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Quinta-feira, 9 de maio de 2019 II Série-E — Número 19

XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)

S U M Á R I O

Observatório Técnico Independente:

Relatório da avaliação do incêndio de Monchique.

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Citação recomendada:

Observatório Técnico Independente, Castro Rego F., Fernandes P., Sande Silva J., Azevedo J., Moura

J.M., Oliveira E., Cortes R., Viegas D.X., Caldeira D., e Duarte Santos F. – Coords. (2019) Avaliação do

Incêndio de Monchique. Relatório. Observatório Técnico Independente.

Assembleia da República. Lisboa. 78 pp.

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ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO

2. O CONTEXTO

2.1 O ANO DE 2018 E AS ESTATÍSTICAS ANUAIS DOS INCÊNDIOS

2.2 A METEOROLOGIA E OS INCÊNDIOS DURANTE O ANO DE 2018

2.3 O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

2.4 A GESTÃO DE COMBUSTÍVEIS ANTES DO INCÊNDIO

3. O INCÊNDIO

3.1 A ORIGEM DA IGNIÇÃO

3.2 VIGILÂNCIA E DETEÇÃO

3.3 EVOLUÇÃO DO INCÊNDIO E FATORES DETERMINANTES

3.3.1 Evolução do incêndio

3.3.2 Fatores determinantes

3.4 O ATAQUE INICIAL

3.5 O ATAQUE AMPLIADO

3.5.1 Os meios aéreos

3.5.2 O uso do fogo de supressão

3.5.3 O uso de máquinas de rasto

3.6. AS OPERAÇÕES DE RESCALDO, REATIVAÇÕES E REACENDIMENTOS

3.7 A SEGURANÇA DAS POPULAÇÕES

3.8 A ORGANIZAÇÃO, O PLANEAMENTO OPERACIONAL E A ESTRATÉGIA

3.8.1 Os briefings operacionais

3.8.2 O apoio à decisão

4. A RECUPERAÇÃO DA ÁREA ARDIDA

4.1 O PLANEAMENTO PARA A ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA

4.2 O APOIO ÀS AÇÕES DE REABILITAÇÃO

4.3 O PLANEAMENTO DA RECUPERAÇÃO A LONGO PRAZO

4.4 DO PLANEAMENTO À CONCRETIZAÇÃO DAS AÇÕES DE RECUPERAÇÃO

5. AS LIÇÕES APRENDIDAS

ANEXOS

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1. Introdução

Pela Lei n.º 56/2018 de 20 de agosto alterada pela Lei n.º 1/2019 de 9 de janeiro a Assembleia da

República criou o Observatório Técnico Independente para “análise, acompanhamento e avaliação dos

incêndios florestais e rurais que ocorram no território nacional, cuja missão consiste em proceder a uma

avaliação independente dos incêndios florestais e rurais que ocorram em território nacional, prestando apoio

científico às comissões parlamentares com competência em matéria de gestão integrada de incêndios rurais,

proteção civil, ordenamento do território, agricultura e desenvolvimento rural, floresta e conservação da

natureza.”

Na sequência deste mandato o Observatório deliberou elaborar um relatório sobre o incêndio iniciado a 3

de agosto de 2018 no sítio de Perna da Negra, na freguesia e concelho de Monchique, distrito de Faro, vindo a

atingir o concelho de Silves, afetando uma área de 27154 hectares, tendo sido dado como extinto no dia 10 de

agosto.

Um ano depois dos incêndios de junho e outubro de 2017, e apesar de não ter registado vítimas mortais, a

dimensão e o impacto deste incêndio, justificam uma reflexão sobre o seu desenvolvimento e gestão

operacional, atendendo aos elevados prejuízos verificados em infraestruturas, património florestal e ambiente.

Com este objetivo, o Observatório fez uma análise circunstanciada do incêndio, incluindo uma deslocação

aos concelhos de Monchique e Silves, recolha de informação junto das principais entidades envolvidas nas

fases pré-incêndio, incêndio e pós-incêndio e diversas audições com elementos envolvidos naquela

ocorrência.

Analisada toda a informação disponibilizada, o Observatório concluiu o presente Relatório que pretende ser

um contributo técnico, científico e independente de uma ocorrência da qual entende necessário extrair lições

que possam resultar em aperfeiçoamentos do sistema. Esta melhoria deve, no entender do Observatório,

materializar-se numa reforma sistémica da gestão de incêndios rurais, alicerçada em três princípios

estruturantes: o princípio da aproximação da prevenção e do combate, o princípio da especialização e o

princípio da profissionalização e capacitação do sistema de gestão integrada de fogos rurais.

O Observatório gostaria de deixar expresso neste relatório o sincero agradecimento a todos quantos, nos

diversos setores, se disponibilizaram e empenharam para prestar as informações e os esclarecimentos

solicitados. O Observatório não pode, por isso mesmo, deixar de lamentar o atraso nos trabalhos pela

incompreensível demora do Ministério da Administração Interna em enviar a este Observatório a informação

solicitada à GNR com vista a clarificar a intervenção daquela entidade nas operações do incêndio em

apreciação. Recordamos aqui o disposto no número 1 da Lei n.º 56/2018 de 20 de agosto que estabelece que

“o Observatório tem acesso a toda a informação necessária ao cumprimento da sua missão, estando todas as

entidades públicas e privadas obrigadas ao seu fornecimento atempado, e aos esclarecimentos adicionais que

lhes forem solicitados”.

Neste contexto, o Observatório vem desta forma cumprir a missão que lhe foi confiada, com a elaboração e

divulgação do presente Relatório sobre o maior incêndio ocorrido em 2018.

2. O contexto

2.1 O ano de 2018 e as estatísticas anuais dos incêndios

As estatísticas anuais dos incêndios no continente e em particular no distrito de Faro são a melhor fonte

para análise do contexto histórico da ocorrência de Monchique em 2018.

A evolução das tendências de evolução do número de ocorrências é sempre difícil por não ter sido sempre

constante ao longo dos anos o critério do seu registo. As estatísticas anteriores a 2001 são subestimadas em

relação às posteriores a esta data uma vez que nos anos 80 se registavam apenas ocorrências superiores a

0,1 ha de área ardida e nos anos 90 apenas ocorrências com áreas superiores a 0,01 ha. No entanto, após

2001 o critério manteve-se com todas as ocorrências registadas. Ainda assim, é interessante verificar o que as

estatísticas oficiais do ICNF indicam. O número de ocorrências por ano no distrito de Faro indica um máximo

de cerca de 850 nos anos de 1991 e 1992, depois um decréscimo, um novo período com um número de

ocorrências elevado entre 2006 e 2009, entre 500 e 750, e depois um decréscimo que acompanha a tendência

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geral no continente, parecendo nos dois últimos anos que essa tendência de decréscimo não esteja a

continuar no distrito de Faro (Figura 1). Ainda assim, o número de ocorrências nos últimos anos, entre 2013 e

2018, situa-se entre 175 e 350, muito abaixo dos valores de períodos anteriores, tanto no âmbito do território

continental como no do distrito de Faro.

Figura 1. Evolução do número de ocorrências no distrito de Faro (colunas a azul) e no total do continente (colunas

sem preenchimento): Fonte: estatísticas ICNF. Registe-se que para 2017 os valores oficiais reportam-se ao período

desde o início do ano até 15 de outubro e em 2018 até 15 de setembro.

No que respeita às áreas ardidas, com critérios mais comparáveis ao longo dos anos, estas mostram no

distrito de Faro uma evolução por episódios discretos sem grande relação com o número total de ocorrências e

bastante distinta da evolução da área ardida no continente (Figura 2).

Figura 2. Evolução da área ardida no distrito de Faro (colunas a azul) e no total do continente (colunas sem

preenchimento). Fonte: estatísticas ICNF. Registe-se que para 2017 os valores oficiais reportam-se ao período

desde o início do ano até 15 de outubro e em 2018 até 15 de setembro.

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Os dados das áreas ardidas no distrito de Faro, como no resto do continente, são extremamente

influenciados pelos grandes incêndios. O ano de 2003 foi o de maior área ardida no distrito de Faro, com perto

de 60 mil hectares, seguindo a tendência do restante território continental. No entanto, tal simultaneidade não

aconteceu noutros anos, como em 2005 e 2017, em que a área ardida no distrito de Faro foi muito reduzida

enquanto no resto do território atingiu níveis elevados. Essa simultaneidade também não ocorreu nos anos em

que a área ardida no distrito de Faro foi mais elevada, como em 2004, em que arderam no distrito mais de 30

mil hectares, ou no ano de 2012, quando um só incêndio nos concelhos de Tavira e de São Brás de Alportel

consumiu uma área de mais de 20 mil hectares, tendo sido na altura objeto de um relatório específico (Viegas

et. al. 2012).

Esta não coincidência de áreas ardidas elevadas no distrito de Faro e no restante território é

particularmente acentuada no ano de 2018, em que até 15 de setembro o ICNF registava no conjunto do

território continental pouco mais de 38 mil hectares ardidos, dos quais cerca de 27 mil no distrito de Faro

(Figura 2). Acresce que, praticamente, toda a área ardida no distrito correspondeu ao incêndio de Monchique

em análise.

Este enquadramento é importante para compreender que o incêndio de Monchique constituiu a maior

componente da área ardida a nível nacional o que tem, como se verá, consequências importantes que

transparecem na análise que apresentamos.

Convém igualmente identificar do ponto de vista do histórico dos incêndios as componentes associadas

aos matos e aos povoamentos florestais nos espaços florestais percorridos pelos incêndios. Neste caso, a

análise mostra claramente que no distrito de Faro e, particularmente, no incêndio de Monchique, os

povoamentos florestais foram os mais atingidos pelo incêndio, em maior proporção do que sucedeu em anos

anteriores (Figura 3). Os números provisórios do ICNF apontam para cerca de 10 mil hectares de matos e 16

mil hectares de povoamentos florestais ardidos, a que se deverão adicionar cerca de mil hectares de área

agrícola.

Figura 3. Evolução das áreas de matos e de povoamentos florestais ardidos no distrito de Faro. Fonte: estatísticas

ICNF. Registe-se que para 2017 os valores oficiais reportam-se ao período desde o início do ano até 15 de outubro

e em 2018 até 15 de setembro.

Convém ainda registar que na análise do incêndio de Monchique de 2018 se constatou que este percorreu

essencialmente área já consumida em 2003 (em cerca de 80% da sua extensão), o que pressupõe 15 anos de

considerável acumulação de biomassa combustível, sobretudo florestal, sem a adequada gestão. Aliás, o

estudo elaborado na Primavera de 2018 por vários especialistas da Universidade de Lisboa (Turkman et al.

2018, Pinto et al. 2018), considerava já que, devido à acumulação de combustível naquela área, o concelho de

Monchique encabeçava a listagem dos concelhos do país com maior probabilidade de voltar a ser afetado por

um mega incêndio. Uma catástrofe anunciada, portanto.

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2.2 A meteorologia e os incêndios durante o ano de 2018

A evolução da área ardida ao longo do ano de 2018 no continente pode ser analisada em função do

número de ocorrências e da meteorologia. O gráfico da Figura 4 resume a evolução dessas variáveis em 2018

em comparação com os valores medianos e máximos correspondentes.

Figura 4. Evolução diária no continente ao longo de 2018 do número de ocorrências (gráfico de cima), do valor do

índice de severidade meteorológica DSR (gráfico do meio) e da área ardida, em hectares em escala logarítmica

(gráfico de baixo). Em todos os gráficos mostra-se a evolução em 2018 (a negro) em comparação com o valor

mediano (verde) e com o valor máximo (azul) no período 2002-2017. Dados do SGIF - ICNF.

O gráfico da Figura 4 é ilustrativo da situação ao longo do ano de 2018. Do ponto de vista das ocorrências,

o seu número foi claramente inferior à mediana do período 2002-2017 durante os meses de verão, de junho a

setembro, havendo valores superiores nos meses de fevereiro, abril, maio e outubro.

No que respeita à meteorologia o ano de 2018 foi, em comparação com os anos anteriores, bastante mais

favorável até ao aumento rápido da severidade meteorológica no início de agosto. O mês de agosto e o

período de final de setembro a meio de outubro foram de severidade bastante alta.

A área ardida em 2018 foi mais elevada do que a mediana no período anterior nos meses de fevereiro, abril

e maio, seguindo a tendência do número de ocorrências naquele período, mas nunca excedendo valores de

área ardida significativos por ser sempre baixo o índice de severidade meteorológica. O início do mês de

agosto e o período entre o final de setembro e o meio de outubro, coincidindo com os valores mais elevados

de severidade meteorológica, são aqueles que apresentam uma área ardida superior à média do período

anterior.

No gráfico da Figura 4 é claramente visível a coincidência do grande incêndio de Monchique com o

aumento do índice de severidade meteorológica no início de agosto, bem acima da mediana e próximo do

máximo histórico para aquele período. O número de ocorrências naquele período foi baixo, não podendo, por

isso, ser justificação para a área ardida em agosto, em que foi a meteorologia o fator claramente mais

importante.

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Esta conhecida elevada dependência entre grandes incêndios e meteorologia pode e deve ser aproveitada

para a utilização das previsões meteorológicas na antecipação e preparação do sistema. No caso em análise,

a deflagração, extensão e severidade do incêndio de Monchique foram plenamente consistentes com as

condições pirometeorológicas previstas e observadas durante o período de tempo em questão. Com efeito, no

dia 3 de agosto de 2018 estava decretada Situação de Alerta para todo o país e ativado para o nível vermelho

o Estado de Alerta Especial do SIOPS para o DECIR.

A previsão do IPMA para a zona em que o incêndio se iniciou e para os dias 3-5 de agosto indicava perigo

meteorológico de incêndio, dado pelo índice FWI, acima de 64, isto é, bastante acima do valor que define

condições extremas em povoamentos florestais (FWI=38) e dentro da subdivisão mais extrema da

classificação atualmente adotada pelo IPMA.

Todos os incêndios no Algarve que no passado (desde 2001) superaram 5000 hectares de dimensão

haviam tido o seu início em dias com FWI ≥68. Adicionalmente, a previsão do IPMA para o índice modificado

de Haines, um indicador de instabilidade atmosférica e do potencial para o desenvolvimento de incêndios

convectivos era de 12-13, valor muito elevado e similar àquele registado nos incêndios de Pedrogão

Grande/Góis em 2017. As previsões da plataforma CeaseFire da Faculdade de Ciências da Universidade de

Lisboa para o dia 3 de agosto indicavam índices de humidade do combustível morto fino (FFMC), propagação

do fogo (ISI) e FWI acima do percentil 95 para o dia e região em causa. Pelo contrário, os índices de humidade

da manta morta (DMC), disponibilidade de combustível (BUI) e seca (DC) apresentavam valores bastante

baixos para a época (percentis 5-10 ou 10-25), apesar de em valor absoluto serem conducentes ao consumo

total do combustível existente e indicarem a necessidade de trabalho exigente de consolidação perimetral e

rescaldo.

A previsão meteorológica diária é sempre útil no pré-posicionamento dos meios mas também no apoio à

decisão em diversas operações de combate até ao rescaldo e extinção. Como veremos adiante, também a

previsão horária dos índices meteorológicos se revela de grande utilidade e deverá ser muito mais utilizada no

futuro.

2.3 O ordenamento do território

O uso do solo no território é outro elemento de contexto essencial porque dele depende em grande parte o

combustível dos incêndios. Para o conjunto da região do Algarve, os dados do Inventário Florestal Nacional,

de 2010, apontavam para uma floresta com uma composição florestal distribuída por diversas espécies,

dominando o pinheiro manso (27%), o sobreiro (23%), a azinheira (7%), o eucalipto (21%) e outras folhosas

como a alfarrobeira e medronheiro (19%).

O Programa Regional de Ordenamento Florestal (PROF) do Algarve, em vigor desde fevereiro de 2019, e

que utiliza como base a desatualizada informação de 2010, aponta para uma manutenção global destas

proporções, com algum decréscimo da proporção de eucalipto, compensada com um ligeiro aumento de

sobreiro e outras folhosas. A anterior versão do PROF, elaborada em 2006, apontava para uma ainda menor

proporção da floresta de eucalipto devido, sobretudo, ao maior aumento da proporção de outras folhosas

(Figura 5). O Observatório já fez as suas apreciações sobre os PROF em Nota Informativa anterior pelo que

não faz neste relatório nenhuma outra análise suplementar.

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Figura 5. Evolução comparativa prevista da composição da floresta no Algarve, relativa aos primeiros PROF

elaborados em 2005 com base nos dados de 1995 (primeiras três colunas), relativamente aos segundos

PROF, onde a composição de 2010 foi usada em 2018 como base da sua revisão (segundo grupo de três

colunas).

A realidade do território não é, no entanto, homogénea em todo o Algarve. Na sub-região homogénea da

serra de Monchique, uma das mais afetadas no incêndio de 2018, as ocupações dominantes incluíam o

eucalipto (40%) e os matos (40%), ocupando o sobreiro 2% dessa superfície, o que reflete o enorme potencial

de combustibilidade desta área. Por outro lado, nas sub-regiões homogéneas da serra de Silves e da Meia

Serra, os matos continuavam dominantes (40%), mas observava-se uma maior diversidade de espécies

florestais. Na serra de Silves o sobreiro cobria 15% da área e o eucalipto 5%, enquanto na Meia Serra, o

eucalipto situava-se nos 15%, com um valor idêntico para o pinheiro manso.

