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Quinta-feira, 8 de Março de 2007 II Série-C — Número 36
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
SUMÁRIO Presidente da Assembleia da República: Protocolo-Quadro de Cooperação Parlamentar entre a Assembleia da República de Portugal e a Câmara dos Representantes do Reino de Marrocos.
Comissões parlamentares: Comissão Eventual para os Fogos Florestais: — Declarações de voto apresentadas pelos Grupos Parlamentares do PS, PSD e PCP acerca do segundo relatório final da Comissão.
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PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Protocolo-Quadro de Cooperação Parlamentar entre a Assembleia da República de Portugal e a Câmara dos Representantes do Reino de Marrocos
O Presidente da Assembleia da República de Portugal e o Presidente da Câmara dos Representantes do Reino de Marrocos, reunidos em Lisboa; Sublinhando a importância fundamental da instituição parlamentar como centro da soberania popular, do pluralismo político e do resultado de eleições democráticas; Conscientes de que os intercâmbios e a cooperação a nível parlamentar podem contribuir para o reforço do conhecimento mútuo e a aproximação entre os povos português e marroquino; Convictos de que a diplomacia parlamentar pode contribuir para consolidar a amizade e promover a compreensão entre os dois povos; Conscientes de que a fé comum nos valores da liberdade e da democracia, assim como os laços históricos e culturais que unem os dois Países, tornam oportuna a institucionalização dos contactos entre as duas Assembleias; Referindo-se aos instrumentos jurídicos que regem a cooperação bilateral, especialmente ao Tratado de Amizade, Boa Vizinhança e de Cooperação, assinado entre os dois Países a 30 de Maio de 1994; Considerando a convergência dos seus interesses em numerosas questões de política internacional e exprimindo a sua vontade de cooperar para a realização dos objectivos parlamentares comuns; Acordam o seguinte:
I Princípios e objectivos
Artigo 1.º
As Partes pretendem, com este Protocolo, ter relações privilegiadas, baseadas nos princípios de igualdade, reciprocidade, benefícios mútuos e respeito pela sua independência, comprometendo-se a proceder a consultas recíprocas em matérias parlamentares de interesse comum.
Artigo 2.º
As Partes pretendem ainda proceder ao intercâmbio de experiências e conhecimentos no âmbito da actividade parlamentar, designadamente através da realização de reuniões entre delegações parlamentares, promovidas e apoiadas pelos Presidentes de ambas as Assembleias, e da organização de missões técnicas e outras formas de cooperação.
II Domínios de cooperação
Artigo 3.º
Na prossecução dos objectivos definidos nos artigos anteriores, as Partes comprometem-se igualmente a:
a) Organizar encontros periódicos entre os órgãos das duas Assembleias e, em particular, entre comissões homólogas, para a troca de experiências sobre assuntos de interesse comum; b) Realizar visitas de estudo recíprocas de delegações parlamentares; c) Organizar conferências, seminários ou colóquios, alternadamente por cada um dos Parlamentos, sobre as grandes questões bilaterais ou relativos à actualidade internacional.
Artigo 4.º
As Partes comprometem-se ainda a trocar, regularmente, pontos de vista e a concertar posições em torno das grandes questões internacionais, muito especialmente aquelas que dizem respeito às zonas geopolíticas comuns.
Artigo 5.º
As delegações das Partes comprometem-se a realizar consultas aquando da participação em reuniões de organizações parlamentares internacionais de que ambos os Países façam parte.
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Artigo 6.º
As Partes decidem apoiar os encontros bilaterais entre os dois Presidentes das Assembleias à margem da sua participação em grandes encontros parlamentares internacionais.
Artigo 7.º
As Partes comprometem-se ainda a:
a) Organizar, de comum acordo, intercâmbio periódico de missões de estudo para funcionários nos domínios de competências específicas, a fim de promover um conhecimento profundo e um funcionamento mais eficaz das administrações parlamentares; b) Trocar, entre as administrações das duas Assembleias, informações sobre as boas práticas em vigor no domínio do funcionamento e da gestão administrativa, técnica e financeira dos respectivos serviços.
