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Sexta-feira, 9 de Maio de 2003 II Série-C - Número 41
IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)
S U M Á R I O
Presidente da Assembleia da República:
- Relatório da reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia com o Presidente do Parlamento Português, realizada em Lisboa, Portugal, nos dias 25 e 26 de Abril de 2003.
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PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Relatório da reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia com o Presidente do Parlamento Português, realizada em Lisboa, Portugal, nos dias 25 e 26 de Abril de 2003
1 - A reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia com o Presidente do Parlamento Português realizou-se no Palácio de São Bento, em Lisboa, nos dias 25 e 26 de Abril corrente. Estiveram presentes os Presidentes dos Parlamentos da Bulgária, Eslováquia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Polónia, República Checa, Roménia, e a primeira Vice-Presidente do Parlamento da Eslovénia, todas acompanhadas pelas respectivas delegações. Por motivos internos, não puderam comparecer as delegações do Chipre e de Malta. (Anexo I)
2 - Foi a seguinte a composição da delegação portuguesa:
- Presidente da Assembleia da República;
- Vice-Presidente da Assembleia da República, Dr.ª Leonor Beleza;
- Vice-Presidente da Assembleia da República, Dr. Manuel Alegre;
- Vice-Presidente da Assembleia da República, Prof. Narana Coissoró;
- Vice-Presidente da Assembleia da República, Dr. Lino de Carvalho;
- Presidente da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, Dr. Jaime Gama;
- 1.º Secretário da Mesa da Assembleia da República, Dr. Duarte Pacheco;
- 2.º Secretário da Mesa da Assembleia da República, Dr. Ascenso Simões;
- Deputado António Nazaré Pereira;
- Deputada Elisa Ferreira;
- Deputado Guilherme d'Oliveira Martins;
- Secretária-Geral da Assembleia da República, Dr.ª Isabel Côrte-Real;
- Chefe de Gabinete do Presidente da Assembleia da República, Dr. António Romano de Castro;
- Adjunto para os Assuntos Políticos e Relações Internacionais do Presidente da Assembleia da República, Dr. Nuno Manalvo;
- Adjunto para os Assuntos Jurídicos do Presidente da Assembleia da República, Dr. Pedro Cardoso da Costa;
- Adjunto para a Imprensa do Presidente da Assembleia da República, Dr. Aníbal Cabeça;
- Director do Gabinete de Relações Públicas e Internacionais da Assembleia da República, Dr. Domingos Almeida Machado.
3 - A Conferência apresentou um programa dividido em dois temas principais. (Anexo II) Na intervenção inicial, o Presidente da Assembleia da República destacou o paralelismo dos processos de conquista da liberdade e da democracia verificado no caso português e nos diferentes países da Europa Central e de Leste que, em 1989, se emanciparam face ao imperialismo soviético. Foi reforçada a identidade europeia destes países, associada à consolidação do seu próprio processo democrático. Com o objectivo de apresentar Portugal à nova fronteira europeia, foram apontadas as vantagens portuguesas no seu processo de integração. Dando as boas vindas aos novos Estados-membros da União, ao mesmo tempo que não deixava de realçar os desafios que isso mesmo implica para Portugal, não foi deixado de exprimir um profundo apoio a esta nova fase do ideal europeu. Preocupado com o défice democrático que grassa actualmente na União, foi defendido o reforço do papel dos parlamentos nacionais no futuro quadro institucional da União Europeia. (Anexo III)
No primeiro painel, o Primeiro-Ministro de Portugal reforçou o apoio do País à adesão destes novos Estados-membros, relembrando as semelhanças entre os seus processos de integração e o caso português. Reflectindo os principais desafios que hoje se colocam à União, foi defendida a importância do reforço do papel dos parlamentos nacionais no futuro da organização. Preocupado com o evoluir da arquitectura institucional da Europa, enfatizou a necessidade de, em conjunto, se evitar a constituição de directórios que ponham em causa a dignidade da soberania de todos os Estados-membros. Sensível às expectativas dos novos aderentes, deixou o alerta para que se evite o defraudar da ambição daqueles que agora chegaram à família europeia. (Anexo IV)
No segundo painel, a cargo do Presidente da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, Sr. Deputado Jaime Gama e do Sr. Deputado António Nazaré Pereira, representante do Parlamento Português na Convenção Europeia, foram avançadas algumas das possíveis soluções para que, com base na experiência da COSAC, se defenda e incentive o futuro papel dos parlamentos nacionais no processo de construção europeia. Ao mesmo tempo, foi apresentada a perspectiva portuguesa sobre o actual evoluir dos trabalhos da Convenção Europeia. Ambos os oradores falaram de improviso, pelo que não é possível anexar os respectivos discursos.
Por fim, no terceiro e último painel, os Presidentes das delegações presentes tiveram a oportunidade de expressar as suas expectativas e perspectivais individuais sobre a sua adesão à União Europeia.
4 - O debate permitiu verificar uma assinalável convergência de pontos de vista, que se exprime nas conclusões da reunião, aprovadas consensualmente, com pequenas emendas. (Anexo V)
5 - A participação de S. Ex.ª o Presidente da República, que recebeu os participantes na Conferência, mantendo com eles um interessante diálogo, veio reforçar a unidade do Estado português quanto à importância da política europeia e desta nova fase do alargamento da União.
6 - A troca de impressões com os homólogos europeus, bem como o clima de convívio entre as diferentes delegações presentes, foi de extrema importância.
7 - O empenho e o profissionalismo dos serviços da Assembleia da República merecem um destacado louvor.
Palácio de São Bento, 29 de Abril de 2003. - O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.
