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Sábado, 17 de Novembro de 2007 II Série-OE — Número 8
X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 16 de Novembro de 2007
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 10 horas e 20 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 162/X — Orçamento do Estado para 2008, tendo o Ministro da Saúde (Correia de Campos) apresentado à Comissão o orçamento respeitante à sua área.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado da Saúde (Francisco Ramos) e Adjunta e da Saúde (Carmen Pignatelli), os Srs. Deputados Ana Manso (PSD), Victor Baptista (PS), Bernardino Soares (PCP), Teresa Caeiro e Diogo Feio (CDS-PP), João Semedo (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Carlos Andrade Miranda (PSD), Maria Antónia Almeida Santos (PS) e Eugénio Rosa (PCP).
Sobre o orçamento do Ministério da Educação pronunciaram-se, além da Sr.ª Ministra (Maria de Lurdes Rodrigues) e dos Srs. Secretários de Estado da Educação (Valter Lemos) e Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira), os Srs. Deputados Pedro Duarte (PSD), Paula Barros (PS), Miguel Tiago (PCP), José Paulo Carvalho (CDS-PP), Ana Drago (BE), Helena Lopes da Costa (PSD) e Fernanda Asseiceira (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior pronunciaram-se, além do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago) e do Sr.
Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Manuel Heitor), os Srs. Deputados Pedro Duarte (PSD), Bravo Nico (PS), João Oliveira (PCP), José Paulo Carvalho (CDSPP), Ana Drago (BE) e Miguel Tiago (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 20 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Neto): — Srs. Deputados, vamos dar inicio à nossa reunião.
Eram 10 horas e 20 minutos.
A nossa reunião de hoje é com o Sr. Ministro da Saúde, no âmbito das obrigações regimentais e constitucionais da discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2008.
Esta é uma reunião conjunta da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Saúde, cuja Presidente, a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, está aqui presente, o que agradeço.
Queria dar as boas-vindas, em primeiro lugar, ao Sr. Ministro da Saúde e ao Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Ministro irá expor as linhas gerais das políticas públicas na área do Ministério da Saúde plasmadas no Orçamento para 2008. Em traços gerais, e de acordo com um relatório já produzido pela Comissão de Saúde, gostava de relembrar aos Srs. Deputados que, em termos de despesa consolidada, está afecta uma verba, na proposta de lei de Orçamento do Estado para 2008, para o Ministério da Saúde da ordem dos 8600 milhões de euros, qualquer coisa como 5,1% do PIB, concretamente a maior fatia do Orçamento em termos de ministério sectorial. Isto releva, grosso modo, um acréscimo de despesa relativamente ao ano transacto, de 2007, de cerca de 0,9%.
No que concerne às políticas alinhavadas na proposta de lei de Orçamento para 2008 para o Ministério da Saúde, destacaria cinco: em primeiro lugar, a reforma dos cuidados de saúde primários; em segundo lugar, o desenvolvimento e a expansão da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados; em terceiro lugar, a promoção da flexibilidade da organização hospitalar; em quarto lugar, a política do medicamento e da farmácia; e, em quinto lugar, o planeamento dos recursos humanos da saúde. São estas as linhas de força que enformam as políticas públicas na área do Ministério da Saúde para 2008.
Naturalmente, os Srs. Deputados terão também alguma curiosidade em questionar o Sr. Ministro no que concerne à aplicação do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE) no Ministério da Saúde tout court e, obviamente, no que respeita a um esforço global do Governo, que é a contenção orçamental e a redução da despesa pública. Importará também saber, junto do Sr. Ministro, o que é que está previsto nesta sede para fazer uma redução efectiva da despesa pública.
O Sr. Ministro fará, pois, uma primeira intervenção, de 15 minutos, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas. Nessa primeira ronda, cada grupo parlamentar terá direito a 7 minutos de intervenção, a que o Sr.
Ministro responderá directamente. Numa segunda ronda, de 3 minutos a cada grupo parlamentar, as perguntas serão agrupadas em bloco e o Sr. Ministro responderá de uma só vez.
Peço rigor nos tempos que estão distribuídos e também respeito escrupuloso pelo Regimento, designadamente no uso, e não no abuso, de algumas figuras regimentais, maxime das figuras da interpelação à mesa ou do protesto, que, muitas vezes, como sabem, são indevidamente utilizadas pelos Srs. Deputados para almejarem algum tempo adicional de intervenção.
Tem, então, a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde (Correia de Campos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A dotação do Serviço Nacional de Saúde no Orçamento do Estado para 2008 conta com mais 225 milhões de euros, ou seja, sobe 2,9%. É o primeiro aumento significativo desde que, em 2005, um orçamento inicial de 5,83 milhares de milhões foi corrigido com mais 1,8 milhares de milhões para o seu valor real de 7,63, no qual se manteve durante dois anos – 2006 e 2007.
Estamos em condições de afirmar, apesar de faltar mês e meio para o final do ano, que também iremos cumprir este orçamento.
Na comparação da despesa de 2006 com a estimativa para 2007 e a previsão para 2008, com universos comparáveis, esperamos controlar em 2,8% o crescimento da despesa este ano. Contámos com 2,5% de crescimento em encargos com pessoal, 2% em compras hospitalares (onde os medicamentos são a maior fatia), menos 0,9% em medicamentos vendidos nas farmácias, menos 0,4% em meios complementares de diagnóstico e terapêutica, apesar de as transferências para os hospitais EPE crescerem 5,7%. Pelo segundo ano consecutivo, dispensaremos um orçamento rectificativo.
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Esta situação permitirá lançar três novos programas – Saúde Dentária, Procriação Medicamente Assistida e Vacinação Universal e Gratuita a uma faixa etária de jovens adolescentes –, num custo total estimado de 42 milhões, para 2008; ampliar o apoio a milhares de diabéticos, com dois novos produtos de insulina retardada e bombas difusoras, num valor de cerca de 4,2 milhões de euros; ampliar o apoio terapêutico na medicação contra a dor e iniciar, tentativamente, outras terapêuticas modernas, após criteriosa avaliação fármaco-económica.
Só com rigor se pode entrar, de forma sustentável, em programas inovadores.
As garantias de que, nos 10 primeiros meses, mantivemos o crescimento negativo da factura farmacêutica nas farmácias de venda a público em menos 1,1% e, nos seis primeiros meses, na farmácia hospitalar em mais 3,1% dão-nos confiança para confirmar a boa execução de 2007.
Não incluímos no articulado do Orçamento do Estado para 2008 nenhuma medida específica de contenção para além da fixação de limites de crescimento, mas estaremos atentos ao comportamento da despesa mais sensível, que agora acompanhamos ao mês: desvios para além do previsto desencadearão medidas correctoras, como não pode deixar de ser.
A melhor garantia do rigor orçamental está, todavia, nos prestadores, médicos e enfermeiros, a quem devemos uma parte substancial dos bons resultados alcançados.
Uma palavra especial aos hospitais: é notável o esforço de modernização, permitido pelo uso criterioso de uma pequena parte das dotações de capital em algumas das maiores unidades. É, sobretudo, de saudar o esforço de contenção terapêutica inteligente, sem qualquer perda da qualidade da assistência. O esforço de contratualização cada vez mais evoluída fez baixar o volume global das verbas de convergência (como sabem, são aquelas que visam cobrir desvios acumulados por erros de gestão anteriores) de 700 milhões, em 2006, para 500 milhões, em 2007, e para 300 milhões em 2008. A execução orçamental hospitalar, que representa quase 50% da despesa total, tem vindo a aperfeiçoar-se ano após ano.
Para as economias observadas, contribui de forma decisiva a concentração de hospitais em centros hospitalares e a constituição de mais 10 novas EPE: oito em Março, duas em Outubro. Economias de escala, duplicações evitadas e maior flexibilidade de gestão com mais responsabilidade têm sido os ingredientes desta mudança.
O rigoroso cumprimento orçamental na saúde foi um factor decisivo para a já reconhecida aceitação por Bruxelas do nosso défice orçamental previsional para o ano que agora termina.
Sr.as e Srs. Deputados: Só boas contas nos permitem criar novos programas. E vale a pena recordar o anúncio do Sr. Primeiro-Ministro no início do debate.
Em primeiro lugar, o alargamento dos cuidados dentários a crianças e jovens escolarizados (aos 7 e 12/13 anos), de forma a cobrir, em parceria entre centros de saúde e sistema educativo, mais 20 000 destinatários, num total de 80 000 crianças e jovens; cobertura em saúde dentária, através de três cheques-dentista, às 65 000 grávidas cuja gravidez é seguida nos centros de saúde e dois cheques-dentista para cerca de 90 000 idosos, potenciais beneficiários do complemento solidário para idosos. O acréscimo de encargos atinge os 16 milhões de euros.
Em segundo lugar, financiamento, a partir do 2.º semestre de 2008, da vacinação universal e gratuita contra o vírus do papiloma humano, começando por um grupo etário de jovens do sexo feminino, antes da idade previsível do primeiro contacto sexual.
Os contornos técnicos desta operação, a definição dos grupos-alvo, a selecção do produto vacinal e a organização logística carecem ainda de opinião final por parte da Comissão Técnica de Vacinação da Direcção-Geral da Saúde. A nossa decisão respeitará as suas recomendações. Todavia, tem-se gerado consenso nos países que nos são próximos e com os quais temos mantido contactos estreitos sobre esta matéria. O custo total inicial será de 15 milhões de euros e duplicará nos segundo e terceiro anos, se for adoptada a estratégia de recuperação progressiva de mais faixas etárias.
Em terceiro lugar, financiamento a 100% dos tratamentos de procriação medicamente assistida na primeira linha (inseminação intra-uterina e indução/estimulação ovárica) e de parte da segunda linha, relativa a fecundação in vitro e injecção intracitoplasmática de espermatozóides, cobrindo o 1.º ciclo, mais a transferência de embriões criopreservados. Estes tratamentos, já hoje realizados gratuitamente nos centros públicos, com grandes listas de espera, passarão a ser prestados também gratuitamente no sector privado, em regime de convenção com o Serviço Nacional de Saúde.
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Manter-se-á a comparticipação medicamentosa de 37%, o que terá um resultado final de responsabilidade financeira de 56% para o SNS e de 44% (em vez dos anteriores 53%) para os casais candidatos.
Com este programa, esperamos fazer sair Portugal da cauda da Europa na procriação medicamente assistida (PMA), actualmente com 250 ciclos por milhão de habitantes, para um valor de 625, próximo dos 665 do Reino Unido, acima dos 584 da Áustria, mas ainda um pouco abaixo dos 803 da Alemanha. Este programa implicará um acréscimo de 12 milhões/ano para o SNS, além dos 6,5 milhões que já hoje se despendem em medicamentos, e espera-se que possa gerar 1400 partos adicionais e 1750 recém-nascidos.
O programa do Governo na área da saúde, como muito bem referiu o Sr. Presidente, continua centrado em três orientações: cuidados primários, através de unidades de saúde familiares; cuidados continuados a idosos e dependentes; e eficiente controlo da gestão orçamental.
Demonstrada que foi a boa execução da última orientação, olhemos às duas primeiras.
Confrontando o desempenho nos nove primeiros meses deste ano com período homólogo do ano anterior, o número de consultas em centros de saúde continua a aumentar.
Nas consultas programadas, o aumento foi de 1,6%, ou seja, mais 331 700 consultas em apenas nove meses. Os atendimentos em serviços de atendimento permanente (SAP) reduziram-se, como deveria ser, menos 14,3% As primeiras consultas do ano, um bom indicador de acessibilidade, subiram 4%, ou seja, 258 480, passando de 25,2 para 26,6% do total de consultas.
Estão em funcionamento 73 unidades de saúde familiar com um ganho assistencial de 130 000 novos utentes com médico de família. Há um ano atrás, elas eram apenas 43 e o ganho assistencial de 85 000 utentes.
Havia, então, 132 candidaturas aprovadas, hoje há 204. O número de unidades móveis de saúde era, então, de 56, é agora de 76.
O centro de atendimento Saúde 24, criado a 25 de Abril, já atendeu 195 200 chamadas até ao início de Novembro. Comparando a situação de Novembro de 2007 com a de Novembro de 2006, temos, hoje, 1661 lugares contratados em cuidados continuados integrados, tínhamos então apenas 797. Tínhamos então 23 lugares em cuidados paliativos, temos hoje 68. Em Março de 2008, teremos 2397 lugares de cuidados continuados integrados e, no final do ano, 3029.
O acesso ao medicamento foi profundamente revolucionado.
Temos, hoje, 552 lojas de venda de medicamentos não sujeitos a receita médica, tínhamos 333 há um ano.
Os genéricos representam, hoje, 17,7% do mercado em valor; há um ano representavam 15,2%.
O preço dos medicamentos, que já havia diminuído para —0,4% em 2006, reduziu para —0,3% entre o 1.º e o 2.º trimestre de 2007, e para —2,6% entre o 2.º e o 3.º trimestre. Dos 10 medicamentos mais vendidos, os 9 que são comparticipados baixaram todos de preço para o consumidor.
Os encargos com comparticipações de medicamentos nas farmácias, que haviam subido 9,6% entre 2003 e 2004, 4,1% entre 2004 e 2005, baixaram para —1,4% entre 2005 e 2006 e, no mês de Outubro deste ano, têm uma redução acumulada de —1,1% na comparação com os 10 meses homólogos do ano anterior. O consumo de medicamentos em meio hospitalar, que crescia, entre 1998 e 2002, à média anual de 16%, subiu em 2006 apenas 3,6% e nos primeiros seis meses deste ano apenas 3,1%.
Temos, assim, Sr.as e Srs. Deputados, medicamentos mais baratos, mais próximos do consumidor, e tanto as famílias como o SNS têm vindo a controlar a respectiva factura farmacêutica sem qualquer restrição terapêutica identificável.
O acesso aos cuidados de saúde, quer em consulta externa de especialidade (hospitalar) quer em cirurgia electiva, também registou uma evolução positiva. Comparando 2004 com 2007, com extrapolação dos primeiros oito meses deste último ano, fazem-se, agora, mais 1 122 652 consultas externas hospitalares por ano. Só nos primeiros oito meses de 2007 o crescimento em consultas hospitalares, face ao mesmo período do ano anterior, foi de 4%, ou seja 230 700 a mais. No ano de 2006 realizaram-se mais 322 600 consultas do que em 2005.
As primeiras consultas no total de consultas, um bom indicador de acessibilidade, que se encontrava em 24,9% em 2005, subiu para 25% em 2006 e atingiu 26% no total acumulado até Agosto de 2007.
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Na cirurgia em contexto hospitalar, o crescimento nos primeiros oito meses deste ano foi de 6,2% no total, de 8,3% nas programadas, de 29% nas cirurgias de ambulatório, tendo-se reduzido em 1,5% as cirurgias urgentes, sinal de gestão mais eficiente e de melhor qualidade.
Na cirurgia electiva (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia — SIGIC) continuam a observar-se movimentos consistentes.
A redução dos doentes em lista de inscritos para cirurgia (LIC) de 241 000 em 2005 para 203 000 em 2007, o que significa uma redução de 38 000 pacientes em três anos.
A lista de espera a mais de seis meses baixou também. A mediana do tempo de espera, em meses, baixou, no mesmo período, de 8,57 para 4,8 — a média baixou de 13 para 8 meses.
O número de pessoas que entram na lista de inscritos para cirurgia é cada vez menor (proporcionalmente, claro está) face ao número dos que foram tratados — a razão entre tratados e inscritos subiu de 105 para 111, em apenas um ano.
Em algumas intervenções electivas, onde o tempo conta para salvar vidas, a mediana de tempos de espera é muito mais baixa que a mediana geral. Assim, na urgência das neoplasias malignas, a situação melhorou consideravelmente desde 2005. Tínhamos então 4577 doentes em lista de espera com 2,7 meses de mediana; em Setembro último, tínhamos apenas 1,57 meses e a lista baixou em 1080 doentes. Em algumas localizações de maior sensibilidade à evolução temporal, como o cancro da mama, alcançámos 1,23, 1,67 na próstata e 1,07 meses no cancro do cólon e recto (valores nacionais). É, certamente, ainda um tempo intolerável para todos nós, é um tempo a encurtar, mas devemos reconhecer a visível melhoria em relação à situação inicial.
O sistema de emergência pré-hospitalar e o respectivo transporte assistido têm tido, e vão ter, uma responsabilidade acrescida. Os meios disponíveis do INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica, IP) foram muito ampliados. Passámos de 35 a 45 ambulâncias VMER (Viatura Médica de Emergência e Reanimação), de 16 a 42 ambulâncias SIV (Suporte Imediato de Vida), de 46 a 86 ambulâncias de emergência SAE (Serviço de Ambulância e Emergência) e vamos passar de 2 a 5 helicópteros. Em apenas um ano aumentaram em 11% as chamadas de emergência; os accionamentos das VMER subiram 16%; os accionamentos de helicóptero passaram de 466 a 673.
Para atingir este nível de recursos, o orçamento do INEM cresce 12% este ano.
Apesar destes visíveis progressos, Sr.as e Srs. Deputados, reconhecemos estar ainda muito para fazer. Os tempos médios de espera em cirurgia são ainda excessivos e as listas de espera para consulta de especialidade, apesar do visível aumento de produção, mantém-se em valores inaceitáveis, sobretudo em algumas especialidades como a oftalmologia, a otorrinolaringologia e a urologia, razão pela qual estamos a adoptar medidas especialmente orientadas para os atrasos no acesso, que terei muito gosto em partilhar convosco.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Ministério da Saúde apresenta-se perante as duas Comissões com a consciência de que o caminho percorrido, por difícil que tenha sido, nos permite agora registar bons resultados. Os encargos com a saúde continuam a crescer mais depressa do que o PIB, como acontece em todas as nações evoluídas, mas com moderação e rigor foi possível abrir espaço para novos programas, novas tecnologias, novos serviços.
Os nossos hospitais estão muitíssimo melhores do que quando os encontrámos, os centros de saúde, sobretudo aqueles que dispõem de USF, estão irreconhecíveis. Criámos um novo programa para apoio universal de saúde a idosos e dependentes. Os medicamentos reduziram o seu peso na factura final e as reformas empreendidas devolveram governabilidade ao sector.
Se é verdade ter sido necessário lutar contra interesses instalados, essa luta foi frontal e leal e dela resultou um Ministério mais informado, uma governação mais rigorosa e sempre assertiva. O trabalho pela frente, o caminho a percorrer, são ainda de uma dimensão que extravasa o ciclo político. As duas principais reformas, cuidados primários e cuidados continuados, carecem, porventura, de uma década para se solidificarem e tornarem irreversíveis.
Sr.as e Srs. Deputados, ninguém concentra o monopólio da sabedoria ou do conhecimento. Todos os dias se aprende. O Governo tem a noção clara de que o muito que resta fazer depende do muito que importa estudar e conhecer.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Saúde.
Vamos, então, iniciar o debate, para o qual está inscrita, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Ana Manso, a quem peço que respeite escrupulosamente os 7 minutos que lhe estão confiados.
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Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.ª Presidente da Comissão de Saúde, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, gostaria de colocar três ou quatro questões.
A primeira diz respeito à questão das dívidas.
O Governo anunciou, em 2005, que iria pôr as contas da saúde na ordem e, para isso, aprovou nesse ano um orçamento rectificativo de 1800 milhões de euros, do qual teria destacado 400 milhões de euros para pagamento de dívidas a fornecedores do Serviço Nacional de Saúde.
Aliás, o Sr. Secretário de Estado afirmou, nesta Comissão, em Novembro de 2006, relativamente às dívidas do SNS a fornecedores, que estava a ser feito um trabalho de negociação dos nossos hospitais, desta vez feito a sério, com credibilidade, com empenho e com objectivos, que estava a produzir resultados.
Ora, acontece que todos sabemos que os hospitais do SNS têm hoje elevadíssimas dívidas à indústria farmacêutica, cujo total ultrapassa os 810 milhões de euros, tendo subido, só no último ano, quase 15%. E a dívida a mais de 90 dias ultrapassa os 550 milhões de euros, registando uma subida, nos últimos 12 meses, de 23%.
Mais: nos últimos dois anos e meio, só as dívidas dos hospitais EPE aumentaram 132%, isto é, mais do que duplicaram. E a taxa de crescimento das dívidas no último ano atingiu os 48%.
Por isso, Sr. Ministro, a questão que coloco é se assume a derrapagem nas contas da saúde — esta derrapagem. E como interpretar dívidas cujo pagamento chega a ser feito com mais de 400 dias de atraso? Qual o detalhe dessas dívidas em termos de fornecedores e em termos de prazos de pagamentos? E onde está referida, para 2008, a regularização dessas dívidas? Uma outra questão, Sr. Ministro, prende-se com o investimento público.
O investimento público na área da saúde tem caído de forma muito significativa. No que diz respeito à construção dos novos hospitais, de 2007 para 2008, está prevista uma diminuição de mais de 60%, isto porque, entre outras, o Governo comprometeu-se a iniciar a construção, até ao final da década, de seis novos hospitais — Lisboa, Algarve, Seixal, Évora, Vila Nova de Gaia e Vila do Conde — que, até agora, têm sido sucessivamente adiados, com prejuízos evidentes para as respectivas populações.
Vou referir um, o mesmo, uma vez que não tivemos resposta aquando da discussão na generalidade: o hospital central do Algarve.
Há três meses, V. Ex.ª prometeu que o concurso para a sua construção seria lançado no 1.º trimestre de 2008, que as obras começariam em 2009 e que o hospital estaria concluído em 2012. Acontece que, de acordo com o Orçamento do Estado, o Governo apenas disponibiliza verbas para a construção dos «hospitais de segunda vaga» em 2011.
Isto quer dizer, Sr. Ministro, que o Governo mudou de ideias e considera que já não é urgente, ou tão urgente, construir estes novos hospitais? E qual é a repercussão em ganhos de saúde em termos dos doentes? Por outro lado, há uma quebra do investimento em PIDDAC, contrariamente ao que o Sr. Ministro nos afirmou. O orçamento de 2007 previa, no PIDDAC, 142 milhões de euros e estão previstos 107 milhões de euros para 2008, ou seja, menos 25%. Também o financiamento nacional seria de 79 milhões de euros, enquanto, para 2008, já só prevê 39 milhões de euros, ou seja, menos de metade.
Vou referir apenas seis casos concretos, Sr. Ministro: o Centro de Saúde de Almodôvar passou de 571 000 € em 2007 para 0 € em 2008; o Centro de Saõde de Macedo de Cavaleiros passou de 323 000 € em 2007 para 0 € em 2008; o Centro de Saõde de Vila de Rei passou de 697 000 € em 2007 para 0 € em 2008; o Centro de Saúde de Viana do Alentejo passou de 811 000 € em 2007 para 0 € em 2008; o Centro de Atendimento Permanente das Taipas passou de 713 00 € em 2007 para 0 € em 2008. E, já agora, permita-me também, Sr.
Ministro, que lhe fale, como é óbvio, do Hospital da Guarda, que passou de 360 000 € em 2007 para 1000 € em 2008.
Mas, Sr. Ministro, parece haver duas teses diferentes no Governo: a primeira, veiculada pelo Ministro da Saúde, que diz não confiar nos hospitais SA e logo mostra pressa em transformá-los em hospitais EPE, e a segunda, agora difundida pelo Governo, que faz saltar a Estradas de Portugal das EPE para as SA. Por isso, Sr. Ministro, julgo que devíamos saber o que o Governo pensa sobre esta matéria.
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Sr. Ministro, o Governo não investe na rede pública e parece também não querer criar condições para que os privados o possam fazer. O que está a passar-se ao nível dos convencionados é, em nosso entender, um absurdo.
Em 14 de Novembro do ano passado, a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) fez publicar um estudo referente aos convencionados, pelo qual ficou claro que o regime vigente é injusto, inadequado e até propiciador de fraude. Tudo, «preto no branco», tudo descrito, justificado, exemplificado.
Provavelmente, pela força deste relatório, precisamente aquando desta mesma reunião no ano passado, o Sr. Ministro disse: «Eu quero abrir as convenções, nós temos de abrir as convenções ao mercado». Ou: «Esta é a altura adequada para regulamentar o quadro das convenções com a preocupação de as abrir, porque a situação actual é inaceitável» — agora palavras do Sr. Secretário de Estado.
Ora, um ano volvido, e mau grado algumas das medidas de política noutras áreas irem também no mesmo sentido, o que é um facto, Sr. Ministro, é que a reforma do regime de convencionamento marca passo. E neste particular o diagnóstico está feito, pelo que não prevalece o argumento tradicional para adiar decisões, o «estafado» está em estudo ou vamos nomear um grupo de missão, um grupo de trabalho ou uma comissão.
Mais: mesmo que V. Ex.ª venha aqui argumentar que a revisão do regime de convencionamento obriga à revisão concomitante do regime de licenciamento, essa argumentação é, em nossa opinião, desculpa que não colhe, porquanto a já referida Entidade Reguladora de Saúde produziu um estudo que inclui propostas e recomendações muito concretas — e este estudo data de 20 de Março, já lá vão 8 meses! Portanto, convenhamos, já passou tempo suficiente para ter visto a luz do dia.
Assim, com este enquadramento e, também, porque V. Ex.ª, apesar da nossa insistência, não respondeu aos requerimentos do PSD sobre esta matéria, gostaria de colocar-lhe as seguintes questões: em que estado de desenvolvimento se encontra o processo de revisão do regime jurídico das convenções entre o SNS e os operadores privados e para quando o Governo tenciona aprovar e fazer publicar as diferentes peças que o compõem? Assume aqui, Sr. Ministro, mesmo com um ano de atraso, um compromisso claro e inequívoco, com um calendário concreto: 30 dias? 60 dias? 3 meses? Mantém V. Ex.ª o entendimento da adopção das medidas de política preconizadas pela ERS no estudo já referido? E se não, Sr. Ministro, em que pontos em concreto? Especificando a pergunta anterior: defende V. Ex.ª, Sr. Ministro, que a forma de contratação seja o contrato de adesão? Que, à imagem do que fez o seu homónimo da Região Autónoma dos Açores, o regime de adesão dos privados seja livre, apenas condicionado pelo prévio licenciamento, para que a acessibilidade dos utentes seja alargada, havendo real possibilidade de escolha e os actos tenham associado um valor justo, acabandose com fenómenos de subsidiação cruzada e classificação por similitude? Finalmente, Sr. Ministro, de que forma é que as respostas às questões anteriores estão plasmadas no Orçamento para 2008? Sistematizando, de uma forma clara: vai ou não cumprir as recomendações do regulador? Se sim, quando e como o vai fazer? Mais concretamente: em que ponto estamos? Que calendário assume? Qual o modelo que preconiza em termos de convencionados? E de que forma tudo isto está plasmado no Orçamento do Estado para 2008? Para terminar, Sr. Ministro, apenas um desabafo: contrariamente àquilo que muitas vezes é referido, V. Ex.ª aumenta as dívidas, diminui serviços, encerrando alguns, não investe no sector público e não cria condições para que os privados o façam. A pergunta que lhe deixo é muito clara: o que pretende fazer com a saúde dos portugueses?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, vou dar-lhe duas respostas muito telegráficas em relação a duas questões e, depois, o Sr. Secretário de Estado responderá às restantes.
Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada Ana Manso, agradeço as suas palavras, mas quero contrariar a sua indicação de que reduzimos o financiamento. Segundo a nossa informação, o financiamento dos hospitais, em 2005, incluindo o imobilizado, atingiu 193,8 milhões de euros e o PIDDAC e o restante 114,3 milhões de euros.
Em 2006, passámos para 358 milhões de euros, dos quais 73 milhões de PIDDAC e 285 milhões de capital das EPE, e a despesa imobilizada dos hospitais passou para 264 milhões de euros. Em 2007, foi de 212 milhões de euros, sendo a despesa realizada em imobilizações nos hospitais e nas ARS de 371 milhões de euros.
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O Hospital Central do Algarve não consta do orçamento nem deve constar. Vai ser construído em pareceria público-privado e, portanto, essa despesa orçamental só surge a partir do momento em que ele entrar em funcionamento. No ano em que começar a prestar serviços, começa a facturar-se.
Por vezes, é necessário introduzir no PIDDAC algumas verbas, como aconteceu com os casos dos Hospitais de Cascais e de Braga, porque há necessidade de comprar terrenos para a sua instalação. Isso foi feito em devido tempo.
A situação do Hospital Central do Algarve é esta: o programa funcional está a ser executado por uma empresa de consultoria e a informação que tenho é de que ele estará pronto no final de Março. Portanto, os prazos que anunciei serão rigorosamente cumpridos.
No que se refere ao Hospital da Guarda, estamos na fase da sua transformação, como a Sr.ª Deputada bem sabe, em unidade local de saúde sob a forma de EPE. Esta EPE terá uma dotação de capital social e, a partir desse momento, será através deste financiamento que se farão as alterações que, como a Sr.ª Deputada sabe, são, há muito tempo, necessárias.
Com a permissão do Sr. Presidente, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito bom dia a todos.
Sr.ª Deputada Ana Manso, muito obrigado pelas suas questões, que são temas importantes e sobre os quais vale a pena gastarmos dois ou três minutos desta minha intervenção a esclarecer a Comissão.
Sr.ª Deputada, sobre os compromissos de execução orçamental e o equilíbrio das contas do Serviço Nacional de Saúde, gostava de reafirmar, com toda a veemência, que, de facto, nestes últimos três anos, finalmente, foi possível trazer ao Serviço Nacional de Saúde uma execução orçamental rigorosa que permitiu o equilíbrio das contas. Portanto, levantar questões como as dívidas dos hospitais EPE é um ponto importante que também vamos esclarecer.
Se os Srs. Deputados estiverem interessados, estamos perfeitamente disponíveis para analisar, caso a caso, aquilo que se passa, mas tal não deve ser usado para questionar a honorabilidade das contas do Serviço Nacional de Saúde, que não são trazidas por mim, Secretário de Estado da Saúde, ou pelo Sr. Ministro da Saúde, mas, sim, pelos serviços do Ministério da Saúde. Elas são auditadas por todos os organismos do Estado que têm responsabilidade de o fazer e, portanto, suponho que merecem toda a credibilidade desta Câmara e não só.
A questão das dívidas trazidas a público pela indústria farmacêutica não é nova. Sempre existiram dívidas à indústria farmacêutica, sobretudo criou-se, ao longo de muitos anos, uma imagem e uma prática nos nossos hospitais de que, provavelmente por se tratar de multinacionais, a indústria farmacêutica pode aguentar e ser paga em último lugar.
Estou em condições de lhe dizer, Sr.ª Deputada, que a dívida no final de 2007 não será superior à dívida que havia em 2006. E não será superior, apesar de, ao longo do ano, ter crescido, porque o Ministério da Saúde tem recursos suficientes para fazer uma realocação de verbas de tesouraria — cerca de 300 milhões de euros — que existiam disponíveis no orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Já foi tomada a decisão de redistribuir essa verba pelos hospitais, para que a dívida no final de 2007, provavelmente até no final deste mês, uma vez que esse trabalho está a ser executado em termos de realocação interna das verbas, seja inferior à de 2006.
Portanto, gostava de negar completamente a caracterização que fez de derrapagem. Não há qualquer derrapagem, antes pelo contrário estamos em condições de garantir que — o Sr. Ministro já o disse na sua intervenção inicial —, pela segunda vez consecutiva, o Serviço Nacional de Saúde cumpre o seu orçamento inicial.
Quer isto dizer que não temos instrumentos para atacar a questão da tesouraria? Não! É também do conhecimento da Comissão que, há um ano, criámos, em conjunto com o Ministério das Finanças, com o Tesouro, um fundo de pagamento, que nos permita alguma tranquilidade de tesouraria. Por outro lado, no âmbito dos serviços partilhados, o que envolve, no momento de arranque, três grandes hospitais de Lisboa, já criámos um sistema de garantia de pagamento, que vai fazer com que os fornecedores recebam de uma forma
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mais rápida, contribuindo isso, como, aliás, as outras medidas de gestão, para que os preços dos produtos reflictam essas melhorias de pagamento. Portanto, quanto às contas, penso que estamos esclarecidos.
Em relação aos convencionados, Sr.ª Deputada, com certeza que reafirmo aquilo que disse há um ano, ou seja, que continua a ser muito importante reabrir as convenções. Estamos a trabalhar para isso, em conjunto com o licenciamento. Quanto ao modo de o fazer, espero ter notícias a muito curto prazo. Teremos, naturalmente, de discutir isso com todos os parceiros, mas a base da nossa proposta será exactamente aquela que a entidade reguladora nos propôs.
Um último comentário, Sr. Presidente, se me permite, sobre a questão do investimento, para reafirmar que não há qualquer quebra no investimento — o Sr. Ministro já teve oportunidade de referir os números. Contando com as dotações dos hospitais empresa, que são hoje uma importantíssima fonte de financiamento, passámos de 200 milhões de euros, que foi o total do investimento na saúde em 2005, para uma despesa prevista que será superior a 400 milhões de euros no próximo ano, de 2008. Mas, mesmo em termos de PIDDAC, que é a fonte de financiamento nacional, quero fazer aqui uma correcção aos números apresentados pela Sr.ª Deputada Ana Manso: em 2007, o orçamento inicial referia 37 milhões de euros e, em 2008, serão 39 milhões de euros. O aumento é curto, mas é um aumento.
A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa no seguinte sentido: coloquei questões muito concretas ao Sr. Ministro relativamente às várias áreas, mas especialmente em relação à questão das convenções. Foram quatro as questões concretas que coloquei e não tive uma única resposta. Gostava que isto ficasse registado.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, como sabe, nos termos do artigo 80.º do Regimento, a figura da interpelação à mesa destina-se apenas a esclarecer dúvidas relativamente a decisões da mesa ou para a questionar sobre a orientação dos trabalhos.
O âmbito, a amplitude e a magnitude das respostas produzidas pelo Sr. Ministro e pelo Sr. Secretário de Estado é algo que não compete, de facto, à mesa nem ao presidente ajuizar. Quer o Sr. Ministro quer o Sr.
Secretário de Estado são livres de responderem nos termos, nas condições e com a amplitude que entenderem e os Srs. Deputados, designadamente os interpelantes, farão o juízo que entenderem, mas não pode haver qualquer interferência, que seria manifestamente abusiva, da parte do Presidente da mesa nessa matéria.
Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.
O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, quero começar por cumprimentar V.
Ex.ª e os Srs. Secretários de Estado.
Antes de mais, estando nós aqui, em reunião conjunta das Comissões de Orçamento e Finanças e da Saúde, para debater na especialidade o orçamento da saúde, é, de facto, interessante compreender a sua evolução. Um Orçamento do Estado tem normalmente dois problemas: o orçamento da área da segurança social e o orçamento da área da saúde. Estes dois orçamentos, em matéria de financiamento do subsector Estado através das transferências, somam mais de 15 000 milhões de euros. Por aí se vê a dimensão da importância destes dois orçamentos.
O Sr. Ministro, quando iniciou funções no Governo, porque era um profissional da área — tinha dado aulas a muitos gestores da área da saúde e até tinha textos publicados —, tinha um grande desafio: o desafio de conseguir ou não inverter, do ponto de vista orçamental, a evolução da despesa no Serviço Nacional de Saúde, a evolução da despesa na saúde.
Mas, para enquadrar isto melhor, é preciso compreender o que tem acontecido nos últimos anos — e não faço qualquer distinção entre os governos do PSD e os governos do PS. No ano de 2000, a evolução da despesa entre a dotação inicial do orçamento e a dotação final — e o que importa é a dotação final, porque inclui os orçamentos rectificativos — foi de 40,4%; de 2001 para 2002, a evolução no orçamento final foi de 3,3%; no ano de 2003, não houve orçamento rectificativo, houve claramente uma suborçamentação — de resto, os
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desceu para 5400 milhões de euros; depois, em 2004 passa para 7500 milhões de euros. Não há, pois, qualquer dúvida de que houve uma suborçamentação claríssima.
Portanto, tirando a suborçamentação de 2003, entre 2000 e 2004 o crescimento da despesa foi de 16% em média. Isto demonstra a dimensão da dificuldade de controlar a despesa na área da saúde. Era, de facto, um grande desafio como é que o Sr. Ministro conseguiria moderar este crescimento insuportável do ponto de vista das finanças públicas, do ponto de vista da economia portuguesa! E a história inverteu-se. A partir do orçamento rectificativo de 2005, não tivemos mais orçamentos rectificativos, nem em 2006 nem em 2007 e, com certeza, em 2008 irá acontecer o mesmo.
Mas, olhando ainda para 2008, poder-se-ia esperar que houvesse agora um momento mais acelerado de mais crescimento. O que é que nós verificamos? Em termos das finanças e da despesa consolidada, existe apenas um crescimento de 0,9% e, em termos das contas tradicionais, existe um crescimento do Serviço Nacional de Saúde de 3,4%. Portanto, existe um leve crescimento. Então, se compararmos com a história — e a história também faz justiça —, acho que o Sr. Ministro, de uma vez por todas, conseguiu colocar as contas da saúde em ordem.
Poder-se-ia sempre dizer — é a crítica que muitas vezes recebe — que conseguiu isso encerrando serviços e reduzindo a qualidade. Mas nós vamos aos números e verificamos o seguinte: nos centros de saúde, as consultas programadas crescem 1,6% e as primeiras consultas crescem 4% e nos hospitais as consultas externas crescem 4%. Isto é, houve um controlo da despesa e, simultaneamente, houve uma subida da produção. Ora, isto não é fácil de conciliar! Diria mesmo — perdoem-me as pessoas que já tiveram responsabilidades nesta área — que é uma situação única que aconteceu, fruto, com certeza, da experiência, fruto do trabalho que desenvolveu e, sobretudo, fruto do conhecimento que tem na área.
O Partido Comunista (que está nervoso e vai falar a seguir) vai dizer: «Ai que o Serviço Nacional de Saúde está em crise! Ai que o Serviço Nacional de Saúde está a acabar! Ai que o cidadão está a pagar a saúde em Portugal!» Mas vemos o conjunto da despesa global, os 8600 milhões de euros, que é a despesa da saúde, e as receitas próprias dos subsistemas, as contribuições do cidadão, e verifico que apenas 3,2% são receitas próprias, isto é, o Estado suporta 96,8%. Então, isto não é um serviço tendencialmente gratuito?! É o que diz a Constituição da República. Se não é para dizer «tendencialmente gratuito» ponha-se lá que é gratuito! Portanto, o Partido Comunista, que está tão nervoso, não tem nenhuma razão. Eu bem os percebo! Mas o certo é que Portugal deve orgulhar-se do sistema de saúde que tem e, sobretudo, de ser um sistema quase integralmente pago pelo próprio Estado.
O Sr. Ministro poderia até, no conjunto global, reivindicar mais algumas receitas para o Serviço Nacional de Saúde. E digo isto porquê? Vamos ao Serviço Nacional de Saúde e vemos o peso que esta despesa tem no produto interno bruto — 5,4%; vamos à média europeia e verificamos que é de cerca de 5,7%. O que é que isto significa? Como o produto, em Portugal, são 170 000 milhões de euros, 0,3% daria mais 500 milhões de euros.
O Sr. Ministro até teria boas razões para reivindicar do Orçamento mais cerca de 500 milhões de euros.
Mas não o reivindica, o que significa que faz uma gestão criteriosa e rigorosa. E está na altura de fazer justiça à equipa do Ministério da Saúde, a justiça que alguns partidos não querem ver. E a pior coisa é que «o pior cego é aquele que não quer ver». Portanto, os números estão à vista, são elucidativos, a produção está à vista e é elucidativa.
Termino com duas perguntas, Sr. Ministro. Contas são contas, estão controladas, mas também quero ter os olhos no futuro.
Primeira questão: que investimentos vai o Ministério da Saúde fazer até 2009? Vamos ter novos hospitais ou não? Vamos ter novos concursos? Que tipo de investimentos considera o Ministério da Saúde como prioritários para lançar até 2009? Segunda questão: o texto deste orçamento vem com uma novidade — o financiamento relacionando com a capitação. Julgo que é interessante, que é uma nova forma de vermos o financiamento dos serviços de saúde e dos hospitais. Pedia ao Sr. Ministro que fizesse o favor de falar mais sobre este estudo. O que é que pensa sobre isto? Vai funcionar até 2009? É uma experiência? Isto é para ir para a frente? É que se trata de um corte profundo com a forma de financiamento tradicional da saúde. Penso que é um bom passo: é que as coisas devem ser financiadas de acordo com o serviço que prestam, de acordo com os utentes e os doentes que servem. Portanto, não deve ser uma coisa só reivindicativa que não esteja ligada à produção. Este é um bom princípio, mas penso que não é de execução fácil.
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Portanto, peço ao Sr. Ministro que aborde esta questão com os olhos no futuro, para na Comissão de Saúde a percebermos melhor.
Termino, dizendo que o Sr. Ministro conseguiu até agora aquilo que muitos não conseguiram, apesar do esforço que fizeram. E não se trata, da minha parte, de nenhuma avaliação negativa de quem teve o exercício de cargos de responsabilidade. Penso que foram outros momentos, outras prioridades, outro tipo de investimentos. Cada responsável tem de ser considerado e enquadrado nesses momentos. Mas, considero que o Sr.
Ministro fez um bom trabalho, prestou um bom serviço a Portugal e um bom serviço ao Serviço Nacional de Saúde.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, não foi sem algumas dúvidas que um académico regressado à política previu a possibilidade de gerir o Serviço Nacional de Saúde com as verbas de que dispunha.
O Governo todo, e não apenas o Ministro da Saúde, adoptou a postura, em 2005, de atribuir à saúde um orçamento realista. À chegada, havia um buraco enorme de 21,8 milhões de euros, que era qualquer coisa que tornava ingovernável o sector. A partir daí, com um orçamento credível e sem suborçamentação, foi possível controlar a despesa. É que um orçamento credível dá outra força ao gestor: este pode exigir, pode negociar com os fornecedores em condições completamente diferentes. E isso fez mudar tudo.
Quero dizer também que não se trata de mérito exclusivo da equipa ministerial. Temos, certamente, algum mérito e somos também responsáveis por aquilo que de mal ocorra, mas o mérito vai para os gestores locais e, sobretudo, para os médicos, para os enfermeiros e para os profissionais de saúde, que perceberam muito bem esta dinâmica da produção, do aumento dos cuidados, do aumento do acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde.
Em relação à questão sobre o investimento até 2009, permito-me ultrapassar esse ano. Embora a nossa responsabilidade termine em Outubro de 2009, penso que os investimentos, pela sua própria definição, prolongam-se no tempo.
Quanto aos cuidados continuados integrados, esperamos ter, já em 2008, 3029 camas contratualizadas e chegar a 5000 camas em 2009. É evidente que a meta que almejamos é de 10 000 camas, mas isso terá a ver com os responsáveis que estiveram no governo depois deste ciclo político. Mas tenho a certeza de que não haverá reversão nessa meta.
São 73 as unidades de saúde familiares existentes neste momento. É pouco, gostaria que fossem mais — todos gostaríamos —, mas isso decorre do mecanismo e do método que adoptámos, de deixar à espontaneidade da organização local o aparecimento dessas unidades, e, por outro lado, da enorme falta de médicos de família. Por isso, decidimos que, este ano, 25% das vagas do internato serão para médicos de família. E, para isso, vamos ter necessidade de ir buscar médicos ao estrangeiro, como estamos a fazer com o INEM.
Ainda há dois dias, estive com uma delegação parlamentar da República do Uruguai. No fim deste mês, uma delegação do INEM desloca-se ao Uruguai num programa de intercâmbio com duas valências: uma, oferecendo a nossa capacidade formativa em alta tecnologia e em alto treino, como é o transplante hepático e o transplante renal; outra, para treinar um conjunto de médicos em medicina de emergência. Trata-se de um programa de duas faces com contrapartidas mútuas para os dois países e que está a ser muito bem acolhido.
Quanto a investimentos mais palpáveis, está a terminar a negociação para a construção do novo hospital de Cascais. Se pudermos iniciá-la ainda em Dezembro, óptimo, se não, será em Janeiro. Mas estamos a semanas de poder assinar o contrato.
Sobre o novo hospital de Braga, terminou a fase de negociação competitiva e estamos a aguardar a proposta do concorrente preferido. Pensamos que o contrato e a negociação vão decorrer ao longo do próximo ano.
Relativamente ao novo hospital de Vila Franca de Xira, a avaliação preliminar das candidaturas foi concluída e a negociação competitiva entre os dois concorrentes vai iniciar-se ainda neste trimestre.
Quanto ao hospital de Loures foram recebidas propostas de dois concorrentes, ambas com valor acrescentado líquido inferior ao custo público comparado. Seguir-se-á a avaliação.
Do hospital central do Algarve já falei há pouco. Quanto ao hospital do Seixal, estamos na fase da selecção do terreno, porque tem de ser conciliado com os nós viários da A2 e do IC32.
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Os novos hospitais de Vila Nova de Gaia, de Póvoa do Varzim e de Vila do Conde estão em início de preparação, tendo já sido constituídos os grupos técnicos que vão preparar o seu perfil de necessidade. O mesmo aconteceu com o de Évora e vamos iniciar, no primeiro trimestre do próximo ano, a nova extensão do Hospital Amadora-Sintra.
Mas há dois investimentos muito importantes que estão numa fase mais próxima de concretização. O primeiro diz respeito ao Hospital de Todos-os-Santos, para o qual temos um terreno, o velho terreno de há 60 anos, colocado na encosta de Chelas; o outro é o de que, muito provavelmente, vamos ter uma decisão em relação à oferta que a Câmara Municipal de Lisboa nos fez de relocalizar o IPO perto dessa zona. Peço desculpa por não poder adiantar mais sobre esta matéria, mas as negociações prosseguem.
Relativamente ao financiamento por capitação (questão que me foi colocada), pode ser, desde já, aplicável às unidades locais de saúde onde há articulação entre os cuidados hospitalares e as unidades de saúde primárias, ou seja, a Unidade Local de Saúde de Matosinhos e a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano. O mesmo virá a acontecer na Guarda, quando for aprovado o respectivo estatuto.
Pensamos instaurar um regime experimental já em 2008 e monitorizá-lo para aprendermos com os seus efeitos.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quero começar por dizer que este Orçamento proposto para 2008 diminui o peso do orçamento da saúde em relação ao PIB, que era de 5,4% em 2007 e que passa para 5,1%; diminui o peso do orçamento da saúde em relação aos orçamentos da administração central, que tinha um peso de 15,7% em 2007 e que agora é de apenas 15,4%; tem um investimento que continua a ser de baixo nível e que não se compara com os 57,6 milhões de euros orçamentados no primeiro orçamento apresentado por este Governo, em 2006. Há, pois, uma diminuição real do financiamento da saúde ao longo dos últimos anos, se tivermos em conta a inflação.
Queria abordar também questões relacionadas com pessoal. O que vemos no Serviço Nacional de Saúde, tal como noutras áreas da Administração Pública e de serviços públicos, é um crescendo de precariedade, de despedimentos e de dispensa de pessoal necessário para o funcionamento dos serviços e a manutenção de situações de carência, que em alguns aspectos, em algumas profissões e especialidades começam a atingir níveis muito preocupantes, como tem sido denunciado por várias organizações profissionais.
Gostaria de saber o que é que o Governo prevê em relação à aplicação da mobilidade na Administração Pública ao Ministério da Saúde, em que medida é que ela vai ser aplicada de que forma, em que institutos, em que organismos, em que hospitais.
Queria também perguntar-lhe, Sr. Ministro, se não o preocupa uma cada vez maior proliferação de recurso a trabalho temporário na área da saúde, como hoje já é frequente, por exemplo, em muitas urgências hospitalares e noutros serviços, e se isso não põe em causa a qualidade dos cuidados prestados, tendo em conta a não permanência, o não entrosamento das equipas de profissionais que prestam estes cuidados de saúde.
Queria também chamar a atenção para que este Orçamento diminui drasticamente a despesa com pessoal, aumentando drasticamente a despesa com aquisições de bens e de serviços. A despesa com pessoal diminui 19% em relação a 2007; a despesa com aquisição de bens e serviços aumenta quase 9% em relação a 2007, sempre comparando com os dados inscritos no relatório do Orçamento do Estado. Isto é, cada vez mais, o Governo passa para formas não directas de pagamento ao pessoal — para os hospitais EPE, bem sei, e tudo o mais —, tornando-o menos transparente. Isto também é um sinónimo de precariedade e de vínculos mais precários.
Quanto aos custos, achei muita graça à conta do Sr. Deputado Victor Baptista. Até me admirou um bocadinho a ligeireza com que abordou esta questão, porque fez o seguinte raciocínio: o Orçamento do Estado assume 96,8% da despesa do Serviço Nacional de Saúde, logo cobre, nesta medida, os custos com a saúde, restando muito pouco para os privados.
Ó Srs. Deputados, o problema é que, com a política deste Governo, o Serviço Nacional de Saúde dá uma resposta mais diminuta. Portanto, para além dos 3,2%, que não são financiados pelo Orçamento do Estado, há os mais de 30% de custos privados, que são aqueles que decorrem do pagamento dos medicamentos, do pagamento das consultas fora do Serviço Nacional de Saúde, porque não se tem acesso a elas no Serviço
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Nacional de Saúde. Esses é que são os gastos reais, não é a parcela do orçamento do SNS que não é transferida do orçamento das receitas do Estado. Esta é que é a conta que se tem de fazer.
Gostaria, ainda, de referir-me à questão das listas de espera, que vêm a propósito destes custos. A questão das listas de espera, que recentemente foram divulgadas — e espero que tenhamos oportunidade, proximamente, de as debater na Comissão de Saúde, fora do calendário orçamental —, denuncia em, primeiro lugar, uma diminuição da resposta do Serviço Nacional de Saúde, denuncia que a estatística não bate certo com a realidade nesta matéria, denuncia que as pessoas que estão nesta lista de espera ou não têm acesso porque não têm recursos económicos ou então têm de recorrer ao sector privado para terem acesso a estas consultas de especialidade. E é, também, grave que estes dados existissem — mesmo que o Governo tivesse sobre eles uma apreciação diferente das suas conclusões — e não tivessem sido divulgados aos Deputados e à opinião pública para poderem ser debatidos e analisados.
Em relação às taxas moderadoras, queria perguntar-lhe o seguinte: estranhamente — não tenho explicação para isto, espero que o Governo tenha —, há uma diminuição das verbas inscritas para taxas moderadoras nos mapas orçamentais. Elas dividem-se pelos «serviços integrados» e «fundos e serviços autónomos» e aquilo que podemos detectar é que, em 2007, a totalidade das taxas era cerca de 44,651 milhões de euros, prevendo-se este ano pouco menos de 42 milhões de euros, ou seja, uma diminuição de cerca de 6,5%. E como não acredito que seja porque o Governo vai aligeirar as taxas moderadoras — não tenho essa expectativa, peço desculpa —, alguma outra explicação deve haver. Não se vai traduzir, certamente, num aliviar dos custos que as pessoas já pagam, mas pelo menos ficávamos a perceber as contas, o que já não era pouco neste âmbito.
Queria também chamar a atenção para a questão do financiamento por capitação: hoje, no seu próprio discurso, o Sr. Ministro valorizou imenso a questão da produção. Ora, o Governo anda há vários anos a valorizar a questão da produção e do incentivo à produção com contrapartida em remuneração e financiamento das unidades e depois aponta o caminho do financiamento por capitação! Não é isto um pouco incoerente? Ou trata-se, apenas, de aplicar um critério que permite mais facilmente diminuir os custos? Quanto à privatização — tenho feito esta pergunta todos os anos e nunca obtenho resposta; espero obter este ano —, gostava de saber se o Governo tem ideia que parte, que porção, que percentagem dos serviços hospitalares (clínicos, designadamente) já estão entregues ao sector privado. Quantas unidades de análise já estão concessionadas? Quantos funcionamentos de urgências já estão concessionados a sectores privados? Quantas unidades já estão, na prática, concessionadas internamente em hospitais públicos, empresariais, ao sector privado? Qual é o balanço que o Governo faz dessa matéria? Quanto às parcerias público-privadas, este ano há um aumento enorme da verba prevista ao longo dos anos para essas parcerias. Até 2015, a verba prevista em 2007 era de 2569 milhões de euros e em 2008 passa a ser de 2785 milhões de euros. Isto é um aumento de 8,4%. Mas se virmos mais além, nas contas até 2023, tínhamos 3185 milhões de euros em 2007 e temos agora, em 2008, 4803 milhões de despesa prevista com parcerias público-privadas até 2023, o que significa um aumento de mais de 50% em relação ao que o Governo previu no ano passado.
