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Quinta-feira, 14 de novembro de 2019 II Série-E — Número 4
XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)
S U M Á R I O
Observatório Técnico Independente:
— Estudo técnico sobre «A valorização da primeira intervenção no combate a incêndios florestais». — Estudo técnico sobre «Estabilização de Emergência pós-fogo».
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OBSERVATÓRIO TÉCNICO INDEPENDENTE
ESTUDO TÉCNICO
A valorização da primeira intervenção no combate a incêndios rurais
OBSERVATÓRIO TÉCNICO INDEPENDENTE
para análise, acompanhamento e avaliação dos
incêndios florestais e rurais que ocorram no território
Novembro de 2019
Citação recomendada:
Observatório Técnico Independente, Castro Rego F., Fernandes P., Sande Silva J., Azevedo J., Moura
J.M., Oliveira E., Cortes R., Viegas D.X., Caldeira D., e Duarte Santos F. – Coords. (2019) A valorização da
primeira intervenção no combate a incêndios rurais.
Assembleia da República. Lisboa. 38 pp.
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Índice
1. O principal problema: os grandes incêndios
2. A importância reconhecida à rapidez da primeira intervenção
3. A geografia dos grandes incêndios e da rapidez de intervenção
4. A primeira intervenção no quadro do ataque inicial (ATI)
5. Os meios disponíveis para a primeira intervenção
5.1 Os corpos de bombeiros
5.2 Os sapadores florestais
5.3 A intervenção dos meios aéreos
6. Tempos de primeira intervenção estimados e observados
7. Conclusões e recomendações
Anexos
1. O PRINCIPAL PROBLEMA: OS GRANDES INCÊNDIOS
O objetivo central de qualquer política associada aos incêndios florestais e rurais deve ser o de minimizar
os correspondentes prejuízos e custos. Nesta perspetiva o indicador mais simples e por isso o mais utilizado é
o da área ardida. É verdade que muitos dos prejuízos causados pelos incêndios rurais têm consequências na
segurança e saúde das pessoas, nos seus bens patrimoniais, na agricultura ou nos animais, e também nos
espaços florestais os prejuízos e custos são diferentes se arde mato ou floresta e, dentro desta, do tipo de
floresta que arde.
Qualquer que seja a forma de contabilização do custo social dos incêndios, a área ardida total é sempre um
indicador importante, justificando que o Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PNDFCI) de
2006 (Resolução do Conselho de Ministros n.º 65/2006, DR 26 de maio) tenha apontado como meta para 2012
um valor inferior a 100 mil hectares de área ardida por ano. Nesse mesmo diploma compreendia-se que a área
ardida em cada ano se ficava a dever sobretudo aos grandes incêndios pelo que se incluía também como
meta a eliminação dos incêndios com áreas superiores a 1000 hectares.
A estatística tem confirmado a importância dos grandes incêndios (acima de 100 hectares, mas sobretudo
acima de 1000 hectares) como os grandes responsáveis pelas variações ao longo dos anos da área ardida
total, sendo que sem incêndios acima de 1000 hectares a área ardida total não ultrapassaria o limite anual dos
100 mil hectares (Figura 1).
Figura 1. Área ardida em hectares ao longo dos anos apresentadas por classe de dimensão. Os incêndios de mais de 100 hectares e sobretudo os de mais de 1000 hectares, apesar do seu reduzido número, são os que verdadeiramente constituem o problema que queremos minimizar.
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É por todos reconhecido que a grande variabilidade das áreas ardidas totais ao longo dos anos depende,
em larga medida, da variabilidade das condições meteorológicas entre anos. A dependência da ocorrência de
grandes incêndios das condições meteorológicas em que ocorrem pode ser efetuada a partir dos dados do
SGIF de todas as ocorrências entre 2001 e 2019 (Anexo 1). A proporção de ocorrências que ultrapassa os 100
hectares e os 1000 hectares aumenta substancialmente com a severidade meteorológica medida pelo índice
Canadiano DSR – «Daily Severity Rating» (Figura 2).
Figura 2. O gráfico indica a percentagem de ocorrências e a tabela o número de ocorrências por classe de dimensão demonstrando a influência das condições meteorológicas na proporção de grandes incêndios. No histórico de mais de 408 mil ocorrências registadas entre 2001 e 2019 verifica-se que a proporção de incêndios que ultrapassa os limites de 100 e de 1000 hectares é sempre baixa em relação ao número total de ocorrências, mas muito dependente das condições meteorológicas em que ocorreram (DSR). Quando o valor de DSR é superior a 60 a proporção de ocorrências que ultrapassa os 100 hectares é de quase 10%.
2. A IMPORTÂNCIA RECONHECIDA À RAPIDEZ DA PRIMEIRA INTERVENÇÃO
Para além das condições meteorológicas, que não são controláveis, um fator geralmente apontado como
determinante do sucesso do combate é a rapidez da primeira intervenção. O PNDFCI de 2006 já refletia a
importância empiricamente atribuída a esse fator, apontando a necessidade de se garantir uma capacidade de
reação que permitisse uma primeira intervenção em menos de 20 minutos em 90% das ocorrências.
Também neste caso os dados do SGIF permitem avaliar a importância da rapidez da primeira intervenção
na redução dos grandes incêndios (Figura 3).
Figura 3. Proporção de ocorrências que ultrapassam os limites de 100 hectares e de 1000 hectares em função dos tempos de primeira intervenção. Durante o período 2001 a 2019 quando o tempo da primeira intervenção foi superior a 50 minutos quase 2% das ocorrências ultrapassaram os 100 hectares.
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Do gráfico da Figura 3 é possível concluir facilmente sobre o grande efeito da rapidez da primeira
intervenção na probabilidade de ocorrência de grandes incêndios. Da análise do histórico 2001-2019 (SGIF)
conclui-se que, quando o tempo de intervenção foi inferior a 10 minutos a percentagem de ocorrências que
ultrapassou os 100 hectares foi muito baixa (0,42%) dos quais apenas 0,06% ultrapassam os 1000 hectares.
Pelo contrário quando o tempo de primeira intervenção foi superior a 50 minutos quase 2% das ocorrências
ultrapassou o limite de 100 hectares das quais 0,43% ultrapassou mesmo os 1000 hectares.
Conclui-se desta análise que os tempos de primeira intervenção mostram uma relação clara com a
dimensão final do incêndio. Como, por outro lado, vimos uma grande dependência da dimensão do incêndio
com a meteorologia concluímos ser de grande importância garantir uma primeira intervenção mais rápida
quando a meteorologia é mais severa.
O objetivo da atual doutrina de garantir uma primeira intervenção em menos de 20 minutos parece
adequada, mas sobretudo particularmente necessária em condições meteorológicas mais severas, acima de
um valor de DSR a determinar. Assumindo uma relação de causa e efeito entre o tempo de intervenção e a
área ardida podemos ter ideia da significativa redução desta área se conseguirmos diminuir os tempos de
primeira intervenção.
A redução dos tempos de primeira intervenção só pode ser conseguida através do reforço da quantidade
de meios de ataque inicial e da otimização da localização geográfica desses meios, temas que serão tratados
de seguida.
3. A GEOGRAFIA DOS GRANDES INCÊNDIOS E DA RAPIDEZ DE INTERVENÇÃO
A distribuição geográfica dos incêndios mostra uma grande heterogeneidade com as áreas de maior
número de ocorrências a serem bastante diferentes das dos incêndios de maior dimensão (Figura 4).
Figura 4. Geografia da densidade de ocorrências em função da dimensão. Dados: SGIF 2001-2019.
A geografia da totalidade das ocorrências é clara, associada às áreas de maior densidade populacional. No
entanto a densidade de ocorrências acima de 100 hectares e sobretudo a densidade de incêndios com
dimensão superior a 1000 hectares mostra uma geografia completamente diferente, com os grandes incêndios
a ocorrerem sobretudo no Norte e Centro mais no interior, com alguma incidência na região do Algarve. Fica
então claro que são nessas áreas que existem os maiores problemas associados aos grandes incêndios.
Importa agora saber como se distribuem geograficamente no continente Português os tempos da primeira
intervenção. Na Figura 5 apresentam-se, para o período 2001-2019 e por concelho, as médias dos tempos de
intervenção (no total e no período de julho a setembro) e as percentagens de ocorrências com tempo de
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intervenção inferior a 20 minutos.
Figura 5. Indicadores de todo o tipo de meios quanto aos tempos de intervenção por concelho em tempos médios de intervenção referentes a todo o ano (esquerda) e aos meses de julho a setembro (centro) assim como as percentagens de ocorrências com tempo inferior a 20 minutos (direita). Fonte: SGIF 2001-2019.
Da análise da Figura 5 pode concluir-se que a rapidez de intervenção é bastante heterogénea no território
do continente sendo naturalmente maior a rapidez de intervenção nos meses de julho a setembro quando se
reforçam os meios. A mesma heterogeneidade geográfica é visível no mapa da direita da Figura 5, que
evidencia as percentagens de ocorrências com tempos de intervenção inferiores a 20 minutos, como aponta o
PNDFCI.
Da comparação das Figuras 4 e 5 conclui-se facilmente que nas áreas em que o número total de
ocorrências é maior há em geral maior rapidez de intervenção, mas que o objetivo do PNDFCI de que a
primeira intervenção ocorresse em menos de 20 minutos está ainda longe de ser conseguido em áreas
significativas do território, algumas delas coincidentes com áreas de menor densidade populacional em que
ocorrem grandes incêndios.
Sendo particularmente importante a rapidez da primeira intervenção nos meses de julho a setembro,
quando os meios dedicados ao ataque inicial são reforçados, é interessante saber como evoluiu, ao longo do
período em análise (2001-2019) a rapidez da primeira intervenção (Figura 6).
Figura 6. Evolução dos tempos de intervenção de 2001 a 2019. Dados SGIF.
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Da análise da Figura 6 pode concluir-se que houve flutuações do tempo de primeira intervenção ao longo
dos anos, embora os tempos de intervenção acima dos 20 minutos tenham sido sempre uma fração
relativamente pequena do total. Independentemente destas flutuações a heterogeneidade geográfica da
rapidez da primeira intervenção tem-se mantido.
4. A PRIMEIRA INTERVENÇÃO NO QUADRO DO ATAQUE INICIAL (ATI)
Conforme se pode verificar na Figura 7, a primeira intervenção está incluída na fase de Ataque Inicial (ATI)
que está devidamente estabelecida e doutrinada nos termos e conforme a diretiva operacional, DON 2-DECIR
2019 que refere o ATI é uma intervenção organizada e integrada, sustentada por um despacho inicial de meios
até 2 minutos depois de confirmada a localização do incêndio, de meios aéreos se disponíveis, e em
triangulação, de meios terrestres de combate a incêndios rurais.
Uma discussão detalhada do ATI foi já incluída no Relatório de «Avaliação do sistema nacional de proteção
civil no âmbito dos incêndios rurais» produzido por este Observatório em dezembro de 2018.
Figura 7. Diagrama temporal das fases do combate a um incêndio rural conforme estabelecido nas sucessivas diretivas operacionais.
A primeira intervenção é a efetuada pelo primeiro meio a chegar ao Teatro de Operações (TO). Neste
estudo o tempo da primeira intervenção foi estabelecido como o tempo que medeia entre o tempo de alerta e o
tempo em que o primeiro meio chega ao teatro de operações (TO), sejam meios terrestres ou aéreos, dos
Corpos de Bombeiros, das Equipas de Sapadores Florestais ou da Guarda Nacional Republicana. Outros
agentes, como a Força Especial Proteção Civil também participaram na primeira intervenção no período em
análise, mas estão atualmente vocacionados para o Ataque Ampliado. É este tempo da primeira intervenção
que pode ser determinado por análise dos registos do Sistema de Gestão de Informação de Incêndios
Florestais (SGIF).
A partir da primeira intervenção, que pode ser efetuada por qualquer dos meios referidos, a doutrina
instituída é baseada no conceito de triangulação, ou seja o despacho de três veículos de combate a incêndios
(VFCI) dos três Corpos de Bombeiros mais próximos do local do incêndio, complementados pelo despacho de
um meio aéreo de ATI e respetiva equipa/brigada helitransportada. Releva-se deste conceito que a
triangulação, em bom rigor, refere-se aos três Corpos de Bombeiros mais próximos do local de incêndio, ainda
que para efeitos do estabelecido no ATI, seja suficiente que qualquer meio (aéreo ou terrestre) esteja em
combate até aos 20 minutos depois do alerta para que fique cumprido o critério da primeira intervenção. Pode
por isso acontecer que um dos meios cumpra o critério da primeira intervenção em 20 minutos e que os
demais possam demorar 30, 40 ou mais minutos até se consagrar em pleno o conceito da triangulação.
