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Quarta-feira, 3 de Maio de 2006 II Série-C - Número 50

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

S U M Á R I O

Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC):
Primeiro relatório mensal referente ao período compreendido entre 17 de Fevereiro e 31 de Março de 2006.

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ERC - ENTIDADE REGULADORA PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL

Primeiro relatório mensal referente ao período compreendido entre 17 de Fevereiro e 31 de Março de 2006

A ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, entidade administrativa independente dotada de poderes de regulação e supervisão sobre todas as entidades que, sob jurisdição portuguesa, prosseguem actividades de comunicação social, tem o exercício das suas atribuições sujeito a acompanhamento parlamentar (artigo 73.º, n.º 1, dos Estatutos da ERC, adoptados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro).
Assim, e de acordo com o disposto no citado n.º 1 do artigo 73.º, impende sobre a ERC a obrigação de manter a Assembleia da República informada sobre as suas deliberações e actividades, dever esse que se cumpre com o envio de uma colectânea mensal das mesmas.
Tendo a ERC iniciado funções a 17 de Fevereiro de 2006 com a tomada de posse dos membros do Conselho Regulador, este primeiro relatório incide sobre o período que vai desde essa data a 31 de Março do corrente.
Os primeiros tempos de actividade da ERC, como bem se compreende, pautaram-se por dar uma atenção particular à sua organização interna, que passou, nomeadamente, pela instalação do Conselho Regulador, pela designação do Director Executivo, pela estruturação dos serviços técnicos e administrativos e pela preparação e lançamento de processos de recrutamento de pessoal técnico para fazer face às acrescidas competências e responsabilidades de regulação e supervisão atribuídas à Entidade. Com o início de funções, com efeito, o Conselho regulador da ERC deparou com uma situação de notória carência de quadros, que era urgente enfrentar uma vez que, em termos práticos, impossibilitava o exercício normal do essencial das suas competências. Por conseguinte, foi já lançado tanto um concurso para recrutamento de juristas quanto um outro para recrutamento de informáticos.
Ainda neste plano, e em aplicação do disposto no artigo 3.º, n.º 3, da Lei n.º 53/2005, acima referida, foi publicado o Despacho n.º 5776/2006 (Diário da República, 2.ª Série), de 27 de Fevereiro, que contém a lista nominativa do pessoal do Instituto da Comunicação Social que passa a exercer funções junto da ERC. Recorde-se que esse é o pessoal anteriormente afecto às Divisões de Fiscalização e de Registo do ICS, competências agora exercidas pela ERC. Por falta de espaço disponível nas actuais instalações da Entidade Reguladora, e em articulação com o ICS, foi decidido que esses agentes continuassem a exercer as respectivas funções nas instalações deste, actualmente no Palácio Foz.
Por outro lado, considerada a necessária articulação de algumas das suas competências com as de outras entidades reguladoras (a saber, a ANACOM e a Autoridade da Concorrência) e com o ICS, o Conselho Regulador da ERC reuniu com cada uma destas entidades, de forma a dar execução ao que estipula o artigo 11.º dos seus Estatutos (segundo o qual a ERC "deve manter mecanismos de articulação com as autoridades reguladoras da concorrência e das comunicações e com o Instituto da Comunicação Social, designadamente através da realização de reuniões periódicas com os respectivos órgãos directivos"). Recorde-se depois que, segundo as suas normas estatutárias, são várias as disposições em que, concretamente, o exercício de competências da ERC está cruzado, se a expressão é permitida, com as da ANACOM e as da Autoridade da Concorrência. Serve de exemplo, aliás, o facto de uma das primeiras deliberações do Conselho Regulador ter sido proferida na sequência de pedido de parecer da Autoridade da Concorrência, ao abrigo da n.º 1 do artigo 39.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho (cifra infra).
De registar ainda, na execução das atribuições da nova Entidade Reguladora, todos os procedimentos administrativos entretanto iniciados ou retomados (em relação aos transitados da Alta Autoridade para a Comunicação Social), e cuja tramitação se vai desenvolvendo nos termos legais.
Segue-se, então, na sequência do atrás exposto, a lista de deliberações já aprovadas pelo Conselho Regulador no âmbito das suas competências (e que se juntam em anexo):

- Deliberação 1-Q/2006 - Notícias difundidas pela LUSA sobre a instalação de banda larga nas escolas públicas do País;
- Deliberação 2-Q/2006 - Queixa apresentada pelo Clube Midas Prestige contra a SIC e a SIC Notícias;
- Deliberação 1-P/2006 - Pedido de parecer da Autoridade da Concorrência, ao abrigo da n.º 1 do artigo 39.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho;

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- Deliberação n.º 2-P/2006 - Pedido de parecer sobre a exoneração e nomeação do subdirector de conteúdos partilhados e de produção do canal A2;
- Parecer n.º 1/2006 - Parecer relativo ao anteprojecto de decreto-lei que aprova o regime das taxas da Entidade Reguladora para a Comunicação Social;
- Parecer n.º 2/2006 - Parecer relativo ao anteprojecto da proposta de lei que altera o Estatuto do Jornalista.

O Presidente da ERC, Prof. Doutor José Alberto Azeredo Lopes.

Anexo

Deliberação n.º 1-Q/2006

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Assunto: Notícias difundidas pela Lusa sobre a instalação de banda larga nas escolas públicas do País

I - A 8 de Fevereiro de 2006 a Directora de Informação da Agência Lusa, Dra. Deolinda Almeida, solicitou à Alta Autoridade para a Comunicação Social que esta se pronunciasse sobre "notícias saídas na imprensa nos últimos dias" que, no seu entender, punham em causa "a independência da agência noticiosa Lusa face ao poder político, bem como o rigor informativo" daquele órgão de comunicação social.
O pedido transitou para a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro.
Em síntese, o objecto do diferendo versa a cobertura noticiosa feita pela Agência Lusa da instalação de banda larga nas escolas públicas do País, na altura anunciada pelo Governo. Embora as notícias sobre o assunto tivessem sido iniciadas em data anterior, a controvérsia incide, no essencial, sobre os despachos emitidos nos dias 31 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2006.
Também o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD) solicitou a intervenção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, destacando no pedido que, em seu entender, o caso da "banda larga" colocava questões atinentes ao exercício da liberdade de informação.
II - Tendo presente o exposto, o Conselho Regulador da ERC realizou um conjunto de diligências instrutórias, nomeadamente a audição da Directora da Agência Lusa, Dr.ª Deolinda Almeida, e das jornalistas Dr.as Ana Leiria, Joana Bastos e Sílvia Maia.
O Conselho Regulador notificou também o Conselho de Redacção da Agência Lusa, solicitando a indicação de um seu representante para efeito de audição. No entanto, os membros eleitos daquele órgão escusaram-se a indicar um representante, tendo enviado ao Conselho Regulador uma declaração escrita depois de tal faculdade lhes ter sido comunicada por este Conselho.
III - O Conselho Regulador coligiu e apreciou, entre outros, os elementos acima aduzidos e, nos termos dos artigos 8.º, alíneas a) e c), e 24.º dos Estatutos anexos à Lei n.º 53/2005, concluiu:

1) Não terem sido apurados factos que indiciem, por qualquer forma, a existência de pressões ilícitas que possam afectar a independência da Agência Lusa perante o poder político;
2) Terem existido, no plano profissional interno, discordâncias relevantes entre as jornalistas envolvidas e as suas hierarquias, relativamente a critérios jornalísticos aplicáveis à cobertura deste caso (com claro prejuízo do ambiente de trabalho e consequentes reflexos na situação jurídico-laboral) e traduzidas, nomeadamente, em intervenções jornalísticas paralelas e concorrentes, por vezes contraditórias, pouco credibilizadoras da Agência e prejudiciais, em última instância, ao rigor da informação;
3) Não serem os factos submetidos à apreciação da ERC suficientemente relevantes para justificarem outro tipo de intervenção.

Lisboa, 8 de Março de 2006.

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0004 | II Série C - Número 050 | 03 de Maio de 2006

 

O Conselho Regulador da ERC: José Alberto de Azeredo Lopes - Elísio Cabral de Oliveira - Luís Gonçalves da Silva - Maria Estrela Serrano - Rui Assis Ferreira.

