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Sexta-feira, 18 de janeiro de 2019 II Série-D — Número 10
XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)
S U M Á R I O
Delegações da Assembleia da República:
Relatório da participação da Comissão Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias na Reunião Interparlamentar organizada pela Comissão das Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos (LIBE) - aspetos dos direitos fundamentais na integração e no combate à hostilidade em relação aos ciganos, que decorreu no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no dia 18 de outubro de 2018.
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DELEGAÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Relatório da participação da Comissão Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
na Reunião Interparlamentar organizada pela Comissão das Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos
Internos (LIBE)
Aspetos dos direitos fundamentais na integração e no combate à hostilidade em relação aos
ciganos
(Parlamento Europeu, Bruxelas, no dia 18 de outubro de 2018)
Composição da Delegação
A Delegação da Assembleia da República foi constituída pela Sr.ª Deputada Catarina Marcelino (PS).
A assessoria foi prestada pela Representante Permanente da Assembleia da República junto da União
Europeia, Cristina Neves Correia.
Síntese
A reunião teve como objetivo a promoção da troca de pontos de vista entre parlamentares europeus e
nacionais sobre os obstáculos à inclusão dos ciganos e as possibilidades de os ultrapassar, apesar dos
programas estratégicos nacionais. Do debate, que ocorreu com a participação de representantes do Conselho
da Europa, da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), do Gabinete do Alto Comissário
das Nações Unidas para os Direitos Humanos, bem como de representantes de diversas ONG, foi possível
perceber que, apesar do longo caminho já percorrido no sentido da inclusão do povo cigano, muito há ainda a
fazer.
➢ Sessão de Abertura
Birgit Sippel (S&D) deu as boas-vindas aos participantes, em nome do Presidente da Comissão LIBE.
Recordou que o tema da integração dos ciganos tem sido uma preocupação, quer da Comissão, quer da
totalidade do Parlamento Europeu (PE), referindo-se, em especial, à Resolução do Parlamento Europeu, de 25
de outubro de 2017, sobre o aspeto dos direitos fundamentais na integração dos ciganos na UE: combater a
hostilidade em relação aos ciganos [2017/2038(INI)]1.
➢ Alocuções iniciais
A primeira intervenção coube à Vice-Presidente do PE, Lívia Járóka (PPE), que começou por referir que
o tema da integração dos ciganos e o combate à pobreza tem vindo a ser objeto de debate na UE e, em
especial, no PE, desde 2010. Ainda assim, dos 30 milhões de pobres na Europa, 8 milhões são ciganos.
Neste contexto, apesar das estratégias de integração dos ciganos e contra a pobreza, quer da União
Europeia (UE), quer dos Estados-Membros (EM) terem vindo a cumprir a sua função de redução da pobreza
extrema, o envolvimento dos ciganos ainda fica abaixo do desejável. Prosseguiu, sublinhando que nada
mudará se não se mudar a educação e partilhou a sua própria experiência, enquanto membro da etnia
cigana, referindo que os seus pais a haviam feito perceber que a batalha pela melhoria das condições de
vida dos ciganos passava pelo sucesso escolar, tendo o seu pai lutado para que a sua educação fosse
integrada e não segregada. No que concerne ao Quadro Financeiro Plurianual (QFP) ainda em vigor,
partilhou que, após uma análise atenta dos fundos estruturais, resultou que existe ainda dinheiro que pode
ser usado em programas de integração de ciganos, nomeadamente no âmbito dos programas de luta contra
a pobreza extrema. Da mesma forma, também o novo QFP terá de prever fundos com esse objetivo.
Terminou, sublinhando a necessidade de igualdade de acesso à saúde, à educação e ao emprego, na
1 Disponível em. http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P8-TA-2017-0413+0+DOC+XML+V0//PT
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medida em que todos os indicadores apresentam resultados piores para os ciganos, quando comparados
com o resto da população. Neste contexto, solicitou aos parlamentares nacionais que, tendo conhecimento
das dificuldades nacionais, possam apresentar propostas para a nova estratégia de integração dos ciganos
para o período 2021-2027.
