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Sábado, 2 de Dezembro de 1989
II Série -C — Número 8
DIÁRIO
da Assembleia da República
V LEGISLATURA
3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1989-1990)
COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO
Acta da reunião de 30 de Novembro de 1989
SUMÁRIO
Acta da reunião de 30 de Novembro de 1989: continuação do debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 117/V — Orçamento do Estado para 1990 — e 118/V — Grandes Opções do Plano para 1990 (Ministérios do Planeamento e da Administração do Território, dos Negócios Estrangeiros, da Justiça e das Finanças).
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A Sr." Presidente (Helena Torres Marques): — Srs. Deputados, temos quórum de funcionamento, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação do orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Começo por agradecer a presença dos Srs. Secretários de Estado, lamentando, porém, que o Sr. Ministro não possa estar connosco, uma vez que se encontra em reunião do Conselho de Ministros da CEE. Talvez tivesse valido a pena termos mudado esta reunião para outra ocasião, em que o Sr. Ministro pudesse estar presente, porque consideramos que seria importante a sua presença para se proceder à análise do orçamento deste Ministério...!
O Sr. António Barreto (PS): — Sr.' Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa
A Sr.* Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Barreto (PS): — Sr.* Presidente, receio que me tenha enganado no «Fdme», pois pensei que também fossemos discutir Ciência, Investigação Científica e Tecnologia, mas nem vejo o Sr. Secretário de Estado nem o Sr. Ministro. Será que essa matéria foi marcada para outra altura e que o engano é meu?
A Sr.' Presidente: — Para responder à sua questão, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Libcrato): — Sr. Deputado, como a Sr." Presidente já teve ocasião de referir, o Sr. Ministro está na reunião do Conselho de Ministros e, inesperadamente — ao contrário até do que tinha pensado —. não vai poder abandoná-la para vir a esta reunião, tendo-me pedido para assegurar a coordenação dos Srs. Secretários de Estado aqui presentes.
O Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia está fora do País. Naturalmente, o Govemo está sempre disponível para comparecer nas reuniões às horas que forem entendidas e também na medida das suas possibilidades, mas o que quero assegurar é que estou aqui em representação do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
A Sr.» Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.
O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Secretário de Estado, como pode imaginar não estou a tentar criar qualquer incidente parlamentar. Como sabe, foi apresentado este ano um planeamento plurianual para a Ciência e Tecnologia que não pôde ser discutido, há duas semanas, com o Sr. Secretário de Estado, porque também estava ausente. Falou-se do assunto antes de este planeamento ter sido entregue, mas penso que é bom que, antes da aprovação final do Orçamento e do Plano haja uns minutos dedicados a este sector.
Sc o Sr. Secretário de Estado me diz que está totalmente habilitado a informar-nos relativamente a este assunto, fico encantado. A questão era apenas de saber se seria hoje ou noutra altura.
A Sr.* Presidente: — Srs. Deputados, vamos hoje analisar, na especialidade, não só o orçamento de despesa do Ministério do Planeamento e da Administração do Território mas também o PIDDAC, na sua globalidade, uma vez que este Ministério é responsável pela sua elaboração.
No entanto, gostaria de, antes de passar a palavra aos Srs. Deputados e de iniciarmos a discussão propriamente dita, apresentar alguns problemas, lamentando, mais uma vez, o facto de não termos entre nós o Sr. Ministro, embora o Sr. Secretário de Estado o represente.
Creio que todos nós reconhecemos que na equipa do Ministério do Planeamento e da Administração do Território há uma vontade muito grande de colaborar com a Assembleia da República — penso que vale a pena reconhecer isso— e de fornecer os elementos que normalmente solicitamos. Considero mesmo que os ministérios têm desenvolvido uma boa colaboração com a Comissão de Economia, Finanças e Plano e têm, digamos, muito acima da média legal, um respeito especial pelo trabalho desta Assembleia
Acontece que este ano, uma vez que estamos a discutir as matérias deste Ministério quase no fim das discussões com todos os outros ministérios, apercebemo-nos de que a elaboração do PIDDAC nos traz problemas bastante grandes e gostaríamos que, também em termos globais, fosse possível perceber a razão desta nova orientação na apresentação do PIDDAC.
Uma das facetas que temos vindo a verificar nas sucessivas reuniões é que os Srs. Ministros se desvinculam bastante das verbas que vêm referidas no PIDDAC, sobretudo das verbas que temos de votar. Ou seja, temos de votar o crédito global e os Srs. Ministros preocupam-se fundamentalmente, se não exclusivamente, com a verba que está para 1990, e dizem que o resto é meramente indicativo... Mas são as verbas que temos de votar!...
O que acontece —e vou recordar o que se passou ontem na reunião da Comissão de Agricultura e Pescas — é que as verbas globais que estavam inscritas no PIDDAC para o Ministério da Agricultura eram, aproximadamente, 4 milhões de contos, mas a execução dá-nos 22 milhões de contos. Este ano, o orçamento aparece-nos com 23 milhões de contos e o ano passado estava previsto que tivesse 5 milhões.
Eu sei, já nos foi explicado, que nada disto é mistério, há sempre justificação para todas estas situações, mas o problema não é esse. Nós estamos aqui a analisar o PIDDAC deste ano e temos de compará-lo com o dos anos anteriores para tentarmos compreender a evolução, mas assim escapa-nos completamente.
Outra situação, por exemplo, passou-se com o Sr. Ministro da Educação, que nos disse que as verbas que tinha para este ano eram perfeitamente suficientes, dado que linha cerca de 37 milhões de contos e que não queria um «orçamento de fartura». E quando lhe perguntei por que é que, para o próximo ano, precisava de 65 milhões de contos, a resposta dele foi esla: «65 milhões de contos? Mas por que é que preciso desse dinheiro todo?». Eu disse-lhe que era a verba que constava no PIDDAC e ele respondeu-me: «Está a dar-me uma boa notícia!»
Pisos.
Sr. Secretário de Estado, isto parece um fail divers, mas realmente é o que temos aqui para votar.
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Para além destes aspectos genéricos, que se poderiam repetir, acontece muitas vezes nós dizermos que pegamos no PIDDAC deste ano, analisamos, comparamos com o ano anterior, tiramos as conclusões que é possível tirar para quem tem o PIDDAC na mão e, quando levantamos as nossas dúvidas, os membros do Governo dizem-nos: «Oh, não* Esse valor que está aí não é nada disso; não se preocupe.' Nós temos muito mais verbas por outros fundos (...]». E começam a citar-nos n fundos para o mesmo programa e projecto.
Ora, o que antes acontecia, segundo me parece, é que o valor do investimento do programa e de cada projecto, muitas vezes não coincidia com o cap. SO, o que significava que, através do Orçamento do Estado, se incluía a verba nesse capítulo, mas o valor do programa era um valor superior, porque havia outras fontes de financiamento alternativo, o que se compreende, sobretudo depois de nos dizerem quais eram as fontes!
Porém, o que acontece agora, quase sistematicamente, é que a verba do investimento e a do cap. 50 correspondem, apesar de os ministros ou os secretários de Estado nos dizerem: «Não, há muitos mais financiamentos do que isto!»
Outros casos que se verificam e que gostaria que ficassem esclarecidos na Comissão de Economia — embora tenhamos muito gosto em ter aqui colegas nossos das comissões ligadas à Administração Local e à Ciência — têm a ver com o seguinte: por vezes também se indica o valor do investimento, mas depois não há qualquer verba no cap. 50. Então, se não há qualquer verba neste capítulo, por que é que ela consta no PIDDAC? Por que razão é um investimento da Administração Central, uma vez que não existem verbas naquele capítulo?
O que nos pareceria correcto era que o valor do investimento correspondesse ao investimento total previsto para esse ano e fossem depois indicadas as fontes de financiamento, uma das quais seria o PIDDAC, através do capítulo 50, ainda que, para além do PIDDAC, existam n fontes de financiamento que viriam especificadas e com a comparticipação de cada uma.
Como entenderá, Sr. Secretário dc Estado, a Comissão de Economia e todas as comissões poderiam analisar, efectivamente, o PIDDAC e compreendê-lo.
Por último, repito, o que votamos é o crédito global, no fundo, o custo total da obra, havendo depois uma discriminação ano a ano. Ora acontece, Sr. Secretário de Estado, que esta Assembleia é levada a votar num ano e no ano seguinte verbas completamente diferentes para o mesmo projecto e com justificações difíceis de entender.
Vou apresentar dois casos concretos, para que se torne fácil perceber o que está aqui a discutir-se. Um deles respeita ao conjunto monumental dc Belém, que constava do PIDDAC do ano passado com um valor de 6 milhões de contos. A Sr.' Secretária dc Estado da Cultura referiu, cm sede de comissão, que o investimento seria dc 12 milhões dc contos e, afinal, do PIDDAC constam 14 milhões de contos.
Embora este valor do PIDDAC na área da Secretaria de Estado da Cultura, a Sr.* Secretária dc Estado diz que nada tem a ver com aquele investimento, porque ele é das Obras Públicas... E quando ontem perguntei ao Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações se este valor global do PIDDAC já incluía o equipamento, ele disse-me que não sabia.
O que pretendo dizer é que temos de ter cuidado com estes valores que estamos a volar como créditos globais.
porque esse será o valor por que, de facto, a Assembleia da República vai ser responsável, pelo que não podem mudar de um ano para o outro em 200 % ou 300 %, para já não falar nos 50 % a mais, porque é uma coisa que acontece inúmeras vezes.
As respostas que nos dão são como esta: «Isso era o valor do ano passado.» Ora, não se pode prever que, de um ano para o outro, com uma taxa de inflação mesmo na ordem dos 13 %, o custo dos investimentos aumente 50 %, 100 % ou 200 %. Mas também há casos em que diminui, ou seja, reduz-se a verba que havíamos aprovado o ano passado.
Ainda ontem tivemos oportunidade de perguntar ao Sr. Secretário de Estado da Segurança Social por que é que um determinado investimento, que o ano passado tinha sido votado com um determinado crédito global, aparecia este ano com um crédito global 30 % inferior. E o Sr. Secretário de Estado disse: «Não, não! Eu pago tudo, mas não por essa fonte!» Mas, então, o que é que estamos aqui a aprovar?
Julgo que este é um problema muito sério. Estamos todos a querer analisar o PIDDAC com o máximo rigor, ele era bastante perceptível, mas agora está muito menos. Sei que há razões — não estou a dizer que alguém quer esconder essas razões —, sei que há fontes de financiamento alternativas, fundamentalmente os fundos comunitários e os serviços com autonomia financeira. Porém, o que sugeria era que a elaboração do PIDDAC sofresse as modificações necessárias para que nós aqui, na Assembleia da República, soubéssemos o que votamos, quer como investimento global, quer como verbas do cap. 50, quer como outras fontes de financiamento que cobrissem estes investimentos.
Era este aspecto de carácter geral que eu pretendia colocar ao iniciar esta reunião.
Entretanto, se os Srs. Secretários de Estado quiserem responder desde já, aceito as inscrições.
Pausa.
Tem então a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota): — Sr." Presidente, quero começar por agradecer-lhe o facto de tet colocado o dedo num aspecto que, do meu ponto de vista, e considerando a actuação da Secretaria de Estado do Planeamento, reputo da maior importância.
Como os Srs. Deputados sabem, desde o ano passado que, em termos de planeamento, temos vindo a fazer uma alteração muito grande em relação a todos os procedimentos, fundamentalmente por força da reforma dos fundos estruturais — e é evidente que é isso que está aqui em causa —, e ainda pelo rigor acrescido com que temos de responder a toda a programação dos investimentos e do PIDDAC. Isso mesmo leva a que, por um lado, o PIDDAC apresente um grande crescimento e, por outro lado, sejamos permanentemente confrontados com novas actuações.
Quando a Sr.* Presidente diz que o PIDDAC é menos perceptível, devo dizer que discordo, por completo, da sua afirmação. Não é menos perceptível, o que há é uma realidade nova. Com efeito, se, por exemplo, V. Ex." quiser confrontar a informação detalhadíssima que vem nas GOPs — e que até este momento nunca existiu —, irá
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reconhecer isso mesmo. Neste momento, nas GOPs , no capítulo que se refere ao PIDDAC, vem especificada,
pomo por ponto, toda a informação complementar, o que
permite uma leitura mais adequada do mapa vn, não na perspectiva de programa a programa, mas na da lógica que lhe subjaz.
Assim, em primeiro lugar, saliento que estamos perante despesas de desenvolvimento, portanto, são despesas da Administração Central que, por um lado, são investimento público e, por outro lado, muitas delas, são despesa pública para viabilizar o investimento privado...! E isto é logo uma grande revolução em termos de toda a programação e de toda a orçamentação!
Esta alteração, que começou a ser introduzida no ano passado, é o chamado PIDDAC tradicional, isto é, o PIDDAC de infra-estruturas, e, por outro lado, o PIDDAC/apoios, alteração que, só por si, provoca logo uma mudança completamente diferente, que está na base da razão de — conforme V. Ex* diz, e muito bem — aparecer uma despesa relativamente pequena no PIDDAC quando, por outro lado, aparecem investimentos muito grandes que esse pequeno montante de PIDDAC vai viabilizar. Esse é o caso da agricultura, que no âmbito do PEDAP/Infra -Estruturas tem um determinado tratamento em termos de PIDDAC, enquanto tudo o que é apoios tem um tratamento completamente diferente, pois apenas é inscrita contrapartida interna que viabilize um determinado volume de actividade.
É evidente que isso provoca algumas alterações e ainda será necessário introduzir mais — reconheço-o e é minha intenção fazê-las — para que se possam dar passos em frente no sentido de tornar o mapa vn cada vez mais perceptível.
Em relação ao sector da educação, enquanto os meus colegas Secretários de Estado da Administração Local c do Ordenamento do Território e do Ambiente e dos Recursos Naturais estiverem a responder às questões que lhes forem colocadas, irei informar-me por que 6 que aparecem os referidos 65 milhões, pois já agora também tenho curiosidade em saber.
Mas, é evidente!, o que está no mapa vn não é inventado pela Secretaria de Estado do Planeamento; todos os dados têm por base fichas e instrumentos de notação que são feitos pelos diversos sectores e discutidos caso a caso, e só depois, obviamente, é que são inscritos no documento que constitui o mapa vn.
Gostaria ainda de dizer que, a partir do ano que vem, vamos ter de dar um passo muito profundo em termos de alteração do mapa vn. E porquê? Porque, como sabem, a lógica que está na base da intervenção da Comunidade Económica Europeia vai abandonar, por completo, o programa isolado e vai passar a haver programas.
Com toda a franqueza, posso dizer que, com um grupo que começou a funcionar este ano, tentei já reflectir no mapa vn a nova estrutura da Comunidade Económica Europeia, para que, ao olhar-se para o mapa vn, pudesse ser possível a qualquer pessoa verificar, muito claramente, por exemplo, o que é o PRODEP/Programa de Educação — a parte que tem reflexo no Orçamento do Estado, claro!, pois é isso que está aqui em causa—; o que 6 o Programa «Ciência»; os grandes programas e, no fundo, tudo aquilo que denota o que é o investimento estratégico do Estado, porque é isso que está em causa. Mais do que conhecer «programinha a programinha», interessa saber, exactamente, se a verba aumenta ou diminui. Portanto, o que está aqui em causa é ter uma visão estratégica do
investimento público, do investimento da Administração Central e, directamente, aquele que ela viabiliza em
termos de apoios à actividade produtiva.
Este ano ainda não foi possível, atempadamente, proceder desta forma, pois corria-se o risco de prejudicar os calendários que estavam previstos, uma vez que, como todos sabem, houve uma coincidência, no tempo, entre a discussão do quadro comunitário de apoio e a preparação do Orçamento do Estado, pelo que acabámos por resolver que se daria um pequeno passo apenas no sentido da indicação de alguns elementos, que me parecem ser importantes, e no próximo ano então tentar-se-ia conseguir ter — e espero que assim seja — uma total coincidência entre a lógica de intervenção do quadro comunitário de apoio, o nosso PIDDAC, e a lógica de intervenção da Comunidade Económica Europeia, sobretudo nos sectores que são co-financiados.
Todo o trabalho que foi feito aponta já — e, se os Srs. Deputados repararem, isso é uma coisa que aparece pela primeira vez — para a indicação dos programas, entre os quais aparece o FEDER. Estão indicados caso a caso. Nuns casos tem FEDER, noutros já tem PRODEP. O que são? São programas que integram o grande programa nacional de educação, de ciência ou de qualquer outro sector, como o caso do PRODAC.
Os investimentos da JAE, que estão com o financiamento do FEDER, que vem do passado, ou que vão integrar um novo PRODAC, estão aqui assinalados.
É evidente que o passo seguinte tem de ser dado no sentido de consolidar isto de uma forma mais perceptível, mas julgo ter conseguido dar a volta, tanto quanto possível, através das GOPs. Penso que nas GOPs existe uma discriminação muito grande, não só de todo o programa de investimentos, como até da informação das receitas. Não nos podemos esquecer de que quando falamos aqui em outras fontes estamos a votar o mapa de despesa e não de receita e, portanto, tentei, nas GOPs, dar o complemento da informação que me parece que no conjunto possibilitará o esclarecimento necessário, designadamente a algumas das questões que a Sr.* Presidente solicitou.
Quanto às outras fontes, é evidente que muitas são comunitárias, simplesmente no texto das GOPs, e fazendo uma leitura cruzada, é fácil ver qual é, caso a caso, o montante atribuído de ministério a ministério, ou seja, os meios necessários para a política de cada sector.
Queria ainda dizer que, durante o próximo ano, uma das prioridades da Secretaria de Estado do Planeamento, em conjunto com a Secretaria de Estado do Orçamento, é dar uma nova estrutura ao mapa vn, de forma a torná--lo também mais estratégico, em termos das novas modalidades a que, em meu entender, temos de dar resposta, não só por serem da Comunidade Económica Europeia mas também porque já se toma necessário conciliar os dois tipos de orçamentação, pondo assim a tónica num aspecto muito importante em relação ao qual é necessário que se dêem passos em frente, e que é a programação plurianual.
É evidente, Sr.* Presidente, que estou de acordo consigo quando diz que, em termos de programação plurianual, têm de se dar grandes passos. Na verdade, não posso estar mais de acordo. É uma das minhas lutas permanentes.
Penso que o facto de se ter estabilizado, em termos contratuais, com a Comunidade Económica Europeia, uma parte fundamental de todo o PIDDAC —o que aconteceu há cerca de dois meses— nos permite, pelo menos aí.
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ter já uma base onde se pode ver que o trabalho de programação foi muito afinado. Foram gastos meses, ou melhor, mais de um ano de trabalho a afinar essa programação. Foram feitas várias versões e procedeu-se à compatibilização até onde se podia ir em termos de contrapartida interna, ou seja, considerando-se o que vinha da CEE.
Neste momento, em que estamos a terminar a negociação, por exemplo, no caso da educação, no caso do PRODEP, sabemos exactamente quanto é que vai ser o PRODEP co-financiado e estamos a isolar e a determinar quais são as medidas que vão estar incluídas. Assim, não tenho dúvida alguma de que, no próximo ano, a programação plurianual vai ser facilmente ajustada e acertada. E precisamente esse o trabalho que se está agora a fazer. Noutros campos tem de se ir mais longe.
Muitas das razões que levam V. Ex.* a dizer que desde o ano passado para este houve saltos — e eu nisso tenho bastante responsabilidade — devem-se ao facto de muitos dos «saltos» serem fruto do trabalho que na Secretaria de Estado do Planeamento se fez e que provocou a redução de determinados montantes que visavam investimentos que, obviamente, não eram plausíveis, pelo que não era possível avançar com eles.
Tem vindo a fazer-se um esforço, em meu entender, ainda não totalmente conseguido, mas estou, perfeitamente crente —e irei dar-lhe toda a prioridade— de que, no próximo ano, existirão já condições para que a programação plurianual esteja cada vez mais próxima da realidade.
Quanto ao conjunto monumental de Belém, gostaria de esclarecer que, se bem me lembro, os 3 milhões de contos referidos no PIDDAC do ano passado diziam apenas respeito à construção do Centro Cultural.
Certamente VV. Ex." se lembram de que o ano passado essa verba estava inscrita no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, pois, no fundo, tratava-se da transferência de uma verba para uma empresa que vai levar a cabo a obra. O que aparece este ano no mapa vn é uma tentativa de clarificação relativamente a todo o projecto e engloba já a 2.1 fase. Tem, pois, uma explicação e o montante que está indicado no mapa vn está correcto, uma vez que o promotor do projecto a refere como sendo, neste momento, a estimativa plausível para as duas fases do projecto. Assim, passou de 6 para 14 milhões porque diz respeito a universos diferentes.
A inclusão desta verba na Secretaria de Estado da Cultura em vez de ser no Ministério das Obras Públicas, do ponto de vista da mecânica orçamental, «tanto faz como fez», mas, do ponto de vista da lógica do investimento, considero que assim faz muito mais sentido. Foi esse o entendimento do Governo ao incluí-la na Secretaria de Estado da Cultura em vez de fazê-lo no Ministério das Obras Públicas, porque não é uma obra pública e tem um sentido diferente, muito mais profundo do que propriamente uma estrada ou uma escola. Trata--se de algo que se pretende que venha a ter um papel muitíssimo importante na projecção cultural do nosso país. É isso que está em causa! Os 12 milhões que o ano passado se apontavam como valor global passaram, neste momento, para os 14 milhões referidos no mapa VII.
Sr.* Presidente, penso que, nesta primeira intervenção, terei respondido às questões pertinentes que me colocou.
A Sr.* Presidente: — Gostaria de agradecer à Sr.' Secretária de Estado as explicações que acabou de nos dar
e, sobretudo, queria deixar-lhe uma preocupação: a de que, efectivamente, todos temos uma vontade de compreender melhor estes elementos que nos são dados e para que eles sejam compreensíveis tem de haver transparência nos elementos que nos são fornecidos e uma lógica de análise.
Gostaria também de lembrar à Sr.* Secretária de Estado que somos deputados da Nação, mas somos todos eleitos por círculos eleitorais e regionais, e, portanto, com o mesmo interesse com que analisamos as perspectivas globais, fazemos também análises de tipo regional e local, pelo que todos estes elementos têm de ser transparentes, compatíveis e perceptíveis. Foi nesta perspectiva que orientei a minha intervenção de há pouco.
Neste momento, estão inscritos três Srs. Deputados para intervir.
Tem a palavra a Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol.
A Sr.' Lourdes Hespanhol (PCP): — Começaria por perguntar à Sr.* Presidente se tem conhecimento de uma carta que foi enviada à Comissão de Economia, Finanças e Plano por alguns deputados do Grupo Parlamentar do PCP e do respectivo despacho da Comissão, que foi distribuído aos restantes grupos parlamentares.
É porque esta caria foi também enviada ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, ao Sr. Presidente da Assembleia da República e a outras entidades, e com ela pretendia.-se denunciar o não cumprimento da lei por pane do ministério, que, todos os anos, cumpre escrupulosamente a Lei das Finanças Locais, indicando todos os elementos necessários e imprescindíveis para a apreciação do orçamento, mas este ano não o fez.
Assim, não cumpriu o n.° 5 do artigo 3.° da Lei das Finanças Locais, pois, quanto à atribuição de novas competências, não existe plano de distribuição, não existe um mapa, nem nada que possamos analisar.
Também não cumpre o n.° 4 do artigo 10.° da mesma lei, relativo à distribuição do FEF e, por isso, não sabemos como é que foi feito... Não temos esses indicadores.
Mas houve outras coisas que não cumpriu e outros dados que deveria ter dado e não deu, pelo que não compreendo a atitude do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Não acredito que o orçamento tenha sido elaborado sem terem recorrido a outros dados. Aliás, a Sr.* Secretária de Estado acabou de dizer que ele não é inventado e que se baseia em dados concretos e em estudos... Ora, esses estudos têm de ser, obrigatoriamente, enviados à Assembleia da República.
Não percebo por que é que eles não estão na posse dos deputados, que têm de analisar o Orçamento do Estado, tal como também não percebo por que é que não houve uma resposta a uma carta escrita e enviada por mim, e também a um requerimento urgente que fiz.
De facto, o Orçamento do Estado não leva um ano inteiro a ser discutido. É verdade que já tenho feito requerimentos em Outubro e recebido a resposta no ano seguinte, em Agosto, mas com o Orçamento do Estado esta situação não se pode passar! A situação a que estamos aqui a assistir é extremamente grave!
Não sei se algum dos Srs. Secretários de Estado quererá dizer alguma coisa já em relação a isto, porque, caso contrário, passarei a outras questões que tenho para colocar.
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A Sr.* Presidente: — Sr.ª Deputada, creio que para o bom andamento dos trabalhos será melhor os Srs. Deputados colocarem primeiro todas as perguntas que pretendem formular e, no caso de as inscrições feitas serem muitas, dividi-las por blocos.
Portanto, pode prosseguir no uso da palavra, Sr.' Deputada.
A Oradora: — Então, a primeira questão que tenho para colocar prende-se com o cap. vi das Finanças Locais, nomeadamente com vários artigos, o primeiro dos quais é o artigo 42.°, que incide sobre o Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Como já denunciámos, continua a fazer-se nesse capítulo um cálculo para o FEF que enferma da mesma doença de que já enfermou em anos anteriores e que é a da subavaliação do IVA. O IVA continua a ser subavaliado!
Já denunciámos que o FEF deverá ser de 155,6 milhões de contos, o que significa um reforço de 17 055 000 contos em relação à verba inscrita no Orçamento pelo Governo.
A verdadeira cobrança do IVA para este ano permite fazer estes cálculos e chegar à conclusão de que há subavaliação. Por isso o PCP propõe uma alteração neste artigo, no sentido de que o montante do FEF seja Fixado em 136 155 600 contos para o ano de 1990.
A segunda questão prende-se com as novas competências, designadamente as'que constam do artigo 52.°, n.° 3: «A participação na reforma educativa e nas novas competências.» Em relação a este artigo o PCP tem uma pergunta a fazer, pergunta que se prende com a falta dos elementos de que dispomos.
Haverá novas competências para as autarquias locais? Por outras palavras, para além dos protocolos que estão assinados relativamente à construção de escolas, o que é que se passa no que respeita às transferências do pessoal pré-escolar, do primário e do CPTV? É porque não há qualquer mapa que nos dê indicações sobre quais são as verbas disponíveis. Sobre o que é que vai ser transferido e como é que vai sê-lo!...
Sem esses elementos pensamos não poder, de forma nenhuma, tratar este assunto, pelo que o PCP propõe para o artigo 52.° uma alteração, que acrescenta um n.° 2, do seguinte teor: «O disposto no número anterior só é aplicável através da celebração de protocolos com autarquias e desde que cumprido integralmente o disposto no artigo 3.° da Lei n.° 1/87, de 6 de Janeiro.» Este termo
«integralmente», evidentemente, é para que se inclua, no caso de transição de pessoal, não só o pessoal do quadro que está colocado, como o pessoal dos quadros a ser colocado e também o pessoal tarefeiro e contratado a termo certo. Não podemos, de forma nenhuma, aceitar aquilo que no ano passado foi presente a esta Comissão como estudo, em que o moniante das transferências, a serem feitas, seria de menos 50 % do valor real que as autarquias locais iriam pagar.
Uma outra questão prende-se com novos encargos que se destinam a subsidiar a Administração Central através da administração local. De facto, as autarquias locais recebem o FEF, que é «magro», e depois ainda vão subsidiar o poder central!!... Afirmamos isto porquê? Porque, a manter-se o artigo 46.° — e acredito que ele vá ser eliminado, pois temos uma proposta nesse sentido para apresentar, penso que os autarcas, que são muitos nesta Assembleia, não deixarão passar um artigo como
este—, haverá uma retenção na fonte para pagar aos elementos dos gabinetes de apoio técnico (GATs) verbas a serem transferidas para as comissões de coordenação regional (CCRs). Outra forma de a Administração Central ser subsidiada é a do pagamento do IRS, em que as autarquias locais vão ter de pagar as compensações referentes aos aumentos de que os seus funcionários vão auferir, e que têm todo o direito de auferir!
Sendo o IRS um imposto novo, as autarquias locais têm de ser compensadas e as compensações têm de ser necessariamente feitas. Até este momento o que tem acontecido e que está a acontecer por esta via, designadamente no que se refere às comparticipações para a Caixa Geral de Aposentações e Montepio dos Servidores do Estado, é que as autarquias estão a pôr do seu próprio dinheiro para entrar esse dinheiro nos cofres do Estado.
Gostaria ainda de fazer uma pergunta respeitante a uma matéria em relação à qual não sei se os Srs. Secretários de Estado saberão o que se passa. É que o Estado consegue fazer retenções do FEF na fonte, mas retém mais: retém contribuições nas repartições de finanças, de há cinco anos a esta parte, verbas que, pelo menos nalguns casos que conheço, não entrega às autarquias locais.
Um exemplo: neste momento estão retidos numa repartição de finanças do Alentejo mais de 10 000 contos que pertencem à autarquia local e que não lhe são entregues. É evidente que esto dinheiro está a vencer juros a favor do Estado de há cinco anos a esta parte! Diria, em bom rigor, que não são 10 000 contos de há cinco a esta parte, pois, se fizermos uma média dos juros, estes serão de cerca de 2000 contos/ano!...
Uma outra questão respeita —e já falei um pouco acerca disso — à falta de compensações das isenções do IVA. Propomos, por isso, uma alteração ao artigo 27.° Nós não somos contra as isenções, concordamos com elas, mas desde que sirvam para beneficiar a vida das populações. Todavia, temos, por exemplo, o caso dos transportes escolares, que foram transferidos para as câmaras municipais. Ora, no Código do IVA existe uma disposição que não refere especificamente que os transportes escolares deverão ser compensados, mas, sim, transportes a visitas, nomeadamente de âmbito cultural, etc. Há inclusivamente um despacho de resposta a ofícios de câmaras municipais que colocaram esta questão. A resposta dada é a de que há direito a serem compensadas, mas essa compensação ainda não chegou e soma muitos milhares de contos, se considerarmos isto em termos nacionais! Aqui também as autarquias locais não podem reter nada! Quem pode reter é somente o Estado. Portanto, assistimos a retenções relativamente às quais não há volta a dar. Tem de ser tomadas medidas de fundo agora para resolver esta questão e é por isso que para o artigo 26.° propomos um novo texto.
Uma outra matéria a tratar é a relativa à questão da revisão da Lei das Finanças Locais. Não se compreende que no artigo 41.° do Orçamento do Estado se venha rever a Lei das Finanças Locais, alterando deste modo números do seu artigo 7.° Qualquer dia o Orçamento do Estado chega aqui c substitui toda a lei deste país!... Basta ser um volume mais grosso do que o actual!
Não concordamos com isso de forma alguma, pelo que propomos a eliminação desse artigo. A Lei das Finanças Locais existe e é para ser cumprida! Se não se concorda com ela, então proponha-se uma alteração, mas não se tomem medidas destas através da proposta de lei do Orçamento do Estado.
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Mudando um pouco de assunto, pego nas palavras que a Sr.1 Secretária de Estado proferiu há pouco, quando disse que houve uma tentativa de colocar lá à frente o PRODEP..., algumas verbas, etc., para nós ficarmos a perceber melhor o programa. E pego nisso para dizer que fiquei a perceber pior! É verdade que na arca da educação tem lá o PRODEP. Mas, depois, chegamos à rubrica «Sector de Defesa e Protecção do Ambiente» e a referência que vem seguidamente expressa é a de «Novo projecto». O que me causa grandes dúvidas é que, não estando indiciada qualquer ajuda comunitária, as verbas propostas no Orçamento do ano passado para este ano eram umas verbas consideráveis e as verbas agora apresentadas são, na maioria dos casos, menos de 50 %. Não percebo o que é que se passa!
É natural que a resposta esteja neste bonito livro que nos foi entregue no início desta reunião, sob o título Ambiente/90, pelo Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, mas realmente um livro que é entregue na hora de irmos discutir uma coisa tão importante como é o Orçamento do Estado...! Ó Sr. Secretário de Estado, com lodo o contentamento que fico por ter um livro com uma capa tão bonita e que deve ter coisas muito ricas cá dentro, fico também extremamente baralhada. Penso que não é assim que deve ser discutido o Orçamento do Estado. Ele é por de mais importante.
Lá fora diz-se que o debate do Orçamento do Estado deve constituir na Assembleia da República o momento alto e mais interessante dos trabalhos parlamentares e eu penso que deveria ser assim. No entanto, acho que também é um momento extremamente amargo, em que nós, deputados, deparamos com imensas dificuldades para podermos analisar as coisas como devem ser.
De facto, chegamos aqui e os Srs. Secretários de Estado dizem que neste ou naquele outro livro há-de estar isto ou aquilo, e é uma tristeza não termos tido oportunidade de- verificar se no livro está ou não está aquilo que é necessário para a defesa e protecção do ambiente.
A Sr." Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ávila.
O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Gostaria de fazer duas perguntas à Sr.1 Secretária do Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional e ao Sr. Secretário de Estado da Administração do Território.
Em relação à área do PIDDAC, gostaria, na sequência das perguntas que foram efectuadas pela Sr.* Presidente da Comissão, de perguntar à Sr.* Secretária de Estado se não seria possível, em futuras apresentações do PIDDAC, discriminar, de forma mais clara, as alterações de montante das verbas que estão previstas plurianualmente para os projectos e programas do PIDDAC, de modo que pudéssemos ter em conta, por um lado, quais seriam as alterações de montantes que têm a ver com as revisões de preços aos projectos inicialmente programados, de acordo com o cronograma inicialmente previsto, e, por outro, as alterações decorrentes de uma reprogramação de projectos e programas. Porque o que acontece é que, por exemplo, as previsões de 1989 para 1990, no PIDDAC de 1989, apontavam para determinados montantes. Porém, chegamos a este ano com montantes diversos e não sabemos se, nuns casos, é devido a uma reprogramação, se, noutros casos, por desistência de projectos e se, ainda noutros, por reforço de verbas para projectos que
continuam a estar programados nos mesmos termos em que o foram inicialmente. Ora, podem fazer-se várias leituras...
Há, nomeadamente, casos em que se verifica um arrastamento de obras, que não estão a ser feitas, e convinha saber o porquê disso. Claro que da forma como o PIDDAC está organizado, com estas três situações cumulativamente apresentadas num único mapa, é difícil fazer qualquer tipo de leitura — cada um de nós poderá fazer uma leitura diversa sobre os mesmos números.
Portanto, se fosse possível ter em conta em anos seguintes estes três tipos de situações, seria muito útil para se ver o que está a acontecer com os projectos que anualmente vamos aprovando. Isto tem também a ver, por exemplo, com a tal variação de verbas, de 6 milhões para os 14 milhões de contos, embora para este caso concreto já tenhamos a explicação do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Mas como esta situação é um caso pontual, convinha que o problema fosse tratado de uma forma sistemática.
Quanto às questões relacionadas com a Administração do Território —matéria já referida por muitos grupos parlamentares durante o debate, na generalidade, do Orçamento do Estado, mas que conviria escalpelizar um pouco mais —, verificamos anualmente que, estando o Fundo de Equilíbrio Financeiro indexado à previsão da receita do IVA (e a lei não é clara quando diz que é o IVA previsto no Orçamento do Estado do ano previsto, porque não diz se é no início ou se no fim do ano, se é o IVA executado ou se é o projectado), nessas circunstâncias —como o Sr. Secretário de Estado sabe tão bem ou melhor do que eu —, tem havido, em anos sucessivos, sobretudo nos últimos três anos, verbas que poderiam ter sido transferidas para as autarquias, no caso de se ter tido em conta o IVA executado em cada ano. Neste momento, passados três anos, essas verbas ascendem a 12,6 milhões de contos, que acabaram por não ser transferidas por o Governo ter vindo a entender que o IVA previsto no Orçamento do Estado é o projectado no início do ano. Acontece que, desta forma, as autarquias nunca recuperarão nos anos seguintes essas verbas.
Pode ver-se, por exemplo, que em 1988 o IVA projectado foi de 355 milhões de contos c que a transferência para as autarquias foi de 91,2 milhões de contos. Acontece que em 1989 o IVA foi de 107,6 milhões de contos e na base de uma previsão para 1989 de 419 milhões de contos. Segundo o Governo, o IVA projectado, na alteração orçamental de 1989, será ainda superior: 431 milhões de contos. Ora, isto significa que há aqui uma diferença de cerca de 3,1 a 3,2 milhões de contos em 1989, por exemplo, que poderiam ter sido transferidos para as autarquias. O Governo não considera isso para o ano de 1990, ao estipular os 128,4 milhões de contos.
Pergunto, Sr. Secretário de Estado: até que ponto é que considera a hipótese de estas verbas, pelo menos no passado, os 12,6 milhões de contos, virem a ser afectadas a um «fundo de desenvolvimento do potencial endógeno das regiões», nomeadamente com vista a favorecer o aparecimento de projectos empresariais de pequena e média dimensão no Interior? Esta é uma questão.
Em relação a situações futuras, como é que encararia a hipótese de se fazer, em alteração orçamental — eventualmente traduzível também em alteração legislativa na Lei das Finanças Locais —, para que o Governo possa ver isso em anos seguintes, uma correcção à fórmula, que neste momento se encontra em vigor na Lei das Finanças
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Locais, de modo que ajustamentos positivos na cobrança efectiva do IVA possam ter repercussão aditiva em anos subsequentes?
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — É inconstitucional!
O Orador: —Não, não é inconstitucional. Esta questão é uma lacuna legal que neste momento existe.
No entanto, gostaria de saber a opinião do Sr. Secretário de Estado para estas duas situações.
Antes de dar por concluida a minha intervenção, se fosse possível, gostaria de pedir à Sr.' Secretária de Estado do Planeamento que, abrindo uma excepção, pelas razões que de início apresentei e que me obrigam a sair com urgência, me responda de imediato a estas questões, o que agradeço desde já.
A Sr.* Presidente: — Srs. Deputados, a fim de ajudar ao debate, lembro que os termos exactos, constantes na Lei das Finanças Locais, é «o IVA orçamentado no ano n e «o IVA orçamentado no ano n-l».
Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: — Sr. Deputado Vítor Ávila, quanto à questão que colocou e que vem na linha da que a Sr.* Presidente já havia referido, penso que é possível darem-se passos no sentido de um melhor esclarecimento das alterações da programação plurianual.
Porém, quero fazer ainda, em relação a esta matéria, mais dois comentários.
Todos se devem recordar de que na altura em que o mapa vn surgiu — e vale a pena olhar-se um pouco para trás e perceber-se o porquê das coisas —, pela primeira vez, quando começou a fazer-se a programação plurianual no nosso país, a política de desenvolvimento não tinha uma expressão muito importante e vivia-se numa fase, sobretudo, de acordos com o Fundo Monetário Internacional.
É evidente que, nessa altura, a programação plurianual não tinha um papel estratégico muito grande, e as preocupações eram de facto de outro tipo, estando exclusivamente centradas na redução do défice do Estado e na solução dos problemas da balança de pagamentos. Por isso é que os sectores, aquando da apresentação do plafonà para o ano seguinte no mapa vn, isto em anos passados, tinham sempre a tendência de avolumar na perspectiva legítima de, enfim, levar a cabo os projectos que estavam em carteira e tentar que, por essa via, houvesse no ano seguinte a garantia de mais fundos.
Esta mentalidade ainda não foi totalmente abandonada pela nossa Administração, pois, como é óbvio, estas coisas não se mudam de um dia para o outro. Enfim, para responder tanto à sua preocupação como à da Sr.* Presidente, e essa é também a minha preocupação, penso que as coisas estão neste momento a mudar, e é evidente que o facto de haver fundos comunitários e uma garantia de um contrato plurianual, porque é isso que está em causa com o quadro comunitário de apoio... O que é o quadro comunitário de apoio e em que termos c que € um instrumento fundamental para o País? Para além do aspecto de fundo, que é, enfim, o desenvolvimento das áreas que estão contempladas, do ponto de vista financeiro, ¿ um aval para os projectos e programas contemplados. Porque?
Porque o Estado membro tem um contrato com a Comissão Europeia para, em tantos anos, gastar aquele montante, porque se o não fizer perde o direito, a não ser que faça uma alteração interna de programas, etc.
Portanto, há todo um conjunto de factores, de instrumentos, ou seja, uma alavanca adicional que leva a que a programação tenha de ser muitíssimo mais rigorosa. E é isso que está a ser feito!
Digo-lhe que —e isto é uma questão de tempo, de timing, de garantia — já tenho neste momento elementos de compatibilização entre um calendário negocial e a apresentação do Orçamento do Estado. Ou seja, neste momento já se dispõe, para sectores de muito peso ou, melhor, para sectores com um peso muito importante no PIDDAC, de elementos muito concretos de programação plurianual de médio prazo para 1993.
Completando a resposta à sua questão, penso que é possível dar-se, não no mapa vn, o da programação plurianual, mas em elementos adicionais que possam ser fornecidos aquando da apresentação, em anos futuros, do PIDDAC, uma justificação para as alterações, isto é, dizer-se se é de conteúdo, se é de preço ou do atraso de execução.
Portanto, tem, da minha parte, todo o apoio e abertura para prosseguir nessa via.
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Vou tentar esclarecer o Sr. Deputado Vítor Ávila em relação à questão que colocou.
Penso que, a breve prazo, iremos ter todas as condições para, na Assembleia da República, discutir essa matéria, porque o Governo, no cumprimento do seu programa, irá apresentar uma proposta no sentido de rever a Lei das Finanças Locais, o que deverá acontecer nas primeiras semanas do próximo ano. Nessa medida todas as questões que levantou, nomeadamente a do esclarecimento dessa eventual lacuna que existe na actual Lei das Finanças Locais, podem ser colmatadas e discutidas aqui, entre todos nós.
No entanto, o que está agora em causa são duas previsões orçamentais para o IVA: a do ano passado t a deste ano. Por outro lado, a taxa de crescimento vai levar um determinado valor do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Mas o que está em causa e o que é realmente a questão de fundo é verificar se efectivamente as evoluções ao longo do ano das previsões do imposto do valor acrescentado deverão conduzir a alterações do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Estou convencido de que isso geraria uma instabilidade enorme no próprio Orçamento do Estado, o que não é desejado por ninguém, estou crente.
Quanto à sugestão feita pelo partido que o Sr. Deputado representa, a criação desse fundo, penso que a Associação Nacional dos Municípios Portugueses não estará muito de acordo com essa solução, porque, tanto quanto sei, as suas posições são no sentido de querer ver reforçado o Fundo de Equilíbrio Financeiro, pura e simplesmente. Mas, de qualquer forma, é uma solução que, naturalmente nessa sede, pode ser estudada e decidida pela própria Assembleia da República.
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A Sr.' Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Bartolomeu.
O Sr. Luís Bartolomeu (PCP): — Bom, eu tinha uma série de questões preparadas para colocar ao Sr. Ministro, que não está presente, mas, como está tão bem representado, falarei da mesma forma. Vou fazer uma pequena reflexão sobre o Projecto Alqueva e, ao mesmo tempo, anunciar que os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista eleitos pelos distritos de Beja, Évora e Portalegre apresentaram uma proposta de alteração relativa à construção da barragem do Alqueva.
A construção da barragem do Alqueva é uma preocupação constante de todos os que desejam o desenvolvimento do Alentejo e de Portugal, mas que para alguns é apenas lembrada em momentos de campanha eleitoral. V. Ex.\ Sr. Secretário de Estado, sabe que em tempo de eleições todos prometem a construção da barragem do Alqueva. Todavia, passado o acto eleitoral, apenas alguns lutam por isso. Escusado será dizer que os deputados do PCP e a esmagadora maioria, repito, a esmagadora maioria —e quase que me atrevia a falar em totalidade dos alentejanos— está nessa luta. Este é um problema que não é apenas alentejano, pois muitos portugueses entendem que a barragem do Alqueva é tão importante que o consideram nacional. Por conseguinte, a ajuda do Sr. Presidente é preciosa.
O PIDDAC apresentava o seguinte quadro: em 1989, para o estudo do impacte ambiental, 29 SOO contos; em 1990, para o mesmo estudo ambiental, para o estudo da mais-valia agrícola é, em 1989, de 8500 contos; em 1990 de 5000 contos. Portanto, há um decréscimo; há aqui uma alteração entre um ano e outro — em 1989, havia estudos para aquicultura e piscicultura, este ano é a informatização. Essa é a grande diferença!
Por último, qualquer dos dois PIDDAC, tanto o de 1989 como o de 1990, falam na recuperação do património arqueológico e ambos apontam com a verba de 9 500 000 contos.
Verifica-se, assim, que continua a haver estudos, uns já feitos outros quase feitos, mas quanto é que se destina a isso? Milhões? São milhões!
Os senhores entendem, com certeza, onde quero chegar e não é uma questão de mais um zero ou de menos um zero que reduz o interesse que todos devemos ter na sua construção.