Anexo I
Constituição das delegações dos países presentes na reunião
Bulgária
Assembleia Nacional
S. Ex.ª Prof. Dr. Ognian Gerdjikov Presidente
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Sr. Nikolay Tzanev Director das Relações Internacionais
Sr.ª Teodora Mihaylova Intérprete
Sr. Svetlan Angelov Segurança
Embaixada
Sr. Aliosha Nedelchev Embaixador
Sr. Ivan Tzvetkov Conselheiro
Sr.ª Ekaterina Natcheva Intérprete
Chipre
Embaixada
Sr.ª Thalia Petrides Embaixadora
Eslováquia
Conselho Nacional
S. Ex.ª Sr. Pavol Hrusovsky Presidente
Sr.ª Helena Hrusovska Esposa do Presidente
Sr. Tomas Zalesak Assessor Diplomático do Presidente
Sr.ª Alena Mesarosova Directora do Gabinete do Presidente
Sr. Michal Dyttert Porta-voz do Presidente
Sr.ª Elena Jancovicova Assessora das Relações Internacionais
Sr.ª Miroslava Petrovska Intérprete
Sr. Robert Bros Segurança
Sr. Vladimir Sklenka Segurança
Embaixada
Sr. Peter Rusinak Embaixador
Eslovénia
Assembleia Nacional
S. Ex.ª Sr.ª Irma Pavlic Krebs Vice-Presidente
Sr.ª Barbara Reflak Secret. Comissão Assuntos Europeus
Sr.ª Tania Kolenc Koprivc Subchefe Protocolo e Tradutora
Embaixada
Sr. Bogdan Benko Embaixador
Estónia
Riigigoku
S. Ex.ª Prof.ª Dr.ª Ene Ergma Presidente
Sr. Heiki Sibul Secretário-Geral
Sr. Juri Kahn Director das Relações Internacionais
Embaixada
Sr. Mart Piiskop Encarregado de Negócios
Hungria
Assembleia Nacional
S. Ex.ª Sr.ª Katalin Szili Presidente
Sr. Attila Weber Chefe de Gabinete do Presidente
Sr. Péter Sardi Director
Sr. Zoltan Horvath Director
Sr.ª Maria Mesterházy Intérprete
Sr. Gábor Karakai Intérprete
Sr. Lazlo Doboczi Segurança
Embaixada
Sr. János Balla Embaixador
Letónia
Assembleia Nacional
S. Ex.ª Sr.ª Ingrida Udre Presidente
Sr.ª Silvija Dreimane Chefe de Gabinete
Sr.ª Ligita Andzane Conselheira de Imagem
Embaixada
Sr. Ints Upmacis Embaixador
Lituânia
Seimas
S. Ex.ª Arturas Paulaskas Presidente
Sr. Arminas Lydeka Deputado
Sr.ª Erika Veberyte Assessora Diplomático
Sr. Arvydas Zilinskas Assessor
Sr. Jurate Dvaricnaite Intérprete
Embaixada
Sr. Dalius Cekuolis Embaixador
Sr.ª Laura Tupe Intérprete
Embaixada
Sr. Salvino Busutil Embaixador
Polónia
Sejm
S. Ex.ª Sr. Marek Borowski Presidente
Sr. Dobromir Dziewulak Director das Relações Internacionais
Sr. Jacek Roszkowski Segurança
Embaixada
Sr. Adam Halamski Embaixador
Portugal
Assembleia da República
S. Ex.ª Deputado João Bosco Mota Amaral Presidente
Deputada Leonor Beleza Vice-Presidente
Deputado Manuel Alegre Vice-Presidente
Deputado Narana Coissoró Vice-Presidente
Deputado Lino de Carvalho Vice-Presidente
Deputado Jaime Gama Presidente da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa (CAEPE)
Deputado Duarte Pacheco 1.º Secretário da Mesa da AR
Deputado Ascenso Simões 2.º Secretário da Mesa da AR
Deputado António Nazaré Pereira Deputado (PSD)
Deputado Guilherme d'Oliveira Martins Deputado (PS)
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Deputada Elisa Ferreira Deputada (PS)
Dr.ª Isabel Côrte-Real Secretária-Geral
Dr. António Romano de Castro Chefe do Gabinete do Presidente
Dr. Nuno Manalvo Adjunto do Presidente
Dr. Cardoso da Costa Adjunto do Presidente
Dr. Aníbal Cabeça Adjunto do Presidente
Dr. Domingos de Almeida Machado Director das Relações Internacionais
República Checa
Câmara das Deputadas
S. Ex.ª Sr. Lubomir Zaoralek Presidente
Sr. Jan Prokes Assessor
Sr. Jan Vlna Protocolo
Sr.ª Jana Ulbrychova Secretária
Sr. Petr Chalupecky Segurança
Embaixada
Sr. Jaromir Kvapil Embaixador
Roménia
Câmara dos Deputados
S. Ex.ª Prof. Dr. Valer Dorneanu Presidente
Sr. Florica Ionea Director
Sr. Cristian Cavescu Assessor
Cmdt. Spiru Segurança
Embaixada
Sr. Teodor Baconsky Embaixador
Srª. Milu Anca Secretária/Tradutora
Sr.ª Oana Ureche Tradutora
Secretariado
Dr.ª Sofia Bray Pinheiro
Dr.ª Ana Mïlheiriço
Dr.ª Helena Alves
Dr. Nuno Paixão
Dr.ª Rita Pinto Ferreira
Dr.ª Leontina Luís
Dr.ª Manuela Azóia
Sr.ª D. Helena Reis Alves
Sr.ª D. Rosa Fernandes
Sr.ª D. Elvira Nogueira
Sr.ª D. Paula Cristina
Sr. Victor Costa.
Sr.ª D. Lurdes Graça
Intérpretes
Christina Langhorn
Lara Duarte
Laurence Correard
Manuel Santiago
Salomé Silva
Vera Couriel
Anexo II
Programa
(23 a 27 de Abril de 2003)
23 de Abril
Quarta-feira
Chegada das Delegações Sala VIP A do Aeroporto de Lisboa
Instalação no Hotel Tivoli
Acolhimento individual com Guarda de Honra e audiências bilaterais como Presidente a Assembleia da República no Palácio de São Bento
24 de Abril
Quinta-feira
Chegada das Delegações Sala VIP A do Aeroporto de Lisboa
Instalação no Hotel Tivoli
Acolhimento individual com Guarda de Honra e audiências bilaterais com o Presidente da Assembleia da República no Palácio de São Bento
19.50 horas saída do Hotel Tivoli para a Assembleia da República (Novo Edifício), em minibus
20.00 horas O Presidente da Assembleia da República oferece um jantar buffet no Restaurante do Novo Edifício
21.30 horas Saída da Assembleia da República (Novo Edifício) para o Hotel Tivo1i, em minibus
25 de Abril
Sexta-feira
10.20 horas Saída das Delegações do Hotel Tivoli em direcção à Assembleia da República, em autocarro
10.35 horas Chegada à Assembleia da República
11.00 horas Sessão Solte Comemorativa do XXIX Aniversário do 25 de Abril na Assembleia da República
13.25 horas Saída dos Presidentes das Delegações da Assembleia da República para a Residência Oficial do Primeiro-Ministro, em autocarro
13.30 horas Os Presidentes das Delegações almoçam na Residência Oficial do Primeiro-Ministro
As Delegações almoçam no Restaurante do Novo Edifício (informal)
14.50 horas Saída da Residência Oficial do Primeiro-Ministro para a Assembleia da República, em autocarro
15.00 horas Sessão Inaugural na Sala do Senado
Intervenção do Presidente da Assembleia da República
15.30 horas Intervenção do Primeiro-Ministro (com debate)
17.00 horas - Pausa
Coffee break
17.30 horas
A COSAC
Intervenção do Presidente da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa da Assembleia da República.
