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Sábado, 14 de Março de 2009 II Série-C — Número 15
X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)
SUMÁRIO Comissões parlamentares: Comissão de Ética, Sociedade e Cultura: Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família: — Relatório elaborado pela Deputada Maria do Rosário Carneiro, do PS, referente às audições efectuadas sobre portugueses ciganos no âmbito do Ano Europeu para o Diálogo Intercultural (2008).
Comissão de Ética, Sociedade e Cultura: — Relatório elaborado pela Deputada Maria do Rosário Carneiro, do PS, referente à sua participação na reunião da UIP, por ocasião da 53.ª Sessão da Comissão sobre o Estatuto da Mulher, que decorreu em Nova Iorque, no dia 4 de Março de 2009.
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COMISSÃO PARLAMENTAR DE ÉTICA, SOCIEDADE E CULTURA Subcomissão para a Igualdade de Oportunidades e Família
Relatório das audições efectuadas sobre Portugueses Ciganos no âmbito do Ano Europeu para o Diálogo Intercultural
I. Nota introdutória
1. Em Portugal, vive há cerca de 500 anos uma comunidade composta por pessoas identificadas por uma origem, língua e cultura próprias – a Comunidade Cigana ou a Comunidade Roma (segundo a terminologia adoptada na União Europeia).
Decorridos estes cinco séculos, verificamos hoje que sabemos pouco sobre esta comunidade de cidadãos, entretanto, portugueses. Sabemos pouco sobre a sua dimensão, a sua distribuição, as suas características. Contudo e para além do reduzido conhecimento que eventualmente se tem da sua diversidade cultural, identitária, reconhece-se uma evidência de situações de pobreza, exclusão, marginalidade, que afecta uma parte significativa desta comunidade.
2. Por outro lado e tendo presente que 2008 foi o ano proclamado pela União Europeia como o Ano Europeu para o Diálogo Intercultural, a Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura, em 28 de Novembro de 2007, aquando da aprovação do seu plano de actividades para a 3.ª sessão legislativa, deliberou levar a cabo um trabalho sobre a Comunidade Cigana, no sentido de reunir informação que permita um conhecimento mais aprofundado acerca da sua identidade, da sua diversidade, das suas condições de vida, e que simultaneamente habilite os decisores políticos com os elementos necessários à formulação de eventuais iniciativas legislativas e políticas promotoras da mais plena integração desta comunidade. Neste contexto, coube à Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família a responsabilidade da coordenação e execução daquela tarefa.
3. Para efeito de sistematização prévia dos dados a recolher e da organização das audições, foram consideradas como áreas de recolha privilegiada de informação, a educação, a habitação e o trabalho, na medida em que são expressão de direitos
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humanos, que explicitam também áreas instrumentais promotoras da dignidade humana e de uma plena integração cidadã.
4. Entendeu-se realizar este trabalho através de audições a portugueses ciganos e a entidades com responsabilidades nesta área. Com o objectivo de elaborar a correspondente lista das personalidades a ouvir, da forma mais abrangente possível, ouviu-se num momento prévio e preparatório, o Presidente da Câmara de Torres Vedras, Dr. Carlos Manuel Soares Miguel, o Professor Doutor José Pereira Bastos, do Centro de Estudos de Migrações e de Minorias Étnicas/Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa e os Drs. Luís Pascoal e André Jorge, técnicos do CIGA-NOS, do ACIDI tendo sido aprovado pela Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família, em 29 de Abril de 2008, o seguinte mapa das entidades a ouvir:
Adérito Mendes (Associação para o Desenvolvimento da Etnia Cigana) Anabela Carvalho Olga Mariano (Associação das Mulheres e Crianças Ciganas Portuguesas) António Fonseca (Associação Social, Recreativa e Cultural Cigana de Espinho) António Pinto Nunes (ACAJUCI e FECALP) Bruno Gonçalves (Associação mista na Figueira da Foz) Cândida Cabeças (jovem que encabeçou a formação de uma associação) Carlos Miguel (Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras) Dinis de Abreu (Associação Cigana de Leiria) Francisco Vasquez (Líder, Sintra-Amadora) Hugo Blanco (Sociólogo) Joaquim Cabeças (Chefe de Família, em Sintra) Guim Jair Joaquim Mariano (Pastores da Igreja de Filadélfia de Moura, Seixal e Lisboa) Joaquim Cardoso (Associação Social, Recreativa e Cultural Cigana de Coimbra)
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Joel (Porto) Luís Filipe da Conceição Silva (Cigano nómada do Alentejo) Luís Romão (Mediador Cigano em Elvas) Rafael Gimenes (Associação Social, Recreativa e Cultural Cigana de Águeda) Telmo (Mediador) Vítor Marques (Associação União Romani Portuguesa) Vitória Silva (Trabalhadora em Setúbal) Direcções Regionais de Educação Centros de Emprego Segurança Social/IRS Autarquias Beja Braga Faro Évora Lisboa Oeiras Autarquias Portalegre Porto Reguengos de Monsaraz Serpa Setúbal Tunes Vieira do Minho ACIDI Ana Maria Braga André Jorge (Ciga-nos)
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Helena Torres (GACI) Isabel Ferreira Martins (Entre Culturas) Laura Godinho (MEDIAR) Luís Pascoal Carlos Peixoto (Professor na Escola EB1 Tunes) Fernanda Pedro Fernanda Reis Francisco Monteiro (Pastoral dos Ciganos) Isabel Estevens (Professora em Serpa) Isabel Gaivão (Delegada de Saúde de Moura) João Antunes José Falcão (SOS Racismo) Maria José Mendonça (Professora em Faro) Marta Santos (Técnica da Gebalis) Mirna Montenegro (Projecto Nómada) Teresa Fernandes (Professora em Beja) Vanda Narciso (Divisão de Inclusão Social de Setúbal) Abílio Amiguinho (ESEP/Portalegre) Alexandra Castro (CET/ISCTE) Alfredo Bruto da Costa (CEESIS/ISEG) Ana Brinca (CEMME+FCSH) André Correia (CEMME+CET) Carlos Silva (ICS/U.MINHO) Donizete Rodrigues (CEMME+UBI) Elsa Rodrigues (CEMME/FCSH) José G P Bastos (CEMME/FCSH) Luisa Ferreira da Silva (U.ABERTA/PORTO)
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Luiza Cortesão (FPCE/UP) Maria Manuela Mendes (UTL/TAC.ARQUTECTURA) Olga Magano (U.ABERTA/PORTO)
As audições a que se refere o ponto que antecede ocorreram entre os meses de Junho de 2008 e de Outubro de 2008:
3 de Junho de 2008 Francisco Vasquez (Líder cigano) Vitória Silva (Cigana) Dr.ª Fernanda Pedro [Representante da CEFAI (Centro Europeu de Estudos e Formação sobre Migrações)] António Pinto Nunes [Cigano, Representante da ACAJUCI (Associação cristã de apoio à juventude cigana) e da FECALP (Federação Calhim Portuguesa)] 17 de Junho de 2008 Anabela Carvalho, Olga Mariano, Sónia Matos [Ciganas, Representantes da AMUCIP (Associação das Mulheres e Crianças Ciganas Portuguesas), mediadoras sócio-culturais] Maria Dulce Canoa (Cigana, mulher de líder cigano) Dr.ª Clotilde Saraiva (Docente da Universidade Lusófona) Carlos Manuel Soares Miguel (Cigano, Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras) Bruno Gonçalves (Cigano, Associação cigana na Figueira da Foz) 24 de Junho de 2008 Adérito Montes (Cigano, Representante da Associação para o Desenvolvimento da Etnia Cigana) José Falcão (SOS Racismo) Dr.ª Marta Santos (Técnica da Gebalis) Mirna Montenegro (Projecto Nómada) Dr.ª Vanda Narciso (Divisão de Inclusão Social de Setúbal) José Maria Fernandes (Cigano, Associação União Romani Portuguesa) 1 de Julho de 2008 Dinis de Abreu (Cigano, representante da Associação Cigana de Leiria) Dr. Francisco Monteiro (Pastoral dos Ciganos) Dr. João Viana (Advogado) Dr.ª Eva Gonçalves (ex-Directora da Escola Básica de Alcobaça, impulsionadora do realojamento da comunidade cigana em Alcobaça) Dr.ª Teresa Fernandes (Professora em Beja) Dr.ª Dulce Cachola (Directora Técnica do Centro Comunitário do Bairro da Esperança, em Beja) Dr.ª Isabel Estevens (Professora em Serpa)
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15 de Julho de 2008 Dr.ª Isabel Gaivão (Delegada de Saúde de Moura) Dr.ª Cláudia Guerra (Associação para o Desenvolvimento do Concelho de Moura) Dr. Carlos Carneiro (médico) Dr. Hugo Blanco (Cigano) Dr.ª Fernanda Reis (Pastoral dos Ciganos) José Pinto de Sousa (Cigano, representante da Federação das Igrejas Evangélicas em Portugal) Dr.ª Maria José Mendonça (Professora em Faro) 16 de Setembro de 2008 Dr.ª Sílvia Rodrigues e Dr.ª Maria João Romano (Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz) Prof. António Carlos Bico e Profª. Angélica Maria Prego Nogueira (Escola de Ensino Básico de Reguengos de Monsaraz) Dr. Alexandre Cantigas Rosa (Vice-Presidente do Instituto de Emprego e Formação Profissional) Délcio Martins (Presidente da Associação de Jovens da Apelação) e Nuno Archer (Coordenador dos Territórios Escolares de Intervenção Prioritária) Francisco Inácio Serrano Silva (cigano nómada do Alentejo, acompanhado por Domingues Piedade Silva, Maria Emília, José Manuel Silva, Francisco José Serrano e Soraia Rosa Canhoto) Barbara Wong (Jornalista do “Público”) Dr. Sérgio Aires (Sociólogo) 23 de Setembro de 2008 Sílvia Maia (Jornalista da Agência de Notícias LUSA) Dr. José Pereira Bastos (Centro de Estudos de Migrações e de Minorias Étnicas/Faculdade de Ciências Sociais e Humanas) Dr. Félix Bolaños e Dr.ª Célia Marques (Assistente social) –
(Agrupamento de Escolas da Apelação) Dr.ª Luisa Ferreira da Silva (Universidade Aberta – Porto) Dr. Luís Pascoal (Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural) Drª Helena Torres (Gabinete de Apoio às Comunidades Ciganas – ACIDI) Carlos Silva (Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho) 7 de Outubro de 2008 Dr. André Correia (Centro de Estudos de Migrações e de Minorias Étnicas /Centro de Estudos Territoriais) Profª. Maria José Casa-Nova (Universidade do Minho) Profª. Maria Manuela Mendes (Universidade Técnica de Lisboa – Faculdade de Arquitectura) Dr. André Jorge (Director do JRS - Jesuit Refugee Service) Dr. José Leitão (Director Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo) Dra. Laura Godinho e Dra. Ana Oliveira (Associação MEDIAR) Dra. Isabel Ferreira Martins e Dra. Isabel Paes (Entre Culturas)
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Dr. Pedro Machado (Vereador da Câmara Municipal de Montemoro-Velho) Dr.ª Dina Campino (Administradora da habitação) e Dr. Nuno Cavalheiro (Chefe da Divisão de Acção Social) – Câmara Municipal de Évora Dr.ª Patrícia Aparício (Gabinete de Acção Social) – Câmara Municipal de Leiria Dr.ª Anabela Paraíso (Chefe da Divisão de Saúde e Acção Social) – Câmara Municipal de Sintra Dr. Dionísio Simão Mendes (Presidente da Câmara Municipal de Coruche) Dr. Carlos Jorge Sousa (Cigano) Dr.ª Maria Manuel Coelho (Coordenadora do Gabinete de Assuntos Sociais) e Dr.ª Sara Serrano (Técnica de Investigação Social) – Câmara Municipal de Beja Dr.ª Marina Pereira Figueiredo (Assistente Social – Rede Social de Moura) e Dr.ª Custódia Maria Deodato Lopes (Assistente Social – Habitação Social) – Câmara Municipal de Moura 6 de Fevereiro de 2009 Dr.ª Rosário Farmhouse – Alta Comissária para a Imigração e o Diálogo Intercultural 11 de Fevereiro de 2009 Dr. Edmundo Martinho – Presidente do Instituto da Segurança Social
5. Estas audições foram complementadas com deslocações a vários pontos do país, que ocorreram entre Novembro e Dezembro de 2008:
a. Visita ao Centro do País (13 de Novembro de 2008): i. Em Leiria, a Subcomissão visitou o Bairro da Integração e o Bairro da Cova das Faias, tendo sido acompanhada pela Dr.ª Joaquina Serrão (Chefe da Divisão de Acção Social). ii. Na Figueira da Foz, realizou-se uma reunião nas instalações da Câmara Municipal com a Vereadora Teresa Machado (área da acção social) e a Figueira Domus (empresa municipal). A Subcomissão visitou um acampamento na Estrada de Mira e o bairro de Vila Robim, tendo participado nessa visita a Vereadora Teresa Machado.
