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Quinta-feira, 23 de Outubro de 2008 II Série-OE — Número 1
X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 22 de Outubro de 2008
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 10 horas e 30 minutos.
No âmbito da discussão prévia ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009, o Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos) apresentou o Orçamento.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo), os Srs. Deputados José Manuel Ribeiro (PSD), Afonso Candal e António Gameiro (PS), Diogo Feio (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Francisco Louçã (BE), Duarte Pacheco (PSD), Maximiano Martins (PS), Eugénio Rosa (PCP) e Hortense Martins (PS).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 35 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Neto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.
Eram 10 horas e 30 minutos.
Começo por agradecer a presença do Sr. Ministro de Estado e das Finanças e do Sr. Secretário de Estado.
Esta é a primeira reunião para discussão, na generalidade, do Orçamento do Estado para 2009.
A metodologia para esta reunião será como tem sido norma na Comissão de Orçamento e Finanças, isto é, haverá uma primeira intervenção do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, pelo tempo que entender – e o Sr.
Ministro já me disse que a sua exposição inicial não será muito longa –, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas.
Como também é normal nesta Comissão, esta primeira ronda terá uma dignidade superior às demais do ponto de vista do tempo, uma vez que cada grupo parlamentar disporá de 15 minutos e a resposta será individualizada, ou seja, o Sr. Ministro responderá às perguntas, uma a uma.
Finda esta primeira ronda, teremos mais duas: uma segunda em que cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos, sendo que as perguntas serão agrupadas em bloco e o Sr. Ministro também responderá em bloco e, se for o caso, uma terceira ronda, com 3 minutos para cada grupo parlamentar, a que o Sr. Ministro responderá em bloco.
Gostava de sublinhar aos Srs. Deputados a necessidade respeitarem os tempos que estão cometidos a cada grupo parlamentar, tanto mais que o Sr. Ministro já me adiantou que, na parte da tarde, vai ter de ausentar-se cerca das 17 horas e 30 minutos. Portanto, é fundamental rigor no cumprimento do tempo que está atribuído a cada um dos grupos parlamentares.
O Orçamento do Estado para 2009, que hoje começa ser debatido na generalidade, foi já distribuído aos Srs. Deputados. No seu sumário executivo, tem elencada a dificuldade do actual cenário macroeconómico, que todos conhecemos, mas é para dar a conhecer em traços gerais as linhas de força que enformam este Orçamento que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças aqui está, hoje, com a sua equipa.
Assim, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com todo o gosto que eu próprio e o Sr. Secretário de Estado nos apresentamos nesta Comissão para dar início ao debate em torno da proposta de Orçamento para 2009.
Agradeço ao Sr. Presidente o apelo que fez à disciplina na gestão dos tempos. Prevejo um longo dia de trabalho. A disponibilidade da minha parte é grande, como sempre, para esclarecer os Srs. Deputados, mas temo que, se prolongarmos muito esta reunião, a minha resistência não seja proporcional à disponibilidade. Agradeço, pois, o apelo do Sr. Presidente e espero que consigamos fazer uma boa gestão do nosso tempo.
Conforme acabou de referir o Sr. Presidente, esta proposta de Orçamento é apresentada à Assembleia da República num momento em que a conjuntura internacional, financeira e económica, é particularmente adversa. É uma conjuntura que, nos últimos meses, se deteriorou ainda mais devido ao aprofundamento da crise financeira que tem vindo a afectar o funcionamento dos mercados internacionais.
Este Orçamento que aqui vos é proposto não ignora essa realidade nem ignora as repercussões que essa conjuntura externa terá, já está a ter, sobre a economia portuguesa. Este é um Orçamento de combate aos efeitos desta crise internacional sobre a economia portuguesa.
É um Orçamento de combate a esses efeitos porque preconiza um conjunto de apoios, que reputamos importantes, para as famílias e um conjunto de apoios, também importantes, para a economia e para as empresas, mas é, também, um Orçamento de combate ao facilitismo, à demagogia e às propostas populistas.
É um Orçamento de combate ao facilitismo, porque pretende preservar o que conseguimos nos últimos anos — salvaguardar a saúde das contas públicas.
De facto, ao longo dos últimos três anos, o País fez um esforço muito significativo para pôr em ordem as contas públicas, para reduzir o défice das contas públicas até um nível historicamente baixo nunca atingido desde que entrámos em democracia. É fundamental que a solidez até agora conseguida seja mantida, não seja agravada, de forma a podermos assegurar que Portugal continuará a ter condições não só para resistir à presente conjuntura adversa, não só para poder dar resposta e apoiar os portugueses e as famílias nas dificuldades que têm de enfrentar, mas também de forma a manter a robustez necessária para que, uma vez passa-
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da esta conjuntura, tenhamos condições de retomar o crescimento, a criação de emprego e o progresso da nossa economia.
Por isso mesmo, este é um Orçamento que, como referi, é feito com realismo, com prudência e com rigor.
É um Orçamento feito com realismo porque não ignoramos a conjuntura internacional e os seus efeitos sobre a economia portuguesa. O crescimento mundial está a baixar, o crescimento das economias com as quais nos relacionamos mais directamente está a baixar, o crescimento da economia portuguesa também já baixa este ano relativamente ao ano passado e a nossa previsão é que também irá baixar no ano 2009. Temos de fazer frente a estas repercussões.
É um Orçamento prudente porque os pressupostos em que assentamos as nossas projecções estão em linha com os adoptados no seio da União Europeia. Mas também adianto que são pressupostos assumidos num contexto de incerteza acrescida quanto ao evoluir da situação internacional e às suas possíveis implicações sobre a economia portuguesa.
É um Orçamento de rigor que, pelas razões que referi, não quer comprometer a saúde das contas públicas até agora já conseguida.
Está preconizado um conjunto de medidas importantes de apoio às famílias e às empresas.
Gostaria de destacar que, no âmbito do apoio às famílias, este Orçamento corporiza um conjunto de iniciativas já anunciadas que visam aliviar os encargos adicionais que as famílias portuguesas estão a suportar com o desenvolvimento dos mercados financeiros, expresso, em particular, no agravamento das taxas de juro ao longo do último ano.
Temos, ainda, medidas que procuram dar um apoio às empresas, quer se trate de alívio fiscal, como, por exemplo, a redução para metade da taxa de IRC, abrangendo cerca de 80% das nossas empresas — e é uma medida que beneficiará, diria, a globalidade das nossas pequenas e médias empresas —, os apoios no sentido do financiamento da respectiva actividade através do lançamento de linhas de crédito especificamente vocacionadas para esse fim.
Baixando impostos, dando apoio sociais, respondemos às exigências e às necessidades de apoio que a economia e as famílias reclamam.
Quanto ao conjunto de apoios que estão preconizados neste Orçamento, diria que o conjunto das políticas tem a ver com redução dos impostos, quer do IRC, quer do IVA em um ponto percentual, tal como já anunciado, quer do IMI, quer do pagamento por conta por parte das pequenas e médias empresas, e, ainda, com a concessão de apoios sociais em sede do abono de família, da acção social escolar, do transporte escolar, e o aumento dos funcionários públicos — 0,4 pontos percentuais acima da inflação esperada. Todas estas medidas visam, de facto, dar um estímulo à capacidade dos portugueses para resistirem à situação actual e, no seu conjunto, ora por impostos que não são cobrados, ora por apoios que são prestados efectivamente, representam um esforço orçamental da ordem de 1,1 milhões de euros.
É com este Orçamento que nos propomos enfrentar o ano 2009. É com este Orçamento que nos propomos ajudar as famílias e as empresas a enfrentarem as dificuldades.
Não pretendemos criar a ilusão de que o Governo vai resolver inteiramente os problemas dos portugueses, isto é, não vamos substituir-nos aos portugueses naquilo que também deve ser o seu próprio esforço e a sua responsabilidade para enfrentarem as dificuldades, mas estaremos com eles. Estaremos ao lado dos portugueses para melhor enfrentarem essas dificuldades.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
Vamos dar início ao debate, começando pelo PSD, o maior partido da oposição.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, dispondo de 15 minutos para colocar as suas perguntas.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, há uma máxima, na economia, que diz que pode conseguir-se enganar algumas pessoas durante todo o tempo, pode conseguir-se enganar toda a gente durante algum tempo, mas não se consegue enganar toda a gente durante todo o tempo. Esta máxima assenta que nem uma luva a este Orçamento do Estado e a este Governo.
Vejamos porquê: o Sr. Ministro das Finanças, na apresentação do Orçamento do Estado para 2009, classificou-o – e agora voltou a fazê-lo – de realista, prudente e rigoroso. Sr. Ministro, nada mais enganador. Na verdade, este Orçamento tem pouco de realista, de prudente e quanto ao rigor, esse, nem vê-lo!
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Desde logo, no que se refere ao crescimento o económico, o Governo prevê um crescimento de 0,6% para a nossa economia, enquanto na Alemanha se prevê um crescimento de 0%, em França de 0,2%, em Itália e em Espanha de -1,2% e na Irlanda de -6%.
Mais: a previsão da zona euro situa-se em 0,2%, ou seja, três vezes menos do que o Governo prevê para Portugal, o que não deixa de ser surpreendente, sobretudo pela ilusão que o Governo pretende criar, porque, historicamente, Sr. Ministro, o nosso país nunca teve este comportamento face à zona euro e é importante que se diga como quer agora o Governo, nestas condições, que isso aconteça.
Não bastando, é o próprio Governo que rejeita as previsões do FMI para a economia portuguesa, mas é o mesmo Governo que as utiliza quando já lhe dá jeito, ou seja quando pretende fazer comparações com outros países europeus ou com a zona euro.
Bem pode o Governo afirmar que a sua previsão pretende transmitir confiança às famílias e às empresas. É um argumento que consideramos, no mínimo, lamentável.
Sr. Ministro, pergunto se é com esta manifesta ausência de rigor que se transmite confiança. É a faltar à verdade que se transmite confiança? É a vender ilusões que se transmite confiança? Não, Sr. Ministro! Só se transmite confiança falando verdade, trazendo as pessoas à realidade, preparando-as para o que aí vem e apresentando não números irreais, mas, antes, medidas concretas e eficazes para resolver os seus problemas, e é nisto que o Governo falha.
Será que o Governo não compreende que o pior que se pode fazer é criar expectativas – falsas, direi –, que se desfazem quando se começar a sentir na pele a dura realidade? No que se refere ao desemprego, o Governo prevê uma taxa igual à de 2008, ou seja, 7,6%. Sr. Ministro, isto acontece num cenário de forte abrandamento da economia, parecendo que o Governo não consegue compreender a realidade que está perante todos, e o mesmo raciocínio aplica-se, precisamente, à previsão do emprego.
Seria inteligente que o Governo entendesse as palavras do Sr. Presidente da República quando diz temer um surto de desemprego. São palavras que o Governo devia ter em boa em conta, sobretudo nesta fase.
No investimento, apesar da conhecida situação financeira grave, o Orçamento aponta para um crescimento praticamente igual ao estimado para 2008: 1,7%, em 2008, e 1,5%, em 2009.
Por outro lado, não tem adesão à realidade a estimativa da receita, nomeadamente a fiscal, que, como todos sabemos, deve assentar em bases cautelosas. O melhor exemplo do que refiro é o IVA. Apesar da redução da taxa máxima ocorrida em 2008 e do mais que previsível abrandamento da economia e da actividade económica, o Governo prevê para o próximo ano um crescimento da sua receita em 3 ou 4%.
O mesmo se passa no que se refere ao ISP. Para o presente ano a estimativa do Governo para a receita de ISP consagra uma redução de 7,2% face ao inicialmente orçamentado. Todavia, o Governo, não querendo novamente compreender este fenómeno, apresenta um crescimento orçamentado desta receita para 2009 de 3,4%.
Sr. Ministro, parece evidente a intenção do Governo no que se refere à receita. Inquina a receita exacerbando-a o suficiente para acomodar a despesa que não consegue ou não quer controlar. É mais «gordura» para um Estado já demasiado excedentário no que se refere a despesas de funcionamento.
Outra matéria que merece a nossa análise atenta é, precisamente, a despesa pública, e, Sr. Ministro, voume quedar por alguns momentos.
O Governo apresenta para a despesa pública o valor de 46% do PIB, tentando passar a ideia de que, em 2009, se atingirá o mais baixo valor dos últimos anos, o que, na óptica do Governo, representaria o sucesso da sua governação, nomeadamente do PRACE.
Sr. Ministro, novamente, nada mais enganador. Tal só acontece à custa de uma alteração metodológica no registo das contribuições para a Caixa Geral de Aposentações, que merece umas poucas palavras no relatório do Orçamento, mas que não merece o rigor político e técnico do Governo.
Na verdade, nos vários quadros e gráficos que comparam a evolução dos vários agregados das despesas e das receitas públicas, nunca é referida a não comparabilidade dos dados.
Não estando contra esta alteração metodológica, que até nos parece lógica, não podemos deixar de transmitir o nosso desagrado pelo facto de o Governo não ter assegurado a comparabilidade dos dados antes e depois destas alterações.
Não o fazendo, deveria ter assinalado devidamente tal situação sempre que isso se impusesse. Infelizmente, não foi assim e isto, que parece ser de somenos importância, tem toda a importância. Ao ter procedido des-
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ta forma, o Governo, em especial o Sr. Ministro das Finanças, arrisca-se a que se conclua que tentou esconder os verdadeiros números. E isto é inaceitável.
Vamos, então, aos verdadeiros números: numa base comparável, a despesa pública atingirá, em 2009, o valor mais alto de sempre face ao PIB, um valor historicamente negativo: 47,8%. É mesmo este o número.
Isto quer dizer que, em 2009, a despesa pública crescerá, face a 2008, cerca de 7%, num ano – recorde-se – em que a taxa de inflação prevista será de 2,5%. Sr. Ministro, arrisco a dize-lo desta forma: de facto, crescimentos da despesa a este nível fazem lembrar outros tempos em que V. Ex.ª fazia parte do governo. Mais: a despesa corrente primária crescerá 5%, provando que a «mãe» de todas as reformas deste Governo, o PRACE, foi e é um profundo fracasso.
Outra consequência da alteração metodológica é na carga fiscal e contributiva. Novamente, o valor que o Governo apresenta não corresponde à verdade, pois não assenta numa base comparável. Nesta base, a comparável, a carga fiscal e contributiva atinge o valor histórico de 38%, o mais alto valor de sempre.
Nunca, Sr. Ministro, a carga fiscal foi tão elevada em Portugal! Para quem anunciou com tanta ênfase, como fez o Sr. Ministro, e já o fez novamente aqui hoje, que este Orçamento reduz impostos e a carga fiscal, fica esclarecida a verdade.
A ideia que fica deste Orçamento é que ele foi construído ao contrário. Ou seja, o Governo definiu o valor que queria para o crescimento económico, definiu o valor que queria para o défice público e partir daí manobrou os números a seu bel-prazer e conveniência, num exercício de total ausência de seriedade e rigor técnicos.
Sr. Ministro, quanto aos mega-investimentos, faço duas críticas concretas. Primeira: ausência de informações sobre os encargos futuros destes investimentos, numa falta de transparência sem paralelo. O que está aqui, Sr. Ministro, é praticamente nada! Segunda crítica, obviamente dirigida ao Governo e que apela a algum sentido de responsabilidade nesta altura: não compreende que este é mais um momento para o Governo repensar e reanalisar os grandes investimentos públicos e criar prioridades.
Permita-me, Sr. Ministro, que a este propósito recorra a algumas individualidades portuguesas que têm defendido esta solução e vou até recorrer a alguns ex-ministros socialistas, como seja o Prof. Campos e Cunha, ou então, muito mais recentemente, o Sr. Eng.º João Cravinho, que, como sabemos, é o «pai» das SCUT.
Mas, se este Orçamento permite analisar as opções políticas do Governo para 2009, ele é o corolário de uma política económica e orçamental, que, nos últimos quatro anos, contribuiu para agravar a divergência de Portugal face ao rendimento médio europeu, tornando o País mais pobre. Para provar isto, contrariamente aos risos do Srs. Deputados, que se devem rir pelo País estar mais pobre, convido o Sr. Ministro a fazer um exercício relativamente simples.
Sr. Ministro, vamos comparar a actual situação orçamental com a que se vivia em finais de 2004, o último orçamental completo da responsabilidade do governo PSD e CDS-PP. Sr. Ministro, neste simples exercício, vamos constatar a actual verdade.
O rendimento por habitante da Europa a 27, em 2004, era 74,7%, e em 2009, era 73,3%. Pior! O crescimento económico era 1,5%, em 2004, e 0,6%, em 2009. Pior! O desemprego era 6,7%, em 2004, e 7,6%, em 2009. Pior! Quanto ao défice externo, a percentagem do PIB foi 6,1% em 2004, e 10,6% em 2008. Em 2009 ainda será pior! O endividamento do País foi 64%, em 2004, e 100%, em 2009.
A despesa pública total foi, em 2004, 46,5% e, em 2009, 47,8%. Sr. Ministro, a despesa corrente foi, em 2004, 42%, e em 2009, 44,3%.
A despesa corrente primária, em 2004, foi 39,3% e, em 2009, foi 40,9%.
A despesa pública, em 2004, foi 58,3% e, em 2009, 64%.
Sr. Ministro, o défice público, a bem da verdade, foi, em 2004, 3,4%, e em 2009, 2,2%.
Protestos do PS.
Sr. Ministro, não são dados de 2004?
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Melhorou, Sr. Ministro, mas, como «não há bela sem senão», vamos analisar a outra componente, que é a carga fiscal. Sr. Ministro, a carga fiscal, em 2004, foi 33,8% e, em 2009, foi 38%.
Sr. Ministro, se dúvidas houvesse quanto ao único dado que melhora de 2004 a 2009, ficavam completamente esclarecidas pela análise deste índice, desse indicador que é a carga fiscal.
Protestos do PS.
Sei que dói, Srs. Deputados, mas vão ter de ouvir até ao final. Esta comparação mostra que os últimos cinco anos, até 2009, foram perdidos em termos de consolidação orçamental, apesar dos sacrifícios que foram pedidos aos portugueses, sobretudo a brutal e generalizada subida de impostos decidida por este Governo.
Mas os números não ficam por aqui, Sr. Ministro: em 2009, Portugal entrará no 10.º ano consecutivo de divergência face ao nível médio europeu, ocupando o 21.º lugar no ranking da União a 27.
Este é novamente o resultado de uma política económica errada que nunca esteve virada para a competitividade da nossa economia, como se comprova pela evolução de Portugal nos principais rankings de competitividade internacionais entre 2004 e 2008.
No ranking do Institute of Management Development, o nosso país perdeu cinco posições, passou do 32.º lugar para o 37.º lugar. No ranking do World Economic Forum, o resultado ainda é pior: Portugal perde 18 lugares, da 25.º posição para a 43.º.
Finalmente, o Orçamento do Estado para 2009 corporiza o falhanço das promessas do Partido Socialista e do Eng.º José Sócrates em Fevereiro de 2005. O crescimento económico previsto para 2009 é de 0,6%, mesmo assim bem acima do previsto pelo FMI de 0,1%, deixando os 3% prometidos como uma miragem.
Por outro lado, o crescimento previsto para o emprego não permitirá a criação dos 159 000 postos de trabalhos ao longo das Legislatura – «promessas, promessas, levou-as o vento!» Fica claro que este Orçamento fomenta a «subsídiodependência», numa miríade de medidazinhas, não apontando para a resolução de qualquer problema. O Orçamento do Estado para 2009 deveria conter medidas efectivas para ajudar a resolver os problemas das famílias e das PME.
Protestos do PS.
Ó Srs. Deputados, já lá chegaremos! Tenham mais calma! Sei que dói, mas vão ter de ouvir mesmo até ao final.
Foi neste sentido que a Presidente do PSD, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, já propôs algumas medidas, que o Grupo Parlamentar do PSD apresentará e que convém aqui reforçar – e os Srs. Deputados não queriam, mas vão ter de ouvi-las.
Passo a enunciá-las. Primeira proposta: reduzir o custo do trabalho e, dessa forma, defender o emprego, mediante a descida de 1% da taxa social única, suportada pelas empresas patronais.
Segunda proposta: para fazer face à previsível dificuldade da recuperação do emprego, propomos um alargamento excepcional do período de atribuição do subsídio de desemprego.
Terceira proposta: a fim de fomentar a poupança e reparar uma grave injustiça cometida por este Governo, propomos a reposição do regime que vigorava nos certificados de aforro.
Quarta proposta: quanto às PME, vamos insistir na alteração do regime de pagamento do IVA, de modo a que este deixe de ser efectuado no momento da prestação do serviço ou da facturação e passe a ser pago no momento do efectivo recebimento.
Quinta proposta: pagamento atempado das dívidas do Estado às empresas, bem como a possibilidade de o Estado negociar com a banca a realização de factoring com garantia.
Sexta proposta: faculdade de as empresas, que sejam credoras do Estado, realizarem, no cumprimento das suas obrigações fiscais, a compensação de créditos.
Sétima proposta: extinção do pagamento especial por conta, criado como instrumento de combate à fraude e evasão fiscais.
Sr. Ministro, estas são medidas que o PSD considera realistas e solidárias e que se impõem num momento complexo e difícil para as famílias e para as empresas.
Sr. Ministro, é assim que se cria a verdadeira confiança!
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Entretanto, o Sr. Ministro já veio protestar – e hoje voltou a fazer algumas alusões, embora de forma indirecta – contra as medidas do PSD.
Ó Sr. Ministro, como compreendemos tão bem o seu desconforto! O senhor, de facto, transmitiu um enorme desconforto.
Mas também aqui convidamo-lo a vislumbrar o mérito das mesmas e a não se enredar na teia de «aquilo que é da oposição é mau«»! Sr. Ministro, nem sempre ç assim; na maior parte das vezes, ç precisamente o contrário, é mesmo tudo bom.
Protestos do PS.
E, a respeito da sua reacção a estas medidas, Sr. Ministro, permita-me dizer-lhe, olhos nos olhos, que, em nossa opinião, as suas reacções partiram de um juízo precipitado e foram pouco racionais.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — As vossas propostas, e isso é que é mau!
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Ministro, com as suas reacções e com aquilo que referiu relativamente às propostas do PSD, o que o senhor veio transmitir, no essencial, foi que o défice estava a ser conseguido à custa das famílias e das PME portuguesas. São estas, Sr. Ministro, que, pegando nas suas palavras, acabam por financiar a «gordura» do Estado, que este próprio Governo promove.
Por outro lado, ignorar as virtudes e as repercussões destas medidas, nomeadamente o fôlego que as mesmas vêm proporcionar à economia e às famílias portuguesas, é incompreensível.
Sr. Ministro, esquecer que a economia é dinâmica e não estática, como quer dar ou deu a entender, e que reage aos bons estímulos que lhe dão, também não fica bem a quem ocupa o cargo de V. Ex.ª.
Sr. Ministro, para terminar (julgo estar no limite do tempo), o PSD vem aqui reiterar a sua intenção de, na generalidade – como sabe, na generalidade, o PSD não tem em discussão, como alternativa, as suas propostas, o que só acontecerá em sede de especialidade, pelo que estamos simplesmente a votar o Orçamento do Estado tal qual ele está –, votar contra este Orçamento do Estado,»
Protestos do PS.
» por entendermos que ele ç a demonstração de um modelo de desenvolvimento esgotado e de uma política económica fracassada.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Ribeiro, ouvi-o atentamente e gostaria de chamar a sua atenção para a necessidade de talvez rever as suas fontes, porque não me recordo que a máxima que aí referiu seja uma máxima da economia – pode ser de outras coisas, da ciência política ou da comunicação, mas não é da economia; e pode é querer aplicá-la à economia, mas não me parece que as suas fontes de informação estejam correctas, mas isto é irrelevante e é tão-só um pequeno reparo.