Ora, isto tem de ter uma explicação. Avanço já uma: o Governo recuou em relação à perspectiva que o próprio Sr. Ministro da Saúde tinha avançado no início da Legislatura, de que, ao contrário do que o governo anterior tinha feito, uma parte das parcerias que ainda não estava lançada poderia não ter a entrega da gestão clínica também ao sector privado. Sabemos que, em alguns casos, o Governo já disse que isso não vai acontecer, salvo erro no Hospital de Todos-os-Santos e no Hospital de Évora, mas isto quer dizer, na minha opinião, que nos outros hospitais essa gestão clínica vai ser entregue. Daí ter novamente aumentado a remuneração das parcerias público-privadas. Se há outra explicação, o Governo que faça favor de a dar.
Gostaria de saber, também, quantas unidades de saúde familiares de tipo C vão ser criadas, já em 2008, pelo Governo, isto é, em quantos casos o Governo vai constatar, como já se prevê, que não há candidatura de profissionais no Serviço Nacional de Saúde e que, portanto, se tem de abrir o tipo C, que era o anterior nível 5 das unidades de saúde familiares, isto é a concessão ao sector privado e privado social.
Ainda quanto às parcerias público-privadas, gostaria de chamar a atenção para dois exemplos: Cascais e Braga.
Em relação a Braga, diga-nos, Sr. Ministro, se não há alguma resistência do candidato melhor colocado em assumir a questão do centro hospitalar de Braga/Barcelos e se não é esse um dos pontos que está a dificultar a negociação.
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Em relação a Cascais, explique-nos, Sr. Ministro, porque é que a oncologia e o HIV ficaram fora do contrato, porque é que agora o HIV vai ser negociado num contrato adicional e suplementar e quanto à oncologia o que vai haver é uma descontinuidade do serviço prestado. Isto significa que, nestes negócios, o privado não quer ficar com aquilo que é mais oneroso e que mais dificuldade tem para uma gestão que pretende ser lucrativa, o que é bem o exemplo daquilo que é a gestão das parcerias público-privadas.
Sr. Presidente, termino referindo-me, apenas, a mais dois ou três pontos, de forma muito breve.
Quanto ao artigo 122.º do articulado do Orçamento do Estado, o Governo diz que não quer um crescimento superior a 2,9% de medicamentos dispensados em ambulatório e meios complementares de diagnóstico e que, em relação à vertente hospitalar interna, o aumento não pode ser — penso que devem querer dizer um ponto percentual, mas está lá 1%, o que tem de ser corrigido; o PS tem de fazer essa proposta» Gostava de saber quais são as medidas correctivas que o Governo vai aplicar se isto não se estiver a verificar. O Sr. Ministro referiu-se a medidas correctivas, pelo que gostava de saber que tipo de medidas se vão aplicar.
De resto, este artigo é um bocado redundante. É que o Governo diz que tem de haver um limite de despesa (quando o Orçamento tem os seus mapas para impor os limites das despesas) e que, portanto, se não houver o limite da despesa «nós trataremos da saúde a quem o ultrapassar». No fundo, é isso que diz este artigo. É um artigo com muito pouco conteúdo jurídico, mas, enfim, se o Governo o quis incluir no Orçamento por alguma razão terá sido.
Ainda mais algumas questões muito rápidas.
Em relação às dívidas dos hospitais, como é que o Ministério da Saúde vai aplicar a grande prioridade que o Governo dá neste Orçamento ao pagamento atempado aos fornecedores? Como é que isso se reflecte no Ministério da Saúde? Porque o que foi dito até agora é que se trata de uma pequena parte.
Uma breve referência em relação ao orçamento do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT): o orçamento do IDT tem uma diminuição de um investimento de quase 30%, uma diminuição das verbas para produtos químicos e farmacêuticos de mais de 35%, uma diminuição das verbas em serviços de saúde de quase 15%, uma diminuição das verbas para financiamento e subsídio a instituições que trabalham nesta área de mais de 30%, o que não é senão um desinvestimento nesta área.
Finalmente, faço referência a um problema que já foi colocado no ano passado, que tem a ver com a cobrança adicional de taxas moderadoras em certas misericórdias com convenção com o Serviço Nacional de Saúde no distrito de Braga.
O Sr. Ministro conhece bem este problema, já na sua anterior passagem pelo Ministério ele lhe foi repetidas vezes colocado, tendo respondido, no ano passado, ao meu camarada Agostinho Lopes o seguinte: «Quero dizer-lhe que não esqueci o problema e que penso poder ter, ao longo do próximo ano (»)« — que é este em que estamos — «(»), uma proposta com cabeça, tronco e membros«. Sr. Ministro, nem cabeça, nem tronco nem membros! Continua a mesma situação! Há 10 anos que andamos a falar nisto! Já na anterior «encarnação» do Sr. Ministro como Ministro da Saúde dizia que ia resolver; já está noutra «encarnação» e continua a existir o mesmo problema que é, afinal, o de os utentes do Serviço Nacional de Saúde pagarem duas taxas em relação a estas misericórdias no distrito de Braga.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, vou partilhar a minha resposta com os Srs. Secretários de Estado, mas começo por lhe dizer o seguinte: diz o Sr. Deputado que o Orçamento do Estado diminuiu o peso da saúde no PIB. Sr. Deputado, a subida dos encargos com a saúde no produto interno bruto é uma arma de dois gumes: é muito boa quando estamos abaixo da média dos países com os quais nos queremos comparar e pode ser muito má quando estamos muito acima da média dos países com os quais nos queremos comparar.
Portanto, não veja isto linearmente. O senhor, que é um especialista político da saúde, sabe perfeitamente que isto não pode ser visto linearmente. A situação que tínhamos até 2004, de 10,2% de gastos totais da saúde no PIB e 7,6% dos gastos públicos, era uma situação anormal para a nossa economia, como sabemos. Foi, pois, muito bom ter subido, mas quando subimos acima daqueles países com quem nos comparamos alguma
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coisa está mal. E sabe o que é que estava mal? Desde logo, a factura dos medicamentos, que era de 2,8% do PIB. Estou certo que o senhor acompanha o Governo na verificação de que havia desperdício nessa matéria.
Já respondemos à sua crítica póstuma de investimento de baixo nível, pelo que não penso gastar mais tempo com essa questão.
Sobre o crescendo de despedimentos e as carências crescentes de que fala, penso que o Sr. Deputado deve confundir alguns decibéis que surgem por baixo da minha janela, na esquina da Av.ª João Crisóstomo com a Av.ª Defensores de Chaves, com a realidade. Portanto, não é pelo facto de haver manifestações deste género que a verdade muda. Do que se trata é da verdade, e o Sr. Deputado sabe isso perfeitamente.
O Sr. Deputado, que conhece tão bem o problema da saúde, ainda colca questões dizendo que o pessoal diminuiu 19%!? Então o Sr. Deputado não sabe que se reduziu o universo dos hospitais SPA e que esses encargos com o pessoal aparecem nos hospitais EPE?! O senhor sabe isso perfeitamente, não precisa de fazer perguntas cuja resposta conhece.
Sr. Deputado, se ler a minha intervenção de há pouco, perceberá que o Serviço Nacional de Saúde não dá uma resposta mais diminuta; o Serviço Nacional de Saúde está a dar uma resposta cada vez maior. E isso é surpreendente para si, porque o senhor estava à espera que os factos fossem diferentes da realidade! O senhor estava à espera que tudo isso corresse mal, e, paradoxalmente para si, essas coisas até correm bem para o cidadão! Mais, os senhores, há dois anos atrás, não acreditavam que os genéricos iriam aumentar a sua quota de mercado»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Era o PSD!
O Sr. Ministro da Saúde: — Não, não, os senhores tambçm» O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está enganado
O Sr. Ministro da Saúde: — Os dois, os dois» O senhor sabe a quem me refiro.
Claro que a realidade demonstrou absolutamente o contrário e muitas outras realidades que os senhores» No ano passado, até foi zurzido aqui, no Parlamento, que o preço dos medicamentos ia aumentar para os cidadãos! Então os senhores querem prova mais cabal de que, do segundo para o terceiro trimestre, baixou 2,4% o preço unitário dos medicamentos no cabaz do INE?! E que dos 10 medicamentos mais vendidos — posso demonstrar-lho, tenho aqui o nome de todos —, a parte paga pelo utente baixou em relação a nove medicamentos?! E só não baixou em relação a um porque não é comparticipado.
Espero que, pelo menos da sua bancada, não venham mais comentários desse estilo. O Sr. Deputado conhece essas respostas e sabe que não correspondem ao teor do comentário.
No que se refere à lista de espera, a estatística não bate certo com a realidade — com a sua realidade! A verdade é que há aumentos de produção enormes.
Pergunta o Sr. Deputado se o Ministro da Saúde está satisfeito com o número de 382 000 doentes em listas de espera de consultas da especialidade, identificado pela Inspecção-Geral de Saúde e que, provavelmente, não é o número completo. O Ministro da Saúde não está satisfeito, mas tenho uma confiança enorme no sistema. Sabe quanto representam estes 382 000 doentes do total de consultas de um ano? Representam 4,4%.
Será que um sistema que conseguiu aumentar a produção no último ano em 360 000 (de um ano para o outro) tem ou não condições para ampliar a sua resposta? Tem e vai ter! Espero estar aqui dentro de um ano a demonstrar a V. Ex.ª que tenho toda a razão.
Quanto às taxas moderadoras e à redução de 47%, Sr. Deputado, trata-se da mesma questão que se coloca em relação ao pessoal, ou seja, reduziu-se o universo hospitalar e, portanto, naturalmente que»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não, não!
O Sr. Ministro da Saúde: — Sim, Sr. Deputado! Como sabe, a receita das taxas moderadoras dos hospitais EPE não está incluída nas contas das receitas, mas aparece nas contas das EPE. O universo das EPE ampliou-se: há mais 10 EPE este ano!
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Saúde: — O Sr. Deputado vai dispor de outras figuras regimentais para ter essa licença.
A questão das convenções já foi parcialmente respondida e o Sr. Secretário de Estado completará a resposta.
Relativamente ao aumento de verbas para as parcerias público-privadas, Sr. Deputado, naturalmente que, se só temos duas unidades — o Centro de Medicina Física e de Reabilitação do Sul e o Centro de Atendimento «Saúde 24» —, partimos da despesa mensal.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é isso! É a programação ao longo dos anos!
O Sr. Ministro da Saúde: — E, por isso, a programação ao longo dos anos vai crescer à medida que se vão construindo os hospitais e que a facturação dos serviços prestados vai sendo apresentada. Se essa facturação se refere apenas à infra-estrutura ou à infra-estrutura e ao funcionamento é outra questão — dependerá disso. As decisões finais nessa matéria não estão tomadas. O que dissemos é que queremos ensaiar parcerias público-privadas apenas com base infra-estrutural, para podermos, depois, comparar umas com outras.
O Sr. Deputado pergunta ainda quantas unidades de saúde familiar de tipo C se vão criar. Não está ainda regulamentada a sua criação, mas há uma orientação no sentido de que a criação de unidades de saúde familiar público-privadas respeite rigorosamente o princípio da supletividade do sector privado. Ou seja, elas criarse-ão prioritariamente nos locais onde haja mais dificuldade de cobertura em médicos de família e não nos locais da «nata». Foi esta a afirmação que sempre fizemos.
A questão da resistência do candidato à integração do centro hospitalar Braga/Barcelos, Sr. Deputado, é puramente jurídica. Considera que é possível, depois de feito um concurso, apurados os dois primeiros candidatos, discutido qual deles era o seleccionado, vir agora dizer: «Desculpe, Sr. Candidato, mas dava-nos jeito que juntasse Barcelos a esse centro hospitalar. Importa-se de fazer isso?»?! Talvez isso possa vir a ser feito, mas não é nesta fase. Fazer isto nesta fase seria imediatamente «deitar o concurso às malvas» e destruir, por completo, a base de comparação entre os concorrentes. Sei que o Sr. Deputado se interessa pouco pelas realidades da comparação, da competição, da disputa do mercado, sei que se trata de valores que não entram no seu raciocínio, mas perceba-os para quem tem outra visão do mundo que não a sua.
No que se refere à questão sobre as áreas de oncologia e HIV do novo hospital de Cascais, o Sr. Deputado voltou a insinuar que há pressões de interesses privados que fazem com que retiremos o serviço de oncologia do Hospital de Cascais e acrescentemos»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não!
O Sr. Ministro da Saúde: — Desculpe, mas tomei nota de que se estava a referir à pressão de interesses privados.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que as razões são exclusivamente técnicas. O hospital de Cascais não foi desenhado para ter um serviço de oncologia. Um serviço de oncologia não é só um local acolhedor onde se faça quimioterapia. É um local onde se faz quimioterapia, mas também cirurgia multilocalizada e cirurgia em quantidade suficiente que dê garantias de qualidade. Não pode fazer 5 intervenções ao esófago por ano, tem de fazer 50! Percebe, Sr. Deputado? Não pode fazer 50 intervenções ao cólon, tem de fazer, se calhar, 500! É isso que dá qualidade! E, nesta situação, não existem condições para isso.
Já a luta contra o HIV é muito menos exigente do ponto de vista da qualidade. Naturalmente que adoptámos a posição de a incluir no contrato e é isso que faz parte da negociação que decorre.
No que se refere às medidas correctivas do artigo 122.º, peço desculpa, Sr. Deputado, mas basta-nos a indicação de medidas correctivas e compreenderá que não é este o momento de estar a identificar quais são essas medidas correctivas.
Quanto ao Instituto da Droga e da Toxicodependência, ainda bem que alguém o defende o neste Hemiciclo, mas quero garantir-lhe que não está a ser objecto de nenhum processo de desinvestimento. Bem pelo contrário! Como sabe, Sr. Deputado, há uma mudança clara do padrão de consumo, que é muito mais rápida do que
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a rigidez das estruturas, pelo que, provavelmente, vamos ter de reorientar dotações e recursos para podermos responder às novas necessidades, que conhece perfeitamente.
No que se refere à cobrança adicional ou, posso acrescentar, ilegal — tenho pena que não esteja presente o Sr. Deputado Agostinho Lopes, que é um veemente crítico desta situação, a quem presto homenagem, porque é consistente nessa crítica —, na realidade, cobrar mais qualquer coisa em cinco misericórdias por esse tipo de trabalho desgosta-nos a todos. Gostaria de ter feito alguma coisa este ano, no entanto há várias situações anormais e especiais. Como sabe, há outros locais onde temos convenções, e todas elas são diferentes.
Será que faz algum sentido estarmos a mexer numas sem mexer noutras? Não, não faz sentido. Por outro lado, essas instituições têm aquilo a que se chamava «urgências», as quais têm de ser resolvidas de acordo com o plano nacional de urgências. Portanto, aqui tem as duas razões pelas quais não foi possível ainda apresentar a tal proposta com cabeça, tronco e membros.
O Sr. Presidente: — Para prestar esclarecimentos adicionais, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde. Peço-lhe brevidade, por favor.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: — Sr. Presidente, tentarei ser telegráfico nas restantes respostas às questões levantadas pelo Sr. Deputado Bernardino Soares.
Quanto à questão da mobilidade, estão identificadas 401 situações propostas para o quadro de mobilidade especial no total dos serviços da administração central e regional — estamos a falar de direcções-gerais, institutos centrais e núcleo central, que são as administrações regionais de saúde. Está, portanto, a decorrer o processo. É conhecido também que foi pedido a todos os serviços prestadores — hospitais e componente prestadora — para identificarem e aplicarem a legislação sobre a mobilidade. Parece-me que há que valorizar neste momento o facto de termos um novo instrumento que permitirá melhorar as condições de mobilidade no Serviço Nacional de Saúde.
No que se refere à questão das contas, à diminuição da fatia do pessoal e ao aumento das aquisições, o Sr.
Ministro já respondeu. Queria, no entanto, referir-me ao comentário do Sr. Deputado, no sentido de que se trataria de uma redução de transparência.
Sr. Deputado, todas estas informações estão nos orçamentos, nas contas das entidades públicas empresariais, que são os hospitais EPE. Portanto, não há aqui, da nossa parte, nenhuma menor transparência. As regras de prestação de contas são claras, as regras de apresentação e divulgação dos orçamentos são claras, pelo que toda a informação está disponível, conforme as regras que estão aprovadas.
O mesmo se passa, aliás, na questão das taxas moderadoras.
E aproveito para fazer um comentário e dizer-lhe que, na prática, repetiu o mesmo erro que a Sr.ª Deputada Ana Manso reproduziu sobre a indústria farmacêutica, quando disse que a realidade dos hospitais empresa mudou, neste caso, aumentando a sua componente de taxas moderadoras. De facto, foi por essa razão que, quando apresentámos as contas do SNS, o fizemos em duas versões: uma, que não toma em atenção as mudanças verificadas de um período para o outro; e, uma outra versão, a que chamamos «universo comparável», para que se possam tirar conclusões sobre a gestão feita. Aliás, para além daquilo que é necessário, as contas dos hospitais EPE relativas ao primeiro semestre estão disponíveis na Internet, na página do Ministério, aumentando ainda essa transparência.
Quanto à questão da capitação, que o Sr. Deputado disse que era contraditória com o incentivo à produção, queria dizer-lhe que não é contraditória. Trata-se da evolução naquilo que parece mais adequado. Ou seja, o pagamento pela produção visa o quê? Melhorar acesso e eficiência. Portanto, quando apresentamos os resultados de produção, naturalmente que os bons resultados são em consonância com o sistema de financiamento que temos. Vale a pena eternizar esse modelo? É o único modelo que temos de ter para actuar junto dos serviços? Não! A capitação faz sentido, vale a pena estudá-la, vale a pena experimentá-la e, sobretudo, prevenir os efeitos perversos.
Por último, e de forma muito rápida, o Sr. Deputado perguntou quantas unidades foram já concessionadas ao sector privado. De que tenha informação, foram zero. Já foram feitas várias propostas pelos hospitais, que estão ainda a ser analisadas, mas nenhuma foi concretizada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
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A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria pedir-lhe para partilhar o tempo de que disponho com o Sr. Deputado Diogo Feio, que irá colocar uma questão no fim.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, os grupos parlamentares são livres de gerir o seu tempo como entenderem, desde que, naturalmente, respeitem o limite que lhes está confiado, que, como sabe, são 7 minutos.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito obrigada, Sr. Presidente.
Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, começo com uma frase que parece um lugar-comum ou uma redundância, que é a seguinte: «a prevenção é melhor do que qualquer tratamento». Ora, estou certa de que concordam com esta frase, mas a verdade é que têm alguma relutância em pô-la em prática Esta matéria leva-nos, evidentemente, à questão das vacinas e do Programa Nacional de Vacinação.
A frase «a prevenção é melhor do que qualquer tratamento» é, obviamente, uma evidência, mas tem dois aspectos muitíssimo importantes: desde logo, permite poupar, a montante, o sofrimento; e permite, à posteriori, do ponto de vista financeiro, poupar nas terapêuticas e no tratamento.
Daí que eu pergunte duas coisas muito concretas: Sr. Ministro, onde é que estão cabimentadas no Orçamento do Estado as verbas para a introdução no Plano Nacional de Vacinação da vacina contra o vírus do Papiloma Humano, porque eu não consegui encontrar essas verbas.
Aliás, até vou já antecipar a resposta do Sr. Ministro, pois creio que o senhor irá dizer que isso irá depender do relatório, mas se essa vacina for, de facto, para introduzir no Plano Nacional de Vacinação essa verba deverá estar contemplada.
Por outro lado, pergunto-lhe o seguinte: Sr. Ministro, chegou uma informação, que não dou por confirmada até que o Sr. Ministro a mantenha, de que a introdução desta vacina no Plano Nacional de Vacinação só ocorreria no início do próximo ano lectivo, ou seja em Setembro de 2008.
Ora, esta informação não corresponde, de forma alguma, com o anúncio que foi feito, com grande pompa e circunstância, pelo Sr. Primeiro-Ministro, depois de várias recusas, quer por parte da tutela quer por parte do Grupo Parlamentar do PS, no sentido de comparticipar ou introduzir esta vacina no Plano Nacional de Vacinação.
Todavia, pergunto-lhe, Sr. Ministro, qual vai ser a faixa etária abrangida. Vai ser só uma faixa etária? Como é que isso se vai apresentar e quando é que é a entrada em vigor? Relativamente à vacina cujo nome comercial é Prevenar, quero dizer-lhe que, como sabe, esta vacina é recomendada pela esmagadora maioria dos pediatras, porque permite uma imunização elevada e eficaz de doenças tão importantes como a meningite, a septisémia, as pneumonias, as otites, os problemas respiratórios.
Ora, o que acontece é que esta vacina é cara, tem de ser tomada em três doses, sendo que cada uma custa 75 €, por isso estamos, mais uma vez, perante uma situação de grande injustiça social, que fica ainda mais evidente quando sabemos que vacinas para a gripe já têm uma comparticipação de, aproximadamente, 40%.
Assim, o que lhe pergunto é por que é que o Ministério, e já estando esta vacina testada e, portanto, não existe o argumento de ela não estar testada, de não haver dados científicos, pois esses já existem, pelo menos não comparticipa esta vacina? Por outro lado, não posso deixar de lhe falar – embora creia que o Sr. Ministro venha à Comissão de Saúde para nos esclarecer sobre este assunto – da situação das listas de espera para primeira consulta.
É evidente que o Sr. Ministro gosta mais de falar na evolução das listas de espera para cirurgia, e ainda bem que estamos a fazer um progresso nessa área, mas, como sabemos, o grande entrave a um bom funcionamento do Serviço Nacional de Saúde está na falta de acesso ou na demora de acesso a uma primeira consulta.
Já aqui foi referida, e o Sr. Ministro sabê-lo-á melhor do que ninguém a situação das listas de espera, embora tenha querido ocultar o relatório que evidenciava a existência de 383 000 utentes em lista de espera em Março de 2006 – 100 000 em oftalmologia, 46 000 em otorrinologia, 37 000 em dermatologia, 30 000 em ortopedia.
Todavia, a verdade é que o Sr. Ministro, quando foi questionado sobre o tempo de espera – e eu fi-lo na última reunião da Comissão de Saúde estando Sr. Ministro presente –, nos disse que não tinha dados sobre essa matéria, quando, na realidade, já os tinha, pelo menos, desde 2006.
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Não posso, igualmente, deixar de manifestar o meu espanto quando a Sr.ª Secretária de Estado, reagindo à situação das listas, disse o seguinte: essas listas já estão desactualizadas, porque algumas pessoas já morreram e outras dirigiram-se ao sector privado.
Ora, estas declarações são a negação daquilo que se pretende que seja o Serviço Nacional de Saúde e, desde logo, demonstram que ele não é nem universal nem gratuito. Não é universal, porque muitas pessoas ficam de fora e não é, certamente, gratuito, porque muitas pessoas têm de se dirigir a consultas privadas para poderem ter acesso a cuidados de saúde e a consultas de especialidade. Aliás, não é por acaso que são exactamente as especialidades que tem mais tempo de espera aquelas onde existe uma maior taxa de consultas no privado.
Depois, Sr. Ministro, não posso deixar de referir três aspectos relativamente aos quais me parece que houve uma grande falta de rigor.
Primeiro, a questão dos genéricos. O Sr. Ministro diz que a quota de mercado dos genéricos está nos 17%, mas o que está nos 17% é o valor. O que acontece é que houve uma estagnação no volume de vendas em termos de unidades, que se situa nos 11%, e, portanto, não houve um crescimento relevante relativamente a 2006 (cujo valor se situava nos 9,9%), nem a Março de 2005 (cujo valor se situava nos 6%), o que houve, sim, foi o afastamento e uma divergência crescente entre o número de unidades vendidas e o valor de vendas dos genéricos. Traduzindo isto: os genéricos aumentaram de preço. Segunda falta de rigor. O Sr. Ministro, também naquela última reunião da Comissão de Saúde, questionado por mim sobre se havia ou não falta de médicos, disse: não há falta de médicos! Eu lembro-me perfeitamente da frase que, então, disse: não há falta de médicos. O nosso ratio médicos per capita é superior ao da média europeia.
Ora, agora, o Sr. Ministro veio a reconhecer nesta discussão o óbvio: e que faltam médicos, nomeadamente para clínica geral e emergências.
Terceira falta de rigor. É evidente que nos congratulamos com o facto de os senhores dotarem com 21 milhões de euros o programa de saúde oral; agora, apresentar como o grande projecto de saúde oral, esse projecto que já resultava do governo de coligação PSD/CDS»
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Então, por que é que não apresentaram?
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Foi apresentado» Bom, o Sr. Ministro diz que vão ser abrangidos 90 000 potenciais idosos abrangidos pelo Complemento Solidário para Idosos, mas nós sabemos que, neste momento, são apenas trinta e poucos mil os idosos nessa situação. E vá lá que o Sr. Ministro tem a cautela de dizer «potenciais« beneficiários» Mas nós sabemos que este número de 90 000 não irá ser atingido, certamente, até ao fim do mandato deste Governo.
Finalmente, há aqui uma matéria sobre a qual não posso deixar de falar, embora seja uma matéria delicada, porque li um testemunho, que muito me impressionou e penso que terá impressionado todos os que o leram, constante de um artigo chamado «O sentido de uma vida». É a vida de uma senhora chamada Irene Sabino – alias, estou a falar neste assunto, porque a senhora escreveu-me pedindo que falasse nessa tragédia que lhe aconteceu.
Sr. Ministro, pergunto-lhe, sem qualquer demagogia, pois esta é uma matéria que nos deve preocupar a todos, o que é que se pode dizer a uma pessoa que por aparente – eu diria óbvia – negligência médica ficou amputada dos seus quatro membros e que se vê obrigada a passar o resto da sua vida numa cadeira de rodas sem braços e sem pernas? Não pretendo, de forma alguma, assacar-lhe quaisquer responsabilidades nesta matéria, mas será que o Sr. Ministro pode garantir, aqui no Parlamento, que todas as queixas relacionadas com negligência ou erros médicos, embora só exista erro e negligência médica quando há actos médicos, é evidente – aliás, o erro faz parte de qualquer prática e de qualquer actividade –, mas será que o Sr. Ministro nos pode garantir aqui que todas essas queixas são estudadas, são objecto de um processo transparente, têm uma conclusão e são tratadas com seriedade? A resposta a esta questão é muito importante não só por causa deste caso mas também por causa dos demais.
O Sr. Presidente: — Tem agora, a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, utilizando um grande poder de síntese vou colocar três questões todas elas relacionadas com o mesmo tema e vou enunciá-las de forma telegráfica.
Sr. Ministro, neste momento, ao discutirmos o Orçamento do Estado, estamos a discutir a política geral do Ministério da Saúde e a política geral de saúde para Portugal.
Estranhamente nesta semana o Sr. Ministro tornou num caso de política geral do Ministério de Saúde algo que eu nunca pensei que pudesse sê-lo. Refiro-me à relação entre o Código Deontológico dos Médicos e a questão da interrupção voluntária da gravidez.
Assim, as perguntas que lhe faço são três e muito claras: primeira, o Sr. Ministro considera uma atitude de bom senso fazer afirmações quanto à necessidade de comportamento do Ministério Público e fazê-lo na comunicação social? Não seria melhor utilizar os expedientes normais e privados para o fazer? Aliás, acho que seria de bom senso que o Sr. Ministro não tivesse utilizado a comunicação social.
Segunda, não entrando na discussão entre despenalização e liberalização, até porque tivemos um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez e não vale a pena estar a retomar essa discussão, a questão que lhe coloco é a seguinte: temos, neste momento, um quadro legal que determina uma despenalização e, tendo determinado apenas uma despenalização, em que medida é que o Sr. Ministro considera que existe, como afirmou, uma obrigação da sua parte de ter em atenção o cumprimento do quadro legal normativo português, quando aquilo que se determinou não foi uma obrigação, mas, sim uma despenalização e em relação a esta matéria qual é a ligação que o Sr. Ministro faz com regras deontológicas e éticas que os médicos devem ter? Terceira, acreditando que o Sr. Ministro não quer ser conhecido pelo ministro que dá ordens à Ordem, o que lhe pergunto é o que é que ganha com a criação de um conflito, que me parece artificial, com os médicos, quando aquilo que considero que seria importante, para reformar, para ter uma política orçamental que possa ser bem executada, era ter um clima de total pacificação com a classe médica.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr.ª Depurada Teresa Caeiro, a vacinação contra os diferentes tipos de pneumococos está à venda em Portugal e cobre sete estripes.
A mesma empresa que a fabrica já contactou o Ministério da Saúde dizendo que vai haver uma nova vacina que vai cobrir 13 estripes. Assim, foi solicitado à empresa que baixasse o preço da sua venda ao público, a empresa pediu uma comparticipação e foi-lhe exigido, nos termos legais, que apresentasse o estudo fármacoeconómico, estudo esse que ainda não foi apresentado, mas quando a empresa o apresentar os dados serão trazidos à Comissão Técnica de Vacinação e esta emitirá um parecer com base no qual o Ministério tomará uma decisão.
Quanto à vacina contra o vírus do Papiloma Humano, ela está no quadro 7 da documentação que foi hoje distribuída, incluída nos chamados programas verticais e aí encontrará os 15 milhões de euros.
Quando é que essa vacina vai ser administrada? Chamo a atenção para as minhas declarações no princípio desta reunião, quando disse o seguinte: «Os contornos técnicos desta operação, a definição de grupos-alvo, a selecção do produto vacinal e a organização logística carecem, ainda, de opinião final por parte da Comissão Técnica de Vacinação da Direcção-Geral de Saúde.» A hipótese de a vacinação ser ministrada a partir do segundo semestre de 2008, aproveitando o início do ano escolar, tem boas condições, porque há uma possibilidade de ser fácil, do ponto de vista logístico, associar essa acção ao início do ano escolar e à concentração de jovens do sexo feminino com determinado grupo etário.
Todavia, não lhe vou dizer, neste momento, porque quem vai tomar a decisão sobre qual o grupo etário por onde vamos começar é a Comissão Técnica de Vacinação, mas o que lhe posso garantir é que começaremos por um grupo etário este ano e no ano seguinte faremos o catch-up para o grupo etário dos anos seguintes e em dois anos cobriremos quatro grupos etários.
Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, a questão da saúde oral e de como se compara o número de idosos beneficiários do Complemento Solidário para Idosos, que não são cerca de trinta e tal mil como disse mas, sim, 50 000, com os 90 000 propostos por nós, é que a partir do próximo ano, como terá conhecimento, a Segurança Social resolveu ampliar este complemento para os idosos com mais de 65 anos e isso vai ampliar o universo base.
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Por outro lado, também temos a noção da importância da indução da procura pela oferta e, portanto, sabemos bem que o funcionamento desta medida vai trazer algum aumento, sobretudo daqueles que ainda não a conhecem inteiramente.
Quanto à questão da negligência médica e do caso que apresentou, que certamente nos sensibilizou a todos, posso dizer-lhe que, como sabe, a Assembleia da República aprovou recentemente legislação sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado. Aliás, informei-me junto do eminentes juristas que estão nesta mesa e que me disseram que se mantém o regime da responsabilidade solidária, podendo ser solicitada a responsabilidade à instituição a qual terá, depois, direito de regresso do, digamos, eventual médico ou profissional de saúde sobre o qual seja identificada a culpa.
Em relação às questões do Sr. Deputado Diogo Feio, que agradeço e a quem cumprimento, pois fico muito honrado por um líder parlamentar ter baixado aqui a esta Comissão para nos colocar questões, quero dizer-lhe o seguinte: o Sr. Deputado colocou-me três perguntas políticas, tendo-me perguntado, em primeiro lugar, se era de bom senso e, em segundo lugar, o que ç que eu ganho» Sr. Deputado, o que é que as pessoas que têm responsabilidades públicas ganham com a defesa da lei? Ganham trabalho! É o que eu ganho! Mas ganham o cumprimento do seu dever. Por outro lado, o Sr. Deputado também me perguntou se não seria melhor eu chamar à puridade o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos. Foi o que eu fiz, Sr. Deputado, e por duas vezes! Chamei à puridade o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos em Junho quando lhe entreguei uma carta pessoal onde lhe pedia que considerasse. O Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos, que estava a meses das eleições da Ordem, que vão ter lugar no final do ano, não se dignou responder à carta.
Entretanto, eu tinha pedido um parecer à Procuradoria-Geral da República para esclarecer quaisquer dúvidas do Conselho Consultivo, esse parecer chegou e eu, de novo, chamei o Sr. Bastonário à puridade... Bom, neste caso não foi à puridade, porque ele veio acompanhado por um seu distinto colega e eu, de novo, lhe disse que ele não tinha respondido à minha cara e que, agora, tinha um mês para realizar as alterações que a lei propõe e se não fizesse as alterações eu seria forçado, quer quisesse quer não, a comunicar o facto ao Ministério Público para proceder de acordo com a lei.
Sr. Deputado, o meu comportamento é o do cumprimento da lei. A lei dá à Ordem dos Médicos poderes de império, poderes de autoridade sobre os seus profissionais, poderes para lhes aplicar sanções disciplinares gravíssimas» Então, nós assobiamos para as árvores, quando algumas das sanções que estão aí tipificadas contrariam a lei geral? Não é possível, Sr. Deputado! A lei é para ser cumprida como, aliás, tenho a certeza que o Sr. Deputado pretende.
E digo mais: eu não criei nenhum conflito, eu estive sempre calado neste processo. Eu recebi os maiores vilipêndios e insultos desde há meses por parte do Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos sobre tudo, sobre tudo e tenho-me mantido rigorosamente calado. Sabe porquê? Por duas razões: primeiro, porque assumo uma posição de Estado e, segundo, porque tudo aquilo que eu dissesse poderia ser sempre interpretado como uma intervenção no âmbito de um período eleitoral ou pré-eleitoral de uma Ordem.
Portanto, as intervenções que fiz foram as de ontem, Sr. Deputado. Foram as únicas que fiz sobre essa matéria e foram extremamente cautelosas. Não me acuse, Sr. Deputado! Já agora, também lhe digo que as suas palavras colam-se às palavras de alguns dos protagonistas e deixeme que lhe dê um conselho: é sempre muito mau colarmo-nos à posição de protagonistas sociais que têm uma visão localizada, parcial, da realidade. Nós temos de ter uma visão de Estado e, portanto, esse tipo de intervenção e esse tipo de colagem, se me permite a franqueza, não me parece que beneficie o debate parlamentar.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr. Secretária de Estado Adjunta e da Saúde.
A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Saúde (Carmen Pignatelli): — Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, vou responder às questões colocadas pela Sr.ª Deputada e que têm a ver com as listas de espera para consultas de especialidade hospitalar. Todavia, antes disso, queria fazer uma nota prévia, informando que estamos disponíveis para voltar a esta Assembleia para dar mais informação, do que a que aqui vai ser dada nesta Comissão, sobre esta matéria.
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Quanto às questões que colocou, relativamente à primeira – o Ministério da Saúde quis ocultar um relatório, sendo que referiu que não tinha dados mas, afinal, até tinha –, quero dizer-lhe o seguinte: o relatório a que está a referir-se é um relatório preliminar que está em fase de contraditório.
Ora, como a Sr.ª Deputada sabe, pois tem formação em Direito, um relatório só pode ser divulgado quando concluída a fase de contraditório. Neste caso, a Inspecção-Geral das Actividades de Saúde recolhe os contributos, os comentários dos intervenientes, ultima o relatório preliminar e este é submetido à tutela.
E, Sr.ª Deputada, vou dar-lhe as datas: a análise foi concluída no final do primeiro semestre deste ano, mas os dados constantes do relatório reportam a 31 de Março de 2006, dados esses que, aliás, até têm sido muito publicitados na comunicação social. Portanto, creio que a Sr.ª Deputada compreende a diferença.
O relatório preliminar, antes do contraditório, foi entregue no Gabinete do Sr. Ministro a 3 de Agosto de 2007, foi divulgado pelas ARS no dia 10 de Agosto de 2007 e estas tiveram que pedir informação aos diversos hospitais, que, como sabe, são cerca de uma centena, e, presentemente, decorre o follow-up dessa acção para ultimar o relatório preliminar.
Portanto, creio que a questão que suscitou, referindo que nós ocultámos o relatório, é falsa.
Relativamente à segunda questão que colocou sobre o facto de o Ministério ter dito que não tinha dados, mas afinal tinha-os desde 2006, já lhe dei as datas e, portanto, também o que referiu não é verdade.
Em relação às minhas declarações, proferidas na sequência de outras declarações da Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, a 2 de Novembro deste ano, sobre as quais a Sr.ª Deputada disse que elas apontavam – e sou eu que interpreto desta forma – para uma falta de assumpção da universalidade do Serviço Nacional de Saúde, uma vez que eu disse – e confirmo – que, seguramente, temos a certeza, os dados não são fiáveis, correctos e completos, porque algumas pessoas, e todos o sabemos, desistem da espera e recorrem ao privado eu quero dizer-lhe que, Sr.ª Deputada, em relação às minhas declarações e à falta de assumpção da universalidade do Serviço Nacional de Saúde, tenho para mim que esta assumpção não se faz com retóricas mas, sim, trabalhando.
E, Sr.ª Deputada, nós, nesta área, não nos sentimos em incumprimento, por uma razão simples: as declarações da Sr.ª Deputada são do dia 2 de Novembro de 2007 e nós começámos a trabalhar as listas de espera para as primeiras consultas hospitalares no dia 16 de Fevereiro de 2006. Portanto, quando a Sr.ª Deputada suscitou a questão na comunicação social nós já estávamos a trabalhar há um ano e 8 meses, sendo que o dia 16 de Fevereiro foi o dia em que integrámos este projecto no Simplex de 2006.
Portanto, para concluir, quero dizer-lhe que não nos sentimos em incumprimento neste domínio, mas, como o Sr. Ministro da Saúde já disse, sabemos que temos muito trabalho pela frente e que há ainda situações que subsistem e que não são aceitáveis.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: — De forma muito rápida e para responder à questão colocada pela Sr.ª Deputada Teresa Caeiro relativa à sua afirmação de que os genéricos crescem em valor e não em volume, quero dizer-lhe que isso não é verdade, ou seja, de Janeiro a Setembro de 2006 – e esta informação está disponível no site do Infarmed – a quota de mercado dos genéricos em embalagem era de 9,5%; a quota do mercado dos genéricos de Janeiro a Setembro de 2007 é de 11,46%, ou seja dois pontos acima; em embalagens, em valor, a quota de mercado em 2006 de Janeiro a Setembro, é de 14,98% e a quota de mercado, em valor, neste ano é de 17,65%. Ou seja, em ambas as situações, em ambos os casos, a quota de mercado continua a subir.
Números ainda não disponíveis, mas já em relação a Outubro. Como é que o mercado tem crescido? Os genéricos cresceram, em relação aos dez primeiros meses do ano passado, em número de embalagens 26,6% e em valor 23,6%, ou seja, exactamente o contrário daquilo que a Sr.ª Deputada disse.
Os genéricos crescem mais em quantidade, em número de embalagens, do que em valor e o mercado geral dos medicamentos cresce 5% em relação ao ano passado, sendo 27% pelos genéricos e 2,5% pelos medicamentos de marca.
Este é um caminho lento de inversão de uma situação que queremos corrigir, sendo que estamos todos de acordo que a situação de termos, em média, genéricos mais caros do que os medicamentos de marca não faz
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sentido, por isso o Governo tomou medidas, já neste ano, de redução do preço dos genéricos que já estão a reflectir-se e que continuarão a reflectir-se nos próximos meses.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Srs. Presidentes, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Gostaria de começar por fazer um comentário genérico à evolução da despesa pública para lembrar que 5,1% do PIB, em despesa pública de saúde, faz-me regressar ao ano de 1995. Para uns este regresso será a tradução de um grande êxito financeiro, para outros, como é o meu caso, é um motivo de apreensão.
Assim, gostaria de, sobre isto, dizer o seguinte: mais do que o valor do PIB o que será importante avaliar, e isso até agora não o podemos fazer, é a evolução nestes últimos três anos da repartição entre a despesa privada e a despesa púbica no conjunto das despesas de saúde.
Na altura em que esse número estiver disponível, certamente, teremos aqui um novo debate que poderá responder devidamente às inquietações relevadas, ou, mais do que inquietações, às certezas reveladas pelo Sr. Deputado Victor Baptista, mas que são muito prematuras, porque a minha convicção é de que, inevitavelmente, a percentagem da despesa privada aumentou significativamente nos últimos anos na saúde em Portugal.
Portanto, é a minha convicção de que tem sido assim nos últimos anos e creio, até, que este Governo acentuou essa deslocação.
Todavia, gostaria de começar por algumas polémicas políticas e orçamentais do ano passado, fazendo algumas perguntas simples para as quais gostaria de ter respostas simples.
A primeira é a seguinte: estava previsto, com as novas taxas moderadoras, internamento e cirurgia, o ministério recolher 7 a 9 milhões de euros e eu gostava de saber quanto foi recolhido em matéria de novas taxas moderadoras.
E a propósito de taxas moderadoras gostava de perguntar ao Sr. Ministro o seguinte: tenho aqui um bilhetepostal a convocar um cidadão para uma consulta no hospital de Guimarães onde se pode ler, curiosamente, aquilo que eu até hoje nunca tinha lido em nenhum bilhete-postal do mesmo tipo.
Diz o seguinte: «Atenção: Esta consulta só será realizada caso não tenha taxas moderadoras em dívida.» Ora, eu gostava de saber se isto é a politica oficial do Governo ou se é um excesso de zelo do Conselho de Administração do hospital de Guimarães. E isto não é um pormenor; é uma questão de fundo, ou seja é a de saber como é que os cidadãos são penalizados se não cumprirem determinadas exigências que a lei, no caso concreto das taxas moderadoras, lhes coloca.
Depois, gostaria de voltar um pouco atrás, falar de urgências e emergências e recordar umas palavras do Ministro Correia de Campos numa entrevista ao Diário de Notícias de Fevereiro de 2006.
Dizia, então, o Sr. Ministro, o seguinte: «Não vou fechar nenhum SAP enquanto não tiver toda a nova rede de urgências montada a requalificação dos sítios para onde vão ser encaminhadas as pessoas e a garantia de que há transporte do INEM ou certificado pelo INEM».
Bom, passados quase dois anos podemos dizer que pouco ou quase nada disto foi verdade. Como sabemos fecharam dezenas de SAP e o mais grave é que podemos constatar hoje – e alguns já o constataram durante o ano – que o INEM não tinha condições para resolver o problema criado pelo encerramento desses SAP.
E se houvesse alguma falta de prova do que estou a afirmar bastaria verificar o aumento significativo – aliás, o maior aumento no orçamento do Ministério da Saúde – registado pelo INEM. A receita do INEM vai crescer 12%, apesar de os responsáveis do INEM e o Sr. Ministro terem afirmado no debate no ano passado que o INEM era o mais rico dos organismos do Estado em matéria de orçamento.
Ora, eu gostaria de perguntar se, apesar deste crescimento do INEM, os portugueses podem ou não ter a garantia de que vão ter, finalmente, um serviço de urgência de acordo com as suas necessidades, porque eu olho para o Orçamento e o que verifico é isto: urgências básicas – 700 000 € para a região centro e 100 000 € para a região do Algarve.
Verifico, pois, que mais nenhuma outra região é contemplada e por isso pergunto se este orçamento significa ou não que o Sr. Ministro desistiu de uma das suas mais emblemáticas reformas. A saber: a chamada requalificação das urgências.
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Pergunto-lhe o mesmo quanto às unidades de saúde familiares. Como o Sr. Ministro sabe há, neste momento, 19 unidades de saúde familiares que estão aprovadas e que não iniciam a sua actividade porque faltam obras de reabilitação, de recuperação ou até mesmo de construção.
Mas mais grave do que essas 19 é que estão, até hoje, já aprovadas mais 64 novas unidades de saúde familiares. Ora, eu olho para o orçamento e só vejo orçamento para 5 novas unidades de saúde familiares. E o Sr. Ministro não me vai dizer, com certeza, que isto é também sector empresarial do Estado, porque essa resposta não pega para esta matçria» Portanto, o Sr. Ministro dirá que ç o investimento que temos e temos de nos resignar. Ora, eu creio que a resposta terá de ser outra: é que investimento público em saúde, finalmente percebeu-se, que para o Governo significa parcerias público-privadas. Tudo é remetido para parcerias públicoprivadas, o que tem uma enorme vantagem: ir permitindo prolongar no tempo, dilatar no tempo, protelar no tempo, a resposta às necessidades de novas unidades hospitalares.
Já agora, quero lembrar-lhe, embora creia que não seja necessário, que a primeira parceria que, eventualmente, vai ter um tijolo em Portugal será o Hospital de Cascais e que essa parceria está em preparação há quase cinco anos» Por este andar todos os hospitais que esta equipa ministerial tem anunciado estarão construídos tarde e a más horas relativamente às necessidades do país Ainda sobre as parcerias, e porque temos uma divergência profunda relativamente à sua política, queria dizer-lhe o seguinte: consideramos que as parcerias público-privadas são uma péssima e desastrosa solução.
Primeiro, porque oneram excessivamente os custos do capital e, segundo, porque – e o Sr. Ministro dir-me-á que isso já não será consigo – vão criar uma pressão insuportável sobre a sustentabilidade financeira dessas instituições a prazo. É que nos 30 anos que estão previstos para estes contractos e apenas para as quatro parcerias que estão anunciadas em sede deste orçamento o Estado vai pagar qualquer coisa como 6000 milhões de euros. Imaginemos o que será quando forem 12 parcerias a funcionar e a estar devidamente instaladas»! Pergunto, Sr. Ministro, se não considera isto um excesso de optimismo quanto à capacidade e à sustentabilidade financeira a prazo do Serviço Nacional de Saúde. E, já agora, quero dizer-lhe que, no final, vou entregarlhe um estudo da Universidade de Edimburgo sobre o quanto estão a custar ao Estado em Inglaterra as 83 parcerias que estão a funcionar. Creio que este é um estudo que com alguma prudência o Sr. Ministro deveria ler com atenção.
Ainda em matéria de parcerias público-privadas, gostaria de lhe perguntar duas coisas muito directas: primeiro, a ausência em PIDDAC do novo IPO significa o quê? Significa que o prazo de construção será adiado para momento mais oportuno? Ou significa que o novo IPO vai ser construído em regime de parceria públicoprivada? Por último, gostava, ao contrário da pergunta feita pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, que nos confirmasse uma informação relativa à parceria do Hospital de Cascais sobre se o facto de não haver unidade de oncologia dá o direito à entidade concessionária dessa parceria de pedir uma indemnização ao Estado. Se assim for eu acho isto absolutamente extraordinário, porque ainda a parceira não começou e já o Governo está a pagar custos a mais.
Queria, ainda, dizer-lhe o seguinte: creio que os negócios que o Estado tem feito com o sector privado na área da saúde envergonham-nos, porque são uma história ou muitas histórias de contas mal feitas, de muita trapalhada e de muita situação que não é transparente.
Na verdade, o caso do Amadora Sintra é lamentável a este respeito e eu gostava de lhe perguntar, como já o fiz ao Sr. Ministro das Finanças, que me disse que o melhor era perguntar ao Dr. Correia de Campos, como é que convive a sua política de auto-reclamado rigor com a situação de um hospital cujas contas não estão validadas nos últimos cinco anos. Perante isto como é que é possível que os cidadãos portugueses achem que o Estado está a defender os seus interesses? Ontem entregámos um pedido, que vai ser discutido na Comissão de Saúde, solicitando a audição da ARS e do Conselho de Administração do Amadora Sintra, porque consideramos que é absolutamente inadiável considerar este problema: está ou não a sociedade gestora do hospital Amadora Sintra em condições de assegurar e garantir o cumprimento dos objectivos públicos do contrato de concessão que o Estado assinou com a sociedade gestora.
Termino lembrando que não conheço nenhum negócio do Estado, na área da saúde, com grupos privados que não tenha redundado numa trapalhada. E temos já outra trapalhada à vista que é a do licenciamento das farmácias nos hospitais públicos, que foi uma decisão do Governo contra a qual nos manifestámos e que
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ameaça ser um novo folhetim, um novo imbróglio jurídico e político em que o Ministério da Saúde se vai envolver, porque, como sabe tão bem como eu, surpreendentemente, os principais concursos de muitos milhões de euros foram ganhos por pequenas farmácias de província que têm, visivelmente, até porque é uma situação publicamente conhecida, um testa-de-ferro que, certamente, defende interesses económicos e financeiros que nada tem a ver nem com a actividade farmacêutica nem sequer vão ao encontro dos objectivos que o Sr.
Ministro anunciou quando se decidiu por este solução para a instalação de farmácias nos hospitais.
Portanto, termino, recordando, mais uma vez, as palavras do Sr. Ministro da Saúde nessa entrevista ao Diário de Notícias, em Fevereiro de 2006. Dizia, o Sr. Ministro, com uma grande capacidade, quase visionária do que iriam ser os próximos anos em matéria de política de saúde, o seguinte: «A fronteira entre o público e o privado na saúde é muito fluida.» Dir-lhe-ei, Sr. Ministro: nem fluida nem líquida e muito menos sólida; já se evaporou completamente e esse é o principal saldo da sua política nestes últimos dois anos e é lamentável que quem mais devia combater a promiscuidade entre o sector público e o privado seja o principal agente da entrada dessa mesma promiscuidade nos serviços públicos de saúde.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Deputado João Semedo, muito obrigado pelas suas perguntas.
O senhor está triste por a despesa com a saúde este ano representar 5,1% do PIB. Bom, há duas formas de reagir em relação a esta notícia: se o PIB crescesse muito eu estaria alegre, devo dizer-lhe, era porque o denominador tinha crescido muito, mas todos sabemos os números e, portanto, não me parece que o senhor deva antecipar nada.
As contas dos gastos públicos e privados na saúde não são contas que se façam «em cima do joelho» nem sequer são contas que caibam no Orçamento do Estado dessa forma. Essas contas são feitas há muitos anos e estou à vontade para falar sobre isto, porque fui eu quem enviou para a OCDE, há mais de 25 anos, os primeiros dados, que me deram um trabalho enorme a coligir, sobre toda a despesa pública e privada na área da saúde.
A despesa pública que o Sr. Deputado aí tem, esses 5,1%, é apenas a dotação do Ministério da Saúde; o Sr. Deputado não tem aí, sequer, a parte da ADSE, não tem os outros serviços de saúde e os outros encargos de saúde dos restantes ministérios. Portanto, o Sr. Deputado tem de fazer muitas outras contas para ter bem a noção do que são os gastos públicos em saúde.
O nosso referencial são os relatórios da OCDE. A OCDE tem dados de 2004, na combinação público e privado, e diz que são 7,6% a parte pública e o total são 10,2%, ou seja na parte pública e privada.
Esperemos o relatório da OCDE, de 2005, onde as contas nacionais do INE são reflectidas, para não estarmos a fazer juízos de valor precipitados.
Depois, Sr. Deputado, não lhe sei responder sobre a questão das taxas moderadoras – e talvez o Sr. Secretário de Estado tenha alguma informação –, mas, como sabe, as novas taxas moderadoras entraram em vigor mais tarde.
Sobre o bilhete-postal convocatório para o hospital de Guimarães se está realmente lá escrito aquilo que o Sr. Deputado leu, eu solidarizo-me com o seu desconforto. Também não fico muito satisfeito com isso, penso que há muitas outras formas de chamar a atenção dos cidadãos, cumpridores ou incumpridores, para o cumprimento das obrigações de participação ou comparticipação, do que essa, que me parece (se é verdade o que me leu), no mínimo, agressiva.
Quanto a terem fechado dezenas de SAP, Sr. Deputado, julguei que me ia acusar do contrário, ou seja de não estarem substituídos os SAP que não estão já contratualizados através de protocolos com as câmaras municipais. E não estão, pela simples razão que o Sr. Deputado apontou, referindo-se à minha entrevista publicada no Diário de Notícias. Isto é, quando estiverem garantidas as condições de transporte – e, naturalmente, as condições de transporte de ambulância não estavam ainda garantidas – a substituição far-se-á para que não haja mudança para pior mas, sim, mudança para melhor.
