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Sábado, 11 de Novembro de 2000 II Série-C - GOP-OE - Número 2

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO

Reunião de 10 de Novembro de 2000

S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite) abriu a reunião às 9 horas e 50 minutos.
Em continuação do debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 47/VIII - Grandes Opções do Plano Nacional para 2001 e 48/VIII - Orçamento do Estado para 2001, usaram da palavra, sobre o orçamento do Ministério das Finanças, além do Sr. Ministro (Pina Moura), dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais (Ricardo Sá Fernandes), do Tesouro e das Finanças (Manuel Baganha) e Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco) e da Sr.ª Presidente da Comissão, os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira (PS), Maria Celeste Cardona (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Rui Rio (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Francisco Torres (PS), Lino de Carvalho (PCP) e Machado Rodrigues (PSD).
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 12 horas e 50 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 9 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início ao debate, na especialidade, do orçamento do Ministério das Finanças, com a presença do Sr. Ministro das Finanças e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto e do Orçamento, do Tesouro e das Finanças e dos Assuntos Fiscais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Pina Moura): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nas últimas semanas temos tido oportunidade de nos encontrarmos repetidamente para discutir o Orçamento, uma primeira vez na reunião que tivemos com a Comissão de Economia, Finanças e Plano, para o discutirmos, na generalidade, e, depois, no debate em Plenário, também na generalidade.
Do nosso ponto de vista, creio que tanto as características essenciais como a análise da situação económica subjacente ao Orçamento do Estado, no que respeita à avaliação que o Governo faz de umas e de outra, estão claras. Há, entretanto, um ponto que, reconheço, ficou omisso ao longo de todo o debate anterior e que seria o único tópico novo que eu gostaria de acrescentar no início deste debate com as Sr.as e o Srs. Deputados da Comissão de Economia, Finanças e Plano, e que diz respeito à política salarial ou à política de rendimentos que, do nosso ponto de vista, o Orçamento do Estado tem pressuposta e que o caminho que entendemos necessário para a evolução da economia portuguesa impõe.
Em tese geral, o Governo tem definido em anos anteriores, e mantém este ano, a ideia de que o crescimento sustentado e em novos moldes da economia portuguesa pressupõe uma política de moderação salarial. Qualificando este conceito, posso dizer que uma política de moderação salarial é, em nosso entender - e tem sido esta a nossa prática ao longo dos últimos anos -, uma política capaz de garantir aumentos reais nos salários, uma política capaz de produzir uma partilha adequada dos ganhos de produtividade, uma política capaz (e isto é particularmente importante em 2001) de evitar ou de diminuir tensões inflacionistas que se repercutem na nossa economia, mas cujas razões são exógenas à economia portuguesa, e uma política capaz de estimular o investimento e o crescimento continuado do emprego. Tendo sido esta a orientação geral dos últimos cinco anos, será também a orientação para este ano de 2001.
Há, no entanto, duas alterações que se impõe sublinhar e que têm consequências sobre o que vou dizer a seguir: por um lado, as tensões inflacionistas são mais fortes do que em anos anteriores, fundamentalmente por razões exógenas que têm a ver com a evolução do preço do petróleo e com a subavaliação continuada em que o euro tem vivido nos mercados cambiais. Há, contudo, uma segunda característica nova que gostava de sublinhar, até porque esta é de natureza interna, endógena e representa uma escolha política essencial do Governo, partilhada, aliás, pela Assembleia da República - refiro-me, naturalmente, à reforma fiscal. O desagravamento geral do esforço fiscal em sede de IRS, conseguido pela baixa das taxas de tributação e por um alargamento e uma actualização excepcional dos limites dos escalões de tributação, produzirá, por si só - segundo dados que tenho em meu poder e que correspondem a situações de contribuintes tão diversas como as que vão de um contribuinte solteiro com zero dependentes a de um casal com um dependente ou dois dependentes -, um aumento do rendimento disponível da ordem dos dois pontos percentuais. É um valor muito significativo e é um valor que não pode deixar de ser tido em conta quando se faz a formatação da evolução da política salarial e da política de rendimentos ao longo de 2001.
É por isso que nas negociações que começarão dentro de minutos, dirigidas pelo Ministro Alberto Martins, no que respeita à tabela salarial da função pública, o Governo avança com uma proposta de actualização das tabelas de 3%, tendo em conta que a taxa de inflação que prevemos para o ano de 2001 está situada num intervalo centrado em 2,8%. Recordo que estamos a falar apenas do ano de 2001, havendo que acrescentar a este valor a reposição de perda de poder de compra ocorrida em 2000, por virtude de uma taxa média de inflação anual que, seguramente, ficará acima dos 2,5% que constituíram a base de actualização dos salários da função pública em 2000. Ora, este valor de negociação para a evolução das tabelas salariais na função pública que propomos significa, por si só e desde logo, um aumento de poder de compra real, tomando como padrão a inflação prevista, como é normal. Esse valor é significativamente mais acentuado quando incorporamos, o que não podemos deixar de fazer, na evolução relativa e absoluta do rendimento disponível das famílias e também dos funcionários públicos ao longo de 2001 os ganhos resultantes do desagravamento fiscal, que, como digo, se traduzem, em média, por um ganho efectivo de rendimento disponível na ordem dos 2%, sendo em alguns casos mesmo superior e só em muito poucos casos, e apenas nos escalões mais altos de rendimento, esse ganho de poder de compra ou esse ganho de rendimento disponível por efeito do desagravamento fiscal é, com efeito, ligeiramente inferior a 2%.
De todo o modo, nos escalões mais baixos de rendimento, ou seja, nos escalões que podem ir até 300 ou 400 contos por mês, o ganho de rendimento disponível por efeito do desagravamento fiscal é, por si só, de dois pontos percentuais, podendo mesmo ser ligeiramente superior.
Quer isto dizer que a evolução do rendimento disponível das famílias em 2001 - e este é o ponto que quero sublinhar - é o resultado de um efeito combinado tanto da actualização salarial como do desagravamento fiscal significativo que se produz com a baixa geral de taxas e a actualização excepcional dos escalões.
Cremos que esta política é particularmente adequada quando se coloca a questão - e tive oportunidade de o fazer na intervenção que produzi em Plenário há dois dias - de encontrarmos um padrão de crescimento da economia portuguesa que seja mais sustentado, mais são e mais competitivo. Trata-se, ao fim e ao cabo, de, com este desagravamento fiscal e olhando para o seu significado microeconómico, o Governo e a política económica estarem a dizer aos agentes económicos que há uma partilha de ganhos de produtividade que pode e deve ser feita entre o trabalho e o capital, mas de uma forma que seja estimuladora do investimento e da competitividade da economia portuguesa, e que há, em consequência da perda fiscal por parte do Estado, um efeito de compensação mais amplo do que é habitual em termos de rendimento disponível por parte das famílias.
Era esta a informação e eram estas as considerações, Sr.ª Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, que queria fazer para abrir esta discussão.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, se algum Sr. Deputado ou alguma Sr.ª Deputada quiser usar da palavra antes de mim, não tenho problema algum em deixar o meu pedido de esclarecimentos para depois.

A Sr.ª Presidente: - Não há mais inscrições, pelo que pode usar da palavra, Sr. Deputado.

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O Orador: - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças e Srs. Secretários de Estado, têm sido discutidas nos últimos dias e referidas na comunicação social por várias entidades e mesmo por cidadãos contribuintes as alterações que este Orçamento apresenta ao imposto automóvel. Ora bem, em primeiro lugar, queríamos saudar a posição que o Governo tomou na proposta de lei orçamental, nomeadamente em relação à questão dos todo-o-terreno. Já sabemos que, no ano passado, um conjunto de Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista pretendeu que essa alteração fosse introduzida no Orçamento, tendo acabado por entregar uma declaração de voto em que se conformava com o que ficou no texto orçamental. O Governo, de facto, analisou em boa hora este ponto e apareceu com uma proposta no sentido de resolver esta situação, alterando e acabando com o privilégio que existia para os todo-o-terreno. Estamos conscientes da situação que algumas empresas do sector nos apresentaram, mas julgamos, todavia, que essa orientação é globalmente correcta.
Em sede de especialidade, porque estivemos a analisar e a preparar o assunto com algum detalhe e porque o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais já prestaram declarações à comunicação social neste sentido, gostaria que precisassem à Comissão de Economia, Finanças e Plano se, em relação a alguns dos outros veículos abrangidos por esse privilégio, nomeadamente as chamadas pick-up, existe alguma abertura para introduzir algumas alterações. Como digo, pergunto se há abertura para introduzir alterações em relação não aos todo-o-terreno mas às pick-up, fazendo-se a distinção pelo uso dado a essas pick-up, que, como sabemos, pode ser diverso.
Em segundo lugar, na intervenção que tive oportunidade de fazer no Plenário, aquando do debate do Orçamento na generalidade, perguntei à oposição, especialmente ao partido numericamente mais importante da oposição, o PSD, o que é que propunha realmente quanto à política de combustíveis. Ou seja, perguntei se tinha uma estimativa da evolução do preço do crude e quais seriam as propostas ou sugestões que o PSD gostaria de introduzir se um dia fosse governo ou se, por acaso, estivesse no governo quanto ao preço do gasóleo e da gasolina. Não recebi resposta do PSD, mas recebi um documento do Bloco de Esquerda, em relação ao qual, tanto o Sr. Secretário de Estado, com mais detalhe, como eu, mais sinteticamente, e outros Srs. Deputados fizemos alguns pequenos comentários.
Todavia, dada a importância do assunto no seu conjunto e dado ser um tema iniludível que está em cima da mesa, gostaria que o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado nos dissessem alguma coisa, em sede de Comissão, sobre o modo como vêem esse tipo de propostas, dizendo se elas contribuem ou não para o debate, e sobre o raciocínio que se faz quanto ao imposto sobre produtos petrolíferos (ISP). Isto porque, como sabemos, há comentadores que pensam que o ISP é correcto, enquanto outros pensam que ele não estará bem estimado, mas ninguém explica nem garante com segurança, nem o pode fazer, qual será a evolução do preço do crude. Como tal, vários responsáveis políticos da oposição e alguns comentadores encartados também fogem um pouco a dizer como é que deveria ser. Sabemos que alguns dos que criticam o Governo por não ter aumentado o preço dos combustíveis, se o preço aumentar amanhã, criticá-lo-ão também, havendo até quem encoraje manifestações se o preço aumentar, ao mesmo tempo que criticam o Governo por não ter procedido a esse aumento.
Sobre isto, apesar de tudo, bem ou mal, tenha a validade que tiver, há um documento em cima da mesa da autoria de um partido parlamentar e gostaria que o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado, em sede de especialidade, nos dissessem alguma coisa sobre o que pensam desse contributo para o debate.
Em terceiro lugar, gostaria de abordar a questão do IRS, sobre a qual muito se tem discutido. O Sr. Ministro fez uma exposição clara, quer em sede de generalidade, quer em sede de especialidade, e o Sr. Secretário de Estado também tem intervindo sobre o assunto, tanto no cerne destes debates, como no debate da reforma fiscal dos impostos sobre o rendimento, indissoluvelmente ligado, do meu ponto de vista, ao debate do Orçamento. O processo de ligação é que pode ser diverso, mas há, indissoluvelmente, uma ligação entre o debate deste Orçamento e o debate da reforma fiscal, até mesmo pela estrutura do próprio Orçamento. A este respeito, há-de haver sempre quem diga que o IRS ainda devia descer mais, mas há também quem comente e comece a levantar a possibilidade de o IRS estar a descer demais. No fundo, para alguns de nós, o ponto a que chegou o IRS é, de facto, o ponto máximo ao qual se pode chegar neste momento e, para nós (e nisto não estaremos isolados), seria complicado ir mais longe. Há, portanto, um fortíssimo esforço do Governo neste sentido. Porém, eu gostaria de saber se o Governo confirma isto, se lhe parece ser, ou não, impossível, inaceitável ou arriscadíssimo alterar-se o IRS para além do que já se fez.
Mas, além desta crítica, há ainda uma outra, mais ou menos aberta, que surge também no Parlamento, a de se dizer que a administração fiscal não vai ser capaz de adaptar-se a todo este conjunto de alterações, sejam elas relativas ao IRS ou a outros impostos, não sendo, por isso, capaz de as concretizar. Sei que sobre isto já começou a haver um conjunto de actuações, nomeadamente a reunião que o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado fizeram com um conjunto de quadros técnicos da administração fiscal. Todavia, estou convencido de que, apesar das deficiências e da necessidade de melhorias que existe, esta administração fiscal tem condições para ir executando, pelo menos, o que está proposto neste Orçamento e, eventualmente, o que mais tarde apareça.
No entanto, sobre isto, gostaria, com toda a seriedade, de ouvir um comentário do Sr. Ministro.
Em quarto lugar, num documento sobre a reforma fiscal, apresentado pelo PSD - e não sei se o PSD irá apresentar essa proposta de alteração na especialidade, pelo que tenho de aproveitar esta oportunidade, já que o Sr. Ministro, dados os seus compromissos internacionais, não estará cá na reunião da próxima sexta-feira -, este partido fala das alterações à estrutura do IVA. Como tal, se o PSD apresentar neste Orçamento alterações ao IVA, como propõe na parte dos considerandos da sua proposta de reforma fiscal - e saliento que ainda não encontrei com clareza essa proposta na parte dispositiva, se bem que possa ser distracção minha -, gostava de saber como é que o Governo reagirá. Ou seja, quero saber qual seria a reacção do Governo a propostas deste tipo que o PSD possa entregar, alterando o IVA neste Orçamento, em coerência não com a parte dispositiva da sua proposta de reforma fiscal mas com a parte dos considerandos.
Em quinto lugar, vou referir-me aos deficientes. Sabemos que há um conjunto de fraudes que são feitas por alguns deficientes, mas sabemos também que não é uma andorinha, mas, sim, um conjunto que faz a Primavera. Como tal, penso que é complicado, apesar de tudo, centrarmos o combate à fraude sobre a questão de uma mudança de percentagens, embora seja compreensível a argumentação que tem sido dada pelo Governo. O que eu gostaria de perguntar, muito sinceramente, é se existe alguma abertura do Governo no sentido de o Grupo Parlamentar do PS ou mesmo de alguns Deputados do PS poderem apresentar em várias comissões, como a do Trabalho e Solidariedade, a da Defesa Nacional ou da Economia, Finanças e Plano, alguma sugestão que repusesse novamente o grau de invalidez nos

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60%. É que o artigo 29.º da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2001 propõe que se altere o n.º 3 do artigo 51.º do Código do IRS, fixando o grau de invalidez permanente em 65%.
Considera o Governo, apesar de tudo, que este é o melhor processo? Digo isto porque admitimos a hipótese de se poder exercer um maior controlo sobre este tipo de processos e de fraudes, que, efectivamente, existem, e, assim sendo, pensamos que se poderia manter o grau de invalidez nos 60% no já referido artigo do Código do IRS. Porém, como o Governo tem um conjunto de dados organizados ao qual não temos necessariamente acesso, gostaríamos que se pronunciasse sobre isto. Não sendo importante esta questão, em termos de relevância orçamental, é uma questão importante no que respeita à sociedade portuguesa, por ser uma das sociedades onde houve mais acidentes de trabalho em períodos passados, apesar do grande esforço que tem sido feito para os combater, e onde há um grande conjunto de deficientes vindos da guerra colonial, daí a importância dos deficientes das Forças Armadas nesta questão. Nós, estando solidários com o Governo no combate à fraude que existe em alguns domínios, fraude que é preciso reprimir, porque há alguns casos em que as pessoas não têm esse grau de invalidez, o que constitui um abuso, perguntamos se não poderemos conduzir esse combate de outra maneira e voltar ao grau de invalidez dos 60%, que é o que vigora no Código do IRS.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, começo por responder às várias questões que colocou quanto às medidas de combate aos abusos existentes no domínio da utilização de benefícios fiscais, que constam do Orçamento do Estado para 2001.
Comecemos pelos veículos automóveis. Aqui, tanto os chamados todo-o-terreno como as pick-up têm um conjunto de benefícios fiscais associado ao pressuposto de que a sua condição de utilização era, fundamentalmente, em actividades económicas.
Contudo, ao fim de alguns anos de experiência, é evidente que, no que respeita aos todo-o-terreno, a regra é a do abuso, sendo a excepção a verificação das condições originariamente propostas para a concessão de benefícios fiscais a este tipo de veículos.
Daí que a erradicação do abuso signifique, do nosso ponto de vista, a erradicação do benefício, o que é absolutamente claro para nós, no que respeita aos todo-o-terreno.
Quanto às pick-up e aos veículos que, assim, podem ser classificados, há muitíssimo abusos, mas também é evidente que há a utilização deste tipo de veículos por parte de agentes económicos no exercício da sua actividade económica.
Ora, tendo nós, na proposta de lei orçamental, seguido a metodologia da eliminação dos benefícios para os todo-o-terreno (onde, insisto, a regra é o abuso e a excepção é a utilização conforme as regras originárias e autênticas que conduziram a estes benefícios), no que respeita aos veículos de caixa aberta, as pick-up, conforme já foi dito por mim e pelo Sr. Secretário de Estado Ricardo Sá Fernandes, há disponibilidade para se fazer uma modulação diferente, a fim de combater os abusos, que também aí se verificam.
Portanto, estamos dispostos a, se a Assembleia da República assim o entender, introduzir alguma modulação, no que respeita à diminuição de benefícios fiscais, para as pick-up, em troca de normas claras de verificação, normas de antiabuso. Esta questão é essencial, porque não se trata de modular os benefícios sem criar medidas de controlo às situações de abuso mas, sim, de modular a redução desses benefícios em função da verificação e da implementação de normas antiabuso.
No que respeita aos veículos todo-o-terreno, a nossa posição mantém-se, e mantém-se com toda a clareza. É unanimemente reconhecido na sociedade que a regra de utilização dos todo-o-terreno é a de abuso das condições para a obtenção dos benefícios fiscais em que foram concedidos. Daí ser absolutamente claro para nós que esses benefícios devem ser completamente eliminados.
Conforme também já tivemos oportunidade de dizer, estas são medidas importantes, são medidas moralizadoras e que se inserem numa reforma do imposto automóvel, cujo trabalho já teve início. Aliás, há já um despacho do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para se formar um grupo de estudo, o qual tem também o envolvimento das associações representativas do sector, no sentido de se proceder a uma reformulação do imposto automóvel, embora sem consequências para o exercício de 2001. Todavia, penso que o Sr. Secretário de Estado Ricardo Sá Fernandes poderá desenvolver esta questão depois.
No que respeita aos deficientes, aproveito para referir que o que levou à alteração do grau de invalidez permanente, dos 60% para os 65%, foi o mesmo tipo de preocupação quanto a situações de abuso. Também aqui o Sr. Secretário de Estado Ricardo Sá Fernandes poderá detalhar este ponto. Mas a verdade é que se tem verificado uma concentração muito grande em torno dos 60%, o que, para nós, não está claro serem ou não situações de abuso.
A alteração do grau de invalidez de 60% para 65%, não é, como bem se vê, para diminuir qualquer tipo de benefício aos deficientes "pesados", digamos assim, cuja grau de invalidez vai - e é exemplo disto os deficientes resultantes da participação na guerra colonial -, na maior parte dos casos, muito acima dos 65%.
De qualquer forma, no sentido da substância da questão, a nossa abordagem é semelhante ao ponto que referi anteriormente. Isto é, se for possível, sendo possível - e devo dizer que, da parte do Ministério do Trabalho e da Solidariedade, temos indicações neste sentido -reforçar a fiscalização sobre a verificação das condições que levam à concessão de benefícios fiscais a deficientes com um nível de deficiência da ordem dos 60%, ou seja, se for possível chegarmos a medidas claras de verificação destas situações, há, da nossa parte, disponibilidade para fixarmos a situação anterior e não produzirmos, com esta alteração, aquilo que queríamos produzir, que era uma reverificação, nomeadamente através de atestados médicos, das condições de um grupo apreciável de contribuintes em relação aos quais temos dúvidas sobre se estarão a utilizar, de forma abusiva, este benefício fiscal. Como digo, também neste caso, em troca de uma maior controlo - e temos indicações do Ministério do Trabalho e da Solidariedade, que poderá desenvolver esse controlo de uma forma mais efectiva, a nossa disponibilidade existe.
Quero, ainda, referir uma outra questão que, apesar de não ter sido levantada pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, já aqui foi referida pelo Sr. Primeiro-Ministro na sua intervenção inicial aquando da apresentação da proposta de lei orçamental e que tem a ver com benefícios fiscais.
O Governo está disponível para que a Assembleia, se assim o entender, fixe um plafond superior, como actualização, às deduções fiscais por despesa feita com o crédito à habitação. Recentemente, tomámos uma medida destinada a eliminar aquilo que era uma perversidade no anterior mecanismo de fixação da taxa de referência para o crédito bonificado. Como sabem, a partir do dia 1 de Setembro, essa taxa de referência para o crédito bonificado ficou de alguma forma indexada à evolução da taxa de juro no mercado, com actualizações semestrais; houve uma