Define-se então, para além do tempo de primeira intervenção, de um tempo de triangulação como aquele que
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medeia entre o tempo de alerta e aquele em que aqueles três meios terrestres e o meio aéreo se reúnem no
combate, isto é, em que se consagra em pleno o conceito da triangulação. A análise do tempo de triangulação
é apenas possível a partir dos registos de entrada dos diversos meios no teatro de operações que consta no
sistema de apoio à decisão (SADO) que será objeto de próximo estudo técnico.
O Ataque Inicial termina no momento em que o incêndio for considerado dominado (em resolução) pelo
Comandante de Operações de Socorro (COS). No entanto, caso não seja considerado dominado até 90
minutos (tempo associado à autonomia do meio aéreo ligeiro), o incêndio passa automaticamente de Ataque
Inicial à fase de Ataque Ampliado (ATA). Assim, apesar de não ser indicador oficial, tem-se considerado como
medida do sucesso do ataque inicial a percentagem de ocorrências em que o tempo de resolução (tempo
entre o alerta e o momento em que o incêndio é considerado dominado) é inferior a 90 minutos (Figura 8).
Figura 8. Percentagem de ocorrências com tempo de resolução inferior a 90 minutos de 2008 a 2019 (dados SGIF).
O Ataque Inicial foi melhorado a partir de 2006 com o despacho automático de meios aéreos e com o
aperfeiçoamento do conceito de triangulação, tendo a informação sobre o tempo de resolução começado a ser
melhor registada a partir de 2008. A melhoria do sistema justifica que cerca de 90% das ocorrências tenha tido
um tempo de resolução inferior a 90 minutos.
De forma equivalente aos valores globais para a rapidez de intervenção, também os valores do tempo de
resolução mostram a mesma variabilidade geográfica, sendo que os 10% de ocorrências em que o tempo de
resolução excede os 90 minutos se localizam naturalmente nas áreas em que os tempos de primeira
intervenção são mais longos e por isso também mais associados aos maiores incêndios.
A heterogeneidade geográfica da rapidez da primeira intervenção e do tempo de resolução deve-se, por um
lado, à geografia das ocorrências, mas também, em grande medida, à distribuição geográfica dos meios
disponíveis, tema que abordaremos na próxima secção.
5. OS MEIOS DISPONÍVEIS PARA A PRIMEIRA INTERVENÇÃO
Os meios disponíveis para a primeira intervenção são também aqueles que estão referidos nas sucessivas
diretivas operacionais como incluídos na fase de Ataque Inicial (ATI). Neste estudo incluímos os meios
disponíveis mais significativos, incluindo meios terrestres e aéreos, dos Corpos de Bombeiros, dos Sapadores
Florestais e da GNR.
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5.1 – OS CORPOS DE BOMBEIROS
Não cabe naturalmente neste estudo fazer a história dos Corpos de Bombeiros em Portugal, uma história
tão rica e interessante e em que está ainda muito por conhecer, apesar de algumas excelentes contribuições,
como a obra em dois volumes coordenada por F. Hermínio Santos: «Bombeiros Portugueses – Seis Séculos
de História 1935-1995», publicada em 1995 pelo Serviço Nacional de Bombeiros e a Liga dos Bombeiros
Portugueses.
Importa aqui apenas referir que, desde 1995, apesar de algum decréscimo nos números, existe uma
estabilidade geral dos Corpos de Bombeiros e da sua distribuição no território (Figura 9).
Figura 9. Comparação do número de bombeiros por tipo e distrito em 1995 (LBP 1996) e 2019 (ANEPC).
Da análise da Figura 9 é claro que, apesar da estabilidade do número de Corpos de Bombeiros, existe
alguma diminuição no número total de bombeiros de 1995 para 2019 sendo a sua distribuição por tipo e por
distrito muito equivalente naqueles dois anos. Manteve-se durante todo este período uma grande dominância
dos bombeiros das associações humanitárias, complementadas por sapadores nos distritos das grandes
cidades (Lisboa, Porto, Coimbra, Setúbal, Braga e Faro) e por bombeiros municipais noutros distritos
(Santarém, Faro, Coimbra, Leiria, Viana do Castelo e Viseu).
Considerando a distribuição geográfica de proximidade em todo o território, os Corpos de Bombeiros são
indiscutivelmente os primeiros guardiões das comunidades, a quem os cidadãos recorrem quando sujeitos aos
mais variados e diferentes tipos de riscos. Relativamente aos 442 corpos de bombeiros existentes em Portugal
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continental, estes caracterizam-se pela diversidade de natureza, estrutura, história, idade, tipologia, evolução e
grau de desenvolvimento. Dos 278 municípios existentes no território do Continente, apenas o município de
Castro Marim não possui corpo de bombeiros, sendo a área deste município coberta pelos bombeiros
voluntários de Vila Real de Santo António.
Os corpos de bombeiros de qualquer natureza (voluntários, municipais ou sapadores) cumprem mais de
90% das missões de proteção civil em todo o território nacional, distribuindo-se naturalmente em função da
densidade populacional (Figura 10).
Figura 10. Densidade de bombeiros e densidade populacional em 2011 a partir do trabalho da ANMP/LBP da autoria do I.P. Leiria (J.M.Moura).
Os corpos de bombeiros, no âmbito das missões legais que lhes estão atribuídas, desenvolvem também
todas as ações que possam conduzir a uma imediata intervenção terrestre e ao rápido domínio e extinção de
incêndios rurais, potenciando a atuação articulada do dispositivo.
Nos últimos 10 anos, os sucessivos Governos têm investido na criação de Equipas de Intervenção
Permanente (EIP) nos corpos de bombeiros voluntários, numa parceria entre a ANPC e os respetivos
municípios, suportando cada uma das partes 50% do custo das referidas equipas, compostas por 5 elementos,
para trabalharem 8 horas, de segunda a sexta-feira. Depois de uma fase transitória que estabilizou a
dificuldade de resposta ao socorro, detetado num elevado número de corpos de bombeiros, este modelo
revela-se hoje insuficiente para garantir a adequada cobertura de socorro às populações em todo o território
nacional, nas 24 horas dos 365 dias do ano.
Em documentos anteriores este Observatório, e antes dele a Comissão Técnica Independente, apontava já
a necessidade de celebração de contratualização plurianual entre o Estado e as Associações Humanitárias de
Bombeiros para definir de forma realista os respetivos direitos e deveres no âmbito dos incêndios florestais.
Essa necessidade continua premente.
Devido à diversidade das suas missões no âmbito da proteção civil a geografia dos Quartéis de Bombeiros
corresponde mais à geografia da população que protege e não está naturalmente pensada para a otimização
da rapidez da primeira intervenção em ocorrências de incêndios florestais.
Neste estudo foi possível aprofundar esta questão utilizando a metodologia definida nos Planos Municipais
de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) e fazendo recurso à rede viária com tipologias e
velocidades definidas (Anexo 2). Assim, estabeleceram-se para todo o Continente as isócronas a partir dos
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quartéis de bombeiros (Figura 11).
Da Figura 11 facilmente se conclui existirem áreas significativas do território em que a distância em tempo
ao quartel de bombeiros mais próximo excede largamente os 20 minutos previstos no PNDFCI e nas
sucessivas diretivas operacionais. São os concelhos do Alentejo e os do interior (Norte e Centro) aqueles em
que a intervenção a partir dos quartéis de bombeiros é naturalmente mais lenta.
Figura 11. Localização dos quartéis dos bombeiros (esquerda) e isócronas dos tempos estimados de primeira intervenção a partir dos quartéis dos bombeiros e utilizando a informação da rede viária com as suas tipologias e velocidades indicativas constantes no guia metodológico dos PMDFCI (direita).
Sendo a intervenção a partir dos quartéis dos bombeiros claramente insuficiente para garantir uma primeira
intervenção rápida em grande parte do território foram surgindo ao longo do tempo soluções de pré-
posicionamento de meios no sentido de suprir essa falta. O estabelecimento dos Locais Estratégicos de
Estacionamento (LEE) é uma resposta nesse sentido.
No entanto, a melhoria da rapidez da primeira intervenção foi também um dos objetivos da criação das
Equipas de Sapadores Florestais (ESF) que são objeto da secção seguinte.
5.2 – OS SAPADORES FLORESTAIS
Desde a sua génese em 1999, as equipas de Sapadores Florestais (ESF) têm tido grande desenvolvimento
e têm-se instalado em áreas do território do interior mais vulneráveis aos grandes incêndios florestais (Figura
12).
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Figura 12. A evolução das equipas de sapadores florestais desde 1999.
O Programa de Sapadores Florestais, que enquadra o funcionamento dos sapadores florestais, tem
também fragilidades diversas que têm sido referidas por este Observatório e tratadas em anteriores relatórios.
Apesar dos quase 20 anos de existência do Programa de Sapadores Florestais e dos indicadores da situação
das ESF apresentados em diversos relatórios e documentos produzidos por organismos públicos bem como
pelas recomendações da Assembleia da República nas várias legislaturas, os problemas de fundo quanto ao
funcionamento, número de equipas, estrutura e condições laborais e formativas dos Sapadores Florestais
continuam por resolver.
Uma das dificuldades reside no facto de terem sido criadas por diferentes entidades privadas e públicas:
associações de produtores florestais, cooperativas, organizações de baldios, juntas de freguesia, câmaras
municipais (Figura 13).
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Figura 13. A evolução do número de Equipas de Sapadores Florestais desde o início do Programa em 1999 até ao ano de 2018 com 288 equipas.
A acrescer a esta complexidade foram recentemente criadas brigadas de sapadores florestais no âmbito
das comunidades intermunicipais cujo funcionamento está ainda pouco claro.
O Observatório propôs, e continua a propor, que o Programa de Sapadores Florestais seja revisto de forma
a contemplar a diferente natureza das entidades responsáveis e a permitir um melhor e mais estável
funcionamento.
Não obstante as dificuldades expressas, as Equipas de Sapadores Florestais permitem um trabalho muito
próximo dos problemas reais que atingem a floresta, facilitando a conciliação de interesses dos utilizadores e
residentes do espaço rural-florestal e os interesses da prevenção e defesa da floresta contra incêndios.
Quando se constituem equipas de Sapadores Florestais e estas se consolidam num território, os seus
elementos adquirem um certo grau de especialização que não pode ser ignorado nem subvalorizado, em
matérias de prevenção, de conhecimento do fenómeno dos incêndios locais e das causas e motivações
associadas ao uso do fogo.
Os Sapadores Florestais atuam transversalmente nos três pilares do SDFCI, encontrando-se implicados
todo o ano na prevenção estrutural, vigilância ou combate. De acordo com a legislação em vigor, as ESF
devem prestar seis meses de serviço público ao Estado. Com base nos dados dos relatórios públicos
divulgados pelo ICNF referentes ao período de 2011 a 2015, a atividade de vigilância e supressão de
incêndios florestais se abrange em média 57 dias por ano.
A contribuição das Equipas de Sapadores Florestais no âmbito da primeira intervenção faz-se, em
princípio, a partir dos Locais Estratégicos de Estacionamento estabelecidos no âmbito dos PMDFCI. No
entanto, o número de LEE estabelecido em PMDFCI é naturalmente muito superior ao número de equipas de
sapadores florestais.
Neste estudo foi também possível aprofundar esta questão de forma equivalente ao que foi efetuado para
as distâncias em tempo aos quartéis de bombeiros (ver Anexo 2), incluindo aqui as distâncias a Locais
Estratégicos de Estacionamento com localização indicada em PMDFCI assumindo que o número de LEE
operacionais era o mesmo do de equipas de sapadores florestais no mesmo concelho. Os resultados deste
exercício apresentam-se na Figura 14.
