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Sábado, 20 de Novembro de 2010 II Série-D — Número 7
XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)
SUMÁRIO Delegações e Deputações da Assembleia da República: Relatório elaborado pelo Deputado Eduardo Cabrita, do PS, relativo à reunião da Comissão para a Promoção da Qualidade de Vida, dos Intercâmbios Humanos e da Cultura, da Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (APEM), que teve lugar em Bruxelas, no dia 30 de Setembro de 2010.
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DELEGAÇÕES E DEPUTAÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Relatório elaborado pelo Deputado Eduardo Cabrita, do PS, relativo à reunião da Comissão para a Promoção da Qualidade de Vida, dos Intercâmbios Humanos e da Cultura, da Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (APEM), que teve lugar em Bruxelas, no dia 30 de Setembro de 2010
No dia 30 de Setembro realizou-se em Bruxelas, no Parlamento Europeu, a segunda reunião da Comissão da Cultura sob a Presidência italiana da Assembleia Parlamentar Euro-Mediterrânica (APEM): A primeira realizou-se em Istambul em Maio último em conjunto com a Comissão Política.
A reunião foi organizada e presidida pelo Deputado Eduardo Cabrita, Presidente da Comissão, com a colaboração dos três vice-presidentes: o Deputado Miloud Chorfi (Argélia), o Deputado Raul I Romeva (PPE, Espanha) e o Deputado Walid El Khoury (Líbano) e ainda com o Secretariado da Divisão Euro-Med do Parlamento Europeu. Estiveram no encontro 32 membros da Comissão, dos quais sete deputados do Parlamento Europeu e 16 delegações nacionais, das quais oito de Parlamentos nacionais da União Europeia.
Na reunião participaram nove oradores, nomeadamente Catherine Teule, Vice-Presidente da Associação Europeia para os Direitos Humanos (AEDH), Bernd Hemingway, representante da Organização Internacional para a Migração, Katherine Stenou, Directora da UNESCO, Andrzej Pyrka, da Gallup Europa, Jean Boghossian, Presidente da Fundação Boghossian, Dominique Baudis (MPE), Presidente do Instituto do Mundo Árabe, Rachele Furfaro, Presidente da Fondazione Campania dei Festival, e Renato Quaglia, do projecto le città del mediterrâneo e, finalmente, Chrystelle Lucas, da DG AIDCO, Comissão Europeia.
Os trabalhos: Os trabalhos foram presididos pelo Deputado Eduardo Cabrita, Presidente da Comissão da Cultura, o qual começou por dar o acolhimento aos participantes e fazer a apresentação da ordem do dia, referindo a discussão dos três temas que adoptados em Junho, em Palermo:
— «Imigração e integração: diálogo entre as novas gerações para o desenvolvimento de uma cultura de paz» (Tópico 1); — «Diálogo entre culturas e religiões: para uma Carta Mediterrânea de Valores» (Tópico 2); — «Património Mediterrâneo: a preservação dos sítios arqueológicos» (Tópico 3).
Tema I — Imigração e integração: diálogo entre as novas gerações para o desenvolvimento de uma cultura de paz:
Catherine Teule, Vice-Presidente da Associação Europeia dos Direitos Humanos, iniciou a sua intervenção com alguns dados estatísticos: 3% da população mundial é migrante, sendo que na União Europeia a percentagem ronda os 6,2%, o dobro do nível registado a nível global. Contudo, estes valores levam a conclusões erradas, visto que grande parte da percentagem remete para migrantes europeus.
Consequentemente, estes valores não justificam o actual aumento da xenofobia na Europa. Precisamos de pessoas. Presentemente, a maioria dos migrantes tem educação superior e há um maior número de mulheres e de menores não acompanhados. Para os países de origem estes factos são motivos de preocupação e causam novos problemas. Será que a Europa está assim tão sobrecarregada com migrantes que a única solução é enviá-los de volta aos seus países? Ao fechar as fronteiras estamos a enclausurar as pessoas na própria União Europeia. O facto de ser difícil entrar na União Europeia não incentiva ninguém a sair novamente. Segundo a Declaração dos Direitos Humanos, todas as pessoas têm o direito de deixar o seu país de origem. De facto, se não permitirmos a sua entrada, estamos a proibir a sua saída.