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iii. Em Montemor-o-Velho, a Subcomissão foi recebida na Junta de Freguesia de Arazede, pelo Presidente, Aurélio da Rocha, estando também presentes os Vereadores Pedro Machado (área da educação) e Hernâni Rama (área da acção social), técnicos da segurança social e Comandante do Destacamento da GNR. Foi visitado o acampamento de Vila Franca (Arazede).
iv. Finalmente, realizou-se uma reunião na Câmara Municipal de Montemor-oVelho, com o Senhor Presidente da Câmara, Dr. Luís Manuel Barbosa Marques Leal, os Vereadores Pedro Machado e Hernâni Rama, representantes da Associação Fernão Mendes Pinto, do Agrupamento de Escolas de Montemor-o-Velho, do Centro de Emprego, da Reinserção Social, da CPCJ e do Centro de Saúde.
b. Visita ao Alentejo (24 de Novembro de 2008): i. Em Reguengos de Monsaraz, a Subcomissão visitou a Escola E.B1 onde, para além dos professores responsáveis, Drs. Angélica Nogueira e António Carlos Bico, estavam presentes, na ocasião, o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz (RM), Vítor Martelo, o Senhor Presidente do Conselho Executivo do Agrupamento Vertical de Escolas de RM, Dr. Rui Amendoeira, um elemento da Direcção Regional de Educação do Alentejo, técnicas da Segurança Social da distrital de Évora, uma oficial da GNR e, ainda, uma mãe cigana que de há muito faz a ponte com os meninos e a escola.
ii. Na freguesia do Sobral d’ diça , no concelho de Moura, a Subcomissão visitou o acampamento cigano instalado há 10 anos naquela localidade.
Estavam presentes a Senhora Vereadora da Câmara Municipal de Moura do Departamento Sócio-Cultural/Divisão dos Serviços Urbanos e Ambiente, Maria José Fialho, a Dra. Custódia Maria Deodato Lopes, também dos serviços camarários, o Presidente da Junta de Freguesia de Sobral, António Paulino Valério e 2 técnicas da Associação para o Desenvolvimento do Concelho de Moura.
iii. Em Moura, a Subcomissão visitou o Bairro do Girassol.
iv. Em Beja e antes da visita ao Bairro das Pedreiras, teve lugar uma reunião nos paços do concelho com o Presidente da Câmara e entidades com trabalho directo com a comunidade cigana, desde assistentes sociais, a elementos da PSP, da GNR, da Segurança Social e ainda do Projecto Inclusão pela Arte.
c. Visita ao Norte do País (15 e 16 de Dezembro de 2008): i. Em Peso da Régua, a Subcomissão visitou o Bairro das Alagoas, tendo reunido previamente no Pavilhão Multiusos do bairro com o Vereador Dr.
Mário Mesquita Montes, da Dr.ª Maria João Gonçalves (Técnica de Acção Social) e do Eng. Paulo Cardoso (Presidente do Conselho Executivo da EB1 n.º 3 de Godim). Ainda dentro do Bairro, foi visitada a EB1 n.º 3 de Alagoas ii. Em Lamego, a Subcomissão foi recebida pelo Presidente da Câmara e acompanhada, nas visitas, pelo Vereador Manuel José do Carmo Coutinho.
A Subcomissão teve oportunidade de visitar o Bairro da Quinta de Santo António, um bairro de realojamento novo. Foi também visitado o Bairro de Nazes, já na sua maior parte demolido, tendo a maior parte das famílias sido realojadas no Bairro da Quinta de Santo António.
iii. Em Barcelos, a Subcomissão foi acompanhada, nas suas visitas, pelas Dr.as Márcia Soares (técnica da área da rede social) e Anabela Pimentel (psicóloga da Câmara Municipal). Foi possível visitar o acampamento das Andorinhas, em Barcelos e um outro acampamento com o mesmo nome,
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em Barqueiros. Finalmente, foi visitado um acampamento num pinhal, em Barqueiros.
iv. A reunião que se realizou na Câmara Municipal de Barcelos contou com a presença da Vereadora Joana Garrido Fernandes (áreas da cultura, turismo, artesanato e juventude), representantes do Centro de Saúde, do Centro Social Abel Varzim, em Cristelo, do Centro de Bem-Estar Social de Barqueiros, do Gabinete de Acção Social e do agrupamento de escolas.
v. Em Coimbra, a Subcomissão foi recebida pelo Presidente da Câmara, Dr.
Carlos Encarnação, e o Vereador da área da habitação, Dr. Gouveia Monteiro.
vi. Após a visita ao Parque de Nómadas, a Subcomissão deslocou-se à EB2,3 Poeta Manuel da Silva Gaio, tendo reunido com a Presidente do Conselho Directivo, Dr.ª Berta Matos.
vii. Finalmente, realizou-se uma reunião na Câmara Municipal de Coimbra, com a presença do Senhor Presidente da Câmara, Dr. Carlos Encarnação, e do Vereador da área da habitação, Dr. Gouveia Monteiro.
6. Foram entregues os seguintes documentos pelas entidades ouvidas e que se encontram depositados nos serviços da Comissão:
a. Em suporte papel:
“ caravana” (vários números desta publicação) Edição trimestral da Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos A Escola é uma esperança – Sugestões aos pais imigrantes (e não só) Maria Helena Noronha Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural Setembro de 2001 A Escola é uma esperança – Sugestões para famílias de etnia cigana Maria Helena Noronha Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural Janeiro de 2003 A Tolerância – ensaio antológico Textos escolhidos e apresentados por Zaghloul Morsy Presidência do Conselho de Ministros/ACIME/IPJ Lisboa, Novembro de 2006 Alagoas – História de Vidas Coordenação de Marluci Menezes Garça Editores – Peso da Régua Março de 2008 Apologia do Intercultural António Perotti Secretariado Entreculturas Janeiro de 2003 Casos de boas práticas de integração/sucesso educativo da comunidade cigana DRELVT-TEIP Centro de Estágio Habitacional do Parque dos Nómadas - documentos fornecidos pela Câmara Municipal de Coimbra
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Ciganos Aquém do Tejo – Proposta de actividades nómadas para o ensino básico Projecto Nómada Setembro de 2004 Ciganos, crónicas, números e histórias – Atlas do Risco/Quotidianos Edição Associação Fernão Mendes Pinto Projecto Entreculturas Dezembro de 2005 Ciganos e Cidadanias Mirna Montenegro Cadernos ICE Comunidades Ciganas, Representações Sociais da Comunidad Cigana na Sociedade Portuguesa Luís Miguel Faísca, Jorge Correia Jesuíno ACIME, FCT Outubro de 2008 Cooperação e Aprendizagem, educação Intercultural Cadernos de Formação ACIDI Agosto de 2008 Entre dois mundos – vida quotidiana de famílias portuguesas na América Pedro d’Orey da Cunha Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural Julho de 1997 Guia do Morador – Bairro das Alagoas Coordenação de Marluci Menezes Garça Editores – Peso da Régua Março de 2008 Juntos na Diversidade (brochura) Ano Europeu do Diálogo Intercultural 2008 Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural Manual de Sensibilização para a Elaboração de Políticas de Inclusão Social das Comunidades Ciganas Projecto financiado pela Comissão Europeia no âmbito do Programa de acção Comunitária de Combate à Exclusão Social 2002-2006. A presente publicação é da autoria da parceria deste projecto e a Comissão Europeia não tem qualquer responsabilidade no seu conteúdo e pelo uso que possa ser feito do mesmo. Modelo integrado de actuação com a população cigana – Metodologia e estratégias Coordenação de Rosa Santos Coimbra, 2007 Nós, os Ciganos e os Outros – Etnicidade e Exclusão Social Maria Manuela Ferreira Mendes Livros Horizonte Março de 2005 Os Meninos e o Jardim de Infância – Sugestões aos pais imigrantes Maria Helena Noronha Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural Dezembro de 2000 Projecto Dignidade – Relatório Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos Dezembro, 2000
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Que sorte, ciganos na nossa escola! Secretariado Entreculturas 2001 Relações Inter-étnicas: portugueses, ciganos-portugueses e imigrantes dos PALOP. Um estudo de caso no distrito de Braga Conclusões e Recomendações do Relatório (Projecto POCTI/SOC 103/96/2000) Prof. Manuel Carlos Silva (Coordenador) Sintrenses Ciganos – Uma abordagem estrutural-dinâmica (Síntese, conclusões e recomendações) José Gabriel Pereira Bastos Câmara Municipal de Sintra Um Livro... Uma História... Interculturais Sugestões de exploração ACIDI Lisboa, Agosto de 2008 Uma Escola... Uma Sala de Aula... Interculturais Sugestões para Professores ACIDI Lisboa, Agosto de 2008
b. Em suporte informático:
A mediação sócio-cultural – propostas de acção para a implementação em territórios semelhantes ao Concelho de Moura (apresentação em Powerpoint) ADC Moura Setembro 2008 A situação habitacional das famílias de etnia cigana no concelho da Figueira da Foz, powerpoint apresentado pela Figueira Domus, Empresa Municipal, na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família que teve lugar na Câmara Municipal da Figueira da Foz, aquando da visita àquele concelho em 13 de Novembro de 2008 Apresentação do Dr. André Correia em powerpoint na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família na reunião de 7 de Setembro de 2008 Apresentação na Câmara Municipal de Beja em powerpoint aquando da visita da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família àquele concelho, em 24 de Novembro de 2008 Ausência de consulta aos representantes dos ciganos aquando da elaboração do decreto-lei sobre a privatização das feiras – Texto do Presidente da FECALP “Ciganos, Territórios e Itinerância – Análise de um questionário enviado aos postos da Guarda Nacional Republicana” , estudo de Novembro de 2006, enviado pela Prof.ª Alexandra Castro “Contributo para o Plano Nacional de cção para a Inclusão 2008/2010 – Portugueses ciganos” , enviado pela Dr.ª Alexandra Castro Documentos relativos a três reuniões do Grupo de Trabalho das Minorias Étnicas, fornecido pela Câmara Municipal de Beja aquando da visita da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família àquele concelho, em 24 de Novembro de 2008
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“ Dos contextos locais à invisibilidade política – Discussão em torno dos ciclos de exclusão habitacional dos ciganos em Portugal”, artigo de 2007 enviado pela Prof.ª Alexandra Castro “Educação Intercultural – O Outro como Ponto de Partida” , powerpoint apresentado pelo ACIDI na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família em 7 de Outubro de 2008 Exposição do Dr. Francisco Monteiro, da Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos, na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família em 1 de Julho de 2008 Informações sobre a implantação geográfica da comunidade cigana em Portugal (Documentos enviado pela ANAFRE, com informações relativas a vários distritos do país) “Iniciativa Nacional para a Infância e dolescência. Contributo sobre os port ugueses ciganos” , de Junho de 2008, enviado pela Prof.ª Alexandra Castro Notas sobre a intervenção junto da comunidade cigana, enviado pelo Dr. Edmundo Martinho, presidente do Instituto da Segurança Social Os acampamentos ciganos no Concelho de Montemor-o-Velho, documento entregue pelo vereador desta Câmara Municipal na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família de 28 de Outubro de 2008 “Portugueses ciganos no Concelho de Moura” , powerpoint apresentado pela Delegada de Saúde de Moura, na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família em 15 de Julho de 2008 Projecto de percurso curricular alternativo para alunos de etnia cigana em vigor na EB1 de Reguengos de Monsaraz, powerpoint apresentado pelos professores dessa escola, na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família em 16 de Setembro de 2008 Projecto para a Inclusão e Cidadania no Concelho de Reguengos de Monsaraz, powerpoint apresentado pela Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, na reunião com a Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família em 16 de Setembro de 2008 “Projecto Piloto de Mediação Sócio -Cultural” , fornecido pela Câmara Municipal de Beja aquando da visita da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família àquele concelho, em 24 de Novembro de 2008
c. Em suporte digital:
DVD Percursos. Em Nós – I Narrativas de Vida Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas DVD Percursos. Em Nós – II Celebração da Diversidade Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas DVD Percursos. Em Nós – III Acolhimento Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas
7. A sistematização da informação reunida ao longo das audições procura seguir as áreas instrumentais adoptadas, incorporando contudo as preocupações e sugestões manifestadas ao longo das audições
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II. Da caracterização da comunidade Portuguesa Cigana
A exiguidade da informação disponível, a dispersão dos vários registos, a multiplicidade de metodologias de recolha de dados, a ausência de informação em domínios essenciais da respectiva caracterização são alguns dos factores que evidenciam a dificuldade em percepcionar de forma clara e sistemática esta comunidade.
Não quisemos no entanto, e relativamente às áreas que considerámos instrumentais, deixar de incluir alguma informação, que foi possível compilar e que de alguma forma nos pareceu relevante e indiciadora da situação em que se encontra a comunidade cigana.
1. Dimensão populacional e distribuição espacial “ nível internacional alguns estudos apontam p ara a existência em Portugal entre 50 a 100 mil ciganos, sem no entanto se explicitar o método de recolha de informação. Para o European Commission Against Racisms and Intolerance (ERCI) existem em Portugal entre 50 000 a 60 000 ciganos (2002: 23) e para Machiels os dados variam entre os 50.000 e os 100.000 (2002: 11). Em Portugal a organização SOS Racismo (2001) através de um Inquérito realizado junto das Câmaras Municipais apenas conseguiu apurar um número total de 21 831 e Castro (2007) através de dois inquéritos aplicados às Câmaras Municipais e à Guarda Nacional Republicana obteve cerca de 34000” 1.