III Grupos parlamentares de amizade
Artigo 8.º
As Partes apoiam o desenvolvimento de relações parlamentares através dos Grupos Parlamentares de Amizade Portugal/Marrocos e Marrocos/Portugal.
IV Disposições finais
Artigo 9.º
1 — O presente Protocolo-Quadro entra em vigor após a sua assinatura por um período de quatro anos, sendo automaticamente renovado por períodos iguais e sucessivos, salvo indicação contrária por qualquer das Partes.
2 — A denúncia é comunicada à outra parte com antecedência não inferior a 180 dias em relação ao termo do período em vigor.
Assinado em Lisboa, a 15 de Fevereiro de 2007, em dois (2) exemplares originais em cada uma das línguas, fazendo fé, de forma idêntica, os quatro (4) exemplares, ficando cada uma das partes com dois (2) exemplares.
Pela Assembleia da República de Portugal, o Presidente da Assembleia da República, Jaime José Matos da Gama — Pela Câmara dos Representantes do Reino de Marrocos, o Presidente da Câmara dos Representantes do Reino de Marrocos, Abdelwahad Radi.
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COMISSÃO EVENTUAL PARA OS FOGOS FLORESTAIS
Declarações de voto apresentadas pelos Grupos Parlamentares do PS, PSD e PCP acerca do segundo relatório final da Comissão
Declaração de voto apresentada pelo PS
O segundo relatório da Comissão Eventual para os Fogos Florestais, agora apresentado, constitui mais um exercício da qualidade e rigor que presidiu aos trabalhos desta Comissão. Está de parabéns o Deputado relator.
O Governo apresentou no final de 2005, após um ano complicado de incêndios florestais, um conjunto de acções concretas nos domínios da prevenção e combate, que permitiu identificar responsáveis pelas áreaschave na defesa da floresta contra incêndios. A Direcção-Geral dos Recursos Florestais na coordenação da prevenção estrutural, a Guarda Nacional Republicana na coordenação da fiscalização, vigilância e detecção e o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil na responsabilidade do combate aos incêndios florestais.
Fruto dessas medidas do Governo foi possível em 2006, num ano que deve ser encarado de transição, inverter o ciclo devastador dos incêndios florestais em Portugal.
O registo apurado de 75 000 ha de área ardida (que corresponde a 1/3 da área ardida em média nos últimos cinco anos) não é resultado da meteorologia mas, sim, da consequência da determinação e empenho
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dos homens e mulheres que integraram a Força Operacional Conjunta, que, pela primeira vez, integrou em articulação meios dos bombeiros e de outras entidades, tais como sapadores florestais, sapadores da AFOCELCA, meios do ICN e das Forças Armadas.
Este esforço de articulação e optimização dos meios foi um aspecto relevante da nova política de defesa da floresta contra incêndios, política que pela primeira vez tem um rumo, rumo esse definido em termos operacionais pela Directiva Operacional Nacional do SNBPC e no domínio do planeamento pelo Plano Nacional de DFCI, aprovado em Conselho de Ministros em Maio.
É claro que incêndios da dimensão daqueles ocorridos no Parque Nacional da Peneda-Gerês ou na Serra d'Ossa constituem motivo de preocupação, tal como o trágico acidente de Famalicão da Serra.
É claro que a sensibilização e informação da população tem de ser mais trabalhada.
O sistema de vigilância e detecção tem de ser melhorado.
A participação das Forças Armadas tem de ser revista.
A profissionalização da protecção civil tem de prosseguir.
Mas todas estas fragilidades estão, e bem, identificadas na análise apresentada no relatório e são merecedoras de reparo ao Governo. Temos consciência de que o caminho que o Governo traçou é o correcto, mas tem de ser percorrido etapa a etapa e, nesse percurso, o ano de 2007 adivinha-se como um ano decisivo para a consolidação das medidas propostas e sobretudo do Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios, aprovado no Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho.
Importa, pois, prosseguir a acção de fiscalização por parte da Assembleia da República, como oportunamente é sugerido no relatório. A renovação do mandato desta Comissão Eventual ou a criação de uma solução alternativa, no curto prazo, que permita prosseguir o acompanhamento da política nacional de DFCI e a sustentabilidade das medidas adoptadas pelo Governo é fundamental para que todo o trabalho desenvolvido pela Comissão Eventual para os Fogos Florestais não fique incompleto.
