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Quinta-feira, 26 de Outubro de 2006 II Série-OE — Número 2

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 25 de Outubro de 2006

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Patinha Antão) declarou aberta a reunião às 9 horas e 50 minutos.
Prosseguiu a preparação do debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 99/X — Orçamento do Estado para 2007, tendo as equipas governamentais do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, do Ministério da Defesa Nacional e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior apresentado à Comissão os respectivos orçamentos.
Relativamente ao orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, o Sr. Ministro (Vieira da Silva) e os Srs. Secretários de Estado da Segurança Social (Pedro Marques), Adjunta e da Reabilitação (Idália Moniz) e do Emprego e da Formação Profissional (Fernando Medina) deram resposta às perguntas formuladas pelos Srs. Deputados Adão Silva (PSD), Ricardo Freitas (PS), Eugénio Rosa (PCP), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Miguel Santos (PSD), Sónia Fertuzinhos (PS), Jorge Machado (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP) e Mariana Aiveca (BE).
Usaram da palavra, a diverso título, sobre o orçamento do Ministério da Defesa Nacional, além do Sr. Ministro (Nuno Severiano Teixeira) e do Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (João Mira Gomes), os Srs. Deputados Henrique Rocha de Freitas (PSD), António Filipe (PCP), João Rebelo (CDS-PP), Fernando Rosas (BE), Marques Júnior (PS), António Carlos Monteiro (CDSPP) e Correia de Jesus (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, intervieram, a diverso título, além do Sr.
Ministro (Mariano Gago), os Srs. Deputados Agostinho Branquinho (PSD), Manuel Mota (PS), Luísa Mesquita (PCP), Abel Baptista (CDS-PP), Cecília Honório e Fernando Rosas (BE), Bravo Nico (PS), Miguel Tiago (PCP), Emídio Guerreiro (PSD) e Eugénio Rosa (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 21 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente (Patinha Antão): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 9 horas e 50 minutos.

Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros da Comunicação Social, Minhas Senhores e Meus Senhores, vamos dar início à audição, no âmbito do Orçamento do Estado para 2007, da equipa ministerial do Trabalho e da Solidariedade Social.
Como está combinado, os nossos trabalhos irão decorrer da seguinte maneira: haverá lugar a uma intervenção inicial por parte do Sr. Ministro, que durará cerca de 20 minutos, seguida de intervenções de 10 minutos (ou um pouco menos do que isso, se for possível) por cada Sr. Deputado, em representação do respectivo grupo parlamentar. Depois, o Sr. Ministro — ou, eventualmente, os Srs. Secretários de Estado — responderá em bloco, também no mais curto espaço de tempo possível. Seguir-se-á uma segunda ronda de perguntas com duração mais curta, sendo, posteriormente, dada uma resposta em bloco.
Feita esta consideração, e sendo esta uma reunião conjunta da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Trabalho e Segurança Social, damos as boas-vindas à equipa ministerial e desejamos que o nosso trabalho seja profícuo, claro e muito esclarecedor.
Posto isto, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social para fazer a intervenção inicial.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social (Vieira da Silva): — Srs. Presidentes, Sr.as e Srs. Deputados, muito bom dia.
No cumprimento desta nova metodologia de trabalho, no debate, na generalidade e em comissão, do Orçamento do Estado para 2007, vou fazer uma intervenção inicial centrada nos aspectos mais marcantes das opções governativas no domínio das políticas e do Orçamento na área do trabalho e da solidariedade social, que procurarei que seja o mais curta possível por forma a que possamos ter tempo mais desenvolvido para a fase de debate.
Gostaria de começar por vos dizer que o orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social é marcado por duas realidades de enquadramento de enorme significado.
Por um lado, aquela que tem a ver com a situação económica e social, nomeadamente na sua vertente do emprego, que influencia sempre de forma significativa a prossecução das políticas neste Ministério e também a sua consequência orçamental.
Como sabem, e consultando os dados do Orçamento, assim como já o pudemos fazer relativamente às Grandes Opções do Plano, o Governo assenta a elaboração dos seus cenários orçamentais com base numa evolução da situação económica e social, que é marcada principalmente pelo facto de haver uma significativa estabilidade do ponto de vista dos dados da relação de desemprego — houve uma ligeira queda da taxa de desemprego, o que significa uma relevante inversão no ponto de vista da criação de emprego, na sequência do que já aconteceu no último ano.
O crescimento económico previsto irá traduzir-se, a nosso ver e conforme os dados mais recentes apontam, num volume de criação líquida de emprego com algum significado, que, no entanto, não será suficiente para baixar de forma drástica ou significativa as taxas de desemprego, apesar de ser uma inversão face a um conjunto de anos que ficaram marcados pela incapacidade da economia de criar empregos líquidos.
Este é, obviamente, um facto enquadrador do orçamento em quase todas as áreas do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, mas este orçamento tem de ser lido a par da conclusão de uma fase do processo de reforma do sistema de segurança social, que esperamos que venha a concretizar-se nos próximos meses em sede parlamentar, mas também em sede governativa, no exercício das competências próprias do Governo. Iremos debater brevemente o processo de reforma do sistema de segurança social e, apesar de os aspectos mais marcantes dessa reforma se projectarem no médio e no longo prazo, estou convicto que algumas das suas variáveis irão também ter, do ponto de vista instrumental, uma importância na gestão do sistema já no decorrer do próximo ano.
Feito este enquadramento, gostaria de vos dizer que prevemos uma melhoria dos saldos da segurança social, na linha de continuidade das políticas de reforço da sustentabilidade de curto prazo. Contamos, portanto, passar de um saldo em contas nacionais previsto de 296 milhões de euros, em 2006, para 333 milhões de euros, em 2007. Isto quer dizer que, nestes dois anos, vai ser possível, invertendo uma tendência do passado recente, gerar novos fundos para reforçar o fundo de capitalização da segurança social.
Neste aspecto, o dado talvez mais marcante tem a ver com o facto de, em 2007, não só prevermos transferir todos os saldos do sistema previdencial que vieram a registar-se, como está na lei, como também, desde já, e pela primeira vez desde 2003, prevemos transferir à cabeça, ao longo do ano, contribuições do próprio ano de 2007 no valor de 114,6 milhões de euros. Assim, ainda que longe dos valores que estão previstos na lei de bases, voltaremos a uma situação de «capitalização estrutural» do próprio sistema de segurança social.
Esta melhoria da situação global da segurança social resulta de vários factores. Em primeiro lugar, talvez como factor mais marcante, uma previsão de crescimento das receitas de contribuições de 5,75 acima do

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crescimento previsto do produto nominal ou acima do crescimento das remunerações, denotando a continuação do aumento da eficiência contributiva.
Esse aumento da eficiência contributiva irá passar por um reforço da recuperação da dívida — que já cresceu em cerca de 100% até ao final do primeiro semestre de 2006 —, que irá contar com o impacto muito positivo do facto de ter havido um reforço dos técnicos afectos à área da recuperação da dívida, com a contratação de 34 técnicos para a área das secções de execução (portanto, para a área da recuperação da dívida).
Também o processo de gestão corrente, nomeadamente a emissão das declarações de remunerações oficiosas, irá, a nosso ver, ter um impacto muito positivo do ponto de vista da melhoria da eficiência contributiva, assim como o cruzamento de dados, nomeadamente com o Ministério das Finanças, que é já hoje um ponto fundamental para melhorar a eficácia contributiva.
Em termos de despesas, o orçamento continua a assegurar uma evolução normal da despesa nas principais rubricas da segurança social. Temos um crescimento com as despesas com pensões acima dos 7%, isto é, mais de 857 milhões de euros de crescimento de despesa nominal para as pensões. Obviamente, como sabemos, não só as pensões têm alguma rigidez no seu comportamento, como também haverá um processo de actualização do valor das pensões actuais. Contudo, esperamos que exista uma diminuição do ritmo de aumento desta despesa, especialmente articulado com a introdução de regras mais restritivas no que respeita aos diferentes modelos e mecanismos de antecipação da idade da reforma e também pelos incentivos que pretendemos criar à postecipação dessa mesma idade da reforma.
Em linha com a previsão que fazemos da estabilização do desemprego, também prevemos uma contenção do crescimento da despesa com estas prestações. Esta contenção, que tem um crescimento nominal de 2,68, tem a ver, por um lado, como referi, com os dados materiais, físicos da evolução desta variável e que estão em linha com a evolução recente da mesma, mas também com a introdução de novas regras mais rigorosas de combate à utilização indevida desta prestação que decorrem da aprovação da nova legislação do subsídio do desemprego.
Este orçamento — e estou apenas a focar os aspectos mais importantes — reforça também as verbas destinadas aos instrumentos mais significativos de combate à pobreza, nomeadamente, conforme o Governo aprovou recentemente, alargando-se este ano a faixa etária que passará a ser elegível para o complemento solidário para idosos, haverá naturalmente um reforço, por exemplo, de 55 milhões de euros para esta prestação, atingindo o total de 90 milhões de euros.
Também no domínio da protecção social de cidadania, ou seja, dos instrumentos de combate à pobreza, vale a pena fazer uma referência ao rendimento social de inserção. Este instrumento, que, como sabem, é o instrumento por excelência de combate à severidade da pobreza, vai ter um comportamento orçamental de relativa estabilização, depois de um ano em que assistiu a um crescimento significativo.
Dado esse aspecto ser muito relevante, gostaria de dizer que esse crescimento da execução orçamental de 2006, mais do que corresponder a um alargamento do número de beneficiários, correspondeu a três movimentos muito importantes: primeiro, a aceleração dos prazos de pagamentos e de apreciação das candidaturas, que foi muito significativa; depois, a conclusão do processo de transição de beneficiários que ainda estavam no antigo rendimento mínimo garantido para as regras do rendimento social de inserção; e, também, a actualização da situação financeira das condições de recurso das famílias, algumas das quais não viam essa actualização ser feita há cerca de três anos.
Depois desta correcção global que foi feita à prestação, que teve como consequência um crescimento mais acentuado da sua execução financeira em 2006, contamos que uma aposta num maior rigor e contenção e uma intensificação da dimensão de inserção social dos contratos de inserção junto destas famílias conduza a uma estabilização dos encargos desta mesma prestação do rendimento social de inserção.
Do ponto de vista das despesas de administração, em particular no domínio do sistema de segurança social, o Ministério acompanha o movimento global de contenção e, portanto, as despesas de administração crescerão abaixo da inflação e muito abaixo do crescimento das despesas globais da segurança social, o que garante uma forte redução do peso das despesas de administração, das despesas burocráticas, nas despesa globais da segurança social.
Quanto às áreas das políticas activas e de formação e também aos domínios relativos às condições de trabalho, as transferências para estes organismos crescem mais de 5%, o que permite garantir o cumprimento do compromisso do Governo de reforço das políticas activas de emprego, em torno do que são a principais opções governativas e que se estruturam na iniciativa Novas Oportunidades.
No domínio da acção social, o crescimento efectivo da despesa é de cerca de 5%, denotando alguma contenção face ao ano anterior, mas com importantes excepções, já que foram criadas condições para um reforço das dotações afectas a áreas que consideramos particularmente críticas.
Por exemplo, as verbas afectas às Comissões de Protecção de Crianças e Jovens têm um crescimento de 22%, depois de já terem tido um crescimento da mesma ordem no ano anterior. O mesmo se passa com as verbas destinadas às políticas dirigidas às pessoas com deficiência que, no seu conjunto e no âmbito do orçamento para a segurança social, têm um aumento de cerca de 7,9%.
Cremos também que é da maior importância salientar que 2007 será um ano de reforço de algumas opções políticas estratégicas que, portanto, terão o correspondente enquadramento orçamental.

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Refiro, em particular, o Programa de Cuidados Continuados, que é articulado entre o Ministério da Saúde e o Ministério do Trabalho. Refiro, também, o Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais, o PARES, que é financiado pela nova estrutura de distribuição das receitas dos jogos sociais e cujo primeiro processo de apresentação de candidaturas foi apresentado há uns meses, tendo já sido anunciada a aprovação das primeiras candidaturas, nomeadamente no domínio das creches — já foram aprovadas 75 novas creches — e, nas próximas semanas, serão aprovadas mais cerca de 200 candidaturas relativas a equipamentos na área das creches e dos idosos, porque são estas a três principais áreas do Programa PARES.
Portanto, este aumento de mais de 250 novos equipamentos sociais distribuídos por todos os distritos do Continente constitui um importante reforço da nossa rede de equipamentos e serviços sociais e irá permitir dar um salto significativo no sentido do cumprimento das metas estabelecidas pelo Governo, em particular no que toca ao apoio à primeira infância, já que a abertura de creches é, como sabem, uma prioridade maior do Programa do Governo, aliás, em cumprimento das metas fixadas na União Europeia.
Por isso mesmo, depois desta primeira fase de candidatura ao PARES, será lançada, ainda este ano, uma segunda fase que visa, precisamente, um reforço das candidaturas à valência «creche».
Portanto, nesta primeira fase, já foram aprovadas algumas centenas de equipamentos nas áreas de primeira infância, de deficiência e de idosos. Esta segunda fase de lançamento de candidaturas será centrada na área que tem uma importância estratégica para nós e relativamente à qual temos compromissos muito exigentes, isto é, a área da primeira infância. Provavelmente, o referido segundo período de candidaturas a este Programa será aberto ainda durante o próximo mês de Novembro.
Gostaria de recordar aqui que a primeira fase de candidaturas teve uma procura extremamente elevada, principalmente nalgumas valências, não tanto na valência «creche». Por isso mesmo, sentimos necessidade de relançar um novo período de candidaturas nesta valência, para além de já ter sido lançado o programa de apoio ao investimento privado na área dos equipamentos sociais.
O tempo de que disponho está prestes a esgotar-se, mas ainda gostaria de fazer uma referência à área do trabalho.
Está em marcha um processo de reestruturação organizativa do Ministério do Trabalho no âmbito do PRACE (Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado), à semelhança do que se passa com todos os outros ministérios. Como sabem, isso irá dar origem a uma nova instituição responsável pela área da inspecção do trabalho e da promoção das condições de higiene, saúde e segurança no trabalho.
Neste momento, estamos a concluir uma fase de formação de novos inspectores do trabalho, o que irá permitir-nos reforçar o número de efectivos, colocando-nos a um nível que já não era atingido desde há cerca de sete, oito anos. Obviamente, esta ainda não é a dotação que gostaríamos de ter.
A partir deste reforço da função inspectiva, pretendemos aumentar a cobertura dos serviços da InspecçãoGeral do Trabalho, numa lógica de médio prazo, já que, como sabem, este é um processo sempre relativamente lento. No médio prazo, essa será, seguramente, uma das principais prioridades na jurisdição do Ministério do Trabalho.
Justifica-se a atribuição desta prioridade que referi porque, apesar de termos tido importantes progressos, em particular no domínio dos acidentes de trabalho com maior gravidade, os acidentes mortais, esta continua a ser uma área crítica do funcionamento da nossa economia, da nossa sociedade, do nosso sistema de emprego e das condições de trabalho. Portanto, esta será uma das maiores prioridades, não para o presente orçamento mas também numa óptica de médio prazo.
O orçamento para o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social acompanha, pois, o esforço governamental em termos de contenção da despesa mas é, também, um orçamento atento às principais prioridades no domínio das políticas sociais, concretizando o objectivo de conciliar o rigor com a eficácia das políticas sociais. Julgamos que este orçamento é um passo positivo nesse caminho.
No entanto, também julgamos que o processo de consolidação da reforma da segurança social dará melhores condições para que, neste orçamento, e principalmente nos que vão seguir-se-lhe, a eficácia seja ainda acrescida.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, fez uma intervenção dentro do tempo que estava previsto. Muito obrigado.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, os meus cumprimentos.
Sr. Ministro, agradeço as explicações que nos deu sobre o orçamento para 2007 relativo ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e tenho algumas questões a colocar-lhe.
Um dos aspectos que V. Ex.ª não mencionou mas que é muito relevante é a redução, muito importante, das transferências do Orçamento do Estado para a segurança social.
Como é sabido, o orçamento da segurança social alimenta-se fundamentalmente por duas fontes — as contribuições e as transferências do Orçamento do Estado — e, olhando o histórico, verifica-se que as transferências do Orçamento do Estado andam, em média, por volta de 18%. Comparando com anos anteriores,

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verifica-se que, em 2006, face a 2005, as transferências aumentaram 14,2% e, para 2007, face a 2006, aumentam apenas 6,2%, ou seja, menos de metade do ano passado.
A primeira pergunta é a de saber como é que se explica esta súbita redução das transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social e, depois, quais são as implicações que isto vai ter, Sr. Ministro.
É que, com certeza, vai haver importantes implicações ao nível do saldo da segurança social que, na óptica da contabilidade pública, se reduz para 176 milhões de euros, enquanto, em 2006, foi de 343 milhões de euros.
Obviamente, como o Sr. Ministro já foi dizendo, vai haver uma implicação a nível da quebra de algumas despesas, como no caso do rendimento social de inserção que, em 2006, cresceu 16,2% mas que, para 2007, cresce a inacreditável percentagem de 1,1%.
De igual modo, na acção social, que, como é sabido, é a terceira maior rubrica de despesa da segurança social depois das pensões e do subsídio de desemprego, há uma redução: de 2005 para 2006, as transferências do Orçamento do Estado aumentaram 18,1%, enquanto, de 2006 para 2007, vão aumentar apenas a inacreditável percentagem de 2,2%.
A sensação que fica é a de que, no ano de 2007, a segurança social vai ter uma fortíssima travagem de despesa no que se refere às despesas que são acompanhadas pelas transferências do Orçamento do Estado, como sejam a acção social e certo tipo de rubricas ao nível do subsistema da solidariedade.
Portanto, pergunto se, no fim, não iremos assistir a uma de duas situações: ou a um aumento, ao longo do ano, do reforço das transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social, ultrapassando, portanto, aquela percentagem de 6,2%, ou, então, serão as contribuições a assumir despesas da parte que competia ao Orçamento do Estado.
Um aspecto mais relevante ainda é o que tem a ver com a acção social.
Como já dissemos, o orçamento para a acção social cresce 2,2%, muito abaixo do que tem sido a tradição, sempre acima de 10% — no ano passado, face a 2005, o aumento foi de 18,1%. Assim, não se percebe esta súbita redução de 18,1% para 2,2%, sobretudo quando o que está em causa são as transferências para as instituições sem fins lucrativos — Misericórdias, IPSS. Aliás, olhando para o Mapa XIV, nota-se que, em termos nominais, o valor para 2007 é menor do que foi para 2006, isto é, em 2006, foi de 2255 milhões de euros e, para 2007, é de 1242 milhões de euros, portanto, menos 13 milhões de euros, o que é algo extraordinário.
Repito, pois, que deixa-nos um pouco perplexos esta redução de transferências para as instituições sem fins lucrativos, como, aliás, toda a redução a nível do orçamento da acção social. Isto porque, tal como aqui já foi dito e reiterado pelo próprio Sr. Ministro, o Governo anuncia um aumento de programas e de despesas, nomeadamente a nível da rede de cuidados continuados, que vai envolver largos milhões de euros, mas também a nível da implementação de lugares que já serão disponibilizados através do Programa PARES.
Portanto, para lá do que é a evolução normal das vagas das IPSS que são sujeitas a acordo de cooperação, vai haver um aumento também provocado pelo Programa PARES. Isto é, o pior que pode acontecer — e o Sr. Ministro dir-nos-á que não é assim porque não pode ser assim — é andar-se a estimular as IPSS a fazer obras e a instalar equipamentos no domínio das creches, dos idosos, dos deficientes e, depois, não haver acordo de cooperação para dar apoios às mesmas. Tal seria, realmente, trágico, porque seria uma situação de logro que, obviamente, não quadra com a personalidade e a forma de estar na política próprias de V. Ex.ª.
De qualquer maneira, convinha averiguar isto porque, realmente, o pior que podia acontecer era estar a estimular as IPSS, dizendo-lhes «Construam! Têm aqui dinheiro, têm aqui apoios financeiros, oriundos, nomeadamente, do Programa PARES, mas, depois de estarem concluídas as obras, não há acordo de cooperação». Ora, o Sr. Ministro sabe tão bem quanto eu próprio que, sem acordo de cooperação, há imensas IPSS que não podem pôr a funcionar os lugares que já estão disponíveis.
Até diria mais, Sr. Ministro: o Sr. Ministro deve ter informação — e, se tem, agradecia que no-la desse — de quantos lugares já existem disponíveis neste momento, nas várias IPSS do País, que não podem ser postos à disposição das populações, em lares de idosos, em centros de dia, em creches, em jardins de infância, justamente porque os centros distritais de segurança social dizem que não há dinheiro para acordos de cooperação.
Portanto, era importante sabermos isto, senão, às tantas, estamos a entrar num beco sem saída, isto é, depois de muita obra feita, a mesma não é operacionalizada, não é posta ao serviço dos que mais precisam.
O Sr. Ministro certamente dir-me-á alguma coisa sobre isto.
A não ser que esta redução das transferências do Orçamento do Estado tenha a ver com um aspecto que já vinha prometido em sede do orçamento para 2006 — e a promessa repete-se no orçamento para 2007 — que é o de um novo modelo de financiamento dos equipamentos sociais, no qual vai ser posto ênfase na questão da diferenciação positiva. Gostaria de saber se vai ou não avançar com esta medida durante este ano e, já agora, em que é que ela se traduz, isto é, o que significa para o Governo a diferenciação positiva em relação às IPSS.
Um outro aspecto tem a ver com o PIDDAC. O PIDDAC sofre uma redução importante, de 14,4%. Mas, depois, acaba por não se perceber qual é o PIDDAC global da segurança social, porque os PIDDAC, nesta área, são muito complexos — se há coisa complexa na segurança social são os PIDDAC, pois há PIDDAC para todas as circunstâncias. No entanto, quero focar, sobretudo, o PIDDAC que tem a ver com as IPSS, as

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misericórdias, no esforço que fazem de investimento em equipamentos. Ora, acabo por não perceber qual é esse valor e gostava de sabê-lo. De qualquer modo, neste momento, já percebemos que, do ponto de vista orçamental, o que consta do PIDDAC relativo às IPSS não é tão relevante como o é o Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais (PARES). De facto, o PARES converteu-se aqui numa espécie de suplemento de PIDDAC, isto é, num suplemento de investimento posto à disposição das IPSS por parte do Estado, e bem — aliás, o governo anterior deixou a este Governo uma herança milionária, de 113 milhões de euros, que estavam anunciados no orçamento para 2006 —, tendo sido atribuída no tal Programa, que, nesta fase de candidaturas, está a chegar ao fim, uma verba de 97,1 milhões de euros. Porém, ouvimos o Sr. Ministro dizer que o PARES vai continuar para o próximo ano de 2007/2008 — aliás, basta ler o Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI) para perceber que vai continuar.
Mas há uma certa opacidade nisto, pelo que, a meu ver, o orçamento deveria traduzir os valores que vão ser orçamentados, para todos saberem qual é a perspectiva de investimento, qual é o montante posto à disposição das IPSS, e também para, de algum modo, perspectivar os acordos que vão ser realizados.
Depois, quanto ao complemento solidário para idosos, acabámos por não saber qual foi o montante global gasto em 2006, pois isso não é dito (há-de estar algures «semeado» no meio daqueles números). A sensação que há, Sr. Ministro, é que a implementação deste complemento solidário para idosos não tem corrido bem.
Concordamos com ele, achamos que é um programa muito importante porque combate a pobreza sobretudo nas «bolsas» mais relevantes que são os idosos, mas isto tem corrido mal. E tem corrido mal sobretudo porque os senhores converteram isto numa espécie de «inferno burocrático», que, agora, ao que parece, vai ser corrigido (parece que, no dia 12 de Outubro, foi aprovado um decreto-lei que altera o decreto-lei anterior e que vai no sentido da simplificação dos procedimentos). Ora, o que lhe pergunto, Sr. Ministro, é justamente que simplificação vai ser essa.
O Sr. Ministro, e bem, anunciou (este decreto-lei também o diz, assim como o orçamento) que, a partir de 1 de Janeiro de 2007, este complemento vai passar a ser atribuído aos idosos com mais de 70 anos (e não só àqueles com mais de 80 anos). Achamos bem, achamos até que não há razão alguma para, depois de ter sido feita a experiência durante o ano de 2006 com os que tinham mais de 80 anos e em que se corrige a lei (seguramente simplificando alguns procedimentos), este complemento não poder ser atribuído, já a partir de 2007, a todos os cidadãos com mais de 65 anos. Isso teria sentido — aliás, não se percebe que agora se reduza para 70 anos e não já para 65 anos, como, aliás, foi entendido pelos portugueses durante a campanha eleitoral de 2005. De facto, a ideia que havia era a de que este complemento iria ser atribuído a todos, ao mesmo tempo, a partir dos 65 anos. Não é isso que está a acontecer, mas há este esforço de baixar já para os 70 anos, o que saudamos. A minha pergunta é por que razão não baixa um pouco mais, para os 65 anos, e não ficam todos esses cidadãos com acesso ao complemento solidário para idosos.
São estas as minhas perguntas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Freitas.

O Sr. Ricardo Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Caros Colegas: O Sr. Primeiro-Ministro avisou todo o País, há bem pouco tempo, precisamente antes da apresentação deste Orçamento do Estado, que viriam tempos difíceis, exigentes e de grande rigor. Este Orçamento do Estado confirma essa exigência, esse rigor, essa diminuição, que, custe ou não a muitos partidos da oposição, é feita na despesa e não só através de crescimentos de receita. Efectivamente, há aqui um esforço profundo para conseguirmos atingir o controlo claro das contas públicas.
O orçamento deste Ministério apresenta uma situação de equilíbrio e de clara estabilidade e é um orçamento credível. Importa recordar que, em anos anteriores e com governos anteriores, essa credibilidade jamais existiu, o que foi confirmado, ano após ano, nas contas e pela realidade, com os desvios da «pesada herança» que todos nós recebemos. E importa recordar aqui isto porque um dos aspectos deste orçamento que ninguém tem contestado, e muito bem, é a sua credibilidade, pois ele é credível.
Evidentemente, perante os desafios que o País atravessa e que realmente apontam para situações de desemprego, é com satisfação que vemos que este orçamento dá resposta a essas situações. E não é uma resposta demagógica, não se diz que o desemprego vai desaparecer. Porém, os números e a realidade do País apresentam uma estabilização significativa.
O orçamento põe à disposição uma série de instrumentos que criam apoio àqueles que eventualmente caiem na malha do desemprego; responde às condições importantes de um combate à fraude e evasão fiscais, o que também é inédito (não há comparação com o passado, e a realidade hoje atesta-o), e aponta ainda na prossecução clara desse objectivo. E é credível que seja possível atingir esse objectivo.
Este orçamento cumpre a lei de bases, coisa que também parece ser inédita, pois normalmente não se cumpria a lei de bases. É evidente que, em relação às transferências, temos aqui o apoio do IVA, o que ajuda.
Mas indiscutivelmente, logo à partida, verificamos que o fundo de capitalização, aqui, tem imediatamente uma resposta — ainda não no cumprimento total das disposições, mas tem uma resposta —, que já não se verificava desde 2003. E é importante recordar essa realidade. Mais uma vez, há aqui um esforço real e uma res-

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posta adequada às dificuldades que Portugal efectivamente tem, uma resposta pública dada pelo Estado a essas necessidades.
Este orçamento contempla ainda o rendimento social de inserção, o complemento solidário para idosos e as redes de equipamentos sociais. Efectivamente, temos tido neste processo preocupações sociais claras e, mais uma vez, credíveis para poder satisfazer as necessidades públicas.

Risos do PCP.

São cinco vezes, Sr. Deputado! E serão mais, porque há aqui algumas verdades que têm de ser ditas.
Aliás, a este propósito, não posso deixar passar o que, ainda há pouco, o Sr. Deputado Adão Silva aqui disse, que resulta quase num paradoxo, pois pretende que haja mais despesas por parte do Estado, dando mais benefícios sociais, mas simultaneamente faz o discurso público de que é preciso reduzir na despesa. Não sei como é possível ter «sol na eira e chuva no nabal», é um pouco difícil podermos satisfazer esta dupla condição… Aliás, aproveito para perguntar ao Sr. Ministro como seria possível esta dupla realidade, como poderíamos seguir uma política de rigor e até de exigência de diminuição de despesa — e, efectivamente, há aqui diminuição de despesa, especialmente de funcionamento e não propriamente em relação ao executado (e, em relação ao executado, também é bom recordar que não há diminuição de despesa, ao contrário temos a capacidade de poder ir mais além, de poder responder às necessidades)… Agora, nem tudo pode ficar como dantes e o que era antes não era um bom exemplo de resposta social, com rigor e com capacidade de resposta.
Nesse sentido, este orçamento vem ao encontro das necessidades do País, das necessidades dos mais desfavorecidos — e voltamos aqui a realçar não só as disposições nas políticas de emprego como as disposições nas políticas sociais. E quando há pouco se falou nas dificuldades do PIDDAC e, eventualmente, em encontrar aqui soluções através do PARES, acho bem. Ao contrário do que alguns (e aqui tenho de me voltar para a esquerda) referem, ao dizerem «aqui d’el rei!, estes programas não são públicos e deviam sê-lo», sublinho que estes programas são para responder a necessidades dos portugueses e, obviamente, através das IPSS e não de empresas lucrativas como normalmente temos ouvido.
O fundamental é que, com controlo, rigor e, mais uma vez, com credibilidade, podemos responder a necessidades e esse é o sentido geral deste orçamento.
É com este sentimento de pertença do povo português, com esta disposição de responder às necessidades públicas com rigor e com competência, que estamos aqui a apresentar este Orçamento do Estado. Este Orçamento do Estado reflecte isso e fá-lo numa área eminentemente social. Não estamos, pura e simplesmente, a falar de uma situação de exercício de serviços ou de entrega de serviços, mas também a responder com áreas directas ao cidadão, directas aos mais pobres, distinguindo, de entre os pobres, os mais pobres e introduzindo aqui factores diferenciadores. Não são, pois, de estranhar as novas reformas, já aqui apresentadas pelo Partido Socialista e pelo Governo, que têm a ver com a própria reforma da segurança social mas que apontam claramente um desígnio, uma capacidade de resposta às necessidades do País, e que dão, outra vez aqui, credibilidade, Srs. Deputados. E é nesse sentido que importa destacar esta disposição.
Para terminar, e na medida em que há esta vontade de querer dar com uma mão e tirar com a outra, muitas vezes reduzindo a despesa, mas depois pretendendo, de alguma maneira, «dar arroz a pataco», gostaria que o Sr. Ministro me explicasse qual é a solução que se preconiza. Também a manutenção de todo este processo, a manutenção do antigamente, não responde, de maneira alguma, a qualquer resposta futura para o País.
E é neste quadro que pedia um reforço e uma clarificação por parte do Sr. Ministro.

Entretanto, assumiu a presidência, a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, ouvi com atenção a sua intervenção e começo por me congratular com o facto de o Governo, quase pela primeira vez, vir reconhecer que a situação da segurança social não é tão grave como a que foi «pintada», nomeadamente pelo Ministro das Finanças.
A segurança social tem problemas, mas não está falida, nem está próxima da falência, como se pretendeu fazer passar essa mensagem.
Passando a coisas mais concretas, e com vista à obtenção de esclarecimentos que o Sr. Ministro vem aqui prestar, no sentido de nos ajudar a compreender o orçamento que apresentou, começo por me referir às contribuições.
Se se compararem as contribuições previstas no Orçamento para 2006 com o efectivado conseguido verifica-se um aumento de 234 milhões de euros, pelo que gostaria de saber qual é a parcela que daqui resulta.
Em relação a 2007, relativamente ao aumento, gostava de saber qual é parcela que resulta dos aumentos da massa salarial, qual o aumento que está implícito e, também, qual é a parcela que resulta do combate à evasão e à fraude fiscais.

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Segunda questão: uma questão grave em Portugal são as subdeclarações das remunerações para a segurança social. De acordo com os últimos dados que constam das estatísticas da segurança social, essas subdeclarações continuam a ser extremamente grandes, atingindo níveis entre 20 a 30% não declarados para a segurança social.
Relativamente a esta questão, gostava de saber quais são as medidas concretas que o Governo vai tomar para reduzir este problema grave para a segurança social e, nomeadamente, como este controlo tem de se fazer no terreno, nas empresas, qual é o aumento previsto de inspectores da segurança social, que em 2006 nem chegavam a 200, conforme informação que foi dada na altura em que se debateu o Orçamento, já para o final de 2006 e qual é a previsão para 2007.
Outra informação que gostaria de obter é a de qual é o valor da dívida declarada no fim de 2005 e, em relação a 2006, pelo menos do último mês em que há estatísticas. Conhecer-se-ão talvez no fim do ano, mas gostaria de as conhecer relativamente ao último mês disponível.
Uma questão extremamente importante e sempre difícil para nós, até para mim que ando nisto há muitos anos, é saber de forma clara se o nível de transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social cumpre, efectivamente, o que está estabelecido na lei. O Sr. Ministro deu-nos hoje os mapas dos subsistemas, mas digo-lhe que mesmo com esses mapas é difícil ficar a saber se a lei está a ser cumprida.
Irei colocar-lhe algumas perguntas concretas, mas gostava que, de uma forma sintética e resumida, desagregasse a transferência global, que este ano corresponde apenas a um aumento de 6%, quando no ano passado foi de 14%. E não estou a dizer que é muito ou pouco, estou apenas a chamar a atenção para a diferença que eu gostava de compreender.
Gostava também de ficar a saber como é que esta transferência de cerca de 6 milhões se encontra desagregada relativamente às componentes de despesa, porque os respectivos mapas foram-nos fornecidos tardiamente, pelo que é difícil que os analisemos agora aqui. Esses mapas deveriam ter sido entregues na altura em que deu entrada o Orçamento, de forma a permitir um estudo com maior rigor e a possibilidade de se colocarem mais perguntas fundamentadas ao Sr. Ministro. Mas, repito, peço-lhe que desagregue essa transferência de uma forma que nos ajude a fazer essa comparação e a verificar se o Decreto-Lei n.º 331/2001 e a Lei de Bases da Segurança Social são, efectivamente, cumpridos.
No entanto, gostava de colocar-lhe algumas perguntas neste campo, que reputo de grande cobertura: o Governo assumiu um compromisso com os parceiros sociais para 2007 — e eu gostaria de perceber se isso está a ser cumprido — no sentido de que 65% dos encargos familiares seriam financiados com receitas fiscais. O Governo assumiu também o compromisso com os parceiros sociais de que os encargos com subsídios de desemprego, isenções e reduções das taxas contributivas, que constituem medidas activas de emprego, seriam suportados com 65% das receitas fiscais. Gostaria que o Sr. Ministro me concretizasse se tal vai ou não ser cumprido.
Desejava também, Sr. Ministro, que me dissesse — há um compromisso que foi tomado, pelo menos consta de um documento que foi distribuído pelo Governo; estive agora a olhar para esse mapa e cheguei à conclusão que isso não acontece, mas posso ter visto com pouca precisão— se a diferença entre a formação comparticipada e a não comparticipada seria suportada não por receitas da segurança social, como tem acontecido no passado, mas pelos orçamentos dos ministérios responsáveis.
Uma outra questão, que me parece importante, tem ainda a ver com este assunto: uma resposta que o Ministério do Trabalho deu a um requerimento que fizemos dizia que, em 2005, o montante dos complementos sociais atingiram 954 milhões de euros e que apenas 50% foram financiados pelo Orçamento do Estado. No entanto, acrescentava que, a partir de 2006, portanto neste Orçamento, conforme previsto na Lei do Orçamento, os componentes sociais passavam a ser financiados na sua totalidade pelo Orçamento do Estado. Gostava que o Sr. Ministro me dissesse se isto está a acontecer.
A terminar, pretendia ainda saber qual o número de beneficiários do Completo Solidário para Idosos. Qual o número potencial com mais de 80 anos e quantos estão a receber.
Por que razão se verifica em 2007 uma quebra importante nas despesas com a formação profissional? O Sr. Ministro já explicou a quebra relativamente ao rendimento social de inserção, embora, a meu ver, não seja ainda muito fundamentada, mas pretendia que me explicasse qual é a razão de quebras importantes, também no orçamentado, relativamente à acção social e ao subsídio de desemprego.
Lembro que, em relação ao subsídio de desemprego, a verba que constava do orçamento para 2006 estava suborçamentada e que o valor que se gastou foi significativamente superior.
Gostava ainda de perceber porque é que o Governo, na página 218 do Relatório, afirma que vai contratualizar com entidades privadas uma fracção do Fundo de Estabilização, quando se sabe que a entidade pública responsável por esta gestão tem rentabilidades iguais ou superiores ao sector privado. Não sei quais são os interesses que determinam que o Ministério opte por uma contratualização privada, pagando, naturalmente, custos. Isto tem custos, ninguém faz isto de borla.
Sr. Ministro, espero que responda às perguntas concretas que lhe coloquei e que não fuja a elas.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, penso que o Sr. Ministro terá todo o interesse em esclarecer todas as perguntas que lhe forem colocadas.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Srs. Secretários de Estado, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho.
Sr. Ministro, começo por agradecer a sua intervenção, que seguimos muito atentamente. Penso que foi útil, pois trouxe aqui um conjunto de elementos muito importantes para a análise que começamos agora a fazer, ainda que seja só na generalidade.
Sr. Ministro, não leve a mal — trata-se da vantagem ou desvantagem de falar em quarto lugar — que faça dois pequenos comentários a algumas coisas que foram ditas antes.
De momento, não se encontra presente o Sr. Deputado Ricardo Freitas…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Está atrás de si!

O Orador: — Melhor ainda! O Sr. Deputado Ricardo Freitas disse que, afinal, a situação é difícil. Fiquei bastante admirado, pois a última afirmação que eu tinha ouvido da parte do Governo foi a de que tinha acabado a crise, mas pelos vistos a bancada do Partido Socialista tem aqui um canal especial de informação com o Governo que consegue desdizer as afirmações de alguns ministros.
Quero também descansar o Sr. Deputado Adão Silva, que, de forma muito preocupada, disse que não havia um aumento da despesa no Ministério da Segurança social. Não se preocupe, Sr. Deputado, só com pessoal aumenta, e aumenta bem. As despesas com pessoal e com os serviços e fundos autónomos aumentam, e aumentam significativamente. Portanto, não fique muito preocupado com isso.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Aumenta onde não deve!

O Orador: — Exactamente! Sr. Ministro, gostava de questioná-lo sobre um aspecto muito focado na sua intervenção e que se prende com as verbas do subsídio de desemprego.
Temos inscrito no orçamento um crescimento da verba com o subsidio de desemprego de 2,7%, que é uma verba ainda bastante significativa. Aliás, nota-se que o Governo, quando apresenta estes números, já está aqui a fazer uma previsão até do aumento de emprego. Achei curioso verificar que as receitas com contribuições dos trabalhadores aumentam 5,8%. Isto pode significar que pode haver um combate à fraude e, significa, acima de tudo, que o Governo está a prever aqui que haja um maior número de criação de postos de emprego.
Mas há uma coisa que, sinceramente, não consigo entender, pelo que lhe pergunto concretamente o seguinte: para o ano de 2007, o Ministério prevê uma diminuição, ainda que muito pouco significativa, da taxa de desemprego, contudo uma diminuição de 0,1%, cruzando até os dados com os dados do Plano Nacional de Emprego.
O Conselho de Ministros está, neste momento, à espera que o Sr. Presidente da República promulgue o novo regime jurídico de protecção social do subsídio de desemprego. Ainda não conhecemos aprofundadamente este novo regime jurídico, mas já conhecemos um conjunto de matérias que nos têm sido apresentadas pela comunicação social e vimos, até com alguma curiosidade, um estudo apresentado pela comunicação social que apontava para uma redução, em matéria de subsídio de desemprego, de um valor de cerca de 59 milhões de euros para 2007.
Portanto, com a entrada em vigor deste novo regime jurídico do subsídio de desemprego, haveria uma diminuição na atribuição do subsídio de desemprego de cerca de 59 milhões de euros.
Antes de mais, gostava de saber se o seu Ministério confirma estes números, se confirma este quantitativo, bem como a análise que faz e a expectativa que tem relativamente à entrada em vigor do novo regime jurídico do subsídio de desemprego.
Mas, Sr. Ministro, se juntarmos estas duas variáveis, não consigo compreender este crescimento. Isto é, se, por um lado, diminui o desemprego e, por outro lado, com as novas regras, o Ministério até prevê gastar significativamente menos, não percebo como é que, ao mesmo tempo, há um crescimento das verbas do subsídio de desemprego. Ou o Governo não nos está a dizer a verdade toda, ou já está a garantir uma «almofada» financeira para o caso de as coisas correrem mal e haver um crescimento da taxa de desemprego.
Muito sinceramente, gostava que o Sr. Ministro pudesse aprofundar um pouco mais este ponto.
Uma segunda questão prende-se, como é óbvio — não poderia deixar de o referir —, com a reforma da segurança social. Esta é, aliás, uma discussão que vai prolongar-se ao longo desta semana (na próxima sexta-feira, vamos debatê-la na Comissão de Trabalho e Segurança Social), mas em sede de Orçamento do Estado ela ganha uma importância fundamental. Isso é evidente, desde logo, quando lemos o Relatório sobre a Sustentabilidade da Segurança Social.
De facto, como tenho alguma memória histórica, não posso esquecer a discussão que teve lugar em 2002, portanto, há muito pouco tempo atrás, nesta mesma Sala, sobre a actual Lei de Bases da Segurança Social.
E, na altura, dizia o Sr. Ministro, então Deputado da oposição, que, com as alterações feitas no «Livro Branco»

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e com a anterior Lei de Bases, o cenário de ruptura estava totalmente afastado, nem sequer se colocava. E mesmo as dificuldades de financiamento do sistema só surgiriam a partir da década de 30.
Já nem sequer falo das declarações do Primeiro-Ministro da altura, que afirmava que, durante 100 anos, não seria preciso mexer na segurança social… Fico-me pelas suas declarações, Sr. Ministro.
A verdade é que, a partir do momento em que este Governo iniciou funções, o discurso foi significativamente alterado e hoje, no Relatório sobre a Sustentabilidade da Segurança Social, pode ler-se que, se nada for feito, o cenário de ruptura é muito mais imediato, em 2010.
Contudo, com as alterações que foram propostas pelo Ministério na nova Lei de Bases da Segurança Social (no novo regime jurídico de que agora vamos falar), curiosamente, em 2035 entra-se de novo num cenário de ruptura, visto que as fontes de financiamento não são suficientes.
Sr. Ministro, esta é a melhor prova ou a prova mais cabal do que temos vindo a dizer até hoje, isto é, que a reforma que o Governo está a propor na área da segurança social adia o problema, não o resolve. A verdade é que, em 2035, vamos estar de novo colocados perante o mesmo problema. Essa data atinge a geração — que é a minha — de quem tem hoje trinta e poucos anos, de quem está há pouco tempo no mercado de trabalho, despertando uma grande atenção nas pessoas que iniciaram a sua vida profissional e estão a fazer os seus descontos, porque, eventualmente, quando chegarem aos 65 anos (ou ao momento da sua reforma), podem vir a não ter financiamento para as reformas.
Portanto, a única forma estrutural de alterar esta situação é fazer-se uma reforma da segurança social que seja uma verdadeira reforma, introduzindo plafonds máximos que permitam retirar da segurança social as pensões mais altas, porque todos desejamos que os salários cresçam, como é óbvio.
Por esta razão, Sr. Ministro, não posso deixar de perguntar, em sede de discussão do Orçamento do Estado, se o Governo está ou não disposto a aceitar um sistema de plafonamento, nomeadamente um sistema de plafonamento como o que o CDS prevê, com dois tectos contributivos: a partir de um tecto contributivo, haveria um desconto facultativo para o Estado ou para os privados e, a partir de um segundo tecto contributivo, existiria ou não — de acordo com a escolha do contribuinte — um desconto.
Esta é, de facto, uma questão absolutamente essencial nesta discussão.
A terceira questão que gostava de colocar-lhe prende-se com as verbas para a formação profissional.
Verificamos que há uma grande redução nas transferências do Fundo Social Europeu — em transferências directas, ocorre uma diminuição de 32%, salvo erro.
No mapa do Orçamento do Estado relativo às principais receitas e despesas da segurança social, nas acções de formação profissional assistimos a uma quebra de 13,4% e nas verbas financiadas pelo Fundo Social Europeu essa quebra atinge 6,7%. E, como sabemos, vai entrar em vigor um novo Quadro de Referência Estratégico Nacional — pelo menos, é o que todos esperamos! Infelizmente, este é um processo que está atrasado, não por responsabilidade directa do Ministério da Segurança Social… Mas a verdade é que o Governo está objectivamente atrasado neste dossier.
Curiosamente, Sr. Ministro, nos mapas que agora nos foram distribuídos, relativamente ao subsistema de protecção familiar e de políticas activas de emprego, preocupou-me um pouco o que li. Refere aí o Ministério que a receita de capital, num montante de 260 milhões de euros, advém exclusivamente da possível contratação de um empréstimo no mercado financeiro para fazer face a diferenças na remessa de verbas por parte do Fundo Social Europeu para financiamento de acções de formação profissional, tendo em vista o fecho do QCA III e o início da execução do QREN. Antes de mais, Sr. Ministro, tenho de perguntar-lhe: que empréstimo é este? Com que prazo vai ser feito? E em que condições? É que estamos a falar de uma verba muito significativa: 260 milhões de euros é, certamente, uma verba muito significativa! Por outro lado, assumindo o Governo que uma das tarefas mais importantes e fundamentais é a aposta na formação e na qualificação dos portugueses, nomeadamente através do Programa Novas Oportunidades, não vemos aqui uma consequente resposta orçamental; não vemos um crescimento do Orçamento do Estado nestes sectores que possa sustentar o discurso do Governo, Sr. Ministro.
Uma quarta questão — e estou quase a terminar — prende-se com o Complemento Solidário para Idosos (CSI). Não estão autonomizadas as verbas da segurança social que se destinam a este Complemento, por isso gostava de perguntar-lhe directamente qual é a verba específica que está adstrita ao Complemento Solidário para Idosos. Apenas encontramos a verba de «outras prestações», que tem um crescimento de 595 milhões de euros para 670 milhões de euros. Penso que poderá sair daí, mas gostava de obter uma resposta mais cabal.
Sr. Ministro, com esta descida dos 80 anos para os 70 anos e com a conhecida — ou, pelo menos, anunciada — revisão dos critérios de acesso a esta prestação, quantas pessoas é que o Ministério estima que, ao longo de 2007, possam vir a ser abrangidas por este Complemento Solidário para Idosos? Este é, para nós, um elemento muito importante porque, como sabe, Sr. Ministro, as grandes críticas que temos tecido a este Complemento prendem-se com a dificuldade do seu acesso e, pelo que vemos em termos de consagração orçamental, parece-nos que essas dificuldades podem manter-se e, até, agravar-se, uma vez que o universo de pessoas está a ser fortemente alargado.
A minha última questão prende-se com a adequação das fontes de financiamento da segurança social.

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Sr. Ministro, na concertação social, o Governo alcançou um acordo, no qual se prevê a passagem das verbas relativas ao abono de família, ao subsídio social de desemprego e às isenções do orçamento da segurança social para o Orçamento do Estado. Deixam de ser pagos através de impostos e contribuições para passarem a ser pagos apenas através de impostos, e assume o Governo que esta passagem será feita progressivamente até 2010.
Contudo, neste momento, não consigo descortinar no Orçamento do Estado uma passagem imediata em 2007. Por isso, a questão que lhe coloco é se vai haver, já em 2007, alguma passagem. Há essa possibilidade? Ou ela só será feita nos anos de 2008 e de 2009? É que, segundo sei, no acordo que o Governo estabeleceu com a segurança social, parte deste orçamento passava já, em 2007, para o Orçamento do Estado, saindo do orçamento da segurança social.
É tudo, Sr. Ministro.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, gostaria de colocar duas questões.
Segundo a nossa leitura, este é um orçamento que aposta no corte da despesa e, também, no aumento das receitas mas, curiosamente, sempre à custa dos mesmos! É igualmente um orçamento em que investimento público cai e o investimento privado também.
Consideramos que com este orçamento o País não vai melhorar, as políticas não vão melhorar e a vida das pessoas também não. E é um pouco sobre a vida das pessoas que gostaria de falar-lhe, Sr. Ministro.
A vida das pessoas não melhora exactamente por causa de uma primeira grande questão: o desemprego não diminui. Muito embora se verifique, no momento, uma redução mínima da taxa de desemprego, a verdade é que, com esta redução, a criação líquida de emprego não passará de mais 5000 novos empregos, isto num universo de 500 000 desempregados. Também sabe o Sr. Ministro que apurar o número de desempregados é sempre complicado, uma vez que se mantém a eterna contradição entre os dados do INE e os do Instituto de Emprego e Formação Profissional. Além do mais, desconfiamos muito de alguns dos dados, tendo em conta a discussão que tem havido a este propósito.
Bem sabe que muito do desemprego de longa duração (ou das pessoas que, nas últimas semanas, não passaram pelos centros de emprego) não contará para as estatísticas. Portanto, haverá sempre uma dificuldade na compreensão desta realidade.
A questão muito concreta é esta: como é que teremos aumento do emprego se o investimento caiu 1,8% no 1.º semestre e cairá 5,4% no segundo semestre? E o investimento que temos hoje é menor do que o investimento em 2001. Sem investimento, como se criarão mais empregos? O Governo mantém, com certeza, a sua promessa eleitoral de criação de 150 000 novos postos de trabalho. Mas, com este panorama de investimento, como vai ser possível fazê-lo? Como já referi, as receitas aumentam sempre à custa dos mesmos, dos mais fracos. E, ligando esta questão à do desemprego, também é verdade que as novas regras do desemprego geram uma poupança de 59 milhões de euros.
Por outro lado, também verificamos que a despesa com o desemprego aumenta neste orçamento 2,7%, enquanto que em 2006 aumentou 6,1%. Como é que se resolve este problema? Ou seja, se com as novas regras se poupa 59 milhões de euros e se está consignado um aumento de 2,7% na despesa do desemprego, a leitura que fazemos é que só há uma hipótese: o Governo prevê que o desemprego vá efectivamente aumentar.
Uma outra questão que gostaria de colocar prende-se com a formação profissional.
Não se compreende — aliás, ainda ontem vieram notícias a público relativas à formação profissional — por que fica de fora a formação profissional contínua, algo que está previsto até no Código do Trabalho.
Não dar atenção a esta formação profissional contínua significa a não aplicação de acordos celebrados entre parceiros sociais, muito embora o Governo não os tenha assumido. Além do mais, não se compreende como é que não se responsabiliza, também, a iniciativa privada na área da formação profissional. Apenas será o Governo a despender verbas para a formação profissional.
Uma outra questão muito concreta que lhe coloco, e que também foi noticiada ontem, é a seguinte: o que significa exactamente o «cheque de formação»? Que medidas vai o Governo tomar? Estas notícias relativas à formação profissional são ou não credíveis? Há um terceira questão que demonstra que a vida das pessoas vai piorar. E a vida dos pensionistas vai, efectivamente piorar.
Recordo que, no ano passado, quando discutíamos os cenários possíveis para as questões da segurança social, o Sr. Ministro respondeu a um cenário que hipoteticamente eu lançava e que correspondia à opção do Governo. O Sr. Ministro dizia: «A Sr.ª Deputada já sabe qual é o cenário pelo qual o Governo vai optar». A verdade é que o Governo optou exactamente por um cenário de baixar as pensões e de aumentar os anos de trabalho das pessoas. É disto que se trata com a nova lei relativamente às pensões e que teremos oportunidade de discutir em sede de Comissão de Trabalho e Segurança Social na próxima sexta-feira.
De qualquer forma, o Relatório sobre a Sustentabilidade da Segurança Social, anexo ao Orçamento do Estado, considera que as pensões vão efectivamente descer. Isto é, considerando as pensões com o cenário

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actual, em 2050, a pensão média seria de 908 €. Com as medidas que agora constam e que vão constar da nova lei de bases e com o novo cálculo das pensões, a pensão média será, nessa mesma altura, de 744 €. O Governo pode dizer que não baixa, que baixa o ritmo ou que não aumenta, mas esta é a realidade. Ou seja, os futuros pensionistas, que actualmente são os trabalhadores mais jovens, vão ter a sua pensão em risco.
Esta é, pois, mais uma poupança à custa dos mesmos.
As medidas previstas neste Orçamento em sede de IRS vão afectar muitas pessoas com deficiência. Como se sabe, com o Orçamento anterior durante este ano os rendimentos de trabalho e das pensões tinham deduções de 50% e de 70% respectivamente. Com este Orçamento, quer os rendimentos do trabalho quer os rendimentos das pensões vão ser todos passíveis de IRS.
As próprias deduções à colecta que estão previstas no articulado da lei não respondem e não são suficientes para este prejuízo que se estima que vá afectar 39 000 pessoas.
Também por força das novas regras nas deduções específicas em sede de IRS — como se sabe, no ano passado, com a passagem da dedução de 8383 € para 7500 €, foram afectados 850 000 pensionistas —, estima-se que com a redução que se vai verificar este ano, ou seja, de 6100 €, vão ficar abrangidos 180 000 pensionistas do regime geral e 213 000 pensionistas da Caixa Geral de Aposentações. De facto, aqui há uma poupança à custa das pessoas.
Quanto às IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social), não entendo de todo, e por isso peço uma explicação ao Sr. Ministro, o que consta da página 208 do Relatório do Orçamento do Estado relativamente a algo que já foi abordado por alguns Srs. Deputados, mas que gostaria de reafirmar, ou seja, a implementação de um novo modelo de financiamento para a rede de serviços e equipamentos sociais. Isto quer, ou não, dizer, que vai haver alteração no formato dos acordos de cooperação hoje existentes com as instituições de solidariedade social? É que as instituições também estão preocupadas com outras questões, nomeadamente com algumas valências que não decorrem apenas de políticas do seu Ministério, mas de outras políticas, nomeadamente do Ministério da Educação.
Refiro-me concretamente à questão dos ATL (Actividades de Tempos Livres) que, com as novas medidas do Ministério da Educação, podem correr o risco de terem dificuldades de funcionamento e que abrangem cerca de 100 000 crianças. Chamo a atenção do Sr. Ministro para o facto de estas instituições serem as que melhor conhecem o terreno e a interioridade. Estamos, pois, preocupados com estas situações.
A finalizar, coloco a seguinte questão: como se sente o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social quando as despesas com remunerações vão sofrer um corte de 498 milhões de euros? Como se sente o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social quando na Administração Pública a única verba que cresce é a verba dos contratos a termo, o que significa que a precarização vai aumentar também nesta área? Outras matérias ficarão para uma segunda volta. Muito obrigada.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Para responder a este conjunto vasto de perguntas sobre o Orçamento do Estado para 2007, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões que colocaram. Vou tentar responder a todas elas e depois pedirei ajuda aos Srs.
Secretários de Estado para completarem aquilo a que, eventualmente, eu não for capaz de responder.
Sobre a primeira questão que foi colocada, e posteriormente retomada por vários Srs. Deputados, acerca das transferências do Orçamento do Estado, aquilo que vos posso dizer e que podem confirmar com os mapas por subsistema é que o Governo vai cumprir rigorosa e religiosamente a Lei de Bases da Segurança Social no que toca às responsabilidades das contribuições e dos impostos ou das transferências do Orçamento do Estado. Isso é absolutamente inquestionável. Não haverá nenhum financiamento de despesas que competem à transferência do Orçamento do Estado que seja feita pelas contribuições e pelas cotizações. Nenhuma! Cumpriremos a lei integralmente. Se algum Sr. Deputado tiver dúvidas que as coloque em concreto, ou seja, que refira a que despesas e em que áreas é que esse risco pode existir.
Quanto à evolução das transferências, o Sr. Secretário de Estado explicará mais detalhadamente os respectivos valores. Sei que para alguns Srs. Deputados da oposição parece conveniente esquecer a questão da transferência do IVA, mas a transferência existe. E existe por razões concretas, que têm a ver com a situação em que o sistema da segurança social estava e, em parte, ainda está. Parece que esse é um parceiro não convidado para esta reflexão, mas ele está aqui, por opção do Governo, para resolver um desequilíbrio que foi gerado durante os anos em que o PSD e o CDS estiveram com a responsabilidade da governação, concretamente desta área.
Portanto, as transferências serão aquelas que são absolutamente necessárias para cumprir com rigor e exigência a lei de bases.
Vários Srs. Deputados, entre os quais o Sr. Deputado Adão Silva, perguntaram o que queríamos dizer com a diferenciação positiva e os acordos com as IPPS e com as outras instituições de solidariedade. Nós não temos uma visão imobilista desses acordos. Os acordos celebrados entre o Estado e as instituições de solidariedade são acordos para servir as famílias. As transferências que o Estado faz para as instituições, que aliás

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representam um volume significativo, como já aqui foi dito, pois é a terceira maior rubrica do orçamento da segurança social, destinam-se às famílias. Sendo para as famílias, é natural que o Governo tenha a preocupação de introduzir nesses acordos e na sua regulamentação um princípio da diferenciação; também é natural que elas sejam canalizadas principalmente para as famílias que mais necessitam, que nem sequer sejam neutras e que muito menos permitam qualquer selecção negativa.
Posso dizer-vos com toda a clareza que aquando da assinatura do acordo para este ano foi assinado um documento suplementar que, entre outras coisas (apoio à formação na área social), criou um compromisso entre as instituições e o Governo no sentido de, até ao final do ano, trabalharem na elaboração de um novo modelo de financiamento que não tem como objectivo reduzir a despesa pública nesta área, mas torná-la mais eficaz do ponto de vista social.
E todos nós, que conhecemos este sector, sabemos que essa eficácia não está totalmente assegurada.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Isso é verdade!

