportunidade de comparar os mapas do Ministério — não os meus, mas aqueles que o Ministério nos enviou em 1987 para o ano de 1988 e em 1988 para o ano de 1989 — e pude verificar o seguinte: em termos de investimento para as construções de ensino básico e secundário há um decréscimo de 116 000 contos e em termos de gestão do funcionamento, onde se enquadra também a questão do reapetrechamento e conservação, há um decréscimo de 72 000 contos comparando o ano de 1988 com o de 1989 e tendo em conta os dados fornecidos nos documentos governamentais.

Ora, isto quer dizer que para a rede escolar do ensino básico e secundário há no total um diferencial negativo de 188 000 contos. Portanto, quanto a dizer-se que isto é um grande esforço e um grande impulso, Sr. Ministro, ou vão buscar o dinheiro a outro lado, e eu não o encontrei, ou esse esforço deve ser apenas de palavras.

Sr. Ministro, permita-me que lhe volte a colocar a questão do PRODEP. No primeiro encontro que tivemos, o Sr. Ministro referiu que se estava a acertar a última versão desse programa. Gostaria de saber quando é que podemos ter conhecimento dessa versão para que possamos fazer um juízo exacto em termos de Grandes Opções do Plano a curto e a médio prazo e para quando é que está previsto um projecto concreto para esse domínio, ou seja, para quando o PRODEP.

Quanto à transferência de responsabilidades para as autarquias, creio que o mínimo que lhe podemos pedir ê que seja quantificado, quer em número de con-celhos, quer em termos de verbas, o que vai significar a transferência de responsabilidades com o pessoal do Ministério da Educação para as autarquias locais.

Gostaria também de lhe fazer esta pergunta em relação à construção escolar dado que, ao que compreendi da leitura do orçamento, o Ministério da Educação propõe-se, pura e simplesmente, suspender a construção escolar nos ensinos básico e secundário se não houver protocolos assinados pelas autarquias. Portanto, nos casos em que as autarquias não assinaram protocolos, o Ministério da Educação não constrói escolas dos ensinos preparatório, secundário ou C + S.

Já aqui foi referido o problema dos regentes escolares. Penso que este aspecto também merece alguma apreciação dado que, sendo uma lei aprovada por unanimidade, é com estranheza que verificamos que o Governo, que é apoiado por um dos partidos que votou essa lei, propõe a suspensão da sua aplicação. Aliás, seria até interessante verificar que quem apresentou a primeira proposta para que uma lei com essas características fosse aprovada foi o PSD, através dos seus deputados da Madeira.

Sr. Ministro, depois de todas estas considerações também nós entendemos que valeria a pena aprovei-

tarmos esta troca de opiniões na especialidade para tentar encontrar as disponibilidades necessárias para as correcções ao seu orçamento por forma a evitar ou cortes desnecessários ou a necessidade de, a meio do ano, estarmos confrontados com um pedido de aprovação de um orçamento suplementar para o Ministério da Educação. Uma vez que esta questão foi colocada, creio que o Sr. Ministro terá que a ter em atenção.

Finalmente, devo dizer que tencionamos apresentar um conjunto de propostas neste sentido, pois pensamos que o grande objectivo que colocou no início do seu mandato como Ministro, de que a educação deve corresponder a um esforço de consenso e a um esforço nacional, deveria também, neste momento, corresponder a um esforço por parte da maioria e do próprio Governo para que pudéssemos encontrar, em termos de inscrições orçamentais, as verbas necessárias para que não houvesse uma inflexão na reforma educativa que todos desejamos que avance.

O Sr. Presidente (Rui Machete): — Tem a palavra a Sr.a Deputada Julieta Sampaio.

A Sr.a Julieta Sampaio (PS): — Sr. Ministro, um fantasma muito grande continua a pairar sobre o Orçamento do Estado: o famoso PRODEP, a que o Sr. Deputado Jorge Lemos já se referiu. Na verdade, o País continua a desconhecer o que é o PRODEP.

Presumo que o Ministério da Educação tem um documento a que pomposamente atribuiu o nome de PRODEP, que, segundo dizem, tem várias versões. Arranjei, com dificuldade, algumas fotocópias desse documento, no entanto, não sei se correspondem à versão final nem mesmo se esta versão já foi discutida pelo Conselho de Ministros. Sei, no entanto, que é um documento muito importante, que, no mínimo, com um Governo que diz que a educação é a prioridade das prioridades, já devia ter sido objecto de debate público e nacional. »

Este documento sobre a reforma educativa vai ser, com certeza, muito importante nos próximos anos e, segundo as cópias que aqui tenho — e o Sr. Ministro fará o favor de me dizer se correspondem à realidade ou não —, ele refere-se já ao ano de 1989, ou seja, terá de fazer obrigatoriamente parte do Orçamento que estamos agora a discutir e que o Parlamento vai ou não aprovar.

As fotocópias de que disponho são de 5 de Julho de 1988, no entanto, não sei se o Sr. Ministro já tem outras versóes mais actualizadas. Como o Ministério não forneceu um documento tão importante como este a que me estou a referir e como gostamos de estar devidamente informados fizemos algum esforço no sen-tiso de arranjar aquilo que o Ministério não nos deu ...

Deste documento consta que, para a educação pré--escolar para o ano de 1989 e para as Regiões Norte, Centro, Alentejo e Algarve, são destinadas verbas bastante significativas que não vi contempladas no Orçamento do Estado. Presumo que a educção pré-escolar será uma prioridade do Governo, porque sem uma boa educação pré-escolar não há sucesso educativo.

Gostaria ainda de chamar a atenção do Sr. Ministro para o facto de para 1989 o planeamento financeiro

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do projecto do ensino especial para as Regiões Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve ser dotado de um total de verbas bastante significativas.

Continuando o meu rosário, chego ao planeamento financeiro/ano/região para o ensino profissional e aqui aparecem novamente para o ano de 1989 o Norte, o Centro, etc, atribuindo-se-lhes verbas também significativas.

Depois, seguem-se outros quadros referentes aos vários sectores da vida educativa para o ano de 1989 e aos quais são atribuídas verbas também significativas.

Aparecem também referências ao parque escolar para o 1.° ciclo, já para o ano de 1989, referentes às regiões que já citei, onde surgem verbas bastante significativas que eu, francamente, não vi inscritas no Orçamento do Estado e que estão aqui mencionadas para o ano de 1989. Quero ainda chamar a atenção do Sr. Ministro para os quadros referentes à conservação do parque escolar já para o ano de 1989.

Analisando tudo isto atentamente pergunto ao Sr. Ministro se é verdadeiro o que está inscrito neste documento. Se é verdadeiro, por que razão é que o Ministério não trouxe este documento junto dos deputados para que ele fosse debatido na Comissão de Educação, Ciência e Cultura? Como é que o Sr. Ministro pretende cumprir o que está neste documento para o ano de 1989 com o Orçamento que o Governo apresentou à Assembleia da República?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em primeiro lugar, gostaria de salientar um aspecto por nós já destacado aquando do debate na generalidade do Orçamento do Estado e que o Sr. Ministro hoje aqui reafirmou, ou seja, que o Orçamento do Estado dará os meios indispensáveis e essenciais para o prosseguimento da política de reforma educativa na linha daquilo que se verificou no passado. Isto é fundamental porque, efectivamente, houve partidos que, de algum modo, pretenderam pôr em causa este assunto.

Quero realçar este aspecto sem esconder que, naturalmente, não deixarão de existir problemas que não se ultrapassarão num ano, nem em dois, três, quatro ou cinco, pois, porventura, levarão dezenas de anos a ultrapassar, ou seja, são problemas que têm a ver com qualquer reforma profunda que se quer operar numa estrutura de um país como o nosso. Portanto, penso que existirão alguns problemas que, naturalmente, não deixarão de nos marcar.

Gostaríamos, pois, de salientar que o Orçamento para 1989 dá os meios necessários para o prosseguimento da política educativa. Esperamos que a política que o Governo tem vindo a prosseguir ao longo dos tempos, na linha de tudo aquilo que se tem vindo a fazer no passado, continue, pois isto, para nós, é digno de congratulação.

Para além disto, e porque nos dispensamos de estar a repetir aquilo que, de algum modo, já fizemos na generalidade, quanto aos aspectos que considerávamos dignos de maior destaque a nível do Orçamento, dese-• jaria apenas frisar uma questão, para nós, PSD, essencial, e que, de certo modo, gostaríamos que ficasse hoje, aqui, clara.

Para nós é absolutamente indispensável que haja uma valorização efectiva da carreira docente e da função do professor, sem a qual, efectivamente, nos parece que não poderá ser feita uma qualquer reforma educativa, hoje ou em qualquer futuro, neste país ou em qualquer outro.

Daí que aguardamos, com expectativa, os resultados daquilo que vai ser a valorização generalizada de toda a Administração Pública, esperando que os professores, no âmbito dessa reforma global, venham a ter uma fatia substancial e que responda a este desiderato fundamental, ou seja, àquela que é indubitavelmente a maior reforma a que o País está sujeito.

Isto é uma declaração de princípio,...

Risos.

... que gostaríamos ficasse clara para desfazer equívocos era que, sobretudo o Partido Comunista, vai nadando ...

O Sr. Jorge Lemos (PSD): — Essa é boa!

O Orador: — ... e se vai enfiando cada vez mais e dos quais, naturalmente, terá extrema dificuldade em sair num futuro próximo.

c

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Abrantes.

O Sr. Afonso Abrantes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro e restantes membros do Governo, Srs. Deputados: Na nossa opinião, a educação não deixou de ser prioridade com este Orçamento. Cremos mesmo que já deixou de o ser no Orçamento de 1988. Senão, vejamos: o Sr. Ministro afirmou no ano passado, aqui, nesta Comissão, o que vou citar: «Sobre a famigerada questão da dotação concorrencial, que foi levantada por grande parte dos Srs. Deputados que intervieram, eu tenho algumas garantias para vos dar, entre as quais a minha confiança de que o Ministério da Educação não será afectado negativamente pela dotação concorrencial. E isso, por três ordens de razões fundamentais [...)» (omito a primeira e a segunda e vou ler a terceira). «A terceira é aquela que factualmente vos posso apresentar neste momento, ou seja, a de que na negociação que houve para o Orçamento de 1988, que é apresentada à Assembleia da República, foi possível fazer valer os direitos de alforria — digamos assim — do Ministério da Educação. Assim, como penso que temos muitos e pesados argumentos para apresentar contra a aplicação da dotação concorrencial, e já os tivemos para apresentar a propósito do tecto do orçamento para a educação, e em condições de, que como de resto já foi referenciado por vários Srs. Deputados, apresentar um orçamento bastante bom dentro das dificuldades orçamentais conhecidas e da contenção do défice.»

Esta é uma primeira questão.

Efectivamente, todos sabemos que assim não foi e que se o Sr. Ministro entendia a educação como uma prioridade, como nós, aliás, a considerávamos também, o Governo, também aqui, não cumpriu com aquilo que tinha prometido, pelos vistos, ao Sr. Ministro da Educação, e retirou à educação 8,5 milhões de contos.

A outra questão prende-se com as dívidas aos empreiteiros, mais um exemplo de como, efectivamente, a educação não foi considerada prioridade.

O Sr. Ministro afirmou nesta Comissão, a propósito desta questão, o seguinte: «Logo e à medida que se-

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jam apurados os montantes reais das dívidas, elas serão frontalmente satisfeitas e sem oneração para o orçamento do Ministério da Educação para 1988.»

Assim não sucedeu, e aproveito para perguntar ao Sr. Ministro, dado que pode haver novos dados, qual a importância que foi liquidada da dívida de 4,2 milhões de contos apurada na altura, se essa importância que foi liquidada saiu ou não do orçamento da educação e, ainda, quem vai custear o restante da dívida.

Depois, Sr. Ministro, o artigo 55.° da proposta de lei, já aqui referido, diz que vão reter 10 % da despesa do Orçamento, no cap. 50, de todos os ministérios, até ao 1.° semestre deste ano, ou seja, até Junho.

Porquê esta retenção também no Ministério da Educação, sobretudo se tivermos em consideração que o Ministério tem de funcionar um pouco em função dos anos lectivos e que esta retenção pode prejudicar o lançamento do próximo ano lectivo?

Seguidamente, Sr. Ministro, apresentamos mais um exemplo de como, efectivamente, este orçamento também não é considerado uma prioridade.

Como dizia o Sr. Ministro no ano passado, o Orçamento de funcionamento do ensino superior teve um acréscimo «moderado de 16 %». Ora, o orçamento de 1989 cresce para o funcionamento do mesmo sector apenas 8,3 % e o da educação em geral apenas 8,2 %.

Finalmente, e ainda para que não fiquem dúvidas de que este Orçamento não atribui prioridade à educação, as instalações do ensino básico e secundário tinham uma dotação no investimento do Plano de 1987 de 12 800 000 contos. Este ano, mesmo juntando-lhe os 600 000 contos para pavilhões, a mesma dotação é de 12 258 969 contos. Portanto, não há crescimento e reconhece-se que a situação do parque escolar — foi um aspecto aqui focado na sua intervenção inicial — é uma necessidade, como necessidade é também o apetrechamento dos estabelecimentos dos ensinos básico e secundário, em relação ao que, de modo idêntico, vou referir-me aos números.

Nos investimentos do Plano de 1987 havia uma dotação inicial de 1 500 000 contos; no de 1988, 1 398 000 contos. Quanto à conservação e remodelação do parque — ensinos básico e secundário — os investimentos de 1987 eram dotados com 2 500 000 contos.

Pergunto se, analisada a situação, feito o seu diagnóstico — bem feito, na nossa opinião, pelo Sr. Ministro —, é com este decréscimo que vai resolver os problemas do parque escolar.

Ainda uma outra questão, que me parece constituir uma prioridade da educação no conjunto do orçamento do Ministério, prende-se com o ensino particular e cooperativo, questão esta que gostava de ver explicada com alguma clareza.

Com efeito, o ensino particular e cooperativo é, na minha análise, a única rubrica que sofre aumento no ano de 1988, que não foi afectado pela dotação concorrencial, que viu aumentada a verba inicialmente inscrita, o que deu um acréscimo de 56,9 % em relação a 1987-1988 e que cresceu neste orçamento 14,3 °7o.

Não há dúvida nenhuma de que o ensimo particular, esse sim, é aqui uma prioridade e gostava de saber, naturalmente, porque é que este ensino foi bafejado, por um lado, com a sorte de não sofrer o corte de 1988 e, por outro, de ter ainda este acréscimo para 1989, quando o ensino oficial cresce apenas 8,5 %.

Outra questão que também gostava de colocar ao Sr. Ministro, e que já aqui foi referida, é a da rede do pré-primário.

Gostava de saber, até porque fiz um requerimento que não foi respondido, quantos jardins-de-infância, dos 500 previstos para a zona do PIPs, para este ano lectivo foram efectivamente criados e entraram em funcionamento e já agora, também, quantos dos restantes 300 do total de 800.

Uma outra questão ainda — e esta será, por agora, a última — tem a ver com o encerramento de escolas do ensino primário. O Sr. Ministro afirmou no ano passado, também na discussão do Orçamento, que havia, numa primeira fase, 1100 escolas a encerrar com início no ano lectivo em que nos encontramos.

A minha pergunta é no sentido de querer saber como foi atingido este objectivo, quantas escolas efectivamente foram encerradas, que critérios foram aplicados e, já agora, o que é que isso representou em termos de ganhos e perdas para o Ministério e para as autarquias locais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Moreira.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputado: Começaria pela questão das propinas dos estudantes do ensino superior. Creio que este seria o local adequado para que o Sr. Ministro da Educação nos esclarecesse, em bom rigor, de quais as intenções do Governo em relação a esta matéria. Intenções não apenas no domínio dos quantitativos, que estão em estudo no Ministério da Educação a esse respeito, mas do modas faciendi de toda esta problemática, de como é que o Governo a pensa vir a aplicar, quando pensa vir a aplicá-la e com que critério pensa vir a considerar aquilo que vem classificando como uma maior aproximação das propinas pagas pelos estudantes universitários àquilo que são os custos reais do ensino.

E isto torna-se indispensável, até porque este tem sido um dos argumentos utilizados pelo Governo, para considerar e dar a entender que as verbas destinadas à universidade devem passar a ser consideradas em função de outras fontes de receita que não apenas as do Orçamento do Estado.

Das discussões que tivemos oportunidade de travar, designadamente com os próprios reitores da universidade, é possível verificar que, de forma alguma, o aumento das propinas falado pelo Ministério poderá, em qualquer circunstância, corresponder às necessidades de financiamento que as universidades têm hoje, dado que ficarão, inevitavelmente, bastante distantes e aquém das necessidades de financiamento. É uma forma algo ilusória de tratar este problema aquela que o Ministério tem considerado.

Desde logo se justifica a abordagem de um outro problema, qual seja o dos serviços sociais do ensino superior, até porque a realidade é por demais grave para poder continuar a passar em claro e é pena que em varias discussões do Orçamento seja necessário repetir situações que, no essencial, se mantêm.

O Sr. Ministro da Educação não pode, certamente, orgulhar-se de, depois de já há algum tempo estar a ocupar a pasta da educação, se manter uma situação em que a capitação com direito à bolsa máxima é de

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5000$, ou seja, em que um estudante fdho de famílias que vivam de salários mínimos continua ainda hoje a não poder ter acesso à bolsa máxima que lhe permite frequentar os estabelecimentos do ensino superior.

A bolsa média continua a ser de 10 400$, valor ridículo para os dias que correm e com que, certamente, qualquer um de nós não teria possibilidade de frequentar um estabelecimento do ensino superior. Não a têm, também, os estudantes que recebem esta bolsa, que é ridícula face às necessidades da sua frequência.

O mesmo se dirá quanto ao número de estudantes abrangidos por residências, ainda hoje de 4 %.

Tudo isto leva a considerar que é manifestamente insuficiente a verba inscrita no Orçamento do Estado para esse efeito.

Ora bem, o Governo pensa e proclama o aumento das propinas, mas não pensa e não propõe o aumento, que tem de ser radical e substancial, das bolsas de estudo. A única coisa em que pensa é numa política de empréstimos que faria com que o estudante andasse durante uma boa parte da sua vida a pagar, e a altos juros, aquilo que lhe poderia ser eventualmente emprestado para concluir o seu curso.

Importa clarificar esta matéria: há ou não disponibilidade para um crescimento das verbas para os serviços sociais das universidades?

Uma nota ainda, e inevitável, quanto à questão das universidades. É escusado estarmos aqui a repetir ou a sermos porta-vozes do conjunto de preocupações que os reitores das universidades, as associações de estudantes e um conjunto de entidades têm manifestado de forma pública, designadamente junto da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura.

Creio ser escusado que o Sr. Ministro da Educação venha aqui procurar dar a entender que, afinal de contas, até há grandes crescimentos, que este ano não há restrições, que tudo isto é ilusão das bancadas da oposição! Não é absolutamente nada disto o que se passa! Os números existem e creio não ser necessário estar a repeti-los, mas dos elementos que nos foram enviados por cada universidade saliento o caso da Universidade do Minho, cujas verbas correspondem a 95 % do orçamento de 1988, da Universidade Nova de Lisboa, cujo número de alunos cresce 19 %, enquanto as verbas crescem 1,7 %, e há outros exemplos que poderemos adiantar a este respeito.

O Governo considerou que a Lei de Autonomia Universitária devia ser uma forma de se desembaraçar um pouco dos encargos financeiros que tem com as universidades de ir começando a aliviar um pouco a bolsa, mas, ao contrário, o Governo deveria, sim, ter aproveitado essa lei para apoiar mais eficazmente a universidade, ou, de outra forma, o Governo está a menosprezar o efeito multiplicador que têm as universidades, inevitavelmente, no progresso do conhecimento no nosso país e da educação em geral.