A Convenção Europeia
Intervenção do Deputado António Nazaré Pereira
Intervenção do Deputado Guilherme d'Oliveira Martins
Debate
19.00 horas Fim dos trabalhos e regresso das delegações ao Hotel Tivoli, em autocarro
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19.40 horas Saída dos Presidentes das delegações do Hotel Tivoli para o Palácio de Belém, em autocarro
20.00 horas O Presidente da República recebe em audiência os Presidentes das delegações no Palácio de Belém
20.30 horas O Presidente da República oferece um jantar aos Presidentes das delegações
As delegações têm jantar livre
22.15 horas Saída do Palácio de Belém para o Hotel Tivoli, em autocarro
26 de Abril
Sábado
09.45 horas Saída das delegações do Hotel Tivoli em direcção à Assembleia da República, em autocarro
09.55 horas Chegada ao Palácio de São Bento e encaminhamento para a Sala do Senado
10.00 horas Sessão de trabalho
Intervenções dos Presidentes participantes
12.30 horas Partida das delegações para o Guincho, em autocarro
13.00 horas Almoço no Restaurante Porto de Santa Maria
15.30 horas Partida para Sintra
16.00 horas Visita ao Palácio da Vila
17.00 horas Regresso a Lisboa pela Praça do Império
Visita à Igreja do Mosteiro dos Jerónimos
Passagem pela Torne de Belém com pequena paragem
18.30 horas Regresso ao Hotel Tivoli
20.20 horas Saída das delegações do Hotel Tivoli em direcção à Assembleia da República, em autocarro
20.30 horas Banquete Oficial no Salão Nobre do Palácio de São Bento, com momento de Fado
22.30 horas Saída do Palácio de S. Bento para o Hotel Tivoli, em autocarro
27 de Abril
Domingo
Partida das delegações
Anexo III
Intervenção do Presidente da Assembleia da República na abertura da reunião com os Presidentes dos Parlamentos dos países candidatos à adesão à União Europeia
(Lisboa, 25 de Abril de 2003)
Sr.as Presidentas e Srs. Presidentes, Sr. Primeiro-Ministro de Portugal, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Ilustres Convidados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Renovo às Sr.as Presidentas e aos Srs. Presidentes dos Parlamentos participantes nesta reunião, bem como aos membros das delegações que chefiam, a cordial saudação que a todos dirigi na sessão solene desta manhã, comemorativa do 29.º aniversário da Revolução do 25 de Abril.
A todos agradeço a gentileza da resposta positiva ao meu convite para virem celebrar com o Parlamento de Portugal o Dia da Liberdade.
Para os portugueses e para as portuguesas, esta data significa a restauração das liberdades cívicas e da democracia, após quase meio século de ditadura autoritária de inspiração fascista.
A nossa revolução democrática marcou de algum modo o início de uma vaga que percorreu o mundo, libertando muitos povos de variadas formas de opressão. Quinze anos depois, em 1989, a queda do Muro de Berlim abriu também as portas da liberdade às sacrificadas nações da Europa Central e de Leste, que o imperialismo soviético mantinha dominadas pela força das armas.
Todos nós temos, por isso, boas razões para festejar a liberdade, proclamando a nossa decisão de a mantermos sempre, como conquista irreversível, transmitindo-a cada vez mais forte às gerações vindouras.
Caros Colegas Presidentes, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Depois de Abril de 1974 e do árduo processo que se seguiu de construção do regime democrático português, a adesão às Comunidades Europeias tornou-se sinónimo da consolidação dos ganhos da própria Revolução. Tendo Portugal apresentado o seu pedido de adesão em 1977, podemos hoje afirmar que o fizemos, em primeiro lugar, por uma razão essencialmente política.
Depois de várias décadas de ditadura autoritária, a adesão à Europa das democracias de tipo ocidental era vista como uma garantia de preservação do novo regime que então dava os seus primeiros passos. Por outro lado, terminado o ciclo imperial da história portuguesa, com a independência das colónias, era tempo de recentrar Portugal no quadro do Continente Europeu.
Havia ainda, é certo, o argumento económico: erguer o País a um nível de desenvolvimento e de qualidade de vida condignamente equiparável à média dos Estados-membros da então Comunidade Económica Europeia, tornou-se um objectivo central do processo de integração português.
A integração passou a ser vista como sinónimo de desenvolvimento económico e social do País. Era necessário fazer acordar e mobilizar a sociedade civil portuguesa e a pesada organização do Estado, no sentido de vencer os novos desafios e aproveitar as oportunidades que a adesão representava.
Muito rapidamente se percebeu que o País enfrentava um desafio arrebatador que exigia uma reacção rápida e eficaz. Se não se aproveitassem os fundos estruturais de apoio à economia portuguesa, não só se perdia uma oportunidade ímpar, como se agravaria a situação debilitada em que Portugal se encontrava, sobretudo a partir do momento em que cessassem esses mesmos fundos estruturais e nos tornássemos porventura num contribuinte líquido da Comunidade.
Portugal assumiu este enorme desafio consciente de que a responsabilidade do novo processo de desenvolvimento se colocava, antes de mais, não no exterior, mas na capacidade de resposta e na coragem reformista do País no seu todo. Era tempo de cada um de nós perguntar, não o que é que o País poderia fazer por nós, mas o que nós poderíamos fazer pelo nosso país.
O balanço da adesão é deveras positivo. Portugal reduziu significativamente o desnível de desenvolvimento face à média europeia, modernizou o sistema financeiro, reestruturou o aparelho produtivo, arejou mentalidades, entrou na vanguarda das novas tecnologias e dos novos métodos
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de gestão, construiu infra-estruturas a um ritmo e amplitude nunca antes registados na história de Portugal. Em suma, modernizou-se e desenvolveu-se, integrou-se no espaço europeu e vive hoje em paz e com um assinalável progresso económico.
No entanto, nem tudo foram facilidades. Nos momentos de maiores dificuldades, sempre houve os saudosistas do passado, temerosos da grandeza esmagadora da Europa. O tempo, esse velho e sábio conselheiro, provou que a aposta europeia tinha sido a mais acertada.
Estou certo, Caros Colegas, que nesta descrição sumária do processo de integração, iniciado por Portugal logo após a conquista da liberdade, várias são as semelhanças com as realidades que viveram e vivem muitos dos futuros Estados-membros da União.
É este paralelismo que nos identifica e reúne hoje, aqui, na sede da democracia portuguesa.
