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Sexta-feira, 28 de Outubro de 2005 II Série-C — OE — Número 4

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 27 de Outubro de 2005

SUMÁRIO No âmbito da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 40/X — Orçamento do Estado para 2006 —, as equipas governamentais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Ministério da Educação apresentaram à Comissão os respectivos orçamentos, tendo ainda prestado esclarecimentos sobre os mesmos aos Srs. Deputados.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.

Eram 14 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início a esta audição do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, sobre a proposta de orçamento para 2006 relativa a este Ministério, que vai ser realizada em conjunto pelas Comissões de Orçamento e Finanças e Educação, Ciência e Cultura.
Esta audição decorrerá segundo os procedimentos habituais. Portanto, o primeiro orador será o Sr. Ministro, que fará a apresentação do orçamento para o seu Ministério, após o que iniciaremos o debate com as intervenções de um representante de cada um dos partidos, a quem peço desde já que não excedam 10 minutos para melhor gestão dos tempos, seguindo-se a resposta do Sr. Ministro a cada um dos Srs. Deputados, individualmente. Depois, haverá lugar a uma segunda ronda, com inscrição livre das Sr.as e Srs. Deputados, cujas questões serão respondidas em conjunto, no final.
Posto isto, tem, então, a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Espero que tenham recebido um documento de apoio a esta apresentação, o qual enviei ontem para o Parlamento para ser distribuído a todos os grupos parlamentares. Se houver quem não disponha desse documento, temos connosco cópias que poderemos entregar, porque simplifica a discussão.
Tentarei ser tão sucinto quanto possível nesta apresentação, após o que o Sr. Secretário de Estado e eu próprio ficaremos à vossa disposição para responder a todas as questões que queiram colocar.
Vou começar por sublinhar o que considero serem as questões centrais deste orçamento no que se refere aos sectores de ciência e tecnologia, sociedade da informação e ensino superior, que são os tutelados por este Ministério.
Entendemos poder provar que esta proposta de orçamento cumpre os objectivos expressos no Programa do Governo e visa contribuir para a sua concretização, designadamente no âmbito do plano de desenvolvimento científico e tecnológico do País.
Vejamos, pois, quais são as linhas fundamentais deste orçamento.
Este é um orçamento de crescimento num contexto especialmente exigente de consolidação orçamental.
Portanto, revela e sublinha uma prioridade política do Governo; consagra uma maior prioridade ao desenvolvimento da ciência e tecnologia que retoma um ritmo de crescimento orçamental acima de 15%; reforça o investimento nos programas criados no âmbito do Programa Operacional Sociedade da Informação, cuja dotação cresce acima de 6%; consolida o funcionamento do ensino superior e da acção social escolar do ensino superior, apesar da redução do número de alunos que, por razões diversas, designadamente demográficas, se verifica em Portugal e ainda se verificará durante os anos seguintes, no que diz respeito aos alunos jovens; exerce contenção em novas obras no âmbito do ensino superior, consagrando montantes do Orçamento do Estado para obras em curso e para equipamento ou para necessidades inadiáveis, reservando, contudo, de forma competitiva e após avaliação, financiamento para outros empreendimentos que sejam mais necessários.
Seguidamente, detalha-se esta apresentação em três capítulos — Ciência e Tecnologia, Sociedade da Informação e Ensino Superior —, chamando a atenção para a relação entre o orçamento e os objectivos.
No que diz respeito a ciência e tecnologia, deve ficar claro que retomamos a normalidade das relações científicas e tecnológicas internacionais. Portanto, não se passa o que se passou na vigência de anteriores orçamentos, isto é, a não orçamentação das quotas de Portugal para os organismos científicos e tecnológicos internacionais. Assim, o que já tinha sido resolvido através do Orçamento rectificativo, fica consagrado, como é normal, neste orçamento para 2006.
Devolve-se a prioridade estratégica e orçamental à promoção da cultura científica e tecnológica cuja linha orçamental representa cerca de 5% do orçamento de investimento em ciência e tecnologia, de acordo com a prática que, durante vários anos, se seguiu em Portugal e que, hoje, é seguida em vários outros países do mundo.
A formação avançada de recursos humanos representa mais de um quarto de todo o investimento em ciência e tecnologia. Portanto, há aqui uma aposta e uma resposta a gerações novas que procuram a formação avançada em ciência e tecnologia e às instituições científicas que têm capacidade de fornecer essa formação avançada.
Para lá dos mecanismos normais de reforço das condições de avaliação internacional, da renovação de equipamentos científicos, é lançado um programa novo de criação de redes temáticas de investigação e desenvolvimento, no País.
É reforçada a capacidade de co-financiamento de projectos de investigação científica e de inovação em todos os domínios científicos mas, em paralelo, é lançada uma nova linha de programas e projectos de investigação orientados para políticas públicas, designadamente em colaboração com outros ministérios ou com entidades privadas.

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No que respeita ao sector da sociedade da informação, e no quadro da iniciativa Ligar Portugal, já conhecida e aqui também já apresentada, é reforçado o investimento em banda larga na rede que hoje liga as escolas, os estabelecimentos de ensino superior, os estabelecimentos de investigação e outras instituições de natureza cultural e científica sem fins lucrativos.
Investe-se na duplicação dos espaços Internet, em Portugal. Este projecto de instalação de espaços Internet tem vindo a continuar e investe-se na sua duplicação dado o enorme sucesso, até porque se entende que, tal como já acontece em muitas das regiões do País, tais espaços podem vir a funcionar como verdadeiros centros comunitários.
Naturalmente, prossegue-se e reforça-se a prioridade dada ao uso de tecnologias e sistemas de informação na modernização administrativa, na Administração Pública, nas compras electrónicas, etc.
Será feito um esforço especial no domínio de formação e certificação em tecnologias de informação e comunicação, em Portugal. Aliás, mais adiante, poderemos discutir este assunto com maior detalhe.
Gostaria de chamar a atenção para o que está consagrado no articulado da proposta de Orçamento, isto é, a prioridade, expressa já na iniciativa Ligar Portugal, que aqui encontra consagração legislativa, de apoio fiscal à aquisição de computadores por parte de estudantes de qualquer grau de ensino.
No que respeita ao ensino superior, gostava de chamar a atenção para aspectos que podem ser menos evidentes pela leitura do orçamento, o primeiro dos quais é a transparência na atribuição das verbas a cada uma das instituições de ensino superior.
Nesta área do ensino superior, como sabem, o que a legislação consagra é a distribuição do montante de financiamento para o ensino superior através de uma fórmula objectiva, cujos critérios podem ser discutidos mas que envolve uma distribuição transparente de verbas entre os diferentes estabelecimentos de ensino superior públicos, sejam politécnicos ou universitários. Essa distribuição de verbas foi decidida após negociação e está publicada. Ora, a distribuição que encontram inscrita no orçamento é exactamente a que é consagrada pela fórmula de financiamento que, para lá dos tradicionais parâmetros objectivos — custos, número de alunos, etc. —, envolve, pela primeira vez, a qualificação do corpo docente, como um dos parâmetros, e a eficiência na graduação dos estudantes, como outro dos parâmetros.
Ainda em matéria de critérios objectivos, devo dizer que, pela primeira vez, fez-se um trabalho de procurar privilegiar os apoios directos aos estudantes no quadro da acção social, introduzindo uma distribuição por instituições, com base em critérios objectivos.
Este trabalho apenas se iniciou este ano, na medida em que, como é patente, o facto de, até hoje, a distribuição de verbas pelos serviços de acção social ter em vista, essencialmente, o respectivo orçamento histórico e não os critérios objectivos, variados e discutíveis mas que têm de ser apurados, relativamente a cada um dos serviços e à resposta às necessidades que cada um visa satisfazer, faz com que, face a critérios objectivos que foram utilizados pela primeira vez, a distribuição de verbas resultaria em divergências muito grandes, muito acentuadas.
Por isso, neste primeiro ano experimental, foi preciso introduzir elementos de moderação na aplicação desta fórmula que denota uma tendência para fazer com que haja maior equidade nos serviços de acção social do ensino superior e não haja grupos de estudantes que, com as mesmas necessidades, tenham, per capita, menos apoio do que outros. Este é, então, um trabalho que foi iniciado este ano e que já tem reflexos, embora limitados, no orçamento para 2006.
Por outro lado, chamo a atenção para o facto de este orçamento consagrar as verbas necessárias para a avaliação internacional do ensino superior, que já anunciámos e já tivemos ocasião de discutir nesta Casa, o que vai iniciar-se ainda este ano.
Por outro lado, ainda, promover-se-á um programa de combate ao insucesso e ao abandono escolares, verificado especialmente nos primeiros anos do ensino superior.
Este programa parece-nos essencial. Não é apenas um programa de estudo das causa do abandono e do insucesso, mas é, desde já, um apoio às instituições e aos serviços para o combate efectivo ao insucesso escolar, sobretudo onde é mais grave no ensino superior.
Há outros aspectos deste orçamento que, provavelmente, será melhor serem abordados durante o debate que vai seguir-se, como, por exemplo, o pedido de autorização legislativa que é feito à Assembleia da República no sentido de regular a garantia prestada pelo Estado em empréstimos a estudantes, ou seja, situações em que o Estado surge como garante de tais empréstimos.
Naturalmente, gostaríamos de explicar melhor e discutir quais são as intenções do Governo nesta matéria e estamos à disposição das Sr.as e dos Srs. Deputados para responder a qualquer pergunta que nos queiram fazer sobre esta ou outras matérias.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Ministro, agradeço-lhe desde já as informações adicionais que nos trouxe relativamente ao orçamento para o Ministério da Ciência Tecnologia e Ensino Superior.
Antes de dar a palavra ao primeiro Deputado que vai intervir, gostava de deixar registado que, entretanto, juntou-se-nos, na mesa, o Sr. Vice-Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, Deputado Sérgio Vieira.
Como habitualmente, julgo que o PS cede a palavra para a primeira intervenção ao Deputado do maior partido da oposição.

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Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Gostaria de iniciar esta minha intervenção dizendo que também nunca assisti a qualquer fenómeno de levitação física.
Porém, o Sr. Ministro, com a sua intervenção, conseguiu pôr-nos um pouco a levitar espiritualmente, ao apresentar um cenário idílico do orçamento para esta área, o qual, infelizmente, não posso subscrever em alguns eixos fundamentais.
Digo-o, porque o Sr. Ministro começou por referir que este orçamento de crescimento é um sintoma da prioridade política que o Governo atribui a esta área. De facto, temos vindo a assistir, desde a campanha eleitoral, pela voz do actual Primeiro-Ministro, Eng.º José Sócrates, a um permanente anúncio de uma prioridade política associada a todas estas matérias de índole tecnológica (digamos assim, para facilitar, julgo que todos percebemos do que estamos a falar) — no início, era um «choque», depois, passou a «plano» e, agora, essa expressão vai morrendo aos poucos.
De facto, reparei que o Sr. Ministro não deixou uma palavra sobre o plano tecnológico, sendo que, por aquilo que vamos assistindo em relação à orgânica interna do Governo que nos deixa algumas dúvidas, aparentemente o Sr. Ministro é o actual responsável (eventualmente, por outros não terem conseguido dar o devido empurrão) por este plano tecnológico — pelo menos, é o que as notícias que têm vindo a público nos vão mostrando.
Efectivamente, não houve qualquer palavra a esse respeito, e compreendo que não tenha havido. Digo-o, porque se olharmos, por exemplo, para a matéria da sociedade da informação…

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não, não!

O Orador: — Não é verdade?! Então, é um deslize da comunicação social…

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Agora, é um lapso seu! Falei em Plano de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Desculpe, não gosto de interromper, mas se ler o texto que distribuí, diz-se aí «(…) e visa contribuir para a sua concretização, designadamente no âmbito do Plano de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do País (Plano Tecnológico)». Está cá escrito!

O Orador: — Então, foi só o Sr. Ministro que se esqueceu de o referir, está aí. No entanto, apesar de estar no texto, não vemos qualquer concretização prática. E vou dar-lhe um exemplo muito concreto: o orçamento para a sociedade da informação. Todos nós percebemos que este plano tecnológico passa pela sociedade da informação, por razões óbvias, julgo. E acho que se olharmos, com a seriedade intelectual que evidentemente reconheço ao Sr. Ministro e a todos os presentes, para aquilo que é o orçamento da sociedade da informação — e não especificamente para aquilo que está alocado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, porque isso é redutor, mas, por exemplo, para os programas horizontais, concretamente para o P001, dedicado à sociedade da informação e governo electrónico —, percebemos que, ao contrário daquilo que tem vindo a ser afirmado, há manifestamente um decréscimo.
De facto, a dotação proposta é de 269 milhões de euros contra 387 milhões de euros no orçamento para 2005, pelo que há uma redução de 118 milhões de euros no investimento numa área que julgo fulcral para o futuro do nosso país, a que todos atribuímos enorme importância e que, na boca do Sr. Primeiro-Ministro tem vindo a ser a grande bandeira deste Governo. Portanto, julgo que isto prova bem aquilo que, na nossa óptica, é uma falácia, aquilo que é um plano não tecnológico mas virtual, e só a esse respeito é tecnológico, como sendo uma prioridade política do Governo. Na realidade, isso não se verifica.
Ao mesmo tempo, convirá o Sr. Ministro deixar bem claro o seguinte: o Sr. Ministro não o afirmou, e bem (aliás, não esperaria de si uma outra atitude), mas o facto é que tem vindo a ser permanentemente noticiado, com origem em alguma fonte, e não foi desmentido, que haveria um acréscimo de 300% na Unidade de Missão Inovação e Conhecimento (UMIC) — Agência para a Sociedade do Conhecimento. Ora, o Sr. Ministro sabe, como eu, que isso não é real, aliás, não é intelectualmente sério dizê-lo.
O que se verifica é que, agora, há uma alocação, digamos, do Plano Operacional para a Sociedade do Conhecimento à UMIC, que, noutros orçamentos, estava alocado noutras rubricas, o que, portanto, faz com que haja este aumento aparente, porque, na realidade, há um decréscimo significativo também na UMIC, nomeadamente na componente de orçamento do Estado, de fundos nacionais, digamos. Há um decréscimo objectivo e ele é muito significativo.
Nesse sentido, acho que, compreendendo as dificuldades que o País vive, compreendendo que todos temos de fazer um esforço de contenção, seria mais interessante que o Governo reconhecesse que, também aqui, não pode, afinal, dar concretização àquilo que, supostamente e nos discursos, é uma prioridade. A realidade é que, quando vamos analisar os números, tal não está a verificar-se no concreto. Portanto, aquilo que é a grande bandeira do Governo no Plano Tecnológico não tem, a nosso ver, de modo algum, concretização neste orçamento.

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Para tentar cumprir o tempo de intervenção inicial de 10 minutos, sem prejuízo de, depois, avançar com mais algum pormenor noutras matérias, quero fazer uma referência à matéria do ensino superior, para dizer, em primeiro lugar, que subscrevemos aquilo que são as intenções do Governo no que diz respeito ao combate ao insucesso e ao abandono escolares, nomeadamente nos primeiros anos do ensino superior. Todos sabemos que as taxas de insucesso e de abandono são elevadíssimas no ensino superior, pelo que tudo o que surja poderá contar com o nosso contributo positivo. Agora, também compreenderá, Sr. Ministro, que o mero anúncio de um programa de combate é, para nós, extraordinariamente vago, nada significando enquanto não tiver mais alguma concretização.
Porém, subscrevemos, tal como, penso, todos os presentes, o princípio em si.
No que diz respeito à avaliação internacional das instituições, ainda bem — já o afirmámos no passado e voltamos a fazê-lo — que essa é uma opção do Governo e que vai avançar. O Sr. Ministro disse-nos, primeiramente, que teria início em Setembro, o que não aconteceu, mas isso ocorrerá até ao final do ano, o que, a meu ver, não é dramático, importa é que isto avance. Portanto, quero também subscrever esta posição.
Quanto ao sistema de empréstimo aos alunos, que, agora, através de uma autorização legislativa, poderá ter concretização, trata-se de uma medida que, como sabe, também subscrevemos.
Contudo, no que diz respeito ao orçamento para esta área, todos nós sabemos e é conhecido desde há largos anos — aliás, durante muitos anos, o Sr. Ministro afirmou-o, repetida e publicamente — que há um problema de suborçamentação das instituições do ensino superior no nosso país. E o que verificamos é que há um decréscimo real em relação ao financiamento das instituições do ensino superior. Assim sendo, julgo que vamos ter problemas, nomeadamente quando surgirem cativações, situações que, tendo infelizmente já alguma tradição no nosso país, vão colocar seriíssimos problemas a uma área de formação dos nossos recursos humanos que todos apelidamos de fundamental.
Isto para não dizer que nos faz alguma confusão que a fórmula encontrada para financiamento das instituições seja penalizadora para as mais eficientes. Com isto, não digo que não devamos ter todos uma particular preocupação com instituições que vivem dificuldades e que, portanto, merecem toda a atenção. Contudo, a redistribuição do financiamento, do «bolo» global, pelas instituições, sendo feita à custa de instituições que apresentam índices de, direi para facilitar, competitividade que são reais, pode também causar problemas à qualidade do ensino. Por isso, julgo que essa deve ser uma opção.
Independentemente de todos querermos que haja uma rede de instituições de ensino superior bastante abrangente no nosso país e que, por essa via, consigamos também o desenvolvimento e o equilíbrio regionais que o nosso país merece, julgo que isso não pode ser feito à custa da qualidade das melhores instituições de ensino superior.
Acho que já excedi o tempo, pelo que, nesta primeira ronda, ficarei por aqui, sem prejuízo de haver outras matérias que mereceriam a minha abordagem. Não quero, no entanto, monopolizar o debate.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Deputado, pelo seu poder de síntese.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, agradeço-lhe as suas afirmações, que, em primeiro lugar, denotam que há — e espero que haja em toda a Câmara — um acordo em que o desenvolvimento científico e tecnológico do País é, de facto, uma prioridade nacional.
Insisto nesta matéria porque, nos vaivéns das políticas ao longo dos sucessivos governos nesta matéria, se alguma diferença houve entre aquilo que se passou nos últimos 30 anos em Portugal e aquilo que se passou noutros países, que conseguiram mais rapidamente do que nós, partindo de níveis igualmente baixos de desenvolvimento científico e tecnológico, chegar a níveis mais altos, essa diferença é ter havido, em Portugal, períodos de paragem e períodos de recuos. Esse é o grande problema.
Por isso, considero como um valor de primeiríssima importância nesta matéria um consenso social e político, em Portugal, para o desenvolvimento científico. Se não houver esse consenso, o subdesenvolvimento científico leva sempre a melhor. É que todos sabemos o grau de persistência e de investimento constante que é necessário para que um país supere o subdesenvolvimento científico, designadamente em competição por recursos humanos e por capacidades instaladas contra os seu principais concorrentes.
Agora, não posso obviamente estar de acordo com o Sr. Deputado quando procura menorizar, depois de ter afirmado a prioridade que também atribui a esse desenvolvimento, o esforço que é feito neste orçamento nessa matéria. Com toda a franqueza, parece-me que é mais uma força de expressão do que um sentimento real, pois, olhando para o aumento das percentagens destes objectivos no Orçamento do Estado, verificará que há aqui uma prioridade real.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Não, não!

O Orador: — Quer dizer, o sector aqui em consideração não segue a tendência do resto do Orçamento.
Designadamente nas áreas da sociedade da informação e da ciência e tecnologia, há um crescimento extraordinariamente significativo, em particular na ciência e tecnologia, com o qual, julgo, o Sr. Deputado concordará.

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O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Mas a sociedade da informação está a descer!

O Orador: — O Sr. Deputado dirá que há um programa para a sociedade da informação que parece estar a descer. Mas o Sr. Deputado verificou o que tinha sido transferido para os programas da Administração Pública? Verificou o que estava executado ou em vias de executar? O Sr. Deputado sabe que grande parte dos fundos estruturais no programa da sociedade de informação estão por executar? Sabe que grande parte deles não estavam sequer comprometidos? Posso inscrever todos os fundos estruturais que quiser e, depois, não os executar, mas é evidente que é preciso gastá-los, porque o Quadro Comunitário de Apoio termina no final de 2006.
Assim, o que posso garantir-lhe é que — e posso dar-lhe os números detalhados que entender, ficando à sua disposição para esses detalhes — este orçamento para a sociedade da informação é, de facto, um orçamento de crescimento relativamente ao que está em curso, é, de facto, um acréscimo relativamente ao que estava em curso.
Agora, não me culpe por afirmações que nunca fiz e que desmenti junto da imprensa, pois são absurdas, de dizer que há acréscimos de 300% na UMIC. A UMIC não existia no Orçamento do Estado para 2005, enquanto instituto público, pelo que essa comparação carece de sentido. E tive ocasião de explicá-lo repetidamente junto da imprensa. Trata-se de uma conta feita sobre esta matéria que tem um efeito meramente formal, não correspondendo à realidade das coisas.
O Sr. Deputado disse algo que me deixou surpreendido, ao referir, repetindo afirmações que vieram a lume na imprensa, que a distribuição de verbas para o ensino superior penaliza as instituições com maior eficiência.
Sr. Deputado, não penaliza, faz exactamente o contrário! As instituições com maior eficiência – eficiência de graduação, eficiência na qualificação de recursos humanos – têm, precisamente, mais orçamento, mais parte do orçamento.
Sr. Deputado, entenda o que isto quer dizer em termos práticos: há um plafond, um montante global de funcionamento que é atribuído pelo Estado ao ensino superior público. Do que estamos a falar é de uma fórmula distributiva desse financiamento.
Essa fórmula distributiva aplica-se ao orçamento previsto (que, como lhe disse, aumenta relativamente ao ano anterior), dando ganhos que são resultado da eficiência, da qualificação e, obviamente, também do número de alunos, e descidas que são resultado da falta de qualificação, da falta de eficiência ou da redução do número de alunos, que é um parâmetro muito importante.
Foi tomada a decisão política (decisão política que o Sr. Deputado também tomaria) de dizer que, de um ano para o outro, é necessário limitar as descidas que se admitem de transferências do Orçamento do Estado para uma instituição. Ou seja, não é possível admitir que uma determinada instituição desça mais do que x por cento!

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Mas quem é que paga isso? São as outras instituições?

O Orador: — Como é evidente! Mas, Sr. Deputado, não se trata de «pagar». A matemática mostra que esta é uma fórmula que torna claro para os Srs. Deputados do que estamos a falar. Posso apresentar-lhe uma fórmula de financiamento que não seja linear e que dê exactamente o mesmo resultado! Simplesmente lhe digo que se aplicar factores estritamente lineares nos dois casos, nuns casos descia 10% e noutros casos, em vez de subir 3% ou 4%, subia 7%. Pois, com certeza! Isto não vai ser feito num único ano, mas é aplicado, e aplicado com total transparência. O que significa que a instituição que desce 3% este ano tem um ano para se adaptar e evitar continuar a descer no próximo ano; se continuar a descer, tem de adaptar a sua estrutura de pessoal, de custos, etc.
Pode recomendar-se outra política diferente? Não se pode recomendar outra política diferente! Claro que posso inventar outro critério, dizendo algo do género: da totalidade das verbas para o ensino superior, dedicamos 10% a um fundo de reorganização e distribuímos o resto linearmente, segundo as fórmulas. Os 10% servem exclusivamente para permitir um período de reorganização das instituições cuja dimensão vai ser reduzida. Ora, o resultado é exactamente o mesmo, mas parece-me mais claro o processo que seguimos.
Em qualquer dos casos, gostava de deixar assente um ponto, e esse ponto é o da transparência deste processo.
Se entendem que estes critérios não são os que devem ser utilizados na distribuição das verbas públicas, estamos prontos a ouvir outras alternativas; se entendem que o peso destes critérios não é o que deve ser utilizado, estamos prontos a ouvir outras alternativas. Pelo menos, em cima da mesa estão as opções políticas sobre esta matéria.
Estas opções políticas obrigam a exigências particulares, sobretudo da parte de instituições com menores qualificações do pessoal docente, com maior ineficiência e com menor número de alunos, ou seja, com maior quebra do número de alunos, e obrigam a uma reorganização.

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É uma fatalidade? Não é uma fatalidade. Volto a insistir que não me parece que se deva aceitar como uma fatalidade a redução do número de alunos jovens à entrada do ensino superior. Aquilo em que apostamos, e procuramos transmitir às instituições de ensino superior esse objectivo nacional, é que as instituições do ensino superior que, neste momento, têm uma oportunidade única na sua história para atrair e responder a públicos adultos, o façam. Se não o fizerem no momento em que o número de estudantes jovens diminui às suas portas, nunca o farão! É o que nos diz a experiência de todos os países que tiveram sucesso (mas também sabemos que houve muitos países e instituições de todo o mundo que tiveram insucesso) nesta transferência de competências.
Tal exige muito trabalho de reorganização e, para tanto, aprovámos aqui, nesta Câmara, as alterações à lei relativa a Bolonha, estamos a trabalhar na sua regulamentação, consoante foi determinado por este Parlamento, e esperamos dar todos os sinais – e gostaria que esses sinais fossem dados pelo Parlamento e pelo Governo – a todas as instituições. É o que pretendemos.
O facto de a demografia nos obrigar, durante alguns anos, a uma redução do número de estudantes à entrada, que poderá vir a ser compensada – mas demora tempo – com uma redução do insucesso escolar e do abandono escolar nos ensinos básico e secundário, não significa, necessariamente, uma redução do número de estudantes no ensino superior se, pela primeira vez em Portugal, o ensino superior conseguir, de facto, alterar os seus hábitos de trabalho e a sua relação com a comunidade e responder a uma procura de formação dos públicos adultos. E isto vale tanto para o ensino superior público como para o ensino superior privado, no nosso país.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota, do PS.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Caros Colegas: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem de manifestar, desde logo, com clareza, à equipa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a satisfação com que analisou a parte do Orçamento do Estado relativa a este Ministério.
Em primeiro lugar, porque salvaguarda as prioridades políticas estabelecidas pelo Governo. Fazendo uma análise que nem precisa de ser muito aprofundada, é com clareza que aqui se vê encrostado o Plano Tecnológico e a perspectiva da sustentabilidade de um novo modelo económico para o País. Ou seja, a valorização do investimento em ciência e tecnologia na sociedade de informação, e mesmo no ensino superior, é demonstrativa da ideia de que com a qualificação dos nossos recursos humanos se pode perspectivar um desenvolvimento sustentado e um desígnio para o País.
A análise específica dos valores por sector do Ministério leva-me a concordar que na ciência e na tecnologia – os valores são muito objectivos – há um aumento de 17,1% em relação ao orçamento anterior, demonstrando claramente esta prioridade política como objectivo de contribuir para vencer o atraso científico e tecnológico do País.
Na sociedade de informação é mais do que objectivo que há um aumento do valor deste orçamento em mais de 6%, tendo por base não o orçamento inicial de 2005, em que era difícil de analisar qual era o investimento na sociedade de informação, mas o orçamento rectificativo.
No ensino superior, apesar de o resultado global se traduzir apenas num crescimento de 1,9%, portanto, aparentemente abaixo da taxa de inflação, se fizermos uma análise cuidada, percebemos que houve uma visão estratégica ou uma preocupação clara por parte do Ministério em reduzir ou conter despesas – estamos num período de consolidação orçamental e, portanto, naturalmente com um objectivo de diminuição das despesas –, perspectivando um aumento das despesas de funcionamento em 3,4%, um aumento da acção social escolar em 6,4%, numa altura em que o próximo ano lectivo terá uma diminuição de cerca de 3% do número de alunos.
A redução objectiva que se verifica no orçamento tem a ver com as obras. Por isso, a primeira pergunta que formulo ao Sr. Ministro vai mais no sentido de apurar qual a orientação na redução do orçamento em termos de despesas com infra-estruturas. Depois, farei uma avaliação mais específica, sector a sector.
Na ciência e na tecnologia, queria realçar o retomar da normalidade.
Portugal viveu, nos últimos três, quatro anos, infelizmente, um período de retrocesso de investimento nestas áreas. Desde logo, deixou de pagar as quotas aos organismos internacionais, o que implicou, desde logo, uma perda de credibilidade do Estado português e, entre outras coisas, a impossibilidade de os nossos cientistas e de as nossas empresas participarem em organismos internacionais. Saúdo, por isso, mais uma vez, o retomar da normalidade com o pagamento de quotas a estes organismos.
Volto a cumprimentar o Governo e o Partido Socialista, que já na oposição prometia não deixar morrer o projecto Ciência Viva (e a Agência Ciência Viva), que, infelizmente, ao longo destes últimos quatro anos, esteve absolutamente parado, porque este orçamento demonstra, com clareza, o retomar deste projecto.
Sublinho a aposta estratégica na formação avançada de cientistas e tecnólogos, com um investimento de cerca de um quarto do investimento total na área da ciência e da tecnologia, e relevo, também, a autonomização das instituições científicas, permitindo avaliações internacionais, com naturais benefícios para a comunidade científica portuguesa.

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Saliento ainda – este é um dado extremamente importante, que poderá, de certa forma, até demonstrar uma visão diferente do Partido Socialista no Governo e da direita enquanto governo – o investimento em investigação e desenvolvimento.
No período de governação do Eng.º António Guterres houve um crescimento exponencial do investimento em investigação e desenvolvimento, seguindo-se um retrocesso claro, a partir de 2001 – se estão com dúvidas, posso mostrar o quadro –, o que fez com que, infelizmente, estejamos, em 2005, com valores de cerca de 0,5% do PIB. Ou seja, da nossa riqueza, apenas 0,5% era investido em investigação e desenvolvimento.
Regozijo-me por sentir que houve a preocupação, por parte deste Ministério, de que, no final do ano, haja investimento público de cerca de 1% do PIB em investigação e desenvolvimento, com a perspectiva de, também dessa forma, potenciar o investimento privado em investigação e desenvolvimento (que, neste momento, se cifra em 0,3%), permitindo uma aproximação clara à média da União Europeia, que é de cerca de 2%.
Na sociedade de informação há um conjunto de projectos que demonstram, com clareza – apesar de isso não ter ficado tão claro na intervenção do PSD –, um investimento nas novas tecnologias. Desde logo, a iniciativa Ligar Portugal, que permite a generalização no acesso às tecnologias de informação e comunicação, com impacto na qualidade de vida, na segurança e no trabalho das pessoas.
Mas o Ministério vai mais longe – este é um valor importante de análise em sede de especialidade – e faz a quantificação dos objectivos. Pretende, até 2010, duplicar os utilizadores regulares de Internet, triplicar os agregados familiares com acesso à Internet, passando para cerca de 50% em 2010, e multiplicar os computadores nas escolas, criando um ratio de cerca de um computador para cada cinco alunos.
Há ainda um reforço no investimento da banda larga, como foi dito – e muito bem –, e a duplicação do espaço Internet.
Aqui, o elemento estrutural que nos parece fundamental realçar é a perspectiva deste investimento na sociedade de informação e comunicação como um elemento de criação de emprego e desenvolvimento económico, perspectivando-se que cerca de 3% do emprego se situe nestas áreas, ou seja, cerca de 44 000 postos de trabalho. Sabemos que o tele-trabalho, a tele-medicina são elementos estratégicos e claramente potenciadores de um novo modelo de desenvolvimento económico.
Realço ainda a proposta de redução fiscal, até 250 euros, nos agregados familiares que adquiram um computador, já com validade para o mês de Dezembro.
Em relação ao ensino superior, queria voltar a realçar um elemento estratégico. Apesar do esforço de contenção, houve uma preocupação por parte do Ministério em não fazer cortes cegos, ou seja, há contenção nas despesas de funcionamento (apesar de crescerem para 3,4%), bem como uma diminuição das despesas em infra-estruturas, pelo que se percebe – era este o ponto que gostava de ver esclarecido –, em novas obras, mas há uma preocupação estratégica em relação ao que é, neste momento, uma preocupação pública: o abandono escolar.
O Ministério responde ao problema do abandono escolar no ensino superior (matéria que se vai discutindo, de certa forma, na comunicação social e, até, nas próprias instituições do ensino superior) com um aumento da dotação para a acção social, tendo em linha de conta que é de 6,7%, mas que até pode ser considerado superior, tendo em linha de conta a diminuição do número de alunos para o ano lectivo de 2005/2006, em cerca de 3%.
Realço também a importância da avaliação internacional das instituições e a perspectiva de podermos fazer, de acordo com a alteração da lei de bases e com a participação de Portugal no Processo de Bolonha, uma reorganização do ensino superior. Esta reorganização, que é feita através da transparência e do estabelecimento de critérios claros em relação à distribuição de verbas para o ensino superior, pode concretizar a nossa esperança da mudança de paradigma. E não vejam isto apenas na perspectiva keynesiana, de abertura ao mercado, ou dos conceitos da universidade sem muros, claramente aplicada ao que são as necessidades de mercado, mas, sim, perspectivando também o que é a qualidade do ensino superior e um ensino superior ao serviço das necessidades do País.
É de valorizar, igualmente, o facto de o Ministério perceber, com muita clareza, que a acção social deve ser direccionada essencialmente para os alunos. Sabemos que, em certas circunstâncias, nalgumas instituições de ensino superior, os serviços de acção social não estão apenas direccionados para os alunos, estando também direccionados para a comunidade. E a perspectiva de apoio ao aluno parece-me ser aqui claramente prioritária.
Por último, queria valorizar este elemento estratégico, este pedido de autorização, por parte do Ministério, para as garantias aos empréstimos dos estudantes. Neste momento, infelizmente, estes empréstimos rondarão os valores do crédito ao consumo. Quais são, então, as perspectivas do Governo, em relação às negociações com a banca, para a redução da taxa de juro dos empréstimos aos estudantes?

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, muito obrigado pelas suas palavras.

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Começo por responder a este último ponto que me colocou sobre os empréstimos aos estudantes. Como os Srs. Deputados sabem, este ano tornámos público um estudo que tinha sido iniciado já há mais de um ano, encomendado pela Direcção-Geral do Ensino Superior a um importante centro de investigação português um estudo, sobre as condições socio-económicas dos estudantes do ensino superior. Esse estudo foi feito no quadro de um trabalho internacional, de um trabalho europeu, com uma metodologia aproximadamente equivalente em todos os países. Trata-se de um estudo preliminar, mas muito importante, que dá as primeiras indicações, em termos comparativos, das condições socio-económicas dos estudantes do ensino superior em Portugal e do impacto da acção social ou da sua relevância para a melhoria do acesso ao ensino superior.
Não responde a todas as questões, mas a algumas delas.
A primeira das questões a que responde é que a acção social — e ainda bem, pois era isso que esperávamos — dirige-se, no essencial, aos mais carenciados. Até agora não havia elementos que nos permitissem verificar isso. Hoje, há verificações cruzadas de muitos indicadores de pertença socio-económica para nos induzir uma confiança nesse sistema.
Por outro lado, em termos internacionais, há duas questões que gostaria de fazer ressaltar, pondo entre parêntesis, evidentemente, as diferenças culturais e as diferenças de sociedade.
Quando comparamos Portugal com praticamente todos os países da União Europeia verificamos que, em primeiro lugar, Portugal é o país onde os estudantes do ensino superior a tempo inteiro menos trabalham, ou seja, são os que têm menos empregos em part-time ou alguma forma de trabalho remunerado em complemento do seu estudo. Em segundo lugar, a acção social é feita, essencialmente, por apoios públicos directos do Estado a fundo perdido, sem ser complementada, como acontece praticamente em todos os países europeus, por sistemas de empréstimos a estudantes que se dirijam, de uma forma diferenciada, aos mais ou aos menos carenciados.
Sabemos que os empréstimos aos estudantes têm diferentes objectivos, designadamente não só objectivos de acção social. Em vários países desenvolvidos da Europa, os empréstimos aos estudantes têm por objectivo contribuir para a sua autonomização económica, mas uma fracção desses empréstimos pode ter também como objectivo não só a autonomização mas o complemento, o reforço dos sistemas de acção social.
O Sr. Deputado fez-me uma pergunta, que, aliás, o Sr. Deputado do PSD já tinha feito anteriormente, sobre as questões do abandono escolar. Por isso, vou aproveitar para referir esta questão. Actualmente, os sistemas de empréstimos a estudantes do ensino superior que estão disponíveis na banca comercial têm taxas de juro extremamente elevadas quando comparadas com as taxas de juro praticadas em outros países europeus, onde esses sistemas de empréstimos são generalizados. Portanto, o primeiro problema passa por conseguir encontrar uma forma de disponibilizar um capital significativo, em condições de controlo de risco para a instituição que empresta, que permita que o custo do dinheiro seja o mais baixo possível.
O primeiro problema diz respeito ao risco e ao controlo do risco. O controlo do risco tem a ver com os critérios de atribuição, com o montante do empréstimo concedido, com os períodos de carência que são consentidos e com o período de reembolso. Depois de uma análise a sistemas de outros países, verificamos que é necessário que um sistema de empréstimos, pelo menos na parte garantida pelo Estado, responda a algumas questões.
Em primeiro lugar, deve impedir-se um endividamento excessivo e, portanto, dever-se-á limitar estritamente o montante máximo do endividamento. Não é positivo que um estudante, após terminar o seu curso superior, tenha uma dívida significativa. Isso não deve acontecer. Hoje, isso verifica-se nos sistemas avançados que têm empréstimos como complemento de sistemas de acção social. Portanto, tem de haver uma limitação do empréstimo que pode ser consentido através desses sistemas.
Depois, deverá haver um período de carência suficientemente longo, após terminar os estudos. Obviamente, se o estudante tiver em condições de reembolsar mais cedo reembolsará, mas não é obrigado a fazê-lo.
Ou seja, a entrada na vida activa não fica onerada por esse empréstimo. Deverá haver igualmente um período de reembolso suficientemente dilatado que, tanto quanto possível, seja de reembolso simples e esteja administrativamente associado, para efeitos do risco, quando este é assumido pelo Estado, ao sistema fiscal e às execuções fiscais no caso do não cumprimento.
Claro que existe sempre um risco. A medida desse risco é importante para o Estado, porque, em última análise, ele tem de ser compensado ou por uma diluição desse risco através do aumento da taxa de juro ou pela sua assumpção e do seu custo através do Orçamento do Estado. Estes são os problemas que temos pela frente.
Além destes, temos outro problema, que é, no cálculo da taxa de juro para estes empréstimos, temos de conseguir taxas de juro o mais baixas possíveis. E pergunta-se: deve ou não o Estado, e em que condições, financiar ou bonificar esse juro? A nossa opinião é que o Estado não deve bonificar esse juro para os estudantes que não são beneficiários da acção social. Mas não deve proibir que este sistema possa ser utilizados por estudantes que, não sendo beneficiários da acção social, sejam beneficiários da garantia de risco e, portanto, paguem os juros do empréstimo para se autonomizar.
Julgamos, pois, ser possível compatibilizar os critérios que hoje são seguidos em toda a Europa, ou seja, a possibilidade de os sistemas de empréstimo servirem para aumentar a autonomização dos estudantes relativamente às suas famílias e a responsabilidade económica dos estudantes sem que a comunidade pague esse sistema, sendo esse sistema, obviamente, pago pelos próprios estudantes. Além disso, deve fazer-se com

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que os orçamentos da acção social venham a incluir todas as parcelas de juros necessárias para complementar os sistemas da acção social em vigor.
Que fique absolutamente claro que a nossa intenção não é reduzir, mas antes aumentar, a dotação da acção social escolar. Contudo, hoje, entendemos que, em toda a Europa, para lá do sistema da acção social, tem de existir, deve existir, um sistema de empréstimos que não pode ser meramente indexado ao sistema de empréstimos ao consumo. Tem de ser um sistema de empréstimos a juros suficientemente baixos, o que só o Estado garantir. Estas são as orientações que queremos trabalhar.
Todavia, Sr.as e Srs. Deputados, porque se trata de um sistema que tem de vigorar por muitos anos para poder ser viável, teremos o cuidado de procurar, em diálogo com a Assembleia da República, o consenso absolutamente indispensável nesta matéria. A introdução de um sistema de empréstimos a estudantes do ensino superior tem uma tal importância e tais implicações ao longo dos anos que muitos governos e muitas maiorias políticas se sucederão e, à partida, será absolutamente indispensável que haja um consenso muito alargado na criação deste sistema, na garantia e no grau de risco que o Estado está disponível para assumir.
Julgo já ter respondido às outras questões que o Sr. Deputado colocou. Efectivamente, é com grande satisfação que vemos a promoção da cultura científica, designadamente o lançamento do concurso Ciência Viva para as escolas, que está neste momento em curso. Esperamos que a ciência possa contribuir, junto com a educação, para a melhoria das condições de ensino das ciências e, sobretudo, da aproximação da comunidade científica e da comunidade escolar para o reforço das aprendizagens científicas e tecnológicas nas escolas do nosso país.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, gostaria de começar por falar da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006 e voltar às questões de natureza orçamental. Esta é uma discussão é uma discussão na generalidade e, portanto, há dados fundamentais para que possamos perceber alguns dos documentos que temos na mão e com eles descobrir a tradução orçamental de algumas das medidas que o Ministério, o Governo, propõe no relatório do Orçamento do Estado para 2006.
Quanto à proposta de lei orçamental, gostaria de falar dos artigos 16.º e 20.º. O artigo 16.º prevê a admissão de pessoal na função pública. Assim, as perguntas que tenho para lhe colocar são muito concretas, não propriamente de reflexão filosófica sobre ciência e tecnologia, porque é com respostas muito concretas — estou ciente que o Sr. Ministro fará questão disso — que estaremos em condições de saber se esta vontade e este plano de intenções tem efectivamente Orçamento para andar.
O artigo 16.º diz que carece de parecer favorável do Ministro de Estado e das Finanças a contratação de professores para o ensino superior. Sr. Ministro, considera esta medida facilitadora do funcionamento flexível e autonómico das universidades e dos politécnicos e da sua gestão de pessoal para — naturalmente, o Ministério da Ciência e Tecnologia não funciona por oposição ao Ensino Superior — conjuntamente porem em prática as intenções do seu Ministério? A segunda questão que gostaria de colocar tem a ver com o artigo 20.º, que diz respeito às contribuições para a Caixa Geral de Aposentações. O n.º 1 do referido artigo diz que as entidades com autonomia administrativa e financeira que tenham trabalhadores abrangidos pelo regime de protecção social da função pública em matéria de pensões contribuem para a Caixa Geral de Aposentações com a importância mensal correspondente a 13% da remuneração do referido pessoal sujeito a desconto da quota. Ora, não estando aqui prevista qualquer excepção neste articulado, esta medida também contempla as universidades, o ensino superior e os laboratórios do Estado? Sr. Ministro, se não contempla, onde está a excepção? É que aqui referem-se as entidades com autonomia administrativa e financeira e os laboratórios, por decisão do Governo — e bem —, passam a ter autonomia, ou pelo menos alguns deles, também eles estarão sujeitos a este n.º 1 do artigo 20.º.
Não estando sujeitos, por que razão não está aqui a excepção? Caso estejam dispensados, o Governo e o Sr.
Ministro admitem uma alteração deste articulado no Orçamento do Estado para que fique claro a excepcionalidade dos laboratórios e do ensino superior? Caso admitam essa excepcionalidade, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português está disponível para produzir essa alteração.
A terceira pergunta que vou colocar diz respeito ao Orçamento, sendo que questão que logo se levanta, e que já se tem levantado noutras discussões, é o que estamos a comparar. Sei que, sendo o Sr. Ministro quem é, as questões do rigor e da transparência lhe dizem muito, mas a verdade é que nós temos, no Parlamento, cada vez menos condições para poder discutir com rigor e transparência os orçamentos, visto que tudo é possível. Às vezes, compara-se o Orçamento inicial de 2006 com o Orçamento inicial de 2005, outras vezes compara-se com o rectificativo e outras vezes compara-se mesmo com a estimativa de execução. Como tal, os aumentos, os acréscimos e decréscimos variam de acordo com a subjectividade das leituras comparativas, e esta é que é a realidade dos factos!