Creio que, a esse respeito, valeria também a pena uma maior explicitação daquilo que é considerado como receitas próprias das universidades. Tivemos há dias, eu e outros Srs. Deputados aqui presentes, oportunidade de, na Universidade de Évora, visualizar, deparar com o espanto do Sr. Reitor e de outros membros da Universidade, pela forma como se consideravam, nos dados que nos foram distribuídos, as receitas próprias daquela Universidade. No fundo, as receitas que ali são referidas são, elas próprias, in-

feriores às despesas que a Universidade tem com os serviços de que provêm aquelas receitas. É o caso, por exemplo, das chamadas «herdades experimentais» as verbas que a Universidade despende com elas são bastante superiores às receitas que essas herdades permitem, regra geral, obter. É ilusório considerar aqui que são receitas líquidas aquelas que, de facto, são receitas brutas e que, como tal, não permitem à Universidade superar as carências do financiamento por via do OE. Será importante clarificar se isto se verifica apenas em relação à Universidade de Évora ou se há outras situações de carácter semelhante a esta.

Por último, uma nota ainda quanto à afirmação que o Sr. Ministro fez em relação às verbas para investigação científica. Não me parece que seja de deixar passar em claro as suas afirmações de um certo regozijo quanto às verbas, dado que os elementos de que dispomos e os que nos são fornecidos, quer pelo Sr. Ministro da Educação quer por outros membros do Governo com responsabilidades na área da investigação científica, nos fazem pensar rigorosamente o contrário, ou seja, não há crescimento de verbas para a investigação — há, em algumas circunstâncias e em boa parte das instituições de investigação e desenvolvimento, redução das verbas. No caso estrito do ensino superior, as verbas apresentadas correspondem a um decréscimo real de cerca de 3 °7o. Estes dados foram-nos disponibilizados pelo Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, prevendo um total de 5 879 000 contos para as universidades em 1989, face a 5 526 000 contos em 1988! São dados que o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior também, ele próprio, já possui, razão pela qual espero que hoje possa dar uma resposta diferente daquela que nos foi dada na Comissão Parlamentar de Educação quando tivemos oportunidade de colocar este problema, embora ainda de forma talvez menos experimentada.

O Sr. Presidente: — Como estão inscritos vários Srs. Deputados, vamos ter de usar o tempo com a parcimônia indispensável à economia de um bem escasso dado que já são 23 horas e 30 minutos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Antes de mais, devo confessar algum embaraço, na medida em que julgo que este debate tem uma razão de ser — é um embaraço legítimo e saudável para o bom funcionamento destas instituições e tem a ver com alguma repetição de debates. Foi por isso que eu disse «muito bem» quando o Sr. Deputado Jorge Lemos começou por afirmar (depois perdeu-se a meio) que não ia repetir o debate na generalidade, mas ia fazê-lo na especialidade. Pelo seguinte: julgo que o debate na generalidade é a sede própria para que cada deputado e, naturalmente, cada grupo parlamentar dê a sua opinião legítima sobre as prioridades que devem enformar a proposta de lei do OE, uma vez que o Orçamento é feito pela Assembleia. Nomeadamente no que tem a ver com o equilíbrio entre as receitas e as despesas e as prioridades relativas que são dadas a cada grande sector da despesa, designadamente de cada ministério, e, dentro de cada um, as principais prioridades orçamentais. Não me parece que possamos ou devamos repetir essa discussão a cada momento no debate na especialidade. E nós devíamos estar já, em sede de especialidade, a ver

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ponto por ponto, quais são as prioridades — uma vez que, repito, o Orçamento é feito pela Assembleia no quadro dos pressupostos já adquiridos aquando da discussão na generalidade.

O Sr. Presidente: — Apoiado! Apoiado!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente. V. Ex.a lisonjeia-me sempre com a sua estima e consideração.

Risos.

Quero eu dizer com isto que, em nossa opinião, ficou adquirido um referencial político da proposta de lei que o Governo nos apresenta, que tem a ver com o grande objectivo de reduzir o défice do OE. E como o meu companheiro de bancada, o deputado Jorge Paulo Cunha, em nome da JSD, teve ocasião de reforçar no debate na generalidade na tribuna da Assembleia da República, para a JSD essa é uma prioridade indiscutível. O endividamento progressivo do Estado reflecte-se nas gerações vindouras e só por ingenuidade ou por qualquer outra razão adjectivavel de maneira menos feliz poderíamos defender o endividadamento progressivo do Estado sem ter em atenção a responsabilidade que a geração que no momento está no poder tem, indiscutivelmente, sobre as próximas gerações.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito obrigado, Sr. Deputado Jorge Lemos. Mas temos de dar consequência e esta preocupação — não vale a pena dizermos apenas «muito bem» ao facto de lutar contra o endividamento do Estado; temos de saber muito bem qual a consequência que damos a esta afirmação de princípio.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Estou a gostar muito da sua intevenção na especialidade.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Não peco mais do que V. Ex.a

O Sr. Presidente: — Convém não exagerar no pecado, não reincidir.

Risos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Se as interrupções não me impedirem, tentarei ser mais breve. Isto para dizer, passando à especialidade, que, se a JSD concorda com esta posição de princípio, tem de tirar daí a sua consequência. E a consequência é dizer que, se entendemos que devem ser aumentadas algumas verbas, em sede de especialidade, do OE, temos de ver qual é o equilíbrio que tem de se buscar, de forma a não aumentar o défice do OE.

Foi nesse sentido que perguntei ao Sr. Deputado António Barreto, no debate na generalidade, se não entendia que devia concretizar a sua acusação política de falta de prioridade para a área da educação, com a denúncia de qual a outra área do OE que seria mais beneficiada do que a educação, em relação ao Orçamento de 1988; mas, não obstante a maneira simpática e, naturalmente, delicada como o Sr. Deputado António Barreto me respondeu, não deu resposta a esta

questão fundamental. Ou seja, não enumerou, perante o Plenário da Assembleia da República, outras áreas que fossem mais beneficiadas do que a área educativa.

Sr. Ministro da Educação, é fundamental situarmo--nos em relação a algumas matérias que dizem particularmente respeito aos jovens e que, aliás, foram objecto quer do parecer da Comissão Parlamentar da Juventude quer da intervenção do meu companheiro de bancada deputado Jorge Paulo Cunha. Há duas que já foram aqui referidas, mas que a JSD gostava de novamente trazer ao debate: a primeira é a autonomia universitária; todos nós concordamos que o espírito da Lei de Autonomia Universitária, que foi aprovada por unanimidade no Plenário da Assembleia da República, comporta uma responsabilidade acrescida para as universidades desde logo e também na captação de receitas próprias. A questão não surge, no entanto, colocada nesse plano — surge num outro, que foi evidenciado nos dois documentos a que já fiz referência, a saber: se, no primeiro ano de implementação da Lei de Autonomia Universitária, seria ou não defensável um acrescido investimento por parte do Estado, no sentido de pôr a máquina a rolar de maneira mais oleada. A pergunta concreta que gostaria de lhe fazer, entrando no debate de especialidade, é se o Sr. Ministro concorda ou não que assim é, ou seja, que deveríamos reforçar o apoio do Estado às universidades, para além daquela componente que constituirá sempre responsabilidade do Estado, por esta razão — a de este ser o primeiro ano de implementação da Lei de Autonomia Universitária.

A segunda pergunta que gostaria de lhe fazer tem a ver com a acção social escolar, particularmente com a do ensino superior, que também já aqui foi referida, e colocá-la-ia nas seguintes condições: embora isso crie muitos engulhos a alguns Srs. Deputados e a alguns grupos parlamentares, o que é facto é que uma lógica de justiça social obriga a que entendamos que não podem pagar todos o mesmo — devem fazê-lo de acordo com as suas possibilidades. Provavelmente, dentro daquilo que o Sr. Ministro já teve ocasião de anunciar perante a Assembleia da República, há alguma margem de captação de outras receitas para fazer face a despesas na acção social escolar.

Gostaria de recordar aqui, perante a Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano, e como valor de opinião política publicamente expressa, que a JSD entende que todas as verbas obtidas com o eventual aumento das propinas no ensino superior devem ter repercussão directa no aumento das verbas disponíveis para a acção social escolar. Mas, mais do que isto, a pergunta que eu gostaria de fazer ao Sr. Ministro é se há algum grau de previsibilidade, a auto prazo, de a acção social escolar ver engrossadas as suas receitas por outras fontes, e, se assim não for, se não seria defensável que neste momento outra fosse a verba afecta à acção social escolar universitária.

Para terminar, nestas duas matérias que, na área educativa, reflectem as maiores preocupações da JSD, gostaríamos de fazer uma pergunta que tem a ver com a consequência política do debate, nos pressupostos que tive ocasião de referir em primeiro lugar, isto é, na estrutura da despesa do Ministério da Educação, vê o Sr. Ministro alguma verba cujo aumento em relação ao orçamento de 1988 tenha sido feito de forma que aí possamos ir buscar verbas que possam permitir aumen-

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tar quer a acção social escolar universitária quer o apoio às uruversadad.es? Partindo do princípio de que está fixado o plqfond atribuível ao Ministério da Educação, entende o Sr. Ministro que é possível ir buscar a outra verba do Orçamento o dinheiro suficiente para fazer face a estas duas preocupações que acabei de lhe exprimir? Se assim for, aonde e em que termos?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): — O Sr. Deputado António Barreto interpelou o PSD no sentido de saber, se bem entendi, da receptividade relativamente a propostas de alteração. Quanto a isso, dir-lhe-ia que pronunciarmo-nos sobre propostas em abstracto é impossível de fazer. O que lhe posso dizer, e V. Ex.B sabe-o tão bem como nós, é que este Orçamento — como outros do passado e, seguramente, ainda alguns orçamentos do futuro — foi elaborado com alguns constrangimentos, desde logo a escassez de recursos e, por outro lado, a necessidade imperiosa de conter as despesas públicas e de, assim, obter uma adequada redução do défice. O Orçamento do Estado é, pois, um instrumento que assim tem de ser considerado e será seguramente a esta luz que o PSD vai estudar as propostas de alteração que eventualmente vierem a ser apresentadas e depois julgá-las-á em conformidade com estes princípios que enunciei.

O Sr. Presidente: — V. Ex." acabou o seu pedido de esclarecimento, e acabou bem, porque enunciou algo que é evidente e com o que estou de acordo.

Risos.

Não havia justificação para pôr em dúvida, como parece que foi posto antes. Tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madail.

O Sr. Gilberto Madail (PSD): — Antes de mais, gostaria de felicitar o Sr. Ministro e a equipa da Educação pelo bom trabalho e bom desempenho que têm vindo a realizar no País — penso que isso é incontestável e é reconhecido pela maioria das pessoas.

Em sede de especialidade, quero apenas focar dois pontos que, na minha perspectiva de deputado eleito pelo círculo de Aveiro, me parecem importantes.

O primeiro ponto relaciona-se com a questão da Universidade de Aveiro. Esta Universidade é uma das chamadas universidades novas que tem tido a expansão que o Sr. Ministro da Educação e o Sr. Secretário de Estado sabem e que vai ter agora uma responsabilidade acrescida com a abertura do eixo do IP5 e, particularmente, com a melhoria geral das vias de comunicação nacional ao nível do distrito.

Chamo, pois, a atenção dos membros do Governo aqui presentes para o orçamento das despesas correntes desta Universidade, que não me parece suficiente para encarar o embate que ela vai ter.

Tenho tido oportunidade de conversar com o Sr. Reitor da Universidade de Aveiro, que, mau grado pertencer a um partido da oposição, se mostrou extremamente agradado com 0 PIDDAC atribuído à Universidade. Porém, pediu-me para chamar a atenção do Governo para a questão do orçamento de despesas

correntes, porque esta universidade vai estar sujeita a fortes pressões que são a consequência lógica do próprio desenvolvimento do distrito.

O segundo ponto que gostaria de levantar e que creio que o Sr. Ministro estará mais por dentro, digamos assim, é o que se prende com o apoio que o Governo deve ou não dar às associações desportivas. Aliás, temos tido oportunidade de conversar sobre isso com o Sr. Ministro e de expor esta nossa preocupação.

Considerando que as associações desportivas — e para além do futebol refiro-me a outras áreas — são, de facto, a coluna vertebral do desporto em Portugal, não do desporto espectáculo, mas sim do desporto pelo desporto. A verdade é que as associações desportivas foram altamente penalizadas, em particular com a nova redistribuição da matriz de acesso às verbas do Totobola e do Totoloto, situação que o Sr. Ministro conhece, sendo certo, também, que tem demonstrado toda a disponibilidade para resolver o problema. Contudo, pensamos que terão de ser dados passos mais concretos, sob pena de aquilo que é o verdadeiro fomento do desporto num primeiro grau, que é feito pelas associações desportivas, poder vir a ser perdido.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por me manifestar sensibilizado e comovido pela preocupação manifestada pelos Srs. Deputados da oposição pelo orçamento do Ministério da Educação, nomeadamente com as verbas da reforma educativa.

Como já referi na intervenção que fiz, creio que não há motivos sérios para preocupações, tal como se encontra evidenciado na vasta documentação que foi distribuída, documentação essa, aliás, singularmente'pormenorizada e detalhada, como alguns Srs. Deputados da oposição já fizeram o favor de considerar.

As grandes actividades e prioridades da reforma educativa encontram-se dotadas naquilo que significa o necessário e o suficiente — como há pouco foi sublinhado — para que sejam levadas por diante.

Temo que a grande maioria das questões que aqui foram levantadas, como disse o Sr. Deputado Carlos Coelho, sejam «questões requentadas». Na medida do possível, elas já foram discutidas e amplamente esclarecidas em sessões anteriores do debate na especialidade.

Na realidade, a elaboração de um orçamento é sempre um exercício complicado porque as prioridades defrontam-se com a escassez relativa de recursos. Portanto, há sempre um conflito de prioridades, seja qual for o Governo e o orçamento em elaboração.

O problema dos orçamentos da educação não é um problema típico português. Como os Srs. Deputados sabem, em toda a Europa da CEE há uma discussão generalizada sobre a forma de encontrar fontes alternativas de financiamento, de conter despesas, de aumentai a eficiência no sector sem reduzir a equidade e a justiça social. Ora, este é um problema a que não podemos fugir! Temos que o encarar de frente e ter a coragem de afrontar as questões tal como elas hoje se colocam!

Portugal tem ainda hoje uma percentagem do défice do orçamento em percentagem do PIB bastante ele-

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vada, se o compararmos, por exemplo, com a vizinha Espanha. É, pois, necessário que essa percentagem desça!

Esta Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano seria a última a, responsavelmente, poder colocar a questão das despesas sem atender ao seu equilíbrio relativamente às receitas e à necessidade de não empenhar as gerações futuras, como referiu o Sr. Deputado Carlos Coelho.

Não creio que seja justo afirmar que há uma perda de prioridade na educação. Na realidade, e em termos relativos — essas coisas nunca podem ser analisadas em termos absolutos —, o orçamento da educação é daqueles que percentualmente mais progride no Orçamento de 1989 — e não apenas aquilo que está expresso em valores absolutos, em números, na proposta de lei do Governo, como aquilo que se encontra implícito na proposta de lei, nomeadamente o recurso a fundos comunitários.

A grande vitória nacional que recentemente foi obtida, quer no novo regulamento-quadro dos fundos comunitários, quer nos regulamentos de aplicação, nomeadamente no Fundo Social Europeu e no FEDER, que vieram totalmente ao encontro das nossas teses, irá certamente permitir a canalização de fluxos acrescidos de recursos de origem comunitária para o financiamento, nomeadamente de investimentos na área da educação.

Gostaria de dar testemunho que — uma vez que uma das razões fundamentais pela qual há pouco tempo estive em Bruxelas teve a ver com isso — na última reunião do Conselho de Ministros dos Assuntos Gerais foram finalmente aprovados os regulamentos de aplicação. E na reunião dos Ministros da Educação tivemos ocasião de discutir a respectiva aplicação, nomeadamente para os países do objectivo n.° 1, de entre os quais Portugal se encontra, e a cláusula que se encontrava já aprovada no regulamento-quadro e que foi repescada para o regulamento de aplicação do Fundo Social Europeu, onde se singulariza o caso português como um caso em que o Fundo Social Europeu deve ser canalizado para acções institucionais de formação, e não apenas para acções não formais de educação e de formação profissional.

3à foi possível apresentar um conjunto de candidaturas bastante vasto para 1989, não obstante o facto de este regulamento de aplicação entrar em vigor, fundamentalmente, em 1990. Como sabem, as candidaturas para o Fundo Social Europeu, ao contrário de outros fundos, não são rolantes, são candidaturas que se colocam, de uma vez, dentro de prazos previamente determinados para o ano seguinte, e os prazos para 1989 já foram «queimados».

No entanto, antecipando em larga medida aquilo que julgaríamos ser e veio a ser confirmado, a evolução do regulamento-quadro e do regulamento da aplicação e a defesa das nossas teses e a respectiva aplicação foi já possível — como já tive ocasião de anunciar em reuniões anteriores com os Srs. Deputados —, um conjunto de candidaturas bastante vasto na área da educação para o Fundo Social Europeu. O FEDER tem vindo a aprovar sistematicamente as nossas propostas, como já aconteceu em 1988, relativas a instalações, a construção de escolas, não apenas dos blocos vocacionais e dos laboratórios, mas escolas inteiras do ensino secundário e do ensino preparatório. E no novo regu-

lamento do FEDER — isto é importante sublinhar não apenas para a administração central, mas até para as autarquias locais — não está, em princípio, vedado qualquer sector da educação, desde o ensino básico até ao ensino superior, ao respectivo financiamento.

Devo dizer que isto representa uma evolução muito grande em relação ao Tratado de Roma. O Tratado de Roma não falava na educação, falava apenas em termos de formação profissional, e representa, de facto, uma derrogação daquilo que era a letra — para não falar no espírito — do Tratado de Roma. Isso significa que, a partir do ano de 1989, teremos oportunidades acrescidas, o que, de resto, coloca uma responsabilidade muito grande sobre toda a administração portuguesa, repito, administração central e autarquias locais, no sentido de aproveitar plenamente estes recursos e esta oportunidade que os fundos comunitários nos trazem.

É evidente que, como foi sublinhado pelo Sr. Deputado António Barreto e outros Srs. Deputados, há um acórdão do Tribunal Constitucional que declara como inconstitucional alguns artigos do Orçamento de 1988 que pessoalmente não conheço. Ainda não conheço o respectivo texto e suponho que ele ainda não foi distribuído, nem sei se já foi redigido na sua versão final ou se se encontra para publicação.

Sei que alguns artigos da Lei do Orçamento de 1988, nomeadamente aquele que se refere aos 30 % do FEDER, terão sido postos em causa pelo acórdão do Tribunal Constitucional.

Em primeiro lugar, julgo que a publicação desse acórdão — isto é um facto concreto, temporal, cronológico — e a respectiva eficácia não se operará a tempo de ser eficaz para o Orçamento de 1988, pois isso, como sabem, obedece a prazos.

Em relação a 1989 há uma norma análoga que até aumenta a percentagem em que o sector seria beneficiado, de 30 % para 50 %, já dentro do espírito da canalização de fundos acrescidos da CEE e de um benefício acrescentado ao sector que tem feito um grande esforço para candidatar projectos ao FEDER.