O que houve, Sr. Deputado, foi encerramentos de SAP em áreas urbanas ou periurbanas e esse encerramento fez-se com o que não existia e melhorou, nomeadamente com o alargamento das consultas aos sábados, domingos de manhã e feriados. Ofereceu-se uma outra capacidade, que permitiu compensar e, apesar de todos os esforços de alguns movimentos sociais, e até de alguns partidos, de animarem e activarem essas
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populações, o Sr. Deputado não viu que isso tivesse trazido um grande problema social. E, apesar da crítica que foi feita de que tinha havido um aumento no recurso às urgências dos hospitais da cidade, isso também não se passou isso como sabe e como já foi profundamente documentado.
Portanto, não vale a pena argumentar com factos que não têm argumentação possível.
Sobre o investimento remetido para as PPP, Sr. Deputado, a decisão foi tomada no governo anterior e foi baseada numa resolução do Conselho de Ministros do XIV Governo a que me orgulho de ter pertencido e isto representa uma importante continuidade de linha de orientação.
Mas se o Sr. Deputado não visse no Orçamento o desenvolvimento dos mapas de responsabilidade financeira futura das parcerias público-privadas, o senhor teria razão. Alto lá, que isto não é transparente!... Estamos a hipotecar o futuro! Mas o senhor tem essa informação completamente diferenciada, hospital a hospital, ao longo de uma série cronológica de trinta anos.
Portanto, o Sr. Deputado não tem razão nenhuma para desconfiar que há aqui alguma espécie de «gato escondido com o rabo de fora» ou de falta de transparência no processo. A solução é má? É a sua opinião. O que lhe posso dizer é que no momento em que escrevi a resolução do Conselho de Ministros de Novembro de 2001 não havia outra solução. No momento em que entrámos para o Governo os custos de mudar o esquema para um outro, que não tinha qualquer financiamento, seriam muitíssimo mais altos. Quanto à insustentabilidade financeira, Sr. Deputado, o senhor já sabe como é o nosso Ministro das Finanças. O Sr. Deputado acha que o nosso Ministro das Finanças deixava continuar uma experiência destas, que tivesse a insustentabilidade financeira a prazo, a não ser que ela estivesse rigorosamente analisada nos seus efeitos futuros? Lerei com todo o prazer o estudo da Universidade de Edimburgo sobre as 83 parcerias em Inglaterra. Mas em Inglaterra, tal como em Portugal, há pluralismo de opiniões e há opiniões de pessoas que são manifestamente contra as parcerias público-privadas e há a opinião de pessoas que são manifestamente a favor. E a Inglaterra tem, sobre nós, uma enorme vantagem: um crescimento económico muito mais forte do que o nosso e, portanto, poderia ter alternativas. Nós temos a pequena dificuldade de não termos muitas mais alternativas para o investimento que é necessário fazer.
Quanto ao IPO novo não estar no PIDDAC, tenha calma, Sr. Deputado, cada coisa a seu tempo! O IPO tem capital social que não está dispendido e tem um capital muito importante, que é o seu terreno. Portanto, tenhamos calma! Havemos de encontrar mecanismos para ver, em orçamentos futuros, todo este desenvolvimento.
O Sr. Deputado perguntou também se a oncologia dá direito a um pedido de indemnização. A resposta é: não, Sr. Deputado! A oncologia dá direito a uma reclamação por lucros cessantes e essa reclamação está a ser discutida na negociação e havemos de chegar a bom termo.
O Sr. Deputado disse ainda que estes negócios com o sector privado têm sido todos uma trapalhada e deu o exemplo do hospital Amadora Sintra. Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não tenho essa opinião. Por muitas discordâncias que tenha em relação às contas e à validação das contas de 2002 e 2003 do Hospital Amadora Sintra, fui surpreendido há dois dias, porque tinha-se chegado a um acordo, por um novo desacordo sobre a validação destas contas, mas devo dizer-lhe que não estou muito preocupado com isso, porque nas contas posteriores até somos credores em relação ao Hospital Amadora Sintra, ou seja temos uma pequena margem creditícia sobre o hospital.
Portanto, podemos ter muitas diferenças de opinião, mas deixe-me dizer-lhe também que não fomos nós que fizemos este segundo contrato. Não há contratos puros, perfeitos. Foi um segundo contrato que foi melhor do que o primeiro, certamente, mas talvez pudesse ter sido ainda mais perfeito. Muito bem! Percebo essa posição. Mas, Sr. Deputado, o que me parece é que não podemos denegrir uma experiência que, apesar de tudo, foi uma experiência muitíssimo positiva. Devo dizer-lhe que, confrontando a experiência do Amadora Sintra com a possível alternativa na época, que seria a de ter o hospital gerido apenas pelo sector público, se eu tivesse estado na génese dessa decisão, eu não me teria razões para me arrepender.
O Hospital Amadora Sintra é um hospital de muita qualidade, de muito bom serviço à população, apesar de estar inserido num ambiente social muito adverso, é, porventura, o hospital português mais submetido a escrutínio dessa população – o que é bom! – e é, provavelmente, um dos hospitais que melhor desempenho tem entre nós, tanto qualitativa como quantitativamente.
Temos desaguisados sobre as contas do passado? Temos. Esses desaguisados são difíceis de solver? São. Sabe porquê? Porque 21 funcionários da Administração Pública foram perseguidos pelos meios judiciais,
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e só agora ilibados, pelo facto de, supostamente, terem apreciado errada ou indevidamente as contas do Hospital Amadora Sintra.
Ora, não posso aceitar que haja mais 21 pessoas ou outras tantas, funcionários que trabalham sob a minha responsabilidade, e que sejam passíveis de poderem vir a ter a sua existência envenenada durante quatro anos e a sua despesa forense não coberta pelo Estado. Porque, com toda a relação, até de amizade e de respeito que tenho pelo meu antecessor, eu tenho uma mágoa enorme com ele nesta matéria, por ele ter recusado o patrocínio forense às 21 pessoas que estiveram envolvidas nesse processo.
Só agora é que elas estão a ser ilibadas e já gastaram, cada uma delas, mais de 15 000 € do seu bolso.
Isto, portanto, é uma razão que nos leva a pensar muito seriamente. Tenho que dar muita atenção aos meus colaboradores que trabalham nessa área, porque os meus colaboradores chamam-me muito a atenção a dizer que não querem passar pelo vilipêndio por que passaram os seus antecessores e, porventura, isto levá-los-á a ser sobre-reactivos.
Sr. Deputado, não há nada que não chegue a bom porto. Portanto, tenho tido muito boa relação com o concessionário. Entendo que o concessionário tem cumprido globalmente os seus objectivos, discordo da sentença do Tribunal Arbitral, mas também acho que a sentença foi justificada por mau acompanhamento público na altura, mas a verdade é que penso que melhores dias virão e não sinto qualquer pessimismo nesta matéria.
Sobre o que o Sr. Deputado entende que são trapalhadas de licenciamento de farmácias em hospitais, o senhor faz uma declaração que só o responsabiliza a si. Sei que o Sr. Deputado tem imunidade parlamentar, mas quando o Sr. Deputado diz que cinco farmácias foram ganhas por um testa de ferro, ó Sr. Deputado, desculpe, mas penso que é preciso ter algum cuidado com as afirmações que se fazem.
Portanto, tenhamos todos muito cuidado, deixemos o processo ir até ao fim e o Sr. Deputado nessa altura falará. Repito, o Sr. Deputado tem imunidade, mas não tem imunidade para chamar nomes a pessoas que ganham concursos.
O Sr. Presidente: — Para o último leque de questões da primeira ronda, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, a sua área foi escolhida pelo Sr. Primeiro-Ministro na abertura da discussão do Orçamento do Estado, que decorreu no plenário da Assembleia da República, para o anúncio de três novas medidas com carácter social e parece-me que isso não foi por acaso.
A recorrente presença de V. Ex.ª no fundo da tabela das sondagens de popularidade dos membros do Governo, sempre muito bem acompanhado da Sr.ª Ministra da Educação, foi, certamente, parece-nos a nós, determinante nesta decisão e nesta necessidade que o Governo sentiu de dar um sinal de que, afinal, também tem preocupações sociais e de que, afinal, todo o panorama que este Orçamento do Estado, mais uma vez, traz de retracção e de cortes nos direitos dos cidadãos, é desmentido por três medidas muito concretas.
Não está em causa que as medidas são positivas ou que vêm no bom sentido, pese embora se levantem, desde já, algumas questões que gostaríamos de abordar.
Relativamente à saúde oral, fica, é claro, a proposta que o Governo traz, muito aquém do que seria justo, adequado e necessário e que, aliás, o Partido Socialista até já teve ocasião de chumbar na Assembleia da República, nesta Legislatura, e que era a inclusão da especialidade de estomatologia no Serviço Nacional de Saúde.
Assim, ficar-nos-emos por três cheques dados às grávidas. Ou seja, as mulheres já vão poder ter acesso a cuidados de saúde oral, desde que engravidem – não sei se isto é mais um incentivo à natalidade – e, por dois vales por ano para os idosos mais carenciados.
A pergunta é se o Governo, como apresenta já um valor global para essas medidas, já tem também valores atribuídos a esses vales e a esses cheques dentistas para as grávidas. Designadamente, em relação aos vales para os idosos, gostaria de saber se cobrem apenas as consultas ou se vão destinar-se a cobrir também os gastos com a aquisição das respectivas próteses dentárias.
Outra das medidas que o Sr. Primeiro-Ministro anunciou e que o Sr. Ministro também já referiu aqui hoje tem a ver com a vacina do vírus do Papiloma Humano, mais conhecida pela vacina do cancro do colo do útero.
Entretanto, já descobrimos a verba inscrita, nesta informação complementar que o Sr. Ministro hoje aqui nos trouxe, de 15 milhões de euros, mas isto suscita outras questões.
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Gostaríamos de perceber, reforçando aquilo que o Sr. Ministro já hoje disse, salientando que ainda não temos o relatório final da Direcção-Geral de Saúde, qual foi o critério para a inscrição destes 15 milhões de euros, designadamente atendendo ao facto de o Sr. Ministro, em declarações à comunicação social, ter dito que, se por hipótese a administração da vacina for iniciada no grupo de jovens de 12 anos, o que significa 50 000 raparigas, isto custa cerca de 15 milhões de euros só em custos directos de vacinas.
Ora, ao ter já inscrito estes 15 milhões de euros, o Governo já tomou certamente uma decisão, independentemente daquilo que o relatório venha a dizer, e essa decisão é a de que irá ser abrangida apenas uma faixa etária de 50 000 raparigas que, aparentemente, tendo em conta as declarações do Sr. Ministro, seria a faixa dos 12 anos. Gostaria, portanto, que confirmasse isso mesmo.
Mas também há especialistas em Portugal e organismos europeus que apontam para a necessidade de começar logo aos 9 anos. Por outro lado, a altura em que esta vacina vai começar a ser administrada não é indiferente nem se deve atender apenas a critérios relativos ao calendário escolar, por exemplo.
De facto, se há aqui uma abrangência de faixas etárias e de uma determinada idade, isso significa que, começando num mês ou noutro, serão diferentes as jovens que terão acesso a esta vacina.
Assim, gostaria de perceber quais foram os critérios que o Governo observou para avançar com esta proposta dos 15 milhões de euros e o que é que o relatório que aí vem trará de diferente em relação a toda esta medida, que, naturalmente, consideramos positiva, ou não fosse ela no seguimento de uma proposta que nós próprios apresentámos na Assembleia da República.
Gostaria, agora, de colocar outras questões.
No Orçamento do Estado para 2007 não aparecia qualquer referência explícita ou clara às intenções de encerramento de maternidades ou de serviços de urgência e, no entanto, este foi um dos principais traços da política do seu Ministério durante o ano que passou.
Ora, o Relatório do Orçamento do Estado para 2008 traz-nos outra questão, prevendo, em relação à reforma dos cuidados de saúde primários, a criação de agrupamentos de centros de saúde. Acrescenta-se, aliás, que um dos objectivos, para além do de agregar recursos e estruturas de gestão, é o de eliminar concorrências institucionais.
Então, a minha pergunta procura saber se, no âmbito deste projecto, desta intenção de criar agrupamentos de centros de saúde, podemos contar com novos encerramentos de serviços de saúde, designadamente no interior do País, e se este argumento da eliminação de concorrências institucionais significará, mais uma vez, a criação de condições para que instituições privadas apareçam a substituir instituições públicas na garantia dos cuidados de saúde.
De facto, as medidas deste Governo têm vindo paulatinamente a abrir caminho aos privados, com as parcerias público-privadas, com o encerramento de serviços, com os hospitais EPE, onde vamos assistindo à promiscuidade entre serviços públicos e privados e à degradação dos próprios vínculos laborais, tendo sido noticiado em Outubro que cerca de 13 000 técnicos (médicos, enfermeiros, etc.) serão contratados a prazo até ao fim de 2008, o que, naturalmente, vai reflectir-se na degradação da qualidade do serviço prestado no Serviço Nacional de Saúde.
Ora, tudo isto é preocupante e a verdade é que o encerramento de serviços, designadamente de urgência, não se resolve apenas com a aquisição de mais ambulâncias para o INEM, processo, aliás, que o Governo não teve, sequer, o cuidado de compatibilizar com os compromissos assumidos com a Liga de Bombeiros Portugueses, que fez investimentos para responder a esta necessidade e que agora, de repente, descobre que só em 2008 vai poder contar com as verbas para fazer face a esse investimento.
Depois, Sr. Ministro, ainda em relação a esta questão do INEM, sem querer manchar a honorabilidade ou o realismo das contas do Serviço Nacional de Saúde apresentadas no Orçamento do Estado para 2008, não me parece correcto comparar «alhos com bugalhos». E isto, Sr. Deputado Victor Baptista, até um cego consegue ver com o tacto!... Comparar «alhos com bugalhos» não é, de facto, a mesma coisa, tal como estimativas de execução e valores orçamentados não são realidades iguais. E o Governo, no Relatório do Orçamento do Estado, compara sempre a estimativa de execução de 2007 com o orçamentado para 2008, assim conseguindo chegar a certas conclusões, como a do aumento de quase 12% das verbas previstas para o INEM.
Mas se compararmos o orçamentado em 2007 e o orçamentado em 2008 e se aplicarmos a taxa de inflação de 2,1%, que o Governo antevê e que, como sabemos, fica sempre abaixo daquilo que no fim do ano é apurado, a verdade é que o aumento fica em cerca de 3,5%, ou seja, praticamente um quarto daquilo que os senhores anunciam.
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Mas mais exemplos podiam ser dados nesta matéria, Sr. Secretário de Estado. Aliás, basta fazer as contas com base nos dados que os senhores nos dão.
Já aqui foi referida a «derrapagem» de contas na saúde, pelo que pergunto, muito concretamente, ao Sr.
Ministro, se não reconhece que os números que a Lusa hoje avançava, que dão conta de que as dívidas dos hospitais transformados em Entidades Públicas Empresariais mais do que duplicaram nos últimos dois anos e meio, porque a dívida total aumentou, não são o reconhecimento de que esse modelo de gestão não serviu para melhorar os cuidados de saúde, para aumentar os ganhos em saúde ou mesmo para resolver o problema do défice dos hospitais, que teria sido o propósito do Governo ao alargar esta experiência da gestão empresarial, supostamente mais eficiente e racional.
Afinal, teremos, porventura, de ficar com outros dois objectivos: o primeiro é o da aproximação ao modelo da privatização, já que a transformação em EPE ou SA é sempre o primeiro passo para uma futura privatização dos serviços de saúde, isto para além de já se ter falado na externalização de serviços e na promiscuidade entre público e privado no SNS; o segundo grande objectivo é o de contribuir, mais uma vez, para a desorçamentação do défice, que volta a acontecer neste Orçamento do Estado.
Finalmente, colocarei uma questão telegráfica. Durante esta Legislatura já houve ocasião para discutir, várias vezes, a necessidade da entrada de uma participação mais efectiva do Serviço Nacional de Saúde nos estabelecimentos prisionais.
Gostaria, portanto, de saber se para 2008 vamos poder contar com algum avanço nesta área e, se for o caso, que verbas é que estão previstas no Orçamento do Estado e onde.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Deputado, antes de mais agradeço a sua preocupação com a tabela da popularidade ministerial – aliás, verifico que nos dá também uma ajuda, porque considera que as medidas anunciadas foram boas. Embora, em sua opinião, essa tomada de medidas pretendesse, como deixa intuir, retirar o Ministro da Saúde do fim da tabela de popularidade, a verdade é que o critério que adoptámos nada tem a ver com isso, mas, sim, com servir o público, servir o cidadão e com o desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde. Isso é o que nos preocupa, mesmo que tenhamos de ultrapassar obstáculos, de lutar contra interesses estabelecidos, poderosos e que fazem opinião. Temos a certeza, porém, que o tempo dirá, Sr. Deputado.
Portanto, agradeço muito a sua solidariedade nessa matéria, mas espere mais algum tempo e verá como os resultados que hoje aqui apresentamos vão consolidar-se nos anos seguintes.
Claro que estava à espera de comentários dizendo: «bom, 42 milhões de euros para estes três programas são interessantes, sem dõvida. Não estamos contra, mas ç pouco»!« Ó Sr. Deputado, pois ç! Que novidade»! É pouco! Todos gostaríamos que fosse muito mais, mas a verdade é que é por aqui que tem de se começar, porque até aqui não tínhamos nada, a não ser o subprograma que o Sr. Deputado não referiu, certamente por lapso, que é aquilo que já se faz no sistema educativo dos selantes e dos exames aos 7, aos 12/13 anos – aliás, esse programa também vai ser ampliado para mais 20 000 utilizadores.
O Sr. Deputado diz que é pouco, e é, mas é importante e significativo, sobretudo se for bem feito, com todos os intervenientes na mesma linha de actuação e é isso que me incumbe garantir.
Por outro lado, o Sr. Deputado gostaria de saber se eu já tenho valores para o cheque-dentista. Já tenho, sim, mas o meu dever é não os divulgar enquanto não tiver a negociação terminada, como calcula.
Perguntou, ainda, o Sr. Deputado se o montante cobre também as próteses, mas suponho que o Sr. Deputado tem conhecimento do decreto-lei que já dá cobertura ás próteses atç 250 € em cada três anos em relação aos idosos beneficiários do Complemento solidário para Idosos. Como tal, os cheques-dentista são duas consultas para esses estimados 80 000 idosos e apenas para observação e tratamentos necessários e, depois, para ajustamento da dentadura. Como isso não estava previsto, tinha de sair do preço da comparticipação da dentadura.
Perguntou qual o critério observado para a vacinação e eu remeto-o, de novo, para o meu texto – é a segunda vez que o faço, mas tenho muito gosto em responder-lhe – onde se pode ler que «Os contornos técnicos desta operação, a definição dos grupos-alvo, a selecção do produto vacinal (porque há dois produtos vacinais) e a organização logística carecem ainda de opinião final por parte da Comissão Técnica de Vacinação da Direcção-Geral de Saúde» Não adiantemos os passos. A Comissão Técnica, no fim deste mês, produ-
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zirá o seu relatório. Nós tomámos a decisão de financiar a vacina, inscrevemos para o próximo ano 15 milhões de euros e no ano seguinte inscreveremos 30 milhões de euros para o catch-up de mais uma faixa etária.
Estas são as nossas decisões.
Sobre os agrupamentos de centros de saúde, o Sr. Deputado deixa cair uma afirmação um pouco insidiosa, falando em novos encerramentos de serviços de saúde.
Sr. Deputado, não houve encerramentos de serviços de saúde; houve, sim, requalificações de urgências e onde, porventura, deixou de haver consultas à noite, passou a haver consultas ao sábado durante todo o dia e ao domingo de manhã e aos feriados. Perceba isto, Sr. Deputado, e não venha falar, como muitas pessoas infelizmente fazem, de forma pouco clara, ambígua ou, às vezes, intencional, dizendo que o Ministério da Saúde está a encerrar serviços no interior do País. Não está! Não encerrou nenhum! O que está, pelo contrário, é a requalificar as urgências, como sabe, para que todos os cidadãos fiquem a menos de uma hora de uma urgência requalificada.
Leva tempo? Pois leva, Sr. Deputado! É necessário ter radiologia nas novas urgências básicas, é necessário ter química seca nas novas urgências, é necessário ter dois médicos de serviço em permanência e não apenas o que tínhamos até hoje. E é por isso que «Roma e Pavia não se fizeram num dia».
O Sr. Deputado fez ainda um comentário dizendo que os contratos a prazo conduzem à degradação do serviço, mas penso que essa é uma afirmação não substanciada. Aliás, o senhor conhece bem a questão e sabe que, pelo contrário, o que fizemos foi a substituição dos contratos 3+3, renovados a cada três meses, que eram viciosos para todos, ou seja para os trabalhadores, porque criavam instabilidade laboral, e para a administração, porque abatiam os seus filtros e as suas barreiras selectivas, levando-os a pensar «já agora, por mais três meses, deixa cá meter mais pessoas»«, acabando com o recrutamento, e, agora, com contratos a um ano, renováveis por mais um, os rigores serão certamente diferentes.
Quanto ao INEM, disse o Sr. Deputado que o orçamento é insuficiente. Pois, olhe, eu não tinha feito as contas que V. Ex.ª fez, mas, se mas quiser fazer chegar, terei gosto nisso.
Aliás, vejo que serve de «caixa de ressonância» em relação às queixas da Liga dos Bombeiros sobre os investimentos que, supostamente, fizeram e que temem não vir a utilizar. Tranquilize-os! Diga-lhes que todos os investimentos que fizeram serão usados. Nós contamos muito com eles, porque são a parte mais importante do nosso transporte de doentes e, portanto, contamos muito com essa parceria. E não temos necessidade nenhuma de ouvir aqui afirmações, como essa que acabou de proferir.
Quanto à dívida dos hospitais EPE e à desorçamentação, Sr. Deputado, isso já foi respondido. Vai desculpar-me, mas não há respostas repetidas.
Em relação aos estabelecimentos prisionais e à transferência: sim, é uma questão que tem oportunidade.
Aquilo que está combinado entre o Sr. Ministro da Justiça e o Ministro da Saúde é que, por enquanto, mantemos as dotações orçamentais em cada Ministério. Quando a prática se modificar, nessa altura, as dotações serão transferidas, mesmo que seja a meio do ano.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Saúde.
Vamos entrar na segunda e última ronda de perguntas, cabendo 3 minutos a cada grupo parlamentar.
Tenho inscritos os Srs. Deputados Carlos Miranda, do PSD, Maria Antónia Almeida Santos, do PS, Eugénio Rosa, do PCP, Teresa Caeiro, do CDS-PP, e João Semedo do BE.
Srs. Deputados, tenho de me ausentar por razões políticas, e por isso vou ser substituído pela Sr.ª Deputada Teresa Venda, Vice-presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, a quem peço que ocupe a presidência.
Aproveito para agradecer ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado o prestimoso contributo que deram para o esclarecimento destas questões.
A sessão será, agora, presidida pela Sr.ª Deputada, Teresa Venda, Vice-Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Carlos Miranda, tem a palavra para começar esta segunda ronda de perguntas.
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O Sr. Carlos Miranda (PSD): — Sr.ª Vice-Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.ª VicePresidente da Comissão de Saúde, Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, os meus respeitosos cumprimentos.
As primeiras palavras, nestes brevíssimos instantes em que tenho o prazer de voltar a dirigir-me a V. Ex.ª, Sr. Ministro da Saúde, são necessariamente uma nota crítica e um registo crítico em relação a uma opção muito importante que V. Ex.ª tomou, ou se omitiu de tomar, durante este ano de 2007 e que se projecta no ano de 2008.
Como corrobora, e muito bem, a Sr.ª Secretária de Estado, desde Fevereiro de 2006, que o Sr. Ministro tem o alerta em relação à situação calamitosa das listas de espera para as primeiras consultas de especialidade nos hospitais, mas, V. Ex.ª, efectivamente, não tomou quaisquer medidas.
Confiávamos, porque o PSD insistiu variadíssimas vezes com V. Ex.ª no sentido de que não esperasse por resultados ou por números finais em relação a esta situação, que o Sr. Ministro avançasse com medidas provisórias, com medidas imediatas, como aquelas que V. Ex.ª já pratica na gestão do Ministério da Saúde.
De facto, V. Ex.ª pratica, e bem, com êxito, o sistema do vale cirurgia no âmbito do SIGIC (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia), sendo que para 2008 V. Ex.ª anuncia o início da prática do vale dentista no âmbito da saúde oral. Então, por que não, Sr. Ministro, insisto com V. Ex.ª, o vale consulta para obviar, naqueles hospitais e naquelas especialidades mais preocupantes, a que esta situação se prolongue e não possa ser minimamente mitigada? Por que é que V. Ex.ª não usa este mesmo sistema para esta situação preocupante? A segunda questão, esta com algum melindre, tem a ver com a descentralização dos serviços do Ministério da Saúde em relação às autarquias e aos municípios portugueses.
Vemos no Orçamento para 2008 uma menção muito genérica, muito, muito ténue no artigo 22.º, em que se fala, ao contrário de outras transferências de competências noutras áreas, em relação à saúde, de uma mera transferência de actividades de prevenção da doença e da promoção da saúde, dizendo-se que o Governo, nomeadamente o Ministério da Saúde, fica autorizado a transferir para os municípios dotações inscritas no orçamento específico da saúde, na eventualidade, pressuponho eu, de V. Ex.ª tomar essa decisão durante o ano 2008.
E a questão que coloco é esta: que verba concretamente é que V. Ex.ª destinou, no Orçamento do Estado para 2008, para prevenir essa eventualidade, essa faculdade, de que se reservou nesse aspecto? Outra dúvida com que os agentes económicos, nomeadamente os agentes públicos e privados, no domínio da saúde, se debatem hoje, nomeadamente com o anúncio do Sr. Ministro das Finanças, quando disse que, a partir de ontem, quinta-feira, estavam abertos os guichés para as candidaturas ao QREN – e na saúde há possibilidade de recorrer e apresentar candidaturas a este novo quadro de apoio – é a de que ninguém sabe, concretamente, se existe algum programa operacional específico na área da saúde nem se existe alguma verba alocada à saúde no QREN, a não ser, uma coisa que descobri e que é o seguinte: para a formação e valorização de recursos humanos há lá uma verba inscrita a retirar dos 6000 milhões de euros destinados à valorização dos recursos humanos.
Sr. Ministro, era importante perceber a forma como V. Ex.ª tem orientado o investimento público na área da saúde para 2008, conjugado com o QREN, e em que medida é que outros actores económicos podem recorrer e, se existem programas específicos, quais são esses programas.
Finalmente, uma última questão, porque realmente 3 minutos são 3 minutos, que tem a ver com um cálculo genérico se V. Ex.ª tiver a possibilidade de o retirar do orçamento para 2008.
V. Ex.ª teve, desde o princípio, a ideia de que os médicos trabalham pouco. Para pôr os médicos de medicina familiar a trabalhar mais, instituiu recentemente as Unidades de Saúde Familiar – e muito bem! –, com incentivos ao desempenho. Óptimo! Para pôr os médicos hospitalares a trabalhar mais, o Sr. Ministro anunciou uma reforma do trabalho médico hospitalar, também com incentivos e desempenhos. Bom! Quanto prevê, V.
Ex.ª, gastar de incentivos para pôr os médicos a trabalhar mais durante o ano de 2008? É tudo, muito obrigado.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Dou, agora, a palavra à Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos.
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A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bom dia, Sr.as Presidentes, Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, saúdo a presença de todos e, desde já, cumprimento o Sr. Ministro pela radiografia tão completa, com tantos elementos, tantos números e tantos resultados que nos conseguiu trazer na sua intervenção inicial.
Começo por fazer uma afirmação: penso que as questões, hoje em dia, são muito mais transversais do que sectoriais. E estamos, de facto, conscientes de que há uma necessidade absoluta de contenção da despesa, sob pena, até, de podermos afectar a universalidade do direito à saúde. Mas também sei que, apesar do esforço de contenção, mesmo assim, a economia cresceu. E isto é preciso lembrar aos portugueses, pois há alguma oposição que tenta desvalorizar este dado.
Para quem fala em que são só números, que são só números, eu quero dizer que não são só números! Lembro que é precisa competência e essa competência existiu. Por isso, estamos, de certa forma, contentes – ainda não completamente satisfeitos, é evidente –, com o desempenho do Governo na área da saúde.
Gostaria também de lembrar que tudo isto se deve a uma boa execução orçamental, que existiu em 2006 e em 2007, que permitiu (apesar desse esforço, repito, porque no que toca à produção e ganhos em saúde os indicadores estão praticamente todos a aumentar), que o Orçamento para 2008 avançasse, pela primeira vez – e é preciso lembrar: pela primeira vez! –, com novos cuidados para o Serviço Nacional de Saúde! Desde logo, pela primeira vez se vai incluir um Programa Nacional de Promoção da Saúde Oral, com três vertentes: para crianças, para grávidas e para idosos. Penso que já foi reclamado no passado por outros grupos parlamentares, que, na altura, tinham responsabilidade no governo, mas que rapidamente o desvalorizaram.
Também a inclusão da vacina contra o cancro do colo do útero, se houver consenso científico. E aqui lembro que não prescindimos que as decisões políticas tenham sempre um fundamento científico. Não prescindimos! E acho bem que o Sr. Ministro lembre, quantas vezes forem precisas, que esse é um princípio por que nós e o Governo do Partido Socialista se vão reger sempre.
Igualmente, o apoio à Procriação Medicamente Assistida, também anunciado, garantindo, desta forma, o acesso a este tratamento a mais famílias que desejem ter filhos. Também muito se falou, nunca se tinha feito.
É bom lembrar ainda as medidas anunciadas no apoio às pessoas com a doença da diabetes.
Tudo isto parece pouco. Será pouco, certamente, mas é a primeira vez e talvez convenha lembrar, a certo tipo de oposição, que nunca se tinha feito. Portanto, era bom não termos de assistir muitas vezes, a uma desvalorização lamentável por parte da oposição.
Quero lembrar, novamente, perante este quadro de credibilidade e de verdade orçamental, que também se iniciou um ciclo, há poucos anos, onde a saúde é o seu mais fiel reflexo, sabendo que diversas medidas de contenção da despesa já foram tomadas, que também sabemos que há rubricas cujo esforço de contenção dificilmente conseguirá conter aumentos.
Pergunto: do elenco das medidas apresentadas, umas mais implícitas, outras menos implícitas no Orçamento do Estado, quais podem resultar em novas poupanças? E termino, saudando o Governo e lembrando que a lógica continua a ser não a lógica dos cortes cegos, mas uma lógica de gerar poupanças, onde é possível, para gastar onde é necessário e onde sempre se disse que era necessário, mas que, de facto, nunca se tinha feito.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Dou, agora, a palavra ao Sr. Deputado Eugénio Rosa do PCP.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr.ª Presidente, tenho que ser sintético e vou começar já por colocar a primeira questão.
O Instituto Nacional de Estatística acabou de publicar dados sobre o índice de preços no consumidor. E eu, naturalmente, fui ver a evolução verificada em relação à saúde, Sr. Ministro, e devo dizer-lhe que esta é a classe onde se verificam aumentos mais significativos.
Só para lhe dar um exemplo, tomando como base o mês homólogo do ano anterior, em Janeiro, 5,6; em Fevereiro, 6,1, depois 6,4, 10,9, 9,8, 9,5» Enfim, a mçdia anda á volta dos 8% acima do valor do ano passado e representa três vezes mais do que o aumento do índice de preços total. São três vezes mais! Portanto, na saúde os aumentos têm sido extremamente significativos.
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Pergunto: não seria de repensar toda esta política que está a trazer consequências, custos extremamente elevados para os portugueses, conforme está traduzido neste índice do INE? Esta é a primeira questão que lhe coloco.
Pergunto: não seria de repensar toda esta política que está a trazer consequências, custos extremamente elevados para os portugueses, conforme está traduzido neste índice do INE? Esta é a primeira questão que lhe coloco.
A segunda questão prende-se com a necessidade de analisarmos o Serviço Nacional de Saúde não apenas circunscrito a si próprio mas também englobando os hospitais EPE. Os dados que nos são fornecidos são extremamente fragmentados, no entanto, tentei consolidá-los, embora correndo alguns riscos de falta de rigor total, para colocar ao Sr. Ministro uma questão. Peguei nos dados que nos foram fornecidos, sendo que os mais credíveis me parecem ser os de referência, utilizando as contas nacionais, num universo comparável, e comparei, numa primeira etapa, os dados referentes ao Serviço Nacional de Saúde. E quais são as conclusões que se tiram dos dados que foram fornecidos? Entre 2006 e 2008 a receita aumenta 2,3% e a despesa aumenta 5,9% e a primeira coisa que é preciso ter presente é que, neste período, os preços deverão aumentar entre 7% e 8%. Portanto, se compararmos o aumento de preços em 2006, em 2007 e a previsão para 2008 — e aponto apenas para metade do ano e não para a totalidade —, chegamos à conclusão de que há uma quebra real bastante grande, fundamentalmente nas receitas do Serviço Nacional de Saúde. Entre 2006 e 2008, as receitas aumentam 190 milhões de euros e as despesas aumentam 464 milhões de euros. O Sr. Ministro pode dizer-me: «Bom!, mas mesmo com isto, a situação está controlada». O que sinto é que se estão a impor limites extremamente apertados às transferências para o Serviço Nacional de Saúde, e o Orçamento deste ano é outro exemplo disso, que, depois, naturalmente, têm consequências a nível da despesa.
Mas, deixando agora esta situação do Serviço Nacional de Saúde, vamos ver o que está a acontecer nos hospitais EPE. Não temos dados consistentes para todo o período, que começa em 2003, com a criação dos hospitais SA, mas tentei juntar os dados dispersos, nomeadamente no que se refere aos resultados e a conclusão que se tira — e penso que este dado poderá estar muito perto do verdadeiro — é a de que os prejuízos acumulados nos hospitais EPE, de 2003 a 2007, andarão à volta dos 700 ou 800 milhões de euros. E a questão que lhe coloco é precisamente esta: qual é o valor correcto dos prejuízos acumulados nos hospitais EPE? Por exemplo, na informação que nos foi fornecida hoje, relativamente a 2007, se percebo o que está aqui escrito, na demonstração de resultados, aparece-nos, relativamente a 2007, para os hospitais EPE, um resultado negativo operacional de 230 milhões de euros e líquido de 215 milhões de euros. E isto ç só este ano»! Portanto, a questão que se coloca, Sr. Ministro, é esta: a contenção que se está a fazer no Serviço Nacional de Saúde não está a determinar este acumular de prejuízos nos hospitais EPE? Como os prejuízos dos hospitais EPE não contam para o défice orçamental, segundo me parece, não se estará, desta forma, utilizando este instrumento, a reduzir o défice global? Esta era a primeira questão que lhe queria colocar sobre estes dados, relativamente aos quais tenho consciência de que não são totalmente consistentes, mas fica a minha dúvida.
A segunda questão»
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Todos falaram um bocadinho mais, Sr.ª Presidente. Não sei se esteve atenta»
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Já falou um bocadinho mais,»
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Não, mas eu vi que falaram mais. Só quero colocar mais uma questão.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — De qualquer modo, agradeço-lhe que tenda para a conclusão.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — A segunda questão que lhe quero colocar tem a ver com a política do medicamento. Fui aos anexos do estudo sobre a sustentabilidade do financiamento do Serviço Nacional de Saúde, retirei os dados sobre a percentagem da participação do utente no medicamento e constatei que essa percentagem está a crescer: em 2002, era de 30%; em 2003, passou para 30,6%; em 2004, passou para 31%; e, de
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acordo com os dados que me foram fornecidos pelo Sr. Secretário de Estado, na última discussão do Orçamento do Estado para 2007, cheguei à conclusão de que a participação do utente no medicamento já é de 35%, com a disparidade entre o regime dos reformados, em que é de 26%, e o regime normal, em que é de 46%. Isto significa que há um crescimento contínuo. A questão que lhe coloco vai no sentido de saber se, em 2007, se continuou a verificar este crescimento.
Finalmente, em relação às parcerias público-privadas, constatamos que o Ministério, pelo menos em determinados momentos, teve opiniões diferentes sobre essas parcerias. E sabemos agora, com o Orçamento, e não só, que foi adoptado, como modelo, o período de 30 anos para as infra-estruturas e de 10 anos para os serviços clínicos. A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, vai no sentido de saber que razões levaram o Ministério da Saúde a adoptar este modelo. Quais as vantagens em relação à gestão pública, nomeadamente na parte clínica? O Ministério da Saúde tem estudos técnicos que fundamentem a sua opção? Em caso afirmativo, poderá disponibilizá-los à Assembleia da República? Tinha muito mais questões, mas deixo-lhe estas três, concretas, e espero que me responda concretamente, porque, se não souber, diga que, neste momento, não me pode responder.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, a quem alerto, desde já, para o facto de que o tempo de que dispõe é de 3 minutos.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.
Sr. Ministro, tenho de voltar um pouco atrás e clarificar uma questão que pensava não ter de voltar a abordar, que é a daquela senhora que, por um erro médico, quando podia ter sido tratada com um antibiótico, se viu privada dos seus quatro membros. O Sr. Ministro responde a esta questão, remetendo para a responsabilidade extracontratual do Estado, mas, Sr. Ministro, desculpar-me-á, isso também eu sei! O que pedi que o Sr.
Ministro nos dissesse foi se todos nós, enquanto cidadãos, podíamos ter a certeza de que uma queixa que é formulada prossegue com um inquérito que é feito com transparência e que chega a bom termo. Era isso que pretendia e gostava que nos deixasse aqui essa garantia, porque o Sr. Ministro é a tutela e o que queremos saber é se os serviços sob a sua tutela funcionam de forma diligente e transparente relativamente às queixas que são apresentadas.
A propósito de transparência, Sr. Ministro, também não pretendo lançar aqui anátemas sobre quem quer que seja, e penso que não foi esse o objectivo do Sr. Deputado João Semedo, mas o Sr. Ministro há-de concordar que, no mínimo, é estranho e coloca-nos algumas dúvidas o facto de um concurso para uma farmácia hospitalar, com encargos, nomeadamente de renda, muito elevados, ser ganho por uma farmácia de Vila Nova da Barquinha, quando um agrupamento de 36 farmácias não conseguiu cumprir os requisitos e as quotas variáveis que eram impostas. É, no mínimo, estranho, Sr. Ministro»! Mas aguardemos para ver — e, mais uma vez, estes concursos decorrem sob a sua tutela» Também lhe peço transparência relativamente a uma outra questão. Já aqui disse que estavam cabimentados os 15 milhões de euros para a vacina contra o cancro do colo do útero, mas o Sr. Ministro responde sempre escudando-se no relatório e no estudo médico. Ora, de duas uma: ou o relatório era suficientemente sólido para permitir ao Primeiro-Ministro vir cá anunciar essa comparticipação ou a introdução no Plano Nacional de Vacinação, ou, então, não era e, nesse caso, o Primeiro-Ministro não podia fazer esse anúncio. Portanto, repito: como é que os senhores inscrevem esta verba de 15 milhões de euros? Não remeta sempre para o estudo, Sr. Ministro, porque +percebemos que o Sr. Ministro já sabe qual é a decisão. E é evidente que é importante que as decisões sejam tomadas com base em estudos científicos, mas, obviamente, a decisão final é uma decisão política, caso contrário não teria sido o Primeiro-Ministro a vir cá anunciá-la.
Vou ainda interpelar o Sr. Ministro, visto que esta matéria já não está nas suas mãos, no sentido de, por favor, perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro qual é o ponto da situação relativamente às discussões sobre a regulamentação da Concordata, no que se refere à assistência espiritual em meio hospitalar, se já nos pode dar alguma resposta sobre o que vai suceder a médio prazo.
Tinha mais perguntas a fazer, mas faço apenas mais uma. Diz o Sr. Ministro, no Relatório, que pretendem fazer o reforço da cooperação em saúde e dar prioridade à saúde reprodutiva, no contexto dos objectivos do milénio. Muito bem! O que pergunto, de forma breve, é em que é que se vai consubstanciar esse reforço da
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cooperação. E não falo apenas de métodos contraceptivos e com vista a prevenir a contracção de HIV/SIDA mas também de outros medicamentos relacionados com a maternidade.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, começo por registar a resposta do Sr.
Ministro à questão das taxas moderadoras, que é uma resposta que me satisfaz, e espero apenas que a administração central do sistema de saúde divulgue as orientações necessárias para que disparates e atropelos destes não tenham visibilidade nos avisos públicos de marcação de consulta ou em qualquer outro acto médico.
Quero também dizer-lhe, Sr. Ministro, que usei a expressão «testas de ferro» como ela é utilizada no mundo empresarial e não num sentido depreciativo da expressão ou com qualquer carga negativa. Mas também lhe devo dizer o seguinte: o cidadão é conhecido, porque foi a uma assembleia da Associação Nacional de Farmácias dizer: «eu estou aqui, eu represento estas farmácias, eu ganhei estes concursos». Portanto, não tenho qualquer problema em afirmar aquilo que foi ouvido, directamente, por centenas de farmacêuticos reunidos em assembleia-geral da Associação Nacional de Farmácias. Agora, o ponto aqui é que eu prevejo, e era esta a questão que pretendia sublinhar, que tudo isto se vai transformar num enorme imbróglio jurídico, porque todos sabemos — isto foi amplamente divulgado na comunicação social — que há contestações judiciais, se não estou em erro, em relação a praticamente todos os concursos. E a tese que defendo — esta é, de facto, uma grande divergência entre nós — é a de que procurar resolver problemas nos hospitais públicos recorrendo ao sector privado dá mau resultado, dá trapalhadas. Esta é a minha opinião, e creio que fundamentada em muitos factos.
Terceiro ponto: IPO. Bom! Creio que, como o Sr. Ministro disse, se estão ainda a desenrolar negociações, mas, tanto quanto sei, a posição da Câmara Municipal de Lisboa é muito clara e é a de não permitir qualquer especulação imobiliária com os terrenos do actual IPO. Não sei se o IPO detém tanto capital social para conseguir, com base nesse capital, construir um novo edifício, mas, enfim, duvido que a solução seja a dos terrenos, porque não me parece que a Câmara Municipal de Lisboa vá abrir mão dessa premissa.
Por outro lado, gostaria de chamar a atenção do Sr. Ministro para o seguinte: a realidade é que fecharam muitos SAP sem que houvesse qualquer alternativa — isto é um facto! — e muitas das alternativas que foram criadas — também é um facto! — foram-no em torno da prestação de outros serviços que nada têm a ver com as situações agudas, que eram a principal vocação dos SAP.
Gostaria ainda que o Sr. Ministro me respondesse a uma pergunta que lhe fiz: há ou não verbas suficientes, neste Orçamento do Estado — eu não as encontrei ou as que encontrei são em volume insuficiente —, para, finalmente, promover uma expansão mais acelerada da rede de unidades de saúde familiar e também para assegurar a criação das urgências básicas, que são em número suficientemente grande para exigirem um volume de investimento relativamente grande também? Queria só fazer um apontamento: aqui há tempos, numa reunião com o Presidente do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), onde estiveram vários Srs. Deputados, a solução apresentada para aumentar os recursos humanos do INEM (e é um problema difícil) era recorrer a médicos das Repúblicas bálticas — não sei se os colegas Deputados estão recordados disso —, que eram, digamos, aqueles que de uma forma mais rápida poderiam superar essas dificuldades de recursos humanos. Bom, agora já não são médicos das Repúblicas bálticas, vêm do Uruguai» Tudo bem, sou internacionalista, mas acho um pouco estranha uma mudança tão acentuada de solução para o problema.
Finalmente, gostaria de dizer ao Sr. Ministro da Saúde que não levanto qualquer problema relativamente à transparência, ou não transparência, da contabilização das parcerias público-privadas em Orçamento do Estado — pelo contrário, até referi um número que só seria possível se essa transparência existisse.
O que o Orçamento do Estado diz é que temos, nos próximos 30 anos, para quatro parcerias públicoprivadas (quatro novos hospitais), um encargo previsível de 6000 milhões de euros. Acho que isto é um volume excessivo e que poderá comprometer, a médio e a longo prazos, a sustentabilidade dessas instituições hospitalares.
Portanto, não contesto a transparência mas, sim, a opção política, sobretudo porque o Sr. Ministro nos diz uma coisa que acho um pouco chocante em termos políticos: é que não há outras alternativas. Isso não é verdade! O Estado dispõe de outras modalidades de financiamento que não sejam as parcerias público-privadas.
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Mesmo para terminar, vou colocar duas perguntas muito concretas e muito simples.
A primeira pergunta é sobre se o Sr. Ministro está, ou não, em condições de nos dizer e de nos sossegar sobre uma forma de calcular os tempos de espera da lista de espera de cirurgia.
Ouvi dizer (digo que ouvi dizer porque foi isso aconteceu) que, como sabe, há 80 000 cidadãos a quem as instituições entregaram um cheque-cirurgia e que 80% desses cidadãos devolveram o cheque-cirurgia por não quererem ser operados na instituição para a qual estavam referenciados.
A minha pergunta é a seguinte: é ou não verdade que estes 80% sobre 80 000 cidadãos estão, agora, contabilizados nas listas de espera do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC) como cidadãos com «tempo zero de espera»? Coloco-lhe esta pergunta porque isto altera muito a contabilidade das listas de espera.
Agora, passo à segunda e última pergunta sobre algo que também ouvi dizer»
O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Ou sabe ou não sabe!
O Sr. João Semedo (BE): — Se tivesse a certeza não diria nestes termos» Nas redes de referenciação hospitalar que estão em recomposição, nomeadamente a de oncologia e a das doenças cardiovasculares, está ou não prevista também a inclusão de unidades privadas? Coloco esta pergunta porque numa reunião em que foi discutida a rede de referenciação das doenças cardiovasculares foi dito que o futuro hospital dos Lusíadas integrará essa rede de referenciação e não gostaria de ficar sem resposta porque acho que este é um problema central de transparência também no que respeita à forma como o Estado regula a composição das novas redes de referenciação hospitalar.
Sr.ª Presidente, muito obrigado pela sua tolerância.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Agora, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde, para responder a este conjunto de perguntas. Sendo a última ronda, não haverá mais intervenções, pelo que será a sua declaração final.
O Sr. Ministro da Saúde: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões colocadas.
O Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda queixou-se da situação calamitosa da lista de espera da consulta externa hospitalar.
Sr. Deputado, a sua memória é curta: como é que seria a lista de espera nas urgências das consultas externas hospitalares quando os hospitais faziam muito menos consultas externas do que fazem hoje? Sabe que cerca do ano 2000 temos uma inversão da curva das consultas externas em relação à curva das urgências. Vou procurar o documento e já lho mostrarei. A curva das urgências está estabilizada, até baixou.
Olhe para o documento que lhe estou a mostrar: o que está a verde são as consultas externas e a vermelho são as urgências. O «clique» deu-se por volta de 2000/2001 e veja como o nosso sistema melhorou, como continua a melhorar e como as urgências estão a estagnar e até provavelmente o que se vai passar, se tudo correr bem, é que as urgências vão baixar e a consulta externa vai continuar a progredir. Portanto, não consideremos a situação calamitosa; a situação, pelo contrário, está a evoluir no sentido absolutamente correcto.
Sobre a adopção do vale-cirurgia e de um cheque de consulta de externa, bem sei que o novo líder do Partido Social-Democrata defendeu, no seu programa de governo, uma ruptura dramática com a situação actual da combinação público-privada do exercício da Medicina. Bem sei que o líder do partido a que V. Ex.ª pertence propõe corajosas medidas de separação entre a prática pública e a prática privada. Ou seja, os médicos teriam de decidir «de cimitarra ao pescoço» se queriam ir para o sector público ou para sector privado, sendo mutuamente exclusivos. É, digamos, a veemência no escrito do programa de candidatura do Sr. Dr. Luís Filipe Menezes, pessoa que muito respeito e de quem sou amigo.
Agora, deixe-me que lhe diga uma coisa: é muito fácil propor medidas drásticas quando se está na oposição. Os senhores estiveram muito tempo no governo e nunca propuseram medidas destas.
Até somos capazes de concordar que é necessário clarificar muito esta combinação público-privada e restringir progressivamente a capacidade de as pessoas andarem a saltar de um sistema para outro, essa «contaminação» que não é saudável para o sistema de saúde.
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Contudo, somos realistas, Sr. Deputado: não propomos medidas violentas, revolucionárias, que iriam criar instabilidade, por completo, no tecido da saúde em Portugal. Entendemos que isso está assim feito paulatinamente, vai continuar a ser feito, por isso tenho dito repetidas vezes, quando vejo médicos a irem só para o sector privado, «ainda bem, vão», porque é muito melhor que vão só para o sector privado do que «ficarem com uma perna num e com outra perna noutro». E o sector público tem muitas pessoas na segunda linha (repito comentários meus várias vezes feitos) que podem passar para a primeira linha. Essa é a nossa estratégia. A estratégia que V. Ex.ª defende é revolucionária: «tiro-lhe o meu chapéu», mas não tenho coragem de entrar nessa revolução tão afrontadamente como V. Ex.ª propõe.
No que respeita às transferências para os municípios, o Sr. Deputado acompanha a vida política e já deu conta que o processo de gestão e de «gestação» das transferências dos municípios teve um arrefecimento devido à recomposição das pessoas que participam, do seu próprio partido, na comissão. São pessoas muito importantes e por quem, aliás, tenho o maior respeito. Logo, esperamos que essa recomposição se faça, termine e que essa energia transferidora de competências recupere, pelo que o único compasso de espera aqui é um compasso de respeito pela resolução da crise interna, que está em vias até de reconfiguração no partido a que V. Ex.ª pertence.
O Sr. Deputado acusa-me de uma coisa que nunca fiz, isto é, de eu dizer que os médicos trabalham pouco.
Nunca disse isso! Sou extremamente cuidadoso nas afirmações que faço sobre o exercício das pessoas que trabalham sob a minha responsabilidade. Garanto-lhe que nunca disse isso! Desafio-o a trazer-me o texto onde, porventura, viu isso! O que digo sistematicamente é que os médicos ganham pouco e que todo o sistema melhoraria se os médicos tivessem incentivos ao desempenho. Isso digo, mas nunca me ouviu dizer que os médicos trabalham pouco.
A Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos enalteceu os novos programas existentes no Serviço Nacional da Saúde. Acho que o que estes programas têm de importante é que não foram inventados numa semana, têm meses e meses de trabalho atrás de si.
O programa da procriação medicamente assistida foi ancorado numa tese de mestrado e na capacidade técnica de um especialista que está a fazer o seu doutoramento nesta matéria, portanto teve conhecimento e experiência de investigação sobre a matéria! Não andamos a brincar nestas coisas! Em matéria de saúde oral, devem ter ouvido o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas dizer que as prioridades que o Governo definiu para a saúde oral são as correctas! E não as inventámos, elas estão há muito tempo definidas nas instâncias internacionais, na Organização Mundial de Saúde, e nós próprios também as sabemos! Portanto, temos aí, naturalmente, credibilidade, porque nos baseamos em evidência.
Que medidas podem resultar em ganhos de eficiência, perguntou a Sr.ª Deputada.
Sr.ª Deputada, as unidades de saúde familiar são, provavelmente, a maior fonte de ganhos de eficiência, porque a proximidade do cidadão em relação ao seu médico de família, o não andar a saltar constantemente para uma relação despersonalizada, é a melhor forma de passar a ter uma solidariedade terapêutica, um acompanhamento mais directo, menos meios complementares de diagnóstico, tudo isso.
Perguntou-me sobre os cuidados continuados. Então, os cuidados continuados não são a forma de deslocar doentes, que estão com um custo de manutenção e de diária tão alto nos hospitais de agudos, para as camas de convalescença ou de média duração, onde os custos médios são muitíssimo mais baixos?! Aí estão as economias.