Vozes do PSD: — Muito bem!

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A Oradora: — Sabia que os Srs. Deputados estavam de acordo comigo, até porque já faziam o mesmo quando estavam no governo e, como tal, conhecem o processo. Ainda bem que os senhores o reconhecem, porque é, de facto, assim! Aliás, esta questão, ontem levantada pelo Grupo Parlamentar do PCP, teve, por parte do Governo, através do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, um assentimento claro de que tínhamos razão e de que, pela parte daquele Ministério, o próximo Orçamento não cairia nesta tentação de criar obstáculos à leitura dos Srs. Deputados. Estou convicta de que o Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior, naturalmente, também irá ao encontro desse mesmo assentimento.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Dá-me licença que a interrompa por uns segundos, Sr.ª Deputada?

A Oradora: — Com certeza que dou, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — A Sr.ª Deputada não deve estar a referir-se a esta sessão…

A Oradora: — Estou, sim!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Como a Sr.ª Deputada sabe, porque já várias vezes estivemos nestes debates, as comparações que são feitas nos documentos que vos entregámos são comparações entre o Orçamento inicial para um ano e o Orçamento inicial para outro.

Vozes do PSD: — Não, não!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Deixámo-lo absolutamente claro, assim como esclarecemos que há um único caso em que não conseguimos fazer essa comparação. De todo o modo, se os Srs. Deputados entenderem que, no que respeita à verba da Sociedade de Informação, e dada a mudança de estrutura, se pode fazer uma comparação entre orçamentos iniciais, fá-la-emos, podendo mesmo comparar o Orçamento rectificativo com o inicial. Para além disto, nos mapas que estão à vossa disposição, também é feita a comparação entre todas as estimativas de execução.
Todas as comparações estão à vossa frente e, portanto, não há aqui nada que esteja escondido, Sr.ª Deputada!

A Oradora: — Sr. Ministro, as palavras, na nossa língua como em qualquer outra, têm significância e, portanto, esclareço que não estamos a falar de esconder mas, sim, de criar obstáculos à leitura ou à subjectividade dos acréscimos e dos decréscimos. Foi exactamente isto que disse, sem me referir a algo que estivesse, ou não, escondido.
De qualquer modo, o Sr. Ministro conhece, naturalmente, o Relatório do Orçamento do Estado para 2006 e encontrará no Ministério da Ciência e do Ensino Superior leituras comparativas entre o Orçamento inicial e a estimativa de execução para 2005, ou seja, encontra comparações que não são feitas entre os Orçamentos iniciais.
Relativamente a este Orçamento para 2006, V. Ex.ª já reconheceu que estamos a falar, nesta área do Governo, de um acréscimo financeiro baseado numa verba crucial relativa à rubrica da Sociedade de Informação. Esta mesma rubrica, porém, desce em PIDDAC, em relação ao qual, Sr. Ministro, tenho Orçamentos iniciais para comparar. Tenho o Orçamento inicial para 2006 e o Orçamento inicial para 2005. Contudo, se eu comparar as medidas e os programas previstos no Orçamento para 2006 com o que estava previsto no rectificativo de há dois meses atrás, descubro, Sr. Ministro, que a totalidade dos programas desce, que os projectos em curso são reduzidos a um décimo do que estava previsto, que os projectos novos descem, assim como descem a Sociedade de Informação e o Governo Electrónico, a investigação científica e tecnológica, o ensino superior, a acção social escolar e a Sociedade de Informação para todos. Poderia mesmo dar-lhe um conjunto de medidas e de programas que, comparados com o Orçamento rectificativo de 2005, descem. Naturalmente, esta leitura não está nos mapas que nos deram, visto que nestes as comparações registam uma subida de todos os programas.
Depois, Sr. Ministro, mesmo considerando os orçamentos privativos das respectivas instituições e dos respectivos sectores, verifico que há decréscimos nos laboratórios do Estado, nos politécnicos e nas universidades. Já imagino que o Sr. Ministro me venha dizer: «Não, não! Há um ligeiro acréscimo!» Também é verdade.
Há um decréscimo e um ligeiro acréscimo. Há um decréscimo nas transferências do Orçamento do Estado para muitos dos laboratórios, dos politécnicos e das universidades, que, depois, é atenuado pelas receitas próprias dos laboratórios e das propinas, redundando, depois, num ligeiro acréscimo. Contudo, a realidade é que não há um aumento do Orçamento do Estado para as universidades e para os politécnicos.
Como tal, a minha primeira grande dúvida é esta: como é que, numa das poucas áreas da governação que sobe em termos globais, esse acréscimo não contempla a qualificação e a formação dos politécnicos e das

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universidades? Por que é que essa mais-valia que o Sr. Ministro conseguiu — faço ideia da dificuldade da negociação, tendo em conta que o Orçamento do Estado é aquilo que conhecemos para 2006 — não contempla as instituições de ensino superior que, como V. Ex.ª bem sabe, têm funcionado em perfeito desinvestimento e com imensas dificuldades de funcionamento há vários anos? Sr. Ministro, não me diga que acredita que os orçamentos são suficientes e que as instituições de ensino superior — os politécnicos e as universidades — estão a transformar em investimento as propinas, não as utilizando para o seu funcionamento interno. Lembro que o Sr. Ministro pertence a um Governo de um partido que muitas vezes disse nesta Casa que, estando no poder, jamais as propinas serviriam para fazer funcionar as universidades e os politécnicos.
As propinas devem ser uma mais-valia para a qualidade das universidades e dos politécnicos, mas todos sabemos que não é assim! Isto a não ser que o Sr. Ministro considere — eu, pelo menos, não considero — que os responsáveis das instituições de ensino superior não falam verdade e que as propinas não servem, efectivamente, para pagar salários, para fazer funcionar as universidades e até para as fazer adiantar-se ao próprio Governo, quando este não envia a tempo o dinheiro necessário para «apagar alguns incêndios»! É que as propinas não servem, de facto, para aumentar a qualidade do ensino mas, sim, para fazer funcionar as universidades e os politécnicos.
Entretanto, é, no mínimo, estranho que, havendo uma aposta na ciência e na investigação ao nível do ensino superior politécnico — e sabendo nós que este tem sido mal tratado pelos diferentes governos —, um dos programas previsto no Orçamento rectificativo para 2005 e relativo aos politécnicos tenha desaparecido no Orçamento inicial para 2006. Aparece o programa relativo às universidades, mas não aparece o do ensino politécnico. Pode acontecer que seja eu quem não encontra este programa, mas, se for o caso, peço-lhe que me ajude a encontrá-lo, Sr. Ministro, pois também é para isso que aqui está. Imagino que o Sr. Ministro tenha uma resposta para isto, que a verba esteja noutro sítio qualquer que eu não encontrei e que V. Ex.ª encontre a aposta na investigação e ciência no ensino politécnico.
Quanto ao Relatório, penso que sucede sempre o mesmo, todos os anos, quando discutimos os orçamentos, ou seja, sucede que o texto discursivo que o acompanha mais não é do que um conjunto de consensos generalizados entre a bancada que apoia o Governo e as demais. De facto, está aqui um conjunto de intenções, muitas das quais já deviam ter sido realizadas há muitos anos, pelo que são tardias, mas que se repetem anualmente, reconhecendo-se que pode ser desta vez que se realizem. Só que, depois de todas estas boas intenções e boas vontades, não conseguimos descobrir as verbas.
Naturalmente, podemos estar perante um problema difícil como aquele que assola as finanças locais e que passa pelo facto de as câmaras municipais terem menos dinheiro, mas, afinal, passarem a ter mais dinheiro, graças ao «saco azul» de 210 milhões que vai ser distribuído pelas câmaras, sabe-se lá de que cor!… A verdade é que as verbas crescem! Não se dá é por isso! Como tal, peço ao Sr. Ministro que me diga onde é que estão orçamentalmente traduzidas todas estas intenções.
Prevêem, por exemplo, fazer crescer em 50% os recursos humanos em I&D (Investigação e Desenvolvimento). Como? Onde é que está a verba? Querem fazer crescer para 1500 por ano o número de doutoramentos em Portugal? Sr. Ministro, não me ofereça um «bolo» e um «saco azul», já que eu quero ver planificações, pois isso é que é importante para a nossa discussão na especialidade. Onde é que estão as verbas que traduzem estas intenções? Querem duplicar o investimento público em I&D, de forma a atingir 1% do PIB? Querem triplicar o esforço privado de I&D empresarial, criando as condições de estímulo necessárias! Se pretendem criar as condições de estímulo, como é que o Governo sabe que vai triplicar o esforço privado em I&D? As verbas, o «bolo» global já está negociado com algumas empresas? Sabe-se quais vão ser as empresas que permitem garantir uma coisa destas, este esforço triplicado? Como já ultrapassei o tempo de que dispunha e estou certa de que os demais Deputados abordarão algumas destas matérias nas suas questões, limito-me a referir o lançamento de um programa de reforma dos laboratórios do Estado. Penso que o Sr. Ministro está a retomar as conclusões da avaliação final de 1997, na qual já eram apontadas as reformas necessárias, tendo sido sugerido na altura que, ou as reformas eram urgentes para termos laboratórios do Estado, ou o Governo devia ter a coragem de fechar alguns deles, pois, no estado em que estavam, não funcionavam. Deixe-me dizer, aliás, que estou convicta de que esta área lhe é muito cara, Sr. Ministro.
Em suma, afirma-se aqui que há o lançamento de um programa de reforma dos laboratórios do Estado que contribuirá para a revisão das suas missões, modelos e estruturas e procurará garantir a sua autonomia científica, o rejuvenescimento dos seus quadros — e, se o Sr. Ministro se recorda (e recorda-se, com certeza, bem melhor do que eu), esta era uma das recomendações da altura — e a sua relevância para a prossecução das políticas públicas. Fala-se no rejuvenescimento dos quadros, mas não apenas a nível dos investigadores, incluindo também os técnicos, que são cada vez menos nestes laboratórios, como o Sr. Ministro bem sabe. Os investigadores, por seu turno, são cada vez menos, porque estão lá, em sua vez, os bolseiros.
Por acaso, não sei como é que os bolseiros se vão entender com o pagamento dos empréstimos e com o período de carência, mas valia a pena o Sr. Ministro debruçar-se sobre esta matéria dos bolseiros, que o são até aos 30 ou 40 anos, que nunca integram a função pública e que substituem trabalhadores permanentes nos laboratórios do Estado para responder de forma permanente às suas necessidades.

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Gostaria ainda de saber, caso não seja a de 1997, que reforma é esta e, voltando à questão anterior, que decréscimos são estes, se é que os há, sendo certo que resultam da leitura atenta dos orçamentos privativos e que só não são tão graves por causa das receitas autónomas. Gostava ainda que se debruçasse sobre a questão das propinas das universidades e dos politécnicos e sobre as receitas autónomas dos laboratórios do Estado, esclarecendo se são aquelas que resultam de prestações de serviço ou se há outras receitas que desconhecemos.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, agradeço, antes de mais, as questões que me colocou.
Começarei por responder a uma questão mais política e passarei, depois, às questões técnicas que levantou.
Disse a Sr.ª Deputada que havia — o que me enche de regozijo — um consenso generalizado relativamente a esta matéria do desenvolvimento científico e tecnológico do País. Oxalá haja! Tenho aqui um quadro que mostra que mostra que não foi assim nos últimos 30 anos. Sei que houve muitas dificuldades, mas é em períodos de dificuldade que se testa a prioridade daquilo que é difícil e que não rende votos a curto prazo.
Este documento é muito difícil de ler, mas explicá-lo-ei muito rapidamente. Trata-se de dados estatísticos relativos aos governos constitucionais e aos governos anteriores a 25 de Abril, de 1971 até 2005, e não são orçamentais, são dados de execução pública e privada em Portugal.
O que é que verificamos? Verificamos que a despesa de I&D, em Portugal, era de cerca de 0,4% do PIB em 1971, assim como em 1986, oscilando entre 0,3 e 0,4% neste período de 15 anos, nunca subiu acima deste valor. Mas a certa altura o PIB cresce… Este número cresce a partir de 1982. Em 1982 é de 0,3% do PIB e há um longo período de crescimento que vai desde 1982 (a partir de um valor baixíssimo, insisto, mais do que em 1971) até 1992, ocorrendo uma aceleração com a entrada de Portugal na União Europeia. Em 1992 atinge 0,6% do PIB e, logo a seguir, cai, e os dados estatísticos do inquérito de 1994 mostram essa quebra.
Os números de 1992 apenas foram retomados em 1997 — foi a quebra do investimento público e privado em 1993 e 1994. Retomamos, a partir de 1995, de novo, uma trajectória de crescimento, que dura de 1995 até 2001, e voltamos a ter uma quebra em 2003.
Este quadro ilustra com grande clareza as chamadas dificuldades práticas do consenso generalizado. Oxalá houvesse um consenso generalizado tão forte como aquele a que todos aspiramos.
Este quadro, de que todos temos culpa, mostra as dificuldades que a sociedade portuguesa tem em assumir, de uma maneira persistente ao longo dos anos, esta prioridade.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita colocou-me algumas perguntas e serei o mais rápido possível a responder.
Em primeiro lugar, não gostaria de passar em claro (apesar de a Sr.ª Deputada me ter dados uns minutos para a interromper) a questão das comparações. Sr.ª Deputada, o que é preciso é ter todas as comparações, todas! E espero que tenha à mão todas as comparações que se podem fazer. Temos um orçamento inicial para 2006 e, portanto, não se pode comparar com o orçamento de execução para 2006. Então, compara-se com o quê? Com o Orçamento inicial para 2005, com o Orçamento rectificativo, porque houve um Orçamento rectificativo em 2005, e com a estimativa de execução para 2005.
Estas são as comparações possíveis e todos estes elementos estão à vossa disposição. Se houver algum elemento de que não disponham, agradeço que o solicitem, pois teremos todos o gosto em fazer os cálculos necessários que faltem e entregar-vos. Se houver algum elemento que não esteja nos documentos que estão publicados, no site do Ministério das Finanças ou no documento que vos preparámos em complemento do que já está publicado, agradeço que nos peçam esses dados.
Por outro lado, gostaria de esclarecer uma confusão, transmitindo-vos os elementos técnicos necessários sobre a transferência de verbas dos programas de Governo Electrónico para os programas da Administração Pública, ou seja, do POO1 para o P28. É necessário ver onde estão as verbas que antes estavam num sítio e que, depois, passam a estar noutro e teremos todo o gosto em transmitir às Sr.as e aos Srs. Deputados esses elementos em detalhe.
Refiro, em primeiro lugar, duas questões práticas e, depois, duas questões centrais levantadas pela Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Deputada refere que o artigo 16.º do articulado diz que carece de aprovação de um despacho conjunto do ministério da tutela e o das Finanças a definição de um determinado despacho, o qual não tem a ver com a contratação 1.1 mas, sim, com os plafonds de pessoal docente para o ano. Sr.ª Deputada, o que a lei obriga estritamente é que isso não seja feito sem intervenção da tutela. Até hoje a tutela tinha, obrigatoriamente, de definir todos os anos esse plafond. A única alteração é a de que isso passa a ser feito por despacho conjunto entre o ministro da tutela e o das Finanças, o que me parece bem. Dentro de um quadro de responsabilidade orçamental não me custa absolutamente nada que isto aconteça, aliás, penso que é melhor que a

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tutela e as Finanças assumam a co-responsabilidade dessa matéria, quando até agora era só a tutela a assumi-la.
É evidente que não está em causa a autonomia das instituições de contratarem, depois, nos termos de lei, dentro do plafond geral que lhes está atribuído e que tem critérios objectivos.
A segunda questão que levantou diz respeito ao artigo 20.º, segundo creio, e já houve condições para o esclarecer. O artigo 20.º diz respeito aos organismos com autonomia administrativa e financeira, cujos diplomas específicos e leis orgânicas prevêem uma contribuição, que actualmente é de 10%, passando para 13%.
Ora, nem as universidades nem os politécnicos têm essa determinação nas suas leis orgânicas e, portanto, este artigo, que, admito, deve ser clarificado, não se lhes aplica, porque se trata de entidades em cuja legislação específica não se prevê uma contribuição da entidade (não é dos funcionários) para a Caixa Geral de Aposentações.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — E os laboratórios, Sr. Ministro?

O Orador: — Os laboratórios não também não, a menos que tenham essa medida (e julgo que neste momento nenhum deles tem) inscrita na sua lei orgânica. Se houver algum laboratório ou alguma entidade que já contribua com 10%, este valor passa para 13%, mas, repito, creio que, neste momento, nenhum deles tem essa medida inscrita na sua lei orgânica.
Vou agora passar às questões mais importantes, e gostaria de responder a duas delas.
A primeira é a seguinte: a Sr.ª Deputada pergunta como é que é possível que este Ministério aumente e que não se transfira este aumento para o ensino superior, mas para a ciência e tecnologia. Basicamente é esta a pergunta, Sr.ª Deputada. É que, grande parte, se não a maioria, do aumento em ciência e tecnologia vai para o ensino superior, porque é no ensino superior que está a maioria dos investigadores portugueses e a capacidade científica portuguesa no sector público — uma parte vai para o sector privado e outra vai para os laboratórios de Estado.
No essencial é isto, com uma diferença: recuso-me terminantemente a atribuir verbas para investigação científica ao ensino superior sem ser após avaliação competitiva. Essas verbas são atribuídas de uma forma independente e totalmente desgovernamentalizada, mas através de avaliação independente, e é isso que permite que haja, todos os anos, melhor investigação. O contrário permite que a investigação estiole e que se torne pior.
Portanto, isto tem a ver com a política científica e com a do ensino superior. É assim que se qualifica o ensino superior, não é dando, à cabeça, parte do orçamento ao ensino superior nem sequer dando, à cabeça, uma parte aos laboratórios do Estado. Se os laboratórios do Estado não competirem por nenhuma verba de investigação acontece aquilo que aconteceu durante muitos anos: reduz-se a sua relevância em termos de investigação e de produção científicas, até por comparação com outras entidades públicas ou privadas em Portugal. Mas já vamos falar os laboratórios do Estado.
Espero que fique claro que uma grande parte do aumento da verba de ciência e tecnologia destinar-se-á, obviamente, ao ensino superior, por razões lógicas: porque no ensino superior está a maioria dos investigadores que têm capacidade para ir buscar essa verba.
Gostaria agora de falar de uma questão que em colocou sobre a reforma dos laboratórios do Estado. Perguntou-me: «Então, o Sr. Ministro quer retomar a reforma dos laboratórios do Estado iniciada em 1997?». Pois queremos! Em 1997, assumimos a responsabilidade de lançar uma análise sistemática de todos os laboratórios do Estado, de fazer uma avaliação internacional das suas missões, da sua organização, de extrair conclusões e assumir a responsabilidade internacional de pedir à mesma comissão que fizesse um relatório público de follow-up do que tinha acontecido alguns anos depois, o que foi feito.
Com bases nessas análises, como a Sr.ª Deputada se lembra, foram feitas várias alterações. Foi alterada a legislação sobre as instituições públicas de investigação e foi criado um programa especial de apoio financeiro à reforma dos laboratórios do Estado, o qual foi interrompido em 2002. Tenho muita pena mas não sou responsável por essa interrupção, como também não sou responsável pelo facto de, em 2002, o principal contributo que o governo de então deu à reforma dos laboratórios do Estado foi retirar-lhe autonomia financeira.
Este Governo retomou a autonomia financeira dos laboratórios do Estado, que entra em vigor dia 12 de Janeiro, para todos os laboratórios do Estado, designadamente para aqueles que nunca tinham tido autonomia financeira. Portanto, trata-se de uma melhoria significativa.
É preciso que fique claro que é necessário ver o que é aconteceu nestes anos, pois sabemos que se houve laboratórios do Estado que conseguiram resolver muitos dos seus problemas internos durante estes anos também houve outros em que o declínio foi acentuado.
Não tenho nenhuma visão religiosa sobre a estrutura actual dos laboratórios do Estado nem sobre as missões que lhes foram definidas há várias décadas, mas a estrutura actual dos laboratórios do Estado, sobretudo depois deste longo período de declínio, exige ser repensada. Há laboratórios do Estado que já não correspondem às missões que lhes foram atribuídas, e por isso devem ser mudados, e faltam laboratórios do Estado para missões absolutamente indispensáveis da vida nacional.

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Neste momento, a comparação da matriz, quanto mais não seja de uma única matriz, que é a dos grandes riscos públicos a que Portugal está sujeito, desde as epidemias até às infra-estruturas críticas, e essa transposição, que em todos os países deve encontrar expressão nos laboratórios do Estado como máquina pública de investigação para a defesa das populações, encontram, hoje, enormes carências no nosso país.
Por isso, assumimos a responsabilidade de proceder já não a uma avaliação, Sr.ª Deputada, mas a uma reforma da totalidade dos laboratórios do Estado portugueses. Não é um a um, é ao conjunto dos laboratórios do Estado.
A reforma da estrutura dos ministérios não é apenas das direcções-gerais e das estruturas centrais. No que diz respeito aos laboratórios do estado, assumimos a responsabilidade de propor ao Governo e de vir aqui discutir com os Srs. Deputados uma reforma em profundidade de toda a matriz dos laboratórios do Estado.

O Sr. Presidente (Teresa Venda): — Para formular questões, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr. Secretário de Estado, caros colegas, Sr. Ministro: Começo por saudar algumas das questões que V. Ex.ª aqui enumerou, nomeadamente uma das respostas que deu à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita dizendo que a atribuição de verbas ao ensino superior será feita apenas mediante a prévia avaliação do desempenho da própria universidade. E saúdo-o, Sr. Ministro, porque não era essa a posição que o Partido Socialista tinha anteriormente, portanto, começa a andar no bom sentido. Há dois anos, o governo da maioria PSD-CDS-PP quis fazer a avaliação da Administração Pública, segundo critérios de excelência e de bom desempenho, e teve uma forte oposição por parte do Partido Socialista. Por isso, esta é uma matéria que gostaria de saudar.
A segunda questão que gostaria de saudar é o facto de no Relatório do Orçamento do Estado ser contemplada uma questão em que o CDS-PP já há muito vem a batalhar, que é a questão dos empréstimos — não a questão do empréstimo dos manuais escolares, que está discutida e não parece vingar nesta matéria, mas a questão da acção social escolar no âmbito do ensino superior. Espero que esta matéria seja devidamente alargada e regulamentada e que não venha simplesmente a ficar no papel ou na ideia. De qualquer forma, Sr.
Ministro, não queria deixar de saudar estes dois aspectos.
Seguidamente, tenho algumas questões a que gostaria que o Sr. Ministro respondesse. A primeira diz também respeito a esta matéria, porque, sendo V. Ex.ª um fervoroso adepto da inovação, da ciência e da tecnologia, verifico que está aqui «meio envergonhada» a questão do choque tecnológico com que o Sr. PrimeiroMinistro ganhou as eleições. O Partido Socialista ganhou as eleições com a questão do choque tecnológico, mas há aqui muito pouca coisa relativamente àquilo que pensaríamos e estávamos à espera que fosse o choque tecnológico.
Por exemplo, aparece muito pouco desenvolvida, de forma, diria, ainda não muito clara, a questão da inovação, do desenvolvimento e das novas tecnologias em termos de criação dos próprios empregos. Isto porque não é só a questão da investigação, é necessário que a mesma depois seja posta em prática ao serviço das pessoas, sobretudo ao serviço das pessoas que precisam dela para trabalhar. É evidente que é referenciado o apoio à criação de novas empresas de base tecnológica, mas ainda está muito no fim da linha, no último ponto do capítulo, portanto, parece estar muito pouco adiantado.
Depois, Sr. Ministro, nesta matéria ainda, e não discutindo o facto de haver uma indicação de aumento, parece-nos que há ainda algumas opções políticas em relação às quais me parece que o Sr. Ministro provavelmente não está satisfeito. E nós também não estamos. Não estamos satisfeitos, por exemplo, porque no PIDDAC aparece 42,1% (os números poderão não ser exactos) para obras públicas contra cerca de 12% para a ciência, tecnologia e ensino superior. Ora, para um País que está demasiado aquém da média europeia no âmbito da ciência e tecnologia, parece-me que este investimento é ainda muito modesto. Por isso, julgo que o Sr. Ministro, provavelmente, também não estará satisfeito, pelo que gostaríamos de saber se foram conseguidos todos os objectivos a que o Sr. Ministro se propôs para o próximo ano.
No âmbito do ensino superior há também algumas questões que gostaria de ver esclarecidas. O Sr. Ministro falou no relatório e no estudo que foi feito sobre as condições socio-económicas dos estudantes do ensino superior em Portugal, e, portanto, o diagnóstico está feito.
Mas o Sr. Ministro referiu também outra questão que nos coloca, também neste aspecto, no último lugar a nível europeu, da Europa dos 15. Somos o país onde os estudantes do ensino superior menos actividade profissional têm enquanto estudantes, seja como trabalhadores a tempo inteiro, como trabalhadores-estudantes, seja como trabalhadores a tempo parcial. Esta é uma questão que nos preocupa e que, penso, também tem de ser vista, porque é uma questão que tem a ver não só com a forma de organização do ensino superior, mas também com o estatuto fiscal.
O estatuto fiscal não incentiva a que o estudante trabalhe, porque o estudante que seja trabalhador no sentido correcto e legal do termo (em que a sua actividade não seja paralela) tem de ser trabalhador por conta de outrem ou tem de estar colectado como trabalhador por conta própria, e, portanto, tem de pagar, logo à cabeça, uma determinada importância em termos fiscais — a colecta mínima, creio que é assim que vulgarmente se chama —, o que é desincentivador para a prática de uma actividade remunerada. Obviamente, para um trabalhador-estudante que ganhe muito pouco dinheiro esta situação é muito pouco compensadora.
Finalmente, Sr. Ministro, gostaria de colocar mais duas questões muito concretas.

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Em primeiro lugar, no Relatório do Orçamento do Estado, o Sr. Ministro refere-se a uma matéria relativamente à qual lhe disse no início que o felicitava, que diz respeito à celebração de contratos-programa de acordo com a excelência da universidade, para a realização de contratos-programa e de financiamento. Ora, uma vez que o Sr. Ministro fala na revisão dos contratos-programa, gostaria de saber, concretamente, porquê essa revisão e o que pretende rever.
Seguidamente, gostaria de referir uma matéria que denota, eventualmente, alguma inexecução por parte dos serviços respectivos no que diz respeito à análise e à aplicação da acção social escolar. Isto porque — diz o Sr. Ministro — terá de passar por um cálculo através de indicadores objectivos. Ora, creio que isso hoje (teoricamente, pelo menos) já existe. O que sucede, se calhar, é que, na prática, não está convenientemente aplicado. Portanto, ou é o próprio Governo a censurar uma parte dos seus serviços ou, então, sou eu que estou a ler incorrectamente e, por isso, solicito a sua explicação sobre esta matéria.
Termino com a questão seguinte: de acordo com o Processo de Bolonha, o ensino superior tenderá a deixar de ser ensino superior politécnico para ser ensino superior universitário. Portanto, parece haver alguma homogeneização em termos do ensino superior. Gostaria de saber o que se passa, porque hoje temos um financiamento muito inferior do politécnico relativamente ao universitário. Sabemos que o ensino universitário é que tem a parte da investigação, embora o politécnico comece hoje a reivindicar competências para a investigação.
Sr. Ministro, são estas as questões que, de momento, gostaríamos de colocar.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, muito brevemente, gostaria de dizer que terminarei a resposta com a questão política. Já agora, como o Sr. Deputado do PSD teve a bondade de me falar sobre a questão do plano tecnológico, termino com essa questão para ser mais claro.
O Sr. Deputado fez-me algumas perguntas a que gostaria de responder. Em relação aos empréstimos e avaliação estamos de acordo. Chamou-me também a atenção para o problema do regime fiscal dos estudantes-trabalhadores, designadamente dos estudantes-trabalhadores a tempo parcial e dos que trabalham a tempo inteiro, e quero dizer-lhe que estamos perfeitamente disponíveis para estudar este assunto em detalhe. Faz parte das nossas prioridades, por isso, qualquer sugestão nesse sentido será bem-vinda. O nosso objectivo é, sobretudo, tentar harmonizar esta situação, que é uma situação que só pode contribuir para modernizar o sistema de ensino superior português, sobretudo o acesso ao ensino superior de mais camadas da população.
O regime fiscal do trabalho de estudantes foi já analisado em vários países, gostaríamos de transpor essa experiência para Portugal tão rapidamente quanto possível, por isso, estamos obviamente disponíveis para qualquer sugestão que as Sr.as e Srs. Deputados tenham a fazer ao Governo nesta matéria.
No que diz respeito à revisão dos contratos-programa com as instituições de ensino superior, a mesma decorre dos próprios contratos-programa, que prevêem que têm de ser avaliados os resultados no final deste ano. Portanto, tem de se ver o que foi feito, o que não foi feito e o que deve ser corrigido.
Quanto aos indicadores objectivos da acção social escolar, provavelmente não fui tão claro quanto devia.
Até este ano, a prática era a seguinte: os orçamentos de funcionamento do ensino superior estão separados dos orçamentos dos serviços de acção social escolar do ensino superior. Primeiro, são orçamentos separados: uma coisa é o orçamento das universidades enquanto tal, definido em função de um conjunto de critérios, outra coisa é o orçamento dos serviços de acção social das mesmas universidades, embora esses serviços dependam das universidades. Não é assim na esmagadora maioria dos países. Segundo, enquanto que do ponto de vista legislativo é claro como é que o Estado deve, respeitando a autonomia universitária, financiar o ensino superior público — isto é, a partir de critérios objectivos, deve decidir como é que reparte o orçamento para o ensino superior pelas várias instituições, pelo número de alunos, pelo custo, pela eficiência, etc. –, o mesmo não é requerido para a repartição do esforço global em acção social escolar do ensino superior pelos diferentes serviços de acção social.
Pode perguntar: então, qual é que era a prática até este ano? Era simplesmente a prática histórica. Era assim em qualquer direcção-geral. Quanto é que este serviço de acção social teve no ano passado? Quanto é que executou? Quanto é que não executou? Quais são as suas necessidades? Em vez de se comparar, à escala global, como é que se reparte este montante para a acção social escolar, no ensino superior todo, pelos diferentes serviços de acção social — em função do número de alunos, dos indicadores de carência desses alunos, etc. Isso não acontecia até este ano.
Este ano, pela primeira vez, introduziu-se experimentalmente um critério cujo impacto não houve tempo para analisar com detalhe mas que o será durante este próximo ano lectivo. E procurámos, obviamente, moderar esse impacto porque não era possível, pela primeira vez na história, fazer um critério objectivo sem um período de teste e experimentação.
É isto que está em curso este ano. Ou seja, o orçamento deste ano aproxima-se de um orçamento histórico no que diz respeito à acção social escolar, porque limitámos as variações. Porque as variações seriam brutais;

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nuns casos para cima e noutros para baixo, e conduziriam, em particular, a reduções significativas dos montantes do Estado para um grande número de serviços de acção social e subidas significativas desses montantes para outros serviços de acção social. Ora, isto exige uma análise fina, para saber se os critérios estão certos, para saber se estes critérios aferidos à realidade local correspondem aos objectivos que queremos.
E os objectivos que queremos são muito simples. É que, de uma maneira geral, se procure encorajar maior eficiência dos serviços e maior transferência de recursos para os estudantes. É isto que queremos! Não queremos alimentar burocracias, queremos que, no essencial, a verba que o contribuinte paga para a acção social escolar se transmita não só em bolsas de estudo como em melhores cantinas, melhores residências, melhores serviços de apoio aos estudantes. É isto! Portanto, pela primeira vez isto fez-se! Está terminado? Não está terminado este processo. Este processo tem de ser agora testado, porque é a primeira vez que aplicamos uma fórmula de critérios objectivos, que obviamente terá de ser corrigida com a avaliação deste ano.
Gostaria de deixar clara também outra questão. Peço desculpa ao Sr. Deputado, mas não estou de acordo com a conclusão de que Bolonha vai homogeneizar o sistema de ensino superior, designadamente politécnicos e universidades. Não vai! Isto é, os politécnicos alemães, os politécnicos finlandeses, os politécnicos suíços ou os politécnicos noruegueses não vão confundir-se com universidades. Têm uma função específica no sistema de ensino superior desses países, e essa função específica, que tem a ver também com uma função específica junto do mercado de trabalho, está a ser, sobretudo, preservada, e é essa a orientação deste Governo.
A orientação deste Governo é não aceitar a extinção do ensino superior politécnico no nosso país e antes procurar o seu reforço e a aproximação do sistema politécnico português aos melhores sistemas politécnicos dos outros países mais desenvolvidos da Europa. Isto implica uma internacionalização do sistema politécnico português, que os critérios dos melhores sistemas politécnicos dos outros países sejam adoptados em Portugal e que haja investigação tecnológica ou investigação aplicada em muitos desses politécnicos. Implica muitas coisas. É isso que estamos a fazer. Portanto, não estamos a pensar, de todo, numa homogeneização dos sistemas. Provavelmente houve aqui uma confusão.
Por último, gostava de voltar a insistir sobre a questão do plano tecnológico. O plano tecnológico é descrito com grande clareza no Programa do Governo como estando assente em quatro vectores estratégicos: um primeiro vector, de melhoria da qualificação dos recursos humanos no nosso país; um segundo vector, de aprofundamento da sociedade de informação, quer no que diz respeito às aplicações sociais e culturais das tecnologias de informação, quer à sua endogeneização por tecido económico e pelo próprio sector económico das tecnologias da informação e comunicação; um terceiro vector, que diz respeito ao desenvolvimento das capacidades científicas e tecnológicas do País e, portanto, ao desenvolvimento da ciência e tecnologia; e um quarto vector, que diz respeito à modernização das empresas e ao desenvolvimento da inovação no tecido empresarial português.
Este Ministério, este orçamento e este programa contribuem expressamente para os vectores que correspondem à nossa matriz de actuação.
No que diz respeito à qualificação dos recursos humanos e no que diz respeito ao ensino superior, o nosso contributo não é só através dos graus do ensino superior e da abertura do ensino superior a novos públicos e a formações pós-secundárias, mas também através da contribuição que a ciência e a tecnologia podem dar ao desenvolvimento das aprendizagens científicas e técnicas nas escolas básica e secundária, que é também para a educação, além do da formação dos próprios professores.
No que diz respeito à sociedade de informação, coordenando as políticas da sociedade de informação do Estado, em colaboração com os outros ministérios e em articulação com o sector privado, que nesta matéria tem um papel absolutamente decisivo, quer no sector das telecomunicações, quer no sector da electrónica e nos outros sectores onde as tecnologias da informação hoje participam abundantemente.
No que diz respeito ao desenvolvimento da ciência e tecnologia, como elemento central da nossa actuação, como aqui está visto, quer no sector público, quer no sector privado e, por último, na contribuição da aproximação entre o sector público e o sector privado, para a modernização das empresas, tendo consciência de que um grande número de vectores para a modernização das empresas e para a inovação não passa directamente pela ciência e tecnologia, mas aquela parte que passa pela ciência e tecnologia, pela endogeneização de capital humano nas empresas e pela investigação em consórcio entre empresas e os institutos de investigação está prevista neste nosso orçamento e neste nosso programa de actividades.
Portanto, o plano tecnológico tem expressão directa não só no orçamento como no plano de actividades deste ministério.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para terminar esta primeira volta, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Teixeira Lopes, do BE.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, começaria por referir que uma leitura política deste orçamento nos leva a afirmar que temos, cada vez mais, um Ministério da Ciência, Tecnologia e, cada vez menos, um Ministério do Ensino Superior. Isto é uma leitura política fundada na análise dos dados.