Nas relações Euromed a União Europeia tem acordos e parcerias com os países vizinhos, o que impede as pessoas de chegarem às nossas fronteiras. Foi ministrada formação e concedido financiamento aos países parceiros para pôr termo aos fluxos migratórios. Temos de assegurar que essas negociações sejam levadas a cabo de forma transparente e que respeitem os direitos humanos, tanto por parte do norte como do sul. A Convenção das Nações Unidades sobre Migração poderá ser uma boa base comum para a criação de futuras
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políticas. Recomenda-se a todos os países do sul do Mediterrâneo que ainda não tenham assinado a Convenção de Genebra em matéria de migração, bem como aos países da União Europeia, que o façam, de modo a facilitar o respeito pelos trabalhadores migrantes e a melhorar o futuro das próximas gerações.
Bernd Hemingway, da Organização Internacional para as Migrações: «É importante frisar que a região mediterrânica é considerada a mais emblemática no que respeita a migração sul-norte no mundo. Na União Europeia temos um fluxo migratório misto que é composto por migrantes económicos e, mais recentemente, por um número maior de migrantes ambientais, requerentes de asilo, migrantes de tráfico para fins de exploração sexual e laboral, bem como de menores não acompanhados.
A particularidade da região mediterrânica é que não se trata apenas de emigrantes do sul do Mediterrâneo, mas também de emigrantes da Ásia e do Médio Oriente que entram na União Europeia através do norte de África. Existe um percurso migratório que é difícil e perigoso: deserto, mar e montanhas e, ainda, o factor demográfico. Estes perigos tornam a migração mais visível na comunicação social e alteram a percepção de que a maioria dos migrantes chega desta forma à Europa, quando na verdade a maior parte dos imigrantes ilegais chega inicialmente de forma legal à Europa e posteriormente permanecem no país de acolhimento após caducidade do visto.
Raül Romeva I Rueda (MPE), Comissão das Liberdades Cívicas do Parlamento Europeu: «Gostaria de destacar três questões, sendo que a questão mais importante é a dos valores. Há uma crise de valores na Europa. É necessário ter uma visão clara sobre o significado dos direitos fundamentais europeus e sobre como gerir os valores e direitos das pessoas que imigram para a Europa. A pergunta a colocar é: quando é que uma pessoa cessa de ser imigrante e se torna cidadã? A segunda questão importante é a da concessão do direito de exercício de uma actividade laboral. Esta questão é pertinente, sobretudo quando nos referimos a políticas europeias. Temos de nos focar nas causas de emigração e estabelecer cooperações regionais e inter-regionais, de forma a minimizar a necessidade sentida de deslocação.
Tema II — Diálogo entre culturas e religiões: para uma Carta Mediterrânea de Valores:
Katherine Stenou, Directora da Divisão de Políticas Culturais e Diálogo Intercultural da UNESCO: «Acima de tudo, é a cultura comum que nos une antes de as fronteiras nos separarem. O nosso objectivo é o de aproximar as pessoas, a alquimia, algo que não se consegue criar por decreto, tem de haver apoio voluntário.
Os artistas, escritores e filósofos são os verdadeiros legisladores. São eles que determinam a verdadeira natureza da sociedade. Presentemente, sou responsável por um programa financiado pela Espanha chamado Vademécum Intercultural. Estamos a promover a ideia da cidadania intercultural e da cidadania mediterrânica.
A iniciativa Vademécum Internacional tem por objectivo a divulgação escrita e electrónica, de forma directa e estimulante, de uma visão intercultural da história, aproximando o mundo árabo-muçulmano e o mundo ocidental. É de destacar a necessidade de se reconhecer a interacção intensa entre os povos da bacia do Mediterrâneo e as suas ligações com culturas mais distantes, nomeadamente na Índia, na Pérsia, na Península Árabe e em África.» Andrzej Pyrka, da Gallup Europa: «Falarei sobre uma sondagem realizada juntamente com a Fundação Anna Lindh que teve início recentemente. Antes das conclusões é importante realçar que o Relatório Anna Lindh constituiu um exercício de participação intercultural, que efectivamente aproximou peritos de referência, analistas, profissionais da sociedade civil e representantes políticos. Para além da primeira sondagem de opinião realizada com a Gallup Europa com 13 000 pessoas de 13 países euro-mediterrânicos, o processo de elaboração do relatório envolveu 40 peritos e analistas de referência e identificou boas práticas em todas as redes Anna Lindh, uma abordagem que é fundamental para a elaboração de conclusões significativas.
