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Quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020 II Série-E — Número 14
XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)
S U M Á R I O
Observatório Técnico Independente: Relatório do parecer sobre a Estratégia 20-30 do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais.
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RELATÓRIO
Parecer sobre a Estratégia 20 – 30
do Plano Nacional de Gestão Integrada
de Fogos Rurais
OBSERVATÓRIOTÉCNICO INDEPENDENTE para análise, acompanhamento e avaliação dos incêndios florestais e rurais que ocorram no território nacional
fevereiro 2020
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RELATÓRIO
Parecer sobre a Estratégia 20 – 30
do Plano Nacional de Gestão
Integrada de Fogos Rurais
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fevereiro 2020
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Citação recomendada:
Observatório Técnico Independente, Castro Rego F., Fernandes P., Sande Silva J., Azevedo J.,
Moura J.M., Oliveira E., Cortes R., Viegas D.X., Caldeira D., e Duarte Santos F. - Coords. (2020)
Relatório - Parecer sobre a Estratégia 20 – 30 do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos
Rurais
Assembleia da República. Lisboa. 49.
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Índice 1. ANTECEDENTES: UM PROCESSO INICIADO EM 2017 ...................................................................
2. O QUE ESTÁ EM CONSULTA PÚBLICA? ..........................................................................................
3. A APRECIAÇÃO PELO OBSERVATÓRIO DA ESTRATÉGIA 20-30 ...................................................
3.1 O PRINCÍPIO DA AVALIAÇÃO COMO BASE PARA A MELHORIA DOS SISTEMAS ...............................................
3.2 QUE MUDANÇA DE PARADIGMA? ........................................................................................................
3.3 ORIENTAÇÕES E OBJETIVOS ESTRATÉGICOS ......................................................................................
3.3.1 Valorização dos Espaços Rurais (Orientação estratégica OE1) ..........................................
3.3.1.3 Disponibilizar incentivos jurídicos e financeiros à valorização do território rústico (Objetivo
estratégico OB1.3) .............................................................................................................................
3.3.2 Cuidar dos Espaços Rurais (Orientação estratégica OE2) ...................................................
3.3.2.1 Planear e promover uma paisagem diversificada e em mosaicos (Objetivo estratégico OB2.1)
.............................................................................................................................................
3.3.2.2 Diminuir a carga combustível à escala da paisagem (Objetivo estratégico OB2.2) ...............
3.3.2.3 Aumentar a eficiência da proteção das populações e do território edificado (Objetivo
estratégico OB2.3) .............................................................................................................................
3.3.3 Modificar os comportamentos (Orientação estratégica OE3) ...............................................
3.3.3.1 Reduzir as ignições de maior risco (Objetivo estratégico OB3.1) ..........................................
3.3.3.2 Especializar a comunicação de risco (Objetivo estratégico OB3.2) .......................................
3.3.4 Gerir o Risco Eficientemente (Orientação estratégica OE4) ................................................
3.3.4.1 Implementar o planeamento integrado incorporando a avaliação de risco (Objetivo
estratégico OB4.1) .............................................................................................................................
3.3.4.2 Implementar um modelo capacitado de governança do risco (Objetivo estratégico OB4.2) ..
3.3.4.3 Redesenhar a gestão do dispositivo (Objetivo estratégico 0B4.3) .........................................
3.3.4.4 Aumentar a qualificação dos agentes SGIFR (Objetivo estratégico OB4.4) ..........................
3.3.5 Impactes legislativos ............................................................................................................
3.4 A SEQUÊNCIA DE PROCESSOS OU CADEIA DE VALOR NO PNGIFR .................................................
3.4.1 No Planeamento (PL): ..........................................................................................................
3.4.2 Na Preparação (PR): ............................................................................................................
3.4.3 Na Prevenção (PV):..............................................................................................................
3.4.4 Na Pré-supressão (PS): .......................................................................................................
3.4.5 Na Supressão e Socorro (SC): .............................................................................................
3.4.6 No Pós Evento (PE): .................................................................................................................
3.5 A ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL ...................................................................................................
3.6 METAS E INDICADORES .............................................................................................................
3.7 FORMAÇÃO E QUALIFICAÇÃO .....................................................................................................
4 SÍNTESE CONCLUSIVA ....................................................................................................................
DOCUMENTOS DE SUPORTE RECOMENDADOS ..................................................................................
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1. Antecedentes: um processo iniciado em 2017
Na sequência dos graves incêndios ocorridos entre 17 e 24 de junho de 2017 decidiu a
Assembleia da República criar, através da Lei nº 49-A/2017, de 10 de julho, a Comissão Técnica
Independente (CTI) com um mandato para proceder a uma avaliação independente sobre
aqueles incêndios, bem como emitir as conclusões e as recomendações entendidas como
pertinentes para aplicação futura.
As recomendações da Comissão Técnica Independente produzidas em outubro de 2017 foram
logo nessa altura rapidamente adotadas pelo Governo, através da Resolução do Conselho de
Ministros n.º 157-A/2017, publicada no Diário da República n.º 208/2017, 1º Suplemento, Série I
de 2017-10-27, que aprovou alterações estruturais na prevenção e combate a incêndios
florestais. A decisão do Conselho de Ministros, conforme proposto pela CTI, foi a de “reformular
os princípios do sistema de defesa da floresta contra incêndios, passando-se do atual conceito
de Defesa da Floresta contra Incêndios (DFCI) para a Defesa contra Incêndios Rurais (DCIR),
assente no Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), subdividido em duas
componentes interdependentes e complementares, e com uma gestão e responsabilização
autónoma: a Gestão de Fogos Rurais (GFR), orientada para a defesa dos espaços florestais, e
a Proteção contra Incêndios Rurais (PCIR), orientada para a salvaguarda dos aglomerados
populacionais, incluindo as pessoas e bens.”
No mesmo diploma de outubro de 2017, e também como proposto pela CTI, foi decidido “criar,
na Presidência do Conselho de Ministros (PCM), a Agência para a Gestão Integrada de Fogos
Rurais (AGIF), a quem compete a análise integrada, o planeamento e a coordenação estratégica
do SGIFR, incluindo a intervenção operacional qualificada em eventos de elevado risco”. A
primeira das competências atribuídas à AGIF seria a de “coordenar a elaboração e execução de
um novo Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, com base na vertente de
gestão de fogos rurais e na vertente de proteção de pessoas e bens contra incêndios rurais, a
aprovar até 30 de abril de 2018.”
A elaboração e execução do novo Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais
(PNGIFR) de outubro de 2017 a abril de 2018 parecia perfeitamente razoável e adequada já que
este novo Plano substituiria assim, a partir de 2018, o Plano Nacional de Defesa da Floresta
Contra Incêndios (PNDFCI) que deveria vigorar entre 2006 e 2018. O PNDFCI tinha sido
aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 65/2006, publicada noDiário da
República n.º 102/2006, Série I-B de 2006-05-26, e assumiu “como períodos temporais para o
desenvolvimento das políticas sectoriais e para a concretização dos objetivos e ações os
períodos que vão de 2006 a 2012 e de 2012 a 2018.”
A expectativa de que o PNGIFR fosse aprovado em 2018 era também decorrente do que tinha
sido estabelecido em fevereiro de 2018 pelo disposto no Decreto-Lei n.º 12/2018, publicadono
Diário da República n.º 34/2018, Série I de 2018-02-16, que aprovou a orgânica da Agência para
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a Gestão Integrada de Fogos Rurais, I. P. (AGIF). Esse diploma estabelecia, de acordo com a
alínea b) do número 2 do seu artigo 4º, que era uma atribuição do seu conselho diretivo,
“coordenar a elaboração e a execução do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais
(PNGIFR 2019-2030), garantindo o levantamento e o desenho dos processos de trabalho, bem
como a sua revisão, em articulação com as diversas entidades envolvidas, desde o planeamento
até à recuperação de áreas ardidas, cujos elementos essenciais devem ser vertidos nas diretivas
operacionais e manuais de procedimentos”. Também compete ao conselho diretivo, de acordo
com a alínea c) do número 2 do mesmo artigo 8º, “analisar as disponibilidades financeiras das
diferentes componentes do sistema, contribuindo para um balanceamento progressivo dos
recursos entre prevenção, pré-supressão, supressão e recuperação, considerando a totalidade
dos instrumentos financeiros disponíveis, diretos e indiretos, nacionais e europeus, que
contribuam para a implementação do PNGIFR 2019-2030”.
Seria, portanto, expectável que em agosto de 2018 houvesse um PNGIFR 2019-2030 sujeito a
revisão anual quando a Assembleia da República decidiu, pela Lei n.º 56/2018, publicada no
Diário da República n.º 159/2018, Série I de 2018-08-20, criar o Observatório Técnico
Independente tendo como uma das suas principais atribuições, de acordo com a alínea c) do
artigo 2º daquela Lei, emitir pareceres na revisão do Plano Nacional de Gestão Integrada de
Fogos Rurais” (PNGIFR). Esta expetativa não foi, no entanto, correspondida e o PNGIFR não foi
conhecido nem aprovado durante 2018.
Logo no início de 2019, o Conselho de Ministros decidiu, no número 9 da sua Resolução n.º
12/2019, publicada no Diário da República n.º 14/2019, Série I de 2019-01-21, que o PNGIFR
fosse entregue ao Governo até 30 dias após a publicação daquela Resolução, definindo as
grandes linhas de ação do SGIFR no horizonte 2019-2030, de acordo com o disposto
na Resolução do Conselho de Ministros n.º 157-A/2017, de 27 de outubro, “constituindo o modelo
organizativo, o encadeamento processual e o modelo de capacitação do sistema, conforme o
programa de transformação gradual nele inscrito”.
Entretanto, o Observatório, de forma a cumprir a sua atribuição, solicitou reiteradamente à AGIF
a documentação que o habilitasse a dar o correspondente parecer, sem que este tenha chegado
a este órgão. Foi-nos apenas dada a indicação, confirmada no preâmbulo do documento da
Estratégia agora apresentada, de que a AGIF tinha entregue ao Governo a primeira versão do
PNGIFR no dia 7 de março de 2019.
Nesta sequência, foi colocada em consulta pública, no dia 5 de dezembro de 2019, a Estratégia
20-30 do PNGIFR e na mesma consulta pública foi incluído um documento sobre a “Cadeia de
Valor do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais” e uma apresentação sobre uma “Visão
Integrada – Portugal protegido de incêndios rurais graves” em que se fazem referências a
despesas previstas no âmbito do PNGIFR.
Neste contexto, no dia 16 de dezembro de 2019, em reunião na Assembleia da República, o
Observatório recebeu formalmente do Governo, representado pelo Ministro do Ambiente e
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Transição Energética, com a presença do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, da
Secretária de Estado da Proteção Civil e dos Presidente e Vice-Presidente da AGIF, a versão
preliminar da “Estratégia 20-30” do PNGIFR, preparada pela AGIF e colocada em consulta
pública até dia 5 de fevereiro de 2020.
É no período desta consulta pública que o Observatório apresenta o presente parecer.
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2. O que está em consulta pública?
Convém clarificar que os documentos agora postos em consulta pública não são o PNGIFR como
tem sido divulgado de forma pouco rigorosa. Como se clarifica nos próprios documentos, estes
correspondem apenas à primeira componente do PNGIFR, a Estratégia 2020-2030, que
“identifica o contexto, estabelece a visão e o modelo, designa as orientações estratégicas e
objetivos estratégicos e introduz um novo modelo de governação e gestão risco, detalhado no
documento específico da Cadeia de Valor.” Falta, portanto, o Programa de Ação que “aprofunda,
atribui prioridades e detalha as linhas de ação, ou projetos a implementar, com a respetiva
calendarização, orçamento e entidades primariamente responsáveis e participantes,
incorporando e reforçando, também, medidas que têm já vindo a ser implementadas nos últimos
dois anos”, propondo-se um “apuramento regional do programa de ação” num processo de
implementação faseada em que o sistema se “organiza territorialmente nas unidades territoriais
NUTSII e NUTSIII, o que exige o desenvolvimento de mecanismos de articulação institucionais
alinhados com esta organização territorial.” Este processo teria, de acordo com a apresentação
da Visão Integrada, uma construção colaborativa em que o Programa de Ação Nacional se
concluiria no primeiro trimestre de 2020 e os Programas de Ação Regionais no terceiro
trimestre de 2020.
O processo de consulta pública está, portanto, envolvido nalguma confusão que resulta da
imprecisão da comunicação, até no Portal do Governo e na página web da AGIF, que não
explicitam suficientemente que o que está divulgado e em consulta pública é apenas a primeira
componente do Plano.