1Castro, A. (set2008) Contributo para o Plano Nacional de Acção para a Inclusão, 2008-2010, Ciganos e Habitação, Lisboa, Centro de Estudos Territoriais, página 2
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Distribuição espacial da população cigana
Distribuição do n.º de ciganos por distrito:2
2 Castro, A (Nov2006) Ciganos, Territórios e Itinerância – Análise de um questionário enviado aos postos da Guarda Nacional Republicana, Centro de Estudos Territoriais, pag. 16
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Distribuição do peso dos ciganos face à população residente por distrito:3
3 Castro, A (Nov2006) Ciganos, Territórios e Itinerância – Análise de um questionário enviado aos postos da Guarda Nacional Republicana, Centro de Estudos Territoriais, pag. 19
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Distrito de Coimbra
Distrito de Évora
Distrito de Faro
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Distrito de Viseu
2. A escolarização
“ Alguns estudos apontam para que cerca de 38% (da comunidade cigana) possua menos de 15 anos. Se se considerar a existência de cerca de 40 mil ciganos, pode-se inferir que aproximadamente 15 200 crianças com menos de 15 anos, são portugueses ciganos” 4.
Contudo, “ os dados relativos ao ano lectivo 2003/2004 revelam que das 8324 crianças e jovens portugueses ciganos matriculados 86,7% estavam no 1º ciclo, permitindo inferir uma retenção de alunos muito elevada (face aos 49,6% do total de alunos). No ensino secundário (incluindo os cursos tecnológicos) as matrículas de jovens ciganos apresentam um peso residual, justificando um particular esforço para a correcção desta situação.” 5
3. A situação habitacional Na página da Internet da Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos, pode ler-se que “os ciganos a viverem em barracas/tendas a nível nacional rondam os 7000, correspondendo a 18% da população cigana”, para um universo estimado de cerca de 40 mil pessoas. De acordo com os dados recolhidos no âmbito de um estudo do CET (Castro, 2007) constata 4 In Notas sobre a Intervenção junto da Comunidade Cigana (2009), Instituto da Segurança Social, Lisboa 5 Idem
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se a existência de 6516 ciganos a viverem em condições precárias de habitação sejam estas fixas ou móveis, correspondendo a 16% face ao número estimado de população cigana (40 mil)” 6.
4. O Rendimento Social de Inserção
a. nº de famílias de etnia cigana, beneficiárias do RSI, em acompanhamento Distritos N.º Famílias Obs.
Aveiro 501 Beja 328 Braga 364 Bragança 110 Castelo Branco 122 Coimbra 239 Évora 205 Portalegre 364 Porto 384 Santarém 330 Setúbal 250 Faro 583 Guarda 189 Não existem projectos de intervenção específicos, contudo, as áreas que assumem maior relevância: Educação (aquisição da escolaridade obrigatória - crianças); Saúde (materno-infantil); Acção social (apoio ao exercício da cidadania e organização da vida quotidiana).
Leiria 181 Lisboa 609 Viana do Castelo 140 Vila Real 65 Viseu 311 .
Total 5275 3,90% Face ao total de famílias beneficiárias RSI Fonte: ISS, IP. Dezembro de 2008 Nota: Total de famílias beneficiárias com processamento de RSI 135.428 (Dezembro de 2008) 6 Castro, A. (set2008) Contributo para o Plano Nacional de Acção para a Inclusão, 2008-2010, Ciganos e Habitação, Lisboa, Centro de Estudos Territoriais, página 3
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III. Do relatório
Das audições efectuadas sobre portugueses ciganos, resultou o reconhecimento generalizado e consensual quanto: (i) à insuficiente e pouco sistematizada informação relativa a esta comunidade, aliás, heterogénea na sua composição, (ii) à situação de extrema vulnerabilidade e exclusão em que se encontra um número apreciável dos seus membros, (iii) à necessidade de promover uma sistemática e metódica recolha de informação sem a qual não poderão ser equacionadas as medidas necessárias à promoção da sua plena integração.
O presente relatório estrutura-se em cinco grandes grupos: as três áreas estratégicas, inicialmente consideradas – educação, habitação e trabalho, e outros domínios apresentados nas audições como igualmente estratégicos. Face à informação recolhida entendeu-se conveniente destacar para cada um destes grandes grupos subcapítulos relativos à caracterização feita e às prioridades referenciadas. Incorpora-se mais um grupo que inclui outros factores considerados pertinentes.
O relatório assenta no registo das informações transmitidas nas audições, omitindo-se contudo as sugestões mais concretas que foram sendo apresentadas, remetendo-se a sua consulta para as respectivas transcrições que se encontram depositadas nos serviços da Subcomissão para a Igualdade de Oportunidades e Família.
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A. Educação A educação é um instrumento fundamental de desenvolvimento pessoal e social e é determinante para que as pessoas possam alcançar formas de vida autónomas. Sem escolarização ficarão sempre em situação de desvantagem, sem possibilidade de escolha, dependentes. Por outro lado, é também através da educação que se adquirem as competências sociais e comportamentais indispensáveis à integração na sociedade, e factores de robustez e coesão social.
É sabido que a escola é um factor de integração social na medida em que envolve a criança e toda a família, e por isso o ensino obrigatório é um instrumento privilegiado. A educação é um elemento inultrapassável para o empoderamento dos ciganos: sabe-se, por exemplo, do papel fundamental da escola como mediadora entre a saúde e estilos de vida mais saudáveis, podendo contribuir significativamente para reduzir a mortalidade e aumentar a esperança média de vida. Contudo, a percepção da importância da educação, da frequência escolar, da aquisição de qualificações académicas e profissionais, pela comunidade cigana, é diversa e contraditória.
Tanto quanto se sabe, a maior parte da população é pobre e não foi/é escolarizada e a educação formal não é valorizada pela comunidade: a venda ambulante não precisa de escola ou a escola só é útil para tirar a carta. Pode-se ainda acrescentar a esta percepção, uma visão negativa da escola por parte dos pais, alicerçada em factores diversos: a. o medo da escola e o receio pela protecção das crianças, b. a desconfiança pelos conteúdos ensinados, c. a percepção da falta de competências dos seus filhos face às outras crianças, nomeadamente no domínio da oralidade e de outras competências, e o consequente receio da sua desvalorização, d. a rigidez da comunidade escolar (desvalorização dos valores culturais próprios, práticas pedagógicas pouco inclusivas.), e. os prolongados horários escolares e as crianças fora de casa depois do sol se pôr, f. a duração da escolaridade e o casamento precoce, g. as crianças nem sempre serem aceites na escola, pela comunidade escolar, pelos pais das outras crianças, pelas populações, e serem transferidas de escola para escola, h. a falta de condições de acessibilidade à escola, i. a itinerância, as feiras, a ausência de programa para quem não tem residência, a escola de matrícula e a escola de frequência, j. a percepção da educação como uma intrusão nos seus ritmos de vida e como uma violência sobre as crianças, k. a relação permissiva com a infância (fazem muito a vontade às crianças – se não apetece.) l. a possibilidade de filhos de contrários estarem na mesma escola, m. etc..
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A ausência de registos, que identifiquem as comunidades, é responsável pela inexistência de estatísticas que permitam a identificação e a consequente abordagem informada da comunidade cigana. E como é sabido, por não haver tratamento estatístico, o que é valorizado é sempre o que corre menos bem. Aliás é só a partir de 1990 que se começa a verificar uma grande preocupação com a integração das crianças ciganas na escola e se constituiu uma base de dados – base de dados do entre culturas - desta população escolar7.
É possível no entanto reter alguma informação, que permite a identificação de algumas características mais marcantes: a. são poucos os que frequentaram o pré-escolar, (sendo no entanto visível o impacto positivo naqueles que o frequentaram), b. é elevado o abandono e irregular a frequência escolar, c. são baixos os níveis de sucesso escolar, d. há falta de competências sociais, e. há dificuldade em aceitar as regras, f. verifica-se uma alta conflitualidade quando reunidos em grupo (que por via do insucesso é quase sempre de mais velhos), com adopção de comportamentos intimidatórios, g. verifica-se uma baixa participação nas actividades da comunidade educativa, h. constata-se um baixo envolvimento parental.
E sabe-se também: a. que algumas das comunidades educativas são rígidas, ignoram os valores próprios destas crianças, ignoram a sua dificuldade, sobretudo daqueles que não frequentaram o pré-escolar, em permanecer em ambientes fechados, durante prolongados períodos de tempo, b. que são frequentes as manifestações de discriminação e preconceito relativamente a estas crianças, c. que há falta de preparação dos professores e falhas no respectivo acompanhamento, d. que a inclusão em sala de aula é deficiente com os meninos colocados no fim da sala, sendo-lhes aplicado de forma desajustada o conceito de Necessidade Educativa Especial (de facto estas crianças carecem de apoios especiais que não se podem contudo confundir com as NEE), e. que a maior parte das crianças está na escola por causa do RSI, f. e que há uma constante e importante falta de mediadores.
7 não manutenção da “Base de dados do entre culturas”, além de ser uma quebra na recolha e tratamento de informação, representa também uma perda de memórias (a sua extinção resulta de um equívoco, já que não havia identificação nominal da crianças e se partia de um levantamento com origem nas direcções das escolas).
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Deve ainda ser tido em conta que a habitação precária, a ausência de emprego, a verificação de deficientes condições de saúde, a marginalidade, tem impactos incontornáveis no comportamento escolar e nos respectivos resultados.
Sabe-se também que, e apesar de muitos dos pais não quererem os seus filhos na escola, há um impacto directo do RSI na escolarização das crianças: o número de crianças aumentou extraordinariamente. As crianças estão nas creches, nos jardins-escola, na escola por força de uma contratualização com a Segurança Social8. Constata-se no entanto que esta afluência é marcada por uma enorme disparidade de idades, em níveis educativos comuns, facto que representa uma dificuldade acrescida à organização da escola.
Os pais ciganos querem que os seus filhos aprendam, se desenvolvam e tenham acesso a melhores condições de vida como é comum a todos os pais. Os pais ciganos estão interessados em que os seus filhos aprendam efectivamente e que não transitem sem conhecimentos.
Quando metade da população era analfabeta (há cerca de 70 anos), havia famílias ciganas que mandavam os filhos à escola e muitas crianças foram assim escolarizadas; contudo, faltaram os apoios para que esta opção continuasse, a sociedade desinteressou-se deste empenho das famílias.
Sabe-se que os meninos ciganos gostam de ir à escola, aprendem como qualquer outra criança, gostam de livros e das novas tecnologias. Sabe-se que querem uma escola mista, (se não nem vale a pena sair do acampamento). Aliás só assim é que as crianças aprendem a conhecerem-se umas às outras e aprendem a viver juntas, e só assim é que as crianças, convivendo umas com as outras, ganham o desejo de continuarem na escola.
Neste contexto, é ainda de assinalar que frequentemente os tribunais aceitam o incumprimento da escolaridade obrigatória por parte das crianças ciganas, por respeito à cultura cigana, e que nem sempre as comissões de protecção de crianças e jovens sinalizam as situações de abandono escolar destas crianças. Mas as regras são para todos: o abandono escolar tem sempre que ser denunciado e objecto da intervenção necessária adequada, caso contrário quase que representa o reconhecimento de que se pode abandonar. A exigência que impõe a aceitação da diferença quanto à identidade, tem que velar também pelo cumprimento da igualdade.
As mudanças são de longo prazo. É da maior importância a reflexão sobre a educação, sobre as políticas educativas e o trabalho no terreno, sendo claro que a concretização da escolarização nunca será o resultado de uma obrigatoriedade forçada, nem de um único modelo. É por isso necessário reflectir sobre questões que têm a ver com: a. a criação de mecanismos para que se alterem as percepções relativas à escola; b. o respeito pelas opções dos pais, dando-lhes alternativas, permitindo assim uma efectiva igualdade de oportunidades, em princípio só possível para quem tem recursos; 8 Falta no entanto a avaliação necessária dos impactos sem a qual não é possível retirar as devidas consequências e falta também o acompanhamento que garanta a eficácia da medida, acompanhamento que só pode ter sucesso se for realizado em parceria
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c. o envolvimento obrigatório da comunidade destinatária, percebendo as necessidades de auto-estima, desenvolvendo competências de gestão dos recursos: a comunidade cigana não delega os filhos na escola – quer conhecer quais são as finalidades, quer negociar; d. o envolvimento obrigatório da comunidade maioritária, combatendo estereótipos e desenvolvendo competências inclusivas; e. a abertura da escola a modelos diversificados (ensino à distância, escola virtual, escola móvel, etc.), estabelecendo sempre parcerias; f. a introdução na formação inicial dos professores de componentes específicas que os preparem para a diversidade; g. etc. .
1. A educação das meninas ciganas O medo do casamento fora da comunidade é determinante para não deixar as meninas frequentarem a escola. É por isso frequente que a partir dos 10 anos abandonem a escola prevenindo-se dessa forma contactos com a restante sociedade. A virgindade tem que ser protegida, as meninas têm que estar ao lado das suas mães e têm que se preparar para casar.
Contudo a educação das mulheres é fundamental: como direito pessoal, como factor determinante da educação das crianças e do desenvolvimento da comunidade.