Uma das conclusões principais do Relatório Anna Lindh é que as pessoas da região euro-mediterrânica partilham um sentido de pertença estimulante. Há uma perspectiva partilhada e uma imagem comum que se associa ao «Mediterrâneo», por exemplo um determinado estilo de vida, um sentido profundo de hospitalidade e um vasto património cultural comum, sendo que, por coincidência, determinados valores, como, por exemplo, a «solidariedade familiar» e o «respeito por outras culturas» podem ser identificados como «valores que ligam» as sociedades dessa região.
O relatório confirma que, juntamente com a consciência de que houve um aumento de inter-relações humanas e sociais, existe uma «atitude mediterrânica», uma mentalidade comum que pode permitir que as
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pessoas da região euro-mediterrânica se sintam parte de um espaço partilhado com valores específicos que se distinguem dos valores de outras regiões, o que constituiu um elemento valioso para a estratégia da Fundação Anna Lindh. De facto, a existência de um sentimento «de casa», reforçado por determinados valores comuns às pessoas da região e, sobretudo, aos jovens, constitui um factor decisivo para o objectivo de aproximar as pessoas para uma interacção positiva em contextos culturais diferentes e que constitui um elemento prévio à criação de um projecto colectivo na região do Mediterrâneo.
O que se constata é que as pessoas da zona sul e este do Mediterrâneo tendem a sobrestimar a importância dos valores individualistas dos europeus, enquanto os europeus, por sua vez, subestimam a importância de «crenças religiosas» e «curiosidade» das pessoas do sul e este do Mediterrâneo. No que diz respeito a grupos sociais específicos que possam ter impacto sobre as tendências dos valores, as mulheres e os jovens merecem especial atenção. As mulheres têm grande curiosidade pelo «outro» e desempenham um papel importante na criação e transmissão dos mais importantes valores sociais, enquanto o potencial dos jovens como forças matrizes para toda a sociedade se manifesta através da combinação de um nível elevado de exposição a comunidades diferentes na região e do seu interesse para saber mais das mesmas.
Na região euro-mediterrânica a religião desempenha um papel importante nas relações e percepções entre pessoas de países distintos e um dos desafios principais é o de entender as diferentes abordagens sobre práticas e valores religiosos. A sondagem da Fundação Anna Lindh e da Gallup Europa revela a importância da religião em termos de valores na maioria dos países do sul do Mediterrâneo e, em comparação, a limitada consideração e relevância da religião nos valores dos europeus, cujas sociedades, de um modo geral, são mais seculares, embora a religião esteja presente na esfera pública de vários países europeus.» Jean Boghossian, Presidente da Fundação Boghossian: «Três gerações da minha família viveram em várias regiões do Mediterrâneo, significando que nós somos um exemplo real do que se tem falado nesta reunião.
A Fundação Boghossian foi criada em 1992 pelo meu pai, Robert Boghossian, o meu irmão, Albert Boghossian, e por mim. Ao criar esta Fundação, o nosso objectivo era o de partilhar a prosperidade que obtivemos através dos nossos negócios, bem como enfatizar as nossas raízes arménias ao estabelecer uma rede de solidariedade com o nosso povo ao longo da sua jornada e especialmente no século XX, durante e posteriormente ao genocídio. Desejamos, igualmente, deixar um património para futuras gerações e associar o nosso nome a um acto de generosidade virado para o futuro. O Centro de Formação para os Órfãos de Gumri é um projecto entre muitos outros projectos humanitários. Mais direccionado para questões ambientais é o projecto do Puskin Park (espaços verdes públicos). A Fundação Boghossian financiou o prémio da República da Arménia atribuído a jovens que se distinguem nos vários domínios das artes e das ciências. Expandimos a nossa intervenção também para outros projectos no Líbano, o nosso país de acolhimento.»