Verifica-se, assim, que os estudos já feitos e outros quase feitos vão continuando e, quanto à construção, nada!
Pergunto: até quando esta situação? Será até 1991, ano de eleições? Sinceramente, gostaríamos que esta pergunta não se transformasse em acusação. Se em 1991 nada tiver sido feito, acusarão VV. Ex.** de eleitoralismo.
Por isso, os deputados dos três distritos alentejanos, para evitar essa acusação, apresentaram uma proposta de reforço do PIDDAC para 1990 no valor de 1 milhão de contos, com vista ao relançamento das obras.
A Sr.* Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.
O Sr. António Barreto (PS): — Sr.* Presidente, Srs. Deputados: Faço esta intervenção, como no futebol, a pretexto das inadmissíveis condições em que estamos a trabalhar. O frio, o barulho, o ruído, a porta aberta que não se pode fechar, as correntes de ar, o fumo, tudo o
que quiserem, não é aceitável, não é admissível! Sei que o homem se habitua a muita coisa e o português se habitua a tudo, mas eu não me habituo a isto — e já o ano passado foi a mesma coisa! —, pois não é aceitável, é malcriado! Não se recebe ninguém numa sala destas e é mau para o trabalho e para nós próprios!...
Passado isto, antes de iniciar a minha intervenção sobre questões que dizem respeito à ciência e à tecnologia, não quero deixar passar sem um brevíssimo comentário telegráfico a observação da Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional de que o conjunto monumental de Belém está bem instalado no orçamento da Secretaria de Estado da Cultura. Não está! O objectivo fundamental, a vocação daquele Centro (que é plurivocacional, como se costuma dizer nos gabinetes, é polidimensional, como se costuma dizer também) não é a de um investimento essencialmente cultural, destinado à vida cultura], à expressão cultural, ao acesso à cultura, à conservação, preservação e modificação da cultura. Não é isso! Está ali, eventualmente, porque é uma obra de regime, é uma obra de governo, é uma obra de consolidação e de aparência!... É por isso que está aí! Só nesse aspecto é que é cultural, infelizmente não pelas melhores razões.
Quanto à ciência e tecnologia, gostava de elogiar o Ministério do Planeamento e da Administração do Território e a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia pela publicação, este ano, pela primeira vez, do volume Planeamento Plurianual de Actividades Científicas e de Investigação Tecnológica. É uma obrigação, dado que a Lei n.° 91/88 isso impõe, mas, nos tempos que vivemos, quando alguém cumpre obrigações, merece elogio.
Posto isto, constatamos que neste planeamento plurianual a ciência perde em percentagem do PIB. O Sr. Pri-meiro-Ministro declarou, em 1987, nas jornadas tecnológicas, que em 1990 o investimento em ciência e investigação científica em Portugal seria de 1 % do PIB. Afirmou-o e reafirmou-o no ano seguinte e este ano, segundo os próprios números do Ministério, o investimento é de 0,65% — muito aquém, portanto, do objectivo de 1 %.
Mais interessante, todavia, é que o investimento não é de 0,65 %, porque o Ministério do Planeamento e da Administração do Território, pelo menos neste documento que nos forneceu, calcula o PIB para 1990 em 7 biliões de contos, mais zero menos zero. Ora, como toda a gente sabe, a estimativa oficial do Governo, do PIDDAC, do Orçamento de Estado é de 8 000 150 milhões de contos. Quer dizer que esta enorme diferença entre os 7 biliões de contos e os 8 000 150 milhões de contos de percentagem para ciência e tecnologia — que é, de facto, de 047% — aparece no planeamento plurianual como sendo de 0,65 %. É uma derrota face ao 1 %, mas é ainda suplementar, dado que as contas não jogam e a apresentação do PIB tão baixo permite sobreavaliar as despesas de investigação e ciência.
Quer isto dizer que o objectivo de 1999, o objectivo oficial do Governo — aliás, sugerido por todas as instituições internacionais interessadas por questões que dizem respeito à tecnologia e ciência —, que é o de atingir 2,5 % do PIB em despesas públicas e privadas, recursos nacionais e externos, está mais recuado e mais longínquo. Curiosa e infelizmente, este planeamento plurianual, depois de constatar esta enorme discrepância entre os objectivos, as metas e o que se vai conseguindo ano após ano, não faz correcção e mantém, religiosamente, os
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2,5 % e o 1 % como se nada fosse, quando é verdade que 6 totalmente impossível atingir estas propostas, de acordo com o que aqui vemos!
Retomo aqui uma proposta que o meu grupo parlamentar apresentou na Comissão de Educação —e volto a lembrá-la aqui —, no sentido de ser dotado com 30 000 contos o Laboratório de Microbiologia da Faculdade de Farmácia, para investigação fundamental em matéria de SEDA.
Sei que o Governo tem vindo a apoiar um grupo relacionado com a SIDA e com as actividades de divulgação e informação; simplesmente, o grupo que pertence a este laboratório está mais preocupado com a investigação, tem pergaminhos internacionais, colabora com instituições internacionais, nomeadamente o Instituto Pasteur. A verba necessária é muito pequena e eu, volto a insistir, sugiro a intercessão dos membros deste Ministério junto dos restantes para que o financiamento deste laboratório para o programa de investigação da SIDA possa prosseguir, porque é importante. A pessoa responsável por este laboratório é também responsável pelo isolamento do segundo vírus da SIDA, uma performance científica feita por portugueses de relevo internacional, pelo que era bom que não fosse posto termo a esta possibilidade de desenvolvimento científico.
Devo mesmo dizer que se este ano ou no ano que vem alguns cientistas envolvidos neste programa não tiverem possibilidade de continuar a trabalhar, pura e simplesmente vão-se embora, uma vez que já têm ofertas de trabalho nos Estados Unidos e em França.
Ainda em relação ao planeamento plurianual, em princípio, lamento que não haja — e a lei obriga a isso — o parecer do Conselho Superior de Ciência. A Lei n.° 91/88 obriga a que este planeamento inclua uma reflexão, uma análise e um parecer do Conselho Superior de Ciência e este parecer não se encontra aqui. Imagino que, pura e simplesmente, não foi pedido ou, então, não foi dado. Desmintam-me, Srs. Secretários de Estado.
Vou agora tecer comentários, por vezes sob formas de perguntas, por vezes sob a forma simples de comentários.
Assim, começo por discordar da inclusão nos orçamentos da ciência do SNIG (Serviço Nacional de Informação Geográfica), que não é um organismo de investigação, como toda a gente sabe, mas um serviço de informação, útil, importante e interessante mas que nada tem a ver com a ciência e com a investigação e está aqui incluído indevidamente.
Não sei porquê, mas a JNICT (Junta Nacional de Investigação Cientifica e Tecnológica) aparece sem verbas da CEE —talvez nos quadros principais, que são os quadros xrx e XXI, apareça com dois financiamentos —; por um lado, aparece com as suas receitas próprias e, por outro, com as transferências feitas pela JNCT para os laboratórios e organismos de investigação. Pergunto — e desmintam-me, por favor! — se estes financiamentos não estão duplamente contados. Não sei como é que se faz depois, porque então a JNICT teria de perder os financiamentos que fazem parte das suas tranferências.
Quero deixar claro que o programa PRODEP, em relação ao qual a Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional já falou, nao existe! E não existe há dois anos! É mesmo uma não existência perseverante. O PRODEP não foi aprovado em Conselho de Ministros, não foi aprovado pela CEE, não foi aprovado por ninguém com competência para o fazer, não foi, sequer, conhecido nem discutido por instituições,
tais como a Assembleia da República e o Conselho Nacional de Educação. O PRODEP não é público, apenas se conhecem cópias clandestinas, e eu venho a dizer isso desde há dois anos, mas lenho muita paciência. Esse programa não existe e, das suas múltiplas versões (e já vão em 24!), os números são sempre diferentes, as metas são sempre diferentes, os recursos, os financiamentos e as despesas são sempre diferentes.
Assim, o PRODEP neste planeamento, nas Grandes Opções do Plano, no PIDDAC e na intervenção da Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional é uma aspiração, tal como os Portugueses devem ser bons, bonitos, ricos, inteligentes e com saúde!... É uma aspiração, pois o PRODEP não existe, tal como não existe o Programa Ciência. Desmintam-me, Srs. Secretários de Estado! O Programa Ciência não está negociado, terminado, assumido ou garantido. É uma aspiração — e esperemos que os Portugueses sejam o que eu disse há pouco!... Tudo isto são aspirações! Não me importo de inovar a técnica parlamentar contemporânea e aprovar aspirações, mas vamos é chamar-lhes o que elas são e não vamos chamar programas consolidados, calibrados, programados, etc., aos que o não são!
Quanto ao PRODEP —e parece ser um problema de pormenor, mas não é —, devo recusar e denunciar a inclusão, nos documentos oficiais do Governo, de uma projecção tal da população no ensino superior que, em quatro anos, aumenta de 95 000 alunos, isto é, 82 %. No mundo inteiro, ninguém que seja responsável programa, em quatro anos, um aumento da população universitária e politécnica superior de 82 %, num montante, em números absolutos, de 96000 anulos ...
Repito: quero deixar claro que é política, cultural e cientificamente irresponsável programar e, eventualmente, tentar fazer, em quatro anos, um aumento de 82% da população universitária. Em Portugal, não há professores qualificados, doutorados, com mestrado, com agregação, com experiência pedagógica e científica para aguentar um aumento de 82% da população universitária; não há instalações, não há hierarquia universitária, não há comunidade científica académica capaz de permitir um aumento destes. Para ter as curvas na CEE, para ter as curvas na OCDE, para ter as curvas a subir na UNESCO ou em Portugal, quem tentar pôr em prática um plano destes está a desgraçar a comunidade académica e a comunidade científica; está a formar lumpen doutores, lumpen licenciados e é irresponsáveí. Se isto é só para deitar «poeira nos olhos», muito bem, diga-se, mas é irresponsável!
Gostaria agora de, com duas ou três observações, mostrar a insuficiente qualidade técnica do planeamento plurianual. Em primeiro lugar, tem o carácter insólito de ser um planeamento retroactivo, porque os principais quadros de programação plurianual para a ciência referem-se a 1986-1990. Bem, isto não é uma programação, mas, sim, são memórias; é autobiografia, é história. Para 1991 e anos seguintes não há absolutamente qualquet programação, mas, sim, um cálculo totalmente vago e aéreo — aliás, as frases iniciais da Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional sobre os velhos hábitos do nosso planeamento confirmam aquilo que digo. Diz-se assim: «Em 1999, haverá 150 milhões», mais zero, menos zero. Seja por organismos científicos, seja por áreas científicas, seja por funções científicas ou tecnológicas, não há uma linha nesta programação plurianual, que começa, curiosamente, por
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um longo capítulo sobre a situação em 1986, fazendo depois a programação de 1986 a 1890. Isto não é, uma vez mais, uma programação nem um planeamento, mas, antes, um contributo para a história da ciência em Portugal.
Por outro lado, como disse há pouco, faltam os montantes globais, somados, dos diferentes programas, porque apenas constam valores até 1990; em 1991 já não consta qualquer verba e daí para à frente ainda menos. Portanto, não há, como deveria haver, valores indicativos globais — repito —, valores indicativos, flexíveis, não autoritários, não imperativos, o que, segundo creio, era necessário num trabalho de programação e planeamento como este.
Problema mais qualitativo é o da investigação universitária. Portugal vive em termos de ciência universitária, desde há muitas décadas, dominado pela docência. É uma característica do antigo regime, e digo antigo regime com A grande—Ancien regime para falar no termo adequado —, pois em Portugal, de facto, a universidade não tem autonomia científica praticamente nenhuma. Não há PIDDAC para a investigação científica universitária, porque esta é financiada por fora, isto é, pelo Instituto Nacional de Investigação Científica (fNIC) e por outras vias externas.
Quer dizer, depois de aprovada a Lei da Autonomia Universitária, era indispensável, imperativo, que este ano, em vez de haver o PIDDAC do INIC, ou o PIDDAC «por fora», houvesse, pura e simplesmente, o PIDDAC das universidades, por forma que estas tivessem autonomia para gerirem os seus próprios financiamentos e fazerem a sua própria investigação científica.
Devo dizer-lhes que, pessoalmente — não envolvo o meu partido neste ponto de vista —, creio que o INIC devia ser, pura e simplesmente, extinto, porque é um organismo político de controlo e, como tal, serve para controlar a aplicação política da investigação científica e para controlar as universidades —, isto dito em termos simples, breves e rápidos.
Aliás, já existe um «braço» de organização da ciência do Estado, que é a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT), que devia, no meu entender, ter algumas reformas importantíssimas — devo dizer que algumas delas, apesar de terem sido começadas, foram travadas durante este ano. De qualquer forma, aqui está um organismo que permite planear, pensar, organizar a investigação científica ou, pelo menos, a presença do Estado na investigação científica.
O INIC deveria ter uma real autonomia universitária, pois, neste momento, não serve para nada a não ser para controlar politicamente as coisas. Lamento que no planeamento plurianual o Governo e o Ministério mantenham a investigação universitária sob controlo estritamente vigiado, quando a década de 90 deveria ser justamente a da explosão e a da autonomia da investigação universitária.
Sob a forma de comentário, a espera que os Srs. Secretários de Estado me desmintam, gostaria de colocar uma outra questão. Não há incentivos para a investigação científica e tecnológica empresarial, como não há incentivos para a produção e divulgação dos resultados da investigação científica feita por indivíduos, cientistas, universidades, etc.
Ora, a Lei n.° 91/88 obriga, o Programa do Governo obriga, o planeamento plurianual diz, promete e aspira, mas quando vamos às coisas reais, desde o subsídio à desalfandegação, aos impostos, às isenções, às deduções,
sobre tudo isso a actuação do Governo é quase nula, há apenas pequeninas coisas.
Curiosamente, há dois dias, na televisão, um empresário — não sei se pequeno se médio, em todo o caso não era grande— explicou que tinha descoberto um device tecnológico, que esse device tinha tido grande aceitação no País e no estrangeiro, que linha concorrido aos organismos do Estado para obter um subsídio, que era um prémio no valor de cerca de 1000 ou 1500 contos—,era, simplesmente, ridículo — e esteve dois anos à espera que o prémio pela sua descoberta tecnológica lhe fosse concedido. Ora, durante esses dois anos em que esteve à espera que lhe concedessem o prémio arranjou dinheiro por outro lado e, ao fim de dois anos e meio, já estava a comercializar tudo e não tinha, de facto, tido o apoio, o subsídio, ou o premio, neste caso merecido e obrigado, que deveria ter.
Isto demonstra que, na verdade, não há incentivos à investigação científica empresarial e tecnológica e há aqui um defeito político do Governo que ê muito grave: o Govemo não fala com as multinacionais nem com as grandes empresas privadas. Durante o último ano fiz alguns telefonemas — e não estou a ser sujeito a pressões dos lobbies —, falei com as multinacionais que estão instaladas em Portugal e com grandes empresas portuguesas.
É uma ideia absolutamente ultrapassada pensar que a pequena e média empresa portuguesa será o essencial da investigação científica e tecnológica, porque não o é. Decerto que haverá investigação que se poderá fazer aí, é uma parte muito importante e interessante, repito e para não me interpretarem mal, como também há investigação científica e tecnológica individual — embora já não vivamos no século xvn ainda há coisas que se fazem a nível individual —, mas o essencial hoje (e veja-se a publicação das patentes por todo o mundo!) é feito por grandes empresas com grandes meios económicos, humanos e científicos.
Bom, mas como estava a dizer, da consulta que fiz às grandes empresas multinacionais e portuguesas verifiquei que todas se queixam, todas, sem excepção! Todos os empresários portugueses com quem falei, todos os grandes empresários das multinacionais se queixam de que o Govemo fala com as associações de classe, com as quais, desculpem que lhes diga, em matéria científica, isso é conversa fiada... Aquilo é política, é cultura, é propaganda, ou concentação social, como se costuma dizer, pois, para tratar e trabalhar, realmente, na investigação científica tem de ser com as empresas, com os agentes económicos, com as empresas privadas.
Porém, a verdade é que Portugal, com esta política de privilegiar as associações de classe, nem consegue, por exemplo, arranjar entrada nos grandes programas europeus — e vou só citar dois: o AIRBUS e o ARIANNE — que solicitam e atraem milhares de participações europeias, seja de organismos, seja, sobretudo, de empresas privadas. Nós, no ARIANNE e no AIRBUS, e em mais alguns programas deste género, não «riscamos» nada, pois não há multinacional que tenha nos últimos anos criado novas instalações, novos centros, novos laboratórios de investigação, e não de investimento produtivo.
Ora bem, é esta linha política que o Governo tem de prosseguir e não o faz por diversas razões, sobre as quais não vou agora fazer qualquer processo de intenções. Mas a verdade é que no planeamento plurianual o Governo não
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dá qualquer indicação sobre o investimento e a despesa privada na investigação científica.
É curioso, e o Sr. Deputado Vieira de Castro está a olhar para mim, porque está a perceber o que estou a dizer, está a perceber tudo...
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Estou com atenção! Estou embevecido!...
Risos.
O Orador: — Como estava a dizer, é muito curioso que um governo que tanto tem utilizado as empresas privadas para a sua afirmação doutrinária, não consiga, num caso como este, em que é indispensável e obrigatório ter muito boas relações e muito bom diálogo com as empresas privadas, multinacionais e com as grandes empresas portugueses, dialogar, pois é praticamente nulo o seu contacto permanente.
Gostava de contar uma história, mas não vou fazê-lo porque isso demoraria muito tempo; vou apenas dizer que nos últimos anos já foram entregues dos fundos públicos, por exemplo, para investigação na área da produção de cortiça — uma vez que este é um dos sectores económicos mais importantes —, desde a cortiça no montado à cortiça na rolha, contraplacado e outras utilizações industriais, cerca de 400 000 contos. Ora, os técnicos calculam que nem 10 % desta verba acabou realmente em operações de investigação e desenvolvimento tecnológico da cortiça. Não digo que esse dinheiro tenha sido aldrabado, mas, sim, espalhado por vários organismos, vários laboratórios, várias instituições que não fazem investigação científica real.
Pausa.
Sinto que estou a discutir um assunto quando todos os presentes estão à espera de discutir outro, as Grandes Opções do Plano, o ambiente, a administração local, o FEF, etc. Mas se isso é assim também resulta da má organização desta reunião de trabalho!...
Continuando, eu gostaria de perguntar quantos descongelamentos foram feitos para a investigação tecnológica e científica nos últimos dois anos — ao que me parece, quase nenhum ou mesmo nenhuns, desmintam--me Srs. Secretários de Estado se assim não for! —e de saber quantas novas bolsas foram concedidas para pós-graduação e investigação científica e tecnológica no estrangeiro durante o ano de 1989—1990, e, repito, novas bolsas e não renovação ou manutenção de bolsas já concebidas.
O número de bolsas para o estrangeiro em pós-graduação científica estão a decrescer assustadoramente, inclusivamente até porque um dos maiores financiadores dessas bolsas de estudo para investigação científica era a Fundação Calouste Gulbenkian, que infelizmente, por definições de política interna da Fundação — não tenho nada a ver com isso, pois não se trata de uma instituição pública—, está praticamente ausente deste sector nos últimos anos, o que quer dizer que o Estado ficou quase sozinho no terreno.
A existência da Fundação Luso-Americana e da Fundação Oriente, de que tanto se fala, não chega, porque estas Fundações nem sequer têm fundos, por isso pouco tèm feito em matéria de investigação e pós-graduação cientifica no estrangeiro. Aliás, devo dizer que uma das
Fundações é muito nova e a outra, embora já tenha alguns anos, não creio que tenha feito muito nesse domínio.
Gostaria ainda de dizer que a lei obrigaria, e os bons costumes e o programa do Governo também, a que houvesse anualmente uma espécie de definição do «envelope» científico para a cooperação externa. Bem sei que há uma cooperação militar, que é sempre um assunto estranho e nenhum de nós sabe o que quer que seja disso — talvez daqui a 10 ou 20 anos a democracia esteja melhor e, então, saberemos todos o que se passa—, que há a cooperação política, com as visitas, a diplomacia, etc., e que, depois, há a cooperação real, no terreno, a cooperação externa com os países de língua portuguesa. Ora esta cooperação, no meu entender, teria na ciência, na tecnologia, na investigação um terreno fantástico de actuação, uma vez que desde a medicina tropical às ciências da natureza relacionadas com os países tropicais, etc., temos algumas qualificações, meios, pessoas que sabem e até algumas tradições.
Ora, no Orçamento não existe um «envelope» global para isto e, quando eu quis obter informações sobre este assunto, do Ministério da Educação mandaram-me para a Ciência e Investigação, daqui já me mandaram, até, para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, que me mandou outra vez para aqui, e nisto andamos!...
Não existe, de facto, esse «envelope», não existe uma coordenação absolutamente indispensável para enriquecer, potenciar e maximilizar, como se diz nos gabinetes, a nossa presença nos países de língua portuguesa através da investigação científica, que é, como sabem, enorme, porque vai desde a análise dos solos à meteorológica, geológica, botânica, da fauna e da flora, até à análise antropológica e social, médica, de saúde pública. Na realidade, o campo de actuação é enorme, mas pouco, tem sido feito, muito pouco, e, sobretudo, o que tem sido feito é desgarrado e não é programado.
Vou dizer-lhes que, por exemplo, já desde há alguns anos certas pessoas na comunidade académica e científica têm vindo a sugerir — e vou resumir para não maçar os Srs. Deputados — que Portugal tenha uma organização em cada um destes países, porque imaginem o que é, por exemplo, um geólogo, um médico, um dentista, um especialista em saúde pública, um geógrafo, que vai a Guiné ou a Angola integrado num trabalho de cooperação ou que vai prestar um serviço a esse país. Bom, esse senhor não tem casa, não tem quarto, não tem uma máquina de escrever, não tem um laboratório de revelação de fotografia, não tem absolutamente nada; está, como dizem os brasileiros, «no mato sozinho e sem cachorro»; não tem absolutamente nada para subsistir.
Ora, esta situação faz com que estes senhores fujam para a cooperação técnica e cientifica sueca, americana e alemã, de entre outros países, e acabem por ir trabalhar para outros países, que não falam português, já não por conta da procura mas, sim, por conta da oferta.
Era, pois, indispensável que Portugal tivesse em cada um destes países um ou vários centros de apoio à cooperação, com meios dactilográficos, com telefone, com telex, com fax, com um pequeno laboratório fotográfico, com acesso a todos os meios de investigação, de informação e divulgação sem os quais não há qualquer espécie de cooperação técnica e científica possível. Porém, o Ministério e o Governo não têm nem um «envelope» financeiro nem a linha política coordenada para a cooperação científica com os países de língua portuguesa.
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Termino pedindo desculpa aos outros Srs. Deputados que estão interessados noutros assuntos por ter trazido aqui este tema.
A Sr.* Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado António Barreto, pela forma como introduziu a sua intervenção.
Aproveito para evidenciar e pedir desculpa a todos pela falta de condições de trabalho que existem na Assembleia da República; porém, nós somos os responsáveis pelo nosso orçamento, pois temos autonomia financeira. Assim sendo, chamo a atenção dos membros do Conselho de Administração desta Casa aqui presentes e do PSD, que tem a maioria, para a resolução desta situação.
Temos de. efectivamente, melhorar as condições de trabalho, pois não podemos trabalhar nem receber as pessoas da forma como estamos a fazê-lo. Felizmente hoje não está a chover muito, porque até chove nesta sala, na Sala do Senado, é bom que isto fique registado!
Sobre a forma como estamos a trabalhar, convém insistir, este ano o nosso calendário é ainda mais apertado do que o de anos anteriores. A Assembleia da República vai encerrar os seus trabalhos no dia 7 de Dezembro e tem de votar o Orçamento do Estado para 1990 nesse dia, o que nunca foi feito. Como consequência, estamos a ter as audiências com os diversos ministérios umas em cima das outras, o que prejudica a nossa forma de trabalho.
O Ministério do Planeamento e da Administração do Território abarca muitos sectores, portanto é natural que os assuntos que estamos a tratar sejam múltiplos. De qualquer forma, temos nesta comissão —e creio que ainda bem—, o hábito de não contar os tempos. As intervenções fazem-se pelo tempo que se devem fazer, pois o que é importante é que os assuntos sejam bem tratados e penso que com a concordância de todos continuaremos a funcionar assim.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, tem a palavra.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr.' Presidente, eu começaria exactamente pelas palavras por si proferidas, reforçando já que, efectivamente, as condições em que estamos a trabalhar, do ponto de vista intelectual — e não físico ou material, uma vez que a essas já se referiu o Sr. Deputado António Barreto—, são realmente deploráveis. Não estou a criticar o Governo, estou a criticar toda a gente, todos os participantes neste debate geral e não neste específico — aliás, tenho sempre a sensação de que nós participamos num «teatro de sombras» e que não estamos a discutir nada de importante.
Do meu ponto de vista, não é verdade que nós tenhamos pouca informação, temos até muita informação, não temos é tempo para apreendê-la. De resto, a informação nem sempre aparece suficientemente sintetizada e articulada —não sei se isso é propositado se não é — para que possamos fugir à tentação de esgrimir com números, com índices, com referências quantitativas, e encontrarmos ali, na esquina, um membro do Governo a dizer: «Olhe que a percentagem que calculou de 3,6, afinal de contas, não é 3,6 é 3,7 %.» Nessa armadilha já não caio, porque já tenho alguma experiência parlamentar, mas infelizmente é muito fácil cair nela.
Penso que devemos fazer uma reflexão futura sobre a forma como estes debates devem ocorrer, o tempo que devemos dedicar-lhes. a metodologia que devemos utilizar, independentemente de as condições materiais serem
as que são. Também não vejo que elas possam melhorar muito a curto prazo, mas, apesar de tudo, sempre poderão melhorar alguma coisa.
Entronca -se nesta minha observação inicial uma referência a alguma frustração que sinto e que penso a equipa do Ministério do Planeamento também sentirá pelo facto de. ao longo destes debates, praticamente ninguém falar nas Grandes Opções do Plano. Aliás, a comunicação social até diz que se está a debater o Orçamento do Estado e que ninguém fala no Plano, ninguém fala em opções. Efectivamente, o que há no imaginário colectivo é que estamos a debater o Orçamento e que alguns membros do Governo, felizmente não esta equipa, têm sobre isto uma perspectiva de tesouraria;
Para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, política fiscal é tesouraria, para o Sr. Ministro das Finanças, parece que é «livrinhos de poupança» e, realmente, sobre os problemas estratégicos do planeamento — querem ver que o Sr. Deputado Vieira de Castro vai protestar ...!? Também já espero isso —, sobre os problemas de desenvolvimento não se faz qualquer análise.
Recordo que o Sr. Ministro do Planeamento fez uma intervenção no Plenário em que procurou de algum modo fugir a uma crítica que o meu partido e eu próprio faço — não sei se com razão, ver-se-á no futuro — sobre a falta de estratégia que, de algum modo, está por trás deste conjunto de instrumentos financeiros e de desenvolvimento que nos são apresentados.
Referiu-se, quando foi questionado, directamente ou indirectamente, ao que estava por trás da política governamental relativamente aos chamados indicadores tangíveis e à sua evolução. Penso que ele fez aqui uma confusão quanto à perspectiva quantitativa e contabilística de outro sector da governação. E só por isso se terá louvado na evolução dos indicadores tangíveis, para dizer que a estratégia é visível, a partir do momento em que os indicadores tangíveis evoluem no sentido positivo — não sei se excluía disso a inflação — e que isso prova que estamos no bom caminho. Mas penso que era muito mais importante que, em vez de falar dos indicadores tangíveis, falássemos dos quotidianos tangíveis. Talvez se analisássemos a vida do dia-a-dia das pessoas a reflexão e o optimismo já não fossem tão grandes. E, para não me alongar muito mais e tentar colocar a discussão na específica matéria que aqui deve ser analisada, direi, por exemplo, que quanto ao problema da repartição funcional do rendimento —não sei se alguém vai ficar su-preendido com o que vou dizer aqui—, o Sr. Ministro das Finanças, questionado na Comissão de Economia sobre a evolução sistematicamente negativa da repartição funcional do rendimento, atirou-nos com esta: «Esse é um conceito que já não tem grande utilidade, porque, do ponto de vista teórico, cada vez se usará menos» — aliás, nós sabemos isso, pois também lemos livros!
Só que no quotidiano dos Portugueses isso ainda tem alguma importância, pois a parcela do rendimento nacional que é atribuída ao trabalho tem alguma importância, porque ela é de tal maneira diminuta que é fundamental. Não é verdade que todos os portugueses já tenham rendimentos de outras proveniências e que, portanto, os trabalhadores sejam a final todos pequenos capitalistas. Ora bem, o quotidiano de todos esses trabalhadores é capaz de não ser tão optimista quanto é a evolução tangível dos indicadores quantitativos que o Governo nos apresenta.
E no domínio das autarquias, outro quotidiano? Os autarcas hoje defrontam-se com muitas dificuldades. Já
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foram aqui, antes de mim, abordadas algumas das questões que irei também referir, embora muito por alto — o Sr Deputado Vieira de Castro dirá que é falta de imaginação. Mas a isso responderei que a repetição de três ou quatro pontos essenciais que todos aqui fazemos não é falta de imaginação, por que resulta do facto de se tratar de questões que realmente são importantes. Se estamos aqui a «bater» no FEF é porque isto é importante. Quem tem alguma experiência de gestão autárquica sabe que é assim! Parece podermos concluir —e é uma pergunta concreta que coloco aos membros do Governo — não ser aceitável, na nossa interpretação, a atribuição orçamental ao Fundo de Equilíbrio Financeiro face a uma revisão verificada na cobrança do IVA.
Ora bem, terei de concluir —e se não é assim os Srs. Secretários de Estado farão o favor de me dizer — que este tipo de metodologia e de entendimento justifica perfeitamente — e eu não estou a dizer que o tenham feito, pelo menos formalmente — todo o tipo de manipulação orçamental. Assim, se não quiser transferir verbas para o FEF, eu posso fazer uma subavaliação de nceitas ao nível do IVA, depois, no Outubro quente do ano respectivo, corrigirei as cobranças do IVA e como entretanto não tenho nada que fazer a ligação de uma coisa à outra acabo por não transferir e não transfiro as verbas. Bemisso é importante, mas penso que não é esse o entendimento geral.
Os autarcas pensam —aliás, estão muitos deles convencidos e eu próprio vou desenganando aqueles com quem vou falando — que não vão mesmo receber a correcção do Fundo de Equilíbrio Financeiro proveniente da alteração da cobrança do IVA, mas isso tinha de ficar esclarecido de uma vez por todas. No entanto, ficará esclarecido quando apresentarmos uma proposta concreta e os senhores votarem contra ela, mas, apesar de tudo, talvez valesse a pena esclarecê-la aqui, também de uma vez por todas.
Isto liga-se também um pouco à compensação de algumas receitas que as autarquias perdem, o caso da sisa é o mais evidente e não se vê também forma de compensação, como, aliás, não se vê forma de compensação das competências que são «atiradas» para as autarquias. Claro que haverá uma forma de compensação, eventualmente no primeiro ano, mas não é isso que está em causa; o que está em causa é a compensação em anos futuros, quer dizer, como é que as autarquias vão ser compensadas de um esforço financeiro que vão ter de suportar e que é mais violento.
Outra questão um pouco ligada a esta problemática autárquica, mas não só, pois também está ligada às Grandes Opções do Plano, é a do associativismo municipal. Eu gostava que algum dos Srs. Secretários de Estado, presumo que a Sr.' Secretária de Estado, me responda concretamente se acha ou não que a forma de associativismo municipal, particularmente a eventual criação de áreas metropolitanas, é um factor importante da consolidação do poder democrático local c desenvolvimento das regiões.
Não estou com isto a criar-lhe qualquer armadilha e vou dizer-lhe sinceramente o que é que tenho por trás desta questão. Há pouco tempo um alto responsável do seu partido e candidato a uma das câmaras mais importantes do País, a do Porto, afirmou que a criação da Area Metropolitana do Porto conduziria ao esvaziamento das autarquias do distrito do Porto. Ora, como penso que não é assim, pelo menos a intervenção cultural e política do
Sr. Ministro do Planeamento não vai nada nesse sentido, gostaria de ouvir a opinião de VV.Ex." sobre essa matéria.
Tinha também uma questão relacionada com o PIDDAC, mas aí sinto-me satisfeito com a intervenção que a Sr.* Secretária de Estado proferiu, porque me pareceu correcta e esclarecedora das minhas dúvidas, quanto à melhoria que ao longo do tempo terá de fazer-se neste tipo de avaliações, níveis de execução e até na melhoria
dos próprios processos de previsão orçamental. Agora o que não vejo é o nível das Grandes Opções e, voltando ainda atrás, uma avaliação que gostaria muito de ver era
um balanço, numa óptica social, do crescimento da economia portuguesa. E não o vejo numa óptica social como também não o vejo numa óptica regional. Não concluo bem — e se calhar o defeito será meu — o que 6 que se passará depois do crescimento que o Govemo nos propõe em termos sociais. Como é que as assimetrias sociais serão diminuídas em termos regionais? Aliás, também não vejo explicitados quais foram os critérios, quais foram as opções, que levaram a reforçar o investimento em determinados sectores e contra o investimento em outros sectores. Foi apenas a tentativa de canalizar para o País
— o que é uma tentativa louvável, é um esforço louvável — verbas comunitárias, ou por trás das opções de investimento que foram feitas encontra-se outro tipo de motivações de desenvolvimento, de correcção de injustiças e de assimetrias?
Será que, afinal de contas, V. Ex.*, Sr. Secretário de Estado, existe apenas para que seja possível canalizar da CEE para Porugal verbas significativas, o que já seria motivo importante da existência, ou é um pouco mais a sua vocação — eu sei que o seu desejo seria naturalmente maior, mas não é obviamente uma pergunta pessoal que lhe estou a fazer, é, sim, uma pergunta política— ou, efectivamente, a existência da sua Secretaria de Estado não se esgota apenas nisso?
Por exemplo, parece que estamos todos de acordo (pelo menos, alguns estão) cm que havemos de desenvolver os sectores menos desenvolvidos do país, mas nós — e correndo o risco de cair na tal armadilha de me dizerem: «Olhe que não é 12,6 % mas 12,7 % —, analisando algumas verbas, assim de repente — também temos uns PCs (personal compuier) naturalmente!... —. portanto, analisando a evolução de algumas verbas chegamos a conclusões giras: o distrito de Bragança representava no PIDDAC, em 1989, 1,66% — e eu já tentei fazer as contas com o itinerário principal e sem ele, e digo-lhe isto porque já sei que me iria responder nessa base—, representa, em 1990, 0,95 %, portanto decresceu; Vila Real aumenta aqui de 1,43 % para 1,72 %; Viseu felizmente também aumenta de 1,84 %; mas Portalegre já decresce de 0,89 % para 0,68 %.
Qual é a lógica de tudo isto? Quais foram as opções? Foi só apanhar dinheiro, o que é louvável? Digam isso e eu aplaudo! Digam: «Foi assim para apanhar dinheiro, é preciso até 1993 —e não até 1992 como alguns dizem, inclusive em propaganda eleitoral—, portanto, até 1 de Janeiro de 1993 é preciso apanhar dinheiro.» Essa é uma óptica de tesouraria — e cá volto eu à óptica de tesouraria! Afinal a questão das contas externas parece que continua a ser uma questão importante!... Vejam esta minha observação como um desabafo e não uma crítica
— tenho por alguns dos senhores enorme simpatia, de resto o Ministro das Finanças foi meu colega e é meu
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amigo pessoal —, mas penso que é uma questão com uma predominância excessiva neste governo, Sr. Ministro das Finanças!
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.
O Sr. Luís Roque (PCP): — Sr. Secretário de Estado, vou fazer uma intervenção a nível regional e fugir ao âmbito geral em que se estava aqui a cair. Vou falar num distrito que tem apenas 0,07 % em termos de PIDDAC, com OID incluído, pois tem a Operação Integrada de Desenvolvimento do Norte Alentejano, no caso concreto Portalegre. Em Portalegre passam-se coisas muito esquisitas. Anda para lá uma barragem a fazer-se já há vários anos, já foi abandonada, agora continua a fazer-se: é a barragem da Apenadura, no Marvão.
É uma barragem fundamental para o abastecimento de água a Portalegre e a outros concelhos, além de ter aproveitamento hidroagrícola Mas a verdade é que não se conhecem os mistérios do que se passa com aquela barragem.
Por outro lado, uma das grandes aspirações do distrito, como a barragem do Pisão, que ficaria integrada na zona do Crato, uma das zonas mais pobres do distrito, foi prometida há 30 anos e não há meio de fazer parte sequer do Orçamento do Estado — isto apesar de o Pisão ser uma «aldeia adiada». E é uma «aldeia adiada» porque a Câmara do Crato não investe, quer em saneamento, quer em rede de águas, quer em electricidade; tudo é provisório porque a aldeia vai ficar inundada— não se sabe é quando; entretanto, as pessoas há 30 anos que vivem nestas condições, nem bons caminhos têm, quanto mais falar em estradas.
Por outro lado ainda, há dois casos que são característicos deste distrito e dos distritos do Interior: é o caso dos Bombeiros Voluntários de Avis, que não têm quartel, têm um remendo de um quartel, e são obrigados a deixar as viaturas à chuva Outro caso caricato —é próprio de Portalegre — é o da corporação de bombeiros de Monforte, que também não tem quartel.
Entrando agora propriamemte na OID do Norte Alentejano, quero realçar que o PCP nunca esteve contra a OID, aliás isto ficou claro até em reuniões feitas em Portalegre com o Sr. Secretário de Estado. O problema que se põe é que esta OID limita-se a ser uma «manta de retalhos», um monte de projectos que podem criar boas condições de bem-estar mas que se resumem a meia dúzia de projectos de saneamento básico. Quanto a projectos de desenvolvimento, não existem — basta ver que, sendo um distrito em que o sector primário é importante, a grande falia dos investimentos é feita no turismo. Mas não se concebe como se deve ter turismo sem vias de comunicação... É evidente que existe o Programa para as Regiões Transfronteiriças e existe o PRODAC (Programa de Melhoria das Acessibilidades), mas nós não temos acesso a ele, só os ministérios é que sabem o que se passa sobre isso — eu, pelo menos, não tenho conhecimento dele, não me foi enviado!...
Por outro lado, a OID não faz o que devia, ou seja, devia incidir e não incide no sector primário, no aproveitamento das barragens já existentes, do regadio já existente, como o das barragens do Caia, de Montargil c do Maranhão — só a barragem do Caia é que está melhor aproveitada, isto é, semiaproveitada, e não chega aos 20 % de aproveitamento.
Em termos de OID não sabemos o que é que se vai passar, porque a verdade é que continuam sem investimentos.
Por último, entendemos que há certas discrepâncias no que respeita à OID, e vou focar uma que é fundamental para o desenvolvimento do Norte do distrito, que é a parte mais industrial —trata-se da cidade de Portalegre—, cujos industriais põem com uma certa força e com alguma razão o problema do ramal Torre das Vargens-Marvão, que, em termos de planos a médio prazo, está desclassificado pela CP, mas que, em termos de OID, é reclassificado. Em que ficamos, Sr. Secretário de Estado?
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa
O Sr. Mendes Costa (PSD): — Sr.* Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de fazer um esclarecimento em nome dos deputados do PSD que fazem parte da Comissão da Administração do Território, Poder Local e Ambiente em relação a uma observação que fez a Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol sobre o envio de elementos. Devo dizer que esta questão já foi debatida em sede de comissão e que realmente, embora a Lei das Finanças Locais estabeleça que o Governo deve enviar os elementos para apreciação, nomeadamente na repartição e cálculo do FEF, em sede de comissão, esses elementos nunca foram pedidos e é praxe da Comissão solicitar atempadamente ao Govemo o envio desses elementos — sempre a Comissão o fez — desde que os Srs. Deputados os solicitem ao Governo.
Na primeira reunião que tivemos aqui com a equipa do Ministério do Planeamento e da Administração do Território não foi solicitado por parte dos Srs. Deputados qualquer elemento e creio que, a ser pedido, devia tê-lo sido atempadamente, através da comissão. De resto, já esclarecemos em sede de Comissão por que razão é que os elementos não foram enviados!
Em segundo lugar, queria colocar duas questões, uma à Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e outra ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
Relativamente às questões do ambiente, sob a rubrica «Protecção do ambiente para a península de Setúbal», está aqui consagrada uma verba global de 1 600 000 contos para a recuperação da Costa de Caparica, da lagoa de Albufeira, do Parque Natural da Arrábida e das Reservas Naturais do Sado e do Tejo, sendo 353 000 contos para o ano de 1990.
Pergunto ao Sr. Secretário de Estado se, em seu entender, com tanto que há a fazer na zona de Setúbal, que é de alto valor turístico, esta verba é suficiente para recuperar as belezas que lá possuímos, como, por exemplo, a península de Setúbal, e se, realmente, já existe algum projecto executado. Dada a riqueza que existe naquela zona, em termos de ambiente e em termos de natureza, o Sr. Secretário de Estado entende que estas verbas são suficientes para recuperar aquela maravilha que possuímos na península de Setúbal?
Quanto à Sr.* Secretaria de Estado do Planeamento, em relação ao mapa vn, no subcapítulo de intervenções regionais, estão reservadas à Operação Integrada de Desenvolvimento da Península de Selúbal 75 milhões contos.
Tenho conhecimento de que a comissão executiva da OID já aprovou 81 projectos referentes às nove novas câmaras municipais que compõem a península de Setúbal, num valor global dc 15 milhões de contos, dos quais
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9 300 000 contos são a fundo perdido, provenientes dos diversos fundos comunitários.
Como no capítulo da OID não encontro nenhuma repartição destas verbas, pergunto à Sr.' Secretária de Estado como é que elas são repartidas, uma vez que pesquisei o mapa vu e não consigo perceber como é que a comissão executiva vai transferir para as câmaras municipais estas verbas de apoio aos projectos já aprovados, no valor de 15 milhões de contos.
O Sr." Lourdes Hespanhol (PCP): — Peço a palavra, Sr.' Presidente.
A Sr.* Presidente: — Para que efeito, Sr.' Deputada?
A Sr.' Lourdes Hespanhol (PCP): — Sr.' Presidente, é para fazer um protesto.
A Sr.' Presidente: — Sr.' Deputada, vou conceder-lhe a palavra, mas gostaria de recordar-lhe dois aspectos: primeiro, estamos em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano e conviria restringir ao máximo todos os aspectos que estejam fora da discussão da análise em especialidade deste orçamento; segundo aspecto, já são 12 horas e 30 minutos.
A Sr.* Lourdes Hespanhol (PCP): — Sr.* Presidente, compreendo a escassez de tempo, no entanto não posso deixar passar em claro uma afirmação que o Sr. Deputado Mendes Costa aqui acabou de fazer.
Com efeito, este Sr. Deputado diz que nunca foram pedidos, em sede de comissão, os devidos elementos.
Tenho a informar que no dia 8 de Novembro, em sede de Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, apresentei uma proposta no sentido de serem pedidos ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território todos os elementos necessários, uma vez que ainda não tinham chegado à Comissão. Os Srs. Deputados do PSD não concordaram, pelo que a proposta, após ter sido posta à votação, foi rejeitada com os votos contra do PSD.
Portanto, é bom que fique bem claro que a proposta foi feita, mas que os Srs. Deputados do PSD não quiseram dar-nos a possibilidade de termos acesso a esses elementos, uma vez que impediram que os mesmos fossem pedidos quando eram entendidos como necessários e imprescindíveis para a análise do Orçamento do Estado.
De 8 de Novembro até hoje, 30 de Novembro, haveria muito tempo para os documentos chegarem e serem analisados, de modo que hoje se pudesse fazer uma apreciação mais correcta e, possivelmente, até mais contemporizadora, o que, certamente, evitaria que se colocassem tantas questões e tomaria mais rápida a discussão que estamos a travar.
A Sr.1 Presidente: — Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.
O Sr. Mendes Costa (PSD): — Devido ao adiantado da hora, não vou entrar em polémica com a Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol, até porque estamos aqui para tratar de outras coisas e não para esse efeito. Recomendo à Sr.* Deputada a leitura da acta da Comissão relativa à afirmação que fez.
A Sr.° Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Vou ser extremamente rápido, uma vez que, neste momento, o tempo escasseia. De qualquer modo, gostaria de retomar a questão levantada pela Sr.' Presidente no inicio desta reunião, ou seja, o problema do mapa vu.
Estou de acordo com o que a Sr.* Presidente referiu acerca do mapa. Aliás, também estou de acordo com
muitas das coisas, para já não dizer com lüòo — e íapo esta ressalva com receio de me ter passado alguma coisa despercebida — o que a Sr.* Secretária de Estado referiu. Perdoará esta prudência!...
Risos.