É claro e tenho confiança que, sendo essa norma declarada inconstitucional, o seu espírito e a sua intencionalidade se mantêm. Isto é, será encontrada uma maneira de que os fundos, e nomeadamente o FEDER, não deixarão de ser canalizados para a educação e não deixará de ser atribuído um prémio — no fundo era este sentido da norma que estava no Orçamento de 1988 — em relação a um sector que se empenha tão fortemente e desenvolve um grande esforço técnico no sentido de apresentar um grande volume de candidaturas ao respectivo financiamento da CEE.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Deputado, permite--me que o interrompa?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Creio que todos estaríamos de acordo com o esforço.

Vejo que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento está a dizer que sim, pelo que gostava de perguntar ao Sr. Ministro da Educação como é que esse esforço vai ser canalizado.

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O Tribunal Constitucional acabou de dizer «não» e o Sr. Ministro diz «sim, de outra maneira». Gostava de saber qual é a maneira no quadro do Orçamento e da disciplina orçamental.

O Orador: — Sr. Deputado, não vou entrar neste momento nas minudências da solução jurídica; essas formas estão a ser estudadas em sede de alguns grupos parlamentares, nomeadamente o da maioria, em articulação com o Governo.

Acrescentaria apenas que, como o Sr. Deputado sabe, as verbas do Fundo Social Europeu são adicionais, apesar de não estarem orçamentadas, e nunca foi posta em causa a questão de não serem adicionais.

As verbas do FEOGA, no essencial, no que se traduz no PEDAP, etc, encontram-se orçamentadas no PIDDAC dito de apoios, mas são adicionais, têm sido consideradas como tal aos orçamentos normais.

As verbas do FEDER para autarquias locais são, essencialmente, verbas adicionais na percentagem que representa de co-financiamento dos respectivos projectos.

Portanto, nunca houve dificuldade em relação a esses vários sectores e na aplicação dos vários fundos comunitários, mas acredito que seja possível com imaginação, com talento e nomeadamente com uma intencionalidade que parece ser consensual encontrar uma resposta adequada para que essas verbas também venham, pelo menos em termos parciais, com adicio-nalidade ao orçamento do Ministério da Educação.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Mas quando é que saberemos isso?!...

O Orador: — Sr. Deputado, saberá a breve trecho, espero que ainda de acordo com a formulação final que venha a ser aprovada na Lei do Orçamento para 1989. Saberá, com certeza, a forma de encontrar a solução.

O Sr. Deputado António Barreto levanta a questão da desigualdade social.

V. Ex.a, como muito bem compreenderá, não detém

com certeza o monopólio da preocupação pela igualdade e pela justiça social. Essa preocupação é também minha, tenho-a manifestado em várias e diversas circunstâncias e tenho procurado, muito sinceramente, fazer premiar as principais medidas de reforma educativa que temos promovido e iremos promover por essa preocupação. É claro que há um velhíssimo conflito na sociologia da educação que é o da eficiência versus equidade. Trata-se de um problema discutido e redis-cutido e sobre o qual não há uma solução final.

Por um lado, é necessário ganhar eficiência, que os dinheiros sejam aplicados com maior rendibilidade, ou seja, que os output cada vez correspondam melhor ao volume de input que são canalizados para o sector.

Para tratar estas questões, ainda no último fim-de--semana teve lugar uma conferência internacional que contou com a presença de representantes de vários Ministérios da Educação e de altos representantes sobre os problemas da eficiência no ensino superior, e obtiveram-se resultados bastante interessantes.

Contamos, também, com relatórios de organizações internacionais que recomendam algumas vias que podem e devem ser seguidas e intensificadas nos próximos tempos, no sentido de alcançar esse ganho de eficiência — que é um imperativo nacional — e de transparência na utilização de recursos que são escas-

sos e que custam muito trabalho a produzir aos portugueses que pagam honestamente os seus impostos, e relativamente aos quais o Governo tem de ter, a cada momento, um elevado sentido de responsabilidade quando se trata da respectiva aplicação.

No entanto, também é evidente que num país, carenciado como o nosso, onde ainda existem, reconhecidamente, bolsas de probreza muito grandes, onde ainda há desigualdades no acesso e na fruição de alguns bens públicos e essenciais, como é o caso da educação, essa procura de eficiência não pode ser cega nem discriminatória nem acentuar as injustiças sociais.

Por estas razões, tenho pré-anunciado que em tudo o que pretendemos fazer na procura de maior margem de receitas no ensino superior, que é um esforço de geração de outras fontes de financiamento e de receitas, nomeadamente as que provêm das propinas, vai ter de recair principal ou exclusivamente sobre aqueles agregados familiares que estão em condições de sustentar esse esforço e de pagar esse valor, que consideramos ser justo, por um serviço que lhes é prestado. Com efeito, esse esforço e a receita assim gerada deve ser, no essencial, canalizada para objectivos de maior justiça social e para uma redistribuição efectiva de rendimento na população portuguesa. A tal ponto que — como também já tive ocasião de dizer em público —, tenho um acordo com o Sr. Ministro das Finanças no sentido de que, no momento em que entrar em vigor o novo sistema de pagamento das propinas, seja possível, por um instrumento muito ágil e directo, que pode ser, por exemplo, uma declaração sob compromisso de honra e, eventualmente, uma anexação de uma fotocópia simples da última declaração do imposto complementar ou do IRS, isentar do pagamento das propinas sem mais burocracia ou exigências burocráticas, e também sem prejuízo da verificação a posteriori, por amostragem, da falsidade ou veracidade das respectivas declarações.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Toda esta actuação tem o objectivo de não penalizar aqueles que, pelo contrário, devem ser beneficiados por uma medida de maior justiça social que hoje não existe.

O sistema actualmente em vigor traduz uma manifesta injustiça social.

Em breve, através de um estudo económico que está a ser feito, estarei em condições de demonstrar como o actual sistema de propinas, que se mantém inalterável há 47 anos, representa concretamente uma transferência líquida de rendimento das populações de mais fraco poder económico para as de maior poder económico, uma vez que todos pagam impostos e apenas alguns chegam ao ensino superior e podem fruir dele, o qual é virtualmente gratuito em Portugal.

Com certeza que essa desigualdade social no acesso à educação não se combate apenas por medidas ou por enunciados de retórica. Ela tem de combater-se em todos os domínios concretos da política e da acção educativa, onde ela exista.

No caso do ensino superior, pelas medidas que tenho vindo a enunciar e que estão previstas na proposta de lei do Orçamento, onde se prevê a revisão do imposto do selo no sentido de que as receitas das propinas deixem de ser pagas em estampilhas fiscais e pos-

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sam ser — como decorre do disposto na Lei n.° 108/88, que define a autonomia das universidades — receita própria da universidades. Esta medida deverá também ser estendida ao ensino básico e secundário.

Srs. Deputados, é preciso que não se esqueçam que o essencial da desigualdade no acesso à educação ocorre, infelizmente, não no ensino superior, mas em níveis educativos anteriores, pois verifica-se, logo à partida, no ensino básico, depois no secundário e, portanto, não só no ensino superior.

Vozes do PCP: — Muito bem. Apoiado!

O Orador: — Srs. Deputados, com este coro de vozes que diz «Muito bem. Apoiado!», muito me espanta que o essencial das vossas preocupações, manifestadas durante estas horas de debate, se concentrem apenas ao nível das universidades.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Vozes do PS e do PCP: — Não é verdade!

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — O Sr. Ministro está a falar para a JSD!

O Orador: — Srs. Deputados, a transcrição desta sessão vai permitir demonstrar à saciedade como o essencial das vossas preocupações em relação ao Orçamento do Estado para 1989, pelo menos quanto ao debate na especialidade, se situa no orçamento das universidades.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — A JSD é que falou nisso!...

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Ministro, V. Ex.a ainda está a tempo de ler a nossa declaração de voto comunicada à Comissão de Economia, Finanças e Plano e ao Plenário.

O Orador: — Sr. Deputado, vou lê-la com muito gosto, mas estou a referir-me às manifestações orais das vossas preocupações durante esta sessão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado! Mas solicito-lhe que depois me deixe concluir a minha intervenção, porque não podemos estar com interrupções permanentes para bem da continuidade dos nossos trabalhos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro, creio que V. Ex.a poderia dirigir esse tipo de acusação a algumas intervenções proferidas por elementos da bancada da maioria. Não deveria ignorar é que, pelo menos, da parte da minha bancada, houve uma intervenção específica sobre a problemática do insucesso escolar, que não tem a ver com as questões universitárias, e durante a qual colocámos todos os problemas relativos à educação pré-escolar, à situação dos professores no ensino básico e secundário, questões que também se prendem com o sucesso ou com o insucesso, com a transferência de competências para as autarquias e ainda outras.

O Sr. Ministro, ao dizer que só falámos nas universidades, leva-me a concluir que tomou poucos apontamentos e, nesse caso, a leitura da acta desta reunião será mais útil ao Sr. Ministro e aos Srs. Deputados do PSD do que aos deputados do PCP.

O Orador: — Sr. Deputado, quero dizer-lhe que tomei vastos e pormenorizados apontamentos, aliás, no respeito que me merecem todas as intervenções vindas de qualquer grupo parlamentar representado aqui nesta sessão como em outras.

Aliás, no seguimento da minha intervenção, vou referir-me às outras questões que V. Ex." enunciou, designadamente às questões do acesso à educação, que, infelizmente, se colocam de forma dramática, quer no que diz respeito ao cumprimento da escolaridade obrigatória durante nove anos, que vem prescrita na Lei de Bases do Sistema Educativo, quer no aumento da taxa de escolarização no ensino secundário. Ainda é muito restrita a percentagem de alunos que chegam ao final do ensino secundário, que, como VV. Ex.as sabem, é de apenas 40 %.

Na verdade, é e será sempre o nosso objectivo primordial no PRODEP — que desejamos que esteja, no essencial, aprovado, em sede de Governo, e em condições de divulgação até ao final deste ano — aumentar a taxa de escolarização e o acesso a todos o níveis educativos, onde se inclui o ensino superior, é certo, mas é óbvio que para aumentar o acesso ao ensino superior é necessário aumentar o acesso ao ensino básico e secundário, isto é, que o nível do recrutamento para o ensino superior se faça numa base mais larga.

De nada serve apregoar que o grupo etário do ensino superior deve passar de 11 % para 18 °7o ou 20 °7o, se na base não se aumenta a área de recrutamento do ensino secundário, para que, pelo menos, entre 70 % e 80 % dos alunos que chegam ao final do ensino secundário tenha acesso ao ensino superior.

Por estas razões, vai continuar a ser feito um grande esforço em matéria de investimentos no parque escolar do ensino básico e secundário.

Ainda hoje foi entregue aos Srs. Deputados um documento sobre esta matéria, onde se pode verificar que o número de empreendimentos em 1989 vai estar próximo dos 100, ou seja, cerca de 100 novas escolas, das quais uma grande parte vai entrar no parque escolar em 1989, o que significa e manifesta um grande sentido de prioridade com o objectivo de aumentar o acesso à educação, aliás, na sequência do que já vem sendo feito nos últimos anos.

A título de indicador relativo, faço lembrar que em todo o período do Estado Novo, ou seja, em cerca de 50 anos, foram construídas no total pouco mais do que 50 escolas secundárias.

Hoje, estamos a construir, num único ano, mais de 50 escolas. Em 1988 vão entrar no parque escolar 56 novos empreendimentos e em 1989 vão entrar mais novos empreendimentos e em número superior. Trata-se de um esforço sem precedentes à escala nacional e os portugueses saberão certamente reconhecê-lo.

Quanto à questão dos professores, gostaria também de tecer alguns comentários, porque se trata de uma questão estrategicamente vital para a reforma educativa, para o carácter de mobilização que tem de manter--se no sector, que deve não só aceitar como também

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participar activamente na reforma educativa. Creio — e tenho já afirmado várias vezes — que não será possível fazer a reforma educativa sem mobilizar todos os segmentos sociais interessados, que são parte fundamental dessa reforma educativa e, naturalmente, que os professores constituem a parte fundamenta] dessa reforma. Não tenho qualquer dúvida em voltar a dizer que me parece que o estatuto social dos professores está hoje muito mais desvalorizado do que há vinte anos. Hoje, não se considera o professor da mesma maneira que há quinze ou vinte anos atrás e isso é grave, sobretudo numa sociedade que quer investir no futuro, nos jovens, na educação e no essencial dos seus interesses.

Portanto, é necessário que a classe docente tenha uma revalorização global do seu estatuto.

Não se trata apenas de revalorizar o seu estatuto remuneratório, em que uma eventual revalorização deve ocorrer em 1989, mas, em meu entender, essa revalorização geral deve resultar de um sentimento nacional e de um sentido global. Mas essa revalorização, em termos de estatuto social, não deve ser colocada como um mero objectivo apriorístico sem que na sociedade seja considerada como um valor a preservar.

Por outro lado, é evidente que não se pode destacar a classe docente, por importante que ela seja, do conjunto do funcionalismo público, pois seria desonesto fazê-lo.

Aliás, já várias vezes me pronunciei publicamente nesse sentido e elucidei as várias frentes e associações sindicais que, desde Março deste ano, têm negociado com o Ministério da Educação o estatuto dos docentes do ensino básico é secundário.

Neste momento o Governo já apresentou às frentes sindicais da Administração Pública um projecto de diploma sobre o regime geral do sistema retributivo da função pública, sobre o qual aguarda pareceres até ao dia 6 de Dezembro.

Até ao final deste ano espera-se que, com base nos pareceres e numa negociação que certamente irá ocorrer na sequência desses pareceres, seja possível consolidar o modelo.

É necessário saber se nos conseguimos pôr de acordo, se há ou não corpos especiais, se o regime é ou não indiciário, se se põe fim ao regime de letras que tem vigorado desde há dezenas de anos até hoje, se a revalorização se fará ou não globalmente e em sistema de harmonia e coerência e como é que os parâmetros ou índices dos corpos especiais se reportarão aos do próprio sistema central nuclear da função pública.

Não queremos que a grande reforma estrutural da •^Administração Pública, nesta matéria sobre o sistema retributivo, se venha a saldar por um fiasco, por um novo sistema destituído de harmonia e de coerência, como o que actualmente existe e que herdamos e que é uma floresta de vencimentos que está destituído de qualquer coerência.

Assim, é necessário que o novo sistema retributivo seja desenvolvido globalmente, obedecendo a parâmetros de negociação que não podem fazer-se apenas sectorialmente.

Por esta razão, o Ministério da Educação, solidário como está com os outros membros do Governo, nesta matéria, não pode nem deve desencadear uma negociação de grelhas salariais sem que o essencial do modelo esteja estabilizado.

Srs. Deputados, devo dizer-lhes que esta postura do Ministério da Educação foi esclarecida desde o primeiro momento — e até por escrito — em que os princípios fundamentais do Estatuto dos Docentes do Ensino Básico e Secundário foram postos à discussão em Março passado.

No entanto, o Ministério da Educação não se sentia autorizado, nem poderia avançar numa proposta ou numa negociação de grelhas salariais, sem que o essencial do sistema global estivesse estabilizado e, inclusivamente, negociado com as frentes sindicais na sua aplicação genérica na função pública.

Muito proximamente, o Ministério da Educação, através do Sr. Secretário de Estado Adjunto, em articulação e até com a presença de outros membros do Governo, que estão medularmente interessados e a conduzir este processo, nomeadamente a Sr.a Subsecretária de Estado da Modernização Administrativa, vai receber cada um dos sindicatos e frentes sindicais, que têm vindo a negociar o estatuto da carreira docente com o Ministério da Educação, no sentido de lhes dar a conhecer objectivamente qual é o calendário possível de desenvolvimento das negociações e quais os diversos passos e etapas que deverão ser cumpridas durante o ano de 1989 para que, com rigor, se possa chegar a um quadro geral de sistema retributivo, que seja mais justo, mais revalorizador de todas as funções e de todos os sectores que compõem a função pública e, nomeadamente, que possa trazer também a necessária e justa revalorização ao corpo docente.

Esta indicação do calendário será feita, com certeza, antes do final do ano corrente.

Ainda no âmbito das questões de ordem global, gostaria de, muito rapidamente, comentar a que diz respeito ao Conselho Nacional de Educação e que o Sr. Deputado António "Barreto referiu.

Se bem me recordo, o estabelecimento de um Conselho Nacional de Educação constituía uma grande reivindicação de vários grupos parlamentares da oposição, nomeadamente do Partido Socialista. Quando tomei posse, há cerca de 16 meses, recordo-me de que uma das invectivas feitas ao Governo era a de este ainda não ter criado as condições para a entrada em funcionamento do Conselho Nacional de Educação, instituição criada uns anos antes por um decreto-lei que, depois, foi objecto de alteração através de uma ratificação por lei da Assembleia da República.

Desde o primeiro momento, o Governo, no âmbito das competências próprias, empenhou-se em propiciar as condições para a criação desse Conselho. Também o Grupo Parlamentar do PSD criou todas as condições para a eleição de um presidente do Conselho Nacional de Educação. Em Abril passado ou até antes, os vários grupos parlamentares designaram os respectivos representantes para este Conselho, o Governo também designou prontamente os seus sete representantes e o Conselho Nacional de Educação entrou em funcionamento. Neste momento, está constituído e penso que já está eleita a respectiva Comissão Permanente com todos os seus membros. Tanto quanto sei, o Conselho tem vindo a analisar as várias propostas e projectos do Governo e, de resto, já nos foi enviado parecer sobre um dos projectos do Governo, o da Universidade Aberta.

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Sr. Deputado António Barreto, o facto de o Conselho Nacional de Educação funcionar e receber propostas para emissão de pareceres não é, com certeza, bastante e suficiente para o Governo desvalorizar, quer o Parlamento, quer a Comissão Parlamentar de Educação. E certamente não cometeremos a indelicadeza de enviarmos propostas à Comissão Parlamentar de Educação solicitando um parecer, tal como as enviamos ao

Conselho Nacional de Educação, pois a função da Comissão Parlamentar não é a de emitir pareceres sobre propostas do Governo. De facto, a função do Parlamento é fiscalizar os actos do Governo a posteriori, dizer se acha bem ou mal o que o Governo faz e não debruçar-se e emitir opinião sobre as propostas ou projectos do Governo. Se assim não fosse, julgo que estaríamos perante uma monumental confusão e uma sobreposição de funções. Aliás, é este o sentido que decorre dos vários diplomas que criaram e que regulam o Conselho Nacional de Educação. Portanto, julgo que não há qualquer margem de equívoco nem qualquer sobreposição de competências.

O Governo, como sempre o fez e fará, respeita o papel da Comissão Parlamentar de Educação. Temos comparecido perante esta Comissão sempre que solicitados e temos procurado estar sempre disponíveis para fornecermos toda a informação e documentação exigível e exigida pelos Srs. Deputados para analisarem os actos do Governo e certamente continuaremos a manter essa conduta.

Repito que, certamente, não cometeremos a indelicadeza, perante o Parlamento, de enviarmos documentos solicitando pareceres à Comissão Parlamentar da Educação, Ciência e Cultura.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Mas já nos enviaram um decreto-lei com um pedido de emissão de parecer!

O Orador: — Não, Sr. Deputado, deve estar enganado. Não há nenhum pedido por escrito de parecer sobre isso ...

Vozes do PS: — Há, há, Sr. Ministro!

O Orador: — O Sr. Deputado está certamente enganado.

Srs. Deputados, a seguir, pedirei aos Srs. Secretários de Estado que vos dêem as informações na especialidade que pediram, mas gostaria ainda de abordar duas ou três questões de fundo, nomeadamente o Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Escolar que foi referenciado por vários Srs. Deputados.

Nunca dissemos que este é um Programa perfeito e nunca nos manifestámos totalmente satisfeitos com ele. De facto, há um grau de insatisfação que é natural em relação a um Programa deste volume com esta implantação territorial e atendendo ao número de escolas e de alunos e professores que abrange. Assim, da nossa parte, há um sentido reiterado de humildade, perante a magnitude da tarefa com que nos defrontamos.

