Página 1
Terça-feira, 9 de janeiro de 2024 II Série-D — Número 13
XV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2023-2024)
S U M Á R I O
Delegações da Assembleia da República:
Relatório da participação da Assembleia da República na Conferência Interparlamentar sobre a Democracia na Europa, organizada no âmbito da dimensão parlamentar da Presidência Sueca do Conselho da União Europeia, que decorreu em Estocolmo, nos dias 18 e 19 de junho de 2023.
Página 2
II SÉRIE-D — NÚMERO 13
2
DELEGAÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
RELATÓRIO DA PARTICIPAÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA NA CONFERÊNCIA
INTERPARLAMENTAR SOBRE A DEMOCRACIA NA EUROPA, ORGANIZADA NO ÂMBITO DA
DIMENSÃO PARLAMENTAR DA PRESIDÊNCIA SUECA DO CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA, QUE
DECORREU EM ESTOCOLMO, NOS DIAS 18 E 19 DE JUNHO DE 2023
Nos dias 18 e 19 de junho de 2023, foi realizada uma conferência interparlamentar no Riksdag1 sobre a
democracia na Europa. O objetivo da conferência era oferecer aos membros dos Parlamentos nacionais uma
oportunidade para discutir como podiam ajudar a salvaguardar e reforçar a democracia e o Estado de direito
na Europa. A conferência foi realizada no âmbito da dimensão parlamentar da Presidência sueca do Conselho
da União Europeia. O Comité Riksdag sobre a Constituição organizou a conferência, tendo nela participado
cerca de uma centena de membros e funcionários de delegações de diferentes Parlamentos da Europa. A
conferência iniciou-se com um jantar em Skansen a 18 de junho e continuou no dia seguinte na antiga
Segunda Câmara do Riksdag. A parte da conferência que decorreu no Edifício Riksdag foi dividida nas
seguintes sessões:
• A importância de salvaguardar o diálogo democrático e a importância dos parlamentos;
• Troca de opiniões sobre o tema discutido na sessão anterior;
• A importância de salvaguardar a independência dos tribunais e a confiança nas instituições sociais.
A conferência foi aberta com discursos do Parlamento da Suécia, Andreas Norlén, e do Vice-Presidente do
Parlamento Europeu, Michal Šimečka. O Presidente enfatizou a importância da União Europeia para a
democracia, os direitos humanos e o Estado de direito. Realçou também que os membros dos Parlamentos
precisam de defender a cultura política e como o acordo sobre questões processuais permitiria políticas
construtivas.
O Vice-Presidente afirmou no seu discurso que a última década tinha sido de crise para a democracia e o
Estado de direito e salientou que o Parlamento Europeu estava muito empenhado naquela questão, por
exemplo através dos relatórios sobre o Estado de direito e que existiam mecanismos em vigor para lidar com
as infrações, tais como o regulamento de condicionalidade.
Sessão I, Parte I - A importância de salvaguardar o diálogo democrático e a importância dos
Parlamentos
A Sessão I foi apresentada pela Presidente da Comissão da Constituição, Ida Karkiainen.
1 Parlamento da Suécia.
Delegação:
– Deputada Edite Estrela (PS) – Comissão de Assuntos Europeus – Chefe da Delegação;
– Deputado Pedro Delgado Alves (PS) – Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias;
– Deputada Mónica Quintela (PSD) – Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades
e Garantias;
– Tiago Moreira de Sá (PSD) – Comissão de Assuntos Europeus.
A assessoria foi prestada por Ricardo Pita, Assessor da Comissão de Assuntos Constitucionais,
Direitos, Liberdades e Garantias.
Página 3
9 DE JANEIRO DE 2024
3
Seguiu-se um discurso de Johannes Lindvall, professor de Ciência Política na Universidade de
Gotemburgo, cuja apresentação se centrou no extremar da polarização política e na medida em que tal
constituía uma ameaça à democracia. Afirmou que a função central dos Parlamentos seria transformar os
conflitos de lutas em debates. Enfatizou o facto de que se devem separar os conflitos sobre políticas, onde as
opiniões podem divergir, dos conflitos sobre as próprias regras, onde deveria haver consenso.
Seguidamente, usou da palavra Sara Hagemann, professora de Ciência Política na Universidade de
Copenhaga, cuja intervenção se centrou nas três vertentes do Parlamento enquanto fórum do debate
democrático. Em primeiro lugar, observou que as regras eleitorais e as organizações dos Parlamentos eram
importantes para o diálogo democrático, tanto a nível nacional como no estrangeiro, e que diferentes sistemas
políticos tinham diferentes culturas políticas. Em segundo lugar, salientou a importância das comissões
parlamentares na promoção do diálogo democrático. Em terceiro lugar, afirmou que a melhor forma de
conseguir a responsabilização no Parlamento é através de uma combinação de escrutínio e diálogo. Terminou
a sua intervenção, sublinhando que, embora as decisões estivessem concentradas nos Governos em tempos
de crise, a tomada de decisões deveria continuar a ser responsável.