Refira-se que a peça do Plano em falta (o Programa de Ação) é fundamental para se entender a
implementação dos princípios enunciados bem como as metas apresentadas na Estratégia,
sendo, portanto, as duas peças quase indissociáveis para análise. Por isso não se compreende
a razão pela qual o processo de consulta pública se faz separando as duas componentes. Esta
separação é tanto mais estranha quando o documento da Estratégia 20-30 indica ter sido
entregue ao Governo no dia 7 de março uma primeira versão do PNGIFR, pressupondo-se que
esta primeira versão correspondesse à totalidade de PNGIFR e não apenas a uma parte, de
modo a cumprir a decisão da Resolução do Conselho de Ministros. Mais uma vez se confunde
talvez o PNGIFR com a primeira das suas componentes, a Estratégia. Mas ainda assim parece
estar já desenvolvida uma proposta de Programa de Ação, de acordo com o que se indica no
documento da Estratégia 20-30: “definida a visão e os objetivos estratégicos, dinamizaram-se
reuniões com as partes interessadas, públicas e privadas, consolidando o diagnóstico e onde se
recolheram também propostas de medidas para cada um dos objetivos estratégicos
identificados” sendo que, desde 7 de março de 2019, “têm sido dinamizadas várias reuniões para
receber as contribuições das entidades e tutelas e, paralelamente, foram promovidas várias
reuniões técnicas plenárias, bilaterais e sectoriais de concertação”. Não conhecendo o
Observatório o processo subjacente a essa recolha de contribuições, as entidades envolvidas ou
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os resultados atingidos nas ações mencionadas, fica a dúvida sobre o atual desenvolvimento de
uma proposta de Programa de Ação e sobre a intenção de que este seja colocado igualmente
em consulta pública. Uma clarificação sobre esta matéria seria necessária para a compreensão
do processo desta consulta pública.
A falta do Programa de Ação para a concretização da Estratégia descrita, não é irrelevante.
Validada que esteja a Estratégia, poderão seguir-se medidas que poderão consubstanciar
mudanças que não foram totalmente apresentadas. Analisando em detalhe as conclusões dos
Relatórios das Comissões Técnicas Independentes (CTI) dos incêndios de 2017, que
frequentemente são utilizadas para fundamentar as decisões e orientações seguidas pela AGIF,
os documentos agora em apreciação não permitem garantir que não sejam desvirtuados os
princípios e as soluções apontadas pelas CTI. E o Observatório não poderá deixar de prestar a
maior atenção a esta matéria.
Finalmente, lamentamos que não tenha sido possível, até esta altura, que o Observatório tenha
tido a possibilidade de dar quaisquer contributos para o PNGIFR por não ter sido informado, quer
do desenvolvimento do Plano quer do documento da Estratégia 20-30.
É, portanto, apenas sobre os documentos colocados em consulta pública, correspondentes à
Estratégia 20-30 (incluindo a Cadeia de Valor), que o Observatório vem agora dar o seu parecer
no cumprimento possível da atribuição que lhe foi confiada pela Assembleia da República.
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3. A apreciação pelo Observatório da Estratégia 20-30
3.1 O princípio da avaliação como base para a melhoria dos sistemas
O Observatório tem por diversas vezes apontado para a necessidade de melhor aprender com
as lições, recomendando uma melhor e mais detalhada avaliação do sistema, dos seus pontos
fortes e fracos.
Assim, vimos com interesse a indicação no preâmbulo do documento da Estratégia 20-30 que
“no primeiro trimestre de 2018 estudou-se o modelo existente até 2017” podendo subentender-
se que teria sido feita uma avaliação do modelo antecedente (SDFCI). Porém em nenhuma fase
do documento em apreciação é explicito o resultado da suposta avaliação nem detalhadas as
suas múltiplas variáveis.
Esta necessidade de avaliação é novamente reforçada, e bem, no documento da Estratégia:
“cada ação realizada no âmbito do SGIFR deve incorporar as lições aprendidas em ações
anteriores adotando as soluções que se revelarem adequadas, corrigindo erros identificados e
tentando maximizar resultados. (…) A vantagem da experiência reside não na instalação da
rotina, mas na capacidade de examinar de forma crítica as ações passadas, identificar os erros
cometidos e usar esse saber para melhorar as práticas futuras”. Esperar-se-ia que esse mesmo
princípio fosse evidenciado na elaboração do próprio documento da Estratégia.
A partir do princípio da importância da avaliação como base para a melhoria dos sistemas seria
de esperar que esse princípio fosse desde logo aplicado no desenvolvimento do novo PNGIFR.
No entanto, o documento da Estratégia não apresenta uma avaliação nem um diagnóstico claro
para o sustentar. Não se compreende se a referência às “conclusões do exercício avaliativo do
PNDFCI” se refere a uma avaliação própria, que se desconhece, ou às avaliações feitas por
outras entidades, não parecendo terem sido consideradas as análises intercalares do PNDFCI.
Tendo vigorado o PNDFCI entre 2006 a 2018, o procedimento natural seria o da sua avaliação
atempada para que esta pudesse estar na base das alterações previstas no processo de
elaboração do novo PNGIFR. No entanto, essa avaliação detalhada, prevista no próprio PNDFCI
não é conhecida a partir de 2012 e não parece ter sido tida em conta na elaboração do novo
PNGIFR.
Por outro lado, o documento da Estratégia, apesar de referir integração, ignora a Estratégia
Nacional para as Florestas atualizada e aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º
6-B/2015, de 4 de fevereiro, onde consta o seguinte: “Independentemente das conclusões da
avaliação intercalar do PNDFCI, que está em curso, recomenda-se que as medidas essenciais
preconizadas, por manterem atualidade, devam continuar a ser seguidas, garantindo, em
particular, o pleno funcionamento das estruturas orgânicas criadas para o desenvolvimento
harmonioso do próprio plano.”
Pelo exposto, conclui-se que uma análise e avaliação detalhada do PNDFCI seriam
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fundamentais. Naquele Plano, depois dos incêndios de 2003 e 2005, o Governo estabeleceu em
2006 no PNDFCI “um quadro de responsabilidades muito claro” cometendo “a responsabilidade
das acções de prevenção à Direcção-Geral dos Recursos Florestais, a vigilância, detecção e
fiscalização à Guarda Nacional Republicana, o combate ao Serviço Nacional de Bombeiros e
Protecção Civil e a sua ligação funcional ao nível do Sistema Integrado de Operações de
Protecção e Socorro”, estabelecendo “linhas de actuação com a indicação clara da fase de
planeamento, execução e controlo, calendarização de medidas e indicadores de execução,
tornando simples, objectiva e operacional a implementação deste instrumento estratégico.”
A comparação dos elementos de diagnóstico utilizados na elaboração do PNDFCI e no
documento de Estratégia do PNGIFR é apresentada no quadro seguinte.
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PNDFCI 2006 - 2018 PNGIFR 2020-2030
DIAGNÓSTICO
«O Plano Nacional de Defesa da Floresta
Contra Incêndios consubstancia-se,
assim, num documento nacional assente
nos diagnósticos constantes da proposta
técnica elaborada pelo Instituto Superior
de Agronomia (ISA), do relatório da
Autoridade Nacional para os Incêndios
Florestais (ANIF), das Orientações
Estratégicas para a Recuperação das
Áreas Ardidas, do projecto de
investigação científica intitulado
"Projecto de Vigilância Florestal,
Detecção de Incêndios Florestais e Apoio
a Sistemas de Combate" promovido pela
COTEC Portugal e ainda em elementos de
análise de carácter técnico-científico de
muitos trabalhos relevantes neles se
incluindo os produzidos pela Assembleia
da República»
«Estes objetivos estratégicos derivam do
diagnóstico (CTI1 e CTI2), de outros relatórios
sobre os incêndios 2017, de estudos
preliminares e análise de benchmarking e do
trabalho conjunto com entidades públicas desde
final de 2017 e do diálogo com stakeholders,
que permitiu identificar as oportunidades a
capitalizar e as ameaças a mitigar.»
Nota: O PNDFCI teve por base um
fundamentado conjunto de diagnósticos,
bem como avaliações intercalares que
permitiram avaliar o grau de
implementação e resultados, bem como a
sua atualização durante o período de
vigência (2006 – 2018).
Nota: O documento estratégico do PNGIFR
refere o seguinte: «Definida a visão e os objetivos
estratégicos, dinamizaram-se reuniões com as
partes interessadas, públicas e privadas,
consolidando o diagnóstico e onde se
recolheram também propostas de medidas para
cada um dos objetivos estratégicos
identificados.». No entanto, a atual Estratégia do
PNGIFR refere recomendações das extintas
CTI1 e CTI2, resultantes exclusivamente dos
grandes incêndios que afetaram em 2017
diversas regiões do país, pelo que implicitamente
não considera todo o histórico e desenvolvimento
do PNDFCI em vigor.
Apesar da referência à existência de um diagnóstico, este não se encontra integrado nem
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fundamentado no atual documento estratégico do PNGIFR. Para além de não ter havido um
documento de diagnóstico conhecido nem uma avaliação adequada do anterior PNDFCI, parece
que as recomendações do Observatório Técnico Independente descritas nos diversos
documentos publicados (notas informativas, relatórios e estudos técnicos) foram ignoradas,
inclusive não existindo qualquer menção a este órgão de apoio à Assembleia da República nos
documentos em análise. Neste âmbito, o Observatório não pode deixar de recomendar a análise
cuidada dos Estudos Técnicos e Relatórios que este Observatório produziu sobre estas matérias.
O Observatório não pode assim deixar de considerar negativamente a não existência de uma
avaliação específica do PNDFCI, que o PNGIFR substitui, nem a muitos outros documentos de
referência relevantes para o processo.
Relativamente ao Sistema de Monitorização e Avaliação (M&A) proposto no documento, este
define-se como o “processo contínuo de recolha sistemática de dados sobre os indicadores que
fornece aos gestores e demais partes interessadas, indicação sobre os progressos realizados e
a execução dos objetivos e recursos afetos. Por outro lado, a avaliação consiste no processo
sistemático de apreciação sobre o mérito ou valor de uma intervenção”. O mesmo documento
propõe “a constituição de uma unidade de coordenação de M&A” para “assegurar que as
atividades de M&A decorrem de forma regular, facilitando a elaboração dos relatórios anuais de
execução e a gestão dos processos de avaliação interna e externa. Esta unidade, a funcionar na
dependência da AGIF, IP, integra representantes das entidades do sistema, bem como outras
entidades relevantes, enquanto fornecedores de dados de contexto, no processo de M&A. Tem
como responsabilidade elaborar o Plano de M&A, identificar lacunas de informação, harmonizar
orientações, zelar pela existência de informação relevante para o apuramento dos indicadores,
apoiar o processo de elaboração do relatório anual de execução, apoiar o processo de
formulação dos termos de referência e contratação das avaliações”.
Embora se entenda o propósito deste modelo de M&A, a unidade apontada para a sua
coordenação, dependente da AGIF, contraria o disposto no noutro parágrafo do documento que
afirma que “o exercício de M&A, tal como proposto, observa os princípios de independência,
imparcialidade, credibilidade, transparência e utilidade, tal como determinam os padrões
internacionais vigentes”.
O Observatório recomenda que tanto a Monitorização como a Avaliação sejam obrigatoriamente
feitas de forma independente das entidades envolvidas no sistema, em particular da que mais
responsabilidades detém na coordenação do SGIFR, ou seja, a própria AGIF.
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3.2 Que mudança de paradigma?
No preâmbulo do documento evocam-se os relatórios das CTI sobre os incêndios de 2017 para
concluir que “foi amplamente reconhecido que os incêndios mais severos e frequentes
resultaram de uma formulação excessivamente simplificada de um problema complexo, onde as
principais soluções e apostas no reforço da rede viária, aumento dos pontos de água, opção pela
rápida deteção e supressão dos incêndios, embora com efeito a curto prazo, produziram um
resultado contrário no médio prazo, uma vez que descuraram o processo de acumulação da
vegetação e enviesaram a perceção do risco por parte da população”.
Esta ideia é continuada com a indicação de que o sistema foi “vítima do seu sucesso, gerando
oportunidade para a acumulação de combustível vegetal”, referindo-se, portanto, ao chamado
paradoxo do fogo. Ora, não se compreende a que sucesso se referem os documentos. Para que
se verifique o paradoxo do fogo, tem que haver sucesso na redução temporária da área ardida,
a qual implica o aumento da continuidade e da carga de combustível. Na verdade, a elevada
recorrência do fogo nalgumas partes do país até reduziu a carga de combustível desde os anos
80, não o oposto.