Deliberação n.º 2-Q/2006

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Assunto: Queixa apresentada pelo Clube Midas Prestige contra a SIC e a SIC Notícias

I - O Conselho Regulador decide, nos termos dos artigos 8.º, alínea f), e 24.º dos Estatutos da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, revogar a deliberação sobre um recurso do Clube Midas Prestige contra a SIC e a SIC Notícias, aprovada em reunião plenária da Alta Autoridade para a Comunicação Social, a 7 de Setembro de 2005, por considerar que poderá estar em causa a garantia do exercício do direito de resposta, tal como vem previsto no artigo 59.º da Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto (Lei da Televisão).
II - Em consequência, a queixa será oportunamente reapreciada pelo Conselho Regulador da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

Lisboa, 8 de Março de 2006.
O Conselho Regulador da ERC: José Alberto de Azeredo Lopes - Elísio Cabral de Oliveira - Luís Gonçalves da Silva - Maria Estrela Serrano - Rui Assis Ferreira.

Deliberação n.º 1-P/2006

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Assunto: Pedido de parecer da Autoridade da Concorrência ao abrigo do n.º 1 do artigo 39.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho

I - Em 1 de Março de 2006 a Autoridade da Concorrência solicitou à ERC que emitisse parecer sobre o processo de aquisição, pela empresa Sonaecom, SGPS, SA, do controlo exclusivo sobre a Portugal Telecom, SGPS, SA, conforme previsto no n.º 1 do artigo 39.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho.
II - O Conselho Regulador da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, no exercício das atribuições e competências previstas nos artigos 7.º, 8.º e 24.º dos Estatutos da ERC, adoptados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, delimitou o âmbito da sua análise às questões relativas aos sectores imprensa, radiodifusão sonora, televisão, internet, comunicações móveis e publicidade.
O Conselho Regulador verificou a ausência de normas preventivas de concentração vertical e diagonal nos média, bem como relativamente aos novos meios de transmissão, designadamente telecomunicações móveis e internet.
Com esta limitação, deliberou, por unanimidade:

Nos termos da legislação aplicável, Lei de Imprensa (Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro), Lei da Televisão (Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto) e Lei da Rádio (Lei n.º 4/2001, de 23 de Fevereiro), não se registam obstáculos à concretização da operação de concentração em causa.

Lisboa, 21 de Março de 2006.
O Conselho Regulador da ERC: José Alberto de Azeredo Lopes - Elísio Cabral de Oliveira - Luís Gonçalves da Silva - Maria Estrela Serrano - Rui Assis Ferreira.

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Deliberação n.º 2-P/2006

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Assunto: Pedido de parecer do Conselho de Administração da RTP sobre a exoneração e nomeação do subdirector de conteúdos partilhados e de produção do canal A2

Tendo sido solicitada pelo Conselho de Administração da RTP a emissão de parecer da AACS sobre a exoneração do subdirector de conteúdos partilhados e de produção do canal A2, Dr. Carlos Vargas, e subsequente nomeação, para o mesmo cargo, da Dr.ª Paula Moura Pinheiro, cujo procedimento administrativo transitou para a ERC, o Conselho Regulador deliberou o seguinte, à luz da informação entretanto recolhida:

I - De acordo com a letra do artigo 24.º, n.º 3, alínea l), dos Estatutos da ERC, que define as competências legalmente cometidas à ERC neste domínio, a emissão de parecer prévio e vinculativo reporta-se à nomeação dos directores e directores-adjuntos, pelo que não abrange, explicitamente, o cargo de subdirector em causa;
II - Sem prejuízo do antes referido, o Conselho Regulador da ERC reserva-se, naturalmente, o direito e dever de apreciação material dos conteúdos funcionais dos cargos directivos não referidos de forma específica no preceito legal acima mencionado.

Lisboa, 29 de Março de 2006.
O Conselho Regulador da ERC: José Alberto de Azeredo Lopes - Elísio Cabral de Oliveira - Luís Gonçalves da Silva - Maria Estrela Serrano - Rui Assis Ferreira.

Parecer relativo ao anteprojecto de decreto-lei que aprova o regime das taxas da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Parecer n.º 1/2006

Solicitado a pronunciar-se sobre o anteprojecto de decreto-lei que aprova o regime das taxas da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, e após análise do respectivo diploma, o Conselho Regulador é de parecer que:

Quanto ao decreto preambular:
Artigo 5.º - propõe-se a sua eliminação.
Sugere-se, quando muito, a previsão, dois anos após a entrada em vigor do diploma, de uma avaliação do respectivo impacto, tanto do ponto de vista de sua repercussão sobre a organização e funcionamento da ERC quanto sobre os diferentes agentes com intervenção na comunicação social.
Quanto ao regime das taxas (aprovado, e em anexo, ao anteprojecto de decreto-lei):
Artigo 2.º, n.º 2 - a norma é pouco esclarecedora e, quanto à relação subsidiária de fontes, pode colocar problemas interpretativos graves, de que é exemplo o tratamento parificado de diplomas com regimes que, em concreto, se podem mostrar contraditórios.
Artigo 3.º, n.º 1, artigo 4.º, n.º 1, artigo 8.º, n.º 1, e artigo 9.º, n.º 1 - A utilização do termo "remunerar" é inapropriada e conotativa, podendo sem necessidade chamar à colação a questão antiga da distinção entre taxa e imposto.
A mesma observação vale para os restantes preceitos em que o termo é utilizado.
Artigo 5.º, n.º 1, alínea f) - propõe-se alterar para "Serviços audiovisuais em linha e sítios informativos submetidos a tratamento editorial". Sugere-se, por conseguinte, e em conformidade com o artigo 5.º, n.º 7, a alteração dos demais preceitos que se lhe refiram.
Artigo 5.º, n.º 8 - chama-se a atenção para o facto de a disposição apenas prever uma regra de isenção (circunscrita, aliás, à imprensa periódica), não contemplando outros universos, como, por exemplo, os sítios de estações de televisão e rádio, com constante actualização de conteúdos. Além disso, dada a crescente

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tendência para autonomização estrutural destes sítios em termos de conteúdos e respectiva exploração comercial, afigura-se preferível à figura da isenção o recurso a um critério de majoração de taxa de supervisão e regulação.
Artigo 6.º, n.º 2, alínea b) - propõe-se alteração em conformidade com a terminologia utilizada na nova redacção do artigo 7.º, n.º 1.
Artigo 6.º, n.º 2, alínea d) - sugere-se que esta alínea seja colocada a seguir à alínea a), uma vez que ambas têm a ver com a entidade regulada.
Artigo 6.º, n.º 3, alínea b) - sugere-se que as publicações exclusivamente distribuídas em suporte electrónico sejam incluídas neste nível de regulação.
Artigo 6.º, n.º 5, alínea b) - a expressão correcta a utilizar parece ser "Os serviços de programas com cobertura de âmbito regional ou internacional".
Artigo 6.º, n.º 7, alínea b) - sugere-se "abranja dois ou mais distritos ou uma região autónoma".
Artigo 6.º, n.º 7, alínea c) - sugere-se o corte de ou uma região autónoma".
Artigo 7.º, n.º 1, alínea e) - sugere-se que, em vez de "impacto social", se opte pela mera referência a "impacto".
Artigo 7.º, n.º 2 - propõe-se a seguinte redacção: "Os critérios repercutidos no método de fixação da Taxa de Regulação e Supervisão constante do Anexo 1 ao presente Regime de Taxas servem de base à definição do seu quantitativo em valores mínimos e máximos expressos em unidades de conta por (…)". Propõe-se ainda a inclusão de um n.º 3 que preveja que a aprovação da portaria do número antecedente seja precedida de consulta à ERC.
Artigo 8.º, n.º 2 - substituir "qualidade profissional" por "qualificação profissional".
Artigo 10.º, n.º 2 - propõe-se a eliminação do preceito e, quando muito, a inclusão da justificação nele contida, na parte inicial do diploma (eventualmente, na parte preambular).
Artigo 10.º, n.º 3 - Sugere-se a previsão de uma intervenção consultiva da ERC na fixação dos montantes a prever na portaria conjunta referida no preceito.
Artigo 11.º, n.º 1 - tendo em conta a natureza criminal do termo "multa" (referido no preceito), pede-se uma aclaração da sua utilização neste contexto.
Artigo 12.º, n.º 1 - propõe-se que a isenção aqui contemplada não inclua os sítios ou portais directamente operados por fornecedores de acesso à internet (ISP), dada a relevância dos meios e conteúdos envolvidos, bem como a actividade económica àqueles associada (por exemplo, IOL, CLIX e SAPO).
Além disso, os demais sítios informativos submetidos a tratamento editorial apenas deverão beneficiar de uma isenção transitória, com prazos definidos no diploma.
Artigo 13.º - a remissão contida no preceito in fine deverá ser corrigida por, em rigor, visar o artigo 26.º, n.º 1, alínea f), dos Estatutos da ERC. Além disso, sugere-se vivamente que fique prevista a possibilidade mais ampla de substituição em juízo, nos termos da redacção a seguir proposta:

"A representação judiciária da ERC deve ser exercida pelo Presidente do Conselho Regulador da ERC, outro membro do mesmo órgão, ou mandatário por este designado, e habilitado para o efeito."