A saúde oral tem uma importância decisiva e, então, do ponto de vista de prevenção é essencial. É muito mais rentável tratar dos selantes das crianças e prevenir a cárie dentária do que depois ter crianças aos 15 anos com cáries dentárias e com extracções totais, ou parciais, de dentes. É muitíssimo mais barato, portanto, todas estas políticas visam» E da mesma forma no que respeita às grávidas! Os senhores conhecem o estado lastimoso dos dentes de muitas grávidas portuguesas nas aldeias, onde não há acessibilidade aos cuidados dentários?! Já olharam para a boca das mulheres ao fim da primeira, segunda e terceira gravidezes para verem como é importante investir na prevenção? E isto sem contar com a transferência de mãe para filho da própria cárie e com outras razões.
Sr. Deputado Eugénio Rosa, deixe-me aproveitar esta ocasião para cumprimentá-lo.
Tenho sempre muito gosto, porque somos amigos há muitos anos e trabalhámos juntos noutras áreas.
Aliás, atç fomos colegas de um mesmo governo, se bem me recordo, portanto temos muitos pontos»
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Aparte inaudível do Deputado do PS Ricardo Gonçalves.
Não tenho qualquer desconfiança, ou descrença, no meu passado e naquilo que em comum trabalhámos, muitas vezes com versões divergentes com o Sr. Deputado Eugénio Rosa, que aproveito para saudar.
Há algumas perguntas que são muito técnicas e especializadas. Como sempre acontece, o Sr. Deputado prepara-se muito bem! Tenho apenas uma discordância em relação aos índices de preços no consumidor: é que os índices de preços no consumidor do INE são índices de um cabaz de preços no consumidor, não são índices dos preços nos hospitais, nem englobam os preços administrados.
Portanto, dizer que os preços da saúde sobem mais não é novidade alguma, porque sempre subiram mais.
Mas sobem mais porque os medicamentos sempre tiveram taxas de crescimento mais altas do que o resto e eles são uma parte muito importante do cabaz de preços nos consumidores, como o Sr. Deputado sabe.
Mas o Sr. Secretário de Estado vai dar-lhe informações sobre os hospitais entidades públicas empresarias e sobre o seu estudo, que consolidou à sua maneira, certamente, do universo comparável.
O Sr. Deputado referiu que existiam restrições excessivas nas transferências financeiras para o Serviço Nacional de Saúde. Muito obrigado, Sr. Deputado! É o que tenho a dizer-lhe.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Relativamente à matéria disse nada!
O Sr. Ministro da Saúde: — Não, não! O Sr. Deputado diz que o Orçamento é pouco generoso para o Serviço Nacional de Saúde e eu respondo: muito obrigado, Sr. Deputado! Também eu gostaria que fosse muito mais generoso.
Relativamente à política do medicamento, Sr. Deputado Bernardino Soares, eu não quero zangar-me com V. Ex.ª, pois tenho muito respeito por si. O senhor sabe muito bem que eu gostaria que houvesse mais dinheiro para a saúde.
Na política do medicamento a comparticipação é de 35%. Suponho que o Sr. Deputado conhece outros estudos que dizem que, na parte dos gastos privados com saúde, o medicamento representa a fatia mais volumosa. Não sei se ainda está em 50%, mas houve momentos em que a parte dos gastos privados das famílias com saúde era muito alta. Naturalmente, a média das comparticipações tem este peso enorme no PIB.
O seu número não me parece muito desajustado da realidade: 35,65% é capaz de ser a situação hoje. Mas uma coisa lhe garanto: ao contrário do que os Srs. Deputados da bancada do PCP vieram dizer veementemente, há um ano e dois anos atrás, os medicamentos baixaram de preço, mesmo na parte para o consumidor.
Tenho aqui a prova disso, Sr. Deputado, e é com muito gosto que lhe faculto toda a baixa dos medicamentos. Não digo os nomes comerciais, naturalmente, mas vou ler as denominações comuns internacionais: o Clopidogrel baixou 1,1 € por embalagem em relação a Dezembro de 2006; o Ácido Alendónico + Colecalciferol baixou 0,69 €; a Atorvastatina baixou 1,54 €; o Bioflavonóides baixou 1,25 €, o Irbesartan + hidroclorotiazida baixou 0,57 €;»
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Eu não falei no preço, falei na repartição!
O Sr. Ministro da Saúde: — » a Rosuvastatina baixou 3,81 €; a Sinvastatina + Ezetimiba baixou 4,62 €; o Omeprazol baixou 1,8 €; e a Trimetazidina baixou 0,25 €.
Sabe qual é que não baixou? Só não baixou (ficou em zero) aquele que não tem qualquer comparticipação, a vacina pneumocócica conjugada.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Eu falei na repartição, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro da Saúde: — Pergunta-me ainda: porquê os 30 anos para a gestão clínica? A questão dos prazos foi definida num decreto-lei, ao abrigo do qual se lançaram quatro concursos. E a posição do Ministro Correia de Campos, quando entrou no Governo, foi esta: não vamos desestabilizar o mercado, os quatro concursos que estão lançados mantêm-se tal como estavam previstos, isto é, com infra-estruturas mais gestão clínica.
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Fi-lo por razões de estabilidade de mercado. Respeito muito o mercado, respeito muito quem cria emprego e respeito muito quem organiza o seu investimento a pensar no futuro. Portanto, não me veria a desrespeitar a preparação — que eu sabia, ainda por cima, que era uma preparação muito dispendiosa para as candidaturas —, daí a manutenção.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E os outros?
O Sr. Ministro da Saúde: — A propósito do erro médico, a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro questiona se as queixas chegam algum dia a bom termo. A Sr.ª Deputada vive num Estado de direito! Se me disser que nalgumas queixas, em relação a alguns grupos profissionais, há uma protecção profissional ou que há sinais de ter havido alguma protecção profissional, eu não comento essa afirmação. Mas o que posso dizer é que, ainda recentemente, tive de aplicar uma pena disciplinar de suspensão a um clínico, ao abrigo de um processo disciplinar, numa situação que teve sequelas gravíssimas no nascimento de uma criança com paralisia cerebral.
Posso responder por mim e dou-lhe este exemplo muito visível, mas não se pode fazer teoria geral a partir de casos isolados. Tenho a maior solidariedade e o maior sentimento de tristeza pelo caso que refere, mas não posso comentar uma situação isolada.
Quanto aos concursos de farmácias hospitalares ganhos pela farmácia de Vila Nova da Barquinha, tenho a dizer-lhe o seguinte: o concurso tem regras, é transparente, é sindicável nos termos da lei e dos concursos administrativos. Certamente, ele será objecto de apreciação cuidadosa. Portugal é um Estado de direito: os reclamantes reclamarão e, se intentarem providências cautelares, a Administração pública responderá a essas providências cautelares. Portanto, a lei segue os seus trâmites, até mesmo quando esses trâmites são um pouco estranhos e encontram eco nestas paredes.
A Sr.ª Deputada sabe, certamente, que há um processo-crime que foi intentado por alguns dos agrupamentos perdedores de certos concursos contra os agrupamentos ganhadores — um processo-crime! Portanto, entendo que devemos ter alguma cautela nesta matéria e não nos referirmos a ela. A questão está a este nível, criminal e de reclamação administrativa, por isso vamos deixar o processo ser resolvido. Não espere, pois, que o Ministro da Saúde se meta nesse assunto, a não ser para responder às providências cautelas e fazer avançar o processo — isso farei, com certeza! Pergunta-me igualmente como é que inscrevemos 15 milhões de euros no HPV (Human Papiloma Virus). É muito simples, Sr.ª Deputada: tendo em conta que estão em causa 50 000 destinatários (jovens, sensivelmente) e que o preço da vacina é de cerca de 300 € nas três doses, quando vendido fora das farmácias (ç esse o preço noutros países, em Espanha, por exemplo), só temos de fazer uma multiplicação.
Aparte inaudível da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.
Sr.ª Deputada, há duas vacinas e é preciso saber qual delas é que deve ser escolhida. Temos de decidir, designadamente: se devem ser postas em concurso as duas, ou não; qual é a faixa etária em que deve ser administrada primeiro; qual é o método logístico da administração; como é que isso se vai inscrever no Plano Nacional de Vacinação... Há tanta coisa ainda a decidir, Sr.ª Deputada! E o Ministério tem os seus órgãos competentes para o fazer.
Também tomámos esta decisão financeira de 15 milhões de euros, muito simplesmente porque conhecíamos já a primeira versão, a versão provisória do relatório da instituição internacional que nos ajudou,»
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Ahhh!»
O Sr. Ministro da Saúde: — » mas não a pudemos divulgar. Estamos em contacto com Espanha, Itália, França, Luxemburgo e Inglaterra e, portanto, sabemos o que esses países estão a fazer. Não andamos cegos nem surdos nesta matéria! Sobre a situação da regulação da Concordata sobre assistência religiosa hospital, pergunto se a Sr.ª Deputada leu o artigo da Concordata sobre regulamentação. Há duas formas de resolver este assunto, e a forma de não o resolver é agarrarmos na letra do artigo que regulamenta a Concordata, que estabelece que a Concordata é regulada por acordo entre os dois Estados. Ora, se vamos fazer isto por acordo entre os dois Estados,
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então o Ministério da Saúde lava daí a s suas mãos, entrega a questão ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, que vai dialogar com o Vaticano. Essa é a forma de deixar tudo na mesma! A forma como estamos a trabalhar com a Conferência Episcopal Portuguesa é a de ouvi-la, com muita atenção e interesse, na elaboração da proposta do Governo. E esse documento depois será apresentado à Comissão da Liberdade Religiosa, que é o organismo de audição obrigatória nesta matéria. Mas é muito mais vantajoso levar à Comissão de Liberdade Religiosa um projecto de diploma sobre o qual já se conversou, ainda que não haja qualquer auto de assinatura, sobre o qual demos informação franca e muito aberta. É este o caminho que estamos a seguir e creio que é um caminho de bom senso e correcto.
Sr. Deputado João Semedo, registo que ficou satisfeito com a resposta sobre taxas moderadoras. Sobre o testa de ferro já falámos e sobre os imbróglios jurídicos penso que não vale a pena repetir a resposta já dada.
Sobre a especulação imobiliária dos terrenos do IPO, mais adiante o Sr. Deputado questionou-me sobre se não haverá outras alternativas às PPP. Sr. Deputado, entendamo-nos: o que é que o senhor quer? Não se trata de especulação imobiliária, trata-se de utilizar os terrenos devolutos dos hospitais de Lisboa para o que estava previsto no Plano Director Municipal!! Nada mais queremos, nada! Queremos apenas o que está previsto no Plano Director Municipal! Portanto, essa é a nossa base.
Pelos vistos, o senhor chama especulação imobiliária ao que está previsto nos planos directores municipais»! Peço desculpa, mas eu não chamo, nem vejo o mundo por essas lentes; eu vejo o mundo atravçs das lentes de planeamento, programação cuidadosa, coisas que estão feitas há muito tempo e que nem sequer são conjunturais e, portanto, é isso que vamos adoptar.
Eventualmente, vamos alienar o terreno pelo seu valor comercial, à luz do Plano Director Municipal. Mas nada do que isto! Não esperaria de mim que fizesse pressão para mudar o Plano Director Municipal e permitir ali uma cércea de 50 andares, naturalmente?! Por muito bom que isso fosse financeiramente para o Ministério da Saúde, mas nem sequer eu tinha condições para pedir isso, como calcula. Depois, ver-se-á como é que isto é feito.
O Sr. Deputado está muito inquieto em relação aos recursos financeiros para unidades de saúde familiares.
As unidades de saúde familiares precisam apenas de pequenas obras dentro dos centros de saúde existentes, e os centros de saúde novos já são construídos com unidades de saúde familiares. São pequenas obras, pequenas adaptações, mais o equipamento informático, para o qual temos uma dotação especial. Olhem para o anexo dos programas verticais, porque lá encontrarão uma dotação generosa para os sistemas informáticos.
Quanto a recrutar médicos bálticos ou uruguaios para o INEM, bom, todos são bem-vindos! Para os bálticos é mais fácil o seu entrosamento nas regras da sociedade médica nacional, porque há, naturalmente, questões que têm a ver com a fluidez das regras comunitárias», mas os uruguaios têm a vantagem da língua. Portanto, há vantagens para ambos os lados.
Já respondi à questão das parcerias e a Sr.ª Secretária de Estado vai responder-lhe sobre a espera cirúrgica.
Quanto à questão de o hospital dos Lusíadas integrar a rede,»
O Sr. João Semedo (BE): — Exactamente!
O Sr. Ministro da Saúde: — » peço muita desculpa, mas o senhor e o seu líder parlamentar são reincidentes em lançarem «lama» sobre as pessoas.
Protestos do Deputado do BE João Semedo.
Ó Sr. Deputado, desculpe, tenha modos! A lei portuguesa, a Constituição da República, a lei do Serviço Nacional de Saúde e a política deste Governo consideram o sector privado sempre complementar. E, portanto, a resposta à questão da rede é esta: se a complementaridade do sector privado for necessária à rede, sim! Se o privado for uma duplicação da rede, não, nunca! Percebe? Não, nunca, se for uma duplicação da rede!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E se for complementar, «sim» ou «não»!?
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O Sr. Ministro da Saúde: — Mas se for complementar, sim! Vou dar-lhe um exemplo: temos uma complementaridade a funcionar muito bem com o Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa e, provavelmente, até vamos alargá-la para recuperar alguma especialidade médica, matéria de que ouviremos falar em breve. Trata-se de uma rede complementar no caso da cirurgia cardíaca, como sabe, sobretudo pediátrica, e tratar-se-á também, neste caso, da complementaridade de uma rede que claudica, como é o caso de oftalmologia, por falta de oferta.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado da Saúde: — Sr.ª Presidente, alguns comentários breves.
O Sr. Deputado Carlos Miranda pergunta se no QREN há um programa para a saúde. A resposta é «não», porque a estrutura do QREN está definida. Há uma concentração em três programas nacionais, há cinco programas regionais no continente, ou seja, sete programas regionais ao todo, portanto não há um programa para a saúde. Houve uma opção política, por razões de coerência, de concentrar os programas em três grandes áreas.
Há um regulamento específico para os projectos de saúde, que, naturalmente, fará com que as prioridades políticas da saúde sejam respeitadas e a aprovação desse regulamento está, certamente, para breve.
Sr. Deputado Eugénio Rosa — a quem também saúdo —, quanto à questão dos prejuízos acumulados nos hospitais empresa não estou em condições de lhe confirmar o número que citou, mas não me surpreende que seja esse o número. Enfim, os números têm sido públicos ao longo dos anos e o caminho que estamos a percorrer é um caminho de progressivo equilíbrio financeiro de todos os hospitais. Ou seja: o que nos interessa é reduzir, ano a ano o desequilíbrio financeiro. Isso tem acontecido e, em 2007, vai novamente acontecer.
O mapa que lhe distribuí tem, numa primeira coluna, a execução de Setembro de 2006, numa segunda coluna, a execução de Setembro de 2007 e, numa terceira coluna que diz «final», a execução final de 2006, não é, sequer, a prevista para 2007. Portanto, essa é a tendência que estamos a executar e que tem vindo a acontecer.
Apenas mais 20 segundos para dizer que há também para todos os actuais hospitais EPE planos estratégicos, pelo menos, a três anos e em alguns casos para mais de três anos, exactamente por se entender que o equilíbrio financeiro não é alcançável em três anos. A nossa política nesta matéria é conciliar a óbvia necessidade de estarmos a falar de instituições de interesse público que interessa que funcionem e que funcionem cada vez melhor e com mais eficiência.
Portanto, o objectivo não é o de que num hospital que tem problemas hoje amanhã tudo esteja resolvido.
Não! O nosso objectivo é o de que o hospital seja dotado de um plano estratégico, em regra, a três anos, mas em alguns casos mais do que isso, e que tenha o seu caminho traçado para o equilíbrio financeiro.
Devo dizer-vos que, em termos globais, para a rede ou para o conjunto dos hospitais-empresa, estamos a perspectivar para os próximos dois anos crescimentos de proveitos na ordem dos 3%. São, de facto, aumentos muito diminutos, na maior parte dos casos de cerca de 1%, isto a preços constantes para os custos, exactamente com aquilo que interessa, que é aumentar os níveis de eficiência.
Um comentário também sobre a política do medicamento e sobre aquilo de que o Sr. Deputado Eugénio Rosa fala quando diz que estamos a aumentar a componente privada. Ó Sr. Deputado, é uma questão de fazer contas e não de querer — e, certamente, não era essa a sua intenção — «massajar» os indicadores. Este Governo tomou medidas de redução do preço dos medicamentos comparticipados. Penso que hoje não há qualquer dúvida de que, nesse conjunto de medicamentos, que é o conjunto mais importante dos medicamentos consumidos em Portugal, isto significou poupança para o Estado, para o Serviço Nacional de Saúde e para as famílias no ponto de consumo.
O facto de haver uma outra componente — medicamentos não comparticipados — onde não basta não ter havido essa redução de 6%, a aplicação imediata desse magnífico indicador, que é a proporção «gastos das famílias/gastos privados», faz com que isso balance. Agora, vale a pena ir um pouco mais longe e perguntar: se não tivesse havido essa quebra de preço dos medicamentos qual teria sido a injunção? O meu comentário é: apesar de isso ser estatisticamente verdade, de essa relação percentual acontecer, no final do dia o que aconteceu para as famílias foi uma poupança na despesa em medicamentos. E vale a pena fazer as contas, porque estou certo de que concordarão comigo depois de fazerem uma análise um pouco mais profunda.
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Aliás, em relação aos números, bem-vindo, Sr. Deputado João Semedo, à realidade dos números dos gastos em saúde. Em 30 anos 6000 milhões de euros e quatro parcerias. Sr. Deputado, convido-o, provavelmente com a ajuda de técnicos especialistas do seu grupo parlamentar, a fazer as contas sobre quanto é que custa um grande hospital, por exemplo, no Porto, em 30 anos. Ora, se fizer as contas a preços de 2007, chega aos 6000 milhões de euros. Portanto, quando diz: «Há aqui um grande compromisso!«» Há quatro parcerias e 6000 milhões de euros! A saúde é cara, Sr. Deputado! Já sabemos! Bem-vindo à realidade dos números e à realidade do custo da saúde.
Finalmente, se me permitem, gostava de fazer também um último comentário em relação à nova proposta de comparticipação de mais uma vacina apresentada pela Sr.ª Deputada Teresa Caeiro. Certamente, conforme o Sr. Ministro já disse, vale a pena analisar a sua proposta. Mas valia a pena também que, nos considerandos da sua proposta, acrescentasse as razões pelas quais a primeira vez que a proposta de comparticipação desta vacina foi feita, que foi em 2003, ela não chegou ao fim. Sabe, certamente, quem é que estava no governo durante o ano de 2003»! E, portanto, Sr.ª Deputada, valia a pena, para fundamentar melhor a sua proposta, dizer que, em 2003, não foi possível comparticipar exactamente esta vacina por esta e por esta razão e que, agora, o Grupo Parlamentar do CDS-PP entende que essas razões estão ultrapassadas e deve voltar a valer a pena olhar para o processo.
A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Saúde.
A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Saúde: — Sr.ª Presidente, quero começar por responder ao Sr. Deputado João Semedo sobre o cálculo do tempo de espera. Penso que o Sr. Deputado sabe que nós calculamos o tempo de espera para a cirurgia de acordo com o que está no regulamento que foi aprovado em Novembro de 2004. Este regulamento de Novembro de 2004 diz o seguinte: «Entende-se por tempo médio de espera a mediana do tempo de espera dos utentes com registos activos» — esta é a fórmula de cálculo do tempo. Mas, como o Sr. Deputado sabe, até porque já teve acesso a alguns desses dados, para patologias mais severas, nós utilizamos para trabalho interno e de preparação de iniciativas também a média do tempo de espera.
Em relação à recusa dos vales de cirurgia, deve haver um problema qualquer, porque os dados que tenho não são recusas na ordem dos 80% dos vales. Os vales emitidos até agora rondam os 164 000 e as recusas são da ordem dos 22%, o que é aproximadamente 35 418, mas, tal como o Sr. Deputado João Semedo, nós também partilhamos dessa preocupação.
Eu pedi muito recentemente ao Sr. Coordenador do Programa do SIGIC, que tem em vista o tratamento da lista de inscritos para cirurgia, que me analisasse ou que encomendasse um trabalho no sentido de se analisar as causas que levam a recusas da ordem dos 22%. O que queremos saber é se isso tem a ver, como nós achamos que tem, fundamentalmente com razões sociais. Por exemplo, não querem ser deslocadas do hospital de origem para uma outra unidade hospitalar, pública ou privada, por razões familiares, porque têm independentes, filhos, etc., e, portanto, preferem adiar as cirurgias, aguardando, portanto, pela possibilidade de a cirurgia se realizar no seu hospital.
Ainda em relação à lista de inscritos para cirurgia, o Sr. Deputado sabe que a nossa maior atenção vai para as patologias mais severas, para as neoplastias, onde, quando chegámos, encontrámos uma mediana de tempo de espera da ordem dos 2,7 meses e agora estamos em 1,57 meses, e para os tempos de espera mais longos, independentemente da severidade da patologia. Portanto, vamos quase só trabalhar caso a caso os que estão inscritos na lista de espera e que estão, a nosso ver, para além do tempo que é considerado aceitável.
Vou terminar, completando apenas o que o Sr. Ministro já disse em relação à questão das primeiras consultas da especialidade, que nós sabemos que são um enorme e significativo indicador do acesso ao nosso sistema.
O Sr. Deputado Carlos Miranda disse que a situação é «calamitosa» — o adjectivo é seu — e que nada fizemos. Gostaria de responder ao Sr. Deputado dizendo-lhe o seguinte: olhe que fizemos, Sr. Deputado! Fizemos e muito!! E começámos a fazer — eu hoje estive a contar — um ano e oito meses antes de porem a questão na agenda da Assembleia da República. Olhe, fizemos o seguinte: aumentámos em 9,4% as consultas
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hospitalares entre 2004 e 2006, aumentámos as primeiras consultas em 8,4%; e iniciámos a implementação de um novo modelo de marcação das primeiras consultas de especialidade hospitalar.
Devo recordar ao Sr. Deputado que o SIGIC, que abrange apenas cerca de uma centena de unidades do Serviço Nacional de Saúde, levou mais de dois anos a implementar e nós iniciámos a implementação de um sistema para a inscrição para as primeiras consultas, que abrange cerca de 2000 instituições do Serviço Nacional de Saúde — hospitais, centros de saúde e extensões de centros de saúde. Portanto, abraçámos essa tarefa ciclópica, que não nos amedronta.
A marcação vai ser feita por via electrónica, portanto desaparecem os caixotes com os pedidos de marcação de consultas nos centros de saúde, que não são enviados para os hospitais, e desaparecem progressivamente, pois, como disse, isto é uma tarefa de grande envergadura, o sistema de quotas. A marcação de consultas vai se feita por prioridade clínica e não por ordem de chegada do pedido de consulta ao hospital e vamos ter um sistema central, uma base de dados central, através da qual nos é possível conhecer a lista de inscritos por instituição hospitalar, por especialidade e os respectivos tempos de espera.
Como deve calcular, Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda, para montar esta operação, para além de um enorme esforço organizacional, é necessário um esforço tecnológico, como o Sr. Ministro já referiu. Temos de olhar para o equipamento informático destas 2000 instituições do serviço nacional de saúde, sendo que algumas delas não estão ainda equipadas informaticamente; e temos de olhar para a nossa Rede Informática da Saúde (RIS), que, não sei se têm conhecimento, é a maior rede privada de comunicações, atingindo mais de 2000 pontos de rede.
E, portanto, esta operação, que visa termos um sistema equiparado ao Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC) para as primeiras consultas abrangerá não os 100 hospitais mas, sim, 2000 instituições. Mas vamos tê-lo.
Gostaria, assim, de sublinhar que fizemos muita coisa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Ficou acordado que haveria só duas rondas. Vou dar a palavra ao Sr. Deputado Bernardino Soares, que passa a abrir a terceira ronda»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, não vou fazer qualquer pergunta»
O Sr. João Semedo (BE): — Peço desculpa por interromper, Sr.ª Presidente, mas depois gostaria de fazer um protesto.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, no meu caso pedi a palavra simplesmente porque penso que é de inteira justiça fazer uma saudação e um agradecimento ao trabalho das nossas intérpretes de língua gestual, que é muito complexo. E hoje isso foi bem visível, por exemplo, na tradução dos «princípios activos» que o Sr. Ministro aqui nos referiu...
Risos.
Penso que num debate complexo e com especificidades técnicas, como é o do Orçamento do Estado nas suas várias áreas, este trabalho é de redobrada dificuldade. Penso que esta palavra é inteiramente justa no momento em que estamos a aproximar-nos do final da discussão na especialidade, pois este trabalho permite que um conjunto de dezenas de milhares de cidadãos surdos possam acompanhar um importante aspecto da vida política do País, como o é a discussão do Orçamento do Estado.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado Bernardino Soares, acho que todos nós lhe agradecemos por se ter lembrado de fazer este elogio a estas nossas colaboradoras, que, de facto, têm feito um trabalho muito útil para que qualquer cidadão seja considerado como igual na nossa sociedade.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, de forma muito rápida, quero dizer que tenho de reagir vigorosamente e de repudiar a acusação que o Sr. Ministro fez de eu estar a enlamear o nome fosse de quem fosse e de, ainda por cima, ser repetente, reincidente nessa matéria.
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Esse tipo de argumentação, Sr. Ministro, não nos fará calar sobre uma questão de fundo do Estado democrático, que é a questão, que está regulada para o exercício de outras funções, de determinado tipo de incompatibilidades. O Sr. Ministro acha que não é incompatível — aliás, até autorizou a cumulação de funções.
Temos o direito legítimo de achar que isso não é bom para o Estado, não é bom para os próprios e não é bom para o serviço nacional de saúde. Nada tem que ver com a seriedade, com a competência ou com o desempenho das próprias pessoas. Não achamos isso uma boa solução. E a sua resposta à minha pergunta deixou-me todas as inquietações sobre esta matéria.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Deputado, como considero a sua intervenção como uma defesa da honra, vou dar a palavra ao Sr. Ministro para, querendo, dar explicações.
O Sr. Ministro da Saúde: — Não quero dizer rigorosamente nada, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Chegámos ao fim desta audição.
Agradeço ao Sr. Ministro, à Sr.ª Secretária de Estado e ao Sr. Secretário de Estado a disponibilidade para estarem aqui hoje, durante a manhã e já a entrar na parte da tarde, a aprofundar as políticas de saúde que suportam o Orçamento do Estado para 2008.
Agradeço também aos Deputados da Comissão de Saúde que estiveram presentes e à sua Presidente, a quem vou dar a palavra para encerrar a audição, todos os contributos que deram para, em conjunto com a Comissão de Orçamento e Finanças, aprofundarmos o orçamento da saúde, que, como todos sabemos, é dos mais significativos do Orçamento geral do Estado.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, Presidente da Comissão de Saúde, para encerrar esta audição.
A Sr.ª Presidente da Comissão de Saúde (Maria de Belém Roseira): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente em exercício da Comissão de Orçamento e Finanças.
Quero manifestar ao Sr. Ministro, à Sr.ª Secretária de Estado e ao Sr. Secretário de Estado o gosto que foi tê-los tido nesta reunião e agradecer o facto de se terem disponibilizado para prestar todos os esclarecimentos, pergunta a pergunta, questão a questão.
Penso que este debate cumpriu o seu objectivo de melhor esclarecimento das propostas do Governo e da sua apreciação por parte dos diferentes grupos parlamentares mas, sobretudo, de um melhor esclarecimento para todas as portuguesas e para todos os portugueses.
Muito obrigada pela vossa disponibilidade, mais uma vez.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Srs. Deputados, está encerrada esta audição. Lembro que às 15 horas começa a audição com a Sr.ª Ministra da Educação.
Vamos interromper os nossos trabalhos.
Eram 14 horas e 10 minutos.
No recomeço, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Jorge Neto.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos retomar os nossos trabalhos.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Trata-se de uma reunião conjunta da Comissão de Orçamento e Finanças com a Comissão de Educação e Ciência realizada no âmbito do Regimento e da Constituição tendo em vista o debate e a discussão na especialidade da proposta do Orçamento do Estado para 2008.
Temos hoje connosco a Sr.ª Ministra da Educação e os Srs. Secretários de Estado, cuja presença aqui desde já agradeço e a quem dou as boas-vindas.
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Gostava de dizer que nesta sede foi já dado a conhecer o relatório da Comissão de Educação e Ciência relativamente a esta área específica, o qual aponta, em linhas gerais, para o seguinte: uma despesa consolidada afecta ao Ministério da Educação na ordem dos 5984 milhões de euros, qualquer coisa como 3,5% do PIB (é concretamente a segunda verba de maior valor, em termos sectoriais, afecta no Orçamento do Estado, o que representa basicamente idêntico valor à estimativa da execução relativa a 2007).
No que concerne às linhas axiais de orientação do Ministério da Educação para 2008 plasmadas na proposta do Orçamento sublinhava, em concreto, três áreas: o combate ao insucesso escolar e a colocação das escolas ao serviço da aprendizagem e dos alunos; o alargamento das oportunidades de aprendizagem ao longo da vida; e a perspectiva de enraizar a cultura e a prática de avaliação.
São estas as três linhas de força sublinhadas no relatório da Comissão de Educação e Ciência que subjazem às políticas públicas do Ministério da Educação, vis-à-vis com o Orçamento para 2008.
Naturalmente, há questões candentes que se colocam em sede das áreas tuteladas pelo Ministério da Educação. Todos nós ouvimos falar das reformas dos ensinos básico e secundário; todos nós ouvimos falar da regulamentação na área da educação e da necessidade de autonomia das escolas, das famílias, dos encarregados de educação; todos nós ouvimos falar do estatuto do aluno; e todos nós ouvimos falar, naturalmente, da necessidade da contenção orçamental também na área da educação. Esse é um desiderato transversal a todas as áreas sectoriais das políticas públicas com vista à redução da despesa pública, com o desejo óbvio de libertar recursos para o sector privado, atingindo o objectivo último, que é o crescimento económico e a criação do emprego.
É, pois, com vista a analisar em profundidade estas políticas públicas do Ministério da Educação que hoje temos aqui a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretários de Estado.
A Sr.ª Ministra fará uma primeira intervenção de 15 minutos, colocando em relevo as principais linhas orientadoras do seu Ministério para 2008. Após essa introdução, seguir-se-á uma primeira ronda de perguntas, sendo confiado a cada grupo parlamentar um tempo máximo de 5 minutos de intervenção, a que a Sr.ª Ministra da Educação responderá directamente.
Depois dessa primeira ronda, seguir-se-á uma segunda e última ronda de perguntas, sendo atribuídos 2 minutos a cada grupo parlamentar. Essas perguntas serão agrupadas e a Sr.ª Ministra responder-lhes-á de uma só vez.
Chamo a atenção dos Srs. Deputados para a necessidade de rigor no cumprimento dos tempos destinados a cada grupo parlamentar. Haverá a audição de um outro Sr. Ministro logo a seguir a esta, concretamente às 17 horas, pelo que há que cumprir rigorosamente o tempo que nos está distribuído, que são duas horas.
A acrescer a isso gostava de sublinhar que, muitas vezes, o tempo desliza porque há uma utilização abusiva de algumas figuras regimentais, in caso as figuras da interpelação à mesa, de protesto ou mesmo de defesa da honra, as quais, naturalmente, serão admitidas desde que cumpridos escrupulosamente os requisitos plasmados no Regimento quanto à sua invocação.
Posto isto, concedo a palavra à Sr.ª Ministra da Educação para fazer a sua introdução.
A Sr.ª Ministra da Educação (Maria de Lurdes Rodrigues): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com o maior gosto que aqui venho expor, em traços gerais, os objectivos associados ao orçamento do Ministério da Educação para o ano de 2008.
Dá-se a circunstância de o Ministério da Educação balizar a sua actividade por dois calendários, o calendário escolar e o calendário do ano civil, pelo que uma parte das novidades traduzidas no Orçamento para 2008 é antecipada pelo ano escolar de 2007-2008. E, portanto, algumas das características que aqui sublinharei são já conhecidas dos Srs. Deputados porque foram até anunciadas em sessões públicas e em sessões de divulgação de dados estatísticos e de resultados.
Eu diria que este orçamento continua orçamentos de anos anteriores na preocupação de controlar e qualificar a despesa pública em matéria de educação, sem prejuízo de prosseguir investimentos definidos por nós como prioritários, de manter os investimentos iniciados em anos anteriores e de alargar essa possibilidade de investimento à medida que os próprios programas lançados vão sendo ampliados e alargados a todo o sistema.
Gostava de sublinhar alguns dos aspectos que me parecem da maior importância neste orçamento, alguns deles, evidentemente, iniciados em Setembro, com o início do ano lectivo de 2007-2008 (apenas serve esta
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oportunidade para reforçar essas características), outros referem-se a acções iniciadas nos anos anteriores, tratando-se agora de as manter, consolidar e, eventualmente, ampliar um pouco.
Em primeiro lugar, eu diria que este é o orçamento da diversificação e da expansão da oferta formativa. Em dois anos consecutivos, aumentámos muito o número de cursos e o número de alunos nas vias profissionais, tanto no ensino secundário como no ensino básico, com os cursos de educação e formação, que têm permitido dispor, assim, de um instrumento efectivo de combate ao insucesso escolar no ensino básico.
Tivemos, no ano de 2006-2007, 44 000 alunos nos cursos profissionais de ensino secundário e, este ano, temos inscritos 63 000 alunos. Pelo segundo ano consecutivo, há um aumento do número de alunos que aponta para uma consolidação desta aposta do Governo na diversificação de oferta formativa no ensino secundário também como medida de melhorar os resultados e de combater o abandono.
Ao nível do ensino básico, no ano de 2006-2007 tínhamos tido cerca de 24 000 alunos nestas ofertas formativas e, este ano, temos inscritos mais de 30 000 alunos nos cursos de educação e formação.
A segunda característica que eu gostava de sublinhar, que é também ainda uma medida de continuidade mas que surge neste orçamento de forma ampliada e consolidada, é a generalização do nível de ensino secundário para toda a população. A criação dos Centros Novas Oportunidades, a aprovação de cursos de educação e formação, a transformação progressiva de todo o ensino recorrente em cursos de educação e formação de adultos, em paralelo com o alargamento desta rede e com tudo o que isto significa de consolidação do Programa Novas Oportunidades, apontam para um crescimento desta área de intervenção mas também para a sua consolidação.
Temos, neste momento, mais de 300 000 adultos inscritos nos Centros Novas Oportunidades, isto em menos de um ano desde o primeiro alargamento da rede. Grande parte destes adultos procura o reconhecimento e a validação de competências na área do ensino secundário. Uma grande parte destes adultos tem até o ensino secundário incompleto — têm experiência e têm algum percurso escolar incompleto. Trata-se agora de dar-lhes uma oportunidade de verem reconhecidas as suas competências adquiridas formal ou informalmente.
Portanto, diria que este orçamento é também o orçamento do reforço das medidas de acção social escolar, em primeiro lugar, para os alunos do ensino secundário, que era talvez o segmento de alunos em que a necessidade de apoio social se fazia sentir com mais urgência — não apenas os montantes de apoios por aluno eram bastante inferiores aos dos alunos do ensino básico, e foi necessário fazer a actualização da capitação dos apoios, como em regra o subsistema de ensino secundário tem uma menor percentagem de alunos abrangidos pela acção social escolar fazendo pressentir que uma parte dos alunos que poderia beneficiar deste apoio social escolar nem sequer está nas escolas.
Assim, o que fizemos foi o levantamento desta situação e a sua caracterização, a identificação daquilo que podiam ser linhas de intervenção e em sede de Orçamento do Estado foram actualizadas as capitações para os alunos do ensino secundário mantendo uma situação igual à dos alunos do ensino básico e preparámos no próximo Quadro de Referência Estratégica Nacional, no âmbito do Programa Operacional do Potencial Humano, uma linha de apoio a todos os alunos dos cursos profissionais que se traduzirá, desde logo, em apoios para o transporte e para a alimentação. Estão ainda em estudo outras possibilidades de apoio para os alunos dos cursos profissionais, tanto das escolas públicas como das escolas privadas e o objectivo é abranger todos os alunos já não apenas numa lógica de apoio social, de apoio aos alunos carenciados, mas de apoio a todos os alunos, uma vez que a rede dos cursos profissionais não é uma rede tão ampla como a das vias gerais, não tem a mesma possibilidade de acesso — trata-se aqui também de criar estímulos para a procura destas vias profissionais.
No que respeita aos planos lançados, Plano de Acção para a Matemática, Plano Nacional de Leitura, os programas de apoio às escolas em territórios educativos de intervenção prioritária, os programas de formação de professores, são actividades que foram lançadas umas há dois anos, outras o ano passado e que terão continuidade e ampliação e isso tem tradução neste orçamento.
Quanto ao Plano Nacional de Leitura, haverá um investimento reforçado este ano também em resultado dos apoios que foram conseguidos e das parcerias que foram estabelecidas com as autarquias e outras instituições para as mobilizar para este desafio da promoção da leitura nas nossas escolas.
Este será o ano em que faremos a conclusão da rede das bibliotecas escolares. Falta-nos concluir a rede e para podermos dizer que existe uma biblioteca escolar em todas as sedes de agrupamento precisamos de construir 130 bibliotecas, o que será feito durante este ano, tendo também uma tradução no nosso orçamento.
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Acerca das escolas de 1.º ciclo, será criada uma nova figura, a figura do serviço de biblioteca a prestar pelas sedes de agrupamento às escolas de 1.º ciclo, sobretudo tendo em consideração que uma grande parte das nossas escolas de 1.º ciclo não é de futuro, pois serão substituídas por centros escolares. Nos centros escolares temos a garantia de que será criado de raiz este equipamento nas escolas que estão em funcionamento e, sobretudo, nas que têm menos de 50 alunos, as que são pequenas escolas, será desenvolvido o serviço de biblioteca de apoio à promoção da leitura numa outra perspectiva diferente da criação das bibliotecas.
Depois, há, ainda, todo o programa de modernização do equipamento das escolas, desde logo, o alargamento da largura de banda à Internet, mas, também, a criação das redes locais de acesso à Internet para que os alunos e os professores possam ter acesso não apenas em pontos determinados do espaço da escola, mas em toda a escola, em todas as salas de aula, nos espaços comuns, no sentido de criar diferentes condições para o acesso à informação através deste meio. Em paralelo, será continuado aquele programa que designámos como o «plano tecnológico para as escolas» que nos permitirá renovar todo o equipamento informático e equipar com novo equipamento todas as escolas.
Destaco, ainda, o Programa de Modernização das Escolas Secundárias, iniciado o ano passado. Temos neste momento quatro escolas em fase de obra e 26 outras escolas que estão em fase de projecto cujas obras se iniciarão no próximo ano civil, em 2008, e isso tem tradução também no nosso orçamento. No ano de 2008, também se iniciarão os processos de elaboração de projectos para mais 120 escolas e isso está traduzido neste orçamento, sobretudo, em termos de PIDDAC.
Há um esforço financeiro que não tem tradução directa no orçamento do Ministério da Educação mas que corresponde também a uma linha de trabalho muito importante, que é a da articulação com as autarquias e que será a da renovação do parque escolar das escolas do 1.º ciclo cujos montantes financeiros mais significativos ou estão nos Programas Operacionais Regionais ou estão nos orçamentos das próprias autarquias, mas a nossa própria previsão é a de que ainda este ano se possam abrir os concursos para dar início ao financiamento dos centros escolares e as autarquias têm já, neste momento, centenas de centros, alguns construídos e outros em preparação.
Portanto, isso pode dar uma outra perspectiva de renovação do parque escolar ao nível do 1.º ciclo e nestes novos centros escolares todos os equipamentos relacionados com a prestação do serviço de refeições, com o serviço de biblioteca, com o acesso às tecnologias de informação e comunicação estarão considerados, porque é uma exigência do próprio caderno de encargos.
Depois, todos os outros programas de alargamento da rede do pré-escolar, das refeições aos alunos do 1.º ciclo, dos transportes, das actividades de enriquecimento curricular, os programas de formação de professores, como disse, são tudo programas de continuidade e garantidos financeiramente por este Orçamento de 2008. E é tudo, nesta fase.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, iniciar o nosso debate.
Nesta primeira roda, em primeiro lugar, está inscrito o Sr. Deputado Pedro Duarte, a quem dou a palavra pedindo-lhe que cumpra escrupulosamente o limite temporal de cinco minutos para a sua intervenção.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra da Educação, em Abril de 2005, imediatamente no início do seu mandato, fez uma declaração a um jornal que eu julgo que é matricial e que valeria a pena agora recuperar. A Sr.ª Ministra disse em declarações ao Diário Económico que «é necessário melhorar a eficiência do investimento na educação», mas não admite «imaginar um cenário em que não haja um esforço fortíssimo de investimento na educação».
Em primeira instância, gostaria de dizer que subscrevo na íntegra esta declaração, nomeadamente na sua primeira parte quando se refere à necessidade de melhoria da eficiência no investimento da educação, mas eu queria dizer que, hoje em dia e passados mais de dois anos sobre esta declaração, se poderá fazer um balanço e dizer que há uma discrepância forte entre aquilo que foi esta manifestação de intenções no início do mandato e aquilo que é a realidade de hoje. Digo isto porque na nossa opinião nada de estruturante foi alterado no sentido de melhorar a eficiência do investimento. Como sabe, o PSD tem uma visão de um modelo de ensino estruturalmente diferente que permita outros ganhos de eficiência no investimento da educação.
Por outro lado, se nós analisarmos aquilo que é o esforço de despesa pública do Orçamento do Estado na educação percebemos que, desde 2005, até hoje se fizermos a actualização dos dados em função da taxa de
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inflação percebemos que houve um decréscimo desse mesmo esforço e, portanto, algo diferente daquela que era a intenção da Sr.ª Ministra.
Assim, a primeira pergunta é a de saber o que mudou, se foi o cenário, a conjuntura, o contexto, se foi a opinião da Sr.ª Ministra ou se, pura e simplesmente, não foi capaz de convencer os seus pares no Conselho de Ministros para que houvesse esta alteração.
Depois desta pergunta, um pouco mais a nível de enquadramento, gostaria de lhe colocar algumas questões muito mais concretas: em primeiro lugar, a questão do ensino especial, porque aqui temos uma divergência. A Sr.ª Ministra poderá dizer-me que houve um aumento, como já ouvimos o Sr. Ministro das Finanças dizer, de 5,5%, salvo erro, desde o orçamento do ano de 2007 para o próximo. Mas a verdade, Sr.ª Ministra, é que nós sabemos que o ano passado, quando discutimos o Orçamento do Estado, a Sr.ª Ministra apresentounos um decréscimo brutal das verbas do ensino especial e isso tem-se reflectido naquilo que é a realidade hoje nas nossas escolas. Não vou perder tempo a recordar-lhe os inúmeros casos muitos deles têm vindo a ser retratados na comunicação social de situações gravíssimas, eu diria dramáticas, de pura insensibilidade social e isso é consequência, também, da opção orçamental do Governo tomada há um ano atrás.
Portanto, a verdade é que a Sr.ª Ministra não rectifica este erro que foi cometido o ano passado. Pelo contrário, o aumento do ponto de vista de orçamentos iniciais é de cerca de 1%, abaixo da inflação, um decréscimo real e se puder falar em 5,5% é porque de facto a execução nem sequer foi a 100%, perante a quebra que verificámos o ano passado, pelo que há aqui uma divergência total.
Consideramos que a contenção da despesa pública que a Sr.ª Ministra anunciou como a sua primeira prioridade, logo agora no início da sua intervenção, não pode ser feita à custa do ensino especial nomeadamente de alunos que têm necessidades educativas especiais.
Outra questão muito concreta, Sr.ª Ministra, tem que ver com os estágios curriculares remunerados. Já em 2005, o Governo decidiu terminar com a remuneração desses estágios e, na altura, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou num debate mensal aqui, no Parlamento, o seguinte — e vou citar a acta da Assembleia da República: «não podemos privilegiar ninguém, mas faremos o que nos compete fazer. Por isso, serão atribuídas ajudas de custo e bolsas para que aqueles que antes tinham direito a um estágio remunerado possam beneficiar de apoio por parte do Estado». Portanto, gostaria que a Sr.ª Ministra nos dissesse se está ou não prevista neste Orçamento do Estado uma verba para ajudas de custo e bolsas no que diz respeito a estes estágios, concretizando assim aquilo que foi, também, uma promessa do Sr. Primeiro-Ministro aqui, no Parlamento.
Gostaria, ainda, de lhe colocar uma outra questão, que é um bocadinho ampla — e admito que a Sr.ª Ministra hoje não tenha muito tempo para responder a isto, de forma mais concreta, pelo que poderá ficar, eventualmente, para outra oportunidade, se assim o entender — e tem que ver com toda a dotação orçamental prevista para a nova empresa Parque Escolar e tudo aquilo que tem que ver com prioridades de actuação, nomeadamente se está ou não previsto haver outro tipo de parcerias com o envolvimento de municípios. Mas, repito, admito que esta questão seja tão complexa que valerá a pena discutirmos este assunto numa comissão especial que parece de primordial relevância, sem qualquer dúvida.
Outro assunto tem que ver com o ensino do português no estrangeiro. Sr.ª Ministra, nós temos visto que apesar das alterações, nomeadamente ao nível da colocação de professores, este Governo levou avante e dos conflitos já tradicionais entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério da Educação nós apercebemo-nos que a situação não está melhor do que estava, pelo contrário, os casos também são múltiplos, espalhados um pouco por todo o mundo, sobre as dificuldades do ensino do português. Gostaria de saber se considera que este decréscimo orçamental que aqui nos apresenta vai ou não beneficiar isso e se podemos ter melhores perspectivas para o futuro.
Já agora a propósito do ensino do português no estrangeiro coloco-lhe duas questões concretas que gostaria que a Sr.ª Ministra fizesse o favor de comentar, agradecendo-lhe, desde já, apesar de não ter o impacto orçamental directo, como é evidente, mas pode ter indirectamente nomeadamente quanto ao retorno do investimento que é gasto.
Ouvimos ontem o Presidente norte-americano George Bush tratar com desdém evidente o ensino do português nos Estados Unidos. Assim, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se o Governo português reagiu, se tenciona reagir, por via diplomática ou por intervenção pública. No fundo, gostaria de saber qual é a resposta do Estado português perante uma intervenção que me pareceu absolutamente lamentável por parte do Presidente norteamericano.
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Segunda questão: sendo o Ministério da Educação, desde logo, um garante da promoção da língua e da cultura portuguesas, surgiu-nos ainda esta semana uma proposta no âmbito europeu e que o Sr. Ministro do Ensino Superior, aliás, já relatou, de que o 2.º ciclo do ensino superior no âmbito do Processo de Bolonha passa a ser obrigatoriamente ministrado na língua inglesa.
Gostaria de saber se a Sr.ª Ministra, considera que isto faz ou não sentido e se o Governo português vai ou não apoiar esta proposta, e como é que isto pode ser introduzido no âmbito da promoção da língua portuguesa. Não tendo evidentemente que ver com os ciclos de ensino que a Sr.ª Ministra tutela, julgo que tem uma palavra importante a dizer em todo este processo.
Relativamente ao quadro de mobilidade, apercebemo-nos que a verba prevista não chega a 50 000 €, o que me parece irrisório para se poder concretizar alguma coisa de muito significativo. Concretamente, gostaria que fizesse o balanço de um protocolo que foi assinado em 2005 com o Ministério da Cultura no sentido de que professores que estivessem no quadro de mobilidade pudessem servir publicamente o nosso país, nomeadamente no apoio aos museus. Segundo recentes notícias, há museus que estão fechados ou que têm alas fechadas por falta de pessoal. No entanto, julgo que este protocolo deixou de fazer sentido hoje em dia, porque o quadro de mobilidade do Ministério da Cultura é muito maior do que o do Ministério da Educação. Gostaria, portanto, de lhe pedir para fazer o balanço deste protocolo: se já foi, ou não, rasgado ou se vai ser renegociado ou repensado quanto a este efeito.
A terminar queria colocar-lhe duas questões.
Quanto ao Programa Operacional Potencial Humano, admito que a pergunta se deve ao facto de não termos tido acesso a informação suficiente, mas a Sr.ª Ministra, eventualmente, esclarecerá. Este Programa Operacional engloba um conjunto de Ministérios (não sei precisar, mas são vários), mas curiosamente não consta o Ministério da Educação, para o qual está previsto «zero». Não sei qual a razão para este efeito e gostaria de saber se nos poderá explicar.
Por outro lado, uma última questão, a Sr.ª Ministra tem vindo a aperceber-se de que têm surgido consecutivamente um conjunto de sentenças judiciais que têm decretado a ilegalidade dos exames que foram repetidos há mais de um ano a Química e a Física. Trata-se de um processo muito polémico, que todos recordamos, e as sentenças têm dito isto mesmo. Ora, os alunos que foram objectivamente prejudicados com este processo, se assim o entenderem, poderão ser indemnizados pelos prejuízos que lhes foram directamente causados, o que poderá envolver, como sabemos, milhares de alunos. Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, se o Orçamento prevê alguma verba ou onde a irá buscar para o caso de, pela decisão tomada à época, esta despesa pública ter de ser assacada ao Ministério da Educação.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, para responder à questão da eficiência do orçamento do Ministério da Educação tenho comigo uns gráficos que foram divulgados há relativamente pouco tempo (que posso, depois, mandar distribuir) e que revelam que, em 10 anos, o orçamento do Ministério da Educação duplicou, o número de alunos diminuiu sempre, o número de professores aumentou sempre e os resultados escolares mantiveram-se. E o que conseguimos nestes dois anos foi, com contenção orçamental, diminuir o número de professores, aumentar o número de alunos e de cursos e melhorar os resultados escolares. Portanto, sobre eficiência dos gastos públicos em educação, penso que estamos conversados. É isso que tenho para lhe responder.
Acresce que, apesar da contenção orçamental, fizemos mais do que aquilo que habitualmente se fazia: generalizámos as actividades de enriquecimento curricular a todas as crianças do 1.º ciclo — o que teve um impacto no orçamento do Ministério da Educação da ordem dos 100 milhões de euros e corresponde, evidentemente, a um esforço de racionalização e de melhoria do investimento em educação; conseguimos alargar os cursos profissionais; e conseguimos integrar no orçamento do Ministério da Educação aquilo que tínhamos herdado como sendo financiamento comunitário, ou seja, integrámos todas as escolas profissionais de Lisboa e Vale do Tejo que eram tradicionalmente financiadas por fundos comunitários no orçamento Ministério da Educação, o que teve um impacto superior a 50 milhões de euros.
Portanto, há um conjunto de indicadores que revelam o esforço que tem sido feito de melhorar o investimento público em educação, apesar de haver um esforço de contenção que obriga todos os ministérios e não exclusivamente o Ministério da Educação.
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Há, porém, outros indicadores ainda mais significativos: conseguimos, com isso, aumentar o financiamento destinado ao funcionamento nas escolas. Quando chegámos ao Ministério da Educação, a tradição da percentagem destinada a funcionamento no orçamento das escolas era de 2%. Aliás, um dos constrangimentos básicos no nosso sistema é, justamente, o peso das remunerações certas e permanentes, a rigidez nesta estrutura de orçamento, que impede dispor de fundos financeiros para flexibilizar. Neste momento, no Orçamento para 2008, o orçamento de funcionamento das escolas cresce em 21%. Ou seja, quando chegámos era da ordem dos 2% e neste momento conseguimos ter qualquer coisa como 3%. Não é muito, mas conseguimos aumentar em 1%, tendo-se verificado só este ano um aumento de 21% no orçamento de funcionamento das escolas.
Se acrescentarmos a estes números os valores das receitas próprias das escolas (que este ano também aumentarão), que o Ministério da Educação respeita integralmente como sendo um fundo para que as escolas possam investir melhorando a qualidade do ensino que prestam, diria que estamos, de facto, a conseguir níveis de eficiência com o orçamento do Ministério da Educação e a melhorar a qualidade da despesa pública da educação.
As questões do ensino especial serão respondidas pelo Sr. Secretário de Estado da Educação e as do ensino do português no estrangeiro pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.