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Figura 14. Equipas de Sapadores Florestais e Locais de Estacionamento Estratégico em 2019 (esquerda) e isócronas dos tempos estimados de primeira intervenção a partir dos quartéis dos bombeiros e dos locais de estacionamento estratégico (LEE) e utilizando a informação da rede viária com as suas tipologias e velocidades indicativas constantes no guia metodológico dos PMDFCI (direita).
A comparação dos mapas das Figuras 11 e 14 permite compreender a melhoria da rapidez da primeira
intervenção possibilitada pela participação das equipas de sapadores florestais a partir dos Locais Estratégicos
de Estacionamento. A complementaridade geográfica entre quartéis de bombeiros e locais estratégicos de
estacionamento possibilita uma melhor cobertura de zonas mais vulneráveis aos grandes incêndios. Ainda
assim existem áreas significativas do território onde a primeira intervenção não é tão rápida quanto desejável.
A importância dos meios aéreos é, por isso, justificada pela complementaridade geográfica aos meios
terrestres disponíveis. E essa complementaridade continuaria a justificar-se ainda que fossem preenchidos
todos os LEE por equipas de sapadores florestais ou bombeiros.
5.3 A – INTERVENÇÃO DOS MEIOS AÉREOS
Para além dos Corpos de Bombeiros e das Equipas de Sapadores Florestais, que participam na primeira
intervenção deslocando-se com meios terrestres a partir dos quartéis ou dos locais de estacionamento
estratégico, é muito importante a intervenção dos meios aéreos.
Durante o período em análise a Força Especial de Bombeiros (FEB), atualmente designada como Força
Especial de Proteção Civil, teve um papel determinante na participação dos meios aéreos no âmbito da
primeira intervenção. Durante o mesmo período o Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da
Guarda Nacional Republicana (GNR) repartia com a FEB a responsabilidade da primeira intervenção
helitransportada.
Durante o ano de 2018, o GIPS deu origem à Unidade Especial de Proteção e Socorro (UEPS) que viu
reforçada a sua capacidade bem como alargado o espetro da sua missão, com um aumento do seu efetivo em
mais 500 militares e renovação de uma parte significativa dos seus meios, entre viaturas e equipamentos de
proteção individual. A UEPS passou a guarnecer todas as equipas helitransportadas nos 18 distritos do país,
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operando os 40 meios aéreos instalados nos 39 centros de meios aéreos, reforçando assim a sua capacidade
no Ataque Inicial (ATI), bem como em Ataque Ampliado (ATA).
A participação da GNR através da UEPS permite assim que, para além dos meios terrestres de que
também dispõe, sejam ativados os meios aéreos que lhe estão afetos. Os meios aéreos, sejam de asa fixa ou
de asa rotativa, constituem uma das variáveis mais importantes da equação dos meios de combate aos
incêndios rurais. Regista-se positivamente que o dispositivo mantém na sua génese meios de diferentes
tipologias, que respondem de forma diferenciada às orografias do nosso território, bem como aos diferentes
planos de água disponíveis, que permitem em função da sua disponibilidade ritmos de cadência de descarga
muito aceitáveis, seja via «scooping» para os meios de asa fixa, seja pontos de água naturais ou outros para
meios de asa rotativa, mobilizando assim a cada momento os meios mais adequadas à parcela do território
que esteja a ser afetada.
No Quadro 1 identificam-se as diferentes tipologias de aeronaves, sendo que a sua classificação está
associada à correspondente carga instalada. O quadro refere ainda quais os meios mais usados nos
diferentes dispositivos nos últimos 15 anos. Os dados referidos tiveram em conta o planeamento estruturado
em sede da respetiva Diretiva Operacional Nacional em cada um dos anos, não considerando por isso os
meios mobilizados por ativação de acordos bilaterais estabelecidos internacionalmente nem aqueles que
foram mobilizados por ativação do Mecanismo Europeu de Proteção Civil. Embora o quadro não o reflita,
sublinha-se que em 2006 e 2007, através do acordo bilateral com a Rússia, estiveram no dispositivo de forma
planeada e não reativa, dois aviões bombardeiros pesados, modelo Beriev BE200. O avião bombardeiro ligeiro
tipo Dormader foi descontinuado do dispositivo a partir do ano de 2010, não tendo surgido outro com
características semelhantes que tenha sido adotado para o dispositivo.
Quadro 1. Classificação do tipo de aeronaves sejam de asa fixa ou de asa rotativa, usadas nos dispositivos
desde o ano 2000
Tipologia de Aeronave Aeronaves usadas no
dispositivo
Capacidade
padrão (litros)
Capacidade
instalada (litros)
Helicóptero Bombardeiro Ligeiro (HEBL) Ecureil AS350 < 1000 900
Helicóptero Bombardeiro Médio (HEBM) Bell 205 e 212 1000 – 2500 1200
Helicóptero Bombardeiro Pesado (HEBP) Kamov KA32 > 2500 4000
Avião Bombardeiro Ligeiro (AVBL) Dromader a) 1500 – 3000 2200
Avião Bombardeiro Médio (AVBM) Airtractor FB 3000 – 5000 3100
Avião Bombardeiro Pesado (AVBP) Canadair 215 > 5000 5350
a) Descontinuado desde 2010
Como se constata na Figura 15, onde se referem os meios aéreos contratualizados pelo Estado ao longo
dos últimos 15 anos, regista-se que o maior número de meios aéreos de combate ocorreu em 2008, 2009 e
2010, respetivamente com 56 unidades/ano, sendo agora atingido o mesmo número de meios para 2019.
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Figura 15. Evolução dos meios aéreos de Ataque Inicial (ATI) e de Ataque Ampliado (ATA). Os helicópteros bombardeiros ligeiros (HEBL) e médios (HEBM) são os meios específicos do Ataque Inicial. Os helicópteros bombardeiros pesados (HEBP) e os aviões bombardeiros ligeiros (AVBL), médios (AVBM) e pesados (AVBP) são vocacionados para o Ataque Ampliado.
Procurando estimar o tempo de intervenção a partir dos Centros de Meios Aéreos criou-se a Figura 16,
onde se verifica que a possibilidade de ataque inicial em menos de 20 minutos a partir dos meios aéreos cobre
quase a totalidade do território continental.
Figura 16. Localizações dos Centros de Meios Aéreos e dos raios de ação sobrepostos às classes de perigosidade (Fonte: ANEPC – esquerda) e tempos de intervenção estimados (direita).
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Note-se que para cumprir o objetivo de uma primeira intervenção de meio aéreo em 20 minutos seria
necessário, no mínimo, um meio aéreo disponível situado a uma distância menor do que 30 km (HEBM) ou 52
km (HEBL) (ver Anexo 2). Por simplicidade usa-se um raio médio de 40 km para qualquer dos helicópteros
utilizados.
A questão essencial na análise da contribuição dos meios aéreos para a primeira intervenção é a de que
não é realista partir do pressuposto de que estes meios são ativados para todas as ocorrências. Em primeiro
lugar porque não operam em grande parte do ano, não operam de noite, nem operam sem condições
atmosféricas adequadas. Por outro lado, dados os custos associados, a sua utilização deve obedecer a
critérios exigentes e dependentes do julgamento do decisor.
O SGIF não permite fazer uma análise da contribuição específica de cada tipo de meios. A análise dos
dados do SADO irá permitir, num segundo momento, fazer essa análise mais detalhada.
6. TEMPOS DE PRIMEIRA INTERVENÇÃO ESTIMADOS E OBSERVADOS
Os tempos de primeira intervenção podem ser estimados para cada ocorrência registada no SGIF de 2001
a 2019 a partir da sua localização e proximidade à rede viária. A partir desse exercício foi possível estimar
para cada concelho a percentagem de ocorrências que poderiam ter uma intervenção dos Corpos de
Bombeiros (CB) em menos de 20 minutos a partir dos seus quartéis. O mesmo exercício foi feito para a
intervenção a partir dos bombeiros a partir dos seus quartéis complementada com a intervenção dos
sapadores florestais a partir de locais estratégicos de estacionamento (CB e LEE). Finalmente esses valores
estimados foram confrontados com os valores observados, obtidos a partir do SGIF (Figura 17).
Figura 17. Valores estimados de percentagens de ocorrências em menos de 20 minutos pelos Corpos de Bombeiros a partir dos seus quartéis (CB – esquerda) e destes complementados pelos Sapadores Florestais a partir dos locais estratégicos de estacionamento (CB LEE – centro). Valores observados a partir do SGIF (esquerda).
Da análise da Figura 17 destaca-se a significativa melhoria da cobertura de primeira intervenção
proporcionada pela complementaridade geográfica dos quartéis de bombeiros e dos locais estratégicos de
estacionamento. Ainda assim, a realidade registada no SGIF é significativamente melhor do que seria possível
apenas com as intervenções dos corpos de bombeiros e sapadores florestais, demonstrando a importância
dos meios aéreos na primeira intervenção.
De qualquer forma os dados do SGIF (Figuras 5 e 17) revelam que há ainda áreas significativas do
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território onde é frequente que a primeira intervenção ocorra para além dos 20 minutos. A mesma análise
efetuada em função de um tempo de intervenção de 10 minutos (Figura 18) indica que percentagens
significativas (mais de 80%) de intervenções em menos de 10 minutos poderiam apenas ocorrer a partir dos
quartéis de bombeiros em áreas muito reduzidas perto de Lisboa ou do Porto, abrangendo outras áreas mais
para o interior quando complementadas pelos sapadores florestais, aproximando-se do padrão observado a
partir dos dados do SGIF.
Figura 18. Comparação das percentagens de ocorrências estimadas com um tempo de intervenção inferior a 10 minutos a partir dos quartéis de bombeiros (esquerda), destes complementados pelos locais estratégicos de estacionamento (centro), com as percentagens observadas registadas no SGIF.
7. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
As análises efetuadas a partir dos dados do SGIF permitem conclusões sobre a importância da primeira
intervenção na dimensão final dos incêndios, mas não permitem avaliar a importância do tipo de meios
utilizados na primeira intervenção nem da importância dos outros meios envolvidos no ataque inicial para o
sucesso do combate. Também as importantes questões da simultaneidade de ocorrências e do tempo crítico
entre a ignição e o alerta não foram objeto de análise neste estudo. Ainda assim, as análises permitiram
concluir que:
1. A par das condições meteorológicas, a rapidez da primeira intervenção é um fator com influência muito
significativa na dimensão final dos incêndios;
2. A rapidez da primeira intervenção é muito variável no território havendo áreas em que ocorrem grandes
incêndios com tempos de intervenção frequentemente maiores do que os indicados como objetivos no
PNDFCI e nas diretivas operacionais;
3. Os indicadores médios a nível nacional dos tempos de intervenção e de resolução são aparentemente
favoráveis, mas não refletem a grande variabilidade geográfica existente;
4. A distribuição geográfica dos Bombeiros e dos seus quartéis segue de perto a distribuição geográfica da
população que serve para a proteção dos diversos riscos, não podendo, portanto, conseguir uma
primeira intervenção atempada em zonas de menor densidade populacional;
5. A distribuição geográfica dos sapadores florestais e dos locais de estacionamento estratégico é um
complemento importante aos corpos de bombeiros para os meios terrestres de primeira intervenção,
não cobrindo ainda assim, algumas áreas do território;
6. Os meios aéreos fornecem a componente em falta em áreas significativas do território possibilitando a
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aproximação aos objetivos definidos de uma primeira intervenção em menos de 20 minutos.