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primeira actualização excepcional em Outubro e, a partir de agora, haverá actualizações em Junho e em Janeiro. Sendo certo que demos este passo, também reconhecemos que as despesas com o crédito para a habitação pesam, hoje, bastante na bolsa das famílias portuguesas, nomeadamente na bolsa daquelas famílias que têm os rendimentos mais baixos e que nos últimos anos adquiriram casa recorrendo ao crédito.
Estamos, por isso, disponíveis, em matéria de política fiscal, para fazer uma actualização do plafond de dedução da despesa com a habitação no cálculo do IRS, a partir de valores mais elevados do que aqueles que constam do Orçamento do Estado. O plafond da dedução desta despesa foi, no Orçamento do Estado para 2001, foi actualizado em 2,81%, em linha com o valor de referência previsível da inflação para 2001, mas, da nossa parte, há disponibilidade para que essa actualização seja feita por um valor mais alto, produzindo-se, assim, por via fiscal, uma medida de apoio às famílias, nomeadamente àquelas cuja despesa com a habitação seja, por via do crédito a que recorreram, elevada, significativa, e sabemos que o é, na medida em que as taxas de juros tiveram, ao longo do último ano, um aumento muito significativo, muito expressivo.
No que respeita às questões relacionadas com o preço dos combustíveis e, de uma forma geral, às que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira colocou sobre o conjunto de propostas apresentadas pelo Bloco de Esquerda para esta área, não vou referir-me apenas à questão dos combustíveis e à evolução do seu preço, já lá irei, mas devo dizer que as propostas apresentadas são interessantes, são um contributo, como outras que, porventura, virão a surgir aqui, no debate, ou que surgiram a propósito de outros domínios da tributação.
Todavia, quero dizer, com toda a clareza, que esta Assembleia conhece o calendário (reafirmado, por várias vezes) e o cronograma da reforma fiscal que o Governo propõe para os vários módulos, chamemo-lhe assim, da reforma fiscal.
Comprometemo-nos a apresentar à Assembleia antes do Orçamento a proposta de lei para a reforma da tributação do rendimento, o que fizemos. Houve o debate parlamentar relativo a esta temática; as várias propostas que estiveram em confronto foram aprovadas na generalidade; e há agora um trabalho na especialidade que o Governo apela a que seja conduzido com a máxima celeridade possível. Ora, a proposta de lei relativa à reforma da justiça tributária que nos comprometemos a aprovar e a apresentar nesta Assembleia, envolvendo não só a organização institucional dessa justiça como também os direitos dos contribuintes e as infracções tributárias, já foi aprovada, na generalidade, em sede de Conselho de Ministros e só ainda não foi entregue à Assembleia por considerarmos desejável ouvir os conselhos da magistratura sobre essa matéria, audição que está em curso. Portanto, no próximo dia 23 de Novembro, terá lugar a aprovação final dessa proposta pelo Conselho de Ministros e fár-se-á a sua entrega imediata na Assembleia da República.
Comprometemo-nos, ainda, até ao final deste ano, a discutir e a aprovar os diplomas relativos à tributação do património imobiliário e a iniciar, durante o primeiro trimestre de 2001, o debate e o confronto de propostas sobre a chamada nova fiscalidade, onde, penso, se insere o essencial das propostas apresentadas pelo Bloco de Esquerda.
Dito isto, e reconhecendo que essas propostas são já um contributo para esse debate, quero dizer que o Governo não irá alterar o calendário que definiu. Creio que, por uma questão de seriedade política, não podemos andar numa espécie de corrida contra ao tempo, sendo muito importante mencionar que o Governo tem a sua própria agenda sobre esta matéria, da qual informou a Assembleia e sobre a qual tem trabalhado com a Assembleia.
Portanto, tomamos nota das propostas apresentadas pelo Bloco de Esquerda e, na altura própria, serão, com certeza, discutidas nesta Assembleia, sendo certo que o Governo contribuirá para essa discussão com a sua própria visão e as suas próprias propostas.
Talvez seja esta também a altura de dizer que não é por se apresentar primeiro as propostas que se apresenta melhor. Existem corridas contra o tempo que, politicamente, se compreendem para se levantarem certas bandeiras ou reivindicar certas patentes, mas é muito importante sublinhar que, desde o dia 22 de Dezembro de 1999, o Governo se comprometeu a apresentar um conjunto de alterações ao nível da fiscalidade, do qual também fazem parte as questões relativas à fiscalidade energética e à ecofiscalidade.
No que respeita aos preços dos combustíveis, repito o que já tenho dito em várias ocasiões ao longo destas últimas semanas: a política fiscal, no que respeita aos combustíveis, é minimalista. Isto é, ao longo de 2001, o que o Governo se propõe fazer, e dispõe-se a isso, é - isto no pressuposto, não infirmado nas últimas semanas, de que o valor do crude e a cotação do euro continuarão em níveis desfavoráveis a uma diminuição dos custos energéticos - operar a tributação dos combustíveis em valores muito próximos, ou iguais, aos valores mínimos legais possíveis. Não temos, portanto, o objectivo de aumentá-los, por comparação com a receita previsível em ISP em 2000, para valores que não sejam explicados pelo próprio crescimento do consumo.
Logo, a nossa política, no que respeita ao preço dos combustíveis, a manterem-se os níveis actuais, a continuar a ser impossível manter o nível de preços de venda ao público que ocorre desde Março de 2000 e ocorrerá até ao final de Dezembro de 2000, será a de produzir ajustamentos moderados e graduais.
Como ainda faltam cerca de dois meses para o fim do ano, tempo suficiente para as condições dos mercados, tanto o petrolífero como o cambial, poderem-nos dar outras indicações, consideramos, por isso, que não é ainda altura para se avançar com um qualquer calendário ou uma qualquer quantificação. Contudo, em tese geral, deve ficar perfeitamente claro que - e isto já foi dito tanto por mim como pelo Sr. Primeiro-Ministro na passada segunda-feira - a manterem-se os níveis actuais, dependendo o preço dos combustíveis e o preço da sua venda ao público de factores que são completamente exógenos ao Governo (e qualquer destes dois factores é exógeno ao Governo), teremos, provavelmente, de, em 2001, fazer ajustamentos moderados e graduais. De qualquer forma, esses ajustamentos, a ocorrerem, não se destinarão a obter, por parte do Estado, mais receita fiscal.
Para nós, enquanto se mantiverem os níveis actuais do preço do crude, a variável receita fiscal em ISP será um objectivo secundário, em relação ao qual, como demonstrámos ao longo deste ano, estamos dispostos a sacrificar receita fiscal para garantir um nível de preços que não seja tão penalizador para as actividades económicas e para as famílias, mas principalmente para as actividades económicas, porque, como já tive oportunidade de referir na reunião anterior, os combustíveis, como fonte primária, ainda constituem um input muito importante para o conjunto da economia portuguesa.
Quanto à administração fiscal, as medidas referidas pelo Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira são significativas da vontade do Governo de, para além daquilo que é a dinâmica própria da reforma e da modernização da administração tributária, exprimir com acções de formação descentralizada, que começarão a ocorrer até ao mês de Fevereiro por toda a administração, e de projectar para a administração aquilo que são as alterações principais decorrentes das propostas de lei de reforma fiscal que trouxemos ou vamos trazer a este Parlamento.

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Em relação ao cartão electrónico de contribuinte, há já, neste momento, 1 milhão de contribuintes possuidores desse instrumento, que é absolutamente essencial para o conhecimento e o reconhecimento da situação fiscal de cada contribuinte.
Há, enfim, um grande movimento de modernização da administração fiscal. Eu próprio tenho em meu poder um conjunto de informação que foi distribuído no passado domingo na reunião que tivemos com a administração fiscal e que dá muita informação sobre o processo de modernização verificado na administração, nomeadamente na informatização da administração fiscal - deixarei esta informação à Sr.ª Presidente da Comissão para que ela possa mandá-la distribuir pelos vários grupos parlamentares.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças e Srs. Secretários de Estado, começo por fazer uma observação prévia e, de seguida, por formular uma ou duas questões.
A observação prévia é a seguinte, Sr. Ministro: tem-me vindo a parece, quer pela introdução de alguns mecanismos, quer pela explicação de outros que têm vindo a ser apresentados pelo Governo, que se está a concretizar aquilo que eu, numa intervenção que fiz no Parlamento, designei, já em segunda via, naturalmente, porque o termo nem sequer era meu, por "técnica do palpite".
O Sr. Ministro voltou a referir agora, relativamente ao problema colocado quanto à determinação do grau de invalidez dos deficientes, que lhe "parecia" - repito, "que lhe parecia" - haver neste ponto alguns abusos. Mais, disse ter dúvidas de que, de facto, não estaria a ser devidamente utilizado o benefício fiscal previsto para os deficientes com um grau de invalidez de 60%.
Sr. Ministro das Finanças, eu gostaria que, de uma vez por todas, relativamente a esta formulação de juízos, quando viesse à Assembleia da República, nos trouxesse dados concretos e quantificados quanto a fenómenos desta natureza, porque (e vai-me perdoar) proceder a alterações no regime tributário aplicável, designadamente neste caso concreto, aos deficientes - e não conheço outro país da Europa cuja concessão de benefícios não seja feita a partir dos 60% de grau de invalidez, inclusive, mas se o Sr. Ministro das Finanças conhecer, agradeço-lhe que me informe, porque eu não conheço e procurei saber…

O Sr. Ministro das Finanças: - 60%?!

A Oradora: - Sim, 60%!
Como eu estava a dizer, proceder a alterações do regime de benefícios fiscais aplicáveis aos deficientes, cidadãos que ainda por cima deveriam merecer dos senhores aquilo que apregoam com tanta veemência, qual seja a consciência social deste Governo, para nós é um dado que nos custa a admitir.
Mais, Sr. Ministro das Finanças: quando analisei esta questão, verifiquei que, enquanto no artigo 80.º do CIRS se aumentava para 65% o grau de invalidez para efeitos da possibilidade de dedução, mantém-se em vigor o n.º 5 do artigo 40.º, se não estou em erro, do Regime Jurídico do Estatuto dos Benefícios Fiscais…
Desculpe, Sr.ª Presidente, mas não consigo exprimir-me em condições, porque, de facto, o barulho de fundo é demasiado.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, especialmente os da bancada do PS, peço-lhes que criem condições para que a Sr.ª Deputada possa exprimir os seus pontos de vista.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr.ª Presidente.
Julgo que a matéria dos deficientes não interessa a ninguém nesta Câmara, e é pena!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mais barulho fez o Sr. Deputado Vieira de Castro quando eu estava a falar!

A Oradora: - Sr. Deputado, está bem, mas eu, de facto, não estou habituada a isso, e não consigo formular os meus juízos de forma razoável!
Estava eu a dizer, e vou tentar retomar o meu raciocínio, que, de facto, até me pareceu que teria havido algum lapso nesta matéria, uma vez que no artigo 80.º do CIRS é alterado o grau de invalidez de 60% para 65%, no entanto, se formos verificar e analisar o artigo do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que, se não estou em erro, é artigo 40.º, constatamos que aí não são alterados os 60% de grau de invalidez para efeitos de concessão do benefício fiscal.
Portanto, Sr. Ministro das Finanças, nós, Grupo Parlamentar do Partido Popular, vamos entregar uma proposta de alteração para que se mantenha aquilo que para nós é essencial neste domínio, que é não pôr em causa um conjunto de cidadãos, que esses, sim, merecem do Governo e de todos nós uma atenção especial e específica, sobretudo quando o Sr. Ministro vem aqui dizer que lhe parece que tem dúvidas relativamente à utilização do benefício.
Sr. Ministro, a meu ver, não é um bom princípio inverter os termos deste tipo de equações. A meu ver e por regra, o princípio deve ser o de que os contribuintes não são bandidos, não são infractores, e é ao Governo que compete demonstrar e quantificar quando e em que situações é que as normas são usadas abusivamente, para usar a sua terminologia.
Outra questão que gostaria de colocar ao Sr. Ministro, esta muito breve, é a seguinte: também verifiquei que, na proposta de lei do Orçamento do Estado, são alteradas, modificadas ou introduzidas algumas regras no que diz respeito à sisa. Sr. Ministro das Finanças, veja se é capaz de dizer a esta Casa quando é que, finalmente, vai acabar o absurdo - e a qualificação não é minha, Sr. Ministro das Finanças - desse imposto no que toca a alguns casos muito concretos, designadamente na aquisição da primeira habitação para jovens.
Para terminar, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de obter o seu comentário, tão claro e esclarecido quanto possível, porque isso para nós é importante, sobre uma proposta apresentada aqui no primeiro dia da discussão do Orçamento do Estado pelo Sr. Deputado João Cravinho, respeitante à apresentação de um relatório, nos primeiros seis meses do próximo ano, sobre o estado da administração tributária, para que a sua reforma seja executada até 2003. Gostaria de obter o seu comentário sobre esta proposta, designadamente quando a administração tributária tem tantas e tão importantes tarefas para desempenhar já no ano de 2001.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Ministro das Finanças quer responder desde já?

O Sr. Ministro das Finanças: - Quero, sim, Sr.ª Presidente, e, depois, gostaria que desse também a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para completar a minha resposta.
Irei apenas abordar duas questões de ordem geral levantadas pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.
A Sr.ª Deputada disse que deve ser o Governo a qualificar e a quantificar os abusos. Ó Sr.ª Deputada, se nós ou qualquer governo fossemos capazes de quantificar, qualificar e

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"nominativizar" todos os abusos, eliminávamo-los directamente! Não é verdade? Se eu fosse capaz de dizer quantas e quais as dezenas de milhar de portugueses que utilizam abusivamente o benefício fiscal, como, por exemplo, na utilização dos todo-o-terreno, cortava.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não, Não! Não dava a esses!

O Orador: - Não dava a esses! Agora, esta é a regra geral, e, como é assim, a norma geral de aplicação geral e abstracta, como é próprio das leis, tem de ser a eliminação do benefício fiscal.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não tem!

O Orador: - Tem, com certeza, Sr.ª Deputada! Portanto, essa é uma falsa questão.
A Sr.ª Deputada ao levantar esta questão - e eu percebo qual é o sentido político da sua observação - quis aparecer aqui como a defensora dos interesses dos deficientes. Terá o direito de o fazer. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista já o tinha feito, já tinha chamado a atenção para tal facto, e a nossa disponibilidade para alterar essa norma, pedindo normas mais firmes e verificáveis de combate a abusos, que existem,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Com certeza!