Pelo exposto, somos de opinião que, à semelhança do primeiro relatório desta Comissão, que mereceu a aprovação com base num consenso lato, foi traçado pelo relator, Deputado Carlos Lopes, um retrato sério e objectivo dos fogos florestais de 2006, numa perspectiva de cariz essencialmente operacional. Assim, na avaliação do Grupo Parlamentar do PS, este segundo relatório da Comissão é igualmente merecedor de um voto favorável, quer na sua estrutura e conteúdo quer nas conclusões e recomendações que tece.
Reitera-se os parabéns ao Deputado Carlos Lopes.
Reitera-se o reconhecimento da forma como o Sr. Presidente conduziu os trabalhos desta Comissão e, bem assim, o apoio dado pelos Dr. José Alberto Vasconcelos e pela Dr.ª Noémia Fonseca.
O Governo deve criar um prémio de boas práticas florestais que sirva de exemplo e de incentivo a todos os proprietários florestais do País.
Assembleia da República, 16 de Janeiro de 2007.
Os Deputados do PS: Horácio Antunes — Nelson Baltazar — Miguel Ginestal — Fernando dos Santos Cabral — Luiz Fagundes Duarte — mais uma assinatura ilegível.
Declaração de voto apresentada pelo PSD
O Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente, na generalidade, as conclusões e as recomendações do segundo relatório da Comissão Eventual para os Fogos Florestais, tendo no debate, na especialidade, apresentado diversas notas e propostas, algumas das quais mereceram acolhimento por parte do relator.
No entanto, no entendimento do Grupo Parlamentar do PSD persistem alguns aspectos relevantes que poderiam ter sido incluídos e/ou enfatizados no presente relatório, a saber:
Entende o PSD que as condições climatéricas têm uma influência primordial na prevenção e combate aos incêndios florestais. Conforme é referido pelo Instituto de Meteorologia, o ano de 2006 caracterizou-se, felizmente, pela ocorrência de situações sinópticas, nomeadamente entre os meses de Maio e Setembro, pelo que as grandes quantidades de precipitação acima do normal entre os referidos meses contribuíram para classificar o Verão de 2006 de «chuvoso a extremamente chuvoso». Aliás, as chuvas ocorridas na segunda quinzena foram consideradas pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais (DGRF) como elemento de estabilidade da severidade, na forma de travar diversos incêndios activos em Portugal. Assim, o Grupo Parlamentar do PSD considera que o presente relatório poderia e até deveria ter reforçado a ideia de que, em 2006, as condições climatéricas, registadas na segunda quinzena de Agosto, foram determinantes para a redução do risco de incêndio e para o combate aos muitos incêndios activos no País.
Congratulamo-nos por se ter verificado uma redução de área ardida, mas duvidamos que o País esteja em melhores condições para enfrentar as condições adversas de um novo Verão quente, seco e ventoso, nomeadamente no que respeita à prevenção florestal e ao ordenamento florestal e rural. O Grupo Parlamentar do PSD julga, assim, não ser prudente retirar conclusões precipitadas sobre a redução de área ardida em 2006.
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A situação estrutural da floresta portuguesa e os processos de desertificação económica e humana do mundo rural exigem da parte dos governantes uma actuação mais profunda, enfrentando o problema com medidas de carácter estrutural, visando a sustentabilidade das florestas e o seu enquadramento no meio agrícola e rural.
Neste sentido, consideramos que existe no relatório um manifesto défice de merecida crítica à actuação deficiente por parte dos Ministros da Agricultura e do Ambiente que fazem parte integrante e crucial do processo de defesa da floresta e combate aos incêndios.
Por último, é de mencionar que nas propostas apresentadas pelo PSD realçámos ser fundamental o relatório abordar os seguintes pontos (entre outros): ausência de estratégia na área da formação de bombeiros; lamentar a morte dos bombeiros chilenos; reflectir sobre a necessidade de introduzir meios de videovigilância nas florestas; reorganização do dispositivo/optimização dos meios disponíveis e sua eventual realocação; ponderação sobre a clarificação quanto à estratégia de utilização e aquisição de meios aéreos e necessária estabilização deste importante recurso.