O problema do insucesso escolar é um problema gravíssimo e de natureza estrutural na sociedade portuguesa que se arrasta há dezenas de anos. Com certeza que os Srs. Deputados têm consciência disso e que não

é em seis meses ou num ano que irá ser erradicado. Nenhum de nós teve sequer essa atitude perante o problema.

De resto, a própria resolução do Conselho de Ministros que aprovou o PIPSE refere que se trata de um programa de emergência que apenas foi aprovado e avançou em face da constatação honesta de que não é possível continuar à espera das consequências da reforma de fundo do sistema educativo, a qual acarre-

terá a terapêutica estrutural de fundo para o problema do insucesso escolar, desde a reforma curricular até ao novo esquema de formação de professores, até à reorganização da rede escolar com a eliminação total das escolas minúsculas e a consequente criação de escolas centrais dotada de meios que satisfaçam as necessidades pedagógicas das crianças, até à criação de condições de atendimento e de apoio às crianças com dificuldades de aprendizagem ou com dificuldades de natureza social.

Por conseguinte, o Conselho de Ministros deliberou que seria necessário lançar, de imediato, um programa de emergência para, durante os três anos da sua vigência, ir atendendo àquelas gerações mais sacrificadas que não podem nem devem esperar pelos resultados da aplicação eficaz da reforma educativa. Aliás, tal como aqui já foi afirmado hoje mesmo, aquela reforma levará muitos anos — mais de uma dezena — a ser completamente implantada, dado tratar-se de uma reforma de geração.

É por estas razões que, com natural prudência, o programa foi lançado nos primeiros 60 concelhos em 1987-1988. Reconhecemos que o arranque só se deu a meio do ano lectivo, até porque não era possível tê-lo sido antes, devido à data do seu lançamento. Recordo--vos que a própria resolução do Conselho de Ministros apenas data de Dezembro de 1987 e, portanto, ao fazermos o balanço do programa temos quê ter em atenção as condições concretas temporais e cronológicas do arranque.

Ora, o facto de aqui estarmos hoje, em Novembro de 1988, a fazer o balanço do programa, dizendo que algumas acções apenas foram implementadas nalguns concelhos e não noutros, que há pagamentos atrasados, embora certamente venham a ser satisfeitos, que havia acções expectáveis e que ainda não foi possível chegar a todo o lado, já de si, representa um ganho qualitativo importante. Porque se não tivesse havido o Programa de combate ao insucesso escolar, certamente que, hoje, ainda estaríamos a lamentarmo-nos que nada se fez, que ainda há 40 % de insucesso na primeira fase do ensino primário, que ainda temos 30 °7o de insucesso na segunda fase do ensino primário ... Certamente estaríamos a fazer um novo exercício de retórica, todos muito penalizados, mas não havendo sequer acções concretas para criticarmos, e também sem qualquer sentido de alguma acção ter sido feita — embora estejamos muito aquém do desejável, e porventura necessário, para combater este flagelo com maior eficácia. Portanto, o que está feito é o que foi possível regimentar e corresponde aos recursos que foi possível canalizar neste ano de 1988.

Disse-se que 3 milhões de contos foram insuficientes para a implementação deste programa. Respondo--vos que talvez tenham sido, mas que, de facto, esta verba foi acrescida à dotação para o orçamento do Ministério para 1988 com a finalidade de atender a esta

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área concreta de grande prioridade nacional que é o combate ao insucesso escolar. Pensamos que é razoável e realista o orçamento para esta acção, que está elaborado para 1989, e que é de 4 milhões de contos.

Também náo Yale a pena inflacionar e injectar no sistema recursos a granel que não possam ser objecto de uma execução eficaz. Na área da educaçção, o nosso objectivo não é apenas injectar recursos, mas é fazer um reforma educativa que permita que os recursos afectados ao sistema o sejam de uma forma correcta e que permitam atingir resultados concretos e objectivos.

Dentro de alguns momentos, o Sr. Secretário de Estado da Reforma Educativa poderá explicar-vos concretamente qual é a desagregação previsível do Orçamento.

De resto, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento acaba de me confirmar que se conseguiu que as verbas para o leite escolar sejam financiadas pela CEE, a exemplo do que acontecia, já há muito tempo, nos outros países comunitários, à excepção de Portugal e da Espanha. Este financiamento representa o resultado de uma negociação que foi dura e que, na prática, permitiu derrogar o período de transição do tratado de adesão que, só em 1992, permitia o acesso de Portugal ao programa alimentar da CEE e, portanto, conseguimos antecipá-lo em três anos. Através do ressarcimento dessas verbas da CEE, esta situação vai permitir uma reafectação do essencial das verbas que estavam afectas ao INGA (Instituto Nacional de Garantia Agrícola) e ao 1ASE (Instituto de Acção Social Escolar) a outras acções de apoio ao programa de combate ao insucesso escolar, com eventual alargamento de algumas dessas componentes.

Portanto, as acções de apoio pedagógico-didáctico e de fornecimento de materiais escolares, etc, que já vinham sendo financiadas em 1988 e cujas despesas estavam previstas na verba de 4 milhões de contos — destes, 2 milhões de contos constituíam transferências do INGA para financiamento do leite escolar —, são acções que, eventualmente, até poderão ser ampliadas em 1989, através deste acréscimo de possibilidades que nos são dadas pelas verbas que foram negociadas com a CEE.

Julgo que respondi ao essencial das questões globais que me foram colocadas.

Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lemos, falou da execução do PIDDAC para 1988. Pensei que o Sr. Deputado iria referir a taxa de execução prevista — 98 % — para nos dar os parabénsrpOis sempre pôs em dúvida que o executássemos.

Ora, apresentámos uma taxa de execução muito elevada e é aproveitada para se lhe fazerem críticas noutro plano ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sempre disse que era pouco!

O Orador: — ... de facto, é como aquela história em que se é preso por ter cão e preso por não ter cão ...

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro não foi isso que eu quis dizer. Sempre disse que era pouco e o facto de o terem executado em 98 % e de, nalguns

casos, até terem ultrapassado os 100 %, significa que, se tivesse havido mais dinheirto, mais projectos teriam avançado.

Risos do PSD.

O Orador: — Sr. Deputado, ainda bem que «emendou a mão» em relação à sua intervenção anterior ...

De facto, o sector da educação tem procurado executar, com elevado sentido de responsabilidade, todas as verbas que lhe têm consignadas.

Tal como vos garanti, e repito agora na presença do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, julgo que, até mesmo quanto ao Orçamento para 1988 as verbas indispensáveis para satisfazer despesas essenciais, nomea-^ damente salariais, certamente não deixarão de ser consignadas para o efeito. E se, como prevemos, for necessário descativar alguma parte, até do orçamento de funcionamento, estou certo que, atendendo aos contactos que temos mantido com o Ministério das Finanças, será possível, tal como vos referi há pouco, encontrar a tal plataforma necessária a essa mesma descativação para atender às despesas indispensáveis.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Com um orçamento suplementar!...

O Orador: — Sr. Deputado, não será necessário qualquer orçamento suplementar, como também não foi necessário no ano passado ...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Orçamento rectificativo!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Isso é para esconder o défice! ...

O Orador: — Baixou o défice do Orçamento ...

Perdoe-me que lhe diga, Sr. Deputado Jorge Lemos, mas faz uma lamentável confusão entre os compromissos assumidos e cumpridos até 30 de Novembro e aquilo que é a execução do Orçamento. Como sabe, em qualquer manual elementar de contabilidade pública está escrito que não podem existir compromissos orçamentais posteriormente a 30 de Novembro. Portanto, o Sr. Deputado certamente tem consciência dessa confusão e sabe que compromissos assumidos a partir de 30 de Novembro terão que ser executados até 31 de Dezembro.

A cativação que vem prevista na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1989 tem uma natureza completamente diferente da que estava prevista no Orçamento para 1988 e, dentro da «imaginação semântica» do Ministério das Finanças ...

Risos.

... até a terminologia é completamente diferente: não se trata de uma dotação concorrencial. Há apenas, no primeiro semestre, uma retenção que é exemplar e que é cautelar, na medida em que os indicadores macroeconómicos que venham a revelar-se na altura serão certamente muitos positivos.

Aliás, como sabem, este ano, os indicadores macroeconómicos excederam as previsões em larga medida, quer quanto ao crescimento do PIB, quer quanto ao investimento, quer quanto ao consumo e quanto ao desemprego.

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Portanto, certamente que os indicadores macroeconómicos de 1989 não deixarão de continuar a evidenciar um ano de grande expansão económica, como tem acontecido nos últimos três anos, e permitirão, com certeza, encarar com grande dose de optimismo a possibilidade de executar a 100 % o PIDDAC em 1989. A reforma educativa de 1989 continuará por certo ao ritmo de cruzeiro em que já entrou e não sofrerá qualquer solução de continuidade, designadamente por razões de ordem financeira.

Vou pedir ao Sr. Secretário de Estado Adjunto que se debruce sobre as questões que são mais directamente da sua competência.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Destacaria duas ou três questões postas por alguns Srs. Deputados, designadamente pelo Sr. Deputado Jorge Lemos.

Relativamente ao orçamento da conservação, penso que é de facto um orçamento que tem um crescimento exponencial no PIDDAC de 1989, crescendo cerca de 40 °7o. Para a conservação do parque escolar prevemos 3,5 milhões de contos contra 2,4 milhões em 1988 e praticamente zero no passado. É de facto uma indicação estratégica de que se pretende efectivamente reabilitar o parque e de como reabilitá-lo.

Quanto a outro aspecto, que concretamente o Sr. Deputado António Barreto levantou, e penso que em tom de alguma crítica, que é o crescimento de 14,3 % do orçamento do ensino particular e cooperativo em 1989, deve-se a dois tipos de razões.

Por um lado porque, efectivamente, a base de incidência era baixa e, consequentemente, quando se aumenta sobre uma base de incidência baixa o crescimento percentual é acentuado. Isto deveu-se fundamentalmente a dois aspectos: o primeiro, em consequência de uma medida a que ninguém negará o seu vastíssimo alcance social e que foi a resolução do problema dos professores do ensino particular e cooperativo, que era uma justíssima bandeira sua desde 1961 e que, finalmente, obtivera; o segundo, foi a aprovação da linha de crédito bonificado para a instalação, recuperação e apetrechamento de colégios — penso que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento melhor me complementará —, mas que estaria esgotada desde 1985. É, portanto, e fundamentalmente, uma questão de base de incidência.

Por outro lado, é óbvio que se tratou do aproveitamento do ensino particular e cooperativo como instrumento da rede do ensino público no apoio à gratuitidade do ensino. É de facto também o reforço das dotações orçamentais do Estado para colégios com contratos de associação e, consequentemente, no reforço da gratuitidade do ensino.

Um outro aspecto que foi suscitado pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, que aüás é uma pessoa que — e muito bem! — acompanha com interesse estas questões, é o de como vamos quanto à regularização das contas com a indústria de construção civil e qual foi o esforço do Ministério da Educação e o esforço da dotação provisional. Ora bem, de uma dívida que vinha crescendo a partir de 1981 — e o pico até nem foi 1987, mas em 1985-1986 — e que em 31 de Dezembro de 1987 andaria pelos 5 milhões de contos, 1 milhão de contos do ensino superior foi imediatamente pago e de 4 milhões

de contos do básico e secundário 3 milhões de contos estão totalmente liquidados, dos quais 2,2 por reforço do orçamento do Ministério da Educação por via da dotação provisional e 0,8 foi o esforço do Ministério da Educação. Falta pagar cerca de 1 milhão de contos, o que, enfim, num orçamento de construções escolares de 15,3 milhões de contos não será grande coisa, pelo que penso estar totalmente esvaziado o gás a esse doloroso balão. De qualquer maneira, na reprogramação do PIDDAC de 1988, o Ministério da Educação previu mais 0,4, portanto, mais 400 000 contos, e os outros 600 000 contos são situações ou de transitados recentes ou, sobretudo, de dívidas não reclamadas pela indústria de construção civil relativas a empresas em situação falimentar ou pré-falimentar.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Secretário de Estado, desculpe interrompê-lo, mas o ponto da pergunta do meu colega Afonso Abrantes era o de obter a confirmação de que, ao contrário do que tinha sido afirmado, essas verbas tinham saído do Orçamento do Ministério da Educação.

O Orador: — Não, não.

Saíram 2,2 da dotação provisional, Sr. Deputado. Portanto, o esforço do Ministério da Educação foi de 0,8, isto é, de 800 000 contos. Esses 600 000 contos, efectivamente, em termos de transitado é muito pouco num orçamento de construções escolares de 15,3 milhões de contos e, repito — neste caso desculpar-me--ão a insistência da repetição —, uma parte dessa dívida é dívida não reclamada.

Portanto, é dívida que será paga em processo falimentar dessas empresas ou com contratos de assistência no âmbito da PAREMPRESA ou já em processo falimentar.

Assim sendo, penso que podemos afirmar com segurança que o Ministério da Educação pode em consciência deixar de falar em dívidas à indústria de construção civil. De qualquer maneira, tenho todo o gosto, até porque isso era um assunto que pessoalmente me angustiava como os Srs. Deputados sabem, em prestar detalhadas contas sempre que aqui vier sobre a liquidação desse passivo.

Ura outro aspecto, e aí depois passaria a palavra ao meu colega da Reforma Educativa, onde percentualmente a subida é muito grande, é efectivamente sobre os aspectos qualitativos da reforma. O apoio e desenvolvimento pedagógico cresce cerca de 50 % em 1989 relativamente ao Orçamento de 1988.

Se me permitem um esforço de síntese, diria que as linhas estratégicas do crescimento exponencial, que é superior a 30 °7o ou 35 %, estão efectivamente no orçamento da construção e recuperação, designadamente da conservação, no apoio e desenvolvimento pedagógico — é, portanto, todo o esforço da reforma — e, em termos muito mais modestos, mas enfim orgulhosamente assumidos relativamente ao que corresponde da integração, de facto, do ensino particular na rede de ensino público e da utilização do ensino particular no apoio à gratuitidade do ensino, também nessa vertente, o ensino particular e o cooperativo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Reforma Educativa.

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O Sr. Secretário de Estado da Reforma Educativa

(Carrilho Ribeiro): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro já falou no essencial do Programa Interministerial para a Promoção do Sucesso Escolar, no que se refere ao que aqui foi classificado de radiografia do programa no seu primeiro ano de execução com as dificuldades que teve e com a pouca expressão que algumas das actividades nele inseridas tiveram. Penso que essa radiografia ficará mais completa quando o Ministério fornecer o relatório de execução do programa que, neste momento, está em elaboração, quer por parte da estrutura de coordenação do programa, quer por parte dos serviços de controle normal do Ministério, em particular da Inspecção-Geral do Ensino, o que ficou por esclarecer foi fundamentalmente a desagregação do Orçamento previsto para este novo ano do programa que, em termos globais, já aqui foi enunciado de que seria de cerca de 4 milhões de contos.

Diria, atendendo às grandes componentes do programa, que relativamente aos cuidados de alimentação, se assim me posso exprimir, a verba orçamentada é de cerca de 2 milhões de contos.

No que se refere aos cuidados de saúde — e inscrito no orçamento respectivo do Ministério da Saúde — prevêem-se cerca de 400 000 contos.

No que se refere às componentes dependentes do Ministério do Emprego e Segurança Social, que são exactamente o apoio à família, estão inscritos cerca de 138 mil contos e no que se refere à pré-profissionalização cerca de 200 000 contos.

Quanto à componente da ocupação de tempos livres, a verba orçamentada na parte do Ministro Adjunto e da Juventude é de cerca de 600 000 contos.

A verba referente à rede escolar de transportes — e aqui esclareço que se trata apenas do transporte das crianças de escolas suspensas para as escolas das zonas, e não dos transportes em geral da escolaridade — está prevista uma verba de cerca de 130 000 contos. São, pois, escolas que estão em extinção e que, de modo nenhum, atingem as previstas 1000 — obviamente que não! —, até porque essa extinção tem de ser gradual e de acordo com as próprias autarquias. Aliás, é um número relativamente reduzido de escolas que são encerradas este ano — não serão mais que 100.

Das componentes mais directamente relacionadas com o Ministério, no que se refere à educação pré--escolar, a previsão é da ordem dos 400 000 contos, no referente à educação especial 75 000 contos, quanto aos materiais escolares cerca de 170 000 contos e no que se refere à formação de professores e apoio pedagógico--didáctico para este programa cerca de 500 000 contos.

É evidente que estas verbas do Ministério da Educação, como as verbas dos outros ministérios, devem ser consideradas para além das actividades normais dos ministérios, e concretamente no que se refere ao Ministério da Educação há muitas destas componentes que serão reforçadas pelo orçamento normal do Ministério, quer no que se refere à formação de professores, quer no que se refere à educação especial, quer no que se refere também ao apoio em materiais escolares. Isto é, portanto, o orçamento que está previsto para este ano e a sua desagregação.

No referente ao programa do sucesso escolar não adiantaria mais neste momento, a não ser que os Srs. Deputados queiram mais algum esclarecimento.

No que se refere ao orçamento da reforma educativa, que, aliás, consta dos documentos que vos foram entregues, as grandes actividades que serão contempladas fundamentalmente são, obviamente, a reforma curricular e, concretamente, o lançamento do 1.° e 5.° anos de escolaridade, nomeadamente no que se refere às várias componentes que a integram. Desta destacaria a elaboração de manuais experimentais para o acompanhamento dos próprios programas, uma vez que, de acordo com a nossa perspectiva, não é possível extrair resultados da experimentação dos programas se não forem acompanhados de materiais concretos que os alunos possam ter na sua posse. Só assim é que teremos possibilidade de extrair resultados sobre essa mesma experiência e tentar generalizá-los para lá, portanto, dos outros aspectos que se referem à formação de professores, nomeadamente dos professores que vão estar implicados nessa primeira experiência e ainda verbas da reforma que têm que ver, nomeadamente, com lançamentos de actividades e de certas estruturas institucionais que vão proceder à avaliação da própria experimentação dos programas e da elaboração dos instrumentos de avaliação, a fim de verificar se, efectivamente, os resultados obtidos pelos alunos durante o período experimental da reforma — dos 1.° e 5.° anos — são ou não os que se têm em vista.

O Sr. António Barreto (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Secretário de Estado, há duas perguntas que ficaram por responder e que lhe dizem directamente respeito.

Trata-se, em primeiro lugar, de saber qual foi o orçamento, passado e executado, da Comissão de Reforma do Sistema Educativo durante os seus um ou dois anos de funcionamento.

Em segundo lugar, trata-se de saber quem aprovou o plano curricular. Com efeito, se já estão a ser feitos manuais e programas, qual foi a instância política nacional que aprovou o plano curricular do ensino português?

O Orador: — Quanto à primeira pergunta, tendente a saber qual o orçamento da Comissão de Reforma do Sistema Educativo, não tenho, de facto, elementos sobre isso. Trata-se de uma estrutura que funcionava com independência face aos serviços do Ministério e, de facto, não conheço rigorosamente o orçamento previsto para essa Comissão.

Vozes do PS: — Quem conhece então?!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Dá-me licença que use da palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Sr. Deputado António Barreto, salvo erro ou omissão, que depois confirmaria, penso que o orçamento da Comissão de Reforma do Sistema Educativo anda pelos 80 000 contos.

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30 DE NOVEMBRO DE 1988

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O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado da Reforma Educativa.