O Sr. Deputado, conforme eu esperava, começa por criticar a proposta do Governo no seu cenário macroeconómico, acusando-a de falta de rigor e de, no fundo, querer gerar falsas expectativas.
Sr. Deputado, chamo a atenção para o facto de assentarmos a elaboração do nosso cenário macroeconómico na base de pressupostos definidos de acordo com os procedimentos a nível comunitário. Portanto, não somos nós que os inventamos, utilizamos aqui a metodologia e os pressupostos que são utilizados e aceites comummente a nível comunitário.
Nas nossas projecções do crescimento mundial e, em particular, das economias que são relevantes para a economia portuguesa, porque isso é importante para podermos estimar a evolução das exportações, tivemos em linha de conta as previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), quanto ao crescimento das economias — não ignorámos isso.
Ora, o Sr. Deputado, no fundo, quer insinuar que a nossa previsão de crescimento é optimista. Porém, também noto que a vossa líder é igualmente optimista, porque prevê (não sei como, nem com que fundamentos,
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mas presumo que terá a sua fundamentação e que terá tido um modelo rigoroso de previsão) que o crescimento de Portugal vai ser o triplo do previsto pelo FMI, ou seja, 0,3%.
Portanto, creio também que estarmos agora aqui a discutir números de 0,6% ou de 0,3%, sinceramente, é colocarmo-nos num terreno de discussão no qual me parece, sob o ponto de vista das implicações políticas e do sentido das opções de política económica que o Orçamento deve ter, estarmos de acordo.
Estamos de acordo, primeiro, que a economia portuguesa vai crescer um pouco acima daquilo que o FMI prevê; segundo, que a economia portuguesa não vai entrar em recessão; e terceiro (e é essa a grande implicação que as previsões têm) que vamos crescer menos.
E independentemente de estarmos aqui a discutir números, Sr. Deputado, porque cada organismo, cada entidade poderá ter o seu número para a previsão do crescimento, há algo que, julgo, não podemos ignorar (e teremos de tirar daí as implicações que isso tem para o Orçamento e as responsabilidades que teremos de assumir): a economia portuguesa vai crescer menos e, porque a economia portuguesa vai crescer menos, vamos ter um ano mais difícil. Por isso, temos de ir ao encontro das necessidades dos portugueses e das empresas para fazerem face a essa realidade que vem do exterior.
O Sr. Deputado, no final da sua intervenção, veio dar aqui um pouco a entender que falhámos as promessas porque, em 2005, tínhamos uma previsão de crescimento maior e, agora, vamos crescer menos e a culpa é do Governo. O Sr. Deputado poderá fazer esse exercício, pode até entreter-se com esse exercício, mas isso é fazer como a avestruz, «enterrar a cabeça na areia» e ignorar que temos, de facto, uma conjuntura internacional que é bastante adversa e que nos afecta a todos. E querer dizer que isso é um falhanço do Governo, sinceramente, é gratuito e não é um exercício sério. E para quem começou a sua intervenção citando economistas, o Sr. Deputado revelou que é muito pouco economista a fazer essa análise.
Abordemos, agora, algumas questões que foram aqui referidas. O Sr. Deputado invoca o comportamento da despesa pública e afirma que a despesa pública aumenta como nunca.
Tenho aqui comigo os dados relativamente à evolução da despesa pública. Ora, corrigindo esses dados, no que se refere ao procedimento contabilístico para a contabilização das transferências para a Caixa Geral de Aposentações, chamo a atenção do Sr. Deputado para que, no próprio dia em que a informação foi disponibilizada à Assembleia, no próprio dia, chamei publicamente a atenção para a existência no Relatório de um procedimento contabilístico que é diferente e, portanto, para o facto de os dados não serem necessariamente comparáveis, tive esse cuidado, Sr. Deputado. O Sr. Deputado queixar-se-á do Relatório, não vou estar a argumentar consigo quanto a isso, mas o que não posso aceitar é que o Sr. Deputado insinue que se quis esconder,»
Protestos do PSD.
» porque nada foi escondido, porque eu próprio chamei a atenção para isso. Aceito que o Sr. Deputado aponte deficiências ao Relatório, é livre de fazê-lo e respeito-o. Agora, o que não posso aceitar é que o Sr. Deputado pretenda dar a entender que se quis esconder, isso é que refuto.
Quanto à questão da despesa, e usando o mesmo procedimento contabilístico, verifica-se, entre 2004 e 2008, uma descida do peso da despesa no PIB. Por acaso, notei que, curiosamente, o Sr. Deputado, ao comparar 2004 com 2009, teve o cuidado de, desta vez, contrariamente à sua líder, não se esquecer do défice. É que a sua líder, quando falou nessa comparação, esqueceu-se do défice — pelo menos, não o vi referido em lado algum. Assim, esqueceu-se de que, num ano em que o crescimento foi quase o dobro do crescimento de 2008, o défice foi de 3,4%, quando, em 2008, será de 2,2%. E se estamos a falar de rigor e de consolidação orçamental, então, comparemos os valores do défice.
Vozes do PSD: — E a carga fiscal?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quanto à carga fiscal, o Sr. Deputado, na apreciação que faz, ignora que, nos últimos três anos, a carga fiscal estabiliza. Praticamente, temos pequenas oscilações da carga fiscal, que até terão mais a ver com a desaceleração do Produto, mas, desde 2007 até 2009, a carga fiscal manter-se-á praticamente estabilizada e reflecte até essencialmente as oscilações do crescimento do Produto mais do que propriamente um grande aumento ou aumentos acentuados da parte da receita.
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Mas na evolução da carga fiscal e contributiva, nestes anos, há uma coisa que o Sr. Deputado ignora, que é o esforço feito pela administração fiscal na melhoria da sua eficiência, na sua capacidade de recuperação de dívidas e na melhoria da receita.
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
Sr. Deputado, com certeza que tem um impacto muito grande. Nestes anos, temos cobrado, em números redondos, em mçdia de 2006, 2007 e 2008,»
Vozes do PSD: — O problema é para 2009!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » mais cerca de 1500 milhões de euros de cobrança executiva. São dívidas ao fisco. É o fisco que as está a cobrar. E isso representa quase um ponto percentual do PIB, Sr. Deputado!
Protestos do PSD.
E o Sr. Deputado ignora que esse indicador não reflecte necessariamente que haja um agravamento de impostos sobre os cidadãos. Há, sim, uma melhoria de eficiência da nossa administração em cobrar os impostos que são devidos ao Estado e que é importante para combater a fraude e a evasão fiscais!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Então, aumentou as taxas para quê?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O Sr. Deputado dá de barato um esforço da administração fiscal e não reconhece, não faz justiça aos trabalhadores dos impostos que, com muito afinco, têm melhorado a sua eficiência e têm conseguido esse resultado que é brilhante.
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
Sr. Deputado, eu ouvi-o em silêncio, agradeço que também me ouça em silêncio e com respeito, que acho que não fica mal a ninguém! Por sua vez, o Sr. Deputado veio dizer que a despesa pública reflecte o insucesso do PRACE.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — E é verdade!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, vamos falar de PRACE.
Se queremos falar de PRACE, chamo a atenção para o facto de que o peso das despesas com pessoal, no PIB, em dados comparáveis, baixou de 12,9% do PIB, em 2005, para 11,2% do PIB, em 2008, e espera-se que atinja os 10,8% em 2009.
O peso das despesas com pessoal, no PIB, tem aqui um decréscimo como nunca teve historicamente e isto é o resultado do PRACE, é o resultado de menos 51 486 funcionários na nossa Administração, Sr. Deputado!
Protestos do PSD.
Não me venha dizer que o PRACE não está a ter efeitos! Não me venha dizer que a reforma da Administração Pública não está a ter efeitos, porque tenho aqui um efeito bem visível, nesta evolução.
Digo-lhe mais, Sr. Deputado, dou-lhe os outros indicadores que reflectem isto: as despesas com pessoal baixaram, em termos nominais (e estamos a falar de euros), em 360 milhões de euros, entre 2005 e 2008.
Com o pessoal da nossa Administração Pública, gastámos, em 2008, menos 360 milhões de euros do que em 2005! Quer isso dizer que reduzimos as despesas com pessoal em quase 2%, mais propriamente, em 1,9%.
O Sr. Deputado vem dizer-me que a reforma da Administração Pública não está a ter efeitos?! Diga-me: quando é que em Portugal se assistiu a algo deste género? Diga-me, Sr. Deputado!
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Protestos do PSD.
Quanto aos grandes investimentos, de que o Sr. Deputado também fala, permito-me chamar a sua atenção para que, no relatório que vos foi submetido, nas páginas 201 e seguintes, encontra a descrição e a projecção dos encargos»
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — E o resto, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Se me permite, Sr. Deputado, até tenho aqui um quadro, na página 205, que dá a previsão dos encargos com as parcerias público-privadas, no âmbito dos quais esses investimentos vão ser feitos, desde 2008 e até 2039. Tenho aqui essa projecção, Sr. Deputado, tenho essa informação!
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
O Sr. Deputado faça o favor de ler o relatório com atenção. Admito que não tenha tido tempo para ler tudo, mas essa informação consta do relatório e são feitas aqui referências aos investimentos.
Chamo a atenção para o seguinte, Sr. Deputado: não ignoro, nem o Governo ignora, as dificuldades que vivemos nos mercados financeiros internacionais. Não ignoramos as dificuldades que existem no financiamento da economia e também no financiamento, obviamente, dos projectos de investimento, sejam públicos sejam privados. Não ignoramos, Sr. Deputado! Por isso mesmo, o Governo tomou uma iniciativa, e tomará as que forem necessárias, para fazer com que o nosso sistema financeiro possa assegurar o financiamento normal da nossa economia.
À semelhança de outros países e em coordenação com outros países da União Europeia, criámos um instrumento de prestação de garantias às instituições financeiras sediadas em Portugal para poderem levar a cabo as operações de financiamento indispensáveis ao normal funcionamento da nossa economia. E fazemos isso — já o disse e repito aqui — não é por causa dos banqueiros ou de salvar os banqueiros. Não! É para fazermos com que o sistema financeiro continue ao serviço da economia, ao serviço das economias portuguesas e é para proteger os depositantes dessas instituições, assegurando o normal funcionamento das instituições. Isto é fundamental para que haja confiança e para que a actividade económica se desenrole.
Apraz-me, e acho que foi positivo que o vosso partido como outros partidos tiveram, de facto, o sentido de responsabilidade que isto implica, em podermos promover essa estabilidade e esse normal funcionamento do sistema financeiro. Isso também é importante para podermos assegurar que a nossa economia, para o ano, vai resistir a estas dificuldades que temos pela frente. Isso é importante para financiar toda a actividade económica — a privada e também os investimentos que o Estado pretende levar a cabo.
Agora, há uma coisa, Sr. Deputado, que penso não poder aceitar: é o discurso ou a reedição do discurso da «tanga»! É a reedição do discurso que diz: «Não há dinheiro, não se pode fazer nada! Baixemos os braços e esperemos que a crise passe!» Não, Sr. Deputado. Recordo o que o vosso líder parlamentar disse num dos últimos debates, aqui. Ele dispunha-se a «Levantar os braços e a arregaçar as mangas!». No fundo, os senhores estão a fazer o contrário, estão a baixar os braços. Mais, até digo: «Estão quase a pôr as mãos nos bolsos e a sentarem-se e esperar que a crise passe!».
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Acha que isso é sério, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não, Sr. Deputado, estou a usar uma imagem! Temos de reagir a esta situação internacional, temos de ser proactivos, não nos podemos resignar de forma alguma. Por isso, os investimentos que o Estado tem previstos têm de continuar o seu curso normal de projecto, lançamento de concurso, adjudicação, etc. Não vamos parar! Temos é, sim, que nos esforçar para fazer com que o financiamento ocorra nas condições desejáveis.
Mais: chamo a atenção dos Srs. Deputados para o seguinte: estes projectos de que tanto falam são projectos que têm co-financiamento do Banco Europeu de Investimento (BEI). Ora, o BEI não se mete a co-financiar
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projectos de ânimo leve; o BEI avalia também os projectos; o BEI tem um limiar de retorno dos investimentos abaixo do qual não co-financia; o BEI só co-financia investimentos que ultrapassam esse limiar quanto ao retorno do investimento. E, se o BEI co-financia estes projectos é porque, da análise que faz, conclui que são projectos financiáveis e que tem razões para co-financiar e participar nesse esforço de financiamento.
Portanto, essa ideia de que isso são projectos que não estão bem pensados nem avaliados, essa também é uma falsa ideia que querem transmitir.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — O seu antecessor diz isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Finalmente, insiste-se muito nos grandes projectos de investimento e, quando se fala em grandes projectos de investimento, o que é que nos vem à cabeça? Novo aeroporto e TGV.
Mas se o Sr. Deputado for ver, a única coisa que tem, quanto a grandes projectos de referência neste Orçamento para 2009, é a ligação Caia-Poceirão, que está em concurso. É a única coisa de que se fala e sem grande incidência no Orçamento ou ano 2009. Portanto, também estamos aí em torno de uma grande ficção.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não ç só!» Págs. 203, 204 e 205.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quando o Sr. Deputado me vem lembrar as opiniões de alguns economistas da área do PS, para fazer valer a sua posição quanto aos grandes investimentos, vejo que há uma grande confusão no seio do PSD. É porque o PSD, tendo dificuldade em fundamentar a sua posição nas posições que tomou em governos anteriores em que defendeu estes projectos, agora, vai ao campo ideológico a que tem feito oposição buscar argumentos a seu favor, também para procurar branquear os compromissos assumidos pelos governos do PSD neste domínio quanto aos grandes projectos.
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
Essa é uma grande capacidade, eu diria, se me permite a expressão, de «golpe de rins». É, de facto, uma grande agilidade.
Mas a bancada do PSD não pode ignorar que, quando foi governo, subscreveu estes projectos, defendeuos, considerou-os importantes e, de um momento para o outro, mudou de opinião. Tem é de explicar por que é que mudou de opinião e não procurar refugiar-se em argumentos de outros economistas.
Já agora, Sr. Deputado, também gostaria de comentar as propostas do PSD que apresenta, porque estas propostas contradizem o discurso do PSD.
Vozes do PSD: — Vai haver mais!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É que o Sr. Deputado vem aqui dizer: «A despesa aumenta.
Este Orçamento agrava a despesa.» Sr. Deputado, aumentar o período do subsídio de desemprego não aumenta despesa? Reduzir a taxa social única não reduz despesa? Repor o regime dos certificados de aforro não aumenta a despesa? Sr. Deputado, nos certificados de aforro, só o agravamento de juros que a reposição do regime dos certificados de aforro implica mais o alargamento do subsídio de desemprego dá cerca de 400 milhões a mais de despesa, Sr. Deputado. Está a ver?!» O PSD pode considerar que isto é pouco, mas são 400 milhões, Sr. Deputado!
Protestos do PSD.
Muito bem! Mas o Sr. Deputado avaliou o impacto das propostas do PSD sobre o Orçamento?
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — É evidente!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Avaliou?!
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O Sr. Deputado permite-me que lhe faça uma pergunta sobre, por exemplo, o IVA de caixa. Não sei se o Sr. Deputado sabe, mas o IVA de caixa, o IVA que cobramos mensalmente, a receita mensal do IVA, é de cerca de 1100 milhões de euros mês. Agora, relativamente ao regime de IVA de caixa que preconiza, Sr. Deputado, faz ideia que fracção desta receita é que poderá afectar? Faz ideia?!
Vozes do PSD: — Isso não é perda de receita! Isso é falso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não, Sr. Deputado. Diga-me só se quer responder ou não!
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
Sr. Deputado, posso clarificar a minha pergunta? Destes 1100»
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Não é perda de receita, como diz!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não estou a dizer que é perda de receita! Destes 1100 milhões de euros, Sr. Deputado, diga-me qual é a fracção que beneficiará do regime de caixa.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Ó Sr. Ministro, mas não é perda de receita, como diz!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas não é isso que lhe estou a perguntar, Sr. Deputado. Já percebi que não sabe!
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — E eu já percebi o que o Sr. Ministro quer!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Se passarmos para o regime do IVA de caixa, o Sr. Deputado faz ideia em quanto é que prolongaremos o pagamento do IVA? Isto prolonga o prazo de pagamento em quanto? Faz ideia, Sr. Deputado? Diga-me!
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — São três meses!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Diz o Sr. Deputado que prolongará mais três meses. Ora, Sr. Deputado, digo-lhe o seguinte: se pudéssemos optar por um regime de IVA de caixa, o que é duvidoso ou, melhor dizendo, não é duvidoso, é claro, porque a 6.ª Directiva não o permite,»
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Leia, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, esclareço, e volto a isso, porque me parece que estão a criar uma grande ficção em relação a esta questão.
Os regimes especiais de caixa, nos termos da 6.ª Directiva, são somente admissíveis como regimes especiais e estão sujeitos a negociação com a Comissão Europeia,»
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Até agora, tem toda a razão!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » não podem ser um regime geral de caixa.
Segundo: os países que aqui citaram, como a Estónia, a Eslovénia e a Suécia, têm esses regimes em situações muito limitadas. Por exemplo, na Estónia é só para sociedades unipessoais, na Eslovénia é só para volumes de negócio abaixo dos 200 000 euros e na Suécia é para volumes de negócio até 3 milhões de coroas.
Mas, Sr. Deputado, este regime de caixa também obrigaria à implementação, nas entidades que pudessem vir a usufruir, de um regime de dupla contabilidade, porque os critérios de aferição para aplicação desse regi-
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me de IVA seriam critérios contabilísticos diferentes daqueles que são aplicáveis para efeitos de POC e de IRC. Portanto, também teríamos aqui um problema de imposição de custos adicionais às empresas.
Por outro lado, Sr. Deputado, não sei se ignora que este regime abriria campo ao mundo das facturas falsas, de uma forma, diria, muito, muito significativa.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Essa, não! Então, a máquina está tão boa e não consegue detectar isso?!»
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Em terceiro lugar, Sr. Deputado, não é algo que seja possível como uma aplicação generalizada, como tem vindo a propor e a sugerir, e nós já estamos a utilizar o regime de caixa em certos domínios, como na área das empreitadas de construção, das cooperativas, etc.
Mas vou voltar aos números, Sr. Deputado.
Se, desses 1100 milhões de receita de IVA mensal, assumirmos que somente um terço corresponderia ou seria beneficiário do regime de IVA de caixa, o prolongamento por um mês do período de pagamento implicaria, em 2009, em números redondos, uma perda de receita de 350 milhões de euros. E o Sr. Deputado até me diz o seguinte: «espero que isso possa prolongar o prazo em três meses». Bom! Então, isto significaria que a perda de receita, em 2009, seria de 1100 milhões de euros.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — São essas as suas contas?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Isto não é nada! É que a redução da taxa social única implicaria uma perda de receita de 390 milhões de euros.
Quanto ao aumento do período de subsídio de desemprego, representa uma despesa de mais 86 milhões de euros por mês. E, supondo até que só iria beneficiar metade, isto significa que teríamos cerca de quase 260 milhões de euros a mais em subsídios de desemprego a pagar no próximo ano.
Relativamente à reposição do regime dos certificados de aforro, obrigando o Estado a pagar mais do que aquilo que tem de pagar nos mercados financeiros pelo endividamento,»
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Nunca devia ter feito isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » iria ter um efeito de mais 150 milhões de euros em juros.
E o regime do IVA iria implicar – e até sou benevolente na minha estimativa – uma perda de receita de 350 milhões de euros, partindo do pressuposto de que só atrasaria um mês, embora o Sr. Deputado até aceite que poderia ser de três meses.
Protestos do PSD.
Quanto ao pagamento especial por conta (PEC), é curioso que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite venha advogar o fim do PEC. É que, Sr. Deputado, recordo que, quando o PEC foi lançado, o pagamento mínimo previsto era de 500 euros e o máximo era de 1500 euros. E sabem o que é que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite fez? Aumentou o mínimo para 1250 euros e o máximo para 40 000 euros. Agora, a Dr.ª Manuela Ferreira Leite está com muita pena das empresas, por terem de pagar um PEC que ela própria agravou de forma muito significativa, e vem dizer que já não é preciso combater a fraude e a evasão e, por isso, podemos acabar com ele, podemos baixar os braços na luta contra a fraude e a evasão e abandonar esta política, que, ela própria, reputou de tão importante que até agravou, de forma tão considerável, o regime do PEC no seu Orçamento para 2004.
Porém, Sr. Deputado, o fim do PEC representa uma perda de receita de 300 milhões de euros.
Vozes do PSD: — Não é verdade!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Srs. Deputados, 300 milhões de euros são a receita do PEC.
Ora, somando tudo isto, Sr. Deputado, ou seja, 390 milhões da redução da taxa social única, 260 milhões a mais de encargos com subsídio de desemprego, 150 milhões a mais de juros a pagar por certificados de afor-
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ro, perda de receita no IVA, em 2009, de, pelo menos, 350 milhões e perda de receita no PEC de 300 milhões, obtenho um total de 1450 milhões de euros.
Sr. Deputado, posso ter feito contas de merceeiro, mas parece-me que os senhores não fizeram contas nenhumas!
Protestos.
Ignoraram inteiramente o impacto destas medidas! O que isto quer dizer, Sr. Deputado, e repito o que já disse outro dia, é que, com estas medidas, em 2009, o défice saltaria para 3%, Portugal ficaria, novamente, numa situação de défice excessivo.
Srs. Deputados, esclareçam-me: o PSD quer colocar o País, novamente, em défice excessivo? Ou vai aplicar umas operações extra e extraordinárias, como já fez no passado, para resolver a questão? A vossa líder, de facto, já mostrou ser capaz de soluções extraordinárias para resolver esta situação. Pretendem recorrer a elas, novamente, em face deste impacto? Digam-me!
Protestos do PSD.
Não, não! Temos de ser realistas! Temos de avaliar o impacto das vossas medidas! Temos de o avaliar, senão, isso, sim, é vender ilusões, é querer enganar os portugueses, é não querer mostrar-lhes o caminho por onde os querem levar.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Isso é demagogia, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Pela minha parte, penso que tenho a obrigação de denunciar isto, porque estas propostas revelam uma grande irresponsabilidade financeira, Sr. Deputado. Portanto, não posso aceitar que elas avancem.
Termino com uma outra observação, quanto às medidas de apoio às famílias e às medidas de apoio às empresas e à economia, constantes deste Orçamento, nada ouvi da bancada do PSD.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Ah, não?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Presumo que o PSD está de acordo com as medidas preconizadas neste Orçamento, porque não lhes ouvi qualquer crítica. Portanto, se bem entendi, o PSD considera estas medidas boas e importantes para apoiar as famílias e as empresas.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Afonso Candal, chamo a atenção, uma vez mais, para a necessidade de cumprir rigorosamente os tempos que estão definidos, quer para os grupos parlamentares, quer, naturalmente, para as respostas produzidas pelo Sr. Ministro.
Só a título indicativo direi que, nesta primeira ronda, o PSD utilizou 22 minutos, ou seja, 7 minutos além do que estava definido, e o Sr. Ministro, na resposta, também foi um pouquinho mais longo, pois usou 35 minutos.
Compreendo, aliás, tenho sido condescendente e vou continuar a ser, mas solicito, naturalmente, no interesse de todos, que, efectivamente, cumpram os limites temporais que estão determinados.
Segundo me foi transmitido, a intervenção, da parte da bancada do PS, será repartida pelos Srs. Deputados Afonso Candal, que usará da palavra em primeiro lugar, e António Gameiro, que dispõem de 15 minutos.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.
O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Srs. Secretários de Estado, começo por manifestar, enfim, uma ligeira discordância em relação ao Sr. Ministro. É que V. Ex.ª detectou uma incoerência no PSD, o que compreendo, porque o discurso do rigor e as propostas que apresenta, de facto, são incoerentes, mas o caminho que o PSD tem percorrido nos últimos tempos é coerente.
