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Terça-feira, 25 de Outubro de 2005 II Série-C — OE — Número 1
X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 24 de Outubro de 2005
SUMÁRIO No âmbito da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 40/X — Orçamento do Estado para 2006 —, as equipas governamentais dos Ministérios de Estado e das Finanças e da Economia e da Inovação apresentaram à Comissão os respectivos orçamentos, tendo ainda prestado esclarecimentos sobre os mesmos aos Srs. Deputados.
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O Sr. Presidente (Patinha Antão): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 9 horas e 45 minutos.
Em meu nome, da mesa e, certamente, de todos os Srs. Deputados que compõem a Comissão de Orçamento e Finanças, damos as boas-vindas ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
É a primeira que V. Ex.ª está em audição na Comissão de Orçamento e Finanças, pelo que desejamos-lhe o maior sucesso no cumprimento das suas responsabilidades. Estes votos são também extensivos à equipa dos Srs. Secretários de Estado, pois alguns dos Srs. Secretários de Estado também estão aqui pela primeira vez em audição em sede de debate do Orçamento.
Sr. Ministro de Estado e das Finanças, no âmbito da Lei de Enquadramento Orçamental, que rege as nossas responsabilidades, à Assembleia da República cabe realizar o controlo político da proposta de lei do Orçamento do Estado, sendo que a discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado é um momento muito alto do ano parlamentar.
As responsabilidades que a Assembleia da República tem neste domínio são de valor reforçado no âmbito das suas competências gerais e é, pois, desnecessário enfatizar a importância do Orçamento do Estado como grande momento de apresentação das políticas públicas na sua totalidade e dos respectivos meios que estão disponibilizados para a realização desses objectivos, razão pela qual a importância deste debate não precisa, pois, de ser enfatizada.
Efectivamente, é esperável que no decurso desta audição o Governo produza esclarecimentos adicionais e quantificações, para além daquelas que já são conhecidas não só na proposta de lei como no debate que tem sido feito em sede da comunicação social. Portanto, é nesta evocação das responsabilidades extremamente exigentes que nos cabem a nós, parlamentares, como responsáveis por este debate político que termino esta curta intervenção, chamando agora a atenção para os aspectos de organização habituais neste tipo de audição.
Cabe ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças, como líder desta equipa e em nome do Governo, fazer a apresentação dos tópicos fundamentais que entende trazer-nos ao nosso conhecimento; seguem-se as intervenções de cada um dos porta-vozes dos partidos representados na Assembleia da República por ordem descendente da respectiva votação; depois o Sr. Ministro de Estado e das Finanças e a equipa governamental responderão a cada um desses porta-vozes; depois, seguir-se-á uma segunda ronda, em que faremos um agrupamento das questões em bloco, porventura de três ou quatro questões, e o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado responderão em bloco a cada um desses conjuntos.
Esta é, portanto, a modalidade habitual de organização da audição, com a qual, penso, todos estão de acordo.
Assim sendo, dou a palavra ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças para a sua intervenção inicial.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar esta apresentação das linhas de força da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006 recordando que o esforço da consolidação orçamental levado a cabo pelo Governo teve a preocupação de assentar num correcto conhecimento da verdadeira situação das finanças públicas em que o País se encontrava no início deste ano – aliás, tinha sido assumido um compromisso eleitoral de avaliação dessa situação real das finanças públicas.
Ora, na sequência desse compromisso, foi designada uma comissão presidida pelo Sr. Governador do Banco de Portugal que procedeu à referida avaliação, sendo que, creio, todos reconhecem a surpresa das conclusões a que essa comissão chegou.
Durante o debate eleitoral e o debate que se seguiu mesmo após o acto eleitoral, e ainda antes de esta comissão ter chegado às suas conclusões, a opinião pública e os especialistas estavam longe de imaginar que o nível de défice das contas públicas pudesse atingir o valor a que esta comissão chegou e que, recordo, era um valor da ordem dos 6,8% do Produto Interno Bruto (PIB).
Face a este diagnóstico e a esta projecção do que seria o défice em 2005, na ausência de quaisquer medidas correctivas, o Governo teve uma reacção pronta no sentido de, em primeiro lugar, apresentar à Comissão Europeia e ao Conselho Europeu um Programa de Estabilidade e Crescimento, em que se propôs reduzir esse défice abaixo dos 3% no ano de 2008, descrevendo a trajectória de ajustamento que nos próximos anos seria seguida pelo Orçamento e enunciando um conjunto vasto de medidas tendentes a sustentar a consolidação orçamental que se propôs levar a cabo.
De imediato, o Governo submeteu a esta Assembleia um Orçamento Rectificativo para 2005, no sentido de fazer face a algumas responsabilidades e a alguns problemas de natureza orçamental que foram identificados no âmbito da avaliação feita pela chamada Comissão Constâncio.
Nesse sentido, a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006, que o Governo submete a esta Assembleia, não é nem um ponto de partida e muito menos um ponto de chegada. É que a consolidação já começou em 2005. A redução do défice esperada, e que iremos concretizar em 2005, é, como referi, uma
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redução de 6,8% para 6,2% no final deste ano, com medidas de contenção da despesa e com um conjunto de alterações entretanto anunciadas e já introduzidas em matéria fiscal.
A consolidação vai prosseguir para além de 2005 e, assim, iremos reduzir o défice para 4,8% do PIB, em 2006, e, em 2008, atingiremos um défice de 3%.
Esta trajectória de consolidação orçamental que acabei de anunciar, bem como todo o conjunto de medidas que a suporta, constantes no Programa de Estabilidade e Crescimento, foram objecto de aprovação por parte da Comissão Europeia e mereceram uma recomendação favorável do Conselho Europeu, estabelecendo-se assim o nosso quadro de referência por nós adoptado e aceite a nível comunitário.
Muito embora o Orçamento do Estado para 2006 faça parte deste percurso de consolidação orçamental, gostaria de frisar que a proposta do Orçamento do Estado para 2006 é, no contexto deste esforço de consolidação, um marco decisivo. E porque é um marco decisivo, esta consolidação tem de ser credível e sustentável, sendo que, para isso, ela parte de uma base realista, como referi, no que diz respeito ao estado das finanças públicas, assenta num cenário macroeconómico realista e prudente – inclusivamente, revê em baixa, em comparação com o Programa de Estabilidade e Crescimento, as projecções de crescimento para o próximo ano – e representa quantitativamente o maior esforço de redução do défice previsto até 2008. No próximo ano, o ajustamento estrutural do défice será 1,6 pontos percentuais do PIB, constituindo a maior redução do desequilíbrio das contas públicas ocorrida nos últimos anos.
A proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006 define também uma nova estratégia de consolidação que corrigirá os desequilíbrios de uma forma sustentada, pois aposta na redução da despesa.
Gostaria de frisar que vária evidência empírica, vários estudos académicos sustentam a tese de que consolidações orçamentais para serem credíveis e sustentáveis devem assentar na redução da despesa. Ora, é nesta abordagem que procuramos fundamentar a nossa consolidação orçamental, por isso entendemos que esta consolidação deve assentar em reformas estruturais importantes.
O Orçamento que vos propomos é um Orçamento que não tem artifícios, não tem truques. Isto é, não recorremos a medidas de correcção extraordinária, as chamadas medidas one-off, que não permitem ganhos sustentáveis em termos de consolidação, e muito menos caímos na tentação de suborçamentar rubricas orçamentais.
Porque acreditamos, por estas razões e por estarmos perante um Orçamento credível, este Orçamento será susceptível de gerar confiança aos agentes económicos. É, de facto, um Orçamento que aposta na redução do peso da despesa, na redução do peso do Estado e, nesse sentido, liberta a iniciativa privada, dando espaço para que a iniciativa privada se revele e leve a cabo iniciativas de investimento susceptíveis de gerarem maior riqueza e maior emprego na economia. E por que razão este Orçamento é credível? Permitam-me que vos recorde um princípio basilar de finanças públicas: é a dinâmica da evolução da despesa que acaba por determinar a dinâmica da receita.
A evolução da despesa nos últimos anos tem sido de um crescimento contínuo. Por exemplo, nos últimos três anos, a despesa corrente primária aumentou, em média, em cada ano, 1,1 pontos percentuais do PIB. Por este andar, só há um limite: o próprio PIB. Aqui não é caso para dizer que «o céu é o limite»; neste caso, o limite é o próprio PIB. E se esta evolução da despesa não parar, o Estado acabará por absorver, através da despesa, a globalidade do produto. Ora, como já referi, a evolução da receita é, a longo prazo, determinada pelo nível da despesa, pelo que o Estado, das duas uma, ou faz pagar a presente geração este aumento continuado da despesa, agravando os impostos sobre esta geração, ou passa o pagamento desta despesa para as gerações futuras, comprometendo o crescimento e o bem-estar dos nossos filhos ou dos nossos netos.
Mais grave: o Estado não poderá, em boa verdade, garantir às portuguesas e aos portugueses que os custos decorrentes do pagamento das pensões possam continuar a ser suportados, como têm sido até agora, pelo Orçamento, daí que a consolidação se deva centrar, como referi, sobre a contenção e a redução da despesa. É este o caso, com certeza, e é esta a aposta deste Orçamento.
Permitam-me que justifique esta ideia, afirmando que, para caracterizar qualquer orientação da política, devemos olhar para as novidades que são introduzidas. Ora, pergunto: quais são as novidades introduzidas por este Orçamento? Vejamos o que este Orçamento nos traz em termos de novidades. Novos aumentos de impostos? Não! Este Orçamento limita-se a incorporar os já anunciados e, sob este ponto de vista, não há novidades.
De facto, a receita, em 2006, aumentará em virtude do efeito conjugado de dois factores: por um lado, o aumento nominal do produto de 3,4%, aproximadamente; e, por outro, no quadro de política fiscal já definido, num contexto de forte combate à fraude e à evasão, orientação esta que também está a ser seguida.
Em resumo, a evolução da receita deve-se, somente, à dinâmica resultante de políticas já adoptadas e não a novas medidas. Do lado da fiscalidade, só terão a temer este Orçamento todos aqueles que, de uma forma sistemática, têm fugido e defraudado o fisco.
Na verdade, as novidades encontram-se no lado da despesa. É este o traço inovador da presente proposta de Orçamento do Estado. Este é um Orçamento que aprofunda as reformas estruturais já avançadas pelo Governo com impacto na despesa.
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Recordo, a este propósito, a convergência dos sistemas de aposentação entre o sector público e o regime geral, a harmonização dos regimes especiais de aposentação, de saúde, etc., e o congelamento das progressões automáticas.
Por outro lado, esta proposta de Orçamento abre caminho a novas reformas que serão lançadas em 2006.
Permitam-me, assim, que destaque algumas das medidas enunciadas no relatório que acompanha a presente proposta de Orçamento.
Começo, a este propósito, por referir a reforma da Administração Pública, onde um ambicioso projecto de reorganização está já em marcha, revendo-se as carreiras, as remunerações e o sistema de avaliação, devendo também ser revisto o quadro de supranumerários e a sua regulamentação.
No âmbito desta reforma da Administração Pública, há que dizer, à cabeça, que o Governo não hesitará em eliminar todos os serviços que se afigurem desnecessários ou que consistam na duplicação de serviços já existentes, procurando, por esta via, criar uma estrutura mais ágil ao alcance dos utentes, sejam eles particulares ou empresas.
Avançar-se-á com projectos inovadores no que se refere à prestação de serviços aos utentes. Assim, vamos alargar o conceito da Loja do Cidadão, desenvolvendo o chamado Balcão Único, que será um balcão multiserviços, evitando que os agentes económicos tenham de se deslocar a vários serviços em locais diferentes, podendo num único ponto encontrar resposta e ter o atendimento adequado às suas solicitações. Isto não só se traduz numa melhoria da qualidade do serviço prestado como num forte elemento racionalizador e de economia e eficiência na organização dos serviços e da sua prestação ao público.
Na organização da administração central, irá ser desenvolvida e implementada a lógica de serviços partilhados, serviços comuns que encontramos dentro dos vários ministérios e que, assim, podem ser geridos numa lógica global, conjunta, procurando explorar sinergias e economias que daí resultem. Apostar-se-á na simplificação do funcionamento da Administração Pública, facilitando em muito a vida aos utentes.
Permitam-me que recorde iniciativas como a do chamado Cartão Único, do Documento Único do Automóvel ou da Empresa na Hora como iniciativas que, de alguma forma, simbolizam e exprimem esse esforço de simplificação.
Estas medidas, visando a maior eficiência e economia na produção e prestação de serviços públicos, vão também procurar alcançar um outro objectivo que nos parece fundamental. Procuraremos dignificar, por esta via, a função pública e melhorar a imagem dos seus trabalhadores, promovendo melhores serviços, melhores condições de trabalho e maior eficiência. Há que o reconhecer: a imagem que, hoje em dia, grassa na opinião pública referente ao funcionalismo público não é das imagens mais positivas e, há que reconhecê-lo também, muitas vezes essa imagem é injusta, porque encontramos, de facto, no contexto da Administração Pública, exemplos de excelência, de dedicação, de bom desempenho e de profissionalismo.
Não podemos, pois, permitir que o bom funcionário público, competente e profissional, possa ser afectado por esta imagem global e injusta que sobre esta classe de profissionais tende a estabelecer-se. Neste sentido, esta reforma da Administração Pública deve apostar fortemente nesta dignificação, razão pela qual cremos ser importante desenvolver uma lógica de gestão de recursos humanos diferente da que tem vindo a ser prosseguida até agora. Esta deverá ser uma abordagem da gestão dos recursos humanos que assente na avaliação e na valorização do bom desempenho, premiando os melhores.
Mas as medidas de controlo e de contenção da despesa não se ficam somente pela Administração Pública, pelo que permitam-me também que vos refira medidas importantes que serão adiantadas ao longo de 2006.
Frisaria, assim, as medidas a pôr em prática no que toca à Segurança Social, começando por aquelas que visam o prolongamento da vida activa dos portugueses, dificultando e desincentivando o recurso a reformas antecipadas, fazendo com que a idade de reforma efectiva não seja tão baixa quanto tem sido, com o ónus que isso representa para a Segurança Social, e incentivando aqueles que, atingindo a idade legal de reforma, queiram voluntariamente – sublinho, voluntariamente – permanecer no activo.
De igual modo, proceder-se-á à revisão do regime do subsídio de desemprego, pois é importante que o subsídio de desemprego se oriente para aqueles que não têm trabalho e não para aqueles que não querem trabalhar.
Por outro lado, será importante introduzir uma maior rapidez na transição para uma nova fórmula de cálculo das pensões, sendo também estudada a introdução de um limite superior para estas.
Assim, estas medidas relativas à Segurança Social, a par do esforço de moderação das despesas sociais que será efectuado, do combate à evasão e fraudes contributivas e da consignação efectuada da receita adicional do IVA, contribuirão, de forma significativa, para uma maior solidez financeira do sistema de segurança social e para o reforço da sua sustentabilidade.
O relatório que acompanha a proposta de Orçamento aponta outras áreas onde serão levadas a cabo importantes medidas de economia e de redução de despesa. Não vos vou maçar com o seu enunciado, mas chamo a vossa atenção para as medidas elencadas no âmbito da saúde e da educação, que, como sabemos, são duas outras áreas importantes de despesa no contexto do Orçamento do Estado.
A par destas políticas, haverá uma política global de redução de gastos correntes e de reforço dos mecanismos de controlo da execução orçamental e teremos também um controlo mais apertado de admissão de pessoal, de forma a assegurar a sua redução global.
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Chamo a vossa atenção para a suspensão das requisições, destacamentos ou transferências de pessoal das administrações regionais e locais para a administração central, para a limitação das despesas com o pessoal nas autarquias locais e para a necessidade do acordo do Ministro das Finanças em processos de admissão em que, até agora, não se previa a sua intervenção, designadamente na área da saúde, da educação, na área militar e na das forças de segurança.
Iremos também implementar, efectivamente, o conjunto de previsões legais, constantes na Lei de Enquadramento Orçamental e na própria proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006, relativas aos deveres de reporte de informação regular quanto à execução orçamental e não hesitaremos em impor as sanções previstas na lei a quem não cumpra estas obrigações.
Finalmente, chamo a vossa atenção para a criação e implementação da figura a que se chama Controlador Financeiro, alguém que, ao nível de cada ministério e dos seus serviços dependentes, irá proceder a um acompanhamento próximo e em tempo tão real quanto possível da execução orçamental, sendo capaz de identificar factores de derrapagem e de risco, no sentido de, em devido tempo, serem tomadas as medidas correctivas e de controlo indispensáveis.
No que se refere à despesa de investimento, chamo a vossa atenção para a manutenção do seu nível, o qual assegura a afectação das verbas disponíveis a projectos de qualidade que não comprometem a dinâmica da economia nem o esforço de contenção da despesa. Isto é, impede-se também que o Orçamento, apesar de não sofrer qualquer quebra acentuada, seja um factor de pressão para o aumento da despesa.
Do conjunto de medidas contempladas neste Orçamento, a despesa total do Sector Público Administrativo vai reduzir-se em meio ponto percentual no PIB, o mesmo acontecendo à despesa corrente e à despesa corrente primária.
Chamo a atenção dos membros desta Comissão para o facto de a despesa total líquida da transferência do Estado para a Segurança Social ser reduzida em quase 250 milhões de euros e de a despesa corrente primária do Estado abatida daquela transferência ser reduzida em 260 milhões de euros, o que exprime bem o esforço de contenção e de redução da despesa levada a cabo pelo subsector Estado no âmbito deste Orçamento.
Daí que, face a este esforço de consolidação, que será levado a cabo pelo subsector Estado, nos pareça inteiramente legítimo exigir aos demais subsectores que participem neste esforço de contenção e de redução da despesa.
Por isso mesmo, é invocado o princípio da solidariedade recíproca da parte das autarquias locais e das regiões neste processo. Nesse sentido, as transferências do Orçamento, quer para as autarquias quer para as regiões autónomas, manter-se-ão, em 2006, ao nível das de 2005. Friso que a lei é cumprida e não há aqui qualquer desrespeito pelo enquadramento legal a que deve obedecer a definição destas transferências.
Mas, a par disto, o Governo vai desenvolver uma nova abordagem das finanças locais e regionais à luz deste princípio de solidariedade e, nesse sentido, proceder-se-á, ao longo de 2006, a uma revisão das respectivas leis de financiamento.
Srs. Deputados, antes de chamar a vossa atenção para alguns aspectos relevantes no que se refere à receita, apelo à vossa paciência, para vincar um aspecto que também reputo de particular importância.
A política de contenção e de redução da despesa contemplada neste Orçamento não é uma política de cortes cegos; é uma política – e por isso tem prioridades – que salvaguarda os principais objectivos políticos do Programa do Governo, é uma politica que aposta na ciência e tecnologia e na inovação, na difusão da sociedade de informação, dando o enquadramento fiscal necessário à promoção de um programa de difusão do uso da banda larga como é o Programa Ligar Portugal.
Esta política de contenção aposta ainda na qualificação das portuguesas e dos portugueses, preparandoos para o mundo da qualificação – e chamo a vossa atenção para a iniciativa do ensino do inglês no 1.º ciclo do ensino básico, que é exemplar neste domínio – e aposta também no combate à pobreza dos idosos, precisamente aquele sector da sociedade que não tem voz nem poder reivindicativo.
Permitam-me, agora, que avance algumas considerações quanto à receita do Sector Público Administrativo, que aumenta 5,7% em relação a 2005. Como já referi, não há novos aumentos de impostos para além dos que já foram decididos e anunciados pelo Governo, designadamente no âmbito do Programa de Estabilidade e Crescimento, sendo que a receita fiscal aumentará 6,8% em relação a 2005 pelas razões que explicitei anteriormente.
Irá ser dada especial atenção ao combate à fraude e à evasão fiscais, haverá um maior controlo das operações sujeitas a impostos, intensificando as verificações inerentes à facturação e contabilização das operações dos sujeitos passivos de imposto e serão penalizados quer os utilizadores quer os fornecedores de material informático concebido especialmente para viciar a situação tributária dos vários contribuintes.
Será implementada, através da revogação do despacho ainda vigente, o que será feito pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a factura obrigatória.
Não se reconhecerá a dedução de encargos para efeitos fiscais e em sede de IRC em relação a documentos emitidos por entidades cuja cessação de actividade tenha sido oficiosamente declarada, o que é uma das situações típicas de factura falsa.
Dá-se um passo importante no levantamento do sigilo fiscal, passando a ser permitida à administração fiscal a divulgação de listas de devedores por dívidas tributárias.
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Propõem-se também neste Orçamento medidas importantes de natureza fiscal no âmbito ambiental. Nesse sentido, proceder-se-á à reforma progressiva do Imposto Automóvel, colocando-o ao serviço do combate à poluição.
Há incentivos à renovação da frota de veículos pesados afectos aos transportes públicos e é também pedida uma autorização legislativa no sentido de se poderem definir incentivos fiscais no âmbito dos biocombustíveis, entre outras medidas e, permitam-me que chame a atenção para algumas delas: propomos, no âmbito desta proposta de lei, reavaliar o quadro de benefícios fiscais existentes e o aprofundamento do regime fiscal das zonas francas; apostamos no aumento da eficácia da administração tributária e também da simplificação fiscal.
Assim, procedemos à alteração de regras na tributação do IRS, por exemplo, de um cônjuge que habitualmente não reside em território português, e à aproximação gradual do regime tributário das pensões ao dos rendimentos do trabalho por conta de outrem, ou seja, de Categoria A. Por outro lado, fixam-se critérios objectivos para a administração tributária proceder à liquidação oficiosa de IRC quando não é apresentada a respectiva declaração de rendimentos.
Estes são exemplos de simplificação e de melhoria da eficiência.
Permitam-me que termine esta apresentação chamando a vossa atenção para o facto de o esforço de redução do peso do Estado na economia prosseguir também através de uma politica de privatizações que queremos que seja ambiciosa.
Esperamos, com as privatizações a efectuar em 2006, obter uma receita total de 1600 milhões de euros, dos quais 80% serão afectos à redução da dívida, isto é, 1280 milhões de euros.
Apesar deste esforço, dado o nível ainda excessivo do défice em 2006 – 4,8% do PIB, recordo –, será de esperar que o peso da dívida pública no PIB aumente três pontos percentuais e isto revela bem que o esforço de consolidação orçamental terá que continuar de modo a podermos inflectir esta trajectória recente da dívida.
Termino, reafirmando o mote deste Orçamento: consolidar agora para um futuro melhor.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro de Estado e das Finanças, agradeço a sua exposição que foi convenientemente detalhada e propícia um bom lançamento do nosso debate.
O Partido Socialista, entendeu, depois de auscultado, como tem sido habitual, permitir que a primeira intervenção seja feita pelo PSD, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Frasquinho.
O Sr. Miguel Frasquinho (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de cumprimentar toda a equipa governativa do Ministério das Finanças, em particular o Sr. Ministro pela intervenção detalhada que acabou de nos fazer relativamente ao Orçamento.
Sr. Ministro, queria começar por lhe dizer que, no que toca à sua intervenção, como às anteriores que fez no âmbito deste Orçamento, o PSD revê-se, no essencial, nesse discurso, ou seja, o de que o caminho correcto é o da consolidação orçamental pelo lado da despesa e o de que só com finanças públicas saudáveis poderemos aspirar a ter um nível de crescimento económico forte e um desenvolvimento económico sustentado.
Tudo isto é verdade, e, aliás, permita-me aqui também saudar a nova postura do Partido Socialista, que defende agora aquilo que há bem pouco tempo criticava e de forma violenta. Bem-vindos, pois, a esta postura em termos de discurso, pelo menos! No entanto, Sr. Ministro, permita-me dizer-lhe que o problema é que das palavras à realidade vai uma grande distância e as palavras que o Sr. Ministro referiu encontram pouco eco na realidade, sobretudo nos números deste Orçamento do Estado – aliás, quanto mais tempo vai passando e mais se aprofunda a análise mais dúvidas se instalam no nosso espírito.
Comecemos, por exemplo, pelo cenário macroeconómico. Em primeiro lugar, penso que a estimativa, por exemplo, para o preço médio do barril de petróleo do próximo ano parece bastante prudente, conservadora e realista, ou seja, 65 dólares como preço médio parece-me razoável face à informação conhecida.
No entanto, Sr. Ministro, a projecção para o crescimento das exportações deixa muito a desejar. As estimativas para o crescimento na Europa na zona euro são sistematicamente revistas em baixa e o crescimento na União Europeia não ultrapassará, no próximo ano, 1,5%, 1,8% (umas décimas acima ou abaixo, mas rondará este valor), portanto, um pouco acima do que se passa em 2005. Por isso, gostava de saber como é que é possível sustentar uma projecção de crescimento das exportações de quase 6%, quando, em 2005, as exportações crescerão pouco mais de 1%. Portanto, isto poderá ter efeito no andamento da economia.
Esta é a primeira questão, ou seja, gostaria de saber como é que o Ministério das Finanças e o da Energia e Inovação sustentam esta projecção a nível das exportações.
Depois, quando o Sr. Ministro disse que a consolidação orçamental deve ser essencialmente do lado da despesa não poderíamos aplaudir e aprovar mais essa carta de intenções. Mas, o problema, Sr. Ministro, é que a redução do peso da despesa pública no PIB é de meio ponto percentual, passando de 49,3% para 48,8%, e, portanto, parece ser curta essa redução para as necessidades de emagrecimento do Estado de que o País necessitaria. Isto é tanto mais verdade quanto reparamos que o peso da receita no PIB aumenta um ponto percentual, isto é, passa de 43% para 44%.
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Portanto, isto significa que a redução do défice de 6,2% para 4,8% do PIB, grosso modo 1,4 pontos percentuais, é feita dois terços do lado da receita e um terço do lado da despesa, pelo que, Sr. Ministro, penso que poderemos concluir que a maior parte da consolidação orçamental continua a ser feita do lado da receita.
Assim, Sr. Ministro, se as suas palavras de que a consolidação orçamental deve ser feita do lado da despesa estão correctas, a verdade é que, depois, o Orçamento do Estado não confirma esta realidade, porque dois terços, ou seja, quase 67% da consolidação orçamental (que é a sua maior parte), vêm, mais uma vez, do lado da receita e apenas um terço, ou cerca de 33%, vem do lado da despesa.
Por isso, é pena que neste Orçamento não seja consagrado um plano de redefinição das funções do Estado no sentido de algumas das tarefas que o Estado protagoniza poderem passar para a iniciativa privada ou para a área social, o que contribuiria para um Estado mais pequeno, mais eficaz e contribuiria, de igual modo, para uma redução mais acentuada da despesa pública. Mas sobre este aspecto não vemos uma única palavra neste Orçamento do Estado.
Gostaria, pois, de saber se nos pode dizer se o Governo se mostra receptivo a abordar este tema, de molde a que possamos ainda ir a tempo, não só em 2006 mas nos anos vindouros, de ter reduções de maior magnitude no peso da despesa pública no PIB.
Segundo julguei perceber das suas palavras, Sr. Ministro, relativamente ao Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado, até Fevereiro estarão feitas as anunciadas auditorias aos ministérios.
Depois, irá correr um processo de decisão, que estará pronto até Junho, mas Junho já é a meio do próximo ano, e portanto perdeu-se aqui meio ano, pelo que pergunto se não haverá ainda a possibilidade de fazer ajustamentos na segunda metade de 2006. No entanto, nada é dito no Orçamento do Estado sobre estes timings, pelo que vamos perder muito tempo com um programa do qual não se conhece minimamente nem informação nem a estrutura.
Por outro lado, este Orçamento é também bastante opaco, o que levanta dúvidas no que diz respeito aos cortes ou poupanças adicionais que são projectadas do lado da despesa e que, no Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente, para 2006, ascendem a 1185 milhões de euros.
De facto, são 1185 milhões de euros que estão quantificados, mas que não estão, do nosso ponto de vista, devidamente explicados. De resto, isto acontece também com a redução da despesa prevista até 2009, porque surgem lá uns números que são muito bonitos, que estão quantificados, mas a verdade é que não se explica como se chega até eles. Daí que lhe pergunte, por exemplo, como é que o Governo espera poupar 475 milhões de euros na rubrica Despesas com o pessoal em 2006.
Diz-se que essa poupança resultará do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado, da revisão do regime jurídico do pessoal supranumerário, do controlo das novas admissões de funcionários públicos e também da suspensão da progressão automática do sistema de carreiras. No entanto, apenas esta última é concreta e só em relação a ela conseguimos, de facto, perceber do que se trata, porque o resto é extremamente vago, não havendo uma explicação detalhada sobre a forma como se pretende chegar a este número. Ou seja, o número está lá, mas falta a explicação e isto acontece um pouco por todo o Orçamento, inclusive em todo este Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente.
Ao mesmo tempo instala-se uma outra dúvida, que foi levantada na semana passada pela comunicação social, que diz respeito ao facto de a verba inscrita para os aumentos salariais não permitir esse aumento.
Tive oportunidade de fazer as contas, pegando nos mapas do Orçamento, no que está no relatório e fazendo a diferença, jogando inclusive com a dotação provisional, e a verdade é que os valores líquidos da despesa para a rubrica Despesas com o pessoal e todas as sub-rubricas que a compõem, que estão nos mapas do Orçamento, não batem certo com o que vem no relatório. A diferença deve ter que ver, com certeza, com a dotação provisional que aí é utilizada, mas a verdade é que o que fica da dotação provisional não dá nem sequer para um aumento de salários da ordem de 1% na função pública.
Portanto, gostaria que o Sr. Ministro elaborasse um pouco sobre este tema de modo a podermos perceber duas coisas: primeiro, se se mantém o compromisso que o Governo tinha assumido anteriormente de um aumento salarial à volta de 2% no próximo ano e, se sim, como é que o Governo pretende atingir este aumento.
Seguidamente, ao nível das necessidades líquidas do financiamento do Estado, existe uma discrepância entre o valor que consta do relatório e o valor que está no articulado.
No relatório fala-se em 9100 milhões de euros em termos de necessidades líquidas – tendo já sido emendada a gralha que constava da primeira versão, o que, de facto, era um engano aborrecido, porque falava num valor claramente superior –, mas no articulado o artigo 82.º refere explicitamente que as necessidades líquidas de financiamento ascendem a 10,8 milhões de euros, que são acrescidos, tal como consta do artigo 83.º, de 1600 milhões de euros. Penso que a interpretação a dar não é outra: é que são acrescidos 1600 milhões de euros. Mesmo se descontássemos este acréscimo já haveria uma diferença de cerca de 1700 milhões de euros, mas, se contarmos com este acréscimo, a diferença passa quase para o dobro.
Assim, Sr. Ministro, gostaria de o ouvir sobre esta diferença, sobretudo porque o Sr. Ministro tinha referido que o Orçamento não continha truques, não continha enganos, mas a verdade é que há estas vamos chamarlhes discrepâncias que era importante que fossem explicadas.
Seguidamente, ouvi o Sr. Ministro dizer que este Orçamento dedica uma grande atenção à área do conhecimento, à sociedade de informação, ao governo electrónico, à investigação científica e tecnológica e também
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à formação dos recursos humanos, com a educação pré-escolar, o ensino básico e secundário e o ensino superior.
O problema é que olhamos para o PIDDAC e todas estas áreas de que lhe falei, Sr. Ministro, representam apenas 16,2% do PIDDAC. Se analisarmos o capítulo relativo à sociedade do conhecimento, verificamos que representa apenas 6% do PIDDAC, mas continuamos a ver o sector dos transportes com mais de 40%. Por isso, pergunto-lhe se não há, até face ao apregoado Plano Tecnológico, uma clara inversão da realidade, porque, mais uma vez, os números não jogam com o que é apregoado.
Além disso, relativamente a esta área dos transportes, gostaria ainda que o Sr. Ministro esclarecesse qual a posição que vão ter face às SCUT, designadamente se vai ser a posição que o Sr. Primeiro-Ministro exprimiu e que rejeita liminarmente a introdução de portagens nestas vias, sejam elas quais forem; se vai ser a posição do Sr. Ministro, que aproveito para felicitar, porque revela coragem no sentido de admitir a introdução de portagens em algumas destas vias, se não já no próximo ano, logo que possível; ou se vai ser a terceira opinião, a do Sr. Ministro das Obras Públicas, que ainda ontem não se quis comprometer com este cenário, atirando para o futuro qualquer decisão neste aspecto. Assim, Sr. Ministro, importa esclarecer este facto.
Quanto ao PSD a nossa posição mantém-se relativamente a esta matéria: somos contra, porque pensamos que é muito mais justa a aplicação do princípio do utilizador/pagador e, portanto, a introdução de portagens nestas vias pela renegociação dos contratos. No entanto, importa esclarecer esta situação, que passa para a opinião pública uma imagem de confusão no seio do Governo, o que não é positivo para a confiança dos agentes.
De facto, se pensarmos que, a partir de 2007, o Governo terá de pagar cerca de 700 milhões de euros relativos a estas portagens, é óbvio que, em abono da verdade e da justiça, estes 700 milhões de euros deveriam ser pagos pelos respectivos utilizadores e não por todos os portugueses, quer lá passem quer não.
Quanto à área fiscal, é importante salientar que 2006 será o primeiro ano em que os portugueses sentirão na sua plenitude os aumentos de impostos, que foram decididos aquando do Orçamento rectificativo – nomeadamente em relação ao IVA e ao ISP –, e os efeitos de arrefecimento claríssimos que estão a ter sobre a nossa economia e que poderão mesmo levar a economia a entrar em recessão.
Não posso deixar de recordar que o compromisso da subida da taxa nominal do IVA de 19% para 21% foi consignada à Segurança Social – se bem me recordo, 1% para a Caixa Geral de Aposentações e 1% para o subsistema da Segurança Social. Mas isto seria uma espécie de «almofada», também na Segurança Social, que acresceria às transferências feitas por parte da administração central para ajudar a atrasar e a atirar mais para a frente os problemas financeiros e uma potencial situação de insolvência da Segurança Social.
Quanto a este aspecto, devo dizer que, na verdade, não é isto que se verifica, Sr. Ministro. Isto porque no texto do relatório é explicitamente referido que o que existe não é um acréscimo de financiamento, quer da Caixa Geral de Aposentações, quer da Segurança Social, mas, sim, uma mera substituição de financiamento.
Ou seja, as transferências do subsector Estado reduzem-se e há a consignação das receitas do IVA, quer à Segurança Social quer à Caixa Geral de Aposentações.
Portanto, não é uma «almofada adicional»; aliás, «almofada» por «almofada» já tínhamos o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Segundo as projecções da Segurança Social, que estão referidas na página 244 do relatório, este Fundo deveria suprir as necessidades da Segurança Social, logo, a partir de 2007.
Mas há mais, Sr. Ministro: enquanto que se estima que a ruptura deste subsistema com esta «almofada» do IVA aconteceria em 2015, se não se tivessem aumentado o IVA, explicitamente por causa da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, esta ruptura seria antecipada apenas em dois anos, ou seja para 2013. Ora, o que temos aqui? Temos uma substituição de financiamento e com isso estamos obviamente a ajudar a um menor dinamismo da economia e a um arrefecimento maior – o que significa que há despesa que está a ser desviada para outras áreas e não continua nestas áreas da Segurança Social. Portanto, os aumentos de impostos decididos foram, de facto, para suportar o despesismo que este Governo, apesar de tudo, tenta esconder.
Mas, atenção, nesta área fiscal, há algo com que o Sr. Ministro tem de ser confrontado, pois o Sr. Ministro disse que não iria haver mais aumentos de impostos para além daqueles que tinham sido anunciados no Programa de Estabilidade e Crescimento.
Mas, Sr. Ministro, então o que é que podemos chamar à aproximação gradual do sistema de tributação dos rendimentos de pensões aos rendimentos do trabalho dependente em sede de IRS? É clarinho que isto é um aumento de impostos! Ainda por cima para os pensionistas! Portanto, há obviamente um aumento de impostos, que é novo, que não tinha sido anunciado no Programa de Estabilidade e Crescimento, tal como se verifica a queda da dedução específica que ocorre de 8283 para 7500 euros, o que se traduz num novo aumento de impostos.
Por conseguinte, Sr. Ministro, o compromisso que o Governo tinha assumido não se manteve. Há uma quebra clara, o que é grave, porque, obviamente, faz minar a relação de confiança entre a população e o Executivo.
Temos também o processo de aproximação, de convergência, entre o regime de pensões e o regime do trabalho dependente. Em termos de tributação diz-se que é um processo gradual, mas não se diz como é que
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é feito, com que velocidade, quanto se avançará por ano, se é para esta Legislatura, se se deixa para legislaturas posteriores, enfim, nada é referido nesta matéria. Mais uma vez estamos perante uma questão em que o Orçamento é extremamente vago, pelo que também gostaria de ouvir os seus comentários sobre esta matéria.
Depois, há também um aumento da carga fiscal no que toca às empresas. É certo que há uma tentativa de simplificar o sistema fiscal, tentativa essa que saúdo, mas, Sr. Ministro, mais uma vez, é algo muito vago.
O Governo pede uma autorização legislativa para actuar em sede de benefícios fiscais, mas aumenta o pagamento especial por conta de 40 000 para 70 000 euros. Bom, se isto não é um aumento da carga fiscal para as empresas, de facto, não sei o que será!… Nesta matéria, Sr. Ministro, com o que referi à pouco – isto é com a redefinição das funções do Estado e com a reorientação das funções que o Estado pode assumir –, poderíamos ir mais longe e, sempre numa lógica de face às dificuldades orçamentais, não perder receitas.
Este Orçamento, Sr. Ministro, podia ser mais amigo da competitividade, sobretudo da competitividade fiscal. Por exemplo, na medida em que os benefícios fiscais são eliminados, as deduções suprimidas, etc., poder-se-ia, da mesma forma e na mesma proporção, para não perder receita – e é possível estimar isso com programas econométricos que o Ministério das Finanças, seguramente, tem –, diminuir a taxa nominal do IRC na mesma proporção, fosse umas décimas, fosse um ponto, fossem dois ou fosse o que fosse… Era um sinal que era dado à economia e às empresas.
A economia está tão ausente deste Orçamento do Estado, Sr. Ministro, e era importante que este Governo tivesse em atenção o que se passa lá fora nesta área e nesta matéria, o que não tem acontecido.
Sei que o Sr. Ministro nos vai dizer que nós, na anterior legislatura, tínhamos este compromisso, mas deixámo-lo pela metade no que se refere a reduzir a taxa do IRC. Tudo isto é verdade, mas convém não esquecer, Sr. Ministro, que a legislatura também foi interrompida, não chegou até ao fim, portanto não podemos levar em linha de conta aquilo que podíamos ter feito.
Se conseguíssemos, por esta via, atrair mais empresas, teríamos, com certeza, mais receita e também mais dinamismo da actividade económica, mais emprego e mais riqueza. E isto não era matar a economia, como tem vindo a ser feito com a subida de impostos.
Termino rapidamente, referindo apenas que a criação de um escalão adicional no IRS de 42% é outro factor com que, obviamente, não podemos concordar, porque vai em sentido contrário ao que se passa lá fora, uma vez que a generalidade das economias europeias diminui a sua tributação em sede de IRS, nomeadamente dos últimos escalões, precisamente para poder segurar ou atrair os quadros que podem trazer mais valor acrescentado para essas economias. Todavia, o Governo português faz exactamente o contrário, ainda por cima com uma receita que, claramente, é estimada em valores muito baixos.
Portanto, pergunto: é assim que o Governo pretende atrair os cérebros e os génios da área do Plano Tecnológico? É que parece-nos, Sr. Ministro, que, assim, os cérebros nunca virão para cá, irão, com certeza, para outros países da Europa.
E, se dúvidas há nesta matéria, penso que os prémios Nobel da Economia de 1999 e de 2001 e o exconselheiro do ex-presidente Bill Clinton, que estiveram em Portugal, referem esta matéria como essencial para que a economia portuguesa possa ter sucesso e, explicitamente, referem o caminho a seguir, ou seja: consolidar as finanças públicas e a despesa pública, para, o mais rapidamente possível, assegurar uma competitividade fiscal que Portugal não tem. E não esqueçamos que Portugal nunca será verdadeiramente competitivo, com todas as vantagens que possui noutras áreas importantes para a competitividade, se não for fiscalmente competitivo – esta é que é uma grande verdade.
Para já, ficar-me-ei por estas observações e por estas dúvidas, que gostava que o Sr. Ministro comentasse dentro da medida do possível.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Frasquilho, devo confessar que não fiquei surpreendido com as observações que fez à proposta de lei do Orçamento, o que, na minha opinião, também me permite compreender melhor por que é que o PSD não teve sucesso enquanto foi governo para levar a cabo uma verdadeira política de consolidação orçamental: foi porque, quando apresentou medidas de redução da despesa, não acreditava que elas funcionariam. Ora, eu acredito que elas vão funcionar,…
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Isso é uma questão de fé!
O Orador: — … por isso aposto nesta convergência. Quando, à partida, nos sentimos, desde logo, derrotados, é evidente que será muito difícil prosseguir qualquer política de verdadeira consolidação orçamental através da despesa.
Chamo a atenção para o facto de que 0,5% de redução do peso da despesa no PIB poder parecer pouco no entender do Sr. Deputado, mas, se compararmos com o que foi a evolução da despesa nos anos anteriores, essa redução traduz, de facto, um esforço considerável.
A despesa corrente primária aumentou, de 2001 para 2002, de 37,6% para 38,7% do PIB; de 2002 para 2003, de 38,7% para 40% do PIB; e de 2003 para 2004, de 40% para 40,9% do PIB. Nos anos anteriores, ou
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seja, de 1995 a 2001, aumentou 0,6 pontos percentuais do PIB e nestes últimos anos aumentou, em média, pelo menos, 1,1%, ano após ano. Ora, pode parecer pouco ao Sr. Deputado uma redução da despesa de 0,5 pontos percentuais, mas, dada a trajectória da despesa nos últimos anos, isto revela um esforço considerável.
Mais: o Sr. Deputado sabe, e sabe tão bem quanto eu, porque estuda estas coisas – e temos aqui, se me permite, uma costela académica –, que o ajustamento orçamental via receita e via despesa é completamente diferente, as velocidades de ajustamento são diferentes, porque as medidas sobre a receita têm um impacto mais rápido e as medidas sobre a despesa são mais lentas.
E as medidas que estão preconizadas neste Orçamento são medidas importantes não só para 2006 mas, fundamentalmente, para os anos que vêm a seguir, por isso apostamos numa consolidação sustentável.
É evidente que estas medidas não irão ter plenos efeitos em 2006 e, por isso mesmo, as medidas que foram já anunciadas no domínio da receita vão continuar a desempenhar o seu papel. Mas, como frisei na minha intervenção inicial, o que estamos aqui a fazer é a introduzir elementos novos, adicionais, de política de consolidação do lado da despesa, sendo esta a aposta deste Orçamento.
É evidente que as políticas do lado da receita que já foram anunciadas são importantes, designadamente o aumento do IVA, para ter um efeito imediato que auxilie a consolidação orçamental, porque as medidas da despesa vão requerer algum tempo para surtirem pleno efeito.
E, Sr. Deputado, não me diga que é pouco do lado da despesa, pois eu digo-lhe que é imenso em comparação com o que foi feito atrás, ou melhor, com o que não foi feito. Veja-se, por exemplo, a convergência do regime de aposentação, a harmonização dos regimes especiais de saúde e os congelamentos das progressões automáticas.
Mais: nós já começámos a mexer na Administração fundindo uns serviços e eliminando outros. Por exemplo, antes tínhamos três hospitais militares, agora temos um; antes tínhamos três escolas militares, agora temos uma; antes tínhamos vários sistemas de saúde, agora estão todos uniformizados com a ADSE; vão fechar escolas, aliás, ainda recentemente, a Sr.ª Ministra da Educação reconheceu o fecho das escolas que não tenham o número de alunos suficiente; vão fechar maternidades, pois o Ministro da Saúde já disse que irão fechar as maternidades que não tenham partos suficientes que justifiquem o seu funcionamento com serviços de qualidade, isto até no interesse dos próprios utentes; vamos ter um quadro de supranumerários, em que os funcionários que o integram (permita-me que lhe recorde), primeiro, têm uma redução de um sexto do seu vencimento, de acordo com a lei, segundo, deixam de auferir subsídios e complementos que estejam associados ao exercício activo de funções, e, terceiro, existem estudos que estimam que, em termos de despesas de funcionamento associadas a cada funcionário, há uma economia de cerca de 20%.
Ora, o impacto da reforma da Administração Pública que está em curso e a libertação de um número significativo de funcionários para o quadro de supranumerários não vai deixar de ter um impacto positivo.
Pergunta-me: quantos? Como referi, iniciámos as auditorias há mais de um mês e elas ainda estão em curso. Sou muito sincero consigo: seria prematuro e inconsciente da minha parte estar a avançar números antes de termos todo o levantamento feito; não seria sério da minha parte indicar um número, que seria uma wild guess no meio deste debate.
Agora, não me venha exigir, neste momento, que tenha um trabalho completo, que, ao fim de seis meses, esteja feito aquilo em que, durante três anos, ninguém mexeu nem teve a coragem de mexer. Estas coisas requerem tempo, têm de ser analisadas, e a reforma profunda que vamos ter no âmbito da Administração Pública está em curso e vai ser efectuada até meados do próximo ano. Disso não tenhamos dúvidas! Relativamente à questão das funções do Estado, esta reorganização da Administração Pública vai encarar essa questão e vai, com certeza, trazer novidades neste domínio.
No que se refere às despesas com pessoal, sem prejuízo de o Sr. Secretário de Estado do Orçamento poder dar alguns detalhes adicionais – e peço-lhe para, depois da minha intervenção, fazer alguns comentários –, permita-me que lhe diga que a alteração do regime de aposentação e o encerramento das inscrições na Caixa Geral de Aposentações no próximo ano, por um lado, e o facto de aumentarmos a taxa de contribuição de 10% para 13% para a Caixa Geral de Aposentações, por outro, está também na base da necessidade de uma menor transferência do Orçamento do Estado para a Caixa Geral de Aposentações, porque, através do aumento dessa taxa, há aqui um elemento de financiamento adicional, que não vai ser à custa de transferência de verbas do Orçamento do Estado mas, sim, dos serviços empregadores, que passarão a efectuar um desconto maior.
Quanto aos aumentos salariais, não lhe vou dar um número, porque isso, aliás, está sujeito a um processo negocial com os representantes dos trabalhadores da função pública, agora já dei sinais muito claros de que a margem de manobra é estreita e, portanto, não é de esperar, de facto, aumentos salariais significativos.
A taxa de 2% de que tanto se fala é a que vem no Programa de Estabilidade e Crescimento. Ora, o meu entendimento é o de que essa taxa de 2% é uma taxa uniforme média a considerar para os vários anos abrangidos pelo Programa de Estabilidade e Crescimento e não um compromisso de aumento de 2% todos os anos.
Não se trata, portanto, de um aumento de 2% todos os anos mas, sim, de uma média, um valor uniforme aplicado a todos os anos, para se ter uma estimativa do impacto previsível do ajustamento salarial em termos orçamentais.
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Sobre as necessidades líquidas de financiamento, Sr. Deputado, não há quaisquer discrepâncias. Gostaria de tornar bem claro que o limite de endividamento do Governo é o estabelecido no artigo 82.º da proposta de lei, ou seja os tais 10,8 mil milhões de euros. Nem mais um cêntimo em cima deste plafond.
O que o artigo 83.º diz é o seguinte: para além das necessidades de financiamento definidas no artigo 82.º, que, como lá diz, é para o financiamento do Orçamento e dos fundos ou serviços com autonomia administrativa e financeira, fixa-se um tecto de endividamento para as regularizações de situações do passado, que estão autorizadas na proposta de lei, mas não se estabelece qualquer plafond, qualquer limite, sendo que o artigo 83.º, no nosso entendimento, vem estabelecer um limite a essas regularizações do passado, limite esse que, aliás, se vir no quadro da página 103 do Relatório, está já incorporado no cálculo das necessidades de financiamento líquidas do Estado. Não haja dúvidas quanto a isso.
Na página 103 do Relatório, que tem o quadro que calcula as necessidades líquidas de financiamento, de 9,1 mil milhões de euros, estão aí incluídas as regularizações do passado, esses tais 1,6 milhões referidos no artigo 83.º. Portanto, não há que contar duas vezes! Não haja dúvidas quanto a isso! Mas, se a Assembleia tiver dúvidas, para nós, não há qualquer problema que as clarifiquem. Porém, o nosso entendimento quanto a isto é claro e gostaria de afirmar, com toda a clareza, perante esta Assembleia, que não há aqui qualquer intuito escondido ou recurso a qualquer leitura mais oportunista, se me permite o termo, do alcance do artigo 83.º.
O artigo 83.º para nós – repito – é tão-somente para dizer que, dentro daquele limite de 10,8 mil milhões de euros, 1,6 mil milhões de euros é para regularizações do passado, que já se encontram incluídos naquele montante. É este o nosso entendimento.
Agora, e para mostrar o rigor com que isto foi feito, Sr. Deputado, há uma questão, sobre a qual também não quero que fiquem dúvidas, que é a seguinte: porquê, então, nesse quadro da página 103 do Relatório se prevêem necessidades líquidas de financiamento de 9,1 mil milhões e aqui temos 10,8 mil milhões de euros? Sr. Deputado, a previsão de 9,1 mil milhões de euros considera que o défice vai ser de 4,8%. Portanto, os montantes cativados não vão ser descativados. Mas, e a prudência financeira assim o aconselha, para o caso de ocorrer um cenário pior, no caso de haver necessidade de proceder à descativação da cativação de 7,5 precisamos de ter meios de financiamento da verba ou verbas necessárias para cobrir a descativação. Ora, então, é preciso acrescentar a esses 9,1 mil milhões de euros o montante correspondente à cativação.
Por outro lado, Sr. Deputado, todos os anos é feito um financiamento de um período complementar relativamente ao ano anterior e, portanto, é preciso acrescentar também as necessidades de financiamento desse período complementar.
Ora, o valor dos 10,8 mil milhões de euros resulta, precisamente, da consideração não só das necessidades líquidas, tal como determinadas no topo do quadro da página 103 do Relatório, mas também para cobrir a eventual necessidade da descativação – espero que nunca venha a ocorrer! – e ainda para fazer face às necessidades de financiamento decorrentes do período complementar. E tão-só! Nesta previsão não existe seja o que for escondido.
Gostaria também de chamar a atenção para o facto de que este limite de endividamento de 10,8 mil milhões de euros, em relação ao endividamento que é feito em 2005, traduz-se numa redução de 2150 milhões de euros, verificando-se uma redução, de 2005 para 2006, do endividamento do Estado superior a 2000 milhões de euros, e eu gostaria de salientar este aspecto.
Quanto à questão relativa ao PIDDAC, suscitada pelo Sr. Deputado Miguel Frasquilho, invocando que é baixo na educação, na ciência e tecnologia e mais elevado nos transportes, tenho de esclarecer o seguinte: o PIDDAC é, de facto, reconheço-o, de contenção em todos os sectores mas, como tive oportunidade de referir, não é uma contenção cega.
O PIDDAC procura, de facto, em áreas essenciais, acautelar objectivos de política importantes e eles são acautelados na área da educação e na da ciência e tecnologia.
Permitam-me que, não sendo eu ministro da educação nem, sequer, da ciência e tecnologia, os meus colegas do Governo tenham a oportunidade de explicar com maior pormenor à Assembleia as opções de política neste domínio, pois entendo que não compete ao Ministro das Finanças e, mais, considero estar um pouco para além da sua capacidade de abrangência ou, pelo menos, nos detalhes de todas estas matérias, entrar nestes detalhes.
Quanto à questão dos transportes, o PIDDAC é elevado – tem toda a razão – e isso decorre das obrigações quanto às SCUT. Mas, Sr. Deputado, permita-me que corrija o seu entendimento sobre o que o Sr. Primeiro-Ministro, eu próprio e o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações temos vindo a dizer sobre esta matéria.
É que, em boa verdade, temos andado a dizer o mesmo, não temos é de andar a repetir ipsis verbis o que cada um diz, portanto, não temos aqui uma cassete para as SCUT, apesar de todos dizermos o mesmo... E o que dizemos é o que consta do Programa do Governo, que refere que, de acordo com os indicadores económico-sociais e com a existência ou não de alternativas rodoviárias, haverá uma decisão de manutenção da inexistência das SCUT ou a introdução de portagens nessas vias, e isto consta claramente no Programa do Governo.
Não sei se o Sr. Deputado já o leu, mas peço-lhe para ler esse capítulo e verificar que nele consta que, de acordo com estes indicadores, o Governo admite que poderá haver lugar à introdução de portagens nas SCUT
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e o que tem vindo a ser anunciado e que eu tive a oportunidade de afirmar, tendo-o feito em consonância com aquilo que é a orientação do Governo, em particular do Sr. Primeiro-Ministro e do Ministro das Obras Públicas, é que durante 2006 e nos anos seguintes (e este é um estudo que se repetirá) será feita a avaliação dos indicadores económico-sociais das regiões beneficiadas com as SCUT e, em função dos resultados desse estudos, então será de admitir que, em algumas SCUT, possam vir a ser introduzidas portagens.
Foi isto o que foi dito; é isto o que o Sr. Primeiro-Ministro diz e é isto que diz o Ministro das Obras Públicas e – por amor de Deus! – não introduzam ruído, porque a mensagem é clara. Andamos a dizer o mesmo; não haja dúvidas a quanto a isto! Permitam-me que volte atrás, referindo a questão do cenário macro, porque constato que não comentei a sua observação. O cenário macroeconómico é, de facto, um cenário prudente e todos os comentadores, analistas e agências internacionais reconhecem a prudência do cenário, o que está inteiramente em linha com as projecções de organizações internacionais nesta matéria.
Todavia, o Sr. Deputado levantou a dúvida sobre as exportações. Ora, no cenário macroeconómico que temos e na projecção quanto às exportações há alguns elementos que me parecem importantes de referir: primeiro, usamos como parâmetros nesta projecção um quadro comum para projecções macroeconómicas que é fornecido ao nível europeu. A Comissão Europeia fornece e tem indicadores e elementos de referência a servir de base a estes trabalhos de previsão ou de projecção macroeconómica e nós usamo-los, concretamente no que se refere à evolução das nossas exportações.
Assim, o que importa, Sr. Deputado, não é o crescimento das exportações da zona euro para o exterior da zona euro mas, sim, o crescimento da economia exterior a Portugal, o que é um bocado diferente. E o crescimento que está previsto nas fontes que referi é de 6% da procura, ou seja, há um crescimento da procura mundial de 6% e é este o parâmetro fundamental para prevermos a evolução das nossas exportações.
Um outro elemento que gostaria de referir tem a ver com um pressuposto implícito quanto à evolução dos custos unitários. Em particular, e o Sr. Deputado, estou certo, já o fez, se compararmos a evolução dos custos unitários de trabalho em Portugal com o que tem vindo a ser a evolução nas outras economias europeias, verificaremos que Portugal tem vindo a ter incrementos muito significativos e bem superiores aos da média europeia com as repercussões que isso tem tido no âmbito da nossa competitividade externa, sendo que está implícita na projecção que fizemos uma hipótese de contenção dos custos unitários, não só a nível dos custos unitários de trabalho mas também das margens de lucro, porque esta conjuntura económica também não deixará de se repercutir nas margens de lucro praticadas pelas várias empresas, em particular, as exportadoras.
Portanto, há também um pressuposto implícito nesta projecção, que é o de que haverá um comportamento mais favorável a este nível e que alguma recuperação da nossa competitividade ocorrerá, em virtude das razões que explicitei, durante 2006.
E permito-me chamar a sua atenção para um outro elemento: mais importante do que olhar para o nível das exportações, julgo ser importante olhar para as exportações líquidas, isto é, para a diferença entre exportações e importações, e aí poderá ver que no cenário que temos há uma projecção da taxa de aumento das importações bem mais acentuada em comparação com a taxa de 2005 – aliás, não sei por que é que não questionam isto!?... Não percebo como é que questionam que as exportações possam crescer tanto e não questionam como é que as importações, face a esta conjuntura de baixo crescimento, vão subir tanto!?... Porque é de esperar que, se o crescimento na economia é fraco, como se prevê, então as importações não vão crescer muito, porque elas dependem, fundamentalmente, do crescimento da procura interna e esta não vai crescer muito. Portanto, temos é que olhar para o saldo exportações/importações e isto é que é fundamental.
Quanto à fiscalidade, não há aqui nenhum aproveitamento no que se refere ao aumento do IVA no sentido de reduzir as transferências do Estado para o sistema de Segurança Social, transferências essas que são feitas de acordo com a lei de bases. O IVA adicional vai, de facto, repartir-se, sendo uma parte para o regime geral e outra parte para a Caixa Geral de Aposentações e quanto a isto não me parece que haja, ou possa haver, qualquer dúvida. De qualquer modo, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento poderá densificar melhor esta matéria.
Sr. Deputado, permita-me que discorde da insinuação que faz de que não respeitamos compromissos no que se refere à questão do tratamento fiscal dos rendimentos das pensões, pois só posso concluir que o senhor não terá lido o Programa de Estabilidade e Crescimento, ou não o leu inteiramente, porque essa é uma medida que está lá inserida, ou seja a convergência do regime e a aproximação do regime fiscal dos rendimentos da Categoria H — Pensões com os rendimentos da categoria A. Está lá no Programa de Estabilidade e Crescimento, portanto não há qualquer quebra de compromisso, pois, repito, essa medida já estava prevista e anunciada.
Permita-me que discorde também da ideia de que o aumento do pagamento especial por conta das empresas é um aumento da carga fiscal. Não é, porque as empresas não vão ser obrigadas a pagar mais impostos do que aqueles que teriam de pagar em virtude de qualquer agravamento de impostos. Em segundo lugar, esta medida introduz um elemento de maior equidade, porque quem vai estar abrangido por um pagamento de 70 000 euros por pagamento por conta são empresas que têm uma facturação de quase 35 mil milhões de euros. Estamos a falar de grandes empresas e o esforço que se pede a uma empresa com este volume de negócios para pagar 70 000 euros de pagamento por conta é, em termos proporcionais,
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bem menor do que aquele que se pede a empresas mais pequenas, de menor dimensão, com menor volume de negócios.