A sessão continuou com reflexões de um painel de Deputados e ex-Deputados, moderado por Cecilia
Garme.
Astrid Thors, Vice-Presidente da Internacional Liberal e ex-membro do Parlamento finlandês e do
Parlamento Europeu, destacou três elementos: primeiro, a importância de declarar conflitos de interesses;
segundo, a interação entre os Parlamentos e os meios de comunicação social; e, terceiro, como a confiança
nas instituições públicas pode ser aumentada. Por último, observou que as mulheres tinham menos
probabilidades do que os homens de permanecer na política e instou os participantes a apoiarem as mulheres
que eram atacadas por serem representantes políticas, jornalistas ou investigadoras.
Posteriormente, interveio Reinhold Lopatka, membro do Conselho Nacional da Áustria e Vice-Presidente da
Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, cujo discurso se focou em dois temas: confiança e respeito.
Afirmou que havia falta de confiança e que uma forma de alterar essa situação seria envolver os cidadãos nos
processos políticos, por exemplo através de referendos. Observou também que todos os partidos eleitos
deviam ser respeitados e incluídos em todos os aspetos do trabalho parlamentar, porquanto defendeu ser
perigoso ter um pária político no Parlamento.
Björn von Sydow, antigo presidente e membro do Parlamento sueco, seguiu com um discurso centrado na
distinção entre especialistas e políticos – enquanto os primeiros procuravam a verdade, os últimos lidavam
com exigências e prioridades. Observou também a necessidade de fóruns onde essas duas categorias
pudessem interagir, como debates que incluíssem especialistas e políticos.
Sessão I, Parte II - Troca de opiniões sobre o tema discutido na sessão anterior
Durante a segunda parte da Sessão I, foram trocadas opiniões sobre os temas discutidos durante a
primeira parte, sob moderação de Cecilia Garme. Nesse período, os representantes dos Parlamentos tiveram
oportunidade de expressar a sua opinião sobre os temas discutidos. Vários participantes mencionaram a
questão do envolvimento público em processos políticos, tais como referendos ou conselhos de cidadãos nos
Parlamentos. Observou-se, no entanto, que esses esforços para aumentar a confiança do público nas
instituições também deviam produzir resultados. Vários participantes também levantaram a questão da
fiabilidade das novas plataformas tecnológicas destinadas a aumentar o envolvimento dos cidadãos na
política. Concomitantemente, foram abordadas as preocupações sobre a capacidade de tais plataformas
permitirem uma participação igualitária.
Nesse período, intervieram a Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS) e o Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá
(PSD), que o fizeram, em língua inglesa, nos seguintes termos2:
2 Tradução livre
Página 4
II SÉRIE-D — NÚMERO 13
4
Deputada Edite Estrela (PS)
Caros Colegas,
A globalização promoveu uma nova era de prosperidade económica e desenvolvimento tecnológico que
retirou milhões de pessoas da pobreza. No entanto, a ideia de que interdependências complexas entre
nações acabariam por enfraquecer e isolar Governos autoritários há muito tempo se revelou estar errada.
Os Governos autoritários demonstraram ao longo do tempo que podem prosperar num mundo
globalizado, explorando as cadeias de abastecimento para causar dificuldades económicas e utilizando a
guerra da informação e a desinformação para minar a confiança pública nas instituições democráticas.
Nesse sentido, quero deixar uma questão, porque a guerra voltou, mais uma vez, ao continente europeu.
Num tempo em que reina a violência, as desigualdades estão a aumentar, as políticas estão polarizadas e
os Governos são confrontados com as alterações climáticas, a pandemia e o crescimento das novas
tecnologias, é pertinente perguntar: pode a democracia alcançar a paz?
Muito obrigada.
Deputado Tiago Moreira de Sá (PSD)
Bom dia a todos.
Quando falamos de democracia na Europa atualmente, temos de ter em conta que estamos em guerra. A
Rússia ameaça a democracia de forma traiçoeira, como se vê todos os dias nos campos ensanguentados da
Ucrânia. Quando falamos de democracia atualmente, a coisa mais importante a fazer é continuar a apoiar a
Ucrânia sem hesitações. Devemos apoiar a Ucrânia com diplomacia e dinheiro, mas, acima de tudo,
devemos dar apoio militar à Ucrânia, incluindo tanques e aviões. E precisamos de ir mais longe, devemos
apoiar sem hesitação a admissão da Ucrânia na União Europeia. A Ucrânia é Europa. Como nos disse
George Steiner, num momento inspirador, a Europa vai desde o café de Fernando Pessoa, a Brasileira, em
Lisboa, até aos cafés dos gangsters de Isaac Babel, em Odessa. Também devemos considerar manter a
porta da NATO aberta à Ucrânia para quando o momento e as condições corretas forem alcançados. A
anterior arquitetura da segurança e defesa na Europa foi destruída pelos tanques e pela artilharia russa.