Com base nestas conclusões o Observatório recomenda que:
1. A muito valiosa base de dados do SGIF seja mantida e associada à base de dados do SADO. Esta
associação de bases de dados permitirá uma análise mais completa da importância dos meios
associados ao Ataque Inicial, mas também ao Ataque Ampliado. O Observatório julga que será possível
com base nessa análise conjunta, que prevê efetuar num outro estudo, avaliar o atual conceito de
triangulação e propor critérios que estabeleçam para dias com condições meteorológicas adversas (em
que o valor de DSR seja superior a um dado valor limite) as combinações de meios e tempos de
intervenção que permitam o melhor sucesso do combate;
2. O planeamento da distribuição espacial dos locais de estacionamento estratégico e das equipas
de sapadores florestais deverá ser efetuado no quadro do conjunto de todos os meios de ataque
inicial. Este planeamento em sede de PMDFCI é por vezes efetuado com pouco critério. O nível
distrital, intermunicipal ou regional deverá ter em conta a disponibilidade de todo o tipo de meios. A
ausência do nível distrital no planeamento, com a falta dos Planos Distritais de DFCI, não permite a
necessária visão de conjunto no planeamento da primeira intervenção. A seleção de novas equipas de
sapadores florestais deveria ser efetuada tendo em consideração a complementaridade geográfica dos
meios;
3. O dispositivo de Ataque Inicial deve ser avaliado no seu conjunto, incluindo a
complementaridade dos meios terrestres de Bombeiros e Sapadores Florestais e dos meios
aéreos. O registo de informação do SADO poderá permitir esta avaliação permitindo a reavaliação ou
reforço da doutrina instituída no conceito de triangulação, envolvendo, para além dos Corpos de
Bombeiros, os meios de todas as outras forças que concorrem para o dispositivo, independentemente
da sua titularidade, podendo admitir-se diversos tipos de combinações de meios para, de forma
coordenada, integrar o combate;
4. O critério de tempo máximo de primeira intervenção deverá ser definido em função das
condições meteorológicas. O objetivo do ataque inicial (ATI) é o de extinguir o incêndio nascente de
forma a evitar a necessidade de ataque ampliado (ATA). Para o sucesso dessa intervenção concorrem
diversos fatores locais (topografia, tipo de vegetação, acessibilidade) mas também de forma
determinante os fatores meteorológicos. A necessidade de maior rapidez na primeira intervenção é
função das condições meteorológicas existentes, como se demonstra na Figura 19. O dispositivo deverá
ser capaz de corresponder à variabilidade do contexto meteorológico. Assim, os meios mobilizados em
triangulação devem estar em combate mais rapidamente (desejavelmente até 20 minutos) em dias em
que a severidade é significativa (necessariamente com valores de DSR acima de 20);
Figura 19. A percentagem de ocorrências acima dos 100 hectares em função do DSR e do tempo da primeira intervenção.
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5. O objetivo de conseguir uma primeira intervenção em menos de 20 minutos parece adequado,
sendo importante garantir que se estenda a todo o território aproveitando as características dos
diferentes meios. Não faz sentido afetar novas equipas de sapadores florestais nem meios aéreos para
primeira intervenção em áreas em que a densidade de quartéis de bombeiros permite uma intervenção
atempada. Por outro lado, em áreas de menor densidade populacional, com menor número de
ocorrências e com menor número de bombeiros e sapadores florestais é fundamental a intervenção
mais forte dos meios aéreos. A procura de maior homogeneidade na resposta de primeira intervenção
atempada em todo o território, e em particular nas áreas onde os grandes incêndios são mais
frequentes, deve ser objetivo fundamental da estratégia a desenvolver no curto prazo.
ANEXOS
Anexo 1 (SGIF)
A informação sobre a primeira intervenção está incluída no Sistema de Gestão de Informação Sobre
Incêndios Florestais (SGIF) da responsabilidade do ICNF e que inclui a informação relevante fornecida pela
ANEPC. A recolha mais sistemática destes dados iniciou-se em 2001, apesar de haver na base de dados
muita falha de informação nos primeiros anos. De qualquer forma existe informação sobre dia, hora e minutos
relativa ao alerta e à primeira intervenção num número muito significativo de ocorrências, mesmo se depois de
serem identificados os diversos problemas de falta de informação ou de informação de qualidade duvidosa.
Assim, não foram consideradas na análise as situações em que as diferenças entre a primeira intervenção e o
alerta eram coincidentes, negativas, ou superiores a 60 minutos. Uma tabela com o número total de
ocorrências registadas (total de 443 698) e com as que foram consideradas nesta análise (337 910) é
apresentado de seguida.
Ocorrências na base de dados do ICNF, em número total por ano e com indicação do número utilizado na
análise depois de removidas as ocorrências sem informação do tempo de primeira intervenção ou com
informação duvidosa.
Ano Número total de ocorrências
consideradas na análise Número total de ocorrências
registadas
2001 9746 29 309
2002 16 232 28 993
2003 13 694 28 087
2004 8418 27 829
2005 18 547 41 689
2006 19 452 24 242
2007 23 548 25 132
2008 18 076 18 958
2009 28 373 29 783
2010 24 526 26 113
2011 28 447 29 782
2012 24 582 25 352
2013 22 521 23 129
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Ano Número total de ocorrências
consideradas na análise Número total de ocorrências
registadas
2014 8883 9388
2015 18 736 19 643
2016 15 492 16 104
2017 20 329 21 006
2018 11 724 12 253
2019 6584 6906
Total 337 910 443 698
Anexo 2 (Características dos meios terrestres e aéreos)
Anexo 3. Número de ocorrências em função do DSR e dos tempos de primeira intervenção
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ESTUDO TÉCNICO
ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA PÓS-FOGO
Observatório Técnico Independente
Citação recomendada:
Observatório Técnico Independente, Castro Rego F., Fernandes P., Sande Silva J., Azevedo J., Moura J.M.,
Oliveira E., Cortes R., Viegas D.X., Caldeira D., e Duarte Santos F. – Coords. (2019)
ESTUDO TÉCNICO – Estabilização de Emergência Pós-Fogo
Assembleia da República. Lisboa. 31 pp.
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Índice
1. Introdução à estabilização de emergência
2. Efeitos do fogo nas propriedades físicas e químicas do solo
3. Técnicas e procedimentos de estabilização de emergência
4. Extração e ordenamento florestal pós-fogo
5. Tipologia de ações apoiadas a nível da estabilização de emergência pós-incêndio e para o
restabelecimento da floresta afetada análise crítica (Operação 8.1.4)
6. Recomendações/processo operativo e a importância dos planos regionais de ordenamento florestal
7. Casos de estudo
7.1. Programa de recuperação das matas litorais
7.2. Plano de ação pós-fogo da peninha – cresmina (Cascais)
7.3. Incêndio de Monchique
8. Conclusões e recomendações
Referências
1. INTRODUÇÃO À ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA
A estabilização de emergência representa a 1.ª fase da recuperação de áreas ardidas, procurando, após a
avaliação dos danos, o rápido controlo da erosão, tendo em conta as zonas de maior suscetibilidade à perda
de solo e a proteção das linhas de água, bem como a defesa das infraestruturas e aglomerados urbanos de
fenómenos hidrológicos extremos, como cheias, e, ainda, a proteção dos habitats mais sensíveis. Todavia, o
que acontece depois do fogo, principalmente ao nível da conservação do solo, recebe pouca atenção por parte
das entidades competentes e dos próprios proprietários. Em boa verdade, as questões relacionadas com o
pós-fogo em Portugal estão essencialmente centradas na investigação das causas, sendo na prática pouco
evidentes as intervenções no âmbito da estabilização de emergência e, de um modo geral, da restauração dos
ecossistemas florestais. Apesar das preocupações de alguns proprietários e associações, é urgente
disponibilizar normas de orientação com a indicação dos procedimentos adequados. Existem ainda muitos
milhões de hectares de floresta não cadastrados, onde os proprietários não sabem o que ardeu nem se
preocupam com o que possa acontecer posteriormente ao fogo. Acresce que os apoios para este tipo de
intervenções tendem a ser escassos e são disponibilizados muito tempo depois da ocorrência dos fogos,
quando os seus efeitos nefastos no ecossistema já se fizeram sentir. Este documento procura sensibilizar para
a necessidade de intervir nas áreas afetadas por incêndios bem como fornecer informação técnica necessária
às intervenções, de forma a colmatar uma lacuna evidente na recuperação de áreas ardidas: a inexistência de
uma intervenção generalizada no pós-fogo.
Num inquérito realizado em Portugal (Sousa, 2011), dirigido a Gabinetes Técnicos Florestais (GTF) e
Associações Florestais em Portugal (Sousa, 2011), obtiveram-se indicações no mesmo sentido. Concluiu-se
assim que 71% dos inquiridos não efetuava qualquer ação de mitigação da erosão do solo e/ou do risco de
cheia. Nas intervenções realizadas em encostas, constatou-se que as técnicas mais frequentemente aplicadas
consistiram na criação de valas, escarificações e mobilização do solo (29%), realização de sementeiras (28%)
e utilização de troncos como barreiras (26%). Não obstante, apesar das medidas de recuperação de solos e
de mitigação hidrológica serem muito escassas em Portugal, existe nestas matérias um conhecimento técnico
e científico considerável na Península Ibérica, resultante dum intenso e prolongado trabalho de investigação e
experimentação.
Podemos considerar as ações de restauração florestal faseadas de acordo com as seguintes três
categorias (Bento-Gonçalves et al., 2013):
a) As medidas de intervenção aplicadas a curto prazo após os incêndios, que cabem na designação de
estabilização de emergência, procuram controlar a erosão e assentam frequentemente no mulching,
barreiras de tronos segundo as curvas de nível ou check-dams nas linhas de água (açudes de correção
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torrencial) e sementeiras, procurando a proteção do solo, aumento da infiltração e regulação hidrológica;
b) Numa segunda categoria inserem-se as intervenções realizadas no período entre 1 um a três anos após
o fogo, incluindo as ações mais comuns de reabilitação de ecossistemas e bacias hidrográficas florestadas;
c) Seguem-se as estratégias de restauração de longo prazo viradas para a melhoria da qualidade do
habitat, da produtividade e do aumento da resiliência a novas perturbações.
É precisamente à estabilização de emergência, pela sua importância estratégica na minimização dos
impactos dos fogos e na manutenção da capacidade de resiliência dos ecossistemas, que pretendemos dar
destaque neste Documento Técnico. Pretendemos incidir em ações e estudos publicados referentes ao
contexto da Península Ibérica, embora, por vezes, alargados à Região Mediterrânica. Incluímos igualmente
três casos de estudo resultantes de eventos recentes com um elevado significado ambiental e social.
2. EFEITOS DO FOGO NAS PROPRIEDADES FÍSICAS E QUÍMICAS DO SOLO
A cor negra que apresenta o solo após o fogo deve-se à acumulação de cinzas e folhada parcialmente
consumida. A espessura da camada de cinza depende da severidade do fogo e é proporcional à matéria
orgânica consumida (Celis et al., 2013). Contudo, uma densa camada de cinzas oferece algum efeito inibidor
de erosão (De Luis, et al., 2003). Todavia, muitas outras propriedades do solo podem ser afetadas,
verificando-se frequentemente um aumento do pH e da condutividade elétrica (esta devido à mineralização da
matéria orgânica), afetando a capacidade enzimática do solo (Barreiro et al., 2013; Pereira, 2018). Segundo
estes autores, à superfície podem atingir-se temperaturas de 500-800º C, até mesmo de 1440º C, mas como o
solo é mau condutor a diminuição da temperatura em profundidade é muito acentuada a níveis inferiores aos 5
cm de profundidade.
Na Figura 1 encontra-se um diagrama ilustrativo dos fenómenos associados com a sequência em cascata
da alteração dos componentes do solo como resultado dum fogo que ocasiona um elevado aumento da
temperatura à superfície.
Figura 1. Efeito cascata na química do solo como consequência do fogo (adaptado de Úbeda & Outeiro, 2008).
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Outra consequência do fogo resulta no aumento da hidrofobicidade (repelência à água) do solo, processo
que se intensifica continuamente até aos 250º C, com efeitos diretos na diminuição da infiltração da água,
resultado da acumulação de cinzas, volatilização dos compostos orgânicos e posterior condensação nas
partículas do solo. Não obstante, acima dos 350º C pode haver uma reversão e destruição das substâncias
hidrofóbicas. No entanto, o carbono e o azoto tendem a ser completamente volatilizados a temperaturas
superiores a 550º C (Pereira et al., 2018). Outros elementos, como cálcio (Ca) e magnésio (Mg), necessitam
de temperaturas mais altas para serem volatilizados, acabando por ser exportados através das cinzas.
Acresce que o mencionado aumento do pH e da condutividade favorecem também a solubilidade de catiões
como Ca, Mg, sódio (Na) e potássio (K). Saliente-se que, mesmo para temperaturas superiores a 80º C,
verifica-se já uma alteração profunda na flora microbiana do solo, com o seu desaparecimento completo acima
dos 150º C (Mataix-Solera et al., 2008).