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Portanto, Sr. Ministro, quando V. Ex.ª diz que as propostas do PSD agravariam o défice em 1450 milhões de euros, não impressiona o PSD. É que, em 2005, só a suborçamentação do SNS era de 1500 milhões de euros, para não falar em todas as outras. E V. Ex.ª sabe o montante do Orçamento rectificativo de 2005, para que houvesse, de facto, rigor nas dotações orçamentadas para esse mesmo ano.
Quando V. Ex.ª pretende chamar o PSD à realidade, dizendo que, por esse caminho, o défice seria de 3%, Sr. Ministro, se o PSD conseguisse um défice de 3% seria a sua melhor marca. Ou seja, o PSD, mesmo com todas as suas propostas, teria conseguido, porventura, pegando no seu Orçamento e acrescentando-lhe as suas propostas, reduzir para metade aquele que foi o seu resultado mínimo histórico em termos de défice.
E já que se fala de percentagens, convém também lembrar que o próprio Conselho de Ministros discutiu, sob proposta do, então, Ministro das Finanças Bagão Félix, o verdadeiro défice das contas de 2004, ou seja, em Conselho de Ministros de 13 de Agosto de 2004, Bagão Félix calculou em 6,4% o valor do verdadeiro défice.
A decisão final manteve as contas de Manuela Ferreira Leite, que se tinha comprometido a um défice de 2,9%, à custa das receitas extraordinárias. Portanto, sem receitas extraordinárias, o PSD, no governo de coligação, termina o ano de 2004 com um défice de 6,4%. No Orçamento de 2005, tem uma suborçamentação, só do Serviço Nacional de Saúde, de 1500 milhões.
Portanto, Sr. Ministro, daí as minhas discordâncias. Acho que não consegue impressionar o PSD nesse registo de responsabilidade e de rigor, porque, de facto, nunca o tiveram quando estiveram no governo. Não há-de ser, porventura, agora, na oposição, que V. Ex.ª conseguirá que isso aconteça.
Relativamente a este Orçamento, quero referir algumas questões e alguns traços que o caracterizam.
Primeiro: não se fala de suborçamentação, nem na saúde nem em qualquer outro sector.
Segundo: neste três últimos anos, não houve nenhum orçamento rectificativo. E, enfim, pergunto a V. Ex.ª se, até ao final do ano, pode haver o risco de haver um orçamento rectificativo, ou não, para que essa afirmação seja consolidada, ou não.
A verdade é que se prevê que o défice, tendo sido o mais baixo da democracia portuguesa em 2007, ainda desça em 2008.
No entanto, e considerando a situação económica internacional difícil e as suas repercussões no espaço nacional, a verdade é que com este Orçamento o Governo também demonstra que o défice, sendo uma preocupação central, não é uma obsessão.
Perante a situação em que nos encontramos, o Governo, mantendo a sua politica de rigor, de verdade e a aposta estratégica na consolidação das finanças públicas, prevê para 2009 o mesmo défice que prevê atingir em 2008, ou seja, o défice não é uma obsessão, o défice está ao serviço do País. E, como o Sr. Ministro disse e bem, hoje, o País, as empresas e as famílias precisam de ter alguma ajuda por parte do Estado, a qual também só é possível face às conquistas que se verificaram, em termos de contas públicas, nos últimos anos.
Recordo que houve aumentos de impostos, com certeza que sim, mas também na legislatura anterior tinha havido aumentos de impostos. A grande diferença é que os aumentos de impostos de então não resultaram em nenhuma consolidação orçamental e os aumentos de impostos desta Legislatura tiveram como resultado uma forte consolidação orçamental.
Além do mais, o próprio Governo, já este ano, baixou em um ponto percentual a taxa do IVA. Falava-se, na altura, da possibilidade – para não dizer da certeza de alguns – de o Governo, agora, baixar ainda mais o IVA numa lógica eleitoralista, porque estávamos em ano de eleições. O Sr. Ministro sempre afirmou que só o faria se tivesse possibilidades de o fazer, que não poria em causa as conquistas em termos de consolidação das finanças públicas, obtidas com o sacrifício de todos os portugueses, por questões eleitoralistas. E V. Ex.ª demonstrou que não tem preocupações eleitoralistas tem, sim, preocupações com o futuro do País.
Gostaria ainda de referir o reforço em termos da protecção social e o aumento da sustentabilidade do regime da segurança social, que consta, com as suas projecções, em anexo ao Orçamento do Estado, no qual essa mesma sustentabilidade aumenta. Ou seja, num quadro difícil a preocupação do Governo continua a ser a sustentabilidade da protecção social dos portugueses.
Sublinho também o reforço do valor de algumas reformas, nomeadamente daquelas cuja carreira contributiva plena justificaria um valor superior ao que decorre da fórmula de cálculo hoje existente.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
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Acho que isso é importante e justo. Teremos oportunidade de discutir isso mais aprofundadamente e, nessa altura, o Sr. Deputado Jorge Machado perceberá bem que esses seus apartes só demonstram uma profunda ignorância. Mas teremos oportunidade para abordar essa matéria tranquilamente.
Um outro apontamento fundamental – que, estou certo, não deixará de ser saudado pelo Sr. Deputado Eugénio Rosa – é o cumprimento dos termos da Lei de Bases da Segurança Social em situação de normalidade. Ou seja, a diminuição do défice, também num quadro em que já há uma consolidação orçamental bastante significativa e uma saúde financeira da segurança social que não tem comparação com o passado. Refiro-me, portanto, às transferências de 2% das contribuições dos trabalhadores directa e mensalmente para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Estou certo que isso não deixará de ser registado com agrado por parte do PCP também.
Para terminar, Sr. Ministro, refiro a questão do aumento do apoio às famílias. As medidas têm sido anunciadas e são diversas: o aumento dos abonos de família em função do número de filhos e nos primeiros anos; o subsídio à maternidade. Tudo isso é um aumento de despesa significativo.
Há ainda um aumento do apoio às empresas pela via da redução do IRC, fundamental para muitas pequenas e médias empresas deste País. Mas também se verifica um apoio significativo, de mais de 1000 milhões de euros, de bonificação de crédito para novos investimentos dessas pequenas e médias empresas.
Portanto, Sr. Ministro, resumindo os traços gerais do Orçamento, acho que este demonstra não só que o Governo não tem uma obsessão pelo défice mas também que o Governo mantém o seu registo de verdade e de rigor e a sua aposta estratégica na consolidação das finanças públicas.
É um Orçamento que reforça significativamente, num contexto difícil, a sustentabilidade da segurança social.
É um Orçamento que aumenta os apoios às famílias e aos mais necessitados, nomeadamente com um reforço, também muito significativo, do complemento solidário para idosos.
E é um Orçamento que olha, como nunca nenhum outro olhou, para a situação, também difícil, das pequenas e médias empresas.
Há uma diminuição de receita potencial e um aumento de despesa potencial, mas a verdade é que o Governo se compromete a manter o défice em 2,2%.
Sr. Ministro, é um exercício difícil, mas V. Ex.ª já deu mostras de que tem capacidade para executar aquilo a que se propõe.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.
O Sr. António Gameiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, de facto, o quadro macroeconómico do Orçamento que nos é apresentado demonstra, mais uma vez, que V. Ex.ª traz, até esta Câmara, um Orçamento que qualificaria, para além daquilo que já afirmou, de verdade e de esperança.
De verdade, porque se esperava – estava traçado, nas semanas anteriores à apresentação, na Assembleia da República, do Orçamento do Estado – um quadro muito mais negro do ponto de vista orçamental para os portugueses.
Portanto, este discurso do PSD de afirmar que há falta de verdade no Orçamento, só por via de uma «política de avestruz» é que pode existir, porque V. Ex.ª trouxe um Orçamento qualificado como de verdade e de rigor.
De facto, não conseguimos perceber, tanto os Deputados desta Câmara como os portugueses, como é que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, questionada sobre o aumento de 2,9% das remunerações dos funcionários públicos, dá a resposta evasiva de «vamos ver se será bom».
A bancada do PSD tem um discurso completamente contraditório com o da sua líder, porque vem, aqui, dizer que a despesa aumenta 7%, apresenta um conjunto de sete medidas qualificadas e já quantificadas de 1450 milhões de euros. E então fica claro, aos olhos dos portugueses e de todos os Srs. Deputados, que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite queria voltar atrás, ao passado! Se fosse ela a decidir, cortaria nesse aumento de 2,9% aos funcionários públicos para conseguir sustentar as sete medidas que aqui apresenta! Porque o valor, que quer fazer crer aos portugueses, de 1450 milhões de euros a mais na despesa só podia ser contrabalançado, se quisesse continuar a política de estabilidade apresentada pelos portugueses na União Europeia, através do Pacto de Estabilidade e Crescimento, nos níveis de 2,2% previstos para o ano que vem.
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Logo, fica claro que o Sr. Ministro fala verdade e que há, aqui, um discurso em que «a bota não bate com a perdigota». Uns querem aumento da despesa; outros queixam-se do aumento da despesa e não conseguem combater, nem criticar, as medidas que V. Ex.ª traz, aqui, de apoio direccionado às famílias e às empresas.
Sobre isso nem uma palavra. Portanto, acho que, se o Sr. Ministro e a equipa ministerial queriam sair daqui descansados relativamente ao rumo que traçaram, o discurso da bancada da oposição faz transparecer que estão no bom caminho.
Sr. Ministro, tenho duas questões para lhe colocar.
O Sr. Ministro, já o afirmei uma vez na Tribuna, vai ficar conhecido como o reformador da Administração Pública portuguesa no pós-25 de Abril. Se houve uma reforma da Administração Pública em Portugal, foi feita pela mão do Sr. Ministro.
Os funcionários públicos sabem que houve um trabalho de rigor e de exigência, nos últimos três anos, mas começam, agora, a vislumbrar as mudanças no seio da Administração Pública. E quem trabalha da Administração Pública sabe, hoje, que há mudanças radicais na forma de gerir, na forma de planear e até na forma de controlo! Por isso mesmo é que V. Ex.ª pode apresentar, aqui, menos 360 milhões de despesa com remunerações certas e permanentes na Administração Pública; e uma despesa, em termos do PIB, a baixar – 11,9% para 11,2%, e prevendo-se para ano que vem 10,8%.
De facto, desse quadro, V. Ex.ª tem, agora, depois de ter diminuído em 51 000 o número de trabalhadores da Administração Pública, que dizer também, nesta Assembleia, que todos os anos se reformaram funcionários. Quanto ao argumento de que se reformaram muitos neste ano, ou nos últimos três anos, o que tenho a dizer é que todos os anos se reformaram, felizmente, muitos milhares de funcionários públicos por atingirem o limite de idade.
Portanto, o Governo tinha previsto uma redução de efectivos na Administração Pública da ordem dos 75 000. Ao terceiro ano vai com 51 000, se dividirmos esses 51 000 por três, teremos menos 17 000 funcionários, em termos médios. Perto de 20 000 funcionários no próximo ano, irá perfazer um montante muito próximo dos 75 000 – mais de 70 000. Nesse ponto penso que o objectivo político de reforma está atingido e que o Governo está de parabéns.
Depois, houve uma mudança radical na forma como os funcionários públicos se comportam, e se têm de comportar, face à Administração paga com os impostos de todos os portugueses.
As mudanças na legislação que têm que ver com o emprego público, quer a do novo contrato de trabalho em funções públicas quer a do regime de vínculos e carreiras, levam-me a fazer a primeira pergunta.
Teremos, no próximo ano, a alteração e a regulamentação dos regimes especiais que têm também um forte impacto em áreas específicas da Administração Pública? Teremos, para o ano, uma regulamentação do regime de protecção social, nomeadamente quanto à doença e à maternidade, após a aprovação, na Assembleia, do Código do Trabalho? E para quando a expansão do regime da ADSE a todos os funcionários? Coloco-lhe esta pergunta, porque essa é uma reivindicação de há anos que nunca mais chega à luz do dia! Muitos trabalhadores da Administração Pública vieram, por via das suas forças sindicais, reivindicar que o regime da ADSE se aplicasse a todos os funcionários.
De facto, essa nova medida, nomeadamente acompanhada de uma nova acção social complementar – mudança do subsídio de creche e pré-escolar – é muito importante para os trabalhadores da Administração Pública.
Portanto, é claro que o programa da gestão por objectivos do planeamento, acompanhada do programa de formação e qualificação dos funcionários, é muito importante. Aliás, tinha sido afirmado que, no final deste ano e início do próximo ano, iria arrancar definitivamente esse plano de formação e qualificação dos trabalhadores da Administração Pública.
Pergunto, então, qual é o ponto da situação, para que, de facto, as medidas estratégicas de implementação e aprofundamento dos serviços partilhados da Administração Pública, nomeadamente ao nível da gestão dos recursos financeiros e humanos, possam vir a produzir mais redução da despesa pública e para que V. Ex.ª (ou um governo do PS) possa apresentar aqui, no próximo ano, um Orçamento para 2010, demonstrando que estas medidas ainda terão mais impacto orçamental e que a redução da despesa pública — que este Orçamento, hoje, já bem credibiliza e patenteia — ainda terá mais expressão, do ponto de vista financeiro, no próximo Orçamento do Estado.
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O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de questões, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, antes de mais, agradeço ao Sr. Deputado Afonso Candal ter discordado de mim.
O Sr. Afonso Candal (PS): — Às vezes «calha»!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Penso que chamou bem a atenção para algumas incongruências a que vamos assistindo na posição dos partidos que têm vindo a fazer oposição a este Governo.
Não acrescentarei nada mais às considerações que fez quanto à questão do rigor com que o Orçamento é elaborado, à semelhança dos anteriores, nomeadamente em termos de não suborçamentação, de grande rigor na previsão dos encargos, bem como da receita, e de rigor na execução, de forma a evitar a necessidade de Orçamentos rectificativos. Pela primeira vez na nossa história, estivemos três anos seguidos sem apresentar a esta Assembleia um Orçamento rectificativo.
Chamo igualmente a atenção — penso que este ponto que o Sr. Deputado referiu é relevante — para o reforço da sustentabilidade da segurança social, para a importância das reformas introduzidas no domínio da segurança social, quer da Administração Pública quer do regime geral.
É uma reforma que já está feita, que está no terreno e que, aliás, está a reflectir-se nos resultados da própria segurança social, que vê robustecida a sua capacidade financeira, assegurando, no fundo, o financiamento de encargos futuros neste domínio.
Ora, o défice não é, de facto, uma obsessão. Penso que, neste momento, é bem claro que o défice não é nem pode ser uma obsessão.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sempre foi!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não fora o esforço que fizemos, ao longo destes anos, em colocar as contas públicas em ordem, não podíamos dizer aos portugueses que estamos, neste momento, em condições de ir ao encontro das suas preocupações, de os apoiar a enfrentar as dificuldades que esta crise internacional nos coloca.
Se hoje o défice fosse de 6,8%, os portugueses teriam juros bem mais altos a onerar os seus orçamentos, teríamos maiores dificuldades em financiar a nossa economia, porque teríamos muita dificuldade no acesso ao financiamento — que já não está fácil, mas que, com um défice de tal natureza, seria bem mais difícil —, nem poderíamos dizer aos portugueses que podemos ir ao seu encontro, reforçando o abono de família, apoiando os seus filhos nas escolas, no transporte escolar, aliviando os seus encargos com a habitação, majorando as deduções em IRS, reduzindo o IMI, etc., etc.
Não poderíamos dizer às empresas que podemos aliviar a sua carga fiscal em IRC, nem poderíamos dizer aos portugueses que podemos aliviar também a respectiva carga fiscal, reduzindo o IVA em um ponto percentual, etc., etc.
Foi porque colocámos as contas públicas em ordem, reduzindo o défice para 2,2%, que agora conseguimos ir de encontro a essas exigências dos portugueses e ser solidários com eles num momento de dificuldade para todos.
Todavia, isto tem de ser feito não perdendo de vista a necessidade de mantermos esta «saúde» das contas públicas. E permitam-me que vos diga, Srs. Deputados, que manter o défice de 2,2% em 2009 não quer dizer que afrouxamos no esforço de consolidação ou de manutenção da disciplina e da responsabilidade financeira.
Muitos recordar-se-ão que havia o objectivo de termos um défice de 1,5% em 2009. Sim, mas com um crescimento da ordem dos 2,5% ou, inicialmente, até superior a 2,5% — a previsão que tínhamos era, salvo erro, de 2,8%. E é tão exigente manter um défice de 2,2% em 2009 com um crescimento de 0,6% como seria conseguir um défice de 1,5% com um crescimento de 2,8%.
Portanto, não se perde de vista a necessidade de manter essa disciplina, esse rigor financeiro, porque a indisciplina financeira do Estado tem implicações gravíssimas sobre todos os portugueses, sobre as empresas,
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sobre a economia. Esse é um bem fundamental que temos de continuar a preservar e não perder de forma alguma.
Por muitas «contas de merceeiro» que eu possa fazer, como insinuam, a verdade é que é preciso fazer contas! Há quem não as faça,»
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » quem avance com propostas populistas e demagógicas, irresponsáveis e com graves consequências sobre a «saúde» das contas públicas, ignorando isso e não gostando que se aponte as implicações dessas propostas sobre o rigor das nossas contas públicas.
Quanto à questão da execução orçamental, tenho consciência de que 2009 não vai ser um ano fácil para ninguém — é visível! Vai ser um ano de dificuldades, vai ser um ano em que nos vamos confrontar com as consequências desta crise financeira e do seu impacto na economia dos países com quem nós mais nos relacionamos. E Portugal vai ter de enfrentar essas dificuldades.
Temos incertezas acrescidas pela nossa frente quanto ao evoluir da situação, daí que seja muito importante o esforço que os países europeus (naturalmente, procurando coordenar-se a nível extra-europeu) têm vindo a desenvolver para enfrentar e ultrapassar esta situação de crise financeira com repercussões nas nossas economias. Portugal quer estar associado a este esforço.
De alguma forma, o nosso cenário macroeconómico reflecte a confiança de que o esforço que estamos a desenvolver vai produzir alguns efeitos e vai habilitar-nos a enfrentar melhor essas dificuldades. Daí podermos ter até alguma diferença entre a perspectiva europeia, de alguém que está empenhado em lutar contra esta adversidade, e a perspectiva, por exemplo, do Fundo Monetário Internacional, que, de alguma forma, não terá muito em conta os possíveis efeitos benéficos destas iniciativas sobre a nossa capacidade de reagir a esta conjuntura adversa.
Gostaria de referir, contudo, que, apesar destas incertezas, o comprometimento do Governo em velar pela «saúde» das contas públicas continuará e o Ministério das Finanças, o Ministro e os seus Secretários de Estado estarão vigilantes, ao longo de 2009, para que se cumpram os objectivos orçamentais. E fá-lo-emos em 2009 como fizemos em anos anteriores! Em anos anteriores até melhorámos os resultados. Recordo: em 2008, qual era a previsão de crescimento que tínhamos inicialmente? Era de 2,2%. E qual era o défice previsto? De 2,4%. Apesar do crescimento ser menor em 2008, vamos cumprir o nosso objectivo orçamental e vamos atingir um défice de 2,2% em 2008.
Entendemos que é importante esta «saúde» financeira das contas do Estado para que possamos enfrentar as consequências e os efeitos desta crise internacional.
A reforma da Administração Pública, Sr. Deputado António Gameiro, é, sem dúvida, a par da reforma da segurança social, uma reforma emblemática deste Governo.
Trata-se de uma reforma que mexeu em inúmeros aspectos da nossa Administração, desde a sua organização aos modelos de gestão e avaliação; é uma reforma já com efeitos orçamentais, mas é uma reforma que, à medida que vai sendo implementada e se traduz em mudanças de métodos e procedimentos de gestão, vai, de facto, alterar, de forma radical, a nossa Administração, tornando-a mais moderna, mais eficiente, mais capaz de diferenciar quem tem bom desempenho e quem não tem e de premiar em conformidade com o mérito, com o desempenho.
Quanto a dizer-se que o número de funcionários se reduziu porque se reformaram, recordo o seguinte: em 2003, houve 34 000 reformados; em 2007, 19 000; e, em 2008, 17 000. Mas, o número verificado em 2003 deveu-se a uma política excepcional de permitir e incentivar que os funcionários públicos se reformassem — foram 34 000! Pergunto, então: o número de funcionários diminuiu ou aumentou? Penso que não...
Dizer-se agora que o número de funcionários se reduziu porque se reformaram é fácil! Bem, também foi mais fácil em 2003 e não temos sinais de que, então, tenha reduzido o número de funcionários na Administração Põblica. É a história da raposa e das uvas: «Ah, estão verdes, não prestam»« É fácil escarnecer dos resultados dos outros, mas penso que é falta de vergonha quando não se fez nada que dê autoridade para que se escarneça dessa forma.
Acima de tudo, gostaria de salientar a importância do rigor que temos tido nas admissões, porque não basta só deixar que, pelo mecanismo natural da reforma, da aposentação, se reduzam os funcionários; é necessário,
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principalmente, controlar as entradas. E nós temos vindo a controlar o número de entradas, por isso foi possível, nestes três anos, reduzir o número de funcionários em 51 486.
Quanto aos regimes especiais e à regulamentação do regime de protecção social, a resposta é afirmativa: 2009 será o ano em que iremos trabalhar nesses domínios, na revisão dos regimes especiais, avançando, obviamente, com um novo regime de protecção social.
A expansão do regime da ADSE a todos os trabalhadores que exerçam funções públicas está prevista na Lei do Orçamento que é aqui apresentada. Esse foi um compromisso que assumimos com os sindicatos da função pública e que aqui está consagrado.
Finalmente, passo a referir-me à questão dos serviços partilhados.
Esta é uma aposta importante: os serviços partilhados estão lançados, não estão ainda generalizados a toda a Administração, porque a metodologia — e nós, aqui, aprendemos com o que é feito no sector privado e noutras administrações — é começar num universo limitado de serviços partilhados e, depois, alargar, progressivamente, ao universo da Administração Pública. Mas, mesmo neste universo mais limitado em que já estamos a trabalhar, a implementação dos serviços partilhados permite-nos ter já uma economia que estimamos em cerca de 150 milhões de euros em 2009 e em 2010. Com as iniciativas já adiantadas, em 2009 e em 2010 vamos poupar 150 milhões de euros.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, permita-me que fale sentado, porque tenho vários papéis que vou ter de consultar. Não se trata, portanto, de uma questão de menor consideração, como deve imaginar.
O Sr. Ministro tem apresentado este Orçamento como um Orçamento de rigor, de coragem e de eficácia naquilo que é necessário. Recordo-me, aliás, de uma frase dita ontem pelo Sr. Primeiro-Ministro: «Este é um Orçamento sem maquilhagem».
Na justificação do Orçamento do Estado consta a questão da crise financeira e também os objectivos para as famílias e para as empresas.
Sr. Ministro, é precisamente sobre essa óptica, a óptica da maquilhagem, por um lado, e sobre a óptica da eficácia das medidas em relação aos objectivos, por outro, que tenho um conjunto de perguntas e uma análise a fazer.
Comecemos, então, pelo quadro macroeconómico. O primeiro dado que se pode salientar é o do crescimento. Não vamos entrar em discussão sobre se a economia vai crescer 0,3% ou 0,6%, apenas se pode, e deve, fazer a comparação com a previsão que o FMI faz e, já agora, com as previsões que são feitas para Estados com, aproximadamente, o mesmo tamanho e o mesmo número de habitantes de Portugal. Por exemplo, a Grécia, que costuma ser sempre o país de comparação, tem uma previsão de crescimento para o próximo ano de 2% e o mesmo acontece com vários Estados do Báltico, que têm uma previsão acima da nossa.
Mas, como lhe digo, a nível da maquilhagem, não me quero centrar nessa previsão e, por isso, vamos aos números do desemprego.