Caros Colegas Presidentes, Minhas Senhoras e Meus Senhores: O objectivo da Assembleia da República ao organizar esta reunião é estreitar os laços de amizade com a nova fronteira da Europa, consolidando as aspirações de um futuro em liberdade e em democracia que tanto nos unem.
Na altura em que a Europa se alarga, aproveitando o novo tempo histórico, de comunhão de interesses entre povos irmãos, anteriormente desavindos, é fundamental que as antigas raízes comuns europeias que o tempo afastou e, por vezes apagou, possam ser recuperadas e valorizadas em iniciativas de aproximação entre terras e povos outrora tão distantes.
A presente iniciativa do Parlamento Português insere-se nesse espírito de aproximação e reflexão, afastando os fantasmas da História ao mesmo tempo que abre as portas ao nosso futuro comum, na casa comum europeia.
O ideal europeu, sobre o qual muito se tem discutido nas últimas semanas, por vezes com um certo tom pessimista, volta a estar hoje no centro das atenções. Depois de uma fase de intenso diálogo sobre a reforma institucional da União, a recente intervenção aliada no Iraque e as consequentes divisões de posicionamento dos diferentes Estados Europeus, fizeram alguns duvidar do futuro da Europa.
Ora, a histórica experiência de integração europeia, que conta já quase meio século, tem sido um sucesso absoluto, quanto aos objectivos inicialmente definidos. Tanto assim é que dos seis países fundadores tem vindo a alargar-se, sucessivamente para nove, dez, doze (em 1985, quando entrou Portugal), quinze, agora já vinte e cinco, com compromissos assumidos para com mais dois, a Roménia e a Bulgária - e sem que o processo tenha sido, nem possa ser, considerado como findo.
O quadro actual está permitindo resultados excelentes, com avanços impressionantes no exercício conjunto de poderes soberanos, sem prejuízo da identidade própria de cada um dos Estados-membros. O que talvez seja excessivo e mesmo imprudente é a pressa com que se pretendem fazer agora alterações qualitativas nas estruturas europeias, acelerando uma dinâmica federalizante, que parece longe de estar amadurecida.
E julgo de rejeitar por completo e de modo terminante certas veleidades de impor como orientações europeias soluções que apenas servem os interesses de afirmação mediática de quem as apresenta. Mais ainda quando tudo isto surge envolto numa ao menos aparente reformulação do quadro geo-estratégico global, incluindo andar de braço dado com a Rússia, que não está dando sinais de pretender fazer uma opção europeia, muito pelo contrário se inclina para manter o seu imenso império asiático.
É importante não esquecermos - e os novos Estados-membros sabem-no, infelizmente, de forma muito particular - que o maior sucesso da integração europeia é ter garantido a paz no Velho Continente, no quadro da aliança militar da NATO, portanto em estreita cooperação com os Estados Unidos da América, durante mais de meio século. Todos sabemos que a História da Europa não tinha registado, até então, períodos tão prolongados sem conflitos nem morticínios. As gerações mais velhas experimentaram, dolorosamente, as agruras da guerra, às quais, felizmente, têm sido poupados os nossos filhos e netos.
Impressiona sempre conversar com pessoas que viveram as privações e o horror do período antes, durante e imediatamente depois da guerra de 1939-1945. Compreende-se então melhor o empenho vital de toda uma geração europeia na ultrapassagem dos problemas de fundo, incluindo de mentalidade, que estiveram na origem daquele conflito tremendo.
E não deixa de surgir também a dúvida se as camadas mais jovens vão continuar a perceber o que está em causa, mantendo abertura de espírito e disponibilidade para aceitar os sacrifícios necessários quaisquer que estes sejam, serão sempre menos do que os prejuízos pessoais e colectivos de uma guerra! Mas a ideia generalizada entre os jovens é que a paz na Europa é qualquer coisa que se pode dar por adquirida e a guerra se tornou impossível em solo europeu convicção infelizmente infirmada pelo que se passou há bem pouco tempo nos Balcãs.
Isto, só por si, já seria muito e de valor inestimável! Mas a integração europeia, impulsionada inicialmente pelos efeitos da aplicação do Plano Marshall, fez ainda muito mais, desencadeando um vertiginoso progresso económico, sobre o qual assenta um modelo social extremamente avançado. A revolução tecnológica dos últimos anos, no contexto da economia global, projectou-nos para patamares muito diversos, em chocante desnível com a metade oriental da Europa, já para não falarmos do panorama mundial.
Neste contexto, é facilmente plausível deduzirmos que a nossa própria segurança reclama estender, com urgência, a todos os países dominados e mantidos em atraso pelo comunismo soviético, durante quase toda a última metade do século XX, os benefícios do desenvolvimento económico, cultural e político. E o modo prático de realizarmos este desígnio estratégico fundamental consiste em abrirmos as portas da União a todos os que, revestindo as condições apropriadas, nisso estejam interessados - noutro plano também, mas convergente, devem ser abertos os portões da NATO.
No entanto, no início da década de 90, e logo após a libertação do jugo soviético, a importância atribuída à convergência nominal, para efeitos de se alcançar a moeda única europeia, travou a resposta rápida e generosa que as jovens democracias do centro e leste necessitavam para fazerem arrancar os respectivos processos de modernização e desenvolvimento.
Com o atraso de uma década, a estas hesitações iniciais, a Europa responde hoje com uma ambiciosa agenda para a adesão de novos Estados-membros. A União tem plena consciência que, a prazo, a segurança europeia passa pela substancial melhoria do nível e da qualidade de vida dos países que, repito, o comunismo soviético dominou durante décadas.
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Caros Colegas Presidentes, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Para se tornar eficaz e viável, o alargamento da União pressupõe uma reforma institucional, mas não é a única razão de ser dela. A reforma é necessária para colmatar o défice democrático europeu, para tornar mais eficaz a gestão dos problemas, para evitar o bloqueio do projecto por força do desinteresse e alheamento, quando não mesmo da indignação e da revolta dos cidadãos, face a um poder longínquo, desencarnado e dominador, obnubilado pela burocracia e pela tecnocracia.
Foi já com base neste dilema da legitimidade democrática, que na declaração de Laeken sobre o futuro da União Europeia se equacionou o papel dos parlamentos nacionais sob a perspectiva de estes virem a estar representados numa nova instância comunitária ou se deveriam ter, simplesmente, novas responsabilidades em áreas comuns da competência do Parlamento Europeu.
Esta dúvida deverá encontrar na Convenção sobre o Futuro da Europa uma solução adequada que valorize o papel dos parlamentos nacionais no combate ao deficit democrático.