Não me venha dizer que é equitativo que uma empresa com 35, 50, 100 milhões de euros de facturação ao pagar 40 000 euros está a ser tratada da mesma forma, em termos equitativos e relativos, do que uma empresa menor, que tem um menor pagamento por conta, mas que, se calhar, lhe pesa bem mais financeiramente, em termos de esforço que tem de fazer para garantir esse pagamento, do que a uma empresa com outra dimensão. Esse não é um elemento de maior carga fiscal; é, sem dúvida, um elemento de maior equidade, obrigando as empresas maiores e contribuírem mais significativamente através do pagamento por conta, sendo certo que não vão pagar mais impostos do que os que teriam de pagar.
Quanto à diminuição do IRC, creio que já muito foi dito. Sempre considerámos irrealista, no actual quadro das finanças públicas e face ao esforço de consolidação que nos é pedido, pensar que há espaço para acomodar uma descida do IRC.
Devo dizer-lhe que, neste momento, tenho as minhas dúvidas quanto ao verdadeiro impacto sobre o investimento e sobre a actividade económica, de mais reduções do IRC. O IRC baixou e não me parece que seja notória a reacção em virtude dessa descida, pois penso que ainda está por provar o grande impacto positivo que a redução efectuada teve. Portanto, tenho dúvidas de que mais reduções do IRC tenham um impacto significativo.
Apraz-me constatar que o Sr. Deputado reconhece que não diminuíram o IRC, porque a legislatura não foi até ao fim e não puderam concluí-la, o que indicia que há medidas que os governos tencionam adoptar que não são tomadas logo no início mas só no fim, daí que não compreenda a pressa do Sr. Deputado em que o PS execute já todas as medidas neste Orçamento, sendo certo que tem uma legislatura até 2009. Sr. Deputado, dê-nos algum tempo para que muitas medidas possam vir a ser implementadas até ao fim da legislatura, tal como vocês consideraram ser necessário.
Relativamente ao escalão adicional de IRS, parece-nos, quando se pede um esforço a todos os portugueses em torno desta consolidação orçamental, que os titulares de rendimentos mais elevados também deverão dar um contributo, que é marginalmente pouco significativo.
Gosto muito de ler textos de académicos e de gurus externos, mas muitas vezes esses textos são feitos sem conhecimento da realidade, são meros exercícios académicos com muito pouca aderência à realidade.
Contudo, eles dizem (não ouvi, mas fio-me nas palavras do Sr. Deputado) que há que consolidar para assegurar a competitividade fiscal, e eu concordo, mas primeiro temos de consolidar e é isso que queremos fazer agora.
Em seguida, darei a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento para prestar alguns esclarecimentos adicionais, designadamente quanto às questões das despesas com pessoal.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Ernesto Augusto Santos): — Srs. Deputados, vou cingir-me ao esclarecimento da questão das despesas com pessoal.
Em primeiro lugar, como preâmbulo à resposta, gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de a informação constante no nosso Orçamento ser muito mais detalhada do que a que foi dada no Orçamento do Estado para 2005.
Sobre essa matéria, muito concretamente, se olharmos para o Quadro 3.2.12., que está na página 74 do Relatório e o compararmos com o quadro do ano passado, que era o quadro 3.2.11., poderemos observar que este ano decompomos as Despesas com Pessoal nas suas três componentes principais, que são: as Remunerações certas e permanentes; os Abonos variáveis ou eventuais; e as Contribuições para a Segurança Social, neste caso são as contribuições para a Caixa Geral de Aposentações, dado que a segurança social do regime público não é igual à dos privados, e fizemo-lo porque cumprimos estritamente o que está preceituado no sistema europeu de contas. Essas transferências do Estado são, pois, uma contrapartida da contribuição patronal que os privados fazem para a Segurança Social.
Portanto, nesse quadro encontra-se a desagregação que permite perceber que o que está em causa não é apenas as Despesas com Pessoal, que, efectivamente, apresentam um decréscimo de 2,5%, mas se olharmos com maior atenção para as Remunerações certas e permanentes, que são uma das componentes desse agregado, verificaremos que o crescimento já é de 1,9%.
Perguntará o Sr. Deputado: então, 1,9% será o limite máximo para a actualização da tabela salarial? Isso não é verdade, porque nas Remunerações certas e permanentes também temos de entrar em linha de conta com, pelo menos, quatro elementos fundamentais.
O primeiro desses elementos é o valor de base, que, como o Sr. Deputado sabe, é o que apurámos em Julho de 2005, ou seja, é a situação existente à data de elaboração do nosso Orçamento.
Todavia, para além desse elemento, quais são os outros que vão influenciar a verba das Remunerações certas e permanentes? Um desses elementos é, naturalmente, a actualização da tabela salarial, mas não é o único. Então, e o efeito do emprego? Ao contrário do que o Sr. Deputado argumentou na sua intervenção, mesmo que as medidas de reestruturação da Administração Pública não dêem aquele resultado muito significativo que o senhor gostaria de ver imediatamente no ano de 2006 (com certeza, vê-lo-á mais tarde), sabemos que há outras medidas, essas verdadeiramente estruturais, que vão influenciar esse valor.
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Por exemplo, será que o aumento progressivo da idade da reforma dos funcionários públicos não vai ter um efeito nas despesas, não nas Despesas com pessoal, mas nas da Caixa Geral de Aposentações? Com certeza que sim, e este é um elemento do puzzle.
Por exemplo, o estabelecimento da regra, que o Governo já anunciou, de que o Estado e o conjunto das administrações públicas apenas poderão admitir um funcionário público por cada dois que se aposentem, permitirá uma redução do emprego na função pública, portanto, temos aqui um efeito no sentido da diminuição.
Se tivéssemos apenas aquela taxa de 1,9% para a actualização salarial conjuntamente com menos emprego, até poderíamos acomodar um aumento da tabela salarial superior a 1,9%, contudo há outros elementos, pelo que não posso dizer-lhe que o aumento da tabela salarial equivale à taxa de crescimento prevista para as Remunerações certas e permanentes.
Há ainda um terceiro elemento, que não referi, que é o efeito das promoções não automáticas, que também está incluído nas Remunerações certas e permanentes, que joga ao contrário daquele que acabei de referir, ou seja, enquanto que a diminuição do emprego permite acomodar mais actualização da tabela salarial, as promoções não automáticas aumentam as Remunerações certas e permanentes dos funcionários públicos, mas não por via da actualização da tabela.
Ora bem, todos estes quatro elementos têm de ser combinados entre si e é desse conjunto que deverá sair, e sairá com certeza, a possibilidade de acomodar um maior ou menor aumento na actualização da tabela salarial dos funcionários públicos.
Como o Sr. Ministro referiu, não podemos dizer qual é esse valor, porque ele resultará de uma negociação prévia com os sindicatos da função pública, negociação essa prevista na nossa Constituição.
Sr. Deputado, no ano passado, tínhamos uma equação, uma incógnita e é evidente que não tirávamos muito dali, porque a incógnita era só Despesas com pessoal; este ano, temos três equações, três incógnitas. Ora, é um sistema um pouco mais complexo, dali não é possível tirar a solução linear e imediata para a actualização da tabela salarial, mas, mesmo que fosse, nós não tomaríamos este sistema de três equações com uma solução única, porque o Sr. Deputado recorreria aos seus conselheiros matemáticos, que lhe dariam, com certeza, as soluções para as duas incógnitas anteriores e concluiriam deterministicamente que estava ali a actualização salarial, só que o Sr. Deputado não foi por esta via mas, sim, pela da comparação de mapas da lei com o que está no Relatório.
Agora, farei um pequeno preâmbulo para dizer que devemos ser um dos países do mundo que mais informação dá, à partida, para a discussão pública do Orçamento. E desafio o Sr. Deputado a consultar o âmbito de divulgação de orçamentos do Estado de outros países, tanto a nível europeu como mundial… Se o Sr. Deputado me permitir direi até que o que temos é mais do que uma proposta de lei, do ponto de vista da divulgação, é um verdadeiro plebiscito.
Neste momento, todos, tanto os Srs. Deputados como os jornalistas, podem confrontar as verbas até ao último cêntimo e, inclusive, ver as verbas do PIDDAC por região, todas as verbas do nosso Orçamento estão inscritas e acessíveis. É evidente que a consulta do Orçamento não é fácil, tem alguma complexidade, porque há muitas metodologias que estão implícitas na passagem de uns quadros para os outros, nomeadamente contas públicas e contas nacionais, mapas que têm despesas com activos e despesas sem activos, mapas que têm dotação provisional e mapas que não têm dotação provisional, porque não podem ter… Por exemplo, não se pode ver logo, como o Sr. Deputado gostaria, qual é a parte da dotação provisional prevista no Mapa para a actualização da tabela. Infelizmente, não podemos fazer essa explicitação, porque, embora toda a informação esteja lá, inclusivamente a dotação provisional, não é possível, porque há algum grau de indeterminação, saber exactamente qual é o valor que está implícito no nosso Orçamento para a tabela salarial.
O que posso dizer-lhe – e o Sr. Ministro já o referiu – é que é o possível e o adequado para, no contexto de negociação salarial, decidir qual vai ser a actualização salarial dos funcionários públicos.
O Sr. Presidente (Patinha Antão): — Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, antes de passar a palavra ao próximo interveniente, que é o Sr. Deputado Afonso Candal, do Partido Socialista, permito-me levar ao conhecimento de todos a existência de uma solicitação no sentido de que alunos de uma escola secundária, que estão de visita à Assembleia, possam assistir ao nossos trabalhos.
Julgo que não haverá oposição de nenhum dos Srs. Deputados, nem do Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, não me oponho.
O Sr. Presidente: — Queria informar que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ainda pretende fazer um esclarecimento adicional em matéria de receitas fiscais.
Gostaria de dizer que tomámos todos a devida nota da qualificação de plebiscito, que o Sr. Secretário de Estado fez relativamente à proposta de lei do Orçamento do Estado, dado que é a primeira vez que a ouvimos.
Agora, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
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O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (João Amaral Tomaz): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Frasquilho, antes de mais, agradeço as perguntas que formulou.
Quanto à questão do IVA, efectivamente, pode haver algumas dúvidas em relação às transferências mas é perfeitamente claro e, aliás, já justifiquei, também na Comissão de Orçamento e Finanças, a estimativa de 250 milhões de euros para este ano e de 900 milhões de euros para o próximo ano, tendo explicado o porquê.
As transferências estão a ser feitas regularmente quer para a Caixa Geral de Aposentações, quer para a Segurança Social e, contrariamente àquilo que alguns pensavam, não está a haver quebra de receita imputável ao aumento da taxa de 19% para 21%.
Portanto, fizemos uma estimativa relativamente prudente mas tendo em conta que eram quatro meses. Só para lhe dar um exemplo: no mês passado, seguramente, atingimos os objectivos, este mês – e trata-se de informação de sexta-feira que tive oportunidade de ler hoje de manhã, antes de vir para a Assembleia – já vamos com cerca de mais 70 milhões, imputáveis ao aumento de taxa, o que faz com que os 250 possam, eventualmente, vir a pecar por excesso e não por defeito, o que é uma notícia que me apraz registar. Mas isto também tem um pouco a ver com aquilo que eu havia anunciado na altura, que era o esforço que ia ser feito na cooperação com Espanha, para fazermos o cruzamento. Portanto, basicamente, é esta a razão, está a resultar e espero que continue a resultar nos próximos meses.
Quanto às pensões, tem havido algumas informações que não estão totalmente correctas. O abaixamento da dedução específica, de 8283 para 7500 não implica que quem ganhe mais de 7500 passe a pagar imposto, porque, como sabe, há a dedução a que todos os contribuintes têm direito, aquela dedução standard para os contribuintes não casados, casados, etc.
O número exacto onde passa a haver alguma pequena tributação é de 9691 euros. De qualquer modo, queria que ficasse aqui bem claro que esta análise era no pressuposto de que não houvesse qualquer aumento das pensões no próximo ano, com um cenário de crescimento zero, o que não corresponde à realidade.
Se o aumento das pensões for de 1% – tenho vários cenários e isto está calculado na nossa calculadora –, o ponto de indiferença vai situar-se em 14 384 euros, se for de 1,5%, já vai situar-se em 42 571 euros, se for de 2%, situar-se-á em 44 538 euros, e assim sucessivamente. Portanto, por aqui se vê que, efectivamente, esta questão não tem a dramatização que muitas vezes se lhe atribui e, como o Sr. Ministro teve oportunidade de dizer, estava prevista no PEC.
O Sr. Deputado tocou num aspecto sobre o qual concordo sempre consigo, que é o da simplificação.
Temos de simplificar mais o sistema fiscal e essa é uma aposta que consta do relatório.
Como o Sr. Deputado sabe, fizemos aprovar, no mês passado, em Conselho de Ministros, um pacote de medidas de simplificação – é pouco mas é o que, de momento, se pode fazer –, e estou altamente esperançado de que, no próximo ano, com o relatório do Grupo de Trabalho – Simplificação do Sistema Fiscal Português, presidido pelo Professor António Martins, haja possibilidade de se avançar a sério neste domínio. O sistema fiscal é demasiado complexo, tem de ser simplificado e, por isso, esta é uma aposta em que estamos particularmente empenhados.
Quanto à questão da competitividade, também só quero mostrar o acordo de princípio quanto à necessidade de termos uma fiscalidade mais apoiante do desenvolvimento das empresas e há uma medida que reputo de extremamente importante mas não está no Orçamento, porque não precisa nem deve lá estar, uma vez que pode ser resolvida através de um mero despacho normativo, que é a da aceleração dos reembolsos aos exportadores, de que, aliás, já falei aqui, nesta Assembleia.
A partir do próximo ano vamos ter um sistema de reembolsos praticamente automático, tendo em conta o elemento factor de risco e uma selectividade maior para detectar as empresas que estão a usufruir ou a beneficiar de reembolsos indevidos.
Portanto, esta é uma aposta que vamos fazer, não posso anunciar já qual o mês em que vai avançar, porque isto implica alterações informáticas, mas tudo aponta que seja possível já em Março, porém, não posso garantir, totalmente, que seja em Março ou em Abril, porque pode haver qualquer atraso no desenvolvimento informático. Será, no entanto, uma realidade e também me parece ser de sublinhar.
Quanto à questão do pagamento especial por conta, o Sr. Ministro referiu, e bem, qual era a razão: não há aqui o objectivo da receita fiscal, não é isso que nos move, é uma medida que visa, de certo modo, tornear ou contornar situações de empresas que, escandalosa e sistematicamente – e estou a falar de empresas de grande dimensão –, apresentam resultados nulos ou negativos. É que estas empresas, como o Sr. Deputado sabe, se quiserem reaver o pagamento especial por conta, e é deste que estamos a falar, podem solicitar uma fiscalização para obterem o reembolso do montante que pagaram.
Portanto, o alvo está perfeitamente definido, até porque para a empresa que apresenta lucros coloca-se apenas a questão de um float, uma vez que o pagamento especial por conta é deduzido à colecta, mas atacam-se, de imediato, situações que, em meu entender, são profundamente escandalosas.
Muito obrigado.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Este conjunto de respostas está concluído, pelo que tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.
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O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, começo por considerar este Orçamento como um orçamento diferente. Há, de facto, uma preocupação extrema de rigor, há uma preocupação de detalhar a informação acima daquilo que tem sucedido ao longo dos anos, enfim, em relação a todos os Orçamentos que conheci, sem distinções entre partidos.
É um Orçamento de contenção mas, principalmente, de consolidação, que tem uma reposição de verbas em despesa, ou seja, também há despesas que sobem, não há cortes cegos e generalizados, como já foi evidenciado pelo Sr. Ministro.
Portanto, é um Orçamento que, sendo de contenção e de consolidação, é também de consagração daquelas que foram algumas das principais propostas políticas feitas pelo Partido Socialista em campanha eleitoral e, posteriormente, pelo Governo, no seu Programa de Governo.
Este é o Orçamento necessário, nesta fase que atravessamos no País, que é uma fase difícil, e muitas das medidas até poderão não ser medidas populares mas são justas e necessárias considerando as circunstâncias. E, por isso, considero que este é, de facto, um bom orçamento, um orçamento ao serviço do País e das principais propostas eleitorais do PS.
Daquelas que têm sido as prestações públicas e as posições manifestadas, também alguns partidos da oposição consideram este Orçamento como globalmente positivo. É evidente que temos de compreender que, sendo este Orçamento globalmente positivo, não é um orçamento neutro, ou seja, tem opções políticas e, portanto, é normal que os partidos mais responsáveis da oposição olhem para ele como o orçamento necessário para a situação do País mas que, de alguma forma, entendam que uma ou outra opção, caso fossem Governo, seria diferente. Portanto, é de destacar a concordância com a globalidade do Orçamento, compreendendo que possa haver diferenças pontuais, normais e até desejáveis em democracia, para que possa também haver, enfim, uma objectivação das posições de cada um.
Mas relativamente a isto, parece-me que este Orçamento tem uma aposta clara, ou seja, este Orçamento não teme correr o risco de alguma impopularidade, em nome da defesa e da sustentação daquelas que são as principais áreas de política social em Portugal.
Este Governo aposta determinadamente na sustentabilidade do sistema de Segurança Social, este Orçamento olha com olhos diferentes dos de sempre ou, pelo menos, dos dos últimos anos, para o Serviço Nacional de Saúde, com uma aposta no rigor e na responsabilização de todos os agentes, fazendo, pela primeira vez, uma dotação verdadeira e abandonando a prática escandalosa da suborçamentação crónica do Serviço Nacional de Saúde, bem como outros truques, esses, sim, claramente truques, de que falarei mais à frente.
Este não é, portanto, um Orçamento neutro. E, Sr. Ministro, V. Ex.ª é um académico reputado, conheço-o já há alguns anos, mas sei que também é um homem de convicções e até de convicções políticas, pelo que este não é apenas um orçamento técnico, é um orçamento que, obviamente, tem restrições fortes, nomeadamente a questão da rigidez da despesa e muitas outras restrições que não permitem a um Governo ter todo o espaço de manobra que, eventualmente, desejaria, mas, mesmo assim, considerando essa circunstância, é um orçamento com claras marcas políticas.
É também um orçamento que, pela primeira vez, aborda, de forma detalhada e determinada, de acordo e coerentemente com aquele que tem sido o discurso e a prática, principalmente a prática política deste Governo, uma profunda reestruturação dos serviços públicos, ou seja, o processo de auditorias, de que há muitos anos se fala como fundamental para racionalizar os meios e promover poupanças onde há desperdícios e fusão de serviços onde há duplicação de objectivos e de missões. E, nesta medida, este Orçamento, sobre a questão da Administração Pública, tem um capítulo muito importante e que, de alguma forma, também marca diferença em relação a idênticos documentos no passado.
Por outro lado, a questão da gestão do património do Estado também é abordada numa perspectiva muito mais profunda e abrangente do que normalmente tem sucedido. E outra das reivindicações que normalmente se ouvem, em termos daquela que é a gestão da coisa pública, é a de o Estado passar a gerir melhor o seu próprio património, rentabilizando-o, diminuindo custos onde eles sejam excessivos, pelo que, também neste ponto, este Orçamento marca uma diferença.
Relativamente à questão salarial, se me permitem, também se trata de uma questão crónica, ou seja, é verdade que, em todos os Orçamentos, normalmente, esta questão é suscitada pelo Partido Comunista Português, principalmente quando os Orçamentos são feitos por um Governo do Partido Socialista. Aliás, não trouxe agora mas trarei daqui a pouco algumas cópias de jornal onde vêm declarações e entrevistas do Sr. Deputado Octávio Teixeira e do Sr. Deputado Lino de Carvalho sobre a questão do congelamento dos salários da função pública, onde se referia que, olhando para o Orçamento e feitas as contas à dotação provisional, aos mapas e aos quadros, não era possível, de forma alguma, o Governo do Partido Socialista fazer aumentos, os aumentos estariam congelados, etc… Bom, a realidade acaba sempre por desmentir aqueles que são alguns fantasmas lançados aquando destas discussões. Mas, repito, terei oportunidade de trazer esses recortes, porque, enfim, até do ponto de vista histórico e fazendo jus ao combate político e à memória do Deputado Lino de Carvalho, é bom recordarmos que, de alguma forma, já todos conhecemos algumas técnicas que são repetidas neste campo.
Sobre as SCUT, penso que está tudo dito, o que me parece interessante é que o Sr. Deputado Miguel Frasquilho diga hoje que o PSD é contra as SCUT, porque – repare-se! – houve um intervalo de governação
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do Partido Socialista de três anos, em que alguém esteve no Governo, e presumo que tenha sido o PSD, o Sr. Deputado Miguel Frasquilho foi, inclusivamente, na altura, Secretário de Estado do Tesouro, pelo que sabe bem que foi o PSD que esteve no Governo, mas, volvidos três anos, a situação em relação às SCUT continua rigorosamente na mesma.
Portanto, é muito curioso que quem teve responsabilidades diga que é contra mas, efectivamente, nunca o tenha sido. Esta é que é a evidência mas, enfim, mais tarde, certamente, poderemos ter debates mais precisos sobre esta questão.
Quanto ao combate à evasão e à fraude fiscais, parece-me também uma das apostas determinadas, com medidas inovadoras, que consta deste Orçamento, nomeadamente a da divulgação da lista de contribuintes faltosos, em termos das suas obrigações quer perante a Segurança Social, quer perante o fisco. Penso que este tipo de medidas é importante, terá, certamente, um efeito dissuasor mas se o efeito dissuasor for nulo, pelo menos, há o efeito de informação, no sentido de que todos saibamos quem nos deve dinheiro, porque quem deve ao fisco e à Segurança Social deve a todos nós e é importante que os contribuintes possam saber quem lhes deve dinheiro, porque é disto que estamos a falar.
Pergunto ao Sr. Ministro se, de alguma forma, já sabe ou se há alguma ideia — admito que não, mas perguntar não custa — sobre a forma de divulgação desta lista, ou seja, se os mecanismos para essa divulgação já estão pensados ou se serão trabalhados a partir do momento da aprovação da ideia base, o que também seria razoável.
A questão do controlo e inspecção da fiabilidade dos sistemas informáticos também me parece bem importante, assim como uma outra medida, em relação à qual também peço esclarecimentos concretos, que decorre da transposição de uma das duas directivas transpostas neste Orçamento, relativa à tributação de empresas que se deslocalizem.
Sr. Ministro, gostaria de saber como funcionará esta medida em concreto. Penso que os objectivos são perceptíveis, mas gostaria de saber quais são os mecanismos desta tributação, que, no fundo, é uma medida dissuasora da dita deslocalização ou, pelo menos, de tributação de algumas operações.
Por outro lado, e agora não só pelo aumento desta tributação como pela diminuição, mas que é uma aposta bastante substancial e significativa, temos a questão da dedução em sede de IRS da compra de computadores; temos também, por exemplo, o facto de os empréstimos contraídos para os projectos para a Sociedade da Informação e do Conhecimento ao nível municipal não estarem englobados no cálculo do endividamento das autarquias… Portanto, também aqui há sinais importantes de direcções e marcas políticas próprias.
Também ao nível das alterações feitas ao sistema fiscal dos Plano de Poupança Reforma (PPR), aos benefícios fiscais, apesar de haver uma reposição destes instrumentos de acordo com o significado do nome PPR, há alterações substanciais do ponto de vista da sua lógica. Ou seja, passa a haver uma vantagem para quem use o Plano de Poupança Reforma de acordo com aquilo para que ele foi imaginado, ou seja, para ser efectivamente um complemento à reforma.
Quem usar esse dinheiro a título de renda terá benefício face a quem resgate o capital e, no fundo, não fará outro uso dos PPR que não o de um depósito a prazo com benefício fiscal, ou seja, vai depositando o dinheiro e, ao fim de cinco anos, tem o benefício fiscal e levanta o capital acumulado. Portanto, apesar de aparentemente se tratar de reposição, há alterações políticas significativas que, uma vez mais, deixam uma marca própria.
Nos pagamentos especiais por conta há um aumento do tecto máximo, mas não há uma alteração da sua fórmula, o que quer dizer que haverá empresas que irão pagar mais por conta, mas não serão as mais pequenas. O problema é que as empresas, a partir de certo ponto, pagariam todas 40 000€, enquanto agora algumas passam a pagar 70 000€.
As empresas que pagarão 70 000€, como o Sr. Ministro disse e bem, são as que têm um volume de negócio na ordem dos 35 milhões de euros, mais exactamente de 34,5 milhões de euros, mas começa a haver um pagamento superior a partir daquelas que já pagavam os 40 000€. Portanto, se não me falham as contas, as empresas que vão pagar acima de 40 000€ são as que têm 19,5 milhões de euros de volume de negócio por ano, o que equivale — só para percebermos a dimensão ao milímetro — a 1,6 milhões de euros/mês, 54 000€/dia e 2257€/hora. Ou seja, são empresas que têm um volume de negócio na ordem dos 500 contos/hora, portanto, não estamos a falar de uma pequena empresa (digo-o para tranquilizar os pequenos empresários que possam, de alguma forma, sentir-se atingidos com esta medida).
Não estamos a falar nem de pequenas nem de médias empresas mas, sim, de empresas de uma gama média/alta, as quais terão um agravamento no pagamento que, como o Sr. Ministro disse e muito bem, é por conta. Não se trata de um agravamento da tributação, dos impostos; trata-se, sim, de aumentar a progressividade da medida de pagamento especial por conta e alargá-la para partilha, pois é também uma medida de equidade entre empresas.
No que se refere à tributação de pensões, trata-se também de uma medida de equidade, apresentada há muito tempo, que prevê que, a seu tempo, os rendimentos oriundos do trabalho e os rendimentos vindos de pensões tenham um tratamento fiscal idêntico, que é o que acontece no grosso dos países da União Europeia, à excepção de outros três países para além de Portugal, como consta do relatório. Portanto, este é um primeiro passo nesse sentido, mas é um passo moderado, até porque a aproximação dos montantes da dedução
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específica, a ser feito a este ritmo, demoraria seis anos (ou, pelo menos, mais cinco anos para que os montantes se encontrassem), o que demonstra a moderação desta medida.
É evidente que esta medida pode criar algum aumento de carga fiscal, mas estamos a falar de um aumento, nomeadamente para os contribuintes cujos rendimentos não ultrapassam o escalão mínimo do IRS e que, por isso, têm e continuarão a ter uma taxação de 10,5%, que pela diferença da dedução específica será de 82,21€/ano, o que equivale a 1300$/mês. Em qualquer circunstância, como já foi dito pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, esta medida só terá impacto para rendimentos na ordem dos 140 contos/mês (falando na moeda antiga). Portanto, em rendimentos de 140 contos/mês traduzir-se-á em mais 1300$.
Isto é feito numa lógica de aproximação gradual, porque a questão é muito simples: por que é que quem tem rendimentos de pensões na ordem dos 9500€ não paga qualquer imposto e quem tem rendimentos de trabalho desta mesma grandeza paga já um valor razoável e substancial de impostos? Portanto, é preciso ter em conta esta discriminação. Não basta dizer que não se quer a tributação sobre as pensões, que esta é uma medida injusta; é preciso explicar por que é justo o tratamento diferenciado entre um e outro sistema.
Há uma outra medida a sublinhar, a perda do direito à dedução específica para rendimentos acima do 40 000€/ano, que é, mais uma vez, uma medida de equidade que permite aumentar a progressividade do imposto e torná-lo mais justa.
Em relação à questão fiscal gostaria também de ter algum esclarecimento sobre o Imposto Automóvel. Não deixa de ser curioso que associações do sector tenham leituras completamente diferentes das consequências deste imposto.
A Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel (ANECRA) diz que se verifica uma diminuição global de 2,4%; a Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP) diz que se traduz num aumento de 7,7%. Perante esta situação, que é pública, pergunto ao Governo, que certamente fez cálculos, ensaios e simulações, qual é o impacto desta medida, porque a informação que vai sendo dada em termos públicos é claramente contraditória.
Sr. Ministro, no que se refere às autorizações legislativas constantes do Orçamento do Estado, e que são diversas, a minha pergunta é exactamente no sentido de precisar quantas autorizações legislativas estão previstas neste documento.
O Sr. Ministro já fez uma abordagem sobre as privatizações mas, caso seja possível, peço-lhe que adiante mais alguns detalhes, compreendendo que é normal haver alguma reserva quanto a estas matérias.
Uma outra alteração constante do Orçamento é a relativa ao prazo máximo para empréstimos a emitir e para operações de endividamento, que passa de 30 anos para 50 anos. Sr. Ministro, quais são o impacto e o objectivo desta alteração na gestão da dívida do País? Finalmente, já V. Ex.ª fez referência à questão do endividamento líquido e à diminuição desse tecto face ao que constava para 2005. Portanto, apesar de muito se falar de que o tecto é muito acima disto ou daquilo, a verdade é que está francamente abaixo do tecto que constava como limite de endividamento líquido para o ano de 2005 (e não falo apenas no Orçamento inicial, mas também do rectificativo), mais concretamente representa uma diminuição de mais de 13% face ao tecto para 2005.
Sr. Ministro, há aqui uma questão política a que há pouco fiz referência e que me parece importante. No meio destas regularizações há uma que não pode passar despercebida, quer pelo seu montante quer por sucessivamente ter sido feita denúncia da situação: refiro-me aos famosos 800 milhões de euros da área da saúde para pagar as comparticipações com medicamentos. Ou seja, trata-se de uma operação efeito «bola de neve», que apareceu no Orçamento do Estado para 2003, se não me falha a memória, com 300 milhões de euros de autorização de adiantamentos do Tesouro à Saúde; apareceu no Orçamento seguinte já não com 300 milhões de euros mas, sim, com 600 milhões de euros; e apareceu no último ano já não com 600 milhões de euros mas, sim, com 800 000 de euros, o que demonstra que, de facto, o Estado estava a pagar a alguns fornecedores com dinheiro que não tinha — esta é a realidade! Aliás, esta matéria foi aqui diversas vezes discutida.
Portanto, Sr. Ministro, a pergunta que lhe faço objectivamente é no sentido de saber se V. Ex.ª tem, neste momento, informação rigorosa (caso contrário, certamente que o Ministério da Saúde a terá) sobre o valor que destes 800 milhões de euros de adiantamentos do Tesouro, que mais tarde teriam de ser transformados em empréstimos bancários, foi utilizado pelo sector da saúde, ou seja, quanto é que, neste momento, é preciso pagar. E repare-se que, uma vez mais — e aqui está a política de verdade e de transparência —, será este Governo a assumir os encargos financeiros que não foram assumidos pelo governo anterior durante três anos.
Portanto, estamos a falar de assumirmos, neste Orçamento, encargos com as comparticipações de medicamentos respeitantes a três anos.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, temos um lote de muitas questões para responder. Assim, dado até o detalhe de algumas das questões colocadas, penso que os Srs. Secretários de Estado terão aqui uma boa oportunidade para intervirem, justificando também a sua presença, que considero importante e relevante.
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Antes de passar a palavra aos Srs. Secretários de Estado gostaria de vincar bem um aspecto que me parece politicamente importante.
O Governo esforçou-se por apresentar um Orçamento do Estado credível, sério, sem truques, malabarismos ou artifícios, como temos vindo a dizer, apontando uma estratégia de consolidação correcta. Julgo que o facto político importante a relevar é aquele que o Sr. Deputado Afonso Candal referiu: esta proposta de lei de Orçamento do Estado mereceu uma aprovação de amplos sectores políticos, incluindo da própria oposição.
Sem dúvida que os representantes da oposição, sejam seus porta-vozes ou não, colocam as suas reservas e cautelas, como, aliás, fica sempre bem a quem se encontra na oposição, mas gostaria de frisar que o próprio Sr. Deputado Miguel Frasquilho — cito o seu nome porque faz parte desta Comissão — teve oportunidade de afirmar que o caminho proposto é globalmente positivo.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Parcialmente negativo!
Risos do PSD.
O Orador: — E dois anteriores ministros do PSD afirmaram que o Orçamento do Estado tem intenções que subscreveriam, tendo um deles referido que a proposta é globalmente positiva, embora considerasse que dever-se-ia ser mais ambicioso no corte da despesa, aliás, observação que ouvimos anteriormente por parte do Sr. Deputado Miguel Frasquilho.
Mas, curiosamente, um conhecidíssimo comentador político do PSD afirmou que duvida de que se o PSD estivesse no governo fosse capaz de ir mais longe do que o PS nos cortes da despesa pública. Isto revela bem a ambição que está presente a este Orçamento do Estado. Mas trata-se de uma ambição com realismo, porque também temos consciência de quão difícil é o caminho a traçar. Por isso não estamos a prometer, como houve a tentação no passado, «mundos e fundos» e que num ano vamos mudar tudo radicalmente.
Temos consciência de que não é fácil, já que isto requer trabalho aturado, determinação e firmeza, e é isso o que vamos ter pela frente.
Mais: conforme disse na minha intervenção inicial, como temos consciência de que um Orçamento com esta ambição realista vai ser um Orçamento exigente no âmbito da execução, acautelamos mesmo esse âmbito reforçando os poderes do Ministro das Finanças no controlo dessa execução, e reforçando também os mecanismos de controlo e de acompanhamento da execução, para prevenir eventuais derrapagens e surpresas desagradáveis.
Quanto às questões que levantou, gostaria de pedir ao Sr. Secretário de Estado da Administração Pública que desse alguma informação adicional quanto à reestruturação dos serviços públicos — como tive oportunidade de referir, o Sr. Secretário de Estado poderá acrescentar um pouco mais sobre esta matéria —, quanto às questões do património do Estado, das privatizações, da gestão da dívida e do serviço nacional de saúde, no que respeita ao tal endividamento e à cobertura de encargos através de operações de tesouraria, peço ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças que dê também sobre elas alguns esclarecimentos, e, finalmente, peço ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que comente as várias questões de natureza fiscal que levantou.
Se o Sr. Presidente me dá licença, peço ao Sr. Secretário de Estado da Administração Pública que complemente o que já foi dito quanto à reestruturação dos serviços públicos.
O Sr. Presidente: — Com certeza.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (João Figueiredo): — Srs. Deputados, relativamente às reformas a introduzir nas administrações públicas, e na sequência, aliás, da exposição já feita pelo Sr. Ministro, que não foi só uma exposição na generalidade, pois abordou muitos aspectos de pormenor e de especialidade, gostaria de sublinhar algumas das reformas que já foram introduzidas e que produzirão impacto ao nível da despesa no próximo exercício orçamental: a reforma que foi feita nos subsistemas de saúde na Administração Pública, com a sua conformação ao nível da ADSE, que produzirá imediatos efeitos no exercício orçamental de 2006; a aprovação e apresentação a esta Assembleia da proposta de lei relativa às alterações gerais a introduzir ao regime geral da aposentação dos funcionários públicos, que também produzirão efeitos, em termos de execução orçamental, em 2006; a revisão de cerca de 30 regimes especiais de aposentação, com preocupações de convergência com o regime geral de aposentação dos funcionários públicos e com o regime geral de aposentação dos demais trabalhadores, que está praticamente em vias de ser concluído — sê-lo-á ate ao final deste ano .-, produzindo efeitos já a partir de Janeiro do próximo ano e que, portanto, também terá impacto no exercício orçamental de 2006; uma medida que, aliás, já foi aprovada pela Assembleia da República, a que tem a ver com o congelamento das progressões de natureza praticamente automática na evolução das carreiras, que também produzirá efeitos no exercício orçamental de 2006.
Isto é o que foi feito e que permite ao Governo, nesta proposta de lei de Orçamento do Estado apresentada à Assembleia, ter alguns objectivos ambiciosos em matéria da redução da despesa.
Mas há outras medidas que, como o Sr. Ministro de Estado e das Finanças já adiantou, estão a ser desenvolvidas, concretamente o programa de reestruturação da administração central, que está estreitamente rela-
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cionado, e que deve ser estreitamente relacionado, com a revisão dos regimes de supranumerários. Portanto, este programa está em marcha e é nesse quadro que se fará a avaliação das missões dos vários ministérios e das estruturas que suportam o cumprimento dessas missões.
Gostaria de dizer, a propósito do facto de várias figuras importantes da vida pública terem vindo a público afirmar que não estava a fazer-se o aproveitamento de trabalhos anteriores, que todos os trabalhos anteriores que têm relevância para esta matéria estão a ser objecto de aproveitamento. Mas também é preciso dizer-se, relativamente a alguns trabalhos anteriores — e estou a referir-me, concretamente, ao que diz respeito às funções de Estado —, que, sendo o relatório de avaliação das funções do Estado que foi elaborado um exercício académico interessante, não é um documento operacional, isto é, não é um documento do qual se retirem, de facto, conclusões concretas, efectivas, para a redução dos aparelhos administrativos. É um relatório interessante e inspirador, mas que precisa de ser muito completado, que precisa mesmo de acções suplementares muito vastas para que dele se possam tirar conclusões.
A par disso gostaria de dizer que um outro trabalho realizado, o da avaliação dos institutos públicos, é útil na perspectiva da avaliação da «criticidade» dos institutos públicos, no que respeita à sua qualificação jurídica e no que respeita a algumas indicações que dá em matéria de fusões e de extinções de institutos públicos.
Mas nele é preciso também reconhecer-lhe algumas limitações, na medida em que não aborda toda a problemática, naturalmente, da administração directa do Estado, que precisa, toda ela, de ser objecto de revisão.
Também não faz propostas de reestruturação interna relativamente aos institutos públicos a manter, por forma a poder libertar recursos.
Logo, este programa de reestruturação da administração central tem como objecto, neste momento, a avaliação de toda a administração directa do Estado, a avaliação dos institutos públicos na sequência do trabalho já realizado mas também exigindo o seu completamento, e pensa-se que estamos a conduzir os trabalhos a um ritmo adequado, que nos permita começar a obter resultados concretos a partir de Março do próximo ano, mais concretamente entre Março e Junho do próximo ano. Não é possível, realisticamente, antecipar dados e decisões concretas antes desse tempo, porque estes trabalhos têm de ser feitos e, como os Srs. Deputados muito bem sabem e compreendem, face à sua amplitude e à profundidade que devem ter levam tempo a ser executados.
Para além da reestruturação da administração central, gostaria de referir que também está em marcha a revisão do sistema de carreiras e remunerações, que — esse sim — justifica a medida anteriormente apresentada a esta Assembleia de congelamento das progressões; está também em marcha o desenvolvimento de mecanismo de reforço de controlo de admissões na Administração Pública.
Daí que, nesta proposta de lei do Orçamento do Estado, se chame a atenção para as normas que foram apresentadas e que constam da proposta de lei, as que dizem respeito à «dificultação» de transferências ou de movimentos de mobilidade entre a administração local e a administração central. Porquê? Porque temos vindo a verificar, pelos últimos dados que estão disponíveis, que é precisamente através destes mecanismos de mobilidade entre as administrações local e central que se identificam possibilidades de aumento de número de efectivos nas administrações públicas. Com esta medida que propomos à Assembleia da República levantamos um obstáculo a esse aumento de efectivos.
Por outro lado, na proposta de lei do Orçamento do Estado foram também incluídas várias normas que reforçam o controlo em determinados sectores do Estado que não tinham um controlo suficientemente apertado. Estou a referir-me, concretamente, a sectores com os da Defesa, da Administração Interna, do Ensino Superior e a alguns sectores da Educação.
Finalmente, há um conjunto de normas que foram introduzidas na proposta de lei do Orçamento do Estado que têm a ver com a actualização da base de dados de recursos humanos da Administração Pública. É uma base de dados que está desactualizada e, para que o Governo possa conduzir as suas políticas — e antes da sua substituição por mecanismos mais ágeis e mais actualizantes dos dados que são necessários —, foram introduzidas normas que permitem a sua actualização à data de 31 de Dezembro deste ano.
A par de outras reformas, que, aliás, já foram aqui referidas pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças, permito-me sublinhar estas e sobre elas dar esclarecimentos complementares, ficando à disposição dos Srs. Deputados caso não tenha sido suficientemente claro ou caso necessitem de informações.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças (Carlos Costa Pina): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, começarei por responder a um dos pontos focados pelo Sr. Deputado Afonso Candal — e não sei se a ordem foi exactamente esta — o das privatizações.
Relativamente a esta questão o que pode ser dito, desde já, é que, em cumprimento do que estava previsto no Programa de Estabilidade e Crescimento, será dada sequência a um programa de privatizações. Mas aqui, na preparação e na divulgação destas medidas, julgo que é importante referir que serão retomadas aquelas que nos parecem ter sido as boas práticas de transparência seguidas entre 1995 e 2001, uma vez que o sucesso de um programa de privatizações pressupõe clareza na política seguida e nos sinais que são dados ao mercado.
Por isso mesmo, o programa de privatizações será objecto de aprovação através de uma resolução de Conselho de Ministros, onde se definirão as empresas potencialmente abrangidas e será fornecido um calen-
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dário indicativo para a realização de operações, sem prejuízo, naturalmente, da sua sujeição às melhores condições de mercado.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças já teve a oportunidade de referir — e, aliás, isso consta também do relatório do Orçamento do Estado — que o programa abrangerá, em especial, sectores como a pasta e o papel, a energia e os transportes e comunicações.
Um aspecto importante é o de que qualquer política de privatizações tem de ser feita acautelando o equilíbrio financeiro global do sector empresarial do Estado. Aqui deve ser dito que a consolidação orçamental que está a ser feita a nível do sector público administrativo será necessariamente reforçada por uma maior eficiência do sector público empresarial, traduzida, naturalmente, nos seus resultados globais e, portanto, não sendo feita à sua custa.
Paralelamente, gostaria de salientar duas outras importantes medidas a propósito das empresas públicas, começando pela da adopção, no próximo ano, de um código de boas práticas de governo empresarial para as empresas públicas, que são, no fundo, as melhores práticas de corporate governance a que muitas empresas já estão sujeitas, reforçando com isto a transparência e o profissionalismo deste sector, e, além disso, aprovando um novo Estatuto do Gestor Público, cujo anteprojecto está já a ser elaborado por uma comissão presidida pelo Sr. Prof. Dr. Jorge Miranda.
Portanto, relativamente a esta matéria o Governo não tem dúvidas sobre qual o caminho que deve ser seguido.
Em matéria de gestão do património imobiliário, de facto, um dos aspectos da sua gestão, que consta, aliás, da proposta de lei, tem que ver com a consagração da afectação de receitas da alienação do património aos serviços públicos a que os imóveis estavam afectos. Portanto, como regra geral, estabelece-se que parte das receitas (até 25%) reverterá, em regra, para os serviços a que os imóveis estavam afectos, estabelecendo-se, naturalmente, algumas excepções, em especial nas áreas das chamadas funções de soberania, e que até 75% dessa receita possa reverter para serviços na área dos negócios estrangeiros e das forças e serviços de segurança, ou até 100% no caso dos imóveis afectos à Defesa Nacional e à Justiça.
Portanto, julgamos que estas são medidas importantes e que devem ser levadas a cabo para incentivar o que designaríamos por uma gestão activa do património imobiliário. Isto a par, naturalmente, da redefinição das necessidades de espaço por parte dos serviços, por referência a indicadores eficientes de ocupação do espaço, e, ao mesmo tempo, em articulação com o processo de reforma da Administração Pública que será levado a cabo, em função também da libertação de espaços que venha a ser conseguida, teremos, naturalmente, imóveis que o Estado, por não necessitar deles, deve alienar, poupando os contribuintes a custos de manutenção e conservação com imóveis de que não necessita.
Para enquadrar tudo isto, é intenção do Governo proceder à aprovação de um novo regime jurídico de gestão do património imobiliário público. Hoje, deparamo-nos, nesta matéria, com um panorama legislativo perfeitamente disperso e caótico, com legislação importante que data dos anos 30, ou seja, do início do Estado Novo, com dúvidas relativamente a alguma legislação que ainda é do final do século XIX. E, portanto, é uma área onde muita coisa precisa ser feita e onde, sob o ponto de vista também do respectivo ordenamento jurídico, importa trabalhar.
Paralelamente, será aprofundado o processo de recenseamento de imóveis da Administração Pública.
Nesse sentido, o Conselho de Ministros aprovará, brevemente, uma resolução tendo em vista, precisamente, recensear e conhecer mais aprofundadamente o seu património imobiliário. Como se costuma dizer, «aquilo que não se pode medir não se pode gerir». E, portanto, para se poder gerir o património, tem de se conhecer quantitativamente a realidade que temos à nossa frente.
Finalmente, ainda relativamente ao património imobiliário, em cumprimento quer do Programa do Governo quer do Programa de Estabilidade e Crescimento, avançaremos também com a introdução do princípio do pagamento de renda pela Administração Pública. Esta é também uma das medidas que, como há pouco dizia, será fomentadora de uma gestão patrimonial activa do património imobiliário, em estreita articulação quer com as efectivas necessidades de ocupação quer com a capacidade de suportação do custo para os serviços públicos da utilização dos imóveis. Esta medida não irá gerar aumento de custos mas, sim, a explicitação de custos ocultos que, neste momento, o Estado tem, mas não conhece nem mede.
Relativamente à questão da dívida pública e do aumento do prazo para 50 anos, aquilo que está previsto no projecto de articulado é uma mera autorização. Embora a política de dívida pública seja conduzida autonomamente pelo Instituto de Gestão de Crédito Público, não está, neste momento, prevista qualquer operação de emissão de dívida com este prazo. Entendemos, no entanto, que seria adequado acautelar a possibilidade de este prazo ser utilizado, tendo em conta as perspectivas de estabilidade de longo prazo do euro e o facto de alguns países, como a França e o Reino Unido, já se terem socorrido desta possibilidade. Aliás, há já hoje investidores institucionais que apreciam este tipo de produtos financeiros a longo prazo, designadamente fundos de pensões, não encontrando muitas vezes os produtos mais adequados para a composição das respectivas carteiras. Portanto, é uma mera possibilidade que se consagra — se se utiliza, ou não, é algo que será avaliado, em concreto, quando a situação surgir, se for o caso.
Por fim, relativamente à questão das dívidas do Serviço Nacional de Saúde, aquilo que se procurou fazer neste Orçamento foi consagrar, na norma relativa à disponibilidade de verbas para regularização de situações do passado, a possibilidade de emissão de dívida pública para cobrir precisamente estes encargos decorren-
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tes de situações do passado. Portanto, os 800 milhões de euros da saúde estão previstos nessa norma e explicitados no mapa do relatório relativo às necessidades líquidas de financiamento. Aquilo que aqui pretendemos fazer é também, tão-só, garantir uma política financeira de transparência, de rigor e de verdade, porque consideramos que não faz sentido manter aquilo que vinha sendo a prática habitual dos anos anteriores, em que a dívida existia, a Direcção-Geral do Tesouro antecipava as verbas, o IGIF (Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde) com essas verbas procedia ao pagamento aos respectivos credores e, depois, pedia um novo empréstimo para regularizar a situação junto do Tesouro. Ora, esta situação não faz qualquer sentido e, precisamente por ser insustentável, o valor em causa se foi avolumando ao longo dos anos. Queremos, assim, acabar com essa situação, regularizá-la de uma vez por todas. E será isso que será feito.
Também quanto a este ponto, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças já se referiu, pelo que peço desculpa pela repetição, mas é importante que fique absolutamente claro: não há aqui, para este efeito, duplas contagens das necessidades líquidas de financiamento, na medida em que o valor dos 800 milhões de euros está contido nos 10,8 mil milhões de euros de autorização de endividamento prevista na proposta de lei do Orçamento. Portanto, não há duplas contagens. O valor está previsto de uma forma transparente que, parece-nos, é perfeitamente rigorosa.
Julgo que eram estas as questões fundamentais. Nada mais vou acrescentar por agora.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, vou ser muito rápido para responder às três questões que o Sr. Deputado Afonso Candal colocou.
Vou começar pela primeira, que diz respeito à divulgação das empresas que tenham dívidas fiscais. Ainda não está tomada uma decisão, mas, em princípio, parece-me que a solução de divulgação através do próprio site da Direcção-Geral dos Impostos talvez seja a mais aconselhável.
De facto, tomámos já uma decisão em relação à fraude que o Sr. Ministro referiu há pouco — a «fraude fénix», em que empresas cessam a actividade, mas continuam a inundar o mercado com facturas para defraudar o fisco. Só se avançará (e espero poder avançar logo em Janeiro) com esta disposição, quando os contribuintes sujeitos a IRC tiverem ao seu dispor uma disponibilidade informática que permita controlar se o seu fornecedor é, ou não, uma empresa com actividade fiscalmente cessada. Só assim é que se poderia avançar.
Também neste domínio, penso que a melhor solução será avançar através da divulgação via Internet.
A questão da deslocalização de empresas está tratada em três artigos: está tratada na transposição da directiva comunitária que o Sr. Deputado referiu; está tratada numa outra disposição que tem a ver com o tratamento fiscal dos prejuízos de empresas que mudam a sua sede ou direcção efectiva para outro país — a explicação consta das págs. 21 e 22 do relatório, pelo que me poupo a repetir o que está lá escrito; e junto um terceiro elemento, que aparece depois tratado numa outra página do relatório, que tem a ver com os benefícios fiscais. Também aqui se pretende legislar no sentido de, nos contratos de investimento directo estrangeiro, no chamado «regime contratual», ficar sempre uma norma que regule qual é o tratamento fiscal a dar às empresas que fruíram de benefícios fiscais em Portugal e depois deslocalizam para outro país. Trata-se, portanto, de três medidas concretas.
O imposto automóvel é uma questão interessante, porque as duas análises são válidas, mas partem de pressupostos diferentes.
Queria só explicar o que é que está no Orçamento do Estado. No Orçamento fez-se a actualização até ao dia 1 de Julho normal, isto é, como se não houvesse uma modificação do sistema em vigor, e a partir do dia 1 de Julho diminuiu-se, em média, 10% o imposto automóvel e introduziu-se uma componente ambiental com penalizações para as viaturas mais poluentes. Portanto, é este o objectivo.
Qual a diferença entre os cálculos que foram feitos pela ANECRA e pela ACAP? A diferença é basicamente a seguinte: a ACAP fez as comparações em relação à tributação este ano, quando a ANECRA — e, quanto a mim, mais correctamente — fez a comparação entre a tributação a partir do dia 1 de Julho e a tributação antes do dia 1 de Julho de 2006. Portanto, logo aqui há uma diferença de 2,3%, que é a taxa de indexação que foi utilizada.
Uma segunda razão — e esta parece-me, talvez, a mais forte das diferenças — é que, enquanto a ACAP tomou em linha de conta, em termos estáticos, as emissões que existiam, a ANECRA tomou em linha de conta os anúncios de redução feitos pelos fabricantes, que apontam para uma redução de 1% este ano e 2% no próximo ano. Portanto, é essa a razão para a diferença dos valores.
De qualquer modo, queria chamar a atenção para a necessidade de se proceder a um pequeno ajustamento no 1.º escalão, no que se refere à parte ambiental, pelo seguinte: quando foram feitos os cálculos, não se tomou em linha de conta uma situação concreta que existe, que é a de uma viatura (e, se calhar, há mais do que uma) que tem uma cilindrada inferior a 700 cm
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. Para não haver um aumento de tributação neste caso concreto, que é uma viatura específica, era necessário que o imposto automóvel fosse negativo. Assim, para tornear essa situação, estamos a ver o que é que se pode fazer através de uma medida específica para este caso, porque a tributação em IA já era tão baixa que a redução de 10% não é compensada pela taxa ecológica ou pelo elemento ecológico.
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De qualquer modo, há uma lógica em todo o sistema, que é esta: em todos os países que têm impostos com esta natureza — com a componente ambiental — considera-se que existe um mínimo que qualquer viatura, mesmo que seja pouco poluente, deve pagar, porque há sempre emissões por pequenas que sejam. Portanto, vamos propor uma pequena alteração em relação ao 1.º escalão para acomodar este caso concreto que não tinha sido previsto quando as contas foram feitas.
O Sr. Presidente: — Com esta intervenção, concluem-se as respostas do Governo às questões levantadas pelo Sr. Deputado Afonso Candal.
Com a anuência do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, visto que temos de possibilitar uma gestão equilibrada do tempo, vamos previsivelmente prolongar o nosso debate por mais meia hora, para que não haja desequilíbrio, designadamente nas intervenções desta primeira ronda.
Tem, agora, a palavra, em nome do Partido Comunista Português, o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, agradeço a observação preliminar, porque, até agora, só ouvimos quem considera o Orçamento globalmente positivo. Era bom que se desse alguma margem de manobra àqueles que não têm essa perspectiva e que o tempo disponível não fosse exíguo, porque há aqui muito a esclarecer e a debater e espero, naturalmente, a complacência e a participação da equipa das finanças.
Sr. Ministro, uma vez que este é o primeiro debate orçamental, é aqui que começa o debate do Orçamento.
Nesse sentido, deixe-me começar por lhe colocar uma questão prévia, que gostaríamos de ver esclarecida de uma forma definitiva, mas bem esclarecida, já hoje! Na quinta-feira, dia 13 de Outubro, realizou-se, nesta Casa, uma série de reuniões com o Sr. Ministro e os diversos grupos parlamentares, onde foi possível trocar impressões absolutamente genéricas sobre as grandes orientações relativas ao Orçamento do Estado, que foi apresentado depois, no dia 17. Foi no dia 17 de Outubro que os partidos e o País ficaram a conhecer aquilo que são os números concretos do Orçamento.
Só que, Sr. Ministro, exactamente nesse dia, no dia 17 de Outubro, um jornal económico de referência deste país dizia que o Ministro português das finanças, uma semana antes, isto é, a 10 de Outubro, tinha estado em Bruxelas, tinha conversado com o Sr. Comissário dos Assuntos Económicos da Comissão Europeia, Joaquín Almunia, a quem tinha dado nota, segundo consta da notícia, do cenário macroeconómico e dos principais números e medidas do documento.
Portanto, a questão prévia, Sr. Ministro, torna-se evidente perante esta notícia. Das duas uma: ou a notícia é falsa e nada disto ocorreu e o Governo português não foi no dia 10 de Outubro apresentar os números à Comissão Europeia — e portanto, se é falsa, é bom que se diga aqui, hoje, para tranquilidade de todos, e é pena que, durante estes 15 dias, o respectivo desmentido não tenha sido comunicado ao jornal em questão, para publicação... — ou, a outra hipótese, a notícia é ser verdadeira. Se assim for, então, o Sr. Ministro deve uma explicação óbvia a este Parlamento. Deve, ainda, uma explicação ao País no sentido de se saber por que é que, do ponto de vista do Governo, a prioridade está em informar a Comissão Europeia sobre o Orçamento e não, como está previsto na Constituição e na lei, vir a esta Casa apresentá-lo, em primeiro lugar, no prazo legal.
Portanto, Sr. Ministro, agradecia que me esclarecesse devidamente, por uma questão de princípio, de ética.
No que se refere ao Orçamento e ao seu conteúdo, insistiu-se durante esta manhã, mas não só, em que o mesmo é credível, sério, sem truques, sem medidas extraordinárias, sem alçapões — e cito um conjunto de adjectivos utilizados para caracterizar este Orçamento.
Ora, seria bom que o Orçamento fosse tudo aquilo que citei, mas a verdade é que, em nossa opinião, infelizmente, não é.
Confesso, Sr. Ministro, que só ainda não tínhamos ouvido dizer o que ouvimos hoje, de manhã, da parte do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, ou seja, que este Orçamento é um plebiscito.
Se fosse um plebiscito, Sr. Secretário de Estado, certamente seria submetido ao voto dos portugueses e seria rejeitado. Não é um plebiscito e admito que a maioria da maioria do Grupo Parlamentar do Partido Socialista seja mais confiante do que o povo português. De facto, o Orçamento não é um plebiscito nem tem informação a mais. O que terá, certamente, é informação credível a menos.
Retorno agora aos «rótulos» que se pretendem colar a este Orçamento e para colocar-lhe algumas questões, Sr. Ministro.
Custa-me sempre aceitar o adjectivo «credível» aplicado a um documento que traça um cenário macroeconómico que altera aquele outro que, há quatro meses atrás, era igualmente credível.
Não se trata de mudar a credibilidade ao fim de um ano, como é normal e razoável acontecer. Não, passaram apenas quatro meses! Não sei se, eventualmente, teria sido teimosia do seu antecessor não vislumbrar o que outros já vislumbravam, não aceitar o que outros já aceitavam, ou se se trata de um critério de credibilidade e de prudência diferente, mais rígido, menos flexível do que há quatro meses, no fundo, Prof. Teixeira Santos, menos flexível do que era o do Prof. Campos Cunha — «ponhamos os nomes aos bois», sem qualquer conotação negativa, evidentemente! Portanto, repito que custa-me que, em quatro meses, tenha havido uma mudança e desvios tão importantes em previsões no cenário macroeconómico, como, por exemplo, um desvio superior a 30% quanto ao cres-
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cimento para este ano, superior a 22% quanto ao crescimento para o ano que vem, superior a 50% quanto à formação bruta de capital fixo, etc.
A propósito de credibilidade, vou colocar-lhe quatro questões, algumas das quais certamente retomarão as que foram suscitadas por quem me antecedeu.
Como é possível sustentar que haverá um acréscimo de exportações de quase 6%, em 2006, sabendo-se que, em 2005, a previsão é no sentido de não serem superiores a 1,2%? Pergunto, pois, Sr. Ministro, o que vai acontecer na economia portuguesa.
Há pouco, disse que haveria uma contenção, um esmagar de custos — preparem-se os trabalhadores deste país porque, pelos vistos, o acréscimo nas exportações vai ser conseguido à custa de um aumento de competitividade obtido à custa do esmagar dos «grandes» salários dos trabalhadores portugueses! O Sr. Ministro disse também que os resultados previstos seriam obtidos através de uma compressão de margens de lucro. Ora, gostava de perceber como é que isto se faz e agradecia-lhe que conseguisse esclarecer-me.