Mais do que uma mudança de paradigma ditada por um hipotético “sucesso” do sistema, a
mudança subjacente ao novo PNGIFR está associada à passagem do conceito de Defesa da
Floresta contra Incêndios (DFCI) para um conceito baseado em dois eixos, o da Gestão de Fogos
Rurais (GFR), orientado para a defesa dos espaços florestais, e o da Proteção contra Incêndios
Rurais (PCIR), orientado para a salvaguarda dos aglomerados populacionais, incluindo as
pessoas e bens.
Para além desta divisão entre dois eixos, sugerida pela CTI e adotada pelo Governo, a Estratégia
é apresentada como sendo também uma abordagem incluída no conceito de Gestão Integrada
dos Fogos Rurais. Importa, assim, clarificar esse conceito.
Em sentido lato, a gestão do fogo é entendida como o conjunto de ações destinadas a regular
os fogos de vegetação e, em última análise, o regime de fogo, a fim de cumprir objetivos de
gestão do território incluindo, portanto, atividades diversas (prevenção, pré-supressão,
supressão, ...). Em sentido mais restrito, a “gestão do fogo” foi formulada nos anos setenta do
século 20 nos EUA por oposição às políticas em vigor de exclusão (ou supressão) total do fogo.
O conceito tornou-se mais abrangente e detalhado e evoluiu para a “gestão integrada do fogo”
ou “gestão sustentável do fogo”, definível como o alcance simultâneo da proteção da vida e dos
bens humanos e da minimização dos impactos ambientais dos incêndios, levando em conta o
papel do fogo na conservação da biodiversidade e fornecimento de serviços de ecossistema. As
caraterísticas da gestão integrada do fogo estão listadas no quadro seguinte, obtido a partir de
várias fontes.
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Características da Gestão Integrada do Fogo
Minimizar os danos causados pelo fogo e a diferença entre os seus impactos negativos e
positivos como objetivo geral e através de uma abordagem holística: viver com o fogo;
As operações de combate são flexíveis e variáveis em esforço, através de uma resposta
deliberada e planeada, ponderando as consequências e incluindo opções de monitorização
e supressão limitada ou inexistente;
Racionalização de custos;
Otimização da efetividade das operações de supressão;
Programas alargados de gestão do combustível e silvicultura preventiva, frequentemente
através de fogo controlado e resultando em mosaicos à escala da paisagem;
Distribuição equilibrada do investimento entre a pré-supressão e supressão do fogo e a sua
prevenção e mitigação;
Planeamento orientado pelos objetivos de gestão do território;
Planeamento segue a seguinte hierarquia: definição dos objetivos globais de gestão de
recursos, definição dos objetivos da gestão do fogo, formulação de estratégias, táticas e
ações;
Resposta a incêndio e uso do fogo são definidos através de zonagem do território
Equacionada como um problema socioecológico e com consideração das dinâmicas
transversais;
Consistente e compatível entre organizações, clara e abrangente, e escalável no espaço e
no tempo;
Baseada no conceito de risco;
Considera a ecologia do fogo e assume que o fogo providencia serviços de ecossistema.
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Quadro 1. Explicitação das características de uma política de Gestão Integrada do Fogo.
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Considera-se que a Estratégia apresentada, embora considerando diversas características da
Gestão Integrada do Fogo, não as integra todas de forma completa e explícita.
Assim, o carácter inovador da Estratégia e do SGIFR em relação ao anterior SDFCI não reside
propriamente na aplicação completa do conceito de Gestão Integrada do Fogo, mas antes na
consideração de dois eixos, numa segmentação baseada na especialização e coordenação
integrada.
Para além dessa segmentação, o documento da Estratégia, no desenho macro do novo modelo
de competências e especialização, releva a dimensão da Conservação da Natureza e do
Ordenamento Florestal “como condição necessária ao sucesso do sistema, dado o seu papel de
construção de uma paisagem rural sustentável.” No entanto, as questões da Conservação da
Natureza estão praticamente ausentes da Estratégia e as questões do Ordenamento Florestal
não consideram o disposto na Estratégia Nacional para as Florestas nem os Programas
Regionais de Ordenamento Florestal.
Por outro lado, o documento preconiza alterações da paisagem muito discutíveis que parecem
contrariar o objetivo de aumentar a “capacidade de sumidouro carbónico”, pretendendo-se
resolver o problema da combustibilidade da paisagem através de modelos agroflorestais
desenquadrados da realidade, nomeadamente através da redução da densidade do arvoredo e
do aumento da densidade de herbívoros domésticos. Pelo contrário, os sumidouros do carbono
são potenciados com a imobilização do carbono sob a forma de árvores de longa duração,
nomeadamente em formações florestais de espécies nativas, e não com sistemas abertos ou
pouco densos que irão agravar os problemas de desertificação associados às alterações
climáticas.
Também nada se refere quanto ao restauro ecológico e à promoção de bosques de folhosas
nomeadamente em zonas mais produtivas como linhas de água e encostas viradas a norte,
excelentes sumidouros de carbono com provas dadas no retardamento ou mesmo extinção de
incêndios. Parece reduzir-se a solução do problema da combustibilidade à via da redução dos
combustíveis, nunca se considerando a via da condução da vegetação para formas mais estáveis
e mais interessantes do ponto de vista do armazenamento de carbono, da biodiversidade e da
prevenção contra incêndios.
As questões da adaptação climática, do armazenamento de carbono, do ordenamento da
floresta, da biodiversidade e da Conservação da Natureza estão assim quase ausentes do
documento da Estratégia.
Vejamos então quais as orientações e objetivos estratégicos considerados na Estratégia.
3.3 Orientações e Objetivos Estratégicos
No documento da Estratégia 20-30, as Orientações Estratégicas enquadram Objetivos
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Estratégicos de acordo com o quadro seguinte:
Quadro 2. Orientações Estratégicas e Objetivos Estratégicos do PNGIFR
Orientações
Estratégicas Objetivos Estratégicos
OE1 Valorização dos
Espaços Rurais
OB1.1 Redimensionar a propriedade rural
OB1.2 Aumentar a remuneração dos proprietários com a reforma do
modelo de gestão florestal
OB1.3 Disponibilizar incentivos jurídicos e financeiros à valorização
do território rústico
OE2 Cuidar dos Espaços
Rurais
OB2.1 Planear e promover uma paisagem diversificada e em
mosaicos
OB2.2 Diminuir a carga combustível à escala da paisagem
OB2.3 Aumentar a eficiência da proteção das populações e do
território edificado
OE3 Modificar os
comportamentos
OB3.1 Reduzir as ignições de maior risco
OB3.2 Especializar a comunicação de risco
OE4 Gerir o Risco
Eficientemente
OB4.1 Implementar o planeamento integrado incorporando a
avaliação de risco
OB4.2 Implementar um modelo capacitado de governança do risco
OB4.3 Redesenhar a gestão do dispositivo
OB4.4 Aumentar a qualificação dos agentes SGIFR
A definição das orientações estratégicas e dos objetivos estratégicos segue uma estrutura
comparável à definida no PNDFCI, como se comprova no quadro seguinte.
Quadro 3. Comparação entre PNDFCI e PNGIFR no que respeita a objetivos estratégicos
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Analisando ambos os planos, verifica-se que o que no PNDFCI era considerado como Eixos
Estratégicos, agora, no PNGIFR, assume-se como Orientações Estratégicas, mas muitos dos
objetivos operacionais são semelhantes nos dois planos, pelo que não é evidente o grau de
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inovação do PNGIFR face ao plano antecessor. A comparação permite ainda evidenciar a pouca
atenção dada às questões relacionadas com a recuperação e reabilitação de ecossistemas e
das questões orgânicas e funcionais da estrutura de gestão integrada, que deixam de constituir
eixos/orientações estratégicas. Por outro lado, regista-se como positiva a explicitação do objetivo
estratégico associado ao aumento da qualificação dos agentes do SGIFR, depois pouco
aprofundado.
Iremos de seguida comentar as Orientações Estratégicas e, dentro delas, os Objetivos
Estratégicos definidos:
A Estratégia baseia-se em quatro orientações estratégicas, que correspondem aos objetivos do
SGIFR definidos e aprovados na RCM 12/2019 de 21 de janeiro de 2019. Poderiam ser outras
orientações ou estarem articuladas de outras formas no sentido de estabelecer uma base
concetual mais equilibrada e melhor articulada para o Plano, mas a opção foi assumir os objetivos
do SGIFR como orientações. Por objetivos no Plano são considerados os objetivos mais
particulares enquadrados nas orientações estratégicas. As diferentes orientações estratégicas
apresentadas são algo desequilibradas na forma como são descritas e no que parecem indicar
ao nível da sua implementação. Os seus pesos e influências reais no PNGIFR e nas medidas
que o deverão compor, no entanto, mesmo considerando os objetivos estratégicos associados e
apresentados neste Plano, dificilmente poderão ser avaliados sem se conhecer o Programa de
Ação Nacional. Dessa forma, só após a publicação do referido documento, integrante do Plano,
mas atualmente em falta no processo de discussão pública, será possível apurar a relevância
das orientações estratégicas e dos respetivos objetivos estratégicos para o Plano Nacional e
SNGIFR, no sentido de se conhecer se estas trazem modificações significativas relativamente
ao Plano atualmente em vigor (PNDFCI).
Os objetivos estratégicos (OB) são apresentados de forma muito resumida sendo remetido o seu
desenvolvimento para o futuro Programa de Ação que não integra ainda os documentos em
discussão pública. Tal como referido já por diversas vezes e em diferentes secções deste
documento, a análise parcial e incompleta do SGIFR não permite uma avaliação integral da
mesma, o que lamentamos mais uma vez não ser possível realizar no âmbito do processo de
discussão pública em curso.
Os objetivos são integrados nas OE o que evidencia o desequilíbrio do caráter estratégico das
orientações, já comentado, mas também do seu eventual peso nas medidas a integrarem o
Programa de Ação e o seu impacto ao nível do Sistema.
A associação de objetivos estratégicos a OE, por outro lado, não é bem conseguida. Alguns
objetivos são passíveis de serem integrados diretamente em OE individualizadas, mas outros
são demasiado transversais para o serem. Este aspeto é ainda patente na ligação dos OE com
os Macroprocessos da Cadeia de Valor: na verdade, nem todos os Macroprocessos contemplam
os OE, nem aqueles se relacionam de modo sistemático com estes. A própria designação de
“Cadeia de Valor” pode ser questionada, sendo mais clara a designação de cadeia ou sequência
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de processos.
Independentemente destas questões, apresentam-se de seguida algumas considerações
relativamente a cada uma das quatro orientações estratégicas e aos respetivos objetivos
estratégicos.
3.3.1 Valorização dos Espaços Rurais (Orientação estratégica OE1)
Consideramos tratar-se de uma orientação fundamental para o sucesso de qualquer sistema de
gestão de incêndios em Portugal, principalmente nos aspetos relacionados com a remuneração
de serviços de ecossistema, inovação com base no conhecimento, diversificação das atividades
económicas e aumento da resiliência dos espaços rurais.
Pretende-se uma articulação com o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território
(PNPOT) que estabelece políticas de valorização do território, onde o mais marcante é a
remuneração dos serviços prestados pelo capital natural, a valorização do mesmo no sentido de
se explorarem novas formas de gerar valor, ao mesmo tempo que se apela a tirar partido dos
recursos endógenos em termos de bens ou serviços, na exploração de nichos de mercado e na
diversificação de atividades, de forma a atrair e fixar pessoas. Não deveria ser esta propriamente
a vocação do PNGIFR (a centralização em novas apostas para gerar valor para os espaços
rurais), o qual, apesar destas intenções indicadas no âmbito da valorização das regiões de baixa
densidade, afirma-se como inovador no domínio da integração dos processos colaborativos, que
aliás se procuram desenvolver na designada Cadeia de Valor. Nesse sentido, parece-nos
especialmente interessante a criação de um centro multi-agências (ANPEC, ICNF, GNR, FFAA,
IPMA; AGIF) que visa reunir no mesmo espaço físico as competências de planeamento e
coordenação do sistema, para incrementar a eficácia de decisão desde o nível nacional até ao
nível local (embora este aspeto transcenda a mera Valorização dos Espaços Rurais). A
institucionalização duma cultura de avaliação, assente num sistema de indicadores definidos é
também uma importante mais-valia do PNGIFR, embora esse procedimento não tenha sido até
agora seguido na preparação deste novo Plano.
