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Terça-feira, 24 de Novembro de 1998 II Série-C - GOP-OE - Número 2
VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)
COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO
Reunião de 23 de Novembro de 1998
S U M Á R I O
Pelas 10 horas e 30 minutos, a Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite) deu início à continuação do debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 210/VII - Grandes Opções do Plano para 1999 e 211/VII - Orçamento do Estado para 1999.
Sobre o orçamento do Ministério da Saúde intervieram, além da Sr.ª Ministra (Maria de Belém Roseira), do Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos) e da Sr.ª Presidente, os Srs. Deputados Paulo Mendo (PSD), Nelson Baltazar (PS), Bernardino Soares (PCP), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Jorge Roque Cunha (PSD), José Alberto Marques (PS), João Corregedor da Fonseca (PCP), Moura e Silva (CDS-PP), Bernardino Vasconcelos (PSD), João Rui de Almeida (PS), Duarte
Pacheco e Manuel Moreira (PSD) e Casimiro Ramos (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Economia intervieram, além do Sr. Ministro (Pina Moura) e dos Srs. Secretários de Estado da Indústria e Energia (Fernando Pacheco), Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Ramalho) e do Comércio (Osvaldo Castro), os Srs. Deputados Francisco Valente (PS), Hugo Velosa (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Luís Queiró (CDS-PP) e Carvalho Martins e Carlos Duarte (PSD).
Sobre o orçamento da Presidência do Conselho de Ministros intervieram o Sr. Secretário de Estado (Vitalino Canas) e o Sr. Deputado Rui Carreteiro (PS).
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 35 minutos.
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A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, vamos dar início à reunião conjunta das Comissões de Economia, Finanças e Plano e da Saúde para discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Saúde, com a presença da Sr.ª Ministra e do Sr. Secretário de Estado da Saúde.
Julgo que será dispensável qualquer exposição prévia por parte da Sr.ª Ministra, uma vez que isso já verificou tanto na Comissão de Saúde como na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Portanto, peço aos Srs. Deputados que queiram inscrever-se para perguntas sobre o orçamento do Ministério da Saúde que o façam.
Antes de iniciarmos, quero aproveitar para fazer uma sugestão aos Srs. Deputados, que tem a ver com o seguinte: a despeito de estarmos em comissão, penso que as regras que funcionam para o Plenário deveriam verificar-se aqui também, tendo uma delas a ver com o não fumar e outra com os telemóveis.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas pode-se tomar Nimed?!...
Risos.
A Sr.ª Presidente: - Isso já é um problema seu e do seu médico!
O não fumar aqui tem apenas a ver com a preservação do local onde nos encontramos, motivo pelo qual durante o Plenário também não é permitido fumar. A Sr.ª Ministra, no entanto, pede para eu juntar, além da preservação do local, a preservação da saúde, que é realmente matéria que lhe compete defender.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mendo.
O Sr. Paulo Mendo (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, não vou propriamente fazer já uma análise detalhada do orçamento sob o ponto de vista, chamemos-lhe assim, processual. Antes disso, gostava de, sobre ele, tecer algumas considerações de ordem política, porque me parece que são estes o sítio e altura ideais para fazê-lo.
Em 1995, deixei, ou melhor, deixámos, como sabe, no Ministério, no fim da nossa permanência no governo, um défice de 67 milhões de contos e uma proposta de financiamento, que era, como sempre disse enquanto estive no governo e aqui mesmo no Parlamento, um problema essencial de resolução política, e considero que ainda é.
A constituição e a correlação de forças políticas têm vindo, desde há bastante tempo, a condicionar uma forma de orçamentação e de financiamento que é francamente má e, nos últimos anos, com a publicação da Lei de Bases da Saúde e do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, começaram a reunir-se condições que tornam possível uma discussão alargada e uma decisão de modificação do orçamento da saúde. Por isso, em 1995, precisamente em 7 de Abril, apresentámos uma proposta, elaborada por técnicos economistas, para uma discussão sobre o financiamento da saúde.
Consideramos que este problema é essencial na política de saúde em Portugal e nisso estamos, como sabem, acompanhados, por exemplo, pelo órgão talvez mais importante neste aspecto, que é o Tribunal de Contas, que, na auditoria ao Serviço Nacional de Saúde, de 1994 a 1996, portanto, precisamente na altura em que estivemos no Governo, diz nas suas conclusões gerais, o seguinte: "O método utilizado para a elaboração do orçamento financeiro perverte a lógica orçamental, dado que as orientações dadas às instituições financiadas pelo Serviço Nacional de Saúde para a elaboração do seu orçamento financeiro são no sentido de o equilibrar, de acordo com a verba do financiamento que lhes é atribuída, não tendo em atenção as reais necessidades expressas nos orçamentos económicos".
Mais abaixo, diz também: "Estas deficiências verificadas no processo de orçamentação originam que o orçamento financeiro elaborado para cada instituição não reflicta as necessidades reais, antes, porém, forçando o ajustamento formal das necessidades aos recursos atribuídos pelo orçamento".
E mais adiante, nas suas conclusões, diz ainda: "O financiamento do Serviço Nacional de Saúde, obedecendo ao modelo tal qual vigora e tendo em conta as insuficiências que o caracterizam, deve urgentemente ser repensado, aferindo com rigor a capacidade de sustentação do modelo de financiamento exclusivamente público e ponderando devidamente as decisões que visem a alteração dos modelos de gestão pública, salvaguardando, a todo o custo, que não sejam lesados os interesses dos cidadãos.
Esta posição, anunciada no início de 1996, foi motivada, entre outras coisas, pela verificação que o Tribunal de Contas fez de que a situação deixada nessa altura, em que a primeira regularização de 1995 das dívidas ocasionou uma intensa redução dos passivos acumulados, foi ao encontro dos objectivos responsáveis.
Mas diz a seguir: "O segundo processo, em 1996, prosseguindo a mesma linha de intenções, não conseguiu já esse objectivo, na medida em que apenas possibilitou a liquidação de débitos. E, à data de 30 de Setembro de 1996, observa-se já um montante de débitos que ultrapassa em 13,6% os valores verificados em 31 de Dezembro de 1995".
Quer dizer: o próprio Tribunal de Contas verifica que a forma de modificação de financiamento da saúde é um problema urgente, que a forma como está a ser orçamentada a saúde é uma forma perfeitamente perversa e que, por muito que a gente vá pagando os défices num ano, eles têm tendência imediata a surgir no ano seguinte.
Este para mim, Sr.ª Ministra, é o problema político mais importante da saúde e é um problema que tem de ser resolvido por nós políticos, mas, no entanto - custa-me dizê-lo, mas é esta a minha confissão -, não avançou um passo durante estes três anos.
Desde 1996, oscilamos entre afirmações de VV. Ex.as de que iriam fazer muito melhor com o mesmo orçamento, portanto aproveitando os orçamentos tidos e disso retirando muito maior rendimento, e a afirmação de que gastaram muito mais porque fizeram muito melhor. Esta posição, que balanceia entre estas duas situações, traduz uma coisa que é grave, que é o desaparecimento do espírito de uma política de saúde e a introdução, consensual e permanente, de uma política administrativa. Estamos a administrar a penúria, não estamos a lançar e a discutir a política de saúde do País.
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Sabemos, Sr.ª Ministra, que a percentagem que o Orçamento do Estado concede à saúde - e aqui já vale a noção de percentagem - é menor do que a que os países com muito mais dinheiro consagram a esta mesma área. Quer dizer: países mais ricos, que, naturalmente, deviam consagrar uma percentagem muito mais pequena do seu orçamento, mesmo assim gastam na saúde em percentagem, que não em quantitativo, mais do que nós. Em quantitativo, gastam muito mais. Enquanto aqui se mede por uns valores que oscilam entre dois ou três números percentuais, em quantitativo é o dobro, é o triplo, é o quíntuplo. E, no entanto, vivemos num país em que o que garantimos e o que queremos garantir ao cidadão é rigorosamente o mesmo que garante a sociedade alemã, a sociedade francesa ou a sociedade inglesa.
O Orçamento do Estado português vai consagrar este ano cerca de 100 000$/ano/pessoa, mas sabemos que a nossa vizinha Espanha já consagra mais 40% do que isto; que a França consagra duas vezes e meia; que toda a Europa consagra cerca do dobro; e que os Estados Unidos da América, nem se fala, consagram quatro vezes mais.
O orçamento deste ano, como verificamos, segue rigorosamente a mesma linha e a mesma metodologia, com os mesmos defeitos estruturais de todos os anteriores. O futuro dele é, evidentemente, gerar défices. Vai provocar, na mesma, a continuação de uma gestão angustiada pela penúria - eu que o diga, a Sr.ª Ministra que o diga, porque estivemos muito tempo a tentar fazer flores desta penúria; vai provocar no Gabinete de V. Ex.ª e do Sr. Secretário de Estado da Saúde uma inglória e desgastante actividade de sobrevivência; e, sobretudo - e é para isto que gostava de alertar -, vai provocar e está a provocar a morte da política de saúde, que é transformada, assim, numa administração dos recursos insuficientes.
O conter o défice, tarefa, quanto a mim, impossível, torna-se o objectivo central de uma política, aliás anunciada como vitória ao dizer-se que o défice está a diminuir, que substitui a verdadeira política.
Quais são os problemas políticos? Lembro - porque sei muito bem que os Srs. Governantes também sabem isso - que o nosso atraso, em relação aos outros países, está a ser dramaticamente aumentado. Nós quase já só pensamos em hospitais e centros de saúde, em manutenção, pelo menos com alguma suficiência, dos cuidados médicos imediatos. Não temos um único centro para tratamento de uma das maiores e, provavelmente, das mais importantes áreas médicas, até de investigação, do mundo actual, que são os traumatismos vértebro-medulares; não tratamos, não sabemos seguir e não fazemos qualquer forma de manutenção séria aos nossos doentes neuromusculares; não conseguimos desenvolver a nossa medicina escolar; não desenvolvemos a nossa medicina desportiva; não desenvolvemos, o que é mais grave ainda, a nossa medicina de saúde pública, cuja integração nacional continua à espera; continuamos a não ter uma rede de internamento de cuidados continuados; não sabemos, nem sabemos tratar, o que são cuidados terminais; não temos, nem podemos ter porque não temos dinheiro, uma política de saúde, fazemos apenas uma tentativa de contenção de custos. E, nessa contenção de custos - e voltamos ao problema inicial de, sem política, continuarmos a viver sempre em défice -, é impossível termos sucesso, enquanto os orçamentos de saúde se fizerem como se fazem.
A Sr.ª Ministra sabe muito bem que estamos numa área em que quanto menos trabalho menos custos, o que significa que se um hospital não trabalhar é um hospital que não apresenta défices. Estamos num ambiente de tal modo pervertido - desculpem-me o termo, mas nisto sou muito radical - que uma greve, para mim, asquerosa que é feita actualmente neste país torna-se útil para o Orçamento do Estado. Isto é a perversão completa de uma situação social de qualquer país.
A não aceitação dos orçamentos económicos e a sua transformação em orçamentos financeiros deficitários está positivamente a matar a política de saúde neste país.
Eu podia mostrar que, em 1996 e em 1998, de cada vez que tocamos neste aspecto a posição do Governo é mais longínqua. Em 1996, grande parte dos problemas que agora estou a abordar constavam das Grandes Opções do Plano e, na discussão do Orçamento do Estado para 1997, de acordo com o que foi publicado, diz-se, na página 58, que o problema do financiamento vai ter solução, a qual está em curso, na página 66, que o funcionamento dos hospitais vai ter auditorias externas, na página 68, que as unidades de saúde vão passar a ter muito mais autonomia e assessoria dos médicos com mais de 50 anos, na página 88, que a natureza jurídica dos hospitais vai ser anunciada.
Diz-se, também, que os seguros de saúde vão ter uma solução em 1997 e que vamos fazer com que os seguros e os subsistemas paguem a curto prazo. Diz-se e afirma-se aqui, pela voz do Sr. Secretário de Estado, que o défice se manterá para 1998 igual ao défice de 1996, que era de 106 milhões de contos. Diz-se e repete-se que os medicamentos aumentarão 7% em 1997, mas afinal, aumentaram 12,1%.
Diz-se, cada vez mais, que os Hospitais de S. João e de Santa Maria, que são as duas grandes unidades que espelham a medicina portuguesa, estão cada vez mais degradados. Em 1996, o respectivo plano de intervenção genérica ainda era admitido, agora, já não se fala nele ou fala-se a custo, dotando-o, este ano, se não me engano, de 200 000 contos.
Isto significa, Sr.ª Ministra, que este orçamento não é mais do que um passeio pela penúria, uma tentativa mais ou menos heróica de o Governo tentar mostrar que com este dinheiro vai resolver os problemas da saúde portuguesa, mas o que vai suceder é que, daqui um ano, provavelmente - aliás, como eu disse o ano passado ao Sr. Secretário de Estado Arcos dos Reis -, será talvez outro secretário de Estado a vir aqui proferir que o que afirma este ano não pode ser mantido no ano seguinte.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde, para responder.
A Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém Roseira): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Mendo, eu iria responder à sua intervenção e pedir, desde já, licença à Sr.ª Presidente para o Sr. Secretário de Estado da Saúde acrescentar algumas informações.
Gostaria de começar por dizer que, efectivamente, quando, em 30 ou 31 de Março deste ano, o Governo apresentou à Assembleia da República as reformas estruturais para alguns sectores, designadamente para o da saúde, o
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financiamento da saúde apareceu como sendo uma das grandes preocupações, cuja resolução devia ser objecto de uma tentativa de consenso alargado. O Sr. Deputado sabe que todos os líderes da oposição foram contactados pelo Sr. Primeiro-Ministro; o PSD respondeu, na altura, que apenas estaria disponível para trabalhar connosco medidas concretas e não para discutir a questão da reforma da saúde; o CDS-PP, para se pronunciar, pretendeu obter alguns esclarecimentos em relação àquilo que poderia ser a proposta do Governo no respeitante a esta matéria e o PCP considerou-se disponível para discutir com o Governo essas propostas.
Esse documento visava, efectivamente, afirmar aquilo que penso ser indiscutível - ainda não tivemos qualquer manifestação em contrário das bancadas -, ou seja, que o sistema de saúde assenta em princípios e valores que são inerentes à nossa cultura e, como tal, devem ser preservados e defendidos.
Neste documento apontavam-se nove objectivos a alcançar - aliás, penso que a maioria deles cruza-se com as preocupações que o Sr. Deputado expandiu. O primeiro objectivo era reorientar todo o sector para a obtenção de ganhos em saúde, tornar o sistema mais sensível aos direitos e aos deveres dos cidadãos, embora fundamentalmente aos direitos, e aperfeiçoar o seu financiamento, designadamente através da redução de duplicações de cobertura. Todos sabemos que temos um problema específico que deriva da existência, ou coexistência, de subsistemas de saúde que as pessoas utilizam em função das suas necessidades ou conveniências sem haver uma identificação muito clara da sobrecobertura e dos desperdícios que tudo isto determina. Referiam-se, também, outros aspectos, como a melhoria da eficiência distributiva na aplicação de recursos financeiros através da separação financiador/prestador, a questão da qualidade, as remunerações associadas ao desempenho, a melhoria do acesso e da interligação entre prestados e a regulação do sistema com coordenação entre os sectores público, privado e social.
Em relação a todas estas questões, o Ministério da Saúde avançou inequivocamente com um conjunto de medidas coerentes com os objectivos identificados, não tendo sido qualquer deles considerado inadequado. Desde logo, a estratégia, que identifica um conjunto de acções prioritárias independentemente daquilo que é a acção normal, a carta dos direitos e deveres do doente, o progressivo apelo à participação dos doentes e das associações de doentes num conjunto de aspectos e a questão da progressiva informatização, desde o cartão de utente aos Programas SINUS (Sistema de Informação Nacional Unidades de Saúde) e SONHO (Sistema Integrado de Informação Gestão Hospitalar), que permitirão, progressivamente, uma melhor interligação entre as instituições.
A última legislação aprovada na Assembleia da República relativa à protecção de dados é fundamental para permitir avançarmos mais claramente em relação a alguns aspectos ligados quer aos doentes propriamente ditos quer à gestão do sistema, designadamente dos subsistemas.
Uma outra medida foi a intensificação da função de agência e o financiamento das ARS (Administrações Regionais de Saúde) em função de capitação progressiva e dos hospitais em função da produção, com uma componente maior em relação aos GDH (Grupos de Diagnóstico Homogéneos).
O Hospital da Feira tem um novo estatuto jurídico; há um trabalho adiantado em relação a centros de responsabilidade integrados como níveis de gestão intermédia nos hospitais; o Programa Moniquor, que faz parte do Sistema de Qualidade na Saúde, foi alargado aos centros de saúde e vai ser objecto de avaliação no fim deste mês; iniciou-se a remuneração experimental dos clínicos gerais e também, no âmbito dos centros de responsabilidade integrados, as remunerações ligadas à qualidade e ao desempenho. Avançámos, ainda, com as seguintes medidas: programas específicos de acesso; a rede informática da saúde e a clarificação das relações entre os vários prestadores através do diploma das convenções.
Por outro lado, em relação a algumas das afirmações do Sr. Deputado Paulo Mendo, gostaria de dizer que o facto de haver constrangimentos financeiros, que foram reconhecidos e objecto de referência expressa na intervenção do Sr. Primeiro-Ministro durante a discussão do Orçamento do Estadona generalidade e do Sr. Ministro das Finanças no âmbito do discurso de encerramento desse mesmo debate, não tem afastado o Ministério da Saúde da condução inequívoca de uma política de saúde.
Especificamente em relação a alguns dos aspectos que o Sr. Deputado Paulo Mendo referiu, queria identificar a questão da rede de internamentos de cuidados continuados, em relação à qual, como sabe, já foi assinado um despacho conjunto com o Sr. Ministro da Solidariedade que nos permite identificar aquilo que, em cuidados continuados, é responsabilidade da saúde e aquilo que é responsabilidade da segurança social. Gostaria de referir os acordos que têm sido celebrados em todo o País fundamentalmente com as misericórdias e que se prevê que aumentem no ano 1999.
Em relação, especificamente, aos cuidados terminais, para além da abertura da unidade do IPO (Instituto Português de Oncologia) do Porto, que, aliás, estava pendente no Ministério da Saúde quando o Sr. Deputado ainda era Ministro, tem havido uma intensificação de acções de formação especificamente para os cuidados paliativos.
Em relação à questão da greve, que o Sr. Deputado classifica como asquerosa e diz que vai permitir poupar dinheiro, gostaria de referir que penso que a greve não vai permitir poupar dinheiro mas, sim, permitir e agravar o sofrimento de pessoas e, obviamente, as dificuldades de acesso ao sistema de saúde, uma vez que, como sabe, a forma como tem estado a ser conduzida a greve não implica que se poupe qualquer tipo de dinheiro, a não ser, eventualmente, em material clínico nas intervenções cirúrgicas. A greve está a ser feita por forma a impedir a presença de um elemento nuclear de qualquer equipa, portanto, o Ministério da Saúde continua a sustentar a equipa na íntegra.
Não deve considerar-se que esta greve é bem vinda pelo Ministério da Saúde. Pelo contrário, é inequivocamente condenada, como, aliás, se pode concluir das medidas tomadas a esse propósito.
O Ministério da Saúde tem conduzido uma política de financiamento das instituições em que, efectivamente, a fatia do orçamento afecta em função dos GDH passou de 10% para 30% em relação aos hospitais. Portanto, apesar dos constrangimentos e de muitas limitações, há um percurso inequívoco em relação ao financiamento da produção em detrimento do consumo ou da existência das instituições.
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Em relação à dívida transitada de 1995 para 1996, aos planos e programas de intervenção específicos quer no Hospital de S. João quer no Hospital de Santa Maria e, ainda, a alguns aspectos mais específicos que o Sr. Deputado descreveu na sua intervenção, gostaria de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, a quem pedia que referisse todos os complementos que considerasse adequados.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos): - Sr.ª Presidente, antes de abordar esses aspectos específicos, gostaria de aproveitar para agradecer a intervenção do Sr. Deputado Paulo Mendo quando refere, exactamente, a questão das formas de financiamento, o baixo peso dos gastos com saúde em percentagem do PIB e, naturalmente, o valor desses gastos. Nisso estamos de acordo - aliás, as estatísticas falam por si. Ou seja, se em termos de gastos totais em saúde o nosso valor, cerca de 8%, já anda um pouco acima da média da União Europeia, em termos de gastos públicos ainda estamos abaixo dessa média.
Os gastos per capita, até mesmo quando ponderados com o poder de compra, deixam-nos bastante abaixo no ranking desses países.
De qualquer maneira, julgo que vale a pena fazer aqui dois comentários. O primeiro refere-se aos progressos que têm sido feitos - e não apenas nos últimos três anos, mas nos últimos 20 anos - no Serviço Nacional de Saúde, enquanto forma organizativa que tem vindo, cautelosa e progressivamente, a aumentar e a sustentar a utilização de recursos públicos na área da saúde. O segundo diz respeito a algo que também não podemos deixar de ter em conta, que é, generalizadamente, o problema do crescimento das despesas em saúde, por razões que o Sr. Deputado Paulo Mendo referiu, e bem. Ou seja, há áreas extremamente diferenciadas, que, hoje em dia, são provavelmente indispensáveis para o nosso nível de desenvolvimento, que custam muito dinheiro e carecem de muitos recursos.
Isto para dizer que o nosso país está, independentemente das políticas concretas de saúde que sejam seguidas, numa situação de transição, de um país em que a saúde tem características de país não desenvolvido para uma integração europeia, em que, também na saúde, quer a nível de despesas quer a nível de conteúdo do sistema, estamos claramente englobados e somos comparáveis com a situação europeia.
É uma fase em que, provavelmente, ambiguidades e problemas são inevitáveis e, a esse propósito, gostava também de fazer um comentário: quando o Sr. Deputado Paulo Mendo nos diz que estamos a transformar a discussão numa discussão meramente económico-financeira e a esquecer a política de saúde, diria, na sequência, aliás, daquilo que a Sr.ª Ministra referiu, que é exactamente isso que se tem tentado não fazer. Ou seja, o que se tem feito, nestes anos, é reforçar uma política de saúde, não deixando naturalmente de fazer todo o esforço possível para olhar a componente económico-financeira, isto é, fazer todo o esforço para controlar aquilo que é inevitável no nosso desenvolvimento, que é uma tendência para o crescimento da factura em saúde.
Nesse aspecto, permitia-me salientar alguns pontos. Há uma opção pelo Serviço Nacional de Saúde, enquanto sector estratégico e fundamental do sistema de saúde em Portugal. Isto porque, mais uma vez, e como está, aliás, no conjunto de reformas propostas a esta Casa, há uma opção estratégica que passa, de facto, por uma fortíssima intervenção do sector público, adequada à sociedade portuguesa e aprendendo com a realidade de outros países, em que a intervenção do sector público em saúde é estrategicamente necessária, quer em termos de efectividade quer em termos de eficiência. E por muito que isso fuja aos cânones de outras áreas, é essa a solução que tem provado ter melhores resultados, conjugada, naturalmente, com uma alteração profunda da administração de saúde.
Em questões como o reforço da rede de saúde pública, do aparelho de saúde pública, em que estamos a trabalhar activamente, desde os órgãos centrais até aos órgãos locais, criando e propondo centros regionais, os órgãos de saúde pública, como o Sr. Deputado Paulo Mendo disse, e bem, têm um papel essencial nesta reformulação do sistema.
À questão das agências de contratualização, ao estatuto hospitalar, enfim, a boa parte das coisas de que a Sr.ª Ministra já falou, acrescentaria apenas duas outras iniciativas legislativas recentes, que têm a ver, primeiro, com o diploma das convenções, em que se caminha, mais uma vez, para a construção de instrumentos e para a clarificação das águas, de modo a que o sistema possa progredir de forma sustentada e equilibrada, e, segundo, com a questão dos medicamentos e a legislação sobre as comparticipações, evitando transferir responsabilidades do Estado para os cidadãos e intervindo, sim, de forma a controlar o crescimento da despesa, ou seja, evitando sempre penalizar os utentes e transferir meramente verbas para os mesmos.
Quanto à questão dos Hospitais de Santa Maria e de São João, o plano global de intervenção, quer num quer noutro hospital, prossegue numa linha que é hoje inequívoca, mas queremos dar um passo mais além. Até ao final do ano, estarão praticamente prontos os planos directores de intervenção nesses hospitais. Não houve qualquer suspensão daquilo que já estava em programa, ou seja, o conjunto de intervenções que está a ser executado continua a sê-lo, mas queremos transformar planos globais de intervenção num instrumento melhor elaborado e fundamentado em planos directores que foram já lançados e estão a ser executados e que, espero, até ao final do ano, estejam prontos, para permitir continuar aquilo que está a ser feito e, eventualmente, dar um passo em frente numa intervenção mais profunda. Exactamente nessa perspectiva que o Sr. Deputado Paulo Mendo deixou entender, trata-se de dois hospitais, que, apesar de provavelmente ser um exagero chamar-lhes as "jóias da Coroa", são demasiado importantes para se poder continuar a admitir intervenções avulsas, por vezes de uma forma não completamente articulada.
Quanto à questão do défice deixado pelo governo do PSD, o montante global, em 1995, era de cerca de 112 milhões de contos, e, por muitas voltas que se dê a esse número, esse é, de facto, o valor que consta das contas e que é mais ou menos incontornável.
Não sei se deixei alguma questão por responder, mas, se o fiz, provavelmente terei oportunidade de voltar a ela mais tarde.
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A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mendo.
O Sr. Paulo Mendo (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Secretário de Estado, a sua resposta foi aquela que esperava. Porém, continuo a achar que um dos problemas fundamentais, o que foi expresso pelo Tribunal de Contas, não obteve qualquer resposta e essa foi uma pergunta que fiz. Esse relatório, que foi entregue ao Ministério, resulta de uma auditoria ao Serviço Nacional de Saúde feita pelo Tribunal de Contas, onde tinha estado, como presidente, o actual Ministro das Finanças. O Tribunal de Contas, nas suas conclusões gerais, diz especificamente que é urgente a modificação do tipo de orçamentação da saúde. No entanto, não me foi dada qualquer resposta relativamente a isso. Verifico que estamos no fim de uma legislatura e que o discurso de VV. Ex.as se tem repetido. Tive o cuidado de ler as discussões relativas ao Orçamentos do Estado para 1996, 1997 e 1998 e, sistematicamente, as afirmações de VV. Ex.as são idênticas: "Vamos fazer", "Está quase a ser feito", "Vamos mudar"… E, por exemplo, o plano de intervenção nos dois grandes hospitais foi, no Hospital de Santa Maria, aprovado publicamente, com a presença de todos os membros do Conselho de Administração, um plano feito por eles, a que foi atribuído 1 milhão de contos/ano, para poderem fazer modificações urgentes naquela instituição. Porém, no fim da legislatura, vêm dizer que aquilo foi revisto, que está a ser feito e que talvez venha a ser melhor do que no passado. Da primeira vez, ainda acreditámos, mas, no fim de uma legislatura, é uma profunda desilusão, Sr. Secretário de Estado.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Mendo, quero só dar-lhe um esclarecimento relativamente ao que disse acerca do Hospital de Santa Maria.
Quando digo que vamos avançar para um plano director, isso não põe em causa aquilo que está a ser feito, como sejam - e digo-o de memória - obras no serviço de urgência, uma nova obra para o serviço de pediatria, que está a meio, adjudicação de intervenções no serviço de medicina, adjudicado há poucos meses, e radiologia. Ou seja, aquilo que do PGI não merece contestação e que estava a ser feito, continua a sê-lo, e foram lançadas novas obras há alguns meses. Agora, em termos da tal intervenção global no hospital, aí é que nos pareceu valer a pena introduzir uma nova reflexão e elaborar um plano director, para que pudéssemos fazer uma intervenção ainda mais concertada no hospital. Mas isto não põe em causa aquilo que estava a ser feito onde não há dúvidas de que é urgente fazer-se. Portanto, essas intervenções continuam, hoje, a ser feitas.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.
O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado: É com alguma satisfação que vejo que, nesta discussão do Orçamento do Estado, na especialidade, se tende finalmente a regressar a uma discussão sobre as políticas da saúde.
Quero salientar o esforço que está a ser feito nesse sentido, na medida em que, cada vez mais, é necessário conseguirmos enquadrar alguns aspectos da política de saúde, discuti-los aqui e, eventualmente, avaliá-los de uma forma serena e calma.
Gostaria de dizer que, apesar de tudo, apesar desta discussão, aparecem aqui algumas coisas no meio… No entanto, vou iniciar a minha intervenção nesta perspectiva das grandes linhas das políticas de saúde e, concretamente, da política de saúde que efectivamente tem sido seguida…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso foi o que já disseram no ano passado e há dois anos!
O Orador: - … e que, com alguma coerência, também foi discutida nesses Orçamentos, tal como o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha acabou de dizer, no ano passado e há dois anos. Isso significa que temos uma política de saúde no terreno, que existe uma coerência no terreno e que já temos algumas coisas feitas.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Têm, têm!…
O Orador: - Relativamente às questões do controlo financeiro e dos vectores de financiamento, que têm sido aqui debatidas com algum interesse, devo dizer que, hoje, existe, ao nível da política de saúde, da existente e da que está proposta, concretamente no plano do SNS XXI, uma direcção política nacional sobre as grandes linhas estratégicas para os problemas de financiamento. E essa direcção política nacional infere fundamentalmente quatro vectores, que importa aqui salientar. O primeiro é o aperfeiçoamento do modelo de financiamento, limitando o universo dos utilizadores e a própria interacção entre os subsistemas e os sistemas que interferem no SNS. Outra questão importante é o reforço das competências das ARS. Naturalmente, através desta via e das agências de acompanhamento e contratualização, é possível obter regionalmente mais acções e intervenções neste aspecto, de forma a controlar melhor a aplicação do esforço financeiro feito na saúde, e também a separação clara, cada vez mais clara, entre o prestador e o pagador. Esta forma tem sido conseguida, está no terreno, e naturalmente vai trazer alguns benefícios sendo este também um dos vectores importantes.
Outro vector que também consideramos extremamente importante, sobre o qual já falámos aqui e que já está no terreno com um peso suficientemente aceitável, é a atribuição dos orçamentos a cada uma das unidades de saúde através dos compromissos de actividade expectada.
Estas são questões importantes que os próprios Srs. Deputados do PSD quando foram governo tentaram - e conseguiram em parte - implementar ou, pelo menos, estruturar de uma forma global, embora não tenham conseguido implementar totalmente no terreno em termos orçamentais. Portanto, estamos a seguir essa política, política clara de intervenção na área de orçamentação e de financiamento das unidades de saúde que nos parece extremamente importante.
Quanto ao financiamento, estamos a implementar estes vectores e estão a obter-se alguns resultados, que, se assim o entenderem, poderei até dizer quais são.
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De qualquer maneira, discutindo ainda política de saúde, penso que é claro para todos que existem três funções fundamentais na política de saúde que está a ser estruturada, implementada e que tem um objectivo de planeamento futuro que são vectores funções específicas, por exemplo, na área dos recursos humanos. Recursos humanos onde a regularização das disfunções antigas foi feita - ainda está alguma regularização em curso mas já no final - e naturalmente estão a ser discutidas melhorias nas condições de financiamento dos recursos humanos. Na área dos equipamentos temos alguma renovação; temos também uma intervenção clara das novas tecnologias; temos instalações e equipamentos a ser construídos por todo o País, prosseguindo uma política de reequipamento ao nível das instalações; e, por último, temos uma questão que considerámos importante - que todos considerávamos importante há já muitos anos, não só no Governo anterior mas nos anteriores - e que já foi feita por este Governo que era aquilo que antigamente se chamava a carta hospitalar e que hoje temos como a carta de equipamentos de saúde, que nos permite ter uma noção mais clara do que são as instalações e os equipamentos ao nível da saúde.
Na área dos medicamentos, temos os acordos, as comparticipações e os genéricos; nos aspectos financeiros, temos os novos modelos de financiamento, em particular para as questões regionais. Isto na área dos recursos.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Ninguém acredita nisso!
O Orador: - Na área dos planos, a estratégia política nacional naturalmente que intervém muito mais ao nível dos planos de acção regional. Assim, temos uma intervenção clara ao nível da prioridade do acesso à saúde - já temos obtido alguns resultados com esta política, mas vamos obter mais, naturalmente colocando os equipamentos de saúde, as instalações e os recursos humanos a funcionar mais horas, com melhores condições, com mais qualidade, e diminuindo as listas de espera, promovendo, assim, o acesso ao nível da saúde.
Como sabem, pois já vos dei esses números, há já alguns números, que poderei, no entanto, se assim entenderem, voltar a referenciar.
Mas, falando de política geral, estão em curso os centros de saúde da terceira geração, estão em curso os novos sistemas de financiamento dos hospitais, temos experiências relativamente recentes do novo estatuto jurídico para os hospitais e vamos implementá-los.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Anda a brincar aos "legos"!|
O Orador: - Penso que seria bom, cada vez mais, os partidos e as pessoas ligadas à saúde acompanharem estes sistemas, eventualmente, criticá-los aqui ou ali, e não criticá-los como um todo.
Temos em curso, como já aqui foi dito, alguns aspectos das remunerações experimentais. Existe um pacote normativo e legislativo para o licenciamento de instalações e temos uma intervenção, esta sim importante, na medida em que não havia qualquer tipo de regulação nesta área, no sector de cuidados continuados. Este é um sector importante, onde a saúde deve ter uma intervenção clara, e tem uma intervenção clara, com os sistemas de segurança social.
Outro aspecto que também consideramos fundamental é o da qualidade, com atributos de índoles nacional, regional e local, muito em particular, na área profissional.
Outras estruturas que controlam este processo de qualidade e que são importantes e estão neste momento a funcionar são o Conselho Nacional de Qualidade, o Instituto de Qualidade, que está em fase de implementação, a Comissão Nacional de Acreditação e temos também a Agência de Avaliação das Novas Tecnologias,...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mais boys! Tantos boys!
O Orador: - ... não falando aqui de uma questão que está a funcionar e que tem dado resultados importantes que são os sistemas de avaliação de medicamentos e de serviços de sangue.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, gostaria ainda de referenciar, e para terminar, que há, efectivamente, uma clara aposta em alguns aspectos e não quero deixar passar sem uma referência esta aposta que considero importante e que tem a ver com a área da recuperação, ou seja, da acessibilidade.
Como todos sabemos, em 1995, o investimento neste programa da acessibilidade e da melhoria do acesso à saúde era muito baixo e não havia propriamente um programa específico para esta questão, havia algumas intervenções desgarradas; em 1997, este programa iniciou-se com 1,8 milhões de contos; em 1998, o investimento foi de 3,1 milhões de contos; e, em 1999, prevê-se que seja de 6 milhões de contos. Mas isto com uma intervenção clara e com dados obtidos em termos de resultados perfeitamente claros. Estamos a falar de política de saúde, estamos a falar do Serviço Nacional de Saúde, para o qual temos um projecto e temos um plano. O SNS XXI é um programa estratégico, que tem definições muito claras até ao ano 2002, que poderá estender-se, na sua leitura, até 2010 e isto significa, claramente, que este Governo está a apontar para um plano estratégico que naturalmente tende a abarcar um espaço temporal que permita melhorar a promoção e a monitorização do acesso das pessoas ao SNS, um sistema que promova a qualidade e uma mudança de atitudes e de comportamentos.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Sr.ª Ministra ou Sr. Secretário de Estado da Saúde pretendem a palavra para responder?
Parece-me que a Sr.ª Ministra está sem saber se tem alguma coisa para responder ou se foi simplesmente um comentário do Sr. Deputado... É isso Sr.ª Ministra?
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Se a Sr.ª Presidente me der licença, pretendo fazer só um comentário genérico em relação ao regresso à discussão política. Aquilo que o Sr. Deputado Nelson Baltazar foi referindo foi sendo objecto de comentários a latere. De modo que, se calhar, têm de ser os Srs. Deputados a responder ao Sr. Deputado Nelson Baltazar, uma vez que aquilo que ele disse se "encaixa" naquilo que foi a apresentação em relação às medidas tomadas e em curso.
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Se a Sr.ª Presidente me der licença, pretendo só fazer um pequeno comentário porque acabei por não responder completamente ao Sr. Deputado Paulo Mendo quando este disse que estamos aqui há três anos a ouvir a mesma coisa.
Sr. Deputado, ainda bem que estamos há três anos a ouvir a mesma coisa, porque se tivesse havido uma definição de política um ano num sentido, outro ano noutro e outro ano noutro, então é que seria complicado.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É quando dizem que vão fazer!
A Oradora: - Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, com certeza que com essa fogosidade toda vai intervir e nessa altura então responder-lhe-ei.
Não quero é deixar de referir, no entanto, que efectivamente há muitas coisas que foram feitas, outras que estão a ser feitas e muitas mais há para fazer, mas que sejam feitas de acordo com uma definição clara dos objectivos e do rumo, o que muitas vezes faltou na política de saúde ao longo dos 20 anos de existência do SNS.
A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, não vou começar, tal como os restantes Srs. Deputados, pelas considerações gerais - deixá-las-ei mais para o fim -, mas por fazer algumas perguntas concretas, de especialidade, pois parece-me que é o que aqui estamos a fazer hoje. Compreendo que o Sr. Deputado Nelson Baltazar não tenha tido oportunidade de intervir durante o debate na generalidade e tenha feito a intervenção na generalidade hoje, durante o debate na especialidade. Não queria de qualquer maneira deixar de colocar algumas perguntas.
Risos dos Deputados do PSD.
A primeira questão tem a ver com as convenções e com as novas regras que foram aprovadas e que levariam, até pela discussão que temos feito na própria Comissão de Saúde, a pensar que estas novas regras seriam um instrumento e permitiriam uma maior racionalização e até uma redução nas despesas com as convenções, com o aumento da capacidade do SNS, nas áreas onde ainda é preciso recorrer aos convencionados e, enfim, com uma certa disciplina e rigor que eram os objectivos anunciados nestas medidas.
Mas o que acontece é que nas previsões para 1999 não há diminuição dos gastos com convenções. Portanto, há aqui uma contradição que é preciso explicar: ou não há fé no resultado destas medidas, ou elas não são adequadas para atingir este fim, ou nem sequer era esse o seu objectivo. Portanto, é preciso perceber por que é que, havendo medidas tomadas e sempre referidas pelos membros do Governo para fazer face a esta questão das convenções, os números que depois nos apresentam como previsão - e se são realistas, ainda bem - acabam por não reflectir esta preocupação e estas medidas tomadas.