Salienta-se, demais, a necessidade de compatibilização do preceito com o artigo 31.º, n.º 2, dos Estatutos da ERC.
Artigo 14.º, n.º 1 - sugere-se a alteração seguinte: "É da competência do Conselho Regulador (…)"
Artigo 15.º, n.º 1 - em consonância proposta relativa ao artigo 27.º, sugere-se que o artigo 15.º, n.º 1, atribua ao Director Executivo a competência actualmente conferida ao Presidente do Conselho Regulador.
Artigo 16.º, n.º 2 - a redacção deste número é particularmente gravosa para os particulares e, sendo comum no direito tributário, não parece justificar-se no relacionamento entre particulares e Administração quando aqueles pagam anualmente uma taxa de regulação. Assim, sugere-se que a redacção seja "caso não seja possível a concretização do procedimento nos termos da alínea b) do número anterior, só é devido o pagamento da taxa quando a não concretização do procedimento se dever a facto ou omissão do particular interessado".
Artigo 17.º, n.º 2 - substituir "os serviços de apoio da ERC" por "a ERC".

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Artigo 21.º, n.º 5 - sugere-se que se faça referência expressa a dias úteis. Cifra sugestão relativa ao disposto no artigo 26.º, n.º 1.
Artigo 26.º, n.º 1 - Relativamente ao artigo 26.º, não se concorda tecnicamente com a contagem em dias contínuos, dado que estamos perante um procedimento administrativo/tributário.
Assim, os dias devem ser contados nos termos do Código de Procedimento Administrativo e não nos termos do Código Civil, devendo, por isso, ser dias úteis quando estão em causa procedimentos.
Não faz sentido criar especificidades relativamente a contagem de prazos dos procedimentos a que a ERC está obrigada nem que essas diferenças existam para os particulares. A existência de prazos contados diferentemente conduz, não raras vezes, a que o procedimento se esgote ou seja deficientemente organizado pelos serviços, por falta de tempo de decisão.
Artigo 27.º - relativamente ao artigo 27.º, não se percebe a quem é apresentado o recurso hierárquico, quer necessário quer facultativo.
Uma forma de resolver o problema seria o da lei atribuir competência própria ao Director Executivo para a prática dos actos tributários, sendo o recurso hierárquico para o Conselho Regulador.
A forma para a qual o diploma parece avançar é, por conjugação deste artigo com o artigo 15.º, a de prever recurso para o Conselho Regulador das decisões do Presidente da ERC. Tal solução, sobre não ser recomendável do ponto de vista técnico e da protecção dos particulares, levanta problemas práticos, além de colocar em causa teoricamente o princípio de que na decisão do recurso não pode tomar parte quem participou na decisão recorrida (princípio de imparcialidade).
Em caso de incumprimento pelos particulares no pagamento das taxas há lugar a execução fiscal. O que é normal.
Artigo 28.º - pelas razões aduzidas no artigo precedente, sugere-se que a competência para a revogação dos autos de liquidação caiba ao Conselho Regulador.
Artigo 31.º, n.º 4 - esta disposição suscita ao Conselho Regulador as maiores reservas, por poder rotineiramente pôr em causa a actividade e funcionamento regular dos meios de comunicação social. Na verdade, poderemos estar perante uma violação do princípio da proporcionalidade, que depois resulte, ainda que por efeito indirecto, numa restrição inconstitucional de um direito, liberdade e garantia, por desrespeito de competência reservada da Assembleia da República.
A aplicar-se a verdadeira inibição aqui prevista, poderia inviabilizar-se, entre outros, actos tão simples como a substituição do director de um órgão de comunicação social - sabendo-se que a existência daquele responsável é um dever básico que recai sobre qualquer publicação periódica e serviço de programas radiofónicos ou televisivos.

Lisboa, 1 de Março de 2006.

Parecer relativo ao anteprojecto da proposta de lei que altera o Estatuto do Jornalista

Parecer n.º 2/2006

I - Introdução: enquadramento da actividade jornalística

O Estatuto do Jornalista constitui-se, no ordenamento jurídico português, como o documento estruturante do grupo profissional dos jornalistas. De facto, é no Estatuto do Jornalista e na filosofia que lhe está subjacente que o legislador afirma melhor o seu entendimento sobre o que é o jornalismo, a sua relação com a sociedade e com os diferentes poderes, e sobre o que a sociedade deve esperar dos jornalistas enquanto titulares de direitos fundamentais no quadro da liberdade de imprensa, instrumento privilegiado do direito e liberdade de expressão, de que são titulares os cidadãos assim como, naturalmente, aqueles que estão sujeitos à jurisdição do Estado português.
Para que o direito dos cidadãos à informação seja uma realidade devem ser garantidas aos jornalistas independência e dignidade. Assim, o presumem textos internacionais que constituem, hoje, marcos históricos, como a Declaração de Munique, de 1971, que, em preâmbulo, relaciona a defesa da liberdade de informação e os direitos que ela implica, com a defesa da independência e da dignidade dos jornalistas. Mas a

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independência dos jornalistas tem como corolário a sua responsabilidade social, isto é, o seu comprometimento com um jornalismo ao serviço dos cidadãos, empenhado na procura da verdade, livre de todo o tipo de pressões.
A apreciação do anteprojecto da proposta de lei que altera o Estatuto do Jornalista convoca, necessariamente, factores que vão para além do direito e que se reputam essenciais à compreensão e análise de uma actividade e de um grupo profissional que, como a história do jornalismo mostra, fizeram muito do seu caminho, caminhando. É esse o sentido do enquadramento histórico e sociológico que, em traços largos, se julga relevante equacionar.
Historicamente, a emergência de uma imprensa livre está ligada à construção dos regimes democráticos, como se prova pelo lugar dado à liberdade de imprensa nas constituições de grande número de países. O jornalismo surge, aí, associado à democracia, ao interesse público e à procura da verdade.
A ligação genética do jornalismo à democracia e a tomada de consciência da especial responsabilidade social dos jornalistas justificam a existência de um estatuto particular, onde se incluam normas e formas de protecção (como a cláusula de consciência) que o distinguem da maioria dos outros profissionais.
O campo jornalístico é cruzado por tensões que se exprimem em visões conflituais sobre o seu papel na sociedade e sobre a excelência profissional. Ao modelo de um jornalismo ligado a valores de objectividade, de rigor deontológico, de distanciamento crítico e de análise, que encara a informação como um bem social e um serviço prestado à comunidade, norteado por uma missão de serviço público, opõem-se outras referências, nomeadamente as que encaram a informação como um simples produto, orientado para a conquista de audiências.
A flexibilidade da identidade profissional do jornalista torna o jornalismo uma "profissão" fracamente institucionalizada, cimentada que esteja pela partilha de uma ética e deontologia comuns - uma ética entendida como instrumento de questionamento da sociedade e uma deontologia encarada como "teoria dos deveres", materializada em códigos que funcionam como instrumentos legitimadores da "profissão".
Nas suas origens a deontologia assentou na reivindicação de um espaço de liberdade e de dignidade que permitisse o respeito espontâneo de regras. A deontologia remete para uma abordagem empírica dos deveres relativos a uma situação social ou a uma determinada profissão. Possui um carácter instrumental, o que significa que tem limites.
Apesar de possuir uma formulação codificada, característica que a aproxima do direito, possui uma autoridade limitada a um grupo profissional, cujo poder de imposição é problemático. No jornalismo a deontologia funciona como uma ética própria da "profissão", assentando no respeito e adesão espontâneos.