O Sr. Secretário de Estado da Reforma Educativa: — Quanto à segunda questão que o Sr. Deputado

levantou, não há ainda, neste momento, qualquer aprovação formal dos planos curriculares, uma vez que o assunto se encontra ainda em processo de elaboração de parecer no Conselho Nacional de Educação.

A decisão tomada quanto à procedência da elaboração dos programas refere-se fundamentalmente aos programas dos 1.° e S.° anos de escolaridade, na presunção de que, no que se refere àqueles anos de escolaridade, os planos curriculares em discussão não são susceptíveis de grandes alterações na aprovação que vier a ser feita.

Portanto, como não podíamos prejudicar o lançamento da reforma em 1989, decidimos avançar na elaboração dos programas dos l.° e 5.° anos de escolaridade no que se refere àquelas partes de ciclos de estudo sobre as quais se pode, de uma maneira geral, dizer haver relativo consenso sobre os planos curriculares que vierem a ser adoptados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior (Alberto Ralha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como já é quase 1 hora, irei ser breve e, para começar, responderia a algumas questões colocadas pelo Sr. Deputado António Barreto, começando talvez por uma observação que fez no sentido de que os serviços do Ministério não publicavam relatórios.

Sr. Deputado, devo dizer que os serviços que dependem da minha Secretaria de Estado, nomeadamente o JNIC, o ÍCT e o ÍCALP, publicam relatórios anuais. Claro que não os publicam, como o Sr. Deputado pediu, a 30 de Novembro, uma vez que o ano termina, para estes organismos, no fim de Dezembro — não é por anos lectivos.

Portanto, como ia dizendo, por volta de Março esses relatórios são publicados e se V. Ex.a neles tiver interesse e os pedir com certeza que lhe serão fornecidos. Aliás, o INIC não só publica relatórios como guias das publicações que vai editando, como mesmo um va-demecum para os bolseiros saberem como se devem dirigir, etc.

Por outro lado, referiram o Sr. Deputado António Barreto e outros Srs. Deputados o ensino superior, julgando não haver preocupações de justiça social.

O Sr. Ministro já se referiu a esse aspecto e julgamos que são as propinas muito baixas que não conduzem a uma justiça social. Trata-se de um problema de equidade colocado por vários examinadores do nosso sistema de ensino superior, problema esse resultante exactamente da existência de propinas muito baixas, as quais favorecem os alunos das classes mais ricas.

Há um relatório, publicado em 1980-1981 pelo Instituto Nacional de Estatística — com certeza que o Sr. Deputado António Barreto o conhece —, transcrito num dos livrinhos da Comissão de Reforma do Sistema Educativo e versando a reformulação da política de acção social escolar, que mostra que 87 % dos alunos do

ensino superior pertencem ao grupo dos 30 % mais ricos. Ora, esses 30 °Io podem, realmente, pagar propinas mais altas.

Por outro lado, outro aspecto que não foi aqui focado — este primeiro já o Sr. Ministro o tratou com o desenvolvimento conveniente —, é que os mesmos

30 % utilizam serviços sociais a preços ridículos.

Devo dizer que, por exemplo, basta uma semana de utilização das cantinas universitárias para que os alunos tenha compensado o que pagam de propinas, já que o custo das refeições é duplo do preço pago pelos mesmos. Tal equivale a um prejuízo de cerca de 130$ a 150$ por refeição fornecida. Logo, basta uma semana, com duas refeições por dia, para compensar o preço da matrícula.

Essas refeições deviam, portanto, ser pagas de acordo com os custos reais. Aliás, se isso se fizesse — é fácil tratar o problema nestes termos —, seria então possível aumentar as bolsas significativamente.

Em relação à acção social escolar, questão aqui também levantada por alguns Srs. Deputados, devo dizer que a portaria que este ano foi aprovada corresponde exactamente à proposta do CASES, onde estão representados os alunos — não fizemos qualquer alteração a essa proposta.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado?

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber qual a base a partir da qual foi feita essa proposta.

O Orador: — Bem, o CASES é que fez a proposta ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — O CASES fez a proposta, como sabe, com base numa mera actualização da proposta do ano passado. Portanto, espero que isto não signifique que o Sr. Secretário de Estado esteja a considerar ser esta a política de bolsas a adoptar.

O Orador: — Não, eu estou a considerar que é ainda errada. Aliás, estamos a trabalhar nesse sentido e, no início do ano passado, pusemos a funcionar um grupo para estudar os problemas do financiamento do ensino superior.

Como o Sr. Ministro teve ocasião de referir há pouco, houve uma reunião no fim-de-semana passado — não sei se alguns dos Srs. Deputados assistiram, uma vez que, com certeza, devem ter sido convidados e, além disso, tiveram pelo menos conhecimento pela imprensa — em que estiveram presentes representantes do Reino Unido, da França, da Dinamarca, da Espanha, etc., na qual houve uma troca de informações sobre os sistemas de funcionamento do ensino superior nos diferentes países. Aliás, estiveram presentes os reitores das universidades, os presidentes dos politécnicos, comparecendo mesmo entidades alheias ao ensino superior.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa de novo, Sr. Secretário de Estado?

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O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretário de

Estado, em alguns desses países a situação das bolsas pagas aos estudantes tem qualquer comparação com a portuguesa? Em alguns desses países a capitação para a bolsa máxima impede um agregado familiar, que vive do salário mínimo, de receber a bolsa? É que isto é inacreditável! Quando o Sr. Secretário de Estado diz que há aumento, o que se verifica é que esse aumento se processa sobre uma base completamente ridícula e desadequada. Faz sentido defender isto?!

O Orador: — Sr. Deputado, tenho aqui um quadro que compara as propinas nos diferentes países, com os valores das respectivas moedas já transformados em escudos.

Por exemplo, em Espanha, neste momento, as propinas variam entre 45 500$ e 105 000$; em França, entre 27 000$ e 528 000$; na Irlanda, entre 196 000$ e 815 000$; na Grécia, entre 68 000$ e 100 000$; na Holanda, entre 65 000$ e 81 000$; no Reino Unido, entre 146 000$ e 460 000$; em Portugal, 1200$ por ano ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, já agora, compare também os regimes de acção social ...

O Orador: — Sr. Deputado, quanto aos regimes de acção social, umas coisas estão relacionadas com as outras.

Foi aqui referido por muitos dos Srs. Deputados que as verbas destinadas ao ensino superior são insuficientes.

Devo dizer que o orçamento das universidades cresceu, a preços constantes, de 3,5 milhões de contos em 1977 para 5,6 milhões de contos em 1984. Em termos reais, o mesmo orçamento cresceu, no período de 1977 a 1987, 59 <7o. Se formos para outro período — de 1980 a 1988 —, o crescimento foi de 99,5 % em termos reais, enquanto que o aumento dos alunos foi de apenas 34,6 °Jo.

Foi também aqui referido por alguns Srs. Deputados — creio que do PCP — que as verbas destinadas à investigação são insuficientes.

Bem, se considerarmos o último ano em relação ao qual existem dados mais recentes sobre as actividades de investigação e desenvolvimento em Portugal, que é o ano de 1986 — a JNICT não tem dados mais recentes —, poderemos verificar que os gastos totais nas universidades correspondem a 67,9 % para o ensino e 32,1 % para a investigação.

Normalmente, quando apreciamos os números referentes ao ensino universitário, não apreciamos estes dados, uma vez que a Direcção-Geral do Ensino Superior apenas conhece o que se passa nas universidades no âmbito do ensino. De facto, são o INIC e o JNICT que têm os dados da investigação.

Contudo, como ia dizendo, nesse ano de 1986 o País gastou em investigação cientifica o correspondente a 0,45 % do PNB. Não foi muito e este ano já deve andar à volta de 0,7 °7o, em termos de previsão.

Ora, o que se passa é exactamente o contrário do que o que o Sr. Deputado Rogério Moreira pensa ...

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — É o que diz o Governo!

O Orador: — Não, o Governo não pode dizer isso!

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — É a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia que o diz!

O Orador: — O que é que diz? Diz que gasta pouco? O País é que gasta pouco!

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Não, Sr. Secretário de Estado, é a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia que nos apresenta despesas em investigação e desenvolvimento para os anos de 1987, 1988 e 1989 nas universidades. Há pouco referi os números e tenho aqui comigo os dados, que, aliás, lhe posso fornecer.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Gostaria que o Sr. Deputado Rogério Moreira dissesse, se assim fosse entendido, se esses elementos constam dos tais documentos que o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, neste mesmo lugar, afirmou não serem os documentos definitivos. Isto porque, de contrário, estaremos a defraudar esta discussão e a perjurar, aliás, membros do Governo.

Realmente, se esses documentos são, precisamente, os do relatório que o Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia disse serem elementos de trabalho bem elaborados, mas que não eram do Governo, VV. Ex." estão a tentar iludir esta discussão, o que não é muito correcto em termos parlamentares.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Dá-me licença que use da palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — O Sr. Secretário de Estado começou bem, pedindo-me para o esclarecer, embora depois tenha começado a fazer considerações sobre um esclarecimento que ainda não dei.

Sr. Secretário de Estado do Orçamento, esses dados a que nos referimos eram projecções até 1992, as quais o Sr. Secretário de Estado afirmou não serem ainda chanceladas pelo Governo — esses são outros dados. Aliás, comparei esses dados com estes, os quais são os dados reais constantes da actual proposta de lei do Orçamento do Estado e dos orçamentos dos anos anteriores.

Portanto, aquelas a que me estou a referir são as verbas orçamentadas em 1986, 1987, 1988 e a proposta para 1989, no âmbito das universidades e no quadro das actividades de investigação e desenvolvimento. Trata-se dos dados fornecidos, nada tendo que ver com projecções ou com estudos.

Para precisar as verbas de 1988 e de 1989 no quadro das universidades, posso só adiantar que, em 1988,

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foram orçamentados 5 milhões 526 mil contos para 5 milhões 879 mil contos em 1989, o que corresponde a um acréscimo de 6,3

Como pode verificar, o peso desta verba no quadro das actividades de I&D é bastante mais significativo do que o correspondente àquela que o próprio INIC recebe.

O Orador: — Sr. Deputado, estamos a falar de coisas completamente diferentes!

Comecei por dizer que o último ano em relação ao qual existem dados, ou seja, 1986 ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Estamos a discutir 1989, Sr. Secretário de Estado!

O Orador: — Sr. Deputado, o que pretendo dizer é que todos os dados que se referem a 1987, 1988 e 1989 são projecções que, aliás, fui eu próprio que fiz quando era membro do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia. Portanto, também as conheço! Ora, o Sr. Deputado usou as projecções que eu fiz, mas devo dizer que se trata de projecções que não têm segurança nenhuma. Estou aqui a falar em dados seguros!

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Estamos perante o quê?

O Orador: — Estamos perante uma interrupção do Sr. Deputado! Portanto, se me dá licença, vou continuar.

Risos.

O que estava a dizer era que se considerarmos o ano de 1986, que é aquele em relação ao qual existem dados mais recentes e seguros sobre as actividades de investigação e desenvolvimento em Portugal — são dados da JNICT que me foram fornecidos esta semana em primeira mão —, verificaremos que os gastos globais com as actividades do ensino propriamente dito representavam 12,69 milhões de contos e com a investigação 99 milhões de contos, ou seja, 67,9 % dizem respeito à investigação.

Em 1984, dos gastos totais atribuídos à investigação no País cabia ao ensino superior 25 % e o número de investigadores que trabalhavam no sector do ensino superior era de 50 °7o.

Dois anos depois, em 1986, segundo os dados já confirmados pela JNICT — e não as projecções que fui eu que fiz —, a percentagem de gastos do ensino superior passou de 25 °lo para 30,2 °7o e a percentagem da comunidade científica a trabalhar no ensino superior passou de 50 % para 62,9 %.

Se há aqui alguma coisa de preocupante, é que este aumento relativo — e não me estou a referir ao valor absoluto, que até desejaria que fosse mais alto — se tenha verificado, porque preferiria que tivesse sido o sector das empresas que tivesse crescido, e não este. Portanto, até para mim isto é preocupante, Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se me permitem, voltarei a abordar,

telegraficamente, alguns aspectos que foram levantados e que ainda não foram respondidos, por um lado devido à grande prolixidade das questões e, por outro lado, à escassez de tempo.

Em relação à Lei n.° 103/88, lei dos regentes escolares, julgo que deveremos ponderar universos que são completamente diferentes.

O primeiro universo é o dos ex-regentes escolares que continuam no activo e em funções docentes, que fizeram o curso especial e que obtiveram sucesso nesse mesmo curso. O segundo universo é o dos ex-regentes escolares que continuam no activo, que não se encontram em funções docentes, mas sim em funções administrativas, de apoio logístico, etc. O terceiro universo é o dos ex-regentes escolares aposentados.

A Lei n.° 103/88 tratou por igual todas essas situações, o que veio a criar fortíssimas reacções na própria classe docente, quer entre os do activo, quer entre os aposentados, e situações que, a manter-se a vigência desta lei, se poderiam considerar como gravemente ilegítimas e injustas. Por isso, o Governo tomou a iniciativa de propor a suspensão da vigência da Lei n.° 103/88, dadas as iniquidades profundas que dal resultariam, não em termos absolutos — em termos absolutos todas as questões têm mérito —, mas em termos relativos a todas as outras classes de profissionais da educação e até em relação a outros funcionários públicos que há muito tempo se mantêm com pensões degradadas.

Em relação à transferência do pessoal para as autarquias locais, como já tenho dito, nada será feito nas costas das autarquias locais. Como é do conhecimento de todos os Srs. Deputados, tem vindo a ser desenvolvido um processo moroso e sistemático de negociação com as autarquias locais, e estamos a chegar a uma fase decisiva dessas negociações e da tentativa de conciliação das perspectivas de um lado e do outro quanto às necessidades do pessoal não docente e à respectiva transferência de verbas.

A redacção que vem contemplada na proposta de lei do Orçamento para 1989 — que, aliás, é a mesma que já estava consagrada na Lei do Orçamento para 1988 — dá todas as garantias no sentido de que o Governo respeitará a posição das autarquias e, por todos os meios ao seu alcance, procurará encontrar uma convergência de posições nesta matéria. De resto, o facto de ainda não ter sido possível, tal como estava previsto na Lei do Orçamento de 1988, resolver o problema é consequência directa deste diálogo sustentado que tem vindo a ser mantido com a Associação Nacional de Municípios Portugueses.

A formação contínua de professores é uma das grandes prioridades do Governo. Estão previstos cerca de 250 mil contos no Orçamento para 1989, o que é cinco vezes mais do que constava do Orçamento de 1988.

Devo ainda acrescentar que nos vários estabelecimentos de ensino se encontra à discussão uma proposta de sistema de formação contínua de professores, que esperamos venha a suscitar o interesse dos professores e uma tomada de posição quanto às propostas nela contidas.

Em relação à educação pré-escolar quero tornar muito claro que a opção do Governo não é pela estatização. Não há nenhum país da Europa do Mercado Comum onde a educação pré-escolar se tenha desenvolvido por via de estatização. Pelo contrário, julga-

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mos privilegiar as iniciativas das autarquias locais, das instituições privadas de solidariedade social, que cobrem todos os concelhos do País — são cerca de 2000 instituições privadas de solidariedade social —, e só em caso residual se virá a criar uma rede estatal de educação pré-escolar.

O Governo e o Ministério da Educação estão em contacto com as autarquias locais para o desenvolvimento desta rede. De resto, mesmo que não tenha sido formalizada a criação de jardins-de-infância, este ano já estão cerca de 400 jardins-de-infância em funcionamento, resultantes de reafectação de pessoal, etc. Aliás, devo dizer que estou certo de que durante o ano de 1989 esta situação irá ser regularizada e irá continuar o diálogo, quer com as autarquias locais, quer com as instituições privadas de solidariedade social, no sentido do desenvolvimento da rede, fundada, sobretudo, nos pressupostos de uma iniciativa local, legítima e que seja representativa das comunidades e dos interesses dessas mesmas comunidades.

Outra questão que o Sr. Deputado António Braga levantou refere-se à verba disponível para o ano lectivo de 1988-1989 atribuído ao desporto escolar. Devo, pois, dizer que para este ano lectivo está orçamentada uma verba de 300 mil contos através do Fundo de Fomento do Desporto, o que representa um avanço de infinito %, uma vez que nos anos anteriores essa verba era de 0 °7c, pois não havia desporto escolar. Portanto, é uma verba de infinito % em termos matemáticos e em termos absolutos representa um esforço muito grande.

Foi feita uma proposta a todas as escolas e, do universo de 900 escolas, temos neste momento 531 respostas, das quais cerca de 50 % são afirmativas.

Já foram dadas indicações a todos os delegados distritais, que, como se sabe, são professores de educação física, para apoiarem as escolas e fornecerem os créditos horários pagos através deste programa para os professores de educação física organizarem o desporto intra-escola e inter-escolas. Portanto, todo o programa está a ser desenvolvido — aliás, há uma comissão que coordena este programa, que tem representação de todos os segmentos interessados, desde a Direcção-Geral Pedagógica, a Direcção-Geral dos Desportos, profissionais de Educação Física, o Conselho Nacional de Juventude, a Inspecção, etc.

Por outro lado, entregaremos até ao final do ano, no Conselho Nacional de Educação, um projecto de decreto-lei nos termos do artigo 59." da Lei de Bases do Sistema Educativo sobre o desporto escolar e a educação física.

O Sr. Deputado'Gilberto Madail levantou a questão do associativismo desportivo. Ora, quero reiterar aqui o que várias vezes tenho dito, ou seja, que por parte deste Governo não há um projecto de estatização do desporto em Portugal.

A proposta de lei de bases do sistema desportivo, que já foi a Conselho de Ministros numa primeira versão para discussão pública, que se concluiu recentemente com um seminário internacional que teve lugar num hotel da capital, é uma proposta que vai claramente no sentido da não estatização do desporto, até porque o associativismo desportivo nos merece o maior apreço.

Já em 1988, para além das verbas destinadas ao futebol e que resultam da lei, que são uma percentagem, do totobola, o Governo, através de contratos--programa, investiu cerca de 1 milhão de contos no

apoio ao associativismo desportivo, dos quais cerca de 200 mil contos são para a alta competição, uma vez que nos encontrávamos em ano olímpico e era justo e necessário apoiá-la.

Para 1989 esse apoio vai continuar e será incrementado dentro da perspectiva de ciclos olímpicos — o período de 1989-1992 — e de uma programação do desenvolvimento desportivo baseada em ciclos olímpicos.

Como os Srs. Deputados já devem ter observado, no documento das GOP para 1989-1992, chamado «Portugal 1992», vem um capítulo sobre desporto — devo dizer que é a primeira vez que ele vem contemplado com esta conspicuidade e com esta valia — onde se prevê, justamente, o desenvolvimento necessário das infra-estruturas desportivas para este período, com uma grande prioridade para algumas zonas do País onde a carência dessas infra-estruturas desportivas mais se manifestam. É o caso do desenvolvimento do vale do Ja-mor, do Palácio de Cristal do Porto, de infra-estruturas desportivas ligadas a universidades, a escolas, a pistas de atletismo, a planos de água — aliás, Portugal é um país com uma larga costa, que tem uma longa tradição de desportos náuticos e que até já ganhou várias medalhas olímpicas na modalidade de vela, a última das quais foi em 1960. Portanto, é necessário que Portugal volte à tradição de desportos náuticos!

Devo dizer que recentemente assinámos um programa com a Federação Portugesa de Vela, criando um fundo de fomento da vela para a aquisição, através de créditos bonificados, desde embarcações optimist, que é a primeira embarcação para a aprendizagem da vela, até às mais sofisticadas, e vamos fazê-lo em todas as áreas.