A questão que coloco é esta: julgo que terá de haver — e o próximo ano é inultrapassável nessa questão — uma alteração da perspectiva com que deve ser elaborado o mapa vn, para além de outras razões, porque com as alterações que se prevêem, em termos de lei do Orçamento do Estado, já decorrentes também de algumas alterações feitas na Constituição, a perspectiva que o Governo nos apresenta da orçamentação por programas vai implicar, necessária e obrigatoriamente, alterações. Por isso, julgo que se trata de um problema a ser visto no próximo ano.
De qualquer modo, penso que algumas das questões e das insuficiências referidas pela Sr.' Presidente em relação ao mapa vn deste ano não terão a ver com isso, porque, em termos comparativos com anos anteriores, independentemente das questões que se relacionam aqui e que, do meu ponto de vista, são compreensíveis tendo em atenção o quadro comunitário de apoio, há alterações que, pela nossa parte, não percebemos por que é que terão sido feitas, na medida em que, como já referi, foram -no em termos de reduzir alguma da informação que era prestada.
Quanto à questão da diferença entre as verbas referidas no cap. 50 e o total do PIDDAC, penso que não tem a ver com esta matéria da necessidade de revisão. Aliás, poderá vir a ter, mas, do meu ponto de vista, houve apenas uma inversão no âmbito do quadro de financiamento de todo o PIDDAC. Também me parece que houve alguma inversão no âmbito da informação que era prestada anteriormente.
Julgo que o problema que se coloca —e retomando uma questão há pouco levantada por um Sr. Deputado, em termos de análise do PIDDAC, aliás como de todo o Orçamento— não é um problema de muita informação.
Na verdade, quando não se pretende dar informação, a maneira mais simples de não a prestar é carrear toneladas de papel.
Por conseguinte, o problema não está na muita informação, mas, sim, em a informação ser suficiente e boa. E neste aspecto — digo-o com toda a sinceridade — julgo que este ano houve alguma inversão em relação aos anos anteriores. Mas esta é uma questão que teremos de analisar a posteriori.
Ainda nesta perspectiva, gostaria de colocar-lhe uma questão que tem a ver com o que sucedeu este ano e já o ano passado — e é isto que considero não aceitável do ponto de vista do comportamento do Governo.
Tenho conhecimento de que, tal como já havia acontecido no ano passado — e muito bem! —, a biblioteca da Assembleia da República, os serviços da DILP (Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar) ou mesmo outros serviços de informação e de documentação que existem na Assembleia, ao analisarem o livro Grandes
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Opções do Plano—Linhas de Actuação para 1990, descobriram uma série de siglas relacionadas com programas e solicitaram ao Governo os respectivos programas.
A propósito disto, julgo ter sido o Sr. Deputado António Barreto que, há pouco, referiu: existe o PRODEP que só se obtém clandestinamente. Julgo até que existem outros programas que, de vez em quando, se vão obtendo clandestinamente, mas nós. Assembleia da República, não temos de ter «relações clandestinas» com o Governo.
Ora, na verdade, os programas foram solicitados,
existem, mas foram todos recusados pelo Governo, tal como já havia acontecido o ano passado com os programas que teriam servido de base para a elaboração do PDR. Também esses foram solicitados, vieram para a Assembleia da República, mas, pelos vistos, por lapso de qualquer serviço —«lapso» na perspectiva do Governo—, assim que cá chegaram, logo surgiu um telefonema do Governo a dizer «Retirem isso da Assembleia!»
Digamos, então, que eles foram retirados —em meu entender, embora não seja esse o problema que aqui está em causa, houve uma prepotência do Sr. Presidente da Assembleia da República — e agora todos esses documentos estarão por aí em alguma cave da Assembleia.
A questão que coloco é esta: se os programas existem, que razão há para negar o seu conhecimento à Assembleia da República?
Relacionada ainda com o o mapa vn está a questão do arrastamento de programas e de projectos, em termos de programação financeira, a que a Sr.* Secretária de Estado também há pouco teve oportunidade de se referir.
Considerando que o mapa nos merece, ou nos deve merecer, alguma credibilidade — e parto do princípio que merece—, deverá então haver uma informação que, na verdade, não foi dada até hoje, nem em termos globais nem ministeriais, em termos orgânicos, nas discussões que temos tido acerca do «arrastamento» de projectos que houve do Orçamento de 1989 para o de 1990.
Posso explicar melhor o que chamo de arrastamento de projectos, em termos de programação financeira: a programação financeira, em termos globais, e apenas em PIDDAC, prevista para 1990 no Orçamento do Estado para 1989 e a que é agora consagrada no PIDDAC de 1990, é uma verba na ordem dos 38 milhões de contos, para menos. Por isso, concluo que ou houve no ano passado um optimismo exagerado no Governo ou, se assim não foi, houve uma programação relativamente correcta e o Governo, este ano, por qualquer razão, se calhar até por considerar que devia conter os seus gastos, resolveu não programar tudo o que estava previsto. Esta informação já deveria ter sido fornecida, e não foi!, tanto mais que, do meu ponto de vista, este «arrastamento» tem-se verificado todos os anos.
No entanto, este ano o «arrastamento» de projectos poderá surgir com mais acutilância pelo seguinte: todos estaremos de acordo em que, independentemente do grau de execução financeira que se verificou ou que se poderá verificar em 1989, relativamente ao PIDDAC, é evidente que essa execução financeira não corresponde à execução material prevista no início do ano, devido ao diferencial de inflação verificado, o que, por conseguinte, virá agravar tudo o resto.
Por outro lado, e ainda relacionada com o problema do PIDDAC, gostaria de colocar à Sr.' Secretária de Estado uma questão — embora admita que possa não ser uma matéria, pelo menos, da sua exclusiva responsabilidade, em termos de tutela— relativa ao problema dos
co-fínanciamentos da CEE ou, melhor, relativa ao problema das comparticipações do Orçamento do Estado para os projectos e acções co-financiados pelos fundos comunitários.
Já tivemos oportunidade de referir que, do nosso ponto de vista, o problema da incapacidade do Orçamento do Estado para financiar projectos, programas e acções que não sejam co-financiados pelas Comunidades aponta para situações que podem vir a ser muito delicadas num futuro muito próximo, e que já se começam a sentir no Orçamento do Estado para este ano.
A questão que, muito claramente, lhe coloco é esta: sei — por via indirecta, pelas declarações do Sr. Jacques Delors, porque quanto a uma informação dada à Assembleia pelo Governo sobre isso nada temos— que o Governo tem andado a procurar aumentar substancialmente o actual quadro definido para o financiamento de Portugal por pane das Comunidades. Nada terei a objectar a não ser que, após um conhecimento mais aprofundado da situação, chegue à conclusão de que, por exemplo, será uma exigência excessiva ou irrealista na perspectiva de poder vir ou não a ser considerada pelas Comunidades.
Há uma outra questão, que temos vindo a defender há bastante tempo, que tem a ver com a negociação entre Portugal e a Comunidade de redução das comparticipações orçamentais portuguesas para esses projectos, programas e acções. É evidente que, para não arrasar ou para não reduzir a perspectiva material consubstanciada nas projecções, essa contrapartida, a ser acrescida por parte das Comunidades Europeias, dará um valor muito menor do que aquele com que o Governo estará, aparentemente, a tentar pressionar nas Comunidades Europeias.
Por que é que lhe coloco esta questão? Porque tive oportunidade de, ào falar com um comissário — concretamente com o comissário português — sobre esta matéria, em termos públicos, nem sequer foi uma conversa particular, lhe colocar, muito clara e frontalmente, esta situação: qual é o posicionamento possível da Comissão das Comunidades perante uma exigência deste tipo? E a resposta foi esta, apesar de ir sintetizá-la não a vou distorcer minimamente: «É perfeitamente viável, ou seja, a Comissão das Comunidades veria isso com toda a boa vontade, só que não se debruça sobre o assunto porque o Governo Português nunca lhe colocou essa questão.» Parece-me que esta resposta do comissário deveria ser encarada seriamente por pane do Governo, devido aos problemas que coloca sobre o futuro próximo de o financiamento das verbas dos programas, projectos e acções que não são co-financiados poder vir a desaparecer praticamente do Orçamento do Estado.
Um terceiro tipo de questões, embora relacionado com o problema do PIDDAC, tem a ver com o conjunto monumental de Belém, que, pelo menos oficialmente, já não é o «Centro Cultural de Belém»!... Penso que a parte da proposta de lei que a Comissão de Economia, Finanças e Plano tem em carteira neste momento poderá vir a resolver uma parte do problema, que é o da criação de mais um «SUCH»!... É aquele da saúde e que a Sr.* Secretária de Estado conhece bem!...
Risos.
Aliás, é um problema do PIDDAC, o de nem todos os investimentos do Ministério da Saúde passarem pelo Orçamento do Estado. E quem fala no da Saúde fala em outros sectores, cujos investimentos não passam por aqui.
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pois são financiados por outro lado, mas sempre com dinheiros públicos. Penso, no entanto, que talvez a Lei de Bases da Contabilidade Pública nos venha resolver este problema.
Porém, a questão que gostaria de colocar-lhe sobre o financiamento do conjunto monumental de Belém é esta: a Sr.' Secretária de Estado falou na «2.* fase» — e penso que essa é a parte mais comercial, como a dos noteis, a dos centros comerciais, etc.
A Sr.' Secretária de Estado do. Planeamento e do Desenvolvimento Regional: — Não é, não!
O Orador: — Não me diga que há ainda uma 3.* fase!?
A Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: — A segunda tem a ver com a passagem subterrânea!
O Orador: — Já estou a perceber!...
No entanto, já houve um membro do Governo, creio que a Sr.' Secretária de Estado da Cultura, que referiu que o aumento dos 6 para os 14 milhões de contos foi devido a outra componente — que, pelos vistos, não é 2.' fase: a dos hotéis, dos centros comerciais, etc. Ora bem, independentemente do futuro a curto prazo que venha a ter a sociedade que foi criada para este efeito, ela, de acordo com o diploma que a criou, vai, pura e simplesmente, desaparecer quando tudo estiver construído.
Pergunto: o Governo vai financiar toda a parte comercial, em termos de investimento? E, depois, o que é que vai fazer? Isto é, o Governo vai financiar não só «o chamado conjunto monumental de Belém» como toda a parte comercial?
Ponho isto em termos interrogativos porque por aquilo que temos no PIDDAC é isso, aceitando como boa a tal outra informação de que afinal a passagem dos 6 para os 14 milhões de contos foi devida a isso, que seria a «2.' fase» no entendimento da pessoa que deu essa explicação, e que seria, portanto, a respeitante à parte comercial.
Um quarto tipo de questões, Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território — e serei muito, muito rápido, porque os problemas já aqui foram levantados—, tem a ver com o FEF. A situação é aquela que já aqui foi apontada e apenas quero referir uma questão, fundamentalmente, porque o Sr. Secretário de Estado e o Ministério a que pertence são o elo de ligação entre o Governo e as autarquias locais. Por conseguinte, tem de haver aqui um certo entendimento do «papel» e dos direitos das autarquias locais e terá de haver, do meu ponto de vista e — permita que lhe diga — , um combate em defesa desses princípios, por parte deste cio de ligação a nível governamental, com outras parcelas do Governo que eventualmente não queiram cumprir com rigor o que está legislado sobre a matéria de finanças locais. Mesmo que houvesse dúvidas, embora não as haja do meu ponto de vista — e já tivemos oportunidade de falar sobre isso na comissão —, por parte do Sr. Secretário dc Estado, elas seriam em termos da letra da Lei das Finanças Locais e não, de certeza absoluta, sobre o espírito deste diploma. Repito que, no meu entender, em termos da tetra do diploma não existem dúvidas!
Quanto ao IRS, questão que também já aqui foi referida, o meu problema coloca-se exactamente neste sentido:
como é que se pode compreender a atitude do elemento de ligação —a que não quero chamar dc tutela, porque penso que não há tutela governamental sobre as autarquias locais—, a nível do Governo com as autarquias locais, quando aceita, não digo pacificamente, porque não sei se foi assim, que no primeiro ano, em que a compensação
de impostos para os trabalhadores da função pública foi
feita apenas de forma escriturai (não há movimentos de numerário), haja uma transferencia do Orçamento do Estado para as autarquias locais a fim de compensar o pagamento do imposto e que no segundo ano, quando deixou de ser uma questão meramente escriturai para ser de pagamento efectivo, deixe de haver essa transferência. Não é compreensível, do meu ponto de vista, este tratamento dúplice, por parte do Governo, nesta matéria de IRS em relação as autarquias locais.
Já agora, e ainda sobre o problema das autarquias locais, gostaria de colocar-lhe uma questão, que foi levantada pelo Sr. Deputado Costa Mendes, sobre o pedido de elementos informativos que aqui foi referido. Sinceramente, considero que a afirmação feita pelo Sr. Deputado é um pouco surrealista, se me permite a expressão. Pergunto: mesmo que não tivesse havido uma exigência, um pedido, um requerimento, o que quer que seja, por parte do Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado admite ou considera —pelo menos, parte desse princípio— que uma coisa que está expressamente na lei, «que o Governo deve fornecer anualmente», só deve ser de facto fornecida quando lhe for pedida? Então para que é que serve a lei? Admito é que o Governo venha dizer que os elementos, os critérios quantitativos, etc., são exactamente os do ano passado, mas tem de dar essa informação e não pode estar à espera que lha peçam.
Duas últimas questões, muito concretas.
Sr. Secretário de Estado da Administração Local —e a primeira questão, já agora, se quiser pode entendê-la como tal, é uma encomenda—, sabemos que há uma certa incompreensão com o que se está a passar com a ET AR de Coimbra. Pergunto, sucintamente: não há verbas em lado algum...
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Essa pergunta não deve ser para mim!...
O Orador: — Se for com o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, então a pergunta será para ele.
O meu problema é o de saber onde é que estão as verbas. Esta questão coloca-se porque no ano passado fizemos uma proposta de inscrição no Orçamento do Estado para 1989, que não foi inscrita, e agora aparece uma informação do Governo, no final do ano, a dizer que a empreitada já foi adjudicada. E por isto que gostaríamos de saber onde é que está essa dotação.
Última questão, Sr. Secretário de Estado do Ambiente: qual é afinal a posição definitiva, se é que existe —e penso saber explicar a razão de estar a dizer «se é que existe» —, do Governo sobre o problema do alargamento do Campo de Tiro de Alcochete?
A Sr." Presidente: — Srs. Deputados, apesar de serem já 12 horas e 50 minutos, como tenho ainda mais três inscrições e gostaria que os trabalhos ficassem concluídos ainda agora, vou fazer com que os Srs. Membros do Governo passem, além de frio, fome, fazendo, no entanto, com que os trabalhos se acelerem um pouco mais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Gilberto Madail.
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O Sr. Gilberto Madail (PSD):—Relativamente à intervenção do Sr. Deputado António Barreto, devo dizer que também estou de acordo com a necessidade de um maior apoio à investigação e ao desenvolvimento teconológico por parte das unidades económicas privadas. No
entanto, relembro que existem já alguns instrumentos nessa área — estou, nomeadamente, a recordar-me do Programa II do PEDIP, que já permite, ainda que insuficientemente, que se possa fazer alguma coisa nessa área.
De facto, também não temos a contrapartida que pensamos que devíamos ter em termos de investimento público, já que somos um distrito onde se produz grande parte da riqueza deste país. Isto é, gostaríamos de ter muito mais investimentos, de pagar menos impostos, mas milagres ninguém faz!
Na verdade, temos vindo a assistir, particularmente nos últimos anos, a uma actuação do Governo que considero notável, quer a nível do crescimento das verbas transferidas para as autarquias locais — e penso que nunca estas tiveram tantas dotações, tantos meios, como agora—, quer a nível da construção que tem vindo a ser feita por todo o País, veja-se o número de estradas, de auto -estradas e de portos, e a nível dos apoios sociais, nomeadamente na construção de centros de dia, e em todas as outras áreas. Estamos sempre insatisfeitos!... Uma característica nossa é a de que estamos sempre insatisfeitos, mas penso que alguma coisa de notável tem vindo a ser feito.
Gostaria agora de colocar uma pequena questão ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente, e também de lhe dizer que admiro a forma como tem vindo a encarar alguns problemas e a tentar resolvê-los.
De facto, temos visto, nomeadamente no distrito de Aveiro, os esforços que tem vindo a ser feitos para a regularização da Barrinha de Esmoriz, da Pateira de Fermentelos, bem como os projectos da Comissão do Complexo de Estarreja.
Mas há um problema, Sr. Secretário de Estado, que, pelas declarações públicas que V. Ex.* já produziu sobre este efeito e pela expectativa que foi criada em Aveiro, eu gostaria de referir. É a questão da ria de Aveiro. Pensamos que terá de haver um programa de ataque, diria até de assalto rápido, aos problemas da ria de Aveiro, sob pena de se eternizar esta questão.
Sabemos que existe o Gabinete da Ria, que tem vindo a desenvolver projectos, mas penso que aí existe um «calcanhar de Aquiles». Muitos estudos têm sido feitos sobre a ria e muita coisa tem sido dita sobre ela, mas acções concretas... Sr. Secretário de Estado, tínhamos grande esperança de que V. Ex.* pudesse ser a pessoa através de quem os Aveirenses pudessem ver, a curto prazo, uma das suas grandes ambições realizadas. Já não falo na limpeza da ria de Aveiro, mas, pelo menos, deveria começar-se por adoptar um conjunto de medidas e de acções que visassem não a deixar degradar mais para seguidamente se proceder à sua recuperação.
Neste sentido, devo dizer que não vejo, ao nível do Orçamento do Estado, inscrições orçamentais significativas para tratar o problema da ria de Aveiro. Respeito a importância dos problemas do Estoril, do Algarve.... mas o problema da ria de Aveiro tem vindo a ser arrastado c gostaríamos de vè-lo resolvido, na prática, em termos de investimentos por parte do Estado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes): — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Peço desculpa por não ter tempo para estar aqui mais tempo, em virtude de esta reunião estar a decorrer em simultâneo com a sessão do Plenário da Assembleia da República, onde também vou intervir sobre a matéria que lá está em apreço. Mas não quero perder a oportunidade de deixar aqui a nossa posição, a posição do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes, sobre as questões que nos preocupam em relação ao ambiente, ao planeamento e ao ordenamento do território.
De facto, pensamos que as questões do ambiente só poderão começar a ser resolvidas quando forem consideradas a um nível global de intervenção de toda a política ambiental, quando existir um plano de ordenamento a nível nacional, isto é, quando o planeamento for feito de forma ordenada.
Estas são questões de fundo para nós. De facto, entendemos que sem isso não haverá resolução dos problemas do ambiente, que cada vez mais se degrada, e dos recursos naturais, que cada vez mais são explorados até à exaustão.
Pensamos que, a par desta política que não existe, é necessário regulamentar a Lei de Bases do Ambiente, que há cerca de três anos a Assembleia da República aprovou, estando até agora apenas regulamentada a parte referente ao ruído. E mesmo assim verifica-se que na prática não há condições para que a legislação seja aplicada. E porquê? Simplesmente pela razão de que os problemas não são atacados na fonte; simplesmente porque há pequenas e médias empresas que não têm meios para investir em equipamentos susceptíveis de evitar os efeitos poluentes.
Poderíamos mesmo dizer que, se as questões do ambiente fossem tratadas no âmbito de uma política global, as verbas existentes no actual Orçamento para a área do ambiente, embora inferiores em relação às do ano anterior, seriam ainda assim suficientes, comparando a disponibilidade de verbas que o nosso país tem e que deveria empregar na área do ambiente e da protecção dos recursos naturais.
No entanto, pelas razões anteriormente apontadas, pensamos que, de facto, muitas das verbas aqui referenciadas serão aplicadas de uma forma que não contribuirá para, na fonte, evitar a continuação da degradação dos recursos naturais e do ambiente.
Se me permitem, eu gostaria de apresentar agora algumas propostas de alteração à proposta de lei do Orçamento que vários deputados desta Assembleia irão subscrever. Elas referem-se concretamente à atribuição de verbas para o Parque Nacional da Peneda-Gcrês (PNPG). Estas propostas que aqui são avançadas, de novas verbas a incluir no Orçamento do Estado, realmente não irão resolver os grandes problemas nem a situação de degradação em que se encontra o Parque Nacional da Peneda--Gerês.
No entanto, o grupo de trabalho desta Assembleia que se deslocou ao PNPG, no encontro que teve com as entidades responsáveis pela intervenção naquela area protegida, considerou que havia algumas medidas que era necessário tomar para que no próximo ano não tivessem lugar acontecimentos com a mesma gravidade daqueles que têm vindo a ocorrer nos últimos anos, em particular no passado mês de Setembro.
Assim, as propostas referem-se à construção de um quartel de bombeiros no concelho de Terras de Bouro,
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onde existe uma corporação que nem sequer tem um local para estacionar as viaturas, o equipamento e o pessoal — e trata-se de um concelho que ocupa a maior área do Parque.
Por outro lado, propõe-se também a aquisição de equipamento auto destinado à prevenção e detecção de incêndios e à aquisição e instalação de equipamento de comunicações no PNPG.
Propõe-se, finalmente, a ampliação do quadro de pessoal do próprio Parque, nomeadamente pessoal devidamente qualificado para poder fazer a vigilância e atacar os incêndios que possam verificar-se nessa zona.
Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.1 Vice- Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano Helena Torres Marques.
A Sr.* Presidente: — O Sr. Deputado António Barreto pediu a palavra para que efeito?
O Sr. António Barreto (PS):—Para fazer uma interpelação à Mesa, Sr.* Presidente.
A Sr.* Presidente:—Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Barreto (PS): — Julgo que a Sr.' Presidente não deve estar de acordo, bem como os outros Srs. Deputados, mas gostaria de propor, dado o grau de refrigeração que atingimos... Isto é muito sério.... estou cheio de frio — as pessoas estão a aquecer-se junto do calorífico— e isto não faz sentido! Isto não é um acampamento de crianças, nem de pioneiros ou de escuteiros!
Proponho que interrompamos a sessão dentro de cinco ou dez minutos, e que nos vamos aquecer e almoçar.
Posso ficar aqui as horas que os Srs. Deputados do PSD quiserem.... inclusivamente até amanhã!
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Não sou eu que quero, Sr. Deputado.
O Orador: — Graças a Deus estou seguro, estou inscrito na ADSE, etc.... Mas, trata-se de trabalhar bem e de não estar a «pagar portagem» à democracia, que é o que estamos a fazer!
Proponho, pois, que interropamos os trabalhos dentro de cinco ou dez minutos, que os retomemos daqui a uma hora, calmamente, e na Sala das Sessões, onde há condições de trabalho. E se há reuniões programadas para as 14, as 15 ou as 16 horas elas serão alteradas e adiadas conforme todas foram até hoje.
Obrigado e desculpe-me, Sr.' Presidente.
A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado, eu já tinha falado com os representantes dos grupos parlamentares aqui presentes e tinha, inclusivamente, feito uma primeira aproximação nesse sentido ao Sr. Secretário de Estado que está mais próximo de mim.
Assim, sugeriria que ouvíssemos todos os Srs. Deputados inscritos, visto que estamos quase no fim, após o que marcaríamos para uma outra hora as respostas dos Srs. Secretários de Estado, as quais trazem muitas vezes novas perguntas.
À tarde já não nos reuniremos nesta sala do Senado. Iremos para a do Plenário, que também não tem excelentes condições, mas que sempre é melhor do que estarmos aqui reuníaos. Temos é de combinar a hora a
que vamos reunir, o que faremos no final desta reunião,
se concordarem. Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Vou reter os Srs. Deputados por muito pouco tempo. Subscrevo aquilo que o Sr. Deputado António Barreto disse quanto às condições em que aqui trabalhamos e que, apesar de tudo, este ano são incomparavelmente melhores do que as do ano passado. No ano passado, de madrugada, a Comissão de Economia, Finanças e Plano encontrava-se em «blocos de gelo».
Em determinada altura foi aqui dito — sei que foi com um certo ar de graça— que a maioria poderia fazer alguma coisa pelas condições de trabalho. Temos efectivamente a maioria, mas não temos dinheiro, de modo que temos de ser todos a resolver este problema das más condições de trabalho.
Risos do PS e do PCP.
Sr.' Presidente, pediria a V. Ex.* que fossem garantidas as condições para que eu pudesse continuar a minha intervenção.
A Sr.' Presidente: — Sr. Deputado, faremos os possíveis. Os «impossíveis» não posso ainda fazer.
Pausa.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.
O Orador:—Uma das coisas que gosto é de ser ouvido quando estou a falar, porque também procuro não perturbar aquilo que os outros estão a dizer.
Há aqui uma questão que é importante, mas que tem de ser dirimida entre o Sr. Deputado Manuel dos Santos e o Sr. Deputado Octávio Teixeira. É aquela que se refere à ausência ou à abundância de informação. Depois VV. Ex." tratarflo de resolver esse problema.
Relativamente à questão do Fundo de Equilíbrio Financeiro, falo acerca desta matéria com algum à- vontade. Em Janeiro de 1990 cumprirei dez anos de funções autárquicas — sete dos quais como presidente da Assembleia Municipal de Cascais.
No que respeita à célebre actualização do FEF em consequência do facto de as cobranças do IVA ultrapassarem as previsões que são feitas no início do ano, devo dizer aos Srs. Deputados da oposição que tal não é possível por ser inconstitucional. Não tenho agora aqui os elementos que identificam o acórdão do Tribunal Constitucional que poderá ser aplicável ao caso. Embora não se refira directamente à questão do FEF, mas, sim, às alterações orçamentais, pode ser-lhe aplicado. Aliás, quando há dias aprovámos aqui o Orçamento rectificativo, melhor seria, porventura, ter-lhe chamado uma alteração orçamental.
Mas esse acórdão do Tribunal Constitucional diz, em síntese, que Orçamento há apenas um, que é aquele que é aprovado no fim de cada ano para vigorar no ano seguinte e que o resto são alterações orçamentais que não têm o mesmo tratamento que a proposta de lei do Orçamento do Estado. VV. Ex." farão o favor de ler e, depois, tirarão as vossas próprias conclusões, porque eu já tirei as minhas.
Isto não significa que a Lei das Finanças Locais não tenha de ser alterada, mas isso será algo que todos nós
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teremos de fazer vamos «constitucionalizar» a alteração do FEFSS (Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social), só que, para fazê-lo, teremos de alterar a referida lei, coisa que todos nós podemos fazer. VV. Ex." podem tomar uma iniciativa legislativa nesse sentido e o nosso partido também, ou até o poderemos fazer em conjunto.
Provavelmente, a Lei das Finanças Locais tem de ser sujeita a alguns aperfeiçoamentos e julgo que há grande consenso neste aspecto.
Já não podemos é dar o nosso consenso ao que, há pouco, disse o Sr. Deputado Manuel dos Santos e que se refere à repercussão de uma eventual subavaliação da cobrança do IVA num determinado ano. É que se V. Ex." fizer as contas verificará que, no caso de haver subavaliação, o quociente IVA/i/TVA(n - 1) cresce desmesuradamente no ano seguinte. Ou seja, como o denominador é menor, V. Ex* poderá verificar que se regista uma compensação.
Por outro lado, a grande, a única crítica da oposição ao Orçamento do Estado para 1990 é, sem dúvida, a da subavaliação das receitas do IVA.
Risos.
Estão a rir-se? Já lá iremos a outra crítica que é a que quero que os senhores façam o favor de me explicar.
Srs. Deputados da oposição, VV. Ex." têm de fazer o favor de acolher o que vou dizer a seguir porque é verdade e só por isso.
A economia portuguesa tem registado um andamento excepcional, o que é verdade e está confirmado e, se quiserem, posso facultar-vos relatórios de instituições internacionais que o demonstram. Aliás, devo dizer que, para mim, tanto vale um relatório do Banco de Portugal como um da OCDE, ou que tanto valem as estatísticas do INE como as da Comissão das Comunidades Europeias, atitude em que me considero bastante português!!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem, Sr. Deputado Vieira de Castro!
O Orador: — É que VV. Ex.", normalmente, não crêem nas estatísticas nacionais, embora não o digam francamente por isso poder colidir com o prestígio inequívoco do Banco de Portugal. Daí que, de vez em quando, eu me socorra dos relatórios das lais instituições internacionais, face aos quais —perdoem-me que lhes diga— os senhores ficam completamente mudos, tendo que aceitar as respectivas conclusões, cujo peso é demasiado para poderem ser postas em causa.
Portanto, repito que a economia portuguesa tem tido um andamento excelente e o consumo tem crescido mais do que a meta fixada pelo Governo no início do ano, assim provocando um aumento das receitas do IVA. Também é verdade que, globalmente, a economia tem crescido mais do que o previsto no início de cada ano.
Por acaso, quanto a este aspecto, a oposição tem sido cuidadosa, só falando no mau andamento da inflação e não no «mau» andamento da economia. Isto é, o Governo previu que a economia iria crescer 4,5 % e — meu Deus! —, afinal, cresceu 5 %! A isto os senhores nunca se referem! Ora, neste domínio, o Governo «engana-se» e, também, no do crescimento do consumo.
Assim, no fundo, é bom que haja algum crescimento que corresponda a um certo engano relativamente à meta
inicialmente fixada: é porque há poder de compra para se consumir. Claro que houve tempo em que o consumo decrescia, mas, felizmente, já lá vai!
Nesta questão das receitas do IVA há um outro aspecto importante que gostaria de focar e que também é verdadeiro.
A eficácia da administração fiscal é, hoje em dia, completamente diferente da que existia no tempo do imposto de transacções. VV. Ex." não se lembram? Pululavam por aí as empresas-fantasmas destinadas a passar as célebres declarações mod. 6 e a evasão àquele imposto já se tinha tornado perfeitamente inquantificável. Aí residia, também, a ineficácia da administração fiscal.
Ora, a actual eficácia daquela administração reduz a evasão fiscal...
Uma voz do PSD: — Muito bem!
O Orador: — enquanto só um bruxo será capaz de determinar qual a redução da evasão fiscal resultante da eficácia da administração fiscal.
O Sr. Deputado Manuel dos Santos referiu-se ainda à predominância excessiva do Sr. Ministro das Finanças...
A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado Vieira de Castro, agradecia-lhe que fosse breve, pois a reunião já vai muito longa.
O Orador: — Sr/ Presidente, compreendo que tanto os Srs. Membros do Governo como nós próprios estamos com pressa, mas, embora não tenha olhado para o meu relógio, sei que estou a falar bastante menos do que alguns dos outros Srs. Deputados e que tenho exactamente os mesmos direitos que eles. Como também ainda não almocei, peço-vos o favor de aguardarem mais um pouco. Além disso, tal como VV. Ex.", estou aqui desde o início desta reunião, pelo que tenho tanto frio como VV. Ex.", mas não posso é deixar passar em claro estes problemas.
A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado Vieira de Castro, não lhe cortei a palavra, apenas lhe pedi que fosse breve.
O Orador: — Repito que o Sr. Deputado Manuel dos Santos afirmou que havia uma predominância excessiva do Sr. Ministro das Finanças. Ora, não estou de acordo com V. Ex.*, mas estaria se V. Ex.* tivesse dito que o Sr. Ministro das Finanças tem executado bem a política económica e financeira do Governo e que, manifestamente, daí têm advindo resultados que confirmam que aquela política é um êxito.
Se, por um lado, é verdade que para aquele êxito também contribui a conjuntura externa favorável, por outro, também temos de reconhecer que essa situação tem sido bem gerida.
Porventura, o Sr. Ministro das Finanças poderia, como diz o Sr. Deputado Manuel dos Santos, «ter uma predominância» menos «excessiva» se, por acaso, em 1985, o Governo tivesse tomado conta do País noutra situação económica e financeira. Neste aspecto estamos inteiramente de acordo.
É que há países em que a situação económica e financeira é de tal ordem que o Ministro das Finanças pode limitar-se a gerir os assuntos correntes e não tem mais que fazer. No caso de Portugal, ainda hoje estamos numa situação complicada — o Sr. Deputado Manuel dos Santos
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reconhecê-lo-á-T-, daí que a intervenção do Sr. Ministro das Finanças nunca seja excessiva, mas indispensável: o País pede-a!
Há pouco, numa atitude que considero muito salutar por eu próprio também ter muito sentido de humor, os Srs. Deputados da oposição riram-se quando vos pedi para fazerem o favor de me darem uma explicação antes de terminarmos as reuniões de hoje com os Srs. Membros do Governo.
É que já vi declarações de representantes de partidos da oposição em que diziam que o Orçamento do Estado para 1990 é eleitoralista, o que faz pressupor que é um Orçamento com superabundância de meios.
Protestos do deputado do PS António Barreto.
O Sr. Deputado António Barreto não está de acordo com «eleitoralista» ou com «superabundantes meios»? Depois, fará o favor de mo dizer.
Por outro lado, quando assistimos a estas reuniões com a presença dos Srs. Membros do Governo, já a oposição reclama que o Orçamento não chega para ninguém e que é escasso para tudo. Então, em que ficamos? O Orçamento é eleitoralista ou contraccionisia? Ficarei feliz se os Srs. Deputados da oposição me derem uma explicação.
A Sr.' Presidente: — Espero que os Srs. Secretários de Estado aqui presentes tenham anotado as perguntas que acabaram de ser feitas.
Temos sempre muito gosto em ouvir o Sr. Deputado Vieira de Castro, mas poderemos responder-lhe noutras circunstâncias.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr/ Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
A Sr.° Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr.* Presidente, gostaria de invocar a sua condição de membro do governo em 1985 para lhe pedir que explicasse ao Sr. Deputado Vieira dc Castro a situação das finanças públicas nessa altura.
A Sr.* Presidente: — Já tive oportunidade de explicá-lo ao Sr. Deputado Vieira de Castro mais do que uma vez, mas, quando ele não quer ouvir, não há nada a fazer!...
Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Almeida.
O Sr. Casimiro Almeida (PSD): — Em primeiro lugar, queria congratular-me com o que está previsto no PIDDAC quanto ao sector da defesa e protecção do ambiente.
Os sistemas de controlo de poluição dos rios Almonda c Alviela e o de Minde estão providos de verbas de centenas de milhar dc contos — para não dizer milhões. Finalmente, parece que os três casos a que me referi vão começar a ser resolvidos e temos esperança de que, nos próximos dois a três anos, sejam dados passos decisivos na resolução destes problemas, o que é motivo para nos congratularmos.
No entanto, noto uma lacuna que me parece dever ser rapidamente revista e que é a de que, ainda nesta altura, não se começou a pensar no caso do rio Nabão, cujas águas são da classe D, e a que não encontro referência no Orçamento do Estado para 1990.
Em relação às infra-estruturas básicas, queria pôr uma questão ao Sr. Secretario de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais. É que, no Orçamento, não encontro quaisquer verbas destinadas à resolução dos problemas do abastecimento de água ao norte do concelho de Torres Novas e aos de Tomar e Fátima. Trata-se de obras de grande envergadura, que julgo poderem ser financiadas pelo FEDER, mas, apesar de constituírem uma preocupação para as respectivas autarquias e para o próprio Sr. Secretário de Estado, não sei em que situação estão nem encontro no Orçamento uma rubrica que preveja o financiamento em tempo oportuno.
Também queria pôr uma outra questão à Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
Consultando os documentos que nos foram facultados, verifica-se que estão previstas operações integradas de desenvolvimento e PIDRs de norte a sul do País, desde o rio Minho à ria Formosa, mas não encontro nada de explícito quanto às operações integradas de desenvolvimento da lezíria e do médio Tejo.
Estas são questões que nos preocupam e em relação às quais pensamos que é importante estarmos esclarecidos sobre o pensamento do Governo.
A Sr.' Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Deputada Lourdes Hcspanhol.
A Sr.* Lourdes Hespanhol (PCP): — Apenas pedi a palavra para que não restem quaisquer dúvidas quanto à questão que levantei relativamente aos pedidos de elementos informativos que foram feitos e apresentados em sede da comissão.
Como há pouco afirmei, no dia 8 fiz o pedido, coloquei-o à discussão e, como não teve acolhimento, foi formalizado sob a forma de proposta, tendo sido posta à votação.
Sr. Deputado Mendes Costa, lamento ter de dizer-lhe que o Sr. Deputado já estava presente na reunião quando foi apresentada a proposta a que me refiro porque, na página 5 da acta, está escrito «[...] o Sr. Deputado Mendes Costa, que havia chegado [...]», portanto, já lá estava. Ora, a votação da proposta é referida na página 6 — pelo que sei, o n.° 6 vem sempre depois do n.° 5 —, portanto, o Sr. Deputado já estava presente naquele momento.
Assim, na carta que foi enviada, em que a proposta consta sob forma reduzida embora esteja na íntegra no requerimento que fiz, relativamente à respectiva votação, está escrito que foi derrotada pelos votos dos Srs. Deputados do PSD, tendo votado a favor da mesma os Srs. Deputados do PS, do PCP e de Os Verdes, e encontrando-se ausentes os Srs. Deputados do PRD, do CDS e o Sr. Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.
Portanto, está feita a clarificação. Compreendo que os Srs. Deputados do PSD se sintam incomodados por terem tomado esta atitude, mas, como me aconselhou a ler as actas, remeto-lhe o seu conselho, até porque, pela minha parte, já tenho o hábito de fazê-lo.
A Sr.* Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território gostaria que estabelecêssemos um consenso sobre quando é que recomeçaremos a reunião, uma vez que já são 13 horas e 20 minutos. Talvez
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às 14 horas e 30 minutos, a fim de ouvirmos os Srs. Membros do Governo sobre esta matéria... O que é que têm a dizer?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr.' Presidente, proponho que recomecemos às 14 horas e 10 minutos, se os Srs. Secretários de Estado estiverem de acordo, logicamente.
A Sr." Presidente: —E o PSD?
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Sr.' Presidente, devo confessar que agora estava distraído. Pode fazer o favor de repetir?
A Sr.' Presidente: — É que já há algum acordo no sentido de a reunião recomeçar às 14 horas e 30 minutos, a fim de ouvirmos os Srs. Secretários de Estado e, eventualmente, o Sr. Ministro, se entretanto chegar.
Gostaria, pois, de saber se o PSD dá o seu acordo.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Sr.' Presidente, é evidente que damos o nosso acordo, mas adianto uma proposta no sentido de adiarmos a reunião para as 14 horas e 15 minutos. Isto por uma razão muito simples: é que às 15 horas vamos apreciar o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros; às 16 horas, o orçamento do Ministério da Justiça; às 17 horas, o orçamento do Ministério das Finanças, e ainda vamos ouvir as respostas dos Srs. Secretários de Estado, que, aliás, são importantíssimas.
Podemos trabalhar amanhã, mas ...
A Sr." Presidente: — Compreendo, Sr. Deputado. Poderei pôr à consideração quais são os grupos parlamentares que estão de acordo em que trabalhemos amanhã, mas o que é importante é que qualquer destas audições são importantes e não podemos tratar estes assuntos a correr, de forma leviana, porque, como todos reconhecemos, são assuntos de muito interesse para todos nós.
Estamos a tentar votar, este ano, de uma forma que tem de ser excepcionalmente rápida e, se não lemos possibilidade de fazer caber dentro do calendário os horários que temos, eventualmente teremos de arranjar soluções, tais como a de trabalhar na sexta-feira ou no sábado.
Gostaria, pois, de saber o que é que os outros grupos parlamentares pensam sobre esta questão. Se tivermos de adiar a apreciação do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros para as 15 horas e 15 minutos ou para as 16 horas, penso que devemos fazê-lo.
O que é que o PS pensa sobre esta matéria?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr." Presidente, pensamos que o esclarecimento é importante, pelo que estamos disponíveis para trabalhar em qualquer altura que seja marcada, com a antecipação adequada para estarmos avisados e podermos fazer a nossa própria programação. Por exemplo, vou ter de deslocar-me ao Porto, mas isso não significa que amanhã não esteja cá, até porque, felizmente, há ligações aéreas regulares c frequentes.
A questão fundamental não é a de sabermos a que horas vamos recomeçar a reunião, mas a colocada pelo Sr. Deputado Vieira de Castro. Podemos começar às 14 horas, às 14 horas e 30 minutos, às 14 horas e 30 mi-
nutos ou até às 15 horas, se for adquirido que não vamos apreciar os orçamentos dos Ministérios das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, sendo os mesmos apreciados noutro dia, porque, se assim não for, não sei muito bem como é que vamos «encaixar» nos 45 minutos de que dispomos toda a matéria que ainda está para debater.
No entanto, deixo à sua consideração, Sr." Presidente, a melhor solução.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Peço a palavra, Sr." Presidente.
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr." Presidente, julgo que não podemos estar a pensar fazer o impossível. Do meu ponto de vista, é absolutamente necessário que a reunião só recomece depois do almoço, porque não posso compreender a hipótese de se dizer aos Srs. Secretários de Estado que, para responderem, têm 15 minutos, 20 minutos ou mesmo 30 minutos. Não pode ser, logicamente!
Por conseguinte, vamos ser realistas, Sr. Deputado Vieira de Castro. Não ponho a questão de se mudarem as audições de hoje para outro dia, embora não fosse o primeiro ano em que trabalharíamos em dias feriados, designadamente nos dias 1 e 8 de Dezembro; julgo é que devemos ser realistas e, de acordo com os Srs. Secretários de Estado, marcarmos o recomeço da reunião, por hipótese, para as 14 horas e 15 minutos ou para as 14 horas e 30 minutos, darmos um prazo razoável para o término da apreciação do orçamento deste Ministério, até porque tanto as questões que foram levantadas como as respostas dos Srs. Secretários de Estado têm interesse, e, utilizando a expressão que há pouco usei para o PIDDAC, «arrastarmos» a apreciação dos orçamentos dos outros ministérios. Talvez assim fossemos mais realistas!
Uma sugestão que deixo, desde já, é a de que a apreciação do orçamento do Ministério das Finanças, que está prevista para as 18 horas, passasse, eventualmente, para as 20 horas e 30 minutos, ou seja, para depois do jantar, a fim de fazermos a «noitadazinha», que ainda não fizemos este ano e que devemos ter de fazer.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Sr.* Presidente, dá--me licença?
A Sr.* Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): —O Sr. Deputado Octávio Teixeira entendeu-me mal. Quando referi o recomeço da reunião para as 14 horas e 15 minutos tinha em mente exactamente ouvir os Srs. Secretários de Estado. Não estou a prescindir de ouvi-los; aliás, tenho nisso o maior interesse.
Apenas quis chamar a atenção de VV. Ex." para o calendário, que foi uma proposta da Comissão de Economia, Finanças e Plano. Este calendário não foi feito pelo Governo, mas pela Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Hoje a tarde vamos apreciar mais três orçamentos de três Ministérios e segunda-feira, de manhã, vamos apreciar os orçamentos do ministério da Defesa Nacional, da Secretaria de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e depois vamos começar as votações.
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Chamo também a atenção para a circunstância de irmos discutir, em Plenário, na especialidade, as propostas de lei do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano nos dias 6 e 7 de Dezembro, se a memória não me falha, e é costume o relatório levar um dia a ser elaborado, ou seja, sê-lo-á no próximo dia 6 ...
A Sr.* Presidente: — No próximo dia 5, Sr. Deputado!
O Orador:—Pior, pior!... Foi só isto que eu quis referir.
A Sr.* Presidente: — Penso que não vale a pena perdermos mais tempo, porque para estarmos aqui às 14 horas e 30 minutos todos os minutos são poucos.
Creio que devemos ponderar, muito seriamente, trabalharmos hoje à noite e lembro que, se a apreciação dos orçamentos dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Justiça estão marcados para as horas que já foram referidas, isso deveu-se à falta de disponibilidade dos Srs. Ministros, o que é perfeitamente possível e razoável c que nos fez arrastar. Não tínhamos esse objectivo, mas agora ele está colocado e o que lemos é de discutir bem estes assuntos.
Os Srs. Secretários de Estados foram sujeitos a muitas perguntas e têm direito a ter todo o tempo para responder.
Mais: é muito provável que volte a haver novas perguntas e isto tem de ser previsto.
Penso que todos nós devemos apontar para trabalhar hoje à noite e desde já dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local ...
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — Sr.* Presidente, se me permite...
A Sr.* Presidente: — Desculpe, mas não percebi que queria intervir.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): —Sr.* Presidente, confesso-lhe que me transtornou um pouco!...
Sr.* Presidente, ninguém quer prescindir de ouvir os Srs. Secretários de Estado, entendamo-nos, de uma vez por todas! O PSD também está interessado em ouvi-los. Só chamei a atenção para o calendário, mais nada! Foi só isso.
A Sr.' Presidente: — Sr. Deputado...
O Orador: — Segunda questão ...
A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado, por favor...
O Orador: —.... não houve só indisponibilidade...
A Sr.' Presidente: — Sr. Deputado, eu oiço-o muito bem, com muito gosto, e ouvi-lo-ei sempre. Agradeço é que não grile quando lula comigo.
O Orador: —Não estou a gritar. Estou a pôr calor nas minhas palavras.