Seja como for, os reparos que se deixam expressos não justificam um voto desfavorável ao relatório apresentado.
Palácio de São Bento, 18 de Janeiro de 2007.
Os Deputados do PSD, António Montalvão Machado — Ofélia Moleiro — mais uma assinatura ilegível.
Declaração de voto apresentada pelo PCP
I
O Grupo Parlamentar do PCP absteve-se na votação do segundo relatório da Comissão Eventual para os Fogos Florestais, incluindo as suas conclusões, por julgar adequado o relato da actividade da Comissão durante o período dos fogos e errada a avaliação positiva que globalmente é feita das opções, decisões, medidas e actividade do Governo durante o mesmo período. Considera ainda o Grupo Parlamentar do PCP insuficiente a avaliação dos incêndios florestais analisados na base da informação disponível e metodologicamente incorrecta a tentativa de validar a referida actuação governamental a partir da constatação da redução da área ardida.
O Grupo Parlamentar do PCP votou a favor das recomendações ao Governo por julgar que podem contribuir para uma melhor resposta nacional ao complexo e dramático flagelo dos fogos florestais, longe de estar garantida a sua redução a níveis aceitáveis, compatíveis com a sustentabilidade da floresta portuguesa e a preservação do importante património económico, social e ambiental que representa.
O Grupo Parlamentar do PCP, valorizando o trabalho do Deputado relator pela abordagem exaustiva e atenta à actividade muito diversificada que foi a da Comissão Eventual para os Fogos Florestais e o esforço feito para incorporar as sugestões e propostas de emendas e acrescentos feitos pelos diversos grupos parlamentares, enuncia de seguida mais detalhadamente as considerações que a análise do relatório lhe mereceu, e que estão na base dos votos atrás assinalados.
II Avaliação na generalidade
Quanto às questões gerais que o relatório não aborda ou aborda de forma insuficiente ou são contestáveis pela «filosofia» que as enforma.
1 — O relatório subestima, seguindo o balanço governamental, a gravidade da dimensão da área ardida e o insuficiente sublinhado da manutenção de inúmeros problemas. Igualmente se sublinha a reforçada subestimação do que aconteceu nas áreas protegidas! Só uma visão muito rigorosa e precisa da situação permitirá debelar o flagelo! 2 — O relatório faz uma avaliação claramente insuficiente ou nula de vertentes centrais da problemática «fogos florestais», como as questões da vigilância e alerta, ordenamento, prevenção e infra-estruturas. É um relatório que não assinala com suficiente vigor o atraso ou até a total ausência da silvicultura preventiva.
3 — É insuficiente o relatório no balanço/sistematização dos fogos ocorridos em 2006. Falta uma identificação dos principais problemas que resultam da análise dos grandes incêndios, embora aqui o relator tenha enfrentado as dificuldades de relatórios sobre os incêndios florestais muito desiguais no nível da informação e tipificação dos problemas.
4 — É um relatório que assume, numa consideração global, a filosofia do Governo, expressa no seu acordo com a legislação publicada, com os meios orçamentais e os recursos humanos disponibilizados, com os instrumentos e estruturas estabelecidos ou criados, considerados, aliás, na ENF e no PNDFCI, lançando responsabilidades e custos para as «costas» dos pequenos proprietários e autarquias.
5 — Uma conclusão geral: é um relatório que se dispersa numa visão de que, apesar de problemas aqui e ali, tudo está a correr pelo melhor, sem assinalar com suficiente vigor défices, estrangulamentos e obstáculos nas necessárias respostas do País ao flagelo dos incêndios florestais. Apesar desta conclusão geral, não pode
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deixar de se reconhecer que o debate na Comissão Eventual para os Fogos Florestais do projecto inicial de relatório permitiu uma redacção final em que se atenuou a «colagem» aos balanços do Governo e a afirmação de um julgamento mais afastado e mais independente, mais conforme com as opiniões e sugestões muito diversas manifestadas pelos grupos parlamentares da oposição.