Nesta matéria, sou particular adepto do princípio da subsidiariedade e frontalmente contra a criação de uma segunda Câmara legislativa, paralela ao Parlamento Europeu. O seu papel afigura-se-me reduzido, limitando-se à duplicação da função do actual Conselho de Ministros em matéria de elaboração da legislação comunitária, cuja iniciativa os tratados incumbem à Comissão.
Representante dos Estados-membros no seio da União Europeia é, por agora, do ponto de vista institucional, o Conselho de Ministros. A criação de um Senado representando todos os Estados-membros por igual, num órgão que permita fazer o balanceamento dos interesses comunitários com os interesses nacionais, parece-me mais problemática que eficaz.
A criação do Senado Europeu viria introduzir maior complexidade ainda num processo decisório considerado pelos cidadãos e pelas cidadãs como sendo algum tanto opaco. No domínio legislativo são cada vez mais demorados os procedimentos, tantas são as entidades com direito a dar parecer. As exigências reforçadas quanto à co-decisão, envolvendo o Parlamento Europeu e o Conselho de Ministros, tornaram há algum tempo tudo mais difícil. Por outro lado, erguem-se, um pouco por toda a parte, vozes de protesto contra o regulamentarismo europeu, acusado de, segregando a tecnocracia dos eurocratas de Bruxelas, funcionar como uma rasoira cerceadora das especificidades nacionais e regionais, invadindo assim a competência dos respectivos órgãos legislativos, que dela se vêem expropriados sem qualquer razão útil. Um Senado Europeu ajudaria a travar essas tendências? Em tal caso, seria bem-vindo; mas é de duvidar que pudesse vir a ter tamanha eficácia.
Para muitos, o debate sobre o futuro da União Europeia abrange sobretudo os aspectos institucionais: os órgãos a estabelecer, a distribuição de competências, os seus modos de funcionamento… É um debate sobre o poder! E não consegue, por isso, esconder, se é que o tenta minimamente, as apreensões, as suspeitas, os receios dos pequenos face aos grandes e, talvez mais ainda, destes face aos primeiros, que tendem a ser em maior número, com o alargamento já decidido e em marcha, e têm interesses convergentes, dados os desníveis de desenvolvimento que padecem em relação às médias da União Europeia.
A reforma institucional é, sem dúvida, muito importante; mas o alargamento e as condições para o seu sucesso são-no ainda muito mais. Nesta nossa reunião faremos certamente interessantes reflexões sobre esta matéria.
Minhas Senhoras e Meus Senhores: A importância dos parlamentos nacionais no futuro quadro institucional da União Europeia deve ser preservada e reforçada.
É evidente o desconforto dos parlamentos nacionais perante o processo de construção europeia. Cumprida a tarefa essencial de aprovar os tratados, abrindo o caminho para a sua ratificação, parece que tudo o resto, subsequente, lhes escapa das mãos e passa a decorrer noutra órbita diferente…
O pior é que nas altitudes europeias a democracia, nos seus procedimentos usuais, captáveis pelos cidadãos e pelas cidadãs, se torna rarefeita. Daí que o fosso de cidadania e de participação tenha vindo a alargar-se um pouco por toda a parte, tornando-se cada vez mais sensível um défice democrático, que enfraquece a adesão cívica à União Europeia e, consequentemente, as instituições dela.
Mercê de várias razões, uma ampla faixa de cidadãos não se encontra motivada para intervir politicamente, através do voto, quanto aos problemas europeus. E no entanto, a própria dinâmica da integração tem vindo a transferir questões cada vez mais importantes para um nível de decisão comunitário. O pior é que vão aumentando as queixas pela correspondente diminuição do controle democrático, da competência dos parlamentos nacionais, enquanto se alarga a influência de uma tecnocracia sem rosto, hábil em preparar soluções tomadas à pressa em reuniões ministeriais e cimeiras, de grande repercussão mediática, onde todos os participantes têm de cantar vitória.
Ora um tal estado de coisas assume particular gravidade na difícil e perigosa fase em curso de fortalecimento da dimensão política da União, que pretende consolidar-se na área da justiça e da segurança interna e assumir mesmo um papel nos domínios da defesa e da política externa.
No funcionamento dos nossos regimes democráticos nacionais o Parlamento tem uma função legitimadora insubstituível. A ele cabe fazer as leis e aprovar os tratados que sejam fonte de direito internacional; é ele também que investe o Governo, lhe aprova o orçamento e fiscaliza a sua actuação.
O Parlamento Europeu foi concebido como o órgão democrático representativo dos povos da União; a eleição dos seus membros por sufrágio directo fortaleceu este conceito. Mas algumas das competências parlamentares fundamentais não lhe estão atribuídas senão desde há pouco tempo e mesmo assim em termos limitados (co-decisão em matéria legislativa, controle democrático do executivo comunitário). E o facto de os governos nacionais manterem no domínio inter-governamental a cooperação em matéria de política externa e de segurança comum, teve por efeito afastar o Parlamento Europeu de algumas das questões de maior visibilidade, esvaziando o espaço público europeu.
Em nome da transparência e da democraticidade do processo de construção europeia, muito mais do que sobrecarregar com novos órgãos a estrutura institucional da União, importa reforçar a participação nele dos parlamentos nacionais - e através dos mesmos, como seus representantes legítimos, dos cidadãos e das cidadãs de cada um dos nossos países.
Pronuncio-me, por isso, claramente, a favor do reforço dos mecanismos existentes e no sentido de se aperfeiçoar o seu funcionamento, não só no seio de cada parlamento
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nacional, mas igualmente, através do diálogo interparlamentar ao mais alto nível de que é exemplo a reunião anual dos Presidentes dos Parlamentos dos Estados-membros da União Europeia, bem como através da COSAC. A isso convém acrescentar uma articulação permanente de cada parlamento nacional com os correspondentes membros do Parlamento Europeu. E na fase actual, o acompanhamento dos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa, na qual cada um dos parlamentos nacionais participa directamente.
Os parlamentos nacionais dos países-candidatos devem acompanhar, se me é permitida a sugestão, com especial atenção e cuidado as negociações em curso, batendo-se pela salvaguarda dos seus interesses vitais, que o interesse de uma grande Europa plural tem obrigação de salvaguardar, integrando-os numa síntese superior, de justiça e solidariedade.
É, por tudo isto, muito vantajoso que os parlamentos nacionais estabeleçam laços fortes de cooperação entre si, sobretudo os de dimensão e grau de desenvolvimento aproximado.
Pelo Parlamento Português posso testemunhar a firme vontade de um crescente e profícuo relacionamento com todos os parlamentos amigos neste processo de adesão e integração europeia.