Seguiu-se uma alocução de Doris Wolfslehner, Chefe do Departamento da Chancelaria Federal na
Representação Permanente austríaca junto da UE que, em síntese, reafirmou o compromisso da Presidência
austríaca na luta contra a discriminação, a segregação e a hostilidade, no âmbito de uma estratégia de
cooperação transnacional. Referiu, ainda, que a 27 de novembro haveria lugar a uma conferência, cujo tema
incidira sobre a hostilidade contra os ciganos.
Tiina Astola, Diretora-Geral de Justiça e Consumidores, referiu que a reunião em curso ocorria na altura
certa, na medida em que a Comissão Europeia se encontrava a terminar a avaliação da estratégia de
integração dos ciganos, cujos resultados eram esperados para novembro. A oradora partilhou alguns
resultados preliminares, que levarão ao estabelecimento de objetivos futuros, nomeadamente: a eleição das
questões da hostilidade e da integração socioeconómica como objetivos mensuráveis e acompanhamento
transparente; a escolha da área da educação como objetivo específico, concentrando-se em subgrupos como
mulheres, crianças, nacionais de países terceiros e nómadas; a redução das desigualdades no acesso ao
alojamento e à saúde.
➢ Sessão I – A inclusão dos ciganos e os direitos fundamentais
Esta sessão foi presidida por Judith Sargentini (Grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia), Membro do
Parlamento Europeu (MEP) e teve início com uma alocução da MEP Soraya Post (S&D), relatora do PE do
Relatório de 2017 sobre o aspeto dos direitos fundamentais da integração dos ciganos na UE: combater a
hostilidade contra os ciganos. A oradora, de etnia cigana, começou por sublinhar que os ciganos são sempre
encarados como inferiores e incapazes de se comportarem como bons cidadãos, sendo os bodes expiatórios
de tudo o que de mal acontece. Recordou, ainda, que os ciganos são vítimas de esterilização forçada, força
policial excessiva, segregação na habitação e nas escolas, não tendo, em muitos casos, acesso a água
canalizada, eletricidade ou transportes. 63% da população cigana entre os 18 e os 29 anos não têm educação
nem emprego, uma taxa muito superior aos 12% da média europeia. Uma em cada três casas ciganas não
tem água canalizada, uma em cada cinco não tem vidros ou tem tetos não impermeáveis. Acresce que, com
frequência, é afirmado que os ciganos têm culpa da sua própria situação, não querendo integrar-se, nem
trabalhar, como se alguém escolhesse ser pobre, tendo outras opções. Na realidade, a oradora referiu que,
quando se é permanentemente encarado como um ser de segunda classe, se acaba por interiorizar esse
conceito, o que aconteceu com ela durante 55 anos embora, agora, como membro do PE se sentisse
respeitada. Sublinhou, no entanto, que a integração constitui o termo de um longo e árduo caminho contra a
exclusão, a expulsão, a retirada de filhos, as esterilizações forçadas, as perseguições e a desumanização.
Na opinião da oradora a plena integração terá de passar por uma consciencialização pública da situação,
comissões de reconciliação e educação, numa postura de abertura, tolerância e respeito por todos os
cidadãos, independentemente das suas etnias.