Como estava a dizer, não houve só indisponibilidade da parte dos membros do Governo. Algumas alterações tambem foram feitas por conveniência de alguns Srs. Deputados. Tem de se dizer tudo para a história ficar completa. AYiás, acolhemos essas sugestões que foram apresentadas.
Não garanto que possamos contar com a disponibilidade absoluta dos Srs. Membros do Governo, porque, por exemplo, a reunião com o Sr. Ministro das Finanças já esteve marcada para outra hora, salvo erro para duas ou três horas diferentes das que agora constam. Não sei se o Sr. Ministro das Finanças pode ou não estar presente hoje à noite. Portanto, não partamos do princípio de que, quanto ao calendário, fazemos dele o que quisermos.
A Sr.* Presidente: — Como é óbvio, teremos de ouvir os Srs. Membros do Governo e saber da sua disponibilidade.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr.* Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.' Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr.* Presidente, dá -me a impressão de que estamos a perder demasiado tempo, mas, por acaso, gostei muito de ouvir o Sr. Deputado Vieira de Castro: é que ele, afinal, tem uma voz forte.
Risos.
Uma vez que julgo que os Srs. Secretários de Estado não se importarão de responder depois do almoço, a minha interpelação vai no sentido de interrompermos já a reunião e de pormos a hipótese de trabalharmos à noite ou até amanhã com o Sr. Ministro das Finanças. Amanhã é feriado, mas estamos dispostos a estar aqui presentes para discutirmos o Orçamento do Estado.
A Sr.' Presidente:—Já nos pronunciámos quanto à disponibilidade de trabalharmos hoje, amanhã, sábado ou mesmo domingo, mas este assunto será tratado fora do âmbito desta Comissão.
Uma vez que o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território quer prestar um esclarecimento muito curto, dou-lhe a palavra.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Muito obrigado, Sr.' Presidente.
Vamos responder longamente às perguntas que nos foram colocadas no período da tarde, mas, para que não se mantivesse especulação sobre o assunto, gostava de responder, desde já, à questão sobre o fornecimento de elementos relativamente à distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Não vou pronunciar-me sobre o incidente processual que existiu, pois competirá aos Srs. Deputados debater esse assunto; apenas gostava de esclarecer que as alterações, em termos de critérios de distribuição do FEF, são nulas, estão previstas na lei e não há grande novidade. Efectivamente, o facto de a comissão parlamentar não \sx solicitado os elementos cm causa levou o Governo a não os transmitir à Assembleia da República, mas, tendo em atenção o que está previsto na Lei das Finanças Locais, o Governo não tem qualquer dificuldade cm transmitir essa informação.
Tenho comigo um exemplar, que vou entregar a Sr.* Presidente e esta tarde trarei mais.
A Sr.* Presidente: — Agradeço a boa vontade dos Srs. Secretários de Estado cm voltarem aqui e, se o Sr. Ministro liver possibilidade de estar presente, gostaríamos muito que cie viesse a esta reunião.
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Voltaremos a encontrar-nos às 14 horas e 30 minutos, pelo que está interrompida a reunião.
Eram 13 horas e 35 minutos.
A Sr.* Presidente: — Srs. Deputados, declaro reaberta a reunião.
Eram 15 horas.
Para responder às perguntas que lhe foram formuladas no período da manhã tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Sr.* Presidente, Srs. Deputados: Vou procurar passar em revista os vários pontos que foram apresentados e os meus colegas complementarão a parte que, eventualmente, tenha ficado incompleta na minha resposta.
À Sr.' Deputada Lourdes Hespanhol, antes do intervalo, já respondi parcialmente à pergunta que diz respeito aos indicadores do FEF. Efectivamente, não existe qualquer surpresa na aplicação dos indicadores do Fundo de Equilíbrio Financeiro para o ano de 1990 e vou diligenciar no sentido de serem distribuídos vários exemplares dos critérios e, sobretudo, dos valores que foram utilizados no cálculo da distribuição desse Fundo.
Como sabem, mantém-se a programação que havia sido delineada nas medidas transitórias da Lei n.° 1/87, ou seja, uma aplicação progressiva dos novos critérios, utilizando ainda os antigos, e estamos na fase final desse período transitório de aplicação. Aliás, por essa e outras razões e conforme o Programa do Governo, o Governo tem intenção de apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei, com vista a uma revisão da lei, sendo certo que é matéria onde é impossível a satisfação ser unanime e onde as dificuldades são realmente muito grandes. Cremos, contudo, que há razões para fazermos um novo aperfeiçoamento no texto da lei.
Quanto às questões que se prendem com as novas competências — e que também fazem parte da carta que o Partido Comunista Português dirigiu aos vários grupos parlamentares e ao Governo—, devo dizer que, relativamente aos montantes a transferir para as autarquias locais, eles só não estão fixados porque o Ministério da Educação tem coordenado um longo, profundo e profícuo diálogo com as autarquias para tentar chegar a determinados valores consensuais, porque, como sabem, existem algumas divergências de parte a parte, claramente assumidas.
Não podemos, com estas transferências de competências, pensar que são transferidos recursos orçamentais ideais, porque, como é natural, existem sempre muitas necessidades a acorrer da parte do Orçamento do Estado e muitas vezes os municípios pretendem que a totalidade de uma situação ideal seja a verba a transferir pelo Estado, neste caso pelo Ministério da Educação. Isto não encerra qualquer crítica, pois acho muitíssimo bem que os municípios procedam dessa forma; só assim é que estão a defender os seus interesses.
Competirá ao Govemo manter esse diálogo com as autarquias, que tem prosseguido e ainda não está concluído. Há ainda divergências significativas de montantes e, se o Govemo avançasse neste momento para montantes concretos, ficaria porventura aquém daquilo a que pode ir, ainda, nessa matéria.
Quanto à retenção do imposto na fonte, referiu o caso concreto de Ferreira do Alentejo. Devo dizer que nunca tinha ouvido falar deste caso, mas gostaria de aprofundá-lo.
A Sr.' Lourdes Hespanhol (PCP): — Mas há mais!
O Orador: — Se a Sr.* Deputada ou o respectivo presidente da Câmara me quiser fazer chegar a informação, comprometo-me a procurar investigar o que se passou. Mas não vejo qual possa ser a cobertura para concretizar a retenção da transferência de impostos. Já as retenções na fonte do Fundo de Equilíbrio Financeiro correspondem a situações que já temos aqui discutido em diversas circunstâncias, a dívidas que os municípios têm, nomeadamente à EDP e à EPAL. Instituiu-se este sistema, como, aliás, tenho dito, com sucesso. Ou seja, o número de casos em que se tem conseguido chegar a acordo com os municípios no que diz respeito à regularização dessas dívidas tem sido significativo e corresponde realmente a um custo que resolvemos assumir e que muitos municípios têm compreendido.
Quanto à revisão da Lei das Finanças Locais e à questão do artigo 41.°, diria que este artigo diz respeito à situação nova que decorreu da introdução da contribuição autárquica, em relação à qual se suscitou esta questão da necessidade de implementar o sistema desde já. A revisão da Lei das Finanças Locais será, naturalmente, um momento muito adequado para incorporarmos qualquer alteração deste estilo na própria lei. Eu diria ser preferível para os municípios considerar este novo mecanismo como conjuntural e, portanto, não irmos assumir necessariamente para a Lei das Finanças Locais uma situação que será conjuntural e que porventura não irá beneficiar os municípios, caso haja uma referência na lei.
Relativamente aos problemas da ciência e tecnologia, aproveito para dizer que o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, com quem contactei imediatamente após sair da nossa reunião da manhã, já estava na sala de embarque para o Porto, a fim de acorrer a compromissos que tinha assumido para esta tarde. Não lhe é possível, portanto, estar hoje aqui presente.
Quanto ao Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia, ausente em missão oficial no estrangeiro, estou certo —posso falar por ele, embora não o lenha contactado— de que, se porventura os Srs. Deputados ainda tiverem disponibilidade na próxima segunda-feira, que sei estar muita preenchida, ele estaria na disposição — e eu próprio me ofereço para lhe falar nisso — de vir aqui para convosco debater os problemas da sua área.
A Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional dará também algumas achegas nesta matéria, nomeadamente na incidência comunitária de todo este processo.
Mas também eu, que estou aqui em representação do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, gostaria de fazer alguns comentários e procurar, de alguma forma, satisfazer as perguntas, que julgo pertinentes, colocadas, em especial, pelo Sr. Deputado António Barreto.
Em relação aos montantes, o Programa Ciência e Tecnologia e as Grandes Opções do Plano assumem a realidade. Os números são como são. Foi fixado um objectivo, que foi um objectivo ambicioso em termos de percentagem de despesas em ciência e tecnologia. Tal objectivo ainda não está atingido, mas o que é inegável
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é que tem sido possível dar um salto espectacular, que está fora de todas as expectativas alimentadas, nomeadamente quando foi criada a então Secretaria de Estado da Investigação Científica e quando o anterior governo tomou posse. Os números têm sido sucessivamente ampliados e os programas que têm sido instituídos extremamente significativos. Há, portanto, uma alteração quantitativa e qualitativa que qualquer observador pode registar. É certo —essa é uma verdade de La Palice — que o objectivo ainda não está atingido, mas o que também é certo é que nos propomos vir a atingi-lo a muito curto prazo.
Quanto ao caso concreto referido em relação à Faculdade de Farmácia e às investigações em curso, os promotores dessa investigação têm, naturalmente, acesso aos programas de ciência e tecnologia e podem candidatar-se aos apoios disponíveis no que diz respeito à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica e à Secretaria de Estado em geral.
Relativamente à colheita do parecer do Conselho Superior de Ciência, a informação que tenho é afirmativa: foi ouvido o Conselho Superior de Ciência.
Quanto à questão do Serviço Nacional de Informação Geográfica, nalgum lado havia que se situar esta iniciativa governamental. Eu próprio tenho também acompanhado a questão, na medida em que tenho a responsabilidade da condução dos assuntos relativos ao Instituto Geográfico e Cadastral, havendo, pois, um grande contacto entre estes dois tipos de assuntos. Foi considerado que seria adequado que o sistema nacional de informação geográfica tivesse o seu «pontapé de saída» na Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia. Eu diria que se trata de uma fase transitória, porque neste momento está em curso uma grande reestruturação do Instituto Geográfico e Cadastral e, portanto, de todas as estruturas de cartografia. Vai ser instituído, finalmente, o Conselho Nacional de Cartografía nas próximas semanas, com a tomada de posse do seu presidente, e todo o sistema pode vir a ser conduzido de outra forma.
Nesta fase e nesta matéria, não estamos, como sabem, muito avançados. Dado o carácter inovador para Portugal do Sistema Nacional de Informação Geográfica, foi considerado que teria uma localização adequada na Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia.
Quanto à eventual duplicação de verbas no âmbito da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, ela não existe. Mas essa questão poderá ser explicada com maior detalhe pelo meu colega.
Em relação a incentivos à investigação das empresas, também existem mecanismos que podem conduzir ao financiamento das empresas nas suas despesas de investigação.
Quanto aos países africanos de língua oficial portuguesa, tem sido desenvolvida uma acção que talvez merecesse a pena desenvolver mais do que tem sido. Foi recentemente agregado à Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia o Instituto de Investigação Científica Tropical, o que corresponde, segundo julgo, a uma oportu-niuadc significativa para se ganhar uma maior sinergia na matéria. E estou convencido de que será possível, nos próximos tempos, proceder a um desenvolvimento desta faceta no âmbito da Secretaria de Estado. ...
Quanto à questão levantada pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos, relativa às áreas metropolitanas, temos de-ScTtvoVnào.um esforço assinalável, t\o que diz respeito tanto à área metropolitana do Porto como à de Lisboa,
no sentido de se avançar para a sua consolidação. O Governo tem assumido, desde há algum tempo, a posição, que, aliás, consta do seu programa, de proceder na matéria com a maior prudência e não atribuir a sua prioridade à instituição política das áreas metropolitanas e a tudo o que está inerente a essa figura.
No caso da área metropolitana do Porto, instituiu-se uma estrutura muito leve, aliás muito dinamizada por presidentes de câmara de grande gabarito, inclusive do Partido Socialista, que têm colaborado muito nesses trabalhos, colaboração essa que tem vindo a conduzir, nomeadamente, a propostas que resultarão em financiamento comunitário para uma avaliação mais global dos problemas da área metropolitana do Porto. Já há, aliás, uma resolução do Conselho de Ministros sobre esta matéria.
No que diz respeito à área metropolitana de Lisboa, o Governo já decidiu, por resolução do Conselho de Ministros, mandar elaborar o Plano Regional de Ordenamento do Território, o que mereceu o acolhimento, quase unânime, da parte das câmaras municipais envolvidas, sendo muitas vezes a crítica a de que o deveríamos ter feito mais cedo. Mas as coisas acontecem quando acontecem. Estamos, pois, a trabalhar nessa área.
Quanto às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira a toda esta questão do Fundo de Equilíbrio Financeiro e do estabelecimento do seu montante, o que é certo é que, no estado actual das coisas, estamos a trabalhar no Orçamento do Estado para 1990 e a comparar duas previsões orçamentais. Estas previsões orçamentais para o imposto sobre o valor acrescentado são o que são e o resultado são os 128,4. A Associação Nacional de Municípios levantou, aliás, um problema de arredondamentos, pois o número poderia eventualmente vir a ser corrigido — é uma questão a ver.
O que é indesmentível é que o que estamos agora a discutir não é propriamente o Orçamento rectificativo, nem de 1989, nem de 1988, nem de 1987. Estamos, sim, a discutir o Orçamento do Estado para 1990. E, no actual estado da arte, a questão é realmente a comparação de previsões em dois orçamentos. Não obstante o Partido Comunista ter, nomeadamente, outra previsão para o imposto sobre o valor acrescentado, que é, naturalmente, uma previsão da sua iniciativa e da sua responsabilidade, o Governo apresenta uma determinada previsão, que é diferente. É a previsão que irá constar do Orçamento do Estado a que vai contar. E é essa que vai desencadear os valores correspondentes ao Fundo de Equilíbrio Financeiro.
Quanto aos pagamentos relativos ao IRS, são, enfim, questões que já foram discutidas em anteriores orçamentos. Mesmo quando a questão foi levantada relativamente ao imposto complementar, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento teve ocasião de referir aqui, na Assembleia, o enquadramento que dava a este assunto e à evolução que ele teria. Não existem, portanto, compensações previstas para o efeito.
Mas volto a dizer aquilo que tenho dito sucessivamente — Os Srs. Deputados insistem nos seus argumentos (estão no seu legítimo direito!), mas também eu estou no meu legítimo direito de insistir nos meus argumentos. É que realmente o Fundo de Equilíbrio Financeiro volta a crescer com uma taxa elevadíssima.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Supcr-eleva-díssima!...
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O Orador: — É esse o pano de fundo, muito significativo.
Os Srs. Deputados da oposição gostariam que fosse ainda maior. As câmaras municipais acham que deveria ser maior. Estão no seu pleno direito...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — É só uma questão de cumprimento da lei!
O Orador: — O que estou a dizer é no âmbito do cumprimento da lei e estou a referir-me ao Orçamento do Estado para 1990. Estão comparadas as duas previsões e o valor estimado para o Fundo de Equilíbrio Financeiro é aquele que é coerente com essa comparação de previsões.
Quanto à questão, também colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, do elemento de ligação do nosso Ministério, não esperará de mim, naturalmente, outra resposta que não a de que o Governo apresentou o seu Orçamento, que é do Governo e não do ministério A, nem da secretaria de Estado B.
Em relação à questão de saber se aceitámos pacificamente ou não os números, esse é um problema que fica connosco. E naturalmente não vou entrar por aí nesta discussão orçamental. O que as autarquias pensam é que desejavam mais dinheiro. E os Srs. Deputados não iriam esperar que os municípios em geral —cada um, individualmente, ou a sua associação representativa — viessem dizer, seja aos Srs. Deputados, seja à opinião pública, que tinham dinheiro a mais, queriam devolver dinheiro ao Govemo e desejavam que o dinheiro fosse utilizado para outra finalidade, como igualmente não assistem a que os investigadores venham dizer que têm dinheiro a mais e que o dinheiro deve ser utilizado noutra matériaIsso corresponde à dinâmica natural destas coisas. Compete ao Govemo, na proposta de Orçamento que faz, procurar balancear todas estas finalidades, o que, como os Srs. Deputados sabem, nem sempre é fácil.
A Sr.' Presidente: — Tem a palavra a Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: — Irei tentar responder às questões que me foram colocadas, indo das mais gerais para as mais particulares.
Em primeiro lugar, quanto à questão do envio de elementos informativos, quero que fique claro que do lado do Ministério, e designadamente da minha Secretaria de Estado, há disponibilidade para enviar todos os elementos que o Srs. Deputados considerarem necessários para complementar a informação e fundamentar melhor a discussão. Mais do que isso: quer eu quer as equipas técnicas que sustentam a Secretaria de Estado estamos à disposição para todas as discussões que forem necessárias.
Relativamente à questão do planeamento e à pergunta que me foi colocada, penso que pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos, sobre se haveria ou não alguma frustração de as GOPs não serem tão discutidas como o Orçamento, devo dizer que não me sinto nada frustrada, Sr. Deputado. Muito pelo contrário! Aliás, se o Sr. Deputado verificar, temos um plano de médio prazo pela primeira vez desde a revolução e um plano de desenvolvimento regional que tem merecido uma coincidência
de opiniões relativamente à sua qualidade, quer interna quer externamente. A resposta esti, pois, aí.
Não vale a pena perder muito tempo com elogios ao plano — a resposta é o quadro comunitário de apoio, é o aval a toda a estratégia de desenvolvimento que o Governo se propôs. E praticamente, como sabem, todas as intervenções que foram discutidas e propostas à Comunidade Europeia foram concedidas (e já voltarei à questão do quadro comunitário de apoio).
Portanto, penso que essa é a melhor resposta que se pode ter nesta área. Se analisar cuidadosamente, por exemplo, a área de fundos —e também já irei de encontro ao elogio que me quis fazer —, constatará que todas as metas que foram estabelecidas foram até ultrapassadas. Considero que em matéria de planeamento temos
de ter uma visão mais vasta, não é só o documento
GOP smas esse também foi feito com muito envolvimento de toda a Administração e, enfim, com todo o interesse.
E, repare, os frutos estão aí: quando vemos o P1DDAC a crescer 26 %, isso é fruto de uma tarefa de planeamento, é fruto de uma política de desenvolvimento que foi assumida pelo Governo.
Portanto, as respostas estão aí, são claras; não é tanto o documento que está em causa, é o fruto que resulta de toda essa tarefa. É por isso que digo que não sinto qualquer frustração; e além disso penso que há uma tendência natural na atracção que os números exercem sobre as pessoas!...
O Sr. Deputado foi, inclusive, o primeiro a ter uma visão muito financista de toda a problemática do desenvolvimento. Quando me fez o grande elogio — que tomo como isso — de dizer que «a Sr.' Secretária de Estado é só sacar fundos!», não me podia ter feito melhor elogio. Sabe porquê? Porque os fundos estruturais não são fundos para financiar o défice do Estado, nem para ficar nos cofres do Ministério das Finanças. Os fundos só entram se existirem projectos concretos a realizar. Se entraram muitos fundos no nosso país foi porque houve muito desenvolvimento, porque as nossas políticas estruturais estão a andar para a frente, já que o que está em causa quando se fala em fundos estruturais —claro que é entrada de dinheiro (é evidente!) para viabilizar uma determinada política de desenvolvimento— é a política estrutural. Portanto, ao dizer-me que se têm sacado muitos fundos para Portugal eu digo-lhe que sim, que têm, até se tem ultrapassado as metas. E, mais, vou dizer-lhe uma coisa: este ano vamos até sacar fundos de outros países!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Não vai ficar a descoberto dos outros países?
A Oradora: — Não, pois são países que não tiveram a mesma capacidade de realização. Porque o que está em causa —se os Srs. Deputados conhecem bem as regras comunitárias — é que os fundos comunitários não entram se não houver realização de projecto. Daí que quando se fala em fundos se quer referir Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), o que significa que se os fundos entraram e foram aplicados é porque existe desenvolvimento, mais precisamente desenvolvimento regional. Portanto, Sr. Deputado, queria agradecer-lhe o grande elogio que me fez.
Em segundo lugar, queria debruçar-me um pouco sobre a questão das negociações com a CEE e a existência ou
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não de programas. Terei de falar dos calendários para poder explicar o que se passa sobre os programas e responder, designadamente, a algumas das questões que o Sr. Deputado António Barreto colocou, tais como o PRODEP, se existem ou não existem, se estão ou não negociados e quantas versões já existiram dos programas. E absolutamente verdade que existiram muitas versões dos programas; só do próprio quadro comunitário de apoio não sei quantas foram, mas perdeu-se quase a conta das diversas versões que, ao longo do processo de negociações com a CEE, foram havendo relativamente ao quadro
comunitário de apoio e aos programas que envolvia.
Se os Srs. Deputados bem se recordam, a negociação da reforma dos fundos estruturais —que, com a regulamentação geral, veio depois a envolver todas as propostas concretas— começou há pouco mais de um ano, altura em que naturalmente ao nível das administrações nacionais se começaram a dar os primeiros passos na preparação das propostas que vêm viabilizar essa extraordinária oportunidade que é a duplicação de fundos, o que constitui o grande salto em termos das políticas estruturais.
Citando o caso que o Sr. Deputado António Barreto referiu, o PRODEP, foi logo nessa fase que apareceu uma primeira versão de um documento que se denominou PRODEP, mas que obviamente não era ainda um programa; se quiser, era uma primeira vontade de colocar no papel um esforço de planeamento que durante muitos anos não se fez —como sabe, porque se vivia o dia-a-dia e se ia vivendo de um determinado tipo de situações, dando respostas sem uma perspectiva estratégica e de médio prazo — para pôr um programa em pé. E muitas dúvidas surgiram de elegibilidade de programas. Por exemplo, no campo da educação, quando se fez a primeira versão daquilo que neste momento estamos quase a ter —o PRODEP —, não era claro se a educação ao nível secundário era ou não elegível pelo FEDER de acordo com as novas regras. É ou não possível chamar o Fundo Social Europeu (FSE) para financiar, por exemplo, equipamento escolar? Coisas desse tipo.
Nessa altura não se tinha a menor ideia. Pelo contrário, foi muitíssimo importante que se tivessem feito esses trabalhos preliminares que permitiram municiar os negociadores portugueses de modo a garantirem que, no âmbito da reforma dos fundos e dos regulamentos comunitários, viessem a estar contemplados aspectos que tinham a ver directamente com as nossas necessidades — no caso de o FSE poder vir a financiar a educação. Se não tivesse havido esse primeiro esforço do tal PRODEP (versões 1, 2 e 3) provavelmente não tinha sido possível obter uma resposta tão cabal em termos dos regulamentos comunitários.
Obviamente que um trabalho de planeamento é um trabalho de puzzle (de acertar peças), de negociação, mesmo entre departamentos do Estado. Um departamento sectorial, só por si, tem a ambição lógica, legítima e de aplaudir de poder ir mais longe do que aquilo que provavelmente lhe é permitido quando são colocadas em conjunto sobre a mesa as diversas componentes que têm de ser pensadas numa governação.
Esse é o caso concreto — para também dar já resposta à questão do Sr. Deputado — das contrapartidas internas. Não escondo de ninguém que a primeira versão do PRODEP era muito maior do que aquilo que veio a ser possível depois e que resultou de um esforço de conciliação e negociação internas, entre contrapartida interna e aquilo que se veio a conseguir negociar pela CEE. Ainda
quanto a esta questão muito concreta sobre se o PRODEP e o PRODAC existem ou não, se foram ou não aprovados em Conselho de Ministros, direi, Sr. Deputado, que foi tudo aprovado em Conselho de Ministros da CEE, só que a versão que foi na altura enviada para Bruxelas — e que está neste momento em negociação —, embora em termos de estratégia, de lógica e de componentes tivesse sido discutida e analisada em Conselho de Ministros, sabia-se na altura que ainda não havia a resposta completa do quadro comunitário de apoio, aliás tal como se conhecia a necessidade de as verbas serem ajustadas.
Ora bem, o Governo entendeu que era de assumir o
risco — e fê-lo! — de, em Agosto, se candidatar formalmente a esses programas para negociação, de modo a garantir que as despesas pudessem ser elegíveis desde essa altura. E felizmente foi o que veio a acontecer! É que, entretanto, fechou-se o quadro comunitário de apoio.
Neste momento, trata-se de meros ajustamentos, que só à mesa das negociações se podem fazer, e é isso que estamos a fazer. Ainda bem que os projectos que estão no programa são os que estão a contabilizar desde a data de candidatura.
Portanto, houve também que assumir riscos no meio de tudo isto. Obviamente, e como calculam, num processo tão complexo, em que os próprios serviços da Comissão Europeia a maior parte das vezes não estão ainda apetrechados para nos dar respostas concretas, porque foi uma reforma de anos que começou a vigorar num curto espaço de tempo, com novos formulários, novas regras, etc, o risco era maior.
Relativamente a todas as propostas que foram apresentadas e que constam do documento do quadro comunitário de apoio — penso que é do conhecimento dos Srs. Deputados —, podem encontrar aí as traves-mestras por que nos vamos mover e é dentro desse quadro que vai decorrer agora a negociação.
Não se trata ainda de dinheiros, porque a parte financeira está estabilizada no quadro comunitário de apoio; agora, estamos na fase de negociação de programas, de políticas, de intervenções. Portanto, é neste momento aquilo que estamos a fazer.
E a situação é a seguinte: no que respeita ao PRODAC, o grande Programa de Melhoria de Acessibilidades, está terminada a instrução do processo e penso que a decisão vai ser tomada (é a informação de que disponho neste momento) no dia 15 de Dezembro, o que me vai permitir sacar ainda mais fundos este ano por conta de despesas que estão a contar de há uns meses a esta parte, proporcionando assim um fluxo importante de dinheiro neste ano. E esse dinheiro vamos sacá-lo a outros países, porque houve países que por diversas razões não tiveram a mesma capacidade que nós para apresentar os programas ou não quiseram assumir o risco de apresentá--los, tal como nós, ao abrigo da nova reforma, o que nos vai permitir ir à quota delas, sendo sem dúvida bom para o País.
O PRODAC vai ficar pronto e têm o meu compromisso de que no dia em que o programa existir como tal será imediatamente enviado à Assembleia da República. Simplesmente, o que estava em discussão era uma proposta negocial. E há coisas, nomeadamente no PRODEP, que ainda estão por discutir.
Dou-lhes um exemplo: uma das coisas que queremos é concentrar dentro do PRODEP a componente das escolas secundárias e a CEE não concorda porque está habituada a outros países e outros níveis de desenvol-
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vimento, em que o importante é a tónica, suponhamos, no ensino universitário — é este tipo de discussão e de doseamento que ainda não está completamente fechado.
Contudo, penso que o PRODEP não ficará concluído ainda este ano, porque a sua aprovação está dependente dos trabalhos dos órgãos comunitários, que a partir do dia IS não funcionam, pois os trabalhos são suspensos em virtude das férias de Natal. O compromisso que tenho é o de que, em meados de Janeiro, o programa está concluído para poder arrancar e ser posto em execução.
Outro programa cujas negociações terminarão ainda este ano é o Programa Ciência. Nesse dia passa de proposta negocial a um programa completo, negociado e fechado.
Quando isso acontecer têm o meu compromisso de que os programas serão enviados à Assembleia da República. É evidente que até aí apenas se trata de documentos de trabalho, aproximações sucessivas objecto de diversos arranjos ao longo do tempo.
Já agora, quero aproveitar para dizer que o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território vem ao Parlamento no dia 12 fazer uma apresentação detalhada dos resultados das negociações do quadro comunitário de apoio.
Ainda sobre as negociações, e entrando já parcialmente na resposta ao Sr. Deputado Octávio Teixeira sobre o pedido de mais dinheiro e sobre a existência ou não de capacidade, peço à Sr.* Presidente da Comissão se pode ser distribuído o último comunicado de imprensa do comissário da CEE sobre política regional, de modo a explicar qual é neste momento a fase de negociação quando se refere que se anda a pedir mais dinheiro.
Não se anda a pedir mais dinheiro, o que se anda a pedir prende-se com o seguinte: a negociação do quadro comunitário de apoio que foi fechada diz respeito à proposta que fioa dentro da quota de cada país.
Como sabem, Portugal apresentou —e connosco, por exemplo, a Espanha, no caso do Programa de Ajuda às Regiões Fronteiriças — outro tipo de propostas que estavam incluídas no PDR e que pedimos fossem consideradas no âmbito de iniciativas comunitárias (do FEDER, portanto). Há, pois, uma margem que ficou reservada e sobre a qual a Comissão decidirá, pois tem autonomia e competência para dizer o que vai fazer desse dinheiro no âmbito das iniciativas comunitárias.
E, mais, dissemos que, nesse âmbito, gostaríamos de ver contempladas três intervenções específicas: uma, a relativa ao programa fronteiriço; outra, às regiões autónomas, e uma terceira ao projecto do gás natural.
Qual é a situação neste momento? A Comissão Europeia anunciou, em conferência de imprensa, a semana passada, onde ia aplicar o dinheiro que tem reservado e foi com muito gosto que verificámos que o nosso esforço de negociação é contemplado nessa iniciativa comunitária para dois casos: para o Programa de Apoio às Zonas Fronteiriças e para o das Regiões Autónomas. Está ainda em aberto a questão do gás natural, mas existe ainda uma reserva financeira da Comissão Europeia para poder dar resposta a essa questão. E devo dizer que se não tivesse sido feita a proposta — e podem verificar no comunicado que fala claramente nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores e também no Programa de Ajuda às Regiões Fronteiriças —, isto não viria a estar contemplado, portanto foi fruto de um trabalho negocial permanente.
Obviamente, onde é que, neste momento, se centram as nossas preocupações? Com certeza naquilo que ainda falta, e que é a questão do gás natural.
A negociação terminou. Portanto, não se trata de pedir mais dinheiro, mas, sim, de garantir que seja contemplado o conjunto das nossas propostas em globo.
Vou aproveitar para responder à questão posta sobre as contrapartidas internas e o facto de o Govemo ter negligenciado negociar ou não maiores taxas de comparticipação.
Sr. Deputado, isso é uma falsa questão, pois o Governo podia perfeitamente ter posto, por exemplo, todo o dinheiro que lhe cabia no mesmo saco. Podia, por exemplo, dizer que só fazia estradas e escolas. E óbvio que isto é um exagero, mas podia ter seguido por uma opção desse tipo, porque se o «bolo» é o mesmo não se trata de aumentar ou diminuir a taxa de comparticipação; trata-se, sim, da forma como se faz a afectação dos recursos comunitários. Por isso é que o trabalho de planeamento foi tão importante. Nós fomos tão longe quanto pudemos, dentro da medida do possível, em termos de perspectivas futuras.
Houve um trabalho muito rigoroso que foi feito em conjunto com o Ministério das Finanças, para ver até onde é que se poderia ir, em termos de contrapartida interna e de despesa pública.
No campo da saúde, dou-lhe o exemplo dos hospitais, que é tão caro ao Sr. Deputado. Tomara a CEE que nós não tivéssemos insistido em dois hospitais, pois, se esse dinheiro que fui pôr nos hospitais tivesse ido para outra coisa, iria aumentar mais a taxa de comparticipação.
Aqueles milhões de ecus que estão afectos aos dois hospitais poderiam ter ido, obviamente, para o programa PRODEP e aumentar assim a taxa de comparticipação. Simples matemática, como se vê. Só que achamos que era estrategicamente importante garantir, desde já, um pé num sector que, até agora, a Comunidade Económica Europeia não financiou, para garantir a possibilidade de, em futura afectação de recursos, prosseguir com o apoio comunitário.
A cultura é um outro exemplo. Um programa de cultura, que já aqui foi falado na Assembleia, é um programa de turismo e cultura em que é, sobretudo, a conservação do património histórico que está em causa.
E óbvio que é um programa que era inovador e que foi muito importante do ponto de vista da estratégia global, porque o desenvolvimento não é só fazer isto e aquilo. É uma questão global que está em causa e é evidente que o facto de haver por detrás fundos comunitários dá um estímulo muitíssimo maior, quer ao sector quer aos próprios operadores, o que vai permitir dar até, se quiser, como que «um fermento» de uma determinada intervenção.
A questão das taxas é uma falsa questão, porque houve casos em que foi uma opção clara ter-se ido até onde se foi, tendo sempre em conta, por outro lado, a componente financeira, para se saber até onde era possível ir. Foi esse o trabalho de base que esteve por detrás de tudo isto.
Queria agora responder à questão das OIDs, primeiro em termos gerais, porque um Sr. Deputado fez uma crítica, dizendo que as OIDs eram uma «manta de retalhos», onde constavam coisas que não deviam constar e faltavam outras que deviam constar.
Sobre isso vou dizer-lhe uma coisa*, sou profundamente a favor da figura da operação integrada de desenvolvimento, pois acho que é a figura privilegiada de intervenção a nível regional, só que, obviamente, é uma figura que é muito mais difícil de pôr em pé do que uma
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simples intervenção de natureza sectorial, porque é preciso articular e é preciso estar a negociar permanentemente.
Se uma OID foi, desde a sua génese, devidamente participada, onde todos os sectores estiveram envolvidos e em que os parceiros sociais estiveram presentes desde o princípio, e não responde àquilo para que foi concebida, então acho que isso é muito grave e tem de se pensar muito bem nos figurinos de gestão. Simplesmente, acho que o Sr. Deputado está muito errado, porque a informação que tenho sobre o que se passou na comissão de acompanhamento, há muito pouco tempo, é a de que as metas que foram traçadas não têm desvios importantes, nem pouco mais ou menos.
Além disso, penso que também tem alguma informação menos correcta quando diz que é fundamentalmente turismo. Se é fundamentalmente turismo — e penso que não é, porque tem agricultura, tem formação profissional e tem uma componente importantíssima do SIBR de apoio à actividade produtiva —, está nas mãos de todos os participantes, de todos os sectores e de todos os agentes económicos ir dando contorno. A grande vantagem da OID é poder ir dando o contorno e corrigindo a trajectória, sendo uma figura tão participada como é a sua gestão.
Portanto, repito, pela informação que tenho e que foi testada pela própria CEE, cujo relatório tenho nas mãos, não há razão para estarmos preocupados —pelo contrário! —, pois o relatório da comissão de acompanhamento, que reuniu há IS dias, é muito positivo e favorável.
Quanto à questão do PIDDAC, do mapa vn, dos desvios e do planeamento, o Sr. Deputado disse que do ano passado para este ano se perderam 38 milhões de contos ou, melhor, que houve um arrastamento de 38 milhões de contos. Estamos a falar em 15%. Devo dizer que não considero que um erro ou um desvio numa programação plurianual de 15% ou 16% seja nada de grave. Pelo contrário, acho que é um desvio perfeitamente aceitável nesse tipo de programação.
Porquê esse desvio? Penso que o Sr. Deputado referiu que teria sido por excesso de optimismo. A meu ver, há duas razões fundamentais para que isso tivesse acontecido: primeira, porque se procedeu este ano àquilo a que chamo uma limpeza de algumas despesas correntes, que estavam, por tradição, a ser incluídas no PIDDAC e que foram passadas para o orçamento de funcionamento; segunda, porque se procedeu a um ajustamento aos calendários do quadro comunitário de apoio que se arrastaram mais do que aquilo que na altura se previa. Portanto, é óbvio que o facto de ter atrasado teve reflexos, que tiveram de ser corrigidos e ajustados no ano seguinte.
Estamos a falar em 15 %, portanto não é nada que me pareça grave, pelo contrário!
Ainda voltando às OIDs, dois Srs. Deputados perguntaram por que é que os 15 milhões de contos que a comissão executiva informou que tinha não constam do Orçamento do Estado, isto é, não têm tradução no Orçamento. Isso acontece porque essas verbas se destinam directamente aos municípios e por isso entram para o Tesouro nacional, de onde vão directamente para os municípios. Portanto, a contrapartida não é do Estado. É essa a razão por que também não está expressa na OID do Norte Alentejano.
Tudo o que é transferências do FEDER —e isso é uma coisa de que nós às vezes nos esquecemos— vai
directamente para as autarquias; são receitas que vêm a acrescer às autarquias e que, portanto, não têm qualquer reflexo no Orçamento do Estado, nem têm de ter.
Quanto à questão do Alqueva, o Sr. Deputado disse — e estou perfeitamente de acordo consigo — que é uma questão nacional. É evidente que é uma questão nacional!
Os Srs. Deputados sabem perfeitamente — várias vezes já o ouvi dizer ao Sr. Ministro do Planeamento e, de
resto, o Sr. Secretário de Estado irá falar-vos também
deste assunto — que é uma questão que é, tecnicamente,
polémica!
Ninguém sabe dizer, exactamente, qual é o montante que está em causa, sabendo-se, no entanto, que são muitos milhões de contos. Fala-se em mais de 100 milhões de contos e é por isso que digo que é um projecto tecnicamente polémico. Não há um rigoroso conhecimento da situação — os dados de base até se alteraram..., há departamentos do ponto de vista de energia ou da mais valia agrícola, etc.
As opiniões não são unânimes e por isso o Governo entendeu fazer um levantamento, que tenho neste momento em mãos. Mas devem ter verificado que isso estava no Plano de Desenvolvimento Regional...!
Vai fazer-se, conscientemente e com toda a honestidade, um accessement desta situação e vamos fazê-lo com o apoio da Comunidade Económica Europeia. Vai haver dinheiro para isso no Orçamento, na rubrica «Assistência técnica», dependente da minha Secretaria de Estado. Aí vou lançar, por instruções do Sr. Ministro do Planeamento e de acordo com uma equipa que vamos constituir para poder fornecer os elementos — porque há imensos estudos, só que não são conclusivos; não há uma opinião estratégica neste momento devidamente consolidada (esta é a verdade dos factos!) —, por instruções do Sr. Ministro do Planeamento, dizia, e com< o apoio da Comunidade Económica Europeia vamos fazer um accessement global desta situação, porque é de facto um problema nacional quando estão em causa estes milhões todos.
Quanto à questão da lezíria do Ribatejo, neste momento está terminada a 1.* fase do estudo da Operação Integrada de Desenvolvimento do Vale do Tejo. Este estudo só irá estar concluído no final do 1.° trimestre do próximo ano, mas vai reunir agora uma primeira comissão para fazer a avaliação destas primeiras conclusões, com vista a ser uma OID.
A Sr.* Presidente: — Muito obrigada, Sr.* Secretária de Estado.
Gostaria de informar que estamos a prever terminar esta reunião por volta das 16 horas, pois foi a informação que demos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais (Macário Correia): — Sr.* Presidente, Srs. Deputados: Pela minha parte, vou procurar fazer com que se cumpra esse horário c vou procurar ser, naturalmente, sintético, mas claro, em relação às questões que aqui foram levantadas.
Em relação à primeira pergunta que foi colocada pela Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol, que começou por dizer que estava algo baralhada e que não via muito bem como é que aquelas verbas, em relação ao ambiente, apareciam, devo dizer-lhe que percebo a razão de ser dessa confu-
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são, porque, pegando no documento que foi aqui distribuído como Diário da Assembleia da República, na página onde está feita a agregação global das verbas dos diferentes ministérios e pelos itens que estão aqui, a chamada defesa e protecção do ambiente aparece com 2,5 milhões de contos, mas na soma dos serviços que estão, de facto, integrados na política do ambiente isso é sensivelmente quatro vezes mais. De maneira que é essa diferença que nos leva por vezes a leituras diferentes, quando estamos a falar das questões do ambiente.
Como é óbvio, grande parte das acções de ambiente aparecem, talvez por razões de contabilidade pública, incluídas naquilo que é agricultura, silvicultura e pecuária e naquilo que são algumas outras questões, como a habitação e urbanismo, e até noutros itens, como alguns que tem a ver com o turismo ou com a própria energia.
O que é facto é que, como é sabido, a reforma da contabilidade pública está em marcha e, na sua sequência, a própria Lei de Enquadramento do Orçamento, pelo que esta classificação, que já dura há alguns anos, poderá vir a sofrer ajustamentos, que me parecem pertinentes, por forma que possamos fazer uma leitura mais lógica dos quadros e possamos falar de números comparáveis, quando falamos realmente na mesma coisa.
Penso que a sua questão, no essencial, tinha a ver com isso, mas devo dizer-lhe, apenas para clarificar, que na área do ambiente o conjunto dos serviços integrados nessa política tem como dotação para o ano de 1990 cerca de 11 milhões de contos, o que equivale a cerca de 22% mais do que unha no ano de 1989.
Em relação àquilo que foi levantado pelo Sr. Deputado Luís Bartolomeu, cm dado momento, eu retenho que, para o Sr. Deputado, o Alqueva não é uma «questão de zeros». De facto, é bom que assim seja, porque aquilo que está em causa é algo com muitos algarismos, como a minha colega acabou de dizer.
Pela parte que mc loca, devo dizer-lhe que, de facto, já se gastou muito dinheiro no projecto do Alqueva: está lá principiado um paredão, está um desvio do leito do rio e desde há 12 anos que está em funcionamento um pequeno serviço do Estado que se preocupa apenas com esse assunto.
Vários estudos têm sido feitos e dois ou três serão concluídos em 1990. É exemplo disso o caso do património arqueológico, em que há todo um levantamento já feito. Desde Alqueva até toda a área potencial de regolfo, a área a montante da potencial albufeira, tem de ser avaliada. É porque não é só da Aldeia da Luz que se trata; muitas outras ocorrências arqueológicas têm de ser inventariadas, têm de ser estudadas para que esse património não seja eventualmente destruído e não seja menos cuidado com a construção da albufeira.
Um outro aspecto que está em estudo final é o que se prende com a valia agrícola do empreendimento. Como é sabido, o empreendimento tem, em termos de estudo, duas vertentes: a parte eléctrica e a parte agrícola. Qualquer das duas tem a sua polémica própria, que tem a ver com as conjunturas da evolução, quer da agricultura quer dos combustíveis, e de toda a política energética. Naturalmente que são esses aspectos que estão a ser averiguados e, em particular no que toca à valia agrícola do empreendimento, há alguns aspectos que estão em vias de conclusão e, por isso, estão incluídos no Orçamento.
Depois da conclusão desses estudos, falta concluir da viabilidade em termos globais do investimento e fazer, no fundo, a reflexão sobre se à sociedade portuguesa vale ou
não a pena pôr para aquela finalidade centenas de milhões de contos no horizonte dos próximos anos.
Em valores calculados em 1989, só o paredão em si tem um significado da ordem dos 60 milhões de contos e o conjunto de obras associadas ao emprendimento andaria, por valores de hoje, em perto dos 200 milhões de contos.
São, de facto, expressões com uma série de zeros, que valerá a pena ter em conta. Teremos, naturalmente, que ponderar se esses milhões deverão ser afectados a esta finalidade ou se haverá outras finalidades em Portugal que
possam, também, ter de ser tidas em conta para que as
opções sejam tomadas a bem de todos nós.
Em relação àquilo que disse o Sr. Deputado Luís Roque, que, creio, não está agora presente na Sala, mas que colocou uma pergunta pertinente — e certamente a resposta ser-lhe-á transmitida —, devo dizer que a barragem da Apertadura está em construção, em ritmo normal, e tem uma dotação de 370 000 contos prevista no Orçamento para 1990.
A barragem da Apertadura sofreu da crise que se viveu na construção civil —e não só!...— nos anos de 1983, 1984 e 1985, crise essa que levou algumas empresas a atravessarem períodos difíceis e, até, a irem à falência (foi o que aconteceu com o empreiteiro da barragem da Apertadura).
Teve, por isso, de abrir-se novo concurso, cujas regras têm de ser respeitadas, traduzindo -se em meses o tempo que decorre da avaliação das propostas até nova adjudicação da obra. Foi assim que aconteceu, tendo a obra entrado em empreitada novamente há cerca de dois anos; está a decorrer em bom ritmo e prevê-se que dentro de dois anos esteja concluída.
Em relação à barragem do Pisão, trata-se de um assunto que tem a ver com as prioridades da própria EDP. Como é sabido, esta empresa tem um certo número de atribuições que lhe foram cometidas pelo seu próprio estatuto e que têm, naturalmente, prioridades que só a ela dizem respeito no que concerne à construção de aproveitamentos hidroeléctricos.
O Pisão não está na primeira linha das suas prioridades e, portanto, não sendo para essa finalidade, para outras, que seriam as de carácter hidroagrícola, o empreendimento não se tomaria grandemente rentável. Desta forma, o Pisão será um assunto em estudo como muitos outros, mas não será certamente barragem nos próximos meses, nem antevejo que num espaço de poucos anos.
Em relação à barragem do Caia, permito-me não concordar com os números que o Sr. Deputado tinha referido de manhã, quando diz que não chega aos 20 % o seu aproveitamento...
O Sr. Luís Roque (PCP): — Foram números avançados pela Associação de Hidráulica Agrícola.
