Página 1
Quarta-feira, 15 de Novembro de 2006 II Série-OE — Número 10
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 14 de Novembro de 2006
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Patinha Antão) declarou aberta a reunião às 9 horas e 50 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 99/X — Orçamento do Estado para 2007, tendo as equipas governamentais dos Ministérios das Finanças e da Administração Pública e do Trabalho e da Solidariedade Social apresentado à Comissão os respectivos orçamentos.
Sobre o orçamento do Ministério das Finanças e da Administração Pública, usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro (Teixeira dos Santos) e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (João Amaral Tomaz), os Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), Victor Baptista (PS), Honório Novo (PCP), Francisco Louçã (BE), Diogo Feio (CDS-PP), João Cravinho (PS) e Eugénio Rosa (PCP).
Sobre o orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, intervieram, a diverso título, além do Sr.
Ministro (Vieira da Silva), os Srs. Deputados Miguel Santos (PSD), Isabel Santos (PS), Jorge Machado (PCP), Mariana Aiveca (BE), Esmeralda Ramires (PS), Eugénio Rosa (PCP) e Pedro Mota Soares (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 17 horas e 45 minutos.
Página 2
2 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
O Sr. Presidente (Patinha Antão): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 9 horas e 50 minutos.
Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, vamos começar a audição do Ministério das Finanças em sede do debate da especialidade do Orçamento do Estado para 2007. De acordo com a metodologia estabelecida, esta é uma audição com maior extensão, estão previstas até 4 horas. Mas, desejavelmente não utilizaremos o tempo na totalidade, como tem acontecido noutras audições.
A metodologia que utilizaremos é esta: o Sr. Ministro de Estado e das Finanças faz uma intervenção inicial, que deverá durar até 20 minutos. Haverá, depois, uma primeira ronda de intervenções, em que os Srs. Deputados que representam os partidos no Hemiciclo têm a possibilidade de utilizar até 10 minutos para fazer uma intervenção inicial. Haverá uma resposta em bloco, que não deverá exceder 40 minutos, a que seguirá uma segunda ronda, com reduções dos tempos para metade, com a qual concluiremos a nossa audição.
Dito isto, Sr.as e Srs. Deputados, dando, em meu nome e certamente no vosso, as boas-vindas ao Sr.
Ministro e ao Sr. Secretário de Estado, passo de imediato a palavra ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças, para fazer a sua intervenção inicial.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, o debate que ocorreu na semana anterior em torno da apreciação, na generalidade, da proposta de Orçamento para 2007 tornou claro que o Governo mantém o seu compromisso de prosseguir uma política orçamental que vise a redução do défice de 4,6 do PIB, em 2006, para 3,6 do PIB, em 2007, e está empenhado em atingir este objectivo através da redução da despesa no PIB.
Foi argumentado e ficou bem claro no debate que ocorreu na semana passada, que o Governo se apresenta perante esta Câmara com uma posição de credibilidade e de reputação claramente reforçadas, alicerçada nos resultados relativos à execução de 2006, que é já possível antever.
Recordo que há um ano poucos acreditavam que o Governo pudesse vir a atingir o objectivo do défice de 4,6% do PIB no final deste ano; poucos acreditavam na sensatez e no realismo do cenário macroeconómico que esteve subjacente a esse Orçamento. Mas creio que o debate da semana passada tornou bem claro que o Governo assentou a sua política num cenário macroeconómico que se revelou realista e até prudente e que obteve resultados que, de todo em todo, a oposição não acreditava que fosse possível atingir. É com essa credibilidade e, ao mesmo tempo, com a convicção de que seremos capazes de prosseguir esta política que nos apresentamos no Hemiciclo.
Creio que o debate torna também claro que o Orçamento, visando reduzir a despesa, corta-a onde é possível e contém a evolução de outras despesas relativamente às quais seria, de todo em todo, impensável proceder a cortes de natureza nominal. Nesse sentido, é um Orçamento que, não procedendo a cortes cegos, investe claramente nas áreas da ciência e tecnologia, indicando-as como uma aposta estratégica, tendo em vista criar condições para o reforço da competitividade da nossa economia e para a inovação e modernização do nosso tecido produtivo.
Trata-se de uma política que está associada a uma segunda prioridade, que tem a ver com o reforço na qualificação dos portugueses. É na aposta no chamado capital humano, isto é, nos portugueses, que temos de prosseguir, tendo em vista criar condições de futuro para todos nós.
Finalmente, é uma proposta de Orçamento que não ignora os imperativos da justiça e da equidade e, por isso, prossegue e adopta medidas importantes no reforço destas, eliminando diferenças de tratamento que são de todo em todo injustificáveis sob o ponto de vista da equidade fiscal.
É também um orçamento que tem como preocupação os mais desfavorecidos da nossa sociedade.
Em primeiro lugar, porque há a cautela e o cuidado de evitar que as várias medidas adoptadas afectem as famílias com mais baixos rendimentos.
Em segundo lugar, tem subjacentes políticas salariais na área da Administração Pública, em particular no que se refere às pensões, que não ignoram a necessidade de se proceder a ajustamentos mais significativos aos níveis de rendimentos mais baixos.
Finalmente, é um Orçamento que, ao estender o apoio do complemento solidário para idosos àqueles com mais de 70 anos, dá um sinal de que não pactuaremos com a pobreza e com a exclusão social, em particular daqueles que, pela idade, têm uma voz mais fraca e que tenderão mais facilmente a ser esquecidos e sacrificados. Esses nós não esquecemos.
Estou aqui perante vós para discutir o Orçamento na especialidade e, por se tratar de uma questão de especialidade, o tempo impede-me de discutir e de analisar ponto por porto, em detalhe, todos os aspectos deste Orçamento. Por isso, coloco-me desde já à disposição dos Srs. Deputados, tal como os Srs. Secretários de Estados que me acompanham, para analisar o Orçamento nos aspectos que entendam relevantes e que entendam merecer a vossa atenção.
Página 3
3 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
O Sr. Presidente: — Vamos proceder, então, à primeira ronda, pertencendo a primeira intervenção, como é habitual, ao Partido Social Democrata, a qual está a cargo do Sr. Deputado Hugo Velosa, a quem dou a palavra.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, saúdo, em nome do grupo parlamentar do PSD, o Sr. Ministro, o Sr. Secretário de Estado, as Sr.as e os Srs. Deputados.
É verdade que estamos a discutir o Orçamento do Estado, em sede de especialidade. De qualquer modo, o Grupo Parlamentar do PSD e eu próprio não iremos fazer a apresentação concreta de propostas que já foram, de certa forma, divulgadas nos debates anteriores, na medida em que, como V. Ex.ª, Sr. Ministro, bem sabe, elas foram liminarmente rejeitadas, pelas razões entretanto apontadas.
No entanto, o Grupo Parlamentar do PSD vai manter essas propostas, que darão entrada e serão discutidas na altura própria.
Portanto, a minha intervenção é fundamentalmente relativa ao Orçamento na especialidade, aliás, como deve ser, na medida em que todos já discutimos na generalidade e sabemos as posições quer do Governo, quer do grupo parlamentar que o apoia, quer dos outros grupos parlamentares.
Começo por dizer que o PSD se congratula por uma mudança de posição do Governo relativamente a uma proposta que foi apresentada pelo PSD no Orçamento do Estado para 2006, e que foi rejeitada pelo Partido Socialista, referente à taxa reduzida de IVA para as empreitadas de reabilitação urbana dos imóveis situados nas unidades de intervenção das sociedades de reabilitação urbana, que agora consta do artigo 57.º do Orçamento do Estado para 2007. Ainda bem que o Governo acabou por aceitar algo que tinha sido proposto no ano passado pelo Partido Social Democrata.
Gostaria ainda não de congratular-me mas de chamar a atenção para o facto de o Governo utilizar (embora a utilize menos) uma espécie de «cavalo orçamental», isto é, «cavalga» o Orçamento para autorizações legislativas impróprias. Ora, não há dúvida de que este Orçamento tem algumas autorizações legislativas impróprias, às quais falta sentido, extensão e alcance. Desde logo, a do artigo 80.º, que é uma autorização legislativa muito importante, porque autoriza o Governo a republicar na íntegra o Estatuto dos Benefícios Fiscais, mas ao mesmo tempo diz «rever». Se há uma autorização legislativa que vai republicar — e republicar quer dizer pegar em normas que estão dispersas e juntá-las num só documento — , seria muito mais fácil para todos nós. Mas a autorização diz que vai rever, pelo que gostaria que o Governo esclarecesse em que sentido é que o vai fazer, porque esta autorização legislativa não diz qual é o sentido, o que é ilegal e inaceitável na medida em que o Parlamento nem se pode pronunciar sobre o sentido dessa revisão.
Há uma outra autorização legislativa relativa ao artigo 84.º, que tem a ver com a Lei Geral Tributária, que não se entende, está um pouco desenquadrada. Diz que o Governo fica autorizado a consagrar um regime de acordos prévios vinculativos sobre preços de transferência em ordem à determinação das metodologias a utilizar pelos contribuintes e entidades relacionadas, em termos obrigatórios, para a administração fiscal. Tudo isto carece, como autorização legislativa que é, de sentido, extensão e alcance. Mas não se entende o que é que se quer dizer — esta é a verdade! Portanto, se não se entende, muito dificilmente é legal ou aceitável.
Esta é uma outra explicação que aguardo que o Governo dê.
De igual modo, é muito importante a autorização legislativa constante do n.º 2 do artigo 24.º, que também não cumpre esta obrigatoriedade de sentido, extensão e alcance. Refere o n.º 2, sob a epígrafe «Transferências de competências para os municípios», que «durante o ano de 2007 fica o Governo autorizado a legislar no sentido de regulamentar os poderes tributários dos municípios relativamente aos impostos a cuja receita tenham direito nos termos previstos na Lei das Finanças Locais». Ora, é algo demasiado vago para ser considerado uma autorização legislativa, tendo em conta o sentido, a objectividade e o alcance que estas devem ter.
Temos mais algumas dúvidas em relação a outras medidas fiscais que constam da Lei do Orçamento, por exemplo em relação à banca. Deixo, desde logo, uma questão ao Governo: estas medidas fiscais implicam um alargamento do sigilo bancário? Ou seja, a medida prevê que os bancos reportem às finanças quaisquer esquemas, operações ou transacções adoptadas ou propostas para efeito de planeamento fiscal, ainda que com derrogação do sigilo bancário? É com derrogação do sigilo bancário tal como ele é entendido actualmente e com aplicação da lei actual ou é necessária outra norma para derrogar o sigilo nesta matéria? Num regime importante como é o regime simplificado há também uma autorização legislativa que nos levanta dúvidas.
Existem três regimes em vigor em termos de IRC. Entretanto, o Governo vem pedir à Assembleia da República uma autorização legislativa, nos termos do n.º 2 do artigo 52.º do Orçamento do Estado, que diz que o Governo fica autorizado a revogar o regime simplificado em IRC, substituindo-o por um regime que consagre regras simplificadas de apuramento do lucro tributável com base na contabilidade, para os sujeitos passivos de IRC cujo volume de negócios não ultrapasse os 250 000 €.
Ora, isto diz alguma coisa, mas não diz tudo sobre o que o Governo pretende fazer do regime simplificado.
Se esta disposição não viesse sob a forma de autorização legislativa, ficávamos a saber, discutiríamos e concordaríamos ou não. Mas como vem sob a forma de autorização legislativa, realmente falta-lhe qualquer coisa para sabermos exactamente o que se passa e o que pensa o Governo fazer.
Página 4
4 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Uma outra questão tem a ver com as normas internacionais de contabilidade. No Orçamento do Estado, o Governo assume o compromisso de adaptar o Código do IRC às normas internacionais de contabilidade.
Depois disso, procede-se à clarificação e desenvolvimento das regras de determinação do lucro tributável por parte dos sujeitos passivos de IRC obrigados a adoptar as normas de contabilidade ajustadas e introduz-se uma autorização legislativa para adaptação do Código do IRC às normas internacionais de contabilidade.
Em face disto, pretendo que o Governo esclareça qual a natureza destas alterações. Ou seja, se com as adaptações previstas aos artigos 51.º a 53.º da proposta de lei as empresas passam a ter de processar apenas uma contabilidade ou se as alterações vão ser apenas um primeiro passo, não dispensando as empresas de continuarem a ter duas contabilidades. Esta é, portanto, uma dúvida que temos em relação à adaptação das normas internacionais de contabilidade neste Orçamento.
Depois, temos também uma dúvida relativamente à questão do consumo de energia. O Governo tem dito que esta é uma questão fundamental, sobretudo no que diz respeito às energias limpas ou renováveis, no entanto, este Orçamento não prevê quaisquer medidas que estimulem a eficiência energética e o uso de energias renováveis. Eu, pelo menos, não as vi, mas, se existirem, o Governo dir-me-á. Recordo, por exemplo, que a compra de equipamentos e de painéis solares mantém uma tributação muito alta e uma dedução muito baixa. Assim, a minha pergunta é por que é que o Governo não prevê, em concreto, no Orçamento, outro tipo de incentivos nesta matéria, que, como todos sabemos, é uma matéria fundamental, e, aliás, também tem sido assim considerada pelo Governo.
Para terminar, nesta primeira fase — até porque ainda tenho algumas dúvidas que colocarei, talvez, na segunda fase —, gostaria de dizer o seguinte: li algumas notícias que diziam que o Governo vai incluir no Orçamento do Estado para 2007 uma norma transitória para que as freguesias e os municípios recebam transferências por duodécimos até que esteja aprovada (e eu digo que não é aprovada mas publicada, porque as leis só entram em vigor quando são publicadas) a nova lei das finanças locais. Aliás, um dos jornais dizia que, realmente, houve um recuo por parte do Governo por a lei de estabilidade orçamental permitir que o Orçamento do Estado tenha normas baseadas em leis ainda não aprovadas.
De resto, e como o Sr. Ministro sabe, quando da discussão na generalidade tive ocasião de manifestar a minha discordância em relação a esta matéria. Em democracia a discordância por vezes existe e naturalmente que cada uma das partes envolvidas «defende a sua dama» conforme entende que deve defender. O Sr.
Ministro defende a sua posição, mas eu devo dizer que, ao ler esta notícia, fiquei surpreendido, pelo que gostaria de saber a opinião do Governo sobre esta matéria.
Para nós (e ainda há poucos dias tive ocasião de dizer qual a opinião do Grupo Parlamentar do PSD), a lei de estabilidade orçamental não vale por si própria. A lei da estabilidade orçamental estabelece um princípio mas tem de ter subjacente uma lei das finanças locais ou uma lei das finanças regionais, porque ela, por si própria, não vale. Se a lei da estabilidade orçamental valesse por si própria, o Governo poderia, a seu belprazer (este governo ou qualquer governo), sem critério e sem fundamentação, tomar decisões em relação a transferências para os municípios ou para as regiões autónomas.
Ora, isto parece-me completamente inaceitável. Por isso, quando li estas notícias, pensei que o Governo tinha mudado de posição, sendo que se mudou ainda bem.
Portanto, a questão que lhe deixo, Sr. Ministro, é no sentido de saber se o Governo mudou de posição, se vai ou não incluir a tal norma para transferências por duodécimos até à publicação da lei das finanças locais e da lei das finanças regionais, porque, no nosso entendimento, ao fazer isso, iria no bom sentido de respeitar aquilo que a lei dispõe.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Pelo Partido Socialista, a intervenção está a cargo do Sr. Deputado Victor Baptista, a quem dou a palavra.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, confesso que esperava que nesta reunião, na especialidade, o PSD nos desse a oportunidade de compreender a proposta que apresentou durante o debate na generalidade. Aparentemente era uma proposta tão «bondosa» que levaria à poupança rápida de 1300 milhões de euros. No entanto, dado que não ficámos esclarecidos no debate na generalidade, contava que o PSD nos demonstrasse agora como é que aquele montante é possível de alcançar.
Afinal, os problemas são de outra natureza. O PSD rapidamente compreendeu que tal proposta não tinha sustentação e deixou-a cair imediatamente. O que é estranho, uma vez que, numa primeira abordagem, quando se tem consciência da razão das propostas, elas não devem ser abandonadas, devem ser debatidas, explicadas devidamente, para ver se há alguma fundamentação.
No entanto, o PSD já não acompanha o seu líder nas propostas, pelo que não está agora, no debate na especialidade, a defender com convicção a razoabilidade e a fundamentação de tal «bondade» em poupar tão rapidamente 1300 milhões de euros.
Esta é, pois, uma primeira conclusão que retiramos da vossa intervenção.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Nós preferimos actuação de surpresa!
Página 5
5 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
O Orador: — De facto, é difícil fazer contas, porque, por mais contas que se fizessem, teriam muita dificuldade em explicar a história dos 1300 milhões de euros. Mas tiveram oportunidade para o fazer e fico a aguardar, durante esta reunião, que usem esta oportunidade para dar essa explicação, para ver se compreendemos.
O PSD optou, antes, por abordar a lei de enquadramento orçamental (que nós aprovamos, e bem), em que, curiosamente, o referido artigo 85.º da Lei n.º 2/2002, salvo erro, é claríssimo quando diz que, por questões de cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento, é possível a redução de montantes para além daqueles que estão previstos em leis, nomeadamente na lei das finanças locais e regionais.
Por isso, não se percebe muito bem esta dúvida do PSD relativa à possibilidade ou não da redução dessas transferências. E se assim fosse, como aqui foi adiantado, então, colocaria a questão sobre qual o objectivo da alteração deste artigo, se vamos remeter tal facto apenas para a lei das finanças locais ou regionais.
Penso que o que transparece deste debate, quer na generalidade quer na especialidade, é que já ninguém tem dúvidas quanto à credibilidade do Orçamento. E ninguém tem dúvidas porque a credibilidade assenta em iniciativas relacionadas com o Orçamento do Estado para 2006, nomeadamente em objectivos definidos no Orçamento, que são alcançados e que vão ser conseguidos. Portanto, é evidente que não vale a pena debater a credibilidade do Orçamento, porque já ninguém tem dúvidas quanto a isto.
Em todo o caso, Sr. Ministro, estamos no debate na especialidade, pelo que gostaria de referir-me a uma matéria que foi aqui abordada e que foi, aliás, referida pelo Sr. Primeiro-Ministro quando do debate na generalidade. Refiro-me concretamente ao sigilo bancário.
De facto, o Governo tinha uma proposta relativamente ao sigilo bancário, proposta essa que baixou à Comissão, sem votação, conjuntamente com outras propostas, e que em breve será debatida.
A questão que gostaria que o Sr. Ministro clarificasse diz respeito ao facto de hoje os bancos já serem obrigados a comunicar à administração fiscal os factos que se relacionam com os impostos, nomeadamente no que se refere às retenções. A minha pergunta é se o que está em causa é algo que irá para além do que existe hoje, isto é, da obrigatoriedade de os bancos comunicarem à administração tributária os factos que se relacionam com a colocação de rendimentos à disposição do cidadão, ou se vamos mais longe desta vez e se o que se pretende é atingir operações que não se relacionam directamente com rendimentos do cidadão mas que se relacionam com aquilo que se poderá designar por planeamento fiscal.
Devo dizer que me parece bem que a administração tributária conheça não só algumas operações dos bancos que se relacionam com a distribuição de rendimentos ao cidadão mas que estes comuniquem também outras operações em que, não estando em causa claramente o problema do imposto, esteja em causa o problema do planeamento, para verificar se essas operações estão perfeitamente definidas e dentro do quadro legal.
Julgo que este passo pode ser interessante e gostaria que o Sr. Ministro, se fosse possível, nos precisasse e esclarecesse esta questão.
Depois há uma outra questão que se prende com o pagamento do IRC por parte dos bancos. A questão que coloco é quais são as medidas concretas que o Governo pensa implementar relativamente à possibilidade do aumento da taxa efectiva de pagamento.
Além disso, gostaria que nos dissesse qual foi o aumento da taxa efectiva. Devo dizer que, há dias, fiquei com a convicção de que a taxa efectiva, nos dois últimos anos, terá crescido cerca de 3%. Gostaria que o Sr.
Ministro esclarecesse se é exactamente assim ou não, se a administração fiscal dispõe desses montantes, no fundo, que nos dissesse qual foi o aumento da taxa efectiva de IRC paga pelos bancos e quais são as medidas que estão previstas concretamente para o próximo ano.
Não vamos falar evidentemente do cenário macroeconómico da redução da despesa, porque esta matéria já foi debatida na generalidade e, por mais voltas que se dêem, a realidade é só uma e os números são inequívocos. É evidente que se poderia sempre ir muito mais longe, mas, entre ir mais longe e fazer o que é possível e adequado, julgo que os passos têm de ser seguros e não devem ser passos que possam contribuir para a instabilidade. Daí que esta matéria esteja mais do que resolvida.
No entanto, há uma questão de fundo que agradecia se o Sr. Ministro pudesse abordar.
Na minha opinião, um grande desafio deste Governo para 2007 é, sem dúvida, a reforma da Administração Pública. A reforma da Administração Pública é uma medida séria e não é por acaso que nenhum governo, ao longo de todos estes anos, a assumiu. Repito: nenhum governo a assumiu. Trata-se de uma reforma difícil de fazer, é uma reforma que se dirige a pessoas, sendo que a história política dos últimos anos tem mostrado que a tentação tem sido sempre a de «ser agradável» para a Administração Pública.
Mas chegámos ao ponto de, nas despesas de funcionamento, as despesas com pessoal serem 85%. Ora, isto é insuportável, sendo que muitas das dificuldades que temos no País também resultam disto.
Portanto, gostaria que o Sr. Ministro precisasse exactamente que medidas irão ser incentivadas e concretizadas no âmbito da reforma administrativa que permitam aliviar o Orçamento e que dissesse se há outras medidas simultâneas que possam servir de amortecedor a esta situação no âmbito da Administração Pública.
O Orçamento do Estado para 2007 parece-nos que irá depender muito desta reforma da Administração Pública, que clarissimamente se impõe, sob pena de o País continuar a sonhar como aqueles que sonham jogando no Euromilhões, que nem sempre é fácil de ganhar, como é visível.
Página 6
6 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Portanto, julgo que é preciso ter a coragem de assumir estas medidas em nome do País, para ele se tornar governável.
Se o Sr. Ministro nos puder ajudar e dar-nos factos mais concretos, julgo que isso pode ser útil também para os portugueses que estão em casa a ouvir-nos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, quero, em primeiro lugar, cumprimentar o Sr. Ministro de Estado e das Finanças e os Srs. Secretários de Estado.
O Sr. Ministro, no início deste debate na especialidade, reiterou, de uma forma até solene, porque se levantou, coisa que não é necessária neste tipo de debates, alguns pressupostos e o entendimento que o Governo tem quanto àquele que terá sido o resultado do debate, na generalidade, na semana passada.
É verdade que há uma questão em que podemos estar de acordo, se quiser, é que o objectivo, segundo o Governo, ou a obsessão, segundo alguns outros sectores, nos quais nos incluímos, de um défice de 4,6% este ano, será, de facto, atingido, mas também é verdade que tudo o resto nos distingue e nos diferencia, e não diferencia o Governo só desta bancada diferencia-o também de vastíssimos sectores da opinião pública.
É que, quanto aos custos da obtenção deste objectivo, quanto a quem pagou e não pagou estes custos do alcance deste objectivo e quanto aos métodos e à forma como tal objectivo foi obtido, a diferença existe e ela não foi dirimida no debate na generalidade do Orçamento do Estado a favor da perspectiva governamental, antes pelo contrário, em minha opinião e face àquilo que é a opinião pública nacional, foi claro que este objectivo foi alcançado mas por vias que, porventura, não são as mais justas e aquelas que melhor defendem o futuro do País.
Mas, Sr. Ministro, estamos num debate na especialidade e, se me permite, irei enunciar, dentro daquilo que é nosso entendimento ser um debate na especialidade, um conjunto de questões para as quais solicito, naturalmente, o maior empenho e o maior rigor nas respostas da equipa ministerial.
Primeira questão: o artigo 30.º do actual Orçamento do Estado tem como objecto «auxílios financeiros e recuperação técnica e financeira». Na audição com o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna foinos referido que a verba aí inscrita, constante do n.º 4, de 16,7 milhões de euros, foi alvo de uma série de protocolos, que iriam ser devidamente publicados, como manda o n.º 5. Está esclarecido este aspecto. Agora, o que não está esclarecido — foi uma questão que já lhe coloquei no debate na generalidade e que continua sem resposta — é o que se passa com a verba de 200 milhões constantes do n.º 7 do mesmo artigo, afecta a diversos ministérios — Ministério do Ambiente e outros —, que teria sido distribuída de acordo com os termos de uma resolução do Conselho de Ministros, previamente autorizada por V. Ex.ª. Gostávamos, portanto, de perceber o que é que se passa sobre isto.
Segunda questão: com data de 31 de Outubro, Sr. Ministro, a Direcção-Geral do Orçamento distribuiu uma informação relativa à execução do PIDDAC que dá nota de uma execução, no ano de 2006, em torno dos 65%, mas apenas no que diz respeito à execução do Capítulo 50. Ora, isto não chega para termos uma informação criteriosa sobre a execução do PIDDAC no ano de 2006. Esta foi uma questão que lhe coloquei também em sede de generalidade, entretanto surgiu esta informação parcelar e, por isso, queria saber, por escrito, qual é a informação geral formal, independentemente de uma informação verbal que queira fornecer-nos no âmbito deste debate.
Terceira questão: porque razão a alienação e oneração de imóveis objecto do artigo 3.º da proposta de lei do Orçamento do Estado, este ano, contrariando o que tinha sido adoptado no ano anterior, não está sujeita a uma informação semestral obrigatória à Assembleia da República, através de um relatório detalhado sobre a venda ou compra de património do Estado? Porque é que é retirada esta norma e, já agora — admito que esteja com um défice de informação —, o que é que se passou relativamente a este ano, porque, que eu saiba, esta Assembleia da República, ao contrário do que impõe a norma aprovada em lei pelos senhores, não foi objecto de qualquer informação ou entrega de relatório detalhado quanto à compra ou venda de património do Estado? Quarta questão: o endividamento municipal constante do artigo 31.º. Nos n.os 5 e 6 deste artigo, os senhores propõem algumas excepções para o limite de endividamento — são investimentos financiados com fundos comunitários e outros, não interessa quais — condicionadas à autorização prévia de três ministros. Ora, durante o debate aqui ocorrido, na generalidade, com o Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna foi reiterada por parte do Sr. Ministro de Estado e da Administração Interna a hipótese de que, do ponto de vista dele, não haveria necessidade da exigência da autorização de três ministérios. Quero ouvir a sua opinião sobre isto e perguntar-lhe se entende que poderão ser só dois, que poderá ser só um ou, que é o nosso ponto de vista, não deverá ser nenhum, porque as condições estão expressas e elas, por lei, têm de ser cumpridas por todos neste país e, por isso, não têm de estar condicionadas a autorizações prévias.