Existe também uma procura de articulação entre este Plano e o Plano Nacional de Investimentos
no domínio da promoção da sustentabilidade do território rural, focalizado no aumento do
potencial económico florestal, mas numa perspetiva correta de diversificação de atividades no
espaço agroflorestal (conjugação com a componente agroambiental, promoção da
biodiversidade, etc.).
Todavia, a Estratégia Nacional para as Florestas (que se articula com o PNPOT) deveria, na
verdade, ser um documento de referência, integrador de diversas componentes e diretrizes
constantes em documentos mais específicos que vão desde o Plano de Ação Nacional de
Combate à Desertificação (PANCD) à Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da
Biodiversidade (ENCNB) e, ainda, o Plano Nacional de Combate à Desertificação (PNAC),
embora todos estes instrumentos tenham um interface com o PNPOT. Por outro lado, o Plano
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ao procurar promover uma floresta mais resiliente e sustentável deveria ter em conta as
limitações dos PROF (Programas Regionais de Ordenamento Florestal) no que se refere à
composição das florestas de diversas Regiões e outros fatores ambientais condicionantes, como
as áreas de máximo risco de erosão e a suscetibilidade à desertificação, onde estas áreas são
definidas. Com efeito, estes Planos encerram debilidades e não foram aprendidas as lições
decorrentes dos incêndios catastróficos de 2017 nem houve a preocupação de redesenhar a
floresta e a paisagem rural em Portugal à luz da probabilidade de eventos da mesma magnitude
voltarem a ocorrer durante o período de vigência dos PROF. Também não houve a preocupação
de adaptar a floresta em Portugal no sentido de diminuir os riscos de desertificação decorrentes
das alterações climáticas. Este assunto já merecera ainda em 2018 por parte do Observatório
um conjunto de recomendações específicas a este respeito “Recomendações do Observatório
Técnico Independente sobre os Planos Regionais de Ordenamento Florestal”.
Na verdade, a valorização dos espaços rurais e a diminuição do risco de incêndio não podem
ser abordadas sem uma análise dos PROF, tal como tinha salientado o Observatório na análise
destes documentos em 2018. É clara a necessidade destes Planos integrarem estratégias claras
de política florestal, em particular as estabelecidas na ENCNB relativamente às questões da
diminuição do risco de incêndio, o que poderá não estar de todo refletido nas metas propostas
para algumas das regiões mais vulneráveis. Por se tratar de um aspeto fundamental para a
valorização dos espaços rurais, defende o Observatório que os PROF devem ser urgentemente
revistos no sentido de os tornar planos de referência para o ordenamento do território no sentido
do aumento da resiliência do território e de acordo com o principio da valorização dos espaços
rurais, o que deverá ser parte integrante do PNGIFR.
A valorização dos espaços rurais não pode ser dissociada da aplicação das medidas para
recuperação do território e do ordenamento do espaço florestal para o tornar mais resiliente a
incêndios, nem abdicar de medidas tendentes a promover a conservação da água e do solo e a
diminuir a incidência dos fenómenos erosivos, para se atingir a recuperação do potencial
produtivo agrícola e florestal ou do património edificado, bem como da própria reorganização do
tecido social (de realçar que no Macroprocesso PE2 _Recuperação, misturam-se vários
conceitos, como o regresso das populações à normalidade com a estabilização de emergência
e com o aumento de resiliência dos ecossistemas).
Dentro desta orientação estratégica enquadram-se os objetivos estratégicos que adiante se
referem.
3.3.1.1 Redimensionar a propriedade rural (Objetivo estratégico OB1.1)
Este processo de aumentar a percentagem de propriedades rústicas de maior dimensão assenta
na criação dum banco de terras e na criação de um fundo de mobilização de terras.
É discutível a ausência de estímulos à formação de cooperativas através das Unidade de Gestão
Florestal (UGF), bem como a nível de promoção das Entidades de Gestão Florestal (EGF). O
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fundo de mobilização de terras também não é devidamente caracterizado.
Não é claro de que maneira o aumento da dimensão da propriedade florestal contribui de forma
significativa para a valorização do território uma vez que outros fatores afetam de forma mais
marcada o seu valor, como a distância a mercados, produtividade, distâncias a escolas e
equipamentos de saúde, etc. Esta questão é diferente da necessidade de existência do cadastro
florestal, que está relacionada com a responsabilização dos proprietários, a aquisição de terra e
a implementação de medidas de gestão conjunta. É certo que a dimensão das parcelas de gestão
é importante para o sucesso da atividade produtiva relacionada com a madeira, mas tal não se
reflete necessariamente nos serviços de ecossistema. No caso destes serviços, cujo pagamento
é uma bandeira do PNGIFR, os mesmos poderão ser afetados negativamente pelo aumento da
dimensão da propriedade, exceto no caso da produção de madeira/fibras já referido. Por essa
razão, a meta única neste objetivo estratégico “Aumentar a percentagem de propriedades
rústicas com maior dimensão” é modesta e um pouco lateral relativamente ao que é mais
relevante nos aspetos relacionados com a propriedade.
3.3.1.2 Aumentar a remuneração dos proprietários com a reforma do
modelo de gestão florestal (Objetivo estratégico OB1.2)
Pretende-se aumentar o valor das propriedades, criar modelos de negócio diversificados
assentes em produtos endógenos e “tornar o território mais atrativo, inovador, diversificado e
competitivo”. Procura-se ainda desenvolver um mecanismo adaptativo de governança do recurso
florestal.
Neste campo seria importante adicionar a remuneração dos serviços de ecossistema e
respetivos mecanismos de financiamento. O conceito do modelo adaptativo expresso no
documento não é clarificado.
Este objetivo, dada a sua ambição e potencial impacto na valorização do território, requereria um
aprofundamento significativo, que não se encontra presente. As propostas listadas são todas
interessantes e passíveis de contribuir para a valorização do território, mas a apresentação de
um leque tão diversificado de medidas e a forma solta e não articulada com outros objetivos e
medidas não permitem conhecer que condições efetivas vão ser criadas para a sua
concretização. Principalmente, porque este tipo de medidas depende de outras alterações
profundas no tecido empresarial e na sua cultura de inovação, na formação dos agentes, no
estabelecimento de cadeias de valor entram muitas outras modificações que, por não serem
descritas ou sequer abordadas aqui, não permitem conhecer o verdadeiro alcance deste objetivo.
A meta de “incrementar o Valor Atualizado Bruto da propriedade” num contexto tão diversificado
de medidas e de propostas parece insuficiente para resumir tudo o que está incluído neste
objetivo.
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3.3.1.3 Disponibilizar incentivos jurídicos e financeiros à valorização do
território rústico (Objetivo estratégico OB1.3)
Pretende-se a disponibilização de linhas de crédito e de programas multi-fundo para a gestão
agroflorestal, contratos programas de gestão florestal, incentivos financeiros e tributários à
atividade silvícola e silvopastoril a Entidades/Unidades de Gestão Florestal e a organismos de
investimento coletivo usando-se para este fim a mobilização de fundos europeus da política
agrícola comum e fundos próprios do ambiente e florestas e, ainda, do PT2030. O financiamento
deve ter em conta a bioeconomia e a economia circular, o que parece correto, bem como o
condicionamento à pecuária extensiva, no sentido que esta deve observar as boas práticas de
gestão ambiental.
É mencionado o apoio a conceder às EGF e UGF: a questão é assegurar que os conceitos de
subordinação à bioeconomia e economia circular são aplicados.
No entanto, esperar-se-ia que também neste OB a remuneração dos serviços de ecossistema
fosse abordada de forma direta, o que não acontece. Sendo o pagamento de serviços de
ecossistema aos proprietários e gestores uma forma fundamental de valorização das atividades,
recomendamos que seja aqui apresentada de forma assumida, clara e objetiva o pagamento
desses serviços no país, de preferência com referência a mecanismos e instrumentos planeados
para a sua realização.
3.3.2 Cuidar dos Espaços Rurais (Orientação estratégica OE2)
A segunda orientação é porventura demasiado vaga e apresentada de forma excessivamente
genérica. O termo cuidar, que é passível de várias interpretações, poderia ser substituído por
termos mais objetivos e traduzíveis para a prática como responsabilidade, gestão, manutenção
de sistemas produtivos, entre muitos outros. A OE2 deveria ser também mais detalhada na sua
relação com outros instrumentos de política e direito, como o regime de propriedade, cadastro,
regime florestal, etc.
A OE2 aponta neste âmbito para a obrigação dos proprietários em zelar pela sustentabilidade
dos espaços rurais de modo a assegurarem as funções a que se destinam e de os proteger
contra os incêndios. Ora, este objetivo estratégico não tem ligação com o diagnóstico feito pela
própria AGIF, que menciona que os incêndios que ameaçam todos os anos o património
periurbano, infraestruturas agrícolas, e florestas acabam por inibir o investimento florestal no
interior e degradam o ambiente e os ecossistemas, alimentando o ciclo vicioso do abandono,
onde tem subsistido a incapacidade de se introduzir um modelo de gestão florestal que agregue
as propriedades para uma intervenção planeada, em vez da ausência de intervenção dos
milhares de proprietários, o que deu origem a um paisagem monótona e sem gestão visível, num
emaranhado de floresta e matos com elevadas cargas de combustível vegetal.
Seria importante que o Plano analisasse criticamente o modelo atual vigente nos Perímetros
Florestais, e formas de gestão associativa como as UGFs, EGFs, ZIFs, no sentido da otimização
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para a agregação da propriedade que permita um maior investimento na floresta e uma gestão
sustentável e que contribua para a minimização dos perigos.
Existe a perceção que o Plano dá mais peso ao investimento financeiro e não à agregação de
proprietários, quando este aspeto condiciona aquele.
3.3.2.1 Planear e promover uma paisagem diversificada e em mosaicos
(Objetivo estratégico OB2.1)
Pretende-se implementar programas e projetos de reconversão de povoamentos, pela instalação
de pastagens melhoradas e manutenção da área agrícola em locais estratégicos, mas também
pela concretização da criação de faixas agrícolas de gestão e de interrupção e manchas
agrícolas.
Estes princípios estão absolutamente corretos, mas ficam por conhecer os incentivos para tais
objetivos poderem ser concretizados em áreas demograficamente desfavorecidas. Por outro
lado, o Macroprocesso PV1 (Gestão do Território Rural) prevê, para além da execução das redes
de gestão de combustíveis, a realização de mosaicos como parte integrante dos PMDFCI, bem
como a redução da massa combustível vegetal, valorizando o território, mas a capacidade de
intervenção neste domínio está por esclarecer, até porque estes Planos Municipais têm um nível
de ação limitado para se concretizar a diversificação da paisagem.
Na verdade, este objetivo, pela sua importância e potenciais impactos, requereria uma melhor
formulação da sua aplicação no sentido de reduzir o caráter generalista e por vezes vago da sua
apresentação. Mais uma vez optou-se pela listagem de uma série de medidas a implementar
sem a devida integração ou apresentação de aspetos mais concretos que possam
operacionalizar o objetivo. Pela relação direta com diversos instrumentos de gestão territorial,
nomeadamente os PROF, o enquadramento destas medidas avulso nos mesmos seria
recomendável. Da mesma forma, a articulação com outros objetivos do Plano contribuiria
decisivamente para a sua coerência. Com a presente redação e definição, também este objetivo
corre o risco de ser visto como apenas um conjunto de boas intenções.
3.3.2.2 Diminuir a carga combustível à escala da paisagem (Objetivo
estratégico OB2.2)
No Plano é dado o enfoque ao incremento da área anual sujeita a gestão de combustível, com
especial atenção à expansão do uso do fogo controlado ou para o aproveitamento de sobrantes
(ex. para produção de energia).
Ressalta na análise deste objetivo a abordagem de múltiplos temas, nomeadamente a gestão
dos parques naturais e áreas de elevado valor conservacionista, onde o Plano vira a sua atenção
para a promoção do restauro da paisagem e sua defesa através da implementação de faixas de
gestão de combustível, recuperação de áreas ardidas e, ainda, a criação dum fundo de
emergência e recuperação pós-evento. Naturalmente, a pormenorização destas medidas não
tem o espaço desejado. Além do mais, é necessário ter em conta a reduzida qualificação (e
II SÉRIE-E — NÚMERO 14________________________________________________________________________________________________________
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certificação) de agentes para a realização de fogo controlado em grande escala e a pouca
expressão das Centrais de Biomassa para o aproveitamento de resíduos florestais e matos.