Ioannis Dimitrakopoulos, Chefe do Departamento para a Igualdade e Direitos dos Cidadãos, da Agência
dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA) abordou a questão da hostilidade contra os ciganos
como uma barreira à sua integração, partilhando os dados do relatório da agência publicado em abril de
2018.2 O orador referiu que, apesar das conclusões do Conselho de junho de 20113 sobre as estratégias
para integração dos ciganos, dos dados coligidos para o relatório de abril resulta que a comunidade cigana
continua vulnerável, sobretudo devido às más condições de vida e à pobreza. Os ciganos continuam a não
ser tratados de forma igual, sendo vítimas de assédio e de crimes motivados por ódio, o que constituiu um
obstáculo a qualquer medida de integração. De acordo com o orador, as prioridades consistem em acabar
com a pobreza e dar acesso à educação. No que concerne à hostilidade, 4% dos ciganos inquiridos já
sentiram violência motivada pelo ódio, sendo que apenas 1/3 destas situações foi comunicada às autoridades
policiais e judiciais. O preconceito persistente contra os ciganos impede, igualmente, um pleno acesso ao
2 http://fra.europa.eu/en/publication/2018/roma-inclusion 3 http://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST-23-2011-INIT/pt/pdf
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emprego, à educação e ao alojamento. A este propósito, o orador referiu a situação do acesso a água
canalizada que, para os ciganos residentes na Roménia, é similar à dos habitantes do Butão. Neste contexto,
deixou um repto aos parlamentares presentes, no sentido de um compromisso mais forte, em conjunto com
os seus governos, tomarem medidas concretas para melhoria tangível das condições de vida dos ciganos,
nomeadamente através do aproveitamento dos fundos do atual e do novo QFP.
Jonathan Mack, representante do Conselho Central dos Ciganos Alemães (sinti e romani) partilhou uma
perspetiva da sociedade civil sobre a inclusão dos ciganos. O orador começou por agradecer a Resolução
do Parlamento Europeu. Referiu a importância do reconhecimento da existência de ódio e hostilidade,
comparável ao antissemitismo, que se traduz em manifestações de racismo quotidiano no acesso ao
alojamento, à escola e à saúde. Acresce que, frequentemente, as vítimas deste racismo estrutural são, elas
próprias, consideradas culpadas por isso. Continuou, referindo que a responsabilidade da luta contra a
discriminação não é das minorias, mas da restante sociedade e instituições e que, embora no debate político
se note já alguma diferença, na sociedade continua a verificar-se uma rejeição à comunidade cigana,
exemplificando com um (então) recente homicídio de um cigano búlgaro em Berlim. Expressou, ainda, a sua
preocupação quanto ao facto de, em Itália, se pretender registar os ciganos, o que viola as leis fundamentais
e terá, como consequência, dificultar a permanência dos ciganos que não tenham passaporte italiano. Deu
ainda o exemplo do Presidente da Câmara de Duisburg, que se referiu aos ciganos como sendo pessoas
que sujam as ruas efazem assaltos. Aludiu, ainda, à importância do reconhecimento do genocídio dos
ciganos pelos Nazis que, durante o holocausto, exterminaram mais de 500.000 ciganos. Terminou,
reconhecendo a existência de sinais positivos, como a criação de comissões de verdade e reconciliação e o
importante trabalho do Conselho da Europa, sublinhando que a hostilidade contra os ciganos é um ataque à
democracia europeia.
Seguiu-se uma intervenção do Deputado sueco Thomas Hammarberg, que iniciou a sua intervenção
reiterando as ideias dos anteriores oradores, sobre o longo caminho a trilhar para uma plena integração dos
ciganos, devendo o primeiro passo consistir no reconhecimento da existência de um problema,
nomeadamente através do esclarecimento da história, o que tem um enorme impacto positivo no
relacionamento e na confiança. Enquanto antigo comissário para os direitos humanos do Conselho da
Europa, o orador teve oportunidade de contactar com a realidade difícil dos ciganos nos vários países.
Partilhou, ainda, a experiência sueca, muito positiva, onde foi constituída uma comissão para a integração,
composta por nove elementos (6 ciganos e 3 peritos de vários setores). A comissão analisa as questões
históricas, bem como o presente e o futuro, produzindo relatórios com estratégias a adotar. São também
abordadas questões concretas, como o facto de a polícia pretender registar ciganos apenas com base na
sua etnia, o que acabou por ser legalmente impedido, ou o facto de a polícia e os tribunais não relevarem os
crimes contra ciganos. Foram ainda reiteradas as seguintes ideias já abordadas em anteriores intervenções:
fomentar a integração através da educação e do emprego sendo, para isso, necessária formação para
entidades públicas e privadas sobre a cultura cigana; assegurar uma plena cidadania aos ciganos,
terminando com a situação escandalosa de existirem apátridas na UE; assegurar a representação política
dos ciganos; e aproveitar as competências existentes na comunidade cigana. Terminou a sua intervenção,
sublinhando que, para terem sucesso, todas as ações deverão ser decididas em conjunto com os ciganos.