O Orador: - … é total sobre essa matéria. Mas o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais vai, com certeza, acrescentar algo mais sobre este assunto.
No que diz respeito à sisa, comparo - e perdoe-me o abuso da comparação - a resposta que lhe vou dar com a resposta às propostas avançadas pelo Bloco de Esquerda em relação à tributação da energia.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Os senhores prometeram uma reforma da sisa!

O Orador: - A Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona sabe perfeitamente qual é o calendário da reforma da tributação do património imobiliário que o Governo vai apresentar, sabe perfeitamente que desses diplomas constará a eliminação da sisa e do imposto sucessório…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Até ao final deste ano!

O Orador: - A Sr.ª Deputada sabe que a proposta será apresentada até ao final deste ano e que produzirá efeitos no exercício de 2002, se for aprovada pela Assembleia em tempo útil e nos moldes em que o Governo a vai apresentar, mas isto já não depende do Governo. E isto está dito desde o debate do Orçamento do Estado para 2000! Lembro-me de ter tido este debate e esta conversa - sem sentido pejorativo - com a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Já lá vão dois anos!

O Orador: - Não! Não vão dois anos, Sr.ª Deputada! Vão exactamente, desde que tivemos essa conversa, oito meses! Tivemos esta conversa aqui aquando do debate do Orçamento do Estado para 2000, ou seja, em Fevereiro e Março deste ano. O tempo é que anda muito depressa e convém não esquecer que, num ano de presença no Ministério das Finanças, este é o terceiro Orçamento do Estado que estamos aqui a debater com as Sr.as e Srs. Deputados.
Portanto, não vale a pena também, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, estar a querer aparecer com a patente da ideia da eliminação da sisa!

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Não está registada ainda, Sr. Ministro!

O Orador: - Mas vamos registá-la, com certeza, em termos legais, pelo menos no que respeita à proposta do Governo até final deste ano, e espero que o trabalho da Assembleia permita que essa patente possa ser registada e concretizada já no Orçamento do Estado para 2002, quando ele for aqui discutido daqui a um ano.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para completar a resposta, se assim o entender.

O Sr Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Ricardo Sá Fernandes): - Sr.ª Presidente, tendo em conta os esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro das Finanças, quero acrescentar duas coisas relativamente a dois assuntos diferentes: um, tem a ver com a questão das pick-up e dos veículos ligeiros de mercadorias e, outro, com a questão dos deficientes.
No que se refere à questão das pick-up e, em geral, dos veículos ligeiros de mercadorias, quer o Sr. Ministro, quer eu próprio, tivemos já oportunidade de dizer que a sua situação é diferente da situação dos jeep, dos veículos todo-o-terreno. Em relação aos veículos todo-o-terreno, há, de facto, uma consciência muito clara de que existe, esmagadoramente, um aproveitamento abusivo de um benefício, ou melhor, está estabelecido um benefício para uma situação que não foi aquela para que ele foi criado…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Isso é diferente!

O Orador: - Exactamente!
Como eu estava a dizer, está estabelecido um benefício para uma situação que não foi aquela para que foi criado e, nesta medida, entendemos que a posição correcta é, efectivamente, terminar com um benefício que, no fundo, a experiência demonstra que está a ser utilizado esmagadoramente para um fim que não é aquele para que foi criado.
Relativamente às pick-up também há situações de abuso, mas há situações que não são tão claramente de abuso. Neste sentido, a posição do Governo é a de encontrar uma plataforma equilibrada e ter em conta esta realidade; e, por isso, relativamente à proposta… O processo legislativo não está concluído, o Governo apresentou uma proposta e, em virtude de estarmos no decurso do processo legislativo, o Governo está efectivamente aberto, conversando com os grupos parlamentares, com a Assembleia, a contribuir para encontrar uma solução mais justa e mais equilibrada neste domínio.
Há um ponto relativamente ao qual, suponho, a proposta do Governo tem, efectivamente, de ser alterada, porque a avaliação nela implícita, do ponto de vista técnico, está errada, e tem a ver com o facto de, naquilo que hoje é comum designar-se por pick-up, que são, portanto, os veículos ligeiros de mercadorias, estarem incluídas coisas muito diferentes: por um lado, as pick-up, que hoje circulam em Lisboa e por todo lado, que têm uma pequena caixa muito útil para quem quiser pôr a prancha de windsurf para levar para a praia e, por outro, outros veículos, que, apesar

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de também estarem na mesma categoria, são verdadeiros veículos de trabalho.
Não tenho quaisquer problemas em admitir - enfim, a responsabilidade é do Governo, mas fui eu que trabalhei nesta proposta - que, quando a formulei, não tinha consciência de que nesta categoria, dos veículos ligeiros de mercadorias, havia, efectivamente, coisas que eram completamente distintas, mas entendo que é imperioso estabelecer uma distinção nestes veículos ligeiros de mercadorias; e a Direcção-Geral das Alfândegas está a trabalhar com as associações do sector no sentido de encontrar critérios que distingam aquilo que tem de ser distinguido.
Portanto, relativamente à questão dos veículos ligeiros de mercadorias, a posição do Governo é a de que é muito útil que a Assembleia - e o Governo, por meu intermédio, fornecerá os elementos de trabalho para esta matéria - possa distinguir aquilo a que eu, por graça, chamo as pick-up de windsurf daquelas que são, efectivamente, veículos de trabalho. Tem de estabelecer-se uma distinção legislativa, porque está a meter-se no mesmo saco coisas que são diferentes, e este erro de avaliação foi por mim cometido, não tenho qualquer problema em o reconhecer neste caso e em todos os outros casos em que isto se verificar.
Quanto à questão dos deficientes, quando dizemos que existem, efectivamente, situações de abuso na margem que está à volta dos 60%, 61% e 62% é porque temos elementos seguros para poder concluir isso, e hoje até é possível definir zonas do País onde os deficientes aumentaram exponencialmente, aproveitando a facilidade com que, por vezes, os médicos outorgam a incapacidade para os 60% ou para os 61%.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Isso também é uma outra questão!

O Orador: - Os grupos que trabalharam nesta matéria entenderam que os 65% , do ponto de vista técnico, era um patamar suficientemente seguro para eliminar as situações de fraude. E, mais, propuseram, e isto está incluído na proposta de alteração ao CIRS - não está no Orçamento do Estado, porque não se mexeu nesta parte -, que, inclusive, o benefício devia ser majorado para os grandes inválidos, para aqueles que têm um índice de incapacidade superior a 80%.
Portanto, entendemos que, nesta matéria, se deve manter o regime actual para as situações de invalidez mais frequentes, mas, que, inclusive, o benefício deve ser majorado para as situações de grande invalidez que, também de acordo com os elementos que recolhemos, são as situações com graus de invalidez superiores a 80%.
Agora, somos sensíveis à argumentação de que, dentro deste limiar entre os 60% e os 65%, haja situações que não são de fraude.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Como somos sensíveis a esta argumentação, porque, como é óbvio, a reforma fiscal não é dirigida contra os deficientes -…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … isso seria um completo absurdo -, e porque estamos, de facto, no decurso de um processo legislativo, que não está encerrado, conforme disse o Sr. Ministro, o Governo aceita recolocar a questão nos termos em que ela estava anteriormente. Isto já foi dito às associações de deficientes e tenho reuniões agendadas com estas associações já para a próxima semana.
O Governo não faz finca-pé de que, efectivamente, o mito técnico deva ser 65% ou 60%, não tem objecção a que ele se coloque nos 60%, entende é que é útil que se estabeleçam mecanismos de controlo das situações de abuso, que são muito significativas na faixa entre os 60% e os 65%.
Portanto, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, esteja descansada que da parte do Governo não haverá qualquer objecção a que a Assembleia coloque de novo o grau de invalidez permanente nos 60%, deixando cair o que está na proposta relativamente aos 65%; porém, entende é que, e penso que a Sr.ª Deputada concordará com isto,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Concordo!

O Orador: - … se têm de introduzir mecanismos contra os abusos nesta matéria.
Estamos no decurso de um processo legislativo, o Governo e eu em particular não temos qualquer dificuldade em ajudar a encontrar com os Deputados, porque quem encontra são os Deputados e a Assembleia e não o Governo, as melhores soluções, as soluções que sejam mais justas, mais razoáveis e mais equilibradas, nesta como em todas as outras matérias.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (Manuel Baganha): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona, a única questão que aparece relativamente à sisa no Orçamento do Estado é o ajustamento dos escalões, como seria normal - digo isto porque a sua pergunta poderia dar a ideia de que andaríamos a mexer em aspectos mais substanciais.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Eu queria é que eles estivessem lá! Mas será só no fim do ano!

O Orador: - A única questão que lá está é o ajustamento dos escalões, o que seria de esperar.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, começo por pedir-lhe desculpa, porque certamente me enganei, mas, hoje, pensava falar apenas sobre a despesa, deixando a parte da receita para a altura que, a meu ver, seria a altura própria, que é a do debate, na especialidade, em Plenário. Por isso, hoje irei apenas falar de despesa, porque estava convencido de que seria isso que iríamos tratar aqui.

A Sr.ª Presidente: - Se o Sr. Deputado está a querer dizer…

O Orador: - Não estou a querer dizer nada! Apenas aquilo que disse mais nada!

A Sr.ª Presidente: - … que eu não devia ter deixado a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona falar sobre a receita, é evidente que poderei pensar que foi redundante, por este tema ser para ser discutido em Plenário, mas…
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr.ª Presidente, eu só quis dizer aquilo que disse e não percebo por que é que a Sr.ª Presidente refere apenas a

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Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona e não o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, por exemplo.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Muito obrigado, Sr. Deputado!

O Orador: - Vou voltar à questão das despesas, ou melhor, vou tentar introduzir a questão das despesas naquilo que me parece que vale a pena discutir hoje aqui com o Sr. Ministro das Finanças.
Das várias questões que tinha para colocar, há uma que coloco inicialmente em termos interrogativos, que é a de saber se o problema das despesas com as concessões é respondido pelo Sr. Ministro das Finanças, pelo Sr. Ministro do Equipamento Social ou pela Sr.ª Ministra do Planeamento, porque se não for com o Sr. Ministro das Finanças, guardarei a pergunta para a reunião com os outros ministérios. Por exemplo, as SCUT, as pontes "vascos da gama", etc.

A Sr.ª Presidente: - É respondida pelo Ministro do Equipamento Social!

O Orador: - Então, guardarei as perguntas sobre estas matérias para o Sr. Ministro do Equipamento Social, ficando o Sr. Ministro das Finanças aliviado desta carga!

A Sr.ª Presidente: - Não tenho dúvida de que fica aliviado!

O Orador: - Eu sei! Eu sei!
Irei, então, começar pela queda do tabu. Hoje, acabou o tabu em relação à denominada moderação salarial para a função pública; o Sr. Ministro fez a sua intervenção inicial sobre esta matéria e já aqui tenho uma notícia da Lusa a dizer que parece que o Governo perdeu a cabeça este ano e propôs aos sindicatos um aumento salarial de 3% - perdeu a cabeça em termos de propor um valor que ninguém estaria à espera, um valor extremamente elevado! E vou começar precisamente por esta matéria, tendo em consideração a própria intervenção que o Sr. Ministro fez no início.
O Sr. Ministro fala na questão da contenção ou moderação salarial dizendo o seguinte, em síntese: por um lado, é preciso ter em atenção que há tensões inflacionistas para 2001 mais fortes do que em anos anteriores, resultantes, designadamente, do preço do petróleo e da desvalorização do euro. E, na prática, conclui o seguinte: como há estas tensões inflacionistas provocadas pelo preço do petróleo e pela desvalorização do euro, têm de ser os trabalhadores (e, no caso concreto e específico, os trabalhadores da função pública) a compensar estas tensões inflacionistas. Quando o petróleo baixa, não há compensação para os trabalhadores da função pública nem para os outros, mas quando o petróleo aumenta, são os salários dos trabalhadores que têm de compensar.
A seguir, o Sr. Ministro refere o problema da reforma fiscal, ou melhor, o problema da proposta de tabela para o IRS que é apresentada no Orçamento do Estado. E, aqui, considero que eu estava completamente enganado até há alguns minutos atrás, porque estava convencido de que, em sede de uma reforma fiscal, pela qual nos temos batido e vamos continuar a bater, a componente relativa à redução da carga fiscal sobre os rendimentos dos salários seria para reduzir de facto a carga fiscal em benefício dos trabalhadores, traduzindo-se essa redução da carga fiscal em ganho para os trabalhadores. Mas, agora, o Sr. Ministro diz que não, diz que essa reforma fiscal, essa redução da carga fiscal vai traduzir-se numa compensação para a ausência de aumento dos salários reais! Isto são…

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, peço desculpa por o interromper, mas, em virtude de termos um barulho de fundo muito audível, quero pedir aos Srs. Deputados que necessitam de tratar de alguns assuntos o não façam aqui, no meio da sala e em pé, porque desta forma não deixam que se ouça os oradores.
Faça o favor de prosseguir, Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Orador: - Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Por conseguinte, é em relação a dois pressupostos de que o Sr. Ministro parte que manifestamos a nossa total e completa discordância.
Mas a questão dos salários e da quebra do tabu no dia 10 de Novembro, por parte do Governo, em relação aos trabalhadores da função pública, tem ainda a ver com o referencial da inflação. Recordo aquilo que o Sr. Ministro disse há pouco - e bem, do meu ponto de vista! -, que as tensões inflacionistas para 2001 serão muito superiores à deste ano e às dos anos anteriores. Entretanto, o Governo apresentou um referencial de 2,7% a 2,9% de inflação para 2001.
Sr. Ministro, faço-lhe a seguinte sugestão: em termos de variação em cadeia, em 1998, a inflação em Portugal aumentou 3%; em termos de variação em cadeia ainda, no ano 2000, a inflação aumentou 3,8%; no ano de 1999, aumentou apenas 2,3%. Face àquilo que o Sr. Ministro disse há pouco, se a variação em cadeia no ano de 2001 fosse tão boa, tão boa - e tudo aponta para que seja bastante pior! -, como a de 1999, que foi muito abaixo da verificada em 1998 e em 2000, só por isso - repito, só por isso! - teríamos uma inflação adquirida para 2001 de 3%. E estou a ser o mais optimista possível, face ao quadro conjuntural em que nos encontramos! Mas, Sr. Ministro, o Governo nem sequer os 3% aponta como o possível crescimento do índice de preços - aponta para entre os 2,7% e os 2,9%. Porém, tudo aponta para que o valor seja superior!
Então, isto conduz-me à questão orçamental concreta, que é a das verbas disponíveis para aumentos salariais da função pública no ano 2001. As verbas que estão disponíveis no Orçamento do Estado que nos é apresentado são: 50,8 milhões de contos, para despesas com pessoal, mais 20,7 milhões de contos para despesas com pessoal em termos de transferências para os Fundos e Serviços Autónomos. Estes valores dão, na melhor das hipóteses, possibilidades de aumentos nominais dos salários de 3,6%. Ora, com uma inflação de 3%, no mínimo, em termos de previsão para 2001, e com a necessária compensação, a que o Governo se comprometeu, daquilo que foi o prejuízo dos trabalhadores da função pública no ano 2000 devido à passagem da inflação de 2% para 2,8% teria de haver - só para compensar isto - um aumento de 3,8%. Porém, as verbas que estão inscritas na dotação provisional não dão para pagar os 3,8%!
Para além disso, pergunto, onde está o aumento real para 2001? Pura e simplesmente, não existe! Porque para isso precisaríamos de ter 3,8%; com verbas que dão, no máximo, 3,6%, significa haver um prejuízo efectivo, em termos de salários reais, para o ano circunscrito de 2001. A evolução salarial em 2001 terá um prejuízo efectivo em termos reais pelo menos na ordem dos 0,2 pontos percentuais. E esta é uma questão central deste Orçamento do Estado.
Não podem continuar a ser sempre os trabalhadores a "pagar" a crise e, depois, quando não há crise, não serem compensados em absolutamente nada. Por isso, por nós, vai manter-se, até ao final da votação do Orçamento do Estado a questão de prever aumentos salariais minimamente compensadores para os trabalhadores da função pública. Não estamos a colocar a exigência de aumentos salariais astronómicos mas aqueles que, no mínimo, compensem os prejuízos do ano 2000 e que dêem algum

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ganho real para o ano 2001, sem incluir o problema das tabelas do IRS, porque isso é para reduzir a carga fiscal e não para compensar perdas salariais.
A segunda questão que gostaria de colocar-lhe, Sr. Ministro, tem a ver com o problema, que já foi aqui referido hoje por outras razões, dos acidentes de trabalho. Gostaria que o Sr. Ministro me explicasse o que é que se passa com o Fundo de Acidentes de Trabalho em termos orçamentais. Todos nós sabemos que, em Portugal, as indemnizações por acidentes de trabalho são de autêntica miséria. O Fundo de Acidentes de Trabalho, que estava no Instituto de Seguros de Portugal, foi agora autonomizado e verifica-se que as transferências orçamentais para este Fundo baixam de 16,9 milhões de contos, em 2000, para 9,8 milhões de contos, em 2001 - menos 42%. Dito isto, gostaria de saber o que significa esta baixa de transferências para o Fundo de Acidentes de Trabalho, se ela é compensada com um aumento, pelo menos correspondente, por parte das empresas de seguros ou de quem quer que seja e o que pensa o Governo, em termos da alteração absolutamente necessária e exigível, deste problema das indemnizações por acidentes de trabalho.
A terceira questão, Sr. Ministro, tem a ver com o problema dos pagamentos às petrolíferas. Foi reconhecido, se a memória me não trai, pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais - não tenho a certeza, mas sei que foi por um membro do Governo -, publicamente, que haveria uma dívida às petrolíferas na ordem dos 15 milhões de contos. Gostaria de saber como é que o Governo tenciona pagar estes 15 milhões de contos. Isto é, se o Governo vai pagar estes 15 milhões de contos de dívida às petrolíferas através da cativação pelas petrolíferas de uma parte do ISP no ano de 2001 ou se, de uma forma mais transparente, o Governo paga a dívida que existe, e, a ser assim, onde está contida a verba de 15 milhões de contos para pagar às petrolíferas.
Sr.ª Presidente, se a memória me não trai, eram estas as questões que eu queria colocar.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, eu e o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco responderemos às questões que colocou.
Em primeiro lugar, a proposta avançada pelo Ministro Alberto Martins nas negociações com a função pública é de actualização da tabela salarial para 2001 em 3%, sem considerar a compensação para reposição do poder de compra em virtude do andamento da inflação em 2000, cuja taxa média anual estimamos, no cenário macroeconómico, que seja de 2,7%.
Portanto, no fundo, estamos a falar de uma proposta de 3,2%, para que fique claro. Quisemos separar aquilo que é a nossa proposta de actualização para 2001 daquilo que é a reposição do poder de compra tal como ela foi assumida e definida pelo Primeiro-Ministro no debate que aqui teve lugar no dia 17 de Maio.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - (Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar as palavras do Orador).