O Orador: — Não vou tão longe como ia o programa eleitoral de um partido da oposição aquando das penúltimas eleições, que defendia, salvo erro, uma mudança muito mais radical, isto é, a passagem para a subsidiação directa às famílias. Pelo menos, estava lá escrito. Depois começou a ser negociado, mas, por razões que os deuses conhecerão, nunca chegou a ser concretizado. Não vou tão longe, mas é indiscutível que é necessário valorizar mais a situação concreta das famílias nos acordos de cooperação. É isso que está inscrito e é isso que vai ser concretizado. Ou seja, tem de haver mais apoio aos que mais precisam por forma a ser socialmente mais justo e mais eficaz.
O Sr. Deputado Adão Silva também se referiu ao PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais), ao PIDDAC e da opacidade… Estamos disponíveis para fornecer toda a informação que os Srs. Deputados solicitarem, como sempre fazemos, mas tem de concordar — e o Sr. Deputado tem experiência nesta área — que o modelo de financiamento de equipamentos sociais da rede solidária que está subjacente ao PARES é muito menos opaco do que era a tradição do PIDDAC. Sabe porquê? Porque é sujeito a um concurso com regras publicitadas, claras, objectivas, com uma análise multicritérios que selecciona as instituições e as valências e depois dá o apoio público e não a discricionariedade.
Sobre a informação estamos de acordo: ela será prestada com todo o rigor. Porém, hoje já são publicadas no Diário da República todas as peças que fundamentam estas candidaturas. Ora, isto permite um escrutínio das opções públicas que é indiscutivelmente superior àquele que existia aquando dos modelos tradicionais de financiamento dos equipamentos sociais. Portanto, foi um bom passo em frente. Julgo que isso é absolutamente indiscutível.
O Sr. Deputado manifestou estranheza relativamente às verbas para as despesas de financiamento de acordos de cooperação, mas o Sr. Secretário de Estado esclarecerá com mais detalhe os números. No entanto, há algo que, desde já, tenho de precisar. É que, infelizmente, não estamos a assistir a um crescimento significativo de instituições que chegam à segurança social a dizer: «Olhe, o meu equipamento acabou.
Vamos lá negociar o acordo de cooperação!» Sabe porquê? Porque os únicos equipamentos que estão a ser concluídos são aqueles que eram financiados pelo Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social (POEFDS), visto que o PIDDAC esteve congelado uma série de anos.
E, infelizmente para mim – não posso negar que, neste aspecto, tenho um resultado financeiro interessante –, o tempo de concretização do PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais) não vai ainda gerar despesa corrente no ano de 2007, porque as candidaturas foram aprovadas agora, vão ser contratualizadas, há as obras que têm de ser feitas, etc., porque é o que decorre da lei.
Obviamente, temos responsabilidades nos valores que propomos e sabemos que as fontes de financiamento que alimentam este importante programa de equipamentos sociais vão ser também canalizadas para as despesas de funcionamento, porque não vamos expandir eternamente a rede de equipamentos. Temos um programa de expansão ambicioso, mais será necessário fazer no futuro, mas há uma parte dessas verbas devidamente estruturadas, do ponto de vista da sua utilização, que passarão a estar disponíveis para financiar as despesas correntes dessa instituição. Não há, aqui, qualquer opacidade, mas, sim, uma utilização que, julgo, ser muito racional dos recursos.
Relativamente ao Complemento Solidário para Idosos, gostaria de dizer que o Sr. Deputado Adão Silva tem uma interpretação do que está diluído na cabeça dos portugueses e eu tenho uma interpretação do que está escrito no Programa do Governo. Ora, no Programa do Governo dizia-se que este iria ser cumprido durante toda a Legislatura. Está lá, preto no branco, não oferece dúvidas!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas não era isso que se dizia!

O Orador: — Era isso que se dizia! Eu sempre o disse e por muitas vezes! Aliás, seria absolutamente impensável que fosse de outra forma, porque todos os programas com esta ambição não nascem com o estalar dos dedos; se nascessem, já tinham sido criados há muito tempo.

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O que lhe posso dizer é que estamos obviamente empenhados e tranquilos, pois cremos que vamos cumprir os objectivos do Complemento Solidário para Idosos.
Este Complemento, por outro lado, já hoje está a pagar uma prestação, em média um pouco superior à que tínhamos perspectivado, a cerca de 17 000 idosos. Ainda não atingiu o valor que tínhamos ambicionado para este escalão etário, mas a verdade é que o ritmo de aprovação destas candidaturas supera largamente o mesmo ritmo relativamente a programas similares, ou seja, programas submetidos a condição de recursos.
Nós temos praticamente 9 ou 10 meses de aplicação desta medida, pelo que se conclui que ela é concretizável, está a ser concretizada e, com esta expansão, vai aprofundar-se a sua capacidade de agir como instrumento de combate à pobreza dos idosos.
A alteração que fizemos à legislação, questão que foi abordada por vários Srs. Deputados, não altera o essencial nem o acessório das regras do Complemento Solidário para Idosos. Obviamente, houve um ponto que teve de ser alterado, como foi anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro há uns meses atrás, relativo à antecipação para este ano do escalão etário dos 70 para os 80 anos.
Depois, há uma ou outra precisão, uma delas sugerida pela bancada do CDS — não tenho qualquer problema em reconhecê-lo — num anterior debate, de acordo com a qual se inverte o ónus da apresentação de informação. Ou seja, sempre que a segurança social tem informação, é ela que a deve incluir nos processos de candidatura e só em casos excepcionais é que, por ausência de informação… É evidente que já tínhamos essa prática, mas o que estava na lei permitia uma interpretação diversa e não temos qualquer problema em corrigir o que julgamos ser adequado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas, na altura, isso foi negado pelo Sr. Primeiro-Ministro, que disse que não era verdade!

O Orador: — E eu volto a dizê-lo! O Sr. Deputado, aliás, pode confirmar isso com toda a facilidade. Do ponto de vista prático, já era assim que os serviços procediam. Todavia, também é vantajoso que o direito seja reconhecido dessa forma.
Passo, agora, à questão global colocada pelo Sr. Deputado Ricardo Freitas, procurando saber como é possível conciliarmos, numa área tão crítica e exigente como esta, a contenção e a eficácia das políticas sociais. Penso que num debate desta natureza, que podemos aprofundar noutras ocasiões, há uma realidade que temos de ter presente, e estão aqui Deputados de duas Comissões, mas, em particular, os que pertencem à Comissão de Trabalho, que têm uma particular sensibilidade para este tema.
De facto, se olharmos para as comparações internacionais, se olharmos para o papel das nossas transferências sociais na diminuição das desigualdades e na capacidade de erradicação da pobreza, verificamos que temos ainda um sistema menos eficaz do que outros países da União Europeia — aliás, temos um dos sistemas menos eficazes. E isto põe em causa a eficácia redistributiva do nosso sistema de protecção social, porque temos despesas sociais, em percentagem do PIB, equiparadas às desses países. Isto é, não se trata aqui do montante global em percentagem do PIB, mas, sim, da forma como essas transferências são aplicadas.
Há que, sem pôr em causa o princípio da universalidade nas prestações estruturantes de qualquer sistema de protecção social, aprofundar cada vez mais a eficácia social das transferências dos impostos dos cidadãos para as prestações destinadas à correcção das assimetrias e ao reforço da coesão. Esta é uma linha fundamental e, julgo, é ela que estrutura a resposta estratégica à questão que colocou e que é, obviamente, importante, procurando saber como é que conciliamos a necessidade de rigor com a necessidade de aumentar a eficácia social das políticas sociais.
O Sr. Deputado Eugénio Rosa colocou várias questões, começando, contudo, por se referir ao aumento das contribuições.
Ora, a estimativa que fazemos para o aumento das contribuições é baseada em dois tipos de construções: uma, de natureza mais objectiva, relacionada com a previsão conhecida do crescimento da massa salarial e do emprego e que, por si só, nada mudando, dará a taxa de crescimento das contribuições; e, depois, a partir da experiência acumulada e do que foram os resultados deste ano, por exemplo, introduziremos um factor de aumento da eficiência contributiva, que é tanto relativo à recolha das contribuições como à recuperação da dívida.
Na verdade, estes valores são muito fáceis de calcular e mantêm o que foi o resultado do aumento das contribuições deste ano.
Se nós colocámos um crescimento das contribuições superior a esse produto de massa salarial e emprego, foi porque conseguimos, ao longo deste ano, um aumento de eficiência contributiva significativa e por isso estamos com taxas de crescimento das contribuições próximas ou mesmo superiores às que estão previstas para o ano seguinte, o que deve ser comparado com as taxas de crescimento de 3%, que existiam quando este Governo tomou posse.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O Sr. Ministro não respondeu à questão que lhe coloquei, procurando saber qual era o aumento implícito. É que deu uma volta tão grande que…

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O Orador: — Se o Sr. Deputado, que tem uma tão conhecida apetência pelos números, olhar para os dados que estão no Orçamento, facilmente chegará a esse resultado.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Se é assim tão fácil, responda!

O Orador: — Mas eu não acabei a resposta, Sr. Deputado! Tenha calma!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Peço desculpa, mas não pode haver diálogo! Deixem o Sr. Ministro acabar de responder e depois, na segunda ronda, poderão reforçar as questões que entenderem.

O Orador: — Tenha calma, Sr. Deputado! Quando acabarmos a nossa resposta, verá se está esclarecido ou não.
O Sr. Deputado apresentou um cálculo, que não subscrevo, porque não o conheço nem aos seus fundamentos, sobre o peso da subdeclaração, mas, obviamente, sabemos que ela existe e que é importante. Aliás, na minha intervenção inicial apresentei um dos principais instrumentos para o combate à subdeclaração. Na verdade, a partir de 2007 passará a existir um instrumento de controlo das contribuições, as declarações oficiosas. Ou seja, se uma empresa, de um mês para outro, tem uma alteração inexplicável na sua declaração de remunerações, haverá, da parte da Administração Pública, a presunção de que isso corresponde a uma…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — E se eles não declaram desde o início?!

O Orador: — Ó Sr. Deputado…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Ficou sem palavras?!

O Orador: — O Sr. Deputado até pode perguntar qual a minha opinião sobre o Big Bang, mas… Pronto! Se uma empresa não declarar desde o início, é óbvio que há serviços de inspecção que têm de agir e o que lhe posso dizer, face a uma questão concreta que colocou, é que temos neste momento 300 técnicos a trabalhar no domínio da inspecção da segurança social e que reforçámos recentemente, com transferências de outros serviços, em 43 esse número de técnicos. Dirá o Sr. Deputado que é pouco, mas é um reforço considerável dessa dotação.
Já agora, para não deixar qualquer dúvida sobre esta questão da taxa, o que consideramos neste valor de 5,75 é que cerca de 1,5 corresponde ao aumento da eficiência contributiva e o resto ao crescimento normal da evolução salarial e do emprego.
Sobre a questão da lei de bases, mantenho o que disse, ou seja, que a responsabilidade relativa das transferências do Orçamento do Estado e das contribuições será completamente garantida, terminando, de facto, a fase de transição, como se assume no Orçamento, relativamente aos complementos sociais.
Gostaria ainda de dizer, o que serve para responder a muitas questões dos Srs. Deputados, que os compromissos assumidos no domínio da concertação social, que não estão ainda traduzidos em lei — o que quer dizer que muitos não poderão ser ainda aplicados em 2007 por falta de enquadramento legal —, e que os compromissos no que toca ao aperfeiçoamento da adequação selectiva estão fixados para 2009. Mas, obviamente, a transferência que o Orçamento do Estado está a fazer neste momento para o sistema de segurança social excede claramente a progressão necessária para atingir em 2009 esse compromisso de ter uma nova lógica de repartição de financiamentos.
Os Srs. Deputados esquecem-no, mas está a haver uma transferência excepcional do IVA — que, aliás, termina em 2009 — que é mais do que suficiente para cobrir esse acréscimo da responsabilidade do Orçamento do Estado. Portanto, não há aqui qualquer subfinanciamento no Orçamento do Estado, ao contrário, se quisermos, até está a haver um sobrefinanciamento através da transferência excepcional do IVA. Portanto, as coisas são absolutamente claras desse ponto de vista.
O Sr. Secretário de Estado falará a seguir sobre as questões da formação profissional ou, pelo menos, sobre algumas delas.
Mais uma vez — esta é uma questão recorrente — a bancada do PCP vem com a questão da contratualização de parte do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social em termos de gestão privada. Eu apenas posso responder da mesma forma que tenho respondido das outras vezes: quer os Srs. Deputados gostem quer não, os resultados que são obtidos pelo Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social e pelo Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social são-no pela aplicação dos seus recursos numa carteira diversa no mercado de capitais, respeitando a lei.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — A pergunta não é essa!

O Orador: — Sr. Deputado, permita-me que termine a minha explicação.

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O Sr. Deputado acha que…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Eu não disse isso!

O Orador: — … a aplicação no mercado de capitais do excedente da segurança social — que, felizmente, existe — feita por uma instituição pública é perfeitamente legítima, mas, depois, acha que, se essa mesma instituição atribuir a uma entidade privada uma tranche desse Fundo,…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Pagando!

O Orador: — … se ela lhe garantir uma vantagem do ponto de vista de resultados, se está aqui a beneficiar o capital financeiro… Ó Sr. Deputado, essa afirmação que os Srs. Deputados vão continuar a fazer ad aeternum carece completamente de sentido.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Ó Sr. Ministro!

O Orador: — O que os Srs. Deputados poderão questionar, quando e se essas operações forem feitas, é se os resultados forem inferiores àqueles que o Fundo de Estabilização garante. Se o Fundo de Estabilização, através dessa contratualização, garantir melhores resultados, por que é que não o há-de fazer? Por que é que pode escolher as instituições e os papéis que compra e não subcontratar uma instituição especializada para o fazer, se ela lhe garantir melhores resultados? Isto é uma coisa completamente absurda! Negar esta possibilidade é negar a boa utilização dos recursos públicos.
Peço desculpa, Sr.as e Srs. Deputados, mas sobre esta questão mais não digo,…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não se exalte! Não se exalte!

O Orador: — … porque penso que ela está completamente esclarecida e os preconceitos ideológicos não devem, a meu ver, alimentar o debate nestas questões.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O preconceito é seu! É uma questão de racionalidade!

O Orador: — Sobre as questões da evolução da taxa de desemprego e das alterações ao subsídio de desemprego, que foram levantadas por vários Srs. Deputados, quero dizer o seguinte: Em primeiro lugar, todos os Srs. Deputados sabem que existe aqui uma diferença entre taxa de desemprego e subsídios de desemprego. Ninguém pode fazer uma correlação absolutamente directa e estatisticamente à «prova de bala» entre taxa de desemprego e subsídios de desemprego. Como sabem, a taxa de desemprego mede uma realidade diferente da daqueles desempregados que estão a receber subsídio de desemprego.
São duas variáveis, que têm uma forte correlação, mas são exactamente a mesma coisa.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que não foi da responsabilidade do Governo e, portanto, não subscrevo qualquer estimativa como aquela que os Srs. Deputados citaram dos 59 milhões de poupança no subsídio de desemprego. Portanto, se alguém a fez, alguém que assuma essa responsabilidade. Não foi o Governo, que não partilha dessa análise. Sinceramente não sei quem a fez, admito que tenha sido um qualquer suplemento de um qualquer jornal económico, mas, desse ponto de vista, não é subscrita pelo Governo.
Aquilo que pretendemos com a nova legislação do desemprego, e que, aliás, obteve o acordo na concertação social de todos os parceiros sociais, à excepção de um ponto, é tornar mais eficaz os mecanismos de controlo e de combate à fraude nesta prestação. O objectivo essencial é tornar o subsídio de desemprego um instrumento que permita o regresso ao mercado de trabalho e não a eternização da sua atribuição. São estes os objectivos, a activação dessa prestação.
Estou convencido que isso vai potenciar também melhorias ou ganhos financeiros, porque, se formos mais eficazes a combater a utilização indevida do subsídio de desemprego — e todos sabemos que ela existe —, isso tem, obviamente, reflexos no Orçamento.
Não é fácil estimar esse efeito e não é sério estar a antecipá-lo. Se o conseguirmos, depois, daremos conta do que conseguimos, porque ele precisa de uma activação, da acção de vontade. Não basta publicar a lei, porque a lei nada vai mudar se, depois, não houver da parte dos serviços da segurança social e do Instituto de Emprego a correspondente actuação no combate à utilização indevida, que eu estimo que tenha algum significado, mas não sou capaz — nem julgo que alguém seja — de estimar com rigor qual é a dimensão dessa utilização irregular.
No entanto, sabemos, por experiências concretas empíricas e por contactos com os centros de emprego, com os empresários e com os sindicatos, que existe uma margem de utilização irregular, ou seja, de acumulação de trabalho e subsídio de desemprego, que é, a meu ver, uma ferida forte nesta prestação social, que é muito sensível. Portanto, vamos trabalhar para o evitar.

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Agora, o crescimento das verbas do subsídio de desemprego tem a ver com dois aspectos, sendo que o primeiro têm a ver com um crescimento que sempre existe e que está associado à massa salarial, à rotação dos desempregados, e, portanto, se há crescimento do salário de referência, há crescimento nominal, mesmo com o mesmo número de desempregados do subsídio de desemprego.
Segundo, tem a ver também com outro aspecto importante, é que, como afirmámos e estamos empenhados em cumprir, estamos a acelerar o período de apreciação dos requerimentos para atingir os objectivos que fazem parte do Programa do Governo nesta área. E quando se apreciam os requerimentos mais rapidamente, é óbvio que há aqui um artificial crescimento da despesa. Artificial porquê? Porque essa despesa sempre se faria, mas faz-se mais rapidamente. Foi, aliás, o que aconteceu em 2006, porque, por exemplo no subsídio de desemprego, a média, entre Janeiro de 2005 e Setembro de 2006, passou de 41 dias para 31 dias. Ora, ao diminuir o tempo de atribuição do subsídio de desemprego, obviamente que há aqui, como eu disse, um crescimento artificial da despesa.
Já agora, permitam-me que passe ao Rendimento Social de Inserção, porque neste rendimento a mudança foi a passagem de 184 dias para 112 dias. Obviamente que foram apreciados muito mais casos e, sendo apreciados muitos mais casos, começaram a ser mais rapidamente atribuídas as prestações e isso fez aumentar a despesa de 2006. Ora, isto já não acontecerá com a mesma dimensão no próximo ano.
E, para completar a resposta sobre o Rendimento Social de Inserção, aquilo que consideramos é que o objectivo que está inscrito no PNAI (Plano Nacional de Acção para a Inclusão) de atingir, até 2008, 90% das famílias que beneficiam do Rendimento Social de Inserção com contratos de inserção social tem, obviamente, um impacto positivo do ponto de vista da despesa, não só porque é uma medida eficaz de combate também à utilização indevida desta prestação mas também porque a inserção substitui, muitas vezes, a necessidade da prestação por outro tipo de rendimentos, seja do trabalho, seja até de outro tipo de apoios sociais. É por isso que estamos, com segurança, a trabalhar com este valor do Rendimento Social de Inserção. E verão que o vamos atingir sem grande dificuldade.
Sobre a formação profissional gostaria apenas de referir que, obviamente, os dados têm de ser lidos em função da fase de transição dos quadros comunitários.
Esclareço que o empréstimo que está referido é um empréstimo, chamemos-lhe de tesouraria, que sempre aconteceu nos fundos comunitários — não é a primeira vez, vão encontrá-lo em muitos orçamentos do passado —, que se destina, geralmente em fases de transição entre quadros, a poder antecipar o fecho de alguns programas antes do último envio de verbas de Bruxelas ou a antecipar o lançamento de programas do no quadro comunitário antes de a primeira tranche ser enviada pela Comissão Europeia, pois, como sabem, os tempos não são sempre aqueles que desejaríamos.
Portanto, este empréstimo tem apenas essa função de tesouraria, para impedir que os beneficiários estejam muito tempo à espera do fecho dos saldos ou para fazer com que os novos programas entrem em vigor o mais rapidamente possível. Não é uma realidade nova, é algo que já aconteceu em vários momentos.
Sr. Deputado Pedro Mota Soares, teremos oportunidade de debater a reforma da segurança social, mas deixe-me que lhe responda à questão que colocou.
Em primeiro lugar, os resultados que esperamos da nossa reforma — e eles têm de ser vistos no seu todo — é que a estabilidade do sistema esteja garantida para além de 2035, porque o Fundo de Estabilização vai crescer até lá e continuará a suportar perfeitamente qualquer acréscimo de despesa durante um período mais longo.
Portanto, não há, de facto, qualquer ruptura ou défice que origine necessidades adicionais de financiamento no horizonte que é possível cenarizar. Eu sei que agora há quem esteja muito entusiasmado a dizer que cenários só a 75 anos. Provavelmente, depois veremos que será a 90 anos, depois a 120 anos e poderemos passar, com alguma facilidade, para alguns analistas, para o domínio da ficção científica…! Mas aquilo que conseguimos cenarizar é até 2050, porque é para essa data que existem dados do EUROSTAT acerca das bases demográficas, que são essenciais para cenarizar para o futuro. Não há, de facto, défice no sistema, não há ruptura, não há necessidade de financiamento adicional no horizonte que podemos prever.
Agora, Sr. Deputado, não é essa a questão fundamental. O Sr. Deputado não pode vir aqui com a candura, que simpaticamente tem, dizer que é preciso outra reforma, que tem como característica principal acelerar o processo de défice da segurança social. Não tem outra consequência no médio e no longo prazos, senão diminuir receitas, diminuir receitas, diminuir receitas. E, depois, daqui a 30 ou 35 anos, pode haver uma diminuição de despesas. Haverá decerto.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Aí o Sr. Ministro já não está preocupado, porque já não está cá!

O Orador: — O que os senhores nunca conseguiram provar é que essa diminuição de despesas que existirá daqui a 30 ou 35 anos compensa a diminuição de receitas que teremos durante esses 30 anos. Isso não conseguiram provar, simplesmente porque não é possível.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Nem, aos senhores interessa!

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O Orador: — Porque, se conseguissem provar, não o tinham apenas provado tinham-no concretizado, porque tiveram tempo e oportunidade para isso. Eu já ouvi dizer: «Ai, se eu tivesse mais 15 dias!...» Mas tiveram quase três anos. E não julgo que as remodelações governativas ponham em causa estas grandes opções que já estavam tão bem assumidas por parte da anterior maioria.
É certo que agora essa anterior maioria já tem visões diferentes, já tem dois modelos distintos, mas isso é um problema…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não fomos nós que mudámos!

O Orador: — É verdade, tem toda a razão! Não foram os senhores que mudaram, mas é por isso mesmo que o CDS se assume como um partido conservador. Não mudaram desse ponto de vista! Quando me conseguir provar, não a mim, mas aos portugueses, que essa redução de receitas tem uma consequência na solidez do sistema e, já agora, também, na solidariedade e na melhoria das prestações, então a sua proposta ganhará, por certo, mais credibilidade do que aquela que tem.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Provo com os seus números que em 2035 o sistema entra em rotura.

O Orador: — O Sr. Deputado não quis ouvir o que eu disse, mas o problema é seu; não é meu! O Fundo de Estabilização Financeira, nessa altura, terá uma dimensão muito maior do que tem agora e terá capacidade para alimentar todos os problemas que possam existir no sistema – aliás, é para isso que ele existe e é para isso que foi criado.
Já estou a abusar um pouco do vosso tempo, mas gostaria, também, de me referir à intervenção da Sr.ª Deputada Mariana Aiveca relativamente a algumas questões essenciais que têm a ver com o emprego.
Sr.ª Deputada, nós temos de ter um pouco mais de cuidado, todos nós – eu procuro ter – quando tentamos traduzir as nossas convicções em números, porque os números têm o seu peso. O facto de a Sr.ª Deputada dizer que aquilo que o Governo prevê, na sua cenarização, é que haja uma criação líquida de 5000 postos de trabalho é, pura e simplesmente, falso! É, pura e simplesmente, errado! A Sr.ª Deputada está apenas a pensar no desemprego e não no emprego, ou seja fala do emprego a pensar no desemprego…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não é verdade!

O Orador: — Sr. Deputada, houve criação líquida de postos de trabalho no último ano. Não houve? Não houve mais de 48 000 postos de trabalho líquidos criados? E ainda assim, infelizmente, a queda da taxa de desemprego não foi da mesma ordem de grandeza, porque – e a Sr.ª Deputada sabe – há aquela velha afirmação de que isto é como a Terra, a economia move-se, e, portanto, há novos trabalhadores a entrarem no mercado de trabalho, a população activa cresce e ao crescer essa população activa é possível – e foi o que aconteceu no último ano – que haja crescimento líquido de postos de trabalho até com algum significado e isso não ser suficiente para diminuir drasticamente a taxa de desemprego.
Agora, o que a Sr.ª Deputada não pode dizer é que se criaram 5000 postos de trabalho, porque isso não é, pura e simplesmente, verdade! E a verdade aqui ajuda a todos.
Eu reconheço a realidade conforme nós a apresentamos e duvido que a Sr.ª Deputada a conteste – aliás, a Sr.ª Deputada até a crítica, dizendo que nós apresentamos uma taxa de desemprego que praticamente não desce. Bom, é verdade! Nós não dizemos que este ano o Governo tem a previsão de uma inversão drástica da taxa de desemprego; admitimos uma diminuição ligeira, o que não é a mesma coisa que dizer que não há criação de postos de trabalho. E isto é muito importante, do ponto de vista da economia e do ponto de vista social, porque se não houvesse criação líquida de postos de trabalho não havia manutenção da taxa de desemprego, sendo que ela passaria era para várias décimas, um bom par de décimas, acima do que é actualmente.
E não perceber que este é um sinal positivo da economia e da sociedade é estar a fintar a realidade.
Sr.ª Deputada, eu acho que é chegado o momento de ultrapassarmos determinados… e de estarmos sempre a falar das contradições entre os números e as realidades.
Eu, para mim, quando quero falar da taxa de desemprego e da taxa de emprego utilizo a informação oficial que se rege por critérios oficiais, que são padronizados à escala internacional pela Organização Internacional do Trabalho e pela União Europeia e esses dados são dados do INE.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas também já usou dados do IEFP.

O Orador: — Foi o que eu disse! Não me recuso a comentar outros indicadores, mas para outras variáveis.
Para a taxa de desemprego e para a taxa de emprego eu falo dos dados oficiais.
Os Srs. Deputados, nomeadamente do BE, podem discordar das normas que são fixadas internacionalmente, podem dizer que elas sobrevalorizam o desemprego, ou subvalorizam o desemprego, podem até fazer

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uma proposta de alteração das regras, estão no seu direito, agora estas são as regras que nos comparam com o resto do mundo e que nos comparam este ano com o ano anterior e com o ano a seguir. Portanto, são estas regras que temos de utilizar; tudo o mais é demagogia!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — A realidade é demagogia?

O Orador: — Os senhores dizem: «bom, está bem a taxa é essa mas há outras realidades». Pois. há outras realidades, sempre houve outras realidades, sempre tivemos de levá-las em consideração; agora, o discurso do «sim, mas…» é um discurso que pode ter algum impacto mas não tem muita realidade.
A Sr.ª Deputada vem dizer que nós abdicamos da formação contínua. Mas onde é que a Sr.ª Deputada ouviu isso? A Sr.ª Deputada tem de distinguir entre as coisas que alguém diz que o Governo pensa daquilo que o Governo pensa ou que propõe. E o Governo não propõe nem pensa diminuir o investimento na formação contínua; bem pelo contrário, foi este Governo que fez aqui um desafio à sociedade portuguesa e a si próprio no sentido de envolver, em processos de requalificação, um milhão de activos. Isso não e formação contínua? Então, o que é que é formação contínua? Nós propusemos uma metodologia, temos metas e recursos financeiros, decidimos alterar a estrutura do novo quadro comunitário, do ponto de vista financeiro, para viabilizar esse objectivo e a Sr.ª Deputada diz que não apostamos na formação contínua? Sr.ª Deputada, não sei onde recolheu essa informação, mas não foi em bom sítio ou, pelo menos, não era muito credível essa sua informação.
Depois, acerca do cheque formação, teremos oportunidade de discutir isso, mas, obviamente, que o Governo tem um grande objectivo, que, suponho, poucos ou nenhuns nesta Casa deixarão de subscrever: é que a formação profissional seja, cada vez mais, ditada pela procura e menos pela oferta. Ou seja, a formação profissional deve ser determinada por quem dela necessita, pessoas e empresas, e não pelas estruturas que estão montadas, muitas delas bem montadas, em cima da estrutura de financiamento.
É este o nosso grande objectivo e o cheque formação faz parte dessa dimensão, faz parte de atribuir às pessoas uma capacidade para determinar que tipo de formação que se faz.
Sobre as IPSS já respondi e, aliás, não estava à espera de ver a Sr.ª Deputada ser uma advogada tão convicta da bondade, sem mácula, deste modelo de financiamento das instituições de solidariedade, mas, pronto, estamos sempre a aprender.
Sobre as questões, que, não sendo da minha responsabilidade governativa, tocam áreas da minha responsabilidade, de que falou, nomeadamente sobre as pensões e sobre o benefício fiscal às pessoas com deficiência, perdoe-me que lhe diga mas penso que não é a melhor forma de escolher o que quer que seja, pegar apenas numa parte da realidade.
Por que é que a Sr.ª Deputada, à semelhança de alguns títulos dos jornais, que eu compreendo que se façam, porque são capazes de vender mais, quando fala na questão dos benefícios fiscais às pessoas com deficiência só fala da parcela, que é minoritária,…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Eu falei dos rendimentos do trabalho e dos que recebem pensões!

O Orador: — … daqueles que terão uma diferença, porque têm rendimentos elevados, e não fala na maioria que têm uma melhoria ou, pelo menos, uma manutenção dos benefícios? E por que é que não fala que está no Orçamento um cálculo de evolução da despesa fiscal com essa área que garante um crescimento global dessa despesa fiscal?

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O Sr. Ministro das Finanças não está assim tão seguro!

O Orador: — Por que é que só fala de uma parte da realidade? É essa que a preocupa? O que a preocupa é o benefício fiscal das componentes com rendimentos mais elevados? Bom, não espera essa afirmação da sua parte…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Ó Sr. Ministro…

O Orador: — Sr.ª Deputada, não fique nervosa, vai ter tempo de responder à minha intervenção.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Eu estou muito calma!

O Orador: — Sr.ª Deputada, sobre a questão das pensões, o Governo assume, com toda a clareza, a posição que apresentou, que é de evolução do nosso sistema de pensões, que garante essas mesmas pensões com níveis de relação entre o rendimento dos futuros pensionistas e a riqueza do país e os salários dos portugueses que evoluirão no sentido de se aproximarem da média europeia, de forma lenta mas progressiva, e pensa, com sinceridade, que essa é a única forma séria de tratar este problema.
Por outro lado, os senhores acham que este problema se resolve mantendo tudo como está e ir acrescentando carga fiscal, mais carga fiscal, mais carga fiscal…

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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não é nada disso!

O Orador: — É. Sr.ª Deputada, essa não é uma resposta séria para o problema, nem é uma resposta exequível e, portanto, a Sr.ª Deputada poderá fazer as declarações que entender – tem todo o direito – e assacar ao Governo o cenário que entender, mas ele não é o nosso é outro; é a sua visão da realidade, mas não é isso que serve os interesses dos futuros pensionistas e daqueles que esperam que a Segurança Social continue a estar presente quando eles necessitam.
Sr.ª Presidente, solicito, agora, que os Srs. Secretários de Estado possam completar a minha intervenção.

O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Pedro Marques): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, pretendo, apenas, dar dois ou três esclarecimentos adicionais.
Relativamente à questão das transferências para a Acção Social e ao cumprimento dessas transferências, previsto na lei de bases, aquilo que está no Orçamento para 2007 cumpre integralmente a actual lei de bases e o Decreto-Lei n.º 331/2001, que estabelece as modalidades de financiamento, e o aumento extraordinário do IVA e a canalização de metade dessa receita para a Segurança Social não está a ser utilizada, como o Governo sempre disse que não seria, para o cumprimento da lei de bases; é uma transferência adicional, nomeadamente para fazer face às dificuldades do regime contributivo. É isso que está em causa. Ela entra pelo regime tripartido nos moldes da actual lei de bases, pelo que é necessário que isto fique claro.
Sobre a divisão das transferências por subsistemas, ela consta no documento que vos foi distribuído, montante a montante, e está perfeitamente desagregada por subsistemas, pelo que eu não vou ler os números, pois, repito, eles estão no documento que vos foi entregue e não valerá muito a pena estar aqui ler os números, um a um, mas garantimos integralmente o financiamento por Orçamento do Estado a 100% do Subsistema de Acção Social e de Solidariedade onde eles têm de ser financiados, que não nomeadamente pelos jogos sociais, e todas as outras matérias é Orçamento do Estado. Os 50% de financiamento, nomeadamente do subsistema tripartido, isso está perfeitamente garantido nesta lei de bases.
Está também garantido – respondendo e precisando agora outra questão – que a contrapartida nacional do novo quadro comunitário, o chamado QREN, será integralmente financiada por Orçamento do Estado – aliás, há uma disposição na lei do Orçamento do Estado, artigo 42.º, n.º 1 nesse sentido –, por forma a que seja integralmente financiado por transferência do Orçamento do Estado e foi esse o compromisso assumido, na contrapartida do FSE, em sede de Concertação Social ao qual daremos já cumprimento neste Orçamento do Estado.
Quanto ao acrescentar das componentes de financiamento a caminho dos 100% de financiamento de algumas rubricas aqui referidas, vale a pena reiterar aquilo que o Sr. Ministro já disse sobre o financiamento através do IVA, que garante muito mais do que os 65%, e o financiamento gradual que aqui foi referido, mas a nova lei de bases e, depois, a sua concretização, do ponto de vista da regulamentação, estabelecerá os termos concretos dessa transição. Porém, estamos integralmente a cumprir a actual lei de bases, o actual regime de financiamento e os compromissos assumidos na concertação social.
Sobre o financiamento da acção social e o crescimento das suas verbas, vale a pena dizer que o Sr. Ministro já referiu também na intervenção inicial que o crescimento efectivo das despesas com a acção social é da ordem dos 5%.
Os 2,2% somam, digamos, uma realidade que teve que ver com um crescimento muito mais significativo que ocorreu este ano em vários programas financiados pelos jogos sociais, naturalmente no ano em que a alteração do decreto-lei dos jogos permitiu esse crescimento e em que fizemos uma integração de saldos com algum significado para financiar programas que estavam a ficar com problemas, nomeadamente o Programa Ser Criança e o Programa de Idosos em Lar (PILAR). São todos programas em que podemos aproveitar saldos existentes (no próprio Euromilhões pode fazer-se isso), logicamente que depois, em anos seguintes, esses saldos já estão utilizados o que se repercute num crescimento menor das verbas.
Mas o crescimento da acção social global, excepto nestas rubricas, anda na ordem dos 5% e o orçamento decorrente da cooperação cresce 6,9% — queria dar-lhe esta nota sobre esta matéria.
Os mapas que hoje vos distribuímos também já permitem uma análise muito mais refinada sobre este assunto.
Igualmente com toda a transparência, o PIDDAC do chamado programa de equipamentos sociais tem um valor global, para 2007, na ordem dos 32 milhões de euros, o qual teve, comparativamente, execuções entre os 17 e os 17,8 milhões de euros em 2004 e 2005, como julgo que saberá.
Portanto, apesar de haver uma contenção global indubitável no PIDDAC face às previsões iniciais deste ano, em relação às execuções efectivas do PIDDAC de 2004 e de 2005, a nossa componente de equipamentos sociais continua a ter um crescimento significativo, nomeadamente porque estamos a intensificar significativamente, no ano em curso e fá-lo-emos também no próximo ano, a utilização dos fundos comunitários afectos a esta área, o que, como sabem, tem igualmente repercussão em PIDDAC no que respeita a própria contrapartida nacional. E aí queremos fazer o melhor aproveitamento possível dos fundos comunitários, porque, como o Sr. Ministro já disse, eles foram os responsáveis, até ao lançamento do Programa de Alargamento da

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Rede de Equipamentos Sociais (PARES), pelas novas possibilidades de alargamento da rede de equipamentos, logo, asseguraremos a execução global destas verbas, ou seja, este crescimento de que aqui falei.
Também sobre o Programa PARES, com toda a transparência, quanto às verbas para investimento em equipamentos sociais previstas para 2007 (necessariamente, não estamos a falar ainda de funcionamento nessa fase), prevemos executar, no próximo ano, cerca de 53,4 milhões de euros.
Portanto, das verbas concursadas o apoio público a executar durante o próximo ano, nesta fase, e, depois, dependerá um pouco da evolução das obras, mas a nossa previsão em face das candidaturas agora aprovadas, ou a aprovar e da nova fase a lançar, ronda os 53 milhões de euros no próximo ano.
A última referência é sobre uma previsão orçamental concreta que os mapas que agora têm ao vosso dispor já permite clarificar, mas que refiro desde já: nas verbas para o Complemento Solidário para Idosos, no ano em curso, temos uma previsão orçamental de 35 milhões de euros e um crescimento para 90 milhões de euros no próximo ano.
Portanto, quando falámos no Orçamento, dizendo que dava prioridade clara ao combate à pobreza, que afectava recursos ao combate à pobreza, é também disto que estamos a falar, é de 55 milhões de euros de crescimento da despesa para o combate à pobreza dos idosos no próximo ano neste Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação (Idália Moniz): — Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho e Segurança Social, Srs. Deputados: Entendo, ou melhor, registo o comentário da Sr.ª Deputada Mariana Aiveca acerca da preocupação com as pessoas com deficiência e sobre o novo regime fiscal.
No entanto, não vejo essa preocupação em relação ao regime actual, nem consigo entender, muito sinceramente, que diga que o Orçamento é de rigor e de contenção sempre à custa dos mesmos e que, depois, não seja capaz de fazer uma leitura da situação que temos actualmente com as pessoas com deficiência – e passaria, em traços gerais, a tentar defini-la.
Efectivamente, temos 39 000 pessoas que vão ser afectadas com esta medida. Muito bem. Mas não percebo, uma vez mais, por que é que não se refere que cerca de 135 000 pessoas ganham ou mantêm os benefícios que tinham até agora e que, dentro dessas 135 000 pessoas, 43 565 tinham benefícios quase inexistentes. E quem eram essas pessoas? Eram os dependentes com deficiência e sem rendimentos: qualquer família que tivesse um dependente a cargo abatia à colecta apenas 20% do salário mínimo nacional (77,18 €), agora passa a deduzir à colecta um salário mínimo nacional, sendo que temos aqui um aumento de 501%.
Além das pessoas que referi, quem é que destas 46 565 tinha benefícios quase inexistentes? Aquelas pessoas com deficiência que integravam um agregado familiar, mas que não geravam rendimentos de trabalho, situação de uma completa injustiça. Imagine um agregado familiar onde existe um sujeito, que tem a sua família, que tem filhos, que tem o seu companheiro, o seu cônjuge, mas que não gera rendimentos de trabalho, esse sujeito tinha uma dedução à colecta quase inexistente e essa medida é de uma injustiça muito grande.
Quem é que não tinha qualquer benefício também? Os sujeitos com rendimentos prediais. Pode parecer, à partida, pouco relevante, mas imagine uma pessoa com deficiência cujo ascendente decide fazer-lhe uma doação ou deixar-lhe uma herança que se pode constituir como um qualquer imóvel. Quem tivesse rendimentos prediais não tinha qualquer dedução.
Portanto, as pessoas que estão nessa situação são efectivamente 43 565.
Posso dizer-lhe que com as mudanças que propomos ganham cerca de 99 000 pessoas, mantêm cerca de 35 000 e, efectivamente, perdem cerca de 39 000, mas convém falarmos de quem vai beneficiar, de quem vai manter e das injustiças que existiam até aqui.
Contudo, gostaria ainda, de forma muito breve, de poder caracterizar-lhe os rendimentos do trabalho.
Da totalidade das pessoas com deficiência que entregaram declarações com rendimentos da categoria H (pensões) cerca de 48% tem um rendimento mensal igual ou superior a oito salários mínimos, isto é, cerca de 3087 €. E mais: destas pessoas com deficiência com maiores rendimentos, aquelas que têm rendimentos médios iguais ou superiores a 15 salários mínimos nacionais mensais, isto é, 9100 €, são em número muito significativo.
Sim, Sr.ª Deputada, temos esta caracterização toda feita.
E das pessoas com rendimentos da categoria A (rendimentos do trabalho) que entregam declarações de rendimentos cerca de 53% têm um rendimento mensal igual ou superior a oito salários mínimos, portanto, a 3087,20 €.
Portanto, temos de conhecer bem esta realidade e admitir que agora mais pessoas têm benefícios, que nunca tiveram, e que outras pessoas vão ter os seus benefícios aumentados.
Acresce também que ainda existem as deduções à colecta de 30% sobre as despesas de educação ou reabilitação e de 25% sobre os prémios dos seguros de vida.
Acresce ainda que estamos a rever um despacho de 1999, que prevê IVA reduzido para um conjunto de ajudas técnicas, e temos estado a trabalhá-lo com as organizações representativas e prestadoras de serviços.
Acresce também que são anuladas as diferenças progressivas da incapacidade – deixam de existir os dois patamares dos 60% e dos 80%, passando a ser considerado o grau de incapacidade igual ou superior a 60%

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– e que a partir do próximo ano só aceitaremos como prova do grau de incapacidade o atestado de incapacidade multiusos. Até agora, quaisquer documentos eram passíveis de ser aceites pelos serviços, a partir do próximo Orçamento apenas será aceite o atestado de incapacidade multiusos.
Portanto, Sr.ª Deputada, espero ter respondido às suas inquietações e agradeço a questão que formulou.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, permita-me solicitar um ponto de ordem à mesa.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, já registei que está preocupado com o tempo, mas…

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Não é possível que, tendo sido dados 10 minutos a mais para a intervenção, haja ainda uma outra intervenção…

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, deixe-me responder.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Faça favor.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado estão cá para esclarecer todas as questões que os Srs. Deputados puseram relativamente ao Orçamento do Estado.
A metodologia utilizada ontem foi a seguinte: na segunda ronda, o tempo que a equipa utilizou a mais foi distribuído pelos grupos parlamentares, para haver equilíbrio na utilização dos tempos, mas o objectivo é que todos nós sejamos esclarecidos dentro dos tempos disponíveis.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Com certeza, Sr.ª Vice-Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Portanto, na segunda ronda vamos dar 7 minutos a cada Deputado.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Acho muito bem, no mínimo 7 minutos e alguma tolerância também, como tem havido,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Já houve tolerância da primeira vez.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — … porque, tal como os Srs. Membros do Governo estão aqui para prestar esclarecimentos, os Srs. Deputados estão aqui para colocar as questões relevantes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Claro. Sr. Deputado, esteja certo que estou atenta no sentido de haver equilíbrio, mas também penso que estamos aqui para ouvir as respostas da equipa governamental.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — E para colocar as questões.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Exactamente, mas vamos equilibrar os tempos.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra, para mais um ponto de ordem à mesa.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, coloquei oito questões e o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado não responderam…

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, inscrevo-o na segunda ronda.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Contudo, chamo à atenção que o Sr. Ministro não respondeu às perguntas concretas: respondeu a duas, reconheço, mas coloquei oito, pelo que não respondeu a seis.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Ministro regista já esta sua observação.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional quer completar as respostas ou fica para a segunda ronda?

O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional (Fernando Medina): — Sr.ª Presidente, pretendo intervir agora.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Então, tem a palavra Sr. Secretário de Estado.

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O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional: — Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho e Segurança Social, Srs. Deputados: Vou responder, de forma muito telegráfica, às questões colocadas no âmbito da formação profissional.
A diminuição que aparece nos mapas do Orçamento do Estado relativamente a esta área refere-se unicamente às transferências da União Europeia. Esta é uma ocorrência perfeitamente normal, previsível, programada de transferências de quadro comunitário e tem que ver até com o que foi acordado com a União Europeia na altura, na negociação do quadro, por isso, o ano de transição é aquele em que se recebe menos.
Mas esta diminuição das verbas de transferências comunitárias é compensada com um significativo reforço das verbas nacionais adstritas a estas prioridades, que estão nas transferências correntes, nomeadamente ao nível do Instituto do Emprego e Formação Profissional com 5,75% de aumento. E temos também, se prepararem, julgo que na página 212 do Relatório, um aumento do orçamento disponível no Instituto do Emprego e Formação Profissional — incluindo Instituto do Emprego e Formação Profissional e Programa Operacional de Emprego e Formação Profissional — de 7,2%.
Respondendo à preocupação política dos Srs. Deputados, que julgo que se prende não com as verbas mas com a execução, penso que este reforço das verbas nacionais, em simultâneo com uma reafectação das verbas concentrando estes recursos no essencial e eliminando os desperdícios, nos deixa confortáveis, diria mesmo bastante confortáveis, relativamente aos níveis de execução das políticas de formação profissional no próximo ano.
E esta concentração poderá levar, e levará (e darei três exemplos relativamente ao Programa Novas Oportunidades), a um acréscimo de cerca de 16% dos abrangidos nos cursos de aprendizagem; a um aumento de cerca de 18,8% nos cursos de educação e formação de jovens; e a um aumento de 97% relativamente aos cursos de educação e formação de adultos.
Por isso, estes valores – aumento das verbas nacionais, reafectação e concentração nas prioridades – deixam-nos relativamente confortáveis, ou bastante confortáveis, na execução das políticas em 2007.
Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada Mariana Aiveca sobre a formação contínua, julgo que há uma leitura ou uma percepção muito apressada relativamente ao documento que foi apresentado, pois o que se pretende é que todo o esforço de formação contínua seja um esforço que permita, e que assim seja contabilizado, uma qualificação escolar e profissional dos indivíduos. Por isso, é uma opção política de tornar relevante o investimento e o esforço em formação, nomeadamente para os indivíduos e para os trabalhadores em concreto no contexto em que estamos de profunda mudança económica e empresarial.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, pretendia fazer uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, alguns de nós já conversámos sobre isto informalmente durante o dia de ontem, mas creio que, antes que o processo de debate orçamental decorra, era importante que a Mesa da Comissão de Orçamento e Finanças encontrasse um momento, porventura à hora de almoço, para redefinir e rediscutir, em alguns termos que nunca discutiu, os aspectos de intervenção dos diversos intervenientes no processo de debate orçamental.
Portanto, sugiro à Sr.ª Vice-Presidente e aos coordenadores dos diferentes grupos da Comissão de Orçamento e Finanças que se encontre um momento, durante a hora de almoço, para encontrarmos um consenso sobre a forma de intervenção e os tempos a atribuir aos diversos intervenientes neste debate.
Faço esta sugestão e gostaria que ela se concretizasse.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito bem, Sr. Deputado, aceito a sua sugestão e podemos encontrar-nos à hora do almoço, até porque temos outro tema para discutir no âmbito do orçamento e finanças, e convém discuti-lo.
Portanto, talvez logo, no término desta audição, os coordenadores da Comissão possam ficar mais um pouco.
Vamos, agora, entrar na segunda ronda de perguntas, para podermos esclarecer as dúvidas que os Srs. Deputados tenham relativamente ao orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.
Conforme estava convencionado, peço que cada Sr. Deputado utilize apenas até 7 minutos na sua intervenção e, eventualmente, abriremos um segunda ronda. Para já, só tenho inscrições para a primeira ronda e não tenho nenhum Deputado inscrito para uma segunda ronda. Se procedermos deste modo, isso ainda é compatível com o tempo que temos até à próxima audição, que começa às 15 horas.
Tem, pois, a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Miguel Santos.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho e Segurança Social, Srs. Membros do Governo, este Orçamento do Estado para 2007 caracteriza-se pela subida da despesa do Estado em mais 2000 milhões de euros; há um aumento da carga fiscal sobre os portugueses; os pensionistas que auferem mais de 485 euros passam a pagar IRS, com a redução da dedução específica; os funcionários públicos pagam mais para a ADSE; os aposentados da função pública passam a pagar ADSE; há

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taxas de internamento na saúde; há o aumento do imposto sobre os combustíveis; há portagens nas SCUT, ao contrário daquele que tinha sido o compromisso assumido com os portugueses; há uma redução no investimento público; metade do PIDDAC é para o TGV e para transportes; há milhares de milhões de euros que o Estado vai encaixar com as privatizações; há uma dependência da receita para a correcção do défice público — uma opção errada! —; e a execução do Orçamento do Estado depende da redução de dezenas de milhares de postos de trabalho na função pública. Entretanto, o Ministro de Estado e das Finanças, perdoa à banca o IRS e o IRC devido a título de retenção na fonte por juros.
No meio de tudo isto, Sr. Ministro, como é que é possível revogar as isenções previstas, no Estatuto dos Benefícios Fiscais, para pessoas com deficiência e, sobretudo, para pessoas com deficiência igual ou superior a 60%?! A questão que coloco ao Sr. Ministro, que é Ministro da Solidariedade Social todos os dias, e Ministro do Trabalho por vezes, e tem ainda a Secretaria de Estado da Reabilitação, é a de saber se o Sr. Ministro, sequer, foi ouvido relativamente a esta opção e se, tendo sido ouvido, concordou com esta opção.
Quanto à questão do desemprego, o PSD tem denunciado, já de há alguns meses para cá, a não existência da redução do desemprego, infelizmente, para o País e para os portugueses. Mas a política que o Sr.
Ministro tem seguido — é uma opção que tem feito — é a de fazer crer aos portugueses que o desemprego está a baixar. O Sr. Ministro, com certeza, fará o que tem feito, e tem todo o direito de o fazer, e dar-me-á aquela resposta já tradicional dos dados do INE, da OIT, como, aliás, já fez aqui hoje de manhã.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Essa é tradicional?!