A mesma coisa em relação aos medicamentos. Não se consegue perceber o efeito que algumas destas medidas que foram anunciadas possam ter na despesa com medicamentos. Mas aí talvez haja uma explicação mais lógica: é que as medidas são insuficientes, as medidas não vão, provavelmente, ao cerne da questão da despesa com medicamentos - isto ao confrontar as medidas com aqueles interesses que levam a que esta despesa cresça da maneira como cresce todos os anos. Portanto, as medidas acabam por não ter o reflexo prático que seria desejável.
Ainda sobre a receita cobrada, todos os anos colocamos aqui essa questão, que é recorrente, e para a qual todos os anos temos a mesma resposta; no ano seguinte os dados são os mesmos e continuamos a levantá-la. Trata-se da questão relativa à previsão de receitas a cobrar e às receitas efectivamente cobradas. Para 1998 tínhamos uma previsão de cobrança, na prestação de serviços com terceiros, de 71 milhões de contos e agora a previsão de cobrança que aparece no Orçamento deste ano é de 46 milhões de contos. Será que a previsão de 62 milhões de contos para 1999 se vai efectivamente verificar? Ou, então, qual é a taxa de quebra previsível, à semelhança do que aconteceu nos outros anos, que se prevê para o ano de 1999? É porque desde o primeiro Orçamento deste Governo que não se confirmam as receitas cobradas e inscritas na previsão orçamental para o ano seguinte.
Sobre as questões mais gerais, o Sr. Deputado Paulo Mendo fez uma série de referências a opiniões do Tribunal de Contas que, enfim, julgo não estarem inscritas nas suas competências - refiro-me à capacidade e possibilidade de o Tribunal de Contas se pronunciar sobre as soluções políticas de organização do financiamento da saúde. Portanto, aí como se costuma dizer, "cada macaco no seu galho"...
Risos do Deputado do PCP Octávio Teixeira.
O que temos de decidir aqui é politicamente o que é que deve ser o financiamento da saúde,...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - ... enquanto o Tribunal de Contas terá a sua capacidade de análise, de fiscalização, de auditoria, que é a sua competência, mas não tem de se pronunciar sobre a forma como se organiza o financiamento da saúde porque essa é competência estrita da Assembleia da República e do Governo.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Esta questão do financiamento da saúde é, de facto, um problema real porque em si mesmo tem a ver com a organização dos gastos e da despesa pública, mas porque tem reflexos na prestação de cuidados de saúde. É porque uma má gestão dos dinheiros que estão orçamentados para a saúde tem necessariamente custos na garantia dos cuidados de saúde à população portuguesa. A verdade é que este orçamento, mais uma vez - e julgo que nem o Governo nem qualquer bancada parlamentar conseguirá desmentir isto -, é um orçamento de subfinanciamento do Serviço Nacional de Saúde e que não contemplará todas as verbas de que o Serviço Nacional de Saúde necessita para cumprir cabalmente a sua função.
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Uma realidade que não pode ser escondida é a de que todas as questões de menor racionalidade na gestão de desperdício destes ou daqueles recursos, que são uma realidade em muitos casos, não escondem que, no montante global atribuído ao SNS, há, de facto, uma realidade de subfinanciamento que não é menor por existirem estes outros problemas que também são graves e devem ser resolvidos.
Portanto, quanto ao desperdício de recursos, o mesmo verifica-se, fundamentalmente, por algumas deficiências dos métodos de gestão que estão implantados no SNS, relativamente aos quais apresentámos recentemente uma proposta de reorganização que julgamos muito valiosa e que, se for aplicada, certamente permitirá uma muito maior racionalidade na gestão dos dinheiros e dos serviços de saúde.
Por outro lado, o desperdício de dinheiros públicos nesta área tem a ver, fundamentalmente, com os fortíssimos interesses económicos que estão instalados neste domínio, que vão minando o terreno do orçamento para a saúde e retirando para si próprios uma boa parte dos recursos que seriam necessários para outros fins muito mais idóneos.
A este propósito, aliás, ainda ontem ouvi críticas, por parte de uma entidade da área da saúde, à Sr.ª Ministra e ao Governo por causa de determinadas medidas que, eventualmente, possam reduzir alguns lucros nesta área.
Julgo que o fundamental a ter em conta nesta questão não é apenas vermos o problema do ponto de vista da despesa pública e da gestão dos dinheiros públicos. Devemos inverter o ponto de vista e ver esta questão sob a óptica do cidadão, do português que tem de aceder aos cuidados de saúde. Este, para além do que já paga para os impostos, paga muito mais do seu bolso para os cuidados de saúde do que a generalidade dos cidadãos da União Europeia. Na verdade, a despesa privada com saúde no nosso país era, em 1995, cerca de 40%, enquanto a média na União Europeia era apenas 25%. E aqui é que está o cerne do problema.
Todas estas questões reflectem-se no que cada cidadão tem de despender para obter cuidados de saúde, uma vez que o SNS não os presta com a rapidez, a qualidade e a suficiência que seriam necessárias.
Portanto, as medidas que, eventualmente, venham a ser tomadas nesta área têm de ter em conta a realidade de que não pode mexer-se no sistema de comparticipações sem garantir que a alteração a fazer não se repercute nos utentes; caso contrário, tenta-se resolver um problema de despesa pública à custa dos direitos dos cidadãos, o que não pode ser uma solução.
No que diz respeito às comparticipações, o que é necessário é aumentar as comparticipações dos medicamentos básicos e mais importantes bem como, por exemplo, dos medicamentos relacionados com a psiquiatria, relativamente aos quais não há qualquer razão para não serem incluídos no escalão mais alto de comparticipação em que estão outros medicamentos semelhantes com as mesmas finalidades e a mesma importância.
É, igualmente, preciso rever as comparticipações dos medicamentos que têm preços mais elevados e que têm sucedâneos com suficiente eficácia terapêutica. Mas que isto não se repercuta no utente, que é quem acaba por ser o receptor deste sistema.
Uma outra questão tem a ver com a acessibilidade. É que muita desta despesa privada é causada pelo facto de o Serviço Nacional de Saúde oferecer aos seus utentes grandes dificuldades no acesso e obrigá-los a recorrer frequentemente à prestação privada de cuidados de saúde com grandes custos nos orçamentos familiares a ponto de, muitas vezes, os cidadãos prescindirem de tais cuidados porque não têm possibilidade de suportá-los e porque, em tantas e tantas situações, o SNS acaba por colocar muitos obstáculos à prestação dos mesmos.
Em relação à "limpeza" da dívida e, ainda, à do financiamento, dissemos, na discussão na generalidade, que se esta dívida que se vai acumulando ano após ano fosse comparada a um vírus num sistema informático, a solução não seria fazer reset todas as vezes que é preciso "limpar" a dívida mas, sim, instalar um antivírus que permita que esta situação não volte a ocorrer.
Aliás, e continuando na mesma linguagem, em relação à questão do financiamento e ao agravar da dívida, que dá argumentos aos que defendem uma maior privatização do sistema e que as soluções para o financiamento devem passar por uma maior privatização, há, também, uma opção muito clara: ou fazemos como fazem os que defendem a privatização do sistema, isto é, mudamos de sistema operativo, deixamos de ter um sistema público para passarmos a ter um sistema muito mais privado do que actualmente ou, então, fazemos - isso, sim! - um upgrade, uma melhoria do sistema que temos para permitir que o actual dê melhor resposta às necessidades dos utentes, não dando espaço aos que argumentam que este sistema faliu, que não há possibilidade de recuperá-lo e que, portanto, temos de mudar para algo completamente diferente e que vem na senda dos interesses que tanto prejudicam o SNS, os interesses económicos que estão instalados nesta área e que pretendem retirar ainda mais lucros à custa dos direitos da população. Portanto, neste domínio, a opção é muito clara.
A questão do financiamento tem importância real na prestação de cuidados de saúde aos utentes e a não melhoria do actual sistema de financiamento do SNS, o facto de não se pôr fim ao seu subfinanciamento, à sua má gestão, ao retirar de recursos que deveriam ser aplicados nos cuidados de saúde é "abrir a porta", dar argumentos aos que defendem o fim do SNS como serviço público, universal e que garante os cuidados de saúde aos portugueses.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, gostaria de começar por dizer-lhe, em relação às questões que levantou no domínio da especialidade, se as novas regras relativamente às convenções determinariam ou não um "emagrecimento" desta factura.
Ora, desde o princípio, referimos que era absolutamente indispensável o estabelecimento destas novas regras em relação às convenções, mas o objectivo fundamental é o de utilizar as convenções na obtenção de ganhos em saúde. Portanto, o objectivo não é propriamente o do "emagrecimento" desta factura, embora este deva ser um objectivo associado ao conhecimento da capacidade instalada no SNS, cuja carta de equipamentos de saúde continua a
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ser desenvolvida e completada, mas é o de utilizar fundamentalmente… e com regras de não existência das mesmas pessoas em ambos os lados para obter ganhos em saúde para as pessoas e não, pura e simplesmente, para fazer na privada o que não se faz na pública por inadequada gestão dos recursos existentes.
Portanto, a política tem sido no sentido de aproveitar ao máximo a capacidade instalada.…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Essa é boa!
A Oradora: - Pensamos que os sistemas locais de saúde, tal como estão concebidos e nos locais onde estão instalados, dão-nos, efectivamente, resultados muito optimistas em relação à possibilidade de aproveitamento adequado da capacidade instalada. Mas porque, além da capacidade instalada, há problemas no acesso, queremos ajustar as convenções à estratégia de saúde e reorientá-las para os problemas específicos de saúde dos portugueses - o acompanhamento adequado da gravidez, a questão do cancro, a questão do acidente vascular cerebral (AVC) -, enfim, para uma série de patologias que podem merecer uma atenção específica pela importância que têm em termos do estado de saúde dos portugueses e, aí, sim, utilizar as convenções para esse efeito com uma perspectiva de prestar os melhores cuidados de saúde mais atempadamente em relação às situações que mais nos preocupam.
Passo agora à questão dos medicamentos.
A este propósito, aliás, faço aqui um parêntesis para agradecer ao Sr. Deputado ter-me falado nas críticas que ontem surgiram no congresso da ANF (Associação Nacional de Farmácias). É que não gosto de levar as minhas intervenções já escritas, sob pena de o meu discurso não se ajustar aos desafios que me são feitos durante as apresentações. Ora, é evidente que o Sr. Presidente da ANF tinha o seu discurso já escrito e deve tê-lo passado aos jornalistas, pelo que foi mais fácil a estes passar para a opinião pública as críticas do Presidente da ANF do que a resposta que lhe dei.
Como dizia, em relação aos medicamentos, é muito importante referir a questão dos genéricos relativamente aos quais o Presidente da ANF considerou que a actual legislação era um retrocesso. Ora, tive ocasião de explicar-lhe que, se era um retrocesso, não percebia por que é que, durante cerca de sete anos, não tinha havido um alargamento da percentagem dos genéricos na factura dos medicamentos ao SNS e, sobretudo, por que é que os pedidos de autorização de genéricos tinham, e têm, vindo a descer progressivamente.
Também tive ocasião de explicar ao Sr. Presidente da ANF que um dos problemas complicados quanto à receptividade e à possibilidade de os médicos prescreverem por princípio activo tem a ver com o facto de a própria ANF ser produtora de genéricos e, assim, os prescritores consideram que poderia haver um encaminhamento da dispensa do medicamento relativamente aos medicamentos produzidos pela própria ANF. Isto é muito importante para explicar as desconfianças e as dificuldades que, por vezes, existem em relação a problemas específicos de um determinado país.
Igualmente tive ocasião de explicar ao Sr. Presidente da ANF que o diploma relativo aos preços e às comparticipações dos medicamentos é uma real consagração do preço de referência mas com preocupações sociais.
Se o Ministério da Saúde aplicasse, tout court, o preço de referência tal determinaria apenas a transferência de maior despesa para a despesa privada que os portugueses já sustentam e que - e, como o Sr. Deputado disse, e bem, já aqui foi referido pelo Sr. Secretário de Estado -, efectivamente, é das maiores entre os países da União Europeia. Daí que o que se fez foi um enfoque na aproximação dos preços das várias especialidades com um mesmo princípio activo no sentido de permitir que não só as pessoas passem a pagar menos pela parte não comparticipada do medicamento como também o Estado pague menos na parte que corresponde à respectiva comparticipação. Portanto, há aqui uma convergência de objectivos que nos parece ser a forma adequada de gerir este problema, em relação ao qual consideramos que existem boas perspectivas no sentido de, progressivamente, ir diminuindo esta factura.
Tive, ainda, ocasião de explicar que o novo modelo de receita médica que entrará em vigor no início do próximo ano, embora, conforme está previsto, apenas em três sub-regiões, a título experimental, vai, pela primeira vez, determinar a prescrição por princípio activo, mesmo que se indique o nome comercial do medicamento, para criar o hábito da prescrição por princípio activo. Isto ajustado ao que é já uma rede de informação que o INFARMED tem divulgado através da internet mas que queremos introduzir na rede de informação da saúde.
Portanto, devo dizer que algumas destas medidas precisam de sustentação em termos de instrumentos que lhes permitam ser efectivas, reais e aplicáveis.
Voltando à questão da rede de informação da saúde, queremos disponibilizar a todos os clínicos prescritores as várias apresentações dos medicamentos, o princípio activo, os vários nomes comerciais, os preços de cada um deles, a percentagem de comparticipação a cargo do SMS e a percentagem a cargo do doente. Isto para dar toda a informação que conduza depois a uma decisão mais esclarecida, mais informada que, progressivamente, permita, de certa forma, racionalizar a prescrição.
Em relação a outro aspecto referido e aos projectos de lei apresentados pelo PCP, estamos a analisar no gabinete os projectos de lei, os quais serão - penso eu - agendados oportunamente e, nessa altura, penso que será um momento importante para discutir algumas das propostas neles contidas, algumas das quais se cruzam com os nossos diplomas e com um conjunto de acções e medidas que temos vindo a desenvolver. Portanto, essa será uma boa altura para discutir todo este conjunto de aspectos.
Peço ao Sr. Secretário de Estado que complemente as minhas informações.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Penso que ficou por abordar a questão das receitas cobradas que é uma questão recorrente nestes debates. Ou seja, o SNS, sistematicamente, desde a sua criação, não consegue cobrar, no próprio ano, a totalidade das receitas que emite e esta, como aliás já foi afirmado, é uma questão que tem de ser trabalhada, esclarecendo o papel dos subsistemas, ou seja, trabalhando no sentido de uma maior clarificação do papel dos subsistemas, evitando, tanto quanto possível, actuais sobreposições de cobertura que geram não só problemas financeiros como este, mas que geram, elas
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próprias, algumas ineficiências no funcionamento de todo o sistema. Há, pois, que trabalhar nesse sentido.
Há, também, que concretizar mais uma medida já anunciada e que será ainda mais generalizada no próximo trimestre, no primeiro trimestre de 1999, que é o cartão do utente. Ou seja, este cartão é, de facto, um instrumento fundamental dos utentes do SNS e permitirá um salto qualitativo muito importante nesta área. Aliás, os últimos números que tenho são de 49% da população já com cartão do utente disponível. Portanto, penso que estamos em condições de, conjugado com a recente publicação da Lei de Protecção de Dados Pessoais, utilizar, de facto, o cartão do utente de uma forma racional e integral, conforme estava previsto.
Quanto à questão do desperdício de recursos de que o Sr. Deputado Bernardino Soares falou e, para além dos contributos dos projectos do PCP, gostaria de salientar uma questão que tem a ver com o financiamento na sua dupla vertente: a da origem dos recursos, ou seja, a de saber qual o montante global do Orçamento do Estado, e não só, para a saúde, e a da distribuição.
Quero salientar o facto de ser importante trabalhar estas duas áreas no seu conjunto e quero salientar, também, mais um vez, a importância dos progressos que têm sido feitos no sentido de racionalizar a própria distribuição interna dos recursos, exactamente, na lógica de evitar desperdício.
Como sabem, e como é facilmente apreensível, uma lógica de distribuição interna de recursos, nomeadamente do financiamento hospitalar, meramente por questões históricas é, de facto, uma filosofia péssima para contribuir para introduzir instrumentos de racionalização na utilização desses recursos.
Para 1999, dois passos importantes foram dados. Por um lado, visa-se estender-se progressivamente, ainda mais, no campo hospitalar, a utilização de grupos de diagnóstico homogéneo (GDH), enquanto medida da produção dos hospitais, em termos de 30% do financiamento pela lógica dos GDH e 70% pelo critério histórico, o que representa uma subvalorização perversiva dos critérios históricos.
Um outro pormenor, que, nesta altura, em termos quantitativos ainda é um pormenor, mas, de qualquer maneira, é um sinal claro para as administrações hospitalares, é a individualização da cirurgia do ambulatório e a existência de critérios claros de financiar tudo o que é cirurgia de ambulatório, ou seja, fazendo a ponte, no fundo, com uma dupla vertente: arranjar critérios objectivos de financiar hospitais por aquilo que fazem e não por aquilo que existem e, em simultâneo, introduzir também um critério no sentido de o ambulatório ser privilegiado. Portanto, introduzem-se progressivamente critérios objectivos quanto a esta questão.
Um outro instrumento na parte de cuidados de saúde primários é a introdução, pela primeira vez, de um critério para o orçamento das ARS, no que toca aos cuidados de saúde primários, através de capitação ponderada não só pelos critérios demográficos inevitáveis mas também com alguns indicadores de doença que permitam, de facto, dotar melhor as regiões onde esses indicadores de doença sejam mais prementes em detrimento de outros. Mais uma vez, provavelmente, isto é feito de uma forma necessariamente insuficiente, ou seja, estamos a falar de 15% do total do orçamento distribuído com estes critérios.
Agora, naturalmente, este é o caminho possível para, sem criar rupturas no sistema, introduzir esses critérios na distribuição dos recursos financeiros que conduzam, exactamente, à preocupação que todos temos de evitar o desperdício de recursos.
Quanto à questão, digamos, da "limpeza" da dívida ao instalar um antivírus e não fazer apenas um reset, como provavelmente já tive oportunidade de dizer, pelo menos na Comissão de Saúde, a importância desta medida proposta neste Orçamento vem exactamente no momento em que a evolução económico-financeira do Serviço Nacional de Saúde é consistentemente positiva. Ou seja, os números não apresentam altos e baixos, pois estamos, de facto, num período em que a evolução dos números é consistentemente positiva. Portanto, esta medida não deve ser vista apenas como um reset mas exactamente como uma medida que visa consolidar e permitir que essa evolução positiva se continue a fazer.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, um ministro deste Governo que faz o favor de ser meu amigo noutro dia confessou-me que esta discussão orçamental é um desespero: na generalidade fala-se na especialidade e na especialidade fala-se na generalidade. Como, de facto, o Dr. Paulo Mendo, por quem eu tenho grande consideração e estima, deu um "pontapé de saída" na generalidade, tenho de voltar a assuntos aos quais julguei que já não fazia sentido voltar.
A minha convicção é a de que só se fala de subfinanciamento no fim dos mandatos. Nunca vi um Governo chegar aqui e dizer: "A base de financiamento do Serviço Nacional de Saúde é baixa e, portanto, este governo vai aumentá-la". Nunca vi! Mas, no fim dos mandatos, verifico que os governos dizem: "Pois é, não se pode fazer nada porque o dinheiro é pouco".
Acho que a questão política do financiamento - e é bom que isto fique claro - prende-se com essa decisão. A questão era, neste momento, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento anunciar que, realmente, não era este o orçamento da saúde, era mais 25%, mais 30%, mais 40%, porque o Governo reconhecia que a base era baixa e todos reconhecemos que a saúde é suficientemente importante. Tudo o resto é um farisaísmo que não interessa e de que estamos cansados!
Se realmente se entende, em consciência, que a base de financiamento é tão baixa que nenhum governo, por melhor que seja, nenhum ministério, nenhum ministro, nenhuma equipa governamental pode fazer mais ou melhor, então acho que a proposta tem de ser de aumento do peso da saúde no Orçamento do Estado. Depois, cada governo estabelecerá as suas prioridades, porque esse também é um papel do Governo, o de estabelecer as prioridades e dizer: "Pois, provavelmente, tiramos daqui e de acolá".
É que se discute o financiamento, mesmo neste Parlamento, como se fosse uma teimosia, como se uns não quisessem dar e outros quisessem dar!...
A dúvida que todos temos é a de saber onde é que se vai buscar essa fatia que falta - se é que falta.
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Em relação a isto, devo dizer que não vi, nos Estados Gerais, no documento que daí resultou, nem no Programa do Governo, nada de significativo sobre o subfinanciamento. Nessa altura, o Partido Socialista entendia que tinha possibilidades de pegar no Serviço Nacional de Saúde e no sistema de saúde e fazer um trabalho de arrumação, de organização, de gestão, de corte nos desperdícios, de corte naquilo que não interessava e, eventualmente, com isso e com os financiamentos que, neste momento, já caiem no sistema de saúde. E esta é outra questão que fica sempre escamoteada. O que é que cai no sistema de saúde? Cai o que está no Orçamento do Estado; cai aquilo que os cidadãos, que têm subsistemas legalmente obrigatórios, pagam todos os meses; cai aquilo que as entidades desses subsistemas também pagam todos os meses; alguns seguros complementares são pagos pelo próprio e pela companhia de seguros; e, ainda, como já foi acentuado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, conseguimos ainda a proeza de ser o País onde os cidadãos pagam uma maior percentagem de despesas de saúde directamente do seu bolso e atrever-me-ia a pensar que estes são aqueles que não fizeram seguros, não têm ADSE, não têm SAMS, têm expectativas do sistema, não são atendidos, mas estão verdadeiramente doentes e, portanto, "vendem os anéis para ficarem com os dedos". É tudo isto que financia este sistema de saúde. Não é só o que está no Orçamento. E isto é muito dinheiro!
Quero saber como é que vai ser possível chegar à conclusão de um subfinanciamento - conclusão científica, minimamente estudada -, se não se decidir o que é que compete ao Serviço Nacional de Saúde. Isto porque se ao Serviço Nacional de Saúde competir dar tudo a todos, em todo o momento, é melhor olhar para o mundo que nos rodeia e chegar à conclusão de que esse problema já os países ricos tiveram e estão a tentar resolver. Não é possível, com as novas tecnologias, com o actual desenvolvimento científico, dar tudo a todos em todo o momento. Portanto, a ideia de um pacote de cuidados de saúde ou a ideia de qualquer arquitectura desta oferta tem de ser feita. E só depois disso é que se poderá dizer que o dinheiro não chega. Até lá, estamos a falar de ficções. Puras ficções. Julgo que o Sr. Secretário de Estado me dará razão.
Quero apontar duas medidas, na especialidade, que penso que revelam um bocado esta situação.
A primeira é a seguinte: se, realmente, temos um Serviço Nacional de Saúde universal e geral e tendencialmente gratuito em que o utilizador paga, tanto quanto eu sei, uma taxa moderadora, por que é que em termos de créditos fiscais não se consideraram os descontos que os cidadãos, sem serem consultados para tal, fazem, mensalmente, para a ADSE e para o SAMS?
Se este Serviço Nacional de Saúde vai ter, um dia, mais tarde ou mais cedo, de receber o financiamento necessário para tratar 10 milhões de portugueses - o que também é mentira, porque o Serviço Nacional de Saúde pode ser prestador de 10 milhões de portugueses, mas não é responsável pela saúde de 10 milhões de portugueses da mesma maneira - se, realmente, o cartão do utente tem - e bem!- como objectivo identificar o financiador de cada utente, se a partir daí vai ser possível ao Serviço Nacional de Saúde cobrar os serviços à ADSE e ao SAMS e se os cidadãos a e b, que agora estão muito na moda, não têm culpa de ser funcionários públicos, bancários ou empregados do comércio, por que razão, então, não são dedutíveis à colecta os descontos que o cidadão bancário ou o funcionário público fazem para o seu subsistema. Qual é o critério para introduzir aqui uma desigualdade que, pelos vistos, nem sequer é apreciada pelos gestores do sistema?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (José Carlos Silva): - Olhe que as contribuições para a saúde são dedutíveis em sede de IRS.
A Oradora: - Quero também perguntar como é tratado este utente que tem de ir buscar o dinheiro ao seu bolso, que é a forma mais irracional de gastar dinheiro, não é verdade?, para pagar uma cirurgia, porque esteve em lista de espera ou lhe disseram que tinha de esperar dois anos, quando ele não pode esperar dois anos porque, naturalmente, tem dores na anca. Fiscalmente, como é tratado este doente, a quem foram criadas expectativas de ser atendido por um Serviço Nacional de Saúde, doente que não tem subsistemas, a quem não ocorreu, e bem, fazer qualquer seguro complementar - nem para isso deve ter dinheiro -, que, de repente, se confronta com dois anos de espera para ser operado e que, por isso, faz qualquer coisa? Não sei como é!…
Inclusivamente, até está prevista no Orçamento a possibilidade de ele contrair um empréstimo... Este sistema é tão perverso que, sendo, aparentemente, o mais generoso, prevê que o utente do Serviço Nacional de Saúde - direito garantido na Constituição - contraia um empréstimo para pagar, num sítio qualquer, uma cirurgia que, em condições normais, teria o direito de fazer no SNS. Então, parece que, para os juros dessa dívida, o sistema fiscal é, enfim, mais compreensivo.
Portanto, quero saber uma coisa muito concreta: como é que são tratadas estas pessoas, em face do Serviço Nacional de Saúde, entendido como uma realidade subfinanciada e que, em breve, vai ser devidamente financiada? Para dar resposta a quê? A 10 milhões de portugueses. Eu, que, neste momento, estou equiparada a funcionária pública, para este efeito, pago 1% e gostava de saber por que razão pago 1% e outros não pagam.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - E pode deduzir! Se não o está a fazer, está a cometer um erro!
A Oradora: - Já me vai explicar isso.
Agora, quero perguntar outra coisa que também se prende com esta questão do subfinanciamento e que é uma evidência: o Ministério decidiu fazer um acordo com a Associação Nacional de Farmácias, um acordo que, digamos, é muito melhor do que aquele que fez com outros credores.
O Governo fez esse acordo, um acordo preferencial, criando alguma desigualdade em relação a outros credores, e a única explicação para isso poderia ser, de facto, o volume financeiro muito grande que envolve este sector concreto dos medicamentos. Não vi mais nenhuma razão, mas o que vejo agora é uma coisa curiosa: é que, tendo diminuído o crescimento do consumo de medicamentos de 12,18 para 8,21, o Ministério da Saúde consegue dever 106 milhões à Associação Nacional de Farmácias. Ora, um ministério que deve 106 milhões à Associação Nacional de Farmácias nada pode negociar, está completamente
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refém. Ou seja, o Governo fez um acordo que só se poderia justificar para lhe poupar algum dinheiro, mas esse acordo resultou mais caro e, ao não ser cumprido, resultou muito mais caro e criou uma situação em que o Ministério se tornou refém da Associação Nacional de Farmácias. Sendo assim, também este utente normal olha e pensa: qual é a minha defesa perante uma situação em que o Ministério está refém da Associação Nacional de Farmácias? Então, para que é que serviu prever um montante, no Orçamento do Estado para 1998, para pagamento de medicamentos, de acordo com os termos deste contrato, se o crescimento é menor e, mesmo assim, ninguém paga nada a ninguém?
Se fosse verdade que, resolvido o problema do subfinanciamento, o Serviço Nacional de Saúde passaria a funcionar, diria que podíamos ir à rua e dar 2000 milhões, em vez de 1000 milhões, à primeira cidadã ou ao primeiro cidadão que passasse e teríamos um excelente Serviço Nacional de Saúde. Sabemos que não é assim!
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, vou deixar a questão das deduções para o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que poderá explicá-la, certamente, melhor do que eu, embora possa, desde já, dizer-lhe que, de facto, essas contribuições para sistemas de saúde são, obviamente, dedutíveis em sede de IRS. Mas, enfim, provavelmente melhor do que eu, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento o dirá.
Quanto à questão genérica dos gastos privados e do financiamento, naturalmente, concordo com a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, porque o cenário ideal seria bom.
No que diz respeito ao que vamos fazer, exactamente, do Serviço Nacional de Saúde, que tipo de prestações, a quem, quando, em que momento, posso dizer-lhe que isso vai ser feito e, a seguir, vamos, então, discutir o modelo de financiamento. Infelizmente, não podemos fechar a porta, parar o tempo que for necessário, fecharmo-nos a conversar e a discutir e só depois tomar as decisões. Infelizmente, tudo isso tem de ser feito em simultâneo, ou seja, a administração tem de ser melhorada, os instrumentos de gestão e de regulação do sistema têm de ser preparados - e far-me-á a justiça de dizer que é isso que temos estado a fazer - e, enquanto fazemos isso, os modelos de financiamento e de distribuição de recursos financeiros têm de ser melhorados. Far-me-á a justiça de reconhecer que temos estado a fazer exactamente isso, ou seja, a arrumar a casa, a reorganizar a casa, de modo a que, de facto, a política de saúde possa ser definida de uma forma controlada.
Relativamente a quem fica de fora, é uma questão que, nesta altura, não se coloca, quer por imperativos constitucionais quer mesmo pelas características da sociedade portuguesa. Julgo que, neste momento, não há condições para deixar ninguém de fora e duvido que seja interessante definirmos se alguém deve ficar fora do Serviço Nacional de Saúde.
Que tipo de prestações devem ficar fora é também uma questão que, provavelmente, pode ser fácil de enunciar, mas a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto sabe, certamente, tão bem como eu que é extraordinariamente difícil dizermos que um tipo de prestação deve ficar fora do Serviço Nacional de Saúde. Aliás, a este propósito, trago à colação uma questão que o Sr. Deputado Bernardino Soares, que, neste momento, não se encontra na Sala, referiu há pouco, quando disse que alguns medicamentos mais caros deveriam ficar fora das comparticipações do Serviço Nacional de Saúde. Esse não pode ser, claramente, o único critério. Recentemente, tomámos medidas para que os preços dos medicamentos que são comparticipados tivessem um ranking bastante inferior ao que têm, pois parece-nos a medida certa para evitar essas grandes diferenças de preço, muitas vezes sem qualquer razão, mas, quer a evolução das tecnologias quer as novas patologias - e sabemos que, quer para a SIDA quer para questões oncológicas, há, de facto, benefícios sensíveis na introdução de novos medicamentos e de novas tecnologias de saúde -, implicam que não deixemos de incluir no leque do Serviço Nacional de Saúde, que queremos necessariamente abrangente, medicamentos e novas tecnologias de saúde que são caríssimos.
Ou seja, em suma, teremos de ser capazes de realizar essa discussão em simultâneo com a execução do Serviço Nacional de Saúde, em simultâneo com a administração do Serviço Nacional de Saúde. Mais: temos de encontrar soluções em simultâneo com o financiamento do Serviço Nacional de Saúde.
Infelizmente, repito, não podemos parar e fechar tudo para pensar - provavelmente, seria mais simples - e voltarmo-nos, então, a sentar à Mesa com todas as soluções, o que torna as coisas mais morosas e mais difíceis de realizar. No entanto, entendo que temos condições para dizer que estamos hoje bastante melhor apetrechados do que há três anos atrás para entrar nessa discussão. Mesmo relativamente à questão de rever modelos de financiamento, estamos hoje, digo eu, em bastante melhores condições para o fazer, quer pelos instrumentos de regulação do sistema que os serviços de saúde já possuem quer pela dinâmica que foi instituída.
Quanto à questão da Associação Nacional de Farmácias, dois comentários: em primeiro lugar, o acordo que foi estabelecido há cerca de dois anos e a revisão desse acordo possibilitaram, de facto, poupar largas centenas de milhares de contos aos cofres do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente no que toca à revisão do modelo para fixar a taxa de juro. Ou seja, encontrar uma solução, deixar uma taxa de juro fixa e passar para uma taxa de juro de mercado, num momento de redução de taxas de juro, foi um acto de gestão mas foi um acto de gestão que permitiu poupar umas largas centenas de milhares de contos. Não tenho o número,…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mas continuam a pagar juros!
O Orador: - … nem, provavelmente, é possível ter o número exacto de quanto é que se poupou, uma vez que teríamos de simular qual era a evolução da taxa de juro no modelo anterior.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É tudo "herança"!
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O Orador: - De qualquer forma, continua a ser um problema e é uma das razões por que propomos medidas de equilíbrio financeiro para o Serviço Nacional de Saúde. Ou seja, quando digo que temos um percurso positivo e números positivos de evolução económico-financeira do Serviço Nacional de Saúde, naturalmente, não nego que existem fortíssimos problemas de tesouraria. Quando se propõe uma regularização de dívidas é exactamente para se poder continuar o caminho de equilíbrio do SNS, para se poderem continuar a tomar medidas que são importantes executar.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, quero apenas referir, embora, digamos, quando vim para o Governo, tenha abandonado as minhas funções de consultor fiscal, que as contribuições para a ADSE são despesas com saúde e, portanto, tal como as contribuições para a segurança social,…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Já disse isso em público alguma vez?
O Orador: - Dizia isso aos meus clientes. Agora, cada qual lê a lei e faz o seu planeamento fiscal.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Agora, os seus clientes são os portugueses!
Orador: - Isso está na lei, as pessoas podem perfeitamente deduzir e há um campo nas declarações de IRS para inscrever essas despesas.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não é "despesas de saúde".
Orador: - Portanto, estou aqui a declará-lo formalmente e fica registado em acta, só não deduz quem não quer.
Já agora, Sr.ª Deputada, há também, por exemplo, certas contribuições para serviços sociais…
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Isso é outra coisa!
O Orador: - … que, na parte em que digam respeito a regimes mútuos de saúde, também são despesas de saúde dedutíveis como quaisquer outras. Agora, é preciso que seja demonstrado pela entidade recipiente dessas contribuições qual a parte que se destina a despesas de saúde e qual a parte que se destina a outros benefícios sociais, como livros escolares, festas de Natal e coisas do género. Aquilo que disser respeito a despesas de saúde é claramente dedutível como despesa de saúde, tal como o é a parte não comparticipada, porque, no fundo, como V. Ex.ª bem sabe, o que se dá é uma substituição.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Isso não é a mesma coisa!
Orador: - Para o Estado, tanto faz ou, melhor, não é tanto faz, porque o Estado não é neutro. Mas, de qualquer forma, em termos fiscais, tanto faz ao Estado que o cidadão que vai ao médico obtenha um recibo verde da despesa que fez e o desconte totalmente no seu IRS ou o entregue a um subsistema, que lhe dá uma comparticipação, abatendo a pessoa apenas a parte que suportou, adicionada da sua quota para esse subsistema.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - As quotizações também?
O Orador: - Portanto, Sr.ª Deputada, quanto a isso, parece que estamos claros; não há problema algum.
Gostaria, ainda, de fazer uma referência à questão do financiamento. É claro que o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde, orçamentalmente, não tem nada a ver com o funcionamento de qualquer outro serviço ou qualquer outro fundo autónomo, verificando-se que, quando o orçamento é elaborado, ele é feito de forma equilibrada, porque assume que as prestações de serviço que são efectuadas são, efectivamente, cobradas.
Em determinado momento, verifica-se uma deficiência de cobrança, por várias razões: ou por uma efectiva mora dos devedores; ou porque o montante que o Serviço Nacional de Saúde tem a receber é controverso, nomeadamente ao nível de responsabilidade pelo pagamento dessa prestação - é o caso de acidentes de viação, de trabalho, etc. - e, portanto, constata-se que, no final do exercício, a despesa é superior à receita. Isto pode acontecer no Serviço Nacional de Saúde e não pode acontecer em mais nenhum organismo do Estado.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Isso é uma questão contabilística!
O Orador: - Sr.ª Deputada, não sou contabilista, mas estou a falar daquilo que são as minhas funções e o que se passa é o seguinte: não é possível, em qualquer outro serviço do Estado, que a despesa seja superior à receita, excepto no Serviço Nacional de Saúde, porque quem decide a despesa...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Por isso é que eu digo que é um problema de contabilidade pública!
O Orador: - Srs. Deputados, estamos numa Comissão, não há limites de tempo para intervir e com certeza que VV. Ex.as, se quiserem que eu vos escute, têm de esperara que eu cabe de falar. Não consigo falar e ouvir ao mesmo tempo!
Portanto, dizia eu, se não há um regime de duodécimos, se não há um regime de congelamentos, se não há um regime de taxas de execução, se não há um regime de autorização com reforços ou descativações para que se possa fazer despesa, sendo a determinação da despesa feita pelos próprios clientes do sistema e pelas entidades administrativas que nele exercem funções, se não há qualquer controlo político prévio em relação ao nível de despesa efectuada,...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Por isso, é que é preciso mudar o sistema!
O Orador: - ... então, direi que todo o fundamento do Serviço Nacional de Saúde necessitaria de ser repensado na sua génese, caso não houvesse limitações constitucionais,
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com as quais estamos de acordo, aliás, e que são importantíssimas.
Aquilo que a Sr.ª Deputada referiu relativamente ao que deve ou não ser prestado, sobre quem é que deve ou não estar no sistema, com certeza que não tem a unanimidade nem sequer a maioria desta Câmara. Se está na Constituição que o Serviço Nacional de Saúde deve ser universal e gratuito, o que temos de verificar é, por exemplo, qual a oferta do Serviço Nacional de Saúde em relação ao nível da evolução das despesas. Isto é uma coisa que podíamos analisar, como também poderíamos ver quantos centros de saúde, quantos hospitais, quantas valências existem, etc., analisando deste modo o nível de oferta, de sofisticação tecnológica, de demanda de saúde das próprias pessoas.
Ora, isso é que nos permitiria ver se estamos ou não no bom caminho e se fizermos essa análise veremos que ela é claramente favorável. E isto não é para tirar méritos para um governo que tem três anos, é para analisar a evolução do sistema, como fez o Sr. Secretário de Estado da Saúde há pouco, dizendo se, de há 20 anos para cá, desde que começou o Serviço Nacional de Saúde, houve ou não uma evolução positiva e se isto é ou não uma experiência bem conseguida mas que está longe de estar no seu funcionamento perfeito.