Gostava de lhe responder ainda às questões colocadas sobre os estágios curriculares remunerados. Penso que está a falar dos estágios para professores — naquela célebre medida. O que se passava era que os professores, quando recebiam esta remuneração pelo estágio, não tinham acção social escolar e tinham de pagar propinas. Ora, passando a poder estar abrangidos pela acção social escolar por ausência da remuneração no estágio, essa situação regularizou-se no próprio funcionamento do sistema de ensino superior e nunca o ensino superior solicitou qualquer espécie de apoio ao Ministério da Educação nessa matéria. Portanto, não houve necessidade de fazer coisa alguma, visto que as coisas se passam ao nível dos protocolos entre as universidades e as escolas. Nunca nos foi solicitado qualquer apoio. Penso que o problema que se colocava na altura era o de que esses professores não tinham acção social escolar por força de terem o estágio renumerado e que isso foi, assim, ultrapassado.
Sobre as questões do uso da língua inglesa no 2.º ciclo do ensino superior, penso que é uma discussão que terá de ter com o Sr. Ministro da Ciência, que foi quem anunciou essa medida.
Não percebi a sua pergunta sobre o Programa Operacional Potencial Humano. O Ministério da Educação está, evidentemente, envolvido não apenas na comissão ministerial que coordena o próprio programa como tem um eixo importantíssimo, que é o eixo da formação inicial de jovens, que no próximo ano terá um custo superior a 200 milhões de euros só para os cursos profissionais, dada a ampliação que eles sofreram. Isso não tem tradução no nosso orçamento, porque não há contrapartida nacional, não há Orçamento do Estado envolvido nesse financiamento. Como sabe, a contrapartida nacional é feita no caso das instituições públicas com as despesas correntes e no caso das instituições privadas com o orçamento da segurança social e, portanto, não tem tradução imediata no nosso orçamento.
Sobre a questão de eventuais parcerias e alargamento do parque escolar a outras instituições, o programa de modernização do parque escolar tem por missão prioritariamente as escolas secundárias, mas temos mais 1000 escolas de 2.º e de 3.º ciclos, onde há, aí sim, um campo de colaboração com as autarquias, que é suficientemente mobilizador e consumidor de recursos. É, sobretudo, nesse campo que estamos a ensaiar os protocolos com as autarquias, nalguns casos cedendo até espaço e terreno para a construção dos centros escolares de que as autarquias necessitam.
Se o Sr. Presidente aceitar, os Srs. Secretários de Estado usariam agora da palavra para responder às outras questões.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.
O Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, relativamente à questão da transferência dos professores para o quadro dos museus e para o Ministério da Cultura, quero dizer-lhe que o Governo já aprovou um decreto-lei que está publicado e que permite a transferência para os quadros do Ministério da Cultura dos professores que exerciam esse tipo de funções no âmbito do protocolo que referiu, o que está a decorrer com normalidade. Está inscrito no Ministério da Cultura e, portanto, a situação está normalizada. Nesse quadro, mantém-se essa situação de normalização.
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Aparte inaudível na gravação.
Os que lá estavam. Os que o Ministério da Cultura necessitar, como é óbvio.
No que respeita à questão da mobilidade, o que lhe posso dizer é que está inscrita uma verba para a abertura do programa e as dotações, como é evidente, serão acrescidas ao longo do ano por transferência das verbas de pessoal correspondente, se for colocado pessoal no quadro de mobilidade, como é normal. Se o pessoal deixa de estar de um lado, passa a estar noutro, pelo que a transferência das verbas é imediata, não é preciso nenhuma engenharia orçamental especial.
Quanto à questão da educação especial, gostaria de deixar uma nota. A diferença entre o orçamento inicial do ano passado e a execução que o Sr. Deputado criticou não se deve à não realização das actividades mas, sim, ao facto de no ano passado, no orçamento inicial, não terem sido contabilizados os recursos da intervenção precoce, que estavam trocados no local. Essa situação é corrigida este ano. A intervenção precoce estava contabilizada na educação pré-escolar, não estando na educação especial. O que significa que este ano há, efectivamente, um reforço, mas não há só um reforço, pois há também uma efectiva melhoria da eficiência na situação da educação especial.
Sr. Deputado, tal como referi no ano passado e volto a repetir este ano, todas as situações de alguma criança sinalizada com necessidade de educação especial que não esteja a ser correctamente atendida o Ministério da Educação garante o seu atendimento. E o grande esforço que muitas instituições fazem em tentar descobrir alguma criança que esteja em situação de carência e sem educação especial, algures numa aldeia deste país, ajuda a que a cobertura fique assegurada.
Sr. Deputado, como toda a gente sabe, a eficiência da educação especial aumentou muito com o sistema de sinalização internacional, coisa que não existia em Portugal, e com a criação de um grupo de docência específico de educação especial, que existe em Portugal também pela primeira vez. E, ao contrário do que tenho ouvido publicamente (e que teremos oportunidade de falar mais vezes, ao longo desta reunião), o número real de professores que estão na educação especial em efectividade de funções é muito maior (tenho comigo os números) do que o que, infelizmente, é sucessivamente repetido por alguma comunicação social. A educação especial está, nesse aspecto, em claro caminho de melhoria da eficiência e do reforço. As crianças estão muito mais bem atendidas do que estavam há dois anos, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, vou responder às suas questões relativamente ao ensino do português no estrangeiro.
Quero dizer-lhe, em primeiro lugar, que a redução a que se referiu é, no contexto das reduções do orçamento de funcionamento do Ministério da Educação, claramente inferior às outras.
Em segundo lugar, existe, efectivamente, um aumento em relação à estimativa de execução para 2007, porque o Orçamento para 2007 continha apenas uma previsão, na medida em que a alteração do regime de colocação do pessoal docente não pôde ser inteiramente prevista. Ela só se verificou com a colocação dos professores em Agosto e Setembro, pelo que não era possível ter uma previsão correcta do impacto. Em todo o caso, foi possível ter uma execução que se prevê seja inferior em cerca de 1,5 milhões de euros relativamente ao previsto.
Assim mesmo, a dotação que está prevista para este ano, que é quase 2% superior à que estava prevista para 2007, permite um número de alunos que é 4,5% superior ao do ano passado. Portanto, não há nenhuma redução, pelo contrário, há uma expansão do sistema do ensino do Português no estrangeiro.
Apesar disto, não lhe escondo que é necessário repensar o ensino do Português no estrangeiro.
Hoje, temos uma realidade que é completamente diferente daquela para a qual este sistema foi construído.
Hoje, temos uma Europa comunitária em que os cidadãos circulam livremente e é possível, em poucos anos, como aconteceu recentemente no Reino Unido, construir-se uma comunidade de 20 000 portugueses, dispersa por zonas rurais. Ora, é muito difícil dar uma resposta a situações deste tipo. Naturalmente, é impossível resolver todos os problemas, mas não há nenhum desinvestimento. Pelo contrário, continuamos a apoiar o ensino do Português no estrangeiro.
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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Vamos agora iniciar a segunda ronda de perguntas.
Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Barros.
A Sr.ª Paula Barros (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Gostava de iniciar esta minha intervenção, não deixando de fazer referência à do próprio Sr. Presidente, Deputado Jorge Neto, ao abrir este debate.
Como bem disse o Sr. Presidente e, a nosso ver, fazendo um sério exercício de síntese em relação a este orçamento, estamos a falar de um orçamento que traduz 3,5% do PIB, porventura a maior fatia do PIB»
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, interrompo-a apenas para sublinhar que não é a maior fatia mas a segunda maior, porque, como sabe, a primeira é do Ministério da Saúde — 5,1% do PIB, quase o dobro, portanto.
A Sr.ª Paula Barros (PS): — Portanto, após as suas palavras, agora reforçadas, uma fatia de 3,5% do PIB é destinada ao Ministério da Educação, o que bem traduz a clara aposta no sector da educação.
Não podemos deixar de analisar este orçamento e considerá-lo rigoroso que tem vindo a aumentar, em termos de investimento, enquadrado de contenção orçamental, mas que vê diminuídas as suas despesas de funcionamento num quadro de elevação do número de alunos, de ofertas educativas e de sucesso escolar, o que, sem dúvida e naturalmente, é traduzido por uma palavra: eficiência.
Portanto, entendemos este orçamento como um sinal exterior de boa gestão.
Parece-nos que só não vê isto quem não quer ver e quem, porventura, faz uma análise deste orçamento por fatias. Aqui, refiro-me claramente à intervenção que o Sr. Deputado Pedro Duarte fez, na qual levantou um conjunto de questões «fatiadas». Assim, continuamos a não ouvir o PSD apresentar claramente quais são as suas apostas, as suas prioridades, continuamos a não saber quais as políticas em que, efectivamente, o PSD gostaria de apostar na área da educação.
Se conseguíssemos perceber isso, conseguiríamos também, naturalmente, perceber que houvesse alguma divergência traduzida em termos orçamentais. Como não conseguimos ver qual é a aposta do PSD para a área da educação, também, não conseguimos entender que divergências «fatiadas» são estas em relação ao orçamento apresentado.
Por seu lado, o Partido Socialista tem uma política para a educação claramente definida, uma política de forte aposta na valorização da escola pública, na igualdade de oportunidades, na equidade, na justiça social, em potenciar o real sucesso dos alunos, em combater o abandono escolar. Ou seja, em elevar realmente a qualificação dos portugueses.
Portanto, vamos procurar verificar se este orçamento vai ao encontro daquilo que é a defesa da política educativa do Partido Socialista.
Ora, Sr.ª Ministra, não podemos deixar de referenciar o aumento de 6,1% em termos do investimento no funcionamento dos complementos educativos, focalizado fundamentalmente na área da generalização do Inglês e na das actividades de enriquecimento curricular no 1.º ciclo. Gostava, pois, de lhe fazer uma pergunta, Sr.ª Ministra.
Nesta área, para nós fortíssima, de aposta na valorização da escola pública — a escola a tempo inteiro em que se fomenta a igualdade de oportunidades para todos os alunos —, gostaria que nos dissesse de onde partimos nesta matéria, quando a Sr.ª Ministra chegou ao Ministério da Educação, onde estamos neste momento e até onde, com este reforço de investimento nesta área, a Sr.ª Ministra pensa que conseguiremos chegar no final de 2008.
Por outro lado, não podemos deixar de realçar também o aumento de investimento na área das Novas Oportunidades, um claro aumento de 45%, na formação de jovens e de 7,3% na qualificação dos adultos.
Sr.ª Ministra, sabendo bem que esta política das Novas Oportunidades em termos do alargamento da oferta educativa, da qualificação dos adultos, tem-se traduzido numa das principais políticas que tem chamado os nossos jovens à escola e que, portanto, tem promovido seriamente o combate ao insucesso e ao abandono escolar, pedíamos-lhe que, se possível, nos fizesse um exercício de eficiência em relação ao que estamos a investir — porque é um forte investimento — e aos resultados que temos. Ou seja, gostaríamos que fizesse o
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balanço entre o que estamos a investir e o número de alunos a mais que estamos a conseguir chamar às escolas.
Sr.ª Ministra, não podemos deixar de saudar este acréscimo de investimento no que diz respeito à rede de bibliotecas escolares e ao Plano Tecnológico da Educação.
Sem dúvida, devemos ter a consciência de que ainda temos uma grande fatia de alunos que não tem acesso à informação com qualidade e, sobretudo, não tem acesso à informação de forma a garantir a sua competitividade, quer ao nível do País, quer mesmo ao nível internacional.
A este respeito, a Sr.ª Ministra disse que faltam 130 bibliotecas que se prevê que estejam prontas até ao final do próximo ano. Gostávamos de saber se nesta rubrica de enquadramento orçamental também está contemplado o dito serviço de biblioteca às escolas do 1.º ciclo por parte das suas sedes de agrupamento, matéria que nos parece importante.
No que diz respeito ao Plano Tecnológico da Educação, não podemos deixar de lembrar que Portugal recebeu o prémio pelo melhor projecto europeu desenvolvido na área da sociedade de informação, o Programa eescolas. Por isso, parece-nos que estamos a apostar e já estamos a obter resultados.
Sr.ª Ministra, neste orçamento do Ministério da Educação, verificamos que há um forte investimento, dinheiro público, e é exactamente por isso que lhe fazemos a pergunta: quer resultados vamos obter com este investimento? Estamos a falar de investimento público na área da educação e ficamos contentes quando vemos que já há resultados. Assim, o que pedimos à Sr.ª Ministra é que nos dê uma estimativa dos resultados.
Passando ao campo da acção social escolar, que entendemos que deve ser visto e assumido com pouca demagogia e muita seriedade, o que o Partido Socialista sempre defendeu claramente foi que devemos ir alargando progressivamente os níveis de capitação para que possa ser cada vez maior o número de famílias abrangidas pela acção social escolar. Por este orçamento e através da leitura do relatório do Orçamento, verificamos que já alargámos bastante esse leque de famílias. Gostávamos era que a Sr.ª Ministra clarificasse se este aumento de capitação tem a ver especificamente com os alunos do ensino secundário — e bem, porque temos consciência de que, por necessidades económicas, há um afastamento da escola por parte de muitos dos nossos jovens na frequência do ensino secundário e, portanto, se pudermos apoiá-los, com certeza que também obteremos resultados ao nível da diminuição da taxa de abandono escolar — ou se se trata de um aumento de capitação global. Perguntamos-lhe, ainda, quais as perspectivas para o futuro quanto à continuação deste esforço progressivo, de forma séria e que pactue com o exercício orçamental que, naturalmente, todos sabemos que temos o dever de partilhar no sentido de nos comprometermos com o equilíbrio das contas públicas do nosso País e, portanto, com a sua credibilidade.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Barros, agradeço muito a sua intervenção e gostava de sublinhar que o esforço que temos vindo a fazer é o de, nos dinheiros públicos que são disponibilizados ao Ministério da Educação pelo Orçamento do Estado, acomodar não apenas as despesas correntes para o funcionamento das escolas, seja em termos de remunerações certas e permanentes seja em termos do funcionamento diário, mas também as ambições de investimento para a melhoria da qualidade das aprendizagens e do ensino.
Nesse sentido, não é por falta de orçamento que têm ficado por concretizar alguns dos projectos, mesmo os mais emblemáticos deste Governo, como o enriquecimento curricular, ou o ensino de Inglês no 1.º ciclo, ou mesmo os cursos profissionais nas escolas públicas. Pelo contrário, o que se procurou fazer foi justamente a racionalização dos recursos existentes e a mobilização das escolas e das várias instituições para o cumprimento desses objectivos.
Penso que as actividades de enriquecimento curricular são bem o paradigma desse esforço pois, num período de contenção em que, aparentemente, não era possível dispor de nem mais um euro para uma actividade nova, foi possível acomodar as referidas actividades e, neste momento, ampliar um pouco. Digo «ampliar» porque não apenas procuraremos actualizar os custos por aluno, portanto, actualizar os montantes dos contratos com as instituições promotoras, maioritariamente autarquias embora haja outras instituições envolvidas, mas também procurando incluir o escasso de número de escolas e de crianças que ainda não são abrangidas por estas actividades.
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Um objectivo a prazo — e tem já algum reflexo neste orçamento — é o de alargar ao apoio à família, neste caso, com a responsabilidade não apenas do Ministério da Educação mas também das autarquias.
Portanto, nas áreas geográficas em que se justifique a prestação de apoio às famílias também por parte das escolas, pretendemos criar um mecanismo que estimule e incentive o envolvimento das famílias, das autarquias e das próprias escolas na prestação desse serviço de apoio à famílias. Penso que este último é o mecanismo que falta para consolidar o programa da escola a tempo inteiro, digamos assim.
Para muitas famílias, a escola a tempo inteiro não pode estar reduzida ao funcionamento no período entre as 9 horas e as 17 horas e 30 minutos. As famílias têm necessidade de mais apoio e o Ministério da Educação pode participar na solução do problema. Não consideramos que tal seja uma responsabilidade total da escola mas esta pode apoiar as famílias na resolução do problema.
No que respeita ao programa Novas Oportunidades, tanto na vertente dos adultos, que se materializa sobretudo nos centos Novas Oportunidades, como na vertente dos jovens, que se materializa sobretudo nos cursos de formação inicial, consideramos que já é um resultado o aumento do número de alunos. Consideramos que a diversificação das ofertas formativas foi suficientemente atractiva para fazer aumentar o número de alunos. Mais: não só foi atractiva como mobilizadora porque, neste ano, verificou-se um aumento do número de alunos não apenas nas vias profissionais como nas vias de prosseguimento de estudos. Houve, pois, um aumento generalizado de alunos no ensino secundário. Houve também um aumento no ensino básico, sobretudo nestes cursos de educação/formação, cujos números referi há pouco.
Portanto, o aumento do número de alunos já é uma melhoria ao nível de resultados. No entanto, é necessário que isto tenha também uma tradução ao nível dos resultados escolares. Não é suficiente atrair os alunos, é necessário atraí-los e conseguir que concluam com êxito as modalidades de ensino em que se inscrevem. Não há, pois, razão para pensar que não vamos continuar a melhorar os resultados escolares ao ritmo a que melhorámos nos dois últimos anos e até superando-o.
Quanto à questão da rede das bibliotecas, é da maior importância concluir esta rede. Não é aceitável que, passados 10 anos sobre o lançamento de rede de bibliotecas, continue a haver uma escola que seja sem biblioteca, um espaço essencial para garantir a igualdade de oportunidades de acesso à informação e a recursos escolares. Para muitos jovens alunos o acesso a livros, o acesso a informação escrita, é, sobretudo e em primeiro lugar, no espaço da escola. Se há elemento modernizador lançado nos últimos anos que contribui para diminuir a desigualdade social e escolar, é a biblioteca. Neste sentido, do ponto de vista simbólico, mas também material, faremos um esforço para dotar todas as nossas escolas deste equipamento da maior importância.
Para as escolas de 1.º ciclo, cuja responsabilidade nesta área é sobretudo das autarquias, é preciso sublinhar que beneficiamos da constituição dos agrupamentos. Não era possível lançar com êxito muitas das medidas políticas se não tivesse sido possível concluir com êxito uns anos antes a consolidação dos agrupamentos.
Hoje, tirar todo o partido do ponto de vista da gestão financeira, mas sobretudo da gestão pedagógica e dos recursos desta unidade de gestão, que é o agrupamento, facilita muito o lançamento de medidas. Resolver questões como a do encerramento das escolas, a da criação de cursos profissionais e outras só foi possível porque estas novas unidades estavam em pleno funcionamento.
Para a questão do serviço de bibliotecas tirar-se-á partido da figura do agrupamento, sendo mais fácil fazer chegar livros às escolas do 1.º ciclo que não os têm, sendo urgente a prestação deste serviço. Mas não precisamos de ter recursos para construir bibliotecas, podemos mandar uns baús, umas caixas e professores com esta competência para fazer chegar às escolas de 1.º ciclo estes livros que fazem falta.
Sobre a acção social escolar, se o Sr. Presidente consentir, passaria a palavra ao Secretário de Estado Adjunto.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Barros, agradeço a questão que colocou. Desde que este Governo está em funções tem vindo a aumentar de forma sustentada a capitação acima da inflação no sentido de permitir cobrir, designadamente no escalão A, um maior número de famílias.
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Para além do esforço que tem vindo a ser feito, foram aumentadas de forma muito significativa as capitações do escalão A do ensino secundário no sentido de equiparar a situação dos estudantes do ensino secundário, menos favorecida do ponto de vista do apoio social, à dos estudantes dos ensinos básico e secundário.
Isto enquadrado no esforço do Governo para que o ensino secundário se torne o grau de referência para a população portuguesa e, portanto, nesse sentido houve um aumento muito significativo da capitação para equiparar os estudantes do ensino secundário aos do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico.
Para além disto, houve um aumento muito significativo dos auxílios económicos directos naquilo que diz respeito ao contributo para a aquisição de manuais e de material escolares. De resto, neste momento, relativamente aos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, os plafonds estabelecidos para o escalão A cobrem a integralidade dos custos dos manuais em todos os anos menos nos anos iniciais de ciclo, isto porque nesses anos se concentra a aquisição de manuais de ciclo em determinadas áreas curriculares. Mas há uma cobertura muito significativa, de tal forma que houve aumentos da comparticipação que, no caso do 3.º ciclo, uma vez que no 2.º ciclo já estavam mais próximos da cobertura do total do valor, atingiram 17,5% para o escalão A e mais de 20% para o escalão B.
Houve também um esforço significativo na comparticipação da aquisição de manuais escolares para os alunos do ensino secundário, que foram beneficiados, por um lado, com o aumento da capitação e, por outro, com o aumento da contribuição para os manuais, que foi de 27,8%.
O Governo tem inscrita no Orçamento uma verba de 29 milhões de euros para aquisição de manuais escolares, verba muito significativa que vai reduzir os encargos das famílias.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, antes de mais registamos que a Sr.ª Ministra da Educação, na intervenção inicial, se limitou a fazer considerações gerais sobre a política do Governo e que pouco ou mesmo nada se referiu às questões orçamentais. Não será certamente por acaso, terá íntima ligação com o facto de este Orçamento em nada reflectir as campanhas de propaganda do Governo, que insiste em tentar mostrar-nos um País que não existe.
Segundo a intervenção da Sr.ª Ministra, o aumento do número de alunos é um dado positivo e representa um combate ao insucesso e ao abandono escolar No entanto, a Sr.ª Ministra escondeu, ou não quis referir, que 4,7% tem a ver com o aumento dos estudantes no privado contra apenas 3% no público, o que demonstra que afinal não são as políticas do Governo que motivam exclusivamente este aumento ou, então, motivam-no — e os dados que refiro são do Ministério — em maior proporção no privado, o que não me estranharia tendo em conta que a política deste Governo vai no caminho do desmantelamento do ensino público.
A Sr.ª Ministra vangloria-se pelo aumento dos 10 000 estudantes no ensino profissional, mas omite que esse número é exactamente igual ao número de estudantes que diminui nas vias tecnológicas, ou seja, aqueles estudantes que antes estavam nas vias tecnológicas passaram — como sabemos, em muitos casos, administrativamente — para o ensino profissional, ou seja, não representa em muitos casos um verdadeiro aumento.
Sobre as actividades de enriquecimento curricular — que, na verdade, são mais actividades de empobrecimento! —, a Sr.ª Ministra também omite, muito provavelmente de forma deliberada, que estas actividades anteriormente faziam parte dos currículos do ensino básico e que agora, por serem consideradas actividades de enriquecimento, estão colocadas à parte. Portanto, a experiência demonstra que se verifica um empobrecimento curricular, porque o que, antes, era obrigatório ser contido no currículo é, agora, feito com os recursos que conhecemos e, quer do ponto de vista da qualificação dos professores para cada uma das áreas em que estão a leccionar, quer do ponto de vista da forma como é feito o pagamento aos professores e dos valores, bem vamos conhecendo a triste experiência que se passa no plano de actividades de enriquecimento curricular.
Sobre o Plano Tecnológico da Educação, também anunciado e vangloriado pela Sr.ª Deputada do Partido Socialista, é caso para perguntar quantas vezes mais fará o Governo o «número» de dizer que ligou a última escola à banda larga. É que no ano passado, anunciou, pela primeira vez, que o Governo tinha ligado a última escola à banda larga, neste ano anunciou, de novo, que tinha ligado a última escola à banda larga e o relatório do Orçamento do Estado anuncia, de novo, que irá ligar a última escola à banda larga. O certo é que todos
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Relativamente ao ensino pré-escolar, o Orçamento do Estado (e o respectivo relatório), com as comparações a que estamos habituados, isto é, comparando com os dados que mais convêm, apresenta aparentemente uma subida de 2,2%. Na verdade, quando fazemos os cálculos e comparamos com a verba orçamentada e não com a executada, e quando incluímos a inflação nos valores, verificamos que há uma diminuição de 6,34% na verba do Orçamento do Estado dedicada ao pré-escolar. Isto num quadro de carência do sector público, da oferta pública e em que o Governo anuncia, até com alguma regularidade, as suas políticas de incentivos à natalidade.
Há um corte orçamental de 0,8% nos ensinos básico e secundário, aliás, bem explícito no próprio relatório do Orçamento. Mas o que não é de todo compreensível é como é que o Governo pode justificar um corte desta natureza e desta grandeza nos ensinos básico e secundário quando aumenta as verbas do ensino privado em 6,5%. À luz desta suposta política de investimento na educação, de fazer da educação um aspecto central da política deste Governo, como é que justifica que haja um aumento de 6,5% nas transferências para o privado e uma diminuição de 0,8% para os ensinos básico e secundário? Sr.ª Ministra, sobre a degradação do parque escolar, julgo que haverá alguma sensibilidade tendo em conta o Orçamento e a política do Governo que têm apontado no sentido da intervenção nesta área, mas a opção do Governo foi pela constituição de uma entidade pública empresarial, a Parque Escolar, pelo que fica por esclarecer um conjunto muito vasto de dúvidas.
Qual é a principal missão desta entidade? Sabemos que a Parque Escolar tem intenção de fazer uma intervenção em quatro escolas, mas são anunciadas já, até 2011, muitas outras escolas. A questão que se coloca é a de saber quais foram os critérios — isto porque o Gabinete do Ministério refere «uma escolha bastante criteriosa» (julgo que é esta a expressão utilizada), mas não refere quais foram os critérios utilizados para o elenco das escolas prioritárias — e se está ou não prevista alguma alienação de património do Ministério da Educação, nomeadamente escolas.
Já agora, Sr.ª Ministra, dos 42 milhões de euros das despesas previstas para a Parque Escolar, EPE, quantos serão dedicados à intervenção física em escolas? Sabemos bem que de norte a sul do País há escolas sem pavilhão gimnodesportivo, há escolas cujas salas de aulas não têm sequer tectos, há escolas em que se só se pode ir à cantina com guarda-chuva, há escolas que não têm biblioteca, computadores, etc.
A terminar, refiro as questões da acção social escolar. Os Srs. Membros do Governo anunciaram o aumento da acção social escolar de 92,4% milhões de euros, se não estou em erro, para 95 milhões de euros, portanto, aparentemente, há um aumento. Se tivermos em conta a inflação, verificamos que é um aumento muito modesto, mas, se acrescentarmos o número de estudantes que o próprio Governo anuncia ter aumentado no sistema público de ensino, que é acima de 1%, verificamos que, de facto, a acção social escolar diminui. No entanto, se acrescentarmos ainda a esta análise uma nova política deste Governo, que é apresentada no Orçamento do Estado em conjunto com a acção social escolar — não somos nós que a estamos a inserir no mesmo «saco», é o Governo que o faz —, que é a das bolsas de mérito, então, chegamos à conclusão de que, para um aumento de estudantes, para um aumento de tipos de bolsas, onde entram as bolsas de mérito, há uma diminuição do total destinado à acção social escolar, o que, na verdade, demonstra bem o «castelo de areia» que é o aumento de apenas 3 milhões na acção social escolar.
Sr.ª Ministro, mesmo a terminar — e peço desculpa pelo tempo que estou a tomar a mais —, no que se refere ao ensino artístico, o relatório do Orçamento do Estado anuncia novamente a sua refundação. Ora, a refundação do ensino artístico, por aquilo que temos sabido, ainda que seja pouco conhecida por parte dos seus agentes, continua a avançar — e isto não sofreu qualquer inversão desde a última vez em que falámos sobre esta matéria — à revelia das escolas, dos professores e dos estudantes do ensino artístico. Continua a perspectiva de avançar na refundação? Que reflexos orçamentais tem esta refundação, porque, embora venham referidos no relatório, não conseguimos detectá-los no Orçamento do Estado? Posso dizer, inclusivamente, que, há pouco tempo, o Grupo Parlamentar do PCP levou a cabo uma visita a algumas escolas de ensino artístico e, Sr.ª Ministra, não há refundação que valha ao estado de degradação das instalações daquelas escolas que visitámos.
Portanto, é urgente que o Governo aceite e tome a iniciativa de fazer chegar, através do Orçamento do Estado, as verbas necessárias até para a manutenção dos edifícios. Já não se fala só da qualificação ou da modernização dos edifícios, fala-se também da sua manutenção e da sua capacidade de permanecerem de pé
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durante mais uns anos, porque, de facto, trata-se de situações demasiadamente gritantes. Não se compreende, Sr.ª Ministra, porque é que não estão nas intervenções prioritárias da Parque Escolar, EPE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, começo por agradecer os comentários que fez a este orçamento.
Não sei se o País que não existe é o meu ou se é o seu!? Ficamos no mundo da sua opinião! Tem, provavelmente, uma visão diferente.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Manifestamente!
A Sr.ª Ministra da Educação: — Cada um vê o que pode ou o que quer! Não é?! Gostava de lhe dizer que há vários aspectos da política educativa que este Governo leva a cabo que são diferentes da visão do Partido Comunista em relação à política educativa. Em matéria de enriquecimento curricular, tivemos várias vezes oportunidade de aqui falar sobre essa diferente visão. O Partido Comunista sugere que as actividades de enriquecimento curricular deviam ser o que sempre foram: uma escola a funcionar das 9 ás 13 horas»
Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.
Peço desculpa! O senhor diz que as actividades de enriquecimento curricular já existiam curricularmente; no entanto, o que existia era uma escola a funcionar das 9 às 13 horas! Estamos conversados sobre isso.
Portanto, registo o apreço que o senhor tem e o que valoriza pelo facto de hoje termos quase 400 000 crianças a poderem beneficiar destas actividades, que não tinham antes, de uma escola a tempo inteiro, com refeição, com transporte, com actividade física e desportiva, com ensino precoce da língua, com ensino artístico.
O que é facto é que tínhamos uma escola a meio tempo e em dois anos construímos uma escola a tempo inteiro, em que as crianças passaram a ter acesso a actividades que nunca tiveram, repito, que nunca tiveram.
E o Sr. Deputado insiste em que estamos hoje a prejudicar estas crianças, porque tinham umas actividades curriculares muito enriquecidas e, hoje, perderam-nas. Lamento, mas não consigo ver aquilo que o senhor vê neste País. Não sei qual é real, mas não consigo ver esse «prejuízo» tão grande que causámos às nossas crianças!» Também lamento que o Sr. Deputado não consiga perceber que há uma diferença entre ligar uma escola à Internet e tratar de actualizar a largura de banda de acesso à Internet. As ligações à Internet, neste momento, podem ser feitas com diferentes possibilidades de largura de banda.
Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.
Eu ouvi-o pacientemente, Sr. Deputado. Ouvi-o muito pacientemente. Tudo aquilo que teve para me dizer eu ouvi e, portanto, gostava que me ouvisse também.
Quando se diz que se actualiza a largura de banda de acesso à Internet de todas as escolas com mais de 100 alunos para determinado valor, não significa que se está a ligar, de novo, a última escola já ligada. Só se está a dizer uma coisa simples: a de que se actualiza a largura de banda de acesso à Internet, largura, essa, que era insuficiente para aquilo que são hoje as necessidades das escolas. Foi isso que anunciámos e é isso que estamos, neste momento, a fazer.
Também lamento que o senhor não distinga aquilo que é a ligação de uma escola à Internet a partir de um ponto, seja a biblioteca, seja a secretaria ou outro qualquer da escola, e a possibilidade de criar redes locais de acesso à Internet em toda a escola, em todas as salas de aulas. Foi isto que anunciámos. No início do Verão, quando apresentámos o Plano Tecnológico das Escolas, anunciámos duas coisas relacionadas com as ligações à Internet: uma, a actualização da largura de banda e, outra, a criação de redes locais de acesso à Internet em todos os pontos da escola.
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Lamento que o Sr. Deputado não conheça aquilo de que se está a falar e, portanto, se pronuncie como se estivéssemos em 1997, quando o governo socialista anterior ligou, de facto, todas as escolas à Internet. Já não é disso que estamos a falar. Nessa altura, foi feita uma ligação e, agora, falamos de actualizações. Primeiro, foi uma feita uma ligação em banda larga e, agora, falamos de actualizações.
Finalmente, faz-se um esforço para apresentação dos resultados, comparam-se com o ano anterior, e para o PCP aquilo que é um aumento é sempre uma diminuição. E as diminuições serão o quê? É que também há diminuições no Orçamento do Estado! Aumento e diminuição é a mesma coisa para o Sr. Deputado. Pareceme haver aqui algum problema. Não sei se de «numeracia»!? Não consigo explicar como é que para o Sr. Deputado um aumento é uma diminuição! Sinceramente, não consigo explicar. É que quando há um aumento, há um aumento! Quando há um aumento para o pré-escolar, regista-se, de facto, um esforço de aumento efectivo de dinheiros públicos; quando há um aumento para o ensino profissional, regista-se, de facto, um aumento efectivo de dinheiros públicos afectos ao ensino profissional.
Portanto, também não consigo fazer esse raciocínio que o Sr. Deputado faz de ver diminuições onde, na realidade, há aumentos. Os números são números, Sr. Deputado! Quanto à Parque Escolar, o seu objectivo é o de intervir em todas as escolas secundárias. Há um calendário: foram seleccionadas as primeiras quatro escolas, cujas obras decorrem; há, como disse, 26 escolas em relação às quais já estão a ser elaborados os projectos, que entrarão em obra no próximo ano; e a seguir entrarão 120. Os critérios de escolha são os critérios de rede e de necessidade de intervenção. Estes são os dois principais critérios que levam a ponderar a urgência dessas intervenções. A nossa expectativa é a de que, de acordo com o calendário que já foi divulgado, todas as escolas sejam intervencionadas.
Por outro lado, também fazemos outras ponderações relacionadas com a localização geográfica, pois temos em conta a interioridade. Depois, há uma grande dificuldade, que é o facto de a Região de Lisboa e Vale do Tejo estar fora dos financiamentos comunitários e de as obras terem de ser feitas com o esforço do Orçamento do Estado, o que leva a que haja a uma ponderação diferente.
Sobre se vai ou não haver lugar a alienação do património, já respondi, segundo penso, mais do que uma vez. É recorrente imaginar-se que se cria a Parque Escolar para vender escolas. Já fomos acusados de tudo no que respeita à venda de património. Por exemplo, a D. João de Castro, que está agora a ser intervencionada e a ser recuperada como escola, já tinha sido dada como vendida pelos Deputados do Partido Comunista. A existência de interesses imobiliários de que aqui fomos acusados nunca foi objecto de um pedido de desculpa por parte do Partido Comunista, embora essa escola nunca tenha sido vendida. E não apenas não foi vendida como está a ser intervencionada e modernizada. Depois de fazerem processos de intenção, a seguir, deviam dizer: «Olhe, enganámo-nos!». O Sr. Deputado enganou-se, achou que o Ministçrio da Educação ia vender» Mas também já tive oportunidade de lhe responder aqui que vender património não é pecado quando se tratar de racionalização de recursos do Ministério da Educação. Quando uma escola já não for escola e precisar de ser alienada, será alienada.
Porém, esse não foi o objectivo com que a Parque Escolar foi constituída. A Parque Escolar foi constituída para recuperar todas as escolas do ensino secundário. É disso que a Parque Escolar está a ocupar-se, é isso que está a fazer e, no seu programa de actividades para o próximo ano, não tem qualquer previsão de alienação de património.
Sobre o ensino artístico, também não consigo compreender como é que o Sr. Deputado considera que ele está a ser feito à revelia das instituições de ensino artístico quando, justamente, essas instituições fazem parte do grupo de trabalho que está a promover essas alterações que é necessário fazer. É justamente com as instituições de ensino artístico que esta refundação está a ser feita. Espero que a reforma que vier a ser feita não implique um aumento de orçamento. Na minha opinião, o que se passa com as escolas de ensino artístico, sobretudo os conservatórios, é que elas têm um orçamento que é confortável, como se fossem escolas que estivessem a diplomar alunos e, na realidade, não estão a fazê-lo — esse é, justamente, o problema. O nosso objectivo é o de que, com esse mesmo orçamento, estas escolas possam vir a ter uma metodologia de ensino que permita resultados diferentes daqueles que apresentam ao País.
Portanto, isso não tinha de ter qualquer tradução no orçamento, porque não é disso que estamos a falar. A refundação não significa mais dinheiro para as escolas do ensino artístico, significa, sim, um melhor funcionamento e uma melhor eficiência nos recursos públicos que são afectos a essas escolas.
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O Sr. Secretário de Estado da Educação, se o Sr. Presidente autorizar, vai responder às questões sobre a acção social escolar e sobre o ensino particular e cooperativo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, não sei bem que número deva corrigir, porque não tenho a certeza se algum dos números que o Sr. Deputado deu consta do orçamento do Ministério da Educação!? De qualquer modo, gostaria de dar uma explicação simples, que, creio, é fácil de perceber, relativamente àquilo que o Sr. Deputado disse sobre uma diminuição no orçamento de funcionamento do sistema público e um aumento de 1,5% — o Sr. Deputado falou em 6%, mas eu não consigo descobrir onde é que o Sr. Deputado foi buscar os 6%! — no orçamento para o ensino particular e cooperativo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está no orçamento!
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — O aumento que está inscrito no orçamento é de 1,5%, repito, 1,5% relativamente ao orçamento do ano passado.
E, Sr. Deputado, isto é em defesa dos trabalhadores. Estou surpreendido que o Sr. Deputado tenha colocado o problema. Sabe porquê? Porque, no caso do ensino público, os aumentos salariais que estão previstos para o próximo ano não estão inscritos no orçamento, porque fazem parte das dotações do Ministério das Finanças, como o Sr. Deputado sabe. Porém, no caso do ensino particular e cooperativo, como o Sr. Deputado também sabe ou devia saber, o financiamento às instituições de ensino particular e cooperativo é baseado nos salários dos professores e dos funcionários e tem de estar aqui inscrito. O dinheiro não pode ficar nas dotações do Ministério das Finanças, tem de estar aqui inscrito para cobrir esses aumentos de actualização, na defesa, Sr. Deputado, daquilo que são os direitos, em princípio, dos professores e dos funcionários dessas instituições. É esta a diferença dos números, Sr. Deputado! Tão simples quanto isto! Este 1,5% é absolutamente elementar! Quero, ainda, dizer-lhe que o pequeníssimo crescimento do número de alunos, que o Sr. Deputado citou — e citou números que eu não consigo descobrir em lado algum — e que se vê aqui para o ensino particular e cooperativo, tem a ver com o facto de se ter aberto também para o ensino particular e cooperativo a possibilidade de poder realizar cursos profissionais (o que não faziam anteriormente), por ter sido feito o alargamento do acesso aos cursos profissionais. Esta possibilidade foi numa percentagem muito inferior à do sistema público, como se sabe, mas não faria sentido deixar de fora deste esforço nacional o ensino particular e cooperativo também poder aceder ao financiamento dos cursos profissionais, que, como o Sr. Deputado sabe, vão ser, se não na totalidade, parcialmente suportados por verbas de fundos europeus e essas instituições terão a mesma possibilidade que as restantes de apresentarem a sua candidatura.
É esta a razão dos números que foram referenciados da diferenciação relativamente aos números que foram apresentados sobre o orçamento do público e do privado.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado da Educação.
Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação, que pretende dar ainda um esclarecimento adicional.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Quero dar esse esclarecimento, sim, Sr. Presidente, porque percebi quais são os quadros que o Sr. Deputado consultou. Há um quadro na página 7, que refere o particular e cooperativo que diz, entre parêntesis, «inclui o ensino profissional», onde se regista um aumento de 6,5%, porque inclui o ensino profissional.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — As escolas profissionais privadas!
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Deputado, peço-lhe o favor de olhar para o quadro que está na página 10, que refere exclusivamente o ensino particular e cooperativo, onde o aumento é de 1,5%.
Portanto, o sector tradicionalmente considerado ensino particular e cooperativo ç o que»
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Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.
Como sabe, Sr. Deputado, no sistema público de ensino, há o ensino particular e cooperativo — o das vias gerais, que é aquele que é feito complementarmente à via do prosseguimento de estudos do Ministério da Educação (que é tradicionalmente o ensino particular e cooperativo), que tem um aumento de 1,5%, que corresponde ao aumento dos encargos salariais desses contratos de associação que o Ministério tem — e o ensino profissional, que é também desenvolvido por escolas privadas, mas, habitualmente, não está incluído neste conceito. Como referi no início, são escolas financiadas pelo Quadro Comunitário de Apoio (QCA), mas que, de há dois anos para cá, o Ministério da Educação tem feito um esforço no sentido de integrar no seu orçamento os encargos que essas escolas têm com esses alunos. Portanto, esse aumento resulta desse esforço de investimento público que era feito com dinheiros comunitários, que deixou de ser feito com esses dinheiros e passou a ser feito com dinheiros do Orçamento do Estado.
A minha pergunta ao Sr. Deputado é no sentido de saber o que é que queria que o Ministério da Educação tivesse feito. Queria que deixasse esses alunos sem financiamento das actividades de ensino? Que deixasse essas escolas sem qualquer possibilidade de serem financiadas por dinheiros públicos? Havia outra solução, Sr. Deputado?
Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Secretário de Estado Adjunto e da Educação, que gostaria ainda de prestar um esclarecimento adicional e a quem solicito alguma brevidade na resposta.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Com certeza, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, gostaria de comentar o que o Sr. Deputado referiu relativamente ao aumento do número de alunos.
Disse o Sr. Deputado que o Governo se vangloriava do aumento do número de alunos nos cursos profissionais, esquecendo que o decréscimo nos cursos tecnológicos tinha sido exactamente igual. É o mesmo rigor com que, sistematicamente, o Sr. Deputado tem usado os números.
O aumento líquido do nõmero de alunos»
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É de 10 000!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — É de 10 000, exactamente. Mas, se reparar, o aumento que se verifica nos 1.º e 2.º anos dos cursos ou nos 10.º e 11.º ano (por causa do efeito do aumento do sucesso escolar e, portanto, de uma maior saída de alunos do último ano) é o mesmo número de 9000 alunos, o que significa um aumento de 15% dos alunos, só no último ano. Repito, só no último ano, houve um aumento de 15% nas vias profissionalizantes. Gostaria de saber qual é o ano da história da educação em Portugal em que o Sr. Deputado encontra um aumento semelhante.
É, pois, com este rigor que o Sr. Deputado tem vindo a tratar todos os números, ou seja, nenhum. Aliás, o mesmo acontece no caso da acção social escolar.
O Sr. Deputado tenta sistematicamente transformar os aumentos em diminuições. Os aumentos das capitações e dos auxílios económicos são uma realidade que está inscrita em despacho, portanto, as despesas inerentes serão pagas pelo Ministério da Educação. Por isso, por mais exercícios que o Sr. Deputado faça, dizendo: «E se descontarmos isto, e se descontarmos aquilo?», não consegue transformar aumentos em diminuições.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à mesa.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, como sabe, a figura da interpelação à mesa tem a ver com decisões da mesa ou com orientações dos trabalhos.
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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É sobre a condução dos trabalhos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, julgo que não é possível uma boa prossecução dos trabalhos se não ficarmos esclarecidos quanto à diferença entre banda larga e Internet.
De facto, o que foi anunciado durante o ano lectivo passado (como se pode verificar pela comunicação social, nas duas alturas) foi a ligação em banda larga e o que foi anunciado este ano foi novamente a ligação em banda larga, não foi a actualização da velocidade da transferência de dados. Já agora, mesmo após a segunda ligação em banda larga, continua a verificar-se que existem escolas com ligações inferiores a 100 k.
Portanto, escolas com ligações a 100 k, só mesmo no Portugal da Sr.ª Ministra é que podem ser consideradas boas práticas na banda larga.
Já agora»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa, mas a sua intervenção não corresponde à figura da interpelação à mesa.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, mas para o trabalho dos Srs. Deputados também convinha saber quais são os quadros do relatório que são válidos para as análises.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a intervenção que fez não corresponde à figura da interpelação à mesa.
A figura da interpelação à mesa destina-se a decisões da mesa ou sobre a orientação dos trabalhos e a questão que o Sr. Deputado coloca tem a ver com a amplitude da resposta da Sr.ª Ministra ou do Sr. Secretário de Estado. Ora, a amplitude da resposta é algo que cabe exclusivamente à Sr.ª Ministra ou ao Sr. Secretário de Estado. Não me compete a mim nem aos Srs. Deputados fazermos o crivo dessa resposta, por muito que a mesma possa desagradar. Portanto, trata-se de um direito que a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado têm, sem prejuízo naturalmente de os Srs. Deputados poderem, aqui ou ali, censurar ou não aprovar a amplitude ou a magnitude dessa resposta.
Aqui chegados, tem agora a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado, tendo em conta que na quarta-feira nos encontraremos novamente para discutir questões de política educativa em geral, vou tentar ser muito sucinto e colocar questões que tenham apenas alguma consequência do ponto de vista orçamental.
Como ponto prévio, ao contrário da Sr.ª Deputada Paula Barros — que pediu à Sr.ª Ministra que abordasse estas questões e que respondesse com «pouca demagogia» —, gostaria que respondesse sem demagogia alguma às questões que vou colocar.
Começo por uma questão objectiva. Há, de facto, uma redução nas despesas com pessoal previstas para o próximo ano e há também, nas estatísticas publicadas pelo Ministério da Educação, uma previsão da diminuição do número de professores. Gostava que a Sr.ª Ministra nos dissesse se o Governo está em condições efectivas de dizer qual vai ser a diminuição do número de professores durante o próximo ano e, em particular, que professores, e em que número, vão ser abrangidos pela mobilidade especial.
Coloco esta questão pelo seguinte: há cerca de um ano a Sr.ª Ministra disse que os professores não iriam ser abrangidos no quadro da mobilidade especial. Se bem me recordo, há cerca de dois meses o Sr. Secretário de Estado referiu que alguns professores iriam ser abrangidos no quadro da mobilidade. Gostaria, pois, que nos dissesse, com toda a clareza, qual é a previsão do Ministério da Educação para o próximo ano no que diz respeito aos professores a serem abrangidos no quadro da mobilidade especial e, em concreto, qual vai ser o critério que irá presidir à inclusão de professores no quadro da mobilidade especial.
Já agora, gostava que nos explicasse se considera que houve uma mudança de opinião ou se somos nós que estamos a fazer uma abordagem pouco clara desta questão.
Gostava também de lhe perguntar, Sr.ª Ministra, se sabe e se nos pode transmitir quanto custa uma turma ou um aluno de uma escola pública, durante um ano. Se possível, gostava, ainda, que estabelecesse a compa-
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ração entre os custos dessa mesma turma ou desse mesmo aluno nas escolas privadas abrangidas pelos contratos de associação, isto é, escolas particulares que são consideradas pelo Ministério como incluídas no serviço público de educação. Faço esta pergunta porque isto tem uma repercussão orçamental evidente e, portanto, parece-me que se inclui perfeitamente no âmbito da matéria que aqui estamos a discutir.
Por outro lado, gostava que se pronunciasse sobre o Programa dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP). Isto porque o Observatório de Segurança na Escola, se bem me recordo, sinalizou 36 escolas como carecidas de intervenção e, tanto quanto sei, foram apenas celebrados sete acordos durante o ano de 2007 com estas escolas. Daí que pergunte qual o número actual, isto é, se ainda estamos neste número, se há mais e qual a previsão para o ano de 2008. Isto porque, no Orçamento do Estado, o relatório é bastante genérico, não havendo lugar a um assumir de compromissos por parte do Ministério da Educação.
Gostava também que a Sr.ª Ministra se pronunciasse sobre o famoso Plano Tecnológico da Educação.
Questões de banda e de capacidade de comunicação à parte, a verdade é que o programa e-escolas foi anunciado como sendo para todas as escolas, abrangendo todos os professores dos ciclos de ensino respectivos e todos os alunos numa sequência de abrangência que estava devidamente prevista. Portanto, sublinho que foi apresentado como um programa para todos, isto é, para todos os professores, todas as escolas e todos os alunos.
A verdade, porém, é que, nomeadamente em relação aos professores dos ciclos de ensino respectivos e aos alunos dos anos já abrangidos das escolas privadas, quando lhes é pedida a senha e o número para poderem ter acesso e para virem a ser abrangidos, nomeadamente, por esta matéria da distribuição de computadores de acesso à Internet, verifica-se que não estão abrangidos, ou seja, estão de fora.
Gostava, portanto, que a Sr. Ministra se pronunciasse sobre esta questão, para sabermos se isto é apenas uma falha do sistema ou se é realmente uma opção política. Devo dizer que já apresentei, juntamente com outros Deputados do Grupo Parlamentar do CDS, um requerimento dirigido ao Ministério da Educação e estamos a aguardar resposta. No entanto, uma vez que a Sr.ª Ministra se encontra aqui, peço-lhe que se pronuncie sobre esta questão.
Seguidamente, gostava de abordar a temática da autonomia das escolas. É certo que o Governo e a Sr.
Ministra já aqui hoje falaram sobre a autonomia das escolas, mas, muito sinceramente, parece-me que nesta matéria o Governo apregoa mas não pratica, porque a verdade é que há muito poucos contratos de autonomia assinados. Gostava que a Sr.ª Ministra nos dissesse qual é o objectivo do Governo quanto à celebração de contratos de autonomia para o próximo ano e que avaliação faz a Sr.ª Ministra dos contratos de autonomia celebrados até ao momento.
Terminaria esta primeira intervenção com uma pergunta a que peço uma resposta sincera. A Sr.ª Ministra está aqui a apresentar o Orçamento do Estado para o ano de 2008 e o que lhe pergunto é se está convencida de que o vai executar até ao fim do ano ou não.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, agradeço-lhe em particular a parcimónia exemplar que manifestou no uso do tempo.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Deputado, se estava a perguntar-me se vou gastar o Orçamento todo nos primeiros três meses do ano, respondo-lhe que não. Vou mesmo gastá-lo em 12 meses, que é o que está previsto.
Quanto às questões relacionadas com a redução das despesas com pessoal e com o quadro de mobilidade, temos aqui outra matéria em relação à qual houve muita injustiça e muitos processos de intenção atribuídos ao Ministério da Educação, sem que, depois, verificados os factos, tenha havido qualquer pedido de desculpas. Cheguei a ver vários títulos de jornal a dizer que o Ministério da Educação ia pôr no quadro de mobilidade 20 000 professores ou 5000 professores e a verdade é que até hoje não colocámos nem um! O mesmo se passou com a D. João de Castro, que também já estava vendida e, finalmente, não está.
Todavia, depois não se verifica nenhuma reposição da verdade.
Sobre o quadro de mobilidade, passa-se a mesma coisa. No ano passado, o que disse nesta ocasião foi que a expectativa do Ministério da Educação em relação ao Orçamento era a de contratar menos 5000 professores do que no ano anterior. E foi isso que aconteceu. No ano de 2007, o Orçamento reflectia o esforço de
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racionalização de recrutamentos e de selecção de professores, pelo que contratámos menos 5000 professores do que no ano anterior.
Neste Orçamento, não há qualquer previsão de diminuição do número de professores a contratar, justamente porque há um acentuado aumento de cursos e de alunos, sobretudo nas vias profissionais, e, portanto, não temos ainda qualquer previsão. Aliás, a nossa previsão, que, no fundo, foi a que guiou a elaboração do Orçamento, é a de que estes cursos venham a funcionar com o mesmo número de escolas e de que as contratações sejam residuais e apenas para as componentes técnicas destas formações, que poderão ser suportadas com fundos comunitários.
O que lhe diria, portanto, é que a nossa palavra foi sempre uma e uma só: não há quadro de mobilidade para os professores. Isto sem prejuízo de se ter tomado uma iniciativa para professores que não são professores. São pessoas que eram professores e que foram declaradas incapazes para a docência, pelo que estão afastados da carreira docente, já não são professores. Considerámos, contudo, que o quadro de transição que lhes era proposto pelo enquadramento que tinha sido elaborado não era suficiente. Entretanto, tinha sido actualizada a própria legislação da mobilidade e entendemos que podia haver aqui um espaço de reconversão destes ex-professores — que não são professores —, declarados incapazes para a docência, mas que podem, evidentemente, ser reconvertidos para outras actividades, que foi o que se lhes propôs com esta medida. De qualquer modo, neste momento não há nenhum professor no quadro de mobilidade nem a expectativa de colocar professores no quadro de mobilidade.
Sobre os custos de uma turma ou de um aluno por ano nas escolas privadas ou públicas, as escolas são muito diferentes e, portanto, podemos estar a falar de escolas de 1.º ciclo ou de outras. De todo o modo, em média é a mesma coisa, porque os contratos de associação obrigam o Ministério da Educação a pagar todas as despesas que as escolas privadas têm, tal como obriga a pagar nas públicas. Como tal, não há diferenças.