No contexto deste território compreende-se que a área ardida no incêndio fosse maioritariamente ocupada

por matos (35%) e eucalipto (35%), tendo também o montado de sobro uma expressão relevante (15%).

Para a propagação dos incêndios a questão do combustível disponível, bem como a da composição e

configuração da floresta são muito relevantes. No incêndio em análise, a propagação para Oeste, na margem

esquerda da Ribeira de Odelouca, terá sido limitada pelo pouco combustível acumulado depois de outro

incêndio significativo ocorrido em 2016. Por outro lado, a maior diversidade e fragmentação do espaço florestal

na serra de Silves, mas especialmente na Meia Serra, quando comparada com a da serra de Monchique, terá

contribuído para limitar a propagação do incêndio mais para Sul e Sudeste. Retomaremos esta análise na

evolução horária da propagação do incêndio.

2.4 A gestão de combustíveis antes do incêndio

O contexto de elevada continuidade e quantidade de combustível acumulado conduz sempre a um elevado

risco de incêndio na área. Esta constatação tem conduzido à procura de soluções baseadas numa maior

necessidade de infraestruturação do território de modo a procurar minimizar aqueles riscos. Neste sentido tem-

se dado ênfase à construção e manutenção de uma rede primária como peça essencial de uma rede de faixas

de gestão de combustível realizada à escala da paisagem. O delineamento da rede primária e dos mosaicos

de paisagem permitiria, com o recurso à reconstrução histórica dos incêndios recorrentes na área e a

modelação da sua propagação, reconhecer os pontos estratégicos de gestão a merecerem planeamento

próprio nos Programas Regionais de Ordenamento Florestal.

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Para a execução da rede primária e para a sua manutenção, os municípios são as entidades que reúnem

as melhores condições de acesso aos instrumentos financeiros para a sua implementação. Ora, a rede

primária, embora tenha sido uma das metas do PNDFCI publicado em 2006, teve apenas o seu traçado

finalizado a nível nacional no 1.º trimestre de 2013, de acordo com a Avaliação Intercalar do PNDFCI (2006-

2012) e apenas uma reduzida parte foi executada no terreno. Esse atraso teve consequências relevantes para

a incipiente rede primária no Algarve.

No entanto, talvez ainda mais fundamental do que a rede primária é a diversificação de espécies e a sua

distribuição em mosaicos, bem como a redução dos combustíveis acumulados com a aposta na gestão e na

silvicultura preventiva aproveitando o potencial oferecido por atividades complementares, como a extração da

resina, da biomassa para aquecimento ou energia, a silvo-pastorícia, ou outras. A falta destas alternativas de

gestão dos combustíveis implica a inevitável acumulação da biomassa que, criadas as condições

meteorológicas próprias, conduz a incêndios com rotações entre os 15 e os 20 anos com grande intensidade

como aquele que aqui se analisa.

Na área ardida não eram mantidos corredores ecológicos ou seja, estruturas territoriais aproximadamente

lineares, frequentemente estabelecidas ao longo de linhas de maior altitude ou de vales fluviais, para

assegurarem a continuidade dos processos ecológicos entre as áreas nucleares e permitirem a conservação

de valores naturais e a proteção contra incêndios. Estas faixas implicam, afinal, critérios de diversidade

paisagística e a compartimentação das parcelas com recurso a ecossistemas florestais naturais (em equilíbrio

com as condições climáticas e edáficas de cada território) e a elementos paisagísticos agro-pastoris. A

existência destes corredores teria podido criar elementos eficazes de descontinuidade que poderiam jogar com

as faixas de gestão de combustível na prevenção dos fogos rurais.

A gestão de combustíveis é um elemento fundamental dos Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra

Incêndios. Uma análise do PMDFCI do concelho de Monchique (2016-2020) revela que foram identificadas as

áreas prioritárias para a realização de gestão de combustível (designadas por modelos de combustíveis 5 e 6,

essencialmente matos) e as áreas de especial perigosidade (Figura 6), precisamente as zonas mais afetadas

pelo incêndio em análise. Na verdade, da análise do mapa de perigosidade pode verificar-se que as zonas

com maior perigosidade (classe Muito Alta) ocupavam a parte oeste do concelho de Monchique, na

confluência com o concelho de Aljezur e na parte Sul na confluência com o concelho de Portimão, além da

zona definida com perigosidade Muito Alta que se estendia desde a zona da Foia, Madrinha, Cimalhas, Cerro

do Lobo até ao Cerro da Esteveira, correspondentes, afinal, à primeira fase do incêndio.

Figura 6. Mapa de perigosidade de incêndio florestal no PMDFCI de Monchique (2016-2020).

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Analisando a Rede de Faixas de Gestão de Combustível (FGC) do respetivo PMDFCI (CMDFCIM 2015),

na zona onde teve início o incêndio (Perna Negra), destaca-se a existência de uma faixa associada à rede

elétrica em alta tensão (15 kV), porém classificada “sem intervenção” para o quinquénio de 2016 a 2020

(Figura 7) nesse Plano Municipal. Desconhece-se se a razão para a classificação de “sem intervenção”

informação do PMDFCI, embora a intervenção esteja atribuída à EDP. Sublinhe-se que esta faixa tem como

fim reduzir o potencial de ignições resultantes do contacto de combustível florestal com os cabos condutores

da rede elétrica, sendo obrigatória a execução de uma "faixa de largura não inferior a 10 metros para cada um

dos lados, nos espaços florestais e previamente definidos no PMDFCI" (ICNF 2010).

Figura 7. Faixa associada à rede elétrica de alta tensão prevista no PMDFCI de Monchique e localização do

ponto de início provável do incêndio. Elaboração própria: Observatório Técnico Independente, 2019. Fonte:

PMDFCI de Monchique 2016 – 2020 (CMDFCIM 2015).

No que respeita à faixa de proteção de aglomerados populacionais verificou-se que a sua execução (ainda

que a sua dimensão não cumpra, na larga maioria, a exigida legalmente, definida no PMDFCI, não inferior a

100 metros) parece ter permitido reduzir eficazmente o impacto direto da propagação do fogo, embora o maior

risco se encontre associado a projeções sobre a cobertura dos edifícios e em matéria combustível junto a

estes, resultantes da combustão de eucalipto. Na Figura 8 verifica-se a existência de FGC no aglomerado

populacional de Alferce, cuja população ficou confinada durante o incêndio.

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Figura 8. Faixa de gestão de combustível ao redor do aglomerado de Alferce. Elaboração própria: Observatório

Técnico Independente, 2019. Fonte: PMDFCI de Monchique 2016 – 2020.

No caso concreto da Rede Primária de Faixas de Gestão de Combustível esta foi iniciada há cerca de 15

anos mas, a sua implantação tem sido obstaculizada por empresas e produtores florestais nas áreas de

floresta de produção de eucalipto (como assinala o PMDFCI de Monchique e se constatou nas reuniões com

as autoridades municipais). No concelho de Monchique a rede primária de faixas de gestão de combustível

tinha sido previamente definida para todas as freguesias, representando um total de cerca de 2500 hectares,

ou seja, mais de 6% do território. No entanto, apenas uma reduzida percentagem da mesma terá sido

executada.

Importa ainda salientar que o traçado da Rede Primária de FGC não terá seguido todos os critérios

técnicos para a sua melhor implantação, tal como se pode comprovar pelos troços desta rede sobre as vias de

comunicação EN266, EN267 ou EM501, entre outros exemplos (Figura 9). O traçado não parece ter tido em

consideração suficiente fatores como os ventos predominantes e o historial anterior do fogo, a topografia e uso

do solo e a eficácia esperada e segurança das forças de combate. A sua considerável extensão, desenho do

traçado, ocupação do solo e regime de propriedade dificultaram também a sua execução, pelo que se

identificou, no terreno, a existência desta infraestrutura de DFCI em retalhos, o que acabou por anular ou

reduzir a sua função.

A eficácia da Rede Primária como elemento passivo de contenção seria sempre reduzida, e ainda mais

quando a ocupação do solo tem uma componente importante de povoamentos de alta combustibilidade,

muitas vezes sem gestão de combustíveis que, com topografias acentuadas e ventos fortes, permitem o

desenvolvimento de incêndios de grande intensidade, com abundantes projeções, logo sem capacidade de

deter a progressão frontal deste tipo de incêndios. Um estudo anterior (Oliveira et al. 2016) revelou que caso a

Rede Primária do Algarve fosse totalmente executada reduziria (de forma passiva) a área ardida total em

apenas 17% e a probabilidade de arder entre 4% e 31%, sendo necessário tratar 26 ha para diminuir a área

ardida em um ha. A eficácia da Rede Primária é portanto grandemente função da sua utilização nas operações

de combate.

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Figura 9. Desenho da Rede Primária de FGC sobre a área afetada pelo GIF de Monchique. Só uma parte desta

rede primária estava executada em 2018. Elaboração própria: Observatório Técnico Independente, 2019. Fonte:

PMDFCI de Monchique 2016 – 2020.

No caso do concelho de Silves, a aposta tinha sido igualmente destinada às redes secundárias e terciárias

tendo sido consideradas como freguesias prioritárias São Marcos da Serra e de São Bartolomeu de Messines.

No entanto, a norte da cidade de Silves, em Odelouca, Vale de Lama e no Falacho, foram constituídos até

junho de 2018, 110 hectares de gestão de combustíveis, afinal manifestamente insuficientes em função da

elevada biomassa combustível. Nesta altura, as faixas de interrupção de combustível (FIC) tinham atingido em

todo o concelho uma extensão aproximada de 65 km (150 hectares), as quais resultaram da aprovação de

candidaturas submetidas pelo Município ao Fundo Florestal Permanente (FFP). As FIC foram assim

implantadas nas áreas de fronteira com os municípios de Ourique, Odemira, Almodôvar e Monchique e na

interligação intra-freguesias, destacando-se os troços Fitos/ValeTouriz/Benafátima, Azilheira/Santa Maria/IC1,

Monte e Azilheira/Perna Seca/ICI. De realçar a beneficiação até à altura do incêndio de 125 km de caminhos

florestais, com destaque para a Herdade da Parra e para a zona envolvente do Centro Nacional de

Reprodução do Lince Ibérico (CNRLI). Como em Monchique, conclui-se que a existência destas faixas não

consegue condicionar, de forma passiva, o alastrar da área ardida em incêndios desta intensidade e

dimensão.

3. O incêndio

3.1 A origem da ignição

A informação sobre a causa da ignição que dá origem a um incêndio está frequentemente associada a

polémica e incerteza. No intricado de fatores que resultam numa área queimada e em danos materiais e

pessoais, a causa de um incêndio está a montante de tudo o resto e a sua determinação pode ter enormes

consequências do ponto de vista da responsabilização civil e criminal. Essa responsabilização será

naturalmente proporcional aos danos causados. Por isso a investigação das causas está a cargo de entidades

especialmente preparadas na GNR e na PJ que, depois das causas apuradas, as fornecem ao Sistema de

Gestão de Incêndios Florestais (SGIF) gerido pelo ICNF.

De acordo com dados do SGIF o distrito de Faro registou em 2018 um total de 711 ocorrências das quais

357 (cerca de 50%) terão sido investigadas. O grau de detalhe destas investigações foi já objeto de apreciação

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por parte do Observatório em anterior relatório. De qualquer forma, de entre as causas investigadas, 40%

dizem respeito a uso do fogo, 15% são causas acidentais, 9% dizem respeito a incendiarismo e 40% são

indeterminadas. Apenas está registado um incêndio com causas naturais e um incêndio devido a

reacendimento. A ignição por linhas de transporte de energia (código 211), no Distrito de Faro correspondeu a

9% de todas as causas investigadas em 2018, sendo a causa acidental mais frequente.

Apesar das investigações o incêndio em análise é um bom exemplo da dificuldade em apurar claramente e

de forma inequívoca a causa da ignição de origem. À data da redação deste relatório a causa do incêndio em

análise (Perna da Negra - Boavista) tem ainda a classificação de “desconhecida”.

Não tem este Observatório a incumbência nem a competência para realizar o trabalho técnico de

investigação necessário para o apuramento dessa causa, socorrendo-nos portanto da informação recolhida

por outras entidades. Mas incluímos naturalmente neste relatório as impressões recolhidas aquando da visita

feita por este Observatório, em fevereiro deste ano, ao local que nos foi indicado como sendo o do provável

início do incêndio (Figura 10).

Por outro lado, há fotografias iniciais em que são visíveis chamas próximo do local indicado e indícios que

apontam para que a linha elétrica possa ter estado na origem do incêndio por haver no local árvores -

essencialmente eucaliptos - com desenvolvimento suficiente para poder entrar em contacto com os cabos da

linha elétrica (Figura 10), apesar da versão da EDP não apontar nesse sentido. Apesar dos indícios que

apontam para que a causa do incêndio possa ter tido origem na linha de média tensão que atravessa o local

de início do incêndio, não existe qualquer informação oficial sobre investigação mais detalhada que permita

confirmar esta hipótese.

Figura 10. Local indicado como provável início do incêndio (Lat: 37.396944, Long: -8.588963; registo SGIF)

debaixo de uma linha elétrica de média tensão (15kV), gerida pela EDP.

A gestão de combustíveis, associada a estas infraestruturas, foi já referida em capítulo anterior (2.4) onde

se verifica que a faixa referida é estabelecida no PMDFCI mas sem indicação de intervenção.

É também de referir que, de acordo com o Relatório Operacional Preliminar da ANPC relativo a este

incêndio, o CNOS já estava alertado para a existência de ignições por linhas elétricas em Monchique, nos dias

30 de Julho, 1 de Agosto e 2 de Agosto. No dia 3 terá havido uma “reunião com o oficial de ligação da EDP e

responsáveis pelas redes de baixa e média tensão, com o intuito de reforçar medidas preventivas e de

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antecipação, por forma a mitigar o risco”. Ainda de acordo com o mesmo relatório, no dia 3 de Agosto terá sido

mobilizada uma parelha de aviões Fire Boss em vigilância armada na região.

O Relatório da GNR, que nos foi facultado em 20 de abril, aponta nas suas páginas 31 a 34, que a origem

do incêndio se situa num local próxima da linha elétrica de 15kV por nós referenciada e exibe fotografias do

local que permitem concluir que se trata do mesmo local que é indicado neste Relatório. Os agentes do

SEPNA referem que apesar de não terem encontrado testemunhas oculares do início do fogo, obtiveram

dados relevantes sobre a sua origem, nomeadamente a ausência de indícios que permitissem relacionar a

causa do fogo com o uso negligente do fogo, afirmando, no entanto, que a ignição poderia ter sido realizada

por chama direta, embora não fundamentem esta afirmação. Pela ausência de elementos objetivos suficientes,

o SEPNA classificou este incêndio como sendo de causa indeterminada. O Relatório do SEPNA cita um

relatório elaborado pelo NPA de Portimão, que “parece apontar para que o ponto de início da ocorrência tenha

tido origem num local sujeito a gestão obrigatória nos termos do n.º 1 d) do Aº 15.º do DL 124/2006, de 28 de

junho”. Refere ainda as obrigações que a EDP tinha, de acordo com o Plano Municipal, de efetuar pelo menos

uma intervenção por ano naquele troço.

Num Relatório que a EDP Distribuição preparou, contesta-se a possibilidade de relacionamento entre a

origem do incêndio e a linha elétrica em causa. Refere-se ainda que no ano de 2015 foi realizada uma

empreitada de gestão da faixa de proteção da linha na área de Perna Seca, verificou-se que não era

necessário realizar qualquer trabalho.

Em conclusão, muito embora não exista confirmação quanto à causa de origem deste incêndio em

particular, as estatísticas sobre causas investigadas levam a encarar com grande preocupação as ignições

causadas pela rede elétrica. Em particular as linhas que atravessam áreas com eucalipto deverão ser alvo de

extrema atenção, devido ao rápido desenvolvimento em altura das árvores desta espécie, potenciando

descargas por toque ou mesmo potenciando a danificação das linhas de transporte de energia.

Por outro lado, não podemos deixar de chamar a atenção para a falta de eficácia na investigação das

causas de incêndio. Volvidos que são nove meses desde a ocorrência, é no mínimo estranho que não exista

ainda uma causa conhecida para um incêndio com as consequências que este teve. Assim, recomenda-se

uma melhoria no serviço de investigação de causas particularmente em incêndios de grandes dimensões.

3.2 Vigilância e Deteção

"A Rede Nacional de Postos de Vigia (RNPV) constitui a espinha dorsal da deteção fixa terrestre de

incêndios em Portugal. É atualmente operada e gerida pela GNR e funciona de acordo com um calendário em

duas fases, respetivamente a guarnição da rede primária (em 2018 de 7 de maio a 30 de outubro) e a

guarnição dos restantes postos de vigia, de 1 de julho a 15 de outubro. A dinâmica espácio-temporal do perigo

de incêndio e a cobertura limitada do território por parte da RNPV impõe, ou recomenda, que seja

complementada através de vigilância móvel com meios terrestres ou aéreos em função do potencial de ignição

e propagação e dos valores em risco. Cabe ao ICNF recomendar vigilância adicional em locais e contextos

críticos" (Relatório de Observatório, 2018).