II - O anteprojecto de Estatuto do Jornalista: apreciação geral

O anteprojecto de Estatuto do Jornalista contém inovações que se consideram positivas, em especial as que se referem ao acesso à profissão (artigo 2.º), ao alargamento das incompatibilidades (artigo 3.º), à clarificação e desenvolvimento dos princípios de salvaguarda do sigilo profissional (artigo 11.º), à valorização da "cláusula de consciência" (artigo 12.º) e ao alargamento da intervenção dos conselhos de redacção (artigo 13.º).
Suscita, porém, algumas objecções, nomeadamente no que se refere aos deveres dos jornalistas (artigo 14.º) e às sanções disciplinares profissionais (artigo 21.º), mais adiante expostas em pormenor na análise na especialidade. Trata-se, nomeadamente, de apurar se deveres deontológicos assentes em conceitos de difícil transposição num quadro jurídico devem ser incorporados na lei ou, como se defende, mais vocacionados para os domínios da auto e da co-regulação.
Esta é uma questão de fundo reconhecida, já em 1971, pela Declaração de Munique, ao delimitar o campo da liberdade (deontológica) do jornalista relativamente à ordem jurídica, preconizando que "chamado a confrontar-se com a sua deontologia, o jornalista só aceita em matéria profissional a jurisdição dos seus pares, excluindo toda a ingerência governamental ou outra". Essa jurisdição, restringida, no espírito da citada Declaração, à interpretação e aplicação de deveres deontológicos, constitui, ainda hoje, um ponto chave no exercício da actividade jornalística.
Ora, o anteprojecto em análise contém, ao longo do articulado, diversas assimilações entre a ética, a deontologia e o direito. Essas assimilações ocorrem, por exemplo, no artigo 14.º, causando, segundo se crê,

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dificuldades interpretativas, de aplicação e até garantia face a planos que não são coincidentes e visam objectivos diferentes.
Relativamente à apreciação na especialidade do texto do anteprojecto, chama-se a atenção para o facto de o Conselho Regulador da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, ter optado por analisar, no essencial, as disposições matriciais daquele documento; isto é, aquelas em que, no seu entender, são arroladas as temáticas de estrutura relativas ao Estatuto do Jornalista.
Desta orientação houve que excluir os artigos atinentes ao direito de autor do jornalista (artigos 7.º-A, 7.º-B e 7.º-C), visto que a complexidade da matéria não se compadece com um pronunciamento em curto prazo de tempo. De todo o modo, a ERC irá contribuir, também aqui, para a discussão pública a que está sujeita esta iniciativa do Governo, propondo-se fazê-lo numa fase subsequente do processo legislativo.

III - Apreciação na especialidade

Acesso à profissão (artigo 2.º):
Historicamente, o jornalista não se define pela posse de um diploma nem por competências reconhecidas e controladas mas, simplesmente, pelo exercício de uma actividade que, dentro de condições próprias de cada país, lhe permite dispor de uma carteira profissional. A concessão da carteira profissional de jornalista não dependeu, por isso, tradicionalmente, nem de uma determinada formação nem da detenção de um diploma.
É que o ser jornalista pressupõe uma relação com o "terreno", uma "agenda de contactos", um saber ligado à "tomada de notas", um "faro" para a notícia, o domínio de tarefas e competências, uma escrita própria e diferente da escrita de outras actividades.
O conceito de jornalismo como "profissão aberta" continua, aliás, a vigorar em muitos países, não obstante a exigência crescente de formação superior, quer por parte dos empregadores quer como consequência da democratização do ensino e da chegada às redacções de novas e mais escolarizadas gerações.
A sociologia das profissões salienta o papel da formação e das habilitações académicas na estruturação de certas profissões, cujo objectivo é o de delimitar o respectivo mercado e proteger os trabalhadores da concorrência externa e interna. Mas a habilitação não consiste, necessariamente, na existência de um diploma, título, curso ou antiguidade, podendo ser uma qualificação resultante de um acordo estabilizado, abrangendo a relação entre as potencialidades reconhecidas ao trabalhador e as tarefas que lhe estão atribuídas.
A existência de um diploma ou formação específica não é, por isso, uma questão decisiva no jornalismo. Embora a actividade jornalística exija uma cultura humanística, a fluidez e abrangência das matérias que trabalha tornam, aliás, problemática a exigência de uma formação específica. A "aura" do jornalista é, por outro lado, reforçada pelo amplo espectro das suas possíveis competências, tanto mais reconhecidas quanto mais capaz o jornalista for de se adaptar à evolução cultural, económica, social e tecnológica.
Contudo, ressalvando muito embora o percurso histórico da não exigência de uma habilitação específica, o jornalismo evoluiu nos últimos anos no sentido do aumento do nível de habilitações dos jornalistas. As competências que lhe são exigidas e que decorrem, entre outros, de fenómenos como a globalização e o desenvolvimento tecnológico justificam que o patamar de formação para acesso ao jornalismo se torne mais exigente.
O Estatuto do Jornalista ainda vigente assume a natureza do jornalismo como "profissão aberta", facultando o acesso ao jornalismo às pessoas reconhecidas como jornalistas pela Comissão da Carteira Profissional (CCPJ), órgão onde têm assento jornalistas, representando, em partes iguais, a sua classe profissional e os operadores sectoriais. A concessão do título profissional limita-se, aí, a verificar um facto: é jornalista aquele que ganha a sua vida, em primeiro lugar, fazendo trabalho de jornalista, consagrando, assim, o perfil de uma actividade para a qual não é requerida nenhuma condição de entrada.
O anteprojecto do Estatuto do Jornalista altera a natureza "aberta" da actividade jornalística, introduzindo, no artigo 2.º a exigência de "habilitação académica de nível superior". O "fechamento" do acesso à actividade jornalística daí resultante, ao elevar o nível de qualificação, acompanha a evolução do perfil social das novas gerações de jornalistas, o que não pode deixar de aplaudir-se. Contudo, a especificidade da situação portuguesa, nomeadamente a tardia democratização do ensino superior, aconselhariam que se

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mantivesse, no novo estatuto, a possibilidade de acesso à profissão de pessoas sem habilitação superior, mediante critérios a estabelecer e apreciação, em concreto, da Comissão da Carteira Profissional.

Incompatibilidades (artigo 3.º):
A credibilidade do jornalista resulta, em grande medida, da sua independência. O jornalista não deve produzir e publicar informação para o seu próprio prazer e lucro mas para a comunicar aos cidadãos, detentores do direito à informação.
Grande número de códigos deontológicos, códigos de conduta e livros de estilo incorporam regras de natureza ética que, por exemplo, proíbem os jornalistas de aceitar qualquer tipo de vantagem susceptível de prejudicar a sua liberdade perante os poderes político, económico, dos anunciantes ou outros. Alguns desses códigos assumem, com grande pragmatismo, recomendações quanto à aceitação de viagens gratuitas, prendas e outros privilégios. E o Código Deontológico dos Jornalistas Portugueses refere, no seu ponto 10, em termos gerais, o dever do jornalista de "recusar funções, tarefas e benefícios susceptíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional".
O anteprojecto de Estatuto do Jornalista, no artigo 3.º, n.º 1, alínea b), mantém o leque de incompatibilidades do actual estatuto relativamente a "profissões-fronteira" do jornalismo, como sejam o marketing, as relações públicas, a assessoria de imprensa e a consultoria de comunicação, alargando o âmbito das incompatibilidades a funções não remuneradas. Amplia, no entanto, o âmbito das incompatibilidades relativamente ao exercício de "funções executivas de natureza política" que, no actual estatuto, abrangem, apenas, as funções de membro do Governo da República ou dos governos regionais e presidente da câmara ou vereador, em regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo, em órgão de administração autárquica.
No artigo 3.º, n.º 1, alínea e), do anteprojecto, as incompatibilidades estendem-se às funções de Deputado no Parlamento Europeu, na Assembleia da República ou nas Assembleias legislativas Regionais e, ainda, a funções nos gabinetes dos membros do Governo da República e dos governos regionais. Dentro da mesma linha de exigência, justificar-se-ia, contudo, que o exercício de funções nos gabinetes dos ministros da República para as regiões autónomas ficasse igualmente coberto por este preceito, por não apresentar diferenças de natureza no confronto com as demais situações nele tratadas.
O exercício de funções políticas por jornalistas tem sido objecto de alguma discussão no nosso país, centrada, no essencial, em dois aspectos: por um lado, o alegado direito do jornalista, enquanto cidadão, de participar activamente na vida pública e política, sem que para isso tenha de abdicar do exercício da sua profissão; por outro, a defesa do princípio de que o jornalista não deve assumir compromissos de natureza política susceptíveis de quebrar a sua independência profissional. O actual estatuto não considera existir incompatibilidade no exercício cumulativo da função de deputado e de jornalista, situação que o anteprojecto vem, com pertinência, alterar.
De facto, se a incompatibilidade entre o exercício de funções de jornalista e de assessor de imprensa (qualquer que seja o estatuto e a função do assessorado) prevista no actual estatuto não suscita discussão, por maioria de razão se tem de considerar incompatível o exercício do jornalismo e de funções executivas de natureza política. Ser assessor de imprensa de uma personalidade ou instituição política pressupõe um "contrato", explícito ou implícito, entre assessor e assessorado, baseado em afinidades pessoais e políticas, que obriga aquele a um dever de lealdade para com o assessorado.
Ora, o jornalista possui um "contrato" com os cidadãos e a sociedade, fundado num "horizonte de expectativas" quanto ao que dele se espera, isto é, informação rigorosa e independente sobre o que acontece no mundo. Em troca dessa independência, o jornalista é credor de confiança, credibilidade e autoridade, que lhe conferem uma legitimidade que o coloca acima de quaisquer interesses, sejam eles de natureza pessoal ou política, respeitem a personalidades ou instituições públicas ou privadas.
A expectativa do público relativamente ao jornalista é, pois, a do seu distanciamento face a pessoas e instituições públicas ou privadas. Não basta, assim, que um jornalista se declare independente. É preciso que o público lhe reconheça essa qualidade.
Ponderadas as considerações antecedentes, é forçoso reconhecer que a alínea e) do n.º 1 do artigo 3.º levanta alguns problemas interpretativos. Na verdade, ao determinar a incompatibilidade da profissão de jornalista com "funções executivas de natureza política, designadamente de membro do Governo da