6 — Uma nota ainda sobre um problema que não é apenas da responsabilidade do relator. O segundo relatório, apesar das visitas e reuniões que tiveram a presença directa da Comissão Eventual para os Fogos Florestais, está, mais do que o primeiro, quase que inteiramente informado e enformado pelas informações, opiniões e balanços do Governo. Isto é, é um relatório construído sobre a documentação fornecida pelos diversos departamentos do Governo, com citações, inclusive, dos Ministros ouvidos. É um relatório cujo conteúdo, relativamente a questões essenciais, como, por exemplo, as operações de silvicultura preventiva, não resulta do trabalho da Comissão Eventual para os Fogos Florestais no terreno. É ainda um relatório que não tem em conta a opinião de outras entidades, nomeadamente daquelas que, tendo tido uma intervenção activa no combate aos incêndios florestais, elaboraram relatórios de balanço, como a Liga dos Bombeiros Portugueses! O relatório chama em sua ajuda o relatório da empresa de consultoria McKinsey & Company, encomendado pelo Governo. Como afirmou o Grupo Parlamentar do PCP durante o debate do relatório, a «avaliação externa» nada acrescenta em isenção, seriedade e fiabilidade ao que poderia ser tido realizado pela DGRF. E custaria bastante menos ao erário público! Esta questão — fontes e acervo documental de relatórios parlamentares — merece ser abordada na consideração do trabalho das comissões parlamentares, permanentes ou eventuais. Se no seu trabalho as comissões não podem esquecer ou desvalorizar a informação com origem nos departamentos governamentais, pelas suas atribuições e competências constitucionais e regimentais, não podem limitar-se a decalcar e reelaborar essa informação. Antes a devem confrontar e interpretar face àquela que recolhem directamente «no terreno» (que deve ser privilegiada) e indirectamente de entidades e cidadãos sem articulações com o Estado (a dita «sociedade civil»). A audição de entidades públicas com responsabilidades directas na matéria (no caso dos incêndios florestais, a DGRF, o ICN ou o CNOS/SNBPC, por exemplo) deve ser efectuada sem a mediação ou filtro do «aparelho ministerial».
III Avaliação na especialidade
1 — Balanço dos IF de 2006 (página 12): As formulações do relatório levam a uma subestimação da gravidade dos incêndios florestais e área ardida (75 000 hectares), através de uma avaliação comparativa com os incêndios florestais e áreas ardidas nos últimos cinco anos e do facto da área ardida ficar dentro dos objectivos do PNDFCI.
2 — Ideias-chave dos incêndios florestais de 2006 (página 15): Havendo uma referência à gravidade das condições «meteorológicas» para explicar a origem do «aumento exponencial da área ardida» na primeira quinzena de Agosto, era obrigatório acrescentar fortes precipitações havidas em pleno Verão, na origem de um número reduzido de incêndios e contenção da área ardida em certos períodos.
A afirmação de que o «principal problema» são os grandes incêndios, é desprovida de sentido se não se referir a manutenção das dificuldades e problemas na contenção e combate de incêndios pequenos e médios, impedindo que «cresçam»! A formulação «a área ardida localizou-se, sobretudo, nos distritos do litoral Norte (…)» pode levar a uma visão desfocada, pois em 2006 verificaram-se grandes incêndios florestais a sul do Tejo (Serra d'Ossa, por exemplo)! Évora teve uma área ardida ao nível do Porto, Viseu, mais que Bragança e Vila Real! Deveria nesta síntese acrescentar-se um ponto sobre a questão crucial dos incêndios florestais: a «situação das florestas» e as razões dessa situação (abandono da terra agrícola, desertificação), problema bem visível na leitura de muitos dos relatórios dos incêndios florestais! 3 — Os grandes incêndios florestais de 2006 (página 17): Considerando-se correcto o destaque dos grandes incêndios florestais, não seria despiciendo fazer uma «leitura sistematizada» do que informam os relatórios (que foram disponibilizados) de outros incêndios.