Muito preocupante, e ainda pouco estudada, é também a contaminação proveniente de substâncias
químicas que integram os retardantes aplicados no combate aos incêndios (como os produtos
organofosforados), ou resultantes da alteração da matéria orgânica, gerando a produção de compostos
aromáticos policíclicos (PAH) quando a temperatura é muito elevada (Campo et al., 2017) ou de compostos de
difenil-brómio (PBDE), podendo exercer grande toxicidade e um efeito de bioacumulação.
A erosão hídrica é causada pelo efeito splash (mobilização das partículas de com solo com a energia
cinética das gotas de água) e pelo escoamento superficial, variando de acordo com a intensidade e quantidade
da precipitação, bem como do comprimento da encosta e rugosidade superficial, aspetos potenciados pela
mencionada impermeabilização das camadas superficiais. As alterações hidrológicas que podem ocasionar
cheias intensas e perdas de solo são muto variáveis de acordo com a natureza da combustão. Acresce que a
estrutura, textura e porosidade do solo variam também com as condições térmicas verificadas à superfície
durante o fogo. Por exemplo, os incêndios muito intensos podem levar à fusão das argilas e ao aumento
proporcional do limo e areia.
As consequências da erosão são, portanto, difíceis de avaliar até porque, com altas temperaturas, pode
ocorrer a recristalização de alguns minerais, essencialmente hidróxidos de ferro (Fe) e alumínio (Al), o que
sendo positivo, por aumentar a estabilidade do solo, traduz-se em baixos teores de matéria orgânica, afetando
a regeneração da vegetação (Mataix-Solera et al., 2011). Por sua vez, com a ausência de vegetação em
declives moderados a elevados existe uma elevada suscetibilidade para a formação de ravinas, aumentando a
escorrência em detrimento da infiltração (Martins Pedrosa, 2013). Aliás, como mostram Baptista et al. (2013),
após o incêndio a declividade passa a ser o fator condicionante da perda de solo, o que acontece
especialmente em solos incipientes. Por sua vez, os impactes da erosão torrencial levam ao transporte de
sedimentos para as linhas de água, com o concomitante assoreamento dos rios, diminuindo a sua capacidade
de vazão, incrementando cheias rápidas e potenciando ainda a erosão fluvial (Fernandes, et al., 2013;
Pacheco et al., 2015).
A maior parte dos estudos realizados em zonas de influência mediterrânica mostram que os 1.º e 2.º anos
após o fogo são os períodos mais críticos no aumento do escoamento e perda de solo (Cerdá, 1998), bem
como de azoto e fósforo (Hosseini et al., 2017), com efeitos cumulativos à medida que aumenta a recorrência
do fogo, podendo conduzir à eutrofização das linhas de água. Se bem que haja uma resiliência de curto prazo
ao fogo, este período de recuperação pode ser posto em causa em situações de seca, dado que esta atrasa a
recuperação da cobertura vegetal (Mayor et al., 2007). Isto é, segundo estes autores as perdas de solo em
sistemas mediterrânicos são substanciais, não somente quando ocorrem picos de precipitação poucos meses
a seguir ao fogo, mas também quando estes surgem vários anos após, especialmente quando, em
consequência de fenómenos de seca, a proteção conferida pela vegetação é escassa.
3. TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS DE ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA
Após o fogo, a intervenção a realizar no solo deve localizar-se nas vertentes mais ou menos inclinadas e
nos canais de escoamento, segundo Vallejo e Alloza (2018) que analisaram a aplicação destas medidas na
Península Ibérica. Os procedimentos de correção torrencial após os fogos florestais, com muitas décadas de
aplicação em Portugal, foram profusamente utilizados na região centro do país, complementados com a
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estabilização das encostas e das bacias de receção. Os açudes utilizavam frequentemente materiais de
alvenaria argamassada, mas houve também recurso a gabiões, alvenaria de pedra solta, alvenaria mista,
betão armado e, mais recentemente, laje (Fernandes et al., 2013). Devido aos elevados custos e, também, ao
seu impacte visual, estas estruturas nos fluxos de escoamento têm vindo a ser substituídas por técnicas de
Engenharia Natural (troncos, faxinas, empacotamentos, enrocamentos vegetados, etc.).
Nas encostas a resistência ao escoamento tem sido feita essencialmente com barreiras de troncos e
faxinas. A monitorização realizada revela uma nítida eficácia na retenção de matéria orgânica e sedimentos,
no curto prazo, mas é escassa a informação para períodos mais dilatados (González-Romero et al., 2018).
Trabalhos como os de Badía et al. (2015) verificaram que, mesmo para barreiras de troncos, a capacidade de
retenção mantinha-se ativa nos primeiros quatro anos após instalação e, de modo mais significativo, a
eficiência de retenção aumentava em zonas áridas. Esta capacidade de armazenamento pode ainda ser
aumentada combinando bacias de retenção em simultâneo com açudes de tronco, designados vulgarmente
como LDD: log debris dam (Fox, 2011).
Existe, na verdade, um largo universo de técnicas disponíveis para encostas. Coelho et al. (2010)
identificaram mesmo um total de 27 técnicas distintas adaptadas ao pós-fogo, sendo as mais correntes o
mulch, hidromulch, cordões de mulch, sementeira e hidrosementeira, barreiras (troncos, tubos de nylon
revestidos de palha ou geomantas), mobilização do solo, como lavoura e escarificação, terraceamento,
barreiras transversais em canais (fardos de palha, troncos, blocos/enrocamento, sacos de areia), além de
múltiplos processos para proteção dos caminhos florestais.
Um óbice à aplicação de muitas destas técnicas reside nos seus elevados custos. Por isso, Bento-
Gonçalves et al. (2013) testaram processos de baixo custo, como coberturas de palha e caruma, que
apresentaram também bons resultados, embora a sua eficácia diminua após o 1.º ano com a decomposição
dos materiais. A aplicação de mulch tira partido do material orgânico particulado existente, sendo, portanto, um
processo de baixo custo, mas não tem passado na maioria das vezes de aplicações em projetos
demonstrativos. A utilização de mulch de detritos florestais, particularmente de cascas de eucalipto trituradas,
obteve resultados muito interessantes em áreas ardidas da região centro, mas o hidromulch, que inclui fibras
orgânicas projetadas e ainda sementes de leguminosas e gramíneas, obteve resultados superiores no controle
da erosão (Prats et al, 2013), embora com custos superiores. A aplicação extensiva de misturas de sementes
de gramíneas e leguminosas constitui, igualmente, um dos processos mais difundidos (Barreiro et al., 2013),
procedimento que ultrapassou já, mesmo na Península Ibérica, a mera fase experimental.
Em Espanha, e com particular incidência na Galiza, especialmente após os fogos de 2006 em que em 12
dias terão ardido cerca de 75 000 ha (Carballas et al., 2009), efetuam-se regularmente atividades de
estabilização de emergência, analisadas criticamente por Díaz-Raviña et al. (2012). Naquele país tem-se
recorrido com frequência a hidrossementeiras extensivas, complementadas ou não por hidromulch, por vezes
com recurso a meios aéreos, no caso da dispersão simultânea de sementes e de mulch/palha, prática que
entre nós tem ainda uma expressão residual. Por exemplo, foram realizadas sementeiras de gramíneas e
leguminosas em Mangualde em 2017 e em Monchique-Silves, em 2019. Todavia, estes trabalhos foram
executados por via aérea, numa área reduzida e muitos meses após o incêndio. Experiências conduzidas por
Vázquez et al. (2018) evidenciaram resultados muito mais interessantes, no caso pela aplicação extensiva de
mulching comparativamente à mera sementeira, além duma melhoria a mais longo prazo nas propriedades do
solo.
Têm também sido testadas poliacrilamidas (PAM), polímeros sintéticos de alto poder coesivo (na prática
agentes floculantes) que melhoram as propriedades físicas do solo, embora tenham sido realçados alguns
efeitos contraditórios da sua aplicação em áreas ardidas. Em termos experimentais, mais recentemente, têm-
se aplicado poliacrilamidas aniónicas granulares, com resultados prometedores na proteção do solo no pós-
fogo (Inbar et al., 2015). Estes autores verificaram que inicialmente se produzia um aumento da viscosidade
dos escoamentos superficiais e da solução do solo, ao mesmo tempo que se dava a estabilização dos
agregados quando o PAM ficava adsorvido nas partículas de solo. Vários tipos de polímeros têm sido
aplicados com sucesso, como os polissacáridos e as poliacrilamidas lineares, sendo realmente as PAM
aniónicas, de alto peso molecular, as que demonstraram uma capacidade superior (Sojka et al., 2007). Um dos
problemas na sua aplicação resulta da difícil dissolução do produto, precisamente devido à sua viscosidade
elevada, pelo que é necessário o recurso a grandes quantidades de água. Assim, a aplicação na forma
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granular permite, de algum modo, ultrapassar este obstáculo, melhorando-se ainda a sua dispersão
recorrendo a eletrólitos como gesso. Na prática, temos uma alteração das cargas electroestáticas devido à
adsorção nas partículas de argila de cadeias dos polímeros resultantes dos PAM, devido aos seus grupos
funcionais negativos, com os minerais de argila positivamente carregados. Tal adsorção permite, portanto, a
formação de agregados de solo mais estáveis através de pontes entre as moléculas funcionais de PAM (de
cargas negativas) e os catiões dos minerais de argila, especialmente Ca2+.
Os custos pouco elevados destes produtos, especialmente na forma granular, tornam o seu uso no futuro
prometedor, embora o seu efeito não seja de modo algum imediato dado que só ao fim de algum tempo após a
aplicação se deteta o aumento da coesão das partículas do solo.
4. EXTRAÇÃO E ORDENAMENTO FLORESTAL PÓS-FOGO
Um aspeto que não tem sido suficientemente debatido, pelo que chamamos a devida atenção para o
mesmo, reside na extração do material lenhoso após o fogo, nomeadamente a sua extração completa e
subsequente toragem no local, com a concomitante queima ou estilhaçamento dos resíduos vegetais.
Salienta-se que, de acordo com o inquérito já mencionado de Sousa (2011), num número expressivo dos
casos (78%), as árvores são cortadas na sua totalidade depois de um incêndio. Nestes casos, segundo as
respostas (50%), tal acontece entre os três e os seis meses após o fogo, através de corte raso seguido de
extração e transporte. Na maioria dos casos (60%) os agentes florestais indicaram que foram tomadas
precauções para preservar a regeneração natural pós-fogo, mantendo-se as árvores jovens.
Mas até que ponto a extração dos restos vegetais não representa realmente uma perturbação adicional,
reduzindo a biodiversidade e a capacidade de recuperação? Beschta et al. (2004) referem que os restos
vegetais ajudam na recuperação da vegetação e na retenção do solo, servem de armadilha para a deposição
de sementes e potenciam associações mutualistas planta-animal. Acresce que, tal como Leverkus et al. (2014)
e Marañón-Jiménez (2013) evidenciaram, a extração homogeneiza a vegetação, mas também a avifauna e
mamofauna, tendo os mesmos autores concluído que, mesmo em zonas mediterrânicas, a madeira queimada
é um componente útil do ecossistema, favorecendo a regeneração natural de curto e médio prazo. As razões
prendem-se com o facto destes resíduos atenuarem a indisponibilidade de nutrientes e o incremento do stress
hídrico, aumentando a viabilidade das sementes presentes.
Na verdade, numerosos estudos evidenciam que a presença de resíduos queimados incrementa a
regeneração, quer pelo microclima criado (ex. redução da radiação solar e da perda de humidade), quer pelo
fornecimento de nutrientes resultantes da decomposição da matéria orgânica particulada, além de que o abate
e remoção da madeira queimada podem aumentar a erosão e a compactação do solo (Shakesby et al., 1996;
Castro et al., 2011). Estes autores especificam que, no caso do pinheiro bravo, é muito importante, para a
proteção do solo, a permanência duma manta de agulhas, pelo que a extração do material lenhoso não
deveria ser realizada imediatamente após o fogo (no mínimo seria desejável um período de retenção entre 12-
15 semanas); salientam também que os ramos e troncos queimados permitem a presença de um banco de
sementes considerável, e a concomitante redução do stress hídrico, diminuição da foto-inibição e fornecimento
de nutrientes, aspetos que no conjunto se traduzem por um fenómeno de facilitação de posterior colonização
vegetal, um mecanismo de grande importância ecológica.