O Orador: — É essa que tem dado sempre! Assim como no caso dos benefícios fiscais também não respondeu, rigorosamente, a nada, ao que nos tem habituado, desvalorizando a questão colocada anteriormente por um outro grupo parlamentar e pedindo para olhar para o todo, porque, com o olhar para o todo desfaz a questão que estava a ser, legitimamente, colocada.
Bom! Mas, no caso do INE. O INE, para fundamentar as estatísticas que lança, vai buscar os dados do IEFP, e o Sr. Ministro também sabe disso.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — O quê, o quê?

O Orador: — Pondo isso à margem, Sr. Ministro, não vou cair no teatro normal que o Sr. Ministro faz quando não quer responder, mas há uma série de questões, entre as quais uma a que o Sr. Ministro nunca respondeu e que, hoje, vou colocar novamente e irei colocá-la sempre, até que o Sr. Ministro, um dia, dê resposta. E porquê? Porque as reduções do desemprego são sempre apresentadas comparando com os meses homólogos.
Mas há aqui um milagre que o Sr. Ministro ainda não explicou ou não quis explicar: se o desemprego reduz, comparando com os meses homólogos, como é que, no dia 23 de Outubro, mais uma vez, o Banco de Portugal colocou no seu site um boletim estatístico que vem comprovar mais um mês — porque tem acontecido todos os meses — de crescimento homólogo dos valores que são pagos com subsídio de desemprego?! Como é que o Sr. Ministro pode afirmar que o desemprego está a reduzir homologamente, quando o Banco de Portugal, todos os meses, apresenta crescimento homólogo dos valores que são pagos em subsídio de desemprego?! O Sr. Ministro nunca respondeu a isto! Isto é um milagre…! Ora, esta questão entronca numa outra relativa ao Orçamento do Estado, que é a do aumento de 2,7% da dotação prevista para pagamento de subsídios de desemprego em 2007, quando o mesmo Orçamento do Estado prevê a redução da taxa de desemprego para 7,5% — o FMI tem 7,6%, pelo que a diferença também não é muita.
Ou seja, o Orçamento do Estado prevê a redução da taxa de desemprego para 7,5%, o Sr. Ministro prevê um aumento da dotação para pagamentos de subsídio de desemprego de 2,7% e afirma também que existe um novo regime jurídico de acesso ao subsídio de desemprego com regras mais restritas. Aliás, há até a história do passaporte para os desempregados, que, agora, de 15 em 15 dias, terão de ir aos centros de emprego carimbar o passaporte. É uma forma de tentar apanhá-los em falso e mandá-los, outra vez, para os anulados, para se anunciar, outra vez, o decréscimo do desemprego.
Portanto, há regras mais apertadas, o desemprego está a baixar e a explicação que o Sr. Ministro já deu aqui hoje, de que há uma aceleração da análise dos pedidos de atribuição de subsídio de desemprego, não é fundamento suficiente para justificar que a despesa com subsídio de desemprego aumente sempre, sempre, e o desemprego baixe ou reduza, aliás, hoje até já ouvi aqui o termo «estabiliza», hoje, o termo já não é a «redução» é a «estabilização».
Aqui está, pois, um milagre que, se o Sr. Ministro quiser explicar hoje, explica, mas, mais tarde ou mais cedo, terá de dar esta explicação. E, quando esta política de enganar os portugueses acabar, os portugueses perceberão que a sua explicação não foi suficiente.
Quanto à questão dos funcionários públicos, o Orçamento do Estado para 2006 referia que o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social tinha, nos seus quadros, 8873 funcionários públicos. Este Orçamento do Estado para 2007 diz «zero», ou seja, não diz quantos funcionários tem, actualmente, o Ministério do Trabalho

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e da Solidariedade Social, razão pela qual, Sr. Ministro, gostávamos de saber se esse número aumentou, se baixou, se se aplica aquela regra de «saem dois, entra um», enfim, o que é que se passa relativamente a esta questão. É um mero erro ou lacuna — e já foram detectados outros, pelo que este será mais um — ou há mesmo aqui uma omissão e porquê esta omissão?! No que diz respeito à formação profissional, regista-se uma baixa de cerca de 242 milhões de euros, o que não bate certo com o esforço de requalificação dos portugueses que o Sr. Ministro vem anunciando, a menos que isto diga respeito à tal selectividade que o Sr. Ministro também anuncia.
No entanto, há aqui um problema bem mais grave, e esse problema chama-se QREN. E porquê? Porque o QREN devia entrar em vigor no dia 1 de Janeiro de 2007, mas tal não vai acontecer, e nós já sabemos disso.
Este Governo não apresentou o projecto, não apresentou os regulamentos subsequentes, isto tem de ser negociado, enfim, há aqui todo um processo que está atrasado. E o Sr. Ministro, julgo que então Secretário de Estado, já esteve a par de um fenómeno destes na passagem do II Quadro Comunitário de Apoio para o III Quadro Comunitário de Apoio, na qual também se verificou um fenómeno dilatório que vai voltar a acontecer.
Em boa verdade, Sr. Ministro, o QREN irá entrar em funcionamento — prevejo eu e o Sr. Ministro vai negálo, mas vê-lo-emos no decurso do próximo ano — no dia 1 de Janeiro de 2008. O País vai perder um ano, em que vai jogar com a dilação do QCA, o encerramento do QCA e o resto das verbas do QCA, numa lógica do século passado, ainda do QCA, quando podia estar já a contar com o QREN, se o Governo tivesse feito o trabalho de casa e tivesse assegurado aquilo que era necessário para o País e que, na matéria da formação, é essencial.
Posto isto, percebe-se, nomeadamente nos financiamentos do Fundo Social Europeu, que, em 2005, tenham sido de 259 milhões, em 2006, o Sr. Ministro tenha orçamentado 792 milhões e, em 2007, só estejam orçamentados, como financiamento do FSE para a formação, 539 milhões, isto é, menos 253 milhões do que no ano em curso. É aqui que entra o tal empréstimo bancário, o tal financiamento privado de 260 milhões de euros, que o Sr. Ministro fez incluir na proposta de Orçamento do Estado, exactamente para tapar este buraco.
Relativamente ao Complemento Solidário para Idosos, pedindo apenas a tolerância de mais 1 minuto, o Sr.
Ministro, hoje, finalmente, levantou o véu sobre um dado deste complemento, depois de muitas vezes interpelado por todos os grupos parlamentares, designadamente pelo PSD, através de um requerimento apresentado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, em 6 de Abril de 2006, que até hoje não teve resposta, apesar de o Sr. Ministro ainda hoje ter afirmado que responde sempre a tudo.
O Sr. Ministro já foi interpelado, várias vezes, em Comissão e em Plenário sobre o Complemento Solidário para Idosos e hoje, pela primeira vez — chego à conclusão de que é preciso colocar-lhe as questões muitas vezes até que o Sr. Ministro, um dia, acabe por responder —, fez uma referência a este instituto e à sua execução, referindo que as candidaturas que foram aprovadas estão já a ser pagas a 17 000 idosos. Sr. Ministro, 17 000 idosos é óptimo, mas deviam ser mais, porque são 17 000 em 300 000, segundo aquilo que o Sr.
Ministro andou a apregoar. E 17 000 em 300 000 representam apenas 5%! Daí a questão que já lhe coloquei, aquando da apresentação do PNAI em Comissão, que é exactamente a de saber qual é o cronograma previsto de aplicação do PNAI e, nomeadamente, do Complemento Solidário para Idosos, ou seja, quantas candidaturas é que o Sr. Ministro prevê aprovar e implementar durante 2007 e com que verba total, quantas prevê em 2008 e quantas prevê em 2009. Está aqui a falar-se de um movimento crescente, que irá aumentar em 2008 e mais ainda em 2009?! Gostava de colocar mais questões ao Sr. Ministro, mas, até pela reclamação que fiz, passarei para outra ronda.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Como viu, a minha tolerância foi de 3 minutos, Sr. Deputado.

O Orador: — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, de facto, permitam-me que comece por dizer que este debate se revela como muito difícil para a oposição e que esta última intervenção, do Sr. Deputado Miguel Santos, não deixa, quanto a mim, margem para dúvidas.
Do lado do PSD, começámos com uma intervenção do Sr. Deputado Adão Silva, que eu diria tímida, cautelosa, porque, de facto, os senhores, e o CDS-PP também, não conseguem disfarçar o peso da responsabilidade que sentem por algumas das dificuldades da situação actual. E não é a cassete, Sr. Deputado Miguel Santos; é a verdade! Os senhores perderam as eleições, já pagaram, mas o facto de terem perdido as eleições não os exime das responsabilidades.
Portanto, compreendo a intervenção cautelosa e tímida do Sr. Deputado Adão Silva e, aliás, até acho fantástico que os senhores venham aqui criticar medidas e políticas de rigor no combate ao abuso e à fraude, quando os senhores, no Governo, em nome desses mesmos abuso e fraude, o que fizeram foi, pura e simplesmente, cortar os direitos das pessoas. Mas, isso, este Governo não o está a fazer! Depois da intervenção cautelosa e tímida do Sr. Deputado Adão Silva, o Sr. Deputado Miguel Santos, que, aliás, já nos habituou a este tipo de intervenção, ensaia a intervenção global do PSD para o Orçamento do

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Estado, porque, relativamente a esta matéria e à área do trabalho e da segurança social, o Sr. Deputado nunca vai ter a resposta que pretende. É que, no dia em que disser que as suas perguntas tiveram resposta, o Sr. Deputado não vai ter rigorosamente mais nada para dizer! E, portanto, quem aqui ensaia teatros de intervenção não é mais ninguém a não ser o próprio Sr. Deputado.
Gostava apenas de dizer que quando me preparava para esta reunião fui reler a transcrição do debate do ano passado e até de alguns dos Orçamentos anteriores e, de facto, relativamente à discussão da questão taxa de desemprego, é bom lembrar que, no ano passado, os Srs. Deputados da oposição não acreditavam que essa taxa fosse abaixo dos 8%.
De facto, as intervenções acerca desta matéria são muito cautelosas e muito responsáveis e, portanto, nesta área, os senhores podiam ser sérios, rigorosos e manifestarem-se satisfeitos por alguns resultados, que são positivos, em primeiro lugar, não para o Governo mas, sim, para as pessoas; é para a vida das pessoas que esses resultados são importantes.
Foi, na verdade, muito referida a questão do Complemento Solidário para Idosos. Começámos com uma posição inicial da oposição de dúvida relativamente à capacidade de se cumprir este objectivo e perguntavase qual era a perspectiva, em quatro anos, para o cumprimento desta medida: agora, até se acha que ela já devia estar a ser completamente concretizada porque há condições para isso.
Portanto, também há aqui uma mudança radical de atitude relativamente a isto, o que revela o bom trabalho que tem sido feito para que este cenário possa agora ser avançado.
No que diz respeito à oposição situada à nossa esquerda, gostava apenas de dizer que tenho alguma dificuldade em registar a relutância que manifestam em aceitar aquilo que se ganha no combate à fraude e à evasão, no combate aos abusos, que há, de algumas medidas e de aceitar esses ganhos como bons e como sendo possíveis de reutilizar na garantia de mais direitos, de maior efectivação de direitos.
Portanto, considero que o objectivo de garantir mais a quem mais precisa é politicamente mais difícil mas é socialmente muito mais responsável, e esse é, de facto, o verdadeiro desafio de todos os políticos e de todos os governos. Acho que este aspecto é também de salientar.
Gostaria de colocar apenas três questões muito concretas, que têm que ver com algumas medidas referidas no relatório que acompanha o Orçamento do Estado.
A primeira das questões é relativa à nova geração de programas de emprego com base territorial. Gostaria de ter mais algumas informações sobre os objectivos que estão por detrás desta medida.
Uma outra questão, que também não foi levantada, tem que ver com a transversalidade das políticas de igualdade de género nas políticas de emprego, nomeadamente os planos para a igualdade nas empresas.
Pretendia colocar uma questão sobre o Rendimento Social de Inserção mas já foi respondida.
Relativamente à qualificação e à formação profissional, que preocupa e bem esta Assembleia, eu pediria ao Sr. Ministro para fazer um ponto de situação do programa Novas Oportunidades e das perspectivas para o próximo ano.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, muito bom-dia a todos.
Apesar de já termos tido esta discussão em momentos anteriores, há algo a que não posso deixar de fazer uma referência, sem com isto prolongar a minha intervenção, pois não disponho de muito tempo. Constato um facto, já sabendo qual é a resposta do Sr. Ministro: temos mais um Orçamento do Estado de contenção salarial e que aposta num modelo de desenvolvimento que claramente está esgotado; é mais do mesmo, e quanto a isso não há novidade alguma.
Quanto ao Orçamento do Estado, a diminuição, ou pelo menos um não aumento, das verbas transferidas para as prestações reflecte não uma melhoria da qualidade de vida, nomeadamente no que se refere aos subsídios de desemprego ou às reformas da segurança social, mas, sim, alterações legislativas em curso. Isto é, as verbas transferidas reflectem já hoje, no Orçamento do Estado, iniciativas legislativas em curso. E, portanto, o que o Governo faz é reflectir no seu Orçamento do Estado, nomeadamente da Segurança Social, a perda da qualidade de algumas prestações e a diminuição das prestações nos seus valores que advém de alterações legislativas.
Apesar de ter sido sete vezes repetido que este é um Orçamento de rigor, basta algumas destas medidas legislativas, nomeadamente a relativa ao subsídio de desemprego, que ainda não foi promulgada pelo Presidente da República, ou a que se refere à reforma da segurança social, cuja discussão, tanto quanto sei, ainda nem sequer se iniciou em sede de Parlamento (na sexta-feira vamos ter a apresentação das propostas do Governo), basta algumas das propostas que o Governo apresenta sofrer uma alteração para que o Orçamento não tenha qualquer capacidade para ser executado.
Portanto, o Governo faz a eficácia e o rigor deste Orçamento, sete vezes repetido pelo Sr. Deputado Ricardo Freitas, depender da aprovação de medidas legislativas que podem ou não ser promulgadas pelo Presidente da República ou sofrer alterações em sede de discussão na especialidade na Assembleia da República.

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Apesar de o Sr. Ministro só se ter virado para a direita quanto às propostas relativamente à segurança social, importa olhar também para as propostas do lado da esquerda da bancada do PS. Existem propostas que visam garantir a sustentabilidade da segurança social com um aumento de receitas que vai ter de ser discutido e analisado em sede parlamentar.
Começo por referir um conjunto de questões a que peço que me responda.
Em primeiro lugar, qual vai ser o aumento das pensões mínimas? O que é que o Governo prevê quanto a essa matéria? Em segundo lugar, toda a questão dos reformados. Os reformados, em 2006, viram os abatimentos serem reduzidos para 7500 euros e no próximo ano diminuem para 6100 euros. Portanto, a partir de agora, qualquer reformado com pensão acima de 435 euros — essa fortuna gigantesca, colossal! — vai ser claramente penalizado em sede de IRS.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Não é verdade!

O Orador: — Portanto, temos aqui um Orçamento do Estado que penaliza também os reformados que com os privilégios injustificados estejam a receber 435 euros/mês, o que é claramente demonstrativo das opções orçamentais deste Governo.
Sr.ª Secretária de Estado, já que leu um conjunto de dados relativos às pessoas com deficiência, e antes de abordar a questão dos benefícios fiscais e das alterações legislativas para as pessoas com deficiência, solicitava que fizesse distribuir às diferentes bancadas parlamentares essa informação.
Portanto, Sr.ª Secretária de Estado, peço que faça distribuir os dados que tem quanto à composição dos rendimentos das pessoas com deficiência às diferentes bancadas parlamentares para que possa fazer-se uma análise do impacto financeiro das medidas que agora propõe, e que o faça ainda hoje, se possível.
A Sr.ª Secretária de Estado afirma uma coisa que é preocupante, no nosso entender. Diz que 39 000 pessoas são prejudicadas com esta medida. Ora, a verdade é que o Governo altera benefícios fiscais, diminui a dedução à colecta, por exemplo, dos prémios de seguro para todas as pessoas com deficiência, e há uma diminuição, por exemplo, na comparticipação de medicamentos, o que faz uma diferença significativa neste sector da população. Portanto, há aqui claramente uma opção. O Governo, numa altura em que não toca nos benefícios fiscais, por exemplo, da banca, que, coitadinhos!, têm lucros fabulosos, ou nos benefícios das operações realizadas offshore, opta por eliminar, reduzir os benefícios fiscais das pessoas com deficiência.
Não tenho qualquer problema em admitir que haja necessidade de rever alguns benefícios fiscais, podemos discutir isso, porém, a verdade é que qualquer pessoa com deficiência com rendimentos acima de 700 euros vai ser penalizada com estas alterações legislativas. O importante era não só olhar para a redução mas também pensar na melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência. É nessa medida que achamos que há uma clara opção de classe quanto às pessoas com deficiência, uma vez que não se tocam grandes privilégios fiscais para mexer nestes, relativamente aos quais, podendo embora ser discutidos e melhorados, a preocupação devia ser a de os melhorar na generalidade, sendo que são prejudicados rendimentos não muito significativos.
Importa lembrar — a Sr.ª Secretária de Estado está a rir-se mas esta é uma questão importante — que as pessoas com deficiência pagam os seus custos de adaptação com o posto de trabalho, têm custos adicionais, as ajudas técnicas não funcionam, portanto, há um conjunto de encargos que estas pessoas têm e que lhes saem dos bolsos. São obrigações do Estado e que este não cumpre e, portanto, estas pessoas têm um encargo adicional e não vêem qualquer reflexo disso nas questões fiscais.
Quanto ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social o Orçamento do Estado apresenta dois dados diferentes: são 6 674 milhões de euros ou 6 594 milhões de euros? Pedia um esclarecimento quanto a este aspecto, uma vez que aparecem estes dois dados distintos quanto à situação do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.
O Sr. Ministro não respondeu à questão sobre a evolução da dívida declarada. No ano passado disse-nos que se tratava de 3400 milhões de euros, mas não disse qual é a evolução relativamente a este ano, qual é o montante da dívida declarada? Quanto à divida das empresas à segurança social gostaria de fazer uma pergunta relativamente ao artigo 35.º, que prevê uma medida que permite ao Estado beneficiar, isentar, anular a dívida das empresas à segurança social. Em que medida e com que fim vai isto ser usado? Quais os impactos financeiros que isto vai ter? É por esta via que se vai anular a dívida declarada à segurança social? Anulando-a?! Portanto, deixo estas questões ao Sr. Ministro, esperando uma resposta, se possível.
No que respeita às medidas de apoio ao desenvolvimento do interior do nosso país não temos nada contra que sejam encontradas medidas, mas a questão que se coloca é por que deve ser a segurança social a suportá-las e não através de formas — aí, sim, — ao nível de apoios financeiros e benefícios fiscais.
A questão da redução da formação profissional já foi colocada, pelo que não vou referi-la. Peço, no entanto, um esclarecimento quanto ao Instituto para a Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho. Qual é a sua situação? Qual é o futuro deste Instituto? Vive-se uma instabilidade e uma preocupação dos trabalhadores do Instituto, pelo que agradeceria que o Sr. Ministro desse algum esclarecimento sobre esta matéria.

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Para concluir, uma vez que já estou a exceder o meu tempo, penso que era importante que o Sr. Ministro nos esclarecesse um aspecto relativo à Inspecção-Geral do Trabalho. O Sr. Ministro disse que havia inspectores em formação. Pergunto-lhe quantos inspectores estão em formação, pois não ouvi esse dado, e se estes vão ou não ser suficientes para compensar aqueles que nos últimos tempos têm vindo a sair da InspecçãoGeral do Trabalho, isto é, se vamos ter um reforço a sério, líquido, do número de inspectores comparativamente ao passado recente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, gostaria de começar por repor alguma verdade dos factos.
É uma ousadia, para não dizer um abuso, o Sr. Ministro falar na herança, no seu entender catastrófica — penso que foi esta a palavra que utilizou ou uma semelhante —, na pesadíssima e desequilibrada herança do governo PSD/CDS-PP. E digo que é uma ousadia para não dizer que é um abuso ou, talvez, um desplante.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Tem de dizer isso aos portugueses!

A Oradora: — Vamos lá ver alguns pontos.
No que se refere à suposta situação financeira que herdaram, essa, os senhores resolveram-na muito facilmente: por um lado, penalizando toda a população com o aumento do IVA; por outro lado, herdaram um «jackpot» previsto na legislação aprovada pelo governo de coligação, que é a atribuição de parte das receitas do Euromilhões.
Portanto, não estou a ver em que medida o Sr. Ministro pode queixar-se da herança de três anos de governação do governo de coligação.
Há um outro aspecto que me coloca algumas dúvidas. Suponho que o Sr. Ministro subscreve este Orçamento na íntegra, incluindo a sua parte introdutória, onde, a propósito do controlo da despesa, é dito que se impõe em Portugal uma trajectória que passa pela travagem do crescimento explosivo das prestações sociais a que se assistiu no passado recente.
Pergunto, Sr. Ministro, com toda a clareza: que travagem é esta? Que crescimento explosivo foi este? A que prestações sociais se refere o Relatório? E qual é o passado recente? Isto porque não vejo que tenham existido prestações sociais excessivas, ou, então, VV. Ex.as não concordarão com as prestações sociais que foram atribuídas nos últimos tempos.
Por falar em «heranças», porque o Sr. Ministro falou da «herança» em termos de PIDDAC, devo recordar que quem recebeu uma «herança» extremamente pesada em termos de PIDDAC foi o governo de coligação PSD/CDS-PP. E vou explicar-lhe porquê, Sr. Ministro. Como se recordará, o Partido Socialista era useiro e vezeiro numa técnica de manipulação do Orçamento em termos de PIDDAC, a de fazer pequeníssimas inscrições (por vezes apenas de 50 contos, na altura) que ficavam distribuídas pelos orçamentos subsequentes.
Não vamos, portanto, falar em «heranças». E fomos obrigados a fazer um congelamento em termos de inscrições de PIDDAC porque herdámos inscrições que eram um mero plano de intenções políticas, não eram exequíveis e claras.
Por falar em clareza, pergunto ao Sr. Ministro o que é que quis dizer com a actual transparência, em termos de apreciação das candidaturas para equipamentos sociais. Na opinião do Sr. Ministro não havia um processo transparente quando eram os centros distritais e a Direcção-Geral da Segurança Social a fazer a apreciação dos equipamentos e dos acordos de cooperação que eram viáveis? Deixo esta questão, porque, de facto, me parece um pouco excessivo acusar o processo que existia de falta de transparência.
Quanto ao PIDDAC e à sua óbvia redução, tenho várias dúvidas que vou colocar com toda a franqueza e sem qualquer intuito de utilização política, e vou fazê-lo muito devagar para permitir à equipa governamental responder, se possível, de uma forma clara e transparente.
Qual é a perspectiva de receitas em termos de Euromilhões? Como é que, com este decréscimo do PIDDAC, que, segundo dizem, vai ser ultrapassado pelo PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais), que vai servir para a construção dos vários equipamentos, vão ser financiados estes equipamentos, estes compromissos, estas promessas, que têm sido assumidos pelos senhores não só em termos do PNAI (Plano Nacional de Acção para a Inclusão), como também e, mais uma vez, aqui, no Orçamento do Estado? Vou começar pelos compromissos assumidos em termos do PNAI. Em relação à criação de uma rede de apartamentos residenciais para pessoas com deficiência, pergunto: quantos apartamentos, para quando e quanto custarão? No que se refere às famosas creches, foi prometido haver, até finais de 2008, 30% das 9000 novas vagas.
Pergunto: mantém-se este compromisso? Se se mantém, como vai ser pago e quanto vai custar? No que toca à concretização de uma rede de cuidados continuados e integrados para pessoas em situação de dependência (e suponho que isto terá de ser a meias com o Ministério da Saúde), pergunto: quais são

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esses cuidados, quanto vai custar e como é vai ser financiada a rede? Suponho que a generalização do apoio domiciliado integrado cai na acção social, que os senhores fazem descer.
Só para dar apenas mais alguns exemplos. Como é que vão criar a rede de apartamentos de autonomização para jovens em risco? Quantos apartamentos estão previstos? Para quando? Quanto vão custar e como vão ser financiados? A propósito do aprofundamento do modelo das comissões de protecção de crianças e jovens (CPCJ), pergunto: qual é o estado deste reforço, visto que os senhores tanto se queixaram do que tinha acontecido com as CPCJ durante o governo de coligação? Qual foi o reforço que estas comissões tiveram em termos de recursos humanos e de meios financeiros e técnicos? Ainda no âmbito da acção social, já aqui foi perguntado, mas não posso deixar de voltar a colocar uma questão. Prevendo e havendo o compromisso deste aumento de equipamentos, de duas, uma: ou este compromisso não é real, não é verdadeiro, ou, então, não se percebe como é que não há um acréscimo equivalente, em termos de verbas previstas para acordos de cooperação e para efeitos de diferenciação positiva, que todos pretendemos.
Sr. Ministro, neste momento, quantos centros de saúde já estão em condições de fazer a comunicação por via electrónica dos certificados de incapacidade temporária para a segurança social? Sr. Ministro, o que faz a Secretaria de Estado relativamente à inclusão? Coloco a pergunta de outra maneira: em que medida é que a vida, o dia-a-dia das pessoas com deficiência, ao fim destes dois anos, melhorou? É verdade que agora temos estas novas medidas, que se perspectivam — e não vamos debruçar-nos sobre elas —, mas o que é que aconteceu até agora? O que foi feito até agora no âmbito do Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade (PAIPD)? Para que vai servir este aumento de 7,9% nas verbas atribuídas a este Plano e às suas políticas? Em termos gerais, em que é que mudou a vida das pessoas com deficiência? Qual foi o benefício que elas tiveram, para além da alteração ao Decreto-Lei n.º 123/97, que se limita a prorrogar ainda mais o prazo para adaptação das acessibilidades dos edifícios e estabelecimentos públicos? Por último, para que serve a Secretaria de Estado da Reabilitação?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, vou formular algumas questões e tentar responder a algumas outras que o Sr. Ministro colocou.
Sr. Ministro, factos são factos, não são fantasias. E comecei por dizer que este orçamento não melhorava a vida das pessoas.
Podemos falar de novo no desemprego. Quem disse que se tinham criado 48 000 novos postos de trabalho líquidos foi o Sr. Primeiro-Ministro, José Sócrates. Este é um facto! Outro facto é que, no passado mês de Setembro, inscreveram-se nos centros de emprego mais 13 000 novos desempregados; ou seja, o efeito sazonal passou e a verdade é que o desemprego também está a crescer. E não é possível discutir emprego sem discutir desemprego.
Portanto, quem começou por falar na perspectiva de criar 5000 novos postos de trabalho líquidos foi o Sr.
Primeiro-Ministro e agora, aqui, o Sr. Ministro tentou baralhar um pouco as coisas — o Governo nunca «dá o braço a torcer» e o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social fica frequentemente nervoso com as questões que o Bloco de Esquerda coloca.
No que se refere às pessoas com deficiência, não temos qualquer problema, nem qualquer constrangimento, em reconhecer, e somos favoráveis, que se beneficie os que menos têm, admitimos até tudo isto como bom. O que consideramos errado é reduzir a uns para beneficiar outros. Isto, para nós, é errado! Por exemplo, um professor com deficiência e um professor sem deficiência, ganhando ambos o mesmo salário. É ou não justo que o professor com deficiência tenha uma dedução, como vinha tendo até aqui? Na nossa perspectiva, é justo, até porque a deficiência pode ter ocorrido pelas mais diversas razões, entre elas por acidentes de trabalho, e os gastos destas pessoas são bastante superiores aos das pessoas sem deficiência.
Falando de factos e ainda das pessoas, é ou não verdade que as alterações propostas neste orçamento ao valor das deduções específicas vão afectar cerca de 180 000 pensionistas do regime geral e 213 000 pensionistas da Caixa Geral de Aposentações? É ou não verdade que vão pagar mais por causa desta alteração? Relativamente aos acordos de cooperação, Sr. Ministro, não percebi o que é que quis dizer com isto. Os acordos de cooperação, como bem sabe, são atribuídos por valência, e, na nossa perspectiva, deverão continuar a ser. E existe diferenciação de facto naquilo que é a comparticipação das famílias, porque, como também sabe, a parte da comparticipação das famílias está sujeita a uma aferição dos seus rendimentos e não é igual para todas as famílias, nem é igual para todos os utilizadores, visto que decorre da aplicação dos mecanismos àquilo que as pessoas ganham. Por exemplo, no caso dos idosos, decorre de uma verba relativamente à pensão que auferem e, no caso das famílias, decorre da verba da comparticipação das famílias.
Pergunto: também aqui estará perspectivado que haja um cheque para a família? Isto porque, se bem percebemos, os acordos de cooperação e estas instituições têm a ver com o valor que se dá às famílias. E não temos qualquer problema, ao contrário do que o Sr. Ministro deu a entender, exaltando até, que, finalmente, o

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Bloco de Esquerda reconhecia como bons os acordos de cooperação, em dizer que concordamos com os acordos. Mais, reafirmo que estas instituições prestam um bom serviço à comunidade, um serviço que deveria ser inteiramente prestado pelo Estado mas que não tem capacidade para tal. O que tememos é que, por aquilo que li na pág. 208 do Relatório, estes serviços sejam transferidos para instituições com fins lucrativos.
A nossa preocupação é que se descaracterize as instituições particulares de solidariedade social (IPSS), que, como bem se sabe, tiveram a sua génese muito após o 25 de Abril, exceptuando as misericórdias, que são bem mais antigas e com outra história. Mas estas instituições nasceram, de facto, da necessidade de dar uma resposta às populações, para o que na altura o governo não tinha capacidade e, nos últimos anos, tem vindo a ter cada vez menos, porque, se considerarmos o número de lares e de creches que existem no sistema público em determinados distritos, essas pessoas ficavam, efectivamente, em perfeito abandono, quase ao estilo do século passado, se não fosse o papel das IPSS.
Por último, há pouco perguntei como é que se sentia o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social em relação a algumas situações, nomeadamente ao crescimento das verbas no domínio da contratação a termo na função pública, e o Sr. Ministro não respondeu. Faço-lhe, agora, outra pergunta que tem a ver com o salário mínimo nacional (também são factos e é a vida das pessoas!): o Sr. Ministro também não se sente incomodado por, exactamente em 2006, o salário mínimo nacional ser, em termos percentuais, inferior ao de 1990, altura em que o mesmo representava 54,9% da remuneração média, enquanto, hoje, representa 50%? Creio que o Ministro não pode estar alheio a estas coisas, nem pode estar descansado.
Eram estas questões que queria colocar-lhe.

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, visto haver só mais uma inscrição para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, se não houver mais inscrições para uma 3.ª ronda de perguntas, daria de imediato a palavra ao Sr. Deputado inscrito. Concordam, Srs. Deputados?

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Depende da resposta do Sr. Ministro!

A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Então, vou dar a palavra ao Sr. Ministro para responder, uma vez que podem surgir inscrições em face da resposta.
Faça favor, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Santos, vamos lá, então, às questões que colocou, se é que colocou questões.
Perdoe-me, Sr. Deputado, mas algumas das questões que colocou são para si próprio. É que, Sr. Deputado, há um mínimo de conhecimento da realidade, de fidelidade ao que é essa realidade e de consistência nas questões que são colocadas nesta Câmara que têm de ser atingidos.
No que se refere ao emprego e desemprego, o Sr. Deputado não ouviu o que respondi inicialmente, mas repito a resposta com toda a paciência, com todo o empenho e toda a minha capacidade, apesar de, e tenho de lho dizer, Sr. Deputado, não ter a certeza da eficácia da resposta no que lhe respeita. Provavelmente, voltará a colocar as mesmas questões,…

Risos do PSD.

… com o mesmo grau de distância, face aos mínimos de que falei.
Sr. Deputado, o que eu disse foi que, no que se refere a emprego e a desemprego…

Protestos do Deputado do PSD Miguel Santos.

Sr. Deputado, importa-se de me ouvir?

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Deixe-se de considerações pessoais!

O Orador: — Considerações pessoais fez o Sr. Deputado durante grande parte da sua intervenção, além de outras considerações que não comento. Portanto, se quiser ouvir-me, respondo; se não me quiser ouvir, não respondo ou respondo à Câmara.
Sr. Deputado Miguel Santos, o que eu disse aqui, e repito, é que emprego e desemprego, em Portugal, medem-se através do Instituto Nacional de Estatística (INE). E, Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, mas, para lhe responder, vou ter de sair do domínio político e entrar um pouco no domínio técnico, porque é imprescindível para que o Sr. Deputado possa compreender a minha resposta.
Ao contrário do que o Sr. Deputado disse, as estatísticas do INE sobre o emprego e o desemprego não utilizam os dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Aliás, suponho que, se algum técnico responsável do INE o ouvisse dizer isso, o senhor arriscava-se a ter um processo em cima.

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O Sr. Miguel Santos (PSD): — Um processo?!

O Orador: — Sim, porque há normas que os técnicos estão obrigados a seguir para estudar, classificar, identificar e publicar as estatísticas sobre emprego e desemprego.
Saiba o Sr. Deputado que as estatísticas sobre emprego e desemprego são calculadas, em Portugal, como em qualquer outro país da União Europeia, através de um inquérito às famílias, que é realizado todos os trimestres. Trata-se, aliás, do maior inquérito por amostragem feito em Portugal. É dele que resultam os dados relativos ao emprego e o desemprego. Como é óbvio, isto nada tem a ver, nem poderia ter, com os dados relativos aos desempregados inscritos nos centros de emprego do Instituto do Emprego e Formação Profissional.
Sr. Deputado, quando se ignora este aspecto tão elementar, não nos podemos deixar de questionar sobre o sentido das perguntas que são feitas. Quando se ignora um aspecto tão elementar quanto aquele, Sr. Deputado…! O que eu disse, e repito, foi que, em Portugal, o emprego e o desemprego caracterizam-se pelo INE.
O Sr. Deputado não encontrará em lado algum, desde que assumi a pasta do Trabalho e da Solidariedade Social, qualquer avaliação da minha parte à situação do emprego e do desemprego que seja, permitam-me a imodéstia, menos rigorosa.
Eu sei — estranho seria se não soubesse — que existe um volume de desemprego significativo em Portugal. Sei também que, segundo os dados do INE, esse desemprego tem vindo a estabilizar, até com uma baixa ligeira, o que é positivo. Ora, isto permite, por exemplo, que, na última estatística sobre o desemprego do EUROSTAT, que não é propriamente uma dependência do Ministério do Trabalho e da Segurança Social, a taxa de desemprego para o último mês conhecido seja de 7,2%. O problema não desapareceu, porque 7,2%, ou 7,7%, ou 7,5%, é uma taxa de desemprego elevada, nomeadamente num país que, durante muitos anos, teve taxas de desemprego de 4,5%,como há quatro anos atrás, por exemplo.
Não obstante, é igualmente mistificatório ignorar que o INE — não é o Sr. Primeiro-Ministro, é o INE! — mostra que, no último ano, foram criados, em termos líquidos, 48 250 postos de trabalho, salvo erro.
Há pouco, a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca disse que o Governo pretendia criar 5000 postos de trabalho! E não é verdade! A Sr.ª Deputada não está a fazer bem as contas, está a esquecer-se de que a população activa cresce e que, se mantivermos a taxa de desemprego ou se a diminuirmos em uma décima, isto obriga a criar, em termos líquidos, mais 45 000 ou 50 000 postos de trabalho. Isto é óbvio, decorre dos números, decorre da leitura da realidade! Não é uma invenção, não é uma «pintura», não é um Estado «cor-de-rosa», é a realidade dos factos! Para mantermos a taxa de desemprego a níveis semelhantes aos que agora se registam, torna-se necessário haver uma criação de postos de trabalho, em termos líquidos, próxima dos 50 000. É estranho isto?! Não! É assim, é a realidade! No entanto, é um facto que outras informações estatísticas também são úteis, como, por exemplo, os «célebres» dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional, que tanto estimulam a intervenção do Sr. Deputado Miguel Santos.
O que se passa, de forma muito clara, é que os dados relevantes, que são utilizados por todos os analistas independentes, os dados relevantes que constam, por exemplo, dos boletins mensais do IEFP correspondem às ofertas de emprego, o que nada tem a ver com o trabalho administrativo do Instituto. Trata-se das ofertas de emprego por parte das empresas e da colocação em postos de trabalho. E o que se verifica nos últimos meses são taxas de crescimento ao nível da oferta de trabalho, são taxas simétricas das que tínhamos há um ano e meio, que eram taxas de decréscimo. Hoje, ao nível de oferta de emprego, temos taxas de crescimento da ordem dos 7%, 8%, 10%, enquanto que, ainda há bem pouco tempo, estas taxas eram da ordem dos ()15%, (-)27%. Estes não são dados irrelevantes, mas resolvem-nos os problemas? Não, não nos resolvem os problemas! Mas, se não trabalharmos com toda a informação, só poderemos produzir intervenções demagógicas.

Risos do PCP e do BE.

Portanto, sobre o emprego e o desemprego, citarei a Organização Internacional do Trabalho (OIT) — quem não o faz?! —, com muita honra e muito respeito por esta organização, o EUROSTAT e as normas para aferição do desemprego. Quem não o faz?! Só por pura ignorância é que se pode menosprezar a informação, as normas e as regras que emanam destas que são instituições de referência.
Por isso, é estranho que algumas intervenções continuem a ser feitas no mesmo tom. Mas eu continuarei a responder…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — No mesmo tom!

O Orador: — … exactamente da mesma forma que tenho feito, e continuarei a citar a OIT, se for necessário.

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No que diz respeito ao complemento solidário para idosos, os nossos compromissos são conhecidos, o nosso objectivo é conhecido, nada está escondido por detrás de qualquer ecrã. Continuaremos a trabalhar para que esta prestação social se dirija a todos os que dela necessitam. As verbas orçamentais que estão consignadas — 35 milhões de euros é a previsão de execução para este ano e 90 milhões de euros é a prevista para o ano que vem — significam a ambição de ir estendendo esta prestação social.
Sr. Deputado Jorge Machado, não percebi muito bem o queria dizer quando falou em transferências. Se se referia às transferências do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social, digo-lhe que crescem 6,2%. Num orçamento com as características deste, diga-me se tal significa um desinvestimento nas funções sociais.
Sr. Deputado, actualmente, o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social tem 6490 milhões de euros. Não confundamos as informações inscritas em processos de cenarização, que servem uma lógica de outra natureza, com as informações objectivas do orçamento — é a previsão para o fim do ano e não a situação actual. Portanto, não é informação exactamente da mesma natureza, mas, em todo o caso, agradeço-lhe que tenha colocado a questão.
O Sr. Deputado voltou a colocar as questões relacionadas com as pessoas com deficiência. Suponho que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças já explicitou estas questões, como lhe compete, e que a Sr.ª Secretária de Estado também já deu informação adicional.
Mas há um dado que estranho que os Srs. Deputados escamoteiem, que não falem dele. É que, já o disse, mas repito, a despesa fiscal prevista com os benefícios fiscais para as pessoas com deficiência aumenta em 2007 face a 2006. Aumenta! Sabem o que é aumentar? É mais! Não é menos, é mais!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Em quanto?

O Orador: — São mais 9 milhões de euros, salvo erro. Passa de 150 milhões de euros para 159 milhões de euros.
Há, de facto, uma reformulação do modelo. Os Srs. Deputados estavam satisfeitos com o modelo existente? Acham que maior justiça na distribuição daqueles benefícios fiscais não é um objectivo que qualquer governo deve prosseguir?! Se o acham, digam-no!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Ninguém disso isso!

O Orador: — Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, não gosto muito de discutir «heranças»,…

Vozes do PCP: — Heranças?!

O Orador: — … mas estamos a falar de dados objectivos e não de qualquer invenção. Se a Sr.ª Deputada quiser, vamos comparar os excedentes do sistema de segurança social de há 10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2 ou 1 ano, dos anos que quiser, e vai ver que, de facto, entre 2002 e 2005, houve um substancial agravamento dos desequilíbrios da segurança social.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É muito fácil haver superavit com o IVA a subir!

O Orador: — Sr.ª Deputada, não estou a reivindicar qualquer superavit, estou a responder à sua questão.
A Sr.ª Deputada não pode ignorar duas coisas: primeiro, em poucos anos, passámos de um superavit no sistema (e isto sem qualquer IVA) que se aproximava de 1000 milhões de euros para um deficit no sistema contributivo.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Em quantos anos?

O Orador: — Entre 2001 e 2005, Sr.ª Deputada. Curiosamente, no tempo em que os senhores estiveram no governo…

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — E os senhores também!

O Orador: — Não, Sr.ª Deputada… Em 2002, em 2003, em 2004!

Protestos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Patinha Antão.

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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro e Srs. Deputados, como é evidente, podemos utilizar esta vivacidade do diálogo continuado, não é nada que seja impróprio em termos parlamentares, mas, se VV. Ex.as quiserem retomar um tom um pouco mais habitual, será da vossa escolha.

O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada, fiz aqui uma intervenção inicial, de 20 minutos, em que não falei, uma única vez, em «herança» alguma. A Sr.ª Deputada é que me fez a pergunta!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Eu?! O senhor é que falou em «herança»!

O Orador: — E se fez a pergunta, tem de ouvir a resposta! Pode não gostar dela, mas o facto é que temos superavit transformados em deficit e crescimentos de 3% das contribuições contra crescimentos de 7% ou 8%, que, agora, voltaram aos 6%. Esta é a realidade! E, Sr.ª Deputada, não me venha dizer, até porque com isso não convenceria ninguém, que foi a prática de inscrição em PIDDAC que justificou a quebra abrupta do PIDDAC para os equipamentos sociais. Digo-lhe já, com toda a sinceridade, que sempre me opus a este tipo de prática orçamental, a de inscrever 5000 €, 10 000 €, 25 000 €, não gosto dela. Infelizmente, ela tem uma longa tradição na nossa prática orçamental. Se a Sr.ª Deputada recuar alguns anos, encontrará inscrições de 5000 contos, 200 contos, 100 contos — é uma velha tradição, que, infelizmente, existiu, mas, pela minha parte, tudo farei para acabar com ela.
Agora, não foi por causa destas inscrições de 5000 € que os senhores, quando estiveram no governo, fizeram um corte dramático no investimento em equipamentos sociais, até porque esse corte significou que algumas instituições, que estavam a meio da construção dos seus equipamentos, ficassem impossibilitadas de os concluir ou tivessem de recorrer a outras fontes de financiamento (e a lista é muito significativa). Posso dizerlhe — e isto foi anunciado — que as primeiras verbas dos jogos sociais foram destinadas a cumprir compromissos do PIDDAC que estavam há anos por cumprir. Isto é conhecido, há casos destes em todo o País e, se quiser, posso fazer a conta e dizer-lhe quantos foram e quantos milhões de euros significaram.
Agora, Sr. Deputada, as verbas dos jogos sociais são verbas que todos os governos geriram ao longo das últimas décadas. E seria um pouco extraordinário que, como grande resultado da gestão do PSD/CDS-PP (particularmente do CDS-PP) no governo deste país e na área da solidariedade, viesse também inscrita a invenção do Euromilhões!… Creio que a invenção do Euromilhões, Sr.ª Deputada, não foi feita na Praça de Londres…!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Mas beneficiou!

O Orador: — E quem paga as receitas do Euromilhões são os mesmos que pagam os impostos, são os portugueses que jogam nos jogos sociais. Portanto, essa é uma reivindicação absurda.
O que acontece é que fizemos uma reforma da estrutura de aplicação desses fundos, orientada para objectivos — e para objectivos com enorme transparência.
Há pouco, não fiz qualquer acusação à forma como o PIDDAC era gerido. Mas, agora, pergunto: há alguém nesta Sala que não prefira um modelo de concurso público, com regras publicitadas e com um modelo de avaliação conhecido, para distribuição de dinheiros públicos, a um modelo de distribuição em que é a decisão arbitrária de um membro do Governo que o determina? Há alguém que consiga defender que o primeiro método não é o mais transparente, mais eficaz e mais justo? Suponho que a Sr.ª Deputada concordará comigo.
A Sr.ª Deputada fez uma série de perguntas concretas.
Sr.ª Deputada, mais uma vez, tenho de dizer-lhe que essa contradição, entre as verbas dos acordos de cooperação e os investimentos que estão a ser lançados e as candidaturas que estão a ser aprovadas no PARES, não existe. Sr.ª Deputada, alguém que tenha tido responsabilidades mínimas no sistema de segurança social sabe que o período de construção de qualquer equipamento social é superior a um exercício orçamental. Gostava que fosse menos, mas, como sabe, e bem, todas as instituições sociais que recebem fundos públicos acima de uma certa percentagem, estão obrigadas, e bem, a cumprir as regras, nomeadamente, dos concursos públicos, da contratação pública — e isto tem os seus procedimentos e estes procedimentos levam o seu tempo. Portanto, no exercício seguinte, haverá exigências do ponto de vista dos acordos de cooperação. E eu já aqui disse, e repito-o, que me parece perfeitamente razoável que, depois desta fase de expansão da rede de equipamentos, o mesmo tipo de receitas seja aplicado ao financiamento do funcionamento dessas instituições na área da infância, da deficiência ou da velhice e que haja, portanto, aqui uma permanência na canalização das verbas dos jogos sociais para a rede de equipamentos e serviços sociais, que, como sabe (e partilha comigo esta opinião), é uma das maiores debilidades que temos do ponto de vista da coesão social.
A Sr.ª Deputada perguntou qual era a percentagem de articulação entre o Ministério da Saúde e o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social no domínio das baixas. Sr.ª Deputada, neste momento, é de 54%, ou seja, mais de metade dos centros, sendo obviamente nosso objectivo atingir a totalidade.
Depois, todos os financiamentos do PARES estão identificados, são públicos e estão, aliás, incluídos no PNAI, isto é, estão cobertos por verbas inscritas neste orçamento.

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A Sr.ª Deputada questionou ainda sobre a rede de residências para deficientes. Sr.ª Deputada, ela foi lançada no concurso do PARES, com 20 unidades e 655 lugares a criar. Se bem me recordo, houve uma procura superior a esta, mas foi feito o processo de selecção e, nas próximas semanas, serão aprovados e assinados os contratos com as instituições de solidariedade. Mas todas estas verbas — e não vou entrar em detalhe relativamente a cada uma delas — constam quer do orçamento quer dos diplomas que criaram este tipo de instrumentos.
Só para finalizar e deixar os 3 minutos restantes para os Srs. Secretários de Estado do Emprego e da Formação Profissional e Adjunta e da Reabilitação completarem as minhas respostas, gostava de dizer à Sr.ª Deputada Mariana Aiveca que nós continuamos a acreditar (e ainda ontem estive numa cerimónia a reforçar esta ligação) nas virtualidades da cooperação entre o Estado e a sociedade civil, nomeadamente nas instituições de solidariedade, que são uma peça fundamental no nosso sistema de políticas sociais e de coesão social. Mas isto não quer dizer, Sr.ª Deputada, que o modelo que existe actualmente não possa ser melhorado — e melhorado para aperfeiçoar a eficácia social dos apoios, porque efectivamente são apoios à família. E se isso passar por aprofundar a diferenciação positiva, de forma a que esses apoios à família sejam mais fortes para as famílias com mais debilidades, se passar por blindar esses acordos contra qualquer processo de selecção negativa, todos ficaremos a ganhar com isso.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Essa é a pergunta!

O Orador: — Agora, estar aqui a invocar o fantasma da transferência para instituições privadas, ó Sr.
Deputada, os fundos públicos de cooperação são com instituições do sector social! Outra coisa é haver uma parte de fundos públicos, nesta área como em qualquer outra, que é destinada a incentivar investimentos privados. Mas por que é que se questiona aqui o incentivo ao investimento privado e lucrativo no sector social (nos lares ou nas creches) e já não se questiona se se tratar de uma fábrica de automóveis ou de uma fábrica de cortiça?

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Porque o Estado não gasta na rede pública!

O Orador: — Srs. Deputados, estes apoios ao sector privado, para além de terem uma contrapartida em lugares sociais, têm também um efeito social muito importante, que é o de diminuir a pressão sobre os equipamentos de base social por parte de segmentos da população que não necessitam de aceder a esses mesmos equipamentos.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Mas pagam mais!

O Orador: — Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, acredito na virtualidade do investimento privado nestas áreas. Acho que ele tem lugar e tem mostrado que tem lugar, desde que tenha qualidade e eficiência.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — É pena que não acredite na rede pública!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional.