O alargamento é o caminho certo para a correcção das assimetrias verificadas no seio do nosso Continente, para que haja mais justiça e solidariedade entre os europeus, para que haja progresso e paz para todos.
O sucesso do alargamento tem custos políticos e financeiros; teremos de pagar, de boa vontade, o seu preço. O alargamento é a certeza do futuro da Europa.
Anexo IV
Intervenção de S. Ex.ª O Primeiro-Ministro na Assembleia da República por ocasião do encontro com os Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia
(25 de Abril de 2003)
Portugal: uma experiência bem sucedida numa Europa em mutação
Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Presidentes dos Parlamentos dos países que em breve vão aderir à União Europeia, Senhoras e Senhores: Gostaria, em primeiro lugar, de agradecer ao Sr. Presidente da Assembleia da República ter-me convidado, para transmitir a uma tão ilustre plateia algumas reflexões sobre a experiência de Portugal na União Europeia.
Quero também felicitá-lo, Sr. Presidente, por esta magnífica e oportuna iniciativa de reunir os Presidentes dos Parlamentos dos países que em breve farão formalmente parte da União Europeia. Se é verdade que este evento reflecte o espírito europeu de Portugal e a proximidade política que sentimos relativamente a estes países, não é menos verdade que ele testemunha, a sensibilidade política e a inteligência de um estadista de que nós em Portugal tanto nos orgulhamos.
Sinto-me particularmente grato por poder abordar esta questão. A minha participação em anteriores governos durante 10 anos permitiu-me testemunhar a evolução do processo de construção europeia. Mais recentemente, desde que o Governo que chefio assumiu funções, pude confirmar algumas das suas tendências e características, nalguns casos muito próprias da situação portuguesa, mas noutros com uma aplicação mais geral e com incidências para os países agora em vias de concretizar a sua adesão.
Procurarei partilhar convosco um pouco da minha própria experiência. Embora consciente da especificidade de cada caso e da importância dos países seguirem os seus próprios caminhos, creio também que é a partir das lições do passado que os Estados candidatos melhor se poderão preparar para o grande desafio que é a sua plena integração na União Europeia.
Tive, aliás, há poucos dias o prazer e a honra de assinar em Atenas, pelo meu país, o Tratado de adesão dos dez Estados que se tornarão muito em breve novos membros de pleno direito do União.
Seguir-se-á num futuro não muito distante, estou convencido, a assinatura do Tratado de adesão da Bulgária e da Roménia, dois Estados candidatos que têm feito grandes progressos na via da adesão, e que tudo indica estarão prontos para aderir em 2007, de acordo com o calendário previsto.
Minhas Senhoras e meus Senhores: Portugal apoiou, activa e convictamente, desde a primeira hora, o alargamento da União Europeia, que encarámos como um imperativo de solidariedade política para com os países candidatos.
Como poderia ter sido de outro modo? Como poderia Portugal negar aos outros o que aspirou para si próprio e lhe permitiu consolidar o seu jovem regime democrático?
O pedido de adesão de Portugal deveu-se de facto a uma opção verdadeiramente política. Recordemos que, em 1977, quando Portugal apresentou a sua candidatura, ainda não existiam nem fundos estruturais nem de coesão.
Não nos arrependemos do caminho percorrido. O nosso PIB per capita passou de cerca de 50% da média Europeia, quando aderimos às Comunidades Europeias, a quase 75%. O desafio que constituiu a nossa integração, nomeadamente no mercado interno, foi um verdadeiro estímulo para o desenvolvimento e um desafio que Portugal venceu claramente.
A participação de Portugal no espaço europeu obrigou a uma reestruturação e uma modernização do aparelho económico e do sistema financeiro. Particularmente importante, obrigou a uma mudança de comportamentos, que tiveram de adaptar-se à concorrência, à exigência de qualidade, à necessidade de modernização. Construíram-se infra-estruturas a ritmos muito superiores ao passado, sem custos excessivos para o erário público, fruto da comparticipação do orçamento comunitário, com ganhos para o emprego e o rendimento.
Em suma, a nossa adesão, não obstante impactos por vezes negativos, agiu como um impulsionador externo, obrigando-nos a combater inércias e a fazer as reformas indispensáveis que nos permitem hoje percorrer o caminho da modernidade.
A introdução da moeda única trouxe novas exigências, nomeadamente uma disciplina orçamental consubstanciada nas regras do Pacto de Estabilidade e de Crescimento, e que nós tencionamos respeitar, apesar das difíceis condições que herdámos do anterior governo.
Uma das primeiras preocupações do meu Governo foi equilibrar as contas públicas. Implementámos medidas, algumas
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das quais difíceis, conseguindo reduzir o deficit em 2002 de 4,2% do PIB para 2,6%.
Estes esforços foram publicamente louvados ao nível Europeu e por observadores internacionais. A própria Comissão reconheceu o empenho bem sucedido do Governo português para controlar o seu deficit orçamental.
Por outro lado, e para consolidar uma estratégia de crescimento sustentado no médio prazo, procurámos aplicar estas medidas orçamentais em estreita articulação com numerosas outras reformas que, estamos certos, terão um impacto positivo na economia portuguesa.
Tudo isto, que garantiu o sucesso da participação de Portugal no processo de construção europeia, deveu-se em boa parte à existência de um amplo consenso nacional sobre as grandes prioridades para o País no nível europeu.
E porque foi assim, uma mensagem que eu gostaria de vos transmitir é justamente esta: é particularmente importante para um Estado-membro criar e conservar um tal consenso ao nível nacional.
Minhas Senhoras e meus Senhores: Desde o dia 16 de Abril que os vossos países, ao terem assinado o Tratado de adesão; participam como observadores em todas as instâncias do Conselho. Porque este será o primeiro verdadeiro teste à capacidade da União de fazer face do desafio do alargamento, gostaria também de utilizar a experiência portuguesa para me debruçar um pouco sobre o nosso futuro comum.
Não podemos deixar que esta Europa, que está a viver uma verdadeira metamorfose, produza mais História do que aquela que é capaz de consumir, para utilizar a fórmula que Winston Churcill utilizou uma vez com alguma ironia quando se referia aos Balcãs.
Temos pois que agir, e agir bem, preparando adequadamente a União para o alargamento. Os meios existem. A Convenção para o Futuro da Europa tem feito progressos consideráveis. É essencial que os resultados do seu trabalho sejam equilibrados e traduzam os compromissos obtidos, mas também as divergências existentes.
Infelizmente, as recentes propostas que o Presidente da Convenção apresentou, pelo seu carácter francamente parcial e tendencialmente intergovernamental, não auguram nada de bom para a prossecução dos trabalhos.