O local indicado como o do início do incêndio é coberto por três postos de vigia da Rede Nacional de

Postos de Vigia:

1. Posto de Vigia da Madrinha, Foia, Monchique (PV 82-01)

2. Posto de Vigia da Picota, Monchique (PV 82-02)

3. Posto de Vigia da Mesquita, Odemira (PV 63-08), não referido no PMDFCI de Monchique.

Analisando as bacias de visibilidade daqueles postos de vigia conclui-se que, à semelhança de outras

áreas do País com idêntica orografia, uma ampla extensão do território afetado pelo incêndio se encontra em

zonas sombra, isto é, não é visível diretamente (Figura 11). Assim sendo, um incêndio só é visível quando a

coluna de fumo atingir uma altura que permita a sua deteção.

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Figura 11. Bacias de intervisibilidade dos postos de vigia na área do grande incêndio florestal de Monchique.

Elaboração Própria: Observatório Técnico Independente, 2019.

Neste incêndio, o alerta da ocorrência deu-se às 13:32 (hora local), sendo que o provável local de início

tem uma cota aproximada de 230 metros. O posto de vigia mais próximo desse local é o PV 63-08, situado na

Mesquita a uma cota 510 metros aproximadamente, e a uma distância de cerca de 6 km. O segundo posto de

vigia mais próximo é o PV 82-01, em Madrinha - Foia, distando cerca de 9 km e a uma cota aproximada de

850 metros e por último e, o mais distante é o PV 82-02, situado na Picota, a uma distância de 11 km e a uma

cota aproximada de 770 metros (Figura 11).

Devido ao relevo recortado, demarcado pelos vales encaixados da Ribeira da Perna Negra e da Ribeira de

Seixe, com a sucessão de elevações na linha de visão entre os postos de vigia e o local de ocorrência,

verifica-se que o campo de visão direta entre os postos de vigia e o local provável de início é nulo (Figura 12),

o que terá sido determinante na demora da deteção até que a coluna de fumo pudesse ser avistada por um

dos postos de vigia, o que implicou que a pluma se erguesse o suficiente na baixa atmosfera até entrar dentro

do campo de visão.

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Figura 12. Visadas entre os postos de vigia e o local provável de ocorrência (verde - visível; vermelho – não

visível). Elaboração Própria: Observatório Técnico Independente, 2019.

Salienta-se que próprio PMDFCI de Monchique identifica a dificuldade de cobertura do território concelhio

pela vigilância fixa e propondo a complementaridade com a vigilância móvel: «Dado que os postos de vigia

não asseguram uma cobertura efetiva de toda a área do concelho, torna-se necessário complementar a

vigilância fixa com a vigilância móvel.» De acordo com o mesmo plano, o itinerário que intercepta o ponto

provável de início ficou estabelecido como um circuito de vigilância móvel.

Destaca-se ainda que segundo o Relatório Especial “Grandes Incêndios” elaborado pelo CODIS de Faro,

desde o dia 28 de julho à data de ocorrência (03 de agosto de 2018) foram adotadas medidas operacionais de

antecipação "algumas previstas nos respetivos planos, conforme constam dos Briefings Técnicos Operacionais

(BTO) diários do CDOS de Faro, n.º 227/2018, n.º 228/2018, n.º 229/2018, n.º 235/2018, n.º 237/2018 e n.º

239/2018 (Anexo A1)".

Recorde-se que a atividade de vigilância é coordenada pelas equipas da GNR (Equipa de Manutenção e

Exploração de Informação Florestal - EMEIF), presentes em cada CDOS da Autoridade Nacional de Proteção

Civil (ANPC). Importaria assim avaliar a implementação das medidas adotadas, só possível depois do

Observatório obter a informação do Município de Monchique, GNR e ANPC referente a este capítulo,

nomeadamente os locais estratégicos de estacionamento ou de pré-posicionamento, e os circuitos de

vigilância móvel estabelecidos e, em concreto, a localização das equipas de vigilância móvel no horário entre

as 13:00 horas e as 14:30 horas de dia 3 de agosto de 2018. Sem esta informação não nos é possível

estabelecer o grau de cumprimento dos objetivos associados à deteção complementar às dos postos de vigia.

Recomenda-se fortemente que seja permanentemente recebida e registada a informação referente ao

posicionamento dos meios móveis de deteção. Só assim, aprendendo as lições, se poderá melhorar e otimizar

o sistema.

3.3 Evolução do incêndio e fatores determinantes

3.3.1 Evolução do incêndio

O estudo da expansão do incêndio tem agora a possibilidade de utilizar imagens de satélites que permitem

uma fácil ilustração e uma melhor interpretação da ocorrência. A Figura 13 dá-nos uma visão global da

evolução da área ardida desde 4 a 9 de agosto.

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Figura 13. Imagens obtidas pelo satélite Sentinel 3, entre as 10:00 e as 11:00 nos dias 4 e 5 (imagens de cima) e

nos dias 8 e 9 de agosto de 2018 (imagens de baixo). Fonte: COPERNICUS, Agência Espacial Europeia. No

meio à esquerda imagem de Landsat, no final da manhã de dia 5 de agosto de 2018. Fonte: USGS. No meio à

direita imagem de 7 de agosto de 2018 produzida a partir do VIIRS (middle infrared). Fonte: Agência Espacial

Europeia.

Desta sequência verifica-se a pequena dimensão da área ardida na manhã de dia 4, o aumento

significativo no dia 5, verificando-se na imagem de Landsat permitia ver um conjunto de pontos quentes que

iriam dar origem a novas expansões. O incêndio continuava ativo e no dia 7 de agosto observava-se um

perímetro com grande número de focos ativos bem documentados. O incêndio continua a sua expansão

registando-se no dia 8 a área ardida mostrada na imagem. Até à manhã de dia 9 de agosto o incêndio ainda

se prolongou para Este, como se mostra na figura, ficando nessa altura com a sua configuração final.

Para além da visualização da história geográfica do incêndio algumas imagens de satélite permitem

também uma indicação sobre a evolução da potência do próprio incêndio através da sua potência radiativa

(FRP). Este valor, em Mega Watts, foi calculado para o incêndio de Monchique para cada hora, usando o valor

máximo dos quatro valores medidos a cada 15 min pelo radiómetro SEVIRI (a bordo do Meteosat Second

Generation, MSG). Através desse método foi possível verificar a evolução da potência do incêndio desde o

seu início no dia 3 até ao final do dia 9 de agosto (Figura 14).

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Figura 14. Evolução da potência radiativa (FRP) do incêndio de Monchique (em Mega Watts) do dia 3 ao dia 9 de agosto

de 2018. Gráfico produzido a partir de dados fornecidos pelo Prof. Carlos da Câmara (Universidade de Lisboa)

(https://meetingorganizer.copernicus.org/EGU2018/EGU2018-15968.pdf). No gráfico as linhas verticais distinguem os dias.

Verifica-se que o incêndio esteve praticamente inativo na manhã de dia 4 e depois na manhã dos dias 5 e 6, que

constituíram as janelas de oportunidade referidas noutro capítulo.

A reconstrução mais detalhada da propagação do incêndio, efetuada com o apoio do Engenheiro Nuno

Guiomar (Universidade de Évora), recorreu a mais de 2000 pontos provenientes de informação obtida no

terreno e por deteção remota. Desse trabalho resultou a Figura 15 que resume a história geográfica e

cronológica do incêndio. As isócronas da expansão do incêndio permitem avaliar os períodos de maior

expansão e, por outro lado, a sobreposição das áreas ardidas de hora a hora com a cartografia do uso do solo

permite compreender o que ardeu e quando.

Figura 15. Reconstrução horária e diária da expansão do incêndio de Monchique, mostrando a grande

expansão do incêndio nos dias 5 e 8 de agosto.

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Constata-se na Figura 15 que, no dia em que o incêndio se iniciou (3 de agosto), se propagou

predominantemente para oeste, tendo queimado 325 ha em cerca de 10:00 horas. No dia 4, devido ao vento

proveniente de noroeste, que se manteria posteriormente e que viria a ditar a orientação NO-SE do incêndio,

percorreu mais 1719 ha, com a expansão mais significativa entre as 20:00 horas e as 24:00 horas. A maior

expansão do incêndio verificou-se, no entanto, no dia 5 de agosto, tendo sido estimada em 8587 ha,

correspondendo a 31,6% da área ardida total. No dia 5 o incêndio desenvolveu-se principalmente nas 6 horas

finais do dia e através de duas frentes, separadas por uma mancha que apenas viria a arder no dia 6. A frente

ocidental atingiu a interface urbano-rural de Monchique e percorreu 15,6 km em 6 horas, o que representa uma

velocidade média de propagação da cabeça do incêndio de 2,6 km/h. A frente oriental viria a impactar a

povoação de Alferce – que ficou isolada após a expansão do flanco direito da frente oeste e sem apoio de

bombeiros durante cerca de 5 horas – e progrediu 9,4 km em 3 horas (3,1 km/h), sendo que entre as 18:00

horas e as 19:00 horas quase atingiu 4 km/h, o valor mais elevado registado; a barragem da Odelouca acabou

por quebrar o seu avanço.

A intensidade da frente de chamas da cabeça do incêndio, dependendo da velocidade de propagação e da

carga de combustível consumida na propagação, terá variado entre 15.000 e 60.000 kW/m durante os

períodos mais críticos. Estes valores situam-se bastante acima da capacidade de extinção por meios aéreos

pesados. Esta fase mais severa do incêndio prolongou-se pelas duas primeiras horas do dia 6 e, globalmente

(em 8 horas), correspondeu a um avanço de quase 20 km no sector ocidental. A partir daí, e sensivelmente até

final do dia 7, o incêndio progrediu essencialmente através dos flancos e sem grandes oscilações na sua taxa

de expansão, que em média se cifrou em 166 ha/h.

Durante a manhã de dia 8 a taxa de crescimento do incêndio foi inferior ou similar àquela registada do dia

anterior. Recrudesceu porém entre as 16:00 horas e as 20:00 horas, período em que arderam 3069 ha e findo

o qual havia ardido 96,7% da extensão total (27154 ha) que o incêndio viria a alcançar. Esta expansão (que

alcançou 2,1 km/h na primeira hora) fez-se maioritariamente pelo flanco leste até à barragem do Arade e na

direção nordeste uma vez que o flanco oeste foi limitado pela área afetada por um grande incêndio ocorrido

em 2016.

Apesar da longa duração do incêndio é muito evidente a grande irregularidade na expansão da área ardida.

Com efeito, 62% da superfície queimada correspondeu apenas a 16% do tempo de duração do incêndio como

se pode verificar na Figura 16.

Figura 16. A taxa de expansão da área ardida (em hectares por hora) desde o dia 3 ao dia 9 de agosto. Note-se os rápidos

aumentos da área ardida no final de dia 5 e no princípio de tarde do dia 8 de agosto.

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As isócronas da Figura 15 e o gráfico da Figura 16 mostram que em todos os dias houve períodos durante

os quais o crescimento do incêndio foi muito limitado, com início entre a meia-noite e a madrugada, sendo as

condições para o combate descritas como favoráveis entre as 22:00 horas da noite e as 10:00 horas da manhã

(exceto durante a noite de 5 para 6 de agosto). Fotografias e filmes a que o Observatório teve acesso

evidenciam também este ciclo diário de contenção-reativação. Note-se que o incêndio foi descrito na respetiva

fita do tempo como "sem chama ativa em todo o perímetro" no dia 4 de agosto às 13:40 h, e com "95% do

perímetro sem chama" no início da manhã do dia 6, o que é coerente com o observado na Figura16.

3.3.2 Fatores determinantes

O contexto meteorológico e de vegetação favoreceu claramente o desenvolvimento do incêndio de

Monchique, dada a combinação de ventos fortes, com picos diários sempre acima dos 30 km/h, baixa

humidade relativa do ar e do combustível morto fino, cerca de 7% desde o início e que só aumentou a partir da

noite do dia 6 de agosto, e espaço florestal contínuo e constituído por formações vegetais propensas a fogos

rápidos e intensos (eucaliptal, matos, sobreiral com abundante desenvolvimento arbustivo).

As condições meteorológicas durante o período do incêndio estão ilustradas na Figura 17. Aí se

apresentam a evolução da temperatura, da humidade relativa do ar e do vento na estação de Foia e o valor do

índice de perigo meteorológico de incêndio (FWI) calculado em cada hora para a área de incêndio ativo.

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Figura 17. Evolução dos parâmetros meteorológicos, temperatura, humidade relativa do ar, velocidade do vento a 10 metros para a estação de Foia (IPMA) e índice de perigo meteorológico de incêndio (ISI e FWI) calculados de 10 em 10 minutos.

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É especialmente notória a coincidência entre o período de expansão máxima do incêndio, no final do dia 5,

com o aumento acentuado da velocidade do vento na estação da Foia (até um pico de 40 km/h) e o muito

elevado valor de FWI nesse período. A esse aumento segue-se um pronunciado decréscimo no início do dia 6,

referente à já descrita "janela de oportunidade" (Figura 17). Em geral, a expansão do incêndio foi dominada

por efeitos topográficos e convectivos durante as manhãs e pelo vento durante as tardes, com atividade muito

significativa de projeções geradoras de focos secundários a distâncias por vezes na casa dos 0,5-1 km.

Para além do fator meteorológico importa também considerar a vegetação. Uma análise da expansão

horária do incêndio através de uma regressão em árvore permitiu quantificar a importância relativa dos fatores

condicionantes da propagação. A análise explicou 88% da variação observada, sendo que a velocidade do

vento dominou a explicação (53% do total), seguida pela humidade do combustível morto (28%),muito

associada à humidade relativa do ar e só depois o tipo de vegetação (19%).

Apesar de a vegetação corresponder a uma fração reduzida da explicação da propagação, uma análise da

evolução horária da ocupação do solo na área ardida permite algumas considerações interessantes (Figura

18).

Figura 18. Composição percentual das formações ardidas durante a progressão do incêndio.

Da análise da Figura 18 verifica-se que nos dois primeiros dias (3 e 4 de agosto) o incêndio incidiu

principalmente em eucaliptal (55% da área ardida) e matos (29%) e a sua propagação não foi muito rápida

possivelmente pela defesa às manchas de eucaliptal jovem e sob gestão industrial.

A maior expansão do incêndio verificou-se no dia 5 de agosto, tendo atingido eucaliptal em cerca de 50%

da área ardida nesse período. Nos dias 6 e 7 de agosto a área ardida de matos (41% do total) ganhou terreno

face ao eucalipto (44%), e no dia 8 o incêndio consumiu essencialmente áreas de mato (70%). No dia 9, com

muito pouca área ardida foram as outras resinosas, neste caso sobretudo o pinheiro manso, o mais

representado.

A análise efetuada permitiu também identificar a correspondência entre maiores taxas de crescimento da

área ardida e maior proporção de matos e sobreiro (que apresentava uma significativa componente arbustiva).

O mesmo se pode observar comparando os gráficos das Figuras 16 e 18.

A evolução do incêndio condicionou e foi também condicionada pelas operações de combate descritas em

seguida.

3.4 O Ataque Inicial

"O Ataque Inicial (ATI) a um incêndio nascente ou recém-detetado constitui uma obrigação de qualquer

cidadão, atendendo a que é em princípio mais fácil e viável suprimir um foco de incêndio quando ele se

encontra na sua fase nascente. No âmbito do sistema a sua execução está atribuída em especial aos Corpos

de Bombeiros (CB), à GNR, às Equipas de Sapadores Florestais (ESF) e a equipas de Empresas ou

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organizações de produtores. Tecnicamente, é uma intervenção organizada e integrada, sustentada por um

despacho inicial de meios até 2 (dois) minutos depois de confirmada a localização do incêndio, garantindo que

existem meios em combate, de qualquer tipologia, até ao máximo de 20 minutos após o alerta. Esta doutrina

está sustentada no conceito de triangulação, ou seja, o despacho de 3 Veículos de Combate a Incêndios (VCI)

dos três Corpos de Bombeiros mais próximos do local do incêndio, tendo em vista uma ação rápida e incisiva

nos primeiros momentos. Esta ação deve ser complementada, de forma imediata, pelo despacho de um meio

aéreo de ATI e respetiva equipa/brigada helitransportada, se a localização do incêndio se encontrar no raio de

atuação de meios aéreos de ATI, de acordo com o nível de empenhamento e dispositivo disponível que se

verificar no momento do evento" (Relatório do Observatório 2018).

O ATI é definido pela duração máxima de 90 minutos, tempo este associado à autonomia do meio aéreo

ligeiro. Esta ação termina quando o incêndio for considerado dominado (em resolução) pelo COS no local, ou

no momento em que o incêndio passa a Ataque Ampliado (ATA).