Em segundo lugar, como é possível falar em credibilidade do Orçamento e não se ter falado em taxa de desemprego — e estamos aqui há quase três horas? Nenhum dos Srs. Deputados que me antecedeu, nenhum dos membros do Governo que interveio até este momento falou em desemprego.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Já lá íamos!
O Orador: — E a questão é esta: num cenário revisto de diminuição da produção de riqueza, de diminuição do PIB, de diminuição da actividade económica, como é que o Governo não altera a taxa de desemprego — e, obviamente, tinha de alterar para mais e não para menos? Não se consegue entender como é que mantém a taxa de desemprego exactamente igual à do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), à do Orçamento rectificativo. Acha que isto é credível, Sr. Ministro? Num cenário macroeconómico ainda mais deprimido, acha que é credível manter uma taxa de desemprego como a que aqui consta? Em terceiro lugar, num quadro de diminuição do PIB, um decréscimo do PIB para 1,1%, portanto, uma diminuição de cerca de 20% relativamente ao crescimento da riqueza, como é possível, em nome dessa credibilidade, que as receitas fiscais venham acrescidas de 3000 milhões de euros? Como?...
Tal como V. Ex.ª disse, já estavam previstos todos os aumentos dos impostos indirectos que, em conjunto, vão permitir uma receita adicional de cerca de 350 milhões de euros.
No que se refere ao IVA, prevê-se um acréscimo de cerca de 1000 milhões de euros. Como é possível e credível permitir-se prever um aumento das receitas do IVA com uma actividade económica cujo acréscimo previsto é tão inferior? Como é possível prever, para 2006, um aumento da receita do IRS de cerca de 500 milhões de euros, apenas com a alteração da taxa máxima de 40% para 42%, ainda por cima com o aumento da despesa fiscal decorrente da reintrodução do benefício fiscal que constitui maior despesa fiscal? Como é que isto é credível? Será só por via do aumento da eficiência fiscal? Ninguém acredita que seja possível! O Sr. Ministro já o disse aqui mas permito-me duvidar que seja possível obter um aumento de receitas fiscais desta natureza sem que haja uma nova mexida a nível fiscal durante o ano que vem, seja nas taxas reduzidas de IVA, seja na taxa normal de IVA, seja em quaisquer outras.
Em quarto lugar, como é possível falar na inexistência de suborçamentação na saúde se o Orçamento prevê um custo semelhante ao de 2005? Como é isto possível? Em que é que o Governo se baseia, que elementos novos vai trazer-nos, hoje, amanhã ou depois, que permitam tornar credível uma afirmação destas, Sr.
Ministro? Por outro lado, diz-se que o Orçamento não tem truques, que é sério.
A este propósito, faço-lhe duas perguntas, Sr. Ministro das Finanças: como é que o Orçamento pode ser sério e não ter truques se não cumpre a Lei de Bases da Segurança Social, por exemplo, no que diz respeito à questão essencial das transferências para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social? Como pode ser sério um Orçamento que não cumpre a Lei das Finanças Locais? Na sua intervenção inicial, o Sr. Ministro disse que, quanto a transferências, o Orçamento cumpria a lei.
Não, não cumpre! A Lei das Finanças Locais não é cumprida! Sr. Ministro, porque acho que se trata de uma questão política que não quero escalpelizar aqui, hoje, já nem vou pôr a questão de saber se o não cumprimento das Lei das Finanças Locais segue uma decisão do tempo do Prof. Cavaco Silva. Quer dizer, o Eng.º Sócrates retoma, em 2005, o que tinha sido uma prática dos governos do Prof. Cavaco Silva, em inícios dos anos 90. Durante mais de 10 anos, a Lei das Finanças Locais foi cumprida... Eu não queria entrar por aí, mas apenas sublinhar isto que disse. Nem sequer queria abordar a questão do que pode ser entendido como uma fraude política. É que este segredo, que era uma espécie de segredo de Estado, foi divulgado pelo Governo oito dias depois de terem terminado uma campanha eleitoral onde se escondeu este incumprimento legal, como se fosse um segredo de Estado.
Repito, pois, que não quero entrar por aí, mas queria colocar-lhe uma questão numérica e de seriedade.
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Como é possível o Governo dizer que vai cumprir a Lei das Finanças Locais, manter as transferências para as autarquias e, simultaneamente, criar um enorme «saco azul» para os 109 amigos — não é para os «101 Dálmatas»… — …
Risos do PS.
…, para os 109 amigos do Partido Socialista? É que, ao não cumprir a Lei das Finanças Locais, o Governo poupa 50 milhões de euros e, depois, cria um artigo, um «saco azul» com até 200 milhões de euros para distribuir pelas autarquias, por contratos-programa.
Sr. Ministro, como é que isto é sério? Cria um fundo de maneio para distribuir pelos amigos que é quatro vezes o valor da verba que seria necessária para cumprir a Lei das Finanças Locais?! Entendamo-nos: isto é o paradigma da falta de seriedade, Sr. Ministro! Peço-lhe desculpa pela frontalidade com que o digo, mas isto tem de tudo menos de seriedade.
A propósito de truques, quero colocar-lhe uma questão sobre mais um: explique lá, Sr. Ministro, qual é o truque relativamente à dotação provisional para os aumentos da função pública.
Entendamo-nos: em primeiro lugar, será que a dotação provisional está devidamente contabilizada para efeitos de determinação do défice? O que é que, de facto, vai ocorrer com o aumento de vencimentos dos funcionários públicos? Sr. Ministro, sei que não quer entrar em detalhes, mas responda-me a esta pergunta: vai ou não haver uma nova perda de poder de compra para os trabalhadores da função pública? Qual é a sua previsão? O Sr. Secretário de Estado do Orçamento disse também que temos de atender à diminuição em volume do emprego dos funcionários públicos. Traduzamos isto «por miúdos», Sr. Ministro! Sejamos frontais, claros e sérios: o que é que isto significa? Qual vai ser a diminuição, em números, do efectivo dos funcionários públicos que os senhores estão a prever para o ano 2006, através de despedimentos, através de rescisões? Qual vai ser o número? Dito de outra maneira e, se quiser, complementarmente, qual é o número de pessoas que estão a prever que entre no quadro de excedentes e qual vai ser o valor da remuneração das mesmas? Faço esta pergunta para percebermos claramente o que vai acontecer com a política salarial, para o ano.
Finalmente, passo à questão das receitas extraordinárias.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro acaba de dizer-nos que o programa de privatizações vai retomar as «boas práticas» assumidas pelo governo, entre 1995 e 2001.
Sr. Secretário de Estado do Tesouro, atendendo à sua juventude, receio bem que ainda não tenha tido tempo de estudar o caso da privatização da TAP, aliás, do «romance» da privatização da TAP versus Swissair. Mas se são essas as «boas práticas» entre 1995 e 2001, ó Sr. Secretário de Estado, estamos fartos dessas «boas práticas»!... E nem sequer lhe estou a colocar a questão política das privatizações!! Se isso é boa prática, não vale a pena retomar essas «boas práticas» que quase levaram à bancarrota a companhia de bandeira nacional, por arrastamento da falência da Swissair, Sr. Secretário de Estado!! Quanto a privatizações, é claro que vamos ter o mesmo romance que tínhamos com o Prof. Campos e Cunha: ninguém vai saber aqui quais são as empresas que os senhores querem privatizar. Vou insistir nisto n vezes e n vezes os senhores vão dizer que não podem dizer, porque provém de resolução do Conselho de Ministros, etc.
Quero, no entanto, abordar esta questão sob um ponto de vista formal, porque, sob o ponto de vista político, estamos conversados. Então, afinal, este Orçamento não tem receitas extraordinárias, Sr. Ministro? Não tem?! Estes 1600 milhões de euros, que resultam de receitas provenientes das privatizações, não são receitas irrepetíveis, não são receitas extraordinárias? Então, o que são? Só não são receitas extraordinárias porque não podem contar para o controlo do défice? Ah, é só por isso que não são receitas extraordinárias?! Mas podem contar para o controlo da dívida pública — ou não podem?!... —, que é um dos dois critérios do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Então, qual é o conceito de «extraordinário»? É a sua natureza irrepetível ou o destino para que são obtidas essas receitas? É que o conceito de «extraordinário», em português (e não em portu… qualquer coisa), é um só e não pode ser manipulado! Assim sendo, se o Orçamento em vigor previa 400 milhões de euros de receitas extraordinárias resultantes de privatizações, Sr. Ministro, comparativamente com o que está em vigor, a sua proposta multiplica por quatro as receitas extraordinárias resultantes de privatizações — e este é um dado objectivo a que os senhores não podem fugir, nem por mais rótulos que ponham ao Orçamento.
Uma palavra final, Sr. Ministro, para lhe dizer o seguinte: não são bons para um Governo socialista — é, antes, o pior que lhe pode acontecer — os elogios vindos da bancada do PSD sobre o Orçamento, porque isso mostra bem qual é a natureza política das opções políticas que estão por trás deste Orçamento.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, ouvi com atenção as suas observações e começo por comentar que extraordinário é o raciocínio de V. Ex.ª, que, se me
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permite, arrogando-se em arauto da seriedade e do rigor, levanta todo um conjunto de suspeições, procurando manchar a reputação e a seriedade de quem é responsável pela apresentação desta proposta de Orçamento.
Começo pela questão prévia que levantou, de uma notícia, que saiu num jornal, sem qualquer fundamento.
E garanto-lhe: é mentira! E lamento que o Sr. Deputado, sem se dar ao cuidado de comprovar ou não essa notícia, tenha sido um propagador dessa mentira num canal de televisão. Lamento…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas foi desmentida pelo Governo?
O Orador: — Sr. Deputado, tenho um objectivo, que é apresentar a esta Assembleia um Orçamento. Se eu tivesse de desmentir as notícias erradas que saem nos jornais, não faria outra coisa. Portanto, tenho de definir prioridades.
E, se o Sr. Deputado ficou muito preocupado com essa notícia, o senhor, sabendo que está em causa a imagem e a reputação de uma pessoa, de um Ministro das Finanças do seu país, deveria, pelo menos, de ter tido o cuidado de, junto do Ministério das Finanças, ou através dos meios parlamentares adequados, esclarecer essa questão, antes de, ligeiramente, ter propagado essa mentira num canal de televisão.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Só tinha resposta daqui a um mês…!
O Orador: — Permita-me, pois, que lhe aponte essa questão. Compreendo que tenha ficado preocupado, pelo que isso representa de renúncia à autonomia e à soberania, mas devo garantir-lhe, Sr. Deputado,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Devia era agradecer-me por lhe dar a oportunidade de nos esclarecer!
O Orador: — … que nunca pus em causa aquilo que são os interesses do Estado português e da sua soberania. E, após a apresentação da proposta de Orçamento e sua discussão no âmbito do Governo, a primeira entidade que teve conhecimento dessa proposta foi esta Assembleia.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem! Dei-lhe a oportunidade de o fazer aqui e agora!
O Orador: — Isso está garantido. E ponto final! Se me permite, acho que não vale a pena estarmos a falar mais do assunto.
Quanto à questão da informação que é prestada, entendemos que a informação que está no Orçamento é credível. O Sr. Deputado diz que tem informação a menos, mas não disse qual. Porém, repito que estão perante um documento que procura não esconder nada e que queremos seja o mais claro possível. Admito que poderá haver aspectos não facilmente inteligíveis, mas para isso aqui estamos, para esclarecer e para explicar. E é com todo o gosto que estou aqui, nesta Câmara, pelo tempo que for necessário, para esclarecer todas as questões.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não é um «plebiscito», portanto…!
O Orador: — Não joguemos com palavras! Estamos perante um documento que é público, a que os portugueses podem aceder e que podem comentar. Não joguemos com as palavras num sentido que nunca se lhes pretendeu dar. Trata-se de um documento que foi colocado ao escrutínio da opinião pública e de todos os portugueses e é esse o sentido. Não vale a pena entrar num jogo de palavras, porque isso é desviarmo-nos do essencial, que deve ser uma discussão séria do Orçamento.
Sobre a questão que o Sr. Deputado coloca quanto ao cenário, o facto de o cenário que agora é apresentado ser revisto em comparação com o cenário de há quatro meses só reforça a sua credibilidade, não a questiona. É que, Sr. Deputado, devemos ter consciência de que estes cenários macroeconómicos e estas projecções para o futuro estão muito influenciadas pela própria evolução presente e linhas de evolução que podemos percepcionar no momento actual com implicações no futuro. E não faria sentido algum que mantivéssemos uma previsão macroeconómica para 2006 ignorando aquilo que se passou nos últimos quatro meses, designadamente no comportamento do preço do petróleo e na conjuntura internacional, com as previsões da conjuntura internacional não só na Europa mas também em todo o mundo.
E é fundamental, se queremos um Orçamento de verdade, um Orçamento realista, que ele assente num cenário macroeconómico actualizado. Aliás, recordo que essa é uma preocupação patente em várias organizações internacionais que, periodicamente, apresentam actualizações dos cenários macroeconómicos — normalmente, há uma previsão na Primavera, outra no Outono... Portanto, com regularidade, a informação recente é incorporada nas previsões que fazemos para o futuro. Este é um exercício saudável, que temos de fazer e que, repito, só reforça a credibilidade do nosso cenário.
No que se refere à sua questão sobre as exportações, chamo a atenção para que nós revimos em baixa, em comparação com o tal cenário, de que gostava tanto, do PEC, a taxa de crescimento das exportações, pelo que aqui também há prudência nessa previsão. E, como referi, Sr. Deputado, o quadro no qual projecta-
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mos este crescimento das exportações tem a ver com uma previsão do aumento da procura internacional, globalmente, de 6%, como mencionei, e também com um pressuposto quanto à evolução dos custos de produção, sejam custos salariais sejam margens de lucro. A evolução destes custos será determinada pelas condições do mercado no mercado de trabalho, no mercado de produtos, que condicionarão obviamente a progressão destes custos; não o será por acto legislativo ou político.
O Sr. Afonso Candal (PS): — Muito bem!
O Orador: — Efectivamente, não estamos numa economia de planeamento central, onde isso seja feito de cima para baixo, por um acto do Governo; isso irá resultar (e é essa a nossa previsão) do próprio ajustamento do mercado a esta situação conjuntural.
Quanto à taxa de desemprego, não se falou, mas no relatório está presente — e não se falou até agora, mas falou o Sr. Deputado, pelo que a questão não foi ignorada e certamente é um assunto que deve merecer a nossa atenção.
A taxa de desemprego mantém-se, porque não resulta do nosso modelo e das interacções existentes um agravamento do desemprego. É que também não há aqui uma relação mecânica entre crescimento e taxa de desemprego. Assim, é perfeitamente compatível que tenhamos um crescimento global ligeiramente abaixo do previsto há quatro meses, compatível com a manutenção da taxa de desemprego tal como se previa há quatro meses — não vejo aí qualquer problema.
Relativamente às receitas fiscais, garanto-lhe que não haverá mexidas nos impostos, Sr. Deputado. A previsão do acréscimo de receita fiscal é, como tive oportunidade de referir, de 6,8%, que compara com o acréscimo, este ano, de 6,7%. Este ano, a nossa previsão é de um aumento, como digo, de 6,7% da receita fiscal, mas posso informá-lo de que a receita acumulada, até ao final de Setembro, cresceu, em relação ao período homólogo do ano passado, 8,9%. Portanto, 6,7% não é uma meta impossível, este ano, nem é uma meta impossível para o próximo ano.
Mas permita-me que entre em algum detalhe nesta matéria, porque me parece importante esclarecer. Uma parte do aumento da receita fiscal tem a ver com o aumento do IVA e o impacto global do aumento, em dois pontos percentuais, do IVA está estimado em cerca de 900 milhões de euros. Ora, como a nova taxa do IVA já entrou em vigor este ano, este ano já se arrecadaram, em virtude desse acréscimo, 250 milhões de euros, o que quer dizer que, comparando 2006 com 2005, o acréscimo, em boa verdade, vai ser de 650 milhões de euros. Se retirarmos ao aumento da receita fiscal estes 650 milhões de euros, que resultam do IVA e que foi uma medida extraordinária, o crescimento da receita ficará nos 4,6%, de 2005 para 2006.
E façamos aqui um exercício um pouco, digamos, de «contas nas costas de um envelope», quer dizer, sem grande rigor econométrico, mas um exercício que, julgo, é aproximado do que isto representa: se o aumento nominal do Produto vai ser de 3,4% — ou seja, 1,1% de crescimento real, mais 2,3% do deflactor —, a receita fiscal tenderá, grosso modo, a acompanhar a evolução do Produto. Podemos discutir se a elasticidade é unitária ou não, são questões de pormenor técnico, mas, grosso modo, podemos tomar esta aproximação de que a receita fiscal vai acompanhar a evolução do Produto em 3,4%. Sobra 1,2% — e foi aqui que apostámos (e julgo que o Sr. Deputado concorda) no combate à fraude e à evasão fiscais e na melhoria da eficiência. E é esse o ganho que vamos buscar, que é 1,2% do IVA.
Creio, com isto, ter explicado o porquê desta previsão da receita fiscal.
Não há suborçamentação na saúde, Sr. Deputado Honório Novo, mas, sim, um esforço de contenção. O que acontecia é que, até este Orçamento, a suborçamentação gerava um ambiente de falta de credibilidade na gestão financeira da saúde: ninguém acreditava que os plafonds definidos na saúde fossem para cumprir e, portanto, ninguém se sentia obrigado a cumprir fosse o que fosse! Ora, esta orçamentação, que é rigorosa, realista mas exigente, permite ao Ministro da Saúde definir metas financeiras credíveis e impor o seu cumprimento, a par dos mecanismos que iremos estabelecer de acompanhamento e controlo da execução fiscal. E há várias medidas importantes, como sejam: a melhoria e a racionalização da gestão, a política do medicamento e toda uma séria de medidas que estão identificadas no relatório e que terão, com certeza, um impacto significativo na contenção da despesa — mesmo na saúde —, sem suborçamentação.
Disse o Sr. Deputado que a Lei de Bases da Segurança Social não é cumprida, mas não me explicou porquê! A Lei de Bases da Segurança Social está a ser cumprida…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não está! Refiro-me aos dois pontos percentuais de transferências, Sr.
Ministro!
O Orador: — … e a transferência que é feita está de acordo com a Lei de Bases.
A Lei das Finanças Locais é cumprida. Chamo a atenção do Sr. Deputado de que o artigo 21.º da proposta de lei refere que, em 2006, a participação das autarquias se mantém ao nível do ano de 2005, não se aplicando o n.º 1 do artigo 14.º-A e os n.os 4 e 5 do artigo 15.º da Lei das Finanças Locais. Ora, o enquadramento legal de execução deste Orçamento derroga a Lei das Finanças Locais ou, por outras palavras, a Lei das Finanças Locais é a que vai passar a vigorar a partir desta lei do Orçamento, e essa lei vai ser cumprida
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Mais: independentemente deste facto, acima da Lei das Finanças Locais há uma lei de valor reforçado, aprovada por esta Câmara — a Lei de Enquadramento Orçamental —, que no seu artigo 88.º, n.º 1 (tenham paciência e permitam-me que o leia), estabelece o seguinte:…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu conheço-o, mas pode lê-lo!…
O Orador: — … «Para assegurar o estrito cumprimento dos princípios da estabilidade orçamental e da solidariedade recíproca, decorrentes do artigo 104.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia e do Pacto de Estabilidade e Crescimento, a lei do Orçamento pode determinar transferências do Orçamento do Estado de montante inferior àquele que resultaria das leis financeiras especialmente aplicáveis a cada subsector, sem prejuízo dos compromissos assumidos pelo Estado no âmbito do sistema de solidariedade e de segurança social».
É à luz da lei que isto é feito! Não há, pois, qualquer incumprimento da lei e a base jurídica da opção tomada pelo Governo, no que se refere às transferências para as autarquias e regiões, é sólida, Sr. Deputado Honório Novo, no estrito cumprimento do que está na lei — e, chamo a atenção, de uma lei de valor reforçado, como é a Lei de Enquadramento Orçamental.
Quanto à questão dos «109 amigos» e do «saco azul», permita-me que diga que não sei por que é que se lembrou que a tentação seria a de beneficiar estes amigos. Não sei se está habituado a isso… Eu não estou! Portanto, não há aqui qualquer intuito de beneficiar seja quem for através de contratos-programa.
O Sr. Honório Novo (PCP): — É a história que o mostra!
O Orador: — O que se pretende com esta norma é disciplinar as relações financeiras extra-tranferências do Orçamento com as autarquias locais, que têm sido das situações mais descontroladas que temos no relacionamento financeiro entre o Estado, a administração central e as autarquias.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não são descontroladas! São, sim, bem controladas para os amigos!
O Orador: — O que aqui se pretende, precisamente, é introduzir uma norma que limite estas transferências que, sem transparência alguma, têm vindo a ser feitas para as autarquias locais. Procura-se, portanto, introduzir transparência e rigor para evitar e combater a suspeição que o Sr. Deputado está a levantar.
Vozes do PCP: — Não é verdade!
O Orador: — Desculpem, mas ouvi-os com paciência, agora ouçam-me, por favor! A dotação provisional está devidamente contabilizada no cálculo do défice. Não tenha dúvidas quanto a isso, Sr. Deputado: garanto-lhe que esta dotação provisional está devidamente considerada e contabilizada no apuramento do défice do Orçamento do Estado para 2006.
Em relação ao que vai passar-se com os vencimentos da função pública, mantenho o que já disse anteriormente; não vou desvendar seja o que for, mas garanto que não haverá despedimentos. Vai haver, sim, o recurso ao quadro de supranumerários, em que os funcionários vão ganhar inicialmente, nos primeiros três meses, o que ganham actualmente e, ao fim de três meses, como sabem, ocorre a redução de um sexto do seu salário. É o que está previsto na lei que rege o quadro de supranumerários.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Quantos?
O Orador: — Iremos ver, em devido tempo.
Quanto às privatizações, pelo menos enquanto fui responsável pela condução do processo de privatizações neste país, procurei pautar sempre essas operações com grande transparência e rigor, e creio que o consegui. Se há coisa de que me orgulho é de tê-lo, de facto, conseguido.
Contudo, os negócios têm riscos e, de facto, a operação que chegou a ser acordada com a Swissair não correu bem — há que o reconhecer.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Nós avisámos! Nós prevenimos sobre isso, aqui!
O Orador: — Mas, Sr. Deputado, não há um plano que elimine os riscos e dê segurança! Nós não vivemos numa economia que segue um plano rigoroso pré-definido onde não há riscos. Não! Há riscos, os negócios implicam riscos e, por vezes, as coisas nem sempre correm bem. Esse é um caso.
Não foi por falta de transparência, não foi por erro de opção em levar a cabo uma operação de privatização pela TAP. Aconteceu, porém, que as circunstâncias do desenvolvimento do negócio de transporte aéreo a
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nível internacional foram bastante adversas, com implicações muito negativas em particular na Swissair, o que deu no que deu.
Em matéria de receitas extraordinárias, não confundamos os portugueses também com esta matéria.
Quando dizemos que não há recurso a receitas extraordinárias referimo-nos ao recurso a este tipo de receitas para financiar as despesas do Orçamento com impacto no défice. Sempre foi o que dissemos.
A receita das privatizações não é, nesse contexto, considerada uma receita extraordinária — não é e nem o Eurostat o considera. Só que essas receitas têm um enquadramento muito rigoroso e muito preciso, e é nesse enquadramento que nós encaramos as receitas das privatizações. Isto é, são receitas que não financiam a actividade corrente nem de investimento do capital do Orçamento, mas que devem ser canalizadas para o abate da dívida. É isso que vamos fazer.
Portanto, o cálculo do défice de 4,8% para o próximo ano não tem qualquer interferência ou influência de receitas provenientes das privatizações.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
Como sugeriu muitas outras coisas nas entrelinhas, quero ter o cuidado de não deixar dúvidas também nesta matéria.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Sr. Presidente, com toda a consideração que tenho por V. Ex.ª e pela forma como normalmente conduz estes trabalhos, queria dar nota de alguma estranheza em relação à gestão dos timings a que tem obedecido esta discussão.
De facto, o Governo, o PS e o PSD, isto é, as forças políticas que estão conformadas com este Orçamento do Estado, estiveram três horas a perguntar, a responder e a comentar este mesmo documento. Contudo, às forças políticas que verdadeiramente se opõem a este Orçamento do Estado — CDS, PCP e BE —, diz-nos o Sr. Presidente, depois de ter consultado o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, vai ser dada uma hora e meia para poderem formular as perguntas e verem as mesmas respondidas pelo Governo, isto depois do Ministro das Finanças já ter dado uma especial benesse de 30 minutos, para que não sejamos prejudicados.
Ora, esta situação é completamente inaceitável e creio que é obrigação desta equipa do Governo, do Sr.
Ministro das Finanças e respectivos Secretários de Estado, dado que a gestão destes timings foi feita pelos próprios membros do Governo e pelos partidos que o apoiam, garantir aos partidos que agora estão a intervir as mesmas condições de tempo para poderem fazer os seus comentários e verem respondidas as questões relativamente a este Orçamento.
Portanto, não me parece razoável pensar que esta sessão possa terminar às 14 horas, até porque há uma segunda ronda de perguntas que, necessariamente, queremos fazer.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, permita-me que o interrompa para dizer-lhe o seguinte: as deficiências da gestão do tempo são da minha exclusiva responsabilidade. É evidente que procuro que a gestão do tempo seja feita com equilíbrio e sem interrupções, mas queria sublinhar, porque é absolutamente factual, que o Sr.
Ministro de Estado e das Finanças está perfeitamente disponível para ir para além dessa hora. De resto, teve ocasião de o afirmar, se bem me lembro, na intervenção que proferiu há pouco.
Deste modo, gostaria que todos tivessem pleno conforto de que terão disponível o tempo adequado para o debate, que é um debate de elevadíssima responsabilidade de todos nós.
O Orador: — Agradeço-lhe o esclarecimento, Sr. Presidente. De facto, é importante que o tenha dado para podermos organizar as duas intervenções que temos previstas da parte do CDS-PP.
Em primeiro lugar, queria cumprimentar o Sr. Ministro e respectiva equipa.
Começo por dar-lhe os parabéns, Sr. Ministro: realmente, é notável que um documento como aquele que apresentou à Assembleia da República tenha conseguido merecer uma espécie de consenso nacional relativamente ao universo político e de comentadores do País «politicamente correcto».
Penso que este é, de facto, um Orçamento central, porque responde, agrada e encanta o bloco central e os interesses que estão instalados à mesa do Orçamento, normalmente associados aos partidos políticos centrais da democracia portuguesa. É óbvio e normal que assim seja, porque este documento, no que é essencial, em nada modifica a forma de organização do Estado, que tem vindo a conduzir aos problemas que temos de desenvolvimento económico e de fortes défices orçamentais.
A estrutura do Estado, as funções do mesmo e a respectiva organização ficam exactamente, no final de 2006, como estavam quando V. Ex.ª tomou posse. Não é, para mim, por isso, motivo de surpresa nem me faz confusão alguma ver os partidos do bloco central aplaudirem ou considerarem globalmente positivo este documento.
Foi essa a manifestação previsível do Partido Socialista, mas também era previsível que o PSD fizesse essa mesma interpretação,…
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O Sr. Honório Novo (PCP): — É óbvio!
O Orador: — … através do seu responsável para a área das finanças, o Deputado Miguel Frasquilho, aqui presente, e secundado por figuras importantes, nomeadamente ex-ministros das finanças do PSD, como o Dr.
Miguel Beleza e o Dr. Catroga, que são também, em boa parte, responsáveis pelo estado de desenvolvimento e dos problemas orçamentais a que este País chegou. Portanto, nada me surpreende na discussão que até aqui temos tido.
As pessoas têm de compreender que o CDS diga «não» a este Orçamento do bloco central! E, Sr. Ministro das Finanças, não está em causa a seriedade do documento. Não vou entrar com um processo de intenções, embora haja algumas componentes deste documento que me parecem particularmente obscuras e que gostaria de ver clarificadas com as suas respostas. Não é um problema de seriedade; é um problema de divergência ideológica relativamente ao que deve ser o papel do Estado, à forma como o Estado se deve organizar e deve dar resposta às necessidades dos cidadãos e à forma como o Estado se deve organizar e reduzir para deixar de ser um bloqueio ao desenvolvimento e ao crescimento económico do País.
Realmente, o CDS não podia dizer «sim» nem sequer abster-se e «lavar as mãos» relativamente a uma proposta de lei de um Orçamento do Estado que ignora por completo a economia e a competitividade das empresas, que não dá o destaque fundamental ao papel da criação de riqueza por parte do sector privado, que evita uma discussão séria sobre a forma mais eficaz de combater o desemprego e que, inclusivamente, procura escamotear o impacto que necessariamente vai ter na evolução do desemprego do próximo ano pelo facto de este Governo socialista não estar a conseguir «aquecer» a economia e, bem pelo contrário, estar a «gelar» a economia face às expectativas já relativamente frias que herdou do governo anterior.
Também não podem esperar que o CDS diga «sim» ou que «lave as mãos» relativamente a uma proposta de lei orçamental que faz a necessária consolidação orçamental, mas que a fundamenta essencialmente na evolução das receitas. Sr. Ministro, não é certo nem me parece razoável dizer que, em 2006, não vão haver aumentos de impostos só pelo simples facto de muito deles já terem sido anunciados ao longo do ano de 2005 por este Governo, aliás, incumprindo as promessas eleitorais que fez. É que, precisamente a partir do dia 1 de Janeiro de 2006, os portugueses vão sentir no bolso o custo e o sacrifício de um aumento generalizado dos impostos, porque todos os impostos aumentam com base nas propostas que o Partido Socialista e o Governo socialista resolveram executar.
Posso recordar que o IRC aumenta porque são subtraídos alguns benefícios fiscais que existiam anteriormente — apesar de não ser um aumento de impostos acaba por funcionar também como se fosse, pois são estabelecidas algumas regras mais estritas nos pagamentos especiais por conta.
O IRS aumenta 7% no próximo ano porque o Governo, numa medida ideológica que criticamos e que é um incentivo a que não se crie riqueza, penalizando provavelmente aqueles que maior riqueza criam e usufruem em Portugal — e do meu ponto de vista não é pecado algum —, resolve implementar uma taxa máxima de IRS de 42%, quando a generalidade dos países nossos concorrentes na Europa está a diminuir as taxas máximas.
Há um aumento do IVA, que passa de 19% para 21%, a meio de 2005 e que se confirma durante todo o ano de 2005. É isso que explica o aumento da receita do IVA de 9%. Há um aumento do imposto sobre produtos petrolíferos; há uma maior incidência, e bastante mais abrangente, do imposto de selo, que aumenta 4%; há um aumento do imposto do tabaco, que não criticamos, mas que aumenta 9%; há uma dotação por explicar ou uma previsão de receitas fiscais ao nível das autarquias e dos municípios que aumenta 8% — e ainda gostaria de perceber a sua origem… Realmente, é pela via das receitas e do aumento generalizado dos impostos — a que não fogem sequer as pensões, que passam a ser tributadas de uma forma muito mais genérica do que eram até aqui — que se faz basicamente a necessária consolidação orçamental.
Na verdade, não estou a discutir a bondade desta consolidação, mas uma coisa é a posição ideológica que o Governo e o Partido Socialista podem ter relativamente a esta consolidação orçamental, outra é a de um partido democrata cristão de influência liberal que necessariamente entende que o esforço devia vir, sobretudo, pelo lado da despesa.
Ora, relativamente à despesa, também não se pode esperar que o CDS diga «sim» ou que «lave as mãos» relativamente a um Orçamento que é extraordinariamente tíbio e muito pouco claro no que diz respeito à reforma da despesa, que praticamente não desce. A despesa pública, no próximo ano, vai aumentar na mesma proporção do aumento da inflação. Por isso, dizer-se que se está a controlar a despesa pública é criar uma mitologia. É uma ficção porque a despesa corrente vai aumentar 2,2%, sendo que em 2005, num ano de execução socialista, aumentou 6% e a despesa total vai aumentar 2,5%, ou seja, acima da inflação. Baixa, é certo, o peso da despesa no produto, nomeadamente se ele crescer o que está previsto no Orçamento, ou seja, passa de 49,3% para 48,8%.
Sr. Ministro, isto é altamente insuficiente. A este ritmo, baixando a despesa meio ponto por ano, precisaríamos de 20 anos para atingir o nível de consolidação orçamental, pelo lado da despesa, que a Espanha já tem hoje. Ora, é com a Espanha que, fundamentalmente, Portugal está a concorrer e que tem de se comparar.
Já nem sequer estou a falar do caso da Irlanda, onde seriam necessários 30 anos de consolidação orçamen-
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tal, ao ritmo a que V. Ex.ª está a propor para o ano de 2006, para nos podermos comparar ao modelo irlandês.
Entendo que não é esse modelo com o qual Portugal se deve comparar. Penso que a Espanha, dos pontos de vista económico e de organização do Estado social, é um bom exemplo e deveria servir de base para aquilo que em boa medida devíamos fazer no que respeita à reforma do nosso modelo social e de eficiência das nossas prestações sociais. Vão ser necessários 20 anos para apanharmos e agarrarmos a Espanha em termos de organização e de eficiência do Estado, se for este o caminho traçado e implementado pelo Governo.
Não quero deixar de lhe dizer também que há aspectos positivos que o CDS reconheceu neste Orçamento do Estado. Evidentemente, apesar da forma desastrosa como, por vezes, são anunciadas e explicadas as medidas, estamos solidários com o Governo pelo esforço que está a ser feito na reforma da Administração Pública, com todos os custos que isso implica do ponto de vista do curto prazo.
Também entendemos como necessária a equiparação de direitos entre o sector público e o sector privado.
Portanto, reconhecemos mérito em muitas das propostas que este Governo tem vindo a implementar do ponto de vista da segurança social, por muito desagradáveis que algumas dessas medidas possam ser para as pessoas em concreto. Não vemos forma de sustentar o nosso Estado social, nomeadamente ao nível da segurança social, se algumas destas medidas não forem implementadas.
Reconhecemos como positiva a intenção, que não passa disso mesmo, e este Governo já está em funções há muitos meses, de regular de forma diferente as finanças regionais e autárquicas, assim como a necessidade de se controlar a despesa em áreas como a educação e a saúde, onde o nível de despesa em Portugal é já enorme, sendo que no caso da educação, ainda por cima, choca totalmente com a qualidade e a eficácia dessa mesma despesa.
Merece ainda especial apoio por parte do CDS e saudamos todo o esforço que este Governo fez, na continuidade dos governos do PSD e do CDS, no trabalho iniciado em 2002 — como é reconhecido neste relatório do Orçamento do Estado, salvo erro na pág. 17 —, no combate à fraude, tanto ao nível das prestações sociais como da evasão fiscal, que está a ser continuado por este Governo e que resulta de medidas concretas tomadas pelos governos do PSD e do CDS. Essas medidas são medidas sérias e fogem à tentação populista de procurar encontrar em cada contribuinte e em cada criador de riqueza uma espécie de bandido até prova em contrário.
Há alguns aspectos neste Orçamento, apesar das divergências ideológicas que com ele mantemos e que justificam a nossa posição negativa relativamente ao mesmo, com os quais o CDS se identifica e está, pelo menos, parcialmente solidário.
Sr. Ministro, há quatro ou cinco questões que gostaríamos de ver clarificadas, apesar de algumas delas já terem sido anteriormente alvo de perguntas dos meus colegas Deputados das outras forças políticas.
Em primeiro lugar, o crescimento da economia de 1,1% está totalmente suportado ou basicamente sustentado no crescimento das exportações de cerca de 6%, quando este ano o comportamento das exportações foi decepcionante e se cifrou em 1,2%, tendo sido revisto em baixa sucessivamente ao longo do ano. Neste momento, não tenho qualquer motivo para acreditar que vá haver uma explosão mágica das exportações no próximo ano, nem V. Ex.ª conseguiu demonstrar até aqui esse fenómeno. Uma vez que, seguramente, os seus técnicos e a sua equipa fizeram a necessárias análises de sensibilidade para o facto e dado que o tecido económico português não mereceu do ponto de vista da competitividade qualquer tratamento especial por este Governo desde que tomou posse, gostaria de saber se, no próximo ano, as exportações em Portugal crescerem 1,2% ou metade daquilo que V. Ex.ª prevê, ou seja cerca de 3%, qual é o efeito no crescimento económico do próximo ano. Com que PIB, com que crescimento da riqueza podemos efectivamente contar com base em premissas realistas das exportações do próximo e que possam ter equivalência com o comportamento recente, em 2004 e 2005, do sector privado em Portugal? Sr. Ministro das Finanças, há ainda um conjunto de áreas obscuras neste relatório do Orçamento do Estado e não me parece razoável que permaneçam obscuras. Apesar de as razões das minhas perguntas e das minhas questões serem seguramente muito diferentes daquelas que colocou o Deputado Honório Novo,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Convém esclarecer isso bem!...
O Orador: — … não considero normal que esteja prevista uma receita de privatizações de 1600 milhões de euros, para o ano de 2006, e que V. Ex.ª e a sua equipa venham aqui apresentar o Orçamento do Estado sem sequer dar conta de quais são as empresas e as partes de capital dessas empresas que pretendem alienar no próximo ano para atingir estes 1600 milhões de euros.
Sr. Ministro das Finanças, é preciso perceber que a gestão dos assuntos do Estado, do Governo, da nação não pode ser conduzida como se estivéssemos a tratar da gestão de uma empresa privada. Bem sei que há essa tentação por parte do Governo socialista. É a isso que temos assistido como aspecto mais negativo desde que o Eng.º José Sócrates é Primeiro-Ministro de Portugal: é tratar os assuntos de Estado como se fossem uma espécie de assuntos internos do Partido Socialista. Todavia, esta Assembleia da República tem de ter condições para controlar, acompanhar e fiscalizar os programas que são apresentados neste Orçamento do Estado. Assim, porque há uma componente muito grande que tem a ver com as privatizações, uma componente de 1600 milhões de euros, penso que, se o seu Governo disser a esta Câmara quais são as partes do capital das empresas públicas ou participadas pelo Estado que pretendem privatizar no próximo ano e que vão
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dar origem a estes 1600 milhões de euros, estará a cumprir um mínimo de transparência democrática, até porque queremos saber ao longo do ano em que medida é que estes objectivos podem ou não ser atingidos.
Também não me parece razoável que o Sr. Ministro e a sua equipa, ao nível dos salários da função pública, não assumam neste Orçamento do Estado qualquer meta quantificada que possa, de forma transparente, dar uma explicação a esta Assembleia da República. Isto não é normal, Sr. Ministro das Finanças! Aquilo que é normal é que, num Orçamento do Estado, estas premissas sejam apresentadas e passíveis de discussão pela Assembleia da República. Não estamos a falar da gestão de uma empresa privada mas, sim, dos destinos da Nação e de cerca de 700 000 funcionários públicos. Podemos considerar que 1,5%, 2% ou 2,5% é muito, pouco ou nada. Contudo, o que não é razoável é que V. Ex.ª reconheça que tem uma dotação no Orçamento para aumentar os salários públicos e se negue a dizer a esta Câmara qual o aumento que está previsto e implícito neste Orçamento do Estado. Volto, portanto, a fazer a pergunta que já alguns colegas meus fizeram e que procura saber qual a previsão de aumento de salários da função pública — com excepção, obviamente, das promoções de carreiras e das promoções automáticas, que, sei, estão congeladas — que consta deste Orçamento para 2006. Qual é a sua base inicial de negociação e qual é a margem de manobra que este Governo tem neste Orçamento que apresenta aos portugueses? Também não me parece razoável que, estando prevista uma taxa de crescimento da riqueza de 1,1%, o Governo tenha evitado rever o crescimento do desemprego no próximo ano. Os senhores não estão a procurar dizer toda a verdade aos portugueses, porque, de facto, ao não atrair investimento e ao não atrair a confiança dos agentes económicos, este Governo socialista está a arrefecer a economia e está a conduzir o País para um momento económico altamente negativo — já é a segunda ou a terceira vez, desde que o Eng.º José Sócrates é Primeiro-Ministro, que se revêem em baixa as previsões de crescimento económico em Portugal.
Não é, portanto, razoável partir do pressuposto de que V. Ex.ª há pouco partia, segundo o qual o desemprego não vai sofrer por causa disso. Eu quase que apostaria que, se a taxa de crescimento do PIB no próximo ano não passar do valor de 1%, o desemprego vai chegar a valores superiores a 8%! E V. Ex.ª vai confrontar-nos, nessa altura, com crescimentos do desemprego superiores aos valores com os quais o Partido Socialista sistematicamente procurava diabolizar os governos do PSD e do CDS quando estava na oposição. Aliás, era o Eng.º José Sócrates, quando era Deputado do Partido Socialista e não Primeiro-Ministro, o porta-voz desses protestos.
Também está instalada a total confusão e falta de clareza relativamente ao que vai suceder com as SCUT, pois deste Governo já ouvimos tudo e o seu contrário. Toda a gente sabe que o CDS tem uma posição de princípio que é relativamente contrária à generalização das SCUT, visto que entendemos que o princípio que deve prevalecer, salvo razões ponderosas, é o do utilizador/pagador. Há, contudo, um problema de palavra do Primeiro-Ministro, pois todos ouvimos na campanha eleitoral que foi feita há menos de um ano o Eng.º José Sócrates garantir que a Via do Infante seria gratuita durante esta Legislatura e já há declarações do Ministro das Finanças e do Ministro das Obras Públicas que põem em causa esta promessa eleitoral do Eng.º José Sócrates. É, pois, muito importante percebermos qual vai ser a política do Governo relativamente às SCUT, nomeadamente no que se refere à Via do Infante, procurando perceber-se qual a implicação financeira dessa mesma política do ponto de vista do Orçamento do Estado para 2006.
Finalmente, colocaria mais duas questões. Algo que não me parece correcto e que tenho dificuldade em entender é que na despesa do Estado por classificação económica, na pág. 74 do relatório, se tenha feito este brilharete de apresentar a despesa corrente crescendo só 1,5% e as despesas com pessoal decrescendo, inclusive, 2,5%, sem, sequer, se sustentar tão extraordinária evolução. Depois, percebemos que uma boa parte desta poupança, diria mesmo que a sua totalidade, resulta de uma poupança nos custos com a segurança social, diminuindo-se as transferências para esta, devido ao facto de se estar a contemplar como forma de financiamento da segurança social o acréscimo da receita do IVA de 19% para 21%. Do meu ponto de vista, uma coisa é a forma como se financiam as pensões e as necessárias dotações da segurança social, outra é, através deste aumento de impostos, diminuir a dotação normal que deveria corresponder à segurança social. Ora, estou contra o princípio de aumentar os impostos para financiar a segurança social, por pensar que se está a pôr em causa a competitividade da economia para financiar a segurança social. Penso mesmo que deviam encontrar outro tipo de respostas que não penalizassem a economia e a vida das empresas.
Todavia, da leitura da pág. 74 do Relatório e da explicação que vem na pág. 75, onde se escalpeliza a extraordinária evolução negativa das despesas com pessoal, é feita referência explícita à consignação de metade da receita do IVA, resultante do aumento da taxa normal de 19% para 21%, como explicação para a redução dos encargos do Estado com o pagamento de pensões dos funcionários públicos para 2005-2006, explicando-se, assim, esta diminuição de 11% nas dotações da segurança social do sector Estado. Pareceme, portanto, que esta matéria precisa de ser esclarecida, pois tenho dúvidas, do ponto de vista técnico, da bondade deste procedimento.
Por último, no que toca às despesas do Estado, o CDS não pode deixar de ser sensível à evolução das despesas com as funções de soberania, porquanto estas decrescem com muito significado. Da estimativa de 2005 para o Orçamento para 2006 elas decrescem cerca de 410 milhões de euros, ou seja, há um decréscimo de 7%, sendo que este está concentrado na área da Administração Pública, onde a dotação passa de 1910 milhões de euros para 1754 milhões de euros, e na área da segurança e da ordem pública (que nos é particu-
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larmente cara), onde a dotação decresce 10%, passando de 2500 milhões de euros para 2245 milhões de euros. Como tal, gostaria de saber, Sr. Ministro, que tipo de cortes vão ser feitos nos serviços que, supostamente, devem zelar pela segurança e pela ordem públicas para permitirem tão extraordinária poupança no ano de 2006. Quem é que vai pagar este tipo de cortes na despesa? É a segurança dos cidadãos? São os salários dos polícias e agentes que estão responsabilizados pela manutenção da segurança e da ordem pública no País? Esta é uma descida — que, aliás, não tem correspondência com o que aconteceu em 2005, pois, neste ano, esta dotação cresceu 6% — demasiadamente forte para poder passar sem explicação nesta discussão do Orçamento nesta Comissão.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pires de Lima, tive oportunidade de enfatizar na minha intervenção inicial que este Orçamento inicia uma trajectória de redução do défice público e que aposta claramente na redução do peso da despesa do Estado na economia. Ora, entre várias reformas estruturais que tive oportunidade de referir, mencionei a reorganização da Administração, que terá, sem dúvida, implicações na organização do Estado e dos seus serviços.
Eu chamo a atenção para a magnitude do ajustamento orçamental que vamos ter de fazer, uma redução de 6,2% do PIB para 4,8%, o que é, de facto, considerável. Mais ainda se atendermos ao que este Orçamento representa em termos estruturais, em que teremos uma redução de 1,6% pontos percentuais do PIB, o que é um esforço considerável. Não é de somenos, como já tive oportunidade de frisar em esclarecimentos anteriores, a redução da despesa que está contemplada neste Orçamento. Esta é, acima de tudo, uma redução da despesa corrente primária e, em muito, uma redução da despesa corrente primária do próprio subsector Estado.
O Sr. Deputado queixa-se do facto de este Orçamento não modificar em nada a forma de organização do Estado, mas parece pretender que num Orçamento e num ano se modifique a forma de organização do Estado, coisa que o CDS-PP teve oportunidade de fazer durante três anos, sem, contudo, nada ter mudado.
Quanto às questões do aumento da receita, gostaria de pedir ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que esclarecesse mais pormenorizadamente os vários aspectos que V. Ex.ª referiu, se bem que me veja forçado a repetir o que há pouco afirmei, no sentido de que não podemos deixar de contar para esta consolidação com a evolução esperada da receita, que resulta da própria dinâmica da economia, do quadro fiscal definido e dos resultados do combate à fraude e à evasão fiscais. Por cima disto, repito, nós acrescentámos — e é esta a novidade — um esforço considerável de contenção e de redução da despesa. Esta é a inovação e este é o aspecto forte deste Orçamento.
Estranho, sinceramente, Sr. Deputado, que V. Ex.ª venha reclamar mais cortes do lado da despesa quando, de facto, o anterior líder do seu partido assumiu compromissos de despesa claramente exorbitantes, alguns dos quais não ainda devidamente autorizados na lei.
O Sr. Maximiano Martins (PS): — Bem lembrado!
O Orador: — E, portanto, fico agradado pela «conversão» do CDS-PP ao desígnio de reduzir a despesa, se bem que me espantem as críticas à falta de cortes, especialmente porque a vossa prática não foi essa.
O Sr. Deputado falou em 20 anos para alcançar o que a Espanha alcançou, mas essa é uma extrapolação linear e bastante simplista do que vai ser o fito da contenção de despesa. Tive oportunidade de referir que as medidas já adoptadas e que nos propomos adoptar ao longo de 2006 não terão um pleno impacto nesse ano mas, sim, nos anos seguintes, pelo que será de esperar que esse ajustamento não seja, sob este ponto de vista, linear. Ou seja, não se vai sentir mais 0,5% de redução em 2007 e outro tanto em 2008. Haverá aqui um efeito bem mais significativo em anos futuros e daí a natureza sustentável do esforço de consolidação.
Quanto à lei das finanças regionais e locais, registo com agrado a concordância do CDS-PP quanto à necessidade de revermos este quadro e saliento, Srs. Deputados, que não se trata de uma intenção. Isto vai ser feito e, aliás, amanhã de manhã já terei oportunidade de iniciar os trabalhos do grupo de trabalho que vai debruçar-se sobre o estudo de uma nova lei das finanças locais.
Portanto, já estamos a trabalhar nesta matéria e em breve teremos oportunidade de apresentar propostas à Assembleia.
Quanto às perguntas, creio que já expliquei suficientemente o cenário macroeconómico e os pressupostos subjacentes às exportações.
O Sr. Deputado António Pires de Lima desafia-me com um cenário hipotético de algo correr mal. Sinceramente, gostaria de não acreditar na verosimilhança desse cenário, mas permita-me que lhe diga que, se alguma coisa correr mal nas exportações, convém não esquecer que as próprias importações reflectirão um andamento diferente, resultante da economia. Mais uma vez, chamo a atenção para o facto de termos de olhar para as exportações líquidas. E, independentemente disto, parecem-me realistas os pressupostos em que assenta esta projecção.
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O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Ó Sr. Ministro, tem a obrigação de responder às perguntas que lhe fazemos.
O Orador: — Não me parece que quer o quadro de crescimento da procura externa, de 6%, quer a evolução previsível que referi dos custos unitários sejam susceptíveis de questionar a nossa previsão quanto ao andamento das exportações.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Ó Sr. Ministro, tem de responder-nos!
O Orador: — Sr. Deputado, quanto a estas matérias, tratando-se de previsões, sinceramente ninguém tem certezas.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Eu também não! Por isso é que se fazem análises de sensibilidade!
O Orador: — Ninguém tem certezas absolutas!
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — O Sr. Ministro fez uma análise de sensibilidade?!
O Orador: — Claro que foi feita a análise de sensibilidade, e este é o cenário que nos parece mais ajustado.
Sr. Deputado, quanto a áreas que reputa de obscuras, não tenho memória de alguma vez, nesta Câmara, em sede de discussão do Orçamento, ter sido apresentado um programa pormenorizado de privatizações.
Este programa irá ser aprovado pelo Governo, irá ser publicitado e o que fazemos aqui é reafirmar o compromisso que já foi feito em sede de Programa de Estabilidade e Crescimento, no que se refere a privatizações. Mas posso adiantar-lhe que privatizações de entidades como a GALP Energia, a Rede Eléctrica Nacional (REN), a Portucel, na qual temos uma participação, e outras serão, obviamente, contempladas no nosso programa de privatizações.
Sr. Deputado, compreendo a sua curiosidade quanto a montantes e a timings. Agora, para além de ter de respeitar, obviamente, o interesse dos Srs. Deputados, também tenho de respeitar o interesse das próprias empresas na sua estabilidade na gestão e dos impactos negativos que os anúncios precipitados poderiam provocar em termos de mercado…
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Essa agora!…
O Orador: — … e em alguns processos de reestruturação empresarial que serão necessários efectuar antes de avançarmos com as operações propriamente ditas.
De qualquer forma, garanto-lhe que, em momento oportuno, haverá um programa de privatizações, que será devidamente publicitado, e terei muito gosto em o enviar e eventualmente, se quiserem, em o discutir aqui, na Assembleia. Penso que não posso ser mais claro do que isto; nada tenho a esconder, tenho é que gerir o processo com prudência e cautela para não causar danos desnecessários ao bom andamento da vida destas empresas.
Quanto à questão dos aumentos salariais, também não vou aqui abrir uma excepção relativamente à prática do passado. Não vou negociar os aumentos salariais com o Parlamento, vou negociá-los com os representantes da função pública…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito bem!
Risos do PCP e do BE.
O Orador: — … e apresentarei qualquer valor indicativo para o arranque das negociações salariais em sede própria e não neste Parlamento.
Com certeza que tenho ideia de até onde podemos ir e não ultrapassarei essa barreira, por razões óbvias, e asseguro que a dotação provisional tem as verbas necessárias para cobrir os encargos que daí venham a ocorrer.
Já respondi à questão relativa ao desemprego. Percebo que o Sr. Deputado gostasse que o Governo desse más notícias nestas matéria — seria bom para os senhores —, mas, infelizmente, o modelo de previsão que temos não acarreta qualquer agravamento da taxa de desemprego, apesar da revisão do cenário macroeconómico.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — É insensível aos argumentos!
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O Orador: — Lamento não lhe fazer a vontade de dar mais más aos portugueses, mas, nesta matéria, as coisas são o que são! Relativamente às SCUT, não há qualquer mudança.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo e do Deputado do CDS-PP António Pires de Lima.
O que está no Programa do Governo é claro e o que tem vindo a ser dito quanto às SCUT é exactamente o dele consta, e já há pouco tive oportunidade de referir o alcance do que está no Programa do Governo.
Quanto às despesas do Estado, nomeadamente à diminuição das transferências para a segurança social, chamo a atenção do Sr. Deputado para o facto de ela se dever a um aumento significativo da taxa contributiva, de 10% para 13%, no sentido da convergência, neste domínio, entre o regime da Caixa Geral de Aposentações e o regime geral.
No que respeita à segurança e à ordem pública, segundo refere, há cortes no Orçamento. Sr. Deputado, posso dizer-lhe que não se pretende de forma reduzir a segurança dos portugueses, mas, dada a especificidade da matéria, permito-me pedir-lhe alguma paciência adicional para aguardar pela oportunidade de interpelar o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna especificamente quanto a esta matéria.
Se o Sr. Presidente autorizar, peço, agora, ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que esclareça a questão dos aumentos de receita que foram aqui invocados.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, não sei se fomos totalmente bem sucedidos ao apresentar uma justificação no capítulo da receita fiscal — págs. 81 e seguintes —, onde, de uma maneira transparente, procurámos explicar para cada um dos impostos os pressupostos que estão na base da estimativa.
Em relação ao IVA já foi referido, portanto não vou repetir; relativamente aos outros, está explicado os cenários, que são relativamente prudentes — quando falo em prudência estou a pensar no IRC e no IRS, embora também se aplique aos outros impostos.
Vamos agora ver como é que é possível estimar este aumento de receita do IRC num contexto em que a economia, infelizmente, não está a crescer tanto quanto todos o desejaríamos. A razão é simples: para além do crescimento da base subjacente à estimativa, há também uma estimativa implícita que tem a ver com o controlo dos omissos. Só para dar uma ideia, devo dizer que este ano apareceram mais 25 000 contribuintes a apresentar declarações de IRC; uns são empresas novas, mas muitos outros eram contribuintes que estavam fora do sistema. É aqui que nós temos de fazer muito mais do que temos feito até hoje — quando digo «nós», quero dizer este Governo e os governos que nos antecederam —, porque nos concentramos demasiado nos contribuintes que apresentam regularmente as suas declarações.
Vozes do PS e do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Temos de atacar de uma maneira mais eficaz, mais eficiente, a economia paralela.
No próximo ano vamos passar a dispor, com reforço de meios humanos, que também já foi referido nesta Casa, de novos meios para fazer este tipo de tarefas, e alguns deles, que poderão ainda não estar preparados para fazer auditorias, que requerem uma certa sofisticação, podem ser já aproveitados (é uma espécie de on job training) no decurso do próximo ano para fazer este tipo de controlo, o qual me parece essencial.
Esta era uma das razões para o aumento da receita do IRC.
Em relação ao IRS, há uma explicação detalhada do aumento da receita, que resulta quer do aumento da base — e esta é pequena, como todos sabem — quer da redução da despesa fiscal, e aparece um quadro que calcula… Portanto, de uma forma transparente, está explicado de onde vem o dinheiro. Logo, não há aqui soluções milagrosas.
Quanto à pág. 93, onde constam as receitas fiscais das autarquias locais, a parte mais importante tem a ver com o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) e com o Imposto Municipal sobre Transmissões de Imóveis (IMT). O aumento das receitas próprias das autarquias tem muito a ver com estes impostos. Porquê? O IVA resulta de transferência, mas as receitas próprias das autarquias têm crescido em virtude da actualização das avaliações — esperamos chegar ao final do ano com 700 000 avaliações, que é um número recorde.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Sr. Secretário de Estado, a isso chama-se aumento de impostos!
O Orador: — Não, não é um aumento de impostos! É a aceleração da avaliação… Os contribuintes apresentam a sua declaração para efeitos de IMI e de IMT e aquilo que se está a fazer é uma aceleração da avaliação. A avaliação, no limite, em termos ideais, deveria ser feita logo no momento. Portanto, o que estamos a fazer é a ser muito mais céleres em termos de avaliação e, consequentemente, na transferência dos dinheiros para as autarquias.
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O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, ao longo destas quatro horas de debate, o Governo furtou-se a dar alguns esclarecimentos com várias justificações. Volto a uma ou duas dessas questões porque parece-me que não merecem ser discutidas em abstracto, mas, se as trouxer ao concreto dos números, talvez o Governo possa rever o seu silêncio.
No entanto, sobre outras questões já foi dado algum esclarecimento neste debate. O Sr. Ministro esclareceu, por exemplo, as contas que várias entidades tinham feito, segundo o qual a conta do défice não contabiliza as cativações, sendo, portanto, necessário um financiamento adicional, se porventura as utilizar. Algum dia teremos de nos perguntar qual é o sentido de ter um montante geral de despesa de investimento, e outras, do qual é extraído uma parcela que nem sequer serve para as contas, porque é logo pressuposto que não vai ser gasta. É, portanto, uma técnica de gestão um pouco surpreendente, qualquer que seja o critério de bom senso que se possa utilizar.
Mas o Governo até agora usou sobretudo três segredos, insistiu neles e garantiu-nos que até ao fim do debate do Orçamento vai mantê-los. O primeiro é sobre a política de rendimentos; o segundo é sobre o cenário macroeconómico e a justificação para o mesmo; e o terceiro é sobre a política de receitas de privatizações.
Queria deter-me detalhadamente em cada um deles porque me arriscaria a apresentar a resposta que o Sr. Ministro não deu e que talvez continue a não querer dar.
O primeiro é sobre a política de salários. O Sr. Ministro explicou-nos que o que consta do Pacto de Estabilidade e Crescimento é uma média de aumento previsível de 2%/ano num conjunto de anos; e, portanto, não é uma sugestão de que no próximo ano o aumento seja de 2%. Além disto, na sua tabela, prevê que o aumento das remunerações certas e permanentes seja de 1,9% no total.
