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Sexta-feira, 20 de outubro de 2017 II Série-D — Número 2
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
S U M Á R I O
Delegações da Assembleia da República:
— Relatório da deslocação do Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas a Praga, na República Checa, que se realizou de 10 a 12 de setembro de 2017.
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DELEGAÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Relatório da deslocação do Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades
Portuguesas a Praga, na República Checa, que se realizou de 10 a 12 de setembro de 2017
A convite do seu homólogo da Câmara de Deputados do Parlamento checo, Senhor Karel Schwarzenbeg,
deslocou-se a Praga o Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas,
Deputado Sérgio Sousa Pinto, entre os dias 10 e 12 de setembro passado.
O Programa da visita foi o seguinte:
Domingo — 10 de Setembro de 2017:
Jantar de trabalho com o Presidente da Comissão dos Negócios Estrangeiros da Câmara dos Deputados da
República Checa, Karel Schwarzenberg;
Segunda-feira — 11 de Setembro de 2017
Almoço de trabalho com o Diretor da Fundação Forum 2000, Jakub Klepal; Embaixadora Manuela Franco;
Terça-feira — 12 de Setembro de 2017
Almoço de trabalho com o Presidente da Comissão dos Negócios Estrangeiros, Defesa e Segurança do
Senado da República Checa, František Bublan;
Visita ao Palácio Walldenstein;
Regresso a Lisboa.
I
Durante o jantar com o Senhor Schwarzenberg, foram avaliadas as circunstâncias atuais da política e
sociedade checa e portuguesa.
No mesmo sentido, foi analisado o momento político europeu a as posições mais relevantes de ambos os
países neste contexto, tendo sido revisitada a história europeia, da mesma forma que se perspetivaram as
tendências futuras, mormente no que concerne ao funcionamento das instituições europeias e da reforma do
funcionamento das suas instituições.
De notar que o Senhor Schawrzenberg, ao que anunciou, irá candidatar-se ao próximo ato eleitoral que
decorrerá no seu país em dezembro próximo, sendo cabeça de lista do seu partido1 pelo círculo eleitoral de
Praga.
II
No dia 11, pelas 12 horas, teve lugar o almoço de trabalho com o Senhor Jakub Klepal,2 no qual esteve
igualmente presente a Senhora Embaixadora de Portugal em Praga, Manuela Franco.
Para além da troca de pontos de vista acerca da atual situação política na Europa, o senhor Klapel aludiu ao
momento político interno da Chéquia, tendo destacado o aparente declínio dos dois principais partidos do
sistema (centro-direita e sociais-democratas), e o surgimento de populistas, sem qualquer projeto ideológico,
assente, apenas, na individualidade do respetivo líder,3 evidenciando um forte discurso populista e anti-
1 Candidata-se pelo Partido Top 09 (acrónimo de Tradice Odpovědnost Prosperita, i.e, Tradição, Responsabilidade, Prosperidade) que
agrupa liberais e conservadores; é seu antigo líder e presidente honorário. 2 Diretor-executivo da Fundação Forum 2000 e membro do Colégio de Diretores da Associação para a Democracia e Direitos Humanos,
da qual foi presidente entre 2009 e 2010. Jornalista, foi investigador na Universidade Autónoma do México, e bolseiro Fulbright no Instituto de Estudos Internacionais de Monterey, nos Estados Unidos da América. Formado pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Charles, em Praga, e Joseph M. Katz Graduate School of Business, da Universidade de Pittsburgh. Trabalhou, ainda, como investigador convidado em assuntos da América Latina no Centro de Investigação da associação de Relações Internacionais.
3 Trata-se de Andrej Babis, bilionário que é líder do partido ANO, curiosamente, ele mesmo, originário da Eslováquia.
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imigração, tendo manifestado forte receio de que este partido, nascido em 2011, possa vir a vencer as próximas
eleições.
Foi também evidente a enorme curiosidade acerca da situação política interna de Portugal, designadamente
pelo seu crescimento económico diminuição do desemprego, no pós-resgate. Tal interesse radica, sobretudo,
na discussão em curso na Chéquia relativamente a uma eventual adesão à moeda única, com a qual a maioria
da população não concorda, contrariamente às maiores empresas do país, que vêm no euro uma forma de
facilitar exportações e estabilizar câmbios.
Facto é que a economia checa tem vivido num sistema pragmaticamente dual,4 i.e, mantendo a sua moeda
(Coroa checa), a qual vai sofrendo sucessivas e cirúrgicas depreciações, de forma a manter a atratividade das
suas exportações e os níveis de inflação. Relembrou que na Eslováquia a adesão ao Euro trouxe uma melhoria
muito grande para a sua economia, tendo, por exemplo, catalisado a reforma do respetivo sistema fiscal. Até
pela comparação recíproca de situações — embora essencialmente agrícola, a Eslováquia encurtou em muito
o atraso que vinha tendo para os checos —, trata-se de uma matéria de viva discussão na sociedade checa.