Consequentemente, tal como nos casos anteriores, este objetivo carece de adequada
clarificação sobre a forma como vai ser abordado e implementado. Neste caso, dado que o
PNDFCI incluía metas semelhantes, seria importante destacar aspetos inovadores ou
diferenciadores deste objetivo particular. Seria igualmente importante clarificar a escala da
paisagem no âmbito deste objetivo (e de outros onde surge o termo paisagem).
3.3.2.3 Aumentar a eficiência da proteção das populações e do território
edificado (Objetivo estratégico OB2.3)
Procura-se a gestão ativa das faixas de gestão de combustíveis de rede secundária em redor
dos aglomerados rurais e a criação de programas para aumentar a segurança do edificado,
assegurando a execução daquela rede e potenciais penalizações aos proprietários de prédios
urbanos e misto não edificados na interface entre o urbano consolidado e os espaços rurais.
Deveria ser considerada a revisão dos PDM e dos PMDFCI para melhor definirem as zonas de
proteção/proibição em áreas de elevado risco de incêndio. Em termos do Macroprocesso PV2, é
especialmente importante a criação e manutenção de boas práticas de defesa do edificado
isolado e de aglomerados populacionais e industriais sendo esta preparação do edificado e
espaços de interface uma clara aposta deste Plano que deve ser priorizada. É de destacar pela
sua importância o Macroprocesso PV3, que aposta na operacionalidade das estruturas e
equipamentos de proteção e supressão, impondo uma fiscalização do estado e das condições
de segurança das infraestruturas, nomeadamente, redes de defesa da floresta (RDF) contra
incêndios, pontos de água, rede viária florestal, sistemas de controlo e sinalização, etc.
Consideramos que este objetivo dificilmente se justifica enquanto objetivo individual. Seria
facilmente integrado no objetivo anterior. Demonstra-o o texto explicativo ainda mais vazio do
que no caso dos outros objetivos.
3.3.3 Modificar os comportamentos (Orientação estratégica OE3)
O Plano pretende modificar comportamentos e dar a conhecer as boas práticas de prevenção de
incêndios e gestão do território, bem como divulgar os conhecimentos científicos sobre o uso do
fogo. Nesse sentido, deseja promover junto da população a adoção das melhores práticas de
defesa e reduzir as fontes de ignição em períodos de maior risco, como as queimas e queimadas,
as fogueiras e as ignições decorrentes de máquinas e ferramentas.
Tal como no caso anterior, a orientação é definida e apresentada de forma pouco objetiva,
misturando um conjunto de aspetos bastante diversificados numa redação relativamente
confusa. Recomenda-se um melhor desenvolvimento deste princípio, articulado com um
diagnóstico que o suporte de forma a ser mais do que a combinação dos dois objetivos
estratégicos que contém (redução de ignições e preparação das comunidades rurais).
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Recomenda-se ainda que, a manter-se esta designação, a orientação estratégica foque
igualmente os comportamentos de outros agentes do sistema e da sociedade em geral, incluindo
o poder judicial, o poder político (local e nacional), os profissionais da engenharia, planeamento
urbanístico, arquitetura paisagista, entre outras, que atuam no território, e que se reforce o papel
do conhecimento científico e técnico nestas alterações.
3.3.3.1 Reduzir as ignições de maior risco (Objetivo estratégico OB3.1)
Pretende-se reduzir o número e o risco das principais causas das ignições, nomeadamente, das
queimas e queimadas, quer através da revisão da legislação, quer promovendo a implementação
duma rede integrada de vigilância.
Todavia, não é transparente a caracterização do que se pretende atingir em termos da alteração
da legislação (reforço da moldura penal? Alteração da regulamentação de queimas e
queimadas?). Por outro lado, também não se compreende o que será a rede integrada de
vigilância. Este objetivo está associado ao Macroprocesso PS2 _ Vigilância_, que incide em
grande parte na necessidade de melhorar a deteção e resposta a incêndios rurais.
Tal como noutros objetivos, não são descritos os processos ou componentes que promovem
inovação ou melhoria relativamente ao instituído no PNDFCI.
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3.3.3.2 Especializar a comunicação de risco (Objetivo estratégico OB3.2)
A tónica reside na divulgação das boas práticas que tendam a criar medidas preventivas para
conhecer o risco e evitar incêndios e, ainda, em apontar a necessidade de criar mecanismos de
aviso e alerta adequados a públicos-alvo para uma melhor autoproteção, o que tem interface
com a implementação de programas como “Aldeias Seguras, Pessoas Seguras”.
Este objetivo conjuga-se com o Macroprocessos (PR1) _Comunicação Integrada e Educação _,
e engloba campanhas nacionais, ações ditas de “grande impacto” e ações de caráter regional,
sem que exista um direcionamento temático e alvos a atingir dentro de cada nível.
Tal como no caso anterior, não é evidente o que se altera em relação ao sistema em vigor.
3.3.4 Gerir o Risco Eficientemente (Orientação estratégica OE4)
A ênfase no Plano vai para a monitorização de resultados e para o estabelecimento de processos
de avaliação e comunicação para se instituir um modelo de governança do risco. Como vetores
essenciais o Plano define a cooperação interagências e a partilha de dados, conhecimento e
experiências e para uma melhoria contínua. Dá-se também realce à criação de provisão
orçamental virada para a mitigação das consequências dos incêndios essencialmente na
pequena e média agricultura, surgindo a referência à criação de seguros agrícolas que
contemplem a perda de culturas decorrentes de incêndios rurais o que, sendo correto, não inclui
um quadro distinto do atual.
Não se entende por que razão nesta orientação estratégica em particular surge uma alusão à
“criação (de) provisão orçamental” ao contrário das restantes onde tal aspeto não é considerado.
Nem deve ser, uma vez que se trata de orientações e também porque se espera que haja
provisão orçamental para colocar em prática cada uma das quatro orientações definidas que
necessita de ser considerada no Orçamento de Estado.
Possivelmente nesta OE a estratégia associada poderia ser concebida de forma a torná-la mais
funcional. Tal como nos outros casos, ou porventura de forma ainda mais gritante, os objetivos
são apresentados de forma extremamente vaga e superficial e, por isso, desligadas da sua
operacionalização. Sendo esta uma das bandeiras do SGIFR exigia-se uma melhor
apresentação dos objetivos e do seu enquadramento no Plano, mas, sobretudo, da sua
articulação com os restantes elementos do Plano e do Sistema.
3.3.4.1 Implementar o planeamento integrado incorporando a avaliação de
risco (Objetivo estratégico OB4.1)
Pretendem-se criar as condições para uma avaliação do risco de incêndio nas modalidades
estrutural e conjuntural, a partir da elaboração de mapas que, entre outras variáveis, requerem
informação sobre o combustível e a piro-meteorologia.
A avaliação de risco de incêndio utilizando metodologias adequadas é prioritária (risco estático
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e dinâmico em função da meteorologia), embora seja desejável a ligação entre os processos
associados à elaboração de cartografia de risco e a concomitante estratégia de comunicação
desse mesmo risco.
3.3.4.2 Implementar um modelo capacitado de governança do risco
(Objetivo estratégico OB4.2)
Transparece uma focalização no incremento das competências de governança do risco das
instituições que participam na recolha, análise, tomada de decisão e comunicação sobre risco
de incêndios.
Este Objetivo articula-se com o Macroprocesso PS1 sobre Análise de Risco dado que tem a ver
com a especialização de células de apoio à decisão, integrando a informação meteorológica que
é periodicamente disponibilizada pelas entidades competentes, bem como no que se refere aos
dados do estado dos combustíveis, informação da perigosidade de incêndio, informação
operacional, vulnerabilidade e população potencialmente afetada, e na capacidade de receber e
interpretar parâmetros operacionais condicionantes. É sempre transversal a estes processos a
passagem da análise de risco para a comunicação atempada às populações. De realçar que
existe alguma redundância entre este objetivo e o anterior.
3.3.4.3 Redesenhar a gestão do dispositivo (Objetivo estratégico 0B4.3)
Melhorar os processos operacionais para o correto dimensionamento, posicionamento e
envolvimento face ao risco dos meios de prevenção, vigilância e supressão.
Neste âmbito a necessidade de integração de sistemas de informação existentes (e.g. GeoMai
e SGIIF, e outros) salientada no Capacitador “Sistemas de Informação e Comunicação” é de
grande importância. Este Objetivo encontra-se ligado a um conjunto de Macroprocessos, como
o PS3_ Pré-Posicionamento, de modo a atingir-se a melhor alocação de meios em locais
estratégicos de estacionamento com base no risco de incêndio, património, histórico de incêndios
ou comportamentos de risco, mas também aos Macroprocessos SC1 Ataque Inicial; SC2; Ataque
Ampliado; SC3 Rescaldo e Extinção; SC4 Restabelecimento da Segurança; SC5 Resposta em
Emergência Social e Ambiental.
3.3.4.4 Aumentar a qualificação dos agentes SGIFR (Objetivo estratégico
OB4.4)
É definida sumariamente a implementação dum programa nacional de qualificação dos Agentes
SGIFR, em articulação com os centros de conhecimento e partilha de experiências com as
melhores práticas internacionais.
Não obstante, não é disponibilizado o devido enquadramento sobre como será desenvolvido este
plano essencial para a melhoria de todos os agentes e processos das seis fases da cadeia de
valor. Aliás, no documento da Cadeia de Valor menciona-se que o roteiro para o novo modelo
de qualificação dos agentes do SGIFR, só será detalhado em documento autónomo a publicar
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posteriormente, pelo que não se pode discuti-lo nas condições atuais. O Macroprocesso PE1-
Investigação de Causas, com a consequente premência de se melhorar o conhecimento sobre a
origem das ignições deverá ser também articulado com este objetivo.
3.3.5 Impactes legislativos
Para a implementação do SGIFR preconiza-se naturalmente a alteração dos diplomas que
regulavam os processos existentes, com relevância para a alteração do Decreto-Lei n.º
124/2006, e 134/2006. Dado que o SGIFR contempla a prevenção de incêndios a uma escala
espacial inédita, com implicações ao nível do ordenamento global do território e, mais
concretamente, de ordenamento florestal, é mencionada a necessidade de revisão dos
instrumentos de planeamento de defesa contra incêndios (Planos Municipais e Intermunicipais
de Defesa da Floresta Contra Incêndios), embora estes últimos não tenham tido verdadeiramente
impacto no território.
Estas alterações decorrem ainda da nova Lei orgânica do ICNF que atribui a este organismo
uma organização espacial diferenciada, de âmbito nacional, regional e sub-regional, com novas
responsabilidades em termos de planeamento e coordenação das ações de prevenção e deteção
e de colaboração no combate aos incêndios.
Outros aspetos versam a revisão do Regulamento do Fundo Florestal Permanente, pela criação
de um regime especial de financiamento, além dos processos legislativos que incrementem as
áreas cobertas pelo cadastro predial.
É ainda dada uma tónica especial à expropriação de terrenos, com poderes mais amplos neste
domínio ao ICNF para uma superior prevenção de fogos rurais, no que parece ser um processo
coercivo que não se pode generalizar.
Mais uma vez não é feita referência à articulação deste Plano com outros instrumentos de gestão
territorial, nomeadamente os PROF, que parecem ser centrais na modificação de alguns dos
princípios e processos em causa neste Plano e no SNIGFR.
3.4 A sequência de processos ou cadeia de valor no PNGIFR
O documento da Estratégia 20-30 apresenta a sequência de processos, que é descrita com mais
detalhe noutro documento, com a designação de Cadeia de Valor (termo este já atrás criticado),
que constituirá um segundo documento do Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais
(PNGIFR). Este segundo documento desenvolve conceitos que tinham já sido apresentados no
documento sobre a Estratégia 20-30. O capítulo inicial deste documento, intitulado “A Cadeia de
Valor e Capacitadores”, é mesmo na prática uma cópia quase integral do capítulo correspondente
do documento da Estratégia 20-30.
O documento aponta para que o SGIFR encontre suporte em “capacitadores” que sustentam
ou promovem o sucesso de cada processo, e que são três: (i) Governança, (ii) Qualificação e (iii)
Sistemas de Informação e Comunicação.
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No âmbito da Governança considera-se a gestão do risco em geral e do risco de incêndios em
particular, a nível supranacional, nacional, regional e local, em múltiplas perspetivas, desde a
coordenação política, atividade legislativa, à gestão autárquica e á educação e ensino, dando-se
relevo, na gestão a nível nacional ao papel da AGIF.
No que respeita à Qualificação é de realçar o seu destaque como capacitador, na medida em
que se preconiza uma cultura de promoção do conhecimento, da valorização e reconhecimento
da formação e qualificação. No entanto, a definição mais detalhada deste capacitador é remetida
para outro documento que se encontra em preparação.