Quinta questão: a inflação prevista pelo Governo para este ano e para o ano que vem e as suas incidências e consequências. Começo por referir que temos um Orçamento que, no quadro macroeconómico, afirma que a inflação este ano é de 2,5%, o que, obviamente, é um valor diferente daqueles que são os valores ofi-
Página 7
7 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
ciais, os valores das instituições nacionais e europeias, que têm como obrigação oficial a determinação do valor da inflação e de outros valores.
Portanto, a minha primeira pergunta é formal, isto é, se o Sr. Ministro entende que se deve manter no Orçamento a aprovar um valor consabida e comprovadamente errado, pelo menos a meu ver, face àqueles que são os valores oficiais. Não são os valores especulativos, são os valores oficiais. Esta é uma questão formal mas importante, obviamente, até porque o Sr. Ministro começou por falar na credibilidade deste Orçamento.
Uma segunda pergunta, mais importante do ponto de vista político, prende-se com as consequências do valor da inflação esperado pelo Governo para 2007. Não vou falar das negociações salariais, porque nessas percebemos bem quais são as intenções do Governo, e elas, infelizmente, são públicas, mas vou falar-lhe das consequências ao nível dos artigos 68.º, 70.º, 82.º, 85.º, 86.º e 100.º do Código do IRS, objecto de alterações no âmbito do artigo, salvo erro, 42.º da proposta de lei do Orçamento do Estado.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Artigo 44.º!
O Orador: — No âmbito do artigo 44.º, corrige-me o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Ministro já percebeu que esta minha pergunta tem a ver com os escalões do IRS, com as deduções à colecta e com as deduções de saúde, habitação, energias renováveis, educação, etc. O que eu gostava de perceber é se o Governo acha que pelo menos aqui, nestes aspectos, deve insistir com uma actualização de 2,1% ou está receptivo a uma actualização que tenha pelo menos como objectivo a recuperação do poder de compra perdido durante este ano, entre aquela que era a inflação oficial e aquilo que era não a inflação que os senhores agora dizem que é mas aquela que esperavam que fosse, que era 2,3%, recordo. Portanto, ao menos a este nível, os senhores estão dispostos ou não a eliminar aquilo que, objectivamente, para muitos sectores dos trabalhadores por conta de outrem neste país, se insistirem nesta norma, vai constituir, de facto, um novo imposto escondido, sem assumir integralmente a sua designação.
Sexta questão: normas fiscais. Os senhores anunciaram o vosso objectivo de aproximar a taxa efectiva à taxa real de IRC da banca, mas eu incluiria, Sr. Ministro, os grandes grupos económicos. Ora, gostava de perceber se os senhores estão ou não dispostos a concretizar isto de uma forma clara e transparente, e a forma clara e transparente não é irmos por pequenas normas de planeamento fiscal.
Aliás, essa norma de planeamento fiscal sugere-me até, um pouco ironicamente — perdoe-me a imagem —, que os senhores a meio do ano de 2007 vão parar e vão perguntar à banca: «agora, digam lá o que é que este ano combinaram para escapar legalmente aos impostos? Digam-nos para, depois, nós actuarmos em conformidade». Isto é — passe a expressão e a ironia — ridículo! Mas, independentemente das ironias que possamos construir em torno desta ideia, a verdade é que os senhores enunciaram este objectivo. E a forma de clarificar e de tornar transparente e visível aos olhos dos portugueses esta questão, se houver vontade política, é, pelo menos, criar aquilo que eu designo por uma norma-travão, que, em qualquer circunstância e a propósito seja do que for, impeça que a taxa efectiva de IRC da banca e, enfim, da generalidade das empresas, seja inferior a 20% ou, se quiser, cinco pontos percentuais abaixo da taxa real nominal de IRC aplicável às diversas situações. Eventualmente, haverá as questões de taxa de IRC inferior para determinadas empresas no interior, etc., etc., mas não é disso que estamos a falar, estamos a falar, obviamente, dos grandes grupos e, portanto, dos valores de 25% e 20%. Gostava de ouvir a sua opinião sobre esta questão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, o facto de o CDS não estar presente dá-nos um pouco mais margem de manobra nesta reunião.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, permita-me, se não se importa, que deixe aqui um aviso público em relação ao CDS. Aliás, a mesa já o devia ter feito e por isso me penitencio, fazendo-o neste momento.
O CDS, por razões que têm a ver com o atraso de aviões, estará mais tarde nesta reunião e, nessa altura, ser-lhe-á dado o tempo correspondente à primeira intervenção.
Pode continuar, Sr. Deputado.
O Orador: — Bom dia, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado.
Sr. Ministro, quero começar por lhe perguntar se sugere alguma alteração ao Orçamento, ao Relatório, à documentação que o Governo enviou à Assembleia.
Faço-lhe esta pergunta não só porque alguns dos números do Orçamento estão contraditados por outras instituições do Estado — acabou de ser referido o caso da inflação, nada mais direi sobre isso, é um assunto suficientemente importante — mas também porque o próprio discurso do Governo parece estranho.
O Primeiro-Ministro, por exemplo, no debate da semana passada, insistiu em indicar taxas de desemprego que não são as que o Governo escreve no seu relatório. O Governo fala de uma taxa de 7,5%, o PrimeiroMinistro fala de uma de 7,3%, e eu gostava de saber em que é que ficamos, que informação é que o Governo
Página 8
8 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
pretende dar a esse respeito, se quer corrigir, se quer manter, se foi o Primeiro-Ministro que se enganou, se foi o Relatório que se enganou, ou seja, o que é que se passa a este respeito. Tanto mais que há algo de surpreendente no Orçamento, que é facto de ter dois discursos diferentes: tem o discurso do optimismo e tem o do pessimismo, tem o da expansão e tem o da restrição.
Num episódio muito citado, dizia o Ministro da Economia que a crise já está para trás de nós. No entanto, o Orçamento insiste em invocar uma cláusula de crise económica, ou seja, de excepcionalidade, para que as transferências para a segurança social, para a capitalização, sejam menores ou iguais do que 2%. O cenário macro é mais positivo do que o que o Governo tinha admitido para 2006, mas não tem diferença para 2007, e nos dois anos é também ainda um cenário restritivo.
Dito isto e ficando à espera do seu esclarecimento, sobre o texto tal como está quero colocar-lhe três questões concretas e confrontá-lo também com duas propostas.
A primeira questão é sobre benefícios fiscais. O Governo anunciou que este ano faria uma proposta à Assembleia da República de uma revisão do conjunto dos benefícios fiscais. Isso foi apresentado com grande insistência e seria uma boa notícia, porque precisamos de modernizar e de rever o sistema de benefícios fiscais — entende-o esta bancada desde sempre e muitos fiscalistas de outras opiniões —, no sentido de simplificar, de tornar mais transparentes, mais evidentes, mais controláveis, mais simples, portanto, os benefícios fiscais. No entanto, não é isso que faz este Orçamento.
Aliás, já seria má técnica legislativa, seria confuso e provavelmente errado, que fosse no Orçamento que se fizesse todo o trabalho da revisão dos benefícios fiscais – da Lei Geral Tributária, do Estatuto dos Benefícios Fiscais e de outra legislação. Parece que o Partido Socialista nos anuncia que é assim. O relatório aprovado na Comissão de Orçamento e Finanças diz que o Governo avançou e concluiu o processo de alteração dos benefícios fiscais. Portanto, o entendimento do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que será provavelmente o do Governo — e gostava de o ouvir a esse respeito —, é o de que nada mais a fazer se não a republicação e, portanto, a consolidação da legislação. Se não for assim, melhor, porque creio que era importante que tivéssemos essa discussão e esse trabalho, mas não parece ser o que a maioria entende.
Desse ponto de vista, a autorização legislativa que nos é apresentada, das duas uma: ou é republicar e, portanto, nada mais de novo tem em relação às normas já existentes, ou é de fazer um novo quadro legal dos benefícios fiscais, e isso exigiria um esclarecimento e não deve ser feito no Orçamento.
Ora, uma das normas da política sobre benefícios fiscais que aparece neste Orçamento é a alteração, no artigo 83.º, do artigo 14.º da Lei Geral Tributária, que determina que os benefícios fiscais deixam de ter um prazo de vigência de cinco anos para passarem a ser estáveis, passando a ser perpétuos enquanto a lei o determinar. O Sr. Ministro ainda não teve ocasião de explicar esta alteração, porque esta alteração vai exactamente no sentido contrário a tudo o que se poderia esperar sobre a evolução dos benefícios fiscais.
A segunda questão desta natureza que eu queria colocar-lhe é sobre o que o Primeiro-Ministro anunciou no Plenário. Não discutimos isso nesta Comissão porque era um «segredo» que o Governo tinha para o Plenário. O Primeiro-Ministro apresentou duas medidas novas: a primeira é anunciar que vai fazer aquilo que não precisa nem de legislação nem de qualquer disposição, que é um controlo sobre as empresas, uma inspecção insistente sobre as empresas que declaram mais de um milhão de prejuízos no ano transacto.
É um bom anúncio. Isso é o que deve ser feito em qualquer circunstância, sobre essas e sobre outras que reiteradamente têm prejuízos e não pagam IRC, é o que deve fazer a administração tributária, enfim. Mas não se compreende bem por que é que, no Orçamento, o Primeiro-Ministro anuncia que vai fazer agora o que se esperaria que um governo fizesse sempre.
Mas a segunda medida deixa-nos uma obrigação de esclarecimento aqui e, aliás, o Deputado do Partido Socialista já levantou essa questão. O que é que o Governo quer exactamente sobre o controlo do planeamento fiscal e sobre a declaração ex ante sobre o planeamento fiscal? Em primeiro lugar, esclareçamos uma coisa: o Governo já não pode fazer alterações ao Orçamento, portanto, tem de propor ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista que as faça; o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pergunta ao Governo o que é que tem a dizer a este respeito. Portanto, estamos aqui com «uma pescadinha de rabo na boca». O que é que o Governo quer? O Governo tem de propor, e deve discuti-lo agora, na especialidade, aquilo que o Primeiro-Ministro apresentou para sabermos o que é que vamos votar no Orçamento, porque tem de vir a voto no Orçamento.
Digamos que seria transparente, do ponto de vista democrático, que, na última reunião que temos com o Ministro das Finanças para discutir esta questão, a proposta do Governo, por via do Partido Socialista e que o Partido Socialista pergunta ao Governo, pudesse ser apresentada. Isto para nós a podermos discutir, pois, caso contrário, só temos o debate em Plenário, quando aí chegarmos.
Mas vamos ao fundo da questão. Diz-se, nas palavras do Primeiro-Ministro (e o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Secretário de Estado deram indicações nesse sentido, de outra legislação europeia, na Inglaterra, na Irlanda e noutros países, que seguem esta estratégia), que se trata de obter uma declaração antecipada obrigatória ou imediata aos actos de planeamento fiscal sobre o que é que as instituições financeiras pretendem operacionalizar quanto a propostas ou decisões dos seus clientes.
Página 9
9 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Muito bem, é importante que assim seja. Mas penso que temos de ter o cuidado de separar claramente o campo em que deve actuar prioritariamente a administração fiscal; caso contrário, entraremos numa floresta em que se vêem muitas árvores mas não se descobre rigorosamente nada.
Um PPR é planeamento fiscal e há muitas outras formas de planeamento fiscal. Portanto, o que pretendemos saber é como é que o Governo quer tipificar operações que sejam destinadas à diminuição dos impostos utilizando a lei para contornar as obrigações fiscais.
Mas o problema, Sr. Ministro, é que não há só esta forma de planeamento fiscal, há também outras formas, que são de evasão fiscal, e a fronteira não é muito nítida nas operações que conhecemos.
O Bloco de Esquerda proporá, no debate em Plenário, uma alteração no sentido de definir com rigor que as obrigações de comunicação devam ser, entre outras, a da comunicação de movimentos transfronteiriços de capitais acima de um pequeno montante. E queremos saber da abertura do Governo para acolher esta proposta porque, tal como vemos a prática fiscal de outros países e tal como vemos as operações de triangulação que permitem um planeamento fiscal agressivo, a única norma que permite a clareza da comunicação de todas as entidades financeiras é este tipo de declaração. Todas as operações que sejam colocadas em qualquer praça financeira exterior, seja ela regime fiscal privilegiado, offshore ou não, qualquer forma de transferência de capitais para além fronteiras deve ser declarada e verificada pelas instituições tributárias, a partir de um montante razoável. Portanto, queremos saber se é a este tipo de operações que o Governo se refere ou se é a outras.
Resta ainda acrescentar que qualquer norma que se aplique deste ponto de vista implica um alargamento do dever de informação e, portanto, uma derrogação do segredo bancário. Até agora, a bancada do Partido Socialista e o Governo só tinham querido alterar as regras do segredo bancário no estrito caso das reclamações e das impugnações, quando vários grupos parlamentares neste Parlamento, entre os quais o Bloco de Esquerda e outros, temos vindo a defender que essa deve ser a regra da verificabilidade das declarações dos sujeitos passivos, nomeadamente no IRS, coisa que tem tido o obstáculo do Partido Socialista.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Já está levantado!
O Orador: — Não, não está! O que quer dizer que não querem fazer rigorosamente nada, mas, enfim. Sabe, «pôr palas à frente dos olhos» não é nunca um bom caminho para avançar.
Portanto, o que eu queria saber do Governo — e não tanto do Deputado Victor Baptista, que, nestas matérias se agita rapidamente — é como é que entende este efeito concreto.
Última questão, Sr. Ministro das Finanças. Ontem, a Ministra da Educação disse que não queria colocar professores em supranumerários. Pensamos que seja difícil fazê-lo na saúde e queria voltar a confrontá-lo com a questão com a qual é confrontado em todas as reuniões: como é que o Governo pretende obter, no conjunto da Administração Pública, a redução de 400 milhões de euros nos salários e como é que planeia, ao longo do próximo ano, aplicar a regra do regime especial da mobilidade para conseguir esse efeito e, agora, em que ministérios, visto que não é no ministério da educação e, presumivelmente, é nos outros. Queria que nos desse esclarecimentos sobre isso, porque esse é talvez o aspecto mais importante deste Orçamento e sobre o qual o Governo ainda nada nos disse.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio, informando o Sr. Deputado que dei público conhecimento das razões do atraso que teve.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Evidentemente que começo por, na sua pessoa, pedir desculpa por este atraso, ainda por cima com uma situação difícil que é a de não ter culpa dele, e ainda por cima, como membro da oposição, nem sequer a poder imputar ao Governo — o que seria sempre bom —, porque o nevoeiro em Lisboa e atrasos de hora e meia nos aviões ainda não estão no cardápio das competências do Governo nem da oposição …
Risos.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não se sabe! Eu não seria tão peremptório nessa afirmação!
O Orador: — E, portanto, estaremos todos bem em relação a essa matéria.
Mas, entrando naquilo que, evidentemente, mais nos interessa e que não são as razões do meu atraso, o Grupo Parlamentar do CDS considera que este debate se deve centrar fundamentalmente na matéria da receita, estritamente na matéria da receita fiscal, porque já muito debatemos em relação ao cenário macroeconómico, em relação à despesa, em todo o debate na generalidade.
No entanto, Sr. Ministro — que aproveito para cumprimentar —, não poderia deixar de começar por questioná-lo em relação a uma matéria que me parece importante.
Este Orçamento foi apresentado como um Orçamento de uma enormíssima aposta na área da ciência.
Salvo erro, em relação à matéria da ciência, temos um aumento de dotação de 63% – não sei se estarei a
Página 10
10 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
dizer um número errado, mas, pelo menos, é este o número que aqui tenho de memória. Porém, temos assistido, nos últimos dias, quase um por dia, às queixas dos reitores das nossas universidades.
Ora, sabendo nós que o Ministério é da Ciências também é do Ensino Superior, aquilo que pretendíamos saber da parte do Governo e no plano financeiro, é qual é a estratégia para esta área, porque ainda no ano passado pudemos ouvir, da parte do Governo, a ideia de prémios de mérito para as melhores instituições do ensino superior e o que vemos é que são precisamente essas que estão a queixar-se de uma forma amarga.
Ainda ontem pudemos ouvir a Sr.ª Reitora da Universidade de Aveiro, Prof.ª Helena Nazaré, a dizer que, com grande probabilidade, não tem dinheiro que chegue para os salários durante o próximo ano e a questionar o Governo em relação à estratégia para a área em causa.
Entrando nas matérias de natureza fiscal, aquilo que começamos por notar é que este ano há, a nível de artigos, um maior aumento de alterações do que existiu, por exemplo, no ano passado. Ora, sabendo nós que um dos princípios fundamentais em relação a esta matéria é não só o da simplicidade mas também muito o da estabilidade, para que os agentes económicos possam fazer a sua previsão em relação aos custos que vão ter no ano, para que possa existir alguma estabilidade de médio e de longo prazo em relação a todos os contribuintes, não nos parece que (acho que o nível de alterações ultrapassa as 150, fora as revogações e artigos novos) esta seja a melhor maneira.
No entanto, há algo que se nota, que é o conjunto de alterações em relação ao Estatuto dos Benefícios Fiscais. E esse conjunto de alterações é feito, desde logo, porque no ano passado, aquando da discussão do orçamento, votámos uma autorização legislativa para uma revisão geral do mesmo.
Portanto, entroncando com a questão da estabilidade, que é necessária, o que pretendia saber é se é esta a revisão geral do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Isto é, se o que nos é apresentado no Orçamento corresponde à grande modificação, porque quando vamos comparar o que consta no documento do grupo de trabalho com as alterações verificamos que há enormíssimas diferenças. É claro que um grupo de trabalho é de natureza técnica e as respostas legislativas são coisas distintas, mas era importante que se soubesse desde já se não vamos ter posteriores modificações em relação à matéria do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Curiosamente, tendo-se feito um conjunto de grandes alterações em relação ao Estatuto, deixa-se quase intocado o regime específico dos fundos de investimento mobiliário e imobiliário – salvo erro, o artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Acredito que o Sr. Ministro já leu este artigo e convidava-o relê-lo, porque é um emaranhado de remissões de um lado para o outro, um texto complicadíssimo em relação a uma matéria que necessitava de uma enormíssima simplicidade. A sua aplicação não é fácil e, portanto, não é fácil compreender qual o regime que está previsto.
Queria questionar o Sr. Ministro em relação a uma modificação que é feita precisamente quanto a estes fundos de investimento imobiliário. Quando estamos a falar de fundos fechados de subscrição particular determina a proposta de lei do Orçamento uma diminuição dos benefícios.
Bem sei que se referiam várias vezes situações de abuso em relação à utilização desses mesmos benefícios. Mas será que isso necessitava de uma alteração de natureza legal? Não bastaria uma melhor fiscalização em relação às situações de abuso? Porque, no fundo, aplica-se aquele princípio de que «pagam os justos pelos pecadores» e muitos daqueles que utilizavam este sistema – ele próprio também como um sistema de administração e investimento, porque tinha as duas vertentes – deixam de poder fazê-lo com as alterações que este Orçamento tem.
Queria ainda dizer ao Sr. Ministro que concordamos com a opção feita em relação aos acordos prévios quanto aos preços de transferências. Mas estamos a falar desta autorização de natureza legislativa, que ainda por cima seria necessário precisar melhor, porque cria dúvidas. O que pretendemos saber é o seguinte: na lógica e na planificação que o próprio Governo tem em relação ao próximo ano, quando é que pretende utilizar esta autorização legislativa? Coloco esta questão porque ela é importante para os agentes económicos. Se for utilizada, como, por exemplo, foi a do Estatuto dos Benefícios Ficais, meramente no fim do ano é uma situação; se for utilizada mais para o início do ano temos, claramente, uma outra situação.
Pretendíamos igualmente saber qual o sentido que se pretende dar a esta autorização legislativa quanto aos acordos prévios, porque concordamos com a ideia de que é melhor um bom acordo do que uma má demanda.
Colocamos essa questão precisamente por isso e porque sabemos a situação que existe nos tribunais administrativos e fiscais em Portugal, que é uma das grandes causas de falta de competitividade para as nossas empresas e para aqueles que pretendem investir em Portugal. E porquê? Porque estes tribunais estão verdadeiramente atulhados de trabalho e os seus juízes dizem publicamente – pude ouvir eu e também já o Sr. Secretário Estado – que não têm os meios necessários para fazer todo o trabalho.
Por isso mesmo, o CDS vai apresentar, na especialidade, uma proposta em relação a esta matéria. Já a fez no ano passado mas, talvez por ter sido uma das propostas finais, não houve a possibilidade de discutir esta matéria com o Governo como quereríamos. Porém, pretendemos que entre, cada vez mais, na matéria fiscal o princípio da resolução alternativa dos litígios, seja por via de mediação, seja por via de arbitragem.
Não é aceitável que as empresas, quando têm que impugnar, cumpram a regra, maioritariamente, de prestar uma garantia, que a garantia entretanto caduque e a questão continue no tribunal ainda durante muito
Página 11
11 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
tempo. E posso dizer-lhe que, estatisticamente, sempre que temos grandes litígios em tribunal nesta matéria, são as empresas que têm saído com vencimento e não tanto a Administração fiscal.
Uma forma de mediação fiscal criaria mais facilidade em relação à resolução do litígio, ele seria resolvido mais cedo e a solução seria melhor quer para o Estado quer para os particulares: para o Estado porque ele próprio não teria, possivelmente, que despender tanto quanto tem de despender com o andamento de toda a questão em tribunal, e para os particulares porque resolveriam bem mais cedo as suas questões com a Administração.
Além disso, queria dizer-lhe que achamos que é um sinal confuso aquele que se dá em relação à questão do abuso de confiança fiscal, em que, no fundo, se parte do princípio de que quando se paga o crime fica sanado. Achamos que, em relação a esta matéria, se estão a dar sinais contraditórios quanto ao que deve ser a aposta, que apoiamos muitíssimo, de combate à fraude e evasão ficais e situações como estas.
Mas nós, para além do conjunto de medidas que temos para a fiscalidade das empresas, temos igualmente medidas para a fiscalidade das famílias. E ouvimos o Sr. Ministro, num programa televisivo, dizer que essa era uma matéria importante.
Em relação a isso, temos uma proposta, que é a seguinte: actualmente, temos uma divisão do rendimento feita pelo quociente conjugal e o que pretendíamos era que ela se fizesse não com base no quociente conjugal mas com base num quociente familiar. Ou seja, em vez de se fazer uma divisão por dois, dava-se um peso, em relação a cada filho, de 0,1%. Era apenas um sinal. Não teríamos, possivelmente – ainda vamos fazer melhor essas contas –, uma quebra muito grande na receita e dávamos um sinal às famílias portuguesas.
Aliás, um sinal que também é necessário em relação à matéria dos abatimentos, porque está previsto um abatimento para as pensões de alimentos pagas por divorciados, ou seja, para a pensão de alimentos que um dos cônjuges tem de pagar na sequência do divórcio. Além do mais, para quem recebe esse rendimento, ele não é considerado a nível de tributação e temos, aqui, uma situação de total desigualdade para com os casais casados e com dependentes.
Posso dizer-lhe, Sr. Ministro, que se considerarmos um casal com três dependentes que tenha um rendimento anual bruto na ordem dos 70 000 € e igual situação quando há um caso de divórcio e uma pensão de alimentos no valor de 8 300 €, aproximadamente, o casal casado paga o dobro do imposto em relação ao casal divorciado com três dependentes. Esta é uma situação de tal desigualdade que há até quem a considere contrária à Constituição. Vamos fazer propostas para modificar este regime e queríamos saber, por parte do Sr. Ministro, qual a abertura do Ministério das Finanças em relação a esta matéria.
O Sr. Presidente: — Têm, agora, a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças e, naturalmente, os Srs. Secretários de Estado, se assim o desejarem, para responderem em bloco às questões suscitadas.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, farei um breve comentário a algumas das questões colocadas e, depois, pedirei aos Srs. Secretários de Estado, em particular o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que esclareça muitas das questões que sobre esta matéria foram apresentadas.
Gostaria de começar por tecer algumas considerações sobre as questões suscitadas a propósito da fiscalidade no sector financeiro, em particular na banca, e as relacionadas com o sigilo bancário e com as iniciativas que o Governo apresentou neste domínio.
Em primeiro lugar, gostaria de tornar claro que o Governo não olha com qualquer preconceito, contrariamente ao que alguns partidos parecem denotar, os lucros que a banca apresenta. Creio que é importante para o País, para o desenvolvimento da economia, que tenhamos um sistema financeiro sólido, rentável, competitivo e que, por isso, merece a confiança dos portugueses.
Já o disse, e repito aqui, que pessoalmente não ousaria, e creio que também nenhum dos Srs. Deputados, confiar as poupanças a um banco que desse prejuízos.
O que é importante, isso sim, é que os bancos tenham um tratamento fiscal que não seja diferenciado dos demais sectores de actividade e que, por isso, devam também contribuir na proporção dos lucros que obtêm para as receitas do Estado, tendo em vista promover as políticas públicas que temos que prosseguir. E é tãosó isto que move o Governo nas medidas que apresenta quanto a este sector.
São medidas importantes não só no que refere à alteração dos regimes de retenção na fonte, ou até mesmo de isenção, nalguns casos de tributação de distribuição de dividendos, levando a situações que chamamos de dupla não tributação, mas também no que se refere à alteração do regime de aprovisionamento, ou de certas provisões, para efeitos fiscais. Designadamente a alteração do tratamento fiscal de provisões quer para menos-valias quer para créditos com garantia real parece-nos ter um impacto muito significativo no aumento da matéria tributável neste domínio, com um efeito na receita fiscal.
Também não podemos de forma alguma ignorar que é no sector financeiro, pela globalização neste existente, pelo elevado grau de inovação e de sofisticação que existe na montagem de operações e pelo acesso fácil a mercados e a praças no exterior, e não ignorando também a existência de offshore a nível internacional, repito, é no sector financeiro onde a probabilidade de ocorrência de operações de planeamento fiscal mais agressivas, roçando mesmo a fronteira da legalidade, poderei até dizer, deve merecer uma atenção especial.
Página 12
12 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Por isso mesmo, parece-nos importante que haja aqui uma atitude diferente e uma atenção muito especial da administração fiscal no acompanhamento de operações financeiras que se enquadrem em acções de planeamento fiscal que poderão configurar processos de evasão fiscal, para não falar até, eventualmente, de situações de fraude fiscal.
É este o sentido da iniciativa que foi enunciada e que não procura, obviamente, acompanhar os movimentos de capitais de todo e qualquer cidadão ou operações transfronteiriças, porque, sinceramente, Sr. Deputado Francisco Louçã, e aqui respondo à questão que suscitou, creio que será excessivo termos um sistema de acompanhamento, de monitorização de todo e qualquer movimento de capital transfronteiriço de qualquer cidadão. Não é isso que está em causa! Não queremos ter aqui um sistema de big brother, que é, no fundo, aquilo que propõe neste domínio, queremos, isso, sim, estar atentos às operações que, obviamente, têm maior probabilidade de configurar situações de evasão ao fisco, mas não querermos ir longe demais, impondo um sistema que acabaria por prejudicar a própria liberdade de movimento de capitais que deve existir numa economia aberta como a nossa.