Está previsto para este ano que o desemprego chegue a 7,6% e para o próximo ano estão previstos os mesmos 7,6%. Sr. Ministro, quero perguntar-lhe, então, que «pó de arroz» é que pôs nesta previsão, porque temos a economia a crescer menos e as procuras interna e externa em dificuldade, especialmente no caso da Espanha. Como é que vamos conseguir isso? Vamos ter uma grande quebra de produtividade na nossa economia de forma a compensar este objectivo dos 7,6% durante o próximo ano? Depois do quadro macroeconómico, passemos agora à despesa.
Primeira questão: o subsídio de desemprego para o próximo ano — que está previsto na página 166 de relatório, que, ainda há pouco, o Sr. Ministro nos mostrou — tem, em relação à previsão de execução para este ano, um aumento de 3,6%. Poder-se-ia pensar o seguinte: é um aumento de 3,6%, com grande probabilidade vamos um aumento do desemprego, portanto esta previsão é razoável. Acontece que, de 2007 para 2008, diminuiu 9,6%. Portanto, aquilo que o Sr. Ministro nos vem apresentar, no tal Orçamento de grande rigor, para um ano de dificuldades económicas, é uma previsão de gastos com subsídios de desemprego abaixo do que estava prevista no ano de 2007. Portanto, falando de maquilhagem, que «base» é que pôs nesta previsão?!
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Segunda questão: de acordo com a previsão que consta do Orçamento do Estado, a despesa com pessoal baixa. Aliás, o Sr. Ministro, ainda há pouco, nos fez uma comparação a três anos com aquilo que tem sucedido com a despesa de pessoal, e nós bem gostaríamos que ela estivesse a baixar efectivamente. Mas o que eu gostava de saber é como é que compatibiliza essa sua previsão com a saída do domínio do Estado da Estradas de Portugal, dos vários hospitais que passaram a EPE, dos laboratórios e das universidades que passaram a fundações. Isto é, se eu for retirando do domínio do Estado várias instituições, com certeza que a despesa com pessoal baixa! Mal seria que não baixasse! Mas no tal Orçamento sem maquilhagem não percebo como é que tal pode suceder.
Já agora, Sr. Ministro, uma das afirmações que fez foi também em relação ao aumento da despesa com pessoal, de 2,9%: «Esta não é uma medida eleitoralista, é uma medida que é permitida pela saúde das nossas contas públicas». Ó Sr. Ministro, mas a previsão que faz do défice para o próximo ano não é igual à previsão de défice para este ano? Então, por que razão é que é precisamente neste ano, um ano de eleições, que temos um aumento de 2,9% na despesa com os funcionários públicos, esquecendo-se Sr. Ministro que apenas revê em 2,5% os escalões de IRS e que, portanto, grande parte das pessoas que vão ficar a ganhar mais também vão ficar a pagar mais impostos? É o Estado a dar por um lado e a ir buscar por outro.
A nível da despesa, gostaria de saber, se o Sr. Ministro me conseguir quantificar, quais os efeitos que o PRACE» Constam do Orçamento os objectivos do PRACE e o nõmero de leis que saíram. Tendo em conta os quilos de papel, realmente o PRACE foi eficaz. Mas, quanto à despesa, quanto é que se poupou? Foi a poupança com os 2300 — não estou a dizer o número certo mas, sim, aproximado — funcionários no regime de mobilidade? É esse o grande sucesso que tem para nos apresentar no fim do seu mandato no Governo? É que, se é esse, a mim parece-me curto.
Também quanto à despesa, o relatório orçamental, na página 140, refere: «A redução prevista para 2009 da despesa com subsídios resulta (») de ter sido afecto o valor se 466,2 milhões de euros á amortização do dçfice tarifário do sistema eléctrico nacional». Quanto é que prevê, Sr. Ministro, que este ano seja abatido a esse défice? Porque é um défice preocupante, que tem aumentado de ano para ano e que, mais tarde ou mais cedo, vai rebentar nas mãos dos consumidores. Qual o esforço de natureza financeira que o Sr. Ministro pretende ter este ano com esta matéria? Voltemos às suas previsões e à maquilhagem. Eu acho que na parte da receita temos o supra-sumo da maquilhagem. Na página 144 do relatório do Orçamento do Estado, no quadro das receitas fiscais, no primeiro imposto, ou seja, no IRS, vem previsto um aumento da sua variação de 0,4%, portanto parece que as pessoas singulares não vão ter grande aumento da carga fiscal. Mas, depois, continuamos a ler o relatório e, logo a seguir, diz-se assim: «A receita do IRS»« — que está prevista no quadro, o que leva a que daquilo que o Sr.
Ministro tem aqui previsto de IRS no Orçamento — sem maquilhagem, pelos vistos —, que são 9380 milhões de euros, seja apenas cobrado no próximo ano o valor de 9776 milhões de euros. Isto é, a carga fiscal no IRS, que está previsto que aumente 0,4%, vai aumentar 4,7% em relação àquilo que é a estimativa de execução do ano corrente. Ora, se isto não é aumento da carga fiscal, eu não sei o que será! Relativamente às previsões do IVA, acho-as verdadeiramente extraordinárias. Está previsto no Orçamento que os impostos indirectos, aqueles que dependem do consumo, vão aumentar 4,8% e que o IVA vai aumentar 3,4%. Fui às justificações, que constam da página 147 do relatório do Orçamento, e lá diz-se: «Justifica este resultado a evolução esperada para a actividade económica,»« — ora, para o próximo ano, não esperamos grande evolução da actividade económica, como é natural, Sr. Ministro — «» as medidas legislativas tomadas para o ano de 2008, nomeadamente a redução da taxa máxima do IVA,»« — ora, quando se reduz uma taxa, por princípio vamos cobrar menos — «» bem como a redução do prazo mçdio dos reembolsos (»)« (antes fosse assim, mas já me referirei a essa matéria). Mas essa redução também não leva a que se vá cobrar mais, leva a que se vá cobrar menos.
Portanto, Sr. Ministro, isto não é maquilhagem, é fantasia pura.
A previsão que os senhores fazem da cobrança do IVA não é realizável durante o próximo ano. E o senhor vai ser confrontado, durante 2009, com enormíssimas dificuldades.
Passo a referir-me ao imposto de selo, um imposto que está estritamente relacionado com muitas operações de natureza financeira e com as operações de empréstimos. Os empréstimos e o crédito dos bancos estão difíceis, mas os senhores prevêem que o imposto de selo aumente 7,8%! Como é que consegue este milagre? Mas este imposto nem está justificado no relatório do Orçamento e não está tão concretizado como o
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IVA. Nesse aspecto, o Sr. Ministro foi um pouco mais cauteloso — depois, nas componentes, vai-se ver e não se percebe.
E passo já às componentes.
Sr. Ministro, diga-me uma coisa: como é que vai conseguir cumprir este Orçamento nas receitas? Vai ser à base do aumento das cobranças executivas? É que já está quase no limite! A administração fiscal já está a abusar e aquilo que nos vem propor é que, possivelmente, durante o próximo ano, ainda abuse mais. Já não sei por onde é que poderemos ir! A nível das receitas, gostava que o Sr. Ministro nos fizesse umas precisões técnicas, se fosse possível.
Temos sempre ouvido que este é um Governo que não recorre às receitas extraordinárias. Ora bem, no ano passado, a transacção das hídricas, das barragens, para a EDP valeu 832, 5 milhões de euros. Bom jeito deu para cumprir o défice! Isso não é uma receita extraordinária, Sr. Ministro?! É que disse que não recorria a elas! Ou, então, as vendas de imóveis — página 150 do relatório do Orçamento do Estado —, na ordem dos 500 milhões de euros, para o próximo ano, também não são receitas extraordinárias? Então, o que são, para podermos ficar a perceber? Sr. Ministro, relativamente aos objectivos do seu Orçamento, os que são determinados são bons objectivos.
Temos de, num momento de crise, auxiliar, na medida do possível, as famílias e criar condições para que as empresas possam, elas próprias, gerar riqueza. Como é que as empresas conseguem isso? Concordará comigo que, neste momento difícil, do que elas necessitam é de liquidez! E a primeira medida aqui apresentada pelo Sr. Primeiro-Ministro em relação às empresas — nos debates parlamentares com o Sr. PrimeiroMinistro as medidas quase sempre têm de ser apresentadas de uma forma curta — foi: baixa no IRC. E qual é a baixa que nos propõe no IRC? Para os primeiros 12 500 € de lucro tributável das empresas a taxa deixa de ser de 25% e passa a ser de 12,5%. Portanto, para os primeiros 12 500 €, e apenas para estes, temos uma baixa de taxa para metade.
Em primeiro lugar, esta cobrança será feita no ano de 2010 e as empresas necessitam de dinheiro agora.
Em segundo lugar, o montante de que estamos a falar ç de, aproximadamente, 1600 €, o que, em muitas situações, se calhar, não dá para um salário. E no sumário executivo figurante no Orçamento vem referido que esta medida vai aplicar-se a 80% das nossas empresas. Diga lá, Sr. Ministro de Estado e das Finanças: como é que isto é possível? Será que 80% das nossas empresas têm lucro tributável? Não têm prejuízos? Não têm prejuízos a abater dos anos anteriores? Antes fosse! E como é que isto se aplica, durante o próximo ano — um ano de dificuldades —, a 80% das nossas empresas? Ó Sr. Ministro, as empresas, em relação ao próximo ano, com as dificuldades com que estão, o que querem é conseguir chegar ao fim do ano! Portanto, não compreendo como é que nos vem apresentar, como uma grande medida para as empresas, esta do IRC. A minha dúvida é sobre a sua eficácia.
A segunda grande proposta para as empresas é a dos pagamentos por conta. Sim senhor, a dos pagamentos por conta é aplicável durante o próximo ano. Porquê? Porque os pagamentos por conta vão ser pagos em 2009. E o que é que os senhores fizeram? Algumas empresas passam a ter um pagamento por conta mais baixo — de 75% passa para 70%; outras passam a ter um pagamento por conta mais alto — de 85% passa para 90%. Aqui, tenho uma dúvida de natureza técnica: é que, olhando para o seu quadro orçamental, em relação ao imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, os senhores prevêem para o próximo ano cobrar mais a nível de pagamentos por conta do que estão a cobrar este ano — esse montante passa de 2650 milhões de euros para 3147 milhões de euros! Ora, quando o que as empresas necessitam é de liquidez, acho isto extraordinário! Sr. Ministro, qual foi o milagre que conseguiu aplicar para que esta seja uma medida boa para as empresas? Uma outra medida tem a ver com a linha de crédito. Sim senhor, é uma medida positiva, as empresas necessitam dela. A primeira que existiu, o Invest I — este será o Invest II —, foi esgotada em pouco tempo. Sr.
Ministro, não seria melhor que fosse selectivo na concessão do crédito, por exemplo em relação às empresas que têm uma actuação fundamentalmente no sector exportador? É que é aí que vamos ter grandes dificuldades, por exemplo, com a procura interna a contrair imenso em Espanha.
Portanto, confronto o Sr. Ministro com a eficácia das suas medidas em relação às empresas.
Passo às medidas em relação às famílias. Com a ideia do fundo imobiliário que o Sr. Ministro nos apresenta acho que tem de conseguir um milagre. É que este fundo é apresentado como sendo bom para as empresas e para as pessoas. Como é que consegue isto?
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Fui informar-me e constatei que o valor médio das nossas rendas, na comparação com o valor do imóvel, é de 6,5% a 7,5%. São estes os dados possíveis de conseguir. Então, como é que é possível que um fundo de investimento imobiliário, em que os investidores querem ter lucro, aplique estas rendas e também seja bom para as famílias? É que, com grande probabilidade, a aplicarem-se estes valores de 6,5% a 7,5%, isto não é bom para as famílias. Ou, então, as empresas não vão poder aplicar estes valores, vão aplicar mais baixo. E, nesse caso, quem é que vai investir? Soubemos: a Caixa Geral de Depósitos, em que o único accionista é o Estado. Mas quem mais poderá investir nesta lógica, com fundos que, no limite, até podem ir parar (ouvindo algumas afirmações) à Bolsa? Não se entende, Sr. Ministro, como é que vai conseguir este milagre, de que seja bom para todos — para as empresas e para os cidadãos — esta transformação que aqui faz. A ideia, na teoria, seria positiva. Mas bem melhor, em nossa opinião, era que se actuasse (e votámos favoravelmente a proposta que o Governo aqui trouxe em relação aos juros) de uma forma ainda melhor para as famílias.
O que é que o Governo propõe? Que a dedução que é feita com os juros da habitação, que é de aproximadamente 583 €, aumente, para os dois primeiros escalões de rendimento, 50% (aliás, já aumentou), para o terceiro, 20% e para o quarto, 10%. Ora, a maioria da classe média do nosso País, que está asfixiada, encontra-se precisamente nos escalões onde esta dedução dos juros vai aumentar menos. No quarto escalão, aumenta 50 €, num ano; no terceiro escalão, aumenta 100 €. Sr. Ministro, e temos de ver se, no primeiro e segundo escalões, os das pessoas que têm rendimentos muito baixos, alguns deles na ordem dos 600 €, 700 €, essas pessoas têm crçdito á habitação, se a essas pessoas se aplica esta medida! Já agora, Sr. Ministro, onde é que está previsto — e, se calhar, pode perguntar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que está sempre com vontade de falar — a cobrança da «taxa Robin dos Bosques»? É que procurei e não consegui encontrar. Quanto é que vai ser cobrado com essa grande medida que o senhor nos apresentou? E, já agora, quantos carros movidos a electricidade pensa que vão ser produzidos durante o próximo ano? É que está prevista uma dedução no IRS, que, suponho, ç para ter efeitos» Ou ç só para apresentar e poder dizer-se «temos aqui uma redução para os carros eléctricos!»? É que, se os carros eléctricos não existem, até podia ser para os foguetões!» Aí tambçm podia apresentar com certeza uma dedução — e podia fazê-lo com grande pompa e circunstância! Sr. Ministro, o que se pretende — e, como é evidente, acredito sinceramente que o Sr. Ministro também o pretende — é muito simples: é que uma crise financeira não se transforme numa crise da economia real, com efeitos sobre as empresas e as famílias. E aqui o que importa é ver em que medida o Orçamento do Estado pode ajudar a impedi-lo.
Por isso mesmo, o CDS propõe que as devoluções do IVA sejam feitas segundo um princípio mensal e não trimestral. Sr. Ministro, da pág. 12 do Orçamento consta o tempo médio da devolução do IVA, quer para os pagamentos trimestrais, quer para os pagamentos mensais. Verifica-se que tem havido uma diminuição do prazo de reembolso por parte da Administração, mas ainda não é satisfatório. Por exemplo, para pagamentos a três meses, o tempo médio de devolução é de aproximadamente 100 dias (mais precisamente, 106 dias).
Ora, com uma administração fiscal que se quer tão eficaz, que manda SMS, e-mail, tudo, por que é que não se opta por esta medida de uma devolução mais rápida? E, Sr. Ministro, não estou (porque sei bem as consequências que isso tem) a virar o sistema do IVA «de pernas para o ar«;»
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Gostei dessa!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — » estou a referir-me apenas às devoluções.
Quanto aos pagamentos às empresas, o Sr. Ministro, no ano passado, apresentou o programa a tempo e horas. Aliás, tirei do site desse mesmo programa 50 entidades cujos prazos de pagamentos estão acima dos 90 dias. Por exemplo, desde que o programa teve início, a Manutenção Militar, que estava em 505 dias, passou a ter atrasos de 1380 dias — deve ser a grande eficácia do programa» Mas, por exemplo, a SecretariaGeral do Ministério da Cultura melhorou, tendo passado de 1180 para 655 dias, ou seja, demorou aproximadamente dois anos para pagar aquilo que é devido.
Este é um problema que toca muito as empresas. Elas necessitam de liquidez e pagam IVA por essas cobranças que têm de fazer. Não seria melhor pensar, senão pela totalidade, pelo menos de forma parcial, na emissão de dívida pública (eficaz, neste caso, porque dava liquidez às empresas, em relação a essas mesmas dívidas)?
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Propõem, como autorização legislativa, no IRC, um regime simplificado de contabilidade. Não sabemos em que sentido. Não seria melhor que, em vez dessa medida dos 12,5%, esse regime simplificado de contabilidade se estendesse a mais pequenas e médias empresas do que o regime simplificado actual e tivesse uma taxa mais baixa? Isso, sim, ajudaria certamente as empresas.
Para as famílias, propomos retenções na fonte mais baixas e uma diferente política quanto aos juros, calculando quanto é que, no passado, as famílias pagaram de juros a mais, porque isso custou muito aos orçamentos familiares, encontrando-se, assim, uma forma de se ressarcir as pessoas por esse mesmo pagamento.
Será que não é positivo modificar aquela que é a tributação — e nós vamos apresentar propostas nesse sentido — em relação à poupança prevista, quer no Código do IRS quer no Código do IRC, por exemplo, a nível das taxas liberatórias? Será que, baixando essas mesmas taxas, essa medida não poderia incentivar as poupanças? O crédito, em Portugal, não estará facilitado demais? Não teremos de pensar sobre sites e anúncios que apresentam taxas de juro verdadeiramente inacreditáveis?! Sr. Ministro, neste momento, há famílias que recebem para pagar esses empréstimos, como sabe, com taxas de juro muitas vezes acima dos 20%! Não será necessário regular isso? Pelo que percebo, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, já se está a antecipar e acha que não. Eu acho que sim.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, se me permite, também me antecipo e solicito-lhe que conclua.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Não sei se já terei ultrapassado em muito os 22 minutos»
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou substancialmente os 22 minutos!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Vou, então, terminar, referindo-me à despesa fiscal que, neste Orçamento, é feita quanto ao IRC (págs. 153 e 155).
Sr. Ministro, tudo o que é despesa fiscal que será boa para o emprego e para a empresa — a criação de emprego para jovens, os projectos de investimento à internacionalização, os grandes projectos de investimento, as despesas com investimento e desenvolvimento — é despesa fiscal a baixar. Isto não me parede razoável, quando o que se pretende é mais competitividade.
Para terminar, Sr. Ministro, direi o seguinte: já conhecemos o balcão «Perdi a Carteira», aqui apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro. Temo que, durante o próximo ano, tenhamos o balcão «perdi o controlo, perdi orçamento» e que, a certa altura, se esteja a chamar o Dr. Vítor Constâncio para analisar as contas públicas.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, notei uma grande preocupação em todas as suas observações, mas ainda bem que não perdeu o sentido de humor, bem evidente na parte final da sua intervenção.
Sr. Deputado Diogo Feio, suponho que vou responder às questões colocadas pelo CDS-PP, na primeira e segunda rondas de perguntas,»
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Depois, ainda há uma terceira!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » o que constitui um conjunto de observações bastante extenso.
Vou responder às questões que apresentou, mas permitir-me-á que, relativamente a alguns pormenores e detalhes mais técnicos, solicite ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que, depois, preste alguns esclarecimentos.
O Sr. Deputado começou por tecer comentários ao cenário macroeconómico, que, creio, nada acrescentam àquilo que outras bancadas já referiram a esse mesmo respeito.
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Quanto à questão do desemprego e de saber como se compatibiliza a sua evolução com o cenário macroeconómico, recordo que, já em 2008, apesar da desaceleração que nós sentimos no crescimento da economia, registámos na primeira metade deste ano uma descida da taxa de desemprego.
Há um ano a esta parte que vimos a assistir a uma descida da taxa de desemprego e, mesmo apesar da desaceleração já existente em 2008, o desemprego baixou e a taxa de desemprego que atingimos no fim do primeiro semestre era de 7,3%. Ora, o que estamos a prever é que esse movimento da descida da taxa de desemprego não irá continuar e, consequentemente, o número de 7,6% aqui adiantado já reflecte o impacto da evolução prevista para a economia, dado que estamos no fim do semestre com 7,3% e prevê-se já que haja uma evolução para o nível de 7,6%.
Recordo também que, apesar da desaceleração do crescimento, nós temos vindo a criar emprego e essa criação de emprego vai continuar, embora menos acentuadamente.
Até meados deste ano, tivemos uma criação líquida de emprego na nossa economia acima dos 130 000 empregos criados e, citando de cor o número — que fica sujeito a confirmação —, mas se bem me recordo, prevemos que a taxa de crescimento de emprego seja de 0,4% em 2009, metade da taxa de crescimento de 2008, mas que, apesar de tudo, haja ainda uma evolução positiva nesse domínio, o que também atenua parcialmente o impacto da desaceleração do crescimento económico sobre a questão do desemprego.
Sr. Deputado, quanto à questão do subsídio do desemprego, não me parece correcto que queira comparar a orçamentação para 2009 com aquilo que se previu em 2007 para 2008. Parece-me que o que é realista prever para 2009 é saber quanto é que, de facto, estamos a gastar este ano, devendo ser essa a base de referência para o próximo ano.
Aliás, Sr. Deputado, os plafonds que o Conselho de Ministros decidiu para os vários ministérios não foram plafonds na base daquilo que os ministérios tiveram definido ou orçamentado no último Orçamento. Não, nós acompanhamos a evolução da execução orçamental e é a base da despesa existente e estimada no ano de 2008 que serve de ponto de partida para definirmos o Orçamento para 2009. E daí não haver suborçamentação e ser um Orçamento realista; não parte de ficções, parte da realidade concreta em que nos encontramos no domínio da execução orçamental.
Sr. Deputado, quanto às despesas com pessoal, essa questão não é nova, já foi várias vezes respondida pelo Governo. Permita-me que chame a sua atenção para que os senhores insistem em insinuar que a descida do peso da despesa com pessoal no PIB se deve a umas mudanças institucionais de tirarmos as empresas põblicas do perímetro, de criar hospitais/empresa, etc» Sr. Deputado, por exemplo, o Programa de Estabilidade e Crescimento que foi apresentado — não estou certo, mas presumo que também o próprio relatório da orientação da política orçamental, que foi submetido há pouco tempo a esta Assembleia — refere esta questão e quantifica.
Srs. Deputados, baixámos as despesas com pessoal e o peso no PIB — como há pouco referi —, até final de 2008, em 1,7 pontos percentuais. Prevemos que, em 2009, essa descida represente 2,1 pontos percentuais do PIB. E disto tudo 0,3% é que poderão corresponder a essas operações.
Portanto, Sr. Deputado, mesmo assim, tendo em conta esses efeitos, nós temos uma descida significativa, de 1,7» Bem, ç de 1,4%, 2,1, 2,9%, 1,8% ?... É uma descida significativa do peso das despesas com pessoal no PIB e que, de facto, traduz um esforço de controlo dos gastos de funcionamento, da melhoria de eficiência na utilização dos recursos na nossa Administração e é uma consequência do PRACE, que, no fundo, está na base das iniciativas tomadas quanto à reforma da nossa Administração. Em particular no que se refere às remunerações certas e permanentes, que são aquelas que estão directamente associadas ao nível de emprego, de 2008 para 2009 prevemos uma descida de 0,3%.
Portanto, este esforço de contenção e de redução das despesas com pessoal permanece presente nas nossas preocupações orçamentais. E é isso que está, conforme poderá ver, nos mapas ou nos quadros que são disponibilizados no relatório.
Relativamente aos aumentos de 2,9% com o pessoal da Administração Pública, perguntou porque é que eles não ocorreram em anos anteriores, isto é, se o défice em 2009 vai ser de 2,2%, igual ao de 2008, porque é que já não houve esse aumento em 2008 e se isso foi por acaso.
Não, Sr. Deputado, não foi por acaso. É que o Sr. Deputado ignora a distinção entre défice nominal e défice estrutural ou até défice primário, mas o Sr. Deputado não pode ignorar isso. Aliás, presumo que há pouco me tenha ouvido dizer que o esforço de manutenção do défice de 2,2, igual nominalmente ao de 2008, representa, de facto, um grande esforço de contenção. E eu até disse que não exige menos do que baixar para 1,5% com
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um crescimento de 2,8%. Porque, em boa verdade, o saldo primário do Orçamento, que é positivo em 0,8% do PIB, passará para 1,1% do PIB em 2009.