O Orador: — Isso não existe. Há, sim, uma Direcção--Geral de Engenharia e Hidráulica Agrícola.
O Sr. Luís Roque (PCP): — É uma associação hídrica particular, que realizou o painel «Caia/1988», em que estive presente, e onde foram debitados esses números e foi feita a comparação entre os aproveitamentos do lado de cá e do lado de lá, em Espanha. Os números são completamente vergonhosos para nós!...
Eu conheço a situação porque resido em Elvas e conheço muito bem o perímetro do Caia. Aliás, se V. Ex." quiser, faço consigo uma visita guiada, Sr. Secretário de Estado.
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O Orador: — Sr. Deputado, agradeço bastante o seu convite, mas já lá estive noutras ocasiões. No entanto, admito que possa ter bastantes vantagens em fazer essa visita consigo. Aproveitarei o convite para depois acordarmos uma data, mas, de momento, o que lhe posso adiantar em relação a isso é que não é verdade que o seu
aproveitamento esteja abaixo dos 20%, pese embora o
facto dc alguma associação, suponho que de beneficiários
do perímetro de rega, poder eventualmente ter feito essa
referência em público, nesse encontro.
Conheço as conclusões desse painel sobre o Caia, em que serviços da Administração Central que me estão confiados participaram. Todavia, não foi essa a conclusão a que chegámos pelos números que temos, embora saiba que, muitas vezes, quando se discute o preço da água, quando se discutem as contas das associações de beneficiários, há, por vezes, nos interesses em disputa, números que não foram encontrados por razões que certamente compreenderá!... Mas sobre isso não valerá a pena entrar aqui em detalhe!
Devo dizer-lhe, ainda em relação ao Alentejo — já que fez essa referência e a sua pergunta da manhã também suscitava isso—, que tenho pena —e penso que os Alentejanos ainda têm mais razões do que eu para ter pena porque o sentem directamente, enquanto eu o sinto, apenas, como responsável político— que, embora o Alentejo seja um país de lagos, um país de água abundante, de água não aproveitada, globalmente, cerca de metade da sua água disponível não é aproveitada. Naturalmente, a primeira resposta a isso cabe aos Alentejanos, organizando empresas, dinamizando as existentes e fazendo com que a água disponível dentro desses reservatórios gere desenvolvimento, gere emprego e gere riqueza nessas áreas.
O Governo está disponível para isso e naturalmente que o Srs. Deputados e todos os interessados na região estarão também; temos é de dar, em conjunto, esses passos.
Em relação àquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Mendes Costa, estamos novamente numa leitura perversa dos números, pois referiu, a dado momento, que de uma dotação de 1 600 000 contos para a península de Setúbal em 1989, passava-se para 350 000 em 1990. Bem, eu posso fazer uma leitura totalmente inversa e dou-lhe alguns exemplos: a Direcçâo-Geral da Qualidade do Ambiente, que investiu zero contos em 1989 na região de Setúbal, passa a ler uma dotação de 126000 contos para 1990; o Serviço Nacional de Parques, que investiu 190 000 contos em 1989, passa para 353 000 contos em 1990.
Estamos, assim, perante agregações que, pelo facto de serem feitas com itens não comparáveis, levam, naturalmente, a conclusões não coincidentes.
Em conclusão, o que é facto é que a operação integrada da península de Setúbal vai aumentar o investimento do Estado na área, o qual vai, por sua vez, ter um efeito multiplicador, porque vai chamar a atenção do grande investimento das próprias autarquias, que vai ser afecto a essas finalidades, particularmente em contratos programa, e, por outro lado, vai chamar fundos comunitários que, quer como contrapartida do Orçamento do Estado quer como contrapartida do investimento municipal, vão também ser canalizados para aquela área.
Em termos dc ambiente, pela nossa parte, devo dizer--üte que, na semana passada, decorreu no Barreiro um encontro sobre a Lei do Ambiente, em que foi claramente frizado o aumento do investimento que existe, porque uma
das apostas em Setúbal é, de facto, a qualidade de vida. Trata-se de uma zona que tem as praias, tem a proximidade dos grandes centros, tem uma auto-estrada, está próximo do aeroporto e tem, ainda, bons pinhais, parques naturais e bonitos estuários. Mas faltam-lhe, contudo, estações de tratamento de resíduos, de esgotos, captações de água em condições, arranjos das praias da Fonte da Telha, da Arrábida e de muitas outras coisas. Tudo isso, naturalmente, motiva investimento e esse investimento
será feito, em 1990, em montantes superiores a 1989.
No entanto, da leitura, por vezes, de algumas agregações feitas, chegamos a conclusões que não são necessariamente coincidentes, mas, em detalhe, poderemos, depois — como, de resto, há pouco fazíamos—, acertar alguns pormenores em relação à leitura dessas dotações.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira levantou a questão da ET AR de Coimbra. Sobre isso, devo dizer-lhe que, a página 241 do Diário da Assembleia da República, de 18 de Outubro, está inscrita a ET AR de Coimbra com uma designação que não é facilmente perceptível: é quando se fala da qualidade da água no Baixo Mondego. Obviamente que, fazendo a ETAR de Coimbra, melhora-se a qualidade da água. Para esse efeito, inscreveram-se lá 390000 contos, que estão, naturalmente, previstos para suportar metade do encargo.
A ETAR foi adjudicada há dias, conforme é do conhecimento público, e vai entrar em obra dentro de poucas semanas. De resto, devo ainda dizer-lhe que parte da obra, sobretudo no que toca ao equipamento electromecánico e outro, até já está feita. A obra de construção civil vai arrancar dentro de dias e dentro de ano e meio, naturalmente, a ETAR de Coimbra estará pronta e todo o canal do Mondego, particularmente em direcção a Montemor, terá uma qualidade de água que não tem hoje.
Quanto à questão, que referiu, do Campo de Tiro de Alcochete, devo também dizer-lhe que é uma matéria que tem sido, ao nível do Govemo, acompanhada em particular pelo Sr. Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa, dado que se trata de um assunto de âmbito militar. Mas, tanto quanto sei, está programado que ele estará presente nesta Comissão na próxima segunda-feira. Por isso, mais em detalhe poderá informar a Comissão a esse respeito.
Quanto ao que disse o Sr. Deputado Gilberto Madail, eu comungo das suas preocupações em relação à ria de Aveiro, que só podem ser iguais mas nunca superiores. E devo dizer, também em relação a isso, que temos investido muito nessa área. Eslá em marcha um conjunto de obras que têm a ver com o abastecimento de água à região de Aveiro, a todo o Baixo Vouga, a partir do Carvoeiro.
Na ria de Aveiro tem de se resolver, naturalmente, o problema da despoluição. Isso passa por ter todo o novo sistema de fornecimento de águas (que é este) e, por outro lado, passa também por investimentos de dois tipos: uns que têm a ver com as autarquias e outros, com as próprias empresas.
Com efeito, não se pode obrigar o bolso dos contribuintes a suportar encargos que as empresas não suportaram ou não querem suportar. De maneira que temos de criar mecanismos que possam jogar com a «cenoura e com o pau» a cada momento.
Em relação à «cenoura», já há o PEDDIP e todo um conjunto de incentivos, em particular o ENV1REG, que foi aprovado em colégio de comissários da semana passada e noticiado em Bruxelas e que vai, no fundo, ser
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uma «cenoura» aliciante para os nossos empresários, que criam tanto emprego, tanta riqueza e tanta poluição.
Contudo, por outro lado, não faltará «o pau» adequado nas mãos de quem tiver de utilizá-lo, pois as multas que antes eram de 40 000$ passam a 12 SOO vezes mais, isto é, até ao montante máximo de 500 000$, conforme o Diário da República publicará dentro de dias e o Governo já aprovou. E não excluo a possibilidade de fazer com que essa lei se aplique com eficácia e até de forma exemplar aos industriais da região de Aveiro, que tanta experiência têm em poluição e que, certamente, também poderão vir a ter em despoluição.
Desta maneira, o investimento público não está descurado. Nós criámos há algum tempo um gabinete para a ria de Aveiro, que abrange um conjunto de municípios e que está a estudar soluções técnicas adequadas para resolver o problema.
Confesso que, há dois anos atrás, quando comecei a estudar o assunto, toda a gente falava da ria de Aveiro, mas ninguém era capaz de apontar uma solução técnica, lógica e fundamentada que estivesse, no mínimo, na fase de anteprojecto ou quase em projecto. Todas as câmaras municipais falavam no assunto e as empresas também, mas estavam à espera de alguém que «passasse cheques avulso» ou que «entregasse projectos avulso».
Esta é uma leitura talvez radical do problema, mas o que é facto é que nós, nestes últimos dois anos, temos tentado, com o apoio quer das empresas quer das autarquias, levar por diante as investigações que faltavam ser feitas em relação ao problema.
Neste momento, criou-se, como sabe, uma associação de municípios para a ria de Aveiro, dado que os problemas não podem ser resolvidos num só concelho, sem se ter em conta os concelhos do lado, e soluções do ponto de vista técnico podem ser mais funcionais se forem feitas em conjunto, sendo até mais eficazes e mais baratas, agora sob o ponto de vista económico, se feitas em articulação.
É, pois, isto que estamos a fazer. Há uma equipa técnica que está a trabalhar em full time há dois anos na ria e que, neste momento, tem praticamente concluído tudo aquilo que eram estudos prévios, havendo também um elenco de projectos que já está na manga vão agora começar a ser executados com investimentos de empresas, de autarquias e com o «cheiro multiplicador» que o dinheiro do Estado tem de ter nessas e noutras ocasiões.
Para este efeito, temos dotações globais em contratos programa que estão inscritos no Orçamento do Estado e que também irão para a ria de Aveiro. Porém, não incluímos Estarreja, Águeda, Murtosa e Ovar, em particular porque as soluções ainda não estão em definitivo concretizadas, mas está lá, digamos, em dotação redonda, uma fatia que prevê, de facto, essa ajuda, logo que os projectos estejam reunidos e em boas condições. Alguns deles, contudo, já estão em vias de avançar e até já correm as intenções nos pedidos ao FEDER.
Sendo breve, tanto quanto me chamam a atenção, devo dizer ao Sr. Deputado André Martins, que a respeito de ambiente tem sempre boas e oportunas questões a colocar, que, em relação à Lei de Bases do Ambiente —e acabei de prometer-lhe isso há pouco—, vou enviar-lhe uma listagem dos diplomas que o Governo fez nos últimos tempos a esse respeito.
Quanto à referência que o Sr. Deputado fez sobre a falta de regulamentação da Lei de Bases do Ambiente, à excepção do ruído, peço-lhe que pondere as fontes de
informação, pois vou enviar-lhe uma listagem completa dos diplomas que foram publicados por este Governo sobre essa matéria e que são cerca de 60 decretos-leis e decretos regulamentares, para além de várias portarias que também regulamentam alguns aspectos da Lei de Bases do Ambiente.
Devo dizer-lhe, ainda, que o exemplo que deu do ruído nem sequer serve para o efeito. É que o Regulamento sobre o Ruído foi aprovado antes de publicada a Lei de Bases do Ambiente. Portanto, nem sequer pode fazer alusão de que uma é já regulamentação da outra.
Sobre alguns outros aspectos há diplomas que, embora ainda não estejam publicados, já estão aprovados, como sejam os referentes ao capítulo da água, que foram objecto de aprovação pelo Governo há três ou quatro semanas.
Devo, por fim, dizer-lhe que falta regulamentar os capítulos do ar e dos impactes ambientais, coisa que acontecerá nas próximas semanas.
Em relação ao resto, globalmente, penso que está feito e vou ler ocasião de mandar-lhe, ainda hoje ou segunda--feira, uma listagem desse material publicado recentemente.
Também, em relação ao que disse sobre a falta de meios das empresas para promoverem acções de despoluição, devo dizer-lhe que fico muito «preocupado» com essa sua «preocupação». O que as empresas têm de fazer é resolver o problema rapidamente e deixarem de fazer o «choradinho» habitual, que nós conhecemos, por pensarem que os bons resultados são para a empresa e os maus resultados —que são a poluição— devem ser pagos pelos contribuintes e que o dinheiro público é que tem de ser investido para evitar essa poluição. Eu não penso assim, pois acho que o dinheiro dos contribuintes deve ser utilizado em outras coisas.
Em relação ao Parque Natural da Peneda-Gerês comungo das suas preocupações. Estarei aí dentro de dias, visitando um certo número de aspectos que são da minha competência e responsabilidade.
Como poderá verificar, relativamente ao Orçamento de 1989 aumentei as dotações para esse Parque em cerca de 40 %. Fi-lo porque, nos próximos tempos, há, de facto, um certo número de investimentos que nele têm de ser feitos. No entanto, não se deduza que os incêndios que ocorreram no Parque da Peneda-Gerês ou que os outros problemas graves com que ele se debate são da única responsabilidade de quem tem a tutela da Secretaria de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais. O Ambiente gosta de apagar fogos — de preferência de apagar todos os fogos —, mas há fogos que ele não acende e que não pode, por si só, apagar. É o que se passa com o Gerês.
Ainda há pouco falámos da coordenação de meios que tem de ser feita nesse sentido, mas não é só dentro do Parque da Peneda-Gerês que temos de melhorar e de reforçar a coordenação de meios em relação a incêndios e a outras ocorrências que possam despontar.
No que se refere ao quadro de pessoal, penso que essa matéria não será do interesse dos outros Srs. Deputados. De resto, já falei consigo sobre isso e creio que ficámos esclarecidos.
O Sr. Deputado Casimiro Pereira não podia deixar de falar em Torres Novas, em Tomar e no rio Nabão. Tive o prazer de estar, há dias, na Câmara Municipal de Torres Novas, homologando um contrato programa com o seu sucessor autárquico, e penso que o início do processo de despoluição no Almonda já começou. Tudo aquilo que lá vi — e vi até mesmo tubos de PVC com pedras na ponta,
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para a água ser lançada mais fundo — vai desaparecer. São imagens que não devia ter visto e que não deverei voltar a ver nos próximos tempos, dado que a actual legislação e as previdências que se combinou levar a cabo não o permitirão.
A última preocupação do Sr. Deputado tem a ver com o abastecimento de água ao Alto Ribatejo, ou seja, aos sete municípios a norte do distrito de Santarém. Devo dizer-lhe que esse assunto está a ser tratado pelas autarquias. A EPAL, a Comissão de Coordenação de Lisboa e Vale do Tejo e a Direcção-Geral dos Recursos Naturais já enviaram a essas sete autarquias, há dias, uma proposta de compromisso para lançar a obra. Para mim pode ser lançada já amanhã!
Devo dizer-lhe que tudo será feito sem o nosso dinheiro— nosso, enquanto contribuintes. O empreendimento será pago pela EPAL, através das tarifas que cobra aos consumidores de água, e pelo FEDER, através do fundo autárquico. Só eventualmente, caso se venha a julgar necessário, será dado um pequeno «cheiro» por parte do Estado.
Vou, no entanto, aliviar o Orçamento do Estado dessa matéria, pois penso haver outras fontes monetárias, que não o dinheiro dos contribuintes, capazes de levarem a água a esses concelhos.
A Sr.* Presidente: — Muito obrigada, Sr. Secretário de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, por ter procurado ser tão rápido.
Estou francamente preocupada com o tempo e queria pôr o seguinte problema aos Srs. Deputados: o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, como sabem, já sc encontra na Assembleia da República desde as 15 horas c informou que às 17 horas terá de sair para ir esperar o Sr. Presidente da República ao aeroporto.
Por sua vez, o Sr. Ministro da Justiça, cuja audição estava prevista a partir das 17 horas, fez-mc saber que tem compromissos a partir das 18 horas.
No entanto, há ainda cinco Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos, ao que se seguirão as respostas dos Srs. Secretários de Estado.
Peço, pois, que façam o favor de serem o mais sintéticos possível.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira pede a palavra para que efeito?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr." Presidente, para dizer que, face aos condicionalismos apontados e apesar disto não significar o meu acordo relativamente a algumas das questões que foram aqui colocadas, quer pelo Sr. Secretário de Estado da Administração Local, quer peia Sr.' Secretária de Estado do Planeamento, prescindo do uso da palavra.
A Sr.' Presidente:—Obrigada, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.° Deputada Lourdes Hespanhol, a quem peço que seja muito breve.
A Sr.» Lourdes Hespanhol (PCP): — Vou apenas fazer uma pergunta que há pouco esqueci c que tem a ver com a estação de tratamento de esgotos de Figueira de Cavaleiros, no concelho de Ferreira do Alentejo.
Gostaria de saber. Sr. Secretário de Estado, se já está ou não desbloqueada a questão do terreno para essa estação de tratamento, pois não faz sentido que tal ocorra
dado tratar-se de um terreno do Estado e estar tudo previsto para que a obra arranque. Queria, pois, que me fizesse o ponto da situação.
Embora tivesse outros assuntos a apresentar prescindo deles e limito-me a esta pergunta, em virtude da falta de tempo.
A Sr.* Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.
O Sr. António Barreto (PS): — Em primeiro lugar, parece-me que nestes debates há que haver conclusões de parte a parte.
Quero deixar bem claro que não aceito nem partilho a ideia do Sr. Secretário de Estado sobre o salto espectacular da ciência. Houve, realmente, um salto, mas esse salto foi travado, sobretudo este ano, tanto institucionalmente como financeiramente, e o que eu disse sobre o cálculo do PIB não foi refutado por ninguém. De facto, a Secretaria de Estado da Ciência utiliza um número do PIB que não é o número do Governo.
Em segundo lugar, o parecer do Conselho Superior da Ciência —se foi ouvido— devia ser público e encontrar-se anexado ao planeamento. É para isso que os pareceres destes organismos — Conselho Superior da Ciência, Conselho Nacional de Educação e Conselho Nacional do Plano — existem.
Em terceiro lugar, noto que não fui desmenudo nem respondido sobre os dois únicos aspectos relativamente aos quais fiz perguntas formais, ou seja, as novas bolsas de pós-graduação no estrangeiro e os descongelamentos
para a ciência e investigação tecnológica.
Em quarto lugar, não quero esmorecer o entusiasmo e a competência da Sr.* Secretária de Estado do Planeamento. Aceito que, dos planos apoiados pelos fundos estruturais da Europa, alguns sejam de grande importância para o País. Não tenho qualquer dúvida sobre isso! Quero, no entanto, acrescentar que alguns desses planos levantam as maiores dúvidas, senão mesmo objecções flagrantes, sejam eles decididos por Portugal sejam eles decididos pela CEE. E vou dar-lhe exemplos de planos que não correspondem à própria ideia que nos transmitiu aqui da contribuição para a transformação das estruturas nacionais. O PRODIATEC, financiado pela Comunidade Económica Europeia, prevê para o programa «Os Castelos em Portugal» 25 000 contos, para o programa «Os Solares em Portugal» 25 000 contos e para o programa «As Igrejas em Portugal» também 25 000 contos. A preços correntes, Sr.* Secretária de Estado, um telhado custa mais ou menos isto... ou três relvados!
Temos, pois, de equilibrar o entusiasmo dos grandes projectos com alguns objectivos, que às vezes são ambíguos, como foi o caso —a meu ver, que estou a fazer uma dedução política — do desvio de fundos portugueses para o Centro Cultural de Belém. Como este Centro não teve o financiamento da CEE, foi pôr-se a CEE a financiar essa «missanga» patrimonial c a dar 25 000 contos para uns milhares de igrejas, castelos e solares.
Finalmente, para terminar, Sr.* Secretária de Estado, percebo que estamos cm fase de negociação!... Não posso senão acenar admirativamente ao seu esforço, à sua competência, ao seu entusiasmo de negociar. Claro que, antes de se negociar, não sc pode dizer que é definitivo e vir já aqui indicado.
O que eu quis dizer foi que estas coisas, pelo menos no Parlamento, têm de ser devidamente identificadas. Há
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que indicar o que está negociado, o que está assegurado e o que o não está. Nos casos do PRODEP e da ciência, que são os mais flagrante, nada do que foi negociado é ainda moeda sólida!... Está tudo ainda em negociação!... Foi isso o que eu quis dizer!...
O que acontece, Sr.* Secretária de Estado, é que este é um problema político. E é-o por ser importante saber, por um lado, quem é que decide o quê, isto é, se a decisão provém de um órgão eleito, se de um órgão nomeado ou se de um órgão técnico e, por outro lado, se tem origem num órgão nacional ou num órgão europeu.
Ora, tanto eu como o meu grupo parlamentar — e isto é estritamente político e diz respeito ao conjunto da política governamental —, consideramos que o Governo Português, cm matéria de decisão sobre estes grandes programas, está a contribuir actualmente para o défice democrático da Comunidade Económica Europeia, dado que os órgãos eleitos, os órgãos nomeados, os órgãos técnicos e os órgãos sem controlo parlamentar estão, lentamente, a sobrepor-se aos órgãos políticos, aos órgãos representativos e aos órgãos com controlo parlamentar ou com controlo da população, isto é, aos órgãos com poder soberano e com origem no sufrágio.
Este é um grande problema e lembro, a propósito, que o Sr. Ministro da Educação prometeu vir trazer a esta Assembleia o PRODEP, não o fez durante dois anos e veio aqui dizer-nos, anteontem, ao contrário do que hoje nos diz a Sr.' Secretária de Estado, que o PRODEP nem sequer tinha sido aprovado em Conselho de Ministros. Disse-o e está nas actas!
O problema é, portanto, político, e não processual ou técnico. É um problema estritamente político!
A Sr.* Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.
O Sr. Luís Roque (PCP): — Sr.* Presidente, vou tentar também ser o mais rápido possível.
Quero apenas desculpar-me por não ter assistido às respostas que os Srs. Membros do Governo quiseram dar aos pedidos de esclarecimento que fiz. Tive, realmente, de me ausentar para comparecer a uma audiência marcada muito antes da calendarização da presença do Governo nesta Comissão e à qual me era totalmente impossível faltar.
De qualquer modo, peço desculpa
A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado Jorge Pereira, tem a palavra para pedir esclarecimentos. Peço-lhe que seja também sintético.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): — Pretendo apenas fazer uma brevíssima justificação à proposta de aditamento que apresentei aos artigos 42.° e 42.°-A e ao mapa vi. Não é, portanto, em sede do artigo 45.°
A Sr.* Presidente: — O Sr. Deputado pretende obter respostas, sobre essa matéria dos membros do Governo?
O Orador: — Pretendia pelo menos, Sr.* Presidente, justificar a proposta de aditamento c pedir algum empenhamento do Governo relativamente a esta matéria.
A Sr.' Presidente: — Como sabe, Sr. Deputado, no próximo dia 4 de Dezembro vamos discutir essas propostas.
O Orador: — Se a Sr.' Presidente achar que é conveniente para o bom andamento dos trabalhos, poderei deixar a pergunta para essa altura.
O meu pedido de intervenção centra-se, essencialmente, num pedido ao Governo, por intermédio do Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, Nunes Liberato, para prestar o máximo de atenção às propostas referidas, uma vez que elas decorrem do cumprimento do Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira e têm implicações orçamentais que deverão ser aqui consagradas.
Posso continuar a minha explanação, Sr.* Presidente?
A Sr.' Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Orador:—Em primeiro lugar, constata-se que da aplicação dos critérios definidos no artigo 10.° da Lei n.° 1/87 e no artigo 26.°, no que diz respeito às disposições transitórias, que a capitação que o Fundo de Equilíbrio Financeiro reserva para a Região Autónoma da Madeira é consideravelmente inferior à da média nacional.
Dadas as características da própria região autónoma, a diferença, a registar-se, justificar-se-ia que fosse para mais e não para menos.
O Programa de Reequilíbrio Financeiro da Madeira diz que o Governo, em próxima revisão da Lei das Finanças Locais, mediante proposta de lei — e é isto que cu quero sublinhar —ou no uso de autorização legislativa, procurará aproximar a capitação da Região Autónoma da Madeira da média nacional.
Ora, uma vez que o artigo 41.° da Lei do Orçamento consagra já uma revisão para além das finanças locais, como é sabido, pretendemos que o Governo reveja o montante global do Fundo de Equilíbrio Financeiro, de maneira a cumprir esta quinta medida do Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira.
Era isto, fundamentalmente, o que pretendia dizer.
A Sr.' Presidente: — Para dar esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Em relação à conclusão que o Sr. Deputado António Barreto tirou desta troca de impressões diria que mantenho ter havido crescimento e que a situação é significativamente diferente daquela que existia em 1985.
Evidentemente que há taxas de crescimento maiores e menores, que há acelerações e desacelerações!... A verdade, porém, é que nos encontramos hoje num patamar muito superior àquele em que nos encontrávamos há uns anos atrás e que mantemos o objectivo de elevar as despesas da ciência e tecnologia para os níveis que o Sr. Pri-meiro-Ministro, em determinado momento, apontou.
Quanto ao parecer do Conselho Superior da Ciência e Tecnologia, existindo, também não vejo por que motivo a Secretaria de Estado respectiva não o juntou ao Orçamento ou não deu conhecimento do seu conteúdo.
O Sr. Deputado Luís Roque interrogou-me, há pouco, sobre dois quartéis de bombeiros, o de Avis e o de Monforte. Devo dizer-lhe que conheço bem o caso do quartel de bombeiros de Avis, dado o Sr. Deputado já ter tido a ocasião de o descrever, o que já não ocorre relativamente ao de Monforte, que não tenho de cor. Posso assegurar-lhe, no entanto, que o programa dos quartéis de
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bombeiros continua a ser financiado. Só que, até agora não foi ainda possível financiar esses dois empreendimentos. Tão logo seja possível eles entrarão no PIDDAC.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Jorge Pereira, não estou em condições, como Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, de me pronunciar sobre a questão que aqui colocou, a qual necessitará, certamente, de uma concertação com o Sr. Ministro das Finanças. Posso, no entanto, adiantar-lhe que os critérios que foram utilizados na proposta do Governo são os que se encontram previstos na Lei das Finanças Locais.
A Sr/ Presidente: — Tem a palavra a Sr.1 Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.1 Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional:—Propunha-me responder, muito brevemente, a duas questões pontuais e remeter as questões de fundo, embora esteja disponível para discuti-las neste momento, que carecem de uma resposta muito mais elaborada, nomeadamente as relacionadas com a forma de condução política das questões relativas à Comunidade Económica Europeia, para discussão no dia 12 na Comissão de Integração Europeia onde vamos apresentar as negociações e fazer um ponto da situação mais detalhado de todos os programas. De qualquer forma, estou disponível para fazer essa discussão neste momento, embora pense que a oportunidade que referi será a melhor.
Relativamente ao problema das bolsas, Sr. Deputado António Barreto, a informação que temos é a de que foram concedidas 80 novas bolsas para países estrangeiros, mas este número tem de ser visto tendo em conta a estratégia actual que o Governo segue, que é a de privilegiar, fundamentalmente, as bolsas para doulouramentos feitos no País.
A situação tem evoluído; nós, hoje em dia, temos no país uma capacidade muitíssimo maior do que a que tínhamos há alguns anos para poder dar esse tipo de apoios e a JNIC tem privilegiado esta vertente de actuação a nível nacional. Portanto, temos, como já disse, capacidade e não é preciso ir estudar para o estrangeiro, ou melhor, não são só as bolsas no estrangeiro que reflectem uma determinada atitude do Governo perante a necessidade de conceder bolsas de estudo.
Relativamente ao descongelamento, devo dizer que não houve nenhum.
Quanto ao PRODIATEC, e embora queira retomar esta questão noutra oportunidade, porque é uma questão técnica, queria dizer-lhe que não tem nada a ver com o Centro Cultural de Belém nem com o desvio de verbas que referiu. Não houve qualquer desvio de verbas! E mais: as verbas que o Sr. Deputado referiu —neste momento não as tenho aqui presentes, mas se as referiu é porque constam do Orçamento — significam uma contrapartida interna, são programas abertos aos quais acrescerão as verbas da Comunidade Económica Europeia. Portanto, isso não pode ser visto dessa maneira! Sr. Deputado, tenho muito gosto em fomecer-lhe o exacto valor da intervenção do Estado Português no âmbito do PRODIATEC.
O Sr. António Barreto (PS):—Dos 25 000 contos, 8000 contos para o Estado Português e 17 000 contos para a CEE.
A Oradora: —Sr. Deputado, tenho de consultar esses valores. Neste momento não sei dizer-lhe exactamente quais os montantes, porém, se essa verba está inscrita no Orçamento, dir-lhe-ei que isso seria a contrapartida interna. Mas, já agora, pergunto-lhe: a verba de 17 000 contos que referiu vem inscrita no Orçamento do Estado?
O Sr. António Barreto (PS): — Sr.1 Secretaria de Estado, só posso citar o que tenho! Tenho um documento do Instituto Português do Património Cultural e da Secretaria de Estado da Cultura que tem ...
A Oradora: — Ah, é um documento que diz «PRODIATEC», não é o que consta do Orçamento do Estado!...
O Sr. António Barreto (PS): — Não, não, Sr.' Secretária de Estado! É um documento que traduz os números do Orçamento do Estado.
A Oradora: — Não conheço esse documento!
O Sr. António Barreto (PS): — No Orçamento do Estado para 1990 vem inscrita a verba de 25 000 contos, depois no documento da Secretaria de Estado da Cultura diz-se: «25 000 contos. Fontes de financiamento: 8000 contos do Orçamento do Estado; 17 000 contos da CEE.»
A Oradora: — Não conheço o orçamento da Cultura. Vou vê-lo e depois dar-lhe-ei a resposta com muito gosto.
A Sr.1 Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais perguntas dou por concluída a discussão, na especialidade, do orçamento da despesa do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, agradecendo a disponibilidade dos Srs. Secretários de Estado ao terem vindo de manhã e terem -se disposto a prolongar a audiência durante a parte da tarde e pedindo aos Srs. Deputados que fazem parte da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação o favor de virem para a Comissão de Economia, Finanças e Plano a fim de podermos analisar o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Pausa.
Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em primeiro lugar, peço-lhe desculpa por o ter feito esperar mais de duas horas, mas estes debates têm-se prolongado para além do previsível e, por outro lado, pergunto-lhe se deseja ou não fazer uma intervenção inicial.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (João de Deus Pinheiro): — Sr.1 Presidente, não pretendo fazer uma intervenção inicial.
A Sr.1 Presidente: — Assim sendo, aceito inscrições para serem formuladas perguntas ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Ribeiro.
O Sr. Sérgio Ribeiro (PCP): — Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Srs. Secretários de Estado: I>a análise do orçamento relativo ao Ministério dos Negócios Estrangeiros surgiram-me algumas dúvidas que, talvez por deformação profissional, mas, neste caso, adequada, terão uma quantificação que, eventualmente, irá incomodar os meus colegas.
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Quando analiso este orçamento, particularmente no que respeita às remunerações certas e permanentes encontro uma situação que, em confronto com a do ano anterior, parece-me um pouco estranha: é que a verba para as remunerações certas e permanentes do Ministério para este ano é menor do que aquela que consta do Orçamento do Estado para 1989 corrigido. Esta situação, ou seja, o facto de haver uma diminuição de verba parece-me, pois, estranha.
Nos abonos variáveis ou eventuais, particularmente a conta 01.02.05 «Outros abonos em numerário ou espécie», que terão a ver com as residências de diplomatas, embaixadas e consulados, aparece uma verba três vezes superior à do pessoal dos quadros. No entanto, esta verba, confroniando -se com o que é a Conta e não o Orçamento, aparece sempre sobreavaliada, pelo que, sem qualquer processo de intenções, se poderá ter, pelo menos, a seguinte dúvida: se a partir de uma previsão tão elevada e, depois, de uma execução bastante menos vultuosa não haverá aqui a constituição de uma espécie de «saco» para
0 qual ficam uma série de verbas que terão aplicação por transferência que mais convenha.
Isto tem a ver com o facto de também aqui, neste Ministério, surgir como uma característica extremamente significativa o facto de um conjunto de verbas terem um peso enormíssimo e que, por não terem um destino muito claro e muito definido, podem servir para tudo. Refiro--me, por exemplo, à conta 02.03.10 «Outros serviços», que no total do Ministério tem cerca de 5 %. De facto, em algumas das subdivisões em que o Ministério se subdividide, esta classificação económica ainda aparece subdividida por «Alojamentos» e «Diversos», e algumas vezes com a expressão «Acções a concretizar por despacho ministerial». Como esta verba atinge cerca de
1 030 000 contos, ou seja, 5 % do Orçamento do Ministério, parece-me que carece de uma explicação.
Ainda uma última observação nesta primeira volta, digamos assim, de perguntas, e o Sr. Ministro desculpar--me-á a quantidade de números. Parece significativo que num ministério com um aumento de verbas da ordem dos 10,7%, depois quando vamos analisar os fundos autónomos que são tutelados por este Ministério como, por exemplo, o Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas e o Instituto para a Cooperação Económica, que têm a ver com áreas importantíssimas, verificamos que, nestes casos, os acréscimos de transferências são pequeníssimos, são praticamente irrisórios: no primeiro caso tem-se um acréscimo nominal de 8 % e no segundo caso de 3,6 %. Ora, estes acréscimos nominais estão muito abaixo daquilo que é a inflação esperada, donde resulta haver uma dotação inferior àquela que é a do Orçamento do ano anterior.
Estas são algumas das dúvidas, que resultaram da leitura do orçamento do seu Ministério, em relação às quais gostaria que o Sr. Ministro me esclarecesse.
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.
O Sr. Caio Roque (PS): — Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, em primeiro lugar gostaria de saber se o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas vai ou não estar presente nesta audição.
Na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação V. Ex.' prometeu que nos daria uma informação das despesas, nomeadamente relativas ao
Conselho das Comunidades Portuguesas, e que as faria chegar no próprio dia: porém, até hoje, ainda não chegaram, e nós continuamos à espera.
Gostaria de fazer aqui algumas considerações sobre o orçamento do seu Ministério. Comparando as verbas com as de orçamentos anteriores, verificamos que elas sobem muito pouco, nomeadamente as do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas e do Instituto para a Cooperação Económica, tal como disse o Sr. Deputado do PCP. De facto, há um aumento de 8 % no primeiro caso, que se traduz num aumento de apenas 84 140 contos, e no segundo caso um aumento de 50 000 contos, ou seja, 3,6 %.
Comparando estes valores com os dos gabinetes dos membros do Governo verifica-se o seguinte: os gabinetes de membros do Governo têm um aumento de 705 000 contos, os serviços diplomáticos e consulares têm um aumento de 1 035 000 contos e os encargos comuns das relações externas têm um aumento de 260 000 contos. Gostaria, pois, que o Sr. Ministro nos explicasse e esclarecesse quais foram os critérios para estes aumentos, por um lado tão grandes nos gabinetes dos membros do Governo e serviços diplomáticos e consulares e de um aumento tão pequeno para os Institutos de Apoio à Emigração c Comunidades Portuguesas e para a Cooperação Económica.
A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.
O Sr. Mota Torres (PS): — Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, já tive a oportunidade de, numa reunião da Comissão de Negócios Estrangeiros. Comunidades Portuguesas e Cooperação, dirigir-lhe uma pergunta relacionada com os seis meses da presidência do Conselho da Europa, de que Portugal é, neste momento, titular, com a perspectiva que o Governo tem da importância da sua participação enquanto país presidente deste organismo e com a sua tradução em termos orçamentais.
Na altura, o Sr. Ministro respondeu-me dizendo que o que estava previsto em lermos orçamentais era a importância de 20000 contos, se não estou em erro, o que, tanto quanto julgo saber, não chega para cobrir as despesas previstas para que este período da presidência portuguesa seja, de facto, um período aúreo em termos da política externa portuguesa junto do Conselho da Europa.
Julgo, pois, que haveria a necessidade, e esta é a altura soberana para isso, de fazer uma dotação suplementar no Orçamento do Estado, tendo em vista o desenvolvimento de acções que permitissem uma maior divulgação de Portugal enquanto país presidente do Conselho da Europa.
Por outro lado, e este era um aspecto relacionado com a política externa ao nível do Conselho da Europa, gostaria que o Sr. Ministro, se pudesse, desenvolvesse com mais promenor acções e dotações orçamentais previstas para a protecção da língua e cultura portuguesas junto das comunidades portuguesas, mesmo ao nível da acção do Estado Português e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, junto dos países com os quais há acordos de cooperação, nomeadamente com os países africanos de expressão oficial portuguesa. Que acordos de cooperação técnica e cientifica estão previstos em termos de dotação orçamental no presente Orçamento? Em última análise, o que é que pensam o Governo e o Ministério dos Negócios Estrangeiros quanto à sua possibilidade de êxito face à dotação orçamental do Orçamento para 1990?
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O Sr. Presidente (Rui Machete): — Sr. Deputado Luís Geraldes, tem a palavra.
O Sr. Luís Geraldes (PSD): —Sr. Ministro, numa análise comparativa entre o Orçamento de 1989 e o que actualmente está em apreço verifica-se, obviamente, uma receita, um aumento que talvez não seja .... enfim, o que nós, como deputados, desejaríamos ver para o apoio às inúmeras comunidades que temos espalhadas pelo estrangeiro. Sucede, porém, que eu penso que algumas das despesas que anteriormente seriam atribuídas à Secretaria de Estado serão obviamente suportadas pelo Despacho n.° 12 do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que passará, de certa forma, a tutelar, a orientar ou a suportar e a administrar grande parte do Instituto de Apoio às Comunidades Portuguesas.
Se isso assim for, penso que é uma atitude nobre; de facto, ficarão disponíveis mais algumas verbas para as acções concretas de apoio às comunidades. Por outro lado, penso que seria interessante ser informado sobre verbas significativas, verbas extremamente importantes, que emanam de outros ministérios e que, obviamente, têm como objectivo o apoio às comunidades, como, por exemplo, do Ministério das Finanças, no que concerne à bonificação de juros em relação à taxa em vigor para os residentes e à bonificação que se verifica para os não residentes. Também em relação ao Ministério da Educação, e que não se reflecte no orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, existem verbas bastante significativas que são o apoio ao ensino no estrangeiro. Gostaria de saber se estas verbas poderão ser quantificáveis, a fim de, em conjunto, fazermos a análise apropriada no que respeita ao orçamento global da Secretaria de Estado das Comunidades, para o apoio às comunidades que temos espalhadas pelas cinco partidas do mundo.
O Sr. Presidente: — Sr.' Deputada Helena Torres Marques, tem a palavra.
A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Ministro, gostava de fazer-lhe uma pergunta que diz respeito ao Orçamento, mas não ao orçamento do seu Ministério. Só que, depois de ouvir os sucessivos ministros, me parece que teria de ter origem no seu Ministério qualquer acção que se viesse a fazer nesse domínio.
Tem a ver com o seguinte: a Europa sem fronteiras tem várias consequências; normalmente mede-se em termos de circulação de pessoas, de capitais, de livre estabelecimento em relação a empresas, mas há um aspecto que me parecia muito importante, pelos reflexos que tem para o desenvolvimento do País e sua tradução orçamental, e que diz respeito à utilização de determinadas infra-estruturas. O que verifico é que ainda continuamos a ver e a considerar que, cm termos de infra-estruturas, os investimentos têm como limite a fronteira do País, como se o país que está ao lado, neste caso a Espanha, não pertencesse à mesma área comum e como se não tivesse verificado a integração de Portugal na CEE e, sobretudo, se não tivesse existido o Acto Único.
O que desejo perguntar ao Sr. Ministro é se essas infra-estruturas não serão passíveis de negociação para também serem utilizadas por Portugal. Vou dar-lhe o exemplo de um caso concreto, que já coloquei, e cuja resposta vou dizer-lhe qual foi, e que leva a entender porque é que eu ponho o problema agora assim, Sr. Ministro.
Existe uma barragem em Espanha que fica perfeitamente na fronteira portuguesa, ou seja, é a barragem do Pomerão, na ribeira de Criança, que faz limite com Portugal. Nós estamos em Portugal a ver ali a barragem, só que não a pudemos utilizar até agora porque é espanhola. Entretanto, estão previstos, e até aprovados, financiamentos para se construir uma barragem do lado de cá, gastando-se as verbas correspondentes, quer do FEDER, quer da contrapartida nacional, quando parecia que era muito mais inteligente negociar com os espanhóis, pagando, como é óbvio, uma utilização da água existente na barragem. O que eu queria perguntar ao Sr. Ministro é se o seu Ministério está a analisar este problema, se isto é passível de ser negociado e, se assim é, se, depois, os orçamentos dos ministérios correspondentes poderão ter em linha de conta este aspecto que acabei de referir e, portanto, se se poderia fazer economias em investimentos portugueses que passariam a não ser feitos desta forma, passando só a ser feita a ligação dos investimentos espanhóis aos portugueses.
O Sr. Presidente: — Sr.* Deputada Edite Estrela, tem a palavra.
A Sr.' Edite Estrela (PS): — Sr. Ministro, peço desculpa de ter chegado atrasada. Vim aqui duas vezes e não tinha começado esta reunião, de modo que não tive oportunidade sequer de saber quais as perguntas que já tinham sido feitas. Vou tentar não repetir eventuais perguntas e também ser muito breve.
Como deve compreender, as minhas preocupações vão para a cooperação cultural. Estive a ver o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros e verifico que a verba atribuída ao sector cultural é muito escassa, é diminuta, Sr. Ministro, é quase ridícula. Gostaria de saber, porque tive bastante dificuldade em ler o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, já que nao tive acesso a documentos com mais discriminação de verbas, em que fossem indicados os programas que estão previstos e as verbas correspondentes. Por isso, não sei se, neste domínio, haverá em outro local, em outra rubrica, verbas que eu não consegui encontrar. A minha pergunta concreta consiste, pois, em saber quais as verbas destinadas à cooperação cultural, nomeadamente no que diz respeito à defesa e difusão do património cultural português, à abertura de novos centros culturais, saber se é desta vez que o centro cultural de Angola é aberto, se há outros centros culturais que vão ser abertos nos países africanos de língua oficial portuguesa e se estão previstas outras iniciativas tendentes à promoção da imagem cultural de Portugal no mundo.
O Sr Presidente: — Suponho que posso pedir ao Sr. Ministro para responder, querendo, às diversas questões que lhe foram postas.
Tem V. Ex-' a palavra.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (João de Deus Pinheiro): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, todos os anos temos falado um pouco na questão de determinadas verbas que existam ou não no nosso orçamento serem ou não suficientes para realizar um determinado número de acções e, designadamente — e vou citar três campos —, no campo da cooperação, no campo da língua e cultura e no campo das comunidades portuguesas.
Gostava de referir aquilo que já disse no ano passado, e que me parece fundamental: nós procurámos suprir uma
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permanente escassez de meios que teremos sempre, pelo menos no horizonte que se avizinha, para responder às solicitações que temos, procurando mobilizar a favor de alguns programas as chamadas verbas multilaterais. Foi um pouco nesse sentido que encetámos um esforço no sentido de termos uma maior participação nos organismos multilaterais, e é nesse sentido que se conseguiu, ao longo ao UiámO áffÓVaJtfê' Pdffíigái fosse efeito para o conselho
de administração do PNUD, que fosse eleito ontem ou anteotem para o conselho executivo da FAO, que se procurou criar em Lisboa um centro norte/sul, e, enfim, de uma maneira geral se procurou, ao nível da UNESCO, o apoio para alguns programas em cooperação com os cinco países de África de expressão portuguesa e com o Brasil para promoção da língua e da cultura portuguesas.
Julgo que isto não é despiciendo e é uma acção que tem muito mais significado em termos financeiros ou cm termos de recursos disponíveis de modo que possamos aproveitar os meios de que já dispomos e que são fundamentalmente os recursos humanos nacionais, isto é, as pessoas que, de algum modo, podem promover essas acções.
Tendo dito isto, começaria por responder à Sr.* Deputada Edite Estrela referindo que as verbas do sector cultural no Ministério, de facto, em termos comparativos, são diminutas, porque o Ministério dos Negócios Estrangeiros não deve ser, em qualquer circunstância, a entidade executora de acções do domínio cultural porque não tem o know-how necessário para o fazer. Portanto, esta verba que aqui está inseriu» é uma verba residual para acções derivadas de iniciativas essencialmente políticas ou de iniciativas de arranque de algumas instituições e que não se coadunam ou que não se enquadram nas actividades normais dos institutos ou das instituições que têm por missão promover na prática essa acção cultural.
Citou-me o caso dos centros culturais. Os centros culturais são um caso típico em que o formato pode ser profundamente diferente, e será certamente diferente um centro cultural feito em Luanda de um centro cultural feito, por exemplo, na cidade da Praia ou em São Tomé.