Gostaria também de referir que não estamos preocupados com aplicações que, obviamente, trazem benefícios fiscais, legítimas e previstas na lei, como os PPR ou outras. Não é isso que está aqui em causa, o que está aqui em causa são operações muito significativas, de engenharia financeira, muitas vezes altamente complexas, com triangulações, como se costuma dizer, com a criação até de instrumentos e de produtos financeiros novos, que possam visar, tão-só, um efeito fiscal. É nestas que nos concentraremos, não vamos andar atrás de toda e qualquer aplicação financeira que possa trazer um benefício fiscal previsto na lei a um vulgar cidadão. Não é isso que nos move e, portanto, quanto a esta matéria, quero tranquilizar os cidadãos e os contribuintes portugueses.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Mas é para votar neste Orçamento, Sr. Ministro!
O Orador: — No que se refere à questão que foi suscitada a propósito da reforma da Administração Pública, também gostaria de tornar claro que esta é, sem dúvida, uma reforma que reputamos importante e é um dos pilares de todo o processo de consolidação orçamental previsto no Programa de Estabilidade e Crescimento. Recordo que a reforma do sistema de segurança social dos funcionários públicos e do regime geral é um dos pilares; as alterações introduzidas no que se refere à convergência dos subsistemas de saúde é também um pilar importante; acabarmos com regimes especiais de aposentação, altamente mais beneficiados, bem como com regimes especiais de assistência na saúde, é outro pilar, mas, de facto, o pilar fundamental é o da reforma da Administração Pública.
A este propósito, gostaria de deixar claro, de uma vez por todas, como, aliás, já tive oportunidade de dizer nesta Assembleia, que me recuso a partir para esta reforma como quem vai contar cabeças e identificar um certo número de funcionários dos quais a Administração se tem de ver livre.
Recuso-me a essa atitude, porque o objectivo desta reforma da Administração Pública é, em primeiro lugar, o de melhorarmos o funcionamento da nossa Administração, que é objecto de muitas críticas dos próprios utentes, quanto a burocracia, morosidade e até falta de qualidade no atendimento, mas também o de a melhorar no que se refere às condições que oferece aos seus funcionários, em termos de prestação de trabalho.
Creio que não é, de todo em todo, aceitável que tenhamos uma Administração Pública que se baseia num paradigma segundo o qual um funcionário entra, tem um emprego garantido e não é mais sujeito a uma avaliação criteriosa, objectiva, na base da qual assente a sua progressão na carreira. Basicamente, temos uma Administração em que as pessoas entram nas carreiras e basta que o tempo passe para que progridam, sem quaisquer exigências adicionais de desempenho e até de conteúdos funcionais, quanto às tarefas que têm de executar.
Recusamo-nos a manter este estado de coisas e queremos, de facto, mudar a nossa Administração para uma Administração que tenha, efectivamente, um sistema de vinculação, carreiras e remunerações que avalie o desempenho, reconheça o mérito dos funcionários e os premeie, nessa base, quer em termos salariais, quer em termos de progressão na carreira. Não nos parece que os automatismos de progressão sejam algo de justificável numa economia e numa Administração que entendo que tem de ser exigente. E exigir é, de facto, também avaliar a prestação e o desempenho das pessoas.
Por isso mesmo digo que esta reforma da Administração não é uma reforma contra os funcionários, mas é, sem dúvida, contra aqueles que entendem que não têm de ter um bom desempenho, que o mérito não interessa e que basta, pura e simplesmente, ter entrado na função pública, porque nada mais lhes pode ser exigido para que progridam automaticamente — contra estes é, não tenhamos dúvidas! Obviamente, esta reforma visa estimular os funcionários, e são muitos, que vêem, com certeza, na função pública, a possibilidade de uma carreira que os dignifique, que os prestigie e na qual estão empenhados. É nestes funcionários que estamos a pensar e são estes que queremos apoiar e prestigiar.
Finalmente, queremos uma reforma da Administração Pública que não ignore a necessidade de redimensionarmos a Administração. Temos uma Administração que é, de facto, onerosa para os contribuintes, pelos custos que implica, e que, contrariamente ao que acontece noutros países da União Europeia, tem vindo a onerá-los cada vez, dado que o peso dos seus custos no PIB tem vindo a aumentar, ao contrário, por compa-
Página 13
13 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
ração, do que se tem vindo a passar ao nível da União Europeia, onde tem havido um esforço de redução do peso da Administração Pública, que nós não temos acompanhado. E se queremos ter uma economia mais eficiente e mais competitiva temos de ter também uma Administração Pública que seja, ela própria, mais eficiente, que combata o desperdício, que combata a ineficiência.
Por isso mesmo, é importante reorganizar a Administração, que é o que estamos a fazer com o PRACE, reafectando os recursos de que dispõe, designadamente os funcionários, através dos mecanismos de mobilidade previstos na lei, reduzindo a sua dimensão — não o escondo! —, fundindo ou extinguindo serviços e, obviamente, sempre que necessário, não sendo possível a reafectação, colocando os funcionários em situação de mobilidade especial.
Agora, uma coisa é certa, recusamo-nos a abandonar os funcionários que se venham a revelar não capazes de ser reafectos a uma actividade. Isto é, se, no âmbito dos processos de reorganização, de racionalização, houver um conjunto de funcionários relativamente aos quais não sejamos capazes de os reafectar a outras funções, teremos de apostar na sua requalificação, teremos, obviamente, de tomar iniciativas no sentido de promover a sua reafectação; enquanto isso não for possível, eles permanecerão numa situação de mobilidade especial e não os abandonaremos. Por isso, assumimos o compromisso de continuar, por um lado, a manter o pagamento de um salário e, mais, dar-lhes a oportunidade de poderem desenvolver uma actividade alternativa no sector privado.
Esta solução é inovadora e é francamente mais favorável para os funcionários, em comparação com algumas alternativas que têm vindo a ser sugeridas, como, por exemplo, a das rescisões amigáveis, que tantas vezes tem vindo a ser adiantada.
Sr. Deputado Honório Novo, quanto à questão dos auxílios financeiros para as autarquias, que suscitou, gostaria de referir o seguinte: com efeito, estamos muito aquém de utilizar plenamente a verba dos 200 milhões prevista no Orçamento para este ano e os auxílios que têm vindo a ser prestados têm sido objecto de publicação no Diário da República. Ainda há cerca, talvez, de duas semanas, pouco mais ou menos, várias publicações foram efectuadas, dando conta de auxílios concedidos. Continuaremos, até ao fim do ano, a fazêlo e o Ministério das Finanças promoverá essa publicação, de acordo com a informação que lhe vai sendo prestada pelos Ministérios que venham a efectuar esses auxílios.
Quanto às alienações de imóveis, gostaria de dar a seguinte informação: já foi enviado para a Assembleia, em inícios de Setembro, um relatório referente às operações do 1.º semestre deste ano e, com certeza, iremos também apresentar o relatório referente ao 2.º semestre, que ainda está em curso.
Se a proposta de lei de Orçamento para 2007 não inclui uma disposição de obrigatoriedade de prestação de informação à Assembleia é porque está a ser preparada uma nova lei sobre a gestão do imobiliário, mais propriamente sobre a gestão do património do Estado, a qual será submetida a esta Assembleia, visando, de facto, proceder à reforma do enquadramento jurídico no domínio da gestão do imobiliário público. Nessa lei, estão previstas obrigações de informação, sendo desnecessário estar a introduzir, anualmente, na lei do Orçamento, uma norma que imponha essas obrigações. Isto será feito de forma permanente, numa lei própria sobre o imobiliário do Estado.
Quanto à questão do endividamento municipal parece-nos que o conjunto de normas presentes no Orçamento é suficiente para clarificar quais as obrigações ou, mais propriamente, quais os limites de endividamento município a município. As autorizações previstas em termos de intervenção dos ministérios parecem-nos também suficientes. Aliás, por isso mesmo é que as normas têm a redacção que têm.
Quanto à inflação prevista, Sr. Deputado, tive já oportunidade de dizer, na semana passada, na Assembleia, que não vemos qualquer razão para que se proceda a uma revisão da inflação esperada para o ano de 2007. O INE anunciou, como é sabido, uma alteração do índice de preços que tem vindo a publicar, alteração essa que faz com que esse índice dê um «salto» no seu valor mas que não afecta o ritmo de evolução do índice ao longo do tempo, portanto não afecta a sua taxa de crescimento. E quando falamos de inflação falamos da taxa de crescimento deste índice.
Apesar dessa correcção, que é um movimento pontual do índice, tal não implica que o seu andamento no futuro venha a ser alterado em virtude do «salto» introduzido no ano de 2006. Por isso mesmo, entendemos que não há razões para alterar a nossa taxa de inflação.
Recordo ao Sr. Deputado que não temos quaisquer razões para prever que no próximo ano iremos ter um comportamento do preço do petróleo como tivemos este ano e que nem iremos ter no próximo ano o impacto de alteração da taxa do IVA que também se fez sentir no ano de 2006. E basta para já mencionar estes dois factores, Sr. Deputado, para perceber, se assim o entender — pode não querer perceber, e também está no seu direito —, por que o Governo entende que a inflação, no próximo ano, situar-se-á nos 2,1%.
Quanto à inflação observada em 2006, acho que fui suficientemente claro nesta Assembleia na semana passada quando disse que em relação a esta matéria o Governo respeitará os números oficiais da inflação que venham a ser publicados pelas entidades oficiais a quem compete a publicação dessa taxa.
Sr. Deputado Francisco Louçã, parece-me que V. Ex.ª também não quis perceber os números do desemprego que o Sr. Primeiro-Ministro referiu e os números reportados no Orçamento. Aliás, acho que o Sr. Deputado percebe bem qual é a diferença, quer é dar a entender que há uma diferença ou que há aqui uma confusão, quando não a há.
Página 14
14 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Sr. Deputado, o que o relatório aqui refere é a taxa de inflação média do ano de 2006 e de 2007. E a taxa de 7,6% de desemprego aí referida é a taxa anual média de desemprego.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Então, faça as contas!
O Orador: — O Sr. Primeiro-Ministro contextualizou muito bem a sua referência à taxa de desemprego quando mencionou o número 7,3%. O Sr. Primeiro-Ministro disse que em Junho deste ano a taxa era de 7,3%.
Estava a referir-se à taxa do segundo trimestre deste ano, não à taxa média anual.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — É? Em Junho a média anual é 7,6%?
O Orador: — O Sr. Deputado também não quis perceber e, fingindo que não percebeu, quis dar aqui a entender que há alguma confusão com os números.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Mas os senhores é que escreveram que era de 7,6%!
O Orador: — Poderemos chegar a uma média anual que até pode ser inferior a essa. Aliás, também foi dito aqui, Sr. Deputado, que a taxa de desemprego até pode, eventualmente — e aí convido-o a consultar o registo das intervenções —, ser inferior a 7,6%. E, por isso mesmo, este ano, pela primeira vez desde 2001, iremos ter uma redução da taxa de desemprego. Foi dito aqui, Sr. Deputado! Relativamente à questão do planeamento fiscal creio que já clarifiquei em parte essa matéria e deixarei ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a possibilidade de adiantar mais alguns pormenores.
Já agora, gostaria de comentar a intervenção do Sr. Deputado Diogo Feio. Quanto à questão da aposta na ciência e na tecnologia e às queixas das universidades começaria por pedir ao Sr. Deputado que não confundamos ciência e tecnologia com ensino superior. Há, de facto, uma aposta na área da ciência e da tecnologia, há um reforço considerável das verbas do PIDDAC orientadas para este domínio, mas o esforço de consolidação orçamental que é pedido a todas as administrações, à administração central, à administração local e regional e também aos fundos e serviços autónomos passa pelas universidades. Daí que a transferência feita do Orçamento do Estado para as universidades seja também objecto de uma redução, forçando as universidades a melhorar o seu rigor orçamental e a eficiência com que usam os seus recursos.
Sei que o Sr. Deputado conhece o meio universitário — se calhar, melhor do que eu, porque ultimamente, dadas as funções que desempenho, não andarei tão próximo das universidades — e também reconhece que há aí muito campo onde o rigor e a disciplina orçamental podem traduzir-se em economias significativas e em redução de gastos. E é isto que se pede às universidades. Mais: pede-se isso às universidades sem reduzir o apoio aos alunos universitários.
O Orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não contempla quaisquer reduções dos apoios previstos para os alunos universitários, que continuarão a ser apoiados como antes. Porém, é preciso melhorar a gestão e a eficiência das nossas universidades, e há muito onde melhorar, há que o reconhecer. É este desafio que se pede aos responsáveis e às equipas responsáveis pela gestão universitária.
Antes de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais há uma matéria que referiu e que merece ser ponderada, que tem que ver, no domínio da fiscalidade da família, com algumas situações que apontou como de tratamento desigual.
Devo reconhecer que entendo, de facto, que temos de olhar para estas situações e de encontrar soluções que atenuem essas desigualdades e que, tanto quanto possível, as possam eliminar. Mas não ignoro, de facto, a situação de dificuldade que temos de, num contexto de consolidação orçamental, muitas vezes podermos avançar com medidas que possam traduzir-se em despesa fiscal, o que poderá ser significativo. É isso que temos de ponderar, é isso que temos de analisar mas, havendo margem de manobra para procedermos a essas correcções, não tenha dúvidas, Sr. Deputado, que aquilo que for justo tem de ser, e será, feito.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (João Amaral Tomaz): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, tenho agora oportunidade de tentar responder a várias questões, a maioria bastante pertinentes, que me foram colocadas.
Começaria por responder ao Sr. Deputado Hugo Velosa e, depois, quando se tratar de questões comuns, responderei também às perguntas vindas de outras bancadas.
O direito de iniciativa é do PSD, de qualquer modo, em relação às três propostas que vão apresentar e que já foram discutidas aqui, permitia-me duas sugestões. A primeira delas refere-se à questão do goodwill. Penso, mas cabe à bancada decidir, que não pode ser esquecido que esta questão foi significativamente alterada nos últimos tempos pelas razões que o Sr. Ministro já teve oportunidade de referir. Posso errar na data porque
Página 15
15 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
não tenho aqui o apontamento, mas penso que foi no dia 22 de Março de 2004 que a Norma Internacional de Contabilidade n.º 2 foi revogada, tendo sido substituída pela norma de contabilidade n.º 36, pela International Financial Reporting Standards (IFRS) n.º 3 e já tinha sido revogada nos Estados Unidos, dois anos antes, pela Financial Accounting Standards Board (FASB) n.º 142. Portanto, penso que, efectivamente, seria de repensar e de insistir nesta tecla.
Quanto à segunda questão, sobre a quantificação da redução da taxa do IRC para as pequenas e médias empresas, já fizemos uma quantificação. Penso que vai ser muito difícil quantificar-se os efeitos do IMI. Tentámos fazer os cálculos e não conseguimos chegar a uma conclusão. Quando se propõe reduzir a taxa do IMI de 5% para 4% e de 2% para 1% não sabemos qual o efeito porque a decisão pertence ao município. Será que o município que tem neste momento uma taxa de 2% pode abdicar de 50% da receita e passar para 1%? Portanto, é extremamente difícil fazer qualquer quantificação neste domínio.
Quanto às autorizações legislativas, começaria pela do artigo 80.º, que tem que ver com o Estatuto dos Benefícios Fiscais e que se prende também com as questões que os Srs. Deputados Francisco Louçã e Diogo Feio levantaram.
Reconheço que, efectivamente, esta não foi a melhor solução em termos de apresentação à Assembleia da República, e não era a que pretendíamos, só que não haveria garantias de que o Estatuto dos Benefícios Fiscais, sendo discutido autonomamente, pudesse ser promulgado a tempo, dado o calendário que temos até final do ano. Daí ter-se optado pela solução menos bonita da sua integração no Orçamento.
Quanto ao conteúdo, ele não se altera, com a pequena nuance de ter de ser feita a republicação no início do próximo ano. De qualquer modo, queria que ficasse aqui bem claro o que entendemos por rever. Rever está utilizado na autorização legislativa no sentido de se introduzir correcções a gralhas que vêm do passado e também de aproveitar esta oportunidade para que algumas importâncias, alguns montantes que estão expressos em euros, arredondados até aos cêntimos, possam ser apresentados num arredondamento diferente. Portanto, são questões quase de cosmética, não de fundo.
Podemos dizer que aquilo que consta do Orçamento em termos de Estatuto dos Benefícios Fiscais era aquilo que o Governo queria apresentar num outro formato, mas em relação ao conteúdo é este o Estatuto dos Benefícios Fiscais revisto.
Quanto às normas internacionais de contabilidade e ao regime simplificado do IRC, esta é uma das áreas que está em evolução permanente. Neste momento, a tendência que existe a nível europeu, e não só, é a de se prever um regime simplificado dentro das empresas que têm contabilidade para as pequenas e médias empresas. Portanto, é nesta acepção que se faz a referência a contabilidade.
Assim, está aqui uma escolha clara de se optar não por regimes «forfetários» de tributação para as sociedades mas, sim, por regimes em que, utilizando uma base contabilística, se utilizam mecanismos simplificados de contabilidade semelhantes aos que existem, por exemplo, em Espanha, o chamado regime real simplificado, que é um regime de contabilização simplificado que tem exigências diminutas. Designadamente, em relação às amortizações, há uma taxa de amortização ou de reintegração genérica para todo o imobilizado, em vez de haver taxas específicas, regimes de provisões simplificados, etc. Portanto, penso que está de certo modo clarificado o que é que entendemos por regime simplificado na acepção que está na autorização legislativa.
Uma outra questão que foi colocada tem a ver com as energias renováveis. Em nosso entender, não há na proposta qualquer surpresa. A única alteração que existe tem a ver com revogar. Vamos, no entanto, ainda tentar introduzir, na discussão em sede de especialidade, uma pequena alteração, porque há alguma situações de experiências piloto que tinham uma vigência temporal, depois da autorização, de 12 meses e que ainda estão em curso. É que, a partir do momento em que se instituiu um regime regra para os biocombustíveis, não fazia sentido mantermos aquilo que era necessário na altura, que era um regime piloto, um regime de experiência. Portanto, neste momento, estamos praticamente em velocidade de cruzeiro. Aproveito para responder também à questão colocada pelo Sr. Deputado Honório Novo, na discussão anterior, que tem a ver com a razão pela qual aumenta tanto a despesa fiscal em relação aos biocombustíveis, que, penso, assim está perfeitamente esclarecida.
Queria também aproveitar para responder a várias questões que foram levantadas sobre o tema do planeamento fiscal, do qual o Sr. Ministro de Estado e das Finanças já fez a caracterização geral.
Antes de a proposta ter sido formalmente submetida à Assembleia da República, alguns analistas já estão a tentar destruir a ideia, fazendo mesmo referências a que quem subscrever um PPR fica abrangido por este regime. Não se trata de nada disso! Acontece que o combate a estas medidas evasivas começou noutros países há alguns anos e, quer queiramos quer não, a nossa realidade não se afasta muito daquilo que se passa nos outros países. O que é que interessa atacar? É a utilização abusiva de offshores, é a utilização abusiva de planeamentos fiscais, é a criação de produtos financeiros que mudam de nome conforme as circunstâncias e que servem, única e exclusivamente, para tornar nula ou quase nula a base tributável.
Aquilo que está por detrás desta ideia, que não é nossa, foi muito influenciado pela descoberta recente, no Reino Unido, que curiosamente passou quase despercebida na imprensa portuguesa, de uma fraude gigantesca no sector financeiro que abrangia uma situação de fuga aos impostos estimada em 1000 milhões de libras esterlinas. Em função da descoberta dessa situação de planeamento fiscal abusivo, que consistia em transformar dividendos em juros, o Governo inglês resolveu alterar um sistema que já vigorava desde 2004 e
Página 16
16 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
criou agora aquilo a que chama de new tax avoidance disclosure, que entrou em vigor no dia 1 de Agosto. A ideia básica é a de que há que separar quem é o promotor e quem é o utilizador de situações evasivas. O primeiro responsável é o promotor; quem cria a ideia, quem a vende é o principal responsável. O utilizador é também co-responsabilizado sempre que o promotor resida num paraíso fiscal ou, não residindo num paraíso fiscal, não tenha residência num país no qual o Reino Unido possa recolher directamente essa informação.
Já agora, não seguindo a ordem das questões, passo para a do combate à fraude e à evasão fiscais.
Como os Srs. Deputados sabem, podemos considerar que a estratégia que tem sido seguida é uma estratégia cirúrgica de tentar fazer face aos problemas mais prementes com que nos debatemos. Não podemos atacar tudo ao mesmo tempo. Temos de atacar aquilo que é possível atacar desde logo. Assim, a primeira iniciativa que este Governo tomou, neste domínio, foi atacar uma questão que o Sr. Deputado Francisco Louçã várias vezes referiu, extremamente importante, que é a utilização abusiva de prejuízos fiscais para pagar menos impostos. Pode parecer que não tem importância, mas esta é uma das questões fundamentais na quebra da receita fiscal. E temos outras situações extremamente graves, como facturas falsas, que continuam a existir no nosso mercado, fraude carrossel, etc.
O problema com que nos debatemos também — e, já agora, faço aqui um apelo às Sr.as e Srs. Jornalistas — é que, muitas vezes, estes temas não são tratados com a atenção que deviam. Há poucas condenações de prisão efectiva em Portugal. Cito, a título de exemplo, um caso extremamente grave de facturas falsas, chamado «caso de Fafe», que foi julgado há poucos dias. Apenas, o Jornal de Notícias, se não estou em erro, fez uma descrição com algum destaque relativamente àquela situação, que, no resto da imprensa, passou completamente despercebida.
Verificamos, pelo contrário, que aparecem sistematicamente notícias do género «Direcção-Geral dos Impostos sai derrotada», como a do caso de 10 milhões de euros que uma empresa não pagou, porque não quis levantar uma carta onde estava a notificação. Ou seja, a carta ficou na caixa de correio, num apartado postal, 15 dias, tendo ficado demonstrado que, durante aquele espaço de tempo, foram levantadas todas as cartas menos aquela.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Era muito pesada!
O Orador: — Apareceu, depois, na imprensa «Direcção-Geral dos Impostos sai derrotada neste confronto» e o caso arrastou-se, durante alguns anos, no tribunal. Penso que, nestes casos, aquilo que se devia dizer era que quem sai derrotada não é a Direcção-Geral dos Impostos, mas os contribuintes que têm de pagar aqueles 10 milhões de euros, porque os outros não pagaram. Quem sai derrotado, num caso como este, é o País.
No entanto, isto é corrigido neste Orçamento.
Existem algumas medidas cirúrgicas, que estavam previstas no Orçamento para 2006 e que constam também deste Orçamento, que visam precisamente evitar a prescrição e a caducidade dos impostos. No ano passado, os Srs. Deputados aprovaram, e bem, uma medida que faz com que, quando houver o julgamento da «Operação Furacão», haja a possibilidade de o fisco vir cobrar o imposto que aqueles contribuintes defraudaram. Se não fosse aquela alteração, tal como outras que constam deste Orçamento, nunca iríamos cobrar aqueles impostos.
O Sr. Deputado Francisco Louçã levantou ainda duas questões quanto à justificação da alteração do artigo 14.º da Lei Geral Tributária.
Como o Sr. Deputado sabe, o artigo 14.º contempla duas situações: os impostos e as quotizações para a segurança social. Este artigo funcionou sempre como uma mera intenção pia e, como tal, apesar de estar consagrado que os benefícios fiscais tinham uma validade de cinco anos, salvo se não houvesse uma definição expressa no respectivo diploma, na prática, o Decreto-Lei n.º 404/90 vigorou sempre, sucedendo o mesmo com outros diplomas. Portanto, não houve precedentes em relação a reconhecer a caducidade temporal da vigência dos incentivos.
Ao consagrá-los no Estatuto dos Benefícios Fiscais, está a dar-se um passo no sentido de que, se passado cinco anos não houver uma cláusula nesse sentido, o governo que estiver em funções na altura terá de tomar a decisão de submeter à Assembleia da República a renovação daquele incentivo, porque, caso contrário, caduca automaticamente.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não parece um argumento seu!
O Orador: — O argumento é precisamente esse! Alterou-se o artigo 14.º, porque, se apenas o revogássemos, deixaríamos de fora a segurança social. Foi por esta razão que a alteração feita, se não estou em erro, no artigo 83.º da Lei do Orçamento é precisamente neste sentido.
Quanto às questões levantadas pelo Sr. Deputado Diogo Feio, uma delas tem a ver com os acordos prévios vinculativos. Esta é uma questão essencial, porque também temos problemas de evasão e de conflito permanente entre a administração fiscal e os contribuintes. Só para terem uma ideia, o número de técnicos da Direcção-Geral dos Impostos especializados em preços de transferência é de cerca de metade do de qualquer consultora.
Página 17
17 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Precisa de mais funcionários públicos!
O Orador: — Portanto, estamos numa situação de menoridade total, pelo que temos de dar um passo no sentido de fixar previamente regras, em vez de utilizar o litígio em tribunal, porque em todos aqueles casos, para além da dificuldade em dirimi-los tecnicamente, há depois o problema de que normalmente estão envolvidos grandes montantes e não há uma situação em que o contribuinte, quando recebe a notificação, pague voluntariamente o montante; vai para tribunal e os processos arrastam-se. Parece-me que uma solução pragmática, como a que pretendemos tomar, vai neste sentido.
O âmbito dos acordos prévios vinculativos, que têm muito a ver com os preços de transferência, prende-se ou com os acordos unilaterais entre o contribuinte e a Administração ou com os acordos bilaterais ou multilaterais. Apesar de a autorização ser ampla, de abranger os dois, portanto, não especificar, a nossa grande prioridade é a dos acordos bilaterais ou multilaterais, na linha daquilo que a própria OCDE recomenda.
Em relação aos fundos de investimento imobiliário, como o Sr. Deputado Diogo Feio sabe, procurámos fazer uma reformulação do regime. No entanto, o cálculo que fizemos em termos de incidência de receita fiscal traduzia-se numa perda de mais de 100 milhões de euros. Portanto, não estávamos em condições de avançar com uma solução em que iríamos perder um montante tão significativo em termos de receita.
Quanto à questão concreta dos fundos de investimento imobiliário, como o Sr. Deputado sabe, tratava-se de uma situação que, nalguns casos, raiava o escândalo. Como sabe, não faz sentido, é impossível tolerar que quem tenha um apartamento na Brandoa pague IMI e quem utilize um esquema que estava montado para vivendas de determinados montantes não pague um tostão de imposto.
Assim, sem procurar destruir os fundos de investimento imobiliário, está a procurar dar-se um passo no sentido da moralização. É apenas isto que se pretende.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr.ª Presidente, não vou questionar a forma como o Sr. Ministro respondeu ou não respondeu a algumas questões, não é isso que está em causa. No entanto — creio, obviamente, tratar-se de um lapso do Sr. Ministro —, houve, pelo menos, um tema que não abordou e que considero importante em termos de debate na especialidade, que respeita à execução do PIDDAC na sua globalidade. Não sei se valeria a pena que o Sr. Ministro guardasse este tema em carteira para uma próxima ronda.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, creio que o Sr. Ministro registou a sua preocupação e falará dessa matéria na segunda ronda de intervenções, que vamos iniciar de imediato.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr.ª Presidente, peço-lhe que tenha alguma condescendência com o tempo que vou utilizar, porque poderia ter utilizado a figura regimental da interpelação à mesa para referir as quatro ou cinco questões que coloquei e que não foram respondidas. Não o fiz, e vou, em vez disso, utilizar a minha intervenção para esse efeito.