O saldo corrente primário, que também é positivo, passa de 2,2% para 2,6% do PIB e o défice estrutural reduz-se de 2,2% para 1,8%. Portanto, Sr. Deputado, 2,2%, que é o défice nominal em 2009, não é bem a mesma coisa que 2,2% em 2008. Há uma clara melhoria da situação das contas públicas, olhando para esses indicadores, que eu diria serem mais representativos da situação das contas públicas, que são os indicadores na base do saldo primário ou do défice estrutural. Há uma melhoria, e porque há essa melhoria é que nós dizemos aos funcionários públicos que podemos aumentar os seus salários acima da inflação esperada no próximo ano. Isto também é particularmente importante — como há pouco referi — no momento em que todos vamos ter de enfrentar dificuldades. E o Governo não pode ignorar que o esforço que foi feito ao longo destes anos na consolidação orçamental incidiu particularmente sobre os nossos funcionários públicos.
Portanto, há que reconhecer, perante os funcionários públicos, que foi desenvolvido um esforço ao longo destes anos e que tendo nós condições, neste momento, para aliviar esse esforço, aplicaremos um aumento acima da taxa de inflação esperada. Por outro lado, também há o intuito de, por esta via, podermos, através de uma classe significativa da nossa população activa, haver uma melhoria do rendimento real que também auxiliará a enfrentar as dificuldades e fará com que a procura na economia se mantenha mais sólida nesta conjuntura, que é particularmente difícil.
Também não ignoramos essa vertente económica. Há nisto um misto de justiça com um misto, obviamente, de política económica, que procura manter, pelo menos em algo que depende directamente da acção e da decisão do Estado, alguma solidez na procura na nossa economia, através deste aumento, em termos reais, dos salários da função pública em 2009. E importa sublinhar isto sem comprometer os objectivos de rigor e de saúde financeira que temos de preservar.
O Sr. Deputado Diogo Feio referiu-se ao défice tarifário. Com certeza que as contas e as projecções não ignoram os encargos com o défice tarifário. O Sr. Deputado desculpar-me-á que não lhe saiba dizer qual é o número, mas terá oportunidade de ter aqui o Sr. Ministro da Economia, que estará em melhores condições do que eu para falar sobre a questão da política energética e do défice tarifário. Portanto, quanto a esta matéria, remeto-o para o Sr. Ministro da Economia, que poderá elucidá-lo melhor quanto a esta matéria.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Parece que não conhece o seu colega!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sim, é muito competente e capaz de responder a questões como estas, não tenho dúvidas.
Quanto às receitas fiscais, pediria ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que falasse sobre isso no final desta minha intervenção.
Mas gostaria de fazer um comentário: o Sr. Deputado, e também o líder do seu partido, manifestou alguma estranheza em como é que a receita fiscal pode subir 2,7% quando a economia só vai crescer 0,6%.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Mais!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sim, mas eu gostaria de esclarecer o seguinte: Sr. Deputado, em 2003, quando a economia decresceu 0,8%, apesar de tudo, a receita fiscal subiu 2% nesse ano. E, mais, se olhar para o comportamento da receita fiscal noutros anos verifica que há taxas acima dos 7%, muito acima do crescimento real verificado.
Portanto, há uma ligação de mecânica que o Sr. Deputado quer estabelecer entre o crescimento real e o crescimento da receita fiscal que não é justificável, esquecendo-se que o que importa não é o crescimento real mas o crescimento nominal — convém não ignorar. E também não deve ignorar que a eficiência e os programas do combate à fraude e evasão da nossa administração fiscal dão resultados muito significativos, que em muito têm melhorado a sua eficiência e que desfazem essa ligação mecânica entre crescimento nominal e crescimento da receita. Mas quanto às questões mais em concreto que colocou relativamente a esta matéria, o Sr. Secretário de Estado, como referi, dar-lhe-á esclarecimentos.
Sr. Deputado, sobre as receitas extraordinárias, não escondo — e elas estão referidas — que o Estado, no desenvolvimento da sua actividade normal — reforma muito importante no património do Estado —, tem alie-
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nado imóveis. O Estado, como concedente, leva a cabo a sua política e celebra contratos de concessões, e com certeza que isso dá origem a receitas.
Mas há uma diferença muito grande entre esta situação e montar operações propositadamente delineadas para dar origem a uma receita extraordinária por forma a esconder ou a evitar um défice mais elevado. Há uma diferença muito grande! Não confundamos celebrar um contrato de concessão, que obviamente poderá dar origem a um pagamento ao concedente, com, por exemplo, uma operação tipo Citigroup. Sr. Deputado, há uma diferença! Portanto, quando falamos nesse tipo de receitas, penso que convém ter bem presente do que é que se trata.
Quanto à questão que o Sr. Deputado levantou das descidas do IRC, gostaria de ser muito claro no seguinte: o Sr. Deputado tem andado, ao longo destes anos todos, a defender a descida de impostos — há que reconhecer a coerência com que o tem feito. Ora, o Sr. Deputado tem direito às suas convicções e às propostas que pretenda apresentar nesta matéria, no entanto, penso que, apesar de tudo, há uma diferença entre este Governo e aquele em que — estou convencido disso — teve a honra de participar. O Sr. Deputado, quando fez parte desse governo, teve a oportunidade de descer os impostos.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E então?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, eu tive a oportunidade e não a perdi. Se os senhores tiveram essa oportunidade e a perderam» Gostaria ainda de chamar a atenção para um facto que considero muito curioso. Defendem a descida dos impostos, mas depois, quando se descem os impostos, dizem que não interessa, que não vale nada, que é pouco. Bem, estamos conversados! Essa postura de, quando as coisas se fazem, procurar minimizar a sua importância ou o seu impacto, é sempre muito fácil de adoptar.
Quanto à questão do fundo de investimento, Sr. Deputado, gostaria de referir que, se é possível, no âmbito destes fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, uma iniciativa como a que a Caixa Geral de Depósitos ontem anunciou e que, comparando os encargos com o crédito versus arrendamento, permite economias que podem ir dos 25% aos 40%, consoante os prazos de maturidade e as situações — temos aqui um leque vasto de economia muito significativa —, é porque há um regime fiscal francamente competitivo neste domínio. Sr. Deputado, leia atentamente o regime fiscal que consta da proposta de lei quanto a estes fundos para perceber por que é que é possível termos economias desta natureza, que permitem, de facto, que instituições financeiras, como a Caixa (e espero que outras se venham a associar à Caixa em iniciativas semelhantes), possam oferecer condições de habitação que desonerem, de forma significativa, dentro dos valores que referi, os encargos com a habitação de muitas famílias.
Quanto a esta matéria, Sr. Deputado, não são só as deduções em sede de colecta do IRS que permitem aliviar as famílias dos encargos acrescidos que têm de suportar devido ao aumento das taxas de juro. Essa medida já nós a tomámos, majorámos essas deduções e demos algum alívio. Mas também adoptámos outras iniciativas, permitindo renegociar sem custos esses contratos e aliviar os encargos que as pessoas têm de suportar. Temos também a iniciativa deste fundo de rendimento imobiliário, do qual as pessoas se podem socorrer em situações que sejam mais difíceis. Não podemos pensar numa solução ou num único instrumento para resolver esse problema. Há já uma panóplia de vias possíveis que podem ser utilizadas pelas famílias com maiores dificuldades nesse domínio para aliviar os seus encargos.
Sr. Deputado, não criemos ilusões aos portugueses, procurando dar a ideia de que, como têm encargos acrescidos, deve ser o Estado que os deve suportar. Não, Sr. Deputado! Não podemos dar essa ideia aos portugueses. Estaríamos a criar uma ilusão insustentável e que não é praticável. Temos de estar ao lado dos portugueses, permitindo que tenham instrumentos para ultrapassarem essa situação e apoiá-los nesse domínio.
Mas não somos nós que nos vamos substituir a eles e resolver os problemas em vez deles. Não! Temos de estar com eles a resolver os problemas.
Para finalizar, e antes de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, gostaria de falar sobre o IVA.
Sr. Deputado, quanto aos prazos de reembolso do IVA, apesar de o ter reconhecido, penso que é bom recordar números. O prazo médio de reembolso do IVA em 2003 (e em 2004 não foi muito diferente) era de 66 dias no regime mensal e de 196 dias no regime trimestral; em 2008, estes prazos são de 30 dias no regime mensal e de 106 dias, como há pouco foi referido, no regime trimestral. Ao longo destes anos, reduzimos qua-
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se para metade os prazos de reembolso do IVA, Sr. Deputado! E isto não é de somenos importância! Portanto, não se pode estar a querer dar a ideia aos portugueses de que o Governo tem andado a negligenciar esta matéria, que obviamente é importante para as empresas, e de que nada foi feito. Não! Nestes três anos, reduzimos para metade os prazos de reembolso do IVA, o que é muito importante! E, mais: ontem, foi anunciada pelo Sr. Director-Geral dos Impostos uma iniciativa que também vai permitir melhorarmos ainda mais este panorama.
Quanto à questão dos prazos de pagamento do IVA, dá-se aqui a ideia de que o Estado português está a usar de uma exigência injustificada em relação às empresas. Não sei se o Sr. Deputado sabe que o Estado português é, no contexto da União Europeia, dos Estados mais generosos em termos do prazo que dá às empresas para pagarem o IVA. Senão, vejamos: na Alemanha, quer no regime mensal quer no regime trimestral, terminado o mês ou o trimestre a que se referem, as empresas têm de pagar o IVA em 10 dias; no Chipre, têm 10 dias; na Bulgária, têm 14 dias; no Luxemburgo, têm 15 dias; na Letónia, têm 15 a 25 dias, consoante seja mensal ou trimestral; na Irlanda, têm um regime bimensal e pagam 19 dias após o período; em Espanha, têm 20 dias; na Hungria, têm 20 dias; na Bélgica, têm 20 dias; na Estónia, têm 20 dias; em França, têm 24 dias; na Eslováquia, têm 25 dias; na Romçnia, têm 25 dias, etc» Em Portugal, têm 40 ou 45 dias, tal como acontece na Áustria, na Finlândia e em Malta. Ninguém mais, no seio da União Europeia, tem prazos tão dilatados para o pagamento do IVA, Sr. Deputado! Portanto, dar a ideia de que o Estado está a ter uma exigência excessiva quanto aos termos em que o IVA tem de ser pago pelas empresas é uma ficção que estão a criar, porque Portugal é dos países mais benevolentes, no contexto da União Europeia, nesta matéria.
Passo, então, a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Carlos Baptista Lobo): — Sr. Presidente, vou igualmente pedir permissão para falar sentado, porque também tenho uma série de documentação e de papéis que gostaria de consultar.
Relativamente à questão da previsão da receita fiscal que consta no Orçamento do Estado, devo dizer que foi efectuada com critérios de extremo rigor. Já foi referido pelo Sr. Ministro a conformação macroeconómica, no entanto vou analisar os impostos que o Sr. Deputado Diogo Feio referiu.
Efectivamente, ao nível do IRS — e está salvaguardado no Orçamento — não consta a transferência de 396 milhões de euros para os municípios, porque, nos termos da Lei das Finanças Locais, essa participação é, a partir deste ano, uma receita do município. É por essa razão que o crescimento da receita não é de cerca de 4%, como seria em condições normais e como, em circunstâncias normais, constaria do Orçamento, mas de 0,4%. Ou seja, estes 0,4% contêm integralmente a dedução dos 396 milhões de euros que são transferidos e que são receita do município. Senão, obviamente que no Orçamento estaria 4,5% ou 4,6%, que é a taxa bruta de crescimento de IRS que esperamos para o próprio ano. Mas está, claramente, no relatório, é logo a primeira ressalva, a receita de IRS»
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — 4,6%!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Exactamente! É basicamente o crescimento da receita que esperamos para este ano, de cerca de 4%, perlo que não temos aqui grande divergência no que diz respeito a estes valores. Se colocasse aqui 4,6% e não deduzisse os cerca de 400 milhões de euros é que haveria um elemento de extrema estranheza.
Relativamente ao IVA, este ano tínhamos uma previsão de crescimento de 8%. Efectivamente, iríamos crescer os 8% ou ficaríamos muito perto desse valor. Mas não vamos crescer 8%, porque baixámos o imposto.
Ou seja, houve uma opção de política ponderada no sentido da redução da taxa normal do IVA em 1%, o que se traduz numa redução de receita de cerca de 4,8% em sede de IVA. Nessa perspectiva, não vamos crescer os 8%, mas um pouco menos; ficaremos à volta dos 5%, 5,1%, 5,2% de crescimento.
Para o próximo ano, temos uma outra previsão. Tínhamos uma previsão de crescimento médio que, em circunstâncias normais, não seria de 8%, mas, tomando em consideração o ciclo económico, se nada fosse feito, se no policy change, ou seja, se não houvesse redução de taxa, de cerca de 6,3% a 6,5%. No entanto, temos uma previsão de 3,4%, que é precisamente a diferença dos cerca de 400 milhões de euros que pensamos
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cobrar a menos pelo efeito da redução de taxa no próximo ano. Neste caso, é mais do que cautelosa, porque o efeito da redução de taxa não é de 400 milhões de euros, visto que só se verifica em metade do ano, até 1 de Julho, e, a partir de 1 de Julho de 2009, a receita vai «alisar». Assim, temos aqui, de facto, uma previsão mais do que cautelosa.
Relembro que a taxa de crescimento do IVA nos últimos anos tem sido muito superior, porque não há uma ligação efectiva relativamente ao crescimento económico. Ou seja, a receita fiscal não pode ser prevista na base de uma transposição directa do crescimento económico e da taxa de inflação para a evolução das receitas. Os impostos contêm mecanismos muito mais complexos que explicam a existência de variações entre o crescimento nominal e a receita de imposto.
Relativamente ao imposto do selo, a resposta é muito simples. Não sei se reparou, mas existem duas alterações fundamentais na estrutura do imposto do selo neste Orçamento do Estado. A primeira é consequência da desmaterialização das escrituras notariais, o que significa que o prazo de entrega do imposto do selo, da verba 1.2 da Tabela Geral (0,8%), vai ser encurtado em cerca de um mês.
Ora, isso significa que vamos ter 13 meses de receita da verba 1.2. É uma consequência da reforma de desmaterialização da justiça, o que nos permite aumentar, obviamente, a receita por termos mais um mês de imposto de selo nessa rubrica.
A outra componente tem a ver com a tributação do jogo social. Ou seja, temos uma autorização legislativa no Orçamento, por via de uma comunicação da Comissão Europeia, no sentido de eliminar a discriminação de tributação dos jogos sociais. Aqui temos de tomar uma de duas opções. Ou tributamos os prémios em sede de IRS, e nesse caso temos de acrescer à receita de IRS que aqui está a receita correspondente à tributação dos prémios, ou tributaremos em selo o valor das apostas. Em princípio, apesar de ainda estarmos a finalizar os estudos, inclinamo-nos para a tributação das apostas em selo.
Isso também nos permitirá tributar as apostas em sites da Internet. Ou seja, se optarmos por essa tributação em selo, também tributamos de forma não discriminatória as opções de jogo pela Internet.
Essa é a razão que justifica, nas diversas fracções da receita do imposto de selo, a receita do crescimento de 7.8%. Ou seja, não é por via directa do crescimento económico, mas por regra de alterações que fizemos à própria estrutura do imposto e que, no meu entender, o tornam bastante mais justo e coerente.
Há uma questão que tem de ser clarificada relativamente a 2008. Fala-se que o crescimento do imposto, em 2008, deveria ser 3,4% da receita fiscal. Penso que é melhor refazer as contas. É que, efectivamente, o cálculo que tem de ser efectuado não é face à previsão de 2007 e à previsão de 2008, mas face à execução de 2007 e à execução de 2008.
Se fizermos a execução de 2007 face à previsão de 2008, vão ver que o crescimento da receita fiscal para 2008 que ç necessário ç de cerca de 2,3% e não são 3,4%. Ou seja, há aqui uma»
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, agradecia que concluísse.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sim, Sr. Presidente.
Dizia eu que há aqui uma variação.
Questionam-me acerca do regime simplificado do IRC. Estão um pouco desatentos, porque o novo regime das Normas Internacionais de Contabilidade (NIC) foi colocado em discussão pública em Julho deste ano.
Todo o regime de transposição das NIC encontra-se no site do Ministério das Finanças e foi alvo de uma ampla discussão pública, durante cerca de dois ou três meses, em que as diversas entidades participaram.
O regime simplificado, não a configuração final mas uma proposta de regime simplificado, consta já dessa proposta de alteração e já foi resultado de uma ampla discussão pública. Obviamente, estamos a analisar os resultados dessa discussão pública e vamos tomá-la em consideração.
O que pretendemos é que o regime simplificado seja efectivamente simplificado para as pequenas e médias empresas, com redução dos custos de contexto e não unicamente um sistema pelo qual os agentes podem obter menores taxas ou efectuar determinado tipo de operações sem serem tributadas.
Queremos que o regime simplificado seja efectivamente simplificado e não um instrumento de planeamento fiscal. É por essa razão que optámos por alterar esta matéria.
Relativamente à questão da redução do IRC em 12,5%, efectivamente são beneficiadas 80% das empresas portuguesas. Porquê? Porque, obviamente, com os 12,5% não entendemos que as empresas que têm actualmente resultados negativos fiquem com resultados negativos para todo o sempre. Vemos as empresas com
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resultados negativos como uma fase transitória para uma evolução de resultados positivos. Na verdade, temos vindo a reduzir o número de empresas com resultados negativos. Temos essa percepção.
Além disso, também temos a percepção de que, se houver uma redução da taxa para 12,5%, existirá uma maior apetência para a apresentação de resultados positivos, ou seja, em termos da própria selecção.
No entanto, posso dizer-lhe que, actualmente, serão integralmente abrangidas 101 461 empresas com resultados fiscais positivos. Se 101 461 empresas com resultados positivos ç um nõmero reduzido»
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — São cerca de 60%
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado, não posso dizer mais nada! De facto, há uma redução da carga fiscal para metade. Isso é um facto.
Relativamente à questão dos juros dos agregados familiares, o Sr. Deputado esquece-se que com os juros do agregado familiar existirão cerca de 280 000 agregados que beneficiam efectivamente do aumento das deduções dos juros em 50%. Aliás, já foi transmitido ao Sr. Deputado Honório Novo que existem 280 000 agregados que efectivamente têm uma vantagem decorrente do benefício. Não estamos a falar daqueles que estão abaixo do limiar da sobrevivência nem daqueles que não têm colecta fiscal positiva. Estamos a falar de 280 000 no primeiro e no segundo escalões. Ou seja, temos aqui, efectivamente, o resultado desta opção. Esta é uma medida efectiva que beneficia os agentes.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, agradeço que conclua.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, gostaria ainda de abordar a questão relativamente ao pagamento por conta e ao resultado da evolução do pagamento por conta. Como o Sr. Deputado bem sabe, o pagamento por conta não é feito numa base linear, tomando em consideração a evolução do ciclo económico de um ano para o outro, mas toma em consideração os resultados anteriores. Ou seja, é uma operação matemática e por isso é um pagamento por conta.
Nesse sentido, se o agente não concretizar a autoliquidação, no ano seguinte o pagamento por conta é-lhe devolvido. O que está em causa, em termos de pagamento por conta, é o volume real. Se o agente não conseguir alcançar os resultados previstos, ser-lhe-á devolvido. Basicamente, a questão é esta.
Por isso, o IRC tem uma redução de 0,9% e não tem a correspondência relativamente ao aumento do valor dos pagamentos por conta. O pagamento por conta não é receita, Sr. Deputado, é um adiantamento por conta da receita.
É por essa razão que, tomando em consideração a redução da taxa para 12,5%, se reduziu o pagamento por conta das pequenas e médias empresas para 75%, para lhes permitir uma maior liquidez, uma vez que há uma redução da taxa.
Penso que teremos mais oportunidades para falar sobre estas questões.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Gostava de dizer que o Sr. Ministro mostrou disponibilidade para continuar a reunião, mas penso que, face ao adiantado da hora, será melhor interrompê-la e continuar a seguir ao almoço.
De qualquer forma, o Sr. Deputado Honório Novo quer dizer algo. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, decorreram praticamente 3 horas após o início desta audição — um pouco menos — e foram ouvidos apenas três partidos. Isto é, cada conjunto de pergunta/resposta demorou cerca de uma hora. Se esta média se mantivesse, e como ainda falta ouvir dois partidos, terminaríamos a reunião só cerca das 15 horas e 30 minutos.
Uma vez que o nosso planeamento de audição era das 10 às 13 horas e das 15 às 19 horas, penso que seria mais avisado que pudéssemos recomeçar os trabalhos às 15 horas ou até anteciparmos em 30 minutos.
Ou seja, sugiro que recomecemos às 14 horas e 30 minutos, dada a manifestação de vontade do Sr. Ministro de se poder ausentar um pouco mais cedo do que estava previsto.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Honório Novo.
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Essa também era a minha sugestão. De qualquer forma, creio ser demasiado apertado recomeçarmos os trabalhos às 14 horas e 30 minutos.
Vamos, pois, interromper a reunião, dando guarida à sua pretensão, que aliás sufrago, recomeçando-a da parte da tarde, às 15 horas, com as intervenções que faltam desta primeira ronda, as do PCP e do BE.
Eram 13 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Srs. Deputados, dentro da primeira ronda de perguntas, faltam ainda as intervenções dos Grupos Parlamentares do PCP e do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, queria começar por saudar o Ministério das Finanças em peso (o Ministro e os Secretários Estado).
O Sr. Ministro, da parte da manhã, há cerca de 5 horas, anunciou que este Orçamento era de combate à crise. A ideia que me ocorreu foi um pouco esta: veja-se lá o Ministro das Finanças, o mesmo Ministro das Finanças que, durante meses, andou a dizer que a banca era absolutamente imune à crise, que a nossa economia era absolutamente resistente, robusta e preparada para resistir à crise, vem agora apresentar exactamente um Orçamento pretensamente para combater a crise! Sr. Ministro, de facto, insisto nesta ideia: pretensamente para combater a crise.
É que, em nossa opinião, este Orçamento não é contra a crise, não tem características anti-cíclicas. Eu diria mais o contrário, Sr. Ministro: no fundamental, este é um Orçamento de resignação, que não pretende combater a perspectiva de estagnação económica que temos no horizonte — já não falo em recessão económica, não quero falar nisso — e que espera uma espécie de um milagre, como se a solução dos problemas «caísse do céu aos trambolhões».
A questão central que poderia marcar a diferença em termos de opções e indiciar uma viragem no sentido de combater a crise, que este Orçamento não combate, é a opção relativamente ao défice orçamental.
Os senhores insistem em manter o défice de 2,2% para 2009, igual ao de 2008. Isto é, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Afonso Candal, da parte da manhã, o Governo continua a ter uma obsessão por mais que diga e faça crer que não tem.
Efectivamente, depois de anos a fazer com que o controlo orçamental, a diminuição do défice orçamental fossem feitos à custa das famílias, das pequenas empresas, dos trabalhadores, dos que menos têm, agora pretende resolver o problema da crise exactamente à custa das mesmas pessoas. Sr. Ministro das Finanças, isto não era obrigatório nem necessário. Por isso, é importante dizê-lo e sublinhá-lo aqui.
Por essa Europa fora, em todos os governos onde a crise «bate à porta» — e são todos — a opção foi diferente. Isto é, foi utilizar a margem que existe no próprio Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Ora, é esta margem que o Governo, em Portugal, não quer usar. O Governo recusa a utilização da margem e da folga orçamental que tem em nome de um pseudo-rigor, de um rigor que todos os governos europeus não querem ter, desvalorizam, não utilizam. É que este não é o momento de utilizar esse rigor.