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Já agora, permita-me também duas notas preambulares.
Em primeiro lugar, de facto, a opacidade dos orçamentos tem vindo a aumentar. Sou Deputado nesta Casa há 4 anos e noto isso cada vez mais. Aliás, o facto de haver várias grelhas de leitura do orçamento e na medida em que todas elas são legítimas faz, simultaneamente, com que nenhuma seja legítima. O raciocínio é este. Porquê? Porque eu falo-lhe a partir de um determinado ponto de vista e o Sr. Ministro responde-me a partir de outro. Falo-lhe, por exemplo, de uma comparação entre a estimativa de 2005 e o orçamento de 2006, em que temos uma quebra no investimento na acção social de 63,5%, enquanto o Sr. Ministro me fala de outros números, mediante outras comparações e outros termos de análise, o que, claramente, dificulta um plano de entendimento, ou seja, as condições de comunicabilidade ficam prejudicadas.
Em segundo lugar, quero também lavrar o meu protesto por ter recebido apenas hoje, às 15 horas e 30 minutos, o complemento com quadros anexos, que não é sequer um orçamento por acções, que o ministério entregou aos Deputados.
Voltando à questão que há pouco referi, devo dizer que, de facto, temos, cada vez mais, um Ministério da Ciência e Tecnologia e, cada vez menos, um Ministério do Ensino Superior. E isto é uma linha de «continuísmo», Sr. Ministro, em relação ao governo anterior. Isto é, temos aqui, claramente, o zeloso cumprimento do Programa de Estabilidade e Crescimento, o qual diz que as verbas para o ensino superior não aumentarão. Se tivermos em conta a inflação e as cativações, vamos ter, de facto, novamente, um decréscimo real no ensino superior. E o Sr. Ministro contra-argumenta: «Mas há perda de alunos, logo, per capita, haverá um aumento».
Mas esse discurso é também o discurso a que já estávamos habituados do governo anterior.
O Sr. Ministro diz que o número de alunos também não é uma fatalidade. Também já o governo anterior dizia que era necessário conquistar novos públicos, mas o que é certo é que nunca houve programas específicos para a conquista desses novos públicos e também não há, do ponto de vista orçamental, estímulo para essa procura de públicos. Claro quer isso vai reflectir-se nos contratos-programa com as instituições e poderá ser um ponto de discriminação positiva, mas o próprio orçamento deveria ter uma estrutura montada para a captação de novos públicos para o ensino superior, e isso não acontece.
A qualidade de ensino fica também, a meu ver, gravemente afectada quando, por exemplo, no que diz respeito às obras, todas as novas obras previstas são praticamente canceladas. Ainda a semana passada tive ocasião, por questões académicas, de estar na Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Faculdade de Coimbra, que funciona num pavilhão gimnodesportivo, e que continuará a funcionar nesse pavilhão porque as obras não avançaram. Por conseguinte, vão ficar congeladas até 2008. É esta a informação que eles têm.
Depois, o Sr. Ministro fala também da comparação entre Portugal e a União Europeia, e isto prende-se também com a questão da qualidade de ensino. Mas vejamos essa comparação. Já agora, parece-me interessante verificar esse aspecto.
No tal relatório que me foi hoje entregue às 15 horas e 30 minutos, refere-se o seguinte: «O nível de financiamento público às actividades do ensino superior é actualmente semelhante ao valor médio praticado na União Europeia a 15, quando quantificado em termos do PIB». Mas o problema todo, Sr. Ministro, é que nós partimos de um atraso incomensurável e abissal, isto é, as taxas de escolarização da população que poderia estar no ensino superior são as mais baixas desta União Europeia a 15, o que quer dizer que não nos podemos contentar com o facto de termos agora um valor de PIB per capita, nesta caso, por aluno, que seja semelhante ao da União Europeia a 15, quando o atraso nos coloca numa situação de clara desigualdade, de décalage, que não será ultrapassada com este orçamento.
Por outro lado, refere-se também a questão da fórmula de financiamento. Há quebras tremendas nas unidades de ensino superior, quebras que, em alguns casos, chegam a ser de 40%. A fórmula, uma vez mais, como todas as fórmulas, tem a desvantagem de, por vezes, ser cega.
Dou-lhe um exemplo: as faculdades que têm ramos educacionais e que têm leitores estrangeiros não podem ter o mesmo ratio de professores doutorados que as demais, e, no entanto, sofrem cortes abruptos com esta fórmula, que, além do mais, foi fracamente negociada ou praticamente não foi negociada com os parceiros. Como é possível haver uma fórmula contratualizada e que, inclusivamente, tem valor de avaliação, quando os destinatários dessa avaliação não foram envolvidos na sua discussão e naquilo que é hoje a sua aplicação? Dirá que os reitores que têm vindo a público denunciar esta situação e dizer que as suas instituições não têm dinheiro para funcionar a partir de uma certa altura do ano são outro lobby corporativo, mas espero que o Sr. Ministro não caia nessa tentação, porque, se cair nela, mais uma vez se nota o tal «continuísmo», neste caso em relação a todo o Governo, isto é, considerar todos os aqueles que são afectados pelos cortes e pelo desinvestimento orçamental como lobbies corporativos.
Já agora, falemos na questão do abandono do ensino superior. Há vários estudos que têm vindo a ser feitos — conheço estudos de Aveiro, de Coimbra e da Universidade do Minho — que mostram como o abandono no ensino superior relacionado com questões económicas tem vindo a aumentar exponencialmente.
Ora, este ano, Sr. Ministro, temos um aumento brutal, em muitos casos, nas instituições, que passaram, algumas delas, da propina mínima para a propina máxima, não havendo praticamente hoje instituições, nem tão pouco as faculdades de letras, que tenham a propina mínima, o que significa num só ano um aumento de

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20%. E é evidente que as propinas estão hoje claramente a cobrir despesas de funcionamento das instituições de ensino superior. Gostava que o Sr. Ministro o assumisse de uma vez por todas, por uma questão de honestidade de discurso, porque dizer que elas são para a promoção da qualidade do ensino superior é falso, elas não são para promover a qualidade do ensino superior mas, sim, para pagar salários e outras despesas de funcionamento, o que implica um esforço inaudito das famílias portuguesas, famílias que, obviamente, têm recursos desiguais e muitas delas vêem os seus orçamentos familiares tremendamente afectados com este aumento de mais de 20%.
A questão do insucesso escolar não pode ser dissociada desta questão do aumento das propinas e do abandono por razões económicas. O Sr. Ministro vai promover um programa de combate ao insucesso escolar, em particular nos primeiros anos, e eu pergunto-lhe se este combate ao insucesso escolar é compaginável com este abandono, comprovado estudo após estudo, por razões estritamente económicas dos estudantes e das próprias famílias.
Por outro lado, no que diz respeito aos 80 000 licenciados — dados que já estarão, certamente, desactualizados — que estão no desemprego e que tendem a estar no desemprego por períodos cada vez mais elevados, que representam já 20% do total de desempregados, gostava de saber como é que tem avançado o ritmo do plano tecnológico de colocação de licenciados em empresas ou em instituições que promovem I&D. Sabemos — e nós já o denunciámos nesta Casa — que esse ritmo era a «passo de caracol». Gostava de obter informações sobre estes programas de colocação, em particular nas empresas que promovem I&D e sobre quantos licenciados é que já temos colocados neste preciso momento.
A questão da acção social escolar cruza-se, mais uma vez, com o tal combate ao insucesso escolar e com a qualidade do ensino. Como é que é possível haver acção social escolar de qualidade, apesar de o Sr. Ministro dizer que há uma revisão dos indicadores através dos quais essa acção social se irá implementar, quando há uma quebra tremenda nas despesas de investimento na acção social escolar de 63,5%, se eu comparar com a página 206 do Relatório do Orçamento do Estado? Sr. Ministro, como é que haverá acção social escolar de qualidade, sem investimento nas cantinas e sem investimento nas residências universitárias? Gostava que me dissesse o que é que se vai passar a este nível.
Ou seja, se ao nível infraestrutural a quebra é tão acentuada, como é que meramente com a questão das bolsas poderemos ter um aumento efectivo e de qualidade na acção social escolar? Por isso mesmo, parece-me que, no que diz respeito ao ensino superior, a palavra de ordem neste caso é de resignação, desinvestimento e «continuísmo» face àquilo que aconteceu nos períodos anteriores. Ou seja, não vamos ter, efectivamente, aumento do investimento no ensino superior, universidades e politécnico, e isto significa, mais uma vez, o cumprimento escrupuloso do Programa de Estabilidade e Crescimento, o que é sabido por todos, mas eu gostava que isto fosse também assumido pelo Sr. Ministro, ou seja, que o Sr. Ministro assumisse, de facto, que esse desinvestimento vai permanecer.
Gostava também de colocar-lhe uma última questão que se prende com a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
Como é sabido, a FCT atravessou no governo anterior um período de enorme turbulência, de enorme desorçamentação e de tropelias várias. Sabemos também que, hoje ainda, há programas e projectos que foram aprovados e não receberam um cêntimo; sabemos também que as unidades de I&D têm o seu pagamento atrasado, havendo projectos que foram aprovados há dois anos e que ainda não receberam um cêntimo.
Em suma, Sr. Ministro, gostava de saber se estes 15% de aumento para a FCT serão suficientes para assegurar o normal funcionamento desta instituição, que é pagar a tempo e horas, ou seja, pagar aos projectos que são financiados, pagar às unidades de I&D e pagar aos bolseiros.
Penso que poderemos ter da sua parte uma palavra de claro compromisso em relação a esta matéria.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr.as e Srs. Deputados, antes de passar a palavra ao Sr. Ministro para responder, quero anunciar que terminámos, agora, a primeira parte da nossa reunião.
Portanto, agradeço que quem quiser pedir esclarecimentos, faça o favor de se inscrever, assinalando-o à mesa, durante a intervenção do Sr. Ministro, para depois regularmos os nossos tempos e, eventualmente, se necessário, adiarmos a audiência seguinte.
Tem, então a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, começo por responder à última questão, pois, com certeza, será a que está mais fresca nos vossos espíritos, relativa à regularização dos pagamentos da Fundação para a Ciência e a Tecnologia a vários projectos.
Como o Sr. Deputado sabe esta é uma preocupação não só do Governo, mas minha, em especial, e sabe que este assunto está a ser regularizado com enorme rapidez. Explicitando: quando iniciei funções no Governo, constatei a existência de projectos que tinham sido avaliados há muito tempo e outros que nem sequer tinham sido avaliados, apesar de o concurso ter tido lugar há muito tempo. Ora, tudo isto já foi feito! Portanto, a regularização de que o Sr. Deputado está a falar não tem a ver com o orçamento do ano que vem, uma vez que o orçamento deste ano permite pagar tudo o que está em atraso nessa matéria. Portanto,

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não há lugar a qualquer regularização, transferida para o ano que vem, pelo que é por este motivo, entre outros, que houve um Orçamento rectificativo.
Em suma: esta questão está resolvida. Aliás, agradeço que me seja transmitida qualquer informação sobre este assunto, porque temos tido um enorme cuidado na regularização de tudo o que estava atrasado nesta matéria, por várias razões, algumas das quais não são sequer da responsabilidade – como deve imaginar – dos próprios funcionários do organismo.
Depois, há muitas questões de pormenor e gostava de deixar claras algumas delas. O Sr. Deputado levantou alguma dúvida sobre o empenhamento político e orçamental deste Governo em atrair novos públicos para o ensino superior. Ora, o número dos cursos de especialização tecnológica, que estavam aprovados e financiados, era de 17; agora são mais de 60. O que nós, Governo PS, encontrámos foi um sistema que estava em avaliação e concluímo-lo relativamente aos pedidos existentes, que tinham sido feitos pelas instituições de ensino superior, no sentido da criação de cursos de especialização tecnológica.
Mas também quero dizer-lhe que o que prevemos, relativamente ao próximo ano, e uma vez terminado este primeiro ciclo dos cursos, é, de facto, ampliar as condições de normalidade da criação de cursos de especialização tecnológica em todo o ensino superior, por não nos parecer normal que o ensino superior funcione sempre através de mecanismos excepcionais, extraordinários, de contratações, etc. em muitas instituições do ensino superior. Entendemos que devem fazer parte da vida normal das instituições, além dos estudantes que estão em mestrados ou em licenciaturas, os estudantes – e devem ser «estudantes elegíveis», designadamente para as fórmulas de financiamento das instituições – que frequentem também cursos de especialização tecnológica.
Tal discriminação é o primeiro passo que gostaríamos de dar, mas façam-nos a justiça de dizer que nós, Partido Socialista, regularizámos este processo, designadamente o processo de financiamento às instituições e aos cursos de especialização tecnológica.
O Sr. Deputado disse também que há muito para fazer nesta matéria e eu concordo. Há muito a fazer e o primeiro passo, agora, seria no sentido de resolver o problema da regulamentação da lei de bases e o segundo passo, para o qual espero contar com o vosso apoio, designadamente o seu, é no sentido de procurar fazer com que junto das instituições de ensino superior se crie a consciência da responsabilidade social do ensino superior, com vista a levar o ensino superior para fora da população tradicional constituída pelos jovens que saem do ensino secundário. Fazer isto exige uma batalha moral e uma batalha política muito intensa, pelo que, espero, todos estejamos nessa frente de batalha.
Também quero deixar clara a questão dos resultados das fórmulas – e já discuti isto, há pouco, com o Sr. Deputado do PSD –, porque as fórmulas são objectivas; as fórmulas podem ter outros critérios, e se houver outros critérios a introduzir nas fórmulas, por favor, digam-nos para podermos discuti-los. Aliás, a vantagem das fórmulas é, precisamente, a de permitirem clarificar quais são os critérios utilizados. As fórmulas não são cegas, antes pelo contrário, são transparentes e objectivas; podem ser diferentes, admito que sejam diferentes, mas, quem quiser que sejam diferentes, proponha essa diferença.
Agora o que não admito é um sistema como aquele que encontrei no Ministério, em que umas instituições não sabiam qual era o financiamento das outras e em que, ficticiamente, se aplicava uma fórmula e, depois, «por debaixo da mesa» havia instituições que recebiam mais do que outras, ou seja, umas instituições recebiam financiamentos às escondidas de outras. Lamento muito, mas não será comigo no Ministério que isso acontecerá.
Também devo dizer-lhe que o critério que utilizámos foi o de não poder haver redução alguma, abaixo de 3%, nas transferências do Orçamento do Estado para qualquer instituição do ensino superior, quando comparado com o ano anterior. Se há instituições dentro de alguma universidade, ou se há alguma unidade orgânica dentro de uma universidade ou de um politécnico, que tenha quebras mais acentuadas, essas quebras mais acentuadas foram decididas internamente e no quadro da autonomia das instituições do ensino superior. Aquilo que o Ministério definiu foi o plafond para cada uma das universidades e para cada um dos politécnicos e posso garantir-lhe que nenhuma delas se reduziu mais do que 3% relativamente ao ano anterior.
Também quero deixar clara a questão dos salários, para que não restem dúvidas: não há instituição alguma do ensino superior em que a transferência do Orçamento do Estado seja inferior ao valor das remunerações certas e permanentes dessa instituição. E, nos raros casos em que isto acontecesse, foram reforçados os contratos-programa para que estes cobrissem tais diferenças, sendo que, em muitas instituições a dotação é muito superior ao valor das remunerações do pessoal dessas instituições.
Relativamente à questão das obras no ensino superior, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, discuti-a, há pouco, com a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, mas quero esclarecê-la melhor e, por isso, até gostava que esta discussão se fizesse como uma discussão política.
Mas, a este propósito, posso dizer-lhe que, neste momento, estão 120 obras em curso no ensino superior público financiadas pelo Estado. Mas como existe uma redução do número de estudantes do ensino superior, existem inúmeros cursos em perda acelerada, existem instituições com instalações vazias, e, então, espero que o Sr. Deputado forneça contributos para uma política nacional que permita reorganizar o parque instalado do ensino superior português.

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Esta deriva de estar constantemente a medir a evolução do ensino superior pela criação de mais obras no ensino superior, peço-lhe desculpa, mas é totalmente inaceitável! Porque todos pagamos isto, designadamente os estudantes do ensino superior, porque é dinheiro que não vai para eles ou irá mais tarde para eles, para instalações vazias... Dir-me-á, o Sr. Deputado: mas há sítios onde são precisas. E eu respondo-lhe: pois, há! E foi por este motivo que não contestei qualquer uma das obras que estivessem em curso e adjudicadas, mesmo aquelas que parecessem absurdas ao comum bom senso.
O Sr. Deputado quer que eu concorde com a criação e a instalação, que estão em curso, de uma escola superior de música encostada à segunda circular de Lisboa? E quer que eu mande averiguar quais são os custos de insonorização?! Não tenho condições, nem creio que o País as tenha, para mandar suspender esta obra, mas considero a sua localização absurda, e posso dar-lhe inúmeros exemplos desta matéria.
Entendo que tudo isto tem responsáveis, mais do que isto, que tem custos e estes custos significam que existem investimentos que estão a ser feitos mas não deviam ser feitos. Esta pausa nas obras do ensino superior parecem-nos absolutamente indispensáveis, dado o volume das obras neste momento em curso, e era preciso parar com esta deriva do betão no ensino superior. É necessária mais construção? Pois, com certeza que é, estamos de acordo! Mas não é possível continuar na deriva que estávamos a seguir. Sei que é extraordinariamente populista e fácil dizer: «faz-se mais esta obra ou mais aquela obra…». Lamento muito, mas a política do ensino superior não pode ser essa! Relativamente ao que o Sr. Deputado disse sobre as várias grelhas de leitura, devo dizer-lhe que não estou de acordo com a ideia de que várias grelhas de leitura de uma realidade prejudiquem a comunicabilidade.
Sr. Deputado, creio que deve haver um ponto de entendimento entre a engenharia física, de onde sou proveniente, e a sociologia, de onde V. Ex.ª provém e na qual foi educado: é que a comunicabilidade e a inteligibilidade exigem várias grelhas de leitura e não um prisma único de leitura. Quando lhe digo que a verba aumenta, quero significar que diminui nas obras e aumenta no investimento corrente, pois, com certeza que num sítio aumenta e noutro diminui. E não escamoteei este facto, somando os dois para lhe demonstrar que aumentava tudo um bocadinho. Não! Há uma coisa que diminui muito, que são as obras, e outra que aumenta um pouco, que é o funcionamento. Pode fazer outra leitura, é livre de fazê-lo, porque tem todos os quadros à sua frente! Também não estou de acordo com a sua leitura política da ciência e tecnologia contra o ensino superior – e esta é uma questão de fundo –, porque entendo que não há qualidade e desenvolvimento da qualidade no ensino superior sem ciência e tecnologia no ensino superior. Esta ideia de opor o ensino à ciência é uma ideia fácil na análise do ensino superior, mas não é uma ideia produtora de melhorias e, portanto, neste ponto peçolhe alguma reflexão sobre esta matéria. Fazer com que o ensino superior cresça ligeiramente num período de diminuição do número de alunos e possa crescer mais…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Só se for com a taxa de inflação prevista pelo Governo!

O Orador: — Desculpe, mas o funcionamento não desce, mesmo com a inflação! Descem as obras, nisto estamos de acordo, mas o funcionamento não desce!

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — A taxa de inflação vai ser superior a 4%!

O Orador: — Acha que vai ser superior a 3,4%, muito bem. Bom, longe vá o agoiro! Então, a sua previsão é de que a taxa de inflação será de 4%, 5%? Não será de 3,4%?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — É que aos valores acrescem as cativações!

O Orador: — Claro, com certeza!… As cativações e outras desgraças.
Sr. Deputado, estamos a comparar orçamentos iniciais, não é verdade? No que diz respeito ao crescimento da ciência e da tecnologia, insisto que uma grande parte dele, como reconhecerá, será captado pelo ensino superior em formas competitivas.
Espero que esteja de acordo com isso, espero que concorde que uma parte do desenvolvimento do ensino superior deverá ser o aumento da ciência e da tecnologia, das actividades de investigação, dos centros de investigação, do envolvimento dos estudantes nas actividades de investigação, desde os primeiros anos no ensino superior. É isso que diz este orçamento.
Por último, não vou comentar, porque penso que o Sr. Deputado sabe, melhor do que eu, com certeza, que ser licenciado não é um passaporte para o desemprego; ser licenciado é, dentro do conjunto dos desempregados, a melhor das garantias disponíveis para obter emprego, e que o desemprego sazonal dos licenciados, quando terminam os cursos, é recorrente todos os anos.
Mas, no que diz respeito aos estudos sobre o abandono do ensino superior, o Sr. Deputado conhece, tão bem como eu, os indícios que existem e os pequenos estudos que foram feitos em algumas universidades. O que posso garantir-lhe é que será feito, durante este ano, um estudo alargado, sistemático e exaustivo ao ensino superior português, sobre as causas do abandono escolar, designadamente nos primeiros anos, e as modalidades do insucesso escolar no ensino superior. Será um estudo de grande dimensão, para o qual espe-

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ro contar com a colaboração da maioria dos centros de investigação portugueses competentes nesta matéria, para clarificarmos, de uma vez por todas, este problema e para podermos fundar uma acção rigorosa e focada sobre as áreas em que a intervenção pública é possível.
Estou convencido de que pode haver margens onde estudantes estão mal cobertos pela acção social, ou não são cobertos pela acção social, mas deveriam ser cobertos pela mesma.
Mas é por isso, Sr. Deputado, que todos precisamos uns dos outros, porque, neste momento, é preciso olhar para os serviços de acção social com uma atitude de enorme rigor e não de complacência.
A verba da acção social tem de ser concentrada para chegar aos estudantes e não podemos ter nenhuma complacência nesta matéria. Se uma parte significativa, como os números parecem indiciar, da verba pública para os serviços de acção social serve para alimentar estruturas que poderiam fazer sentido no passado, mas que hoje são claramente ineficientes e incompatíveis com uma transferência de mais recursos para os estudantes do ensino superior, não se deve proceder à fuga para a frente para aumentar recursos mas, sim, em primeiro lugar, ver se esses recursos chegam aos estudantes e fazermos todos uma aliança para que isso aconteça e para tornarmos mais eficientes os serviços de acção social.
Portanto, é este o propósito do Governo e estamos abertos a todas as sugestões que possam vir dos vários partidos políticos nesta matéria.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, vamos iniciar a segunda parte da nossa reunião conjunta com a equipa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que está dentro da hora programada para terminar.
Estão inscritos a Sr.ª Deputada Paula Barros e os Srs. Deputados Miguel Tiago, Pedro Duarte, Eugénio Rosa e João Teixeira Lopes. Se não houver mais nenhuma inscrição, considero-as encerradas.
Proponho que cada Deputado intervenha durante 5 minutos e apelo, encarecidamente, ao vosso poder de síntese, para ver se podemos iniciar a reunião com o próximo ministério às 18 horas.
Agora, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Barros.

A Sr.ª Paula Barros (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr.
Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Caros Colegas, tentarei ser breve.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que, no âmbito da análise generalizada do Orçamento do Estado e, no caso concreto, no que diz respeito à ciência, tecnologia e ensino superior, não podemos deixar de manifestar não digo a nossa surpresa, porque conhecemos e acreditamos na visão estratégica do Ministério face às matérias do seu âmbito de competência, mas, sim, o nosso agrado e apoio por verificarmos que estão enquadrados orçamentalmente os objectivos propostos no Programa do Governo.
Não tencionamos deixar passar a oportunidade para vermos aqui objectivadas algumas questões que colocaremos a seguir, mas também não queremos abdicar de saudar o regresso do Programa Ciência Viva, que vemos contemplado no Orçamento deste Ministério com 5% das verbas destinadas à ciência e tecnologia.
É que acreditar neste Programa pode parecer uma visão reducionista, e já alguém a assumiu dessa forma, mas o Partido Socialista não a assume assim. Aliás, entendemos a desvalorização deste Programa, ao longo dos três últimos anos, como uma grande falta de visão estratégica no que respeita à educação, na sua globalidade, e à formação científica, em particular.
Consideramos que este Programa funciona como um incentivo sustentado, tem um forte pendor para os ensinos básico e secundário e potencia capacidades fundamentais dos jovens no campo da investigação, da reflexão e do desenvolvimento de espírito crítico. Julgamos que essas capacidades são o motor fundamental de motivação e de sucesso real no percurso escolar básico e secundário dos jovens, bem como o sustentáculo para o ensino superior.
Cremos que estes incentivos estratégicos são indispensáveis para podermos acreditar numa verdadeira qualificação dos portugueses, que os virá a tornar competitivos no campo nacional e internacional. E conseguimos, assim, ver mais de perto a concretização do objectivo do Governo de alargamento do número de investigadores e de técnicos em Portugal, suportado também no aumento orçamental destinado ao emprego científico.
Sr. Ministro, sendo a nossa preocupação a qualificação dos portugueses, gostaríamos que V. Ex.ª nos desse alguns esclarecimentos relativamente à importância de acreditação da experiência profissional, por força do Processo de Bolonha, para o reingresso no sistema por parte daqueles que o abandonaram; ao impacto do novo modelo de avaliação internacional das instituições do ensino superior, no que respeita à aferição da qualidade da formação ministrada; e, ainda, à reorganização coerente do ensino superior, com vista a uma resposta eficaz, face às necessidades do mercado de trabalho e ao alargamento dos horizontes de intercâmbio internacional.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr.
Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, antes de mais, pretendia dizer que caso

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venha a existir, durante a minha intervenção, alguma sobreposição, que tentarei que seja a menor possível, com o que anteriormente disse um membro da bancada meu partido, será porque não nos sentimos esclarecidos com as respostas dadas nessas matérias. Ainda assim, tentarei não o fazer, embora seja ela seja inevitável em algumas matérias.
Começarei exactamente pelo que consideramos o acentuar do subfinanciamento no ensino superior.
O Sr. Ministro já referiu que existe uma compensação no aumento do financiamento da ciência e da tecnologia, sendo grande parte desse aumento dedicada, em grande parte, ao ensino superior. Isso já acontecia no ano passado, portanto, se formos a ver, os aumentos não compensarão sequer o corte.
Há, efectivamente, um corte, que é inolvidável e não dá para esconder. Portanto, no geral, do Orçamento do Estado irá menos 2,26% para as universidades, menos 3,38% para os politécnicos e os serviços de Acção Social Escolar serão afectados em percentagens ainda maiores, também negativas, mas já iremos à Acção Social Escolar.
Sobre a fórmula de financiamento, que o Sr. Ministro referiu no início da sua intervenção como algo muito objectivo por introduzir um conjunto de critérios objectivos, devo dizer que esses critérios são objectivos, sem dúvida, mas também são discutíveis. Aliás, eles não são discutíveis, a sua utilização é que é discutível. Introduzir com alguma ponderação o sucesso das graduações, portanto, a percentagem de graduações, a quantidade de graduações e a qualificação dos docentes não nos parece, com muita ponderação, um aspecto tão positivo, porque, em vez proporcionar um equilíbrio entre as instituições com mais necessidades, potencia exactamente o acentuar do fosso, a não ser que seja uma ponderação inversa, mas não foi isso que deu a entender na sua intervenção.
Na sua intervenção, o Sr. Ministro deu a entender que serão beneficiadas as instituições que já dispõem das melhores condições de graduação e da melhor qualificação do corpo docente. Portanto, parece-nos que isso não pode ser aplicado como um standard, tem de haver algum critério que equipare o mais possível as instituições não discriminando as que têm actualmente mais dificuldades.
Além disso, não se pode falar do que está nos quadros, no Relatório, e nas somas dos orçamentos privativos sem referir as propinas e a previsão que o Governo faz do aumento das contribuições dos estudantes. E, se olharmos para o Quadro II do último documento que o Ministério nos distribuiu para nos ajudar a situar, o aumento de 1,9% na área do Ensino Superior contém as receitas próprias e, aqui, se separarmos das receitas próprias as propinas, veremos que as propinas desempenham, este ano, no total do orçamento, um papel ainda maior do que no ano passado, crescendo, se não me engano, 2%.
Portanto, estamos a falar de um orçamento que não cresce, que aumenta abaixo da inflação, e que, ainda assim, onera cada vez mais as famílias e os estudantes, o que vai completamente ao arrepio do que deveria ser o papel do Estado, que é exactamente o de garantir a educação em todos os seus graus.
Sobre a Acção Social Escolar, Sr. Ministro, há um conjunto de dados. No Relatório, fala-se do apoio directo e do seu reforço – não poderíamos estar mais de acordo com o reforço ao apoio directo –, mas não se fala, curiosamente, do reforço ao apoio indirecto, que também sofre de um conjunto da carências muito vasto, até mais no plano das residências do que no das cantinas.
Gostaria de saber quais são as intenções do Sr. Ministro, no que respeita aos apoios indirectos aos estudantes no quadro da Acção Social Escolar, porque a Acção Social Escolar, em termos de transferência para as universidades e para os politécnicos, também tem um decréscimo de verba, que é significativo, principalmente no investimento.

Aparte inaudível do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Sim, Sr. Ministro, se não tivermos em conta as receitas próprias. Estou a falar da transferência do Orçamento do Estado. Tenho aqui as contas e o crescimento é negativo.

Aparte inaudível do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Então, tem de confirmar isso, porque é. Aliás, não sou o primeiro a dizê-lo, todos os Deputados que aqui intervieram o disseram, à excepção, obviamente, dos da bancada do PS.
Até lhe digo, por exemplo, que a soma da Acção Social Escolar, no ano passado, relativa ao ensino universitário e politécnico, era de 118 milhões de euros, arredondando, e que este ano vai ser de 111 milhões de euros, pelo que há, claramente, um decréscimo.
Mas queria colocar a ênfase na seguinte questão: o que é que irá acontecer aos apoios indirectos, isto é, às cantinas e às residências? Gostaria ainda de saber por que é que os empréstimos aparecem agora, e muito claramente, sem escamotear, o Sr. Ministro assume, logo no Relatório,…

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, peço desculpa por interrompê-lo, mas talvez não estejamos a olhar para o mesmo Orçamento.
Se tem à sua frente os quadros VI e VII, que foram distribuídos, verificará que só a parte de transferências do Orçamento do Estado para a Acção Social Escolar, «Bolsas+Funcionamento», representa 155 milhões de

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euros contra 143 milhões de euros, no ano passado, pelo que me parece que essa verba está a aumentar. O que está a diminuir, de facto, é a verba destinada às obras da acção social escolar, para as quais estavam orçamentados 72 milhões de euros e passam a estar 33 milhões de euros.
Sr. Deputados, interrompi-o só para perceber se estamos a olhar para os mesmos números.

O Orador: — Eu estava a dizer, e o Sr. Ministro sabe-o, que aquilo que vai para as bolsas dos estudantes é o que está nos serviços de acção social das universidades e dos politécnicos e esta parcela é diminuída, e como se pode ver neste quadro, ela diminui de 75 para 74 milhões de euros, aumentando ligeiramente, para 34 milhões de euros, nos politécnicos, mas se formos fazer a soma dos privativos, não são esses os números.
É disto que estou a falar, daquilo que está nas universidades e nos politécnicos, que é o que vai para os estudantes do ensino superior público. E, relativamente às universidades e politécnicos a acção social é cortada – julgo que o Sr. Ministro concordará comigo.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não, não!

O Orador: — Então, peço que, depois, me clarifique.
Sobre os empréstimos, para terminar, parece-me importante que o Governo clarifique muito esta questão, dizendo, nomeadamente, de que forma, com que verbas, que verbas guardará e como para a garantia desses empréstimos, e se o Sr. Ministro confirma aquilo que, de alguma forma, já deu a entender, na sua primeira intervenção e na sua primeira resposta a uma pergunta hoje aqui colocada, salvo erro pelo PSD, e no relatório do Orçamento do Estado.
Portanto, fica é confirmado que os empréstimos estão a ser encarados como um complemento da acção social escolar e que, de futuro, as verbas para os empréstimos vão estar incluídas nas verbas para a acção social escolar. É que, se sim, se os empréstimos são encarados como um complemento da acção social escolar, estamos, mais uma vez, perante a desresponsabilização do Governo de uma função básica que lhe incumbe realizar, que é a de garantir o acesso à educação, através de bolsas e não de empréstimos.
Assim, o que o Governo está a fazer aqui é, de alguma maneira, passar a acção social escolar para o sector privado, beneficiando, obviamente, os bancos, que, sem risco, porque o Estado, neste caso, cobre o risco da banca, vendem o seu crédito. Então, pergunto: com que objectivo vão ser feitos estes empréstimos? São para possibilitar a frequência do ensino superior? É que este é um papel do Estado e o Sr. Ministro disse, claramente, que os estudantes carenciados vão ter condições especiais de acesso a estes empréstimos e é a estes que o Estado dará especial atenção. Portanto, estamos a falar de acção social no sector privado.
Esperemos que isso não venha a significar, a médio prazo, uma diminuição das bolsas mas, independentemente de vir ou não a significar uma diminuição das bolsas, parece-me que deve ficar claro se o Governo tenciona ou não alargar o âmbito das bolsas, os critérios de atribuição, tornando-os mais amplos, e o próprio valor das mesmas, ainda que não seja para já, porque já vimos que não é, ou se a sua política é a de, ao invés disso, recorrer a mecanismos como o dos empréstimos.
Uma última pergunta sobre os empréstimos tem a ver com o seguinte: foi indicado pelo Sr. Ministro, na imprensa, que o período de carência poderia rondar os dois ou três anos. Que estudos sustentam este período de carência? Que estudos existem sobre a empregabilidade dos recém-licenciados e o período que passam no desemprego ou com vínculos precários? Ou seja, que estudo sustenta estes dois ou três anos, que não são um número meramente indicativo e, logo, de grande subjectividade? Para terminar, duas questões muito rápidas.
No relatório, e isto pode não ser uma questão orçamental mas está no relatório e, por isso, não somos nós que a trazemos para aqui, é o próprio Governo, diz-se, duas vezes «(…) rever as leis que regulam a autonomia e governo de universidades e politécnicos (…)». Era bom que fosse clarificada a forma como vai ser feita esta revisão da lei de autonomia. Os estudantes vão ou não manter as posições que têm nos órgãos de gestão? Os órgãos vão manter a configuração de poderes que têm actualmente ou vai haver perda de poderes por alguns e aquisição por outros? Como é que será? Julgo que o Sr. Ministro terá alguma perspectiva quanto a isto.
Mesmo, mesmo para terminar, muito rapidamente, o PS, na última legislatura, tal como o PCP, apresentou um projecto de resolução no sentido da reactivação do Instituto Geológico Mineiro com autonomia. Qual é, neste momento, tendo em conta que os argumentos apresentados, na altura, continuam a ser válidos, a posição do Ministério e do Governo perante isto?

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Deputado.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, com frontalidade, tenho de lhe dizer que fico um pouco preocupado com a nossa reunião de hoje, porque me parece que temos um problema político muito forte no âmbito do seu Ministério, que decorre, desde logo, admito, de um equívoco orgânico.

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E digo isto porque corroboro as palavras já aqui ditas de que o Sr. Ministro tem a responsabilidade de três áreas distintas que, evidentemente, não são contraditórias, pelo contrário, são compatíveis e conciliáveis, embora distintas, mas ficamos todos um pouco com a sensação de que o Sr. Ministro gostaria de ter voltado ao Governo com a mesma pasta que teve há uns anos atrás, a da Ciência e Tecnologia, no, no entanto, agora, tem o incómodo, a maçada de ter de tratar também das matérias do ensino superior e, ainda por cima, veja só, também das matérias da Sociedade da Informação. É a conclusão que podemos retirar do Orçamento do Estado e, mais do que isso, se calhar, até da conversa que estamos aqui a ter hoje.
Sr. Ministro, é bom que fique claro que o plano tecnológico anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro não significa apenas a devolução da autonomia financeira aos laboratórios de Estado, é muito mais do que isso. O plano tecnológico era, nas palavras do Sr. Primeiro-Ministro, a mola impulsionadora da competitividade da economia portuguesa e do crescimento económico. Ora, nós, «espremendo» aquilo que é este Orçamento do Estado, chegamos à conclusão de que houve um claro retrocesso nesta área – esta é a conclusão que podemos tirar.
O Sr. Ministro bem pode dizer que analisarmos dados comparáveis e não analisarmos dados que não são comparáveis é termos um só prisma de avaliação, mas eu prefiro esse prisma único de rigor do que comparar dados que não são comparáveis. E, se analisarmos esses dados comparáveis, chegamos à conclusão de que, na área da Sociedade da Informação, há, claramente, um decréscimo do investimento. Não está apenas em causa o não cumprimento daquelas que são as promessas, os anúncios periódicos, que, aliás, têm ocorrido, por parte do Governo, nesta área, é muito mais grave do que isso, estamos a decrescer, e já me referi aos números na primeira intervenção e não fui desmentido, porque o Sr. Ministro, naturalmente, é uma pessoa rigorosa e, portanto, com certeza, corrobora e aceita esta minha avaliação.
Sr. Ministro, nesta área, pergunto-lhe: onde é que está, neste Orçamento do Estado ou em todo o relatório ou no extenso texto que antecede o próprio Orçamento, o Plano de Acção para a Sociedade da Informação? Onde é que está o Plano de Acção para o Governo Electrónico? Onde é que está a Iniciativa Nacional para a Banda Larga, que está em concretização e bem precisa de voltar a retomar o seu andamento? Onde é que está o Programa Nacional de Compras Electrónicas? Há, nesta área, uma perigosa paragem e estagnação que me parece poder vir a ter consequências dramáticas, porque o mundo não pára, a tecnologia está a evoluir, as sociedades com que competimos e convivemos todos os dias estão a evoluir e, além disso, o Estado português tem de recuperar de um atraso estrutural, o que não se consegue com a estagnação e a confusão que verificamos neste momento.
Admito, Sr. Ministro, que a culpa não seja sua, aliás, parece-me que se trata de um problema orgânico, como disse há pouco, pois é evidente que esta área deveria estar num ministério com competências de coordenação ao nível de todo o Governo, uma vez que se trata de uma matéria transversal e o seu enclausuramento no Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior é, pois, um erro e vale a pena reconhecê-lo rapidamente para que todos possamos rectificar e voltar a dar o impulso devido a esta área.
Por vezes, há a tentação, por parte de quem não acompanha estas matérias, e o Sr. Ministro sabe disto, de entender que as tecnologias de informação devem ser um coisa para cientistas e, portanto, devem ser colocadas junto à ciência e tecnologia, que, infelizmente, também é uma área muitas vezes desvalorizada, como o Sr. Ministro aqui bem referiu, até no campo político. Só que o Sr. Ministro sabe bem que não é assim, que, quando falamos da Sociedade da Informação, estamos a falar, desde logo, da competitividade da economia portuguesa, para além de muitas outras coisas. Mas a realidade é que esta área, infelizmente, tem sofrido uma desvalorização.
A segunda questão que lhe quero deixar tem a ver com o seguinte: a comparação dos números que nos foram apresentados, e isto é importante, porque todas as bancadas parlamentares sentiram confusão quanto à comparabilidade dos números que nos são apresentados, leva a que concluamos, se formos rigorosos na avaliação, que a suposta subida do Orçamento do Estado, no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, mais não seja do que uma consequência das alterações orgânicas introduzidas pelo actual Governo. E aquilo que o Sr. Ministro…

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Ó Sr. Deputado, peço desculpa mas não! Foi corrigido e tem exactamente a mesma orgânica que para o ano de 2005. Não me faça a injúria de dizer…

O Orador: — Vou dar-lhe um exemplo, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — … que lhe vou apresentar dados aldrabados.

O Orador: — Não! Como o Sr. Ministro bem disse, os números são apresentados da forma que lhe parece mais interessante e eu diria mais conveniente, mas esta já é a minha palavra.
Vou dar-lhe um exemplo: o Sr. Ministro fez questão de referir que o orçamento para o INETI era excluído mas, por exemplo, relativamente ao Programa Operacional da Sociedade do Conhecimento não há qualquer referência de que agora é introduzido no âmbito do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e, como sabe, no Orçamento para 2005 estava nos Encargos Gerais da Nação no âmbito da Presidência do Conselho de Ministros.

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Portanto, Sr. Ministro, tudo isto tem de ser bem cruzado e, se fizer este exercício, como, aliás, já se propôs fazer, e voltarmos, depois, a discutir esta matéria, parece-me que valerá a pena, uma vez que vamos chegar, acredito eu, à mesma conclusão.
De resto, para não perder muito mais tempo, porque, para nós, essa matéria, como digo, infelizmente, é uma realidade, gostaria de dizer que, mesmo naquela área que admito que, sinceramente, o Sr. Ministro mais gosta de acarinhar, e ainda bem, porque é bem preciso gente, nomeadamente no âmbito do exercício da actividade política, que tenha uma predisposição para a aposta na ciência e tecnologia, na investigação e desenvolvimento, mesmo aqui, vejo com alguma dificuldade a forma como o Governo vai concretizar o objectivo ambicioso, que foi delineado no seu Programa do Governo e que é reafirmado no texto que acompanha este Orçamento do Estado, de duplicação do investimento em investigação e desenvolvimento.
É que o passo que está a ser dado este ano, como o Sr. Ministro reconhecerá, é muito curto para podermos chegar a esse objectivo. Portanto, se o Sr. Ministro tiver já um plano, e admito que sim, porque estes números, naturalmente, não são atirados para o ar sem fundamento, é bom que nos diga qual vai ser o escalonamento, qual vai ser a progressão deste aumento do investimento, ao longo dos anos, até ao final da Legislatura, porque nós gostávamos de perceber como é que isto vai ser feito. Admito que, por razões de responsabilidade política, não será no último ano, antes das eleições, e o Sr. Ministro também admitirá, que iremos, rapidamente, perder o controlo das contas públicas e aumentar o investimento para cumprir uma promessa eleitoral. Esta é, pois, uma questão concreta que lhe deixo aqui.
Uma outra questão concreta vai no sentido de saber se o Sr. Ministro já estimou quais os valores da quebra de receita fiscal que pode estar associada ao apoio fiscal à aquisição de computadores por parte de estudantes.
Quanto ao ensino superior, para nós, também fica claro que não existe a aposta que seria desejável. Não vou dizer que se trata de uma desvalorização do ensino superior, porque isto tem uma carga subjectiva muito forte, mas parece-me que isso é claro.
O Sr. Ministro fez alusão a financiamentos supostamente menos claros no passado, o que me parece uma acusação complicada, pelo que era interessante esclarecê-lo. Se se estava a referir a contratos-programa que eram estabelecidos com instituições, o Sr. Ministro, agora, prevê aumentá-los e, portanto, por aí… Não sei se são esses os financiamentos por baixo da mesa mas, em todo o caso, parece-me uma acusação grave não tanto ao Governo anterior, porque, esse, foi julgado nas urnas, mas, principalmente, aos responsáveis das instituições de ensino superior em causa, que, certamente, não corroborarão essa opinião.
Deixo ainda uma palavra muito simples no que diz respeito à acção social escolar, porque a matéria já foi bastante aflorada.
Sr. Ministro, esta era uma prioridade do Governo anterior. Havia uma aposta clara na acção social escolar e um consenso estabelecido aqui, na Assembleia da República, por parte de todas as forças partidárias, incluindo o Partido Socialista, porque todos percebíamos que teríamos de reforçar, de forma muito intensa, a acção social escolar no ensino superior, por um conjunto de razões, incluindo pelo facto de se ter verificado, de há poucos anos a esta parte, um aumento das propinas no ensino superior, na altura, com a oposição do Partido Socialista – bem sei – mas, felizmente, mudaram de opinião, e ainda bem para bem de todos nós, e não revogaram essa medida.
Mas, o que é facto é que esse aumento de propinas está a levantar problemas de sucesso escolar, desde logo, e de abandono escolar no ensino superior. Há dados que nos dizem isso, há um estudo, e não o conheço aprofundadamente a não ser pelo que vem nas notícias de hoje, que nos diz que um terço dos alunos admite deixar a Universidade de Aveiro por causa da propina máxima. É um título de um jornal de hoje, relativo a um estudo que foi ontem conhecido. Não sei se será um terço, se será metade, se serão 10%, mas desde que haja um aluno que deixa de estudar por razões económico-financeiras, parece-me que o Estado tem a obrigação de olhar para esse caso.
Por isso, aquilo que está a verificar-se em termos de acção social escolar é preocupante face ao futuro do nosso ensino superior e de uma vontade que comungamos: a de querermos aumentar a participação dos nossos cidadãos no ensino superior.
Gostaria, ainda, de deixar uma palavra sobre o sistema de empréstimos, que tive oportunidade de dizer que o PSD subscreve, para deixar bem claro que não percebemos muito bem o que está em causa nesta sua proposta de criação de um sistema de empréstimos. Não aceitamos que este seja um sistema para substituir, nem sequer para complementar, a acção social escolar. É importante que este aspecto fique claro, mas da sua intervenção não sei se isso terá ficado totalmente expresso.
Não podemos, de maneira alguma, subtrair uma responsabilidade do Estado – e assumimo-lo – através de um sistema de empréstimos. Não sabemos quem vai ser abrangido por esse sistema de empréstimos, não sabemos o que é abrangido no seu âmbito: é o valor da propina? São os custos de frequência de forma mais genérica?... Portanto, queremos deixar claro que temos algumas dúvidas no que diz respeito a esse sistema.
Já quanto ao dar autonomia aos alunos estamos inteiramente de acordo, mas nunca para suprir dificuldades económico-financeiras de estudantes mais carenciados.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa para pedir esclarecimentos.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, começo por deixar uma pequena nota: das nove perguntas formuladas pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita o Sr. Ministro só respondeu a três; espero ter mais sorte! Sr. Ministro, apesar de ter ouvido a sua posição relativamente à construção de novos estabelecimentos de ensino, vou colocar uma questão sobre essa matéria.
O PCP apresentou um requerimento relativo a um projecto, ao qual recebemos recentemente uma resposta escrita do Ministério, que vou lembrar para depois procurar ouvir a posição de V. Ex.ª.
Em 2004 foi assinado um contrato entre o Ministério e o Instituto Politécnico de Beja para a construção da escola superior de tecnologia, uma área que é bem simpática para o Sr. Ministro.
Em Maio de 2005, apresentámos um requerimento e, em Agosto, o Ministério que V. Ex.ª preside respondeu que o projecto se encontrava inscrito no PIDDAC com uma programação financeira de cerca de 10 milhões de euros, que tinha sido já dispendido meio milhão de euros e que para este ano, 2005, havia uma verba que não foi disponibilizada.
No PIDDAC para 2006 vemos «zero». Sr. Ministro, depois de ter acenado que «sim» e logo que «não», responda-me, por favor! Sr. Ministro, passo agora a perguntas concretas.
Primeira questão: no relatório que nos foi apresentado consta que o número de docentes no ensino superior anda à volta de 21 500. Se possível, gostaria de saber qual a percentagem de professores com vínculo precário e seus reflexos na qualidade e resultados obtidos. Gostaria ainda de saber se nesta área, que é fundamental, o Ministério pensa alterar a situação ou mantê-la.
Segunda questão: qual o número médio de anos que, em Portugal, se demora para alcançar uma licenciatura de cinco anos? Gostaria de ter esta informação por áreas científicas e quais as suas causas.
A terceira questão está ligada à adequação das saídas às necessidades de desenvolvimento. Se analisarmos quer a forma como se repartem os inscritos no ensino superior quer mesmo as saídas da universidade, concluímos que a grande maioria dos alunos, quase 60%, estão em áreas das ciências da educação, das humanidades, das ciências comportamentais, etc. Portanto, as áreas de saúde e de tecnologia não chegam a representar 20%. Muitos destes licenciados, depois, não encontram emprego, estão desempregados ou têm até de mudar de profissão, chegando-se mesmo ao ponto de utilizar fundos comunitários para reciclar os licenciados que saem da faculdade e que depois não encontram trabalho, até porque grande parte deles não correspondem às necessidades de desenvolvimento do País.
Assim, Sr. Ministro, a pergunta que quero colocar-lhe é a seguinte: o que é que pensa sobre esta não adequação das saídas das universidades às necessidades de desenvolvimento? O que pensa o Governo fazer para alterar a situação, se é que pensa alterá-la? No que respeita às despesas de investigação e desenvolvimento e à sua eficácia, elas representam cerca de um terço, ou menos, da média comunitária e têm diminuído. Mais grave ainda é que mais de 80% desse esforço é feito pelo sector público, sendo a parte de participação das empresas extremamente baixa, mas, mesmo assim, essa parte de participação pública é de eficácia reduzida porque tem pouca aplicação nas empresas. Pergunto: como é que o Governo pensa conseguir, por um lado, uma maior participação das empresas nas despesas de investigação e desenvolvimento e, por outro lado, uma maior aplicação no trabalho de investigação e inovação financiado por fundos públicos? Passo à última pergunta. Na generalidade dos países, de acordo com os dados da OCDE, que estão disponíveis e que conheço, a despesa por aluno no ensino superior é mais elevada do que no ensino secundário, mas, em Portugal, penso que acontece precisamente o contrário. Esta discrepância relativamente ao que acontece nos outros países continua? Quais são as suas causas? Como é que o Governo pensa alterá-las, se é que deve alterá-las, evidentemente?