Seguiu-se uma fase de debate com parlamentares nacionais e do PE, durante o qual foram partilhadas
experiências de integração de ciganos, providenciando programas de acesso a alojamento, educação,
emprego, cidadania e envolvimento na vida pública (Momcilo Martinovic, do Montenegro; István Bajkai,
da Hungria; e Pedrag Bakovic, da Eslovénia;). Alguns intervenientes centraram-se na situação difícil dos
ciganos, nomeadamente ao nível da pobreza e das condições de saúde. (Veljko Kajtazi, da Croácia). Maria
Theleriti, da Grécia salientou ainda o facto de o medo dos ciganos estar a aumentar, no que foi secundada
pela MEP Julie Ward (S&D). Eva Matyasova, da R. Checa, aludiu às barreiras linguísticas, que constituem
mais um elemento de segregação dos ciganos. Os MEPs R.Franz e J. Sargentini ( ambos do Grupo dos
Verdes/Aliança Livre Europeia),referiram o facto de o governo alemão ter decidido não ser necessária uma
estratégia nacional de integração dos ciganos.
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A subscritora do presente relatório, Deputada Catarina Marcelino,participou igualmente no debate,
começando por referir que Portugal está muito empenhado na integração das comunidades ciganas,
compostas por cerca de 50.000 pessoas. Continuou, referindo que, embora a história da comunidade cigana
da Península Ibérica seja um diferente da das suas congéneres da restante Europa, não deixa de ser uma
história de exclusão e de discriminação. Referiu que a estratégia nacional de integração de ciganos havia
sido recentemente revista, sendo agora mais ambiciosa e elegendo a educação como a chave para a
integração, na medida em que mais de metade da comunidade cigana é constituída por crianças e jovens.
Neste contexto, uma aposta séria na educação levará a uma integração nas próximas duas décadas. Nos
últimos 20 anos duplicou o número de crianças de etnia cigana nas escolas, embora subsista alguma
segregação indireta. No que concerne ao ensino básico, a grande maioria das crianças ciganas encontra-se
já integrada, ao contrário do que acontece no ensino secundário. Existe, ainda, um programa especial para
o ensino superior (Programa OPRE). No que concerne ao emprego, é necessário o incentivo ao emprego
apoiado para se gerar confiança. A oradora sublinhou ainda a necessidade de os fundos comunitários
poderem ser utilizados para construção de casas, única forma de permitir que o Estado e os municípios
possam resolver a questão do acesso à habitação por parte das comunidades ciganas. A mudança passa,
forçosamente, pela participação das pessoas ciganas e o incentivo ao seu associativismo. Em Portugal existe
um programa, com o Conselho da Europa, uma academia de política, onde as pessoas ciganas podem
participar ativamente na comunidade e na decisão política sobre as suas vidas.
➢ Sessão II – Aumentar as estratégias ciganas e o combate à hostilidade contra os ciganos
Lina Vosyliute, investigadora do Centro Europeu para Estudos Políticos, partilhou com a audiência os
resultados preliminares do estudo4 levado a cabo sobre os efeitos das estratégias de integração das
comunidades ciganas que, na sua opinião, são mínimos, sobretudo no que concerne ao combate à
hostilidade. Na opinião da oradora deverão ser constituídas comissões de verdade e reconciliação,
reconhecendo-se os crimes cometidos contra a população de etnia cigana e delineando uma estratégia de
futuro, em condições de igualdade, não discriminação e cumprimento dos princípios do Estado de Direito.