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República, dos governos regionais ou dos respectivos gabinetes, bem como funções de deputado no Parlamento Europeu, na Assembleia da República ou nas Assembleias Legislativas Regionais", o preceito causa, por um lado, alguma incerteza face ao vocábulo "executivas" e, por outro, exclui, sem que para isso se identifiquem razões materiais, actividades políticas que, independentemente da sua natureza executiva, deverão merecer o mesmo tratamento.
Por outro lado, não é inequívoca a qualificação da actividade dos membros dos Gabinetes como política (e muito menos executiva), sendo de salientar, por exemplo, que os conselheiros técnicos - equiparados a adjuntos, nos termos do artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 262/88, de 23 de Julho - tal como os assessores, assumem muitas vezes uma colaboração puramente técnica, facto que, porém, não deve afastar a incompatibilidade.
Sugere-se, por isso, a reformulação do preceito, de modo a abranger as situações identificadas.
Idênticas dificuldades suscita a alínea a) do n.º 3 do mesmo preceito, ao prescrever que "não é incompatível com o exercício da profissão de jornalista o desempenho voluntário de acções não remuneradas de: a) Promoção de actividades de interesse público e de solidariedade social". O recurso à cumulativa "e" indicia, aparentemente, que se trata de dois requisitos cumulativos - interesse público e solidariedade social -, embora tal interpretação não seja segura, podendo também ser lido como uma falsa cumulação (interpretando-se, nesse caso, em alternativa), o que levaria a que fosse suficiente o preenchimento de um dos requisitos para se verificar uma situação de não incompatibilidade.
Perante os valores ali manifestamente envolvidos entende-se como mais correcta a posição que considera aqueles requisitos como cumulativos, ou seja, que se trate de uma situação de interesse público e, neste, de solidariedade social. Pelo que, como a solidariedade social assume por natureza interesse público, parece que a referência simples à solidariedade social clarificaria a solução legislativa.
Já se afigura como pertinente o disposto no ponto 6 do artigo 3.º, relativo ao impedimento do jornalista de exercer a sua actividade em áreas editoriais relacionadas com a função que desempenhou, reconhecidas pelo conselho de redacção, por um período de seis meses, corrigindo lacuna do actual estatuto.
Em suma: a introdução, no anteprojecto de estatuto, de uma maior exigência quanto ao regime de incompatibilidades do jornalista deve considerar-se positiva, decorrendo, em última instância, do direito do público a uma informação isenta, rigorosa e independente.

A salvaguarda do sigilo profissional (artigo 11.º):
Como é sabido, os dispositivos legais por que se rege, actualmente, o segredo dos jornalistas têm dado azo a uma margem significativa de incerteza jurídica, muito por força da invocação, pelo Código de Processo Penal (artigo 135.º, n.º 3, in fine), do "princípio da prevalência do interesse preponderante" enquanto fundamento de quebra do sigilo profissional.
De facto, a jurisprudência nacional não tem aplicado de forma homogénea este princípio, denotando mais elevada sensibilidade garantística quando protagonizada pelos tribunais superiores, em contraste com a maior permeabilidade às motivações da investigação judiciária revelada pelos juízes de primeira instância .
De resto, a situação tem paralelo com a verificada noutros países, como a Bélgica e os Estados Unidos, onde vêm sendo manifestas as tensões entre as esferas judicial e mediática no que toca à protecção do segredo dos jornalistas.
Acontece, porém, que a recente jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, ancorada no Acórdão Goodwin (1996) -, veio evidenciar, com toda a clareza, a desconformidade, relativamente ao artigo 10.º, n.º 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem - o seu preceito matricial sobre a liberdade de informação - de qualquer orientação normativa que sacrifique o sigilo dos agentes da informação a interesses que não revistam a natureza de "imperativo preponderante de interesse público".
No mesmo sentido, a Recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa R (2000) 7, de 8 de Março, veio propugnar a excepcionalidade da quebra do segredo profissional, limitando-a a circunstâncias que assumam "m carácter suficientemente vital e grave".

Tenham-se presentes, fundamentalmente, os artigos 11.º da Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, 135.º e 174.º e seguintes do Código de Processo Penal e o artigo 360.º do Código Penal.
E que é flagrante exemplo o processo instaurado ao jornalista Manso Preto, condenado por desobediência (recusa e revelação das fontes) pelo 4.º juízo do Tribunal Criminal de Lisboa, em 10 de Dezembro de 2004, e absolvido do mesmo crime, subsequentemente pelo Tribunal da Relação, em 26 de Outubro de 2005.
Mas já prolongada e adensada nos Acórdãos Roemen e Schmit (1999) e Ernest & outros (2003).