O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional: — Sr. Presidente, vou responder de forma muito telegráfica.
Ao Sr. Deputado Jorge Machado, que questionou sobre o futuro do Instituto para a Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho (ISHST), tenho a dizer-lhe que ele será integrado com a Inspecção-Geral do Trabalho na futura autoridade das condições do trabalho.
Em resposta à Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, quanto aos programas de base territorial, quero dizer que, antes do fim do ano, contamos avançar com iniciativas nesta área, visto estarem praticamente finalizados os trabalhos de revisão dos programas gerais — este é, pois, o passo seguinte.
Permitam-me que aproveite os 30 segundos restantes para me referir à Iniciativa Novas Oportunidades.
Este primeiro ano foi um ano forte, de lançamento da Iniciativa, em que tivemos, relativamente aos jovens, um significativo alargamento do número de cursos profissionais — cerca de mais 25 000 vagas em cursos profissionalizantes, de 10 000 na rede do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e de 15 000 na rede do Ministério da Educação. Relativamente aos adultos, este ano foi um ano de criação, de construção da infraestrutura mínima para funcionar o processo de reconhecimento de competências. Neste sentido, foram abertos cerca de 22 novos centros, antecipando em um ano a meta que tínhamos para 2007, pelo que, neste momento, os números já cumprem a meta para 2007; e fizemos sensibilização directa a empresas, celebrando cerca de 350 protocolos com empresas para permitir a divulgação e a mobilização dos trabalhadores para a Iniciativa. Neste momento, já estão inscritas no processo cerca de 50 000 pessoas, o que aconteceu no espaço de um ano. Além disso, foram alargados significativamente os cursos de educação/formação de adultos e

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foi feita uma coisa que era de elementar bom senso, mas que não existia até ao momento: a disponibilização de cursos em horário pós-laboral em toda a rede de centros do Instituto do Emprego e Formação Profissional.
Relativamente ao ano de 2007, é um ano de expansão do sistema, de reconhecimento e consolidação do esforço feito, em três vertentes: primeiro, no alargamento dos referenciais (para o 12.º ano e para todas as especialidades profissionais); segundo, na implementação da reforma da formação profissional, que, no fundo, vai permitir a concentração de recursos da formação naquela formação que se destina, de forma crítica, a permitir a progressão escolar e profissional dos indivíduos, terminando com o financiamento à formação avulsa e desenquadrada por completo das progressões reais dos indivíduos e das necessidades das empresas; e, terceiro, num esforço significativo na mobilização da procura e das pessoas para esta iniciativa de qualificação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero somente prestar alguns esclarecimentos em relação às comissões de protecção de crianças e jovens.
Foram contratados 128 técnicos, o processo está concluído e foi objecto de Visto favorável do Tribunal de Contas. Estes técnicos já iniciaram o processo de formação, já fizeram a formação em sala e, neste momento, estão a fazer formação nas próprias comissões de protecção.
A formação dos técnicos que já integravam as comissões de protecção foi objecto de um plano de formação, que tem estado a ser desenvolvido e que foi disseminado pelos distritos. Também foi efectuado um protocolo com o Ministério da Educação que permite a colocação em comissões com um volume processual até 300 processos de um professor e em comissões com um volume processual superior a 300 processos de dois professores, uma vez que o absentismo e o insucesso escolar são as principais causas de sinalização nas nossas comissões.
Quanto ao funcionamento das comissões, existe um protocolo que foi celebrado entre o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) que permite transferir de seis em seis meses verbas para apoio estrito ao funcionamento das comissões de protecção.
Esta transferência, para o ano corrente, é de 6,589 milhões de euros. Notamos que existem progressos, que há melhorias quanto às condições de funcionamento das comissões. No entanto, ainda não estamos satisfeitos e, por isso mesmo, solicitámos à Associação Nacional de Municípios Portugueses que fizesse uma avaliação do protocolo que existe, e registamos, com agrado, que o próprio relacionamento com as autarquias começa a dar sinais de alguma estabilidade.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Faça favor de dizer qual é o sentido da sua interpelação.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, houve duas perguntas que, no nosso entender, são muito importantes e que não foram respondidas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para a enunciar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro não respondeu à minha pergunta sobre a travagem do crescimento explosivo das prestações sociais a que se refere a pág. 5 do Relatório do Orçamento do Estado para 2007.
Também não disse em que medida é que, nos dois últimos anos e em virtude da existência de uma secretaria de Estado para a reabilitação, o dia-a-dia na vida das pessoas com deficiência melhorou. Não vejo uma única política para esta matéria enunciada no orçamento!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, o Sr. Ministro responder-lhe-á após a 3.ª ronda de questões.
Peço aos Srs. Deputados que vão intervir, que são apenas dois, os Srs. Deputados Adão Silva e Eugénio Rosa, que sejam muito concisos nas suas intervenções, o que, certamente, estará no vosso espírito, e aos membros do Governo que sejam, igualmente, concisos nas respostas. Recordo às Sr.as e Srs. Deputados que hoje temos um dia particularmente longo, pelo que vos peço esta concisão.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, é apenas para dizer que o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social também não respondeu às questões que coloquei sobre o QREN e o aumento do pagamento de subsídios de desemprego. Estas questões já vêm de trás e nunca obtiveram resposta.

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O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro, após a 3.ª ronda de perguntas, responderá não só às questões colocadas pelos Srs. Deputados que irão intervir como também às que agora foram equacionadas e, eventualmente, a alguma outra, se subsistir, que, porventura, ainda não tenha sido respondida.
Tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva, e, mais uma vez, peço que respeite os 3 minutos, embora pense que isto também esteja no seu espírito.

O Sr. Adão Silva (PSD):— Sr. Presidente, antes de mais, começo por agradecer a simpatia da Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos ao classificar a minha primeira intervenção de tímida e cautelosa — tímida, porventura, nem tanto, cautelosa sempre, seguramente — e por dizer à Sr.ª Deputada que também gostei da intervenção que fez, que foi vigorosa e carinhosa;…

Risos.

… carinhosa, sobretudo, quando aborda matérias com aquela delicadeza que a senhora sabe ter, e fez bem.
E, a meu ver, houve aqui um processo de alguma ingratidão por parte do Sr. Ministro, porque não lhe respondeu como devia, detalhadamente, às perguntas ciosamente colocadas por V. Ex.ª.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Respondeu o Sr. Secretário de Estado.

O Orador: — Passo agora a formular as perguntas ao Sr. Ministro, e vou ser muito rápido, muito directo, cauteloso sempre, tímido, nem por isso.
Sr. Ministro, insisto, as transferências do Orçamento do Estado para o ano de 2007 são manifestamente insuficientes, não alinham com o histórico dos anos anteriores e não dão, seguramente, para cumprir todos os pagamentos que a elas dizem respeito.
Concentremo-nos no subsistema de solidariedade. A despesa cresce 8,5%, o subsistema é alimentado, praticamente, e só através das transferências do Orçamento do Estado que não compaginam, porque só cresce 6,2%. Repito: as transferências do Orçamento do Estado são 6,2%, o subsistema é alimentado só através das transferências do Orçamento do Estado e cresce 8,5%. Sr. Ministro, explique isto, por favor.
Não vale a pena confundir-nos, Sr. Ministro, porque o IVA é à parte. As transferências do IVA, Sr. Ministro, são à parte e não alimentam nem o sistema de acção social nem o subsistema de solidariedade, como V. Ex.ª muito bem sabe.
Pergunto: as transferências do IVA crescem 4%, em quanto cresce o IVA, segundo o Orçamento do Estado para 2007? Resposta: 5%! Isto é, o Orçamento do Estado fica a dever 1% de IVA ao orçamento da segurança social.
Terceira questão, acordos de cooperação das IPSS. Diz que não é possível fazer, o Sr. Ministro não conhece. Eu digo-lhe: há milhares no País. Milhares! E faço-lhe um desafio: mande fazer um levantamento, por distrito, de todos os acordos passíveis de serem feitos e que não são feitos — aliás, fiz-lhe um requerimento neste sentido há mais de meio ano. São milhares, Sr. Ministro! Repito, milhares que não precisam de obras! Tomemos como exemplo um acordo no âmbito do apoio domiciliário em que a IPSS «calibra» obras para 50 apoios, mas só está a fazer 25, tendo, portanto, a possibilidade de fazer mais 25. No entanto, não as faz, porque simplesmente não há acordo e a IPSS não tem recursos próprios e, sem recursos, não os pode fazer. Sr. Ministro, mande fazer este levantamento e concluirá que estamos a subutilizar uma capacidade enorme que este país tem instalada para apoiar os mais pobres e os mais necessitados.
Finalmente, o Sr. Secretário de Estado disse-me que há 32 milhões de euros de PIDDAC para os equipamentos das IPSS para o ano 2007. Sr. Secretário de Estado, calcorreei, um a um, todos os distritos do país para ver a dispersão das verbas e constato duas coisas: primeiro, uma flagrante injustiça, pois há distritos que têm e distritos que não têm, injustiça que redobra, porque há distritos que não têm pelo segundo ano consecutivo; segundo, somando tudo aquilo que lá está inscrito, distrito a distrito, não dá nem metade dos 32 milhões que V. Ex.ª falou.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, no fundo, vou relembrar algumas questões, infelizmente quase pela terceira vez, que colocámos e para as quais não recebemos resposta.
A primeira delas tem a ver com a dívida declarada, e já é a terceira vez que fazemos perguntas sobre isto.
Será que a desorganização vos impede de dar uma resposta a esta questão, que é fundamental? Queremos saber qual é o valor que foi recuperado em 2006. Qual é a dívida declarada, o último mês disponível de 2006? Qual é o aumento previsível nas pensões? A esta pergunta também não recebemos resposta.
Em relação à Sr.ª Secretária de Estado, peço-lhe, se for possível, que nos forneça os dados que trouxe para aqui.

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Perguntámos ao Sr. Ministro — e também não obtivemos resposta — qual o número de inspecções realizadas pela Inspecção-Geral do Trabalho.
Relativamente à proposta de lei fizemos duas perguntas. Sobre o artigo 39.º, que cria uma isenção, gostaríamos de saber quanto custa e quem vai financiar. Quanto ao artigo 35.º, que permite a anulação de dívidas à segurança social, gostaríamos de saber qual é a estimativa daquilo que vai ser anulado.
Com base nos dados que nos foram fornecidos, para além da dificuldade em analisar se a lei do financiamento está ou não a ser cumprida, colocámos, além da questão das transferências, algumas questões concretas, tais como as dos complementos sociais, encargos familiares…Ora, o Governo comprometia-se a que, em relação ao investimento, retirando-se a parte do Fundo Social Europeu, a contrapartida pública nacional fosse feita através do orçamento dos ministérios. Olhando para o mapa das despesas do subsistema que só hoje nos foi distribuído, encontro, do lado das receitas, o valor de 539 milhões de euros e, do lado das despesas, o valor de 859 milhões de euros. Gostaria que me explicassem esta diferença.
Finalmente, uma outra questão — esta notícia saiu hoje nos jornais e gostaria que o Sr. Ministro também a esclarecesse — tem a ver com a contratação de jovens que não completaram o ensino secundário. Nesta notícia, diz-se que, futuramente, o Governo vai retirar os apoios dados à contratação de jovens que não tenham completado o ensino secundário. Em Portugal, o ensino obrigatório ainda é o 9.º ano de escolaridade e não o ensino secundário. Será isto verdade? Penso que, em relação a incentivos à criação de trabalho, é tudo.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, começo por responder à Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, dizendo que, se olharmos para o crescimento das despesas com transferências sociais no produto interno bruto ao longo, por exemplo, da última década, dos últimos 15 anos, verificamos que esse crescimento é, provavelmente, o mais elevado da União Europeia. É um facto positivo que tenhamos feito crescer as nossas transferências sociais, talvez nem sempre na melhor direcção, mas o ritmo deste crescimento é dificilmente sustentável, para não dizer impossivelmente sustentável, no longo prazo. E é a esta apreciação que corresponde a frase que citou e que está, também, na origem de algumas das orientações das reformas na protecção social que foram feitas, nomeadamente a convergência dos sistemas ou as mudanças de algumas regras no domínio da segurança social. É tão simples quanto isto! Os dados estão lá, basta visitálos e conhecê-los. Esta não é nenhuma afirmação que careça de realidade.
Relativamente à existência de uma secretária de Estado, neste caso, para a reabilitação — já agora aproveito para dizer que, na minha opinião, na nossa estrutura institucional não existem secretarias de Estado, o que existem são secretários de Estado, mas este é apenas um pormenor —, se a Sr.ª Deputada conhecer o Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade que foi aprovado — conhece-o, decerto — verifica que há um conjunto de medidas elencadas e que muitas delas estão em desenvolvimento. Neste momento, não temos tempo para fazer este debate, mas, desde já, desafio a Sr.ª Deputada — desafio que aceitará, decerto — a fazê-lo numa reunião da Comissão de Trabalho e Segurança Social, especificamente dedicada a este tema, ao Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiência ou Incapacidade,…

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Diga uma medida que tenha sido feita!

O Orador: — Ó, Sr.ª Deputada, aceite o desafio de marcar uma reunião da Comissão de Trabalho e Segurança Social para discutir estes temas?

Protestos da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.

Sr.ª Deputada, essa demagogia não terá da minha parte qualquer resposta. Se quiser discutir seriamente eu discuto consigo; se quiser fazer demagogias com um dedo no ar, o problema é seu.

Protestos da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.

Ó Sr.ª Deputada, está a pedir a palavra?

O Sr. Presidente: — Ó Sr. Ministro, vamos…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O Sr. Ministro também não está a pedir a reunião!

O Orador: — Sr. Presidente, tem mesmo de ajudar aqui a…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, é isso mesmo que vou fazer. Já há pouco sugeri que se se pretender continuar num registo de interpelação cruzada, e se todos os intervenientes estiverem de acordo, esta meto-

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dologia será aceite, certamente, por todos, mas peço que seja por um período curto, porque não é habitual e pode não ser a solução mais eficiente para a boa condução dos nossos trabalhos.
Para concluir, penso que já se percebeu o sentido e o alcance do ponto que estava em discussão, mas, como é evidente, a mesa nunca impedirá as interrupções de qualquer Sr. Deputado desde que o tom e o registo usado nas interrupções, assim como a frequência com que são feitas, não se tornem danosos para a qualidade do nosso trabalho.
Sr. Ministro, faça favor de continuar no uso da palavra.

O Orador: — Sr. Presidente, deixo aqui um desafio: pela minha parte e por parte da equipa de que sou responsável, cá estaremos para debater todos os sistemas que entenderem no domínio das políticas de apoio às pessoas com deficiência.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Está registado!

O Orador: — Sr. Deputado Miguel Santos, relativamente à questão, recolocada, sobre o subsídio de desemprego, devo dizer que, com certeza, o Sr. Deputado não ouviu a resposta que dei no fim da primeira ronda de perguntas, mas esta já não é uma responsabilidade minha. O senhor não ouviu, mas eu vou repetir: a previsão do crescimento do subsídio de desemprego que está inserida no Orçamento do Estado leva em conta a análise que temos da situação do desemprego, de relativa estabilidade, e o crescimento nominal que sempre acompanha qualquer prestação social. Portanto, é da conjugação destes esforços, tendo em conta, naturalmente, a obrigação que o Estado tem em combater a fraude e a evasão, que resulta esse crescimento das despesas com o subsídio de desemprego. É simples de perceber.
Os Srs. Deputados também disseram que os objectivos fixados para este ano, em termos de taxa de desemprego, eram impossíveis de atingir, estamos a verificar agora que não era tanto assim! Portanto, cá estaremos para verificar se esta proposta orçamental é ou não exequível.
Sr. Deputado Adão Silva, tenho de dizer-lhe que a comparação que fez de taxas não é aceitável, porque não diz respeito à mesma variável, ao mesmo valor. Comparar taxas de valores diferentes não permite tirar qualquer conclusão! Desafio o Sr. Deputado a provar que algum ponto da Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social em vigor não é cumprido por este orçamento, se há alguma despesa da responsabilidade de transferências sociais que deixa de ser cumprida. Se encontrar uma, diga-me! Até agora não o fez, e não acredito que o faça, porque não vai encontrar.
Sobre a rede de equipamentos sociais — e tenho pena que não possamos discutir este ponto com mais detalhe —, o que eu disse é indiscutível. Neste momento, antes do lançamento do PARES, temos no terreno apenas os programas co-financiados pelo Fundo Social Europeu, no POEFDS (Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social). Houve, de facto, uma decisão escrita no sentido de não autorizar qualquer nova inscrição em PIDDAC. E não fui eu que a assinei! Isso foi feito há alguns anos atrás.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Existem vagas!

O Orador: — Claro que existem vagas…

O Sr. Adão Silva (PSD): — São milhares!

O Orador: — Sr. Deputado, claro que existem vagas. E, como sabe, estamos a ampliar os acordos de cooperação, e algumas vagas têm, aliás, uma longa história… O que releva para este debate político é o facto de o congelamento da rede de equipamentos e serviços sociais, a que Portugal foi votado durante uma série de anos, ter acabado! Está em marcha uma significativa ampliação da rede de equipamentos e serviços sociais, e de forma transparente e sustentada. Além do mais, no PIDDAC, estão previstas verbas para todos os distritos do País, apesar da sua dimensão — podemos confirmar este ponto num outro debate.
Para terminar, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Eugénio Rosa que, com a entrada — provavelmente, ainda este ano — de 39 novos inspectores do trabalho, teremos 284 inspectores a exercerem a sua função no terreno, um número claramente superior ao que existia nos últimos anos, mas, como eu já disse, ainda não é um número suficiente para uma cobertura eficaz.
O Sr. Deputado fez ainda referência a algumas normas do orçamento como se elas fossem «descobertas de última hora», refiro-me, nomeadamente, ao célebre artigo 35.º, que aqui ganhou algum protagonismo. Este artigo consta de muitos outros orçamentos — não sei quantos! — e destina-se a resolver problemas de dívidas cujo processo de cobrança exige mais custos do que o valor a cobrar: 5 cêntimos, 10 cêntimos…

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Esse é outro!

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O Orador: — É este o objectivo do artigo 35.º. Se provar que ele alguma vez foi ou vai ser utilizado para outro fim, faça favor de o denunciar.
Em matéria de dívidas à segurança social, como sabe — tem a informação, porque ela foi dada recorrentemente —, durante o ano de 2006, estivemos a proceder a um movimento de actualização e de clarificação da situação contributiva de todos os contribuintes da segurança social para com o sistema. É a partir daqui e com a entrada em funcionamento, no próximo ano, do novo sistema de contas correntes que teremos capacidade de identificar, com rigor, o valor da dívida à segurança social.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Agora não se sabe!

O Orador: — Sr. Deputado, eu conheço a dívida… Se quiser compreender o que estou a dizer, compreende; se não quiser, não compreende! Como sabe, foi feita uma notificação a dezenas de milhares de contribuintes com situação irregular no sentido de ela ser esclarecida. Este processo está a ser finalizado; no momento em que ele for finalizado teremos, pela primeira vez, todas as condições para ter uma leitura rigorosa da dívida à segurança social. Esta é a verdade e penso que é mais sério e mais honesto afirmar que estamos, pela primeira vez, desde há muitos anos, com a consolidação de todos os sistemas de informação da segurança social, a criar as condições para termos um relacionamento nacional com os contribuintes e, também, um conhecimento da situação contributiva efectiva.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.

O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: — Sr. Presidente, vou apenas dar um esclarecimento adicional, porque o Sr. Deputado Eugénio Rosa faz questão, e bem, de ver respondidas todas as perguntas que formulou, e a verdade é que ficou uma por esclarecer.
Como sabe, ou deve saber, a principal diferença entre os saldos da segurança social em contabilidade pública e em contabilidade nacional tem a ver com os fluxos do Fundo Social Europeu (FSE). A questão que colocou sobre a diferença entre a receita inscrita para FSE e a despesa está um pouco desprovida de sentido, porque, se for ver as contas de anos anteriores, constata que entraram mais receitas do FSE do que as transferências que foram feitas a título de despesa. Portanto, neste momento, temos um pouco menos de receita e mais de despesa, mas dispomos dos saldos oriundos da União Europeia e, por isso, vamos pagar tranquilamente, sem que haja qualquer desorçamentação das verbas do Fundo Social Europeu nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim de mais uma audição. Agradeço a participação de todos e julgo que foram muito úteis e significativos os esclarecimentos aqui prestados, também para quem segue os nossos trabalhos em casa.
Srs. Deputados, retomaremos os trabalhos da Comissão às 15 horas.
Está suspensa a reunião.

Eram 13 horas e 45 minutos.

Sr.as e Srs. Deputados, declaro reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Vamos reiniciar os trabalhos da Comissão de Orçamento e Finanças com a audição do Sr. Ministro da Defesa Nacional em sede do Orçamento do Estado para 2007.
Como é habitual nos nossos trabalhos, começamos com uma intervenção inicial do Sr. Ministro, que dispõe de 20 minutos para o efeito, seguindo-se uma primeira ronda de perguntas a formular pelos Srs. Deputados que representam os grupos parlamentares, dispondo cada grupo parlamentar de 10 minutos. No final, o Sr.
Ministro responderá em bloco às questões, havendo ainda lugar a uma segunda ronda de perguntas, com a redução a metade dos tempos disponíveis. E, eventualmente, se houver necessidade, poderá haver uma terceira ronda para ser dada resposta a algumas questões que possam ter ficado por esclarecer.
Sem mais considerações, e interpretando também o sentir do Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional, aqui presente, damos as boas-vindas à equipa governamental.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Nuno Severiano Teixeira): — Srs. Presidentes das Comissões de Orçamento e Finanças e de Defesa Nacional, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, como é natural, deixar-vos uma palavra de saudação e dizer-vos que é sempre grato, uma honra e um prazer para mim estar aqui entre vós. É mais comum a minha presença em sede da Comissão de Defesa Nacional, mas tenho o maior prazer em estar aqui neste formato, mais alargado, também com a Comissão de Orçamento e Finanças da Assembleia da República.

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Em segundo lugar, em cumprimento do que já foi referido pelo Sr. Presidente, irei fazer uma brevíssima apresentação da forma como encaro o Orçamento do Estado para 2007, no que concerne à defesa nacional.
Talvez a minha disciplina, não digo orçamental mas de tempo, permita economizar algum tempo dos 20 minutos que me estão consignados, no sentido de que se possa maximizar também o debate.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e toda a equipa do Ministério das Finanças já estiveram aqui, nesta sala, a fazer a apresentação geral das orientações macroeconómicas sobre o Orçamento do Estado para 2007, orientações estas que, naturalmente, condicionam e dirigem as várias políticas públicas sectoriais. Portanto, não só porque o Sr. Ministro de Estado e das Finanças já o fez mas também por eu próprio não ter qualquer competência nesta matéria, não farei quaisquer observações sobre estas questões de carácter geral e concentrar-me-ei, particularmente, naquelas que são as orientações relativas ao orçamento do Ministério da Defesa Nacional.
Não posso, porém, nesta ocasião e dado o contexto em que estamos, deixar de fazer uma referência ao quadro em que se desenvolve o orçamento da Defesa Nacional para 2007, que é, como todos sabem — e isto, enfim, não é excepção à regra do Orçamento do Estado em geral —, um quadro de contenção e de esforço de consolidação das finanças públicas no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). E, portanto, se assim é para o Orçamento do Estado em geral, também o é para o orçamento da Defesa Nacional em particular. Logo, estamos num quadro e num exercício de contenção que não é de facilidade; pelo contrário, é um exercício difícil, devo dizê-lo com muita clareza perante a Assembleia e as Comissões hoje aqui reunidas.
Também quero dizer, com muita clareza, que, apesar das dificuldades e dos sacrifícios que tal implica, do ponto de vista do esforço para a consolidação das finanças públicas, o orçamento para a Defesa Nacional permite cumprir inteiramente as missões essenciais das Forças Armadas.
Foi feito um estudo, um trabalho longo, conjunto e consensualizado com as chefias militares e, apesar do quadro de dificuldades, o resultado final deste orçamento para a Defesa Nacional permite cumprir inteiramente as missões das Forças Armadas.
Aliás, e esta é uma nota que me apraz sublinhar, devo dizer que, apesar do esforço que as Forças Armadas portuguesas têm vindo a fazer não só no quadro do pessoal, porque o processo de profissionalização implicou uma redução de efectivos para cerca de metade — o que vem acontecendo desde há uns anos a esta parte —, mas também com os exercícios de melhor gestão, de racionalização e de optimização de meios, as chefias militares encararam este exercício e este orçamento de uma forma que dá mostras do seu empenho e da solidariedade relativamente ao esforço que o País está a fazer, o que não posso deixar de sublinhar.
Perguntarão os Srs. Deputados: mas este é o orçamento ideal? Não! Não é o orçamento ideal em termos de afectação de recursos, mas é o orçamento, em primeiro lugar, necessário à consolidação das finanças públicas e, em segundo lugar, aquele que permite cumprir todos os compromissos das Forças Armadas e da Defesa Nacional, quer no que diz respeito às estruturas, quer no que diz respeito à modernização e à operação das Forças Armadas portuguesas.
Se os Srs. Deputados me perguntarem como é que leio este orçamento da Defesa Nacional para 2007, eu, que não sou um especialista em números — e confesso que tenho uma vaga noção de estatística, de que já me esqueci, dos primeiros tempos da faculdade —, leio este orçamento a partir de três ou quatro linhas. É, sobretudo, uma leitura política e é esta que partilho convosco.
Começo por dizer que encontro neste orçamento uma linha de convergência do esforço da consolidação das finanças públicas. O orçamento da Defesa Nacional é solidário com um esforço de consolidação orçamental que atravessa todos os sectores da Administração Pública. Não vou perder muito tempo com números, mas, apesar de haver, do ponto de vista da despesa nominal, um aumento de 2,5% quanto à previsão da execução de 2006, é certo — e é isto que exprime esse quadro de solidariedade do orçamento da Defesa Nacional em relação às finanças públicas nacionais — que há um esforço de redução do peso da despesa pública afecta à Defesa Nacional, relativamente ao PIB, da ordem dos 0,1%.
Portanto, a primeira tendência é a de que há um esforço de convergência na consolidação das finanças públicas. Isto significa, como verificaram — os quadros foram distribuídos e não vale a pena perder tempo com isto —, uma descida na ordem dos 4,2% relativamente ao funcionamento normal.
Mas há algo que eu gostava de vos dizer, porque, do ponto de vista do funcionamento concreto e da execução ao longo do ano 2007, é, a meu ver, importante sublinhar: naquilo que concerne ao orçamento de funcionamento, não há cativações. E eu penso que, do ponto de vista da execução e do funcionamento normal da defesa nacional e das Forças Armadas, esta é uma boa notícia.
Ainda neste campo, quero dizer que o esforço de contenção que foi feito, o sacrifício que é pedido e que se traduz nessa economia de 4,2% foi dirigido de uma forma clara a que o sacrifício fosse menor no que diz respeito à operação e manutenção. Isto é, o sacrifício é um pouco maior no que toca ao pessoal, o que, naturalmente, exige racionalização de efectivos — se quiserem, já vamos às explicações —, mas de forma a reflectirse menos (cerca de 2,2%) na operação e manutenção, naquilo que permite um funcionamento e um exercício normal das missões essenciais das Forças Armadas.
Em suma, a primeira linha é esta: um orçamento de solidariedade com o esforço de consolidação das finanças públicas, mas por forma a permitir cumprir todas as missões das Forças Armadas no ano 2007.

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A segunda linha de leitura que faço deste orçamento é a de um aumento, um aumento considerável, no investimento. Há, como os Srs. Deputados viram, um aumento das despesas de investimento, o que significa que se dá uma prioridade à modernização e ao compromisso com o que será o futuro das Forças Armadas portuguesas nos dois grandes sectores de despesa de investimento: a Lei de Programação Militar (LPM) e o PIDDAC. A Lei de Programação Militar não é um mérito do actual Ministro da Defesa Nacional, porque quando chegou ao Governo já a lei estava aprovada pelos Srs. Deputados. E, portanto, não reclamo, obviamente, este mérito.
De qualquer modo, como eu estava a dizer, objectivamente, há um aumento não só nominal mas também percentual do peso da despesa ou do investimento da Lei de Programação Militar e há também — e isto já é importante, pelo que gostava de o sublinhar — um aumento significativo, muito significativo mesmo, no PIDDAC do Ministério de Defesa Nacional. E isto porque, sendo as cativações as mesmas que as do ano passado — não há cativações para o funcionamento e as que há são os mesmos 7,5% para o PIDDAC e os mesmos 40% para a LPM —, se fizermos as contas e compararmos o que é comparável, já com as cativações, verificamos que há um aumento de 4% na Lei de Programação Militar e de 82% no PIDDAC, o que dá um saldo final na ordem dos 10%, em termos de aumento do investimento.
Há, no entanto, uma outra matéria que considero importante e que também gostaria de realçar, pode parecer de menor importância, mas julgo que tem de ser salientada, que é o aumento da dotação para a investigação e desenvolvimento no seio da LPM, o que se traduz numa aposta nas áreas da defesa, da investigação científica e do desenvolvimento, aspectos absolutamente fundamentais para a modernização e para o futuro das Forças Armadas.
Vale a pena chamar a atenção para o facto de, pela primeira vez na história orçamental portuguesa e da Defesa Nacional em particular, as despesas de investimento superarem as despesas de funcionamento. Nós temos 352 milhões de euros para o investimento e 339 milhões de euros para o funcionamento. Portanto, isto também dá a ideia de um caminho que se está a fazer relativamente à modernização das Forças Armadas e à aposta neste domínio.
Por outro lado, e esta é a terceira característica que, a meu ver, se pode realçar relativamente ao orçamento da Defesa Nacional para 2007, há aqui um facto que pode não parecer muito importante mas que, apesar de tudo, eu gostava de referir: há uma evolução na estrutura do orçamento da Defesa Nacional para um paradigma mais moderno das Forças Armadas. O que quero dizer com isto? Quero dizer que a distribuição da despesa por grupos de despesa é bastante mais equilibrada e aproxima-se tendencialmente — não tanto como queríamos, obviamente, mas a realidade não é o nosso desejo — daquilo que será um paradigma correcto da distribuição das despesas. Se tomarmos como modelo ideal a distribuição da despesa com uma estrutura de 50% para pessoal, de 25% para funcionamento e de 25% para investimento, o orçamento para 2007 vai neste sentido. Ou seja, diminui ligeiramente as despesas com o pessoal, de 57% para 55%, aumenta ligeiramente o investimento e mantém, com uma ligeira redução, a operação e a manutenção.
Portanto, verifica-se uma tendência relativamente equilibrada dos valores proporcionais e a caminho daquilo que entendemos que pode vir a ser uma estrutura correcta para o orçamento da Defesa Nacional.
É um princípio de «saúde» orçamental, pode ser difícil de consolidar, mas será, sobretudo, difícil de desenvolver, de crescer nessa tendência. É um esforço que, julgo, deve continuar a fazer-se de forma a não termos de «alargar o fato» à medida que vamos «engordando» mas, pelo contrário, a permanecer com o «fato», neste caso, o uniforme, com alguma elegância, fazendo uma «dieta».
Uma outra característica deste Orçamento do Estado para 2007, no que diz respeito à Defesa Nacional, é a continuação e o reforço da racionalização dos efectivos, das estruturas e dos sistemas. O objectivo que referimos atrás, o de tender para uma distribuição, uma estrutura do orçamento mais equilibrada, exige a continuação e o reforço de uma política de reformas nestas três áreas: racionalização dos efectivos, no que diz respeito ao pessoal; integração das estruturas, quanto às estruturas institucionais; melhoramento ou aperfeiçoamento dos sistemas de gestão.
Muito rapidamente, o que significa isto, ponto por ponto, tendo por base o objectivo de controlo e redução de despesas, de melhor afectação e de rentabilização das receitas, que é, no fundo, o objectivo final? O que significa isto do ponto de vista do pessoal? Significa basicamente duas coisas: primeiro, no que diz respeito ao regime de contrato e de voluntariado, os chamados RC e RV para quem acompanha esta matéria na defesa, a manutenção da sustentabilidade da profissionalização das Forças Armadas, que, até agora, tem sido um sucesso, devo dizer, e os Srs. Deputados sabem que assim é, mas que pode ser ajustado no sistema de forças em função da evolução, sempre com alguma flexibilidade. Portanto, é possível fazer-se um esforço aqui, mas não é neste ponto que se faz ou se deve fazer um verdadeiro esforço de racionalização dos efectivos.
Este é um esforço para a sustentabilidade. A verdadeira área onde se deve fazer o esforço é nos quadros permanentes, na reestruturação das carreiras, para a qual há, neste momento, um grupo de trabalho a fazer um estudo e que dará, certamente, os seus resultados até ao final do mês de Dezembro.
Portanto, as duas áreas são: regime de contrato e voluntariado e, sobretudo, reestruturação de carreiras dos quadros permanentes.
No plano da integração das estruturas também há que fazer e está a fazer-se. É um caminho que se está percorrer. Em breve continuará, e julgo que chegará a bom termo, a reestruturação da estrutura superior da defesa nacional, procurando eliminar duplicações, que ainda hoje existem, entre o Ministério da Defesa

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Nacional, o Estado-Maior-General das Forças Armadas e os três ramos das Forças Armadas, o que, pelos estudos que estão feitos, vai permitir algumas economias de recurso estimadas em 670 000 euros.
Também está em curso, estando uma parte já realizada, a fusão dos institutos no Instituto de Estudos Superiores Militares, o que já deu frutos, do ponto de vista das economias, com uma poupança da ordem de 1,5 milhões de euros. O mesmo registo verifica-se no quadro da saúde que também já deu origem a poupanças claras.
Finalmente, algo que é muito importante e que virá a ter reflexos provavelmente no final de 2007, mas que se projectará de uma forma mais clara em 2008, decorre da grande reforma do Exército, com a extinção das três regiões militares, que virá libertar um conjunto de imóveis militares que serão utilizados e rentabilizados em várias áreas, nomeadamente na modernização das infra-estruturas, do armamento e nos fins que conhecem dos fundos.
No plano da melhoria da gestão há também um processo que está em curso, que precisa de ser aprofundado e reforçado. Destaco a implementação do sistema integrado de gestão, que conhecem, a consolidação e o alargamento do âmbito da central de compras do Ministério da Defesa, que já produziu economias de escala e poupanças da ordem dos 6 000 000 €, e, depois, algo que também está a ser trabalhado, que é a dinamização dos serviços partilhados, ou seja, dos serviços jurídicos, financeiros, de contabilidade, etc., que, potenciada, virá a dar poupanças estimadas de cerca de 600 000 €.
Em quinto lugar, deixo uma nota breve sobre o que me parece merecer, apesar de tudo, uma palavra. Refiro-me às condições de sustentabilidade do Orçamento a médio prazo e, em particular, às questões, conhecidas de todos os Srs. Deputados, que estão relacionadas com o património e o imobiliário. Conseguiu-se, de forma feliz, que na proposta de Orçamento do Estado para 2007 fosse introduzida uma cláusula que permite ao Ministério da Defesa Nacional a afectação de 100% dos rendimentos da alienação do património para o próprio Ministério da Defesa, rendimentos que serão aplicados nas áreas a que estão consignados. Penso que isto é importante e que é um instrumento fundamental não só para uma futura lei de infra-estruturas que permita modernizar e rentabilizar o património das Forças Armadas e da defesa nacional mas também para a modernização de equipamentos e para os fundos de pensões e dos antigos combatentes. Devo dizer, contudo, que para o Fundo dos Antigos Combatentes não há património que chegue! Mas, enfim, lá iremos! Termino, portanto, com o que é, para todos nós, a «jóia da coroa» da defesa nacional e das Forças Armadas, que são as Forças nacionais destacadas. Quanto a este aspecto, devo dizer que se verifica, para 2007, a manutenção do orçamento de 2006, ou seja, 58 000 000 €. É esta a parte nobre do produto operacional das Forças Armadas e é isto que julgo ser, indiscutivelmente, a «jóia da coroa».
Apesar de haver uma nova missão no Líbano, estes 58 000 000 € parecem-nos poder ser conjugados com a retracção de outras missões que estão a terminar, nomeadamente a do Congo e, a partir da Primavera de 2007, a da Bósnia. Como tal, esta retracção em dois teatros de operações militares permite, de certa forma, compensar o do Líbano. Mas é preciso dizer também que, sendo esta uma operação das Nações Unidas, é ressarcida em 70%, pelo que essa despesa poderá ainda ser minorada, embora tenhamos de ter a prudência — porque, normalmente, esse ressarcimento das Nações Unidas é lento — de considerar que o encaixe possa já não ser feito em 2007 mas, sim, em 2008. De qualquer forma, de acordo com as estimativas, isto é possível e é exequível.
Concluo, dizendo que, se me perguntassem o que é que sintetiza esta proposta de orçamento para a defesa nacional para 2007, responderia da seguinte forma: a vida vai ser fácil? Não!! A vida vai ser difícil! Vamos cumprir as missões essenciais das Forças Armadas e da defesa nacional? Sim, vamos cumprir as missões essenciais das Forças Armadas e da defesa nacional!

O Sr. Presidente: — Para iniciar a primeira ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, antes de mais, queria cumprimentar o Sr.
Ministro da Defesa Nacional e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos do Mar, fazendo votos para que as suas tradições académicas e diplomáticas sejam usadas a bem da defesa e para que, de alguma maneira, as suas tradições possam valer contra as tradições socialistas em matéria de defesa nacional. Digo-o porque, de facto, a tradição socialista em matéria de defesa nacional é a de apoucar ou de desgraduar continuamente as funções de soberania, nomeadamente as funções militares da República Portuguesa, as funções de defesa nacional.
Na verdade, olhar para um Governo socialista, no que diz respeito à defesa nacional, é — perdoar-me-á o Sr. Ministro e o seu conhecimento de História pelo facto de não fazer a citação correcta da fonte — lembrar uma frase geralmente atribuída a Bette Davis. Dizia ela: «When I’m good, I’m good. When I’m bad, I’m very, very bad»! A verdade é que os socialistas, quando estão no governo, são muito, mas mesmo muito maus para a defesa nacional. Já que estamos a falar de Bette Davis, diria que não me lembro deste Governo socialista invocando, por exemplo, o filme A estrela, mas há um filme curioso com esta actriz, com o nome de Payment on demand. Ora, penso que nesta reunião da Comissão de Orçamento e Finanças o Payment on demand não é, certamente, o melhor elogio possível, mas é um regresso às origens do puro parlamentarismo…

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É, portanto, nesta Comissão parlamentar que devemos falar não da história e tradição dos governos socialistas, que conhecemos há largos anos, mas, sim, da engenharia do Partido Socialista. É que todos compreendemos o que o Governo nos diz sobre contenção, até porque, quando estivemos no governo, fomos solidários para com o esforço nacional de controlo das finanças públicas. A verdade, porém, é que nunca penalizámos as funções de soberania, porque, nestas matérias, é necessário olhar para Portugal e para as Forças Armadas sentindo que estamos a olhar para três gerações de portugueses: para os que combateram, e que hoje são comummente chamados de antigos combatentes; para os actuais combatentes, os militares dos quadros, as suas carreiras, estruturas e equipamento que utilizam; e, finalmente, para a geração dos jovens, dos que poderão tomar o caminho da profissionalização. É a estas três gerações e a estes três problemas que acabei de identificar que um orçamento tem de responder. O orçamento tem de responder à questão que procura saber qual a razão de ser das Forças Armadas e da instituição militar em Portugal. Isto porque se não queremos valorizar a instituição militar retraímos o orçamento, claro! Vamos, então, à engenharia orçamental. Desde logo, gostava de fazer um pequeno sublinhado acerca do método. A nota explicativa que nos foi entregue, por engenharia financeira e não sei se por outra razão política mais funda, limita-nos a uma análise comparativa entre o Orçamento do Estado proposto para 2007 e a estimativa de execução. É a primeira vez que isto acontece com as notas explicativas enviadas a este Parlamento. Normalmente (até o último governo do Partido Socialista o fez), eram-nos sempre enviadas as variações comparativas da estimativa de execução com o orçamento inicial do ano anterior. Ora, como o Sr. Ministro saberá (e por isso falo numa eventual questão política de fundo), a comparação com a estimativa é sempre mais benéfica para um Governo que vê diminuir as suas verbas, como é o caso deste.
Por outro lado, quando falo da tradição de desgraduação e de apoucamento da defesa nacional pelo Partido Socialista não o faço «no ar» mas, sim, com dados concretos. A verdade é que se olharmos para a documentação e para os orçamentos da defesa no século XXI, ou seja, para os orçamentos de 2000 a 2007, o que constatamos, Sr. Ministro, é que o orçamento para a defesa que o Governo do Partido Socialista propõe para 2007 é o equivalente ao orçamento que aqui, nesta Casa, o ministro Castro Caldas apresentou para 2000.
Repare que estamos a falar de um orçamento de 1069 000 000 € em 2007 e que estávamos a falar de 1064 000 000 € para o ano 2000!... O Sr. Ministro dir-me-á que isto são engenharias, mas eu direi que isto é triste para quem, como o PSD, gosta de preservar a dignidade da instituição militar. Citarei, aliás, um membro do Partido Socialista, o Deputado Marques Júnior, com a estima que por ele tenho. Em 2000, dizia o Deputado Marques Júnior, «o problema que pode surgir, e surge com este orçamento da defesa, é o facto de ser o mínimo dos mínimos, pois representa 1,6% do PIB, enquanto a União Europeia caminha para 1,8%». Ora, em 2000 o orçamento da defesa rondava os 1,6% do PIB e um Deputado do Partido Socialista dizia — é o que consta do Diário — que esse era «o orçamento mínimo dos mínimos», citando, curiosamente, o ministro Castro Caldas. Ora, quero ver, com franqueza, o que é que, sete anos depois, o Partido Socialista dirá das mesmas verbas. Aliás, já que estamos a actualizar as fontes, direi ainda que o Sr. Ministro e o seu Governo retiraram ao funcionamento das Forças Armadas, de 2006 para 2007, 80 000 000 €. A verdade, porém, é que desde que o Engenheiro Sócrates é Primeiro-Ministro as Forças Armadas portuguesas receberam menos 236 000 000 €!! Estas são, portanto, as questões de princípio que me levam a discordar da indicação que aqui nos deixa de que o orçamento para a defesa tem um crescimento de 2,5%. Se nós fizermos a comparação não com a estimativa de execução mas com o Orçamento inicial de 2006, temos que o orçamento da defesa desce 6,8%, valor que seria ainda mais elevado não fosse o facto, que o Sr. Ministro referiu e muito bem, de a Lei de Programação Militar ter um crescimento exponencial de 73,4%. Ou seja, este Orçamento, em termos reais, é um mau Orçamento para a defesa e uma má notícia para as Forças Armadas portuguesas. Aqui realço, tal como o Sr. Ministro fez, o esforço patriótico a que as chefias militares se conduziram ao longo da discussão e — porque presumo que o façam — conduzirão ao longo da execução deste exercício em 2007.
Também é preciso dizer, Sr. Ministro, e estes já são dados que qualquer mapa vindo do Ministério da Defesa não consegue escamotear, que o peso do orçamento da defesa nacional no peso da administração central baixa de 3,9% para 3,8%, enquanto o seu peso em percentagem do PIB baixa de 1,4% para 1,3%.
Estas são realidades indesmentíveis!! O Sr. Ministro gaba-se da dotação da Lei de Programação Militar, mas a verdade, uma vez mais sublinho, é que foi com o Governo do Engenheiro Sócrates que as cativações da Lei de Programação Militar, até então de 20%, passaram para 40%.
O PIDDAC, de facto, aumenta, mas a verdade é que, pela primeira vez, há uma alteração das rubricas orçamentais, visto que a fiscalização deixa de estar na Lei de Programação Militar e passa para o PIDDAC.
Isto é, se mudarmos uma cadeira de sítio, o local para onde ela vai fica logo cheio! As forças nacionais destacadas ficam a um nível idêntico ao do ano passado e há uma diminuição, que o Sr. Ministro, como eu, lamentará, nas verbas da cooperação técnico-militar. Ora, porque África é um desígnio nacional, devíamos ter alguma cautela nessa matéria.
E chegamos aos antigos combatentes. Neste domínio, não resisto a ir à pág. 27 da nota explicativa do seu Ministério. Os antigos combatentes perderam a designação governamental — já o ano passado tinham perdido a graduação política —, mantêm, no entanto, a honra de um dia terem sido militares.

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A verdade é que aquilo que leio sobre a política de apoio aos antigos combatentes me intriga, desde logo, porque no ano passado, nos órgãos e serviços centrais e gabinete dos membros do Governo, tínhamos uma definição clara do valor do Fundo dos Antigos Combatentes, que era de 35 milhões de euros, e este ano desaparece — estão lá inscritas transferências em DCCR no valor de 81 milhões. Ora, eu gostava de saber, desses 81 milhões, quais são aqueles que o Sr. Ministro transferirá para o Fundo.
Mas, depois, há aqui uma alínea fantástica que diz: «Competência do processo dos antigos combatentes: processar, digitalizar e digitar os requerimentos dos antigos combatentes emigrantes, advogados, bancários, solicitadores e jornalistas, procedendo ao posterior envio dos dados informáticos para os regimes da segurança social». Gostava que o Sr. Ministro me contabilizasse também, no universo dos antigos combatentes, estes combatentes que, por via da aprovação da Lei n.º 21/2004, também ficaram com direito ao acesso.
São estas as duas questões que lhe coloco: «cadê» o fundo — uma pergunta muito clara — e o que é que o Sr. Ministro vai fazer destes novos combatentes, que não estavam no universo da Lei n.º 9/2002, e também por que é que diminui o dinheiro aplicado ao departamento dos antigos combatentes? Com isto, Sr. Ministro, chegamos à natureza da defesa.
Peço imensa desculpa de dizer-lhe, uma vez mais, que este Governo do Partido Socialista diminui as verbas com operações de manutenção em cerca de 2% — e estes números são, uma vez mais, dos documentos que nos entregou.
Gostava também de saber, Sr. Ministro, como é possível, numa fase de estabilização da Lei do Serviço Militar, da profissionalização, baixar as verbas disponíveis para a Lei do Serviço Militar, que passam de 7 milhões de euros para 5, 4 milhões de euros.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Orador: — Terminarei muito rapidamente, Sr. Presidente.
No ano passado esta Câmara teve consciência dos números exactos das transferências para a Cruz Vermelha Portuguesa, para a Liga dos Combatentes e para a Associação dos Deficientes das Forças Armadas, mas nesta nota explicativa esse número aparece num «bolo» sem definição clara.
Termino, Sr. Ministro, com duas notas muito breves: uma é para saber se V. Ex.ª é sensível aos argumentos da Associação dos Deficientes das Forças Armadas — dos quais, Sr. Presidente, se me permite, leio um pequeníssimo parágrafo — que têm a ver com as alterações aos artigos do IRS e dos benefícios fiscais: «A Associação dos Deficientes das Forças Armadas sempre defendeu, e continua a defender, que as pensões dos que, na flor da vida e no cumprimento do dever militar, foram levados a combater numa guerra para que a Pátria os chamou têm carácter indemnizatório, pelo que os seus montantes nem sequer devem estar sujeitos a qualquer tributação, pois demos ao Estado o mais alto valor que possuíamos para ter o reconhecimento económico e moral que a Nação nos deve — o próprio sangue».
Julgo que a tradição académica de valores militares que o Sr. Ministro e também o Sr. Secretário de Estado respiram serão sensíveis a este argumento, não sei é se o Governo socialista será, porque também não foi sensível ao seguinte argumento: com estas verbas, os ramos quantas horas de voo podem fazer? Funciona ou não funciona a esquadra? Por isso, Sr. Ministro, termino como comecei: de facto, este Governo desgradua as funções de soberania e o que deve prevalecer aqui não é o argumento do controlo das finanças públicas mas, sim, o nome de Portugal e a instituição militar.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado excedeu ligeiramente o seu tempo, mas estamos com um controlo razoável de tempo.
Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, vou ser relativamente breve.
Sr. Ministro da Defesa Nacional, quero dizer-lhe que esta proposta de Orçamento do Estado não me surpreende. Aliás, devo dizer que, se o orçamento do Ministério da Defesa Nacional registasse um acréscimo, creio que aí poderíamos falar num Orçamento socialmente mais injusto, na medida em que seria motivo de forte polémica que, num quadro em que vão aumentar as dificuldades para a generalidade dos portugueses, designadamente para aqueles com menores recursos, e em que os orçamentos para a área social vão ser fortemente penalizados, houvesse um aumento do da Defesa Nacional. Isso seria, obviamente, muito questionável. Portanto, não me surpreende! Embora deva registar, algo que já foi aqui registado, que é o seguinte: o termo de comparação que nos é apresentado para este orçamento é o da execução estimada e não a dotação que foi inscrita para 2006. Portanto, estamos a comparar realidades que, em rigor, não são comparáveis, para além de estarmos a trabalhar com base numa estimativa…, um pouco como acontece com as cobranças do consumo de electricidade, que agora são feitas com base num consumo estimado. Não sabemos qual será a execução de 2007 e, portanto, não podemos comparar a execução de 2006 com a inscrição de 2007, teríamos de comparar a inscrição de 2006 com a inscrição de 2007. Aí teríamos um termo de comparação, que agora não temos.

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Refere-se um aumento percentual de 2,81%, que é virtual, porque, se compararmos com a dotação inscrita inicialmente para 2006, teremos uma quebra que andará à volta de 0,5%. Este é o aspecto que eu queria referir em primeiro lugar.
Quanto às várias componentes orçamentais, o orçamento consegue ser socialmente injusto, reflectindo, segundo creio, alterações legislativas que foram aprovadas há alguns meses atrás, e aqui gostaria que houvesse da parte do Sr. Ministro algum esclarecimento.
É porque as duas componentes deste mapa global do orçamento do Ministério da Defesa Nacional que registam decréscimos muito significativos são as remunerações de reserva e os encargos com a saúde. Imagino — e o Sr. Ministro confirmará ou não — que o decréscimo previsível nas remunerações de reserva terá a ver com as limitações na passagem à reserva que decorrem da legislação que foi aprovada, que restringe muito as possibilidades de acesso à reserva.
Depois, existe também uma redução drástica dos encargos com a saúde. Sabemos que houve também alterações legislativas lesivas para o direito à saúde dos militares e dos seus familiares. Na altura em que se discutiu a legislação, afirmava-se que também não era tanto como a oposição dizia, mas o orçamento aqui está, estimando-se, em 2006, uma despesa de 123,6 milhões de euros de encargos com a saúde, que cai para metade em 2007, isto é, para 62,5 milhões de euros. À custa do quê é isto possível?

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Da saúde!