No caso deste incêndio o alerta foi registado às 13:32 horas do dia 3 de agosto. De acordo com os

relatórios dos Briefings Técnico-Operacionais (BTO) do CDOS de Faro que precederam a ocorrência, a zona

estava sob Alerta, garantindo-se o pré-posicionamento da ECIN H24 (Marmelete), mobilização de 25% do

efetivo em pré-alerta e a mobilização de uma máquina de rastos e de um trator com porta-máquina em 30

minutos (BTO N.º 227/2018), bem como o pré-posicionamento de ELAC H12 entre as 08:00 horas e as 20:00

horas em Marmelete (BTO N.º 235/2018). No dia 2 foi estabelecido o nível de Alerta Vermelho até às 23:59

horas do dia 3 de agosto (BTO N.º 237/2018), o que obriga a aplicar os procedimentos operacionais previstos

na DON N.º 2 e Plano de Operações do Algarve, tais como medidas de prevenção ativa e de planeamento

operacional, com vista a garantir uma resposta antecipada e imediata a possíveis emergências. Neste

contexto operacional foram pré-posicionadas a BCIN Barlavento 01 (VCOT, 2 ECIN e ELAC Lagoa) em Alferce

(Monchique) e a GRUATA 02 Lisboa em São Marcos da Serra (Silves), mantendo-se os demais meios

estabelecidos nos BTO anteriores. Adicionalmente, e de acordo com o BTO N.º 239/2018, no dia 3 de agosto

foi pré-posicionada a ELAC do CB de Olhão em Monchique pelas 09:00 horas.

À hora do alerta é acionado o despacho de 1.º alerta para o local da ocorrência, sendo o 1.º COS o chefe

da equipa GIPS da GNR. O despacho implica uma ordem de incorporação dos meios no dispositivo de

extinção. Importa destacar que apesar da distância relativamente curta (cerca de 20 km a partir dos locais de

pré-posicionamento), a sinuosidade do relevo e o tipo de piso condicionaram a mobilidade dos meios

terrestres de combate, cuja velocidade de deslocação é adicionalmente limitada pelo transporte de água.

O conceito de triangulação foi cumprido, através de três meios de combate de três CB diferentes e um meio

aéreo ligeiro (ECIN dos CB Monchique, Aljezur e Portimão e meios aéreos H37 e H46), tendo sido

substancialmente reforçado a partir do momento em que chegam os primeiros pontos de situação

desfavoráveis.

Apresentam-se no mapa e Quadro1 os itinerários mais curtos simulados através do Google Earth Pro a

partir dos LEPP para o ponto provável de início do incêndio, registando-se as distâncias correspondentes que,

dadas as caraterísticas da rede viária florestal em que a velocidade média dos veículos é aproximadamente de

25 a 30 km/h, resultam nos tempos aproximados de chegada ao local provável de ocorrência indicados.

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Quadro 1. Itinerários simulados a partir dos LEPP até ao ponto provável de início do incêndio com

indicação de distâncias e tempos aproximados ao local provável da ignição. Fonte: Google Earth Pro;

Open Street Map.

Aos seis minutos os meios são reforçados com meio aéreo da AFOCELCA e equipa de reconhecimento

(ERAS). Aos 8 minutos são despachados dois aviões anfíbios Fire Boss, com indicativo Alfa 08 e Alfa 09. O

Grupo de Ataque Ampliado (GRUATA) de Lisboa (com meios dos Corpos de Bombeiros daquele distrito) que

se encontrava pré-posicionado em São Marcos da Serra é mobilizado. Aos 12 minutos é acionado um heli

pesado Kamov (H73). Aos 14 minutos são acionadas seis brigadas do distrito de Faro e um novo GRUATA,

Lisboa 02 que se encontrava pré-posicionado em Ourique.

Apesar da capacidade de mobilização na fase do ATI ter sido excecional, tal não se traduziu em resultados

objetivos, atendendo à evolução do incêndio. O Comandante piloto do H37, e respetiva equipa

helitransportada, primeira equipa a chegar ao TO, informaram que o incêndio já afetava uma área bastante

significativa.

Entre a hora de alerta e a hora de despacho de meios cumpriu-se com rigor o padrão de despacho de

meios em dois minutos. O limite de 20 minutos para a chegada do primeiro meio em combate também foi

cumprido, através do meio aéreo de ATI. Tal como já indicado, o tempo de deslocação dos meios terrestres a

partir de Monchique e dos LEPP até ao ponto de início não seria nunca inferior a 30 minutos, sobretudo com

meios terrestres pesados. Fica por determinar qual a hora de início do incêndio, mas tendo como base uma

fotografia da coluna de fumo às 13:34 horas, conclui-se que este não se terá iniciado muito antes. Conforme

referido noutro ponto deste documento, as condições pirometeorológicas eram extremamente adversas,

caracterizadas por comportamento extremo do fogo em zona de declive acentuado. Por essa razão, o incêndio

aumentou rapidamente as suas proporções (Figura 19).

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Figura 19. Fotografias da evolução da fase inicial do incêndio a partir de pontos diversos

(coordenadas 37,40°N; 8,48°W, as duas fotografias de cima e 37,40°N; 8,55°W as duas de

baixo). Fonte: AFOCELCA.

O 2.º comandante do CB de Monchique, ainda em trânsito para o TO emite o seguinte pedido “…situação

complicada necessito de reforço de meios para o TO…”. O chefe da equipa helitransportada no seu primeiro

ponto de situação (POSIT) refere: “…Incêndio em eucaliptal e mato arde com muita intensidade, declive

acentuado, necessários mais meios para o local”. Decorreram cerca de 10 minutos desde o alerta até às

declarações dos operacionais, os quais se estima que necessitariam de mais 20 minutos para chegar ao local.

Por outro lado, o tempo entre a declaração do chefe da equipa helitransportada e a hora estimada de início

ronda cerca de 25-30 minutos, o que indica que o incêndio teria completado a sua fase de aceleração inicial,

pelo que estaria já fora da capacidade de extinção dadas as condições pirometeorológicas em vigor.

3.5 O Ataque Ampliado

"O início do ataque ampliado é obrigatoriamente garantido sempre que, após atingidos os 90 minutos de

intervenção desde o despacho do primeiro meio de ATI, o incêndio não tenha sido dado como dominado (ou

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em resolução) pelo Comandante das Operações de Socorro. A ação de ATA pode mesmo iniciar-se antes de

se atingirem os primeiros 90 minutos de operação quando a previsão da evolução do incêndio, efetuada pelo

COS, assim o determine" (Relatório do Observatório 2018).

Operacionalmente, o incêndio de Perna da Negra em Monchique passou à fase ATA às 15:02 horas do dia

03AGO2018. No “Relatório de Primeiras Impressões ao incêndio de Monchique” elaborado pelo Comandante

Operacional Distrital de Faro, foram sucessivamente solicitados ao Comando Nacional um conjunto

significativo de meios, pedidos esses integralmente correspondidos, nomeadamente quatro Grupos de Reforço

para Incêndios Florestais (GRIF), uma bateria de máquinas de rasto, grupos dos GIPS e da FEB e pelotões

militares. A prontidão e despacho de meios foi facilitada pela ausência de incêndios significativos e

simultâneos no país, o que permitiu a mobilização máxima dos diversos recursos.

A significativa mobilização de reforço de meios nesta fase do ATA (meios aéreos pesados e grupos de

reforço) conseguiu-se através de um processo de balanceamento de meios intradistritais de socorro e apoio

terrestres, por despacho do CDOS, e/ou de meios interdistritais ou nacionais terrestres e aéreos, por despacho

do CNOS. Houve também cooperação de outros organismos ou instituições nacionais ou estrangeiras, tendo

sido ativado o acordo bilateral com Espanha, que permitiu a mobilização de três meios aéreos pesados

Canadair.

Entre as 23:00 horas do dia 3 de agosto e as 08:30 horas do dia 4 de agosto a área ardida acumulada e

perímetro evoluíram de 325 ha e 9 km para 535 ha e 12 km. O incêndio, agora sob condições

pirometeorológicas menos adversas e estando disponíveis um conjunto apreciável de recursos de combate,

esteve muito perto de ser dominado na manhã do dia 4 de agosto, constituindo essa a primeira oportunidade

perdida para o seu controlo. A janela de oportunidade persistiu até às 12:00 horas de 4 de agosto, não tendo

sido “fechadas” e/ou vigiadas adequadamente as linhas de controlo. Poderão ser avocadas dificuldades

impostas pela orografia, condicionando a materialização das determinações operacionais. Contudo, o relatório

do Comandante Operacional Distrital de Faro refere “…falta de atitude e proatividade, por parte de algumas

equipas e grupos em alguns momentos, incluindo o facto de não realizarem tarefas de consolidação da

extinção, quando tal lhes foi solicitado.”. Este tema será desenvolvido mais adiante quando tratada a questão

específica do rescaldo.

No dia 5 de agosto foi consolidada a zona norte do incêndio e é estabelecida uma estratégia no sentido de

o dominar durante a noite de 5 para 6 de agosto. Para o efeito são solicitados meios adicionais de modo a

garantir operacionais com maior disponibilidade física, tendo-se somado ao dispositivo de extinção do incêndio

mais seis GRIF, máquinas de rasto, FEB e GIPS. Durante a tarde as condições meteorológicas agravaram-se,

embora no período noturno se tenha colocado o plano estratégico em ação conforme previsto. Ainda assim, a

capacidade de antecipação dos meios de combate foi insuficiente e o incêndio propagou-se de forma violenta

e rápida até à EN 266, que constituía a linha de controlo, alcançando em poucas horas a povoação de Alferce.

É ao início da noite que o incêndio entra na vila de Monchique, obrigando a um reforço adicional de meios para

a sua defesa perimetral.

Na manhã do dia 6 a estratégia de ataque ampliado pareceu finalmente dar frutos, registando-se na fita de

tempo que “…95% do perímetro não existe chama ativa, no entanto existem muitos pontos quentes que têm

todas as condições para terem reativações fortes sem capacidade de combate, atendendo a que as mesmas

podem ocorrer em zonas inacessíveis a meios terrestres e com limitação de operação com meios aéreos, o

que não permitirá retardar a progressão do incêndio de forma a projetar meios terrestres.” Nesta fase do

incêndio, o potencial de reativação com intensidade dos flancos do incêndio aparenta ter sido subavaliado,

considerando que 5% do perímetro estava por consolidar, o que corresponde a aproximadamente 4 km. Sendo

assim, parece-nos ter sido perdida mais uma oportunidade para controlar o incêndio. Na tarde de dia 6 viam-

se já diversas colunas de fumo (Figura 20).

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Figura 20. Fotografia ilustrativa de parte do perímetro do incêndio, onde se observam

inúmeras colunas de fumo, no dia 6 de agosto pelas 15:26 horas. Fonte: AFOCELCA.

Importa salientar que não é normalmente feito o levantamento georreferenciado do perímetro do incêndio

durante as ações de REVIS, tal como ocorreu neste incêndio, bem como a análise individual das frentes ativas

para estimar o comportamento potencial do fogo, assim como estimar a quantidade e tipologia de recursos e

meios necessários para o perímetro atual e para o perímetro expectável. Nestes teatros de operações é regra

geral a ausência de mapas operacionais com os perímetros devidamente cartografados e a sua distribuição

pelos operacionais envolvidos na extinção, o que se traduz em maior risco de acidentes e dificuldade em

operacionalizar a estratégia de combate e as respetivas táticas.

Figura 21. Fotografia do dia 7 de agosto pelas 9:30 horas, registando-se inúmeras colunas de fumo

junto a extensas áreas que ainda não tinham ardido, no entanto nesta zona não se encontrava

qualquer meio de combate. Fonte: AFOCELCA.

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É no dia 6, pelas 23:50 horas, que o Comando Nacional entende assumir o Comando da Operação (na

pessoa do segundo Comandante Operacional Nacional), o que acontece formalmente no dia 7 de agosto às

18:26 horas.

A partir da manhã do dia 8 de agosto o principal objetivo era conter o incêndio nos limites estabelecidos, a

Este no IC1, a Sul na EN124, a Oeste na zona da Foia. Nos dias 8 e 9 deu-se início à recuperação da

organização do TO, verificando-se ainda intensa atividade operacional, tendo o incêndio sido formalmente

dominado no dia 10 de agosto às 07:55 horas.

Destacamos de novo o relatório de primeiras impressões do Comandante Operacional Distrital de Faro,

onde são referidos os pontos positivos, pontos de melhoria e conclusões, com o qual, no essencial,

concordamos. Tendo já sido referidas as falhas de consolidação perimetral em locais críticos, citamos do

referido relatório o seguinte: “…Apesar de terem formação e equipamento adequado, denotou-se pouca

disponibilidade dos militares que integram os pelotões para realizarem ações de rescaldo, estando mais

interessados em limitar o seu empenhamento apenas a ações de vigilância.” Na mesma linha, o relatório

operacional preliminar do Comando Nacional de Operações de Socorro, no ponto 3, alínea n) nos pontos de

melhoria, refere: “sensibilizar os pelotões militares para a necessidade de intervenção com ferramentas

manuais”.

Esta situação de inércia ou passividade poderá ser motivada por receio e inexperiência em incêndios

complexos, mas não se deve generalizar a todos os operacionais envolvidos. Quando uma frente está fora de

capacidade de extinção é recomendável aguardar pela mudança do comportamento do fogo, contudo sem

deixar de operar nas secções do perímetro que se encontrem dentro da capacidade de extinção ou

necessitem de um musculado trabalho de rescaldo.

A Figura 22 faz a correspondência aproximada entre o número de operacionais e a evolução diária do

perímetro, entre os dias 3 e 9 de agosto. Com base nos dados referentes à “Notificação” do COS e registados

no Relatório de Ocorrência 2018080033743, estima-se para o total do incêndio um número médio de 26

operacionais por quilómetro de perímetro do incêndio. Trata-se de um valor que supera qualquer um dos 100

incêndios de dimensão superior a 2500 ha incluídos num estudo efetuado para o período 1998-2013

(Fernandes et al. 2016).

Figura 22. Distribuição do número de operacionais segundo a evolução do perímetro do incêndio entre o dia

3 e o dia 9 de agosto de 2018. Fonte: Relatório de Ocorrência 2018080033743 - Incêndio de Monchique -

ANPC.

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Os trabalhos de extinção que sejam planificados devem ser executados em função dos meios e recursos,

bem como da capacidade de extinção de que dispõem, com vista a atingir os objetivos dentro de um espaço

físico e temporal, evitando-se a resposta reativa ao fogo, como sucedeu em diversos momentos deste

incêndio. Não menos importante é as operações de vigilância armada não se reduzirem apenas à observação,

mas obrigatoriamente ao percurso apeado junto das linhas de controlo com apoio de ferramentas manuais e

água, com o objetivo de impedir reativações.

Os meios e as abordagens diversas dentro do conceito de Ataque Ampliado são tratados neste relatório

nas secções seguintes, dedicadas aos meios aéreos, ao fogo de supressão e às máquinas de rasto.

3.5.1 Os meios aéreos

Estamos na presença de um incêndio cuja área ardida estimada ultrapassa os 27 mil ha. A supressão

desta ocorrência envolveu 3005 operacionais, 855 meios terrestres e 28 meios aéreos. A alocação de meios

aéreos ao incêndio de Monchique foi significativa, somente sendo possível pela circunstância de o resto do

país não registar ocorrências significativas. O distrito de Faro tem uma cobertura integral de meios aéreos de

1.ª intervenção. Acresce que a parelha de aviões médios Fire Boss esteve disponível para dar um contributo

ainda em fase de ATI.

Os meios aéreos mobilizados para este incêndio cobriram várias tipologias, de asa rotativa e de asa fixa.

De asa rotativa, Heli ligeiros, empenhados no ATI desde o início, Heli médios e Heli pesados Kamov. De asa

fixa, aviões médios Fire Boss usados em ATI e em ATA atendendo ao seu pré-posicionamento em Portimão, e

aviões pesados Canadair do dispositivo nacional, bem como três Canadair espanhóis, ativados no âmbito do

acordo bilateral entre os dois países, que estiveram em operação permanente entre os dias 7 e 9 de agosto.

As condições meteorológicas prejudicaram em muitos momentos a eficaz utilização dos meios aéreos,

devido à força e turbulência do vento e à falta de teto por ação do fumo do incêndio num território difícil, que

originou, não raras vezes, serem evocadas razões de segurança para não poderem operar. Esta situação

agravava-se durante a manhã, quando os meios aéreos seriam mais efetivos, mas em que as condições de

inversão térmica na baixa atmosfera mantinham o fogo latente mas impediam o apoio com meios aéreos.

De registar que a pista de Portimão consta na DON n.º 2 como centro de meios aéreos (CMA) alternativo.

Está por explicar o porquê dos meios aéreos de asa fixa terem deixado de abastecer em Portimão, alegando

falta de condições, e terem passado a fazê-lo a partir da base aérea de Beja, com várias consequências,

desde logo menos autonomia no TO e impacto na rotatividade, não permitindo otimizar meios que são

escassos e de custo significativo.

A utilização de meios aéreos sem equipas de apoio terrestre não é de todo eficiente. Importa no futuro

mudar protocolos e integrar equipas terrestres ou aerotransportadas para apoio aos meios aéreos, pois são os

operacionais em terra que extinguem incêndios (Fernandes et al. 2016).