Ora, confrontado com a perplexidade sobre como é que estes números permitem um aumento, por exemplo, de metade da taxa da inflação, o Sr. Ministro remeteu para o Sr. Secretário de Estado, que fez aqui um dos exercícios mais brilhantes que ocorreram nestas quatro horas de debate,…
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Muito obrigado!
Risos do PS.
O Orador: — … porque disse-nos que havia informação a mais, começou por aqui — um verdadeiro plebiscito, mas o Sr. Ministro das Finanças já o criticou, e, portanto, não volto a este episódio…
Risos do PCP.
Mas, depois, disse-nos que a razão pela qual se podia compatibilizar os números actuais era porque tinham de ser considerados quatro factores: o primeiro, o segundo, o terceiro e, inevitavelmente, o quarto.
Pensei ter regressado à série Yes Minister, em que aqueles directores de ministério se encontram, à hora do chá, para trocar impressões sobre como é que «aconchegam» os números.
O Sr. Secretário de Estado e o Ministério nunca nos quiseram, nem querem, responder a questões que não têm a ver com a contratação, têm a ver, rigorosamente, com a cenarização daquilo que ocorre em 2006.
Diz o Sr. Secretário de Estado: «tem de se considerar a tabela de aumentos salariais» — com certeza! — «tem de se considerar que o aumento da idade da reforma no próximo ano é de meio ano» — com certeza! — «e que isto tem efeitos na Caixa Geral de Aposentações» — com certeza! — «tem de se considerar o critério de que por cada dois funcionários que se aposentem só pode entrar um» — com certeza! E depois?! Façamos as contas.
No próximo ano, conjugando o efeito da restrição da admissão e do aumento da idade da reforma nesse meio ano, vão aposentar-se cerca de 20 000 funcionários. Se o Governo cumprir a regra de 1 para 2, poderá admitir 10 000 funcionários; se não a cumprir, ficará com estes 10 000 funcionários a menos em relação a esta conta.
Mas, Sr. Secretário de Estado, que está a abanar a cabeça,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Está a fazer o «plebiscito»!
O Orador: — … deixe-me dizer-lhe que, mesmo que o Governo não admita os 10 000 funcionários que correspondem aos 20 000 funcionários que saem — e chamo a sua atenção para este facto, pois não sei se fez este estudo —, se analisar em detalhe a estrutura do emprego na função pública verá que há sectores estratégicos em que a idade dos funcionários vai conduzir a uma elevada taxa de aposentação, como é o caso, por exemplo, de médicos ou de enfermeiros, o que dificilmente poderá impedir a busca de novos quadros para cumprir essas funções.
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Admitamos, no entanto, o pior dos cenários possíveis, o cenário mais duro e mais brutal: não entra nenhum funcionário para cumprir qualquer função e aguentam-se como estão. Ainda assim, o Governo terá de colocar pelo menos 30 000 funcionários no quadro de supranumerários para poder fazer oscilar a negociação salarial entre os 0,8%, para o qual actualmente tem dotação orçamental, e os 1,2% ou 1,3% que pudesse alcançar.
Para conseguir fazer esta variação na proposta de aumento da massa salarial, o Governo tem de colocar 30 000 funcionários no quadro de supranumerários.
Ora, isto exige, naturalmente, uma avaliação que o Governo não tem. O Governo tem a ideia geral de que é preciso conter ou reduzir os efectivos e criar o quadro de supranumerários, mas não nos quer dizer, nunca, qual é a política a este respeito. Não o faz por uma razão: a negociação. Curiosa razão! Porque, na verdade, não há, nunca houve, e não vai haver este ano qualquer negociação com os sindicatos da função pública.
O Governo já tem implícito, como o Sr. Ministro disse, a taxa de aumento prevista para este ano — à volta de 1% — e não vai negociar com ninguém, como nenhum governo anterior negociou. Vai comunicar aos sindicatos, depois de uma simulação de reunião, a sua decisão.
Na verdade, entendamo-nos bem, num contexto em que se tem «a faca e o queijo na mão», nunca há negociação! Poderia haver negociação se fosse ao contrário! O Governo chegava lá e dizia: «queremos aumentar 1,1%». E os sindicatos diziam: «não, queremos só metade!». Ao que o Governo respondia: «não, homem, leve lá 1,1%!». E os sindicatos insistiam: «não, nós queremos metade!». Isto não acontece! Como compreenderá, os sindicatos vão pedir, no mínimo, o aumento da taxa de inflação, para não se perder esse elementar salário real, que é o dobro, ou mais do que o dobro, do que o Governo quer dar. Portanto, não há negociação! O problema é que o Governo utiliza o pretexto de uma negociação que não existe para não dizer ao Parlamento aquilo que vai fazer. E, portanto, para ocultar do Orçamento o debate público e transparente sobre as suas consequências sociais.
Se assim for, se houver um aumento desta ordem, o que isto quer dizer, Sr. Ministro das Finanças — se me permite que faça as contas —, é que, para um salário médio da função pública, o aumento vai ser de 1 conto. E este aumento significa uma perda real em relação à inflação verificada, que faz com que as pessoas, no próximo ano, trabalhem uma semana «à borla» para o Estado. A diferença entre o aumento que compensasse a inflação e o aumento que o senhor vai dar é uma semana de trabalho «à borla» para o Estado. Não me venha depois dizer que é preciso qualificar a função pública (e é preciso), porque, pelo contrário, o Governo toma-a como o bode expiatório de toda esta crise! Percebo, por isso, por que é que o Governo nada quer dizer a respeito da sua política de rendimentos em relação à função pública, que, depois, serve de referência para o conjunto da economia, e é assim que vai funcionar.
O que me leva ao segundo segredo, que, aliás, é coerente com este: o cenário macroeconómico.
O Sr. Ministro vai permitir-me a franqueza, mas eu já disse isto a outros ministros das Finanças: penso que este Governo, como os anteriores, não tem qualquer modelo macroeconómico. Não existe! Existe um conjunto de contas que são fechadas com o último número conforme as conveniências. Acreditarei que não é assim, que há, de facto, um modelo e análise de sensibilidade quando vir o modelo, quando ele se tornar público e for discutido. E penso que isto não é um segredo do Estado, é obrigação do Governo, como, aliás, das oposições, quando apresentam cenários e projecções macroeconómicas, explicar, tecnicamente, como é que os fundamentaram, para que não haja possibilidade alguma de ser uma aldrabice contabilística.
Não há modelo macroeconómico do Governo! E é por isso que faz as projecções que faz! Quando o Governo nos diz que, de 2005 para 2006, as exportações vão quintuplicar — repito, quintuplicar —, é porque não tem modelo macroeconómico.
Quando se pede uma explicação, o Sr. Ministro refugia-se num mistério que agora apareceu, que é o défice comercial. Há uma dinâmica menor das importações, que vão subir, mais ou menos duplicar, e das exportações, que quintuplicam, e, portanto, o saldo é mais favorável. Tomara que fosse! Vamos analisar o que determina as exportações em 2004: competitividade; taxa de câmbio, o que é praticamente irrelevante deste ponto de vista, porque Portugal não tem muitos mercados fora da União Europeia; e, naturalmente, os vários elementos da competitividade, como a competitividade/preço, a competitividade/inovação, e esse efeito volume, que pode ser obtido a partir das quotas de mercado.
Portugal perdeu 4% de quotas de mercado em 2004; está à beira de perder 7% de quotas de mercado em 2005, e diz-nos que vai quintuplicar as exportações no próximo ano. E quando perguntamos concretamente porquê e como — se é o aumento da quota de mercado, se é o aumento da competitividade —, o Sr. Ministro fala-nos do efeito saldo comercial e das margens de lucro.
Bom, aqui há um esclarecimento que é devido: se as margens de lucro aumentam, elas poderiam produzir um aumento da competitividade/preço.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Baixam! As margens de lucro baixam!
O Orador: — Está bem, permite uma margem de manobra ao nível da determinação. E, portanto, há uma margem de manobra diferente das empresas e pode jogar-se com a competitividade.
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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu disse que iam diminuir!
O Orador: — Disse-me que diminuíam? Bom, então estamos pior ainda, Sr. Ministro!
Vozes do PCP: — Claro!
O Orador: — Vai-me desculpar, mas então estamos pior ainda. Assim, não há margem nenhuma para ajustar os preços. Logo, se não há margem nenhuma para ajustar os preços, não se vê que a competitividade/preço possa ocorrer deste ponto de vista, nem se vê que o efeito volume de quotas de mercado possa favorecer esta projecção. Por isso, de duas uma: ou há uma componente de grandes programas, de grandes projectos e de grandes investimentos que promovam o aumento das exportações, ou tudo isto é um saco de nada! Podemos ver na pág. 49 do Orçamento como é que se faz o financiamento da economia portuguesa.
Extraordinário! É o investimento estrangeiro? Não é! Não é o investimento directo estrangeiro, porque ele vai diminuir. Não é sequer o investimento em carteira, que permite alguma folga deste ponto de vista, são algumas componentes de financiamento que são das mais especulativas e das mais voláteis. Portanto, não é nem investimento de carteira nem investimento directo estrangeiro que cria capacidade produtiva.
Logo, de nenhum ponto de vista se consegue ver — indo ao detalhe, e já não volto a pedir o modelo, porque, evidentemente, ele não existe — como é que se suporta um crescimento de 1,1% do Produto que depende de haver 5,7% das exportações. Aliás, o Fundo Monetário Internacional e outros organismos internacionais prevêem uma dinâmica do comércio externo muito inferior àquela que nos apresenta.
Mas há ainda outros factores surpreendentes.
O Governo diz-nos, e tem razão, que em 2006 o endividamento das famílias chega a 130% do rendimento disponível — o rendimento depois de pagos os impostos. Mas em 2006 o problema não é só o de haver uma estagnação da economia portuguesa de 1,1%, ou menos. Há uma ligeira, muito ligeira, recuperação. A Espanha cresce cinco vezes mais do que Portugal, e outros países europeus também crescem mais. Portanto, a taxa de juro de referência tende a aumentar.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro, o que é que espera que aconteça, na sua análise de sensibilidade, a um endividamento de 130% do rendimento disponível, com um aumento da taxa de juro de referência internacional, que não somos nós que fixamos mas, sim, a economia europeia, o Banco Central Europeu, e que efeito é que isto tem na procura interna, e, portanto, nos elementos da despesa que contribuem para a dinamização e para a criação do Produto e para a agregação do PIB.
É por isso que este não é um cenário credível. E não é credível naturalmente em relação ao desemprego.
Aliás, permita-me fazer-lhe também mais uma correcção sobre os números.
A taxa de desemprego de 7,7% é uma taxa falsa. É uma taxa relativa a quem está inscrito nos centros de emprego — sabemos, agora, que no final de Setembro, há 15 dias, estavam 482 548 pessoas inscritas —, mas também contam os trabalhadores permanentemente desincentivados, que já nem se inscrevem nos centros de emprego, o que faz com que a taxa verdadeira de desemprego chegue muito mais próximo dos 600 000 do que de qualquer outro valor. E esta taxa, naturalmente, neste contexto, ressente-se da quebra da actividade económica.
Portanto, temos, mais uma vez, um segredo, que o Sr. Ministro não quer tratar, mas creio que faz mal, porque o conhecimento destas matérias, como sobre a questão dos salários, é uma questão de clareza democrática.
O terceiro segredo é sobre as privatizações.
O Sr. Ministro, na última resposta, já anunciou as privatizações da GALP e da REN, além da da Portucel.
Bom, já avançámos alguma coisa. Mas o Sr. Ministro, a todas as perguntas, responde sempre, como, aliás, o seu antecessor, que «um dia o Conselho de Ministros vai decidir um programa de privatizações». Deixe-me dizer-lhe que o seu antecessor tinha prometido esse programa para Julho, depois prometeu para Setembro e já vamos em finais de Outubro. Mudou o ministro, e compreendo que haja problemas deste ponto de vista.
Mas, Sr. Ministro, quer dizer-me que o Conselho de Ministros não decidiu ainda um programa de privatizações?! Então, o senhor diz-nos que em 2006 vão ser 1563 milhões de euros, e não decidiu quais são as privatizações?! Quer dizer, virou-se para algum assessor e disse assim: «Olha, achas que é 1562, 1564, 1570 milhões de euros?». Não, não! O senhor pôs lá 1563 milhões de euros! Portanto, tem de ter um estudo de mercado das partes das empresas que vai vender. Senão, não era 1563 milhões de euros, era qualquer outra coisa! O senhor tem um valor exacto: em 2007, são 726 milhões de euros; em 2008, são 596 milhões de euros; e, em 2009, são 614 milhões de euros! Para os próximos quatro anos o senhor diz-nos, com uma aproximação totalmente rigorosa, quanto é que valem as partes das empresas que quer vender em cada ano.
Pode dizer-me, e isto percebo, que há algumas reestruturações em curso e que nem todas pode anunciar.
Mas que já tem o programa de privatizações, já tem! Ou, então, isto é uma farsa! Já tem o programa de privatizações, porque tem os valores, fez os cálculos. O senhor, com certeza, não inventou os cálculos! Tenho toda a consideração pela competência técnica da sua equipa, e fez, de certeza, um estudo de mercado dos valores de cada uma das empresas.
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Há pouco, o Sr. Secretário de Estado, não falando da REN e da GALP, disse: «vamos privatizar na pasta de papel, energia, transportes e comunicações». Ou seja, só falta a Caixa Geral de Depósitos — suponho que se esqueceu do sector da água, e penso que seria bom acrescentar-se a água, de que se esqueceu com certeza.
Por outras palavras — e já agora faço aqui as contas nas costas do envelope —, a GALP e a REN não dão 1563 milhões de euros mais 726 milhões de euros. Não dão isto! Dão menos! Portanto, tudo o que o senhor, com números, nos anuncia para os próximos anos é mais do que a GALP e a REN, até porque disse que queria manter 20% do capital da GALP. Logo, é mais! E, deste ponto de vista, uma vez que nos diz que a privatização é na pasta de papel, na energia, nos transportes e nas comunicações — e suponho que se esqueceu das águas —, só falta a Caixa Geral de Depósitos.
O que o senhor nos está a dizer é que o objectivo estratégico deste Governo socialista é o Estado ausente, é o Estado totalmente ausente de qualquer intervenção directa em sectores estratégicos da economia portuguesa. E esta, como compreenderá, é a razão pela qual a minha bancada insiste sempre em podermos discutir, de uma forma transparente, as escolhas estratégicas, porque isto não é um negócio que se faz a partir de uma envelope fechado, é preciso escolher se o Estado português, para a sua intervenção num período tão difícil, deve, ou não, ter capacidade de intervenção económica nos sectores da energia, dos transportes, das comunicações, no sector financeiro e nos serviços públicos, como a água, a electricidade e alguns outros.
Este é o grande debate de fundo sobre esta matéria.
A última questão que quero colocar-lhe é sobre a política fiscal, para registar, mais uma vez, uma surpresa, que é esta: um jornal anunciou — e não sei se entra na categoria dos não desmentidos do seu Ministério, mas suponho que não — que o seu Governo iria pedir ou exigir, aliás, a todos os idosos com mais de 80 anos, que terão acesso ao complemento de reforma, um complemento bem-vindo, o conhecimento das suas contas bancárias para provar a titularidade desse direito. Dir-me-á se isto é desmentido ou não, mas suponho que não, porque o seu Governo fez o mesmo em relação ao rendimento social de inserção. É que para se poder chegar ao rendimento social de inserção — 20 continhos por mês — é preciso abdicar do segredo bancário e dar informação sobre todas as contas bancárias da pessoa.
Em relação a esta matéria, quero chamar-lhe a atenção para o seguinte, Sr. Ministro: o seu antecessor chegou ao Governo na base de uma campanha eleitoral em que José Sócrates prometeu levantar o segredo bancário para todos os contribuintes, na base dos melhores critérios europeus. O seu antecessor era contra esta posição e, portanto, substituiu-a por uma formulação, que era: vamos levantar o segredo fiscal a toda a gente e, assim, resolve-se o problema.
Isso já foi abandonado, já não se faz o levantamento do segredo fiscal, a não ser nos casos das listas dos devedores — e não conhecemos a sua posição sobre este assunto —, mas ficamos a saber pela prática que o Governo, de que o senhor é titular das Finanças, acha que o levantamento do segredo bancário é um bom instrumento para o combate à fraude, só que acha que esse bom instrumento se aplica aos titulares do rendimento social de inserção e, pelos vistos, agora também aos que têm mais de 80 anos, mas não aos outros contribuintes. Serve muito bem para evitar as fraudes em relação aos mais pobres e aos mais velhos, aliás, aos mais pobres dos mais pobres e aos mais velhos dos mais velhos, mas não em relação aos outros contribuintes. Se for para Deputados, engenheiros, economistas, advogados, médicos, técnicos do que for não vale utilizar o levantamento do segredo bancário no combate à fraude fiscal, mas para aqueles sectores já está na lei, é uma condição para o rendimento social de inserção.
Gostaria que me explicasse, porque ainda não teve oportunidade de o fazer, se o Governo pretende abdicar da sua promessa eleitoral de considerar o levantamento do segredo de bancário como um instrumento, que, aliás, é utilizado em toda a Europa no combate à fraude.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, com a eloquência que lhe é sobejamente reconhecida, ao longo da sua intervenção — permita-me o termo —, martelou em algumas frases que tiveram como intuito, pura e simplesmente, dar a ideia de que há falsidades…
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Segredos!
O Orador: — … e de que há segredos em torno deste Orçamento.
E, como bom parlamentar que é, sabe muito bem que repetir uma incorrecção e uma inverdade convém sempre até que ela seja assumida como uma verdade, e, portanto, usou bem esta estratégia ao longo da sua intervenção.
Mas vou procurar, de facto, esclarecê-lo e tornar claro que não tem razão para acusar de falsidades, nem da existência de segredos, e fá-lo-ei correndo ponto por ponto as suas observações.
Começo pelas cativações. Sr. Deputado, não é surpreendente que haja cativações nem que elas não sejam contabilizadas. Esta tem sido sempre a prática no apuramento do défice em contas nacionais. O que é surpreendente, devo dizer-lhe, é que haja cativações de 15%, como, por exemplo, foi previsto para o Orça-
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mento do Estado de 2005, ou cativações de 21% ou de 21,4% — desculpem-me se o número não é exactamente este, mas é à volta deste valor — no PIDDAC.
O Sr. Honório Novo (PCP): — É isso, é!
O Orador: — Peço também a vossa indulgência, porque os números são tantos e nem sempre a frescura mental é a maior em todos os momentos e às vezes pode haver aqui também algumas falhas de memória.
Ora bem, isso, sim, é surpreendente, porque aí se esconde alguma coisa, em meu entender.
Por esta razão, procuramos adoptar neste Orçamento uma política de cativações que seja razoável — 7,5% — e uniforme, independentemente de se tratar de despesas correntes ou despesas de capital, que tem, tão-só, um intuito, Sr. Deputado, o de propiciar ao Governo uma margem de flexibilidade na gestão da execução do Orçamento, que é necessária.
O Orçamento é uma referência, é para ser cumprido, mas não pode ser um espartilho tal que não permita ajustamentos pontuais das verbas inscritas e, por isso mesmo, as cativações introduzem uma folga que permite essa flexibilidade, mas fá-lo com um princípio que está subjacente: quando, em sede de execução orçamental, houver uma descativação nesta ou naquela rubrica, ela deverá ser devidamente compensada por economias, por ganhos, noutras rubricas, para que o plafond global da despesa se mantenha inalterado, tendo em vista o cumprimento do objectivo do défice orçamental de 4,8%.
Portanto, isto é um instrumento de gestão da execução orçamental e, no fundo, também uma forma de economia. E mais: eventualmente, pode permitir acomodar uma conjuntura, porventura, bem mais favorável, e oxalá isto possa vir a ocorrer. Temos uma previsão de receita que, eventualmente, pode ser melhor do que aquela que se prevê e, portanto, pode gerar aqui alguma margem para se atender a algumas emergências em algumas situações, devido ao uso da cativação ou, mais propriamente, da descativação, que, assim, poderão ser devidamente atendidas.
Repito: a existência de cativações busca, tão-somente, esse elemento de flexibilidade na execução orçamental, sendo certo que, globalmente, o objectivo é o de não descativar em termos globais e manter o nível de despesa para cumprirmos as metas.
No que se refere à política salarial, o Sr. Deputado fez um exercício numérico, que não vou comentar, é da sua responsabilidade, nem sei quais os pressupostos em que assentou, a base de que parte… No entanto, gostaria de lhe dizer que as verbas inscritas — e repito a afirmação, que já fiz anteriormente —, em termos de encargos com pessoal, são as suficientes para encararmos os encargos ou as responsabilidades que teremos nesta matéria e para acomodar um aumento salarial na tabela.
De quanto vai ser este aumento, dirá que é um segredo…
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Parece!
O Orador: — Entendo que haverá um momento oportuno para o Governo adiantar e dar informação quanto à sua política salarial, que não é este. Em momento oportuno essa orientação será do vosso conhecimento.
Não há aqui um segredo. Não há segredo, isto vai ser revelado, só que não é este o momento, pelas razões que já explicitei.
Quanto ao modelo macroeconómico, permita-me, Sr. Deputado, que o corrija: há um modelo macroeconómico. O Sr. Deputado diz que não há, mas o que acontece é que o Sr. Deputado não o conhece, mas que existe, existe.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — É secreto!
O Orador: — E concordo consigo quanto aos aspectos que refere, de que, se calhar, deveria ser conhecido e acessível. Neste ponto, estou inteiramente de acordo consigo e não há que fazer segredos nesta matéria.
Agora, existe um modelo macro e as previsões que aqui temos resultam da utilização de um modelo macro.
Poderá não o conhecer, pelas razões que explicitou, e simpatizo com as considerações que fez quanto a esta matéria, mas, por favor, não repita a ideia de que não existe um modelo macro, porque existe. Não é verdade o que está a dizer.
Permita-me que o esclareça sobre um outro ponto. O Sr. Deputado refere que, quanto às exportações, Portugal perdeu quota de mercado em 2004 e em 2005. Seria bom que se perguntasse porquê, por que é que perdemos quota de mercado. Nós perdemos quota de mercado, porque, de facto, perdemos competitividade, e, como há pouco referi, basta olhar para a evolução dos custos, designadamente os custos unitários de trabalho — um indicador que é publicado e que permite comparações entre outros países —, para vermos que Portugal tem tido um comportamento que destoa com a média ao nível europeu e com muitos países que são próximos concorrentes do nosso país.
Perante esta realidade, não podemos ignorar — e eu não o ignoro, por muito impopular que isto possa ser — que a reposição de alguma margem de competitividade na nossa economia leva-nos a enfrentar a questão da evolução dos custos unitários, em particular dos custos unitários do trabalho e das margens de lucro. E se
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isto é um sinal de que vai ser necessária a contenção salarial, pois seja um sinal nesse sentido, porque não me parece que, sem essa contenção, seja possível a Portugal explorar, de imediato e a curto prazo, outros factores de competitividade, na base da inovação, de produtos, de novas tecnologias, de novos designers, etc.
Não temos capacidade de, a curto prazo, por esta via, desenvolver novos factores de competitividade. Infelizmente, a realidade é esta: temos de encarar a questão dos custos unitários como uma questão crucial para repor essa competitividade. Por isso mesmo, é que referi a questão da evolução dos custos de trabalho e das margens de lucro.
Portanto, permita-me que corrija V. Ex.ª, porque, para mim, pelo menos, não foi clara a forma como entendeu a minha observação às margens de lucro: a margem de lucro é uma componente do preço e, quando falamos em baixar margens de lucro, é para baixar preços, e, baixando preços, repõe-se competitividade.
Portanto, creio que houve aí alguma confusão na forma como abordou a questão, penso que involuntária, mas gostaria de clarificar o alcance da observação que fiz há pouco quanto a esta matéria.
No que diz respeito ao endividamento, com certeza que o aumento do endividamento das famílias será um elemento de contenção na sua procura, porque as famílias sentirão uma pressão maior para reforçarem a sua poupança, com impacto na sua capacidade de consumo, dada a poupança adicional que terão de fazer para fazer face aos encargos que resultarem desse endividamento. Este efeito está já devidamente contemplado na nossa previsão para a evolução do consumo privado.
Sr. Deputado, a questão da medida do desemprego, dos chamados trabalhadores desincentivados ou desencorajados, é uma velha questão, uma questão académica já antiga. É evidente que aquilo que estatisticamente é medido como desemprego, até para efeitos de comparação entre várias economias, é um critério objectivo, que terá as suas limitações, sem dúvida, na base do qual teremos de medir as variações do desemprego na economia. Dir-lhe-ia que isto é quase como a ponta do iceberg, porque, como é evidente, se a ponta aumentar, a massa global será, se calhar, um pouco maior e, se a ponta diminuir, o iceberg, globalmente, será mais reduzido. Trata-se de um indicador, como sabemos, definido com critérios objectivos, designadamente com as regras do EUROSTAT, e é este que devemos usar para, numa base objectiva, podermos comparar no tempo e no espaço a evolução do desemprego.
Tem deficiências, como é óbvio, mas, com certeza, devemos saber interpretar o sentido dos números. E, como referi, o modelo que existe, repito — já agora, uso a sua técnica —, não aponta para qualquer agravamento da taxa de desemprego relativamente àquela que já foi prevista para 2005. Portanto, em 2005, a taxa de desemprego prevista é de 7,4%, prevê-se um agravamento de 7,7% para 2006, mas este agravamento não é maior pelo facto de o crescimento previsto do Produto ser menor em 3 décimas de ponto percentual.
Ora, quanto a privatizações, Sr. Deputado, não quero iludir a questão, mas gostaria de explicitar o seguinte: os 1563 milhões de euros referidos são o valor inscrito no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), que foi apresentado a esta Assembleia, em Junho passado. Esta é a previsão que consta no PEC, e a previsão do Orçamento é de 1600 milhões de euros.
Presumo — e neste aspecto, peço-lhe que compreenda a minha posição, porque, como eu não estava à frente do Ministério, não acompanhei o processo de cálculo feito para esta previsão — que terá sido uma previsão feita com base em valores de mercado, em alguns casos, e daí eu dar os valores com este rigor, que aqui aparenta. Mas, sinceramente, penso que vale o que vale por estarmos sempre a falar de previsões, e é neste sentido que devemos encarar os números referentes às privatizações.
Reafirmo que há um conjunto de empresas privatizáveis; algumas delas não estão no mercado, e, por isso, não tenho qualquer problema em anunciar que é intenção do Governo privatizá-las, mas há empresas que estão no mercado, pelo que terei de usar de alguma cautela por razões que me parecem óbvias.
Porém, sossego-o, Sr. Deputado, dizendo-lhe que a Caixa Geral de Depósitos não é para privatizar. Nunca defendi a privatização da Caixa Geral de Depósitos! Sou contra a privatização da Caixa Geral de Depósitos e não será comigo que se operará qualquer privatização da Caixa Geral de Depósitos. Assim, ela continuará a ser uma entidade de referência pública, como tem sido até agora.
Quanto à política fiscal, não sei qual é a fonte desse anúncio de pedir a todos os idosos o conhecimento das contas bancárias. Não sei se isto vai ou não ser exigido, mas posso adiantar-lhe já a minha opinião: parece-me, como noutras situações em que as pessoas beneficiam de subsídios do Estado, legítimo que o Estado averigúe se essas pessoas necessitam de facto de um apoio estatal. Isto, portanto, por meras razões de justiça e de equidade social.
O levantamento do segredo fiscal não foi abandonado. Dá-se um primeiro passo neste Orçamento com o âmbito que aqui lhe é atribuído, mas já tivemos oportunidade — quer eu quer o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais — de tornar claro que este é um primeiro passo e que será de esperar que novas iniciativas venham a ser tomadas, no sentido do levantamento do segredo fiscal.
No que toca ao levantamento do segredo bancário, concordo tratar-se de um instrumento importante de luta contra a fraude e evasão fiscais, e creio que é neste contexto que devemos equacionar os termos em que este levantamento deve ser feito. Portanto, aqui não há qualquer recuo relativamente às intenções já anunciadas pelo Governo neste matéria.
Se o Sr. Presidente da Comissão der licença, peço ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais o favor de complementar algumas das observações feitas sobre estas matérias, designadamente de natureza fiscal, se assim o entender.
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O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, também considero — e a minha curta experiência como Secretário de Estado tem-no demonstrado — que o levantamento do sigilo bancário é, quando bem utilizado, uma alfaia poderosíssima no combate à evasão e fraude fiscais.
Quero aqui recordar o compromisso que vai ser assumido pelo Ministério das Finanças no sentido de apresentar, logo no início do ano, um balanço do que foi esta experiência de um ano. Ou seja, iremos ver em quantos casos houve levantamento do sigilo bancário, quais foram as consequências a nível de correcções fiscais, como funcionou, se houve dificuldades em obter essa informação junto da banca e se houve ou não colaboração por parte dos contribuintes. Este balanço vai ser efectuado. E o que posso antecipar desde já é que os resultados obtidos são particularmente animadores.
Relativamente a esta questão concreta, quero recordar que pode parecer que é a primeira vez que aparece uma disposição deste género mas já há 15 anos que o Código do IRS contém uma disposição em que os contribuintes que optam pelo englobamento dos rendimentos sujeitos a imposto de capitais, à taxa liberatória prevista, abdicavam efectivamente do sigilo bancário. Porém, o que posso dizer, e esta é a experiência a nível fiscal, é que esta possibilidade era depois utilizada de uma forma não massiva, era utilizada selectivamente.
Não fazia sentido que os funcionários da administração fiscal estivessem a controlar tostões quando eram mais eficazes a controlar montantes mais elevados.
Em suma, esta possibilidade generalizada de abdicação do sigilo bancário já estava prevista no Código do IRS, há cerca de 15 anos. Agora, em relação à questão concreta que coloca, que se prende com a segurança social, não sei qual é a perspectiva subjacente a esta informação.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, antes de darmos início à segunda ronda de pedidos de esclarecimentos, permito-me sublinhar que a Comissão, na sequência do que foi solicitado, designadamente o modelo macroeconómico que o Ministério das Finanças utiliza, e tendo em conta a disponibilidade manifestada pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças, vai requerer o envio desse mesmo modelo que manifestamente tem todo o interesse para a qualidade das nossas apreciações.
Encontram-se inscritos sete Srs. Deputados, que intervirão de acordo com a regra da alternância, e, se for possível, a equipa do Ministério das Finanças responderá no fim, em bloco.
Faço um apelo ao espírito de síntese dos Srs. Deputados, que sempre têm tido, para, e atrevo-me a sugerir, não ultrapassarem o tempo de 5 minutos em cada intervenção, que me parece extremamente adequado.
Mas, enfim, os Srs. Deputados exercerão aqui a sua temperança na forma como têm articuladas e pensadas as suas intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, em primeiro lugar, quero relevar o facto de este Orçamento, pela primeira vez, tanto quanto me lembro, ter sido recebido com grande aceitação,…
Vozes do PS: — Vamos ver!
O Orador: — … pela sua seriedade e adequação. E penso que este ponto é tão inusitado que merece, de facto, ser destacado neste momento.
Tenho três pedidos não de dúvida mas de informação.
Primeiro, é sabido que a operação de titularização, desencadeada a pretexto de salvar o défice, camuflando a sua dimensão real, se traduziu (e está a traduzir-se) em impactos negativos sobre o próprio Orçamento.
Portanto, quero pedir que seja fornecido à Comissão a estimativa do total desses impactos negativos e a sua repartição pelos anos de 2004 (suponho que já os houve), mas, sobretudo, pelos de 2005 e 2006, os anos desta Legislatura, e o seu total.
Segundo, quanto à política de combate à fraude e evasão fiscais e à melhoria da eficiência da máquina fiscal, devo registar que existem aqui grandes progressos, que, aliás, têm também fundamento em acções de governos anteriores, mas, de facto, tem havido continuidade e dinamizou-se muito este aspecto. Sei que a administração fiscal preparou um documento chamado «plano estratégico para a justiça e eficácia fiscal» — suponho ser este o título, mas, se não for, o Sr. Ministro saberá identificá-lo, pois é um documento da administração fiscal que foi presente ao Governo —, gostaria que este documento fosse enviado à Comissão, assim como eventuais avaliações, estudos complementares e decisões tomadas.
Devo dizer que não vejo este problema apenas na óptica das receitas, não é esta até a minha primeira e grande preocupação, vejo-o na óptica da credibilidade do Estado, da justiça e da confiança que a administração fiscal tem de merecer de todos nós. Este é, de facto, um problema de grande relevância, e parece-me que a Assembleia deveria ser informada sobre esta matéria.
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Finalmente, vou abordar uma questão que, sei, o Sr. Ministro, de certeza, não teve a menor possibilidade de levar muito à frente, neste tempo tão curto do seu mandato e deste Governo, que é a da programação, isto é, o Orçamento por programas. E ao falar de Orçamento por programas não me vou repetir ao falar do Orçamento por objectivos.
Mas a questão é esta: temos 28 programas que representam 16 000 milhões de euros de despesa em 2006 — 40% da despesa do Estado — e não se cumpre, nem de longe, nem de perto, a Lei de enquadramento orçamental nesta matéria. Penso que a Assembleia tem de ser exigente e tem de pugnar para que de facto a Lei de enquadramento orçamental se cumpra.
Para poder situar exactamente o meu pedido, vou ler o n.º 1 do artigo 19.º da Lei de enquadramento orçamental, sob a epígrafe «Programas orçamentais»: «O programa orçamental inclui as despesas correspondentes a um conjunto de medidas de carácter plurianual que concorrem, de forma articulada e complementar, para a concretização de um ou vários objectivos específicos, relativos a uma ou mais políticas públicas, dele fazendo necessariamente parte integrante um conjunto de indicadores que permitam avaliar a economia, a eficiência e a eficácia da sua realização».
Ora, o Mapa XVI dá-nos os 28 programas com detalhe para 2006 e programa a programa com o total dos anos seguintes, mas não há a menor indicação de duas coisas: primeiro, dos objectivos específicos que concorrem em cada programa e, segundo, da estrutura de indicadores que permite avaliar a economia, a eficiência e a eficácia da sua realização, pois, como sabemos, com esses indicadores, haverá também, ano a ano, alguma avaliação.
Sei que esta matéria não se resolve de um momento para o outro, mas pergunto se, em sede de execução orçamental, porque é até onde me parece que as coisas porventura terão mais oportunidade de avaliação, é possível ao Sr. Ministro dar conhecimento ao Parlamento e à Comissão competente, a de Orçamento e Finanças, da execução, durante o ano de 2006, dos diferentes programas à medida que eles forem sendo, digamos assim, organizados, estruturados ou reavaliados, de modo a cumprir o artigo 19.º da Lei de enquadramento orçamental.
A título complementar, julgo que é tempo de o Governo explicar como é que vai cumprir a Lei de enquadramento orçamental em matéria de programação por objectivos. É uma questão de fundo, que exige estudos complexos por parte dos serviços e, sobretudo, grande direcção política sobre os serviços, porque eles tendem a combater esta ideia de modo a não saírem dos moldes tradicionais. Mas esta matéria é de tal maneira fundamental que, estando em curso a reforma da Administração Pública, não me parece sequer possível que na sua preparação as diferentes comissões que vão estudar os diversos Ministérios não tenham, desde logo, a perspectiva orçamental por objectivos associada à própria reforma.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa. O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, tentarei ser o mais breve possível, embora, se calhar, com alguma dificuldade.
Em primeiro lugar, para esclarecer as bancadas, e foram várias as que falaram nesta questão, e também poderá interessar ao Governo, sobre a posição do PSD em relação ao Orçamento, devo dizer que o consideramos globalmente positivo no que respeita aos aspectos nele concretizados e globalmente negativo em todos os outros aspectos, que são muitos, que não vêm nele concretizados.
Aliás, estas questões já aqui foram postas hoje, ao longo deste debate, mas posso dar exemplos: as alterações ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, que é um autêntico «cheque em branco» e não concretizado no Orçamento; o plano plurianual de redução da despesa corrente, que também já aqui foi falado, que é um outro autêntico «cheque em branco» não concretizado no Orçamento, e muitos outros aspectos. Já agora, cabe aqui dizer que não podemos plebiscitar nada no Orçamento.
Risos do Deputado do PCP Honório Novo.
Não temos competências plebiscitárias! Sou Deputados há muitos anos e estou habituado a votar a favor, contra ou a abster-me em relação a propostas em que o posso fazer, não posso concorrer para plebiscitos.
Portanto, um aspecto extremamente negativo deste Orçamento é tudo aquilo que vem «jogado» para o futuro sem a concretização de vários aspectos.
Estivemos a ouvir as várias explicações do Sr. Ministro sobre a questão das exportações e, sinceramente, gostaria de dizer uma coisa: ou somos nós que não o entendemos ou, então, algo está mal explicado nesta previsão do crescimento das exportações em 5,7%.
Quanto a isto, vou só deixar uma nota: há uns meses atrás, o Sr. Governador do Banco de Portugal, na Sala do Senado, quando interrogado por Deputados de várias bancadas, numa altura em que se previa já para 2006 um crescimento das exportações desta ordem, disse que esse crescimento ocorreria fundamentalmente devido a um cabriolet da Volkswagen.
Muito sinceramente, face às explicações do Sr. Ministro e à resposta do Sr. Governador do Banco de Portugal ficamos sem saber por que razão se prevê um crescimento de 5,7% das exportações quando todos os
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dados que constam do Boletim Informativo de Execução Orçamental, que saiu recentemente, sobre a evolução das exportações e das importações não apontam, de maneira alguma, para um crescimento desta ordem.
Ainda a título de comentário, e é extremamente complicado dizer isto, mas teremos de o dizer à tarde, na audição com o Sr. Ministro da Economia e da Inovação, apesar de não haver dúvidas, porque, de certa forma, já foi aqui dito e a intervenção inicial do Sr. Ministro de Estado e das Finanças foi notória neste aspecto, gostaria de dizer que este Orçamento esquece a economia. Não há nenhum dado que comprove aquilo que foi sempre… E refiro-o, porque estava habituado a ouvir o Primeiro-Ministro Eng.º José Sócrates, enquanto Deputado da oposição, dizer que quem estava a «matar» a economia, quem estava a fazer com que não houvesse confiança, quem estava a fazer com que a economia não crescesse era o governo anterior, mas este Orçamento não tem, para nós, qualquer sinal desse crescimento da economia.
Gostaria também de colocar uma questão relacionada com a capacidade deste Governo para executar este Orçamento. Temos de dar o benefício da dúvida a V. Ex.ª, Sr. Ministro, aos Srs. Secretários de Estado e ao Governo, mas temos sérias dúvidas, face ao passado do Partido Socialista que sempre atacou — e escuso-me, aliás, de os especificar — os governos anteriores em relação aos Orçamentos que preparavam e traziam a esta Câmara para aprovação, porque, agora, diz que vai executar este Orçamento exactamente com base nas críticas que fazia a esses mesmos governos anteriores.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ora, aí está uma boa observação!
O Orador: — Repito: temos de dar o benefício da dúvida, e acreditamos que esta equipa tem a possibilidade de o executar — o Partido Socialista até tem maioria absoluta; acreditamos na boa-fé. Contudo, o Governo do Partido Socialista terá mesmo capacidade para executar este Orçamento conforme nos diz que o vai executar? Já se falou da previsão do crescimento das exportações.
Agora, quanto à previsão do crescimento da receita fiscal, não há dúvida de que há um grande esforço de consolidação orçamental do lado da despesa, mas ele ocorre fundamentalmente do lado da receita, daí o aparecimento de uma previsão de crescimento da receita de 6,8%.
Gostaria de perguntar se não há aqui algum irrealismo, face à previsão de crescimento da economia.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não!
O Orador: — O Sr. Ministro diz que não.
Então, se não há irrealismo, gostaríamos de saber em que é que o Governo se baseia para fazer esta afirmação. Ou seja, qual é a parte que advém do combate à fraude e evasão fiscais? Qual é a parte que advém do aumento de impostos? Em que é que se baseia, se é que esse estudo está feito, para dizer que a receita vai crescer 6,8%? Nós temos, sinceramente, sérias dúvidas em relação a este aspecto.
Sr. Presidente, sei que já estou a demorar um pouco, mas pedi, inclusive, a um colega que não se inscrevesse para que eu pudesse ter mais 2 ou 3 minutos para colocar questões ao Sr. Ministro.
Sr. Ministro, uma outra questão é a do congelamento das transferências para as autarquias e regiões autónomas, sobre a qual parece haver, não em relação a todas as bancadas, algum consenso. Não está aqui em causa a legalidade desta decisão, penso que todos percebemos que ela tem fundamento legal; a questão que se coloca é a do fundamento para a tomar face a outras políticas deste Governo. Atrever-me-ia a comparar essa decisão com a política adoptada em relação às SCUT.
Já se começou falar que o Governo está a pensar alterar esta situação, mas por enquanto vai pensando… E a verdade é que no Orçamento para 2006 está prevista para as SCUT uma verba de cerca de 280 milhões de euros e, se em 2006 se não resolver, a partir de 2007 estão previstos cerca de 700 milhões de euros por ano.
Portanto, a questão que se coloca é muito claramente esta…
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Está a querer as SCUT para a Madeira!
O Orador: — Sr.ª Deputada, na Madeira já temos SCUT! Como eu dizia, coloca-se a questão: se existe este tipo de despesa, é justo que se penalize ainda mais as autarquias e as regiões autónomas? Em relação às regiões autónomas, gostaria colocar uma questão, e, tanto quanto sei, esta situação diz respeito quer à Região Autónoma da Madeira quer à Região Autónoma dos Açores.
Nos anos anteriores, já havia limitações nas transferências para as regiões autónomas; agora, esta limitação vai ao máximo que a lei permite, mas também em todos os Orçamentos aparecem normas que permitem ao Governo autorizar capacidades de endividamento às regiões autónomas. Ora, esta norma vem no Orçamento para 2005 e, tanto quanto sei, ainda não foi dada essa autorização.
Perante esta situação, justifica-se que haja este tipo de cortes?! Ou seja, justifica-se que o Governo vá reduzir ainda mais as transferências para as regiões autónomas?! E coloco esta questão relativamente às
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duas Regiões Autónomas, a dos Açores e a da Madeira, porque, no fundo, estão na mesma situação. Isto é injusto, porque, se esta autorização não foi efectivamente dada, havendo nos anos anteriores uma norma que a prevê, há uma dupla penalização, em termos financeiros, para as regiões autónomas.
Para terminar, embora saiba que já demorei muito tempo, gostaria ainda de colocar mais duas ou três questões, e a primeira delas tem a ver com o sigilo fiscal.
Aceitamos e acreditamos que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, e não tenho qualquer problema em dizê-lo, está a fazer um excelente trabalho (nós, na política, não temos de dizer bem ou mal só por estarmos de um lado ou de outro). Está a fazer um excelente trabalho, porque notamos não só que há uma continuidade em relação ao que vinha a ser feito relativamente ao combate à fraude e à evasão fiscais mas também que toda a administração fiscal está a funcionar melhor. Portanto, não devemos dizer mal daquilo que está bem, contudo, o sigilo fiscal parece-nos algo que não serve para atingir objectivo algum. Nós sempre defendemos que o levantamento do sigilo fiscal, mesmo global, não resolveria problemas fundamentais do combate à fraude e à evasão fiscais. Não há dúvida de que, como se faz na Europa, o levantamento do sigilo bancário é que seria fundamental, e, se vamos ter de esperar até Janeiro pelos resultados do que está a fazer-se nesta matéria, para nós, é óbvio que seria melhor que o Governo não só agilizasse e fizesse um estudo sobre o seu funcionamento mas também abrisse mais o sigilo bancário para combater a fraude e a evasão fiscais.
Vou terminar com as duas questões que coloquei no início, o programa plurianual da redução da despesa corrente e o Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Sobre o Estatuto dos Benefícios Fiscais, diz-se, no Relatório do Orçamento, que vai sofrer alterações de relevo, que serão suprimidos alguns benefícios, que serão reformulados outros, mas, depois, vamos ver e só há uma autorização legislativa sobre benefícios fiscais, ou seja, não há nenhuma repercussão concreta, na lei do Orçamento, destes grandes objectivos do Governo.
Ora, a Assembleia da República e os Deputados ficam numa situação extremamente difícil. E, mais uma vez, lhe digo, Sr. Secretário de Estado, nós não vamos plebiscitar coisa nenhuma, nós vamos votar um orçamento e, ao votarmos um orçamento, votamos aspectos concretos e não intenções do Governo, que poderão ser mais ou menos correctas mas relativamente às quais gostaríamos de saber exactamente quais são.
No que toca ao programa plurianual de redução da despesa corrente, a actual Lei de enquadramento orçamental prevê que a Assembleia se pronuncie sobre ele, mas, quanto ao que aqui está — e li-o com cuidado, pensando que iria encontrar efectivamente um programa plurianual de redução da despesa corrente que pudéssemos votar —, cheguei à conclusão de que não o podemos votar. Aliás, o programa é de tal forma abstracto, genérico e sem repercussão concreta que nos leva a pensar que talvez fosse melhor não existir, porque, se assim fosse, discutiríamos um programa plurianual de redução da despesa corrente concreto, relativamente ao qual todos pudéssemos dar o nosso contributo. E, neste caso, não plebiscitávamos um programa plurianual de redução da despesa corrente mas votávamos um programa plurianual de redução da despesa corrente, que é algo que, segundo me parece, todos estão de acordo em que deve existir.
Portanto, ficamos sem saber como é que, em concreto, depois de 2006, vão ser os cortes na despesa corrente. Vão fechar serviços? Vão fechar institutos? Haverá fusões de institutos e de serviços? Quantos serviços ou institutos vamos passar a ter? Toda esta falta de concretização do programa plurianual, para nós, é algo que nos custa registar, estando ele no Orçamento; mas também nos custa registar que, não estando concretizado, não o possamos votar.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, tenho um conjunto de questões concretas a colocar, mas, antes, gostaria de fazer um reparo, para reflexão do Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
Já ouvi dizer, várias vezes, que esta proposta de lei de Orçamento não agrava o desemprego e, mesmo na apresentação aos media, o Sr. Ministro deu a entender que era uma proposta amiga do emprego e que poderia até criar emprego. Gostaria de lembrar o Sr. Ministro que, pelos estudos empíricos feitos em Portugal, não há criação de emprego com uma taxa de crescimento do PIB de 1,1%, seria necessário duplicar esta taxa para haver criação de emprego em Portugal. E todos os anos chegam ao mercado de trabalho novos trabalhadores à procura de emprego, é certo que uma parte é absorvida com os que saem, mas outra parte determina acréscimo.
Portanto, era importante que nestas matérias muito sensíveis para os trabalhadores houvesse maior rigor.
Passo à análise do Orçamento.
O Sr. Ministro afirmou que não havia aumento de impostos, mas o aumento de impostos também pode verificar-se de uma forma automática. Se analisarmos as propostas do Governo que dizem respeito aos rendimentos do trabalho, nomeadamente a da actualização que faz nos escalões do rendimento do trabalho e nas deduções que mais beneficiam os trabalhadores, que rondam apenas os 2,3%, e prevendo-se que, em 2006, a taxa de inflação seja, naturalmente, superior à deste ano — recordo-se que os últimos dados do INE dão um aumento da inflação de 2,8% entre Setembro de 2004 e Setembro de 2005 —, é evidente que basta um aumento salarial superior àquela actualização de 2,3% para que isto determine a passagem automática
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para o escalão seguinte de uma parte do rendimento do trabalhador, aumentando, deste modo, a carga fiscal.
Este é um aspecto que me parece importante.
É incompreensível que o Governo, numa altura em que faz este tipo de actualizações e se sabe a taxa de inflação que se vai verificar no próximo ano, introduza novamente o benefício fiscal ligado aos PPR, o qual vai, certamente, determinar um aumento da despesa fiscal do Governo, porquanto, no último ano em que vigorou, custou, em termos de receitas, cerca de 190 milhões de euros. Não seria mais correcto fazer uma actualização adequada nos escalões, para favorecer fundamentalmente os trabalhadores de mais baixos rendimentos, uma vez que não são estes os beneficiados pelos PPR? Deixo esta questão.
Outro aspecto importante e que me provocou surpresa foi a alteração que o Governo pretende fazer no Estatuto dos Benefícios Fiscais, nomeadamente em relação às zonas francas.
O artigo 33.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que está em vigor, determina que só 15% do lucro tributável está quase isento, ou seja, está sujeito à taxa de 2%, o que significa que se considera que 85% do lucro tributável resulta de actividade exercida fora do âmbito institucional das zonas francas da Madeira e da Ilha de Santa Maria.
Ora, a proposta do Governo, a nosso ver, altera radicalmente esta situação, quando pretende que se considere que 40% do lucro tributável resultante da actividade global corresponde às actividades exercidas fora do âmbito institucional das zonas francas, isto é, reduz os 85% para 40%, o que determina que 60% passem à taxa reduzida. É certo que o Governo, à frente, diz que se refere a entidades que, predominantemente, desenvolvam a actividade na própria zona franca, mas não há dúvida de que isto determina benefícios importantes.
Portanto, até aqui, por lei, de acordo com o Estatuto dos Benefícios Fiscais, apenas 15% do lucro tributável — fundamentalmente das instituições financeiras e de crédito, ou seja, dos bancos — estavam sujeitos a uma taxa de apenas 2%, sendo quase isentos. O que é que o Governo pretende agora? Com a figura de «actividade predominantemente desenvolvida na zona franca» o Governo pretende aumentar esses 15% para 60% e é sobre estes que vai incidir a taxa de 12%. Actualmente, devido a esta isenção temporária, e de acordo com os dados que constam do Relatório, o Estado tem uma despesa fiscal de 1200 milhões de euros. Não vou dizer que o facto de se passar de 15% para 60% vá determinar quatro vezes mais, mas não há dúvida de que vai determinar um aumento da despesa fiscal do Estado, o que é incompreensível numa altura em que se pedem bastantes sacrifícios aos trabalhadores.
Portanto, gostava que o Governo nos esclarecesse por que razão, numa altura destas, faz uma proposta desta natureza.
Uma outra questão, que também tem a ver com um benefício, é a seguinte: na proposta de lei, no artigo 55.º, o Governo pretende ficar autorizado, isto é, ter um «cheque em branco» para rever o regime de tributação dos fundos de investimento, com o objectivo de assegurar a sua competitividade. Bom! Descodificando isto, esta linguagem tributária significa dar mais benefícios ou reduzir a taxa que incide sobre os rendimentos destes fundos. Pergunto: concretamente, o que é que o Governo pretende fazer? Numa altura em que se estão a pedir grandes sacrifícios, e mais sacrifícios, aos trabalhadores, é legítimo apresentar uma proposta desta natureza? Relativamente às despesas com pessoal, que aqui foram bastante debatidas, gostaria de colocar uma questão não para esclarecimento mas para confirmação.
Comparando os dados que aparecem no Relatório, na pág. 74, sobre as despesas, que são desagregadas por natureza, com os dados que constam do Mapa IV, que é aquele que a Assembleia tem de aprovar, sendo que no Relatório estão aplicadas as cativações e não se diz que a dotação provisional está distribuída, chegase à conclusão de que, para «Remunerações certas e permanentes», no Mapa IV aparece o valor de 8389 milhões de euros e no Relatório temos o valor de 8719 milhões de euros. Portanto, se no Relatório estão aplicadas as cativações, este valor só pode ser explicado por uma distribuição já da dotação provisional de cerca de 329 milhões de euros, valor que, comparado com a estimativa de despesa apresentada para 2005, pelo Governo, determina um aumento de apenas 1,9%. A questão que lhe coloco é a de saber se esta conclusão está correcta e se no valor que consta do Relatório, que representa apenas um aumento de 1,9% relativamente à estimativa de despesa — e estou apenas a falar das «Remunerações certas e permanentes» —, já está incluída a dotação provisional destinada à actualização das remunerações dos trabalhadores da Administração Pública.
Gostava ainda de referir dúvidas…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, se puder ser sintético, agradeço.
O Orador: — Sr. Presidente, já que estive tantas horas à espera, agora, deixe-me também terminar o que quero dizer. Não me corte a palavra e tenha calma, porque eu também estive calmo, durante 4 horas e 30 minutos, a ouvir muitas repetições.
O Sr. Presidente: — Não é disso que estamos aqui a tratar, Sr. Deputado.
O Orador: — Então, deixe-me falar!
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O Sr. Presidente: — Deixo-o falar, mas, por favor, utilize também uma moderação de linguagem apropriada à…
O Orador: — Penso que estou a colocar as questões ao Sr. Ministro com calma.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, só estou a pedir-lhe para ser sintético.
O Orador: — Está bem, é isso que estou a fazer.
Sr. Ministro, tenho dúvidas e também precisava que me esclarecesse sobre o valor que aparece relativamente ao aumento da dívida líquida.
Utilizei uma metodologia para calcular as necessidades de financiamento que me parece muito mais consistente e que se baseia fundamentalmente na utilização dos valores dos passivos financeiros, receita e despesa. Assim, com base nos dados que constam dos Mapas I e IV, para o sector Estado, cheguei à conclusão de que as necessidades de financiamento para o sector Estado são de 9489,6 milhões de euros. Fui também calcular as necessidades de financiamento, com base nos dados fornecidos nos mapas, para os serviços e fundos autónomos e concluí que as necessidades de financiamento são de 1293 milhões de euros. Somei as duas necessidades de financiamento e cheguei ao valor de 10 783,2 milhões de euros, que gostaria que, depois, me pudesse explicar.
Comparando, agora, este valor com o montante que está no artigo 82.º, que é de 10 875,8 milhões de euros, concluo que há uma diferença de 92,6 milhões de euros. Pergunto: por que é que o Governo apresenta um pedido de autorização para aumentar o endividamento líquido num montante superior em 92,4 milhões de euros ao valor — se o meu cálculo anterior, utilizando os valores constantes dos passivos financeiros, está correcto — das necessidades de financiamento obtido daquela forma.
Ainda no Relatório do Orçamento do Estado, o Governo diz — depois, esta referência desaparece, mas penso que seria importante esclarecê-la — que alguns tipos de activos estratégicos geridos por empresas públicas, designadamente por aquelas que constituem monopólios naturais, vão manter-se na esfera de domínio público, embora possam ser entregues à exploração privada. Sr. Ministro, gostaria de saber quais são estas empresas.
Para concluir, em 2006, o Governo pretende manter, ou congelar, as transferências para as autarquias, no entanto cria-lhes novas despesas. Vou dar um exemplo: o Sr. Ministro disse, e é verdade, consta da proposta de lei do Orçamento, que a contribuição das entidades para a Caixa Geral de Aposentações vai passar de 10% para 13% (mais 30%); se formos ao relatório da Caixa Geral de Aposentações concluímos que cada 1% representa 120 milhões de euros, pelo que 3% são 360 milhões de euros, isto em dados gerais.
Pergunto: sabendo-se que esta despesa, que agora se transfere para as autarquias e que até aqui era suportada pelo Estado, representa um acréscimo de despesa para as autarquias — e uma das consequências é passar a haver menos necessidades de transferência do Orçamento do Estado para a Caixa Geral de Aposentações —, numa altura em que se congela o valor das transferências para as autarquias, o Governo pensa compensar, ou não, as autarquias deste acréscimo de despesa no seu orçamento num momento em que os sacrifícios são grandes? E como é que o pensa fazer?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, muito boa tarde! — posso garantir-lhe que, antes de entrar para esta sala, de todas as afirmações que pensou que eu pudesse dizer, esta é a única que o vai surpreender, porque, nessa altura, os dois pensaríamos, com certeza, que era grande a probabilidade de a esta hora já não estarmos aqui.
Quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que o CDS terá, durante toda a discussão do Orçamento do Estado, uma posição concordante com aquilo que sempre tem dito e assumido sobre a matéria orçamental nos vários debates. Por isso, também lhe agradecemos um pouco a intervenção que tem sobre a bancada do PS, porque, de facto, é com alegria que agora ouvimos dizer que o investimento público tem de ser selectivo, que é essencial consolidar as contas públicas, controlar a despesa corrente e de investimento do Estado. Lembrome de debates que ocorreram precisamente nesta Sala, por exemplo, sobre a matéria de juro bonificado para a aquisição de habitação, onde se ouviu do PS as maiores críticas sobre esta medida de controlo da despesa.
Portanto, foi também com satisfação que verifiquei que no Orçamento do Estado não aparece a sua reposição, o que é, com certeza, um bom sinal.
O Sr. Ministro, no Relatório, dá-nos um conjunto de objectivos assumidos por este Orçamento, salientandose o de consolidação orçamental. E, em relação a essa consolidação orçamental, diz-se que se deve seguir cinco linhas de força: a reforma da Administração Pública; a promoção de condições de sustentabilidade a longo prazo da segurança social; a melhoria da qualidade da despesa pública corrente e de investimento; a simplificação e moralização do sistema fiscal; a redução do peso do Estado na economia.
Quanto a estes objectivos, estamos perfeitamente de acordo. Mas, Sr. Ministro, eu diria que a nossa discordância está no modo como, por exemplo, neste Orçamento é concretizada a consolidação orçamental.
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Quando a consolidação orçamental é feita em 64% pela receita fiscal e em 36% pela despesa não se pode pedir a um partido como o CDS, com todas as posições que tem assumido, que diga que se vai no bom caminho.
Quando no Relatório se assume, e bem, que é necessária a redução do peso do Estado na economia, como é dito na pág. 5, e se vê, na pág. V do seu «Sumário Executivo», que a carga fiscal, entre este ano e o próximo, passa de 36,6% a 37,5% verificamos que o caminho da redução do peso do Estado na economia começa precisamente com o aumento do peso do Estado na economia, e é isto, Sr. Ministro, que criticamos.
Se passarmos às págs. 81 a 84 do Relatório e fizermos uma comparação entre a estimativa de execução para este ano e aquilo que é previsto para o próximo ano, quanto à cobrança de impostos, verificamos subidas no IVA de 8,5%, no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos de 8,1%, no Imposto sobre o Tabaco de 9,1%, no IRS de 6,9%, no IRC de 4,6% e no Imposto do Selo de 4,1%.