O Orador: - Com certeza! Aquilo com que o Primeiro-Ministro se comprometeu foi com uma reposição da perda de poder de compra dos salários da função pública, medida pela taxa de actualização da tabela salarial em 2000, e essa taxa foi de 2,5%. Ou seja, foi sempre entendimento do Governo, várias vezes reafirmado ao longo dos últimos meses, que a reposição se faria a partir desse valor. Estamos, portanto, a falar de uma reposição, de acordo com o cenário macroeconómico, de 0,2% ou de 0,3%, supondo, porque é outro valor plausível, que a taxa média anual de inflação encerra não em 2,7% mas em 2,8%. Mas, seja 0,2% ou 0,3%, a reposição a fazer será acrescentada à base de partida da negociação, que é uma taxa de actualização da tabela salarial de 3% mais a reposição da perda de poder de compra por referência à tabela fixada em 2000.
Portanto, estamos a falar, seguramente e à partida, de uma actualização para 2001 de 3,2%.
No que respeita à tabela, o Sr. Deputado Octávio Teixeira diz que julgava - e julgava bem! - que a redução do esforço fiscal sobre o trabalho, nomeadamente sobre o IRS, seria para reduzir o esforço fiscal. Sem dúvida que é este o objectivo e foi ao serviço deste objectivo que foram feitas as alterações que constam quer da proposta de lei orçamental quer da proposta de lei de reforma da tributação do rendimento. Agora, o que o Sr. Deputado não pode negar - e eu sei que não vai negar isto - é que esta redução do esforço fiscal por via da redução das taxas e da actualização dos escalões gera um aumento do rendimento disponível para as famílias e para os contribuintes.
Assim, à pergunta como vai o rendimento disponível de um contribuinte solteiro, com zero dependentes, evoluir no ano de 2001, a resposta é: pressupondo uma actualização salarial de 3,2%, o rendimento disponível desse contribuinte, nestas condições, vai aumentar 5% - vai aumentar 3,2% por virtude da actualização da tabela salarial e 1,8% pelo facto de o seu rendimento disponível ser aumentado por diminuição dos encargos fiscais. Quando esta mesma pergunta for feita em relação a um contribuinte que ganhe, por exemplo, 350 contos/mês, a resposta é a de que a evolução do seu rendimento disponível será de 4,9%. É esta a situação, independentemente dos objectivos com que foi feita a reforma fiscal, e ela foi feita com os objectivos que o Sr. Deputado referiu e de que partilho inteiramente. Portanto, em termos macroeconómicos, quando estamos a analisar a evolução do rendimento disponível ao longo do exercício de 2001, verificamos que ele terá, ao contrário dos anteriores exercícios, por virtude da reforma fiscal e das característica que a mesma tem, duas componentes a considerar: a que resulta da actualização salarial, ela mesma, e a que resulta do aumento do rendimento disponível por efeito de desagravamento fiscal. Isto é claro como água e não pode ser desmentido! Não se trata de estar a dizer - e eu não disse isto - que isto foi feito para compensar…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Fui eu que o disse!

O Orador: - Eu sei que foi o Sr. Deputado, mas quis deixar claro que não fui eu que o disse!
Mas, dizia eu, dizer-se que isto foi feito para compensar os trabalhadores por efeito de uma subida salarial, que fica aquém daquela que tanto o Sr. Deputado como eu desejaríamos, do ponto de vista da competitividade da economia portuguesa, parece-me francamente negativo para o emprego e, consequentemente, para os trabalhadores.
Nós todos, que tivemos, enfim, a felicidade, julgo eu, de viver em condições de vida adulta os últimos 26 anos de democracia, pudemos conhecer vários períodos da história económica portuguesa ao longo destes anos em que ficou absolutamente claro que o pior que pode haver para o emprego e para os trabalhadores é a existência de uma situação inflacionista e de uma situação de descontrolo macroeconómico. Penso que o Sr. Deputado também partilha desta visão, de que a garantia de uma política, que não será só uma política de rendimentos e salarial, terá outros componentes, nomeadamente na política orçamental, que contribua para reduzir ou diluir tensões

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inflacionistas é um contributo importante para a evolução sustentada do rendimento dos trabalhadores e para a existência de mais e melhor emprego na nossa economia. Que fique claro que a evolução do rendimento disponível dos trabalhadores portugueses em geral e em particular dos da função pública, já que é sobre estes que o Governo tem algum poder de decisão na fixação da evolução da norma salarial, partindo dos valores hoje avançados pelo Governo nas negociações com os sindicatos da função pública, é na casa dos 5%. É disto que estamos a falar e isto não pode ser omitido, não pode ser desvalorizado, nem pode ser deixado de ter em conta também na análise da política macroeconómica que estamos a desenvolver.
No que respeita às outras questões, o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco irá desenvolvê-las, mas, em relação às suas dúvidas, Sr. Deputado Octávio Teixeira, sobre se as verbas inscritas no Orçamento do Estado para remunerações certas e permanentes são ou não sustentáveis e consistentes com estes objectivos de política salarial que acabo de enunciar, devo dizer que o Governo e eu próprio estamos em condições de propor ao Sr. Deputado uma iniciativa para o deixar completamente tranquilo, apesar de considerarmos isso redundante, porque temos a certeza de que as verbas inscritas suportam perfeitamente as propostas de evolução salarial que apresentamos e que vamos negociar com a função pública. Mas, se, em relação a isto, o deixa mais tranquilo a inscrição de um reforço na dotação provisional de mais 20 milhões de contos (que, em nosso entender, não vai ser necessário utilizar!) afectos exclusivamente a este objectivo, estamos disponíveis para aceitar essa proposta de alteração da sua parte. Isto por forma a deixá-lo completamente tranquilo, bem como àquelas pessoas que, como Sr. Deputado Octávio Teixeira, nesta Assembleia ou fora dela, possam ter qualquer tipo de dúvida sobre essa matéria. Nós não a temos, conhecemos o perfil da evolução salarial, sabemos explicar em concreto, em relação a este ano, o aumento de 8,8% que está a ter a rubrica de remunerações certas e permanentes, que se deve à evolução das tabelas salariais, à evolução e finalização do processo de actualização de carreiras, nomeadamente em alguns corpos especiais, à evolução do efeito volume no que respeita a novos funcionários públicos existentes. Portanto, estamos absolutamente tranquilos com os nossos cálculos, mas, como não queremos que esta dúvida o atormente ao longo do ano, estamos disponíveis para aceitar este tipo de alteração.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Dá-me licença que interrompa, Sr.ª Presidente?

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, se me permite, e se o Sr. Ministro também mo autoriza, evidentemente, quero dizer que, independentemente do desafio do Sr. Ministro, vou abrir aqui não um tabu mas um pequeno segredinho, dizendo que iremos apresentar uma proposta sobre esta matéria - e sem aumento do deficit, o Sr. Ministro também pode ficar descansado e ir para Moçambique, porque não irá ter problemas com isso.
Agora, repare, o nosso problema não é inscrever para não ser utilizado; é inscrever para ser utilizado. É que a verba que cá consta dá para os 3,6%, isso já o afirmei; agora, 3,6%, no quadro que lhe coloquei é que não é aceitável!

O Orador: - Dando por assente esse seu cálculo, 3,6% quereria dizer uma evolução do rendimento disponível dos funcionários da Administração Pública da ordem dos 5,6% - é disto que estamos a falar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Estou a falar de salários!

O Orador: - E eu estou a falar de rendimento disponível, porque, quando cada família, cada um de nós, tem o seu rendimento, tem o seu rendimento disponível, independentemente de qual seja a origem desse rendimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Fernando Pacheco): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, começo pela questão concreta que colocou quanto ao Fundo de Acidentes de Trabalho, dando-lhe um esclarecimento, sem prejuízo de, posteriormente - e penso que o Sr. Deputado aceitará isto -, ele vir a ser confirmado.
De facto, há, no relatório, três valores que parecem estranhos, no caso do Ministério das Finanças: há uma redução de 100% de dotação, há uma redução de 86%, digo, 85,7%, de dotação e há uma redução de 42% de dotação. O Sr. Deputado ficou-se na dos 42%, mas, de facto, há estas três, que são as únicas reduções…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - A dos 100% é normal!

O Orador: - A dos 100% é perfeitamente normal e tem a ver com uma instituição que saiu do sector público, que tem as suas fontes próprias de financiamento (o normativo legal que a enquadra prevê-as). Portanto, esta é perfeitamente normal.

A Sr.ª Presidente: - As fontes próprias de financiamento… (Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar as palavras finais da Oradora).

O Orador: - Não. A fonte própria da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários é através de receitas que eles têm sobre os movimentos que existem e, portanto, não tem a ver com financiamentos da UE. Por esta razão é que saiu do Orçamento do Estado. Aliás, esta instituição teve um excedente, em termos de receitas sobre as suas despesas.
Quanto ao Fundo Extraordinário de Ajuda à Reconstrução do Chiado, penso que o Sr. Deputado não colocou esta questão, porque, como é sabido, este é um fundo que está em phasing out e, como está em phasing out, é normal haver essa redução.
No que toca ao Fundo de Acidentes de Trabalho, o que posso dizer-lhe - e confesso que não estou a falar com 100% de certeza, razão pela qual lhe peço que me deixe confirmar isto mais tarde - é que as remissões das pensões mobilizadas através deste Fundo dependem de uma programação que tem a ver com as próprias decisões dos tribunais. Isso significa que a redução que temos aí não é real, são pagamentos que são diferidos. Por exemplo, no caso concreto do ano de 2000, sobre um valor de 16,9 milhões de contos, que aí está inscrito, a despesa vai ser de 8,6 milhões de contos. O que significa que, de facto, vai haver um aumento de despesa, de 2000 para 2001, e não uma redução como aí está patente, porque aí estão as dotações iniciais, mas não estão, de facto, as utilizações. Portanto, essa estimativa de execução que aí está…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Esta é a estimativa?

O Orador: - Não! Essa estimativa de execução que aí está não tem a ver com a utilização real dos valores, porque essa utilização real é estimada em 8,6 milhões de contos. Tem, sim, a

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ver com algo que o Sr. Deputado conhece bem: é que quando há uma transferência do Orçamento do Estado, é considerado como executado. Logo, esse valor é contabilizado como 100%, independentemente de o valor, depois, ser ou não todo ele utilizado.
Como referi, depois, terei oportunidade, se o Sr. Deputado assim mo permitir, de confirmar esta minha interpretação, pois estou a falar de memória. Mas como serei companhia regular dos Srs. Deputados ao longo da próxima semana, entretanto ou na discussão de sexta-feira, poderei prestar este esclarecimento ao Sr. Deputado. Isto, apenas para me certificar de que não estou enganado na resposta que estou a dar-lhe.
Penso que era intenção do Sr. Ministro que eu falasse também sobre a questão da inflação.

O Sr. Ministro das Finanças: - Exactamente!

O Orador: - Sr. Deputado, mais importante do que a variação em cadeia, se quiser usar um valor, parece-me ser a variação homóloga. A variação em cadeia, como sabe, flutua muito de mês a mês e há flutuações muito significativas. Já a variação homóloga tem alguma regularidade adicional, reflecte a variação em cadeia e, apesar de ser mais irregular do que a variação média, como é evidente - a variância da média é menor do que a variância do valor isolado -, será, porventura, mais correcta para este fim.
Chamo é a sua atenção - e reportando-me à informação até Setembro, porque ainda não temos os valores de Outubro do INE - para que, em termos de variação homóloga da taxa de inflação e referida a Setembro (portanto, o ano que termina em Setembro), a responsabilidade por 56% de variação da inflação é de duas rubricas do índice de preços: uma delas, os transportes, por razões conhecidas, e, outra delas, com um peso superior a 20% dos 56% (portanto, não é metade dos dois agregados, mas é superior a 20%), os produtos alimentares e bebidas não alcoólicas, dos quais o grosso disto é o célebre problema da batata. Portanto, há apenas quatro produtos que explicam a variação, ou o grosso da variação, na componente de alimentação: o pão, a carne, o peixe e a batata. E isto reflecte também, particularmente no caso da batata, mas também no do pão, o próprio ano agrícola. Ou seja, houve condições extraordinárias e negativas, durante este ano, quer no caso dos transportes, onde houve um aumento muito significativo pelas razões conhecidas, quer no caso dos produtos alimentares e agrícolas, que tiveram esta repercussão de explicar 56% da variação do índice de preços.
Para se manter uma dinâmica semelhante e para termos um efeito de pioria semelhante no próximo ano, teria, por exemplo, se considerarmos que este ano houve um mau ano agrícola, de haver um péssimo ano agrícola, teria de ser muito pior.
Significa isto que, em termos de dinâmica e em termos de modelização - porque, depois, estes são exercícios feitos com modelização macroeconómica, como o Sr. Deputado sabe, e por duas fontes, pela via dos modelos de extrapolações de tendências, vulgo, Box & Jenkins, e por via de modelos macroeconómicos -, em termos de extrapolação e, depois, de construção de cenários, não houve razões para se considerar que o cenário seria tão negativo quanto o cenário que acabámos por viver, que não era o que, inicialmente, estava equacionado, no ano 2000.
Agora, Sr. Deputado, numa coisa, tem toda a razão: há um grande grau de incerteza nisto. E, evidentemente, isso traduz-se, depois, noutros elementos, que estão ligados à variação e não ao valor da projecção. Por essa razão é que, na preparação do cenário do Orçamento do Estado, se trabalhou com intervalos, porque se considerou que a variância era de tal maneira elevada que justificava uma previsão em termos de intervalos. É evidente que o intervalo não cobre 100% da possibilidade, porque 100% era só de (- ) a (+ ), mas é o intervalo que tem aquilo que é, enfim, o grosso da probabilidade que consideramos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr.ª Presidente, vou tentar…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, o Sr. Secretário de Estado não respondeu a uma das questões que formulei, a das petrolíferas.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Rui Rio, peço-lhe desculpa, mas parece que houve aqui um lapso que o Sr. Deputado Octávio Teixeira está a referenciar.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - É verdade, mas posso responder se…

A Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Peço desculpa, Sr.ª Presidente e Sr. Deputado Rui Rio, por o interromper, mas falhou-me a resposta à questão sobre as petrolíferas, colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Sr. Deputado, há duas razões para que se continue a proceder como até aqui. A primeira é porque, enfim, esse é o quadro que está em vigor, é aquilo que as petrolíferas têm vindo a aceitar e, portanto, a ideia seria precisamente a de continuar com o mesmo enquadramento, ou seja, através de uma medida de natureza fiscal, ligada à questão do ISP, resolver esse problema, que também é fiscal, da tributação dos produtos combustíveis.
Mais: se se tentasse proceder de outra maneira, como o Sr. Deputado estava a sugerir, não só se faria de uma maneira desenquadrada e sem ligação directa aos valores de que estamos a falar, que, como é evidente, estão ligados às quantidades e, por este facto, o mais normal até é ser precisamente a partir dos próprios consumos, para que, depois, não se ponham problemas de divisão, como até se colocaria um outro problema, no caso de se tentar dar esse dinheiro directamente às companhias, que era o de saber qual o enquadramento jurídico dessa transferência, que seria um auxílio do Estado e, como tal, não seria permitido.
Portanto, a ideia é a de continuar a privilegiar o mecanismo que até aqui tem vindo a ser utilizado.

A Sr.ª Presidente: - Agora, sim, Sr. Deputado Rui Rio, tem a palavra.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr.ª Presidente, vou tentar ser coerente com aquilo que disse, ontem, no início da discussão do Orçamento do Estado, e ser rápido e directo, pois, a meu ver, é assim que este debate, na especialidade, deve ocorrer.
Começo por esta última resposta parcial do Governo ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, dizendo o seguinte: tanto quanto percebi da questão formulada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, uma das coisas em que consistia a pergunta, e que eu também gostaria de saber, é, para já, se confirmam que o valor em causa são os 15 ou 16 milhões de contos. Portanto, em primeiro lugar, gostaria de saber qual é o valor.
Em segundo lugar, vou fazer, então, uma pergunta de carácter de especialidade e técnica, que é esta: em que sítio do Orçamento é que está essa verba?
Ainda no âmbito desta questão e apesar da resposta agora dada pelo Sr. Secretário de Estado, continuo, sinceramente, a não entender por que é que não se altera o limite inferior do intervalo - porque este imposto funciona por intervalo -, quando

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aquilo que se pretende é pagar menos imposto. Ou seja, cobra-se mais imposto e, depois, subsidia-se o contribuinte para ele poder pagar impostos. Não tem lógica! Então, cobre-se menos imposto - é mais transparente e mais lógico! Ou, se não for, explique-me por que não é. Porém, a meu ver, não tem qualquer sentido estarmos a cobrar um imposto e, depois, a subsidiar o contribuinte para ele pagar o imposto que nos deve.
Gostaria também de saber qual é o montante - e onde posso encontrá-lo no Orçamento - da componente de portagem virtual na ponte Vasco da Gama. O facto de o Governo não ter cumprido o acordo previamente estabelecido levou a que o Orçamento do Estado tenha de subsidiar as pessoas que passam na ponte Vasco da Gama, porque pagam uma portagem inferior àquela que estava previamente estabelecida. Quanto é que custa aos contribuintes portugueses o facto de o Governo não ter tido a coragem necessária para mexer nas portagens da ponte Vasco da Gama e onde é que posso encontrar esse valor no Orçamento?