Temos de pagar todos os encargos com salários, todos os encargos com água, luz, telefones e comunicações e, portanto, o Ministério da Educação paga essas facturas.
Se o Sr. Deputado me quer ouvir dizer que um aluno custa muito menos no ensino privado do que no ensino público, não posso responder-lhe, porque, na realidade, não custa menos. Em alguns casos custa mais e noutros custa o mesmo.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Eu só fiz a pergunta, Sr.ª Ministra!
A Sr.ª Ministra da Educação: — Não vamos deixar criar aqui a ideia de que o grande despesismo acontece nas escolas públicas e de que a economia de recursos está nas escolas privadas, porque isso não corresponde à verdade.
Sobre as escolas TEIP, já foram, de facto, assinados todos os protocolos com todas as 26 escolas que tinham sido identificadas. A nossa expectativa era a de alargar este conceito e vir a abranger outras escolas.
Repare que o conceito de escola em Território Educativo de Intervenção Prioritária não tem, obrigatoriamente, de estar associado às questões de segurança escolar. Está normalmente associado a territórios em que as condições económicas e sociais podem ter alguma degradação e a verdade é que precisamos de abranger outras escolas em outras regiões que não têm qualquer problema relacionado com as questões de segurança e indisciplina, mas simplesmente com territórios deprimidos que, no fundo, transportam para o interior da escola os problemas que são do seu exterior. Assim sendo, precisamos de ter um programa de intervenção. Os contratos estão todos assinados com as 26 escolas e alargaremos este conceito para abranger novas escolas, não tendo os programas grande reflexão no Orçamento do Estado, justamente porque haverá uma linha de financiamento nos fundos comunitários para estes programas de intervenção nestas escolas.
Sobre o Plano Tecnológico da Educação, há de novo uma confusão. Existe o plano tecnológico para as escolas na área da educação, que tem três grandes componentes: o equipamento para as escolas, os conteúdos para as escolas e a formação de professores. Nestes conteúdos, o que está previsto é a actualização da largura de banda, a criação de redes locais e o equipamento — computadores e quadros interactivos, o cartão electrónico, equipamentos de segurança, etc.
Mas não podemos confundir este plano com o programa e-escolas, que não é o plano tecnológico. É um programa que se insere no quadro das contrapartidas que os operadores de telemóveis de terceira geração negociaram com o Estado aquando da atribuição de licenças, tendo, na altura, sido determinadas contrapartidas que nunca tinham sido clarificadas em termos de montante, nunca se tendo definido, tão-pouco, em que é
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que esses fundos poderiam ser gastos. Aquilo que este Governo conseguiu foi, por um lado, negociar com os operadores a identificação do montante da dívida, o montante das contrapartidas. Neste sentido, houve um acordo entre os operadores e o Governo e com este montante foi criado o Fundo para a Sociedade de Informação. A segunda coisa que este Governo conseguiu foi um entendimento com os operadores sobre o que podiam ser programas para o desenvolvimento da sociedade de informação.
Muito nos satisfaz que este entendimento passe pelas escolas, pelos alunos e pelos professores e que os operadores e o Governo se tenham entendido para considerar um programa que facilite o acesso a estes meios de comunicação a alunos do ensino secundário e a professores do nosso sistema de ensino, permitindo-lhes não apenas condições de acesso ao equipamento mas também à Internet. É disto que estamos a falar.
O programa foi definido pelo Governo em acordo com os operadores e não houve restrições, porque mesmo para o outro programa, o plano tecnológico das escolas, não há restrições.
O nosso entendimento é o de que será feito o investimento tanto nas escolas públicas como privadas, abrangendo alunos das escolas públicas e privadas e professores de ambas as escolas. Mas o que temos é um problema de tempo. Quem ouça o Sr. Deputado falar pode pensar que os professores e alunos das escolas públicas já receberam todos computadores, o que não é verdade. Este programa tem um tempo de execução que temos de respeitar. Aquilo que parece uma operação simples, a distribuição de computadores a formandos da Iniciativa Novas Oportunidades ou das escolas, tem exigências técnicas. É preciso comprovar que o aluno existe e esse aluno precisa de envolver a sua família na contratualização com os operadores, tanto para o computador como para a ligação à Internet. É, portanto, toda esta montagem técnica que o Ministério da Educação está a assegurar e foi muito mais fácil começar com as escolas públicas, porque estão no nosso sistema de informação, e não tão fácil de fazer com as escolas privadas, porque não estão em qualquer sistema de informação. Lamento que seja necessário o assunto chegar aqui, porque o Ministério da Educação está, com as associações do ensino particular e cooperativo e com as associações do ensino profissional, justamente a tratar de integrar a informação no sistema do Ministério da Educação para poderem ser emitidos vouchers e para que os professores e os alunos destes subsistemas possam ter acesso a esse equipamento. Não há, portanto, qualquer discriminação, mas, sim, dificuldades técnicas na resposta a este programa.
Finalmente, se os alunos e professores das escolas privadas ainda não receberam, os dos públicos também não. Há apenas uma pequena parte de alunos e professores que conseguiram chegar ao fim de todo o processo, o que é bastante complicado, e à entrega do computador.
Sobre a autonomia das escolas, deixe-me algum espaço para a ironia! Então o Governo apregoa e não faz?! E do partido do Sr. Deputado, que esteve no Ministério da Educação, diremos o quê?! Apregoa e não faz!» Não sei a quem se aplica esta frase, Sr. Deputado, mas diria que se aplica a quem a disse e não a quem o senhor a dirigiu.
Celebrámos contratos de autonomia que começaram a desenvolver-se no início deste ano lectivo. Estes contratos foram assinados em Setembro e o Sr. Deputado pede-me já que faça uma avaliação e que lhe diga quantos mais vão ser assinados. Estamos a caminhar com passos seguros. A autonomia é um objectivo instrumental, e não um objectivo em si, para melhorar os resultados escolares dos alunos. A partir deste processo, faremos a revisão do Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, como já anunciámos, e celebraremos os contratos de autonomia com as escolas que tiverem condições para gerir de outra forma os meios que estão ao seu dispor, sempre com o objectivo de melhorar os resultados escolares.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Quero apenas dizer que, relativamente ao programa eescolas, a informação que temos dos operadores é a de que estão a ser entregues 1500 computadores por dia e que nem sequer no mercado há computadores disponíveis para permitir aumentar este volume de entregas.
É bom clarificá-lo.
Por outro lado, como a Sr.ª Ministra disse, todo o sistema de informação do particular e cooperativo não existia. Não estão registados em base de dados os alunos e professores do ensino particular e cooperativo, situação que já foi acordada com as associações e que está a ser resolvida em colaboração com o Ministério da Educação neste momento.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, deixe-me dizer-lhe que foi, de facto, frontal e verdadeira quando iniciou a sua intervenção neste debate dizendo-nos que não há novidades. Grande parte das propostas e das orientações políticas que discutimos neste Orçamento já foram anunciadas, diria mesmo que várias vezes. Como tal, já as conhecíamos.
O que este Orçamento tem como novidade é o facto de haver um investimento zero na educação. Ou seja, havia toda uma campanha de propaganda que anunciava a segunda «lua-de-mel» do Partido Socialista com a educação, que o Partido Socialista voltava a estar apaixonado pela educação, e, portanto, a novidade é que o crescimento do orçamento da educação é zero! E dentro deste saldo zero, é preciso perceber que os ensinos básico e secundário têm um corte de 3,9%, de acordo com os seus números. Por outro lado, lamento dizer-lhe que são os seus mapas que dizem que o ensino particular e cooperativo tem um aumento de 6,5%. A Sr.ª Ministra diz-nos que esse aumento inclui o ensino profissional. Pois inclui! Mas essa é uma escolha do Ministério da Educação no sentido de não criar uma rede pública de ensino profissional e de fazer uma aposta na contratualização com privados. Ou seja, esta é uma escolha política assumida de forma relativamente clara.
Será que o investimento zero é explicado pelo facto de estar tudo bem na educação? A Sr.ª Ministra sabe que não e sabe que, tendo em conta a despesa de educação por aluno no espaço da OCDE, Portugal aparece em 23.º lugar. A Sr.ª Ministra conhece estes números e sabe, portanto, que o abandono escolar é preocupante, que há uma redução do número de alunos que conclui o secundário na última década e, como tal, que há aqui uma contradição insanável. Há até palavras do Sr. Secretário de Estado Valter Lemos que são relativamente curiosas. Dizia o Sr. Secretário de Estado que os resultados escolares em Portugal são o maior problema da educação, constituindo «o resultado de um mau funcionamento e de uma má organização».
Depois, conclui: «Em termos de Orçamento do Estado, o que queremos é manter os níveis de eficiência».
E, portanto, basicamente, sem investimento, a proposta é a de manter o mau funcionamento e a má organização.
Tinha uma série de questões para lhe colocar, mas, enfim, não posso ser completamente indiferente às coisas que, entretanto, já foram ditas.
A Sr.ª Ministra diz-nos que não vai haver mobilidade especial para docentes; vai haver mobilidade especial para professores que não são professores. Ora, a Sr.ª Ministra sabe que se está a referir a professores que, por problemas de saúde, não podem cumprir funções lectivas. A vontade do Ministério de Educação de retirar estes professores das escolas, Sr.ª Ministra, não pode ter outro nome senão crueldade. Ou seja, o Sr. Secretário de Estado apareceu dizendo que, enfim, havia professores nas escolas que não tinham nada para fazer, para os quais era preciso «inventar tarefas». Pergunto se as escolas portuguesas tinham um tal contingente de 2000 professores que estavam aí de «braços cruzados»? Não! Eles estavam noutro tipo de actividades. Portanto, é de uma enorme crueldade, tenho de reconhecer este aspecto, que a mobilidade especial seja aplicada, exactamente, a pessoas que estão numa situação de fragilidade.
Mas passemos ao debate sobre as políticas que vão ser implementadas.
Sr.ª Ministra, falava-nos sobre Plano Tecnológico da Educação e dizia-nos que ele era para todas as escolas, para todos os alunos. O que é incompreensível é por que é que, sucessivamente, temos tido notícias de que, aquando da distribuição dos instrumentos básicos de acesso às redes nas escolas — os computadores, cuja distribuição o Ministério anunciou várias vezes —, os professores contratados não têm acesso a estes computadores. O que não compreendo é por que é que os alunos que têm o azar de ter um professor contratado não têm o mesmo tipo de instrumentos do que tendo um professor de carreira, do quadro. Isto é que eu não consigo perceber e, portanto, gostava que a Sr.ª Ministra me esclarecesse qual foi o anúncio em que disse que, nas aulas que são dadas por professores contratados, os professores não têm o tal computador que a Sr.ª Ministra e os Sr. Primeiro-Ministro anunciaram.
Perguntava-lhe, depois, pela questão da educação especial. Pela intervenção do Sr. Secretário de Estado, não consegui perceber se os professores de agro-pecuária, electrotecnia e português-francês continuam a fazer o apoio a crianças que têm necessidades no âmbito da educação especial. Portanto, pergunto não se o Governo e as direcções regionais continuam à procura de uma criança, numa aldeia, que precisa de educação especial mas, sim, se já encontraram estes professores, que não têm qualificação – eles próprios assumem que não têm qualificação e competências – para lidar com crianças que têm necessidades especiais, e se são eles que continuam a fazer este tipo de acompanhamento da educação especial.
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Depois, a Sr.ª Ministra falou-nos sobre a importância do enriquecimento curricular. É todo um dossier para discutir, que vai da forma como determinados conteúdos curriculares são passados para este enriquecimento curricular à forma como há quase um excesso de «curricularização» daquilo que são as crianças nesta idade escolar. Mas o tempo é restrito e este é um debate que faremos numa outra altura.
Porém, a Sr.ª Ministra dizia que este enriquecimento curricular foi feito, apesar de tudo, em tempos de contenção orçamental.
O que eu lhe queria perguntar, Sr.ª Ministra, é o seguinte: a Sr.ª Ministra, de alguma forma «chutou» ou passou a responsabilidade do enriquecimento curricular para as autarquias e eu pergunto quem é que se responsabilizar pela qualidade do enriquecimento curricular.
Tenho comigo um contrato de prestação de serviços como os que estão a ser feitos a vários professores que têm formação para dar aulas de inglês – não sendo inglês técnico, sempre é inglês! —, a quem são pagos 9,5 euros por 45 minutos que são leccionados. Portanto, não há qualquer pagamento para a preparação das aulas.
O que acontece é que estes professores, mesmo querendo seguir a sua vocação, têm de ganhar a vida de uma outra forma e, portanto, dão aulas como quem faz um biscate. O que eu queria saber, Sr.ª Ministra, é quem é que se responsabiliza pela qualidade destes conteúdos? Ou seja, não deverá o Ministério estabelecer um mínimo de tempo de preparação destas aulas que deve ser pago a este docentes, exactamente para assegurar a qualidade? Não é essa a responsabilidade do seu Ministério? Uma última pergunta, pois vejo o Sr. Presidente já um pouco preocupado com o meu uso do tempo.
A Sr.ª Ministra fez declarações várias sobre os rankings, nos últimos dias. Divulgou-os mas disse que não gosta, que têm constituído uma arma de ataque à escola pública, e devo dizer-lhe que concordo. Mas, então, não consigo perceber por que é que não estabelece critérios mínimos de elaboração destes rankings.
O que eu lhe quero perguntar é o seguinte: sucessivamente, temos notícias de escolas públicas que fazem selecção de alunos. Dou-lhe o testemunho de um professor, que, como sabe, é o presidente do Fórum de Estudos de Educação, o professor David Rodrigues, que diz que, falando com uma professora, soube que certas escolas seleccionavam os alunos que recebiam. Não todos! Mas quando se tratava da possibilidade de o aluno frequentar uma ou outra escola, o encaminhamento dos alunos para certas escolas era feito em função da profissão dos pais: se os pais eram profissionais liberais ou de classe média, os alunos eram acolhidos em certas escolas; se os pais eram operários ou trabalhadores de outro tipo, dizia-me o presidente, os alunos eram indicados para outras escolas. E isto tem, obviamente, implicação nos rankings.
Conhecemos também as várias histórias sobre a selecção de alunos e a criação de turmas de elite. O que quero saber é o que é que o seu Ministério faz sobre isto? Como actua a Inspecção-Geral da Educação? A Sr.ª Ministra anunciou que vamos ter mais 40 inspectores no ano 2009, os que temos não chegam, não são suficientes, mas eu gostava de saber o que é que o seu Ministério pretende fazer sobre estas situações que conhecemos.
«Ultimíssima» questão: queria, Sr.ª Ministra, o seu compromisso para uma proposta que o Bloco de Esquerda apresentou, agora, para este orçamento.
Há uma carta que veio na imprensa que considero particularmente chocante e passo a ler esse testemunho: «Eu, professora contratada, pertencente ao domínio das escolas públicas do Ministério da Educação, tenho um bebé de dois meses e meio e tenho um contrato. E ou aceito o contrato e me apresento a serviço ou, se quiser usufruir dos dias que me restam da licença de maternidade, não posso aceitar a colocação.» Assim, Sr.ª Ministra, gostava de saber se conto com o compromisso da Sr.ª Ministra e do Partido Socialista para que, de facto, os direitos à licença de maternidade, ao subsídio de maternidade e também à redução do tempo de horário para amamentação para as professoras contratadas sejam aceites pelo Partido Socialista, na votação deste Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Ana Drago, pelas suas questões.
Dou a palavra à Sr.ª Ministra para responder, a quem vou solicitar, com simpatia, brevidade nas respostas.
Temos ainda uma segunda ronda de perguntas, já atingimos a nossa deadline em termos de tempo disponível e, neste momento, já está o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior à nossa espera.
Sr.ª Ministra, tem a palavra.
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A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, vou procurar responder brevemente.
Sr.ª Deputada Ana Drago, parece-me extraordinário que a Sr.ª Deputada considere quase 6000 milhões de euros no orçamento do Ministério da Educação como investimento zero! Se 6000 milhões de euros são zero, também estamos entendidos sobre o que dizer acerca do Ministério da Educação! Sim, o orçamento é um investimento!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Mas o crescimento é zero!
A Sr.ª Ministra da Educação: — O crescimento pode ser zero, é uma coisa diferente! Mas, então, não podemos dizer que o investimento é zero. O investimento é de 6000 milhões de euros, e eu podia dizer-lhe mais: o crescimento pode ser zero mas, como já aqui expliquei, tem sido feito um esforço de racionalização dos recursos e nenhum investimento ficou por fazer no Ministério da Educação por falta de recursos financeiros. Nenhum investimento! Desde logo, já aqui lembrei o Programa de Actividades de Enriquecimento Curricular, o Programa de Modernização do Parque Escolar do Ensino Secundário, a reorganização do 1.º ciclo, as refeições para as crianças do 1.º ciclo. Aliás, mesmo quanto à Acção Social Escolar no ensino secundário, se se vier a verificar que é necessário reforçar as verbas da acção social escolar, ela será reforçada. Disso, a Sr.ª Deputada pode ter a certeza absoluta! Portanto, não estou muito preocupada com essa questão porque os investimentos que é necessário fazer são feitos com este orçamento.
Não podemos nunca esquecer de que estamos a falar de dinheiros públicos e temos uma responsabilidade enorme de fazer um gasto racional e equilibrado destes dinheiros públicos. Não são dinheiros em relação aos quais possamos ter a indiferença de entender que tanto faz a forma como os gastamos. Temos uma enorme responsabilidade em gastar bem, em qualificar este investimento! Sobre a questão do plano tecnológico confundido como programa e-Escola do fundo para o desenvolvimento para a sociedade da informação, aquilo que lhe posso dizer é o mesmo que respondi, há pouco, ao Deputado do CDS: são problemas técnicos, de facto. Enquanto todas as pessoas do quadro estão na base de dados do Ministério da Educação e é muito fácil emitir um voucher para que possam ter acesso ao programa, no caso dos professores contratados assim não é! Nunca em momento algum a Sr.ª Deputada me terá ouvido dizer, como me atribuiu quando disse «em que momento a Sr.ª Ministra disse«» A Sr.ª Ministra nunca disse! A Sr.ª Ministra nunca disse que os professores contratados não teriam acesso a este programa! Portanto, aquilo que se passa são dificuldades técnicas. Ainda nem sequer todos os professores do quadro receberam computadores, menos ainda os professores contratados, porque não estamos em condições de emitir os vouchers. Mas, evidentemente, essa é uma situação que se resolve. Não é esse o problema.
De resto, a nossa satisfação é a de que a adesão ao programa tenha sido desta ordem e que, de facto, os professores queiram poder aceder a este equipamento e os alunos também. A situação que nos satisfaz é que a adesão seja massiva.
Sobre a questão do enriquecimento curricular e a relação com as autarquias, vamos lá a ver se nos entendemos! O Ministério da Educação não «chutou» para as autarquias coisa nenhuma! Recuso em absoluto essa linguagem ou o que ela pode significar! O que acontece é que as autarquias têm responsabilidade, como o Ministério da Educação, nas actividades de enriquecimento curricular. Está na lei há muito tempo! E o facto de ninguém respeitar essa lei não significa que ela não deva ser respeitada.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma má lei!
A Sr.ª Ministra da Educação: — Vamos ver se nos entendemos! E, em matéria de enriquecimento curricular, muitos autarcas têm muito boas práticas e muito boas experiências. Muito boas! Quando eu cheguei ao Ministçrio da Educação, já havia»
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar o aparte da Oradora.
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A Sr. ª Ministra da Educação: — Sr.ª Deputada, peço desculpa! A lei já existia quando cheguei ao Ministério e o que eu faço é respeitar a competência em matéria de enriquecimento curricular. Esta é uma competência das autarquias, que eu respeito. Aquilo que fiz de diferente, talvez, foi dar condições às autarquias para que pudessem desenvolver bem o seu trabalho.
O papel do Ministério da Educação é um papel não exclusivamente dos organismos centrais nem de inspecção: é um papel dos professores titulares de turma, que devem fazer a supervisão destas actividades; é um papel dos agrupamentos, que devem fazer o enquadramento destas actividades; e é, evidentemente, um papel que cabe também à comissão de acompanhamento que procura resolver todas essas questões, no quadro do acompanhamento e da avaliação que faz.
Sobre os rankings, a linguagem pouco precisa leva de novo a afirmações igualmente pouco precisas. É que o Ministério da Educação não divulgou nenhum ranking. O Ministério da Educação não divulga rankings nem faz critérios para rankings. São visões muito diferentes! O Ministério da Educação faz aquilo que tem a obrigação de fazer, que é divulgar os resultados dos exames dos alunos do ensino secundário. Se, com isso, algumas instituições produzem rankings, isso é da responsabilidade dessas instituições.
A Sr.ª Deputada diz: «bom, mas haveria aqui lugar a alguma regulação, havia aqui lugar a alguma intervenção do Estado nessa matéria». Mas é um assunto diferente, que não a pode levar a concluir que o Ministério divulga e que o Ministério não actua. O Ministério não divulga! Peço desculpa por esta correcção dos termos em que colocou o problema.
Depois, se há escolas públicas em que o efeito dos rankings não é o de melhorarem as suas práticas de ensino mas copiarem das instituições privadas o que elas fazem, peço desculpa mas o Ministério da Educação intervém perante os casos que são apresentados ou denunciados. Se a Sr.ª Deputada me fizer chegar qual é a escola que faz aquilo que a Sr.ª Deputada aqui denuncia, certamente que irá uma inspecção fazer a avaliação desta situação, porque isto é absolutamente ilegal e intolerável.
Agora, não podemos é ficar com os casos, que mantemos sob anonimato, que não denunciamos, para poder ter armas de arremesso para atirar aos Membros do Governo. Todos os casos que a Sr.ª Deputada me apresentar como sendo escolas públicas que fazem selecção de alunos, que criam turmas de meninos especialmente dotados ou outras situações que contrariam as regras de organização pedagógica das escolas públicas, agradeço muito que me faça chegar para que possamos mandar apurar.
Não sei qual é a proposta do Bloco de Esquerda mas, com certeza, tem o meu compromisso de a avaliar.
Eu própria estou a trabalhar com o Ministro do Trabalho no sentido de resolver esta situação, que surge como uma situação nova em resultado das condições de contratação destes professores. Por isso, em resultado de alguns casos que se nos apresentaram, estamos os dois a procurar criar um quadro para estes professores, nomeadamente para a protecção na maternidade e na assistência a filhos menores, em igualdade de circunstâncias com os professores que são quadros de escola ou quadros de zona pedagógica.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
O Sr. Secretário de Estado da Educação quer dar um esclarecimento adicional, pelo que lhe peço brevidade máxima nesse esclarecimento.
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Serei muito breve, Sr. Presidente, não vou fazer as caricaturas da Sr.ª Deputada mas vou ser breve.
Sr.ª Deputada, relativamente à educação especial, gostava de lembrar que o Bloco de Esquerda foi frontal e muito violentamente contra a criação do grupo de educação especial. O Bloco de Esquerda defendeu aqui que não devia haver grupo de docência para a educação especial e, portanto, todos os professores dos vários grupos de docência deviam leccionar na educação especial, como sucedia anteriormente. Não nos esquecemos da enorme defesa que o Bloco de Esquerda aqui fez.
Ora, gostava de dizer à Sr.ª Deputada que não foi isso que aconteceu, felizmente, o Ministério da Educação criou um grupo de docência para a educação especial. Posso dizer-lhe que, neste momento, há 4745 professores a leccionar em educação especial, no âmbito desse grupo de docência. Se existir alguma situação caricatural de distribuição de serviço incorrecta, tanto pode existir para essa situação como para a distribuição de turmas erradas no âmbito da respectiva escola.
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Desses 4745 professores, gostava que a Sr.ª Deputada me dissesse quantos é que estão na situação que a Sr.ª Deputada referiu, para tentar perceber qual a correcção que temos de fazer.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado da Educação.
Vamos entrar na segunda e última ronda de perguntas, para o que cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos, mas 2 minutos tout court, isto é, não haverá tolerância.
Assim, tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa.
A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Sr. Presidente, serei muito breve e começo por dizer que, às vezes, há silêncios que são preocupantes.
Foi aqui referida, pelo meu colega Deputado Pedro Duarte, a afirmação que, ontem, foi feita pelo Presidente Bush relativamente à proposta dos democratas sobre o ensino do Português. E, francamente, penso que estes silêncios, às vezes, podem deixar-nos algumas preocupações, a nós, portugueses, pelo que era bom que a Sr.ª Ministra nos dissesse qualquer coisa sobre isto.
Outra questão que quero suscitar é muito concreta e prende-se com o artigo 22.º do Orçamento, onde se refere que o ensino básico vai, todo ele, ser transferido para as autarquias locais, isto é, o 1.º ciclo já está e os 2.º e 3.º ciclos vão ser transferidos.
Sei que, em algumas reuniões que decorreram com a Associação Nacional de Municípios, foi entendido pelos municípios que havia um rácio de pessoal em excesso, na ordem das 5000 pessoas não docentes, nas escolas do ensino básico. A pergunta que faço é a seguinte: já se encontra definido, neste momento, qual o pessoal que vai transitar para as autarquias locais? E todos eles vão transitar em regime de contrato individual de trabalho ou não? Outra questão que quero colocar prende-se com os normativos que ficaram de ser estabelecidos, até ao final de Dezembro deste ano, relativamente ao pessoal não docente, à acção social escolar e aos transportes escolares. Gostava de saber se todos esses normativos estão ou não a avançar e como é que ficou o normativo que estava a ser preparado entre a Secretaria de Estado da Educação e a da Segurança Social.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Asseiceira.
A Sr.ª Fernanda Asseiceira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, começo por felicitá-la, pois, ontem, em Bruxelas, na reunião dos Ministros da Educação da União Europeia, foi alcançado um acordo político, que me parece relevante, sobre o futuro quadro europeu das qualificações.
A oposição teima em não admitir três grandes objectivos que a Sr.ª Ministra e o Ministério da Educação estão, efectivamente, a atingir com as suas medidas: o combate ao abandono escolar, a promoção do sucesso escolar, a melhoria das aprendizagens dos alunos nas suas escolas. O objectivo final é o da qualidade da escola pública. Tudo isto é conseguido, obviamente, com rigor, não esquecendo o rigor do programa de contenção orçamental, que é um imperativo que importa respeitar.
Relativamente à Lei das Finanças Locais, a Lei n.º 2/2007, e à transferência de atribuições e competências para as autarquias locais, é importante realçar um aspecto: as áreas da educação, da saúde e da acção social são três áreas contempladas no âmbito desta transferência de competências.
O Ministério da Educação foi pioneiro nesta matéria, pelo que, se fosse possível, Sr.ª Ministra, gostaria que fizesse uma avaliação do processo em curso. Que novas transferências estão, eventualmente, previstas? Como é que tem decorrido a articulação com a Associação Nacional de Municípios, em particular, e com os autarcas, em geral, no âmbito dos recursos da chamada «mochila financeira» que, obviamente, acompanha esta transferência? Tendo ainda em conta esta articulação com os municípios, parece-me importante salientar aqui a elaboração e correspondente homologação das cartas educativas. Pergunto: qual o ponto da situação relativamente ao número de cartas educativas que faltam para que este processo esteja concluído? Quanto à construção de novos centros escolares, gostava de saber se, ao nível desta melhoria dos equipamentos, é possível concretizar o número de centros escolares que estão previstos para 2008.
Mesmo para terminar, Sr. Presidente, se me permite, é importante referir também que há um acréscimo, em termos orçamentais, para a Equipa de Missão para a Segurança Escolar, sem contar com os encargos que
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o Ministério da Administração Interna também contempla para esta equipa. Será possível concretizar que acções estão previstas no âmbito desta Equipa de Missão para 2008?
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, a quem peço o cumprimento dos 2 minutos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, espero contar com a tolerância de V. Ex.ª, porque vou ter de referir, na minha intervenção, todos os quadros que contêm os números que o Governo forneceu à Assembleia da República para discutirmos este Orçamento do Estado e que, agora, o Governo parece, afinal, desconhecer ou onde parece encontrar divergências, sendo dados que ele próprio forneceu. Portanto, conto com a tolerância de V. Ex.ª»
O Sr. Presidente: — Tolerância, sim, mas tolerância «q.b.», porque há um limite.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Certamente, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, começo por registar aqui um milagre que a Sr.ª Ministra reconheceu no início da sua intervenção, que é, por um lado, o do aumento do número de alunos e, por outro, a redução dos professores. Em nosso entender, é um verdadeiro milagre fazer-se uma redução dos professores e um aumento dos alunos sem prejudicar a qualidade do sistema educativo.
Mas, relativamente a esta questão dos meios humanos do sistema educativo, Sr.ª Ministra, começo por referir a redução de verbas com pessoal, que, de facto, este Orçamento prevê, de 4677 milhões de euros para 4613 milhões de euros — consultem-se os Quadros IV.14.3. da página 222 do Relatório do Orçamento do Estado para 2007 e III da página 261 do Relatório do Orçamento do Estado para 2008, onde estes dados estão previstos.
Mas o Governo propõe ainda mais precariedade para o pessoal afecto ao Ministério da Educação, porque prevê a diminuição da despesa com os vínculos à função pública e prevê o aumento da despesa com contratos individuais de trabalho e com a contratação a termo — consultem-se os Mapas Informativos — Serviços Integrados, concretamente o Mapa 5-A, onde estes dados estão contidos.
Relativamente aos contratos a termo, a verba mais do que duplica, o que, em face da redução dos vínculos à função pública, constitui, de facto, um aumento da precariedade nos trabalhadores afectos ao Ministério da Educação, que não são apenas professores mas uma generalidade de trabalhadores.
Concretamente em relação aos trabalhadores não docentes, esta situação é excessivamente preocupante, porque a realidade que temos hoje é de escassez de trabalhadores não docentes. Há soluções, aliás, subscritas pelo Sr. Director Adjunto da DREN, que defende a transferência de competências para as autarquias como solução para o problema da falta de trabalhadores não docentes, mas, no que diz respeito à educação especial, Sr.ª Ministra, a situação é gravíssima. E refiro-lhe só, a título de exemplo, aquilo que se passa na escola EB 2,3 de Estremoz, onde a própria escola, com receitas privativas, com receitas próprias da escola, contrata duas funcionárias não docentes para acompanharem crianças deficientes que necessitam, de facto, de acompanhamento, porque o Ministério não disponibiliza as duas auxiliares que são necessárias para acompanharem aquelas crianças. Isto, Sr.ª Ministra, é vergonhoso, num Estado que se diz democrático, que subscreveu a Declaração de Salamanca e que diz promover a escola inclusiva.
Em relação à educação especial, o Orçamento por acções, página 13, aponta um aumento de 5,5%. Se a Sr.ª Ministra tiver em consideração a inflação prevista no próprio Orçamento do Estado, pelo Governo, de 2,1%, verificará que aquele aumento é de 3,3%. A questão que lhe coloco, Sr.ª Ministra, é a de saber se é este aumento que compensa a escassez de professores que o Ministério da Educação impõe às escolas e aos alunos — que, aliás, resulta em situações, no mínimo, caricatas, mas que são verdadeiramente desastrosas, de colocação de professores de Português, de História e de Agro-Pecuária nos grupos destinados à educação especial — e se é este aumento que vai, de facto, compensar a falta de pessoal não docente, de que, aliás, já lhe dei um exemplo.
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Em nosso entender, Sr.ª Ministra, no que diz respeito à educação especial, aquilo que este Orçamento confirma é o fim da escola inclusiva que o Governo decretou, ao limitar e impedir o acesso aos apoios educativos a que os alunos tinham direito e ao diminuir drasticamente o número de professores afecto ao ensino especial.
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado, porque a minha tolerância já vai longa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente, com a questão referente às AEC (Actividades de Enriquecimento Curricular).
Sr.ª Ministra, V. Ex.ª continua a querer esconder que aquilo que o Governo fez foi, de facto, transferir competências para as autarquias. E continua a querer esconder que estas actividades estavam previstas nos currículos mas saíram e passaram a ter uma consideração de actividades de carácter opcional, que as crianças têm ou não, de acordo com as opções que as autarquias e outro tipo de instituições façam, e são garantidas por profissionais mal pagos que, infelizmente, por vezes, não têm formação para as actividades que têm de garantir.
Muito obrigado, Sr. Presidente, pela tolerância.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho, a quem relembro, de igual modo, o limite de 2 minutos.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, serei, de facto, muito, muito breve.
Sr.ª Ministra, antes de mais, quero registar que não respondeu à pergunta do custo da turma e do aluno. E o que lamento, Sr.ª Ministra, não é apenas a ausência de resposta mas que a Sr.ª Ministra não tenha respondido porque entendeu que, na pergunta que lhe fiz, havia como que algum preconceito ou alguma tentativa de, em face disso, eu tentar obter uma determinada resposta.
A única coisa que eu queria, Sr.ª Ministra, era que a Sr.ª Ministra respondesse, mas a Sr.ª Ministra não quis responder, dizendo-me que não me iria responder aquilo que eu queria ouvir. Ó Sr.ª Ministra, isto é que é lamentável! Portanto, o que lhe peço é que, se, por acaso, entende que foi com base nesse pressuposto que lhe fiz a pergunta, e até nem foi, então, Sr.ª Ministra, destrua-o. E, por isso, Sr.ª Ministra, peço-lhe que, se for possível, me responda.
Quanto aos professores que serão colocados no quadro de mobilidade especial, gostava só que esclarecesse se, realmente, podemos concluir das suas palavras que não vai haver, ou, então, se houver, quantos serão. É que, relativamente a isto, também gostava que ficássemos com elementos claros, isto é, se sim ou não e, a final, quantos serão.
Termino, até para cumprir o limite de tempo, com uma referência à acção social escolar. É verdade que há um aumento de 5,1% da verba mas também todos nós conhecemos as metas que o Governo se propôs para 2009: manuais escolares para 200 000 alunos; duplicar o número de alunos do ensino secundário com apoios sociais; subsídio de transporte para os alunos inscritos nos cursos profissionais e ainda a questão das bolsas de mérito. O que lhe pergunto é em que estado vamos estar, a caminho dessas metas para 2009, no final de 2008?
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago, a quem relembro, igualmente, o limite de tempo de 2 minutos.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Educação, compreendemos que, sobre as actividades de enriquecimento curricular, a Sr.ª Ministra quer ter os louros do lançamento do programa, mas as responsabilidades são com outros, portanto, as responsabilidades são com as escolas, com os professores titulares, com as autarquias. Ou seja, se não são asseguradas as condições mínimas para haver qualidade neste tipo de actividades, a responsabilidade é dos outros, mas o bom do programa, os louros do programa são para a Sr.ª Ministra.
Sr.ª Ministra, a segunda questão é sobre a selectividade social das escolas públicas. Não tenho por hábito inventar situações nem trazer aqui nada que não possa afirmar, e foi por isso mesmo que lhe trouxe o texto do Prof. David Rodrigues, porque relata uma situação. E como esta situação é muito falada, mas está aqui escrita,
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confronto a Sr.ª Ministra com isto. E como esta situação é muito falada mas raramente aparece, gostava de saber se a Sr.ª Ministra tem mais informações sobre isto. Não trago aqui coisas inventadas.
A terceira questão é sobre os rankings.
A Sr.ª Ministra «colocou o dedo na ferida»: é que o Ministério da Educação divulga dados que depois são escalonados de acordo com critérios estabelecidos por diferentes entidades.
O problema é que, como a Sr.ª Ministra disse em declarações públicas, este tipo de critérios está a ser utilizado como um ataque à escola pública. Ora, a responsabilidade política pela escola pública é sua, logo, é sua a responsabilidade de estabelecer critérios de análise destes mesmos dados. A Sr.ª Ministra é da área de sociologia, pelo que compreende isto muito bem.
Agora, vou colocar a última questão.
O Sr. Secretário de Estado está certamente confuso neste debate: é que não sou seu a secretária de Estado, é o senhor, e não é o senhor que é Deputado, sou eu. Portanto, sobre a análise da situação no terreno, a responsabilidade é sua, no que respeita às questões de educação especial.
Não sou a Inspecção-Geral da Educação, não sou uma entidade de recolha de dados, aquilo de que tenho conhecimento trago aqui, estudo e analiso. Por isso, terei muito prazer em dar ao Sr. Secretário de Estado aquilo que veio relatado na imprensa, há pouco menos de seis dias, sobre professores que dizem o seguinte: «é a mesma coisa que me porem num hospital, eu não tenho competências para dar este tipo de acompanhamento». Terei todo o prazer em divulgar isto ao Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: — Para responder, vou conceder a palavra à Sr.ª Ministra da Educação.
Sei que tem uma caterva infindável de questões para responder, mas faço um apelo à sua proficiência para, telegraficamente, com brevidade, se possível em 5 minutos, dar resposta a estas questões.
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, agradeço todas as questões que nesta última ronda foram colocadas.
Passo a responder sobre as autarquias locais e o processo de transferências de competências, que, como sabem certamente, não foi concluído com êxito este ano, portanto não teve uma tradução no Orçamento do Estado para 2008, como era a expectativa do Governo nesta matéria. Infelizmente, assim foi e aquilo que penso é que se continuará a trabalhar para encontrar as soluções para os problemas que foram colocados, sobretudo do lado das autarquias, para poder concretizar esta transferência.
Ao contrário do que aqui foi dito por um Sr. Deputado, não escondo que transfiro, ou que quero transferir, competências para as autarquias. Não escondo isso de ninguém! Aliás, isso não é uma questão pessoal, é uma questão de Governo, é uma questão de Estado bem mais antiga. Está assim estabelecido que na área da educação há uma partilha de competências entre o Governo central e as instituições de governo local e isso tem de ser concretizado. Temos a obrigação de fazer um esforço para encontrar as soluções para concretizar essa situação.
Portanto, há dificuldades nas áreas da transferência do pessoal não docente, da acção social escolar, do transporte escolar, mas estamos a trabalhar, naturalmente, para desbloquear as situações e encontrar as soluções para que isto possa ser feito com confiança. O mais importante é que se faça este processo de transferência com confiança e salvaguardando, sobretudo, a qualidade do sistema de ensino e das escolas, bem como o direito dos alunos a um ensino de qualidade.
De resto, no que respeita à área da construção dos centros escolares e das cartas educativas, existem já 215 cartas educativas homologadas, estão 32 em processo de avaliação e 31 em elaboração, portanto, é um processo que também está a correr naturalmente.
Da mesma forma, no próximo dia 24, teremos uma sessão pública com a Associação Nacional de Municípios e as comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR) para dar início a um processo de divulgação das regras, dos regulamentos para o acesso aos fundos comunitários para a construção de centros escolares.
Por isso, penso que esta é uma área que corre de forma bastante tranquila, com esta dupla preocupação: por um lado, conquistar o espaço de confiança entre o Governo central e o governo local; por outro lado, salvaguardar as questões da qualidade do ensino.
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Portanto, não é verdade que o Ministério da Educação esconda que transfere competências para as autarquias. Não esconde, transfere de forma explícita, aliás, cumprindo a lei, e procura fazê-lo trabalhando da melhor forma possível com as autarquias, como é sua obrigação.
Sobre a Equipa de Missão para a Segurança Escolar, também o objectivo é melhorar. A equipa foi criada no ano anterior e este ano o que procuramos fazer, como sempre, é melhorar os meios e as condições de trabalho destas equipas.
Depois, para responder ao Sr. Deputado do PCP, diria que se trata do milagre da eficiência, diminuindo o número de professores e aumentando o número de alunos, tendo em atenção, sobretudo, os rácios nacionais na comparação internacional: o número de alunos por professor que temos no nosso sistema não tem comparação com o de nenhum outro país da Europa, e aquilo que procuramos é a racionalização dos recursos.
Ainda por cima, o Sr. Deputado deveria saber também, já que lê tantos relatórios, que todos os relatórios apontam para a inexistência de correlação entre o número de alunos/professores e os resultados e sucesso escolares obtidos por esses alunos.
Depois, gostava de fazer uma outra observação, para ver se nos entendemos ainda em relação ao ensino particular e cooperativo e às escolas profissionais.
Não é verdade que este ajustamento seja o contrário! Este Ministério, esta equipa governativa foi a primeira que tomou a sério a necessidade de criar cursos profissionais na rede de escolas públicas: criámos milhares de cursos e, hoje, temos milhares de alunos. Durante mais de 15 anos, este país manteve um subsegmento de escolas profissionais privadas ou semipúblicas, digamos assim, porque em muitos casos as autarquias são proprietárias destas instituições.
Durante 15 anos, o País viveu bem com isto, com numerus clausus que impediam o crescimento deste sistema, sem dispor de Orçamento do Estado, sem que o Estado verdadeiramente se responsabilizasse por este ensino. E pela primeira vez, quando há um Ministério que cria milhares de cursos, que tem milhares de novos alunos, que resolve esta situação, viabilizando as soluções e dando condições para que o segmento das escolas privadas que prestam um bom serviço público ao País continue a prestar um bom serviço público e para que as escolas públicas possam também ser envolvidas neste desafio, é dito que há uma confusão entre o público e o privado! Não há confusão nenhuma, se houver confusão é mesmo na forma como estas coisas podem ser lidas pelos Srs. Deputados.
Sobre a questão das actividades de enriquecimento curricular, também gostava de dizer-lhe, de novo, que o Ministério não esconde nem se desresponsabiliza, Sr.ª Deputada! Se há coisa que nos caracteriza é não nos desresponsabilizarmos, justamente porque o que fizemos foi responsabilizar-nos por darmos condições às entidades que têm, nos termos da lei, competências nesta matéria. As actividades de enriquecimento curricular são da competência das autarquias e aquilo que o Ministério fez foi responsabilizar-se por viabilizar a possibilidade de as autarquias promoverem este serviço na área da educação.
Sr. Deputado, também gostava de perceber, quando diz que estas actividades eram todas curriculares, onde é que as crianças já tinham inglês, por exemplo, no 1.º ciclo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Já constava da lei!
A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Deputados, tenha santa paciência, constava da lei como actividade de enriquecimento curricular! Peço ao Sr. Deputado que vá ver o currículo aprovado em 2001, onde encontrará que o ensino precoce das línguas no 1.º ciclo é uma actividade de enriquecimento curricular, uma actividade extra-curricular.
No que respeita aos custos, eles podem ser muito variados. O Sr. Secretário de Estado dará uma explicação sobre por que razão não há esse valor: o valor médio existe, mas ele é completamente opaco e, portanto, de nada lhe dirá se não tiver uma explicação sobre o que é que se passa.
Agradeço muito a informação sobre a escola em que ocorrem essas situações de selecção de alunos.
Sobre a questão dos critérios para a elaboração de rankings, gostaria muito de ver o Ministério da Educação fazer outras coisas, não preocupar-se com essa situação dos rankings que são feitos a partir das notas.
Aliás, se tivermos boa memória, algumas tentativas feitas nesse sentido foram bastante desastrosas.
Portanto, gostaria mesmo de ficar fora dessa responsabilidade e de produzir outro tipo de avaliações, porque o que penso que faz falta é promover, tal como estamos a fazer, um sistema sério de avaliação externa das escolas, que permita devolver à sociedade portuguesa um retrato das escolas, mas completo, sobre o
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esforço que essas escolas fazem para melhorar a qualidade do ensino, para promover os resultados escolares dos alunos, para promover a integração de todos os alunos e para responder aos desafios não apenas da escolarização mas também da integração dos alunos, porque é sempre disso que estamos a falar.
Portanto, o meu objectivo, e é nisso que temos vindo a trabalhar, é promover a avaliação externa das escolas para que, num espaço de tempo breve, o País possa ter esse retrato das nossas escolas públicas e não apenas os rankings que são publicados.
Dou ainda a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação para concluir.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação, agradeço que responda não de forma telegráfica, mas forma meteórica.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, só quero dizer, no que respeita à acção social escolar e aos compromissos tomados relativamente aos manuais escolares, que este ano já estão cumpridos quanto aos alunos do 6.º, 8.º e 9.º anos e que para o ano estarão cumpridos relativamente aos demais alunos do ensino básico.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado da Educação, agradeço que intervenha meteoricamente também.
O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, fá-lo-ei meteoricamente, só para indicar um dado ao Sr. Deputado do PCP relativamente às dificuldades de lidar com os números que estão no orçamento.
Queria dizer que a redução das verbas de pessoal, como se verificará, é de 0,4%, na relação entre a execução deste ano e a previsão do orçamento do próximo ano.
Sr. Deputado, como ali não estão previstas as verbas dos aumentos da função pública, todos perceberão (é uma conta elementar, porque estamos a comparar a verba de execução com a verba do orçamento e já se sabe que os aumentos da função pública serão superiores a 0,4%) que o valor real é um aumento e não uma diminuição.
Sr. Deputado, responderei ainda brevemente sobre a questão do custo por aluno.
A fórmula de financiamento, que está em vigor há muitos anos, para o ensino particular e cooperativo assenta nos pagamentos reais dos professores e não no pagamento por cabeça. E há uma grande amplitude tanto nas escolas privadas como nas públicas: basta ter professores mais velhos a leccionar numa determinada escola privada, por exemplo, com o dobro do tempo de serviço, para ter custos a duplicar em relação aos custos por aluno, e essa variabilidade é imensa quer nas escolas públicas quer nas escolas privadas.
É por isso que, como dizia a Sr.ª Ministra, o custo médio é opaco, porque a variabilidade, ou seja, o desvio padrão, se quisermos, é enorme, portanto não dá para ver esse valor. De qualquer modo, a comparação no range pode ser feita, mas em termos de custo médio não tem qualquer interesse e valor. O valor varia entre 3000 €/ano e 5000 €/ano, consoante as circunstâncias e o tipo de escolas e, como dizia, fundamentalmente a composição do corpo docente das escolas, que é a questão mais determinante no peso dos custos, quer no privado quer no público.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Ministra já me disse, por duas vezes, que lhe tinha escapado responder a uma questão concreta colocada pelo Sr. Deputado Pedro Duarte, por isso vou conceder-lhe 1 minuto, para dar essa resposta. A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, sobre as declarações do Presidente George Bush a propósito do ensino do português nos Estados Unidos (que, digo sinceramente, ainda não consegui ouvir, porque ontem estive fora todo o dia e hoje de manhã, vim a «correr» do Porto para aqui e apenas vi o foi relatado nos jornais), a avaliação que fiz foi a de que havia um enorme desconhecimento sobre o que é o ensino do Português nos Estados Unidos por parte do Presidente George Bush.
Quanto a este assunto, o que pensamos fazer é tratá-lo pelas vias normais, que são as diplomáticas, como tem que ser, evidentemente.
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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, chegámos ao final da nossa reunião. Em nome da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, cujo Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, esteve aqui presente, resta-me agradecer à Sr.ª Ministra da Educação e aos Srs. Secretários de Estado o seu contributo inestimável.
Está suspensa a reunião.
Eram 17 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados, vamos reiniciar a reunião.
Eram 18 horas e 5 minutos.
Nesta audição, contamos com a presença do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no âmbito das obrigações regimentais e constitucionais para debate, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2008, e esta é uma reunião conjunta da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, cujo Presidente está ao meu lado.
Em primeiro lugar, quero, naturalmente, dar as boas-vindas ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Bem-vindos ao Parlamento.
Sabemos, em traços gerais, a partir do relatório já apresentado pela Comissão de Educação e Ciência, que, basicamente, no que concerne à proposta de Orçamento do Estado para 2008, a despesa considerada do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior aponta para um valor da ordem de 1,5% do PIB — cerca de 2500 milhões de euros. Sabemos ainda que a principal aposta política plasmada no Orçamento para 2008 coloca a ênfase na iniciativa do compromisso com a ciência.
Conhecemos igualmente as propostas apresentadas, com consagração no Orçamento para 2008, no sentido da continuidade das políticas de parcerias na área da ciência e tecnologia, designadamente as parcerias com algumas universidades internacionais. Recordo, em concreto, Massachusetts Institute of Technology (MIT), University of Texas and Austin, Carnegie Mellon University, Harvard Medical School, entre outras, para citar apenas algumas.
Sabemos que esse programa de parcerias internacionais vai continuar, visto que uma das apostas prioritárias do Ministério que V. Ex.ª tutela é, de facto, a investigação e desenvolvimento, mas a concretização do Processo de Bolonha também é uma das apostas prioritárias do Ministério para o ano vindouro.
É, pois, com o objectivo de dilucidar estas questões em toda a sua plenitude, naturalmente com interpretações díspares, como é, aliás, característico do pluralismo partidário, a base democrática desta Casa e da dialéctica parlamentar, que vamos iniciar o debate, que terá o seguinte modus eperandi: o Sr. Ministro fará uma primeira introdução, com a duração de 10-15 minutos, abordando os temas prioritários que entender oportunos elencar relativamente à aposta do seu Ministério para 2008; a seguir, teremos uma primeira ronda de perguntas, dispondo cada grupo parlamentar de 5 minutos, e o Sr. ministro responderá directamente a cada grupo parlamentar; depois, haverá uma segunda e última ronda, de 2 minutos a cada grupo parlamentar, em que as respostas serão agrupadas em bloco e a que o Sr. Ministro responderá de uma só vez.
Solicito aos Srs. Deputados o respeito escrupuloso pelo Regimento, designadamente no que concerne às figuras de interpelação à Mesa, protesto ou defesa da honra, que, muitas vezes, como sabem, são usadas de forma ínvia e nem sempre legítima, dando origem a intervenções adicionais que não cabem nem se subsumem à alçada ou à égide concreta, quer na letra quer no espírito, das disposições regimentais.
Posto isto, Sr. Ministro, concedo-lhe a palavra para, então, fazer a sua introdução.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado por me acolherem nesta sala, com menos formalismo do que a sala do Plenário, onde habitualmente nos encontramos nesta altura do ano.
Farei uma primeira intervenção, cingindo-me, tanto quanto possível, a um texto escrito para ser breve e não me alongar mais do que os 10 minutos que estão previstos.
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Fizemos chegar à Comissão, em devido tempo, não apenas quadros comparativos detalhados relativos ao orçamento da responsabilidade do Ministério, como é habitual, mas também notas de síntese relativamente às áreas de intervenção do Ministério, incluindo a versão provisória preparada pelo Observatório da Ciência e Tecnologia do orçamento de ciência e tecnologia para 2008, nos termos da lei.
Presumo, portanto, que todas essas notas são do conhecimento dos Srs. Deputados e lhes chegaram a tempo, no sentido de elucidar grande parte dos problemas. Não repetirei, portanto, o que está escrito nessas notas.
Gostaria de salientar na apresentação deste orçamento que, pela primeira vez na história portuguesa, estimamos que seja a primeira vez que o orçamento de ciência e tecnologia nacional, que envolve todas as fontes do Orçamento do Estado, de todos os ministérios (e não significa que a execução seja no interior do Estado, aliás, uma grande parte será execução feita nas empresas), ultrapasse 1% do PIB e 3% do Orçamento do Estado. E esse facto enche-nos de satisfação e, certamente, tem gerado satisfação em toda a Câmara.
No que respeita ao Ministério da Ciência e Tecnologia, são nossas prioridades para 2008, como resulta claro do orçamento: continuar a aposta na qualidade da formação avançada de recursos humanos; reforçar o contributo do Estado para a expansão do emprego científico no sector público e no sector privado; após uma avaliação internacional que está em curso (não extraordinária, mas uma avaliação que ocorre de três em três anos em todo o sistema científico, como previsto e anunciado), redimensionar toda a rede de instituições científicas nacionais, em particular eliminando o financiamento público às instituições que tenham comportamento e produção científica abaixo do que é considerado exigível; criar, pela primeira vez, novas instituições científicas interdisciplinares em Portugal, sob a forma de consórcios de investigação e desenvolvimento, que estão identificadas neste momento a partir do trabalho que foi feito no sector público de investigação — as áreas dos oceanos, a área dos riscos, a área da biologia e da biomedicina, entre outras, e ainda a criação do laboratório internacional de vulcanologia dos Açores.
O orçamento de ciência e tecnologia para 2008 permite o lançamento concreto destas iniciativas. Tal como prevemos ter, pela primeira vez — já o preparamos há muitos anos —, condições concretas para a criação de redes temáticas de investigação e desenvolvimento, em associação, sempre que possível, com parcerias e redes internacionais, designadamente no âmbito europeu.