Sobre os Sistemas de Informação e Comunicação, pressupõe-se a existência de protocolos de
partilha de dados, preconiza-se a adoção de plataformas informáticas que permitam
compatibilizar a informação e gerir o seu acesso.
Para além destes capacitadores, que claramente se justificam, sugerimos que seja associado
um outro capacitador, o da Monitorização e Avaliação. Este deveria constituir um capacitador do
sistema e não um mero macroprocesso, ligado a uma das fases de execução do sistema, ainda
que na sua introdução se diga que se trata de um macroprocesso transversal a todo o sistema.
Propomos por isso que se crie um novo capacitador e se reformule a Cadeia de Valor tendo isto
em consideração.
A cadeia de valor, ou sequência de processos, do SGIFR compreende as seis fases que já
estavam definidas na Resolução de Conselho de Ministros nº12/2019 de 21 de janeiro que
aprovou a missão e a visão do SGIFR. Cada uma destas fases é por sua vez constituída por
“macroprocessos” quecorrespondem genericamente aos processos de execução definidos
na Diretiva Única de Prevenção e Combate pela Resolução de Conselho de Ministros nº20/2018
de 1 de março.Também por isso a designação de “macroprocessos”, extensamente usada
nestes documentos, não parece justificar-se já que não há referências a outro tipo ou nível de
processos, podendo ser substituída simplesmente por “processos”.
Os processos do sistema tinham sido já organizados de forma sequencial na “Avaliação do
sistema nacional de proteção civil no âmbito dos incêndios rurais” produzida por este
Observatório em dezembro de 2018 e que não foi considerado, nem sequer referido, no
documento da Estratégia 20-30 agora em análise.
As fases definidas no Relatório produzido pelo Observatório em 2018 e os processos aí
considerados são referidos no Quadro 4. A sequência destes processos está representada na
capa deste Relatório.
Quadro 4. Fases e processos referidos no relatório do Observatório
Fase Processos
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1 Prevenção e Preparação para o
evento
1.1 Planeamento
1.2 Gestão do combustível
1.3 Sensibilização
1.4 Fiscalização
1.5 Vigilância e deteção
2 Resposta durante o evento
2.1 Segurança das populações
2.2 Ataque inicial
2.3 Ataque ampliado
2.4 Rescaldo e extinção
3 Análise e recuperação pós-evento
3.1 Investigação das causas
3.2 Avaliação pós-evento
3.3 Recuperação pós-incêndio
3.4 Gestão da informação
4 Investigação científica e
qualificação dos agentes
4.1 Investigação científica
4.2 Qualificação dos agentes
Os processos referidos naquele Relatório do Observatório correspondem, no geral, aos
macroprocessos referidos neste documento de Estratégia. Usando a terminologia adotada neste
documento da Estratégia 20-30, os macroprocessos são em número variado consoante a
complexidade da fase, conforme se apresenta no quadro 5.
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Quadro 5. Fases e macroprocessos da Estratégia 20-30
Fase Macroprocessos
1 Planeamento
PL1 - Diretrizes e planeamento
PL2 – Diretrizes Operacionais
PL3 – Orçamentação e financiamento
2 Preparação PR1 – Comunicação e Educação
PR2 – Fiscalização
3 Prevenção
PV1 – Gestão do território rural
PV2 – Preparação do território edificado
PV3 – Verificação das condições de segurança
4 Pré-supressão
PS1 – Análise de risco, aviso e alerta
PS2 – Vigilância
PS3 – Pré posicionamento
5 Supressão e Socorro
SC1 – Ataque inicial
SC2 – Ataque ampliado
SC3 – Rescaldo e extinção
SC4 – Restabelecimento de segurança
SC5 – Resposta em emergência social e
ambiental
6 Pós Evento
PE1 – Investigação de causas
PE2 – Recuperação
PE3 – Melhoria contínua
Em três das seis fases estão previstos macroprocessos de Fiscalização, de Verificação ou de
Melhoria Contínua, o que nos parece ser de valorizar, na procura de promover uma cultura de
autoavaliação e de melhoria contínua, que deveria ser comum a todas as fases e transversal a
todas as entidades do Sistema. O conteúdo do documento da Cadeia de Valor visa atribuir (de
forma exaustiva) responsabilidades ao conjunto de entidades do sistema, em todos os domínios
dos macroprocessos referidos.
Em todos estes domínios a AGIF está presente, com diferentes funções no processo, mas todas
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suficientemente robustas para poder influenciar a decisão. Isto confere à AGIF a dimensão de
tutela do sistema, o que não está suficientemente enquadrado no ordenamento jurídico que a
regula.
Quanto aos macroprocessos e às responsabilidades atribuídas às diversas entidades, estas
são referidas através de um código nos vários processos ou tarefas descritas. Regista-se que na
listagem das entidades, não é reservada uma sigla própria para as entidades do Sistema de
Ensino e Investigação, estando relegadas para o conjunto de “outras entidades relevantes”. É
ainda referido um Comité Nacional de Coordenação do SGIFR, sem que sejam detalhadas a sua
composição e atribuições.
Fazem-se de seguida alguns comentários específicos aos macroprocessos indicados:
3.4.1 No Planeamento (PL):
PL1 – Diretrizes estratégicas: Nas nove tarefas da Estratégia de Planeamento Integrado, a
AGIF surge como entidade coordenadora (EC) em todas elas, responsável em duas delas e
como Avaliadora e Articuladora (Aa) nas restantes sete. Parecem-nos ser atividades claramente
pesadas e de grande responsabilidade, que dificilmente a AGIF poderá desempenhar, sem que
venha a dispor de recursos humanos e financeiros importantes.
PL2 – Diretrizes Operacionais: Nas seis Tarefas correspondentes às Diretrizes Operacionais,
a entidade coordenadora é a Administração Central do Estado (ACE), presumindo-se que seja o
Conselho de Ministros (CM), sendo uma vez mais a AGIF a entidade Aa (que realiza a Avaliação
e a articulação). Temos dúvidas sobre a capacidade técnica do CM para coordenar o vasto
conjunto de Diretrizes Operacionais, de diverso nível, que se podem encontrar na gestão dos IF.
Tendo em conta o passado recente na emissão de diretrizes e de legislação emanada do CM,
presumimos que se deverá tratar de mais uma tarefa atribuída à AGIF.
PL3 – Orçamentação e financiamento: Nas sete tarefas correspondentes a este processo,
curiosamente surge a AGIF como sendo a entidade coordenadora de todas, menos de uma,
sendo ao mesmo tempo a entidade responsável por todas elas. Chama-se igualmente a atenção
para o facto de em nenhuma destas tarefas haver alguma entidade que desempenhe as tarefas
de informar, fiscalizar ou avaliar.
3.4.2 Na Preparação (PR):
PR1 - Comunicação e Educação: Uma vez mais, a AGIF é coordenadora das três tarefas deste
processo, sendo ainda responsável por duas delas. Aqui também não se define quem fiscaliza
ou avalia as tarefas. É notória a ausência de menção aos estabelecimentos de ensino ou de
investigação, numa tarefa intitulada “Educação”, apesar de na sua introdução se mencionar a
necessidade de haver “expansão do conhecimento”.
PR2 – Fiscalização: A GNR é a entidade coordenadora das quatro ações desta Tarefa, sendo
a AGIF a entidade Aa de todas elas. Uma vez mais se nota que as ações de fiscalização incidem
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praticamente apenas na gestão de combustíveis, como se a vegetação fosse o único fator
componente do perigo.
3.4.3 Na Prevenção (PV):
PV1 – Gestão do Território Rural: Nas seis ações desta Tarefa, o ICNF surge como entidade
coordenadora e responsável, embora partilhe a responsabilidade em quatro delas com um
conjunto diversificado de outras entidades, que chegam a ser cinco. Esta partição torna
possivelmente difícil de avaliar a posteriori a responsabilidade efetiva do êxito ou do insucesso
de algumas dessas ações, uma vez que esta responsabilidade se encontra diluída por várias
entidades. Em nenhuma outra ação, em todo o documento, a responsabilidade se encontra
dividida por mais de duas entidades. Curiosamente, sempre que a responsabilidade se encontra
partilhada, o ICNF encontra-se envolvido, com exceção das ações cuja responsabilidade esteja
partilhada entre a PSP e a GNR. Neste último caso, essa partição é compreensível, dada a
partilha jurídica de território entre aquelas duas entidades do sistema policial. Tipicamente, a
AGIF surge como Aa em todas elas, com exceção da ação que corresponde a registar em base
de dados, que curiosamente não prevê nem F nem Aa. Nas ações 2 e 3 desta Tarefa faz-se
menção aos PMDFCI, que noutra parte do PN são dados como extintos. A ação 4, referente à
gestão agrária, está quase reduzida à redução da biomassa.
PV2 – Preparação do Território Edificado: Nas cinco ações desta Tarefa, a ANEPC surge
como entidade C, sendo igualmente Aa em três delas, partilhando essa função com a AGIF nas
outras duas. Não é mencionado o papel nem da população nem dos cidadãos, que, no entanto,
são o objeto ou destinatário de muitas das ações desta Tarefa. É muito questionável a
incumbência atribuída à ANEPC nesta tarefa.
PV3 – Verificação das condições de segurança: A coordenação das cinco ações desta Tarefa
são partilhadas entre a ANEPC (3) a AGIF (1) e a ACE (1). Chama-se a atenção para o facto de
a rede elétrica não ser mencionada na ação 1, de inventariação e localização das infraestruturas.
3.4.4 Na Pré-supressão (PS):
PS1 – Análise de Risco: As dez ações desta tarefa são coordenadas e da responsabilidade da
ANEPC, com exceção de uma delas, referente ao “Fornecimento de Informação meteorológica
«não valorada»”, cuja responsabilidade está a cargo do IPMA. Não se compreende por que razão
esta tarefa não é totalmente coordenada pelo IPMA, em particular a ação correspondente ao
fornecimento de dados meteorológicos, e outros, de suporte à decisão. Não se consegue
igualmente alcançar o significado da expressão informação meteorológica “não valorada”. Quem
é a entidade que produz tal informação “não valorada”? E quem é a entidade que a valora ou
valoriza? Tipicamente, a AGIF surge em todas as ações, quase sempre como Aa. Seis das ações
não dispõem de F ou Aa. A redação da Ação 4 é particularmente confusa.
PS2 – Vigilância: As quatro ações desta Tarefa estão sob a coordenação e responsabilidade da
GNR (2) ou da ANEPC (1), sendo que na restante a coordenação é da ANEPC e a
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responsabilidade é da GNR. Na ação 2, de vigilância, estranha-se a não menção dos populares,
que são, como é bem conhecido, a principal fonte de alertas de incêndios rurais em Portugal.
Também não são referidas as autarquias, que têm igualmente um papel importante na Vigilância,
sendo que muitas possuem os seus próprios sistemas de vigilância. Também não se faz
referência a novas tecnologias de vigilância, tanto terrestre como aérea. Curiosamente nesta
ação, o ICNF, em negrito, é mencionado como entidade que deve ser consultada.
PS3 – Pré posicionamento: As três ações desta Tarefa serão coordenadas pela ANEPC, que
é igualmente responsável pela sua execução, embora partilhe a coordenação de duas das ações
com o ICNF. A AGIF é a entidade Aa das três ações.Analisando os documentos normativos em
vigor, em comparação com o presente em apreço, embora apresentados de modo diferente, não
se consegue identificar qualquer alteração doutrinária e operacional substantiva.
3.4.5 Na Supressão e Socorro (SC):
SC1 – Ataque Inicial: A coordenação deste processo é da responsabilidade da ANEPC, mas no
domínio da execução esta é partilhada com o ICNF “porque a esta entidade cabe gerir a
especialização da intervenção em solo rústico”. Embora se diga no preâmbulo da Tarefa que a
responsabilidade de execução de vários subprocessos é partilhada com o ICNF, invocando o
princípio da especialização entre os dois territórios, tal não se reflete na descrição das ações. A
questão que se coloca é a de, no contexto do Sistema Integrado de Operações de Proteção e
Socorro (SIOPS) e do Sistema de Gestão de Operações (SGO),),), quem manda em quem,
quando e como?
No ponto de vista procedimental, nada de substantivo se acrescenta aos normativos e diretivas
em vigor, mudando-se apenas, por vezes de forma enviesada e pouco clara, a sua descrição,
porque em tese permanece de modo semelhante ao atualmente em vigor.