O Orador: — Diz bem o Sr. Deputado Hugo Velosa, é à custa da saúde! Gostaríamos de saber o que é que vai acontecer. Trata-se de uma reestruturação de serviços? Do encerramento de serviços? De perda de benefícios sociais? Como é que o Governo consegue esta «proeza», que não é uma proeza, porque, infelizmente, não é de aplaudir, de reduzir para metade os encargos com a saúde do Ministério da Defesa Nacional. Devo dizer que este é um aspecto que me preocupa e creio que é, numa primeira leitura, o aspecto mais negativo que ressalta desta proposta de Orçamento do Estado.
Agora, algumas perguntas concretas. O Sr. Ministro fez uma alusão aos fundos de pensões, nos quais, desde há vários anos, se tem vindo a falar muito, e tem sido salientada a sua ruptura financeira e a sua «falência» — este termo já chegou a ser utilizado. Ora, eu gostaria de saber qual é o ponto da situação relativamente os fundos de pensões dos militares.
Gostaria também de saber o que é que vai acontecer na orgânica do Ministério da Defesa Nacional relativamente ao PRACE, porque ele não pode também deixar de ter implicações orçamentais. O PRACE foi apresentado com grande aparato mediático, tendo sido apresentados organigramas comparados dos vários ministérios, e o do Ministério da Defesa Nacional sofria alterações muito significativas, apesar de aquele que era apresentado como o organigrama actual não estar correcto, porque não é bem aquele, com a extinção de várias instituições e a fusão de outras.
Portanto, de duas, uma: ou isso não é para 2007 ou, se é para 2007, eventualmente, terá de ter alguma tradução orçamental, porque, senão, dir-se-ia que nem valeria a pena. Gostaria, por isso, de saber o que é que está previsto no Ministério da Defesa Nacional em 2007 relativamente à aplicação do PRACE e para quando.
O Programa do Governo para a Defesa Nacional prevê várias medidas de modernização em vários aspectos e, a certa altura, refere-se a «Reforma do modelo de organização da Defesa e das Forças Armadas, de modo a reestruturar o dispositivo e a optimizar as condições de comando e controlo operacional das missões das Forças Armadas (…), que deverá conduzir à criação, por etapas, de um Estado-Maior da Defesa». Isto está no Programa do Governo, mas nunca mais se falou em tal. Ora, eu gostava de saber o que é que o Sr.
Ministro pensa disto, se tenciona tomar alguma medida em 2007 que vá no sentido do que está aqui previsto no Programa do Governo, ou seja, da organização do modelo de Defesa e das Forças Armadas com a criação de um Estado-Maior da Defesa.
Uma outra pergunta tem a ver com a reestruturação das carreiras. É sabido que está a funcionar um grupo de trabalho sobre a reestruturação das carreiras. Sabemos que é uma matéria que, evidentemente, não é fácil, é muito complexa, dada a multiplicidade de carreiras e os vários problemas que se colocam quanto à progressão nas carreiras dos militares. Gostava de saber se haverá resultados desse grupo de trabalho para 2007 e em que sentido. Portanto, a minha pergunta é a de saber qual é o ponto da situação relativamente ao grupo de trabalho da reestruturação de carreiras e se essa reestruturação terá consequências em 2007.
Finalmente, duas últimas perguntas também concretas: primeira, qual é o ponto da situação quanto aos F16, uma vez que, na revisão da Lei de Programação Militar, foi prevista a redução do seu número? Há uns anos atrás foi anunciado que estaria pronto um F16 em cada três meses, mas na última revisão da Lei de Programação Militar foi decidido que uma das frotas de F16 seria alienada. Ora, eu gostaria de saber qual é o ponto da situação relativamente a isto.
A última pergunta, também muito pontual, é a de saber se há alguma decisão tomada relativamente à manutenção dos novos helicópteros EH-101, concretamente se a manutenção será feita ou não nas OGMA, em Portugal.
Com isto termino, por agora, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero cumprimentar o Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, o Sr. Secretário de Estado e as minhas colegas e os meus colegas aqui presentes.
Eu não vou utilizar a frase, que tinha não sei o quê de humorístico, que foi utilizada pelo Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas, mas vou citar uma frase… O Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas falou de «engenharia» e eu acho que este orçamento tem sobretudo muita «criatividade», e vou citar uma frase de um antigo primeiro-ministro francês, Poincaré, que dizia sobre esse exercício de, às vezes, se tentar esconder as coisas com alguma criatividade: «A mente usa a sua faculdade de criatividade apenas quando a necessidade ou o desespero obriga a fazê-lo». E, de facto, parece-me que o Sr. Ministro está aqui numa situação de necessidade evidente de esconder o óbvio. E esta «criatividade» que aparece neste orçamento tem a ver com uma coisa que é importante e óbvia, que é a escassez de meios que tem este orçamento.
Foi dito pelo Sr. Ministro — bem, e concordo com esta frase — que a «vida não será fácil no próximo ano».
São as palavras do Sr. Ministro, apesar de considerar que as verbas são necessárias para manter em funcionamento as nossas Forças Armadas e cumprir com os seus deveres constitucionais.
Em relação a este orçamento tenho um conjunto de dúvidas e outras perguntas, e algumas vão no sentido do que já aqui foi dito pelos Srs. Deputados António Filipe e Henrique de Freitas.
Mas, antes de mais, eu gostaria de fazer uma análise sobre «o óbvio». Nestes dois anos de governo do Partido Socialista, relativamente ao orçamento da defesa nacional inverteu-se um rumo que tinha acontecido no anterior governo de coligação do Partido Social-Democrata e do CDS-PP, que foi: em 2001, «bateu-se no fundo» em relação à proporção e ao valor do orçamento da defesa nacional em relação ao PIB, tendo chegado a 1,2-1,3%; o anterior governo inverteu esse ciclo e, gradual, sustentada e progressivamente, foi-se evoluindo para 1,3%, 1,4% e 1,5% em 2005, sendo que no orçamento de 2006, desceu-se para 1,4% e neste orçamento já baixa para 1,3%.
Portanto, aquele pedido e requisitos, que muitas vezes defende, quer na União Europeia quer também na NATO, a pedir para a próxima sessão 1,8%..., este Governo inverteu esse ciclo de aproximação. E esse é um dado negativo em relação às nossas obrigações internacionais e também a um dever que é o de garantir as funções de soberania.
Este orçamento é preocupante porque contém também em si um conjunto de indicações e mecanismos que podem transformá-lo num instrumento de gestão complicado e insuficiente para as necessidades da defesa nacional e para as Forças Armadas.
Esses factores preocupantes são, em primeiro lugar, as cativações. Temos a cativação da Lei da Programação Militar, que se mantém a 40% e pode ter o Sr. Ministro certeza de que com este Ministro das Finanças essa cativação vai acontecer, de certeza absoluta; aconteceu e irá acontecer também este ano!! Já agora, porque não está escrito, não é claro e tem a ver com um compromisso do Governo com o CDSPP aquando da votação da Lei da Programação Militar, pergunto se estão mais ou menos garantidas duas coisas: por um lado, que estas cativações não vão afectar os programas já contratualizados — aliás, tencionamos apresentar uma alteração ao orçamento que irá deixar isso claro —, e, por outro lado, que na transição de saldos da LPM — e, olhe…, tenha cuidado porque o Sr. Ministro das Finanças não lhe vai lembrar isso e vai fingir que isso não existe…! — as cativações também não afectariam essas transições, porque senão pode ter a certeza de que esta lei fica totalmente descaracterizada em relação à sua aplicação.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Também deixo aqui referido aquilo que foi realçado pelos meus dois anteriores colegas e que é verdade: este relatório tem um conjunto de elementos para tentar esconder a realidade, nomeadamente quando põem na LPM um aumento fabuloso de 179 milhões de euros, para o valor actual de 311 milhões de euros. Obviamente este relatório está a comparar o que foi realizado e executado este ano na LPM com o que é projectado para o ano e, portanto, a comparação era, mais uma vez, o que estava projectado para este ano de 2006, que era 300 milhões de euros para 311 milhões de euros. Portanto, o aumento não é de 73% mas, sim, de 3,9%!! Aliás, quanto aos dados em relação ao orçamento, temos de comparar «o óbvio» e o orçamento deve ser comparado ao projectado, o indicado no ano passado para este ano, e a diminuição, como sabemos, não é um aumento, como foi dito pelo Governo, de 2,5% mas é uma diminuição de 2,9%, porque de 2107 milhões passamos para 2046 milhões. Trata-se, portanto, de uma diminuição!! Outro aspecto preocupante tem a ver com outras cativações que podem influenciar este orçamento da defesa nacional, porque não é só na LPM, pois na leitura que fiz do orçamento existem outras cativações que vão influir 7,5% das cativações que é afecta aos investimentos do Estado, o PIDDAC. Bem sei que essa cativação é para o «bolo» todo e que, eventualmente, tanto pode não cair como pode cair na defesa nacional.
Portanto, pergunto se o Sr. Ministro está em condições de garantir que esta cativação de 7,5% em relação aos investimentos do Estado, PIDDAC, não vão ter influência sobre a verba — que é boa, reconheço, aumentou –

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prevista para a defesa nacional e tem a ver também com um compromisso assumido pelo Governo em relação à votação da LPM sobre o PIDDAC para os patrulhões.
Por outro lado, também em relação à disciplina orçamental, o Orçamento do Estado fala de 5% de cativações em relação a todos os serviços e fundos autónomos.
Portanto, estamos a falar em relação à defesa nacional do Arsenal do Alfeite, das Oficinas Gerais de Fardamento e Engenharia, dos laboratórios, da Manutenção Militar, do Instituto Hidrográfico e do Instituto da Acção Social das Forças Armadas. Portanto, será que estas cativações também vão cortar em relação a este aspecto? Portanto, as cativações preocupantes não são só em relação à LPM, que já em si é preocupante, mas também o que afecta os outros órgãos e funções e items que têm a ver com a defesa nacional.
Em relação às forças nacionais destacadas, por um lado, quero manifestar o nosso apoio ao Governo em relação às decisões tomadas na manutenção das nossas Forças Armadas nos vários teatros de operações, o CDS continua firmemente ao lado do Governo nesta matéria. A verba parece-me razoável, tendo em conta que vai haver uma retracção do efectivo da Bósnia. Esperamos que tudo não corra mal no Congo…, vamos ver se, depois das eleições, isso não se transforma numa situação complicada e, como a União Europeia está envolvida «até ao pescoço» para que aquilo corra bem, se calhar vamos ter outras responsabilidades não previstas…! Mas o Sr. Ministro também não controla isso e Deus queira que corra tudo bem.
Por outro lado, e baseado num elemento optimista — eu gosto das pessoas optimistas, não critico isso —, é de esperar que as Nações Unidas nos ressarciem num tempo recorde, o que nunca aconteceu e dificilmente irá acontecer no próximo ano. Mas vamos esperar que, com um novo Secretário-Geral, e coreano (os asiáticos são mais disciplinados), o pagamento das Nações Unidas seja feito.
Houve aqui um elemento para o qual alertou o Deputado António Filipe e que, de facto, me preocupa — e eu não percebo como é que o Sr. Ministro me vai conseguir explicar isso sem dizer que há suborçamentação — e que tem a ver com os encargos da saúde e com as pensões de reserva. Há uma diminuição acentuada e mesmo tendo em conta, como o disse o Deputado António Filipe que houve alterações em relação a isso sobre um conjunto de benefícios, que erradamente, e mal, o Governo tirou aos militares nesta matéria e às suas famílias, não consigo perceber esta diminuição na ASFA (Acção Social das Forças Armadas) ou, então, o Sr. Ministro está a apostar que os militares e as suas famílias para o ano vão ter uma saúde e um bem-estar de tal ordem que não vão ficar tão doentes, o que eu considero muito difícil tendo em conta as medidas do Governo e o stress criado — aliás, em todos os cidadãos e as cidadãs portuguesas em relação a essa matéria, mesmo se parte será financiado pelo Instituto de Acção Social das Forças Armadas (IASFA), que me parece que deve ser mais ou menos a solução que os senhores encontraram; mesmo assim, não consigo perceber estas diminuições. Como foi dito aqui pelo Deputado António Filipe, são menos 49% na saúde e menos 25% com as pensões de reserva. Eu gostaria que o Sr. Ministro falasse mais sobre essa matéria.
Há uma questão que não consegui ainda entender, porque não há explicação ou, se calhar, há uma explicação razoável para isso, e que tem a ver com a diminuição drástica das despesas de formação do Ministério da Defesa Nacional.
Há uma diminuição global no Orçamento do Estado para todos os Ministérios, mas o da Defesa Nacional tem uma descida brutal, de 44%, e eu não sei o que é que isso… São 6,4 milhões de euros que são afectados. Há algumas diminuições noutros Ministérios, mas não entendo uma diminuição de tal ordem. Aliás, isso foi alvo de um artigo no Jornal de Negócios, que fala sobre isso mas que também não conseguiu encontrar explicação… Nem há na nota explicativa no Relatório do Orçamento do Estado nada explicado sobre o motivo por que acontece este corte tão brutal em relação à formação.
Finalmente, há uma coisa que me preocupa e que também já foi aqui levantada por outros Srs. Deputados: a redução de 5,3% no exército e de 4,5% na força aérea é muito preocupante — a Marinha mantém-se mais ou menos com 1,1% de decréscimo. Das duas, uma: ou o Sr. Ministro nos vai anunciar uma diminuição dos efectivos do exército que poderá compensar isso ou, então, é preocupante porque, tendo em conta que temos agora um exército totalmente profissionalizado as despesas existem e, portanto, é preocupante.
Por outro lado, a diminuição na força aérea. Também sei que há um problema que acontecia no nosso tempo e que continua a acontecer, que é a falta de condições que dadas aos nossos pilotos para se manterem na força aérea e que, depois, no momento certo, pedem o abate ao quadro e vão-se embora para a TAP e para outras companhias aéreas.
Ora, se estamos a diminuir a verba de funcionamento da força aérea, temos aqui um problema que é o de não criar as condições para eles estarem interessados em continuar.
Aliás, gostaria de relembrar que apresentámos um projecto de lei nesta Assembleia da República, que ainda não foi agendado porque estamos à espera que o Governo também apresente a sua proposta de lei sobre a alteração da obrigação de os pilotos ficarem 12 anos e não oito, para evitar essa debandada que acontece.
Relativamente aos antigos combatentes, em primeiro lugar, gostaria de manifestar a minha satisfação com o Governo mas também a minha preocupação. A minha satisfação foi porque no ano passado apresentámos uma proposta em relação ao Fundo dos Antigos Combatentes , sendo que o CDS sempre se disponibilizou para arranjar, eventualmente, outro tipo de financiamento para o Fundo dos Antigos Combatentes . De facto, somos contra a alteração da lei e, por isso, questiono o Sr. Ministro, no sentido de saber se já tem em mente a

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alteração da lei, isto porque o anterior ministro disse que ia alterar o universo de beneficiados por essa mesma lei.
Por outro lado, o Governo veio com uma proposta de financiamento deste fundo que era igual àquela que nós propúnhamos, que era, obviamente, a alienação do património das Forças Armadas, que poderia, num primeiro tempo, financiar este fundo. O Governo tem isso agora incluído no orçamento, o que é positivo e vai no sentido que nós defendíamos. É pena que o PS, no passado, tivesse chumbado essa nossa proposta.
Tivemos o voto favorável do Partido Social-Democrata e a abstenção das outras bancadas, mas o PS, à época, votou contra. Portanto, as boas ideias ficam e isso é positivo.
Dou os parabéns ao Governo ou, melhor, concretamente a este Sr. Ministro, que, pelo menos, conseguiu que 100% da venda de património da defesa nacional passe, agora, a ser exclusivamente para a defesa nacional e isto é um avanço. Deverá ser provavelmente o único neste orçamento, mas convém realçá-lo e isso também é positivo.
Finalmente, e termino com esta questão, Sr. Ministro, o PIDDAC: vi que há algumas verbas de aumento em relação ao PIDDAC. Portanto, o Governo está a cumprir também o compromisso que fez connosco sobre o financiamento dos projectos nos estaleiros nacionais de Viana do Castelo. É óptimo! Mantém uma empresa necessária à economia nacional, a um distrito que muito necessita, a trabalhadores que estão envolvidos no projecto e a Marinha precisa deste projecto. É muito positivo que assim aconteça.

O Sr. Ramos Preto (PS): — Só coisas boas!

O Orador: —Agora, tem de ter em conta um conjunto de coisas: o projecto está atrasado, portanto, os custos aumentaram, e há que saber se se tem em conta também esse aumento de custos. Temos de ter também em conta que é necessário, se calhar a longo prazo, o Governo definir o financiamento desse projecto. Não seria boa ideia ter uma resolução do Conselho de Ministros prevendo já nos próximos cinco ou seis anos o financiamento aos estaleiros para dar estabilidade ao projecto todo e permitir, portanto, em termos de negociação empresarial, uma melhor disponibilidade para isso.
E termino, Sr. Ministro, com o fim, que é: na classificação que darei a este orçamento o termo correcto será «sofrível»…

O Sr. Ramos Preto (PS): — «Sofrível» é 10!

O Orador: — «Sofrível» que é um nove em 20, não é positivo. Sofrível porque ainda tem mecanismos para evitar que isto não corra mal. Mas se tudo acontecer, como foi dito, nas cativações, na falta de vontade no exercício das finanças, que já o demonstrou claramente na primeira proposta que fez de orçamento de defesa nacional, que era péssima, se isso acontecer, aí, sim, vamos ter problemas. Portanto, espero que o Sr. Ministro tenha a capacidade de evitar isso.
Termino, dizendo, que este orçamento é preocupante, é perigoso, tem potencialidades, mas está «preso por fios», Sr. Ministro. Evite que isso aconteça.

O Sr. Presidente: — Seguindo agora a ordem das intervenções, temos a do Sr. Deputado Fernando Rosas, a quem dou a palavra. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, vou ser breve, em relação à análise desta proposta de lei de Orçamento.
Em primeiro lugar, quero dizer que a escassez de meios do orçamento da defesa nacional é a forma possível de minorar a injustiça global, do ponto de vista social deste Orçamento do Estado e, portanto, não é uma coisa que nos incomode, como relativamente a outras bancadas.
Quero também dizer que, em relação aos termos de comparação, perfilho as anotações que aqui foram feitas. Na realidade, os números que nos foram apresentados fazem comparação entre valores executados e valores estimados, e não entre valores estimados entre si, o que pode deformar as conclusões a que se chegue, em relação às percentagens de diminuição ou aumento das verbas que aqui estão inscritas.
Quero chamar a atenção para o facto de que o orçamento da defesa nacional parece inclinar-se para uma racionalidade que é diminuir despesas de funcionamento e aumentar despesas de investimento. Com isto, o que acontece, na realidade, é que as despesas de funcionamento normal, apesar de tudo, se mantêm excepcionalmente altas — 68% do orçamento é para despesas de funcionamento normal —, o que parece significar que a reestruturação da função pública ainda não será contemplada no orçamento do ano que vem relativamente ao Ministério de Defesa. E o que se diminui, na realidade, não são tanto as despesas de funcionamento normal mas, sim, como já foi aqui assinalado, os encargos com a saúde, que recebem um corte de menos 61 milhões de euros, ou seja, são reduzidas para metade (49,4%), bem como as pensões de reserva, que recebem um corte de ¼, de menos 25%, o que não pode deixar de ter previsíveis efeitos, aparentemente, nos direitos, nas regalias e nas condições das remunerações acordadas quer para a saúde quer para o sistema de

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pensões militares, que, como se sabe, foram revistos em baixa recentemente. Mas um traço muito nítido deste Orçamento é a diminuição dos direitos e das regalias das pessoas em relação a estes assuntos.
No que toca às verbas previstas, naturalmente, as observações que havia a fazer relativamente à Lei da Programação Militar (LPM) fi-las na altura do debate dessa lei.
Há, obviamente, opções e prioridades da Lei da Programação Militar que, para nós, são altamente discutíveis (outras menos, umas mais do que outras), mas que foram inscritas na Lei e que aqui são aplicadas. Naturalmente, quer em PIDDAC quer em LPM, na nossa maneira de ver, há algumas prioridades que são interessantes e há outras que são claramente discutíveis, mas o que me parece realmente merecedor de atenção é a despesa com as forças nacionais destacadas.
As forças nacionais destacadas, que são a «jóia da coroa» do Sr. Ministro, são uma «coroa» frágil. Sabe que historicamente essa coisa das «jóias da coroa» normalmente acabou mal para quem as tinhas… Mas as forças militares nacionais destacadas correspondem a uma política que merece a nossa oposição no que toca à maioria da sua execução: achamos que são prioridades politicamente erradas e que não são no interesse do país e, neste momento, significam 58 milhões de euros, ou seja, 3,3% das despesas da defesa.
Gostaríamos de saber quais são as verbas gastas «teatro» a «teatro», porque não encontramos no orçamento qualquer elemento que nos possa indicar o que é que se está a gastar em cada um dos «teatros» onde temos forças militares destacadas e seria interessante sabê-lo.
São 58 milhões de euros revestidos de uma grande retórica pseudoconsensual acerca da legitimidade destas intervenções, elas próprias, a maior parte delas, altamente discutíveis. De qualquer maneira, isto significa que são verbas superiores às do PIDDAC neste orçamento, que são de 41 milhões de euros; que são verbas 10 vezes superiores àquilo que gastamos com a cooperação com os PALOP, que, essa sim, deveria ser uma opção muito importante no orçamento de defesa — a cooperação, a formação, a assistência —, a qual está reduzida a uma verba de 6 milhões de euros.
O Sr. Ministro não me levará a mal como velho colega que sou dele, mas faz no orçamento o contrário do que prega nas aulas em matéria de cooperação estratégica com os PALOP. Os PALOP deveriam ser uma opção muito mais importante no orçamento de defesa, no qual são reduzidos a 1/10 daquilo que se gasta com as forças nacionais destacadas.
Portanto, naturalmente, essa é uma objecção de fundo que temos em relação a este orçamento, que não nos incomoda tanto pelo que não gasta mas, sobretudo, por aquilo que em certos aspectos gasta.

O Sr. Presidente: — O Partido Socialista pediu para intervir no final desta ronda. A intervenção está a cargo do Sr. Deputado Marques Júnior, a quem dou a palavra.

O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Sr. Secretário de Estado de Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, Caros Colegas: Vou, agora, fazer uma intervenção sobre o orçamento dizendo que as várias intervenções das diversas bancadas têm coisas com as quais concordo embora de uma forma contraditória.
Por um lado, gostava de dizer aos Srs. Deputados Henrique Rocha de Freitas e João Rebelo que estou perfeitamente de acordo com a ênfase que é colocada na dignificação das Forças Armadas e de todos aqueles que ao serviço das Forças Armadas cumpriram o seu dever nas mais variadas situações, tendo-se muitos deles acidentando com consequências gravíssimas para a sua vida e para as suas famílias. Creio que esse é um traço comum que é muito enfatizado pelos Srs. Deputados, com o qual concordo e gostaria de dizer que estou 100% solidário com esse tipo de preocupação.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — O Governo é que não!

O Orador: — Concordo também com os colegas à minha esquerda, os do PCP e do Bloco de Esquerda, quando se referem à situação de justiça relativa do orçamento relativamente ao Orçamento do Estado, porque é evidente que também seria negativo, mesmo na consideração da opinião pública, para as Forças Armadas que elas beneficiassem, à revelia do Orçamento que estamos a analisar em termos globais para o ano 2007, de um orçamento especial no qual não se fizesse incidir o esforço que é pedido a todos os portugueses.
Portanto, desse ponto de vista, creio que as Forças Armadas terão de compreender esta situação e que este orçamento se enquadra no Orçamento do Estado para 2007, sendo certo que o Sr. Ministro afirmou — e todos reconhecemos que isso tanto sucede aqui como noutros ministérios — que este orçamento é feito em condições de restrição, de dificuldade e que procura acomodar os compromissos internacionais com que Portugal está confrontado e as metas determinadas e assumidas em vários momentos na Assembleia da República e fora dela, nas instâncias internacionais, pelo Governo português.
Logo, é um orçamento que acompanha o esforço que está a ser pedido aos portugueses. Mas há que reconhecer que nestas restrições orçamentais houve habilidade ou engenho (aquilo que quisermos entender) do Governo e das estruturas militares para que o Sr. Ministro possa afirmar — creio eu sem o perigo de ser desmentido — que, e cito, «permite cumprir inteiramente as missões das Forças Armadas».
É evidente que as missões das Forças Armadas, que são a razão de ser da sua própria existência, não poderiam ficar prejudicadas com este ou com qualquer outro orçamento.

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É evidente que as Forças Armadas, a Defesa Nacional e o Sr. Ministro, em primeiro lugar, e todos os outros ministros, diria eu, prefeririam um orçamento que permitisse maior desafogo, equipamento mais adequado, dar melhores condições ao pessoal que serve na Forças Armadas. Todos nós sabemos isso, mas é óbvio que estamos a trabalhar com um orçamento que implica, efectivamente, algumas restrições.
Mas este orçamento, nestas condições, prejudica o essencial do cumprimento da missão das Forças Armadas? Diz o Sr. Ministro que não. E creio que não vai ser desmentido, sendo certo que os chefes militares devem, conforme o Sr. Ministro disse, ter assumido claramente esta situação, isto é, que gostariam que o orçamento fosse diferente, mas que, atendendo às condições com que nos defrontamos, vão aceitá-lo e gerir as Forças Armadas cumprindo as missões com a dignidade que é própria dos militares neste quadro, sendo certo também que este orçamento, com estas restrições, não pode pôr em causa não só as missões das Forças Armadas como ainda, a montante, a sua própria existência.
Refiro isto para dizer o seguinte: há quem defenda que se o orçamento das Forças Armadas for pequeno ou cada vez mais pequeno é um elemento que não tem qualquer preocupação especial, mas isso poderia também conduzir a uma extinção das próprias Forças Armadas. Evidentemente, nós não podemos concordar com essa situação.
Depois, há um outro elemento que penso ser importante: todos nós podemos, relativamente a este orçamento, encontrar rubricas que sobem e descem, que «mais assim mais assado»; todos nós podemos sobre um qualquer orçamento fazer um conjunto de considerações a favor dos nossos objectivos… Gostaria de agradecer ao Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas o facto de me ter citado…

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Já não é a primeira vez!

O Orador: — … — sim, já não é a primeira vez — a propósito da discussão do Orçamento do Estado para 2000.
Procuro ser muito coerente com as minhas posições e devo dizer o seguinte: continuo a achar, como achava na altura, que em 2000 o orçamento era «o mínimo dos mínimos» — o Governo, aliás, tem a mesma opinião — e continuo a pensar que este orçamento também é «o mínimo dos mínimos», é um orçamento que cumpre as missões que estão atribuídas às Forças Armadas e cumpre-as em condições de restrição que as Forças Armadas assumiram. É «o mínimo dos mínimos»! Mas seria abaixo do mínimo se me dissessem, aqui, que as missões das Forças Armadas, o essencial das Forças Armadas, iriam ser prejudicadas com este orçamento. Portanto, também continuo a pensar que este orçamento que estamos a analisar é «o mínimo dos mínimos».
Diz o Sr. Deputado Henrique Rochas de Freitas: «Bem, mas há uma diminuição, em termos reais, entre o orçamento de 2000 e o orçamento de 2007».
Podia responder-lhe da seguinte maneira: isso é verdade, mas algum efeito terão as reformas que têm vindo a ser desenvolvidas nas Forças Armadas relativamente a racionalizações, algumas desencadeadas pelo governo de que o Sr. Deputado fez parte, como a Central de Compras, de que já se falou aqui, e outras, que o Governo do Partido Socialista continuará. Portanto, há ganhos que depois podem, com um orçamento menor, não pôr em causa as missões que foram cumpridas também no ano de 2000. Logo, creio que não há qualquer contradição entre aquilo que eu então disse e aquilo que posso afirmar hoje, relativamente a esta mesma questão.
Mas também queria dizer, parafraseando alguém, que «há vida para além do orçamento»…

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Essa foi bem lembrada!

O Orador: — … e eu quero que haja vida nas Forças Armadas para além deste orçamento, porque há coisas que podem estar de uma ou de outra forma reflectidas neste orçamento, mas que têm a ver com questões muitíssimo importantes. E algumas delas foram aqui citadas: têm a ver com a aplicação de algumas reformas que estão em curso, com a concretização de alguns objectivos que foram determinados em tempos anteriores e que se têm concretizado, um dos quais é o relativo aos antigos combatentes.
É evidente que essa consideração é devida, independentemente da divergência que existe, que é real, entre a concepção de atribuição de consideração relativamente aos ex-combatentes, que é feita pelo Partido Socialista e por outros grupos parlamentares, na qual existe unanimidade numas coisas e não existe noutras.
O Ministro tem dito que esse estudo está a ser feito e, obviamente, depois terá de haver decisões políticas sobre essa matéria. E esse é um elemento que, podendo não estar suficientemente reflectido no orçamento, evidentemente, está para além do orçamento, é muito importante e faz parte da «vida» das Forças Armadas, «para além do próprio orçamento».
Foi dito aqui que foi criado pelo governo anterior o Fundo dos Antigos Combatentes. É verdade, mas o Fundo criado ainda não foi financiado em um euro, está criado formalmente, mas não foi financiado num euro!!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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As transferências do Orçamento do Estado, como nós sabemos (acho que não devemos reinventar agora, aqui, aquela história antiga), estão a ser feitas com base numa legislação que existe e até com base numa legislação que não existe.
Mas penso que esta questão dos antigos combatentes é politicamente relevante, pelo que não é despicienda a sua análise. E só convoco, se me permitem, os grupos parlamentares a analisar esta questão com seriedade, sem qualquer demagogia e com a importância que ela tem, quer do ponto de vista financeiro, que é uma, quer do ponto de vista da História que ela representa para o nosso país, para as nossas Forças Armadas e, diria mais, para mais do que as Forças Armadas, porque estiveram ao serviço do país elementos que hoje não são das Forças Armadas.
Há aqui um aspecto, que é importante e que gostaria de sublinhar, uma vez que já foi referido, que é o problema da nova metodologia encontrada. Pelos vistos, não percebi bem, mas penso que era uma invocação que o PSD já teria feito e não teria tido o acordo, em tempo, do Partido Socialista, mas penso ser uma medida positiva a da forma como se processa a alienação do património do Estado afecto à defesa nacional, mais propriamente, e para não lhe chamar património das Forças Armadas, sendo que a norma que está na proposta de Orçamento me parece correcta.
Gostaria ainda de sublinhar outra coisa, corroborando, digamos, aquela ideia que o PSD e o CDS aqui explanaram, creio eu, relativamente ao PIDDAC. Este aumento significativo do PIDDAC tem, de facto, uma explicação, que é aquela que já foi dada: foram deslocadas para o PIDDAC, e daí o aumento significativo, verbas que estavam inscritas na Lei de Programação Militar para dar cumprimento àquele programa dos navios de patrulha oceânicos e de combate à poluição, que se desenvolve no distrito de Viana do Castelo.
Esperamos que os estaleiros cumpram também a sua missão, sendo certo que, infelizmente, já foram ultrapassados todos os prazos possíveis e imaginários para a concretização deste grande projecto.
Outra questão que também quero sublinhar é aquilo que foi dito aqui em relação aos deficientes das Forças Armadas. No que diz respeito à proposta do Governo e no que se refere à análise que esta situação requer, entendo que não deve ser feita no âmbito do Ministério da Defesa mas no âmbito mais geral da Comissão de Orçamento e Finanças.
Sr. Ministro, termino, dizendo, que o Partido Socialista gostaria, obviamente, como o Sr. Ministro, de ter um orçamento diferente mas, considerando que este orçamento se enquadra no conjunto geral do Orçamento do Estado e cumpre os objectivos essenciais atribuídos às Forças Armadas, naturalmente, tem o nosso apoio.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, esgotadas que estão as inscrições para a primeira ronda, tem, agora, a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional, para responder às questões que foram suscitadas.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Sr. Presidente, se me permitem, vou fazer a ronda inversa, partindo do fim para o princípio, e começando por agradecer as palavras que me foram dirigidas pelo Sr. Deputado Marques Júnior.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Também posso fazer ao contrário…! Não há mal algum nisso! Mas vou tentar, de imediato, responder às questões que me foram colocadas e, se estiverem de acordo, farei uma primeira observação sobre as questões de metodologia que foram transversais a todas as intervenções e, depois, procurarei responder, uma a uma, a todas as questões suscitadas pelos Srs. Deputados.
Em relação às questões de metodologia, devo dizer que a metodologia adoptada no Ministério da Defesa foi aquela que foi adoptada no Orçamento do Estado em geral. Portanto, não se fez excepção metodológica relativamente àquela que foi a lógica utilizada pelo Ministério das Finanças e pelos outros Ministérios. Mas estou à disposição dos Srs. Deputados para vos dizer, se quiserem fazer as comparações entre as outras duas estimativas, quais é que elas são. E não são de acordo com algumas das estimativas que foram dadas, ou seja, se compararmos o número global da proposta para 2007 com o número global inicial de 2006 temos uma diferença de 1,5 a menos, mas, se fizermos a comparação com a estimativa de execução de 2006, temos mais 2,5. Agora, quero dizer que, relativamente à estimativa da execução de 2006, estamos a trabalhar, digamos, nas nuvens, isto é, estamos a trabalhar com números que são reais até Setembro de 2006 e, naturalmente, com a previsão do último trimestre. Não há outra maneira de fazê-lo.
Agora, se me derem licença, vou tentar responder às várias questões que foram aqui colocadas pelos Srs. Deputados.
O Sr. Deputado Fernando Rosas suscitou um problema relativamente à atribuição, à afectação de recursos às forças nacionais destacadas e o que é que isso significa do ponto de vista de cada uma delas. E, se me dá licença, vou referir-me a elas, uma a uma: a UNIFIL, no Líbano, tem um custo total de 9,2 milhões de euros, sendo que 2,4 milhões são de 2006; a KFOR, tem um custo de 18 milhões de euros; a ISAF tem 11,8 milhões de euros; a EUFOR, no Congo, tem 3,2 milhões de euros. Depois, as outras são bastante mais baixas. Naquilo que corresponde à Bósnia-Herzegovina, e uma vez que estamos a fazer a projecção para 2007, o que

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temos é um custo de 900 000 euros/mês, o que significa que, como a previsão de retracção é a partir da Primavera, teremos, provavelmente, três meses a 900 000 euros cada.
Do ponto de vista da pergunta que me fez, não posso de forma alguma estar de acordo com o Sr. Deputado Fernando Rosas, e isso nem corresponde àquilo que ensino nas minhas aulas. Porquê? Por uma questão muito simples: se fôssemos pelo raciocínio de que a única prioridade portuguesa era a cooperação com os países africanos de expressão portuguesa, estávamos a deixar de fora aquela que é a mais-valia da situação de Portugal, hoje, em África, que é a sua pertença à União Europeia e às organizações internacionais de que faz parte. Esse é que é o problema! Além disso, a cooperação técnico-militar é, indiscutivelmente, um dos eixos fundamentais da política de defesa portuguesa, tem crescido sustentadamente durante os últimos anos e cresce 3,7% do ano passado para a proposta de Orçamento para 2007.
A questão que temos de colocar é a seguinte: a vantagem comparativa de Portugal em África é a sua presença nas organizações internacionais a que pertence, ou seja, é pelo facto de ser membro da União Europeia que Portugal ganha capacidade acrescida em África e é pelo facto de ter relações privilegiadas em África que ganha capacidade acrescida na União Europeia. Isto é um jogo de complementaridades e, portanto, desse ponto de vista, entendo que só tem interesse para Portugal a pertença às organizações internacionais de natureza europeia, rentabilizando essa sua posição nas relações com África. Aliás, esta não é a altura para discutirmos política de defesa e relações externas de defesa, mas estamos num ponto em que isso é particularmente importante, porque Portugal, neste momento, tem um programa de apoio às missões de paz em África, de formação das missões de paz em África, que está, digamos, a rentabilizar, de um ponto de vista multilateral, no quadro da União Europeia e que está a oferecer aos países de expressão portuguesa. Portanto, esta multilateralização só se pode fazer e só pode ser rentabilizada no quadro desta dupla pertença.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Mas o que é que isso tem a ver com as tropas no Afeganistão?

O Orador: — Não foi essa a pergunta que o Sr. Deputado me fez, a pergunta que me fez foi no sentido de saber se não deveríamos dirigir todos os recursos para a cooperação técnico-militar, em detrimento da presença em missões internacionais e de paz. Mas também posso responder à questão do Afeganistão, e faço-o com todo o gosto.
Em relação ao Afeganistão, trata-se de um problema de segurança regional e internacional. O modo como vejo a questão do Afeganistão é em sentido global. O que é que quero dizer com isto? Quero dizer que o que está em causa no Afeganistão não é uma questão puramente militar ou de segurança, é uma questão de state building, é a capacidade de criar um Estado naquela região. Mas para isso é preciso que haja uma condição de segurança, é preciso que haja segurança. É esta a missão das forças que estão no terreno. E devo dizer que, do ponto de vista das forças portuguesas, é um elemento que não me parece que seja de discutir nesta altura.
Quanto ao segundo conjunto de questões que me foi colocado pelo Sr. Deputado João Rebelo, partilho consigo a ideia de que a «criatividade» tem origem na necessidade ou em desespero. Fico satisfeito que tenha dito que, no meu caso, tem origem na necessidade, pois isso significa que não estou em situação de desespero.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Lá iremos!

Risos do PSD.

O Orador: — Em relação às questões concretas, a primeira tem a ver com as percentagens da despesa da defesa no PIB e a sua comparação com os critérios NATO, e foi colocada pelos Srs. Deputados João Rebelo e Henrique Freitas. Vamos ver: nós precisamos de comparar aquilo que é comparável e, portanto, quando comparamos o critério que estamos a utilizar na despesa da defesa nacional no PIB e o critério que é utilizado pela NATO, temos de acrescentar, àquela que é a despesa que estamos a usar, no caso português, as despesas com as pensões, que não estão incluídas e que estão a ser pagas pela Caixa Geral de Aposentações.
É porque, se as incluirmos, a percentagem do PIB vai subir para cima de 1,3%, vai atirar-se para 1,5% ou 1,6%. Portanto, se quisermos comparar com os números da NATO, temos de usar os mesmos critérios que estão na base das estimativas da NATO.

O Sr. Ramos Preto (PS): — Muito bem!

O Orador: — Se compararmos os 1,5% ou 1,6%, porque as pensões significam 0,3%, então, estamos mais ou menos a meio da tabela, do ranking, porque temos abaixo de nós países como a Bélgica e temos, mais ou menos, com 1,7% a Holanda e a Alemanha, com 1,6% a Dinamarca, e não nos podemos comparar com países que têm despesas acima dos 2%, como a Inglaterra, a França ou a Grécia, porque não temos a Turquia ao lado.

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Portanto, temos de comparar o que é comparável e, desse ponto de vista, o exercício tem de ser feito nessa base.
Outra coisa que devemos dizer — e nisto, naturalmente, estou de acordo com a evolução dos números — é que, se compararmos, numa linha cronológica, o caso português, é evidente que ele vem descendo, mas também temos de perceber que o ponto onde chegámos tem uma relação com o défice existente, porque, quando se despendia 1,5% tínhamos um défice x e, quando despendemos 1,3%, ou seja, a projecção para o ano que vem, temos um défice diferente. Portanto, deste ponto de vista, também é preciso termos a noção daquilo que estamos a comparar.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — O Sr. Ministro é muito «criativo»!…

O Orador: — Quanto à questão da Lei de Programação Militar e das cativações, naturalmente, estão assegurados os contratos em curso. Isto está garantido e nem poderia ser de outra maneira.
Em segundo lugar, estão garantidos os contratos que se irão desenvolver no próximo ano.
No que se refere às cativações no PIDDAC, são de 7,5%. Relativamente ao PIDDAC, entendo que a verba que dele consta, que é a verba nacional mais a verba comunitária — os 41.3 milhões de euros —, assegura, claramente, os programas dos navios de patrulha oceânicos e das lanchas de fiscalização costeira. O problema que vejo é outro! O problema é a capacidade de os estaleiros de Viana do Castelo responderem, em tempo, a essa questão, porque o financiamento está assegurado.
Já agora, também quero dizer ao Sr. Deputado que está em preparação uma nova resolução do Conselho de Ministros que projecte nos próximos anos a continuação deste programa, que é, indiscutivelmente, um programa de interesse nacional.
No que diz respeito à transição dos saldos, vou ter a maior atenção a esta questão, como é natural.
Em relação às despesas de formação, penso que se refere, essencialmente, à Força Aérea. É isto? Ou refere-se aos ramos? É que o problema é o seguinte: houve uma transferência de despesas de formação dos ramos para os órgãos e serviços centrais do Ministério da Defesa Nacional. Com a centralização do Instituto de Estudos Superiores Militares essa verba sai dos ramos e transfere-se para os órgãos e serviços centrais do Ministério da Defesa Nacional, portanto, penso que pode ser isso.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — É no Ministério no seu todo!

O Orador: — Quanto à redução de efectivos, dentro do sistema de forças nacional, e sem alterá-lo, pode fazer-se um exercício de redução da ordem de 900 efectivos, o que minora as despesas com pessoal.
Passando já a uma questão levantada pelo Sr. Deputado António Filipe, relativa a encargos com pensões e saúde, há indiscutivelmente uma diminuição nessas duas rubricas, a qual tem, como é natural, uma explicação; não se trata de diminuição de privilégios ou de direitos sociais.
Relativamente à saúde há, em primeiro lugar, uma rentabilização de poupanças e, em segundo lugar, um aumento de receitas. As poupanças têm que ver com as alterações legislativas que já foram feitas no sentido de aproximar os regimes de saúde dos subsistemas ao regime geral, o que já gerou este ano economias muito substanciais, na ordem dos 30 milhões de euros. É provável, pelo menos projecta-se que assim seja, que essa rentabilização venha a continuar no ano de 2007. O aumento das receitas tem que ver com o facto de o desconto dos beneficiários ter sido aumentado em 0,5%.
Estas duas razões — a diminuição de despesas pela racionalização e pela aproximação do subsistema ao sistema geral e o aumento das receitas pelo aumento da contribuição do desconto em 0,5% —, estes dois factores em conjunto, provocam um efeito de diminuição da despesa.
A diminuição das pensões de reserva também tem uma explicação, que tem que ver com vários factores: em primeiro lugar, a alteração legislativa dos mecanismos de passagem à reserva e à reforma, que passou a ter uma definição mais rígida, ou seja, só passa à reserva quem tem 60 anos de idade e 36 anos de serviço — antes não era assim, era mais flexível —, o que provoca uma dilação no tempo daqueles que vão passando à reserva.
Em segundo lugar, uma explicação que tem que ver com as pensões provisórias de reforma. O que é que acontecia até agora? Havia um tempo, da ordem de um ano a um ano e meio, entre a passagem à reserva e o momento em que a Caixa Geral de Aposentações passava a pagar as pensões de reforma. O que vai acontecer a partir do ano que vem é que a Caixa Geral de Aposentações vai passar a pagar imediatamente as pensões de reforma, retirando esse ónus ao Ministério da Defesa Nacional (MDN). Portanto, são dois efeitos conjugados que levam a uma redução das despesas nestas matérias.
O Sr. Deputado António Filipe colocou também uma questão relativa ao Fundo de Pensões dos Militares das Forças Armadas. Bem, o Fundo de Pensões dos Militares tem claramente de ser viabilizado, não há qualquer dúvida sobre essa matéria. Têm sido injectadas dotações financeiras no Fundo e, portanto, ele vai ter de continuar a ser alimentado e sustentado com a alienação do património. Uma das razões pelas quais é importante que os recursos da alienação do património fiquem 100% no Ministério da Defesa Nacional tem também que ver com a viabilização do Fundo de Pensões. Portanto, esse Fundo tem de ser viabilizado e a capitalização terá de ser feita a partir da alienação do património.

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Está neste momento numa fase bastante adiantada o estudo para dar uma solução a esse problema. Até posso adiantar que essa capitalização passa pela diferenciação de universos dos beneficiários e, portanto, por soluções correspondentes a cada uma delas, mas sempre com base na gestão do património imobiliário.
Quanto à reestruturação de carreiras, como é do conhecimento, está a trabalhar um grupo nesta matéria, o que é algo de muito importante. Esse grupo de reestruturação de carreiras está numa fase bastante avançada do seu trabalho, sendo que os primeiros resultados desse estudo deverão estar prontos durante o mês de Dezembro. Portanto, a partir daí poderá haver novidades.
O PRACE, como é natural, terá efeitos também sobre o Ministério da Defesa Nacional, mas devo dizer que o efeito mais importante do ponto de vista das estruturas e da racionalização dos meios no caso da Defesa não é o PRACE mas, sim, como o Sr. Deputado disse há pouco, a reestruturação das estrutura superior da defesa nacional, procurando eliminar algumas duplicações existentes entre três áreas: Ministério da Defesa Nacional, Estado-Maior-General das Forças Armadas e os três ramos. Daí é que poderá vir — e virá, seguramente — uma economia de recursos maior. Neste momento não sou capaz de quantificar quanto é que isso significa do ponto de vista orçamental, não sou capaz de fazê-lo.
O programa de modernização dos F16 continua. Como sabe, houve alguns atrasos no desenvolvimento do programa, mas ele mantém-se e continua a ser feito.
O Sr. Deputado perguntou-me se a manutenção dos helicópteros é feita na OGMA. Neste momento está a ser estudado qual é o modelo, mas ele, naturalmente, passará por um contrato entre o Estado português, o MDN, e um consórcio de empresas, onde, apesar de ser difícil dar neste momento uma certeza, é provável que a OGMA esteja.
Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas, julgo que de algumas das questões que levantou, quer as de metodologia de natureza geral quer as que se prendem com a diminuição da percentagem do PIB, de certa forma, já falámos.
Quanto às cativações, naturalmente, a cativação dos 40% mantém-se, mas ela não tocará nos programas que estão em desenvolvimento e permite viabilizar todos aqueles que se prevêem para o ano que vem.
Uma questão que nos preocupa a todos e que também foi levantada pelo Sr. Deputado João Rebelo tem a ver com os antigos combates. Essa é uma questão sobre a qual eu gostava de trazer à Assembleia, com muito seriedade, aquilo que penso.
Sobre os antigos combatentes e o Fundo dos Antigos Combatentes, devo dizer que tenho duas certezas em questões de princípio e tenho algumas dúvidas na solução do problema. Para que não haja dúvida alguma sobre as questões de princípio relativamente aos antigos combatentes, seja os que deram o seu contributo ao longo do século XX seja os que estão hoje em teatros de guerra nas várias operações em que Portugal participa, quero dizer que para com todos esses combatentes Portugal tem uma dívida de reconhecimento que não pode ser ignorada e que quero sublinhar para que não haja qualquer dúvida sobre a minha posição nessa matéria.
Podemos concordar ou não concordar, podemos discutir a bondade das decisões políticas de o Dr. Afonso Costa mandar tropas para a Flandres, de o Dr. Salazar ir para Angola rapidamente e em força, podemos discutir, como o Sr. Deputado Fernando Rosas aqui dizia há bocadinho, se devemos ou não estar no Afeganistão, porém não podemos discutir o sacrifício, o esforço e às vezes a vida que os militares que cumpriram essas decisões políticas tiveram nos vários teatros de guerra. Portanto, que não haja dúvidas sobre o dever de reconhecimento que o País tem para com os seus combatentes.
Segunda questão de princípio sobre a qual não tenho dúvidas: esse reconhecimento e essa dívida que o País tem para com os seus combatentes é do Estado português, não do Ministério da Defesa Nacional; somos todos nós que temos essa dívida e é o Estado no seu conjunto que deve assumi-la. Isso prende-se, do meu ponto de vista, com a questão da resolução do problema. Aí julgo que é mais difícil ter certezas.
O Fundo, quando o encontrámos, não tinha um tostão, pelo que tem sido o Estado a pagar esses subsídios, mas temos seguramente de encontrar uma solução para a questão dos antigos combatentes. Previmos que no Orçamento do Estado para 2007 o produto de alienação do património possa ser dirigido para o Fundo dos Antigos Combatentes e para o pagamento desses subsídios mas — não tenhamos ilusões — o património não chega. Pelas estimativas que temos, para o universo global de 193 000 beneficiários precisaríamos de cerca de 828 milhões de euros ou, se calhar, mais. Portanto, temos de encarar este problema com muita seriedade, e o Governo está disposto a fazê-lo, mas temos de encontrar uma solução que permita a sustentabilidade desta situação.
Certezas não tenho. Tenho dúvidas e tenho disposição para dialogar no sentido de resolver este problema.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — 800 milhões de euros em 30 anos?

O Orador: — Não! Para constituir o Fundo de imediato! Portanto, temos de encarar este problema de frente, mas a solução não é fácil e tem de ser largamente trabalhada. Como é natural, estou disposto a vir à Assembleia falar com os Srs. Deputados para encontrarmos uma solução para este problema.

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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Estamos praticamente na fase final da nossa audição. Na segunda ronda temos apenas um pedido de intervenção do Sr. Deputado Correia de Jesus.
Vamos praticar aqui o princípio da alternância, pelo que tem, em primeiro lugar, a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Sr. Secretário de Estado: Falemos, então, dos combatentes e esclareçamos as coisas de uma forma correcta.
Disse o Sr. Ministro que «o Fundo não tinha um tostão». Bom, se «o Fundo não tinha um tostão», a responsabilidade é exclusiva (e meço as palavras que estou a dizer) do Governo do Partido Socialista, porque, quando saímos do governo, em 2005, o Fundo estava constituído através de património dos Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Saúde. A venda desse património tinha de ser realizada no decorrer do ano 2005, mas, como é óbvio, no primeiro trimestre desse ano, o governo demissionário teve sérias limitações a essa venda.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Obviamente!

O Orador: — Se o Governo do PS, em nove meses de gestão não corrente, não consegue finalizar essa verba e se o Ministério da Defesa Nacional não consegue, sequer, convencer os seus colegas da Ciência e da Saúde a fazerem reverter no Fundo essas verbas, peço desculpa, Sr. Ministro, mas não diga duas vezes que «o Fundo estava sem um tostão»!! Diga: «O meu Governo não teve condições e foi incompetente, incapaz de ir buscar o dinheiro que devia»!!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Não executou!

O Orador: — Portanto, o problema não está nos combatentes, Sr. Ministro, mas no facto de que o Fundo foi criado com a consciência de que eram necessárias verbas da Defesa e, porventura, verbas que vão para além do património da Defesa, razão pela qual, na discussão orçamental de 2006, tive ocasião de dizer (no que fui secundado por outros partidos, nomeadamente pelo CDS-PP) que abríamos toda a disponibilidade negocial para enfrentar uma solução que significasse um esforço de todo o Estado perante os antigos combatentes — porque, hoje em dia, aqueles que estão a ser pagos não são militares de carreira, mas 400 000 homens que combateram em África. E, Sr. Ministro, já que estamos em maré de citações, não vou citar o Poincaré, que tem uma citação fantástica, mas Corneille, quando diz que «é mais importante a maneira de dar do que aquilo que se dá»… E este Governo não percebe que o que está em causa não são os 800 milhões de euros em 30 anos e que o Fundo não tem de ser dotado inicialmente dessa verba — não, Santo Deus, se assim fosse! Que irresponsabilidade seria essa!... — mas, sim, que aquilo que se dá é o reconhecimento de um tempo em que eles serviram Portugal, é o gesto. A nenhum deles foi pedida autorização para ir para África! Foram para África combater, vestiram o uniforme, juraram uma bandeira… Essa é uma realidade que o Sr. Ministro não pode ignorar!! Sr. Ministro, sei da consideração que tem pelos antigos combatentes, como acabou de espelhar na sua intervenção, por isso peço-lhe, não digo em nome dos antigos combatentes mas em nome das suas tradições na Defesa Nacional, que perceba que, para os 400 000 portugueses, o que está em causa não é o valor de uma pensão, é o gesto!! E tem, da parte do PSD, abertura para equacionar uma alteração ao modo de financiamento do Fundo, mas não tem, da parte do PSD, abertura alguma para reformular o universo dos combatentes! Em África, combateram 400 000 homens; não combateram 50 000, porque hoje em dia ganham menos do que o rendimento mínimo garantido, nem 100 000, porque ganham mais de 100 euros por mês.
A verdade é esta: o Fundo dos Antigos Combatentes, o complemento especial de pensão não é um sucedâneo do rendimento mínimo garantido ou do rendimento social de inserção!! Não estamos a fazer caridade com os antigos combatentes; estamos a reconhecer-lhes um direito, porque um dia, há 30 anos, combateram por Portugal! E sei, Sr. Ministro, que também partilha desta convicção.
Tinha outras questões para lhe colocar, mas confesso que o facto de eu ter sido secretário de Estado dos Antigos Combatentes me «encalora» ao ouvir falar destas matérias… e uma vez mais lhe digo que é errado afirmar que o Fundo não estava dotado e não tinha um tostão. Tinha, porque deixámos terrenos identificados!! Permita-me, Sr. Presidente, com a sua benevolência, que termine dizendo apenas que concordei e concordo com a intervenção do Sr. Deputado Marques Júnior e estou certo de que o Sr. Deputado João Rebelo também concorda inteiramente… A desgraça deste País é que o Governo não concorda!!

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Para praticarmos a regra da alternância face às iniciativas, vou dar, agora, a palavra ao Sr. Deputado António Carlos Monteiro, seguidamente ao Sr. Deputado Marques Júnior, depois ao Sr. Deputado Correia de Jesus, que não sei se prescindiu…, e, por fim, ao Sr. Deputado João Rebelo.

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Tem, então, a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Srs. Presidentes, Srs. Membros do Governo: Tive oportunidade de analisar a proposta de orçamento para a Defesa Nacional — reparei, aliás, que diz «Ministério da Defesa Nacional» — e queria perguntar ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado que também tutela os assuntos do mar onde está o orçamento para os assuntos do mar… É porque nem no timbre aparece, nem foi mencionado uma única vez na sua intervenção, Sr. Ministro!!

Risos.