Seguir-se-á a Conferência Intergovernamental, na qual deverão participar plenamente os novos Estados-membros. Não seria politicamente aceitável que estes últimos aí estivessem representados com um estatuto de inferioridade. Convém não nos esquecermos que os seus respectivos Parlamentos deverão ratificar o novo Tratado Constitucional que resultar da Conferência Intergovernamental.
Ao construirmos a Europa de amanhã o nosso horizonte deverá ser ambicioso. As reformas que fizermos deverão ser mesmo para durar. A ideia de que União é como uma bicicleta que deve estar sempre a rolar para não cair está hoje ultrapassada.
Por outro lado, ao proceder-se à reforma da União, deveremos preservar as características que fizeram dela uma história de sucesso durante mais de 50 anos, e que motivaram tantas países a pedirem a adesão. Destacaria o mercado interno e o seu ponto de equilíbrio, que é a coesão económica e social, mas também certos elementos, que não obstante subjectivos não deixam por isso ser muito reais, como uma certa cumplicidade entre os Estados-membros e a capacidade de tornar, as decisões num espírito verdadeiramente comunitário.
Seria, de facto, lamentável se os novos Estados-membros pedissem a adesão a uma União e viessem mais tarde a constatar que aderiram a outra, diferente, na qual as palavras solidariedade e coesão já tivessem perdido o sentido.
Para que a reforma não seja um simples exercício de pragmatismo, em que se avança, mudando aqui e ali, fugindo para a frente, mas sem se saber verdadeiramente para onde se vai, é preciso sabermos à partida o que entendemos por União Europeia.
A União é mais do que uma simples associação de Estados soberanos e iguais que perseguem objectivos comuns através de métodos diferenciados consoante os assuntos. Tem uma natureza própria, sui generis, visando uma associação sempre mais estreita e solidária entre os seus membros. Esta crescente confiança e solidariedade deve, no nosso entender, permitir a prazo uma utilização predominante do método comunitário.
Em contrapartida, a União não é, e estaremos muito vigilantes para que não o venha a ser, uma via para a estratificação dos seus Estados-membros.
Uma União nos termos acima referidos assenta no respeito de certos pressupostos apoiados pela grande maioria dos seus Estados-membros.
Uma União nos termos acima referidos assenta no respeito de certos pressupostos apoiados pela grande maioria dos Estados-membros, presentes e futuros, como tem ficado patente nas tomadas de posição dos Representantes dos Governos e dos Parlamentos nacionais no seio da Convenção.
Em primeiro lugar, o respeito do princípio da igualdade entre os Estados-membros. O processo de integração coabita em todos os países da União com um sentimento natural, quase inato, de orgulho nacional. Sou português e ao mesmo tempo sou europeu! E uma realidade, e ainda bem que assim é. Mas a consequência é clara: nenhum cidadão europeu aceitará um projecto europeu que implique a diminuição do seu próprio país.
Devo dizer-vos que tenho por vezes o sentimento que ainda há quem não meça as consequências que poderia ter o não respeito do princípio da igualdade no momento das ratificações nacionais de um futuro Tratado Constitucional.
Um segundo critério é o da preservação e consolidação da componente comunitária da União, e nomeadamente da Comissão, que constitui o verdadeiro motor e ponto de equilíbrio entre os interesses das diferentes partes.
A Europa que construímos deve ser facilmente compreendida pelos cidadãos. Um terceiro critério deve pois ser o da procura da simplicidade. Deve evitar-se a todo o custo que o resultado deste exercício seja o de um imbróglio de procedimentos por vezes incompreensível para os próprios peritos. O novo Tratado Constitucional, ou mesmo uma Constituição a palavra não me assusta será positivo porque clarificará e dará maior dignidade à União.
Também com o objectivo de uma maior simplificação deveria aplicar-se sempre que possível o método comunitário. Foi nas áreas em que este método foi aplicado que se registaram os maiores avanços no processo de construção europeia. Somos favoráveis a que mais assuntos sejam decididos por maioria qualificada e a generalizar a co-decisão.
Outro critério importante é o da procura da eficácia. Mas eficácia não é só decidir com rapidez. A verdadeira eficácia consiste em assegurar que as decisões tomadas ao nível europeu sejam aceites pelos seus principais destinatários, i.e., pelos cidadãos.
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Esta é outra mensagem importante que eu gostaria de transmitir a partir da experiência de Portugal na União Europeia: os cidadãos devem poder rever-se na União que resultar deste processo de reforma. A União far-se-á com a adesão dos cidadãos ou não se fará. É indispensável que a União reconheça aos cidadãos um conjunto de direitos políticos e jurídicos que enquadrem a sua identidade comum. Julgo pois particularmente importante que a União acolha no seu novo Tratado a Carta dos Direitos Fundamentais, cujo conteúdo deverá ser respeitado e garantido juridicamente.
Minhas Senhoras e meus Senhores: Portugal é fortemente favorável ao reforço do papel dos Parlamentos nacionais na vida da União, nomeadamente naqueles assuntos que passam progressivamente do nível nacional para o da União, como por exemplo as questões de segurança e defesa. Por outro lado, os Parlamentos deveriam receber competências suplementares para verificar o respeito do princípio de subsidiariedade, nomeadamente pela via do estabelecimento de um mecanismo de alerta precoce. No entanto, em qualquer circunstância, estes poderes não deveriam poder ser utilizados de uma forma que limitasse a margem de iniciativa da Comissão.
A Comissão deverá ser uma instituição forte. É no interesse da União que ela seja capaz de tomar posição sem precisar sistematicamente de se amparar nas capitais dos Estados-membros. Somos assim favoráveis a conferir uma maior legitimidade à Comissão, o que poderá ser feito pela via da eleição da sua Presidência pelo Parlamento Europeu.
Para além destas questões, os recentes acontecimentos em torno da crise iraquiana mostram-nos que é necessário reflectir-nos também muito seriamente sobre a dimensão de segurança e defesa da União Europeia. A verdade é que apesar das boas intenções repetidamente manifestadas, a dimensão política da União é por vezes insuficiente para fazer face aos desafios. A presente situação mostrou com clareza que a União só poderá desempenhar um papel à altura das suas ambições se reforçar a sua dimensão política.
Isso não acontecerá por simples decreto e todas as medidas que possam ser sugeridas na Convenção e decididas na Conferência Intergovernamental só serão aplicáveis se corresponderem a um elevado grau de confiança entre os Estados-membros. Isso só será alcançado se os Estados-membros, independentemente da sua dimensão, estiverem conscientes de que é absolutamente vital exorcizarem-se as veleidades de directórios e respeitarem-se as sensibilidades e a dignidade de todos os restantes parceiros sempre que sejam definidos objectivos comuns e tomadas decisões com implicações para o conjunto da União.