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, gostava de voltar a colocar-lhe uma questão que há pouco foi respondida de forma a suscitar-me uma nova dúvida.
Antes, porém, gostava de dizer-lhe, Sr. Ministro, que esta concepção binária do seu Ministério não advém de qualquer pressuposto da nossa parte mas, pelo contrário – isso, sim –, da leitura dos números. Este Ministério a duas velocidades é que não permite energias, vasos comunicantes e sinergias entre investigação e ensino superior.
Se de um lado temos condições pedagógicas degradadas, qualidade de ensino com condições de aprendizagem degradas e subinvestimento no ensino superior, as sinergias conseguidas na investigação científica não serão potencializadas. É tão simples quanto isso! Por conseguinte, a tal concepção binária que há pouco referi não advém, de forma alguma, de uma concepção nossa mas, sim, da leitura dos números e do funcionamento do seu Ministério.

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Por outro lado, gostava de colocar-lhe uma questão para que possamos falar claro. O Sr. Ministro, há pouco, quando mencionei o aumento muito elevado das propinas, o aumento do valor da propina mínima para o valor da propina máxima, referiu que não há, nas dotações orçamentais, nenhuma instituição que não tenha o seu funcionamento coberto.
Sr. Ministro, volto a colocar-lhe a questão: o Ministério cobre com dotação orçamental todas as despesas de funcionamento das instituições de ensino superior, ou seja, salários e demais despesas de funcionamento? Porque, se a resposta for «sim», isso contraria, como sabe, de forma flagrante, o discurso das associações de estudantes, do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, de todos os organismos representativos do próprio exercício da profissão docente, dos órgãos de gestão das universidades e das unidades orgânicas.
Por conseguinte, era bom que ficássemos com uma ideia muito clara sobre o que diz o Ministério.
O Ministério afirma, então, que a dotação orçamental que atribuiu às unidades orgânicas, às universidades, é de molde a cobrir todas as despesas de funcionamento? Esta pergunta é, a meu ver, fundamental para que possamos perceber qual é a função das propinas hoje no sistema de ensino superior. Ou seja, se as propinas são mal utilizadas pelas instituições de ensino superior ou se, pelo contrário, é o Ministério que não as dota de verbas suficientes para o seu normal funcionamento. Esta questão parece-me da maior importância.
Sr. Ministro, gostava apenas de referir-lhe dois dados no que respeita à acção social escolar: 40% dos estudantes que pedem bolsa não a obtêm; além do mais, boa parte dos estudantes que obtêm bolsa conseguem apenas a bolsa mínima. Referi há pouco o decréscimo acentuadíssimo, que o Sr. Ministro confirmou, nas despesas de investimento em acção social escolar. Apenas 10% dos estudantes deslocados têm lugar numa residência universitária.
Mediante este cenário, a introdução de facto dos empréstimos via banca não é claramente uma desresponsabilização do Estado? Isto é, uma vez que não estão cumpridas funções essenciais da acção social escolar (40% dos alunos que pedem bolsa não a obtêm; 10% dos alunos deslocados não têm lugar nas residências universitárias; e o investimento para residências universitárias decai desta forma abrupta no Orçamento actual), não estamos a assistir a uma das formas de desmembramento do Estado Providência, neste caso na educação, e de uma das formas mais conhecidas de desresponsabilização do Estado, que é o recurso aos empréstimos?

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, vou tentar responder a todas as questões, mas com certeza que o Sr. Deputado Eugénio Rosa vai fazer uma estatística do número de perguntas a que respondo, porque dificilmente poderei responder, já nem digo a todas mas, sim, à maioria delas.
Sr. Deputado Eugénio Rosa, esqueceu-se de colocar várias perguntas sobre as estatísticas do ensino superior, porque podem colocar-se talvez mais umas centenas!… Tenho todo o gosto em pedir à DirecçãoGeral do Ensino Superior os dados que me solicitou, desde o número médio de anos por licenciatura para as diferentes áreas à qualificação e vínculos dos diferentes professores nos diferentes estabelecimentos do ensino superior, e em transmiti-los a V. Ex.ª.
Sr. Deputado, vou tentar concentrar-me nas questões centrais para este debate, e vou tentar fazê-lo de uma forma sistemática.
Aos Srs. Deputados que colocaram em cima da mesa a ideia de que este Orçamento, em matéria de funcionamento do ensino superior, não cresce, peço-lhes para lerem de novo os números.
O orçamento de funcionamento do ensino superior cresce; decresce o investimento em obras no ensino superior. Cresce o orçamento de funcionamento do ensino superior quer através das receitas do Orçamento do Estado quer, globalmente, através de receitas próprias, as quais, insisto, para muitas instituições do ensino superior – e não lhes façam essa injustiça –, não são só as propina, pois há muitas instituições de ensino superior que têm receitas próprias largamente superiores às propinas, que têm fontes de financiamento, designadamente em matéria de investigação ou de serviços prestados à comunidade. Mas qualquer destes grupos cresce em orçamento de funcionamento do ensino superior, e estes são os dados objectivos.
Por outro lado, houve uma questão que me chocou um pouco no que diz respeito às ponderações positivas e negativas feitas pelo Sr. Deputado Miguel Tiago, o qual entende que o financiamento não deveria ser aumentado para as instituições em que o sucesso da instituição pode ser medido através do maior sucesso escolar dos estudantes ou da maior qualificação do corpo docente. Penso que seria um sinal erradíssimo para as instituições e para a gestão das instituições se fosse penalizada a maior qualificação do corpo docente. Se fizer o contrário, significa que a instituição não tem vantagem nenhuma em aumentar a qualificação do seu corpo docente.
Mas, perguntar-me-á o Sr. Deputado: então, relativamente às instituições que têm o corpo docente menos qualificado, não é preciso, de alguma forma, através de outros mecanismos, encorajar a qualificação? Este é o mecanismo! Porque os mecanismos para financiar doutoramentos, etc., existem, estão à parte, mas se a instituição não souber de ciência certa que, se recrutar um professor mais caro, se qualificar um professor, tem

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não só o dinheiro para pagar esses salários, como mais do que isso, então nunca o fará. E sabe que há muitas instituições de ensino superior que tentaram marginalizar o pessoal mais qualificado? A luta por pessoal mais qualificado em muitos estabelecimentos de ensino superior em Portugal está ainda a correr. Portanto, essa é, de facto, uma mensagem erradíssima que se poderia dar ao ensino superior em Portugal.
Falei de apoio directo e de apoio indirecto aos estudantes e gostava de insistir neste ponto. Não falo apenas das bolsas, mas também das cantinas universitárias e dos outros apoios aos estudantes. O que não falo é dos custos de estrutura dos serviços de acção social. Estes custos ou as verbas que lhe são afectas e que não têm reflexo directo na vida dos estudantes devem ser reduzidas. Estará, com certeza, de acordo comigo: essas verbas devem ser reduzidas. E não imagina que todos têm o mesmo grau de eficiência e que todos têm uma eficiência absoluta. Não têm!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — As cantinas e as residências como ficam?

O Orador: — Com certeza que têm de ser reforçadas, porque faz parte do apoio directo aos estudantes, como é óbvio. No entanto, estará de acordo comigo, com certeza, quando eu digo que os custos burocráticos dos serviços de acção social ou as verbas que são atribuídas para outros fins nos serviços de acção social devem ser convertidas em apoios aos estudantes.
Há ainda uma questão que foi levantada e que me deixou perplexo: trata-se da convergência de posição entre as bancadas do Partido Comunista, do Bloco de Esquerda e do Partido Social-Democrata sobre as dúvidas relativamente aos empréstimos... Talvez tenha sido eu que tenha percebido mal… Acredito.
A este respeito, que fique absolutamente claro que Portugal precisa da disponibilidade de um sistema de empréstimos aos estudantes do ensino superior, pois é, praticamente, o único país europeu que não dispõe desse sistema.
Espero que os Deputados de todas as bancadas estejam de acordo com sistemas de empréstimos ao ensino superior. Se não estiverem, que fique absolutamente claro que esses Srs. Deputados defendem que o único sistema de empréstimos ao ensino superior em Portugal é aquele que hoje a banca comercial oferece, a juros de 10% e 11%, e que fiquem com a responsabilidade política desse facto junto dos estudantes do ensino superior.
Se, pelo contrário, entendem que deve haver um sistema de empréstimos ao ensino superior,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Ministro, peço desculpa, pela interrupção, mas com certeza que o Sr. Ministro já marcou uma reunião com o Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, que é um banco do Estado, para discutir esse seu modelo e poder ter assim um factor de ponderação no mercado, de forma a que este mercado liberal não prejudique os alunos e consigamos ter taxas de empréstimo a valores mais consentâneos com aquilo que deve ser.

O Orador: — Sr. Deputado, agradeço-lhe essa precisão.
É evidente que qualquer instituição bancária que dispõe e gere os nossos depósitos tem por missão garantir a segurança desses mesmos depósitos e a sua rentabilidade. Qualquer instituição bancária, como é natural! As instituições bancárias não fazem nisto nada de mal. Quer dizer, se o Estado não assume com as instituições bancárias, de uma forma transparente, algum do risco destes empréstimos, é evidente que as instituições bancárias terão uma enorme dificuldade em ir para lá dos mecanismos actuais.
Dito isto, que fique absolutamente claro que não é intenção do Governo qualquer substituição da acção social escolar por empréstimos. Os empréstimos têm uma função e a acção social escolar tem outra. A acção social escolar, em Portugal, deve aumentar, deve focar-se, deve diminuir os custos de estrutura e deve fazer com que mais financiamentos cheguem, directa ou indirectamente, aos estudantes e menos financiamento se perca pelo caminho em custos de estrutura desnecessários. Que fique absolutamente claro que é este o nosso objectivo! Neste sentido, gostava que os Srs. Deputados também deixassem claro que não estão contra que os estudantes do ensino superior possam ter acesso a empréstimos, enquanto estão a estudar, em condições diferentes dos empréstimos à generalidade do consumo para a população.
Portanto, que fique absolutamente claro que a acção social escolar não se opõe aos empréstimos, pois a intenção do Governo é reforçar e focar a acção social escolar no apoio aos estudantes.
Há outras questões que foram levantadas e que me deixaram também bastante perplexo. O Sr. Deputado Pedro Duarte procurou dizer que este Orçamento não contemplava a banda larga, não contemplava as compras electrónicas, não contemplava nada disso…

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Eu não disse isso!

O Orador: — Francamente, Sr. Deputado...! Foi o que anotei: banda larga, compras electrónicas, plano de acção para a sociedade de informação.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — É que esses programas são esquecidos!

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O Orador: — Não são esquecidos, Sr. Deputado. Leu o Ligar Portugal e viu as referências expressas, incluindo o financiamento, para essas medidas? Julgo que não viu. Mas está desculpado, se não viu. No entanto, está lá previstos: os programas operacionais, o dinheiro e, mais do que isso, a intenção clara de vir a utilizar as verbas que estavam em risco de não ser utilizadas, designadamente as verbas comunitárias.
Portanto, há aqui, claramente, uma prioridade à sociedade de informação e não lhe fica bem tentar entrar neste registo e, num ministério que tem três vertentes e que as procura conciliar numa estratégia coerente, procurar opor a ciência e tecnologia à sociedade de informação ou a ciência e tecnologia à educação e ao ensino superior. Sr. Deputado, francamente, penso que isso não é normal nem digno de nós.
Temos todos de perceber que estamos a tentar fazer o melhor possível para qualificar o ensino superior português – e não vale a pena alongar-me aqui num discurso que já tive aquando da discussão da Lei de Bases do Ensino Superior.
Gostava que não sobrasse a mais pequena dúvida no País de que o Parlamento e o Governo estão de acordo com estes grandes objectivos – a sociedade de informação tem de se desenvolver em Portugal, a ciência e a tecnologia têm de se desenvolver em Portugal, quer no sector público quer no sector privado, o ensino superior, como todas as qualificações, tem de se desenvolver em Portugal – e que há sinergias a explorar entre estes três campos. E é isso que estamos a fazer! Não deveria haver nenhuma dúvida sobre esta matéria.
Nesse sentido, lançar a dúvida sobre as intenções do Governo, nesta matéria, parece-me muito negativo para as intenções quer dos Srs. Deputados quer nossas.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Será que os senhores não têm dúvidas nenhumas?

O Orador: — Bom, se não têm dúvidas nenhumas, estamos esclarecidos.
O Sr. Deputado Eugénio Rosa fez-me uma pergunta quanto à escola de Beja, que gostava de esclarecer rapidamente. Definimos uma missão técnica dos serviços do Ministério para ir visitar o Instituto Politécnico de Beja.
Foram recebidos estudantes dessa escola de tecnologia, para analisar as condições de ocupação dos diferentes edifícios do Instituto Politécnico e para saber como é que se pode minorar as dificuldades que possam existir nesta ou naquela escola, onde sabemos existirem problemas de ocupação e também de desocupação, e, em função dessa análise, tomaremos a decisão. A decisão será tomada e para isso temos reservas financeiras: poderá ser opção de construção ou opção de não construção, através da rentabilização dos espaços existentes. Não haverá, com certeza, da parte do Sr. Deputado, a ideia de que para resolver todos os problemas temos sempre de construir de novo.
A minha resposta foi simplesmente objectiva: dizer-lhe qual era situação e, depois, tomar uma decisão global para o País relativamente a todas as obras novas que pudessem ser candidatas a financiamento público.
Gostava ainda de lhe clarificar uma questão e uma dúvida que o Sr. Deputado manifestou sobre a adequação dos cursos às saídas profissionais e sobre a dimensão das áreas científico-tecnológicas no conjunto dos primeiros inscritos no ensino superior público.
Gostava de o sossegar, Sr. Deputado, dizendo-lhe que as áreas de ciência e tecnologia e de saúde superam 40% das entradas e são, segundo a conta que fiz rapidamente, cerca de 39% dos diplomados do ensino público.
Dir-me-á: mas isto não é assim no ensino privado, pois não? Por que razão é que a percentagem é muito superior?... Bem, Sr. Deputado, não gostava de fazer uma peroração académica, mas sabe que, nos últimos 30 anos, em todos os países desenvolvidos, o crescimento do ensino superior fez-se, por um lado, com um aumento quantitativo do número de estudantes nas áreas de ciência e de saúde, mas não um aumento em percentagem das áreas de ciência e de saúde. Ou seja, grande parte do aumento da inscrição no ensino superior fez-se, em todos os países, com um aumento nas áreas que não são as áreas de ciência e tecnologia e de saúde. Porquê? Porque todos os países são doidos e querem uma total inadequação ao mercado de trabalho? Não, Sr. Deputado. É porque a reconversão do sector dos serviços, em todo o mundo ocidental, fezse com substituição de empregos menos qualificados por empregos mais qualificados e foi aí que houve a criação de emprego, tendo sido sobretudo as áreas das letras e das ciências sociais que forneceram e fornecem esses quantitativos para a terciarização dos serviços.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Mas, agora, esses estão nas caixas de supermercados!

O Orador: — Com certeza que há anomalias, Sr. Deputado, mas no essencial é isto que acontece. Quer dizer, não pode imaginar que nem em económicas planificadas tal coisa não aconteceu; aconteceu em todo o lado e é normal que seja assim. Não quer, com certeza, que pessoas do sector dos serviços fiquem apenas com o 9.º ano só porque estão no sector dos serviços…! Estamos todos de acordo que manter o nível de qualificações nas áreas de ciência e tecnologia e de saúde é uma prioridade política. Pois com certeza que é! E devo dizer-lhe que Portugal tem uma trajectória muito

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interessante nesta última década, quanto a esta matéria, porque conseguimos que, por exemplo, no ensino secundário, nos cursos gerais e tecnológicos nas variantes de ciência e tecnologias, incluindo saúde, a percentagem de estudantes não tenha diminuído, ao contrário do número global de estudantes, que baixou por via demográfica. As outras diminuíram, mas esta aumentou em percentagem.
Não posso estar de acordo com a afirmação não fundada do Sr. Deputado João Teixeira Lopes, que penso que é simplesmente uma expressão da sua angústia, de que não há suficientes sinergias entre a ciência e tecnologia e o ensino superior.
Sr. Deputado, proponha medidas para aumentar essa sinergia. É que o Governo procura afanosamente, em articulação com as instituições de ensino superior, aumentar essas sinergias entre a ciência e tecnologia e o ensino superior, em primeiro lugar, fazendo com que as reformas dos cursos superiores, por via do Processo de Bolonha, incluam que a formação dos estudantes tenha mais proximidade com as instalações, as práticas e os profissionais de ciência e tecnologia das instituições de ensino superior. Não sou dos que entendem que o contacto com o desenvolvimento e a investigação (I&D) deve estabelecer-se depois de o estudante passar para a fase de pós-graduação ou de doutoramento. Não! É desde o primeiro ano do ensino superior que a formação deve incluir essa proximidade com a actividade de investigação que, em muitos casos, é o que de melhor a instituição de ensino superior pode fornecer aos seus estudantes como prática profissional avançada. Esse é um trabalho muito importante que muitas instituições de ensino superior já estão a fazer e temos de encorajá-las.
O crescimento das áreas de ciência e de tecnologia nas instituições de ensino superior, conjugado com o Processo de Bolonha fazem com que esperemos uma melhoria nesse sector.
Sr. Deputado, não nos confundamos! É que, há pouco, perguntou-me uma coisa e, agora, perguntou-me outra, e ambos sabemos fazer perguntas. Há pouco, perguntou-me se o orçamento pagava ou não os salários em todas as instituições de ensino superior, e eu respondi-lhe que sim; agora, pergunta-me se paga todas as despesas das instituições de ensino superior…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Despesas de funcionamento, Sr. Ministro!

O Orador: — Todas as despesas! Chama-se a isso funcionamento! Respondo-lhe que, obviamente, não, porque, então, não era preciso as instituições terem qualquer receita própria.
Há instituições de ensino superior com tanto sucesso que, neste momento, metade ou mais do respectivo orçamento de funcionamento é composto por outras receitas. Devemos, portanto, reduzir o orçamento? Não, não devemos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — É aí que as propinas entram!

O Orador: — Não, as propinas, em muitas instituições, são muito significativas mas, em inúmeras outras, são muito mais significativas as outras receitas próprias das instituições – e o Sr. Deputado com certeza não estará contra isso! Isso permite melhorar as condições de funcionamento desses estabelecimentos de ensino superior? Claro que permite. Ou será que o Sr. Deputado entende que esses estabelecimentos deviam utilizar as receitas próprias para luxos que não servissem para o funcionamento ou para doações a terceiros?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — A água, a luz, não são luxos!

O Orador: — Sr. Deputado, entendamo-nos! O Sr. Deputado pensa que as receitas de funcionamento não deviam servir para pagar o funcionamento – é uma singular concepção da economia dos estabelecimentos de ensino superior e da defesa do interesse público! Enfim, talvez haja aqui uma qualquer incompreensão da minha parte e, se houver, por certo penitencio-me.
Por último, respondendo ao Sr. Deputado Eugénio Rosa, digo-lhe que não estou de acordo com a sua ideia de que a área de investigação e desenvolvimento, no sector público, deve ser acusada de ter uma eficácia reduzida.
Sr. Deputado, se tem hospitais a funcionar, se tem algum controlo sobre a qualidade do ar, a qualidade dos alimentos, ou as epidemias, é porque existe investigação em Portugal, é porque existe investigação em instituições públicas, é porque existe investigação nas universidades. É que isso faz com que os serviços possam apoiar-se nessa investigação para funcionarem. Denegrir a investigação pública porque uma parte dela, obviamente, tem a ver com serviços públicos, parece-me que não é razoável.
Todos estamos de acordo em que a investigação em ciência e tecnologia deveria ter mais a ver com o nosso tecido económico. Essa é uma parte da questão, mas, Sr. Deputado, em muitas outras áreas, a vida nacional, a saúde, depende criticamente da investigação que se faz em Portugal.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, estamos a chegar ao fim desta audição.
Agradeço a todos as questões que colocaram relativamente ao orçamento para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e, ainda, ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado as respostas que

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foram dadas e que, globalmente, podemos considerar que contribuíram para melhorar o nosso conhecimento da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2006 relativa a este sector.
Creio que fizemos um trabalho bastante cuidadoso sobre esta matéria.
Srs. Deputados, está interrompida a reunião.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram18 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início à audição do Ministério da Educação para a apreciação, na generalidade, da proposta de orçamento para 2006 relativa a este Ministério, que vai ser realizada em conjunto pelas Comissões de Orçamento e Finanças e Educação, Ciência e Cultura, estando presentes a Sr.ª Ministra da Educação e a sua equipa, cuja disponibilidade agradeço, desde já.
A audição decorrerá segundo os procedimentos habituais: a primeira oradora será a Sr.ª Ministra, que fará a apresentação do orçamento para o seu Ministério, depois iniciaremos o debate com as intervenções de um representante de cada um dos grupos parlamentares, seguindo-se a resposta da Sr.ª Ministra a cada um dos Srs. Deputados, individualmente. No fim, haverá lugar a uma segunda ronda, com inscrição livre das Sr.as e dos Srs. Deputados, cujas questões serão respondidas em conjunto, no final.
Tem, então, a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação (Maria de Lurdes Rodrigues): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, boa tarde.
Aproveito esta primeira intervenção para expor três breves notas, para deixar o máximo de tempo possível para o debate.
O orçamento para o Ministério da Educação, para o ano 2006, mantém-se praticamente inalterado em relação à previsão de execução do orçamento para 2005, que é de 6102 milhões de euros, sendo o valor orçamentado para 2006 de 6115,8 milhões de euros.
Todavia, apesar de se viver um período de contenção orçamental, penso que, no orçamento para 2006, se pode assinalar a inversão de uma tendência de decréscimo do investimento em educação no nosso país. Se olharmos as verbas inscritas em PIDDAC nos últimos anos, verificamos que, em 2001, atingiu-se um pico de investimento da ordem de 195 milhões de euros, em 2002, 179 milhões de euros, em 2003, 142 milhões de euros, em 2004, 110 milhões de euros, em 2005, 97 milhões de euros e, em 2006, invertemos esta tendência de decréscimo do investimento, passando o PIDDAC para 120 milhões de euros.
Os principais investimentos inscritos no orçamento para o Ministério da Educação, ora em PIDDAC ora em «Funcionamento», são, sobretudo, relacionados com a conservação e a construção de novas instalações, rubrica para a qual estão previstos 77,5 milhões de euros.
Portanto, pode verificar-se que o essencial do investimento inscrito em PIDDAC é destinado à conservação e à construção de novas instalações escolares, onde, também neste domínio, estamos a procurar fazer alguma inversão das prioridades do investimento.
Na verdade, nos últimos anos, o PIDDAC para o Ministério da Educação tinha um destino muito associado à construção de pavilhões desportivos e, se não invertêssemos esta prioridade, teríamos o PIDDAC para o Ministério da Educação comprometido, nos próximos 10 anos, com o pagamento de dívidas contraídas pelo Ministério perante as câmaras municipais espalhadas pelo País devido à construção de pavilhões desportivos.
Há, pois, um esforço de inversão de tais prioridades.
Assim, as dívidas assumidas perante as câmaras municipais vão ter de ser negociadas e pensamos que o respectivo pagamento será diferido para, com a disponibilidade financeira que daí resulte, podermos proceder à conservação de edifícios escolares e à construção de novas escolas.
Não estávamos em condições de, este ano, inverter definitivamente esta ordem de prioridades nem de fazer maior investimento porque ainda estamos a trabalhar no apoio à elaboração das cartas educativas.
Assim, prevemos que, a partir de Maio de 2006, poderemos ter o levantamento da rede e a identificação do que vai ser o investimento necessário para a recuperação mais definitiva da rede de escolas do País.
O segundo grande programa de investimento é o de generalização do ensino de Inglês no 1.º ciclo para o que, no próximo ano, os fundos de funcionamento implicarão um investimento da ordem de 20,5 milhões de euros.
Temos, ainda, o programa de generalização das refeições escolares a todos os alunos do ensino básico, cujo montante desde já orçamentado é de 13 milhões de euros. Todavia, temos a convicção de que, se houver uma grande adesão a este programa por parte das autarquias, aquela verba será insuficiente e será necessário acomodar uma despesa maior.
Temos também prevista a continuação do programa de investimento na rede das bibliotecas, que contará com 3,7 milhões de euros, e reservámos cerca de 2 milhões de euros para aquilo a que chamamos «a primeira fase de reorganização da rede escolar de 1.º ciclo», que está associada ao já anunciado programa de

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encerramento de umas centenas de escolas de 1.º ciclo – cerca de 500 – e que, evidentemente, vai necessitar de um apoio financeiro, pelo que, nesta fase, não será possível economizar nesta área.
Depois, temos previstos três programas de investimento nas escolas do ensino básico e secundário.
Um destes é um programa de continuidade e consta do apetrechamento das salas TIC (Tecnologias da Informação e Comunicação) e dos equipamentos multimedia para as escolas do ensino básico e secundário, para o qual temos uma expectativa de investimento de 13 milhões de euros que virão, sobretudo, do PRODEP (Programa de Desenvolvimento Educativo para Portugal).
Temos um outro programa que designámos «Apetrechamento de espaços e laboratórios para o ensino vocacional», através do qual lançámos um repto às escolas, tanto do ensino básico como do secundário, para a apresentação de ofertas formativas de componente vocacional mais explícita.
Em muitos casos, tais escolas não dispõem dos meios para o desenvolvimento destas ofertas formativas e, portanto, estamos a lançar este programa que permita às escolas fazerem o apetrechamento de espaços laboratoriais e de oficinas para o desenvolvimento do ensino vocacional. Para isso, contamos com 12 milhões de euros, também provenientes do PRODEP, com a contrapartida nacional inscrita em «Funcionamento» ou em PIDDAC.
Temos, ainda, um outro programa, que designámos «Apetrechamento de salas de trabalho para professores e para apoio da actividade docente», que consistirá no apetrechamento com meios informáticos, designadamente computadores portáteis, que permitam aos professores trabalharem, tanto na escola como na própria casa, de uma maneira um pouco mais flexível.
Finalmente, três programas, também de continuidade, embora com ampliação, que são os seguintes: o programa relativo ao financiamento das escolas profissionais, que tem, no orçamento de funcionamento, um grande crescimento em resultado de se ter passado a incluir no Orçamento do Estado as escolas profissionais da região de Lisboa e Vale do Tejo e, depois, um financiamento adicional do PRODEP, que é a continuação para as outras regiões de programas anteriores.
Temos ainda o programa para a abertura de Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC), que tem como objectivo a criação de centros de RVCC em todas as escolas secundárias e sedes de agrupamento que se candidatem a este programa, que conta com quase 9 milhões de euros para esta expansão dos centros.
Finalmente, existem os programas de formação contínua de professores, que terão um encargo de cerca de 30 milhões de euros, muito centrados naquelas que foram as prioridades definidas pelo Ministério da Educação para este ano.
Como terceira nota, gostava de comentar o orçamento do Ministério da Educação nas suas principais acções, que consta de um quadro disponibilizado aos Srs. Deputados durante esta semana, explicando um pouco aquilo que é a evolução deste orçamento.
Assim as duas rubricas que mais sobem nestas acções, decorrentes de uma diferente organização do orçamento, são a rubrica relativa aos complementos educativos, que passa de 22 milhões de euros para 38 milhões de euros, em resultado do programa de generalização do Inglês no 1.º ciclo – portanto, o crescimento de 71,2% do orçamento de 2005 para 2006 resulta da inclusão nesta rubrica desse programa.
Depois, temos, na Acção Social Escolar, também um crescimento de 8,7%, decorrente de se ter aqui acomodado o programa da generalização das refeições a todos os alunos do ensino básico.
Temos ainda um crescimento de 6,3% na rubrica da educação especial, decorrente sobretudo de um programa de PIDDAC de investimento em equipamento e algumas intervenções nos edifícios escolares, sobretudo para a adaptação dos edifícios às necessidades especiais dos alunos e também o desenvolvimento de equipamento e material pedagógico para alunos invisuais.
Depois, temos ligeiros crescimentos na difusão da cultura e do ensino da língua portuguesa no estrangeiro, que decorrem, sobretudo, de compromissos com as escolas de Timor e de Moçambique.
Finalmente, há um crescimento de 25,9% nas escolas profissionais, que, como já expliquei, é decorrente da acomodação das escolas profissionais de Lisboa e Vale do Tejo no Orçamento do Estado.
Nas rubricas de ensino oficial, onde se inserem a educação pré-escolar, o ensino básico e secundário, que são sobretudo relativas aos encargos com as remunerações, há um ligeiro decréscimo e há também um decréscimo assinalável, de 1,4%, na administração e serviços tutelados, que decorre do esforço de contenção que se está a fazer ao nível da administração central e nos serviços regionalizados.
Isto era o que tinha para dizer na apresentação do orçamento. Agora, deixo espaço para responder às questões que os Srs. Deputados queiram colocar.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr.ª Ministra. Agradeço, desde já, a informação adicional que nos trouxe.
Vamos, agora, dar início aos pedidos de esclarecimento, começando pelo Grupo Parlamentar do PSD, concretamente pelo Sr. Deputado Emídio Guerreiro, a quem peço que respeite os 10 minutos convencionados.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, começo por saudá-los.

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Sr.ª Presidente, vou até procurar levar menos tempo do que os 10 minutos estabelecidos, porque o adiantado da hora é uma realidade.
Tive oportunidade de estudar o orçamento sectorial e de ouvir agora a Sr.ª Ministra.
A realidade é que, de facto, o orçamento cresce 0,2%, o que, como a Sr.ª Ministra teve oportunidade de dizer, é praticamente igual à previsão e quer dizer que, na prática, o orçamento desce, uma vez que não acompanha a taxa de inflação prevista no próprio Orçamento do Estado, o que é uma pena, porque, dando o discurso político do Governo um grande enfoque à educação, estávamos à espera que este discurso, centrado na necessidade de recuperar um atraso estrutural na qualificação dos portugueses, se traduzisse num maior esforço orçamental.
De qualquer forma, temos de fazer justiça a esta proposta, porque, apesar de não haver um aumento real do orçamento, ela procura ir ao encontro daquelas que têm sido as prioridades que a Sr.ª Ministra tem vindo a apresentar neste sector.
É uma realidade, como a Sr.ª Ministra acabou de referir (e nós também o constatamos), que se reforçaram as dotações orçamentais para o ensino do Inglês e para o incremento generalizado das refeições escolares, havendo também um aumento significativo nas escolas profissionais e no investimento.
Quero, pois, realçar aqui aquilo a que chamaria sinais de coerência entre aquilo que se anuncia pretender fazer e a disponibilidade orçamental para suportar essas mesmas realizações – aliás, não encontrámos esta prática nos demais ministérios, mas, neste caso particular, ela verifica-se, pelo que gostaríamos de salientá-lo.
Torna-se assim claro, ainda mais, que é uma pena que o orçamento não tenha crescido face aos anos anteriores, ou seja, que o crescimento fosse acima da taxa de inflação. É que se ele tivesse crescido, como esperávamos, o esforço para a concretização destas medidas seria mais rápido e melhor e os objectivos a que o Ministério da Educação se propõe seriam mais facilmente alcançados.
Mas, volto a dizê-lo, registamos com apreço e de uma forma positiva esta intenção da equipa ministerial, de reafirmar ou de afirmar as prioridades políticas com a devida expressão orçamental.
Muito embora este retrato geral, temos algumas dúvidas. Desde logo, na questão, aqui referida pela Sr.ª Ministra, das refeições escolares, uma vez que também já disse o que veio expresso na imprensa recente, de ontem ou de hoje, de que é provável que a verba inscrita não chegue.
Assim sendo, gostaria que nos explicasse onde é que, não chegando, vai buscar esse reforço. Pelo que li na comunicação social, a diferença era de 13 para 20 milhões de euros, havendo portanto aqui um fosso previsível de 7 milhões de euros, pelo que gostaria de perceber onde tem essa folga e, de qualquer forma, se este reforço não penaliza outra área que já esteja inscrita e, penalizando, qual a área onde isso vai acontecer.
Outra questão que gostaria de ver esclarecida tem a ver com a problemática do alargamento do horário de funcionamento entre as horas lectivas e não lectivas das ditas aulas de substituição.
Há, de facto, uma pretensão por parte dos sindicatos representantes dos professores de que estas horas, quando sejam superiores ao que está previsto no estatuto da carreira docente em termos de horas lectivas atribuídas ao docente em causa, sejam pagas como horas extraordinárias.
Ora, gostaria de saber o que pensa o Ministério da Educação acerca disto, até porque tivemos conhecimento de que, muito recentemente, o Sr. Provedor de Justiça deu acolhimento a esta pretensão dos professores. Como tal, gostaria de saber se está prevista no orçamento alguma folga para a eventualidade de vir a ser obrigatório assumir este pagamento. Como vão fazê-lo? E, mais uma vez, se vão fazê-lo em prejuízo de alguma outra área.
Considerando ainda, e tendo como pano de fundo, o grande enfoque que tem vindo a fazer-se da necessidade, premente e urgente, da requalificação dos portugueses, temos alguma dificuldade em perceber este aumento da verba e, sobretudo, o que se passa em relação ao ensino profissional.
É que a Sr.ª Ministra reduz este reforço de verba ao facto de se inscrever as escolas de Lisboa e Vale do Tejo, só que elas já estavam neste regime, já não estavam abrangidas pelo PRODEP. Por isso, gostaria de saber se também está previsto neste reforço de verba um aumento de turmas, um aumento de alunos neste subsistema que considero (e julgo que todos consideramos) muito importante na qualificação dos jovens. É que, ao longo dos últimos 15 anos, têm sido sobretudo as escolas profissionais, na sua esmagadora maioria privadas, que têm criado os ditos técnicos intermédios de que o País tanto carece.
E a questão é esta: para o futuro, e já em 2006, quais são as apostas estratégicas aqui? É o nível 3 que é para manter e reforçar, ou seja, mais alunos e mais turmas no nível 3? Ou pretende o Governo orientar mais as escolas profissionais para o nível 2, à medida que o nível 3 vai crescendo e implementando-se no sector público, uma vez que já está aí? Gostaria também de saber se neste reforço já está pensada alguma coisa relativamente ao nível 4. É que não posso deixar de recordar que, neste caso, nos cursos de especialização tecnológica, neste ano lectivo de 2005/06, o nível 4 desapareceu das escolas profissionais. Aliás, tive oportunidade de questionar o Governo em requerimento e a resposta foi categórica: não há nível 4, este ano, porque não há dinheiro. Ao fim e ao cabo, esta foi a resposta que o Governo entendeu dar ao requerimento feito pelo PSD.
Esta franqueza é de realçar e agradeço-a, mas, por outro lado, também tivemos a informação de que, em reunião com a Associação Nacional do Ensino Profissional (ANESPO), o que o Governo transmitiu foi que

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estes cursos de nível 4 já não eram prioritários nas escolas profissionais, até porque elas já tinham muito que fazer nos níveis 2 e 3.
Ora, esta resposta é substancialmente diferente daquela que foi dada ao Grupo Parlamentar do PSD e preocupa-me um pouco, porque há uma curva de aprendizagem adquirida ao longo de anos pelas escolas profissionais, que têm sido quem dinamizou e lançou estes cursos no mercado, com grande qualidade e grande proveito para a qualificação dos jovens.
Mas, depois, também constatamos que os níveis 4 foram aprovados nos institutos politécnicos, o que dá um pouco a ideia de que estão a ser desviados das escolas profissionais para serem uma forma complementar de financiamento das escolas politécnicas. Por isso, gostaria que detalhasse melhor este aumento de quase 30% de reforço da verba nas escolas profissionais – a que fins se destina concretamente e se a algumas destas áreas.
Outra medida que recentemente tem dado algum brado na comunicação social é ta intenção do Governo de fechar 512 escolas (pelo menos, foi o número que li), no final do ano lectivo. Isto terá incidência orçamental, porque o próximo ano lectivo começará em Setembro.
Ora, a questão muito concreta que coloco aqui tem a ver com o seguinte: é suposto que, dentro de menos um ano, haja uma definição da rede escolar e seja criada uma rede de transportes escolares. Como tal, gostaria de perceber em que rubrica deste orçamento isso está reflectido. É que parece-me que, nomeadamente nesta questão do transporte, há um acréscimo de despesa que não consigo quantificar e não sei se a Sr.ª Ministra estará em condições de dizer em quanto monta.
Já agora, um pouco à margem da questão orçamental, mas ainda nesta matéria do fecho das escolas e da deslocação dos alunos para outras escolas, gostaria de saber se está prevista uma redefinição do horário escolar ou será que, cada ano que passa, vamos ter mais crianças de seis, sete e oito anos a terem de se levantar cada vez mais cedo para poderem ir à escola? Esta é uma matéria que não tem a ver directamente com o orçamento, mas que preocupa as famílias. É que se a escola que fica ao pé de casa fecha e a criança tem de ir para uma escola mais distante, é verdade que há o transporte para deslocá-la mas, se a escola é mais distante, cada vez a criança tem de sair mais cedo. E ao que já assistimos é, em muitas escolas, sobretudo nas zonas mais desfavorecidas, onde normalmente isto acontece, haver cada vez mais crianças a terem de se levantar de noite para irem para a escola.
Ora, penso que uma adequação dos horários a esta necessidade nova talvez fizesse algum sentido.
Gostaria ainda de a questionar, Sr.ª Ministra, sobre uma matéria que já foi objecto de discussão em sede de Comissão quando o Governo suspendeu a remuneração dos estágios.
Perante o problema real que existia, que era o de o estagiário ter deixado de receber e haver um conjunto de despesas que lhe estava adstrito, colocou-se a possibilidade de ser dado um apoio, pelo menos para assegurar o transporte dos jovens estagiários, caso contrário terão de ser eles a financiar o Ministério da Educação, e não me parece que essa lógica seja correcta. Na altura, a Sr.ª Ministra deixou a porta aberta a esta possibilidade, mas não vejo nada traduzido no orçamento. Posso estar a ver mal, mas… De facto, gostaria de perceber se esta ideia caiu ou, se não caiu, quanto vai custar e onde está prevista.
Como nota final, queria dizer que este Orçamento do Estado, sobretudo na área da educação, tem virtudes mas também um defeito de fundo, que é muito grande: está a ser feito contra toda a comunidade escolar e não consegue mobilizar a comunidade educativa em torno dos grandes objectivos do Ministério da Educação.
Todos sabemos que as resistências às mudanças são sempre grandes e difíceis de superar, mas não concebo, de forma alguma, que todas estas mudanças se consigam fazer sem um envolvimento das pessoas. É, pois, importante esclarecer se este clima é para continuar, com cada vez mais agentes educativos contra tudo o que o Governo propõe, ou se, de facto, o Governo vai optar uma estratégia diferente na abordagem destas situações, no sentido de criar aliados no sistema. Se assim não for, a acção do Governo torna-se muito difícil.
É praticamente impossível fazer o que quer que seja, porque as vossas medidas põem toda a gente em pé de guerra! Mesmo as iniciativas positivas, que já tive oportunidade de referir, têm de gerar a mobilização dos agentes educativos, senão não adianta. Não há medidas que resistam a um clima desta natureza.
Sem prejuízo de ulteriores intervenções e pedidos de esclarecimento de outros colegas de bancada, termino por aqui, agradecendo a atenção da Sr.ª Ministra e fazendo votos para que estas questões também tenham contribuído para o esclarecimento de todos nós.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, muito obrigada pelas questões que levantou, porque, de facto, constituem uma oportunidade para esclarecer um pouco mais as orientações que presidiram à elaboração do Orçamento.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado lamenta que não tenha havido um aumento do orçamento do Ministério da Educação. O que lhe digo é que aumentou muito a qualidade do investimento em educação com este orçamento. Portanto, com o mesmo dinheiro, penso que se faz um investimento de grande qualidade na educação.