A verdade é que o Governo opta por uma alternativa que passa por não utilizar a margem orçamental. Se utilizasse a margem orçamental que tem — ela cifra-se entre cerca de 1400 e 1500 milhões de euros —, sem passar a défice excessivo, sem infringir as normas do Pacto de Estabilidade e Crescimento, poderíamos adoptar políticas mais marcadamente anti-cíclicas, fosse, por exemplo, no investimento, fosse nas medidas que beneficiassem as pequenas empresas, fosse nas medidas de natureza social que pudessem beneficiar e amortecer as consequências negativas para as famílias.
Falei-lhe em investimento, que era central para marcar uma política anti-cíclica que o Governo rejeita. Sr.
Ministro, vamos acabar esta Legislatura, em plena crise, quando o Orçamento deveria ser anti-cíclico, deveria motivar muito mais o investimento em pleno Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), com um investimento público inferior ao que este próprio Governo previa em 2005, em 2006 e em 2007. Esta é a melhor maneira de mostrarmos que as perspectivas deste Orçamento não são anti-cíclicas.
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Sr. Ministro, colocada esta questão, importava perceber o que este Governo tem em mente no âmbito de algumas perspectivas macroeconómicas.
Não vamos fazer um grande «campo de batalha» em torno do valor de 0,6% do crescimento. Sabemos que as condições de incerteza relativamente a este Orçamento são tão elevadas que colocar aqui 0,6%, 0,5%, 0,2% ou 0% é relativamente indiferente. E a validade seria indiferenciada.
Portanto, não nos vamos perder em discussões estéreis à volta dos 0,6%. No entanto, não deixamos de comentar este número quanto ao que encerra de perversidade, Sr. Ministro.
A escolha deste número — 0,6 — não é casual, é intencional. Para quê? Para o utilizar no que, em nossa opinião, é uma pura e simples manobra de propaganda.
É verdade que há incerteza, é verdade que a colocação deste número para o crescimento é relativamente aleatório, mas não aceitamos que este número seja escolhido para dizer publicamente que vamos crescer mais do que a zona euro. Isto é que é inaceitável, Sr. Ministro, e é uma pura manobra de propaganda que precisa de ser denunciada aqui.
Aliás, se recordarmos o passado recente, sabemos o que vale a palavra do Primeiro-Ministro e do Governo sobre estas anunciadas convergências com a zona euro. Ainda há um ano, o Sr. Primeiro-Ministro, relativamente ao crescimento em 2007, dizia que ia ser maior do que na zona euro. Verificou-se que não. Ainda há um ano, o Sr. Primeiro-Ministro, relativamente ao corrente ano, anunciava um crescimento superior ao da média da zona euro e todos sabemos em que é que vamos terminar.
Portanto, em matéria de declarações acerca de convergência com a zona euro e de crescimento superior a esta última — e é por isso que é escolhido este número 0,6 para o crescimento —, a palavra do Governo, pela história recente, não nos merece crédito e, digamos, o anúncio da convergência com a zona euro é, em nosso entender, uma mera retórica de propaganda, nada mais que propaganda.
A escolha deste valor de 0,6 para o crescimento tem algumas implicações no desemprego, e essa é a componente que me importa debater consigo, mais especificamente do ponto de vista macroeconómico. É que, Sr. Ministro, começamos a perceber que os 150 000 novos postos de trabalho anunciados em 2005 vão «pelo cano abaixo», infelizmente.
Assim, gostava de o ouvir dizer se, nestas circunstâncias, o senhor vai manter essa previsão para 2009, para o fim da Legislatura, ou se, como alguns colegas seus do Governo já começam a admitir, vai reconhecer (e quando?) que os 150 000 novos postos de trabalho não vão ser concretizados até ao final de 2009.
Mais: vamos ver como é que é sustentável a previsão de desemprego para o próximo ano.
Em Maio, o Governo, nas últimas revisões que fez das previsões macroeconómicas, anunciou, para 2008, um crescimento de 1,5% e uma taxa de desemprego de 7,6%. Agora, quatro meses depois, o Governo vem rever a meta do crescimento para metade — 0,8, sensivelmente — e mantém a mesma previsão para a taxa de desemprego.
Portanto, há quatro meses, em Maio, a perspectiva de crescimento era de 2%, a taxa de desemprego prevista era de 7,4%; agora, a previsão para a taxa de crescimento é de 0,6%, isto é, menos de um terço do que o Governo previa há quatro meses, e a previsão para a taxa de desemprego é de apenas mais 0,2 pontos percentuais.
Sr. Ministro, gostava de perceber como é possível fazer uma tão significativa, tão enorme redução em termos da previsão para a taxa de crescimento — não estou a colocar em causa a valia dessa revisão — e, simultaneamente, manter praticamente imutável a previsão em termos da taxa de desemprego. Não consigo perceber como é isto possível.
A este propósito, sublinho que não estamos a falar de efeitos imediatos mas de efeitos diferidos no tempo, isto é, entre Maio do corrente ano e o final do próximo ano, portanto, estamos a falar de um horizonte bastante lato.
Mas esta questão pode ser vista de outra maneira, ou seja, em relação aos números do Orçamento. Como é que, para 2009 relativamente a 2008, o Sr. Ministro pode ter a «ousadia» de orçamentar para 2009, para o subsídio de desemprego, uma verba de 1578 milhões de euros, ou seja, 11,3% abaixo do valor que orçamentou para 2008, sendo certo que, afinal, até segundo os seus próprios números, o desemprego vai aumentar? Mesmo partindo do princípio que até se vão verificar os números que aponta para o desemprego, coisa em que ninguém acredita, como é possível e aceitável que consiga diminuir em quase 200 milhões de euros o valor das verbas afectas ao fundo de desemprego?
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Na parte da manhã, o Sr. Ministro das Finanças afirmou que este é um Orçamento de combate, com medidas destinadas às famílias, aos trabalhadores e às empresas.
Vamos começar pelas pessoas, pelos trabalhadores e pela questão dos salários. Sr. Ministro, recordo-lhe que, há um ano, aqui, o senhor e o seu Secretário de Estado do Orçamento, que está sentado à sua direita, anunciaram de uma forma bem explícita que, em 2008, os trabalhadores não iriam ter perda de poder de compra.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — E também o Primeiro-Ministro anunciou!
O Sr. Honório Novo (PCP): — O Sr. Primeiro-Ministro, numa fase posterior, corroborou e ratificou essa sua afirmação.
Então, verifiquemos como são os anunciados aumentos salariais para o próximo ano: 2,9%, superior em 0,4 pontos percentuais à inflação esperada.
Segundo os números do Governo, qual foi a perda de poder de compra ocorrida este ano? 0,8 pontos percentuais. Inflação prevista pelos senhores: 2,1%; inflação agora reconhecida pelos senhores: 2,9%, portanto, uma diferença de 0,8 pontos percentuais. Então, acha que há uma reposição do poder de compra ou, para haver, conforme os senhores — Secretário de Estado, Ministro e Primeiro-Ministro — anunciaram aqui há um ano, era necessário, pelo menos, ter anunciado uma subida de salários de 3,3% — e isto não repunha o poder de compra perdido nos 10 anos anteriores? Passo a duas outras questões, que são centrais e têm a ver com as famílias.
Naturalmente, eu podia pegar na boutade, passe a expressão, do Deputado Afonso Candal, proferida na parte da manhã, quando falou da nova fórmula de cálculo das reformas, e dizer, em jeito de comentário, que ao fim de dois anos — repito, ao fim de dois anos — e depois de, inúmeras vezes, os responsáveis do Governo e da bancada situada à minha esquerda terem apelidado de «mentirosa» esta bancada do PCP quando nós dávamos exemplos de como a fórmula utilizada para cálculo das pensões prejudicava, entre 10% a 15%, as reformas, sobretudo as mais baixas, os senhores vêm admitir agora, finalmente, que vão aceitar refazer essa fórmula de cálculo.
Mas, Sr. Ministro, vamos à questão que quero colocar-lhe, que é importante e não está no Orçamento.
Aceite aquele princípio (e mais vale tarde do que nunca!), os senhores acham justo, acham legítimo não aceitarem que haja retroactividade, a 1 de Janeiro de 2007, dessa nova fórmula de cálculo, assim fazendo com que deixem de ser penalizados e tenham direito a retroactivos aqueles que foram prejudicados com a fórmula de cálculo que os senhores impuseram? É importante que nos diga, Sr. Ministro.
O Sr. Afonso Candal (PS): — Os penalizados pela nova eram os penalizados pela velha!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Finalmente, gostava de colocar uma questão relacionada com os chamados «fundos de investimento imobiliário».
O Governo anuncia a criação destes fundos para salvar milhares de famílias da gravíssima situação em que se encontram, «afogadas» com as prestações de crédito à habitação. Se tais fundos de investimento fossem anunciados na periferia da Administração Pública, isto é, administrações central, regional e local, porventura era uma via que, de facto, mereceria uma reflexão e uma atenção especiais. Mas não é isso que os senhores apresentam.
O que os senhores apresentam é, no fundamental, uma ilusão que é uma espécie de saco de areia que se tenta atirar para os olhos das famílias que estão atrapalhadas e endividadas mas que, na maioria dos casos, não irá resolver os problemas. Porquê? Porque, no fundo, as famílias, de facto, vão perder definitivamente a sua habitação e o seu património. Se quisesse resolver, de facto, a situação das famílias com problemas de pagamento das prestações bancárias, tinha aceite desafios que reiteradamente temos lançado no sentido de descer as margens de lucro nos contratos de empréstimo à habitação. Mas já se percebeu, reiteradamente, que o Governo não quer fazer isso.
Sr. Ministro, em nosso entender, estes fundos não são destinados a resolver o problema das famílias, são, isso sim, criados para dar mais uma ajuda à banca e, agora também, aos grandes grupos imobiliários, que têm centenas, milhares de fogos para colocar no mercado de arrendamento ou de venda e não conseguem arrendar nem vender.
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Estes fundos são fechados, vão ser geridos, obviamente, por bancos, por empresas dominadas por bancos ou por grupos imobiliários e não por parceiros individuais ou por qualquer outra entidade.
Estes fundos, Sr. Ministro, vão estabelecer o preço de compra dos prédios, com critérios até agora desconhecidos — nada consta na proposta de lei do Orçamento que o diga —, o que permite, à partida, que quem está com a «corda na garganta» venda ao desbarato e por valores, se calhar, inferiores ao valor real do prédio e que nunca têm em conta a amortização feita pelas famílias até este momento. Se eu estiver errado, diga-me onde é que isto consta na proposta de lei.
«Ninguém é obrigado a vender», dirá o Sr. Ministro, tal como ontem disse o Secretário de Estado. Peço desculpa, Sr. Ministro, mas esta afirmação, feita pelos responsáveis governamentais, é cínica, se pensarmos que, para as famílias, a opção é entre perder a casa, ou entregá-la ao banco, ou vendê-la ao preço que lhes é imposto.
Já agora, ontem, alguém colocava uma pergunta: por que razão o Governo, face às famílias apertadas, endividadas, não lhes dá as regalias que dá aos fundos? Por que razão não isenta de IMI essas famílias? Por que razão não lhes permite fazerem abatimentos em sede de IRS, diminuindo-lhes assim o valor deste imposto? Aos fundos, tais isenções de impostos são concedidas, as famílias com a «corda na garganta» continuam a pagar IMI, continuam a pagar IRS, mesmo nos escalões mais baixos. Podia ter legislado neste plano, Sr.
Ministro, sem precisar dos fundos.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Finalmente, Sr. Ministro, em síntese, deixe-me dizer-lhe o seguinte: as famílias vendem ao desbarato, perdem as amortizações já feitas, pagam rendas que ninguém sabe como são estipuladas mas que, certamente, não vão abater nem em juros nem em amortizações, como é óbvio, e depois permitem-se criar a possibilidade de recompra do prédio pelo preço de mercado, contraindo novos empréstimos. Sr. Ministro, isto é uma espécie de agiotagem institucionalizada.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Tenha senso!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ainda uma questão que gostava de lhe colocar, em remate. Um economista da área do Partido Socialista — ou militante do Partido Socialista, não sei!? —, que, aliás, é comentador regular num canal de televisão, disse um dia destes, penso que foi ontem, que isto era o «ovo de Colombo» da economia, em que todos saíam beneficiados: famílias endividadas e com a «corda na garganta», grupos imobiliários, bancos e os parceiros dos fundos.
Sr. Ministro, ontem, num fórum de uma estação de rádio, ouvi um administrador de uma empresa, que há dois anos se dedica à criação destes fundos, exactamente destes fundos, com o mesmo sistema, o que significa que já havia, e há, legislação que o permite, a dizer o seguinte: «Eu já posso fazer isto, eu já estou a fazer isto na Península Ibérica. A única diferença entre o que estou a fazer e o que se pretende fazer e se anuncia agora é nas isenções de impostos. É que eu pago os impostos e os fundos de investimento vão estar totalmente isentos de imposto de selo, de IRS, de IRC, de IMI, de IMT». Isto é, a única diferença e o único objectivo para o qual foram criados estes fundos de investimento imobiliário está bem patente na intervenção deste administrador da empresa que há dois anos opera no ramo em Portugal! Portanto, os senhores não têm legitimidade nem de lhe chamar «ovo de Colombo» da economia nem vir para aqui fazer de conta que esta é uma medida para ajudar famílias que estão com a «corda na garganta».
Podem criar ilusões a essas pessoas, podem enganá-las, podem deitar-lhes «areia para os olhos», mas, no fundo, esta medida é para, mais uma vez, dar uma mãozinha à banca e incluir nessa mãozinha os grandes grupos imobiliários.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, gostaria de discordar da opinião que exprimiu de que não é importante combater o défice e assegurar o rigor, a saúde e a disciplina financeira do Estado.
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O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu não disse isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O Sr. Deputado disse que, por essa Europa fora — não sei qual é a fonte de informação? —, ou, pelo menos, dá um pouco a entender, todos os países vão aumentar os défices e, eventualmente, até ultrapassar o limite dos 3%.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Também não disse isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Foi o que deu a entender, Sr. Deputado! O Sr. Deputado invoca esse facto para dizer que Portugal, ao manter um défice de 2,2%, está a ser excessivamente prudente, não está a querer ir tão longe quanto os outros países estão disposto a ir. Foi o que deu a entender.
Sr. Deputado, recordo que, nesta matéria, os países não são todos iguais, porque têm um historial e uma reputação a nível internacional e nos mercados financeiros, e, infelizmente, a reputação que Portugal tem não é das melhores. Uma coisa é um país, por exemplo, como a Irlanda — permita-me que cite este exemplo —, que vai entrar em défice excessivo pela primeira vez. Se Portugal entrar em défice excessivo, será pela terceira vez, o que faz toda a diferença entre estes dois países, Sr. Deputado. Não é a mesma coisa a Irlanda, com o desempenho económico que teve, com as fragilidades que agora até me parece serem perceptíveis, cair em défice excessivo e Portugal, levando uma política um pouco mais relaxada (permita-me o termo) no domínio orçamental, ultrapassar a fasquia dos 3%, caindo pela terceira vez em défice excessivo. Faz toda a diferença! Isto teria um custo a suportar pelo País, e o País são os portugueses. Entrarmos novamente numa zona de risco de incumprimento dessa fasquia é penalizar os portugueses, porque as taxas de juro a que o País se poderia financiar seriam necessariamente mais elevadas, o que pesaria na factura não só do Estado, nos juros que tem de pagar, no seu próprio Orçamento, mas, acima de tudo, na dos portugueses, pois isso implicaria um agravamento considerável dos seus encargos.
Sr. Deputado, a questão já não é sequer a de ultrapassar ou não os 3% mas a de se situar numa zona onde a percepção de que há o risco de ultrapassar este défice é já quanto baste para nos penalizar.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Essa agora!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não tenha dúvidas, Sr. Deputado. Não tenha dúvidas, porque, neste contexto e dado que só este ano é que saímos de uma situação de défice excessivo, o indício de que nos colocamos numa situação de risco seria de imediato incorporado na apreciação e na avaliação que os mercados financeiros e os financiadores fariam do risco do País e, consequentemente, das condições de financiamento.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que é que não fica em 2,8% ou em 2,9%?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, Sr. Deputado, não tenhamos ilusões quanto a esta matéria, em relação à qual temos uma discordância absoluta, aliás, que não é de agora, é de sempre. O Partido Comunista considera que todos os problemas do País se resolvem gastando mais, não interessa o défice.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não, não. Não especule!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — São as soluções para as quais apontam.
O Sr. Deputado afirma que este Orçamento não é anticíclico. Sr. Deputado, não vou argumentar se é ou não anticíclico, pois para mim não é importante entrar nessa discussão.
Permita-me somente que lhe recorde — e este não é um argumento meu — que, há poucos dias, alguns órgãos de comunicação social davam conta de que este Orçamento para 2009 é o mais anticíclico da década.
O Sr. Deputado tem essa opinião, é a sua, mas chamo a atenção para o facto de haver quem tenha opinião diferente.
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Disse, ainda, o Sr. Deputado que podíamos apostar mais no investimento. Sr. Deputado, as verbas do PIDDAC e o financiamento global dos projectos do PIDDAC aumentam 13,5%. Se olharmos para a conta das administrações públicas e para o investimento no sentido estrito da palavra (a formação brutal de capital), constatamos que, no conjunto das administrações públicas, envolvendo a administração central e as autarquias, essencialmente, o investimento aumenta 13,1% e que o investimento do Estado e dos fundos e serviços autónomos, portanto, da administração central no seu conjunto, aumenta 30%. São mais 370 milhões de euros de investimento, em 2009, em comparação com 2008! O Sr. Deputado dá a entender que, neste Orçamento, não há um esforço de investimento, que até é contracíclico, mas não pode ignorar estes números e estas taxas de variação do investimento.
Sr. Deputado, permita-me que louve a sua atitude quando diz que 0,6% ou 0,3% não é relevante — e não vale a pena estar a discutir o número. Penso que é uma atitude face à incerteza que sempre envolve as previsões, particularmente aquela que actualmente existe, e permita-me que note essa sua postura que me parece louvável.
Já não concordo consigo quando quer insinuar que com isso se pretende fazer uma manobra de propaganda.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Quanto a isso, já eu sabia que não estava de acordo!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não, não estou de acordo.
Sr. Deputado, a própria líder do PSD, Dr.ª Manuela Ferreira Leite, diz que vamos crescer o triplo da União Europeia, portanto, não é um exclusivo do Governo reconhecer que Portugal poderá crescer mais do que a União Europeia, pois, repito, o maior partido da oposição também o faz.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso não é prova de nada!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, como o Sr. Deputado pretende insinuar, não há aqui nenhuma manobra de propaganda política.
Quanto à questão do desemprego — e permita-me que não me alongue muito nesta explicação —, hoje de manhã, na resposta que dei ao Sr. Deputado Diogo Feio, tive oportunidade de explicar a razão dessa previsão do desemprego para 2009, que é de 7,6%, ou seja, igual à que temos para 2008.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Acha que é credível?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Expliquei porquê. Tem a ver com o facto de a taxa de desemprego estar num ciclo descendente, que não deixará de pesar no seu valor médio em termos anuais, e também — e este é um dado estatístico comprovável — com o facto de o desemprego não ser uma variável que reaja em tempo real, chamemos assim, com o crescimento.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu disse isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Reage atrasado. É o chamado «indicador atrasado da economia».
Portanto, Sr. Deputado, não é correcto tirar a ilação de que, no caso de redução do crescimento, há uma resposta imediata por parte do desemprego. De facto, a evidência estatística comprova-o.
Sr. Deputado, eu não ignoro que, com a actual conjuntura internacional, com o impacto que terá na nossa economia em termos de crescimento, aliás, reflectido nas nossas previsões, são mais difíceis as condições para a criação de 150 000 empregos»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Novos!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » atç ao fim do próximo ano, conforme foi previsto há quatro anos. Não ignoro isto, Sr. Deputado, mas há uma coisa que, penso, não podemos ignorar. É que, até este
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momento, já foram criados 133 000 novos empregos. Repito, 133 000 novos empregos. Sr. Deputado, faltam 17 000 para os 150 000. Não venha agora dizer-me que, nesta conjuntura adversa, com as implicações que tem no crescimento da nossa economia, esta previsão está muito aquém dos 150 000! Sr. Deputado, sejamos razoáveis na avaliação e na apreciação que fazemos destas questões.
Quanto ao subsídio de desemprego, já tive oportunidade de esclarecer esta matéria quando, há pouco, respondi ao Sr. Deputado Diogo Feio. Em boa verdade, Sr. Deputado, não é legítimo estarmos a querer comparar orçamentação para 2009 com orçamentação para 2008. Nós temos de orçamentar para 2009 em função daquilo que é despesa efectiva de 2008 e, relativamente a 2008, há, de facto, um aumento das verbas para o subsídio de desemprego em comparação com a estimativa de execução de 2008. É isso que conta e não, no fundo, a confrontação com previsões de há um ano, que não se verificaram, porque as despesas com o subsídio de desemprego foram, em 2008, inferiores do que o inicialmente previsto.
Quanto à questão dos salários, Sr. Deputado, gostaria de esclarecer que aquilo que sempre foi dito pelo Governo» Há um ano o que dizíamos era o seguinte:»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ouvimos mal!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu acho que ouviram bem, não quiseram foi perceber. Ou, então, fazem de conta que não perceberam! Aquilo que foi dito há um ano foi que, sendo a inflação prevista de 2,1%, o aumento de 2,1% dos salários da função pública mantém o poder de compra. Foi isso que foi dito, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não foi nada!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, desculpe, mas eu sei o que disse. Eu acho que ainda não me «passei da cabeça» para não ter consciência do que disse, Sr. Deputado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Por causa da crise nunca se sabe!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu não perco a frieza, o sangue frio e a tranquilidade — era o que faltava! — em momentos destes. É bem preciso ter a cabeça fria, muita calma e paciência para enfrentar estas situações. E eu, isso, espero nunca perder, Sr. Deputado.
Tenho bem consciência daquilo que sempre disse nesta matéria e fui sempre muito claro. O Sr. Deputado está a querer dar uma leitura política, dando a entender que havia um compromisso de reposição de poder de compra, que não existiu.
O que quero tornar bem claro é que para o ano, sendo a inflação esperada de 2,5%, estamos aqui a propor aos trabalhadores da função pública uma melhoria do seu salário real com um aumento de 2,9%. É isso que temos pela frente. Propomos um aumento de 2,9%, que é superior à inflação esperada.
Quanto à questão do cálculo das pensões, devo dizer que não tem razão. Há aqui um quadro que já foi definido, aliás, acertado no âmbito da concertação social, e que tem a ver com as regras de actualização das pensões. Há tão-somente uma correcção que visa evitar uma penalização que já existia e que subsistia.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente! De dois anos!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não há, contudo, uma alteração substancial»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Pois não»!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » ou substantiva de orientação dada nesta matçria.
Relativamente aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, o Sr. Deputado diz que o Governo quer criar ilusões. Sr. Deputado, acho que também não é justo estar a acenar com fantasmas.
O que o Sr. Deputado está a querer fazer é a acenar com fantasmas, que não tem razão de ser.
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O Sr. Honório Novo (PCP): — Vamos ver!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu entendo que é claro que os critérios de avaliação dos imóveis estão estabelecidos na lei: é uma avaliação que tem de ser feita por dois peritos, que são dois profissionais registados na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. E essa avaliação é feita. Se, porventura, o acordo celebrado entre o proprietário e o fundo for o de transferir o prédio ou o imóvel correspondente ao capital em dívida, a recompra é feita com base nesse mesmo valor, Sr. Deputado. Se for feita com base no preço de mercado, será o preço de mercado que servirá de referência. E é isso que é justo que seja feito.