Ainda para mais, ontem, o Sr. Secretário de Estado teve a oportunidade de lançar a «estratégia nacional para o mar» e, segundo a comunicação social, há uma prioridade do Governo em aproveitar os recursos do oceano e das zonas costeiras. No entanto, nada tendo sido dito, absolutamente nada, até agora, sobre os assuntos do mar, não constando no orçamento nem sequer no timbre os assuntos do mar, eu gostava de saber o que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre aquele que é um recurso fundamental para o País.
O Sr. Ministro tem a noção de que, em termos de território e de zona económica exclusiva, temos mais mar do que terra. Portanto, se há algum recurso que temos em abundância é, exactamente, o mar. Nesse sentido, se não o soubermos aproveitar e se o Ministro responsável por esse recurso nada diz sobre ele no debate do Orçamento do Estado, estamos mal. Penso que era fundamental fazer esta chamada de atenção.
Sr. Ministro, há ainda uma outra matéria que me intrigou quando ouvi a sua explicação. Trata-se das despesas com os encargos da saúde por parte do Ministério da Defesa.
Na proposta de Orçamento do Estado para 2006, estava inscrito o valor de 78 milhões de euros. O Sr.
Ministro disse, aqui, que poupou, salvo o erro, 30 milhões de euros. No entanto, na proposta de Orçamento para 2007, na rubrica encargos com a saúde, estima-se que vai gastar, até ao final de 2006, 123,6 milhões de euros!!... Onde é que está a poupança, Sr. Ministro? Se aquilo que estava orçamentado eram 78 milhões de euros e se aquilo que se prevê gastar até ao final do ano são 123,6 milhões de euros, é um bocadinho difícil explicar como poupou 30 milhões de euros!!...
Por último, isto é feito quando se orçamenta gastar, para o próximo ano, 62 milhões de euros, que é metade daquilo que, nesta altura, já se gastou…! Para não me alongar mais, termino por aqui, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
De acordo com a sequência de intervenções, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, sou levado a ter uma segunda intervenção, em função da simpatia do Sr. Deputado Henrique de Freitas que, falando em nome do PSD e do CDS-PP, valorizou a minha intervenção, apresentando-a em contradição com o discurso do Sr. Ministro da Defesa e do Governo.
Penso que foi uma simpatia do Sr. Deputado Henrique de Freitas (somos amigos) para me levar a intervir novamente. Só pode ser por causa disso, porque o Sr. Deputado sabe perfeitamente — eu disse-o de uma forma clara — a minha opinião relativamente ao orçamento.
No entanto, pode haver aqui algo que «facilita» a vida do Deputado, em seu benefício (mesmo sendo um Deputado que apoia o Governo), relativamente ao Governo. Talvez seja fácil para o Deputado fazer uma intervenção que recolhe a unanimidade de todos, pondo a tónica nos valores e nos princípios de que toda agente comunga, enquanto que o Sr. Ministro é questionado sobre o «sobe e desce» do orçamento. Aí pode haver alguma dicotomia, visto que eu, enquanto Deputado, estou «poupado» ao facto de ser questionado sobre o «sobe e desce» do Orçamento e posso, efectivamente, pronunciar-me sobre aquilo que são os valores intrínsecos subjacentes à elaboração do próprio orçamento.
Repetindo aquilo que disse, todos os Srs. Deputados concordarão comigo que, perante os constrangimentos orçamentais gerais em que é elaborado o orçamento, em que as Forças Armadas garantem o cumprimento das suas missões principais, não é possível conceber um orçamento diferente, sob perigo de se poder pensar que as Forças Armadas, à revelia das dificuldades do País, estariam a usufruir de privilégios especiais, quando todos sabemos que a maior parte das reformas desenvolvidas por este Governo tiveram o seu início nas Forças Armadas e que, provavelmente, será sobre essas consequências nas Forças Armadas que, no futuro, poderemos ter de intervir.
Gostaria também de voltar, por um minuto, aos ex-combatentes, para mais uma vez sublinhar, de uma forma enfática, aquilo que todos os Srs. Deputados, designadamente os Srs. Deputados Henrique de Freitas e João Rebelo, disseram de forma mais ou menos activa: ninguém está contra este património que, efectivamente, existe relativamente aos ex-combatentes, por aquilo que eles representaram para o nosso País.
Podemos divergir nas formas de concretizá-lo e o Sr. Deputado Henrique de Freitas deu, aliás, uma explicação, que creio que posso interpretar desta forma: vale mais a forma, o gesto de reconhecermos o esforço que dedicaram ao País do que propriamente o valor monetário. Aliás, muitos ex-combatentes, que nos têm procu-

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rado, têm dito claramente que gostariam mais que o País os reconhecesse do que receber algum dinheiro, que nalguns casos representa pouco mais do que uma esmola.
Esse reconhecimento tem sido feito pela Assembleia da República, que tem cumprido essa função.
Temos, assim, um problema, para o qual o Sr. Ministro e a oposição manifestaram disponibilidade em encontrar soluções. Vamos, então, tratar este problema sem demagogia, com muita seriedade, como tem sido feito pela Assembleia da República, que, em momentos difíceis, tem sabido interpretar este sentimento.
Por último, gostaria de deixar este apelo à disponibilidade do Sr. Ministro e à dos Srs. Deputados. Vamos tentar encontrar uma solução para um problema que é, objectivamente, difícil — mais uma vez, não na perspectiva proclamatória dos valores mas na perspectiva da concretização das soluções.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas pediu a palavra para uma interpelação à Mesa, que tem prioridade sobre as demais intervenções.
Qual o sentido e o alcance da interpelação, Sr. Deputado?

O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — V. Ex.ª verá, Sr. Presidente. É um alcance certamente menor do que aquele que têm os nossos F16…!

Risos.

Sr. Presidente, pedia que fizesse chegar ao Sr. Ministro o interesse que temos em ver respondida uma questão que lhe coloquei, porque é importante quanto ao domínio da profissionalização. Trata-se da descida das verbas atribuídas à Lei do Serviço Militar, que passam de 7 milhões de euros para 5,5 milhões de euros.
Gostaria de saber se há alguma realidade que leve à diminuição das verbas, tendo em conta que, neste momento, o Estado faz um esforço significativo no domínio da profissionalização.

O Sr. Presidente: — Trata-se, portanto, de acordo com a sua avaliação, Sr. Deputado, de uma questão não respondida e à qual o Sr. Ministro certamente responderá aquando da resposta aos Srs. Deputados que agora estão a pedir esclarecimentos.
Dito isto, Sr.as e Srs. Deputados, chegámos às duas intervenções finais, a primeira das quais pertence ao Sr. Deputado Correia de Jesus e a última ao Sr. Deputado João Rebelo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): — Sr. Presidente, aproveito também para cumprimentar o Sr. Ministro da Defesa Nacional, o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar e o Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional.
Começo por lamentar não poder continuar o esforço de demonstração, iniciado pelo meu colega Henrique de Freitas, acerca do modo como o Partido Socialista, no Governo, promove uma continuada desgraduação das funções de soberania, nomeadamente no que toca à Defesa Nacional. Certamente, noutra oportunidade, terei condições para dialogar com o Sr. Ministro a este respeito e fazer a demonstração desse fenómeno com base em situações concretas, ao nível quer da legislação quer das medidas tomadas por este Governo.
O Sr. Ministro afirmou que este orçamento do Ministério da Defesa Nacional para o ano de 2007 garante o integral cumprimento das missões que estão cometidas, constitucional e legalmente, às Forças Armadas Portuguesas.
O Sr. Ministro sabe que um dos instrumentos com que lidamos no âmbito da defesa é o Sistema de Forças Nacional (SFN). Já por várias vezes tenho feito a constatação de que os instrumentos legais prevêem um Sistema de Forças Nacional mas que, na realidade, o que existe é um sistema de forças continental. E se faço esta afirmação é porque, se V. Ex.ª e os meus Pares raciocinarem, por instantes, sobre a realidade, verificarão que, apesar da dispersão geográfica do Estado português, o que acontece é que 95% (ou talvez mais) dos meios disponíveis estão concentrados no continente e área adjacente e apenas meios residuais (diria quase insignificantes) é que são deslocados para as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Ora, Sr. Ministro, partindo desta constatação, que é aquela que acontece no âmbito do Orçamento do Estado para 2006 — já de si um orçamento exíguo, mas, de qualquer maneira, melhor do que aquele que a Câmara se prepara para aprovar com o voto favorável da maioria —, pergunto concretamente ao Sr. Ministro se, face à redução que se verifica no que toca aos três ramos das Forças Armadas em matéria de dotações orçamentais, redução essa que é particularmente significativa no Exército e na Força Aérea, as Forças Armadas, no ano de 2007, estarão em condições de garantir a defesa da soberania em todo o território nacional, nomeadamente nas Ilhas Selvagens, de realizar uma fiscalização efectiva da zona económica exclusiva e, finalmente, de realizar, adequada e satisfatoriamente, as acções de busca e salvamento, a que Portugal está obrigado não só por via da legislação interna mas também por obrigações decorrentes de convenções internacionais de que é Parte.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

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O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Defesa Nacional, quando há pouco falei em formação, referia-me à formação profissional contínua, formação e valorização dos recursos humanos, etc., que sofre uma baixa de 44% — e não é por ser transferida dos vários ramos das Forças Armadas para os serviços centrais do Ministério da Defesa Nacional —, referia-me ao valor para todo o Ministério da Defesa Nacional, que baixa 6,5 milhões de euros. Este não é um assunto prioritário ou urgente, mas o que não percebi foi a queda, tendo em conta que no resto… Isto tem a ver com a valorização dos quadros do Ministério da Defesa Nacional e os próprios militares. Gostaria de saber se algum acontecimento extraordinário levou a isso.
Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Correia de Jesus, não gosto de falar de pessoas ausentes, mas, pelo menos, gostaria de dizer que nunca mais vimos o Deputado Maximiano Martins aqui, na Comissão de Defesa Nacional, ele que, quando o Dr. Paulo Portas era ministro, estava sempre presente e a dizer «onde é que está o radar da Madeira?»!... Nunca mais o vimos desde que o PS está no Governo, o que não deixa de ser extraordinário…! Passo a referir-me aos antigos combatentes. Acho que a mensagem do Sr. Ministro, de que isto não pode ser «bandeira» de qualquer partido (como, aliás, foi referido por todas as bancadas), é importante — nisso estou de acordo com o Sr. Ministro. Eu e o Deputado Henrique de Freitas falamos frequentemente deste assunto, porque é importante, mas muitas vezes isso é esquecido — às vezes, as pessoas são acusadas de, só em campanha eleitoral, falarem de certos assuntos, mas não é o caso.
A nossa posição quanto a esta matéria é clara: somos favoráveis, se assim for necessário, a que o Fundo dos Antigos Combatentes seja transferido para o Ministério das Finanças (não nos chocaria que assim fosse).
Também somos favoráveis a uma eventual alteração da forma de financiamento do Fundo dos Antigos Combatentes — e, como referi, até apresentámos, no ano passado, em termos de alteração do orçamento, uma proposta alternativa, «chumbada» pelo PS, que falava não só da alienação do património mas também de outras fontes de financiamento público, pelo que tentámos ajudar o Governo no sentido de esse Fundo não ser descapitalizado. Portanto, estamos disponíveis para apoiar o Governo numa alteração da forma de financiamento. Porém, já não o estamos em relação à alteração do universo dos beneficiários — nisso é que há uma divergência entre nós e o Governo!! Há, pois, um princípio que nos une: o de que todos têm direito à contagem do tempo para efeitos de reforma, e que esteve, aliás, na origem da lei, em 2002. A este princípio o anterior governo acrescentou um complemento de pensão ou um suplemento de pensão para os antigos combatentes. E neste aspecto, há uma divergência com o Governo, pois aqui já não estamos disponíveis para fazer alterações.
Ainda em relação ao financiamento do Fundo, aguardamos a resposta do Governo. É porque o ex-ministro Luís Amado também referiu que estava em estudo uma forma de encontrar outro tipo de financiamento, mas esse estudo ainda não chegou e já passou um ano e meio, Sr. Ministro. E por isso todos os anos, na altura do pagamento desse complemento ou suplemento, em Setembro, Outubro e Novembro, lá anda o Ministério «Ó tio! Ó tio!...» para saber como é que vai pagar — e lá vai, mais uma vez, ao Ministério da Solidariedade Social buscar o dinheiro. E este ano isso vai acontecer outra vez, porque os senhores ainda não alteraram a lei e os beneficiários continuam a ser os mesmos. Portanto, se isto está a correr mal, a responsabilidade é do Governo — não venham agora culpar a oposição de estar sempre a falar disto, porque, como é óbvio, só queremos que a lei seja cumprida! Então, para que fique claro, a posição do CDS nesta matéria é esta: estamos disponíveis para ajudar o Governo a encontrar uma solução para o financiamento do Fundo, mas não estamos disponíveis para a alteração do universo dos beneficiários. Por outro lado, falei deste tema pelo que nos une e não pelo que nos divide, porque todos os partidos falaram deste assunto na última campanha eleitoral.
Agora, não é verdade, Sr. Ministro e Sr. Deputado Marques Júnior, que o anterior governo tenha deixado o Fundo descapitalizado. Na proposta de lei de Orçamento do Estado para 2005, criámos o Fundo dos Antigos Combatentes, que seria inicialmente financiado com a gestão do património, e deixámos património afecto a esse valor, que era de 10 milhões de euros. Recordo-me de que o Ministro Teixeira dos Santos, em Maio de 2005, nos acusava assim: «Vocês deixaram zero!» e o Ministro dos Assuntos Parlamentares reforçava: «Zero! Zero!». Mas, depois, passados três meses, o Ministro da Defesa já dizia: «Bom, afinal não é bem assim, estavam lá 20 milhões, que vieram do Ministério da Solidariedade Social». Então, é preciso ser claro. E os senhores do Governo, que têm este tipo de intervenção, é que, depois, geram este tipo de não direi revolta… Mas, pelo menos, as pessoas que estiveram empenhadas nesta causa dizem-nos: «Os senhores criaram um fundo e aquilo era para enganar as pessoas!» Mas não era, nós deixámos tudo clarinho! Só que o Dr. Jorge Sampaio, ex-Presidente da República, dissolveu o Parlamento e agora estão a responsabilizar-nos, como se nós ainda tivéssemos forma de financiar o Fundo!…Por amor de Deus, os senhores é que são Governo! Portanto, a nossa disponibilidade é total para ajudar o Sr. Ministro da Defesa Nacional a resolver este assunto, mas precisamos de saber quais são as alterações a esse Fundo que os estudos encomendados pelos senhores vão propor.

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O Sr. Presidente: — Para responder, em bloco, a todas as questões suscitadas, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, algumas das questões colocadas são transversais. De facto, tanto o Sr. Deputado Henrique de Freitas como o Sr. Deputado João Rebelo suscitaram a questão do Fundo dos Antigos Combatentes, assim como, há pouco, o Sr. Deputado Marques Júnior.
Julgo que as coisas estão relativamente claras: há algum consenso quanto às grandes questões de princípio, sobre isso não há dúvida, e há um problema concreto, que é preciso resolver. Para tal, há abertura no sentido de dialogarmos e encontrarmos uma solução que seja uma solução do Estado português. Portanto, estamos de acordo em relação aos grandes princípios e em que há um problema cuja resolução é necessária e não pode ser adiada.
O Sr. Deputado Henrique de Freitas colocou o problema concreto da diminuição das verbas no domínio da profissionalização. Sr. Deputado, essa diminuição tem a ver basicamente com a organização do Dia da Defesa Nacional. As estruturas estão montadas, existem, mas os custos que inicialmente foram necessários para fazer face à montagem das estruturas, hoje, já não existem. Portanto, há aí um decréscimo de despesa que, naturalmente, é útil neste momento.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado António Carlos Monteiro, começo pela referente às despesas com a saúde por parte do Ministério da Defesa e, depois, peço ao Sr. Presidente que dê licença ao Sr. Secretário de Estado, que é, de facto, dos Assuntos do Mar (não é que o Ministro não o seja mas não está no título), isto é, que tutela directamente essa área, para lhe dar uma resposta mais cabal à sua questão sobre tal matéria.
Então, relativamente às despesas com a saúde, a razão pela qual há um acréscimo tão grande em 2006 e uma baixa tão acentuada em 2007 é a de que, em 2006, está projectada a transferência das verbas de 2005 (e isto não é despiciendo) e a racionalização vai projectar-se em 2007, além de que a receita dos 0,5%, correspondente ao aumento dos descontos dos beneficiários, também só surge em 2007. Daí essa grande alteração.
Antes de responder às perguntas feitas pelos outros Srs. Deputados, peço, então, ao Sr. Presidente que dê licença ao Sr. Secretário de Estado para responder directamente à questão relacionada com os Assuntos do Mar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (João Mira Gomes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, agradeço-lhe ter suscitado aqui a questão sobre os Assuntos do Mar porque me permite fazer um apelo nesta Câmara a que os Srs. Deputados participem, no período de consulta pública, no debate da «Estratégia Nacional para o Mar», que, ontem, apresentei publicamente, mas que está em discussão pública desde o passado dia 4 até ao dia 3 de Novembro. Portanto, agradeço-lhe imenso a sua questão e espero que também os Srs. Deputados possam dar esse contributo.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Onde é que está o texto?

O Orador: — Está disponível na Internet, quer no site do Ministério quer no site da Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar.
O Sr. Ministro, quando tomou posse, já sabia que era só Ministro da Defesa Nacional, não ficou surpreendido por não ser também ministro do mar, o que não quer dizer que os Assuntos do Mar não sejam importantes na actividade do Ministério da Defesa Nacional. E há verbas inscritas para os Assuntos do Mar no Ministério da Defesa Nacional, desde logo, na Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar, que tem sido responsável pela elaboração da Estratégia Nacional, mas também (e não menos importante) na Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC), que está a fazer um trabalho muito importante que apresentaremos nas Nações Unidas possivelmente até ao final de 2008. Portanto, estas verbas estão lá inscritas.
Mas há outras verbas do Ministério da Defesa Nacional que também têm a ver com o Mar. Desde logo, a Autoridade Marítima, o famoso duplo uso da Marinha, que não é só militar mas também civil e que tem uma actividade muito importante, que se desenvolve ao longo do País, tanto no continente como nas regiões autónomas. O Instituto Hidrográfico, que é uma organização de excelência em tudo o que tem a ver com os Assuntos do Mar. E depois, no Orçamento do Estado, encontramos o Mar praticamente em todos os ministérios.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Nem sempre bem tratado!

O Orador: — Excelentemente tratado e será ainda melhor se a «Estratégia Nacional para o Mar» for aprovada, Sr. Deputado! Este é o desafio do Ministério da Defesa que nós assumimos plenamente: fazer aprovar um mecanismo de coordenação que possa fazer uma melhor articulação entre as várias verbas que estão disponíveis nos vários

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ministérios e isso tudo de acordo com uma estratégia que, pela primeira vez em Portugal, será uma estratégia coordenada e articulada para os assuntos do mar.

O Sr. Presidente: — Para responder ao Sr. Deputado Correia de Jesus, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Srs. Deputados, Sr. Deputado Correia de Jesus, começo por saudá-lo e, respondendo à sua questão, quero dizer-lhe o seguinte: o Sr. Deputado sabe, melhor do que eu, que o Sistema de Forças Nacional é, de facto, um sistema de forças nacional aprovado em Conselho Superior de Defesa Nacional.
Portanto, este sistema abrange todo o território, incluindo o triângulo estratégico dos Açores e da Madeira.
Aquilo que posso dizer-lhe é que justamente uma das preocupações do Ministro da Defesa, este ano, foi a de assegurar que todo o território nacional e todas as missões, incluindo aquelas nas ilhas dos Açores e da Madeira, e no espaço do triângulo estratégico português, não só as missões de natureza militar mas as chamadas outras missões de interesse público (busca, salvamento, etc.) estavam asseguradas. E temos a garantia de que essas missões estão asseguradas com o Orçamento para 2007.
Quero também dizer ao Sr. Deputado que, como sabe, já este ano, particularmente no caso da Madeira — que penso que lhe é caro —, vários grupos de fuzileiros têm estado nas Ilhas Selvagens e o novo helicóptero EH-101 já se encontra na Madeira para os serviços de busca e salvamento.
Portanto, este é o sinal claro de que estão asseguradas as missões em todo o território nacional.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, agradeço-lhe a concisão das respostas. Creio que foram respondidas todas as questões colocadas pelos Srs. Deputados, pelo que, neste sentido, dou por concluída esta audição.
Julgo que é merecida uma palavra no sentido de dizer que foi uma audição profícua, que decorreu de acordo com o que seria expectável e, naturalmente, que os cidadãos que nos ouvem e vêem, lá em casa terão, porventura, sentido que foi algo de útil e proveitoso aquilo a que estiveram a assistir.
Está suspensa a reunião.

Eram 17 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, vamos retomar os trabalhos e proceder à audição do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

Eram 18 horas e 10 minutos.

Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, vamos começar a audição do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no âmbito das audições ministeriais sobre o Orçamento do Estado para 2007.
Como os Srs. Deputados sabem, a metodologia que vamos seguir, do ponto de vista da utilização dos tempos de trabalho, é a seguinte: o Sr. Ministro faz uma intervenção inicial, que poderá durar até 20 minutos, os Srs. Deputados que intervêm na primeira ronda e que representam a posição de cada um dos respectivos partidos têm 10 minutos para fazer a sua intervenção e fá-la-ão por ordem descendente dos resultados eleitorais dos partidos que representam, neste Hemiciclo, sendo habitual que o PS, como partido mais votado, dê a primeira palavra ao segundo partido mais votado, portanto ao PSD.
O Sr. Ministro responderá em bloco e, para o efeito, terá cerca de 40 minutos.
Teremos, depois, uma segunda ronda de inscrição livre em que os tempos serão reduzidos a metade e a resposta também será feita em bloco.
Posto isto, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, em meu nome e, certamente em nome das Sr.as e Srs. Deputados, damo-vos as boas-vindas e estamos certos de que vamos ter uma audição profícua e muito interessante.
Para uma intervenção inicial, tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para abrir esta reunião, a partir de uma breve apresentação que vos fiz chegar hoje — e que julgo que chegou — e que não é mais do que uma leitura daquilo que está escrito no Orçamento, mas de uma leitura detalhada e organizada do que está escrito no Orçamento, eu gostaria de fazer uma primeira apresentação, que procurarei que não seja longa e que não esgote o tempo que está previsto, pois julgo que o mais importante será o debate que se seguirá.
Gostava de vos sinalizar os pontos principais da proposta do Orçamento do Estado no que diz respeito ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino superior.

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As prioridades que este orçamento indica são muito nítidas neste Orçamento: em primeiro lugar, uma contribuição solidária para o esforço de contenção da despesa pública e para a racionalização da Administração Pública.
As despesas de funcionamento do Ministério descem 3,4%, face aos valores iniciais de 2006, ou 8,2%, se considerarmos apenas as dotações iniciais do Orçamento do Estado, acompanhando a reorganização introduzida nas estruturas centrais do Ministério, que já está vertida na nova lei orgânica do Ministério e antecipando a progressiva reforma das instituições.
Por outro lado, há um cumprimento escrupuloso do Programa do Governo no que diz respeito à prioridade «ao rápido desenvolvimento científico e tecnológico do País». Esta é uma prioridade do Programa do Governo, encontra-se detalhada naquilo que já foi aqui apresentado neste Parlamento, quer pelo Sr. PrimeiroMinistro quer por mim próprio, sob o nome de «Compromisso com a Ciência».
Esses objectivos são aqui reafirmados e são escolhidos os instrumentos que tinham sido anunciados para os cumprir, designadamente as metas de elevação do investimento público em I&D, do estímulo ao investimento privado em investigação e desenvolvimento e do crescimento dos recursos humanos em ciência e tecnologia, em todos os sectores da vida nacional.
Como é sabido, o crescimento ímpar do investimento, que não do funcionamento, em ciência e tecnologia é o traço mais marcante das escolhas políticas desta proposta de Orçamento para 2007, nesta área.
O montante do investimento em ciência e tecnologia, inscrito no Ministério, aumenta 77%, 90% em dotações nacionais do Orçamento do Estado, sendo de mais de 60% o aumento da totalidade das verbas de funcionamento e investimento afectas a ciência e tecnologia.
Consagra-se, exactamente, o aumento de 250 milhões no orçamento de investimento para a ciência e tecnologia do Ministério — 160 milhões por fundos nacionais e 90 milhões por fundos comunitários.
Foi acentuado um reforço das condições de equidade no ensino superior, aumentando-se os valores globais afectos a bolsas de estudo no âmbito da acção social escolar. E esta é outra escolha clara deste Orçamento — e mais adiante terei ocasião de detalhar um pouco mais cada um destes pontos.
Por último, há a manutenção de um forte investimento público em matéria de sociedade de informação e há a continuidade dos diferentes regimes de incentivos fiscais, quer em matéria de sociedade de informação quer em matéria de mecenato científico e de investigação e desenvolvimento nas empresas.
Gostaria, agora, de detalhar um pouco cada um destes pontos.
O investimento em ciência e o aumento do investimento em ciência e tecnologia reporta-se às cinco grandes prioridades que estão enunciadas na iniciativa «Compromisso para a Ciência».
Quanto ao investimento em formação e apoio ao emprego científico, há um aumento de 50% desse investimento comparando com o valor do orçamento inicial de 2006.
Como sabem, já estão em curso, os concursos para os contratos individuais de trabalho para doutorados no sistema científico nacional e vão internacionalizar-se as bolsas de doutoramento em empresas.
É triplicado o apoio a instituições de investigação e desenvolvimento a atribuir de forma competitiva na sequência de avaliações e concretizando o objectivo de consolidação institucional, sem o qual não existe possibilidade de desenvolvimento científico, quer no sector público quer no sector privado e na articulação entre ambos, criando massas críticas segundo padrões de qualidade reconhecida e apoiando através desta dotação orçamental a reforma dos laboratórios do Estado e a criação de consórcios de investigação e desenvolvimento, assim como núcleos de ID em empresas.
É aumentado, na mesma proporção que o aumento em formação de recursos humanos e emprego, o apoio selectivo disponível para projectos de investigação e desenvolvimento, incluindo os consórcios entre empresas com actividades de natureza pública.
É duplicado o apoio disponível para a promoção da cultura científica e tecnológica de maneira a investir na captação de novas gerações e no suporte da sociedade, em geral, para o desenvolvimento científico e tecnológico do País e para a vontade de estudar, de aprender e de trabalhar nas áreas de ciência e de tecnologia.
Por último, reforça-se em quase 70% o investimento em parcerias internacionais de ciência e tecnologia, de onde avulta, como é do vosso conhecimento, a nova cooperação no âmbito das parcerias internacionais para o ensino superior e a ciência e tecnologia, para lá das participações que Portugal tem e se têm desenvolvido nos grandes laboratórios internacionais e nos programas europeus.
É criado também — e o primeiro reflexo orçamental é precisamente em 2007 — o Laboratório Internacional Ibérico de Nanotecnologia, que será o primeiro laboratório científico internacional a instalar em território português, por decisão conjunta dos governos de Espanha e de Portugal, na última cimeira ibérica.
Gostaria de vos sublinhar também que em matéria de sociedade de informação, porque são estas as três grandes áreas de intervenção do Ministério — a ciência e tecnologia, a sociedade de informação e o ensino superior —, se consolidam quer os investimentos conjuntos da sociedade de informação com ciência e tecnologia, em três domínios, a iniciativa nacional GRID, a criação e a operação de uma rede de comunicação primária pública, pela primeira vez, a cobrir todo o território nacional e a investigação e desenvolvimento em tecnologias de informação e comunicação.
É reforçada a grande área das acessibilidades e do combate à exclusão, que é particularmente difícil — como se sabe — em países com os níveis de desenvolvimento educacional como o nosso, mas que tem tido o sucesso que todos nós temos testemunhado ao longo da última década.

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É reforçada a formação profissional em tecnologias de informação e de comunicação, designadamente através da expansão dos cursos de especialização tecnológica, prioritariamente em institutos politécnicos.
Por último, em matéria de ensino superior, o Orçamento do Estado para 2007 suporta as orientações políticas que já foram repetidamente afirmadas nesta Câmara.
Primeiro, uma exigência de racionalização da rede de instituições e da oferta formativa que terá lugar durante o ano de 2007, na sequência dos vários exercícios de avaliação internacional que estão em curso e de que, provavelmente, o mais importante é a avaliação internacional promovida pela OCDE, cujo relatório será tornado público e discutido publicamente em Dezembro deste ano.
A finalização da aplicação do Processo de Bolonha no que diz respeito à organização do ciclo de estudo e atribuição de graus e diplomas.
A criação e a entrada em funcionamento no início do próximo ano da Agência Nacional de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior.
A simplificação dos actuais regimes de equivalência, em caso de ingresso a partir de outra instituição nacional ou estrangeira, promovendo, ao contrário da prática — eu diria ancestral — no nosso país, uma cultura de mobilidade, de abertura e de atracção desburocratizada de recursos humanos qualificados para o País.
O reforço, de que já vos falei, em quase 10% — isto é, de 9,7% — do montante global para bolsas de estudo, no quadro da acção social escolar, e o aperfeiçoamento dos seus critérios para os ensinos superiores público e privado, quer para os estudos de licenciatura quer para os estudos de mestrado, tal como tínhamos anunciado nesta Câmara.
A generalização da oferta dos cursos de especialização tecnológica e a abertura do ensino superior a adultos com experiência profissional — como sabem, esta foi a grande mudança deste ano, para lá dos cursos de especialização tecnológica na entrada no ensino superior, com um significativo aumento de ingressos e em condições de maior responsabilidade institucional e de maior controle externo, como é óbvio.
É claro que não aumentamos, antes consolidamos as obras em curso. Haverá um apoio extraordinariamente selectivo a obras novas: não se trata de construir mais para o ensino superior, a não ser de uma forma extraordinariamente selectiva, no âmbito do cumprimento dos contratos de desenvolvimento que foram firmados anteriormente, e para novos empreendimentos adoptámos a norma de que todos os novos empreendimentos a financiar com fundos públicos sê-lo-ão apenas por concurso entre as várias instituições, isto é, terse-á de escolher onde está a prioridade de construção.
O envolvimento institucional das instituições de ensino superior em processos de transformação e reforma induzidos pela estratégia de desenvolvimento científico do País, quer através dos programas científicos quer através da sua participação em parcerias internacionais de grande dimensão. Eu gostaria de sublinhar, a este respeito, que estas parcerias internacionais (a que foi recentemente assinada com o MIT é um exemplo, e a que será assinada, no final desta semana, com a principal universidade líder das tecnologias de informação e de comunicação Carnegie Mellon será outro exemplo) envolvem institucionalmente o ensino superior e, portanto, a melhoria das condições de formação avançada no nosso país, através de mestrados científicos, de mestrados profissionais e de programas de doutoramento, e nas áreas apropriadas, designadamente nas áreas de engenharia, envolvem empresas no esforço de formação (e a participação financeira de empresas está assegurada) e, sobretudo, criam uma nova cultura de responsabilidade empresarial na relação com o ensino superior.
Teremos, com certeza, ocasião de detalhar este assunto no decorrer do debate. Trata-se de uma mudança muito significativa em relação ao que vinha a acontecer no nosso país.
Gostaria de dizer-vos que, durante o ano de 2007, se lançará um programa novo de estímulo à participação dos institutos politécnicos em redes internacionais com instituições congéneres de referência, designadamente à escala europeia.
Também gostaria de sublinhar que este orçamento consagra, pela primeira vez, a abertura à gestão flexível de recursos humanos e financeiros entre escolas dos institutos politécnicos e que, por outro lado, não confunde «orçamentos à cabeça» garantidos às instituições de ensino superior com orçamentos obtidos de forma competitiva pelas instituições de ensino superior.
Sabemos que uma parte muito significativa do aumento de verbas públicas para investigação científica, ciência e tecnologia irá ser executada por instituições científicas no ensino superior. Sabemo-lo porque é esse o padrão e porque é aí que se encontra um número muito importante de recursos humanos qualificados do nosso país — e é bom que assim seja. Ao contrário do que poderíamos ter feito, entendemos que a afectação dessas verbas se faz por via competitiva e não atribuindo «à cabeça», às reitorias das universidades e aos presidentes do politécnicos, quotas no orçamento da ciência e tecnologia para distribuição interna — isso seria a destruição da possibilidade de uma política científica baseada no mérito, na qualidade e na avaliação externa garantida.
Estes são os pontos principais deste orçamento.
Julgo que não esgotei o tempo disponível, Sr. Presidente, por isso, no fim desta minha intervenção e para antecipar perguntas, gostaria de esclarecer o seguinte aspecto.
Poderão perguntar: de onde vêm as verbas comunitárias que estão inscritas neste orçamento? As verbas comunitárias inscritas neste orçamento são exclusivamente as do III Quadro Comunitário de Apoio, com duas

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excepções. E as duas excepções são o acréscimo de 90 milhões de euros em verbas comunitárias para a ciência, a afectar ao próximo QREN, e 45 milhões de euros do QREN, pela primeira vez, como contributo para o aumento das dotações da acção social escolar.
Não afectámos nem inscrevemos neste orçamento — eram compromissos políticos — qualquer verba comunitária no que diz respeito ao Programa Operacional para a Sociedade de Informação. O programa orçamental da Sociedade de Informação tem inscrito como dotação comunitária apenas as verbas do III Quadro Comunitário de Apoio, cuja execução está prevista para o ano de 2007.
Haverá, necessariamente, verbas do próximo Quadro Comunitário de Apoio para a Sociedade de Informação, como é natural, mas não as inscrevemos aqui, porque não existe, neste momento, uma dotação discutida e analisada nesta matéria.
É importante esclarecer este ponto para se fazerem comparações entre anos. Estamos no fim de um Quadro Comunitário de Apoio e no princípio de um novo Quadro Comunitário de Apoio, por isso julgo que tenho a obrigação de explicar exactamente como é que este orçamento foi construído e está clarificado.
Por outro lado, na minha intervenção inicial insisti numa questão política que considero estratégica: a do aumento muito significativo de verbas para a ciência e a sua relação com o orçamento do ensino superior.
A este propósito, gostaria de recordar o seguinte: Portugal é um dos países europeus em que a fracção do orçamento das universidades atribuída por via competitiva, quando comparada com a fracção atribuída através de fórmulas baseadas no número de alunos e noutros indicadores, é das mais baixas. Temos hoje uma fracção muito pequena, cerca de 20% do orçamento global do ensino superior, que é afectada por via competitiva, através de projectos de investigação, através de vários mecanismos de afectação de verbas às instituições de ensino superior.
Entendemos que é uma ocasião excepcional o aumento de verbas para a ciência e tecnologia para não abandonar este princípio e para não enveredar pela via da facilidade, que seria transferir grande parte destas verbas como receitas consignadas a aumentar ao funcionamento das universidades e, com isto, não dispor de qualquer instrumento que apoiasse a racionalização das instituições de ensino superior no seu funcionamento e na sua administração.
Julgo que sublinhei alguns dos pontos mais importantes das escolhas que fizemos neste orçamento e fico agora à disposição das Sr.as e dos Srs. Deputados para as perguntas que queiram dirigir-me.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Vamos iniciar a primeira ronda de perguntas a formular pelos Srs. Deputados, cabendo a primeira ao Sr. Deputado do PSD Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, a propaganda do seu Governo feznos ver, em todos os jornais, que este Governo faz uma forte aposta na ciência. Cheguei a ler num jornal de referência que o orçamento da ciência ia aumentar 75,6%... É notável como a propaganda consegue criar um país virtual…!

Protestos do PS.

As questões que quero colocar-lhe têm mais a ver com o País real.
E a primeira questão que eu gostava de abordar é, exactamente, a que se prende com o investimento público. Esta é uma questão importante e, ao contrário do que diz a propaganda governamental, não é liquido que, no final de 2007, se verifique um aumento significativo do investimento público na área da ciência. E, Sr.
Ministro, deixe-me dizer por que é que não é liquido que, no final de 2007, se verifique um aumento significativo do investimento público na área da ciência.
V. Ex.ª, no orçamento de 2006, tinha inscrita uma verba de 264,2 milhões de euros no PIDDAC, Capítulo 50. Pois a execução orçamental, em 30 de Setembro, já depois do famigerado decreto do Ministério das Finanças a suspender os investimentos, era apenas de 41,4%, ou seja, o seu Ministério só tinha conseguido executar um investimento público na ordem dos 109,5 milhões de euros. É disto que se trata!! Ou seja, quando V. Ex.ª tinha um orçamento, na sua opinião, mais pequeno e mais contido de 264,2 milhões de euros, V.
Ex.ª só conseguiu executar, apenas e tão-só, 109,5 milhões de euros!!...
Portanto, Sr. Ministro, a minha primeira pergunta tem exactamente a ver com o facto de a verba inscrita em PIDDAC, no Capítulo 50, ter passado de 264 milhões de euros para 382,5 milhões de euros. Questiono se este montante é mesmo para executar, ao contrário do que V. Ex.ª tem estado a fazer ao longo deste ano, ou se é pura propaganda.
Muito claramente, do seu ponto de vista, qual vai ser o grau de execução do seu orçamento no final do ano de 2007? É porque só depois poderemos avaliar da performance do seu Ministério. E, já agora, o que vai mudar na execução de 2007 em relação à fraquíssima execução de 2006? Aliás, Sr. Ministro, ainda nesta matéria do investimento, permita-me que lhe diga que VV. Ex.as anunciaram, mais uma vez, aquele número mágico — 1% do PIB — de investimento público em ciência e tecnologia. Até acredito, até dou de barato que, do ponto de vista orçamental, no tal país virtual que VV. Ex.as criaram, o senhor, no final do mandato, tenha 1% do PIB. Só que a questão não é essa! A questão é a de saber se, de

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facto, executamos, se conseguimos colocar no terreno esse investimento. Esse é que é o problema e essa é que é a questão a que V. Ex.ª vai ter de responder perante o País.
Sr. Ministro, V. Ex.ª, não raras vezes, apresenta-nos inúmeros indicadores para mostrar quão «assustadora» é a posição relativa do nosso país em relação aos outros países, mas acontece que, nos últimos 11 anos, V. Ex.ª foi responsável por 8 anos, por mais de três quartos do tempo, nesta área da ciência…! Portanto, V.
Ex.ª deve estar a fazer um acto de contrição, de mea culpa, porque se Portugal está tão mal, de certeza absoluta que V. Ex.ª tem culpas elevadas nesta matéria, é, sem margem para dúvidas, o principal responsável!! Sr. Ministro, uma segunda ordem de questões tem a ver com o anúncio de que V. Ex.ª vai contratar, só em 2007, 500 doutorados e, simultaneamente, proceder à reforma dos laboratórios do Estado e à criação de novos laboratórios associados.
Sobre esta matéria dos 500 doutorados, gostava de colocar-lhe algumas questões que me parecem pertinentes. Desde logo, como vão ser contratados esses doutorados? Quando vão ser contratados e que critérios vão ser seguidos para a sua contratação? Mas, sobretudo, Sr. Ministro, a questão fundamental é esta: qual é o objectivo estratégico para a contratação desses doutorados? Com efeito, em matéria de investigação, VV. Ex.ª habituou-nos a esperar «mais do mesmo», ou seja, a investigação pela investigação, mais Estado, mais «subsidiodependência»!!… Ora, a questão que se coloca é a de haver uma mudança de paradigma nesta matéria, a de contratarmos doutorados para trabalhar em empresas e, desse modo, aumentarmos a inovação e a criação de novos produtos para termos progressos significativos na competitividade.
Uma terceira questão que eu gostaria de colocar-lhe tem a ver com os acordos internacionais, nomeadamente com o MIT (Massachusetts Institute of Technology) e com a Carnegie Mellon, de que V. Ex.ª ainda há pouco falou. Sr. Ministro, quais foram os critérios que presidiram à escolha destes parceiros, sejam eles internacionais ou nacionais? E digo-lhe o porquê desta minha pergunta: é porque tive o cuidado de «fazer o trabalho de casa» e ouvi a Reitora da Universidade de Aveiro a dizer que V. Ex.ª é que escolhe e que a Universidade de Aveiro não foi escolhida; li o que disse o Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, isto é, que os politécnicos tinham sido ignorados no acordo; li o Presidente da UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro) que disse que o acordo sobre o MIT foi pouco transparente — ainda não se pronunciou sobre o acordo de sexta-feira; li o reitor da Universidade de Évora que disse exactamente a mesma coisa — «a metodologia da escolha não foi a melhor»... Ou seja, tanto quanto podemos entender, em relação a esta questão das parcerias, sobretudo do ponto de vista nacional, V. Ex.ª devia ter em linha de conta aqueles que são os parceiros potenciais, os parceiros mais habilitados a poderem ser envolvidos nestes acordos. Mas a questão é que eles dizem que não foram ouvidos…, que foi V. Ex.ª que os escolheu… Aliás, é uma linguagem que V. Ex.ª utiliza, até no documento que fez o favor de nos enviar hoje. Efectivamente, é uma linguagem muito típica do Sr. Ministro, isto é, «o apoio selectivo». De facto, V. Ex.ª tem selectividade na escolha que faz: só faz as suas opções de acordo com os seus critérios, de acordo com quem gosta e de quem está próximo! Peço-lhe desculpa que lhe diga, mas do ponto de vista político esta noção dos «apoios selectivos» levanos ao seguinte comentário político: «apoio selectivo» significa, geralmente, arbitrariedade. É disso que estamos a falar, sem margem para dúvidas, quando lemos o que dizem os reitores e o coordenador dos politécnicos do nosso país.
Outra questão que gostaria de colocar-lhe tem a ver com o ensino superior e o Processo de Bolonha. Sr.
Ministro, o Orçamento do Estado para 2007 penaliza duplamente o ensino superior. Aliás, V. Ex.ª, talvez habituado àquele longo percurso enquanto apenas Ministro da Ciência, esquece-se de que hoje também é Ministro do Ensino Superior, só dessa forma podemos entender esta forte penalização do ensino superior.
Em primeiro lugar, há um corte de 8% nas verbas e, não contente com isto, V. Ex.ª aplica mais um imposto ao ensino superior obrigando as escolas a pagar directamente as contribuições para a Caixa Geral de Aposentações.
Porém, Sr. Ministro, o que resta do financiamento do ensino superior, pelos dados que temos e que são publicados, ou seja, 70%, é já hoje assegurado pelos estudantes. E, para que não haja dúvidas de qual é o ponto da situação, vou citar-lhe um conhecido do Sr. Ministro, uma pessoa que, julgo, o Sr. Ministro considera bastante e que é um especialista da área socialista, ou seja, Pedro Lourtie, que ainda recentemente dizia que, «em termos de financiamento, as instituições do ensino superior estão no limiar da sobrevivência» e que o modelo que V. Ex.ª está a seguir não é, de todo, sustentável.
A ser assim, o que é mais complicado é o que se passa com a acção social escolar. Sr. Ministro, sobre esta matéria, permita-me que lhe diga que é inadmissível a insensibilidade social que o Sr. Ministro tem perante os estudantes do ensino superior, sobretudo os oriundos daquelas camadas mais desfavorecidas da população portuguesa. Os cortes nos fundos para a acção social escolar em termos de ensino superior situam-se entre os 36% a 54% — a não ser que os quadros que nos deu estejam errados…! Os valores que lá constam situam-se entre os 36% e os 54%, o que é inadmissível! Sobretudo, e para que não haja dúvidas, para sublinharmos quão errada está a política do Governo nesta matéria, aí está o último relatório da OCDE que o diz e que, porventura, permite aclarar alguns espíritos um pouco mais intranquilos sobre essa matéria. O último

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relatório diz que nós somos o país com o mais baixo apoio do Estado aos estudantes do ensino superior. Julgo que V. Ex.ª conhece o estudo,…

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não o leu!

O Orador: — … porque eu li-o e, penso, li bem. Portanto, não vai negar o que acabei de afirmar.
Relativamente a Bolonha, V. Ex.ª está perante uma questão dramática para o nosso país. É que nós poderemos estar no limiar de perder uma excelente oportunidade para mudarmos o paradigma de funcionamento do ensino superior em Portugal devido, sobretudo, à forma atabalhoada como o Governo tem vindo a implementar o Processo de Bolonha. E sobre esta matéria, Sr. Ministro, espero que não haja dúvidas, porque o PSD, na altura da discussão da lei de bases, avisou a maioria socialista, aquela maioria absoluta que revela um «autismo» profundo até perante propostas que iriam ajudar V. Ex.ª na concretização do Processo de Bolonha.
Ora, os resultados estão à vista: implementado de uma forma atabalhoada, nós não sabemos bem o que está a acontecer, existindo uma crítica generalizada de ausência de informação atempada.
Há pouco, V. Ex.ª disse que a agência de acreditação e avaliação iria ser criada no início do ano. Será que pode ser mais preciso e avançar mais alguma informação quer sobre a data da criação da agência quer sobre o modo como ela irá funcionar?

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado, pois conteve-se no tempo de que dispôs apenas com uma ligeira ultrapassagem.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Caros Colegas: Tenho o privilégio de voltar a intervir nesta matéria como fiz em 2006 e sinto novamente por parte do Governo e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior o recentrar e a afirmação das prioridades políticas estabelecidas no Programa do Governo, nomeadamente com a aposta naquilo que é estruturante e que é um novo modelo económico sustentado na perspectiva de mais qualificação e de maior investimento em ciência e tecnologia. Ou seja, o aumento de 77% em ciência e tecnologia e de 90% de verbas transferidas do Orçamento do Estado, sendo que, em 2006, já havia um aumento de 17%, é para nós claro e evidente! No entanto, não posso deixar de fazer aqui um pequeno reparo à intervenção do PSD. Em relação a esta matéria, isto é, da ciência e tecnologia, o PSD tem um grande constrangimento: o constrangimento de ter estado três anos no governo e de ter permitido que… O Deputado Agostinho Branquinho dizia que o Sr. Ministro esteve oito anos no governo e nós voltamos a dizer que é pena não ter estado 11 anos, porque se não os dados do investimento no PIB não tinham sido estes.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Este quadro é muito claro: o que diz com clareza é que, quando o PSD entrou no governo, o investimento era de zero…

Protestos do PSD.

Eu sei que não querem ouvir, mas convém serem sérios na discussão. Ora, nada mais sério do que olharmos para os dados objectivos.
O que nos dizem os dados objectivos é que, quando o PSD entrou no governo, o investimento em ciência e tecnologia, em investigação e desenvolvimento do PIB era de 0,27%. Estranhamente, em 2003 e 2004, por sua culpa, Sr. Ministro — porque não era ministro!... —, estes dados baixaram para 0,24% , em 2003, e para 0,17%, em 2004. Estranhamente, o Sr. Ministro chegou ao Governo e voltaram a subir, e subiram tanto que, para o ano de 2007, se prepara uma subida de «apenas» 86%!

Vozes do PS: — Exactamente!

O Orador: — Eu compreendo que haja por parte do PSD um grande constrangimento em relação a esta matéria por duas razões, a primeira das quais porque se «esqueceram» durante os seus governos, por exemplo, de pagar as quotas às instituições internacionais das quais Portugal fazia parte.

Vozes do PS: — É verdade!

O Orador: — Esqueceram-se, mas eu relembro! Na verdade, isso não permitiu que as nossas empresas e os nossos investigadores participassem em instituições internacionais.

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Em segundo lugar, esqueceram-se de intervir e de apostar na Agência Ciência Viva, votando esta instituição ao total ostracismo.
É essa a visão que VV. Ex.as têm. Os cortes que o PSD apresentou em tempos de crise económica foram cortes «cegos» — estava na expectativa de que se construísse um novo modelo económico com base numa ilusão: a de que a economia, por si só, era capaz de resultar e de dar dados positivos.
Este Governo tem outra visão e, em momentos de contenção orçamental, diz claramente aos portugueses: «Esta é a nossa prioridade. Podemos e temos de cortar despesas. Podemos e devemos cortar na despesa pública, mas fazemo-lo com contenção e com rigor.» Nesta área, de investimento prioritário, que pode permitir um novo modelo económico, que pode permitir dar condições a que a nossa sociedade mude de modelo económico, o investimento é claro!! Isto é, foram 17%, em 2006, e vão ser 77% no Orçamento do Estado para 2007!! Para nós a mensagem é clara: rigor na despesa pública! Neste esforço de contenção da despesa pública, as instituições de ensino superior não podem estar à parte, não podem ser postas de parte. Se nós reconhecemos que muitas delas foram capazes de acompanhar o esforço que é necessário para a sua internacionalização, a avaliação, o conceito de «universidade sem muros» e a proximidade que tem com o meio empresarial, este esforço de rigor tem de ser mais potenciado. Efectivamente, aqui podíamos também «dourar a pílula» e podíamos pegar no orçamento para a ciência e tecnologia e, porque que faz todo o sentido, incluir uma parte dele também no ensino superior, e ter um resultado positivo também nesta área.
Porém, o sinal que é dado, a mensagem clara dada por este Orçamento — e volto a salientar este argumento, que é extremamente importante — é a de que essa perspectiva pode ser conseguida pelas instituições de ensino superior através do recurso à via competitiva de verbas em sede de ciência e tecnologia por parte das instituições. Ou seja, é claro dizer-se às instituições que também a elas é dado um sinal de esforço, de valorização, de melhor gestão para perspectivar estes diferentes elementos.
Algumas questões se nos levantam: «estaremos a cortar ‘gordura’ ou ‘músculo’»? — e esta é uma questão levantada pelo PSD. É importante saber, por exemplo, e já reflectimos sobre essa matéria, qual é a ratio do pessoal não docente e docente. Sabemos que há casos de instituições com o mesmo número de alunos que, num caso, têm mais 200 funcionários de pessoal não docente em relação a outras. Sabendo que há especificidades, há que perspectivar e neste caso concreto é muito comparável quer em termos de infra-estruturas físicas, quer em termos de pessoal docente, quer em termos de número de alunos. Portanto, há aqui condições para que a redução média de 3,4% seja considerada.
Além disso, temos também de perspectivar mais três elementos importantes, um dos quais é a reestruturação da rede do ensino superior que se perspectiva para 2007 e que terá aqui um efeito importante na contenção de despesas na perspectiva de «cortar a gordura e não o músculo»; a diminuição do número de alunos no ensino superior e também a redefinição e formulação do número de cursos que estão em causa.
Outra questão sobre a qual não nos coibimos de reflectir é a seguinte: estaremos a inviabilizar o acesso e a permanência de alunos com mais carências e qualidade no ensino superior? Na questão central da acção social há uma mensagem clara dada neste Orçamento do Estado: há um aumento das bolsas em 9,7%! É uma informação objectiva. Há ainda outras perspectivas, ou seja, que as vagas no ensino superior público são por si só capazes de absorver todos os candidatos a candidatos ao ensino superior — passe a redundância.
Centremo-nos agora no esforço de modernização do País. O orçamento deste Ministério contém um aumento de 50% no investimento em formação avançada e apoio ao emprego científico; triplica o apoio às instituições de investigação e desenvolvimento; duplica o apoio disponível para a promoção da cultura científica; aumenta 50% o apoio selectivo em projectos de investigação e desenvolvimento — isto é muito importante, pois incentiva-se a valorização económica dos resultados da investigação —; reforça-se em cerca de 70% o investimento em parcerias internacionais em ciência e tecnologia; consolidam-se investimentos conjuntos em ciência e tecnologia e em sociedade de informação;…

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Isso está escrito. Não vale a pena ler!

O Orador: — … infra-estrutura nacional de computação distribuída; criação e operação de uma rede de comunicação primária à escala nacional, ligando todas as capitais de distrito por cabo; expande-se a rede de espaços Internet; reforma-se a formação profissional em tecnologias da informação e da comunicação (TIC), através da expansão de cursos de especialização tecnológica, nomeadamente em institutos politécnicos; prossegue-se o regime de mecenato para a sociedade de informação; mantêm-se os benefícios fiscais na compra de computadores por estudantes; salientamos, no ensino superior, a racionalização da rede de instituições e a oferta formativa na sequência da avaliação internacional; a finalização da aplicação do Processo de Bolonha; o esforço de 9,7% do montante global nas despesas de acção social escolar através das bolsas; a generalização da oferta de cursos de especialização tecnológica; a abertura do ensino superior a adultos com experiência profissional; a selectividade dos investimentos em infra-estruturas; o envolvimento institucional das instituições de ensino superior no desenvolvimento científico do País, nomeadamente a participação em parcerias internacionais extremamente relevantes para a qualificação das parcerias, designadamente com o MIT, com a Carnegie Mellon University e com a Texas University at Austin; a atracção de cientistas estran-

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geiros com a abertura a novas cátedras; a criação de bolsas para a inserção de estudantes em centros e actividades de investigação; um novo programa de estímulo à participação de institutos politécnicos em redes internacionais de instituições congéneres de referência; a abertura à gestão flexível dos recursos humanos e financeiros dos institutos politécnicos; a muito importante orientação estratégica de ampliar o financiamento público disponível para o ensino superior por via competitiva, designadamente em matéria de investigação e desenvolvimento; há um claro incentivo à cultura de excelência, que se pretende imprimir e premiar, no ensino superior.
Sem prejuízo dos comentários que considere por bem efectuar na sua intervenção, Sr. Ministro, há uma matéria que eu gostava de ver esclarecida. Sucede que, em sede de avaliação do Orçamento, ficámos com a ideia de que a verba que estava destinada à avaliação internacional das instituições de ensino superior em 2006 é superior à verba destinada à avaliação para 2007, sendo que está previsto também para 2007 o aparecimento da agência de avaliação e acreditação do ensino superior. A questão que coloco, portanto, é a de saber se, em Portugal, a avaliação vai ficar mais barata do que a avaliação internacional.
Termino com o que penso ser a mensagem clara deste Orçamento: é este o caminho para o crescimento económico, para um País mais moderno e solidário, para uma economia sustentada em factores determinantes, tendo em vista as sociedades modernas e a globalização. Destaco ainda a contenção e o rigor selectivo das despesas públicas e o investimento estratégico para um novo modelo económico.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Detecta-se, por algum ruído que existe na Sala, uma vontade muito grande que muitos Srs. Deputados têm de participar no debate… Certamente, terão oportunidade para o fazer muito em breve.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, os restantes partidos não podem ficar com o tempo de leitura do Orçamento do Partido Socialista? De facto, como o Sr. Ministro já o tinha lido, pergunto se não podemos repartir entre nós o tempo disponível do Partido Socialista…

Risos do PCP.

Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, a primeira questão que eu queria colocar prende-se com a afirmação feita na apresentação do Orçamento do Estado (que não leio, porque já foi lida duas vezes), relativa à indexação das verbas para a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e para as instituições de investigação científica e de ensino superior. Diz o Sr. Ministro que não se pode agarrar na verba destinada à Fundação para a Ciência e a Tecnologia e, à cabeça, enviá-la já para as instituições, porque essa verba terá outros objectivos e outras estratégias. E di-lo como se as coisas fossem só assim: ou se pudesse enviar a verba ou se não se pudesse enviar esta verba para aquelas instituições.
A questão que se coloca — e era importante o Sr. Ministro dar sobre ela uma explicação — é a de saber se os cortes verificados nos laboratórios do Estado, nos politécnicos e nas universidades permitem que o dinheiro que resta responda às necessidades destas instituições. Por outro lado, cumpre explicar se o dinheiro que fica, de forma centralizada, na Fundação para a Ciência e a Tecnologia não poderia, no mínimo, evitar os cortes que o senhor e o seu Governo levam a cabo nas instituições de ensino superior e de investigação científica. Isto é que era importante que o Sr. Ministro explicasse! A não ser, claro, que V. Ex.ª canalize o dinheiro todo para a Fundação para a Ciência e Tecnologia, de forma centralizadora, porque a sua política científica é centralista, «de topo», como o Sr. Ministro diz, o que lhe permite decidir apenas com os avaliadores internacionais estrangeiros, o que levou a que as instituições nacionais e os seus responsáveis portugueses fossem impedidos de participar na discussão das verbas que estão na Fundação para a Ciência e a Tecnologia e que as instituições não vão ver! Esta é a questão de fundo, porque é ela que determina que política de investigação científica o seu Governo tem para o País.
Uma outra questão que se coloca é a que procura saber se, neste momento, o seu Governo (sem esquecer todos os demais de que o Sr. Ministro fez parte precisamente com a pasta da ciência e da tecnologia) considera que as missões das universidades e dos laboratórios do Estado estão esgotadas. Isto é, queria saber se o Sr. Ministro já subscreve aquela afirmação segundo a qual a massificação do ensino superior já aconteceu — já é uma afirmação que se ouve no seio do Partido Socialista… —, que os laboratórios do Estado já chegam e que, naturalmente, chegámos ao momento da qualidade e que a qualidade passa pela aposta «nos nichos de excelência para nichos de negócios com o nicho MIT e companhia»…! É esta também a sua definição de política científica? É porque ela baseia-se na convicção de que as universidades, os politécnicos e os laboratórios do Estado já não têm como missão o desenvolvimento do País na área científica e tecnológica e na formação de quadros qualificados!! Em terceiro lugar, coloco-lhe uma questão que se prende com a situação das universidades e dos politécnicos. Como sabemos, pelos «seus» números os cortes são óbvios — não falo sequer das diferenças entre os «vossos» números e os «nossos», porque o Sr. Ministro ignorou a inflação para 2007…! O Sr. Ministro não

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parte das verbas iniciais para 2006 e para 2007 mas, sim, das taxas de execução. Como já aqui foi dito, as taxas de execução são de tal maneira baixas que, naturalmente, a divergência é menor. Mas, Sr. Ministro, esta sistemática política é da sua responsabilidade, como é da sua responsabilidade a forma de apresentar os números. Dela faremos, porém, a leitura necessária.
Todavia, se o Sr. Ministro considerar o Orçamento inicial de 2006 e a inflação para 2007 e se tiver em atenção o facto de agora as universidades, os politécnicos e os laboratórios do Estado já não serem excepção, tendo de pagar 7,5% para a Caixa Geral de Aposentações, V. Ex.ª, que é um homem da ciência, facilmente fará contas e saberá — tenho a certeza absoluta! — que as instituições não irão sobreviver com estes cortes. E o Sr. Ministro sabe disto porque as cartas dos Srs. Reitores e dos professores do politécnico, das universidades e dos laboratórios do Estado não têm só chegado aos grupos parlamentares da Assembleia da República e ao Sr. Presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, que é um ilustre socialista, como o Sr. Ministro sabe!! Penso que essas cartas também terão chegado ao seu gabinete…! Eu gostaria, portanto, que o Sr. Ministro respondesse a esta questão: as universidades, os politécnicos e os laboratórios do Estado, com os cortes feitos no seu funcionamento e patentes também no PIDDAC, têm condições para funcionar? Sr. Ministro, dos 11 laboratórios do Estado existentes, o Orçamento apresenta cortes em 9, mantém a verba relativa a um deles e sobe ligeiramente, se não considerarmos a inflação, em relação ao último. É esta a política científica do Governo ou isto já é resultado dos 25% de instituições de investigação que o Governo pretende abater a curto prazo? De facto, como sabe, esta informação foi dada pelo Sr.
Primeiro-Ministro no Plenário da Assembleia da República, pelo que gostaríamos de saber quais são os abates que integram os 25%? Que instituições de investigação científica constituem esses 25%? Não vou dizer quantas vezes o Sr. Ministro aqui falou no que é selectivo. É tudo selectivo, até as infraestruturas! Mas o Sr. Ministro não esqueceu, com certeza, os compromissos que assumiu em 2006, alguns deles pessoalmente perante os responsáveis pelas instituições. Sabe, portanto, que há obras em curso e que há facturas para pagar, tendo o Sr. Ministro, em relação a algumas delas, assumido pessoalmente o compromisso de ter esse dinheiro no Orçamento do Estado para 2007. Ora, não está! Falo-lhe daquela vertente pobre do sistema que muitas vezes é esquecida, isto é, do politécnico — não sei se o Sr. Ministro ainda se lembra dela… Falo daquelas instituições que não têm direito à ciência, que não têm direito a ter corpo docente e que têm direito a ser tratadas como instâncias de «segunda classe» face às universidades! Esses compromissos assumidos e essas facturas por pagar não estão, portanto, em PIDDAC. Estou a lembrar-me, por exemplo, do Politécnico de Leiria, do de Castelo Branco ou do Lisboa. Estamos a falar de obras em curso, algumas das quais devem terminar para o mês que vem. Por que é que o dinheiro para estas obras não está em PIDDAC? Não me pode dizer, sequer, que já seleccionou estas para serem excluídas, visto que a selectividade é apenas para as obras seguintes.
Uma outra questão que quero colocar prende-se com os recursos humanos. Disse o Sr. Ministro, e subscrevo-o inteiramente, que pensar na aposta na ciência sem pensar nos recursos humanos é, de facto, uma má aposta. Pergunto, portanto, se nesta aposta na ciência e nos recursos humanos se refere aos docentes do politécnico e das universidades e aos investigadores dos laboratórios e da carreira técnica de investigação, que são indispensáveis ao seu funcionamento. Li atentamente o relatório de avaliação cujos resultados foram conhecidos em Março, documento que permitiu a intervenção do Governo depois dessa data. Ora, o Sr. Ministro não esqueceu, com certeza, o que aí se disse relativamente a um conjunto de laboratórios, isto é, que precisam urgentemente de recursos humanos ao nível da carreira técnica de investigação e que sentem a ausência total das tutelas (como, por exemplo, das pastas da Economia e do Ambiente) no que respeita à intervenção dos ministérios na missão desses laboratórios. Era importante saber onde é que estão as verbas para estes recursos humanos.
Será que estamos a voltar àquela avaliação da sua responsabilidade, de 1997, em que os avaliadores internacionais dizem que o melhor é fechar os laboratórios e partir para outra coisa qualquer, como os tais consórcios com o MIT, etc.? Todavia, o relatório de Março de 2006 diz exactamente o contrário, ou seja, que é indispensável a existência dos laboratórios do Estado na definição de uma política científica nacional. Não será, contudo, para os pôr a funcionar com 8000 bolseiros. O Sr. Ministro sabe tão bem como eu que cerca de um terço dos investigadores são bolseiros (são cerca de 8000), e são muito mal tratados pelo seu Governo, que não lhes paga as bolsas atempadamente, não lhes garante a segurança social nem a licença de maternidade ou de paternidade, entre muitas outras coisas que V. Ex.ª conhece, porque tem respondido aos meus requerimentos, reenviando sempre a responsabilidade para as tutelas próprias de muitos destes laboratórios.
Lembro, por exemplo, a última resposta que me deu, relativa ao INIAP (Instituto Nacional de Investigação Agrária e das Pescas). Pergunto, portanto, qual é a situação destes bolseiros e como é que eles vão ser tratados.
Em relação ao ensino superior, aos docentes do politécnico e da universidade, como é que o Sr. Ministro encara o despedimento que os politécnicos irão fazer a curto prazo? Estamos a falar, em muitos casos, de quadros qualificados, ou seja, de mestres e de doutores. Naturalmente, isto resulta do que o Sr. Ministro aqui anunciou, isto é, de encerramentos e fusões e da ausência de financiamento público para cursos com menos de 20 alunos na primeira inscrição. Isto tem consequências quanto a estes quadros qualificados. Que aposta de política científica é esta?

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De facto, os senhores dão-se ao luxo de despedir sem dar qualquer apoio social, porque o compromisso assumido pelo Sr. Ministro, em campanha eleitoral, da criação do subsídio de desemprego para investigadores e professores do ensino superior continua por cumprir até hoje!! Como é que o Sr. Ministro vê esta situação particularmente no ensino superior politécnico, mas que, naturalmente, também vai ter incidências nas universidades?

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, uma questão prévia, que, desde já, gostaria de ver esclarecida.
Feita a leitura, que fizemos muito atentamente, dos documentos do Orçamento do Estado, do relatório e, inclusive, das informações complementares que nos enviou hoje mesmo, verificamos que, muito provavelmente, o País vai sofrer uma grande transformação em relação àquela que é a sua base económica, o seu tecido económico, neste momento, porque a grande aposta é sobretudo nas áreas das engenharias, em inovação e desenvolvimento, e, portanto, muito voltada para aquilo que será uma industrialização forte do País. O que gostaríamos de saber é se está pensado qual vai ser, daqui a 10 anos, o tecido empresarial e a base económica do País, sendo que, hoje, a base económica do País está sobretudo assente em serviços.
Esta é uma das primeiras questões que gostaríamos de ver esclarecida, porque há aqui, seguramente, uma alteração substancial da política da ciência, inovação, tecnologia e desenvolvimento. Se isso está pensado, era bom que também nos fosse aqui transmitido, porque, da leitura que fazemos, ficamos apenas com um projecto de boas intenções, e sabemos, seguramente, que o sítio das boas intenções está cheio. Esta é a primeira questão que gostaríamos de ver esclarecida.
Segunda questão: recordo-me de, aqui há uns meses atrás, o Sr. Ministro ter dito que uma das grandes questões que iria estar presente neste Orçamento do Estado, para onde se deveria também vocacionar a despesa pública na universidade e no ensino superior, era o mérito e a excelência Verificamos, agora, que isso não consta deste orçamento ou não é demonstrativo deste orçamento.
Verificamos que o orçamento atribuído às universidades estrangula de forma dramática as instituições (Senado da Universidade da Madeira) e que não existem actualmente mecanismos legais que permitam à generalidade das universidades encaixar a drástica redução do orçamento de funcionamento previsto para 2007 (Senado da Universidade de Coimbra). Por outro lado, o Conselho dos Politécnicos manda-nos um comunicado com um pedido de audiência, com carácter de urgência, dizendo que estão em causa verbas para o politécnico, que não permitem pagar facturas de obras que estão concluídas ou em execução.
Portanto, verificamos que aqui não só não é garantido o funcionamento normal das instituições como ainda, nos orçamentos da responsabilidade de V. Ex.ª, em dois anos consecutivos, não é feito qualquer aumento, diminuindo-se as verbas, designadamente para o politécnico.
Lembro-lhe que as verbas para o politécnico foram, em 2005, de cerca de 430 milhões de euros, em 2006, de 397 milhões de euros e, em 2007, de 387 milhões. Portanto, há uma diminuição gradual, sendo certo que, no caso do politécnico, só este ano o número de alunos aumentou em cerca de 14%. Ora, com mais alunos e com menos verbas é, seguramente, muito difícil conseguir fazer aqui aquilo que todos esperávamos que o Sr.
Ministro fizesse, que era uma continuada democratização do ensino superior em Portugal.
Verificamos também, Sr. Ministro, que, na proposta de Orçamento do Estado, é dado um enfoque muito grande, sendo que é logo a primeira questão naquilo que o Sr. Ministro aqui apresenta como orientações políticas para o sector do ensino superior, à exigência de racionalização das redes e instituições. Ora, Sr. Ministro, convinha que nos esclarecesse qual vai ser esta alteração da rede, qual vai ser esta racionalização da rede e das suas instituições, se vai haver fusões, se vai haver extinções de instituições, como é que isso vai funcionar e o é que o Sr. Ministro vai fazer relativamente a esta alteração da rede. O que vai haver é integração dos politécnicos nas universidades? É que consta para aí que muitos dos politécnicos deixarão de ter autonomia e serão integrados em universidades. Mas como? Para serem departamentos da universidade? Qual é a filosofia que está traçada para esta situação? O Sr. Ministro vai dizer-nos que isso é uma das questões que constam no Programa do Governo, mas lá não está qual vai ser a filosofia, como é que isso vai ser feito, qual vai ser a metodologia e quando, como e em que medida é que isso se vai verificar.
Ainda relacionado com esta questão, o Sr. Ministro refere que vai haver um forte apoio em termos dos cursos de especialização tecnológica, muito em particular nos politécnicos. Ora, como é que conseguimos chegar lá se os cursos de especialização tecnológica são aqueles que, efectivamente, têm maior despesa, sendo que a diminuição de receitas por parte do Estado para os politécnicos vai impedi-los de poderem fazer isto. Será que vão ser financiados exclusivamente pelo pagamento das propinas por parte dos alunos? É essa a perspectiva do Ministério? É que, em alguns casos do politécnico, as verbas do Estado chegam apenas para pagar 10% da despesa corrente e 90% da despesa terá de ser paga com receitas próprias. Portanto, Sr. Ministro, isto é extremamente preocupante.
Ainda relativamente a esta matéria dos politécnicos e também das universidades, atrevo-me a ler-lhe aqui um pequeno texto, que já lhe direi de quem é: «Um aumento drástico dos custo suportados pelas famílias seria contraproducente, porque afastaria ainda mais os jovens do ensino superior e não seria justo, visto que

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cabe às famílias a maior parte dos custos da educação dos seus filhos. De qualquer modo, seria mau fechar, à partida, a discussão técnica e política dentro desta linha de raciocínio. Por exemplo, que o Estado peça uma pequena contribuição adicional aos estudantes para fortalecer os mecanismos de natureza distributiva e, designadamente, aumentar os apoios, em sede de acção social, aos alunos do sector privado, ou para criar incentivos de frequência, sejam eles de crédito ou fiscais, ou para pôr em prática prémios pelo desempenho, como as bolsas de mérito. As soluções de financiamento são compósitas e é preciso comparar globalmente vários compostos para preferir um deles. É isto que nos distingue da ortodoxia neoliberal da retracção do investimento público e da demagogia populista de ‘não pagamos’».
Acabei de ler um texto de um ilustre membro do Governo, que é um forte apreciador de La Fontaine, pois gosta muito de nos contar algumas fábulas, o hoje Ministro Augusto Santos Silva, que escrevia isto em 2003.
Ora, verificamos hoje que o forte investimento do Estado não existe e, portanto, há uma penalização das famílias relativamente ao financiamento dos seus estudantes.
Portanto, gostaria de saber, Sr. Ministro, como é que se consegue fazer este reforço ou esta generalização da oferta de especialização tecnológica, especialmente nos politécnicos, com a diminuição de financiamento ao ensino politécnico.
Para terminar, Sr. Ministro, neste orçamento prevê-se que o financiamento da acção social escolar e das bolsas seja feito por outras fontes, nacionais e comunitárias, e urge esclarecer aqui quais são essas outras fontes.
O Sr. Ministro, há pouco, referiu-nos aqui que ainda são verbas do III Quadro Comunitário de Apoio ainda, mais 90 milhões de euros de acertos e ainda 45 milhões de euros do QREN. Portanto, há aqui que esclarecer exactamente se as verbas destas outras fontes de financiamento estão garantidas, se essas outras fontes de financiamento vão ser aprovadas pelo Ministério e distribuídas pelos respectivos institutos e universidades ou se é por candidatura dos institutos e das universidades.
O Sr. Ministro faz-me sinal de que não, mas estou mesmo a ver que estas verbas destinadas à acção social escolar venham, um dia destes, a ser utilizadas para pagamento de investimentos, nomeadamente em termos de equipamento das universidades.
E, mesmo para terminar, Sr. Ministro, gostaria de saber, porque é um grande objectivo de V. Ex.ª, como é que conseguirá também resolver ou com que verbas irá pagar no próximo ano, uma vez que há um desinvestimento por parte das universidades, os 500 novos doutores e a abertura, em instituições do ensino superior, de lugares de investigadores internacionais de alto nível, com a criação de 50 novas cátedras até 2009, uma vez que elas não constam aqui nas verbas das universidades.
Portanto, o que se nota aqui, e já lhe dei vários exemplos, é uma drástica ou dramática, conforme os casos, situação de diminuição de verbas para as universidades.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, penso que V. Ex.ª vai aproveitar esta oportunidade para esclarecer os modelos que subjazem à sua proposta de orçamento, partindo da necessidade de constatar o óbvio, no que diz respeito ao estrangulamento financeiro das instituições de ensino superior, quer universidades, quer politécnicos. Neste sentido, quero reforçar a pergunta: como é que vai investir na especialização tecnológica através dos politécnicos com esta proposta que aqui nos trouxe? Em segundo lugar, uma pergunta determinante: como é que, efectivamente, vai assegurar que as universidades continuarão a ser a sede privilegiada da investigação em Portugal? Evocou aqui o princípio da competitividade, que, como tantos outros, pode ser um princípio artificial e que, obviamente, faz recair maior preocupação em áreas onde esta orientação de mercado pode ter menos cabimento, nomeadamente nas ciências humanas, como é óbvio.
Este estrangulamento orçamental, aqui já reconhecido, tem consequências e gostaria de o ouvir sobre elas. Não presume, por exemplo, que é um convite à maximização da propina? Não presume que, naturalmente, levará as instituições a apelarem a um segundo ciclo a qualquer preço? Gostaria de o ouvir particularmente sobre estas questões.
A segunda questão tem também a ver, naturalmente, com os recursos humanos e com a iminência do desemprego neste nível de ensino. Pergunto-lhe se vai, finalmente, consagrar um direito fundamental destes professores, que é o direito ao subsídio de desemprego, ou se vai aproveitar toda esta profícua política de bolsas para, durante algum tempo, amortizar o desemprego neste sector do ensino em Portugal.
É evocado, na proposta que estamos aqui a discutir, o reforço do Programa de Formação Avançada, com o aumento do número de bolsas. Quero questioná-lo sobre esta matéria. Parte dos bolseiros que neste momento integram o programa desenvolvem actividade no âmbito de organismos ligados ao seu ministério, não são propriamente empregados ao serviço da ciência. Gostaria de saber o que é que lhes vai acontecer. Vão continuar a desenvolver funções técnicas no ministério? Vão ser integrados nos quadros do ministério? Qual é o futuro destes bolseiros?

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Por outro lado, temos uma preocupação profunda quando se fala em ciência, quando a ciência «encheu as bocas» deste país. Qual é o projecto para a reforma dos laboratórios do Estado? O que é que vai efectivamente acontecer ao INETI, por exemplo? Sem um horizonte de desenvolvimento sustentável, o futuro desta instituição é extraordinariamente preocupante. É uma instituição que não sabe efectivamente qual é o seu futuro, que não conheceu, da parte das tutelas, qualquer proposta de diálogo, qualquer diagnóstico que apontasse o futuro. Por exemplo, é evocado neste quadro de grandes transformações o quadro pluridisciplinar que assiste ao MIT como uma das grandes matrizes de transformação. Ora, o INETI trabalha segundo um espectro largo de competências, como sabe, e com um enquadramento pluridisciplinar. Efectivamente, o que é que vai acontecer a estas instituições? Sobre Bolonha, Sr. Ministro, gostaria de perguntar-lhe se não está preocupado com o facto de este processo se ter aparentemente convertido num processo administrativo de contracção precipitada de currículos em detrimento de todo o modelo que deveria subjazer a estas propostas.
Considera que as competências são, neste momento, o eixo destas propostas curriculares? Considera, neste momento, que as expectativas de alunos e professores estão a ser cumpridas, com a implementação do modelo tal como está a ser realizado neste país? Tem avaliação para o modelo? Tem dados que nos possa já oferecer, dado que esta é, obviamente, uma grande preocupação desta Casa? Neste concernente, quero colocar-lhe uma questão muito concreta. É capaz de nos explicar por que é que, no tocante às tecnologias da saúde, os cursos foram contraídos obrigatoriamente para três anos, à revelia de recomendações europeias e do reconhecimento de acreditação dos cursos em Portugal? Finalmente, quanto à agência de acreditação e avaliação do ensino superior, penso que o Sr. Ministro vem introduzir aqui uma matriz que é determinante, é tardia, e sobre a qual gostaria que nos esclarecesse. Sobre a parte do património do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), gostaria que se pronunciasse, se possível, sobre este processo e que esclarecesse as competências deste organismo e o modelo de avaliação que o vai sustentar, nomeadamente qual vai ser a articulação entre esta agência e a DirecçãoGeral do Ensino Superior, dadas as competências que assistem neste momento.
Finalmente e quando as questões dos fluxos futuros destes bolseiros constituem uma preocupação para o futuro deste país, relativamente às despesas com o pessoal, quando é introduzida aqui uma rubrica bastante «recheada» que diz respeito ao pessoal em qualquer outra situação, para além do pessoal dos quadros do regime da função pública ou do pessoal em regime de tarefa ou avença, gostaria que explicitasse as quantias que constam do seu orçamento.

O Sr. Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Deputada, podemos até cumprimentá-la pela maneira como utilizou o seu tempo.
Vou dar agora a palavra ao Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, para responder em bloco às questões que foram suscitadas. Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito obrigado por esta primeira ronda de questões e pela oportunidade de poder esclarecê-las.
Tomei nota das questões e peço desculpa se alguma delas me passar nesta ronda de respostas. Teremos, com certeza, uma próxima oportunidade para discuti-las.
Durante a intervenção do PSD, tomei algumas notas mas gostava de começar por uma questão que me deixou bastante preocupado. Foi feita uma insinuação um pouco pessoal, o que é de mérito, pois foi-me dito: «então, está à frente de responsabilidades em matéria de ciência e tecnologia e não partilha da responsabilidade do atraso científico do País?» Com certeza! Em primeiro lugar, partilho da responsabilidade do atraso científico do País como cidadão; depois, também partilho como cientista, mas certamente partilho menos do que V. Ex.ª, que é Deputado e tem responsabilidades políticas. Tenho responsabilidades políticas recentes e, durante o período em que as tive, o que aconteceu (e não é, com certeza, por mérito meu) foi que dei corpo ao trabalho de muitas pessoas que fizeram com que o desenvolvimento científico do País fosse, de facto, muito significativo, e todos nos devemos orgulhar por isso, acho eu.
A meu ver, o que se passava há 20 anos e há 10 anos em Portugal, comparado com o que se passa hoje, em matéria de desenvolvimento científico, merece todo o nosso respeito.
Porém, também devo dizer-lhe que eu não ousaria utilizar um argumento desses face ao Sr. Deputado, porque entendo que o PSD, em particular, é um partido que teve muitas vezes responsabilidade de governo e penso que não é possível o desenvolvimento científico de qualquer país sem um forte consenso nacional.
Durante muitos anos, bati-me, e continuo a bater-me, por esta visão e fiquei bastante surpreendido com o tom da sua intervenção.
Não gostaria de ter de o fazer, mas se o Sr. Deputado quiser olhar para esta folha de papel, onde tenho inscrito, por governos constitucionais, a despesa de investigação e desenvolvimento em Portugal, reportada pelo Eurostat e pela OCDE, exclusivamente dividida em governos constitucionais, poderá ver quais foram aqueles em que estagnou, aqueles em que cresceu e aqueles em que diminui. E infelizmente, no passado recente, diminuiu duas vezes, em governos do PSD.
Tenho pena, não me regozijo com isso, tenho pena, e gostaria que o Sr. Deputado partilhasse essa tristeza comigo, porque todos devíamos estar conscientes de que deveríamos fazer sempre o possível, em qualquer

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situação económica, para apostar e privilegiar o desenvolvimento científico do País, precisamente porque partimos de um défice muito grande nesta matéria. Não ficaria de bem com a minha consciência se não começasse já por esta breve preocupação.
Mas, Sr. Deputado, tenho uma segunda preocupação e, quanto a ela, gostaria que nos entendêssemos.
Diria que ela tem a ver com a sua intervenção e com a intervenção do PCP nesta matéria, pois diz respeito à desconfiança que insinuou acerca da avaliação e daquilo a que chamo apoios selectivos.
Depois, discutirei a intervenção da Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, mas apoios selectivos são apoios que são resultado de uma análise e de uma avaliação.
Disse-me que os apoios selectivos podem significar arbitrariedade. Pois podem, podem significar arbitrariedade! Mas não é esse o sentido em que é utilizado apoio selectivo, é utilizado no sentido oposto ao do apoio indiscriminado, não selectivo. E o apoio selectivo é baseado em que critério de selecção? No da qualidade e da bondade do investimento.
Pensa V. Ex.ª, Sr. Deputado, que o MIT colaboraria — e que o País devia querer que ele colaborasse — na área dos transportes, da investigação e da formação avançada em transportes, com uma universidade que não produzisse nenhum elemento de patente ou de produção científica nessa área? Em Portugal, pode ser extremamente produtiva noutras áreas, mas não naquela.
O Sr. Deputado entende que o MIT deve colaborar na área da energia com uma universidade cujo domínio de especialização não seja o dessa área e que não tenha qualquer produção relevante, em termos científicos, nessa área? Com certeza que não, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Tem de dizer isso aos Srs. Reitores!

O Orador: — Mas eu já expliquei isso aos Srs. Reitores.
O que me parece extraordinário é que V. Ex.ª, Sr. Deputado, venha ser porta-voz e amplificador da ideia absolutamente extraordinária de que os apoios do Estado devem ser distribuídos de forma não selectiva.
Ficámos a saber, Sr. Deputado! Achei óptimo! Ficámos a saber que a política científica que defende é a de entregar e distribuir por cabeça as verbas disponíveis do Orçamento do Estado para ciência. Excelente! Tenho muita pena, mas não concordo. E se quer que lhe diga, também acho que o Sr. Deputado não concorda. Não pode concordar! Esta questão cruza-se com uma outra absolutamente central para o futuro do País. O País precisa de fazer crescer os seus orçamentos de ciência e tecnologia, e não é só neste ano, Srs. Deputados, é neste e nos próximos anos. O País precisa de induzir, através de diversos mecanismos de despesa pública – não é uma receita, são várias, tem de haver uma variedade de instrumentos –, o investimento público, as competências, os recursos humanos; precisa de fazer crescer o investimento privado, as transferências, a articulação entre o sector público e o sector privado, a articulação entre a investigação e as políticas públicas. Precisa de fazer isto tudo! E precisa de o fazer a um nível que, hoje, se sabe qual é a sua medida: a sua medida é o défice de recursos humanos, quando comparado com o nível dos nossos competidores dentro do mercado único europeu, ou é o nosso nível de investimento em investigação e desenvolvimento, quando comparado com o dos outros países. É este o padrão com que temos de nos comparar, e já tínhamos de nos comparar antes, mas, a partir do momento em que estamos no mercado único, esse é o único padrão com que nos podemos comparar hoje.
Qual a política de distribuição dos apoios públicos e desse crescimento em ciência e tecnologia? Esta é uma antiga pergunta em política científica e tecnológica que tem em todos os países desenvolvidos uma resposta. E essa resposta é a seguinte: o principal do aumento dos orçamentos públicos de ciência e tecnologia, sobretudo em fase de expansão, deve ser atribuído por via estritamente competitiva.
Competitiva não significa mercado, Sr.ª Deputada, significa fazer competir, na área das ciências humanas, por exemplo, os bons grupos de investigação com os maus grupos de investigação, e fazer com que haja quem seja melhor do que os grupos e seja avaliador, decidindo que o investimento se faz nos bons grupos de investigação e não se faz nos maus, seja nas ciências humanas, seja na engenharia, seja na matemática.
Esta é que é a visão moderna, de há muitos anos, dos países desenvolvidos e do desenvolvimento científico.
Mas existe uma outra visão, que é a de atribuir, à cabeça, esse aumento às instituições de execução existentes, designadamente às universidades, e dizer-lhes: são os senhores, dentro de cada universidade, que vão criar os vossos critérios de selecção. Há alguma desconfiança em não o fazer? Não há desconfiança, há simplesmente um reconhecimento das condições reais de uma pequena instituição, à escala do País, de poder fazer política científica isenta e de qualidade no interior da sua instituição. Isso não é possível sequer nas maiores instituições universitárias do mundo, quanto mais nas pequenas instituições universitárias portuguesas, que o são todas, são pequenas à escala internacional. Não o podemos sequer fazer à escala da pequenez nacional sem recorrermos sistematicamente a júris de avaliação internacionais, como recorrem todos os pequenos países europeus desenvolvidos. Não o podemos fazer porque a comunidade científica de especialistas em cada área é reduzidíssima e é composta pelos próprios que vão ser avaliados.

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Ora, sobre este ponto, Sr. Deputado, eu gostaria de apelar para que houvesse um consenso nesta Câmara, porque, se não o houver, não poderá haver continuidade, ao longo de muitos anos, de política nesta matéria.
Gostaria de relembrar algumas das respostas que já dei a outras questões que foram levantadas.
Fiquei um pouco surpreendido com uma questão, que não corresponde em nada aos dados que ainda há pouco pedi para me serem fornecidos e que tinha de cor: o principal do orçamento de investimento (estou a falar do Capítulo 50 deste ano) está na Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que tem 92% de execução — são dados de há 5 minutos.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Ministro, tenho-os aqui. São dados do Banco de Portugal.

O Orador: — Muito bem, mas o Banco de Portugal, provavelmente,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Da Direcção-Geral!

O Orador: — Muito bem, talvez sejam dados mais antigos… Ver-se-á…. Talvez sejam dados mais antigos.
Mas, como deve imaginar, perguntei à instituição, há 5 minutos atrás, que me transmitiu os números que eu sabia.
Sr. Deputado, não lhe posso pedir que faça confiança, mas ao menos posso transmitir-lhe os dados e, depois, V. Ex.ª verificará.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Também lhe posso pedir que confie em mim! A confiança é recíproca!

O Orador: — A confiança é recíproca! Estou a dizer-lhe que, tratando-se de um organismo sob minha tutela, posso informá-lo que não é verdade, que está ultrapassada essa informação. É simples! Está simplesmente ultrapassada, Sr. Deputado.
Depois, o Sr. Deputado disse-me algo que gostava de rebater com clareza. Disse o Sr. Deputado, e é outro ponto em que gostaria que nos entendêssemos, que «isto é mais do mesmo, isto é mais Estado, precisa-se de um novo paradigma».
Gostava de clarificar: o Sr. Deputado não defende que, do dinheiro público que temos disponível no Orçamento do Estado, devemos gastar mais em ciência e tecnologia e menos noutras coisas menos produtivas? Eu defendo e julgava que o Sr. Deputado também defendia que é preciso mais investimento público em ciência e tecnologia, em detrimento de despesas de funcionamento e de despesas correntes primárias. É isto?

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Com certeza! Mas para onde vão as despesas?!

O Orador: — Bom, então, é este o paradigma que estamos a defender.
E o Sr. Deputado também sabe com certeza que, como em qualquer país em que se está incrementar o desenvolvimento público em ciência, se queremos desenvolver a actividade empresarial de investigação precisamos de afectar uma grande parte do investimento público à formação de pessoas que sejam capazes de fazer investigação e desenvolvimento — essa é precisamente uma das opções principais deste orçamento — e grande parte dessas pessoas circularão pelo tecido económico: ficam por vezes no sector público, depois migram para o sector privado, colaboram entre o sector público e o sector privado. É exactamente o que acontece em todos os outros países europeus, designadamente nos que têm a nossa dimensão.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Menos em Portugal! Em Portugal ficam no Estado!

O Orador: — Sr. Deputado, acho que haverá outra ocasião para conseguir ouvi-lo, para não perdemos muito tempo — e gostaria de ouvi-lo, de facto.
O Sr. Deputado disse-me – e gostaria de responder-lhe com muita clareza, para não ficar qualquer espécie de dúvida em quem nos está a ouvir nesta Câmara – o seguinte: «que insensibilidade, há cortes na acção social escolar». Não, Sr. Deputado, é precisamente o contrário: a acção social escolar aumenta e o montante global das bolsas da acção social escolar aumenta em cerca de 10% — 9,7% comparando os orçamentos iniciais. Fique tranquilo, porque a execução é, com certeza, total, quer num ano quer no outro. Quero que isto fique claro.
O Sr. Deputado fez uma outra pergunta — foi feita, aliás, por vários Deputados — à qual gostaria de responder já, que diz respeito à agência de acreditação. Não repetirei a resposta, porque a pergunta foi feita por Deputados de várias bancadas e essa pergunta é natural, dado que se trata de um objectivo que vem inscrito desde a primeira hora no Programa do Governo, de um objectivo que, penso, é partilhado por toda a gente e é absolutamente indispensável: a criação, em Portugal, de uma agência de avaliação e acreditação independente, que seja reconhecida em termos europeus, para que a certificação dos nossos cursos esteja garantida

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para os nossos licenciados no resto da Europa, o que implica a revisão, e a revisão profunda, do actual sistema de avaliação do ensino superior.
Gostava de perder alguns minutos sobre esta matéria, que é, no meu entender, importante e diz respeito estritamente a este Parlamento.
O sistema actual é o que foi herdado da última lei, que está em vigor, de avaliação do ensino superior, aprovada em 1994, se a memória não me falha, que determina o modelo de avaliação do ensino superior público e privado, universitário e politécnico.
No essencial, essa lei e, depois, os decretos subsequentes determinam um modelo baseado numa estrutura, que é um conselho nacional de avaliação, essencialmente formado não por uma estrutura técnica mas por representantes de vários corpos: por representantes das instituições privadas, das instituições universitárias públicas e das instituições politécnicas públicas. Quando não há reunião de representantes, aquilo que sobra ao conselho é muito pouco, não há estrutura técnica naquele conselho e esse é um grave problema para o País.
Hoje, no final deste ciclo do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), poderia dizerse que temos umas dezenas de pessoas, tal como em qualquer outro país europeu, que efectuaram, como funcionários desta agência, como técnicos, como especialistas, como investigadores, uma prática de investigação e temos aqui um corpo sólido que agora pode transitar para uma agência de acreditação, como aconteceu noutros países. Não é o facto, em Portugal.
Onde está o problema? O problema está no modelo original que foi aprovado, que, essencialmente, não levava a avaliação suficientemente longe para criar um corpo independente e para a tornar independente dos representantes dos avaliados. De alguma maneira, ela era uma emanação das próprias instituições.
Dito de outra maneira: tratava-se de um exercício colectivo, útil sem dúvida nenhuma, utilíssimo, de autoavaliação colectiva das instituições de ensino superior. Eram os seus representantes que escolhiam os avaliadores, eram os seus representantes que apreciavam e avaliavam os relatórios desses avaliadores e que os aprovavam. É este o sistema, que teve os seus méritos, que tem hoje de ser mudado. Este sistema é, reconheçamos, muito atrasado face ao que hoje é a prática internacional de avaliação de sistemas de ensino superior.
Este sistema teve ainda uma outra consequência: atrasou a evolução dos sistemas de acreditação e como «a natureza tem horror ao vazio», como se dizia antigamente, os sistemas de acreditação proliferaram, designadamente suportados nas únicas instituições que eram capazes de os produzir, ou seja, as ordens profissionais nas profissões regulamentadas. Foram elas que intervieram nesse sistema de uma forma que não é razoável em democracia.
O Estado reconhece cursos superiores no sistema público ou no sistema privado e no fim da linha, depois de o curso estar a funcionar e de os licenciados estarem no mercado, uma instituição, que é uma ordem profissional, ela também agindo por delegação e em nome de poderes públicos, vem dizer se um curso é acreditado ou não é. Convenhamos que se tratava de uma situação que tinha, e tem, de mudar. Foi isto que decidimos fazer e que anunciámos.
Qual foi o processo adoptado para o fazer? Pareceu-me que o processo mais razoável era solicitar à agência europeia, que precisamente vai ter de reconhecer, ou não, a agência nacional de acreditação, que avaliasse a situação em Portugal, que avaliasse aquilo que de bom e mau foi feito até agora e que, a partir da experiência portuguesa, do contacto profundo com a realidade portuguesa, discutindo com os actores (com as instituições de ensino superior, com os empregadores, com os sindicatos, com os estudantes, etc.), elaborasse para o Governo português recomendações à luz da prática internacional, para a construção da agência de acreditação. Foi isso que foi feito ao longo destes meses.
Foi entregue o relatório preliminar dessa entidade europeia, da Rede Europeia para a Garantia de Qualidade no Ensino Superior (ENQA), que já foi dado ao CNAVES, em particular, e que obteve resposta do mesmo.
Está prevista para o dia 22 de Novembro a entrega, em Lisboa, do relatório final da ENQA, a que se sucederá imediatamente um debate público organizado pelos próprios intervenientes da Rede Europeia para a Garantia de Qualidade no Ensino Superior, que explicarão o seu relatório e o submeterão às questões que queiram fazer.
É com base nesse trabalho que o Governo de imediato legislará, na parte que lhe compete, e proporá à Assembleia da República as alterações à lei de avaliação do ensino superior, na parte que compete à Assembleia da República. E é com base na confiança deste calendário que vos digo que no início do ano que vem estará criada a nova agência de acreditação e de avaliação do ensino superior em Portugal.
Podíamos fazê-lo mais depressa? Duvido, Sr. Deputado!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não disse para fazer mais depressa! É quando?

O Orador: — Mas julgo que lhe respondi ao quando e ao como.
O Partido Socialista fez uma pergunta sobre esta matéria: quanto custa? Qual é a previsão de custos sobre esta matéria? É mais barato ou mais caro?

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Ora, talvez para grande surpresa dos Srs. Deputados, neste momento, o relatório preliminar – ainda é um relatório preliminar –, baseado na experiência de outros países, indica um orçamento típico, em termos de padrões internacionais, para uma agência deste género num país como Portugal, de cerca de 2 milhões de euros anuais de funcionamento. Devo dizer-lhe que o gasto de funcionamento normal do sistema de avaliação tal como existiu até agora ultrapassou, normalmente, os 3,5 milhões de euros, não sendo as avaliações internacionais nem incluindo nenhum sistema de acreditação.
Teremos ocasião de discutir esta questão mais tarde, quando o relatório final da ENQA for conhecido e quando o Governo apresentar as suas propostas nesta matéria.
Julgo que respondi sobre esta questão ao Bloco de Esquerda, ao PSD e ao PS.
Gostaria agora de responder a uma outra questão que foi levantada por vários Srs. Deputados e que diz respeito ao ensino superior e às verbas globais de funcionamento no ensino superior.
Pedia ao Sr. Presidente que me esclarecesse como é que estamos em termos de tempo.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, faltam cerca 16 minutos.

O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Bem, entendamo-nos, Srs. Deputados: olho para os números consolidados, comparando orçamentos iniciais de 2006 e de 2007. Habituei-me a comparar orçamentos iniciais porque estamos a apresentar um orçamento inicial ao Parlamento; também o poderíamos fazer comparando com as previsões de execução, que, em muitas áreas, têm nos vossos documentos.
Em matéria de funcionamento das universidades, de verbas totais inscritas no Orçamento do Estado, este orçamento apresenta uma redução de 4,4%, bem como uma redução de 2,4% de verbas totais dos politécnicos. Isto é diferente daquilo que se passa exclusivamente com as verbas do OE para investimento, que são uma fracção das verbas de receitas quer das universidades quer dos politécnicos, porque são, respectivamente, de 5% e 5,5%. Mas aquilo que interessa agora é o final, e o final é uma redução de verbas de funcionamento em 4,4%, nas universidades, e 2,4% nos politécnicos. Porquê esta diferença? Porque o número de estudantes no ensino superior, como também sabem, este ano, felizmente, registou um aumento, pela primeira vez desde há vários anos. É um aumento ainda pequeno, mas é um aumento do número de estudantes à entrada no ensino superior, mesmo antes da entrada dos maiores de 23 anos, que se estima em cerca de 4000 a 5000. Mas mesmo antes há um aumento, o qual está, hoje, a ser analisado, e esse aumento, selectivamente, é maior nos politécnicos do que nas universidades, havendo, no entanto, aumento em ambos.
Também devo dizer que a capacidade instalada, docentes e instalações, ou seja, as vagas não preenchidas nessas instituições são maiores nos politécnicos, hoje, globalmente, do que nas universidades. Portanto, estamos longe de esgotar a capacidade instalada nestas áreas, o que significa que pode haver um aumento ainda superior, dado que a capacidade instalada existe e, em muitos casos, é muito superior à procura dos estudantes.
Temos, pois, esta pequena redução de 4,4% e 2,4% — universidades e politécnicos — no funcionamento global destas instituições.
Em paralelo, temos um aumento de verbas de investimento em ciência, disponíveis, em particular, para as instituições de ensino superior, para recursos humanos, projectos, centros de investigação, etc., que é de 77% em investimento, em valores globais, ou de 90,5% em verbas do OE, o que representa 579,6 milhões de euros.
Entendem os Srs. Deputados que a política científica e de ensino superior correcta seria a de não pedir às instituições de ensino superior públicas nenhuma reorganização e contenção orçamental, por pequena que fosse, e é de 4,4% ou 2,4%?! Entendem os Srs. Deputados que não há desperdício, que não há desorganização em instituições de ensino superior? Entendem os Srs. Deputados que não houve instituições de ensino superior, em Portugal, que tivessem, nos últimos anos, reduzido, ano após ano, o número de alunos e aumentado, em quase idêntica proporção, o seu pessoal não docente, ao longo dos mesmos anos?! Entendem os Srs. Deputados que não há nada a fazer e que o ensino superior se deveria manter, por vontade desta Câmara, isolado do esforço geral de reorganização da Administração Pública portuguesa?! Eu não entendo e penso que este esforço, que é, em última análise, ligeiro, tem, além disso, neste sector, a possibilidade de ser corrigido e um sinal claríssimo de como deve ser corrigido. Deve ser corrigido através do combate ao desperdício nas próprias instituições, em matéria de funcionamento, e especializando essas instituições na melhoria dos seus recursos humanos e da sua capacidade científica, capacidade científica que tem a ver com a natureza das instituições.
Que fique claro, Sr.ª Deputada, que, quando falo de ciência e tecnologia, e já travo esta batalha há muitos anos, falo de todas as ciências e de todas as tecnologias, das ciências humanas às engenharias, das ciências básicas às ciências aplicadas.
Dir-me-ão: «mas os institutos politécnicos têm mais dificuldade». É verdade! Há alguns institutos politécnicos que são já relevantes em certos aspectos de investigação tecnológica e até noutras áreas de investigação, e há outros que o não são. É política científica aumentar a capacidade científica e tecnológica dos politécnicos? Sim, é! É óbvio que sim! É óbvio que o País não pode desperdiçar a capacidade instalada no ensino

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superior, designadamente ao nível de 1.
os ciclos no ensino superior, através de docentes crescentemente, ainda que em número muito reduzido, com qualificações adequadas em muitos institutos politécnicos.
Existe ou não, no interior dos institutos politécnicos, um combate entre gerações, entre pessoas mais qualificadas e menos qualificadas, entre aqueles que querem colaborar com instituições científicas ou com instituições empresariais e aqueles que não querem? Existe! Esta política visa apoiar aqueles que, dentro das instituições, pretendem o desenvolvimento científico e tecnológico dessas instituições. Se os Srs. Deputados conhecem instrumentos melhores para cumprir esta política, gostaria muito de os conhecer. Porém, de certeza que não é tornando as instituições de ensino superior imunes, através de um discurso que seria populista, àquele que é o esforço do País de reorganização da sua Administração Pública, de melhoria da sua Administração Pública, de redução de gastos desnecessários e de aumento dos gastos produtivos, designadamente com tarefas mais qualificadas e pessoal mais qualificado. Até porque os recursos aí estão! Muito me espantaria que, no final de 2007, o orçamento consolidado das instituições de ensino superior não aumentasse muito significativamente. E porquê? Porque grande parte dos 579,6 milhões de euros irá, com certeza, para instituições de ensino superior. Dir-me-ão: «Mas não irá para os órgãos centrais das instituições de ensino superior, parte dele irá, directamente, para departamentos mais produtivos cientificamente, para centros de investigação mais produtivos cientificamente ou para os overheads que esses centros ou esses projectos de investigação dão às instituições». Pergunto: não é isto que se passa em qualquer país desenvolvido? Não é este o valor da contribuição do desenvolvimento científico dentro das instituições? Esta questão é, com certeza, uma das que imagino que quererão suscitar de novo, na segunda ronda, e gostaria que ela ficasse clarificada. Gostaria de deixar claro que o que temos aqui é uma opção que visa tornar as instituições melhores, que visa fazer com que os sectores, que devem ser eliminados das instituições, porque são de baixa produtividade e qualidade científicas, sejam substituídos por sectores melhores. Deve haver renovação de gerações entre as instituições e esta política dá mais lugar aos novos, às novas gerações mais qualificadas do que àquelas que são menos qualificados dentro das instituições de ensino superior.
Sr. Presidente, peço desculpa, os 7 minutos que me restam incluem a minha intervenção final?

O Sr. Presidente: — Não, não, Sr. Ministro. Só para esclarecer, não há intervenção final, há tempo afectado para esta primeira ronda e, depois, haverá também tempo para a segunda ronda, que é cerca de 80% do tempo afectado aos Srs. Deputados.

O Orador: — Muitíssimo obrigado, Sr. Presidente, e peço desculpa.
Há outra questão que foi suscitada e sobre a qual já me pronunciei várias vezes, porque é uma questão de fundo que atravessa várias das intervenções dos Srs. Deputados. Refiro-me à racionalização da rede de ensino superior. Isso é afirmado, com toda a clareza, nas Grandes Opções do Plano que o Governo apresentou a esta Assembleia e é afirmado, com clareza, nos textos deste Orçamento do Estado. E, aliás, não é, com certeza, surpresa nenhuma, pois estava no Programa do Governo e os Srs. Deputados conhecem a estratégia que o Governo vem seguindo nesta matéria.
Mesmo antes de termos a funcionar, em novos moldes internacionais, uma agência de acreditação e avaliação, fornecemos meios às instituições de ensino superior, já este ano, para elas, livremente, contratarem, internacionalmente, avaliações institucionais, que não estavam, até agora, disponíveis, e estas avaliações estão em curso em 10 instituições de ensino superior este ano e prosseguirão no próximo ano.
Encomendámos uma grande avaliação do sistema de ensino superior português à OCDE. Essa avaliação teve uma larguíssima participação de todo o sistema de ensino superior mas também dos parceiros sociais e da sociedade em geral e será conhecida e discutida publicamente, em Portugal, a partir de Dezembro. Entendemos que devíamos proceder desta forma.
Estamos a propor-nos uma revisão da rede de ensino superior português, e julgo que todos partilham da noção de que tem de ser alterada. A actual oferta educativa, multiplicada à exaustão, tornou-se insuportável, incomportável e, além disso, absolutamente injustificável. Não é possível admitir que o País precise, que o mercado de trabalho e os estudantes precisem de 20, 30 ou 40 licenciaturas ou microlicenciaturas na mesma especialidade no sector público. Não é razoável! Aliás, é fácil de ver que não haveria recursos humanos, como professores, para dar qualidade a todas essas licenciaturas, quanto mais estudantes para formar massas críticas suficientes em cada uma delas. E isto não acontece em um ou dois casos, acontece em muitos casos! Sei que é muito confortável dizer: «mas, então, deixa de financiar cursos com menos de 20 alunos em licenciatura». Srs. Deputados, com certeza! O País deve alimentar a proliferação de cursos idênticos em todo o País, o que, naturalmente, significa que não haverá massas críticas nem de professores nem de alunos nesses cursos?! Não! Deve dizer-se, com muita clareza, às instituições: «Por favor, especializem-se! Especializem-se!». Não é razoável haver esta dispersão de esforços, que conduz, na maioria destes casos, a uma gigantesca perda de qualidade das formações. E pensam que os dirigentes das instituições de ensino superior não nos agradecem? Agradecem! E dizem: «Mas no interior das nossas instituições tínhamos dificuldade em tomar esta decisão». Porém, esta decisão tem de ser tomada, em nome do interesse público. E não é para isso que há Governo?! Julgo que é para isso, para tomar decisões em nome do interesse público, designadamente quando as próprias instituições não são ou não foram capazes, até hoje, de criar um sistema de auto-

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regulação que permitisse resolver o assunto antes de ele ser um assunto do Governo. E, neste momento, é um assunto do Governo e foi resolvido como assunto do Governo! Mas isso não é nada, estamos a falar de pequenos episódios. Aquilo que é, realmente, importante é resolver o problema da reorganização da rede do ensino superior, a bem da própria sobrevivência das instituições, porque, se não o resolvermos com sentido de Estado, assistiremos, infelizmente, à «evaporação» de algumas instituições de ensino superior portuguesas, como já está a verificar-se, porque se concentraram em áreas para as quais não há alunos, porque estão em competição com três ou quatro instituições na sua imediata vizinhança, sem qualquer acordo ou qualquer auto-regulação.
Ora, isto não vai continuar, Srs. Deputados, tem de ser resolvido e tem de ser resolvido não de uma forma casuística mas a partir de uma análise isenta, externa, participada, à luz das melhores práticas internacionais que, hoje, estão disponíveis e que nos permitem encarar com segurança, sem nenhum voluntarismo e com muito cuidado as alterações à rede de ensino superior nacional.
Seria completamente inconsequente da minha parte vir aqui anunciar um modelo único. Não há modelos únicos nesta matéria para os países que o fizeram! Existem casos em que poderá ter de haver fusões entre instituições; há casos em que poderá ter de haver articulação entre cursos de instituições diversas; há casos em que tem de haver flexibilidade de gestão de créditos curriculares ou de trabalho docente e não docente entre diversas instituições; há casos em que pode haver especialização ao nível regional ou a nível nacional por disciplinas. A experiência internacional é muito vasta nesta matéria e o que aconselha é precisamente à análise caso a caso das situações. É isso que faremos e apresentaremos a este Parlamento, na sequência da avaliação que nos será presente pela OCDE em Dezembro.
Todos temos impaciência para que isto aconteça mas, desenhado este processo, julgo que seria inconsequente não o levar completamente até ao fim, baseado nos critérios escolhidos.
O Sr. Presidente está a indicar-me que os 7 minutos de que dispunha já estão reduzidos a quase zero e que devo parar aqui. É isso o que faço, passando a palavra aos Srs. Deputados e prosseguindo depois, na segunda ronda.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, de facto, o tempo passa objectivamente mas, do ponto de vista subjectivo, às vezes, para nós, tem acelerações e outras vezes corre mais lento. Para o Sr. Ministro correu naturalmente um pouco mais rápido na parte final, mas o Sr. Ministro colaborou para a boa gestão do tempo que temos tido até agora, com a colaboração de todos.
Vamos dar início à segunda ronda do debate, para a qual já temos vários Deputados inscritos.
A nossa reunião deverá terminar às 20 horas e 30 minutos, embora possa ter alguma extensão, evidentemente, por isso vamos procurar gerir bem o nosso tempo também nesta parte final.
Como disse, a mesa regista vários pedidos de intervenção, tendo o Sr. Deputado Fernando Rosas solicitado para ser o primeiro a intervir por razões pessoais, porque tem de se ausentar.
Suponho que não haverá obstáculo por parte dos Srs. Deputados a que o Sr. Deputado Fernando Rosas seja o primeiro interveniente nesta segunda ronda.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, suponho que os tempos previstos para a segunda ronda sejam, tal como tem acontecido nas audições precedentes, de 5 minutos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, de facto, no painel dos tempos aparece registado 3 minutos, mas temos feito uma gestão do tempo que permite a extensão das intervenções até aos 5 minutos – fizemo-lo anteriormente e fá-lo-emos nesta audição.
Portanto, os Srs. Deputados não precisam sentir a constrição rigorosa do tempo que está no painel mas, evidentemente, as restrições funcionam, às vezes, para que os nossos argumentos sejam mais contidos e mais eficazes. E é nesse sentido que há, até do ponto de vista instrutivo, esta recomendação para serem marcados 3 minutos no painel. Mas a interpretação é exactamente a que o Sr. Deputado invocou na sua interpelação à mesa.
Temos inscritos os Srs. Deputados Fernando Rosas, Agostinho Branquinho, Bravo Nico, Miguel Tiago, Abel Baptista e Luísa Mesquita.
Suponho que podemos anuir ao pedido do Sr. Deputado Fernando Rosas e depois respeitar a ordem habitual.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, quero agradecer aos meus colegas a gentileza de me deixarem falar em primeiro lugar. Tenho um compromisso profissional na universidade às 20 horas e 30 minutos, por isso tenho de ausentar-me, pedindo desculpa também ao Sr. Ministro.