Em relação ao futebol juvenil, que tem de ser a grande prioridade de um desporto para todos, e não o desporto profissional é que é mais espectáculo, já tivemos ocasião de assinar um despacho e um contrato--programa com a Federação Portuguesa de Futebol para viabilizar aquilo que numa determinada altura se previa como inviável, ou seja, a realização de todos os torneios dos campeonatos distritais para que essa base larga de prática desportiva, num desporto tão popular como é o futebol, não se perca, e para que as associações distritais tenham o apoio que merecem para o incentivo e para a prática generalizada do desporto nas camadas etárias mais jovens.

Srs. Deputados, como já referi, espero que até ao final do ano o PRODEP possa estar em condições de divulgação e de debate público.

Quanto ao encerramento das escolas do ensino primário, gostaria de vos dizer que durante este ano lectivo foram encerradas 110 escolas do ensino primário, todas elas com menos de cinco alunos — aliás, eram escolas com uma dimensão pedagógica inviável e cuja manutenção se devia apenas a razões de ordem política local, pois as comunidades locais e o próprios presidentes das câmaras tinham dificuldade em desactivar essas escolas.

Como sabem, queremos continuar e prosseguir este programa sem violentação das comunidades e das autarquias locais. As direcções escolares e a própria coordenação do programa do combate ao insucesso escolar, através do diálogo com cada uma da autarquias locais, quer as câmaras municipais, quer as freguesias, está a procurar levá-las a compreender o elevado sentido pedagógico e até social desta medida.

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Não é mantendo uma pequena escola com um, dois ou três alunos, que se valoriza uma comunidade! De facto, é necessário valorizar a comunidade, encontrando formas de enquadramento que sejam pedagogicamente rentáveis e que atendam às necessidades concretas de desenvolvimento psicológico, afectivo, emocional e até «grupai» das crianças que se encontram nesta idade tão critica da escolarização.

Creio que em matéria de questões de pormenor já respondi a todas as perguntas que me foram formuladas e, neste momento, o melhor seria continuarmos o debate, pois mais para a frente tornarei a intervir.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, registei algumas inscrições, mas não sei se elas já foram ou não substituídas pelas perguntas que entretanto foram formuladas ...

Em todo o caso, solicito aos Srs. Deputados que ainda pretenderem usar da palavra o favor de serem o mais sucintos possível, dado que temos de economizar o tempo de que dispomos, para amanhã, às dez horas, reiniciarmos os nossos trabalhos com outra equipa ministerial.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Presidente, tendo presente o apelo que V. Ex." acaba de fazer neste momento, prescindo de usar da palavra. Porém, gostaria apenas de dizer que creio que esta conversa poderia ser bastante interessante e teríamos muito mais para dizer, mas as condições em que o estamos a fazer talvez não sejam as ideais.

Na verdade, penso que esta conversa que temos vindo a travar foi positiva, porque permitiu, de algum modo, esclarecer alguns aspectos no que se refere a certos anúncios de aumentos que constavam do documento inicial distribuído pelo Ministério da Educação, comparativamente ao documento que nos foi distribuído o ano passado e que não correspondia aos valores nem aos aumentos reais. Na verdade, em alguns casos —como se verificou no caso do PIDDAC, que para mim é um elemento essencial — corresponde a um decréscimo do investimento na educação.

A comparação do valor de 26 800 milhares de contos com a previsão para 1989 de 28 318 milhares de contos dá um acréscimo de 5,6%, o que, em termos reais, significa decrescer cerca de 3 pontos, partindo do princípio de uma inflação próxima ...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas o PIDDAC para 1989 é de 29 400 milhares de contos.

O Orador: — Estou a falar de PIDDAC/Educação, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Exacto! Incluindo as OID e os PIDR, são 29 400 milhares de contos ...

O Orador: — Neste momento estou a referir-me ao Ministério, Sr. Secretário de Estado ... Se quiser, en-

tão temos de fazer uma outra comparação, que é juntar os PIDR e as OID de 1988 ...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Mas os 26 800 milhares de contos também incluem os PIDR e as OID, Sr. Deputado. Portanto, a comparação é a mesma!

O Orador: — Creio que não incluem, Sr. Secretário de Estado. Mas podemos fazer essa conta!

Estou a referir-me ao mapa vn, a p. 233, em que na parte correspondente ao Ministério da Educação consta do PIDDAC para 1989 28 318 400 contos. Ora é precisamente este valor que estou a utilizar e estou a compará-lo com idêntico valor inscrito para 1988, que era de 26 800 milhares de contos. Portanto, não estavam inscritos os PIDR nem as OID, Sr. Secretário de Estado.

Aliás, comparo o que é comparável neste momento. Se me pedir que compare coisas que não são comparáveis, fá-lo-ei!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — Sr. Deputado, nunca lhe pedi que comparasse o não comparável! Apenas estamos a tentar chegar a acordo ...

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, creio que a base de comparação só pode ser esta. Se num ano uso um valor e no ano seguinte utilizo outro valor, até posso dizer que há um acréscimo de mais 5 ou 6 milhões de contos ... Mas vou-me ficar por aqui....

Porém, apenas gostaria de dizer que para nós é preocupante ter verificado que de 1988 para 1989 aquele grande impulso que iria ser dado à educação pré-escolar e o anúncio que o Sr. Ministro aqui fez de mais 800 jardins-de-infância é transformado hoje numa mera declaração de que vamos fazer um grande esforço para que sejam as colectividades e as autarquias a avançar com esses jardins-de-infância, libertando, portanto, a administração central. E digo que é preocupante porque é uma desresponsabilização do aparelho central numa matéria que consideramos essencial.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

Sr. Deputado, faço-lhe a mesma solicitação que fiz ao Sr. Deputado Jorge Lemos, pedindo-lhe o favor de ser sucinto, dado o adiantado da hora.

O Sr. António Barreto (PS): — Começo por lamentar as horas da nossa reunião e agradeço ao Sr. Presidente, Rui Machete, que está aqui num longa maratona, aos colegas da Comissão de Economia, Finanças e Plano e ao Sr. Secretário de Estado Rui Carp, que, creio, hoje já vão na quarta sessão com outros tantos ministérios. Ora, para um dos orçamentos mais controversos ou mais sérios e mais importantes, teria sido bom termos pensado noutras horas. Mas, enfim, talvez seja também um resultado da prioridade à educação.

Devo dizer que ouvi a reunião de hoje, e, ninguém me tendo estabelecido em procurador de ninguém nem em porta-voz, não me impeço de concluir por nós.

Enquanto ouvia o Sr. Ministro —e devo dizer que não estou a falar de «boa-fé», de «honestidade» nem

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de «seriedade de propósitos», mas sim de politica e de meios, factos esses objectivos que me interessam— estava a ouvir os membros do Ministério a ler as intervenções dos mesmos membros do Ministério no Plenário e nesta Comissão, o ano passado, e devo dizer que encontrei um ministério normalizado e não um ministério guerreiro, contra a situação da educação portuguesa, mas, repito, um ministério normalizado, um ministério defensivo. É esta a vossa postura.

Gostava de esclarecer rapidamente três ou quatro pontos quanto ao insucesso, porque o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado responderam-nos com o contrário das críticas que fizemos. O que criticámos foi a falta de humildade dos IS %; o que criticámos foi que tivessem ousado pronunciar urbi et orbi 15 % após três meses de programa, quando pensávamos que essa percentagem demoraria, pelo menos, três ou quatro anos, tal como, aliás, tinha sido previsto inicialmente. Nunca menos de três anos para 15 %! O Sr. Ministro respondeu-me com o reverso da crítica que lhe fiz, com o negativo da minha própria crítica.

Não quero resultados fáceis. O Sr. Ministro sabe de educação certamente muito mais que eu e, repito, não queremos resultados fáceis, porque estes só se obtêm com programas fáceis e não duráveis, nem duradouros, nem sérios.

Estou totalmente em desacordo — e gostava de dizer que é político e que é muito sério — com a ligeireza da decisão de avançar no estabelecimento de programas escolares antes de estarem aprovados por entidades políticas responsáveis — estou a falar de responsabilidades políticas objectivas, evidentemente, e não de pessoas.

Todos os países que conheço e que recentemente procederam a importantes reformas curriculares fizeram-no após debates e decisões políticas responsáveis. Parece--me que, neste caso, ligeiramente pelo menos em relação a dois anos e a um período experimental, está-se a inverter a ordem das coisas.

No que toca às universidades, tenho de desmentir formalmente o Ministro da Educação. Eu não falei de propinas. Foi justamente o assunto de que não falei. Falei, sim, de bolsas de estudo e no regime de acesso à universidade. E o Ministro da Educação diz-me: «Estão a proteger os privilegiados.» Foi o que, metaforicamente, me disse, e citou-me as propinas. Eu falei de bolsas de estudo e de regimes de acesso à universidade.

Devo dizer que o regime de acesso, tal como está estabelecido no último decreto-lei, quase descompensa os efeitos de redistribuição social e de rendimento que o Ministro da Educação se propunha. O exame de acesso é um exame socialmente selectivo, toda a gente o sabe.

Foi mencionado por deputados do PSD, e reconfirmado pelo Ministro, o problema das gerações futuras e do défice. Aí está o nó da nossa divergência. Entendemos que há uma escolha a fazer sobre a maneira como querem punir as gerações futuras: será com o défice ou será com a educação. Os senhores escolheram poupar o défice às gerações futuras, mas puni-las com a educação. Entendemos que a educação não deve ser sacrificada à contenção do défice.

Esta a nossa diveTgència, esse o nó do problema!

Punir as gerações futuras com a educação é mais violento e mais socialmente injusto do que o contrário.

Finalmente, não tive respostas precisas, nem optimistas, nem generosas, quanto à abertura às nossas propostas. O Sr. Deputado Vieira de Castro disse que queria ver propostas concretas. Ora foram mencionadas por nós e por outros colegas deputados de outras orientações — eu mesmo cheguei a falar em 1200 milhares de contos para as universidades —, mas da parte do Governo não vi qualquer abertura. Não sei se foi só um pequeno adiamento na sua expressão, mas da parte da maioria também não vi abertura nenhuma para qualquer das propostas. Fá-las-emos na mesma, se tivermos possibilidades de as fazer. Finalmente, da parte do Sr. Secretário de Estado Rui Carp, dele é que não vi nenhuma abertura!

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado António Barreto. Tem a palavra o Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol.

A Sr." Lourdes Hespanhol (PCP): — Sr. Ministro, voltando ainda ao Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Escolar, como sabe — e, aliás, toda a equipa do seu Ministério —, nós, PCP, sempre nos manifestámos favoráveis a esse programa e para ele tínhamos grandes expectativas. Estranhamos a afirmação feita há pouco tempo, durante esta sessão, de que em 1988 fez-se o possível, visto que esta afirmação choca com o entusiasmo demonstrado por V. Ex.a, aquando do balanço deste programa, frente às câmaras de televisão, e que, no mínimo, podemos dizer que chocou não só os profissionais de educação mas também os outros intervenientes no programa: os pais, as autarquias, os serviços de saúde, etc.

Os resultados eufóricamente apresentados em Julho passado foram, no mínimo, lançados sem cuidado e apenas com entusiasmo e sem qualquer reflexão crítica.

O Sr. Secretario de Estado veio ditar-nos hoje, aqui, as verbas para as diferentes vertentes do PIPSE. Permitimo-nos lamentar que estes dados não nos tenham sido fornecidos por forma a podermos analisá--los, além de que também teria sido muito importante termos a sua execução no ano lectivo de 1987-1988.

Relativamente às verbas atribuídas, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado não se combinaram bem. Isto é, o Sr. Ministro afirma que o leite virá das Comunidades e que não se gastarão os 2 milhões de contos em alimentação. Então qual será, depois desta informação, a nova grelha por vertentes? Será que podemos afirmar que a verba não é de 4 mas de 6 milhões de contos para o PIPSE? É assim ou não?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Ministro, muito rapidamente, só para referir a argumentação que aduziu sobre a suspensão da Lei n.° 103/88, nomeadamente o disposto no artigo 2.°

Antes de mais, gostaria de colocar uma questão prévia: é que se o Ministro ou o Ministério tivessem a intenção de cumprir o articulado, talvez, por uma questão de simpatia com que nos têm distinguido, fosse interessante ter-nos perguntado qual a interpretação que dávamos ao artigo 2.° De qualquer maneira, vou dizer--lhe. É que o artigo 2.° refere-se à situação daqueles que eram regentes escolares, mas que o não são hoje,

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porque não há regentes escolares. Quer dizer, o regente escolar, como figura, não existe hoje, e por isso é que dissemos «ex-regentes». Não se refere, portanto, aos funcionários que foram regentes e que hoje são contínuos ou motoristas de táxi ou exercem outra profissão qualquer. Não é a estes que nos referimos, Sr. Ministro. E exactamente àquelas situações, que são reduzidíssimas, que eram regentes escolares —mas que hoje

não são, porque não há regentes escolares— e que estão em funções nas delegações escolares ou até em escolas, não em funções docentes, mas sim noutras funções.

Esta é a interpretação restritiva, se quiser, do artigo 2.° A vossa interpretação foi extensiva e, do nosso ponto de vista, não respeitou o espírito nem a letra daquela norma.

Mas, mais: a atribuição das fases e das diuturnidades aos professores reformados refere-se, só e exclusivamente, ao mesmo tempo dos professores do curso normal. Isto é, Sr. Ministro, por hipótese, um professor com o curso normal reformado em 1975 ou 1972, para ser uma data anterior ao Decreto-Lei n.° 111/76, tem uma certa reforma; o professor com o curso especial e o ex-regente escolar, na situação que há pouco referimos, reformados na mesma data —por hipótese académica— teria o mesmo vencimento e a mesma reforma que o outro professor do curso normal. Não iríamos colocá-los em situação de desigualdade? Não é que não consideremos justo que esse professores que têm a reforma desactualizada a devam ver actualizada. Simplesmente, não queremos criar situações de injustiça ao mesmo nível.

Este é o espírito da lei e a letra permite esta leitura. Embora permita também outras, como é óbvio. E nós sabemos que muitas vezes somos capazes de ler aquilo que lá não está.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Isabel Espada.

A Sr.a Isabel Espada (PRD): — Vou tentar ser breve em atenção à careta que o Sr. Presidente fez quando pedi a palavra.

Risos.

O Sr. Presidente: — Ó Sr.a Deputada! ... Dispõe de mais dois minutos, mas não abuse.

Risos.

A Oradora: — Obrigado, Sr. Presidente.

Tenho estado muito calada, porque tinha uma certa curiosidade em ouvir a resposta do Sr. Ministro da Educação às questões colocadas.

Efectivamente, devo dizer-lhe que o encontrei bastante mais constrangido e com menos à vontade — e não considere isto como uma crítica — do que é habitual vê-lo em debates deste tipo no Plenário da Assembleia da República.

O Sr. Ministro da Educação: — Está enganada, Sr.a Deputada!

A Oradora: — Bom, posso estar enganada, mas foi a impressão com que fiquei.

O Sr. Ministro iniciou a sua intervenção, na segunda parte, ou seja, após as questões colocadas, reafirmando

que este Orçamento era o bastante e suficiente para continuar a execução do programa da reforma do sistema educativo. O Sr. Ministro estava a referir-se a este Orçamento, mas, imediatamente, passa para os fundos comunitários. Desta sua passagem, como que uma espécie de desculpa em relação à insuficiência do Orçamento, só posso tirar uma conclusão; a Sr. Mkústto

pensa que o Orçamento é realmente insuficiente. É a única conclusão que posso tirar, pois a única forma de pôr minimamente em execução, para o próximo ano, o programa para a reforma do sistema educativo é através dos fundos estruturais.

Gostaria que o Sr. Ministro se colocasse um pouco na nossa situação. Somos deputados na Assembleia da República e é função da Assembleia da República aprovar um Orçamento e não os fundos estruturais ou os projectos que são elaborados em função do FSE, do FEOGA, do FEDER, etc. O Orçamento que temos à nossa frente e que nos é dado a aprovar é especificamente um Orçamento que consideramos insuficiente. É lamentável que os deputados sejam confrontados com a situação de terem de dizer «sim» ou, enfim, terem de se pronunciar sobre um Orçamento que nem sequer aqui está para ser aprovado, que é o orçamento que diz respeito aos fundos estruturais. Talvez o Sr. Ministro apareça no princípio ou a meio do ano, no segundo mês, em Fevereiro, em Março, numa conferência de imprensa e decida dizer aos órgãos de comunicação social: «Bom, temos aqui mais um pojecto que nos vai trazer mais 5 milhões de contos para determinada área, ou mais 3 milhões para outra área.»

O que aqui estamos a discutir é o Orçamento do Estado e esse é, obviamente, insuficiente. O Sr. Ministro não explicou como é que com este Orçamento vai dar concretização ao que anunciou, sem pensar nos fundos estruturais — e é bom que o façamos —, porque, inclusive, o Sr. Ministro declarou aqui ainda não ter conhecimento dos termos do Acórdão do Tribunal Constitucional e, portanto, das matérias que, relativamente aos fundos comunitários, não poderemos utilizar por via da inconstitucionalidade declarada.

Enfim, o Sr. Ministro não tem conhecimento, mas é bom que tenhamos isto em conta porque vai acontecer.

Portanto, sem contar com os fundos estruturais, onde é que o Sr. Ministro vai buscar dinheiro, dentro deste Orçamento, para, por exemplo, pôr em vigor já para 1989 — segundo as declarações do Sr. Ministro — o novo estatuto remuneratório. Devo lembrar que o Sr. Ministro declarou que este novo estatuto remuneratório dos professores é para entrar em vigor em 1989. Em termos orçamentais, gostaria que o Sr. Ministro me dissesse qual é a rubrica onde estão orçamentadas estas verbas e se realmente elas são para entrar em vigor em Janeiro de 1989. Caso o Sr. Ministro admita que não existem rubricas orçamentadas para esta área, gostaria de saber se será para entrar em vigor em 1989, mas só no mês de Dezembro. No entanto, não encontramos outras explicações para as afirmações que o Sr. Ministro já produziu relativamente ao estatuto remuneratório dos professores.

Quanto ao programa do insucesso escolar, o Sr. Ministro também ainda não explicou como é que com o Orçamento que temos, não contando com os fundos

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estruturais, vamos conseguir, apenas com mais 1 milhão de contos do que se tinha o ano passado, fazer face às verbas necessárias para o dobro das escolas que

eram cobertas o ano passado. Isto também não foi explicado.

Com os fundos existentes no Orçamento, como é que vai ser feita a formação contínua para um número de

professores que dela carecem neste momento?

Há, enfim, uma série de outras questões e de outras áreas que aqui foram colocadas, que estamos neste momento a discutir na especialidade, relativas ao Orçamento e aos fundos estruturais sobre as quais o Sr. Ministro não disse de que forma é que estavam orçamentadas e previstas.

Para finalizar, pois sei que utilizei mais do que dois minutos, gostaria dê dar um exemplo, a fim de mostrar como é espantosa a forma como se brinca com os números quando se fala de orçamentos. O Sr. Pri-meiro-Ministro, na sua intervenção de sexta-feira passada, fez referência a alguns números, que são perfeitamente demagógicos, dizendo que o poder de compra ou o rendimento per capita dos Portugueses aumentou 105 %, e prova-o dizendo que há três anos os Portugueses tinham 2000 dólares per capita e que hoje em dia têm 4000 dólares. Ora, toda a gente sabe que isso acontece pela descida do dólar e da inflação. Portanto, na prática, a capitação é de 15 % e não de 105 °7t.