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - E na ponte 25 de Abril!

O Orador: - Na ponte Vasco da Gama e, diz o Sr. Deputado Vieira de Castro, e bem, na ponte 25 de Abril.
Outra questão, que não consegui perceber, na discussão na generalidade, pelo lado macro da questão, foi a seguinte: o défice em contabilidade nacional é um, o défice em contabilidade pública é outro. A diferença, em termos de generalidade, são 115 milhões de contos. Não consegui, no debate na generalidade, obter a explicação disso. Então, agora, no debate na especialidade, peço, mais uma vez, que me expliquem o seguinte: expliquem-me quais são as principais variações em termos de contabilidade pública e em termos de contabilidade nacional que levam a que o défice, a diferença entre o défice numa e noutra, seja uma coisa tão monstruosa que não se entende, quando teoricamente até deveria ser o contrário, até deveria ser a contabilidade nacional a apresentar um défice maior, porque esta contabiliza compromissos, enquanto que a outra, que é de tesouraria, não o faz, e, normalmente, o Estado deve mais do que aquilo que tem a receber. Portanto, teoricamente, até apontaria para o contrário, mas dá-se uma situação de relativa excepção, que não é assim. Por isso, volto a pedir que expliquem ao Parlamento por que é que é assim, onde é que está aquilo que dá uma diferença tão grande como 115 milhões de contos.
Finalmente, a última questão tem a ver com o imposto automóvel (IA). Sr. Ministro, concordamos que não é justa, neste momento, nem tem sido justa, a tributação dos todo-o-terreno. Também não tem sido justa no âmbito daquilo que se consideram as pick-up, porque também reconhecemos, como referiu o Sr. Secretário de Estado, que há alguns abusos, há algumas pick-up que, manifestamente, não são veículos de trabalho e estão moldadas para não o ser. Portanto, até aqui, estamos todos de acordo.
Agora, no que toca principalmente aos todo-o-terreno, a questão que coloco tem a ver com o seguinte: não podemos pegar numa matéria que é popular - é evidente que se se fizesse um referendo, todos achavam que os jeep deveriam pagar o mesmo de imposto automóvel ou, eventualmente, até mais do que um veículo normal - e perder o sentido das responsabilidades. Ora, a questão que coloco é esta: é justo, é correcto, é equilibrado "matar" o grosso do mercado - porque o mercado dos jeep praticamente morre, não digo que seja em 100% mas em 90% -, colocando dificuldades a empresas que existem, que têm de ter um retorno para o seu investimento e que contavam com o mercado de uma dada forma? Ou seja, o que me parece sensato é que se diga a essas empresas que isto vai acabar, que isto não é social nem fiscalmente justo, e que elas têm dois, três ou quatro anos (o que se achar equilibrado) para se reconverterem, deixarem de vender jeep e passarem a vender trottinettes, motos, veículos usados. Assim, não criamos dificuldades às empresas cujo volume de vendas depende, em larga escala, de uma injustiça fiscal, é verdade, mas pela qual o Estado é, há muito, responsável. Julgo que isto é mais equilibrado e sensato do que, abruptamente, o Estado tentar acabar com algo que é da sua responsabilidade e não daqueles que vão ser prejudicados. Não estou a falar na óptica do consumidor, pois, nesta óptica, pode acabar no dia 31 de Dezembro; agora, na óptica da empresa que os vende é que, penso, tem de haver um pouco de equilíbrio e acabar-se gradualmente com isto, dando tempo, repito, a que as empresas possam reconverter-se, porque, a não ser assim, muitas delas irão "fechar a porta", o que, a meu ver, não é equilibrado, nem justo, nem bom, para a economia nacional.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Presidente, a resposta às questões colocadas pelo Sr. Deputado Rui Rio serão dadas por mim e pelos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais e Adjunto e do Orçamento.
Sr. Deputado Rui Rio, o motivo pelo qual não se baixa mais o limite inferior do imposto sobre os produtos petrolíferos, sobre a gasolina e sobre o gasóleo, é que nós estamos sobredeterminados por uma directiva europeia que nos fixa, a nós e a todos os países da União, um valor mínimo para a tributação em ISP, quer do gasóleo, quer da gasolina. Portanto, estamos, no que respeita ao gasóleo, a operar nesse valor mínimo, já desde Agosto ou princípios de Setembro de 1999. E é precisamente esse factor de rigidez que, em nome da política de estabilidade de preços de combustíveis que temos tido e que sofreu o ajustamento conhecido em Março mas que se manteve nos seus alicerces essenciais, justifica a criação de uma dívida às petrolíferas. Portanto, nós não fazemos essa baixa, porque não podemos - esse limite é inamovível.
O mecanismo que se criou e que estamos a renegociar com as petrolíferas tem a ver, conforme o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, Dr. Fernando Pacheco, explicou, com o próprio factor de correcção, que é um mecanismo existente na fórmula de cálculo do preço relacionado com a tributação e que nos parece ser a forma mais justa, dos pontos de vista social e orçamental, de fazer esse ajustamento.
A razão é esta. E, quando digo que a nossa política fiscal é minimalista, ela é mesmo minimalista. Ou seja, estamos a operar, insisto, no que respeita ao gasóleo, no valor mínimo, há muito mais de um ano, concretamente, há um ano e três meses, e é isso que explica, em grande parte, a perda de receita fiscal em ISP, este ano.
Relativamente à questão das portagens, Sr. Deputado, como julgo que sabe, tem havido, e houve recentemente, uma renegociação do contrato de concessão com a Lusoponte, onde este e outros factores, que vinham, aliás, do passado na elaboração do contrato de concessão - vinham, salvo erro, da própria negociação inicial, feita pelo Engenheiro Ferreira Amaral -, foram ajustados em função de várias alterações e este elemento também foi tido em conta.
No que respeita às questões de contabilidade nacional e de contabilidade pública, o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco, vai dar-lhe um conjunto de informação que tem a ver com os últimos sete ou oito anos e que evidencia não haver uma regularidade de situações. Isto é, há exercícios orçamentais onde o valor dos défices em contabilidade nacional é superior ao do

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valor dos défices em contabilidade pública e há outros em que se passa exactamente o contrário. Portanto, a evidência empírica não revela a existência de uma regularidade num sentido ou noutro. Mas o Sr. Secretário de Estado Fernando Pacheco, vai, com certeza, esclarecê-lo de uma forma mais completa e concreta sobre este assunto.
Quanto à questão dos todo-o-terreno, Sr. Deputado, reafirmo aquilo que eu disse. Naturalmente também por responsabilidade do Estado, que não agiu mais cedo, mas por um comportamento fiscal e cívico fundamentalmente dos consumidores, a situação dos todo-o-terreno é uma situação em que a regra é o abuso. Não se trata de situações de abuso significativas, mas onde a regra na utilização do benefício, como se verifica em situações concretas, é o abuso. E creio que, dos pontos de vista de ética política e de ética fiscal, só há uma maneira de combater situações em que a regra é o abuso: é erradicando o abuso. Foi isto que fizemos e é isto que vamos fazer. E vamos fazê-lo trabalhando com as associações a quem já colocámos claramente esta questão. De qualquer maneira, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Dr. Ricardo Sá Fernandes, vai dar-lhe mais informação sobre isto.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, para além daquilo que o Sr. Ministro disse, quero chamar a atenção para o facto de haver uma articulação muito importante, que tem de ser feita, com a reforma do IA.
O Governo tem o compromisso de apresentar, no primeiro trimestre do próximo ano, uma proposta de reforma do IA, nesta Assembleia. Neste momento, está constituído um grupo de trabalho, que, até 15 de Fevereiro, apresentará essa proposta - grupo de trabalho esse que conta com a presença dos representantes das associações automóveis. Ora, a alteração do IA ultrapassará um pouco o problema que colocou relativamente aos jeep. O que acontece, hoje, relativamente aos jeep, é que 60% dos veículos vendidos com mais de 2500 cm3 são jeep, são veículos todo-o-terreno, o que os faria passar para um terceiro escalão, que nós eliminámos na proposta, exactamente para atenuar o efeito negativo que isso teria para este tipo de veículos. Mas como a proposta de reforma do IA em que vamos trabalhar, à semelhança do que acontece nos outros países da União Europeia, é a de que a tributação sobre o automóvel seja feita ad valorem, o problema de uma sobrecarga, que existe, para os veículos todo-o-terreno, pelo facto de terem uma cilindrada muito elevada, deixa de se colocar.
Por isso, nesta matéria dos todo-o-terreno, há, de facto, uma preocupação de justiça e de terminar com o abuso que se verificava há anos, também com a consciência de que em Portugal não se fabricam jipes (uma das notícias que apareceu foi relativa à fábrica do Grupo Salvador Caetano, mas aí não se fabricam jipes), portanto o problema não tem incidência a esse nível.
As empresas que procedem à comercialização de veículos todo-o-terreno têm necessidade de fazer uma adaptação, mas também há que contar que, com esta alteração, passaremos a ter um imposto automóvel mais justo e mais equilibrado, o que será importante e beneficiará o comércio de automóveis e os cidadãos em geral.
Todos reconhecemos que, hoje, a estrutura do imposto automóvel é profundamente iníqua, tem de ser modificada, e, modelando em termos de um imposto ad valorem e desdobrando-o num imposto de matrícula e de circulação, aproximar-nos-emos daquilo que é praticado nos países da União Europeia e estabeleceremos uma tributação mais equilibrada e de que o comércio automóvel e os cidadãos automobilistas, em geral, beneficiarão.
Naturalmente, temos de acautelar que isto não se traduza numa diminuição de receitas, porque o sistema para o qual vamos evoluir é de mais difícil fiscalização. Neste momento, temos um sistema muito simples de fiscalização mas, se a Assembleia aprovar essa proposta, caminharemos para um sistema mais exigente de fiscalização, porque a carga é repercutida em vários estádios.
Isto tudo para dizer que nem tudo é mau para os veículos todo-o-terreno, porque já introduzimos na proposta orçamental a eliminação do terceiro escalão, a qual teve sobretudo em conta o facto de estes veículos representarem 60% do mercado de veículos acima dos 1500 cm3.
Por outro lado, isto é feito em articulação com a reforma do imposto automóvel, existindo um grupo de trabalho, já com parâmetros definidos, que também é composto pelas associações representantes do comércio automóvel.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, respondendo à sua questão, em primeiro lugar, e em função de uma afirmação que fez na Comissão de Economia, Finanças e Plano, numa reunião que tivemos há tempos, digo-lhe que a diferença entre contabilidade pública e contabilidade nacional não é sistemática.
Posso desde já dizer-lhe que, por exemplo, nos anos de 1992 e 1993, o défice em contabilidade pública esteve bastante acima do défice em contabilidade nacional; em 1993, foi um valor vizinho dos 200 milhões de contos. Se fizer a conversão dos preços, isto é, se transformar os preços daquele ano em preços deste ano, aproximamo-nos dos 280/290 milhões de contos.
O Sr. Deputado fala muito em grelha de conversão, mas não há grelha de conversão contabilidade pública/contabilidade nacional. Isto tem que ver - e por isso é que este exercício não é fácil - com um procedimento definido e tratado no contexto do Eurostat, que se aplica a todos os países da União Europeia e que, no caso específico desta variável do défice orçamental, está sujeito, depois, a um procedimento, que é o do controlo dos défices excessivos. Portanto, tem que passar por uma triagem que não é só a do Eurostat mas, também, a do próprio ECOFIN. E não há uma grelha fixa, porque isto faz-se mediante a aplicação de um manual, que é elaborado todos os anos para o tratamento destas despesas.
Posso dizer-lhe que, por exemplo, no ano de 1999, houve um défice em contabilidade pública bastante inferior ao défice em contabilidade nacional, mas mais de metade da diferença entre os dois défices corresponde aos 73 milhões de contos de mais-valias que foram lançadas nesse ano em cumprimento de uma recomendação do Tribunal de Contas, o qual se queixava de que estes valores não eram, sistematicamente, "puxados" ao Orçamento do Estado.
O que é que acontece? O que acontece é que, em contabilidade pública, registamos movimentos de caixa, mas em contabilidade nacional não é assim, como o Sr. Deputado bem sabe e como, aliás, afirmou na intervenção que acabou de fazer. Por exemplo, na contabilização dos juros de certificados de aforro há diferenças, diferenças essas que, neste momento, porque, infelizmente, o certificado de aforro é um produto que foi concebido para uma determinada situação, ou seja, para pequenas poupanças, e já não o é…

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O Sr. Rui Rio (PSD): - (Por não ter falado ao microfone não foi possível registar as palavras do Orador).

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, eu estou a dizer-lhe que isto pode movimentar de um lado ou do outro, porque, mesmo nos certificados de aforro, a forma como as coisas são contabilizadas… E faz-se ainda uma outra operação: a capitalização dos certificados de aforro é trimestral, mas nós, em contabilidade nacional, registamos juros corridos, imputando a todos os meses o respectivo valor. Podem ocorrer diferenças que até tenham que ver com o próprio perfil temporal dos certificados de aforro.
Dou-lhe outro exemplo: o caso do IVA. O IVA favorece a contabilidade nacional, porque há períodos em que as suas receitas aumentam, uma vez que há dois meses, como o Sr. Deputado sabe, que são contados de um lado ou do outro, além de existirem operações extraordinárias.
Por conseguinte, não se pode dizer, de uma maneira sistemática, que um valor do défice em contabilidade nacional deve estar acima do valor do défice em contabilidade pública, porque isso depende de procedimentos que têm que ver com os efectivos apuramentos das receitas e das despesas em cada ano. Por isso é que, por exemplo, em 1996, os dois valores são praticamente iguais; em 1992 e 1993, o défice em contabilidade pública é significativamente superior; em 1999, voltamos a ter uma situação em que o défice em contabilidade nacional é superior ao défice em contabilidade pública.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, é, de facto, como diz, mas, mais uma vez, veio na linha do que eu disse. Ou seja, teoricamente - na prática é diferente -, repito, teoricamente, o défice da contabilidade nacional até teria tendência para ser maior do que o da contabilidade pública, porque na contabilização dos compromissos o Estado tem muito mais tendência a dever do que a receber. Aliás, deu-me dois exemplos que vão neste sentido.
Mas, agora, peço-lhe que me dê, se faz favor, exemplos daquilo que são os principais activos do Estado em termos de compromissos. O que é que o Estado tem a receber que já está contabilizado e que ainda não entrou em caixa?
Assim como deu os exemplos dos certificados de aforro e do IVA, que são em sentido contrário, dê-me exemplos de valores muito significativos em termos de activos de curto prazo a receber por parte do Estado para que este ano as coisas atinjam este valor.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, já agora, permita-me que faça uma correcção àquilo que disse: a contabilidade nacional não regista os compromissos mas, sim, os compromissos que têm que ver com aquele ano, porque o registo, em contabilidade nacional, faz-se em relação ao ano. Portanto, a contabilidade nacional não regista os compromissos, o que, mais uma vez, vai no sentido de eu não reafirmar aquilo que o Sr. Deputado disse, ou seja, não há uma tendência para que, em contabilidade nacional, os valores sejam diferentes dos valores em contabilidade pública.
Aliás, aquilo que se admite - e não só no nosso país, porque se admite como uma regra geral - é que, numa situação de steady state, ou seja, se fizer valores sobre vários anos, os valores deverão ser, grosso modo, semelhantes, portanto, não deve haver diferenças significativas. Isso é que explica que constatemos, quando olhamos para o Orçamento, que nuns anos está abaixo e noutros está acima. Pode haver elementos que perturbem isto e que introduzam um desvio sistemático, mas não há qualquer razão para que tal aponte para uma direcção ou para outra. Não há, Sr. Deputado!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, uma das questões de que volto a falar, só para dizer que subscrevemos a posição do Governo, é a dos veículos todo-o-terreno.
Em todo o caso, temos uma dúvida sobre um aspecto, o qual não temos como adquirido que tenha sido mexido, porque se remete para o próximo ano, para a tal "mexidela" global no imposto automóvel, que tem a ver com a manutenção de um benefício para os carros de grande cilindrada.
Com a modificação que foi feita, ou seja, com a retirada de uma medida que era insustentável do ponto de vista social e que não era uma excepção mas, sim, uma regra, não nos parece que faça grande sentido manter um benefício para carros de grande cilindrada.
Gostaríamos que o Governo nos dissesse se está, ou não, aberto para, neste ano, com reflexos para o ano que vem, alterar essa isenção, independentemente de uma reforma mais global em termos do imposto automóvel, na qual se conjuguem factores ambientais, factores de segurança e de justiça fiscal.
Uma outra questão que gostaríamos de ver respondida era a dos deficientes, mas o Governo já modificou a sua posição desde que "Os Verdes" fizeram a primeira abordagem desta questão.
Vou passar a outra questão, que é a do preço dos combustíveis, a qual tem, naturalmente, uma enorme importância, que o Governo assume, em termos da própria flutuação da nossa economia.
Independentemente de o Governo querer manter o preço dos combustíveis para o próximo ano como tabu, a pergunta de "Os verdes" é no sentido de saber se o Governo está, ou não, aberto para estabelecer preços diferenciados entre o gasóleo e a gasolina, considerando que os seus comportamentos são diferentes a nível ambiental e que, por isso, os custos, que não têm sido equacionados, e as consequências também são diferentes.
Um terceiro aspecto que gostaríamos que fosse clarificado é o seguinte: o Governo, independentemente de apresentar, para o ano que vem, uma reforma que pode chamar de ecofiscalidade ou de tributação energética, aceita, ou não, discutir a hipótese de uma pequena parcela do imposto sobre os combustíveis ser investida para garantir uma mobilidade mais sustentável?
Do nosso ponto vista, o investimento nos transportes públicos, que têm uma baixa qualidade e não são atractivos, não é, claramente, suficiente. Independentemente de o Partido Socialista secundarizar esta ideia em debates anteriores, designadamente num debate que se realizou há poucas semanas atrás em que foi discutido um projecto de lei nosso, não somos indiferentes ao preço que os transportes públicos virão a ter no próximo ano, porque isso influenciará as escolhas e as mudanças de comportamento dos cidadãos. Por conseguinte, gostaríamos de saber se este é um aspecto a considerar, ou não.
Por último, independentemente de a reforma sobre a ecofiscalidade ter, seguramente, de equacionar as questões da conservação da energia e da eficiência energética, considero que poderemos desperdiçar mais um ano se estas questões continuarem a ser adiadas.