3.5.2 O uso do fogo de supressão

O fogo de supressão pode ser, se bem realizado, uma ferramenta muito poderosa no combate ao incêndio.

A fita de tempo do incêndio disponibilizada pela ANEPC refere o uso do fogo de supressão por equipas da

FEB (EAUF, ERAS ou GRUATA) em vários momentos no decorrer do incêndio. Com uma exceção (às 16:46 h

do dia 8), as manobras de fogo de supressão decorreram todas durante a madrugada e início da manhã, nos

dias 4, 5, 8 e 9, portanto nas condições mais seguras.

Não é possível avaliar o impacto das manobras na contenção e extinção do incêndio, exceto em dois casos

reportados nos relatórios de intervenção das EAUF, os quais detalham o modus operandi e extensão da

manobra e descrevem o respetivo desfecho:

1 – No dia 4 de agosto (01:50 horas), um contrafogo junto a Aderneira, com o objetivo de facilitar a

extinção de um foco secundário e circunscrever a uma estrada a propagação das carreiras topográficas

do incêndio. A manobra fez-se numa extensão de 266 m e foi bem-sucedida.

2 – No dia 8 de agosto (17:00 horas), um fogo tático nas imediações da barragem do Arade, para

salvaguarda de duas habitações. A manobra alcançou 190 m e o seu desfecho foi positivo.

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No dia 9 de agosto (07:00 horas) há menção de um fogo tático entre Talurdo e a barragem do Funcho,

validado pelo COS, mas que por falta de autorização do comandante da frente não chegou a ser executado.

Quadro 2. Registos sobre o uso do fogo entre os dias 3 e 13 de agosto de 2018. Fonte: Relatório de Ocorrência 2018080033743 -

Incêndio de Monchique - ANPC. Elaboração Própria: Observatório Técnico Independente, 2019.

Há também a referir o uso de fogo, provavelmente por populares, na zona de Barão de São João,

identificado pela GNR e comunicado ao Posto de Comando, mas sobre o qual não dispomos de mais

informação.

Quando questionado pelo OTI sobre o uso do fogo (27 de fevereiro de 2019, Silves), o CODIS de Faro,

Comandante Vaz Pinto, referiu que muitos operacionais executaram manobras com fogo sem o conhecimento

e a autorização do COS e que o que fizeram foi mal feito. Igualmente referiu que não existe um mapa ou um

plano estratégico específico no teatro de operações para a manobra de fogo de supressão, declarando ainda

que este tipo de manobras deveria ser realizado durante o dia e nunca de noite.

Globalmente, e tanto quanto é permitido concluir da informação disponível, foi muito reduzido o impacto

das operações de fogo de supressão no desenrolar do incêndio.

É certo que as formações arbustivas do território afetado, dominadas por esteva (Cistus ladanifer), têm um

intervalo muito curto para um uso seguro e eficaz do fogo de supressão. Durante as primeiras horas da tarde e

até ao seu final ardem com muita intensidade. Pelo contrário, a propagação do fogo pode encontrar

dificuldades durante a noite e com a subida da humidade relativa do ar.

Nos incêndios com comportamento topográfico, o desenvolvimento do fogo é controlado essencialmente

pelo declive e rugosidade do terreno, exposição das encostas e ventos locais, ou seja, a sua intensidade e

direção variam ao longo do dia, com “arranques” previsíveis, o que facilita a análise antecipada da propagação

potencial. Logo, o uso do fogo tático e contrafogo podem ser cruciais na limitação da propagação. De acordo

com os elementos registados, o seu uso foi reduzido e provavelmente muito condicionado pela falta da

familiaridade do COS com a técnica, já que o uso do fogo de supressão não é prática comum no território

como noutras regiões do país.

Dia Hora Descrição Nota

04/08/2018 01:50

COS informa Equipa EAUF FEB vai realizar uma ação de "fogo controlado" no Setor Alfa para garantir condições de segurança para os operacionais. COORDENADAS DE INÍCIO: 37° 22.349'N | 8° 35.660'W;

COORDENADAS DE FIM: 37° 22.265'N | 8° 35.580'W

Consta em Relatório da EAUF03 FEB.

Manobra bem sucedida.

04/08/2018 01:59 Operações de "fogo controlado" pela equipa EAUF FEB realizada no

Setor Alfa com sucesso

05/08/2018 03:10 PCO foi informado que foi efetuado fogo tático pela EAUF 01 FEB com início às 03:10 nas coordenadas 37°21.4934N|08°33.1554W e final às

04:30 nas coordenadas 37°21.4072'N e 08°33.5609'W

Não se obteve relatório

05/08/2018 08:34 CMDT Setor Delta solicita autorização para uso de "fogo controlado" pela

equipa ERAS FEB. COS autoriza manobra de "fogo controlado". Não se obteve

relatório

05/08/2018 09:14 CMDT Setor Charlie pede autorização para uso de "fogo controlado" pelo

GRUATA FEB. COS Autoriza manobra. Não se obteve

relatório

08/08/2018 04:57 FEB procede a fogo tático nas coordenadas N37°21.2292'N

W08°35.5774'W Não se obteve

relatório

08/08/2018 13:34 GNR info PCO indivíduo a puxar fogo na zona de Barão de São João -

AA Lagos Não se obteve

documento

08/08/2018 16:46 EAUF03 info PCO manobra de supressão junto à barragem do Arade

para tentar desviar o incêndio das habitações | HI 16:44 - 37°14,3420’N | 08°26,4537’W

Consta em Relatório da EAUF03 FEB.

Manobra bem sucedida

09/08/2018 00:42 CDOS Faro/PCO: Informa alerta de incêndio para a localidade de

Talurdo, interroga se EAUF ainda está a fazer manobras de fogo nesse local. PCO info MR no local/EAUF FEB/ ICNF

Consta em Relatório da EAUF03 FEB. A

manobra foi validada pelo COS mas anulada pelo

comandante da frente que não concordou.

09/08/2018 08:48 Despacho 08:50 horas, fogo de supressão a ser supervisionado pelo

Comandante de Setor Delta - Bugado, Silves

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32

Por outro lado, as decisões sobre o uso do fogo devem cumprir a janela de oportunidade ou a também

designada “etiqueta horária”. Tal decisão não pode nem deve depender das opiniões dos elementos com

responsabilidades na cadeia de comando que compõem o SGO, sendo que a tomada de decisão é

exclusivamente do COS, tal como consta no artigo 16.º do Despacho n.º 7511/2014, de 9 de junho, que

homologa o Regulamento do Fogo Técnico.

3.5.3 O uso de máquinas de rasto

As tarefas de consolidação perimetral implicam que o trabalho das máquinas de rasto, que neste incêndio

foi significativo (26 unidades), seja acompanhado e complementado com meios terrestres e com o uso de

ferramenta manual. Tal não se efetivou e são inúmeros os registos fotográficos que demonstram esta falha

operacional, muito recorrente nos grandes incêndios florestais em Portugal. Adicionalmente, o trabalho de

extinção com máquinas de rasto tem limitações operacionais e requer operadores experientes em incêndios

florestais. Algumas situações que exemplificam deficiente uso das máquinas de rasto são mostradas na Figura

23.

Figura 23. a) Ponto quente na área verde (ainda não ardida) por arrastamento de material em combustão pela abertura de linha de

defesa com máquina de rastos; b) Parte da área ardida (em combustão) do lado esquerdo da foto ficou do lado de fora da linha de

defesa aberta pela máquina de rastos; c) Linha de defesa aberta com máquina de rastos é ultrapassada duas vezes por deixar

material ardido do lado de fora da linha. Fonte: AFOCELCA.

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Constatámos igualmente, na visita a Monchique e a Silves e nas reuniões aí realizadas, que muitas

máquinas de rasto trabalharam maioritariamente sem o apoio de meios de combate e de pessoal capaz de

supervisionar o seu trabalho. Em vários sectores do incêndio estiveram disponíveis, mas inativas, sendo que

algumas nunca trabalharam, seja por falta de operador, de combustível ou tão só por falta de atribuição de

missão.

Com base no relatório da AFOCELCA sobre este incêndio e no que ao ATA diz respeito, constata-se um

alinhamento com os demais documentos produzidos, sendo que no empenhamento das máquinas de rasto

não foi possível estabelecer uma estratégia com o combate organizado no seu todo, seja com os demais

meios terrestres, seja com os meios aéreos.

3.6. As operações de rescaldo, reativações e reacendimentos

Os problemas associados às operações de rescaldo dão origem a reativações e reacendimentos, que são

fenómenos do mesmo tipo mas diferentes na sua definição. A Diretiva Operacional Nacional 2 (DON2)

esclarece que, enquanto a reativação se refere a um "aumento de intensidade de uma parte ou de todo o

perímetro de um incêndio durante as operações de rescaldo e antes de este ser considerado rescaldado, pelo

COS", o reacendimento é "uma nova ocorrência que tem início no perímetro da área afetada por um incêndio

considerado extinto (após términus das ações de rescaldo e vigilância), ou seja, em que todos os meios já

abandonaram o teatro de operações. Estas ocorrências têm obrigatoriamente área ardida associada às quais

é atribuído o tipo de causa ‘reacendimento’ e a causa 711 – ‘fonte de calor do incêndio anterior’.

Tal como consta nas secções anteriores, terão existido diversas oportunidades perdidas em momentos em

que o incêndio parecia estar dominado e em que a questão do rescaldo poderia ser determinante.

Referem-se em particular as "janelas de oportunidade" entre a noite de dia 3 e a manhã de dia 4, quando o

incêndio esteve quase inativo, a noite entre o dia 4 e 5 e a madrugada do dia 6, em que a meteorologia se

mostrou mais favorável. Nesta secção iremos detalhar os factos da noite e manhã de 3 para 4 de agosto,

altura em que o incêndio esteve praticamente extinto, em que ainda tinha uma dimensão e um perímetro

pouco expressivos (relativamente à dimensão final) e em que as operações de consolidação e rescaldo

poderiam ter feito uma grande diferença.

De acordo com a diversa informação consultada (ANPC e AFOCELCA) o incêndio encontrava-se

praticamente extinto ao final da madrugada do dia 4, ou seja, com cerca de 20:00 horas de atividade. Da

análise do incêndio pelo NAD-AIR pelas 02:40 horas do dia 4 de agosto, dão-se as várias recomendações

(Informação Operacional n.º 2 relativa à ocorrência ANPC 2018080033743), Refere-se nomeadamente a

necessidade de aproveitar a janela de oportunidade noturna (inversão térmica), flanquear todo o perímetro do

incêndio, preferencialmente com recurso a máquinas de rastos, apoiada com meios terrestres e ferramenta

manual e rescaldar todas as orlas do perímetro realizando separação de combustível.

De acordo com o relatório AFOCELCA ao final da manhã do dia 4 existiriam quatro pontos críticos: dois a

norte e a oeste a cargo da AFOCELCA e dois a sul e a leste a cargo da ANPC. São precisamente os dois

últimos pontos que reativam cerca das 14:30, dando origem à segunda fase do incêndio que passa a

propagar-se para Sul-Sudeste, e a partir da qual tudo se complica em termos operacionais. Aparentemente

não terão sido cumpridas as recomendações feitas pelo NAD-AIR de modo a extinguir todos os focos de

combustão, tendo o incêndio reativado na hora de maior calor. Não chegou a este Observatório informação

detalhada sobre o que se terá passado para que não tenha existido uma completa extinção do incêndio nestes

dois pontos críticos. No entanto diversas informações indiciam que o desempenho das equipas colocadas

nestas zonas não terá sido o mais adequado de modo a garantir a completa extinção do fogo. Nem sempre é

possível chegar aos locais com máquinas de rasto, nomeadamente em encostas muito declivosas, pelo que

pelo menos nesses casos, devem ser utilizadas ferramentas manuais. No entanto não temos conhecimento de

terem sido envidados esforços nesse sentido, nem também, diga-se, sobre a exequibilidade prática deste tipo

de operações nesses pontos. Em todo o caso, tudo leva a crer que terão existido condicionantes de natureza

operacional que terão permitido que o incêndio se reativasse numa altura em que todos os focos de

combustão deveriam estar extintos.

Há nos documentos consultados várias referências a insuficiências no trabalho de rescaldo e consolidação.

Por exemplo nos pontos de melhoria do Relatório Primeiras Impressões assinado pelo CODIS de Faro,

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comandante Vaz Pinto a 20 de Agosto, refere-se que: “registou-se falta de atitude e proatividade, por parte de

algumas equipas e grupos em alguns momentos, incluindo o facto de não realizarem tarefas de consolidação

da extinção, quando tal lhes foi solicitado” e que “a falta de condições de segurança é alegada muitas vezes

pelos operacionais quando não querem executar uma manobra que lhes foi determinada”.

Também no relatório da AFOCELCA sobre o mesmo incêndio se refere que não houve capacidade técnica

e operacional para controlar o incêndio na tarde-noite da sexta-feira 3 de agosto, e que o incêndio também não

foi fechado durante a manhã do sábado 4 de agosto, onde existiram condições meteorológicas favoráveis para

tal e tendo sido identificados atempadamente os pontos críticos e de fácil resolução. Por outro lado, o mesmo

relatório refere deficiências, também apontadas pela ANPC, quanto à necessidade de supervisionar

tecnicamente o trabalho das máquinas de rasto e de o complementar com outros meios como ferramentas,

água e uso do fogo técnico. Ainda no mesmo relatório é feita uma referência a deficiências na vigilância,

referindo-se que deve existir rigor e zelo na realização destas tarefas tão importantes, devendo haver uma

vigilância proactiva e uma assunção de responsabilidade sobre as possíveis reativações futuras.

Muito embora não existam detalhes ao nível operacional que permitam conhecer em pormenor o que

aconteceu para que não se tenham aproveitado as janelas de oportunidade, em particular a que decorreu na

madrugada-manhã do sábado dia 4, tudo aponta para que, apesar do enorme dispositivo colocado no terreno,

a utilização desses meios não tenha sido eficaz.

Desta análise surgem algumas conclusões e recomendações que importa destacar. Em primeiro lugar

constata-se, neste caso, um elevado número de reativações por deficiente rescaldo. Esta constatação é

coerente com a do muito elevado número de reacendimentos em incêndios florestais em Portugal, problema já

identificado pelo menos desde o Projeto de Cooperação Técnica em Incêndios Florestais EUA – Portugal, de

2004, e apontado como uma grande falha no sistema de combate a incêndios.

Apesar de se ter estabelecido no PNDFCI como meta a redução da percentagem de reacendimentos para

menos de 1%, as estatísticas oficiais sobre incêndios continuam muito longe disso, com valores em vários

anos a rondar ou a ultrapassar os 10%.

No caso concreto do incêndio de Monchique (Relatório de Ocorrência 2018080033743), entre o dia 4 e o

dia 13 de agosto, verifica-se a ocorrência de 93 reativações, sendo as mais importantes aquelas que

ocorreram entre o dia 4 e o dia 9 de agosto. Em termos percentuais, a larga maioria dos reacendimentos

deram-se entre as 12:00 horas e as 18:00 horas, cerca de 56%, coincidindo com as condições meteorológicas

mais favoráveis para um aumento da intensidade do fogo (aumento da temperatura, descida da humidade

relativa e aumento da velocidade do vento geral e topográfico).

Frequentemente aponta-se como razão para não se dedicar tempo suficiente ao rescaldo, o facto de ser

necessário acorrer a vários incêndios ao mesmo tempo, razão que parece plausível em dias e regiões onde

existe um número extremamente elevado de ocorrências simultâneas. No entanto, no caso de Monchique esse

não foi definitivamente o caso dado não ter havido uma dispersão de meios por múltiplas ocorrências.

As razões de fundo para esta inoperacionalidade residem em deficiências há muito identificadas: a pouca

apetência para trabalhar com ferramentas manuais por parte de uma grande parte dos operacionais; a falta de

sentido preventivo no sentido de apenas dar como resolvido o incêndio quando estão eliminados todos os

focos de combustão, com e sem chama; a baixa proatividade de uma parte das forças de combate para se

empenharem a resolver um problema no momento e no local que têm a seu cargo.

Face a estas limitações não há planeamento nem tática nem empenho musculado de meios que resolva o

problema. Frequentemente a diferença entre um incêndio de apenas 620 ha ou de 27 mil ha, como foi o caso,

é ditada no momento e no local em que alguém ou algum grupo não se empenha para resolver um problema

que é da sua inteira responsabilidade.

A resolução do problema passa inevitavelmente por uma maior especialização e responsabilização das

forças que atuam nos teatros de operações. O trabalho com ferramentas manuais deve ser estimulado e

tornado obrigatório em todas as situações que beneficiem do uso desta técnica, nomeadamente nas

operações de rescaldo.

As operações de rescaldo devem ser realizadas por equipas frescas em número suficiente de acordo com

o perímetro de incêndio, as quais deverão trabalhar em plena autonomia e com um responsável pelas

operações. Estas equipas não deverão intervir nas operações de combate, mas dedicarem-se exclusivamente

à árdua tarefa de rescaldo.