Agora, não acho legítimo que, por cegueira ideológica, que sempre houve por parte do Partido Comunista, se pense que tudo o que a banca se mete é sempre suspeito e é mau, por definição. Muito provavelmente, mas não necessariamente, os fundos de investimento imobiliário serão fomentados pelo nosso sector financeiro e eu não acho legítimo que se crie suspeição ideológica por esse facto. «Mete bancos, claro, isto é para prejudicar o povo!» — é a ideia que logo o Partido Comunista pretende incutir nas pessoas.
Risos do Deputado do PCP Honório Novo.
Sr. Deputado, chamo a sua atenção — e não podemos ignorar isto — para a iniciativa que a Caixa Geral de Depósitos, ainda ontem, anunciou, a qual revela claramente que os interesses patrimoniais das pessoas são respeitados e também que as pessoas podem ter uma redução muito significativa dos encargos que têm com a habitação, se tiverem que recorrer a este mecanismo. Não podemos ignorar que há famílias que já estão, ou que podem correr o risco de virem a estar, em incumprimento das suas obrigações com os bancos e que estão em risco de ver executadas as garantias que deram aos bancos pelos seus empréstimos. E nós podemos, de facto, resolver estes problemas sérios que as famílias têm. Portanto, estar aqui a acenar com fantasmas para assustar desnecessariamente as pessoas, não me parece que seja correcto, Sr. Deputado. De facto, reduções dos encargos da ordem de, pelo menos, 25% e que podem atingir 40% é algo significativo.
Pergunta o Sr. Deputado por que razão não se dão estes benefícios fiscais dos fundos às pessoas. Pois digo-lhe uma coisa, Sr. Deputado: se déssemos às pessoas a mesma redução do IMI que se dá aos fundos,»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Falo em eliminação!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » não iríamos ter o impacto da redução dos encargos que, apesar de tudo, se tem atravçs» Mesmo que se reduzisse ou se eliminasse o IMI — o que iria criar um grande problema às autarquias, não esqueça isso, Sr. Deputado! —, não iria ter o impacto da redução de 25% a 40% nos encargos das pessoas.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
Não ia ter. Não ia. Porque o impacto do IMI não seria esse.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Os fundos não vão dar problemas às autarquias?! O que acaba de dizer é desonestidade intelectual!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Os fundos podem ter esse efeito de redução significativa dos encargos suportados pelas famílias através de um quadro fiscal que, deliberadamente, foi criado para permitir que o arrendamento possa ser feito em condições menos onerosas para as famílias.
No caso, que refere, do empresário, ele não tem conseguido fazer porque, como bem disse, não tem um regime fiscal, mas tambçm nada impede»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Tem!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não tem o regime fiscal dos fundos e, portanto, não tem a mesma capacidade de praticar rendas tão baixas, como os outros têm. Mas os fundos estão abertos a toda a
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gente. Nada impede que a iniciativa privada, eventualmente, deste empresário ou de outros, crie fundos de investimento imobiliário para arrendamento, usufruindo deste quadro fiscal e, obviamente, promovendo a política de arrendamento.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, pedia-lhe, primeiro, uma clarificação: vê algum inconveniente em que eu faça os comentários, as perguntas e as considerações ao Sr. Ministro das Finanças usando metade do meu tempo para obter a resposta, certamente disciplinada, do Sr. Ministro e depois, em função dessa resposta, concluir as minhas considerações?
O Sr. Presidente: — Não vejo qualquer objecção.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito obrigado, Sr. Presidente, Sr. Ministro, boa tarde.
Queria pedir-lhe alguns esclarecimentos pontuais para me concentrar no que me parece que deve motivar o debate nesta Comissão, que é a apreciação da crise financeira internacional, das suas consequências económicas em Portugal e do desenvolvimento das fragilidades da economia portuguesa.
Antes disso, quero fazer duas observações.
O Sr. Ministro tem consciência de que este Orçamento teve alguns percalços: uma pen que só tinha uma página, um apagão, durante uma noite, de uma parte do Orçamento — finalmente, temo-lo! — e agora parece que o Sr. Ministro interveio já durante o dia de hoje acerca do desaparecimento de uma frase na lei do financiamento dos partidos dizendo que ela não tinha consequências.
Queria manifestar a minha disposição no seguinte sentido: se o Governo quiser fazer uma errata do Orçamento ou correcções para esclarecer aquilo que pretende, nós, naturalmente, temos toda a disposição para apreciar essas correcções dos erros que o Governo tenha feito.
Queria perguntar-lhe, ainda, a respeito do aval que o Governo fez aprovar pela Assembleia da República dos 20 000 milhões de euros para o sistema financeiro. Ontem, o Governo entregou-nos o projecto de portaria, que será publicado hoje ou amanhã, e ficou de nos dizer — coisa que ontem não tinha ou não tinha decidido — qual era o valor das comissões e do juro que fariam parte de um anexo dessa portaria. Queria que fizesse o favor de comunicar à Assembleia esses valores para podermos conhecer o conjunto desta operação.
Dito isto, Sr. Ministro, queria concentrar-me na questão essencial, que é a da evolução da política económica.
Estamos a viver uma recessão internacional. Já não há dúvida nenhuma, não é possível ter nenhuma dúvida de que esta crise financeira é uma crise económica. Como sabe, hoje, de manhã, Gordon Brown reconheceu que o Reino Unido está em recessão, os Estados Unidos estão em recessão, a Espanha está em recessão, a França está em recessão, a Itália está em recessão e, se olharmos para Portugal, uma economia das mais abertas da União Europeia, para o indicador coincidente da actividade económica do Banco de Portugal, verificamos que, em Junho, nos dava um indicador de 0,4, em Julho de 0,2, em Agosto de 0 e em Setembro de 0. Ou seja, qualquer que seja a projecção que o Governo queira fazer, os dados de facto sobre a economia real já nos dizem que estagnação já é a situação actual. É por isso que este Orçamento deve ser medido à luz da sua capacidade de responder às dificuldades dos portugueses.
Queria voltar à questão do desemprego porque é, talvez, a maior dessas dificuldades, junto, naturalmente, com a perda do poder de compra e o que tem acontecido nesta conjuntura de desigualdade, que, aliás, é muito clara. Os números da OCDE são esmagadores desse ponto de vista: em Portugal, temos das maiores desigualdades dos 30 países que fazem parte da OCDE, temos um nível de endividamento que tem crescido extraordinariamente e que é, talvez, o maior condicionante externo da nossa economia.
Neste ano, de 2008, 3 milhões de portugueses trabalhadores e reformados perderam poder de compra efectivo. Por isso mesmo, a política de salários, de pensões e de emprego é tão decisiva. O Sr. Ministro, até agora, nas suas intervenções, ladeou a questão.
Queria que se voltasse a concentrar sobre o problema. Porque veja o número que nos deu: disse-nos, e insistiu com a convicção que empresta sempre às suas intervenções, que este ano a média anual do desemprego, no final de 2008, será de 7,6%. Mas, depois, disse-nos, triunfante, que no 1.º semestre foi de 7,3%.
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Sr. Ministro, por favor, acompanhe o raciocínio matemático: se a média do ano é de 7,6%, mas no 1.º semestre foi de 7,3%, então, no último semestre será de 7,9%. Portanto, passamos de 7,3% para 7,9%, diz o Ministro, e não há mais discussão alguma sobre os números que o Ministro nos dá.
O que está a dizer-nos é que, quando começa a estagnação económica (indicador do Banco de Portugal: 0% de crescimento), o desemprego já está a disparar de 7,3% para 7,9%, mas vai amainar no próximo ano, em que teremos maiores dificuldades económicas do que no ano de 2008. Não bate certo! Não bate certo! Eu sei que o desemprego tem um ligeiro desfasamento em relação ao crescimento; na realidade, tem mais desfasamento quando há crescimento do que quando há estagnação porque, quando há estagnação e recessão, o desemprego «bate à porta» muito depressa, como todos sabemos. O problema é que, se o Governo não quer olhar para os números, nem sequer para as consequências dos seus próprios números, como é que vai tomar medidas? O que este Governo fez foi reduzir a cobertura do subsídio de desemprego, reduzir o acesso do subsídio de desemprego aos mais jovens ou aos desempregados de longa duração, considerar inactivos muitos dos desempregados para efeito de uma «maquilhagem» destas estatísticas e, portanto, não responde à questão da criação de emprego.
O Sr. Ministro voltou a falar dos 150 000 postos de trabalho. Mas, Sr. Ministro, o que estava no cartaz era «Recuperar 150 000 empregos». Não quero fazer uma discussão semântica consigo, porque não saímos daqui. O senhor diz que «recuperar» é só criar empregos, não é reduzir o desemprego. Bom, fique com a sua! Mas o único critério, que se vai aplicar, é o de que, tenha acontecido o que tenha acontecido, se tiver mais desemprego, quando chegar ao fim da Legislatura, fracassou. Não pode haver outro critério decente em relação às pessoas! Portanto, se o desemprego aumentou, quando a sua promessa era a de recuperar 150 000 postos de trabalho, fracassou; se tiver diminuído o desemprego, então, naturalmente, houve um sucesso da política de emprego. Até agora, isso não aconteceu e a falta de política de emprego neste Orçamento leva ao risco do aumento do desemprego.
Dito isto, queria voltar à questão das dificuldades que este Orçamento coloca, para terminar esta primeira pergunta.
O fundo de investimento de arrendamento de habitação é fulcral neste Orçamento. Devo dizer-lhe, Sr.
Ministro, que nós, os portugueses, temos imenso azar: não há nenhum Orçamento que não tenha uma marosca e esta marosca, aqui, chama-se fundo de investimento de arrendamento habitacional.
Percebe-se, exactamente, o que se quer com isto: quer limpar-se os balanços dos bancos de todo o crédito malparado ou com dificuldades de cobrança; quer reduzir-se, portanto, as provisões que os bancos têm de fazer e os custos que têm nessas operações; quer, sob a lógica do mercado — «Estado mínimo«!» —, dar-se ao mercado a possibilidade de regular aquilo em que o mercado fracassou. É que, não haver possibilidade de arrendamento é culpa das regras de mercado que impuseram que não haja arrendamentos; e, portanto, todas as pessoas são obrigadas a comprar casa a preços hipervalorizados, que é a realidade da compra do imobiliário em Portugal.
Diz-nos, agora, o Governo: «Vamos, então, fazer com que as pessoas, que têm dificuldades em pagar a casa, entreguem a casa aos bancos, às sociedades financeiras, aos fundos, lhes paguem uma renda e, depois, se quiserem, voltem a comprar a casa, que já era em grande parte deles, porque já tinham pago uma parte dos anos do empréstimo para compra desta casa.» Vou fazer perguntas concretas, Sr. Ministro, e esperava que pudéssemos ter, hoje, uma resposta categórica sobre estas questões. Pode ou não haver uma avaliação do valor da casa abaixo do valor pelo qual as pessoas contraíram o crédito? Por outras palavras, pode ou não haver o caso de uma pessoa que, depois de entregar a casa e ficar a pagar renda ao banco, ainda tem uma dívida ao banco, além da renda que está a pagar? Porque isso seria totalmente inaceitável! Segunda pergunta: as rendas vão ser 25% a 40% mais baratas do que a prestação. Mas, Sr. Ministro, ouvi que — e reparei, aliás, na enorme publicidade que, hoje, aqui fez da Caixa Geral dos Depósitos —, a Caixa Geral dos Depósitos não diz 25% a 40%; diz 20%! Portanto, a minha pergunta é a seguinte: as pessoas, que ficarem sem a casa que já tinham pago em parte, que vão pagar 20% menos, como é que vão poder recomprar a casa? E a que preço? É que, quando o Sr.
Ministro nos diz que o valor da casa que é considerado neste processamento é o valor de dois avaliadores, bom, Sr. Ministro, vamos «pôr os pés na terra!»... Nós sabemos o que são as avaliações! Não há avaliação que esteja ao nível do valor de mercado da casa! Estão abaixo! Portanto, as casas vão ser entregues ao banco
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por menos valor do que aquele por que foram compradas, até porque o mercado, agora, está mais baixo, porque há uma depressão.
Em suma, nestas circunstâncias concretas, é preciso que nos explique qual é o valor da recompra e se ela é possível.
Já agora, explique-me: não baixando os juros — porque o Governo não quer actuar na única política que era decisiva a este respeito, que era a de baixar os juros —, como é que as pessoas, pagando 80% do que já estavam a pagar e tendo perdido tudo aquilo que pagaram antes, depois ainda vão conseguir comprar a casa?! Isto é absolutamente impossível, como se compreende! É sobre isto, em primeiro lugar, que quero a sua resposta.
Uma última questão, Sr. Ministro: quero acentuar que é a primeira vez, na história fiscal portuguesa, que há um produto financeiro que é totalmente isento de impostos. Isto nunca aconteceu em Portugal! Nunca aconteceu em Portugal não haver um único imposto de qualquer tipo que incida sobre um produto financeiro. O Sr.
Ministro fala em eficiência fiscal, fala de equidade fiscal, de rigor fiscal» Sr. Ministro, por favor, não repita isso! Porque, agora, nós passámos a ter, no mercado financeiro em Portugal, para uma massa de casas das pessoas que têm dificuldades, uma gigantesca operação financeira que entrega aos bancos a tutela de um património que as pessoas já tinham pago em parte e que perdem totalmente e que não tem nenhum imposto!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não diga isso! Não é verdade!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não me desminta sobre isto! Não paga IRS, não paga IMT, não paga imposto de selo, não paga rigorosamente nada! Se o Sr. Ministro me quiser dizer um outro produto financeiro que tenha este tipo de vantagens, então, naturalmente, serei eu que estou errado; senão, é o Governo que está errado.
O Sr. Presidente: — Para responder a estes pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Francisco Louçã, quanto à garantia do Estado — o aval às operações de refinanciamento da banca —, há um valor de comissões que vai ser definido na portaria, que assinarei depois de terminar este debate ou, eventualmente, até poderão trazer-ma para a assinar enquanto aqui estou.
Mas quanto às comissões, e conforme ontem vos foi esclarecido, temos de ter o cuidado de pautar a nossa solução em linha com as soluções a nível europeu que pretendemos de forma coordenada.
Neste momento, estamos a acabar de acertar, entre a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, a solução a adoptar nas comissões, que é a solução a aplicar de uma forma generalizada, no conjunto dos países da União Europeia.
Por isso, ontem, foi-vos dito que havia esta preocupação e estamos, de facto, a ultimar essa matéria, de forma a que a portaria possa, de imediato, ser assinada e publicada, para darmos início a essa operação de garantia ao financiamento da nossa economia.
Sr. Deputado, entendo que já disse o que tinha a dizer quanto à minha interpretação e à minha leitura da incidência desta conjuntura económica sobre a taxa de desemprego. Gostaria somente de comentar aquilo que referiu acerca da OCDE quanto ao aumento das desigualdades.
Portugal não está citado pela OCDE entre os países que aumentaram as desigualdades entre pobres e ricos. Os países mencionados são o Canadá, a Alemanha, a Noruega, os Estados Unidos da América, a Itália e a Finlândia.
Recordo também, Sr. Deputado, que, não há muito tempo, saiu esta notícia — também convém que não nos esqueçamos — de que «Portugal é o país europeu que mais reduziu a pobreza». Isso também revela bem o cuidado e a aposta relativamente à prioridade que este Governo tem vindo a dar no combate à pobreza e, consequentemente, na redução das desigualdades sociais.
O Sr. Deputado diz que se há uma falha do arrendamento é porque há uma falha do mercado. Não tenho a mesma leitura. Acho que se o mercado do arrendamento no nosso País tem tido dificuldades — que não são de agora mas de há muito tempo — em se desenvolver é porque, de facto, a intervenção do Estado neste domínio não permitiu ao mercado de arrendamento que se apresentasse como uma alternativa, também com-
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petitiva e vantajosa, para solucionar problemas da habitação. De facto, a política de apoio e, até, de subsidiação que o Estado promoveu, durante muitos anos, à aquisição de habitação própria através do crédito bancário, de alguma forma distorceu, durante décadas, as escolhas dos portugueses no sentido de solucionarem o seu problema da habitação não através do mercado de arrendamento, como acontece em muitos países por esse mundo fora e mesmo na Europa, mas encaminhando-os mais para a solução do crédito. Este é um resultado não necessariamente de uma falha de mercado mas, sim, de uma intervenção e de uma política pública de apoio à aquisição de habitação própria, via crédito bancário. E o Sr. Deputado, com certeza, não ignorará essa realidade.
Quanto à questão do fundo de investimento para arrendamento, o Sr. Deputado chama a isto «marosca». É a sua opinião, Sr. Deputado! Mas é a opinião que não esconde o preconceito ideológico que, tal como no Partido Comunista, o Bloco de Esquerda tem manifestado quanto ao sector financeiro e a tudo o que possa envolver o sector bancário. Vê sempre, por detrás disto, o «fantasma» dos banqueiros, quais entidades portadoras dos piores males para todos nós»! Não consegue ter esta visão moralista, diria, do papel da banca.
Ignora que não há economias que consigam desenvolver-se sem um sistema financeiro e que é fundamental que tenhamos um sistema financeiro que funcione bem e que também consiga colocar à disposição das pessoas os mecanismos e os produtos necessários para que elas financiem a sua actividade e, neste caso concreto, para que possam também resolver os seus problemas financeiros e, acima de tudo, a necessidade de manterem e preservarem a sua habitação.
O Sr. Deputado diz que eu falei em 25% e que a Caixa Geral dos Depósitos falou em 20%. Não. A Caixa Geral dos Depósitos falou em mais de 20%, portanto, não há aqui uma contradição.
Mas, Sr. Deputado, os interesses patrimoniais dos proprietários da casa que queiram socorrer-se desta solução serão acautelados. Essa ideia, que está a procurar incutir, de que as pessoas andaram anos a pagar ao banco e a amortizar o empréstimo da casa e que perdem tudo, não é correcta, Sr. Deputado! As pessoas podem, se assim o entenderem, transferir a casa pelo valor da dívida existente e neutralizar, anular, a dívida que têm ao banco, e exercer a recompra da habitação com base neste valor e não noutro. Isto acautela o interesse patrimonial e, mais, não permite, obviamente, que haja aproveitamentos indevidos, conforme procura insinuar, por parte da banca através desse tipo de mecanismo. Portanto, isso está perfeitamente acautelado.
Há uma coisa que não podemos, de facto, permitir e que temos de garantir às pessoas: é que os seus interesses patrimoniais não serão lesados.
Creio que lançar esta suspeição é descabido e apelidar isto de «marosca», Sr. Deputado, penso que é de uma ligeireza excessiva a analisar um instrumento não só financeiro mas de política habitacional, que, na actual conjuntura, é algo de fundamental para podermos valer a muitas famílias que estão, neste momento, a sentir dificuldades em honrarem os seus compromissos com o sector bancário, devido às dívidas que têm pela aquisição da sua habitação.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Francisco Louçã, na sequência do que ficou acertado, tem V. Ex.ª, agora, oportunidade para colocar as questões ao Sr. Ministro.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Com certeza! Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, dois comentários breves: verifico que não entende necessário mandar-nos uma errata sobre a lei de financiamento dos partidos e sobre a «frasezinha» que caiu, ali, na volta de um parágrafo. Ficamos esclarecidos, então, sobre o sentido desta intervenção.
Fico também esclarecido, porque, enfim, confirmou ou aceitou a minha interpretação de que a sua declaração, no sentido de que a taxa de desemprego é de 7,3% no 1.º semestre, implica que supõe um aumento do desemprego no 2.º semestre para 7,9%. Este é um facto importante no debate deste Orçamento.
Não me respondeu, sobre os fundos de investimento de arrendamento habitacional, a duas questões. Em primeiro lugar, não me disse por que é que este é o primeiro e único produto financeiro que não tem qualquer imposto, e não me vai dizer que é para repartir pelas pessoas, porque é uma vantagem de capital.
Por outro lado, disse-me uma coisa que me surpreende — não gosta do termo «marosca», mas penso até que é um termo delicado, em face do gigantismo daquilo que está aqui envolvido —, a de que as casas vão ser entregues pelo valor da dívida. Hum! Mas o que é que isto quer dizer? Pelo valor da dívida?
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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É uma hipótese!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Ah! É uma hipótese! Mas é uma hipótese extraordinária! Então, uma pessoa que começou a pagar há um ano e uma pessoa a quem falta um ano entregam pelo valor da dívida? Então, entregam pelo valor da dívida, para não terem dívida, e não tem qualquer relevância aquilo que possam ter pago durante 1, 10, 15, 30 ou 40 anos pela sua casa?! É claro que o valor da dívida, Sr. Ministro, é o valor correspondente a um usufruto permanente, é uma garantia para o usufruto permanente, mas o valor que conta é o que as pessoas despenderam, efectivamente, na compra da casa. Portanto, o que o Sr. Ministro está a fazer é a privatizar, a entregar ao banco o valor que a família fez descontar, ao longo do tempo, para poder garantir que a casa seria sua no fim do contrato. Isto é totalmente inaceitável! É mesmo escandaloso! É absolutamente chocante, Sr. Ministro! Ou o Sr. Ministro se enganou ou se, realmente, é isso que pretende e que não está explícito na lei, então, já percebemos que chamar-lhe «marosca» é só uma simpatia e, por isso, não voltarei a fazê-lo, porque terei de utilizar termos bastante mais contundentes.
Dito isto, Sr. Ministro, últimas questões sobre algumas das facilidades deste Orçamento.
Disse-me a frase «não gostam dos banqueiros, são os piores dos males» mas, ao mesmo tempo, «queremos combater as desigualdades». Ponho-o já perante as desigualdades, Sr. Ministro.
Há um regime, nos banqueiros, de prémios de dezenas de milhões de euros. Quero perguntar-lhe se está disposto a aceitar, neste Orçamento, uma regra que penalize fiscalmente os prémios, os «pára-quedas», as vantagens que os banqueiros ou outros administradores têm, visto que isso, hoje, como sabe, é até proposto por vários governos, incluindo pelo Presidente em exercício da Comissão Europeia, ontem, no Parlamento Europeu. Como o Bloco de Esquerda vai apresentar essa proposta, quero, desde já, que me diga, sem preconceitos ideológicos, se está ou não a favor de que estas transferências de rendimento, que tornam os ricos muito mais ricos — há banqueiros que receberam 80 milhões de euros no fim do ano passado —, sejam sujeitas a regras de tributação.
Mas, Sr. Ministro, quero também fazer-lhe outra pergunta, que tem a ver com o seguinte: ontem, o Presidente da União Europeia propôs o fim dos offshore. Sei que, se lhe propuser o fim do offshore da Madeira, o Sr. Ministro me fará o discurso de sempre: «Não! Têm de ser todos!»; «Não gosto nada daquilo ou é muito preocupante e, portanto, têm de ser todos». Vou já facilitar-lhe o caminho! Só quero saber se, caso alguém proponha, como ontem foi garantido que iria suceder, embora eu acredite pouco, mas, caso alguém proponha — e estou a insistir nisto, para que fique, desde já, claro — que a União Europeia tome uma medida europeia para acabar com os offshore, o Governo português vota a favor ou vai opor-se, como sempre se tem oposto. É que vejo as contas do Orçamento e nelas se reflecte que há uma perda, em benefícios fiscais, de quase 1800 milhões de euros, por benefícios na Madeira. Isto significa que há 7184 milhões de euros que o Governo atribui a rendimentos que não são tributados, porque passam pela zona franca da Madeira, pelo offshore da Madeira.
E isto representa 4% do Produto! Percebo que o Sr. Ministro não queira discutir 0,3%, que são 500 milhões de euros — apesar de tudo, é muito dinheiro — e, por isso, menos importantes, mas estou a falar-lhe de 4% do Produto, de 7184 milhões de euros que o Governo diz — são os seus dados! — serem rendimento que passa pela Madeira, não pagando um tostão de imposto. Portanto, é uma perda absoluta de quase 2000 milhões de euros de impostos que são devidos.