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À luz do que antecede, deve saudar-se a preocupação do legislador em densificar devidamente os pressupostos do levantamento desta garantia, através do enunciado de duas situações-limite: a investigação de crimes graves contra as pessoas (de que serão exemplos os atentados contra a vida e a integridade física) ou contra a segurança do Estado.
Deve ainda anotar-se, em termos positivos, a consagração do princípio do prévio esgotamento dos meios investigatórios alternativos, tal como resulta da jurisprudência e doutrina do Conselho da Europa. Mister será saber se a importância de que aqui se reveste tem adequada expressão, sob o ponto de vista da dignidade formal, na referência apenas acessória que lhe é feita na parte final do n.º 2 do artigo 11.º.
Dentro da mesma linha de preocupações, há que assinalar o facto de o projecto vertente não incorporar alguns dos requisitos e sequelas - e não já pressupostos - a que deveria sujeitar-se a revelação coerciva das fontes jornalísticas, quando legítima. Estando, é certo, reproduzida a possibilidade de exclusão da publicidade relativamente ao depoimento identificador das fontes informativas (novo n.º 3 do artigo 11.º), não se verifica idêntica importação para o nosso direito interno do dever de reserva que a já citada Recomendação (2000) 7 faz impender sobre as autoridades judiciárias que tenham acesso a tal revelação .
Tal como não migrou para o novo regime legal a obrigatoriedade de comunicação prévia ao jornalista, por parte da autoridade judiciária que conduza a investigação, do direito que lhe assiste em matéria de protecção das suas fontes ; e, bem assim, a proscrição de medidas sucedâneas - intercepção de comunicações, buscas e apreensões -, como forma de contornar a protecção legal do segredo profissional, sempre que ela deva ter lugar ; ou, inclusivamente, a proibição de utilização em tribunal, como meio de prova, de elementos identificadores de fontes jornalísticas que tenham sido regularmente obtidos pela polícia ou autoridade judiciária, fora das situações que legitimam a quebra excepcional do sigilo .
Os demais dispositivos insertos no artigo 11.º afiguram-se relativamente consensuais, quer por reproduzirem salvaguardas já constantes do texto actual, vinculando ao segredo outros intervenientes no processo informativo, quer por estenderem à classe dos jornalistas, através do presidente da sua organização sindical ou de delegado do mesmo, mecanismos de acompanhamento e controlo existentes noutros casos .
Observe-se, ainda assim, que a concreta redacção prevista, ao fazer intervir o presidente da organização sindical dos jornalistas com maior representatividade (n.º 5), levanta o problema dos critérios de identificação daquela representatividade. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) já teve ocasião de se pronunciar sobre a admissibilidade legal - à luz das convenções internacionais - de estruturas colectivas de maior representatividade, desde que assente em critérios objectivos.
Na nossa ordem jurídica não existem, porém, quaisquer critérios que permitam uma identificação objectiva dessa estrutura, podendo então a solução proposta redundar ou numa situação discriminatória ou na impossibilidade material de aplicação da norma.
Merece especial saliência a aplicação às buscas e apreensões, por efeito dos novos n.os 5 e 6, dos exactos pressupostos de que depende o levantamento do segredo profissional, nos termos do novo n.º 2, o que poderá restringir satisfatoriamente, de futuro, a excessiva amplitude da remissão que o Estatuto vigente contém para a lei processual penal (n.º 3 do artigo 11.º).
Não menos relevante é o facto de os órgãos de polícia criminal perderem, doravante, a faculdade de efectuarem revistas e buscas por iniciativa própria, sujeitando-as a validação ulterior pelo juiz de instrução (artigo 174.º do Código de Processo Penal), uma vez que tal possibilidade ficará exclusivamente dependente de prévio mandado judicial.

A independência dos jornalistas e a chamada "cláusula de consciência" (artigo 12.º):

Note-se que esta faculdade concedida ao juiz acautela menos o interesse fundamental da protecção da fonte do que uma solução que faça impender sobre ele o dever de excluir, por regra, a presença do público em tais situações, remetendo para decisão fundamentada do tribunal a abertura de excepções àquela regra.
Cifra alínea e) do princípio n.º 5.
Cifra alínea e) do mesmo princípio.
Cifra alínea a) do princípio n.º 6.
Cifra alínea b) do mesmo princípio n.º 7.

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A actual redacção do artigo 12.º do Estatuto reconhece já o papel proeminente da cláusula de consciência na protecção da independência dos jornalistas, na esteira da precursora lei francesa de 29 de Março de 1935 .
Se não pode falar-se em verdadeira inovação, olhado o modo como aquela cláusula surge tratada nesta reformulação dos preceitos pertinentes, nem por isso deixará de se registar a circunstância de o legislador agora definir os parâmetros da indemnização exigível, ao remeter para "o valor mais elevado previsto no n.º 1 do artigo 439.º do Código do Trabalho", fixando, simultaneamente, o seu valor mínimo em "três meses de retribuição base e diuturnidades" (artigo 12.º, n.º 4, in fine) .
Num contexto económico e social de notória precarização da relação de emprego, em termos factuais, compreende-se o reforço das contrapartidas compensatórias em causa, por muito que se deva relativizar o seu alcance real perante a escassa elasticidade da oferta de trabalho facultada aos jornalistas que invoquem este direito.
Um outro dispositivo legal de reforço da independência dos jornalistas - constante do n.º 2 do projecto - é a recusa de ordens de natureza editorial "emanadas de pessoa que não exerça estatutariamente funções de direcção ou chefia na área da informação".
A redacção preconizada vem qualificar como dever o que o texto em vigor trata como faculdade, numa mudança de regime que se afigura discutível. Na realidade, a violação de uma exigência legal comporta consequências jurídicas distintas do simples exercício de um poder potestativo, sendo certo que importa reservar ao jornalista, mais que ao legislador, a concreta avaliação da atitude a adoptar, caso a caso, na defesa da sua independência profissional.
Só nesta perspectiva se poderá evitar, de resto, que a não recusa do jornalista, encarada como violação de um dever legal, o sujeite à responsabilidade contra-ordenacional prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 20.º .
Por outro lado, enquanto o actual Estatuto reporta o direito de recusa às ordens "emanadas de pessoa não habilitada com título profissional ou equiparado", no que se poderia ver uma co-responsabilização do jornalista, em abstracto, pela observância das regras de acesso e exercício da profissão, a nova formulação do preceito passa a reportá-lo a "pessoa que não exerça estatutariamente funções de direcção ou chefia na área da informação", o que põe o acento tónico da lei no respeito pelas estruturas dirigentes da empresa.
Em princípio, os resultados serão coincidentes, já que os superiores hierárquicos do jornalista estão igualmente sujeitos à detenção de título profissional adequado , mas a utilização do advérbio "estatutariamente" parece inútil, por introduzir na lei uma ambiguidade desnecessária (na exacta medida em que os cargos de "direcção ou chefia" já são, por si mesmos, estatutários).
Assinale-se, finalmente, que o novo n.º 3, ao consagrar o direito de oposição do jornalista à utilização dos seus trabalhos em órgão cuja orientação editorial lhe suscite fundadas reservas, vem estabelecer uma compreensível relação, no especial domínio que é a liberdade de expressão e informação, entre a protecção da independência e a salvaguarda da vertente moral do direito de autor.

O direito de participação dos jornalistas (artigo 13.º):
Os conselhos de redacção são o instrumento orgânico de exercício do direito inscrito no artigo 38.º, n.º 2, alínea a), da Constituição: a intervenção dos jornalistas "na orientação editorial dos respectivos órgãos de comunicação social".
A nossa Lei Fundamental refere-se-lhes, aliás, expressamente, na alínea b) do mesmo preceito, enquanto manifestação de um direito.
À luz deste quadro normativo, a formulação assertiva agora proposta para o n.º 3 do artigo 13.º - "estes elegem" - parece transformar uma mera faculdade numa obrigação legal.

Trata-se, na verdade, de uma garantia que se aproxima da que a lei processual penal (artigo 177.º, n.º 3) confere, hoje, em caso de busca a escritório de advogado ou consultório médico.
Embora não absorvendo um dos factos geradores do direito de rescisão reconhecido aos jornalistas pelo artigo L. 761-7 do Código do Trabalho francês, a cessão do órgão de comunicação social.
Em rigor, este montante mínimo resulta já do artigo 439.º, n.º 3, do Código do Trabalho, o que torna redundante a sua repetição no Estatuto do Jornalista.
Correspondente ao actual n.º 4.
Uma vez que o inciso legal aplicável está formulado em moldes que abrangem todas as violações dos n.os 1 a 3 do artigo 8.º, sejam elas da autoria do empregador, do jornalista, ou de terceiro.
De acordo com o prescrito pelo artigo 15.º, n.º 3, do diploma.

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Compreende-se que o legislador pretenda uniformizar as leis existentes, que apresentam soluções díspares quanto ao grau de liberdade detido pelos jornalistas na constituição do seu órgão de representação interna mister é saber, todavia, se o caminho apontado é o mais conforme à ausência de compulsividade na letra da Constituição, dado que esta não estabeleceu, para o efeito, qualquer standard mínimo.
Não quer isto dizer, no que se prende com as competências aditadas ao elenco de poderes hoje cometidos aos conselhos de redacção, que o reforço de intervenção nelas patente não esteja em linha com a finalidade que presidiu à consagração destas estruturas orgânicas na nossa ordem jurídico-constitucional, correspondendo ora à densificação de poderes já consignados (como acontece com as novas alíneas d e g), ora ao natural corolário da evolução garantística do próprio projecto [(no que toca à alínea f)].
Ainda assim, este seria um ensejo particularmente oportuno para corrigir a incoerência presentemente detectável no sistema normativo português, no que se prende com a intervenção do conselho de redacção nos casos de recusa do direito de resposta.
Exigindo a Lei de Imprensa tal participação (artigo 26.º, n.º 7), ao contrário do que se passa com a Lei da Televisão (artigo 62.º, n.º 1) e com a Lei da Rádio (artigo 61.º, n.º 1), poderia o Estatuto do Jornalista, com a horizontalidade de que se reveste, adoptar uma posição unívoca sobre a matéria, em lugar de favorecer, por omissão, o seu tratamento dispersivo nas leis sectoriais.
Porque se trata de matéria comummente associada a questões de rigor informativo ou à protecção de direitos da personalidade, não se admite sem rebuço que simples considerações de operacionalidade do direito de resposta devam pôr em causa a intervenção uniforme dos jornalistas na análise da sua denegação.
De todo o modo, razões de simples técnica legislativa sempre recomendariam que o Estatuto cobrisse o conjunto das competências ínsitas no direito de intervenção dos jornalistas - ainda que com respeito pelas particularidades de cada sector -, enquanto repositório, que pretende ser, dos direitos e deveres da classe.
A competência "judicativa" atribuída à ERC pelo novo n.º 6 do artigo 12.º parece consentânea com a função que já desempenha no domínio da invocação da cláusula de consciência.
No tocante aos pareceres a anexar à participação, haverá que ter presente, no entanto, que a organização sindical dos jornalistas deve limitar o âmbito subjectivo da sua apreciação aos respectivos filiados, na esteira, aliás, da jurisprudência introduzida pelo Acórdão n.º 443/93, do Tribunal Constitucional .