Mas devemos também ser humildes e reconhecer as limitações da Política Europeia de Segurança e Defesa, e mesmo da Política Europeia de Segurança Comum, procurando ultrapassá-las de forma realista. A situação em que nos encontramos deveria mostrar-nos que a Europa, para ser credível em matéria de segurança e defesa, deveria constituir-se como o pilar europeu de uma relação transatlântica renovada.
A Convenção e a Conferência Intergovernamental dão-nos a possibilidade de corresponder a estes e a outros desafios. O debate está lançado e deve ser levado com toda a seriedade, definindo-se previamente objectivos comuns. É importante que este debate não se torne numa polémica estéril, entre pequenos, médios e grandes países.
Como já tenho afirmado repetidas vezes, deve antes ser um debate entre pequenas e grandes ambições. E neste registo, posso assegurar-vos que Portugal é um país com grandes ambições para a Europa.
Não nós deveremos também esquecer que a Europa não se esgota nas fronteiras da União. Existem outros países vizinhos com os quais é particularmente importante reforçarem-se as relações, por não se vislumbrar a sua adesão à União, pelo menos num futuro previsível. Deveríamos redobrar os esforços para mostrar a estes países que o alargamento leva a uma maior aproximação entre a União e os seus vizinhos.
A relação transatlântica está incluída neste contexto. Portugal, e também a União, têm uma fronteira marítima com os países do outro lodo do Atlântico. Na minha opinião, a credibilidade do sistema internacional, muito em particular no quadro das Nações Unidas; depende em boa parte da qualidade das relações entre a União Europeia e os Estados Unidos.
Minhas Senhoras e meus Senhores: Quando Portugal aderiu às Comunidades Europeias não só consolidou a sua jovem democracia, como aderiu também a um projecto político que se mantém e se reforçou, sobretudo com o aparecimento da moeda única e a passagem ao estádio de União. Para nós a palavra "União" tem um significado muito real: o de uma comunidade de valores e desígnios que encontra a sua verdadeira motivação na preservação da paz e no respeito da democracia e das pessoas, que são as primeiras destinatárias do projecto de construção europeia.
É a esta União que os vossos países estão agora a aderir. Estou seguro que não obstante as dificuldades, os Estados europeus que VV. Ex.as dignamente representam e que agora reintegraram o seu espaço natural, saberão contribuir para que a União, para além deste alargamento, alcance também um verdadeiro aprofundamento.
Portugal estará sempre ao vosso lado na estimulante tarefa de reunificarmos a Europa ao mesmo tempo que afirmamos no mundo os valores europeus de Liberdade, de Democracia e de Justiça.
Anexo V
Conclusões
(26 de Abril de 2003)
Realizou-se, em Lisboa, nos dias 25 e 26 de Abril, uma reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos países do alargamento da União Europeia com o Presidente do Parlamento português. A experiência portuguesa no processo de integração europeia e o papel dos Parlamentos nacionais na futura arquitectura institucional da Europa constituíram os temas debatidos.
Esta reunião foi realizada no vigésimo nono aniversário da Revolução que restaurou as liberdades cívicas e permitiu a criação de um regime democrático em Portugal.
O alargamento, entendido como um processo político integrado e irreversível, cumpre mais uma etapa fundamental do ideal europeu.
Quanto à reforma institucional da União Europeia, os representantes dos Parlamentos nacionais participantes na reunião advogam a necessidade de a Convenção sobre o Futuro da Europa dever propor a definição do papel a desempenhar por eles no futuro.
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Os Presidentes dos Parlamentos apelam para que seja garantida a igualdade de direitos aos países candidatos na Convenção bem como na Conferência Intergovernamental, adoptando o novo Tratado Constitucional da União Europeia. Todos concordam que o Tratado Constitucional não deverá ser assinado sem a total aceitação dos 25 países.
A crescente transferência de poderes legislativos dos Parlamentos nacionais para os Governos reunidos em Conselho, verificada no processo de integração europeia, tem tido como consequência o afastamento dos Parlamentos nacionais do processo decisório comunitário.
O envolvimento dos Parlamentos nacionais, incluindo o dos países candidatos, no processo de integração europeia, nomeadamente mediante o controlo dos seus próprios governos, melhora a qualidade democrática da decisão comunitária e fortalece a ligação entre os cidadãos e o ideal europeu.
A reunião acolheu, favoravelmente, a ideia de incentivar o relacionamento dos Parlamentos nacionais dos presentes e futuros Estados-membros entre si e destes com o Parlamento Europeu.
Todos os Presidentes dos Parlamentos nacionais advogam que a União Europeia alargada não deve defraudar as expectativas dos novos Estados-membros. Seria lamentável que esses Estados se vissem confrontados, após a Adesão, com uma realidade diferente daquela a que pensavam aderir, na qual as palavras solidariedade e coesão já tivessem perdido o sentido. Por isso, a preservação e a consolidação da componente comunitária da União, e nomeadamente da Comissão, devem constituir o verdadeiro motor e ponto de equilíbrio entre os interesses das diferentes partes. Os Estados-membros, independentemente da sua dimensão, devem estar conscientes de que é absolutamente vital exorcizarem-se as veleidades de directórios e respeitarem-se as sensibilidades e a dignidade de todos os restantes parceiros, sempre que sejam definidos objectivos comuns e tomadas decisões com implicações para o conjunto da União.
O Presidente do Parlamento português congratulou-se com o interesse e a participação dos Presidentes dos Parlamentos dos futuros Estados-membros da União Europeia no esforço de consolidação dos laços de amizade e cooperação que a todos unem.
Sua Excelência
Sr. Ognian Gerdjikov
Presidente do Parlamento da República da Bulgária
Sua Excelência
Sr. Pavol Hrusovsky
Presidente do Parlamento da República da Eslováquia
Sua Excelência
Sr.ª Ene Ergma
Presidenta do Parlamento da República da Estónia
Sua Excelência
Sr.ª Katalin Szili
Presidenta do Parlamento da República da Hungria
Sua Excelência
Sr.ª Ingrida Udre
Presidenta do Parlamento da República da Letónia
Sua Excelência
Sr. Arturas Paulaskas
Presidente do Parlamento da República da Lituânia
Sua Excelência
Sr. Marek Borowski
Presidente do Parlamento da Polónia
Sua Excelência
Sr. João Bosco Mota Amaral
Presidente do Parlamento de Portugal
Sua Excelência
Sr. Lubomir Zaoralek
Presidente do Parlamento da República Checa
Sua Excelência
Sr. Valer Dorneanu
Presidente do Parlamento da Roménia
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.
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