Aliás, a Sr.ª Deputada começou muito bem, pois havia um problema endémico, em Portugal, que era o da segurança social; havia outro problema endémico, que era o do défice de educação e outro ainda, que era o do Serviço Nacional de Saúde.
Ora, não se podem resolver todos os problemas ao mesmo tempo, mas podem dar-se passos para se ir resolvendo uns a seguir aos outros e, de facto, concordo perfeitamente que o esforço que foi feito numa legislatura para a segurança social e para a educação possa, imediatamente a seguir, ser substituído por outro esforço, por exemplo, continuando na segurança social, que está longe de ter toda a segurança financeira para nós que contribuímos hoje, e substituir a educação pela saúde, fazendo um forte esforço financeiro em que se injectam centenas de milhões de contos em quatro anos. Só que é preciso criar uma certa hierarquia, é preciso gerir políticas e gerir políticas é gerir opções, que VV. Ex.as podem contestar, no plano político.
De facto, VV. Ex.as podem contestar, no plano político, a nossa opção, dizendo que nós não devíamos ter subido...
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Ah, já não é paixão!
O Orador: - Bom, nas questões das paixões eu, normalmente, sou um bocado frio, mas, de qualquer das formas...
Como estava a dizer, VV. Ex.as podem contestar o facto de nós termos subido 1% sobre o rendimento nacional nas despesas para a educação, dizendo que nós não devíamos ter canalizado tantos meios financeiros para a educação mas, sim, dar mais meios financeiros para a saúde... Essa é uma contestação política perfeitamente legítima; agora, o que VV. Ex.as não podem é, logo à tarde, quando formos tratar do orçamento do Ministério da Economia, estar a pedir mais umas dezenas de milhões de contos, depois pedirem mais para os Negócios Estrangeiros, para a cooperação, e, depois, para as pensões, e vamos ver o que é que os Srs. Deputados do PP vão propor a esse nível.
Portanto, VV. Ex.as não podem é propor aumentos para tudo ao mesmo tempo! É que a diferença entre fazer uma oposição responsável e uma oposição menos responsável é que a oposição responsável faz também opções políticas enquanto que a oposição irresponsável pede aumentos para tudo ao mesmo tempo. Esta é que é a diferença!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Era o vosso caso antes!
O Orador: - Não estou a dizer que VV. Ex.as são oposição irresponsável...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas pode!
O Orador: - O que estou a dizer é que se devem inserir as prioridades nos recursos financeiros...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Isso é que é governar!
O Orador: - Exacto! E se V. Ex.ª diz que era necessário canalizar mais umas dezenas de milhões de contos para a saúde, eu estou de acordo!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Disse-o o Sr. Primeiro-Ministro!
O Orador: - Aliás, o Ministro das Finanças e próprio Primeiro-Ministro já o disseram...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - E serão irresponsáveis?!...
O Orador: - V. Ex.ª terá ouvido, com certeza, porque é uma pessoa muito atenta, o Primeiro-Ministro dizer que era preciso canalizar para a saúde mais meios financeiros do que aqueles que foram canalizados até agora. Não há dúvida alguma e estamos todos de acordo!
O que tem sido feito até agora é um trabalho extremamente meritório, adequando os meios financeiros disponíveis, que mesmo assim são muito volumosos, e poderá verificar que nunca houve uma transferência tão grande de verbas para a saúde como neste orçamento que VV. Ex.as estão a apreciar.
Mas, é lógico, não pode ser tudo de uma vez nem ao mesmo tempo! É lógico que uma das necessidades fundamentais das pessoas é saúde, mas uma das necessidades fundamentais do País é a educação e uma das necessidades fundamentais dos trabalhadores é a segurança social...
Portanto, temos aqui um leque de opções e era preciso termos dois orçamentos para podermos estar todos satisfeitos com os meios financeiros e criticarmo-nos uns aos outros por gastarmos a mais ou a menos ou fazermos mais ou menos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É cortar nos benefícios fiscais!
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O Orador: - Quanto aos benefícios fiscais, posso dizer-lhe, por exemplo, que o crescimento dos benefícios fiscais se deve, fundamentalmente, ao aproveitamento dos benefícios fiscais com a saúde.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - E não só!...
O Orador: - Aliás, podemos trazer aqui o ratio de crescimento do aproveitamento dos benefícios fiscais e as pessoas cada vez mais...
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não são esses; são os das actividades especulativas!
O Orador: - Posso dizer-lhe que os benefícios fiscais têm crescido muito, nomeadamente nestes últimos quatro anos, e esse crescimento exponencial verifica-se no IRS. Porquê? Porque, se calhar, a maioria de nós há quatro, cinco ou seis anos não fazia qualquer planeamento fiscal e hoje, praticamente, toda a gente o faz, porque o nível de esclarecimento e de conhecimento dos esquemas financeiros dos benefícios fiscais é muito maior.
Portanto, quando falamos em benefícios fiscais temos de analisar o que são benefícios fiscais, porque está lá a educação, a saúde, a habitação, etc.
Bom, mas estou ao dispor de VV. Ex.as para, na especialidade, dar mais esclarecimentos adicionais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Têm de tributar as actividades da Bolsa!
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, respondendo, se me permite, ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, quero referir que eu não disse quem deve ou não deve estar no Serviço Nacional de Saúde; disse uma coisa completamente diferente, que o Sr. Secretário de Estado vai dizer, se continuar no Governo, e que foi o seguinte: o que deve e pode dar o Serviço Nacional de Saúde aos cidadãos. Depois, quando se pensa que talvez nem todos lá estejam dentro, não se pensa diferentemente daquilo que a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado pensaram quando instituíram o cartão do utente.
Não vamos ser farisaicos: o cartão do utente significa referenciar o cidadão ao seu financiador, significa que quem não tenha um cartão do SNS e tenha um da ADSE, é financiado pela ADSE e, nesse sentido, já não é do Serviço Nacional de Saúde, podendo, em todo o caso, ir ao Serviço Nacional de Saúde, porque este é um prestador que pode prestar serviço para fora do seu núcleo de utentes, mas já não é da responsabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde.
Aquilo que eu disse, Sr. Secretário de Estado - e não lhe dê outra interpretação, porque o meu raciocínio é perfeitamente claro -, foi o mesmo que o senhor, o Sr. Secretário de Estado e a Sr.ª Ministra da Saúde.
Considerando o número crescente de cidadãos que, neste sentido, já estão fora do Serviço Nacional de Saúde, não podemos continuar a falar do financiamento da saúde exclusivamente através do Orçamento do Estado, pois ele é feito através do financiamento pelo Orçamento do Estado somado aos descontos, às quotizações, à comparticipação das entidades que são financiadoras destes subsistemas, aos seguros, e a uma realidade que eu considero perfeitamente injusta que é o pagamento directo do bolso dos cidadãos.
Foi este quadro que eu quis dar, ou seja, cai no sistema - e digo cai de propósito, porque cai num saco roto - um conjunto muito grande de financiamentos que se encontram desorganizados e que é preciso organizar.
Ora, aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse foi que, quando quiséssemos organizar esses financiamentos, estávamos a contrariar a Constituição e os valores essenciais que presidem ao Serviço Nacional de Saúde, mas isso não é verdade. Esse discurso está morto, já passou, não é razoável, não é verdadeiro, não é justo e não é bom para os portugueses. Por isso, estou a fazer isto com a consciência tranquila.
Quero dizer-lhe ainda que o pacote de cuidados de saúde é também uma necessidade, porque cada vez mais a oferta e a diversidade da oferta vai ser maior e, num dado momento, vai ser preciso que cada governo, cada Estado, cada país - e esta preocupação está presente em países muito mais ricos do que o nosso -, diga por que é que são responsáveis, ou seja, pelos indicadores de saúde dos portugueses, mas não pela saúde de cada português nas fantasias que essa saúde, muitas vezes, traz.
É que, muitas vezes, o utilizador é um mau utilizador e este sistema também propicia uma má utilização dos recursos por parte do utente, pelo que tem de haver aqui uma pedagogia e o Estado, para não deixar a descoberto situações muito graves de pessoas que não têm realmente recursos, não poderá estar a fazer outras coisas a outras pessoas que têm recursos. É esta a escolha, que é de justiça social, de equidade e essencial nos tempos que correm.
Quando falamos em benefícios fiscais, mais concretamente em créditos fiscais, o Sr. Secretário de Estado, que é um especialista e eu sou uma leiga, concordará que eles fazem sentido num opting out, isto é, faz sentido que alguém tenha uma dedução, porque, na realidade, podendo ir ao Serviço Nacional de Saúde, não o fez, poupando dinheiro ao Estado ao pagar do seu bolso e criando, assim, uma desigualdade em relação a outros, o que é, de alguma forma, compensado através dos créditos fiscais.
Por isso é que apontei dois subsistemas legais que são obrigatórios e que, sendo obrigatórios, implicam que o cidadão, não sendo questionado, não fazendo uma escolha, sai do Serviço Nacional de Saúde, neste sentido.
Entendi da sua resposta que as quotizações também eram dedutíveis. Interrogo-me qual será a consequência de dois milhões de portugueses saberem isto.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Não há consequência alguma!
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - As finanças não têm aceitado isso.
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A Oradora: - Mas vão passar a aceitar, porque temos agora, aqui, uma indicação. Muito bem! Parece-me um aspecto interessante.
Quero dizer-lhe o seguinte: penso que não se pode - e a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado o dirão -, neste momento, em Portugal, fazer aquilo que eu considerava importante (aliás, julgo que todos nós o considerávamos), que é saber se o nível dos cuidados de saúde prestados, por um lado, são adequados às necessidades dos portugueses e, por outro lado, se têm a qualidade necessária e desejável. Penso que, neste momento, não é possível fazê-lo e, assim, continuamos a não saber quanto custa cuidar da saúde dos portugueses; só sabemos, por enquanto, quanto gastamos. Talvez um dia se possa saber quanto custa, mas, neste momento, não é.
Por exemplo, os grupos de diagnóstico homogéneos correspondem a uma tentativa desse género; não foram, ainda, estendidos ao ambulatório, tanto quanto sei, e não constituem sequer um indicador de gestão, nem mesmo para efeitos do Orçamento, na sua totalidade, porque isso não é possível. Isto para lhe dizer que ainda estamos numa fase muito atrasada.
Quanto a dizer que, em 20 anos, se melhorou muito, com certeza! Mas, já agora, deixe-me que lhe diga que Portugal estava muito atrasado, os indicadores de saúde eram muito maus e, portanto, há um esforço inicial que tem resultados imediatos. Chama-se a isso as doenças baratas.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Baratas?
A Oradora: - Baratas no sentido de que envolvem poucos recursos.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Não são os insectos!
A Oradora: - Pense nas vacinações, por exemplo, ou na saúde materno-infantil, que não é uma saúde cara, mas é preciso é fazê-la, é preciso é uma boa cobertura e isso, realmente, conseguiu-se.
Agora, pergunto: no final deste século, não é legítimo que discutamos aqui já uma saúde de outro nível? Já não posso estar preocupada com a mortalidade infantil, Sr. Secretário de Estado! Tenho de estar preocupada com outras coisas, nomeadamente aquelas que o Deputado Paulo Mendo citou, e é aí que não podemos estar a olhar para trás. Podemos fazer uma homenagem ao Serviço Nacional de Saúde, vamos todos descerrar-lhe uma estátua, mas agora temos de andar para a frente, e o que está para a frente é, de certa forma, assustador, porque não vai ter, com o mesmo investimento, os mesmos resultados.
Quero também dizer que fiquei a saber duas coisas: primeiro, que o Governo não é responsável quando diz que a educação é mais importante do que a saúde, mas, segundo, que o PP é irresponsável quando diz ao Governo que, considerando que o Serviço Nacional de Saúde está subfinanciado, tem a obrigação política e, diria até, moral de o financiar devidamente. Ou seja, nós somos irresponsáveis por dizermos ao Governo algo elementar: se reconhecem o subfinanciamento e a importância do Serviço Nacional de Saúde, financiem-no! Por isso, somos irresponsáveis, mas os senhores não são por, ao reconhecerem publicamente esta situação, terem deixado a Sr.ª Ministra da Saúde em "banho-maria" e terem posto o Sr. Ministro da Educação em "banho-manel"!
Risos do CDS-PP.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - É uma questão de opção, não se pode ter tudo ao mesmo tempo!
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, quero apenas deixar aqui uma nota, porque, enfim, me parece perigoso associar a questão do cartão do utente apenas - e mea culpa se, provavelmente, contribuí para isso - a uma lógica de financiador. Ou seja, o cartão do utente é, de facto, um instrumento muito mais importante do que isso…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Eu sei, mas tem também esse objectivo!
O Orador: - Tem também e daí esta minha intervenção para evitar esse risco.
Ou seja, o cartão do utente é um instrumento de gestão que pode ser poderosíssimo para toda a gestão e organização do sistema, muito para além da questão das responsabilidades financeiras.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sim, mas também tem este!
O Orador: - Tem, naturalmente, também, a possibilidade de organizar, e de melhor organizar, responsabilidades financeiras. Agora, que não fique, nem por um minuto, a ideia de que,…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - De que ele se esgota nisso? De maneira alguma!
O Orador: - … mesmo com a obrigatoriedade do cartão do utente, vai haver, eventualmente, uma restrição no acesso de qualquer português, residente em Portugal, aos serviços do Serviço Nacional de Saúde.
Sr.ª Deputada, essa é uma questão, mais uma vez, da especificidade do sector em que estamos. Ou seja, teremos, certamente, todas as campanhas de informação, faremos todo o esforço de sensibilização, de informação, de esclarecimento dos portugueses para a necessidade de usarem o seu cartão, para ajudarem os serviços do SNS nesse esforço. Agora, não nos peçam, necessariamente,…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não deixam o doente à porta! O doente nunca fica à porta!
O Orador: - Exactamente! Não nos peçam que deixemos pessoas à porta pelo facto de existir o cartão.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - É evidente que não!
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Deixam-no é no corredor!
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O Orador: - Teremos de encontrar as maneiras possíveis de ultrapassar estas questões.
Finalmente, uma última questão, que tem a ver com o saber quais são as nossas necessidades de saúde para o século XXI, que, de facto, já são bem diferentes daquelas que ultrapássamos.
A transição epidemiológica está feita e não foi feita agora, foi feita, provavelmente, durante a década de 1970 ou, melhor, talvez durante a década de 1980. Temos, de facto, questões diferentes para resolver. Agora, este problema põe-se também em sede de enquadramento macro de todo o sistema e, para resolver este tipo de questões, o modelo de organização e o tipo do Serviço Nacional de Saúde é aquele que se tem revelado o mais adequado. Ou seja, todos os progressos, em termos de saúde, que foram feitos e a maneira fácil, digamos, de apanhar a questão do período das doenças infecto-contagiosas já não abrange a década de 1990. A reorganização do sistema para tratar com isso é um problema, mas não questiona, de maneira alguma, o Serviço Nacional de Saúde, antes pelo contrário.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas eu também não disse isso!
A Sr.ª Presidente: - Estamos a discutir, além do Orçamento, as Grandes Opções do Plano e é por isso que admito, ao fim de duas horas, que ainda não nos tenhamos centrado na discussão do Orçamento do Estado na especialidade. Tive alguma esperança de que iríamos enveredar por aí quando vi o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tomar a palavra, mas depois fiquei um pouco desanimada.
Não há dúvida que o Sr. Secretário de Estado começou por dizer que havia, realmente, um problema de especialidade do Orçamento, no caso da saúde, em que a despesa é superior à receita - todos sabemos que sim e que não há forma de o controlar previamente - e fiquei à espera que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento concluísse a intervenção dizendo, como membro de um Governo responsável que é, como é que paga essa despesa superior à receita, se é com as receitas das privatizações, se é ficando a dever ou como é.
Isto é, ninguém discute que existe essa despesa superior à receita, penso que nenhum Governo responsável se deve envergonhar por ela e, portanto, pensei que nos vinha, finalmente, dizer quanto era e como a pagaria. Ainda não foi desta, mas, como estamos no debate na especialidade, lá iremos, com certeza.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, não sei se vou também desapontar V. Ex.ª com questões muito abstractas, mas tentarei ser curta e o mais incisiva possível.
A questão a que me reporto não é tanto a de discutir abstractamente uma matéria que me parece importante e que, finalmente, ao fim de mais de dois anos, ficou, do ponto de vista jurídico, definida, mas trata-se de saber a quem cabe a responsabilidade da questão dos resíduos hospitalares.
Como bem se recordam, demorou algum tempo até que, neste "jogo do empurra", se percebesse quem era quem em relação à responsabilidade do tratamento daqueles resíduos, ou seja, à responsabilidade da definição de uma estratégia e, sobretudo, de dar conteúdo à mesma. Finalmente, em Setembro de 1997, ficou claramente definido, do ponto de vista jurídico, a quem cabia a responsabilidade de definição de um plano para os resíduos hospitalares.
Obviamente, esta é uma questão importante do ponto de vista da melhoria das condições de higiene e segurança dos trabalhadores que lidam com esses resíduos e é importante no plano ambiental e no da saúde pública.
Em relação a essa realidade concreta, como todos sabemos e vemos quando circulamos nos locais, são inúmeras as situações de deficiência de funcionamento dos vários sistemas, designadamente dos 35 incineradores que estão a funcionar. Como bem se sabe, há muitas unidades que escapam ainda ao controlo eficaz daquilo que são as normas definidas para o manuseamento, o tratamento, a embalagem, o transporte, enfim, tudo o que tem de pautar o tratamento destes resíduos.
O Governo apresentou, finalmente, este ano, um plano estratégico para os resíduos hospitalares, e isso é um dado importante, sobretudo se esse plano tiver não só as vertentes sanitárias, técnicas e institucionais definidas mas tiver também aquilo que é essencial, ou seja, uma componente financeira para que o mesmo tenha concretização.
Porventura, será deficiência minha - a Sr.ª Ministra o dirá - mas não encontro, no Orçamento do Estado, aquilo que tem de ser a expressão de investimento para que este plano estratégico de resíduos hospitalares (que tem, de facto, um nome interessante) tenha o conteúdo que dele se espera, ou seja, trata-se de saber onde é que estão os investimentos que dêem conteúdo, pelo menos, às duas hipóteses de figurino pensadas.
O Serviço de Utilização Comum dos Hospitais, nesse mesmo plano, coloca duas hipóteses possíveis de funcionamento de incineradoras, designadamente - e circunscrevo-me a este aspecto - ou por distritos, sendo que essa poderia ser uma solução menos cara de investimento, ou não. Mas, em todo o caso, qualquer dos investimentos na construção de um incinerador ronda os 300 000 contos - são dados do SUCH, não são meus - de investimento.
A pergunta concreta que faço à Sr.ª Ministra é a de saber onde é que, em termos do investimento do Ministério da Saúde - sendo que admito que ele também tenha expressão a nível do PIDDAC, que é, tão-só, uma das fontes de investimento -, há expressão para que, finalmente, 1999 seja, ao fim destes anos todos, o ano de concretização do plano estratégico dos resíduos hospitalares.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, como sabe, o plano estratégico relativo aos resíduos hospitalares apresentado aponta para a redução dos actuais 35 incineradores para cerca de cinco e é um plano apresentado à discussão pública que continua, em termos de trabalho, a consubstanciar uma articulação com o Ministério do Ambiente.
Em relação à mais adequada localização, ela tem a ver, precisamente, com aquilo que são as facilidades de transporte dos próprios resíduos e aquilo que está previsto é que os novos investimentos terão de ser feitos através do
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SUCH (Serviço de Utilização Comum dos Hospitais), fazendo também, para isso, recurso às verbas do Quadro Comunitário de Apoio.
Portanto, não há uma identificação específica da questão dos resíduos hospitalares desgarrada de todo um conjunto de investimentos, porque ela se distribuirá em investimentos a serem feitos pelo SUCH e em investimentos a serem feitos através das instituições onde a localização dessas centrais se verificar, que poderão ser, eventualmente, combinadas em termos de técnica.
Aliás, como sabe, a questão da incineração não esgota todo o tratamento dos lixos e, portanto, haverá também o recurso ao auto-investimento, o qual, se verificar pela análise, na especialidade, do Orçamento, este ano compensa a redução que se verifica nos fundos estruturais da saúde propriamente ditos, que no ano de 1999 é mais baixo do que no ano em curso, por força do incentivo grande que foi dado à execução para não perdermos essas verbas.
Portanto, haverá verbas do SUCH, do Quadro Comunitário de Apoio e também auto-investimento. Mas a questão "resíduos hospitalares" não está desdobrada nas rubricas genéricas da ampliação, da remodelação, da beneficiação, ou seja, de todo um conjunto de enquadramento tradicional do PIDDAC.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, pedi o uso da palavra para fazer uma pergunta telegráfica adicional: não entendi o ano de arranque deste plano, ou seja, gostaria que a Sr.ª Ministra precisasse se, neste caso, está à espera do Ministério do Ambiente para ter alguma luz verde para avançar, designadamente em termos das localizações.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, este plano estratégico dos resíduos hospitalares tem de ser ajustado com o Ministério do Ambiente e é por isso que a comissão é conjunta. Agora, não estamos à espera da luz verde desse Ministério, pois, como sabe, já estamos a fazer intervenções a nível de algumas incineradoras e de equipamentos existentes, porque o problema que se levanta relativamente a esta questão é que a sua localização futura tem de ser devidamente identificada e nela serão feitos os investimentos adequados.
Como é evidente, não há ninguém que mais se preocupe com a saúde pública do que o próprio Ministério da Saúde. Obviamente que o Ministério do Ambiente tem preocupações globais, mas é o Ministério da Saúde quem, por natureza, está preocupado com as questões de saúde pública. Por isso, todas as instruções que existem são no sentido de esta questão ser de prioridade e de enorme importância, não só quanto à definição da sua localização, já que a definição dos investimentos tem de ser feita de modo a garantir o adequado tratamento dos lixos, mas também quanto a uma outra coisa, que nos preocupa muito e que tem sido objecto de instruções, a segurança de quem opera com este tipo de resíduos.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora iniciar uma nova ronda de perguntas e vou juntar os pedidos de esclarecimentos de alguns Srs. Deputados antes de dar a palavra à Sr.ª Ministra da Saúde e ao Sr. Secretário de Estado da Saúde.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr.ª Presidente, este Orçamento do Estado dá-nos a sensação de estarmos a assistir à reprise de um filme.
Aliás, tive a oportunidade - e recordo que, inclusivamente, sugeri essa metodologia ao Ministério da Saúde e aos Srs. Deputados do Partido Socialista - de reler tudo aquilo que o Ministério da Saúde vem dizendo de há três anos a esta parte, ou seja, desde que tomou posse. Na verdade, vale a pena fazê-lo, porque 80% do que é dito pelos responsáveis governamentais e pelos Deputados do Partido Socialista é exactamente "vai fazer-se", "vamos começar", "iniciámos ontem" ou "fá-lo-emos em breve".
Não quero deixar de assinalar esta questão porque a melhor maneira de não resolver os problemas é fingir que eles não existem, não pretendendo sequer encontrar soluções para eles. Não sei se isto será já resignação, se será já algum cansaço em relação a esta matéria...
E, já agora, no que se refere às questões das reformas da saúde - e não é só o Partido Social Democrata e os partidos da oposição que dizem que elas não existem, isso é também afirmado em relatórios internacionais e foi-o até mesmo, num raro momento de clarividência, pelo líder parlamentar do Partido Socialista -, sugiro à Sr.ª Ministra que tenha um pouco mais de atenção ao seu líder parlamentar, porque ele próprio disse, num raro momento de clarividência, repito, que em relação à saúde não houve reformas.
Vou deixar também uma nota muito breve no que se refere ao défice e à pesada herança. Não falámos aqui de intenções nem de dados - e lamento que o Sr. Secretário de Estado não esteja presente neste momento, porque isto diz-lhe respeito -, apenas aludimos a documentos oficialmente entregues por um titular do Ministério da Saúde da altura, o Dr. Arcos dos Reis, onde se pode ler que o saldo remanescente no início de 1996 era de 67,7 milhões de contos. E mais: como, de facto, isto foi gravado, o Sr. Secretário de Estado da Saúde, Arcos dos Reis, disse o seguinte: "Devo corrigir os números (…)" - isto na discussão do Orçamento para 1997 - "(…) que foram apresentados, porque, em 1995, o défice não foi de 67 milhões de contos mas de 61 milhões de contos e, em 1996, teremos passado com um défice à volta de 113 milhões de contos. São estes os números (…)".
Refiro isto para dizer, objectivamente, em relação à questão da herança, que é útil que se façam estas precisões, porque o próprio Governo do Partido Socialista já o reconheceu.
O mesmo comentário breve faço em relação às medidas que são anunciadas recorrentemente em relação à cobrança de receitas próprias e à melhor organização. Recordo também aquilo que o Sr. Secretário de Estado da Saúde disse nessa altura quanto às questões mais globais, de fundo, do financiamento, e que foi o seguinte: "Quero também dizer que, estando praticamente concluído um documento que o Conselho de Reflexão apresentou, vamos
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implementar medidas (…)". E enumerava um conjunto de medidas.
A Sr.ª Ministra, inclusivamente, também referiu, em relação à questão do aumento de receitas, que "(…) tem a ver com tudo aquilo que disse, mas também com a reorganização dos serviços, que está a avançar e que necessita de instrumentos de que não dispúnhamos no ano passado e de que vamos passar a dispor no próximo ano, nomeadamente a Carta de Equipamentos de Saúde, que é indispensável para a racionalização daquilo que já é a capacidade instalada." Para além disso, enunciou outras medidas.
Refiro isto só para dizer que, em relação a esta matéria orçamental da saúde, apenas queremos a verdade e o rigor. Assim, o que nós queremos saber é qual é a dívida do Ministério da Saúde hoje, dia 23 de Novembro de 1998, se isso for possível saber, qual é o défice de exercício.
Ouvimos o Sr. Secretário de Estado, depois da discussão na generalidade, quer em Comissão quer no Plenário, dizer a um órgão de comunicação social que esse valor seria próximo dos 80 milhões de contos e até chegou a elaborar que esse défice seria de cerca de 5 a 6 milhões de contos por mês. E recordo aqui, Sr.ª Ministra, que o défice é a diferença entre o que é cobrado e o que, em termos de despesa, é feito - e não há volta a dar em relação a isso -, pelo que é obrigação estrita do Governo revelar esse valor, como é obrigação do Governo revelar quanto prevê que ele seja em 1999.
Portanto, gostava de saber qual é o défice de funcionamento do Ministério da Saúde, porque, em termos de generalidade, já dissemos que, quer em termos de agravamento, por causa da forma como serão contabilizadas as despesas de saúde, quer em termos do aumento das despesas de funcionamento e da diminuição das despesas de investimento, quer ainda em termos de manutenção de um nível de financiamento público com o qual, aqui, pelos vistos e finalmente, três anos depois, todos parecem estar de acordo, inclusivamente o Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Portanto, repito, gostava que o Governo nos desse esse indicador de gestão fundamental, porque ele permitirá, entre outras coisas, em relação aos tais 159 milhões de contos que estão inscritos este ano no Orçamento - e, curiosamente, o Governo elaborou também um conjunto de contradições até chegar a esse valor -, revelar ao que é que esse valor se destinaria.
Mas recordo aqui mais duas contradições imediatas em relação a esse valor. É que esse montante de 159 milhões de contos aparece também num documento oficial do Ministério da Saúde, onde tem uma previsão de cobrança de receitas próprias, para o ano de 1997, na ordem dos 42 milhões de contos. No entanto, verificámos que apenas foram executados cerca de 32 milhões de contos.
Portanto, se fosse exactamente essa a razão para se encontrar o tal valor de 159 milhões de contos, estávamos logo à partida - e com uma análise sumaríssima, que é perfeitamente comparável, pois estão aqui os dados oficiais - com uma diferença de 10 milhões de contos em relação ao que foi dito ter sido o défice do Ministério da Saúde no ano passado. Aliás, se isso é para pagar dívidas anteriores a 1997, então o que é que vai acontecer em relação ao que ocorreu este ano, em termos de despesas?
Recordo aqui que a dívida do Ministério da Saúde às farmácias já não é de 100 milhões de contos mas, sim, de 180 milhões de contos; a dívida a entidades convencionadas é de 50 milhões de contos; os hospitais devem 55 milhões de contos à indústria farmacêutica; o Ministério deve 40 milhões de contos, ou mais, pela aquisição de equipamentos hospitalares e deve um valor não contabilizado aos bombeiros e a um conjunto muito grande de fornecedores do Serviço Nacional de Saúde. E a dívida que tem de ser aqui contabilizada não tem a ver com os acordos que as instituições financeiras façam com os prestadores de serviços, desde o momento em que a factura foi emitida até ao momento em que o Ministério da Saúde paga, e, como sabemos, há prestadores que vêem decorrer seis meses entre esses dois momentos. O que nós queremos saber é como é que o Ministério da Saúde pensa fazer o pagamento dessas dívidas que foram contraídas em 1998 e que, com certeza, como não existem medidas de contenção nem de organização em 1999…
Aliás, este ano dar-se-á o início do funcionamento de dois novos hospitais, sendo que relativamente ao Hospital de S. Sebastião, em Santa Maria da Feira, como todos sabemos, há um compromisso do Ministério da Saúde no sentido de iniciar o seu funcionamento em Março deste ano. Ora, durante o próximo ano, tanto esse hospital como o do Barlavento Algarvio irão, naturalmente, ter um peso importante na componente da despesa, nova e acrescida, do Ministério da Saúde.
Mas em relação a este Orçamento não resisto salientar aqui o que nele me parece mais gravoso e que, em termos objectivos, é aquilo que tem a ver com a diminuição objectiva que existe em termos dos investimentos do PIDDAC.
Já afirmámos que no ano passado estavam inscritos 48,4 milhões de contos para investimento e este ano estão inscritos 44,3 milhões de contos no PIDDAC com a mesma finalidade. Portanto, há aqui uma diminuição de 4 milhões de contos. Ao mesmo tempo, se no ano passado o Ministério da Saúde estivesse a ser verdadeiramente sério quando fez as inscrições simbólicas, em termos de PIDDAC, entre os 2500 e o 5000 contos, verificávamos que este ano - e de acordo com os números oficiais do Ministério da Saúde - o PIDDAC teria de ter um volume de 67 milhões de contos, que é aquilo que consta no Orçamento apresentado no ano passado como sendo o investimento previsível para este ano. Mas o que aconteceu, Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra e Srs. Deputados, foi que eu contei mais de 100 projectos que no ano passado tiveram inscrição em PIDDAC na ordem dos 2000 e dos 5000 contos e que este ano voltam a ter essa mesma inscrição em PIDDAC.
Sr.ª Ministra, no que respeita a essa centena de centros de saúde e de extensões de centros de saúde, o que é que acontece com as verbas que para eles previam e relativamente aos quais as populações e as câmaras, de alguma forma, já criaram a expectativa de que iriam ser construídos? É que em relação a mais de 100 instituições previstas no ano passado, em termos de PIDDAC, há, pelo menos, o deslizamento de mais um ano.
Continuando a comparar os dados oficiais do Ministério da Saúde, reparamos que estão nesta situação uma centena de extensões e de centros da saúde e quase uma dezena de hospitais que recordo en passant, como os da Área Metropolitana da Lisboa e todos aqueles que foram
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anunciados. Portanto, um ano depois, verificamos que as intenções de investimento afirmadas pelo Ministério da Saúde não têm absolutamente nada a ver com a realidade.
Mas podemos tirar ainda outra conclusão: é que, até prova em contrário, as inscrições que foram feitas este ano nesses valores - 2500 e 5000 contos - são, no mínimo, "publicidade enganosa". Digo isto para não ser mais violento, para não dizer aquilo que, de facto, me passou pela cabeça em relação a um dado que é perfeitamente objectivável.
Não venha, portanto, o Ministério da Saúde dizer que o problema é a falta de terrenos, porque temos vários exemplos, que agora não vou referir para não ser fastidioso, como o do Centro de Saúde de Paço de Arcos, que já tem o terreno disponibilizado pela Administração Regional de Saúde. Como disse, há dezenas e dezenas de centros de saúde que estão nesta situação.
É um facto que o Ministério da Saúde não tem conseguido demonstrar capacidade em termos de cobrança de receitas próprias e em termos da previsão da própria despesa. Por outro lado, tenho um conjunto de documentos e de respostas a requerimentos em que se diz que o projecto do centro de saúde A será feito em 1998, que é para isso que são os 5000 contos, e que nos anos seguintes, por ser um investimento plurianual, estará concluído. Parece-me, portanto, que em relação a esta questão do PIDDAC não houve intenção de, seriamente, cumprir aqueles compromissos que ali estão.
Para terminar, volto à questão do rigor e da cobrança de receitas próprias. Já aqui se disse alguma coisa sobre isso, mas quero recordar que a previsão do valor dos serviços prestados pelas unidades de saúde para o ano passado era de cerca de 62 milhões de contos. Em 18 de Dezembro de 1997, o Sr. Secretário de Estado da Saúde apresentou-nos um papel, dizendo que se previa que o valor da cobrança dessas receitas para esse ano fosse de 40 ou de 41 milhões de contos. Nos papéis relativos à execução orçamental deste ano, verificamos que foram efectivamente cobrados 30 milhões de contos. Gostava, portanto, que em relação à má experiência de orçamentação que este Ministério da Saúde tem tido e demonstrado, por excesso de voluntarismo, como dissemos no primeiro ano, por optimismo, como dissemos no segundo ano, mas por alguma irresponsabilidade, podemos dizer neste ano final, houvesse algum rigor. Aliás, seria importante que nos dissessem quanto é que a ADSE e os outros sub-sistemas devem ao Serviço Nacional de Saúde, não tentando encontrar, recorrentemente, expedientes e dizendo que é muito difícil fazer estas cobranças, até porque há dois anos disseram que estavam a desenvolver mecanismos para esse efeito.
Em relação ao contencioso das companhias de seguros com o Ministério da Saúde, pergunto se existe alguma ideia do valor que está em causa. Em todo o caso, saliento aquilo que todos sabemos, ou seja, que o valor que está em contencioso nos tribunais acaba, muitas vezes, por não ser o valor reconhecido, chegando a descer para metade, como o Sr. Secretário de Estado sabe. Recordo, por outro lado, que o Dr. Arcos dos Reis, há cerca de dois anos, dizia que estava praticamente concluído um acordo com as companhias de seguros no sentido de se resolver esse problema.
Em suma, não temos qualquer intenção obsessiva de incomodar os titulares do Ministério da Saúde. O que queremos, fundamentalmente, é que, perante esta Câmara, e, por nosso intermédio, perante os portugueses, haja uma verdadeira noção da situação financeira do Ministério da Saúde, para que seja possível encontrarmos as soluções que, infelizmente, não vão ser encontradas neste momento.
Não queria deixar de recordar, muito rapidamente, a questão da saúde mental, porque me parece que, depois de aprovada a lei da Assembleia da República, os decretos regulamentares continuam à espera. Nessa área, era importante que fossem identificadas as prioridades em termos de investimento e que se resolvesse a questão dos orçamentos dos hospitais.
A última questão que coloco é a seguinte: quais vão ser as consequências práticas para os hospitais que, neste momento, têm dívida e défice e cujos orçamentos vão ser menores, de acordo com os critérios que o Sr. Secretário de Estado implementa? Vão aumentar o défice? Vão aumentar a dívida? É que, realmente, o que era necessário era verificar por que é que não há correspondência entre estes orçamentos.
Por fim, devo dizer que, de facto, o que estamos aqui a julgar e o que os portugueses irão julgar em Outubro são estes três anos e, se fizerem uma análise minimamente correcta, seremos nós a resolver os problemas hoje criados. Parece-me que, em relação a estas questões, o Ministério da Saúde me deve dar respostas muito simples, não elaborando um conjunto de asserções teóricas nas quais só acredita quem não tem contacto com os serviços de saúde.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, queria pedir-lhes que fossem objectivos nas questões que colocam, já que a lista de inscrições é muito longa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.
O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, o que se pode dizer nesta altura do debate tem a ver, naturalmente, com aquilo que já se disse. Pela nossa parte, tentando contribuir para o ambiente de bom senso, de seriedade e de objectividade que têm de existir em matéria de saúde, não podemos deixar de dizer que, ao invés do que aconteceu há alguns meses atrás, a saúde parece ter deixado de ser uma área de arremesso e de chicana política para alguns sectores da oposição. Felizmente, este debate dá-nos a possibilidade de fazermos esta afirmação com toda a convicção, porque hoje esse estado de espírito foi patente por parte de alguns sectores da oposição. Por isso mesmo, a minha intervenção, com o consentimento da Sr.ª Presidente, não será reduzida à objectividade dos números, mas, como V. Ex.ª já referiu, não tem sido essa a tónica do debate.
Para além disso, parece-me que se pode afirmar sem grande margem de erro que, ao cabo de 3 horas de debate, ficou claro que o debate sobre o orçamento da saúde para 1999, na especialidade, teve 99% de discussão sobre política de saúde e, eventualmente, 1 ou 2% de discussão sobre números, o que, em si mesmo, é um facto político.
Isto está relacionado com a perspectiva, na qual acreditamos e na qual estamos todos empenhados, de que temos uma política de saúde diferente, desde logo porque é
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uma política na qual elevámos muito a fasquia. De facto, a nossa fasquia é o cidadão, a nossa política está centrada no cidadão e assumimos esta responsabilidade, porque uma política centrada nos problemas das pessoas tem custos por nós assumidos. Mais importante do que isso, e ao contrário do que o Sr. Deputado Paulo Mendo disse, é a atitude política em si mesma, que é bem diferente da que foi seguida durante muitos anos pelos governos do País em matéria de saúde.
O Sr. Deputado Paulo Mendo está, como muitos outros, no sistema e no Serviço Nacional de Saúde desde o início e, como tal, conhece-o com profundidade. Deste modo, utilizarei uma figura que ilustra a realidade do percurso do nosso Serviço Nacional de Saúde dizendo que, logo após o seu início, este serviço entrou em "piloto automático" no que diz respeito à perspectiva macro-política e ao financiamento. Diria ainda que, ao fim de alguns anos, esse "piloto automático" apontava, pelo seu funcionamento, pela satisfação dos profissionais da saúde e pelo seu financiamento, para um crash e para um abismo em que se afundaria o Serviço Nacional de Saúde.