Seguiu-se uma alocução de Claude Cahn, do Gabinete do Alto Comissário das Nações Unidas para os
Direitos Humanos que, a partir das “lições aprendidas” na implementação da atual estratégia de integração
dos ciganos, referiu os fatores a ter em conta para o enquadramento pós-2020. O orador mencionou que
existem progressos tangíveis em alguns Estados-Membros, nomeadamente no que concerne ao ensino
infantil e primário. No entanto, noutros casos o movimento é inverso, nomeadamente no que concerne à
segregação. Considerou, ainda, que a estratégia para depois de 2020 é menos ambiciosa do que a atual,
esperando que o tema seja objeto de debate nos meses subsequentes. Expressou o seu acordo à
constituição de comissões de verdade e de reconciliação, devendo os países pagar pela violação dos direitos
cometidos e citando, a este propósito, a esterilização forçada dos ciganos, levada a cabo na antiga
Checoslováquia, desde 1957. Preconizou a existência de mecanismos para combater os estereótipos,
citando, como bons exemplos, a Noruega e a Suécia. Alertou para a situação dos apátridas, forçados a
deslocarem-se para países com os quais não têm qualquer ligação.
Jelena Jovanovic, da ONG Roma ERGO network5 partilhou com a assistência a atividade da sua
organização, que está empenhada em combater a hostilidade contra os ciganos. Referiu-se, em particular,
ao projeto em curso, que engloba os seis países dos Balcãs Ocidentais e na Turquia, onde é trocada
informação entre 90 organizações e peritos da sociedade civil e Estados-Membros. Salientou a importância
do trabalho em rede para consciencializar a sociedade civil, sensibilizando-a para o fenómeno do racismo,
xenofobia e hostilidade contra os ciganos, pois tem de conhecer e perceber o fenómeno para o poder
combater. Sublinhou, em particular, a indiferença e incompreensão das autoridades, bem como da restante
sociedade, quanto aos crimes contra ciganos. Terminou, recomendando que o próximo QFP pós 2020 possa
prever o combate à hostilidade como prioridade horizontal, nomeadamente com a constituição de comissões
de verdade e reconciliação, o que só poderá acontecer com o empenho dos Estados-Membros. Estes devem,
4 Embora, no decurso da reunião, se previsse a conclusão do estudo para novembro, à data de conclusão do presente relatório o mesmo não se encontra, ainda, disponível no sítio co CEPS: https://www.ceps.eu/ 5 http://ergonetwork.org/?gclid=EAIaIQobChMIjcGmyeyI3wIVVuJ3Ch0-FgJLEAAYASAAEgIlAvD_BwE
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ainda, priorizar o combate à hostilidade contra os ciganos, quer nos documentos, quer nas leis e nos planos
nacionais de combate ao racismo. Tal implica a existência de fundos financeiros, sem os quais o combate
não sairá do papel.
Seguiu-se uma alocução do Senador romeno Cãtãlin-Dumitriu Toma, que reconheceu que a atual
estratégia para integração dos ciganos não tem produzido os resultados esperados. Neste contexto, a
Roménia encontra-se a repensar as estratégias, numa abordagem positiva e com a participação das
comunidades ciganas na tomada de decisão. Referiu a absoluta necessidade de eliminação da discriminação
social e defendeu a existência de uma campanha para a proteção das mães e das crianças ciganas, como
parte integrante de uma estratégia europeia. convidou os colegas a uma reflexão conjunta no semestre
subsequente, sob a égide da Presidência romena do Conselho da UE.
O Deputado croata Veljko Kajtazi, de etnia cigana, começou por referir que cumpria, atualmente, o seu
terceiro mandato como deputado. No que concerne às atuais estratégias nacionais para a inclusão cigana,
considerou que falta uma efetiva aplicação, bem como responsabilização institucional, mercê da dificuldade
de transposição de documentos estratégicos para o terreno, objetivo que tenta prosseguir no seu mandato.
A Croácia tem, de momento, um programa operacional para implementar o programa estratégico. Até há
pouco tempo, a Croácia não tinha estatística sobre educação e saúde dos ciganos, o que dificulta o
estabelecimento de metas. Com frequência, os programas são executados por ONG, sem qualquer
participação dos ciganos na definição dos seus objetivos. Acresce, que muitos deles são projetos de
integração, por exemplo no mercado de trabalho, mas sem reconhecimento formal de competências, ou seja,
de impacto mitigado. Faltam, igualmente, projetos de infraestruturas. Os ciganos croatas vivem isolados, pelo
que a integração se torna difícil. É necessário levá-los para a comunidade. Até agora, os programas não têm
sido um sucesso, em parte por falta de responsabilização pelo seu incumprimento. Tem de haver
cronogramas obrigatórios com penalizações por incumprimento.