Em primeiro lugar, quero dizer ao Sr. Ministro das Finanças que nada me disse sobre a questão que coloquei relativa à Lei da Estabilidade Orçamental e à Lei das Finanças Locais, relacionada com a questão dos duodécimos ou de aplicação daquilo que está na proposta de lei do Orçamento, que é já estabelecer um determinado tipo de transferências que têm a ver com os critérios da nova Lei das Finanças Locais, aplicandose o mesmo à Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Julgo tratar-se de uma matéria de enorme importância e a que o Sr. Ministro, só por lapso, não me respondeu. Por isso, volto a insistir neste ponto, porque penso que interessará, não só ao Grupo Parlamentar do PSD como a todos os Deputados, saber o que vai ser feito em relação a essa matéria.
Quanto a outras questões que tive ocasião de colocar na minha primeira intervenção, quero, mais uma vez, felicitar o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais pelo exemplo que deu ao tentar responder com segurança às questões que são colocadas. É bom sabermos que temos um Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que põe muito cuidado na forma como está a gerir esta matéria dos assuntos fiscais. No entanto, gostaria de dizer que, em relação às propostas do PSD, tomamos nota das questões que coloca, nomeadamente, em relação ao goodwill. Contudo, gostaria de sugerir que o Governo (mas não só o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais), em relação, por exemplo, à questão do IMI, aplicasse o mesmo critério a todas as questões que são suscitadas por esta matéria. É que há receitas fiscais que não são directamente do Estado central — e estou a recordar-me, por exemplo, em relação à Lei das Finanças Locais, daquela matéria que tem a ver com os 3% a 5% que os municípios podem decidir em termos de matéria de receita e que, por exemplo, dispõe sobre o IRS, que é matéria, por exemplo, das regiões autónomas (isto é, é receita das regiões autónomas e a Lei das Finanças Locais dispõe dessa matéria como se não fosse receita das regiões autónomas). Aliás, amanhã, isso vai ser discutido na especialidade, mas era bom que o Governo usasse o mesmo critério em relação a todas as questões que se colocam em relação a esta matéria. Assim, deveria ser
Página 18
18 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
dado o mesmo tratamento a todas as matérias que têm a ver com aquilo que é receita não do Estado mas, sim, de subsectores.
Gostaria ainda de dizer ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que, apesar do elogio que lhe fizemos e que mantemos, não respondeu a qualquer das questões que coloquei em relação às autorizações legislativas impróprias ou ilegais.
Relativamente às propostas do PSD, gostaria também de dizer ao Sr. Deputado Victor Baptista que pode estar descansado que teremos o cuidado de previamente lhe enviar as propostas de alteração para que o Sr. Deputado tenha ocasião de analisá-las. É que, como sabe, em sede de discussão, na especialidade, das propostas de alteração, por muito respeito que tenhamos por esta reunião devido à presença de um membro do Governo, estamos dentro dos prazos para fazê-las — aliás, nomeadamente em relação à matéria fiscal, poderemos apresentá-las até ao fim da próxima semana. Teremos, porém, o cuidado de enviá-las previamente ao Sr. Deputado Victor Baptista.
Ainda em relação à matéria fiscal, gostaria, no pouco tempo que me resta, de deixar algumas questões.
Analisando o Orçamento do Estado em tudo o que diz respeito à matéria fiscal, mantemos a mesma opinião que há pouco referi em relação ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e ao seu trabalho (e, enfim, ao Sr. Ministro, que dirige o Ministério), mas não há dúvida de que continuamos a aguardar que o Governo vá um pouco mais longe em alguns aspectos relativos a matéria fiscal. Desde logo, em relação à prometida simplificação fiscal, porque o que consta desta proposta de lei de Orçamento pode melhorar aqui ou ali uma determinada matéria, mas não simplifica. No fundo, diria que, nós, neste momento — e julgo que muitos fiscalistas concordam com isso —, mais do que uma simplificação fiscal, precisamos de uma verdadeira reforma fiscal, no sentido de enquadrar toda uma série de normas que tornam o nosso sistema fiscal de tal forma complexo que dificilmente alguém que não esteja preparado o compreenderá. E penso que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais compreenderá que, a continuarmos assim, cada vez mais a fiscalidade será só para especialistas e não para o cidadão comum, que deveria percebê-la muito melhor.
Gostaria também de colocar ao Governo a questão dos mapas dos Auxílios de Estado que têm de ser enviados para a Comissão Europeia — e isto tem a ver directamente com uma questão relativa ao Centro Internacional de Negócios da Madeira, região pela qual fui eleito pelo PSD. Quero perguntar ao Governo qual é o ponto da situação, porque o regime fiscal para o Centro Internacional de Negócios da Madeira, a partir de 1 de Janeiro de 2007 e até 2011 ou 2013, tem a ver com este mapa de Auxílios de Estado, que tem de ser enviado, sob pena de, em 1 de Janeiro de 2007, o regime não poder funcionar — e penso que o Governo concorda, como, aliás, tem demonstrado até agora, que o regime deve funcionar.
Deixo duas notas finais — gostaria de deixar mais, mas, por falta de tempo, não posso fazê-lo. Em primeiro lugar, quanto ao regime que vem previsto no novo n.º 6 de Lei Geral Tributária sobre o prazo de caducidade, que, até agora, tinha de ser um regime receptício, ou seja, o contribuinte tinha de saber exactamente qual era a liquidação para que o prazo de caducidade deixasse de contar, o PSD acha muito perigoso que deixe de ser receptício o regime a partir do qual deve contar este prazo, porque isso deixa o contribuinte numa situação de enorme dificuldade. Julgo que aqui o Governo deveria dar alguma explicação, embora se compreenda que, por vezes, é preciso para combater a fraude e evasão fiscais e para que não haja contribuintes que fiquem fora do sistema porque decorreu o prazo de caducidade.
Em relação ao imposto automóvel, gostaria de deixar várias questões, mas, para já, deixo só esta: há aqui uma diminuição de receita que terá só a ver com o aumento do imposto automóvel relacionado só com a taxa de inflação prevista de 2,1%. Ficamos, porém, sem saber quando é que o Governo pretende efectivamente pôr em prática o novo regime do imposto automóvel baseado na reforma do imposto automóvel, a qual, julgo, o Governo também assumirá que, um dia, terá de ser feita ou, tanto quanto sei, pensa que vai fazê-la (não sabemos é quando e qual a repercussão que isso terá neste Orçamento do Estado).
Gostaria de colocar outras questões relacionadas com este tema, mas, como já não disponho de tempo, julgo que futuramente terei outras oportunidades para fazê-lo.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Vou agora dar a palavra ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que informou a mesa de que vai partilhar o tempo desta segunda ronda de perguntas entre o Sr. Deputado João Cravinho e o Sr. Deputado Victor Baptista.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.
O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro, o actual Orçamento consagra, salvo erro no último artigo, a possibilidade de reforçar os orçamentos dos organismos que combatem o crime organizado e a corrupção até ao limite de 5 milhões de euros. Ora, gostaria que o Sr. Ministro nos fornecesse, mais tarde (certamente não o tem aqui), o movimento a que essa possibilidade deu lugar, isto é, as aplicações que foram efectuadas a partir dessa possibilidade que o Orçamento consagra.
Em segundo lugar, quero pedir-lhe um esclarecimento quanto à possibilidade/necessidade de este Orçamento do Estado para 2007 ter disposição idêntica, ou seja, saber se, em sua opinião, se justifica essa disposição.
Página 19
19 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr.ª Presidente, depois da intervenção do Sr. Deputado Hugo Velosa, ficamos então a aguardar as contas. Espero que a proposta seja acompanhada da fundamentação e das continhas — é sempre bom ver as continhas!
O Sr. Hugo Velosa (PS): — (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)
O Orador: — Ah, agora estão preocupados connosco?! Têm é de se preocupar com as vossas propostas e fazer as continhas e, sobretudo, demonstrar aquela poupança de 15% na aquisição de medicamentos e nos meios complementares de diagnóstico. Têm de justificar para percebermos de onde vêm esses 15% e para vermos da credibilidade da proposta que apresentaram. De resto, há um autarca vosso do Algarve que também não percebe e acha que isso não é possível.
Mas vamos passar a uma outra questão, que, penso, é importante, relativamente à Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Foi aqui produzida uma intervenção da qual se poderá subentender que os impostos que são gerados nas regiões autónomas não são impostos da própria região. Sr. Ministro, haverá algum imposto que seja gerado nas regiões autónomas e que, porventura, não seja receita ou não passe a ser receita das regiões?
O Sr. Hugo Velosa (PS): — O IRS é! Mas alguns não são!…
O Orador: — Havia um, o IVA, que era, digamos, de base nacional, mas, depois, havia uma transferência para as regiões autónomas, a título de compensação. De resto, quando se diz que, no ano de 2007, haverá uma redução de 36 milhões de euros para a Região Autónoma da Madeira, não é verdade que o Orçamento prevê a transferência, a título de compensação, de 41 milhões de euros, por causa do IVA?!
O Sr. Hugo Velosa (PS): — Isso é o IVA!
O Orador: — Eu sei que é o IVA! Mas parece que 41 milhões de euros não é dinheiro e que esse dinheiro não é transferido! Fico surpreendido, porque nunca falam dos 41 milhões de euros mas tão-só nos 36 milhões de euros de redução! Julgo que é fundamental compreender-se que os impostos gerados nas regiões autónomas são receitas próprias e que este Orçamento contribui, nomeadamente, para que o IVA passe a ser receita própria das regiões autónomas. É necessário esclarecer este aspecto para as pessoas não ficarem com dúvidas.
E já nem falo dos critérios de distribuição, que, para mim, são mais do que óbvios e que, penso, já todos compreenderam.
Ainda relativamente às finanças locais e à questão dos duodécimos, fico surpreendido com tanta preocupação. Em finanças públicas, há um princípio, o princípio dos duodécimos. Quando os orçamentos não são aprovados, o que é que vigora, e sempre vigorou, em finanças públicas? É o regime dos duodécimos. Portanto, não se compreende esta dificuldade. A redução de valor é legítima — a Lei de enquadramento orçamental permite-o e não vale a pena estar a complicar ou a lançar a dúvida sobre as questões —, mesmo que a nova Lei das Finanças Locais ainda não tenha sido publicada. Isto é possível. Se não fosse, então, o governo de Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite teriam elaborado uma proposta de lei, posteriormente aprovada como lei, sem qualquer fundamentação e não se sabe com que objectivo. E o Sr. Deputado Hugo Velosa, que é jurista, sabe perfeitamente que isto é possível.
Quanto muito, poderia questionar um outro problema, mas, até hoje, ainda não o fez e não sou eu que vou dizer-lhe qual é.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, o Sr. Deputado Eugénio Rosa.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, o Sr. Ministro afirmou que não tinha razões para mudar a previsão da taxa de inflação. Ora, vou dar-lhe uma razão que talvez o ajude a mudar de opinião. Se compararmos a inflação prevista, constante de todos os Orçamentos, com a inflação verificada, concluímos que, em todos os anos, a inflação verificada fica sistematicamente acima da inflação prevista nesses Orçamentos.
Essa diferença tem variado entre 0,3 e 1,5 pontos percentuais. Em 2003, a inflação prevista no relatório foi de 0,8; em 2004, de —0,4; em 2005, de —0,3; em 2006, de 0,5/0,6.
Portanto, sistematicamente, e não é por acaso, a inflação prevista fica sempre abaixo da inflação verificada.
Página 20
20 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Isto está implícito de uma forma oculta no aumento da carga fiscal, como o Sr. Ministro naturalmente sabe.
E sabe que isto é um instrumento utilizado pelos economistas para o conseguirem. Deixo, pois, isto para reflexão.
A segunda questão que lhe quero colocar, Sr. Ministro, prende-se com a sua afirmação de que está contra regimes especiais. No entanto, é necessário passar dessas palavras à realidade, pelo que lhe vou dar conta de uma situação, em relação à qual gostava de ouvir a sua opinião.
O regime especial das mais-valias em Portugal é mais vantajoso do que o que existe em muitos países, pelo que lhe pergunto o seguinte: o Sr. Ministro acha justo que nas OPA que estão a ser lançadas grandes grupos económicos vão ter mais mais-valias de milhões e milhões de euros e não pagam um euro de imposto? Deixo-lhe esta questão também para reflectir.
A terceira questão tem a ver com a Administração Pública.
A reforma da Administração Pública, como todos nós sabemos, vai pôr em causa direitos dos trabalhadores, nomeadamente o direito ao emprego. Ora, também para reflexão, pergunto-lhe o seguinte: sem pôr em causa as respectivas competências, estará o Governo disponível para negociar com os sindicatos, como estabelece a própria lei da negociação na Administração Pública, ministério a ministério, as suas consequências para os trabalhadores, com o objectivo de encontrar soluções que causem menores prejuízos aos trabalhadores? É que o que está na lei da mobilidade, que foi aprovada, afasta os sindicatos, afasta os representantes dos trabalhadores.
Coloco, pois, a questão não em termos de substituir as competências do Governo, mas em termos de se negociar aquilo que afecta directamente os trabalhadores, de forma a encontrar-se uma solução que seja menos danosa para eles.
Em relação ao orçamento, naturalmente que temos uma leitura política, mas também técnica, diferente da que tem o Governo.
Quando analisámos a redução do défice em valores nominais, concluímos que há uma redução de 1117 milhões de euros. E quando compararmos esta redução, em valor nominal, com algumas medidas que nós consideramos extraordinárias, como é o caso do congelamento das promoções na Administração Pública e do financiamento do PIDDAC… Se compararmos o PIDDAC de 2006 com o de 2007 o que é que constatamos? Que, a nível de fundos públicos (capítulo 50) e fundos comunitários, há uma redução de 528 milhões de euros.
A nível de outras fontes de financiamento, que inclui fundamentalmente o endividamento ou outro modelo de financiamento que o Governo nem sabe qual será — estou a utilizar as palavras do Ministro das Obras Públicas — há um aumento de 653 milhões de euros. Portanto, há uma diminuição da utilização de transferências do orçamento e dos fundos comunitários e há um recurso maior ao endividamento a nível das empresas. Nós interpretamos isto como uma transferência de uma parte do défice para as empresas — é uma interpretação técnica que fazemos.
No entanto, a questão que quero colocar não é essa. Gostava de saber — porque não sei — quais são as empresas públicas que entram na consolidação do défice e quais as que estão excluídas.
Eu sei que o Sr. Ministro e o Governo estiveram a negociar com o Eurostat, mas esse dado nunca nos foi dado. Gostaria, pois, até para chegar à conclusão se tenho ou não razão naquilo que digo, de saber se a REFER e a Estradas de Portugal entram na consolidação.
Outra forma como eu vejo que está a ser transferido o défice para empresas públicas tem a ver com o caso de empresas de transportes colectivos públicos, onde se reduziu, de acordo com os dados que tenho, que podem não estar correctos, as indemnizações compensatórias, relativamente a 2006, em cerca de 86 milhões de euros.
É natural que se o Orçamento do Estado transfere menos 86 milhões de euros, tem menos essa parcela de défice. É uma forma de engenharia financeira, para não utilizar outros termos, de redução do défice. O Sr.
Ministro sabe que os economistas têm muitas maneiras de reduzir défices.
Aparte inaudível do Sr. Ministro das Finanças.
É preciso é torná-las claras, Sr. Ministro, porque o Orçamento não está claro e depois diz-se que é credível. O que eu digo é, pois, para tornarmos as coisas claras e ver o que é extraordinário e o que não é.
Outra questão que lhe quero colocar vem ao encontro de uma preocupação do Primeiro-Ministro, que me parece positiva, se for passada à prática, no sentido de reduzir a possibilidade de a banca, na situação de transmissibilidade dos prejuízos, utilizar os prejuízos de empresas fundidas para reduzir o lucro que está sujeito a imposto. A pergunta que deixo ao Governo é no sentido de saber se estaria disponível para — era uma forma eficaz de reduzir esse lucro — introduzir no n.º 1 do artigo 69.º apenas duas palavrinhas: «os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos até 50%». Em vez de 100%, passaria a ser «até 50%», por exemplo. Já que há a preocupação em que isso não seja utilizado da forma como o está a ser, uma maneira eficaz de fazê-lo seria a de reduzir a uma determinada percentagem a possibilidade de as empresas…
Página 21
21 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Pergunto, pois, ao Governo, já que está tão virado contra esta utilização, se está disponível para aceitar uma proposta desta natureza.
Outra questão que gostaria de colocar — e já a coloquei várias vezes — tem que ver com o problema dos salários na Administração Pública. O Governo, e não só, tem feito passar a mensagem de que os salários na Administração Pública são superiores aos do sector privado.
Por exemplo, numa reunião que tive com o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, perguntei se o Governo tinha mandado fazer um estudo comparativo dos salários na Administração Pública e no sector privado. O Sr. Secretário de Estado disse-me que esse estudo tinha sido feito, mas que o Governo não estava de acordo com as conclusões, nomeadamente com a metodologia, tendo-o devolvido à empresa, para que ela lhe desse outros estudos, naturalmente para obter outras conclusões.
O certo é que saiu na comunicação social aquilo que todos já sabiam, pelo menos quem esteja dentro da Administração Pública, ou seja, que para idênticas profissões os salários praticados na Administração Pública são muito inferiores aos do sector privado.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro: o Governo já dispõe desse estudo? Pode ser-nos fornecido? Quais são as conclusões e as medidas que vão tirar desse estudo? Para terminar, e em relação aos atrasos nos pagamentos dos programas comunitários, na semana passada vi um programa de televisão em que os jovens agricultores se queixavam desse atraso, dizendo que isso estava a pôr em causa a própria sobrevivência. Já que os outros Ministros não nos quiseram responder, pergunto-lhe o seguinte: o que é que está a acontecer? Estão a fazer isso para cumprir o défice?
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, começo por assinalar o facto de o Sr. Ministro das Finanças, na sua intervenção, ter referido como importante a questão da tributação da família, porque o CDS tem propostas concretas em relação a essa matéria. Uma delas, como já referimos, tem que ver com a questão da diferença de regimes de abatimentos, tem que ver também com a passagem para um quociente familiar, pelo que muito nos agrada a abertura que o Sr. Ministro das Finanças demonstrou em relação a essa matéria.
Sr. Ministro, sei bem como se processa a gestão dos dinheiros públicos nas universidades e é também por sabê-lo que penso haver hoje mais eficiência do que havia há uns tempos atrás. Também por isso, não compreendo esta quebra de aproximadamente 53 milhões de euros, que tantos problemas tem criado às universidades. Estamos a falar de reitores de universidades que já falaram, desde logo o reitor da Universidade de Lisboa e a reitora da Universidade de Aveiro, que são instituições credíveis e fundamentais para que a ciência se possa desenvolver em Portugal. Bem podemos gastar muito no PIDDAC para a ciência — vamos ver qual é, para o ano, a execução —, mas depois, se não tivermos quem de uma forma competente possa exercer o desenvolvimento científico, ficamos com certeza numa situação ainda pior do que aquela de que partimos.
Quanto à questão da banca, não a referi na primeira intervenção, mas aquilo que parece incompreensível é que possamos ouvir do Governo, como ainda há pouco ouvimos da parte do Sr. Ministro das Finanças — e bem — dizer que é melhor a fase em que os bancos têm lucros que podem ser tributados do que aquela em que tinham prejuízos e em que não havia qualquer tributação, mas ao mesmo tempo sentir a necessidade de fazer um discurso — e é disso que estamos a falar neste momento preciso, é de um discurso que o Sr. Primeiro-Ministro fez aqui no Plenário e não mais do que isso — em que se assume o combate a mais um dos privilegiados, muito por pressão da esquerda parlamentar, mas ainda por cima assumindo instrumentos que não são os melhores.
É evidente que as matérias relativas às provisões e à modificação do regime fiscal das provisões já estavam no Orçamento do Estado, não são uma novidade para se apresentar no discurso inicial. As novidades que se apresentam criaram dúvidas, porque, desde logo, uma coisa é planeamento fiscal, outra coisa é fraude e evasão, sendo muitas vezes difícil determinar o limite. Planeamento corresponde à utilização daquilo que está previsto na lei; fraude e evasão é ultrapassar a lei.
O Sr. Ministro, numa entrevista, deu uma ideia diferente daquilo que nos foi apresentado, porque, taxativamente, falou na hipótese de se determinar o que é o tal planeamento. Mas aí, se calhar, não se trata de planeamento, mas de fraude e evasão. É isso que é necessário que se tenha em atenção quanto a esta matéria, porque se se quisesse fazer modificações de fundo, elas seriam outras. Estão muito bem determinadas legislativamente, têm que ver com a questão das provisões, tem que ver com a questão dos fundos de natureza social, têm que ver com o tratamento que se dá à Zona Franca da Madeira. Mas a dúvida que eu aqui coloco tem a ver com o que é que este Governo quer: quer que no sector financeiro, em que já se paga uma taxa efectiva de imposto acima daquela que é a média geral, existam ou não lucros que são distribuídos pelos accionistas e que, com certeza, fazem crescer o nosso PIB e que, com certeza, possibilitam o pagamento de impostos? Queria colocar, desde logo, uma questão que tem a ver com o tratamento das SGPS ou, se quiserem, das holdings, para utilizar uma linguagem mais corrente. Não seria relevante ter o tratamento fiscal das SGPS, mais do que no Estatuto dos Benefícios Fiscais, no Código do IRC, dando-lhes um tratamento de natureza estrutural e não datado, a nível de prazo? Esta seria uma questão relevante ao nível da certeza dos agentes económicos.
Página 22
22 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Por muito que isto faça sorrir a esquerda, seria extraordinariamente importante fazê-lo.
Por exemplo, neste momento, as holdings de natureza intermédia estão muitíssimo concentradas em Espanha, tal como as multinacionais, devido, desde logo, ao regime específico existente em relação a esse sector da sociedade. Ora, como medida de competitividade fiscal não seria relevante caminharmos também no tratamento das SGPS de forma a atrair investimento para Portugal? Uma das questões que coloquei há pouco tinha a ver com os fundos de investimento imobiliário, porque não se compreendem bem quais são os sinais. Não conhecia este número dos 100 milhões de euros em relação a modificações mais de fundo, de todo o modo não me parece que seja impossível simplificar o artigo do Estatuto dos Benefícios Fiscais que trata esta matéria. Por outro lado, não se compreende que se tome esta medida e a medida contrária em relação ao IMI e ao IMT para imóveis detidos por offshores, porque são medidas em sentido contrário! Sei porque é que esta medida do IMI e do IMT aparece para os offshores, mas considero que se deveria adoptar uma política de sentido único no Orçamento do Estado.
Outra das propostas que o CDS vai apresentar tem a ver com as sociedades que actuam e têm sedes nas fronteiras. São precisamente essas sociedades que mais sofrem — quase em exclusivo — com o diferencial de IVA em relação a Espanha. Pergunto se não seria relevante fazer uma especificação (visto que já temos um estatuto para o interior) a nível de tratamento de favor em relação às sociedades a operar em zonas de fronteira, que são aquelas que mais sofrem (têm sofrido de uma forma dramática) com o défice de competitividade que temos em termos de IVA.
Devo dizer que concordamos que exista para as PME um tratamento mais simplificado a nível da contabilidade — nós próprios pensamos apresentar propostas agora, em sede de especialidade, quanto a esta matéria.
Por último, uma das medidas previstas no Orçamento do Estado é o fim da necessidade de convocação de outros credores para além do fiscal no processo de execução fiscal. Ora, esta parece-me ser uma medida de natureza labiríntica. Não seria melhor determinar que a administração fiscal tem uma situação de primazia em relação aos outros credores? Para quê falar nela apenas quando não há convocação dos outros credores no processo de execução fiscal? Também não consideram que é uma situação de injustiça a do IVA sobre o IA, quando estamos a falar da aquisição de automóveis? Será que a situação não deveria ser alterada? Aliás, tem sido juridicamente criticada e estudada.
Por fim, para as informações prévias vinculativas poderem ter mais efeitos práticos, não seria importante a determinação de um prazo de resposta em relação a esta matéria, um prazo que fosse praticável?
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, as respostas do Governo são claras, embora contraditórias com algumas das opiniões da bancada do BE em determinadas matérias, mas não noutras.
Vou voltar a insistir nalguns pontos para que fique tudo mais definido.
Em primeiro lugar, sobre a Lei Geral Tributária, o que o Governo faz no artigo 14.º é introduzir boas normas sobre os requisitos do conhecimento da situação tributária do interessado e do beneficiário dos benefícios fiscais, mas retira duas outras que não foram explicadas. Ou, melhor dizendo, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais explicou uma mas não referiu a outra.
Explicou, embora de uma forma pouco convincente, creio, que retirava o carácter provisório — a caducidade ao fim de 5 anos — dos benefícios fiscais, porque deste modo haveria um melhor controlo sobre estes.
Não percebo porquê! A caducidade ao fim de 5 anos obriga a uma revisão geral dos benefícios fiscais ao fim de 5 anos, mas não prejudica que o Governo (ou o Parlamento) possa agir, nomeadamente reformando o sistema, o que não é feito neste contexto.
Portanto, é retirada uma restrição superior e os governos ficam mais à vontade. Para os contribuintes, o arbítrio político é mais impositivo.
Mas foi ainda introduzida uma segunda alteração: retirou-se o n.º 3, que estabelecia que só haveria benefícios fiscais mediante prévia quantificação da despesa fiscal, o que é uma boa medida. Quando um governo, ou um grupo parlamentar, propõe um benefício fiscal é obrigado a apresentar a conta da despesa fiscal que isso implica — esta é uma norma de transparência. Contudo, esse n.º 3 é revogado na proposta do Governo e importa saber porque é que este bom princípio de transparência é retirado.
O Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais insistiram muito em que a inflação esperada para 2007 é certa, isto é, o Governo tem muita confiança nesse número. Todos os governos têm dito o mesmo, mas admitamos agora que, além da confiança, o Governo empenha-se em garantir a manutenção desses números.
Vale a pena dizer, em primeiro lugar, que o diferencial de inflação de 2006 não se deve apenas à modificação de normas estatísticas, Sr. Ministro. Esse facto tem alguma importância mas não justifica a diferença até aos 3,1% que o INE está a supor. Houve, de facto, uma pequena aceleração no crescimento (ainda medíocre)
Página 23
23 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
do produto e, portanto, em consequência, houve um efeito de inflação. E prever uma redução da inflação no próximo ano está em linha com a possibilidade de um crescimento também ainda muito medíocre.
Certamente o Governo, em função da sua confiança, pode aceitar uma proposta que o Bloco de Esquerda apresentará e que se traduz numa norma antidemagogia.
Vejamos.