Depois, em 1993/1994, alguém tentou, e muito bem, mudar de "piloto automático" para "piloto manual", mas esse "alguém", que não interessa agora referir, não conseguiu, infelizmente, alterar a trajectória, porque o "piloto manual" não funcionou. Desde 1995, o Governo do Partido Socialista está a conseguir manter o Serviço Nacional de Saúde e, por arrastamento, o sistema de saúde em "piloto manual". É este "piloto manual" que está relacionado com a nova atitude política, uma atitude séria, clara e transparente que, como aqui se vê, até permite que em debate de especialidade sobre o orçamento da saúde possamos, frontalmente e em diálogo com os responsáveis, equacionar aspectos de macro-política, de micro-política e da própria gestão do sistema.
Gostaria ainda de registar que ouvi a intervenção inicial do Sr. Deputado Paulo Mendo e que, com toda a sinceridade, me revejo nos princípios dessa intervenção. Mas revejo-me também com alguma mágoa, porque se a relação causa-efeito entre os pressupostos do discurso do Dr. Paulo Mendo e a possibilidade de em dois anos se mudar a política de saúde fosse tão simples e linear, ficaríamos muito surpreendidos. Portanto, não venha agora o PSD pedir que, em três anos, o Partido Socialista seja capaz de fazer aquilo que durante 13 anos ninguém fez.
Uma coisa é certa: estamos na política com objectivos concretos e com uma perspectiva séria e, por isso, queremos ser avaliados, não apenas pelas questões económicas relacionadas com a gestão e com o financiamento, mas também pelo modo como a saúde dos portugueses e os próprios portugueses são tratados pelos serviços de saúde, sejam eles públicos ou privados.
Na nossa perspectiva política, o Estado é tão responsável pela prestação efectiva de cuidados de saúde públicos como o é pelo acompanhamento, pela fiscalização e pela criação de condições para que as prestações privadas vão ao encontro das necessidades dos portugueses.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Mantemos a linha de rumo e a afirmação de que a verdadeira reforma da saúde é a que se vai fazendo. A verdadeira reforma da saúde, aquela de que muitos falam e por ela pouco fazem, é aquela que se vai fazendo no dia-a-dia, com alterações concretas na prestação de cuidados de saúde e com a introdução de instrumentos reguladores da organização, instrumentos de garantia e instrumentos de acompanhamento. Essas, sim, Srs. Deputados, são as verdadeiras reformas que estão relacionadas com a qualidade de vida das pessoas.
Não quero terminar sem, mais uma vez, felicitar os Deputados que introduziram neste debate a tónica política, porque não há muito a dizer sobre as despesas de saúde. Toda a gente sabe, e os portugueses, eventualmente, sabem melhor do que nós, que, quando está em causa a saúde das pessoas, quando está em causa o fazer um transplante ou um internamento, isso tem de ser feito, independentemente do seu custo real. Portanto, penso que isso transpareceu neste debate e penso que não tivemos outra solução que não fosse a de discutir as políticas e o modo como elas são executadas.
Por último, diria que, pela nossa parte, o PIDDAC para 1999, que já foi hoje muito debatido, não merece ser tão criticado, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha. Bastaria fazermos uma comparação simples entre o que foi o PIDDAC executado ao longo dos últimos 10 ou 12 anos para verificarmos que aquela situação que tanto o preocupou, e bem, é uma situação normal em matéria de PIDDAC. Não estou a afirmar que é boa ou que é má, estou apenas a dizer que é normal e, portanto, se o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha pretende introduzir no debate um factor analítico profundo - e penso que será útil fazê-lo -, faça-o com aquilo que é relevante e anormal. Mas introduzir no debate situações que têm a ver com a normalidade do instrumento PIDDAC, não me parece, sinceramente, relevante, embora, naturalmente, possa ser feito.
Finalmente, eu esperaria que a oposição - e ainda temos tempo para fazê-lo - fizesse a análise profunda do Orçamento do Estado para 1999. Será que este orçamento corresponde ou não à capacidade de execução das políticas de saúde que este Governo definiu como sendo os seus próprios objectivos? Essa é que é a questão.
Na nossa perspectiva, entendemos que sim. Este orçamento é suficiente para garantir a execução das políticas de saúde.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Há três anos que diz isso!
O Orador: - Dissemo-lo há dois, há três anos e continuaremos a dizê-lo. O que também já temos dito, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, já que está atento e tem feito alguns comentários ao que vou dizendo, é que, tal como nós, os senhores também sabem que o Serviço Nacional de Saúde que temos foi esboçado, no início, com uma previsão muito afastada da sua real dimensão em termos de custos. Nós temos uma situação que foi revolucionária. O Serviço Nacional de Saúde, em si mesmo, foi uma revolução em termos do que é a prestação de cuidados de saúde. Mas, como todos os sistemas e todos os serviços que são implementados por uma lógica política e social, não foram ajustados no que tem a ver com o seu próprio financiamento e, ao longo dos anos, todos os governos, os do PSD, os do PS, foram herdando essa situação.
A diferença está na atitude política: é que alguns dos senhores mantiveram o Serviço Nacional de Saúde em "piloto automático", sem se preocuparem, verdadeiramente, com a natureza e a essência dos problemas do sistema e
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apenas utilizaram o financiamento como "combustível" para a "viagem" do Serviço Nacional de Saúde. Essa é a diferença! Nós assumimos que essa "viagem" precisava de ser comandada em "piloto manual", com novas alterações, com novos rumos. É o que estamos a fazer, foi um pouco o que tentou fazer o Dr. Paulo Mendo, em 1994 e 1995, não temos dúvidas em afirmá-lo. Só que nós estamos a conseguir fazê-lo, porque temos uma entourage política e social que nos é favorável. O Dr. Paulo Mendo, na minha modesta opinião, não conseguiu fazê-lo porque não teve esse apoio político-partidário nem teve essa entourage político-social favorável.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Em Outubro, será mudado o "piloto"!...
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, como não existe regulamento nem para o número nem para o tempo de intervenções e a única coisa que posso fazer, mais uma vez, é apelar ao bom senso dos Srs. Deputados. Vamos tentar evitar que os Srs. Deputados respondam uns aos outros, porque a Sr.ª Ministra da Saúde e o Sr. Secretário de Estado estão aqui para responder às intervenções dos Srs. Deputados. Agradeço que façam perguntas concretas, específicas e rápidas à Sr.ª Ministra e ao Sr. Secretário de Estado, para ver se conseguimos levar a bom termo a discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Saúde.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr.ª Presidente, vou fazer perguntas concretas, a não ser que os Srs. Deputados do PS e do PSD queiram que também faça uma intervenção genérica. Até à meia-noite, podemos estar aqui a conversar!... Na minha opinião, creio que esta repetição permanente, no debate na especialidade, do que se passa na generalidade só atrasa os trabalhos, independentemente das críticas e dos comentários que possam ser feitos. Os Srs. Deputados podem fazer as intervenções que quiserem, mas às vezes está a falar-se e não se diz nada... Pela minha parte, vou fazer perguntas concretas.
Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, no quadro das dotações iniciais do Orçamento do Estado, há uma verba que já referi, em sede de generalidade, de 49,257 milhões de contos, na rubrica "Diversos". Há 30 milhões de contos inscritos para programas nacionais e há uma verba de 13,5 milhões de contos para descongelamento de pessoal. É exactamente sobre esta questão que gostaria de ser esclarecido: que descongelamento de pessoal vai haver, em que áreas, para clínicos ou para enfermeiros? Que tipo de descongelamento se vai processar com esta verba?
A propósito, gostava também de saber se há verbas para a regularização de carreiras, se estão ou não incluídos os médicos e enfermeiros. Tendo em conta os acordos celebrados com os sindicatos, há ou não, para essa finalidade, cabimento orçamental?
Em relação à cobrança de dívidas, é possível saber-se qual o montante de dívidas dos subsistemas, nomeadamente das seguradoras? O Sr. Secretário de Estado referiu que há uma quantia de um milhão de contos de dívidas das seguradoras, sobretudo devido a acidentes de trânsito, mas parece-me que a dívida das seguradoras deve ser bastante superior. Assim, qual o total que os subsistemas devem, não apenas no que diz respeito às seguradoras sobre os acidentes de trânsito. Há-de haver, com certeza, outras áreas em que a dívida das companhias de seguros deve ser bastante superior. Já agora, o que está a ser feito para se conseguir a cobrança efectiva dessas quantias?
Quanto às farmácias, já aqui foi dito que há uma dívida, ao que parece, de cerca de 108 milhões de contos. A propósito, inquiro se o acordo com a Associação Nacional de Farmácias vai ou não ser revisto, se há ou não necessidade de o rever. Neste contexto, em relação às farmácias hospitalares, vai ou não haver algum desenvolvimento positivo, uma vez que entendemos que a dinamização das farmácias hospitalares, além de poder concorrer para uma resposta adequada aos interesses dos cidadãos, poderá também diminuir fortemente a despesa existente no País nesta área.
Sobre o capítulo dos investimentos, há um decréscimo. Verifica-se um certo abrandamento. O Sr. Secretário de Estado, no debate na generalidade, acentuou que é o próximo ano é o último em que vigora o QCA II e que se irá discutir o QCA III. O que pergunto é se as negociações se atrasarem, se por acaso o QCA III não for aprovado num prazo aproximado, o ritmo do crescimento de investimento continuará a baixar? Não haverá uma política de investimento própria do Ministério, sem considerar a eventualidade da existência, ou não, de um QCA?
Quanto ao financiamento da saúde, o Sr. Deputado Bernardino Soares já se lhe referiu. Sobre as construções hospitalares, o Governo definiu, como uma das suas primeiras prioridades o início da edificação do hospital distrital de Loures. A verdade é que consta uma verba de 25 000 contos, o que demonstra que há um arrastamento no prazo da sua construção. Parece que já há alguma evolução em termos de projecto. Relativamente a esta questão do hospital distrital de Loures, qual é a situação real? Se considerarmos que a dotação é de 25 000 contos, esta destina-se ao projecto?! Gostava de saber concretamente o que vai estar em causa.
Já agora, Sr.ª Ministra, a propósito de hospitais, creio que se aproxima o termo do contrato do hospital Amadora/Sintra. Já foi feita uma análise da aplicação deste contrato, o que tem sido negativo e o que tem sido positivo, o que se deve evitar ou não. Quais são os resultados sobre aquele contrato, discutível, celebrado com o hospital Amadora/Sintra?
Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, em relação à prestação de serviços, prevê-se uma verba de 114,2 milhões de contos. Pergunto se não estará sobreavaliada no Orçamento do Estado a previsão de receitas do Ministério, tendo em conta que as cobranças são sempre difíceis, como já ficou patente.
Finalmente, em relação ao artigo 59.º, que trata da regularização de responsabilidades e que vai até ao limite de 159 milhões de contos, no debate na generalidade - e é pena não estar aqui o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, porque com certeza a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado da Saúde darão a mesma resposta, o que será mau -, na reunião que houve na Comissão de Economia, Finanças e Plano, convocada por esta e não pela Comissão de Saúde, foi levantado o problema dos
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159 milhões de contos, nomeadamente a distribuição desta verba por vários anos. A resposta que tive oportunidade de apontar foi esta: "perguntem às finanças, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento já tem esses elementos". Uma vez que foi proferida essa resposta, o Secretário de Estado tem esses elementos. Sendo assim, estão em condições de nos dar informações concretas sobre este problema?
Ainda em relação à política de investimento, ao tal abrandamento, já foram referidas 75 dotações com 5000 contos ou menos, pelo que se verifica um certo abrandamento.
Sr.ª Presidente, outras questões poderiam ser aqui apresentadas, mas queria respostas concretas às perguntas concretas que fiz, sem blá, blá, blá...
(O Orador reviu.)
Risos gerais.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Presidente da Comissão de Saúde, bem como a Sr.ª Ministra da Saúde e os demais membros do Governo.
Acredite que vou ser directo nas questões colocadas, correspondendo também ao apelo feito pela Sr.ª Presidente.
Sr.ª Ministra, baseado nos mapas que nos foram fornecidos pelo Ministério da Saúde, através do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, gostaria de a interrogar sobre a recuperação de listas de espera. De acordo com o mapa, em 1995, foram executados 150 mil contos; em 1996, não houve verba orçamentada para a recuperação de listas de espera; em 1997, foi 1,804 milhões; para 1998, o valor estimado foi de 3,154 milhões (aqui, e ao contrário de outras indicações que nos são dadas nesse mesmo mapa, faltou o executado em 1998 ou, pelo menos, não se aponta a previsão); para 1999, prevê o Orçamento um valor de 6 milhões de contos.
De facto, há aqui um crescimento notório, o que me leva a perguntar se isto não é, de facto, o reconhecimento de que há cada vez mais filas de espera no Serviço Nacional de Saúde, tanto mais que se tem vindo a verificar um crescimento exponencial ao nível desta rubrica no Orçamento. E, curiosamente, há aqui uma inversão em termos dos serviços prestados, porque não é alheio a ninguém a constatação permanente de que há muita gente à espera de uma consulta.
Ainda em relação aos acréscimos percentuais, na receita prevista no Orçamento do Estado para 1999, há uma diminuição na rubrica "prestação de serviços". Percentualmente, de acordo com o mapa que nos é fornecido, em 1997/1998, era de 45,4% e, em 1998/1999, é de 35,4%. Isto significa o quê? Significa que, de acordo com a leitura que faço - e se assim não for, peço à Sr.ª Ministra que corrija -, podemos concluir que o Serviço Nacional de Saúde prevê prestar menos serviços ou, então, está aqui a aceitar, tacitamente - diria eu -, a impossibilidade de algumas cobranças, nomeadamente aos subsistemas. Ou seja, não será corrigir um pouco o "tiro", tendo em consideração os orçamentos anteriores e a dificuldade em cobrar aquilo que estava orçamentado?
Ainda em relação a outro mapa, que tem a ver com o mapa da despesa total do ano, há, de facto, novos investimentos para 1999. Há um acréscimo substancial para novos investimentos, que aceitamos, ou melhor, constata-se uma diminuição no âmbito do PIDDAC, mas aqui, em termos de novos investimentos, há um acréscimo substancial, na ordem dos 8,4 milhões, que corresponde a uma média de 25,8%. Tendo em consideração que tive oportunidade de consultar o mapa do investimento pelo Ministério, e refiro-me apenas aos novos investimentos e às obras de grande volume, verifico que, por exemplo, o Hospital Distrital de Braga tem 450 mil contos; o Hospital de Cascais, 25 mil contos; Hospital de Lamego, 25 mil contos; o Hospital de Loures, 25 mil contos; o Hospital da Póvoa de Varzim, 210 mil contos; o Hospital de Vila Franca de Xira, 25 mil contos; o IPO de Lisboa, 280 mil contos. Dá-me a impressão que alguns destes hospitais já beneficiavam, no Orçamento do Estado para 1998, de uma verba e, curiosamente, aparecem no Orçamento do Estado para 1999 como obras a iniciar, ou seja, como novos investimentos.
Não tenho hipótese de comparar isto com o orçamentado porque esse mapa não nos foi fornecido. Porém, tenho ideia que, por exemplo, em relação ao Hospital da Póvoa de Varzim, já havia uma verba orçamentada para 1998 que não foi utilizada. Era isso que gostaria de saber da Sr.ª Ministra.
Já agora, um pequeno aparte sobre a rubrica relativa a pessoal, que, de acordo com o mapa que nos é fornecido, cresce 5%. Sem querer fazer aqui uma brincadeira sobre este assunto, porque ele é sério, penso que estes valores não chegam para resolver os problemas e os conflitos com os médicos. Julgo que este crescimento no Orçamento não é suficiente para resolver alguns problemas que existem e gostaria de saber se, de facto, este crescimento no Orçamento é suficiente.
Queria colocar ainda uma questão que tem a ver com o Hospital Amadora/Sintra, ou seja, o contrato tinha um preço fechado para cinco anos e pergunto, muito objectivamente, qual o pagamento, nos termos do contrato de gestão, em 1998 e qual a previsão para 1999.
Terminava com uma questão objectiva que tem a ver com as receitas do Serviço Nacional de Saúde. Ao longo da manhã, toda a gente foi unânime em considerar que as receitas são insuficientes em relação à despesa. Partimos de um pressuposto errado pois, nomeadamente, quem está ligado a essas coisas de orçamentos tem de arranjar receita para aquilo que orçamenta. No entanto, sabemos já, a priori, que as receitas não vão ser suficientes para as despesas e pergunto se há uma previsão para a derrapagem em relação ao Orçamento do Estado para 1999 e como pretende o Ministério da Saúde suprir esta derrapagem orçamental, desde já aceite
A Sr.ª Presidente: - Para responder a este grupo de questões, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr.ª Presidente, respondendo às perguntas dos Srs. Deputados e a começar pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha relativamente à afirmação de que neste Orçamento do Estado se está a assistir a um filme repetido, devo dizer que, quando se discute um orçamento, não posso deixar de dizer também aquilo que já foi feito e o Sr. Deputado, que é com certeza uma pessoa
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justa, reconhecerá que foram dados passos muito consistentes em relação àquilo que é uma política de saúde definida, aceite, e que, pelos vistos, não é contrariada pelos Srs. Deputados, em termos da sua formulação genérica e em função dos seus objectivos.
Gostaria de me referir, especificamente, a uma questão que apresentou quanto às reformas da saúde. Se for compulsar o que eu sempre disse, o Sr. Deputado verá que sempre afirmei que as reformas da saúde têm de ser lentas, progressivas, cautelosas, para não implicarem rupturas. E não sou só eu que o digo mas também os instrumentos que foram construídos antecipadamente. Lembro aquele documento relativo ao financiamento do Serviço Nacional de Saúde, ou ao financiamento da saúde, genericamente, digamos assim, do tempo do Sr. Deputado Paulo Mendo enquanto Ministro, que apontava, em relação a todas as medidas, para uma construção progressiva e cautelosa de um conjunto de coisas. Ora, nós nunca afirmámos que íamos fazer reformas com ruptura, pelo contrário, sempre defendi que as reformas têm de ser construídas progressivamente, passo a passo, cautelosamente…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mas não é parados!
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Não é parados, com certeza que não é parados! Por isso mesmo, tem sido construído progressivamente todo um conjunto de coisas que nos permitem avançar consistentemente, com cautela e, sobretudo, solicitando o mais possível de consenso em relação a esse tipo de medidas.
Queria referir, por exemplo, a questão da agência, que foi lançada em 1996, que teve um desenvolvimento relativamente modesto no primeiro ano, como é natural, dado que a própria cultura não estava sedimentada e, progressivamente, tem vindo a ser envolvida na construção dos orçamentos dos hospitais e, sobretudo, na construção dos contratos específicos, para garantir esta cultura que tem de ser construída e não existe na Administração Pública portuguesa.
Consideramos que a saúde é um instrumento vital para modernizar a Administração Pública portuguesa e daí aquilo que tem vindo a ser avançado relativamente a medidas que são importantíssimas para mudar o que é a Administração Pública tradicional.
Gostaria até de me referir a algo que é muito importante, em meu entender, e que penso que também reúne consenso, que são as remunerações ajustadas ao desempenho, em termos de qualidade e de quantidade.
Como sabem, foi já divulgada e publicada a remuneração experimental relativamente aos clínicos gerais e está a ser construída uma forma de remuneração associada a esse desempenho nos hospitais. E nos hospitais, para além do estatuto jurídico novo que, em princípio, deve também ser aplicado a instituições novas, estamos a definir os centros de responsabilidade integrados com um nível de autonomia e uma concepção completamente diferentes daqueles que estavam previstos na actual lei de gestão hospitalar. Foi um passo dado neste sentido já na altura, mas acabou por ter, como sabem, uma concretização muito discreta, em termos dos serviços que adoptaram este tipo de modelo, até porque aquilo que se consagrava, eventualmente, não era suficiente. Penso que aquilo que agora se está a trabalhar e a construir é consistente, é importante e vai ser um factor de intervenção na gestão das instituições em relação às quais não há possibilidade de alterar genericamente o respectivo estatuto.
Gostaria também de apontar outros diplomas e recordar-lhe que temos tido, em saúde, um conjunto de diplomas legais que são, eles sim, afirmativos e por vezes demasiado optimistas, porque as coisas ou se constróem em termos de base ou não conseguimos chegar lá através da mera formulação legal. Isto porque a realidade é resistente e é renitente na adopção de determinado tipo de mudanças. Temos estado a instalá-las progressivamente no terreno, construindo seguidamente os diplomas legais que as consubstanciarão, que as enformarão e que lhes darão um enquadramento, tendo também a preocupação de construir diplomas legais que sejam enquadradores apenas de maneira genérica e não demasiado formatadores da realidade, quando ela é substancialmente diferente nas várias regiões do País e, diria até, nas sub-regiões.
Daí a questão dos sistemas locais de saúde, dos centros de saúde e de um conjunto de outros diplomas, também eles ligados à questão do sistema da qualidade, designadamente aos licenciamentos, que estão em fase final de ultimação, face ao conjunto de parceiros que é necessário consultar, mas que são, inequivocamente, passos dados numa determinada orientação e de acordo com aquilo que foi sempre aqui defendido e afirmado. Portanto, ainda bem, nesse aspecto e em relação ao que são as opções de política de fundo, que hoje dizemos aqui aquilo que dizíamos em 1995 e em 1996.
Gostava ainda de me referir à questão dos investimentos, sem prejuízo, como é óbvio, de mais alguma especificação. Sempre aconteceu,…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Nesta dimensão, não!
A Sr.ª Ministra da Saúde: - … em relação a muitas das previsões que são feitas - pelas mais variadas razões, que às vezes não têm a ver com terrenos mas com lançamentos de concursos que não são feitos atempadamente, também pelas mais variadas razões -, haver todos os anos uma redistribuição do PIDDAC, em função dos projectos que puderam prosseguir em bom ritmo, alguns deles até, adiantadamente, em relação a outros. Isso sempre se fez no Ministério da Saúde e vai continuar a fazer-se, porque as vicissitudes ligadas a um projecto são muito variadas, e o Sr. Deputado sabe isso com certeza.
Portanto, o estranho não é que se façam redistribuições, o estranho seria que se desaproveitassem as inscrições feitas e não se pudessem ajustar àquilo que é a capacidade que uns projectos têm de avançar mais depressa do que outros.
A este propósito, gostaria de referir ainda que as inscrições simbólicas não são publicidade enganosa, são intenções que se concretizam ou não em função dessas mesmas capacidades e da situação real existente. Aliás, se o Sr. Deputado, depois, tiver o cuidado - tem com certeza esse levantamento feito- de identificar aquilo que não avançou, posso dizer-lhe e explicar-lhe, depois de consultados os serviços, o que é que não avançou e porque é que não avançou. Posso explicar!
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Por vezes, as razões são de natureza muito prática e muito ligadas a problemas que existiram e que não têm a ver só com terrenos, como o Sr. Deputado referia. Não se diga que foi só por falta de disponibilidade do terreno. Umas vezes é isso, outras vezes são outros factores, designadamente as impugnações, que são frequentes e que retiram a capacidade e cumprir a calendarização que estava prevista.
Relativamente à questão da saúde mental, que foi também referida pelo Sr. Deputado en passant, não percebi se se estava a referir à saúde mental, medicamentos e comparticipações específicas, ou se era à regulamentação da lei de saúde mental que foi aprovada nesta Câmara. Em relação à regulamentação, já seguiu para Conselho de Ministros, devendo estar a ser aprovada muito brevemente.
Quanto às perguntas que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca colocou - e, no que diz respeito a algumas delas, pediria ao Sr. Secretário de Estado para dar uma resposta mais pormenorizada -, gostava de referir o seguinte: o Hospital de Loures tem o seu programa funcional já terminado. Foi lançado este ano o concurso e penso que o programa funcional foi apresentado há cerca de um mês ou mês e meio, estando, portanto, a ser objecto de análise.
O programa foi feito com base num concurso lançado, penso que um concurso internacional, e está a ser analisado a nível da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo. Trata-se de um programa importante para nós porque, em princípio, será, de certa forma, parecido com os de outros hospitais distritais que vão ser lançados e cuja concepção fizemos questão de entregar ao exterior, para permitir que ele tivesse alguma novidade em relação ao que eram os programas funcionais construídos tradicionalmente pelo Ministério da Saúde.
Em relação ao Hospital Fernando da Fonseca, o contrato é de cinco anos, tendo-se iniciado em 1 de Janeiro de 1996, se não estou em erro, e, portanto, ainda está a meio da sua validade.
Foi já objecto de uma auditoria determinada pela própria empresa gestora e o Ministério da Saúde tem uma comissão de acompanhamento que segue aquela instituição e adquirirá ao exterior aquilo que é a avaliação do próprio Ministério da Saúde.
Em relação às perguntas que o Sr. Deputado Moura e Silva fez sobre os mapas fornecidos pelo Ministério, para além de outras explicitações, gostava de referir o seguinte sobre o Programa Específico de Recuperação das Listas de Espera: aquilo que se executou em 1995 foi na sequência do concurso do PERLE, lançado ainda pelo Sr. Deputado Paulo Mendo enquanto Ministro e parte desse programa veio a concretizar-se em 1996 na ARS do Norte. Foi um programa nacional, mas só a nível da ARS do Norte é que acabou por ter alguma execução.
O programa lançado pelo Ministério em 1997 já recolheu alguns dos ensinamentos daquilo que foi uma incapacidade, digamos assim, do sector privado de responder àquilo que foi uma interpelação, de certa forma, feita pelo Ministério da Saúde. Realmente, a capacidade de execução ficou bastante aquém das expectativas, daí que o Ministério da Saúde tivesse feito, nesse primeiro ano, uma discussão com os seus próprios estabelecimentos, no sentido de eles serem envolvidos em programas de recuperação de listas de espera, até porque essa oportunidade não tinha sido dada no programa inicial e era muito importante, porque, como já aqui tem sido referido, os serviços públicos quanto mais fazem mais gastam se não for associado à sua produção o financiamento. Portanto, era uma forma de começar a corrigir, ao fim e ao cabo, esse problema de base, que, realmente, deve incentivar um aproveitamento cada vez maior daquilo que são os recursos existentes a nível dos hospitais públicos.
Por outro lado, aquilo que será o desenvolvimento deste programa está associado a uma lista de espera não quantitativa mas, sobretudo, qualitativa, associado àquilo que, de acordo com o programa construído pelo Ministério, são efectivamente as diferentes patologias, a sua gravidade em termos do que é o prognóstico relativo ao doente. Portanto, é uma lista de espera que se pretende inteligente e não uma recuperação de uma lista de espera em função apenas daquilo que é a espera realmente existente, uma vez que ela é qualitativamente diferente, e avançando para prazos em termos da duração razoável da espera, em função também da gravidade dos doentes e da situação específica de cada doente.
Peço agora ao Sr. Secretário de Estado da Saúde para completar os esclarecimentos, porque as perguntas que me colocaram já foram muito de especialidade.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, vou tentar responder a todas as questões e ser concreto nas respostas.
Quanto à questão da dívida acumulada, nomeadamente em 1997, devo dizer que, de facto, a estimativa que aqui foi apresentada em Dezembro de 1997 não corresponde aos números finais, pois estes vieram a revelar-se como não conseguindo atingir essa estimativa e, portanto, na cobrança de receitas próprias efectiva em 1997, não foi possível atingir os números previstos, o que quer dizer que a situação financeira teve números um pouco mais no vermelho do que aquela que foi aqui apresentada enquanto estimativa. Aliás, a questão das receitas próprias é, mais uma vez, uma questão recorrente e que isto agora só vem confirmar.
Sobre a questão do financiamento dos novos hospitais a entrarem em funcionamento em 1999, conforme está nos mapas apresentados, estamos a prever, disponibilizando verbas do orçamento do SNS, 7 milhões de contos para cobrir o adicional que vai representar a entrada em funcionamento dos novos hospitais em relação, naturalmente, aos hospitais que vão ser substituídos: no caso da Feira e do barlavento algarvio, os Hospitais de S. Paio de Oleiros e de Portimão. Ou seja: estamos a considerar no Orçamento para 1999 até 7 milhões de contos a mais em relação ao funcionamento dos outros dois hospitais.
A questão do PIDDAC já está respondida.
No que se refere à questão da saúde mental, para além daquilo que a Sr.ª Ministra já disse, posso acrescentar que está a ser feito um trabalho de reequacionamento, face à nova política, daquilo que são, digamos, dotações dos hospitais psiquiátricos, canalizando-os, de facto, para investimentos nas rede junto dos hospitais gerais, ou seja, na prática ver que possibilidades é que temos de gerir as verbas que são dedicadas à saúde mental para implementar esta nova política.
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Quanto à questão da concretização e aprofundamento da metodologia do financiamento hospitalar e da possibilidade de gerar novos défices em alguns hospitais, a situação, mais uma vez, provavelmente, dependerá de hospital para hospital.
A metodologia anterior gerou, de facto, não direi um sobrefinanciamento em alguns hospitais mas, sim, um excesso de dotação financeira, que está agora a ser corrigido não de uma forma meramente administrativa, ou seja, já que há ali algum saldo positivo, vamos lá buscá-lo para transferências, porque isso parecer-me-ia uma medida meramente administrativa que as administrações que se pretendem responsáveis por aquilo que lá acontece não entenderiam, mas, sim, de uma forma que leve a que o dinheiro siga o doente e aquilo que é feito e não apenas critérios de existência dos serviços.
Esta é, sem dúvida, uma medida que visa disciplinar e responsabilizar as administrações hospitalares, dando-lhe instrumentos - sabem exactamente como é que o seu orçamento é construído - e possibilitando também a construção de instrumentos internos ao seu hospital, porque, como todos sabemos, na questão da execução do orçamento dentro de um hospital, é fundamental que os órgãos intermédios, directores de serviços, os futuros centros de responsabilidade, possam compartilhar desses objectivos. É por aí que vamos e é por aí que esta medida vai ter algum impacto também e não na questão de que vai gerar um défice neste ou naquele hospital. Vai ser possível, cada vez mais, explicar por que é que nuns hospitais existe défice e noutros não. Penso que esta é uma medida positiva e um caminho positivo. Estaremos aqui todos de acordo em que, de facto, os problemas financeiros dos hospitais do SNS não sejam uma grande nebulosa mas consigamos ter algum esclarecimento por que é existem e onde é que existem.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca levanta a questão dos 13 milhões de contos para descongelamentos de pessoal. Não tenho comigo qualquer elemento específico de quais são os números, por categorias, que estão aqui previstos, mas, certamente, essa pode ser uma informação a fornecer-lhe com rigor. Agora, sei que estão previstos descongelamentos para médicos e penso que não erro se lhe disser que estão previstos descongelamentos de cerca de 2000 enfermeiros e, naturalmente, para farmacêuticos, para técnicos de diagnóstico e terapêutica, pessoal de serviço social… Enfim, correndo algum risco de não lhe dar os números exactos…
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Poderá dar-mos mais tarde!
O Orador: - Com certeza!
Em relação à segunda questão, ou seja, verbas para a revalorização de carreiras, já tivemos a oportunidade de dizer que sim, portanto, está em termos de dotação global no Orçamento do Estado. São verbas consideradas na dotação provisional do Ministério das Finanças e estão considerados entre 7 e 8 milhões de contos, em 1999, para fazer face a todas as regularizações de carreiras já acordadas, seja com médicos, seja com enfermeiros, fundamentalmente estas duas carreiras.
No que respeita aos débitos das seguradoras, falámos, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, em cerca de 1 milhão de contos e essa é a verba que, provavelmente, será abrangida pelo acordo que estamos a celebrar com as seguradoras, com vista a resolver, de uma forma pragmática e rápida, a questão dos acidentes de viação.
De qualquer maneira, o total dos débitos das seguradoras para com o SNS ronda os 5 milhões de contos, de acordo com a última informação que tenho disponível. Estamos, de facto, a resolver uma parte da questão e estamos, sobretudo, a resolver, não apenas a questão do passado mas a encontrar um método mais simples e pragmático que possa evitar uma situação que é de quase sistemático recurso à via contenciosa para o resolver.
No que se refere às dívidas às farmácias, a revisão do acordo vai colocar-se no próximo ano e, naturalmente, elas serão equacionadas na altura em que se fizer a revisão do acordo com a Associação Nacional de Farmácias.
Sobre a questão das farmácias hospitalares, estamos a preparar medidas que levem a um reforço do papel da actuação das farmácias hospitalares, no sentido de não haver qualquer autolimitação da sua actuação e fundamentalmente com um objectivo, que é facilitar a vida aos utentes dos serviços de saúde. Essa é a questão fundamental. Mais do que, eventualmente, ter como objectivo diminuições de despesa, julgo que aí teremos de fazer, naturalmente, alguns estudos que confirmem essa diminuição da despesa; agora é, de todo em todo, vantajoso, certamente, não limitar a actuação das farmácias hospitalares, antes reforçar o seu papel, dotando-as de melhores meios para fazerem o que fazem hoje e poderem alargar a sua actividade.
Quanto à redução do investimento no PIDDAC, de facto, estamos no último ano do QCA2, o que tem consequências inevitáveis, fruto, fundamentalmente, de uma execução atempada das verbas do Quadro entre 1994 e 1999. Naturalmente que contamos com o novo Quadro Comunitário de Apoio 2000-2006, mas algum atraso que surja, que terá, muito provavelmente, consequências, tem que encontrar formas alternativas de financiamento a dois níveis.
Para 1999 temos uma maior disponibilização de verbas do chamado auto-investimento, ou seja, permitindo que os estabelecimentos hospitalares, nos seus orçamentos, prevejam para 1999, um maior crescimento por verbas de exploração, não baixando o ritmo de investimento, nomeadamente em termos de substituição de equipamento e de pequenas obras que tenham de ser feitas. Essa é uma fonte, mas não é, provavelmente, a questão ideal.
Estamos, como sabem, a estudar fontes de financiamento alternativas para o investimento, até porque, em termos de médio e longo prazos, é importante podermos deter essas fontes alternativas, para que se possa concretizar e antecipar mesmo todo o plano de investimentos que o Ministério da Saúde tem, que não é construir novas edificações, mas, fundamentalmente, olhar para os hospitais que já temos, para as instalações que já temos, e poder aí intervir de forma coerente. No fundo, trata-se de disponibilizar recursos que nos permitam intervir em hospitais, como o de Santa Maria e de S. João, de uma forma mais consistente e rápida, simultânea com a construção de novas instalações.
A questão sobre o hospital de Loures já foi respondida, assim como a referente ao Hospital de Amadora/Sintra.
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Quanto à questão das receitas próprias, devo dizer que a sua orçamentação tem necessariamente de corresponder às expectativas de facturação dos serviços de saúde. Isto sempre foi feito e penso não haver qualquer alternativa a este procedimento. De facto, temos um problema estrutural de cobrança de receitas próprias, havendo necessidade de uma melhor definição do papel dos subsistemas. Já foi referido que estamos a trabalhar nisso e é preciso continuar esse trabalho de definição do papel dos subsistemas, desenvolvendo-o a nível não só de macroestrutura mas também de instrumentos técnicos, como dissemos.
Agora, a estimativa das receitas próprias deve, até mesmo por uma questão de incentivo ao funcionamento dos próprios serviços, reflectir a sua produção e facturação.
Quanto à questão da regularização de dívidas, falada na reunião preparatória do Orçamento do Estado para 1999 na Comissão de Economia, Finanças e Plano, gostava de esclarecer um aspecto: o que referi foi que a contabilização, em sede de contabilidade nacional, deste montante, a sua distribuição pelos vários anos, é naturalmente do conhecimento do Sr. Secretário de Estado do Orçamento; já o montante das dívidas do Serviço Nacional de Saúde é naturalmente do meu conhecimento. E aqui o que estamos a propor é uma regularização de dívidas que abranja as dívidas acumuladas até 31 de Dezembro de 1997. Ou seja, estamos a propor, de uma forma clara, que essa dívida acumulada do Serviço Nacional de Saúde, até 31 de Dezembro de 1997, possa ser regularizada até 159 milhões de contos. Porquê? É que, relativamente à questão da dívida e da dívida rolante, ou seja, dos prazos de pagamento do SNS, nós, em 1998, nesta altura, teremos certamente um valor final dependente da capacidade de cobrança das receitas próprias que formos capazes de implementar até aos prazos regulamentares, mas, de qualquer maneira, numa situação que não inviabiliza aquilo que é uma gestão saudável de tesouraria do SNS. Ora, este valor que aqui está destina-se exactamente a repor a capacidade daquilo que nós chamamos uma gestão saudável de tesouraria do SNS.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Até 159 milhões de contos?
O Orador: - Até 159 milhões de contos.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Mas pode ser que seja mais…
O Orador: - É mais do que 159 milhões de contos. A dívida acumulada, em 31 de Dezembro de 1997, é mais do que 159 milhões de contos, mas o montante de 159 milhões de contos destina-se a repor o equilíbrio financeiro.
Enfim, julgo que, da forma mais concreta possível, foram passados em revista os pontos abordados.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos.
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Começo por cumprimentar a Sr.ª Presidente, o Sr. Presidente da Comissão de Saúde e os Srs. Membros do Governo, nomeadamente a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
Em primeiro lugar, quero dizer que me sinto pouco à vontade a discutir este orçamento da saúde para 1999, porque, até agora, só tenho ouvido, da parte dos membros do Governo, generalidades e intenções. A única coisa concreta que aqui ouvi dizer foi que, afinal, as quotizações para a ADSE podiam ser descontadas em sede de IRS, afirmação feita pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Não se trata de uma medida nova, já é antiga, mas, ao menos, que, concretamente, se fique com essa ideia e que os portugueses, sobretudo aqueles que descontam para a ADSE, também saibam que podem, em sede de IRS, descontar essas mesmas quotizações.
Também me sinto pouco à vontade, porque tudo é projectos-piloto, aqui e além, cada intenção passa sempre por um projecto-piloto, e, às tantas, fico confundido e chego a pensar se este Ministério da Saúde também não será um projecto-piloto e se cada orçamento de cada ano também não será um projecto-piloto. É esta a ideia geral.
Já agora, a propósito de projecto-piloto, fiquei a saber, pelo simbolismo apresentado, em relação à saúde, pelo Sr. Deputado José Alberto Marques, ao falar de "piloto manual" e de "piloto automático", que, afinal, para o PS, a política de saúde é uma política aérea.