Um centro cultural tem que ter por base algo que alimente esse centro cultural, não basta apenas ter o local onde estejam os livros, onde se passem os vídeos, etc. Em Luanda, pelo menos, não chega; tem que se dar um salto qualitativo e é preciso ter aqui, em Lisboa, uma ancoragem que garanta uma qualidade mínima nesse centro. Mas há uma questão ex ante, que consiste na obtenção, por exemplo, de certo tipo de infra-estruturas, de um certo tipo de meios ou de instrumentos para fazer essa acção. É para isso que muitas vezes existe esta verba disponível no Ministério dos Negócios Estrangeiros, para, digamos, pontualmente ou intersiicialmente, poder permitir estas missões. Há, por outro lado, um reforço significativo na Comissão Nacional da Uncsco, porque, essa sim, tem, em princípio, as potencialides e as características que lhe permitem dinamizar e realizar um conjunto de acções de uma forma relativamente autónoma, conquanto integrada numa política geral. É por isso que o orçamento da Comissão Nacional da UNESCO mais que duplica para 1990.
A promoção da imagem de Portugal no mundo, como sabem, conta pricipalmente com verbas afectas ao Ministério do Comércio e Turismo, o que não signinifica que não haja, também aqui, uma participação do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como também do Ministério da Educação e da Secretaria de Estado da Cultura, no
sentido de potenciar, sempre que possível, toda a parte cultural, como é, por exemplo, o caso do Japão, onde isto tem sido feito com algum êxito.
A Sr.* Deputada Helena Torres Marques fala-me da cooperação, nomeadamente com Espanha. Devo dizer-lhe que temos tido sempre uma preocupação sistemática de conseguir uma boa relação e um bom diálogo com Espanha, e até agora, penso eu, com resultados bastante positivos.
Assim, julgo que não há razão alguma para que qualquer tipo de negociação, especialmente esta de tipo transfronteiriço, não venha a ter lugar, desde o momento em que os departamentos respectivos indiquem, ou, pelo menos, indiciem ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a utilidade da discussão.
Existem algumas infra-estruturas que são comuns e que têm sido negociadas entre Portugal e Espanha. Refiro-me, concretamente, às áreas rodoviária e ferroviária, estando agora em curso, como sabem, as negociações na área da energia e do gás. Aliás, um dos temas que, nos próximos dias 7 e 8, estará em discussão em Estrasburgo refere-se ao princípio da aceitação ou não aceitação das chamadas grandes redes europeias, designadamente as redes ferroviárias, rodoviárias, de telecomunicações e de energia. A ser aceite esse princípio, e se for conjugado com os princípios das periferias e das ultraperiferias, permitirá e justificará uma grande interacção entre Portugal e Espanha, porventura ainda acrescida, na medida em que implicará uma aceleração desse projecto, neste momento considerado de médio prazo.
Sou partidário da posição que defende o chamado custo comparativo de projectos. Ou seja, penso que devemos saber qual é a utilização alternativa que poderemos dar à verba que, eventualmente, se vai gastar na barragem x e também se os benefícios que se colhem com a construção dessa barragem são maiores ou menores do que os que se obteriam com a utilização alternativa. Em meu entender, este é um princípio básico que a maior parte das pessoas aceitará e que eu lambem aceito. E não lhe poderei dizer mais do que isto.
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?
O Orador: — Com certeza, Sr.* Deputada.
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Sr. Ministro, em minha opinião — e já tive oportunidade de a expressar a outros membros do Governo—,o que é estranho em todo este processo é que se considere que porque é espanhol é como se não existisse.
Com efeito, a fronteira é ali, e nós, do lado de cá, estamos a ver a infra-estrutura do lado de lá, mas como já é Espanha, faz-se um investimento do lado de cá.
Assim, fico com a ideia de que, em primeiro lugar, teria de haver uma abertura negocial no sentido de se dizer que há infra-estruturas que podem ser utilizadas de forma comum, após o que os ministérios tratariam de substituir os projectos que já tivessem por projectos de utilização, uma vez que, obviamente, é muito mais barato fazer a utilização do projecto. Mas isto não acontece, porque se pensa que como é Espanha não é Portugal. Ora, ser Espanha ou ser Portugal agora é completamente indiferente, estamos na CEE, estamos no mercado único.
O Orador: — Sr.* Deputada, creio que a razão não é essa. O que acontece, e penso que a Sr.* Deputada tem
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conhecimento, é que a Espanha ainda não ratificou a Convenção do Conselho da Europa sobre as Águas, o que
Significa que, neste momento, essas águas fronteiriças não
lem um tratamento ou uma abordagem idêntica do lado
português e do lado espanhol. Por esta razão, em todas as negociações bilaterais em que participámos temos insistido e pressionado nesse sentido.
Por vezes, um outro aspecto que dificulta a negociação não está no lado português, mas no lado espanhol. E porquê? Porque, muitas das regiões fronteiriças espanholas dependem de governos autónomos, enquanto as portuguesas dependem do Governo central, e o Governo espanhol favorece tudo menos a negociação directa com os seus governos autónomos. E compreende-se porquê!...
Desta forma, a abordagem de alguns problemas transfronteiriços tem sido de tal maneira dificultada pelo lado espanhol que mesmo a negociação recentemente levada a cabo para a apresentação ao FEDER das propostas que estabelecem a margem de 15% para a delimitação dos programas transfronteiriços veio muito mais do lado espanhol do que do lado português. Do nosso lado havia uma grande abertura para essa abordagem.
O Sr. Deputado Luís Geraldes respondeu integralmente às questões que me colocou, o que não me surpreende, pois todos sabemos do conhecimento que ele tem das comunidades portuguesas. De facto, não sou capaz de fazer a quantificação, embora esta não seja difícil de fazer, especialmente se, considerando-se o orçamento para o Ministério da Educação, se somar, por exemplo, as verbas relativas aos serviços do ensino básico e secundário português no estrangeiro com as verbas do ICALP, já para não falar noutras.
O Sr. Deputado Mota Torres — peço desculpa por estar a responder do fim para o princípio, mas permite-me, entretanto, obter do meu colaborador a resposta às questões colocadas pelo Sr. Deputado Sérgio Ribeiro — questiona-me sobre a nossa presença no Conselho da Europa e se ela tem tradução em termos orçamentais.
Na verdade, tem mas muito pequena, por duas razões fundamentais: a primeira liga-se com o facto de uma grande parte destas despesas serem cobertas pelo próprio Conselho da Europa, isto é, as despesas da Presidência. A segunda, e num primeiro aspecto, que eu não gostaria de esconder aos Srs. Deputados, diz respeito ao facto de, neste momento, não ser possível prever, pelas razões internacionais que todos conhecemos, se será viável, se será possível, e muito menos, se será provável, a realização em Portugal, durante o 1." semestre, de uma reunião de alto nível.
Num segundo aspecto, visa saber o que é que quer dizer esse alto nfvel.
A ideia que, neste momento, existe ao nível do Bu-reau do Conselho da Europa e do Secretariado é a de que se alguns eventos o justificarem poderá convocar-se essa conferência. É evidente que se assim for, deixará de ser suportado por este orçamento ordinário para o Minsitério dos Negócios Estrangeiros e vai ter de recorrer a uma verba com alguma flexibilidade, a chamada verba de representação quer do Sr. Presidente quer do Sr. Primeiro--Ministro. Mas, de qualquer maneira, neste momento, é prematuro dizer-se alguma coisa sobre esta matéria.
A verba que aqui está consagrada destina-se às chamadas pequenas despesas que podem até estar associadas à nossa presidência. É o caso, por exemplo, das despesas com a eventual edição das capas ou dos blocos ou mesmo com a oferta de um pequeno beberete. Tratam-se de
pequenas coisas desse tipo, não das acções típicas inerentes à presidência como tal.
Quanto aos acordos de cooperação científica e
técnica, que o Sr. Deputado referiu, e muito bem, houve
uma orientação que já não é de agora — se bem me recordo —, já tem pelo menos dois ou até três anos, e que diz mais ou menos o seguinte: os acordos de cooperação científica e técnica, bem como os acordos culturais, fazem intervir os representantes dos diferentes departamentos, que fixam a quantificação dessas acções a suportar pelos respectivos departamentos.
Aliás, nessa altura eu desempenhava as funções de Ministro da Educação e Cultura e procurei desenvolver essa orientação de forma que os acordos de cooperação científica, técnica e cultural passassem a ter algum significado porque, muitas das vezes, assinavam-se os acordos e depois não havia verbas para concretizar as acções neles previstas. Agora não. Cada vez que essa comissão mista dos acordos reúne, identifica as acções, quantifica-as, identifica a entidade pagadora, ou a entidade que suporta as despesas, que as inscreve no respectivo orçamento e não no orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, a não ser que correspondam a certas viagens de acompanhamento de carácter diplomático.
Apresento as minhas desculpas ao Sr. Deputado Caio Roque, mas não fiquei com a ideia de que tinha prometido responder nesse próprio dia relativamente a um receio das comunidades portuguesas. Provavelmente, fi-lo e esqueci-me; disso me penitencio.
Quanto às questões que me coloca em relação ao orçamento para o Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas e para o Instituto de Cooperação Económica e, ainda, às verbas dos gabinetes dos membros do Governo, gostaria de dizer duas coisas: Em primeiro lugar, a verba do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas não cresce muito, de facto, mas pensamos que é imperioso reduzir os custos administrativos face ao custo das actividades. Pensamos que essa deve ser a primeira prioridade, antes mesmo de aumentar os orçamentos de uma forma linear, embora tenha um aumento praticamente igual à inflação. Estamos em crer que será possível fazer isso, ou seja, melhorar, meionalizar e, portanto, disponibilizar mais verbas.
Quanto aos orçamentos para o Instituto de Cooperação Económica, chamo a atenção que se trata de um conjunto: Instituto de Cooperação Económica mais Direcção -Geral de Cooperação, têm um aumento que se cifra em valores superiores aos da inflação, e isto porque enquanto o Instituto de Cooperação Económica é um instrumento colocado ao serviço da cooperação e visa dar apoio técnico na elaboração de acordos e em outras matérias, a Direcção -Geral de Cooperação é que é a entidade activa na promoção da cooperação no que diz respeito a bolsas, ao pagamento de missões e ao suporte de todo o tipo de actos entre cooperantes. Portanto, o orçamento desta é que aumenta acima da inflação.
Mas repito aquilo que disse há pouco: essencialmente, temos de procurar a canalização de verbas dos fora multilaterais ou das agencias multilaterais para, em parte, suportar este acréscimo da cooperação com Portugal.
Acrescentaria ainda outra coisa para não dizerem que estou a jogar à defesa.
O Sr. Caio Roque (PS): — E está!
O Orador: —Não estou, não!
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Srs. Deputados, julgo que esta realidade que acabei de referir é pertinente, mas já nao o vai ser para o próximo ano, por uma razão muito simples: como sabem, a maior parte dos organismos internacionais, e até a maior parte dos países, já fizeram a aprovação dos respectivos orçamentos para 1990. Alguns fizeram-no em Julho, outros em Agosto, ou mesmo em Setembro, em momento anterior à ocorrência das modificações sentidas a Leste. Portanto, no que diz respeito a 1990, o redireccionamento de verbas da zona sul para a zona leste não vai ser muito significativo; vai ter algum significado, mas não vai ainda sentir-se muito. Em 1991 não me restam quaisquer dúvidas de que esse redireccionamento irá fazer sentir uma rarefacção de apoios ao sul, particularmente na África e na América Latina, e, nessa altura sim, irá surgir uma grande multiplicação de pedidos e, porventura, teremos necessidade de dar mais respostas positivas do que as que têm sido dadas até agora.
Deixo aqui este alerta em relação ao próximo ano, porque presumo que isso vai acontecer com alguma pertinência.
Como já referiu o Sr. Deputado, as verbas destinadas às despesas com os gabinetes dos membros do Governo aumentam. Em primeiro lugar, porque, em termos absolutos, as verbas envolvidas são relativamente pequenas. Em segundo lugar, porque não podemos esquecer que em alguns gabinetes, como é o caso do meu e o dos Secretários de Estado, estão incluídos um conjunto de serviços que, esses sim, têm um aumento mais significativo.
Vejamos, por exemplo, o caso do Gabinete do Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia: as verbas para o apoio ao chamado Secretariado da Europa/92 estão inscritas no Gabinete do Secretário de Estado da Integração Europeia e vão atingir em 1990 cerca de 100 000 contos, que é quanto vai custar o funcionamento desse Secretariado da Integração Europeia.
Ao Gabinete do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, por exemplo, estão consagrados cerca de 30 000 contos que, em meu entender, irão ser canalizados para a concretização das iniciativas relativas ao encontro das Comunidades.
No meu Gabinete estão incluídas verbas relativas às Comissões da FAO e da UNESCO, ao Gabinete Interministerial de Macau, à Comissão de Limites e a outro que tem a ver com a parte de Timor, daí que os aumentos sejam, comparativamente com o ano anterior, muito pouco significativos, em valores absolutos, o que quer dizer que se mantêm, praticamente, ao nível do ano anterior.
Finalmente, e respondendo ao Sr. Deputado Sérgio Ribeiro, que me coloca perguntas realmente difíceis de responder. Quanto à ICEE e ao Instituto de Apoio à Emigração já respondi em parte. Relativamente às acções a concretizar por despacho ministerial, trata-se de uma matéria que tem a ver com uma certa flexibilização na utilização das verbas, flexibilização essa que, no entanto, não deve ser deixada ao cuidado dos serviços mas deve co-responsabilizar, na sua utilização, o membro do Governo respectivo.
V. Ex.* chamou-lhe o saco azul. De maneira alguma, Sr. Deputado, trata-se apenas de uma verba que tem alguma flexibilidade mas que exige sempre o comprometimento do membro do Governo na sua execução, muito embora a propositura para a sua utilização venha sempre dos serviços.
Quanto à questão das remunerações certas e permanentes, devo dizer que elas foram calculadas — isto agora
é uma informação dos serviços que tenho muito gosto em prestar — com base nos efectivos reais em serviço no dia 1 de Julho.
No momento em que foi feito o cálculo ainda não tinha sido acrescido ao Orçamento para 1989 o montante de compensação decorrente do imposto complementar, pelo que vai ser necessário proceder à transferência de verbas daí decorrentes que se mostrarem necessárias.
Mas há um aumento global de verbas de pessoal de 7,2%, o que permitirá, em concreto, colmatar qualquer eventual falta de verba para remunerações certas e permanentes. Isto, naturalmente, sem considerar o novo sistema retributivo, que em 1990 terá tratamento próprio.
Acrescentaria ainda que um dos problemas que tivemos no passado foi a dificuldade, uma vez que temos um certo número de despesas que são feitas em moeda estrangeira, designadamente em moeda forte (dólares), em prever, com esta antecipação, qual a variação do dólar em relação ao escudo ou ao ecu. Por essa razão, nos orçamentos anteriores criavam-se, normalmente, umas almofadas que ou eram excessivas ou demasiado curtas.
Acordei com o Sr. Ministro das Finanças que estimaríamos um valor para o dólar, que é o que foi calculado para fazer este Orçamento, e que se houvesse variações que determinassem acréscimos decorrentes desta variação não previsível isso ocorreria, em princípio, pela dotação provisional. Segundo ele me disse, é precisamente para isso que existe a dotação provisional. Refiro-me a despesas que não é possível prever com rigor nesta fase de elaboração do Orçamento.
Quanto à classificação económica 02.01.05, devo dizer que ela passou a abranger despesas como o equipamento das residências das embaixadas, que representam, de facto, despesas de investimento, que no Orçamento de 1989 tinham sido consideradas numa classificação económica de investimento, maquinaria e equipamento.
Quanto à classificação económica 02.03.10, ela tem-se revelado abrangente de despesas variadas: a segurança das instalações, taxas municipais do estrangeiro, alojamento nas missões de serviço público no estrangeiro. O tipo de despesas que pode ler de vir a ser inserido nesta classificação é relativamente variado.
Esta é a informação de que disponho. Espero que o Sr. Deputado tenha ficado esclarecido com esta resposta.
O Sr. Presidente: — Temos ainda três Srs. Deputados inscritos. Suponho que é apenas para pedirem esclarecimentos porque, como VV. Ex." sabem, já estamos muito atrasados.
Portanto, solicitaria que fossem extremamente sucintos nas vossas intervenções e em função daquilo que considerassem verdadeiramente imprescindível.
Tem a palavra a Sr". Deputada Edite Estrela.
A Sr.» Edite Estrela (PS): — Sr. Ministro, realmente não fiquei satisfeita com algumas das respostas. O Sr. Ministro diz que não está a jogar à defesa mas está a fazê--lo, e deixe-me que lhe diga que não joga muito mal. Se passar ao ataque se calhar é capaz de também não se sair mal de todo.
Sr. Ministro, é verdade que a cultura é uma disciplina horizontal — ainda bem que assim é — e que tem verbas inscritas em variadíssimos ministérios, mas que isso não sirva de alibi para a bola ser empurrada de uma baliza para a outra e ninguém querer aceitar o golo, já que estamos a usar uma terminologia futebolística que, confesso, não é o meu forte.
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Quando eu falo da abertura de centros culturais à Sr." Secretária de Estado da Cultura ela diz-me que isso é com o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Quando falo da abertura de centros culturais ao Sr. Ministro da
Educação, concretamente através do ICALP (Instituto da Cultura e da Língua Portuguesa), também me remetem para o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Em relação ao Centro Cultural de Luanda, de cuja abertura se vem falando de há pelos menos dois anos a esta parte, ninguém assume a responsabilidade de dizer quando é que isso se verificará, o que é que está feito e o que é que se vai fazer. Segundo informações que me deram, a última ideia que há sobre o assunto é a de que esse centro irá funcionar nas instalações da própria embaixada, pelo que a instalação física seria da responsabilidade do Ministro dos Negócios Estrangeiros. Enquanto não houver esse espaço físico, também não se pode pensar no conteúdo, no recheio, no apetrechamento. Portanto, gostaria de saber se esse centro vai ou não ser aberto c se outros centros que estejam programados vão ou não ser abertos.
Além disso, tenho alguma dificuldade em fazer análises, como disse há pouco, porque não há uma discriminação de verbas por áreas de intervenção e para execução de programas concretos. Se o Sr. Ministro não se importasse de nos fornecer esses elementos, pelo menos para nossa própria informação, gostaria de os receber. Até para saber se há necessidade de fazer propostas de aditamento de verbas na área da cooperação cultural.
É que eu vejo a defesa e a difusão do património cultural português reduzidas à microfilmagem dos documentos dos arquivos de Goa — 5000 contos. O Sr. Ministro disse-me que tinha aumentado substancialmente a verba para a Comissão Nacional da UNESCO, mas são apenas 4000 contos. Este montante é muito pequeno para a Comissão Nacional da UNESCO fazer alguma coisa, quer na área de cooperação, quer na área da promoção cultural, seja no que for. É uma verba que não dá para nada.
Essa indefinição de competências até levou agora o Sr. Ministro a responder, já não sei a quem, a propósito do ensino do português no estrangeiro. Essa área é que não é da competência do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, é da competência do ICACP, ao nível do ensino superior, e ao nível do ensino secundário é também da competência do Ministro da Educação, através da Di-rccção-Gera! de Extensão Educativa. Aliás, já falei desse assunto quando cá esteve o Sr. Ministro da Educação.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Caio Roque, pedia--lhe que também fosse sucinto. Tem a palavra.
O Sr. Caio Roque (PS): — Vou ser, Sr. Presidente. A Sr." Deputada Edite Estrela já colocou algumas questões que eu tencionava colocar.
Aproveito, entretanto, a oportunidade para fazer apenas uma pergunta ao Sr. Ministro. Como sabe, ainda não foram pagos os aumentos aos funcionários dos consulados, ou melhor, aos assalariados locais. Gostaria de saber se estão previstas verbas para colmatar essa falta de pagamento.
Estive há dias na Holanda, estive em Paris, tenho estado em vários pontos e tenho falado com esses funcionários do Estado que estão nos consulados, nomeadamente os assatariados tocais, e eles ainda nao receberam os seus aumentos deste ano.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.
O Sr. Mota Torres (PS): — Sr. Ministro, não estava a pensar intervir outra vez, até para lhe facilitar a possibilidade de cumprir a sua agenda.
De qualquer modo, relativamente às questões iniciais o Sr. Ministro respondeu-me — e eu aceito com toda a naturalidade — que a prática que descreveu no que respeita aos acordos de cooperação científica e cultural é perfeitamente aceitável.
A minha intervenção vai mais no sentido de dizer onde é que está o peso e o empenhamento políticos do Governo, com tradução orçamental, em relação a essa cooperação científica, cultural e técnica, do que em saber se o cabimento orçamental é vigiado ou fiscalizado por ambas as partes ou por algum expert em relação à política de cooperação.
No que diz respeito à presidência de Portugal no Conselho da Europa, penso que era uma oportunidade soberana a presidência portuguesa para que Portugal marcasse a sua presença no seio desse conselho. Eu sei que agora, em que Portugal aderiu (e já lá vão quase três anos) à Comunidade Económica Europeia, o Conselho da Europa perdeu gradualmente algum peso nas intenções dos Estados membros da CEE. Mas continua a ter, em termos europeus, uma importância inegável.
Hoje há críticas feitas, por exemplo ao Comité de Ministros, no sentido de dizerem que as recomendações ou as resoluções adoptadas pela Assembleia Parlamentar não são objecto de um cuidado suficiente por parte do Comité de Ministros. Daí que eu pense que Portugal deveria aproveitar esta oportunidade para vincar o seu apego ao Conselho da Europa. A Comunidade Económica Europeia discute hoje, por exemplo, a Carta Social Europeia, e já quase não se ouve falar da Carta Social Europeia do Conselho da Europa, que é a primeira das cartas sociais europeias. Ainda há relativamente pouco tempo houve um colóquio na Universidade de Utreque em que a maior parte das pessoas se manifestavam pela articulação do Conselho da Europa e da CEE no sentido da definição da Carta Social Europeia, que a criação do mercado único de 1992 impõe.
Assim, penso, e esse era o objectivo da minha insistência, que estes seis meses da presidência de Portugal no Conselho da Europa deveriam ser uma oportunidade única, uma oportunidade soberana de Portugal marcar a sua presença e o seu empenhamento no Conselho da Europa e, ao mesmo tempo, no desenvolvimento, no aprofundamento e na dignificação daquilo que é a actividade mais nobre desse Conselho. Isto tem, necessariamente, de ter uma cobertura orçamental, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Ribeiro.
O Sr. Sérgio Ribeiro (PCP): — Sr. Presidente, vou tentar ser três vezes sucinto.
Sr. Ministro, agradeço os esclarecimentos que me prestou mas, como é evidente, não me satisfizeram totalmente.
A leitura de um orçamento pode ser uma forma de cultura e de identificar políticas. Por isso mesmo, relativamente às questões que têm a ver com a gestão dos recursos humanos, parece-me evidente que do facto de terem sido reportados a efectivos reais em Julho sem o
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novo sistema retributivo resulta, evidentemente, urna falta de rigor para as previsões que aparecem neste Orçamento. Portanto, terão uma falibilidade muito grande e justificam o facto de, em confronto com as do ano passado, termos encontrado aquele tipo de anomalias que pareciam extremamente significativas.
Em relação à questão daquela conta 02.03.10 e o facto de o Ministério dos Negócios Estrangeiros utilizar a fórmula «Acções a concretizar por despacho ministerial», penso que é realmente uma formula extremamente hábil de concretizar uma vocação deste Governo para solicitar autorizações legislativas. Ao fim e ao cabo, por via do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros vai ter uma autorização legislativa para, em relação a uma verba que não será tão pouco volumosa como isso no seu orçamento, concretizar acções. E já dispõe das verbas.
Isso corresponde, de certa forma, a um expediente que, sendo curioso, me parecia de assinalar porque tem um significado bastante grande neste Ministério em confronto com outros Ministérios — atinge os 5 %.
Por outro lado, e ainda relativamente a esta questão, penso que o Sr. Ministro quando referiu a importância da Direcçâc-Geral de Cooperação versus Instituto como definidor de políticas... Quando li o Orçamento encontrei várias vezes referida na Direcção-Geral de Cooperação uma frase deste género: «Despesas no âmbito do Decreto-Lei n.° 436/79», o que me obrigou, com utilidade, a ir verificar que decreto era esse. Fiquei surpreendido ao saber que esse decreto era o decreto relativo à orgânica da Direcção-Geral de Cooperação. Portanto, nesta Direcção-Geral 80% das verbas expressas sâo-no com o argumento de estarem no âmbito do decreto-lei acima mencionado, o da orgânica desta direcção-geral. Ora, realmente há aqui qualquer coisa que, do ponto de vista da leitura orçamental, me parece não ser totalmente esclarecedora, para mais, 50,5 % na tal conta onde cabe tudo, concretamente na conta 02.03.10, e ainda por cima com este argumento: «No âmbito do Decreto-Lei n.° 436/79».
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Começo novamente do fim para o princípio para dizer ao Sr. Deputado que em muitos casos refere «no âmbito de cooperação internacional», o que significa que é no esUilo cumprimento das competências que lhe são atribuídas por esse decreto relativamente a outras competências que estarão cometidas para o ICE.
• Concretamente, a Direcção-Geral de Cooperação, como disse há pouco, centra a sua actividade na promoção de acções de cooperação no domínio do intercâmbio de bolsas, do intercâmbio de financiamento de cooperantes do sector técnico de uma forma relativamente formal, nomeadamente com previsão no tempo.
Portanto, não entendo a estranheza do Sr. Deputado no que diz respeito a ela referir que é no âmbito daquelas competências que estão previstas no decreto. Constitui uma forma simples de dizer a que é que se referem essas diferentes acções de cooperação. São precisamente essas competências que lá vêm referidas, repito, por oposição às do ICE.
Quanto ao facto de as verbas não se concretizarem por despacho, volto novamente a essa matéria e diria que é evidente que se calhar são muito importantes porque o
orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros é pequenino em comparação com outros. O que quero dizer com isso é que não são verbas que sejam utilizadas pelo Ministro porque senão eram colocadas no Gabinete. Elas estão nos serviços que, em princípio, poderão utilizá-las para as diferentes múnus que cabem nesses serviços, mas para a sua utilização exigem uma chancela, uma aprovação, mesmo que caiam na competência do respectivo director-geral.
Sr. Deputado Mota Torres, estou inteiramente de acordo consigo quanto ao Conselho da Europa. Tenho sido um defensor acérrimo do papel e da revitalização do Conselho da Europa. Mais: o papel que o Sr. Deputado provavelmente teia visto, elaborado pelo Comité de Ministros, sobre a revitalização do Conselho da Europa foi, em grande parte, redigido por mim, no tempo da presidência holandesa, com o meu colega Van den Bruck.
Julgo que o Conselho da Europa tem, de facto, um papel a desempenhar e um papel não despiciendo nos tempos que correm e nos tempos vindouros.
Já não estou tão de acordo consigo em que isso tenha de ter uma tradução efectiva ao nível do Orçamento do Estado Português. Penso, sim — disse-o e defendi-o na última reunião, há cerca de três semanas — que o Conselho da Europa deveria ter um aumento real do seu orçamento — na altura referi que deveria ser de 2,4 %. Disse mesmo que me parecia impossível realizar a Leste as acções de promoção e de abertura que estão programadas se não houvesse, desde já, um compromisso de todos os Estados à volta da mesa em aceitarem, de olhos fechados, um aumento global de 1,8 %. Disse ainda que me parecia que a racionalização do Conselho da Europa não deveria ser feita desde já por um corte indiscriminado chamado «ramos secos» porque me parece que todo o papel do Conselho da Europa deve ser repensado, num momento em que uma série de países do Centro e do Leste da Europa estão em vias de aderir a algumas das suas convenções.
Creio que esta será uma questão que voltará a estar em cima da mesa, mas julgo que está bem encaminhada e pode contar com um grande empenho da minha parte e do Governo Português no sentido de dar força ao Conselho da Europa.
Aquilo que eu referi dos acordos culturais, científicos e técnicos não foi o controlo orçamental, mas sim a responsabilidade pela concretização das acções. Portanto, se duas universidades acordam no sentido de que deve haver uma troca de investigadores, se essa troca custa 3000 contos, é preciso que haja alguém que diga por quem é que estes 3000 contos do lado português são suportados. Isto foi no sentido de dar conteúdo aos acordos, porque tínhamos centenas de acordos em efectividade, com acções a acontecer, inferiores a 10 %, e agora não. Agora, os acordos que temos — ainda lemos algumas heranças do passado — normalmente dão frutos, uma execução, uma contabilização, etc.
O Sr. Deputado Caio Roque disse que este ano os assalariados locais ainda não tinham recebido aumentos. Ora, isso surpreende-me imenso porque o despacho foi feito há bastantes meses e se calhar o que o Sr. Deputado Caio Roque quer dizer é que eles não foram aumentados em Outubro como foram aumentados aqui em Portugal.
Ora, o que posso dizer é que está prevista neste orçamento — tal como tive ocasião de explicar aquando do debate, na generalidade, com a Comissão dos Nego-
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cios Estrangeiros — uma actualização com base nas variações que houver, quer quando forem pagos em dólares relativamente à moeda local, quer quando for a moeda local relativamente à inflação, de modo que se garanta o poder de compra.
Para além disso, uma vez que se verificam, principalmente nos consulados, certas situações de injustiça que já começaram a ser corrigidas este ano, elas continuarão a ser corrigidas no ano de 1990 por e em diálogo com os sindicatos representativos, com os quais iniciámos um diálogo no sentido de, em conjunto, procurarmos atacar um problema que é francamente complexo de resolver de um momento para o outro. Portanto, tenho esperança que continuemos nessa boa direcção.
O Sr. Caio Roque (PS): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Caio Roque (PS): — Sr. Ministro, apenas gostaria de solicitar que se informasse convenientemente sobre aquilo que se passa nos consulados porque as injustiças aumentam de dia para dia.
O Orador: — Sr. Deputado, devo dizer-lhe que eu próprio travei diálogo com as estruturas sindicais, quer no estrangeiro, quer em Lisboa, onde as recebi, juntamente com as estruturas sindicais locais representativas das confederações nacionais sindicais. Portanto, estou ciente dos problemas, estou disponível para o diálogo e estou disposto a resolver o problema, não de um momento para o outro porque é muito complexo e as próprias estruturas sindicais reconhecem isso.
Sr.* Deputada Edite Estrela, o Centro Cultural de Luanda já abriu. Formalmente foi criado no ano passado! Um problema é a abertura e o outro o seu funcionamento. A criação no papel é o mais fácil! Recordo-me que, no passado, foi criado no papel, por exemplo, o Instituto Cultural Português de Roma e do Rio de Janeiro e no entanto nunca funcionaram. De facto, a criação no papel é o mais fácil!
Ora, o que me parece é que não podemos criar centros culturais sem ter um objectivo concreto e sem ter a garantia daquilo que sustenta esse centro —seja ele no plano estritamente cultural, da Secretaria de Estado da Cultura, seja ele no âmbito do Ministério da Educação—, esses meios e esses recursos. Caso contrário, podemos estar a criar um bluff'e uma estrutura vazia. Daí que no caso de Luanda o Ministério dos Negócios Estrangeiros se tenha comprometido a criar condições para a abertura desse centro através da obtenção de um local e da designação de um coordenador, o que já está feito. Portanto, esperemos que agora esse centro arranque em pleno.
A Sr.* Edite Estrela (PS): —Já há o local?
O Orador: — Já há um local e já há um coordenador. Portanto, esperemos que isto agora possa arrancar.
Dentro deste mesmo espírito, gostaria de dizer que o local em Roma deve Gear pronto a curto prazo para o Centro Cultural Português, da mesma forma que em São Paulo estamos a coordenar quer as acções do Estado Português, quer as associações de portugueses locais, que se juntaram todas — o que é inédito — no sentido de
construir um espaço que possa ser polivalente e servir na parte cultura, comercial, educativa e até, provavelmente, consular.
Ora, este é o papel do Ministério: activador, catalizador! Não é nem pode ter o papel de executor. Porém, devo dizer que estamos sempre abertos a sugestões, especialmente da Sr.* Deputada.
A Sr.' Edite Estrela (PS): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr.* Deputada.
A Sr.* Edite Estrela (PS): — Sr. Ministro, sei que não é da competência do Ministério dos Negócios Estrangeiros o apetrechamento, o dar substância e, inclusivamente, até definir os objectivos do centro cultural, embora também deva participar nisso porque a política cultural deve ser definida pela totalidade do Governo e todos devem participar. Já é lamentável que não haja um Ministério da Cultura, mas, enfim, os senhores saberão porquê!
Porém, é um facto que tem de haver a criação de um espaço físico para depois se poder concretizar o resto! E o que me tem sido dito é que esse espaço físico ainda não existe, que seria nas instalações da embaixada, mas que havia a necessidade de serem feitas obras, de alterar o espaço, etc.
Portanto, só não quero é que uns me digam uma coisa e outros me digam outra coisa e eu vá andando de uns para os outros sem obter respostas. Estas são questões que me preocupam e que devem preocupar a todos nós porque creio que todos saberão quais são os objectivos da abertura de um Centro Cultural Português em Luanda. São óbvios!
O Orador: — Sr.* Deputada, estou inteiramente de acordo com o que referiu no que diz respeito à importância, aos objectivos, etc.
Porém, gostaria de referir duas coisas: no que diz respeito à parte educativa, creio que o Ministro da Educação de há três governos andou bem ao ter decidido prestar um apoio substancial a uma cooperativa para o ensino de uma escola portuguesa em Luanda. Foi um passo muito importante e marcante na nossa relação cultural em Luanda.
Ora, o que se passou — e creio que a Sr.' Deputada sabe isso — é que tinha sido previsto um espaço para o Centro Cultural Português em Luanda que não tinha dignidade, e essas coisas são importantes. Não se pode ter um Centro Cultural Português em Luanda sem dignidade, sem espaço, sem uma posição de uma certa qualidade e dimensão.
Portanto, decidiu-se que aquele espaço não servia e que se devia arranjar um maior, com mais qualidade. Assim,
fez-se uma redefinição de espaços, um dos quais—foi aquele que a Sr.' Deputada referiu — era um espaço que estava afecto à embaixada, mais concretamente ao Con-sulado-Gcra), e que se pensa que possa vir a servir para fazer uma instalação condigna do nosso Centro Cultural em Luanda.
A Sr.* Edite Estrela (PS): — Pensa-se?
O Orador: — Digo que se pensa porque quando começámos a falar com as autoridades de Luanda estava prevista uma ideia, mas, simplesmente, as autoridades em
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Luanda, provavelmente fruto do bom relacionamento que existe, querem muito mais do que aquilo que inicialmente tínhamos pensado. Portanto, estamos a ver se isso será ou não possível!
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, muito obrigado pela sua presença e pelas explicações que nos deu.
Vamos agora passar ao debate do orçamento do Ministério da Justiça
Entretanto, gostaria de fazer, rapidamente, o ponto da situação.
A discussão do orçamento do Ministério da Justiça estava marcada para as 16 horas, mas só às 17 horas e 30 minutos é que vai começar, e a verdade é que ainda temos para debater o Ministério das Finanças.
Assim, o que proponho é utilizemos uma hora estrita para o Ministério da Justiça, de modo a acabar às 18 horas e 30 minutos, e até às 21 horas debateríamos o orçamento do Ministério das Finanças.
Se por volta das 20 horas se vier a revelar que tal é impossível, teremos que ponderar a hipótese de fazer um prolongamento da reunião à noite.
Peço, pois, aos Srs. Deputados que sejam sucintos. Compreendo que é muito difícil discutir matérias importantes em pouco tempo e que realmente estamos com um calendário extremamente apertado, mas essa é a realidade com que nos confrontamos e, portanto, cabe-me esse papel desagradável de apelar para a vossa boa compreensão quanto a estas minhas solicitações.
Pausa.
Srs. Deputados, já se encontra entre nós o Sr. Ministro da Presidência e da Justiça a quem, além de dar as boas vindas, pergunto se pretende começar este debate por fazer uma curta exposição acerca do Ministério ou se prefere passar à fase das questões.
O Sr. Ministro da Presidência e da Justiça (Fernando Nogueira): — Podemos passar à fase das questões, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Ministro, como bem sabe, tivemos ocasião de trocar boas impressões no âmbito da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias na fase da apreciação preliminar da proposta do Orçamento.
Portanto, também não será novidade alguma os motivos de reparo e de crítica que têm vindo a ser suscitados pelo PS em vista deste orçamento e, porque não dizê-lo, cm vista também de orçamentos anteriores que, em alguns aspectos, têm incorrido nas mesmas limitações ou deficiências que este mesmo orçamento ainda contém.
Naturalmente que parece agora avizinhar-se uma fase mais promissora, na medida em que, a dar por boas as garantias do Ministro da Presidência e da Justiça, a reforma, em aspectos essenciais da área do Ministério, finalmente concretizar-se-á no próximo ano. Para que fique claramente registado esse propósito, gostaria de sublinhar que o Partido Socialista, em anos sucessivos, vem reivindicando uma inequívica transparência e um princípio de unidade e universalidade do orçamento do Ministério da Justiça.
Dá-se a circunstância curiosa de o Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, aquando Mi-
nistro da Justiça num governo anterior, ter sublinhado — e a nosso ver bastante bem — a necessidade de conferir esse princípio de unidade e universalidade ao orçamento do Ministério, questão que, como todos sabemos, se prende com a problemática da gestão dos cofres do Ministério, portanto, com a problemática do Gabinete de Gestão Financeira.
Creio que a atitude que sucessivamente o PS tem vindo a protagonizar nos últimos anos no sentido da exigência da consagração desse princípio de unidade e universalidade se avizinha agora para mais perto.
Tal como tivemos ocasião de trocar impressões no âmbito da comissão, gostaria que o Sr. Ministro nos pudesse garantir a concretização desse princípio no decorrer da execução orçamental para o próximo ano.
Ligado a isto está sempre o eterno problema da discussão do orçamento do Ministério da Justiça, já que enferma de vícios que afectam a transparência desse mesmo orçamento.
No último ano foi claramente subavaliada a verba a dispor em termos de saldo global e final da área do Gabinete de Gestão Financeira. É de admitir também que a verba em termos de orçamento positivo final para este ano também esteja subavaliada e, portanto, que os meios financeiros de que à partida o Ministério confessa dispor venham a ser mais reforçados ao longo da execução orçamentai para o próximo ano. Assim, gostaria também de saber se o Sr. Ministro protagoniza esta nossa convicção de que há uma subavaliação na perspectiva das verbas e dos saldos a obter ao longo ano de 1990 por via do Gabinete de Gestão Financeira.
Gostaria agora de situar uma outra problemática que em breve estará em apreciação, e que é a do Estatuto Remuneratório dos Magistrados Judiciais. O Sr. Ministro admite ou não como possível a equiparação do vencimento de juiz conselheiro ao de ministro e se se deverá fazer, a partir daí, uma actualização e uma indexação da carreira da magistratura?
Como o Sr. Ministro saberá melhor do que todos nós, esta é uma questão que tem vindo a ser claramente focada pelos magistrados e, ponan to, gostaria de conhecer a sua opinião sobre essa reivindicação.
Uma outra questão, relativamente à qual o Partido Socialista também já teve oportunidade de trocar impressões em sede de comissão, refere-se à política da realização de contratos-programa com as autarquias locais no domínio de muitas obras que correm no âmbito dos tribunais.
Pela nossa parte, não temos críticas a fazer a esta orientação desde que, inequivocamente, não signifique uma diminuição das capacidades financeiras das autarquias locais mas, pelo contrário, uma clarificação das relações de participação financeira da administração central com as autarquias e, portanto, o estabelecimento de um princípio de sã cooperação entre o Ministério da Justiça e essas mesmas autarquias no sentido de um resultado positivo global ao nível do parque imobiliário dos tribunais portugueses.
Em ligação com esta questão dos contratos-programa gostaríamos de saber se o Sr. Ministro nos poderia dizer, com mais detalhe, qual o âmbito dos que desejaria poder realizar no próximo ano.
Ainda sobre a problemática da relação entre as autarquias e o Ministério da Justiça, há a questão da cooperação que passará a haver no domínio da criação de condições para as medidas alternativas de prisão.
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É que lodos sabemos que esse é um dos desafios fundamentais do actuai Código Penal e, também, da aplicação do próprio processo penal que vem potenciar essa filosofía.
Ora, sendo assim, a verdade é que os magistrados se queixam de que, para poderem implementar aquelas medidas, não encontram com facilidade condições alternativas de prisão minimamente adequadas que assegurem o princípio da ressocialização dos delinquentes condenados a esse tipo de penas.
Portanto, gostaria de saber se há em programação algum programa — passe a tautologia — no sentido de interessar as autarquias locais pela relação com as respectivas comarcas, em termos da criação de condições aos níveis possíveis para a implementação deste tipo de medidas no plano das consequências penais.
Por outro lado, também tem sido preocupação constante do Partido Socialista o problema da ressocialização dos ex-reclusos.
Nesta matéria, temos chamado criticamente a atenção do Governo para o facto de a entrada dos ex-reclusos na vida social normal não ser suficientemente acompanhada de medidas que potenciem a res socialiazaçâo nessa fase da reintegração social. Por isso, insistimos neste ponto, que, a nosso ver, corresponde à necessidade de implementar, ao nível das respostas sociais adequadas, essas condições para a ressocializção dos ex-reclusos.
Abordando uma matéria diferente, gostaria que o Sr. Ministro nos desse uma informação mais detalhada sobre a problemática da informatização dos tribunais.
Tem-se falado na informatização ao nível documental mas, apesar do anúncio feito há algum tempo no sentido da realização de uma acção profunda e extensa naquele domínio, creio que a referida informatização parece estar muito circunscrita a algumas experiências-piloto efectuadas no último ano e que não terão passado disso mesmo.
Assim, gostaria que o Sr. Ministro pudesse detalhar com mais circunstância qual o tipo de programação prevista para a informatização dos tribunais no ano de 1990.
Uma outra questão, que também foi debatida no Plenário aquando da aprovação da Lei Orgânica dos Tribunais, é a dos tribunais de relação. Nessa altura, discutiu-se se deveriam criar-se novas relações, tendo acabado por se optar por uma solução mitigada que foi a de admitir a extensão dos tribunais de relação a definir, mas até ao momento não creio que tenha sido implementada esta solução.
Ora, como acabo de ver um aceno do Sr. Ministro cm sentido positivo, gostaria que me informasse sobre esse conjunto de medidas que, porventura, estarão a ser executadas no domínio da extensão dos referidos tribunais. Isto é, gostaria de saber se está a ser previsto algo de efectivo em matéria do desdobramento dos tribunais de relação.
Embora ainda me restem mais questões que gostaria de ver esclarecidas, para já, ficaria por aqui, aguardando as respostas do Sr. Ministro a estes problemas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães flPCP): — Sr. Ministro, gostaria de aproveitar o facto de o Sr. Deputado Jorge Lacão ter introduzido algumas das interrogações fundamentais para chamar a atenção para outros aspectos.
Em primeiro lugar, tradicionalmente, o Ministério da Justiça é incapaz de fazer planeamento, isto é, o que
consta das Grandes Opções do Plano é um conjunto de directrizes diáfanas e mal articuladas com o Orçamento do Estado. Por vezes, sucede que, apesar de tudo, mesmo as mais diáfanas directrizes vêm a revelar-se fustigantes.
Na verdade, se alguém se der ao trabalho de recordar qual era o sentido das GOP para este ano verificará que estava previsto que fossem prosseguidas reformas legislativas tais como a revisão do Código de Processo Civil, a do Código Penal — desenvolvimento das grandes linhas da política criminal, eliminando assimetrias na penalização, etc. —, a da legislação no domínio do direito penal económico e do direito falimentar nos aspectos substantivo, processual e da organização das instancias de intervenção. Estava, ainda, prevista a reforma do direito comercial, a revisão dos direitos sobre processo administrativo e de trabalho, etc.
Ao fazer o balanço desta matéria, o próprio Governo é modesto, uma vez que, na publicação Dois Anos de Governo no Caminho do Progresso, a p. 16, embora baralhando um bocado as datas, se referem como conquistas fundamentais a aprovação da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e respectivo regulamento, o que constituiu um verdadeiro pandemônio de confusões e um tropel que, ainda hoje, está a provocar sensível caos na administração da justiça em vários domínios — e ainda não vimos tudo.
Na mesma publicação, refere-se ainda a aprovação da Lei Orgânica da Procuradoria-Geral da República, a Lei Orgânica das Secretarias Judiciais e Funcionários de Justiça que, ainda hoje, está pendente na Assembleia da República para ratificação, dada a décolage entre as aspirações e a realização, sabendo nós, que, neste domínio, também se gerou uma extraordinária confusão.
Ainda segundo o Governo, outras conquistas fundamentais referidas nesta mesma publicação dizem respeito à aprovação do regime jurídico de acesso ao direito e aos tribunais que, através de um diploma avulso, o Sr. Ministro alterou num aspecto fundamental quanto ao apoio à defesa oficiosa em processo penal, assim alterando a filosofia do sistema e, naturalmente, também as implicações financeiras. Aliás, gostaria de saber qual a razão desta alteração e quais os raciocínios que conduziram a ela.
Há, também, a aprovação de diversas alterações ao Código das Custas Judiciais — é notável a forma delicada como se alude ao psicodrama verdadeiro e à punição que é constituída pelos erros do Governo nesta matéria.