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O rescaldo deverá ser realizado dentro do período horário menos favorável para a propagação, tendo em

conta a hora solar e priorizando as operações pelo potencial de reacendimento: carga de combustível, ponto

de orvalho, exposição solar e mudanças de vento.

O problema da responsabilização é absolutamente fundamental. Deverá existir uma identificação clara de

quem tem a responsabilidade de consolidar e rescaldar o incêndio em cada local da área queimada

considerado crítico.

3.7 A segurança das populações

A segurança das populações foi, neste incêndio, uma preocupação fundamental num esforço para evitar a

repetição, ainda que em menor escala, das tragédias de 2017. Assim, as autoridades tomaram a opção de

retirar as pessoas do trajeto do incêndio, recorrendo de uma forma maciça à evacuação de lugares.

O Relatório da GNR (2018) apresenta uma tabela com a listagem da evacuação de lugares dos concelhos

de Monchique e de Silves, entre os dias 3 e 8 de agosto.

Na Figura 24 mostram-se as localidades que foram objeto de evacuação, por parte da GNR, em cada um

dos dias.

Figura 24. Mapa das localidades onde se procedeu à evacuação da população, em

cada um dos dias assinalados na legenda.

Na Quadro 3 indica-se o número de lugares e de pessoas envolvidas em cada um dos dias:

Dia Lugares Pessoas

3 1 13

4 10 59

5 27 76

6 15 383

7 10 67

8 12 10

TOTAL 75 608

Quadro 3. Número de lugares e pessoas

evacuadas pela GNR entre os dias 3 e 8 de agosto

no incêndio de Monchique. Fonte: GNR.

No dia 6 o número de pessoas retiradas foi muito elevado, pois as operações envolveram lugares tais como

um Hotel nas Caldas de Monchique e outras localidades ameaçadas pelo fogo. No dia 8, salvo algum erro no

relatório da GNR, deverá ter havido localidades em que não se chegou a retirar as pessoas.

Esta decisão teve um resultado positivo dado que se conseguiu efetivamente salvaguardar a integridade

física das pessoas, sem a existência de qualquer acidente mortal, quer entre os operacionais quer entre a

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36

população.

Este bom resultado não pode mascarar a necessidade que há de se promover uma reflexão mais profunda

acerca da oportunidade, a necessidade e o modo de realizar a evacuação das localidades.

Tivemos conhecimento de que a decisão de evacuar a localidade de Alferce teve de ser revertida, por

considerar que a população estaria em relativa segurança no lugar, devido aos trabalhos de prevenção

realizados, além de que se concluiu que o caminho de fuga previsto não era adequado. O mesmo sucedeu em

Marmelete também esteve prevista uma evacuação, que se deveria realizar na madrugada, mas que acabou

por não se concretizar.

Na evacuação de lugares, por parte da GNR, nem sempre foi possível assegurar um acompanhamento

adequado dos percursos de evacuação, como nos foi relatado por um residente numa propriedade na área da

Foia. No dia 6 de agosto, pelas 14h a GNR chegou à propriedade indicando que tinham de sair e ir para

Monchique ou Portimão. No caminho encontrou militares da GNR na estrada para Monchique, mas

prosseguiram em direção a Portimão. Em Nave a GNR deu-lhe indicação para se dirigirem para Marmelete,

mas a partir dali não encontraram mais militares na estrada. Por saberem que em Casais havia uma estrada

para Portimão, dirigiram-se por essa estrada para Ferragudo. Deste relato se pode concluir que se se tratasse

de pessoas que não conhecessem bem a área, poderiam não saber para onde ir e voltar para uma zona de

incêndio.

Um outro aspeto menos conhecido podendo parecer um assunto de menor importância, é o do apoio à

proteção dos animais domésticos, quer de companhia quer de exploração. Este aspeto constitui uma

preocupação importante para muitos cidadãos, quer por razoes pessoais ou afetivas quer por razoes

económicas. Deve certamente constituir uma preocupação da sociedade e em especial das autoridades, tanto

na fase de prevenção, como na de intervenção e na de recuperação. São conhecidos vários exemplos de

situações em que os cidadãos ariscam a sua vida e chegam mesmo a perdê-la a fim de tentar salvar uns

animais de estimação ou um conjunto de cabras, ovelhas ou outros animais, alguns dos quais foram relatados

em Viegas et al. (2019).

Verifica-se por outro lado existir na sociedade uma preocupação crescente com o bem-estar dos animais,

constituindo-se por vezes grupos organizados que estão empenhados a concretizar esse empenho. No

incêndio de Monchique obtivemos o relato de um cidadão que documentou a iniciativa de um grupo de

cidadãos que se mobilizou, a partir da manhã do dia 6, a partir de Portimão para se colocarem no terreno para

“salvar das chamas todos os animais que lhes fosse possível salvar” e, em articulação com o Posto de

Comando e com os Serviços Municipais de Proteção, atuaram, a partir do dia 7, na localidade de Alferce.

Apesar de os voluntários disporem de pouca preparação e equipamento fizeram um bom trabalho no socorro

de animais, tendo estabelecido um hospital de campanha para animais e mobilizado quatro equipas de

voluntários – num total de 55 pessoas - para, durante o dia, efetuarem deslocações no terreno em busca de

animais feridos, perdidos ou até mesmo cadáver. O apoio prestado foi bem acolhido pela população tendo sido

comentado que nalguns lugares “teria chegado primeiro o socorro para animais do que para as pessoas”.

Este aspeto de proteção de animais é porventura uma componente da emergência social que nem sempre

se encontra devidamente acautelada, pelo que a experiencia adquirida na iniciativa relatada poderia ser

proveitosa.

3.8 A organização, o planeamento operacional e a estratégia

3.8.1 Os briefings operacionais

Um incêndio florestal pode tornar-se caótico e muito complexo, principalmente se toma dimensões

crescentes, cuja dinâmica se reforçará dependendo da extensão do perímetro e das frentes ativas, assim

como dos diversos fatores que influenciam o comportamento do fogo. Dada a complexidade dos grandes

incêndios florestais importa compreendê-la e desenvolver um plano adequado e comunicá-lo para que possa

ser operacionalizado.

Um dos fatores-chave para comunicar e dirigir um Plano Estratégico de Ação para a extinção de um

incêndio florestal é o Briefing Operacional. Os Briefings Operacionais são necessários e essenciais nos

grandes teatros de operações quando se prevê um incremento da complexidade da extinção, alterações no

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comportamento do fogo, elementos expostos, e alterações de estratégia e táticas e recursos envolvidos.

O Briefing Operacional é, pois, uma reunião breve com os responsáveis de cada célula de comando e nos

diversos níveis do Sistema de gestão de Operações (SGO), com o objetivo de implementar no terreno o Plano

Estratégico de Ação para extinção do incêndio florestal, com base nos meios e recursos disponíveis e tendo

em consideração o comportamento do fogo, atual e expectável no futuro próximo. Igualmente, os sucessivos

briefings têm por finalidade reavaliar e reajustar as operações, sempre que se justifique.

Neste sentido, o Despacho n.º 3317-A/2018, de 3 de abril, que procede à Revisão do Sistema de Gestão

de Operações (SGO) estabelece através do seu Artigo 46.º a necessidade de realização dos Briefings

Operacionais, cuja competência e responsabilidade é do Comandante de Operações e Socorro:

«Por forma a garantir um permanente fluxo de informação credível e sincronizado entre todos os

responsáveis no SGO, deverão ser promovidos pelo COS briefings regulares, de acordo com a complexidade

e natureza do TO, com vista a capacitar a verificação da prossecução dos objetivos estratégicos definidos para

a operação em curso, contribuindo para o efetivo comando e controlo.»

Analisando o Relatório de Ocorrência 2018080033743 referente ao incêndio de Monchique nos primeiros

10 dias, verifica-se que foram realizados 25 briefings operacionais, mas a intervalos de tempo muito díspares.

Este dado é importante, pois reflete a coordenação da extinção com base na complexidade do incêndio ou do

modo como o comando avalia esta complexidade e o risco potencial, operacionalizando e (re)colocando os

meios e recursos no teatro de operações.

Com base na análise espacial da evolução do incêndio, constata-se que nos primeiros cinco dias, o fogo

percorreu cerca de 77% da sua área total, tendo praticamente consolidado a sua área final no sétimo dia

(09/08/2018). Nos restantes dias apenas se trabalhou na operação de rescaldo, a qual consome cerca de 2/3

do tempo do trabalho de extinção.

Observando os dados referentes aos briefings operacionais registados no Relatório de Ocorrência

2018080033743, verifica-se que nos dias em que o incêndio mais cresceu, apenas se realizaram cinco

briefings, o que demonstra que as forças envolvidas não seguiram um plano estratégico de ação coordenado

pelo COS. Tal implica que as unidades de combate presentes tenham atuado sem um plano e sem a devida e

necessária coordenação para que os objetivos fossem atingidos, levando a dificuldade na concretização da

missão de cada equipa. O reduzido número de briefings registados e, em particular, a ausência de briefings

entre as 09:30 horas do dia 5 de agosto e as 10:30 horas do dia 7 de agosto, demonstra que o Comando de

Operações subvalorizou o potencial do incêndio.

Figura 25. Distribuição do número de Briefings Operacionais durante o incêndio comparada com a evolução da

taxa de expansão do incêndio. Fonte: Relatório de Ocorrência 2018080033743 - Incêndio de Monchique -

ANPC.

Como se pode observar na Figura 25 verifica-se também que a larga maioria dos briefings se realiza num

período horário coincidente com a inflexão do comportamento do fogo, normalmente de menor intensidade,

nos horários da manhã entre as 07:00 horas e as 10:00 horas e nos horários de transição para a noite e

durante a madrugada, entre as 19:00 horas e as 06:00 horas. Dos 25 briefings realizados, 76% ocorrem nos

melhores horários operacionais para o reforço das operações de extinção, quando o fogo mais facilmente cede

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às manobras de controlo. Desta forma, os comandantes de sector e chefias são obrigados a abandonar os

seus postos operacionais nos períodos em que deveriam estar concentrados nas suas diferentes missões,

quer de controlo perimetral, quer na execução de operações musculadas de rescaldo, quer no controlo e

validação das operações, no cumprimento da chamada “etiqueta horária”.

3.8.2 O apoio à decisão

Nas condições de combustível do concelho de Monchique e da meteorologia o apoio à decisão de pré-

posicionamento dos meios de prevenção e combate é essencial e foi já tratado em capítulo anterior.

Após o início da ocorrência, e sendo previsível um comportamento do incêndio de grande intensidade e

rapidez como o que veio a ocorrer em Monchique e Silves, as decisões de combate são complexas, obrigando

a uma adequada antecipação do comportamento previsível do incêndio.

Neste sentido, e por ter sido considerada a importância de melhorar o sistema de apoio à decisão

operacional utilizando as ferramentas entretanto disponíveis, a ANPC criou no quadro do Comando Nacional

de Operações de Socorro (CNOS) uma célula ou Núcleo de Apoio à Decisão - Análise de Incêndios Rurais

(NAD-AIR), apoiando o CNOS, que esteve já operacional na altura do incêndio de Monchique.

Esta estrutura interna da ANPC é responsável pelo processo de criação de uma nova ferramenta, uma

plataforma transversal ao MAI para integração da informação geográfica proveniente de diversas outras

instituições, como o ICNF e o IPMA, que pudesse servir de suporte à decisão operacional, ultrapassando as

limitações do sistema vigente de apoio à decisão (SADO). Este processo, iniciado em 2017, conduziu à

criação da plataforma que, em junho de 2018, entra em fase experimental.

Entre 1 e 12 de agosto o NAD-AIR produziu diariamente uma análise estratégica operacional de âmbito

nacional de muita utilidade potencial com a previsão da meteorologia, incluindo a situação sinótica, a

temperatura do regime de ventos a diversas horas, a estabilidade atmosférica e os índices associados à

condição dos combustíveis. De acordo com as previsões fazem-se também nesta análise considerações sobre

o potencial comportamento de incêndio que ocorra nesse período.

Durante o período em análise, o NAD-AIR incluiu também na sua análise estratégica, nos dias 3, 6, 9 e 12

de agosto, análises de âmbito regional, com indicações meteorológicas de três estações por zona e potencial

de ignição e de comportamento do incêndio, em particular a sua tipologia provável. A organização das zonas

de análise correspondentes a agrupamentos de distritos parece muito adequada com cinco agrupamentos:

Norte (Braga, Bragança, Viana do Castelo, Vila Real e Porto), Centro Norte (Aveiro, Coimbra, Guarda e Viseu),

Centro Sul (Castelo Branco, Leiria, Portalegre e Santarém), Sul (Beja, Évora, Lisboa e Setúbal), e Algarve

(Faro).

O incêndio de Monchique, iniciado a 3 de agosto, foi o primeiro teste ao funcionamento da plataforma e da

sua utilidade no apoio à decisão operacional importando, por isso, retirar desta ocorrência as correspondentes

lições no sentido da progressiva melhoria do sistema.

No âmbito específico do incêndio de Monchique a informação produzida pelo NAD-AIR era do

conhecimento permanente da Força Especial de Bombeiros (FEB) que, às 16:00 horas do dia 3 de agosto,

produz uma primeira informação com a indicação do comportamento previsível do incêndio, as prioridades de

intervenção e as recomendações de segurança. A partir dessa altura o NAD-AIR foi produzindo informações

operacionais (INFOP) no dia 4 (às 2:40 e às 17:40), no dia 5 (16:50 e 17:30), no dia 6 (20:30), no dia 8 (1:00,

10:00 e 16:10), e dia 9 (0:00, 9:00 e 14:15). Durante o dia 7 de agosto o NAD-AIR não produziu documentação

por essa tarefa ter estado a ser realizada por elementos das equipas de análise e uso do fogo (EAUF) da FEB

junto do posto de comando (PCO).

A informação sobre a evolução do incêndio chegava entretanto ao NAD-AIR através das imagens

Copernicus do European Forest Fire Information System (EFFIS) e, mais especificamente, pelas informações

e imagens dos revis aéreos efetuados com a presença das equipas EAUF. Também a informação sobre a

movimentação dos meios era obtida através do SIRESP-GL. Finalmente a análise do comportamento

previsível do incêndio e a estratégia a adotar tinham a colaboração de técnicos do ICNF e da AGIF, que

incluíram a utilização de simulações do comportamento previsível do incêndio.

A análise dos fluxos de informação necessários à decisão e a sua utilização operacional são descritos na

Figura 26.

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Figura 26. Fluxos de informação (setas a azul) e elementos da decisão para o Plano Estratégico de Ação (setas a

vermelho) que define as ações estratégicas a adotar (seta a cinzento). O papel do NAD-AIR na recolha de

informação e no seu tratamento para apoio à decisão é absolutamente central e fundamental em todo o processo de

incorporação do conhecimento nas decisões de combate.

Desta figura ressalta o papel central do NAD-AIR na recolha de vários tipos de informação espacial e

temporal, de combustíveis e de meteorologia, de propagação do incêndio através de meios aéreos e satélites,

de localização de meios. Esta multiplicidade de informações obriga a uma análise cuidada por um conjunto de

profissionais que possam utilizar essa informação e interpretá-la à luz dos conhecimentos técnicos e científicos

existentes mas também da experiência profissional de terreno na área da gestão de ocorrências complexas e

de gestão do fogo. De facto, em situações de grande complexidade em que as preocupações principais são as

da segurança e da eficácia do combate há que fazer análises adequadas de forma a otimizar recursos.

Da experiência do incêndio de Monchique importa concluir que a informação e análises efetuadas foram

insuficientemente utilizadas no teatro de operações.

Esta situação decorre naturalmente da pouca experiência de trabalho coordenado entre o comando das

operações e o NAD-AIR que deverá ser muito mais reforçado, testado e preparado com a antecedência

devida.

O Observatório considera muito relevante o esforço iniciado pela pequena equipa do NAD-AIR de

incorporação da melhor informação e das melhores técnicas de análise para apoio à decisão. Este esforço

precisa de ser muito mais desenvolvido e aprofundado, afetando mais recursos e mais formação, de forma a

que seja atribuída progressivamente maior responsabilidade à equipa central do NAD-AIR e às equipas

regionais EAUF associadas.

O Observatório recomenda que seja revista a prática dos Planos Estratégicos de Ação, que não podem ser

apenas uma obrigação legal e burocrática, mas antes uma ferramenta simples e sempre atualizada que

permita a todos os agentes implicados conhecerem a todo o tempo o seu enquadramento e funções e que

possam ser posteriormente utilizados para a prática saudável da procura das lições aprendidas durante a

ocorrência.

Recomenda-se que a informação meteorológica seja incorporada e distribuída a intervalos de tempo muito

mais curtos, complementando a informação do IPMA com outras como as constantes da figura apresentada. A

informação em tempo real (ou quase real) e da previsão do campo de ventos deveria tirar partido de outras

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estações meteorológicas como as que se poderiam instalar nos postos de vigia ou as que já existem nos

geradores eólicos e que estão já a ser utilizados no Alto Minho ao abrigo de protocolos de colaboração.

Recomenda-se que as equipas da AGIF se vão progressivamente integrando nesta estrutura operativa de

modo a contribuir para as necessárias competências técnicas de análise do NAD-AIR e a complementar as

equipas EAUF e a FEB na intervenção operacional.