Sinto-me também pouco à vontade, porque, quando se quer discutir não só as medidas de política e as suas grandes áreas de intervenção mas também um orçamento do Estado ou um financiamento da saúde, é preciso partir do pressuposto de que estamos a discutir propostas sustentadas, propostas politicamente sérias e consistentes, isto é, propostas credíveis, e de que há vontade de implementá-las. Por isso, sinto-me pouco à vontade. É que, para mim, nem as propostas têm credibilidade, nem V. Ex.ª como Ministra; para mim, digamos que é uma desilusão. E não só para mim como para os agentes de todo o sector e ainda para todos os portugueses.
De facto, ao longo destes anos - e a Sr.ª Ministra já ocupa a pasta da saúde há três anos - e em cada ano, V. Ex.ª promete mais rigor e mais eficiência na gestão do orçamento. Recordo que, por exemplo, em 1996 - na altura em que tudo eram rosas, porque, hoje, já são espinhos, com certeza -, a Sr.ª Ministra dizia isto: "Tenho um orçamento de 800 milhões de contos, que tem de ser gerido criteriosamente" ou, ainda, "as pessoas já aceitaram que há muitas disfunções no sistema de saúde que têm de ser corrigidas, para que seja possível o orçamento chegar" - e o orçamento, neste caso, eram os 800 milhões de contos. Ou, então, ainda em 1997, dizia o seguinte: "A política de saúde vai concretizar-se através de um conjunto de novos programas e medidas com significativo impacto orçamental, a nível da receita e da despesa; haverá, então, melhoria de receitas e de despesas, conseguida através de medidas eficientes nesta área".
No entanto, o que é que se vê? Vê-se que, em três anos, o défice acumulado aumentou cerca de 200%! Sr.ª Ministra, a senhora, quando orçamenta, não sabe quanto gastou no ano imediatamente anterior? Aliás, há pouco, o meu colega Jorge Roque Cunha perguntou qual era a previsão de défice acumulado, no sector, em 1998, e não obteve resposta.
A Sr.ª Ministra financia e, depois, programa. Isto é, actualmente, o Ministério é um grande "saco roto", onde tudo o que entra se perde e não tem o aproveitamento correspondente.
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A Sr.ª Ministra várias vezes tem dito que se gasta mais, porque se faz mais. E nós, constantemente, temos querido compaginar estas suas afirmações, pedindo-lhe os dados estatísticos do Ministério da Saúde, a partir de 1995, que ainda não recebemos, com os indicadores do movimento assistencial de 1996, 1997 e 1998.
No entanto, esse aumento de gastos igual ao aumento de produtividade também não tem compaginação com aquilo que veio a público, esta semana, ao saber-se que a maior parte dos hospitais da região de Lisboa viram diminuir os seus orçamentos. Penso que se se orçamenta em função da produtividade e se percentualmente os seus orçamentos diminuem, é porque, de facto, não há aumento de produtividade. E se não há e se esta zona tem um grande peso no que diz respeito à produtividade a nível nacional, não sei como se poderá ainda afirmar que as grandes despesas na área da saúde, estas grandes derrapagens, têm a ver com um aumento de produtividade.
Também não estou à vontade para estar a discutir este orçamento, porque desde há três anos que a senhora é Ministra da Saúde e promete várias reformas estruturais, ano após ano e em sede de cada orçamento, mas, em cada ano que passa, elas são adiadas.
Onde está a política do medicamento, que a Sr.ª Ministra vem anunciando desde 1996? Onde está, dentro da política do medicamento, que a Sr.ª Ministra vem anunciando desde 1996, o formulário nacional por patologias? Onde está o incremento da prescrição por nome genérico, por princípio activo? Onde está, correspondentemente, o incremento dos medicamentos genéricos?
Há três anos que a senhora é Ministra e fala em novos modelos de gestão nos hospitais, dando-lhes mais autonomia e outras possibilidades de financiamento. Onde está o estatuto jurídico dos hospitais, tão prometido desde 1996?
Há três anos que a senhora é Ministra e, em cada ano que passa, vai dizendo que é preciso dar autonomia aos centros de saúde. Onde está o célebre diploma sobre a criação de grupos personalizados de centros de saúde, que não sei em que situação e em que gaveta está?
Há três anos que a senhora é Ministra da Saúde e, ano após ano, vai anunciando que, no fim daquele ano ou no ano seguinte, o cartão de utente estará implementado em todo o País. Hoje, chega-se à conclusão de que só está implementado em 49% do País e, se calhar, nem isso ou, melhor dizendo, esses 49% não correspondem a uma realidade, porque a maior parte das pessoas tem cartão, mas o sistema informático, o sistema verificador do utente, não está a funcionar.
Há três anos que a senhora é Ministra da Saúde e promete para cada ano maior equidade no acesso ao sistema. No entanto, vão aumentando as listas de espera, sobretudo na área cirúrgica, e quem é atingido por essa grande dificuldade são os mais desfavorecidos.
Há três anos que a senhora é Ministra da Saúde e promete mais qualidade e humanização dos serviços, mas, progressivamente, em cada PIDDAC, verifica-se que os novos investimentos e as novas unidades de saúde são adiados.
Esta falta de política na saúde do seu Governo, esta falta de rumo, não é só observada por nós. Di-lo o relatório da OCDE; di-lo o relatório do FMI; dizem-no os portugueses e, ultimamente, di-lo o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos, ao referir, recentemente, que tinha sido tudo "chá e simpatia".
Sr.ª Ministra, de facto, a senhora, nestes três anos, preferiu não ter problemas na governação, mas criou problemas aos portugueses, concretamente aos utentes, que têm uma maior dificuldade no acesso aos cuidados de saúde.
Pese embora esta minha dificuldade em discutir o próprio orçamento, permita-me colocar-lhe duas questões.
O Ministério da Saúde tem, neste orçamento, um programa de melhoria do acesso, que é financiado com 4,6 milhões de contos, na área da recuperação das listas de espera cirúrgica. Pergunto, Sr.ª Ministra, o seguinte: este número e o número de doentes atingidos por esta recuperação resultaram de que levantamento? Em que áreas do País e em que unidades vai investir nesta recuperação? Faço-lhe estas perguntas, porque já sei que, em Lisboa, pelo acordo que fez com a Cruz Vermelha Portuguesa, vai resolver o problema a grande parte da região de Lisboa, senão a toda.
A minha pergunta de como é que chegou aos números relativos às áreas cirúrgicas tem a ver com o facto de a Sr.ª Ministra pretender resolver o problema das listas de espera, na área de oftalmologia, a 1200 doentes na região de Lisboa e a 2000 no resto do País; na área de varizes, a 1000 doentes na região de Lisboa e a 1500 no resto País; na área de ortopedia, a 1000 doentes na região de Lisboa e a 1000 no resto do País. Portanto, gostaria de saber que tipo de levantamento foi feito e se já estabeleceu em que sítios vai desenvolver esta recuperação das listas de espera.
A outra questão que queria colocar é a seguinte: quando é que a Sr.ª Ministra pretende, ao nível do distrito do Porto, continuar aquilo que já vinha do passado, ou seja, a renovação e remodelação das unidades de saúde? É que, compulsando o Orçamento de 1998, verifica-se que este ano, em termos de PIDDAC, há um desinvestimento, ou um não investimento, de cerca de 3 milhões de contos.
Cerca de 99% dos investimentos a serem feitos em hospitais e centros de saúde do distrito do Porto foram adiados um ano. Senão, repare: Centro Materno-Infantil do Norte, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 1,5 milhões de contos, agora, estão inscritos, para 1999, 80 000 contos; Hospital Dr. Eduardo Santos Silva, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 500 000 contos, agora, estão inscritos 135 000 contos; Hospital Distrital de Póvoa do Varzim, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 300 000 contos, agora, estão inscritos 210 000 contos. Este é o hospital que a Sr.ª Ministra, na célebre viagem de helicóptero que fez pelo País, apontava que estaria terminado no ano 2001, mas, por aquilo que consta em termos de PIDDAC, só 15% das verbas do custo total é que serão utilizadas até 2001, o restante será utilizado nos anos seguinte. Em que anos seguintes?
Outros exemplos: Centro de Saúde de Felgueiras, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 42 000 contos, este ano, tem inscrito "zero"; Centro de Saúde de Foz de Sousa, em Gondomar, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 50 000 contos, este ano, tem inscritos 10 000 contos; Centro de Saúde de Aldoar, em 1998, previa-se, para 1999, uma verba de 105 000 contos, este ano, tem inscritos 10 000 contos; Centro de Saúde de Marco de Canaveses, em 1998, tinha prevista, para 1999, uma verba
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de 100 000 contos, este ano, tem inscritos 50 000 contos; Centro de Saúde de Santo Tirso, em 1998, tinha prevista, para 1999, uma verba de 205 000 contos, este ano, tem inscritos 150 000 contos; Extensão de Veiga do Leça, em 1998, tinha prevista, para 1999, uma verba de 85 000 contos, este ano, tem inscritos 50 000 contos (mais: há aqui uma imprevisão, pois no PIDDAC deste ano está prevista, para 1998, uma execução de 28 750 contos mas ainda ontem lá passei e não vi qualquer obra); Extensão Vila das Aves, em 1998, estavam previstos, para 1999, 57 500 contos, este ano, estão inscritos 50 000 contos. Aliás, também estava prevista, para 1998, uma execução de 27 721 contos mas não há qualquer obra. E assim sucessivamente.
Pergunto à Sr.ª Ministra quando é que pretende, de facto, investir, não desinvestir, no distrito do Porto, em termos de renovação e remodelação das unidades de saúde, como vinha a acontecer nos últimos anos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Para terminar a minha intervenção, queria acrescentar um pormenor.
Nos anteriores Orçamentos do Estado o hospital distrital de Santo Tirso foi incluído em PIDDAC por proposta do PSD. A Sr.ª Ministra não o incluía, mas fazíamos, todos os anos, a proposta e ele era incluído. Este ano, o hospital distrital de Santo Tirso torna a não estar incluído no PIDDAC. A Sr.ª Ministra tem, ou não, vontade de construir o novo hospital em Santo Tirso?
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, gostaria de cumprimentá-la, bem como a Sr.ª Ministra da Saúde, o Sr. Secretário de Estado e os colegas que se encontram nesta Sala.
O orçamento do Ministério da Saúde coloca, hoje em dia, três questões extremamente fortes. Primeira, saber se é, ou não, suficiente o orçamento para a saúde; segunda, saber se o orçamento que temos está, ou não, a ser bem gerido; terceira e grande questão, que nem sempre é dita de forma muito clara, saber se o nosso modelo de saúde, baseado no Serviço Nacional de Saúde, está, ou não, posto em causa.
Em relação à primeira questão, ou seja, se o orçamento para a saúde é, ou não, suficiente, diria que é e será sempre insuficiente, porque há que ter em conta as novas tecnologias, as novas moléculas para os novos medicamentos, a maior longevidade e, por isso, as doenças degenerativas, o maior grau de exigência e consciencialização das pessoas sobre esta matéria, os novos flagelos sociais, as novas investigações na área da medicina e as novas áreas de tratamento. Tudo isto coloca a velha questão: o orçamento para a saúde é sempre insuficiente.
Em relação a esta matéria, há uma questão que tem de ser assumida por todos os partidos e, particularmente, pelos caros colegas da oposição. O PS disse que era necessário repensar a questão do financiamento através da nova fórmula, que está em marcha, da reforma da saúde. Já foi dito pela Sr.ª Ministra da Saúde - eu queria frisá-lo - que foi feito um convite aos partidos políticos pela mais alta instância, pelo Sr. Primeiro-Ministro, para, em conjunto, consensualizar-se sobre a reforma da saúde. O que se constata é que o Grupo Parlamentar do PCP diz que sim e que os Grupos Parlamentares do PSD e do CDS-PP dizem que não. Meus senhores, temos de ser co-responsáveis nesta matéria! Não é só dizer que o orçamento é insuficiente e que são precisas novas fórmulas; é preciso repensar o financiamento.
A segunda questão, que também é importante, é saber se o orçamento que temos está, ou não, a ser bem gerido. Nota-se que há, da parte do Grupo Parlamentar do PSD, um esforço nítido para demonstrar que o orçamento não está a ser bem gerido. Mas os senhores estão mal colocados nesta matéria! Sou obrigado a lembrar, mais que não seja para ficar em acta, que o Hospital Amadora/Sintra, que estava previsto custar 7,2 milhões de contos, custou 18,2 milhões de contos, com enorme acréscimo de prazo de construção, que o Hospital Distrital de Matosinhos, que estava previsto custar 5,6 milhões de contos, custou 14,3 milhões de contos,…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Isso é que é falar seriamente!
O Orador: - … com três anos de acréscimo nos prazos de construção, que o Hospital Geral de Santo António, que estava previsto custar 3 milhões de contos, custou 17 milhões de contos, com dois anos de acréscimo nos prazos de construção. Estas são gestões que vêm do tempo dos senhores, que governaram até 1995, e, de facto, são maus exemplos.
Os senhores querem deixar passar para a opinião pública a ideia de que o PS gere mal, mas os senhores não são bons exemplos nesta matéria. Depois, quer queiram quer não, aparecem os exemplos positivos de gestão nesta matéria, como, por exemplo, o hospital da Cova da Beira,…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - O concurso foi aberto por nós!
O Orador: - … que não teve estes gastos de falta de gestão e de gestão disparatada, e o Hospital Distrital do Barlavento Algarvio. Portanto, são pontos que é necessário ter em conta, sob pena de estarmos a discutir estes assuntos sem grande rigor.
No entanto, todos reconhecemos que, de facto, tem de haver um maior esforço para gerir melhor as verbas. Há um ponto em relação ao qual julgo ser importante fazermos este esforço: o de haver uma maior capacidade de pagamento aos fornecedores, isto é, efectuar-se os pagamentos de uma forma mais célere. É que o prolongamento da dívida vai alterar o jogo e o relacionamento do Serviço Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, com os fornecedores, entrando-se numa área de grande desvantagem para nós.
Relativamente à própria facturação - dirijo-me particularmente à Sr.ª Ministra da Saúde, que saberá isto melhor do que nós porque conhece bem os hospitais -, encontrámos, em Comissão de Saúde, hospitais com uma taxa de facturação e uma rentabilidade muito maior do que outros. Ou seja, também é uma questão de saber gerir melhor através das administrações dos próprios hospitais, porque umas conseguem, de facto, atingir uma percentagem muito mais elevada de facturação do que outras. Talvez haja necessidade de dar maior atenção a esta questão.
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Porque estamos a falar da dívida, é bom termos presente, principalmente os Srs. Deputados do PSD, que o PSD deixou-nos uma dívida superior a 115 milhões de contos!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - 67 milhões de contos!
O Orador: - 117 ou 112 milhões de contos!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - 67 milhões de contos!
O Orador: - Deixaram-nos uma dívida superior a 115 milhões de contos, já sem falar na dívida rolante, que era de 60 milhões de contos. Portanto, julgo que os senhores estão muito mal colocados para tentarem dar algumas lições de como se faz a gestão a nível do Serviço Nacional de Saúde e do Ministério da Saúde. Assim sendo, talvez fosse mais prudente terem uma atitude de maior humildade democrática e política nesta matéria.
Por fim, a grande questão, que atravessa tudo o que temos estado a falar, é saber se o nosso modelo de saúde, cujo suporte fundamental é o Serviço Nacional de Saúde, está, ou não, posto em causa. Esta é uma questão central para a qual gostava de ver uma resposta muito clara de todos os grupos parlamentares, porque, de vez em quando, saltam para as entrelinhas algumas dúvidas. Não posso deixar de dizer que os Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PSD já utilizaram, por várias vezes, a tal "política do camaleão": primeiro, "sim"; depois, "talvez sim";…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - "Não" e "não"!
O Orador: - … "talvez não"; e "não". Depois, começa no "não", "talvez não", "talvez sim" e, depois, quer ir no "sim". Portanto, há algumas dúvidas sobre esta matéria, por isso, era bom que todos explicitássemos se, de facto, a situação actual das contas do Ministério da Saúde, como está, no vosso entender - e peço desculpa porque, em vez de fazer perguntas à Sr.ª Ministra, estava a colocar o desafio aos grupos parlamentares, mas como a Sr.ª Presidente vai falar,…
A Sr.ª Presidente: - Tem de ser, não é?
O Orador: - … certamente que não vai deixar de dar alguma resposta concreta em relação a esta matéria - põe, ou não, em causa o modelo de saúde que temos, em que a espinha dorsal é o Serviço Nacional de Saúde, para além da participação de outros subsistemas.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, gostaria apenas de colocar uma questão, que me esqueci de expor na minha última intervenção, relativamente à dívida ao SNS pelos serviços prestados, para tentar esclarecer uma aparente contradição dos valores que o Ministério da Saúde nos enviou.
Prevê-se que, em 1998, os serviços prestados pelo SNS não cobrados atinjam 65,4 milhões de contos - pelo menos é o que está estabelecido, em nota de rodapé, no mapa que o Governo nos enviou - e que, no ano 1999, esta verba seja de 69,6 milhões de contos. Desde logo, temos de perguntar se esta situação tende a agravar-se, como estes números parecem indicar.
Mas ainda há uma outra questão que gostaria de colocar, para terminar. A previsão que o Governo estabelece para 1999, relativa à cobrança de serviços prestados em anos anteriores, é de 55 milhões de contos, havendo, só em relação àquilo que se prevê não cobrar em 1998, os tais 65,4 milhões, uma diferença de 10 milhões de contos. Ora, o que quero saber é o que podemos concluir destes números todos em relação ao total da dívida acumulada ao SNS, pois julgo que é uma questão que não ficou completamente respondida. Gostaria, ainda, de saber se estes valores evidenciam uma evolução da dívida ao SNS no sentido do seu crescimento, pelo menos entre 1998 e 1999, como parece concluir-se dos dados do Governo.
Não sei se fui suficientemente claro, mas se não fui, tentarei novamente.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Srs. Presidentes da Comissão de Economia, Finanças e Plano e da Saúde, Sr.ª Ministra, volto à questão do investimento. Faço-o porque a Sr.ª Ministra respondeu há bocado de uma forma um pouco evasiva. Mas, pior do que isso, os Srs. Deputados do PS já intervieram e deram a entender algumas justificações.
Por um lado, disseram que é um acto normal prever-se investir e nunca se conseguir investir o que se tinha previsto, que é como aconteceu no passado. Ora, Sr.ª Ministra, com o mal do passado podemos nós bem!
É que, quando se candidataram, os senhores disseram que iam mudar tudo, que tudo ia passar a correr bem, não só no domínio da saúde como no País. Era o "paraíso cor-de-rosa" o que nos foi prometido! E, agora, desculpam-se, dizendo "nós não conseguimos o paraíso mas os senhores também não o conseguiram no passado"?! Infelizmente, essa não é a melhor maneira de fazer política. Temos de ter esperança no futuro e no presente! Ora, se os próprios responsáveis são os primeiros a dizer "nós não conseguimos mas os senhores também não"…?! Penso que esta não é maneira de estar, nomeadamente para quem queira ser líder.
Sr.ª Ministra, não estamos a perguntar por que é que os senhores não fazem investimentos que nós próprios consideramos prioritários, estamos, sim, a perguntar por que é que não fazem os investimentos que os senhores próprios disseram que iam fazer. Eis, pois, uma questão bem diferente.
É que se assim não fosse, a vossa resposta poderia ser óbvia. Ou seja, o Governo poderia dizer "nós temos prioridades e as nossas não são as vossas". Só que não é nesse campo que estamos a discutir mas, sim, no das prioridades que os senhores estabeleceram. Assim, de duas uma: ou fizeram "publicidade enganosa", sabiam que não tinham condições para concretizar as prioridades que apontaram e integraram-nas no orçamento do ano passado apenas porque era ano de eleições autárquicas, ou, então, pensavam que conseguiam concretizá-las e não conseguem, assim reconhecendo a vossa incompetência quanto à realização dos investimentos que tinham previsto. Estas são as duas únicas hipóteses, Sr.ª Ministra.
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É que um atraso num projecto, numa obra ou num concurso é aceitável, acontece, mas o atraso em mais de 100 relativamente ao que os senhores previram já é algo completamente diferente.
Assim, Sr.ª Ministra, vou dar-lhe o exemplo de cinco projectos, todos na zona por que fui eleito, que estão todos nas mesmas circunstâncias. Veja lá o azar: estão previstos projectos para cinco concelhos pertencentes ao meu círculo eleitoral e em todos eles houve atrasos!
Para o centro de saúde da Lourinhã estava previsto um investimento de 80 000 contos para 1999, mas o que está inscrito em PIDDAC são 10 000 contos; para Alenquer, estava prevista uma verba de 187 000 contos e estão consignados 2000 contos; para a Arruda, estavam previstos 50 000 contos e estão consignados 6000 contos; para Torres Vedras, previa-se 100 000 contos e estão consignados 40 000 contos; para Cadaval, também para 1999, estava previsto um investimento de 187 000 contos e estão consignados 8000 contos. Portanto, num total de investimentos previstos de 605 000 contos, estão consignados em PIDDAC 67 000 contos. E que vai acontecer agora? Agora, há-de vir aí o orçamento para o ano 2000, o "ano de todas as realizações"!
Há pouco, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento afirmou que "se nós fôssemos fazer tudo o que os senhores dizem, precisaríamos de dois orçamentos!", ao que nós respondemos "se formos acreditar em tudo o que o Governo se propõe fazer no ano 2000, serão necessários três orçamentos!". É que, agora, o ano 2000 é o ano em que tudo será possível!
Então, pergunto: com que confiança posso acreditar nas vossas propostas depois de, no ano passado, terem dito que 1998 era o ano dos estudos e 1999 era o ano de arranque das obras, enquanto, agora, vêm dizer-nos que, afinal, 1999 não é o ano do arranque, mas sê-lo-á o ano 2000? Posso continuar a confiar em vós? É que tenho aqui prova do que digo!
Portanto, gostava que me esclarecessem: tratou-se de "publicidade enganosa" da vossa parte ou de incompetência quanto à realização dos investimentos?
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr.ª Presidente, aproveito a circunstância de ter chegado à Sala o Sr. Presidente da Comissão de Saúde para fazer uma precisão.
Ao falarmos em 67,7 milhões de contos como sendo o saldo remanescente da dívida em 1996, referimo-nos a um documento que foi distribuído 11 meses após o início de 1996. Portanto, foi durante a discussão do Orçamento para 1997 que o Dr. Arcos dos Reis, a custo, como é costume, fez o favor de dar-nos estes dados. Ora, o valor que consta do documento é o de 67,7 milhões de contos.
Sr. Presidente da Comissão de Saúde, não há dúvida alguma em relação a isto! Trata-se de documentos oficiais em que estão descritas verbas relativamente às quais, aliás, o Sr. Dr. Arcos dos Reis acabou por dizer que o saldo da dívida não era 67,7 milhões de contos mas, sim, 61 milhões de contos - isto está gravado e consta das actas da reunião.
Portanto, penso que o Partido Socialista demonstra claramente a sua incompetência quando, três anos após ter chegado ao poder, baseia no passado, recorrentemente, as explicações que tem a dar.
Passo agora, muito rapidamente, aos hospitais que a Sr.ª Ministra mencionou, embora tenha deixado de fora outros, como o de Viseu ou o de Leiria, em relação aos quais as derrapagens não foram no sentido que disse quando mencionou os outros. Aliás, como é que poderíamos criticar este Governo no que diz respeito às derrapagens se ainda não lançou um único concurso público para construção de um hospital?
É que, quando este Governo tomou posse, o concurso para o hospital de Tomar já estava lançado, embora, posteriormente, tenha havido aqueles problemas com o Tribunal de Contas e com a Comunidade Europeia; o mesmo se passa em relação ao hospital da Cova da Beira; quanto ao hospital do Barlavento Algarvio, já tinha sido construído mais do que as fundações; quanto ao hospital de S. Sebastião, em Santa Maria da Feira, aquelas dezenas de milhões de contos continuam teimosamente "à espera", há mais de nove meses, que comece a funcionar.
Também é bom recordar aqui, em relação ao Hospital Amadora-Sintra, cujo sistema de concurso era de concepção/construção, que fomos nós, governo do PSD, que fizemos a alteração do sistema de concurso, precisamente naquele sentido para evitar alguns desvios com que tínhamos deparado. Daí a justificação de o funcionamento destes hospitais estar a correr bem. Aliás, seria importante saber, particularmente em relação ao hospital do Barlavento Algarvio, se já não vai ser preciso mais nenhuma obra após aquela ter sido entregue e se há obras a menos ou não.
Também quero recordar, a bem do rigor, que, no caso de Matosinhos, houve falência de dois empreiteiros. Neste caso, houve um compromisso do Sr. Presidente da Câmara, Narciso Miranda, de que contribuiria com, pelo menos, 1,5 milhões de contos para a construção de acessos para aquele hospital, o que não aconteceu e também veio "ajudar à festa"!
Finalmente, no que diz respeito ao Hospital de Santo António, devo enaltecer a sua capacidade de trabalho, aliás, consoante a Sr.ª Ministra tem feito sempre que lá se desloca. A propósito deste hospital, devo dizer que não percebo a crítica feita pelo Sr. Ministro das Finanças no encerramento do debate na generalidade do Orçamento e só espero que o Sr. Primeiro-Ministro não fique imbuído do mesmo espírito.
Neste hospital, de facto, foram gastos 17 milhões de contos, mas trata-se de um hospital novo, completamente equipado, dispondo de 450 camas, situado no centro da cidade, no local de um monumento nacional e num terreno cujas condições são altamente complexas, designadamente a nível de condutas de água, de electricidade, etc.
É que há pessoas que, por exemplo, às três da tarde, dizem que é preciso grandes consensos e que, mais tarde, alimentam essas picardias. Ora, não quero alimentar essas picardias, só quero repor a verdade dos factos, nomeadamente quanto à referência que aqui foi feita em relação quer à dívida, quer à derrapagem das verbas para esses hospitais.
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A Sr.ª Presidente: - Entretanto, eu não estava inscrita para intervir sobre esta matéria, mas o Sr. Presidente da Comissão de Saúde lançou-me um repto, por isso, não posso deixar de fazer apenas duas afirmações.
Em primeiro lugar, quanto à questão de o PSD sugerir que há uma má gestão no âmbito da saúde e de nos responderem que não temos capacidade nem sequer moral para dar lições sobre como gerir, Sr. Deputado, o problema é o de que a boa ou má gestão mede-se pelos resultados. Não quero dar lições de gestão seja a quem for. Limito-me a dizer que, gastando-se, actualmente, muito mais dinheiro do que se gastava, esperava-se que o serviço fosse melhor do que era anteriormente. Se o Sr. Deputado entende que os utentes consideram que os serviços são muito melhores do que antigamente, então, consideraremos que os recursos que têm estado a ser utilizados não são um desperdício mas um benefício. Julgo que essa avaliação deverá ser feita pelos utentes. Pessoalmente, creio que estes não são dessa opinião, mas se os senhores entende que sim, direi "tanto pior" porque continua a gastar-se dinheiro sem qualquer espécie de benefício.
Em segundo lugar, quero dizer uma cosia ao Sr. Deputado a propósito de ter dito que havia uma questão que tinha de ser assumida por todos os partidos, que é a do problema do financiamento.
Julgo que o PSD não poderia ter dito mais do que já disse e reafirmou, que é "digam quanto querem que nós votamos a favor". Mais do que isto parece-me impossível. O problema, Sr. Deputado, é que ninguém diz "quanto"! Ninguém o diz porque, na saúde, há uma despesa que, intencionalmente, está a ser encoberta, provavelmente para não mostrar a dimensão da má gestão. É que se assim não fosse, não haveria motivo para não dizerem quanto querem, pois nós aprovaríamos. Repito que maior consenso do que este não me parece possível.
Prosseguindo esta fase de perguntas, está inscrito o Sr. Deputado Manuel Moreira, mas, dada a hora tardia a que entrou na Sala, apenas lhe concedo 2 minutos para usar da palavra.
Tem a palavra.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, espero não esgotar esse tempo.
Sr.ª Ministra, quero aproveitar esta oportunidade para interpelá-la, na sequência do que já disse o meu colega Bernardino Vasconcelos, a propósito de um conjunto de infra-estruturas da área da saúde que, infelizmente, têm vindo a ser consecutivamente adiadas.
No que diz respeito a Vila Nova de Gaia - e como a Sr.ª Ministra sabe, já várias vezes tivemos oportunidade de falar sobre isto - eu próprio já levantei a minha voz nesta Câmara no sentido de se impulsionar e concluir a ampliação e a modernização do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, mais conhecido por hospital Santos Silva.
Ora, verificamos que, na programação financeira do Orçamento do Estado para o ano 1999, tinham sido previstos 500 000 contos mas, agora, na proposta concreta que o Governo apresenta a esta Assembleia, aquela verba é reduzida para 135 000 contos. Para o ano 2000, estava prevista uma verba de 2,5 milhões de contos para aquela obra, mas verificamos agora que apenas estão previstos 568 000 contos. Quer isto dizer que, infelizmente, em vez de haver o tal impulso para, de uma vez por todas, acabar-se a ampliação e modernização do hospital que teve início há uma década, continua a adiar-se sucessivamente.
No início de 1999, fará dois anos que a Sr.ª Ministra se deslocou àquele hospital e fez promessas porque verificou as péssimas condições em que funcionam os serviços de urgência. Pretendia-se construir um pavilhão para instalar os serviços de urgência, só que acontece que este processo sofreu várias peripécias, só agora começou a ser construído e, provavelmente, só deverá entrar em funcionamento dois anos depois de a Sr.ª Ministra ter passado pelo hospital.
Julgo que não vamos longe com estas verbas. Por isso, peço a receptividade da Sr.ª Ministra no sentido de tentar reforçar claramente as verbas consignadas para o Centro hospital de Vila Nova de Gaia, sob pena de nunca mais termos um hospital capaz de servir uma população de mais de meio milhão de habitantes, já que o hospital também serve outros concelhos a sul de Gaia.
Por outro lado, no que diz respeito aos centros de saúde - e eu próprio também já falei sobre isto, várias vezes, nesta Câmara -, a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, através da Junta Metropolitana do Porto, propôs a consignação no Orçamento para este ano de verbas para apoio à construção de vários centros de saúde - Arcozelo, Carvalhos, Olival, Sandim, Vilar de Andorinho. Ora, só está contemplado o centro de saúde de Arcozelo, obra que também já estava inscrita no PIDDAC deste ano, mesmo assim, com uma verba que continua a ser simbólica - 10 000 contos! Quanto aos outros centros de saúde que citei, não consta nada em PIDDAC. Ora, devo dizer que, efectivamente, Gaia está muitíssimo carenciada destas infra-estruturas de saúde.
Gostava, pois, de saber se a Sr.ª Ministra está receptiva a incluir no PIDDAC para o próximo ano mais algumas verbas para alguns destes centros de saúde.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos, para o que dispõe de 1 minuto.
O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, não posso deixar de assinalar que me parece um pouco deselegante abordarmos a questão de inscrições em PIDDAC como se fossem medidas publicitárias, além do mais, vindo da bancada do PSD.
Congratulo-me por o Deputado Duarte Pacheco referir as questões das verbas inscritas em PIDDAC para centros de saúde na área Oeste, mas também gostaria de ouvi-lo inquirir os Membros do Governo quanto à oportunidade da inscrição, por exemplo, do centro de saúde do Carregado e não referir verbas relativas a cinco outros centros de saúde. É que, apesar de eu compreender o rigor do Ministério quanto a esta área, a verdade é que as verbas que o Sr. Deputado referiu significam a diferença para o zero que existiu no tempo do governo do PSD.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Se é para não se fazer nada!
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr.ª Presidente, vou tentar não me perder nas respostas, uma vez que tomei um
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conjunto de notas que totalizam quatro folhas A4.
Gostava de começar por referir-me à intervenção do Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos e à afirmação que fez de que nesta discussão não tinha havido nada de concreto. Achei interessante - não posso deixar de o dizer, porque sabe que sou muito espontânea e muito franca - que o Sr. Deputado venha referir que eu sou uma desilusão, exactamente a mesma expressão que usou o Presidente da ANF quando instado a pronunciar-se sobre os vários ministros da Saúde. O Presidente da ANF disse que eu era uma desilusão mas também disse que o Sr. Deputado Paulo Mendo foi uma pessoa que criou conflitos. Fico realmente sem saber se esta expressão é sua ou se é a adopção de uma expressão de outro, porque me parece que se usam chavões catalogadores das pessoas usando frases incisivas para passarem na opinião pública e que passarão a fazer parte da maneira como se referem aos Membros do Governo ou a qualquer entidade.
O Sr. José Barradas (PS): - É o marketing, Sr.ª Ministra!
A Oradora: - Mas, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que não me cabe a mim catalogar-me. Agora, não pode acusar-me não só de eu ter hoje um discurso diferente daquele que tive anteriormente, porque apareci sistematicamente nesta Câmara para explicar aquilo que estava a ser feito e como devia ser feito, mas também de eu não ter tomado medidas concretas importantíssimas para que o Serviço Nacional de Saúde passe a dispor de instrumentos de gestão adequados, instrumentos esses que não existiam e que têm de ser construídos progressivamente.
Quero também dizer-lhe que nunca entendi a política como uma forma de criticar aqueles que me antecederam - acho que todos me fazem essa justiça. Considero que esta não é a minha forma de fazer política, nem nunca a fiz fazendo promessas, quer em relação a determinadas medidas incumpríveis, quer em relação a determinadas coisas com as quais eu não estava de acordo. Não tenho essa maneira de ser e não sou capaz de o fazer.
Portanto, quando, há pouco, disse que talvez as inscrições em PIDDAC tivessem a ver com eventuais eleições autárquicas, quero aqui referir -…
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Não fui eu que disse isso!
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Mas é verdade!
A Oradora: - ... não sei se foi o Sr. Deputado Duarte Pacheco, mas se calhar foi - que nunca tive esses norteamentos nas minhas intenções. Normalmente, o que acontece é, com todos os partidos e ouvindo as sugestões dos vários presidentes de câmaras - isto fundamentalmente em relação aos centros de saúde - dos mais variados partidos, discutirem-se prioridades, hierarquizarem-se e, na própria discussão do PIDDAC, diz-se muitas vezes que as inscrições são para marcar posição e que poderá não haver capacidade de execução dentro dos prazos previstos. Desta verdade e desta forma de estar eu não abdico, é a minha maneira de ser e não tenciono nem tento enganar ninguém. Se eu tivesse essa intenção, obviamente, num ano, que é o próximo, de eleições legislativas, eu teria tido a preocupação de tentar fazer um PIDDAC enormíssimo, porque é, realmente, uma forma que muitas vezes é usada para marcar anos eleitorais. Penso que não estamos em condições de o fazer e aquilo que sempre tentei discutir e acertar foram prioridades em função dos interesses das pessoas e não em função dos interesses partidários que, eventualmente, existam. Tenho tido esse cuidado, tenho tido essa preocupação e penso que os Srs. Deputados me farão essa justiça.
Neste momento, o Sr. Deputado Jorge Roque da Cunha exibe um documento.
O Sr. Deputado Jorge Roque Cunha agora mostra-me papéis…
Protestos do Deputado do PSD Jorge Roque Cunha.
Sr. Deputado, tenho imensa pena que não tenha vindo de helicóptero comigo, porque refere frequentemente a viagem de helicóptero que fiz com o Sr. Primeiro-Ministro…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Com o Sr. Primeiro-Ministro e com os jornalistas!
A Oradora: - É natural!
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos evitar o diálogo!
A Oradora: - Sr. Deputado, tenho preocupação em andar e falar com toda a gente.
Protestos do Deputado do PSD Bernardino Vasconcelos.
Sr. Deputado, não diga isso porque não lhe fica bem. O Sr. Deputado, que até concorda comigo, por que é que depois faz essas figuras quando estes debates estão a ser transmitidos? Não diga isso porque não lhe fica bem! Dentro do relacionamento que temos desenvolvido e que é um relacionamento que, para além do mais, privilegia aquilo que devem ser relações entre uma mulher e um homem, acho que era bom que não nos desviássemos deste tom, porque todos temos a ganhar com isso.
Risos do Deputado do PCP João Corregedor da Fonseca.
Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, esse documento que mostrou, e que conhece, é da DGIES, mas eu, que conheço o Ministério há muitos anos - há quase tantos como o Sr. Deputado Paulo Mendo -, também devo dizer-lhe que a programação de investimentos que é feita no Ministério da Saúde abrange sempre aquilo que foi feito pelos governos anteriores. Assim, quando saí do Ministério - e durante o tempo que lá estive fui chefe de gabinete do Sr. Ministro Maldonado Gonelha -, ficou uma previsão de investimentos que depois foram sendo progressivamente executados pelos ministros que se seguiram. Ora, isto só espelha que aquilo que alguns constroem não é completamente destruído pelos que se seguem, porque corresponde a reais necessidades do País. Daí que, neste
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caso específico, como há pouco se referiu, de último ano de execução do Quadro Comunitário de Apoio e necessidade de negociação de um novo Quadro Comunitário de Apoio,…
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Já se sabia!
A Oradora: - ... o Governo tenha referido que a saúde terá de assumir uma determinada prioridade. Se isso não acontecer, uma vez que, como já aqui se referiu, estamos em negociações com instâncias internacionais e poderão não se verificar as nossas expectativas, estamos a desenvolver instrumentos que, brevemente, serão objecto de consulta pública relativamente a novas modalidades de financiamento que noutros países têm sido associadas à saúde e que, como o Sr. Deputado imagina, têm de ser feitas com base em determinadas análises e em determinados documentos que possam ser susceptíveis de discussão pública, porque estas questões, como todos sabemos, atingem mais do que uma geração e, portanto, devem ser devidamente avaliadas e validadas por todos os que, efectivamente, têm ou poderão vir a ter responsabilidades governamentais.
Quero também referir que as experiências-piloto não são inadequadas a nível da saúde. Aliás, em relação à certificação das baixas por doença, que era uma enorme aspiração dos centros de saúde - e o Sr. Deputado Paulo Mendo conhece bem este problema, uma vez que também prometeu debruçar-se sobre ele, como confirma -, para evitar aquilo que podia ser um não controlo do crescimento das baixas por doença, foi necessário introduzir um esquema que foi validado numa determinada sub-região, foi corrigido, para depois se passar para todo o âmbito nacional.
Portanto, há, inequivocamente, uma necessidade de atender aos impactos que determinadas medidas podem ter e que nós queremos que sejam positivos mas que poderão ser negativos se não tomados adequadamente e, face a esses impactos, validam-se essas coisas.