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Por outro lado, há um problema de capacidade de execução. Por exemplo, no que respeita à rede escolar, ao reapetrechamento de escolas ou à recuperação de alguns edifícios e à construção de escolas novas, posso dizer-lhe que não havia capacidade de execução de mais investimento este ano. É, pois, necessário fazer um trabalho, que estamos a prever desenvolver até Maio, de levantamento da rede escolar e de sinalização de todas as questões com a indicação da prioridade.
Se queremos inverter a lógica do investimento na rede escolar, passar do pavilhão para a criação de novas escolas, com a substituição de equipamento ou, mesmo, a manutenção e recuperação de algumas escolas mais antigas, tudo isso requer algum tempo, desde logo para a aquisição de terrenos, em alguns casos, ou para a elaboração de projectos, noutros. Portanto, não estávamos em condições de, nestes meses, ter invertido completamente esta lógica.
Porém, assumimos o compromisso – assumimo-lo ontem, com a Associação Nacional de Municípios Portugueses – de ter esse levantamento feito em Maio e, nessa altura, teremos uma ideia precisa e rigorosa sobre qual vai ser a necessidade de investimento, por exemplo, no que respeita à rede escolar. E este investimento condiciona muito todo o outro que se faz em educação.
No que respeita à segunda questão, a do reforço das verbas destinadas ao programa de generalização do fornecimento de refeições escolares, a verba orçamentada teve em atenção o nosso conhecimento da rede de escolas do 1.º ciclo. E estamos convencidos de que não há capacidade de resposta maior do que esta verba que orçamentámos por parte das autarquias, porque ainda temos muitas escolas em regime de desdobramento, muitas escolas isoladas, em que se põem vários problemas.
Não é por acaso que este problema não está resolvido há muitos anos. Penso que tal se deve ao facto de ele ser mesmo difícil de resolver.
Portanto, Sr. Deputado, orçamentámos de acordo com a nossa expectativa, tendo em atenção o conhecimento da rede escolar e do que pode ser a resposta natural das autarquias. Se o orçamentado for muito superior ao que é esperado, num orçamento de 6000 milhões de euros há sempre possibilidade de acomodar 7 ou 8 milhões de euros, nem que seja na gestão dos recursos humanos – por exemplo, no número de professores destacados nos organismos centrais. Há, pois, repito, muita forma de acomodar 7 milhões de euros e isso não é nada que nos assuste.
No que respeita à questão das escolas profissionais, de facto, a região de Lisboa e Vale do Tejo já vinha a ser acomodada no Orçamento do Estado desde há dois anos, mas o problema é que o investimento multiplica por três em cada novo ano orçamental, porque começa, no primeiro ano, por financiar as turmas de 1.º ano, no segundo ano, as turmas do 1.º e do 2.º anos, no terceiro ano, as turmas do 1.º. 2.º e 3.º anos… Portanto, no próximo ano ainda haverá aumentos em resultado desta progressão de alcançarmos um maior número de turmas à medida que os anos vão prosseguindo.
Perguntou o Sr. Deputado qual é a aposta estratégica do Ministério da Educação nesta matéria das escolas profissionais.
As escolas profissionais são, de facto, escolas privadas mas o investimento é público desde sempre. No momento da sua criação, a previsão era que o investimento público se mantivesse durante quatro ou cinco anos, mas, na realidade, ele dura há 15 anos! E há aqui uma dificuldade de perceber qual vai ser a evolução do modelo de financiamento. Vai o Orçamento do Estado integrar a totalidade deste investimento? Temos capacidade de perceber como esta situação pode evoluir? Vem aí um novo Quadro Comunitário de Apoio, mas não é nada seguro que ele possa apoiar integralmente o projecto das escolas profissionais. Portanto, há aqui algumas indecisões, alguns dilemas a resolver, sendo que, neste momento, estamos a fazer cenários sobre qual a possibilidade de resolução do modelo de financiamento das escolas profissionais.
A nossa aposta estratégica, não só para as escolas profissionais como para todas as escolas públicas do Ministério da Educação, sob responsabilidade ou tutela do Ministério da Educação, é uma aposta nos níveis 2 e 3, que são os níveis dos ensinos básico e secundário. O Problema que estava a ocorrer com os designados «setes», ou cursos de nível 4, tinha a ver com o facto de eles constituírem uma deriva para as próprias escolas secundárias e para as escolas profissionais. De facto, estavam a canalizar os esforços, a centrar os seus recursos numa área de formação pós-secundária e que, portanto, respeita a instituições de ensino póssecundário.
Mesmo que no modelo tenha sido prevista essa possibilidade, na minha opinião ela foi prevista erradamente nesta fase, sobretudo porque estas escolas secundárias não estão centradas naquela que é a sua missão.
As escolas secundárias públicas têm uma taxa de repetência e de abandono da ordem dos 35%. Esta é que é a sua missão, ou seja, têm de se centrar na recuperação destes alunos e não na oferta formativa para alunos do pós-secundário.
O mesmo vale em relação às escolas secundárias (que não têm uma taxa de abandono tão grande). O País tem um problema com os jovens com mais de 16 anos – e são muitos, são aos milhares todos os anos –, que atingiram a idade-limite para a escolaridade obrigatória mas, na realidade, não concluíram o ensino básico. E o sistema não tem oferta formativa adequada a estes jovens que já estão numa idade de ensino secundário mas que não têm a formação adequada.
O desafio que lançámos, tanto às escolas secundárias como às escolas profissionais, foi que fizessem uma oferta formativa para a recuperação destes jovens, recuperação para a escola. Aliás, fizemo-lo com

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imenso êxito: apenas com uns meses de trabalho, porque não tivemos tempo para mais, o número de alunos de nível 2, deste segmento, desta faixa etária, alunos entre os 16 e os 18 anos, em cursos de nível 2, em espaços de escolas secundárias, ou seja, de nível 3, triplicou neste ano lectivo. Portanto, tínhamos menos de 5000 alunos inscritos nesta situação e passámos a ter 15 000 alunos.
Penso que esta é a aposta estratégica para recuperar do insucesso do ensino básico e, também, do insucesso e do abandono no ensino secundário. Pareceu-nos, pois, muito importante, nesta fase, fazer com que as instituições se centrassem no seu objectivo principal, naquilo que é a sua missão essencial e não tivessem derivas de ofertas formativas pós-secundárias, havendo instituições capazes de o fazer.
Uma coisa também lhe posso dizer, Sr. Deputado: o meu objectivo não é viabilizar os politécnicos, o meu objectivo é fazer centrar as escolas do ensino secundário e as escolas profissionais naquela que é a sua principal missão.
A questão da remuneração dos estágios relaciona-se com o problema da formação inicial de professores, que, como sabe, está a ser revisto em resultado da introdução do Processo de Bolonha. E, em qualquer caso, precisaríamos sempre de iniciar uma reflexão à volta da questão da formação inicial de professores.
Nas matérias relativas a estágios (que continuam, aliás, nas condições em que existiam), foi feito um normativo dirigido às escolas e às universidades. Tal como estava previsto, os Ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior produziram, em conjunto, um normativo que regulamenta estes estágios que estão em vigor este ano.
A diferença é aquela que tínhamos anunciado, isto é, a suspensão da remuneração dos estagiários. De resto, o regime mantém-se a funcionar nos moldes em que estavam a funcionar, com a compensação aos orientadores de estágio, etc.
Na questão do eventual apoio ao transporte dos estagiários não nos foram colocados casos concretos. De qualquer modo, essa situação não estava prevista no modelo.
O que penso que o Ministério da Educação tem de fazer é definir a formação inicial de professores de acordo com Processo de Bolonha e definir a política de estágios e de recrutamento activo, porque uma política de remuneração de estágios é uma política de recrutamento activo de professores, que, penso, vai ser necessário manter mas apenas para áreas disciplinares muito circunscritas e muito precisas.
Finalmente, no que respeita às medidas que tomámos e aos reflexos que o Sr. Deputado diz terem sobre a comunidade educativa, não sei a quem se estava a referir, se aos pais, se aos alunos… Mas, como resposta, devolvo-lhe as seguintes perguntas: o Sr. Deputado concorda, ou não, com as medidas que foram tomadas? Está de acordo, ou não, que é necessário alargar o horário de funcionamento das escolas do 1.º ciclo? Concorda, ou não, que é necessário que as escolas utilizem o trabalho dos professores, de acordo com o que está previsto no Estatuto da Carreira Docente, no que respeita à componente não lectiva para as actividades que é necessário manter numa organização, como é a escola? A escola é uma organização de trabalho, tem recursos e deve ter os instrumentos de gestão que lhe permitam a melhor utilização e rentabilização desses recursos.
No que respeita à insatisfação que manifesta, Sr. Deputado, diria que há sempre uma certa insatisfação e, também, uma certa alegria da parte, por exemplo, dos alunos ou dos pais dos alunos; há sempre presidentes de conselhos executivos que manifestam também o seu apreço pela possibilidade que têm de gerir melhor as escolas; há sempre professores que também expressam o seu apreço pela possibilidade de desenvolver boas práticas educativas no interior das suas escolas. Tudo depende do foco em que queremos colocar a nossa atenção e, eu, como sou uma optimista, prefiro colocar a minha atenção no foco do lado positivo.
Foi-me colocada uma questão acerca do fecho de 512 escolas, as escolas do insucesso. A rede escolar está num péssimo estado, sobretudo ao nível do 1.º ciclo. Existem 4500 escolas com menos de 20 alunos, dispersas, efectivamente não integradas — o problema que se coloca é de integração no ensino básico. Ora, aquilo que procurámos fazer foi identificar se havia alguma relação entre o insucesso e a dimensão das escolas. E o que verificámos, de forma consistente, foi que os casos absurdos de repetência superior — mas muito superior — à média nacional se localizavam todos, sem excepção, em escolas de reduzida dimensão e nesta situação de abandono.
Penso que tenho a responsabilidade de não ignorar esta informação a partir do momento em que a solicitei. Não sabia o que ia encontrar, mas obtive uma lista de 512 escolas em que, há três anos consecutivos, de acordo com as estatísticas de que dispomos, a taxa de repetência é superior à média nacional.
Considerando que são escolas onde estão inscritos 10 alunos e repetem 5 ou 8, ou onde estão inscritos 15 alunos e repetem metade ou mesmo 80%, e em alguns casos 100%, penso que o problema tem uma expressão que o Ministro não pode ignorar, devendo haver uma intervenção consequente. Ora, a intervenção consequente traduz-se em tudo fazer para que essas crianças sejam transferidas para espaços escolares que lhes ofereçam outras oportunidade. É nisso que estamos a trabalhar.
Este problema não vai permitir ao Ministério da Educação economizar um único euro. Pelo contrário, vai exigir um esforço de investimento. Como já anunciei, nos grandes planos de investimento temos destinados 1,8 milhões de euros para apoiar as autarquias a nível de transporte, refeições e, eventualmente, outras situações.
Não sabemos bem o que vamos encontrar. Neste momento, as equipas das direcções regionais estão a trabalhar com as autarquias com base numa previsão. Mas a responsabilidade pela rede de transporte escolar

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está estabelecida, ou seja, a responsabilidade é das autarquias. Podemos, sim, ter surpresas e encontrar casos muito difíceis. Aliás, já identificámos um ou dois casos como muito difíceis. Ora, aí tem de haver uma resposta. Nesse caso, ou a autarquia a dá ou, caso não dê, a criança não pode ficar sem resposta.
Sr.ª Presidente, gostaria de pedir ao Sr. Secretário de Estado da Educação que respondesse a uma última questão.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos): — Sr.ª Presidente, relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado Emídio Guerreiro acerca do horário de funcionamento e das horas extraordinárias dos professores, não prevemos um aumento muito significativo — embora haja um certo aumento — porque não creio que a interpretação que me pareceu ser a do Sr. Deputado seja aquela que é feita. Como é sabido, nos horários dos professores já existem horas previstas, resultantes de reformas anteriores — algumas resultantes da reforma do ensino básico e da reforma do ensino secundário —, para este tipo de actividade de trabalho de reforço de aprendizagem com os alunos. Repito, estas horas estão previstas e todos os professores têm pelo menos uma ou duas horas do seu horário destinadas a este tipo de actividade, fazendo parte, portanto, do horário normal de um professor.
Por outro lado, relativamente às aulas de substituição, nem todas as actividades que os professores desenvolvem na sua componente não lectiva se traduzem em aulas de substituição. Ora, isso não significa que não devam existir mais do que aquelas que há actualmente e queremos incentivar no sentido de criar mais do que aquelas que já existem. Mas, na globalidade, a nossa previsão vai no sentido de que não vai haver um aumento com uma expressão orçamental muito significativa ou especialmente preocupante. Essa matéria está suficientemente encaixada no orçamento que foi apresentado nas verbas destinadas ao pessoal.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, a qualidade da educação e da formação são determinantes para o futuro de Portugal. Nessa perspectiva, todas as opções tomadas nesta área assumem uma particular importância na nossa sociedade e terão de ter, necessariamente, uma visão estratégica no sentido da promoção do desenvolvimento nacional e da coesão social.
O investimento feito em educação tem procurado acompanhar, ao longo destes últimos anos, os desafios colocados ao País, nomeadamente através de um esforço acrescido na recuperação dos baixos níveis de escolaridade e na procura da convergência aos padrões dos restantes países da comunidade europeia.
Assim, o nível da despesa pública no sistema educativo coloca Portugal entre os países da União Europeia que, nos últimos anos, investiu quantidades muito significativas do seu Produto Interno Bruto em educação.
No entanto, os resultados ainda não acompanham as necessidades do nosso país e temos problemas estruturais que importa resolver, nomeadamente a questão do abandono e do insucesso escolar, para além, como já referi, dos baixos índices de escolaridade da população activa.
Penso não haver necessidade de se colocar mais dinheiro no sistema educativo, mas tem de se inverter a forma como esse dinheiro é investido. Esse tem de ser o ponto de viragem neste processo para ganharmos mais eficácia e mais eficiência em todo o nosso sistema educativo.
Da leitura que fizemos do Orçamento do Estado, verificamos que ele vai de encontro a esta necessidade e procura responder com medidas muito concretas que permitam combater, de forma eficaz, o insucesso e o abandono escolares.
Como é meu hábito, vou começar por abordar o pré-escolar. Neste ciclo, considerado por muitos a primeira etapa da escolaridade obrigatória, é consignada no Orçamento do Estado uma verba que vai permitir o aumento da rede do ensino pré-escolar de forma a que esta mesma rede se consolide e permita o acesso a um número cada vez mais significativo, até atingirmos os 100% de crianças no pré-escolar.
Evidentemente, o pré-escolar é importante porque o acesso das crianças a esta fase escolar vai permitir a igualdade de oportunidades para a sua entrada no 1.º ciclo do ensino básico. Nesse sentido, pois, o Orçamento do Estado consolida a rede do pré-escolar.
Ao nível do 1.º ciclo, e como já aqui foi falado, a nossa rede escolar é dispersa, isolada, obsoleta. Como ainda há pouco tempo ouvi dizer, chamamos escolas a edifícios que não têm mais do que um quadro negro, giz, umas carteiras, por vezes muito degradadas, um professor e, em muitos casos, poucos alunos. Estes edifícios, a que se chama «escolas», são a herança que recebemos do antes «25 de Abril». É essa a rede escolar que temos! Portanto, as escolas fora dos grandes centros urbanos são as que existem há mais de 30, 40 e, por vezes, 50 anos, muitas vezes sem grande conservação, onde a população escolar foi diminuindo drasticamente ao longo destes últimos anos. Torna-se, pois, imperioso o reordenamento da rede do 1.º ciclo.
E se até há relativamente pouco tempo era quase tabu falar-se no encerramento de escolas, penso que hoje é possível um diálogo aberto sobre esta realidade, tanto mais que estão a chegar à discussão novos

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dados sobre situações preocupantes neste nível de ensino, como é o caso que a Sr. Ministra referiu agora, ou seja, o insucesso escolar nestas escolas.
Este debate aberto e a colaboração estreita das autarquias — porque é com elas que se tem de fazer o reordenamento da rede do 1.º ciclo — é fundamental. Sem este reordenamento estaria comprometido o sucesso escolar, bem como todo o trabalho que se pode fazer ao nível do 1.º ciclo, sob pena de se continuar a derramar dinheiro sobre um problema que não tem solução tal como está, sendo necessário atacá-lo naquilo que permite encontrar a sua solução.
Como referi, tem de haver um investimento claro no 1.º ciclo para procurar promover o sucesso educativo Ora, esse investimento passa pelo reordenamento da rede, mas também pela abertura das escolas até às 17 horas e 30 minutos, pelo ensino do Inglês e, necessariamente, pelo apoio à própria família através do serviço de refeições e, voltando ao pré-escolar, na componente de apoio à família. Penso, pois, que o Orçamento do Estado vai na direcção de dar uma resposta eficaz a estas vertentes que acabei de assinalar.
Ainda a nível do 1.º ciclo, e decorrente desse isolamento, existem problemas estruturais que foram colocados a nu pelas provas feitas pelo Ministério da Educação, e posteriormente através de um estudo do PISA de 2004, que dão conta que os níveis de proficiência a Matemática são extremamente baixos, sendo preciso atacar o problema. Uma das formas de o fazer passa por ter um corpo de professores que, ao nível das suas estratégias, tenha uma diversidade de oferta que permita a recuperação destes alunos. Na verdade, encontramos também eco no Orçamento do Estado em relação a esta matéria com a formação contínua a Matemática dos professores do 1.º ciclo.
Todo o Orçamento do Estado apresenta um investimento claro neste nível de ensino e considera prioritário o investimento no 1.º ciclo, no sentido de ultrapassar os graves problemas existentes ao nível do insucesso e do abandono escolares.
Este problema coloca-se também em relação ao 3.º ciclo, mas de forma muito diferente. Estudos feitos em 2001 revelaram que dos alunos que chegam ao 2.º ciclo 46% já reprovaram pelo menos uma vez. Ora, sabemos que a repetência é também geradora de abandono escolar. É, pois, preciso investir para que os alunos não deixem a escola, tendo esses investimentos de ser feitos de uma forma precoce. É que, como sabemos, deixar que o aluno abandone e depois procurar que ele regresse à escola é extremamente complicado.
Por isso, o investimento em percursos escolares alternativos é uma resposta — aliás, a Sr.ª Ministra já falou aqui dos cursos de formação de nível II que são extremamente importantes —, bem como o apetrechamento das escolas para poder responder com eficácia a cursos que permitam um percurso escolar alternativo, nomeadamente as chamadas oficinas laboratórios para o ensino vocacional ao nível do 3.º ciclo. Há um investimento de 12 milhões de contos.
Sr.ª Ministra, sendo a escola o centro das políticas educativas — é assim que entendemos a organização «escola» —, como vão ser definidas as prioridades no investimento do apetrechamento das escolas? Por outro lado, o ensino secundário tem, nos últimos anos, constituído um corredor de sentido único de acesso ao ensino superior. Todos sabemos que isto não pode continuar, mas o que é verdade é que, de facto, não se têm produzido alterações significativas, de modo a diversificar a oferta educativa neste nível de ensino.
O investimento ao nível das escolas profissionais e, simultaneamente, a diversificação da oferta nos cursos tecnológicos no ensino secundário tem de ser uma realidade, pois só assim Portugal entra de novo num caminho que garanta um desenvolvimento sustentado. É com satisfação que vemos um aumento de investimento ao nível das escolas profissionais, mas é nosso entendimento que as escolas secundárias também têm de alargar a sua oferta ao nível dos cursos tecnológicos e encontrar estratégias que permitam a procura destes cursos. E é aqui que entram os gabinetes de orientação escolar e vocacional e o papel do director de turma, que são fundamentais nesta área.
A acreditar nos dados do Eurostat, de 1999, 46% dos jovens portugueses entre os 18 e os 24 anos apenas possuía o 9.º ano de escolaridade, contra os 21% que se verificavam na União Europeia. Ora, um caminho que permita aumentar a qualificação destes jovens passa por uma formação que, por um lado, reconheça as suas competências e capacidades e, por outro, lhes permita um percurso individualizado. Neste contexto, foi com particular agrado que vimos crescer e alargar os Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação das Competências e Capacidades.
Depois, coloca-se a questão da utilização das tecnologias da informação e comunicação em meio escolar, do apetrechamento de salas específicas e do acesso das escolas à banda larga. Neste aspecto, há uma interligação estreita com outras áreas, o que se verifica pela introdução da dedução fiscal até 250 € na aquisição de computadores por parte das famílias. Sabemos que, muitas vezes, são as crianças quem leva para casa a informação que permite à família fazer este tipo de aquisições e transformar os pais, os irmãos mais velhos e outros familiares em utilizadores sistemáticos de tecnologias da informação. Como tal, este apetrechamento é fundamental tanto no que respeita aos laboratórios como às bibliotecas escolares, o que se torna ainda mais significativo quando sabemos que este processo, nomeadamente no que toca às bibliotecas, foi iniciado pelo governo de António Guterres, tendo sistematicamente vindo a crescer em dimensão e em importância nas nossas escolas.
No que concerne à acção social escolar, é com agrado que vemos que há, a este respeito, um aumento da verba disponível no Orçamento do Estado, o que é um indicador claro da compensação social e educativa dos

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alunos que são economicamente mais carenciados, contribuindo-se assim, necessariamente, para a construção de igualdade de oportunidades e para o sucesso escolar.
Nesta viragem estratégica de investimentos, vemos que há um investimento claro na defesa da escola pública, criando-se melhores condições de trabalho para os alunos, para os professores e para o pessoal não docente, assim como para as famílias no que ao acolhimento das crianças pelas escolas diz respeito. A leitura que fazemos da proposta de Orçamento do Estado constata a imperiosa contenção das despesas de funcionamento — que passa, como a Sr.ª Ministra já referiu, pela redução de 1,4% na despesa da administração central e dos serviços tutelados — e, simultaneamente, a racionalização equilibrada dos recursos que vai permitir redireccionar o Orçamento e fazer investimentos em áreas estruturantes do nosso sistema educativo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, aproveito a oportunidade para esclarecer as questões relativas ao programa de formação contínua em matemática para os professores de 1.º ciclo. De facto, este programa já arrancou, já está no terreno, já podemos ter alguns resultados e, como tal, constatar que a adesão dos professores correspondeu ao que esperávamos. A nossa expectativa é a de que estes programas de formação contínua sejam plurianuais, visto que precisamos de alargar esta metodologia de trabalho ao ensino da língua e ao ensino experimental das ciências, que é muito, muito importante. Estas são também áreas deficitárias e precisamos de fazer a valorização das competências dos professores nesta matéria.
A nossa expectativa é a de, neste ano, abrangermos os professores dos 3.º e 4.º anos de escolaridade, continuar no próximo ano com os restantes professores, mas, simultaneamente, alargar já para a Língua Portuguesa e para o ensino experimental. Neste sentido, os programas estão já a ser trabalhados pelos serviços do Ministério da Educação.
Em relação à questão que colocou sobre os critérios para a selecção do apoio às escolas que se candidatam ao programa de equipamento ou construção de espaços laboratoriais e oficinais, podemos neste momento dizer que até ontem tinham manifestado interesse cerca de 1200 escolas, não estando ainda, todavia, feito o cálculo de qual o valor do investimento apontado. A orientação dada a estes programas é a de apoiar todos os projectos que sejam apresentados, desde que eles estejam nos níveis de qualidade e dentro dos referenciais que são definidos pelo Ministério da Educação. Como tal, a proposta das escolas vem sempre associada ao projecto educativo, à identificação da utilidade do espaço a construir e à sua relação com o projecto educativo. Se no projecto educativo cabem programas de recuperação de alunos, se a implementação da diversificação das ofertas formativas para os alunos do básico e do secundário está de acordo com o projecto educativo, se o espaço laboratorial a ser implementado é o adequado e está dentro dos referenciais que o Ministério da Educação define, a expectativa não é a de seleccionar e apoiar duas escolas, mas, sim, todas as escolas, sendo que as propostas têm, evidentemente, de ser analisadas.
Em relação à questão da utilização do STIC (Serviço de Tecnologias de Informação e Comunicação), da banda larga, uma medida muito importante é, de facto, a anunciada dedução em sede de IRS para as famílias que tenham membros em qualquer nível de ensino até ao valor de 250 €. Esta medida é, como disse, muito importante, porque, de facto, a diferença no sucesso escolar está muito associada à possibilidade de ter acesso a estes recursos em casa e, como tal, se assim conseguirmos abranger um número alargado de alunos, sobretudo do básico e do secundário, estamos a dar um forte apoio social e a melhorar as condições de ensino e de aprendizagem das nossas crianças.
Quanto às demais questões, penso que seria melhor ser o Sr. Secretário de Estado da Educação a responder.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, sobre a melhoria das condições de sucesso escolar, a questão colocada falou em dois níveis de intervenção e perguntou quais os níveis que estão a ser considerados nesta matéria. A este respeito, temos um nível de intervenção relacionado com o trabalho dentro das escolas, com o percurso formativo normal dos alunos, onde existe, manifestamente, um problema de alguma falta de organização das actividades de recuperação e de acompanhamento dos alunos.
Aliás, este é um dos resultados dos relatórios internacionais sobre a situação portuguesa na área da matemática e noutras áreas de aprendizagem. Neste sentido, há algumas medidas que têm em vista a criação de condições de organização do trabalho escolar, permitindo que os alunos que estão em risco de insucesso ou de abandono escolar possam ser acompanhados de uma forma mais permanente com planos de recuperação ou de acompanhamento, ou ainda — e passamos para o outro nível de intervenção — com percursos alternativos, quer na via curricular mais comum, quer na entrada em novos percursos, como, de resto, foi referido pela Sr.ª Ministra, que mencionou os cursos de educação e de formação e disse que este ano triplicou o número de estudantes neles inscritos.
Obviamente, tudo isto se relaciona com a possibilidade de abrir mais vias, nomeadamente ao nível do ensino secundário, e, portanto, com a possibilidade de os alunos poderem encontrar as vias mais adequadas aos seus interesses na prossecução do seu percurso escolar. Esta área tem sido amplamente referida, está manifestamente clara nas medidas que a Sr.ª Ministra enunciou e relacionou com os programas de investimento e

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está contemplada no Programa Novas Oportunidades, que foi oportunamente apresentado no Parlamento. A parte deste Programa que está relacionada com os aspectos escolares, nomeadamente dos jovens, está suficientemente explicada e está reflectida nesta proposta de Orçamento.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira): — Sr.ª Presidente, quero apenas deixar uma pequena nota sobre a acção social escolar, dizendo que o Orçamento contém um aumento significativo nesta área, no que respeita ao esforço que será feito para fornecer as refeições às crianças do 1.º ciclo.
Esta é uma mudança muito substancial que importa um aumento significativo de despesa, mas é importante esclarecer que este aumento não se fará à custa das outras rubricas da acção social escolar, visto que até se prevê uma actualização dos montantes, no sentido de melhorar, ainda que ligeiramente, a contribuição dos apoios previstos na acção social escolar.
Era esta a nota que queria deixar, salientando que há um reforço bastante significativo e a resolução de um problema que há muito estava por resolver — o da contribuição do Ministério da Educação para o fornecimento das refeições às crianças do 1.º ciclo. Contudo, este aumento não se faz à custa de outros apoios que o Ministério continuará a prestar às famílias, através dos outros programas existentes neste domínio.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para continuarmos a aperfeiçoar o conhecimento da proposta de Orçamento do Estado para 2006, neste caso no que respeita ao Ministério da Educação, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, antes de iniciar a análise do Orçamento, gostaria de começar por reflectir sobre duas ou três afirmações proferidas pela Sr.ª Ministra na sua intervenção inicial.
Houve, segundo disse, uma alteração das prioridades do Ministério relativamente ao pagamento às câmara municipais dos pavilhões desportivos e que, portanto, essa poupança pode, de algum modo, ser direccionada para outras áreas que o Ministério considerou importantes.
Gostaria de saber se esta notícia já foi transmitida às autarquias, dado que estamos perante a seguinte questão: os governos, ao longo dos últimos 20 anos, fizeram muitas escolas sem pavilhões gimnodesportivos, tendo informado as autarquias de que, «posteriormente», «na próxima legislatura», «no governo seguinte» se procederia à sua construção.
As autarquias esperaram e, não tendo havido boa fé por parte dos respectivos governos quanto às construções dos pavilhões gimnodesportivos, acabaram por encontrar terrenos e fizeram os pavilhões, um pouco à espera que o dinheiro aparecesse. E assim tem acontecido por esse País fora.
Tendo, pois, sido tomada esta decisão por parte do Ministério da Educação, gostaria de saber como é que a Associação Nacional dos Municípios Portugueses recebeu a notícia. Deve ter ficado um pouco intranquila, até porque, Sr.ª Ministra, estamos a falar de um orçamento para as autarquias, ou seja, da Lei das Finanças Locais, que, mais uma vez, não é cumprida.
Portanto, estamos a falar de um decréscimo real das necessidades das autarquias. Muitas delas – e conheço algumas – estavam à espera de que neste Orçamento constasse verba para alguns pavilhões que construiram nos últimos anos. Como não consta, gostaria de saber qual foi a reacção das autarquias.
Percebi a Sr.ª Ministra dizer – mas devo ter percebido mal – que vai ser feito um grande esforço (penso que não deve haver condições para todo esse esforço) para que haja computadores portáteis nas escolas de forma a que os professores os possam levar para casa para poderem trabalhar. Gostaria, pois, que a Sr.ª Ministra me dissesse se percebi ou não mal.
Começo por colocar uma questão que se prende com a leitura que se faz dos orçamentos. Penso que é complicado olhá-los como meros números e, fazendo-o, podemos esquecer que eles não passam da tradução orçamental de políticas. E isso é que me parece importante, ou seja, saber se os grupos parlamentares concordam ou não com a tradução orçamental das medidas que o Governo está a tomar na área da educação.
Fazendo algumas reflexões sobre esta matéria, penso que terei o consenso da Sr.ª Ministra quanto a questões como o abandono escolar, o insucesso, a instabilidade de uma grande parte do corpo docente no País, as escolas do 1.º ciclo sem condições de funcionamento, um ensino secundário sujeito e submisso a reformas que nunca acabam e que se sobrepõem umas nas outras nos últimos 20 anos, não permitindo qualquer estabilidade nem qualquer quadro formativo. Penso que todas estas questões são consensuais, são uma realidade, são factos. Não estou a fazer avaliações, só estou a referir-me ao que tem vindo a acontecer, são esses os dados que conhecemos.
Face a esta realidade, o Governo optou por políticas, e as políticas que conhecemos como fundamentais são: encerramento de escolas, diminuição dos efectivos, particularmente do corpo docente do País, portanto poupança de recursos humanos; constituição de agrupamentos — mais uma vez para poupar recursos — de funcionários administrativos, de auxiliares educativos... Estes agrupamentos criam situações muito complicadas às famílias portuguesas, que vêem os seus filhos, com meia dúzia de anos, a serem deslocados do seu local de residência, e onde até tinham algum acompanhamento, para escolas mais distantes, porque os agru-

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pamentos resultaram muitas vezes de encerramentos de outras escolas mais pequenas. Cria-se, portanto, um espaço globalizado de educação, com alguns agrupamentos com centenas de escolas e milhares de alunos.
Não estou a dizer que foi a Sr.ª Ministra a responsável pela criação dos agrupamentos, mas foi o Partido Socialista. E acredito que o Governo actual, do Partido Socialista, prossiga na continuidade da criação desses agrupamentos.
O Governo do PSD e do CDS não inverteu a política dos agrupamentos. Ouvimos há pouco um Sr. Deputado muito preocupado com a deslocação das crianças nos transportes escolares, mas todos nos lembramos dos agrupamentos constituídos, de forma ilegal, pelo ex-Ministro Prof. David Justino.
Sr.ª Ministra, para esta política não terá, de modo algum, a concordância do PCP. O PCP entende que as medidas deveriam ser outras.
Entendemos que não há falta de horas para as crianças estarem nas escolas, há é falta de escolas em condições para que as nossas crianças lá estejam. Isto sem prejuízo de estarem, como já foi dito, em algumas escolas, horas a mais. Uma escola que tem um quadro negro, quatro paredes, que não tem instalações sanitárias, que não tem refeitório e que, ainda por cima, obriga as crianças, com meia dúzia de anos, a levantarem-se às 6 horas da manhã, é uma escola que não deveria existir. Portanto, não sei se é conveniente ou se é uma desvantagem as crianças terem de estar mais horas na escola.
Entendemos que para haver melhores escolas e melhor educação era preciso inverter e alterar esta situação e não uma diminuição dos efectivos e de escolas.
Como sabe, o 12.º ano vai entrar em funcionamento no próximo ano lectivo, e estive esta manhã reunida com uma associação de livreiros que me disseram que os programas não estão feitos. Então, se há programas que não estão feitos, que não estão concluídos em relação a um 12.º ano que vai entrar em funcionamento, alguém, minimamente sério e rigoroso intelectualmente, espera que haja sucesso educativo? Como é que se espera que os livros sejam feitos em condições, que a avaliação seja feita em condições? Estas é que são as questões da educação.
A Sr.ª Ministra entenderá que não temos todos as mesmas opiniões acerca de matérias similares, mas estas é que são as questões da educação.
Pergunto-lhe também, Sr.ª Ministra: o que se passa com a reforma do ensino secundário? A Sr.ª Ministra tem algum estudo? Tem um estudo de todas as escolas que vai encerrar. E disto tem? O que é que se passa? Quanto aos tecnológicos, o que é que vai continuar e o que é que não vai? Quantos vão funcionar? Em que condições? Por que é que não estão feitos os programas? Por que é que não estão concluídos? Inclusivamente, há disciplinas para as quais ainda não foi feito o projecto de programa.
Deixando agora de lado estas questões, e afirmando que é esta a avaliação que fazemos, gostaria de dizer que o orçamento da educação não «sobe um bocadinho», desce um bom bocado, porque não podemos olhar o orçamento em termos de 0,2%, temos de o olhar em termos da inflação. Bem sei que gostaríamos todos de estar num país onde não houvesse inflação – era muito bom para as nossas casas, para as nossas escolas, para as nossas vidas pessoais –, mas há inflação, e ela é superior a 2%. Portanto, se é superior a 2%, num orçamento de um ministério que aumenta 0,2% há um decréscimo efectivo. O que significa que, no âmbito da contenção, e tendo a Sr.ª Ministra dito que vão ser encerradas escolas, que se poupou em professores e em recursos humanos numa função social do Estado tão importante, o decréscimo ainda é maior, porque o Orçamento devia reflectir exactamente essa poupança acrescida com mais verbas, mas não! Portanto, a educação é penalizada duas vezes: é penalizada porque não cresce e é penalizada porque as poupanças que a Sr.ª Ministra conseguiu, na minha opinião, à custa de violação de direitos adquiridos, não foram canalizadas para a educação.
Espero que a Sr. Ministra tenha o cuidado de entender (penso que terá) que sou Deputada do Grupo Parlamentar do PCP, não represento qualquer organização sindical,...

Risos do PS.

... não cometendo a indelicadeza, que às vezes alguns ministros cometem quando olham para o PCP, e que a Assembleia da República tem todo o direito e todo o dever de avaliar as medidas políticas que estão a ser tomadas pelo Ministério, muito mais quando elas conflituam com direitos adquiridos não só relativamente ao corpo docente mas também aos funcionários auxiliares das escolas, aos administrativos, etc.
Por exemplo, a educação pré-escolar aparece no relatório do Orçamento como algo muito importante.
Reparei na frase e, como sou Deputada desde 1995, acabei por verificar que a frase relativa ao pré-escolar é exactamente igual àquela que constava do primeiro orçamento e do primeiro Programa de Governo apresentados por um senhor chamado António Guterres, que foi Primeiro-Ministro. É exactamente a mesma preocupação.
O Partido Socialista não conseguiu, de 1995 a 2001, cumprir aquilo a que se obrigou quando estava apaixonado pela educação, particularmente pela educação pré-escolar, e, mais uma vez, passados 10 anos, a Sr.ª Ministra veio dizer que não deve ser com esta verba porque a educação pré-escolar aumenta 1.3% no seu funcionamento.

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Sr.ª Ministra, gostaria de dizer ainda que, no caso do seu Ministério, se levanta a mesma questão que há pouco discutíamos com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que é a das comparações.
Compara-se a educação pré-escolar, no que tem a ver com os investimento do plano, com a estimativa de 2005, porque se se comparar o orçamento inicial para 2006 com o orçamento inicial para 2005 ou com o orçamento rectificativo o acréscimo não é o que é referido, não tem nada que se compare. O que há é não um acréscimo, mas um decréscimo relativamente ao orçamento inicial na educação pré-escolar no que tem a ver com o investimento entre o orçamento inicial de 2005 e o de 2006. Ou seja, veja a Sr.ª Ministra que, comparando o que é comparável (sei que a Sr.ª Ministra vem de uma área onde as questões da investigação e do rigor lhe são caras), afinal não há acréscimo, há decréscimo. Era disto que há pouco falávamos, isto é, da subjectividade das leituras quando as fazemos de determinada maneira.
Esta não é uma questão de somenos importância, porque o orçamento por acções refere que se trata de um investimento em que há um crescimento de 315,8%. Como considerei esse número demasiado elevado, fui verificar, acabando por descobrir que afinal não há acréscimo, mas decréscimo.
Se olharmos, por exemplo, para os ensinos básico e secundário, que é também outra aposta, dizendo a Sr.ª Ministra que é importante que se aposte no 1.º ciclo (chamo-o de parente pobre), afinal verificamos que também não há qualquer acréscimo nos investimentos do plano, antes pelo contrário, há um decréscimo, porque o que se compara não pode ser a estimativa de execução, tem de ser o Orçamento inicial de 2005 com o de 2006.
Claro que competia ao Partido Social Democrata fazer esta leitura, mas, como parece que esse partido vai viabilizar o Orçamento, não pode fazer críticas fazendo comparações com o orçamento que apresentou em 2005.
Portanto, esta é que é a leitura do ensino oficial, na perspectiva do documento que nos apresentou, no que tem a ver com os ensinos pré-escolar, básico e secundário.
Gostaria que a Sr.ª Ministra me confrontasse também com os seus dados para verificarmos que o que estou a indicar são números, pois já falei das políticas.
Quanto aos ensinos básicos e secundário há uma informação que me parece estranha, isto é, que o 1.º ciclo do ensino básico, estabelecimentos de educação, ensino e agrupamentos, etc., têm receitas próprias.
Gostaria que a Sr.ª Ministra me dissesse onde é que o 1.º ciclo do ensino básico vai buscar receitas próprias, que também aparecem nos 2.º e 3.º ciclos dos ensinos básico e secundário e nas escolas secundárias. De facto, faz-me impressão falar-se em receitas próprias, porque se as houvesse não se pedia aos pais dinheiro para comprar papel, desde papel higiénico a papel para os meninos escreverem.
Relativamente às verbas no investimento do plano, no que tem a ver também com os ensinos básico e secundário, há pouco referi a verba na sua totalidade, mas dir-lhe-ei que, quanto às instalações para os estabelecimentos de ensino básico e secundário e ao seu apetrechamento, as verbas decrescem relativamente ao que é comparável, isto é, o orçamento inicial de 2005 e o de 2006.
Sr.ª Ministra, as verbas para tecnologias de informação e de comunicação da educação descem, e muito.
Mais uma vez, comparando o orçamento inicial de 2005 com o de 2006, há uma diferença de 16 milhões para 10 milhões. Veja bem a diferença: é quase de 50%.
Não há decréscimos no ensino particular e cooperativo, comparando orçamentos iniciais. Não vou tirar ilações políticas disto, mas é, no mínimo, interessante.
Quanto às escolas profissionais, gostaria que a Sr.ª Ministra me respondesse à seguinte questão: quantas escolas e quantos alunos existem? Era uma informação que existia no orçamento por acções em 2005 e que seria interessante conferir e comparar, para sabermos se temos mais escolas, mais alunos, se isto tem vindo a diminuir e se a estratégia de motivação para as escolas profissionais está a funcionar ou não.
Até porque nesta matéria há acréscimo e, portanto, é natural que queiramos saber exactamente o que é que vai acontecer.
Quanto à difusão da cultura e ensino da língua portuguesa no estrangeiro, vimos ontem que o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros tem as quebras que tem. Devo dizer que estava com alguma esperança que, na área da educação, de algum modo, se colmatasse aquilo que decresce no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Mas afinal desce. Claro que, olhando para o orçamento por acções, não desce, porque, mais uma vez, compara-se com a estimativa. Mas comparando os orçamentos iniciais, desce mais uma vez, e desce particularmente em relação ao ensino da língua portuguesa no estrangeiro. O que pergunto é se esta situação já resulta da medida que consiste em diminuir o número de docentes colocados pelo Ministério da Educação na Europa, e de optar, na Europa, por aquilo que já acontece no resto do mundo, que é tabelar pelo mais baixo.
O que as nossas comunidades na Ásia, na África e na América queriam era que se fizesse o mesmo que se faz na Europa. Ou seja, que o Estado e a tutela assumissem o cumprimento do texto constitucional no sentido de garantir aos filhos das comunidades portuguesas o ensino da língua e da cultura portuguesas.
Ora, gostaria de saber se, tabelando por aquilo que é o mais baixo, tal qual como se está a fazer nas reformas e a outros níveis da função pública, o Governo está a pretender fazer na Europa aquilo que já acontece com as nossas comunidades no resto do mundo, que é entregar às comunidades a responsabilidade constitucional desta garantia, eximindo-se da sua responsabilidade constitucional da garantia do ensino da língua e da

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cultura portuguesas para as comunidades emigrantes. Portanto, uma vez que o orçamento desce, gostaria de saber porquê, e se a perspectiva é esta que acabo de referir.
Em relação à educação especial, a Sr.ª Ministra deve ter visto, como eu vi, recentemente, na televisão, uma reportagem que dava conta de um conjunto de meninos com deficiências preocupantes — que vão desde a surdez, à mudez, etc., que não têm apoio educativo —, dizendo que não há técnicos e que os conteúdos programáticos não estão a funcionar, porque não podem funcionar com um professor qualquer. De certeza que a Sr.ª Ministra ficou preocupada, como eu fiquei. Mas todos os anos é a mesma história. E são muitos e muitos meninos que se encontram nestas condições! Olhando para o capítulo da educação especial, verifico que há um acréscimo. Depois, comparo com o orçamento inicial de 2005 e verifico um decréscimo relativamente às instituições de educação especial e aos apoios à educação especial. Por outro lado, as equipas de coordenação, que constavam do orçamento anterior, desaparecem. Embora essa verba não fosse nada de especial, era pouquíssima para as necessidades, não sei se se trata de uma reestruturação orgânica do próprio Ministério e se as equipas já não são precisas.
Portanto, Sr.ª Ministra, gostaria de saber se isto é uma aposta na educação especial.
O abandono e o insucesso escolares também se tratam criando condições para que as nossas crianças com necessidades educativas especiais tenham uma escola em condições, o que, no caso concreto, significa ter técnicos à altura para que o combate ao abandono e ao insucesso se faça pela aplicabilidade da diferença, através dos instrumentos necessários. Penso que a Sr.ª Ministra estará de acordo comigo.
Ainda em relação à acção social escolar, há algumas diminuições, mas há uma rubrica desaparece. Na acção social escolar, aparecia uma verba para a educação especial, mas agora essa rubrica desapareceu. E era uma rubrica com algum dinheiro. Portanto, o que pergunto é se este apoio socio-económico agora já não é necessário.
Além disso, desapareceu também na acção social escolar a rubrica relativa à construção e equipamento de residências escolares. Pergunto: não são necessárias, na perspectiva deste Governo? Não pensa que essa é também uma estratégia de combate ao abandono e ao insucesso escolares? O facto é que a rubrica desapareceu.
Naturalmente que teria outras questões para colocar, mas teremos outras oportunidades de usar da palavra.
Sr.ª Presidente, muito obrigada pela sua tolerância.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Deputada, agradeço os seus reparos e observações.
É evidente que este é um orçamento que executa as políticas do Governo do Partido Socialista. Portanto, quanto a isso, só podemos estar de acordo. Penso que o assumimos plenamente, com clareza e transparência. Julgo, aliás, que não era a expectativa do PCP que executássemos o programa do PCP. Temos que executar o programa do Partido Socialista.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Era bom que o fizessem, mas não estão a fazê-lo!