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Sr. Presidente, vou tentar dizer em 5 minutos o que penso, pedindo a sua compreensão para o facto de não termos utilizado todo o tempo na intervenção anterior, mas vou tentar ser muito sintético.
Não sou membro desta Comissão, pelo que intervenho como Deputado mas até mais como professor universitário e presidente de uma unidade de investigação financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e, portanto, avaliada internacionalmente. Por isso, sei alguma coisa do que estou a falar, aliás, como todos os que aqui estão presentes.
Em primeiro lugar, quero dizer que considero que este Orçamento tem três características que marcam o seu modelo: um corte entre 3,5% e 4% no funcionamento das universidades e dos politécnicos; um reforço bastante substancial do investimento em ciência e tecnologia, de 77%; e um reforço da acção social escolar de cerca de 5%. É com base nestes três grandes eixos do Orçamento que eu gostaria de abordar algumas questões.
O Sr. Ministro seguramente não pode desconhecer que na universidade vivemos hoje uma crise séria, a qual tem dois factores. O primeiro é a degenerescência da aplicação do modelo de Bolonha, o que é uma coisa muito séria.
Bolonha transformou-se, na maioria das escolas do ensino superior deste país, num exercício patético de tentar meter em três anos o que se dava em quatro e de tentar salvar os empregos daqueles que estão ameaçados com esta redução. Os aspectos pedagógicos, as outras coisas que sabemos que são positivas, tudo isso está, neste momento, na esmagadora maioria das escolas… Nas humanidades é sem dúvida o que se passa, admito que nas tecnologias se tenha, aqui ou acolá, encontrado boas soluções para isto, mas esta é, neste momento, a situação.
O que acontece é que está a viver-se uma situação de «salve-se quem puder» em matéria de emprego, porque está tudo reduzido de quatro para três anos. E, depois, no segundo ciclo, o que será o quinto e o sexto ano dos mestrados, como o sistema de financiamento é diferente quer a nível da segunda parte quer ao nível do doutoramento, ou seja, é mais caro, o que estamos a fazer neste momento nas universidades é a criar situações em que quem não tem dinheiro não faz pós-graduações, pura e simplesmente, a não ser que estas bolsas que agora aumentaram vão de alguma maneira compensar essa carência, mas a meu ver nunca a poderão compensar suficientemente.
Temos, portanto, uma situação de deturpação do Processo de Bolonha. Junte-se a isto — e estou a resumir, necessariamente — os cortes financeiros. Percebo o Sr. Ministro, tem razão, as universidades têm de ser eficientes. Nas universidades há coisas boas e más, nenhuma universidade é em si mesma boa e má; há dentro das universidades coisas boas e coisas más, não há nenhuma escola que não seja assim, e a política de educação deve ser no sentido de consolidar as coisas boas e de tentar superar as más.
Portanto, sim, senhor, as universidades devem ser competentes, devem alargar-se para fora, mas o corte financeiro que está a fazer-se — e estou lá, sei do que estou a falar — não é maneira de resolver o problema.
Maneira de resolver o problema, se calhar, é arranjar um novo modelo de financiamento, uma nova política de financiamento. As fórmulas que estão a ser usadas neste modelo estão a originar nas nossas universidades — e chamo-lhe a atenção para isto, Sr. Ministro — a regressão curricular e científica, ou seja, a aplicação de Bolonha leva à regressão curricular e científica.
Estamos a formar uns semianalfabetos funcionais com três anos de escolaridade e que, depois, não se sabe o que vão ser a seguir. É a tal geração de que falam, a «geração dos 1000 €», ou seja, depois vão para o mercado de trabalho por 1000 € fazer qualquer coisa em qualquer lugar.
Portanto, a aplicação de Bolonha significa regressão curricular e científica e não renovação do corpo docente. Neste momento, com os cortes financeiros, há anos e anos que não renovamos o corpo docente.
Dentro de 10 anos, as nossas universidades são corpos de gente caquéctica, a começar por mim, que já tenho 60 anos, porque não se renova. Estamos a deixar ir embora os melhores valores, não conseguimos segurá-los. O Sr. Ministro dirá que «temos aí a carreira científica que vai abrir», mas não se pode fazer isto porque a carreira científica é alimentada pela qualidade da universidade.
A universidade, em Portugal, é o «caldo» onde se faz investigação científica. É certo que pode haver, e há, outros modelos lá fora em que existem carreiras científicas auto-sustentadas. Em Portugal não é assim! Em Portugal, a universidade é o «caldo» de formação dos cientistas e se estamos a estrangular financeiramente a universidade, se não conseguimos recrutar gente nova porque não há dinheiro para o fazer, não só não estamos a renovar o corpo científico como estamos a desaproveitar a elite, os nossos melhores alunos estão todos a ir-se embora.
Portanto, não se pode pensar em fazer o que o senhor quer, e que eu também quero, que é melhorar a qualidade das universidades, potenciar o bom e deixar o mau para trás, através de soluções administrativofinanceiras. Essa não é a solução, ela passa por formas de financiamento pensadas em conjunto pelo corpo docente.
O Sr. Ministro sabe que os reitores não são um bando de perigosos populistas acerca desta questão. Naturalmente, eles têm os seus interesses a defender, por vezes corporativos, mas há questões reais, como a do desemprego sem subsídio, como o Sr. Ministro sabe.

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E quem é que vai ser atingido pelo desemprego? Não são os catedráticos, como o senhor ou como eu! Quem vai ser atingido pelo desemprego são os jovens licenciados que têm contratos a um ou a dois anos.
Esses estão a ir todos para a rua.
O efeito desta política, ao contrário do que o Sr. Ministro diz, é que não fixamos os novos, os jovens, não os potenciamos. Estamos a despedi-los porque, como não há dinheiro, quem é que vai para a rua? Vai para a rua quem tem vínculo precário, e são esses que estão a ser desempregados. Quem lá fica? Ficam os que estão no quadro, os antigos.
Portanto, Sr. Ministro, e com isto termino, o desafio intelectual que lhe coloco, do ponto de vista da política científica e universitária, é o seguinte: é possível termos uma ciência de qualidade, uma investigação científica de qualidade com a degradação do ensino superior, universitário? É possível isto acontecer? É possível sonharmos com uma ciência progressiva e modernizada se não investimos e deixamos a universidade, que é o «caldo» da investigação científica, esmorecer? Ou isto é uma luta com uma dupla tensão, em que a universidade alimenta a ciência, a ciência alimenta a universidade e temos de olhar para ambas com a mesma atenção? Sr. Presidente, muito obrigado pela tolerância.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, começo por referir-me às suas notas prévias e pela tal necessidade de haver aqui um clima de confiança na discussão destas matérias. Gosto desse tipo de atitude, mas gosto também que, na nossa discussão, tenhamos os mesmos critérios de exigência e de rigor.
Portanto, Sr. Ministro, para ficarmos claros sobre esta matéria, vou fazer-lhe um desafio: através do Sr.
Presidente, vou pedir aos serviços que lhe dêem uma fotocópia da execução do Ministério que tutela em 30 de Setembro de 2007. Se os dados que tenho aqui estão errados, pedir-lhe-ei desculpa publicamente; se os dados estão correctos, penso que o Sr. Ministro devia ter mais algum cuidado na discussão, porque não é pegando no exemplo de uma escola ou de instituto que, por acaso, tem uma execução elevada que V. Ex.ª pode extrapolar para a generalidade da execução do seu Ministério.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, se me dá licença que o interrompa, não tenho qualquer dúvida de que tem um documento e que o mesmo é útil para a discussão. Aquilo que entendi do que estava a dizer-me é que a execução no Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior estava em cerca de 40%, programa a programa, orçamento de Ciência e Tecnologia.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Entendeu bem!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — A informação que obtive relativamente ao organismo único financiador – não é de execução, não é nenhuma escola, é financiador –, que é onde se mede a execução, é que ele era, em Fundos Nacionais, de 92%. Como é que estes dois dados se coadunam, teremos de ver, mas esta informação também lha devo dar.

O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: — Sr. Ministro, para que não restem dúvidas, os dados da Direcção-Geral do Orçamento sobre a execução do seu Ministério, a 30 de Setembro deste ano, referem 41,4% de execução. Ou seja, para este ano, no capítulo 50, o Sr. Ministro tinha 264,2 milhões de euros e executou 109,5 milhões de euros. Vou fornecer-lhe estes dados. Se não forem verdadeiros, assumo e peço-lhe desculpa publicamente. Espero, no entanto, que V. Ex.ª, no decurso do nosso debate, não use coisas parcelares para, a partir daí, dar a entender que estávamos a falar de coisas globais.
Sr. Presidente, gostaria de lhe pedir para fazer distribuir estes elementos.

O Sr. Presidente: — Faremos isso de imediato, Sr. Deputado.

O Orador: — Muito obrigado.
Sobre esta questão, deixe-me aproveitar para interpelar não apenas o Sr. Ministro mas também o Partido Socialista.
Os Srs. Deputados do PS também têm um problema de execução, porque o Sr. Deputado executou mais de metade do seu tempo a falar da minha intervenção e executou, depois, a outra metade a explicar o Orçamento do Estado. Não sei se havia alguma desconfiança sobre a capacidade de o Sr. Ministro explicar o Orçamento do Estado e se o Sr. Ministro está com alguns problemas no interior do Governo, porque o Sr. Deputado veio, aqui, fazer um desenho sobre o que era o Orçamento do Estado. Julgava que quem vinha aqui explicar o Orçamento do Estado eram os Ministros, mas fiquei a saber que os Srs. Deputados têm algum pro-

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blema com o Sr. Ministro da Ciência e, portanto, V. Ex.ª veio, aqui, fazer o desenho da vossa leitura do Orçamento do Estado.
A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com os consensos alargados. Para haver consenso, para poder haver discussão, tem de haver informação, tem de haver conhecimento. E a questão é que nós não temos conhecimento. E quando digo «nós» refiro-me globalmente à sociedade portuguesa, por exemplo, aos reitores, alguns que assinaram o protocolo com o MIT e que disseram que não o conheciam. Portanto, não fui eu que o disse, apesar de não o conhecer, e hoje fiquei a conhecer alguns dados sobre isso, que V. Ex.ª teve oportunidade de referir na sua intervenção. Mas só podemos aderir, ou não aderir, ao que quer que seja, quando temos conhecimento, quando temos informação, e informação é aquilo que falta.
Sr. Ministro, vou dar-lhe um exemplo concreto da maneira como o seu Ministério preparou o orçamento para este ano. Como quer que façamos um trabalho de análise mais puro sobre as verbas que destina à formação avançada ou às redes temáticas, quando, no ano passado, no Orçamento para este ano, discriminava todos os projectos e este ano pega numa verba única, engloba-a (no caso, são 143 milhões de euros e, portanto, trata-se de verbas elevadas) e não explica detalhadamente onde e quando é que essa verba vai ser transcrita.
Do ponto de vista objectivo, quem não dá a informação é V. Ex.ª. Portanto, não pode pedir consensos sobre coisas que não conheço e sobre quais não me posso pronunciar. A única coisa que sei é que, de acordo com a informação que detenho, na minha mão, quer a que trouxe hoje quer a que está no Orçamento do Estado, V. Ex.ª não dá a informação necessária e, como tal, é evidente que temos as maiores dúvidas em relação a muitas das questões que o Sr. Ministro aqui referiu.
A terceira questão refere-se à acção social, que também tem a ver com a primeira questão. O Sr. Ministro disse que, para sermos sérios na discussão, temos de comparar orçamento com orçamento. Então, sejamos sérios e comparemos orçamento com orçamento.
No quadro que V. Ex.ª teve hoje o favor de nos distribuir, o quadro 1, o orçamento para 2006 reservava à acção social 154 milhões de euros e o orçamento para 2007 reserva 119,6 milhões de euros. V. Ex.ª poderme-á explicar como é que faz o «milagre dos pães», em termos de orçamento, para que uma verba de um ano seja superior à de outro ano quando a diferença, em contas rapidamente aqui feitas, são 35 milhões de euros a menos? Estamos a comparar orçamento com orçamento. V. Ex.ª não pode fazer aqui o truque de comparar orçamento mais fontes de financiamento com orçamento. Esse não é um truque correcto. Portanto, o que devemos comparar é orçamento com orçamento. Para a acção social, o orçamento do ano passado era de 154,7 milhões de euros e o orçamento deste ano é de 119,6 milhões de euros. Portanto, essa é que é a comparação, se queremos comparar as mesmas coisas.
Para terminar, quero fazer uma pergunta muito concreta sobre a acção social, para que esta matéria não fique um bocado no vazio. O Sr. Ministro está em condições de dizer qual vai ser o preço social das refeições para os estudantes do ensino superior, no próximo ano? Aguardamos, há meses, por uma resposta a um requerimento que fizemos sobre essa matéria e o Sr. Ministro tem aqui uma boa oportunidade para nos esclarecer qual é a sua política de acção social.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que nenhum de nós terá dúvidas que o nosso sistema de ensino superior está, hoje, perante um desafio grande, talvez com a mesma magnitude do desafio que o nosso país também enfrenta. Portanto, o nosso sistema científico e de formação a nível superior está perante o desafio de redireccionar a sua actividade no sentido de se assumir, de uma forma decisiva, como um instrumento e uma infra-estrutura fundamental num desenvolvimento que queremos social, económico e humano para o nosso país, assente no conhecimento, na tecnologia e na inovação.
E não vai ser fácil, como também já nos apercebemos, que toda esta mudança e este redireccionamento ocorra no tempo que temos e com a qualidade que também queremos que seja assegurada.
No entanto, não deixo de notar aqui, na discussão que temos hoje levado a cabo, um facto que me deixa muito preocupado. Temos um sistema universitário e politécnico em que temos de ter confiança. Não é a primeira vez que o nosso sistema de ensino superior é confrontado com grandes desafios. Lembro esta Câmara o que se passou nas décadas de 80 e de 90, quando o ensino superior português foi confrontado com um enorme desafio no sentido de abrir as suas portas a milhares e milhares de jovens que não tinham oportunidade de aceder ao ensino superior e era urgentíssimo garantir essa oportunidade e qualificar esses milhares de pessoas, que seriam decisivas, por exemplo, no desenvolvimento regional, económico e social do nosso país e na fixação de muitos quadros em muitas empresas, em muitas instituições e em muitos territórios onde eles não eram comuns. E o ensino superior assumiu esse desafio nas décadas de 80 e de 90 e venceu, com grande brilhantismo, tanto que hoje a questão não se coloca neste mas noutro patamar.
Este é um novo desafio e, nesse sentido, fico um pouco surpreendido quando alguns Srs. Deputados afirmam, de maneira mais ou menos explícita, que as nossas universidades e os nossos institutos politécnicos

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não conseguem formar os nossos jovens e os nossos adultos nos mesmos patamares de qualidade, nos mesmos períodos de formação e com as mesmas propostas curriculares com que hoje a restante Europa já forma os seus jovens e os seus adultos. Considero isto uma prova de falta de confiança nas instituições do ensino superior, que é exactamente aquilo que elas, hoje, não precisavam de ouvir.
Penso que temos de ter esta confiança nas instituições de ensino superior, universitárias e politécnicas, porque elas certamente estarão à altura do desafio que lhes é, neste momento, colocado e, tal como já fizeram no passado, hão-de responder com um trabalho de adaptação e de resposta na qualificação daqueles recursos humanos que neste momento são absolutamente fundamentais para o nosso país e numa aposta no desenvolvimento económico e social que assuma, como assume, o conhecimento, a tecnologia e a inovação como eixos estruturantes.
Temos esta surpresa por parte da oposição e, como partido de maioria e responsável que somos, temos de deixar aqui esta mensagem no sentido de que acreditamos que as instituições do ensino superior em Portugal hão-de responder, como já responderam no passado, ao desafio que neste momento lhes é colocado.
A segunda questão que aqui deixo para reflexão tem a ver com a análise que é feita, que é muitas vezes enviesada. Quando observamos e pensamos na dimensão científica e na dimensão formativa temos de assumir que as instituições que promovem a ciência e a formação superior são, em muitos casos, as mesmas instituições e são, muitas vezes, as mesmas pessoas, a mesma infra-estrutura humana que garante uma e a outra coisa. E são muitas vezes também as mesmas instalações físicas e tecnológicas que garantem a formação e a produção da ciência.
Obviamente, como o Sr. Ministro disse e muito bem, se temos de racionalizar os custos no funcionamento destas instituições, elas têm também à sua disposição um «envelope» de recursos financeiros como nunca tiveram na sua história, para a promoção da outra actividade que também está inscrita nos seus estatutos, que é a produção científica e a transferência dessa produção científica e tecnológica para a sociedade, para a economia, para as instituições e, no fundo, para o impulso que queremos dar para o desenvolvimento de Portugal.

O Sr. Presidente: — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
A última palavra que aqui deixo é a simbiose. Penso que o sinal que é dado com este Orçamento do Estado para 2007 é, como disse o meu colega Manuel Mota, para que as instituições consigam cortar nas gorduras que não fazem falta e muitas vezes apenas criam inércia neste movimento que queremos de desenvolvimento e que assentem grande parte daquilo que é a sua prioridade de funcionamento na produção de ciência e de tecnologia e na colocação dessa infra-estrutura científica e tecnológica ao serviço do desenvolvimento do nosso país.
Penso que as instituições já compreenderam este sinal e a melhor prova disto é o grande movimento de candidaturas a projectos da Fundação para a Ciência e a Tecnologia que se verificou até há pouco tempo atrás. Muita gente pode não saber mas foi um movimento gigantesco, que «entupiu» autenticamente a capacidade de resposta do próprio Ministério da Ciência.
Gostaria de deixar esta questão específica para salientar a evidência da resposta que está a ser dada, neste momento, pelas instituições de ensino superior em Portugal.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
O Partido Comunista vai intervir agora, mas dividindo o seu tempo pelos Srs. Deputados Miguel Tiago e Luísa Mesquita.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar, consideramos curioso e gostávamos que o Sr. Ministro nos explicasse como é que vai enfrentar os estudantes e as instituições de ensino superior nesta contradição que existe, à partida, entre dizer que se assumirá um compromisso com o desenvolvimento científico e com a ciência ao mesmo tempo que há um desprezar completo do sistema de ensino superior português. Gostava de realçar esta contradição inicial.
Sr. Ministro, perante este Orçamento do Estado, podemos desde já antever um aumento generalizado das propinas — muito provavelmente, onde não está fixado o máximo, sê-lo-á.
No entanto, pior do que isso é que aquilo que o seu Governo dizia que era propaganda do Partido Comunista já hoje se verifica. Vou dizer-lhe do que se trata. Por exemplo, quanto às propinas do 2.
o ciclo do ensino superior, quando dissemos aqui que elas iriam subir sem qualquer limite e atingir valores completamente fora do razoável, valores brutais, o Sr. Ministro disse que isso era propaganda e alarmismo do PCP. Hoje, existem propinas de 2.º ciclo fixadas na ordem dos 3000 euros por ano, Sr. Ministro! Portanto, com este Orçamento do Estado, podemos desde já prever o aumento generalizado também das propinas do 2.º ciclo, para colmatar os cortes orçamentais brutais que este Governo está a infligir no ensino superior público português, universitário e politécnico.

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Mas este à parte, permita-me, não surpreende, porque é o próprio Partido Socialista que afirma que é bom que o sistema de ensino superior público não cumpra, não alcance e não tenha uma distribuição territorial suficiente, para que haja espaço para o ensino superior privado — isto foi dito, aliás, pelo Sr. Deputado que me antecedeu.
A segunda questão, Sr. Ministro, é sobre a Acção Social Escolar. Quanto ao aumento dos 10%, para já, o que sabemos é que haverá 30% de corte na transferência de verbas do Orçamento do Estado. Além do mais, esse aumento de 10% não é, nem de perto nem de longe, suficiente para colmatar os cortes que se verificaram no ano passado que, como sabe, foram da ordem dos 30%.
Sr. Ministro, para terminar, quero dizer-lhe o seguinte: hoje existem residências estudantis que arrendam quartos a estudantes por 150 €, ao invés de os atribuírem a estudantes carenciados; existem associações de estudantes que estão a assumir, do seu próprio bolso, o pagamento de propinas a estudantes carenciados; e existe uma manifesta insuficiência na atribuição de bolsas (aliás, tenho comigo 400 cópias de requerimentos de estudantes, de uma só universidade, que, apesar de se encontrarem em situação de carência, não estão abrangidos pelas bolsas.).
Sr. Ministro, este orçamento vem, pois, agravar, e não beneficiar, a actual situação no ensino superior e dos estudantes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, vou tentar nos 2 minutos que me restam, lembrar ao Sr.
Ministro — as perguntas foram muitas e é natural que não se tenha lembrado de responder a todas — as questões que lhe coloquei e que ficaram por responder. Trata-se das questões relativas aos laboratórios do Estado, ao PIDDAC e às obras em curso e às obras selectivas para o ano que vem, aos despedimentos no ensino superior politécnico e nas universidades, ao subsídio de desemprego e à taxa de 7,5% para a Caixa Geral de Aposentações.
Se o Sr. Ministro pudesse responder a estas questões na segunda ronda já não perderia tempo a dizer-lhe que é importante esclarecer estas matérias, em vez de ficarmos o tempo todo, os 40 minutos, a tratar da avaliação.
O Sr. Ministro também não respondeu à seguinte pergunta: considera que um orçamento de funcionamento para o ensino superior inferior ao do ano de 2005 não é preocupante para as instituições do ensino superior e que o populismo e os desperdícios é que são preocupantes? É que tão depressa o Partido Socialista tem confiança nos docentes e na capacidade das instituições como o Sr. Ministro diz que há populismo, há desperdícios e nos questiona sobre se não sabemos o que acontece nas instituições. Portanto, é bom que o PS e o Governo se entendam e digam se o Conselho de Reitores, o CSISP e os professores do ensino superior são ou não populistas, são ou não gente séria, desperdiçam ou não o dinheiro dos contribuintes.
Por outro lado, não gostaria de deixar sem resposta e sem reflexão uma sua afirmação, que eu poderia subscrever, mas que deixei de subscrever dadas as suas conclusões finais. O Sr. Ministro disse, e muito bem, que a rede de ensino superior público no nosso país… Aliás, não disse, mas vou eu dizer-lhe: é má, diria que é uma vergonha. É necessário fundir os cursos, reestruturar a rede, eliminar a falta de qualidade, etc. Diria mais: que essa rede é péssima.
Era importante que o Sr. Ministro reflectisse e não dissesse o que disse. Então o Sr. Ministro não encontra responsáveis por isso?! Durante oito anos, enquanto foi ministro, quantos desses cursos, dos que não têm capacidade científica e crítica nem condições para funcionar, é que o Sr. Ministro deferiu? Dê-nos a listagem! Não lhe passou nenhum pela mão? São exclusivamente da responsabilidade do PSD? Era bom que o dissesse. É que os primeiros responsáveis pelo estado da rede de ensino superior público, universidades e politécnicos, são os governos.
Ou o Sr. Ministro vai dizer-me — e se vai, desculpe, porque eu não sabia, mas é uma informação extremamente importante… — que os cursos que existem no País não passam pelo seu Ministério?! É assim, a granel, cada universidade ou cada politécnico cria o curso que lhe apetece na esquina de uma rua e começa a funcionar e o Sr. Ministro não os conhece?! Sr. Ministro, se o Partido Socialista não tem «chumbado» uma proposta do PCP, feita há quatro ou cinco anos, relativa à reestruturação da rede, e que tinha a ver com uma construção temática e regional do ensino superior, naturalmente não teríamos chegado à miséria a que chegámos. Mas que a miséria saiba quem são os responsáveis! Os responsáveis são os ministros da tutela, os governos e as indefinições da política educativa. Estes são os verdadeiros responsáveis.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, reconheço que não sou das pessoas mais habilitadas para ler números, porém o Sr. Ministro acabou por não responder a qualquer das minhas questões, nomeadamente quanto à estratégia em termos de industrialização do País e se essa é consentânea com o que se apresenta neste Orçamento do Estado.

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Mas há uma questão que não posso deixar de colocar-lhe, muito directamente, em termos de números, e que diz respeito ao orçamento de investimento e à comparação entre os anos de 2006 e 2007. O Sr. Ministro apresenta-nos um mapa, identificado como Quadro II, onde, para o ensino superior, está previsto um aumento de investimento na ordem de 1,2%, mas, em termos de crescimento, cresce exclusivamente uma rubrica — e cresce quase 100%, quase duplica a verba —, que é a das receitas próprias do ensino superior. Ora, receitas próprias, Sr. Ministro, são fundamentalmente, tanto quanto sei, propinas dos alunos. No ano passado, foram 7,2 milhões de euros e, este ano, passamos para 13,5 milhões de euros. Portanto, há aqui praticamente uma duplicação de receitas, ou seja, quem vai pagar a subida do investimento no ensino superior são os alunos.
Se assim não é, Sr. Ministro, desminta-me.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Qual é o quadro a que está a referir-se?

O Orador: — Ao Quadro II, Sr. Ministro! É que do Orçamento do Estado há uma diminuição de 33 milhões de euros para 29 milhões de euros, dos fundos comunitários há uma diminuição de 53,4 milhões de euros para 52,3 milhões de euros, e a única coisa que aumenta são as receitas próprias do ensino superior. Portanto, está aqui demonstrado que quem vai pagar isto são os alunos, através das propinas.
Uma última questão, Sr. Ministro, tem ainda a ver com a Acção Social Escolar, apresentada no Quadro I. A Acção Social Escolar e as bolsas de estudo vão ser financiadas, sobretudo por outras fontes, pois o aumento que existe é em «outras fontes». E o Sr. Ministro, há pouco, acabou por não esclarecer quais são essas outras fontes de financiamento. Ora, gostaria que ficasse esclarecido quais são essas outras fontes de financiamento e se estão garantidas, porque, a não ser assim, não teremos um aumento de 4,7% e poderemos ter, inclusivamente, uma diminuição de 22,7%, nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Para responder em bloco às questões colocadas, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por responder ao Sr. Deputado Abel Baptista, a quem, desde já, peço desculpa por me ter esquecido de responder a uma questão a que tinha dado tanta ênfase na sua intervenção inicial. A sua questão tinha a ver basicamente com o seguinte (e peço que me corrija se não for exactamente assim): este investimento na Ciência e Tecnologia, no fundo, pressupõe uma aposta num modelo de desenvolvimento económico assente numa nova industrialização, como se depreende pela política de ciência e tecnologia, designadamente pela ênfase que é dada às áreas tecnológicas e de engenharia nas parcerias internacionais, etc. Perguntou-me, então, como é que isso se compreende num modelo económico que, neste momento, tem uma fortíssima componente de serviços. O Sr. Deputado deu-me oportunidade de responder a esta questão e gostaria de fazê-lo.
Em primeiro lugar, não é verdade (e por isso gostava de esclarecer) que a política científica se concentre exclusivamente nas áreas tecnológicas. A política científica concentra-se em todas as áreas de ciência, porque consideramos que um país (não uma simples região) precisa de desenvolvimentos equilibrados das diferentes áreas científicas. Mas é verdade que existem carências e, daí, apostas importantes em áreas de desenvolvimento científico que estão ligadas às tecnologias e, designadamente, às engenharias.
Quando olha, por exemplo, para o último acordo internacional de grande dimensão entre o ensino superior português, as instituições científicas e o MIT, veja as áreas que foram privilegiadas. Se pusermos de lado a área da gestão, as áreas de engenharia, como a energia e os transportes, são áreas essencialmente de serviços. Estamos a falar de investigação e desenvolvimento, que suporta empresas de apoio a serviços. Se olhar para alguns dos exemplos mais acabados de empresas de base tecnológica recentes, tipicamente da última década — e talvez os casos mais paradigmáticos estejam na área das tecnologias da informação (empresas como a Critical Software, a YDreams ou mesmo o sector de inovação e de investigação da PT) —, aí, tem essencialmente investimentos em investigação que estão ligados ao sector dos serviços (num caso, o sector dos serviços de telecomunicações e, noutro, o sector dos serviços de apoio a empresas).
É verdade que também existem aqui sectores que são sectores industriais: quando existe uma forte concentração e interesse do cluster automóvel, em Portugal, na relação com as escolas de engenharia portuguesas, com as escolas de ciência portuguesas e com o MIT, tem aqui uma mistura de serviços, de serviços a empresas, e de produção industrial, que envolve, desde a indústria têxtil à indústria dos moldes, à indústria de rolamentos, etc., tudo o que tem a ver com o cluster automóvel.
Portanto, o que temos hoje, crescentemente, é um desenvolvimento científico e tecnológico, que apoia a integração de serviços a empresas e que não é de todo incompatível com a presença fortíssima do sector dos serviços numa economia moderna como é a portuguesa.
Aliás, aquilo que estará em questão nos próximos anos será o tipo de desenvolvimento da bioengenharia.
É que o desenvolvimento da bioengenharia, não tendo tido Portugal recentemente química pesada nem indústria farmacêutica multinacional, será em grande parte suportado por indústrias novas, designadamente de serviços, na relação com a saúde, com o ambiente, com o alimentar, etc., como aconteceu em muitas outras regiões da Europa.

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Portanto, não veja aqui uma contradição, face a essa ideia antiga de que a ciência, a tecnologia e a engenharia estão sobretudo ligadas à indústria no sentido de produção de bens, e não à indústria como produção de serviços. Este padrão de desenvolvimento científico a que temos vindo a assistir, no nosso país, tem um forte enraizamento nos serviços.
Todos gostaríamos que tivesse mais enraizamento na indústria de ponta do que tem, mas isso depende de um padrão de especialização de investimentos que não existiu, durante décadas, no nosso país. Nós não temos indústria aeroespacial no nosso país, nem indústrias de defesa aeronáuticas. Quer dizer, há muitas indústrias típicas de investigação de alto nível que não existem no nosso país e algumas delas nem existem na Península Ibérica.
Sr. Deputado, deixei absolutamente claro na minha intervenção a matéria relativa às bolsas, mas, para que não haja dúvidas, gostaria de repetir que o que está aqui previsto é o que está previsto para outros sectores, como, por exemplo (e ninguém o questionou), o das bolsas de formação avançada, em que grande parte destas bolsas são pagas por verbas de fontes nacionais do orçamento e por verbas de fontes comunitárias do orçamento, que estão consolidadas no orçamento de bolsas. O que aqui se faz é alargar este procedimento a bolsas de Acção Social, porque essa é a prioridade neste momento.
E ainda bem, porque isso permite a intervenção, numa área hoje absolutamente prioritária, do Fundo Social Europeu, no sentido de alargar a estudantes carenciados o ensino superior. É bom que assim seja. E isso permite um alargamento da base de suporte da acção social.
Dir-me-á que não é suficiente. Com certeza que não é suficiente, mas convenha que um aumento de 10% no volume global de bolsas da acção social representa um aumento muito significativo, tendo nós, basicamente, uma estabilização do número de estudantes inscritos no ensino superior português.
Mais do que isso, temos que activar outros instrumentos — e vamos activá-los — de suporte aos estudantes, além das bolsas de acção social.
Os Srs. Deputados do PCP levantaram várias questões a que passo a responder.
Foi dito que hoje existem propinas do 2.º ciclo no valor de 3000 €. Srs. Deputados, antes da lei de Bolonha existiam propinas do 2.º ciclo não de 3000 €, mas de 3000 contos! O problema é que hoje não existem só propinas de 3000 €, existem propinas exactamente iguais às das licenciaturas para todos os 2.º ciclos que têm importância e necessidade para fins profissionais.
E existe, tal como existiu sempre, liberdade de fixação das propinas por parte das instituições de ensino superior para mestrados que não são nem integrados, nem são obrigatórios para o exercício de qualquer profissão e para doutoramentos.
Querem os Srs. Deputados dizer que as universidades não devem ter a liberdade que sempre defenderam, e que as leis de autonomia e de financiamento lhes conferiu, de fixação das propinas de doutoramento e de 2.º ciclo?. Entendo que deve manter-se essa liberdade com as restrições que introduzimos aqui, na Assembleia, na fixação das propinas de 2.º ciclo quando são necessárias para fins profissionais.
Sobre os laboratórios do Estado não é, com certeza, num minuto que vou explicar aquilo que é público, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Não é público!

O Orador: — A reforma dos laboratórios do Estado e a resolução do Conselho de Ministros sobre esta matéria é integralmente pública e conhecida de todos os Srs. Deputados, mas estou à disposição da Câmara para qualquer discussão aprofundada sobre esta matéria em sede de comissão.
Mas que fique entendido que não há nenhum mistério, trata-se de trabalho absolutamente transparente: uma avaliação conduz a uma análise e essa análise conduz a conclusões e a decisões como esta da reforma dos laboratórios do Estado.
Aparentemente, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita está contra que as instituições do ensino superior contribuam para a Caixa Geral de Aposentações. Pois eu não estou, entendo que descapitalizar a Caixa Geral de Aposentações…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Descapitalizar?

O Orador: — … é que será uma ofensa ao ensino superior e a todos nós.
A solução que está encontrada neste Orçamento, Sr.ª Deputada, não parece ser objecto de qualquer crítica, porque não afecta o orçamento de funcionamento das instituições, mas afecta a possibilidade legal de que com violação, para este fim, das regras de equilíbrio orçamental os saldos das instituições de ensino superior, que neste momento são perto de 400 milhões de euros e que têm de ser repostos no ano seguinte, possam ser utilizados para minorar e capitalizar a Caixa Geral de Aposentações.
Não creio, Sr.ª Deputada, que alguém de bom senso possa estar contra esta medida.
Não quero abusar do meu tempo — o Sr. Presidente já está a olhar para mim …

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, dispõe de mais 4 minutos.

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O Orador: — Obrigado, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada, quanto aos despedimentos em instituições do ensino superior, de facto a saída de pessoal docente e não docente destas instituições acontece, mas também acontecem recrutamentos para as instituições de ensino superior.
Tem havido reduções e aumentos de pessoal em instituições de ensino superior! Se olhar para os últimos 12 meses das instituições de ensino superior — posso até fornecer-lhe essa lista —, poderá constatar que em muitas instituições houve aumento do número de pessoal, e nalguns casos aumentos muito significativos — podemos discutir a sua bondade, mas não vou fazê-lo agora — e noutras houve reduções muito significativas.
A Sr.ª Deputada perguntou ainda se uma instituição entender que deve dispensar certo pessoal e esse pessoal seja o mais qualificado que políticas deve o Estado ter nessa matéria. Sr.ª Deputada, só vejo uma: não intervir na microgestão das instituições de ensino superior! Não contem comigo para intervir na microgestão das instituições de ensino superior! Sr.ª Deputada, o problema não é o desemprego, mas sim conseguir que as pessoas qualificadas do ensino superior, em qualquer sistema de reestruturação do ensino superior, sejam aproveitadas pelo sistema de ensino superior e pelo sistema científico e tecnológico português. Esse é que é o problema! Já tive ocasião de anunciar a criação de um programa de apoio à mobilidade de docentes do ensino superior atingidos por reestruturações, que podem ser, simplesmente, o facto de departamentos fecharem porque não têm alunos, pelo que o pessoal eventual que está aos serviço desses departamentos não deve ser mantido ad aeternum, sem alunos , naquela instituição.
Não devemos pagar esse desperdício, devemos, sim, pagar para que esse pessoal possa ser «retreinado», formado, aproveitado, por outras instituições, quer de ensino superior, quer por instituições cientificas, se quiser, se o desejar.
Foi esse programa que foi desenhado com as instituições e que está pronto a ser lançado. Eu anunciei-o já e, repito, ele está pronto a ser lançado, mas Sr.ª Deputada que fique absolutamente claro…

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — O quanto deve estar quantificado!

O Orador: — Pois está, está «quantificadíssimo», Sr.ª Deputada. Não me peça para encorajar despedimentos no ensino superior, se é isso que pretende.
Um Sr. Deputado do Partido Socialista colocou-me uma questão à qual eu respondo, insistindo em dizer que este é um orçamento que dá à ciência e à tecnologia, às instituições científicas e aos centros de investigação, no interior das instituições do ensino superior, uma capacidade de intervenção que nunca tiveram, porque é a componente científica dentro do ensino superior que tem mais capacidade, neste momento, de contribuir para o desenvolvimento e, designadamente, para o reforço financeiro das instituições de ensino superior.
Ora, sabem que, pelos estatutos de muitas instituições do ensino superior, senão da maioria, os centros de investigação e os institutos de investigação nem voz activa têm nas decisões das instituições que estão baseadas no modelo pré-científico da sua organização.
Ora, este orçamento e esta política orientam as instituições de ensino superior para um reforço interno das instituições, dos departamentos, dos centros de investigação que são produtivos e que têm capacidade de ir buscar verbas para investigação e desenvolvimento, como acontece em toda a Europa desenvolvida.
Uma conta muito simples: imaginemos que desta verba de investimento, em ciência e tecnologia, de 579,6 milhões de euros não sairá, com certeza, menos de 30 ou 40% daquilo que caberá em competição ao ensino superior português. Seria extraordinário que fosse menos do que isso, dada a presença de investigadores no ensino superior.
Por mais que queiramos que haja transferência para o sector privado, para instituições fora do ensino superior, para laboratórios do Estado, etc., dada a dimensão do sistema, será inverosímil que menos do que uma percentagem que pouco abaixo dos 50% estará ao entrar como receita nas instituições do ensino superior representa um aumento de quase 20%, pelo menos 15%, das verbas de funcionamento, das instituições de ensino superior.
Dir-me-á a Sr.ª Deputada: «pois, com certeza, mas não se distribui uniformemente». Pois não, é preciso que não se distribua uniformemente, é preciso que se distribua e seja afectado onde há mais capacidade e é preciso que os jovens investigadores, os jovens dos centros universitários se movam para os departamentos e para os sítios onde há melhores capacidades de orientação e de direcção.
O Sr. Deputado Fernando Rosas já não se encontra presente, mas teve a gentileza de me telefonar antes de sair, dizendo que não podia ouvir a resposta às questões que colocou.
Também não tenho tempo para responder, mas gostaria de lhe dizer que estou de acordo com as preocupações que ele exprime, estou de acordo com a preocupação que ele exprime em criar uma nova política de financiamento e de repartição de financiamento para o ensino superior.
Estou de acordo que a política cientifica portuguesa e que a reestruturação do ensino superior português exige a alteração significativa do modelo de repartição do plafond orçamental das instituições do ensino supe-

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rior, mas isso não se pode fazer de uma forma radical de um ano para o outro e, muito menos, antes de ter começado a reestruturação profunda da rede de ensino superior.
Por último, gostava de agradecer a informação que o Sr. Deputado do PSD me deu sobre a execução global de investimentos do plano no Ministério, que será confrontada com as verbas lançadas nos sistemas informáticos do meu próprio Ministério e transmitidas ao Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Dois Srs. Deputados inscreveram-se para interpelar a Mesa.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, da minha parte não se trata de uma interpelação. Pretendo apenas sugerir que tenha lugar uma terceira ronda de perguntas, pois pretendíamos colocar pelo menos mais duas questões.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estamos já para além do tempo que foi determinado, pelo que não me parece que, no sentido formal, deva ter lugar uma terceira ronda. Mas para que não haja — e penso que o Sr.
Ministro não se oporá a isso — nenhum impedimento a que alguma questão urgente, inadiável e importante seja colocada, a título excepcional vamos abrir a possibilidade a que sejam feitas duas curtíssimas intervenções, pelo que peço, também, respostas muito curtas por parte do Sr. Ministro.
Intervirão, pois, os Srs. Deputados Emídio Guerreiro e Honório Novo, a quem peço contenção no uso dos tempos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, há uma matéria que foi duas vezes questionada e que, talvez por dificuldade da gestão do tempo, não foi respondida.
Penso, pois, que seria importante sabermos se em 2007 o preço social das refeições nas cantinas se mantém ou não.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, interveio exactamente no registo que seria esperado.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Honório Novo. Sei do seu espírito sintético e da capacidade de nos brindar com uma intervenção muito curta e muito significativa.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sei que o Sr. Presidente procura que o debate orçamental, que é um momento porventura único durante cada ano civil, seja de debate aprofundado. Sei também da disponibilidade reiterada pelo Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino superior para, com prejuízo da hora de jantar, procurar esclarecer até ao fim as questões levantadas por esta bancada. Peço-lhe, pois, Sr. Presidente que conceda um minuto e meio ao Sr. Deputado Eugénio Rosa e ao Sr. Deputado Miguel Tiago para formularem duas perguntas breves nesta terceira ronda.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, percebo perfeitamente. Aliás, a Sr.ª Deputada Cecília Honório…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Nem sequer utilizei o tempo todo, como sabe!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, vou mencionar que o seu contributo foi, porventura, único, no sentido de que não utilizou integralmente o tempo de que dispunha.
Portanto, dentro do equilíbrio que devemos ter no tratamento destas matérias, tenho de respeitar o que a Sr.ª Deputada agora trouxe à liça, que é não haver lugar a uma terceira ronda de perguntas.
Creio que isso será possível, porque o Sr. Deputado Eugénio Rosa é muito telegráfico — poderá haver uma emulação competitiva com o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, que usou da palavra por escassos 17 segundos! Julgo, portanto, que o Sr. Deputado Eugénio Rosa poderá conseguir fazer algo muito próximo disso, tal como o Sr. Deputado Honório Novo. Se assim não for, teremos de reabrir uma terceira ronda, mas com um prejuízo geral no espírito de todos os Srs. Deputados.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa, que dispõe de um pouco mais de 17 segundos, e não mais.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, concede-me também 17 segundos?

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr.ª Deputada, se os quiser utilizar.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: — É claro que os 17 segundos estão num registo irónico, Sr. Deputado.

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, se me permite, queria esclarecer a Sr.ª Deputada Cecília Honório acerca do seguinte: estamos a travar esta discussão em sede da Comissão de Orçamento e Finanças, que acordou a realização de três rondas de perguntas no mínimo, podendo a terceira ser livre, independentemente dos tempos, sujeitando-se em exclusivo à necessidade de esclarecimento do debate orçamental.
Era tão-só este esclarecimento adicional que queria prestar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Honório Novo, sei que nesta matéria é quase imbatível a sua argumentação, mas a verdade é que todos entendemos — e o Sr. Deputado também — que é possível gerir estes debates com equilíbrio. A atribuição dos 17 segundos é em sentido irónico, mas «para bom entendedor, meia palavra basta»! Assim sendo, irão usar dar palavra os Srs. Deputados Eugénio Rosa, Miguel Tiago e Cecília Honório.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, apenas quero colocar duas questões concretas.
A primeira questão prende-se com o impacto dos 7,5%. Estive a fazer cálculos e cheguei à conclusão de que tal custará às universidades e politécnicos cerca de 100 milhões de euros. Ora, pergunto ao Sr. Ministro se garante que todos, universidades e politécnicos, têm saldo suficiente para suportar ainda maiores reduções, que é o que vai acontecer em 2008, porque as estimativas para 2008 baseiam-se, normalmente, no executado em 2007.
A segunda questão diz respeito às parcerias internacionais com entidades americanas: como foram seleccionados os participantes — esta pergunta já foi feita, mas não obteve resposta — e qual é o custo de cada parceria? E com que orçamento serão pagas?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, sejamos honestos e partamos, desde já, do princípio de que, actualmente, o segundo ciclo de formação reveste-se de características diferentes das que o caracterizavam antes da aplicação do Processo de Bolonha. Portanto, não vale a pena proceder a comparações com base em realidades que são radicalmente diferentes: o antigo segundo ciclo, que correspondia ao anterior mestrado, não é a mesma coisa que o actual segundo ciclo, que faz agora quase o papel da anterior licenciatura. Não comparemos realidades diferentes, não comparemos «alhos com bugalhos»! Neste quadro, pergunto-lhe como é que o Governo prevê tratar da acção social nestes segundos ciclos, naqueles em que o Estado encara a igual propina para o primeiro ciclo e naqueles em que prevê que isso não aconteça.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estaria tentado a dar a palavra, como última intervenção, à Sr.ª Deputada Cecília Honório, atribuindo-lhe mais tempo, porque antes utilizou menos…

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não é necessário, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Só que, entretanto, tenho mais um orador inscrito para intervir, o Sr. Deputado Abel Baptista.
Portanto, se a Sr.ª Deputada preferir intervir já, dou-lhe de imediato a palavra; se quiser fechar com «chave de ouro» este nosso debate, será a última a falar.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não é necessário. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, serei muito breve e, provavelmente, os 17 segundos serão suficientes.
Tenho pena, Sr. Ministro, de não o ter ouvido falar da avaliação, da implementação do Processo de Bolonha, que foi um assunto relativamente branqueado em toda a sua profícua intervenção.
Tenho ainda pena de não o ter ouvido falar sobre o futuro do INETI, no âmbito da preparação do Livro Branco sobre os laboratórios do Estado, mas penso que o que o Sr. Ministro disse aqui que assume a sua ida a uma comissão para tratar deste processo com toda a seriedade.
Também não o ouvi esclarecer qual é o seu compromisso com o subsídio de desemprego para os professores do ensino superior. Vai utilizar a política de bolsas para amortizar este processo? Esta foi uma das questões que coloquei na primeira ronda e à qual o Sr. Ministro não deu resposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, questiono novamente o Sr. Ministro, porque há dois pontos que não ficaram de todo esclarecidos, apesar das perguntas que foram feitas ao longo das duas rondas anteriores.
Em primeiro lugar, ficou claro, depois da falta de respostas e do que o Sr. Ministro disse, que este é um orçamento de retenção e de redução de verbas, da parte do Estado, para com o ensino superior. Aliás, essa é a primeira prioridade apresentada pelo Sr. Ministro, a par com a do esforço de contenção da despesa pública.
E o aumento que se verifica em relação a algumas instituições é financiado pelos alunos, pelas receitas próprias das respectivas instituições.
Em segundo lugar, visto que o Sr. Ministro também não esclareceu este ponto, a conclusão que tiro é a de que os politécnicos são «o parente mais pobre» do ensino superior, uma vez que vêem reduzidas substancialmente as suas verbas.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, é falso que os politécnicos vejam as suas verbas mais reduzidas do que as universidades. É exactamente o contrário, a redução é menor: as verbas dos politécnicos reduzem 2,4% e as das universidades 4,4%.
E é ridiculamente falso que seja financiada pelos alunos a parte das obras do ensino superior daquelas instituições que decidiram fazer obras com recurso a receitas próprias. E, como deve imaginar, são poucas as instituições que recorrem a receitas próprias para financiar as obras do ensino superior: estamos a falar de qualquer coisa que representa menos de 1%, ou seja, de uma percentagem insignificante dos orçamentos do ensino superior.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, relativamente à avaliação do Processo de Bolonha, devo começar por dizer que a sua aplicação em Portugal começou há pouquíssimo tempo e, com certeza, vai ser avaliado no quadro das avaliações institucionais das instituições de ensino superior. Mas deve imaginar que é preciso algum tempo para lançar seriamente um processo de avaliação institucional do Processo de Bolonha em Portugal.
Obviamente, é intenção do Governo fazê-lo.
Relativamente ao «compromisso com o desemprego» de que falou, quero dizer-lhe que tenho, sim, um compromisso com o emprego. E não compreendo a atitude de alguns Deputados contra sistemas de mobilidade e sistemas de bolsas. Não compreendo, porque os sistemas de bolsas provaram em todo o mundo, e também em Portugal, que eram essenciais para a formação flexível das novas gerações científicas no nosso país e para a sua progressiva integração no mercado de trabalho.
Devo mesmo dizer-lhe que é absolutamente extraordinário que o sistema de bolsas português, desenvolvido desde a década de 80 até hoje, tenha conseguido (combinado, obviamente, com outros desenvolvimentos), pelo seu carácter competitivo à escala internacional, não só atrair gerações crescentes, na medida em que não faltam candidatos de excelente nível para todas as áreas científicas, como reduzir drasticamente o que todos esperávamos que acontecesse na década de 80, que era um crescimento gigantesco do «brain-drain», da fuga de cérebros do nosso país, como acontecera antes na Grécia e na Irlanda. Só que isso não se passou em Portugal.
Portanto, não consigo compreender como é possível protestar contra a utilização dos mecanismos de formação e de mobilidade quando há reestruturações nas instituições.
O que pretendo — e devíamos pretender todos — é que um docente do ensino superior com mestrado e sem doutoramento que leccionava uma disciplina há três anos numa instituição do ensino politécnico e que viu desaparecer essa área daquele instituto politécnico possa recorrer ao Estado, arranjando este maneira de financiar ou co-financiar esse docente, caso ele queira manter-se dentro das profissões de natureza científica e técnica. Ou seja, o Estado asseguraria a sua permanência dentro do sistema científico, designadamente associando-o a outras instituições para tirar o doutoramento, para entrar em investigação, para circular dentro do sistema científico e encontrar melhores oportunidades de emprego mais qualificado. É disto que estamos a falar.
Relativamente ao futuro do INETI, como ao de outros laboratórios do Estado — não gostava de singularizar nenhum face aos demais —, com certeza estou disponível para discutir o que é público e está escrito na resolução do Conselho de Ministros sobre os laboratórios do Estado.
O Sr. Deputado Miguel Tiago também declarou que o segundo ciclo de formação faz as vezes de licenciatura. Vou escrever esta frase entre aspas, para o citar na próxima conferência de Bolonha, porque me parece particularmente interessante e falsa, precisamente porque se faz a distinção clara entre os segundos ciclos que são necessários para o exercício de profissões e os segundos ciclos que não são necessários para o exercício de profissões, funcionando como um complemento de formação, ao contrário do que acontecia antes, a fim de proteger os estudantes.
Gostaria de deixar claro que o custo das parcerias internacionais que foram acordadas está inteiramente claro, porque, como devem imaginar, a resolução do Conselho de Ministros que autoriza o Ministro da Ciência

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89 | II Série GOPOE - Número: 002 | 26 de Outubro de 2006

e Tecnologia a assinar os contratos em causa detalha integralmente todas as verbas desses contratos. Essa resolução foi distribuída publicamente e deve estar a ser publicada, se não o foi já.
Portanto, apesar de ser pública e de ter sido abundantemente distribuída essa resolução do Conselho de Ministros, tenho todo o gosto em fornecê-la se, porventura, ainda não foi publicada. Mas são públicos e notórios os seus dados.
Agradeço ao Sr. Deputado ter pedido desculpa pelo prejuízo da minha hora de jantar, mas deve imaginar que ainda é muito cedo para sair do Ministério. Normalmente, janto bastante mais tarde, infelizmente. Penso que esta prática não é recomendada pela ciência médica nem pela dietética, mas é assim.
O problema não é de dietética mas de saldos suficientes para a Caixa Geral de Aposentações. E a resposta é «sim» para a esmagadora maioria das instituições de ensino superior. Isto é, existem muito poucas instituições de ensino superior (e de pequeníssima dimensão) onde poderá haver uma diferença e, obviamente, esse assunto será resolvido no quadro das despesas que não estão inscritas nas instituições de ensino superior. Mas, repito, a dimensão é muito reduzida, como, aliás, pode constatar, consultando a lista dos saldos de cada uma das instituições de ensino superior.
O PSD está muito preocupado com o preço social das refeições nas cantinas para o próximo ano. Deve saber o PSD, porque geriu o sector muitas vezes, que o preço social das refeições é definido por despacho, pelos próprios serviços da acção social, sob proposta da Direcção-Geral do Ensino Superior.
Desde que iniciámos funções não alterámos esse preço, mas seria, como devem imaginar, uma enorme grosseria estar aqui a dizer o que vou decidir face a uma proposta que nem sequer me foi apresentada.
Sr. Deputado, convenha que não seria uma atitude correcta.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Sr.as e Srs. Deputados, encerrámos os trabalhos de hoje.
Cabe deixar uma palavra de agradecimento aos Srs. Telespectadores que nos estão a ver e ouvir e que, certamente, tiveram ensejo de assistir a um debate vivo e, do nosso ponto de vista, informativo e interessante.
Muito boa-noite a todos.
Está encerrada a reunião.

Eram 21 horas e 15 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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