Tema III — Património mediterrâneo: a preservação dos sítios arqueológicos:
Dominique Baudis (MPE), Presidente do Instituto Mundo Árabe: «Foi na costa do Mediterrâneo que as três principais religiões monoteístas nasceram, assim como numerosos desenvolvimentos culturais e científicos.
Este facto prende-se com a geografia, este ambiente fechado, com a sua diversidade, o único lugar no mundo onde três continentes se juntam. Em torno do Mediterrâneo, nos três continentes, encontram-se 240 sítios arqueológicos, ou seja, mais do que 25% de todos os sítios arqueológicos classificados pela UNESCO.
No passado houve vários ataques ao nosso património que eu divido em três:
1 — Catástrofes naturais, que remontam ao início dos nossos tempos e perante as quais somos impotentes — Cairo, Istambul e muitas outras cidades foram destruídas; 2 — Outra causa antiga, os riscos relacionados com a guerra. Refiro-me, em particular, aos Balcãs e ao Médio Oriente e, mais recentemente, ao Museu de Beirute. A guerra sempre existiu, mas durante o século XX o poder de destruição tem sido exponencial comparado com as armas utilizadas em séculos anteriores; 3 — A pressão dos seres humanos, a expansão das urbanizações e a pressão imposta pelo turismo.»
Rachele Furfaro, Presidente da Fondazione Campania dei Festival: «Criada em 2007, em Nápoles, a nossa Fundação foi pioneira na realização de um festival de teatro internacional que temos vindo a realizar já há três
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anos. A ideia da realização de um festival foi original e inovadora. O objectivo era o de conceber um festival de elevada criatividade com dimensão internacional, recorrendo não só aos teatros napolitanos, mas também aos sítios arqueológicos como locais de representação. As reacções do público e as críticas foram positivas desde o início.» Renato Quaglia, Director do Projecto Le Città del Mediterrâneo: «O objectivo deste projecto é o de encorajar o diálogo, o comércio e a colaboração entre as grandes cidades da costa do norte e do sul do Mediterrâneo. O projecto tem a duração de dois anos, culminando em 2011 com dois eventos que se realizarão em Nápoles e na Sicília. Serão criados vários «distritos temporários» nos espaços públicos e no centro histórico de Nápoles que representam diferentes actividades nos domínios da cultura, artesanato e comércio, e que são geridos directamente pelas cidades mediterrânicas envolvidas.» Chrystelle Lucas, DG EUROPAID: «Organizamos workshops temáticos em conjunto com os representantes da sociedade civil que não beneficiam necessariamente do Património Euromed IV, mas que demonstraram interesse. Disponibilizamos também ferramentas como documentos de fácil acesso através da nossa página da Internet, práticas de gestão e recomendações, entre outras coisas e, além disso, existe uma secção de apoio técnico a nível regional e nacional, todas relacionadas com o património. Começámos a colaborar com a Tunísia e a Jordânia e tenho conhecimento de que a Argélia está igualmente interessada numa futura colaboração. Trabalhámos com o Conselho da Europa no sentido de actualizar um tesouro sob terminologia específica utilizada e contribuímos para a realização de traduções para árabe.»
Fim dos trabalhos: Foram designados como relatores:
Tópico 1: Albdelkrim Korichi (Argélia) e Patrick Le Hyaric (MPE) Tópico 2: Ionnis Kasoulides (MPE) Tópico 3: Kriton Arsenis (MPE) e Mario Galea (Malta)
O Deputado Eduardo Cabrita concluiu os trabalhos referindo que a estratégia da comissão é a de continuar com o debate das matérias discutidas durante a próxima reunião, que está prevista para o dia 31 de Janeiro 2011, em Lisboa, tanto a nível teórico como prático, de forma a permitir à comissão estar habilitada a elaborar uma recomendação sobre os temas em discussão para ser apresentada e adoptada na próxima sessão plenária da APEM.
A Técnica Superior Principal, Isabel Botelho Leal.
Anexos: (a) Lista de participantes Agenda de trabalhos Documentos distribuídos
(a) A documentação encontra-se disponível, para consulta, nos serviços de apoio.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.