A Oradora: — A questão da inversão de prioridades no que respeita à recuperação do parque escolar, à conservação e construção de novas escolas não é uma questão fácil. Só para que saiba, dir-lhe-ei que nas regiões de Lisboa e Porto, se nada fizermos, se não negociarmos com os presidentes de câmara o pagamento desta dívida com um outro plano de pagamentos não poderemos construir nem recuperar escola nenhuma.
No entanto, penso que também estamos todos de acordo com o facto de que é mais importante recuperar e construir escolas do que construir pavilhões escolares. Vou, aliás, mandar elaborar uma lista dos pavilhões escolares que foram construídos nos últimos seis anos, porque penso que vale a pena comparar essa lista com as escolas que foram construídas e com as escolas que foram recuperadas, para que o País tenha consciência das prioridades que foram definidas nos últimos anos. Penso que vale a pena. Com isso, pode ser que o Ministério da Educação consiga uma base social de apoio para a negociação de tem de fazer com os presidentes de câmara, não com a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Trata-se de um problema que identificámos, que procurámos enfrentar e em que estamos a procurar recuperar algum terreno. Se a Sr.ª Deputada observar com pormenor o PIDDAC da região da Lisboa e da região Norte verificará que está inscrito o pagamento de muitos milhares de euros para pagamento de compromissos do Ministério com a construção de pavilhões. Portanto, é uma situação que só conseguiremos mudar com um pouco mais de trabalho e de empenho.
No que respeita aos computadores portáteis nas escolas, a Sr.ª Deputada não ouviu mal, ouviu bem. Efectivamente, falei de computadores portáteis para que os professores os possam levar para casa de forma a terem melhores condições de trabalho. A minha expectativa é, até, a de poder dobrar aquilo que está no actual orçamento, no PRODEP, por negociação com outros fundos comunitários. O que está reservado no PRODEP é a quantia de 13 milhões de euros e a nossa expectativa é a de podermos dobrar essa quantia e

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assim termos um programa minimamente aceitável, sobretudo para as escolas dos 2.º e 3.º ciclos e escolas secundárias.
Disse a Sr.ª Deputada que devíamos ter melhores escolas e melhor educação, mas que isso não se consegue com encerramento de escolas, com diminuição do número de docentes e do apoio à melhoria das condições de funcionamento dos agrupamentos. Penso que, também aqui, há alguma divergência de posições. É que podemos referir-nos a melhorar as escolas e a educação em abstracto, mas a questão tem de se traduzir em políticas concretas.
Vejamos! Temos de ser muito claros no que respeita à diminuição do número de docentes. A questão, Sr.ª Deputada, é que o número de alunos decresce todos os anos. Temos cada vez menos alunos no sistema! É uma questão da demografia. Não tem sentido pensar-se que o número de docentes a entrar no sistema vai continuar a crescer, como aconteceu nos tempos em que o número de alunos subia todos os anos, se o número de alunos está a diminuir.
A informação que lhe posso dar é que a despesa do Ministério da Educação, por aluno, cresce sempre, tem crescido todos os anos. Segundo os dados de que disponho, a despesa unitária do Ministério da Educação, por aluno, de 1995 até 2006, cresce sempre.
Por isso, julgo que não se pode avaliar a qualidade da educação, nem a qualidade das escolas, nem a qualidade do ensino pelo número de docentes que se faz entrar no sistema. Não pode ser. Não é esse o indicador certo para medir a qualidade do ensino que se faz. O número de docentes que entram no sistema tem de ser o adequado às necessidades do ensino.
Isto leva-me à questão que colocou relativa aos apoios educativos. Vou dar-lhe dois números Sr.ª Deputada. Quando chegámos ao Ministério da Educação, o número de crianças sinalizadas (não sei se conhece este conceito, que é um conceito horrível) era de 55 000, havendo 10 000 professores destacados, envolvidos no apoio a estas crianças. Actualmente, de acordo com dados do mês passado, já estavam sinalizadas 66 000 crianças e o número de professores envolvidos nestas actividades era de 12 000. Penso que, com um pouco de paciência, conseguiremos ter as crianças todas sinalizadas e os professores todos nos apoios.
Isto, Sr.ª Deputada, para lhe dar conta de um problema gravíssimo do sistema educativo e para lhe chamar a atenção para o facto de que, evidentemente, a solução não é «tirada da cartola». É um problema que temos.
Com milhares de professores, com milhares de horas de ensino e de apoio, o País apoia a educação especial, apoia o insucesso e, todavia, as crianças sinalizadas crescem todos os dias e a recuperação destas crianças não tem qualquer garantia no actual quadro de funcionamento deste sistema. Isto para lhe responder, Sr.ª Deputada, que a qualidade do ensino não tem a ver com o número de professores que conseguimos pôr nas escolas ou envolver nestas actividades.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Ninguém disse isso!

A Oradora: — É preciso um pouco mais. É preciso, na minha opinião (e é nesse sentido que toda a equipa do Ministério tem estado a trabalhar), olhar para as escolas como instituições que têm uma missão com objectivos claros, que têm de cumprir, que é o sucesso educativo, prestar ensino, criar condições de aprendizagem e conseguir que isso se concretize com naturalidade e fazendo uma utilização racional e rigorosa dos recursos de que as escolas dispõem.
Seguidamente, para responder a uma questão pontual, gostaria de dizer-lhe que as escolas têm, de facto, receitas próprias, desde logo decorrentes do apoio que muitas autarquias prestam às escolas do 1.º ciclo, o que do ponto de vista contabilístico entra como receita própria.
Sobre a questão do secundário, que é também um problema preocupante, muitas das medidas que estamos a desenvolver no Ministério, muitas medidas de política e iniciativas que lançámos não têm expressão orçamental, porque também entram no quadro da actividade normal dos serviços. Há muitos aspectos que se podem melhorar na área da educação sem que isso custe dinheiro com expressão no orçamento.
Isto leva-me à questão da reforma do ensino secundário, que foi implementada em 2004 e que estava sem qualquer sistema de acompanhamento. Neste momento, foi já anunciada (talvez há cerca de um mês) a criação de um grupo de trabalho que esta a fazer o acompanhamento da reforma do secundário. A informação está disponível na página da Internet do Ministério da Educação. A nossa expectativa é que este grupo vá produzindo resultados que nos permitam, não fazer uma reforma em cima da reforma, mas fazer os ajustes necessários no que respeita aos currículos, aos programas, aos manuais e também à avaliação e à carga curricular de algumas disciplinas e à organização disciplinar.
Portanto, a metodologia de trabalho proposta é uma metodologia de um grande dinamismo. Não esperamos ter resultados daqui por três anos, mas esperamos ter resultados periodicamente, regularmente, que nos permitam ir tomando as medidas de ajustamento que forem necessárias.
Em relação aos programas, a informação de que disponho não regista qualquer atraso na sua elaboração.
O facto é que estava tudo muito atrasado quando chegámos ao Ministério da Educação. Estamos a fazer com que as coisas estejam prontas a tempo e horas, e neste momento não há qualquer atraso significativo de que os livreiros se possam queixar.

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No que respeita ao pré-escolar, também fico bastante satisfeita por a Sr.ª Deputada ter levantado esta «bandeira», porque, na minha opinião, a avaliação que faço é que se houve coisa que foi cumprida nos governos do Eng.º António Guterres foi a educação pré-escolar. Foi um compromisso e uma herança.
Desculpe, mas não respondi à sua questão inicial. A Sr.ª Deputada, durante grande parte do seu pedido de esclarecimento, foi sempre comparando o nosso orçamento e as evoluções com o orçamento inicial de 2005.
Eu tinha duas opções: podia ter trazido o orçamento inicial de 2005 e a expectativa de execução do orçamento de 2005. Trouxe a expectativa de execução do orçamento de 2005, porque me parece mais real. O resto é uma brincadeira. O orçamento inicial de 2005 é uma brincadeira, porque faltavam 400 milhões de euros, que foram colocados no Orçamento rectificativo, e havia cativações do PIDDAC da ordem dos 30%. Portanto, estamos a falar de uma coisa que não existiu, que foi o orçamento inicial de 2005.
Se eu quisesse não falar verdade ou fazer um exercício de pura magia, trazia o orçamento inicial de 2005, mas achei que era mais útil para os Deputados perceberem qual é a comparação trazendo aquilo que é um orçamento real. Foi essa a razão porque trouxe a expectativa de execução.
Isto leva-me à questão do pré-escolar. O ensino pré-escolar foi, no essencial, e de acordo com aqueles que foram os compromissos dos governos do Partido Socialista dirigidos pelo Eng.º António Guterres, cumprido. Hoje temos uma taxa de cobertura em relação às crianças de cinco anos de cerca de 85%, ultrapassandoa até. Portanto, podemos considerar que, no essencial, aquele compromisso foi cumprido. Foi um grande avanço para o País essa «bandeira» do pré-escolar nesses governos. Temos de reconhecer isso.
O compromisso deste Governo é o de atingir a cobertura de 100% das crianças com cinco anos de idade.
Temos já o levantamento feito e verificamos que já não é necessária uma política de massificação mas, sim, uma política de intervenção local. Temos de ir às regiões, às localidades, onde, de facto, esta cobertura está muitas vezes longe da média nacional. Temos zonas do País em que a cobertura das crianças com cinco anos de idade é da ordem dos 40%, portanto bastante inferior á media nacional.
Antes de estudar mais profundamente o assunto, estava convencida de que esta era uma questão das zonas urbanas, mas não é, porque em muitas regiões rurais ainda há um défice de cobertura, que é daquela ordem de grandeza.
De qualquer forma, as medidas necessárias para a resolução desse problema já não são do mesmo tipo das dos anteriores governos socialistas, são medidas de intervenção local — de construção ou de apoio à iniciativa local.
Quanto à tradução orçamental desta questão, quero dizer o seguinte: as verbas inscritas em 2005 eram da ordem dos 244 milhões de euros e, com o Orçamento rectificativo, passaram a 286 milhões de euros; nós agora inscrevemos em PIDDAC, para o pré-escolar, 1,190 milhões de euros. Portanto, há um crescimento efectivo, que vai corresponder a um programa de resolução deste problema, de acordo com o compromisso do Governo.
Há, no entanto, uma questão que não sei se a Sr.ª Deputada tem presente: é que, a partir do ano de 2000, o financiamento da construção dos edifícios para o pré-escolar passou para a responsabilidade das autarquias e uma parte destes montantes que aqui estão inscritos correspondem ao pagamento de compromissos do Ministério da Educação anteriores ao ano de 2000.
Portanto, não se pode fazer uma leitura linear do que aqui está inscrito. Aquilo que lhe posso garantir é que não há qualquer truque para fingir que vamos investir onde não vamos investir. Disso pode ter a certeza absoluta.
Passo agora a palavra aos Srs. Secretários de Estado para completarem as minhas respostas. Entretanto, vou organizar os meus papéis para ver se ficou alguma pergunta por responder.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, vou tentar responder à questão que levantou relativamente ao ensino da cultura portuguesa no estrangeiro. A Sr.ª Ministra já respondeu, em parte, à objecção quanto à comparação entre o orçamento inicial de 2005 e a proposta de orçamento inicial de 2006, resposta que também é válida para a generalidade das considerações que a Sr.ª Deputada fez nessa matéria.
Mas, acerca deste aspecto, gostava de lhe dizer o seguinte: em termos comparativos, no que se refere à perspectiva de execução do orçamento de 2005 e o que consta na proposta de orçamento para 2006, não há qualquer redução e há, inclusivamente, a possibilidade de, com medidas que o Governo já tomou e com as que tomará, fazer mais e melhor com este mesmo montante.
Em primeiro lugar, existia uma situação absurda: na Europa, os professores, enquanto funcionários públicos, beneficiavam do regime de protecção na doença dos países onde se encontravam, mas beneficiavam supletivamente de um seguro de saúde, que, curiosamente, não abrangia todos — por exemplo, aqueles que estão em Espanha não são abrangidos. Por isso, decidimos que esse seguro de saúde deve ser, naturalmente, cancelado, e, portanto, as pessoas terão a protecção que está definida através do funcionamento dos regimes previstos na União Europeia, ou seja, terão os mesmos benefícios de protecção de que beneficiam os funcionários públicos locais. Não existe qualquer razão para que beneficiem supletivamente de um seguro de saúde. Aqui haverá uma economia de 1,3 milhões de euros que poderão ser utilizados no desenvolvimento do ensino português no estrangeiro.

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Em segundo lugar, o próprio regime de contratação será revisto. Neste momento temos uma situação de uma enorme desigualdade, que é a de um conjunto de professores destacados que, em alguns casos, recebem vencimentos que chegam aos 7500 € mensais e um conjunto de professores contratados — neste momento são cerca de um terço dos professores colocados pelo Ministério da Educação — que recebem muitíssimo menos e fazem o mesmo. Esta é uma situação absurda, que não se justifica e que exige uma revisão no sentido da sua correcção.
Portanto, com o novo regime de contratação e com estas medidas que foram tomadas, em lugar de se reduzir a oferta do ensino do português no estrangeiro da responsabilidade do Ministério da Educação, será possível aumentá-la. E não só será possível aumentá-la como será possível requalificar esta oferta, através de medidas que estão a ser desenvolvidas no sentido de criar um quadro de qualificações para o ensino de português no estrangeiro, formas da sua certificação e formas de apoio aos professores, não só àqueles que são colocados pelo Ministério da Educação mas também àqueles que, de facto, um pouco por todo o mundo, apoiam o ensino às comunidades portuguesas.
Haverá, por outro lado, também, um esforço diplomático no sentido de que — e essa é também um forma de dignificação e de requalificação do ensino do português — o ensino da língua e cultura portuguesas no estrangeiro seja introduzido, tanto quanto possível, no currículo dos países onde existem as comunidades portuguesas e que exista mesmo como oferta de língua estrangeira disponível para os alunos dos diferentes países.
Uma segunda observação relativamente à acção social escolar e ao apoio que estava previsto para o ensino especial. Essas verbas estão incluídas nas verbas do apoio socioeconómico ao ensino oficial, que incluem os encargos respeitantes ao ensino especial. Portanto, não houve qualquer retirada desses apoios.
Uma último nota — a Sr.ª Ministra, no essencial, já respondeu a esta questão — tem a ver com os atrasos da aprovação dos programas e às reclamações das associações de editores e livreiros. É preciso «distinguir o trigo do joio». Há reclamações que se justificam e há outras que, de todo, não se justificam.
Em primeiro lugar, há uma questão que, como a Sr.ª Ministra disse, advém da reforma em cima da reforma que o governo PSD/CDS-PP fez e que conduziu, naturalmente, a um atraso substancial na aprovação da reforma. Portanto, não era possível elaborar os programas antes disso. Tem sido feito um esforço de recuperação, mas a maior parte dos programas, não todos, que estão por aprovar são programas de disciplinas para as quais os editores e livreiros não farão, certamente, qualquer manual. É preciso que se esclareça esta situação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, apenas duas pequenas notas de complemento à informação que já foi prestada pela Sr.ª Ministra.
No que respeita à questão do pré-escolar, existe um financiamento à construção de instalações do préescolar, que é feito com as verbas do QCAIII, através da intervenção operacional regionalmente desconcentrada, que não é aqui reflectido neste orçamento, porque não faz parte das verbas do Ministério da Educação.
Ora, essa verba, ao nível do investimento, da construção, é atribuída directamente às câmaras municipais e não através do Ministério da Educação, portanto não consta do orçamento do ministério. Há que ter isso em linha de conta, o que, obviamente, fará com que o investimento em termos de instalações do pré-escolar seja substancialmente superior ao que está reflectido no orçamento.
A Sr.ª Deputada fez também referência a que, na sua opinião, decresciam as verbas na proposta de orçamento. Eu acrescentava-lhe mais uma coisa que decresce, que é esta: decrescem em cerca de 2% as verbas de funcionamento dos serviços do Ministério da Educação, e o montante desse decréscimo foi transferido para verbas de investimento nas escolas.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Ainda bem!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, a minha primeira saudação é uma saudação de boa-noite. Com certeza que não contaríamos estar ainda aqui às oito horas e tal da noite.
Sr.ª Ministra, o facto de ser o quarto orador a questioná-la, e depois de longas respostas, mesmo com um exercício de imaginação e sabendo já que era este o meu cenário, pode, como poderá imaginar, levar-me a fazer algumas repetições.
Mas, até porque ainda não tive oportunidade de o fazer, quero começar por saudar a equipa da Educação e desejar-lhes as maiores felicidades, porque a tarefa é difícil — conheço-a bem —, e, a bem de Portugal, espero que tudo vos corra pelo melhor.
Alinhavei um conjunto de perguntas que têm fundamentalmente a ver com opções de natureza política, porque, como já foi dito várias vezes aqui, quando estamos a discutir um orçamento, estamos também a discutir, e muito, opções de natureza política.
Começo por colocar uma pergunta genérica, para saber se concorda comigo que o problema da educação em Portugal, ou melhor, a questão da educação em Portugal não é uma questão orçamental. Estamos a falar

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de um orçamento da educação que corresponde a 4,1% do PIB, valor que anda na ordem relativa do dos outros Estados da União Europeia.
De facto, como já foi referido, o orçamento da educação para 2006 regista um aumento de 0,2%, o que, de acordo com a inflação, acaba por corresponder a um decréscimo. Mas, mais do que uma questão orçamental, não pensa que são necessários alguns pequenos passos firmes, dados no sentido certo, que possam, na medida do possível, trazer atrás de si os vários agentes educativos — professores, pais, alunos? Não pensa ser também necessário, em relação a estas matérias da educação, ganhar alguma maturidade? Como a Sr.ª Ministra bem sabe, o orçamento da educação tem um aspecto de rigidez extraordinariamente relevante. Estamos a falar de um orçamento com uma ordem de importância de 82% de gastos com pessoal, de gastos com 214 000 efectivos, 63% dos quais são docentes, o que faz do Ministério da Educação a maior entidade patronal do País. Sucede que o conjunto de medidas que têm sido anunciadas pelo Ministério — falamos do congelamento das carreiras e de outras medidas relativas ao funcionamento do próprio Ministério, que merecem, por parte do CDS, uma posição de oposição responsável — levam a uma ligeira diminuição no peso da despesa e, portanto, temos um problema que, apesar de tudo, se vai mantendo.
O que eu gostava de saber, Sr.ª Ministra, é se pretende, para futuro, tomar novas medidas em relação a estas matérias. Caso pretenda tomar, pergunto-lhe que medidas e quais as perspectivas que poderemos ter em relação à evolução deste quadro actual.
Em relação ao PIDDAC, a Sr.ª Ministra referiu — o que merece apoio — uma mudança de opção em relação à questão dos pavilhões gimnodesportivos. Permito-me recordar-lhe que se trata de um problema de compromissos já assumidos, como a Sr.ª Ministra, com certeza, também terá a noção. Muitos desses compromissos têm origem no final dos anos 90 — entre os anos de 1995 e inícios de 2002 houve até um programa em relação a esta matéria dos pavilhões gimnodesportivos.
Nesse sentido, pergunto-lhe: que solução pondera ser possível alcançar com as autarquias locais? É uma pergunta repetida, mas esta questão preocupa-nos. Trata-se de um problema existente no relacionamento entre o Ministério e as autarquias, numa perspectiva de existência de alguma descentralização de competências que poderá trazer problemas em qualquer evolução futura. E este problema vai sempre marcar a relação entre o Ministério e as autarquias locais.
Sr.ª Ministra, concordamos que, de facto, é necessária a requalificação das escolas. Mas está previsto algum trabalho específico relativo a esta requalificação, no que concerne às escolas ainda existentes que funcionam em pré-fabricados, e que, infelizmente, são algumas? E, em relação à própria requalificação, pergunto-lhe: está pensado algum plano no sentido de criar melhores condições para os professores, permitindo-lhes também poderem estar mais tempo nas escolas? Temos ouvido algumas comparações sobre o tempo que os professores passam nas escolas portuguesas e nas escolas finlandesas. Acontece que, muitas vezes, estamos a comparar realidades incomparáveis, ou dificilmente comparáveis, no que diz respeito às condições das próprias escolas. Portanto, gostaria de saber, dentro desta ideia de requalificação, se existe alguma vertente específica no que diz respeito às condições que os professores podem ter nas escolas.
A Sr.ª Ministra tem feito declarações — e assumiu-as aqui também — quanto ao 1.º ciclo e à necessidade de se reordenar o parque escolar. Até já lançou um número quanto às escolas que é ou pode ser necessário encerrar. Ora, gostaria de saber se o Ministério já tem ideias claras sobre os passos a dar a seguir ao encerramento das escolas.
É que, se forem encerradas escolas, vai ser preciso distribuir alunos por outras escolas, colocando-se uma questão de transportes escolares, questão que, mais uma vez, terá de passar por um diálogo com as autarquias.
A Sr.ª Ministra tem falado — salvo erro, o Sr. Secretário de Estado da Educação também falou, até em recente entrevista ao Diário Económico —, da racionalização, dentro da própria orgânica do Ministério, do pessoal dirigente. Em relação a esta matéria, pergunto-lhe se já tem resultados que possa apresentar à Assembleia sobre a possibilidade de o trabalho que anteriormente era feito por mais pessoas ser agora feito por um menor número de pessoas. Pergunto-lhe ainda se, em última instância, uma medida como esta levará ou poderá levar a uma alteração da Lei Orgânica do Ministério da Educação.
Passo agora à questão da estabilidade — e, com isto, falo da colocação dos professores. A estabilidade é, de facto, um objectivo extraordinariamente importante. Dado que o próximo concurso de colocação de professores terá início no princípio do próximo ano, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se neste momento já pode dar novidades à Assembleia da República, que lhe permitam exercer a função de fiscalização da acção do Governo, em relação às medidas que, em concreto, se poderão aplicar para criar maior estabilidade do corpo docente, para além da ideia geral da existência dessa mesma estabilidade.
Continuando com uma referência a políticas, ao ler o relatório do Orçamento do Estado na parte relativa ao Ministério da Educação, verifica-se existir uma palavra que ou não é referida ou é pouco referida — «autonomia». De acordo com a posição do CDS, a questão da autonomia escolar é essencial para a melhoria do sistema. Aliás, foi assinado pelo anterior governo o primeiro contrato de autonomia com uma escola em Portugal.
Pode dizer-nos se a autonomia também é uma opção desta equipa ministerial e informar-nos sobre mais passos que tenham sido dados nesse sentido?

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Passo agora a falar sobre o 1.º ciclo, que considero extraordinariamente importante no âmbito do combate ao abandono e insucesso escolares. Defendo que a política de combate ao abandono e insucesso escolares terá de começar no pré-escolar e no 1.º ciclo e, evidentemente, terá de ser também uma política de médio prazo, isto é, os resultados não são imediatos, vão-se sentindo.
Em relação ao ensino da disciplina de Inglês no 1.º ciclo numa vertente extracurricular, pressuponho haver vontade de o passar para uma vertente curricular. Pergunto se esta modificação poderá pressupor uma alteração do currículo do 1.º ciclo do ensino básico.
Sabemos como é difícil, muitas vezes, dar formação em ciências exactas a alunos do 1.º ciclo, devido muito também às condições do próprio parque escolar. Mas já que estamos no Ano Internacional da Física, no Ano Einstein, será que em relação a esta matéria a Sr.ª Ministra também nos pode trazer algumas novidades? Consideramos igualmente importante o ensino da língua materna, o ensino do Português, e que possam ser criados alguns hábitos de leitura nos nossos alunos desde o 1.º ciclo do ensino básico. Esta questão sempre me preocupou bastante. Aliás, tive oportunidade de, em conjunto com técnicos dos Ministérios da Educação e da Cultura, avançar com vista à criação de um plano para criação de hábitos de leitura nos nossos alunos. No fundo, isto ocorreu um pouco na sequência de um trabalho continuado, a nível da rede de bibliotecas escolares, e que, felizmente, tem passado pelo esforço das três bancadas aqui representadas que têm exercido funções de governo.
No relatório deste Orçamento do Estado, na parte relativa ao Ministério da Educação, vem referido o ensino do Português como uma hipótese de trabalho, pelo que queria saber se, no enquadramento das prioridades desta equipa ministerial, essa é, de facto, uma prioridade essencial. É que, se for uma prioridade essencial, teremos consequências de natureza orçamental.
Sr.ª Ministra, queria também questioná-la sobre várias questões importantes que têm a ver com o 3.º ciclo.
O 3.º ciclo do ensino básico terminou uma reforma e vão sendo ouvidas críticas em relação ao seu funcionamento. Pergunto se a Sr.ª Ministra está a ponderar, tal como referiu estar a fazer no ensino secundário — cuja reforma ainda está em curso —, estabelecer uma avaliação para o 3.º ciclo do ensino básico que passe por uma avaliação de programas, de práticas pedagógicas, de carga horária, de distribuição dessa mesma carga horária.
A Sr.ª Presidente já me fez sinal de que estou a abusar do tempo, pelo que, Sr.ª Ministra, faço apenas um comentário: penso que estas discussões relativas à educação não devem ser de «passado/futuro» e de «passado/presente» ou do tipo «nós fizemos/outros não», pois entendo que os objectivos são bastante mais importantes do que isso.
Por essa razão, quero congratular-me com a intervenção do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação sobre a questão dos programas. No relacionamento com os editores e livreiros também senti, muitas vezes, a dificuldade em relação a programas que, em circunstância alguma, teriam manuais escolares, dado o número de alunos em causa. Também senti dificuldade em relação ao ensino secundário: o facto de termos uma reforma em andamento em simultâneo com alunos que estudavam ainda sob outro regime criava uma dificuldade ainda maior.
Mas, Sr.ª Ministra, independentemente das nossas eventuais diferenças sobre a forma de avaliação do ensino secundário, penso que esta reforma deverá ser avaliada quando terminar. Já existiam (e existem) mecanismos de acompanhamento da própria reforma que, intercalados com os próprios serviços do Ministério da Educação e as suas direcções regionais, davam resposta às escolas em relação a necessidades urgentes que iam sendo criadas, mecanismo esse que estava a iniciar o seu trabalho. Em relação a isso a Sr.ª Ministra tem uma outra opção, que nós respeitamos, mas não poderíamos deixar de o referir.
Muito rapidamente, passo a enunciar duas ou três questões telegráficas.
Mais uma vez, salvo erro no passado fim-de-semana, a discussão sobre a educação centrou-se nos rankings de escolas, de umas poderem ser consideradas melhores e outras piores, o que, na minha opinião, não quer dizer minimamente que os profissionais das escolas consideradas piores não têm competências muito idênticas ou não fazem um maior esforço, porque é completamente diferente trabalhar numa escola de uma zona privilegiada, como o Porto ou Lisboa, ou em muitas das escolas do interior do nosso país.
A Sr.ª Ministra pondera criar algum programa de apoio às escolas que têm maiores dificuldades, o que tem muito que ver com a sua base social? Como sabe, os manuais escolares são uma matéria a que o CDS-PP dá especial atenção. Estamos a terminar o mês de Outubro. Será que já nos pode dar alguma informação em relação a essa matéria? Queria dizer-lhe que a bancada do CDS-PP apresentou uma proposta muito parecida com aquela em que o anterior governo estava a trabalhar, o que, desde já, demonstra uma total abertura para dialogarmos sobre essa matéria e chegarmos a bons resultados.
Sr.ª Ministra, coloquei um conjunto de perguntas, mas penso que a próxima é de todas a mais relevante.
Neste momento, infelizmente, vive-se, em Portugal, em relação à matéria da educação, um clima social que não é o melhor. A contestação vai-se fazendo sentir pela voz de várias entidades e, com toda a sinceridade, o CDS-PP considera que a matéria da educação merecia outro clima social. Seria bom que o clima social fosse bem diferente, senão nunca estaremos perante verdadeiras reformas, mas apenas perante medidas avulsas.

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Sr.ª Ministra, será que não é possível que o Governo, os partidos representados na Assembleia da República, várias organizações sindicais, as associações de pais e os representantes de outros agentes educativos atinjam um patamar de acordo sobre um conjunto de políticas educativas de médio e longo prazo, chame-se a isto pacto de regime, chame-se o que se entender? Não estaria o Governo disponível para, desta forma, melhorar o clima social e podermos fazer verdadeiras reformas na educação? Por parte do CDS-PP, quero dizer-lhe que estamos perfeitamente disponíveis para isso e gostaríamos muito que o Governo também estivesse.
Muito obrigado e peço desculpa pelo tempo que ocupei.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, só recordo que quem invocou o horário nocturno não fui eu.
Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, responderei a algumas questões que colocou um pouco telegraficamente, sendo as restantes respondidas pelos Srs. Secretários de Estado.
Sobre os manuais escolares, o Sr. Secretário de Estado dará resposta, porque já temos novidades em relação aos mesmos.
Quanto aos rankings das escolas e à criação de um programa de apoio às escolas que neles fiquem em último lugar, das duas uma: ou acreditamos nos resultados dos rankings ou não acreditamos. Eu não acredito, porque penso que tal não se trata de um ranking de escolas mas, sim, de uma ordenação das escolas pelos resultados que obtiveram nos exames nacionais do 12.º ano.
Portanto, quando olho para essas listas, vejo resultados de exames e não de escolas. Se confundimos rankings de escolas com a avaliação das escolas, cometemos um erro muito grosseiro, que nos impede de ver com clareza o que necessitamos de fazer em termos de avaliação das escolas. Isso é um outro programa, no qual, eventualmente, os resultados dos exames nacionais são um parâmetro a ter em consideração na avaliação, mas não podemos, de maneira nenhuma, resumir a avaliação das escolas aos resultados dos exames nacionais. Por conseguinte, como não leio naqueles rankings um resultado de avaliação das escolas mas apenas de exames nacionais, para mim não decorre desse resultado qualquer necessidade de apoio às escolas que estão no fim ou no meio.
Há vários aspectos técnicos associados aos rankings sobre os quais poderíamos ficar a tarde inteira a falar. No entanto, penso que o que é necessário é ter um programa de avaliação das escolas consistente, coerente, no qual elas sejam envolvidas. Nesse sentido, temos de trabalhar um pouco mais no que respeita à sua capacidade de autonomia e às suas competências de gestão. Depois, sim, há que ter um programa de apoio às escolas que, em resultado de uma avaliação mais completa, possam revelar dificuldades de recuperação e de concretização do seu projecto educativo. Esta é a minha visão.
No que respeita ao clima social nas escolas, tenho, talvez, uma visão um pouco diferente. Não sei se é certa, não tenho essa pretensão, mas é uma visão diferente da ideia de que os problemas da educação se resolvem com grandes reformas. Tenho, convictamente, essa dúvida, mas já não a tenho em relação a pactos de regime, porque penso que era necessário um acordo e até que a matéria do acordo é muito mais vasta do aquela que alguns debates marcados por um certo radicalismo deixam perceber.
A existência de um pacto de regime, de uma certa consensualização de algumas matérias parece-me muito importante, mas já tenho as maiores dúvidas quanto à necessidade de reformas, porque quando releio os princípios que são a principal herança que nos é dada pela Lei de Bases da Educação, que há uns anos parecia desactualizada, o que verifico é que não estão concretizados. Em relação à educação, estou convencida de que não precisamos de uma grande reforma mas, sim, de uma concretização, porque há aspectos consagrados na Lei de Bases de 1986 que não foram concretizados.
Penso que é isso que vejo de maneira diferente, ou seja, que não é com mais uma reforma ou com mais uma lei de bases que resolvemos os problemas da educação, mas sim pondo as «mãos na massa», ajudando, fora da cadeira e no terreno, a concretizar a Lei de Bases.
E dou-lhe o exemplo das escolas do 1.º ciclo, cujo problema é antigo, vem desde os anos 90. Os relatórios de avaliação do Programa Interministerial de Promoção do Sucesso Educativo (PIPSE), de há 10/15 anos, já revelavam o problema da dispersão das escolas do 1.º ciclo, todavia resolveram-se os casos fáceis, os que a demografia solucionou. O que é que faltou, na minha opinião? Penso que faltou ir ao terreno ajudar os agentes locais a resolver, a identificar os casos.
De facto, este é um trabalho que requer muita energia, talvez uma outra metodologia, mas não acredito que se resolva com mais uma reforma.
Outro problema, o do insucesso e abandono escolares, tem de ser resolvido com a concretização de medidas. Há imensas medidas previstas na legislação da educação no que respeita ao combate ao abandono e ao insucesso escolares que não estão concretizadas por dificuldades várias que temos de perceber quais são e como é que se ultrapassam.

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Considero que em matéria de educação, de enquadramento e de legislação provavelmente está tudo inventado, escrito e dito. As margens de concretização são ainda de grande dimensão e penso que há, aqui, um esforço de energia, de investimento, de empenhamento que, provavelmente, nos permitirá superar algumas dificuldades.
Sr. Deputado, voltando ao princípio da sua intervenção, responderei à sua pergunta sobre se o problema da educação não é uma questão orçamental.
Penso que o problema da educação é uma questão orçamental. Não partilho da visão de que os 4,1% do PIB serão suficientes para resolvermos o problema da educação. Contudo, não sei se era isso que queria dizer-me.
Estou de acordo com algumas opiniões que dizem ser necessário racionalizar melhor os recursos, que há uma rigidez do orçamento da educação decorrente do excessivo peso dos salários no conjunto do orçamento.
Mas nós precisamos de reforçar muito o investimento em educação, não apenas em PIDDAC mas também em funcionamento.
A média do peso das despesas com pessoal nos orçamentos da educação dos restantes países da Europa é da ordem dos 72%, portanto, de menos 10 pontos percentuais. Isto significa que nos outros países há uma maior margem de investimento noutras áreas, designadamente na construção de escolas, no investimento em equipamento, mas também em funcionamento e no apoio a projectos educativos, para as quais, neste orçamento, não temos margem.
Portanto, será necessário trabalhar na qualidade do investimento actualmente feito, mas creio que nos próximos anos Portugal tem de se preparar para fazer um maior investimento na educação, porque o que está por fazer é de uma enorme dimensão. A nível do ensino secundário e do ensino superior, temos taxas de cobertura que estão longe das médias da União Europeia e temos milhares de activos para qualificar. Ora, isso não se faz por artes mágicas mas, sim, com investimento, com empenhamento, com a definição de políticas apropriadas. Estou convencida de que, a prazo, será necessário fazer esse esforço.
As medidas que tomámos, sobretudo as de congelamento de carreira e outras, que permitem uma contenção este ano, obrigam-nos também, durante este ano, a fazer um esforço de definição de novas regras no que respeita à progressão na carreira, à política de recrutamento e de gestão dos recursos humanos, tendo em vista, justamente, adequar estes recursos aos resultados que pretendemos obter, e podermos, então, ganhar espaço para um investimento mais racional em educação.
Quanto ao problema que levantou sobre os pavilhões, penso que os protocolos que assinámos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses revelam a grande preocupação que ela tem, neste momento, com o ensino pré-escolar e com o 1.º ciclo.
O investimento a nível dos pavilhões e os nossos compromissos com as câmaras municipais não são matérias que passam pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, trata-se de uma negociação directa com as câmaras municipais, que procuraremos fazer, não havendo muitas possibilidades, visto que, com o PIDDAC existente, ou se gasta em pavilhões ou se gasta em edifícios escolares e na recuperação dos que estão em mau estado.
O fecho das escolas de 1.º ciclo está a ser feito com base na metodologia que já expliquei aqui, na Assembleia: equipas das direcções regionais de educação estão a trabalhar com as autarquias para estudar as soluções, programa a que a Associação Nacional de Municípios Portugueses dá o seu apoio.
Quanto às novidades sobre o concurso, sobre a estabilidade do pessoal docente, penso que no início do próximo mês poderá haver já uma proposta de trabalho para um novo concurso. Esse é o nosso compromisso com os sindicatos, assumido, aliás, hoje. No próximo dia 11 iniciaremos as negociações com os sindicatos sobre as novas regras de concurso. A nossa proposta é de que o concurso se mantenha no essencial, com as alterações e os ajustes que este último concurso exige, inclusive com modificações para criar maiores condições de estabilidade. O que espero é que, nessa altura, no mês de Novembro, possamos, então, trazer a esta Assembleia as novidades.
Sobre o projecto que temos para 1.º ciclo, devo dizer-lhe que é bastante ambicioso. Trata-se de uma política de médio prazo, ou melhor, os efeitos das medidas de política que estamos a tomar agora são de médio prazo – temos a consciência disso Estou de acordo, já aqui o dissemos, que é necessário alargar a valorização das competências adquiridas neste nível de ensino ao ensino experimental, à Língua Portuguesa, reforçar o ensino do Inglês e dar também dar oportunidade às crianças de terem um efectivo contacto com o desporto escolar e com as expressões.
Nesse sentido, a nossa expectativa é a de, no próximo ano, poder trazer a esta Assembleia uma proposta de enriquecimento extracurricular para todo o 1.º ciclo, em que o Inglês seja complementado com as outras actividades extracurriculares que é possível desenvolver neste nível de ensino, criando ou encerrando o ciclo da criação de condições para uma efectiva concretização da escola a tempo inteiro.
Não equacionamos, neste programa, a revisão curricular do 1.º ciclo. A revisão curricular iniciou-se em 2001, passou muito pouco tempo, não há consolidação do trabalho feito e, pior ainda, considero que a reforma curricular de 2001 no básico não foi concluída; foi definido o currículo nacional mas, depois, faltou o trabalho de desenvolvimento curricular de orientações programáticas e o que temos hoje é que os professores estão a utilizar programas de 1989 e manuais que não estão adaptados. Isto, para responder à sua questão sobre a