Como sabem aqui na Suécia, assim não é possível neutralidade ou zonas-tampão. Precisamos de uma nova
ordem europeia e a Ucrânia deve fazer parte dela. Como quase há um século atrás, a pacificação não é
possível. Se desistirmos de lutar pela democracia na Ucrânia, em nome de uma falsa sensação de
segurança, acabaremos sem segurança e sem democracia!
Muito obrigado.
Num discurso final, o Presidente Andreas Norlén destacou a distinção entre democracia direta e
democracia representativa. Afirmou também que havia benefícios em ter cidadãos envolvidos na política
através de partidos, em vez de diretamente com instituições políticas.
A Presidente da Comissão da Constituição, Ida Karkiainen, concluiu então a Sessão I, afirmando que os
acontecimentos no mundo durante a última década demonstravam que era necessário conquistar a
democracia diariamente. A propósito do envolvimento dos jovens na política, observou que na Suécia os
alunos das escolas eram regularmente convidados a visitar o Riksdag e a encontrar-se com os membros do
Parlamento. Por último, abordou a necessidade de colmatar o fosso entre cidadãos e políticos, bem como de
neutralizar as forças políticas e os Estados que procuravam diminuir a confiança e diminuir a democracia
Página 5
9 DE JANEIRO DE 2024
5
europeia.
Sessão II - A importância de salvaguardar a independência dos tribunais e a confiança nas
instituições sociais
A Sessão II foi sobre a importância de salvaguardar a independência dos tribunais e a confiança nas
instituições sociais e foi liderada pelo Vice-Presidente da Comissão da Constituição, Erik Ottoson.
O primeiro discurso foi proferido por Jessika Roswall, Ministra sueca dos Assuntos Europeus, que observou
que o Estado de direito e a independência do poder judicial eram cruciais para a confiança e sublinhou que
essas estavam entre as prioridades da Presidência sueca. Defendeu um amplo consenso quando a reforma
constitucional for realizada. Por último, afirmou que a União Europeia devia agir, por exemplo, através do
regulamento de condicionalidade, quando os Estados-Membros desafiassem os valores democráticos
fundamentais.
Seguiu-se um discurso de Didier Reynders, Comissário da Justiça, da Comissão Europeia, que começou
por afirmar que os valores fundamentais estabelecidos no artigo 2.º do Tratado da União Europeia estavam a
ser cada vez mais desafiados. Em seguida, sublinhou que a Comissão desenvolveu uma política forte em
matéria de Estado de direito, utilizando, entre outras coisas, os relatórios anuais sobre o Estado de direito,
sendo que o objetivo desses relatórios era detetar problemas numa fase inicial e evitar que se deteriorassem.
Reynders concluiu afirmando que a perceção do público em geral era importante e que, para promover
uma ordem baseada em regras a nível nacional, a União Europeia também precisava de cumprir os seus
objetivos a nível interno para permanecer credível.
O orador seguinte foi Thomas Bull, juiz do Supremo Tribunal de Administração da Suécia, cujo discurso se
centrou na importância da cultura política e jurídica na proteção do Estado de direito e na independência do
poder judicial. Afirmou que os juízes deviam mostrar moderação quando se tratasse de expressar
publicamente opiniões sobre questões políticas.
O último orador da sessão foi Herdís Kjerulf Thorgeirsdóttir, Vice-Presidente da Comissão Europeia para a
Democracia através do Direito (Comissão de Veneza), que argumentou que a participação dos cidadãos era
crucial para defender o Estado de direito e a independência do poder judicial. Afirmou que a propriedade
concentrada dos meios de comunicação social significava que existia um monopólio na formação da opinião
pública com muito poder mas pouca responsabilização pública. Concluiu, afirmando que um objetivo
fundamental seria alcançar liberdade de expressão e debate político robusto no ambiente digital.
Seguiu-se uma troca de opiniões, em que os convidados tiveram oportunidade de expressar as suas
opiniões e colocar questões ao painel de oradores. Os tópicos discutidos incluíram o problema da
desinformação, a regulamentação da condicionalidade e a transparência na nomeação de juízes.
No discurso final, o Vice-Presidente da Comissão da Constituição, Erik Ottoson, agradeceu aos
participantes na conferência e afirmou que os Parlamentos tinham um papel importante no equilíbrio e na
ponderação de diferentes perspetivas, no interesse de uma democracia vital e viva. Concluiu, afirmando que a
proteção cultural da democracia será provavelmente mais forte do que qualquer proteção constitucional.
Assembleia da República, 27 de dezembro de 2023.
A Chefe da Delegação da Assembleia da República,
(Deputada Edite Estrela)
Membro da Comissão de Assuntos Europeus
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.