Seguiu-se uma fase de debate, durante a qual foram reiteradas algumas das ideias-chave partilhadas no
decurso da reunião.
Jana Pastuchova, da R. Checa, lamentou que o seu país tenha sido referido no âmbito de exemplos
negativos. No seu entender, tal deve-se ao facto de os meios de comunicação social nunca divulgarem os
bons exemplos, como os programas de emprego para ciganos. O Deputado húngaro Imre Laslo mencionou
a necessidade da nova estratégia incluir uma vertente de higiene e educação para a saúde, como forma de
inverter a atual situação, em que a população cigana tem uma expetativa de vida em 17 anos inferior à média
europeia. Maria Thalarettti, do Parlamento helénico, referiu-se à inclusão social, à necessidade de
elaboração da cartografia dos campos para preparação de políticas de alojamento; ao aceso à educação e
à saúde. Referiu que a Grécia tem programas de educação para as crianças e de intermediação das famílias
para que estas possam comunicar com as autoridades. Quanto ao emprego, o comércio cigano, que é ilegal,
deveria passar a ser legal, nomeadamente através da organização de feiras com as autoridades locais.
Misrad Muric, do Parlamento do Montenegro referiu que, numa ação de cooperação com ONG e Governo
para melhorar a inclusão dos ciganos, foi editado um dicionário de línguas ciganas.
A MEP Cécile Kashetu Kyenge (S&D) aludiu ao desmantelamento de um campo de ciganos perto de
Roma, apesar da Comissão Europeia recomendar que se evitem os despejos forçados. Lamentou que,
perante este quadro, não haja qualquer preocupação com as pessoas ciganas. Também a MEP Cornelia
Ernst (GCEUE/ENV)referiu a situação dos ciganos em Itália, mais concretamente em Nápoles, onde estivera
recentemente. Mencionou igualmente, que em plena crise dos refugiados foram deportados ciganos da
Alemanha para o Kosovo. O MEP Romeu Franz sublinhou o facto de os ciganos serem explorados,
auferindo, em média, 1,20€ à hora, o que gera aproveitamento de terceiros e corrupção. Em contraponto,
salientou algumas boas práticas, como nos Estados federados da Baviera e de Essen, onde foram assinados
acordos de integração com as associações ciganas.
Participou nesta fase do debate a subscritora do presente relatório, Deputada Catarina Marcelino,
começando por salientar a importância do empoderamento das mulheres ciganas, fundamental para o
sucesso da inclusão das comunidades ciganas, nomeadamente através do apoio à educação das crianças.
A integração passa, assim, pela educação e formação das mulheres ciganas, gerando um maior
empoderamento e mais igualdade de género dentro das comunidades, bem como uma maior inclusão das
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comunidades ciganas com a sociedade maioritária. Aproveitou ainda a intervenção para partilhar com a
audiência, que a Assembleia da República vai produzir um relatório sobre racismo, xenofobia e discriminação
étnico-racial até ao final da Legislatura (julho de 2019). Para a consecução deste objetivo serão ouvidas
entidades públicas, mas também a sociedade civil, pessoas da comunidade cigana e as respetivas
associações. A ideia consiste em produzir um relatório político que sirva para os partidos refletirem sobre a
realidade do racismo, na qual, obviamente, as comunidades ciganas têm um papel central, porque são das
mais discriminadas. Por fim, reiterou a ideia já expressa na anterior intervenção, quanto à necessidade do
financiamento europeu para construção de habitação, pois o facto de muitos ciganos morarem em barracas,
sem quaisquer condições, torna impossível o investimento na educação e no emprego.
A reunião foi encerrada pelas 18:00h.
Assembleia da República, 16 de janeiro de 2019.
A Deputada
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.