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necessidade de avaliar a reforma não apenas do 3.º ciclo mas de todo o básico, que, como sabe, vai dos 1.º ao 3.º ciclos.
Precisamos de perceber várias coisas em relação ao 1.º ciclo, a primeira das quais é a convergência dos vários instrumentos de ensino que, neste momento, os professores utilizam: currículo, orientações programáticas, programa, manuais de ensino, exames, instrumentos de avaliação. E aquilo que se consegue perceber, sem uma avaliação mais sistemática, é que não há convergência destes instrumentos e, por isso, precisamos de a construir. Este é um trabalho que temos de fazer para todo o ensino básico, que vamos começar no 1.º ciclo ou, melhor, que começámos já com o programa de formação de Matemática para professores, o qual contém orientações programáticas que os professores terão de passar a concretizar no ensino. E esperamos, no próximo ano, como eu disse, estender isto ao ensino experimental e à língua portuguesa e, com isso, apurar, trabalhar, enfim, dar orientações mais precisas sobre a concretização do currículo nacional neste nível de ensino. Portanto, começámos no 1.º ciclo, e isto está a correr, sempre com recursos do Ministério da Educação, na modalidade habitual de trabalho com peritos.
Ao nível do 3.º ciclo, em função dos resultados obtidos com os exames nacionais, estamos a fazer exactamente a mesma coisa, ou seja, a análise da convergência dos vários instrumentos de ensino. Começámos com a Matemática e a Língua Portuguesa mas vai também ser estendido às outras áreas de ensino.
Tudo isto para lhe dizer, mais concretamente, que não estamos a pensar rever o currículo do 1.º ciclo do básico para incluir o Inglês. Isto significaria atrasar muitíssimo a concretização do projecto de melhoria das condições de ensino e de aprendizagem do 1.º ciclo, porque seria entrar numa discussão interminável sobre o que sai do currículo para incluir o Inglês e, a seguir, para incluir as expressões e, a seguir, o desporto escolar e, a seguir, o que mais houvesse de actividades de aprendizagem para proporcionar aos alunos.
No conceito da escola a tempo inteiro, há as matérias básicas, de competências básicas, de língua materna, de ensino de Ciências Naturais e de Matemática que penso estarem consolidadas. As crianças precisam de ter oportunidade de tempo de aprendizagem, de acordo com o que está convencionado no actual currículo.
Não sofremos pressões no sentido de dizer que o tempo é excessivo para o Português, a Matemática e as Ciências Naturais. Não ouvi nenhum professor dizer isto, pelo contrário. Portanto, não é nossa intenção alargar este tempo mas também não é nossa intenção diminuí-lo, colocando na área curricular mais disciplinas.
Portanto, penso, e é este o modelo com que estamos a trabalhar, que é possível ter o currículo com estas áreas de competências, que estão estabilizadas, consensualizadas, em relação às quais não há nenhuma discussão na sociedade portuguesa, e criar oportunidades de enriquecimento curricular, num período extracurricular, em que se podem dar oportunidades de formação com referenciais de qualidade, como aconteceu com o Inglês e pode acontecer com as outras actividades extracurriculares. O que se passa, neste momento, com esta discussão, sobre se o Inglês ou o desporto devem ser curriculares é que, em muitas situações concretas, o tempo curricular está reduzido ao mínimo, porque as crianças interrompem o tempo lectivo por tudo e por nada — ora para ir à piscina nadar, ora para ir ao recreio correr —, sem que haja um controlo do que são os tempos de ensino efectivamente dedicados às matérias curriculares, o que tem, seguramente, alguma influência nos resultados. Mas se no currículo estão definidas determinadas horas associadas às competências básicas elas devem ser respeitadas e todas as outras matérias podem, igualmente, ser oferecidas às crianças em condições diferentes, com oportunidade até de contacto com outros agentes de ensino.
Respondi a algumas questões, Sr. Deputado, e dou agora oportunidade aos Srs. Secretários de Estado para completarem a minha resposta.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Obrigado, Sr.ª Ministra.
A primeira nota que quero deixar é sobre a questão da nomeação dos dirigentes nos serviços. O que posso dizer é que estamos a funcionar desde o primeiro dia em que entrámos no Ministério ou, melhor, não desde o primeiro dia mas desde a nomeação dos dirigentes em algumas direcções, com menos 10 subdirectoresgerais do que os inscritos nas diversas leis orgânicas. Até agora, e em face desta questão, não me parece que tenha havido qualquer problema de trabalho realizado pelas diversas direcções-gerais e regionais. Também posso dizer que, em muitos casos, se mantiveram as equipas que estavam e, portanto, não houve aí alteração ou diminuição, porque também não houve nomeações e mantiveram-se as equipas.
A questão fundamental que importa clarificar é que o problema da contenção ao nível dos serviços é uma questão de política que já foi explicada pela Sr.ª Ministra e é também uma questão de necessidade ao nível da despesa na Administração. No caso do Ministério, fizemos a avaliação e, como a Sr.ª Ministra já pôde dizer, não me parece que haja, da nossa parte, qualquer dificuldade, os serviços continuaram a funcionar até agora com perfeita normalidade. E foi possível, penso eu, que estes recursos fossem transitados para outras áreas, designadamente para as áreas directamente relacionadas com as escolas.
A segunda questão tem a ver com o problema da autonomia. O entendimento que temos tido sobre este problema, à semelhança do que a Sr.ª Ministra, aliás, acabou de dizer relativamente às reformas, é o de que a autonomia é uma coisa que se pratica, ou seja, é no dia-a-dia do trabalho que essa questão tem lugar.
Os quadros legislativos actuais sobre a matéria da autonomia das escolas são bastante amplos e há necessidade de concretizar, objectivamente, muitas das coisas que neles estão inscritas, designadamente fazendo uma coisa que temos tentado fazer e que é o seguinte: aquilo que pode ser resolvido pelas escolas,

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no quadro das suas capacidades de definição dos seus projectos educativos e de gestão dos recursos que lhes estão afectos, deve ser resolvido pelas escolas. Obviamente, isto nem sempre é do agrado de toda a gente, porque, muitas vezes, o problema da autonomia tem a ver com a afectação de recursos a finalidades e, portanto, é necessário ter capacidade de gerir os recursos para os poder afectar a essas finalidades. Os principais recursos de que dispomos são o tempo e os professores, pelo que se coloca a possibilidade de um quadro em que as escolas tenham capacidade de poder gerir, de forma eficaz, em relação ao seu projecto educativo, esses dois principais recursos, que são o tempo de aprendizagem, de tarefa e de trabalho da escola com a afectação adequada dos professores às necessidades objectivas de leccionação, de acompanhamento, de trabalho com os alunos, de recuperação, de acordo com a natureza de cada escola. E a autonomia tem de se concretizar, em termos práticos, neste contexto. Este é o caminho que tem vindo a ser prosseguido e continuará a ser prosseguido, não sendo previsível a necessidade de fazer grandes modificações legislativas no quadro desta matéria. Isto implica também, necessariamente, que a administração educativa utilize o princípio da subsidiariedade, que é o de que aquilo que deve e pode ser resolvido pelas escolas, num quadro de prossecução dos seus projectos educativos, deva ser feito e não sejam sucessivamente substituídas pela administração educativa nessas decisões.
Outra nota que quero deixar tem a ver com a comparação das escolas portuguesas e finlandesas. Na minha opinião, é sempre possível comparar, tudo depende dos dados. Mas gostava de lhe dizer que, por exemplo, se olharmos para o último relatório da OCDE, podemos facilmente comparar o ratio alunos/professor nos diversos ciclos de ensino, bem como o número médio de alunos por turma nas escolas portuguesas e nas escolas finlandesas. Portanto, há dados que podem ser comparados e é bom que possamos usar essas comparações nos diversos sentidos, ou seja, quando temos dados favoráveis e desfavoráveis.
Por último, uma nota também sobre o encerramento das escolas do 1.º ciclo. A Sr.ª Ministra já esclareceu esta questão, mas vou acrescentar uma nota adicional, no sentido de dizer que o problema do encerramento das escolas do 1.º ciclo é uma matéria que pode ser demagogicamente cavalgada, de uma forma muito fácil, em termos de política local e de votos locais, mas importa saber que este é o sector do sistema onde a escola pública menos cumpre a sua função e a sua missão. É importante clarificar isto, porque há 60 000 crianças no nosso país, que estão a ser tratadas, na escola pública, muito abaixo daquelas que são as condições de igualdade de oportunidades que devem ser dadas a todas as crianças. Defender a manutenção desta situação é, claramente, defender o não direito dessas crianças a terem a possibilidade de aceder àqueles que são os meios de educação que têm todos os outros portugueses, todas as outras crianças da sua idade. E não basta dizer que é possível colocar mais meios nas escolas, porque isto é falso. Isto é inteiramente falso e tem de ser denunciado como tal. Uma escola que tem apenas cinco alunos está impossibilitada de cumprir uma série de funções educativas, no sentido da promoção da igualdade de oportunidades, independentemente dos meios que nela sejam colocados. Esta é a questão central! É uma questão pedagógica central e penso que é, necessariamente, uma matéria de inteira reflexão para a sociedade em geral e não, exclusivamente, uma matéria de opinião, no sentido da política local. É preciso explicar aos pais dessas crianças as vantagens e as desvantagens de manterem os seus filhos naquelas condições. É óbvio que isto tem a ver com outras matérias adicionais, como as que foram focadas, designadamente a necessidade de deslocar as crianças, etc., mas tudo isso pode ser algo muito menor em relação aos ganhos. É que aquilo que pretendemos da educação é obter ganhos educativos e, portanto, aquilo que importa, fundamentalmente, é ver qual o mecanismo com que conseguimos mais ganhos educativos para as crianças.
Portanto, como a matéria já havia sido suscitada antes por outros Srs. Deputados e voltou a ser suscitada pelo Sr. Deputado Diogo Feio, aproveitei esta oportunidade para me poder referir a ela.
No que me diz respeito, creio que era fundamentalmente isto o que tinha para dizer.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Muito brevemente, quero referir-me apenas a dois assuntos que foram trazidos pelo Sr. Deputado Diogo Feio, designadamente a questão da leitura e a dos manuais.
Relativamente à questão da leitura, como a Sr.ª Ministra já disse, há intenção do Governo de, no próximo ano lectivo, adoptar o esquema que este ano foi utilizado para a Matemática e o seu ensino e aplicá-lo também ao ensino da língua materna. Haverá, pois, aí, desde logo, uma iniciativa no sentido de favorecer a capacidade de ensino dos professores do 1.º ciclo relativamente à língua materna.
Mas há também a iniciativa de adoptar um programa de promoção da leitura. E, deste ponto de vista, houve já alguns desenvolvimentos: os Ministérios da Educação e da Cultura chegaram a acordo na designação de uma comissão, um pequeno grupo de trabalho, que será coordenado pela Dr.ª Isabel Alçada, com o objectivo de definir um programa para a promoção da leitura, que terá uma vertente escolar, mas não se reduzirá a isto.
Ou seja, como temos um défice de hábitos de leitura na população em geral, a vontade do Governo é que haja uma promoção deste hábito no conjunto da população, com, evidentemente, uma incidência particular na escola, e isto não implica necessariamente grandes gastos. Há várias iniciativas de visibilidade e de utilização dos recursos que permitirão certamente ter um impacto, deste ponto de vista, sem grandes encargos. É possível também estabelecer parcerias públicas e privadas, designadamente com fundações e outros sectores, que possibilitem encontrar recursos para esta iniciativa sem que isto constitua um encargo adicional para o Orçamento.

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Relativamente à questão dos manuais, o que posso adiantar-lhe é que, na próxima segunda-feira, será entregue à Sr.ª Ministra — cumprindo, aliás, o mandato que me deu — um documento com uma proposta de articulado que possa vir a ser apresentada a esta Câmara. Ou seja, por respeito à iniciativa que o CDS tomou e ao facto de essa proposta ter baixado à respectiva comissão sem votação, onde está neste momento, o Governo entendeu que o modo mais adequado de legislar seria através da apresentação de uma proposta de lei.
Posso dizer-lhe, em termos muito gerais, que a preocupação fundamental do Governo é a promoção da qualidade dos manuais — adoptar um sistema de avaliação e certificação dos manuais que garanta que nenhuma criança terá na mão, como manual adoptado, um que não cumpra critérios fundamentais mínimos de qualidade. Este é o propósito fundamental do Governo.
Para além disto, é também nossa preocupação a criação de mecanismos de estabilidade e de benefício para as famílias, no sentido de ser possível garantir que os seus encargos não lhes sejam insuportáveis. E isto pode ser feito por duas vias: não só através do apoio da acção social escolar, que em parte é também garantido pelas autarquias, como também através de medidas para a maior durabilidade, em termos de adopção, dos manuais, a possibilidade da reutilização desses manuais, para além de uma intervenção reguladora no próprio mercado, com mecanismos de convenção nos preços e de intervenção, se necessário, que garantam de facto esse apoio às famílias.
Portanto, da nossa parte há, e cremos que também há por parte dos diferentes partidos com representação na Assembleia, toda a disponibilidade para encontrarmos uma solução consensual. A intenção do Governo é a de proceder a um processo de consulta pública antes da aprovação da própria proposta de lei, e, depois, a Assembleia também terá oportunidade de o fazer. O Governo pretende fazer uma consulta pública acerca do texto inicial, após o que aprovará uma proposta de lei que fará chegar à Assembleia.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao último orador desta primeira ronda de pedidos de esclarecimentos, e apesar de já nos encontrarmos em horário nocturno, penso que estamos dentro do que é considerado o tempo normal, por comparação com a duração das outras reuniões.
Temos, portanto, gerido eficazmente o nosso tempo nesta apreciação, creio que com alguma profundidade, das políticas e do Orçamento do Estado para 2006, que é o nosso propósito.
Para uma melhor gestão do tempo, informo que se encontram inscritos seis Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação e Srs. Secretários de Estado, começo por fazer um enquadramento político — é inevitável fazê-lo — e só depois passo depois, às questões relativas ao Orçamento.
De facto, a equipa que a Sr.ª Ministra lidera tem sido a «guarda avançada» da contenção de despesas orçamentais. Basta, aliás, ler o excerto de uma recente entrevista que concedeu ao jornal Público, onde diz: «Este ano essa contenção foi mais fácil por força das medidas tomadas no quadro de estabilidade orçamental e congelamento das carreiras. Este congelamento permitirá também rever o modelo de progressão e controlar de outra forma a evolução futura da despesa, pois só as progressões na carreira representavam cerca de mais 3% ao ano». Por que é que li este excerto? Precisamente para acentuar o facto de muitas das medidas tomadas pelo Ministério serem claramente instrumentais em relação ao objectivo mais vasto de redução do défice, e não são medidas propriamente pedagógicas, nem de valorização da qualidade do ensino ou do processo de aprendizagem.
Este enquadramento, para mim, é fundamental. Não é por acaso, aliás, que a Sr.ª Ministra tem tido tantos elogios à direita. O Fórum para a Liberdade de Educação caminha claramente numa onda de crescente simpatia; o venerando director do jornal Público, representante da nova direita, ou, se quisermos, da direita neoconservadora, também tem manifestado crescente simpatia pela Sr.ª Ministra, apesar de uma ou outra discordância, como, por exemplo, quanto à questão dos rankings — já volto a isto, porque penso que a Sr.ª Ministra também foi cúmplice, infelizmente, como os outros governos, na forma como esses rankings, que são uma forma de terrorismo intelectual, foram publicados; penso que, infelizmente, houve cumplicidade do Ministério.
De facto, não se verificou aqui hoje oposição à direita: o PSD e o CDS-PP ficaram ou por elogios ou por considerações gerais sobre o que tem sido a sua governação. Isto é importante! É o campo político; são as posições que se tomam, são as distâncias relativas, o que, obviamente, é importante, para nos situarmos, porque estas são questões ideológicas.
Outra nota política, toda a primeira parte da sua governação foi claramente no sentido de quebrar o poder sindical. Isto é, o poder sindical foi tido como objectivo número um deste Governo, a começar pelo dos professores, por ser mais organizado, mais forte e por, obviamente, ser de sectores que não dependiam da precariedade, uma vez que, na maior parte dos casos, estão enquadrados no sistema social, o que faz com que tenham mais força reivindicativa. Foi claramente por aqui que a Sr.ª Ministra tentou iniciar a sua governação.
Depois desse marketing bem sucedido e que vai muito ao encontro da ideologia dominante (se me é permitido utilizar este jargão que parece hoje completamente remetido para o caixote de lixo, mas, infelizmente ou felizmente, não está), os professores aparecem muitas vezes como os privilegiados dos privilegiados. Todo

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este trabalho ideológico feito pelo Governo foi o essencial dos primeiros meses de governação; esperava-se agora uma fase mais construtiva, mas, infelizmente, não é o que acontece, porque este é o Orçamento da desqualificação e da continuação da desqualificação dos ensinos básico e secundário.
Lembro à Sr.ª Ministra vários aspectos que me parecem essenciais. Começo pela questão do encerramento das escolas. O Público do dia 20 de Outubro diz que são 512 as escolas que vão ser encerradas, as escolas com insucesso escolar; a Sr.ª Ministra diz que há uma correlação muitíssimo forte entre as escolas de reduzida dimensão e o insucesso escolar. Não tenho quaisquer dúvidas de que assim será e de que muitas destas escolas terão de ser encerradas. Não coloco isto, de forma alguma, como pressuposto, ou a priori da minha parte, contrário à medida. Agora, cinco dias depois, saltar destas 512 para 3500 escolas como as que podem fechar até ao final da Legislatura é que me parece grave e, inclusivamente, uma forma de preparar terreno para algo que, a meu ver, é preocupante.
É que o fechar 3500 escolas, ou o abrir esta possibilidade, até ao final da Legislatura, de acordo com Ramos André, seu adjunto, escolas com menos de 20 alunos, e estamos a falar já de uma outra dimensão totalmente diferente — nem o Prof. David Justino ousou tanto, defendia que se deveria estudar caso a caso as escolas com 10 ou menos alunos para se saber, após uma avaliação contextualizada, se deveriam ou não ser fechadas —, parece estar-se a preparar o terreno para mais uma redução de custos, para mais uma optimização de recursos, para mais um aumento da produtividade em termos de indicadores de execução financeira.
Porque, Sr.ª Ministra, isto significa, em muito casos, que dezenas e dezenas de concelhos por este país fora deixarão de ter escola do 1.º ciclo e significa também que não há aqui um conceito de território educativo, uma vez que para muitos desses concelhos a escola ainda é uma das instituições com mais vitalidade.

Vozes do BE: — Claro!

O Orador: — Parece-me que é de acentuar isto contra esta tendência de abrir caminho para a aceitação de uma medida que pode ser de lógica predominantemente economicista.
Quero, aliás, lembrar que, ao serem encerradas as 512 escolas que referiu como sendo aquelas que o estudo revela como as mais problemáticas, estamos também a mascarar fenómenos de insucesso escolar, porque, obviamente, esses alunos vão para escolas de maior dimensão, e seria muito importante fazer o acompanhamento, aluno a aluno, desses alunos. É que, para além da correlação do insucesso escolar com as escolas de pequena dimensão, há uma outra correlação fundamental, como o prova, aliás, mais um estudo — mais um, dos milhares que existem, mas este muito recente —, do ex-Secretário de Estado Joaquim Azevedo, ao mostrar que a grande relação é entre o contexto social, cultural e económico e o insucesso escolar.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Também por isso é preciso fechar as escolas!

O Orador: — Sr.ª Ministra, podemos entrar em diálogo! Se quiser…

A Sr.ª Ministra da Educação: — Desculpe!

O Orador: — Não me importo absolutamente nada que entremos em diálogo!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Não, não! Peço desculpa!

O Orador: — A forma como a Sr.ª Ministra colocou a questão fez esquecer esta correlação, a correlação que aparece é entre o tamanho da escola e o insucesso escolar, quando há outra correlação mais profunda, que é a do contexto social, cultural e económico e o insucesso escolar. Por que é que a Sr.ª Ministra não levantou esta correlação? Porque a primeira correlação ajuda a rentabilizar recursos e a poupar despesa. É isto que me preocupa na orientação deste Ministério, Sr.ª Ministra.
Sr.ª Ministra, há outros aspectos bastante preocupantes.
A Sr.ª Ministra quer alargar a rede pré-escolar para 90%. Como é que a Sr.ª Ministra vai fazer este alargamento quando há um decréscimo real na dotação para a educação pré-escolar e quando as autarquias, que têm, do ponto de vista da legislação, papel activo nesta área, estão também sob um «garrote» financeiro tremendo? Ou seja, como é possível, nesta conjuntura, em que há um decréscimo real e efectivo de recursos para a educação pré-escolar e em que as autarquias são elas próprias apertadas do ponto de vista financeiro, aumentar para 90% a rede pré-escolar? Francamente, não percebo que milagre da multiplicação será este, pelo que gostaria que mo explicasse.
Sobre as actividades extracurriculares e o Inglês, gostava que a Sr.ª Ministra dissesse a esta Assembleia quanto é pago à hora a cada professor, que, infelizmente, não está no estatuto da carreira docente, por cada aula de Inglês. Percebemos, mais uma vez, que a Sr.ª Ministra, em vez de ter aproveitado esta generalização do inglês como actividade extracurricular para integrar professores que estão no desemprego, aproveitou, isto sim, para integrar mão-de-obra barata através dos institutos privados que leccionam Inglês e que, como sabe, são muito mal pagos, porque aquilo que o Ministério paga (e gostava que o dissesse) é, a meu ver, um insulto

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e não assegura, sequer, a qualidade do ensino do Inglês, porque esses professores não poderiam leccionar esta disciplina numa qualquer escola como actividade curricular.
Por outro lado, vemos que a educação de adultos, que foi colocada como prioridade, uma vez mais, do ponto de vista da dotação orçamental, não aparece como prioridade; a questão dos novos públicos para a educação não aparece como prioridade.
No que se refere à questão das condições concretas em que se exerce a actividade docente — que é também uma grande questão —, o enfrentamento foi tão forte, tão agressivo, tão estigmatizante, que eu creio que a Sr.ª Ministra já não vai conseguir recuperar a confiança dos actores educativos e, com isto, falhará completamente o seu intuito, seja ele reformista ou gestionário. Vai falhar, porque não vai ter os principais actores ao seu lado, já não consegue reganhar a confiança deles.
A Sr.ª Ministra quer que os professores passem nas escolas a componente não lectiva do seu horário.
Como é que eles vão passar esse tempo, sabendo que eles não têm gabinetes — penso que a Sr.ª Ministra até julgava que as escolas tinham gabinetes, mas, como sabe, as salas de professores, na maior parte das escolas, são o que são…! —, ou, por exemplo, que, quando falta um professor de Português, outro professor de Português não o pode substituir, porque isto implica pagar 1 hora extraordinária, e que tem de ser substituído por um professor de Inglês ou de História, ficando as crianças ou os jovens, numa aula perfeitamente parada, passiva, à espera não se sabe bem de quê? O mesmo acontece com esta função de «parque de estacionamento» que a Sr.ª Ministra está a consignar às escolas, porque é disto que se trata. As escolas estão a transformar-se em gigantescos «parques de estacionamento», sem condições para dar uma ocupação activa dos tempos livres às crianças. E isto é um processo que, a meu ver, terá efeitos perversos e não benéficos, como a Sr.ª Ministra pretende.
Não posso deixar de referir a questão dos rankings. A forma como os rankings são, ano após ano, publicados está a criar, no nosso país, estigmas profundos nas escolas mal classificadas, porque são as escolas que têm os alunos com pior qualificação e que têm os alunos oriundos de meios culturais, sociais e económicos mais desfavorecidos. Estas escolas estão a ser duplamente estigmatizadas. E, obviamente, está também a promover-se o negócio do ensino privado, que aparece com as classificações mais elevadas.
Por que razão é que o Ministério não faz acompanhar estes dados de uma avaliação contextualizada, de uma avaliação aferida de dados de autoavaliação? Enquanto eles não existirem, o Ministério não deveria disponibilizar estes dados, que são, provavelmente, do pior que se pode fazer ao sistema educativo. Sei que o José Manuel Fernandes, lídimo representante da nova direita em Portugal, fica muito contente com estes dados, mas espero que o Ministério não seja cúmplice nestes rankings, que são, a meu ver, uma forma terrível de lidar com o sistema educativo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Deputado colocou-nos aqui uma preocupação, dando uma imagem de um certo caos, mas espero que a Sr.ª Ministra vá serenar os ânimos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, na verdade, estava tudo muito morno.

Risos.

O PSD e o CDS-PP não fizeram oposição!

Vozes do PCP: — Só veio destes lados!

O Orador: — Parece que a oposição só veio destas bancadas!

Vozes do PSD: — Vai ter um prémio!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Oh!…

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, começando pela última questão, os rankings e as avaliações contextualizadas, saberá tão bem como eu que, de facto, não há informação sobre a avaliação das escolas que nos permita ter uma avaliação contextualizada. É simples: não existe, não foi feita! Havia um processo de avaliação integrada das escolas que foi descontinuado e, neste momento, não existe informação. Portanto, não é possível.
Em qualquer caso, também não me parece possível fazer reserva de informação que é pública e que deve ser publicamente disponibilizada. Há, evidentemente, opiniões contrárias sobre esta matéria.
Não é pelo facto de fazermos reserva de informação que, em qualquer caso, poderia estar acessível — imagino que um jornalista podia sempre, por inquirição junto das escolas, obter essa mesma informação —, pois é informação pública, que tem de ser disponibilizada e que é passível de ser adquirida, que resolvemos

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os problemas. Os problemas têm de ser mesmo resolvidos e o que o Ministério da Educação deve fazer não é reserva da informação relacionada com os exames nacionais mas, sim, resolver o problema dos resultados que estes exames revelam, que são muito maus. E, neste sentido, pusemos em prática um modelo de reflexão sobre os resultados dos exames de Matemática, para que os professores possam dizer o que se passou, quais as causas a que estes resultados estão associados. Portanto, o que o Ministério deve fazer é repercutir os resultados dos exames sobre o desenvolvimento curricular, que é uma coisa que não se fazia e que é preciso fazer, e é o que estamos a fazer.
Não me parece que seja, de facto, boa política fazer reserva de informação, porque isto protege sempre quem governa de não fazer o que tem para fazer. E o que há para fazer é resolver o problema, é fazer repercutir os resultados dos exames sobre o currículo e ter um programa de avaliação das escolas. E espero, no próximo ano, poder apresentar uma proposta para a avaliação das escolas.
Sr. Deputado, se não temos a discussão sobre os rankings, temos a discussão sobre o acesso a essa informação que é pública. Portanto, não há aqui muitas voltas a dar…! Não me parece que o Ministério da Educação protegesse as escolas se fizesse reserva dessa informação. E também não aceito a acusação de que há cumplicidade do Ministério quando disponibiliza os dados, porque entendo que estamos a cumprir uma obrigação.
Certamente que o Sr. Deputado, na sua qualidade de investigador, não gostaria de pedir ao Ministério da Educação esta ou outra informação estatística e de obter uma resposta no sentido de que se trata de reserva de informação, que é pública. Isto não é, de facto, possível fazer.
Sobre a avaliação que o Sr. Deputado faz da acção desta equipa governativa, tenho de lhe responder o seguinte: de facto, não é objectivo desta equipa governativa quebrar o poder dos sindicatos. Não é! Aliás, sobre isso, tenho de lhe dizer que não foi a equipa governativa que marcou a greve aos exames. Não fomos nós que marcámos a greve aos exames.

Risos do PCP.

Portanto, não fomos nós que tivemos a iniciativa num conflito que foi, na minha opinião, completamente desajustado e desproporcionado em relação àquilo que estava em causa.
Também lhe quero dizer que não é nosso objectivo contribuir, de uma forma pioneira, para a redução do deficit. Penso que o Ministério da Educação tem a obrigação de contribuir para a redução ou controlo da despesa pública, que, no caso do Ministério da Educação, estava absolutamente em descontrolo. A verdade é que, se nada se fizesse, o orçamento do Ministério da Educação crescia a 3%/ano, sem que se tivesse dinheiro para construir uma escola ou para fazer uma única inovação, o que decorria de um processo descontrolado de progressão na carreira, que todos conhecemos.
Também não gostava de perder muito tempo a falar sobre isto, mas a progressão na carreira docente transformou-se num mecanismo burocrático-administrativo, em que tudo estava reduzido à contagem de créditos de formação, que tanto se podia fazer como não fazer, a relatórios de avaliação de desempenho, que tanto se podia ter desempenhado como não — era possível progredir na carreira sem ter dado uma única aula no período de tempo da progressão —, e sem que houvesse qualquer valorização efectiva dos professores que dão aulas.
Portanto, penso que esta é a oportunidade. O mais importante não é, provavelmente, controlar o orçamento da Educação, mas penso que daremos um bom contributo para melhorar a qualidade do ensino e, sobretudo, para que haja uma justiça, apesar de relativa, maior, fazendo com que o trabalho dos professores que efectivamente dão aulas, o trabalho dos professores que efectivamente têm alunos e turmas seja reconhecido.
Tem de se distinguir o mérito dos professores que estão na sala de aula e que têm alunos de professores que não têm alunos e não dão aulas pelas mais variadas razões — e são aos milhares, não estamos a falar de 1000 ou de 2000 mas, sim, de uma elevadíssima percentagem de professores que, pelas mais variadas razões, estão fora da escola e do espaço da sala de aula.
Não é objectivo impedir que os professores progridam na carreira. Todas as carreiras têm de ter uma possibilidade de progressão. Por isso, é que existem. Temos, no entanto, de melhorar e há aqui espaço para melhorar e, com isto, simultaneamente, reequilibrar…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Com quotas!

A Oradora: — Não sei. É uma matéria que está em negociação com os sindicatos. Neste momento, o que pedimos foi um estudo que compare a evolução na carreira dos professores em Portugal — se verificar, os resultados que vêm no Education at a Glance permitem perceber que há uma enorme diferença na situação de Portugal em relação aos outros países da União Europeia que revela esta disfunção — com a dos outros países do espaço da OCDE e que faça alguma comparação com outros grupos profissionais também numerosos (não igualmente numerosos, porque não existe outro grupo igualmente numeroso) por forma a permitirnos ter balizas referenciais e a tomar decisões, que, evidentemente, têm de ser consensualizadas.
O objectivo não é uma obsessão com o deficit mas a percepção de que, se não se controlam melhor as despesas em educação, o País fica impedido de melhorar os restantes investimentos em educação. Não é

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possível continuarmos com uma percentagem do volume da despesa no conjunto do Orçamento, como já aqui foi dito, da ordem dos 82%, quando a média dos países da OCDE é de 72%. São menos 10% que fazem toda a diferença. Isto revela…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — (Por não ter falado ao microfone não foi possível registar as palavras do orador).

A Oradora: — Não! Mesmo em percentagem do PIB, mesmo considerando o per capita, não! Há uma disfunção! Não vale a pena fingir que não vemos a disfunção! Ela existe e temos de encarar este problema. É custoso, causa mazelas, pois causa mas há um momento em que isto tem de ser feito, sob pena de comprometermos o investimento em educação por muitos anos, como, aliás, vinha a acontecer.
O compromisso é ter um controlo melhor sobre aquilo que pode ser a evolução do orçamento, que decorre destes factos que são naturais, evidentemente, e procurar fazê-lo com os mesmos recursos — e mais recursos, porque não tenho ilusões de que vai ser necessário aumentar ainda o esforço em educação, mas depois de estabilizar estes desequilíbrios.
O Sr. Deputado acusa a equipa do Governo de estarmos a desqualificar o ensino básico e o secundário e diz que é muito preocupante que se anuncie o encerramento de 3500 escolas. Por que é que é preocupante?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Porque só vamos ter escolas no litoral!

A Oradora: — Se se chegar à conclusão de que são 3500 as escolas más, que não têm condições, que não oferecem nada aos nossos alunos, por que é que é preocupante? Por que comprometemos a sobrevivência de uma freguesia?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Vai haver concelhos sem escolas!

A Oradora: — Não são concelhos! Neste caso, nunca estamos a falar de concelhos, estamos a falar normalmente de freguesias ou de lugares. Não haverá nenhum concelho sem escolas.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Faça as contas!

A Oradora: — Os concelhos são 300! Estamos a falar de uma outra realidade! Não vamos chamar concelhos aos lugares, porque isto faz aqui bastante diferença.
Pergunto: feita a avaliação, se uma escola é má, não tem condições, o aluno não tem sucesso, o contexto socioeconómico não favorece, e se não temos a possibilidade de, por mais dinheiro que se invista, oferecer às crianças condições de sociabilização, por que é que se sacrificam as 4, 5, 6 crianças, 10 crianças que sejam, a um projecto…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — 20!

A Oradora: — Mesmo que sejam 20 crianças! Sr. Deputado, se a escola for má e não tiver condições e se a 5 km houver uma escola com condições para oferecer tudo a estas crianças, qual é o problema, em abstracto, tendo estas referências, de a encerrar?! Não consigo perceber o problema.
Há muito tempo que a situação está diagnosticada, desde o início dos anos 90, altura em que talvez pela primeira vez se correlacionou a dimensão das escolas com o sucesso escolar e se obteve já um resultado semelhante a este. E, nessa altura, houve um programa de recuperação, em que uma das medidas era a do encerramento das escolas isoladas. Depois, fez-se, de facto, alguma coisa, o País progrediu. No entanto, penso que agora é preciso uma determinação, não se pode adiar mais, porque são 60 000 alunos que estão sem condições de ensino e de aprendizagem. Não consigo entender por que é que a sobrevivência de uma freguesia há-de ser mais importante do que 20 crianças.
Portanto, não faremos nada contra as freguesias, nem contra as localidades. É preciso fazer o trabalho de demonstração de que existem melhores possibilidades, melhores oportunidades para as crianças. É isto que é preciso fazer e isto não se faz por decreto, faz-se com equipas no terreno, em contacto com as famílias, com as autarquias, com as escolas e convencendo. Tem de haver aqui um trabalho de convencimento — eu própria estou convencida disso.
Não há aqui uma política cega no sentido de mandar encerrar essas escolas. Aliás, essa política já foi definida há muito tempo, porque há muito que se mandou encerrar essas escolas e elas não se encerraram porque não se encerram sozinhas. E o trabalho que há a fazer agora é no terreno, mas não considero isto nada preocupante.
Não há nenhuma confusão com os números, nem nenhuma estratégia premeditada no sentido de enganar alguém, os números são claríssimos há muito tempo: existem 4500 escolas com menos de 20 alunos. Umas terão condições, outras não. As 512 escolas que foram listadas são aquelas em que, nos últimos três anos, de

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forma consistente, a taxa de repetência foi superior à média nacional. Obtido o resultado da correlação, pedi a lista dessas escolas e verificou-se serem 512. Tendo conhecimento disto, considero que não tenho condições para voltar a colocar professores nestas escolas sem, antes, perceber se há ou não alternativa para estas crianças e fazer tudo para que essa alternativa seja viável e se concretize. Portanto, este é o trabalho a fazer.
Perguntam-me: há mais escolas para encerrar? Há! Têm urgência estas 512? Não têm urgência, e, em Maio do próximo ano, espero poder obter a identificação correcta das escolas a encerrar — o que estimamos é que haverá mais 3500 —, sendo que, neste momento, ninguém tem uma visão nacional de rede. E precisamos de construir esta visão nacional de rede, trabalhando no terreno com as autarquias, precisamos de aprovar as cartas educativas e de resolver todos estes problemas que estão por resolver.
Relativamente ao insucesso, o Sr. Deputado disse que ele estava muito relacionado com o contexto. É verdade, porque o contexto destas escolas é, muitas vezes, terrível e de círculo vicioso. É tudo mau para estas crianças e não é só a escola, é o contexto e o acesso a recursos socioeducativos que não é possível. Aliás, mesmo que se lá ponham os computadores, a biblioteca, por absurdo, essas crianças não têm desde logo outras crianças com quem conviver. E, portanto, estas não são situações aceitáveis.
A exemplo de outros países, como a França ou a Espanha, em que até se ensaiaram outras modalidades, o nosso país não tem dimensão. É que a dimensão de uma freguesia em França não se compara com a de uma em Portugal. Em França, nunca se pôs o problema de escolas com entre 1 e 20 alunos, era sempre, apesar de tudo, uma outra dimensão. Portanto, as realidades não são comparáveis.
Creio que há aqui um trabalho a fazer. O que quer que se diga quanto a fazer prevalecer o interesse da sobrevivência das freguesias sobre as crianças parece-me…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Não são freguesias, são territórios educativos!

A Oradora: — Mas os territórios têm de ser construídos, porque à volta destas escolas não existem territórios educativos. Não há territórios educativos à volta destas escolas, é um deserto! Será bom deslocar-se a Bragança ou à Guarda e verificar o que são os territórios educativos destas escolas. Não existem! É evidente que é preciso haver territórios educativos, mas eles têm de ser construídos, ou renovados, ou essas crianças têm de ser transferidas para locais onde existem os tais territórios educativos.
O que posso dizer-lhe sobre isto é que é trabalho a fazer e espero que, em Maio, com a definição da rede nacional, possa haver uma solução.
Quanto ao anúncio que fez, tão dramaticamente, de que nunca mais recuperarei a confiança dos actores educativos, gostava de saber se também adivinha assim a sorte grande, porque seria óptimo.

Risos.

Penso que, sobre o futuro, podemos dizer pouco! No entanto, pergunto agora ao Sr. Deputado se concorda com a situação que se vivia nas escolas básicas e secundárias, de não aproveitamento pleno dos tempos lectivos, de «furos», de feriados, de interrupção das actividades lectivas pelas mais diversas razões. Concorda com esta situação? Também considera que havia mil soluções para este mesmo problema?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — A solução é substituir o professor de Português pelo professor de História?!

A Oradora: — Pergunto-lhe se reconhece que o problema existe.
Não conheço nenhuma escola de excelência, que seja referência, pública ou privada, em que a criança chega à escola e tem a certeza absoluta de que vai ter aulas ou de quantos «furos» vai ter durante o tempo em que é suposto estar na escola. Não conheço. Infelizmente, e não gostava de perder muito tempo a falar disto, esta era a realidade das escolas.
Há muitas maneiras de encarar este problema, e a minha perspectiva é a de que a escola é uma organização. Por que é que estes problemas dos «furos» não se sentem, por exemplo, numa cadeia de supermercados? Também aqui há pessoas que adoecem, que faltam. O que é que o supermercado faz? Enquanto organização, organiza-se para superar disfunções. O que é que um hospital faz quando há falhas por parte de um profissional, enfermeiro, etc.? Organiza-se para superar as disfunções. E a maior parte das vezes o público, os utentes, não nota as falhas. É assim em todas as organizações.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Mas os professores notam quando vai um professor de História substituir um professor de Português!

Protestos do PS.

A Oradora: — Há várias maneiras…

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Protestos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

Não vamos fazer demagogia, Sr. Deputado,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado João Teixeira Lopes, se quer usar da palavra, inscrevo-o.
Peço-lhe que deixe a Sr.ª Ministra concluir.

A Oradora: — O Sr. Deputado João Teixeira Lopes sabe muito bem do que estou a falar; estou a falar de uma escola enquanto organização de trabalho que, tendo muitas disfunções, deve organizar-se para as superar. É esta a proposta.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — É com um professor de História a substituir um de Português?!

A Oradora: — Porque não? Qual é o problema?

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Porque a turma fica parada!

A Oradora: — Se me permite, o que lhe sugiro é que olhe para o problema de um outro ponto de vista, do da gravidade do problema. Se identifica tantos problemas agora com as aulas de substituição, imagine a dimensão daquilo que se vivia de facto nas escolas. Pelos protestos, pode ter uma ideia agora do que era! O problema não é fácil, mas é preciso que tenhamos a humildade de reconhecer que existe e que precisamos de o enfrentar e de o resolver.
Em minha opinião, o que está em causa é mesmo o projecto de escola pública, como disse o Sr. Secretário de Estado Valter Lemos. Isto é, ou cuidamos da escola pública, ou ela está comprometida como projecto.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Portanto, o que penso é que estas são medidas de protecção da escola pública. Numa escola privada, pode ter a certeza de que nenhum pai fica ansioso por saber se o seu filho vai ou não ter aulas durante o dia. Esta é uma diferença.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Outro ataque aos professores!

A Oradora: — Não estou a atacar os professores! Tenha santa paciência! Não ponham na minha boca coisas que eu não digo! Eu própria sou professora, tal como o senhor! E, portanto, não ponha na minha boca coisas que eu não digo. Não me acuse de coisas que eu não faço! Não faço qualquer ataque aos professores! Estou a pedir e a dar condições às escolas para se organizarem por forma a minimizar os efeitos das disfunções que ocorrem naturalmente em todas as organizações. Estou até a desvalorizar bastante os problemas e a procurar soluções para que os efeitos sejam de facto minimizados. Isto não é um ataque a nenhum grupo profissional, são medidas precisas de defesa da escola pública, de oportunidade de recuperação do insucesso.
Podemos ainda falar de outros indicadores. De facto, havia uma disfunção na escola pública. Não vale a pena olhar para o lado e dizer que não é nada, que está tudo bem! Não está tudo bem! Algumas coisas estão mal e precisamos de as corrigir.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Com certeza!

A Oradora: — Isto não é nenhum ataque! Por que é que é um ataque querer corrigir situações que são problemáticas?! Qual é o problema das aulas de substituição? Qual é o problema?! Estão previstas! Salvo erro, é o artigo 10.º do Estatuto da Carreira Docente que estipula que todos os professores têm obrigação profissional de contacto com alunos dos outros níveis de ensino, como actividade pedagógica de enriquecimento curricular e extracurricular.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — No mesmo grupo!

A Oradora: — Não! Quantos professores de Português têm gosto em ir às escolas do 1.º ciclo ler poesia, fazer umas graças…? E o mesmo quanto aos professores de música, por exemplo.
Penso que se está a olhar para o problema da pior forma possível. Não gostaria de perder mais tempo com esta matéria, porque, quando as visões são muito opostas, creio que não há possibilidade de encontro.