2008 será o ano do lançamento da construção das instalações do Laboratório Internacional Ibérico de Nanotecnologia. Os trabalhos de arquitectura e de concepção estão em bom ritmo e a comissão instaladora espera receber, antes do final do ano, os trabalhos e os relatórios completos de duas equipas internacionais especializadas na criação de laboratórios de nanotecnologia que, em competição, estão a proceder a esse trabalho, para que, durante o ano de 2008 (na primeira parte do ano), seja possível lançar os concursos públicos internacionais necessários para a construção.
Por outro lado, gostaria de sublinhar, porque é uma área que cruza a ciência e tecnologia com a área da Sociedade de Informação — não serei exaustivo, naturalmente —, que vamos investir selectivamente na área de conteúdos digitais de interesse público e de base científica, designadamente no campo da informação biomédica referenciada e reconhecida, disponibilizada de uma forma universal.
No que respeita ao ensino superior, é do conhecimento de todos que está em curso uma profunda reforma que visa a sua qualificação em termos que são hoje de uma enorme exigência e competição internacionais.
Em 2008, encerra-se a adaptação a Bolonha do sistema de graus e diplomas, é revista a rede de escolas e faculdades públicas (e é revista no âmbito da elaboração dos estatutos e da revisão que cada uma das universidades e politécnicos fará das suas unidades orgânicas) e executa-se a reforma legislativa de todo o sistema, que, como sabem, prevê mais autonomia mas também mais responsabilidade para as instituições, intervenção externa e ligação à sociedade, no respeito, naturalmente, pelo auto-governo das instituições, e garantias de qualificação do corpo docente que sejam iguais no ensino público e no ensino privado.
Em 2008, expande-se a oferta de cursos de especialização tecnológica em instituições de ensino superior.
Até ao momento, estão registados cerca de 180 cursos de especialização tecnológica que entrarão em funcionamento durante o ano que vem. E também se expande a oferta a maiores de 23 anos, crescendo pela primeira vez, de uma forma muito significativa, o número de estudantes em primeira inscrição, como resultado do concurso nacional, que procura o ensino superior e é colocado nas suas instituições. Além disso, foi aumentada a fracção dos colocados em cursos tecnológicos e em ciências da natureza, tradicionalmente uma área em défice e que, neste momento, está de novo em expansão.
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Em 2008, e no quadro deste orçamento, abrem-se as actividades de investigação científica, designadamente dos centros de investigação, aos estudantes de licenciatura e estimular-se-ão, por essa via, as reformas curriculares que sejam necessárias nas instituições. Pela primeira vez, criaremos mecanismos de acesso aos centros de investigação dos estudantes de licenciatura.
Também em 2008, será aberto o ensino superior à frequência de disciplinas isoladas por estudantes livres e o acesso ao ensino superior a estudantes a tempo parcial, será revista a condição de estagiários e o acesso à profissão de jovens diplomados.
Ainda durante o ano de 2008, tal como estava previsto no regime jurídico das instituições do ensino superior, se regulará o ensino à distância e o ensino artístico.
Por último e após a entrada em vigor do novo regime jurídico de vínculos e carreiras da Administração Pública, serão revistos, em 2008, os actuais estatutos da carreira docente do ensino superior, removendo-se desses estatutos os principais pontos (que são hoje razoavelmente consensuais) de entrave à qualidade das instituições e à sua abertura à entrada para as instituições e à progressão de quadros mais qualificados nas instituições, que hoje, em muitos aspectos, se encontram dificultados pelos actuais estatutos.
Esta proposta de orçamento para 2008, Sr. Presidente, consagra, mais uma vez, o cumprimento do Programa do Governo.
Reforça-se em 3,2% o orçamento total do ensino superior (4,2% em funcionamento), que atinge 1740 milhões de euros inscritos nas próprias instituições. Isto representa um pouco mais de 1% do PIB, a que se deve, naturalmente, acrescentar o pagamento das verbas horizontais que passaram a ser cobertas pelo orçamento da ciência e tecnologia – refiro-me à rede científica nacional, à biblioteca digital, etc.
Actualiza-se em 2,7% o montante das bolsas de acção social no País.
Cresce 15% o investimento nacional em ciência e tecnologia e em cerca de 10% o investimento total, mesmo sem considerarmos os investimentos do QREN, que não estão aí inscritos.
Cresce 9,3% o investimento nacional em Sociedade de Informação, não se inscrevendo igualmente neste orçamento, no cômputo total, as verbas que serão provenientes do QREN.
Reforçam-se em 11,4% as verbas destinadas à promoção da cultura científica e tecnológica e prevê-se, em 2008 e 2009 — as datas exactas da abertura dependerão do avançar dos trabalhos —, a abertura de mais seis Centros Ciência Viva que estão em preparação.
Assim, este orçamento aposta, de novo, na qualificação das pessoas, na abertura do ensino superior a novas camadas sociais e no reforço de instituições científicas de nível internacional, tal como na expansão das relações da ciência com a sociedade.
Isto é, em resumo e muito brevemente, o que gostaria de acrescentar aos elementos que as Sr.as e os Srs. Deputados já têm em vosso poder.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Os meus agradecimentos pelo rigor na fruição do tempo que lhe foi concedido e faço votos, naturalmente, que esse rigor na utilização do tempo «faça escola» e doutrina nas intervenções dos Srs. Deputados que se vão seguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, cumprimento o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado.
Sr. Ministro, gostaria de começar por associar-me às suas palavras de regozijo pelo facto de, no que diz respeito à despesa dedicada às matérias científicas, à investigação científica e tecnológica, podermos afirmar que ela representa 1% do PIB. Penso que é uma marca interessante. Portanto, não me referindo, evidentemente, à eficiência desse investimento mas, sim, ao número em si, fica este registo.
Gostaria, contudo, como compreenderá, de lhe colocar algumas questões que têm especificamente a ver com o ensino superior, porque temos muito pouco tempo e parece-me que será o fundamental daquilo que nos traz mais dúvidas neste momento, até porque tivemos uma reunião, há uns dias atrás, há dois ou três dias atrás, com o Conselho de Reitores das Universidades Portugueses, que eu tenho de qualificar de muito preocupante.
A expressão mais ouvida naquela reunião foi «estrangulamento das nossas instituições de ensino superior» e isso para nós é particularmente preocupante. Temos números que nos dizem que a média da União Europeia — não me estou sequer a referir aos países mais desenvolvidos ou, pelo menos, àqueles que dedicam mais atenção a este tipo de matérias do ensino superior — dedica cerca de 1,2% do PIB às matérias do ensino
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superior. Ora, nós estamos em 0,7%, portanto praticamente a meio. E estes números são-nos dados, nomeadamente, pelas instituições, o que, na minha opinião, é algo que deve ser motivo de muita preocupação para todos nós, particularmente num momento em que, como V. Ex.ª tem afirmado, se vive um momento decisivo do ponto de vista da internacionalização do ensino superior, de um espaço europeu de ensino superior, em que a competitividade, evidentemente, se vai passar num registo que não é só nacional, como todos sabemos.
Portanto, a minha primeira pergunta é se partimos em igualdade de oportunidades perante estas instituições e se não acha que o esforço nacional, neste momento decisivo, deveria ser completamente diferente, nomeadamente no financiamento das nossas instituições de ensino superior.
Uma segunda questão muito concreta — e vou colocar-lhe questões concretas, pedindo-lhe, Sr. Ministro, que, de facto, também seja rigoroso a responder — tem a ver com o aumento de desconto previsto para a Caixa Geral de Aposentações por parte das instituições de ensino superior. No ano passado fomos surpreendidos com a decisão do Governo de onerar as nossas universidades e politécnicos com o encargo adicional para a Caixa Geral de Aposentações, no valor de 7,5%, e temos notícias de que esta percentagem aumenta para 11%. Penso que é este o número correcto.
No ano passado, o Governo, numa fase posterior, encontrou uma solução, permitindo a utilização dos saldos das instituições, por isso pergunto-lhe qual a resposta para este ano, porque, senão, este será mais um encargo que vai associar-se ao subfinanciamento que já é reclamado por parte das nossas instituições de ensino superior.
A terceira pergunta diz respeito aos protocolos internacionais com instituições, nomeadamente, norteamericanas.
Sr. Ministro, por princípio, como é evidente, não temos nada contra estes protocolos, bem pelo contrário, temos tudo a favor. Também não temos nada contra o facto de haver um esforço público do Governo português em incentivar este tipo de protocolos, nomeadamente dedicando algum valor do orçamento do Estado para este fim. Mas, Sr. Ministro, não lhe parece desproporcionado que, num momento em que há, de facto, cortes nas transferências para as instituições de ensino superior, em que sentimos um absoluto e claro subfinanciamento das nossas instituições de ensino superior, haja um esforço tão desproporcionado financiando instituições norte-americanas? Sabemos — e, por exemplo, o reitor da Universidade Clássica de Lisboa disse-o na abertura deste ano lectivo — que será maior o valor gasto com algumas instituições norte-americanas por parte deste Orçamento do Estado do que com muitas universidades e politécnicos portugueses. Parece-lhe proporcional? Há pouco, brincava, mas, agora, para aliviar um bocadinho a carga, diria que este Governo está, de facto, a ser muito «simpatético» com o Presidente Bush, porque está a financiar as instituições superiores norteamericanas numa escala superior à que financia as instituições superiores nacionais. Parece-lhe proporcional? Isto sem estar a aferir aquilo que é um princípio óbvio de haver interligação com essas instituições, e temos todo o gosto e todo o interesse em poder associar-nos a esta intenção do Governo.
Quarta questão: o Sr. Ministro referiu-se à revisão do Estatuto da Carreira Docente, que, como é evidente, tem implicações brutais do ponto de vista da gestão orçamental de cada uma das instituições de ensino superior, como sabemos, mas isso já foi prometido ao longo dos últimos meses e, nomeadamente, no Orçamento do Estado do ano passado. Não sei se já tem essa calendarização feita, mas consegue concretizar do ponto de vista temporal quando é que vamos poder ter uma proposta concreta? A quinta questão é se a lei do financiamento vai ou não ser alterada. Temos ouvido — nomeadamente, ainda esta semana, o Partido Socialista disse-o e nós também concordamos com isso — que vale a pena, eventualmente, repensar o modelo de financiamento do ensino superior. Este Governo vai fazer alguma coisa nesse sentido ou não, porque isto, como é sabido, tem impacto orçamental evidente.
A sexta questão tem a ver com a divulgação da origem dos licenciados no desemprego. Esta é uma medida, como o Sr. Ministro se recordará, que já foi prometida. O Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro prometeram aqui no Parlamento, sob palavra de honra, que, ainda na Primavera deste ano de 2007, teríamos esses números cá fora, mas a verdade que não os temos. Esta semana ou na semana passada, foi divulgado um número geral mas que não tem a ver com os cursos especificamente e, portanto, a relevância dessa informação continua a ser altamente reduzida.
Como sabe, o PSD apresentou um projecto de resolução já há muito tempo, em Janeiro de 2007, para este efeito, que foi chumbado pelo Partido Socialista, mas eu julgo que esta é uma matéria que tem relevância no sentido da eficiência do nosso investimento, porque, se calhar, estamos a gastar muito dinheiro com áreas de
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intervenção que não o mereceriam. Por isso, esta pode ser uma informação, naturalmente associada a outras, muito relevante.
Uma outra questão tem a ver com a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, que irá entrar em vigor em 2008, como se espera. Pergunto-lhe: vamos ou não ter avaliação de cursos em 2008, como é compromisso do Governo? Se sim, quanto é que isso vai custar a cada uma das instituições, ou quanto é que a avaliação de cada curso vai custar às instituições? Porque essa avaliação, ao que se sabe, será paga obrigatoriamente num regime de monopólio e, portanto, com o preço a ser acordado, não se sabe muito bem com que critérios, por parte da tal agência de direito privado, o que pode ter um impacto muito complicado em termos do orçamento de cada uma das instituições, associado a todas as outras dificuldades que já aqui referi.
Portanto, é fundamental que o Sr. Ministro aqui nos dê uma informação muito clara sobre quanto é que isso vai custar às nossas instituições de ensino superior.
Por último, quero dizer-lhe que todas estas dificuldades que estão a verificar-se hoje nas nossas instituições de ensino superior, e que pudemos auscultar na audiência com o CRUP, é algo recorrente que, ao longo dos últimos anos e de forma muito veemente no ano passado, temos vindo a assistir. Isto para lhe dizer que, do ponto de vista do PSD, nos parece particularmente crítica esta circunstância de, anualmente, as nossas universidades e os nossos politécnicos viverem com este drama de estarem a «negociar à peça», ponto a ponto, e à espera do mês de Outubro ou Novembro para poderem saber como é que vão programar o próximo ano.
Parecia-nos, por isso, fundamental que, num processo de autonomia das instituições do ensino superior, que nós defendemos, estas instituições pudessem ter outra capacidade de visão estratégica ou de planeamento estratégico, nomeadamente com orçamentos plurianuais. Ora, julgo que a maioria socialista, e este Governo, naturalmente, não permitiram isso com a aprovação do regime jurídico do ensino superior, nomeadamente reprovando o projecto de lei de autonomia do PSD. Isto vai fazer com que, mais uma vez, eventualmente talvez haja algumas que, através do regime fundacional, possam ter esta possibilidade, mas a grande maioria fique de fora. Portanto, julgo que estamos agora a começar a ver no terreno a concretização de um problema para o qual o PSD alertou, que é termos um ensino superior a duas velocidades: uma minoria acarinhada pelo Sr.
Ministro, que lhes dará esta possibilidade através da criação de uma fundação, e todas as outras que, naturalmente, ficarão para trás, porque não têm capacidade de prospectivar assim o futuro das suas instituições.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, a única dificuldade aqui é que podem fazer-se 50 perguntas em cinco minutos, mas é difícil dar resposta a 50 perguntas em 5 minutos.
Portanto, há aqui um problema de gestão de tempo. A igualdade do tempo não é propriamente a igualdade no objecto do tempo.
O Sr. Presidente: — Naturalmente que contamos também com a proficiência do Sr. Ministro para gerir essa dificuldade.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado Pedro Duarte, muito obrigado pelas suas palavras. Regozijo-me pelo seu regozijo aqui expresso de, finalmente, o orçamento da ciência, tecnologia e ensino superior ter atingido 1% do produto interno bruto, mas gostaria de passar rapidamente às suas questões, pela ordem em que as colocou e que eu anotei, relativamente ao ensino superior.
Sr. Deputado, há uma questão de fundo e, depois, há uma série de questões de natureza factual e técnica.
A questão de fundo é esta: eu gostaria, sem lhe devolver as perguntas, de lhe perguntar se o Sr. Deputado e a sua bancada estão ou não disponíveis para apoiar o Governo na reforma das instituições ineficientes. Porque é muito mais fácil e muito mais popular servirmos de amplificador às queixas, mas não é fácil, e exige um grande consenso político, conseguirmos, de uma forma duradoura e não apenas num ou noutro ano, reformar instituições que manifestam, desde há muitos anos, preocupantíssimos indicadores de ineficiência. Porquê? Porque essas instituições estão, de facto, a absorver recursos que são necessários a outras instituições.
O orçamento do ensino superior é um orçamento que, nas transferências directas previstas no orçamento para as instituições do ensino superior, se baseia num mecanismo distributivo absolutamente transparente e definido à partida, que permite, aliás, o planeamento plurianual das instituições. As instituições podem fazer, de
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um ano para os outros, exactamente o seu planeamento. Esse planeamento já hoje existe. Não há qualquer surpresa nesta matéria.
Portanto, há um «envelope» e este «envelope» vai evoluindo ao longo dos anos. Pode haver dúvidas quanto à discussão se estamos em mais 2%, em mais 3% ou em menos 1% do «envelope» global, mas isso pouca afecta cada uma das instituições. O elemento fundamental está nas mãos da instituição, tem a ver com a eficiência da instituição, com o número de estudantes da instituição, com o padrão de custos da instituição, etc.
Isso é perfeitamente definido. É assim há muitos anos e é bom que seja assim.
Agora, o que é que temos? Nós temos instituições de ensino superior em Portugal com indicadores de desempenho e indicadores de despesa que são manifestamente inaceitáveis.
É inaceitável termos instituições de ensino superior que têm mais de 30% ou de 40% de docentes por aluno do que todas as outras, há muitos anos. Isto significa que essas outras estão a pagar, de facto, a ineficiência destas, porque o orçamento é distributivo. Dir-se-á: «Não! Estavam bem, mas, depois, passaram a estar mal, porque o número de alunos baixou!». Ora, nós vamos ver os números e isso não é verdade. Em muitos casos, aumentou o número de contínuos e de funcionários não docentes num período em que estava a diminuir o número de estudantes. É razoável? Queremos defender a autonomia universitária, mas também entendemos que temos de defender o interesse público. E defender o interesse público é garantir que este mecanismo de distribuição objectiva das verbas em função de critérios objectivos se mantenha.
No fim do «jogo», quando a distribuição está feita, um conjunto de instituições vem dizer: «Ah! Não! Mas agora nós temos dificuldades!» Para começar, essa distribuição já está feita com critérios de coesão, ou seja, com critérios que permitem que uma instituição não baixe repentinamente, de um ano para o outro, e tenha tempo para acomodar as mudanças. Mas é já em cima desse critério de coesão que ainda se diz: «Bem! Mas, agora, é preciso ainda mais!» Existem instituições que estão a funcionar 40% ou 50% acima da fórmula que com elas todas foi acordada. E não foi uma fórmula inventada pelo Governo, foi acordada com as instituições.
Portanto, o problema neste momento é simples, Sr. Deputado: precisamos de reformar essas instituições e precisamos que, em nome do interesse público, a Câmara e o Governo estejam de acordo em que é indispensável reformar essas instituições e que lhe demos uma mensagem muito clara e não uma mensagem, cada vez que se chega à discussão concreta do Orçamento do Estado e nas vésperas da sua aprovação, de que o que é preciso é atirar mais dinheiro para cima das instituições ineficientes.
Vamos, agora, ver um outro aspecto que o Sr. Deputado levantou, que é o orçamento do ensino superior. O orçamento do ensino superior que se compara em termos da União Europeia é o orçamento global do ensino superior, são as verbas inscritas no Orçamento do Estado para o ensino superior.
O Sr. Pedro Duarte (PSD); — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Tenho muito gosto em dar mais tempo ao Sr. Deputado, mas o Sr. Presidente não me deixa.
Diz-se que o valor médio do orçamento das instituições do ensino superior na Europa é de 1,2% do produto interno bruto aproximadamente. É verdade! Quanto ç que tem sido o orçamento» Não estamos a falar das verbas transferidas para as instituições pela fórmula, estamos a falar da totalidade das verbas inscritas no orçamento.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador).
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas estes são os números que estão publicados internacionalmente, com os quais estamos a comparar-nos. Não se deve, quando falamos do estrangeiro, considerar os orçamentos todos e, quando estamos em Portugal, considerar apenas uma parte desse orçamento. Isso parece-me pouco científico, Sr. Deputado.
Portanto, o que é que se passa? O que se passa é que, de uma forma sistemática, desde 2002 — tenho aqui os números —, os orçamentos iniciais das instituições de ensino superior público em Portugal são inferiores à execução. Por exemplo, 1,470 milhões de euros — execução: 1,600 milhões de euros; 1,600 milhões de
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euros — execução: 1,670 milhões de euros, etc. Portanto, a relação entre executado e orçamentado oscila entre 12%, 2%, 4% e 6% mais.
Mas vamos aos orçamentos iniciais apenas. Isto é só para não sobrar dúvidas, porque poderia imaginar-se o contrário, que os orçamentos tinham lá as receitas empoladas, as quais, depois, nunca eram cobradas. É ao contrário: as receitas cobradas são sempre superiores às estimadas no Orçamento.
Mas vamos apenas à parte menor, ao orçamento inicial. Pois os orçamentos iniciais das instituições têm vindo a subir, sendo que, neste momento, os orçamentos do ensino superior em Portugal já estão em 1742,328 milhões de euros. Sr. Deputado, isto não é 0,7% do PIB, representa, apenas pelo orçamento inicial — e as estatísticas internacionais publicadas não se referem aos orçamentos iniciais mas, sim, ao executado nas instituições —, pelo menos, um vírgula qualquer coisa porcento do produto interno bruto.
Se verificarmos, nos outros anos, com a diferença para o executado estamos em 1,1%. Se lhe somarmos as despesas do ensino superior, que são consideradas em todos os países e que são pagas pelo orçamento da ciência e tecnologia, chegamos praticamente a 1,2%. Tenho todo o gosto, Sr. Deputado, em transmitir estes números a V. Ex.ª, tal como já os transmiti, há muitos anos, ao Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, que os conhecem perfeitamente.
Fala o Sr. Deputado em descontos para a Caixa Geral de aposentações. Bem, mas já no ano passado estava na lei do Orçamento (não foi nenhuma invenção de última hora), e continua a estar este ano, que os saldos não executáveis das instituições — porque o Sr. Deputado está, com certeza, a favor, da regra do equilíbrio orçamental — podem ser utilizados para os saldos. E já trabalhámos com as instituições do ensino superior politécnicas e universitárias no sentido de verificar onde é que poderá haver alguma discrepância entre o necessário para cobrir isso e os saldos. E também já garantimos a essas instituições que terão os reforços necessários, tal como este ano. Terão os reforços necessários se os saldos e o orçamento não chegarem para cobrir essas necessidades.
Quanto aos protocolos com instituições internacionais, Sr. Deputado, até já o Sr. Reitor da Universidade de Lisboa se veio retractar nos jornais. Porém, acho absolutamente extraordinário que uma verba que é de cerca de 1% (1,1% ou 1,2%) do total das verbas que o Estado entrega para o ensino superior seja considerado muito nesta matéria. Estamos a falar de metade das verbas que o Estado paga como quotas a organismos internacionais, estamos a falar de cerca de 15 milhões de euros/ano, portanto, uma verba que é da ordem de 1% ou 1,5% (não é mais de 1,5%) das verbas totais que o Estado coloca no ensino superior. É muito para uma estratégia de internacionalização?! Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, mas não é, com certeza, muito.
E para esses 15 milhões de euros, as instituições nacionais que participam nesse acordo recebem do orçamento nacional da ciência outros 15 milhões de euros nacionais, que acrescentam aos seus orçamentos próprios. É pouco? Não é pouco, Sr. Deputado! Portanto, parece-me difícil que o Sr. Deputado, legitimamente, possa vir a alinhar na demagogia um bocadinho populista de reitores que vêm dizer «ah, mas essas verbas internacionais deviam é ser gastas!» Ainda me recordo, quando aderimos pela primeira vez aos organismos científicos internacionais, de ter visto responsáveis universitários, responsáveis científicos, em Portugal, escreverem ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, que lá deve ter essas cartas em arquivo, a dizer que isso era a desgraça nacional, porque, obviamente, em percentagem, aquilo era muito relativamente ao que recebiam.
Parece-lhe muito 1%, Sr. Deputado?!
Protestos do Deputado do PSD Pedro Duarte.
É, com certeza, muito relativamente a uma instituição qualquer! Pois, com certeza que encontrará! Por essa via, Sr. Deputado, Portugal nem devia estar nas Nações Unidas. Há, com certeza, alguma instituição que recebe menos do que a quota portuguesa para as Nações Unidas, não tenho a mais pequena dúvida.
Sr. Presidente, isto desconta no tempo do PSD, não desconta?
Risos.
O Sr. Presidente: — Nós aqui somos rigorosos, mas não chegamos a esse ponto, Sr. Ministro!
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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas há uma questão de afectação do tempo! Isto é tempo do PSD!
O Sr. Presidente: — Naturalmente, Sr. Ministro, há aqui sempre alguma moderação e algum equilíbrio, mas o Sr. Ministro também está habituado à dialéctica parlamentar, sabe que estes apartes são normais e, portanto, não pode levá-los à letra, tem de continuar a sua veia discursiva sem deixar incomodar-se por isso.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Então, peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, mas deixarei de responder aos seus apartes e passarei a cumprir as ordens do Sr. Presidente, quaisquer que sejam as suas questões intempestivas.
No que diz respeito à revisão do Estatuto da Carreira Docente, consideramos que, neste momento, depois de se ter terminado na Assembleia a revisão da legislação sobre vínculos e carreiras, estamos em condições de fazer essa revisão. Insisto que o nosso objectivo não é fazer o novo estatuto da careira docente universitária e politécnica, é fazer a revisão — e sempre o anunciámos — desse estatuto, corrigindo dos estatutos das carreiras docentes universitária e politécnica as anomalias que hoje são consensualmente vistas como devendo ser objecto de revisão.
No que diz respeito à lei de financiamento, já afirmei várias vezes no Parlamento que não é intenção do Governo, durante esta Legislatura, proceder à sua revisão, para além das alterações que foram necessárias por força do Processo de Bolonha e que visavam proteger os estudantes relativamente a certos segundos ciclos indispensáveis para fins profissionais, que, como sabe, pela lei de financiamento anterior, eram totalmente livres, em que as propinas podiam ser fixadas livremente pelas instituições.
Sr. Deputado, os dados dos licenciados no desemprego estão disponíveis há mais de um mês no site do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais. É um volume de 60 ou 70 páginas onde são referidos os cursos. A única coisa que lá não encontra ainda, de toda a informação, são as instituições exactas de cada um dos cursos. Porquê? Já o expliquei, Sr. Deputado. Porque é preciso «varrer» completamente toda a série dos inscritos nos centros de emprego para que os inscritos, no período normal em que vão refazer os seus dados, preencham esse campo, que não tinham preenchido inicialmente, como é natural.
Posso garantir-lhe que quando isso estiver feito será, naturalmente, divulgado. Mas já hoje tem lá informação que não estava disponível antes e que está à consideração do Sr. Deputado.
E deve fazer-nos também a justiça de que não fizemos nenhuma demagogia à volta daqueles números.
Aqueles são números de interpretação complexa, na medida em que o facto de, por vezes, numa determinada área disciplinar, haver uma percentagem maior de desempregados, relativamente ao total, não significa uma percentagem maior naquela área, significa pura e simplesmente que há mais pessoas com aquela formação naquele momento.
Mas podemos regozijar-nos com o seguinte: neste momento, continua a ser verdade, e é cada vez mais verdade, que ter um diploma do ensino superior é um passaporte para o emprego. Quem tem um diploma do ensino superior espera, em média, metade do tempo para arranjar emprego do que quem não o tem e fica no desemprego muito menos tempo do que quem não o tem, com as mesmas condições aproximadas de idade, nas mesmas regiões, etc. Ou seja, continua a ser verdade que as qualificações são, de facto, um passaporte para o emprego.
Sobre as outras questões que levantou, Sr. Deputado, julgo que o mais simples, visto que já ultrapassei em muito o tempo de que dispunha, era responder-lhes aquando das respostas à próxima ronda de perguntas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, constatámos que o Sr. Deputado Pedro Duarte gastou aproximadamente 0,5% da sua afectação de tempo — utilizando as suas expressões — para falar do tal 1% do PIB. Gostaria de gastar um pouco mais de percentagem do meu tempo para falar do tal 1% do PIB que está hoje consignado ao investimento em actividades de ciência, tecnologia e inovação.
Gostaria que o Sr. Ministro se pronunciasse acerca da mensagem política e estratégica da afectação de recursos financeiros que hoje atingem essa meta mítica de 1% do PIB e que se traduzem em cerca de 3% do valor do Orçamento do Estado. Portanto, gostaria que dissesse que estratégia está contida nesta aposta muito
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significativa numa área que, na nossa opinião, constrói a última grande infra-estrutura de que Portugal hoje necessita e que ainda não tem, que é, de facto, o conhecimento, a tecnologia, a inovação e a criatividade, que poderá fazer-nos perseguir um modelo de desenvolvimento económico que se baseie nesse conhecimento, o qual — repito porque acho que é muito importante — é a infra-estrutura que nos falta construir.
No seguimento desta dimensão e desta aposta estratégica, gostaria que o Sr. Ministro se referisse, se fosse possível, à implicação que isto tem nos financiamentos das próprias instituições de ensino superior.
É que se falamos de duas fontes de financiamento que se inscrevem em sede deste Orçamento do Estado, a ciência e tecnologia, por um lado, e o ensino superior, por outro, não podemos esquecer-nos de que as instituições do ensino superior recebem financiamento destas duas fontes e não podemos dissociar esta visão integrada, nas próprias instituições, dos recursos que lá são colocados através destas duas fontes. E quando pensamos assim estamos a pensar inevitavelmente no financiamento dessas instituições e numa mudança de atenção e preocupação com as actividades que, de facto, interessa desenvolver em cada uma dessas instituições.
E digo isto porque o Sr. Ministro sabe muito melhor do que nós — e todos o sabemos — que a generalidade dos centros de investigação hoje existentes no nosso país se encontram localizados, ou com elas têm parcerias muito activas, nas nossas instituições de ensino superior, que por isso mesmo têm nessa actividade científica – que, aliás, está inscrita na sua missão de serviço público – uma importante, crescente e fortíssima fonte de financiamento que hoje vê reforçada, em sede do Orçamento do Estado, esta componente para o tal número mítico de 1%.
Sabemos que é um número que ainda está aquém daquele que, hoje, existe nos noutros países com os quais nos queremos comparar, particularmente naqueles que fazem parte da União Europeia e que se encontram num patamar de desenvolvimento económico e social mais avançado do que o nosso, mas pediria, Sr.
Ministro, que nos dissesse qual era o patamar que encontrou quando iniciou funções neste Governo constitucional, para termos uma ideia da evolução que se registou nesta área até ao Orçamento do Estado para 2008.
Uma outra questão que gostaria de colocar-lhe, Sr. Ministro, e que decorre também um pouco desta matéria, é no sentido de saber se haverá alguma universidade no nosso país que não tenha na investigação, no trabalho científico e nas actividades científicas de pesquisa uma importante fonte de financiamento. Isto para termos uma ideia se algumas das universidades mais dinâmicas, mais activas, mais ligadas ao mundo da economia e ao mundo da sociedade não encontram aqui uma importantíssima fonte de financiamento, através dos serviços que prestam à sociedade, das transferências de conhecimento e de tecnologia, que tanta falta fazem ao nosso tecido empresarial e à nossa sociedade civil.
Uma outra questão, Sr. Ministro, prende-se com um dos principais resultados, uma das principais evidências do grau de consecução das políticas educativas nesta área — o aumento do número de alunos no ensino superior.
Gostava que o Sr. Ministro nos elucidasse acerca do real aumento de alunos no ensino superior que se verificou nos últimos dois anos. Já referiu aqui de forma qualitativa a este acréscimo, mas também gostaria de saber se se perspectiva que para o próximo ano lectivo, que engloba parte do ano de 2008, se mantenha esta aposta decisiva no aumento das entradas dos alunos no ensino superior e também a aposta decisiva no aumento do sucesso escolar, ou seja no combate ao insucesso escolar nas instituições, e, por consequência, no aumento do número de diplomados, quer ao nível de licenciatura quer ao nível de mestrado e de doutoramento.
Uma outra pergunta mais concreta, com menor magnitude mas também muito importante, prende-se com o Programa ERASMUS.
Como V. Ex.ª sabe, celebram-se este ano os 20 anos do Programa ERASMUS com todos os benefícios de internacionalização e de mobilidade que a participação de Portugal e das suas instituições têm promovido no seio da nossa sociedade, não só pelos estudantes e professores portugueses que têm tido a oportunidade de se deslocar ao estrangeiro, particularmente a países da União Europeia, para neles fazerem alguma parte da sua formação mas, principalmente, pela chegada ao nosso país de milhares e milhares de estudantes que contactam com as nossas instituições de ensino superior, que dão um contributo muito precioso para a sua divulgação e que contribuem de forma decisiva para a sua internacionalização. Está, ou não, previsto, Sr.
Ministro, o alargamento destas possibilidades de mobilidade a estudantes bolseiros para que estes também estejam em igualdade de circunstâncias para se poderem candidatar ao Programa ERASMUS?
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Uma outra questão que coloco ao Sr. Ministro tem a ver com a existência, e em que situação é que esta existência ocorre, de bolsas de estudo, não só para os primeiros ciclos como para os segundos ciclos, conducente ao grau de mestrado. Qual é a informação que o Sr. Ministro nos pode dar acerca desta realidade das bolsas de estudo destinadas a estudantes de 2.º ciclo nas universidades e nos politécnicos portugueses? Uma outra questão, também muito concreta, tem a ver com uma das preocupações que nos foi apresentada na audição que tivemos oportunidade de realizar com este grupo, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, que é a do impacto, que, previsivelmente, será de 2,1% — mas ainda não sabemos porque as negociações ainda não terminaram —, que os aumentos salariais irão ter no próximo ano nos orçamentos de cada instituição. Há ou não impacto destes aumentos salariais, sejam eles quais forem, nos orçamentos de cada uma das instituições? Por último, vou colocar uma pergunta sobre a internacionalização do nosso sistema. O nosso grau de internacionalização, com as apostas que já aqui hoje foram referidas, estão a gerar os resultados esperados? Eu sei que houve uma avaliação intercalar de todo este processo de parcerias que foi estabelecido há um ano, e gostaria de saber quais são esses resultados, as perspectivas que eles nos indicam para o ano civil de 2008 e as consequências que têm ao nível orçamental.
Fico por aqui e agradeço a oportunidade.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, começo por responder às questões relativas ao orçamento para a ciência e tecnologia e, depois, passarei às questões sobre o ensino superior.
Tenho aqui este quadro da evolução do orçamento para a ciência e tecnologia, que não posso projectar facilmente, mas ele é relativamente visível, e, como se pode ver, a evolução a preços correntes e a preços constantes terá a mesma curva, mas um pouco menos acentuada, naturalmente, ao longo dos anos. Há aqui uma quebra significativa no ano de 2003, que é provavelmente a zona pior desta evolução; há um novo abrandamento nos anos de 2004 e 2005; e, em seguida, cresce significativamente, e este é o último ponto apurado deste ano.
O que é visível é que, neste momento, temos uma evolução extremamente positiva, e posso ler-lhe simplesmente os números, já que mos pediu: o Orçamento rectificativo de 2005 — já nem falo do inicial — apurou 1082 milhões, estamos agora a falar de 1698, 1700 milhões. De facto, estamos a prever um crescimento muito significativo destas verbas, e não falo apenas das do Ministério da Ciência, falo daquelas que são apuradas para o orçamento da ciência e tecnologia, segundo os critérios do EUROSTAT.
Seguidamente, o Sr. Deputado levantou a questão da relação entre instituições de investigação científica e universidades. Parece-me que esta é uma questão que tem de ser clarificada, na medida em que este processo — o de aumentar, nas transferências do Estado para as instituições de ensino superior, as transferências que dizem respeito à ciência e tecnologia e, portanto, a parte competitiva do orçamento das instituições de ensino superior — é um processo que está em curso em toda a Europa e que tem duas consequências fundamentais. A primeira é reforçar o poder da actividade científica e tecnológica na condução das instituições universitárias, na medida em que esta parte das instituições universitárias passa a ser aquela que absorve, que é capaz de trazer para dentro da instituição mais recursos. A segunda consequência é tornar as instituições melhores, mais qualificadas, na medida em que uma parte do seu orçamento proveniente do Orçamento do Estado é obtido por via competitiva e não apenas com base no orçamento histórico, no instalado.
Este processo está em curso em Portugal; contudo, ainda temos uma fracção competitiva do orçamento das instituições do ensino superior que é consideravelmente inferior àquela que acontece nos países desenvolvidos para as instituições públicas, mas estamos a caminhar numa direcção que é positiva neste aspecto.
O que é que acontece numa relação entre as instituições de ensino superior e as instituições de investigação? Parece-me que, em Portugal, há, essencialmente, três modelos Portugal. No modelo dos centros de investigação e que são unidades orgânicas, ou no de outras entidades e que também são unidades orgânicas, ou no de partes da própria universidade, que estão previstos nos estatutos da universidade e que foram criados pela própria universidade, a transferência é feita directamente para os cofres da universidade e a grelha de
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repartição é interna destes recursos. Por exemplo, os projectos de investigação financiados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia ou os projectos de investigação financiados pela União Europeia prevêem verbas que são tipicamente da ordem de 20% para custos e gastos gerais de overheads.
Pode discutir-se se este é um número aceitável ou não. É um número internacionalmente razoável na Europa; é um número bastante superior, sabemos, nos Estados Unidos da América.
Temos muitas instituições universitárias que, na sua história, não criaram, ou, melhor, criaram muitas dificuldades à criação de instituições científicas, o que fez com que grande parte da investigação científica fosse criada pelos universitários em formas de instituições privadas sem fins lucrativos. Em muitos casos, a universidade é parte desta instituição privada sem fins lucrativos ou tem instrumentos de controlo desta instituição privada sem fins lucrativos. As instituições privadas sem fins lucrativos podem estar em instalações universitárias, e, neste caso, de uma maneira geral, ou pagam renda à instituição universitária ou partilham os custos da instituição através do pessoal que contratam ou, enfim, dos gastos gerais da universidade, ou podem estar, quando são inter-universitárias, exteriores ao campus universitário, e, neste caso, são elas que pagam tudo, que pagam todas as suas despesas.
Mesmo assim, quando são instituições inter-universitárias, e temos muitos casos destas instituições, designadamente em Lisboa — no caso do Porto é diferente, porque há apenas uma única universidade pública e temos no Porto algumas das maiores instituições de investigação científica do País, que têm a forma jurídica de instituições privadas sem fins lucrativos, com associação, naturalmente, à universidade —, o que acontece é que nestes casos existem acordos específicos que a instituição faz com cada uma das universidades para autorizar que os respectivos docentes trabalhem nessa instituição. Dou-lhe o exemplo da minha instituição, aquela que ajudei a criar e onde trabalhei até vir para o Governo. É uma instituição que tem entre 160 e 170 pessoas a trabalhar, das quais 30 ou 35, aproximadamente — os números podem não estar exactamente certos hoje —, são pagas pelas universidades, todas as outras são pagas pela própria instituição ou por outras entidades nacionais ou estrangeiras.
Das pessoas pagas pela própria instituição, há muitas pessoas com contratos com as instituições universitárias para aí darem aulas sem receberem qualquer salário das instituições universitárias.
Muitos dos investimentos científicos são feitos pela instituição científica na instituição universitária. Há acordos, por exemplo, e eu subscrevi alguns deles, em que laboratórios de ensino são integralmente financiados pela instituição científica, e isto faz parte do acordo entre as instituições, e é bom que seja assim.
As propinas de todas as pessoas que fazem doutoramentos e mestrados na instituição científica, às vezes muito longe do campus universitário, apenas acedem ao campus universitário no dia em que vão defender a tese — e todas as despesas são feitas pela instituição científica —, são, naturalmente, todos os anos entregues directamente à instituição universitária. No caso que conheço isto representa, por exemplo, cerca de 40 pessoas a pagar propinas às universidades — estou a falar de uma instituição que está ligada a várias universidades, ao Algarve, à Universidade de Lisboa, à Universidade Técnica, à Universidade de Coimbra, etc.
Portanto, o caso que referi e que conheço pessoalmente, mas há muitos outros no País e até de muito maior dimensão, revela como é que a colaboração é feita entre instituições científicas e instituições universitárias. Mas já não estamos como estávamos há 10 ou 20 anos, em que muitas destas instituições eram dominantemente formadas por docentes universitários. Já não é assim. Neste momento, é uma percentagem, em muitos casos, muito pequena, de docentes universitários que estão nestas instituições. Porquê? Porque estas instituições têm capacidade de obter receitas próprias, elas contribuem muito significativamente para os laboratórios, para o ensino, para os recursos financeiros, para os investimentos nas universidades.
O Sr. Deputado fez-me perguntas sobre o aumento dos alunos no ensino superior. Penso que é muito satisfatório que apenas no concurso nacional de acesso, 1.ª e 2.ª fases, tenhamos tido: em 2004, uma redução de 3% dos colocados relativamente ao ano anterior; em 2005, uma nova redução de 3%, comparativamente ao ano anterior; em 2006, um aumento de 7%; e, em 2007, um aumento de 17%. E, provavelmente, o mais significativo é que este aumento de 17% é obtido pela combinação de mais 11% mas universidades públicas, estou a falar apenas do sector público, e mais 24% no sector politécnico.
O que é que isto significa? Significa, em primeiro lugar, que a mensagem e o impacto social do processo de Bolonha chegou a mais grupos sociais, que era possível cumprir, num prazo mais curto, e, portanto, mais acessível às famílias, um 1.º ciclo de estudos superiores; em segundo lugar, que a generalidade ou a quase totalidade dos estudantes que termina o 12.º ano e que tem condições de concorrer ao ensino superior neste momento concorre (era preciso que isto acontecesse em Portugal); em terceiro lugar, que o aumento se faz
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preferencialmente no ensino superior politécnico, e também era preciso que isto acontecesse em Portugal.
Penso que estamos todos satisfeitos com esta evolução, que queremos que continue e se reforce. Mas, além dos alunos que entram no ensino superior pelo concurso nacional de acesso, temos os alunos que entram pelo regime especial de concurso dos maiores de 23 anos e que, apesar de serem em número muito inferior aos primeiros, têm vindo a aumentar, e a previsão é a de um novo aumento no ano que vem — se houver tempo, poderei dar aos Srs. Deputados os detalhes, mas penso que eles estão indicados em alguns dos quadros que vos foram distribuídos —, e também os alunos dos cursos de especialização tecnológica.
Regime especial de concurso dos maiores de 23 anos, os cursos de especialização tecnológica e concurso nacional de acesso, tudo isto vai no mesmo sentido, o de um aumento, e este aumento é maior no politécnico do que na universidade, este aumento quebra radicalmente nos últimos dois anos com a tendência anterior, julgo que há um impacto muito positivo da atitude geral da sociedade portuguesa relativamente ao ensino superior.
O Sr. Deputado fez-me perguntas sobre as bolsas de estudo. Claro que o número de bolsas de estudo que nos é transmitido pelos Serviços de Acção Social, cobrem, com certeza, os 1.º e 2.º ciclos, como está na lei.
Não há qualquer distinção entre o 1.º e o 2.º ciclo nesta matéria. Um estudante carenciado, seja ele do 1.º ou do 2.º ciclo, é um estudante com acesso às bolsas de estudo nos termos da lei da Acção Social Escolar.
Quanto às outras questões que colocou, se o Sr. Presidente autorizar, peço ao Sr. Secretário de Estado para dar uma informação breve sobre a avaliação que foi feita das parcerias internacionais ao fim de um ano de execução. Esta avaliação é feita por uma entidade completamente independente quer do Estado português quer das instituições contratadas.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, de uma forma breve e para ser muito pragmático, as comissões independentes que iniciaram o seu trabalho identificaram, desde logo, um impacto imediato, e de uma forma inédita em Portugal, na oferta de cursos em parceria entre várias universidades. Como sabem, hoje temos, em áreas consideradas estratégicas em termos científicos e tecnológicos, uma panóplia de cursos e de programas de doutoramento que reúnem várias universidades portuguesas.
Um segundo impacto, particularmente noticiado pela comunicação social, foi o facto de algumas dessas parcerias, nomeadamente a parceria em colaboração com o MIT (Massachusetts Institute of Technology), ter facilitado o financiamento directo estrangeiro em Portugal, designadamente na área da energia, onde uma grande empresa americana abriu um centro de investigação em Portugal que representa, em termos de financiamento estrangeiro, cerca de três vezes o financiamento anual do Estado português no total das parcerias.
Um terceiro impacto também largamente notificado foi o investimento privado em investigação e desenvolvimento, nomeadamente, como o Governo tinha sido anunciado, por grandes empresas com participação do Estado. Por exemplo, a Portugal Telecom participa activamente numa parceria com a Universidade de Carnegie Mellon, co-financiada pelo Estado português, no âmbito da qual está hoje a atingir os padrões de referência europeus dos operadores.
Um quarto e último exemplo, também particularmente importante hoje no contexto europeu, é a internacionalização das empresas tecnológicas portuguesas, nomeadamente as pequenas empresas de base tecnológica. E, apenas como exemplo, no âmbito da parceria com a Universidade do Texas, em Austin, uma das empresas modelo portuguesas abriu um escritório em Austin, tendo os seus produtos já entrado no mercado americano.
São quatro exemplos que foram sobejamente notificados e que hoje podem ser consultados nos relatórios que foram divulgados pelas comissões de avaliação independentes.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, antes de passarmos à análise da situação que temos para 2008, gostaria de fazer aqui algumas considerações e
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chamar à colação a situação existente em relação a 2007, porque já na discussão do Orçamento para 2007 o Sr. Ministro anunciou que se tratava de um orçamento de grande investimento, que promovia a qualidade do ensino e a melhoria do funcionamento das instituições de ensino superior, mas a realidade desmente-o.
Numa reunião da Comissão de Educação realizada anteontem, onde recebemos o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, foi-nos transmitido que existem hoje quatro universidades (com a possibilidade de virem a ser cinco) e que, dos três salários que têm para pagar até ao fim deste ano, só podem garantir o pagamento de um deles.
Assim, Sr. Ministro, a primeira questão que quero colocar-lhe é se reitera a afirmação de que o orçamento para 2007 não só garantiu o bom funcionamento das instituições, como promoveu a sua melhoria e qualidade.
Dou-lhe outro exemplo concreto de uma destas situações, que tem a ver com a Universidade de Évora. Em Maio ou Junho deste ano, o Sr. Reitor da Universidade de Évora afirmou publicamente que, quando chegasse a Setembro, provavelmente a universidade não teria condições para pagar os salários a todos os seus trabalhadores. Em Outubro, aquando da realização das jornadas parlamentares do PCP em Évora, tivemos oportunidade de reunir com os responsáveis da Universidade e de lhes perguntar como é que tinham sido assumidos os compromissos do pagamento dos salários, uma vez que já estávamos em Outubro e os salários tinham de facto sido pagos. A resposta foi muito simples e clara, Sr. Ministro: primeiro, adiaram os pagamentos a fornecedores; segundo, recorreram ao adiantamento de duodécimos; e, terceiro, recorreram à dotação provisional do Ministério das Finanças.
Portanto, Sr. Ministro, pergunto-lhe se é este o procedimento que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior entende adequado para garantir o funcionamento das instituições de ensino superior — e já não me refiro à melhoria da sua qualidade.
Sr. Ministro, na opinião do PCP, estamos, em 2008, perante um agravamento do subfinanciamento crónico a que as instituições de ensino superior têm sido submetidas e ao regresso a uma orientação da sua dependência política face ao Governo, designadamente ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que é uma prática que nos traz as maiores preocupações.
Pergunto-lhe também, Sr. Ministro, se está lembrado de uma notícia que fazia manchette em O Independente que se referia à atribuição, dois dias antes das eleições de 2002, de um subsídio de 1,5 milhões de euros a um laboratório que fundou e a que presidia.
Quando se concentra no Ministro a decisão de dizer quem é que sobrevive, ou não, nas instituições de ensino superior, quando não se garante, pelas dotações do Orçamento do Estado, níveis mínimos de funcionamento das instituições de ensino superior significa que estamos a colocar nas mãos do Ministério a decisão de garantir, ou não, a existência de instituições de ensino superior públicas de que o País necessita e que são responsabilidade do Ministério.
Sr. Ministro, esta é uma realidade preocupante e que se agravará certamente em 2008, porque, quanto à obrigação de contribuição para a Caixa Geral de Aposentações das instituições de ensino superior, há este ano um acréscimo de 3,5%. Falou nos 7,5% que já existiam o ano passado, mas esqueceu-se de dizer que este ano há um acréscimo de 3,5% e que há, para além de uma taxa de inflação de 2,1% (nas contas do Governo, porque, se tivermos em atenção as contas da Comissão Europeia, será de 2,4%), também uma estimativa de 2% de aumento nos encargos para as instituições com as progressões obrigatórias das carreiras. O Sr. Ministro bem sabe que os assistentes que concluam o seu doutoramento têm de ser contratados como professores auxiliares — é como manda a lei. Portanto, estes encargos obrigatórios com a progressão das carreiras implicam um aumento de 2% nos orçamentos das instituições de ensino superior. O Sr. Ministro tem ainda de ter em conta que o aumento do número de alunos, se se verificar como referiu, trará também um aumento de encargos para as instituições.
Assim sendo, este orçamento significa, na prática, uma redução muito abaixo daquilo que seria o limiar mínimo de garantia de subsistência das instituições, quanto mais de garantia da sua qualidade. E, quando o Sr.
Ministro vem falar na utilização dos saldos para o pagamento das contribuições da Caixa Geral de Aposentações, importava que pudesse dar uma informação adicional que tem a ver com o facto de grande parte dos saldos das instituições de ensino superior dizerem respeito a receitas consignadas, e que, portanto, estão afectas a determinados projectos, não podendo ser utilizadas para além disso, e também a propinas.
Assim, pergunto-lhe, Sr. Ministro: assume o incumprimento neste plano da lei de financiamento do ensino superior e a utilização das propinas para o pagamento das contribuições para a Caixa Geral de Aposentações?
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Na prática, o que o Ministério está a fazer é a promover uma alteração da lei de financiamento do ensino superior. Aliás, o Sr. Ministro terá de esclarecer o Sr. Deputado Bravo Nico sobre as intenções do Governo, porque ainda recentemente o Sr. Deputado Bravo Nico afirmou que, até ao final da Legislatura, a lei de financiamento seria revista pelo Governo, e o Sr. Ministro hoje disse, aqui, exactamente o contrário. Portanto, esta questão terá de ser esclarecida internamente no Partido Socialista.
Preocupa-nos, no entanto, que o Governo não cumpra e que não permita que as instituições cumpram a lei de financiamento do ensino superior com esta prática crónica do subfinanciamento.
Aliás, Sr. Ministro, neste quadro do subfinanciamento, gostava de colocar-lhe uma questão, já foi colocada mas, em meu entender, não obteve o esclarecimento devido, sobre os protocolos internacionais, porque eles dizem respeito não só ao financiamento mas também à forma como o Ministério trata as instituições. Relativamente ao processo de internacionalização do sistema de ensino do português e às parcerias internacionais — que serviu de instrumento de propaganda do Ministério —, as instituições de ensino queixaram-se de terem sido afastadas e de não fazerem parte do processo. O Sr. Ministro justificou, entretanto, esta situação com o facto de terem sido os parceiros internacionais a escolherem os parceiros nacionais — coisa que foi desmentida publicamente, pelo menos, pelo MIT.
No plano do financiamento, Sr. Ministro, só no que diz respeito aos protocolos que envolvem o MIT, a Universidade de Carnegie Mellon e a Universidade do Texas, em Austin, estamos a falar de 30 milhões de euros por ano. Neste sentido, gostaria que justificasse esta opção perante o quadro de asfixia financeira das instituições portuguesas.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Peço desculpa, Sr. Deputado, mas está enganado. São 30 milhões de euros, de facto, dos quais 15 milhões são»
O Sr. João Oliveira (PCP): — São directamente para as próprias instituições!
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — São para as próprias instituições nacionais!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exacto!
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — É apenas para não ficar a ideia de que são os 30 milhões de euros que vão ser investidos fora do País.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Ministro, a questão que quero colocar tem precisamente a ver com isso.
Como eu estava a dizer, são 30 milhões de euros no âmbito de protocolos internacionais, quando as instituições de ensino superior portuguesas são colocadas, á partida, pelo Orçamento do Estado,»
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não!
O Sr. João Oliveira (PCP): — » numa situação em que se está a decidir a sua sobrevivência, em que se está a decidir a manutenção do seu funcionamento já muito abaixo dos limiares mínimos que seriam aceitáveis. Portanto, gostávamos que o Sr. Ministro nos pudesse esclarecer rigorosamente o que motiva esta opção política, porque, em nosso entender, é uma opção política muito errada.