O mesmo se passa com a nova receita médica. Não podemos aplicar, a nível nacional, determinado tipo de procedimentos que venham a revelar-se negativos. Temos, primeiro, de os testar, corrigir, para, depois, permitir que eles sejam benéficos. Acho que estamos todos aqui no sentido de fazer coisas que sejam boas para os portugueses.
Não quero deixar de me referir à afirmação do Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos respeitante à política do medicamento, onde existem formulários por patologias.
A Ordem dos Médicos já aprovou o primeiro formulário em relação aos acidentes vasculares e tem em construção, de acordo com a informação que nos prestou, cerca de sete formulários. Este processo só pode ser feito desta maneira, porque obriga a consensos inter pares e decorre da medicina baseada na evidência. Penso que o Sr. Deputado, como médico, não contraria que é este o procedimento. Disponibilizámos à Ordem dos Médicos um funcionário a tempo inteiro, um farmacologista, para dar apoio, porque isto é importante e prioritário. Aliás, como o Sr. Deputado pode confirmar, foram objecto de divulgação, numa das últimas revistas da Ordem dos Médicos, os formulários que estavam em preparação e, de acordo com a informação que tenho da Ordem, eles estão prestes a ser aprovados pelos respectivos colégios.
Relativamente à prescrição por princípio activo, aí está um novo suporte de receita médica. Há pouco, tive ocasião de referir que a imposição pura e simples de prescrição por princípio activo tem reacções muito fortes por parte da classe médica, precisamente por causa da produção de genéricos e de quem os produz, mas já me pronunciei sobre isto.
Em relação à autonomia dos centros de saúde, quero também dizer que o diploma já foi objecto de audição de todas as entidades e, formalmente, já foi enviado à Associação Nacional de Municípios Portugueses. Cada ministério tem de promover essa audição e, portanto, já deve ter chegado ao Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Penso que o diploma está bem construído, mas o Sr. Deputado terá oportunidade de se pronunciar sobre ele.
Quanto ao cartão de utente e ao facto de o sistema informático não estar a funcionar, de facto, ele não está completamente a funcionar em todos os lados. Em sítios onde se prevê a mudança de instalações antigas para instalações novas, efectivamente, não está a funcionar.
Em relação a um centro de saúde específico que o Sr. Deputado me falou quando estivemos juntos na Assembleia da República, penso que era o da Póvoa do Varzim ou Vila do Conde, eu própria interpelei a pessoa do IGIF que está a coordenar este processo e essa pessoa disse-me que estranhava que ainda não estivesse a ser utilizado e que ia mandar ver o que se passava com este assunto. Mas, já agora, como o Sr. Deputado costuma ir lá passar os fins-de-semana, se me puder dar depois alguma informação, agradecia,…
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Com certeza, Sr.ª Ministra!
A Oradora: - ... porque confio bastante naquilo que é a sua análise no terreno.
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Em tudo aquilo que diga respeito à incapacidade dos serviços, ajudo!
A Oradora: - Não se trata de incapacidade dos serviços, Sr. Deputado! Foi um processo enorme! Não ataque muito os serviços, porque os serviços que eu tenho são os mesmos que tiveram as pessoas que me antecederam. Não há qualquer dúvida de que têm muitas insuficiências, mas há muita e muita gente que se empenha e se esforça para que sejam cada vez melhores. As insuficiências são aquelas que, infelizmente, existem na sociedade portuguesa e que, por vezes, não são por culpa nem de quem aqui está, nem dos próprios serviços.
De qualquer forma, e em relação ao relatório da OCDE, gostava que o Sr. Deputado confirmasse que a maioria dos dados sobre os quais incide o relatório têm a ver com o ano de 1995 e com anos anteriores. Aquilo que se refere no relatório da OCDE…
Protestos do Deputado do PSD Bernardino Vasconcelos.
Sr. Deputado, não estou a julgar ninguém. Eu não julgo ninguém. Estou a dar-lhe um dado objectivo, ou seja, o relatório da OCDE incide fundamentalmente sobre os dados de 1995 e de anos anteriores.
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Mas, como eu estava a dizer, o relatório refere que os passos que estão a ser dados pelo Ministério, embora tímidos, vão no bom sentido, e nunca o Sr. Deputado me ouviu acusar o PSD relativamente às ineficiências detectadas no relatório da OCDE, porque o que considero é que há problemas estruturais importantes e graves e para os resolver progressivamente há uma determinada política que terá sucesso ou não, será objecto de julgamento. Dizer que o relatório da OCDE critica o facto de não haver reformas estruturais… É que se se quer criticar alguém não é a nós mas os que nos antecederam. Muitos dos problemas que existem no sistema de saúde já estavam a ser detectados, como é evidente, pelos governos que me antecederam e foram objecto das intervenções que os respectivos ministros e governos entenderam dever fazer.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
A Oradora: - No que diz respeito ao relatório do FMI, devo dizer que ele aponta especificamente dois aspectos: quanto à saúde, a necessidade de reformas nessa área e, quanto à segurança social, a necessidade de revisão das pensões. Aquilo que todos sabemos, até pelas propostas que surgem dos vários partidos, é que o nosso sistema de pensões ainda é insuficiente em relação às necessidades das pessoas e daí um conjunto de propostas no sentido da revalorização, até excepcional, das pensões.
Quero dizer com isto que a nossa realidade é a nossa realidade. Temos ainda muitos problemas determinados por questões sociológicas e, apesar de determinadas recomendações técnicas, temos de continuar a trabalhar num certo sentido e com crescimentos de despesas determinados por essas falhas e por essas insuficiências.
Em relação ao levantamento das listas de espera que o Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos referiu e à questão de saber como é que se chegam a uns números a Lisboa e a outros ao Porto ou ao resto do País, penso que o Sr. Deputado se estava a referir à Cruz Vermelha Portuguesa. A Cruz Vermelha Portuguesa não recebe doentes apenas do Sul do País, tem recebido doentes de todo o País. Quanto à questão das listas de espera para operações cirúrgicas e para a cirurgia cardíaca, de acordo com o levantamento efectuado na Direcção-Geral da Saúde, existiam cerca de 800 doentes em listas de espera para cirurgia cardíaca na altura em que o estudo foi feito.
Portanto, reafirmando, o protocolo prevê máximos e não mínimos e será ajustado às necessidades de procura que venham a ser detectadas em termos nacionais.
Em relação aos indicadores do movimento assistencial, penso que já terão sido enviados ao Sr. Presidente da Comissão de Saúde relatórios produzidos pelo Ministério, apesar de, no debate, na generalidade, em Plenário, um Sr. Deputado ter afirmado que os relatórios terão deixado de ser produzidos.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Deixaram de ser enviados!
A Oradora: - Não deixaram de ser produzidos. Eles foram enviados ao Sr. Presidente da Comissão de Saúde.
Mas, em relação aos indicadores do movimento assistencial, também, nessa altura, foi referido o próprio relatório do INE relativo a 1997, que apontava para crescimentos substanciais. O Sr. Deputado diz-me que são insuficientes e eu respondo: com certeza que são. No entanto, esse aumento de actividade..
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - A Sr.ª Ministra tem o relatório do INE?
A Oradora: - Não tenho esse relatório, mas o INE produziu e divulgou os dados e nós até dissemos que, como era uma instância diferente da do Ministério, os números produzidos são os que são recolhidos directamente pelo INE junto das instituições de saúde.
Em relação à execução do PIDDAC, devo dizer uma coisa muito importante e que referi, noutro dia, a propósito da discussão do Orçamento do Estado, na generalidade. Nós temos todo o interesse em dar seguimento aos projectos que são iniciados e prosseguidos. À questão levantada pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco no sentido de não poderem, eventualmente, confiar nas inscrições feitas, digo-lhe o seguinte, Sr. Deputado: antes prevenir que haja algumas inscrições que não sejam objecto de execução do que muitas que estão, por vezes, completamente construídas e que não são disponibilizadas à população, porque não se conseguem resolver, às vezes, pequenos problemas de fim de linha que inviabilizam essa situação.
Relativamente ao Hospital de Santo António e ao Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia, gostava de referir o seguinte: a avaliação inicial das obras do Hospital de Santo António - e o Sr. Deputado Paulo Mendo também conhece bem este processo - rondava os três vírgula tal milhões de contos; no entanto, surgiu um conjunto de vicissitudes relativamente a essas obras que levaram a que as mesmas tivessem ficado mais caras do que o inicialmente previsto - isto são dados objectivos em relação aos quais não estou a emitir qualquer juízo de valor - e por esse facto foi atrasada a execução e a modernização do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia. É que, realmente, o dinheiro, por vezes, não chega para tudo e, estando uma obra já em execução e que teve complexidades acrescidas e não previsíveis que tinham a ver com fundações, com um conjunto de circulações, etc., não há dúvida de que houve algum atraso em relação ao Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.
Relativamente ao pavilhão das urgências, a informação que temos é a de que ele estará concluído em Fevereiro, mas, em nosso entender, obviamente, com atraso face à urgência e premência da obra. Aquilo que foi inscrito é o que consideramos que temos capacidade de afectar para dar início à execução do Plano Director que, entretanto, também foi feito para que as obras que fossem realizadas no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia obedecessem a um plano adequado que não inviabilizasse as circulações adequadas, que são sempre possíveis, em relação a um hospital com aquela concepção.
Peço agora ao Sr. Secretário de Estado que avance com mais alguns esclarecimentos.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, em termos de PIDDAC, penso que a maior parte das questões já foram abordadas. A única questão que gostava de esclarecer era a seguinte: a gestão do PIDDAC revela na prática que se desenvolvem mais rapidamente alguns projectos do que outros, o que tem a ver com os
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ritmos de execução normais de uns projectos em relação a outros. Não há, de facto, qualquer resvalar, digamos assim, não há nenhuma listagem enorme, há, sim, provavelmente, o considerar as vantagens da chamada gestão do Ministério da Saúde em termos de PIDDAC.
De qualquer maneira, em termos dos investimentos hospitalares, há provavelmente uma diferença que pode implicar algum atraso, que é exactamente entender-se - e essa é uma orientação política para os serviços - que a fase de elaboração de programas funcionais e a fase de elaboração de projecto deve ser mais atenta, eventualmente, mais prolongada, para que as coisas possam ser, depois, executadas, em termos de obra, com mais rigor. Essa preocupação que houve em anos anteriores justifica, provavelmente, uma melhor execução das obras. Quanto melhores forem os programas funcionais, quanto mais acabados e detalhados forem os projectos, mais teremos todos a ganhar com execuções mais rápidas, mais baratas, mais eficazes. Naturalmente, somos penalizados pelo eventual impacto político de não ter a obra no terreno mais cedo, pagando, depois, os custos dessa obra.
De qualquer forma, uma boa parte dos hospitais que estão em programa estão, neste momento, a arrancar. Ou seja: o programa funcional do Centro Materno-infantil do Porto, naquilo que toca à transferência do Hospital Maria Pia para os terrenos junto da Maternidade Júlio Dinis, já foi aprovado este ano; o Plano Director de Vila Nova de Gaia, conforme a Sr.ª Ministra acabou de dizer, já foi aprovado este ano; o programa funcional do Hospital Distrital de Póvoa de Varzim/Vila do Conde já foi aprovado; o de Braga já foi aprovado e também o foi a ampliação do da Guarda. Estamos, agora, em condições, não de ter obra, não de lançar primeiras pedras mas de executar, provavelmente, no prazo que esperamos cumprir com rigor, todo esse plano, independentemente de o plano que o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha gosta de nos mostrar (passe a expressão) poder, eventualmente, vir a ter ou não alguma alteração de pormenor. Naturalmente que todos os planos têm alterações; agora, o que há é, de facto, uma tentativa de os executar com o maior rigor possível, mesmo que isso implique atrasos na sua execução e sem escamotear, mais uma vez, que as questões financeiras têm também a sua importância.
Sobre os centros de saúde, poderei enviar-vos informação detalhada sobre os centros de saúde, porque, como devem compreender, não tenho comigo o ponto de situação da Lourinhã, de Alenquer, etc. Esta informação poderá ser enviada posteriormente.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Eu posso mandar. São 120!
O Orador: - Da mesma maneira, em relação à questão das dívidas colocada pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, peço-lhe que me releve pelo facto de não ter possibilidade de o esclarecer nesta altura. Porém, sem fugir à questão, assim que for possível, tentarei enviar-lhe toda a informação pertinente.
A Sr.ª Presidente: - Agradeço a presença da Sr.ª Ministra e do Sr. Secretário de Estado...
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Peço ao Sr. Secretário de Estado o favor de enviar, ainda este ano, a informação que acabou de disponibilizar-se para dar.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vou interromper a reunião…
O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Sr.ª Presidente, antes de interromper os trabalhos, gostaria de dizer o seguinte: a Sr.ª Ministra, quando começou a responder, fez uma relação, que considero grave, a propósito da palavra "desilusão". Gostaria que a Sr.ª Ministra tivesse ficado até ao fim para ver esclarecida essa mesma tentativa de conotação entre mim, como Deputado, e… Sr. Presidente da Comissão de Saúde, Deputado João Rui de Almeida, não olhe para o lado com enfado, porque isso está gravado. É que há coisas que eu não deixo passar em branco.
O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Está a meter-se comigo?!
O Orador: - Como dizia, tenho pena que a Sr.ª Ministra já não esteja presente para precisar aquilo que queria dizer com a tal tentativa de aproximação entre a minha palavra "desilusão" e a expressão empregue pelo Sr. Presidente da ANF, ontem ou anteontem nalgum congresso, seminário ou reunião. É pena que a Sr.ª Ministra já não esteja presente, porque gostaria de a ver precisar essa questão.
De qualquer maneira, quero acrescentar que não tenho qualquer relação em termos contratuais, nunca estabeleci qualquer protocolo nem qualquer outra relação com a ANF.
A Sr.ª Presidente: - Muito obrigada, Srs. Deputados.
Vamos interromper a reunião, que recomeçará às 15 horas e 30 minutos.
Eram 14 horas e 50 minutos.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 1999, com a apreciação do orçamento do Ministério da Economia.
Eram 16 horas.
Srs. Deputados, suponho que estamos todos conscientes de que se trata de uma discussão do Orçamento na especialidade e, por esse motivo, vamos dispensar o Sr. Ministro da Economia de fazer qualquer tipo de intervenção inicial, uma vez que já a fez em sede de discussão na generalidade.
A partir deste momento, aceito inscrições dos Srs. Deputados para colocarem questões sobre o orçamento deste Ministério. Mais uma vez, recordo o facto de que estamos a discutir um orçamento em sede de especialidade e, como tal, seria bom que os Srs. Deputados se cingissem a este tema e fizessem perguntas concisas e directas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Valente.
O Sr. Francisco Valente (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, ao iniciarmos este debate na especialidade do Orçamento do Estado para 1999, não quero deixar de lhe manifestar e à sua equipa o meu reconhecimento pelo excelente trabalho que tem vindo a
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desenvolver à frente do Ministério, quer no desbloqueamento de um conjunto de situações que o PSD deixou - são conhecidas de todos -, quer projectando a modernização das empresas com políticas na área dos recursos humanos e da internacionalização e com políticas energéticas e de qualidade. E este reconhecimento não é só do Deputado, é também do empresário que vive, dia-a-dia, no terreno, a prática e os efeitos práticos desta política.
Sr. Ministro, neste mês de Novembro, em que estamos a comemorar o Mês da Qualidade, o Governo tem razões para estar satisfeito com o desenvolvimento conseguido nesta área, quer pela adesão das empresas ao Sistema Português da Qualidade, quer pela credibilização que esse Sistema angariou junto das suas congéneres europeias. Efectivamente, hoje, as empresas certificadas pelo Sistema Português da Qualidade gozam de credibilidade e usufruem mesmo de uma vantagem competitiva nas suas relações internacionais. Todavia, essa vantagem não se vislumbra ou, pelo menos, não tem um impacto tão forte como deveria ter nem os efeitos práticos na relação entre as empresas do Estado, enquanto comprador dessas mesmas empresas. Assim, Sr. Ministro, pergunto: que possibilidades existem de se efectuar uma discriminação positiva nos concursos públicos levados a efeito pelo Governo, de forma a que as empresas portuguesas certificadas pelo Sistema Português da Qualidade sejam reconhecidas como detentoras de bons níveis de qualidade, no produto e no serviço?
A segunda questão que coloco relaciona-se com a política energética do Governo. Têm sido desenvolvidos esforços no sentido de uma perfeita harmonização com os custos energéticos dos nossos parceiros europeus. Sabemos mesmo que as reduções previstas para breve, na factura da electricidade, levarão a que as empresas portuguesas passem a ter custos energéticos abaixo da média europeia. Mas tais reduções verificam-se nos consumos industriais e nos consumos domésticos e seria necessário repensar os custos energéticos na área dos estabelecimentos comerciais, especialmente na área do comércio dos produtos alimentares, onde, por via da utilização de redes de frio, a factura de energia tem um peso razoável.
A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.
O Sr. Ministro da Economia (Pina Moura): - Sr.ª Presidente, sobre as questões da qualidade, o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco responderá ao Sr. Deputado Francisco Valente, que aproveito para saudar.
No que respeita à política energética ou a uma das componentes da política energética, porque não é a única, que tem a ver com a redução da factura energética, objectivo que sempre temos definido como um dos objectivos essenciais da política energética para 1999, foi tornado público, e não desmentido, que a entidade reguladora do sector eléctrico propôs ao Conselho Tarifário, para 1999, uma redução muito significativa do tarifário, tanto para os consumidores industriais como para os consumidores domésticos. Se essa redução se vier a confirmar nessa dimensão, e o Governo não tem qualquer objecção a que ela se confirme mas a decisão é da entidade reguladora, que é uma entidade independente do Governo e da própria empresa, isso significa uma redução, talvez a maior de sempre, dos custos da factura energética para as nossas empresas, dado que se fala de valores acima de 10%, em termos nominais.
Como sabe, o tarifário é fixado em função da utilização que os consumidores, sejam domésticos, sejam industriais, sejam agentes económicos, dela fazem, em função de níveis de utilização da rede de média e alta tensão ou de baixa tensão - é assim que está padronizado o tarifário - e é nesse contexto que foi e será elaborado para 1999. Portanto, é impossível haver uma alteração de estrutura no tarifário que acomode de uma forma pelo menos tão desagregada as questões importantes que referiu. De qualquer forma, é um ponto que fica para nossa reflexão, a fim de ulteriores desenvolvimentos da política energética, no que respeita ao tarifário.
O que quero sublinhar é que, a concretizar-se esta descida, se cumpre, com um ano de antecedência, aquele que tinha sido um compromisso do Governo no acordo de concertação estratégica, que era o de produzir até ou, melhor, "no horizonte do ano 2000", para citar precisamente os termos do acordo de concertação estratégica, uma convergência do tarifário eléctrico em Portugal com a média do tarifário dos países da União Europeia. Conforme o Sr. Deputado referiu, a serem fixados os valores que vieram a público, isso significa, quase de certeza, pois falta-nos conhecer também em detalhe os tarifários de todos os outros países da União Europeia para 1999, mas significa, com elevado grau de probabilidade, um valor ligeiramente inferior à média europeia e, no que respeita aos consumidores industriais, um valor em linha com o tarifário eléctrico em Espanha, o que é extremamente importante do ponto de vista de rentabilização do investimento em Portugal e de atracção de investimento para Portugal, tenha esse investimento origem fora do País ou nos próprios agentes económicos nacionais.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia (Fernando Pacheco): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Valente, no que toca, especificamente, à questão sobre a qualidade, gostaria de referir que se trata de uma preocupação que é horizontal em todas as empresas. A projecção para este ano do número de empresas certificadas é a de que cresça mais de 10%.
Uma vez que estamos aqui a falar sobre o Orçamento, diria que a previsão da percentagem das receitas próprias do Instituto Português da Qualidade, ligadas à acreditação, à certificação e também à normalização - não tenho o número sem as actividades de normalização -, é a de que essa percentagem ultrapasse 85%, no próximo ano, contra pouco mais de 82% que constavam na execução do ano passado.
Ora, isso significa uma coisa: as empresas estão a valorizar a qualidade e, de facto, tem toda a razão, convém que o Estado dê também um sinal nesse sentido, ou seja, que faça sentir às empresas que vale a pena fazer esse esforço. Sobre isto, quero apenas referir que, no contexto do Mês da Qualidade, o Sr. Ministro da Economia levará a Conselho de Ministros, ainda no Mês da Qualidade, que é o mês de Novembro, uma proposta que visa, precisamente, que, em todas as aquisições públicas, seja exigida
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a certificação da empresa ou do produto, nos casos em que haja acções de certificação ou de normalização.
Saliento apenas mais um ponto: para além daquela que é a face mais visível da qualidade - a certificação, a normalização e a acreditação -, cada vez mais, a certificação, por exemplo, não distingue as empresas portuguesas das empresas estrangeiras, porque há um conjunto de normas e tudo funciona como um level playing field, ou seja, para participarem em mercados desenvolvidos, como são, hoje em dia, os mercados europeus, todas as pessoas procuram respeitar essas normas. Aliás, isso é condição de sobrevivência da empresa, a médio e longo prazo.
Portanto, cada vez mais, as empresas têm de se mover para áreas ainda mais voluntárias da qualidade, isto é, aquelas para as quais ainda não há normas mas que são áreas essenciais para a afirmação de uma política de qualidade por parte das empresas. Isso é algo que está a ser reflectido no Conselho Nacional da Qualidade, com a orientação dada pelo Sr. Ministro - Conselho Nacional da Qualidade que teve uma reunião na semana passada -, através de acções que são também apoiadas no contexto do PEDIP.
Saliento também, precisamente para dar visibilidade à qualidade e para ajudar a acção que a Administração pode ter, ela própria, a promover essa qualidade, até pela via que o Sr. Deputado referiu há pouco, uma iniciativa - o Programa Infante - que visa defender a qualidade, enquanto forma de afirmação das empresas portuguesas, e não a qualidade de qualquer empresa, em abstracto, mas a qualidade integrada nas dimensões estratégicas das empresas e na reflexão estratégica dentro das empresas, dando visibilidade para fora, aos consumidores, de que as empresas portuguesas produzem com qualidade.
A Sr.ª Presidente: - Para completar a resposta, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.
O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Valente, apenas para completar a resposta à questão colocada sobre a política energética e o tarifário, gostaria de acrescentar que, a este movimento de convergência dinamizado e dirigido pela entidade reguladora do sector eléctrico, se sobrepõe um outro, relativo às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, voltado para a promoção da eficiência energética, que, aliás, encontra a sua consagração num programa específico, em PIDDAC do Ministério da Economia, destinado, precisamente, a que o movimento geral de redução do tarifário no continente seja reforçado e ampliado no que respeita às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, por forma a que os níveis actuais do tarifário nas regiões autónomas, que estão acima dos do continente, convirjam, eles próprios, para as tarifas que são praticadas no continente. Isto é particularmente importante, creio eu, no que respeita às actividades económicas comerciais das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, na medida em que vai ocorrer, nas duas regiões autónomas, uma redução ainda superior àquela que se verificará no continente, que, como já vimos, deverá ser realmente muito importante.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, de certa forma, o Sr. Ministro acaba de responder à questão que lhe queria colocar, no âmbito da discussão na especialidade deste Orçamento, relacionada, concretamente, com a Região Autónoma da Madeira, região pela qual fui eleito Deputado para este Parlamento, que era a questão da promoção ligada com a eficiência energética. De certo modo, o Sr. Ministro já respondeu à questão, mas gostaria de clarificar a situação no que diz respeito à forma como vinha inicialmente colocada no Orçamento do Estado para 1999.
A verba de 1,340 milhões de contos, que se destinava exactamente a essa promoção da eficiência energética na Região Autónoma da Madeira, de forma a que as tarifas da electricidade se tornassem iguais em todo o País, vinha inscrita no PIDDAC. Há outras verbas que vêm inscritas no PIDDAC mas, em relação a esta verba, desde o início que não nos pareceu correcta a solução da sua inscrição no PIDDAC. Exactamente por isso, a questão que coloco vai no sentido de saber como é que isso fica resolvido, se é que fica resolvido agora, em sede de especialidade, de forma a que essa verba não fique inscrita no PIDDAC, ou seja, de forma a que essa verba não seja considerada como transferida no âmbito da Lei das Finanças Regionais, o que redundaria, de certa forma, num prejuízo para o orçamento da região, no que diz respeito à sua relação com o Orçamento do Estado.
Aproveitando a presença do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, e como esta questão toca vários ministérios e tem a ver com a Região Autónoma da Madeira, quero referir a dotação provisional que estaria prevista figurar no Orçamento rectificativo de 1998, de 1,5 milhões de contos.
Da leitura desse Orçamento rectificativo verifica-se que essa verba não está inscrita, embora tenha havido um reforço de 5 milhões de contos.
Assim sendo, a questão é a seguinte: a verba de 1,5 milhões de contos, que, tanto quanto fui informado, estaria prevista figurar no Orçamento rectificativo de 1998, está englobada na verba de 5 milhões ou figurará ainda no Orçamento do Estado para 1999 como uma verba à parte?
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia: - Sr. Deputado, penso que a inscrição mais correcta é em PIDDAC, porque, como sabe, o PIDDAC é um programa de investimentos e o que se pretende com este programa, inscrito, neste momento, em PIDDAC, é promover investimentos que depois permitam ganhos de eficiência e que viabilizem de forma sustentada a convergência dos tarifários. Ou seja, a convergência dos tarifários não vai ser assegurada num ano, por isso está previsto um calendário plurianual de aproximação, e a única maneira de assegurar que esse esforço é sustentado, isto é, que não é verba transferida num ano gasta nesse ano e que terá de haver um acréscimo de esforço adicional em anos subsequentes, é fazer com que essa verba seja aplicada em investimentos que promovam a eficiência.
O Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central tem os seus mecanismos próprios, pelo que os programas que lá estão inscritos
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têm de ter uma caracterização e objectivos bem definidos, sendo avaliados em função disso.
Portanto, estamos convencidos que a melhor forma de inscrever estas verbas é no PIDDAC, até porque esse é um bom sinal para se dar, quer aos consumidores de energia eléctrica no continente, quer aos dos Açores e da Madeira, que, penso, não veriam que pudesse haver essa convergência sustentada se não fosse através de investimentos.
Isto significa - e este é o entendimento das duas Secretarias de Estado, a da Indústria e Energia e a do Orçamento, cujo Sr. Secretário de Estado está aqui presente - que, pela via que escolhemos, as regiões autónomas não vão ser prejudicadas, ou seja, de facto, os 3 milhões de contos previstos serão adicionais às transferências que de outras maneiras as regiões autónomas beneficiariam.
Portanto, essa compensação será feita, a transferência é feita ao abrigo do n.º 4 do artigo 30.º da Lei das Finanças das Regiões Autónomas para permitir que não haja prejuízo em relação às transferências de PIDDAC que, normalmente, iriam para as regiões autónomas e, se necessário, aplicar-se-ão outras acções de salvaguarda para que seja uma verba adicional, como eu disse, e nunca uma verba que substitua qualquer outro tipo de verbas que já estavam previstas em investimentos na região autónoma.
Isto significa que neste e nos próximos anos a ideia é continuar a manter a inscrição em PIDDAC, pelas razões que já aduzi, mas, obviamente, se entretanto surgir alguma razão substancial para que no próximo ano a inscrição seja feita de outra maneira sê-lo-á se se provar que é um erro, mas, repito, neste momento, estamos convencidos que é a maneira que melhor defende os interesses dos governos das regiões autónomas.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Srs. Deputados, embora não estejamos propriamente no âmbito da discussão do Orçamento rectificativo para 1998, quero, para não deixar o Sr. Deputado sem resposta, dizer que relativamente à transferência adicional ao abrigo da revisão da fórmula de transferências para a Região Autónoma da Madeira de 1998 confirma-se aquilo que o Sr. Deputado disse: há no Orçamento rectificativo um reforço da dotação provisional do Ministério das Finanças, a qual se destina a cobrir um conjunto de situações ainda não devidamente quantificadas, e também um conjunto vasto de pequenas rubricas entre as quais se inclui uma transferência para a Região Autónoma da Madeira que, salvo erro, ronda os 1,5 milhões de contos, que será transferida ainda este ano e que se traduz, como já disse, no acerto da fórmula de transferência.
De qualquer das formas, gostaria de dizer que essa verba sai da dotação provisional, ou da já existente ou do reforço agora inscrito, mas, repito, sairá da dotação provisional.
O reforço de verba que está no Orçamento rectificativo visa colmatar globalmente as necessidades que a dotação provisional ainda manifesta para um conjunto de pequenas coisas, algumas das quais podiam ser incluídas directamente no Orçamento, mas daria uma lista grande de coisas de 100 ou de 200 000 contos que não valeria a pena trazer aqui. Em sede de discussão do Orçamento rectificativo, com certeza, os Srs. Deputados serão esclarecidos sobre o montante do reforço que se prevê.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro, a primeira questão que quero colocar-lhe tem a ver com o conjunto do orçamento afecto ao Ministério da Economia e com os critérios que, não sendo específicos deste Ministério, pois são critérios globais da Secretaria de Estado do Orçamento, acabam por ter reflexos em diversos ministérios, como o da Economia, que está muito dependente do orçamento dos Serviços e Fundos Autónomos.
A questão é a seguinte: todos os anos se verifica que o orçamento que está inicialmente previsto - a despesa consolidada, digamos assim - para o Ministério fica muito abaixo da execução final. Basta dizer que, em 1998, a despesa consolidada era de 203,2 milhões de contos e a estimativa de execução está em 233,1 milhões de contos, de acordo com os mapas que tenho, e em 1999 o orçamento inicial será de 232,2 milhões de contos que, se compararmos com a estimativa de execução, é menor e se compararmos com o orçamento inicial é maior.
A questão que se coloca, para além destas comparações, é a de que este tipo de metodologia e de afectação de recursos ao Ministério, sabendo-se que já há anos seguidos esta questão evolui desta maneira, tem depois consequências práticas muito complicadas. E quais são elas? É chegar-se a meio do ano e muitos projectos ou programas apoiados pelo orçamento do ministério - e estou a lembrar-me do SIR (Sistema de Incentivo Regionais), mas haverá outros seguramente - acabarem por ter dificuldades de dotações orçamentais, que se esgotam, e projectos que se arrastam e que têm de passar para o ano seguinte.
Esta é uma questão que se traduz, por exemplo, em dois orçamentos que, penso, são particularmente importantes ao nível dos Serviços e Fundos Autónomos do Ministério que só por si representam 93% do orçamento global do ministério: o IAPMEI e o ICEP. Há baixas em relação às estimativas de execução no que toca ao ICEP, há fortes baixas na estimativa de execução no que toca ao IAPMEI e nós verificamos que, depois, na prática, ao longo do ano, isso traduz-se, como eu disse há pouco, em paralisação e/ou arrastamento de projectos e ausência de apoios, porque já se esgotaram as verbas.
Ora, parece-me que esta é uma metodologia e um critério que acaba por traduzir-se em bloqueios ao funcionamento da economia real e de muitas empresas que esperam a aprovação dos projectos a que se candidatam em tempo útil.
Esta é, como primeira questão global, a primeira pergunta que queremos colocar sobre esta matéria.
A segunda questão, Sr. Ministro, e mesmo sabendo que o Sr. Secretário de Estado do Turismo está ausente no estrangeiro, tem a ver com o seguinte: em primeiro lugar, quero lembrar que o Governo tinha ficado de nos enviar, desde a discussão na generalidade do Orçamento - mas até hoje ainda não chegou nada -, a relação dos meios que foram afectos às regiões e às juntas de turismo durante o ano passado para podermos verificar a que é que correspondem os 2,9 milhões de contos que este ano estão inscritos no Orçamento, porque, no ano passado, como sabe, os meios que estavam afectos ao IVA para as actividades
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turísticas também abrangiam as câmaras municipais, que passaram a receber directamente através da nova Lei de Finanças Locais, portanto sobram as verbas só para as regiões e juntas de turismo.
Em todo o caso, não temos meios de comparar, uma vez que, no ano passado, essa verba era global e até este momento o Ministério não concretizou aquilo a que se comprometeu, que foi enviar-nos até hoje essa listagem para podermos fazer o levantamento e a comparação da evolução.
A segunda questão, ainda relacionada com o turismo, tem a ver, Sr. Ministro, com o facto de o Governo ter aceite este ano como princípio um conceito de mercado interno alargado a Espanha, mas este conceito, que há muito o PCP vem defendendo e que os operadores do sector também, tem consequências práticas, não sendo um mero conceito abstracto. Por exemplo, tem de ter consequências práticas a nível da harmonização fiscal, pois não se pode falar no mercado interno alargado a Espanha, considerando que Espanha é já mercado interno nacional, e entretanto haver desequilíbrios, por exemplo, no IVA sobre a restauração ou na dedutividade do IVA num conjunto de despesas de deslocações, etc., que são feitas em Espanha e não são feitas em Portugal.
Portanto, a minha questão é a de saber como é que o Sr. Ministro compatibiliza a definição deste conceito com a manutenção de uma desarmonização fiscal dentro do mesmo mercado interno, porque para este efeito funciona como um único.
Deixando agora de lado o tema do turismo, colocarei uma terceira questão que tem a ver com o preço, que já foi referido há pouco, da energia eléctrica.
O Governo, ou, pelo menos, o sistema regulador, de acordo com as notícias veiculadas pela imprensa, terá levado em boa linha de conta a resolução desta Assembleia da República, proposta pelo PCP, mas de acordo com as informações que vieram a público há aqui um desajustamento - sem prejuízo de não conhecermos as decisões em concreto (estamos a falar pelo que veio a público) -, isto é, há uma anunciada redução do preço da energia eléctrica para a indústria que andará na ordem dos 10% e há uma anunciada redução do preço da energia eléctrica para os consumidores que andará pelos 6%, tanto quanto li.
Pergunto: porquê esta diferença de critérios? Por que é que os consumidores privados hão-de ter benefícios da redução dos custos da energia eléctrica inferiores aos do sector industrial?
Outra questão tem a ver com o seguinte: o Governo afirma em várias partes do Orçamento a importância do investimento estrangeiro em Portugal, mas o que verificamos nos últimos tempos, pelas notícias em catadupa - que fazem com que o Sr. Ministro, naquelas coisas do "sobe e desce" da comunicação social, em vez de estar em cima, esteja em baixo -, é que não é investimento estrangeiro mas, sim, desinvestimento estrangeiro, com deslocalização de empresas. Enfim, temos três anúncios recentes, alguns já concretizados: a Texas Instruments, a Nestlé e um processo de desinvestimento da Siemens - Vila do Conde e Évora -, o que pode levar ao encerramento das empresas, se o processo de desinvestimento anunciado pela Siemens não tiver tradução na criação de novos associados que preencham os objectivos daquelas unidades e, portanto, a perspectiva poderá ser encerrar e deslocalizar.
Aliás, olhando para os comunicados oficiais da Siemens, verifica-se que a expressão utilizada é sempre "desinvestimento" e não outra. O desinvestimento levará a algo que, neste momento, não é possível definir, mas em que a perspectiva de encerramento das unidades não pode ser descartada.
Ora bem, estamos a ter um processo, até, de alguma arrogância, porque veio a público, em relação à Texas Instruments, que veio cá, há oito dias, como o Sr. Secretário de Estado anunciou à comunicação social, anunciar, pura e simplesmente, o encerramento. Isto tem repercussões óbvias nos tecidos económico e social, nos recursos nacionais e comunitários que foram afectos a estes grandes investimentos multinacionais, muitas vezes, em prejuízo das pequenas e médias empresas nacionais, do investimento consolidado e estruturado.
O Sr. Primeiro-Ministro anunciou, em Évora, quando inaugurou a Siemens, que aquele é que era o futuro do Alentejo. Se este é que é o futuro do Alentejo, valha-nos Deus, Sr. Ministro, pois é um futuro de mais desemprego e de perspectiva de encerramento de unidades!
Sr. Ministro, o que quero saber é como é que o Governo avalia esta situação, que resposta é que o Governo dá a estas questões concretas, porque elas são um pivot, digamos assim, da estratégia deste Ministério, de acordo com o que se lê nos documentos e com as declarações públicas. Esse pivot está, obviamente, a enfraquecer-se e, portanto, não só põe em causa todas as questões que acabei de referir em relação ao País, as questões sociais, de emprego, como também a própria estratégia do Ministério, o qual, num quadro de uma forte tendência para deslocação de empresas para outras regiões do mundo, ou num quadro de desinvestimento, ainda se preparava para agravar este processo, assinando o Acordo Multilateral de Investimento (AMI), que, felizmente, "faleceu" - pelo menos, para já -, em resultado de uma forte intervenção do governo francês e da opinião pública nacional. Mas o Governo português preparava-se para o assinar, agravando ainda mais este processo de possibilidade de deslocalização e de desinvestimento estrangeiro ou de arrogância das multinacionais na forma como tratam os investimentos que têm em cada país.
Estas são, pois, as minhas questões e gostaria, em relação a cada uma das multinacionais em causa, que houvesse uma informação concreta do Governo, para além de considerações de filosofia geral.
A última questão, Sr. Ministro, e já que temos cá o Sr. Secretário de Estado do Comércio - que há muito não víamos, aqui, pela Assembleia -, é muito sintética. Veio a público, e, aliás, nas Grandes Opções do Plano e no Relatório do Orçamento do Estado parece apontar-se nesse sentido, uma alteração da filosofia ou, pelo menos, das políticas que o Governo tem definidas, até agora, em relação aos horários das grandes superfícies, com perspectivas de alteração desses horários, reaberturas aos domingos e toda essa polémica que se arrastou ao longo do tempo. Penso que é uma questão importante - porventura, não é a única, mas é importante - e gostaria de saber se o confirma, ou não, qual é a estratégia do Governo nesta matéria e se o Governo já tem estudos que lhe permitam vir a tomar uma eventual nova decisão sustentada nos efeitos negativos ou positivos que o encerramento ao domingo teve, designadamente para o pequeno comércio.