Há pouco, também o Sr. Ministro da Educação brincou com os números dizendo que é fantástico o facto de o Ministério da Educação ter construído, nos dois últimos anos, cerca de 100 escolas — não sei exactamente o número que o Sr. Ministro referiu —, enquanto durante todo o período do Estado Novo apenas se construíram cerca de 50. O Sr. Ministro tem de ter em atenção a população que existe neste momento e as necessidades que existem em termos populacionais. Não é preciso referir mais nada, porque além de ser muito básica não é preciso dar grandes voltas, quer em termos orçamentais, quer em termos de défice ou em termos de inflação, para se chegar a esta conclusão óbvia: a população daquela altura, em termos pura e simplesmente demográficos, não era a que existe hoje em dia. É só por isso que estas necessidades são determinadas; mais nada.

Isto é apenas um exemplo para se provar como se pode brincar com os números um termos orçamentais, e è fácil fazer-se isto em termos de opinião pública, mas para aqui, às vezes, não é tão fácil como isso.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Devo dizer que acolhi a sua exposição com ar de sorriso, embora não concorde com algumas das coisas que disse, como é óbvio.

Risos.

Para responder, também sucintamente, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Sr. Presidente, creio que também me tinha inscrito para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: — V. Ex.s não estava inscrito, mas passará a estar para uma brevíssima pergunta, não è verdade?!

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Desta vez não foi com caretas que o Sr. Presidente aceitou a inscrição.

Risos.

Queria apenas referir que as interrupções havidas no momento em que o Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior usava da palavra tiveram, no mínimo,

o mérito de esclarecer a forma e quais são os elementos que nos são fornecidos para a análise das despesas do Estado pelos departamentos do Estado. Creio que a nossa conversa a este respeito foi suficientemente elucidativa.

De qualquer modo, penso que o Sr. Secretário de Estado poderá não estar a considerar rigorosamente os mesmos elementos que tenho aqui presentes, razão pela qual me parece particularmente útil se este documento que se intitula «Dotações dos principais organismos públicos financiadores, executores de I & D — 1986, 1987, 1988 e 1989», e tem como subtítulo «Despesa orçamentada», pudesse ser, para os devidos efeitos, anexado à acta desta mesma reunião, o que solicito ao Sr. Presidente.

Gostaria ainda de referir que a questão crucial que está em debate é sem dúvida não apenas um esclarecimento de determinados aspectos da proposta de lei do Orçamento do Estado como a da possibilidade de serem ou não introduzidas alterações a essa proposta. Obviamente, neste debate esta é uma matéria decisiva.

A esse respeito é de referir que, por um lado, a disponibilidade de se fazerem alterações manifestada pela bancada do PSD é visivelmente reduzida e, por outro, o facto de nenhum deputado da área educativa do PSD ter procurado responder às diversas solicitações de deputados da oposição quanto a esta matéria é significativo.

Devo dizer que o PCP apresentará propostas no sentido de reforçar as verbas nas áreas da acção social escolar, do ensino não superior, dos serviços sociais universitários, das universidades, da rede de educação pré-escolar e da rede escolar do ensino básico e secundário.

Desta forma, será possível aos Srs. Deputados do PSD considerarem as propostas, não numa base abstracta, mas sim numa base concreta, e esperemos que elas possam ter algum efeito.

O Sr. Presidente: — Se o Sr. Deputado Rogério Moreira quiser fazer o obséquio de entregar na Mesa o documento que pretende anexar, poderei assim mandá--lo fotocopiar para entregar uma cópia ao Sr. Secretário de Estado e só o anexaria depois de ele fazer as suas observações.

O Sr. Deputado Vieira de Castro, da área educativa do PSD, quer dizer alguma coisa?

Risos.

O St. Vieira de Castro (PSD): — Direi alguma coisa se o Sr. Presidente me o permitir.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): — A propósito, há pouco o Sr. Deputado Jorge Lemos disse que os deputados do PSD estavam com sono. Não estão, Sr. Deputado, pese embora já estarem aqui há quinze horas.

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Pretendo esclarecer o Sr. Deputado Rogério Moreira que — talvez há pouco me tenha expressado mal ou o Sr. Deputado não terá entendido bem as minhas palavras — nós não estabelecemos qualquer espécie de limite à receptividade relativamente a propostas de alteração. O que eu disse foi que o Orçamento era feito com constrangimentos, o que não podemos esquecer.

O défice do Orçamento não pode variar entre menos infinito e zero, como o Sr. Deputado bem sabe, e será à luz destes princípios que o Orçamento tem de ter coerência e não pode ser, como já há tempos disse, desfigurado. Foi um documento que deu seguramente muito trabalho a técnicos qualificados na sua elaboração. A oposição tem-nos, de facto, habituado a isto (tenho de fazer esta crítica): remete quantidades industriais — passe a expressão — de propostas de alteração que, a serem todas aceites, teríamos um Orçamento completamente novo e que seguramente seria muito mau porque este Orçamento, não sendo perfeito, em nosso entender ele é bom.

Portanto, as propostas de alteração serão todas devidamente analisadas e terão o julgamento adequado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A hora vai adiantada e ainda tenho no meu relógio a hora da perestroïka, porque cheguei ontem à noite de Moscovo — são 5 horas da manhã...

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Ainda bem!

O Orador: — Sr. Deputado, infelizmente não fui solicitado a elucidá-lo sobre os efeitos da perestroïka na educação na União Soviética. O Sr. Deputado ficaria certamente surpreendido e talvez até fosse bastante ilustrativo para si, em vésperas de congresso ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro, estamos a tempo de conversarmos sobre isso.

Risos.

O Orador: — ..., explicar-lhe, por exemplo, que, em relação à educação pré-escolar, o sentido da perestroïka na União Soviética é o da devolução e não o da estatização para as comunidades. Mas, adiante ...

O Ministério da Educação, ainda não vencido pelo sono, não se considera de maneira alguma vencido por este Orçamento.

Nestes exercícios importantes e democráticos fico cada vez mais com a convicção reiterada de que só é esclarecido quem o quer ser. Naturalmente, vimos aqui com todo o sentido do diálogo procurar dar os elementos para a informação e para o esclarecimento das pessoas. Pessoalmente, custa-me a acreditar que em algumas matérias —não digo em todas— não se sintam esclarecidos e que os dados que aqui foram fornecidos e a documentação vasta enviada há algumas semanas atrás, e que foi contemplada hoje, não tenham sido suficientes para que algumas das matérias sobre as quais tinham, porventura, legítimas dúvidas não tivessem sido suficientemente esclarecidas.

O essencial das intervenções que se processaram nesta última parte já não tiveram a ver com questões muito

concretas ou factuais, o que me faz pensar que as questões mais quantitativas terão sido suficientemente discutidas e, na medida do possível, esclarecidas.

Gostava, entretanto, de me referir à questão do programa do insucesso e dos 15 °7o.

Os factos são os factos e contam como tal. Aliás, aguardo ansiosamente pelos dados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que me foram anunciados pelo Sr. Deputado António Braga, a fim de os enviar para os serviços apropriados, porque não sou eu que faço essas continhas —como deve imaginar—, nem sou eu que cálculo as taxas de reprovação/aprovação. Os dados de que dispomos, e que foram oportunamente divulgados no respeito pela opinião pública e pelos cidadãos que têm de ter a informação, foram elaborados por via informática. De resto, foi o Gabinete de Estudos e Planeamento que me forneceu esses dados com base em inquéritos regulares que têm sido feitos ao longo dos anos e que voltaram a ser feitos este ano. Tenho total confiança neles e ainda hoje pedi a confirmação desses dados aos serviços e foram-me totalmente reconfirmados.

Portanto, os factos são os factos, e eu próprio tive ocasião de referir, na conferência de imprensa que na altura foi dada —aliás, isso está escrito e tenho muito gosto em enviar-vos o texto dessa minha intervenção, que são três páginas—, que não há aqui nenhuma matéria para «euforia» (suponho que até foi o termo utilizado) nem para excessivo optimismo. A questão é suficientemente importante para que façamos um acto de humildade perante a mesma. Não obstante as metas quantitativas terem sido ultrapassadas, há necessidade de continuar a trabalhar, de não perder o sentido de mobilização que está na base, em larga medida, da explicação desse valor dos 15 %: a mobilização a nível das autarquias, dos pais, dos professores, de todos os intervenientes locais no processo. Além disso, tive ocasião de dizer que muito me espantaria que esse sentido de mobilização pudesse continuar, num segundo e num terceiro anos, a produzir efeitos tão espectaculares do ponto de vista quantitativo como os que vieram a acontecer nesta primeira etapa do programa.

É este, tão-só, o sentido que há instantes procurei atribuir ao programa, um entusiasmo que significa entusiasmo para trabalhar e não para contemplar aquilo que já se atingiu com passividade perante o futuro e a enormidade da tarefa a desenvolver.

Voltando à questão dos programas escolares, que o Sr. Deputado António Barreto considera tão ínvia ou, pelo menos, tão passível de discussão, pessoalmente discordo do que diz o Sr. Deputado, por duas ordens de razões fundamentais. Primeiro, o não avanço e o não progresso técnico nesta matéria significaria aguardar passivamente que o Conselho Nacional de Educação viesse a produzir o seu parecer e que o Governo viesse a legislar, nos termos do artigo 59.° da Lei de Bases do Sistema Educativo, sobre planos curriculares do ensino básico e secundário, significaria, muito provavelmente, a perda de um ano lectivo para o processo de implementação da reforma curricular, significaria a impossibilidade concreta de, em 1989-1990, lançarmos a experiência do 1.° e 5.° anos de escolaridade.

Sr. Deputado António Barreto, é esta a nossa intenção, como já tive ocasião de anunciar em Plenário, na Assembleia da República, em resposta a uma pergunta de um deputado do seu grupo parlamentar.

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Pensamos que —como já várias vezes disse— a reforma não se faz para cumprir prazos, mas não se devem, perder prazos e períodos críticos dessa reforma. Seria de todo em todo grave, desestimulante e até des-mobilizador, a meu ver, que tivesse de adiar para 1990-1991 o primeiro ano de experimentação e de lançamento da reforma curricular. E isso aconteceria, ina-pelavelmente, se estivéssemos a aguardar que os planos curriculares fossem aprovados, que nessa sequência, como em rigor técnico, fossem elaborados conteúdos programáticos para sobre esses conteúdos programáticos elaborar manuais escolares, a fim de se proceder então à formação dos professores e dos directores escolares, à criação das condições para que as escolas pudessem, mesmo em regime de amostragem e em universo restrito, proceder à implantação de um primeiro ano experimental da reforma curricular.

Aliás, o calendário da reforma está totalmente elaborado até ao ano de 1993-1994, que é aquele que pensamos vir a ser o da generalização de todos os novos currículos e programas do 1.° ao 12." anos de escolaridade. É um calendário minucioso, feito de mês a mês, quase de semana a semana, com dezenas, se não centenas, de operações de enorme complexidade, que exigem um grande rigor científico para evitar que o sistema se transforme num enorme exprimentalismo, que queremos a todo o custo evitar, e que, pelo contrário, seja feito com grande seriedade e sentido de respeito pelas pessoas implicadas, desde logo a personalidade dos jovens, das crianças e alunos, dos próprios professores, dos pais e das escolas, para que isso seja feito com grande sentido de responsabilidade, ao invés do que, porventura, terá acontecido em anos anteriores de história recente de má memória em Portugal.

Um segundo argumento tem a ver com a analogia e a comparação internacional.

Como o Sr. Deputado bem disse, neste momento praticamente todos os países da Europa estão a tratar desta matéria e a tratar em profundidade.

A Inglaterra aprovou recentemente o chamado Ger-bill, que é a lei da reforma do sistema educativo inglês, que, como o Sr. Deputado deve saber, é a maior reforma, desde os anos 40, que foi profundamente discutida. Foi sujeita a mais de mil emendas até ser finalmente publicada. Devo dizer que é uma reforma extremamente complexa.

Foi publicado um livro muito interessante sobre as implicações dessa reforma em Inglaterra e, em minha opinião, é o primeiro livro sobre estas matérias cuja leitura é de facto interessante.

Acontece, no entanto, que, em Inglaterra, essa reforma foi antecipada já durante os últimos três anos lectivos através de várias experimentações que foram feitas ao nível das-áreas nucleares, onde se entendia que a reforma iria incidir fundamentalmente, ou seja, no chamado «currículo nacional», que agora é induzido pela primeira vez na história da educação inglesa. Incluída nesta área está a Matemática, acerca da qual existe um relatório muito interessante de Lord Cock-croft, que introduziu a base para a experimentação dos problemas da Matemática, permitindo chegar a um apuramento da chamada reforma Baker, recentemente aprovada, e onde também está incluída a própria lín-

IM& maXwna.

Tudo isto faz com que, caso também inédito no panorama do desenvolvimento curricular inglês, a reforma

seja implantada de uma vez por todas, sem qualquer experimentação, o que, aliás, dá que pensar. Oportunamente tive ocasião de discutir esta matéria com o Ministro inglês da Educação e de lhe perguntar como é que conseguiram aquele resultado e a única explicação que me foi dada foi a de que a reforma já tinha sido antecipada, nos últimos três anos, de várias experimentações que permitiram ir apurando os conteúdos programáticos e os vários instrumentos metodológicos ligados aos novos programas, permitindo, de facto, que ela fosse implantada com alguma segurança, como um one short operation, sem necessidade de experimentação e como uma única operação feita logo a partir da sua aprovação política no Parlamento.

Em França, a reforma Chevènement, que vem desde 1988, é muito curiosa e foi amplamente divulgada no chamado livro de poche para que todos os intervenientes, nomeadamente os pais, pudessem colaborar. Foi depois retomada pelo governo Chirac, designadamente pelo Ministro Monory, e, posteriormente, com o governo Rocard volta a estar na primeira linha das preocupações políticas, não obstante a grande agitação social que, como o Sr. Deputado sabe, existe em França, nomeadamente no sector educativo. Trata-se de uma reforma que, em muitos aspectos, foi baseada no queimar de etapas, porque em França se considerou que não poderia esperar-se por uma experimentação que levasse doze anos.

Assim, considerou-se que seria necessário queimar etapas, nomeadamente através da introdução acelerada, em alguns ciclos educativos, que se considerassem menos polémicos, dos princípios dessa mesma reforma.

O mesmo aconteceu em Espanha, onde a reforma se iniciou pelo ciclo superior da educação geral básica do EGB e, depois, passou ao ciclo médio. Houve uma enorme dúvida se se deveria considerar uma escolaridade básica de nove ou dez anos, a questão foi posta à discussão durante alguns meses, ao mesmo tempo que se experimentavam os currículos. Só agora, na vigência do Ministro Javier Solana, vão ser tomadas as decisões sobre os vários ciclos educativos, tendo-se optado pelos dez anos de escolaridade, restando apenas dois anos para o ciclo terminal, o que é manifestamente pouco em comparação com a nossa estrutura do sistema educativo, nomeadamente tendo em atenção as acções de profissionalização. A Espanha aboliu o FP1 e o FP2 e ficou só com o FP, mas teve de rapidamente adaptar toda a experiência que vinha fazendo desde 1983 nos vários ciclos da EGB e da enseñanza média — que é o nosso ensino secundário — a uma nova estrutura dos ciclos, que foi alterada em relação à estrutura dos ciclos vigentes aquando da experimentação curricular.

Não vou maçar os Srs. Deputados com vários exemplos de educação comparada, atendendo ao adiantado da hora, mas como tenho trabalhado, feliz ou infelizmente, na generalidade desses países, já há doze anos, conheço directamente as experiências vividas por eles e não me repugna, embora do ponto de vista da pureza técnica — as questões da pureza, das taxinomias e as dos livros do Taylor, do Bloome, dos curricula developments — as coisas devessem seguir etapas teoricamente sequenciais do ponto de vista político e social, que algumas etapas tenham de ser queimadas para preservar o mínimo de mobilização numa sociedade e

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para evitar que as reformas sejam adiadas para as calendas. Seria grave para a sociedade portuguesa que adiássemos para 1990-1991 a entrada em funcionamento desta reforma.

De resto, julgo que o sentido em que será feita a experimentação dos 1." e S.° anos de escolaridade preserva suficientemente a autonomia da decisão política.

Quanto ao 1.° ano de escolaridade, julgo que não existem nenhumas divergências básicas na sociedade portuguesa, nem sequer ao nível das propostas que estão no Conselho Nacional de Educação relativamente à respectiva estrutura, conteúdos programáticos, metodologias de ensino ou sugestões de actividades, que como VV. Ex. " sabem são estas as categorias fundamentais que constam de qualquer proposta curricular ou conteúdo programático. Em meu entender, a experiência a fazer será, no essencial, válida para a generalização futura.

Em relação ao S.° ano de escolaridade, podem-se colocar algumas dúvidas, designadamente em relação à área de formação pessoal e social e em relação à área escola pode haver algum problema, assim como em relação às áreas inter ou pluridisciplinares. A expressão consignada na Lei de Bases do Sistema Educativo é a de interdisciplinares, mas penso que, porventura, será mais fácil falar em áreas pluridisciplinares e na respectiva dotação horária.

No entanto, afirmamos também que o avançar, desde já, com estes conteúdos programáticos e com uma experiência no ano lectivo de 1989-1990 não invalida, de maneira alguma, que uma vez tomada a decisão politica não se venha a avaliar e a olhar para essa experiência no sentido de verificar a sua validade.

No caso de se verificar que ela não é válida, à luz dos pressupostos que presidiram à decisão política, terá de ser repetida.

No entanto, se em larga medida, isto é, se entre 50% e 80% ela puder ser considerada válida, seja èm função da grelha curricular aprovada, seja em função da sua representatividade até territorial e de escolas a serem seleccionadas, penso que, então, podemos concluir ter ganho tempo e avançado.

Então, ninguém poderá ser acusado de ter estado à espera, de ter estado passivamente a adiar uma questão que é extremamente urgente na sociedade portuguesa, só porque se esperava uma decisão política.

Quanto à questão das propostas e da abertura a alterações gostaria de dizer — como, aliás, já foi afirmado pelo Sr. Deputado Vieira de Castro e tem ficado patente nas várias intervenções públicas que tenho feito sobre esta e outras matérias, pois, pessoalmente, não tenho nem transporto nenhum sentido dogmático em relação a nada do que faço ou do que proponho — que, em princípio, o Governo está naturalmente aberto a propostas de alteração, de modificação, de melhoria dos princípios estabelecidos pela proposta de lei do Orçamento, quer ao nível do seu articulado, quer ao nível da sua organização, em matéria de verbas e outras.

Srs. Deputados, é fácil propor aumentos de despesa; aliás, o Ministro da Educação não se coíbe de o fazer, em sede de elaboração de orçamentos e em sede do próprio Conselho de Ministros, quando entende que o deve fazer. Nem sempre é bem sucedido, porque existem constrangimentos e equilíbrios gerais que têm de ser preservados em todos os sectores e não é apenas o sector da educação que tem de ser dotado.

É necessário é que quaisquer propostas que envolvam aumento de despesas sejam responsáveis no sentido de verificar, em primeiro lugar, de onde vêm as receitas, se é que há receitas que possam ser acopula-das, em segundo lugar, onde é que se diminuem as despesas para que as novas despesas não signifiquem aumento do défice e, em terceiro lugar, se é politicamente viável que essas novas despesas sejam feitas à custa do aumento do défice. São estas as três alternativas que existem, e suponho que não existem mais.

Em meu entender, devem-se considerar novas receitas, cortar outras despesas para financiar estas ou aumentar o défice.

Deste modo, espero que os Srs. Deputados, na qualidade de pessoas responsáveis, ao ponderar as propostas de alteração, ponderem também as contrapartidas que devem ser encontradas num dos três dispositivos alternativos que terão de ser chamados à colação, na medida em que seria totalmente irresponsável propor aumentos de despesa sem a ponderação desses outros factores.