Conclui-se, em termos de ordenamento florestal, que estes materiais residuais devem ser usados no
sentido de propiciar a recuperação do ecossistema (Brewer, 2008; Brooker et al., 2008), sendo relevante, por
exemplo, a permanência da casca do eucalipto nomeadamente sobre a forma de mulching (Prats, 2012),
defendendo Shakesby et al. (1996) que, para esta espécie, a extração do material lenhoso pode ser realizada
mais cedo, comparativamente ao pinheiro bravo. Paralelamente, outros estudos em zonas mediterrânicas
(Siles et al., 2010) demonstraram que os materiais lenhosos ardidos, em conjunto com a presença de espécies
arbustivas incubadoras, as quais desempenham uma função de proteção (pelo que a completa roça de mato
pode ser indesejável), evitam o consumo por herbívoros (ex. caprinos), que é muito mais intenso na ausência
de qualquer forma de cobertura vegetal. Aliás, a própria densidade de germinação das principais espécies
arbustivas (p. ex. Erica spp. e Calluna vulgaris), podem facilitar a colonização por espécies florestais, mas tal
depende da severidade do fogo, com aumentos significativos para temperaturas de fogo mais baixas, mas
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com o efeito oposto para valores mais elevados (Maia, 2014). Apesar destas indicações, o material lenhoso
não pode permanecer no terreno durante um período demasiadamente longo devido ao perigo dum
incremento excessivo de biomassa combustível, ou por permitir o desenvolvimento de pragas.
De realçar que a permanência do material vivo com capacidade de gerar rebentos de toiça (como os
carvalhos ou freixo) é frequentemente preferível à plantação dado que, no 1.º caso, as plantas exibem superior
sobrevivência e crescimento, além de que os custos de instalação são inferiores e não existe mobilização do
solo que possa potencialmente acelerar os processos erosivos (Moreira et al, 2009).
São de referir ainda os trabalhos conduzidos por Maia (2014), que evidenciaram que a regeneração do
subcoberto de pinhais e eucaliptais nos primeiros 5 a 6 anos pós-fogo esteve claramente associada às
práticas de gestão florestal. Assim, a mobilização do solo, o corte de árvores e o desbaste da vegetação
arbustiva no pós-fogo foram associados a uma perda excessiva da cobertura vegetal, afetando negativamente
a densidade de espécies rebrotadoras (embora com menor impacto nas espécies germinadoras), sugerindo-se
ainda que as regiões mais vulneráveis podem sofrer maiores efeitos duma gestão pouco cuidada, conduzindo
á exportação rápida dos materiais orgânicos particulados.
5. TIPOLOGIA DE AÇÕES APOIADAS A NÍVEL DA ESTABILIZAÇÃO DE EMERGÊNCIA PÓS-
INCÊNDIO E PARA O RESTABELECIMENTO DA FLORESTA AFETADA ANÁLISE CRÍTICA
(OPERAÇÃO 8.1.4)
O Decreto-Lei n.º 70/2018, de 30 de agosto, estabeleceu as medidas excecionais de contratação pública
aplicáveis aos procedimentos de ajuste direto destinados à formação de contratos de empreitada de obras
públicas, de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços relacionados com os danos
causados pelo incêndio florestal que teve início em agosto de 2018 e que afetou essencialmente o concelho
de Monchique. Todavia, se esta agilização de procedimentos foi definida para esta área específica, a verdade
é que tal representa uma exceção para a lenta intervenção, dita de emergência, tendo em conta que a maior
perda de solo se verifica no 1.º ou 2.º ano pós-incêndio. Não obstante, os apoios para levar a cabo as fases de
estabilização de emergência e recuperação foram regulamentadas pela Portaria n.º 134/2015, de 18 de maio,
sujeita já a seis revisões, no âmbito do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente para 2014-2020
(PDR 2020).
Aliás, o OTI, no seu Relatório de Janeiro de 2019, já tinha alertado para a necessidade de se proceder no
pós-fogo ao rápido levantamento dos prejuízos, seguido pelas atividades de estabilização de emergência,
onde teria um papel destacado o ICNF em articulação com as Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia.
Nesse documento salientava-se igualmente que, nos fundos provenientes do PDR 2020, a despesa pública
destinada à Operação 8.1.4 (recuperação das áreas degradadas) era claramente menorizada relativamente
aos investimentos dirigidos à florestação e à melhoria do valor económico das florestas, além de que seria
necessário ultrapassar os demorados procedimentos concursais, que excedem geralmente o período crítico
em que se dão os fenómenos erosivos. Como a própria designação refere, insistimos que se trata duma
estabilização de emergência.
6. RECOMENDAÇÕES/PROCESSO OPERATIVO E A IMPORTÂNCIA DOS PLANOS REGIONAIS DE
ORDENAMENTO FLORESTAL
O Quadro 1 explicita os aspetos a ter em atenção nas intervenções de curto prazo que podemos enquadrar
dentro da estabilização de emergência e que dizem respeito especialmente ao 1.º ano pós-fogo.
Paralelamente, deve ser realizada a devida monitorização e, após o 1º inverno, devem ser previstas as
medidas corretivas necessárias.
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Quadro 1. Aspetos sequenciais a ter em conta na estabilização de emergência nas vertentes das bacias
hidrográficas e nas próprias linhas de água.
Sendo a Estratégia Nacional para as Florestas (ENF) o documento de referência para os Planos Regionais
de Ordenamento Florestal (PROF), além de integrador de diversas componentes e diretrizes, desde o Plano
de Ação Nacional de Combate à Desertificação (PANCD) à Estratégia Nacional de Conservação da Natureza
e da Biodiversidade (ENCNBA), é essencial que os PROF reflitam a importância que a ENF atribui à
recuperação e reabilitação dos ecossistemas afetados por incêndios e respetivas comunidades. Aliás, as 3
ações de restauração florestal, entre elas a Estabilização de Emergência, indicadas no ponto 1 deste
documento, constam da ENF, que lhes atribui uma elevada relevância em consonância com a necessidade de
limitar a expansão das lenhosas invasoras. Realçando esta preocupação, o OTI chamara já a atenção, em
2018, para o insuficiente desenvolvimento dos processos restauração florestal e controle da perda de solo
incluídos nos PROF, da falta de pormenor sobre a sua operacionalização e correspondente monitorização,
incluindo a genérica ausência de indicadores de avaliação e eficácia das medidas de controlo. Tais
deficiências são, por ex., patentes nos PROF do Litoral Centro e Interior Centro, regiões devastadas por fogos
em 2017 e 2019. Acrescentamos ainda que as intervenções de Estabilização de Emergência devem ser
realizadas em consonância com as áreas máximas de risco de erosão e a suscetibilidade à desertificação
identificadas nos respetivos PROF.
A Figura 2 ilustra algumas intervenções localizadas que tiveram lugar na serra do Alvão (baldio de Alvadia).
Por sua vez incluem-se na Figura 3 alguns exemplos de técnicas de atuação no pós-fogo (incluindo controle
INTERVENÇÃO DE CURTO PRAZO
ENCOSTA LINHAS DE ÁGUA E FLUXOS DE ESCOAMENTO
1) Inventariação dos prejuízos; criação dum processo de
análise e decisão permitindo a análise integrada do
ecossistema, nomeadamente sobre a capacidade
regenerativa do local, risco de degradação, avaliação das
áreas essenciais para a conservação de espécies e
habitats; proteção fitossanitária dos povoamentos
florestais e controlo das espécies invasoras; cartografia
das zonas mais suscetíveis à erosão.
2) Plano criterioso de extração do material lenhoso ardido,
evitando-se o corte raso e privilegiando a extração do
material de maior DAP. Evitar as condições para
exportação de nutrientes realizando-se a toragem no
próprio local e permanecendo casca, folhada e ramagem
na área, evitando-se queimadas extensivas.
3) Redução da energia de escoamento nas encostas através
da disposição de troncos ardidos segundo as curvas de
nível, abertura de valas de drenagem e ripagem; melhoria
das propriedades do solo através da escarificação;
estilhaçamento de resíduos para obtenção de mulching e
sua aplicação nos locais mais sensíveis com sementeira
de emergência antes do pico de pluviosidade invernal;
controle regular das invasoras; utilização de técnicas de
Engª Natural para aumento da tensão crítica de
arrastamento com utilização dos materiais disponíveis,
complementados com técnicas como faxinas, rolos
vegetados, barreiras de tela, etc.
4) Instalação dispersa de espécies arbustivas e arbóreas de
regeneração vegetativa e baixa inflamabilidade (sendo
preferível, quando possível a estacaria à plantação).
1) Análise da conservação da faixa ripária e do potencial
risco de eutrofização da linha de água e identificação
das zonas mais suscetíveis à erosão fluvial e
observação e cartografia dos potenciais fluxos de
escoamento ao longo das encostas.
2) Retirada dos materiais lenhosos (LDD) que podem
interromper o escoamento em situação de pico de
caudal.
3) Estabilização das margens com recurso a técnicas de
Engª Natural, como faxinas, empacotamentos, grades
vivas, entrançados, etc., complementadas com
geomantas e, apenas em zonas de maior risco e de
modo pontual, instalação de gabiões ou
enrocamentos vegetados e caixas vegetadas
(cribwal), evitando sempre a compactação do solo na
zona ribeirinha (utilização de maquinaria adequada).
4) Diminuição da energia das linhas de água
aumentando a rugosidade hidráulica e as tensões
críticas de arrastamento, recorrendo-se a açudes
submersos ou defletores; instalação de bacias de
retenção em combinação com as estruturas
anteriores.
5) Adensamento da vegetação ripária, especialmente
com espécies de regeneração vegetativa, após a
prévia estabilização dos taludes, tendo em conta a
vegetação autóctone local, recorrendo-se
preferencialmente à prévia recolha de material para
formação de estacas na própria bacia hidrográfica.
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de invasoras exóticas) na zona de Monchique, fortemente fustigada por fogos na última década.
Figura 2. Estabilização de emergência na Serra do Alvão: A – aplicação de faxinas, notando-se apenas 1 mês após a sua instalação a considerável sedimentação de finos; B – utilização de hidrossementeira em áreas ardidas, com seleção apropriada de espécies gramíneas e leguminosas. Fotos OTI.
Figura 3. Intervenções de estabilização de taludes e remoção de infestantes na Serra de Monchique (bacia Ribª Odelouca): A - utilização de caixas vegetadas com troncos de eucalipto parcialmente ardidos; B - remoção de exóticas (canavial - Arundo donax) e C - posterior consolidação com geomantas tridimensionais, seguindo-se plantação e estacaria com espécies autóctones; D - nos taludes mais ingremes, resultado da erosão fluvial, aplicação de gabiões vegetados de salgueiro na base e geomantas com plantação na parte superior. E - 1 ano após a instalação dos gabiões assinala-se o desvanecimetnto do impacte visual e ampla recuperação da vegetação ribeirinha na parte superior do talude e no gabião vegetado. Fotos OTI.
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7. CASOS DE ESTUDO
7.1. PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DAS MATAS LITORAIS
No âmbito da recuperação das matas litorais atingidas pelos incêndios de 15 de outubro de 2017, o ICNF
coordenou um plano para assegurar a gestão sustentável dessas áreas, de que se destaca a constituição da
Comissão Científica do Programa de Recuperação das Matas Litorais, com a participação de várias
instituições do Ensino Superior e do INIAV (Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária), e a
elaboração dos projetos previstos no âmbito da Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/2019. O Plano de
Atividades produzido por estas instituições pode ser consultar em:
http://www2.icnf.pt/portal/florestas/dfci/relat/raa/prg-rec-mataslitorais. Neste documento técnico apresentamos
uma súmula das contribuições dos diversos autores, que podem ser consultadas com mais pormenor no
referido site, centrado na temática específica dos processos erosivos e estabilização de emergência.
No dia 15 de outubro de 2017 o território nacional sofreu a influência da tempestade tropical Ophelia, a qual
exacerbou as condições de perigo meteorológico de incêndio, já de si adversas, pela combinação entre um
período muito prolongado de seca e a exposição à circulação de ar quente e seco proveniente do norte de
África. Os dois incêndios que percorreram as Matas Litorais, respetivamente Burinhosa-Pataias (resultante de
duas ignições distintas) e Quiaios-Figueira da Foz, seguindo uma orientação SW-NE, e cuja propagação
resultou num perímetro fortemente alongado, são bem reveladores da contribuição exercida pelo vento. Este
foi o evento que assumiu proporções mais devastadoras nas Matas Nacionais desde que há registos, sendo
que os dois maiores anteriores, em 1993 e 2003, queimaram, respetivamente, um terço e um quinto da área
percorrida em 2017 (Quadro 2).