Relativamente às questões relacionadas com a investigação, procura-se fazer passar a ideia (a qual o Sr. Deputado Bravo Nico ainda há pouco, mais uma vez, insistiu) de que, pela via da investigação, as instituições de ensino superior conseguem resolver os seus problemas decorrentes de um Orçamento do Estado que prevê verbas abaixo das suas necessidades. E isto não é verdade! Antes de mais, a lógica política do Ministério, de separação entre investigação e ensino, é uma lógica perigosíssima, Sr. Ministro. É perigosíssima! Aliás, os franceses estão agora a reconhecer o erro que é fazer a separação da investigação do ensino. Nós temos a exacta noção das dificuldades que se repercutem na investigação pela difícil situação financeira em que se encontram as instituições de ensino superior, nomeadamente as universidades. E temos a exacta noção do estrangulamento das instituições de ensino superior como consequência desta lógica propagandística de financiamento pela via da investigação, que não poderá ser concretizada. Talvez o Sr. Ministro nos possa dar
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alguma nota da sua experiência pessoal, quanto à transferência de verbas do Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP) para o Instituto Superior Técnico, para a Universidade Técnica de Lisboa. Trata-se de uma boa experiência para percebermos perante que situação estamos de facto, porque não é pela via das verbas de investigação que as universidades ou os institutos politécnicos vão ver resolvidos os constrangimentos financeiros que o Orçamento do Estado para 2008 lhes irá impor.
Para concluir, Sr. Ministro, em nosso entender, este é um Orçamento que prossegue a orientação de subfinanciamento e de garrote ao ensino superior público, visando a eliminação do papel e da responsabilidade do Estado no ensino superior e concentrando perigosamente no Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a competência para a decisão sobre quem sobrevive ou não no ensino superior. Nós necessitamos de todas as instituições de ensino superior que temos e têm de lhes ser dadas condições para o seu bom funcionamento e qualidade, e não é com menos financiamento que isto se consegue, Sr. Ministro.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Bravo Nico (PS): — Para uma interpelação à mesa para defesa da honra, uma vez que o Sr. Deputado João Oliveira se dirigiu a mim uma ou duas vezes»
O Sr. Presidente: — Peço desculpa, Sr. Deputado, mas uma coisa é a interpelação à Mesa e outra é a defesa da honra. São duas figuras regimentais»
O Sr. Bravo Nico (PS): — Peço desculpa, Sr. Presidente. Peço a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, salvo melhor opinião, não vislumbrei nenhures nenhuma ofensa à sua honra. Há apenas um juízo político, que, a meu ver, não é minimamente»
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, se me dá licença»
O Sr. Presidente: — Deixe-me concluir.
Como eu dizia, trata-se de um juízo político que, a meu ver, não é minimamente ofensivo da sua honorabilidade, da sua reputação ou do seu prestígio.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Claro!
O Sr. Presidente: — Como tal, não há uma ofensa à honra e, portanto, não vou autorizar a utilização desta figura regimental para uma intervenção adicional.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, se me permite, gostaria de justificar o meu pedido de palavra ao abrigo desta figura regimental.
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, solicitei a palavra para exercer o direito regimental da defesa da honra porque o Sr. Deputado João Oliveira referiu, como se fosse frase minha, uma coisa que eu não disse.
Como tal, essa frase poderá ser entendida como eu tendo dito uma mentira ou uma inverdade.
Portanto, solicito a V. Ex.ª que a possa rectificar»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, fica registada essa sua observação. Todos percebemos a que frase se referiu o Sr. Deputado João Oliveira: tem a ver com a revisão do regime de financiamento do ensino superior.
Fica feito o registo desta sua observação, Sr. Deputado.
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O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, fica feito o registo, mas nem a Comissão nem a mesa ficam esclarecidas sobre quais foram as minhas palavras em sede da Comissão de Educação e Ciência, quando foi recebido o clube.
Só peço que me deixe rectificar, pois trata-se de uma frase, e tenho-a registada, que proferi nessa Comissão.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, nada há no Regimento que permita e que legitime esta sua intervenção.
Não é uma defesa da honra, não é uma interpelação à mesa, não é um protesto.
A título excepcional, concedo-lhe 30 segundos para dizer qual é a frase, mas faço-o a título excepcional, porque não encontro fundamento no Regimento para esta sua intervenção.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, muito obrigado por esta sua latitude de compreensão e não utilizarei sequer os 30 segundos.
O que anteontem referi, em sede de Comissão de Educação e Ciência — e cito, uma vez que quando digo as coisas é porque as tenho escritas —, foi que, «atendendo às novas missões do ensino superior, aos novos públicos, à nova realidade nacional e internacional e ao novo papel do ensino superior no modelo de desenvolvimento económico e social em Portugal, é fundamental reequacionar o modelo de financiamento». Foi isto que eu disse.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Bravo Nico.
Sr. Ministro, tem a palavra para responder às questões suscitadas pelo Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, há pouco a dizer ao Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. Deputado João Oliveira está do lado daqueles que entendem que tudo como está, está bem»!
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Portanto, se uma universidade tem custos largamente excessivos face ao acordo que existe entre as próprias universidades, todas, de como se devem distribuir as verbas do orçamento para o ensino superior, se já está a receber largamente acima deste acordo, através de um factor de coesão que faz com que todas as universidades estejam a contribuir para a sua ineficiência, esperando, naturalmente, que esta ineficiência não dure para sempre, o Sr. Deputado acha que, em cima disto, a ineficiência ainda deveria ser coberta pelo dinheiro dos contribuintes.
Estamos esclarecidos, Sr. Deputado! Se o Sr. Deputado entende que uma instituição de ensino superior»
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Agradecia que não me interrompesse, eu também não o interrompi, e tive muita vontade de o fazer.
Protestos do PSD.
Interrompi, simplesmente, para clarificar, com grande respeito.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Interrompeu!
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas pedi licença para o interromper, Sr. Deputado.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço-vos que não entrem em diálogo. O Sr. Ministro está no uso da palavra e, portanto, agradeço que se abstenham de falar.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Como eu dizia, quando uma instituição de ensino superior (e o Sr. Deputado deve conhecer bem estes casos), em determinados períodos, emprega funcionários não docentes num momento em que está precisamente a perder alunos (e, por vezes, este crescimento é explosivo em determinados anos), o Sr. Deputado entende que ao Governo compete apenas ajoelhar-se e pagar, em nome dos contribuintes. Entende que a autonomia universitária tem este preço: podem fazer o que lhes apetecer com o dinheiro público. Não, Sr. Deputado! Não é assim que entendemos a política pública e a defesa do interesse público.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Sei que tem uma enorme dificuldade em aceitar que os outros falem quando não dizem exactamente «amen«, mas, enfim, ç assim»! Faz-me lembrar aquela expressão do Eça de Queirós em Uma Campanha Alegre, segundo o qual, o papel do Deputado, para ser patriota, seria substituído pelo busto de Camões e, em cima do busto, punha-se um papagaio que diria «Apoiado!».
O Sr. Deputado diz que o Governo defende a lógica da separação entre investigação e ensino. Não sabe o que diz, nem sabe o que está a pretender dizer. Provavelmente, não sabe o que é uma coisa e outra! É que, precisamente, o novo regime jurídico das instituições de ensino superior prevê, pela primeira vez — repito, pela primeira vez, e não teve qualquer apoio da bancada de V. Ex.ª! —, a intervenção das instituições de investigação científica nos conselhos científicos das universidades, onde nunca tinham entrado até agora.
Sr. Deputado, não estamos de acordo com a sua visão miserabilista do ensino superior.
É absolutamente indispensável reformar as instituições de ensino superior se queremos que algumas delas cumpram verdadeiramente o seu papel, e muitas há que o cumprem; e este seu papel não pode ser limitado por outras instituições congéneres que no passado, em nome da autonomia e com a cumplicidade de muita gente, foram «agências de emprego» e totalmente ineficientes. Temos de as ajudar a reformarem-se, e, hoje, algumas delas têm dirigentes que estão apostados em fazer estas reformas. Gostaria que toda a Câmara apoiasse o Governo nesta estratégia, de as apoiar nesta matéria.
Confundir estratégias de saneamento financeiro das instituições com qualquer ingerência na autonomia das mesmas é inadmissível, Sr. Deputado! E não tenho mais nada a responder sobre esta matéria.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não tem resposta! As minhas perguntas foram todas bem feitas!
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho, para colocar as suas questões.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, vou colocar um conjunto de perguntas, embora confesse que algumas das que eu estava a pensar colocar já foram objecto de debate, tendo o Sr.
Ministro respondido da forma que entendeu, e, por isso, vou colocar algumas outras, de forma breve, para permitir respostas igualmente breves.
A primeira questão tem a ver com o objectivo da colocação, até 2009, de 1000 novos doutorados, nomeadamente em I&D (investigação e desenvolvimento), sendo que, para 2007, a meta era a da colocação de 500.
Gostava que o Sr. Ministro nos dissesse como está este processo, qual é o objectivo para 2008 e como é que tudo isto continuará a processar-se.
Uma outra questão prende-se com o financiamento do ensino superior (matéria que já aqui foi colocada) e com uma crítica que é feita em relação à fórmula de cálculo, definida por portaria, no que diz respeito ao factor de coesão. Isto porque, nomeadamente, o Sr. Presidente do CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas) vem dizer que este factor de coesão vem deturpar o factor «qualidade» — e espero não estar a deturpar o que afirmou o Sr. Presidente do CRUP — e que, sendo uma manifestação de discordância, então, alterem-se os critérios, mas não se introduzam factores de coesão que vêm distorcer o critério «qualidade», que deve prevalecer.
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Devo dizer que tentei consultar a fórmula relativa a este factor de coesão e não é propriamente uma tarefa muito fácil. Assim, gostava que o Sr. Ministro, «trocando por miúdos», passo o vulgarismo, nos dissesse qual é o objectivo e se concorda ou não com o dizer-se que este factor de coesão vem destruir o critério «qualidade».
Gostava também que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, e não vou pronunciar-me sobre questões que, aliás, já tivemos oportunidade de debater noutra altura e que têm a ver com a competência de nomeação e de escolha dos membros dos órgãos desta Agência.
A verdade é que no decreto-lei que cria a Agência se define que a mesma deve cobrar os serviços que presta, o que talvez possa ser uma medida correcta; só que se diz ainda que, tendo em conta o custo, a cobrança que faz pela prestação dos serviços deve reflectir o custo. Então, seria interessante explicar por que razão se vai impor às instituições de ensino superior o financiamento da Agência e, simultaneamente, até 2009, se prevê uma dotação de 4 milhões de euros, isto é, 2 milhões de euros/ano, sendo certo que há politécnicos com uma dotação anual mais ou menos semelhante a este valor.
Uma outra questão, também já aqui referida, tem a ver com a rede de oferta de cursos de ensino superior.
No relatório apresentado pelo Ministério, refere-se que o Governo irá proceder à racionalização da oferta de cursos e do número de escolas, reconhecendo a importância do ensino superior privado como resposta às carências do alargamento do sistema.
Lembro-me que, aquando do debate do regime jurídico das instituições de ensino superior e a propósito da definição de rede e dos critérios a ter em conta, o CDS propôs precisamente que também fosse tida em conta a oferta privada, sendo certo que, na altura, nem o Sr. Ministro mostrou abertura nem o Partido Socialista manifestou apoio, e, portanto, a proposta foi rejeitada. Mas a verdade é que agora verificamos que, afinal, o Governo, na racionalização da rede — e, em meu entender, bem! —, conta com a oferta do privado.
Gostava, então, que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre a necessidade do reordenamento, da racionalização da rede de oferta de cursos e, nomeadamente, sobre o relatório que as universidades entregaram, no qual consideravam que o passo inicial para atingir esse objectivo era, desde logo, o do reordenamento da designação dos cursos, através da criação de alguns padrões de uniformidade segundo critérios que, em países estrangeiros, ao que parece, deram resultado a médio prazo.
Atendendo ao tempo de que disponho, gostava de colocar-lhe apenas mais uma questão que tem a ver com o protocolo com a Universidade Católica.
O Estado tem a tradição de apoiar a Universidade Católica, tendo em conta a especificidade do seu trabalho e também o enquadramento da Concordata, que regula as relações entre o Estado português e a Igreja Católica. Mas a verdade é que, por volta do ano 2000, quando o Sr. Ministro exercia funções ministeriais no Governo do Eng.º António Guterres, o apoio à Universidade Católica rondaria os 700 000 contos. Na vigência do governo anterior, foi celebrado um protocolo, para vigorar durante três anos, que estabelece um apoio anual em cerca de metade daquela verba, ou seja, em 1,5 milhões de euros, destinado à acção social da Universidade Católica.
O Sr. Ministro tomou a iniciativa de não renovar esse protocolo, ou, pelo menos, o protocolo não foi renovado. Ora, eu gostaria que o Sr. Ministro nos esclarecesse por que razão o Governo entende não renovar o protocolo com a Universidade Católica e que destina precisamente a apoiar a acção social da instituição. É verdade que os alunos da Universidade Católica podem recorrer à acção social, mas também é verdade que a acção social da Universidade Católica não se reduzia apenas a isto, porque a verba em questão destinava-se a financiar bolsas de estudo, de mérito, de redução de propinas, de apoio às refeições fornecidas pelas cantinas.
Por tudo isto, parece-nos que o apoio continua a fazer todo o sentido, pelo que gostaríamos que o Sr. Ministro nos esclarecesse a razão da não renovação do protocolo.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Paulo Carvalho, muito obrigado pelas suas questões e vou tentar ser sintético nas minhas respostas.
Sr. Deputado, o objectivo de contratação de novos doutorados mantém-se e está a ser cumprido; foi feito da forma como expliquei que iria ser feito e foi cumprido. Ou seja, foi aberto um concurso para as instituições poderem concorrer, porque quem escolhe os candidatos, as pessoas, são as próprias instituições — não é,
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naturalmente, a Agência do Ministério —, e, portanto, as instituições concorreram. Apresentaram as razões e as condições de acolhimento que tinham dessas pessoas; com base nos seus planos, foi feita uma avaliação normal, científica e independente e, nesta 1.ª fase, foram estabelecidos contratos com as instituições que as autorizam a celebrar contratos, a seleccionar e a contratar até pouco mais que 600 doutorados. As instituições estão todas activas: umas já contrataram e outras estão a fazer os processos normais de selecção desses doutorados.
Além disto, abrimos outras vias de acesso. Uma delas é para as instituições que não apareceram na 1.ª fase e que agora podem concorrer directamente e em qualquer momento com candidatos, e, neste caso, a avaliação é feita em conjunto, o candidato e a própria instituição, aquela instituição que não tenha concorrido na 1.ª fase.
Verificámos que tínhamos ainda de abrir uma terceira via de acesso, designadamente para os doutorados que se encontram no estrangeiro há alguns anos, que não têm relação com as instituições portuguesas e que querem vir para Portugal. E, neste caso, damos-lhes a oportunidade de se dirigem directamente à Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que os porá em contacto com as diferentes instituições portuguesas do respectivo ramo.
Todos estes mecanismos estão em vigor. Portanto, neste momento e no que diz respeito à relação directa e aos contratos estabelecidos entre a Fundação para a Ciência e a Tecnologia e o Estado foram ultrapassadas as metas que tínhamos previstas — estão a ser neste momento realizadas as contratações pelas próprias instituições — e contamos não só atingir como exceder, até 2009, a meta dos 1000 doutorados.
Recordo que se trata de um concurso particularmente exigente e transparente na medida em que os membros do júri são conhecidos e em que todos os concursos estão publicados no mesmo sítio, para não haver dúvidas sobre as oportunidades que existem e para não privilegiar de maneira alguma aqueles que estão mais perto em detrimento dos que se encontram mais longe — esta foi a nossa principal preocupação nesta matéria.
Passo agora à fórmula de cálculo e ao factor de coesão.
Sr. Deputado, no essencial, a fórmula de cálculo tem a ver com o número de estudantes de cada instituição, ponderado naturalmente com os custos típicos dos diferentes ramos de conhecimento, de aprendizagem e de ensino, e ponderado também, em menor dimensão, com a eficiência da instituição. Ou seja, seria absurdo que fosse apenas o número de estudantes, porque senão reprovar todos os estudantes teria mais vantagens do que ensinar bem e permitir que os estudantes cumprissem a tempo e horas as suas obrigações.
Bom, isto é, no essencial, o que está na fórmula de cálculo, mas ela tem outras variáveis — mas não vou entrar nos detalhes.
A aplicar simplesmente estes critérios, hoje haveria universidades que, por esta via da fórmula de cálculo, receberiam mais do que estão a receber e outras que receberiam muito menos do que estão a receber, designadamente as instituições que, manifestamente, têm uma estrutura de custos desadequada, que acumularam ineficiências. E, neste momento, é nestas instituições que se exprime a solidariedade de todas as outras, mas é naturalmente uma solidariedade condicionada a que estas instituições se modernizem, porque todas as outras estão a pagar para elas. É um facto! É assim! É este o acordo que está estabelecido no interior das instituições de ensino superior públicas, universitárias e politécnicas, e nunca foi, colectivamente, posto em causa, e que nós, Governo, temos vindo a cumprir. Os problemas que se têm vindo a reflectir ainda estão para lá disto; já existem instituições que estão a receber muito mais do que normalmente, sem o tal factor de coesão, teriam direito na distribuição. Ou seja, as outras já estão a financiar estas instituições e, como deve compreender, não é aceitável que o Governo dê uma mensagem de laxismo em cima de tudo isto, dizendo: «Olhe, e além disso, já agora, também ainda se pode tirar um pouco mais e fazer um factor de coesão de tal maneira grande que não haja vantagem alguma em se ser eficiente neste sistema»! Claro que o ideal seria não haver factor de coesão algum, como é normal. Ou seja, o ideal seria todas as instituições estarem no patamar de eficiência desejável.
Mas há uma outra solução, mas nesta o Governo não cai: não há fórmula alguma, há apenas os orçamentos históricos, aquilo que a instituição gasta é aquilo que lhe damos. Bom, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que por aqui é que não enveredamos, e penso que nenhum dos Srs. Deputados quererá com certeza que se vá por este caminho, porque isto seria uma fuga para a frente, para a ineficiência total nesta matéria.
Passo à racionalização da rede e à oferta de cursos. Já, na altura, tive ocasião de reflectir que racionalizar a designação dos cursos, o que, ainda por cima, é da responsabilidade das próprias instituições e não da res-
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ponsabilidade do Governo, foi uma forma, numa determinada época, de não responder à necessidade da racionalização dos cursos que tinha sido pedida às universidades pelo Governo. E nós tivemos ocasião de responder às instituições, designadamente ao Conselho de Reitores, dizendo que esta não era com certeza o contributo para a racionalização da rede.
O objectivo da racionalização da rede, que tem de ser, naturalmente, comparticipado pelas instituições de ensino superior, é uma responsabilidade do Estado, e é esta responsabilidade que estamos a exercer não financiando, designadamente, cursos que não têm oferta de emprego, procurando, no âmbito deste novo regime jurídico do ensino superior, encontrar não só um equilíbrio entre a autonomia de cada instituição mas também a racionalidade do conjunto das instituições de ensino superior, porque no fim de tudo isto estão os alunos, os estudantes. Estou convencido de que a aplicação do novo regime jurídico das instituições do ensino superior permitirá ajudar na racionalização da rede de oferta, designadamente através de consórcios entre as instituições. Haverá uma outra racionalização que espero que aconteça, que é, pura e simplesmente, a racionalização das próprias unidades orgânicas das universidades. Cada uma das universidades sabe que em muitos casos existem unidades orgânicas que manifestamente não têm razão de existir e que deveriam ser fundidas. Esta responsabilidade é, em primeiro lugar, das instituições e é, em segundo lugar, do Governo, no caso de as instituições não o fazerem, porque implica desperdícios gigantescos que estão a ser pagos por todos, e não é com certeza qualquer entrave à autonomia universitária emitir, como prevê a lei, orientações gerais nesta matéria. Não é entrar na vida concreta, interna, de cada instituição, mas dar orientações gerais nesta matéria.
Por último, o Sr. Deputado falou do protocolo com a Universidade Católica Portuguesa. Sr. Deputado, não há um, há vários protocolos com a Universidade Católica Portuguesa. Até hoje apenas chegou à minha mão um protocolo cujo prazo de validade se tinha esgotado e que dizia respeito ao financiamento da Universidade Católica Portuguesa em Viseu; e foi até hoje o único protocolo, cujo prazo de validade caducou. Analisei este protocolo, que diz essencialmente respeito à escola de medicina dentária de Viseu e que prevê um pagamento a esta escola do diferencial entre as propinas que são efectivamente cobradas e as propinas do ensino superior público — e isto foi há poucos meses —, e entendi, analisando a situação da oferta de medicina dentária na região, que era vantajoso para o Estado e para o interesse público manter este protocolo, renovando-o.
Há um outro protocolo que diz respeito à acção social escolar que termina no final deste ano, Sr. Deputado.
Este protocolo foi feito numa altura em que a acção social escolar para o ensino superior privado não estava em pleno funcionamento como está hoje e entendemos que ele também tem de ser analisado em condições da equidade com o resto do sector do ensino superior, quer público quer privado — e é isto que vamos fazer até ao final do ano. E, naturalmente, como o Sr. Deputado deve imaginar, não posso, nem devo, dar uma resposta agora sobre uma coisa que só terminará no final do ano e para a qual a Universidade Católica terá uma resposta fundamentada, na base do diálogo que sempre temos tido com esta e outras instituições do ensino superior.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, verifico que o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior fica bastante reactivo a críticas mais veementes por parte da oposição. Permita-me que comece por um aparte.
Há um livro, relativamente interessante, da Marguerite Yourcenar, A Obra ao Negro, que traça o percurso da personagem Zenão, que é, digamos, um pioneiro da busca da ciência ocidental, e que tem um trecho muito interessante, que cito de memória: «jamais torcer os factos, jamais distorcer as palavras do adversário para mais facilmente ter razão». Espero que seja este o espírito do nosso debate.
Sobre o ensino superior, o Sr. Ministro tem insistido na ideia de que é necessário reformar as instituições. E eu só lhe digo, Sr. Ministro: Vamos a isto! O problema é que os instrumentos que o Sr. Ministro encontra deixam muito a desejar — lamento dizê-lo! O Sr. Ministro expõe aqui uma tese que, em meu entender, é preocupante; ou seja, é preciso conter os custos das instituições do ensino superior público e, acima de tudo, é preciso não compensar aquelas que são incompetentes na gestão desses seus orçamentos, que são incompetentes na gestão dessas instituições. Há um enorme problema que o Sr. Ministro já deve ter compreendido: esta é uma lógica de punição colectiva! Ou
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seja, o Sr. Ministro não está a punir apenas os responsáveis pela gestão das instituições, o Sr. Ministro está a punir toda a instituição. E, portanto, aplica um método que a ciência entretanto já descredibilizou, que é o método da sangria. Verdadeiramente é o que, neste momento, o Sr. Ministro está a aplicar.
O Sr. Ministro tem uma técnica darwiniana, que é: vamos aplicar pressão ambiental. Vamos diminuir as resistências das instituições e vamos ver quem, no fim, sobrevive. Este é o problema. Ou seja, por um lado, nas instituições que são penalizadas quem paga são os alunos, são até os seus bons professores, que não têm culpa de uma gestão que possa ser danosa ou pouco ambiciosa, e, por outro lado, deixa as instituições sem capacidade de responder à necessidade de reforma, porque o Sr. Ministro, no regime jurídico que aqui fez aprovar, criou alguns instrumentos de gestão que são bastante interessantes, nomeadamente o do financiamento plurianual, mas esta possibilidade de utilizar o financiamento plurianual está restrita a quem entre na lógica das fundações privadas. Portanto, o Sr. Ministro utiliza aqui a técnica do «chicote e da cenoura»! É esta a técnica que o Sr. Ministro utiliza. Mas quero fazer algumas perguntas muito directas.
Sr. Ministro, tendo em conta o anúncio feito em Abril sobre a contratação de 1000 novos doutorados para as instituições de investigação científica, pergunto: algum destes doutorados já foi colocado e já está a trabalhar? Sim, ou não! Do anúncio das 50 cátedras dos superdoutores — é verdade que o Sr. Ministro pediu às universidades que encontrassem verbas para pagar salários acrescidos, ou seja, salários ao nível de um contexto internacional —
, há algum que vá dar aulas já no próximo semestre? Para quando é que isto se prevê? Passo agora aos efeitos de Bolonha, e, portanto, aos efeitos da separação, na formação, do 1.º ciclo do 2.º ciclo. Há notícias, que vão surgindo na imprensa, de que há cursos de mestrados que estão a abrir com um número reduzido de vagas para aquelas que foram as expectativas criadas nos alunos que entraram anteriormente ao processo de Bolonha. Estes alunos tinham a expectativa de fazer um curso de quatro anos; entretanto, aceitaram o plano de reorganização de Bolonha e, subitamente, quando querem fazer o seu mestrado, não há vagas. Isto acontece, nomeadamente, na Universidade do Minho.
Sr. Ministro, terá, com certeza, sido distracção minha, mas eu ainda não vi o Governo fixar os custos controlados para mestrados que são necessários para o reconhecimento da profissão em determinadas ordens profissionais.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Já estão fixados? Diga, Sr. Ministro! Se o Sr. Presidente permitir, neste momento, aceito diálogo»
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não é o Governo quem os fixa, é a lei!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — E já estão fixados?
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Há já muitas instituições a praticá-los, naturalmente. Não ç o Governo»
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Mas, segundo as notícias que saem na imprensa, as instituições estão a fixar as mais variadas propinas de mestrado, nomeadamente no Curso de Economia»
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Desculpe, Sr.ª Deputada, eu não queria» Gostaria que chegasse ao fim e só depois eu»
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada acabará a sua intervenção e o Sr. Ministro, depois, responderá. Caso contrário, este diálogo é perturbador.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Com certeza, Sr. Presidente.
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A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Ministro, como sabe, a Ordem dos Economistas exige, para acreditação e acesso à profissão de quem tira o Curso de Economia, 240 créditos. Ora, isto exige que se faça três anos do 1.º ciclo e ainda um mestrado. Segundo as informações que temos, para, por exemplo, um Mestrado de Finanças na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, um curso que tem três semestres, um dos quais nem sequer tem aulas pois ç só a feitura da tese, o valor da propina ç de 6000 € — 6000 €, Sr. Ministro! Acontece que a bolsa anual dada pelos serviços da acção social ç de 920 €.
Portanto, o que está a acontecer, hoje, em Portugal — e lamento, mas, de facto, o Bloco de Esquerda tinhao dito —, é que os alunos que querem ter uma formação mais alargada têm de ter meios económicos para o fazer, porque senão não terão essa formação mais alargada. Mais: com o Processo de Bolonha, o que acontece é que os alunos pagam o dobro, o triplo ou, às vezes, o quádruplo, com propinas deste valor, para ter exactamente o mesmo tipo de formação que tinham anteriormente.
Portanto, Sr. Ministro, isto corresponde a uma estratégia de se «chutar» para as escolas e para os estudantes os custos da formação do 2.º ciclo.
Noto que o Sr. Presidente está preocupado com o tempo que estou a utilizar, pelo que vou fazer-lhe, Sr.
Ministro, uma última pergunta. O Sr. Ministro assume a intenção de fazer uma revisão do Estatuto do Bolseiro de Investigação. Como sabe, Sr. Ministro — e até a contratação dos 1000 doutorados era uma resposta a esta situação —, os bolseiros estão hoje a ser utilizados, em muitas instituições de investigação, como investigadores de facto. Ora, como investigadores, eles deveriam ter um contrato de trabalho. No entanto, sucessivamente, eles vão sobrevivendo com bolsas que vão sendo dadas pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
Acontece que, com estas bolsas, recebem apenas 12 ordenados e não têm qualquer tipo de segurança social, subsídio de doença ou subsídio de férias. Enfim, há todo um conjunto de direitos sociais que não existe.
Mais, o relatório PRACE, elaborado pela comissão técnica, tem até um excerto relativamente interessante, que passo a citar: «De referir a existência no Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de uma elevada proporção de bolseiros a desempenhar funções estruturantes», ou seja, eles estão a desempenhar funções de trabalho e não de investigação. Continuo a citar: «Em alguns casos, por exemplo, o total de bolseiros atinge uma proporção da ordem dos 30% ou mesmo 50%».
Pergunto-lhe, Sr. Ministro: na revisão do Estatuto do Bolseiro de Investigação, quais são as suas intenções, no que toca ao apoio social escolar para o 2.º ciclo de formação do ensino superior? São estas as questões que lhe deixo.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Ana Drago.
Já que estamos em maré de citações, depois de o Sr. Ministro ter citado Eça de Queirós e de a Sr.ª Deputada Marguerite Yourcenar, cito Fernando Pessoa e, em jeito de «desabafo da alma», solicito ao Sr. Ministro brevidade na resposta.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito obrigado, mas é muito difícil ser breve. Aliás, Sr. Presidente, peço-lhe que não conte o tempo da primeira parte da minha resposta, pois é raro ter de responder a uma intervenção que cita Zenão. Assim, não posso deixar de trazer à Câmara o paradoxo de Zenão, segundo o qual nunca chegaríamos a lado algum, porque, no minuto seguinte, teríamos percorrido metade do caminho, depois, mais metade, depois, outra metade, e nunca lá chegaríamos. Este paradoxo permitiu resolver e criar o cálculo infinitesimal para a sua solução, mas, depois, veio a sangria, como método ultrapassado. Felizmente, estamos do mesmo lado a defender Darwin contra as ameaças criacionistas, que, parece, estão a entrar em grande força na Europa.
Sr.ª Deputada, vejo com grande satisfação que está de acordo com esta afirmação: é necessário reformar as instituições. O que lhe suscita dúvidas é o método para reformar as instituições, mas estamos de acordo em que é preciso reformá-las. E entende que há outras maneiras de o fazer, de exercer pressão sobre as instituições, num quadro de autonomia — não estamos a falar de direcções-gerais, de serviços públicos; estamos a falar de instituições num quadro de autonomia —, em que as relações do Estado com estas instituições são balizadas pela lei, em matéria quer de financiamento quer de orientações para o seu funcionamento.
A Sr.ª Deputada sabe que há instituições de ensino superior, em Portugal, que, mesmo quando estavam com enormes dificuldades de funcionamento, quando chegavam certos períodos do ano contratavam pessoal
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sem qualificações, aumentando drasticamente esse pessoal, num quadro de redução do número de alunos? Qual é a intervenção do Estado nessas matérias, insisto, num quadro de autonomia? Não é num quadro de intervencionismo, é num quadro de autonomia.
Num quadro de autonomia, a responsabilidade colectiva da instituição está comprometida — pois está! A comunidade académica tem a responsabilidade dos actos irresponsáveis dos seus agentes. É mesmo por isto que participa na sua gestão.
É claro que queremos minimizar estas consequências — pois com certeza! Mas minimizar estas consequências não é ceder sistematicamente à chantagem, designadamente, ao crescimento imoderado de despesas em instituições pouco exigentes consigo mesmas ou pouco exigentes com alguns dos seus corpos, porque sabemos que, em primeiro lugar, são as outras instituições a pagar a ineficiência destas instituições, depois é o contribuinte quem está a pagar esta ineficiência e, em última análise, é o próprio aluno, que, numa instituição destas, certamente não é bem ensinado, nem tem boas condições de trabalho.
Portanto, as condições que temos aqui são de fronteira, sobre as quais temos de agir. Não é apenas este o único processo de agir, mas este é um dos processos de agir, de exercer pressão e não ceder, num quadro que, insisto, é de repartição orçamental, previamente acordado com outras instituições. Do que estamos a falar é mesmo para lá deste acordo.
Quanto ao financiamento plurianual, ele não está, naturalmente, restrito às fundações. Aliás, houve sempre financiamento plurianual a muitas instituições, com base em contratos-programa, pelo que não está restrito às fundações.
A Sr.ª Deputada fala-nos em mestrados com poucas vagas. Devo dizer que, neste momento, o Ministério não fixa vagas do ensino superior de 2.º ciclo em nenhuma instituição quando as aprova. A fixação das vagas, neste momento, está restrita aos cursos de 1.º ciclo, aos primeiros ciclos. Mas, naturalmente, se encontrarmos, ou se forem denunciados, casos manifestamente lesivos do interesse público nesta matéria, o Ministério terá de intervir, designadamente em áreas em que não haja possibilidade de oferta complementar, em regiões em que não haja outro tipo de oferta. Isto terá de ser visto caso a caso, mas posso dizer-lhe que, até hoje, não me chegou às mãos qualquer denúncia que obrigasse a uma intervenção do Ministério nesta matéria.
Mas agradeço-lhe uma outra denúncia que me faz e que, devo dizer-lhe, nunca foi feita directamente ao Ministério, pelo que registo-a como uma denúncia. A Sr.ª Deputada diz-nos que existe uma profissão que, para poder ser exercida, exige a inscrição na respectiva ordem profissional (por se tratar de uma profissão regulamentada) e que para o efeito esta mesma ordem exige um determinado número de créditos, coisa que, aliás, não me parece muito legítima, mas, enfim, depois veremos o que lá está, pois não posso pronunciar-me sobre um assunto que não conheço. Assim, a necessidade de um 2.º ciclo para cumprir esta exigência não está a seguir o que está estipulado na lei do financiamento, porque trata-se de mestrados que são obrigatórios para o exercício de uma profissão. Ora, se o Estado reconhece uma associação profissional para regulamentar essa profissão e se essa profissão considera que o grau do mestrado é necessário, se isto for assim, se todos estes pressupostos se confirmarem, então, estamos perante uma ilegalidade. E, perante uma ilegalidade, agradeço uma denúncia, porque desencadearei os processos inspectivos e de intervenção sobre esta matéria. Mas tomo a declaração da Sr.ª Deputada como uma denúncia, que transmitirei, amanhã, à Inspecção-Geral do Ensino Superior.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Vamos, agora, dar início à segunda e última ronda de perguntas, dispondo rigorosamente 2 minutos a cada grupo parlamentar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, de facto, 2 minutos dão não para colocar muito mais questões, mas tão-só para fazer uma breve síntese. Isto, sem prejuízo de lembrar que, talvez por lapso, o Sr. Ministro não respondeu a uma questão que coloquei e que, nomeadamente, o Sr. Deputado José Paulo Carvalho e talvez outros Srs. Deputados repetiram, a propósito da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior e dos custos dessa avaliação e acreditação.
A síntese que eu gostaria de fazer tem a ver com uma sugestão que faço ao Sr. Ministro, no sentido de alterar a lei orgânica do Governo e a nomenclatura do seu Ministério, porque de facto, em vez de ser Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, talvez se adeqúe mais «Ministério da Ciência, Tecnologia e contra o
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Ensino Superior». É que a sua atitude hoje nesta reunião — e, aliás, o próprio Orçamento do Estado — evidencia que o Sr. Ministro não gosta das nossas universidades e dos nossos institutos politécnicos, não gosta, respectivamente, dos seus reitores e presidentes, eleitos e escolhidos pelas instituições. O Sr. Ministro faz uma crítica generalizada à má gestão e à ineficiência, crítica esta — e perdoe-me que seja eu agora a dizer-lho — que é pouco científica, quando feita de forma assim generalizada, lançando um anátema sobre todos os gestores das nossas instituições, e que, na minha óptica, «sacode a água do capote» sobre a responsabilidade do próprio Governo em toda esta ineficiência.
A verdade é que as instituições do ensino superior — e julgo que ambos o reconhecemos — não têm hoje mecanismos suficientes, em termos de capacidade de gestão, para poderem ter uma gestão eficiente, como ambos gostaríamos. E isto é responsabilidade de quem? O Sr. Ministro diz: «É preciso reformar o ensino superior!» Estamos todos de acordo, mas não sou eu (nem qualquer dos Deputados presentes) que estou, há quase três anos, como Ministro da tutela. Portanto, quem não avançou com esta reforma em tempo útil? Quem demorou dois anos e meio para apresentar uma reforma, nomeadamente, da lei da autonomia? Quem é que apresentou uma reforma da lei da autonomia que, na nossa óptica (e já o dissemos várias vezes), não dá à generalidade das instituições mecanismos de gestão e de flexibilidade suficientes para poderem melhorar a sua eficiência? Quem é que não admite alterar o modelo de financiamento do ensino superior? Quem é que ainda não apresentou uma alteração ao Estatuto da Carreira Docente Universitária e do Ensino Superior Politécnico? Portanto, Sr. Ministro, quando estamos, como nesta reunião, a dar visão dos problemas do subfinanciamento do ensino superior não estamos a dar voz a qualquer chantagem — que isto fique claro! —, estamos, única e simplesmente, muito preocupados com a falta de condições que o nosso ensino superior tem para enfrentar este momento particularmente crítico, do ponto de vista da sua internacionalização e da sua competitividade.
Ora, isto tem prejuízos. E, perdoar-me-á, não é o Reitor A, ou o Presidente do Politécnico B, quem está aqui em causa, o que está aqui em causa é, infelizmente, a capacidade que teremos de ter para, nestes tempos, termos instituições que promovam a qualidade do nosso ensino superior.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, já que estamos em fase de citações, houve um académico ilustre, em Évora, Luís António Verney, um dos maiores académicos portugueses, professor na Universidade de Évora, que nos deixou uma frase que rezava mais ou menos o seguinte: «Não devemos querer que a realidade se comporte de acordo com as nossas opiniões, quando estamos a observá-la mas, sim, que as nossas opiniões se adeqúem à realidade que nós observamos». Ou seja, por palavras mais alentejanas, não devemos querer entortar a realidade para termos razão, devemos, sim, observar a realidade para, em cima dela, construirmos as nossas opiniões, de uma forma séria, rigorosa e principalmente humilde.
A Universidade de Évora tem muitas dificuldades — claro que tem! Mas também aqui devo dizer — até porque sou professor lá — que nunca como hoje a Universidade de Évora teve um período científico de dinâmica, de refundação estatutária e de empreendedorismo como aquele que atravessa hoje. Tem muitas dificuldades — tem sim! —, mas também tem muita vitalidade e uma grande vontade de «dar a volta por cima» e de ser, como foi no passado e esperemos que continue a ser, o mais importante motor de desenvolvimento do Alentejo.
Quero colocar duas questões muito rápidas, a primeira diz respeito à reestruturação de instituições e concretização de parcerias a nível nacional e regional. Este é um dos objectivos inscritos no relatório que acompanha o Orçamento do Estado, e agradeço que o Sr. Ministro se refira de uma maneira mais concreta a esta área. Repito: reestruturação de instituições e concretização de parcerias a nível nacional e regional.
Segunda questão, também está inscrita a assumpção do insucesso como critério contratual, esta matéria tem implicações ao nível não só da avaliação das instituições como também, segundo penso, do seu próprio financiamento. Gostaria que o Sr. Ministro nos esclarecesse esta questão.
São estas as questões, Sr. Presidente. Não consegui demorar menos tempo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, antes de colocar três questões breves ao Sr. Ministro, gostaria de deixar uma nota. Se alguém tem uma visão miserabilista do ensino superior é o Sr. Ministro, que recorrentemente se refere ao ensino superior como sendo de um nível medíocre e perante o qual é preciso a «mão sábia» do Ministro para contrariar os devaneios da gestão autónoma do ensino superior.
Em relação ao 1% do PIB, o tão propagandeado número mítico de 1%, como referiu o Sr. Deputado Bravo Nico, pergunto ao Sr. Ministro se confirma que esta não é de facto a percentagem do PIB afecta ao investimento em investigação e desenvolvimento mas, sim, a soma das três parcelas, a da acção social escolar, a do ensino superior e a da ciência e tecnologia. Isto porque, no ensino superior, de acordo com o inquérito levado a cabo em 2005, sobre o potencial científico e tecnológico nacional, apenas 50% da parcela do ensino superior pode ser contabilizada como investigação e desenvolvimento. Mas, das comparações que fazemos deste número com os números do Orçamento, não conseguimos apurar o 1% do PIB afecto às questões da investigação.
Sobre a acção social escolar, o Sr. Ministro já por diversas vezes nos disse que está garantida a cobertura da acção social escolar ao 2.º ciclo. No entanto, o que se tem vindo a verificar é que, independentemente de ser ou não um 2.º ciclo requerido para o desempenho de uma profissão — matéria em que a opinião do Governo nem sempre coincide com a opinião das ordens profissionais ou do mercado (aliás, o sacrossanto mercado aqui também dita muita coisa) —, as propinas dos mestrados chamados temáticos, aqueles que não são de fileira, aumentam exponencialmente. Ou seja, as propinas passam de 900 € para valores acima dos 6000 €. Ora, não nos vai dizer certamente que a acção social escolar, particularmente com este orçamento que conhecemos, vai cobrir estes aumentos das propinas.
Ainda sobre a acção social escolar, Sr. Ministro, como é que justifica a centralização no Fundo de Acção Social quando sabemos que, ao contrário do que o Sr. Ministro anunciou no ano passado, nem todas as instituições do ensino superior requereram essa centralização.
Para terminar, uma última pergunta: na área da ciência e tecnologia, o laboratório de nanotecnologia é anunciado como uma grande conquista. De acordo com o anunciado, estão previstos 200 novos investigadores, tendo em conta que há que repartir pelos diversos países, mas, por enquanto, é só Portugal e Espanha, pergunto: o Governo está em condições de garantir que, sendo um laboratório internacional, vai financiar, na área dos valores da média de financiamento europeu, por investigador/ano? Ou seja, na área dos 200 000 €/ano? É que isto implicaria, no mínimo, 20 milhões de euros para o financiamento anual, só para o pagamento das despesas deste laboratório.
Sr. Ministro, gostaria de saber qual é a fatia total do financiamento destinada às cátedras convidadas e que são anunciadas no relatório. O Orçamento do Estado vai cobrir todos os gastos envolvidos com estas cátedras, inclusivamente a cátedra em si, o leccionamento da disciplina, etc., ou apenas o salário do professor catedrático convidado?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, tentarei ser, como há pouco sugeriu, «meteórico», e, para isto, começo por avisar que não vou fazer citações.
Risos.
Começo por fazer um comentário — e peço-lhe, Sr. Ministro, que não leve a mal, pois é uma análise que estou a fazer da sua intervenção — e só depois farei um pedido.
Sr. Ministro, agora começo a perceber um pouco a lógica que esteve por detrás da alteração e da criação do novo regime jurídico das instituições de ensino superior. Penso que o Sr. Ministro, por vezes, tem uma visão que é um misto entre alguma desconfiança face às instituições de ensino superior e, simultaneamente, alguma tentação dirigista sobre as mesmas instituições. O que, sinceramente, não me parece positivo — mas, como lhe digo, é um comentário.
Passo à formulação do pedido porque o Sr. Ministro deixou praticamente todas as perguntas que lhe coloquei sem resposta. Portanto, o pedido que lhe faço é se é possível dar as respostas, com a assumpção de compromissos concretos por parte do Governo, relativamente às questões que coloquei, sendo que o Sr.
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Deputado Pedro Duarte também já reforçou o facto de o Sr. Ministro não se ter referido à questão da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior.
Por isso, se for possível, peço-lhe que o faça agora.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, devo dizer que estou muito arrependida da minha intervenção anterior, porque, com certeza, não fui suficientemente contundente ou clara naquilo que disse.
Sr. Ministro, hoje em Portugal, com o estrangulamento do orçamento e do financiamento das instituições de ensino superior, o que acontece é que as instituições procuram receitas próprias, criando preços inacreditáveis para o 2.º ciclo de formação. E o que acontece hoje em dia — e penso que nunca tinha acontecido até hoje, pelo menos com esta gravidade, em Portugal — é haver pessoas que deixam de estudar por não terem condições socioeconómicas para continuar a fazê-lo. E esta situação é responsabilidade sua, porque é resultado da política que o Sr. Ministro implementou. Portanto, de duas, uma: ou o Sr. Ministro coloca um travão no valor das propinas que é estabelecido para os mestrados, ou o Sr. Ministro reforça as verbas para a acção social escolar no 2.º ciclo de formação. Mas tem de resolver esta questão de uma forma ou de outra, porque não é aceitável que quem quer continuar a estudar e tem capacidade para o fazer não o possa fazer por não ter dinheiro.
Segunda questão: o Sr. Ministro não compreende quais vão ser os efeitos da sua política nas instituições de ensino superior. Há muita coisa a fazer; é certo que há muita coisa a fazer! Mas o Sr. Ministro não compreende que, estrangulando as universidades em termos orçamentais, não vai sobrar nada para investir no futuro e que, portanto, não vai haver qualquer reforma para fazer. O que se compreende é que o Sr. Ministro entende que a autonomia universitária é um obstáculo à reforma e à modernização do ensino superior em Portugal.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — É isto que se compreende! Só que não é, Sr. Ministro! Percebe-se que instrumentos de gestão fundamentais como o financiamento plurianual nunca tenham sido oferecidos às instituições para que elas verdadeiramente possam ter uma estratégia de dinamização e reforma para o futuro.
Sobre a situação que lhe contei relativamente à Ordem dos Economistas, fico espantada que o Sr. Ministro não saiba, vem nos jornais, é pública! Por fim, gostaria que me respondesse a uma questão sobre os bolseiros. É hoje sabido que temos milhares de bolseiros a desempenharem funções estruturantes no seu Ministério, nas instituições de investigação científica. Estes bolseiros merecem fazer uma carreira estável, merecem um contrato de trabalho, porque é isto que eles fazem, eles trabalham em investigação científica. Pergunto: quais são as suas expectativas, a sua vontade para a alteração do Estatuto do Bolseiro?
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, antes de mais, quero apenas dizer-lhe para não se arrepender das suas intervenções, que são sempre bem-vindas, como, aliás, as dos demais Deputados, porque são um contributo riquíssimo para o debate.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e, atento o adiantado da hora, peço que o faça com brevidade, dado o leque de questões que tem para responder.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, havia uma promessa, que já está violada, de que a reunião terminaria às 20 horas. Mas fico satisfeito por o Sr. Presidente me dar a palavra já depois das 20 horas, porque, de qualquer forma, a promessa já estava violada mesmo antes de eu começar.
Para começar, tenho muita pena que, na intervenção inicial, o Sr. Deputado Pedro Duarte tenha caído nas declarações fáceis. Para responder no seu tom, Sr. Deputado, é claro que este Ministro é da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior e é contra o mau ensino superior e a favor do bom e do excelente ensino superior que existe em Portugal.
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Fiquei um pouco perplexo com o facto de o Sr. Deputado ter dito a certa altura que gostaria de propor uma alteração à lei de financiamento. Não percebi se era este o caso, mas este já não é o momento de entrarmos neste diálogo.
Há uma questão que colocou e tem todo o direito de obter uma resposta (porque vinha de trás e não houve tempo de dar resposta) e que diz respeito à Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior. Lembro que já respondi várias vezes a esta questão.
Esta Agência tem um fundo e tem uma verba inicial de instalação, porque, como se deve compreender, durante os primeiros anos, precisa de uma verba de instalação, pois não viverá apenas das receitas, e foi estritamente indicado nos seus estatutos que não só se deve orientar pelos seus custos como estes custos devem orientar-se estritamente no respeito da prática seguida na Europa pelas agências similares. Ora, esta prática foi largamente difundida e discutida aquando da avaliação do sistema de avaliação em Portugal, tendo em conta os custos de todos os países que foram reportados nessa altura. Verificou-se, aliás, que grande parte dos custos que actualmente são suportados por instituições de ensino superior, designadamente junto de ordens profissionais e que deixarão de os suportar, são infinitamente superiores aos que são a prática internacional da acreditação de cursos ou de instituições que se praticam na Europa e que certamente a fiscalização do Estado sobre a Agência obrigará a que sejam contidos nesses limites. Portanto, não há aqui qualquer medo a estabelecer.
Sr. Deputado Bravo Nico, já que não posso citar Verney, gostaria de dizer que, a meu ver, esta questão da reestruturação das instituições e dos consórcios é um dos principais desafios que temos pela frente. E devo dizer, de uma forma incisiva, que a reforma do ensino superior começa de facto depois da aprovação da legislação. Começa agora! Portanto, tudo é possível na reestruturação das instituições de ensino superior portuguesas. Apesar de muitas das instituições estarem profundamente envelhecidas e serem conservadoras têm elementos extraordinariamente importantes e decisivos de transformação, esta é a realidade das instituições de ensino superior, quer em Portugal, quer noutros países.
Como e com que rapidez esta evolução se processará? Bom, isto depende não apenas das instituições de ensino superior mas também das mensagens da sociedade a estas instituições, designadamente as mensagens dadas por todos os grupos parlamentares. Apoiam ou não os reformadores dentro das instituições de ensino superior contra as forças mais conservadoras, que, em alguns casos, têm o poder de impedir ou atrasar a transformação? Esta é a questão decisiva que, do ponto de vista político, é colocada a Portugal nos próximos anos. E a criação de parcerias e consórcios entre instituições, a reestruturação de unidades orgânicas de instituições, vai contra muitos interesses estabelecidos, mas tem de ser feita! E tem de ser feita num quadro de autonomia das instituições e num quadro de orientações de que o Governo não pode, nem deve, demitir-se, seja em Portugal ou em qualquer outro país.
Esta experiência, que vamos ter, de instituições muito mais autónomas do que foram no passado (esta autonomia é-lhes conferida pela lei) vai exigir da parte do Estado e, designadamente, da parte dos governos uma responsabilidade acrescida em matéria de orientação e de avaliação das instituições.
O Sr. Deputado José Paulo Carvalho, Partido Comunista Português, também não resistiu ao miserabilismo de 1 742 328 120 €. Estamos, portanto, a falar de mil setecentos e quarenta e dois milhões, trezentos e vinte e oito mil, cento e vinte «miserabilismos» que estão em aumento relativamente a todos os anos anteriores. Posso fornecer a série ao Sr. Deputado.
Quanto à acção social escolar, insisto pela milionésima vez que são cobertos os segundos ciclos. A centralização do pagamento das bolsas, como lhe chamou o Sr. Deputado, ou seja, o pagamento feito atempadamente pela Direcção-Geral do Ensino Superior na conta do bolseiro, instrumento de gestão naturalmente precioso, foi apenas feito nas instituições que o quiseram. É feito, portanto, em praticamente todos os institutos politçcnicos, porque todos quiseram» A centralização do pagamento das bolsas é feita nas instituições politécnicas e apenas nas instituições universitárias que o desejam e em mais nenhuma.
O orçamento previsto para o Laboratório Ibérico Internacional de Nanotecnologia, acordado por tratado entre Portugal e Espanha – e devo insistir que se trata da primeira organização científica internacional que será sedeada na Península Ibérica –, é de 30 milhões de euros por ano, a partilhar pelos dois países e enquanto não entrarem outros neste instituto. Esperamos, contudo, que venham a juntar-se mais países a partir da sua entrada em funcionamento.
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Relativamente ao CDS-PP, julgo que não havia nenhuma pergunta, sendo apenas necessário afirmar que a responsabilidade do Estado não se deve confundir com nenhum autoritarismo. Seria dramático que os Srs. Deputados dessem ao País e às instituições de ensino superior a ideia de que a autonomia das instituições implica a total desresponsabilização do Estado na orientação do ensino superior português. Isto seria dramático e espero que esta ideia de que as instituições têm de ter mais autonomia, coisa que consagrámos na lei, ande a par com o aumento da responsabilidade do Estado em matéria de orientações gerais sobre a satisfação do interesse público da generalidade das instituições do ensino superior, designadamente as públicas.
A Sr.ª Deputada Ana Drago falou das receitas próprias das instituições. Ainda bem que as instituições do ensino superior português têm receitas próprias. É por isso que têm autonomia administrativa e financeira.
Aliás, têm hoje uma autonomia acrescida. Têm menos receitas as instituições de ensino superior portuguesas, designadamente as universidades, do que todas as universidades que, na Europa, estão em competição crescente com elas por investigadores, por professores e por alunos pós-graduados. Têm menos porquê? Porque actualmente apenas nalguns segmentos atingiram o nível de qualidade e relevância que lhes permite ter uma satisfação directa e remunerada de interesses sociais.
Colectivamente, sabemos também que muitas áreas das instituições de ensino superior não são passíveis de gerar directamente receitas próprias e por isso é que têm de cobrir um vasto leque de actividades que lhes permita financiar muitas actividades. Também são financiadas pelo Orçamento do Estado, naturalmente, e pelas receitas de outras actividades das próprias instituições de ensino superior. Não me fará a injúria de acreditar que não quero que as instituições de ensino superior portuguesas continuem a financiar Matemática, Estudos Clássicos ou outras actividades que apenas a longo prazo têm impacto na vida económica do País.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados, chegamos assim ao final da nossa reunião.
Em nome da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, resta-me agradecer ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado o prestimoso contributo que deram para o esclarecimento das questões que estão sob a sua tutela, num debate rico, vivo e, sobretudo, profícuo em citações literárias de diversos quadrantes.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 20 horas e 20 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.