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Admitindo que, na próxima Primavera, teremos novidades do Governo nesta matéria, há um ano que fica, uma vez mais, perdido. Parece-nos que isto é particularmente grave, uma vez que Portugal tem de cumprir compromissos que assumiu no âmbito da União Europeia e que decorrem de Quioto. A nossa situação é suficientemente grave para que não se aceite que, pelo menos, uma parte do problema não comece a ser colocado este ano.
Sendo que a conservação da energia passa, em grande medida, pela questão da construção (e, neste momento, a construção não se projecta tanto em relação ao futuro e às mudanças na arquitectura bioclimática mas em relação a apoios para garantir a conservação de energia nos edifícios), pergunto se o Governo pondera, ou não, como importante, este ano, aceitar medidas de incentivo à conservação da energia.
São estas as questões que gostaríamos de ver respondidas.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, vou responder a algumas questões e os Srs. Secretários de Estado Fernando Pacheco e Ricardo Sá Fernandes responderão a outras.
Quanto à questão da distorção no que respeita ao gasóleo e à gasolina e aos seus efeitos desiguais do ponto de vista da poluição, é evidente que esse problema existe, mas também é evidente que a situação actual, de preços muito elevados, dificulta que seja esta a ocasião para se começar a corrigir essa distorção.
Dir-lhe-ia que, em termos estratégicos, estou completamente de acordo consigo, assim como, ainda em termos estratégicos, também concordo (aliás, já tive oportunidade de o dizer nesta Assembleia) que, quando houver, e se houver, um movimento sustentado de descida do preço do crude, devemos não só evoluir para um mecanismo mais liberalizado de fixação dos preços dos combustíveis mas também aproveitar essa situação para corrigir, em desfavor do gasóleo, a situação actualmente existente, uma situação indutora de um grande crescimento da procura de gasóleo, que cria problemas não só ambientais mas também à nossa indústria de refinaria, na medida em que temos uma capacidade excedentária de refinação de gasolina e deficitária de gasóleo. Portanto, a estrutura dos preços conduz exactamente no sentido contrário.
São factores que, penso, em termos de estratégia, devemos corrigir, mas precisamos de ter condições objectivas, nomeadamente no que respeita à evolução dos preços do crude, que nos permitam fazer estes dois movimentos de correcção.
No que respeita às medidas relativas a uma mobilidade mais sustentável, penso que faz sentido, independentemente de propostas muito concretas que possam vir a ser analisadas na Comissão, enquadrá-las no âmbito da reforma da fiscalidade energética ou da ecofiscalidade.
Quanto às questões relacionadas com a conservação da energia e com a adopção de medidas que racionalizem a utilização da energia, só não concordo com a Sr.ª Deputada quando pergunta se o Governo está ou não disponível para começar este ano ou se vai perder mais um ano. Nós já começámos, Sr.ª Deputada! Há cerca de três anos, eu e o Professor Fernando Pacheco estivemos no Ministério da Economia e essa foi uma das prioridades a que demos não só visibilidade como eficiência, criando instrumentos legislativos, criando políticas e começando a desenvolvê-los. O Professor Fernando Pacheco, que, como sabe, durante dois anos, foi Secretário de Estado da Indústria e Energia, encetou e desenvolveu um conjunto de políticas, que estão, agora, a ser prosseguidas, que mostram que esse caminho já foi iniciado e com um conjunto muito diversificado, digamos assim, de intervenções e de situações.
Por isso, não se trata de começarmos; quanto muito, pode tratar-se de acelerar mais um movimento que já teve expressão, particularmente a partir do início do ano de 1998.
Peço, agora, ao Professor Fernando Pacheco e ao Dr. Ricardo Sá Fernandes para responderem às outras questões que foram colocadas pela Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente deu-me a palavra como Secretário de Estado do Orçamento, o que é verdade, mas tenho a impressão de que vou falar mais como ex-Secretário de Estado da Energia!
A Sr.ª Deputada Isabel Castro colocou uma questão sobre a utilização e produção da energia, que é, sem dúvida, importante.
Não vou falar da parte "pesada", digamos assim, porque o Sr. Ministro já falou dela, mas, sim, da parte menos "pesada" para chamar atenção do seguinte: neste momento, no que toca às energias renováveis, temos um quadro legislativo (e a apreciação não é minha, é dos meus colegas do Conselho Europeu de Energia) bastante perfeito, e vou explicar-lhe porquê.
Nós temos um sistema em que a remuneração, em termos de produção de energias renováveis, é feita em função de duas coisas: uma, o custo evitado e uma componente de benefício ambiental. O custo evitado é o valor de custo que não suportamos por não termos de produzir a energia, por exemplo, numa central como a da Tapada do Outeiro ou a do Pêgo; e sobre isso paga-se, adicionalmente, uma componente de benefício ambiental, que é calculada a partir da quantidade de CO2 que não é emitido, valorizada ao valor de referência da OCDE.
Esta é uma abordagem transparente, que tem a vantagem de não criar dois mercados de energia num país, um para a energia normal, outro para a energia produzida a partir de fontes renováveis, pelo que é consistente com uma abordagem de mercado e com um estímulo continuado às energias renováveis.
Posso dar-lhe mais uma indicação sobre por que é que isto foi considerado importante. Isto foi considerado importante, porque, pela primeira vez, em vez de se internalizar um custo, internalizou-se um benefício, que é o de produzir energia a partir de fontes renováveis, e ao fazê-lo criámos algo que não existe quando se internalizam custos, que é o estímulo à investigação e ao desenvolvimento.
Há um facto que lhe pode dar uma ideia do impacto que isto pode ter: foi criado um mecanismo transitório que permitia a quem estava no esquema anterior de pagamento do preço da energia eléctrica optar entre o esquema anterior e o novo (que acabei de lhe descrever) e, quando deixei a pasta, apenas quatro mini-hídricas estavam na dúvida se iriam, ou não, transitar para o novo sistema, porque este dava garantias de um tarifário justo dos dois lados.
O pagamento da electricidade era ligeiramente mais baixo do que aquele que se efectuava pelo da garantia de Estado que estava em vigor, mas todas as pessoas ligadas às energias renováveis e a própria associação que trabalhou nisto consideravam que era o mais apropriado, porque criava um mecanismo estável, uma vez que não estava dependente do preço de venda da energia eléctrica, o qual resultava de outros factores como, por exemplo, os custos de produção nas tais centrais térmicas. Portanto, o benefício ambiental estava devidamente individualizado e valorizado.

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Este benefício ambiental, quando deixei a pasta, pela valorização decorrente do valor do custo evitado, era de 50% do preço final de compra da energia eléctrica.
Para mais, as energias renováveis evitavam um problema que vai ser complicado neste país. Estamos a passar de uma situação em que o maior consumo de energia eléctrica acontece durante o Inverno para uma situação em que o maior consumo de energia eléctrica acontece durante o Verão. Entre outras coisas, esta alteração tem a ver com o conforto das pessoas, com a utilização de aparelhos de ar-condicionado.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Tem a ver com a construção!

O Orador: - Não, Sr.ª Deputada. Acima de tudo, tem a ver com a generalização dos aparelhos de ar-condicionado! Antes, a explicação para haver um grande consumo de energia eléctrica estava relacionada, sobretudo, com os aquecimentos, agora, está relacionada com a refrigeração.
Sr.ª Deputada, se tivermos instalações de produção de energias renováveis - depois posso dar-lhe exemplos concretos -, por a produção ser descentralizada, está-se mais perto dos consumidores. Portanto, há duas vantagens: em primeiro lugar, há um menor custo de transporte, pois estamos mais perto das fontes de consumo; em segundo lugar, há benefícios em termos de rede de transporte, que, como a Sr.ª Deputada sabe, coloca problemas ambientais de grande importância.
A questão que a Sr.ª Deputada colocou quanto à conservação de energia nos edifícios, que também está ligada a este ponto, relaciona-se com o regulamento dos consumos e da gestão de energia em edifícios, que tem sido implementado de uma maneira deficiente. Vivemos num país que, felizmente, não tem as amplitudes climáticas e térmicas que outros países têm, o que, às vezes, torna as coisas mais simples para quem compra uma casa, não sendo tão exigente neste domínio.
Posso ainda dizer-lhe que a estratégia de abordagem usada é a de fazer um controlo maior, em primeiro lugar, de edifícios públicos e de edifícios que, não sendo públicos, têm utilização colectiva, como é o caso dos hotéis.
Por exemplo, foram realizadas auditorias energéticas aos hotéis de quatro estrelas no Algarve - penso que também já está terminada a auditoria aos hotéis de três estrelas, mas, como deixei de exercer funções na Secretaria de Estado da Energia, não posso confirmá-lo - que visavam identificar, o que é o primeiro passo, quais os benefícios que poderiam ser implementados para minimizar o consumo de energia. Foi uma iniciativa que a indústria hoteleira do Algarve considerou muito importante e aderiu em número muito significativo, tendo sido realizada uma quantidade bastante expressiva de auditorias. Como já referi, a DGE já terminou as auditorias, pelo menos, aos hotéis de quatro estrelas, tendo já ao seu dispor os resultados das mesmas.
Esta acção abria ainda a porta ao financiamento através do Programa Energia, que foi praticado nesta altura para implementação das medidas que estas auditorias detectavam como importantes para reduzir o consumo de energia em edifícios.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, vou dar-lhe mais um exemplo de como é possível aliar aspectos importantes de produção e de consumo de energia conseguindo ganhos sob o ponto de vista ambiental: a co-geração.
Os normativos relacionados com a co-geração foram também alterados de acordo com a filosofia das energias renováveis, ou seja, pagamento de custo evitado (o custo evitado de referência foi a Tapada do Outeiro) com o benefício ambiental resultante de se conseguir, com as co-gerações, níveis de eficiência mais elevados na utilização de energia primária.
Para dar uma ideia do que isto representa, posso dizer-lhe que a Tapada do Outeiro tem uma eficiência energética, isto é, transformação de energia primária em energia eléctrica, que depois pode ser usada, de 55%. Uma boa central a carvão tem uma eficiência de cerca de 30% - o valor correspondente na Tapada do Outeiro é do dobro -, enquanto que uma boa co-geração consegue facilmente ultrapassar os 75%.
Foi preparado um normativo em que o benefício ambiental, como era calculado em função da eficiência energética, pois havia menos CO2 emitido por unidade de energia eléctrica ou térmica utilizada, evoluindo o tarifário em função disto, estimulou as boas co-gerações. Ou seja, em vez de se estimular as más co-gerações, aquelas que eram feitas para produzir energia eléctrica e colocá-la na rede quando o preço da energia era caro, estimulava-se as boas co-gerações, que aliavam a utilização de energia eléctrica à utilização do calor libertado como input produtivo, como factor energético, nesses processos produtivos.
Neste momento, ao nível das empresas que estão a construir grandes co-gerações, vai desde a Petrogal à Unitec, etc, há a produção de mais de 400 MW, isto é, existe um "tecto" que pode ir até 700 MW, que é 10% da produção de energia eléctrica neste país.

A Sr.ª Presidente: - Obrigada, Sr. Secretário de Estado. O que disse teria dado uma conferência sobre esta matéria, mas vamos tentar ater-nos à questão orçamental.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, gostaria de referir-me à questão que levantou relativamente aos veículos de luxo, tendo dito que os mesmos beneficiariam de um desagravamento do imposto automóvel.
A razão por que o Governo incluiu na proposta de lei de Orçamento do Estado a eliminação do terceiro escalão do imposto automóvel foi a que há pouco expliquei. Isto é, uma vez que os jipes passavam para o regime geral, sendo normalmente, pela sua própria natureza mecânica, veículos de grande cilindrada, verificando que 60% dos veículos com mais de 2500 cm3 eram jipes e que os tais veículos de luxo representavam pouco mais de 1% da receita (para ser mais exacto, 1,8%) e tendo em conta que está em curso uma reforma do imposto automóvel, o Governo, perante esta ponderação, entendeu que era equilibrado eliminar o terceiro escalão, ainda que tal se traduza temporariamente num benefício para os chamados "veículos de luxo", que representam apenas 1,8% da receita.
Portanto, a razão fundamental da eliminação do terceiro escalão é a que referi, sendo que o peso dos veículos de luxo no quadro da receita é efectivamente diminuto.
Por outro lado, não é um elemento muito fiável confiarmos no critério dos 2500 cm3 para definirmos se os carros são ou não de luxo e se merecem ou não uma tributação mais elevada. Como estava em curso a reforma do imposto automóvel, pareceu-nos razoável remeter para a mesma a definição de novos critérios; porém, se a Sr.ª Deputada quiser antecipar novos critérios nessa matéria de forma a incluí-los no Orçamento, o Governo, e com certeza que os Deputados também, está aberto a ponderá-los.
Parece-nos que as reformas fiscais globais não devem ser feitas no quadro do Orçamento do Estado, tanto no que respeita à tributação do rendimento como ao imposto automóvel. No Orçamento do Estado fazem-se ajustamentos pontuais e mexe-se naquilo que tem implicações quantitativas, no entanto, não

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nos parece que seja a sede própria para modificar a filosofia do que é ou não é um carro de luxo; a sede própria é a reforma do imposto automóvel.
De qualquer das formas, se a Sr.ª Deputada quiser apresentar uma proposta razoável nesse sentido, naturalmente que o Governo ponderá-la-á, porque não quis desagravar esse tipo de veículos, surgindo a desagravação como uma consequência de uma alteração que tem a filosofia que referi. Parece-nos mais razoável discutir esta questão no quadro da reforma do imposto automóvel, mas, como a iniciativa legislativa também pertence à Sr.ª Deputada, apresente uma proposta e nós analisá-la-emos com todo o gosto.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar uma segunda ronda de perguntas. Peço, mais uma vez, que sejam concisos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PS): - Sr.ª Presidente, gostaria de retomar algumas afirmações do Sr. Deputado Rui Rio acerca da tributação automóvel, dado que ele conhece bem a matéria e a expôs de forma séria.
Para além disso, porque o Sr. Ministro das Finanças, no início da reunião, prestou alguns esclarecimentos ao Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira sobre esta matéria, gostaria de trazer à colação a história destas alterações, bem como colocar algumas questões ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Deputado Rui Rio disse que este tipo de medidas devem ser tomadas com algum gradualismo, com o que estou de acordo, porém, o gradualismo quanto a este tipo de veículos dura há muitos anos, mais precisamente há 12 anos. Há vários anos se diz que tem de ser feita qualquer coisa em termos graduais, mas nada é feito.
O Sr. Deputado Rui Rio sabe que, quando eu estava na bancada do PSD, apresentei uma proposta de agravamento do imposto automóvel sobre os jipes, a qual não passou no seio da própria bancada, e que, no ano passado, este grupo parlamentar fez a mesma proposta. Portanto, quem produz e comercializa este tipo de veículos sabia que esta alteração estava iminente e que já devia ter sido feita há muitos anos, existindo, assim, algum gradualismo, até com taxa zero de agravamento. A taxa de imposto automóvel deste tipo de veículos não foi agravada nem no ano passado, nem há dois anos, ou seja, o agravamento foi "zero", pelo que era natural que agora se tivesse de acabar com essa injustiça, como disseram o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
A situação actual é de uma injustiça gritante, como o Sr. Deputado reconhece, e ainda bem que assim é, havendo um consenso muito grande relativamente à introdução destas alterações. Como o Sr. Deputado também reconheceu, se houvesse um referendo, julgo que haveria grande apoio quanto ao fim desta injustiça gritante, não só pela popularidade da matéria mas também porque as pessoas reconhecem a razoabilidade das propostas. Porém, não se trata só de uma injustiça mas também de uma questão de eficiência, sendo que as reformas fiscais e os Orçamentos são instrumentos de aplicação de medidas eficientes.
O Sr. Deputado disse, e bem, que esta situação de injustiça fiscal era culpa do Estado. De facto, até agora, estivemos a dar um incentivo errado às pessoas para comprarem um determinado tipo de veículos que não são adequados às cidades, por exemplo.
A proporção deste tipo de veículos em Portugal não tem nada a ver com o que acontece em todos os países da Europa civilizada! Nada! Estamos, de facto, numa proporção aberrante, o que torna as nossas cidades muito difíceis para os peões, para as pessoas que têm carros pequenos e para as pessoas que usam ou gostariam de usar os transportes públicos. Ora, temos de acabar com esta ineficiência! Por isso é que houve gradualismo na implementação desta medida, aliás, o Sr. Deputado Vieira de Castro, com quem falo disto há tantos anos, é também muito favorável a esta medida.
Este gradualismo traduz-se, obviamente, no fim desta grande injustiça, porém, não basta ficar por aqui, pois não há apenas a tentativa de penalização de uma categoria de veículos. Já várias vezes foi anunciado e repetido pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que, para o ano, haverá um grupo de trabalho para proceder à revisão de toda a tributação automóvel, a qual, eventualmente, poderá ser implementada em 2002, e o mesmo foi dito à Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Temos de pensar que tipo de tributação nos leva a uma política mais eficiente para o sector automóvel e para o sector dos transportes, pois estão em causa não só os automóveis de maior cilindrada como também outro tipo de veículos. Este grupo parlamentar apresentou, no ano passado, e o mesmo já aconteceu noutros Orçamentos do Estado, propostas muito significativas de desoneração da tributação sobre veículos movidos a electricidade - e vão aparecendo alguns, aliás, várias empresas públicas estão a implementá-los nas suas frotas - e veículos movidos a energias alternativas, como o gás natural, o GPL, etc.
Obviamente, há que incentivar estas iniciativas, pelo que o Grupo Parlamentar do PS apresentará propostas em sede do Orçamento nessa matéria, aproveitando para dar um sinal claro de que não se trata de castigar um grupo mas, sim, de reorientar a produção e a venda para o que é mais eficiente no mercado, até porque é essa também a opção do Governo.
O Sr. Deputado Rui Rio fala no descalabro, na desgraça que pode acontecer a quem comercializa este tipo de veículos, mas julgo que terá noção dos equilíbrios de mercado, até porque já passámos por outras situações idênticas. Por exemplo, quando foi aprovado o fim da gasolina com chumbo, aliás, com ajuda da Comissão de Assuntos Europeus, que se debruçou sobre a matéria, a qual estava em co-decisão nas instituições comunitárias, parecia que também vinha o descalabro, que seriam despedidos tantos e tantos empregados das empresas petrolíferas, mas, afinal de contas, nada disso aconteceu, tendo havido um aumento da eficiência, e, hoje, respiramos melhor. Assim, é bom que andemos também mais depressa quanto a esta matéria.
Portanto, tudo se adequa às regras de mercado. Quem importa e quem comercializa esse tipo de veículos poderá, obviamente, explorar outros segmentos de mercado mais rentáveis e mais eficientes para todos, até do ponto de vista social, ligados a outro tipo de veículos. De qualquer modo, haverá sempre quem compre estes veículos, embora, naturalmente, com preços acrescidos, pois que já não terão uma fiscalidade destorcida.
Gostava de aproveitar esta ocasião para perguntar ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais se pensa incluir, ou se já estão incluídas, no grupo de trabalho para a revisão da tributação automóvel, dado que disse à Sr.ª Deputada Isabel Castro que se tratava de uma matéria essencial e que, nesse âmbito, se pensaria nos veículos de todas as cilindradas, associações de defesa do consumidor, associações ambientalistas, nomeadamente até o Automóvel Clube de Portugal, e não apenas os produtores ou os importadores.
Penso que é importante termos todos os interessados envolvidos nesta matéria, que não diz respeito apenas a quem comercializa, vende ou fabrica automóveis mas também a quem os consome, a quem os vai guiar e a quem sofre a sua incidência