Tão importante como esta questão é, eu diria, o problema da relação das grandes superfícies com a economia
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em geral, aquilo que se diz que é a concretização da lei da concorrência - preços a baixo do custo; venda de metros quadrados de superfície para a instalação de produtos; funcionamento das tesourarias dos grandes hipermercados com os dinheiros dos fornecedores, através do prolongamento de pagamentos, etc. Portanto, gostaria de saber o que é que o Governo pensa fazer em termos de disciplinar o comportamento das grandes superfícies - sobretudo em relação aos pequenos e médios comerciantes, aos fornecedores, aos consumidores em geral -, de molde a que, através da distorção das regras da lei da concorrência, não se ponha em causa o tecido económico, que hoje já é vasto, que tem uma relação muito forte e muito violenta com as grandes superfícies.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de assinalar que assistem aos nossos trabalhos, nas galerias, 41 alunos e professores da Escola Secundária Leal da Câmara, de Rio de Mouro. Congratulamo-nos com a vossa presença, mas quero esclarecer que, a despeito de estarmos nesta Sala, não estamos em trabalho de Plenário, mas apenas em trabalho de Comissão.
Tem, agora, a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia: - Sr.ª Presidente, vou esclarecer a primeira pergunta, que é muito importante e é uma espécie de pergunta sobre o mistério do dinheiro que aparece num sítio mas falta noutro, como o Sr. Deputado a colocou. Ou seja, trata-se de saber por que é que, muitas vezes, nos orçamentos dos ministérios, temos dotações que sobram, não havendo realização, registando-se, aparentemente, uma procura do outro lado. Eu não tinha exactamente os mesmos números, em termos de Orçamento inicial, que o Sr .Deputado, mas penso que a questão do número específico não interessa; o que interessa é saber por que é que as coisas se passam assim.
Começarei por uma justificação de natureza técnica e, depois, explicarei como é que as coisas se passam, avançando para outras áreas que não apenas meramente técnicas.
Quando temos um Orçamento, como no caso que aqui está, o qual é aprovado na Assembleia da República, fixamos um conjunto de tectos para despesas e para certas classes de despesa, o que significa que se pode gastar até aí e não se pode gastar para além disso. Isto torna, logo à partida, evidente que, se há um excesso de dotação face à realização de uma determinada rubrica, depois, muitas vezes, não é possível aplicar esse excesso, que se revela durante a execução, noutras rubricas de outras áreas do Orçamento do Estado.
E relembro, por exemplo, que as transferências entre capítulos são da competência da Assembleia da República, o que significa que, se num determinado momento se quisesse reforçar o Capítulo 50, tal não seria possível, no âmbito de acção do próprio Governo. Mas, mais do que isso, agora há outros elementos que também condicionam a execução do Orçamento do Estado e que podem explicar por que é que, no fim do ano, há saldos nos serviços - que é a realidade que temos, regularmente,…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, não perca tempo a explicar-nos os mecanismos de elaboração do Orçamento, porque isso eu sei, esse é o nosso trabalho. A questão que coloquei reduz-se a isto: porque é que, por exemplo, sendo a execução prevista do IAPMEI de 147,1 milhões de contos para 1998, o Orçamento inicial para 1999 só prevê 131 milhões de contos? Se o Sr. Secretário de Estado vir, para trás, o histórico destes processos, verificará que tal se repete e tem tradução, depois, no funcionamento real dos organismos.
O Orador: - Exactamente!
Sr. Deputado, isso tem a ver com algo a que eu estava a procurar chegar, criando terreno para depois o explicar, que é o seguinte: uma das condicionantes que temos, quando executamos o Orçamento do Estado, é o próprio ritmo de transferências comunitárias de alguns programas. E quando as transferências não são feitas ao ritmo que, inicialmente, estava previsto, só isso é um facto que pode atrasar a execução financeira do próprio programa.
Mas, mais do que isso, dependemos também, em muitas áreas do Orçamento do Estado, da capacidade de realização dos agentes privados. Vou dar-lhe um exemplo concreto, que tem a ver com o IAPMEI e com a questão que está a colocar. Inicialmente, e é uma realidade que também está espelhada no Orçamento, temos dois programas com dotações significativas, as quais são negociadas com a Comissão Europeia e, por essa razão, só podem ser alteradas em sede de comissão de acompanhamento, que envolve os próprios representantes da Comissão Europeia. Temos dois programas de engenharia financeira - um, no âmbito no IMIT, naquela iniciativa para a modernização dos têxteis, outro, no âmbito do próprio PEDIP - e o que se tem vindo a verificar é que essas medidas de engenharia financeira, negociadas com a Comissão, e que visavam estimular a aplicação de capitais a empresas nascentes ou que procuravam expandir a sua actividade, não tiveram, pela parte dos empresários, a aceitação que, inicialmente, se pensava que teriam.
Para ter uma ideia da dimensão destes programas no PEDIP e no IMIT, devo dizer-lhe que estamos a falar de verbas, em cada um dos programas, na casa dos 290 milhões de contos. E são programas que têm tido execuções muito baixas.
O Sr. Deputado perguntaria agora, naturalmente, como é que nós procuramos ultrapassar esta questão. Para além de se procurar dinamizar o capital de risco, que é a principal medida no âmbito da engenharia financeira, vamos tomar também outro tipo de medidas. Assim, na reprogramação do Quadro Comunitário de Apoio, vamos procurar, reduzindo estas verbas de engenharia financeira, aplicá-las noutras áreas, como, por exemplo, no caso do IMIT, na modernização dos têxteis, - acção A.
O que é que isto significa? Significa que um capital de risco em que a parte do Estado é percentualmente menor, em termos de acção - isto é, a percentagem de comparticipação é mais baixa -, é substituída por uma A-2, em que a percentagem de comparticipação com verbas, com fundos comunitários e com o Orçamento do Estado é mais elevada, o que significa que o volume total de investimento diminui.
Esta é uma das razões que explica também por que é que a execução é inferior, não só porque num determinado ano se comprova que, em algumas áreas, não houve a procura pelas entidades privadas que, inicialmente,
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equacionávamos, com base nas informações, estudos e outros levantamentos que tínhamos, como depois somos obrigados, até no contexto de reprogramações, a prever medidas em que a participação dos fundos comunitários e a administração pública é mais elevada porque, precisamente, são estas também que têm mais procura pela parte dos empresários, como é compreensível, porque a taxa de comparticipação é mais elevada.
Além disso, saliento também que há certos tipos de acções, no âmbito do próprio IAPMEI, e que têm que ver com o financiamento da modernização e da reconversão de empresas, que, depois, acabam, na prática, por também não poderem ser executadas a 100%, naturalmente, mas que não podemos, em termos de Orçamento do Estado, descurar, porque, se não estiver prevista toda a despesa, ela depois não poderá ser realizada. Vou dar-lhe um caso concreto: algumas acções para a criação de novas empresas requerem o licenciamento industrial. Ora, comprova-se que, algumas vezes, o licenciamento industrial não consegue ser realizado naquele ciclo orçamental, no Orçamento daquele ano, só sendo terminado no ano seguinte, o que implica um deslizamento, em termos do projecto. Ou seja, fica-se, mais uma vez, aquém daquilo que, inicialmente, estaria pensado, em termos de realização.
O Sr. Deputado fez a pergunta - e muito bem - de saber por que é que ficamos com empresas que nos aparecem com projectos, que, por vezes, até podem ser interessantes, mas que não conseguimos, depois, apoiar. Isso tem a ver com a programação do Quadro Comunitário de Apoio. A nossa principal ferramenta de política industrial é o PEDIP, o qual está programado, tendo a programação sido negociada com a Comissão. Isto significa que temos tectos para a despesa nas várias áreas do programa, para todos os anos, e, portanto, significa que, no contexto de um determinado ano, pode não haver dotação, porque não estava prevista na programação para esse ano, pelo que ficarão de fora empresas com projectos.
Mais uma vez, estamos a procurar, no Ministério, suprir isso por um outro mecanismo, em que temos mais flexibilidade. Como o Sr. Deputado sabe, com certeza, uma parte do financiamento do PEDIP é feita no contexto dos chamados empréstimos reembolsáveis, ou seja, a verba é emprestada às empresas a juro zero, que elas vão devolvendo de acordo com um plano de reembolsos. À medida que as empresas vão fazendo os reembolsos, esse dinheiro entra no Orçamento do Estado, é integrado no orçamento do IAPMEI, ficando disponível para ser, de novo, emprestado. E, por exemplo, neste caso concreto, foi o que aconteceu, na medida III.3, ainda há bem pouco tempo, quando mais um lote de projectos - 49 - foi aprovado, tendo sido assinados contratos em cerimónia pública. A medida III.3 estava suspensa desde 1996 e estas são verbas que o Sr. Deputado não vê agora no Orçamento do Estado porque, como os reembolsos são feitos durante o ano, têm de ser integrados e aparecerão mais tarde no Orçamento do Estado, quando forem integrados no orçamento do IAPMEI. Nós estamos a entrar, progressivamente, na fase de reembolsos, porque como nos encontramos no final do Quadro Comunitário de Apoio as verbas estão a esgotar-se e estamos a viver, cada vez mais, desses reembolsos, que só podem ser gerados agora, porque implicam que o investimento tem de estar já em fase terminal de concretização para o reembolso ser realizado. Isto significa que, progressivamente, cada vez mais, mas em percentagem não muito grande, o financiamento das acções do IAPMEI será feito pela integração, durante o ano, de reembolsos, o que explica menores orçamentos do IAPMEI no início do ano e maiores orçamentos do IAPMEI no fim do ano, quando houver esse reembolso.
Saliento também que uma das razões porque, depois, as verbas diminuem às vezes tem a ver com um outro facto também ligado à nossa actividade principal no domínio que o Sr. Deputado focou e que é o financiamento de acções de reconversão e de modernização de empresas, o que é uma coisa que acontece também mais em final do que em início de Quadro Comunitário de Apoio. É que nós estamos também a empreender agora acções não só de encerramento de projectos como de revogação de homologação de projectos, ou seja, quando certos empréstimos ou subsídios a fundo perdido são dados para projectos que, depois, quando são concretizados, não comprovam as condições para que inicialmente foram contratados, isso obriga à devolução dessas verbas ao Orçamento do Estado. Portanto, elas são abatidas, o que implica uma redução de Orçamento de alguns anos. Essas verbas, mediante um processo de integração, poderão também ser reutilizadas mais tarde.
Temos, depois, acções que os próprios promotores acabam por não querer realizar e que têm a ver com várias razões. Nos últimos anos, a principal razão que levou a que algumas acções acabassem por não ser realizadas com a participação do PEDIP foi o facto de, no contexto do PEDIP, em certos casos de subsídios reembolsáveis, ser necessária a apresentação de uma garantia bancária. Ora, com a redução da taxa de juro tornou-se comparativamente mais onerosa a garantia bancária e há empresas que acabam por prescindir do empréstimo reembolsável para não terem de comprovar certas condições que nós queremos impor. Portanto, mais uma vez, estes são projectos que desaparecem, é despesa que não é realizada e é verba que sobra no final do ano, em termos de Orçamento do Estado.
O Sr. Ministro da Economia: - Srs. Deputados, creio que a resposta dada pelo Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia foi já muito fundamentada e espero que tenha contribuído para esclarecer as dúvidas do Sr. Deputado Lino de Carvalho.
No entanto, permito-me juntar mais dois ou três elementos ao que foi dito. Começaria por dizer que acho que o Sr. Deputado Lino de Carvalho, até por formação, há-de reconhecer que a prática é o critério de verdade. Portanto, em relação às preocupações que exprimiu sobre o facto de as empresas estarem ou não estarem a receber os sistemas de incentivos, nomeadamente ligados a fundos comunitários, e de estarem a recebê-los a horas, gostava de dizer que, no que respeita ao PEDIP, enquanto nos seus dois primeiros anos, em 1994 e em 1995, foram apreciados e aprovados cerca de 1900 projectos enquadráveis nesse programa - no fundamental, programas de pequenas e médias empresas -, correspondendo a um volume de investimento da ordem dos 700 milhões de contos e a incentivos da ordem dos 256 milhões de contos, nos dois anos e meio pelo qual este Governo é responsável no que respeita a termos de execução, ou seja, os anos de 1996, de 1997 e meados de 1998, foram, até agora, aprovados 3000 projectos de investimento, num volume global de 1000 milhões de contos e de 270 milhões de contos de incentivos.
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Contacto muito com industriais e com as pequenas e médias empresas e um dos aspectos que é assinalado frequentemente é o da melhoria efectiva da eficácia na atribuição e na libertação dos próprios sistemas de incentivos.
Portanto, quero eu dizer, acrescentando esta ideia e este dado ao que o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia já referiu, que as menores verbas, afectas tanto ao IAPMEI - e o que eu estou a dizer para o IAPMEI poderia dizer para o ICEP nos programas que lhe são próprios - significam melhor eficácia na utilização dos recursos e não menor capacidade na utilização desses recursos.
Este ponto é muito importante e está relacionado com uma opção de fundo que já outro dia aqui assinalei e que é a de, no Ministério da Economia, trabalharmos - aliás, também no âmbito da orientação geral do Governo, mas no Ministério da Economia isso foi mesmo conseguido - no sentido de, a prazo, criarmos um movimento de descida e de redução das despesas de funcionamento do Ministério, porque esse é um bom critério de eficácia sobre a própria capacidade de o Ministério da Economia servir os agentes económicos e de dinamizar as políticas que estão a seu cargo.
No que respeita ao mercado interno alargado, o Sr. Deputado referiu algumas desarmonias fiscais em relação a Espanha. É verdade que elas existem, como também é verdade, por exemplo, que a redução da taxa do IVA de 17% para 12% na restauração já foi feita por este Governo. É também verdade que o Governo português está em diálogo, que não é fácil, com a Comissão Europeia, por causa dessa redução, dado que, nesse domínio, os pontos de partida de Portugal e da Espanha eram inteiramente diferentes, o que coloca a apreciação dos dois casos, no âmbito da Comissão Europeia, de uma forma diferente. Mas, conforme também já tenho dito várias vezes, a questão do mercado interno alargado não pode ver-se só pelo lado da harmonização fiscal. O processo de harmonização fiscal é um método lento, complexo, que vai ter de ser acelerado até ao ano 2002 e da nossa parte, se continuarmos a ser Governo, há o compromisso de desenvolvê-lo e acelerá-lo a partir do próximo ano.
De qualquer maneira, o que eu queria referir é que o conceito de mercado interno alargado tem a ver com outros domínios e que nesses outros domínios nós estamos a avançar. Por exemplo, no que respeita aos programas de promoção de eventos turísticos, culturais ou sociais importantes para o nosso país, como seja "2001 - Porto, Capital Europeia da Cultura", estamos - e isso está já inscrito nos programas de trabalho promocionais do ICEP e da Secretaria de Estado do Turismo - a conceber, e iremos executar, programas de promoção desse evento, que não terminarão nas fronteiras de Portugal já que se alargarão nomeadamente para a Galiza e conjugarão com outros eventos, também muito importantes do ponto de vista turístico, que acontecerão na Galiza antes de 2001, data em que, como sabe, o Porto será a capital europeia da cultura.
Portanto, o que eu queria dizer é que, no que respeita ao mercado interno alargado, definimos e precisámos o conceito que consta de um estudo que foi tornado público na semana passada pelo Secretário de Estado do Turismo. Mas, além disso, estamos a criar, e já mesmo a operacionalizar, instrumentos, nomeadamente no âmbito da promoção e da organização da política pública, que incorporam este conceito. Não é por acaso que o delegado do ICEP em Vigo tem uma dupla ligação à estrutura do ICEP: reporta a Madrid e reporta ao Porto. Isto significa que estamos a trabalhar já nesse conceito e que iremos continuar a desenvolvê-lo.
No que respeita ao preço da energia eléctrica e aos tarifários, não quero estar a falar em concreto sobre os tarifários quando eles ainda não são públicos, já que será a entidade reguladora do sector eléctrico que, depois de ouvido o Conselho Tarifário, publicará esse mesmo tarifário. De qualquer maneira, há uma opção que me parece lógica e que é a seguinte: numa trajectória - e foi esse o compromisso do Governo - de convergência do tarifário eléctrico português com a média do tarifário da União Europeia, os consumidores industriais, em termos de média europeia, estavam numa situação pior do que os consumidores domésticos. Portanto, é natural que o movimento de convergência seja mais acentuado para os consumidores industriais do que para os consumidores domésticos. Acresce que, nos consumidores industriais, a energia é, digamos, um input importante para as actividades económicas e com repercussões no próprio valor criado na indústria e, portanto, tem um valor multiplicador bastante superior à utilização da energia, chamemos-lhe assim, como um bem de consumo final por parte dos consumidores domésticos, e isto precisa de ser avaliado e de ser tido em conta também no que respeita à estratégia de convergência. Mas o ponto fundamental é aquele que eu comecei por referir, ou seja, em Portugal, os consumidores domésticos têm tarifas menos distantes da média europeia do que os consumidores industriais. Daí que a redução, de acordo com as propostas vindas a público da entidade reguladora do sector eléctrico, sejam mais significativas para os consumidores industriais, mas ainda assim, a serem exactos os valores que vieram a público, essa reduções serão muito significativas e as maiores, julgo eu, depois de todo o período pós-25 de Abril, também para os consumidores domésticos.
No que respeita ao investimento directo estrangeiro, o Deputado Lino de Carvalho referiu as dificuldades recentes que estão a ser vividas no nosso país - e não só no nosso país - pela indústria de semicondutores, Dizem as empresas - e eu já referirei qual é a postura concreta do Governo português em relação ao caso Texas/Samsung -, a imprensa da especialidade e os analistas dos mercados que há um movimento de grande "deslocalização" e de grande redefinição estratégica da própria indústria, resultante daquilo a que poderíamos chamar um choque exógeno, resultante, por um lado, da grande desvalorização das moedas do Extremo-Oriente, onde se situa grande parte dos produtores deste tipo de produtos e de indústria e, por outro lado, também, de uma prática que, não só no domínio dos semicondutores mas também da construção naval de dumping, ou com elementos de dumping, em termos dos mercados internacionais, está a ser desenvolvida, nomeadamente, pelos produtores sul-coreanos.
Isto tem o valor que tem, é um elemento importante e no que respeita à Texas/Sumsung nós consideramos que a aplicação plena, por parte desta empresa, de todas as obrigações em termos de investimento e de modernização do investimento a que estavam obrigados no contrato que tinham assinado com o Estado, permitiria dar resposta positiva a esta questão, isto é, não fechando a empresa.
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Não é esse o entendimento da administração da empresa e dos seus accionistas, mas o contrato assinado entre o Estado português e os accionistas estipula, de uma forma rigorosa e precisa, quais são as consequências jurídicas do incumprimento grave do contrato que, no nosso entender, o encerramento da empresa prefigura.
Nesse sentido, conforme também já foi tornado público, o Governo encetou um processo negocial com a entidade que fechou ou que vai fechar a empresa, ou com os accionistas, no sentido de ser, primeiro, ressarcido de todos os incentivos públicos capitalizados, até agora entregues à Texas/Samsung; segundo, de ser fixado um valor de indemnização para o Estado português resultante, precisamente, de estarmos não perante uma situação de alteração extraordinária de condições, mas sim de incumprimento grave por parte dos accionistas e da própria empresa; terceiro, fizemos condicionar a possibilidade de qualquer solução conciliatória no que respeita a isto não só à verificação destas duas condições mas também à acomodação, em termos razoáveis e defensáveis, da situação social dos cerca de 750 trabalhadores que vão para o desemprego.
De qualquer forma - e, nesse sentido, apelo a todos os Deputados em geral, e ao Sr. Deputado Lino de Carvalho em especial -, sugiro que vejamos a evolução do investimento directo estrangeiro em Portugal nos últimos anos, e neste ano em particular, na sua globalidade e não apenas a partir de um caso muito preocupante e grave que surgiu. E no que respeita a isso, falando só de investimento estrangeiro contratualizado na base do regime contratual, este é, com excepção de 1991, o melhor ano de investimento estrangeiro em Portugal. Foram, até agora, assinados quatro contratos, num total de investimento de 100 milhões de contos, criadores de 5546 postos de trabalho. Não refiro aqui, apesar de representarem algumas centenas de milhões de contos, os projectos de investimento estrangeiro em Portugal de valor inferior a 5 milhões de contos. Contudo, é evidente que o Governo está atento aos sinais que o Sr. Deputado Lino de Carvalho enfatizou e está atento a uma outra realidade: é que, sendo desejável e continuando nós a agir para captar investimento estrangeiro estruturante para Portugal, é muito importante sublinhar que a evolução da economia portuguesa e o seu grau de maturidade permitem hoje, situação que não existia, seguramente, há 10 anos atrás, que a capacidade de investimento nacional em Portugal seja altamente modernizadora e estruturante. É por isso que, neste Orçamento do Estado, o Governo alarga aos investimentos feitos em Portugal por portugueses superiores a 1 milhão de contos os sistemas de incentivos fiscais até agora aplicáveis ao regime contratual de investimento estrangeiro.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço desculpa, mas é apenas para encerrarmos esta parte desta questão concreta.
Sr. Ministro, a verdade é que estamos perante três casos concretos que envolvem uma questão que não é menor e que, infelizmente, o Sr. Ministro não referiu, como não tem referido em intervenções públicas feitas. Refiro-me, naturalmente, aos postos de trabalho, questão que, como digo, não é menor, porque na Texas/Samsung são 800 e na Siemens são uns milhares.
O Orador: - Peço desculpa, mas referi-me a esses casos. Aliás, convém referir que a Siemens não fechou nem vai fechar.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro, quanto à Siemens, não sei se vai fechar ou não. Gostaria de o acompanhar nessa sua afirmação tão sólida, mas a verdade é que o que está aqui no comunicado da Siemens é que esta empresa iniciou um processo de desinvestimento para optimizar o seu portfolio. É, portanto, um mero quadro de raciocínio financeiro no conjunto dos investimentos da Siemens. Como tal, Sr. Ministro, não esteja tão seguro de que este processo de desinvestimento não vai conduzir à redução da actividade das unidades em Portugal, ou, eventualmente, ao seu encerramento.
Por outro lado, a deslocalização a que se está a assistir, não é só uma deslocalização para o Médio Oriente, com baixos custos dos factores de produção e com dumping social. A Nestlé, por exemplo, fecha em Matosinhos e, em princípio, vai reabrir em França ou em Espanha, já que está em negociações com os respectivos governos. Aqui, esse raciocínio não serve, Sr. Ministro.
O Orador: - A Nestlé não faz parte do mercado dos semicondutores, Sr. Deputado, e era a esse mercado que me estava a referir.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro, falei em três grupos de empresas: na Texas, na Nestlé e na Siemens.
O Orador: - E eu falei especificamente de razões precisas no que respeita ao mercado de semicondutores.
Em relação à Siemens, como, aliás, já tive oportunidade de afirmar publicamente, a respectiva administração em Portugal informou-nos formalmente de que o que está em causa é um eventual desenho accionista diferente das sociedades que têm no nosso país e não o volume de investimentos ou a sua durabilidade. É com base nesta informação que faço essa afirmação.
Posto isto, passaria a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Comércio.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio (Osvaldo Castro): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, agradeço-lhe a oportunidade que me dá de falar do sector do comércio que, apesar de tudo, tem mais importância do que às vezes se pensa. No entanto, antes de responder às questões que me colocou, deixe-me apenas saudar esta Comissão que, nesta altura, sei que tem um trabalho muito abnegado e muito intenso.
Em relação aos horários, Sr. Deputado Lino de Carvalho, a posição do Governo neste momento é exactamente aquela que temos desde o princípio da legislatura. Como sabe, há situações em que as câmaras, nas unidades comerciais abaixo de 2000 m2, podem ou não abrir aos domingos, enquanto as unidades com uma dimensão superior obedecem a um outro regime-regra que tem uma excepção nos meses de Novembro e de Dezembro, meses que são coincidentes com o Natal.
O que temos pensado sobre isto é que devíamos estudar o problema, não apenas do ponto de vista político, mas
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também quanto às suas incidências económicas. Para isso, limitamo-nos a dar cumprimento a algo que estava previsto no acordo de concertação social, ou seja, à constituição do observatório do comércio. Este observatório, como sabe, é uma estrutura de projecto que tem fundos comunitários e que, aliás, provavelmente, já devia estar há mais tempo a funcionar, mas que agora está a funcionar em pleno. De acordo com os parceiros sociais e com o acordo de concertação estratégica, esta estrutura tem três objectivos fundamentais que, do meu ponto de vista - e não é por acaso que lá estão -, estão interligados. Assim, o observatório do comércio tem por objectivos o exame da situação dos horários do comércio, o exame das relações laborais do comércio e, finalmente, um outro estudo que é o das relações concorrenciais do comércio. Os estudos dos horários do comércio e das relações laborais do comércio estão já adjudicados a universidades, enquanto o estudo das relações concorrenciais será adjudicado em breve. De qualquer modo, estes estudos já têm relatórios de progresso e estarão prontos, provavelmente, em meados do próximo ano e não antes, visto que são estudos muito complexos. Nessa altura, podemos, então, vir a tomar qualquer posição de carácter político, pelo que vamos aguardar pelos estudos. A nossa posição é, portanto, a que existe, não temos qualquer outra e tudo o que se diga de diferente é pura especulação. Mas, mais: não basta que surja o estudo dos horários, que, tendencialmente, será o primeiro a surgir, já que foi o primeiro a ser adjudicado. Este estudo tem de ser visto conjugadamente com o estudo das relações laborais, obviamente, e com o estudo relativo às relações concorrenciais. Depois de possuir estes três estudos, o Governo, e concretamente o Sr. Ministro da Economia, estarão, certamente, em condições de decidir, se assim o entenderem.
Em relação a uma outra questão que colocou, da promoção e defesa da concorrência e dos preços de venda com prejuízo, os chamados preços predatórios, existia, como é sabido, desde 1994, um famoso "despacho palha" que, no essencial, dizia à Inspecção-Geral das Actividades Económicas para ignorar qualquer tipo de vendas com prejuízo. Isto é, de acordo com esse despacho, pôs-se uma "venda" à IGAE para não apurar essa situação, na medida em que se terá pensado que tal medida seria benéfica em termos de inflação. Quando, há cerca de um ano, chegámos à Secretaria de Estado do Comércio, um dos parceiros sociais, a CCP, pediu-nos a suspensão desse despacho, ao que dissemos que íamos estudar o problema. Depois de o fazermos, entendemos que não se tratava de suspender o despacho mas de o revogar, introduzindo uma alteração legislativa, o Decreto-lei n.º 140/98, que define com mais clareza, porque, de facto, as coisas eram muito omissas, o que é a venda com prejuízo. Esse diploma entrou em vigor recentemente, a IGAE está no terreno e posso dizer, especialmente àqueles que pensavam que tínhamos dado poucos passos e que não tínhamos ido tão longe quanto podíamos em matéria de vendas com prejuízo, que as notícias que tenho da Inspecção-Geral das Actividades Económicas me dizem que em várias situações, em vários grupos e cadeias de distribuição e em vários produtos dos sectores alimentar e de higiene, há, de facto, vendas com prejuízo, pelo que os processos estão a ser remetidos para a Direcção-Geral de Comércio e Concorrência, entidade que tem a responsabilidade e competência para a sua instrução.
Obviamente, este diploma não pretende ter, nem tem, qualquer intenção persecutória. Por outro lado, não ignoramos que existe um código de boas práticas comerciais celebrado entre a APED, que é a estrutura da distribuição, a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição, e a CIP e entendemos, aliás, que esse papel auto-regulador é preferível, só que, até agora, está por demonstrar que a distribuição e a produção conseguem auto-regular-se. Daí que tenhamos tomado essa medida e que estejamos a proceder àquilo que entendemos que devemos fazer, ou seja, ao exercício do papel regulador do Estado, procedendo às devidas inspecções e fiscalizações que, como disse, estão a demonstrar alguns resultados.
De todo o modo, o Sr. Deputado tem razão em dizer que não podemos ficar satisfeitos nesta matéria. Hoje mesmo, uma direcção geral que tutelo, a Direcção Geral de Comércio e Concorrência, organizou durante toda a manhã uma conferência em que estiveram presentes os presidentes dos tribunais espanhol e francês da concorrência, além do Presidente da Comissão de Concorrência portuguesa e de muitas outras pessoas ligadas a esta matéria, subordinada ao tema "O poderio de compra e os seus impactos nas relações comerciais". Isto porque, como é sabido por todos, actualmente, o poder deslocou-se da oferta, dos produtores, que era quem tinha o poder em termos económicos, para o lado da procura. Hoje, os sectores da distribuição têm um papel sobredimensionado, o que está a causar enormes problemas em relação aos sectores da produção, designadamente à indústria agro-alimentar. Isto significa que, em termos da concorrência que é da nossa tutela, mas que é horizontal, não tem a ver só com esta parte, estamos a acompanhar os problemas. Posso dizer-lhe que, só nestas últimas duas semanas, estive presente, sempre em Lisboa, num congresso internacional sobre Direito da Concorrência e num congresso sobre franchising e merchandising, o que quer dizer que estas matérias estão hoje a ser muito acompanhadas, muito debatidas, designadamente por académicos. Tal significa que estas matérias começam a ser estudadas a um nível científico e que, provavelmente, temos de, tal como a Comissão Europeia e as reuniões da OCDE apontam, continuar a trabalhar no sentido de melhorar a nossa legislação e a nossa intervenção legislativa em sede de promoção e de defesa da concorrência, o que, aliás, dizemos nas GOP.
Para terminar, deixe-me dizer apenas, Sr. Deputado Lino de Carvalho, visto que isto pode ter alguma importância, que exactamente por haver uma grande concentração do lado da distribuição e do lado da produção - aqui, em sentido de autodefesa -, temos tido uma política de alguma discriminação positiva em relação àquilo a que se chama comércio tradicional e independente. Isto porque, como é sabido, o tecido retalhista do nosso país ainda tem uma extensão muito vasta de pequenas unidades. De qualquer modo, como pensamos que esta matéria não deve ser vista apenas pela óptica do mercado, há também que ter em conta a coesão social, devo lembrar, o que, certamente, todos sabem, ou seja, que no comércio estão 15% dos trabalhadores por conta de outrem e, portanto, no comércio estão também 15% do Produto Interno Bruto do nosso país. Por esta razão, temos tomado medidas no sentido de discriminação positiva para apoiar esse comércio mais enfraquecido, que é o comércio nacional.
Um grande sucesso - e creio que todos os Srs. Deputados conhecem, porque tenho andado por todos os distritos do País e certamente todos têm eco disso - têm
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sido os programas de incentivo comercial. Nós temos, neste momento, 138 candidaturas conjuntas das câmaras e das associações comerciais, correspondentes a 122 concelhos do País, mais de um terço dos concelhos do País, em que, quer as câmaras, que podem atingir 57% de fundo perdido, quer os comerciantes, que podem atingir melhores condições, 66,6% de fundo perdido, estão a utilizar este programa de uma forma que consideramos um sucesso. Trata-se de um certo tipo de apoio que podemos dar a esse comércio, que tem sido, de algum modo, enfraquecido pela concentração que se verificou nos sectores da distribuição.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Economia, espero não o maçar muito, até porque não sou economista, e o melhor é não falar muito para não ficar a perder.
Basicamente, o que quero dizer ao Sr. Ministro e aos Srs. Membros do Governo presentes entronca-se numa matéria que já aqui foi discutida e que tem a ver com os benefícios fiscais contratualizados, como forma de promoção do investimento externo directo português em Portugal. Depois, o outro lado da questão, ou seja, aquele que tem a ver com o modo como se promove o investimento português lá fora, designadamente do ponto de vista fiscal, julgo que isso ficará para um segundo momento.
Em todo o caso, quero dizer-lhe que não me convenceu, na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1999, o sistema de apoio às micro-empresas, designadamente a introdução de uma taxa reduzida de IRC. Acho que este Governo, qualquer governo, está confrontado com um problema grave no que respeita à estrutura da receita do IRC. A receita do IRC, numa parcela muito significativa, está dependente de um conjunto muito pequeno de empresas, empresas do sector público e do sistema financeiro. Mas nas do sector público, com o plano de privatizações em curso, pode admitir-se que o principal accionista deixará, com certeza, de dar as ordens que dá hoje para o fomento das receitas fiscais e passará a acontecer precisamente o contrário.
Portanto, a ideia que tenho é de que haverá uma redução efectiva da receita deste imposto a prazo. Perante o universo de empresas, que julgo que anda à volta de 400 mil, é preciso, pelo alargamento da base tributária e outros meios, encontrar formas para que elas venham a pagar o imposto que, porventura, hoje não pagam e deviam pagar, em muitos casos, tendo em vista compensar as receitas em risco de se perderem.
Descreio deste sistema de redução da taxa de IRC às micro-empresas, porque acho que a sua aplicação está sujeita a um conjunto de regras cumulativas que é desincentivadora da sua aplicação. Ele não vai dar, a meu ver, em nada, nem para efeitos de combate à evasão fiscal nem para efeitos de dinamização do investimento.
Voltando ao benefícios fiscais contratualizados, quero dizer ao Sr. Ministro que, por princípio, não gosto deste sistema. Em primeiro lugar, porque acho que é um sistema subjectivo, não sujeito a uma ideia prévia, sistematizada, de desenvolvimento económico do País. Em segundo lugar, porque é um sistema distorçor da concorrência, pois quando se dá um benefício individualizado, por contrato, a uma empresa, não se está a dar a outra que porventura a ele poderia concorrer. É, portanto, um sistema que distorce a concorrência, embora aprecie que a sua base de aplicação tenha sido alargada.
Agora, um milhão de contos é o investimento mínimo suficiente para poder aceder ao sistema de incentivos, mas quero dizer-lhe que me preocupa sobretudo o que está a acontecer com alguns sectores de actividade, que estão a desinvestir, logo depois de terem recebido estes incentivos. Já foi aqui referido o caso da Texas e quanto ao da Siemens vamos ver qual é o seu futuro.
Ouvi dizer, há dias - suponho que foi o Sr. Secretário de Estado Vítor Ramalho e o Sr. Ministro confirmou-o agora -, que o Estado português irá ter uma posição muito firme no que toca à Texas/Samsung, que é aquela que está agora em causa. Julgo que o abandono desta empresa tem a ver também com a crise asiática e com a perda de mercado na área dos semicondutores e da tecnologia de ponta na área da electrónica. Disse o Governo que vai agir com muita firmeza, pelo que concluo que as consequências jurídicas do incumprimento da Texas serão assumidas.
Mas quero questioná-lo mais precisamente pelas garantias financeiras deste tipo de contratos. Ouvi o administrador português da Texas dizer que este grupo estaria disposto a negociar a devolução destes incentivos no lugar próprio. Esta linguagem, meia elíptica, não revela nada em especial no que toca às garantias financeiras de que o Estado se rodeou, sobretudo para a devolução de montantes de investimento muito elevados. Não sei se esses contratos são públicos ou não, não tive tempo de averiguar, mas creio que não são públicos nem publicados.
Portanto, nós ficamos sem saber em concreto quais são as possibilidades reais de o Estado português obter, por inteiro, in totum, as devoluções destes incentivos, que, aliás, não são só fiscais. É um conjunto de incentivos muito amplo que engloba benefícios fiscais relativamente a estes grandes investimentos, que, por uma razão ou outra, se vão embora mais cedo do que o previsto, não tendo, por isso, a Texas, no caso concreto, direito à utilização dos benefícios, devendo, portanto, devolvê-los. Portanto, quais foram as garantias efectivas, financeiras, de que o Estado se rodeou para obviar a esta questão? Questão que é séria, apesar da vontade manifestada pelo Governo de fazer cumprir os contratos, que, se não têm mecanismos sancionatórios sérios - e foi uma coisa que aprendi na minha vida profissional, até política, se calhar -, no caso de haver incumprimento, muitas vezes as sentenças, que dirimem judicialmente este tipo de conflitos, nada resolvem para além da obtenção, sem efeito e sem consequências, de meras decisões condenatórias.
Neste contexto, gostaria, sobretudo, de saber se há abertura do Governo para evoluir progressivamente - e não pode ser de outra maneira - para outro tipo de modelos de captação de investimentos. A Irlanda e o Luxemburgo têm sistemas muito mais objectivos, que passam pela atribuição de taxas reduzidas de imposto para as empresas investidoras de acordo com actividades previamente consideradas. Isto tem a ver com o modelo de desenvolvimento económico para o País. É uma ideia muito pouco liberal, mas é uma ideia a que eu adiro sem dificuldade de maior.
Por um lado, o quero saber é de que garantias é que o Estado português se rodeou e dispõe para cumprir ou fazer cumprir os contratos, mesmo em caso de rescisão desses contratos de concessão de benefícios fiscais e, por
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outro, qual a disponibilidade do Governo português para evoluir para um sistema de atracção de investimento estrangeiro e também nacional que não passe apenas pela concessão contratualizada de benefícios, mas passe também pelo estabelecimento - e nas áreas de localização das empresas já há qualquer coisa prevista - de áreas de actividade que poderiam ser previamente elencadas e que poderiam beneficiar dessa redução de taxa de imposto. E isto tinha a ver com uma decisão prévia ou um consenso prévio, muito alargado relativamente a um modelo de investimento ou de desenvolvimento económico que desejamos para o País, ligado ao ordenamento do território. Aliás, julgo que essa discussão está toda por fazer e nem sequer se aproveitou o debate da regionalização para fazer algo parecido com isso.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.
O Sr. Ministro da Economia: - Agradeço, Sr. Deputado Luís Queiró, as questões muito importantes que colocou. Começarei pela última, porque, depois, o Secretário de Estado Vítor Ramalho detalhará sobre o dossier Texas/Samsung e sobre as cautelas que o Estado teve na contratualização e nos instrumentos de accionamento das garantias que o contrato consagra para o Estado.
No que respeita à evolução da política quanto à captação de investimento estrangeiro, a abertura do Governo é total e por várias razões, não tem tão-só a ver com estas dificuldades com que nos estamos a debater, e cujas explicações já foram referidas, mas tem a ver também com duas alterações de fundo na economia portuguesa e no seu enquadramento. Em sentido técnico rigoroso com o euro, o investimento que passe a ter origem nos países da União Económica e Monetária não é investimento estrangeiro. Portanto, uma das características fundamentais da economia é a possibilidade de medição, pelo menos temos de encontrar novos instrumentos de medição e de acompanhamento do que é que é o investimento directo com origem noutros países da União Económica e Monetária, depois da criação do euro. Este é um ponto.