Para que as meninas fiquem na escola, para que possam aprender e desenvolver-se como as outras crianças tem que se pensar uma solução que garanta que os valores da comunidade são respeitados. Tem que se criar um percurso, que dê confiança, o que quer dizer que eventualmente são necessárias medidas especiais que construam essa base de segurança para que as meninas possam ir à escola e ter acesso à educação.
Contudo não há uma via única, consensual, que garanta que os valores são respeitados, que dê confiança aos pais, que permita a permanência na escola, que proporcione a escolarização e a aprendizagem. São diversas as propostas de intervenção: a. turmas só para meninas, b. ou escolas só de meninos ciganos, c. ou escolas só para meninas; d. presença de mediadores, responsável neste caso pelas meninas, e. as meninas com as mães na alfabetização recorrente, f. primeiro ciclo em co-educação, sendo separadas depois em turmas só de meninas, g. as mães presentes na escola, durante os recreios, h. escola virtual, ou escola móvel, i. escolaridade básica, como se fosse recorrente, para poder estar com os pais/mães.
O maior problema é o das meninas não irem à escola, mas há, como se vê, hipóteses para o resolver, há fórmulas que têm que ser adaptados experimentalmente. Não pode haver regimes excepcionais que consintam que estas crianças – meninas – não beneficiem da
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educação como qualquer outra criança. É por isso fundamental que se ensaiem vias diversificadas, adaptadas de forma a que se realize o direito à educação destas crianças.
2. Os modelos educativos Não pode haver uma oferta única de modelo educativo. A diversidade da comunidade cigana, a diversidade das comunidades educativas, a diversidade da sociedade no geral, impõe que a efectiva realização do direito à educação das crianças passe pela construção e concretização de modelos que correspondam àquela diversidade. Nesse sentido a escola deve promover as várias culturas, pelo aprofundamento e desenvolvimento do seu estudo, pela sua aprendizagem e divulgação. E deve ainda analisar os programas existentes, para poder equacionar o que melhor se adequa à sua realidade, durante quanto tempo e com quem.
Ponderando os impactos, avaliando os custos e os benefícios.
As características próprias da população cigana em idade escolar, algumas já atrás referidas, e as características da própria comunidade escolar, levaram algumas escolas a ensaiar modelos diversos, no sentido de combater o abandono e o absentismo, de promover a aquisição de competências, de alcançar o sucesso escolar. Destes, destaca-se: a) Integração regular das crianças ciganas na escola: distribuição por turmas por níveis educativos, concentrando-as ou dispersando-as pelo maior número de turmas.
Esta opção, quando não é acompanhada por um projecto educativo próprio de inclusão activa destas crianças, com recurso activo a práticas pedagógicas adaptadas, a mediação permanente, em regra, é acompanhada por elevados níveis de abandono e absentismo, por baixo sucesso escolar, por conflitualidades frequentes no espaço escolar.
A incapacidade para integrar estas crianças resulta muitas das vezes na sua colocação nas filas detrás, na aplicação indevida da medida de Necessidades Educativas Especiais.
b) Promoção da dispersão das crianças ciganas por várias escolas, assegurando os meios de transportes, evitando dessa forma uma excessiva concentração de meninos que, na sua maioria, não têm as competências necessárias por falta do pré-escolar, são bastante mais velhos (com manifestações de comportamentos violentos, reforçada pela dimensão do grupo).
c) Organização de turmas só para crianças ciganas com fundamentos diversos: a. a necessidade de aquisição de competências pessoais e sociais sem as quais não se pode desenvolver o projecto escolar/educativo, necessidade que é aliás particularmente acentuada nas crianças que não frequentaram o pré-escolar (e que são a maioria); b. a necessidade de retirar as crianças ciganas, mais velhas, das turmas em que a idade média das crianças é muito mais baixa;
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c. a necessidade de conter a conflitualidade das crianças ciganas, nomeadamente das mais velhas, reforçada pela consciência de grupo; d. a possibilidade de, por esta via, ensaiar, metodologias de compatibilização de ritmos, de aprendizagem de contenção em espaços fechados, etc.; e. a possibilidade de incluir, adaptar, significar, traços culturais próprios; e ainda, f. a pressão da restante comunidade escolar que rejeita a presença das crianças ciganas na escola.
Em regra, esta opção é ainda acompanhada por horários desfasados de recreios e de refeições, reduzindo-se assim a integração ao espaço físico da escola, sem que haja uma efectiva partilha de tempos e acções comuns.
É ainda de referir que esta opção, aplicada quase sempre experimentalmente, apresenta nalguns casos, redução drástica do abandono, redução do absentismo, redução da conflitualidade, progressivo sucesso escolar, alguma integração na restante comunidade escolar.
Esta solução é bem acolhida, e desejada por muitos dos pais ciganos que sentem os seus filhos mais seguros, mas é rejeitada por outros que exigem a integração dos seus filhos nas turmas regulares.
d) Presença das mães nos recreios, como forma de ganharem segurança quanto ao modo como os seus filhos são tratados na escola, e assim colaborarem no projecto educativo.
E ainda,
e) Escola móvel, assente na internet: os pais são responsáveis pela educação dos filhos, podendo utilizar o programa da escola virtual da Porto Editora, e há professores que acompanham as crianças na família ou na escola. Os custos desta hipótese são baixos e podem realizar uma função integradora.
Requer portáteis, programas especiais e equipas móveis de professores, mas requer também que as famílias tenham bons níveis de organização.
f) Ensino à distância com recurso às novas tecnologias, apetrechando as comunidades e os centros comunitários, que têm uma relação de proximidade.
g) Educação informal - experiência escola/projecto nómada: curriculum alternativo para meninos que abandonaram a escola.
h) Projecto circense.
i) Educação pré-escolar nos mercados.
j) Cursos de educação extra-curricular, para os jovens adultos, validados por ciclos de competências (o que implica pensar em centros de validação de competências).
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k) O ensino em regime de internato.
E ainda outras ofertas educativas, que podem contribuir para a aprendizagem/integração educativa: 1. Curricula alternativos – afere e adapta o curriculum do básico a públicos específicos (percursos curriculares alternativos); 2. Curricula com conteúdos próprios, diferentes, adaptados à cultura cigana; 3. Cursos profissionais para jovens fora da escolaridade obrigatória; 4. Combinação das crianças com as mães/pais, em segunda oportunidade; 5. TEIPs, através dos quais é possível contratar técnicos mais adequados às necessidades e adoptar outro tipo de intervenções com intenção de promover uma melhor integração; 6. Recurso a mediadores, a educadores, a animadores, a assistentes sociais; 7. Possibilidade de desenvolvimento de projectos com dinâmicas próprias de cada escola, traduzindo assim as capacidades de flexibilidade das escolas para responderem aos problemas concretos através de soluções concretas.
3. As estratégias A escola é central e como tal têm que ser procuradas e desenvolvidas estratégias que a transformem neste efectivo instrumento de desenvolvimento e integração. Neste sentido destacam-se algumas linhas de intervenção: a. O momento da intervenção e a abrangência da intervenção: As crianças deverão entrar na escola o mais cedo possível quer para adquirirem as necessárias competências sociais fundamentais para a aprendizagem, quer para que lhes seja compensada alguma da fragilidade material das suas famílias.
De facto, a vulnerabilidade das condições de vida das famílias, a escassez de meios e a precariedade das condições habitacionais, um estilo de vida que não predispõe para períodos de tempo continuados em ambientes de trabalho fechado nem para posturas mais disciplinadas, um entendimento permissivo quanto aos comportamentos, podem ser compensadas por uma integração escolar precoce.
Nesse sentido, a escola para além de espaço de aprendizagem, deve fornecer às crianças comida, roupa, proporcionar-lhes condições de higiene, que são condições essenciais de bem-estar e de integração e que simultaneamente podem funcionar como aprendizagens para a integração em habitação.
A expansão da educação pré-escolar é pois uma estratégia fundamental para a concretização do direito à educação.
É ainda, entendido por alguns, que o alargamento da rede de creches junto das comunidades ciganas funcionaria como um instrumento estratégico importante.
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b. Os professores: É necessário que a formação inicial de professores contemple as questões da interculturalidade. Não se trata somente de ter professores especialmente preparados para trabalhar com as crianças ciganas e as suas famílias, nas situações em que são requeridos modelos específicos, mas de ter uma escola preparada para a diversidade e com capacidade para desenvolver as vias mais adequadas para trabalhar esta problemática.
Mas é também necessário fazer formação específica de professores: a formação intercultural é imprescindível para o desenvolvimento de trabalho em profundidade com a comunidade cigana. Mas é também necessário inovar a prática pedagógica, criando equipas alargadas com garantia de apoios para que possa haver uma efectiva intervenção. Neste sentido, é fundamental o empenho por parte do Ministério da Educação, para que haja continuidade e acompanhamento nesta tipologia de intervenção.
c. O mediador O mediador tem um papel chave no estabelecimento de pontes entre a família e a escola, na securização dos pais, na clarificação das diferenças, na tradução dos códigos.
Contudo esta função essencial carece de clarificação: quanto à sua formação, quanto ao seu papel na escola, quanto ao seu estatuto profissional e remuneratório.
O mediador não é um bombeiro para gerir conflitos, para controlar comportamentos agressivos; estabelece pontes, lentas na sua construção, mas que através de um trabalho em rede logra alcançar a confiança das famílias e sensibilizá-las para a importância da educação e da sua indispensável colaboração, trabalha preconceitos das famílias e da comunidade escolar, resolve problemas de escolarização, colabora para um projecto educativo mais inclusivo.
d. O trabalho na comunidade Não se pode trabalhar a escola se não se tratar a comunidade e a comunidade mais alargada. Nesta perspectiva é necessário sensibilizar as comunidades docente, discente e envolvente.
Sensibilização que quer dizer conhecimento mútuo: os pais ciganos têm que aprender a aceitar as outras crianças e os outros pais, mas as outras crianças e os outros pais têm que desmontar preconceitos e aprender a aceitar a comunidade cigana.
Sensibilização que quer dizer cativação dos pais ciganos, trabalhando os valores educativos na respectiva comunidade, criando necessidade pelo factor educação.
São assim fundamentais equipas multidisciplinares que trabalhem a capacidade das pessoas para serem integradas, identificando os pontos comuns das vidas partilhadas. Mas é também fundamental que os respectivos projectos de trabalho em rede, em comunidade, sejam apoiados, acompanhados e monitorizados.
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A operacionalização desta sensibilização requer parcerias que envolvem entidades e profissionais das áreas da música, da dança, do teatro, da educação física, da internet, envolvendo as Câmaras Municipais, as instalações desportivas, os centros de saúde, a GNR (escola segura). Requer ainda técnicos e professores com preparação adequada.
E finalmente, trabalhar na comunidade exige descobrir as lideranças com quem são feitas as pontes.
e. E ainda algumas especificidades A inscrição escolar facilitada devido à mobilidade dos pais, a adaptação dos horários, porque não é possível pensar que uma criança esteja fora de casa depois do sol se pôr, o recurso aos ATL como uma via adequada para as crianças obterem competências pessoais e sociais, bem como espírito de comunidade, hábitos de saúde, etc., a criação de um espaço criança, para incutir nas crianças sentimentos positivos pela escola e permitir um primeiro contacto com materiais pedagógicos e a aquisição de atitudes e hábitos necessários ao estar na escola, o expressivo reconhecimento do mérito, nomeadamente pela atribuição de compensações pecuniárias, o reconhecimento das boas práticas, o seu registo e divulgação.
B. Habitação Uma habitação adequada é um imperativo da dignidade humana, é um requisito inultrapassável para que outros direitos fundamentais se realizem, é fundamental na promoção da integração da comunidade cigana e no desenvolvimento de sentimentos de pertença. Tal como noutros domínios fundamentais para avaliação da situação da comunidade cigana não se dispõe de informação suficiente, recolhida de forma sistematizada. É contudo sabido que a situação habitacional da comunidade cigana é muito precária9 e de difícil resolução, sendo visível neste capítulo grandes assimetrias, apresentando-se muitas vezes quase como um problema insolúvel, atendendo a: a. Fraca capacidade económica da comunidade cigana, 9 “ Estima-se que cerca de 6.400 ciganos vivem sem condições de habitabilidade, salubridade e higiene, em habitações móveis ou fixas e enfrentando diversos problemas: dificuldades de fixação de residência em determinadas localidades onde construir sentimentos de pertença; ausência de infra-estruturas básicas como água potável, electricidade e saneamento básico; localização das habitações perto de lixeiras ou de zonas industriais poluídas nas margens das cidades.” In Notas sobre a intervenção junto da comunidade cigana, Instituto da Segurança Social, 2009
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b. Falta de competências de vida com outros grupos e de cumprimento de normas de vida comunitárias, diversas das suas,
e ainda, severas manifestações de discriminação:
c. Ninguém quer um cigano para vizinho, d. Ninguém aluga ou vende uma casa a um cigano, e. Não têm acesso ao empréstimo bancário (genericamente).