Quadro 2. Importânciarelativa dos incêndios de 2017 nas diversas Matas e Perímetros Florestais do Litoral
Centro.
Área total (ha) Área ardida (ha) Proporção %
MN Pedrógão 1808 1620 90
PF da Alva do Azeche 101 87 87
MN Leiria 11 201 9476 86
PF das Dunas de Cantanhede 3522 2328 81
MN das Dunas de Quiaos 6039 3782 63
MN do Urso 6135 3306 54
PF das Dunas e Pinhais de Mira 5315 2817 53
PF da Alva da Senhora da Vitória 338 173 51
MN das Dunas de Vagos 2284 245 11
Total (ha) 35 563 24 344 67
MN: Mata Nacional; PF: Perímetro Florestal.
Algumas medidas de estabilização de emergência no pós-fogo foram aplicadas rapidamente, embora com
caráter pontual, nas margens de alguns troços do Ribeiro de Moel (Mata Nacional de Leiria) logo em meados
de dezembro de 2017. Estas medidas consistiram, basicamente, na construção de barreiras de troncos,
combinadas ocasionalmente com um acolchoado de estilha projetada produzido no próprio local. Foram assim
construídas três barreiras de troncos, instaladas ao longo das margens da referida linha de água, tendo sido
as mesmas dotadas duma faixa específica para infiltração/sedimentação imediatamente antes de cada
barreira e de uma cerca de sedimentos a jusante das mesmas para determinar a sua eficácia.
No referido Plano de Atividades salienta-se que a informação sobre a erosão hídrica do solo e sua
mitigação nas dunas costeiras num cenário pós-fogo é ainda extremamente incipiente, sendo mais numerosos
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os trabalhos de mitigação da erosão por ação do vento. Aliás, nestas zonas costeiras os especialistas
consideraram que a erosão eólica encerraria maior potencial erosivo pelo que deveria ser encarada como
prioritária.
Considerou-se também que a revegetação rápida das áreas ardidas seria premente, não só pela
estabilização dos taludes mas também devido ao perigo de disseminação de espécies invasoras lenhosas,
dado que foi constatado nas matas litorais, após o fogo de 2017, o rápido aparecimento de acácias,
destacando-se a acácia-de-espigas, Acacia longifolia, observando-se igualmente a colonização de outras
acácias como A. melanoxylon, A. dealbata e A. mearnsii, e, em menor grau, A. saligna, A. retinodes e A.
pycnantha, todas com efeitos previsíveis no atraso da recuperação das comunidades autóctones e promotoras
de um baixo grau de estabilização de encostas e margens de cursos de água. O mesmo aconteceu com as
invasoras não-lenhosas, tendo sido especialmente significativos o aparecimento de núcleos de chorão-das-
praias (Carpobrotus edulis), cana (Arundo donax) e erva-das-pampas (Cortaderia selloana). Para ambos os
tipos de invasoras foi definido um programa de monitorização, preconizando-se a cobertura do solo com
mulch, hidrosementeira e biomantas (de preferência bi ou tridimensionais), técnicas que têm o efeito não só de
susterem a eclosão das exóticas, como de potenciarem o sucesso das plantações das espécies florestais e
diminuírem a incidência dos processos erosivos. Paralelamente, foi definido o adequado programa de
monitorização.
Foram também definidas as medidas de intervenção mais urgentes a implementar nos canais de
escoamento e nas zonas de várzea das linhas de água. São, aliás, medidas que podem ser implementadas
em concertação com as técnicas de tratamento das encostas. Vários processos foram igualmente propostos,
como diversas estruturas alinhadas em curva de nível (countour log structures), rolos de palha, escarificação e
ripagem, cercas de retenção de sedimentos (silt fences), complementados com a aplicação de geotêxteis e
sacos de areia, solo ou gravilha, hidrossementeiras, mulching e hidromulching. Foi também tida em conta a
acumulação de material orgânico particulado e sedimentos em alguns troços dos cursos de água, produzindo
barreiras que interferem com o escoamento e incrementando a erosão fluvial, definindo-se a sua remoção,
bem como o restauro de vegetação ripária.
No que se refere à extração do material queimado, estabeleceram-se alguns princípios:
1. Evitar que a longa presença de material ardido provoque graves problemas fitossanitários e valorizar o
material queimado com maior valor comercial, que deve ser retirado prioritariamente.
2. Definir as áreas de exclusão de corte e extração do material queimado, dada a relevância ecológica de
alguns habitats (como a proximidade a linhas de água, em especial as permanentes, e em zonas
dunares frontais ao mar).
3. Realização do corte e extração em áreas bem delimitadas, de modo a não interferirem com habitats
sensíveis que necessitem de algum grau de recuperação, designadamente onde seja necessário
fomentar o aparecimento de regeneração natural (incluem-se aqui também as zonas dunares mais
expostas à erosão eólica).
Seja como for, existem desde há muito numerosos trabalhos resultantes de parcelas permanentes,
estruturas experimentais e outras estruturas localizadas nas Matas Litorais, que foram monitorizados durante
períodos mais ou menos longos, dos quais se pode tirar partido para uma aprendizagem na recuperação
destas áreas. O Quadro 3 dá conta destas estruturas e do tipo de estudos realizados, ou em execução,
embora, como se constata, a maioria tenha sido afetada pela extensão do incêndio.
Quadro 3. Áreas experimentais existentes na Mata Nacional de Leiria e situação após o incêndio de
outubro 2017.
DesignaçãoNúmero do talhãoIdade em 10/2017
(anos)ResponsávelArdido
Ensaio de descendência 260 23 INIAV Sim
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DesignaçãoNúmero do talhãoIdade em 10/2017
(anos)ResponsávelArdido
Ensaio de proveniências 277 24 INIAV Sim
Ensaio regeneração 125,141,158,160,175 21 INIAV Sim
Ensaio de compassos 62 23 ISA Sim
Ensaio de condução de regeneração
natural 279 18 ISA Sim
Ensaio de desbastes 22,25,43 a 46, 148,200, 201 Várias ISA Sim
Parcelas permanentes (51) Vários Várias INIAV Sim
Controle natural da Acacia longifolia S. Pedro Moel - CFE/UC Não
Amostragem de fauna piscícola Ribeiro de S. Pedro - ISA Sim
Avaliação da qualidade biológica Ribeiro S. Pedro - ISA Sim
Devemos ainda referir que o próprio ICNF elaborou para a Mata Nacional de Leiria-Ribeira de Moel um
conjunto de medidas de curto prazo destinadas à estabilização de emergência, para uma área específica de
apenas 4,07 ha, as quais se inserem em três tipos distintos de objetivos complementares:
Controlo da erosão, tratamento e proteção de encostas/taludes no sentido da proteção relativamente à
erosão e arrastamento de materiais (cinzas e areias), através da colocação de troncos e resíduos
resultantes do corte de árvores, sendo os mesmos amparados por estacas, procedimento
complementado pela aplicação de mulching entre barreiras.
Prevenção da contaminação, assoreamento e recuperação de linhas de água com a desobstrução das
mesmas, promovendo-se assim a regularização do regime hidrológico, propondo-se ainda a limpeza de
5-10 metros de largura ao longo dos leitos das linhas de água e eliminação do material lenhoso
depositado para facilitar o escoamento para caudais de cheia.
Controlo de invasoras, especialmente de acácias, por via manual ou com ferramentas moto-manuais.
7.2. PLANO DE AÇÃO PÓS-FOGO DA PENINHA - CRESMINA (CASCAIS)
No âmbito da ocorrência do incêndio florestal de outubro de 2017, que percorreu uma área de 428
hectares, com relevância à escala municipal, a Cascais Ambiente, EMAC, Empresa de Ambiente de Cascais,
S.A., definiu as medidas necessárias para salvaguarda do património natural afetado e para garantia de um
processo gradual de renaturalização. É sobre o respetivo Relatório «Plano de Ação Pós-fogo Peninha-
Cresmina» elaborado pela EMAC cerca de ano e meio após o evento, que nos debruçamos. O documento
estabelece um plano de restauração ecológica para a área afetada pelo incêndio, mais concretamente na área
compreendida entre a Peninha, no limite norte do concelho de Cascais, e a duna da Cresmina, a sudoeste,
junto ao litoral. Esta zona é de especial relevância por estar inserida no Parque Natural Sintra-Cascais (PNSC)
e por estar compreendida na zona de proteção da Paisagem da Serra de Sintra, classificada pela UNESCO
como Património da Humanidade, o que evidencia o elevado valor da paisagem. Dentro de área classificada
como PNSC encontra-se ainda o Sítio Sintra/Cascais, de Importância Comunitária, regido pelo Plano Setorial
da Rede Natura 2000. Acresce ainda que, parte da área afetada (330 ha) está classificada como Reserva
Ecológica Nacional (REN). O incêndio abrangeu 3 unidades de paisagem, nomeadamente a unidade Serra de
Sintra, a unidade Abano-Penha Longa e a unidade Costa do Sol (Quadro 4).
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Quadro 4. Área ardida em 2018 nos concelhos de Cascais-Sintra. É indicada a valoração de cada Unidade
de Paisagem (escala 1-10).
Valoração da Unidade de Paisagem
Área ardida (ha) % área ardida 0 1-3 4-5 6-7 8-9
Área total ardida 428,5 99,9
Concelho de Cascais 428,0 99,9
Concelho de Sintra 0,5 0,1
Unidade de Paisagem do Concelho de Cascais
Serra de Sintra 182,5 42,6 3,5 2,5 176,5
Subunidade Serra de Sintra
102,6 21
Subunidade Litoral da Serra
79,9 16,7
Abano-Penha Longa 226,1 52,8 2,9 223,2
Costa do Sol 19,4 4,1
Subunidade Dunas Cascais-Guincho
19,4 4,5 1 18,4
O Plano de Ação em causa foi delineado para a zona da Peninha, a mais de 400 m de altitude, na serra de
Sintra, até à área do sistema dunar do Guincho e da Cresmina, incluindo 12 habitats prioritários e 14
endemismos de flora, igualmente prioritários para conservação. Em termos de comunidades vegetais
referimos sinteticamente que as zonas mais elevadas (Peninha-Malveira da Serra) são dominadas por
carvalho-negral (com núcleos de sobreiro), enquanto as zonas de menor altitude refletem uma comunidade
climática dominada pelo zambujeiro com formações arbustivas de tojo-durázio, um endemismo lusitânico, e
outras formações de tojais e urzais-tojais, surgindo ainda medronheiros e loureiros. Na área do Abano surgem
também sabinais e carrascais. Mais especificamente, nas dunas e paleodunas de Cresmina-Guincho
encontram-se os sabinais litorais termomediterrânicos e vegetação camefítica e esclerófila. Mas não nos
podemos esquecer que metade da área afetada por este incêndio estava já ocupada por vegetação exótica
invasora, nomeadamente acácia-das-espigas, acácia-austrália, acácia-mimosa ou acácia-negra e, ainda,
háquea-picante e háquea-de-folhas-de-salgueiro, as quais beneficiam direta e indiretamente da ocorrência do
fogo. Observavam-se também núcleos de outras invasoras como canaviais e figueira-da-índia, existindo ainda
alguns eucaliptais dispersos. No Abano, ao longo de vales encaixados, está também presente o Pinheiro-de-
Alepo, o qual apesar de alienígena é considerada uma espécie pioneira com capacidade de proteção e de
colonização de áreas degradadas.
Foram delimitadas três unidades homogéneas territoriais para intervir, com a definição de medidas de
recuperação adequadas a cada uma delas: Peninha-Almoinhas Velhas (setor 1), Almoinhas Velhas-Abano
(setor 2) e Abano-Cresmina (setor 3). Em cada uma foram identificadas as zonas de intervenção prioritária,
tendo sido selecionadas as que apresentavam declives compreendidos entre 15 e 35% (considerando-se que
o acesso era problemático para valores superiores). Procedeu-se ainda a um levantamento das manchas de
material lenhoso fogueado existentes no terreno, que poderiam servir como fonte de matéria-prima para a
implementação de medidas mitigadoras do risco de erosão. Estas manchas foram cruzadas com a carta de
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declives, excluindo-se as áreas inacessíveis. As intervenções preconizadas serão desenvolvidas tendo por
base os caminhos florestais ou zonas com possibilidade de acesso, coincidentes com as zonas identificadas
como de intervenção prioritária (Quadro 5).