Mas há mais, Sr. Ministro: vemos que também há medidas assumidas neste Orçamento e que terão efeitos sobre a receita cobrada em 2007 — estamos a falar de impostos periódicos — que aumentam a carga fiscal.
Por exemplo, em sede de IRS com a redução da dedução específica anual para os pensionistas, que passa para 7500 €, e em sede do IRC com um alargamento da base tributável das empresas, salientando-se a redução para a formação do lucro tributável, em apenas metade do seu valor, das perdas e variações patrimoniais negativas relativas a partes do capital ou outras componentes de capital próprio, designadamente prestações suplementares. Estas são medidas que terão um efeito para além de 2006, vão tê-lo em 2007.
Sr. Ministro, também se pode ler neste Relatório a ideia, sistematicamente repetida, da não opção por receitas extraordinárias. Pergunto: não seria preferível ter uma outra opção quanto às receitas extraordinárias e ao aumento da carga fiscal? Não seria preferível ter receitas extraordinárias, mas com isto não descansar, baixando também ao mesmo tempo a carga tributária de forma a podermos ter outros índices de competitividade fiscal?! Hoje nós temos altas percentagens de carga fiscal em Portugal, e eu diria que a fiscalidade portuguesa não é amiga das empresas.
O Sr. Ministro dá-nos objectivos, em relação às exportações, de aumentos na ordem dos 5,7%, que, com certeza, se atingirão devido à melhor performance das empresas no sector exportador. Não seria importante, em relação a esta matéria, dar sinais de natureza fiscal de forma a poder-se melhorar a situação destas mesmas empresas?! É que, ainda por cima, não sendo no plano técnico um aumento de imposto, assistimos a uma modificação, para cima, do tecto máximo do pagamento especial por conta para 70 000 €. Qual a razão deste aumento, Sr. Ministro? Esta é uma questão que quero colocar-lhe, Sr. Ministro, porque, tendo em atenção que é necessário, para que exista uma devolução, passagem de tempo, por um lado, e uma acção de inspecção, que é paga pelo contribuinte, por outro lado, medidas como esta podem criar problemas de liquidez às pessoas colectivas, nomeadamente às cumpridoras do seu pagamento de imposto.
Em relação à fiscalidade que eu chamo «amiga das empresas»…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa, mas espero que esteja prestes a terminar…
O Orador: — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.
Retomando o meu raciocínio, em relação à fiscalidade «amiga das empresas», quero dizer que, para além dos países de Leste, temos outros Estados que não têm as mesmas necessidades, como, por exemplo, a Bélgica, a tomar medidas fiscais bem diferentes das que nos são propostas neste Orçamento do Estado.
O outro objectivo em relação às receitas é o da simplificação e moralização do sistema fiscal. Concordamos com a grande mancha das medidas que nos são propostas e que estão tecnicamente correctas. Há duas, no entanto, que nos geram algumas dúvidas. A primeira delas tem a ver com um novo escalão de tributação no IRS.
Como o Sr. Ministro sabe, a liquidação do IRS é feita pelos próprios serviços de finanças, não é feita pelo contribuinte, como acontece no IRC. Ora, um novo escalão de IRS vai, com certeza, dificultar a tarefa das finanças, quando ainda por cima é relativo a um conjunto de rendimentos que, como nos é dito no Relatório, não abrange muitos contribuintes, nem contribuirá para um grande aumento da receita fiscal. Então, qual é o objectivo do aparecimento de mais este escalão, que apenas vai complicar o Código do IRS? Quando a tentativa deveria ser no sentido da diminuição dos escalões é-nos proposto um aumento dos mesmos.
Passo à medida que tem a ver com os PPR. Que se saiba, durante este ano, a procura de PPR não diminuiu, bem pelo contrário; portanto, não se entende muito bem a razão desta modificação. Será apenas para se tentar cumprir uma promessa eleitoral do Sr. Primeiro-Ministro José Sócrates?! É que foram feitas tantas promessas que não foram cumpridas que não percebo por que é que esta, simbolicamente, tem de ser cumprida! Por último, quero referir-me à tributação local. Foi dito há pouco, pelo Sr. Deputado António Pires de Lima, que concordamos com a ideia de modificação da Lei das Finanças Locais e da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, mas o Sr. Ministro já disse, segundo o que entendi, que o grupo de trabalho para a alteração da lei das finanças locais iniciaria as suas funções amanhã. Este grupo de trabalho, com toda a certeza, vai trabalhar com uma base de parâmetros políticos que lhe será dada pela equipa ministerial e, com certeza, pelo Sr. Ministro. Gostaríamos de saber, na medida do possível, que parâmetros são esses? Isto porque gostaríamos de saber aquilo que se vai passar a nível da tributação local no futuro.
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Termino, Sr. Ministro, como pode ver — e sei que está atento aos debates nos órgãos de comunicação social —, sem grandes novidades em relação àquilo que o CDS tem dito, mas há questões que gostaríamos de ver respondidas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, como o tempo já vai muito longo, quero só trazer ao Sr.
Ministro três notas telegráficas.
A primeira delas é para registar a sua simpatia e abertura em relação ao conhecimento público do modelo macro. Creio que o Sr. Ministro tem consciência, como eu tenho, de que no dia em que ele for conhecido muitos destes debates mudam de natureza, porque se poderá simular imediatamente o número de funcionários públicos que corresponde a uma determinada dotação orçamental para «Remunerações certas e permanentes» ou, vice-versa, o custo orçamental de um determinado projecto de aumento dos seus salários, e por aí adiante. Mas só ganharemos com o conhecimento desse modelo, porque deixa de haver qualquer dúvida a este respeito e o debate passa a concentrar-se sobre escolhas entre alternativas, o que seria, creio eu, uma grande vantagem do ponto de vista democrático. Registo, portanto, as suas palavras, esperando que no final de 2005 não tenhamos de repetir este debate.
Quero fazer-lhe duas perguntas sobre o que disse, e começo pelas exportações, uma matéria que já se discutiu muito pelo que a ela não volto a não ser sobre um aspecto da sua resposta.
O Sr. Ministro sublinhou que a competitividade das exportações exigia uma contenção orçamental — logo, uma redução, em termos reais, dos salários —, mas isto deixa supor que acredita que, a curto prazo, a competição/preço pode ser significativa para as exportações portuguesas. Trata-se de um salto muito importante e, mesmo que o aumento dos salários fosse zero, o que seria catastrófico do ponto de vista social no privado, não vejo como é que isto permitiria explicar um tal aumento de competitividade/preço e um tal aumento de exportações, até porque — e isto ainda não foi referido — a sua previsão para o aumento do investimento é de 1,7% após vários anos de grande redução, é um aumento muito ligeiro do investimento em relação ao nível anterior, que era uma redução negativa. Portanto, nós não chegamos sequer, com 1,7% de aumento no investimento, ao nível de investimento de 2000 ou de 2001, estamos ainda abaixo. Logo, pergunto directamente: qual é a redução salarial que, em sua opinião, pode permitir um tal aumento das exportações? Por último, quando referi as previsões do Programa de Estabilidade e Crescimento do Verão passado sobre os sucessivos anos nas receitas de privatizações, o Sr. Ministro disse-nos, honestamente, que não acompanhou essa previsão — não era ministro na altura — e que ela vale o que vale (valem sempre o que valem!), mas isto suscita dois problemas. O primeiro é que a soma de tudo o que se encontrava previsto nas receitas de privatização estava abaixo daquilo que o Governo previa — o Governo previa 5000 milhões de euros e a soma destes vários anos são 3899 milhões de euros, há, portanto, aqui uma margem de incerteza.
Mas quando o Sr. Ministro nos diz que as previsões valem o que valem, quando elas são contabilizadas com tanto rigor nos próximo anos, cria uma margem de incerteza sobre a política de privatizações anunciada no Programa de Estabilidade e Crescimento que eu gostaria de ver resolvida, porque ou é aquela ou não é.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.
O Sr. Maximiano Martins (PS): — Sr. Presidente, vou ser muito curto, dado o adiantado da hora.
Gostaria de fazer alguns comentários a vários argumentos que foram aqui usados e «repisados» pelas oposições, mas o tempo não só o não aconselha como, daqui a pouco, todas estas questões irão ser retomadas com o Sr. Ministro da Economia, e eu deixo-os para então.
Contudo, não deixarei de dizer que os argumentos apresentados não têm grande novidade; talvez a originalidade de todo este debate tenha sido a demarcação do CDS relativamente ao PSD, num discurso de ruptura tanto mais significativo por ser próximo das eleições autárquicas, em que o CDS agora se inclui nas forças que verdadeiramente se opõem ao Governo e exclui dessas forças o PSD. Esta é, sem dúvida, uma novidade que mereceria alguns comentários, que não farei.
Relativamente a tudo o resto, não deixarei de dizer que é estranho ver partidos que apoiaram o Governo e que fizeram crescer a despesa do Estado em 1,5%, em termos do PIB, ano após ano, virem agora dizer que uma queda, pela primeira vez, de 0,5% é pouco. Parece-me que há princípios de seriedade e de pudor que deveriam aconselhar alguma contenção nesta matéria, quando aquilo que tanto criticam como despesismo do Governo do Partido Socialista cresceu este mesmo ratio de 0,5%, ou seja, menos de metade daquilo que esta maioria fez.
Termino com a questão principal que me fez intervir: a Lei das Finanças Regionais.
Defendo, defendi e defenderei que as relações financeiras entre a República e as regiões autónomas se façam na base da transparência e da estabilidade do relacionamento, donde saúdo a proposta de revisão da Lei de Finanças Regionais, que está para ocorrer desde 2001 e que a anterior maioria não fez. A não ser assim veremos duas coisas: primeiro, a arbitrariedade, e, portanto, um quadro totalmente instável; segundo, o descontrolo, malabarismos financeiros e alguma irresponsabilidade, como é o caso do Governo da Região Autónoma da Madeira, em matéria de endividamento.
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Quero sublinhar que não gostaria de ver desrespeitada a Lei de Finanças das Regiões Autónomas e dizer que conta mais o princípio — o princípio da estabilidade do relacionamento parece-me essencial — do que o valor em causa neste Orçamento, que é de 5 milhões de euros, o que representa uma semana de transferência de IVA para a Região Autónoma da Madeira (falando apenas da Região Autónoma da Madeira).
Logo, o valor não é significativo; mas gostaria de ver respeitado, reconhecendo legalidade — o que fez também o Deputado Hugo Velosa — e a legitimidade, naturalmente, do princípio invocado, que é o da solidariedade recíproca.
Termino dizendo, Sr. Ministro, que registo como positivo o facto de no Orçamento do Estado, em tempo de grandes dificuldades e contenção, estarem inscritas verbas relativas a compromissos que são muito importantes para os cidadãos que vivem naquelas ilhas, como sejam a convergência do tarifário de electricidade e o centro logístico de combustíveis.
O Sr. Presidente: — Para uma última intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, muito boas tardes.
O Sr. Ministro reafirmou hoje aqui, várias vezes, a ideia de que este Orçamento do Estado para 2006 foi apresentado em nome da verdade, da transparência, de um Orçamento sem truques e engenharias e pela voz de outros Ministros também foi referido o combate a pretendidos privilégios dos funcionários públicos, em particular de alguns dos seus corpos — descobriu-se uma estranha mais-valia do Pacto de Estabilidade e Crescimento como promotor da igualdade neste país.
O Sr. Ministro estará certamente de acordo que, para nós e para todos os portugueses, a clarificação e a transparência da despesa de todas as entidades públicas é uma questão central para a credibilidade do próprio Orçamento.
Sr. Ministro, não vou fazer uma grande introdução, porque o tempo já vai longo, mas gostaria de lhe lembrar ainda três títulos da nossa comunicação social, entre muitos outros, que apareceram nos últimos meses, a partir de Junho. São eles: «O Conselho de Administração do Banco de Portugal custa mais de 1,5 milhões de euros por anos. Administradores acumulam pensões do Banco de Portugal. Tudo permitido por lei»; «Banco de Portugal gasta cada vez mais dinheiro em reformas. Desde 2003 a instituição passou a gastar anualmente mais 4 milhões de euros em pensões»; «Os últimos 26 automóveis do Banco de Portugal, comprados entre 2004 e 2005, custaram quase 1,2 milhões de euros e podem reverter para os funcionários ao fim de 3 anos por 10% do seu valor». Penso, Sr. Ministro, e certamente estará também de acordo comigo, que a instituição Banco de Portugal precisa que a sua credibilidade, a sua idoneidade, o seu comportamento sejam exemplares e sejam defendidos, a todos os níveis, pelo tipo de instituição que é, pelo que ela representa não só para o sistema bancário português mas para o conjunto da sociedade e até pelo papel que o seu governador acaba por exercer, do ponto de vista de intervenção económica, junto da sociedade portuguesa.
Em 1 de Julho, através de um requerimento, procurei esclarecimentos sobres estas questões, que se revestem, na minha opinião, de aspectos verdadeiramente escandalosos no quadro do pedido de sacrifícios feito aos portugueses e, em particular, aos trabalhadores do Estado, a não ser que pensemos, como aquele analista que referiu, que estes valores, embora sejam elevados, representam muito pouco, segundo ele, algumas milésimas, dizendo mesmo que, ao nível do défice do Estado, não têm qualquer significado.
A resposta do seu Ministério a este requerimento chegou-me um dia destes e é fácil verificar, por simples comparação entre as perguntas e as respostas, que, globalmente, não tenho resposta às questões essenciais que coloquei, sobre o nível e evolução dos vencimentos desde 1995, sobre o regulamento dos sistemas de pensões de reformas do Banco, sobre a composição das comissões de vencimentos passadas que aprovaram estas regras e estes regulamentos e sobre os critérios na distribuição de veículos e outras regalias do Banco.
O Sr. Ministro, nessa resposta, promete divulgar oportunamente «o elenco completo de remunerações após o trabalho de fixação do novo regime pela comissão nomeada para o efeito». Ora, Sr. Ministro, por importante que seja ficarmos a saber como vai ser, o que eu pretendia saber é como é hoje e como foi desde 1995 até hoje.
Penso que os Deputados desta Assembleia e o povo português, por nosso intermédio, se não for de outra forma — e não foi possível de outra forma —, têm o direito de saber, têm o direito de ser, capaz e suficientemente, esclarecidos sobre esta matéria; ou, então, há aspectos do funcionamento das entidades públicas deste tipo e dos respectivos dirigentes que devem «ficar no segredo dos deuses».
Gostaria que o Sr. Ministro me respondesse, de uma forma muito simples, se vai dar ou não uma resposta cabal ao conjunto das questões que levantei.
Já agora, faço um pedido de esclarecimento e uma proposta.
Sr. Ministro, pode ser defeito meu e por isso gostaria que me esclarecesse, desde 2000, desde a publicação das Leis n.os 30-F/2000 e 30-G/2000, que pedem legislação complementar, que tem vindo a ser sucessivamente prometido, em sucessivos Orçamentos do Estado, o estabelecimento de indicadores objectivos de base técnico-científica para os diferentes sectores de actividade económica para efeitos de aplicação do regi-
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me simplificado. Até hoje, pelo que sabemos, zero! E, na leitura que fiz do Orçamento, em particular da parte fiscal, nada vi.
Pergunto: o Governo desistiu do estabelecimento destes critérios, ou, pensa, de facto, elaborá-los, e quando? Finalmente, uma sugestão: esta questão da transferência das verbas do Orçamento do Estado e dos fundos estruturais da administração central para as autarquias foi aqui abordada e o Sr. Ministro até referiu que as propostas do Orçamento do Estado vão no sentido da transparência dessas transferências. O Sr. Deputado Maximiano Martins acabou de saudar a necessidade e a oportunidade dessa transferência.
Nesse sentido, permitia-me sugerir ao Ministério das Finanças que fosse feito um estudo quantitativo e qualitativo das transferências da administração central, incluindo os fundos estruturais, para as autarquias, pelo menos desde 1995, para verificarmos se o volume dessas transferências, habitualmente à margem das transferências obrigatórias pela lei das finanças do Estado, têm, ou não, alguma coisa a ver com a cor política das presidências das câmaras.
O Sr. Presidente: — Para responder em bloco, tem agora a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, espero ser capaz de responder às questões que foram levantadas. Em relação a algumas delas, desculpar-me-ão, mas irei responder abreviadamente, porque são repetições de perguntas que já foram colocadas no debate anterior. Pedirei, depois, também aos Secretários de Estado que num ou noutro aspecto mais pontual possam complementar as minhas observações.
O Sr. Deputado João Cravinho, que, de momento, não se encontra presente, levantou a questão do impacto da operação de titularização do Citigroup. Sr. Deputado, tem, com certeza, um impacto negativo no futuro, na medida em que há receitas com as quais se poderia contar nos sucessivos anos que deixam de poder ser um apoio ao financiamento do Orçamento em virtude de estarem já afectas a essa finalidade. De qualquer modo, faremos chegar ao Sr. Deputado e a esta Comissão a informação relevante, nos termos em que foi solicitada.
O Sr. Deputado referiu ainda outras questões de ordem fiscal, que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais irá, depois, responder e complementar.
Quanto à questão do Orçamento por programas, o Sr. Deputado reconheceu que, de facto, não houve ainda muito tempo para aperfeiçoar a informação que é prestada nestes mapas, e há que o reconhecer. Assinalo e partilho dessa mesma preocupação. Teremos, nesta matéria, quer no Orçamento por programas quer no Orçamento por objectivos, de aperfeiçoar os mecanismos à nossa disposição e sem dúvida que o esforço que está a ser feito de reorganização da Administração Pública criará o élan necessário para que muito disto melhore.
Devo confessar que, nestes três meses em que estou à frente do Ministério, tive oportunidade de constatar que, de facto, há aqui circuitos de informação que têm de ser melhorados, e essa será uma frente importante.
Por isso mesmo, tanto no próprio relatório como na proposta de lei, é reafirmada a vontade do Governo em ser mais exigente na informação para melhorarmos todas estas peças não só para nós, numa perspectiva de controlo de execução orçamental, mas para esta Assembleia, no controlo democrático que tem de fazer destas matérias à luz, até, da própria Lei de Enquadramento Orçamental. Portanto, com certeza que estes aspectos terão de ser melhorados.
Sr. Deputado Hugo Velosa, agradeço o apoio às medidas e à orientação do Governo que o PSD tem vindo a manifestar.
Risos do Deputado do PCP Honório Novo.
Posso compreender algumas dúvidas, porque também ficaria mal que um partido da oposição não expressasse dúvidas em torno desta matéria.
Assim, o Sr. Deputado tem uma grande dúvida quanto à capacidade de executar o Orçamento. Neste sentido, aproveito para responder a questões que foram já colocadas posteriormente por outros Srs. Deputados.
Sinceramente, agradeço que dêem o benefício da dúvida. Tenho consciência de que o desafio é grande, encaro-o com relativo optimismo e determinação, que não é só pessoal, porque também sinto o apoio dos meus colegas e, muito em particular, do Sr. Primeiro-Ministro para termos um Orçamento que coloque Portugal numa rota de consolidação orçamental, com os benefícios que daí advirão para a nossa economia. Com certeza que não basta só a boa vontade. Vamos ter de dispor de mecanismos de controlo, de execução, de acompanhamento, de sistemas de alertas adequados, e isso está previsto e é o que queremos fazer.
Quanto à previsão do crescimento da receita fiscal, já tive oportunidade de decompor este aumento entre o arrastamento via PIB, 3,4%, cerca de 2,2% que têm a ver com o IVA e o restante 1,2% que diz respeito ao combate à fraude e evasão fiscais.
O fundamento para o congelamento das transferências para as autarquias locais e regiões autónomas é, como já foi invocado, o fundamento da solidariedade. Parece-nos inteiramente legítimo que o País, como um
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todo, solicite a todas as entidades que integram o sector público administrativo que participem neste esforço de consolidação. Não faria sentido algum que entendêssemos que as autarquias locais e as regiões autónomas tivessem um tratamento excepcional num contexto em que a todos os portugueses, a todas as entidades do sector público administrativo é pedido um esforço de contenção nesta matéria.
Se me permite, direi que é errado pensar-se que há uma grande penalização das autarquias. Em meu entender, não há. Repare que o congelamento da transferência, por um lado, implica uma transferência acima daquela que resultaria da aplicação da fórmula, com base nos impostos de 2004. Não é a transferência que resultaria à luz da cláusula de garantia ou da cláusula de salvaguarda, mas é algo intermédio que acautela as próprias implicações que referiu do aumento da comparticipação que lhes é exigida para a Caixa Geral de Aposentações.
No entanto, apesar do congelamento desta transferência, permita-me que refira que, em números redondos (decompondo entre despesas totais e correntes), é esperado que as receitas das autarquias e das regiões cresçam 5% deste ano para o próximo ano. Portanto, não se pode considerar estejamos a impor às autarquias um verdadeiro aperto orçamental, através deste congelamento. Penso que convirá não dramatizar excessivamente as implicações desta medida.
Quanto à falta de concretização do Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente, Sr. Deputado, devo dizer-lhe que tínhamos um copo vazio nesta matéria e não temos ainda um copo cheio. Direi que o copo está meio cheio; V. Ex.ª diz que está meio vazio.
Sinceramente, é o exercício que, neste momento, é possível fazer. Aliás, uma nota que está inscrita no Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente chama a atenção para o facto de que este documento é um exercício preliminar, é o que é possível fazer nesta fase de análise da estrutura do sector público, da identificação de duplicações, de áreas onde a reorganização pode avançar, de economias, de ganhos de eficiência, etc. Portanto, é ainda um exercício preliminar e peço que o entendam nesse sentido.
Sr. Deputado, chamo ainda a atenção para o facto de que não se pede que vote este Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente. Ele consta do relatório, é meramente informativo. V. Ex.ª vai ter de votar a proposta de lei e os mapas obrigatórios e não, obviamente, o relatório, que não está sujeito a votação. Também não se preocupe que, se por acaso V. Ex.ª quiser votar a favor do Orçamento, não estará necessariamente a votar a favor desse Programa.
A proposta do Orçamento que apresentamos pretende ser amiga do crescimento. Entendemos que há que dar espaço à iniciativa privada para se afirmar e reduzir o peso do Estado na economia — o que, repito, se faz através da redução da despesa e da sua presença em sectores empresariais onde não faz sentido, porque é a redução da despesa que vai determinar, a prazo, a redução da receita e redimensionar o Estado. É este o sinal que este Orçamento dá e, por isso, espero que possa ser um estímulo à iniciativa privada, definindo um quadro orçamental que aposta claramente na redução do peso do Estado na economia e, em particular, da despesa.
Quanto às considerações que faz do aumento de impostos em virtude da actualização dos escalões e das deduções, V. Ex.ª, perdoe-me mas não tem razão, porque a inflação prevista é de 2,3% e foi à taxa de 2,3% que tudo foi actualizado. V. Ex.ª está enganado quando diz que a taxa de inflação é de 2,8% este ano. Ela é de 2,8% de Setembro a Setembro do ano passado,…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Foi o que eu disse!
O Orador: — … mas este ano a média de inflação é de 2,3% e, portanto, não estamos longe daquilo que temos agora em termos de média.
Quanto aos benefícios fiscais, entendemos que é importante repor os benefícios fiscais nos PPR, porque nos parece que os portugueses também têm de contribuir, tal como o Estado o está a fazer, para as suas pensões, para a sua terceira idade, quando se aposentarem. O Estado tem um sistema de protecção social, concretamente de segurança social, que deve garantir o pagamento das pensões, mas também é bom que os portugueses se habituem a comparticipar no assegurar de um rendimento no futuro, na sua velhice, na sua fase de aposentação. E parece-nos que o PPR é um produto que pode cumprir essa função. Não vai custar 190 milhões de euros, como referiu, mas 85 milhões de euros. Isto é, vai custar zero no próximo ano e 85 milhões de euros em 2007.
Quanto a esta matéria, respondo já ao Sr. Deputado Diogo Feio. Os PPR têm aumentado ao longo deste ano, porque, em boa verdade, o ministro das finanças do CDS-PP não retirou todos os benefícios fiscais aos PPR: retirou o benefício à entrada e não o retirou à saída. Portanto, continua a existir um estímulo, através do benefício à saída, à subscrição de PPR. Só que esse estímulo desvirtua aquilo que deve ser um PPR, pois transforma-o num depósito a prazo a cinco anos com um bom benefício fiscal e não num complemento a uma pensão de reforma, como se pretende. Por isso mesmo, introduzimos um benefício à entrada, para estimular a subscrição, e reduzimos o benefício à saída, para o transformar num verdadeiro complemento às pensões dos portugueses que optem por esta via.
No que se refere às zonas francas, deixo para o Sr. Secretário de Estado responder.
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O Sr. Deputado Eugénio Rosa falou nos fundos de investimento. Sr. Deputado, o mundo financeiro evoluiu, não há já só depósitos a prazo para os portugueses aplicarem as suas poupanças. Hoje em dia, há coisas mais evoluídas e aplicações mais atraentes, e uma delas são os fundos de investimento. Parece-nos importante que estimulemos a poupança dos portugueses. Há pouco, falou-se nos níveis de endividamento que são, obviamente, preocupantes, pelo que é importante que incentivemos os portugueses a poupar e a fazer boas aplicações, com um bom retorno, com uma boa compensação à sua poupança.
Os fundos de investimento são um produto que pode ser atraente e, nesse sentido, parece-nos que há que rever a fiscalidade que sobre eles recai, no sentido de fazer o seguinte: é que, neste momento, os portugueses que querem poupar em fundos de investimento colocam as suas poupanças lá fora e o País perde com isso. Se nós pudermos reter no País a poupança gerada na nossa economia e aplicá-la cá, é bem melhor. É isso que se pretende com esta revisão do regime fiscal dos fundos de investimento.
Quanto às despesas com pessoal, a dotação provisional está, de facto, considerada nessas projecções relativas aos encargos. É uma hipótese de trabalho subjacente que está aí incorporada, o que não quer dizer que venha a ser a que será concretizada. Mas, para efeitos de estabelecer a comparação entre o que é o Orçamento para 2006 e o que foi a execução do Orçamento nos anos anteriores, temos de ventilar a dotação provisional pelas suas aplicações, porque, depois de executados, os Orçamentos não têm dotações provisionais, o dinheiro já foi gasto, ou não.
Ora, se temos aqui uma dotação provisional, temos de ter hipóteses de trabalho para afectar, hipoteticamente, o uso da mesma em categorias de despesa para podermos fazer algumas comparações…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O senhor disse que ela não estava distribuída e está distribuída!
O Orador: — Ela está distribuída! Está em «remunerações», em «bens e serviços» e em «despesas de investimento».
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Foi isso que eu quis dizer!
O Orador: — Quanto às transferências para as autarquias, foi dito que cria despesas adicionais mas creio que já explicitei esta matéria. Em boa verdade, o congelamento até permite cobrir os encargos adicionais com a Caixa Geral de Aposentações.
Sr. Deputado Diogo Feio, vou ser muito rápido a responder-lhe porque já tive oportunidade de me debruçar sobre muitas das questões que suscitou.
Quanto à questão da redução da dedução específica nas pensões, permita-me que lhe diga que, em primeiro lugar, trata-se de uma preocupação de equidade. Não nos parece justo que o trabalhador por conta de outrem, ganhando o mesmo rendimento que um pensionista, tenha de pagar mais impostos — é este o princípio-base.
Em segundo lugar, devo dizer-lhe que esta redução da dedução específica não afecta mais de dois terços dos actuais pensionistas. Isto é, os dois terços de pensionistas com pensões mais baixas não são afectados por esta medida e só o serão os pensionistas com rendimentos mais elevados. Portanto, aqui, há uma preocupação de equidade fiscal entre os pensionistas e os trabalhadores por conta de outrem e, mesmo no que se refere aos primeiros, houve a preocupação de não prejudicar aqueles que têm pensões reduzidas.
Quanto às receitas extraordinárias, perguntou-me se não seria possível uma alternativa. Não — e permitame que lhe responda com toda a franqueza; vocês já quase venderam os «anéis» todos!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Ah!
O Sr. Honório Novo (PCP): — E vocês venderam o restante!
O Orador: — Agora, em boa verdade, só nos restam os «dedos»! O recurso a receitas extraordinárias, para além de não permitir uma efectiva consolidação orçamental, é limitado porque as opções já não são muitas, há que reconhecê-lo.
O resultado do recurso a receitas extraordinárias está aí à vista: houve tanta vontade de consolidar, nos últimos três anos, e o resultado foi um défice de 6,8% do PIB. Repito, pois, que está aí à vista o resultado do recurso a receitas extraordinárias. Em boa verdade, devido à falta de medidas estruturais, o recurso a receitas extraordinárias não foi capaz de assegurar uma consolidação efectiva e sustentável.
A preocupação que manifesta quanto ao pagamento especial por conta penso, sinceramente, que é uma preocupação de protecção de grandes empresas porque, também em termos de equidade e até de eficácia no combate à fraude e à evasão fiscais, custa-me compreender as reticências que V. Ex.ª manifesta face a esta medida.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais completará depois as respostas relativamente às questões de natureza fiscal que foram suscitadas.
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Sr. Deputado Francisco Louçã, o que eu pretendia dizer é que parece que, a curto prazo, a única via que temos para repor alguma competitividade é através da contenção salarial, e não só. Aliás, como tive oportunidade de dizer, as margens de lucro e os próprios empresários terão de exercer contenção.
Quanto ao crescimento do investimento, relativamente ao qual afirmou que cresce pouco — 1,7% —, respondo-lhe que com certeza que gostaria de ter um crescimento mais elevado nesta rubrica. Esperemos que eu esteja enganado. Também quanto a este cenário não me criticam por ser bastante modesto em relação à previsão do investimento.
Nesta previsão do crescimento do investimento há alguma prudência também porque temos de tomar consciência de que, com o fraco crescimento que a economia tem tido nos últimos anos, ainda há capacidade instalada susceptível de ser utilizada e, portanto, as respostas a eventuais crescimentos de produção não provocarão imediatamente uma vigorosa reacção por parte do investimento mas, fundamentalmente, utilizando a capacidade que ainda está instalada. Daí que ainda demore algum tempo até à retoma do investimento.
Quanto às previsões das receitas de privatizações, respondo-lhe, Sr. Deputado, que são tão-só previsões.
Os números que constam do Programa de Estabilidade e Crescimento resultaram de um exercício de, na hipótese de privatizar tais e tais entidades durante os anos que aqui constam, de acordo com os valores de mercado ou outras estimativas, os valores que resultam são os que aqui constam. É, pois, uma previsão, repito, pois os valores de mercado alteram-se de um dia para o outro. É por isso que digo que aquelas previsões valem o que valem.
Aquelas previsões dão-nos uma orientação, com certeza, para podermos avaliar o impacto das privatizações, das receitas que se podem esperar para a gestão da dívida, muito em particular para as necessidades de financiamento do Estado.
É óbvio que, neste domínio, teremos de fazer um exercício dinâmico e ir deslizando ao longo do tempo.
Portanto, à medida que o tempo vai evoluindo, podemos afinar melhor estas previsões, o que será feito. Aliás, não é por acaso que, como previsão das receitas de privatizações, já apresentamos um valor de 1600 milhões de euros e não aquele outro valor, muito preciso, que constava do PEC. É que, não só tendo em conta o que prevejo ser susceptível de privatização mas também tendo em conta a natureza do valor, pareceu-me mais razoável — e esta é uma opinião pessoal que está no documento — inscrever o valor de 1600 milhões de euros e não, por exemplo, 1601 milhões de euros, ou 1645 milhões de euros, porque, de facto, tal poderia induzir uma leitura, como a que o Sr. Deputado fez, de isto implicar um rigor e uma precisão que é impossível obter quando se trata de previsões.
Como sabe, quando se trata de fazer previsões, o melhor é estabelecer um valor central e haver uma margem de flutuação em torno deste. Portanto, acho que isto terá de ser devidamente relativizado.
No que se refere às questões que foram colocadas pelo Sr. Deputado Maximiano Martins, creio que já tive oportunidade de responder no que toca às finanças locais e ao porquê. Quanto à questão do tarifário de electricidade, o Sr. Ministro da Economia virá a esta Comissão hoje, de tarde, e poderá esclarecê-lo.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, vejo que o PCP tem um sério problema, diria quase pessoal, com o Banco de Portugal.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Pessoal?!
O Orador: — No que se refere ao Banco de Portugal e a outras instituições, são funções que exigem pessoas de grande competência, de reputação e de credibilidade.
Ora, se queremos atrair os melhores, essas instituições terão de ter um estatuto remuneratório que nos permita competir com o sector privado que tem capacidade de reter essas competências, em prejuízo da capacidade do Estado de poder chamar para o exercício de funções importantes gente de grande qualidade e de grande competência, como é o caso do Sr. Governador do Banco de Portugal. Aliás, permita-me que lhe diga que isto nada tem a ver com a pessoa do Sr. Governador mas, sim, com o estatuto remuneratório e a questão coloca-se com o presente Governador como com qualquer outro.
Não obstante, temos consciência que, de facto, é preciso haver regras de maior transparência neste domínio. O Governo tem tomado iniciativas importantes nesta matéria e, nesse sentido, está em curso a revisão do estatuto dos gestores públicos, como já foi referido pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças.
De igual modo, uma recente resolução do Conselho de Ministros estabelece regras muito claras quanto à divulgação pública dos regimes remuneratórios das entidades públicas, dos respectivos planos de pensões e, mais, acaba, de uma vez por todas, com algo que não me parece de todo justificável, o de que as pessoas possam beneficiar de complementos de pensão antes de se aposentarem efectivamente, e estabelece um princípio de grande transparência, que é o da divulgação pública de tudo isto. É, pois, isto que vai ser feito, Sr. Deputado, para o Banco de Portugal e para outras entidades semelhantes.
Devo dizer-lhe que, nesta matéria, falo com todo o à-vontade porque considero que, pessoalmente, dei o exemplo. É que, enquanto fui Presidente da CMVM, sempre lutei e procurei pressionar as sociedades cotadas para terem políticas de transparência nesta matéria, tendo recomendado que o fizessem. Eu próprio e os meus colegas do conselho de administração divulgámos, no relatório anual da CMVM, quanto ganhávamos e
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qual era o nosso estatuto remuneratório. Portanto, nunca escondi nada a ninguém nesta matéria, pelo que estou à vontade para falar.
Repito, então, que o que acabei de expor é o que irá ser feito no âmbito das entidades públicas. Por isso, tenho relutância, neste momento, em querer fazer do Banco de Portugal um caso exemplar, porque este é um caso entre muitos e a solução será igual para todos. Não quero discriminar o Banco de Portugal e sujeitá-lo a uma campanha populista e demagógica, apontando o seu caso como sendo quase exclusivo e excepcional.
Não! Vamos olhar para a «floresta» e não apenas para esta «árvore» — é esta a minha preocupação.
Quanto às questões relativas ao regime simplificado, também deixo o seu esclarecimento para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
No que diz respeito às transferências do Orçamento e de fundos estruturais para as autarquias, o que queremos é conferir transparência a este relacionamento.
Sr. Deputado, o montante que consta na proposta de lei é 200 milhões de euros. Fizemos uma avaliação que nos indica valores superiores a 300 milhões de euros nessas transferências que actualmente são feitas para as autarquias. Há aqui corte, há aqui rigor, vamos limitar isto. Vamos fazê-lo com uma intervenção do Governo, visionando a forma como estes dinheiros são distribuídos de facto.
Portanto, não vejam aqui a busca de uma forma pouco transparente para transferir para os tais «109 amigos» de que falava o Sr. Deputado Honório Novo. Pelo contrário, queremos é trazer isto à luz do dia, porque não está à luz do dia.
O Sr. Afonso Candal (PS): — Muito bem!
O Orador: — Poucos sabem deste relacionamento financeiro entre a administração central e as autarquias. Que projectos? Que programas? Quem beneficia e quem não beneficia? Vamos dar transparência a estes processos, obrigando à publicação destes apoios e destes auxílios financeiros. É isso que se pretende, Sr. Deputado.
Peço agora ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que complete os esclarecimentos que acabo de dar.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, procurarei ser rápido a responder às quatro ou cinco questões que ainda estão em aberto.
De qualquer modo, aproveito para pedir desculpa se, da minha parte, houver algum imprecisão em relação a referências, dado que estou aqui a trabalhar sem «rede» e sem material de suporte em relação a algumas das questões que foram colocadas e de que não estava à espera.
Relativamente à primeira questão que foi suscitada pelo Sr. Deputado João Cravinho, quero dizer que o pedido vai ser satisfeito. Este plano da justiça fiscal, de que já falei noutra ocasião, é um dos grandes desafios, é um exercício de alto risco, que assumo. É uma situação preocupante e quase diria escandalosa aquilo que se passa a nível de caducidade e de prescrição de impostos. Nenhum português percebe, quando se está a exigir sacrifícios, que haja quem consiga, através de subterfúgios, de habilidades, etc., não pagar impostos.
E isto acontece em diversos domínios e até nos próprios tribunais tributários e administrativos em que há processos que acabam por prescrever porque não foram julgados a tempo.
Portanto, aquilo a que nos propusemos é, em termos de transparência, mostrar qual é a situação, qual é o ponto de partida e qual é o plano para atacarmos esta situação, que tem de ser debelada e enfrentada. Não temos qualquer veleidade de evitar as caducidades e as prescrições; temos, porém, o dever de reduzir significativamente o dinheiro que se perde todos os anos. Portanto, este é o plano que irá ser comunicado e em que apostamos fortemente. É também uma das vias para aumentar a receita fiscal sem estar a aumentar as taxas de tributação.
Quanto às várias questões colocadas pelo Sr. Deputado Hugo Velosa (a algumas das quais o Sr. Ministro já respondeu), penso que, em relação a esta dicotomia entre levantamento do sigilo bancário e do sigilo fiscal, as duas situações não são incompatíveis mas complementares. Ainda há pouco, vi um Sr. Deputado passar com um jornal, que me pareceu o Le Monde, onde, na última página, surge, todos os meses, um tipo de informações em relação a contribuintes incumpridores franceses, o que, em Portugal, seria considerado como uma violação ao sigilo fiscal. É, pois, possível avançar aqui muito mais.
Um outro exemplo extremo é o de um caso com que me deparei recentemente, de uma velha fundação em que o testador — e percebia-se que era um republicano que esteve ligado à implantação da República — dispôs que seriam escolhidos para a administração entre os 40 contribuintes que mais imposto pagassem naquele distrito. E, por incrível que possa parecer, houve um ano em que essa informação foi recusada, porque violava o sigilo fiscal indicar quem eram os 40 contribuintes daquele distrito que mais imposto pagavam — isto, para cumprir o testamento e para lhes ser solicitado se queriam fazer parte da administração daquela fundação. Julgo, pois, que aqui também podemos avançar e ir um pouco mais longe.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Eugénio Rosa, o Sr. Ministro já respondeu a grande parte delas, havendo apenas duas que ficaram por responder e uma das quais carece de uma clarificação
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quanto à tributação dos rendimentos de trabalho por conta de outrem. Quando se falou na indexação em função da inflação esperada — 2,3%, como foi referido —, estamos a referir-nos basicamente aos abatimentos e créditos de imposto, àqueles que são de indexação à taxa de inflação. Como o Sr. Deputado sabe, o artigo 25.º do Código do IRS, relativo à dedução específica para os rendimentos de trabalho, diz que ela não está indexada à inflação mas, sim, ao salário mínimo nacional.
Quanto à sua questão relativa à zona franca, quero também ser muito claro. Já tratei esta questão, pelo menos duas vezes, em reuniões anteriores e houve duas questões que me propus resolver: uma era a da comunicação que a zona franca fazia informalmente das pessoas colectivas registadas na zona franca. Portanto, isto já era feito, como referi; não estava era previsto no Estatuto dos Benefícios Fiscais. Ou seja, consagra-se agora aquilo que informalmente já era feito.
A outra questão diz respeito à tributação. Contrariamente àquilo que o Sr. Deputado presume, não há aqui qualquer intuito de diminuir a tributação, bem pelo contrário. Acontecia que existiam duas situações: a das entidades que tinham uma actividade minoritariamente localizada na zona franca — e essas continuam a ser tributadas, considerando que 85% do rendimento é atraído para o Continente — e a das entidades que têm uma actividade predominantemente localizada lá. Quanto a estas últimas, estava previsto, no n.º 4 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que a análise era feita casuisticamente por despacho do Ministro das Finanças — e em relação a cada uma destas instituições, que são duas (e, só por razões de sigilo fiscal, não digo o seu nome), a fixação era feita pelo Ministro das Finanças por uma análise casuística. O que posso garantir-lhe é que qualquer uma destas duas instituições financeiras estava a pagar menos do que vai passar a pagar com esta regra de considerar que 40% do rendimento é localizado no Continente. Esta situação é clara, não havendo aqui qualquer benefício ou qualquer diminuição da tributação, bem pelo contrário.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Diogo Feio, há só duas que não foram respondidas (as outras já o foram por diversas vezes). Penso que a referência que fez à competitividade e ao exemplo da Bélgica estará eventualmente ligada (mas não tenho a certeza) a uma alteração que a Bélgica fez recentemente, e ainda em curso, em relação às informações vinculativas — e, se for esse o caso, seguiram, de certo modo, a experiência holandesa. Acontece que havia quatro ou cinco regimes belgas que foram considerados como incompatíveis a nível do código de conduta e a Bélgica foi praticamente obrigada a dar um passo em frente, adoptando soluções muito próximas das que eram adoptadas pela Holanda.
Quanto à questão do novo escalão do IRS, devo dizer que, em termos de liquidação, ele não causa qualquer perturbação. Em termos do princípio da simplicidade, efectivamente é mais um escalão. Agora, em termos de liquidação, sendo a liquidação, como sabe, hoje em dia, feita informaticamente, tanto faz serem 3, 4, 5 ou 10 escalões que isso não tem qualquer influência.
Em relação aos passos que estão a ser dados na maior parte dos países da União Europeia, efectivamente, é uma entorse, mas uma entorse assumida. Penso que a situação não irá durar muito tempo — não é preciso termos um número tão elevado de escalões para obter a mesma receita fiscal —, mas há aqui uma mensagem política forte, a de que o sacrifício tem de ser suportado por todos. Há, pois, aqui uma mensagem clara de que também os titulares de mais altos rendimentos devem contribuir para o saneamento das finanças públicas.
Finalmente, em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes, devo dizer que ela é extremamente pertinente. O problema dos indicadores técnico-científicos é muito antigo, já no Livro Branco, do Dr. Silva Lopes, se fazia referência a diversas soluções para fazer face a esta realidade. O grupo de trabalho, presidido pelo Prof. António Martins, de Coimbra, que está a funcionar e a laborar no regime da simplificação, tem o trabalho bastante avançado, iniciando-se, no dia 28 deste mês, os contactos com associações, operadores económicos e universidades para divulgar as diversas alternativas que se colocam em relação aos modelos. Podemos dizer que, em termos extremos, existem dois modelos: o modelo verdadeiramente técnicocientífico, que é o que existe na Itália, em que se parte, ao fim e ao cabo, do tratamento de uma série de dados e depois, em função da aglutinação dessa informação, calcula-se quais são as taxas médias de tributação ou outros indicadores para os vários sectores de actividade, sistema este que é muito pesado; um outro, mais divulgado, é o modelo espanhol, de indicadores meramente técnicos, muito objectivos (é, por exemplo, o caso de um pequeno restaurante ser tributado em função do número de mesas ou do número de empregados ou da área do restaurante), um modelo muito menos perfeito, mas talvez mais pragmático e mais eficaz. Entre estes dois modelos, irá quase de certeza situar-se o modelo que estamos a escolher, que não será um modelo puro. Estamos a analisar quais serão as vantagens e os defeitos de cada um deles e está previsto que, em Abril ou Maio do próximo ano, o relatório será apresentado ao Governo para, depois, se legislar a partir de 2007. Este é, portanto, um assunto que não ficou na gaveta e que está a ser estudado com prioridade. Vamos, então, avançar, porque o sistema fiscal português é de tal maneira complicado que tudo aquilo que se fizer para o tornar mais simples é uma aposta na rentabilidade e no aumento da receita.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Srs. Deputados, gostaria de tirar uma brevíssima ilação: tivemos um debate de 6 horas e 30 minutos, ininterruptamente, sendo que alguns dos Srs. Deputados ainda querem fazer alguma intervenção. Posto isto, permito-me submeter à vossa apreciação uma proposta de ordem prática, que tem até a anuência do Sr.
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Ministro das Finanças: a importância e a dignidade deste debate justifica que, para o ano, o realizemos num só dia, dividido em duas partes, de manhã e de tarde, para lhe emprestarmos a devida profundidade que, apesar de tudo, julgo termos conseguido aqui alcançar.
Deixo uma palavra de apreço a todos, particularmente à comunicação social que também heroicamente aqui esteve de uma forma maciça, ao longo destas 6 horas e 30 minutos, e necessariamente aos nossos convidados, que o são, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças e os Srs. Secretários de Estado.
Muito obrigado a todos por este debate profícuo.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da minha bancada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª, na resposta à questão sobre o Banco de Portugal, referiu, mais uma vez, o facto de esta ser uma questão pessoal entre o PCP e o Banco de Portugal, repetindo palavras do Sr. Governador do Banco de Portugal.
Acho absolutamente estranho (para não dizer outra coisa) que o Sr. Ministro venha repetir essas palavras, porque esta é certamente uma questão eminentemente política. Ou as despesas do Banco de Portugal e de outras instituições não têm nada a ver com o défice público, em nome do qual os senhores apresentam o Orçamento do Estado que é conhecido a este país, com enormes sacrifícios para os trabalhadores e todos os reformados deste país?! O Sr. Ministro não quer que nos centremos em torno dos problemas do Banco de Portugal. Então, apresente — e nós já o requeremos — informação também relativamente à Caixa Geral de Depósitos, à EDP e à Galp, que são outros escândalos neste país! Mas não venha com argumentações e sofismas para não responder a esta questão.
A conclusão que tiro daqui é que o Sr. Ministro se recusa a responder à questão que colocámos. É esta a ilação que tenho de tirar.
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, registo a indignação e a emotividade que coloca na questão, que revelam bem o clima emocional com que se quer discutir e analisar estas questões, questões que são sérias e requerem serenidade. Por isso mesmo, tive o cuidado de lhe dizer que a informação de que carece ser-lhe-á dada, com o conjunto das várias entidades públicas que são abrangidas por aquilo que é uma regra de transparência do Governo, a de que estas questões devem ser divulgadas.
Recuso-me (e assumo-o) a transformar esta ou aquela entidade, em particular, num caso exemplar. Todas elas serão objecto de divulgação em tempo oportuno e em conjunto. Não há excepções quanto a essa matéria.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Srs. Deputados, está concluída a audição do Sr. Ministro de Estado e das Finanças e respectivos Secretários de Estado.
A audição seguinte, do Sr. Ministro da Economia, terá início às 16 horas e 30 minutos.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, vamos retomar os trabalhos.
Eram 16 horas e 50 minutos.
Em meu nome e em nome do Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, cumprimento e dou as boas-vindas ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação e respectiva equipa ministerial.
Nesta audição com o Ministério da Economia e da Inovação, sobre matéria do Orçamento, vamos proceder de acordo com o que é habitual em reuniões conjuntas das comissões.
Naturalmente, começaremos com a intervenção do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado, que, como é patente e notório, vai ser apoiada pela utilização de Power Point, dispondo ainda de documentação de apoio que está a ser distribuída.
Após esta intervenção inicial, organizada de forma simples e focalizada nas questões fundamentais, segue-se a primeira ronda de intervenções, por grupo parlamentar e de acordo com a ordem descendente de representação. Cada primeira intervenção, de acordo com as sensibilidades detectadas, terá a duração de cerca de 10 minutos, para assegurarmos uma boa gestão do tempo.
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O Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado respondem individualmente a cada uma dessas primeiras intervenções dos porta-vozes dos grupos parlamentares, seguindo-se segundas intervenções, por inscrição livre, cujas respostas serão dadas agrupadas em blocos.
Dito isto, passo a palavra ao meu colega, Deputado João Cravinho, Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional.
O Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional (João Cravinho): — Sr. Presidente, limito-me a saudar o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado, desejando que esta reunião seja produtiva para toda a Assembleia da República. Certamente o será, visto que sei que o Sr. Ministro faz exposições temáticas muito interessantes.
O Sr. Presidente: — Para fazer a intervenção inicial, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação (Manuel Pinho): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho muito gosto em estar aqui a apresentar a parte referente à economia do Orçamento do Estado.
Iria compor esta intervenção da seguinte forma: começaria por abordar, eu próprio, três temas — o quadro económico, a necessidade de um novo modelo de crescimento e, finalmente, a análise de alguns dados do Ministério da Economia e da Inovação incluídos no Orçamento do Estado – e iria «salpicar» a minha intervenção de três apresentações que serão feitas pelos Secretários de Estado relativamente a tópicos que são muito relevantes e estão subjacentes ao quadro da política económica. Respectivamente: a forma encontrada para, no quadro do ambiente de facilitação da vida das empresas, acelerar os grandes projectos (os designados PIN); um instrumento financeiro verdadeiramente essencial e que está subjacente à elaboração do Orçamento e ao quadro da política de crescimento e desenvolvimento (o Novo PRIME); e, finalmente, as medidas tomadas de forma a incentivar as exportações e a internacionalização, uma vez que todos estamos conscientes de que o aumento das exportações é verdadeiramente fundamental para conseguirmos acelerar o crescimento da nossa economia.
O crescimento é a grande prioridade. É através do crescimento da nossa economia que será possível melhorar os padrões de vida, ajudar a que a consolidação orçamental tenha menos custos e reduzir as desigualdades, dado que, na Europa dos Quinze, os indicadores sugerem que Portugal tem a maior desigualdade.
Infelizmente, no ano de 2005 continuou a divergência relativamente à média da União Europeia. A zona euro cresceu ou estima-se que cresça relativamente pouco, 1,2%, e a economia portuguesa ainda vai crescer menos, ou seja, estima-se que irá crescer 0,5% em 2005. Há factores adversos que influenciaram o comportamento quer da economia da zona euro quer da economia portuguesa, designadamente o brutal aumento do preço das matérias-primas, em especial do petróleo.
Para 2006 prevê-se uma recuperação quer ao nível da zona euro quer ao nível da economia portuguesa.
No que diz respeito à zona euro, o crescimento estima-se aumentar de 1,2% para 1,8%; no que diz respeito à economia portuguesa, estima-se que o crescimento de 0,5%, em 2005, acelere para 1,1%, em 2006.
Os valores registados em 2005, que se sucederam a um bom segundo trimestre de 2004 mas que veio a revelar-se, esse comportamento positivo, estar muito associado ao Campeonato Europeu de Futebol (e, infelizmente, não se confirmou a melhoria registada nesse trimestre), são explicados por alguns factores, em particular o fraco crescimento da procura interna, especialmente na sua componente investimento — e, dentro do investimento, a parte que diz respeito à construção de obras públicas —, e o abrandamento da procura externa.
Em resultado, a taxa de desemprego aumentou, apesar de que, felizmente, no segundo trimestre, não continuou a observar-se a tendência de aumento registada no primeiro trimestre. De facto, a taxa de desemprego do primeiro trimestre é de 7,5% e do segundo trimestre de 7,2%.
Relativamente a 2006, prevê-se um aumento do ritmo de crescimento da economia de 0,5% para 1,1% e que esta aceleração da economia, que não é tão grande quanto desejável mas que é um aumento em relação ao ano anterior, tenha uma composição saudável. Saudável porquê? Porque a componente do consumo público é prevista contrair-se, a componente do consumo privado é prevista desacelerar, o investimento é previsto recuperar (e, sinceramente, creio que existem já alguns indicadores que permitem alguma segurança relativamente ao investimento) e a procura externa prevê-se ter uma contribuição positiva para o crescimento da economia.
No que diz respeito à taxa de desemprego, prevê-se um ligeiro aumento, numa média de 7,4% para 7,7%.
É bom ou é mau este comportamento? Qualquer comportamento tem de ser medido relativamente a um parâmetro, e o parâmetro de referência é o quadro de um forte ajustamento do défice nas finanças públicas.
Como é sabido, estamos aqui a discutir um Orçamento cujo objectivo é o de reduzir o défice de 6,2% para 4,8%. Muitas vezes — temos essa experiência —, estas reduções são menos custosas porque são feitas muito à base de critérios contabilísticos menos rigorosos ou de medidas extraordinárias. Mas creio que ficou aqui claro que uma das virtudes deste Orçamento é a sua transparência e o facto de se encarar a realidade tal
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como ela é! A nossa situação orçamental é complexa e é necessário, no prazo de três anos, um esforço muito determinado para consolidar as finanças públicas.
O que é que a experiência indica? A experiência indica que, nas situações de forte ajustamento orçamental, existe uma forte probabilidade de uma economia entrar em recessão.
Se olharmos o que se passa pelo mundo fora, ao longo da história, o que se verifica é que a norma é um forte ajustamento orçamental conduzir a uma de duas coisas: ou a uma recessão ou a uma forte contracção do crescimento.
Medido por este parâmetro, então o facto de o nosso crescimento acelerar é uma contradição relativamente à norma, e nesse sentido devemos encarar a aceleração do crescimento prevista de 0,5% para 1,1% como um facto positivo. Ao mesmo tempo, é muito claro que não nos devemos satisfazer nem com o ritmo de crescimento verificado em 2005 nem com aquele previsto em 2006.
Outro factor que se sabe que influencia muito negativamente a evolução das economias é o preço das matérias-primas. Desde que este Governo tomou posse, o preço das matérias-primas, em particular o preço do petróleo aumentou mais de 30%. Este é outro factor que terá contribuído para a desaceleração do crescimento no nosso país.
Todavia, não é apenas com factores relacionados com a despesa agregada que se deve analisar o ritmo de crescimento da nossa economia. Nós precisamos de um novo modelo de crescimento, um modelo de crescimento que tenha como motor o investimento, as qualificações, a inovação, a tecnologia e as exportações.
A própria União Europeia tem um quadro de referência para abordar as questões de crescimento. Esse quadro de referência é a Agenda de Lisboa, Agenda de Lisboa essa que assenta num tripé: o tripé do Pacto de Estabilidade e Crescimento, que tem como propósito assegurar um clima de estabilidade macroeconómica; o tripé do Plano Nacional de Emprego, com vista a assegurar um ritmo de emprego associado; e um tripé relacionado com a competitividade.
No nosso país, foi dada uma importância especial ao tripé em que assenta a competitividade, a qual foi designada por Plano Tecnológico. Tenho aqui a primeira versão desse Plano, que será entregue muito brevemente, pois encontra-se em fase de finalização. Não vou preocupar ninguém com o facto de tratar-se de um documento muito volumoso, porque será feita uma versão de divulgação mais digerível.
Portanto, o Plano Tecnológico engloba um conjunto de iniciativas transversais, não são iniciativas dirigidas a nenhum sector particular da economia, ou seja, não são uma estratégia para desenvolver os chamados «clusters» da economia portuguesa. Pelo contrário, trata-se de um conjunto de medidas transversais destinadas a fomentar as qualificações, a inovação e a tecnologia, tudo isto transformando a nossa economia numa economia mais competitiva e, portanto, com maior capacidade para competir no exterior.
Quais têm de ser as alavancas do crescimento? A primeira é a do investimento. Sem investimento não há crescimento, mas sem investimento de qualidade não há, seguramente, crescimento. Portanto, é necessário assegurar mais investimento e investimento de maior qualidade.
O que está a fazer-se para assegurar este objectivo? Tenho aqui cinco medidas ou cinco eixos de política que estão a ser desenvolvidos. Mas, à frente deles, está algo de intangível, que é a credibilidade das políticas, em particular a credibilidade da política orçamental, que é algo que terá ficado bem confirmado na discussão que teve lugar aqui, esta manhã. É que, se a política orçamental não é credível, vai afectar negativamente o investimento privado, porque não é necessário acreditarmos que as expectativas dos agentes económicos são racionais mas qualquer investidor minimamente informado sabe que, se a política orçamental não é credível num ano, existirá uma grande probabilidade de ser revertida no ano seguinte e isso afectar negativamente o clima de investimento.
Assim, o propósito de reduzir o défice orçamental de 6,2% para 4,8%, de uma forma transparente e sem recurso a medidas extraordinárias, é um factor de credibilidade orçamental que proporciona um clima favorável ao investimento. Estamos a falar de um ajustamento orçamental forte e decidido, ano após ano. Foi intenção do Governo elaborar uma lista de investimentos prioritários, não ano após ano mas para o conjunto da Legislatura — o designado plano de investimentos prioritários (PIIP) —, com vista a sinalizar os agentes económicos das prioridades no que respeita ao investimento privado e ao investimento público.
Além disso, sabemos que, infelizmente, em Portugal, a burocracia tem um peso excessivo. E, porque burocracia não rima com economia, as dificuldades administrativas, muitas vezes, impedem a materialização de projectos que são bons para a economia.
Nesse sentido, como é sabido, foram criados os projectos de potencial interesse nacional (PIN), que são uma «via verde» destinada a desbloquear grandes projectos que, em princípio, cumprem requisitos para serem classificados de interesse nacional.
Quando foi lançado este programa existiam nove projectos que preenchiam esses requisitos. Entretanto, no final de Julho foi promulgado o regulamento dos PIN. Actualmente, o seu número passou de 9 para 18 e, destes 18, 3 já foram totalmente desbloqueados e encontram-se em execução, havendo ainda um quarto cuja aprovação está iminente. Seria bom dizer que todos os meses era possível desbloquear quatro projectos, mas infelizmente isso não vai ser possível. Todavia, consideremos que, no prazo de cinco ou seis meses, foram desbloqueados quatro dos projectos importantes. Seria muito positivo que o fluxo de projectos que engrossava a carteira dos PIN continuasse a aumentar ao ritmo actual e que a Comissão PIN continuasse a conseguir desbloquear projectos a este ritmo.
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Falei da credibilidade orçamental, da estabilidade do investimento a médio prazo e dos PIN e, antes de continuar para os outros factores destinados a promover o investimento, peço ao Sr. Secretário de Estado do Turismo para fazer uma apresentação mais detalhada dos PIN.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.