A habitação é fundamental ( a melhor coisa que se pode ter, é uma casa) , mas há famílias cuja habitação não tem os mínimos requisitos de saneamento, de segurança, de conforto. Muitas delas não têm acesso à água não podendo assim serem satisfeitas as necessidades básicas de sobrevivência e de higiene. Algumas delas, são a expressão da mais profunda miséria, tendas de sacos e plástico. Sabe-se também que a maior parte da comunidade cigana está sedentarizada e que as feiras deixaram de ser factor de nomadismo. Sabe-se de famílias empurradas ao longo de gerações de aldeia para aldeia, por vezes com a destruição dos seus bens. Sabe-se de pessoas que são forçadas a uma mobilidade constante, e de outras empurradas para casas indignas.
Sabe-se também da enorme variação de situações entre os grandes centros urbanos10, os médios e mais pequenos, entre o litoral e o interior, o norte, o centro ou o sul do país, da diversidade de modelos relativos à habitação, ao realojamento, ou ao processo de integração.
Mas sabe-se, como já foi referido, de forma pontual, por manchas, sem uma efectiva sistematização que permita caracterizar bem a situação.
Ter uma casa é, como já se referiu, fundamental para que se possa verificar a integração, até porque ela é facilitadora de outros direitos, como a saúde, a educação, o trabalho. Contudo, é necessário um trabalho profundo que atente em questões como as da localização das habitações, as tipologias das casas, as características da população carenciada e realojada, a restante comunidade com quem os realojados vão passar a conviver.
Há factores que não podem ser ignorados, como as casas de um só piso a que estarão habituados, os espaços abertos com normas muito diversas das que decorrem de uma vida mais urbana, ou o isolamento social em que se encontram, e que impõem que sejam pensadas e procuradas soluções que efectivamente promovam a integração, a mútua integração das comunidades. Para além da diversidade de modelos, a metodologia de intervenção impõe que se trabalhe sempre as populações e com as populações.
1. O realojamento O realojamento tem por objectivo, para além de proporcionar habitação condigna e adequada aos mais vulneráveis, a realização da integração das populações realojadas nas malhas 10 “ 15 a 20% vive na Área Metropolitana de Lisboa” idem
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urbanas, de forma a evitar guetizações, isolamentos, adversos à construção de comunidades integradoras e coesas.
No entanto, o reconhecido isolamento geográfico dos bairros sociais, a concentração dos mais vulneráveis nestes bairros, promove o isolamento social, fomenta o desenvolvimento de contextos favoráveis a comportamentos violentos e marginais. A concentração, nestes bairros, das populações mais pobres, é factor de estigmatização, fomenta comportamentos agressivos: os bairros revelaram ser uma solução pior que os acampamentos, ficaram isolados do mundo exterior, capturados por uma cultura de exclusão e de não cidadania; como é que os habitantes dos bairros se podem integrar na sociedade se estão tão escorraçados? E também, se se é colocado entre marginais, aprende-se a ser marginal! Não se pode colocar as pessoas em blocos, por etnias, porque esta opção é contrária à ideia de integração. Aliás, em muitos bairros de realojamento observa-se uma cultura própria, geradora de tempestades, difíceis de apaziguar.
Nestes bairros de realojamento é necessário criar núcleos técnicos que trabalhem no terreno as populações e as vizinhanças e é fundamental apoiar as instituições que aí trabalham.
Núcleos e instituições que devem integrar trabalhadores com perfil adequado e as necessárias qualidades humanas11. Trabalho de integração que pode também ser feito a nível da Junta de Freguesia.
O realojamento tem que respeitar os princípios fundamentais de inclusão, não colocando as populações realojadas muito afastadas dos núcleos urbanos, com as inerentes dificuldades de acesso à rede de serviços, nem em antigas lixeiras ou terrenos com características impossíveis, atendendo dessa forma ao direito à qualidade de vida.
Muitas vezes o realojamento é feito de forma precipitada: adesão ao PER, entrega da chave e fica tudo resolvido. Contudo o realojamento tem que ser objecto de trabalho prévio, porque: a. A transição da barraca para uma casa, do acampamento para o bairro, requer aprendizagem de utilização do novo espaço, exige aprendizagens sociais e comunitárias, e exige o cumprimento de regras de vida em comum. Os realojamentos têm pois que ser sempre acompanhados por equipas multidisciplinares para trabalhar com as famílias.
b. A transição requer que se tenham consultado as famílias e com elas tenham sido equacionadas as possibilidades de realojamento quanto ao local e às tipologias habitacionais.
Contudo, e exceptuando alguns casos de sucesso no realojamento das famílias ciganas, há um conjunto de problemas que importa destacar: a. Concentração de famílias ciganas em bairros sociais, afastados da malha urbana, com condições de difícil acesso; b. Concentração de famílias ciganas com outros grupos igualmente vulneráveis; 11Há casos em que a autarquia cria espaços para formação parental, escolhas para os jovens, actividades de animação de índole cultural, ateliê de dança, etc., como vias para promoção da integração das populações.
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c. Solução habitacional em altura, por oposição a um estilo de vida horizontal, impondo estilos de vida e de partilha de espaços comuns de gestão difícil; d. Habitações com tipologias incompatíveis com a dimensão dos agregados familiares ciganos e com o estilo de vida das famílias ciganas12; e. Habitações de construção deficiente, com materiais inferiores e de consequente rápida degradação, ausência de chaminés, etc.; f. Imposição da localização da casa e da respectiva tipologia. Mas a estes problemas, mais relacionados com a filosofia do realojamento, acrescem outros que se prendem com as atitudes das famílias ciganas: a. Destruição das casas, b. Vandalização dos espaços comuns, c. Incumprimento nos pagamentos das rendas e dos consumos da água, do gás e da electricidade, d. O problema dos contrários, e. Conflitualidade com os vizinhos.
Ainda de referir a circunstância das famílias ciganas viverem em grupos de família, e tal ser factor de dificuldade acrescida para encontrar habitação adequada para um número muito grande de pessoas. Por outro lado, o facto de os filhos que se casam continuarem a viver com os pais determina uma sobrelotação das casas comprometendo-se assim uma forma de vida adequada. Uma opção alternativa para o realojamento em bairros construídos para o efeito, poderia ser, não a construção de mais casas, ou de mais bairros sociais, mas a dispersão das famílias pela malha urbana, procurando dessa forma promover a sua integração com a restante comunidade. Uma forma possível de o realizar seria através da compra de casas pelas câmaras municipais na malha urbana para depois as disponibilizar às famílias ciganas.13 2. A integração espacial Estreitamente relacionado com a questão da realização do direito à habitação, coloca-se a forma como se realiza a integração espacial da comunidade cigana. De facto realojar, não é sinónimo de integrar.
Contudo, sabe-se que relativamente à comunidade cigana há um conjunto de preconceitos, que levam a que estas famílias sejam colocadas nas periferias, em terrenos impróprios ou com deficientes condições de habitabilidade: 12A habitação social não foi programada tendo em conta a actividade da venda: é necessário um parque para guardar a carrinha, ou arrecadação, para guardar os seus bens: na carrinha está tudo o que possui, todo o seu estatuto.
13 Solução facilitadora da integração na medida em que a dispersão das famílias ciganas facilitaria por um lado a sua integração e por outro contribuiria para diluir o receio da restante população perante um número concentrado e elevado de famílias ciganas.
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a. Há um número elevado de famílias que ainda não teve acesso a habitação social e vive em barracas; b. Há vários locais do País onde é recusada a permanência de famílias ciganas; c. Há vários locais do País onde é recusado o acesso à água, nos acampamentos; d. Há bairros, que além de afastados, têm uma única via de acesso (entrada e saída), poderão estar murados/vedados nalguns casos, sem caixas de correio, com acesso exclusivo a pé ou em transporte próprio; e. Há terrenos que foram vendidos a famílias ciganas para habitação, mas que como estão em zona protegida, não têm acesso nem a água, nem a saneamento; f. Há terrenos que foram vendidos, sem que haja de facto transferência de propriedade, apesar da existência de caderneta; g. Há um sentimento de “inveja”por parte da população envolvente porque não tem casa nova, mas há também um sentimento de “medo” pelos guetos criados. Mas sabe-se também, de alguns comportamentos por parte da comunidade cigana, que reforçam os preconceitos e dificultam a intervenção: a. A simulação de nomadismo por parte de famílias ciganas que residem em concelhos limítrofes, estão sedentarizados e pretendem assim uma habitação nova; b. A simulação de compra de habitação, para depois reaver o sinal, majorado; c. O não respeito pelos hábitos e costumes das famílias com quem vêm a partilhar espaços comuns, impondo-lhes os seus; d. A não aceitação das regras; e. A adopção de comportamentos agressivos e intimidatórios; f. A vandalização de espaços comuns; g. A ausência de vontade em colaborar em processos de mudança.
Registam-se contudo, e apesar do atrás descrito, algumas soluções satisfatórias para a questão habitacional14: a. Situações em que as famílias têm capacidade e podem comprar casa própria, o seu apartamento, onde querem; b. Situações em que foram recuperadas habitações velhas dentro das povoações e atribuídas a famílias ciganas; c. Situações onde a Câmara compra ou aluga habitações, na malha urbana, ou no âmbito concelhio, para depois as disponibilizar aos mais carenciados de habitação; d. Situações em que são criados gabinetes de apoio/integração às famílias ciganas e não ciganas; e. Situações em que são criadas soluções transitórias/ facilitadoras da aprendizagem de competências de vida em meio”urbano”(contentores, pequenos bairros especialmente construídos para essa aprendizagem); f. Situações em que existe apoio pecuniário por parte da Segurança Social e de algumas Câmaras, quando as famílias não têm capacidade para pagar a renda; 14 O PER apresentou-se como uma boa política de integração.
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g. Situações em que foram constituídas comissões de vizinhança de gestão partilhada.
Não pode haver um modelo único. Não há uma família, mas muitas, com características e modos de vida diferentes. É necessário recorrer a soluções diversas, transitórias algumas, sempre com a finalidade de promover uma efectiva integração.
A pressão sobre a habitação é muito grande. As famílias têm que ser avaliadas como as outras e as regras aplicadas igualmente, nomeadamente: a. respeito pela habitação, b. respeito pelos espaços comuns, c. responsabilização pela manutenção, d. responsabilização pelos estragos, e. assumpção das despesas próprias.
Há ainda um número reduzido de famílias, que vive das feiras, e mantém um estilo de vida nómada. Para estas famílias, as soluções de permanência ambulante são difíceis15. A criação de uma rede de parques nómadas, que permitisse um corredor de circulação, é um projecto ambicioso que prevê infra-estruturas, rede de serviços de intervenção junto das crianças, entre outras, mas que poderia representar uma solução inclusiva para estas famílias.
C. Trabalho
Tradicionalmente os ciganos são vendedores ambulantes, cesteiros e ferros velhos, criadores de cavalos e trabalhadores agrícolas sazonais, com pouca ou nenhuma formação profissional.
A alteração dos mercados, a reorganização da economia, o desaparecimento das feiras e da vida agrícola, que representam modos tradicionais de vida dos ciganos, afectam particularmente os ciganos que não têm condições de adaptabilidade e assim perdem autonomia e dignidade.
1. A crise das feiras Os ciganos são feirantes, mas o negócio das feiras está mau, e já não corresponde a uma forma de vida segura: a. a deslocação dos mercados para zonas onde não se vende, b. a mudança dos horários das feiras, (porque não pode haver uma feira que esteja aberta todo o dia; será que estamos condenados a viver do RSI?), 15 Há locais onde não podem permanecer mais que 48 horas, sendo essa permanência entendida como “campismo selvagem”.
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c. a extinção progressiva dos mercados (que representam uma forma lícita de vida das famílias ciganas, em alternância com o trabalho rural sazonal), d. a desvalorização da venda ambulante, e. as pessoas perderam o hábito das feiras e os ciganos perderam a possibilidade de vender, f. a atitude repressiva da ASAE nos mercados, g. os vendedores aumentaram em número e as vendas baixaram, h. as grandes superfícies, os chineses e os cartões de crédito, i. a crise económica e os negócios parados, j. a contrafacção, etc.
A acrescentar a todos estes aspectos são ainda de referir as dificuldades em adquirirem o estatuto de vendedor ambulante e em conseguirem o dinheiro necessário para pagar os postos de venda.
Qual é a alternativa para os ciganos, nomeadamente para os jovens quando não houver mais mercados, para encontrarem modos de vida que garantam a sua sobrevivência? O que vão fazer com a sua predisposição natural para o negócio, mas com habilitações escolares muito baixas e sem qualificações profissionais? Era importante uma dinamização dos mercados e das feiras (há feiras em todas as cidades da Europa, porque não pode haver em Portugal?), e de um adequado enquadramento camarário, quer para garantir a permanência desta forma de actividade comercial tradicional quer para assegurar postos de trabalho. Contudo, e mesmo que se verificassem políticas no sentido de revitalizarem esta área económica, não iria criar os postos de trabalho suficientes.
2. Outras possibilidades de trabalho Deviam ter possibilidade de trabalhar no que sabem fazer. A escolha da profissão é um direito fundamental.
Contudo as áreas tradicionais de trabalho, para além da venda, como por exemplo os ferrovelhos ou os cesteiros (os objectos fabricados deixaram de ser comprados porque foram substituídos pelos da Tailândia, muito mais baratos) entraram em perda progressiva.