Os deveres dos jornalistas (artigo 14.º):
O Estatuto de 1999 incorporou no seu articulado, por vezes de forma literal, a generalidade dos deveres constantes do Código Deontológico em vigor .
A via então seguida, ao atribuir a natureza de verdadeiras normas jurídicas a comandos de dimensão deontológica, veio amalgamar os universos do direito e da ética profissional, em moldes que não estão isentos de crítica.
Ficaram, assim, imbricadas normas de origem e natureza distintas, umas tendencialmente assentes na intra-subjectividade e coercibilidade psicológica; as outras, na intersubjectividade e coercibilidade material.
Esta miscigenação, ao atribuir natureza jurídica a normas oriundas da ética profissional, apresenta sequelas relevantes, tanto no mundo do direito como na esfera de actividade dos jornalistas:

- Importa para o sistema legislativo, sem qualquer vantagem para este, a indeterminação de conceitos própria da esfera deontológica (de que são exemplos expressões como "rejeitando o sensacionalismo" ou "não encenar ou falsificar situações com o intuito de abusar da boa fé do público";
- Confia aos tribunais a interpretação e aplicação de normativos que lhes são extrínsecos, porque característicos do universo socioprofissional;

Enquanto as Leis de Imprensa (Lei n.º 2/99, de 13 de Janeiro, artigo 23.º, n.º 1) e da Televisão (Lei n.º 32/2003, de 22 de Agosto, artigo 34.º) estatuem a existência do conselho de redacção, em contraste com a abstenção normativa da Lei da Rádio, o actual Estatuto do Jornalista acentua claramente o carácter volitivo da constituição deste órgão, não se afigurando que as relações de generalidade/especialidade entre as normas jurídicas possam resolver satisfatoriamente, neste caso, os desencontros dos nossos comandos legais.
Publicado no Diário da República I Série A, de 13 de Agosto.
Código este aprovado por consulta directa aos jornalistas portugueses, realizada em 4 de Maio de 1993, após apreciação em Assembleia Geral Extraordinária do Sindicato, ocorrida a 22 de Março desse ano.

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- Comporta um determinado grau de reescrita das normas deontológicas do jornalismo, visto que o legislador não se limitou a reproduzir o texto do Código de 1993, antes recombinou alguns dos seus preceitos e segmentou outros .
- Traduz-se, igualmente, na criação de constrangimentos ético-jurídicos estatuídos ex-novo, cuja ponderação não passou anteriormente, ao contrário da dos demais, pelo crivo próprio da auto-regulação jornalística. É o que acontece com a proibição, constante da alínea l) do n.º 2, da participação dos jornalistas "no tratamento ou apresentação de materiais lúdicos, designadamente concursos, passatempos ou televotos": de facto, ainda que o princípio da separação entre o discurso jornalístico e o comercial ou o propagandístico explique a razão de ser da injunção, ela suscita problemas de substância e de formulação; desde logo, e quanto mais não fosse, o televoto não deve ser qualificado, necessariamente, como espécie do género "materiais lúdicos";
- Introduz uma apreciável carga derrogatória de comandos da nossa ordem positiva, em moldes que agravam, para os jornalistas, o regime da lei penal vigente .
- Implica, da mesma forma, uma reelaboração doutrinária de questões-chave da dogmática jurídica, também a partir da revisão dos preceitos deontológicos, numa sede normativa que não será, necessariamente, a mais adequada para o efeito .
- É fautora de responsabilidade civil para os jornalistas, uma vez reunidos os pressupostos enunciados no artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil .
- Introduz na actividade jornalística, em conjugação com a disposição inovadora do artigo 21.º, um novo patamar de responsabilidade - qualificada imprecisamente pelo anteprojecto como "disciplinar" - que assim acresce à penal e à civil.

Paralelamente, submete à alçada do poder disciplinar do empregador novas situações de potencial incumprimento das obrigações inerentes aos cargos ou postos de trabalho confiados ao jornalista, o que poderá fragilizar, relativamente a estes, as garantias constitucionais de liberdade de expressão e independência.
Sobre tudo isto, importa sobremaneira destacar que a consecução do rigor informativo não deve assentar apenas na responsabilização dos jornalistas, alheando-se do contributo exigível à ética empresarial.
A declinação exaustiva dos deveres deontológicos contida no artigo 14.º do Estatuto coloca um peso especialmente intenso nos ombros dos agentes de informação, ao mesmo tempo que parece ignorar os condicionamentos com que eles se podem defrontar, na sua actividade quotidiana, por simples efeito do enquadramento socioprofissional a que estão sujeitos.
Quer isto acentuar, por outras palavras, que deve procurar-se uma correspondência entre a carga ético-jurídica que recai sobre os jornalistas e aquela que deve abarcar igualmente os empresários da comunicação social, em tudo o que toca a sua esfera de autodeterminação.

De que é ilustração, desde logo, a alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º, na medida em que integra num mesmo normativo o respeito pelo rigor informativo e a rejeição do sensacionalismo, a que correspondem, no Código Deontológico, dois preceitos distintos (os dos n.os 1 e 2
De que pode apontar-se, como exemplo, a autonomização, nas alíneas c) e g) do n.º 2, das duas vertentes do ponto 7 do Código Deontológico (o respeito pela presunção de inocência, por um lado; a reserva sobre a identidade das vítimas de crimes sexuais, por outro)
Atente-se na prescrição do artigo 88.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal, especificamente endereçada aos meios de comunicação social: a reserva da identidade das vítimas de crimes sexuais vigora, aqui, apenas até à audiência (salvo se o ofendido for menor de 16 anos), enquanto que, no "novo" Estatuto, por influência do Código Deontológico, o dever de omissão perdura, teoricamente, para além dela. Mais notória ainda é a desconformidade entre a imposição de respeito "em qualquer circunstância", pela reserva da intimidade (alínea h) do n.º 2 do artigo 14.º) e a não punibilidade, à luz do artigo 192.º, n.º 2, do Código Penal, da divulgação de factos relativos a doença grave de uma pessoa, sempre que ela tenha ligar "como meio adequado para realizar um interesse público legítimo e relevante" (de que o direito à informação pode ser expressão idónea).
É o caso da difícil separação entre as esferas íntima e privada da vida pessoal, patente na formulação agora dada à alínea h) (antiga alínea g) do n.º 2).
"Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação". Decerto que o jornalista já é passível de responsabilidade civil, por causa do exercício da profissão. Contudo, na situação actual tal condição advém-lhe em segundo grau, por via do direito de regresso que sobre ele seja (ou não) exercido pela entidade empregadora. No novo cenário normativo o jornalista tornar-se-ia sujeito passivo imediato, sendo seu credor directo - e liberto da relação de solidariedade em que está investido o órgão de comunicação social - o próprio lesado.
Em rigor, a responsabilidade "disciplinar" a que o legislador se pretende referir é uma responsabilidade deontológica, por violação de normas da ética profissional que seriam tuteladas pela própria classe, através de um órgão - a CCPJ - dela emanado, e não aquela outra que assenta no incumprimento, pelo trabalhador, "das obrigações inerentes ao exercício do cargo ou posto de trabalho que lhe esteja confiado" - artigo 396.º, n.º 3, alínea d), do Código do Trabalho - e recai, por isso, na alçada disciplinar, em sentido próprio, da entidade empregadora.