Na mesma publicação, o Governo refere, ainda, os institutos médico-legais, a informatização do sistema judiciário, a formação de pessoal na área da justiça, o combate à criminalidade referido por grosso, o Registo Nacional das Pessoas Colectivas e algumas medidas sobre protecção dos agentes de autoridade que, obviamente, não são polémicas.
Eis uma grande distância a grandes reformas anunciadas a titulo de planeamento que não foram executadas.
Eis, portanto, uma primeira conclusão: foi por falta de dinheiro que estas medidas não se realizaram? Em bom rigor, não, pois, pura c simplesmente, muitas delas não dependem de dinheiro. Dir-sc-ia que, após uma fase de extraordinária excitação legislativa, o Ministério passou a uma outra de abulia, de atarax legislativo, da qual ainda não se libertou.
Do ponto de vista da transparência, embora o Sr. Ministro o lenha reconhecido em sede da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias,
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certamente terá ocasião de o fazer em público e de confirmar que há atraso manifesto na concretização da reforma de todo o sistema de gestão financeira do Ministério da Justiça.
Na verdade, embora tenha revelado que existem estudos disponíveis sobre aquela matéria e apesar de eu próprio não duvidar que sejam elaborados com cautela e, em certos casos, até com competência técnica justificável, a verdade é que estão bloqueados, havendo dúvida em saber se será possível que o novo regime entre em vigor durante o ano de 1990, até ao fim do 1." semestre, como chegou a ser anunciado pelo titular desta pasta.
Tendo em conta a revisão da lei orgânica de diversos departamentos, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se considera que são satisfatórias as dotações que estão previstas, atendendo ao volume das tarefas.
O mesmo gostaria de saber em relação ao acesso ao direito. Assim, seria fulcral que obtivéssemos uma informação sobre os quantitativos que o Governo está disposto a gastar para expandir o sistema, pois, tal qual está a funcionar, está aquém das virtualidades que tinham sido imaginadas pela lei aprovada nesta Assembleia e, também, muito aquém das necessidades do país real, o que significa injustiça no acesso.
V. Ex.* revelou que o saldo dos cofres do Ministério, que, no ano passado, foi de 7 milhões de contos, este ano arrisca-se a ser de 4 ou 5 milhões, o que, obviamente, é uma perspectiva pessimista habitual no mês de Dezembro mas que, raramente, corresponde à realidade no ano seguinte — provavelmente, o saldo será maior.
Assim, gostaria de perguntar-lhe porque é que essas verbas estimáveis não são aplicáveis em algumas coisas úteis, designadamente no domínio da reforma do sistema prisional, no qual continuamos a ter um impasse relativamente a diversos domínios.
E, agora, faço-lhe a pergunta aborrecida do costume: até quando o «inferno de Monsanto"?
É que é bom não esquecer este aspecto e gostaria de saber que medidas V. Ex.' pode anunciar nesse domínio.
Um último aspecto diz respeito à situação remuneratória das diversas categorias de pessoal do Ministério da Justiça.
Não falarei da questão das remunerações dos juízes e dos magistrados do Ministério Público, pois voltaremos amplamente a essa questão, no próximo dia 5 de Dezembro, em sede de Plenário. Assim, falar-lhe-ia das outras categorias, designadamente da situação dos trabalhadores do registo e notariado e da dos trabalhadores judiciais que, no passado domingo, em Coimbra, realizaram o seu primeiro congresso constitutivo, e em relação aos quais estão cm curso negociações bastante arrastadas, bem como algumas promessas sobre cujo desenvolvimento seria importante que a Câmara fosse informada.
Sr. Ministro, embora muito amputadamente, são estas as questões que lhe deixamos para já.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr. Ministro, a primeira questão que queria levantar está relacionada com a forma como têm vindo a funcionar as conservatórias de registo predial e comercial por este país fora.
É sabida a situação de estrangulamento que se verifica cm muitas, designadamente pelo facto de, nalguns casos,
os quadros de pessoal estarem completamente desajustados à nova realidade das conservatórias de registo predial e de, noutros, por os concursos não serem feitos ou por não se apresentarem candidatos. Isto tem originado situações de quase autêntica ineficácia desses serviços.
Tal como o Sr. Ministro decerto também saberá, conheço casos de conservatórias que demoram cerca de três a quatro meses para darem resposta a um qualquer pedido de um cidadão, o que, de facto, é grave.
Assim, gostaria de saber para quando está prevista a actualização dos quadros de pessoal de muitas conservatórias, necessidade sentida pelos próprios conservadores.
Outra questão que é extraordinariamente importante, tanto para mim próprio como para o Partido Socialista, é a de saber quando se arranca, de vez, com o processo de informatização das conservatórias.
Sei que, nesta matéria, há um projecto-piloto que julgo que deverá ser implementado na Conservatória de Oeiras mas, no PIDDAC para 1990, vejo que não está prevista qualquer verba, pelo menos devidamente explicitada, no sentido de se avançar com o processo de informatização destes serviços.
Creio que o futuro estará nesse processo e, em termos financeiros, não vejo como se poderá dar cobertura à satisfação daquela necessidade.
A crítica que acabo de fazer relativamente ao funcionamento das conservatórias é extensiva ao de muitos cartórios notariais.
Neste último caso, tanto quanto sei, a questão da informatização estará numa fase ainda mais incipiente, continuando nós a assistir à forma como funcionam muitos dos cartórios notariais.
Tenho, ainda, uma outra questão para colocar ao Sr. Ministro.
Ao analisar o PIDDAC para 1990 e ao compará-lo com o de 1989, depararam-se-me algumas situações de que só retratarei uma para também não gastar muito tempo, mas trago algumas situações um pouco esquisitas, mas a que, naturalmente, o Sr. Ministro dará justificação.
Uma delas refere-se à forma como a construção dos tribunais é financiada.
Começo por dar-lhe um exemplo, simples, que é o da construção do Tribunal Judicial de Coruche, que, aliás, tem vindo a ser adiado de ano para ano, e tenho a impressão de que a sua construção já aparece em três Orçamentos do Estado sucessivos. No PIDDAC do Orçamento do Estado para 1989 o Tribunal Judicial de Coruche aparece com um investimento de cerca de 71 400 contos, totalmente financiado pelo Orçamento do Estado, no capítulo 50.
De facto, a construção deste projecto continua a aparecer no Orçamento do Estado para 1990, agora já não por 71 400 contos mas por 103 000 contos, o que está naturalmente relacionado com o atraso do início da construção, o que é normal, mas, curiosamente, não aparece qualquer verba no capítulo 50 do Orçamento do Estado, o que quer dizer que tem de haver outra forma de o financiar. Era exactamente isto o que eu gostaria de saber, porque o que acontece com o caso do Tribunal Judicial de Coruche acontece com outros uibunais e outros investimentos situados em outfas zonas do País.
Uma outra questão que não se prende muito com o Orçamento do Estado, mas que gostaria de colocar ao Sr. Ministro da Justiça: o novo Código das Sociedades Comerciais, que foi publicado, se a memória me não atraiçoa, em 1986, e que entrou em vigor em princípios
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de Novembro desse mesmo ano, estipula que as sociedades, especialmente as sociedades por quotas, em que o capital social não atinge os 400 000 S têm um prazo, que julgo ser de três anos, para proceder a essa actualização, prazo esse que terminou no fim do mês de Outubro do corrente ano. É evidente que não estou aqui a querer arranjar desculpas para os que não procederam em conformidade com o estipulado no Código, mas todos sabemos que normalmente há a tendência para se deixar arrastar as coisas. De facto, o que se verificou foi que no mês de Outubro os cartórios notariais foram assoberbados com imenso trabalho, não podendo, muitos deles, celebrar as escrituras de aumento de capital que se impunham.
O que me parece é que acima de tudo, para além do cumprimento da lei, o que importa é que, e no caso concreto das empresas, o balanço referente ao exercício de 1989 espelhe essa nova situação financeira.
Pergunto: o Sr. Ministro vê alguma hipótese, pensa que é possível que o prazo para a celebração dessas escrituras seja estendido até ao fim do ano de 1989? De outro modo, podem surgir situações algo complicadas, que me escusava de comentar aqui.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência e da Justiça.
O Sr. Ministro da Presidência e da Justiça (Fernando Nogueira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as questões que me foram colocadas, embora já tivesse tido ocasião de expor desenvolvidamente, no seio da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, a posição do Ministério da Justiça, mas nada me custa voltar a referi--las.
Quanto à Lei Orgânica do Gabinete de Gestão Financeira, referi duas coisas, quando fui interpelado no mesmo sentido na Comissão: a primeira foi que a proposta de lei do Orçamento do Estado para este ano é diversa da do ano passado. Portanto, o regime excepcional, em termos de tratamento de receitas e de despesas do Ministério da Justiça, vigorará até meados de 1990. Ou seja, estabelece um limite máximo do regime excepcional em que o Ministério da Justiça está a laborar nesta matéria. Porquê? Porque pensamos que até lá será possível aprovar uma Lei Orgânica do Gabinete de Gestão Financeira e dando uma vacatio legis algo prolongada, uma vez que se trata de um diploma que vai abolir de forma abrupta e violenta as práticas habituais e rotinas dos serviços — é preciso que eles se adaptem e mesmo que haja um esclarecimento interno para que a nova legislação não vá perturbar em excesso o funcionamento dos serviços.
A segunda coisa que disse nessa reunião da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias foi que o Ministério da Justiça já tinha apresentado ao Ministério das Finanças uma proposta de decreto-lei, que, naturalmente, tem também de ser apreciada pelo Ministério das Finanças. O que na altura não disse, mas agora já estou em condições de o dizer, é que já recebemos a posição do Ministério das Finanças, com pareceres desenvolvidos da Direc-ção-Geral da Contabilidade Pública e da Direcção-Geral da Administração Pública. Os pareceres são, na sua generalidade, favoráveis, embora haja divergências de pormenor, que agora, por decisão do Sr. Ministro das Finanças e minVia, vâo ser ultrapassarias numa reunião em que estarão presentes o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro
da Justiça e, como é óbvio, as pessoas do Ministério da Justiça que elaboraram o diploma e que têm mais directas responsabilidades pela aplicação do novo sistema e os técnicos e responsáveis do Ministério das Finanças que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento quiser que o acompanhem nessa reunião. Portanto, o processo legislativo está a decorrer com normalidade e, tal como eu tinha dito, é muito provável que até ao fim do ano possa vir a ser aprovado o diploma que estabelecerá a unidade e a universalidade no orçamento do Ministério da Justiça, através das alterações introduzidas pela Lei Orgânica do Gabinete de Gestão Financeira.
Em relação ao saldo e à subavaliação, devo dizer que não escondi, nem este ano nem no ano passado, que a minha estimativa era para baixo. Porquê? Porque prefiro as surpresas agradáveis às desagradáveis. Esta a primeira razão. Depois, porque estou numa Comissão de Economia, Finanças e Plano, e os Srs. Deputados não estão a sugerir, com certeza, que eu tenha uma intervenção no sentido de me levar a fazer despesas realizadas a descoberto, isto é, a empolar receitas para poder fazer despesas e não ter depois cobertura orçamental. Um cuidado mínimo a ter é, justamente, o da garantia de que há cobertura orçamental para as depesas realizadas. É o que temos feito.
Quanto aos vencimentos, aproveito a ocasião para pedir desculpa aos Srs. Deputados por não poder estar presente no dia S, visto nessa altura me encontrar em Estrasburgo numa reunião do Conselho de Europa, de maior importância, sobre biotecnologia, em que terei o privilégio de ser o orador político da cerimónia. Portanto, terá de cá estar o Sr. Secretário de Estado Adjunto pelo que peço, desde já, desculpa.
Entretanto, devo dizer que os vencimentos dos magistrados foram actualizados de tal forma que, quer a Associação dos Magistrados Judiciais, quer o Sindicato do Ministério Público, acabaram por chegar a um consenso com o Governo. É natural que tanto o Sindicato como a Associação dos Magistrados desejem sempre mais. No entanto, a posição é consensual. Há um pequeno diferencial, mas é algo que não se pode medir ao milímetro. Há um diferencial na ordem de 1 %, entre as categorias que o Sr. Deputado Jorge Lacão referiu, ou seja, a de ministro e a de conselheiro, mas posso dizer-lhe, por exemplo, que um desembargador com cinco anos ganhará mais do que um secretário de Estado. Portanto, é difícil fazer-se um ajustamento, uma justaposição total e perfeita entre os vencimentos das diferentes categorias, porque há uma grelha indiciária c não se vai deturpá-ia ou enviesa--la para depois se dar uma justaposição perfeita. Pensamos que se foi tão longe quanto possível, olhando não apenas aos vencimentos dos cargos políticos, mas também aos vencimentos de altos funcionários da Administração Pública. Logo, é uma solução que nos parece equilibrada e que é, como tal, reconhecida tanto pelas forças sindicais como pelas associações que representam os magistrados portugueses.
Em relação aos contratos-programa com as autarquias, também já tive ocasião de dizer na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias que este ano foram realizados entre 40 e 50 programas. Pensamos que para o ano este número irá aumentar. No entanto, não podemos fazer, propriamente, uma planificação dos contratos-programa que vamos elaborar com as autarquias, que têm sido, sobretudo, conduzidos para obras de remodelação e de beneficiação de edifícios já existentes. Isto é, aqueías
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obras são de uma tal dimensão que não causam excesso de embaraço às autarquias e facilitam imenso a vida aos serviços centrais do Ministério. Isso não tem significado em qualquer sobrecarga financeira para os municípios, quando muitos eles nos prestam apoio técnico, porque, em princípio, salvo raríssimas excepções, as despesas são suportarias na integra peto Ministério. Isto é, a autarquia toma conta da obra, realiza-a mediante um orçamento previamente estabelecido e presta apoio técnico, uma vez que não disponho, nos serviços centrais, de engenheiros e de arquitectos que possam acompanhar todas as obras que vão decorrendo pelo País — e elas são em grande número —, em todos os tribunais ao mesmo tempo e em todas as conservatórias e cartórios notariais. Tem sido um sistema que nos tem agradado e que tem suscitado o apoio e a adesão das autarquias.
Em relação às medidas alternativas de prisão, devo dizer-lhe, Sr. Deputado Jorge Lacão, que temos procurado estabelecer e desenvolver uma campanha de sensibilização das autarquias. Posso dizer-lhe, por exemplo, que, ainda este ano, houve um encontro subordinado a este tema na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa, promovido pelo CEJ e pelas direcções-gerais do Ministério que têm a ver com esta matéria, nomeadamente com o IRS, com a Direcção-Gcral Tutelar de Menores e com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, em que houve, salvo erro, entre 2500 a 3000 inscritos e presentes nesse seminário, a esmagadora maioria dos quais eram justamente autarcas. Portanto, foi uma grande operação de sensibilização, e penso que, através desse levantamento, ser-nos-á possível no futuro sensibilizar e captar as autarquias para acções desta natureza, com o acompanhamento dos serviços.
Há experiências já cm curso, nomeadamente em Vale de Cambra e Oliveira de Azeméis, num esforço conjugado dos serviços do Ministério Público e das próprias autarquias. O Instituto de Reinserção Social publicou agora um desdobrável em que se faz referência, justamente, às medidas alternativas de prisão e que está a ter uma profusa distribuição por lodo o País, nomeadamente nas autarquias. Estamos sensibilizados para o problema e temos procurado fazer uma campanha de aliciamento e de estímulo a entes externos ao Ministério no sentido de colaborarem com o Ministério, com os tribunais, com o Ministério Público a fim de dar sequência lógica àquilo que a lei preconiza.
Quanto à ressocialização, devo dizer que é impressionante o desenvolvimento e a melhoria da qualidade dos serviços, em termos de serviços prisionais. Temos cm todas as cadeias portuguesas acções de formação profissional. Como já tive ocasião de dizer na 1/ Comissão, hoje o ensino básico é ministrado em todos os estabelecimentos prisionais portugueses e o ensino secundário é ministrado cm todos os estabelecimentos prisionais centrais. Durante este ano, ocupámos, voluntariamente, cerca de 3000 presos, o que quer dizer que há uma movimentação muito grande no sentido de habilitar os detidos com uma formação profissional, com uma actividade que lhes permita depois levar a vida de cara levantada quando saírem da prisão.
Simultaneamente —e podem constatá-lo através da evolução dos orçamentos do Ministério da Justiça nos últimos anos— tem havido quase que o quádruplo das despesas com o Instituto de Reinserção Social. Estamos a estender a malha do Instituto de Reinserção Social a todo o Pais. Hoje em dia, o Instituto de Reinserção Social
já cobre mais de dois de terços de todas as sedes dos tribunais de círculo previstos; falta-nos, pois, cobrir um terço. Já temos equipas de reinserção social em todos os estabelecimentos prisionais centrais e temos admitido pessoas a uma velocidade vertiginosa se atentarmos ao cômputo global das novas admissões na Administração Pública.
Estamos, portanto, a montar um sistema que nos permitirá fazer uma política concreta e eficaz de ressocialização dos delinquentes.
Em relação à informatização dos tribunais, tive ocasião de distribuir aos deputados da 1.* Comissão, na anterior sessão legislativa, um plano de actividades da informatização dos tribunais, que está mais ou menos a ser cumprido nas suas metas e nos seus calendários.
É verdade, e em parte respondo já ao Sr. Deputado José Magalhães, que nem tudo está discriminado nas Grandes Opções do Plano, pelo menos no que respeita ao Ministério da Justiça, pois são princípios gerais pouco desenvolvidos. No entanto, esse documento tem acções concretas, cujo calendário se mantém praticamente intocável. Posso dizer que há o propósito de, em 1990, estender a instalação de equipamentos a todos os tribunais, em todo o País, onde haja processo crime, portanto para a informatização do processo penal. Por outro lado, também pensamos em estender a todo o País o processo de informatização das estatísticas criminais, pois devemos aplicar a informática aos cursos ministrados pelo SEI. Portanto, os magistrados que hoje estão a obter formação no CEJ já têm formação informática, assim como nos cursos de habilitação do Centro de Formação Permanente dos Oficiais da Justiça — que está em gestação — haverá formação informática. Iremos fazer a transposição das experiências-pilolo de Sesimbra, Cascais e Montijo a outros tribunais. Digamos que procuramos permanentemente, junto da Comissão Técnica Permanente — constituída para o efeito e composta por magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público, oficiais de justiça e técnicos do Ministério— avançar, tão depressa quanto possível, neste domínio.
Também, no início do ano que vem, começará a informatização dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça. O equipamento já está instalado (há sotware e hardware); agora, é uma questão de começar a informatizar os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça.
Não percebi bem a pergunta do Sr. Deputado Jorge Lacão a propósito dos tribunais da relação...
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Quando discutimos aqui a lei orgânica dos tribunais, admitiu-se criar novos tribunais da relação, mas isso não foi feito. Admitiu-se, todavia, por cláusula legal, a possibilidade de os actuais tribunais da relação virem a ter desdobramentos noutras áreas do distrito judicial. Um caso concreto: discutiu-se se se deveria ou não criar, por exemplo, um novo tribunal da relação em Santarém, c, nessa altura, o Governo acabou por optar de forma negativa quanto a essa possibilidade.
A questão que coloco é a de saber se a possibilidade que a lei orgânica conferiu de operar desdobramentos de tribunais da relação tem sido ou não executada ou se há um plano de execução dessas possibilidades de desdobramento.
O Orador: — Sr. Deputado, não estamos a pensar fazer desdobramentos de tribunais da relação, porque constatamos que o movimento processual que se podia
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fazer, atribuindo uma circunscrição territorial para criar
um tribuna) da relação cm Santarém (o caso concreto que
imaginei que fosse aquele que quisesse levantar), nüo justificava, de modo algum.
Os que existem correspondem a uma dimensão geográfica e a um volume processual que consideramos suficiente, pelo que, neste momento, está fora de questão a criação de novos tribunais da relação.
O Sr. Deputado José Magalhães teve a bondade de relembrar-me o que está escrito no segundo ano de governo: «Caminho do progresso» —e a palavra é minha c não do Sr. Deputado — e fez uma espécie de dicionário de legislação. Leu todos os diplomas que o Ministério tem em preparação.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Que estavam previstos para 1990!
O Orador: — Sr. Deputado, não se fazem leis dessa envergadura, como o Sr. Deputado imagina e terá a hombridade de reconhecer, com um calendário rígido. Aquilo que disse que foi minha excitação inicial de produzir legislação é imputável ao Sr. Deputado e à Assembleia da República, que condicionou a entrada em vigor do Código de Processo Penal e da publicação de toda a legislação que referiu e que o Ministério teve de publicar num curto prazo.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor. Permito tudo!
O Sr. José Magalhães (PCP): — Muito obrigado, Sr. Ministro.
A expressão é peculiar e compreendo que o tenha sensibilizado.
O que eu queria com ela sublinhar é que houve um grande desfasamento entre o programa previsto pela Assembleia da República e a sua execução, por um lado, no plano legislativo, e, por outro, no plano material.
Não é por acaso que há dias, no domingo, precisamente no Congresso dos Trabalhadores Judiciais, que unificou os respectivos sindicatos, tivemos ocasião de discutir esse aspecto e o próprio Sr. Procurador-Geral da República referia-se às dificuldades quanto ao Código de Processo Penal, não só dificuldades de interpretação quanto às questões da prova pericial, conexão de crimes, medidas de coacção, suspensão provisória do processo,
delegação de competências, como quanto aos próprios meios sistémicos de combate à criminalidade; aliás, é reconhecido objectivamente que falharam. O Ministério Público aplicou o Código, sem meios (isto é um facto histórico!), sem os meios que prevíamos nessa lei detestável. O Ministério Público teve de aplicá-la, com um um défice de meios, com comarcas sem quadros, com mobilidade de quadros, com incapacidade de dotação funcional, com grande dificuldade em cumprir o princípio da dependência profissional da polícias em relação ao Mi-msiério Público, sem coordenação, falhando cm coisas inacreditáveis. Falharam as notificações. Dizemos: «Por que é que falharam as notificações?». Somos capazes de tudo e não somos capazes de organizar com os CTT um sistema decente dc notificações? Por que é que o Ministério não e capaz de fazer isso1) Vfà problemas desse tipo — que já não são dc excitação legislativa mas de competência — que se verificam.
Por outro lado, há uma questão de responsabilidade politicai Então, o Governo vem à Câmara, que aprova (nao com o nosso voto, no caso) umas GOP que prevêem para o ano 1989 a concretização de uma panóplia de reformas; um ano depois, nada disso acontece (o Sr. Ministro anuncia, quando muito, que vai dar uns retoques no Código de Processo Penal) e ninguém verifica que houve um incumprimento dc metas? Nós pagamos isso! O País paga as consequências disso! ... E este o aspecto que gostaria de sublinhar, Sr. Ministro.
O Orador: — Sr. Deputado, se eu quisesse trazer à Câmara, neste momento, um Código de Processo Civil novo trá-lo-ia, porque, como sabe, já foi posto à discussão pública um anteprojecto de Código de Processo Civil. Se eu o quisesse trazer tal e qual ele saiu da Comissão encarregada da revisão do Código, eu tinha-o aqui.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Mas isso era um desastre, é óbvio!
O Orador: — Por isso mesmo, Sr. Deputado, estamos a tentar...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Era péssimo!
O Orador: — Eu não diria que era péssimo.
Pois bem, o anteprojecto foi posto à discussão pública e alarguei o prazo de discussão. É democrático, Sr. Deputado, não é verdade?
O Sr. José Magalhães (PCP): — É prudente!
O Orador: — Com certeza.
Portanto, o Sr. Deputado não pode acusar-me, por um lado, de excitação ... Aliás, não pense que estou magoado com a palavra. Deus me livre! Não sou tão sensível quanto isso!... O que penso é que, neste domínio, era muito pior uma precipitação e, por isso, optei por uma cautela.
Neste momento, já tenho a versão final, entregue pela comissão, do Código dc Processo Civil, depois dc larga discussão e de profundas alterações que foram introduzidas, em resultado dessa discussão. Não se trata apenas de um pequeno ajustamento do Código de Processo Penal que a comissão encarregada dc rever toda a pane criminal já terminou. O Sr. Deputado esqueceu-se, com certeza, que referi na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que está revista a parte geral do Código Penal; até Março, será revista a parte especial e, com ela, o direito penal económico. A comissão está a trabalhar a bom ritmo e reúne todas as semanas. Agora, eu não posso obrigar os elementos que fazem parte de uma comissão — que é composta por juristas dc alta envergadura, que estão a trabalhar a um ritmo que posso considerar bastante acelerado — a apresentar uma obra feita, quando eles não a têm. Não se fazem leis como se faz um qualquer produto industrial. Aquilo não é uma cadeia dc produção, mas um conjunto de pessoas, responsáveis e conhecedoras, que estão, em concreto, a procurar encontrar soluções legais positivas.
Por essa razão, esteja descansado, Sr. Deputado, que, durante 1990, na Assembleia da República, darão entrada alterações ao Código Penal, ao Código de Processo Penai e ao direito penal económico.
Em termos de processo dc recuperação de empresas e direito falimentar, devo dizer-lhe que a comissão está a
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trabalhar na revisão global do direito falimentar, mas, entretanto, como sabe, saiu um diploma sobre o processo de recuperação de empresas, que mostrou algumas disfunções em relação à prática quotidiana. Os elementos que compõem a comissão tiveram de fazer um pequeno interregno nos seus trabalhos para alterarem esse código do processo de recuperação de empresas, uma fase prévia à declaração de insolvência e de falência das empresas que me parece cuidada e também uma atitude acertada.
Do ponto de vista da ratificação das secretarias judiciais, o Sr. Deputado pode imputar responsabilidades a toda a gente menos ao Govemo. Se o processo de ratificação não avançou é porque a Assembleia entendeu que ainda não devia avançar. Não posso responder por um acto que não me pertence.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Nem a pergunta era essa!
O Orador: — Quanto ao acesso ao direito, posso dizer -lhe que está a funcionar satisfatoriamente. Ainda outro dia, como também anunciei na Comissão, tive ocasião de subscrever um protocolo com a Ordem dos Advogados c com o Conselho Distrital do Porto sobre a criação do Gabinete de Consulta Jurídica, no Porto, e, em conversa com o Sr. Bastonário e com o presidente do Conselho Distrital do Porto, tive ocasião de ouvir aquilo que eu já sabia, isto é, os advogados portugueses têm participado em congressos internacionais sobre o acesso ao direito e a imagem que eles trazem de lá é a de que aquilo que temos andam os outros à procura. Isto é, temos um sistema de acesso ao direito que consagra princípios básicos que tem soluções verdadeiramente inovadoras que outros Estados, outros países, na Europa, gostariam de ter.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: —Faça favor.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, obviamente que estou de acordo em que a lei é positiva. Aliás, como V. Ex.* se recordará e para que lodos festejemos, ela foi aprovada por unanimidade.
O problema não está aí: é que demorou quase um ano (ou, pelo menos, mais de seis meses) a ser regulamentada e, depois de regulamentada, já foi alterada em relação às regras sobre defesa oficiosa em processo penal. A minha pergunta concreta não foi a de saber se éramos admirados pelo mundo (e não sei se por outras galáxias!) mas se, no caso concreto, a alteração que V. Ex.* introduziu — e que é fulcral— foi introduzida porque aqueles que ao seu lado se sentam o alertaram para que não há dinheiro ou se foi por outra razão qualquer. Qual é a filosofia?
O Orador: — Foi outra razão ...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Suponho que o estrangeiro não admirará muito essa última norma.
O Orador: — Sr. Deputado, posso dizer-lhe que a alteração que foi introduzida foi-me pedida por muitos magistrados. Foi ouvida a Ordem dos Advogados, que, apesar de não ter dado o aval pleno à alteração, em termos de princípio, está de acordo com ela. Isto porquê?
Porque a norma que lá estava — e o Sr. Deputado disse que respeitava a filosofia do sistema e eu acho que sim, na sua pureza, numa utopia (e é bom que, às vezes, sejamos utópicos!) —, na verdade, estava a degradar o sistema. É que havia circunstâncias em que um advogado, num minuto, ganhava 10 contos.
Por conseguinte, toda a gente estava indignada com esta situação e entendeu-se, a começar pelos próprios advogados, pelos magistrados, quer juízes, quer magistrados do Ministério Público, que não era dignificante para o sistema que isso pudesse acontecer. Portanto, a alteração da norma não foi tanto por falta de dinheiro, mas, antes, por esse aspecto que não ajudava a dignificar o sistema.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Mas passou-se para o extremo oposto.
O Orador: — Não é o extremo oposto, porque, se há uma intervenção mais prolongada, o juiz tem possibilidades de determinar honorários mais significativos.
Quanto à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e correspondendo aos desejos de síntese da minha parte, que vejo, de forma implícita, expressos pelo Sr. Presidente desta Comissão, direi que não se pode passar dos 8 para os 8000. Isto é, para ter uma ideia, Sr. Deputado, dir-lhe-ei que a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, em 1986, gastou no PIDDAC de 1976 1000 contos; em 1987, gastou 301 000 contos; em 1988, gastou 924 000 contos; em 1989, vai gastar 1 500 000 comos, aproximadamente, penso eu, uma vez que isto é uma estimativa; em 1990, tem para investir um total de 1 434 000 contos. Para além disso, para além deste 1 434 000 contos, ainda terá mais 616000 contos do orçamento do Gabinete de Gestão Financeira, como despesa de investimento. Ou seja, em 1986, a Direcçâo-geral dos Serviços Prisionais gastou 76 000 contos em despesas de investimento e, em 1990, terá à sua disposição 2 milhões de contos.
Sr. Deputado, nem os próprios serviços terão capacidade para executar mais do que isto. Estamos a crescer a um ritmo aceleradíssimo, que tem como única limitação a capacidade técnica da própria Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, e essa não a posso resolver com dinheiro, tem de ser com tempo.
A propósito dos vencimentos dos conservadores e oficiais de registo c notariado e dos oficiais de justiça ...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Não quer falar de Monsanto?
O Orador: — Monsanto é para desactivar. O Sr. Deputado sabe que, por exemplo, há cerca de 30 anos, não se iniciava a construção de uma cadeia em Portugal?
O Sr. José Magalhães (PCP): — É um facto!
O Orador: — Durante o meu mandato no Ministério da Justiça, este conseguiu um estabelecimento prisional novo, ou seja, a desafectação das Forças Armadas do reduto norte de Caxias e começou-se a construir uma nova cadeia no Funchal, o que é um happening. Ao fim de 30 anos que não conseguia construir-se uma cadeia e esta está cm adiantado estado de construção. Agora, as cadeias não se constroem em seis meses... Não é pelo Ministro decidir «eu quero uma cadeia ali» que ela aparece feita. São precisos terrenos, estudos, projectos...
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Como o Sr. Deputado imaginará, para um projecto de arquitectura com vista à construção de uma cadeia é precisa a intervenção da Direcçâo-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, que demora um ano e meio, dois anos. Mas nós vamos avançar com outra cadeia: a de Faro. O terreno já está expropriado —e os Srs. Deputados já tiveram o privilégio de visitá-lo—, e levantou alguma reacção que não tinha fundamento. Mas o projecto está a ser feito e, assim que eu o tiver, inicio a cadeia. Quando eu tiver estas cadeias feitas, naturalmente que posso desactivar a cadeia de Monsanto; enquanto não as tiver, não posso pôr os presos na rua nem posso sobrecarregar mais as outras cadeias, que já tem algum défice de celas de presos.
Em relação ao novo estatuto remuneratório dos oficiais de justiça, as negociações estão a decorrer, sem tensão, com um bom espírito de diálogo à proposta inicial do Governo. Houve uma contraproposta do sindicato, o Governo já apresentou uma outra contraproposta e o sindicato disse, outra vez, o que é que deseja, pelo que estamos em fase de negociações.
Quanto aos conservadores e oficiais de registo e notariado, por vontade expressa dos conservadores do registo e notariado e por nossa convicção de que, efectivamente, assim devia ser, os conservadores e os oficiais de registo c notariado e os notários não são abrangidos pelo sistema remuneratório da função pública. Portanto, o Governo está a acabar a revisão do sistema remuneratório da função pública e de seguida irá tratar esse corpo autónomo, que não é corpo especial...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): —O que V. Ex." está a referir é objectivo. Só que o Governo tinha prometido que a partir de Outubro estaria em vigor o novo sistema revibutivo e não está.
O Orador: — O novo sistema retributivo da função pública. Simplesmente, por vontade própria de todas as associações sindicais, dos conservadores e notários e dos oficiais de registos e notariado, eles querem um tratamento completamente autónomo, que merecem, por razões de filosofia que não vale a pena adiantar agora aqui. Não têm, portanto, este enquadramento e terão de ter um enquadramento diverso. É nesse que estamos a trabalhar.
Não tem nem deve ser contemporâneo da revisão global do sistema remuneratório da função pública. É que nem sequer irão ser corpo especial. Têm um estatuto próprio e foi isso que ficou consagrado em lei. É esse estatuto que tem aspectos que vão muito para além das simples questões salariais. Já iniciámos o respectivo estudo e iremos, assim que tivermos uma proposta concreta, encetar o diálogo com o pessoal das conservatórias e dos cartórios notariais.
Em qualquer caso, como o Sr. Deputado saberá, houve, no fim do ano passado ou princípio deste ano, um ajustamento salarial quer para os conservadores, quer para os notários, quer ainda para os oficiais de registos e notariado, com ajustamentos de letras e alterações da participação emolumentar que recebiam. Houve já um ajustamento intercalar. Vamos agora avançar para a reforma de fundo.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos, é verdade que há atrasos consideráveis nas conservatórias do registo predial e comercial. É um dos problemas que mais me afligem no Ministério, uma vez que, havendo bloqueamentos nas conservatórias do registo predial e comercial, há também bloqueamentos na actividade económica e na vida dos cidadãos.
Os quadros de pessoal constituem um problema dramático, sobretudo porque hoje, felizmente de um ponto de vista e infelizmente de outro, a procura de emprego nas conservatórias e cartórios notariais não tem comparação nenhuma com a do passado. As pessoas estão empregadas e não querem concorrer a esses empregos. Há muitos concursos que ficam desertos.
De lodo o modo, posso dizer-lhe que no ano passado descongelámos 3S0 lugares para oficiais de registos e notariado, o que 6 uma excepção, porque esse pessoal é considerado pessoal administrativo nos descongelamentos da Administração Pública. Este ano, sem paralelo em qualquer outro ministério, foram descongelados mais 3S0 lugares para oficiais de registos e notariado e vão ser abertos concursos, que também já estão autorizados pelo Ministério das Finanças, para 160 conservadores e notários.
Há, portanto, a consciência de que os quadros de pessoal estão desfalcados. Por isso, houve também um tratamento excepcional para o pessoal das conservatórias e cartórios notariais em termos de descongelamento dentro da Administração Pública.
Em qualquer caso, o que é que procuramos fazer? Quando há atrasos mais significativos numa conservatória, lemos uma espécie dc brigadas para acudir a essa conservatória. Há equipas, constituídas a nível central, que vão procurar desbloquear situações de maior atraso, quando elas se verificam.
É claro que o problema do registo predial tem muito a ver também com a cobertura cadastral do País. Os métodos são arcaicos e a informatização poderá ser um passo em frente. Como o Sr. Deputado disse, e bem, o processo de informatização da Conservatória do Registo Predial de Oeiras está em curso. Pensamos que durante o próximo ano será possível fazer um plano, com três fases, para a informatização global do registo predial e a sua ligação ao registo comercial e ao registo nacional de pessoas colecüvas.
Ainda ontem tive ocasião dc visitar a Conservatória do Registo Comercial do Porto, que é uma das que regista atrasos e cujas instalações são diminutas — as pessoas não cabem lá dentro. Já encontrámos uma alternativa: vamos fazer a transferência dos serviços e o director-geral dos Registos e do Notariado e eu próprio tivemos ocasião de explicar às pessoas que lá trabalham que muito brevemente será possível a informatização de todo o registo predial.
Em relação ao P1DDAC, o Sr. Deputado citou o caso de Coruche. Como eu disse, o Ministério da Justiça tem 4 011 000 contos de PIDDAC no Orçamento do Estado, mas, através do Gabinete de Gestão Financeira, temos previsto um orçamento de 3 939 000 contos para despesas de investimento, uma parte substancial das quais se destina a tribunais. Ou seja: para tribunais, do Gabinete de Gestão Financeira financiar-se-âo investimentos da ordem dos dois milhões e meio de contos. Há um programa detalhado tribunal a tribunal, estando o Tribunal de Coruche nele contemplado. Não avançou antes porque o projecto não eslava pronto e não nos podemos substituir aos arquitectos.
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Quanto à última questão que me colocou —a da actualização do capital social das empresas—, já foi aprovado em Conselho de Ministros um decreto-lei que prorroga o prazo por um tempo superior àquele que referiu — não é até ao fim deste ano, mas sim, embora não tenha a certeza, até ao fim de 1990.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem ainda a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, quero, concretamente, fazer um pedido de desmentido (a fórmula será pouco vulgar, mas o caso não é para menos).
Uma das reformas legislativas que, simultaneamente com os tais retoques no Código de Processo Penal, será necesssário fazer em 1990 é a revisão da Lei Orgânica da Polícia Judiciária. Segundo notícias vindas a lume e que provocaram compreensível impacte negativo, o diploma em preparação significaria um regresso à competência exclusiva da Polícia Judiciária, impedindo o Ministério Público (MP) de avocar os processos que hoje pode avocar e condenando-o a ficar com bagatelas penais. Por outro lado, esse diploma limitaria os poderes de direcção cometidos ao Ministério Público, criaria uma fase de investigação prévia policial — «pré-processual», assim se chamaria a cuja dita— e legitimaria a existência de agentes secretos da Polícia Judiciária ou, pelo menos, de gente com um estatuto secreto e com remuneração pública (esta, como é óbvio, certamente não secreta).
Não sei bem como é que V. Ex.* compatibiliza esta última norma com as regras constitucionais sobre a existência de dotações e fundos secretos e outras coisas respeitáveis.
Em todo o caso, quanto às primeiras —reforma legislativa —, não por acaso os mais altos responsáveis da Procuradoria-Geral da República tiveram ocasião de sublinhar que isso seria perigosíssimo. O que lhe pergunto, Sr. Ministro, é se V. Ex/ faz o desmentido ou se, pelo contrário, faz não digo o «mentido», mas a confirmação, de tais intenções.
A segunda questão que lhe quero colocar, mais concreta e muito prática, diz respeito à Direcção de Investigação e Acção Penal (DIAP). A DIAP, numa descrição suscinta, tem uma secção central e seis secções de processos; é repartida —é incrível— por dois edifícios diferentes; tem 21 magistrados do MP mais cinco; tem 35 ou 40 funcionários aglomerados e dez funcionários na secção central; tem 5 500 processos novos por mês; cada magistrado do MP tem 275 processos novos e cada secção 825, num total de 1100 processos... E poderia continuar por aqui adiante. É verdadeiramente inacreditável como é que é possível manter condições de funcionamento deste tipo, em que os processos, alguns do mais alto valor e às vezes contendo provas que transitam do Tribunal da Boa Hora de táxi, de metropolitano e, se em Lisboa houvesse trolley cars, também de trolley car, às vezes contendo droga, contendo tudo, circulam assim, sem medidas especiais. E tudo isto funciona graças à boa vontade, ao denodo, ao brio e a outros aspectos que vão salvando estas coisas quando os governos não governam bem.
Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se, face a este quadro de dificuldades, que é de facto gritante e muito perigoso, dadas as funções da DIAP, o Ministério está disponível para encarar isto no curtíssimo prazo. E o curtíssimo prazo não é sequer o ano de 1990, que tem,
como sabe, doze meses, mas já o ano de 1990! — segundo uma conhecida frase.
São estas as duas questões que queria colocar. Ficaríamos mal e com um peso na consciência se elas não fossem formuladas. E V.Ex.*, seguramente, também, se a elas não respondesse.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência e da Justiça.
O Sr. Ministro da Presidência e da Justiça: — Agradeço-lhe, Sr. Deputado José Magalhães, as questões que coloca
Para o Sr. Deputado, governar bem deve ser pegar numa varinha de condão, chegar à Boa Hora e conseguir que a Boa-Hora, que tem 10 000 m2 de área útil, passe a ter 50000.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Tanto não, Sr. Ministro!
O Orador: — E, então, todas as pessoas, todos os magistrados, os oficiais de justiça, os processos todos caberiam lá dentro. É impossível, Sr. Deputado!
Duvido é que o Sr. Deputado conseguisse governar tão bem que lhe permitisse em termos tão rápidos ter arranjado instalações para a DIAP e ter dotado a DIAP de todo o equipamento absolutamente imprescindível.
É que todas as unidades de oficiais de justiça que para lá foram não estavam ao serviço do Ministério Público. Foram já afectados pelo meu Ministério.
O Sr. José Magalhães (PCP): —É claro!
O Orador: — Têm 40? Deveriam ter 60? Mas podiam não ter nenhum! Não invento é oficiais de justiça, Sr. Deputado. Não posso chegar à Rua de Ferreira Borges e dizer. «O senhor quer ser oficial de justiça? Se quer, venha cá, que vai ali para a DIAP.» Os oficiais de justiça têm de ser admitidos e há trâmites legais a observar. Se eu não os observasse, o Sr. Deputado protestaria contra mim, porque eu não atendia às formalidades legais, não obtinha o visto do Tribunal de Contas, não fazia os concursos nos termos legais.
O Sr. Deputado está, portanto, a pedir impossíveis ...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Não, só estou a pedir que o trabalho não seja sobre-humano.
O Orador: — Sr. Deputado, eu não sou um santo milagroso (emboras às vezes tenha um ar de São Francisco) e não posso inventar pessoas e fazer o que não há.
O Sr. José Magalhães fPCP): — Mas por que é que hão-de ser os trabalhadores?
O Orador: — Como é que o Sr. Deputado quer que eu ponha lá mais oficiais de justiça sc não os há? Tenho de cumprir formalidades legais, abrir concursos e dar formação às pessoas, elas têm de ser admitidas nos termos da lei e tem de ser obtido o visto do Tribunal de Contas. Ou quer que se recrute qualquer pessoa de qualquer maneira?
O Sr. José Magalhães (PCP): — É claro que não. Sr. Ministro.
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O Orador: — Vou talvez ali a Monsanto e digo: «Os senhores querem dar ali um jeitinho e ser oficiais de justiça na DIAP?».
O Sr. José Magalhães (PCP): — Nüo faça isso! Isso é demagógico!
O Orador: — Não pode ser e o Sr. Deputado sabe bem que não.
Mas mais: combinei já uma reunião, para a próxima semana, com o Procurador-Geral da Republica, o Director-geral dos Serviços Judiciários e o responsável pela DIAP (isto para ver que não me estou a esquecer dos problemas e que os procuro resolver o melhor que posso e sei) para ver se é possível afectar eventuais oficiais de justiça que porventura estejam subocupados noutros tribunais e procurar reforçar os efectivos.
Estou agradecido ao serviço e ao manifesto espírito de dedicação pública que as pessoas que trabalham na DIAP têm manifestado.
Mas olhe que hoje já lá têm computadores, que há um ano não havia, e vão ter telefaxes. Estamos a procurar munir as pessoas de todos os instrumentos necessários, mas não é possível resolver isso de um dia para o outro.
Ainda ontem visitei uma espécie de DIAP que há no Porto. Também foram instalações que tivemos de arranjar e remodelar em tempo relâmpago. Conseguimo-lo fazer e estão numa solução satisfatória
A DIAP tem falta de oficiais de justiça e tem acanhamento de espaço.
O Sr. José Magalhães (PCP): —E não só!
O Orador: — O edifício onde está instalada a DIAP é composto por três andares. Depois, uma outra parte está na Rua de Comes Freire, porque o Ministério Público quis continuar na Rua de Gomes Freire — e eu achei bem que continuasse. Posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que estamos a tentar adquirir todo o.edifício onde está instalada a DIAP, que não é do Estado. Estamos em negociações nesse sentido. Se for possível adquirir aquele edifício, poderemos, então, colocar ali uma DIAP em condições. Agora, não tenho espaço físico para pôr as pessoas ...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Prolongar este pin-guepongue seria legítimo. Em todo o caso, permita-me que sublinhe apenas a gravidade das dificuldades de ligações entre os famosos dois edifícios. Vistas materialmente, as ligações entre os dois edifícios são assim: transportar em carrinhos de supermercado ou similares processos e dados, mais dados e dados em caixas de «Foto Xerox»...
O Orador: — Mas sempre foi assim.
O Sr. José Magalhães (PCP): —... ou transportar da Boa Hora elementos de prova num saco, com um funcionário que pode ser assaltado...
V.Ex.* já meditou sobre isto? É preciso que algum seja assaltado para que sejam tomadas medidas?
O Orador: — Sr. Deputado, é muito fácil acusar, mas muito mais difícil fazer.
Posso dizer-lhe que, em termos de segurança nos tribunais e nas cadeias, só agora se está a fazer alguma coisa de forma concreta e organizada.