Finalmente recomenda-se também que todos os Comandantes Operacionais adquiram formação e treino

mínimos em análise de incêndios e pirometeorologia, de modo a poder rapidamente interpretar e utilizar as

recomendações técnicas que lhe são transmitidas.

4. A recuperação da área ardida

A requalificação da área ardida é uma componente essencial do ciclo de recuperação dos ecossistemas

florestais sem a qual os mesmos podem, em curto espaço de tempo, perder potencial e sofrer impactes

significativos (erosão, cheias) e, sem a qual, se perde uma oportunidade de alterar os sistemas no sentido da

minimização dos riscos associados aos incêndios. Por isso, é importante estar bem preparado para a

eventualidade de ser necessário acionar, imediatamente após o incêndio, os mecanismos de recuperação da

área ardida.

Os custos associados a essa recuperação são significativos. Na revisão da Estratégia Nacional para as

Florestas, em 2015, estimava-se que o financiamento envolvido na recuperação pós-incêndio fosse de cerca

de mil euros por cada hectare de povoamento florestal ardido, o que, no caso presente, apontaria para custos

de cerca de 16 milhões de euros.

A abordagem para a recuperação de áreas ardidas no pós-incêndio de Monchique planeada pelo ICNF

seguiu a metodologia convencional adotada no Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios e na literatura

especializada (Moreira et al. 2010), a qual envolve três fases distintas: estabilização de emergência,

reabilitação e intervenção de longo prazo.

4.1 O planeamento para a estabilização de emergência

A estabilização de emergência deveria decorrer muito rapidamente após a avaliação dos danos e das

zonas mais sensíveis, visando o controlo da erosão e a proteção da rede hidrográfica, mas também a defesa

das infraestruturas e aglomerados urbanos, bem como dos habitats mais sensíveis do (Observatório Técnico

Independente 2018).

Para intervenção em grande escala, são geralmente recomendadas ações como a instalação de prados

permanentes, a aplicação de coberturas com resíduos orgânicos e sementeiras de emergência (como

hidrosementeira ou por via aérea), medidas de rugosidade hidráulica, para retardarem o escoamento

superficial, e todas as medidas de engenharia natural, como biomantas, biorolos, faxinas, empacotamentos,

etc., além da ação sobre a correção torrencial, restabelecimento da cortina ripária e todas as medidas que

evitem a disseminação de exóticas no pós-fogo, incluindo acácias e eucaliptos. Acresce que a alteração dos

fluxos de água e sedimentos é imprescindível para evitar a destruição de infraestruturas por ação de eventuais

torrentes de detritos e do aumento dos caudais de máxima cheia, como resultado da maior impermeabilização

do solo, o que implica, entre outras técnicas, a correta definição de bacias de sedimentação (Gonçalves e

Vieira 2013).

No caso do incêndio em análise, a estabilização de emergência foi objeto de uma avaliação específica

desenvolvida pelo ICNF e pelo seu Departamento da Conservação da Natureza e Florestas do Algarve (ICNF

2018) em que foram identificadas todas as “intervenções necessárias à estabilização de emergência dos

ecossistemas afetados e à remoção do material ardido, para que posteriormente se proceda à recuperação do

potencial produtivo, tendo em vista a reposição e sustentabilidade dos valores ecológicos afetados.” A

avaliação foi preparada com a preocupação de enquadrar as medidas nos instrumentos financeiros

disponíveis (Operação 8.1.4, “Restabelecimento da floresta afetada por agentes bióticos e abióticos ou por

acontecimentos catastróficos”, inserida na ação 8.1, “Silvicultura Sustentável” da Medida 8, “Proteção e

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Reabilitação dos Povoamentos Florestais”, do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente, PDR 2020)

(Portaria n.º 134/2015, de 18 de maio).

As medidas de estabilização de emergência necessárias foram listadas por categoria de processo afetado

(Combate à erosão e correção torrencial; Recuperação das infraestruturas danificadas; Controlo da erosão,

tratamento e proteção de encostas; Prevenção da contaminação e assoreamento e recuperação de linhas de

água; Diminuição da perda de biodiversidade; e Fitossanidade) seguindo genericamente a classificação e

terminologia estabelecida na Portaria n.º 134/2015, no caso das infraestruturas, e uma série de procedimentos

genéricos que fazem parte habitual de relatórios de estabilização de emergência após incêndio produzidos

pelo ICNF, no caso da correção torrencial e fitossanidade.

O ICNF forneceu também fichas de “necessidades de intervenção de estabilização de emergência pós-

incêndio” onde se apresentaram de forma detalhada todas as medidas preconizadas com indicação do número

ou área, custo unitário e custo total da sua implementação, seguindo a estrutura e nomenclatura das medidas

estabelecidas na Portaria n.º 134/2015, para toda a área afetada (concelhos de Monchique, Silves, Portimão e

Odemira) e individualmente por concelho (ICNF 2018). O custo total estimado das medidas foi de

aproximadamente 4,58 milhões de euros (2,73 milhões de euros em Monchique, 1,82 milhões de euros em

Silves, 38.500 euros em Portimão e 11.150 euros em Odemira). Todavia, neste relatório do ICNF não foram

fornecidos quaisquer elementos sobre a metodologia de avaliação das necessidades ou da estimativa dos

custos nem indicadas áreas prioritárias de intervenção.

A operacionalização das medidas não foi atempada, apesar da resposta rápida através do PDR 2020 (as

primeiras candidaturas abriram entre 30 de agosto e 30 de setembro de 2018, ao abrigo da operação 8.1.4

priorizando o controlo de erosão, tratamento e proteção de encostas e, ainda, para o restabelecimento de

infraestruturas, no valor de 4,5 milhões de euros), previamente incluídas no relatório do ICNF (ICNF 2018)

para os quatro concelhos afetados pelo incêndio de Monchique (10.º anúncio, operação 8.1.4,

«Restabelecimento da floresta afetada por agentes bióticos e abióticos ou por acontecimentos catastróficos”).

Havendo a necessidade de assegurar a realização das intervenções urgentes após a ocorrência do

incêndio, o Decreto-Lei n.º 70/2018 e a Portaria n.º 237-B/2018 de 28 de agosto procuraram agilizar a

execução das referidas operações, vocacionadas para os municípios de Monchique, Silves, Odemira e

Portimão, através da implementação de um regime excecional de contratação de empreitadas de obras

públicas e da possibilidade de adiantamentos contra fatura nas intervenções de estabilização de emergência

(regularizados no prazo de 45 dias úteis após o seu recebimento, mediante a apresentação do comprovativo

do pagamento integral da despesa). Estas intervenções eram essenciais, porque se destinavam em grande

medida à recuperação de troços de rede primária e secções da rede secundária de faixas de gestão de

combustível, e pontos de água, a controlo de erosão, tratamento e proteção de encostas e prevenção da

contaminação e assoreamento e recuperação de linhas de água.

É um facto que algumas ações foram já levadas a cabo, mas meramente com um caráter demonstrativo e

formativo e abrangendo uma área muito limitada. Destacamos o corte de madeira queimada e seu

destroçamento, para espalhamento, na Herdade da Talhadinha em Silves em meados de dezembro que serviu

também para a formação de GIPS e sapadores florestais, e a aquisição de serviços de sementeira aérea para

uma área de 150 ha, através do recurso a um avião Dromader, com vista a assegurar a estabilização de

emergência na Mata Nacional da Herdade da Parra, sob gestão do ICNF. Esta última ação foi, contudo,

realizada apenas a 28 de fevereiro de 2019 e de uma forma casuística, apesar de ações mais amplas terem

sido anunciadas para as primeiras chuvas quando seria efetivamente crucial (uma parte substancial da perda

de solo dá-se no 1.º inverno após o fogo). Nenhuma destas ações, no entanto, tem enquadramento financeiro

no programa referido anteriormente. Não são conhecidas ações concretas de estabilização de emergência

implementadas ao abrigo do mesmo programa de financiamento.

Infelizmente, e apesar da rápida resposta do ICNF (ICNF 2018) e do regime de exceção estabelecido para

o caso de Monchique, verifica-se uma excessiva demora entre a ocorrência do incêndio e aplicação no terreno

das medidas de estabilização de emergência e controle de erosão planeadas. Um melhor apoio técnico pelo

ICNF na definição das medidas e na cartografia das áreas de intervenção prioritárias ou mais suscetíveis à

perda do solo, assim como a revisão dos processos administrativos inerentes a estas medidas, poderiam

contribuir significativamente para uma mais rápida intervenção, melhor racionalização dos custos e, sobretudo,

um melhor sucesso na recuperação.

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Figura 27. Ações de demonstração com barreiras de contenção/estabilização de encostas. Fonte: ICNF.

4.2 O apoio às ações de reabilitação

Relativamente à fase de reabilitação, “na qual deve ser observada a reação dos ecossistemas e

implementadas medidas de engenharia natural tendentes a aumentarem a infiltração e a proporcionarem a

consolidação das encostas e taludes e, eventualmente, iniciar-se a reflorestação adequada das zonas mais

críticas” (Observatório Técnico Independente 2018), foi aberto concurso para “Apoios para a Reabilitação de

Áreas Florestais Afetadas Pelos Incêndios” ao abrigo da Operação 8.1.4, “Restabelecimento da floresta

afetada por agentes bióticos e abióticos ou por acontecimentos catastróficos” do PDR2020 (14.º anúncio).

As candidaturas estiveram abertas a pessoas singulares ou coletivas, de natureza pública ou privada, e

autarquias, entre 16 de novembro de 2018 e 31 de janeiro de 2019, assegurando taxas de financiamento entre

70% e 85% por projeto, para uma dotação orçamental de 4 milhões de euros. As intervenções elegíveis foram

as seguintes: “ações de reabilitação de povoamentos florestais (com exceção de espécies de rápido

crescimento), reflorestação de áreas afetadas e recuperação de infraestruturas danificadas (apenas para a

recuperação de cercas e associadas à reabilitação de povoamentos florestais), em áreas afetadas por fogos

florestais, ao nível das explorações florestais”.

Este processo beneficiária da identificação prévia pelo ICNF das áreas prioritárias de intervenção,

sobretudo as de especial interesse para a biodiversidade e as que apresentem índices de erosão mais

acentuados, indicando, paralelamente, o tipo de medidas a serem implementadas.

4.3 O planeamento da recuperação a longo prazo

A terceira fase de recuperação, de longo prazo, inclui o planeamento e implementação dos projetos

definitivos de recuperação/reflorestação para aumentar a resiliência dos povoamentos, e deverá ter lugar a

partir dos três anos após a passagem do fogo (Observatório Técnico Independente 2018; Moreira et al. 2010).

Presentemente encontra-se prevista, de acordo com Resolução do Conselho de Ministros n.º 13/2019, a

Medida n.º III.13 (“Pagamento pelo Estado dos serviços de Ecossistemas”) que inclui na segunda alínea o

“Programa de Reordenamento e Gestão da Paisagem para uma nova economia rural na Serra de Monchique”,

o qual pode ser enquadrado nesta fase. Este programa estará enquadrado no Programa Nacional de

Investimentos 2030. Presentemente estão disponibilizados apenas 336.750,00 euros para esta fase de longo

prazo (Despacho n.º 8934-A/2018).

Esta fase da recuperação, cujos detalhes são ainda desconhecidos, deverá ser articulada com os

instrumentos de planeamento nacional e regional, nomeadamente o PROF do Algarve, quer em termos de

espécies a privilegiar, quer na definição de corredores ecológicos e de redes de gestão de combustíveis.

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4.4 Do planeamento à concretização das ações de recuperação

O planeamento das ações de recuperação do incêndio de Monchique seguiu o enquadramento previsto e

foi dotado de apoios financeiros significativos. Como elemento positivo regista-se que o relatório de

estabilização de emergência (ICNF 2018) foi produzido atempadamente pelo ICNF. No entanto, verificam-se

dificuldades na execução atempada das ações previstas.

Assim, no princípio de 2019 ainda não se sabia quando iriam estar disponíveis os financiamentos para

execução de projetos de estabilização de emergência e de reabilitação, quantos projetos seriam aprovados e

que área abrangeriam e muito menos quando iriam ser executados, nem como e por quem seria feita a

monitorização das ações previstas.

Por outro lado, não se encontram referências a como serão considerados alguns casos particulares mas

bem significativos do ponto de vista ambiental e florestal como a área incluída na Rede Natura 2000

(PTCON0037 e PTCON0052), com 74% da área ardida, a Mata Nacional da Herdade da Parra, com 52% de

área ardida, ou as áreas incluídas nas Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) de Perna da Negra, Odelouca, e

Arade, onde arderam respetivamente 76, 53 e 71% da área correspondente.

Finalmente, na perspetiva da recuperação a longo prazo conhecem-se intenções gerais interessantes mas

não foi fornecida informação específica sobre o “Programa de Reordenamento e Gestão da Paisagem para

uma nova economia rural na Serra de Monchique”, nem se conhece o envolvimento do ICNF, dos municípios,

das populações e organizações não-governamentais no mesmo, bem como quaisquer indicações sobre a

escolha de espécies e modelos de silvicultura a promover, ou sobre a organização do programa e a sua

gestão e financiamento.

Pelo exposto verifica-se como positiva a existência de um enquadramento para o planeamento e apoio às

ações de recuperação, nas suas diversas fases. No entanto, registam-se pela negativa as grandes

dificuldades na passagem das intenções à ação, principalmente no que diz à rapidez das intervenções,

sabendo-se que o sucesso destas depende em grande medida da sua realização atempada.

5. As lições aprendidas

A melhoria do sistema, objetivo central do trabalho do Observatório, só é possível com uma análise correta

dos pontos fortes e fracos, oportunidades e ameaças observados. Em anterior Relatório o Observatório

procedeu a uma avaliação do sistema no seu conjunto, fazendo recomendações referentes às diferentes fases

e aos processos correspondentes.

Com a análise do incêndio de Monchique, o mais relevante ocorrido em 2018, e com a análise desse ano

no que respeita a incêndios, que se inclui no Relatório, o Observatório procura identificar na prática as mais

significativas deficiências do sistema e propor medidas para a sua correção. É facto que as estatísticas dos

incêndios do ano de 2018, sem vítimas mortais, com menor número de ocorrências e pequena área ardida, em

termos comparativos com as anteriores, foi positivo, mas tal facto está longe de constituir uma segurança para

os anos seguintes. Pelo contrário, esta é uma excelente oportunidade para visitar a prática do sistema e

propor as melhorias necessárias.

A análise aqui apresentada não é, por isso, uma nova avaliação do sistema mas sim a identificação, a partir

do incêndio de Monchique, dos aspetos que, na prática, merecem melhor atenção por parte dos diversos

agentes do sistema no sentido da sua melhoria contínua.

Seguimos, assim, os processos do sistema descritos no anterior Relatório (Figura 28).

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Figura 28. Os processos do sistema identificados no Relatório anterior do Observatório.

No âmbito do Planeamento continuam a verificar-se deficiências na planificação de modo a assegurar a

coerência nas intervenções e otimizar os recursos. A clara subutilização no teatro de operações da informação

de previsão meteorológica e do planeamento estratégico produzido pelo NAD-AIR contribuiu para o não

aproveitamento das janelas de oportunidade meteorológicas. A interação entre agentes do sistema deverá ser

melhorada, exigindo uma melhor uniformização de conceitos técnicos e da sua aplicação prática entre as

múltiplas entidades que intervêm no teatro de operações. A elevada diversidade das entidades envolvidas não

facilita este processo, pelo que tal deverá ser tido em conta em futuras reestruturações do sistema de combate

a incêndios. Por outro lado, é muito evidente a necessidade de integração de melhores ferramentas de

planeamento nos agentes operacionais do sistema, o que deverá ser uma preocupação central da AGIF, que

deverá rapidamente evoluir para uma estrutura de interagência, sem o qual o seu papel na melhoria

operacional do sistema fica esvaziado. O reforço da célula de planeamento NAD-AIR na ANEPC é, neste

sentido, estrategicamente muito importante.

No que respeita à gestão do combustível ficou evidente que neste incêndio estavam reunidas todas as

condições para um fogo de elevadas dimensões, tendo em conta o enorme potencial de combustibilidade

desta área, dado que na sub-região homogénea da Serra de Monchique, mas também nas de Silves e da Meia

Serra, dominavam os matos e o eucaliptal. O ordenamento do território deveria ser repensado de forma a criar

uma paisagem mais diversa, por ser pouco eficiente uma Rede Primária de Faixas de Gestão de Combustível

num contexto deste tipo de monoculturas florestais (particularmente de eucalipto). A reduzida implantação da

Rede Primária em relação ao programado nos PMDFCI dos Municípios afetados, o seu traçado não otimizado

e a sua pouca utilização no combate foram também aspetos negativos detetados. No que respeita às faixas

associadas à Rede Secundária, estas parecem ter permitido alguma eficácia na proteção de aglomerados

populacionais. Regista-se a ausência de utilizações alternativas da biomassa florestal, complementares à da

produção lenhosa, nomeadamente no aquecimento de pequenas unidades, que poderiam contribuir para uma

mais eficiente gestão do combustível. Um programa de apoio a estas alternativas seria altamente desejável.