— Incêndio florestal de Fragoso/Barcelos: A síntese do relatório não tira importantes conclusões da informação dada. A área tinha antecedentes de fogo em 1996 (o fatídico ciclo dos 10 anos) e tinha «gestão activa da floresta», mesmo sem ZIF! Os meios mobilizados para o combate foram insuficientes, decorrente do faseamento feito. Não existiam postos de vigia a funcionar, nem qualquer tipo de vigilância organizada (de quem a responsabilidade???). Não existiam equipas de sapadores! — Incêndio florestal de Famalicão da Serra/Guarda: A síntese não é suficientemente explícita e clara sobre os problemas e deficiências verificados neste incêndio, onde perderam a vida seis pessoas, e os relatórios existentes evidenciam-no; — Incêndio florestal do Parque Nacional da Peneda-Gerês:
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A síntese não traduz de forma suficiente os problemas que em parte estão nos relatórios «oficiais» (aliás, há contradições entre o efectuado pelo Ministério da Administração Interna e o realizado pelo Ministério do Ambiente), bem como as informações colhidas no terreno aquando da visita da Comissão Eventual para os Fogos Florestais. Tardou a primeira intervenção; houve insuficiência e tardia intervenção de meios aéreos, problemas de comunicações e de articulação de forças no terreno. problemas de infra-estruturação do terreno, um relacionamento difícil do «Parque» com as populações e juntas de freguesia (que não é exclusivo do PNPG), um insuficiente investimento agro-florestal, traduzido na suspensão do plano zonal (agro-ambientais), uma insuficiência de verbas para o plano de prevenção e silvicultura preventiva, uma insuficiência de equipas de SF e do sistema de vigilância, a não aprovação/execução de projectos no Monte de Vilarinho das Furnas, a que se acrescenta o não cumprimento das promessas oficiais no momento do incêndio florestal de ajudas a pastores e agricultores afectados.
— Incêndio florestal da Serra d'Ossa/Évora: A síntese é completamente inaceitável e a avaliação um absurdo. Atente-se. Era uma grande área com gestão activa e profissional! Tinha infra-estruturas e a mata estava limpa! O combate teve meios aéreos, bombeiros, etc,, suficientes, com «boa interligação (…) no teatro das operações». Então porque arderam mais de 5000 hectares??? Um absurdo! Porque foi «um incêndio de características tipicamente topográficas», diz-se no relatório da Portucel??? Um absurdo! Comparem-se as informações dos três relatórios, do Ministério da Administração Interna, do seminário feito em Redondo a 29 de Setembro e da Portucel e depois tirem-se conclusões. São muitas as questões insuficientemente ou mesmo, não esclarecidas. Vigilância? Detecção e primeiro alerta? Despacho? Limpeza da floresta? (quem conhece diz que não havia!) No seminário de Redondo diz o Comandante Operacional Distrital: «Um povoamento predominante de eucalipto com continuidade horizontal durante vários quilómetros» (foi acautelada, como se diz no relatório da Comissão, a «continuidade horizontal e vertical»???); «A existência de povoamentos de sobro e azinho e zonas de matos de grande densidade»!!! O pecado original da síntese é ter sido feita exclusivamente na base do relatório da Portucel, pouco interessado no esclarecimento do incêndio florestal.
4 — Os incêndios florestais nas áreas protegidas (página 23): Não é aceitável um texto que subestima a gravidade do problema e que, como o Ministro do Ambiente, na audição realizada na Comissão disse, relativiza os milhares de hectares de área ardida e a «qualidade» ambiental do que ardeu no PNPG e também no PNSAC, face às médias ardidas nos últimos anos e à capacidade de recuperação natural dessas áreas! Não há uma referência clara às evidentes carências de meios assinaladas por vários observadores e referidos por responsáveis do ICN quando as áreas protegidas estavam a ser devastadas pelos incêndios florestais! Repare-se que a própria entrega de 16 viaturas todo-oterreno com kit de primeira intervenção foi feita em Julho, já em plena «época oficial de fogos»! 5 — SNDFCI (página 26): Discordância da legislação já explicitada! Desacordo com a «filosofia», objectivos, meios e instrumentos.