Relativamente às famílias muito pobres, sem escolarização, é importante pensar em algumas hipóteses de trabalho a desenvolver, como a comercialização em 2ª mão, os centros de recolha e tratamento de roupas, integrados nos circuitos de venda, e. porque não conceder micro crédito que permita criar pequenos comércios, ou o seu próprio negócio: Um ateliê de costura? Um ateliê de instrumentos musicais? Seria importante pensar em incentivos que enquadrem as suas actividades, que atendam ao facto de que gostam de trabalhar por conta própria.
É ainda necessário pensar noutras perspectivas de trabalho, como a construção civil, florestas e caça, comércio, auxiliares de educação, artesanato. Contudo, qualquer que seja, requer
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formação profissional e que o cigano a deseje (é impensável pôr um cigano a servir à mesa!) e aceite (trabalhar para um patrão!).
3. A formação profissional A formação profissional é um pré-requisito para reforçar as competências e as qualificações que tornem as pessoas aptas a desempenhar uma profissão. Nesse sentido é importante considerar a validação de competências diferentes, adequando a formação profissional às competências e às necessidades, para o que é indispensável o diagnóstico prévio, acompanhado pelo devido projecto de inserção.
A formação profissional deve ser uma via para expandir a escolaridade para quem não a tem, e deve ser uma via para aquisição de competências profissionais para quem não as tem. O RSI tem um papel importante na disseminação desta medida junto da população cigana adulta, à semelhança do impacto que tem na escolarização das crianças.
Contudo colocam-se algumas questões no que se refere à formação profissional: a. A formação é descontínua, b. Não dá garantias no mercado de trabalho, c. Não há cursos para níveis de escolaridade baixos (os jovens dos 15 aos 20 anos, terão o 5º ano, no máximo, e as raparigas nem o 4º ano terão), d. Não tem correlação com os postos de trabalho disponíveis, e. Não corresponde aos interesses dos ciganos envolvidos, f. O sucesso é quase sempre muito baixo.
Era importante encontrar soluções de formação profissional adaptadas, por exemplo, através de cursos que cubram baixos níveis de escolaridade e envolvam os pais abrangidos pela educação recorrente. Os cursos de alfabetização de adultos são fundamentais, não só pela alfabetização propriamente dita, mas porque permitem chegar às mulheres. A educação das mulheres é nuclear, quer pelo seu desenvolvimento pessoal, quer porque são elas a alavanca para a promoção e sustentabilidade do desenvolvimento das suas famílias. Sabe-se no entanto, que as mulheres que fazem formação profissional, que entram no mercado de trabalho, nem sempre são bem vistas pelos seus companheiros.
E é também importante que a comunidade cigana interiorize a necessidade de adquirir novas competências para poder subsistir e para tal tem que apostar na escola e na formação.
Formação profissional que deve privilegiar a certificação. Mas frequentar um curso de formação profissional não é garantia de trabalho: nem sempre se adequa às necessidades do mercado de trabalho, e dificilmente se encontram empregadores que dêem trabalho.
Há assim um entendimento por parte da comunidade cigana que não faz sentido investir na formação profissional, quando depois não há postos de trabalho. Os ciganos fazem os cursos
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de formação profissional para não perderem o RSI, para ganharem o subsídio, mas depois não conseguem arranjar trabalho.
De novo, é de salientar, o papel fundamental dos mediadores no estabelecimento de pontes indispensáveis para a concretização de projectos de inclusão.
4. O acesso ao trabalho Os ciganos perderam as formas tradicionais de trabalho, não adquiriram as competências formais necessárias à integração no mercado de trabalho, empobreceram e perderam a sua autonomia.
Alguns deles passaram a dedicar-se a actividades ilícitas como o tráfico de armas e de drogas, o que veio contribuir para o reforço dos preconceitos relativos à comunidade cigana.
O acesso ao mercado de trabalho, é difícil, praticamente fechado, com excepção quase única do sector público, nomeadamente as câmaras municipais, através dos POCs. As hipóteses de acesso ao emprego são muito baixas e há apesar de tudo profissionais que não são aproveitados.
As representações negativas, os estigmas (que afectam todos os pobres e não somente os ciganos), não permitem o fácil acesso ao emprego, são factores de descriminação: ninguém dá trabalho ao cigano que vende contrafacção e droga! São comuns as situações em que tendo o cigano um posto de trabalho, quando é sabida a sua pertença, é despedido (o que leva a que muitos vivam em situação de clandestinidade étnica).
Contudo, é de referir que para além dos factores discriminatórios, outros contribuem para esta situação. Contribui a baixa escolaridade e falta de competências profissionais, já referidas, mas contribui também um comportamento que por vezes se traduz em quebra de contratos, ou incumprimento dos compromissos assumidos.
É necessário desconstruir o preconceito e investir na formação e no reforço de competências: sem que tal se faça, não há emprego e sem emprego não há integração.
O PNAI e o RSI são instrumentos fundamentais para a promoção da integração desta comunidade. Os núcleos de RSI têm um papel fundamental no acompanhamento das famílias no desenvolvimento de programas inclusivos.
É fundamental apostar em respostas no trabalho, como forma de escapar à pobreza e recuperar a sua autonomia e dignidade: a. pensar em formas de promover no mercado do trabalho público medidas de promoção de empregabilidade, em nome da igualdade de oportunidades, como por exemplo através do estabelecimento de quotas ou de outros incentivos específicos; b. instituir apoios à criação do próprio emprego como alternativa à venda tradicional; c. fomentar o estabelecimento de parcerias locais;
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d. incentivar e promover a responsabilidade social das empresas; e. apostar na figura do mediador, como elemento estratégico, para construir postos de trabalho.
D. Algumas questões de natureza geral
A comunidade portuguesa cigana, vive em Portugal há cerca de 500 anos, e hoje decorridos todos este séculos, não se sabe exactamente quantos são, nem exactamente onde estão e como são. Conhece-se desta comunidade, sobretudo o que é marginal, a diversidade que não merece acolhimento, a dependência e a exclusão. Conhece-se esta comunidade através de estereotipias e preconceitos, de relações marcadas por comportamentos discriminatórios e excludentes. Conhece-se também o fechamento recíproco em que ambas as comunidades se colocam e sabe-se que as mudanças têm que ser dos dois lados.
Somos todos portugueses, mas não nos conhecemos16, nem nos queremos conhecer.
1. Algumas características da comunidade cigana Trata-se de uma comunidade que vive em Portugal há 500 anos, é portuguesa, tem uma distribuição heterogénea no território nacional, é diversificada, assenta na família alargada (a família é mais importante que o indivíduo), rege-se por critérios de sociabilidade específicos. É ainda marcada por uma memória colectiva e identidade fortes, e por uma forte vinculação com o seu grupo de origem.
A preservação cultural é fundamental, como garantia da sua permanência e nesse sentido desenvolvem estratégias adaptativas, envolvendo os mais novos, na procura da conciliação do passado e da modernidade. Trata-se da preservação da sua cultura e identidade.
Há um conjunto de práticas e tradições estruturantes que se mantém: a. Respeito pelas leis ciganas aplicadas por tribunal interno que resolve conflitos e torna possível a vida em comunidade (apesar de não se conhecer nenhum código sobre a lei cigana17), b. Respeito pela família (elemento fundamental da comunidade, mais importante que o indivíduo), c. Respeito pela criança e pelo mais velho, d. Respeito do casamento segundo a tradição, e. Respeito pela virgindade da mulher (o que implica que não se possa relacionar fora da comunidade e que por isso tenha que abandonar precocemente a escola), f. Respeito pela autoridade masculina, e a consequente discriminação das mulheres18, 16 Apesar de já existir algum património cientifico 17 Tanto quanto se sabe está um código em preparação no ACIDI
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De referir ainda, neste âmbito, que a sedentarização forçou a repensar a vingança, que deixa assim de ser intergeracional e ocorre na mesma geração.
2. A discriminação Ao longo destes cinco séculos é sabido que o Estado Português cometeu injustiças, promulgou leis discriminatórias, promoveu comportamentos abusivos, indutores da marginalização em que se encontra a comunidade cigana, da sedimentação de preconceitos, do fechamento das comunidades entre si19. A dificuldade de acesso a habitação (integrada na malha urbana), a quase impossibilidade de emprego, o deficiente acolhimento nos serviços públicos, ou ainda a ignorância de traços culturais expressivos na educação e na cultura, são evidências deste comportamento discriminatório20.
Contudo, Portugal é hoje um Estado Democrático, fundado na dignidade humana e empenhado na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei e todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição da Republica Portuguesa21.
No entanto, o quadro constitucional não tem sido suficiente na erradicação de práticas discriminatórias. Aliás, a especificidade do grupo, a sua situação minoritária22 e a situação de afastamento em que se encontra, em nome do quadro constitucional, do princípio da igualdade de oportunidades, requerem medidas de discriminação positiva que permitam a promoção de uma real inclusão.
A comunidade cigana desenvolveu uma cultura de resistência, fechou-se sobre si própria, (medo de agressões ancestrais), auto excluiu-se. A relação entre as duas comunidades é de desconfiança mútua. 18 Apesar de algumas matriarcas, em pequeno número, e de algumas particularidades: o patrão em casa é o homem, mas há negócios que só podem ser feitos pelas mulheres, a mulher manda mas quem tem o respeito é o homem, 19 “ Quer na Europa, quer em Portugal, os cidadãos portugueses pertencentes a estas comunidades são objecto de discriminação que, geralmente, se traduz numa inserção profissional precária, na imposição da cultura dominante, sem o respeito pela diferença, em processos de segregação e isolamento face a redes de apoio familiar e social, bem como muitas vezes em preconceitos que os apontam como os principais autores de delitos na comunidade.
Esta atitude, geradora de situações de desigualdade e de exclusão social, perpetua a marginalização dos portugueses ciganos na sociedade”. in Notas sobre a intervenção junto da Comunidade Cigana, ISS, Fevereiro 2009 20 Há uma discriminação histórica, alicerçada consolidada no tempo, que se manifesta num racismo institucional, num racismo quotidiano, expresso no acesso à habitação, à escola, nas políticas formuladas.
21 In Constituição da República Portuguesa, artigos 1º, 12º e 13º 22 Situação que é no entanto recusada por alguns: os ciganos não são uma minoria, mas portugueses que têm uma especificidade própria
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Em Portugal, convive-se com esta minoria adoptando medidas particulares e diferentes, sem que a questão cigana seja enfrentada abertamente, sem uma estratégia nacional, que facilitaria medidas a nível social, de empregabilidade, etc.
3. Os preconceitos As ideias feitas, estereotipadas, preconceituosas, desenvolveram-se ao longo de anos de afastamento das duas comunidades, umas baseadas em comportamentos diversos, não compreendidos, outras em comportamentos marginais, outras ainda em comportamentos resultantes eles próprios da situação de marginalidade: cheiram mal, são violentos, são barulhentos, não cumprem os compromissos, estragam tudo, enganam, roubam, são vigaristas (têm sinais exteriores de riqueza mas simulam a pobreza23), Na verdade, ninguém aceita um cheque a um cigano, ninguém lhe aluga ou vende casa, ninguém lhe dá trabalho. Mas será por causa de comportamentos de facto, ou será por causa dos preconceitos? Os ciganos, como qualquer outra pessoa pertencente a um outro qualquer grupo, são igualmente bons ou maus, e o que é facto, é que nunca são apresentados os factores positivos da comunidade cigana.
Mas os estereótipos são de ambos os lados, a relação entre ciganos e não ciganos é marcada pela desconfiança mútua, transmitida secularmente: a. Os não ciganos consideram que os ciganos não trabalham, não têm valores, não têm educação, não têm higiene, deverão ser banidos dos espaços públicos comuns; b. Os ciganos acham que têm valores superiores aos da sociedade maioritária, que as mulheres não ciganas são promíscuas, que a sociedade no seu todo não cuida nem das crianças nem dos velhos.
A comunidade cigana, aliás, tem ela própria, da comunidade não cigana, percepções estereotipadas que condicionam o seu modo de estar: a. Nós os ciganos e os outros, os brancos, b. As instituições não lhes pertencem, c. A relação é sempre para tirar vantagens, qualquer que seja, d. Não fazem parte desta sociedade, e. Falta de sentimento de pertença.
Percepções claramente diferenciadas, estereotipadas e que medeiam as relações interétnicas.
Percepções assentes em medos e ignorância de um lado e do outro.
Há que investir na desmontagem dos preconceitos: trata-se de um problema fundamental de direitos humanos. O papel dos mediadores é essencial. 23 Mas não se pode olhar para os sinais exteriores de riqueza dos ciganos: são sinais de pouco preparo, para iludir os outros, para ganhar o seu respeito
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4. A pobreza A comunidade cigana é marcada por um número muito elevado de famílias em situação de extrema pobreza e de grande dependência24. A sua pobreza é extrema e cada vez se afasta mais dos níveis médios da restante população.
A diferença é cada vez maior, podendo referir-se alguns factores que contribuem para o acentuar das diferenças: a. a ausência de competências educativas, b. os diferentes estilos de vida acentuados pelo isolamento em que vivem as comunidades ciganas mais pobres, c. a incapacidade de se afirmarem autonomamente, d. o desconhecimento dos direitos, e. e o desconhecimento dos deveres. Nos estudos sobre a pobreza há diferenças muito grandes (negativas) dos ciganos para as restantes comunidades25. E naturalmente sendo os mais pobres, são os que mais sofrem em momentos de crise, de contenção, de menor afluência.