A sensibilização das populações é um tema que não foi muito desenvolvido no âmbito deste relatório. No

entanto, foram recolhidas junto da população diversas sugestões, algumas das quais já postas em prática

nalgumas comunidades do Algarve, mas o facto de tal procedimento não ser ainda geral ou, pelo menos,

percecionado como tal, torna este conjunto de sugestões relevante. Assim, sugere-se que se deveria

previamente mapear toda a área, identificar as casas ocupadas, com informação obtida junto dos residentes,

incluindo dados de contato. Esta informação poderia ser utilizada pelos Bombeiros e pela GNR. Deste modo,

se os residentes telefonarem para o 112 e derem a indicação do número da casa, os Bombeiros saberão para

onde se dirigir. Houve casos de pessoas que contactaram o 112 e não foram socorridas porque não

conseguiam dar o nome de uma rua ou estrada, que permitisse localizá-los. Neste sentido, os Bombeiros e a

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GNR deveriam fazer visitas planeadas a locais ainda não reconhecidos, para obter os dados de contato, os

pormenores dos acessos e outros dados relevantes.

A fiscalização das ações obrigatórias de gestão de combustível é importante mas mantem-se aqui a

recomendação anterior de uma revisão dos critérios para a gestão de combustíveis no âmbito das redes

secundárias com base na análise já efetuada pela Comissão Técnica Independente e no melhor conhecimento

técnico e científico sobre a matéria. Esta recomendação aplica-se também à gestão de combustíveis

associada às linhas elétricas.

A vigilância inclui as duas componentes, a fixa da rede Nacional de Postos de Vigia, e a móvel,

complementar da primeira e dedicada sobretudo às zonas sombra. Neste caso, os detalhes da vigilância

móvel não são conhecidos e por isso é difícil avaliar a sua contribuição. Recomenda-se que sejam sempre

guardados e analisados os percursos de vigilância móvel. Quanto à deteção, e dada a confusão que se

instalou na correta localização do incêndio, em linha com o já verificado noutros incêndios com manifesto

prejuízo da primeira intervenção, urge avaliar o sistema de deteção e localização em vigor, pela entidade

responsável pelo mesmo. A utilização de toponímia leva a erros, como foi o caso, pelo que se aconselha a

utilização de um sistema exato de coordenadas que identifique de forma inequívoca o local aproximado do

incêndio.

O ataque inicial é uma fase fundamental que não foi conseguida neste incêndio. A abundância de

recursos pré-posicionados e o rápido despacho de meios poderiam apontar para uma extinção rápida, apesar

das condições meteorológicas e de combustível desfavorável. No entanto, tal não foi conseguido. Recomenda-

se que, em condições de meteorologia, combustível e território semelhantes, seja aplicado o conceito de

vigilância armada para que possa existir uma intervenção mais eficaz com equipas helitransportadas.

A segurança das populações foi um dos aspetos muito positivos desta ocorrência. Há a relevar o facto de

não ter ocorrido nenhuma fatalidade num incêndio com estas características. Apesar de dificuldades da

situação de Alferce, o sistema de proteção civil e as evacuações promovidas pela GNR funcionaram em geral

de maneira adequada, pelo que há que continuar a melhorar esta linha de atuação de forma a minimizar a

perda de vidas humanas em incêndios rurais.

O ataque ampliado que, neste incêndio, se prolongou por vários dias, mereceu uma análise detalhada,

incluindo as mais diversas vertentes. Desde logo é essencial estabelecer uma estratégia de controlo, antever o

potencial de propagação do incêndio e a sua evolução, e as janelas de oportunidade de controlo que a

meteorologia oferece, conjugada com as condições do terreno e do combustível. Esta definição estratégica foi

largamente subutilizada neste incêndio. Por outro lado, as estratégias de combate e articulação das forças no

teatro de operações não foram as mais adequadas. Por exemplo, no que se refere às máquinas de rasto,

apesar do grande número de unidades presentes, não se teve em conta as limitações operacionais que têm,

pelo que deve a utilização deste meio ser sempre acompanhada e complementada por outras valências,

nomeadamente a utilização de ferramentas em zonas inacessíveis, o uso de água, o apoio aéreo e o uso do

fogo. Também para que o uso do fogo tático seja eficiente nas manobras de extinção, torna-se imprescindível

investir na formação, bem como agilizar e simplificar a autorização para a sua utilização. Em incêndios com

esta duração a questão da rotação de meios é essencial. A rotação de meios deve ocorrer a cada 10:00 horas

de trabalho na linha de fogo e deve ser feita no local, para que não se perca o trabalho que se está a efetuar

em cada momento por quebra na sua continuidade.

O rescaldo e a extinção do incêndio foram de grande dificuldade. As condições meteorológicas e de

combustível eram claramente desfavoráveis, mas não foram aproveitadas as condições mais favoráveis para

as operações de rescaldo, durante a noite e madrugada. Falta de estratégia, de empenhamento, de

cumprimento das ordens de comando, de pouca motivação para uso de ferramenta manual, todas foram

apontadas como razões que contribuíram para as muitas reativações identificadas. Deve existir uma auditoria

externa em situações com a gravidade do incêndio em análise, de forma a responsabilizar quem não fez o

trabalho que era suposto ter feito. O que se passou na manhã do dia 4 é bem ilustrativo deste problema, já

que estavam perfeitamente identificados os pontos quentes que deveriam ter sido adequadamente

rescaldados. O mau desempenho de quem estava encarregado de fazer este trabalho foi determinante para o

que se seguiu nos dias seguintes e para a elevada extensão do incêndio.

A investigação de causas foi outro aspeto negativo encontrado. Havendo indicações que apontam para

um local específico de início do incêndio e para uma causa associada a uma linha elétrica, que a EDP

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contraria, nada justifica que, passados 9 meses, a causa esteja ainda a ser investigada e apontada como

"desconhecida".

A avaliação pós-evento é uma fase fundamental para a aprendizagem das lições. Esta seria uma das

funções mais relevantes da AGIF para que, juntamente com os outros agentes operacionais envolvidos, todos

possam partilhar informação e experiência, acertar processos de transferência de informações pelas várias

entidades presentes no teatro de operações, definindo procedimentos de comunicação das equipas de

combate à entrada no teatro de operações e à saída do mesmo.

A recuperação pós-incêndio é fundamental para evitar consequências maiores e preparar o sistema para

uma menor suscetibilidade ao incêndio. Neste caso, a resposta dada pelo Estado em termos de avaliação das

necessidades e custos das medidas de estabilização de emergência, do enquadramento financeiro dado a

estas medidas e do estabelecimento de um regime de exceção para a sua contratualização foi rápida e

genericamente adequada. No entanto, decorridos 9 meses desde o incêndio, as medidas continuam por

aplicar no terreno. Excetuam-se as medidas definidas e aplicadas pontualmente e com caráter demonstrativo e

formativo e paralelamente ao enquadramento financeiro e administrativo estabelecido. Existem, portanto,

procedimentos de natureza administrativa ou organizativa da responsabilidade dos organismos do Estado

envolvidos na recuperação pós-incêndio que causaram um atraso significativo na implementação das

medidas, o que condiciona seriamente o sucesso da estabilização de emergência e do controle de erosão bem

como as fases seguintes da recuperação das áreas ardidas, as quais dependem da manutenção do potencial

produtivo da área. Com este atraso corre-se ainda o risco de desperdiçar fundos significativos ao executar as

medidas candidatadas a financiamento quando já não houver necessidade das mesmas.

A gestão da informação é importante na fase de gestão das operações e na fase de preparação do

planeamento. Nesta matéria, os briefings operacionais devem ser realizados segundo o comportamento do

fogo presente e previsto, a intensidade ou taxa de propagação do fogo, tendo sempre em conta os momentos

que não retiram a necessária atenção e o empenho dos diversos níveis de comando. Os briefings devem ser

realizados em número suficiente que permita reajustar o Plano Estratégico de Ação sem comprometer a

execução das táticas e manobras, cujo sucesso depende do intervalo de tempo para executar com sucesso

uma determinada manobra. No âmbito da gestão de operações é de destacar o papel estruturante do recém-

criado Núcleo de Apoio à Decisão e Analise de Incêndios Rurais (NAD-AIR). Este núcleo constitui uma mais-

valia na gestão das operações, emitindo análises operacionais e sugerindo manobras de contenção. No

entanto, para que a ação de planeamento estratégico seja eficaz, as sugestões do NAD-AIR deveriam ser

tidas em consideração pelo Comandante das Operações de Socorro, o que pouco aconteceu nos primeiros

dias do incêndio. No entanto, para que esta informação seja completa ela deve circular nos dois sentidos, pelo

que se recomenda a criação de mais equipas operacionais de terreno, conhecedoras do planeamento

estratégico do NAD-AIR, que alimentem a informação de terreno, necessária ao planeamento estratégico. No

que respeita à informação necessária ao próximo ciclo de planeamento, recomenda-se que se desenvolva o

SGIF, que constitui já uma ferramenta de muita utilidade, no sentido inicial de uma plataforma única de

informação criada e partilhada pelas entidades pilares do sistema (ICNF, ANPC e GNR), potenciado pela

AGIF.

A questão da investigação científica e da qualificação dos agentes mantem-se com a mesma

relevância com que foi expressa em anterior Relatório. O incêndio de Monchique revela as fragilidades do

sistema quando confrontado com condições adversas o que recomenda esforços redobrados no sentido da

melhor qualificação dos agentes, de uma investigação aplicada a esses objetivos e uma adequada formação.

Nesse sentido é muito preocupante não se assistir a um adequado processo de formação dos agentes,

planeado, com cronograma e com financiamento, e que corresponda às necessidades detetadas

correspondentes às fragilidades identificadas.

Finalmente tem de registar-se que não existe ainda um processo instituído de aprendizagem contínua, de

avaliação e de incorporação das lições na melhoria do sistema. O papel da AGIF seria essencial nesta matéria

mas ainda não teve reflexos visíveis nesta matéria não existindo uma avaliação do incêndio de Monchique e

do ano de 2018 com as correspondentes propostas de melhoria do sistema. Possivelmente o Sistema de

Gestão Integrada de Fogos Rurais e o Plano, ainda não conhecido, poderão clarificar esta matéria. Assim,

esta análise por parte do Observatório pode contribuir para esse objetivo de melhoria do sistema. É com essa

convicção da utilidade de aprender continuamente com as lições que este Relatório foi produzido e é

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divulgado. É esse, afinal, o mandato deste Observatório.

ANEXOS

ANEXO 1

Lista de Abreviaturas e Acrónimos

AFOCELCA – Agrupamento Complementar Empresas, Navigator e Altri

AGIF – Agência para a Gestão Integrada de Fogos

ANEPC – Autoridade Nacional Emergência Proteção Civil

ANPC – Autoridade Nacional Proteção Civil

ATI – Ataque Inicial

ATA – Ataque Ampliado

BCIN – Brigada Combate a Incêndios

BTO – Briefings Técnicos Operacionais

BUI – Índice de Disponibilidade de Combustível

CB – Corpo de Bombeiros

CDOS – Comando Distrital de Operações de Socorro

CMA – Centros de Meios Aéreos

CMDFCI – Comissão Municipal de Defesa da Floresta

CMDFCIM – Comissão Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios de Monchique

CNOS – Comando Nacional de Operações de Socorro

CNPC – Comissão Nacional de Proteção Civil

CNRLI – Centro Nacional de Reprodução do Lince Ibérico

CODIS – Comandante Operacional Distrital

CONAC – Comandante Operacional Nacional

COS – Comandante das Operações de Socorro

CRIF – Companhia de Reforço para Incêndios Florestais

DC – Índice de Seca

DECIR – Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais

DFCI – Defesa da Floresta Contra Incêndios

DMC – Humidade da Manta Morta

DON – Diretiva Operacional Nacional

ECIN – Equipa de Combate a Incêndios Florestais

EFFIS – European Forest Fire Information system

EAUF – Equipa de Análise e Uso do Fogo

ELAC – Equipa Logística de Apoio ao Combate

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ERAS – Equipa de Reconhecimento e Avaliação da Situação

ESF – Equipa de Sapadores Florestais

FEB – Força Especial de Bombeiros

FFMC – Humidade do Combustível Morto Fino

FGC – Faixas de Gestão de Combustível

FIC – Faixas de Interrupção de Combustível

FRE – Potência Radioativa Obtida Via Satélite

FRM – Fire Risk Map

FWI – Forest fire Weather Index

GIPS – Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro da GNR

GNR – Guarda Nacional Republicana

GRUATA – Grupo de Reforço para Ataque Ampliado

ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas

INFOP – Informação Operacional

IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera

IR – Incêndio Rural

ISI – Índice de Velocidade de Propagação do Fogo

MR – Máquina de Rastos

NAD-AIR – Núcleo de Apoio à Decisão e Análise de Incêndios Rurais

PCO – Posto de Comando Operacional

PMDFCI – Plano Municipal de Defesa Floresta Contra Incêndios

PNDFCI – Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios

PROF – Plano Regional de Ordenamento Florestal

PV – Posto de Vigia

RNPV – Rede Nacional de Postos de Vigia

SADO – Sistema de Apoio à Decisão Operacional

SGIFR – Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais

SGIF – Sistema de Gestão de Informação de Fogos Florestais

SGO – Sistema de Gestão de Operações

SIOPS – Sistema Integrado de Operações de Proteção e Socorro

SIRESP – Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal

TO – Teatro de Operações

USG – United States Geological Survey

VCI – Veículo de Combate a Incêndios

VCOT – Veículo de Comando e Transmissões

ZIF – Zona de Intervenção Florestal

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ANEXO 2

Referências

CMDFM. 2015. Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios. Comissão Municipal de Defesa da

Floresta de Monchique, Monchique.

EDP Distribuição, 2018 – Análise entre Rede Elétrica e foco de incendio: Monchique, 3 de agosto de 2018.

Lisboa, 13 de setembro de 2018. 19 pp.

Fernandes, P.M., Pacheco, A.P., Almeida, R., Claro, J. 2016. The role of fire suppression force in limiting

the spread of extremely large forest fires in Portugal. European Journal of Forest Research 135: 253-262.

GNR, 2018 – Relatório do DFCI 2018. Lisboa, 16 de novembro de 2018. 41 pp.

Gonçalves, A.B., Vieira, A. 2013. Grandes Incêndios Florestais: Erosão, Degradação e Medidas de

Recuperação dos Solos. Universidade do Minho.

ICNF. 2010. Guia Técnico do Plano Municipal de DFCI, ICNF, Lisboa.

ICNF. 2018. Relatório de Estabilização de Emergência do Incêndio de Monchique de Agosto de 2018.

Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, IP. Lisboa. 33 pp.

IPMA, 2018 – Relatório Preliminar de ocorrências de fenómenos meteorológicos na região de Monchique,

3-4/8/2018. Lisboa, 10 de agosto de 2018. 24 pp.

Moreira F., Catry F., Silva J. S., Rego F., Eds. 2010. Ecologia do fogo e gestão de áreas ardidas. ISAPress,

Lisboa.

Observatório Técnico Independente. 2018. Avaliação do sistema nacional de proteção civil no âmbito dos

incêndios rurais. Assembleia da República, Lisboa.

Oliveira T.M., Barros A.M.G., Ager A.A., Fernandes P.M. 2016. Assessing the effect of fuel break networks

to mitigate wildfire area and risk transmission in Portugal. International Journal of Wildland Fire 25, 619-632.

Pinto M. M., Da Camara C. C., Trigo I. F., Trigo R. M., Turkman K. F. 2018. Fire danger rating over

Mediterranean Europe based on fire radiative power derived from Meteosat. Nat. Hazards Earth Syst. Sci. 18,

515–529.

Turkman A., Turkman F., Cardoso Pereira J.M., Sá A., Da Câmara C. 2018. Mapas de probabilidade de

ocorrência de incêndio para áreas ardidas superiores a 250 ha de Portugal Continental. Relatório CEF, Centro

de Estatística e Aplicações da Universidade de Lisboa (CEAUL), Lisboa.

Viegas, D., Almeida M., Ribeiro L., Raposo J., Viegas M., Oliveira R., Alves D., Pinto C., Jorge H.,

Rodrigues A., Ribeiro C., Viegas C., Lopes S., Luis N., Rosa G. 2019. Análise dos incêndios florestais

ocorridos a 15 de Outubro de 2017. CEIF/ADAI, Coimbra.

Viegas DX, Gabbert B., Figueiredo A. R., Reva V., Almeida M., Viegas M., Oliveira R., Raposo. J. 2012.

Relatório dos Incêndios de Tavira/São Brás de Alportel. CEIF/Universidade de Coimbra.

ANEXO 3

Entidades que enviaram informação

 AFOCELCA – Agrupamento Complementar de Empresas, ACE

 ANPC – Autoridade Nacional Proteção Civil

 Câmara Municipal de Monchique

 Comando Distrital de Operações de Socorro de Faro

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 Corpo de Bombeiros de Silves

 EDP – Energias de Portugal

 EDP Distribuição

 GNR – Guarda Nacional Republicana

 ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas

 IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera, IP.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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