O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Bernardo Trindade): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Ministro da Economia e da Inovação, Sr.as e Srs. Deputados: Muito rapidamente, utilizando como suporte uma apresentação em Power Point, vou enquadrar os objectivos dos projectos de potencial interesse nacional.
Tal como foi referido, visa-se, sobretudo, favorecer a concretização de diversos tipos de investimento. O entendimento que temos é o de que o Estado não cria riqueza e tem de haver no ambiente do Estado condições para que essa riqueza se constitua e, assim, passou por constituir numa comissão todas as áreas que são fundamentais no processo de decisão.
Foi criada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 95/2005, de 5 de Maio, publicada em 24 de Maio.
Posteriormente, foi criado o Decreto Regulamentar n.º 8/2005, que aprovou o regulamento do Sistema de Reconhecimento e Acompanhamento dos projectos PIN e, não menos importante, foi formulado o despacho conjunto de 25 de Julho e publicado em 22 de Agosto, que aprovou o modelo de requerimento às empresas a dirigir à Comissão PIN.
Tal como o Sr. Ministro referiu há pouco, foi identificado, inicialmente, um conjunto de projectos. Foram identificados projectos na área da indústria, num total de cinco, e na área do turismo, num total de oito. O investimento total associado a estes projectos era de 4600 milhões de euros, estando prevista a criação de cerca de 13800 postos de trabalho.
O investimento que pudemos desbloquear no âmbito de intervenção desta Comissão de Acompanhamento foram três projectos, que totalizam actualmente 600 milhões de euros e cerca de 4112 postos de trabalho.
Esses projectos são: o projecto emblemático de Tróia; o projecto Piter do Porto Santo; e, mais recentemente, o projecto do autódromo do Algarve.
Temos o ponto de situação de cada um dos projectos relacionados com a indústria e, neste momento, estamos num diálogo concertado e permanente com os promotores e a Comissão de Acompanhamento precisamente para ultimar os aspectos fundamentais à decisão e os projectos relacionados com a área do turismo.
Curiosamente, esta é a área onde podemos dar sinais positivos ao mercado, designadamente com a concretização destes projectos. Todavia, entendemos que a Comissão de Acompanhamento PIN quer-se como um processo dinâmico. Ou seja, à medida que vão sendo concretizados determinados projectos e, portanto, colocados em andamento, vamos recebendo outro tipo de candidaturas. Aliás, é isso que tem acontecido com o surgimento de mais oito projectos, que totalizam, em termos de investimento, 2062 milhões euros e que vão representar cerca de 3940 postos de trabalho.
O Sr. Presidente: — Dou, de novo, a palavra ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Vou, então, retomar a intervenção.
É, de facto, fundamental estimular e suportar o investimento, dado que a política das finanças públicas é de contenção, sendo necessário recorrer a meios alternativos para suportar o investimento. Isto é, em primeiro lugar, o factor de credibilidade orçamental, em segundo lugar, a estabilidade a médio prazo e, em terceiro lugar, os PIN, que já estão a dar resultados e é um facto muito positivo.
Mas os PIN dirigem-se às grandes empresas, aos grandes projectos. Ora, sabe-se que o números de PME é muito superior ao das grandes empresas por definição, que têm uma contribuição extremamente importante em termos de emprego e que é nas PME que, muitas vezes, se encontram os maiores motores de inovação.
Assim, é necessário apoiar, de uma forma diferente, as nossas PME. Para tal, o anterior programa PRIME foi substituído por um programa novo, a que se deu o nome de Novo PRIME. A diferença entre os dois programas não é apenas uma questão de designação.
Como é muito importante, até para se entender melhor o quadro de referência do Orçamento no que respeita ao Ministério da Economia e de apoio à economia, o Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e da Inovação vai fazer uma breve apresentação sobre o Novo PRIME.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e da Inovação (António Castro Guerra): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, como é do conhecimento de VV. Ex.as
, o Novo PRIME é o principal instrumento de financiamento das iniciativas de investimento das PME.
Quando esta equipa chegou ao Ministério, o Sr. Ministro deu orientações no sentido de reorientar o PRIME de acordo com os novos objectivos.
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Assim, ele foi reorientado, em primeiro lugar, por forma a que os seus recursos de disponíveis, que na altura estava a revelar sintomas de escassez, fossem afectos de acordo com prioridades e critérios do Plano Tecnológico.
Em segundo lugar, era necessário relançar o clima de investimento, pois as expectativas dos investidores em relação ao futuro eram baixas. Nesse sentido, relançar o investimento empresarial era outro desígnio.
Finalmente, teria de haver uma preocupação central de orientar estes recursos para os factores da competitividade e muito para a promoção das exportações.
Este trabalho de reorientação foi demorado, mas, logo que ficou pronto, foi divulgado pelo País em várias sedes, no norte, no centro e no sul, sempre em diálogo com as associações empresarias, que tiveram oportunidade de se pronunciar sobre os critérios de orientação deste programa e que, globalmente, podemos dizê-lo, foi bem acolhido.
Quais são as grandes linhas de reorientação deste programa? Em primeiro lugar, reforçar os meios financeiros. Perguntar-me-ão VV. Ex.as como é que isso se fez e eu terei oportunidade de dizer como. Mas, de facto, entre o PRIME e o Novo PRIME temos um diferencial substancial de recursos a disponibilizar às empresas e, portanto, uma capacidade de chegar ao maior número de empresas que deles possam beneficiar.
Em segundo lugar, vocacionar os recursos para o crescimento baseado na inovação, um vector fundamental do Plano Tecnológico.
Havia um conjunto de projectos em stock condicionados à disponibilidade de receitas de recursos orçamentais, através de um exercício com o qual estávamos familiarizados, tentou-se descongestionar esse stock de projectos condicionados acelerando a aprovação dos mesmos e ao mesmo tempo afectando recursos com o adicional de recursos a que fiz referência inicialmente.
Em terceiro lugar, reduzir a burocracia no processo de acolhimento, tramitação, aprovação e acompanhamento dos projectos. Ou seja, trabalhar mais sobre a envolvente do investimento.
Finalmente, adaptar os recursos disponíveis a necessidades específicas de alguns sectores com problemas, regiões ou mercados particulares. Como é do conhecimento dos Srs. Deputados, numa visita oficial a Espanha, o Sr. Primeiro-Ministro teve oportunidade de dizer que estava na hora de dar uma grande prioridade a Espanha na conquista do mercado espanhol, de fazer do mercado espanhol um prolongamento do mercado nacional.
Desse ponto de vista, estão previstas iniciativas em sede do IAPMEI no sentido de criar mecanismos de facilitação de penetração das empresas portuguesas no mercado espanhol, atacando o mercado espanhol não numa base nacional mas em cima das realidades regionais. Até agora, tem havido um erro de enfoque na forma de abordagem do mercado. Claramente, está a trabalhar-se no sentido de o IAPMEI poder actuar numa base de poderes locais.
Porque o sector da energia estava em fase de esgotamento, reforçou-se este vector de intervenção, no sentido de permitir a construção de um cluster eólico em Portugal que possa beneficiar as empresas que vão ser envolvidas na «clusterização» destas actividades.
Finalmente, demos uma especial atenção ao têxtil e ao calçado. Falta aqui fazer uma referência ao têxtil, vestuário e calçado através do programa Dínamo, que não é novo, já vem de trás, mas estava bloqueado e ao qual se deu uma nova vida.
Quais são os recursos envolvidos? Os recursos de que estamos a falar, olhando para o ratio incentivo/investimento, potencia um investimento para o horizonte 2005/2006 de 4600 milhões de euros de investimento, ou seja, um ritmo de crescimento 80% superior à média dos últimos anos. A esta média correspondem 1500 milhões de euros de financiamento público, que eram os recursos disponíveis, aos quais se afectaram recursos adicionais de cerca de 1 bilião de euros. Como tal, o acréscimo de recursos a que faço referência está na última linha desta projecção.
Esta é uma estimativa das áreas em que o investimento será feito, considerando os recursos de incentivo que lhes estão afectos e, como VV. Ex.as podem ver, damos uma grande prioridade à investigação e desenvolvimento, à inovação e à internacionalização, vectores que integram claramente as prioridades do Plano Tecnológico. Isto sem descurar, obviamente, os recursos necessários à formação profissional. Naturalmente, tenho ainda de fazer referência aos recursos para a área da energia, com um ênfase especial para as energias renováveis.
Por outro lado, é de salientar o trabalho que está a ser feito no sentido de desbloquear projectos que estavam condicionados às disponibilidades orçamentais, condicionamento esse que desaparece face ao acréscimo de recursos. Por outro lado, preocupámo-nos em garantir meios, por forma a que os projectos a entrar até ao final do QCA estejam disponíveis. Para isso, tratámos de disponibilizar um conjunto de mecanismos. Os recursos fundamentais a afectar a este Orçamento são os reembolsos dos incentivos já atribuídos num contexto de alguma facilitação às empresas que, ponderadas as dificuldades do ciclo económico, foram contempladas com possibilidades de recalendarização dos seus programas de reembolso, de diferimento na aferição do prémio e até, nalguns casos, de dilatação dos prémios de reembolso.
Para terminar, porque já vai longa esta minha intervenção, saliento que os recursos disponíveis que aqui temos no horizonte de 2005/2006 são cerca de 2 biliões de euros, que claramente alavancam cerca de 4,6 biliões de euros de investimento.
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O Sr. Presidente: — Dou, de novo, a palavra ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Já foram, portanto, referidas quatro formas de tentar animar o investimento: a credibilidade da política orçamental; a estabilidade, a médio prazo, das políticas; a facilitação dos grandes projectos, para os quais foi criada uma «via verde»; e a alavancagem dos fundos disponíveis para as PME e o melhor enfoque dos critérios de acesso a esses fundos. A última forma de apoiar o investimento é, claramente, uma atitude cada vez mais proactiva relativamente ao investimento directo estrangeiro. Portugal tinha saído da rota dos grandes investimentos estrangeiros, infelizmente, e não há a certeza de que já tenha regressado. O que há são indicações claras de que algumas grandes empresas tornaram a incluir o nosso país na lista de países em que vale a pena fazer investimentos. Ainda não existem certezas a este propósito. O que existe, sinceramente, é um conjunto de perspectivas mais animadoras do que as do passado.
Os macroeconomistas tendem a olhar para a questão do crescimento como um número — o valor da taxa de crescimento. Todavia, por trás desse número estão comportamentos distintos relativamente a diferentes sectores. Eu queria falar, durante cinco minutos, dos sectores que se têm revelados mais dinâmicos na nossa economia, pois, sendo aqueles que têm revelado maior dinamismo, têm de ser mais apoiados. Estou a referirme, antes de mais, ao cluster da energia, que tem revelado, está a revelar e vai continuar a revelar uma importância fundamental como fonte de alimentação endógena do crescimento da nossa economia.
No dia 3 de Outubro, em Conselho de Ministros, foi aprovada a resolução do Conselho de Ministros que estabelece a política energética para a próxima legislatura. Este documento estipula uma estratégia nacional para a energia cuja designação é CEE, ou seja, Concorrência e Eficiência Energética. Quais são os objectivos da política energética? São três: em primeiro lugar, o de reduzir a nossa dependência em relação ao exterior; em segundo lugar, o de permitir um uso mais eficiente da energia — e, se temos uma grande dependência de energia relativamente ao exterior, temos um índice muito baixo de utilização de energia, sobretudo eléctrica —
; e, em terceiro lugar, o de ter mais concorrência no sector da energia, em particular no da electricidade. Isto porque todos concordamos que mais concorrência é bom para a economia, para os consumidores e para as próprias empresas.
Ora bem, esta resolução do Conselho de Ministros e esta estratégia para a energia visam enquadrar um sector que tem revelado um fortíssimo dinamismo. Como tal, e já que estou a falar de investimento, queria referir vários tipos de projectos cuja esmagadora maioria é financiada pelo sector privado, o que prova que há grande oportunidades de investimento nesta área. Em primeiro lugar, referiria o concurso para centrais eólicas, que foi aberto no início de Julho e que será encerrado a 31 de Janeiro, contando, muito seguramente, com a participação de vários consórcios nacionais e estrangeiros. Este concurso tem uma configuração muito diferente do concurso que veio substituir, lançado pelo anterior governo, visto que não só é mais ambicioso em termos de montante de energia produzida como foi arquitectado de forma a fomentar um verdadeiro cluster industrial no nosso país que leve à constituição de empresas e à criação de emprego, ao mesmo tempo ligando estas unidades industriais com o sector da investigação e desenvolvimento. Este é, portanto, um exemplo. Por outro lado, esta semana será inaugurada uma das maiores centrais fotovoltaicas do mundo no nosso país.
Outro sector de produção de energia que tem revelado um grande interesse diz respeito a toda a parte da bioenergia na sua vertente de biomassa e dos biocombustíveis. Existem boas perspectivas… Enfim, não vou usar o termo «perspectivas», pois, se o fizer, perguntar-me-ão com muita razão quando é que estes projectos se realizarão. Direi, contudo, que existe bastante interesse em instalar unidades no sector petroquímico no nosso país. Existe mais do que um projecto que está a ser estudado, o que revela até que ponto o sector da energia, mesmo na área da petroquímica, se pode tornar, de facto, um cluster verdadeiramente fundamental na nossa economia.
De entre os investimentos, não referi a construção de meia dúzia de centrais de ciclo combinado, cada uma orçada em cerca de 250 ou 300 milhões de euros, mas aproveito esta minha presença para esclarecer um facto com o qual tivemos de lidar, que foi a razão pela qual teve de ser cancelado um concurso que foi herdado do governo anterior, tendo de ser aberto um novo concurso. Este é um tema que já foi aqui analisado e eu, para esclarecer as razões pelas quais tivemos de cancelar este concurso e porque, agora, temos de abrir um outro, remeto para as conclusões de um parecer da Procuradoria-Geral da República publicado no Diário da República, II Série, n.º 167, de 31 de Agosto de 2005. Na pág. 12735, alínea 8), diz-se que o concurso era inconstitucional, na alínea 11) diz-se que era ilegal e na alínea 13) diz-se que era nulo. Como tal, foi uma pena ter de se esperar desde que o Governo tomou posse até 31 de Agosto para se ter total certeza de que era necessário anular um concurso importante, visto que está envolvido um enorme montante de investimento e estão envolvidas unidades que são verdadeiramente fundamentais para o nosso equilíbrio energético.
Felizmente, este problema está resolvido, são muito claras as razões que levaram o Governo a tomar esta decisão e muito em breve será aberto outro concurso.
Dei aqui, portanto, uma ideia da importância verdadeiramente fundamental do sector da energia e de como há a oportunidade de criarmos um verdadeiro cluster neste sector da nossa economia.
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Outro sector que tem revelado um enorme dinamismo e que é agora claro que tem uma importância verdadeiramente estratégica na nossa economia é o do turismo. Possivelmente, nunca foi dada a importância ao turismo que, por um lado, ele merece e, por outro, tem na realidade. É impressionante a quantidade de projectos de alta qualidade que existem no sector do turismo. Aliás, quando há pouco foi ilustrado o quadro dos projectos candidatos a PIN, creio que toda a gente teve oportunidade de ver a importância do número de projectos na área do turismo. Fundamentalmente, temos três zonas turísticas tradicionais, Lisboa, o Algarve e a Madeira, e agora temos uma oportunidade verdadeiramente única à nossa frente, que é a de desenvolver zonas alternativas, como, por exemplo, o eixo Tróia/Comporta/Grândola, a zona do Alqueva, a zona oeste de Lisboa ou Porto Santo. Como foi visto, aliás, um dos primeiros PITER desbloqueados foi, precisamente, o de Porto Santo e, dentro das áreas de turismo de nicho, a zona do Douro.
Ora, o que é fundamental é, dada a nossa imagem no mercado do turismo no exterior, dada a capacidade instalada — porque, se temos muito bons projectos, é porque temos muito bons empresários nesta área — e dada a capacidade da nossa mão-de-obra neste sector, não repetir erros do passado, como o que foi cometido em zonas turísticas que se desenvolveram de forma algo desordenada. O que procuramos é facilitar o desenvolvimento rápido destas novas zonas, garantindo, simultaneamente, que preenchem os requisitos à camada de clientes a que se dirigem, visto que a nossa vantagem comparativa não está no turismo de massa, mas, cada vez mais, no turismo de alta qualidade e no turismo de lazer. Isto fará com que o peso dos serviços e do turismo na nossa economia seja, possivelmente, cada vez maior. Aliás, não sendo fácil comparar os números deste ano com os de 2004, porque, como é sabido, os de 2004 estão muito empolados pelo campeonato europeu de futebol, é fácil verificar que, se há sector cujo desempenho é claramente muito positivo, é o do turismo. Como tal, dada a capacidade instalada, a quantidade de novos projectos e a imagem que temos, este é um sector no qual vale, seguramente, a pena apostar.
Outro sector que está a dar bons sinais de animação é todo o cluster da madeira e da floresta. Existem projectos muito interessantes nessa área, como, aliás, ficou ali ilustrado no que toca aos PIN. Eu gostaria mesmo que alguns projectos que estão em «incubadora» e que não estão na lista dos PIN se viessem a materializar.
Surpreendentemente, um sector que se considerou como potencialmente problemático mas que está a dar alguns sinais positivos é o do automóvel. Como é sabido, não conseguimos, porque não foi possível, trazer o novo modelo da Wolkswagen para a AutoEuropa mas estivemos muito perto de o conseguir, e este é um factor positivo que só indica que temos de prosseguir neste esforço, porque uma grande empresa considerou o nosso país como localização potencial, por uma razão que não é surpreendente. Fiquei muito orgulhoso de ir à AutoEuropa e à Continental, em Famalicão, e ver que a produtividade destas empresas é a mais elevada no mundo no que diz respeito a estes grupos. Quando se diz que a produtividade da nossa economia é baixa quer dizer-se que do ponto de vista macroeconómica ela é baixa, não há a mínima dúvida, não vale a pena negar a evidência, mas esse número negativo é uma combinação de algo bastante mau com algo que já é topo a nível mundial.
Portanto, temos orgulho nalguns exemplos, tais como no sector industrial e em indústrias sofisticadas, porque quer o sector automóvel quer a construção de pneus muito especializados são sectores industriais muito sofisticados e complexos e no nosso país já conseguimos ter a produtividade mais elevada no mundo.
Referi quatro sectores que estão a dar indicações positivas, apesar de estas serem mais claras no sector da energia e no do turismo relativamente aos outros dois, mas nos sectores da madeira e da floresta e no do automóvel também tenho algum grau de confiança.
Não podemos esquecer os sectores tradicionais onde têm sido desenvolvidas acções tendo em conta o seu apoio e dinamização e relativamente aos quais refiro dois que são, muitas vezes, uma fonte de justa preocupação. Em primeiro lugar, o comércio e, em segundo lugar, os têxteis. Mais tarde, se assim entenderem, desenvolverei as acções que foram tomadas relativamente a cada um destes sectores mais tradicionais e que evidenciam problemas que têm de ser atendidos.
Portanto, como motores do «novo modelo de crescimento», temos os investimentos, cuja dinâmica é necessário promover, as qualificações e a inovação.
Mesmo antes de o Plano Tecnológico ser aprovado, queria referir as aplicações práticas deste Plano na inovação: a criação do INOVJOVEM e do INOVCONTACTO, sendo que a primeira série deste acaba de ser fechada e as aulas de formação começam a 7 de Novembro; o Novo PRIME, cujo acesso, como aqui foi visto anteriormente, é feito em função de critérios de exportação, de inovação e de qualificações, ou seja, do Plano Tecnológico, e o desenvolvimento do capital de risco e das operações de garantia mútua.
Outro motor do crescimento tem de ser, e não o foi no passado, o das exportações e, para dar uma ideia dos esforços que estão a ser feitos e que continuarão a sê-lo no âmbito desta matéria, passava a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor (Fernando Serrasqueiro): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, Srs. Deputados, conforme realçou o Sr. Ministro da Economia e da Inovação, as importações assumem neste Ministério um papel crucial e, por isso, recebemos orientações
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no sentido da criação de um programa muito especial para ser dado um impulso decisivo de apoio às empresas, porque são elas que vão exportar.
As exportações serão o impulso mas, simultaneamente, serão impulsionadas pela reafectação do programa PRIME, como já aqui foi referido, tendo o SIME Internacional um aspecto fundamental nesse programa, o qual veremos mais adiante.
Foi desenhado no programa Exportar Mais um conjunto de linhas de orientação estratégica divididas em medidas perfeitamente claras e que procurarei sintetizar.
Uma primeira linha de orientação visa melhorar os níveis de eficácia de apoio às empresas exportadoras por parte da Rede Internacional do ICEP e, quanto a esta matéria, existem sete medidas, das quais saliento as mais importantes.
A primeira é a da transformação das delegações do ICEP. Este Instituto sofreu uma profunda reorganização em que procura ver um ratio claro entre o front office e o back office. Tentamos criar mais pontos de contacto no exterior e libertá-los de tarefas administrativas, vocacionando-os para a sua principal função, que é a do apoio às empresas exportadoras.
A segunda medida é a da criação do portal «Buy Portugal», orientado para a procura externa e com links direccionados para as associações e para os parceiros da oferta portuguesa.
A terceira medida visa dar eficácia ao serviço de detecção de oportunidades. Foi alocado aos delegados do ICEP — já que o ICEP é o instrumento fundamental do programa Exportar Mais — uma nova função, que é a de serem «antenas» no exterior para detectar oportunidades de negócio e de concurso em cada um dos países onde estão e para as transmitirem para as fileiras nacionais.
A quarta medida é a da criação de um programa de apoio a novos exportadores, aproveitando as estruturas do Centro de Negócios Externos como plataforma de apoio às exportações portuguesas — já estão em desenvolvimento alguns projectos logísticos de parceria entre o ICEP e outras associações.
A quinta medida visa a implementação da iniciativa «Buy Portugal» e com a dinamização de eventos em grandes redes de distribuição, na Rússia e no Brasil.
A sexta medida diz respeito ao alargamento do portfólio dos sectores exportadores. Portugal não podia ficar cingido às exportações clássicas do têxtil e do calçado. Conviria promover iniciativas e áreas de valor acrescentado mais importante, designadamente as tecnologias de informação, suportadas por componentes de design, marketing, tecnologia e inovação, e diversificando as nossas fileiras mais importantes.
A sétima medida visa diversificar os mercados de exportação. Portugal tinha, e ainda tem, os mercados tradicionais e conviria estarmos atentos aos mercados emergentes. Já distribuímos uma lista em que os países do petróleo e do gás natural, dos PALOP, a China, a Rússia, o Brasil, a Europa do alargamento, para não falar de Espanha, que já teve um tratamento especial, serão novas oportunidades de negócio e a Rede do ICEP irse-á ajustar a esses novos mercados.
Portanto, iremos muito rapidamente abrir novas delegações do ICEP. Dentro de dias, teremos uma nova representação na Líbia e tentaremos estar atentos aos mercados emergentes.
Uma outra medida no âmbito da nova linha de orientação estratégica diz respeito à concretização da «Marca Portugal» como instrumento de promoção da qualidade, tecnologia e inovação dos produtos e serviços das empresas portuguesas em todos os sectores de actividade. Temos vindo a fazer vários debates sobre a «Marca Portugal», porque entendemos que ela é decisiva para a valorização dos nossos produtos no estrangeiro.
Com a criação de uma unidade gestora dessa marca, aproveitaremos os investimentos que foram feitos para, em coordenação com outros ministérios — pela primeira vez a «Marca Portugal» será uma marca que não será só gerida pelo Ministério da Economia, estando envolvidos não só a economia, através do comércio e do turismo, mas também o desporto, a cultura, o investimento e outras áreas —, que utilizarão a mesma marca, a podermos potenciar.
Outra das medidas é a da criação de mecanismos de apoio concreto e específico às empresas nas suas acções de exportação e internacionalização.
Refiro, em primeiro lugar, o INOVCONTACTO e, tal como o Sr. Ministro referiu, no dia 7 iniciar-se-á um primeiro curso que procurará colocar os primeiros jovens. Quero assinalar que o INOVCONTACTO sofreu significativas alterações, a primeira quanto ao número dos jovens envolvidos (500 em dois anos, sendo muito superior à média existente até agora); a segunda quanto à existência de três fileiras: uma tradicional, a dos têxteis, do calçado e do turismo, que era a que já vinha sendo atingida, uma nova fileira tecnológica, virada para a inovação e para as novas tecnologias e a terceira fileira dirigida a não licenciados. A terceira alteração tem a ver com a consideração das capitais mais dinâmicas e mais inovadoras como local de estágio dos jovens e, portanto, a novidade é vocacionar-nos para capitais bem conhecidas como Xangai, Helsínquia e outras capitais dos Estados Unidos.
Outra das medidas diz respeito à criação de tradings de novos mercados alvo de exportações. O ICEP tem a vindo a criar várias hipóteses — e neste momento já há uma concretizada — de criação de tradings, através da operacionalização de capital de risco, outsourcing, em perfeita articulação com as diferentes associações empresariais.
Promoveremos o desenvolvimento dos serviços de informação sobre mercados e sectores. Foram encomendados estudos de mercado que já estão a ser feitos para as diferentes áreas em que é mais difícil haver
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um conhecimento. Isto é feito em ligação com a medida que se segue, que é a da inteligência de mercado, no sentido de se fazerem acções de formação dirigidas a mercados mais complexos e em que são menos conhecidas as suas possibilidades de intervenção, como a China e outros, em que necessitaremos de um maior aprofundamento, conhecimento e divulgação junto dos nosso empresários.
Ainda no âmbito de uma nova linha de orientação visa-se transformar o NEPE, que neste momento já traduz uma articulação entre o ICEP e as duas principais associações empresariais (AEP e AIP), em órgão de consultoria estratégica, na medida em que têm de ser os empresários os grandes dinamizadores do mercado externo, em articulação com as instituições de política pública.
Por último, criação de uma unidade de gestão sectorial, o encontro entre o ICEP e as diferentes associações como forma de promoção e novas abordagens do mercado internacional.
A terminar gostaria de dizer que, com este esforço, irão ser alocados mais meios financeiros, não só os que se reflectem no orçamento que estamos hoje a discutir, mas também os que nele não têm expressão directa, como o PRIME Internacional, que já aqui foi assinalado, com 15 milhões de euros, a par de outras verbas do Fundo Social Europeu e da reorganização das empresas de capital de risco do sector público, que serão também alocadas à alavancagem destes projectos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Foi aqui referido o conjunto de acções no âmbito das exportações, sendo reconhecido por todos como uma área em que temos de fazer um grande esforço, porque as exportações com base no aumento da competitividade serão seguramente um motor do nosso crescimento.
Termino, referindo alguns números do orçamento que estão de acordo com este conjunto de políticas que aqui foram enunciadas e que, posso garantir, podem continuar em função dos números do orçamento, que é de disciplina e de contenção.
Verifica-se uma redução global de 18,9% do orçamento do Ministério da Economia e da Inovação, mantendo-se praticamente constante no âmbito do subsector Estado, redução essa que tem mais a ver com a despesa corrente. A grande redução verifica-se nos serviços e fundos autónomos, em especial em dois serviços, o ICEP e o IAPMEI. No que diz respeito ao ICEP, verifica-se uma redução de 98,3 milhões de euros para 81 milhões de euros. Quanto ao IAPMEI, que é, sem dúvida, a instituição principal, verifica-se uma redução de 798,5 milhões de euros para 581,5 milhões de euros.
Gostaria, agora, de tentar esclarecer estes números, começando por dizer que os valores de 2005 e de 2006, pura e simplesmente, não são comparáveis, porque enquanto que uns incluem a transferência de saldos os outros não.
Mais do que isso, no que diz respeito ao ICEP, os números de 2005 encontram-se algo sobrevalorizados, dado que, até Agosto, apenas tinha sido gasto um total de 46 milhões de euros. Portanto, não é certo que seja atingido o valor de 98,3 milhões de euros que se estima para a execução de 2005, mas, sobretudo, o valor de 2006 não inclui um adicional de 15 milhões de euros extra-orçamento pela via do SIME Internacional. Logo, se adicionarmos estes 15 milhões de euros provenientes do SIME Internacional, o que verificamos é que o orçamento do ICEP aumenta, em vez de diminuir.
Repito, o valor para 2006 de 81 milhões de euros somado com 15 milhões de euros perfaz um total de 96 milhões de euros, comparado com 98,3 de 2005, montante este que está algo sobrevalorizado se fizermos um pro rata do que foram as despesas até Agosto e até ao fim do ano. A maior redução é a que diz respeito ao IAPMEI. Mas chamo a atenção para aquilo que foi apresentado há pouco relativamente ao Novo PRIME, porque de alguma maneira está aqui a chave para esta questão.
Como se sabe pela apresentação do Novo PRIME, foi possível criar meios adicionais extra-orçamento, meios esses que passo a recordar. Por um lado, 900 milhões de euros, que é aquela passagem de 0,6 milhões de euros para 1,5 milhões de euros no montante total disponível, e isso foi feito através da utilização de reembolsos, que dão um montante de 900 milhões de euros extra-orçamento, os fundos de capital de risco aumentam em 200 milhões de euros como também foi visto na apresentação anterior. Ora, estes meios adicionais extra-orçamento vão permitir mais do que compensar a redução de verbas orçamentais destinadas ao IAPMEI.
Em boa verdade, convém sublinhar que estes meios adicionais extra-orçamento são para dois anos e não para um ano, ou, em termos de compromisso, mesmo para um pouco mais do que dois anos. Por isso, não seria correcto estar a dizer que estas verbas adicionais vão ser todas utilizadas em 2006.
Assim, esta alavancagem dos fundos do PRIME que foi conseguida é para durar até ao fecho do próximo QCA, portanto, não seria justo dizer que estes meios financeiros «extra» podem ser todos aplicados. Aliás, podem ser aplicados em 2006, mas não seria correcto fazer isso porque é para durar até ao final do novo QCA.
Sr. Presidente, em termos da intervenção que tinha planeado, é tudo.
O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação e aos Srs. Secretários de Estado esta exposição inicial.
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Seguidamente, vamos passar à fase em que é dada a palavra aos Srs. Deputados que representam os partidos com assento no Hemiciclo.
Como é da praxe, o Partido Socialista concede ao Partido Social Democrata a oportunidade de ter a primeira intervenção, que irá ser produzida pelo Sr. Deputado Hugo Velosa, a quem dou a palavra.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Dá-me dá licença que interrompa, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Faça favor. Sr. Deputado.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Sr. Presidente, só para esclarecimento dos vários partidos, gostaria que informasse como nos vamos organizar em termos de tempo.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, no início da reunião, tive oportunidade de sugerir que as intervenções se confinassem a um período de 10 a 15 minutos para cada um dos Srs. Deputados que irão intervir como porta-vozes, sendo certo que as respostas também não deverão exceder esse tempo.
Foi, portanto, isto que foi decidido, Sr. Deputado, o que, penso, é consensual em termos de organização do nosso tempo. Em todo o caso, Sr. Deputado, agradeço ter trazido o assunto à colação.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Economia e da Inovação, embora nos tenha feito crer, no final da sua exposição, que a mesma tem alguma ligação com aquilo que estamos a discutir, que é o orçamento, como primeiro comentário direi que, ao longo da intervenção que farei e das questões que vou colocar a V. Ex.ª, terei ocasião de demonstrar que nos parece que essa ligação não existe. Mas na altura própria di-lo-ei.
De qualquer forma, quero dizer, em primeiro lugar, que para os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD que fazem parte da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional tem sido penosa a vinda de V. Ex.ª a esta Comissão. Hoje, temos o prazer da sua presença, mas não há dúvida de que terei de concluir que o Sr. Ministro da Economia e da Inovação tem estado ausente não só do Parlamento mas também da Comissão, apesar de se ter disponibilizado a comparecer mensalmente na Comissão. Se pensarmos que o Governo tem mais de sete meses de existência e o Sr. Ministro veio cá duas vezes, verificará que podemos dizer que o Sr. Ministro tem sido ausente.
Já agora, também gostaria de dizer que, mesmo depois da exposição que fez, está ausente relativamente a este Orçamento. E hoje de manhã, aquando da audição com o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, apercebemo-nos, logo na sua primeira intervenção, que a economia estava ausente deste Orçamento! O Sr. Ministro vem dizer-nos que estamos numa fase de consolidação orçamental e que teremos de ter em atenção a situação em que vivemos. Mas pensamos que nada justifica essa real ausência deste Orçamento.
Aliás, esta manhã, por várias vezes, ficámos à espera que houvesse alguma referência à economia. Não ao traçar do quadro macroeconómico, porque isso já foi feito esta manhã e voltou a sê-lo agora, mas à economia, que é aquilo que interessa às empresas neste país.
Portanto, estamos todos de acordo que deve haver consolidação orçamental, mas a questão que se coloca, e que é fundamental para nós, é esta: essa consolidação orçamental deve ser feita à custa das empresas e à custa das exportações, apesar de, no quadro macroeconómico, se prever um crescimento das exportações de 5,7%? Tenho ouvido dizer — e já li —, por exemplo, de uma confederação patronal, que não há neste Orçamento do Estado grandes medidas do ponto de vista estrutural para criar melhor ambiente para as empresas. Concordo e penso que temos de estar de acordo com isto.
Mas também já ouvi que este é um Orçamento com «muitas finanças e pouca economia». Penso que, quanto a isto, estamos todos de acordo. Porquê? Porque faltam medidas concretas que incentivem a actividade das empresas, designadamente medidas fiscais e de apoio, por exemplo, à formação profissional. Também estou de acordo.
Ou seja, sinceramente, não me parece que este Orçamento seja um Orçamento do Partido Socialista, porque aquilo que ouvimos ao longo de três anos foi que a anterior maioria é que tinha uma obsessão pelo défice, pelo que todas as suas políticas em relação à economia eram para acabar com ela, para que ela nunca mais crescesse. Contudo, o que se vê é o Partido Socialista fazer o contrário daquilo que criticou quando estava na oposição.
O Sr. Ministro falou do ICEP e do IAPMEI e deu uma explicação que, sinceramente, tenho dificuldade em entender e, por isso, vou ter de voltar a falar desta matéria e o Sr. Ministro vai ter de voltar a explicar muito claramente o que se passa. É que o ICEP e o IAPMEI eram os institutos que, no governo anterior, começaram a ser reformulados, começou a ser alterado os sistemas de funcionamento. O governo anterior tentou dar-lhes outros objectivos, outras formas de actuar, e este Governo veio anular o que estava a ser feito, dizendo que a sua política era diferente. Está no seu direito! O Sr. Ministro da Economia, obviamente, está no direito de o
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fazer. Contudo, o que me parece muito estranho é que, tendo feito isso, haja estas reduções nos orçamentos destes dois institutos — o ICEP tem um corte de 17,6% e o IAPMEI tem um corte de 27,2%.
Mesmo com as explicações que o Sr. Ministro aqui deu, de ter de se contar com os saldos e de haver uma verba de 15 milhões de euros do SIME Internacional, que não entra, mesmo assim, o sinal que qualquer um de nós recebe desta situação é o de que este Governo vai dar menos importância ao ICEP e, pior do que isso, ao IAPMEI, que é o principal destes institutos. Recordo que o Sr. Ministro, quando esteve na Comissão, em Maio de 2005, disse que o IAPMEI era uma «instituição importantíssima que é necessário amadurecer e desenvolver.» Fixou três objectivos para o IAPMEI: o aumento da sua valência no âmbito da inovação; a Espanha (na altura, falava-se muito da Espanha e das relações com a Espanha); e a gestão estratégica das sociedades de capital de risco. Passaram cinco meses e o que é que aconteceu? Essa explicação financeira que o Sr. Ministro nos deu, sinceramente, deixa-nos sérias dúvidas sobre a importância que o Governo dá a estes dois institutos, fundamentais para a nossa economia.
Gostaria de acrescentar que há muito tempo está feito o diagnóstico — aliás, existem vários estudos sobre o atraso estrutural da nossa economia — e recordo que, nesse diagnóstico, há três aspectos fundamentais: a burocracia, e, portanto, a necessidade de desburocratização; o problema da economia paralela e do seu peso na economia em Portugal; e aquilo a que se chama a «informalidade».
O Sr. Ministro disse algo sobre esta matéria, mas nós lemos o Orçamento do Estado e não encontramos praticamente nada sobre isto. Mas aquilo que estamos aqui a discutir é o Orçamento do Estado. A saber, quais são as verbas, para além de verbas de vário tipo, de componente nacional ou de fundos estruturais, que podem ser aplicadas em vários planos.
Portanto, aquilo que estamos aqui a discutir é realmente o Orçamento do Estado e deixe-me que lhe diga, Sr. Ministro, que, em relação ao Orçamento do Estado, o Sr. Ministro disse praticamente nada. Aliás, da própria leitura do Orçamento do Estado, chegamos à conclusão de que não está lá praticamente nada de concreto em relação, por exemplo, aos três aspectos que referi, que são três problemas gravíssimos e estruturais da nossa economia.
Seguidamente, Sr. Ministro, gostaria também de falar sobre o seguinte: o Orçamento do Estado prevê uma arrecadação de receita, em 2006, de 1563 milhões de euros de privatizações. Está lá este valor: 1563 milhões de euros.
Embora, como é sabido, o Partido Social Democrata apoie a redução do peso do Estado no sector empresarial do Estado ou nas empresas públicas, gostaria de saber qual é a estratégia, neste quadro. Ou seja, havendo privatizações, como por aí já se disse, de empresas do sector energético, qual é a estratégia para o País e para os consumidores no sector da energia? E, sobre esta matéria, gostaria de dizer que li atentamente a resolução do Conselho de Ministros, os documentos que a acompanhavam e até algumas declarações do Sr. Ministro sobre esta matéria, mas deixe-me que lhe diga também — e hoje voltou a repetir-se esse problema — que vir ao Parlamento falar de estratégia para o sector energético sem concretizar ou sem conhecermos em que concreto determinados aspectos, para além de uma ou outra grande linha que o Sr. Ministro já referiu, sinceramente, achamos que é curto. É que estamos perante um sector em que é extremamente importante que se saiba não só qual é a estratégia mas também qual é a política concreta que vai ser seguida e que política concreta vai ser seguida com incidência no Orçamento do Estado, que é isso que aqui estamos a discutir. E, sinceramente, da sua intervenção inicial não chegámos a qualquer conclusão.
O Relatório do Orçamento do Estado está cheio de frases um pouco vagas e de objectivos com os quais, se calhar, estamos todos de acordo, mas, depois, falta a concretização. E essa falta de concretização é, na realidade, o mais importante, que nos leva a pensar que a economia foi praticamente esquecida neste Orçamento do Estado. Isso, para nós, é algo com que não concordamos.
Em relação ao sector do turismo, gostaria de dizer o seguinte: o Secretário de Estado do Turismo afirmou há dias que Lisboa vai ter um aeroporto para as low cost. Esta é uma matéria que acho que é extremamente importante que se defina de uma vez por todas. Um membro do Governo vem dizer que vai haver um aeroporto em Lisboa para as low cost, depois vem outro dizer que não vai haver, que vai haver a Ota, depois vem outro ainda dizer que já não há aeroporto para as low cost, e quase nenhum diz o que é que vai acontecer ao actual aeroporto de Lisboa… Esta situação não é normal — e isto passa muito pelo sector da economia, porque está em causa também o sector do turismo, que é considerado pelo Governo e por todos nós um sector fundamental e estruturante para a nossa economia — e, portanto, a questão que lhe deixo é se o Sr. Ministro subscreve esta informação do Sr. Secretário de Estado do Turismo. E, subscrevendo, o que é que vai acontecer à Ota? O Sr. Ministro da Economia e da Inovação também continua a dizer que este é um dos dois projectos fundamentais, um dos dois mais importantes, que, aquando da apresentação do PIIP, lançou alguma polémica e até parece que foi a causa principal da demissão do ex-Ministro de Estado e das Finanças.
Neste quadro, se isso é aceite pelo Sr. Ministro da Economia e da Inovação, o que é que vai acontecer, por exemplo, ao actual aeroporto de Lisboa? Este Orçamento — e penso que será importante referir isto — ataca a economia e as empresas. Além de as esquecer, ataca-as. Houve um relatório recente da OCDE sobre o peso dos impostos na economia dos países europeus que mostrou que só em Portugal é que a carga fiscal se está a agravar. Não quer dizer que
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seja a mais grave, mas, na União Europeia, é em Portugal que ela se está a agravar. Não quer dizer que seja a mais gravosa, porque há outras mais gravosas.
Portanto, a pergunta muito concreta é esta: é ou não importante o investimento estrangeiro na estratégia do Ministério da Economia e da Inovação para Portugal? O que é que vai acontecer ao investimento estrangeiro perante esta situação de agravamento fiscal para as empresas? Para nós, era importante que se actuasse no sentido de haver uma maior competitividade fiscal e não no sentido de haver um maior agravamento fiscal, que é algo que, efectivamente, é muito mau para o País.
Gostaria, para terminar — porque vejo o Sr. Presidente olhando para mim, não sei se já ultrapassei o tempo —, de colocar três ordens de questões muito breves.
Para um ministério tão vasto como este, onde existem muitas áreas e sectores que dele dependem, é surpreendente o facto de, no Relatório do Orçamento do Estado de 2006, serem referenciadas, após um conjunto generalista de frases e objectivos, com os quais todos estamos de acordo — mas nós não vamos votar isto, vamos votar é o Orçamento do Estado —, apenas três áreas de actuação, que, de facto, são importantes: o turismo, a energia e os consumidores. Não vi mais nada lá! A não ser que o Ministro da Economia e da Inovação me diga que há lá mais alguma coisa, para além, repito, daquilo que foi aqui apresentado e que já o tinha sido anteriormente, ou seja, os vários programas que estão a ser tratados pelo Ministro da Economia e da Inovação.
No turismo, a única observação directa e concreta prende-se com o turismo de bem-estar, que permitirá dotar espaços termais com condições e oferta, o que permitiu ao Sr. Ministro hoje referir o turismo de bemestar baseado em legislação que foi aprovada pelo anterior governo. Pergunto: e o resto em relação ao turismo? Não há mais nada? É que o Relatório do Orçamento do Estado, que é aquilo que lemos, só fala disto! Por exemplo, em relação à energia. Se as energias renováveis são realmente o sector estratégico, o relatório passa completamente ao lado, não fala delas. É sem dúvida importante a eficiência energética, mas também o é a promoção de clusters tecnológicos de base nacional, como, por exemplo, o cluster da energia das ondas, de que tanto se fala e em relação ao qual aqui nada é referido.
É louvável a intenção de reduzir os tempos associados aos processos de licenciamento, e isso está lá, pois, como bem sabe o Sr. Ministro, a incerteza e a indecisão políticas são um factor perturbador e desincentivador do investimento. Mas, pergunto: e a concretização desta intenção? Onde é que está a concretização desta intenção? Em relação aos consumidores há algo que nos parece inaceitável, que é não haver aumento de orçamento, ou antes, haver uma quebra do orçamento para a Autoridade da Concorrência. Quero saber o que é que o Ministro da Economia e da Inovação pensa do facto de a Autoridade da Concorrência não ter um reforço de orçamento, quando ela parece ser realmente fundamental para Portugal e para o funcionamento da economia.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, irei responder às perguntas não quero ser mauzinho,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas pode ser mauzinho! Não é que eu o tenha sido!...
O Orador: — … mas, relativamente à última afirmação respeitante às verbas para a Autoridade da Concorrência, devo dizer que ela vê a sua dotação aumentar 19,7%.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Onde?!
O Orador: — Se o PSD dá muita importância à Autoridade da Concorrência, o Governo também, de tal forma que reforça a sua dotação desta maneira. Aliás, outra autoridade de regulação extremamente importante, que é a ERS, vê a sua dotação aumentada em 21,9%.
Mas, passando por cima disto, direi que, naturalmente, a economia está totalmente presente neste Orçamento. Agora, não se pode medir se a economia está presente ou não usando, única e exclusivamente, o montante que é destinado aos programas no âmbito do Ministério da Economia e da Inovação.
Comecei por dizer que precisamos de um modelo de crescimento diferente, um modelo em que as qualificações, a inovação e a tecnologia tenham um maior peso. Basta ver a verba que é consignada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, pois neste ministério vão passar-me muitas das acções necessárias para aumentar a capacidade produtiva e a capacidade de inovação da nossa economia. E o que é que se verifica? Verifica-se um aumento! Ora bem, este aumento não tem de estar no Ministério da Economia e da Inovação, porque não é essa a sua vocação.
Estão contemplados outros sectores em que claramente o investimento público pode contribuir para aumentar a produtividade. Isto é preferível a que esteja aumentado o orçamento, em sentido restrito, do Ministério da Economia e da Inovação, porque precisamos de mais investimento mas precisamos, sobretudo, de melhor investimento.
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Vou dar aqui um exemplo concreto, que é o que diz respeito à política de energia. Se me perguntarem qual é a verba que está no Orçamento destinada a promover a energia eólica, as bioenergias e a construção de centrais de ciclo combinado, dir-lhes-ei: atenção, não é a despesa pública que vai promover estes projectos mas, sim, políticas, incentivos e sinais correctos. Ora, se é possível, através de políticas, incentivos e sinais correctos, promover o investimento privado, não é necessário que as verbas do Ministério da Economia e da Inovação estejam a ser empoladas, porque creio que acabou definitivamente o tempo do investimento público pelo investimento público, em que só se pensava no investimento público em termos quantitativos, agora é necessário olhar para ele em termos qualitativos.
Chamo a atenção, mais uma vez, para a importância do que está a suceder no sector da energia. É natural que não seja o Estado — isso não teria qualquer sentido — a construir centrais de ciclo combinado ou barragens, o que vai fazer é, através de políticas adequadas, criar condições para que o investimento privado acorra a estes sectores. Neste momento está a acorrer, e isto é a prova de que a economia está presente neste Orçamento.
Relativamente a medidas fiscais e à questão do investimento directo estrangeiro, gostaria de falar sobre novos projectos de investimento estrangeiro, no qual devemos apostar, quando eles estiverem assinados.
Mas é conhecido por todos que os grandes projectos de investimento directo estrangeiro têm uma natureza contratual e, portanto, a taxa de IRC que está no Orçamento nada tem a ver com o conjunto de incentivos que são dados a esses projectos. Portanto, estar a relacionar a taxa de IRC com a capacidade para atrair investimento directo estrangeiro não tem lógica, porque tais incentivos são de natureza contratual. E não existem apenas vantagens fiscais, existe também outro tipo de incentivos. O que temos de fazer é criar um melhor ambiente de negócios para as empresas, reforçar e sublinhar as nossas vantagens comparativas e tomar uma atitude muito proactiva.
Por exemplo, pessoalmente, não acredito numa política de captação de investimento estrangeiro a que chamaria de «banda larga». Somos um país muito pequeno, por isso, se conseguirmos captar meia dúzia de projectos para meia dúzia de sectores, resolvemos a nossa questão. Se fossemos a França ou a Alemanha, ou os Estados Unidos, por maioria de razão, então havia um conjunto de medidas transversais que teriam de ser adoptadas para conseguirmos atingir o resultado desejado. No nosso caso, somos uma economia pequena no âmbito europeu e, definitivamente, no âmbito mundial e, portanto, acredito muito nas virtudes das políticas proactivas destinadas a mercados específicos e a tentar captar investimentos em sectores específicos. E é necessário não abrandarmos neste esforço.
Por vezes — posso confessar aqui — fico desiludido quando os nossos esforços não têm os resultados esperados, mas não podemos desistir, temos de ser persistentes e criar um ambiente cada vez mais positivo, e é muita a contribuição deste Orçamento do Estado para 2006 para, o mais rapidamente possível, conseguirmos atrair estes investimentos para o nosso país.
Relativamente à política energética, permito-me não estar de acordo consigo quando diz que as referências são vagas.
Aliás, no último dia 3, foi publicada uma resolução do Conselho de Ministros relativamente ao ICEP e ao IAPMEI, que é importante. De facto, não houve uma grande mudança relativamente ao governo anterior, mas houve, de facto, uma modificação na configuração.
Creio que muitos dos presentes conhecem o que é o ICEP e o IAPMEI, que são instituições que têm um âmbito extremamente alargado. O anterior governo, na prática, tentou levar a cabo a fusão destas duas instituições, mas basta conhecê-las (e, para tal, não é preciso encomendar estudo algum a qualquer consultor) para verificar que têm um âmbito tão lato que obrigam a especialização. Ora, o que se fez foi o seguinte: por um lado, permitir essa especialização (e, hoje em dia, existem equipas extremamente competentes e especializadas no seu campo restrito de actuação) e, ao mesmo tempo, adoptou-se uma filosofia de serviços partilhados, por não se justificar duplicação de custos, como é óbvio.
Muito sinceramente, estou seguro de que esta foi uma boa decisão, como está, aliás ilustrado, não só a nível da implementação da capacidade de desenvolverem novos projectos e novos programas, quer por parte do ICEP quer do IAPMEI, mas também pela ocorrência de dois eventos — um deles, o 30.º aniversário do IAPMEI, teve lugar no mês passado, e o outro, o I Congresso das Empresas Exportadoras, decorreu no Porto há menos de duas semanas.
Cada um destes eventos foi extremamente bem recebido e contou com a presença de centenas de empresários, que foram extremamente bem recebidos. Basta ver as declarações feitas, na altura, não só pelos empresários como pelas associações empresariais para concluir que foram duas manifestações de enormíssima adesão ao novo projecto de desenvolvimento quer do ICEP quer do IAPMEI.
Posso desde já anunciar, ao nível das parcerias estratégicas, no que diz respeito à actuação do ICEP e do IAPMEI, do Ministério da Economia e da Inovação e das associações empresariais — em particular, a Associação Industrial Portuguesa (AIP) e a Associação Empresarial de Portugal (AEP) —, que haverá novidades, muito em breve, que só irão testemunhar uma coisa: a grande consonância existente entre o Ministério da Economia e os representantes das empresas.
Relativamente à burocracia, permito-me não estar de acordo. Uma leitura atenta do documento do Orçamento mostra muitas, mas muitas, medidas no que diz respeito à burocracia. Uma destas medidas, extremamente importante, que já foi adoptada, era qualquer coisa que não se acreditava ser possível, a empresa na
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hora. Aliás, o próprio Programa do Governo apontava para a criação de uma empresa num dia, pois não é num dia, é numa hora. Este programa até vai ser, muito em breve, alargado a um outro tipo de facilidades.
Relativamente às privatizações, o Sr. Ministro das Finanças, hoje de manhã, já falou no que era possível referir neste momento, ou seja, os montantes, por um lado, e as empresas, por outro.
Por mim, permito-me sublinhar aqui um outro aspecto: acredito que a introdução das empresas em Bolsa é uma coisa boa, porque as empresas, como todas as entidades, funcionam tanto melhor quanto mais estiverem sujeitas a disciplina e o mercado de capitais é um bom factor de disciplina para as empresas com uma participação pública serem geridas com o maior cuidado, por estarem sujeitas à disciplina do mercado de capitais.
Portanto, sublinho que a introdução em Bolsa de algumas empresas que não estão cotadas em Bolsa e também, relativamente às outras empresas, o aumento da parte que está cotada, é uma coisa boa para as empresas, para os consumidores e para a economia em geral.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, a título de interpelação, quero dizer que, embora seja um direito do Sr. Ministro da Economia e da Inovação responder ou não, gostaria de dizer que fiz várias perguntas a que o Sr. Ministro não respondeu, designadamente sobre a questão das empresas low cost e outras, que já não recordo, pois foram tantas. Mas, tudo bem, o Sr. Ministro é que sabe e eu só queria que ficasse registado que não obtive resposta.
Em segundo lugar, gostaria que o Sr. Ministro, tal como eu, tivesse o quadro da autoridade da concorrência à frente, onde vemos que há menos sobra em relação a 2005. Mas o esforço nacional no Orçamento do Estado é só de mais 0,1% na autoridade da concorrência, ou seja, o orçamento cresce à custa de receitas próprias.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — É exactamente esse o modo de financiamento. É o modelo financeiro da autoridade da concorrência! Se quiser, pode propor o contrário, o que seria uma novidade, mas sucede que é esse o modo de financiamento.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.
O Sr. Maximiano Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia e da Inovação, julgo que a primeira coisa que temos de deixar claro neste debate, decorrente da leitura dos documentos do Orçamento do Estado, é que a economia está presente neste Orçamento. Esta é uma marca determinante deste Orçamento e é a abordagem que o Partido Socialista faz ao processo de consolidação orçamental e ao processo de crescimento económico. Dizer, como diz o PSD, que a economia está ausente deste Orçamento, sendo dito por quem apoiou a obsessão pelo défice e fez toda a abordagem da política económica focalizada em apenas um objectivo, é, de facto, algo inacreditável! Srs. Deputados, nós, PS, nunca deixámos de considerar a consolidação orçamental como essencial. Dizemo-lo agora, dissemo-lo no passado. Mas abordamos a consolidação orçamental da forma como deve ser abordada: antes de mais nada, através de reformas estruturais, porque o problema da consolidação orçamental só pode ser tratado num contexto de médio e longo prazo e através de reformas que tornem permanentes os efeitos em problemas que são eles próprios estruturais.
Ninguém pode olhar para o défice do Orçamento em Portugal sem ver os seus factores de rigidez a um nível absolutamente insuportável, se é que posso utilizar o termo, nem sem abordar exactamente os elementos que rigidificam o comportamento da despesa. Portanto, ter-se conseguido alterar a trajectória da despesa de há longo tempo a esta parte, para, pela primeira vez, em 2006, um ligeiro decréscimo da despesa do Estado, isto é, sem dúvida, uma grande intervenção. De resto, não compreendo como é que se pode desvalorizar o decréscimo de 0,5% da despesa quando a anterior maioria, ano após ano, manteve o crescimento da despesa em 1,1% do PIB.
Portanto, só através de reformas estruturais e com uma abordagem de médio e longo prazo é que se pode actuar face ao défice interno, bem como pela valorização das políticas públicas e da abordagem estratégica da política económica. Esta é a abordagem que se vê neste Orçamento do Estado, através de parcerias e mobilização do sector privado, com a aposta em clusters e em factores dinâmicos da competitividade. Tudo isto são elementos de abordagem estratégica e de valorização das políticas públicas que lhe estão inerentes e correspondem a uma mudança face ao que se fazia anteriormente, como é evidente com uma valorização do crescimento e da competitividade.
É que a forma de atacar o défice mais crítico da sociedade portuguesa, que é o défice externo, a que eu juntaria o défice das qualificações, mais do que o défice interno, só é possível pela valorização dos factores dinâmicos da competitividade e pela valorização do crescimento. Para tal, é preciso um discurso mobilizador, é preciso induzir confiança, é preciso atacar os elementos de falta de produtividade, porque no médio ou no
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longo prazo é a produtividade que determina o bem-estar e não qualquer outra variável, e isto encontra-se neste documento do Orçamento do Estado.
As medidas do plano tecnológico, a abordagem dos PIN, a abordagem do novo PRIME ou do novo Programa Operacional da Economia, a redefinição dos seus objectivos estratégicos, uma mobilização que permita trazer novos recursos pela reutilização dos reembolsáveis e pelo financiamento, não de verbas a fundo perdido mas pelo financiamento dos juros de empréstimo bancário, tudo isto vai permitir alavancar recursos de que a economia das empresas bem está a precisar. Portanto, penso que estas são marcas deste Orçamento do Estado e são marcas desta consolidação orçamental e da política económica deste Governo.
Já que estamos aqui neste debate, é bom lembrar, sobretudo aos partidos que estão à nossa direita, que os fundamentos de política económica presentes neste Orçamento do Estado se encontram nas empresas apoiadas por políticas microeconómicas que o Ministério da Economia desenvolve. A este propósito, vou referir dois aspectos que me parecem muito importantes: um é o do cenário macroeconómico e das exportações, o outro consiste na questão da competitividade fiscal, que o PSD e o CDS insistentemente «trazem à baila».
Relativamente às exportações, entendo que muito do sucesso para atingir a meta fixada decorrerá do facto de as empresas estarem ou não em condições, através da sua qualidade de gestão e do enquadramento decorrente das políticas públicas, no sentido de aproveitarem um dado objectivo, que é este: o crescimento da procura externa para as exportações portuguesas para o ano é de 6%. Portanto, se as empresas portuguesas estiverem em condições de tirar proveito deste crescimento da procura externa, não vejo que a meta das exportações não possa ser atingida. Aliás, considero esta previsão muito mais realista do que eram as metas fixadas no passado.
Já que estamos em tempo de relembrar propostas do passado, vale a pena lembrar ao PSD e ao CDS-PP que o então Ministro da Economia do primeiro governo da vossa maioria disse, nesta Assembleia, que, em 2010, o peso das exportações portuguesas no PIB já teria passado de 30% para 40% do PIB. Esta previsão significa crescimentos absolutamente — esses, sim! — inqualificáveis, como então dissemos e o tempo veio demonstrar.
Portanto, uma vez criadas as condições de ambiente competitivo para as empresas, não vejo que o crescimento da procura externa não possa ser aproveitado pelas empresas portuguesas, na condição de o custo de trabalho por unidade produzida (o que é diferente dos acréscimos salariais, como convém recordar para fase posterior do debate) se manter contido e também lembrando também que, do ponto de vista técnico, o que conta são as exportações líquidas e não são apenas as exportações. Mas, quanto a isto, podemos passar à frente.
O outro elemento que quero referir é o da competitividade fiscal, para voltar a lembrar a quem tanto insiste na queda da taxa de IRC como elemento de competitividade fiscal que não existem certezas, nem do ponto de vista teórico nem do empírico, quanto à determinação da taxa de IRC e à competitividade fiscal. No que concerne às empresas e aos investidores, àqueles que investem — quer os nacionais quer quanto à nossa capacidade de atracção de investimento estrangeiro —, são muito determinados por outras variáveis empresariais que não o IRC. O vosso contacto com as empresas deveria mostrar isto, incluindo, antes de mais, do ponto de vista do sistema fiscal, que a simplificação fiscal é muitíssimo mais importante para a capacidade de induzir e de atrair investimento do que a mera manipulação da taxa de IRC.