É importante contudo ressalvar, que a cultura cigana é distinta da cultura de pobreza, e que apesar de ser persistente nas últimas décadas para esta comunidade, a pobreza não afecta só os ciganos e a sua abordagem tem que ser mais alargada.
5. O direito e a justiça A comunidade cigana tem um acesso difícil ao direito e uma relação difícil com a justiça: tem poucos meios (praticamente só pode contar com as oficiosas), desconhece as leis, desrespeita as leis, e alguns dos seus membros envolvem-se com alguma frequência em comportamentos violentos e ilícitos (nomeadamente o tráfico de drogas e armas).
Por parte das polícias e dos tribunais há uma percepção antecipada de que terão violado a norma, que o seu comportamento é por natureza desviante, e que a sua palavra vale menos que a de qualquer outro cidadão; por parte da comunidade cigana há uma percepção de que são os bodes expiatórios, que sofrem penas mais pesadas para crimes análogos, que as forças policiais normalmente lhes atribuem crimes que não cometeram.
Nenhuma lei irá resolver esta situação. A questão é de direitos humanos e do seu respeito.
Requer formação das polícias, dos tribunais, mas também um maior esclarecimento da comunidade cigana e um comportamento em conformidade com as leis.
24 Notas sobre a intervenção junto da Comunidade Cigana, ISS, Fevereiro 2009 25 “ Não se trata de uma questão de pobreza, mas de racismo e discriminação, que só terá solução se forem considerados minorias étnicas dum ponto de vista jurídico” .
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6. A comunicação social As representações sociais relativas aos ciganos são genericamente negativas e são por isso uma limitação à sua integração; a sua reprodução é um factor que contribui para bloquear a aproximação das duas comunidades.
A opinião pública portuguesa é a pior da União Europeia: é a mais racista e estereotipada, a que mais rejeita os elementos próprios da cultura cigana, que coloca no mesmo grupo: pobreza, ciganos, exclusão.
Os media têm muita falta de informação e formação sobre o tema, transmitem imagens estereotipadas, negativas, de grande violência, com a consequente produção de efeitos negativos junto das populações. São em regra apontados como os mais rejeitados, conotados com algum exotismo, ou folclore (bastante desvalorizado), subdesenvolvidos, insubmissos a qualquer estrutura.
A comunicação social é fundamental na desconstrução dos estereótipos e na construção de pontes, pela difusão de informação que esclarece modelos ou explicita comportamentos.
7. O papel das igrejas A Pastoral dos Ciganos tem um trabalho pioneiro Junto da comunidade cigana, sendo a sua intervenção marcada sobretudo pela acção caritativa, e pela prestação de acções de formação profissional.
A igreja protestante cigana, nomeadamente a Igreja de Filadélfia, tem tido por seu lado, uma forte penetração na comunidade cigana, sendo muito relevante o papel que desempenha no combate aos contrários, a comportamentos marginais e na introdução de estilos de vida saudáveis e socialmente aceites, destacando-se o acompanhamento no combate à droga, no combate à comercialização de produtos de contrafacção e de outros ilícitos (como a droga e as armas), na contenção da violência.
Os pastores da igreja de Filadélfia são ciganos, são formados entre ciganos, que recorrem a cultos muito expressivos que funcionam como catarse e regulação social.
8. A intervenção no terreno. Algumas experiências de integração O trabalho no terreno permite criar uma nova percepção da realidade e intervir a partir do ponto em que se encontram: para tal são necessárias equipas multidisciplinares. Contudo são poucos os técnicos sociais26, que nem sempre sabem muito sobre a comunidade cigana, e se debatem com poucos recursos. 26Um técnico de intervenção social para uma freguesia problemática inteira? Que sustentabilidade de intervenção junto de cada família?
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É necessário encontrar localmente as soluções, conhecer os “outros”. Têm que ser dados muitos passos e feitas pequenas experiências.
A falta de conhecimento sobre a comunidade cigana, leva a que a intervenção seja baseada em assumpções generalistas, sem envolvimento dos destinatários e muitas das vezes desfocada das suas reais necessidades e capacidades. O trabalho feito a nível local, deve na medida do possível partir da junta de freguesia, a fim de garantir uma efectiva proximidade entre a entidade responsável e a comunidade e assim absorver a diversidade, identificar as problemáticas, sensibilizar as partes envolvidas, respeitar as várias formas de poder organizado.
O trabalho a desenvolver com os ciganos tem que assentar numa base de confiança, só possível se houver envolvimento dos destinatários, que é obrigatório.
As mudanças são de longo prazo, requerem intervenção prolongada, planeamento a prazo.
Contudo, a maior parte dos projectos conhecidos, na sua generalidade bons projectos, tiveram duração curta (o tempo dos financiamentos, ou dos impulsos), não foram retomados, e o seu impacto, se houve tempo para se verificar, diluiu-se rapidamente. Para além, do desperdício de recursos, empenhos, motivações, expectativas, a não continuidade destes projectos é indutor de falta de confiança e desmotiva relativamente a outras iniciativas que possam vir a ocorrer. A descontinuidade das experiências e a falta de avaliação dos projectos são factores muito negativos.
Cada comunidade tem que encontrar os seus melhores modelos. O trabalho em rede é fundamental, sabendo-se que é contudo o trabalho insuficiente. Não há articulação entre instituições, as parcerias são difíceis de estabelecer. Os diagnósticos existentes são desconexos e por isso muitas das vezes produzem intervenções desadequadas. Mas muitas das vezes são os ciganos que não aceitam as soluções apresentadas, exigem alternativas impossíveis, inviabilizam qualquer proposta de intervenção.
Para além da mudança de imagens e vivências, a intervenção estratégica só é possível com o apoio e articulação das Câmaras Municipais e dos Ministérios sectoriais envolvidos nas respectivas áreas, assim como de empresas, instituições privadas, entre outros, de forma a articular as múltiplas actividades e as diversas iniciativas. Mas fundamental também é trabalhar com toda a comunidade: não há um projecto específico para os ciganos. E. Outras áreas estratégicas 1. O “recenseamento” A falta de informação quanto à dimensão, à distribuição, à situação económica e social, às características desta comunidade de portugueses, torna impossível uma percepção clara e real da sua situação, camufla situações, induz em generalizações erróneas, favorece a permanência de preconceitos, impede a concepção das medidas mais adequadas para promover o desenvolvimento e a integração dos seus membros mais vulneráveis.
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Não se sabe exactamente quantos são, como são, onde estão. E daqueles que se sabe um pouco mais pela evidência da sua pobreza, o conhecimento que se dispõe, é avulso e pouco sistematizado.
A promoção dos direitos fundamentais da comunidade cigana, a percepção da nossa identidade, exige que se pensem sistemas de recolha de dados, que sejam capazes de compatibilizar o princípio constitucional da não discriminação, e a necessária recolha de informação global e sectorial indispensável ao conhecimento do que somos, e à formulação mais adequada da intervenção. 2. A saúde A saúde é uma área estratégica que ajuda a medir e a perceber a situação face ao desenvolvimento. Aliás o indicador de esperança média de vida, é um precioso indicador de medida agregada que expressa as condições de vida das comunidades. Ora a esperança média de vida para a comunidade cigana é significativamente mais baixa do que para a restante comunidade, assim como outros indicadores na área da saúde: Estima-se que a esperança média de vida é cerca de menos 15 anos que a restante população, que a mortalidade infantil é cinco vezes superior à media europeia e que a idade média ao primeiro filho é aos 17 anos.
Como fundamento destes indicadores, profundamente assimétricos relativamente à média nacional, podem apontar-se alguns factores: a. As condições gerais da habitação, e da respectiva salubridade, não reúnem as condições básicas para a promoção da saúde; b. O difícil acesso à água; c. A pobreza em geral, impeditiva de acessos fundamentais; d. Os baixos níveis de escolaridade não são favoráveis à adesão de estilos de vida nem ao estabelecimento de rotinas, necessários para que haja mais saúde; e. O recurso à saúde somente em fase aguda, o que só permite diagnósticos tardios, e não facilita o acompanhamento e impede a prevenção; f. O facto de não poderem entrar acompanhados, afasta-os dos serviços de saúde; g. Os comportamentos e atitudes que tornam difícil a partilha dos espaços comuns dos serviços de saúde; h. Os tempos de espera nas consultas, a morosidade dos tratamentos, afasta-os igualmente dos serviços de saúde.
Contudo a saúde é um vector estratégico, nomeadamente a saúde materno infantil e infantil, que pode funcionar como um ponto de charneira, contribuindo para a aceitação mútua das duas comunidades. É facilitadora, são perceptíveis as suas vantagens, funciona por isso como um bom instrumento para promover a integração.
A saúde é ainda particularmente estratégica na promoção das mulheres: quer pela intervenção directa na sua saúde, quer pelos evidentes impactos na educação/formação das mulheres,
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nomeadamente no que se refere a hábitos, comportamentos e estilos de vida próprios e das crianças.
É necessário um grande investimento na saúde, de forma a construir um modelo particularmente centrado na prevenção, envolvendo as componentes da saúde comunitária, que permitam trabalhar de forma integrada os comportamentos e as atitudes.
É ainda importante que a saúde seja próxima da comunidade cigana. Tal como é equacionado para algum modelo escolar, susceptível de ser adoptado, também a prestação dos serviços de saúde poderá nalguns casos ser itinerante e assim mais próxima e acessível à comunidade cigana.
O papel dos mediadores é fundamental no acesso aos serviços de saúde, na medida em que negoceiam soluções, explica comportamentos, esclarece dúvidas e ansiedades.
3. O rendimento social de inserção O Rendimento Social de Inserção revelou-se uma medida da maior importância face à situação de pobreza extrema em que se encontra parte da comunidade cigana27: a. Permitiu enfrentar situações de total incapacidade material para suprir as necessidades básicas, mas foi também factor importante para estabelecer algumas pontes entre o estado e a comunidade cigana. b. Permitiu estabelecer contratualizações com as famílias ciganas através das quais as crianças passam a frequentar a escola, as mulheres e as crianças a serem cobertas pela saúde materno-infantil, as mulheres e os homens a terem acesso à formação recorrente, a população adulta a frequentar acções de formação profissional, a comunidade no geral, a ser abrangida pela Acção Social no âmbito dos apoios ao exercício da cidadania e à organização da vida quotidiana.
Contudo, a esta medida estão também associadas queixas e críticas, das quais se podem destacar entre outras: a. os montantes são insuficientes, e tapam somente a precariedade; b. as prestações são indevidamente utilizadas na compra de mercadorias; c. há assistentes sociais que fazem avaliação errada da ponderação das vendas e os ciganos perdem o direito à prestação; d. as prestações são desmotivadoras do trabalho/indutoras do parasitismo; e. as prestações são formas de chantagear a comunidade cigana a comportar-se de acordo com os nossos objectivos; f. o RSI é uma medida importantíssima que corre o risco de perder a sua real dimensão pela forma como é aplicada aos ciganos. 27 Mas não são só os ciganos que recebem o RSI: representam cerca de 3,7% do total dos beneficiários da prestação de acordo com informação de Dezembro de 2008, do Instituto da Segurança Social
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A aplicação do RSI, requer equipas multidisciplinares que trabalhem com as famílias as suas competências, promovendo assim a sua integração. Requer parcerias e trabalho em rede, sem o qual não estarão reunidos os recursos necessários para atingir os objectivos desta medida.
Requer ainda a formação de técnicos quer para integrar as equipas da Segurança Social, quer para trabalhar nas autarquias ou com outras entidades com as quais é preciso estabelecer parcerias.
4. Os mediadores A figura do mediador é fundamental na resolução de conflitos, no estabelecimento de pontes entre duas comunidades que tardam em se entenderem, promovendo a aceitação das diferenças, explicando o diverso e o desconhecido. A sua função é muito importante na promoção da integração da comunidade cigana, em domínios fundamentais como a educação, a habitação, a saúde e o trabalho, ou outros, sendo recomendado pela União Europeia a necessidade de se formarem mediadores para trabalharem com a comunidade cigana.
Tem que haver mediadores que estabeleçam pontes, e que expliquem também que há direitos e deveres, e para tal, deverão: a. ter uma formação específica, b. ter alguma maturidade, c. ter um adequado “perfil humano”, d. conhecer os códigos culturais, e. saber trabalhar com a diversidade.
Neste sentido é fundamental o reconhecimento da função de mediador e atribuição do respectivo estatuto. Contudo persistem dúvidas quanto a alguns pontos importantes: a. Deve ser cigano, não deve ser cigano, ou é irrelevante? b. Que tipo de formação? Um curso intensivo, uma formação profissional, um curso médio, uma licenciatura? Ou, pelo contrário, não é preciso qualquer formação? c. Qual é o estatuto profissional? Qual é o vínculo profissional? Qual o nível remuneratório? d. Quem contrata? Tem lugar nos quadros de pessoal? e. Qual é a descrição funcional nas áreas onde trabalha? Na realidade, a não resposta a estas e/ou outras questões é responsável pelo insuficiente número de mediadores e pelo insuficiente trabalho de mediação.
O mediador no terreno precisa de ver esclarecida a sua função (não é moço de recados, nem é bombeiro), de ter garantias quanto ao estatuto e integração profissional, bem como assegurada remuneração compatível com a função desempenhada.