O outro ponto tem a ver também com a própria capacidade endógena que a economia portuguesa está a ter e está a gerar de ela própria, a partir dos seus agentes económicos no seu próprio espaço territorial, fazer e ter investimentos estruturantes, modernizantes, com consequências, a montante e a jusante, no tecido produtivo, que há uns anos atrás eram fundamentalmente assinalados ao investimento estrangeiro e era com esse objectivo que se fazia um grande esforço e uma grande captação de investimento estrangeiro.
O que quero dizer é que estamos, visivelmente, não só por razões de conjuntura mas também por razões de estrutura, num ponto de viragem que impõe a consideração e a discussão mais larga desta política. A aproximação que já este ano se faz, que o Sr. Deputado referiu e que eu há pouco informei, de o investimento português superior a um milhão de contos ter já direito a um sistema de incentivos fiscais semelhante ao investimento contratual estrangeiro é um primeiro passo, é um primeiro reconhecimento dessa nova realidade. Não me custa admitir que é um reconhecimento ainda incompleto e que precisa de ser aprofundado e desenvolvido, e vamos fazê-lo.
No que respeita a condições de concorrência da nossa economia com outras economias, que são, elas próprias, fortemente captadoras de investimento estrangeiro, temos alguns factores de descompetitividade estrutural que também estamos a procurar resolver. A factura energética era um deles - já foi muito falado aqui -, e é um ponto que não dou por resolvido, mas dou por bastante melhorado a partir de 1999. A outra, que não é pouco importante, são os próprios entraves e estrangulamentos burocráticos da nossa administração no que respeita ao seu relacionamento, primeiro com os potenciais investidores estrangeiros ou nacionais que querem desencadear os seus investimentos, e, depois, uma vez tomada a decisão de investimento, todos os passos e todos os procedimentos a que os agentes económicos são obrigados para, finalmente, concretizarem e começarem a ter o retorno da decisão que tomaram.
Nós também estamos muito atentos a isso. Aliás, estamos a trabalhar, tanto no domínio da constituição de empresas, como no do licenciamento industrial, como no da articulação de todos os serviços da administração, que, de certa forma, têm que ver e têm procedimentos a desenvolver no que respeita à captação e à concretização dos investimentos. Algumas medidas já foram tomadas, outras sê-lo-ão a curto prazo, nomeadamente no que respeita ao licenciamento industrial, mas temos perfeita consciência de que este é talvez o campo onde, nos próximos anos, temos de fazer progressos mais significativos. Isto é, não podemos continuar a correr o risco de que os procedimentos administrativos e legais das actividades económicas em Portugal sejam geradores de descompetitividade para as nossas actividades económicas e para a captação de investimento estrangeiro em particular; e não nos podemos resignar com o facto daquilo que, como País, temos conseguido, em termos de ganhos de competitividade pela estabilidade macro-económica, pela capacidade de os nossos industriais se modernizarem e modernizarem as suas empresas, seja perdido, por outro lado, por uma relação da máquina do Estado com as actividades económicas que já não têm nada a ver com as necessidades do mundo contemporâneo e com as necessidades da globalização da actividade económica, em que as nossas empresas e a nossa economia vivem, desde logo, no espaço da União Económica e Monetária.
Estas eram as considerações de ordem geral que pretendia fazer.
Entretanto, o Sr. Secretário de Estado Vítor Ramalho irá aprofundar a informação possível no que respeita ao contrato estabelecido em Julho de 1995 entre o Estado português e o consórcio Texas/Samsung.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra para responder, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Ramalho): - Sr.ª Presidente, em relação à questão que o Sr. Deputado Luís Queiró suscitou, neste contrato, outorgado entre o Estado português, a TISEP - que é assim que se chama a empresa - e os dois accionistas que são a Texas Instruments e a Samsung Electronics, há, de uma parte o Estado português e de outra parte três outorgantes que respondem solidariamente por um eventual incumprimento contratual.
O contrato é de 21 de Julho de 1995 e prolongar-se-ia, em termos contratuais, até 31 de Dezembro do ano 2004. No contrato estão previstas obrigações a fazerem-se de
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uma forma faseada, em função da evolução tecnológica que este próprio mercado ou subsector dos condutores electrónicos tem. Por outro lado, está também expressa a qualificação de um eventual rompimento que, nos termos em que as entidades outorgantes comunicaram ao Ministério da Economia, nós entendemos tratar-se, de facto, de um incumprimento grave, que é expressamente previsto no contrato. Daqui decorrem, tal como o contrato prevê, obrigações de restituição de determinadas importâncias, avançadas, em termos de apoio, pelo Estado português, que correspondem, grosso modo, àquelas que foram satisfeitas, incluindo os próprios juros. O contrato prevê isso. E, prevê-o de uma forma directa quando fala do incumprimento ou de uma forma indirecta quando refere a estabilização do número de postos de trabalho que a empresa deve manter, sob pena de lhe ser aplicável, em caso de redução desses postos de trabalho, um determinado mecanismo percentual que constitui infracção. O resultado prático é exactamente o mesmo: ou consideramos o conjunto ou consideramos a diminuição dos postos de trabalho, chegamos à mesma conclusão.
Paralelamente a esta situação, existe também no contrato o mecanismo que nós, desde que tomámos posse, aperfeiçoámos e que tem a ver com o título que é suficientemente garante, em termos de instituição bancária, para cobrir esta situação de incumprimento. Existe um título, neste momento, que cobre uma parte significativa da situação. Por isso, nós não vamos avançar por aí e por uma questão muito simples: quando a empresa incumpriu e declarou o incumprimento disponibilizou-se, nos termos da cláusula 13.ª do contrato, a entrar pela via conciliatória que está prevista, tal como está previsto, se, eventualmente, não houver entendimento - e achamos que pode ser possível o entendimento -, entrar-se por uma via de solução arbitral.
Queria salientar, de qualquer maneira, em resposta ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, que, não obstante serem hoje inúmeros os contratos desta natureza, ou seja, estruturantes, de investimento estrangeiro existentes em Portugal, ao contrário do que alguma comunicação social tem referido, este foi o único contrato que foi incumprido durante a sua vigência. Nenhum outro foi incumprido! Este é o primeiro em que isso ocorre e ocorre pelas razões que o Sr. Ministro, genericamente, já referiu. Nem sequer se trata do "despedimento" que envolve maior número de trabalhadores. Relembro que, em 1976, no caso da Timex - e já lá vão vários anos -, também por razões de evolução tecnológica, o número de trabalhadores nessa altura envolvidos foi muitíssimo superior a este, o que não significa que esta não seja para o Governo uma situação grave, porque é-o socialmente e por isso a resposta foi a que foi. Todavia, é necessário termos os dados reais de toda a envolvência. Repito: este é o primeiro contrato que, nesta situação, é incumprido durante a sua vigência.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carvalho Martins.
O Sr. Carvalho Martins (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, são três as questões que queria colocar.
A primeira diz respeito ao SAJE. Segundo é público - e o próprio Presidente da SAJE há dias falou na imprensa -, este programa está suspenso. Gostaria de saber a razão pela qual este programa está suspenso e se, de facto, a curto prazo será ou não retomado.
A segunda questão tem a ver com o programa de urbanismo comercial explicitado há pouco pelo Sr. Secretário de Estado como um grande êxito deste Governo. De facto, tenho lido nos jornais que o Sr. Secretário de Estado onde vai compromete-se a pagar, normalmente, 4 milhões de contos. Gostaria de saber qual é a verba total afecta a este programa no ano de 1999.
A terceira questão tem a ver com os estaleiros navais de Viana do Castelo. Nas GOP vem previsto que, a curto prazo, este Governo se propõe privatizar os estaleiros navais de Viana do Castelo. Diz-se que a privatização será parcial e a questão que queria levantar era a de saber qual será o valor que o Estado vai alienar nesta privatização e se porventura haverá um golden share nesta empresa.
A quarta questão relaciona-se com o facto de que se admite, também nas GOP, que será estabelecido um plano social por forma a permitir uma melhor adequação dos efectivos à actividade da construção naval. Estão implícitos, na minha opinião, despedimentos. Queria saber se esta adequação se faz antes da privatização, depois da privatização e como é que será feita.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.
O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, queria colocar três questões muito rápidas. A primeira prende-se com uma situação de alguma acuidade, de uma região do País, a região do Douro, num dossier que V. Ex.ª liderou até há cerca de um ano. Gostava de questioná-lo sobre a disponibilidade e a abertura do Governo para, na eventualidade de retomar o protocolo assinado entre o Governo e a Casa do Douro em 1996, poder, eventualmente, reforçar e suspender aquilo que é a fragilização da Casa do Douro e os problemas graves com que os produtores e os vitivinicultores do Douro se defrontam neste momento atendendo à situação da sua instituição representativa.
Uma segunda questão prende-se com a situação do comércio e com a fragilização dos produtores do sector agro-alimentar perante o reforço do poder da distribuição. É público que em Julho e Agosto um conjunto de entidades fez queixas ao Ministério da Economia, mais propriamente à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, em relação à adesão do Pingo Doce e do Feira Nova à Uniarme pelas consequências que isso iria ter na fileira, nomeadamente pelas consequências para os produtores, ao nível da redução do preço e da dificuldade de escoamento dos seus produtos. Em relação a esta questão em concreto gostaria de saber qual a posição do Ministério da Economia.
Uma terceira questão prende-se com a articulação entre os vários departamentos de fiscalização do Governo. Existe a Inspecção-Geral das Actividades Económicas tutelado por V. Ex.ª, existe em alguns ministérios, nomeadamente no Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas a Direcção-Geral da Fiscalização e Controlo da Qualidade Agro-Alimentar. O que se nota no terreno é que a maior parte dos empresários são sujeitos a sucessivas fiscalizações por parte dessas entidades sem qualquer articulação, enquanto se assiste à penetração de produtos externos em território nacional e no mercado sem
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qualquer controlo, quer da qualidade quer das condições de penetração destes produtos - vide o caso presente da suinicultura, em que os espanhóis, nomeadamente, conseguem penetrar no nosso mercado fazendo uma concorrência desleal aos nossos produtores, afectando o preço e os rendimentos dos mesmos. Gostaria que V. Ex.ª me dissesse quais as medidas que poderão ser tomadas em relação a estes sectores e, principalmente, as razões da falta de articulação entre as várias entidades, nomeadamente a IGAE e a Direcção-Geral da Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar.
A Sr.ª Presidente: - Não havendo mais inscrições, gostaria eu própria de colocar uma questão que tem a ver com dois pontos.
O primeiro diz respeito ao problema da redução do preço da energia que se anuncia para o próximo ano. O Sr. Ministro disse que era algo que se verificava com um ano de antecedência relativamente ao acordo estabelecido em concertação estratégica. Pergunto se se verifica com um ano de antecedência ou com um ano de atraso. Isto porque os elevadíssimos lucros que a EDP tem apresentado, para além dos benefícios em termos de receitas fiscais e de privatizações que têm estado subjacentes a esses lucros, a verdade é que tem claramente sido um imposto sobre os contribuintes, o que dá a sensação de que há mais tempo deveria ter sido reduzido.
O outro ponto tem a ver com o PIDDAC. Todo o PIDDAC, mas neste caso vou cingir-me, evidentemente, ao Ministério da Economia, está cheio de verbas de tal forma exíguas que dão a sensação de que estão ali apenas para figurar como potencial investimento, mas que na realidade ou não é para ser feito ou é simplesmente para preencher calendário. Como projectos de valor inferior a 10 mil contos no Ministério da Economia contei 63 projectos, o que, evidentemente, é um número só por si reveledor do que é que afinal significa este PIDDAC no Ministério da Economia.
São estas as minhas duas questões e como não tenho mais inscrições, dou de imediato a palavra ao Sr. Ministro da Economia.
O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, em relação ao SAJE, tal como em relação ao RIME e ao sistema de incentivos de base funcional, que o Sr. Deputado Lino de Carvalho há pouco referiu, conforme creio já aqui Ter dito no debate na generalidade, trata-se de sistema de incentivos que não dependem do Ministério da Economia.
O problema que tem havido - e o caso SAJE é outro problema semelhante àqueles que já tinham ocorrido com o RIME - é uma situação de esgotamento das verbas que estavam alocadas ao programa. O papel do Ministério da Economia tem sido, no caso do RIME e do sistema de incentivos regionais, e será agora, na medida do possível, também em relação ao sistema de apoio aos jovens empresários, o de encontrar recursos, por um lado, e aberturas, por outro, no âmbito do PEDIP para, criando ou generalizando medidas já existentes, poder acomodar parte desses projectos.
Fizemos isso em relação às empresas industriais, fizemos isso em relação ao comércio, com o sistema de apoio às microempresas de comércio, SAMEC, no que respeita às empresas comerciais cuja criação era financiada pelo RIME, fá-lo-emos - estamos a estudar como, de que maneira e em que dimensão - em relação às empresas promovidas pelos jovens empresários, tentando assim promover uma política, que nem por ser pouco habitual deixamos de defender com muita força. Ou seja, defendemos a política de que o serviço e o apoio às iniciativas empresariais não deve estar dependente da rigidez existente entre os vários departamentos governamentais, portanto, se dado um determinado desenho, houve um esgotamento de recursos num programa que dependia, e depende, directamente do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, nós faremos, dentro dos recursos que temos e que gerimos, o possível e, em alguns casos, o impossível por diminuir esse impacto negativo e criar medidas alternativas.
No que respeita ao urbanismo comercial, peço ao Sr. Secretário de Estado do Comércio Osvaldo Castro para abordar o assunto. Quanto à questão dos estaleiros de Viana do Castelo, o Sr. Secretário de Estado Adjunto Vítor Ramalho dará uma resposta.
Relativamente à Casa do Douro, gostava de dizer que o que está em causa desde Janeiro do ano passado quando, por razões que são conhecidas, o Governo suspendeu a negociação que vinha fazendo sobre um ponto concreto do protocolo, que tem mais 12 pontos e que estão em completa execução, o problema não era entre o Governo e a Casa do Douro, não era e continua a não ser. Trata-se de um problema da Casa do Douro com um credor da Casa do Douro e este ponto é muito importante e não deve ser omitido.
A Casa do Douro tem uma dívida com um credor, resultante de um mau negócio que fez, e está a ter, desde há muito tempo, dificuldades em cumprir esse compromisso. Portanto, é muito importante que isto fique claro quando se diz: então o Governo não ajuda? O Governo não apoia? O Governo vai apoiar… Estamos a falar de uma situação em que uma entidade muito respeitável, como é a Casa do Douro, fez um mau negócio, fez um péssimo negócio, toda a gente o reconhece, e a Casa do Douro defronta-se com as consequências desse péssimo negócio que fez.
Segunda questão, no que respeita ao tratamento deste dossier, ele foi, por proposta minha e com o acordo do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, transferido do Ministério da Economia para o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, por uma razão muito simples. Levei para o Ministério da Economia, digamos assim, este dossier, na medida em que o coordenava a nível de secretário de Estado quando era Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro.
Como alguns dos Srs. Deputados se recordarão, ocupo as actuais funções desde princípios de Dezembro ou finais de Novembro do ano passado e tudo na época levava a crer que esse último ponto do protocolo, que não foi possível concretizar pelas razões conhecidas, sê-lo-ia dentro de poucos dias após a minha chegada a Ministro e da chegada do Dr. Vítor Ramalho a Secretário de Estado, que nas suas anteriores funções muito cooperou comigo no tratamento deste dossier.
Como estava a dizer, o que era razoável, racional e expectável era que esse ponto fosse encerrado nos últimos dias de Dezembro ou nos primeiros dias de Janeiro, o que, aliás, correspondia à marcação de sucessivas datas que foram estabelecidas entre o Governo e a Casa do Douro para a assinatura final desse mesmo acordo.
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Assim, era absolutamente inimaginável, na data em que passei a ser Ministro da Economia, que este ponto constituísse qualquer problema na altura ou a prazo. Infelizmente, não foi essa a situação. O comportamento do então presidente da Casa do Douro inviabilizou a concretização desse ponto do protocolo nessa altura e, portanto, daí para cá, o Governo entendeu que não havia condições para ir por esse caminho no que respeita ao apoio à Casa do Douro.
Isto para explicar que o dossier, neste momento, não está sob a minha coordenação, nem tinha de estar; o que faz sentido é ele ser gerido e dirigido pelo Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - e isso só não aconteceu desde a origem por razões muitíssimo específicas, que não vêm aqui ao caso estar a invocar -, que tem toda a capacidade para avaliar a nova situação decorrente da libertação de funções por parte do Engenheiro Mesquita Montes e as propostas que, em decorrência dessa alteração, a actual Direcção da Casa do Douro ficou de apresentar ao Governo.
Creio que é neste ponto que estamos e que o Governo e o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas estão na expectativa de propostas que a actual Direcção da Casa do Douro há-de apresentar, no sentido de ela própria, com os seus recursos e, de alguma forma, com a credibilidade renovada pelo evento que já referi, poder sair da situação difícil em que está e da qual desejamos vivamente que saia.
No que respeita às questões da Uniarme, o Sr. Secretário de Estado Osvaldo Castro falará, porque, quando tomámos conhecimento deste problema, desencadeámos internamente um procedimento de avaliação da situação decorrente: Por isso, ele poderá fazer com detalhe o ponto desse trabalho.
Quanto à fiscalização, devo dizer-lhe que nos confrontámos com um problema quando chegámos ao Ministério da Economia: a própria revitalização da Inspecção-Geral das Actividades Económicas. Fizemos isso mudando a estrutura e os seus dirigentes e dotando-a, para 1999, com um reforço de meios financeiros muito significativo. É dos poucos serviços do Ministério da Economia que sobe significativamente o seu orçamento, porque a esmagadora maioria deles desce-o.
Creio que a questão que coloca, que é uma questão pertinente, da necessidade de uma melhor coordenação entre entidades inspectivas de vários ministérios, ainda não pôde entrar na nossa agenda de trabalho, porque, como digo, estamos numa fase de relançamento e dinamização em termos mais efectivos da actividade da IGAE.
O Sr. Secretário de Estado Osvaldo Castro já referiu que, por exemplo, neste Outono de 1998, utilizando também as alterações legislativas então produzidas sobre as vendas com prejuízo, estamos particularmente activos na inspecção, nomeadamente nas grandes superfícies, sobre a ocorrência de situações ilegais de vendas com prejuízo. E estamos não só activos como, conforme já foi referido, dentro de pouco tempo, poderemos prestar contas, incluindo públicas, sobre a sorte que tiveram as situações irregulares ou potencialmente irregulares já detectadas.
Mas, como lhe digo, cada coisa no seu tempo. Acho que o tempo de uma melhor coordenação entre a Inspecção-Geral das Actividades Económicas e outras inspecções-gerais virá. Estamos atentos a essa sugestão, mas confesso que ainda não tivemos tempo nem possibilidade de desenvolvê-la em concreto.
Em relação às questões colocadas pela Sr.ª Presidente no que respeita ao PIDDAC, o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco irá desenvolver com mais detalhe a questão, mas chamo a atenção, por exemplo, de que, no que respeita aos programas de modernização da indústria, estão orçamentados 16 milhões de contos, e isto desdobra-se, depois, como a Sr.ª Presidente sabe, por um conjunto muito grande de iniciativas, de programas e de sistemas de incentivos, mas o Sr. Secretário de Estado vai responder a isso com mais detalhe.
No que respeita à redução do preço de energia, Sr.ª Presidente, não posso estar mais de acordo com V. Ex.ª. O que eu disse e que a Sr.ª Presidente disse são duas verdades. Este Governo tinha-se comprometido a encetar um programa de convergência do tarifário eléctrico com a média europeia até ao ano 2000, mas, por acção da política energética do Governo, mas não só, também fundamentalmente pela decisão da entidade reguladora do sector eléctrico, é possível antecipar este compromisso um ano.
Também estou de acordo com a Sr.ª Presidente no que respeita ao atraso desta medida. Melhor fora que este objectivo pudesse ter sido atingido há quatro ou cinco anos atrás, ou o ano passado, ou há três anos. É evidente que partimos de um ponto de descompetitividade muito grande nisto, mas também é evidente - e creio que todos nos devemos saudar por isso - que o andamento da gestão da EDP, por um lado, e a determinação do Governo em termos de política energética e na criação de condições institucionais para o tarifário ser fixado por uma entidade independente, por outro, permitem que terminemos com esse atraso competitivo ou, pelo menos, reduzamos muito significativamente esse atraso competitivo da nossa indústria já em 1999.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, se não se importa, apenas uma precisão: quando pus a questão não era propriamente no sentido de que gostaríamos que tivesse sido antes - porque isso é evidente, há quanto mais tempo melhor - mas, sim, porque acho que já havia condições há mais tempo para que essa redução tivesse sido feita.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria e Energia: - Sr.ª Presidente, quanto à questão que colocou, que tem a ver com a organização do PIDDAC, penso que, no caso do Ministério da Economia, há uma relativa transparência sobre a utilização das verbas.
Ou seja, se tivéssemos uma organização em que as verbas nestes programas com pequena dotação estavam organizadas num programa único, por exemplo tudo somado, o que aconteceria era que, porventura, não saberíamos, depois, especificamente como é que essas verbas iriam ser usadas, nós, enquanto decisores políticos sobre uma parte importante do Orçamento do Estado. A orientação do Sr. Ministro, no contexto da preparação do Orçamento para 1999, foi, como já foi aqui dito nesta Câmara, a de haver uma grande contenção na despesa do Ministério da Economia virada para si própria, para o funcionamento dos seus serviços.
Portanto, isso significa que foi exigido aos directores-gerais do Ministério um esforço adicional de justificação das verbas que pretendiam ter para a execução das acções próprias dos serviços, daí que a Sr.ª Presidente tenha toda a razão, pois olho para aqui e vejo os programas do Ministério,
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por exemplo "Caracterização Ambiental da Indústria Portuguesa", com uma baixa dotação, "Hidroquímica e Geoquímica Ambiental Aplicadas à Avaliação de Impactes", "Aproveitamento e Valorização dos Recursos Naturais", "Viabilidade e Melhoria da Produtividade em Sectores Industriais", "Avaliação e Valorização de Áreas Produtoras de Rochas Ornamentais", e poderia continuar por aqui fora.
Todos estes programas, quando estão em PIDDAC, têm de ter uma caracterização muito bem definida e a calendarização das suas acções. O facto de os programas virem a este nível de desagregação, com a correspondente caracterização, é um mecanismo que nos permite o reforço no controlo da execução do próprio Orçamento e por isso é que não nos parece que seja tão negativo. Aliás, isso não pode ser feito noutras áreas, por exemplo na área do marketing internacional ou nas áreas dos sistemas de incentivos, do SIR, porque, evidentemente, um sistema de incentivos tem a caracterização de uma dotação financeira, de um envelope financeiro, que, depois, só pode ser desagregado à medida que os projectos concretos aparecem no terreno, porque senão teríamos assistido no orçamento do Ministério, pela orientação do Sr. Ministro, não à agregação de dotações mas mesmo até à desagregação de dotações até ao nível mais fino.
Tenho apenas comigo o exercício que foi conduzido no caso do IGM, que não vale a pena vermos aqui em detalhe, mas a orientação foi essa, ou seja, a desagregação, de 1998 para 1999, não era para ser menor; pelo contrário, era para ser maior, para se permitir uma correspondência melhor, mais perceptível para nós, enquanto decisores políticos, do que é que cada serviço se propunha realizar com as dotações do Orçamento do Estado que eram colocadas à sua disposição.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia: - No que se refere à Empresa Nacional de Viana do Castelo, quero dizer, muito rapidamente, que há aqui três questões: a primeira tem a ver com a circunstância, como sabe, de que tudo o que seja relativo à reparação e construção naval exigir por parte da União Europeia um acompanhamento especial, e esse acompanhamento, como pano de fundo, está a ser feito de uma forma permanente. Portanto, temos de ter aqui em atenção a 7.ª Directiva da União Europeia.
De qualquer maneira, tendo em vista o peso social que esta empresa tem em Viana do Castelo - tem cerca de 1200 trabalhadores - e o peso económico para a região, é imprescindível fazer a reestruturação. E é-o numa lógica de saneamento financeiro. Como sabe, por razões de vária ordem, tem havido uma situação deficitária dos estaleiros ao longo dos anos que é significativa, da ordem de cerca de 14 milhões de contos, portanto, essa preocupação é prévia a toda a outra reestruturação.
Vamos tentar fazer essa reestruturação através da concentração de tudo o que é património imobiliário na própria mão do Estado, para haver uma articulação em termos concessionários, e o que se passa é que a privatização é feita na perspectiva da futura concessão. Os estaleiros persistirão no molde em que estão, com a percentagem accionista maioritária do Estado.
Quanto à pergunta que me formulou, a ideia é a de que o parceiro a entrar não ocupe uma fatia superior a 20% ou 25%. Essa é a ideia.
Não haverá, seguramente, despedimentos, por uma razão muito simples: essa reestruturação vai necessitar, eventualmente, de uma adaptação e flexibilidade dos postos de trabalho, portanto, uma ligeira diminuição, mas, em função da existência de um fundo de pensões, isso vai ser possível de alcançar com o acordo dos trabalhadores, e é um número muito reduzido.
Tivemos a preocupação de, em primeira linha, transmitirmos isto quer aos sindicatos quer à comissão de trabalhadores e, inclusivamente, eu próprio me desloquei aos estaleiros para ter uma reunião com a administração e com a própria comissão de trabalhadores, explicando previamente toda esta situação.
Portanto, a percentagem do parceiro é limitada - é uma percentagem relativamente pequena - e não haverá despedimentos. Isso é um ponto de honra do Governo.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr.Secretário de Estado do Comércio.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio: - Sr. Deputado Carvalho Martins, se bem me lembro, V. Ex.ª é eleito pelo Distrito de Viana do Castelo, aliás como os Srs. Deputados Roleira Marinho e Marques Júnior.
No que toca ao urbanismo comercial, não há algum distrito do País que tenha tanta confiança neste programa como Viana do Castelo. São 11 concelhos, não é verdade?
O Sr. Carvalho Martins (PSD): - 10!
O Orador: - 10 concelhos.
Em 10 concelhos há 10 candidaturas! 100%! Aliás, são os que estão mais adiantados! Já estive a apresentar o estudo global em Viana do Castelo, Valença, Ponte de Lima, Ponte da Barca e Arcos de Valdevez, e estou para ir aos restantes cinco concelhos muito brevemente. Isto, aliás, é assim por todo o País.
Mas é verdade, tenho de reconhecê-lo, que, no norte litoral, começando em Valença, é onde têm surgido mais candidaturas. É um facto que os distritos do interior, embora existindo candidaturas em todos os distritos, mesmo nas regiões autónomas - aliás, com grande sucesso no Funchal, onde também vou brevemente, e em Ponta Delgada - são os mais participantes.
Posso dizer-lhe em números, visto que o Sr. Deputado falou em números, que, até agora, porque há diversos níveis - como disse, há pouco, há 132 candidaturas, mas elas têm diversos timing -, já analisámos 29, algumas das quais estão fechadas - é, por exemplo, o caso de Braga, Guimarães, Coimbra (1.ª fase), Póvoa do Varzim -, mas as outras estão ainda em aberto. Temos cá 1104 candidaturas individuais e o investimento total, em números redondos, é de 20 milhões de contos - é mais, mas, enfim, é pouco significativo. Posso dizer que o fundo perdido que já pagámos foi de 9 118 784 contos e, para o próximo ano, temos 30 milhões de contos.
Porém, Sr. Deputado, isto é algo que devia ter começado em 1994! O QCA II abrange o período 1994-1999 e, por isso, isto devia ter começado em 1994 e verdadeiramente, tenho de reconhecer que começou em 1997, pelo que, mesmo nós, partimos um pouco atrasados.
Este programa está, agora, a ter um grande empurrão - aliás, é por isso que tenho feito muitos milhares de quilómetros, porque as pessoas entendem que tenho sempre de lá ir para a apresentação do estudo global e, se não for, é porque o projecto não é válido.
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Portanto, no próximo ano, temos à volta de 30 milhões de contos. Mas mais: na União Europeia, trata-se de um projecto-piloto, que, se tiver sucesso em Portugal, vai ser utilizado noutros países - estamos a falar da requalificação comercial e também urbana dos centros históricos e dos centros urbanos. Ao fim e ao cabo, estamos até a ter algum sucesso, que tem efeitos também na área do turismo e, designadamente, no seu distrito - e, para prová-lo, basta falar com o Sr. Presidente da Câmara de Ponte de Lima -, mas também noutros locais, como, por exemplo, em Arcos de Valdevez ou Ponte da Barca.
Agora, até penso - e o Sr. Ministro que está aqui, já conhece esta minha opinião - que temos de ir mais longe. É que, em alguns casos, estamos a conseguir recuperar interiores, fachadas e lay-out de estabelecimentos comerciais, ao nível do rés-do-chão, que é onde eles se situam, e, às vezes, o primeiro andar está desabitado e degradado, nos centros históricos.
Isto significa que estamos a tentar que o Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (MEPAT), que tem demonstrado uma grande compreensão nesta matéria - como sabe, o MEPAT, designadamente a Sr.ª Secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, tem a gestão dos fundos comunitários -, também ele próprio - e, de algum modo, já há no Programa REHABITA algumas intenções nesse domínio…
Portanto, estou confiante de que este programa poderá chegar a uma certa fase de overbooking - admito isso, porque, neste momento, são mais de 130 candidaturas. Mas, como tenho dito, este é um programa que tem dinheiro, pelo que esse não é o problema. E a verdade é que as candidaturas têm vindo a crescer consideravelmente. Aliás, como lhe disse, um exemplo muito evidente é o Minho - o distrito de Viana do Castelo, de um modo particular, mas o Minho, Braga, Guimarães e Póvoa do Varzim têm aqui também um papel, como, aliás, está à vista, com obra muito interessante, designadamente em Braga, Guimarães e Póvoa ou Vieira do Minho.
Sr. Deputado Carlos Duarte, relativamente à questão que colocou, quero dizer-lhe que logo que tivemos conhecimento dela e houve participação por parte de algumas empresas do sector da indústria agro-alimentar, designadamente de uma associação industrial do distrito de Aveiro, em relação ao problema que se passava com Uniarme, fizemos aquilo que somos obrigados a fazer: demos instruções - e produzi um despacho, com o qual o Sr. Ministro concordou - para que fosse aberto um processo, que está a correr na Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência e tem a sua tramitação própria. A abertura do processo, de algum modo, significa que nós, à partida, achámos que havia matéria que podia contender com o direito de concorrência. Porém, como o processo ainda não terminou, nada mais posso dizer-lhe sobre isso.
Permita-me apenas - e o Sr. Ministro já falou sobre isto - dizer o seguinte: evidentemente que a Inspecção-Geral das Actividades Económicas (IGAE), que também tutelo, tem uma estrutura envelhecida, que estamos a procurar melhorar - e daí que talvez tenha sido o único organismo no Ministério da Economia que não viu baixar as suas despesas de funcionamento. A nível de inspectores e de subinspectores, fizemos alguns reforços, porque havia, de facto, lugares que não estavam preenchidos, e já há situações em que se verificam consideráveis melhorias. E vou dar-lhe um exemplo concreto, porque, embora haja, por vezes, zonas de intersecção com a Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar, há exemplos que vêm da Secretaria de Estado das Pescas, como, por exemplo, recentemente, na lota de Matosinhos, de um trabalho de coordenação excelentíssimo entre a Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar e a IGAE, a propósito da entrada de mercadoria e de peixe espanhol, como se recorda. Não quero com isto dizer que tudo corra bem, mas a verdade é que estamos a melhorar muito essa coordenação.
Por último - e, como, há pouco, não falei nisso, julguei que o Sr. Ministro ia falar -, tendo a Sr.ª Presidente falado do PIDDAC, apesar de a pergunta não ter sido colocada, julgo que é justo que se coloque. É sobre o comércio tradicional, que, em toda a história da democracia portuguesa, nunca foi apoiado, em sede de PIDDAC, em valores superiores a 200 000 ou 300 000 contos. Este PIDDAC serve para a animação cultural e para apoiar associações - associações e não câmaras. Ora, este PIDDAC, este ano, tem 800 000 contos, Sr. Deputado. E ainda este ano, onde tinha cerca de 200 000 contos, que não davam para coisa alguma, era um valor irrisório - tanto que nos concelhos que visitava, quando me perguntavam pelo PIDDAC, eu até tinha vergonha de falar nisso -, o Ministério da Economia - e o Sr. Ministro teve nisso uma interferência bastante directa - recuperou mais 500 000 contos. Isto é, este ano, em PIDDAC, só tinha inscritos 200 000 contos, mas vou trabalhar com 700 000 contos e, no próximo ano, o apoio ao comércio tradicional tem 800 000 contos. Creio que este é um esforço muito interessante que foi feito no Ministério da Economia, designadamente, no que toca ao comércio tradicional.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, aproveito esta oportunidade para dizer que ainda bem que o Sr. Secretário de Estado não é pago ao quilómetro, porque, se não, dava cabo do orçamento de funcionamento do Ministério.
Risos.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio: - Nem ajudas de custo!
O Orador: - Porém, a minha questão é outra, Sr.ª Presidente, e prende-se com dois aspectos. Em primeiro lugar, quero sublinhar uma afirmação feita pelo Sr. Ministro, quando, em resposta ao Sr. Deputado Carlos Duarte, se referiu à Casa do Douro. É lícito concluir da declaração do Sr. Ministro que, no fundo, o que esteve em causa foi uma relação conflitual de carácter pessoal entre um membro do Governo e o presidente de uma instituição, o que me parece não ser a melhor forma de gerir as relações entre o Estado e as instituições, neste caso, a Casa do Douro.
Depois, quero lembrar ao Sr. Ministro que ainda não nos foi entregue a relação das verbas que foram distribuídas, no ano passado, para as regiões e juntas de turismo, para estarmos em condições de compará-las com a verba que, este ano, é proposta.
A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia.
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O Sr. Ministro da Economia: - Sr.ª Presidente, peço desculpa por ter de intervir novamente, mas não posso aceitar esta caracterização, feita pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, do problema que levou à não assinatura de um contrato entre o IPE e a Casa do Douro, em Janeiro de 1998. O que eu disse está dito e a interpretação, que contesto absolutamente, é da responsabilidade do Sr. Deputado Lino de Carvalho. Não queria ter de voltar a evocar esses acontecimentos, mas julgo que nenhum dos Srs. Deputados aceitaria, se fosse membro do Governo, de uma câmara municipal ou de qualquer outra instituição pública, assinar um acordo com alguém que representava uma instituição e que, 24 horas antes da assinatura, declarava, por escrito, que não cumpriria o contrato que ia assinar. O que se passou foi tão-só isto. Não houve qualquer problema de natureza pessoal; há, sim, um problema de honorabilidade e de respeitabilidade de umas instituições pelas outras, que tem de e deve ser salvaguardado, nomeadamente quando uma das instituições é o Estado. É que o Sr. Deputado Lino de Carvalho saberá muito bem - e creio que partilha este valor - que com a honorabilidade e a credibilidade do Estado não se deve brincar, nem isso deve ser objecto para alguém, ou quem quer que seja, andar de semana para semana e de dia para dia, a pretender brincar.
O assunto está encerrado, mas não podia deixar de dizer isto, dado que houve uma tentativa por parte do Sr. Deputado Lino de Carvalho de ler ou, perdõe-me a expressão, tresler uma afirmação que fiz, no que respeita à evolução da questão da Casa do Douro.
A Sr.ª Presidente: - Muito obrigado, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado pela vossa presença e pelas vossas explicações.
Dou por concluída a discussão sobre o orçamento do Ministério da Economia e peço aos Srs. Deputados que se mantenham na sala, porque vamos ouvir, de seguida, o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, pelo que vamos fazer uma breve interrupção nos nosso trabalhos.
Eram 18 horas e 5 minutos.
No recomeço dos trabalhos, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Henrique Neto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos reiniciar a reunião.
Eram 18 horas e 25 minutos.
Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 1999 com a apreciação do orçamento da Secretaria de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, agradeço-lhe a sua presença.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carreteiro.
O Sr. Rui Carreteiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, aquando da sua presença na Comissão para a Paridade, Igualdade de Oportunidades e Família, atingiu-se um consenso bastante generalizado, do qual, creio, o Sr. Secretário de Estado partilha, quanto ao reforço de dotação da verba inscrita no orçamento da CIDM (Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres) para as organizações não governamentais (ONG's). Já foi entregue na Mesa uma proposta subscrita por todos os grupos parlamentares para que esse reforço seja na ordem dos 25 000 contos.
Creio que se recorda deste debate. Aliás, este não é um processo novo, pois todos os anos é necessário reforçar esta verba. Queria apenas informar o Sr. Secretário de Estado de que a proposta já foi entregue e que o consenso manifestado na Comissão está presente nesta proposta, uma vez que é subscrita por todos os grupos parlamentares.
O Sr. Presidente (Henrique Neto): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Vitalino Canas): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, parece-me que essa proposta é perfeitamente razoável. Como o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não está presente, posso cometer a inconfidência que já cometi na Comissão para a Paridade, Igualdade de Oportunidades e Família e dizer que, no fundo, utilizamos todos os anos este expediente para permitir que a CIDM suba um pouco o seu orçamento. Assim sendo, parece-me muito razoável a proposta feita, que é subscrita por todos os grupos parlamentares e será, seguramente, subscrita pelo Governo.
O Sr. Presidente (Henrique Neto). - Srs. Deputados, não tenho mais inscrições, o que demonstra, na continuação do que sucedeu esta manhã e esta tarde, que o Orçamento não merece grandes dúvidas ou questões por parte da oposição, para além dos elogios do partido que apoia o Governo.
Pausa.
Srs. Deputados, fui informado de que terão dito a alguns Colegas que os trabalhos se reiniciariam às 18 horas e 30 minutos. Como faltam dois minutos para a hora referida, penso que deveríamos esperar alguns momentos para não suceder que, por pressa excessiva, os nossos Colegas sejam impedidos de colocar as suas questões relativamente ao Orçamento.
Pausa.
Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Presidente Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, gostaria apenas de perguntar aos membros da Comissão de Economia, Finanças e Plano se alguém se opõe a que o relator do relatório do orçamento rectificativo para 1998 seja o Sr. Deputado Casimiro Ramos.
Pausa.
Não havendo oposição de qualquer das bancadas, considero o Sr. Deputado Casimiro Ramos o relator desse projecto de relatório e parecer.
Agradeço a presença do Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e de todos os Srs. Deputados.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 18 horas e 35 minutos.
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