O Sr. Deputado Miguel Frasquilho não está presente, mas quando estiver terei de lembrar de novo esta questão, que é importante, na qual tanto insiste.
Finalmente, queria colocar algumas questões, julgo que dentro do tempo de que disponho.
Primeiro, gostaria que o Sr. Ministro fizesse um ponto da situação quanto à diplomacia económica, à forma como esse dossier foi encontrado e ao que será feito para o seu desenvolvimento.
A segunda questão tem que ver com aspectos de organização do Ministério, no que respeita aos seus institutos, que preocupam aqueles que entendem que o reforço da competitividade das empresas portuguesas passa fortemente pela capacidade das políticas públicas de apoio à inovação.
Refiro-me ao Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação, I.P. (INETI), esse organismo abandonado pela maioria que dirigiu o País nos últimos anos, e ao Instituto Português da Qualidade, I.P. (IPQ), dois institutos essenciais que, embora compreenda que a tarefa de reorganizar o Ministério depois dos últimos anos possa ser gigantesca, deverão merecer a atenção desta equipa. Portanto, gostaria de saber, do ponto de vista orçamental, mas também estratégico, qual é a abordagem feita por esta equipa a estes institutos.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, foi aqui dito que a economia não estava presente no Orçamento do Estado para 2006, pelo que vamos compará-lo com o Orçamento do Estado para 2003.
Como se sabe, de 2005 para 2006 o défice orçamental baixa de 6,2% para 4,8%. E esta redução é compatível com quê? Com uma aceleração do crescimento, que passou de 0,5% para 1,1%.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Vamos ver!
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O Orador: — Por isso, quando dizem que a economia não está presente, eu afirmo que a economia está presente.
Queria perguntar o seguinte: o que terá sucedido de 2002 para 2003, quando, não obstante haver uma obsessão com o défice orçamental, ele, sem medidas extraordinárias, aumentou e o crescimento passou de 0,5% para —1,1%? Esse é que foi um Orçamento em que a economia estava totalmente ausente, o que, aliás, foi bem confessado à partida, porque existia uma obsessão com o défice e quem tem uma obsessão com o défice não tem nada que ter a economia presente.
Por que é que este Orçamento tem a economia presente? Porque, não obstante o esforço de consolidação sustentada do défice orçamental e a necessidade de transparência nas contas públicas, se prevê que o défice orçamental baixe de 6,2% para 4,8% e isso será compatível com um aumento do ritmo de crescimento de 0,5% para 1,1%.
Creio que essa é a prova insofismável de que a economia está presente, e muito, neste Orçamento, porque se ela não estivesse presente, o que é que sucederia? Se ela não estivesse presente, um tão grande esforço de ajustamento das finanças públicas conduziria a quê? Conduziria à estagnação ou a uma recessão. Mas não é isso que se está a verificar e não é só um desejo, porque já há indicadores razoáveis de que estas estimativas para o ano de 2005 e de que as previsões para o ano de 2006 são possíveis. Repito: a economia, definitivamente, está presente neste Orçamento.
Ao mesmo tempo, será que uma taxa de crescimento de 0,5% em 2005 e de 1,1% em 2006 é aquela que desejamos ou aquela que a economia portuguesa necessita? Não é, mas, como é necessário aumentar a capacidade de crescimento da nossa economia no longo prazo, temos de viver com esta situação enquanto se verificam duas coisas: em primeiro lugar, enquanto se consegue ajustar o défice orçamental de forma sustentada e, em segundo lugar, enquanto entra em acção um conjunto de acções, no âmbito do Plano Tecnológico, para aumentar a competitividade da nossa economia e se fazem sentir os seus efeitos, porque são medidas estruturais, pelo que não produzem efeitos tão rápidos quanto seria desejável.
Queria ainda responder à questão do Sr. Deputado Maximiano Martins sobre o turismo. Sinceramente, nunca em nenhum Orçamento como neste houve tantas referências ao turismo, porque, aliás, nunca a este sector foi dada a importância verdadeiramente estratégica que…
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Os senhores até acabaram com o Ministério do Turismo!
O Orador: — Sr. Deputado, pelos vistos, a existência de um Ministro do Turismo nada tinha que ver com a matéria, porque é sabido que o turismo nunca teve a importância estratégica que tem neste momento.
Relativamente aos institutos existentes no âmbito do Ministério da Economia e da Inovação, não só sobre a sua vocação e o seu desenvolvimento mas também sobre o seu orçamento, solicitava ao Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor que passasse a responder.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, quanto ao orçamento do ICEP, a explicação já aqui foi dada pelo Sr. Ministro, de qualquer modo, vou referir os números com mais pormenor.
Em 2005, o orçamento do ICEP era de 106 milhões e com as cativações passaria para 89 milhões de euros. Em Julho, fez-se uma previsão de execução de 98,3%. O Sr. Ministro já disse que não estamos em condições, neste momento, de assegurar a sua total execução, o que significa que este valor é sobreavaliado e é sobre o mesmo que estão a ser feitos os cálculos de um decréscimo de 17,6%.
Já aqui dissemos que ao orçamento do ICEP, cujas fontes são o Orçamento do Estado (37,7%), as receitas próprias (2%) e outras fontes (41,3%), cujo somatório é de 81 milhões de euros, há que juntar um montante novo, cuja criação só foi possível com a reafectacção das verbas do Programa de Incentivos à Modernização da Economia (PRIME), de 15 milhões de euros, totalmente afecto às exportações, através do Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial Internacional (SIME Internacional).
Portanto, se somarmos este valor, os fundos do Fundo Social Europeu (que não aparecem, nem têm de aparecer, tecnicamente no orçamento do ICEP), o reforço dos apoios, através de capital de risco, que, neste momento, estão a ser reafectados e reorganizados, as transferências da Agência Portuguesa para o Investimento (API) pelos serviços prestados, os resultado da reorganização interna, visto que o ICEP e o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPME) têm serviços partilhados com pagamentos de prestações, posso assegurar que o orçamento do ICEP é superior à execução que está a ser feita e que havia sido planeada em 2005 no Orçamento do Estado. Basta somar a essas verbas todas as que vieram da reafectação do PRIME.
E com isso conseguimos ainda dar um forte impulso às missões do próprio ICEP. Esse Instituto, até à relativamente pouco tempo, tinha uma estrutura de back office suficientemente numerosa para poder produzir um conjunto de estatísticas que faziam envolver os delegados no exterior em tarefas demasiado burocráticas e administrativas. Podemos dizer que é possível ter as mesmas missões com menos pessoas no ICEP e com mais delegados no exterior. Ora, se conseguirmos reduzir as despesas de funcionamento como pretendemos, se conseguirmos levar por diante os projectos suportados pelas novas linhas que foram criadas (gostaria de
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referir os oito destacáveis que vos foram distribuídos, que são os novos produtos de apoio às exportações que o ICEP promoverá), poderei dizer que não há insuficiência de meios para a estratégia que está a ser seguida e suportada por aquilo que vim aqui apresentar, que é o programa Exportar Mais.
O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação, que pretende acrescentar ainda um ponto.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, muito brevemente, queria só acrescentar uma coisa sobre a questão da diplomacia económica, que é um ponto muito importante que foi levantado.
Na diplomacia económica, passa-se um bocadinho o mesmo que relativamente à burocracia: da mesma forma que é preferível não fazer uma teoria geral sobre a burocracia mas resolver os seus problemas, também é preferível não elaborar uma teoria geral sobre a diplomacia económica mas pôr a diplomacia ao serviço da economia.
Temos um grande desafio, que é o de explorar novos mercados, não só os que geograficamente nos estão próximos mas também aqueles onde existe uma grande abundância de meios financeiros, nomeadamente os dos países do Magreb, que em virtude do aumento do preço do petróleo têm enormíssimas reservas e que, naturalmente, têm uma grande apetência para comercializar mais com Portugal. Dois desses países foram já visitados, é o caso da Argélia e da Líbia.
Essas visitas foram excelentes exemplos de diplomacia económica. O Ministério dos Negócios Estrangeiros esteve associado à preparação dessas visitas, nas quais participei.
Na visita à Argélia, participaram mais de 60 empresários e foram abertas algumas perspectivas de negócios muito interessantes. Em seguida, fez-se algo não muito usual no nosso país, que foi, depois dessa visita, os serviços do Ministério da Economia e da Inovação acompanharem os empresários, e passados dois ou três meses continuam a acompanhá-los, na realização de negócios.
Ainda este fim-de-semana houve uma visita com características semelhantes, apesar de a delegação empresarial ter sido mais reduzida, à Federação Russa.
Ora bem, esses são bons exemplos de como a nossa diplomacia e a nossa economia devem «andar de braço dado». E até juntaria uma dimensão adicional: por exemplo, o Ministério da Cultura esteve associado na visita à Federação Russa, o que transmitiu uma imagem extremamente positiva e progressiva do nosso país.
Portanto, quando se trata de conquistar mercados externos, só faz sentido, na prática, que a nossa diplomacia «ande de braço dado» com a economia e com outras vertentes, nomeadamente com a cultura, visto que Portugal, em termos culturais, tem uma longuíssima tradição, um património muito grande e grandes agentes nesse sector e, sem dúvida nenhuma, isso pode ser um factor de diferenciação do nosso país junto de mercados externos.
Há muitos países que podem apresentar os mesmos rácios económicos do que Portugal, mas que não têm os nossos patrimónios cultural e histórico, portanto, devemos pôr essa nossa característica específica, que felizmente temos, ao serviço das nossas empresas e da sua capacidade de actuar nos mercados externos.
O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Economia e da Inovação, gostaria de começar por lamentar a sua ausência ao longo destes meses, o que inevitavelmente, para lá de outros problemas, acaba por sobrecarregar este debate com um conjunto de questões que teria sido importante debater e discutir ao longo destes meses e que a ausência do Sr. Ministro não permitiu.
Sr. Ministro, gostaria de afirmar a minha concordância com os dois primeiros períodos do relatório do Ministério da Economia e Inovação. Diz-se, concretamente, que um dos principais desafios que o País enfrenta é o do crescimento económico, o que é, certamente, há muitos anos, uma verdade. O problema é que este objectivo é contrariado, claramente, pelas políticas, pelos instrumentos e pelos meios que, mais uma vez, são definidos e corporizados no Orçamento do Estado.
Estando, naturalmente, de acordo, mais uma vez, com a ideia de uma nova dinâmica das exportações de bens e serviços, assente em melhor produtividade, na alteração do padrão de especialização, na incorporação de maior valor acrescentado, o que reflectirá mais inovação e mais progresso tecnológico, resta acrescentar que estas afirmações de princípio são feitas há muito por sucessivos governos, em sucessivas Grandes Opções do Plano e sucessivos Orçamentos do Estado.
A questão que se continua a colocar, Sr. Ministro, é a de saber por que é que não se concretizaram estes objectivos, ao longo destes anos, pelo menos desde 1995. O que falhou nas propostas e nos projectos? Por que é que em vez de se avançar na resolução destes problemas, se agravaram todos os nossos défices estruturais? É o da produção e o défice externo — basta ver o estado lamentável da nossa balança comercial —, o energético, o tecnológico e, naturalmente, também o orçamental. Quantas vezes, no debate de Orçamentos do Estado, foi feita a afirmação que o Sr. Deputado Maximiano Martins acabou de fazer, no sentido de que ia começar a descer a despesa e a fazer-se a consolidação orçamental? Quantas vezes foram ditas, nesta Sala, estas mesmas palavras?!
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O problema é que, de facto, as políticas, os instrumentos e os meios deste Orçamento do Estado continuam, no fundamental, as políticas anteriores e, portanto, inexoravelmente, na nossa opinião, conduzirão aos mesmos resultados.
Quanto à polémica aqui estabelecida sobre se a economia está ou não presente neste Orçamento do Estado, diria que, de facto, está, o pior é que continua no sentido tradicional, num sentido errado, no sentido de um Orçamento do Estado virado sobretudo para responder aos interesses dos grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros, de capital transnacional, em prejuízo dos trabalhadores portugueses e da generalidade das micro e pequenas empresas deste País.
O crescimento económico exigiria, certamente, uma política que valorizasse o trabalho dos portugueses, dos assalariados e de outros sectores da população — pequenos empresários, agricultores, pescadores — e o que assistimos é a um orçamento que vai em sentido contrário.
O crescimento económico exigiria um orçamento virado, de facto, para a criação de emprego, começando por defender todo aquele que tem possibilidade de ser defendido, e o que verificamos é que, apesar das perspectivas optimistas, o que está em cima da mesa é o crescimento do desemprego.
Mais uma vez, temos uma política a apontar para a desvalorização do trabalho — veja-se a política salarial deste Orçamento, as políticas relativas às pequenas empresas e o que se diz relativamente à defesa dos sectores produtivos.
O crescimento económico exigiria, por exemplo, a defesa dos sectores produtivos, mas o Governo continua cúmplice de uma política de liquidação do sector produtivo, nos têxteis, na agricultura, na pesca. Veja-se o exemplo da produção de beterraba sacarina no nosso país: o que está em cima da mesa — e o Governo abana a cabeça — é a liquidação desta produção, e pelos vistos existem até 50 milhões de euros para desmontar a fábrica de Coruche virada para a produção de açúcar.
Exigia-se um forte sector público nos sectores estratégicos mas o Governo, para satisfação do Pacto de Estabilidade, prepara-se para arrematar o que resta, e não é pouco, em todo o sector da energia. E reparemos no seguinte: temos um orçamento do Ministério da Economia, pelo menos segundo o PIDDAC, com um valor global de cerca de 643 milhões, e o Governo prepara um encaixe, com meia dúzia de privatizações, de mais de 1500 milhões de euros. Esta é a contradição fundamental da economia presente neste Orçamento.
Era necessário um forte apoio às micro e pequenas empresas e, de facto, era preciso implementar políticas de financiamento que respondessem ao grosso do tecido empresarial português — e recordo que mais de 80% são microempresas e 15% são pequenas empresas —, mas o que está em cima da mesa não vai nesta direcção.
O Governo continua sem definir um interlocutor único para as pequenas empresas, contrariando, inclusive, a Carta Europeia das Pequenas Empresas, aprovada solenemente por um governo do PS, em Vila de Feira, e continua a reduzir as verbas ou os apoios a elas destinadas.
Era necessário um grande combate económico dinamizado pelo Estado para responder à anemia económica, à recessão económica que enfrentamos e o que se está a propor é o seu agravamento, com um orçamento altamente restritivo.
Gostava de começar por ser esclarecido, relativamente ao orçamento do Ministério da Economia e Inovação, sobre os números efectivos deste orçamento, e já hoje esta questão aqui foi referida, porque, a não haver milagre de multiplicação dos pães, são referidos uns números no PIDDAC e, depois, aparentemente, os números que estão em cima da mesa para investir em 2006 são bastante superiores, são várias vezes multiplicados.
Gostaria, pois, que se clarificasse, em primeiro lugar, qual é, de facto, no período temporal de 2006, o investimento da responsabilidade do Ministério da Economia e Inovação e qual é a responsabilidade de outros Ministérios — porque, para além do investimento privado, penso que tudo estará ligado a outros ministérios — no investimento sob a tutela do Ministério da Economia e Inovação.
Sr. Ministro, para lá de um conjunto de generalidades e de declarações vagas, que são habituais nestes documentos, vejamos um conjunto de questões mais concretas, a primeira das quais é, certamente, a que tem a ver com o programa de privatizações, tocando, particularmente, o sector da energia.
Gostaria de lembrar, mais uma vez, o que significa este processo de privatizações: perda de receitas do Estado e veja-se o que está a acontecer com os dividendos de algumas destas empresas; perda de instrumentos centrais para a competitividade do tecido empresarial, como é o caso da energia, e penso que, em face dos resultados que, por exemplo, a EDP e a Galp apresentaram em 2004 era claramente possível oferecer outros preços de energia ao tecido económico português; agravamento dos problemas de ordenamento do território, porque se trata de empresas em rede, com evidentes impactos no conjunto do território português, pelo que este processo vai, certamente, agravar a já fortíssima desorganização territorial e as assimetrias regionais, e teremos certamente a continuação do agravamento e discriminação de preços dos bens e serviços que estas empresas fornecem às famílias e às empresas.
Gostaria de lembrar que, por exemplo, o Governo deixou de ter o grande argumento do prejuízo destas empresas, porque, segundo as próprias contas do Sr. Ministro da Economia neste relatório, os rendimentos líquidos destas empresas de serviços de utilidade pública renderam ao Estado, em 2004, 836 milhões de euros. Portanto, não é, certamente, por darem prejuízo que o Sr. Ministro vai privatizá-las.
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Sr. Ministro, sobre o sector energético, continuamos com todas as dúvidas que tínhamos e não é a leitura da pobre resolução do Conselho de Ministros que o Sr. Ministro acabou de referir ou o Relatório do Orçamento do Estado que nos esclarece relativamente a algumas questões centrais.
Gostaria que o Sr. Ministro me dissesse qual a razão, qual a fundamentação para se privatizar uma estrutura tão central como a Rede Eléctrica Nacional, rede de infra-estruturas de distribuição de energia eléctrica e de gás, na perspectiva em que é feita.
Gostaria também que o Sr. Ministro me esclarecesse sobre o que vai ser a estrutura do sector energético em Portugal e se está, de facto, a preparar-se uma situação de um mercado ibérico, com Mibel ou sem Mibel.
Aliás, já nem se fala do Mibel e, de facto, para tornar a anunciar qualquer data que nunca mais se concretiza mais vale não dizer nada. Será que vamos ter um mercado ibérico dominado por duas grandes empresas espanholas? Bem sei que o Sr. Primeiro-Ministro e, agora, também intervenções dessa bancada se referiram à grande prioridade dada a Espanha, pelo que gostaria de saber se esta grande prioridade significa, de facto, que o País vai ter, no futuro, o seu mercado de energia, a sua produção de energia completamente determinada e dominada por empresas espanholas, profundamente articuladas, como é evidente, com o poder político espanhol.
Sr. Ministro, qual é, de facto, a proposta da ENI e qual é a posição do Governo relativamente à proposta da ENI, que um anterior governo do PS deixou «abocanhar» uma parte significativa da Galp? Qual é o papel que os senhores atribuem à Petrocer? Será que o acordo que esta empresa tinha com o Governo português, com o Estado português é, pura e simplesmente, rasgado? O que é que o Governo pensa das pretensões da Iberdrola, questão que de novo coloco porque continuo sem resposta? Relativamente aos sectores produtivos, o que está a passar-se com os têxteis portugueses? O Sr. Ministro respondeu a um requerimento que lhe dirigi sobre esta matéria, concretamente sobre os acordos da União Europeia com a China, referindo que o problema resultou do vazio jurídico que se verificou entre 11 de Junho e 12 de Julho de 2005. Gostaria que o Sr. Ministro me esclarecesse se considera que esse vazio resulta da ignorância ou da incapacidade da União Europeia para avaliar esse problema, se isso aconteceu por acaso? A concretização dessa questão é um problema de incapacidade, de incompetência dos órgãos da União Europeia? Já agora, o Sr. Ministro refere nessa resposta que o problema tem sido acompanhado pelas associações dos sectores, mas devo dizer-lhe que pelo menos uma das mais importantes associações do sector têxtil diz, claramente, que, desde que o Governo tomou posse, nunca foi chamada para tratar de qualquer questão, nem ao nível do Sr. Ministro nem ao nível da Secretaria de Estado.
Vozes do PS: — Qual é?
O Orador: — É a ANIVEC/APIV.
Gostaria, Sr. Ministro, de conhecer, no âmbito das verbas possíveis, o valor das verbas disponíveis para o programa Dínamo. Que plafond tem o Governo disponibilizado, para 2006, para o Dínamo? Sr. Ministro, vou agora fazer-lhe uma pergunta que já uma vez lhe coloquei mas que ficou sem resposta.
É uma evidência a destruição, por deslocalização e encerramento, de um conjunto significativo de empresas, em geral de capital estrangeiro, do sector eléctrico e electrónico. É longa a lista mas não vale a pena estar a referi-la porque certamente o Sr. Ministro a conhece. Qual é a estratégia do Governo relativamente a este problema? Ou vai deixar que a situação decorra e que o mercado resolva o problema sem uma intervenção relativamente aos trabalhadores, às instalações e ao conjunto significativo de pequenas empresas portuguesas que são subcontratadas destas unidades? Sr. Ministro, em questões de competitividade, gostaria ainda que dissesse como avalia a anunciada e significativa subida dos preços da energia eléctrica para o tecido económico português no próximo ano, recentemente anunciada pela entidade reguladora.
Sr. Ministro, como vê o apelo do sector têxtil — aparentemente, não precisaria disso, face ao anúncio de fundos e mais fundos — à banca nacional para créditos adequados aos problemas que aquelas empresas enfrentam? Considera ou não o Governo a possibilidade de a Caixa Geral de Depósitos intervir como um factor concorrencial favorável face a uma situação bancária que está a asfixiar a actividade de centenas de pequenas e médias empresas têxteis? Sr. Ministro, que verbas estarão disponíveis em 2006 para o Sistema de Incentivos a Pequenas Iniciativas Empresariais (SIPIE)? Gostaria de um número para perceber exactamente o que é que se está a propor. E a mesma questão coloco relativamente ao URBCOM — Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial.
Fala-se no Relatório de novas áreas de criação de emprego e da criação e consolidação de centros de competência, promovendo as lógicas de cluster. Como vão ser concretizados estes objectivos? Como é que vão os mesmos ser operacionalizados? Ou o Governo anuncia um conjunto de incentivos e fica à espera que o mercado os resolva? Por que não apostar em pólos dinamizados pelo Governo, com uma forte intervenção, num acto de voluntarismo político do Executivo, quanto à situação que apontámos, concretamente em zonas
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onde os problemas do desemprego estão a fazer-se sentir com toda a força, como é o caso do Vale do Ave, para além de outras zonas do sector têxtil? Relativamente ao comércio, gostaria de saber quais são as verbas para a chamada reabilitação de mercados de interesse local relevante, medida com a qual estou de acordo. Quanto existe no Orçamento do Estado, no PIDDAC, para este objectivo? No que respeita ao Fundo de Modernização do Comércio, gostaria de saber que razões explicam a demora na sua regulamentação. Já falámos desta matéria em Maio, mas estamos a chegar a Novembro e este fundo continua por regulamentar, tanto quanto verifiquei numa uma recente «visita» ao Diário da República.
Já agora, gostaria de saber se esta regulamentação vai prever algum conselho de apoio às entidades que vão decidir (são três, o que é uma coisa esquisita, mas naturalmente que o Sr. Ministro saberá por que é que isso acontece), um conselho onde estejam presentes as associações que são especifica e tipicamente de pequenos e médios empresários deste sector.
Já agora, se possível, gostaria que o Sr. Ministro me explicasse por que continua o Governo sem aprovar um conjunto de projectos do URBCOM que estão suspensos.
Sr. Presidente, muito rapidamente, vou finalizar colocando três questões concretas.
Em primeiro lugar, gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse alguma coisa sobre a estratégia negocial do Governo para a Conferência de Hong-Kong da Organização Mundial do Comércio, que terá lugar em Dezembro. Ou será que o Governo entregou em definitivo essa estratégia ao Sr. Comissário Peter Mandelson, que, como sabemos, é enormíssimo defensor dos interesses nacionais, aliás, basta ver o que está a acontecer no sector têxtil?… Gostaria de saber, porque, mais uma vez, não se sabe, o que é especificamente o plano tecnológico. O que é o plano tecnológico, Sr. Ministro? Sr. Ministro, quero ainda questioná-lo sobre a fiscalização económica, de resto, agradecia se pudesse darme outras informações sobre a matéria. Tinha mais questões para colocar e, embora já não possa alongarme, ainda vou colocar pelo menos uma. Que entidades, que associações públicas e privadas, foram consultadas relativamente a esta reestruturação? Que novos meios humanos e materiais, equipamentos e laboratórios, estão previstos? Que acréscimo de verbas estão previstas para tornar efectiva uma autêntica e boa inspecção das actividades económicas? Sr. Ministro, por último, uma pergunta muito concreta: qual o valor da verba disponibilizada para o Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, colocoume um número muito vasto de questões. Tentarei ser tão concreto quanto possível, mas temo que em 10 minutos não consiga responder a uma boa parte delas.
O que é que falhou? Possivelmente, falharam muitas coisas, mas uma coisa falhou certamente: desde há muito tempo que não há o mínimo de estabilidade nas políticas económicas. E não houve o mínimo de estabilidade nas políticas económicas porque não houve estabilidade política.
Permitia-me recordar aqui algo que dá que pensar: enquanto tivemos oito ministros da economia, Espanha teve dois!…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — E ministros das finanças, provavelmente, ainda foram mais!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, se mantivermos este tom de diálogo receio que tenhamos um longo prolongamento da nossa sessão.
O Orador: — Por acaso, foram menos! Não foram oito mas tende para oito!… Ora bem, este é o primeiro problema. Um País com carências tão graves, com a necessidade, além das políticas de conjuntura, de políticas estruturais, não conseguir assegurar o mínimo de estabilidade significa duas coisas: os problemas estruturais nunca são resolvidos e, pior do que isso, são empurrados para os governos seguintes.
Ora, uma boa novidade — e esta foi uma decisão não do Governo, não dos Deputados mas, sim, de todos os portugueses — é que vamos ter estabilidade durante quatro anos.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Vamos ver! O ministro das finanças já mudou!
O Orador: — Vamos ter estabilidade nas políticas durante quatro anos, o que cria condições para resolvermos toda aquela gama de problemas que por definição são estruturais, que necessitam não de políticas orientadas para daqui a 6 meses ou 1 ano mas, sim, de políticas orientadas para daqui a 3 e 4 anos, porque são políticas que se dirigem aos problemas de fundo, como, por exemplo, os das qualificações, de mais concorrência ou ambientais.
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Relativamente às grandes e pequenas empresas, por tudo o que foi dito aqui quanto ao IAPMEI, algo de que não pode acusar-se este Orçamento e a política económica do Governo é de não dar a atenção devida às PME. Além do mais, o relacionamento entre o Ministério da Economia e da Inovação e as associações representativas das nossas PME, quer no Norte quer no Sul do País, não podia ser melhor. E isto é verdade não só ao nível do sistema de incentivos mas também ao nível do capital de risco e de outro tipo de apoios.
Quero só recordar que no 30.º aniversário do IAPMEI, que se celebrou há cerca de um mês, foi assinada exactamente a carta das PME, que é um compromisso de várias entidades, à frente das quais está o Ministério da Economia e da Inovação, para com as nossas PME, visto que as mesmas — não haja a mínima das dúvidas — têm um papel verdadeiramente central em termos de animar o crescimento da nossa economia, de inovação e, não menos importante, de emprego.
Passo às questões sobre os têxteis e a agricultura, que são dois sectores muito importantes pelo peso que têm na nossa economia e pelas tremendas mudanças que estão a verificar-se a nível mundial.
Começo pelos têxteis, que seguramente merecem uma intervenção por si só. A situação é extremamente complexa porque a liberalização do comércio com a China resultou num aumento dos fluxos de comércio internacional que, honestamente, ninguém podia imaginar. Ninguém podia imaginar! Vou dar um número que é de facto impressionante: entre 12 de Junho e 13 de Julho, um período em que há uma espécie de um vazio legal nas relações entre a União Europeia e a China, só pullovers chineses foram importados 200 milhões!… Pelas minhas contas, isto dá um pullover por cada dois europeus! É uma coisa que não faz sentido! Honestamente, ninguém podia antecipar! Não há dúvida sobre as virtudes do comércio livre, mas também não há dúvida sobre os inconvenientes do comércio desordenado! Quando se fala, num prazo de 31 dias, num aumento de exportações, de repente, de 200 milhões de pullovers, isto não tem nada que ver com o comércio livre, tem que ver com a criação de fluxos de comércio totalmente inesperados.
Qual deve ser a atitude do Governo? Deve ser a defesa do comércio livre, mas não a defesa do comércio desordenado. Tem sido essa a posição defendida em Bruxelas, porém, não nos iludamos: a União Europeia está profundamente dividida no que diz respeito ao sector têxtil, aliás, está totalmente divida! Portanto, o que um país como Portugal pode é tentar uma estratégia negocial que seja até superior ao nosso peso económico na União Europeia. Muito sinceramente, julgo que isso tem sido possível, visto que na primeira reunião, que teve lugar ainda em Abril, acabou por ser Portugal a chefiar a delegação do chamado «grupo dos têxteis», que se dirigiu ao Comissário Mandelson, o qual, de facto, defendia uma atitude muito diferente da que foi finalmente adoptada. Quero aqui chamar a atenção para um aspecto: se a posição do Comissário Mandelson tivesse vingado ainda hoje não teriam começado as negociações com a China. Portanto, não é uma estratégia que permita alcançar o objectivo óptimo, mas é uma estratégia que permite minimizar os danos.
De que forma tem de ser completada esta estratégia negocial no âmbito da União Europeia? Com um apoio ao sector têxtil, nomeadamente às empresas que estão a revelar um grande esforço no sentido de aumentar a sua competitividade, de se internacionalizar e de se tornarem empresas modernas.
É com muita satisfação que verificamos, no âmbito da iniciativa Portugal Marca, em que houve diversas sessões, uma delas destinada às empresas, que uma das empresas modelo é do sector têxtil. Portanto, no sector têxtil não temos apenas empresas problemáticas, temos muitos casos de sucesso, de empresas que, quer no âmbito da produção, quer pela utilização de novos materiais, quer no que diz respeito ao marketing e à distribuição, vectores fundamentais da indústria, são hoje em dia tremendos casos de sucesso.
Antes de passar a palavra aos Srs. Secretários de Estado, vou ainda referir-me às privatizações anunciadas pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
No que diz respeito à energia, há duas coisas que não devemos confundir. Primeiro, é mais importante uma boa política de regulação do que a posse das acções de uma empresa do sector energético. Os exemplos que aqui foram mencionados são modelos em que não é o facto de uma empresa de electricidade ou de uma empresa de petróleo ser pública ou privada que irá determinar, por exemplo, o respeito pelas questões ambientais, que foi o aqui usado. O que irá determiná-lo são a política de regulação e a política ambiental.
Portanto, é nesse sentido que se insiste em acompanhar as boas políticas públicas de regulação, nomeadamente com a existência de autoridades prestigiadas e independentes.
Segundo, no que diz respeito à Rede Eléctrica Nacional SA (REN), quero chamar a atenção para o facto de que a REN não está cotada em Bolsa. Desejavelmente, parte do seu capital está-lo-á um dia, mas existem empresas privadas cotadas em Bolsa que já são donas de parte do capital da REN. É o caso da Electricidade de Portugal SA (EDP), que tem 30% do seu capital. Portanto, não seria correcto dizer que o Estado controla totalmente…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Então, a EDP vai ser privatizada em parte?
O Orador: — Parcialmente. Mas, atenção, ela já foi parte…
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O senhor não quer golden shares!
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O Orador: — Se é golden share ou não, isso é uma coisa mais complexa, que ultrapassa em muito o âmbito desta questão.
Relativamente ao sector do comércio, e respondendo à pergunta sobre qual era o montante envolvido no Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial (URBCOM), esclareço que esse montante é de 50 milhões de euros, que o montante envolvido no Fundo de Comércio é de 20 milhões de euros e que, no que diz respeito ao URBCOM, que é o fundo integrado para o comércio nas zonas históricas existem 45 candidaturas seleccionadas. No que diz respeito aos outros programas, passaria a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e Inovação.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e Inovação: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-me que por este debate passou a ideia de que, não obstante todo o esforço, digamos, de contracção orçamental do Orçamento do Estado — e isto perpassou praticamente todas as bancadas —, de alguma forma é problemático que não haja mais dinheiro decorrente do Orçamento para acudir às políticas do Ministério, parecendo que não foi compreendida a ideia de que o grosso dos recursos do Ministério da Economia e Inovação para a política pública orientada para empresas não releva do Orçamento do Estado, releva, substancialmente, do novo PRIME e da orientação financeira que ele teve, que lhe possibilitou afectar, para além do que estava previsto até ao final do quadro comunitário de apoio, mais cerca de um bilião de euros. Esta é que é a realidade! Portanto, o que está aqui em causa não é uma diminuição de 0recursos, pois há, claramente, mais recursos, mas, sim e sobretudo, uma maior qualidade na orientação de recursos. O problema do País não é um problema de quantidade, é um problema de qualidade! As políticas públicas têm de ser qualificadas e a orientação do PRIME vai nesse sentido: mais dinheiro, mais recursos, mas com mais critério, com mais qualidade.
Qual é a qualidade? É a qualidade dos recursos que importa pôr à disposição das empresas para que os seus recursos sejam qualificados, para que as novas bases do crescimento, no que lhes diz respeito, possam ser potenciadas. E deste ponto de vista estamos a falar de mais de um bilião de euros! De resto, dificilmente podia deixar de haver uma solidariedade de todos os ministérios para a contracção do défice do Orçamento, que é, claramente, um princípio e um objectivo que perpassa a maioria dos grupos parlamentares que estão presentes.
Ficar-me-ia, para já, por esta afirmação de princípio. Já se provou onde está a qualidade do investimento — não vou mais retomar esses argumentos —, e quanto aos valores específicos de alguns programas passaria a palavra ao Dr. Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a reformulação do PRIME, já aqui foi dito, é a estratégia fundamental para adequar a política pública à orientação que foi definida em termos do plano tecnológico.
Relativamente aos valores que me pediu, dir-lhe-ei que os apoios públicos concedidos são os seguintes: o INOV-SIME, 412 milhões de euros; SIME Internacional, 30 milhões de euros; Sistema de Incentivos à Economia Digital (SIED), 25 milhões de euros; Sistema de Incentivos a Pequenas Iniciativas Empresariais (SIPIE), 41 milhões de euros; Sistema de Incentivos a Produtos Turísticos de Vocação Estratégica (SIVETUR), 5 milhões de euros; Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial (URBECOM), 50 milhões de euros mais 12 milhões de euros, porque, entretanto, temos a figura das unidades de acompanhamento e coordenação (UAC), do gestor do centro urbano, que vamos relançar com esta reformulação do SIME.
O URBECOM é um fundo fechado, que já teve as candidaturas seleccionadas e relativamente ao qual estamos a incentivar a apresentação de candidaturas individuais. Contudo, nas 45 candidaturas que recebemos ainda não existem candidaturas individuais das empresas, embora tenhamos andado pelo País a incentivá-las a que apresentem projectos.
Para a formação profissional, o apoio público é de 216 milhões de euros; para as infra-estruturas de apoio, incluindo a Região de Lisboa e Vale do Tejo, a verba é de 214 milhões de euros; para projectos em parceira e para outros programas que foi possível abrir com esta reformulação, vão mais 37 milhões de euros Suponho que já lhe dei os valores que pretendia.
O Sr. Secretário de Estado do Turismo: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Deputado Agostinho Lopes referiu a questão do Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro (PDTVD), que é de facto, curiosamente, uma das medidas que se prevê implementar durante o ano de 2006. Portanto, no Orçamento do Estado para 2006 há uma medida vocacionada directamente para o desenvolvimento de uma determinada zona com potencial turístico.
Deixe-me informá-lo que relativamente ao PDTVD o que acontece é que, embora a resolução do Conselho de Ministro aprovada pelo anterior governo tivesse, de facto, a virtude de tratar da zona em concreto, tinha a limitação de a sua formulação não envolver as entidades que eram decisivas num processo de resolução quer de investimento público quer de investimento privado. Portanto, neste momento estamos a ultimar a alteração da resolução do Conselho de Ministros, no sentido de torná-la vinculativa, com um conjunto de entidades que são decisivas em termos do processo de decisão.
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Outra questão que me parece muito importante, até porque está associada ao Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro, tem que ver com a conclusão do núcleo escolar de Lamego, onde o Instituto de Formação Turística (INFTUR) vai ser absolutamente decisivo para o conjunto de investimentos privados que se prevêem para a zona do Douro. Aliás, é por isso que no PIDDAC para 2006, nas verbas para o INFTUR, há um acréscimo de 23%, que serve, essencialmente, para financiar e para terminar intervenções ao nível dos núcleos escolares e onde, nessa matéria, o núcleo escolar de Lamego terá, seguramente, um papel decisivo.
Em súmula, diria que estamos a terminar a alteração da resolução do Conselho de Ministros para torná-la mais vinculativa e para permitir que as áreas-chave, as áreas de conflito, possam, de facto, ter uma resposta.
Antes de terminar não queria deixar de dizer, porque se tratou, em concreto, de um projecto de investimento, que uma delegação liderada pelo Sr. Ministro da Economia e Inovação teve a oportunidade de, no passado fim-de-semana, se deslocar à zona do Douro, nomeadamente a Mesão Frio, e ver, com um conjunto de entidades da administração pública que tinham sido responsáveis por um parecer que não era positivo, o que havia necessidade de fazer para, precisamente, em conjugação com o promotor, termos a possibilidade de colocar este projecto em condições de ser viabilizado a médio prazo.
Foi isso que quisemos verdadeiramente inaugurar em termos de prática política do Ministério da Economia e Inovação, ou seja, estar sobretudo no terreno e perceber o que é que deve ser alterado, para termos um investimento cada vez mais qualificado.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.
O Sr. António Pires de Lima (CDS/PP): — Srs. Presidentes, Sr. Ministro da Economia e Inovação e respectiva equipa de Secretários de Estado: De manhã, conseguimos, um bocado «a saca-rolhas», confesso, extrair algumas informações preciosas ao seu colega das Finanças relativamente ao plano de privatizações do próximo ano, que tem uma verba explícita no Orçamento de cerca de 1600 milhões de euros.
Apesar de o Ministro das Finanças considerar que a informação concreta relativamente a estas privatizações deve ser obliterada aos Deputados, a verdade é que conseguimos, «a saca-rolhas», repito, perceber explicitamente que entre os vários projectos de privatização calendarizados para o próximo ano — se não estão calendarizados estão explícitos neste Orçamento — estão os da GALP, da EDP, da REN e da Portucel, que, nomeadamente nesta área da energia, creio serem todos da responsabilidade do Ministério da Economia e da Inovação.
Portanto, o que de si gostaria de conseguir, Sr. Ministro, era uma concretização destas intenções e, nomeadamente, perceber que parcelas de capital prevê o Sr. Ministro alienar, no próximo ano, de cada uma destas empresas, qual é a estratégia que está subjacente a estas privatizações e qual é a receita prevista para cada uma delas, nomeadamente para a GALP, para a EDP e para a REN.
Relativamente a este plano de privatizações não tenho uma posição necessariamente negativa, bem pelo contrário. Penso, aliás, que pior não pode acontecer a estas empresas do que continuarem a ser geridas com a constante interferência dos governos e do Estado, coisa que tem acontecido de forma especialmente forte desde que este Governo tomou posse. Portanto, parece-me boa ideia que se privatizem muitas destas empresas, mas o que lhe peço, já que isto está previsto no Orçamento e não está explicitado, é que nos diga exactamente quais são as parcelas de capital e as receitas previstas, e qual é a sua ideia de calendário para cada uma destas empresas.
Quanto ao conjunto de metas macroeconómicas — a economia também trata da macroeconomia — que estão assumidas neste Orçamento, permita-me dizer-lhe que considero algumas dessas metas um bocadinho aluadas, irrealistas e que nós, porque fazemos questão de olhar o nosso Ministro da Economia e da Inovação como um homem com os pés na terra, não gostaríamos que V. Ex.ª ganhasse a fama de estar sistematicamente a viver na Lua. Por isso, precisava da sua ajuda para tentar perceber como é que o Ministério da Economia e da Inovação vê a concretização de algumas das metas que estão explicitadas no cenário macroeconómico e que dependem muito do comportamento da economia.
Percebo que para o Ministro das Finanças seja mais complicado responder a estes objectivos, mas já o Ministro da Economia e da Inovação devia dominar o modelo económico que está por trás destes objectivos.
Por exemplo, quanto às exportações, assistimos a um crescimento (pág. 40 do Relatório) de 4,5%, em 2003, e de 4,6%, em 2004. Acontece que, em 2005, nomeadamente a partir do momento em que VV. Ex.as tomaram pose, a situação alterou-se dramaticamente: tivemos um primeiro trimestre com um crescimento negativo de 0,9% (enfim, confesso que ainda é difícil atribuir esse crescimento negativo ao Governo socialista); um segundo trimestre com um crescimento negativo de 0,1%; e uma estimativa de final do ano, que não sei o que é que tem implícito em termos de terceiro e quarto trimestres, de crescimento de 1,2%.
Portanto, aquilo que gostaríamos de saber é como é que, a partir desta evolução — que não é propriamente uma evolução positiva e cujos últimos dados de curto prazo não parecem indiciar especiais optimismos —, se parte para um pressuposto fundamental no próximo Orçamento de que as exportações se vão multiplicar, em termos de taxa de crescimento, por cinco e crescer quase 6%, em média, durante o ano de 2006.
A mesma questão se aplica ao investimento. Em 2004, cresceu ridiculamente 0,6% e em 2005 a projecção que VV. Ex.as fazem é de um decréscimo de 2,1% no final do ano. Gostaria de perceber o que é que se vai passar de mágico na economia portuguesa para que, no próximo ano, este decréscimo de 2,1% (que, aliás, se
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tem vindo a acentuar de trimestre para trimestre) dê origem a um crescimento de quase 2%, que é aquilo que está no Orçamento.
Queria também dar-lhe nota de que, tanto na pág. 43 como na pág. 44, são feitos diagnósticos, seguramente honestos mas bastante terríveis para Governo socialista e para o Ministro da Economia, relativamente ao vosso desempenho naquilo que à competitividade da economia e das empresas diz respeito, porque, se a situação já não era brilhante nos anos 2003 e 2004, todos os indicadores, nomeadamente aqueles que constam da pág. 41, põem a nu a deterioração da situação ao longo do ano de 2005 e com um agravamento permanente de trimestre para trimestre.
Portanto, não se percebe muito bem, com base na evolução da situação em 2005, de onde é que advém todo este optimismo nas exportações, na recuperação do investimento, apesar de tudo na não deterioração da situação do desemprego face àquilo que tinha sido previsto há quatro meses no Programa de Estabilidade e Crescimento e na recuperação da competitividade das empresas portuguesas.
Aquilo que concluiria é, precisamente, o contrário: é que, de facto, a economia já não estava a navegar em águas especialmente calorosas no anterior governo, em 2003 e 2004, e todos nós que temos de lidar com a vida das empresas no dia-a-dia sentíamos isso, mas a situação gelou, do ponto de vista económico, desde que o Sr. Primeiro-Ministro tomou posse. Portanto, hoje em dia, não há confiança, não se sente nenhuma confiança nos agentes económicos, nem internos nem externos, não há quem invista em Portugal, não se cria riqueza e a situação de desemprego — que não mereceu, até agora, por parte de nenhum dos membros da equipa da economia, qualquer referência — tem vindo a deteriorar-se sistematicamente e está, aliás, suborçamentada no Orçamento para 2006.
Gostaria de perceber, Sr. Ministro da Economia, qual é o seu papel e que responsabilidade pessoal é que sente face à degradação da situação económica em Portugal em 2005 (que, aliás, é reconhecida no relatório) e com que pressupostos, que não conhecemos seguramente, é que parte para a definição destas metas mais ou menos aluadas e irrealistas que fazem nota aqui, no Orçamento para 2006.
Como o Sr. Ministro da Economia foi, pelo menos, um bom professor de Economia — lembro-me dos meus tempos de estudante —, valia a pena perceber se conseguimos obter algumas clarificações que não foram possíveis na reunião da manhã com o Ministro das Finanças.
Vamos supor, Sr. Ministro, que as exportações não têm um comportamento tão meritório, em 2006, como aquele que está previsto no Orçamento: em vez de crescerem 6%, crescem aquilo que cresceram em 2005, 1,2%, se se confirmar alguma tendência positiva no segundo semestre, ou crescem apenas metade daquilo que está previsto no próximo ano, ou seja, cerca de 3% — temos de trabalhar em vários cenários de contingência. Como estamos a falar de um dado que ainda por cima depende tão pouco da actuação do Governo, penso que é má gestão pública fazer depender todo o crescimento económico de um comportamento de aumento em 6% das exportações, as quais VV. Ex.as não dominam directamente.
Portanto, aquilo que gostaria de saber é: no caso de as exportações evoluírem menos positivamente do que está previsto, isto é, no caso de as exportações terem um comportamento idêntico ao que tiveram em 2005 ou ligeiramente melhor mas bastante aquém daquilo que está previsto no cenário macroeconómico, qual é o impacto, em termos de crescimento económico, na economia portuguesa no próximo ano? Ela já assim cresce timidamente 1,1%. O PIB cresce 1,1% no próximo ano. Se as exportações crescerem só 1,2% e não funcionarem como motor de arranque da nossa economia no próximo ano, gostaria de saber o que é que se vai passar ao nível da criação de riqueza e como é que V. Ex.ª prevê que possa evoluir o desemprego no próximo ano? Até onde é que irá o desemprego no próximo ano, se as exportações, em vez de crescerem 6%, crescerem só 1%, 2%, ou 3%? Penso que, seguramente, para poderem fazer estes cálculos todos com que aprimoram o relatório, VV. Ex.as devem ter alguns modelos econométricos que lhes permitam analisar estas distintas sensibilidades.
Do ponto de vista mais prático, deixe-me dizer-lhe mais duas coisas, Sr. Ministro da Economia. Tomo boa nota e registo como positivo — penso que o papel da oposição não tem de ser, necessariamente, destrutivo — todas as intenções e também alguns resultados que estão a ser conseguidos por este Governo ao nível da desburocratização. Penso que é positivo ter-se apresentado, hoje, aqui os PIN (projectos de potencial interesse nacional) com a identificação dos vários projectos que puderam ser desbloqueados devido à interferência desburocratizadora por parte do Ministério da Economia, o seu impacto em termos de investimento e também de criação de emprego.
Em todo o caso, entendo que aquilo que é apresentado aqui ao nível dos PIN são os casos especiais que mereceram uma atenção específica por parte do Ministério da Economia. Penso, no entanto, que seria importante perceber quando é que programas, como aqueles que apresentam aqui no relatório do Orçamento — por exemplo, o que se refere à formação de uma empresa na hora, não sei se é numa hora ou se é «na hora» —, que são dirigidos à generalidade dos agentes económicos em Portugal, vão, de facto, poder estar em «plena carburação».
Penso que isso é muito importante para a capacidade de gerar emprego e de gerar empreendedorismo em Portugal, visto que a burocracia é, seguramente, o maior óbice à capacidade de empreender dos portugueses.
O Sr. Ministro falou da falta de estabilidade em Portugal comparativamente ao que se passa noutros países, nomeadamente em Espanha, para, de alguma forma, justificar o mau desempenho da economia portu-
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guesa face à nossa vizinha espanhola, e tendo a concordar consigo. O que não deixa de ser curioso, no entanto, é esta tentação, que é praticamente irresistível — é uma espécie de luxúria a que submetem todos os ministros que tomam posse —, dos ministros modificarem todos os programas públicos em que podem interferir assim que tomam posse.
Realmente, ao nível do ICEP, nos últimos dois anos — e isto não é só responsabilidade sua, mas também já é responsabilidade sua —, nós, gestores, conhecemos quatro presidentes diferentes. Ao nível do IAPMEI, são constantes as mudanças de orientações e de planos relativamente à sua própria actividade.
O governo anterior constitui a API (Agência Portuguesa para o Investimento), mas, como há uma ignorância total neste relatório relativamente ao papel da API no futuro, presumo que faça parte dos planos do Ministério da Economia, pura e simplesmente, extinguir esta instituição.
Alguns programas, como o que permite potenciar as marcas portuguesas e a imagem de Portugal no estrangeiro, sofrem alterações constantes sempre que mudam as maiorias do governo. Isto é uma crítica que estou a fazer até à própria maioria que suportei no passado. Está a ver, portanto, o gesto de humildade da minha parte ao reconhecer isso.
O programa Marca Portugal, conduzido pelo ICEP, passou a programa das Marcas Portuguesas, quando a maioria mudou, agora, volta a programa Marca Portugal e, em todo este processo que foi executado em dois anos e meio, nós, gestores, conhecemos quatro diferentes responsáveis deste mesmo programa.
É impossível conseguir trabalhar em profundidade e com resultados quando a inconstância e a instabilidade ao nível das organizações públicas, que é suposto funcionarem como instrumentos de apoio às empresas, é esta de que lhe dou nota.
Tenho ainda mais duas questões, sendo que uma tem a ver com o sector energético.
O Sr. Ministro disse que o sector energético, que é um cluster muito especial que o seu ministério acarinha particularmente, está sujeito a um programa CEE que basicamente definiu, tendo em atenção as iniciais, como Concorrência e Eficiência Energética. Deixe-me que lhe diga, Sr. Ministro, que, atendendo às iniciais, provavelmente faria mais sentido que este programa se chamasse «programa de conquista das empresas espanholas do sector energético em Portugal», porque é disso, de facto, que estamos a falar do ponto de vista prático — a não ser que V. Ex.ª se explique de outra maneira.
No CDS-PP ainda não conseguimos perceber qual é, exactamente, a estratégia do Governo socialista para o sector energético: por um lado, pretende estimular a concorrência e, para isso, partiu o mercado doméstico em dois players principais, a Galp e a EDP, mas fê-lo no preciso momento em que o Mibel (Mercado Ibérico de Energia) está a ponto de se tornar uma realidade e em que as grandes empresas espanholas se estão a concentrar e a misturar valências no gás e na energia para melhor poderem concorrer no mercado ibérico e também no mercado europeu.
Portanto, não percebo qual o resultado que V. Ex.ª pretende assegurar com esta estratégia de enfraquecimento objectivo das empresas portuguesas, num preciso momento em que o mercado se abre à concorrência com empresas espanholas que se estão a fundir e a concentrar. Do meu ponto de vista, não faz sentido nenhum, mas, como sei que V. Ex.ª é uma pessoa muito inteligente, estou seguro que nos vai dar aqui uma resposta que permita, eventualmente, esclarecer algumas das nossas dúvidas.
Finalmente, queria terminar com duas pequenas notas.
Relativamente ao PIDDAC para este ano, 42% dos investimentos previstos estão concentrados na área das obras públicas, dos transportes e das comunicações e apenas 13% na área da economia e da tecnologia.
Isto dá bem uma noção da prioridade que aquilo a que chamam pomposamente o «plano tecnológico» continua a merecer por parte do Orçamento do Estado para 2006.
Quanto à política fiscal, lamento que este Governo e este Ministério, para além de algumas questões de simplificação fiscal que valorizo positivamente, não tome nenhum tipo de medidas de estímulo ou de incentivo à capacidade empreendedora em Portugal e, nomeadamente, que não corrija uma diferença que é especialmente gravosa para as empresas portuguesas que estão em processos de reestruturação, de concentração ou de fusão, face àquilo que é a realidade em Espanha.
Como sabe, em Espanha, nestes processos, as empresas podem amortizar como custo fiscal o que é considerado goodwill nestas operações, portanto, os fundos de comércio nestas operações. Em Portugal, tal continua a não ser possível neste Orçamento para 2006. É algo que os empresários reclamam há muito tempo e que, objectivamente, os coloca numa situação de desvantagem face aos empresários espanhóis e que, infelizmente, até leva muitos empresários portugueses a dirigirem este tipo de operações a partir do mercado espanhol em vez de o fazerem com empresas portuguesas. Esta é, pois, uma matéria que critico em relação a esta proposta de lei do Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado António Pires de Lima.
Temos estado a gerir o nosso deslizamento de tempo de uma forma muito regular. Tem havido uma notável uniformidade por parte de todos os intervenientes.
Tem agora a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação, para responder a este conjunto de questões.
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O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Pires de Lima, tratase de um conjunto de perguntas extremamente interessante, às quais tenho muito prazer em responder, mas vou ter de tornar a «vestir» o meu «casaco» de macroeconomista, coisa que «despi» enquanto Ministro da Economia e da Inovação, porque dedico-me mais às empresas, à criação de emprego, à competitividade e à inovação do que aos valores agregados.
Começo por abordar o investimento, que se estima que se vai contrair 2,1%, que vai crescer 1,7%.
Naturalmente, o investimento tem ciclos: quando a economia acelera, o investimento vai atrás. Como o nosso crescimento está a acelerar, é natural que o investimento vá atrás, até porque a contracção que se verifica em 2005 está muito concentrada num sector que é o da construção.
Mas há um outro factor que é o ambiente económico, isto é, os agentes económicos acreditarem ou não se vale a pena investir. Ora, temos aqui, perante nós, uma prova viva de que vale a pena investir no nosso país.
Assim, quero começar por dar os meus parabéns ao Deputado Pires de Lima pela sua acção enquanto empresário. Ao que é conhecido, está à frente de um projecto de investimento muito ousado, num sector extremamente importante, e isso mostra que os políticos, mesmo os da oposição, acreditam na economia, acreditam que vale a pena investir no nosso país. Isto é algo com que, sinceramente, me felicito. Não é preciso provar que vale a pena investir no nosso país, que existem condições e oportunidades porque o testemunho vivo está aqui, à nossa frente. Muitos parabéns por isso.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Isso é demagogia, Sr. Ministro! Mas muito obrigado.
O Orador: — Chama-se a isto «mais confiança» e confiança é algo que não se cria do dia para a noite mas que, através da estabilidade, de objectivos claros, se tenta promover.
Passo agora à questão das privatizações.
A questão das privatizações está tão clara quanto é possível, nomeadamente, está colocada muito honestamente em termos de quais as empresas que vão ser privatizadas (Galp, EDP, REN e Portucel) de entre aquelas cuja tutela não é exclusiva — permito-me fazer esta pequena precisão —, porque é conjunta do Ministério da Economia e da Inovação e do Ministério das Finanças. Estas operações estão previstas para o ano que vem.
Já aqui afirmei, e repito, que é melhor as nossas empresas, mesmo as participadas pelo Estado, estarem sujeitas à disciplina do mercado de capitais do que sujeitas a menos disciplina, pois isso obriga a respectiva gestão a sujeitar-se mais a critérios de mercado e a fazer menos asneiras. É que, normalmente, acabam por ser os contribuintes a pagar essas asneiras.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Este é, pois, um movimento no bom sentido.
A este propósito, há muitas questões que merecem um debate — e permito-me até sugerir que se faça um debate nesta sede — no sentido de saber até que ponto devem ir as privatizações, como, por exemplo, se a questão das golden shares é ou não positiva, questão que é muito polémica até a nível europeu.
Quanto a privatizações, fica dito que estão identificadas as empresas. Quanto a saber qual a percentagem exacta do capital a privatizar, é um bocado difícil antecipar porque, agora, as cotações estão a determinado nível mas não se pode garantir a que nível vão estar dentro de um ano, quando algumas destas operações terão lugar. Portanto, uma combinação entre o valor da cotação na altura da privatização e a necessidade de receita é que vai determinar exactamente a parte das empresas que irá ser privatizada.
No que diz respeito à Galp, existem condições precedentes pois estão a ter lugar negociações que posso garantir serem extremamente complexas e relativamente ao que só faço uma coisa, que é guardar silêncio, porque entendo que fazê-lo é a melhor atitude que se pode ter neste momento.
No que diz respeito à EDP, está anunciada uma operação já para este ano.
Quanto à REN, vai ter de haver uma operação prévia, que é a transferência, para a REN, dos activos de transporte de gás que, actualmente, estão na Galp e, depois, a ideia é fazer uma privatização um bocadinho standard pelos níveis internacionais. É que, dado que a REN é um monopólio natural, é conveniente que a maioria do capital seja detida pelo Estado e, por outro lado, também é conveniente que os operadores do sistema não possam deter mais do que determinada percentagem.
Portanto, não há nada como olharmos para os melhores padrões internacionais para estabelecer limites prudentes, porque não convém que os operadores maiores dominem algo que é um monopólio natural, o transporte de gás e de electricidade. Uma vez que, actualmente, a EDP tem 30% da REN, o que posso adiantar desde já é que o limite será bastante inferior a esta percentagem.
No que respeita aos PIN (projectos de potencial interesse nacional), quero dar um esclarecimento.
É que a lista de PIN que foi apresentada é uma lista exaustiva. Era bom que apenas tivessem sido listados os exemplos que mais convêm ao Ministério da Economia e da Inovação, mas, infelizmente, não é assim. De facto, no início, eram nove projectos e, agora, há mais nove. Todos gostaríamos que fossem muito mais do que 18, infelizmente, não são.
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A este propósito, permito-me retomar as palavras do Sr. Secretário de Estado do Turismo para expor a lógica dos PIN, referindo-me a uma reunião que teve lugar no Douro, no anterior fim-de-semana.
É uma prioridade tentar estimular o turismo no Douro. Ora, há uma série de projectos que, à partida, não preenchem os requisitos necessários. Então, sendo assim, vamos tentar juntar as boas vontades dos promotores dos projectos e de todas as instituições envolvidas para encontrar uma solução que seja óptima porque, repito, são projectos de grande interesse, não só para o turismo mas para o País. No entanto, trata-se de projectos que só faz sentido aprovar se respeitarem os critérios ambientais e de ordenamento do território. É que não é por um projecto x ter uma determinada componente de emprego, ou de exportação, etc., que se aprova automaticamente.
O que é bom é que estes requisitos são totalmente entendidos pelos promotores, portanto, eles próprios têm mostrado disponibilidade em ir ajustando os seus projectos iniciais por forma a que possam ser obtidas as autorizações. Logicamente, esta é uma atitude voluntarista. Idealmente, haveria um sistema que gerava logo a boa solução mas, enquanto o mesmo não existir, vamos adoptar esta política voluntarista, que exige muito trabalho mas em que todos estamos empenhados.
Relativamente às exportações, devo dizer que entre lunar e cósmico há uma grande diferença. Se, por acaso, é lunar a projecção de 5,7% para as exportações, em 2006, o que dizer do programa com o qual o PSD se candidatou às eleições em que, se não me falha a memória, a projecção era de 20%, ano após ano, durante seis anos. Então, estamos a comparar o lunar e o cósmico.