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Tenho para mim que o mais importante é o reconhecimento de que há uma disfunção e a disponibilidade para a resolver. Pode dizer-se: há vários caminhos. Então, vamos explorá-los! Mas o ponto de partida para encontrar soluções é o reconhecimento de que há uma disfunção. Em minha opinião, olhar para o lado e fingir que os problemas não existem em nada ajuda a encontrar as soluções.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Teixeira Lopes, quanto ao ensino de Inglês, devo dizer que o valor previsto por aluno, e que foi negociado com os municípios, é calculado para uma turma de 22 alunos, tendo por base o vencimento de um professor licenciado com a habilitação para a docência definida na lei.
Existe uma comissão de acompanhamento e avaliação do programa de inglês que tem a colaboração da Associação Nacional de Municípios Portugueses, das direcções regionais de Educação e da Associação Portuguesa de Professores de Inglês.
No que respeita às habilitações, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, posso dizer que o que está escrito é que a habilitação necessária é a exigida para a docência do Inglês no ensino básico, é a mesma que para qualquer grau de ensino em qualquer outra escola, e, acresce, por sugestão da Associação Portuguesa de Professores de Inglês — repito, por sugestão formal da Associação Portuguesa de Professores de Inglês —, os professores portadores de diplomas internacionais do ensino do inglês reconhecidos ao nível europeu.
Estas habilitações destes professores foram acrescentadas rigorosamente nos termos em que a Associação Portuguesa de Professores de Inglês propôs ao Ministério da Educação.
Mas, pelos vistos, a preocupação com o valor por aluno é mais do Sr. Deputado do que dos próprios envolvidos, dado que, até agora, não tem havido da parte dos parceiros envolvidos qualquer problema com o financiamento.
Por outro lado, quanto à possível acusação de eventuais negócios relativamente ao ensino do Inglês — e não sei o que o Sr. Deputado quis dizer com isto —, vou clarificar repetindo o que está escrito, e foi assim que o programa avançou: as entidades promotoras são, em primeiro lugar, os municípios e só no caso de ausência de qualquer proposta da parte do município é que pode ser qualquer uma das outras entidades. E posso dizer-lhe que a esmagadora maioria das entidades são municípios, segue-se-lhes os agrupamentos de escolas e há um número muito residual — valor que não sei de cor, mas posso fornecê-lo numa outra altura — de entidades de carácter empresarial, como institutos de línguas, ligadas ao ensino do Inglês. Posso garantir-lhe desde já que estas entidades representam um valor absolutamente residual em relação à totalidade dos cerca de trezentos concelhos abrangidos por esta medida.
Sobre a substituição de professores, gostaria de acrescentar uma nota, se a Sr.ª Ministra mo permitir, dado que já falou sobre a matéria. Espanta-me, e gostaria de perceber o porquê, que o Sr. Deputado considere preferível o aluno ficar sem professor do que ficar com um de qualquer outra disciplina. Não encontro este argumento em nenhum princípio pedagógico, nem em nenhum documento, nem em nenhuma recomendação de qualquer organização internacional, nem em nenhum manual de pedagogia. Nada! A alternativa preferível, portanto,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — É um professor da mesma disciplina!

O Orador: — … é o aluno ficar sem qualquer orientação educativa — era o que acontecia até agora, Sr. Deputado —, completamente abandonado no contexto de orientação educativa da escola,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Agora, fica abandonado com um professor lá dentro!

O Orador: — … ou ficar com um professor de Português na aula de História, ou com um de Matemática na aula de Educação Física? São opções! Provavelmente, o Sr. Deputado considera que é próprio da esquerda deixar o aluno abandonado, eu acho que não é.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, parece-me que o tom eventualmente… Aliás, isto já aconteceu nesta Assembleia, noutras ocasiões, por parte do Sr. Secretário de Estado da Educação.
Sr.ª Presidente, permita-me dizer que me referia apenas ao facto de o Ministério não pagar o que deveria a um professor da mesma disciplina para, aí sim, fazer um acompanhamento dos alunos que não tiveram professor. O Ministério optou claramente por uma medida economicista, que é colocar um professor de outra qualquer área, que mais não vai fazer do que ficar como mero peão dentro da sala perante os alunos. Isto, a meu ver, é uma não-solução.

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E, Sr. Secretário de Estado, tenha educação, porque parece que não tem! Tenha calma e decoro parlamentar!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, vou considerar a sua intervenção como uma defesa da honra e dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado, para dar explicações.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr.ª Presidente, o que o Sr. Deputado João Teixeira Lopes acabou de afirmar é falso. Quem distribui o serviço aos professores é o conselho executivo.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — É falso!

O Orador: — Distribui-o de acordo com os professores que existem na escola e, prioritariamente, aos professores dessa disciplina, se os houver. É assim que está estabelecido. Não há, contudo, qualquer orientação do Ministério, nem isso está escrito em lado algum.

Protestos do Deputado do BE João Teixeira Lopes.

O que o Sr. Deputado está a dizer, relativamente às orientações que o Ministério da Educação deu às escolas, é inteiramente falso.
Se houver alguma escola onde isso se esteja a passar, o Sr. Deputado tem sempre a possibilidade de apresentar essa denúncia ao Ministério da Educação. O que está escrito e foi dito às escolas é simples: os conselhos executivos fazem as substituições de acordo com as disponibilidades que têm de professores, seguindo essas prioridades.
Portanto, querer dar a ideia de que o Ministério da Educação deu uma indicação aos conselhos executivos…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Claro que deu!

O Orador: — … para não substituir os professores por professores da mesma disciplina é, inteira e completamente, falso.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Deputado já fez uma interpelação à Mesa. Estamos aqui perante posições antagónicas, todos o reconhecemos.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Sr.ª Presidente, é apenas para comunicar que todas as federações sindicais — temos esses documentos, pelo que o Governo também os terá — já denunciaram inúmeras situações destas. Quer isto dizer que não será necessário ser eu a denunciá-las, pois elas já estão plasmadas em vários documentos e o Ministério está suficientemente informado.
Aliás, ainda há pouco, o Sr. Secretário admitiu que esses casos aconteciam, dizendo que era «do mal o menos» haver uma substituição por um professor de uma outra disciplina.
A meu ver, esta questão está esclarecida.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Penso que estamos todos esclarecidos sobre as posições que cada um tem sobre a matéria.
Srs. Deputados, vamos passar à segunda fase dos pedidos de esclarecimento. Começo por referir os nomes dos Srs. Deputados inscritos, sendo que tentei distribuí-los de modo a intervalar as intervenções das diferentes bancadas. São os seguintes Srs. Deputados: Emídio Guerreiro, Agostinho Lopes, Hermínio Loureiro, João Bernardo, Eugénio Rosa e Rosalina Martins.
Peço aos Srs. Deputados que não gastem mais de 5 minutos em cada intervenção.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não é preciso tanto!

Vozes do PS: — Bastam 3 minutos!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito bem, então, assinalarei ao fim de 3 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, começo por dizer que tenho alguma dificuldade em aceitar este ranking do que é ser boa ou má oposição. Não conheço os critérios e, sejam eles quais forem, refuto-os, desde já. O que nem eu nem o PSD conseguimos é vir para aqui fazer uma oposição demagógica e

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folclórica. Preferimos este papel de, de uma forma responsável, discutir as matérias que consideramos essenciais, porque acreditamos que é isto que os portugueses esperam de nós. Por isso, será esta a linha que iremos continuar a manter ao longo do debate de hoje.
Pedi para usar da palavra logo no início, porque, talvez por ter sido o primeiro e o mais disciplinado no meu tempo, fui obsequiado com uma única interrogação directa por parte da Sr.ª Ministra. E como, quer a Sr.ª Ministra quer o Sr. Secretário de Estado, procuraram responder às questões que fui colocando, acho que, no mínimo, é merecida a simpatia de responder à questão que me colocou.
Assim sendo, se me pergunta se concordo com o ensino do Inglês no 1.º ciclo e com o alargamento do horário, respondo-lhe que sim. Agora, o que está aqui em causa não é isto; o que está aqui em causa, e que eu jamais faria, é o facto de se ter iniciado todo este processo sem falar, primeiro, com os interlocutores necessários para a sua implementação. O erro, Sr.ª Ministra, foi tudo isto ter começado por ser anunciado nos jornais e nos comícios. Se fosse eu a liderar este processo, nunca iria querer o ónus de não ter iniciado este processo falando com os parceiros — até porque não queria dar-lhes este trunfo. Mas não quero, de forma alguma, estar aqui a dar conselhos — aliás, tarde demais, porque isto já começou mal — à equipa ministerial.
Julgo ter respondido, de forma clara e objectiva, e em menos de 3 minutos, à questão que a Sr.ª Ministra me colocou.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação e Srs. Secretários de Estado, o Ministério da Educação certamente não vai fazer aquilo que o PCP propõe. Mas seria talvez interessante ter alguma preocupação com as preocupações eleitorais de, por exemplo, os candidatos do PS em vésperas de eleições, ou coerência entre os objectivos que se propõe e as medidas de política e os instrumentos que avança.
No debate deste Orçamento, já vi as restrições orçamentais do Pacto de Estabilidade e Crescimento transformadas em promotores da igualdade social, em defesa da qualidade dos serviços públicos. E, agora, a Sr.ª Ministra acrescentou mais uma ideia: o Pacto de Estabilidade e Crescimento transformado em defesa da escola pública — muito interessante… A Sr.ª Ministra exprime uma grande preocupação com o problema do insucesso e do abandono escolares, com a qual estamos de acordo, colocando-o, inclusive, como um dos primeiros objectivos do Ministério.
Mas a Sr.ª Ministra simplifica o problema e esquece que uma razão fundamental para o insucesso e abandono escolares no nosso país é a dos baixos salários, em algumas regiões, como, por exemplo, a do Vale do Ave. E esquece uma outra coisa: fala do insucesso escolar nas escolas com poucos alunos, mas esqueceu-se de falar — o que consta, inclusive, do Relatório do Orçamento do Estado — do insucesso escolar nas escolas que têm alunos a mais.
Ora, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, qual é a resposta para a sobrelotação de um conjunto de escolas do perímetro de Guimarães e Braga. Onde está a resposta, Sr.ª Ministra?!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Perdeu-se!

O Orador: — Há lá uma, até ver!… É que até uma das que acabou recentemente, a Escola Secundária da Veiga, que já passou a Escola ES/3, já está sobrelotada neste momento. E os senhores não têm resposta, neste Orçamento do Estado, para este problema.
Pelos vistos, o abandono e o insucesso escolares decorrentes desta sobrelotação, que atinge os 50%, 60% e 70%, não preocupam o Ministério da Educação.
Depois, Sr.ª Ministra, o abandono e o insucesso escolares resultam não só deste problema mas também de outros — e daí colocar-lhe outras questões —, como, por exemplo, o do conforto escolar. O corte no sistema de aquecimento de um conjunto destas escolas não preocupa a Sr.ª Ministra, do ponto de vista do insucesso escolar? A insuficiência crónica de pessoal auxiliar não cria problemas difíceis à escola e ao seu funcionamento? Quanto ao problema dos pavilhões gimnodesportivos, não sei se percebi bem o que a senhora disse sobre esta matéria, mas a Sr.ª Ministra acha que os pavilhões para as actividades gimnodesportivas não fazem parte das estruturas escolares? Acha que a ausência destes pavilhões em algumas escolas ou o seu estado profundamente degradado, como acontece na região que referi, não é causa fortíssima de problemas de insucesso e abandono escolares? Escolas estas que, além do mais, e há longos anos, têm pavilhões gimnodesportivos a distâncias significativas do edifício escolar, com tudo o que isso significa do ponto de vista da movimentação dos alunos.
A Sr.ª Ministra acha que o estado actual dos transportes escolares, com horas de trajecto e, consequentemente, horas de tempo retirado à escola e à casa, não provoca o abandono escolar? Mas é isto que está a acontecer por razões não propriamente do Ministério mas que se prendem com políticas do Governo.
Sr.ª Ministra, finalmente, gostava de colocar-lhe uma questão, relacionada com o ensino profissional. Como a Sr.ª Ministra já hoje aqui referiu, há no orçamento um significativo investimento no ensino profissional. Não conhecemos quais os projectos de escolas profissionais, não conseguimos detectar isto no Orçamento, nem

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no PIDDAC regionalizado, pelo que gostaria de ter uma ideia de quais são as escolas profissionais que estão a propor-se. O Vale do Ave, por exemplo, tem uma enormíssima carência de escolas profissionais. Ora, um presidente de câmara do Partido Socialista — pelos vistos, sabemos por um presidente de câmara o que deveríamos saber pelo Orçamento do Estado — anunciou, hoje ou ontem, a criação de uma escola profissional no Vale do Ave, como anunciou a criação de uma escola superior de hotelaria e turismo na Universidade do Minho, investimentos estes que não constam do Orçamento e gostaria de saber porquê. Não sabemos onde ele vai buscar o dinheiro,…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — É o compromisso!

O Orador: — … certamente ao orçamento da câmara municipal.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Loureiro.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação e Srs. Secretários de Estado, permita-me que comece, Sr.ª Ministra, por enaltecer a sua coerência — e é pena que não estejam aqui alguns Deputados do Partido Socialista que, na última reunião da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, me desmentiram. Nessa altura, eu disse que a Sr.ª Ministra não tinha como prioridade, para os próximos anos, a construção de pavilhões escolares e fui desmentido pelos Deputados do Partido Socialista, que disseram que a Sr.ª Ministra não quis dizer isso. Porém, hoje, a Sr.ª Ministra disse aqui, com clareza, que não vai fazer pavilhões, que tem outras prioridades — portanto, tenho de registar a sua coerência. E também é pena que não estejam aqui hoje presentes alguns outros Deputados do Partido Socialista que, tantas vezes, neste Hemiciclo, falaram dos pavilhões escolares, melhor, protestaram pela ausência de pavilhões escolares. Diziam mesmo que as escolas não estavam completas, que lhes faltava algo de essencial, os pavilhões. Hoje, esqueceram-se dessa mesma falta.
A este propósito, permita-me citar aqui o Sr. Secretário de Estado da Educação, que falou na condição da igualdade de oportunidades. Não acha, Sr.ª Ministra, que, havendo escolas com pavilhão e escolas sem pavilhão, também não estamos aqui a falar de igualdade de oportunidades? Sr.ª Ministra, sob o tema desporto escolar uma das grandes apostas da Secretaria de Estado, passo a citar-lhe: «(…) no seu primeiro acto oficial como membro do novo Governo, que o reforço do desporto nas escolas é uma das prioridades da Legislatura. (…) ‘O reforço da presença do desporto na escola vai ser uma e a primeira das minhas prioridades’ (…)».
Não se zangue, Sr.ª Ministra, com nenhum dos seus Secretários de Estado, porque não foi nenhum deles que disse isto mas, sim, um secretário de Estado do seu Governo — e esperava que, nas reuniões ou do Conselho de Ministros ou do Conselho de Secretários de Estado, os Secretários de Estado pudessem estar em sintonia relativamente a estas questões —, concretamente, o Sr. Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, que, numa cerimónia, referiu que a sua grande aposta era o desporto na escola.
E não abanem a cabeça, Srs. Secretários de Estado, porque, se querem dizer que o desporto escolar é uma grande aposta, têm de dizer em que condições e com que condições. Ou querem que os alunos estejam à chuva a fazer desporto ou estejam a praticar modalidades colectivas em terrenos que não são apropriados? Ou, então, têm de dizer que as prioridades são outras e que vão voltar a fazer pavilhões desportivos.
É que, Sr.ª Ministra, também é bom que clarifiquemos aqui esta posição. Dado que todas as forças políticas de todas as bancadas, excepto a do Partido Socialista (e vamos já compreender porquê), falaram na questão dos pavilhões desportivos, era bom que a Sr.ª Ministra, nesta última ronda, esclarecesse definitivamente — aliás, o Sr. Deputado Agostinho Lopes, do PCP, ainda agora, disse ter ficado com dúvidas acerca deste aspecto — se vai ou não fazer pavilhões desportivos.
Entende a Sr.ª Ministra que os pavilhões desportivos são, ou não, uma prioridade para a política de educação? Entende que o desporto na escola é, ou não, importante? Julgo que hoje terá oportunidade de esclarecer-nos relativamente a esta matéria.
A Sr.ª Ministra reconhece que há problemas, e problemas graves, na nossa juventude, muitos dos quais devido ao elevado sedentarismo e, também, aos hábitos alimentares. E sabe, está mais do que provado, que um dos instrumentos fundamentais para reduzir estes problemas é a prática desportiva. Mas, para isso, temos de criar hábitos de prática desportiva. E, Sr.ª Ministra, onde é que se criam estes hábitos? Obviamente que nas escolas. Portanto, é fundamental que as próprias escolas tenham condições, tenham esses pavilhões desportivos que permitam a prática desportiva.
Portanto, Sr.ª Ministra, verificamos que há um retrocesso claro e evidente nessas políticas, na aposta nos pavilhões desportivos.
Gostava que a Sr.ª Ministra esclarecesse para que, digo-o com toda a sinceridade, eu pudesse ficar mais tranquilo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Bernardo.

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O Sr. João Bernardo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado: O Orçamento do Estado marca, claramente, que Governo e o Ministério da Educação têm um objectivo geral que visa dotar de maior qualidade e de maior exigência a escola pública, de modo a que possa corresponder, cada vez mais, às necessidades da família e da sociedade.
Nesta perspectiva, verifica-se que as políticas do Ministério da Educação são integradas e obedecem a uma estratégia global que tem como objectivo final a qualificação dessa mesma escola pública. Assim, verificamos que no Orçamento do Estado, nas instalações escolares, há prioridades educativas claras, privilegiando a qualificação e a construção de um novo parque escolar em zonas em que o mesmo está claramente degradado, de modo a criar infra-estruturas físicas de que os profissionais de educação e os alunos necessitam para que o acto educativo se processe cada vez com maior dignidade. Aliás, é de realçar o facto de a Sr.ª Ministra ter calendarizado o prazo para que isto tenha substância e venha a começar a ser concretizado, em pleno, em 2006.
Queremos realçar que no 1.º ciclo do ensino básico há uma aposta clara na mudança de paradigma deste subsistema de ensino e que existem plasmadas, no Orçamento do Estado, medidas claramente estruturadas do primeiro segmento do nosso sistema.
Assim, a implementação do Inglês no 1.º ciclo ultrapassou logo, no primeiro ano de funcionamento, os objectivos mais optimistas. Foram apontados aqui, por alguma oposição, a existência de alguns problemas.
Há-os, certamente! Sabemos que ao inovarmos, ao criarmos, finalmente, o que todos diziam serem os objectivos mas que ninguém ousou concretizar, poderiam surgir alguns pequenos problemas de funcionamento.
Mas, este Ministério está disponível para, e fá-lo-á, com certeza, em 2006 e 2007, corrigir o que funcionar menos bem.
O que é certo é que a medida foi implementada em 307 dos 308 concelhos do País, ficando apenas um de fora. Aliás, esta situação serviu para verificarmos que, em alguns concelhos, há muitos e muitos anos que não se faz uma aposta no ensino básico, ao contrário do discurso de algumas forças políticas.
Pergunto à Sr.ª Ministra se, com a aplicação do Inglês no 1.º ciclo neste primeiro ano, há condições, neste orçamento, para o seu alargamento aos 1.º e 2.º anos de escolaridade, porque, com o sucesso que está a ter, penso que é desejavelmente possível aprofundar esta iniciativa.
Outra mudança significativa que este Orçamento do Estado contempla é o fim da discriminação do 1.º ciclo em relação às refeições escolares. Não faz sentido que os alunos deste ciclo de ensino não tenham acesso às refeições nas próprias escolas. Por isso, é importante e urgente que esta medida se generalize tanto quanto possível a todo o território nacional.
A comparticipação de 12,965 milhões de euros para as refeições destes alunos é um bom investimento na qualidade e imagem da própria escola pública, porque nós, Partido Socialista, defendemos a escola pública como uma escola de qualidade, uma escola em que os portugueses tenham orgulho.
Esta é, também, uma medida não só educativa mas de conteúdo social de grande alcance no combate ao insucesso escolar, em que o Governo tanto se tem empenhado, e na socialização das nossas crianças. Sei que estas são verdades duras de ouvir, mas são as verdades de que alguns falaram no passado mas em relação às quais nunca foram capazes de tomar as medidas adequadas.
Ficamos satisfeitos por esta iniciativa não aguardar o próximo ano escolar, como seria mais fácil para o Governo, e ser já implementada, a partir de Janeiro de 2006. Certamente, isto far-se-á com algumas dificuldades, mas estamos cá para as superar e para que, num futuro muito próximo, todas as crianças do 1.º ciclo deixem de viver com o estigma de não terem as condições mínimas na escola.
O Governo merece ser felicitado e apoiado por todas as famílias e pelos portugueses por ter encontrado o cerne do que deve ser uma verdadeira política educativa, de passos coerentes (e não de pseudo-reformas), centrados no que é essencial, no pré-escolar e no 1.º ciclo, para, no futuro, ir por aí fora, criando uma escola que dignifique a sociedade e que responda aos problemas com que hoje os jovens portugueses e as famílias tanto se debatem.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, tal como referiu, todos estamos de acordo em que é necessário e importante reforçar o investimento na educação em Portugal, até porque todos temos consciência de que não é possível sair desta situação de atraso e de estagnação se não houver uma mudança grande e imediata, não se pode perder tempo. Porém, quando analisamos o orçamento que nos foi apresentado, não há dúvida que ele aponta numa direcção oposta. Vou dar-lhe alguns dados, com base nos quais tirámos esta conclusão.
Começo pelo apoio socioeconómico onde: em 2005 — com base nos dados que nos foram disponibilizados —, estavam previstos 33,5 milhões de euros, a que se somavam 1,290 milhões de euros para o ensino especial, o que totaliza mais de 34 milhões de euros; para 2006, estão apenas considerados 27 milhões de euros. Ora, se estes dados correspondem à verdade, não há dúvida de que esta redução é chocante, sobretudo numa altura em que o desemprego aumenta e quando, naturalmente, associado ao desemprego está a miséria.
Mas não é apenas com base nestes dados…

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A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, peço desculpa pela interrupção, mas a Sr.ª Ministra gostava de saber a que quadro se está a referir.

O Orador: — Sr.ª Presidente, estou a referir-me a duas publicações de dados que nos foram disponibilizados.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Qual é a página?

O Orador: — Os dados relativos a 2006 constam da pág. 17 e os de 2005 constam das págs. 17 e 18. Portanto, estou a referir-me a dois documentos oficiais que nos foram fornecidos sobre apoio socioeconómico.
Mas não são apenas estes números que revelam que o Governo vai na direcção oposta. Se analisarmos as despesas da função educação, que inclui não só o Ministério da Educação como toda a educação em Portugal, constatamos que, em 2006, a previsão, em termos nominais, é de estagnação, o que significa, em termos reais, uma diminuição. E o mesmo acontece já no próprio orçamento do Ministério da Educação, onde, como, aliás, já aqui foi referido, para os ensinos básico e secundário está prevista uma diminuição de 0,5% — isto em termos nominais, porque em termos reais ela é, com certeza, mais significativa.
Em relação a esta última realidade, uma vez que referiu que o ratio em Portugal, a percentagem em despesas com pessoal na educação é muito elevada, é de 80%, enquanto que nos outros países anda à volta de 75%, e que não vai haver aumento global, mas a redução tem de ser feita em algum sítio, pergunto: qual é o resultado, a consequência disto nas pessoas, nos trabalhadores da educação? Esta situação vai determinar que uma parte deles sejam colocados em quadros supranumerários, uma vez que esta é uma forma de reduzir? E a nossa análise do orçamento aponta para aqui.
Por outro lado, quando se fala em escolaridade, pensa-se só nos jovens, mas temos um problema muito grave a nível de adultos. Sobre esta matéria, vou apenas colocar-lhe duas questões.
Em Portugal, se olharmos para os trabalhadores altamente qualificados, verificamos que cerca de 43% têm apenas o ensino básico; se formos para os profissionais qualificados, 76% têm o ensino básico. Portanto, o nível de escolaridade é extremamente baixo. O que é que isto determina? A necessidade de aumentar qualificações, mas a baixa escolaridade é um obstáculo muito grande ao aumento das qualificações.
Sendo assim, o que pensa o Ministério da Educação, naturalmente em articulação com o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, fazer para resolver esta questão? Até aqui, o que temos constatado é que os dois Ministérios estão de costas voltadas, o que tem reflexos graves.
A outra questão que quero colocar tem a ver com os jovens que entram no mercado de trabalho sem a escolaridade obrigatória e sem qualificação profissional. Na área da formação a que estou ligado, normalmente este problema é encarado como «cláusula formação/educação». Mas, na prática, o que tem acontecido? O Instituto do Emprego e Formação Profissional inscreve uma verba — e recordo-me que a penúltima era de 11 milhões de euros — e, no fim do ano, há zero de utilização. Como é que o Ministério da Educação, naturalmente em articulação com o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, pensa alterar esta situação? Finalmente, e esta é última pergunta, a precariedade dos professores contratados. Continuo a pensar que, em Portugal, uma das causas do insucesso e dos baixos resultados está muito ligada à grande precariedade e, até, à humilhação a que são sujeitos os professores contratados. A meu ver, esta situação não os atinge só a eles, atinge também toda a escola, porque acaba por contaminar reajustamentos, etc. Na pág. 205 do Relatório que nos foi apresentado faz-se referência à alteração dos regimes e dos sistemas de colocação, visando a fixação dos docentes, gostava de perceber mais em concreto o que isto significa, embora não seja preciso um grande desenvolvimento, tendo em conta as horas que já são.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Por último, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosalina Martins.

A Sr.ª Rosalina Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Educação e Srs. Secretários de Estado, vou ser muito breve, até porque tenho o compromisso, com a bancada do PSD, de apenas falar 2 minutos.
Pegando no Relatório do Orçamento do Estado para 2006, começo por analisar o primeiro parágrafo, que refere que o compromisso assumido pelo XVII Governo, no domínio da educação e formação, visa colmatar os défices de qualificação e remete para aqueles que foram os pressupostos da Estratégia de Lisboa.
Quando a actual equipa chegou ao Ministério da Educação, lembro-me que um dos primeiros discursos foi centrado na necessidade de construir uma intervenção positiva em torno da educação, construir e implementar medidas que conduzissem ao sucesso educativo e que também fossem orientadas para a qualificação dos portugueses e abandonar a ideia das reformas sucessivas — a Sr.ª Ministra já aqui o referiu hoje —, introduzindo no sistema apenas os reajustamentos necessários.
Ora, sendo o Orçamento um instrumento para executar políticas, penso que ele tem merecido uma apreciação consensual desta Câmara, uma vez que é coerente — foi esta a nota dominante nas diferentes intervenções — com as medidas políticas que vão consubstanciar estas grandes orientações.

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Um pouco na sequência do que o Sr. Deputado Eugénio Rosa disse, vou falar de uma questão que não foi referida ao longo deste debate, que a Sr.ª Ministra apenas aflorou, e que tem a ver exactamente com as oportunidades de aprendizagem ao longo da vida e que se prende, de uma forma indirecta, com o combate ao insucesso escolar.
A Sr.ª Ministra, na resposta a uma questão sobre as escolas profissionais, referiu que, no presente ano lectivo, tinham triplicado os alunos do nível II, alunos que tinham abandonado o sistema, e que o Governo teve a preocupação de lançar um programa específico para dar a estes alunos uma formação adequada, para que eles possam terminar a escolaridade obrigatória.
Gostava de deixar uma nota positiva relativamente a duas questões que não foram abordadas. A primeira tem a ver com o alargamento da oferta dos cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), extensivo ao 12.º ano — e penso que isto responde também à questão suscitada anteriormente. E a segunda prende-se com o aumento — questão que foi aqui apenas aflorada — do número de centros de reconhecimento, validação e certificação de competências e o alargamento também para o horizonte do 12.º ano destes mesmos centros. Esta é uma forma de mostrar a preocupação para com o abandono escolar dos jovens devido ao insucesso não só nas escolas de pequena dimensão, que já aqui foi referenciado, mas também em escolas sobrelotadas, como o Sr. Deputado Agostinho Lopes referiu oportunamente.
Gostaria de deixar aqui como nota que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apesar de já ter sido referido, entende que este é efectivamente o orçamento do Inglês no 1.º ciclo e o que demonstra uma enorme preocupação social — e isto não foi aqui, hoje, dito por algumas bancadas que tinham sempre a preocupação de falar nas escolas que não serviam refeições aos meninos —, uma vez que existe um programa de serviço de refeições aos meninos do 1.º ciclo, o que já deixou de ser um problema, tendo as questões passado para outros patamares. Contudo, este orçamento contempla o serviço de refeições no 1.º ciclo e, por esta via, também será um orçamento de combate ao insucesso escolar. Além disto, é ainda um orçamento — embora esta matéria também tenha a ver com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior — que se baseia numa política articulada, sendo por isso necessário o diálogo entre os Ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social, da Cultura e da Educação, permitindo às famílias a aquisição de um computador para os jovens, podendo elas deduzir 250 euros no IRS. Temos, certamente, também aqui um incentivo a uma melhoria da qualidade da educação dos jovens.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder a todos estes pedidos de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, gostaria de dizer que estava longe de imaginar que íamos ter aqui uma grande discussão à volta dos pavilhões escolares. Pensava que era uma matéria mais do pacífica, que toda a gente preferia escolas a pavilhões escolares,…

Risos.

… sobretudo num quadro em que os pavilhões já se construíram. Há pavilhões escolares por todo o sítio.
Chegamos a ter situações caricatas de escolas, aqui bem perto de Lisboa, que ainda estão instaladas nos velhos contentores, aqueles contentores provisórios de há 30 anos — estão há 30 anos nesses contentores —
, e, todavia, têm já um pavilhão escolar novinho em folha. Temos situações destas que revelam de facto qual era a prioridade, qual era a orientação.
De qualquer modo, penso que é possível orientar esta prioridade, quando fizermos o levantamento da rede, onde iremos ver se ainda há necessidade de construção de mais pavilhões, sobretudo destes pavilhões avulsos, associados a escolas onde chove, onde não há condições para as crianças estarem e onde, todavia, há um pavilhão! Há, no entanto, uma coisa que posso garantir: todas as novas escolas já serão construídas com pavilhão integrado.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Oradora: — Ora, isto é muito diferente de uma política de construção de pavilhões em função de critérios que não eram muito claros, sobretudo persistindo no sistema. Volto a insistir que aqui, na região de Lisboa, temos 13 escolas das antigas a precisar de intervenção prioritária e, na minha opinião, não há nada que justifique o não se ter feito essa intervenção prioritária. São escolas abandonadas! Não são escolas do 1.º ciclo e, portanto, não é o mesmo conceito de abandono.
Penso que agora, resolvido o problema dos pavilhões escolares, temos oportunidade de investir na rede escolar de uma outra maneira.
Um outro sinal de que não temos uma política contra o desporto escolar é o facto de, no próximo ano, irmos alargar as actividades extracurriculares das crianças do 1.º ciclo, introduzindo o desporto escolar com referenciais de qualidade. Portanto, não temos uma política contra o desporto escolar, nem de considerarmos

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que o desporto não é saudável, mas temos de dar uma atenção diferente a prioridades que é preciso considerar.
O Sr. Deputado Agostinho Lopes perguntou se estou preocupada com os baixos salários dos trabalhadores do Vale do Ave ou do Vale do Sousa, com o conforto escolar, com a falta de pessoal… Preocupo-me, evidentemente, com tudo isto. Agora, o que posso dizer é que o Ministério da Educação, a política educativa, tem a possibilidade de intervir em algumas matérias, não noutras. Não posso definir a política educativa, ou ter como objectivo da política educativa o aumento dos salários dos trabalhadores, embora reconheça que esta é uma questão muito importante.
Penso que estas articulações nos desviam e não nos permitem actuar onde é possível actuar. Como é evidente, o insucesso escolar relaciona-se com os baixos salários, com o conforto, com a falta de pessoal auxiliar, com a pobreza nas famílias, mas isto parece-me aqueles diagnósticos em que tudo tem a ver com tudo e que, depois, nada se faz. Precisamos de centrar a nossa actuação, definir prioridades e procurar…

Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.

Ouça, Sr. Deputado, penso que temos uma política vastíssima, apresentámos imensas medidas. Reduzir a nossa preocupação a algo que no Orçamento do Estado vale 1,8 milhões de euros penso que é estar a distorcer o que dissemos.
Relativamente às escolas com alunos a mais, quero dizer-lhe que o problema que identificámos no estudo que fizemos de correlação do insucesso com a dimensão das escolas é o seguinte: em nenhuma escola de grande dimensão, em nenhuma escola com alunos a mais, encontrámos taxas de insucesso iguais, da mesma dimensão e com a mesma expressão, às das escolas pequenas. Tenho imensa pena de não trazer comigo o gráfico,…

Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.

… mas vou mandar, a si e aos grupos parlamentares, o resultado deste estudo e vai ter oportunidade de verificar o que acabo de dizer.
Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, peço-lhe imensa desculpa por não ter respondido a uma pergunta que me fez sobre o número de escolas e o número de alunos nas escolas profissionais. Mas posso dizer-lhe que não houve um aumento, nem do número de escolas nem do número de alunos, nestas…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Perguntei quais eram as escolas que iriam ser criadas de novo!

A Oradora: — São as escolas que eram financiadas. Posso enviar aos Srs. Deputados a lista das escolas com o número de alunos, que são cerca de 30 000. Os numerus clausus têm sido mantidos. A única abertura que se verificou, de novas turmas e de novos alunos para as escolas profissionais, foi o segmento que identifiquei: os alunos com mais de 16 anos que, não tendo concluído o ensino básico, não tinham no sistema público oferta formativa adequada à sua situação, e, portanto, as escolas profissionais foram convidadas a…

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Então, não há a construção de nenhuma escola profissional!

A Oradora: — Da responsabilidade do Ministério da Educação não há a construção de qualquer escola profissional.

Protestos do PCP.

O Ministério da Educação não constrói escolas profissionais! Srs. Deputados, vou enviar a lista das escolas profissionais e o número de alunos por escola em que estas situações se podem verificar. Mas, de facto, não haverá responsabilidade do Ministério da Educação na construção de qualquer escola profissional, no próximo ano, neste Orçamento do Estado.
As questões levantadas tanto pelo Sr. Deputado Eugénio Rosa como pela Sr.ª Deputada Rosalina Martins, sobre a formação dos adultos, levar-nos-iam aqui muito tempo, mas, basicamente, posso dizer que, a meu ver, o desafio da qualificação dos adultos em Portugal tem uma tal dimensão que não é possível resolvê-lo com a estrutura formativa do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social. Temos de aproveitar os recursos do Ministério da Educação para enfrentar este desafio, e ele tem vários níveis e várias expressões. Desde logo, temos o resultado do insucesso do ensino secundário: entre 1991 e 2001, entraram no mercado de trabalho cerca de 400 000 jovens que passaram pelo secundário e não o concluíram. O resultado dos 35% de insucesso anual tem esta expressão no mercado de trabalho: 400 000 jovens que têm uma parte do secundário e que não o concluíram. Tem de ser criada aqui uma oportunidade para estes jovens e, eventualmente, para outros menos jovens que estejam à beira de… É uma urgência porquê? Porque são jovens e estão impedidos de prosseguir a sua qualificação, estão impedidos de entrar no ensino superior e precisam de facto

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de uma nova oportunidade para concluir o 12.º ano. E, para isto, contamos com as escolas secundárias, com os politécnicos, com os cursos de educação e formação, com vários instrumentos que, depois, serão apresentados em detalhe — e que posso enviar no programa Novas Oportunidades — e que se destinam a resolver este problema que é resultado não só da história do País mas também do insucesso recente de jovens que não completaram o secundário.
Gostava também de dizer que, no que respeita aos instrumentos técnico-pedagógicos para resolverem este problema, que são os cursos de educação e formação e os centros de reconhecimento, validação e certificação de competências, neste momento ainda não dispomos dos referenciais de competências para este nível de ensino. É um trabalho que está a ser desenvolvido no Ministério da Educação, e, em Janeiro, pensamos já estar em condições de lançar os cursos de educação e formação e o reconhecimento, validação e certificação de competências para este nível, o que pode fazer multiplicar muito os resultados que se podem obter.
Temos ainda jovens e menos jovens, que é uma população maior, que não completaram o 9.º ano de escolaridade, e são de novo milhares de jovens que passaram pelo básico e que não o concluíram. Pensamos que a resposta deve ser dada pelas escolas secundárias, que têm de criar ofertas formativas para estes jovens com 16, 17, 18 anos e, às vezes, um pouco mais e que estão condenados ou a irem para o ensino nocturno ou a permanecerem, como acontece com alguns, nas escolas do ensino básico.
O que pensamos é que nas escolas em que existe uma população nos espaços de ensino adequados à idade devem ser desenvolvidas ofertas formativas adequadas ao nível do ensino que possuem. Ou seja, são os tais cursos de educação e formação e os cursos profissionais que pedimos às escolas profissionais para apresentarem já este ano, e, assim, esperamos poder multiplicar os resultados nas escolas secundárias.
Há ainda toda a população adulta, que não possui sequer o 9.º ano de escolaridade, e há casos em que não têm sequer os outros níveis de ensino, sobretudo o 6.º ano, e, para esta população, pensamos que os instrumentos cursos de educação e formação e reconhecimento, validação e certificação de competências, em oferta alargada na rede de escolas públicas, pode ser a resposta.
A pergunta que se pode fazer é: os recursos humanos hoje existentes nas escolas, os professores, são suficientes para este desafio? Penso que se vai gerar uma dinâmica, vamos ver como é que ela se comporta.
Mas isto pode, evidentemente, levar a um crescimento do número de professores, a um crescimento do emprego de docentes, mas, neste momento, não estamos em condições de o dizer. Temos de começar com os recursos que existem, e existem de facto alguns disponíveis, porque a taxa de ocupação, por exemplo, nas escolas secundárias é bastante inferior à capacidade instalada. Pensamos, portanto, que ainda há que fazer um esforço de adaptação a este novo desafio por parte das escolas, esforço este que, depois, pode ser multiplicador. Não prevemos, aliás, criar um quadro de excedentes para professores, justamente porque há este desafio do ensino que é necessário enfrentar e isto não está…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — E para os outros trabalhadores da educação?

A Oradora: — São todos necessários! Nunca houve qualquer declaração por parte do Ministério no sentido de dizer que há professores ou pessoal a mais. Temos estado a fazer a integração de imenso pessoal não docente que estava com contrato administrativo de provimento, passando agora a dispor de contratos individuais de trabalho, vamos integrar até ao final do ano cerca de 14 000 trabalhadores, e, portanto, não há qualquer política que considere excedentário o pessoal da educação. O que há é uma retracção nas novas contratações, evidentemente. Este ano contrataram-se menos professores, mas penso até que este movimento é mais decorrente do decréscimo do número de alunos do que de medidas excepcionais que tenham sido adoptadas.
Não posso deixar de comentar a hipótese que o Sr. Deputado coloca, de que o insucesso escolar estará relacionado com a precariedade dos professores. É possível que esteja, mas eu teria alguma reserva em relação a essa possibilidade. E porquê? Repare, por um lado, porque os professores contratados são muito poucos, são cerca de 10 000, enquanto que os professores, no seu conjunto, são 150 000, e, portanto, não são estes «coitados», estes professores contratados, que têm a responsabilidade do insucesso escolar, porque não só são poucos e como o insucesso é muito superior a esta sua proporção. E, por outro lado, porque são normalmente professores mais novos, com mais energia, e, sendo assim, a meu ver, é um pouco complicado fazer esta ligação.
A precariedade afecta, sobretudo, os professores contratados e eu gostaria muito de ter medidas para estabilizar estes professores e também para renovar o corpo docente, porque a taxa de aposentação anda à volta de 3000 professores por ano e precisávamos de ter um mecanismo que garantisse a renovação do corpo docente. Ainda não tenho ideias claras sobre qual possa ser este mecanismo, mas tenho ideias claras sobre a necessidade de ter este mecanismo.
Pode estar a falar, evidentemente, da precariedade relativa aos professores dos quadros de zona pedagógica, mas estes também são apenas 35 000, enquanto os professores do quadro de escola não têm qualquer problema de precariedade — repito, nenhum — e são o maior peso no quadro de pessoal. Penso, portanto, que é preciso ser um pouco mais cauteloso neste raciocínio.

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Quanto às questões relacionadas com o ensino do Inglês no 1.º ciclo e com a atenção particular que lhe estamos a dar, é evidente que o objectivo é o de ter o Inglês como uma actividade normal. Estamos a estudar a possibilidade de alargar ou não o ensino do Inglês aos 1.º e 2.º anos de escolaridade, apesar de esta ser uma questão menos consensual no ambiente escolar. De todo o modo, se houver pressão escolar neste sentido, penso que poderemos ter condições para o fazer.
Contudo, tão importante como o alargamento do Inglês aos outros anos escolares é completar o pacote das actividades extracurriculares e o das refeições, tendo a garantia de que todas as crianças têm acesso a uma refeição escolar e a outras actividades, como o desporto e as expressões, que podem ser desenvolvidas neste espaço da escola a tempo inteiro.
Penso que respondi a todas as questões.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Falta só a questão relativa à pág. 17!

A Oradora: — Tem razão, Sr. Deputado. Falta a questão da pág. 17 e da acção social escolar. A este respeito, repito um pouco o que já disse à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, ou seja, que me parece mais útil comparar o Orçamento para 2006 com o executado de…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr.ª Ministra, se me permite, essa questão não tem importância, visto que, em termos de números, ela é clara. O que sucede é que, há pouco, o Sr. Secretário de Estado ou a Sr.ª Ministra disseram que a tal verba de apoio à educação especial só não está presente em termos de identificação, porque está integrada na verba global para o ensino oficial. Ora, se é assim, o decréscimo é maior ainda, visto que, em 2005, essa verba estava identificada e perfeitamente separada, havia, aliás, duas verbas que se somavam e davam um determinado montante. Estando, em 2006, integrada a verba, o decréscimo é maior ainda. Era só esta a clarificação que queríamos.

A Oradora: — Sr.ª Deputada, a comparação que eu estava a dizer é em relação ao Orçamento inicial e não ao executado.
Em relação ao Orçamento inicial, a verba inscrita era de 33,5 milhões de euros, era uma verba para um programa do anterior governo — e já não está presente o representante do partido responsável por esta medida —, que era o do empréstimo dos livros escolares. Estava, portanto, inscrita uma verba que não foi executada nem implementada, porque não era suficiente nem exequível. Na realidade, o valor que será executado nesta medida é de 24 milhões de euros e não os 33,5 milhões de euros inscritos. Por outro lado, como os valores de capitação também sobem, há, de facto, um aumento. De todo o modo, posso mandar depois todas estas informações em pormenor, se o considerarem útil.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Deputados, agradeço a vossa colaboração no desenvolvimento dos nossos trabalhos, que concluímos dentro do prazo de quatro horas que estava previsto. Foi, aliás, a primeira vez que tal aconteceu nestas reuniões de apreciação da proposta de Orçamento do Estado para 2006, o que mostra a eficácia do Ministério da Educação e dos Srs. Deputados que participaram nesta reunião.
Agradeço à Sr.ª Ministra a disponibilidade que manifestou para responder exaustivamente a todas as questões colocadas.
Srs. Deputados, voltamos a reunir à 9 horas e 30 minutos de amanhã, desta feita com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 22 horas e 30 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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