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Neste sentido, afigura-se manifesto que o repúdio do sensacionalismo, a inalienabilidade da independência da informação perante os poderes político e económico (incluindo a importante pressão dos interesses publicitários), a protecção da imagem e da privacidade das pessoas, o respeito da propriedade intelectual são valores que deveriam vincular igualmente os sectores profissional e empresarial, numa simetria de posições que está longe, entre nós, da indispensável consagração.
Daí que qualquer agudização dos deveres assacáveis aos jornalistas, pela dupla via da juridificação das normas deontológicas e da extensão destas, mais sublinhe - inevitavelmente - o relativo vazio de referências, ainda que indirectas, à ética empresarial.
À luz do que ficou assinalado - e, bem assim, do que adiante se refere a propósito do novo artigo 21.º do anteprojecto, justificar-se-ia o recurso, nesta sede (artigo 14.º - deveres) a uma fórmula legislativa menos circunstanciada e, no limite, invasiva da deontologia profissional, e portanto assente:

a) Num enunciado conciso de deveres suficientemente valorados pelo nosso direito positivo;
b) Numa remissão genérica para a dimensão meta-jurídica da actividade jornalística, expressa na ética e deontologia profissionais.

Para tanto, uma solução próxima da vazada no artigo 11.º Estatuto do Jornalista de 1979 (aprovado pela Lei n.º 62/79, de 20 de Setembro) poderia proporcionar ao texto um outro grau de segurança e alicerçar futuros esforços para a emergência de mecanismos próprios que garantam, por via da auto-regulação e da co-regulação, o efectivo respeito da deontologia profissional.
Este aspecto prende-se intimamente, aliás, com a matéria tratada a propósito do artigo 21.º, para o qual há que devolver a restante análise.

Título profissional dos directores de informação (artigo 15.º):
O artigo 15.º, n.º 3, ao permitir que seja director de serviço informativo indivíduo que tenha "(…) requerido o respectivo cartão e se encontra a aguardar decisão", confere a possibilidade do exercício da actividade sem título habilitador. Por outro lado, condiciona a decisão em termos materiais, uma vez que dificilmente a CCPJ deixará de decidir em sentido favorável, sabendo que o requerente já está a exercer a actividade. A isso acresce que ao permitir, perante o mero requerimento, o exercício da actividade inverte as regras lógicas de apreciação.
O preceito deveria, pelo exposto, determinar, primeiro, a apresentação do requerimento e a respectiva decisão, para posteriormente o requerente poder iniciar a sua actividade. Caso se entenda, poderia prever-se um prazo de deferimento tácito que evitasse situações lesivas dos interesses dos órgãos de comunicação social, pondo termo ao arrastamento de processos pendentes.

As sanções disciplinares profissionais (artigo 21.º):
O fenómeno atrás apontado - a incorporação de princípios deontológicos no nosso direito positivo - coloca problemas acrescidos de tutela jurídica, que o legislador se propõe resolver através do recurso a "sanções disciplinares profissionais".
Para tanto, o n.º 1 do artigo 21.º vem qualificar como infracção disciplinar a violação dos deveres enunciados no n.º 2 do artigo 14.º, fazendo-lhe aplicar as sanções enunciadas no n.º 3 seguinte: da repreensão escrita à suspensão do exercício da actividade profissional , passando pela pena pecuniária de 100 a 10 000 euros.
O "procedimento disciplinar" é conduzido e concluído pela Comissão da Carteira Profissional do Jornalista (n.º 5 do artigo 21.º), com salvaguarda do direito de defesa dos acusados (n.º 6).
Ora, o que se verifica é que a imposição das referidas sanções aos jornalistas por esta Comissão é pouco consentânea com o ilícito disciplinar, uma vez que este deveria ser apreciado, na sua concepção mais genuína, quer pelas estruturas representativas da classe quer pela hierarquia profissional.

Sendo que esta inibição temporária do exercício da actividade supõe, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 21.º, a reincidência do infractor.

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0017 | II Série C - Número 050 | 03 de Maio de 2006

 

Não se vê, de facto, a que título intervirá uma autoridade independente - a CCPJ -, sem quaisquer poderes delegados pelos jornalistas no quadro da auto-regulação ou ínsitos numa relação jus-laboral, na repressão de infracções qualificadas pela lei como "disciplinares".
Estar-se-á, antes, a reconduzir ao terreno do ilícito de mera ordenação social, sob diferente roupagem terminológica, a punição das ofensas à deontologia jornalística, entretanto convertida em lei da República.
O que, por seu turno, abala irremediavelmente a origem ética dos deveres previstos no artigo 14.º do Estatuto, para o converter, afinal, numa mera fonte de justiça administrativa.
E note-se que nem a composição da Comissão da Carteira Profissional devolve suficientemente aos jornalistas a observância da sua deontologia, por isso que metade dos que ali têm assento representam, de acordo com o n.º 2 do novo artigo 18.º-A, "os operadores do sector" .
Mas existe uma razão adicional - quiçá até mais ponderosa - para se não subscrever o modelo sancionatório em apreço.
É que ele criará, desnecessariamente, conflitos positivos de competência entre a CCPJ e a ERC, no que se prende com a avaliação do cumprimento dos deveres exigíveis aos jornalistas. Tal risco resulta óbvio do que dispõem dois preceitos dos Estatutos anexos à Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro:

- Artigo 7.º, alínea c), em matéria de objectivos de regulação a prosseguir pela ERC: "Assegurar que a informação fornecida pelos prestadores de serviços de natureza editorial se pauta por critérios de exigência e rigor jornalísticos, efectivando a responsabilidade editorial perante o público em geral dos que se encontram sujeitos à sua jurisdição, caso se mostrem violados os princípios e regras legais aplicáveis";
- Artigo 24.º, n.º 3, alínea a), quanto às competências do conselho regulador da ERC: "Fazer respeitar os princípios e limites legais aos conteúdos difundidos pelas entidades que prosseguem actividades de comunicação social, designadamente em matéria de rigor informativo e de protecção dos direitos, liberdades e garantias pessoais".

Mesmo que se pretenda que a CCPJ terá alçada sobre os jornalistas, e a ERC sobre os órgãos de comunicação social, nem por isso os riscos de contradição de apreciações são menos candentes: a avaliação do rigor informativo está na base de qualquer juízo de valor que se possa fazer sobre condutas jornalísticas, não sendo aceitável que entidades diferentes possam dar origem a pronunciamentos contraditórios a respeito de um mesmo assunto.
Eis por que se devem suscitar as maiores reservas ao modelo preconizado pelo anteprojecto, para efectivação da responsabilidade "disciplinar" nele prevista. Em alternativa, poderia devolver-se aos meios profissional e empresarial, pela via da auto-regulação, aquilo que é o cerne da deontologia - a expressão de uma consciência metajurídica, revelada de dentro para fora do subsistema mediático .
Não se ignoram as dificuldades de que se reveste a mobilização de todas as partes interessadas, profissionais e empregadores, para alcançar esse desiderato. Existem, porém, sinais na sociedade civil de que ele é alcançável: muito recentemente, a Confederação Portuguesa de Meios de Comunicação adoptou a sua "Plataforma de Auto-Regulação de Conteúdos Informativos", assim dando um passo significativo para a criação de uma disciplina ética susceptível de abarcar o sector empresarial.
Uma empenhada contribuição dos poderes públicos, que promova e articule esta e outras iniciativas congéneres, pode conferir-lhes a necessária visibilidade e solidez, a par do reconhecimento público indispensável ao bom desempenho do seu papel auto-regulador.
A promoção de mecanismos de co-regulação e auto-regulação junto das entidades que prosseguem actividades de comunicação social assim como dos sindicatos e associações do sector é, aliás, uma das incumbências fundamentais fixadas à ERC pelos seus Estatutos (artigo 9.º).

Lisboa, 23 de Março de 2006.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

No que se pode detectar uma outra contradição do diploma: o legislador pretende dar voz, no domínio da ética jornalística, a entidades (as empresas proprietárias de órgãos de comunicação social) que nela não estão inseridas, por não terem tido qualquer papel interventor na produção das correspondentes normas.
Em oposição, pois, ao movimento de sentido contrário - da organização estatal para a comunidade mediática - subjacente ao articulado em apreço.

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