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todos os dias, por exemplo, os peões. Isto é também fundamental para uma estratégia de poupança de energia.
Quanto a outras energias, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento referiu as auditorias feitas aos hotéis, mencionando a ideia de poupança de energia ou o cálculo dos custos alternativos quando estão a ser dados incentivos às energias renováveis.
Obviamente, há um consumo de electricidade maior no Verão devido à utilização de aparelhos de ar-condicionado, mas tudo depende dos incentivos. Há pouco, ficámos preocupados com a ideia de a EDP fazer anúncio de aparelhos de ar-condicionado nas facturas que envia aos seus clientes, até dando facilidades de crédito para a compra desses aparelhos. Desta forma, dar-se-ia um incentivo ao consumo de electricidade, pelo que, sendo essa empresa detida na maioria por capitais públicos, aliás, até já fizemos um requerimento ao Ministério da Economia quanto a esta matéria, não nos parece estar a ser utilizada da melhor forma a função accionista do Estado para publicidade desse tipo de energias. Há que apostar, isso sim, na função accionista do Estado para a promoção daquilo que é difícil, ou seja, para a abertura do mercado às energias renováveis.
Assim, gostaria de perguntar aos Srs. Secretários de Estado do Orçamento e dos Assuntos Fiscais se estão previstas, em sede orçamental e, mais tarde, com a reforma fiscal, incentivos concretos, utilizando a função accionista do Estado - o que pertence ao Ministério da Economia mas, com certeza, haverá uma coordenação grande entre os dois Ministérios -, para abrir determinados mercados e criar determinados incentivos que, depois, se alargam ao mercado privado e que são, de facto, uma forma de ir alterando a estrutura da energia e a eficiência energética em Portugal.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, em primeiro lugar, quero confirmar, agradecendo, que já recebemos, por parte do Governo, a alteração relativamente ao erro de 30 milhões de contos, que consistia em inscrever no relatório do Orçamento do Estado uma receita de privatização que não existia, relacionada com o dinheiro que deveria ter entrado na TAP por via da Swissair mas que não entrou.
Sr. Ministro, gostaria de saber se se tratou de um mero erro de relatório, sendo, portanto, suficiente a rectificação do mesmo, ou se este erro tem repercussões nos mapas, seja na estimativa de receitas das privatizações para 2000, seja nas receitas das privatizações para 2001, porque a estimativa passará para 2001, ou no cálculo da redução da dívida pública.
Portanto, gostaria de saber se este erro provoca alterações também em mapas ou se é exclusivamente um erro de relatório. De facto, não se trata de um erro menor, pois estão em causa 30 milhões de contos, o qual, porventura, não terá consequências só no relatório mas também nos mapas e, se assim for, haverá mapas que têm de ser rectificados. Gostaria de ter um esclarecimento da equipa governamental quanto a esta matéria.
A minha segunda questão tem a ver com um aspecto que estávamos a pensar abordar apenas em sede de Plenário, mas, como todos os Deputados estão a abordá-la, não deixaremos de a referir também. A minha questão refere-se ainda ao "romance" do imposto automóvel.
Congratulo-me pelo facto de o Governo, o PS e, em particular, o Sr. Deputado Francisco Torres, terem decido assumir, neste ano, esta alteração, porque, no ano passado, votaram contra a proposta que o PCP apresentou no Orçamento do Estado visando a alteração do imposto automóvel para veículos de todo-o-terreno nos termos em que o Governo agora propõe.
Portanto, é bom que os pecados sejam redimidos em vida, mas, já agora, que não sejam redimidos assumindo-se isso como a grande vanguarda das alterações e a grande descoberta, por parte da bancada do PS, de uma coisa contra a qual votaram no ano passado, exactamente o Sr. Deputado Francisco Torres e outros, e que o PCP propôs no Orçamento do Estado. Mas enfim, ainda bem que isto hoje acontece, porque o que é preciso é que todos nos encontremos, "as boas almas nas boas soluções", mais cedo ou mais tarde.
Sr.ª Presidente, eu queria guardar esta questão para o Plenário - e, naturalmente, voltaremos a ela -, no entanto, tenho de dizer que todo este imbróglio é da exclusiva responsabilidade do Governo. O Executivo tem na sua mão, por decisão tomada no Orçamento do Estado para 1997, por proposta também do PCP, um relatório e um estudo que lhe foram entregues nessa altura e que, na prática, encerram o que deve ser a alteração global estrutural do imposto automóvel. Como o Governo meteu o relatório na gaveta, faz alterações casuísticas, sendo que cada vez que isso acontece "tapa aqui", "destapa acolá", como, aliás, é visível em toda a argumentação exposta.
Por exemplo, o Sr. Secretário de Estado Ricardo Sá Fernandes descobriu que a eliminação do terceiro escalão poderia ser uma forma de compensar o aumento sobre os jipes, mas, já agora, diga também que essa alteração vai fazer com que os portugueses, a partir de Janeiro, possam comprar um BMW 750, de 5379 cm3, por menos 1949 contos e que passem a comprar um Ferrari, de 5464 cm3, por menos 2015 contos. Se eu quiser renovar o meu Renault Mégane, vou ter de pagar, pelo menos, mais 18 contos.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, não é só o problema de compensação dos jipes, porque o senhor compensa os jipes e reduz 2000 contos para quem quer comprar uns Ferrari e uns BMW. Não tem sentido! São alterações casuísticas, pontuais, "mantas de retalhos", que não têm qualquer sentido, Sr. Secretário de Estado. Enquanto não alterarem, de facto, global e estruturalmente, o imposto automóvel, "tapa aqui", "destapa acolá".
O Sr. Secretário de Estado falou nas pick-up, mas eu dou-lhe o exemplo dos furgões ligeiros que diariamente são utilizados pelos pequenos comerciantes de frutas e legumes ou pelas pequenas empresas de construção civil como viaturas de trabalho e que também são, agora, penalizados por estas alterações casuísticas. Admito, e até podemos vir a fazer uma proposta para apresentar na especialidade (enfim, é uma questão a reflectir), que podemos excluir destes agravamentos de tributação, no que toca às pick-up e aos veículos automóveis ligeiros e aos derivados, aqueles que, com carácter de habituabilidade e forma predominante ou exclusiva, se dediquem às actividades económicas. Era, aliás, a fórmula que constava na proposta de alteração legislativa inicial do Governo. Agora, faço-lhe uma pergunta: como é que o Governo vai fiscalizar isso?
Sr.ª Presidente, era apenas para deixar esta nota, à qual voltaremos, seguramente, aquando da discussão em Plenário. Estamos de acordo com estes problemas que temos em cima da Mesa. Aliás, fomos nós que tivemos a originalidade - já agora, o seu a seu dono - de tomar a iniciativa de que é preciso acabar com esta fraude fiscal que constitui uma utilização da redução do imposto automóvel para veículos todo-o-terreno, ferindo a originalidade com que o imposto foi criado.
O Governo acordou tarde e acordou mal, porque, em vez de apostar na alteração global do imposto, passando o imposto automóvel a ser tributado não inicialmente mas ao longo da vida do veículo, não o fazendo, caindo nesta redução pontual,

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cria novos problemas para os quais dificilmente encontrará uma solução.
Por isso, aguardaremos que, rapidamente, o Governo apresente à Assembleia da República - e, pela nossa parte, iremos acentuar essa ideia no Orçamento - a proposta de lei que reformule globalmente o imposto automóvel, para não andarmos nesta trapalhada.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, porque, incompreensivelmente, ou talvez não, se quis que só houvesse reforma fiscal havendo Orçamento, estamos na situação irónica de estar a discutir o Orçamento no pressuposto da reforma fiscal que irá haver, o que, de facto, tem o seu quê de ironia.
Nesse contexto, queria referir-me a dois aspectos ligados à receita e que têm a ver, de alguma maneira, com a problemática dos mercados de capitais. Suponho que será pacífico aceitarmos todos que o mercado de capitais dinâmico é essencial para uma boa economia e para incentivar a economia, e não vou gastar mais tempo a demonstrar que isso é importante, porque, com certeza, os senhores estão conscientes, como eu, desse facto.
Em primeiro lugar, quanto ao englobamento dos dividendos para o cálculo do IRS, damo-nos conta de que, no fundo, se colocam três situações típicas: a primeira é a de muito baixos rendimentos comparados com os dividendos, pelo que o que venha a afectar esses baixos rendimentos comparados com os dividendos é completamente marginal; a segunda situação extrema é a de altos rendimentos já tributados à taxa máxima, pelo que a afectação do englobamento é nula; e uma terceira situação intermédia que é a da classe média que, tendo a taxa que tiver, a pode ver agravada pelo simples facto de englobar para o cálculo os dividendos, o que, na minha opinião, significa que esta medida é claramente desincentivadora do chamado "capitalismo popular" (se assim quiser) de alargar o interesse das classes médias em, em vez de consumir, investir, porque é perfeitamente compreensível que as pessoas pensem: "vou ser agravado nos meus rendimentos de trabalho, porque tenho uns rendimentos de um investimento que resolvi fazer em alternativa a consumir". Assim, quanto ao papel essencial que a motivação da classe média para o investimento, na minha opinião, deve ter, pergunto se, efectivamente, este aspecto é susceptível, ou não, de revisão.
A segunda questão que quero colocar é em pólo oposto à primeira e tem a ver com os reinvestimentos das mais-valias nas SGPS. A vocação das SGPS, enquanto sociedades gestoras de participações sociais, é a de, por via indirecta, gerir actividade económica. Na sua filosofia, está, ou deveria estar, que os rendimentos que obtenha da sua actividade, e quando de alienações, devem, prioritariamente, ser utilizados para criar mais actividade económica, para gerar mais desenvolvimento.
Por outro lado - e não podemos ter ilusões de que os investidores, sejam portugueses ou estrangeiros, investem onde lhes é mais rentável e mais atractivo -, deveria ser considerado este aspecto da atractibilidade dos investimentos. Sei que nos reinvestimentos das SGPS havia algumas situações peculiares. Quando, por exemplo, uma SGPS detém várias empresas e, pura e simplesmente, reinveste numa dessas empresas num aumento de capital e essa empresa fica com o capital imobilizado, não desenvolvendo actividade económica, estamos perante uma entorse ao espírito da lei. Penso que estes aspectos são perfeitamente salvaguardáveis se se definir o que é que terá de ser feito com o produto do reinvestimento nas empresas que são dominadas. É claro que me poderão perguntar o que é que acontecerá se, entretanto, a SGPS vender a empresa dominada. A isso, respondo de uma maneira muito clara: contratualmente, quem aliena, deve ficar ciente de que, ao alienar, se aquela condição da utilização do montante do reinvestimento não for utilizada, vai ser penalizado por isso. Considero este aspecto também muito importante.
Como vêem, são duas questões de âmbitos diferentes. Agradecia os comentários que me queiram fazer sobre a matéria.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, gostaria apenas de dizer que, tendo em conta as respostas que foram dadas pelo Governo sobre a questão dos deficientes, vamos entregar duas propostas: uma, a repor a situação no que concerne à percentagem dos 60%, e outra, relativa à questão do apoio aos grandes deficientes.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente: - Para terminar esta ronda de perguntas, gostaria também de pedir um esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Sr. Secretário de Estado, vejo que, na transferência das verbas para a segurança social, existe uma parcela de 43,3 milhões de contos em activos. Este montante não surge, como não deverá surgir, nas contas consolidadas e a soma das receitas também não o inclui. Será que isto significa que o défice está aliviado deste valor? Onde é que está este montante de transferência?
O Sr. Secretário de Estado desculpe, mas vamos ter de respeitar a ordem das perguntas e a minha foi a última.
Vou dar a palavra ao Sr. Ministro das Finanças para responder.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Presidente, responderemos em conjunto às várias questões que foram colocadas.
Sobre a consequência nos mapas do Orçamento pela alteração da qualificação da situação da TAP, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, Manuel Baganha, vai esclarecer.
As questões colocadas pelo Sr. Deputado Machado Rodrigues são realmente importantes, pelo que vou começar por dar algumas respostas que serão completadas pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Realmente, há essa relação que o Sr. Deputado referiu entre o Orçamento e a reforma fiscal, ou seja, há elementos da reforma fiscal, nomeadamente o desagravamento, que, conforme sempre dissemos, só poderiam ser concretizáveis no Orçamento para 2001 desde que houvesse Orçamento. Também é evidente que, nomeadamente, no que respeita à criação e à implementação, já em 2001, de novos mecanismos de combate à fraude e à evasão fiscais e de novos mecanismos que constam da reforma fiscal, entre os quais os do englobamento, é muito importante que a discussão na especialidade e a aprovação final da proposta de lei, designadamente quanto à reforma da tributação de rendimento, andem, nesta Assembleia, a um ritmo acelerado.
Naquilo que ao Governo compete - e, neste momento, mais não compete do que apelar a todos os grupos parlamentares - é nosso entendimento, nosso interesse e nossa estratégia que seja possível à Assembleia concluir a discussão na especialidade e realizar a aprovação final desta proposta de lei, a tempo de ela ser plenamente implementável no exercício de 2001, num conjunto

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muito denso de relações que tem com a proposta orçamental, nomeadamente no que respeita ao lado da receita.
Em relação às questões que o Sr. Deputado Machado Rodrigues colocou sobre o reinvestimento das mais-valias nas SGPS e a algumas alterações que se fazem e que têm sempre a mesma matriz de preocupação, que é a de maior rigor e também de combate a situações de abuso - que, aliás, o Sr. Deputado, de alguma forma, referiu e qualificou -, penso que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Ricardo Sá Fernandes, pode, melhor do que eu, fazer uma abordagem e dar uma explicação aprofundada sobre o caminho que nos propomos desenvolver, as razões por que nos propomos desenvolver esse caminho e, também, a margem que temos para, dentro desse caminho, acolher precisões, melhorias ou melhores tipificações no sentido daquilo que referiu.
A questão do englobamento é uma questão de filosofia. Faz parte do Programa do Governo, faz parte dos compromissos que fomos assumindo aqui, na Assembleia da República, nomeadamente nas várias intervenções que fiz sobre essa matéria, procurar começar-se, de uma forma gradual, a superar aquilo que não chamaria de "pecado original", mas "distorção original" de que o IRS foi alvo, aquando da sua criação. A criação do IRS correspondeu a um princípio de tributação de todo o rendimento, independentemente das fontes desse rendimento. Nas circunstâncias em que essa importantíssima alteração do nosso sistema tributário foi feita, no final da década de 80, foi, realmente, justificável a necessidade de haver algumas entorses ou algumas não concretizações, através da isenção de englobamento de um conjunto de rendimentos tipificados na lei. Pareceu-nos que esta era a altura de começar a corrigir ou a superar essas distorções de origem, que, ao fim e ao cabo, correspondem à necessidade de termos uma fotografia fiscal mais completa da situação de rendimento de cada contribuinte e uma tributação feita pelo conjunto de rendimento.
Como o Sr. Deputado sabe, mesmo a superação desta entorse originário não foi global; há rendimentos para os quais continua a haver taxas liberatórias. No debate que tivemos no outro dia, o Sr. Secretário de Estado Sá Fernandes pôde explicar o porquê disso, nomeadamente em relação aos rendimentos com depósitos a prazo e obrigações de títulos de dívida pública, e isso também pode e deve ser encarado como uma medida de estímulo à poupança, através desses instrumentos. Na verdade, pensamos que é bom e é correcto haver um princípio de correcção dessa distorção originária e deixar que o tempo permita que, numa fase posterior, porventura já não connosco, se chegue à versão originária e mais pura da tributação do rendimento, englobando todas as fontes desse mesmo rendimento.
No que respeita à questão colocada pela Sr.ª Presidente, peço à Sr.ª Presidente que dê a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, Fernando Pacheco, para responder.