Se o Governo atribui aumentos salariais e actualizações das deduções fiscais no IRS em função de uma perspectiva de inflação de 2,1%, certamente aceitará que tudo o que ultrapasse esse valor seja reposto, no próprio ano, aos salários que ficaram afectados e, no ano seguinte, à actualização das deduções em termos de IRS.
O Sr. Ministro compreenderá que se houvesse uma norma deste tipo a credibilidade da política económica seria muito maior porque, pela primeira vez na história económica, a política orçamental dos governos seria punida pelo facto de ter um número de inflação que deixa de ser um mero jogo e passa a ser um objectivo efectivo da política económica. É neste sentido que vai a nossa proposta.
Apresentaremos, aliás, uma segunda proposta sobre os financiamentos das universidades. De facto, é verdade que as universidades não têm financiamento para a actualização em 1,5% dos salários nem sequer para fazer o pagamento dos salários. O Conselho de Reitores tem razão deste ponto de vista, por isso propomos a correcção dos mapas orçamentais para que a dotação das universidades públicas garanta o seu funcionamento até 31 de Dezembro de 2007, o que não está assegurado neste momento.
Queria voltar, com um pouco mais de cuidado, à proposta do planeamento fiscal.
O Sr. Ministro não o disse, mas vou presumir que a sua intervenção confirma que discutiremos em sede do Orçamento a norma sobre o planeamento fiscal, porque não teria sentido de outra forma. De facto, seria bizarria que o Primeiro-Ministro, na apresentação do Orçamento do Estado, anunciasse uma nova grande medida que não coubesse no Orçamento (e que, portanto, não a discutíssemos a tempo de ela ter qualquer efeito).
Assim sendo, vou presumir — penso que é de boa fé fazê-lo — que a norma sobre o planeamento fiscal vai ser apresentada para o Orçamento.
Importa discutir agora, mais em detalhe, o que ela significa.
O Sr. Ministro deu algumas indicações, bem como o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, mas nós não sabemos exactamente o seguinte: em primeiro lugar, qual é o perfil do planeamento fiscal que querem atingir? Em segundo lugar, como é que querem operar? E, em terceiro lugar, o que pretendem obter e que efeito fiscal esta medida terá? É muito importante que seja discutido deste modo, porque a discussão na especialidade é uma discussão do rigor destas aplicações.
Diz o Sr. Ministro que aplicar, em vez desta norma que está por definir, um princípio de comunicação dos movimentos transfronteiriços de capitais seria abusivo, seria ir longe demais — o que é discutível, naturalmente. Repare, Sr. Ministro, quando fala de big brother a respeito do dever de informação, lembro que também se falou de big brother a respeito do dever de registo da propriedade imobiliária, ou a propósito do dever de registo da compra de automóveis. No entanto, hoje, está muito claro na sociedade portuguesa uma cultura de responsabilidade no sentido de afirmar que essas obrigações são normais.
Pergunto porque é que, sendo já de comunicação obrigatória os juros obtidos por depósitos em bancos da União Europeia, ou seja, já se tem conhecimento das transferências de capitais para entidades financeiras na União Europeia sem qualquer limite — e todos aceitámos isso como muito natural —, o que fica de fora, as transferências para offshores, não tem de ser submetido ao mesmo dever de registo, seja a posteriori, pelo registo do resultado das operações, seja a priori, pelo registo das transmissões de valores? Repare, Sr. Ministro — certamente, está de acordo comigo —, os offshores só servem para uma destas quatro operações: para depositar dinheiros da corrupção, para depositar dinheiros do crime, para permitir evasão fiscal ou para permitir redução de impostos na base da legalidade. Só existem estas quatro operações possíveis nos offshores; não há offshore algum que produza operações de qualquer tipo que criem um valor, nem sequer financeiras! Isto porque não há operação alguma que se faça nos offshores, são todas a fingir! E o grande problema do offshore da Zona Franca da Madeira é que se tornou num entreposto das Ilhas Cayman.
Protestos do Deputado do PSD Hugo Velosa.
O Sr. Ministro diz-nos que a informação pode ser prejudicial à liberdade dos capitais. Não, Sr. Ministro, a responsabilidade é parte da liberdade e a tranquilidade dos clientes das entidades bancárias portuguesas só ocorrerá se tiverem a certeza de que elas são legítimas.
Deixa de haver tranquilidade quando a justiça espanhola manda a polícia invadir uma agência de um banco português na Catalunha — aí, sim, deixa de haver tranquilidade! Ora, se as regras forem cumpridas, então, sim, estamos garantidos de que criamos confiança e que não há dúvidas a este respeito.
Diz o Sr. Secretário de Estado: «Até agora temos sido cirúrgicos». É claro que é preciso ser pragmático, cirúrgico e ir adaptando as medidas à forma como a evasão fiscal se vai recompondo, mas também é boa medicina actuar preventivamente. Ou seja, além da cirurgia, que actua quando há um abcesso ou um cancro, também é preciso prevenir o cancro.
Página 24
24 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
É, pois, importante ter regras de informação e de transparência que tornem impossível o que aconteceu a um banco português em Espanha, ou o que aconteceu em operações como a de que nos falou em relação a Inglaterra — de facto, é um caso extraordinário.
Há que tornar claro o princípio da transparência. Eu defendo-o em nome da liberdade e da tranquilidade e creio que, mais tarde ou mais cedo, só podemos chegar a uma medida deste tipo. Se chegarmos mais tarde, teremos perdido muito dinheiro em impostos e em fraude fiscal; se chegarmos mais cedo, teremos melhores medidas de transparência.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, dada a flexibilidade de tempos concedida pela Mesa nesta segunda ronda de perguntas, creio poder assumir que não haverá mais questões a colocar.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, trata-se de uma interpelação nos mesmos termos da que foi feita há pouco pelo Sr. Deputado Honório Novo. É que assim não há, certamente, uma terceira ronda.
Há pouco fiz uma pergunta, que era muitíssimo importante que fosse respondida, sobre a introdução do mecanismo da arbitragem também nestas questões fiscais, questão essencial para as empresas que perdem demasiado tempo nos nossos tribunais administrativos e fiscais.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Estou certa de que o Sr. Ministro registou essa questão.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a mesa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr.ª Presidente, penso que não faz sentido fazer terceira ronda, até porque os tempos foram altamente ultrapassados nesta segunda ronda, e em alguns casos no dobro. Dado o esclarecimento que foi agora também solicitado, repito, julgo que não faz qualquer sentido haver terceira ronda.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, é nesse sentido que queria passar a palavra ao Sr.
Ministro, dizendo que se trata das intervenções finais do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado para responder a este conjunto de perguntas.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, começo por me dirigir ao Sr. Deputado Honório Novo, pedindo-lhe desculpa por não ter dado a informação relativamente a esta matéria do PIDDAC.
Tem razão. Como vê, também reconheço quando tem razão e, obviamente, tenho de o reconhecer. Relativamente a outras matérias, teremos de as discutir, como é evidente e habitual. Como sabem, terei muito gosto em o fazer.
Sr. Deputado, as verbas do PIDDAC financiadas através do Capítulo 50 são cerca de 35%, ou seja, 34.5% do financiamento global, sendo certo que o restante é financiado por fundos comunitários e outras fontes de financiamento. Este é um primeiro dado que gostaria de lhe dar.
Quanto à execução do Capítulo 50, no que se refere às verbas que saem do Orçamento para o financiamento destes projectos, até 31 de Outubro, os pagamentos já efectuados correspondem a 70% e temos já compromissos assumidos que correspondem a 85,6% do nosso financiamento nacional. Esta é uma informação que lhe presto verbalmente e que lhe farei chegar, como já referi, com maior detalhe.
Sr. Deputado Hugo Velosa, gostaria de tornar claro o seguinte: independentemente do que venha a suceder às propostas de leis sobre as finanças locais e sobre as finanças regionais, temos uma proposta de lei do Orçamento do Estado que pode ser cumprida e executada. Isto é, a proposta de lei do Orçamento do Estado que foi submetida a esta Assembleia não depende da aprovação das propostas de lei sobre as finanças regionais e sobre as finanças locais. Fizemos uso das disposições da lei de enquadramento orçamental, designadamente das suas disposições que resultaram da chamada de estabilidade para, precisamente, assegurar que temos o enquadramento legal adequado para que assim seja.
Ora, Sr. Deputado, se o Governo admite, como admitiu o meu colega Ministro de Estado e da Administração Interna, que poderá propor e sugerir ao grupo parlamentar que apoia o Governo que, no que se refere às transferências para as autarquias, se possa definir um mecanismo na base dos duodécimos tem somente este objectivo: sinalizar à Assembleia que o Governo não pretende de forma alguma que esta Assembleia se sinta pressionada sobre a questão da lei das finanças locais bem como da lei das finanças regionais.
Gostaríamos que esta Assembleia, e até o Sr. Presidente da República, se debruçassem sobre estas leis e fizessem o seu juízo sem estarem sujeitos a qualquer tipo de pressão que possa ter a ver eventualmente com
Página 25
25 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
a viabilização deste Orçamento. Não queremos que isso aconteça, Sr. Deputado. Gostaria, pois, que essa questão ficasse aqui muito clara.
Nesse sentido, vamos olhar para essas iniciativas do Governo de forma autónoma. E não pensemos que este Orçamento está condicionado pela aprovação dessas leis, porque não está, não pretendemos que esteja e procuramos evitar que assim aconteça.
No que se refere à questão da matéria de simplificação fiscal, Sr. Deputado, devo dizer que o Governo considera muito importante a simplificação fiscal. Penso que, de facto, temos de transformar o «fiscalês» em português. Ou seja, fazer com que o cidadão comum perceba de uma forma mais clara as normas fiscais, se entenda com elas, que entenda o seu alcance, obviamente não perdendo o rigor técnico que estas questões sempre terão de ter.
Se nesta proposta de lei do Orçamento do Estado não constam disposições de grande alcance no domínio da simplificação fiscal isso tem a ver com uma razão muito simples, Sr. Deputado. É que o Governo já aprovou um diploma com um conjunto de disposições no âmbito da simplificação fiscal num pacote autónomo do Orçamento, diploma esse que está para publicação. Esse é um trabalho que o Governo já fez, é uma iniciativa que o Governo já teve e que correu de forma autónoma desta proposta de lei do Orçamento do Estado. Daí que não encontre aqui disposições nesse sentido, porque elas encontram-se noutro diploma.
Sr. Deputado, no que se refere à questão dos auxílios de Estado e à sua informação à Comissão, essa informação já foi apresentada na semana passada pela nossa REPER.
Quanto à questão do prazo de caducidade, e sem prejuízo das considerações que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais possa fazer sobre essa matéria, gostaria de dizer que temos de fazer uma escolha muito clara: ou deixamos que situações como aquela que foi descrita pelo Sr. Secretário de Estado ocorram com frequência, e que não é pública, ou seja, as pessoas retirarem da sua caixa do correio a correspondência que lhes interessa deixando de lado o que não interessa… Ora, temos de entender que não podemos pactuar com esse tipo de situações.
O que é feito nesta proposta de Orçamento é alterar esta situação. No entanto, gostaria de chamar a sua atenção para o seguinte, Sr. Deputado: esta actuação é feita em perfeita harmonia com o Código do Procedimento e Processo Tributário, em particular com o que está disposto no seu artigo 39.º, que não preclude os direitos do contribuinte, neste caso de reclamar ou de impugnar a decisão da administração fiscal.
Penso que temos de ter disposições que dêem eficácia à intervenção da administração fiscal, que limitem a possibilidade desses comportamentos artificiosos, mas, obviamente, salvaguardando aquilo que devem ser as garantias e os direitos dos contribuintes, que também não podemos ignorar.
Sr. Deputado João Cravinho, a questão do IA será respondida pelo Sr. Secretário de Estado.
Relativamente ao reforço orçamental para o combate à corrupção e aos tais 5 milhões previstos no ano passado para este ano na Lei do Orçamento, sem prejuízo de fazer chegar ao Sr. Deputado a informação que solicitou, devo confessar-lhe que não tenho registo na minha memória de que tenha havido qualquer recurso a esta verba prevista no Orçamento Tudo o que haveria a fazer nesta matéria foi desenvolvido pelo Governo, designadamente no âmbito do Ministério da Justiça. Ora, se este ano não incluímos uma disposição análoga, tem a ver, por um lado, com a experiência deste ano, mas também pelo facto de explicitamente, aliás como o Sr. Ministro da Justiça já anunciou, estarem previstos reforços e iniciativas importantes no âmbito do Ministério da Justiça e já contemplados no seu Orçamento, tendo em vista precisamente o reforço da nossa capacidade de intervenção nestes domínios.
Por isso, pareceu-nos mais razoável transformar esta matéria em algo de normal e natural em sede do orçamento do ministério adequado e não lhe dar um carácter excepcional. Isto é, penso que não faz muito sentido entendermos que a luta contra a corrupção é algo excepcional. Não. Pelo contrário, deve ser algo de permanente, normal, deve ser uma rotina das autoridades estarem atentas e tomarem as acções devidas neste domínio. Daí não se justificar dar-lhe um carácter excepcional. Por isso, foi já incorporado no orçamento do Ministério da Justiça.
Sr. Deputado Vítor Baptista, creio que de alguma forma já respondi à questão das finanças locais.
Não me iria alongar muito na questão das finanças regionais porque amanhã vamos ter oportunidade de ter um debate sobre esta matéria e, portanto, se me permite, até por economia de tempo, penso que poderíamos adiar para amanhã essa discussão mais em pormenor sobre esse assunto, não valendo a pena alongarmo-nos muito mais no dia de hoje, sendo certo que gostaria de repetir aquilo que disse ao Sr. Deputado Hugo Velosa. Isto é, essas são iniciativas que em nada condicionam a aprovação e a execução deste Orçamento do Estado.
O Sr. Deputado Eugénio Rosa colocou uma questão relativamente à taxa de inflação. O Sr. Deputado poderá, certamente, indicar-me um conjunto de anos onde a taxa de inflação foi superior àquela que era esperada. Porém, recordo que há 10 anos atrás, por exemplo, quando eu estive no governo, essa situação verificou-se uma série de anos seguidos. Por que razão terá havido só uma excepção nesses anos? Poderá ter sido nos anos que referiu, Sr. Deputado.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Foi uma excepção!
Página 26
26 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
O Orador: — Como sabe, Sr. Deputado, dizem as estatísticas que as previsões erram sempre, ou por excesso ou por defeito. Mas as previsões não serão enviesadas se a média dos erros for zero. Portanto, Sr. Deputado, é preciso ter uma amostra suficientemente representativa. Não são três anos que chegam para averiguar…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — São 10!
O Orador: — Não, Sr. Deputado, se olhar mais para trás verá que houve anos em que a previsão esteve acima do que foi observado.
Quanto à questão que levantou sobre a Administração Pública, gostaria de tornar claro que já negociámos com os sindicatos…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não! Impuseram!
O Orador: — Desculpe, Sr. Deputado, nós negociámos com os sindicatos. Mas gostaria de deixar claro o seguinte: eu não confundo o diálogo com a necessidade de decisão. Ora, nós dialogamos e negociamos com os sindicatos todas as propostas que apresentamos no âmbito da Administração Pública e dialogamos com eles. Contudo, quando partimos para o diálogo não vamos abdicar dos aspectos fundamentais daquelas que entendemos serem as reformas que têm de ser promovidas!
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Esse é um aspecto fundamental?!
O Orador: — Desculpe, Sr. Deputado, mas o diálogo, que tanto é invocado, só é entendido enquanto tal quando o Governo desiste das suas propostas. Aí, sim, havia diálogo! Não, o Governo dialogou, nesse diálogo não abdicou de defender os princípios que entende como fundamentais, que conformam as reformas que temos em curso. Caso contrário, descaracterizaríamos completamente essas reformas. Mas, para além disso, fomos capazes, nesse diálogo com os sindicatos, de introduzir alterações que entendemos serem razoáveis e aceitáveis. Desse diálogo resultaram, portanto, alterações.
Protestos do Deputado do PCP Eugénio Rosa.
O Sr. Deputado não vai dizer que não houve diálogo. Este Governo já reuniu 79 vezes com os sindicatos e, até ao fim do ano, tem mais 15 reuniões agendadas. Os portugueses viram variadas vezes nas televisões representantes sindicais a prestar declarações à saída do Ministério das Finanças. Não me diga que não houve diálogo, Sr. Deputado! Não diga que não houve diálogo! Houve diálogo! O Governo, quando vai dialogar, tem ideias e quer fazer reformas. O que vocês querem é que o Governo abdique de fazer reformas. Agora, eu não confundo diálogo com indecisão e desistência da decisão. Não! O Governo dialogou, defendeu as suas propostas e tomou as decisões que entendeu tomar.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — O que estou a dizer é para aceitar o que está na lei!
O Orador: — Desculpe, que eu saiba, de todas as queixas que foram apresentadas pelos sindicatos, ainda não há nenhuma situação, de qualquer autoridade que tenha apreciado essas queixas, que tenha dado razão aos sindicatos.
Protestos do Deputado do PCP Eugénio Rosa.
Desculpe, mas não! Se fala em cumprir a lei, nós cumprimos a lei. Ainda ninguém reconheceu aos sindicatos que a lei não foi cumprida.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não se irrite!
O Orador: — Não me estou a irritar! O Sr. Deputado é que está aí bastante irritado a perorar contra a minha intervenção!
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, deixem o Sr. Ministro intervir! Ele ouviu-vos calmamente!
O Orador: — A propósito disto quero dizer-lhe que na Administração Pública há organismos que terão de decidir e de gerir o dia-a-dia da Administração e a política de pessoal, tendo, obviamente, de gerir os processos de reforma. Os sindicatos foram ouvidos no momento próprio e a lei esclarece exactamente em que medi-
Página 27
27 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
da é que os trabalhadores poderão ser afectados. E garanto-lhe uma coisa: os trabalhadores não serão mais afectados do que aquilo que está previsto na lei.
Todavia, eu não confundo diálogo com co-gestão. O que o Sr. Deputado vem aqui sugerir…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — É o que está na lei!
O Orador: — … é um mecanismo de co-gestão, que é o de pôr os sindicatos a gerir a Administração Pública e, em particular, o processo de reforma da Administração e de implementação dos mecanismos da mobilidade. Não! Isto não farei. Porém, garanto-lhe que os direitos dos trabalhadores que estão previstos na lei serão defendidos e que os trabalhadores não serão mais afectados do que aquilo que a lei prevê. Portanto, não vejo qualquer interesse em que os sindicatos aqui interfiram, porque, sejamos claro, isto só tem um intuito: «meter um pauzinho na engrenagem» para impedir que se faça a reforma da Administração Pública. É isto que o Sr. Deputado está a propor!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É essa a sua postura?!
O Orador: — É, sem dúvida! Há uma reforma para fazer e vai ser feita! E os sindicatos intervirão em sede própria! Não tenha dúvidas quanto a isto!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Está esclarecido!
O Orador: — O modelo de gestão da nossa Administração não é um modelo de co-gestão. Não tenhamos ilusões quanto a isto!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Está esclarecido!
O Orador: — Esclareço também que as empresas públicas não consolidam para efeitos de apuramento do défice, com a excepção da Estradas de Portugal, que é a única que consolida.
Quanto aos salários da Administração Pública, o estudo que mencionou está a ser analisado no Ministério das Finanças, relativamente ao qual temos de facto observações e críticas de natureza metodológica a apresentar, até por uma razão muito simples: na análise dos níveis de remuneração da Administração Pública, este estudo ignora uma componente importante das remunerações dos funcionários públicos, que são os suplementos remuneratórios. Isto porque fazer um estudo de comparação de remunerações entre sector privado e sector público que ignore os suplementos remuneratórios, convenhamos, Sr. Deputado, não nos dá garantias de grande solidez ou rigor analítico.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — No sector privado não há suplementos?
O Orador: — Esse estudo terá de ser feito, mas, num estudo desta natureza, todas as componentes remuneratórias sem excepção terão de ser tidas em conta, porque, caso contrário, não teremos um estudo que possa ser classificado como rigoroso.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Vai facultar-nos o estudo ou não?!
O Orador: — Sr. Deputado Diogo Feio, no que diz respeito à questão que levantou sobre o IMI e o IMT para os off-shore, gostaria de salientar que há uma diferença entre esta situação e a dos fundos de investimento mobiliário que referiu. De facto, as alterações nos fundos de investimento mobiliário implicam efectivamente uma despesa fiscal superior a 100 milhões de euros, mas, neste caso, Sr. Deputado, a despesa fiscal é nula, porque não há base tributária, não há nada a tributar. O que queremos, de facto, é evitar a deslocalização de investimentos imobiliários, muito relevantes para o desenvolvimento do turismo, que se verificou a favor de Espanha. Neste caso, temos de concorrer com Espanha, daí a introdução desta disposição, que pode trazer receita fiscal adicional, não havendo perda, porque não há, de facto, receita, e repondo uma posição competitiva de Portugal, particularmente quanto a Espanha, num sector relevante para o desenvolvimento de regiões com interesse turístico no nosso país.
Sr. Deputado Francisco Louçã, gostaria de lhe dizer que a sua norma antidemagógica é, de facto, de grande demagogia, porque, no fundo, o que o Sr. Deputado pretende é um sistema de indexação, com o qual, a meu ver, iríamos introduzir um elemento de rigidez ao ajustamento da nossa economia, face à conjuntura económica nacional e internacional, que em muito iria prejudicar a nossa capacidade de competir e crescer numa economia global.
Nesta matéria, defendo que aquilo que deve pautar a nossa orientação é, de facto, a tomada de decisões e a definição de um quadro fiscal na base da taxa de inflação esperada. E se há desvios significativos da taxa
Página 28
28 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
observada face à esperada, é porque, de facto, houve desequilíbrios macroeconómicos que tiveram de ser corrigidos e que se reflectem neste desvio da taxa de inflação.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Ora essa!
O Orador: — Tentar disfarçar isto, é, em minha opinião, não corrigir os desequilíbrios económicos e prejudicar a nossa economia.
Portanto, mecanismos de indexação como aqueles que propõe são altamente prejudiciais para a economia, porque só aumentam a sua rigidez.
Quanto à questão do planeamento fiscal, o que foi dito é que certas actuações, operações ou esquemas vão ser abrangidos pela necessidade de informação prévia. Não é todo o planeamento fiscal mas, sim, um subconjunto das operações, que terão de ser tipificadas para efeitos da intervenção que se pretende neste domínio. Daí eu achar a sua proposta, de que todos os movimentos de capitais transfronteiriços devam ser objecto dessa informação e desse acompanhamento, excessiva, sinceramente. Penso que é ir longe de mais, tanto mais que, no que se refere ao controlo das operações financeiras e às acções preventivas e fiscalizadores de operações de branqueamento de capitais, por exemplo, há um conjunto de recomendações do GAFI (Grupo de Acção Financeira Internacional), já adoptadas em Portugal — e há legislação aprovada neste Parlamento há, pelo menos, um par de anos, se bem me recordo 2 ou 3 anos —, que dão às autoridades de supervisão do sistema financeiro, às entidades financeiras e às autoridades policiais poderes de fiscalização e acompanhamento destas operações. Há regras a que a banca está sujeita para despistar operações de branqueamento de capitais. Isto já está implementado. Estas regras existem.
O que o Sr. Deputado pretende não é «medicina preventiva». O Sr. Deputado quer, primeiro, que eu «espete o bisturi no corpo do doente» e, depois, que eu veja se há, ou não, alguma coisa a retirar. Ora, eu isto não faço, Sr. Deputado!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Deixa o doente fugir!
O Orador: — O que, no fundo, o Sr. Deputado está a propor é um sistema financeiro policiado, e eu não quero um sistema financeiro policiado. Eu quero um sistema financeiro devidamente fiscalizado; policiado não! Srs. Deputados, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais irá complementar os esclarecimentos que, em matéria fiscal, não abordei.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as questões que foram colocadas reportam-se ao sector automóvel, e vou fazer uma ligação directa entre a reforma do sector automóvel e o imposto sobre o valor acrescentado.
Como sabem, o Governo tem preparada uma alteração à tributação dos veículos que entrará em vigor, se for aprovada por esta Assembleia, no dia 1 de Julho do próximo ano. Em que é que, basicamente, consiste esta alteração? Como já tinha sido anunciado (não há aqui nada de novo), o que se pretende é uma transição gradual do actual sistema de tributação monofásico na importação ou na introdução no consumo dos automóveis, passando para um sistema misto em que o actual IA vai diminuindo e, em contrapartida, se adopte um imposto sobre circulação, que tem mais a ver com o ambiente e com a utilização das viaturas do que com a sua aquisição.
Esta transição gradual irá provocar nos primeiros anos uma perda de receita fiscal. Nos primeiros anos, o que está previsto no Orçamento do Estado para 2007 é uma perda de receita do IA, comparativamente com 2006, de cerca de 3%. Passados três ou quatro anos atingiremos a «velocidade de cruzeiro» e o que acontece é que passará a haver equilíbrio de receitas. Este é um sistema evanescente em que vai aumentando o imposto de circulação. O que vai acontecer é que daqui a quatro anos será cobrado não só o imposto de circulação dos carros matriculados naquele ano mas também dos carros matriculados nos anos anteriores, chegando-se a um ponto de equilíbrio.
Esta decisão, como sabem, tinha sido tomada independentemente de qualquer ameaça de sanção por parte da Comissão Europeia, mas acabámos por acertar no timing, porque a Comissão Europeia avançou com um processo de infracção relativamente à Dinamarca, que tem um sistema muito semelhante ao que existe em Portugal.
Em traços muito gerais, será esta a alteração que iremos sujeitar a discussão e negociação com os operadores, mas o trabalho, em termos de input do Governo, está praticamente concluído. Como eu disse há pouco, haverá uma integração maior e perfeitamente desejável da componente ambiental na tributação do sector automóvel nas diversas vertentes, designadamente em relação aos veículos ligeiros e pesados.
Quanto à questão do IVA, é curioso como é que muitas vezes, passados tantos anos, as coisas mudam.
Eu aprendi que — e, se não estou em erro, isto está consagrado no artigo 16.º, n.º 5, do Código do IVA — a base tributável era constituída por um valor complexivo que incluiria outras taxas e outros impostos. Portanto,
Página 29
29 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
o que consta do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA é igualzinho ao que resultava da 6.ª Directiva e que vigorou durante cerca de 30 anos, sem qualquer contestação até agora.
A Comissão Europeia e o Tribunal Europeu mudaram de opinião agora, muito recentemente — isto mostra que não estávamos a cometer um erro, porque seguíamos rigorosamente o que estava consagrado —, no sentido de que, em princípio, a base não deve incluir outros impostos.
Relativamente ao sector automóvel, a medida que estamos a tomar de uma forma escalonada, gradual, já vai neste sentido. Ou seja, a partir do momento em que substituímos o imposto automóvel pelo imposto de circulação — e o imposto de circulação não tem, pela lógica do imposto, a incidência do IVA em si, a somar —
, o que vai acontecer é que esta nossa infracção irá diminuir ao longo do tempo, sem prejuízo de se poder vir a acelerar esta transição, que se previa ser lenta mas que, se calhar, agora, se justifica ser um pouco mais rápida do que havíamos pensado.