Quadro 5. Tipologia de intervenção de emergência na área de Peninha-Cresmina
Procedimento Objetivo
Controle da erosão nas vertentes
Sementeiras de gramíneas anuais (densidade de sementeira aprox. 300 Kg/m2) em faixas em áreas de declive de 15-35% ou em manchas se o declive for superior
Assegurar uma cobertura do solo temporária enquanto a vegetação natural não regenera
Mulching com estilha de madeira (madeira de pinho
não tratada) em 30 a 40% de cobertura do solo
Pretende-se a cobertura e incorporação de fibra e matéria orgânica no solo para aumentar a rapidez de recuperação da vegetação natural
Barreiras de ramos difusos com material lenhoso fogueado existente no local, o qual depois de cortado, é arrumado manualmente e colocado em linha ao longo das curvas de nível. Altura máxima de 40-50 cm e espaçadas 10 a 20 m
Redução do processo de erosão, nomeadamente através da fixação das partículas finas do solo, bem como amortecimento do escoamento superficial. Funcionam ainda como ponto de fixação de sementes
Controle da erosão fluvial
Instalação de gabiões cilíndricos enrocados colocados transversalmente nas linhas de água, os quais são escorados nas margens (distanciamento 50-250 m)
Correção torrencial e retenção de sedimentos nas linhas de água.
Deposição de fardos de palha na linha de escorrência (2-3 fardos fixados com estacaria)
Redução do processo erosivo e contribuição com material orgânico e sementes para a regeneração
Controle das espécies invasoras
Corte de espécies exóticas invasoras com desvitalização dos cepos por pincelagem com glifosato a 50% ou arranque manual. Prevê-se o arranque mecânico, com recurso a retroescavadora no caso de aglomerados de rizomas mais extensos (ex. canavial) e quando não exista risco erosivo. Estilhaçamento dos sobrantes ou traçagem e colocação em fiadas paralelas às curvas de nível. Remoção total junto à rede viária numa faixa de 10 m
Combate à invasão biológica
Recuperação de caminhos florestais
Criação de caminhos de saibro compactado (0,05m espessura), assente sobre terreno natural nivelado
(sem camada de base) com 3m largura
Facilitar o o acesso a todas as manchas ardidas e em áreas arborizadas para permitir o combate a novos focos e incêndio
1.1. INCÊNDIO DE MONCHIQUE
O OTI elaborou anteriormente um Relatório sobre o incêndio iniciado a 3 de agosto de 2018 no sítio de
Perna da Negra, na freguesia e concelho de Monchique, distrito de Faro, vindo a atingir o concelho de Silves,
afetando uma área de 27 154 hectares, tendo sido dado como extinto no dia 10 de agosto. Todavia, não
poderíamos deixar de mencionar este evento neste documento, dado ter sido o mais grave ocorrido no ano de
2018. No referido Relatório elaborado pelo Observatório foram já referenciadas sinteticamente as medidas
tomadas em termos da estabilização de emergência (Avaliação do Incêndio de Monchique, OTI, maio 2019).
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De relevar a publicação do Decreto-Lei n.º 70/2018 e a Portaria n.º 237-B/2018, de 28 de agosto, que
procuraram agilizar a execução das operações, estabilização dentro dos municípios de Monchique, Silves,
Odemira e Portimão, através da implementação de um regime excecional de contratação de empreitadas de
obras públicas e da possibilidade de adiantamentos contra fatura nas intervenções de estabilização de
emergência (despesas regularizadas no prazo de 45 dias úteis, mediante a apresentação do comprovativo do
pagamento integral da despesa). Estas intervenções foram consideradas essenciais, porque se destinavam
em grande medida à recuperação de troços de rede primária e secções da rede secundária de faixas de
gestão de combustível, bem como instalação de pontos de água, controlo de erosão, tratamento e proteção
das encostas e prevenção da contaminação e assoreamento de linhas de água e sua recuperação.
A estabilização de emergência foi objeto de uma avaliação específica desenvolvida pelo ICNF e pelo seu
Departamento da Conservação da Natureza e Florestas do Algarve (ICNF 2018) em que foram identificadas
todas as «intervenções necessárias à estabilização de emergência dos ecossistemas afetados e à remoção do
material ardido, para que posteriormente se proceda à recuperação do potencial produtivo, tendo em vista a
reposição e sustentabilidade dos valores ecológicos afetados.» A avaliação foi preparada com a preocupação
de enquadrar as medidas nos instrumentos financeiros disponíveis.
As medidas de intervenção rápida e de estabilização de emergência necessárias foram listadas por
categoria de processo afetado: combate à erosão fluvial e correção torrencial; recuperação das infraestruturas
danificadas; controlo da erosão, tratamento e proteção de encostas; prevenção da contaminação e
assoreamento e recuperação de linhas de água; mitigação do impacte na biodiversidade; programa
fitossanitário. O ICNF forneceu também fichas de «necessidades de intervenção de estabilização de
emergência pós-incêndio» onde se apresentaram de forma detalhada todas as medidas preconizadas com
indicação de quantidades ou área, custo unitário e custo total da sua implementação, seguindo a estrutura e
nomenclatura das medidas estabelecidas na Portaria n.º 134/2015, para toda a área afetada (concelhos de
Monchique, Silves, Portimão e Odemira) e, individualmente, por concelho (ICNF 2018). Tal permitiu ter
conhecimento dos custos envolvidos para a recuperação das áreas mais sensíveis.
Todavia, o OTI já tinha assinalado que a operacionalização das medidas não fora devidamente atempada,
apesar da resposta rápida através do PDR 2020 (as primeiras candidaturas abriram entre 30 de agosto e 30
de setembro de 2018, ao abrigo da operação 8.1.4, priorizando o controlo de erosão, tratamento e proteção de
encostas e, ainda, o restabelecimento de infraestruturas, no valor de 4,5 milhões de euros, segundo o
mencionado levantamento do ICNF para os quatro concelhos afetados pelo incêndio).
É um facto que já tiveram lugar algumas ações, embora limitadas em extensão e com carácter
eminentemente demonstrativo e formativo. Destacamos o corte de madeira queimada e seu destroçamento,
para espalhamento, na Herdade da Talhadinha em Silves em meados de dezembro, que serviu também para
a formação de GIPS (Grupos de Intervenção Proteção e Socorro da GNR) e Sapadores Florestais. Procedeu-
se também à aquisição de serviços de sementeira aérea para uma área de 150 ha, através do recurso a um
avião Dromader, com vista a assegurar a estabilização de emergência na Mata Nacional da Herdade da Parra,
sob gestão do ICNF. Esta última ação foi, contudo, realizada apenas a 28 de fevereiro de 2019 e de uma
forma algo casuística, apesar de terem sido anunciadas ações mais extensas para as primeiras chuvas após o
fogo, o que seria efetivamente crucial. Nenhuma destas ações teve, no entanto, o devido enquadramento
financeiro no programa referido anteriormente. Não são ainda conhecidas outras ações concretas de
estabilização de emergência implementadas ao abrigo do mesmo programa de financiamento.
Apesar da rápida resposta do ICNF e do mencionado regime de exceção para a área ardida de Monchique,
concluímos, pois, que decorreu um período de tempo excessivo até à aplicação no terreno das medidas de
estabilização de emergência e de controlo de erosão planeadas. O OTI analisou criticamente os
procedimentos envolvidos e considerou no Relatório de Maio de 2019 que teria sido desejável um melhor
apoio técnico por parte do ICNF na definição das medidas e na cartografia das áreas de intervenção
prioritárias ou mais suscetíveis à perda do solo, assim como seria conveniente uma revisão dos processos
administrativos inerentes à execução deste tipo de medidas, o que poderia ter permitido agilizar as operações,
racionalizar custos e aumentar a taxa de sucesso das intervenções.
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2. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
Após o fogo os proprietários procuram o possível ressarcimento dos prejuízos através da extração do
material lenhoso com mais valor deixando a área ardida entregue na maior parte das vezes à regeneração
natural, com o concomitante abandono aos processos erosivos, que se manifestam muito rapidamente, e
colonização de infestantes com a consequente diminuição da qualidade da estação, com a paralela diminuição
da resistência e resiliência a novos agentes bióticos e abióticos. Não há assim tempo a perder após a
destruição do coberto florestal, pelo que a intervenção no território tem de ser célere, o que obriga a
concertação de esforços para a realização da estabilização de emergência, o que implica desde a rápida
determinação dos prejuízos e das áreas prioritárias (com maior suscetibilidade aos processos erosivos) ao
apoio financeiro para estas medidas, com a desburocratização dos procedimentos inerentes. É urgente passar
de medidas pontuais (como os casos de estudo que apresentámos ilustram) para intervenções planeadas e
mais abrangentes.
Poderíamos adotar a experiência e seguir os procedimentos procedentes da vizinha Galiza, como aliás
noutras partes de Espanha, onde existe uma experiência técnica aprofundada na restauração hidrológica-
florestal, cimentada após os incêndios catastróficos de 2006 (e já referidos antes neste documento),
consubstanciada na atual Lei de Montes da Galiza (7/2012, de 28 de junho, ver p. ex. o CAP 7, artigos 64.º e
65.º). A zonação atempada da severidade do fogo (com avaliação por teledeteção) e a estimativa subsequente
do risco erosivo e hidrológico, seguidas pela atuação de equipas multidisciplinares de intervenção rápida, com
a participação frequente de investigadores nesta área, têm permitido atuações viradas para o médio e longo
prazo com um êxito assinalável (Vega et al., 2012). Mais concretamente, foi criada para o efeito uma empresa
pública especializada _SEAGA_, dedicada à requalificação de áreas ardidas e estabilização de emergência, o
que permite uma ágil tramitação administrativa. Compete-lhe a conceção das intervenções, em estreita
colaboração com os investigadores do Centro de Investigación Forestal de Lourizán (CIF) e a responsabilidade
pela própria execução dos trabalhos, que vão desde a aplicação de mulching (geralmente por via aérea _heli-
mulching, ou apicação manual) a barreiras de retenção, reparação de infraestruturas, etc. A sequenciação dos
processos de atuação, que devem merecer a nossa melhor atenção como modelo para intervenção célere nas
ocorrências de maior significado (a SEAGA atua em média numa dezena de incêndios por ano, precisamente
nos de maior impacto), é descrita em Fernández et al. (2019) e envolve as seguintes etapas: a) uma Comissão
de Coordenação seleciona os incêndios florestais; b) segue-se a avaliação preliminar, com estimativa das
áreas potencialmente mais vulneráveis; c) procede-se à análise da severidade do incêndio na vegetação e
solo e à cartografia das zonas prioritárias para intervenção; d) sucede-se a avaliação de campo e a validação
do risco hidrológico e erosivo, bem como dos danos relativos ao património afetado; e) o conhecimento obtido
permite elaborar a proposta de atuação com a relação concreta dos trabalhos a efetuar em cada zona; f)
finalmente, realiza-se a execução dos trabalhos, que se iniciam imediatamente depois da análise da proposta
de atuação. Não é descurada a monitorização, que permite detetar os desvios e que conta também com o
acompanhamento por parte do CIF, potenciando sempre uma aprendizagem contínua e uma ligação com a
investigação no domínio da contenção dos processos erosivos pós-fogo.
É fundamental que, tal como acontece na cooperação transfronteiriça direcionada para a prevenção e
extensão dos fogos florestais (Martín et al, 2019), também no âmbito da estabilização de emergência pudesse
haver uma interação adequada dos dois lados da fronteira e uma aprendizagem com o modelo em utilização
que tem conduzido a resultados muito positivos (Fernández et al. 2019).
Acima de tudo, é essencial que a estabilização de emergência adquira um papel relevante, recomendando
o Observatório que o País seja dotado de uma estrutura operacional que permita uma resposta tecnicamente
adequada, rápida e eficaz, de que o modelo da Galiza é uma excelente referência.
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