Vozes do PSD: — E os 150 000 postos de trabalho?!
O Orador: — Isso verificaremos na altura certa.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — O responsável por esse programa já foi nomeado, pelo Partido Socialista, para uma alta função no Estado!
O Orador: — Que é?…
Risos do PSD e do CDS-PP.
Como é sabido, o valor das exportações previsto para 2005 já foi revisto em baixa.
Sublinho que estou aqui, pura e simplesmente, a repetir palavras do Sr. Ministro das Finanças.
É que temos de ter em consideração que prevê-se que acelere o crescimento da economia da zona euro, que é a nossa principal fonte de exportações. Portanto, é natural que, se a economia da zona euro acelerar, aumentem as nossas exportações.
Além disso, prevê-se que o comércio mundial continue a expandir-se, porque um subproduto da globalização tem sido uma forte expansão do comércio a nível mundial, o que se explica, em grande parte, pelo substancial aumento da procura que provém de países como a China e a Índia.
Juntemos, então, a aceleração da actividade económica na zona euro à expansão do comércio a nível mundial e a uma terceira coisa, que creio que já aqui foi suficientemente falada, que é o estar-se a afectar todos os incentivos disponíveis aos projectos que têm uma forte componente de exportação. Até podia acontecer, noutras circunstâncias, que pudéssemos mexer na taxa de câmbio ou noutro instrumento mas, como não podemos, temos de funcionar com o que é possível. Ora, o que é possível é afectar mais incentivos a tudo o que tem uma forte componente de exportação e que leva ao aumento de competitividade. É natural que isso comece a produzir efeitos a prazo e, no turismo, já está a acontecer.
O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): — Qual a sensibilidade que existe em relação a isso?
O Orador: — Estou razoavelmente confiante relativamente a este valor. Não interessa a minha opinião pessoal e, em relação a certas variáveis, posso ser um pouco mais optimista do que o que está previsto, mas há um aspecto que é importante: é que mais vale pecar por prudência do que por excesso de optimismo. Este é um Orçamento de rigor, que implica contenção e, assim, só faz sentido usarmos da maior prudência com vista a não sermos acusados, à partida, de irrealismo. Não seria correcto impor medidas até mesmo ao nível de custos e, ao mesmo tempo, estar a partir de hipóteses irrealistas.
No que diz respeito à promoção dos nossos produtos e da nossa imagem no exterior, não sou partidário de mudar tudo em termos de pessoas e de programas.
As instituições do Ministério da Economia e da Inovação têm sido mais reformadas do que refundadas.
Sempre que há boas equipas, e independentemente das opções políticas das pessoas que as integram, entendo que devem continuar a exercer as suas funções. No entanto, é natural que as instituições devam adaptar-se à evolução do tempo e vou dar um exemplo muito claro.
Agora, dá-se mais importância à inovação do que nos anos anteriores, é um paradigma diferente. Agora, todos nós acreditamos muito na inovação e, no que se refere ao IAPMEI, era necessário atribuir-lhe uma valência no sentido da promoção da inovação. Assim, isso implica que tenha de haver alguma adaptação do
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IAPMEI. Por exemplo, Espanha é um mercado prioritário — todos estamos de acordo —, não é o único mercado que interessa mas é prioritário. Era necessário dar uma valência um pouco mais internacional ao IAPMEI.
Portanto, é a própria evolução dos paradigmas e da nossa situação económica que deve arrastar as instituições que devem reformar-se, mas sem drama.
No que diz respeito à promoção da imagem, sucede o mesmo. O que havia de bom do passado, desde o símbolo do turismo até alguns programas de promoção de marcas, tudo isso é mantido. E, agora, o que é necessário fazer? É conveniente trabalhar um pouco na imagem geral do País.
Há um exercício muito engraçado que se pode fazer: ao nome de certos países, como a França e a Espanha, fazem-se automaticamente uma série de associações positivas; já ao nosso país, devido ao que se tem passado nos últimos anos, não é fácil fazer uma série de associações espontâneas positivas e isso é algo que prejudica as nossas empresas. Suponhamos que havia uma empresa em dificuldades. Se Portugal fosse conhecido como um país muito progressivo, que estava a crescer depressa, essa empresa seria arrastada no bom sentido. Infelizmente, isso não está a suceder — fala-se muito de Portugal como o país dos fogos, etc.
Ora bem, qual é a ideia? É juntar aqui uma série de disciplinas transversais, que, como foi dito, vão desde o desporto, à cultura, à arquitectura e ao design, à ciência, área em que temos alguns vultos que se afirmaram no exterior, para, através de um conjunto de acções simples — porque também não são programas grandiosos que vão envolver uma série de empresas de marketing, nem meios pesados, pois, muitas vezes, a grande virtude não está aí —, conseguirmos projectar a nossa imagem global num sentido positivo.
Relativamente à API, não sucedeu nada, porque o mandato da actual administração expira, se não me engano, no dia 7 de Novembro. E não tenho por hábito — isso já sucedeu em relação a algumas empresas públicas — andar a especular sobre substituições na administração antes de elas sucederem, pois isso não seria correcto. Por exemplo, aquando da nomeação da administração da Galp, lembro-me de que, dias antes, as pessoas interrogavam-se sobre quem seria nomeado. Ora, acho que isso são coisas que só devem ser conhecidas na altura.
No que diz respeito à API, devo dizer o seguinte: foi feito um trabalho extremamente meritório e não foi fácil lançar a API. A instituição já tem valências importantes e, seguramente, vai adaptar-se às novas necessidades e às novas circunstâncias. E, como foi mencionado, seguramente a API não vai ser fechada, nem drasticamente modificada — isso posso garantir.
Relativamente à fiscalidade versus Espanha, há, de facto, essa vantagem específica. Mas é engraçado: nós vemos sempre «o copo meio vazio», já que, em termos fiscais, e relativamente à Espanha, temos vantagens em tudo, menos nisso. Posso apontar aqui 20 aspectos em que Portugal é um país com mais vantagens fiscais do que a Espanha.
Mas veja-se o seguinte: a Espanha tem crescido bem, é um país que está a modernizar-se e a tornar-se mais competitivo, apesar de ter uma fiscalidade muitíssimo mais pesada do que Portugal — e mais pesada ao nível do IRS, do IRC, do imposto sobre o património, da tributação das mais-valias. Infelizmente para Espanha, posso enunciar 10 casos em que a fiscalidade é mais pesada em Espanha do que cá.
Ora, isto mostra até que ponto é uma quimera pensarmos que baixar a nossa fiscalidade seria a solução dos nossos problemas estruturais.
Quanto ao sector da energia, é sabido que este Governo herdou uma situação que, direi, para ser modesto, muito complexa a todos os níveis. Já mencionei aqui um facto desagradável, que foi o seguinte: quando falamos de um concurso para atribuição de licenças para construção de centrais de ciclo combinado, falamos na chave da produção para os próximos anos e, nesse domínio, este Governo herdou um concurso que era ilegal, inconstitucional e nulo. Portanto, já havia muita complicação e a situação ainda se complicou mais. Por isso, numa primeira fase, estivemos a tentar resolver problemas totalmente desnecessários, que tinham sido criados, e que ainda estão a ser resolvidos. Um deles tem a ver com o seguinte: há pessoas (e isto não se aplica ao Sr. Deputado António Pires de Lima, que, além de político, é um grande empresário) que de empresários têm uma noção teórica, adoram projectos que são fantásticos no papel, mas que, depois, não são passíveis de ser levados à prática. Ora, havia uma resolução do Conselho de Ministros do governo anterior (aliás, não era uma, eram duas, porque foram subdivididas; agora, houve uma economia de meios), em que se propunha um modelo que foi «chumbado» por Bruxelas. E, tendo sido «chumbado» por Bruxelas, morreu, pelo que não vai ressuscitar-se um modelo que, pura e simplesmente, não é passível de ser levado à prática.
Mas será que não ser passível de ser levado à prática vai modificar tudo? Quero chamar a atenção, porque não há nada como números, para o facto de estarmos a falar de uma questão que envolvia juntar à EDP metade de uma empresa que opera no sector do gás. A EDP é uma empresa que, em Bolsa, vale 8500 milhões de euros (8,5 biliões de euros) e 50% da GDP vale qualquer coisa como 400 milhões de euros. Ora, ninguém vai convencer-se de que criámos aqui um problema irresolúvel a uma empresa, a EDP, pelo facto de não ser possível juntar-lhe qualquer coisa que representa 5%, ou menos de 5%, da sua capitalização bolsista — este raciocínio tem algum problema. Agora, temos é de criar condições para as nossas empresas serem cada vez mais eficientes — e isso vem da concorrência. Grave é há bem poucos anos algumas das nossas empresas valerem tanto como as empresas espanholas e agora valerem metade. Daí termos de criar condi-
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ções para essas empresas serem cada vez mais competitivas e mais viradas para o mercado externo e pensarem cada vez mais na criação de valor para o accionista.
Creio ter respondido a todas as perguntas com a concisão possível.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, este tem sido um dia sem grandes surpresas, mas com algumas desilusões. Hoje de manhã, o Sr. Ministro das Finanças manteve um conjunto de segredos; hoje à tarde, o Sr. Ministro da Economia anunciou-nos que já tem o plano tecnológico. Hoje de manhã, interrogado sobre política de rendimentos ou fundamentação da projecção macroeconómica, o Sr. Ministro das Finanças dizia «eu sei, mas não digo»; hoje à tarde, o Sr. Ministro da Economia diz-nos «eu tenho, mas não mostro» e ficamos sem saber da grande novidade que nos deu, a de que, afinal de contas, o plano tecnológico existe, mas ainda não está pronto para ser apresentado. Seria uma excelente oportunidade para apresentá-lo porque daria alguma coerência, se é que a dá, ao debate que estamos a ter sobre economia e sobre inovação, porventura sobre ciência e tecnologia, e este debate merecia ser ilustrado por essa matéria.
Já agora, a propósito do plano tecnológico, se me permite, Sr. Presidente, faço uma mera observação: não sei se a equipa do Ministério da Economia ainda vai continuar a fazer a apresentação em Power Point; caso contrário, há um ícone da Microsoft que está a saltitar no écran há duas horas e que é escusado estar a fazer publicidade.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputado, efectivamente, podemos desligar a máquina.
O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, quero colocar-lhe três questões. A primeira, de ordem mais geral, tem a ver com o seguinte: reparei que, no princípio da sua intervenção, se dedicou longamente a um tema que o Ministro das Finanças já tinha tratado, o do contexto geral das Grandes Opções apresentadas por este Governo. Aliás, na última intervenção, voltou a esse tema, insistindo em que há uma aceleração da economia portuguesa. Quero chamar-lhe a atenção, Sr. Ministro, para o facto de estar a comparar «alhos com bugalhos», pois está a comparar a presumível realidade de 2005 com a projecção para 2006. Se quer comparar projecções, então, teria de comparar a projecção para 2005 do governo anterior, que era de 1,5%, com a projecção para o próximo ano, que é de 1,1%. Se quer comparar realidades, tem de comparar a realidade de 2005 com a realidade que viermos a ter em 2006. O que não se pode comparar, sem riscos ficcionais, é a realidade da estatística do ano corrente com a projecção do Governo.
O Sr. Ministro, depois, diz-nos «há uma aceleração, e ela é até uma excepção à norma porque, ao contrário da Europa, estamos a crescer mais». Bom, Sr. Ministro, desse ponto de vista, 1,1% é desesperante, porque não só pode facilmente deslizar para a estagnação como, mesmo que viesse a ser 1,1% (e chamo-lhe a atenção para um número que o Sr. Ministro conhece muito bem), a Espanha, nos mesmos dois anos, vai crescer sempre 3% ou acima disso, e já cresceu nos anos anteriores. Portanto, mesmo que nós, nesta óptica, acelerássemos, acelerávamos para um terço do ritmo do crescimento anual da Espanha, que já é superior ao que temos tido, e, por isso, deste ponto de vista, é muito preocupante e não entusiasmante.
Concretizando, o Sr. Ministro falou-nos de vários sectores mais dinâmicos e quero concentrar-me nos dois a que deu mais destaque. Em primeiro lugar, o do turismo, em relação ao qual nos apresentou os PIN. E, de uma forma que saúdo, pois é transparente, disse-nos que havia só 18 projectos a ser considerados, dos quais 13 já o foram e cinco estão em consideração. Também de entre esses 18 projectos, cinco são no sector industrial, três dos quais, aliás, na pasta de papel, e 13 são no sector do turismo. Permitam-me, aliás, um pequeno parêntesis, sem qualquer preconceito, para dizer que as candidaturas agora em análise no projecto PIN sobre turismo têm os nomes mais assustadores que se pode imaginar: um chama-se «Dunas Vivas», outro «Hotel Vila Rica» e outro «Boquilobo Golf Resort». Creio que, pelo menos do ponto de vista da sensatez, os autores destes projectos não primam por grande prudência. Mas, enfim, veremos o que são os projectos, não querendo, para já, dizer nada sobre eles.
Quero, no entanto, Sr. Ministro, chamar a sua atenção para o seguinte aspecto: creio que precisamos (e nisso, naturalmente, estaremos de acordo) de uma boa estratégia económica no turismo, mas pensar que a economia portuguesa pode desenvolver uma capacidade de projecção a partir do turismo é continuar a insistir nos erros fundamentais que a economia portuguesa tem tido e que já produzem resultados, como a desordenação territorial do Algarve ou o que está agora a passar-se na costa alentejana, que são desgraças sociais muito difíceis de reverter.
Realmente, o que acontece é que há um paradigma do turismo, da construção civil, das auto-estradas, que é o passado e que dificilmente pode ser visto como o futuro. O turismo acrescenta divisas, mas não acrescenta competências específicas muito significativas, cria algum emprego, mas muito sazonal e, do ponto de vista da reestruturação da economia e da construção de vantagens, é nulo. Portanto, deste ponto de vista, esta indicação que o PIN nos dá é uma indicação da realidade actual da economia portuguesa, mas do seu passado e das suas dificuldades e não creio que seja do seu futuro (sobretudo para um Ministério da Economia e da Inovação).
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O segundo sector de que nos falou foi do cluster da energia. A este propósito, quero insistir, mais uma vez, num terreno acerca do qual não nos deu grandes respostas. O Sr. Ministro, falando de privatizações, falou-nos de um conceito geral, com o qual não estou de acordo. Não estou de acordo em que, como princípio geral, a regulação seja melhor do que a propriedade pública em sectores estratégicos, economicamente. Muito em particular, não estou de acordo que a regulação seja melhor do que a propriedade pública naqueles sectores da economia onde há monopólios naturais e onde o investimento infra-estrutural de longo prazo seja decisivo.
O Sr. Ministro sabe, como eu sei, que a lógica da resposta dos conselhos de administração às assembleias de accionistas é a da apresentação de dividendos anuais e não a de planos estratégicos de investimento. É por isso mesmo que, em sectores como os das utilidades, em Inglaterra, por exemplo – para dar o exemplo que começou mais cedo –, estas privatizações tornaram-se um desastre económico e até, por vezes, um desastre ambiental ou no sector dos transportes.
Portanto, não estamos de acordo nesta matéria. Digo isto porque não queria deixar a impressão de que há uma espécie de «consenso privatizador» na Assembleia da República sobre as utilidades e os monopólios naturais. Não existe esse consenso, o debate existe na sua pluralidade e continuará a ser assim.
Queria ser mais concreto sobre o que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças anunciou hoje de manhã, em particular sobre o caso da Galp.
Agora o Sr. Ministro jurou manter, de Conrado, o «prudente silêncio» e – disse-nos – vai guardar silêncio.
Só que o Sr. Ministro já falou muito sobre esta questão. Na entrevista que deu ao Diário Económico, referiu que pode reduzir uma parte na Galp até 20%. Portanto, fixou já horizontes estratégicos e pode, naturalmente, referir-se a eles.
Isto é tanto mais significativo quanto faltam sete dias (seis ou oito dias) para o fim do prazo em que tem de ser concluído algum acordo com a ENI. Essa dificuldade resulta de um acordo parassocial que permitiria à ENI passar de 33,34% (que é o capital que hoje detém na Galp) para 44% – e até lhes permitiria ultrapassar os 50%! –, acordo parassocial que foi estabelecido pelo Ministro Pina Moura, que, aliás, uns anos depois, é parte integrante directa da estrutura accionista da Galp, em representação dos interesses da Iberdrola.
O facto é que estamos perante esta dificuldade gravíssima, provocada por um acordo parassocial no limite da irresponsabilidade, tal como o podemos medir na avaliação política feita algum tempo depois e, certamente, agora. Portanto, o não cumprimento das cláusulas dá um poder excessivo à ENI, que, tanto quanto leio na imprensa de referência e na imprensa internacional, permite-se impor a troca de 13% ou 18% dos seus actuais 33,34% por 50% da Gás de Portugal! Desse ponto de vista, esta negociação tem um valor estratégico em todo o sector da distribuição de energia e, naturalmente, como o Sr. Ministro já se referiu a esta matéria na imprensa, valia a pena que o fizesse no Parlamento, que é onde temos de discutir se deve haver ou não propriedade estratégica destes sectores, no gás e na distribuição de combustíveis, e qual o modelo de privatização que o Governo pretende apresentar – naturalmente, não seria aceitável que nos trouxesse algum segredo a este respeito.
Portanto, nesta matéria, penso que o Sr. Ministro deve explicitar a posição do Governo sobre o que é do domínio público e do domínio das grandes opções políticas, porque o que este Orçamento faz é discutir as grandes opções políticas para o próximo ano.
Creio que é indispensável fazê-lo, caso contrário tudo o que se diz sobre o cluster da energia torna-se um hieroglifo. Não percebemos sequer do que estamos a falar, porque vai ser privatizada uma parte da Galp e isso implica passar para a parte pública uma parte da ENI (ou toda a parte da ENI) e redistribuir essa parte de alguma forma. Como esse processo está em curso, como houve muitas negociações e muitos projectos diferentes, todos fracassados, que nos criaram uma situação de impasse terrível do ponto de vista estratégico, a única atitude responsável que hoje seria de esperar era a de uma clarificação deste ponto de vista.
É sobre esta matéria que queria ouvir as suas explicitações, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, relativamente à primeira questão que me colocou, creio que estamos no âmbito da semântica, porque o que eu disse é que era esperada uma aceleração. Não sendo vidente, não posso saber qual é o resultado do crescimento da economia portuguesa em 2006. Espera-se uma aceleração se se confirmarem estas hipóteses de base.
O que posso dizer é que o valor do crescimento do PIB, de 0,5%, no segundo trimestre, não é suficiente mas foi superior a muitas expectativas e revelou uma resistência da economia portuguesa que muitos, legitimamente, pensavam que ela não tinha. Porquê? Porque estamos a viver um período de grande ajustamento orçamental e, para além desse ajustamento orçamental, a sofrer um brutal aumento do preço do petróleo que, repito, aumentou mais de 30% desde que o Governo tomou posse.
Portanto, os dados relativos à economia internacional, acrescidos da resistência que a economia portuguesa, felizmente, tem demonstrado até agora, permite considerar como legítimo que ocorra uma aceleração.
Sr. Deputado Francisco Louçã, creio ter compreendido que referiu que Portugal era uma excepção à regra em 2006, mas não é uma excepção à regra porque o crescimento na zona euro vai aumentar. O diferencial de crescimento entre Portugal e a zona euro continua desfavorável em 0,7%, quer em 2005 quer em 2006. Ou
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seja, a zona euro também vai acelerar, mas como partimos de uma base mais baixa, vamos acabar com aquela diferença de 0,7%.
Se me pergunta se este é o valor desejável, respondo-lhe que, obviamente, não é o valor desejável. Devíamos estar a crescer mais depressa do que a média da União Europeia. Mas agora pergunto eu: enquanto economista, considera o Sr. Deputado que é provável, numa economia que tem de fazer um ajustamento orçamental deste tipo, que ela cresça mais rapidamente do que a média? Tal seria uma aberração estatística – nós sabemos isso.
O que a experiência indica é que, quando há a necessidade de fazer um ajustamento orçamental desta magnitude, normalmente uma economia ou desacelera muito ou entra em recessão. Felizmente, até ver, a economia portuguesa está a mostrar uma resistência superior à que muitos julgavam, e isso infirma o que aqui foi afirmado.
Ou seja, este é um Orçamento que tem economia lá dentro, que tem muitas preocupações; o que não tem é preocupações da economia do antigamente, do tipo «investimento público pelo investimento público». Não! Tem investimento de qualidade, políticas sectoriais, promoção da inovação, da tecnologia e dos recursos humanos, como já vimos muitos exemplos.
Sr. Deputado, o turismo é uma grande questão, mas não sou defensor – nem creio que o seja ninguém de bom senso – de um turismo que acabou por se descaracterizar, um turismo de massa. Não faz sentido para o Portugal de hoje apostar nesse tipo de turismo.
Queria recordar aqui o caso da Florida e das Ilhas Baleares. Perguntem aos habitantes da Florida se estão contentes. É claro que estão contentes! O rendimento médio, por habitante, na Florida – não sei o número exacto – é superior a 120% da média americana. E nas Baleares acontece o mesmo. Estão contentíssimos! E não há dúvida de que um núcleo importante da economia, quer da Florida quer das Baleares, é assegurado pelo turismo. Mas por que tipo de turismo? Obviamente, não é um turismo de massa; é um turismo muito residencial, muito dirigido às camadas com maiores rendimentos.
Nós temos hipótese de fazer isso no nosso país.
Contudo, muito possivelmente, não vão ser as dormidas desses turistas com altos rendimentos que nos vão proporcionar as receitas. Não! É todo um conjunto de serviços que se formam em torno não só do turismo tradicional como do turismo residencial. E porque somos capazes de o promover, há outro sector que vai prosperar e que explica grande parte do sucesso espanhol actualmente. Refiro-me ao sector imobiliário ligado ao turismo, nomeadamente aquele que é vocacionado para estrangeiros.
Creio que, actualmente, o turismo tem um peso de 12% na nossa economia e não seria de bom senso pensar que o objectivo é transformá-lo num peso de 51%. Mas se, por acaso, em meia dúzia de anos – e estou a dar um exemplo – fosse possível passar o peso do turismo de 12% para 20% (as dormidas no nosso país estão a aumentar a um nível de 6%, se não estou em erro) e se continuasse a crescer 6%, imagine só o peso que isso não tinha na taxa de crescimento da nossa economia! Falei aqui em valores totalmente fictícios, mas dado que o aumento das receitas de turismo está a ser muito mais rápido do que o crescimento do PIB, certamente era um motor importante do nosso crescimento. Se ele for montado de forma a desenvolver toda uma indústria de serviços, e não estou a falar apenas da indústria da restauração mas, sim, por exemplo, dos serviços de saúde, de todas as actividades culturais e dos transportes à volta do turismo, sobretudo este turismo bem vocacionado para clientes de mais alta gama e residenciais, pode ser uma via interessante para o nosso país.
Todavia, muito sinceramente, creio que nem eu nem ninguém no Ministério da Economia se julga o planeador central da União Soviética.
Porquê o turismo? O turismo está a ocupar um lugar tão estratégico por uma razão simples. Em primeiro lugar, porque há empresários com grande capacidade que estão a propor projectos e que, ao fazê-lo, merecem não ser travados, como nalguns casos a que assistimos, em que projectos estiveram 8, 10 e 15 anos… Creio que há um projecto importante que está travado há mais de 10 anos. Isto é inadmissível! Se os empresários querem investir, querem arriscar, querem produzir, criar emprego, valor, atenção!, porque a função do Estado aqui é, primeiro, não os travar e, segundo, proporcionar um bom enquadramento.
Pessoalmente acredito que o turismo pode ter uma importância muito grande no desenvolvimento da nossa economia.
Relativamente ao cluster da energia, há todas as questões empresariais que o Sr. Deputado Francisco Louçã referiu. São questões complexas e, na medida em que estão a decorrer negociações, gostaria de não desenvolver esse tema.
Mas há questões não empresariais.
Por exemplo, a questão do concurso para a energia eólica, a questão da central fotovoltaica que vai ser inaugurada dentro de dois dias ou, ainda, toda a parte da bioenergia, todas elas são questões independentes de saber quem é o dono da Galp ou da EDP. Sei que esta é uma matéria que legitimamente desperta uma grande curiosidade, porque tem a ver com poder económico, com quem manda nas empresas, com o saber se as nossas empresas são maiores do que as empresas do país x, y ou z – e essas são questões legítimas e importantes. Mas as questões fundamentais da política energética ultrapassam, em muito, quem é que controla a empresa x e a empresa y.
Para que este assunto não fique em palavras vagas, vou dar um exemplo concreto.
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Vão ser distribuídos dois lotes no concurso para atribuição de potência eólica. Quem são os dois candidatos? Não sei nem quero saber! Mas a opinião pública também não sabe. É indiferente que sejam da empresa x ou da empresa y; há-de ser um conjunto de operadores, de industriais, de distribuidores ou de produtores.
O que se anunciou, no dia 3 de Outubro, foram as linhas da política energética, e precisávamos disso. Por estar a ter tão bom resultado já foi lançado o concurso para a atribuição de potência eólica; em termos de energia fotovoltaica um grande, grande projecto será inaugurado daqui a dois dias; e irão ser aprovados, muito brevemente, projectos em bioenergia. E não estou aqui a falar nem da empresa x nem da empresa y, se estamos a pensar na Galp ou na EDP. São investidores! Também a questão da certificação dos edifícios que está prestes a ser aprovada e que vai dinamizar — e de que maneira — o uso de painéis solares térmicos e a sua produção no nosso país nada tem a ver com a empresa x ou com a empresa y. Repito: compreendo a curiosidade em saber quem controla a empresa x e a empresa y. Há casos que merecem ser debatidos e, uma vez resolvida esta questão, estarei totalmente disponível para, com a maior transparência, vir aqui a este local relatar tudo o que foi possível fazer. Mas reconheçamos que as questões mais importantes são as questões de política energética no sentido mais nobre do termo.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
Queria aproveitar este ensejo, depois desta sua declaração, e depois de uma conversa informal que tive com o Sr. Eng.º João Cravinho, para dizer que nos parece adequado e oportuno que façamos uma reunião conjunta, obviamente fora do contexto do debate do Orçamento, quer para debatermos o tema que aqui foi agora trazido à colação quer o tema geral das privatizações que também há pouco foi evocado. São matérias que, pela sua importância, justificam serem objecto de uma audição conjunta com a Comissão de Orçamento e Finanças e a Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional.
Sr.as e Srs. Deputados, dito isto, passamos à segunda ronda de perguntas.
Encontram-se inscritos, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, os Srs. Deputados José Soeiro e Eugénio Rosa, do Partido Comunista Português, e o Sr. Deputado Almeida Henriques, do PSD.
Praticaremos a ronda da alternância, pelo que falará primeiro o Sr. Deputado José Soeiro, depois o Sr. Deputado Almeida Henriques, e, finalmente, o Sr. Deputado Eugénio Rosa. O Sr. Ministro responderá depois, em bloco, às três questões.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar, gostaria de dizer que é um prazer ver o Sr. Ministro, depois de uma grande ausência na Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, sobretudo a abordar temas que consideramos da maior importância. Tanto assim foi que tínhamos solicitado, inclusive, uma reunião para discutir as questões da política energética. Esperemos que a sugestão agora feita possa concretizar-se brevemente, para que possamos aprofundar algumas das questões hoje aqui suscitadas.
Em primeiro lugar, gostaria de sugerir que fizesse chegar por escrito a informação dada sobre os diversos programas e as verbas que estão afectas para 2006.
Antes de me referir ao sector do turismo, gostaria de, rapidamente, colocar uma questão. O Sr. Ministro, por várias vezes, referiu-se à questão da instabilidade política como uma das causas dos problemas que temos. Ora, o problema que se levanta é se a instabilidade resulta das pessoas, isto é, se os Ministros da Economia e os Ministros das Finanças que se foram sucedendo ao longo do tempo estão na origem da instabilidade, ou se, pelo contrário, a sua saída se deve, em primeiro lugar, à instabilidade que as suas políticas geraram na sociedade portuguesa, acabando por criar a necessidade da sua saída. Creio ser nesta questão que reside o problema e, infelizmente, penso que este Orçamento do Estado também não vai criar a estabilidade necessária para o nosso país.
Em relação às privatizações, o Sr. Ministro fala sempre como se o sector privado tivesse uma varinha mágica e um condão para conseguir melhores resultados. Na verdade, o que constatamos é que as privatizações que se verificam não são em sectores que não são rentáveis e que não estão, inclusivamente, a dar lucro ao próprio Estado. Não! São os sectores rentáveis e que dão lucro que são privatizados. É que quando os outros sectores dão prejuízo — até temos experiências, e não são raras — o próprio Estado, que defende os interesses privados, nacionaliza-os ou toma conta deles para voltar a rentabilizá-los e depois privatizá-los.
Portanto, estamos perante um ciclo que é conhecido; não é nenhuma novidade. Aliás, foi aqui sublinhado pelo meu camarada Agostinho Lopes o facto de se falar em privatização de empresas que estão a contribuir — e de que maneira — para as receitas do Estado. Ora, muitas vezes, privatizadas essas empresas, as receitas reduzem-se. Desse modo, o Estado não vai buscar mais receitas; pelo contrário, perde receitas.
Gostaria ainda de colocar uma questão sobre os PIN. Como o Sr. Ministro disse, e bem, há alguns PIN que já são velhotes — com 8, 9 e até 10 e 12 anos, havendo uma questão que se me coloca com alguma preocupação. Naturalmente, queremos que o nosso país se desenvolva e estamos de acordo que é positivo haver projectos comprovadamente de interesse nacional que contribuam para aumentar riqueza e que possam contribuir para aumentar emprego, gerando, portanto, uma dinâmica nova que inverta esta tendência de recessão
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que existe no plano nacional. Mas, então, Sr. Ministro, de que resulta o atraso destes PIN que se arrastaram durante todos estes anos? Creio que não haverá nem das entidades a nível regional nem de outras entidades outra vontade que não seja a de ver as coisas andarem para a frente. No entanto, há normas, há regras, e têm sido elas que, em parte, têm levado os próprios serviços a não aprovarem algumas das questões subjacentes a este projectos de interesse nacional.
Ora, há que ter cautela com a necessidade de se criarem mecanismos que permitam o desenvolvimento, mas acautelando a salvaguarda daquilo que é essencial e estrutural para o nosso próprio desenvolvimento.
Estamos à beira — espero — de discutir a estratégia de desenvolvimento sustentado do País, os planos regionais de ordenamento e os programas nacionais das políticas de ordenamento do território. Enfim, há um conjunto de instrumentos que vão interferir directamente no planeamento e no ordenamento do nosso território.
A minha inquietação, que não é nova — aliás, já tive oportunidade de a expor numa outra reunião —, é se, na verdade, há a preocupação de conjugar esta vontade, ou voluntarismo de intervir, no sentido de desbloquear problemas com a salvaguarda de não comprometer estes instrumentos, que visam planificar e ordenar o nosso território para lhe dar coerência e sustentabilidade em termos de futuro.
Creio que esta preocupação tem de estar subjacente. E daí o envolvimento de algumas entidades nas discussões, como por exemplo as entidades do Douro. E ainda bem, porque discutir e ouvir é um bom caminho.
Depois, então, há que ter em conta o que resulta dos mecanismos criados ao longo do tempo, quer pelos governos do PS quer pelos governos do PSD, que foram criando mecanismos que criaram esta paralisia, ou normas que devem ser tidas em conta na sua apreciação.
Dos projectos que estão na mesa, sobretudo os que dizem respeito ao turismo — alguns estão lá há muitos anos —, têm tido algumas dificuldades e condicionantes.
Quanto ao turismo, gostaria de colocar uma questão. Penso que o que está dito no relatório quanto às potencialidades turísticas do nosso país corresponde à realidade. Não são potencialidades novas, são potencialidades que temos há muito, que têm estado em grande parte subaproveitadas, havendo pelo menos três questões subjacentes a esse não aproveitamento.
Sem dúvida, falta-nos uma política de promoção, sobretudo no plano externo, que incentive a vinda dos turistas. Nesse aspecto, há um problema de infra-estruturas para receber os turistas, o que é essencial para o desenvolvimento. Nesse aspecto algo foi dito e queremos acompanhá-lo com a devida atenção.
Relativamente à vinda dos turistas para o nosso País, muita gente se queixa que os custos de transporte para Portugal são muitíssimo elevados. Isto ouve-se com frequência. Agora tem-se falado muito nos voos de baixo custo — «low cost» pode ser a terminologia mais adequada, mas gosto mais do termo «baixo custo» e, seguramente, faço-me entender. Há dias, ouvi uma declaração do Sr. Secretário de Estado quanto ao peso crescente que este sector tem tido no transporte aéreo e as possibilidades de que o País dispõe de gerir melhor as infra-estruturas existentes que, com o mínimo de investimento, podem — e não vou entrar na discussão do Aeroporto da Portela nem da Ota — ajudar a descongestionar nesta fase e a facilitar também, porque, inclusivamente, algumas dessas infra-estruturas podem praticar, se houver vontade política, custos mais baixo do que aqueles que temos actualmente. Essa baixa de custos permitiria também incentivar um maior fluxo turístico para o País.
Estes três aspectos deviam estar presentes, para além do reforço da nossa realidade, quer em termos de infra-estruturas quer em termos de recursos humanos. Nós precisamos de ter recursos humanos. Aliás, falase aqui no alargamento das redes de estruturas formativas, mas não sei qual o critério subjacente a esta opção. Seguramente, haverá uma explicação lógica para a implantação das infra-estruturas que estão aqui apontadas Deixo a pergunta se, para além delas, haverá depois a preocupação da existência de pólos em determinadas zonas, que permitam potencializar, pelo menos na primeira fase, a prospecção de alunos e depois, com vista a uma formação mais avançada, a existência de escolas especificamente mais vocacionadas para o efeito. Esta é, aliás, uma questão que preocupa os agentes do sector. Ao falarmos com eles ouvimos as preocupações que têm quanto à necessidade de recursos humanos no sector, recursos esses com qualidade que permitam responder aos desafios de uma futura procura.
Também gostaria de saber se — sublinhando a importância do Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro, que já foi aqui sublinhado e que consta especificamente do relatório —, havendo outras regiões com planos de desenvolvimento turístico, porque as há, elas serão tidas em conta pelo Governo em relação a esta matéria.
Para terminar, gostaria de referir que há uma questão que não consigo perceber e que tem a ver com o Instituto de Turismo e com as respectivas verbas que estão consignadas no Orçamento do Estado. Cabendolhe um papel importante na facilidade que pode dar à promoção do turismo, a verdade é que o Instituto — e há opiniões de entidades promotoras externas, como as regiões, neste novo esquema — financia as agências.
Mas no terreno, quando é necessário implantar a nossa própria promoção, cobra-se mais do que se cobrava anteriormente. Entretanto, é um Instituto que apresenta lucros. E esta é a minha interrogação. Isto é, o Instituto dispõe de uma receita que, inclusivamente, apresenta saldos positivos de ano para ano — e não é uma receita pequena, representa umas dezenas de milhões contos, ou, se quiserem, de quase 300 000 € —, mas não faz a promoção de que necessitamos.
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Creio que há aqui qualquer coisa a fazer, até porque este não é um problema apenas deste Orçamento, já que em orçamentos anteriores, pelo menos naqueles que tive oportunidade de analisar, se verificou esta mesma situação que não consigo compreender. Peço-lhe, portanto, uma explicação — pois ela, seguramente, existe — para o facto de dispormos de uma verba que podia e devia potenciar a nossa promoção externa, contribuindo, portanto, para a afirmação da marca Portugal, e que, no entanto, neste Orçamento vai ser menor, acumulando-se um saldo que transita, não sei com que finalidade, para o futuro.
(Entretanto, assumiu a presidência o Presidente da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, Deputado João Cravinho).
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, pedia que nos limitássemos à regra geral, segundo a qual as segundas intervenções têm 5 minutos, ainda que «largos».
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.
O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, prometo que vou ser rápido e conciso, como habitualmente.
Começo por cumprimentar o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado e afirmar que, dos muitos aspectos que gostava de abordar, vou eleger apenas dois, deixando os demais para outras oportunidades, face ao adiantado da hora. No entanto, não o farei sem antes enquadrar a apreciação que fazemos deste Orçamento no que toca à dinamização da economia, que é, desde logo e forçosamente, de decepção, não só por toda a filosofia que lhe está subjacente como pelas respostas que o Sr. Ministro já nos trouxe aqui. Não encontrámos neste Orçamento a tal ideia mobilizadora para a criação de uma nova abordagem da própria economia, tanto no que é relativo ao curto prazo como no que se refere ao médio prazo. O Sr. Ministro mencionou há pouco a Agenda da Lisboa e pensamos que se perde uma excelente oportunidade de se discutir a Agenda de Lisboa com os empresários e com todas as partes interessadas, numa perspectiva de fazer o que não se fez na primeira metade da vigência desta Agenda, ou seja, a efectiva mobilização dos agentes para uma mudança do País, designadamente no seu modelo económico.
Por outro lado, tenho de falar de algumas das questões de base que, do ponto de vista da economia, estão logo à cabeça. Refiro-me, por exemplo, à eliminação dos custos de contexto, em relação à qual, tirando uma área muito específica em que penso que se está a fazer um trabalho meritório, designadamente na desformalização dos actos, pouco se vê de evolução neste Orçamento. Na área do regime da simplificação fiscal, por exemplo, nem vale a pena falar, pois é algo que não se vê. E isto para já não falar de um Orçamento que pretende estimular a competitividade mas que não contém em si medidas que estimulem essa competitividade, premiando o mérito e o esforço que as empresas têm nas suas diferentes vertentes.
É esta a decepção que, desde logo, sentimos, independentemente de concordarmos com os princípios enunciados, como já dissemos, e de considerarmos que o futuro passa, objectivamente, pela inovação e pela dinamização das exportações. Estes dois pilares são críticos, pelo que, começando por eles e olhando para a questão da inovação e do plano tecnológico — e o Sr. Ministro disse-nos hoje que a primeira versão deste plano está pronta! Aleluia!… —, temos de dizer que há questões de fundo que nos preocupam. Para nós, não é indiferente, como já afirmei aqui noutra ocasião, que a inovação seja vista na lógica da competitividade. Ora, o que verificamos é que, sendo o Ministério da Economia quem tem a coordenação do plano tecnológico e da inovação, a verdade é que as verbas estão no Ministério da Ciência e do Ensino Superior.
Por outro lado, vemos com preocupação alguns aspectos dos diferentes programas que têm sido apresentados. Que papel reserva o Governo à Agência da Inovação? Não sabemos exactamente qual é esse papel.
Ainda não ouvimos o Governo falar, por outro lado, em aspectos como os núcleos de inovação tecnológica nas empresas, projecto bem conseguido e sucedido no terreno. O Governo ainda não disse, portanto, que políticas vai seguir ao nível dos núcleos de inovação no seio das empresas. De facto, para nós, a inovação tem de obedecer à lógica da competitividade, pois, se for para fazer inovação, como o Sr. Ministro da Ciência e da Tecnologia andou a fazer durante vários anos, que não se aplica à produtividade e competitividade da economia portuguesa, é escusado estarmos a investir recursos que não têm uma desmultiplicação prática.
Por outro lado, dentro das medidas que o Sr. Ministro tem vindo a anunciar no âmbito do plano tecnológico, gostava de saber onde está, no caso do INOV-CONTACTO, o esforço de mobilização da massa cinzenta que está espalhada por esse mundo. Procura-se aqui uma filosofia de colocação de jovens lá fora e não temos nada a opor, mas gostava de saber onde está o esforço de mobilização de dezenas ou centenas de jovens de primeiro nível que estão espalhados por esse mundo — e conheço vários —, no sentido de os tentar «puxar» para Portugal, envolvendo-os em projectos. Ao nível, por exemplo, da promoção do empreendorismo, pouco se vê neste Orçamento, designadamente no que toca à mudança da mentalidade das escolas, aspecto que seria imperioso «atacar». De facto, devia criar-se uma mentalidade empreendedora para substituir esta mentalidade do «lugar ao sol» que foi grassando nos 30 anos do pós-25 de Abril.
Quanto ao INOV-JOVEM, é preocupante verificar que só um terço do orçamento para este programa é aplicado nas bolsas, ou seja, no pagamento aos estagiários, enquanto os dois terços remanescentes são gastos, eventualmente, no funcionamento e em pouco mais. Preocupa-me esta correlação.
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Por outro lado, o Sr. Ministro fez há pouco uma referência que, em vez de me tranquilizar, me preocupou.
V. Ex.ª disse que a prioridade é Espanha e que o IAPMEI arranjou aqui uma nova vocação, mas eu penso que se há estrutura que está, neste momento, perfeitamente divorciada das microempresas e das PME, é claramente o IAPMEI, que não tem neste momento força anímica, não interage com o tecido empresarial nem funciona como elemento de ligação às empresas, estimulando-as para novos desafios. Esta é, do meu ponto de vista, uma estrutura que não serve, neste momento, os objectivos da economia portuguesa. Se olharmos às diferentes vocações — e, se o Sr. Ministro tivesse vindo mais vezes à Comissão, talvez já percebêssemos isso —, não compreendemos qual é o papel do IAPMEI nem como se concerta com o do ICEP. Como é que se concerta isto tudo com o papel da Agência de Inovação? Ouvimos recentemente o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros dizer, numa entrevista, que ele próprio está a criar uma estrutura para a coordenação da diplomacia económica. Sinceramente, ficamos um pouco baralhados, sem saber muito bem o que pensar. Num momento em que era importante haver objectividade e saber quem faz o quê… Sr. Ministro, o diagnóstico está feito e estamos todos de acordo quanto a ele, mas este é um tempo de acção, de interacção e de saber quem faz o quê. Ora, neste momento, mesmo no que toca à estrutura do Ministério da Economia, fico muito preocupado, sem saber muito bem quem faz o quê, visto que me parece haver um conjunto de estruturas que se sobrepõem às outras sem um fio condutor.
Dou-lhe outro exemplo: parece-me perfeitamente errada a filosofia que está a ser seguida no NEPE (Núcleo Empresarial de Promoção Externa). As empresas portuguesas não se esgotam no modelo que ali está. Há um conjunto de associações sectoriais que deviam estar mobilizadas e deviam ser parte integrante do NEPE, do ponto de vista da definição de promoção externa e comércio externo. O Sr. Ministro apresentou como um grande feito o recente Congresso das Exportações, mas as maiores críticas vêm das associações sectoriais que não foram envolvidas na organização desse congresso, ao contrário do que anteriormente tinha sido feito, que foi essencialmente resultado de uma acção das associações empresariais e dos empresários.
Em suma, penso que se o Sr. Ministro quer mobilizar a sociedade e ser o tal elemento dinamizador da evolução da economia, há aqui muita coisa a corrigir, pois não é com esta prática e muito menos com as ideias que estão aqui contidas nesta proposta de Orçamento que se atinge esse objectivo. Penso que é necessário bastante mais do que isto para conseguirmos dar o salto que necessitamos de dar.
(Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Deputado Patinha Antão).
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, um ponto que me surpreende sempre no discurso governamental é a promessa dos 150 000 empregos, que, de facto, foi feita durante a campanha eleitoral. O PS fez essa promessa ao eleitorado durante a campanha e essa promessa desapareceu completamente do discurso do Governo. Sei que o Sr. Ministro me vai dizer que o Estado não cria emprego, que quem cria emprego são as empresas privadas, mas eu respondo-lhe que quem prometeu isso não foram as empresas privadas, mas, sim, o PS. E nem me diga agora que o PS é uma coisa e o Governo outra! Outro ponto importante é o discurso económico do Governo — e constatei-o tanto nesta reunião como na que tivemos de manhã com o Sr. Ministro das Finanças —, que pretende vender a ideia de que, reduzindo-se o défice, os problemas estruturais da nossa economia se resolverão quase por si. Por vezes, tentam envolver esta ideia com o discurso do crescimento, mas não há dúvida de que o núcleo duro do que VV. Ex.as pensam e de que a ideia que pretendem vender é a de que, efectivamente, reduzindo-se o défice, a economia, automaticamente, resolve os problemas que enfrenta. Para utilizar palavras suas, Sr. Ministro, diria que isto é uma quimera que não está provada cientificamente e que não está minimamente adaptada à realidade portuguesa.
O Sr. Ministro disse — e, pelo menos com as suas palavras, estou de acordo, já que, na prática, as coisas são diferentes — que é preciso investir, mas que o investimento tem de ser de qualidade. Esta é uma questão que já coloco há muito tempo, pois, se olharmos para a realidade portuguesa, constatamos que grande parte do investimento que se faz (mais precisamente, 53% desse investimento), mesmo em tempos de crise, é dirigido para a construção. No que toca aos empréstimos bancários, se o Sr. Ministro se der ao trabalho de ler o último Relatório de Estabilidade Financeira do Banco de Portugal, verificará que cerca de 60% dos empréstimos bancários não são orientados para o investimento produtivo. É a própria banca que admite não estar interessada no investimento em bens transaccionáveis, porque isso envolve risco. Como tal, porque esta questão do mau investimento é, a meu ver, estrutural, gostava de saber como é que o Governo pretende alterar esta situação.
Outro ponto importante é o da qualificação. Fala-se sempre em qualificação e diz-se que toda a gente a tem, mas é preciso lembrar que a qualificação não se reporta apenas aos trabalhadores, mas, também, aos empresários, ponto que é bem importante. Demos aqui dois exemplos, o da Continental e o da Autoeuropa, que, naturalmente, têm gestores diferentes da grande maioria dos gestores portugueses. Basta dizer que a maioria dos gestores portugueses, dos empresários surgidos entre 1990 e 2000, de acordo com um estudo feito pelo Ministério do Trabalho, têm, em média, oito anos de escolaridade. É esta a realidade portuguesa! É
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preciso, portanto, aumentar também a qualificação dos gestores. No ano passado, um instituto do Ministério do Trabalho fez um inquérito a 10 000 empresas portuguesas, 73% das quais confessaram abertamente que não fazem qualificação nem consideram isso necessário, apesar de existir uma lei que obriga as empresas a realizar, pelo menos, 20 horas de formação certificada para os seus trabalhadores. Perante esta realidade concreta, e considerando-se a formação como um ponto-chave para podermos sair da situação em que estamos, o que é que o Governo pretende fazer em concreto? Como é que pensa alterar, de facto, esta realidade? Espero que não seja abrindo mais programas de formação, pois temos tido dezenas de programas de formação e a situação não se tem alterado.
Outra questão liga-se já ao programa de modernização e internacionalização da economia. Este ano, não sei se o Sr. Ministro sabe, realizou-se uma reunião oficial em que se fez um ponto da situação dos fundos comunitários, o que é relevante, até porque este programa de modernização é financiado em 85% por fundos comunitários. Ora, uma conclusão que se tirou, relativamente ao que se passou até agora, foi que se tinha programado executar cerca de 14 400 milhões de euros de fundos comunitários e que, até ao fim de 2004, tinham sido utilizados apenas 10 000 milhões de euros, tendo ficado por executar e passando para os anos seguintes cerca de 4000 milhões de euros.
O programa com a execução mais baixa era precisamente aquele que está na área do seu Ministério, que tinha a ver com alteração do perfil produtivo em direcção a actividades de futuro, portanto, a modernização da economia.
Mais grave do que este atraso na execução era uma conclusão constante de um relatório, que na altura se chamava PRIME — agora o Sr. Ministro mudou o nome (às vezes pensa-se que mudando o nome muda-se o conteúdo, mas muitas vezes muda-se o nome para manter a mesma coisa) —, que dizia que cerca de 95% dos projectos apoiados eram de empresas nacionais, mas apenas 9% é que se concentravam em actividades em torno dos factores competitivos mais avançados, sofisticados e dinâmicos, explorando lógicas de diferenciação dos produtos ou de forte intensidade em I&D. Esta é que é a realidade. Continuava, pois, a aplicar-se esses fundos comunitários no reforço de um modelo que toda a gente quer: a utilização de recursos e da mãode-obra de baixo custo.
Pergunto ao Sr. Ministro como é que se vai alterar esta realidade, até porque o Sr. Secretário de Estado referiu aqui um dado que me parece importante quando disse — e essa era a realidade que foi apontada — que anda pelo país à procura de projectos e que eles não aparecem.
Ora, quando o Sr. Ministro diz que vai apertar o filtro de selecção, este tipo de problemas até se vão agravar, pelo que pergunto novamente como é que o Governo vai alterar esta situação.
São estas as perguntas que lhe deixo, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Economia e da Inovação.
O Sr. Ministro da Economia e da Inovação: — Sr. Presidente, relativamente ao facto de os Programas de Incentivos à Modernização da Economia (PIN) compatibilizarem a necessidade de eficiência económica com os requisitos que dizem respeito ao ordenamento e ao ambiente, trata-se de uma questão extremamente importante porque não se pode beneficiar o critério da eficiência em detrimento dos critérios de ordenamento de território e do ambiente, mas o inverso também seria errado.
Por isso, existem dispositivos rigorosos não só em termos de acesso à candidatura PIN como também à sua aprovação, de forma a que um dos critérios não domine o outro. Portanto, trata-se de algo que está totalmente internalizado pelo Governo, sendo disso prova o facto de responsáveis dos diferentes departamentos estarem presentes na designada Comissão PIN, pelo que peço não haja dúvidas quanto a esta questão.
Mas não é por isso que devemos «deitar água benta» relativamente ao peso da burocracia. Quando os serviços não despacham os processos não devem ser «absolvidos». E dou o exemplo de Tróia: «brada aos céus» por que é que o projecto esteve oito anos parado! É evidente que havia ajustamentos a fazer ao projecto, mas se tivesse havido melhor interacção entre os promotores e os serviços em vez de oito anos tínhamos apenas, talvez, esperado oito meses.
É evidente que o que foi relatado a propósito da experiência que se fez no Douro há 10 dias é impossível, porque, desse modo, o Ministro andaria sempre a passear pelo País e não se podia dedicar a outras coisas.
Mas é um bom exemplo do que se deve fazer: aproximar os promotores das instituições encarregues de dar parecer e respostas e não deixar um vácuo entre ambos. É que uma coisa é certa: precisamos de mais e melhor investimento, temos restrições orçamentais, não temos muitos instrumentos de política macroeconómica, pelo que temos de, de uma forma voluntarista, fazer avançar aquilo que há e que é de qualidade.
Não devemos ter vergonha alguma em assumir que é de uma forma voluntarista. O ideal era que no nosso país não houvesse burocracia e que tudo funcionasse bem. Mas como não funciona e como não vamos ficar de braços cruzados à espera que este período de ajustamento orçamental acabe, fazemos isto de uma forma voluntarista. E, felizmente, existem alguns casos com sucesso.
Mas, repito, não será — e posso dar uma garantia sobre isso — a necessidade de avançar projectos a fazer passar para segundo plano os critérios ambientais e de ordenamento do território. Até porque um empresário com visão apercebe-se de que se esses critérios não forem respeitados, então não se trata de um
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bom projecto, nomeadamente no âmbito do turismo. Como estamos a referir-nos a projectos vocacionados para clientes mais exigentes, são eles próprios que exigem critérios ambientais e de ordenamento muito exigentes.
Relativamente às perguntas feitas pelo Sr. Deputado Almeida Henriques, devo dizer que o Orçamento é o Orçamento e não é um bom local para relatar as conversas havidas, por exemplo, com associações de empresários.
O Sr. Deputado é capaz de ficar muito surpreendido se lhe disser que as medidas do plano tecnológico têm sido debatidas horas a fio e consensualizadas com os responsáveis pelas associações patronais. Mas, bem entendido, não se vai contar essa história no documento do Orçamento, pois, repito, não parece ser este o local ideal para referir estes temas.
Por exemplo, relativamente ao congresso das exportações, foram referidas as opiniões dos empresários.
Em primeiro lugar, duvido que o Sr. Deputado tenha estado presente porque as reacções foram esplêndidas.
Em segundo lugar, antes deste não houve nenhum congresso das exportações, este foi o primeiro. O último tinha tido lugar há muitos, muitos anos.
Não me parece, pois, que o Orçamento seja o bom local para se explanar a opinião dos empresários ou das empresas sobre este tema, o que aliás foi feito numa jornada excelente que ocorreu no Porto.
O Sr. Deputado diz que o IAPMEI não serve. Há uma coisa que posso garantir, é que ele não servia. Há aqui algo um pouco estranho: o Sr. Deputado diz que o IAPMEI não serve, mas o que é o anterior governo fez? Fundiu uma coisa que não serve com o ICEP e, sinceramente, não estou a ver a lógica disso.
Creio que o IAPMEI, gradualmente, porque não acredito em revoluções, está a afinar a sua vocação e a aproximar-se dos seus clientes naturais que são as empresas.
Passo agora a referir-me a uma questão que foi colocada e que me parece ser extremamente pertinente, que é a da avaliação feita da utilização do PRIME, apontando para diversas deficiências, as quais devem ser assumidas e que justificam exactamente a necessidade de reorientar o PRIME.
Esse programa foi «crismado», passando a chamar-se Novo PRIME, mas, como aqui já foi dito, não se tratou de uma questão de mudança de nome, foram exactamente os resultados da avaliação que foi feita que forçaram ou que aconselharam a sua reformulação.
Quanto ao plano tecnológico, as suas diferentes medidas têm sido consensualizadas não só com empresários mas também com associações empresariais e com os diversos actores da inovação.
O Governo tomou posse há sete meses, a Unidade de Coordenação do Plano Tecnológico tomou posse há seis meses menos um dia, pelo que os prazos são totalmente aceitáveis. De qualquer forma, o Sr. Deputado Almeida Henriques referiu algo importante. É que seria um erro se as medidas do plano tecnológico não tivessem sido consensualizadas com os actores, porque se não seria algo artificialmente imposto. Posso descansar o Sr. Deputado a este propósito, já que, de facto, as medidas foram consensualizadas com os principais intervenientes.
Há uma questão que me parece muito importante, mas creio que, honestamente, está a confundir-se o objecto de crítica que possivelmente devia ser outro. Dizer a um Governo, que põe à frente das prioridades o crescimento e o plano tecnológico, que acredita que basta resolver os problemas de finanças públicas para todos os problemas estruturais estarem resolvidos… Sei que o Sr. Deputado não acredita que o Governo pense assim e sabe quem é que poderia partilhar da ideia de que o défice orçamental resolveria por milagre todos os problemas estruturais e aumentaria a capacidade de crescimento da nossa economia. Seguramente, não é nem o Ministro da Economia nem este Governo que pensam assim.
Relativamente à qualidade do investimento, que é uma questão muito importante, será que temos aqui alguma «varinha mágica» para de repente a melhorar? Nós temos essa «varinha mágica». Repito, nós temos essa «varinha mágica». Qual é ela? É estabelecer incentivos correctos.
O sistema de incentivos é que determina, no fim do dia, para onde se dirige o investimento. Mas é uma «varinha mágica» para ajudar grandes movimentos. Permita-me que seja mais claro: relativamente a todos os investimentos nos sectores da energia (um sector que foi aqui muito falado) e do turismo, por que é que o investimento está a dirigir-se para estes e não para outros sectores? Porque, possivelmente, no turismo de forma espontânea, e no cluster da energia, resultante das políticas sectoriais, estão a ser dados bons incentivos para o investimento se canalizar para os bons sectores.
É evidente que não conseguimos fazer isto com «regra e esquadro» para todos os sectores, mas devemos apontar no sentido de as políticas sectoriais transmitirem os incentivos correctos de forma a que menos investimento com melhor qualidades dê melhores resultados do que mais investimento.
Relativamente às qualificações, recordo que se trata de uma área em que se tem de investir imenso, sendo uma prioridade. Não é por acaso que foram anunciados projectos a vários níveis — e serão anunciados mais —, mas um deles é extremamente importante, porque é a última oportunidade de muitos portugueses adultos, sem qualificações, reintegrarem o mercado de trabalho ao nível da qualificação muito superior. E se esta experiência correr bem é algo fantástico para o nosso país.
Nos projectos que aqui foram referidos, como os da Continental e da Autoeuropa, grande parte das equipas de gestão são constituídas por portugueses, o que prova que os portugueses, quer os trabalhadores, quer os gestores, bem enquadrados, bem organizados e bem motivados, podem ter resultados de classe verdadeiramente mundial.
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O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro da Economia e da Inovação. Com esta intervenção, estamos praticamente no final dos nossos trabalhos.
Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.
O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, é só para fazer uma curta interpelação.
Não vou querer que o Sr. Ministro me responda a mais questões do que aquelas que lhe coloquei, mas, pelo menos, gostaria de saber o que vai fazer à Agência de Inovação e qual é o futuro dos Núcleos de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico no Sector Empresarial (NITEC).
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e da Inovação.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e da Inovação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, quer mudá-la? Sabe o que é que se passa lá? Sabe o que lá se passou recentemente? No fundo, qual é a sua curiosidade? É que as perguntas têm de ter um fundamento para podermos responder.
Mas vou responder-lhe. Como sabe, a Agência de Inovação tem uma estrutura accionista composta por dois accionistas em pé de igualdade, ou seja, accionistas do lado da economia e do lado da ciência e tecnologia. É verdade que a Agência de Inovação tem sido, na sua tradição, impropriamente dominada, no quotidiano, pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, que integra hoje, também, o ensino superior.
Se olhar para a composição do actual conselho, que releva da anterior assembleia geral, verifica que é uma instituição que tem uma composição, ao nível do conselho, mais orientada para a problemática da economia, uma vez que temos lá dois administradores em três. Isto significa duas coisas: que a Agência de Inovação está muito orientada para as questões das empresas, e, portanto, reforça o papel da Agência no front office com as empresas.
Quanto ao programa de que fala, é um bom programa, não foi descapitalizado no seu orçamento, está a fazer o seu caminho e, como boa ideia que é, porventura, será acolhida no enquadramento do próximo Quadro Comunitário de Apoio.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, a todos, em particular à equipa governamental.
Srs. Deputados, amanhã retomamos os nossos trabalhos com a audição do Sr. Ministro da Saúde.
Está encerrada a reunião.
Eram 21 horas e 10 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.