DGRF (Página 27): não há, e devia haver, um balanço aos recursos humanos e meios existentes, e do que vai significar o PRACE para esta importante estrutura em todo SNDFCI e na própria concretização da Estratégia Nacional para a Floresta. Não deixa de ser significativo que bem recentemente, na cerimónia oficial de anúncio de 20 novas equipas de sapadores florestais, tenha sido um Vice-Director da DGRF a alertar o Ministro da Agricultura para a insuficiência dos recursos humanos da DGRF para a realização das missões que lhe estão atribuídas! Silvicultura preventiva e recuperação de áreas ardidas (página 29): O relatório tem uma referência aos projectos AGRIS, AGRO e do FFP aprovados, mas não há qualquer balanço da área executada! Não se referem as vultuosas dívidas do Estado a diversas entidades por projectos executados e não pagos! Não se diz o número/área de projectos candidatados e não aprovados, por insuficiência de verbas! Valoriza-se demais o que foi feito e esquecem-se as enormes carências e falhas do projectado! O relatório cita o Ministério da Agricultura como autoridade na validação das asserções feitas. Ora, não é uma questão de autoridade, mas de haver ou não balanços objectivos! Programa de Sapadores Florestais (página 32): Não se assinalam os dois problemas centrais: a manutenção de um número muito abaixo das necessidades já identificadas, bem como de uma distribuição mais ajustada no território; o problema da sua sustentabilidade, em particular em áreas florestais de protecção, e a baixa produtividade lenhosa.
A intervenção da GNR (página 37): Três anotações à referências do relatório: a necessidade de uma maior informação e tipificação dos autos e coimas da GNR; a avaliação da integração da Guarda Florestal na GNR é bastante fantasiosa, porque os problemas foram (e são) muitos; a transição da responsabilidade dos sistemas de Vigilância e Detecção da DGRF para a GNR teve evidentes problemas, visíveis a olho nu, como os relatórios dos incêndios florestais referem (para lá dos que já vinham do passado).
SNBPC (página 40):
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Repete-se o discurso do Ministério da Administração Interna, faltando uma síntese dos principais problemas verificados no teatro das operações de combate, inclusive sobre a articulação com os outros Ministérios! Estratégia de Intervenção (Conceito de Operação) (página 42): Não há um balanço razoável dos processos de «rescaldo», sendo conhecido que muitas vezes não foi bem feito, ou não teve o acompanhamento necessário! Estiveram, ao que alguns indícios indicam, na origem do «crescimento» dos incêndios florestais! E não era necessário citar o relatório McKinsey para constatar a necessidade de uma tipificação/normalização do conceito de «rescaldo» para evitar as contabilizações absurdas/díspares que se verificaram durante o Verão! 6 — A acção das autarquias (página 59): Há demasiadas citações do Ministério da Administração Interna na avaliação da sua intervenção. Não há uma referência detalhada à questão central do financiamento das competências e atribuições das autarquias na matéria! Qual o valor global da intervenção autárquica? Quanto foi suportado pelo Estado central e com que critérios foram distribuídos essas verbas? Como se pensa que deve ser no futuro? 7 — Conclusões (página 62): Pelas razões atrás enunciadas o Grupo Parlamentar do PCP tem um desacordo global com as conclusões.
Com uma excepção. O PCP está de acordo com o «prolongamento do mandato da Comissão Eventual para os Fogos Florestais» ou com uma «solução alternativa», mas considera ser necessário reformular o conteúdo da sua actividade no sentido da verificação no terreno de progressos no ordenamento e prevenção florestal.
IV — Recomendações ao Governo
A inserção das principais sugestões que o Grupo Parlamentar do PCP fez neste capítulo tornou-o adequado aos fins em vista. Um conjunto de recomendações ao Governo que, na base da experiência havida e com o enquadramento do núcleo de orientações fundamentais de políticas agro-florestais presente nas conclusões do primeiro relatório da Comissão Eventual para os Fogos Florestais, pode ajudar a corrigir e tornar mais eficientes as medidas para travar o flagelo dos incêndios florestais, pese o nosso desacordo global com as políticas do Governo.