Posso dizer-lhe, por exemplo, que estou a montar um plano de segurança no Tribunal da Boa Hora. Mas não é fácil montá-lo. Ainda este ano, vamos comprar dois detectores de metais e sistemas de intercomunicadores internos. Mas, para isso, tenho de gastar para aí nove meses em abrir concursos, adjudicar propostas, etc. É isso que estamos a fazer.
Decidi, por exemplo, começar a pagar à Polícia de Segurança Pública os polícias requisitados no Tribunal da Boa Hora. Sabe porquê? Porque, se não lhes pagar e forem obrigatoriamente cedidos pelo Ministério da Administração Interna, os polícias que lá estão, por muito boa vontade que tenham, são polícias que já não andam na rua e que estão cansados, são pessoas que, ao fim e ao cabo, não garantem segurança. Já transferimos para o Ministério da Administração Interna 60000 contos e combinámos com o Sr. Ministro da Administração Interna que, a partir de agora, escolheremos, em conjunto, os polícias que lá queremos.
Estamos a contactar um graduado da PSP reformado para se organizar um gabinete de segurança no Tribunal da Boa-Hora. A seguir, iremos para a DIAP. Tive de encomendar um estudo a um coronel reformado do Exército, que analisou todo o edifício da Boa Hora, o visitou de cima a baixo e verificou as vulnerabilidades do edifício. Preparou-me um estudo que tem 200 páginas e medidas concretas, que já accionei. A partir da Boa Hora, iremos passar para a DIAP.
Agora, não há segurança em Aveiro, nem no Palácio da Justiça do Porto, nem em tribunal nenhum.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Fica registado na acta, e isso é grave!
O Orador: — Estamos a começar, mas tem de se começar por algum lado e a verdade é que comecei.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Espero que sim!
O Orador: — Quanto ao desmentido, o desmentido só se fosse àquilo que o Sr. Deputado disse. A Lei Orgânica da Polícia Judiciária está praticamente ultimada...
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Há quantos anos?
O Sr. José Magalhães (PCP): — Há meses!
O Orador:—Com certeza que há meses. Os senhores estão mais impacientes do que os sindicatos, meu Deus! ...
A Lei Orgânica da Polícia Judiciária está praticamente ultimada e o que tem retardado a sua aprovação final é o facto de eu não a ter querido aprovar sem se definir também a grelha salarial da Polícia Judiciária. É isso que está em discussão e que tem atrasado a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, porque com ela vêm as normas de transição de carreiras e categorias. Pareceu-me absolutamente inconsequente publicar uma lei que logo a seguir pudesse ter de ser alterada em função daquilo que se decidisse em termos remuneratórios. Quanto à articulação com a Procuradoria-Geral da República e o Ministério
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Público, esteja o Sr. Deputado descansado pois já informei os sindicatos da Polícia Judiciária que depois de chegar a acordo com eles ainda iria dar a conhecer o texto ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e ao Sr. Procurador -Geral da República e ia dialogar com eles sobre a articulação entre a Polícia Juduciária e o Ministério Público. Portanto, todos esses problemas cujo teor conheço — também li os mesmos textos, falei com as mesmas pessoas — serão abordados directamente com as pessoas que voluntária ou involuntariamente o Sr. Deputado enunciou; saberemos dialogar com elas...
O Sr. José Magalhães (PCP): — Não há agentes secretos?
O Sr. Ministro da Presidência e da Justiça: — Não estava a falar disso, mas das relações entre a Polícia Judiciaria e o Ministério Público.
Quanto aos agentes secretos a ideia é esta, Sr. Deputado: eles não serão secretos dentro da Polícia, não serão agentes ignorados por todos os seus colegas da corporação. É que muitas vezes o crime avança para áreas de que não há peritos denuo da Polícia Judiciária, e podemos ter de, para determinado tipo de coisas, contratar pessoas que são conhecidas dos seus colegas (desde os superiores hierárquicos aos colegas da secção) e vão trabalhar em conjunto temporariamente enquanto estiver em investigação determinado tipo de crime. Esteja descansado que não quero fazer da Polícia Judiciária uma polícia secreta, pelo contrário, uma polícia bem à vista.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim da análise do orçamento do Ministério da Justiça
Sr. Ministro, quero agradecer a sua presença bem como a dos Srs. Directores Gerais.
Srs. Deputados vamos fazer uma pequena pausa, seguindo-se de imediato a discussão do orçamento do Ministério das Finanças.
Pausa.
Srs. Deputados, iremos analisar o orçamento do Ministério das Finanças. Temos connosco o Sr. Ministro das Finanças e os Srs. Secretários de Estado do Ministério. Temos, contudo, um problema complicado que devo expor-vos: dado os atrasos sucessivos dos nossos trabalhos, hoje vamos dispor de muito pouco tempo para o Ministério das Finanças visto que a hipótese que estava a colocar do prolongamento para a noite, dado o dia que é e os compromissos que o Sr. Ministro já tinha assumido, nao será possível fazê-lo. Portanto, vamos ter que decidir o que poderemos fazer durante os próximos 45 minutos, tempo de que dispomos e o qual, segundo creio, não será suficiente para analisarmos a totalidade do orçamento. Como tal, teremos de considerar a hipótese de utilizar uma parte do tempo de segunda-feira, dia 4, à tarde.
Começaria por perguntar se VV. Ex." desejam fazer alguma exposição inicial ou se consideram que as matérias estão suficientemente dilucidadas pela vossa parte e poderíamos passar imediatamente às perguntas.
O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Cadilhe): — Passemos de imediato às perguntas dos Srs. Deputados, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Vieira de Castro já se inscreveu. Quantos outros Srs. Deputados desejam formular perguntas para poder fazer uma ideia de tempo que irá ser necessário?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.
O Sr. Vieira de Castro (PSD): — A minha pergunta é dirigida ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. A grande crítica que a oposição fez ao Governo foi no sentido de que as receitas fiscais estariam subavaliadas. E, com fundamento nisso, a oposição vem apresentando numerosas propostas de alteração no sentido de aumentar a despesa...
A Sr.' Helena Torres Marques (PS): —O PSD também!
O Orador: — Mas prometem que aí virão as propostas que corrigindo, no entender da oposição, as previsões das receitas vão deixar o défice intocável se é que o não vão reduzir. Em meu entender, seja-me permitido dizer que esta estratégia da oposição é um pouco como a do homem que vai tirando uns coelhos da cartola!
O Sr. Luís Roque (PCP):—Já lá estavam!
O Orador: — Aproveito aqui a presença do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais porque até agora a oposição não provou que a previsão das receitas fiscais esteja subavaliada Enfim, fazem essa afirmação. Espero que a demonstração fique aqui feita hoje num sentido ou noutro. E é por isso que faço uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que em síntese é esta: estão as receitas fiscais subavaliadas?
Mas a oposição diz mais, diz que isto é uma subavaliação propositada, premeditada, para lá para Outubro do próximo ano (vou utilizar palavras da oposição) «o Govemo fazer outro brilharete», vir apresentar uma alteração orçamental no sentido da redução do défice.
A oposição diz ainda uma coisa mais grave do que esta que agora citei: é que, sobretudo no que respeita à previsão da cobrança do IVA, o Governo pretenderia lesar as câmaras municipais, uma vez que as transferências do Orçamento do Estado para as câmaras municipais —o Fundo de Equilíbrio Financeiro — são feitas com base na previsão da cobrança do rVA. Em síntese, era isto que tinha para perguntar ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, per-mitia-me fazer uma sugestão a V. Ex.': a de que esta primeira questão colocada pelo Sr. Deputado Vieira de Castro fosse respondida porque, de facto, aparece num enquadramento tal que penso ser preferível não se misturar com as questões que queremos colocar.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário r)e Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira Costa): — Sr. Deputado Vieira de Castro, as
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receitas não estão subavaliadas. De modo algum isso acontece. Já tivemos oportunidade de dizer, aquando da discussão do Orçamento do Estado na generalidade, que o facto de em dois anos consecutivos ter havido receita que superou aquilo que foi previsto se deve, acima de tudo, a ter-se posto em prática uma política de recuperação de impostos atrasados. E todos estão bem certos do Decreto -Lei n.° 53/88, que, inclusivamente, permitiu o pagamento diferido de impostos em atraso que atingiam mais de uma centena de milhão de contos. É evidente que no ano de 1988 se recebeu bastante dinheiro e no ano de 1989 voltou-se a receber só no conjunto de impostos atrasados 112 milhões de contos.
É isto que tem sido determinante para a boa performance das receitas fiscais. Pretender-se agora que isto vai continuar é uma pura ilusão, e penso que não podemos correr riscos dessa natureza. Os Srs. Deputados pretendem que afinal se force a receita para depois, no decurso do ano, se pedir um orçamento rectificativo, ou suplementar, porque não se atingiu o patamar das receitas que era indispensável para cobrir as despesas? É isso que querem?
Aliás, quantas dificuldades houve porque se fizeram subir as receitas para além daquilo que era razoável? Em 1987 não atingimos o nível das receitas que foram previstas depois, a forúori. Não vamos, pois, cometer o mesmo erro. As receitas não estão subavaliadas, e se tivermos em 1990 o valor global das receitas que estão inscritas no Orçamento vai ser necessário um esforço muito grande, e só porque falo no esforço e na determinação das pessoas é que não digo que é preciso ter muita sorte.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, a primeira questão que gostaria de colocar reporta-se aos pedidos de informação que foram feitos pela Comissão de Economia, que até ao momento não nos foram enviados e que reputamos de interesse para a discussão na especialidade do Orçamento, quer em lermos de despesas —de que agora nos ocupamos—, quer em termos de receitas.
Recordaria, fundamentalmente, o pedido que foi feito sobre alguns elementos infprmativos relacionados com o programa de recuperação financeira da Região Autónoma da Madeira. E, com muita sinceridade o digo, penso que, sem estes elementos, pela nossa parte não estaremos em condições de discutir com profundidade o programa que nos é apresentado.
Acabámos de receber às 18 horas e 10 minutos do dia 30 de Novembro uma informação sobre as taxas de juro implícitas e sobre as taxas de cambio previstas. Deveríamos proceder agora à discussão desta problemática em termos de projecção de despesa, mas, logicamente, tendo nós recebido, como disse, há cerca de 40 minutos a informação, ninguém (penso eu) estará em condições de fazer a tal discussão aprofundada que seria necessário fazer, pedindo informações sobre receitas que, embora constituindo matéria que nos vai ocupar fundamentalmente nos próximos dias 6 e 7, em parte tem repercussões directas nas despesas de que nos ocupamos hoje, designadamente a questão da projecção das cobranças do IVA.
Entre os pedidos formulados e não respondidos conta--se também a solicitação da nota informativa sobre as margens efectivas do imposto sobre os produtos petrolí-
feros verificadas nos primeiros três trimestres de 1989 e as margens previstas para o 4." trimestre.
Feita esta breve referência à problemática dos elementos não fornecidos, completaria dizendo que a informação da projecção da cobrança de receitas que vem no relatório é manifestamente insuficiente. Aliás, foram solicitados os estudos que serviram de base a essa projecção. Certamente que não seria a pergunta, e a resposta consequente, que foi feita no início desta revisão de discussão do orçamento do Ministério das Finanças a dar resposta ao pedido da comissão, bem pelo contrário. As dúvidas que existiam permanecem totalmente, e diria ainda que essas dúvidas até se tornam maiores porque depois de ouvirmos tantas vezes os Srs. Membros do Governo, e designadamente o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, apontar para a necessidade da ponderação, da prudência na determinação da previsão das cobranças. Ao ouvi-lo agora dizer que «só com muita sorte atingiremos as verbas que estão inscritas» perguntamos: afinal e só com muita sorte ou é com prudência que cá estão inscritas?)
Uma voz do PSD: — Não, não foi isso!
O Orador: — A segunda questão está relacionada com a orçamentação dos fundos e serviços autónomos. Eu e o meu grupo parlamentar temos as maiores dúvidas de que as informações e mapas sobre os serviços autónomos que aparecem nesta proposta de lei respondam à exigência constitucional que ficou consagrada com a recente revisão e que diz claramente na alínea a) do n.B 1 do artigo 108.°: «O Orçamento do Estado contém a discriminação das receitas e despesas do Estado, incluindo as dos fundos e serviços autónomos.» Não me parece que haja aqui uma discriminação das receitas e despesas dos fundos e serviços autónomos como se exige na Constituição. Penso que é uma questão que deverá ser analisada com cuidado por toda a Comissão e pelo Governo, no sentido de se poder corresponder ao alargamento que representou a alteração orçamental nesta matéria — o alargamento em relação àquilo que vinha sendo feito.
Mas, para além disso, colocava uma questão global que se reporta a um serviço autónomo, reportando-se eventualmente a outros, pois não estive a analisá-los um por um. Trata-se do problema de, em termos dos mapas anexos, virem orçamentos de fundos e de serviços autónomos. Por conseguinte, não tem a ver com a exigência constitucional que há pouco aqui referi, porque essa é a parte relativa aos mapas, mas é informação complementar para a Assembleia da República.
Pegando no exemplo do Serviço Nacional de Saúde — admito, não estou a afirmá-lo, não estive a analisar orçamentos privativos—, verifica-se o seguinte: em termos de Orçamento do Estado stricio sensu aparece uma rubrica de 275 milhões de contos de transferência para o Serviço Nacional de Saúde. Contudo, vamos verificar o orçamento discriminado —ou que deveria ser discriminado— do Serviço Nacional de Saúde e o que é que aparece? Aparece uma rubrica, da mesma ordem de grandeza, de transferência do Serviço Nacional de Saúde para, salvo erro, o Departamento de Gestão Financeira da Saúde. Vamos à procura do orçamento deste departamento e verificamos que não existe...
Portanto, sobre o Serviço Nacional de Saúde há uma verba global de 275 milhões de contos que apenas existe em toda a cadeia orçamenial como transferência de um
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valor global. E tal não me parece ser suficiente para urna informação da Assembleia da República e para que isto possa ser discutido com a profundidade que merece.
O terceiro conjunto de questões que gostaria de colocar tem a ver com algumas rubricas que aparecem inscritas no orçamento do Ministério das Finanças. Assim, a primeira questão que nessa perspectiva colocaria relaciona-se com os subsídios.
Este ano os subsídios centram-se fundamentalmente no sector dos transportes —28,1 milhões de contos— e o pedido que eu faria de imediato iria no sentido de saber se o Sr. Ministro ou algum dos Srs. Secretários de Estado nos poderiam dar a indicação de qual a previsão de repartição dentro do sector. Para a questão ser mais simples, faria a seguinte pergunta: quanto será para a CP, quanto será para outras empresas de transportes?
Outra questão será a dos activos financeiros. Salvo erro ou omissão, quanto aos activos financeiros, a grande verba que nos aparece, para além da execução de avales, são 35 milhões de contos para empréstimos. Assim, gostaria de ter uma informação no sentido de saber, no essencial, para onde se dirigirão estes empréstimos e se estes vêm substituir aquilo que tem, até agora, constituído prática — por exemplo no Orçamento do Estado para 1989—, isto é, o haver algumas dotações de capital para algumas empresas. É que, na sequência da ressalva que fiz inicialmente («salvo erro ou omissão»), não detecto aqui verbas para aumentos do capital de empresas públicas.
Ainda dentro da rubrica «Acüvos financeiros», verifica-se a perspectiva de empréstimos a médio e a longo prazo para o exterior no valor de 10 milhões de contos. Admito que seja para algum ou alguns dos PALOP, mas gostaria de ter uma informação precisa sobre o assunto.
Quanto ao capítulo 60 «Transferências de capital», veri fica-se uma transferência para fundos autónomos, concretamente para o Fundo de Regularização da Divida Pública, no valor de 158 milhões de contos. Destes 158 milhões de contos, 150 milhões de contos decorrem da perspectiva de alienação de parte do capital social de empresas públicas.
O que gostaria de saber era qual terá sido a base da projecção dos 150 milhões de contos. Com efeito, se se inscrevem 150 milhões de contos, terá de haver um programa de privatizações, totais ou parciais, subjacente a esta verba, sendo esse programa que gostaria de conhecer. E isto em termos de programa não definitivo, mas de programa previsional, na medida em que a verba aqui inscrita é também previsional e uma vez que, como é lógico, não vou acreditar — estaria longe de mim uma ideia dessas — que os 150 milhões de contos fossem aqui inscritos com a ideia: teria de se inscrever uma verba qualquer, porque não 150 milhões de contos?
Passando aos orçamentos privativos, iria voltar ao Fundo de Regularização da Dívida Pública para colocar ainda uma questão. È que, no âmbito das receitas, em lermos de grandes reservas, para além dos referidos 158 milhões de contos, prevê-se uma verba de 28,7 milhões de contos. Esta verba, que inicialmente admiti poder consubstanciar o valor que passará para o Tesouro e proveniente das alienações de capital social de empresas públicas realizadas em 1989, aparece-me aqui como «juros», e eu não estou a ver que juros serão estes. Assim, gostaria de saber de onde é que vêm estes juros.
Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, de momento eram estas as questões que gostaria de colocar.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, irei, de seguida, dar a palavra ao Sr. Deputado Mota Torres, mas antes gostava de prevenir a comissão do que passarei a expor.
Como há pouco tínhamos já referido, estamos muito atrasados e há aqui problemas compreensíveis em relação aos compromissos que os Srs. Membros do Governo tinham já assumido no desconhecimento destes atrasos, que, aliás, não eram previsíveis.
Por outro lado, o Ministério das Finanças é obviamente o departamento mais importante na discussão do Orçamento e, por conseguinte, para que não se prejudique o aprofundamento das questões, vou propor à comissão que se interrompesse a reunião às 19 horas e 30 minutos. Assim, daria a palavra ao Sr. Deputado Mota Torres e depois pediria ao Sr. Ministro das Finanças e aos Srs. Secretários de Estado que, querendo, respondam às perguntas formuladas.
No dia 4, segunda-feira, iríamos assim fazer uma nova alteração e a discussão dos Encargos Gerais da Nação, prevista para as 12 horas, passaria para a tarde, continuando -se a discussão relativa ao Ministério das Finanças entre as 12 horas e cerca das 13 horas e 15 minutos.
Isto é importante em termos de conseguirmos um aproveitamento o mais cuidadoso possível do nosso tempo dentro dos condicionalismos particularmente difíceis que temos encontrado este ano.
Tem então a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.
O Sr. Mota Torres (PS): — Sr. Secretário de Estado do Tesouro, retomava agora, em sede de especialidade, uma componente política, que julgo importante, relativa ao programa de reequilíbrio financeiro da Região Autónoma da Madeira
Neste âmbito, começaria por me permitir rememorar aqui um episódio anedótico, que é contado muitas vezes a propósito da fanfarronice de algumas pessoas e que é tipificado no cidadão que, depois de ser agredido pela mulher, se levanta autoritário e diz: «E para a próxima levas mais!»
O Sr. Presidente da Comissão Políúca Regional do PSD, o Dr. Alberto João Jardim, quando é agredido naquilo que ele tem como ponto fundamental da sua propaganda política — a questão da autonomia regional —, vem à televisão dizer: «Eu estou aqui para lutar, mesmo contra o meu próprio partido, mesmo contra o meu próprio Governo, quando a questão da autonomia é beliscada, por mais pequena que seja essa beliscadura!»
E eu que pertenço a um partido da oposição desde sempre na Região Autónoma da Madeira—já lá vai mais de uma década —, tenho pugnado, juntamente com os meus camaradas de partido e com o meu partido no conjunto, para que haja uma definição de critérios e uma clarificação das transferências do Orçamento do Estado para a Região Autónoma da Madeira e das transferências do orçamento regional para as autarquias locais, embora sujeilas a critérios rigorosos; pela aprovação de uma lei de enquadramento orçamental para a Região Autónoma da Madeira; e tenho defendido uma lei de finanças regionais que ponha alguma ordem nisto tudo. Porém, quando, depois de alguma polémica e de algumas declarações mais ou menos altissonantes, no sentido de dizer que a renegociação do programa de equilíbrio financeiro ia trazer vantagens para a Madeira, o que aparece aqui, e que é traduzido no artigo 6.° da proposta de lei n.° 117/V, foi aquilo que há dias, perante o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, classifiquei como uma humilhação para a auto-
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nomia regional e para a Região Autónoma da Madeira, uma vez que se trata de uma proposta cerceadora da capacidade autonómica da Madeira.
Não estou a fazer considerações ou juízos de valor sobre se o Governo entende, legítima ou ilegitimamente, que deve pôr cobro a algum desregramento orçamental e financeiro da Região Autónoma da Madeira. Na verdade, estou, sobretudo, a debruçar-me sobre aquilo que está à minha frente, isto é, um artigo 6.° com quatro números, qual deles o pior.
Por exemplo, o n.° 2 diz apenas isto: «A Região Autónoma da Madeira não poderá contrair empréstimos que impliquem um aumento do endividamento líquido da Região, incluindo-se aqui todas as formas de dívida, bancária ou não.» Portanto, tal quererá dizer que a partir da aprovação da proposta de lei n.° 117/V, a Madeira não poderá contrair uma dívida de mais um tostão, ainda que isso signifique o seu atrofiamento total em termos de desenvolvimento.
Quanto ao n.° 3, o mesmo refere que «o Governo não poderá aumentar o saldo dos avales prestados à Região Autónoma da Madeira», o que quer dizer que, em relação a 1990, o Governo antecipadamente diz: não nos venham pedir avales, porque não concedemos avales, nem em mais um tostão, em relação ao endividamento da Região Autónoma da Madeira.
Finalmente, o n.° 4 diz uma coisa de facto espantosa: «Se, por força de avales, o Tesouro for chamado a cumprir a obrigação principal relativa a dívidas da Região Autónoma dá Madeira, fica o Governo autorizado a reter parte ou a totalidade da transferencia orçamental anual para aquela Região ou, em caso de insuficiência desta, receitas fiscais da Região até à concorrência dos montantes pagos em execução de avales». Ora, tal significa que, se o Estado for chamado a cumprir a obrigação principal, a Madeira pode, pura e simplesmente, ficar sem qualquer tipo de recurso a transferencias de verbas e impedida de recorrer a empréstimos, o que se poderá traduzir em que a Madeira chegará a um ponto em que não conseguirá sequer pagar aos seus funcionários da administração pública regional. Julgo que esta é uma situação absurda!
Por conseguinte, não acredito no Programa de Reequilíbrio Financeiro —julgo que ninguém acreditará, provavelmente nem o próprio Governo —, nem na possibilidade ou na exequibilidade do seu cumprimento, mas o facto é que isto nos aparece aqui em letra de forma na proposta de lei do Orçamento do Estado. Penso, assim, que é este o momento de, com alguma clareza, se dizer o que é que se pretende com isto; se se pretende isolar a Madeira dentro de um programa que, ainda por cima, é aceite unilateralmente, pois não foi discutido pela Assembleia Legislativa Regional, que o Governo Regional, através do seu Presidente e da sua equipa governamental, procurou esconder às outras forças políticas e à comunicação social e que só agora, por força do Orçamento do Estado, é possível dar-nos alguma luz sobre o que se passa na Região Autónoma da Madeira.
Há dias, aquando do debate na generalidade, o Sr. Secretário de Estado achou que eu tinha deformado o que V. Ex." tinha afirmado em relação a algum desregramento orçamental. No entanto, se me permite e sem querer ocupar muito tempo, sempre diria que o Sr. Secretário dc Estado afirmou — já tenho aqui o «borrão» na minha mão, embora não tenha a acta na forma definitiva — que
o Programa de Reequilíbrio Financeiro resultou «de um
processo cumulativo de desequilíbrios orçamentais regionais que se prolongou durante vários anos, sem que houvesse a coragem política de encarar frontalmente tão sério problema».
Como referi, isto foi dito pelo Sr. Secretário de Estado e tem implícito muito desregramento orçamental e financeiro na vida da Região, que — aqui posso penitenciar-me, pois terá sido, porventura, algum abuso da minha parte — interpretei como sendo uma forma de desgovernar a Região Autónoma da Madeira, o que o Sr. Secretário de Estado não gostou.
A dívida da Madeira é brutal e acumulada sobretudo a partir de 1981, por virtude de cortes orçamentais graves nas transferências para a Região. Por isso, cm tomo destes comentários que teci ao Programa de Reequilíbrio Financeiro, por aquilo que conheço dele e que está no artigo 6.° da proposta de lei orçamentai, agradecia que o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, e eventualmente o Sr. Ministro das Finanças, pudessem proferir algum comentário que possa desmentir as afirmações que aqui fiz.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O Sr. Deputado Octávio Teixeira voltou a insistir no problema das receitas, sobre o qual já dissemos aquilo que tínhamos a dizer.
No que toca às informações, parece-nos que as que constam do relatório têm uma boa sustentação para os valores que apresentámos.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Têm é que nos mandar a sustentação! Admito que cia exista, nós é que não a conhecemos!
O Orador: — Sr. Deputado, para nós é suficiente...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Mas não é para nós!
O Orador:—Suponho que para qualquer pessoa minimamente conhecedora destas coisas também o deve ser!
De qualquer maneira, se o Sr. Deputado interpretou a minha expressão «só com muita sorte» do modo como o fez, gostaria de lhe referir que não foi isso que eu disse. O que eu disse foi que, porque acredito no trabalho e na determinação das pessoas, aceitava que se pudesse atingir essa receita, o que, de contrário, só com muita sorte se conseguiria — é que eu acredito no trabalho, c só assim que atingiremos este objectivo. Agora o que não podemos é passar para além do limite da capacidade das pessoas.
De resto, repetindo aquilo que disse anteriormente, felizmente que as dívidas em atraso diminuíram de modo substancial. É evidente que ainda existem, mas aqueles que tinham condições para pagar já o fizeram. Todos os processos que estão agora em curso são processos extremamente morosos, na medida em que, não havendo bens, há que ir para as execuções, inclusivamente aos próprios sócios das empresas e tudo o mais.
Por conseguinte, não há possibilidade de continuarmos a ter o ritmo que tivemos nestes dois anos, e não vamos cometer o erro de 1986.
O Sr. Presidente: — Igualmente para responder, tem a
palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
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O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Srs. Deputados, iria responder a uma questão que me foi colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, relativa aos «fundos e serviços autónomos».
Muito sumariamente, o que poderei dizer é que o Governo, de urna forma —enfim, faço parte do Governo e poderei estar a cair na ¡modestia — extremamente rápida e inteligente, conseguiu adequar a revisão da Constituição praticamente em cima da sua entrada em vigor. Ou seja, a Assembleia aprova uma revisão constitucional na área, digamos assim, da Constituição orçamental. Essa alteração implica alterações profundas na estrutura do Orçamento, o que se traduz numa alteração à lei de enquadramento, à reforma da contabilidade pública e à própria interdependência e autonomia dos órgãos de soberania Governo, Assembleia da República e tribunais (neste caso o Tribunal de Contas).
O Governo poderia ter deixado a estrutura do Orçamento que tem sido aprovado desde 1982 exactamente como está. Porém, fez muito mais do que isso, adequando, no domínio sempre complexo dos fundos e serviços autónomos, a sua estrutura aos princípios formais da Constituição revista em 1989.
De que modo o fez? Até este Orçamento, a Assembleia não aprovava os orçamentos dos fundos e serviços autónomos, e sobre esta matéria até o Tribunal Constitucional se pronunciou, fazendo-o num extenso acórdão em que não deu razão a muitas das solicitações de partidos da oposição com vista à declaração de inconstitucionalidade de muitas normas —é o célebre Acórdão n.° 267/88. Contudo, tal como referia, o Governo cumpriu, nesta matéria dos fundos e serviços autónomos, as normas da revisão constitucional, passando a incluir com mapas anexos, embora integrantes da própria proposta de lei do Orçamento, os orçamentos dos fundos e serviços autónomos, segundo a classificação económica, funcional e orgânica das despesas. Aliás, neste caso da classificação económica, fizemo-lo sabendo muito bem que nem sequer é uma classificação constitucional— trata-se de uma constituição que é conferida e criada por uma lei ordinária, embora uma lei de bases (a lei de enquadramento do Orçamento). Na parte das receitas, pois estão lá o volume das receitas, portanto a discriminação, por orçamento privativo, de todos os serviços e fundos da Administração Central.
Portanto, neste caso o Governo está plenamente tranquilo e, diria mais, orgulhoso da forma como conseguiu cumprir a discriminação imposta pela Constituição revista de 1989 em matéria de fundos e serviços autónomos.
Por outro lado, e já que o Sr. Deputado se referiu à Constituição, há um outro aspecto, que suponho que já expliquei nesta Comissão em anos anteriores e que volto a repetir. É que os orçamentos e fundos autónomos têm sempre características discriminantes relativamente aos outros serviços, pois, se estivessem, pura e simplesmente, integrados no Orçamento do Estado — não incluídos, mas integrados—, deixariam, por natureza, de ser fundos e serviços autónomos. Ora, a Constituição revista de 1989 é muito clara ao permitir a existência de fundos e serviços autónomos, embora —aqui o aspecto de grande inovação— entregue a sua aprovação à Assembleia da República. Nestes termos, volto a repetir, ainda que com risco de imodéstia, o Governo cumpriu em prazo recorde.
Quanto ao orçamento do Serviço Nacional de Saúde, o Sr. Deputado disse que não existe discriminação.
O Governo também concorda que esta situação,'relativamente à parte dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos da saúde, isto é, dos orçamentos dos estabelecimentos hospitalares e de saúde, tem de ser melhorada—o Governo está e vai continuar a melhorá-la. No entanto, são centenas de orçamentos — o Sr. Ministro das Finanças ainda os apontou há poucos dias, aquando da votação da Lei de Bases de Reforma da Contabilidade Pública —, e, portanto, temos de assumir claramente que não é possível, neste momento, desagregar, em termos de Orçamento do Estado, uma estrutura compósita como a do Serviço Nacional de Saúde.
Assim, apenas diria ao Sr. Deputado Octávio Teixeira que o Governo cumpre formalmente, ainda nesta matéria, os princípios constitucionais em matéria dc Orçamento. Simplesmente, vai cumprir dizendo que esta matéria é uma matéria compósita que está no Serviço Nacional de Saúde, que tem um orçamento que não é uma mera transferência. Aliás, permito-me corrigir essa referência, porque se analisar os desenvolvimentos mecanográficos dos orçamentos do Ministério da Saúde, irá lá encontrar o orçamento do Departamento de Gestão Financeira da Saúde onde se encontram outras despesas e outras receitas, embora com um nível de agregação. Há uma discriminação, embora não tão desenvolvida, não tão pormenorizada como nos restantes serviços.
O Sr. Presidente: — Ainda para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Finanças.
O Sr. Secretário Adjunto e das Finanças (Faria de Oliveira): — Sr. Deputado Octávio Teixeira, iria tentar responder o mais cabalmente possível a três questões que colocou.
A primeira tem a ver com a previsão da repartição de subsídios constantes da secção 02 do capítulo 60 e sobre esta matéria a nossa previsão de repartição é a que passarei a expor.
De facto, para várias empresas públicas estão previstos 28 400 000 contos distribuídos da seguinte maneira: para a área de transportes e comunicações, 27 900 000 contos, destinando-se, em princípio, 6 milhões de contos para a Carris, 18 800 000 contos para a CP, 1 400 000 contos para a STCP, 1 400 000 contos para o Metro e 300 000 contos para a Transtejo.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — O Sr. Secretário de Estado disse 27 900 000 contos para a área dos transpones?
O Orador: — Exacto, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — É que há apenas uma pequena diferença de 200 000 comos. Isso será para empresas de comunicações? Com efeito, no orçamento que tenho aqui —e há pouco referi-o— figuram 28 100000 contos, mas não é uma questão de fundo ...
O Orador: — O apontamento que tenho aqui neste momento indica estes valores, mas é possível que haja alguma pequena diferença.
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Por outro lado, e na linha do que ia dizendo, para a área da comunicação social estão previstos 200 000 contos e para o Teatro Nacional de São Carlos cerca de 300 000 contos. Para além disso, haverá uma verba, da ordem dos S00 000 contos, que se destina também ao apoio à cooperação no domínio da comunicação social e ao apoio à área da marinha mercante, nomeadamente para regularização de situações derivadas do passado e relacionadas com a SOCARPOR.
Para além desta verba destinada às empresas públicas, prevê-se uma verba de 3 600 000 contos para apoio à construção naval, a qual terá muito a ver com a entrada em funcionamento da SOLISNAVE, e uma verba de S milhões de contos para apoio à reestruturação do sector dos adubos, o que perfaz um total de 37 S00 000 contos.
Em relação à segunda questão, a mesma tinha a ver com as dotações de capital.
As dotações de capital para as empresas públicas vão, no ano de 1990, ocorrer basicamente através das receitas das privatizações, portanto através do Fundo de Regularização da Dívida Pública, se se confirmar a nossa previsão de receitas das privatizações de ISO milhões de contos. Como é conhecido, um dos destinos das receitas das privatizações é o aumento de capital das empresas públicas e prevê-se que cerca de 30 milhões de contos derivarão destas receitas.
Haverá ainda a possibilidade de mobilização de activos detidos pelo Tesouro, sob a forma quer de acções, quer de títulos de participação, quer ainda de obrigações, e que, de acordo com a proposta constante do artigo 14.° da proposta de lei do Orçamento, se destina a três grandes finalidades: uma primeira é a conversão de créditos em capital social de empresas devedoras, nomeadamente relativos a responsabilidades assumidas no passado sob a forma de prestação de garantias a empréstimos externos ou de prestação de avales a financiamentos internos contraídos junto de instituições de crédito que já foram, ou estão em vias de ser, honrados pela Direcção-Geral do Tesouro; uma segunda é a realização de capital social de empresas públicas mediante a entrega desses activos financeiros; e ainda, como terceira hipótese, a alienação de créditos de que o Tesouro seja titular, matéria que tem fundamentalmente a ver com processos de reescalonamento de dívidas de países em condições correntes no mercado, mas também de empresas.
Nestas condições, prevê-se que na nossa função de melhorar o papel accionista do Estado através destas duas alternativas seja possível corresponder às necessidades de aumentos de capital social das empresas do sector público, contribuindo assim para o seu reforço.
Finalmente, a terceira questão que o Sr. Deputado Octávio Teixeira me colocou diz respeito à base de projecção dos 150 milhões de contos de receitas de privatização.
Como é conhecido, e já foi dito o ano passado, o processo de privatizações, porque é um processo prudente, que tem de ser seguro, transparente e eficaz, vai sendo, ao longo do ano, objecto de vários ajustamentos.
Para a base desta projecção, contamos com a privatização de parte do capital do Banco Português do Atlântico e da CIMPOR e também da privatização da CENTRALCER, havendo ainda a hipótese da segunda fase da privatização, nomeadamente da UNICER. São as bases fundamentais que conduziram à projecção de ISO milhões de contos, apresentada como receita provável das privatizações, no decurso do ano de 1990.
O Sr. Presidente: — A Sr.* Deputada Helena Torres Marques pede a palavra para que efeito?
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente, mas pode ser após a intervenção do Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr.* Deputada. Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Tavares da Silva): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Octávio Teixeira: Antes de mais, quanto aos pedidos não respondidos, apenas posso dizer que só posso responder aos pedidos que conheço.
A Sr.' Helena Torres Marques fPS): — Burocracia ao extremo!
O Orador: — Até hoje, desconheço a existência de qualquer pedido da Assembleia da República sobre o programa de equilíbrio financeiro da Região Autónoma da Madeira. Não sei se a culpa é dos circuitos do Ministério, se da Assembleia da República.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Há circuitos e circuitos paralelos!
O Orador: — Temos os elementos prontos à espera do pedido, precisamente porque V. Ex.' ameaçou fazê-lo quando estivemos aqui no Plenário.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Não foi uma ameaça...!
O Orador: — Ameaça, no bom sentido, como compreende!
A informação sobre as taxas de juro e as taxas de câmbio saiu, efectivamente, do meu Gabinete há, pelo menos, duas semanas. Há aqui circuitos, erros certamente, mas não sei!
Quanto à questão do orçamento do Fundo de Regularização da Dívida Pública e à receita de 28,8 milhões de contos de juros, a mesma é devida, essencialmente, a duas parcelas: a primeira, é a mais pequena e tem a ver com os juros dos títulos que o Fundo adquire e anula sim-plesmante, mas não abate à dívida. Como sabem, no estatuto do fundo de regularização há duas figuras: na primeira, há o simples abatimento da dívida, mantendo--se esta em circulção, mas na posse do Fundo, que recebe os juros por essa dívida; na segunda, há a anulação da dívida pelo Fundo, que não recebe juros, naturalmente. Mas esta é uma parcela relativamente pequena das receitas de juros, pois o grosso dessa receita diz respeito a uma situação que se construiu para dar transparência aos juros devidos pelas obrigações de capitalização automática.
Como sabem, os juros das obrigações de capitalização
automática são pagos apenas no fim, quando é reembolsado o capital. E uma forma simples de esconder parte do défice orçamental seria financiar esse défice, sobretudo através das obrigações de capitalização automática, porque adiava o pagamento dos juros para daí a cinco anos e, nessa aluíra, quem cá estivesse é que apanhava com os juros em cheio, ampliando o défice, não tendo estes em contrapartida.
O que é que se fez? Fez-se uma espécie de thinking fund que recebe anualmente do Tesouro os juros corres-
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pondcntcs que seriam devidos pelas obrigações de capitalização automática que entram como despesa na rubrica dc encargos da dívida pública. O Fundo dc Regularização da Dívida Pública vai acumulando estes juros c, quando se tratar do reembolso das obrigações dc capitalização automática, o Fundo tem lá estes juros acumulados para os pagar nessa altura.
E uma forma dc imputar, anualmente, os juros aos défices respectivos, cm vez de os imputar só ao exercício cm que eles são efectivamente pagos ao público. Certamente que é um procedimento que esta Assembleia não deixará dc louvar.
Quanto à questão apresentada pelo Sr. Deputado Mota Torres, cu esperaria, que, desde a apresentação do PRF no Plenário, tivesse tido a oportunidade dc o estudar um pouco melhor c, portanto, mudado algumas das opiniões que emitiu na altura. Aló compreendo que tenha alguma incomodidade quanto a este programa dc reequilíbrio financeiro, que nüo goste dele, pois. dc facto, a grande explosão da dívida da Madeira dá-se num período cm que o Partido Socialista tinha a maior responsabilidade no Governo.
O Sr. Mota Torres (PS) —A partir dc 1981 era o Governo da Aliança Democrática!
O Orador: — Estou a falar do período dc 1983 a 1985.
Este programa dc ritmos financeiros estabelece, pela primeira vez, regras financeiras claras entre o Governo e as regiões autónomas. Deixa dc haver aquela discussão anual da transferencia do orçamento para a região autónoma; deixa dc haver a discussão dc quando é que as verbas são transferidas; deixa dc haver uma série dc discussões que, certamente, não deixariam dc lhe agradar e dc ver, volta c meia, o Governo Regional a protestar contra o Governo da República, porque a verba não era suficiente ou porque as verbas não eram transferidas no momento oportuno.
Depois, faz uma análise do programa, onde apenas foca as contrapartidas da Região em relação a este programa, mas uma negociação c um acordo tem contrapartidas dos dois lados.
Esqucccu-sc dc falar que este programa consagra uma comparticipação dc grande importância no serviço da dívida da Região, isto é, liberta a Região dc metade dos juros que tem dc pagar pela sua dívida.
Estabelece, como disse, regras dc transferencias baseadas numa majoração da capitação do PIDDAC do continente c, finalmente, estabelece, como já lhe disse também, o momento c a forma dc fazer as transferencias. Em contrapartida, a Região assume um compromisso que não me parece excessivo que é, face a isto, dizer que nüo aumenta o seu endividamento, o que, aliás, devia ser uma regra geral das Regiões Autónomas — o terem, cm princípio, um equilíbrio orçamental mais ou menos permanente.
Este cálculo dos 50% dos juros foi feito, não por acaso, mas dc maneira que, a partir do próximo ano, a Região Autónoma da Madeira pudesse, sem qualquer violência e sem contrair os níveis de investimento que está a fazer, equilibrar-se. Tenho cm meu poder as projecções c depois podemos discuti-las, se quiserem, mais cm pormenor, onde, dc facto, a Região Autónoma da Madeira, segundo a nossa estimativa dc execução orçamental deste ano, teria um défice dc 7 milhões dc comos
c para o ano poderá ter um pequeno saldo positivo ou um equilíbrio virtual com esta comparticipação de 50 % nos juros.
Não vejo, dc facto, onde é que está a violência e onde é que estão os cortes orçamentais graves. Não existe nenhum corte orçamental grave implícito neste programa c não vejo, como já lhe disse da outra vez, onde é que está a humilhação. Pelo contrário, penso que este programa dá, efectivamente, à Região Autónoma da Madeira condições dc continuar o desenvolvimento, sem esforços intoleráveis. Exige alguma disciplina financeira, como é óbvio, e como, certamente, não deixará de concordar que é necessário.
Aliás, fala-me, simultaneamente, em desregramento orçamental c depois a seguir cm cortes orçamentais graves, o que é algo difícil dc conciliar.
Finalmente, perguntava-lhe, mais uma vez, se tem uma alternativa melhor. Sc tem, talvez fosse boa ocasião de a apresentar.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
De acordo com o que tínhamos combinado a sessão vai continuar, mas vou libertar o Sr. Ministro das Finanças. Tem a palavra a Sr.* Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, desejava pedir ao Sr. Secretário dc Estado Adjunto c das Finanças se, à semelhança do que fez no ano passado, nos fornecia, por escrito, os elementos que agora nos referiu, independentemente de outras perguntas que não tive oportunidade dc fazer hoje, mas que farei na segunda-feira, e perguntar se, além dc as poder trazer por escrito, este pedido pode ser oral. É que se o Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Finanças e também o Sr. Secretário de Estado do Tesouro acharem que os pedidos orais não funcionam, então pedirei ao Sr. Presidente da Comissão para rapidamente se escrever um ofício a pedir estes elementos, dc forma que segunda-feira os Srs. Secretários dc Estado nos possam fazer o favor de trazer os elementos solicitados.
O Sr. Presidente: — VV. Ex." podem dar os esclarecimentos solicitados.
Quanto aos pedidos, houve aqui, realmente, alguns circuitos que se alongaram inexplicavelmente, embora já estejam na posse de VV. Ex.**, suponho cu, cópias pelo menos dc uma das informações que foi oportunamente solicitada c que levou do Gabinete do Sr. Ministro até à Comissão qualquer coisa como 10 dias.
Tem a palavra o Sr. Secretário dc Estado Adjunto e das Finanças.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e das Finanças:— Obviamente que não é preciso nenhum pedido escrito. Na segunda-feira trarei os elementos. Gostaria só dc esclarecer que há uns dias combinei com o Sr. Deputado Octavio Teixeira que ele faria o pedido por escrito e não oralmente, portanto não estou cm falta.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Se permite, Sr. Presidente, é apenas para confirmar que, de facto, o Sr, Secretário dc Estado disse que era preferível fazer o pedido por escrito. Posso dizer-lhe que se não foi nesse mesmo dia, foi no dia seguinte que a Comissão dc Economia, Finanças c Plano enviou o pedido.
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O Sr. Presidente: — Creio que já tem uma cópia da nota que foi remetida ao Sr. Presidente da Assembleia da República, solicitando o ofício a ser enviado ao Ministério das Finanças.
Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Penso que é preferível interrompermos agora os trabalhos até segunda-feira.
Chamava a atenção de VV. Ex." para o seguinte: vamos ter aqui, às 10 horas, o Sr. Vice -Primeiro Ministro e Ministro da Defesa, que se vai ocupar não só do Ministério da Defesa, mas também da Condição Feminina.
Julgo que será prudente, uma vez que vamos ter a equipa do Ministério das Finanças às 12 horas, e porque apenas temos duas horas, reservar (pedia à Comissão a vossa atenção e a vossa aquiescência) 45 minutos para a Condição Feminina e 1 hora e 15 minutos para o Ministério da Defesa.
Irei colocar esse problema na segunda-feira e irei solicitar aos Srs. Deputados que tenham questões a pôr, que o manifestem, para que possamos dividir o tempo de uma maneira equitativa por todos os Srs. Deputados que pretendam falar dentro desse tempo. Tentarei explicar a todos os Srs. Deputados interessados as razões pelas quais a metodologia será a apontada. Formulo votos e tenho esperança de ser compreendido.
Começaremos pelo Ministério da Defesa, pois é difícil começar pela Condição Feminina, visto que o que aqui está é «Ministério da Defesa e Condição Feminina» e, portanto, alguns dos Srs. Deputados poderiam queixar-se de haver uma alteração inopinada da ordem de trabalhos.
Começaremos, espero, rigorosamente, às 10 horas e tentaremos fazer como vos propus.
Dou, pois, por concluída a reunião de hoje.
Eram 19 horas e 40 minutos.
DIÁRIO
da Assembleia da República
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