Quanto às SGPS (sociedades gestoras de participações sociais), em termos de globalização e de concorrência fiscal, é uma questão extremamente pertinente. O problema que se coloca é saber qual o modelo a adoptar.
Há uma publicação recente, de há três ou quatro anos, que penso que conhece, do Henri Lefèvre, sobre as holding, em que o autor faz uma análise sobre o tipo de SGPS mais adequado conforme a intenção de cada governo, o tipo de atracção que se pretenda fazer. Porém, uma coisa é saber teoricamente quais são as alternativas possíveis em termos de fiscalidade e outra coisa é saber qual é a nossa realidade concreta e quais são os constrangimentos com que nos defrontamos em termos de mudança, o que não pode ser dissociado da nossa realidade, designadamente da existência de um centro internacional de negócios, que tem o tratamento que conhece.
Portanto, o problema da mudança em termos de SGPS não é tão pacífico assim, apesar de concordar que é um tema extremamente importante no que toca à concorrência fiscal internacional.
Srs. Deputados, o problema da arbitragem, que é um tema moderno, coloca-nos uma questão que foi focada na intervenção do Deputado Francisco Louçã, o problema de ser ou não preventivo não em termos de combate à fraude e o problema do funcionamento dos tribunais, e isto também não pode ser dissociado da nossa realidade. E a nossa realidade é que os tribunais tributários têm funcionado com grandes dificuldades, como é reconhecido. O tempo médio para resolver um processo é muito longo, e ainda no outro dia ouvimos o Dr. Medina Carreira dizer na televisão que um caso tinha demorado cerca de 20 anos, o tempo foi tanto que ele já nem se lembrava do assunto. Esta é uma realidade que tem de ser resolvida (e já falámos disto há poucos dias) com o reforço do número de juízes para os tribunais tributários, que é uma condição necessária, mas não suficiente, para resolver o assunto, porque não é só em termos de quantidade que o problema se coloca.
E aqui vamos entroncar na questão da preparação e da formação dos juízes que estão a julgar determinados tipos de processo de criminalidade económica, porque, muitas vezes, não há sensibilidade para estes assuntos, por razões que se colocam com a própria formação. E aquilo que estamos a pensar fazer, aliás, já estamos a concretizar, e esta já é uma atitude preventiva, é, no que toca ao combate à fraude e evasão fiscais (aproveitando o apoio, em termos técnicos, de um especialista internacional de que o meu gabinete dispõe), começar pela base, pela própria formação no Centro de Estudos Judiciários, com módulos orientados para este combate, trazendo cá, como temos feito, especialistas de vários países para ensinarem e, de certo modo, aprenderem ao conviverem com a nossa realidade.
Portanto, há aqui um trabalho preparatório, que é fundamental, para evitar situações de se ter decisões perfeitamente contraditórias, como a que recentemente aconteceu num caso de uma grande fraude. Neste processo, o julgamento foi adiado para o próximo ano pela simples razão de o advogado ter dito que não havia sido feita a peritagem, enquanto que, num outro caso perfeitamente idêntico, o julgamento também foi adiado por ter havido peritagem. Ou seja, o que aconteceu é que o julgamento foi adiado, num caso, por não ter havido peritagem e, no outro, por ter havido peritagem, e os dois casos são relativos a situações de fraude em carrossel perfeitamente idênticas. Portanto, penso que há aqui muito a fazer e que este é também um caminho a percorrer.
Para terminar vou responder a uma questão concreta, porque há pouco — e peço desculpa por isso — a minha resposta não foi tão conclusiva e tão exaustiva como deveria ter sido. A minha resposta foi no sentido de dizer que o artigo 14.º da Lei Geral Tributária foi inicialmente concebido para as duas situações, a de benefícios fiscais e a de benefícios da segurança social, e que agora ficou limitado apenas aos benefícios da segurança social. Mas não se perdeu a regra da caducidade, porque ela está reflectida no artigo 2.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Portanto, o que constava para a parte fiscal relativamente aos benefícios fiscais também está transposto no artigo 2.º-A, que foi aditado ao Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Quanto à supressão da quantificação que estava prevista no n.º 3 do artigo 14.º da Lei Geral Tributária, uma outra questão a que também não respondi, gostaria de referir que a supressão tinha toda a lógica enquanto o n.º 3 tinha a ver apenas com benefícios fiscais, mas, a partir do momento em que o artigo 14.º ficou apenas limitado aos benefícios da segurança social, não fazia sentido que o n.º 3 fosse mantido.
Por outro lado, a norma da quantificação resulta (e foi por isto que não foi aditada ao Estatuto dos Benefícios Fiscais) da leitura conjugada dos artigos 2.º e 5.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, daí ter sido considerado desnecessário replicar esta norma. Mas a intenção do Governo, em relação à importância que tem no Orçamento do Estado a quantificação dos incentivos fiscais, está reflectida nas págs. 113 e seguintes do Rela-
Página 30
30 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
tório do Orçamento do Estado, onde se refere o classificador e o que se pretende em termos de transparência no Orçamento e na sua discussão. Estamos por isso a dar um passo no sentido de uma maior transparência, que, embora ainda não seja a que desejávamos, é a possível neste momento. De qualquer forma, a promessa que está explícita é a de que, no próximo ano, haverá uma informação ainda mais completa em relação à despesa fiscal que está associada aos benefícios fiscais. Portanto, não há qualquer intenção de ocultar informação, bem pelo contrário; a intenção é ir-se cada vez mais longe em termos de prestação de informação para todos aqueles que analisam o Relatório do Orçamento.
Posso dizer que o Relatório do Orçamento, na parte fiscal, não é ainda aquele que eu gostaria que fosse, porque, do conhecimento que tenho da experiência de outros países, os relatórios são ainda mais informativos e mais completos. Mas, se compararmos o que eram os Relatórios do Orçamento do Estado na parte fiscal em termos de explicação, verificamos que deixámos de dar aquele tipo de informação que praticamente nada dizia. Neste momento, estão explicadas as medidas, está explicado o porquê, as razões, e este é o caminho que iremos prosseguir, o de dar informação cada vez mais completa para que o Relatório do Orçamento do Estado não seja, como por vezes somos acusados, opaco, algo que ninguém perceba o que lá está.
O que se pretende — e pelo menos eu fiz a tentativa — é que em cada uma das caixas, em cada uma das páginas do Relatório, na parte fiscal, a informação seja a mais completa possível. E penso que este ano a informação é mais completa do que a do ano passado, do que a dos anos anteriores e que é perfeitamente inteligível. É este o caminho que iremos prosseguir.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr.ª Presidente, é só para obter uma resposta conclusiva da parte do Governo, por ter efeitos nos trabalhos da Comissão, sobre a apresentação e discussão de uma proposta do Primeiro-Ministro, relativa ao planeamento fiscal, em sede de especialidade do Orçamento, porque estamos todos a partir desta presunção.
Gostaria de obter esta confirmação oficial.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — E vai ser apresentada!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Também para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, quero apenas lembrar que, das perguntas que fiz, há três a que o Sr. Ministro não respondeu: a redução dos 50%, constante do artigo 69.º; o regime especial das maisvalias relacionadas com as OPA; e os atrasos nos pagamentos dos fundos comunitários.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa também para uma interpelação à mesa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr.ª Presidente, é minha interpelação é para pedir a V. Ex.ª que, se puder, mova alguma influência junto do Governo no sentido de este responder àquilo a que chamei, talvez impropriamente, «autorizações legislativas impróprias». O Governo não respondeu a esta questão, não falou desta matéria e penso que a mesa, tal como eu, não poderá concluir que o Governo entende que são impróprias ou não, que são legais ou não. E ficamos sem resposta.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, se me der licença, posso…
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para, creio, tentar esclarecer essa questão.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, peço desculpa por me ter escapado alguma questão, mas procurei responder às três que tomei nota.
Respondi à pergunta relativa ao artigo 80.º, que tem a ver com o Estatuto dos Benefícios Fiscais. A resposta pode não ter agradado a todos, mas, em relação ao âmbito do que se pretendia com a expressão «rever», que foi a questão concreta que me foi colocada, respondi dizendo que o o Estatuto dos Benefícios Fiscais estava pronto, e era este o objectivo. Portanto, penso que respondi.
Penso que também respondi à pergunta relativa ao artigo 84.º e igualmente à questão colocada sobre o regime simplificado.
Página 31
31 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Não respondi totalmente à questão das NIC (normas internacionais de contabilidade), comecei por responder ao que me parecia mais importante. De qualquer modo, aqui há que separar as razões de se ter avançado mais rapidamente em relação às NCA (normas de contabilidade ajustadas) do que às normas internacionais de contabilidade a utilizar pelas empresas cotadas.
O que acontece — e nesta matéria não tenho qualquer responsabilidade — é que um diploma do governo anterior criou uma excepção, em termos de timing, para a adopção das normas de contabilidade ajustadas pelo sector financeiro. Ora, aquilo que iria acontecer, se não tivéssemos regulamentado, era cairmos numa situação de vazio, em que cada instituição financeira faria o que quisesse.
Portanto, o que fizemos foi avançar mais rapidamente nesta matéria.
Relativamente às empresas cotadas, iremos tentar avançar, também com segurança, o mais rapidamente possível, para evitar aquela situação que foi apelidada de «dupla contabilidade» mas que, na prática, não é, porque, neste momento, como as coisas estão a funcionar, a empresa ou a sociedade utiliza o seu sistema de contabilidade e, depois, extracontabilisticamente, ao preencher o modelo 22 de IRC, procede aos ajustamentos de forma a ficar em situação de tributação perfeitamente igual à das outras empresas que não adoptam as normas internacionais de contabilidade.
De qualquer modo, esta é uma questão para a qual estamos sensibilizados e, em colaboração com a Comissão de Normalização Contabilística, iremos tentar avançar com alguma rapidez, mas também com segurança para evitar os problemas que se colocam. Mais, também temos de ver qual é o universo de contribuintes que se encontra nesta situação, e são poucos, umas centenas, pelo que não têm a dimensão que muitas vezes se pensa que têm. De qualquer modo, penso que é uma situação que necessita de clarificação.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Secretário de Estado.
Srs. Deputados, antes de terminarmos a nossa reunião com o Ministério das Finanças e da Administração Pública, quero agradecer, em nome da mesa, ao Sr. Ministro e à sua equipa o aprofundamento que pudemos fazer do orçamento do Ministério.
Está suspensa a reunião.
Eram 13 horas e 10 minutos
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Patinha Antão.
Srs. Deputados, declaro reaberta a reunião.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, caro colega Vítor Ramalho, Presidente da Comissão de Trabalho e Segurança Social: Esta é uma reunião conjunta das duas comissões em sede de debate na especialidade do Orçamento do Estado para 2007, em que vamos ouvir a equipa ministerial desta área, por solicitação dos Srs. Deputados.
Como é do vosso conhecimento, a metodologia que temos seguido nestas reuniões de discussão do Orçamento na especialidade é a seguinte: há uma intervenção inicial do Governo, que, desejavelmente, não deverá ultrapassar os 10 minutos, é uma intervenção enquadradora do debate; segue-se, uma primeira ronda de perguntas, em que os Deputados de cada um dos partidos representados no Hemiciclo dispõe de 5 minutos, após a qual o Sr. Ministro responderá a todas as questões colocadas em bloco, dispondo para o efeito de 20 minutos; haverá ainda uma segunda ronda de perguntas, com tempos, desejavelmente, um pouco mais curtos, no fim da qual o Sr. Ministro responderá às perguntas. Para tudo isto deveremos utilizar o tempo que temos disponível, que é de 2 horas.
Posto este intróito, certamente em nome de todos e também do Sr. Deputado Vítor Ramalho, apresentamos as nossas boas-vindas ao Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado e passo de imediato a palavra ao Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social para a intervenção inicial.
O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social (Vieira da Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção curta, onde, por uma vez, não irei utilizar todo o tempo disponível, porque, tratando-se de um debate na especialidade e tendo nós já tido aqui uma extensa e produtiva discussão na generalidade, julgo que será muito mais avisado que o tempo da nossa discussão seja dedicado às respostas às questões que os Srs. Deputados das várias bancadas tenham para colocar do que, propriamente, eu estar aqui a repetir-me, já que teria de ser sempre, como é óbvio, uma intervenção na generalidade, pois os 10 minutos não dariam para fazer uma intervenção de detalhe do orçamento na área do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.
Portanto, relembro-vos apenas quais são os traços essenciais do exercício orçamental proposto nas áreas que estão sob a responsabilidade deste Ministério: um orçamento de rigor, em solidariedade plena com as orientações orçamentais que Governo definiu para 2007, mas também um orçamento que leve em linha de conta o desenvolvimento das políticas sociais que são da responsabilidade deste Ministério, em particular
Página 32
32 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
aquelas que têm a ver com as situações associadas ao sistema de segurança social, às políticas de emprego e formação profissional, às políticas voltadas para as pessoas com deficiência e às políticas de combate à pobreza e à exclusão social.
Destacaria apenas que, neste enquadramento — um orçamento que mantém uma lógica de rigor mas que assume os compromissos essenciais que o Governo definiu no domínio das políticas sociais —, existe uma preocupação grande com a contenção das despesas de administração, e, deste ponto de vista, acompanhámos completamente as orientações globais quanto a este tipo de despesas, mas, do ponto de vista dos grandes sistemas sociais que estão associados a este Ministério, temos, obviamente, algumas áreas em que se regista um crescimento, quer seja um crescimento nominal e mesmo real de algumas prestações essenciais (como sejam as pensões), quer seja o crescimento de algumas verbas destinadas a políticas voluntaristas de promoção da inclusão social (refiro-me explicitamente, como já o fiz noutras ocasiões, a todas aquelas políticas que se destinam ao combate à pobreza e à exclusão social), quer seja o crescimento em áreas críticas das políticas sociais, como, por exemplo, as comissões de protecção de crianças e jovens e as políticas de apoio às pessoas com deficiência. Há um crescimento nas dotações orçamentais no âmbito deste Ministério.
Esperamos, com este exercício orçamental, conseguir alcançar um resultado final que, no domínio do orçamento da segurança social, viabilize, ainda que com uma dimensão inferior àquela que todos gostaríamos, a continuação daquilo que já vai acontecer este ano, que é o reforço das verbas destinadas ao Fundo de Estabilidade Financeira da Segurança Social (FEFSS).
A novidade aqui, como já tive oportunidade de referir, é que, enquanto que, em 2006, as verbas a transferir são as que têm origem fundamentalmente nos saldos obtidos no exercício orçamental, para 2007 já pudemos, ainda que com um valor relativamente reduzido, fixar uma verba à cabeça para o retomar do esforço de capitalização que foi interrompido, por razões que todos conhecemos, nos últimos anos.
Portanto, são estes os traços gerais dos objectivos do orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social — e, como eu disse há pouco, já foram discutidos na generalidade há umas semanas — e, a meu ver, o debate na especialidade resultará muito mais eficaz se for feito face às questões que as Sr.as e os Srs. Deputados resolverem colocar.
Assim, Sr. Presidente, termino esta minha intervenção inicial.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a primeira intervenção desta primeira ronda cabe, como é de praxe, ao PSD e será feita pelo Sr. Deputado Miguel Santos, a quem dou a palavra.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, se há coisa que este orçamento não é é um orçamento de rigor, isto, como é evidente, na nossa perspectiva, porque já percebemos que a sua perspectiva é diferente e tem-no deixado de uma forma bastante vincada nos debates que têm sido promovidos na Assembleia.
Este não é um orçamento de credibilidade e a sua execução futura provará, inevitavelmente, as erradas opções que estão a ser tomadas para o País. Senão, vejamos, e só em termos introdutórios, tal como o Sr.
Ministro fez: a despesa do Estado volta a subir — são mais 2000 milhões de euros. Sobe a despesa do Estado em valores absolutos, em termos nominais e em termos reais, aumenta a despesa total, aumenta a despesa corrente e aumenta a despesa corrente primária. Em contra-senso, o investimento decresce.
Como é que o Governo pretende suprir este aumento de despesa? Sobretudo através do aumento da receita, que é uma opção errada na perspectiva do PSD, e, fundamentalmente, através do aumento da carga fiscal sobre os portugueses.
Mas mais grave, Sr. Ministro, é que a execução do Orçamento do Estado para 2007 vai depender, em grande parte, da redução de dezenas de milhares de postos de trabalho na função pública, apesar de nem o Sr. Ministro, já aqui questionado sobre esta matéria, nem nenhum dos seus colegas de Governo terem tido a frontalidade de assumir qual vai ser o impacto nos organismos tutelados.
Posto isto, pergunto-lhe, Sr. Ministro: qual é a previsão do impacto que a redução que está prevista em termos de Orçamento do Estado para 2007 terá nos organismos tutelados por V. Ex.ª? Ainda antes de entrar propriamente na discussão na especialidade, gostaria de dizer-lhe, Sr. Ministro, que, no fim-de-semana, todos nós ouvimos o Secretário-Geral do Partido Socialista anunciar, perante os militantes do Partido Socialista reunidos em congresso — penso que, numa clara confusão de papéis sobre aquelas que são as funções de Estado de Primeiro-Ministro e as funções que exerce como Secretário-Geral do Partido Socialista —, uma proposta de aumento progressivo da remuneração mínima nacional. E vamos aguardar para tentar perceber o que significa essa proposta e em que termos é que está feita, uma vez que existe uma «intoxicação» na comunicação social que não permite perceber detalhadamente e em termos mínimos o que é que isto representa. Naturalmente que esta proposta representará um acréscimo no poder de compra para os portugueses, dependendo da forma como ela será efectuada, mas coloco a questão: como é que ela surge exactamente neste momento? Ou seja, também estava previsto em algum Programa do Governo este aumento progressivo extraordinário da remuneração mínima nacional? Ou foi por ocasião do congresso do Partido Socialista que o Sr. Secretário-Geral o resolveu anunciar este aumento, em virtude de, eventualmente, lhe poder ser benéfico, para conter algum descontentamento partidário ou, então, para iludir a opinião pública?
Página 33
33 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Uma outra questão que quero colocar, Sr. Ministro, porque tem feito referência a isto de uma forma bastante profícua, tem a ver com os 48 000 novos postos de trabalho — e o Sr. Ministro não se cansa de tentar convencer os portugueses de que eles, de facto, existem.
Sr. Ministro, há aqui realidades diferentes: uma coisa são os 48 000 novos postos de trabalho que o Sr.
Ministro afirma existirem e que correspondem à criação líquida de postos de trabalho e outra são as colocações no mercado de trabalho que são feitas regularmente pelos serviços de emprego e formação profissional e que, na maior parte dos casos, não corresponde à criação líquida de novos postos de trabalho. Aliás, Sr.
Ministro, é curioso verificar que, nas estatísticas mensais do Instituto do Emprego e Formação Profissional, que o Sr. Ministro tutela, em 2006, foram colocados 46 045 pessoas, número que nem bate certo com os 48 000 que o Sr. Ministro tem anunciado. E, como o Sr. Ministro sabe, estas colocações não distinguem se correspondem à criação líquida de postos de trabalho ou se correspondem simplesmente à rotatividade inerente do mercado de trabalho entre as pessoas que são despedidas ou cuja contratação a termo termina e as colocações que são efectuadas nesta sequência. Portanto, a pergunta é: onde estão estes 49 000 novos postos de trabalho? Penso que no distrito do Porto não estão, seguramente; nos distritos de Lisboa e de Setúbal também não deverão estar, por isso gostava que o Sr. Ministro nos esclarecesse um pouco mais detalhadamente esta matéria.
No meio de tudo isto, Sr. Ministro — mais impostos, mais carga fiscal —, surge a questão da revogação das isenções previstas no Estatuto dos Benefícios Fiscais para pessoas com deficiência igual ou superior a 60%. E nem a dedução à colecta criada vai compensar a perda destes benefícios. E, Sr. Ministro, não seria de reconhecer a injustiça com que os senhores estão a tratar estes cidadãos, sobretudo porque a forma como implementam esta medida vai beneficiar — é verdade! — cidadãos com rendimentos mais baixos…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, agradeço que conclua.
O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, a forma como implementam esta medida vai beneficiar cidadãos com rendimentos mais baixos, mas vai penalizar outros cidadãos em favor daqueles. E estamos a falar de pessoas com deficiência que enfrentam as maiores dificuldades no dia-a-dia, seja de locomoção, seja de inserção no mercado de trabalho, seja de desenvolvimento social ou financeiro.
Para não tirar tempo aos outros colegas Deputados, fico-me por aqui, reservando para a segunda ronda mais algumas outras questões.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.
A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, não querendo fazer aqui a psicanálise da oposição, depois de ouvir o Deputado Miguel Santos, fico sempre com aquela sensação de uma certa nostalgia de um paraíso perdido ou de uma oportunidade não concretizada, que, depois, se vem a lançar em algumas críticas e até em algumas preocupações, por exemplo, com a redução dos postos de trabalho. E, que eu saiba, foi exactamente o líder do PSD que propôs até o despedimento de funcionários públicos como uma solução um tanto ou quanto miraculosa, porque nunca foi experimentada e muito menos previsível, e a ser suportada com subvenções provenientes da União Europeia.
Quanto à questão do aumento da remuneração mínima nacional, isto já era previsível há muito tempo.
Aliás, o Partido Socialista há muito tempo que anunciava a intenção de fazer a desindexação das prestações sociais do salário mínimo, exactamente para que ele cumprisse as suas funções e para que pudesse haver uma revalorização desta remuneração como retribuição de trabalho.
Como é evidente, este é, na nossa perspectiva, um orçamento equilibrado, um orçamento que respeita o esforço de consolidação das contas correntes e que, pela primeira vez em uma série de anos, vem cumprir a lei de bases e, como foi dito, e muito bem, pelo Sr. Ministro — facto inédito nos últimos anos —, a fixação logo à partida da capitalização da transferência dos trabalhadores no reforço das verbas de capitalização. É também um orçamento que tem preocupações não só com a consolidação das contas públicas mas também com a pobreza, tem uma grande preocupação social, antecipando o escalão etário, por exemplo, de abrangência do complemento solidário para idosos.
Gostaria de ouvir o Sr. Ministro sobre esta medida.
Outra das críticas, por vezes feitas pelos detractores deste orçamento, tem a ver exactamente com o PIDDAC, com a existência de um pretenso baixo PIDDAC na área da segurança social, quando nós sabemos que o PARS é um programa que vem ultrapassar, em muito, qualquer verba alguma vez inscrita em PIDDAC nesta área.
Também gostaria de ouvir o Sr. Ministro sobre esta medida.
Quanto às questões que têm a ver com as pessoas com deficiência, ao longo da discussão deste orçamento foi, por várias vezes, referida a intencionalidade de introduzir um certificado multifunções. E eu gostaria de saber em que residirá este certificado e que mais-valias trará em relação às vulgares declarações de incapacidade. Por outro lado, gostaria também de ouvir o Sr. Ministro falar da revisão que, por várias vezes, foi propalada no apoio às ajudas técnicas.
Página 34
34 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
São estas as questões que quero aqui deixar.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Segurança Social, uma vez que o tempo é curto, começo por colocar-lhe um conjunto de preocupações, sendo a primeira relativa ao acompanhamento da situação financeira da segurança social.
O Tribunal de Contas, no seu relatório, publicado há bem poucos dias, diz que a informação do sistema de informação financeira é insuficiente e pouco credível. Aquando do debate na generalidade, tivemos oportunidade de perguntar directamente ao Sr. Ministro qual era a dívida declarada à segurança social, ao que, na altura, o Sr. Ministro não respondeu, foi evasivo, dizendo que não estava em condições de responder.
Sr. Ministro, explique-nos como é possível que um Ministério como o seu não consiga ter a postura de ser muito claro e muito concreto quanto à situação financeira para com o Tribunal de Contas, nem nos consiga esclarecer sobre a dívida declarada à segurança social, actualmente existente.
A segunda questão tem a ver com o emprego, porque registámos com muita preocupação que o orçamento, que prevê taxas de crescimento de 1,8%, não vai, do ponto de vista económico, responder ao problema do crescimento do desemprego. Aliás, o próprio orçamento aponta para a diminuição do desemprego em apenas uma décima, ou seja, 0,1%, o que é claramente insuficiente e legítimo questionar, o que é feito até pelos diferentes especialistas nas áreas económicas, porque, segundo estes especialistas, do ponto de vista económico, só a partir de uma taxa de crescimento de 2% é que há crescimento sustentado do emprego.
Portanto, registamos aqui esta preocupação quanto aos níveis do desemprego.
Deixamos as transferências para o subsídio de desemprego para uma segunda intervenção, porque, claramente, elas não respondem a esta realidade.
Já foi aqui colocada a questão da política salarial. O seu colega de Governo, em negociação com a Administração Pública, teve a distinta «lata», permita-me a expressão, de propor aumentos salariais de 1% (porque 0,5% vai para a ADSE) e 0,08 € de aumento para o subsídio de almoço. O Governo anuncia as questões do aumento do salário mínimo, e, nesta bancada, teve sempre um acérrimo defensor de que é preciso aumentar de uma forma digna o salário mínimo nacional. Recentes notícias dão conta de que há uma perspectiva de evolução nesta matéria, gostaria que nos esclarecesse, independentemente de esta matéria estar em sede de concertação social, qual é a sua postura, a sua ideia relativamente às questões do aumento do salário mínimo nacional.
Uma outra preocupação, Sr. Ministro, tem a ver com o facto de o Orçamento do Estado cortar em 446 milhões de euros as despesas com funcionários, com trabalhadores da Administração Pública, e para já não vou falar dos impactos que isto poderá trazer a nível do aumento do desemprego — não vou colocar-lhe esta questão directamente. Pergunto: havendo um corte de 3 milhões no seu orçamento em despesas com pessoal, como é que o Sr. Ministro vai concretizar isto? Ou seja, quantos trabalhadores vai colocar em supernumerários? Temos a notícia de que 40 trabalhadores a «recibo verde» do Instituto da Segurança Social já foram dispensados. É este o caminho? Todos os trabalhadores a «recibos verdes», e muitos deles são falsos trabalhadores a «recibos verdes», que trabalham para o seu Ministério vão ser dispensados? Vai colocar trabalhadores em supranumerários? Como é que vai concretizar a meta dos 3 milhões de euros? Quero ainda dar uma nota relativamente às previsões do Governo quanto à ruptura financeira da segurança social.
O Sr. Ministro das Finanças, num programa de televisão e numa atitude alarmista, falou numa possível ruptura da segurança social em 2015, facto que, na altura, denunciámos. A verdade é que, em 2005, o saldo da segurança social foi positivo, em 297 milhões; em 2006, o saldo passou para 314 milhões; e, em 2007, o Tribunal de Contas dá uma perspectiva bastante optimista, algo que saudamos e que prova que há muito caminho a fazer do lado da receita. Pergunto: tendo em conta estes saldos positivos e que não estavam previstos nos estudos que fundamentaram as reformas da segurança social, o Sr. Ministro e o seu Governo propõem-se rever os estudos e as suas conclusões? Sr. Ministro, os saldos positivos são consequência de passos concretos que foram dados e que melhoraram a situação financeira da segurança social, o que nos permite tirar a seguinte conclusão: se olharmos para o lado da receita, para o crescimento económico, o desemprego e, nomeadamente, para o combate à fraude e evasão fiscais, muito provavelmente teríamos uma situação financeira da segurança social bastante diferente.