Também os índices de corrupção, segundo explicou o nosso interlocutor, têm vindo a baixar na República
Checa, com consequências que ficaram muito aquém do que inicialmente se poderia conjeturar.
Outro tema de interesse para o Senhor Klepal foi o de tentar entender se a particular solução governativa
portuguesa teria alguma margem de aplicabilidade no seu país, mormente enquanto ferramenta de combate ao
populismo grassante na sociedade local. A aversão à experiência comunista da era soviética, muito viva nesta
zona da Europa, segundo afirmou, seria motivo suficiente para inviabilizar qualquer tentativa de trazer o Partido
Comunista para semelhante experiência.
Ao nível do relacionamento externo, referiu que a diplomacia chinesa tem vindo a manifestar interesse no
aprofundamento de relações, existindo plena reciprocidade para tal. Porém e logo após ter sido oficialmente
recebido o Presidente chinês em Praga, foi igualmente recebido o Dalai Lama, ao que referiu, contra vontade
da diplomacia chinesa, visita que seria organizada pelo Fórum 2000, a que preside o Senhor Klepal.
Instado a explicar o porquê de existirem tão poucos (e)migrantes no país, explicou o Senhor Klepal que a
maior comunidade é vietnamita, já na 3.ª geração, cujos antepassados afluíam à antiga Checoslováquia para
frequentar a Universidade e fugir à guerra. No caso dos migrantes mais recentes, explicou que em 2015 a
matéria foi alvo de grave aproveitamento político, baseado na massificação de informações e notícias
adulteradas pelos media, no sentido de dar a entender a iminência de uma autêntica “invasão” estrangeira, visão
que agora se torna mais difícil de reverter.
III
Findo este encontro, seguiu-se uma curta reunião com a Senhora Embaixadora Manuela Franco, importando,
das suas palavras, sumariar o seguinte:
i. Existe espaço para que o leste europeu — e a República Checa em particular —, possa vir a ter um
peso diferente, para maior, no rol de prioridades da política externa nacional;5
ii. A Embaixada, correspondendo até ao enorme interesse que os checos assumem ter sobre Portugal,6
está disponível para incrementar tais contactos;
iii. Impõe-se aprofundar a compreensão do modo como as relações bilaterais podem repercutir-se no
contexto multilateral. E relembrou que, em setembro último, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto
Santos Silva, efetuou a alocução de encerramento do Seminário Diplomático, em Praga, impulso ao qual
deveria dar-se conveniente seguimento;
iv. Seria extraordinariamente relevante a criação de um grupo parlamentar de amizade;
4 De notar que os sistemas de faturação comercial emitidos no país apresentam o valor transacionado, simultaneamente, em Coroas e
em Euros. 5 Tal particularidade havia igualmente sido evidenciada por vários Embaixadores em postos no Leste europeu — relembramo-nos do
caso sérvio e búlgaro —, onde a procura da língua e cultura portuguesa é razoavelmente grande e tende a crescer. 6 O Centro português em Praga, gerido pelo Instituto Camões, está instalado na própria Universidade local que se ofereceu para acolhê-
lo.
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v. Fez notar que somente em 2015 foi aprovada a primeira lei institutiva do funcionalismo público,
funcionando até então um sistema de “comissões de serviço”;
vi. A Diáspora checa (aproximadamente de 3 milhões de pessoas) é esmagadoramente posterior a 1946,
resultado do Acordo de Potsdam;
vii. Corroborou que a ambiência económica é muito positiva, até pela ausência de corrupção significativa.
IV
No dia 12, teve lugar, no Senado checo, um almoço formal no qual o Senhor Presidente da Comissão foi
recebido pelo Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Defesa e Segurança daquele órgão, o Senhor
Frantisek Bublan.7
Este almoço contou, ainda, com a participação da Senhora Embaixadora Manuela Franco.
Receção no Senado, com Porto de Honra
Três pontos concentraram o interesse inicial do Senhor Bublan, relativamente aos quais quis avaliar o ponto
de vista do seu interlocutor:
— As relações União Europeia/Turquia;
— O problema das migrações;
— A escalada diplomática e a crispação do relacionamento com a Coreia do Norte (o entendimento
manifestado é o de que as posições do regime norte-coreano pretendem, essencialmente, garantir a
subsistência do regime na esfera internacional).
7 Sem filiação partidária, o Senhor Bublan foi eleito para o Senado em 2012 pelo Distrito Eleitoral de Trebic, tendo anteriormente sido
eleito para a Câmara de Deputados e exercido na mesma o cargo de Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa e Segurança. Frequentou na Universidade de Brno o curso de Agronomia e licenciou-se mais tarde em Teologia pela Universidade de Charles (Praga). Foi Ministro do Interior entre 2004 e 2006, e um dos signatários da Carta de 77 (de 1977) que antecedeu a denominada “Revolução de Veludo”, de 1989.