É necessário um programa nacional de mediação que englobe áreas como a educação, a saúde, a habitação, as relações com a administração central, que clarifique a sua formação e enquadre a sua actuação.
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Mas não chega formar, clarificar estatutos e níveis remuneratórios, é ainda indispensável que o seu trabalho seja integrado num projecto, que o responsabilize, mas que lhe dê também instrumentos de trabalho para o duplo trabalho a fazer: aceitação por parte dos não ciganos e aprendizagem dos ciganos.
Finalmente, é importante reter que o trabalho dos mediadores tem que ser desenvolvido dos dois lados: a mediação não pode ser feita só até meio da ponte. Grande parte do trabalho passará necessariamente por um trabalho de mútua aceitação.
5. A promoção das mulheres A igualdade de género na comunidade cigana é um problema a ser tratado com a comunidade cigana, trabalhada no seu contexto.
O único património que têm, afirma a comunidade cigana, é a cultura que transmitem, e as mulheres são a reserva dessa cultura: por isso têm que ser muito bem cuidadas e protegidas.
Contudo o isolamento das mulheres face aos saberes formais e não formais da comunidade não cigana, o abandono prematuro da escola, a dificuldade na frequência de formação profissional ou de acesso ao mercado de trabalho, tornam a mulher refém de dominações ancestrais, de conhecimentos e hábitos que não favorecem nem a sua plena participação na sociedade, nem a fruição dos seus direitos, nem a promoção do desenvolvimento dos seus filhos.
O trabalho junto das mulheres, tendo em vista sobretudo as suas competências pessoais, sociais, de gestão doméstica, é fundamental para promover o desenvolvimento e a integração da comunidade cigana. Contudo, este trabalho terá que ser feito sempre com a comunidade cigana.
É entretanto possível observar alterações junto das mulheres alfabetizadas no âmbito do RSI: aprenderam outras experiências de vida, e é possível constatar alterações de hábitos no espaço de 10 anos, por exemplo, o recurso à creche, ao jardim-escola ou a frequência regular de consultas de saúde materno infantil.
6. As lideranças e a participação É fundamental que a comunidade cigana escolha os seus interlocutores, quem quer que a represente, que fale em seu nome. É fundamental que identifique os seus líderes para que possam desempenhar um papel insubstituível na mobilização da respectiva comunidade. Mas líderes que não se imponham pela força de um poder resultando de actividades ilícitas.
É assim importante encontrar uma forma para promover a participação de cidadãos ciganos, recuperando laços de confiança, o que quer dizer também, quebrar os laços de desconfiança.
Há assim que se promover a capacidade de cidadania activa, formando as comunidades ciganas para o convívio sem paternalismos, nem condescendências. Não se trata de trazer os ciganos para aquilo que nós somos, mas trabalhar para formar ciganos para que tomem as
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suas decisões, para que se integrem e cumpram os compromissos que daí decorrem. É ainda necessário quebrar o medo que os ciganos têm de perder a sua identidade.
O associativismo cigano carece de ser reanimado, não só como factor mobilizador da comunidade, mas como representante e advogado dos interesses que congrega. É fundamental na construção de uma estratégia de intervenção, de um plano de acção que tem que ser integrado; é uma via essencial na capacitação da comunidade cigana para intervir.
Por outro lado, as associações são fundamentais, precisam de ser relançadas e precisam de líderes que as assumam e dinamizem. Para tal é fundamental formar líderes de associações. É necessário ouvir para incorporar o pensamento cigano nos planos de integração.
Neste âmbito é importante valorizar o papel da família como identidade específica da comunidade e eleger um representante das famílias, eleição que é fundamental para se poder trabalhar com as pessoas.
7. Intervenções específicas São necessárias medidas de políticas específicas, é importante que sejam dados passos, contrariando estereótipos negativos que acabam por se traduzir numa marginalização socioeconómica: é necessário que as políticas de habitação, de educação, de trabalho, de igualdade de género, se tornem em instrumentos que melhorem as condições de vida da comunidade cigana mas que simultaneamente sejam favoráveis a um melhor conhecimento intercultural. O combate à discriminação é um imperativo.
Para enfrentar a especificidade da situação, devem ser ponderadas alternativas de intervenção no sentido de equacionar as que melhor se adeqúem aos fins propostos. Neste sentido, referem-se algumas das alternativas enunciadas: a. Constituição como minoria étnica28, com estatuto jurídico próprio, com uma autoridade que os tutele, que receba as queixas de racismo, que as coloque em tribunal.
Esta opção, reconhecendo-a como categoria diferenciada permitiria uma intervenção preferencial, cativando postos de trabalho na administração pública, garantindo a participação nos órgãos políticos, e implicaria um plano de discriminação positiva.
b. Mas mais importante que um estatuto, é fazer cumprir a lei contra a discriminação racial e fazer cumprir os deveres inerentes aos direitos.
O combate à discriminação pode passar por medidas de discriminação positiva, incluindo eventualmente o recurso a quotas. c. Constituição de uma entidade pública que se ocupe da questão cigana, que procure a promoção da integração das duas partes, com uma visão dupla. Poderia ser, por exemplo, uma fundação, com equipas multidisciplinares.
d. Criação de uma comissão reguladora de todas as iniciativas, e que funcione com a garantia de rede para todos os que estão no terreno. 28 O estatuto de minoria étnica é considerado por alguns como uma moeda de duas faces: por um lado permite a discriminação positiva que pode induzir em melhorias, mas por outro pode significar uma guetização.
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e. Criação de uma comissão transitória, regulada, com um projecto temporal de acção, apresentando periodicamente contas do que faz f. As mudanças são de longo prazo, a intervenção é de longo prazo. Requer medidas de discriminação positiva, transitórias, mas suficientemente duradouras no tempo de forma a permitirem a estabilização das soluções e dos comportamentos, a realização do objectivo da integração. Tem que se correr o risco de experimentar, acompanhar e avaliar modelos: no mínimo uma década de experimentação e acompanhamento. Um centro comunitário pode representar a estratégia: 1. Que trabalhe a comunidade e que ajude a fazer pontes para fora, 2. Que seja centro de mediação comunitária, funcionando o tempo suficiente para provocar o empoderamento.
g. São necessárias ajudas continuadas que não se esgotem em ganhar projectos, e garantam uma permanente intervenção no terreno; h. As câmaras municipais são agentes privilegiados na promoção da integração pela proximidade da sua esfera de acção e têm ainda um papel fundamental na prevenção do racismo, nomeadamente pela formação (adequada) de técnicos (da Câmara, dos tribunais, dos centros de saúde, da escola, das esquadras). Mas qualquer que seja a fórmula política/administrativa que venha a ser adoptada, tem que consagrar formas de audição dos ciganos no que lhes diz respeito. Não se trata somente de uma questão intercultural. Não depende de boas vontades, mas de um adequado enquadramento institucional para o qual se requer uma visão de conjunto, perspectivada num quadro legislativo e político, que inclua eventualmente medidas de discriminação positiva, e que se alicerce num conjunto de acções articuladas que conjuguem estudo/investigação, com intervenção estratégica sustentada num trabalho em rede e em parceria.
É ainda importante ter presente que não é possível uma única resposta, que é fundamental agir sem criar privilégios, respeitando a diferença, tendo como inquestionável ponto de partida, o também ponto de chegada: os princípios constitucionais fundamentais da dignidade humana, da universalidade e da igualdade perante a lei.
IV. Conclusões
A Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura, através da Subcomissão de Igualdade de Oportunidades e Família ao longo de seis meses ouviu em audição um conjunto de entidades e personalidades representativas da comunidade cigana e com marcada intervenção nesta área, e realizou algumas visitas. Da informação recolhida, e da reflexão que dela foi sendo feita, foi efectuado o registo que se apresenta sob a forma do presente relatório. Pela complexidade dos assuntos tratados optou-se por equacionar ao longo dos capítulos e subcapítulos algumas linhas possíveis a ter em conta na intervenção sobre a situação, salvaguardando-se contudo o poder de iniciativa legislativa dos Grupos Parlamentares nos termos constitucionais e regimentais.
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II. Da caracterização da comunidade Portuguesa Cigana ........................................................... 13 III. Do relatório ............................................................................................................................ 27 A. Educação ............................................................................................................................. 28 1. A educação das meninas ciganas .................................................................................... 31 2. Os modelos educativos ................................................................................................... 32 3. As estratégias .................................................................................................................. 34 B. Habitação ............................................................................................................................ 36 1. O realojamento ............................................................................................................... 37 2. A integração espacial....................................................................................................... 39 C. Trabalho .............................................................................................................................. 41 1. A crise das feiras .............................................................................................................. 41 2. Outras possibilidades de trabalho ................................................................................... 42 3. A formação profissional .................................................................................................. 43 4. O acesso ao trabalho ....................................................................................................... 44 D. Algumas questões de natureza geral .................................................................................. 45 1. Algumas características da comunidade cigana .............................................................. 45 2. A discriminação ............................................................................................................... 46 3. Os preconceitos ............................................................................................................... 47 4. A pobreza ........................................................................................................................ 48 5. O direito e a justiça ......................................................................................................... 48 6. A comunicação social ...................................................................................................... 49 7. O papel das igrejas .......................................................................................................... 49 8. A intervenção no terreno. Algumas experiências de integração .................................... 49 E. Outras áreas estratégicas .................................................................................................... 50 II SÉRIE-C — NÚMERO 15
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1. O “recenseamento” ......................................................................................................... 50 2. A saúde ............................................................................................................................ 51 3. O rendimento social de inserção ..................................................................................... 52 4. Os mediadores ................................................................................................................ 53 5. A promoção das mulheres .............................................................................................. 54 6. As lideranças e a participação ......................................................................................... 54 7. Intervenções específicas ................................................................................................. 55 IV. Conclusões ............................................................................................................................. 56
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COMISSÃO DE ÉTICA, SOCIEDADE E CULTURA
Relatório elaborado pela Deputada Maria do Rosário Carneiro, do PS, referente à sua participação na reunião da UIP, por ocasião da 53.ª Sessão da Comissão sobre o Estatuto da Mulher, que decorreu em Nova Iorque, no dia 4 de Março de 2009
A UIP promoveu um evento parlamentar em articulação com a Divisão das Nações Unidas para a Promoção da Mulher, por ocasião da 53.ª Sessão da Comissão sobre o Estatuto da Mulher, tendo por tema de debate o Papel dos Parlamentos na promoção da igual partilha de responsabilidades entre mulheres e homens.
Como metodologia de trabalho para o desenvolvimento do tema proposto, apresentou quatro subtemas1:
a. A intersecção entre trabalho pago e não pago, b. A construção de uma rede protectora e sustentadora dos trabalhadores com responsabilidades familiares, c. A mudança entre as ideias feitas e os comportamentos, d. Homens e mulheres a política: Balanço entre as responsabilidades da vida pública e privada.
Cada um dos subtemas foi objecto de intervenções introdutórias ao debate e que foram da responsabilidade de personalidades especialmente convidadas para o efeito: no subtema a., Marylin Waring, da Nova Zelândia e Winnie Byaniyma, do Uganda, no subtema b., Naomi Cassiner, da OIT e Isabel Allende, do Chile, no subtema c., Andrew Lavack, dos USA e RoseMikantawa do Rwanda, e finalmente no subtema d., Anita Neville, Nicole Demers e Patricia Davidson, todas do Parlamento do Canadá.
À apresentação das exposições preparadas pelos conferencistas seguiu-se um debate generalizado entre os membros das delegações2 relatando experiências nacionais, expondo alternativas, colocando dúvidas e pedindo esclarecimentos, sendo muito evidente a disparidade de situações e de prioridades expostas.
Contudo, foi constatável, apesar da extraordinária diversidade, três pontos comuns: a persistente discriminação da mulher (em graus variáveis consoante as sociedades), o reconhecimento da conciliação como uma área de intervenção estratégica na promoção da igualdade, a imperativa partilha de responsabilidades entre mulheres e homens.
No âmbito do debate tive a oportunidade de intervir de acordo com os seguintes tópicos:
a. Articulação do trabalho pago e não pago e a importância de uma rede de apoio: a. Valor da guarda de crianças e respectivo impacto (doméstico e institucional) b. “Desvalor” da maternidade e o impacto no menor do valor da hora/trabalho da mulher c. Impactos deste desvalor: menos filhos ou nenhum filho, a “não guarda” de crianças d. A insustentabilidade do desenvolvimento
b. As licenças e a partilha a. O alargamento da licença de maternidade e os impactos no “desvalor” do trabalho das mulheres b. A Inclusão dos pais e a ideia de licenças condicionais (a recente alteração do Código do Trabalho) c. O papel das empresas 1 Anexo 1: Programa da reunião em anexo 2 Anexo 2: lista provisória dos participantes
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c. Os parlamentos: as “inovações” da Assembleia da Repõblica a. A aplicação da protecção da maternidade/paternidade aos Deputados e as consequentes adaptações regimentais e estatutárias b. A criação de um infantário para os filhos dos Deputados e funcionários da AR.
Assembleia da República, 10 de Março de 2009.
A Deputada do PS, Maria do Rosário Carneiro.
Nota: Os anexos encontram-se disponíveis para consulta nos serviços de apoio.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.