O Sr. Presidente: — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.
O Orador: — Para concluir, Sr. Presidente, vou fazer uma selecção das perguntas que pretendia colocar.
No que diz respeito às transferência para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), matéria que o Sr. Ministro teve a delicadeza de referir, de acordo com o artigo 34.º da proposta de lei reverte para o Fundo uma parcela até 2 pontos percentuais, mas a Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social refere uma parcela entre 2 e 4 pontos percentuais. A questão está em saber-se se se vai cumprir ou não a Lei quanto a esta matéria.
Página 35
35 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Por fim, os incentivos para a criação de emprego nas regiões do interior do nosso país. A segurança social vai ou não ser compensada das contribuições que as entidades empregadoras vão ser dispensadas de pagar para esses incentivos? Naturalmente, nada temos contra os incentivos, apenas queremos saber se a segurança social vai ou não ser compensada.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Segurança Social, como o tempo não abunda e como já tivemos uma primeira discussão do Orçamento, onde se fizeram as considerações genéricas, fico-me pelas perguntas muito concretas para esclarecimento de dúvidas.
Começo pela implementação do III Plano Nacional para a Igualdade e também do III Plano Nacional contra a Violência Doméstica. Naquilo que é o orçamento para a segurança social, estas verbas não estão claramente inscritas.
No ano passado, se bem se recorda, foi distribuído um «mapinha» onde se considerava, como prioridades, áreas de actuação como o II Plano Nacional Contra a Violência Doméstica e também o reforço das comissões de protecção de crianças e jovens em risco; eram elencadas verbas para a violência doméstica, 409 918 €, para as comissões de protecção de crianças e jovens em risco, 7,570 milhões de euros.
No orçamento da Presidência do Conselho de Ministros constata-se que a verba inscrita, efectivamente, para o Plano Nacional contra a Violência Doméstica é menor do que a que estava perspectivada para 2006.
Pergunto: nas verbas que vêm incluídas na área da acção social, também estão contempladas verbas para este plano de combate à violência doméstica, que, como bem sabe, cresce assustadora e diariamente? A segunda questão tem a ver com a protecção a crianças e jovens em risco. Sabemos que foram contratados mais técnicos, mas consideramos que foram mal contratados, porque foram contratados por empresas de trabalho temporário quando, a nosso ver, deveriam ter um vínculo de serviço público. E parece-nos que o seu Ministério tem grandes responsabilidades naquilo que é o equilíbrio destas comissões, que se pretende que sejam eficazes. Também nesta área, as verbas inscritas para 2007, nomeadamente no PNAI (Plano Nacional de Acção para a Inclusão), que é até 2008, é muito inferior às inscritas em 2006 e definidas como prioridades.
Pergunto: neste «bolo», contemplado no Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social para a acção social, também está adstrita alguma verba para estas comissões? Relativamente à situação das transferências para o fundo de capitalização, Sr. Ministro, é evidente e claro — e este Governo tem feito disto alguma propaganda, no sentido do cumprimento daquilo que é a transferência para o FEFSS — que o próprio artigo 34.º da proposta de lei diz que reverte para o FEFSS uma parcela até 2 pontos percentuais. Ora, como bem sabe, a Lei de Bases da Solidariedade e Segurança Social diz que a transferência será entre 2 e 4 pontos percentuais, pelo que o Bloco de Esquerda irá apresentar, em sede de especialidade, uma proposta no sentido do cumprimento desta Lei de Bases. Pergunto: há disponibilidade para aceitar tal proposta? No que diz respeito ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, nomeadamente para as pessoas com deficiência, o Bloco de Esquerda também considera, e temo-lo vindo a afirmar na discussão deste Orçamento do Estado, que é profundamente injusto tratar, ou pretender tratar, como iguais (ou, pelo menos, é esta também a grande propaganda) situações que, a nosso ver, são perfeitamente desiguais.
Portanto, consideramos que se devem retomar os benefícios fiscais para as pessoas com deficiência, até por uma questão de igualdade social. E, como o Sr. Ministro bem sabe, ainda recentemente foi aprovada nesta Câmara, por unanimidade, a lei que proíbe e pune as discriminações com base na deficiência, pelo que, naturalmente, também nesta matéria, a linha a seguir deverá ser a de que as pessoas devem ser tratadas na sua discriminação de uma forma igual, e tratar de uma forma igual é exactamente ter o direito à diferença.
Este Orçamento não faz esta reflexão; bem pelo contrário, trata, ou pretende tratar, aquilo que não é igual de uma forma igual.
Neste sentido, o Bloco de Esquerda também irá apresentar uma proposta muito concreta para que se retome o artigo 16.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, relativamente às pessoas com deficiência.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social para responder às perguntas em bloco.
O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou procurar responder de forma sintética, para não faltar tempo, às questões colocadas pelos Srs. Deputados.
Sr. Deputado Miguel Santos, começo por dizer que não vou, aqui, retomar o debate geral sobre a natureza do Orçamento, se é ou não um Orçamento de rigor, se é ou não um Orçamento que reduz a despesa. Só conheço uma forma de medir o peso da despesa pública numa economia, que é a sua relação com a riqueza criada, todas as outras formas são meros artifícios. A comparação internacional entre os países no seu esforço de despesa pública, no seu esforço fiscal, no peso das despesas sociais, seja qual for a variável macroeconómica que se utilize, é sempre, obviamente, relacionada com o produto interno bruto. Se não se fizer isto, estamos a «comparar alhos com bugalhos».
Página 36
36 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
É claro que já ouvi tudo! Já ouvi, da parte do seu partido e do Presidente do seu partido, defender como estratégia uma redução da despesa pública em percentagem do PIB; já ouvi defender uma redução da despesa em termos reais; e, finalmente, chegaram ao ponto limite de dizer que só há contenção, só há consolidação, quando houver diminuição nominal da despesa.
Não vou entrar na discussão de dizer «se isto é assim tão evidente, por que é que não foi feito no passado?» O que quero dizer é que, de facto, este Orçamento, como na execução orçamental de 2006, faz aquilo que nunca foi feito: uma consolidação orçamental do lado da despesa e do lado da receita. Do lado da despesa, diminuindo a despesa em percentagem do produto e, do lado da receita, principalmente aumentando a eficiência fiscal.
Agora, o que também não é possível é estar quase consecutivamente a solicitar, por um lado, aumentos de despesa e, por outro, a redução da despesa nominal.
De facto, qualquer economista que observe este Orçamento pode discordar das opções, da evolução das rubricas, mas não pode deixar de constatar que, na sequência da execução orçamental de 2006, há uma redução do peso da despesa pública no Produto, e esta é a única forma de aferir um esforço de consolidação.
Do lado da segurança social, o mesmo se passa: tanto a previsão de contribuições a cobrar no ano de 2007 como a estimativa, já muito próxima dos resultados finais, de contribuições cobradas em 2006 revelam que houve um crescimento acima do Produto ou acima da massa salarial. Mas isto deve-se, na sua esmagadora maioria, para não dizer na sua quase totalidade, não ao aumento de taxas contributivas — o que de facto não existiu, a não ser em casos muito particulares, e não foram aumento de taxas — mas apenas ao aumento da eficiência contributiva. E quando há um aumento de eficiência contributiva quer dizer que se está a combater a evasão contributiva, e isto é algo que nos deve deixar a todos mais satisfeitos, porque quer dizer que a sociedade, a economia, as empresas, todos os agentes, estão a cumprir melhor as suas obrigações para com o sistema de segurança social. É isto que se passa, na generalidade, no Orçamento, e neste caso de forma muito evidente.
No que toca à questão do salário mínimo, se o Sr. Deputado for consultar os principais documentos estratégicos da acção governativa deste Governo vai encontrar múltiplas referências à estratégia que o Governo tem vindo a seguir nesta área; encontra-as, por exemplo, no Plano Nacional de Emprego, no acordo celebrado em concertação social sobre a segurança social e em vários outros documentos, e está, aliás, perfeitamente em consonância com o Programa do Governo. E qual é a estratégia? A estratégia é surge de uma situação que marca a nossa sociedade, pelo menos nos últimos 10 anos, que é a de a evolução do salário mínimo ter vindo a ser consecutivamente condicionada pelo facto de ser, mais do que um instrumento de regulação das relações laborais, um instrumento de indexação de um conjunto de despesas públicas (e não foi para isto que foi criado o salário mínimo), desde as pensões até aos subsídios aos partidos, passando por umas largas dezenas de variáveis. E o facto de isto acontecer vinha a condicionar a evolução do salário mínimo, uma vez que ele não era de facto um instrumento de regulação do mercado de trabalho mas, sim, um factor condicionante do Orçamento do Estado. Talvez por isso, talvez não apenas por isto mas também por isto, infelizmente não há nenhum país da União Europeia — repito, nenhum país da União Europeia — que tenha tido nos últimos anos uma evolução tão pouco positiva, para não lhe chamar negativa, do salário mínimo nacional. A evolução do salário mínimo nacional, em Portugal, é a pior nos últimos anos de todos os 25 países da União Europeia, com as consequências que todos sabemos que isto traz para a distribuição de rendimentos, para o combate à pobreza, para os equilíbrios sociais. E, portanto, a estratégia do Governo não foi inventada no último fim-de-semana, está consagrada em múltiplos documentos e foi apresentada, aliás, por mim, em vários debates nesta Casa, e é a de desindexar o salário mínimo nacional de um conjunto de prestações e de outras variáveis por forma a que ele possa seguir um caminho de valorização.
A proposta que já apresentámos na concertação social tem três dimensões: o salário mínimo nacional deve evoluir com a preocupação de compensar o crescimento do custo de vida, por forma a acompanhar e a defender a sua capacidade de compra; deve respeitar os ganhos de produtividade na economia; e deve também adicionar-se a estas duas dimensões uma outra e que tem a ver com a aproximação da evolução do salário mínimo àquela que tem sido, ou que será no futuro, a evolução dos ganhos reais dos salários na economia.
Portanto, são estas as três dimensões que fazem parte da nossa proposta e que discutiremos com os parceiros sociais.
Como sabe, suponho, o salário mínimo nacional é fixado pelo Governo depois da audição obrigatória por lei da Comissão Permanente de Concertação Social e da apresentação de um relatório interministerial, portanto, da responsabilidade do Governo, sobre a previsão da evolução e a proposta de evolução do salário mínimo. É isto que faremos.
Estamos a negociar e apresentaremos uma proposta, que ambicionamos que seja de médio prazo; uma proposta que fixe não apenas o salário mínimo para este ano à luz dos três princípios que apontei mas que reúna, se for possível, um consenso entre os parceiros sociais para que se tenha também uma visão de médio prazo, de modo a que o salário mínimo assuma plenamente o seu papel de combate à pobreza, como acontece em inúmeros países.
Sr. Deputado, já respondi várias vezes sobre a evolução do emprego, mas não me custa responder-lhe novamente.
Página 37
37 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Quando falamos da evolução do emprego — o mesmo acontece quando se fala do desemprego, mas, agora, estamos a falar de emprego — referenciamo-nos à única fonte de estatística oficial, que é o Instituto Nacional de Estatística. E quando falamos em variação líquida de postos de trabalho referenciamo-nos, obviamente, ao emprego registado pelo Instituto Nacional de Estatística aquando da sua publicação trimestral do Inquérito ao Emprego. Ou seja, quando, nesse Inquérito, aumenta o emprego quer dizer que há uma criação líquida de postos de trabalho, como é evidente! É o resultado da diferença entre a criação de postos de trabalho e a destruição de postos de trabalho. Vou tentar explicar isto da forma mais clara que consiga.
Se a destruição de postos de trabalho for superior à criação, há uma criação líquida negativa, logo o emprego diminui; se a criação de postos de trabalho for superior à destruição, há uma criação líquida positiva, logo o emprego aumenta.
Ora, olhando para os últimos dados conhecidos do Instituto Nacional de Estatística e comparando-os com os mesmos trimestres, que é o que deve ser feito para evitar os erros da sazonalidade, acontece que o emprego cresceu 48 800 postos de trabalho, emprego líquido.
O Sr. Deputado perguntou-me onde é que eles estão. Estão espalhados pelo País. Que eu conheça, o Inquérito ao Emprego não faz uma desagregação distrital, faz uma desagregação por NUTS II. Mas, se o Sr. Deputado quiser (agora, não tenho os números à mão, mas o Sr. Secretário de Estado tem-nos de certeza), posso dizer-lhe como é que foi esta variação nas NUTS II. Posso dizer-lhe, por exemplo, que, em termos de qualificação, como pode verificar, os postos de trabalhos criados foram em qualificações mais elevadas e que os postos de trabalho destruídos foram em qualificações menos elevadas. Verificará tudo o que quiser, porque a informação do Instituto Nacional de Estatística, que segue, aliás, as regras da União Europeia, tem detalhe e qualidade.
É apenas isto que dizemos e nada mais do que isto; as ilações, as interpretações que se podem fazer sobre estas variações, cada um fará as que entender.
Sobre os benefícios fiscais às pessoas com deficiências, vários Srs. Deputados focaram esta matéria, já foi questionado o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, que tem a responsabilidade da política fiscal sobre esta questão, eu apenas posso dizer, mais uma vez, que, neste Orçamento, o Governo não propõe qualquer redução da despesa fiscal para as pessoas com deficiência mas, sim, uma alteração à grelha da atribuição destes benefícios. E fazemo-lo, porque nos parece que a grelha proposta é mais justa e beneficia mais aqueles que mais necessitam — é este o princípio que seguimos. Se os Srs. Deputados têm uma visão diferente, apresentem as propostas que muito bem entenderem. Consideramos que todas as propostas podem ter melhorias e podem ser qualificadas. Porém, o que não faremos é voltar à proposta que constava no anterior quadro fiscal.
Em todo o caso, não gostaria de prolongar este tema, uma vez que ele já aqui foi debatido com o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, que é quem tem a responsabilidade da política fiscal.
À Sr.ª Deputada Isabel Santos — o tempo já se me está a escoar —refiro que, de facto, o complemento solidário para idosos está a desenvolver-se com um ritmo inferior àquele que eu desejaria, eu esperava um número maior de beneficiários do que o que tem actualmente. Mas, sinceramente, neste momento, em que os dados dos últimos dias deverão estar próximos dos 18 000 beneficiários, considerar que isto é irrelevante quando nem sequer atingimos o primeiro ano de aplicação desta medida… Se formos comparar o que aconteceu nos primeiros meses com esta medida e com medidas similares, verificamos que tem havido uma rapidez de concretização desta medida, cujo impacto social é enorme, é bem superior ao de medidas similares, a prestações diferenciais, que exigem um outro tipo de apreciação. E com o alargamento que foi anunciado há já uns meses, e com a aceleração do alargamento a outros escalões etários, obviamente que este instrumento irá ser ainda muito mais poderoso de combate à pobreza.
Relativamente ao PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais), como se sabe, o primeiro concurso foi lançado há uns meses, estão, neste momento, finalizados os trabalhos técnicos de apreciação das candidaturas, tendo sido aprovadas 274, num valor de apoio público da ordem dos 55 milhões de euros para 2007, o que representa um reforço muito significativo desta rede de equipamentos sociais, a qual continuará no próximo ano, com abertura de novas candidaturas, em particular para os equipamentos de apoio à família na área da primeira infância.
O Sr. Deputado Jorge Machado colocou a questão do Tribunal de Contas, que já expliquei aqui várias vezes, mas o Sr. Secretário de Estado poderá explicá-la mais detalhadamente, se tivermos tempo para isso.
Há condicionalismos que têm vindo a marcar as contas da segurança social. Como sabe, as contas até nem foram apresentadas durante alguns anos e foi este Governo que as apresentou, salvo erro, desde 2002, estando, neste momento, em dia. Não digo que estejam resolvidos todos os problemas de natureza informativa, estamos a trabalhar para os resolver, mas, felizmente, o Sr. Deputado também referiu, mais à frente, que o Tribunal de Contas assinala uma recuperação significativa das contribuições e, portanto, do equilíbrio da segurança social.
Sr. Deputado, às vezes, tenho alguma dificuldade em percebê-lo, porque, na última reunião que tivemos, pareceu-me que a oposição, em particular o Partido Comunista Português, afirmava que as verbas de crescimento do subsídio de desemprego eram demasiado elevadas, face às previsões que o Governo tinha em termos de desemprego. Sr. Deputado, estas verbas são compatíveis com duas coisas: por um lado, com uma evolução do desemprego que, como sabemos, na perspectiva do Governo, é de contenção ou até de uma ligeira baixa; por outro lado, com o impacto que, a nosso ver, irá ter a aprovação do novo regime de apoio ao
Página 38
38 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
desemprego. Mas, Sr. Deputado, como sabe, não é muito correcto fazer uma ligação directa, matemática, entre subsídio de desemprego e taxa de desemprego, porque nem todo o desemprego tem cobertura pelo subsídio de desemprego ou tem-no mas com índices diferentes.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Eu não disse isso!
O Orador: — Portanto, teoricamente, até é possível que o desemprego baixe mais e que os subsídios de desemprego cresçam mais, basta, por exemplo, que o crescimento nominal dos salários se reflicta de uma forma mais intensa ou que a taxa de cobertura dos desempregados por pessoas subsidiadas seja mais elevada.
Não deixarei de responder a todas as questões, provavelmente, só o farei na segunda ronda, mas já respondi às questões do salário mínimo nacional e apresentei a estratégia que estamos a propor.
Quanto a rever os estudos da segurança social, Sr. Deputado, todos os anos o faremos, porque todos os anos iremos cumprir e integrar no Orçamento as previsões de longo prazo da segurança social. Logo, todos os anos se fará a reavaliação das previsões de longo prazo. Agora, o que o Sr. Deputado não pode fazer é acusar a análise que o Governo fez, relativamente à evolução futura do equilíbrio da segurança social, de alarmista, só porque, neste momento, existem saldos positivos, quando sabe perfeitamente que eles só existem, no sistema contributivo, porque o Governo aprovou uma transferência extraordinária,…
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não, não!
O Orador: — … excepcional, de montantes da receita do IVA para o sistema de segurança social e que esta é uma despesa que, conforme a Lei de enquadramento orçamental, só poderá vigorar até 2009. O Sr. Deputado sabe disto perfeitamente e, portanto, não adianta estar a dizer que não há riscos no sistema de segurança social, por, neste momento, haver excedentes, quando estes excedentes têm a ver, em grande parte, com o facto de o Governo ter seguido, e bem, este tipo de transferências.
Aliás, esta mesma resposta serve para responder à questão dos 2% de capitalização, colocada pelo Bloco de Esquerda. Nós sabemos perfeitamente o que está na Lei de Bases, aliás, aquele artigo foi proposto por um governo de que fiz parte e numa altura em que tinha responsabilidades na área da segurança social. E o Sr. Deputado Jorge Machado sabe tão bem quanto eu que esta mesma Lei de Bases admite que, em situações económicas precisas, não seja possível a transferência de 2% a 4%. É o que acontece este ano! Se os Srs. Deputados fizerem uma proposta de cumprimento dos 2% a 4% e se ela, eventualmente, for aprovada — e tenho a certeza de que isto não acontecerá, para mal dos pecados dos Srs. Deputados —, isto significa que teria de ser retirada às receitas fiscais uma verba adicional com impacto nas contas públicas, com impacto no défice, com todos os impactos que conhecemos, para ser colocada no fundo de capitalização da segurança social, o que seria completamente irresponsável.
Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, como sabe, pois acompanha estas áreas, existirá, a partir de 2007, uma nova repartição de responsabilidades entre a área da Presidência e a área do Trabalho e da Solidariedade Social, no que toca à questão da violência doméstica. Posso dizer-lhe que as verbas para acção social, destinadas a esta questão, continuarão a crescer e estarão bem acima daquelas que foram previstas para 2005 — terei, depois, todo o prazer em indicar-lhe os valores —, assim como também já tive ocasião de identificar que as comissões de protecção de crianças e jovens terão um acréscimo de cerca de 22,5%.
Sr.ª Deputada, quando o Governo anuncia um reforço de capitalização para a segurança social — suponho que, nos próximos dias ou nas próximas semanas, vai haver um novo reforço de 50 milhões de euros para o fundo de capitalização da segurança social — é um pouco excessivo acusá-lo de propaganda. As pessoas têm o direito de saber a verdade! E quando há uma transferência para o fundo de estabilização isto significa que, felizmente, estamos em melhor situação na segurança social, que podemos ter mais confiança no sistema, e todos nos devemos regozijar com isto. Agora, não se passe daí, mais uma vez, para uma estratégia que seria completamente insustentável, financeiramente irresponsável e estrategicamente indefensável, que é a de estar aqui a criar por decreto uma situação que, de facto, não pode existir: a de permitir, como eu gostaria, que pelo menos 2 pontos percentuais das quotizações fossem destinados à capitalização. Gostaria que assim acontecesse, mas a situação financeira ainda não o permite! Tudo farei para que o venha a permitir, mas não é fácil, com a situação a que chegou o sistema de segurança social. Já o facto de, este ano, pela primeira vez, desde há uma série de anos, se assumir que, à cabeça, uma parte da despesa da segurança social vai para a capitalização é algo extremamente positivo; pessoalmente, independentemente da responsabilidade que tenho nesta área, considero-o extremamente positivo. Agora, mais do que isto só se estivéssemos noutra situação, que não é, infelizmente, aquela que temos hoje.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar na segunda ronda, com intervenções, desejavelmente, de 3 minutos, mantendo a mesma ordem, mas, naturalmente, em relação ao CDS-PP, alocando um tempo de 8 minutos.
Página 39
39 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Assim, por parte do Partido Social Democrata, para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, já aquando da discussão na generalidade coloquei-lhe uma questão a que não respondeu, talvez por descuido, mas, hoje, voltou a não responder. Portanto, vou colocá-la de novo e o Sr. Ministro dará a resposta que entender.
Sr. Ministro, a questão tem a ver com o facto de se fazer depender a execução do Orçamento do Estado para 2007 da redução de dezenas de milhares de postos de trabalho. Hoje, questionei, outra vez, o Sr. Ministro sobre o impacto desta medida nos organismos tutelados por V. Ex.ª. Como já disse, já o havia feito anteriormente, hoje, voltei a fazê-lo e questiono-o, agora, outra vez, pelo que gostaria, efectivamente, que o Sr.
Ministro desse uma resposta definitiva, até porque há um pormenor: no Orçamento para 2006 vinha referido o número de funcionários afectos ao seu Ministério, que era de 8873; neste Orçamento para 2007 não está previsto qualquer número de funcionários dos organismos tutelados pelo Ministério. Agradeço-lhe, pois, Sr. Ministro, a resposta que entender.
O Sr. Ministro, finalmente, levantou um pouco um véu sobre a questão do desemprego, quando fez algumas comparações com os meses homólogos e com os meses anteriores. Também já coloquei ao Sr. Ministro, diversas vezes, uma questão que está relacionada com a própria proposta de Orçamento do Estado para 2007.
O Governo vem afirmando, continuamente, que o desemprego tem vindo a baixar, ultimamente diz que está a estabilizar, mas o pagamento de subsídios de desemprego, verificado nas contas que o Banco de Portugal apresenta, está, continuamente, a aumentar, quando comparado com os meses homólogos. Ou seja, o Sr. Ministro, o Governo, diz que o desemprego está a baixar, mas, quando vamos verificar o Boletim Estatístico do Banco de Portugal, verificamos que o gasto com os pagamentos de subsídios de desemprego está a aumentar, quando comparado com os meses homólogos. Só a título de exemplo, porque é desde o 1.º mês até ao último mês de que se conhecem dados, que é o mês de Agosto, em Julho de 2005 foram gastos 1037 milhões e em Julho de 2006 foram gastos 1091 milhões, em Agosto de 2005 foram gastos 1177 milhões e em Agosto de 2006 foram gastos 1240 milhões. O Sr. Ministro já deu uma explicação relativamente a isto, mas não me parece que seja suficiente. E penso que isto também se relaciona com a previsão de aumento de verba, no Orçamento do Estado para 2007, para pagamento de subsídios de desemprego, no valor de 2,7%. Ora, contraponho isto com a redução da taxa de desemprego que também vem prevista no Orçamento do Estado, reduzindo-a para 7,5%. Já percebi que podemos teorizar um pouco à volta desta questão, mas aquilo que peço ao Sr. Ministro é que não teorize e explique, efectivamente, como é possível não só a realidade actual mas também aquela que prevê para 2007. É que não é suficiente justificar isto com as actualizações. E também penso que não será suficiente nem elucidativo afirmar as saídas de empregados sem pagamento de subsídio de desemprego e a assunção de maior número de desempregados com pagamentos de subsídio de desemprego, até porque o novo regime jurídico de atribuição do subsídio de desemprego vai entrar em vigor e, como o Sr. Ministro sabe, mas, depois, vamos verificá-lo, na prática, vai implicar a redução do tempo de subsídio atribuído, bem como a diminuição dos valores.
Portanto, Sr. Ministro, tudo isto não bate certo.
O Sr. Presidente: — Agradeço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Orador: — Concluo, Sr. Presidente, aliás, fico-me por aqui e aguardo os esclarecimentos que o Sr.
Ministro entenda dar.
O Sr. Presidente: — Por parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra a Sr.ª Deputada Esmeralda Ramires.
A Sr.ª Esmeralda Ramires (PS): — Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, estamos perante um orçamento que, podendo não ser o desejável, é o possível, o qual se caracteriza pela credibilidade e pelo rigor — o Sr. Deputado Miguel Santos não concorda, mas também não concorda com imensas coisas, pelo que não seja por isso — e pretende viabilizar as reformas que o Governo tem em curso.
Em sede de especialidade, nesta Comissão, atenta a importância das questões do emprego, gostaria de começar por destacar e elencar alguns contributos deste Governo para uma efectiva política de emprego.
Destaco, em primeiro lugar, o investimento deste Governo no alargamento da rede de serviços e equipamentos sociais para crianças e idosos, bem como para pessoas com deficiências ou incapacidades. Este investimento é, de facto, um forte contributo para libertar as mulheres e os homens para aceitarem trabalho e, consequentemente, proporcionar a sua efectiva integração no mercado de trabalho, o que contribui imenso para um maior grau de empregabilidade, aquando de um crescimento, que se espera e que se pretende que seja cada vez maior, do emprego.
Página 40
40 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Em segundo lugar, estando o problema do emprego associado ao desenvolvimento económico, é a previsível mudança de página da nossa economia, resultante da política deste Governo, que só por si nos oferece um cenário de expectativa de crescimento do emprego.
Em terceiro lugar, é de realçar o esforço deste Orçamento no contributo para o crescimento do emprego, desde logo com as medidas activas de emprego, com a formação profissional dos jovens e dos desempregados de longa duração, com a medida de apoio à criação e manutenção de emprego nas zonas de reconhecida interioridade, com o apoio às empresas, com o apoio e com a promoção da igualdade de oportunidades.