Finalmente, em relação à questão da Lei n.° 103/88, relativa aos ex-regentes escolares, gostaria de dizer ao Sr. Deputado António Braga que não tenho qualquer dúvida quanto à autenticidade do que se pode considerar o espírito com que foi elaborada a lei. Contudo, a letra da lei, nomeadamente a do artigo 2.°, não reflecte, esse espírito, pelo menos de forma tão rigorosa e é a letra, nomeadamente do artigo 2.°, que dá azo a interpretações pelo menos ambíguas, e o Sr. Deputado concederá isso com certeza.

Os juristas do nosso Ministério ...

O Sr. António Braga (PS): — Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Braga (PS): — Concedo em absoluto essa possibilidade de interpretação, mas na nova, ou melhor, na nossa velha interpretação sobre o articulado considera que pode deixar de suspender a lei?

O Orador: — A eventual alteração da Lei n.° 103/88, ou a aprovação daquilo que vem na proposta de lei, inscreve-se dentro do espírito de abertura geral que há pouco referi. Penso que os próprios Srs. Deputados da maioria poderão ponderar esta hipótese. É uma questão que — repito — não está eivada de nenhum espírito dogmático.

Sr. Deputado, queria dizer-lhe que, pela nossa estimativa, estão abrangidos no artigo 1.° 757, suponho que é—

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação: — São 190 mil contos em números redondos ...

O Orador: — ... 757 ex-regentes escolares, cerca de 190 mil contos anuais, a preços de 1989. É essa a extensão, digamos assim, do custo do artigo 1.°, tal como está redigido.

Mas queria também dizer-lhe, Sr. Deputado, que são 757 os beneficiários desta lei e que o Ministério da Educação e eu próprio temos recebido milhares de abaixo--assinados, que ultrapassam muitas vezes o número de

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beneficiários, pedindo a suspensão e a revogação da lei — são milhares, desde aposentados a outros professores no activo.

Certamente que o Sr. Deputado tem conhecimento disso, assim como os sindicatos, e que se consideram discriminados se esta lei entrar em vigor, sem que nada seja feito para resolver outras situações, quer de aposentados, quer de pessoas no activo.

As situações de aposentados têm a ver com a chamada questão das pensões degradadas, que é uma velha questão na sociedade portuguesa e que não abrange apenas, como sabe, professores. As situações no activo penso que devem ser consideradas em sede do novo estatuto docente dos professores do ensino básico e secundário.

O Sr. António Braga (PS): — Sr. Ministro, se me permite e sem entrar em diálogo, dir-lhe-ei que o Sr. Ministro não tem em conta aquilo que referi, ou seja, que esses protestos não têm razão de ser, porque a actualização das reformas dos professores com curso especial é reportada aos mesmos professores com o curso normal da mesma data ...

O Orador: — Mas do artigo 1.°, Sr. Deputado!

O Sr. António Braga (PS): — É evidente que é do artigo 1.°, Sr. Ministro.

O Orador: — O artigo 2.° não é bem a mesma coisa, como sabe, e estávamos a falar da lei em geral e não a separar os artigos.

Quanto à questão dos fundos estruturais que a Sr.a Deputada Isabel Espada levantou, queria dizer-lhe que uma das primeiras lições que tenho por hábito dar aos meus alunos em Economia dos Recursos Humanos —que há muitos anos ensino— é a da distinção entre financiamento da educação e orçamento da educação. Aliás, é uma distinção que se aplica não apenas ao sector da educação, mas a todos os sectores da actividade pública. O financiamento da educação, como bem quase público que é, se quiser, não se resume ao orçamento da educação. De resto, se existe vício na sociedade portuguesa, é, porventura, a excessiva dependência da quota de financiamento da educação que resulta do Orçamento do Estado e há a necessidade de reequilibrar isso.

Por exemplo, tomemos o caso das universidades espanholas, aqui ao lado. Realizou-se recentemente na Universidade Menendez-Pelayo um seminário muito interessante sobre o financiamento da educação —tenho muito gosto em dar-vos algumas notícias e fotocópias de documentos que aí foram abordados—, onde se discutiu a questão do financiamento das universidades espanholas. Um dos problemas que foi considerado como uma distorção foi o de que apenas 20 % do custo do funcionamento geral das universidades resulta de receitas que vêm por via não orçamental.

Ora em Portugal, hoje, o financiamento das universidades estará em noventa e muitos por cento dependente da via orçamental, enquanto em Espanha estão muitíssimo preocupados pelo facto de 80 % da via orçamental do financiamento das universidades ser uma quota muito elevada, por isso a querem baixar, ou seja, aumentar a da via não orçamental.

E isto para lhe dizer que, naturalmente, ao discutir o Orçamento do Estado, não se pode discutir exaustivamente o financiamento da educação, até porque para esse financiamento concorrem e são convocadas muitas outras fontes, desde as autarquias locais, que têm intervenção —felizmente—, dentro do seu sentido de responsabilidade, na área da educação. Também nas próprias famílias há financiamento privado da educação, há ensino privado, há educação privada, que é também financiada através de outras fontes, e o próprio ensino público pode e deve ter imaginação e talento para convocar outras fontes de financiamento que não aquelas que resultem da estrita via orçamental.

É, por isso, natural que a Sr.a Deputada sinta que, ao discutir o Orçamento, não está a discutir a totalidade ou a globalidade do financiamento da educação em Portugal. Aliás, já pedi ao Gabinete de Estudos e Planeamento, com grande prioridade, a elaboração de um estudo sobre o financiamento da educação em Portugal —que é uma coisa totalmente desconhecida—, porque não se sabe qual é a percentagem que concorre para o financiamento da educação por cada um dos segmentos sociais que rapidamente enunciei: autarquias locais, famílias, Orçamento do Estado, fundações e instituições privadas de solidariedade social, etc. ...

Julgo que era importante saber-se isso, até para termos a possibilidade de, prospectivamente, podermos colocar o problema do financiamento da educação numa óptica correcta de equilíbrio entre as várias entidades e várias fontes de financiamento que poderão concorrer com verbas. Naturalmente, teremos de fazê-lo dentro dá ideia, repito, de que a educação é um bem quase público (não direi que é um bem público completo, mas é um bem quase público) e atenderemos à necessidade de equacionar esta questão, tendo em consideração os vários segmentos concorrentes.

A Sr.a Isabel Espada (PRD): — Posso interrompê--lo, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça favor, Sr.a Deputada.

A Sr.8 Isabel Espada (PRD): — Sr. Ministro, penso que, para além das lições de economia, me está, obviamente, a dar razão. Como não temos conhecimento disso e se o que conhecemos é o que está no Orçamento, então é isso que temos de discutir.

O Orador: — É evidente que é isto que temos de discutir, mas esta questão vinha a propósito dos fundos estruturais.

A Sr.8 Isabel Espada (PRD): — Sr. Ministro, não estamos a falar no vazio e não podemos acreditar, pura e simplesmente, nas palavras do Sr. Ministro, que diz: «Vamos ver, e vocês verão que tenho razão.» Ora, neste momento, a única coisa que vemos é isto.

Eventualmente, se existissem os tais estudos e se fossem apresentados aos deputados conjuntamente com este Orçamento, talvez não tivesse colocado esta questão.

O Orador: — Tem razão, Sr.8 Deputada. Espero sinceramente que no próximo orçamento possamos já dispor desses estudos dos vários sectores que concorrem para o financiamento da educação e de outros estudos

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que eu próprio venho desenvolvendo — alguns dos quais, aliás, estão em vias de publicação — sobre custos unitários no sistema educativo. Esta é uma das questões que têm sido mais nebulosas até agora em Portugal, nomeadamente na introdução de alguns factores que nunca foram tradicionalmente considerados, tais como o custo da oportunidade do investimento, que é uma noção complicada, mas que é muito importante que seja introduzida no financiamento da educação, porque qualquer financiamento do sector educativo implica necessariamente um custo de oportunidade para a sociedade, pois o que se investe em educação não se investe, por exemplo, em estradas ou em saúde e vice--versa.

Portanto, é necessário ter uma noção muito exacta de qual é o custo social do investimento, nomeadamente do custo da oportunidade social do investimento em educação, que este ano vai atingir a quota de quase 30 milhões de contos, e é necessário que responsavelmente estejamos todos em condições de pesar, sopesar e ponderar qual é este custo social do investimento.

Em relação aos fundos estruturais, penso que também será justo considerar que não são apenas palavras. O Governo tem vindo a prosseguir uma via de negociação permanente com a CEE nesta matéria. Já apresentámos candidaturas da ordem dos 12 milhões de contos ao FEDER em 1988 e, quanto ao Fundo Social Europeu, temos candidaturas da ordem dos 20 milhões de contos para 1989. Naturalmente, não sei se vão ser todas aprovadas — se sim ou se não —, mas foi percorrido um larguíssimo caminho e recordo que, há dois ou três anos, era de 600 ou 700 mil contos apenas o total das candidaturas do sector da educação ao FEDER.

Portanto, multiplicámos por 15 ou por 20 as candidaturas e temos vindo a conquistar terreno na própria interpretação —como vos disse há pouco—, em sede da Comissão das Comunidades Europeias, quanto à elegibilidade dos dossiers da educação e quanto aos instrumentos legais que presidem ao funcionamento dos fundos estruturais, designadamente o regulamento--quadro e os regulamentos de aplicação que já foram aprovados, e quanto à aceitação dos dossiers da educação, nomeadamente em relação ao Fundo Social Europeu.

Portanto, naturalmente que não se trata apenas de declarações de intenção, mas já de factos e avanços concretos, ao nível da abertura que a CEE tem tido para esta matéria. Como, aliás, suponho que é desejo consensual, já por várias vezes declarado pelos Srs. Deputados das várias bancadas e dos vários grupos parlamentares, espero sinceramente que a partir de 1989 uma parte importante, uma parte significativa, dos benefícios de que o País vai dispor dos fundos estruturais, que irão duplicar em princípio até 1992, possa ser canalizada para esta grande prioridade nacional e este grande designio que é o desenvolvimento da educação.

Finalmente, em relação ao estatuto remuneratório e ao orçamento para fazer face aos eventuais encargos acrescidos da revalorização dos professores, é evidente que o orçamento da educação não dispõe neste momento de inscrição orçamental de verbas para o efeito, como suponho que nenhum orçamento sectorial que gira funcionários públicos dispõe de qualquer provisão para o efeito. A própria globalização da questão,

desde que o Governo encomendou o relatório à comissão especializada, a chamada Comissão Sousa Franco, leva a que o ano de 1989 —não fui eu que o afirmei, foi o Sr. Primeiro-Ministro— seja, com certeza, o primeiro ano de aplicação da entrada em vigor do novo sistema retributivo. O próprio sentido de globalização leva a que as dotações necessárias para fazer face aos encargos daí decorrentes não estejam inscritas em algum orçamento sectorial. De resto, nem eu o poderia inscrever, na medida em que não posso antecipar, não tenho esse poder de premonição, qual vai ser o sentido da revalorização, que vai passar não apenas pela vontade do Governo mas certamente por um sentido negocial com todos os sindicatos e as frentes sindicais implicadas.

Portanto, será apenas como resultado das novas «grelhas» que será possível estimar quais são concretamente os encargos, e naturalmente que para isso será necessário encontrar, não em cada um dos orçamentos sectoriais, a disponibilidade orçamental para fazer face à respectiva revalorização.

Penso que em essência as questões foram respondidas, peço desculpa se uma ou outra não terá sido respondida. Fico à vossa disposição para, durante os próximos dias, directamente, bilateralmente, fornecer toda a informação que entendam ainda necessária na sequência destas discussões.

Vou terminar, pois este bem escasso que é o tempo está a assomar-se num bem escasso que é o sono ...

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior queria ainda acrescentar alguma coisa.

O Sr. Presidente: — Faz favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior: —

Em primeiro lugar, em relação ao Sr. Deputado Jorge Lemos, que referiu que o PIDDAC não tinha um crescimento aceitável, queria dizer-lhe, referindo-me só ao ensino superior, que o PIDDAC para 1989 é de 10 800 milhares de contos. Portanto, há um crescimento razoável em relação ao ano anterior, que era de 9035 milhares de contos. Se considerarmos que 80 % desta verba é destinada a construções e que os outros 20 % se destinam a equipamentos e a terrenos e se considerarmos um custo médio de 50 000$ por metro quadrado de construção e um valor médio de 10 m2 de área por aluno —que é um valor razoável— dá cerca de 500 000$ por aluno, logo, transformando esta verba, dá para 16 000 alunos. O crescimento dos alunos no último ano foi de 4700, quer dizer, estamos a construir ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Está a falar também do ensino politécnico?

O Orador: — Estou a falar também do politécnico, estou a falar no crescimento do ensino superior.

Se mantivermos este ritmo de construção poderemos em 1992 ter os edifícios que precisamos para os 200 000 alunos.

Em relação ao ensino superior, o PIDDAC previsto está em condições de responder ao objectivo que o Governo colocou de duplicar o número de alunos até 1992.

O Sr. Deputado António Barreto disse que o Ministério estava numa posição defensiva e não guerreira.

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II SÉRIE-C — NÚMERO 4

A esse propósito, queria dizer-lhe que quando fui para a Secretaria de Estadq do Ensino Superior, aliás, pela segunda vez, visto que deste Ministério sou o único repetente, procurei tomar logo uma posição ofensiva e não defensiva, como o Sr. Deputado disse. Mas ofensiva não só em relação ao Ministério das Finanças — e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que está aqui ao lado, pode confirmá-lo— mas também em relação às universidades. Por exemplo, em 1984, as nossas universidades tinham uma parcela de 11,05 % do orçamento do Ministério da Educação e, em 1988, já tinham 12,88 %; as despesas do PIDDAC, em termos reais, triplicaram de 1984 a 1987; temos uma relação aluno/docente de um para oito. Em nenhum país da Europa se está com relações tão favoráveis como estas.

Logo a princípio, criámos um grupo de trabalho, aliás pedindo apoio ao Banco Mundial, do qual fazem parte dois reitores, o reitor da Universidade do Porto e o da Universidade Técnica de Lisboa, para estudarmos os problemas do financiamento, de outras fontes de financiamento para o ensino superior e para uma melhoria da gestão do ensino superior, nomeadamente no ensino universitário.

Como disse há pouco, no último fim-de-semana tivemos uma reunião internacional sobre financiamento do ensino superior, com a participação de muitos reitores.

Pensamos que muita coisa se pode fazer para a melhoria do funcionamento do ensino superior e este grupo de trabalho começou a funcionar muito antes de os Srs. Deputados aprovarem aqui na Assembleia da República a Lei de Autonomia da Universidade. Portanto, não foi em consequência da aprovação dessa lei que isto se fez.

Há também um aspecto muito grave, que aumenta muito os custos no ensino superior, e que é a elevada percentagem de repetências. Como os custos das propinas são muito baixos, quase vale a pena àqueles alu-

nos que conseguem entrar no ensino superior continuar no ensino superior. Posso enviar-lhes essas informações, não tenho aqui os dados, mas o número médio de anos que o aluno leva para tirar um curso de quatro ou cinco anos é muito alto.

O Sr. Rogério Moreira (PCP): — Quer dizer que vêm outra vez as prescrições?

O Orador: — Sr. Deputado, peço-lhe que não me interrompa.

Em relação ao Sr. Deputado Rogério Moreira, que me enviou estes elementos que aqui tenho, talvez não correspondam exactamente àqueles que elaborei. Devo dizer-lhe que fui assessor do Sr. Secretário de Estado da Investigação Científica, o antecessor do Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, pertencendo também ao Conselho Superior de Ciência e Tecnologia, e nesse Conselho fui escolhido, com mais algumas pessoas — uma está aqui presente, a Sr.a Directora-Geral da Contabilidade Pública—, para elaborar uma proposta de orçamento para a área de ciência e tecnologia. Fui o relator desse grupo e elaborei uma proposta idêntica a esta, que talvez tenha umas ligeiras alterações, tendo sido apresentada a uma reunião plenária do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia e aprovada. Talvez esta tenha qualquer ligeira alteração, mas compararei o meu relatório com os números que o Sr. Deputado Rogério Moreira me enviou.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, chegámos ao fim desta fase dos nossos trabalhos. Quero agradecer a VV. Ex.as a vossa contribuição e aos Srs. Deputados e lembrar àqueles que amanhã têm de continuar a análise do Orçamento, que recomeçamos às 10 horas.

Está, pois, encerrada a reunião.

Eram 2 horas e 15 minutos.

Documento enviado à Mesa da Comissão para publicação pelo deputado do PCP Rogério Moreira:

Orçamento de Ciência e Tecnologia

Dotações dos principais organismos púbfcos financiadores e executores de l&D 1986-1987-1988-1989

(Valores iniciais) (a)

Despesa orçamentada

_«o»

 

Despesa total

Despesa em l&D

Organismos públicos

                   
 

1986

1987

1988

1988(M

1989

198«

1987

1988

1988 (6)

1989

Estado

                   

IH ..................

361,5

395,8

580,1

592,7

532,4

36,0

273,9

374,8

382,8

346,3

I1CT.................

641,0

696,0

853,0

919,7

1 010,0

427,5

566,0

694,0

748,0

891,0

INIA................

2 683,8

2 850,8

4 403,9

4 641,6

4 708,2

1 368,9

1 871,9

2 180,8

2 297,8

2 401,8

INIP ................

494,7

828,9

896,4

948,0

892,6

347,2

590,8

892,6

948,0

892,6

JNMG...............

928,7

990,6

1 569,8

1 627,4

1 625,0

314,0

275,0

313,0

324,0

260,0

INS .................

552,9

647,3

718,9

765,3

705,8

28,6

29,3

221,4

235,4

253,9

JNICT...............

1 043,3

2 614,0

3 377,8

3 377,8

3 863,1

1 043,3

2 614,0

3 377,8

3 377,8

3 863,1

LNEC...............

1 546,4

1 825,9

2 055,5

2 215,5

2 038,3

1 030,5

1 340,9

1 215,7

1 307,7

1 369,7

 

4 024,7

4 411,0

3 681,0

3 853.1

5 261.0

1 682,5

2 280.9

2 146,7

2 241,7

2135,8

LNIV................

354,0

544,0

450,5

489,5

618,7

112,0

125,0

130,9

141,9

169,5

 

400,0

400,0

180.1

180,1

252,0

400,0

400,0

180,1

180,1

252,0

SGP (c)..............

-

-

218,4

225,4

203,1

-

-

139,9

143,9

142,5

Página 147

30 DE NOVEMBRO DE 1988

147

 

Despesa total

Despesa em I&D

Organismos públicos

1986

1987

1988

1988 (b)

1989

1986

1987

1988

1988 <*)

1989

Ensino superior

1N1C ................

Esc. sup. {d) .........

1 950,5

2 122,2

2 290,0

2 319,3

2 975,0

1 950,5

2 400,0

2 122,2 237,2

3 500,0

2 290,0 261,0 5 031,0

2 319,3 291,8 5 526,5

2 975,0 310,5 5 879,5

Subtotal (Estado+ 1NIC)

14 981,5

18 326,5

21 275,4

22 155,4

24 685,2

8 741,0

12 489,9

14 157,7

14 648,4

16 553,2

Total......

-

-

-

-

-

11 141,0

16 227,1

19 449,7

20 466,7

22 743,2

Página 148

DIÁRIO

da Assembleia da República

Depósito legal n.0 8819/85

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Por ordem superior e para constar, comunica--se que não serão aceites quaisquer originais destinados ao Diário da República desde que não tragam aposta a competente ordem de publicação, assinada e autenticada com selo branco.

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