Destacaríamos das sugestões feitas:
1 — No enquadramento das recomendações a necessidade de considerar: — Politicas agro-florestais que respondam à diversidade estrutural da floresta com lógicas adequadas e combatam o abandono rural e o fenómeno da desertificação; — Consolidar o ordenamento florestal e alargar a prática da gestão activa e outras boas práticas na floresta, privada, comunitária e pública, através dos diversos instrumentos de ordenamento e gestão (PROF, PGF, PUB, ZIF, etc.) e concretizar como prioridade, em 2007, a elaboração do cadastro florestal, envolvendo, para o efeito, as entidades que dispõem de competência própria; — Intensificar e extensificar as práticas de silvicultura preventiva e fazer da reflorestação das áreas ardidas uma prioridade da política florestal; — A necessidade que a floresta permaneça uma prioridade das politicas públicas, inclusive no plano orçamental e no bom aproveitamento do QREN e PDR.
2 — Sobre as «Recomendações», apresentou o Grupo Parlamentar do PCP as seguintes propostas:
— A necessidade de reflectir na base da experiência, dificuldades e sucessos verificados, em toda a complexa problemática de assegurar o comando único no contexto do DIDFCI a todos os níveis, no pleno respeito pela identidade e natureza muito diversa das forças que integram o dispositivo. A necessidade de que a profissionalização de alguns dos seus segmentos e o imperativo do comando único não contradigam a procura de soluções mais adequadas por via do diálogo, concertação e boa articulação; — A consideração de que uma particular atenção deve ser dada no acompanhamento pedagógico de pastores e agricultores para prevenir riscos em práticas culturais tradicionais; — A consideração da necessidade nas áreas protegidas do reforço dos sistemas de vigilância, de ver a possibilidade, nos casos que se justifique, de as dotar de meios aéreos e da intensificação por parte dos seus responsáveis, de práticas e comportamentos que melhorem substancialmente as relações com as populações que as habitam; — A necessidade de acelerar o aumento do número de equipas de sapadores florestais, velar pela sua sustentabilidade económica e promover uma melhor distribuição territorial; — A consideração de que qualquer desenvolvimento da profissionalização deve acontecer no quadro e a partir dos efectivos das próprias corporações de bombeiros voluntários e não pelo enquadramento e comando desses efectivos por elementos exteriores ao voluntariado, a necessidade da conclusão da anunciada reforma legislativa, bem como responder às deficiências que se continuam a verificar no apoio logístico, à adequada rotação do pessoal envolvido nos TO e à garantia da regularização das despesas extraordinárias das CBV
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com incêndios florestais até 31 de Dezembro do ano a que respeitam. A necessidade de avançar com um novo modelo de financiamento das entidades participantes no DIDFCI; — A consideração de que o Governo na regulamentação do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, deve proceder a uma reflexão com as entidades que estão directamente implicadas neste diploma, nomeadamente em relação à distribuição e suporte pelos diversos agentes dos custos da sua implementação; — A necessidade de estabelecer uma transferência criteriosa e transparente de meios para que as autarquias suportem as novas atribuições e competências, no quadro do SNDFCI, sem a arbitrariedade com que tal tem sido feito e combatendo a tendência para as transformar em delegações ou departamentos da Administração Central, como pensa que são o Ministro da Agricultura; — A consideração de que deve ser feito um balanço rigoroso, a partir do conjunto muito significativo dos relatórios dos incêndios florestais verificados durante o ano e de outra documentação produzida, sobre a quantidade e qualidade dos diversos meios e forças usados no combate, a sua distribuição no faseamento temporal estabelecido e no território que, permita determinar défices e estrangulamentos e assim vir a definir níveis de reforço e a melhor optimização dos efectivos existentes, de que devem ser tomadas as medidas necessárias para a superação definitiva dos problemas com os sistemas de comunicação, de que seja desenvolvida a tipificação dos relatórios dos incêndios florestais, melhorando a identificação de certos conceitos e termos operacionais, com o óbvio objectivo da sua futura e mais fácil sistematização e tratamento.
Os Deputados do PCP: Agostinho Lopes — José Soeiro.
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