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i. Na opinião do Presidente Sousa Pinto, sendo a Turquia parte integrante da Europa, deve a União
Europeia saber promover políticas que evitem o isolamento daquele país.
ii. Acerca da questão coreana, foi frisado que Portugal alinha com os seus aliado tradicional, os estados
Unidos, e com as posições da União. Deve ser privilegiada uma solução diplomática, salvo se o Ocidente e
a China estiverem dispostos a sacrificar a cidade de Seul. Finalmente, relembrou a aprovação neste mesmo
dia de mais um pacote de sanções, durante a reunião do Conselho de Segurança da ONU.
iii. A questão das migrações deve ser vista no contexto da problemática do futuro da Europa. Foi
relembrado, por exemplo, o êxito na integração da comunidade ucraniana em Portugal. Também, a ideia de
que os países do centro da Europa devem partilhar mais as suas ideias e pontos de vista com países que,
como Portugal, estão geograficamente mais distantes, pois, apesar disso, constata serem imensas as
afinidades e interesses comuns, pontuados até pelas suas dimensões territoriais, população e
posicionamento no campo dos valores sociais e políticos.
Sobre as temáticas em apreço, referiu o Senhor Bublan que:
i. A Coreia do Norte acabará, a breve trecho, por trilhar oc caminho já percorrido pela Vietname e pela
China, onde a existência de regimes comunistas não obstaculizou o reforço da paz e do fomento das relações
comerciais internacionais.
Aspeto da mesa de trabalho e almoço no Palácio do Senado
ii. É difícil construir uma Europa consensual, devendo-se saber aceitar a impossibilidade de obtenção de
consensos sobre todas as matérias em discussão. Diferente, é o projeto europeu assentar,
fundamentalmente, na vontade de 2 ou 3 Estados que decidem como se as medidas que impõem fossem do
interesse de todos os europeus.
iii. No que às migrações respeita, relembrou que a questão foi fortemente manipulada há poucos anos
com intuitos político-populistas, através da ligação entre muçulmanos e terrorismo. Contudo, como foi frisado,
nunca o país foi vítima de qualquer atentado terrorista ou prenúncio do mesmo. Aliás, sendo essencialmente
ateia, a sociedade checa, quando confrontada com migrantes muçulmanos, tem sido pródiga em invocar o
seu passado cristão.
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Paralelamente, quis saber o Presidente Sousa Pinto como vêm os checos o relacionamento com a Rússia.
Respondeu o Senhor Bublan não existir convergência entre observadores políticos, Embora os checos se
mostrem muito avessos ao passado político recente, não desdenham o aprofundamento de relações
económicas e comerciais com a Rússia, cuja percentagem representa, apenas, 4% do bolo total. Por outro lado,
sublinhou que a Alemanha é o maior parceiro económico-comercial da República Checa.
A visita terminou com uma visita guiada ao Palácio Walldenstein, onde funciona a Sala de Sessões do
Parlamento checo, o qual conta, presentemente, com 81 Senadores.
Aspeto da Sala do Senado, no Palácio Walldenstein
Refere-se, em conclusão, que:
a) Apesar da sua história recente, a República Checa é uma sociedade moderna e liberal, dotada de forte
sentido de identidade nacional, possuindo uma maturidade política e institucional bem evidente, zelosa dos
valores essenciais do Estado de Direito e do exercício das liberdades fundamentais, cívicas e políticas.
b) Existe algum preconceito contra a imigração estrangeira, essencialmente de origem muçulmana, ao
que parece, fruto de uma certa manipulação mediática fomentada e alimentada por alguns partidos políticos.
Facto é que os checos se mostram extremamente reagentes à introdução de quotas obrigatórias para
migrantes, por alegadamente considerarem que o metido impositivo utilizado pelas instituições europeias
replica o modus operandi soviético.
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c) Existe um evidente espaço de aprofundamento do relacionamento bilateral no imediato, que pode ser
potenciado por via do interesse pela cultura e língua portuguesa, existindo para tal ampla disponibilidade
intermediativa por parte da Embaixada portuguesa.
d) Deve ser estudada a possibilidade de criação de um Grupo Parlamentar de Amizade, por sinal,
bastante desejado pelo Parlamento checo.
e) A finalizar, é de inteira justiça reconhecer (e agradecer) o papel central desempenhado pela Senhora
Embaixadora Manuela Franco, na preparação e viabilização desta visita, cuja postura em, muito dignifica a
Diplomacia de Portugal.
Palácio de S. Bento, 25 de setembro de 2017.
O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.