A Sr.ª Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr.ª Presidente, essa operação de 43,3 milhões de contos (não me lembro da expressão que utilizou, mas penso que disse "operação") é uma transferência de activos para o Fundo da segurança social.
Penso que a sua dúvida é a de saber se este valor deveria, ou não, estar registado na transferência para a segurança social em termos de efeitos, designadamente, sobre o défice. O que temos aqui é uma redução do valor da transferência de 43,3 milhões de contos, mas sem efeito sobre o défice, porque não haveria despesa. Ou seja, isto seria saldo da segurança social, portanto, não havendo despesa, o efeito sobre o défice era nulo. E, na prática, o que haveria, depois, era uma aplicação deste saldo no Fundo da segurança social, que é precisamente o que se está a fazer agora. Está a transferir-se os activos directamente, em vez de gerar saldo e aplicar saldo.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por o estar a interromper, mas gostaria que me esclarecesse se este montante a transferir para a segurança social, sem os 43,3 milhões de contos, cumpriria, ou não, a transferência total do Orçamento para a segurança social.

O Orador: - Sr.ª Presidente, o valor que resultaria da aplicação da Lei de Bases requer estes 43,3 milhões de contos.

A Sr.ª Presidente: - Exactamente! Esse é o meu ponto. Portanto, se requer, tinha de estar no Orçamento. Se não está no Orçamento, porque foi por uma via que não é contabilizável no Orçamento, estamos perante uma suborçamentação ou uma desorçamentação de uma forma expedita - e penso que é imaginativa -, mas que, efectivamente, reduz o défice em 43,3 milhões de contos. O Governo cumpre, ou não, a Lei de Bases da Segurança Social - isso é uma opção do Governo -, mas, se cumpre, estes 43,3 milhões de contos tinham de, seguramente, ter tradução no défice orçamental. Se, por hipótese imaginativa - ainda mais imaginativa -, em vez dos 43,3 milhões de contos, o valor fosse fossem muito superior, até, o total da transferência, quer dizer que se cumpria a Lei e, simultaneamente, não havia um défice. Não pode ser, não é?

O Orador: - Sr.ª Presidente, mantenho aquilo que disse: o efeito sobre o défice é "zero", porque, precisamente, não há despesa, a despesa não existe.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, não tenho dúvidas de que é "zero".

O Orador: - Isso requereria, no limite da interpretação que a Sr.ª Presidente estava a dar, que toda a transferência para a segurança social fosse apenas para capitalizar, ou seja, que não houvesse encargos com os regimes não contributivos, etc. Portanto, haveria sempre claramente um tecto ao valor desta transferência de activos.
A leitura que foi feita pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade e pelo Ministério das Finanças é a de que não resultava daqui incumprimento da Lei de Bases, porque não é essa a intenção.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, penso que há o cumprimento da Lei de Bases.

O Orador: - A Sr.ª Presidente está a dizer que há cumprimento?

A Sr.ª Presidente: - Sim! Mas há um cumprimento em que uma das parcelas, ao não ter efeito sobre o défice - como diz e bem, não tem de lá estar -, efectivamente, corresponde a uma redução artificial desse défice, porque é feito por uma técnica que não leva à contabilização. Portanto, o meu ponto é só esse. É que o défice, neste caso, é mais uma das parcelas, que, por acaso, lhe chamámos a atenção, de desorçamentação.

O Orador: - Sr.ª Presidente, se tomarmos o conjunto do SPA, temos uma transferência para o orçamento da segurança social.

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Ora, isso significa que, não havendo despesa, há um valor do outro lado do balanço que anula este, isto é, o resultado sobre o défice é "zero".

A Sr.ª Presidente: - Eu sei! Exactamente!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, se me permitir que eu "meta a colher"…

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, em termos do SPA, o défice não altera, mas em termos de Conta Geral do Estado o défice está subavaliado em 43,3 milhões de contos. Por isso, há aqui, no mínimo, uma questão de transparência.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Dá-me licença, Sr.ª Presidente?

A Sr.ª Presidente: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, aquilo que está a dizer é absolutamente verdade. Ou seja, ao transferir para a segurança social 43 milhões de contos há, na óptica do subsector "Estado", uma redução de despesa de 43,3 milhões de contos. Isso é verdade! Isto não tem é tradução em termos de despesa pública. Se estamos a falar em termos de transparência, como disse, uma coisa que não se materializa em despesa também não deve contar como receita.
Porém, se essa questão é colocada pela Assembleia da República e se esta acha que este procedimento não é correcto - e adianto que não há qualquer intenção de desorçamentação, porque tudo isto é explicado e está mais do que claro no relatório -, se se considera que esta não é a melhor técnica orçamental, então, pode estudar-se este assunto. O Sr. Deputado terá…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, já agora, coloco a questão de um ponto de vista mais geral: existem, neste Orçamento, previsões de transferências para indemnizações compensatórias ou para aumentos de capital através de activos financeiros? Porque, se existem, como existiram em anos anteriores, este problema agrava-se em termos do montante.

O Orador: - Sr. Deputado, há transferências do Fundo de Regularização da Dívida Pública para empresas, como tem sido feito todos os anos e com o enquadramento legal que tem sido feito todos os anos. Mas isto não é uma prática deste ano nem do ano passado. É evidente que isso existirá. Agora, não tem é de ser confundido…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E fora do Fundo!

O Orador: - Fora do Fundo, não! A única operação que corresponde a uma diferença em relação à prática do passado é esta que aqui está e que está devidamente documentada, é explicada e é comentada. Não se põe, penso eu, a questão de tentar esconder alguma coisa. Não é isso que está em causa! Pareceu-nos que era a maneira mais correcta de tratar a questão, uma vez que o que está em causa é a capitalização da segurança social e, transferindo os activos, há alguns ganhos de eficiência. Isto porque há custos que são evitados no processo, além de não ter de se ir ao mercado de capitais, que é aquilo que faz regularmente a segurança social no final do ano para adquirir títulos de dívida pública ou de outra natureza. Não há essa perturbação de mais 40 e tal milhões de contos no mercado de capitais.
No fundo, a preocupação que teria sempre de haver é a de serem activos sólidos e com um bom rendimento para poderem estar a capitalizar na carteira da segurança social, a qual, como o Sr. Deputado sabe, está obrigada a ter determinadas percentagens de cada tipo de activos. Essa era a nossa preocupação.
A preocupação de transparência é a de o próprio relatório ter tudo explicado aqui e a razão por que isto não tem qualquer impacto no défice. Foi só isto! Não há qualquer intenção… Enfim, não vou citar aqui a Ordem da Jarreteira, porque não faz qualquer sentido.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr.ª Presidente, acerca da última afirmação do Sr. Secretário de Estado, ou eu não a entendi bem… É que não percebo como é que não tem impacto no défice. O normal cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social tem impacto zero no défice, porque o montante sai como despesa do Orçamento do Estado e entra como receita na segurança social, portanto o défice global ficou nulo.
O que aconteceu aqui, tanto quanto estou a perceber, é que há uma receita de 43,3 milhões de contos na componente "segurança social", sem que haja uma despesa do Orçamento do Estado. Ora, isto no fim dá uma vantagem de 43,3 milhões de contos ao défice. Foi assim que entendi e por isso não é compaginável com a última afirmação do Sr. Secretário de Estado.
Agora, se me disser: "Não, não! Está mal, porque a despesa está inscrita ali, naquele sítio, e portanto anula com a receita". É como o normal cumprimento da lei ou não cumprimento da lei. Para efeitos do défice global, cumprir a lei ou não cumprir a lei é indiferente. Neste caso concreto, não me parece, salvo melhor explicação.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: - Sr. Deputado Rui Rio, o que eu disse foi muito simples: numa primeira fase, há uma despesa de 43,3 milhões de contos, verba esta colocada na segurança social com uma determinada finalidade. No Orçamento do Estado, subsector "Estado", na rubrica "Transferência", há uma despesa e há uma receita no orçamento da segurança social. Portanto, as duas coisas, no SPA, equilibram.
Depois, o que acontece? Depois, há uma aquisição de activos financeiros, que, na prática, não é aquisição mas, neste caso, uma transferência. Ora, os activos financeiros não contam para o défice, o que significa que o efeito sobre o défice é "zero", porque há uma receita que anula com uma despesa. Há, sim, depois, a aquisição destes activos, que ficaram a capitalizar na carteira da segurança social.
O que o Sr. Deputado Octávio Teixeira estava a dizer, no seguimento da observação da Sr.ª Presidente da Comissão, é que se eu olhar para o subsector "Estado", aqui é que eu tenho um efeito, e isso é verdade. Mas este efeito resulta apenas de estarmos à procura de um mecanismo, que me pareceu o mais adequado, de dotar a segurança social de uma carteira de capitalização, que é aquilo que, no fundo, é o objectivo. Isto será um

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saldo da segurança social. Isto é, um valor que vai exceder e que a segurança social não vai ter como despesa e que será, pelo menos, de 43 milhões de contos. Aliás, poderá ser mais elevado do que 43 milhões de contos, mas, neste momento, sabe-se que será, pelo menos, esta quantia.
Nesse sentido, Sr. Deputado, não há efeitos sobre o défice, aliás, penso que é a opinião que todos aqui partilhamos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças: - Sr.ª Presidente, quanto ao efeito que pode ter na contabilização o erro dos 34% da venda da TAP ao parceiro estratégico Swissair, quero referir, em primeiro lugar, que, como já foi dito, esta operação de privatização não se traduz num encaixe uma vez que se trata de uma operação de aumento de capital. Por conseguinte, na pág. 143 do relatório do Orçamento do Estado não deveria aparecer a palavra "encaixe". Isso é apenas um lapso de escrita nessa página, não tem qualquer impacto em qualquer dos quadros seguintes, dado que em todos os restantes quadros está considerado como se isso fosse realmente a operação que é. Portanto, repito, isso é apenas um erro de escrita nessa página e nada mais do que isso, pelo que não tem qualquer impacto em termos dos quadros.
Já agora, um outro aspecto relacionado com a questão dos 34% da venda TAP: a razão por que aparece indicada essa operação, embora a sua concretização esteja dependente de uma aprovação da Comissão Europeia, é apenas porque o Governo está convencido de que a operação foi correcta e de que vai ser aprovada pela Comissão. Como a operação foi feita este ano, aparece no relatório relativamente à actividade deste ano. Porém, em termos de impacto dos quadros, não aparece esta operação e, por conseguinte, os quadros estão correctos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, gostaria de prestar três esclarecimentos.
Relativamente à questão suscitada pelo Sr. Deputado Francisco Torres, é evidente que o grupo de trabalho tem prevista a audição de associações de consumidores e de defesa do ambiente. Elas não fazem parte da composição inicial do grupo de trabalho porque se pretende uma estrutura mais leve e mais simples, sem muita gente, mas está previsto no próprio despacho que seja feita essa audição, indispensável numa reforma do imposto automóvel. A reforma do imposto automóvel tem que ter em conta as implicações ambientais. Essas preocupações são fundamentais e têm que estar presentes, repito, na reforma do imposto automóvel.
Estou de acordo com o Sr. Deputado Lino de Carvalho quando diz que a reforma do imposto automóvel tem que ser global, porque este imposto é uma "criatura" distorcida, iníqua e tem de ser revista, tendo em conta, designadamente, essas propostas anteriormente formuladas e que serão ponderadas.
Agora, o que não me parece que seja lógico é inserir essa reforma global no quadro do Orçamento do Estado. A filosofia que o Governo está a imprimir nessas matérias é a de que as reformas globais dos impostos sejam feitas em diplomas autónomos, como deve ser feito, e, no Orçamento, fazem-se ajustamentos pontuais, mas parece que o Sr. Deputado está de acordo que não era em sede de Orçamento do Estado que se tinha que fazer a reforma global do imposto automóvel. O Governo tem o compromisso perfeitamente assumido e firme de entregar até dia 31 de Março do próximo ano, nesta Assembleia, a proposta de reforma do imposto automóvel. O grupo de trabalho está constituído para, até ao princípio de Fevereiro, apresentar propostas ao Governo e a mim próprio nessa matéria.
Agora, se não vamos fazer em sede orçamental a reforma do imposto automóvel, acha o Sr. Deputado Lino de Carvalho que não se deveriam fazer essas alterações pontuais? Ou seja, quase que o vi dizer: "Então, deixemos lá os jipes até à reforma"!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não ouviu nada!

O Orador: - Ouvi, ouvi!
No fundo, se dissesse tudo o que estava na sua lógica, seria: "Então, não vamos fazer a alteração pontual no que respeita aos jipes". É aquilo que se retira daquilo que disse.
Ora, nós entendemos que devemos fazer a reforma do imposto automóvel neste quadro global, mas que agora há ajustamentos pontuais que se deveriam fazer e um desses é o dos jipes.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O que nós propusemos no ano passado e que vocês chumbaram!

O Orador: - Fazemo-lo agora, Sr. Deputado.
Passo, agora, às questões que o Sr. Deputado Machado Rodrigues colocou. São elas de dois tipos.
Quanto ao facto de se considerar os dividendos no englobamento, devo dizer que não se trata de nenhuma profissão de fé do Governo. Numa intervenção anterior, tive já oportunidade de dizer que é das matérias relativamente às quais tenho as maiores dúvidas. Nós sabemos que, do ponto de vista dos princípios - e é para aí que devemos caminhar -, devemos englobar tudo. Temos uma questão, que neste momento nos parece fundamental, que é a de não mexer nos juros dos depósitos bancários. Por força disso, também não devemos mexer nas obrigações e pareceu-nos razoável e equilibrado que, relativamente aos dividendos, tivéssemos uma situação intermédia. Ou seja, eles contam para a determinação da taxa, mas continuam a ser tributados à taxa liberatória. Como todas as posições de equilíbrio, há argumentos a favor e há argumentos contra. Esta pareceu-nos uma solução equilibrada, mas que fique claro que não se trata de uma profissão de fé do Governo nesta matéria. É uma solução equilibrada, mas, repito, sabemos que há argumentos a favor e argumentos contra esta solução e somos sensíveis a essa argumentação.
Relativamente à tributação das mais-valias, é, de facto, uma das matérias mais importantes introduzidas no regime do IRC, matéria relativamente à qual as propostas que existiam quer do Partido Comunista quer do Bloco de Esquerda nem tocavam. Nós entendemos que deveríamos tocar nessa matéria, porque é uma matéria relativamente à qual se tem introduzido planeamentos fiscais abusivos. Circunscrevendo-nos à análise do exercício de 1998, sabemos que o resultado contabilístico das empresas está influenciado por 695 milhões de contos de mais-valias resultantes de transmissão de bens do activo imobilizado e, desses 695 milhões de contos, apenas 215 milhões de contos influenciam a base tributável. Ou seja, há 480 milhões de contos que têm vindo a aproveitar de um regime de roll-over permitido pelo regime actualmente vigente.
Ora, tendo em conta que o lucro tributável dos sujeitos passivos nesta categoria é de 2,520 milhões de contos, há uma percentagem muito significativa, cerca de 1/5 da base tributável, que tem vindo a beneficiar de um regime de roll-over, que não

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foi aquele para o qual foi criado o regime do artigo 44.º do Código do IRC. Ou seja, tínhamos que alterar esta situação, porque, no fundo, tínhamos prometido um regime que era de deferimento das mais-valias, mas que estava a ser aproveitado para um deferimento indefinido.
A solução proposta é equilibrada, é uma solução que diz: "Não! Vamos continuar a permitir o deferimento, mas apenas por cinco anos. Não vamos permitir essa situação ilimitada." Portanto, vamos permitir o deferimento da tributação das mais-valias, como é justo que se faça, mas doseado ao longo de cinco anos.
Esta é, para nós, uma questão de princípio. Todavia, também lhe digo que, relativamente às mais-valias "dormentes" que foram acumuladas ao longo de anos, não somos insensíveis à necessidade de introduzir um regime transitório nessa matéria que tenha em conta algumas das preocupações que o Sr. Deputado Machado Rodrigues referiu. Portanto, essa abertura fica feita.
Agora, a questão de princípio de que este regime tem que ser alterado no quadro desta filosofia é, para nós, uma questão central da reforma da tributação das pessoas colectivas, que queremos introduzir.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, resta-me agradecer a presença do Sr. Ministro das Finanças e dos Srs. Secretários de Estado, bem como dos Srs. Deputados.
A próxima reunião realiza-se segunda-feira, dia 13, com início às 9 horas e 30 minutos, sendo a primeira audição com a equipa do Ministério do Trabalho e da Solidariedade.
Está encerrada a reunião.

Eram 12 horas e 50 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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