Acresce ainda o contributo deste Governo para a responsabilidade pessoal introduzida na nova lei para os trabalhadores desempregados com direito a subsídio, designadamente a comprovação da procura activa de emprego.
Sr. Presidente e Srs. Ministros, considerando que este é um Orçamento credível e rigoroso mas que pretende abranger todos numa perspectiva de inclusão, gostaria de perguntar qual vai ser o esforço de aplicação do Orçamento do Estado para 2007 com as medidas destinadas aos trabalhadores com deficiência e aos trabalhadores migrantes.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa, dispondo de 3 minutos.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, comparando as contribuições previstas neste Orçamento com o valor de 2006 o aumento é apenas de 5,7%; se comparar o de 2006 com o de 2005 o aumento é de 7,2%. Qual é a razão desta redução? Há uma previsão para 2007 de um aumento das contribuições ou das receitas de 5,7%, o que relativamente ao ano anterior é inferior em mais de um ponto percentual. Portanto, parece-me uma meta pouco ambiciosa. No ano passado também fizeram uma previsão de 5,7% e, depois, o que aconteceu foi diferente. É isso que quero recordar.
A segunda questão que quero colocar, também relacionada com esta matéria, é a seguinte: em relação ao aumento de 5,2%, qual é a parte que resulta de variação dos salários, qual é a parte de uma maior eficiência no combate à fraude e evasão e qual a parte que resulta da recuperação da dívida? Portanto, gostaria de saber se é possível ao Governo repartir, desagregar este aumento pelas suas várias componentes, pois não tenho essa informação.
Passo a uma terceira questão, que já foi colocada mas à qual o Sr. Ministro não respondeu, e por isso volto a colocá-la.
Na proposta de Orçamento é criado um novo incentivo à criação de emprego. Só gostava de saber quem é que vai pagar isso, se é o orçamento da segurança social se é o Orçamento do Estado.
Uma outra questão está ligada já com afirmações do Sr. Ministro nesta audição, mas também em audições anteriores e até públicas. O Sr. Ministro tem falado sobre o emprego, referindo que o mesmo está a crescer – aliás, no outro dia até fez aqui uma rábula relativamente a um colega da bancada do Bloco Esquerda. Bom, mas eu vou só dar um número para reflectirmos um bocado. É que mesmo em período de crise tem havido crescimento do emprego em Portugal. Por exemplo, de 2002 a 2004 o emprego líquido – é líquido, não é outro – cresceu, de acordo como INE, em 105 000 postos de trabalho. Está aqui! Se quiser pode ver; é olhar para as estatísticas! Olhe para as estatísticas! Entre 2004 e o primeiro trimestre de 2005 diminui em 30 000 e, depois, entre o primeiro trimestre de 2005 e o segundo trimestre de 2006 aumentou em 86 000. São as estatísticas do emprego do INE – se quiser vá ver –, onde está o número total de emprego.
Finalmente, quero colocar-lhe uma outra questão.
O Sr. Ministro referiu outra vez as suas preocupações em relação à situação financeira e até criticou o meu camarada de bancada por ele dizer que são alarmismo as afirmações do Ministro das Finanças e as suas. Há uma coisa que não compreendo: se o Sr. Ministro está tão preocupado com a situação financeira como é que isso se compatibiliza com a apresentação de uma proposta de lei bases da segurança social onde introduz dois plafonamentos, o seu e o do PSD?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, muito obrigado pela extensão de tempo que me concede, considerando que não estive presente na primeira volta de perguntas. Gostava exactamente de começar por explicar isso, quer ao Sr. Presidente, quer ao Sr. Ministro, quer aos Srs. Deputados.
Estive numa reunião da 1.ª Comissão a votar um diploma importante e, por isso mesmo, não me foi possível estar aqui. Ainda não tenho o dom da ubiquidade, de estar em dois sítios ao mesmo tempo, e, por isso mesmo, antes de mais, queria pedir desculpa ao Sr. Ministro por não ter ouvido a sua intervenção inicial, o que certamente prejudicar-me-á também a mim, mas terei oportunidade de a ver depois através de outros meios.
Sr. Ministro, penso que algumas das questões que quero colocar-lhe ainda não foram referidas, mas, se, eventualmente, houver alguma repetida peço-lhe também desculpa por isso.
Página 41
41 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
Sr. Ministro, quero começar por falar de uma matéria que está a preocupar-nos, a nós CDS-PP, sobremaneira e que já foi abordada também, em parte, no debate em Plenário mas em relação à qual penso que é em especialidade que devemos conseguir elencá-la um bocadinho melhor e para a qual esperamos aqui algumas explicações por parte do Governo, porque é exactamente para isso que estas comissões servem. Prende-se essa questão com o novo regime do subsídio de desemprego.
Como o Sr. Ministro sabe, temos aqui uma oposição grande a este novo regime do desemprego – falaremos nele noutra oportunidade. Acima de tudo, a nossa grande oposição prende-se com a introdução de um regime que dificulta sobremaneira que empresas portuguesas possam reestruturar-se e com a possibilidade de haver não só uma penalização às empresas portuguesas mas também aos próprios trabalhadores que, muitas vezes, podem ser alvo dessas reestruturações, nomeadamente no caso das rescisões amigáveis para reestruturação das empresas, situação em que antigamente já era possível aos trabalhadores recorrerem ao subsídio de desemprego.
Como o Sr. Ministro sabe, no anterior regime, o caso de perda de emprego voluntária por parte do trabalhador já não lhe dava direito ao subsídio de desemprego, portanto, um trabalhador que fizesse um mútuo acordo já não tinha direito ao subsídio de desemprego, com uma excepção, que era no caso da reestruturação das empresas. Esse regime foi sendo mantido porque se entendia que era um mecanismo importante para ajudar as empresas portuguesas a reestruturarem-se e até a serem, depois, mais competitivas e era um mecanismo que também protegia os próprios trabalhadores abrangidos nestas circunstâncias.
Como é óbvio, Sr. Ministro, sabe que na bancada do CDS somos sempre a favor da moralização e entendemos que havia, eventualmente, abusos ao anterior regime, mas sinceramente não conheço uma única acção de fiscalização, por parte das entidades por si tuteladas, a empresas para saber sobre estas situações de fraude na atribuição do subsídio de desemprego, no caso nomeadamente das falsas declarações por parte das empresas e dos trabalhadores.
Assim, a primeira questão que queria fazer-lhe era exactamente no sentido de saber quantas acções de fiscalização existiram ao longo do corrente do ano sobre esta matéria.
A segunda nota, Sr. Ministro, prende-se com perceber realmente, então, quanto é que este novo regime vai poupar ao Estado. Um jornal de referência da área económica publicava há muito pouco tempo, há três semanas, que este novo regime pouparia ao Estado 59 milhões de euros.
Num anterior debate o Sr. Ministro disse logo que estes não são números oficiais, que são números com os quais o Governo nada tem a ver, que não vieram da parte do Governo. Mas, então, a questão que quero colocar-lhe, Sr. Ministro, é a seguinte: quanto é que este novo regime do subsídio de desemprego vai significar de poupança para o Estado ao longo do próximo ano de 2007? Porque se não são estes 59 milhões de euros gostava de perceber, então, qual é a dimensão desta alteração.
Sr. Ministro, acho que corremos aqui um risco muito significativo, que é o de este regime não significar nada de poupança para o Estado e de ser prejudicial para as empresas e para os trabalhadores. É um «3 em 1» ao contrário, ou seja prejudica quer o Estado, quer as empresas, quer os trabalhadores. Por certo que, nomeadamente, as empresas que terão mais dificuldades em fazer a sua reestruturação serão prejudicadas e, nesse sentido, também prejudicarão o Estado porque poderão ser menos competitivas e até, mais tarde, vir a pagar um nível de tributação fiscal superior, que era o que todos nós desejaríamos. Por isso mesmo fica aqui esta questão, Sr. Ministro, que creio ser muito importante.
Passo a outra questão. O Sr. Ministro tem falado muito, nomeadamente no debate orçamental, que um dos grandes desígnios do Governo para 2007 é reduzir os tempos médios de processamento das prestações sociais, nomeadamente falou muito sobre a prestação do subsídio de desemprego. Mas, Sr. Ministro, estive aqui a fazer a recolecção de alguns elementos, de dados oficiais do Governo, e a verdade é que o tempo médio nacional do processamento de todas as prestações sociais em Abril de 2005, quando o Governo iniciou funções – ou quando o anterior governo cessou funções –, sem incluir aqui o complemento solidário para idosos, que não existia nessa data, portanto, é uma prestação que estou a pôr à parte, era de 143 dias. Hoje (o último dado que tenho é de Julho de 2006, portanto, não é de há tanto tempo como isso), o tempo médio de processamento destas prestações vai em 168 dias.
Portanto, estamos a falar aqui de uma subida muito significativa do tempo de processamento destas prestações, estamos a falar em quase mais 13 dias do que estava previsto anteriormente, e isto, como é óbvio, como sabemos, tem um significado muito especial para as pessoas que precisam destas prestações. Estar à espera das prestações é, de facto, algo muito complicado e que gera, até, muitas vezes, situações sociais muito complicadas.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, percebo esse seu desígnio para 2007, mas a verdade é que a conclusão a que chegamos é que em 2006 houve aqui um prejuízo muito forte para os portugueses que tiveram de recorrer às prestações sociais, porque o seu tempo médio de espera é muito superior ao que era há menos de um ano. Por isso gostava também que o Sr. Ministro pudesse comentar esta escalada no tempo médio de processamento das prestações, porque, de facto, entendemos que ela é muito grave e muito prejudicial para os portugueses.
A terceira questão, Sr. Ministro, que já foi aqui falada mas que, infelizmente, acho que vai continuar a sê-lo ao longo de todo o Orçamento do Estado e mesmo depois dele, prende-se com o aumento da carga fiscal sobre os deficientes.
Página 42
42 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
Simplificadamente, o Sr. Ministro diz que não há aqui nenhuma redução por parte do Estado, que o que está a fazer-se é a retirar de um sítio para pôr no outro, gastando o Estado até um bocadinho mais.
Sr. Ministro, tenho aqui um conjunto de números – posso distribuir cópias, se for preciso –, apresentados por várias empresas e consultores internacionais, de simulações para o ano de 2007 de aumentos de carga fiscal de trabalhadores deficientes.
E, Sr. Ministro, vou dar um exemplo: um português que tenha uma deficiência superior a 60%, que tenha rendimentos, em 2006, de 20 000 euros (em 2007 seria de 20 420 euros, portanto, um aumento muito reduzido), que pagará de IRS relativo a 2006 177 euros, terá um aumento, para 2007, de 3116 euros. Este aumento significa um acréscimo percentual de 1687%! É, de facto, algo muito duro.
Sr. Ministro, mesmo que deduzamos aqui o que o Governo propõe em alternativa, que é uma dedução à colecta no valor de três salários mínimos nacionais, até partindo dos números do Governo já anunciados publicamente e que serão definidos agora de um salário mínimo de 400 euros, estamos a falar de uma verba de 1200 euros. Mesmo que retiremos isso vemos que há aqui para este trabalhador um aumento da carga fiscal superior a 300 contos num único ano.
Sr. Ministro, o Grupo Parlamentar do CDS-PP não é insensível a que haja um sistema fiscal mais justo e mais fácil de gerir para todos os trabalhadores portugueses, quer sejam portadores de deficiência ou não. Não me ponho fora disso mas, de facto, do ponto de vista social, não posso considerar a não ser bizarro haver um aumento, nestes casos, deste nível, de 1000% para um trabalhador. Ainda por cima todos nós sabemos que fazemos sempre alguma expectativa relativamente às deduções fiscais, ao que vamos pagar de impostos no próximo ano. Portanto, aumentos deste nível são absolutamente insuportáveis.
O que quero saber é se o Governo está, ou não, disponível para fazer a evolução de forma faseada não prejudicando estes trabalhadores ou, até, eventualmente, adoptar um sistema onde possam conviver o actual e este novo sistema e que, durante um, dois, três anos, caiba ao contribuinte a escolha entre um ou outro sistema.
Gostava de saber se, do ponto de vista do Governo, há alguma abertura a estas propostas.
O Sr. Presidente: — Para concluir esta segunda ronda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro do Trabalho já deu conta que as duas propostas que lhe fizemos aqui vão ser rejeitadas. Não há nada a fazer. É o Governo do Partido Socialista. Que é que se pode fazer? É a vida! No que se refere às outras questões que lhe coloquei, o Sr. Ministro também não respondeu. Com clareza, gostaria de obter alguma resposta, nomeadamente à pergunta sobre a forma de contratação dos técnicos para as comissões de protecção de menores. Como é que se sente o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social numa situação em que a contratação de pessoas para desempenhar estas funções é feita através de empresas de trabalho temporário? Coloquei-lhe a questão e já lhe tinha sido colocada anteriormente, mas o Sr. Ministro não respondeu.
Por outro lado, também não respondeu à questão de saber quantos trabalhadores do seu Ministério irão integrar o quadro dos supranumerários ou de mobilidade especial, se preferir esta terminologia.
Outra pergunta que também já lhe tinha colocado, em sede de discussão na generalidade, é como é que se sente o Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social quando se sabe que, por exemplo, na área da reinserção social correm-se sérios riscos de eficácia, por força da redução de meios que existe nesta área, nomeadamente no Instituto de Reinserção Social.
Estas perguntas vão ficando. O Sr. Ministro vai respondendo a algumas delas, mas àquelas que verdadeiramente preocupam responde imediatamente dizendo, como fez há pouco quanto às duas propostas muito concretas que lhe foram colocadas, quer ao nível da alteração do IRS quer ao nível da segurança social, que não pode ser, que a aplicação das propostas que não sejam as do Partido Socialista seria a desgraça.
Nas outras questões o Sr. Ministro quase que «assobia um pouco para o lado», como se nada se passasse em áreas tão sensíveis como as que temos vindo a colocar.
Por último, Sr. Ministro, porque nessa matéria prometeu que iria disponibilizar mais verbas, também gostaria de saber qual é a contribuição do seu Ministério para a área da violência doméstica, sendo que a verba prevista no orçamento da Presidência do Conselho de Ministros está perfeitamente clara, no Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social está prevista uma verba imensa para a acção social – que, é verdade, até cresce relativamente ao ano passado –, mas depois não sabemos exactamente onde é que ela vai parar, e nestas áreas gostaríamos muito que fosse bastante mais preciso.
O Sr. Presidente: — Para responder em bloco, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.
O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Santos, tenho de confessar que já começo a ter alguma dificuldade em responder a algumas questões que coloca, porque me vejo obrigado a repetir aquilo que já disse uma série de vezes. O Sr. Deputado continua a questio-
Página 43
43 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
nar os dados do Instituto do Emprego e do Instituto Nacional de Estatística, mas são os que lá estão. E sobre isso não lhe posso fazer nada. O Sr. Deputado, se quiser, faça um protesto ao INE. Não sei… Use a sua imaginação! Mas os dados que lá estão são esses! Relativamente às despesas com o subsídio de desemprego, elas dependem de vários factores: do número de desempregados, do número de desempregados com acesso ao subsídio de desemprego, dos salários que esses trabalhadores tinham antes de estar na situação de desemprego e também da evolução do valor do salário mínimo nacional, porque alguns subsídios de desemprego estão plafonados a esse nível. Portanto, basta o crescimento do valor do salário mínimo nacional para todos aqueles que estão com subsídio social de desemprego ou com subsídio de desemprego plafonado o verem crescer e, nesse sentido, cresce a despesa, mesmo que não cresça o número de desempregados.
Aquilo que orçamentámos resulta da análise cuidadosa que fizemos da conjugação de todas estas variáveis.
Sr. Deputado, tantas coisas foram ditas sobre valores irrealizáveis do Orçamento para 2006 e, afinal de contas, revelaram-se realizáveis. Portanto, o Sr. Deputado diz que 2,7% não é credível. Veremos, no final do ano, se é ou não credível, com base na evolução do desemprego.
Sobre a evolução dos valores do desemprego, o que lhe posso dizer é aquilo que sempre tenho dito. Não fiz nunca, nesta Casa nem em outro sítio, nenhuma declaração sobre o nível do desemprego que possa ser confundida com qualquer espécie de cenário mirífico da situação social em Portugal. O que disse, o que procurei comentar e analisar politicamente é aquilo que vem acontecendo.
De facto, o que vem acontecendo é que a economia portuguesa passou de uma situação de estagnação, do ponto de vista da criação de emprego, para uma situação de criação líquida de emprego e o crescimento do desemprego, que tinha vindo a ser elevado nos últimos anos, estancou de forma relevante ao longo já de um conjunto de meses ou de trimestres significativos, consoante a óptica que queira observar.
É isso que se está a passar. Não julgo que alguém possa, de boa-fé, contestar.
Antes de me referir às questões levantadas por outros Srs. Deputados, vou responder ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, que levantou mais questões, visto que não esteve aqui no início.
Sr. Deputado, a nova regulamentação do subsídio de desemprego, repito, foi alcançada e produzida depois de um consenso na concertação social que envolveu as duas confederações sindicais e três das quatro confederações patronais, sendo que uma, a quarta, não concordou com um ponto que é precisamente aquele que referiu, mas as outras três acordaram.
Sr. Deputado, não há nenhum artigo nesta nova protecção no desemprego que impeça situações de desemprego em empresas em reestruturação dos vários tipos – estão lá todas, listadas –, que proíba a reestruturação no âmbito, por exemplo, de um despedimento colectivo – que, é óbvio, é um instrumento que tem a suas regras.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas não é isso que o Governo propõe!
O Orador: — O Sr. Deputado considera que um desemprego por mútuo acordo é sempre melhor que um desemprego por despedimento colectivo? Olhe que há algumas diferenças nos processos que vale a pena…
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Conhece as regras do despedimento colectivo em Portugal?
O Orador: — Conheço, conheço. Vale a pena considerar algumas das regras, porque significam um outro tipo de relação social dentro da empresa.
Depois, há possibilidades de, mesmo nas situações que escapam a toda esta listagem, haver rescisões por mútuo acordo.
No entanto, toda a gente sabe, em Portugal não há nenhum parceiro social que tenha defendido o contrário, mesmo aqueles que não assinaram ou que não acordaram neste ponto, que a situação de rescisão por mútuo acordo estava, em muitos casos, a ser utilizada de forma irregular, de forma pouco apropriada no que toca à evolução desta prestação e desta situação. Não tenho, obviamente, comigo a lista das acções de fiscalização feitas neste âmbito, mas saiba o Sr. Deputado que muitas situações de desemprego por mútuo acordo são recusadas como tal pelos serviços do Ministério do Trabalho. Não pense que são todas aprovadas automaticamente. Não tenho aqui o número, mas, se quiser, posso fazer um pedido à Inspecção-Geral do Trabalho e saberá que não é automático.
Porém, Sr. Deputado, a legislação do subsídio de desemprego, que é socialmente muito sensível, foi alterada com um sentido que, a meu ver, é de um alcance notável. Foi alterada no sentido de tornar esta prestação social mais imune a uma utilização indevida. Foi esse o objectivo que uniu todos os parceiros e que o Governo perseguia. Não é para reduzir a despesa, não é para diminuir… Já aqui foi dito hoje que diminuem os valores do subsídio de desemprego – onde? Houve ajustamentos nos prazos, nalguns casos diminuindo e noutros casos aumentando! Aumentando nas situações socialmente mais graves, como, por exemplo, no caso dos trabalhadores mais idosos, que são aqueles que têm mais dificuldade em regressar ao mercado de trabalho. Há, no entanto, instrumentos que não existiam para combater a utilização indevida do subsídio de desem-
Página 44
44 II SÉRIE-OE — NÚMERO 10
prego, e que agora existem, como, por exemplo, as regras para a aceitação do chamado «emprego conveniente». Alguém está contra isto? Perguntam-nos: quanto é que o Governo vai poupar? Vamos poupar na exacta capacidade que tivermos em tornar este instrumento um instrumento eficaz no combate à fraude e à utilização indevida do subsídio de desemprego. Perguntam-me o valor, mas não digo, porque vai depender da nossa capacidade de o fazer. Eu, como já alguém disse, aqui, nesta Casa, sobre combate a fraude e evasão, gosto mais de apresentar resultados do que de fazer previsões.
Não vejo, porém, razão para essas suas preocupações. Espero, sinceramente, que desta nova legislação resulte um subsídio de desemprego mais moralizado, mais eficaz e destinado efectivamente a quem dele precisa. É isso que espero e tenho uma grande confiança de que isso vai acontecer, porque, se não, não teria sido possível o consenso na concertação social dos dois lados: dos empregadores e das associações sindicais.
Sr. Deputado, não sei onde foi buscar os valores dos números médios. Quanto às prestações substitutivas de rendimento do trabalho, o que lhe posso fizer é que o tempo médio de processamento do subsídio de desemprego é de 31 dias, do subsídio de maternidade é de 23 dias e do subsídio de doença é de 22 dias.
Todos eles baixam relativamente a 2005, alguns deles de forma significativa. E aquilo que referi aqui e mantenho é que fixámos, até ao final de 2006, o objectivo de que nestas prestações substitutivas de rendimento do trabalho o valor máximo – e não o médio – nunca ultrapassar os 30 dias. Foi esse o nosso compromisso. Contudo, todas elas baixaram e no caso do subsídio do desemprego de forma significativa, porque, do início de 2005 a Setembro de 2007, a média nacional passou de 41 dias para 31 dias.
Porém, o nosso compromisso é outro: que não haja ninguém que esteja sem receber o subsídio mais de 30 dias.
Estas prestações, porque não estão sujeitas a condições de recurso, são as mais relevantes, visto que é natural que nas que estão sujeitas a condições de recurso os tempos sejam um bocadinho maiores. Em todo o caso, no rendimento social de inserção também houve uma redução muito significativa.
Sr. Deputado, já respondi sobre as questões dos benefícios fiscais para as pessoas com deficiência. Simulações há muitas e algumas das que foram feitas nos jornais não consideraram, por exemplo, as deduções com despesas de educação, as deduções com despesas de saúde, e isso afecta a taxa de imposto, como sabe e é óbvio.
O que sei e que lhe digo – e o Governo já apresentou estes dados – é que, com a alteração proposta, vão existir muito mais pessoas com deficiência a ver a sua situação beneficiada do que pessoas que vão ver a sua situação prejudicada. E, volto a dizer, o montante global da despesa fiscal, nesta área, para as pessoas com deficiência, não diminui, mas cresce.
Sr. Deputado, se quer falar mais sobre esta questão, sugiro que o faça com o Sr. Ministro das Finanças – o que, por certo, já fez –, que tem a responsabilidade sobre a política fiscal. Eu estou solidário, porque acho que é uma boa medida, que, naturalmente, poderá ser aperfeiçoada. Agora, os termos em que esse aperfeiçoamento poderá ser feito não serão discutidos comigo, como é óbvio.
No final, os Srs. Secretários de Estado que me acompanham irão completar a s minhas respostas.
Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, V. Ex.ª tentou fazer uma graça quando disse que eu rejeitei a proposta, que o Bloco de Esquerda vai apresentar, de se fazer uma capitalização de 2% a 4%. Trata-se de uma proposta à Bloco de Esquerda! Propõe um número, avança um número, e quem paga? Sei lá!... Alguém pagará!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Quem a pôs na Lei de Bases!
O Orador: — Ó Sr.ª Deputada, V. Ex.ª não leu a Lei de Bases! Tenho pena! Porque, se tivesse lido a Lei de Bases, saberia que estão lá esses 2% a 4%, quando a situação económica o permitir. E, se tem dúvidas de que a situação económica da segurança social não permite que haja uma capitalização à cabeça, então, como é que explica que o Governo tenha de colocar metade do acréscimo das receitas do IVA para reequilibrar o sistema de segurança social?!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Também não está até 2%!
O Orador: — Porque a situação económica nos permite já fazer alguma capitalização à cabeça, mas não ainda aquela que a Lei de Bases prevê. É tão simples quanto isto! Agora até pode propor 8% ou 16%! É uma proposta à Bloco de Esquerda!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Até 2% é uma proposta à PS!
O Orador: — Não! É uma proposta realista de quem fez o que não se fazia há vários anos, que foi colocar de novo a capitalização à cabeça no sistema de segurança social.
A Sr.ª Maria Aiveca (BE): — Não é a proposta de quem fez a Lei de Bases!
Página 45
45 | II Série GOPOE - Número: 010 | 15 de Novembro de 2006
O Orador: — O Sr. Deputado Eugénio Rosa colocou aqui a questão de saber quem é que paga os benefícios fiscais dados pelo sistema de segurança social, nomeadamente os benefícios contributivos na área das políticas de interioridade. Ó Sr. Deputado, nós cumpriremos a lei. Como sabe, no caso de benefícios contributivos metade é pago pelo Orçamento do Estado, por transferências, e a outra metade pelo sistema contributivo. O que também é verdade é que, quando a próxima lei for aprovada, será Orçamento do Estado a pagar totalmente estas transferências.
Portanto, a resposta é muito simples: é cumprir a lei, nada mais.
Não sei onde é que o Sr. Deputado foi buscar os seus números, …
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Eu dou-lhe as fotocópias!
O Orador: — … mas os números que tenho aqui sobre a população empregada em Portugal são os seguintes: em 2001 eram 5,111 milhões, em 2002 eram 5,137 milhões, em 2003 eram 5,118 milhões (desceu), em 2004 eram 5,122 (cresceu 4000), em 2005 eram 5,122 (manteve-se). Estes eram os valores médios…
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Se vir por trimestre…
O Orador: — Ó Sr. Deputado, posso continuar?! Estes são os valores médios do Instituto Nacional de Estatística. São aqueles que são comparáveis! Se quiser comparar trimestre a trimestre, também o pode fazer que as conclusões serão exactamente as mesmas!
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não são!
O Orador: — Quando os valores médios dão estabilidade do emprego quer dizer que a economia não está a criar empregos líquidos. Se, em 2006, o valor médio for superior aos 5,122 milhões, então chegaremos à conclusão de que há, efectivamente, criação líquida de emprego. Veremos e cá estaremos para discutir, se, no final de 2006, o valor médio do emprego não for superior ao valor de 2005. O que acontece agora é que, ao longo do trimestre, o emprego líquido está, de facto, a acontecer.
O Sr. Eugénio Rosa (BE): — Tem de se analisar por trimestre!
O Orador: — O Sr. Deputado por vezes acha que é por trimestre e outras vezes acha que é anualmente, mas o que está a acontecer é aquilo que eu disse. Isso é indiscutível, os números aqui estão e eu citei-os: são do Instituto Nacional de Estatística. Nada mais há a dizer acerca deste assunto.
O tempo, infelizmente, está a acabar, tenho pena porque nem sequer posso passar a palavra aos Srs.
Secretários de Estado, que agora me vão penalizar por isso durante o resto da tarde, mas do facto peço desculpa.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Esqueceu-se dos supranumerários!
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, estamos a chegar ao fim da nossa reunião.
Embora possa ter havido aqui ou acolá alguma questão ou parte de questão que não tenha sido respondida, julgo que, no essencial, os objectivos que se pretendiam com a audição do ministério foram alcançados.
Está encerrada a reunião.
Eram 17 horas e 45 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.