Estranha-se a inclusão da ação “Evacuar Povoações” no ATI, uma vez que esta ação supõe um
conjunto de intervenções cujo planeamento, preparação e execução deverão ocupar uma
duração temporal muito superior àquela preconizada para um ATI. Aliás esta ação é replicada
quase com as mesmas palavras no ATA. Estranha-se ainda que a responsabilidade da ação
intitulada “Evacuar Povoações” não seja da ANEPC, uma vez que esta é, em Portugal, a
autoridade responsável pela proteção civil. A designação da ação de “Evacuação de Povoações”
parece-nos ser infeliz, porque sugere a ideia errada – que é de forma geral adotada também no
programa “Aldeia Segura”, que é mencionado nesta ação, - de que as pessoas devem ser todas
retiradas da área potencialmente atingida pela frente do fogo. A experiência mostra que nem
sempre esta é a atitude mais sensata e segura. Muitas vezes existem condições para
permanecer onde se está, ou confinar as pessoas num abrigo seguro, processo que nem sequer
é mencionado nesta ação.
De referir que a AGIF tem um papel em quase todas as ações, por vezes para ser meramente
informada de uma dada ação, outras vezes para ser consultada, mas na Supressão do Incêndio
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a AGIF é simultaneamente a entidade que deve ser consultada e a entidade que avalia e articula.
Ora nesta fase, que é muito curta, 90 minutos, pretende-se que o sistema esteja de tal forma
doutrinado e rotinado entre todos os agentes que permita manter e se possível melhorar a
percentagem de resolução de incêndios em ATI.
SC2 – Ataque Ampliado: Este âmbito é, no nosso ponto de vista, o que consubstancia
alterações mais relevantes, em particular no que concerne à “especialização” da função de
comando. Esta, é porventura uma das Tarefas mais complexas de todo o processo, com 24
ações, todas coordenadas pela ANEPC, com exceção de duas, cuja responsabilidade é
partilhada entre a GNR e a PSP.
É de reconhecer que esta face do roteiro do combate é critica para o sucesso do mesmo. O
fluxograma inserido na página 68 confirma esta constatação.
A dúvida suscitada é quanto ao perfil de especialização exigível para a “expansão da capacidade
de comando e controlo, conforme as especialidades técnicas necessárias para comando da
operação”. E a dúvida ainda mais se acentua quando se prevê que “Ao passar do ataque inicial
para o ataque ampliado, a cadeia de comando evolui combinando o perfil do COS e da sua
equipa de posto de comando com as características da ocorrência”. Teoricamente isto parece
incontestável. Mas no plano prático como se materializa, na doutrina do SGO?
Na setorização dos incêndios o SGO preconiza a aplicação do critério territorial, ou seja, da
especialização de cada setor onde decorre a operação, sendo a setorização definida por uma
“linha” de extensão variável, que corresponde ao perímetro de incêndio. A Estratégia 20-30
aponta para um novo critério, baseado na diferenciação entre Gestão do Fogos Rurais e
Proteção Contra Incêndios Rurais. Reconhecendo a grande dificuldade de aplicação deste novo
critério, que implica a existência de responsáveis diferenciados, o Observatório recomenda a
melhor atenção na alteração profunda do SIOPS a que esta alteração de critério obriga.
em conta o elevado número de ocorrências simultâneas que temos diariamente em Portugal,
com ATI ou ATA, parece-nos que esta atribuição de responsabilidades à AGIF é claramente
excessiva.
A questão é que a AGIF altera o rumo da concentração de informação critica da ANEPC para a
própria AGIF. Enquanto que a ANEPC tem mecanismos de resposta operacional para resolução
dos problemas, a AGIF privilegia a concentração de informação eventualmente para difusão ao
escalão político.
SC3 – Rescaldo e extinção: As seis ações desta Tarefa são coordenadas por e são da
responsabilidade da ANEPC. Tendo em conta o importante papel que os meios terrestres e
aéreos das FFAA podem desempenhar nesta Tarefa, estranha-se que não sejam mencionados
explicitamente. Para além disso, não se consegue identificar qualquer alteração doutrinária e
operacional substantiva, em relação aos documentos normativos em vigor.
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SC4 – Restabelecimento de Segurança: Esta Tarefa conta com quatro ações, todas sob
coordenação da ANEPC, sendo que apenas uma não é também da responsabilidade desta
entidade.
SC5 – Resposta em emergência social e ambiental: Trata-se de uma Tarefa com cinco ações,
todas coordenadas pela ANEPC e da responsabilidade das autarquias. Na ação designada por
Ativação do Plano de Emergência, não existe menção à possibilidade ou ao facto de existirem
danos pessoais graves, que deveria levar a procedimentos de atuação específicos e que,
segundo a experiência mostra, deveriam ser muito diferentes dos habituais.
3.4.6 No Pós Evento (PE):
PE 1 – Investigação de Causas: Nesta Tarefa, que comporta cinco ações sob coordenação e
responsabilidade da GNR, é igualmente esta a entidade que Aa (Avalia e articula) as diversas
ações. A listagem de casos em que se deve informar a PJ é muito limitada e não se menciona o
papel essencial desta Polícia e especialmente do sistema Judicial na prevenção da
criminalidade. Uma vez mais não se menciona sequer o papel da comunidade científica neste
âmbito específico.
PE2 – Recuperação: Esta Tarefa tem quatro ações, em geral coordenadas pelo ICNF e que são
da responsabilidade deste Instituto, mas sempre partilhada com as autarquias e outras
instituições. O texto é muito pobre, para a dimensão desta tarefa e reflete a fraca atenção que
tem sido dada no passado, pelas autoridades, a esta fase do processo de gestão dos IF.
PE3 – Melhoria Contínua: As três ações desta Tarefa são coordenadas pela AGIF, que assume
a responsabilidade de coordenar a recolha dos relatórios, mas a responsabilidade das restantes
ações é partilhada por todo o sistema. Tratando-se de uma Tarefa fundamental e transversal,
em nosso entender deveria haver uma definição mais clara de funções e responsabilidades.
A distribuição específica das responsabilidades em cada macroprocesso está descrita nos
documentos da Estratégia. A comparação entre o PNDFCI e a Estratégia do PNGIFR é
elucidativa. Como se pode verificar também aqui, na definição geral das competências e
responsabilidades, não existe nenhuma novidade, mantendo-se o sistema distribuído em 3
organismos e 2 ministérios. Apenas se alterou a definição de DFCI (Defesa da Floresta Contra
Incêndios) por GFR (Gestão de Fogos Rurais) e de DCIF (Defesa Contra Incêndios Florestais)
por PCIR (Proteção Contra Incêndios Rurais). É claramente confusa a indicação de que o
sistema passa a ser constituído por dois pilares, a ANEPC e o ICNF, excluindo a GNR que
continua a desempenhar as mesmas funções.
As únicas alterações a registar são as da omnipresença da AGIF em todos os processos e da
separação da Gestão de Fogos Rurais da Proteção contra Incêndios Rurais, seguindo as
indicações da CTI, o que consideramos um princípio positivo. No entanto, na prática, a repartição
de competências não é clara.
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A tentativa de separação dos dois “novos” pilares é pouco clara, designadamente quando se
menciona que “o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, I.P., (ICNF) assegura a
coordenação da prevenção em solo rústico, e a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção
Civil (ANEPC) assegurará a coordenação da prevenção em solo urbano e sua envolvente. No
entanto, as técnicas de intervenção na vegetação são iguais, quer à volta dos povoados quer
numa serra remota, apenas os critérios poderão ser distintos e, quer numa situação quer noutra
não se trata de trabalho para especialistas em Proteção Civil; é trabalho para técnicos florestais
e como tal deveria estar sob a tutela do ICNF. A experiência do estabelecimento de critérios de
gestão da vegetação em torno das infraestruturas por parte da Proteção Civil revelou-se
desastrosa, como se tem visto um pouco por todo o país, devido ao desconhecimento sobre a
ecologia das espécies, sobre as boas práticas de gestão e combustíveis e sobre os custos
associados à manutenção de um modelo ideal de gestão de combustíveis. O Estudo Técnico
sobre gestão de combustíveis produzido pelo Observatório é elucidativo a este respeito.
Nesta distribuição de responsabilidades está quase ausente o papel dos Bombeiros como agente
fundamental do sistema, que não é relevado nem clarificado.
3.5 A organização territorial
O Observatório tem, desde o início dos seus trabalhos, chamado a atenção para a preocupante
questão da organização territorial. A comparação dos âmbitos territoriais de intervenção no
PNDFCI e no documento de Estratégia do PNGIFR é apresentada no quadro seguinte.
PNDFCI 2006 - 2018 PNGIFR 2020-2030
ÂMBITO TERRITORIAL DE INTERVENÇÃO
«Todas as alterações radicais já enunciadas e as
melhorias incrementais que se explicitam no
presente plano têm como base uma
responsabilização, cada vez mais intensa, de todos
os patamares de poder político de âmbito municipal,
distrital (ou regional) e nacional.»
«O Plano propõe um apuramento regional do programa
de ação, concretização gradual e sem ruturas de
funcionamento do sistema que passa pela
implementação faseada de acordo com uma
identificação dos processos prioritários e recorre,
sempre que desejável e possível, a pilotos e programas
ad-hoc, proporcionando uma implementação validada e
sustentável.»
Nacional Nacional
- 5 Regiões (Algarve, Alentejo, Centro, Lisboa e Norte)
18 Distritos 23 Territórios intermunicipais (Comunidades
Intermunicipais e Áreas Metropolitanas)
II SÉRIE-E — NÚMERO 14________________________________________________________________________________________________________
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278 Municípios 278 Municípios
Nota: «Todas as alterações radicais já enunciadas e
as melhorias incrementais que se explicitam no
presente plano têm como base uma
responsabilização, cada vez mais intensa, de todos
os patamares de poder político de âmbito municipal,
distrital (ou regional) e nacional»
Nota: o SGIFR organiza-se territorialmente nas
unidades territoriais NUTSII e NUTSIII, o que exige o
desenvolvimento de mecanismos de articulação
institucionais alinhados com esta organização territorial.
(…) «Os dispositivos de resposta aos incêndios foram
organizados em torno de uma hierarquia com três níveis
(nacional, distrital e municipal), mas isso não teve igual
tradução nos outros domínios, como o planeamento
e a prevenção. As competências estão bastante
dispersas entre a administração central do Estado, os
municípios, e organizações não-governamentais que se
afirmaram como relevantes partes interessadas, o que
exige uma fortíssima cooperação horizontal e vertical,
em todos os domínios de intervenção para lá do combate
aos incêndios.»
«De relevar ainda que a implementação do sistema
requer necessariamente o comprometimento das
Autarquias em especial nas atividades de
prevenção, fomentando a autoproteção de povoações e
pessoas e promovendo a responsabilidade de cada
cidadão e de cada proprietário.»
Da comparação efetuada conclui-se que a Estratégia do PNGIFR aumenta a dispersão do
planeamento por mais níveis, abdicando do nível intermédio distrital para o substituir por dois
níveis, o regional e o supramunicipal. A dispersão do planeamento e da responsabilidade dos
atores nos diversos níveis propostos, em particular ao nível da NUTS II e III, é preocupante tal
como descrito no Estudo Técnico do Observatório sobre “O planeamento da Defesa da Floresta
Contra Incêndios (DFCI)”: “estas unidades geográficas não estão pensadas na perspetiva dos
incêndios rurais, nem na otimização da distribuição dos recursos e meios, quer de prevenção
quer de combate.”. Por outro lado, o âmbito supramunicipal do sistema proposto é igualmente
suportado por municípios associados (pelas Comunidades Intermunicipais e Áreas
Metropolitanas), o que incrementa uma excessiva responsabilidade da operacionalidade dos
anunciados programas de execução, com os consequentes custos associados sobre os
municípios quer à escala local quer à escala supramunicipal.
Destaca-se ainda que a CTI, nas recomendações para o Pilar da Prevenção Estrutural, no Anexo
9 do Relatório de Outubro de 2017, refere que: «A Autoridade Florestal Nacional deve, nos
termos do novo PNGIFR, dispor de recursos técnicos e materiais, exclusivamente dirigidos para
a Defesa da Floresta Contra Incêndios, de forma permanente, coordenados por uma Unidade
Nacional de GIFR como determinado no atual PNDFCI, e por Distrito organizados em equipas
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técnicas de operações de Prevenção e Apoio ao Combate.».
Esta organização territorial também não entra em linha de conta com outros instrumentos de
ordenamento florestal, nomeadamente os Programas Regionais de Ordenamento Florestal,
inclusive não atendendo à decisão do Conselho de Ministros extraordinário de 14 de julho de
2018, dedicado a uma nova orientação estratégica para o ordenamento florestal, que pretende
reduzir o número médio de ignições e de área ardida anual: «Esta resolução visa concretizar
uma nova orientação estratégica para o ordenamento florestal, a qual assenta na redefinição do
âmbito territorial dos Programas Regionais de Ordenamento Florestal. É estabelecido o
enquadramento político da criação de uma 2.ª geração de PROFs, que se traduzirá numa
passagem de 21 para 7 Programas, tendo em vista promover ganhos de eficiência na sua
implementação e a redução da complexidade administrativa para todos os agentes nela
envolvidos.»
O Observatório recomenda uma melhor apreciação da organização territorial das entidades
envolvidas no sistema, de acordo com as recomendações já feitas em anteriores relatórios.
3.6 Metas e indicadores
As metas e indicadores anunciados não parecem ter tido por base nem um diagnóstico nem a
perspetiva de cenários futuros, quer derivados do quadro de mudanças climáticas quer do quadro
sociodemográfico previsto para a próxima década. Segundo o Banco Mundial, a população rural
portuguesa poderá atingir em 2030 cerca de 25% do total da população, com as inerentes
consequências sobre o uso e ocupação do solo. Por outro lado, não foram considerados os
relatórios de monitorização do PNDFCI, os quais são totalmente ignorados no PNGIFR, bem
como não foi tido em linha de conta o estabelecido na Estratégia Nacional para as Florestas,
atualizada e aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 6-B/2015, de 4 de fevereiro,
onde consta o seguinte: «O número de ocorrências, médio anual, na última década, oscilou em
torno dos 25 000, não sendo possível verificar tendências de melhoria ou agravamento
relativamente à eclosão de incêndios ou fogachos, o que contraria a perceção dum aumento
deste fenómeno. Depois dos anos 2003 e 2005, em que arderam grandes extensões de floresta
(respetivamente 425.726 ha e 338.262 ha), as áreas ardidas anuais tiveram em três anos
consecutivos valores inferiores a 100 000 hectares, cumprindo a meta estabelecida no PNDFCI
para 2012. Porém, em 2010 e 2012 os incêndios voltaram a percorrer áreas semelhantes às de
2001 e 2002, da ordem dos 120 000 hectares. Estes dados revelam não haver correlação entre
as ocorrências e a área ardida.». E recomenda a Estratégia Nacional para as Florestas:
«Independentemente das conclusões da avaliação intercalar do PNDFCI, que está em curso,
recomenda-se que as medidas essenciais preconizadas, por manterem atualidade, devam
continuar a ser seguidas, garantindo, em particular, o pleno funcionamento das estruturas
orgânicas criadas para o desenvolvimento harmonioso do próprio plano.»
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PNDFCI 2006 - 2018 PNGIFR 2020-2030
METAS E INDICADORES
«As linhas programáticas atrás identificadas são,
em resumo, a estrutura de uma ação concertada
para vencermos o grave problema de segurança
interna que são os incêndios florestais. Ao mesmo
tempo que fazemos cumprir o nosso objetivo de
reduzirmos a área ardida a menos de 100 mil
hectares/ano em 2012.
Assentes os objetivos de médio prazo, importa
perspectivar o desenvolvimento do Plano para além
de 2012. Independentemente das mudanças que se
vierem a verificar, no campo institucional,
programático, económico e informacional, não
deixamos de ter presente que é objetivo em 2018
verificar-se uma área ardida anual inferior a 0,8% da
superfície florestal constituída por povoamentos.
Ao mesmo tempo se verificará a consolidação dos
diversos sistemas de prevenção, vigilância, deteção
e combate o que nos permitirá reduzir, até 2018, para
menos de 75 o número de incêndios ativos com
duração superior a 24 horas.
As mudanças estruturais que se vão fazer sentir até
2018, ao nível da instrução de novos métodos de
organização ao nível da 1ª intervenção e combate
fazem antever a possibilidade de serem
conseguidos os objetivos propostos de diminuir
para menos de 0,5% o número de reacendimentos.»
«A governança do SGIFR manifesta-se ainda
através de uma cultura de avaliação, assente
num sistema de indicadores e metas, ambiciosas,
mas realistas, que norteiam a ação na
concretização dos objetivos fixados.»
(…)
«Recorda-se ainda o compromisso de
neutralidade carbónica assumido por Portugal
para o ano 2050. Para que tal aconteça, a
capacidade de sumidouro carbónico do país terá
que crescer até às 13 Mton/ano, valor que implica
uma redução da área anualmente ardida em
fogos rurais para metade.»
«Reduzir o número de ignições em dias com
severidade meteorológica elevada DSR>15 ou
superior, que pela sua tipologia, local e altura em
que ocorrem apresentam maior risco.»
Quanto às Metas por Orientação Estratégica,
apesar de não se encontrarem indicadas no
PNGIFR, estas surgem no documento de
apresentação pública:
Total de incêndios com área superior a
500 hectares fixar-se em 0,3%
Área ardida < 600 mil em 11 anos
Menos 80 % de ignições em dias de elevado risco
de incêndio
Deve registar-se como muito positiva a consideração do fator meteorológico na definição das
metas e indicadores. Recomenda-se que esta abordagem seja estendida a mais metas e
indicadores.
A definição de metas é sempre um exercício difícil porque se pretende sempre ser ambicioso,
mas colocar a fasquia demasiado alta pode ser contraproducente. A dependência do fator
meteorológico deve ser reconhecida e usada nos indicadores.
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3.7 Formação e Qualificação
A importância da formação e qualificação de todos agentes envolvidos no SGIFR tem sido por
várias vezes indicada tanto pelas Comissões Técnicas Independentes como por este
Observatório.
A importância da ciência e do conhecimento é, neste contexto, essencial para a formação,
estando quase completamente ausente na Estratégia.
O documento da Estratégia começa por dar uma mensagem errada da formação ao referir que
a óbvia necessidade de aumentar a competência dos agentes passa pelas entidades e não por
uma mudança de sistema, indicando que “cada entidade tem de investir na formação dos seus
recursos humanos...”. Na verdade, a mudança de paradigma no que toca à formação tem que
ser pela via da alteração do sistema de credenciação de competências e não dispersando a
responsabilidade para cima de cada uma das entidades.
A qualificação dos agentes é detalhada no documento, onde é apresentada como um dos três
fatores capacitadores da Cadeia de Valor (Governança, Qualificação e Sistemas de Informação
e Comunicação). Apesar de se saudar a importância dada à formação, o documento fica pela
declaração de boas intenções, com as quais todos concordamos. No entanto, fica a dúvida
relativamente ao organismo que irá dirigir o processo de harmonização dos perfis profissionais,
que, tal como refere o primeiro relatório da CTI, deveria ser a própria AGIF.
Neste aspeto, é positiva a criação de um Programa de Qualificação do SGIFR que alcance todas
as funções do sistema, o que está em consonância com a proposta feita pelo Observatório na
“Avaliação do sistema nacional de proteção civil no âmbito dos incêndios rurais” de criação
urgente de um Programa Nacional de formação específica para a gestão integrada de fogos
rurais. A operacionalização deste Plano, a descrever em documento autónomo a publicar, suscita
algumas dúvidas, nomeadamente por ser omisso sobre a necessidade de um mecanismo de
supervisão, ou seja, de um sistema universal de verificação das reais competências dos agentes
credenciados.
No documento sobre a cadeia de valor não existe, tal como é reconhecido na Estratégia, uma
incorporação do Plano de Qualificação o qual será detalhado em documento autónomo a publicar
futuramente, fazendo-se apenas pequenas referências pontuais. Apesar de não haver grande
desenvolvimento sobre os requisitos de formação que se preveem para os agentes do sistema,
parece continuar a apostar-se no generalista e não na especialização. No entanto, toda a técnica
e toda a ciência associado ao comportamento e ao combate ao fogo em vegetação implica um
nível de conhecimento aprofundado e que nada tem a ver com o conhecimento associado ao
comportamento e ao combate a incêndios estruturais.
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4 Síntese conclusiva
Ao longo do texto deste relatório fazem-se diversas considerações, críticas e recomendações
específicas que o Observatório considera de utilidade para a reformulação da Estratégia e para
o Programa de Ação que se lhe segue.
No entanto, importa agora proceder a alguma síntese das principais considerações que os
documentos em análise nos suscitam. Assim:
a) Importa clarificar que os documentos em análise constituem a Estratégia do Plano
Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (PNGIFR) mas não o Plano em si, que só
poderá ser analisado em rigor com os documentos que o concretizam, os Programas de
Ação Nacional e Regionais, previstos para o terceiro trimestre de 2020;
b) O Observatório não pode deixar de considerar como muito preocupante que só agora, no
início de 2020, se coloque à discussão pública a primeira parte, da Estratégia, de um Plano
de Gestão Integrada de Fogos Rurais que deveria ter sido aprovado, na sua totalidade,
em abril de 2018. Cobrindo o anterior Plano de Defesa da Floresta Contra Incêndios o
período 2006-2018 não é compreensível um hiato de 2 anos entre os dois Planos, numa
matéria tão relevante como a dos Incêndios Florestais e Rurais;
c) O Observatório não pode deixar de apreciar positivamente o relevo dado na Estratégia à
importância da avaliação como condição para a melhoria dos sistemas, mas não pode,
por isso mesmo, deixar de criticar a falta de avaliação do PNDFCI e de diagnóstico
aprofundado como base para a construção do novo PNGIFR, como também a não
consideração dos previsíveis cenários de mudanças climáticas e sociodemográficas;
d) O Observatório recomenda que, na reformulação da Estratégia, sejam consideradas,
integradas, ou sugeridas correções às disposições contidas em legislação importante,
nomeadamente a referente à Estratégia Nacional para as Florestas ou nos Programas
Regionais de Ordenamento Florestal;
e) O Observatório recomenda que, na reformulação da Estratégia e no desenvolvimento dos
Programas de Ação sejam consultadas muitas outras fontes relevantes, entre as quais as
Notas Técnicas, Estudos Técnicos e Relatórios produzidos por este Observatório desde o
seu início em 2018 até hoje;
f) O Observatório recomenda que seja dada especial atenção no PNGIFR às questões
associadas aos orçamentos e despesas associadas ao sistema com vista a uma adequada
relação custos-benefícios, em especial após o anúncio do significativo reforço de verbas
para o sistema;
g) O Observatório reitera a importância que continua a dar ao potencial papel da AGIF no
sistema, devendo esta evoluir para uma formulação de interagência de modo a melhor
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aproximar os agentes e contribuir para o reforço dos pilares do sistema;
h) O Observatório recomenda a clarificação do papel dos Sapadores Florestais e da nova
força anunciada para o ICNF dentro do sistema;
i) O Observatório não pode deixar de considerar o pouco relevo dado nesta Estratégia à
clarificação do papel dos Bombeiros como estrutura fundamental de todo o sistema;
j) Finalmente, o Observatório reitera a importância fundamental da adequada consideração
da necessidade de formação e qualificação de todos os agentes envolvidos no SGIFR,
devendo para isso a AGIF desempenhar um papel fundamental na certificação e
acreditação dessa formação.
Documentos de suporte recomendados
O Observatório produziu, desde outubro de 2018 até esta altura, um conjunto de Notas
Informativas, Relatórios e Estudos Técnicos cuja leitura se recomenda de modo a que possam
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servir de suporte ao desenvolvimento da Estratégia e do Programa de Ação do PNGIFR:
Notas Informativas
Data Assunto
Outubro 2018 Coerência territorial do sistema
Outubro 2018 Apreciação da Resolução do CM de 25/10/2018
Dezembro 2018 Recomendações sobre os Planos Regionais de Ordenamento Florestal
Fevereiro 2019 Planos Regionais de Ordenamento Florestal
Março 2019 Apreciação da Resolução do CM 12/2019 sobre missão do SGIFR
Abril 2019 Análise das leis orgânicas do ICNF e da ANEPC
Junho 2019 Análise do DECIR 2019
Relatórios
Data Assunto
Dezembro 2018 Avaliação do Sistema Nacional de Proteção Civil no âmbito dos Incêndios Rurais
Maio 2019 Avaliação do Incêndio de Monchique
Janeiro 2020 Avaliação do Incêndio de Vila de Rei – Mação
Estudos técnicos
Data Assunto
Outubro 2019 Estabilização de Emergência Pós-fogo
Novembro 2019 A valorização da primeira intervenção no combate a incêndios rurais
Dezembro 2019 O planeamento da Defesa da Floresta Contra Incêndios
Dezembro 2019 Racionalizar a gestão de combustíveis: uma síntese do conhecimento atual
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A DIVISÃO DE REDAÇÃO.