Ainda pretendo fazer uma pergunta que já lhe foi feita, Sr. Ministro, e levaria muito a mal se o Sr. Ministro saísse daqui, mesmo com a pressa de assinar a portaria, sem me responder, sobre a «taxa Robin dos Bosques». A taxa desapareceu, Sr. Ministro! Cadê a taxa? Então, uma taxa que levou o Primeiro-Ministro a fazer declarações no Parlamento, de repente, não está no IRC, não está em contribuições especiais» Bom, há aqui uma rubrica «Outros impostos», mas estes «Outros impostos» são uns coitadinhos de 10 milhões de euros. O Primeiro-Ministro enchia o peito e garantia 100 milhões de euros; vinha logo o Ministro e falava em 120 milhões; vinha o Presidente da Galp e falava em 150 milhões — que desgraça! Mas onde é que estão os 150 milhões? Desapareceram? Tanto dinheiro assim desapareceu, Sr. Ministro? Não pode haver bolsos tão fundos no Ministério das Finanças e tenho a certeza de que a Galp respeitará este compromisso, aliás, não pode deixar de o fazer. Então, não está no Orçamento? Uma receita fiscal deste tamanhão não está no Orçamento? Desapareceu? É zero? É o moralismo das correntes de esquerda, que gostam que sejam pagos impostos, que leva» O que ç que aconteceu, Sr. Ministro? Dê-me uma resposta, por favor, para que possamos perceber onde é que está esse dinheiro, que foi tão leiloado, tão publicitado.
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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, em primeiro lugar, gostaria de tornar clara esta matéria dos fundos.
Sr. Deputado, já afirmei que ninguém será lesado nos seus interesses patrimoniais. E, se as pessoas já pagaram parte da casa, está paga. Tendo o direito de recompra, exercem-no, no pressuposto de que já pagaram parte da casa que vão recomprar. E não são prejudicadas por isso. Isto que fique bem claro! É que me parece que aquilo que refere, a tal dita «marosca» — um termo simpático, como diz —, não é, de facto, uma «marosca», conforme pretende insinuar.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Então, qual é o valor da dívida quando está a ser recomprada?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Relativamente à questão da lei de financiamento dos partidos que referiu, Sr. Deputado, gostaria de tornar muito claro o seguinte: a alteração que é proposta neste Orçamento incide sobre o indexante na base do qual as subvenções aos partidos são calculadas; essas subvenções têm vindo a ser calculadas na base do salário mínimo mensal e passarão a ser calculadas com base no indexante de apoios sociais.
Aquilo que a lei mantém é a obrigatoriedade de todos os donativos ou apoios dados aos partidos serem objecto de depósito em conta bancária, que é uma conta explicitamente criada para esse fim, sendo certo que os partidos têm de manter um registo de todos os movimentos dessa conta. Portanto, tudo isso será registado, será transparente e será objecto de sindicação, se necessário, se houver quaisquer suspeitas de transacções menos claras. Tudo isto é o que está previsto na actual lei de financiamento.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não é, não!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas, Sr. Deputado, se tem dúvidas quanto a isso, a lei está aqui em discussão, na Assembleia, e os Srs. Deputados são livres de mudarem o que bem entenderem nessa matéria.
Agora, Sr. Deputado, gostaria de tornar claro que, aqui, tenho apenas um intuito: o dinheiro ou as subvenções aos partidos são dinheiros dos contribuintes e o que pretendo é impor alguma disciplina nos montantes que são transferidos para os partidos, nessa base, impondo a aplicação do indexante de apoios sociais, que é o que me parece mais ajustado e é o que a lei previa mas que, até agora, não foi feito. É para corrigir isso que esta alteração é proposta.
Se há dúvidas quanto a outras matérias, os Srs. Deputados são livres de mexerem no que quiserem na lei de financiamento dos partidos. Não me vou meter nisso e até penso que se trata de matéria que deve ser esclarecida pelos próprios partidos. Aqui, tenho apenas uma preocupação: a de poupar dinheiro aos contribuintes neste domínio. Esta é a minha obrigação, como Ministro das Finanças, porque é de dinheiro dos contribuintes que se trata e é por isso que tomamos esta iniciativa na lei de Orçamento.
O Sr. Deputado fez umas contas quanto á taxa de desemprego»
O Sr. Francisco Louçã (BE): — São suas!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » e quer tirar a ilação de que subscrevi as contas, mas não, Sr. Deputado, não as subscrevi e nem sequer as comentei. São contas suas, o Sr. Deputado responde por elas. Não me impute a mim as contas que fez.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Então, faça as suas contas!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Relativamente à questão que suscitou, dos vencimentos brutos, etc., chamo a atenção para o facto de que já temos uma taxa de tributação de 42%. Mais: chamo a aten-
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ção para o facto de que uma das coisas a que damos prioridade, também nesta proposta de lei de Orçamento, é aos sinais exteriores de riqueza. Vamos apertar, de facto, o controlo dos sinais exteriores de riqueza e, por isso, também aqui, prevemos disposições de levantamento do sigilo bancário que nos permitam melhorar a nossa capacidade de irmos atrás, perdoem-me a expressão, desses sinais exteriores de riqueza.
Quanto ao offshore da Madeira ou aos offshore em geral, Sr. Deputado, pessoalmente, tenho dúvidas de que uma decisão unilateral de acabar com os offshore seja eficaz. Agora, se houver uma proposta no sentido de acabarmos com todos os offshore, sou o primeiro a subscrevê-la, Sr. Deputado. Não tenho qualquer problema nisso!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Faça-a! Por que é que não a faz?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Penso que, nesta matéria, a Europa e os Estados Unidos, essencialmente, têm de se entender. E é o caso que se coloca quanto ao offshore da Madeira e aos números que refere, Sr. Deputado. Certo! Não resolvo o problema que o Sr. Deputado refere acabando com o offshore da Madeira, porque aquilo que, até agora, é feito na Madeira passará a ser feito noutro sítio. Ninguém ganha com isso mas, ao menos, assim, ganho uma coisa: sei o que se faz e temos possibilidade de obter informação, supervisionar e fiscalizar o que se faz, coisa que não sucede com outros offshore que não são cooperantes e que sonegam informação. Isto faz a diferença! Em termos do efeito fiscal que refere, Sr. Deputado, não o ignoro, mas também não tenho a ilusão de que, acabando com o offshore da Madeira, resolvo o problema. Não! É que isso vai ser feito noutro sítio e, de facto, não terá qualquer impacto financeiro.
Agora, repito, o fim de todos os offshore, sim, vamos nisso! Eu subscrevo! O que me parece é que acabar com uns, mantendo outros, criará também dificuldades, até de competitividade das economias, as quais acabam por ser prejudiciais para os países que terminam com os offshore, em confronto com aqueles que os mantêm.
Este parece-me ser um desafio sério para os responsáveis, na Europa e nos Estados Unidos, como referi, o qual tem de ser enfrentado, sem dúvida, mas não com o voluntarismo de «nós, cá, acabamos e resolvemos», porque não resolvemos. Não tenhamos ilusões quanto a isso! Este é um problema global, do mundo financeiro no seu todo, e é a este nível que tem de ser resolvido.
Quanto à questão da «taxa Robin dos Bosques», Sr. Deputado, a chamada «taxa Robin dos Bosques» está numa iniciativa legislativa que não consta do Orçamento — isto já foi decidido aqui, na Assembleia, no chamado «pacote de medidas anticíclicas» — e as previsões de receita de IRC para 2009 já têm em conta a alteração que foi feita neste domínio.
Portanto, isso já foi feito, a legislação já foi aqui decidida e, por isso, não tem de estar no Orçamento.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — E quanto é?
O Sr. Honório Novo (PCP): — Diga lá quanto é?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — A previsão que tenho, neste momento, depende, obviamente, dos tais lucros extraordinários que tanto invocam. Mas, Sr. Deputado, na situação actual, podemos vir a cobrar entre 100 a 120 milhões de euros. Se houver lucros extraordinários mais elevados, será mais; se forem mais baixos, obviamente, erodindo a base, também se perde a receita.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Lá se vai a previsão de receita de IRC!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas, Sr. Deputado, isso está previsto e legislado, a iniciativa já foi tomada e já está vertida em lei, a qual já foi aqui aprovada, nesta Assembleia, e a previsão de receita já está incorporada nas projecções de receita que temos para 2009.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
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Vamos, então, agora, iniciar a segunda ronda de questões e, como ficou combinado, desde o início, nesta segunda ronda, cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos. As perguntas serão agrupadas em bloco e o Sr.
Ministro responderá de uma só vez.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, queria transmitir a V. Ex.ª que ficou acordado que seriam 10 minutos. Nós prescindimos da terceira ronda precisamente com esse objectivo e, posso garantir-lhe, esse tempo não será ultrapassado.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, vai-me desculpar, mas, antes de começar a sua intervenção, informo-o que não estava acordado que fossem 10 mas, sim, 5 minutos.
De qualquer forma, se houver, desde já, manifestação de disponibilidade da parte dos grupos parlamentares para prescindirem da terceira ronda, não vejo qualquer obstáculo.
Pausa.
Informam-me que não há disponibilidade para isso. Não havendo, realizar-se-á uma terceira ronda, dispondo cada grupo parlamentar de 3 minutos.
Portanto, tendo em conta o adiantado da hora, solicitava aos Srs. Deputado que respeitassem estas regras.
O Sr. Honório Novo (PCP) — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP) — Sr. Presidente, não prescindindo da terceira ronda, acho que não é incompatível o uso de 10 minutos, desde que sejam estritos numa segunda ronda e de 5 minutos numa terceira ronda.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, permita-me que transmita que, sendo assim, passo a pedir que os tempos sejam transmitidos previamente em público e não em conversas em privado para termos a certeza de quais são as regras com que nos regemos.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Duarte Pacheco, tendo em conta a proposta do Sr. Deputado Honório Novo, e chamando a atenção para a necessidade que o Sr. Ministro adiantou, no início de reunião, no sentido de ter de se ausentar um pouco mais cedo, vou admitir que cada grupo parlamentar disponha de 10 minutos na segunda ronda e de 5 minutos na terceira ronda. Porém, vou ser absolutamente implacável relativamente ao respeito dos tempos. Digo isto porque os Srs. Deputados, na primeira ronda, não respeitaram o tempo que lhes foi cometido e isso levou a que, efectivamente, a primeira ronda não tivesse sido concluída de manhã.
Desta feita, não vou admitir mais excepções. Portanto, não vou ser condescendente e vou pedir aos Srs.
Deputado que sejam escrupulosos no respeito dos tempos.
Assim sendo, cada grupo parlamentar dispõe de 10 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, para além de algumas questões que quero colocar a V. Ex.ª, a minha primeira palavra é para transmitir alguma preocupação.
Entendemos que é expectável — os portugueses esperam-no da parte do Sr. Ministro de Estado e das Finanças — que tenha sempre um comportamento rigoroso e que dê respostas técnica e intelectualmente sérias. Infelizmente, nas respostas dadas, nomeadamente, às questões levantadas pelo Partido Social Demo-
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crata, nem sempre isso foi respeitado. Assistimos a respostas a raiar pouca seriedade intelectual e eu tenho de mostrar esse desagrado.
Permita-me, então, que coloque agora a V. Ex.ª as questões.
A primeira questão é sobre o cenário macroeconómico e o crescimento do Produto. Sr. Ministro, não vamos encetar uma discussão sobre se é 0,6%, se é 0,1%, se é 0,3% ou se é 0,4%. É perto de 0%. Ou seja, estamos muito perto de estar com a economia estagnada ou, mesmo, em recessão. Se o Sr. Ministro agora não confia nas previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), também no passado recente não as aceitou e veio a verificar-se, infelizmente para todos nós, portugueses, que quem tinha razão era o FMI.
Mas o que temos que questionar e o que constatamos, Sr. Ministro, é que a economia portuguesa já vinha numa trajectória de perca de competitividade. O problema de estarmos a crescer tão pouco resulta, sobretudo, não da conjuntura pontual que estamos a viver mas de uma rota, que já vinha a ser prosseguida nos últimos anos, de perca de competitividade das empresas portuguesas. Isto, Sr. Ministro, são dados internacionais.
Perante isto, não assisto, da parte do Governo, a qualquer palavra de explicação, por exemplo, para que o Fórum Económico Mundial — entidade que o Governo chegou a citar em documentos oficiais — diga que Portugal estava, há quatro anos, na 25.ª posição e hoje está na 43.ª. Perdemos 18 pontos na competitividade da nossa economia, e isto só tem uma palavra: resulta do falhanço da política económica portuguesa.
A segunda pergunta tem a ver com as contas da saúde. No passado, existia uma unidade de missão que, periodicamente, relatava ao Parlamento e ao País qual era a situação de todo o conjunto empresarial hospitalar. Sr. Ministro, desde que temos este novo figurino — aliás, alargado — de empresas públicas hospitalares passámos a estar perante um regime de opacidade. Não se sabe concretamente qual é a situação de todo este universo empresarial: não se sabe quanto devem e quais são os custos efectivos com o pessoal.
Sobre esta última questão, o Sr. Ministro já salientou que as despesas com pessoal associadas a este sector serão pouco significativas. Mas era bom termos os números dos últimos quatro anos para podermos, por um lado, fazer uma análise rigorosa do peso das despesas com pessoal no Produto e, por outro lado, comparar a diminuição das despesas com pessoal e o aumento da contratação de serviços. Porque, infelizmente, aquilo a que assistimos é que, frequentemente, em muitas dessas unidades hospitalares, por exemplo, há pessoas que são dispensadas, pessoas que passam à reforma, mas que, na prática, continuam a trabalhar nessas instituições por contratação de serviços, pois continuam a ser necessárias. O que significa que não há, aí, uma verdadeira redução desta rubrica, o que há é contabilizações diferentes.
Sobre os investimentos públicos, penso que o Sr. Ministro, como qualquer pessoa de bom senso, sabe que empresas, instituições e governos podem ter um programa e uma política de investimentos, mas, perante realidades diferentes, perante conjunturas, porventura, menos favoráveis, é natural que reavaliem o seu programa de investimentos. Isso acontece em qualquer empresa. Não é pelo facto de definir, num determinado momento, qual é o meu programa que o mantenho inalterado, se a realidade é diferente. É isto que, nomeadamente, economias de todos os quadrantes têm vindo a colocar. Porém, assistimos a uma intransigência da parte do Governo, que é inexplicável. Gostava de o confrontar com esta solução.
Sr. Ministro, já afirmou hoje, aqui, que existem estudos do Banco Europeu de Investimento (BEI) que fazem referência ao retorno do investimento de muitos destes investimentos públicos. O que lhe solicito é que, se existem, no-los disponibilize — a nós, parlamentares, e a todos os portugueses —, porque decerto não gosta de fazer segredo desse tipo de informação.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sobre o valor do défice, Sr. Ministro, a verdade é que, em base comparável, a despesa cresce e a receita cresce. Portanto, temos que lhe colocar novas questões, para ter a certeza de que, apesar de a despesa estar a crescer em base comparável, tudo estará lá. Faço-lhe a pergunta directa: a Estradas de Portugal, em 2009, continua a estar consolidada no perímetro do défice? É uma questão com resposta «sim» ou «não».
Também já compreendemos que o Sr. Ministro considera que as receitas extraordinárias, afinal, não são sempre más, depende de quem esteja a implementá-las. Antes, ouvia, da sua parte, uma diabolização das receitas extraordinárias; hoje de manhã, já não é assim, nomeadamente no que respeita à alienação de património, aliás, alienação de património que cresce, no próximo ano, mais de 50%.
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E questiono-o, Sr. Ministro, se um momento de crise, nomeadamente do mercado imobiliário, é o melhor para o Governo, de repente, acrescer em mais 50% o património que quer alienar e se espera por aí conseguir os melhores valores para o Estado. Ou seja, se é um acto de boa gestão, neste momento, colocar tanto património a ser alienado.
Finalmente, sobre as propostas apresentadas pelo Partido Social Democrata, em primeiro lugar, o que constatamos é que elas são boas para o fomento da poupança, são boas para as famílias, são boas para o emprego, são boas para as PME. Isto são factos.
Em segundo lugar, estamos perante uma situação extraordinária. E, perante uma situação extraordinária, Sr. Ministro, só há uma reacção: ou se tomam medidas extraordinárias ou não se querem resolver os problemas específicos com que, numa situação extraordinária, as empresas e as famílias se defrontam. Se não querem resolver os problemas dizem «estas propostas até podem ser boas, mas não as pomos em prática». Se querem resolver e se elas são positivas, dizem «vamos trabalhar sobre elas». Nomeadamente, Sr. Ministro, pode haver, como é natural, no âmbito da discussão na especialidade, abertura para encontrar soluções que sejam positivas para as empresas, para as famílias, e que o Governo também as consiga aceitar.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Com certeza. Abertura total!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas, Sr. Ministro, o que percebemos da sua reacção é algo de diferente, pois o que nos diz é que, com estas propostas, o défice passa para 3%. Ou seja, está a querer dizer-nos que o défice de 2,2% só é alcançado à custa das famílias e das pequenas e médias empresas.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Exactamente!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Este é que é o facto do dia: o Sr. Ministro consegue esse défice à custa das famílias e das pequenas e médias empresas.
Num momento de conjuntura tão difícil, o que se esperava era uma maior abertura para suavizar o impacto da crise nas pequenas e médias empresas e nas famílias. E o senhor, aqui, está a mostrar insensibilidade e indisponibilidade para fazê-lo, o que é inaceitável.
Permita-me que faça uma última pergunta, também relacionada com as PME. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias condenou, há cerca de um ano, o Estado português por causa do imposto de selo cobrado nos aumentos de capitais feitos em dinheiro pelas empresas. Isso já aconteceu há mais de um ano, há n pedidos de informações junto do Ministério das Finanças, os quais estão, até hoje, sem qualquer resposta. A pergunta que lhe coloco é a de saber quando é que o montante devido vai ser pago às empresas, visto que elas têm uma sentença judicial a defendê-las.
Sr. Presidente, consegui cumprir o timing a que me tinha proposto.
O Sr. Presidente: — É verdade, Sr. Deputado. Cumpre-me felicitá-lo pelo rigor do cumprimento do tempo, mas também há-de convir que fui magnânimo, quem sabe até por excesso, relativamente ao seu pedido de alargamento do tempo de intervenção desta segunda ronda.
Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Maximiano Martins.
O Sr. Maximiano Martins (PS): — Sr. Presidente, gastarei, certamente, menos de 10 minutos, pois julgo que cabe ao PS ajudar a recuperar algum tempo. Não faz muito sentido que uma segunda ronda seja a reedição de perguntas da primeira, mas, enfim, o PSD entende que deve insistir em perguntas que já tiveram resposta.
Sr. Ministro de Estado e das Finanças, fui eleito como Deputado da Nação nos termos constitucionais, mas, ao nível dos princípios, tenho um dever de prestação de contas face aos cidadãos que me elegeram e à região de que sou proveniente.
Desse ponto de vista, temos — os Deputados do Partido Socialista eleitos pela Madeira — uma apreciação muito positiva do Orçamento do Estado, pois é o Orçamento do Estado que o País, tendo em conta as circunstâncias, necessita. Devo dizer que a Região Autónoma da Madeira ganha com as acções gerais do Orçamento.
Refiro-me, por exemplo, às políticas sociais, nomeadamente ao complemento solidário para idosos, ou a
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medidas tomadas a outros níveis, que têm uma incidência directa tanto nas Regiões Autónomas tanto da Madeira como dos Açores; bem como às medidas de apoio às empresas. Portanto, a bondade geral do Orçamento do Estado tem uma incidência sobre a Região.
Mas há uma apreciação específica que tenho o dever de fazer. Essa apreciação específica é feita com dois principais critérios. Há outros, mas vou referir-me, para ganhar tempo, apenas aos dois principais critérios: primeiro, cumprimento da lei; segundo, exercício das funções do Estado em benefício do cidadão na Região.
Quanto ao primeiro, e são já questões, o que está em causa no Orçamento do Estado é a garantia de que o que está previsto na Lei das Finanças Regionais e na Lei das Finanças Locais foi integralmente cumprido. E é isso que, mais do que eu, os cidadãos portugueses que residem na Madeira querem que seja garantido, ou seja, que estas leis foram integralmente cumpridas no cálculo das transferências.
O segundo critério que me parece nuclear é o tal que tem a ver com o exercício da soberania e com as funções do Estado.
Nesta matéria, há alguma demagogia, e a comunicação social madeirense reflecte-a, não havendo por vezes a compreensão de que o PIDDAC, por exemplo, tem um impacto nas regiões completamente diverso daquele que tem nos distritos, porque enquanto os distritos dependem em muito, na sua actividade, das transferências do PIDDAC, do exercício e da execução do PIDDAC, as duas regiões autónomas dispõem integralmente das suas receitas fiscais. Portanto, quantitativamente, o elemento PIDDAC, as transferências do PIDDAC são acessórias comparativamente com os distritos do Continente.
Mas, desse ponto de vista, há uma explicação ainda por dar no Orçamento do Estado, que tem a ver com a consideração das duas regiões autónomas. Que razões justificam uma aparente divergência quantitativa excessiva no caso da Madeira e dos Açores? É evidente que aquilo que espero do Sr. Ministro é a garantia de que não há discriminação infundada e a garantia de que o Estado honra os seus investimentos na Madeira, ao serviço dos cidadãos.
Portanto, gostaria de ter a apreciação do Sr. Ministro relativamente a este duplo ponto de vista – exercício da soberania, honrar os compromissos e a função do Estado e o cumprimento da lei.
Finalmente, mais um comentário do que uma questão que tem a ver com o offshore da Madeira.
O offshore da Madeira é o offshore de Portugal. Utiliza-se a denominação de offshore da Madeira por simplificação, porque a lei estabelece a possibilidade de dois sistemas de fiscalidade privilegiada, o da ilha da Madeira e o da ilha de Santa Maria. A Região Autónoma dos Açores nunca avançou com o seu offshore – digamos assim, também para simplificar, porque em rigor técnico não se pode falar de offshore –, pelo que aquilo que existe na Madeira é o offshore de Portugal, que é utilizado pelas entidades portuguesas, designadamente bancos, entidades de serviços e industriais e, convenhamos, muito acessoriamente, por entidades da Madeira.
Relativamente aos offshore, penso que, no elemento essencial, os Deputados que estão nesta sala, como outras pessoas, são capazes de ter uma posição comum. Devo dizer que até um banqueiro «madeirense» – porque não é natural da Madeira mas que tem aí interesses –, o banqueiro Horácio Roque, fez uma afirmação clara no sentido de, se for possível, acabarmos com os offshore. Portanto, a ideia de que dos offshore decorre um desvio financeiro relativamente ao normal fluxo de verbas e à fiscalidade que deve incidir sobre rendimentos e esses fluxos de verbas é muito abrangente, desde a extrema-esquerda até um banqueiro e aos meios católicos, meios ligados à Igreja. Assim, não parece ser uma matéria de discordância, mas parece também evidente que é preciso bom senso para avançar nesta matéria.
Devo também sublinhar que o offshore dito da Madeira é fiscalizado, é regulado – Banco de Portugal, Instituto de Seguros de Portugal, todas essas entidades –, sendo um offshore cooperante, o que significa que não tem nada a ver com paraísos fiscais, onde a opacidade é absoluta.
Mas, evidentemente, aquilo que se espera do nosso Governo é o acompanhamento do esforço europeu – e, articuladamente, da Europa e dos Estados Unidos – que venha a haver em matéria do controlo e, se possível, da extinção de regimes dessa natureza.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, gostava de colocar ao Sr. Ministro um conjunto de perguntas bastante concretas. Não vou fazer processos de intenção, vou, fundamentalmente, pôr questões e gostaria que me respondesse concretamente.
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Há aqui uma questão que não é pacífica, o que já se sentiu neste debate. Refiro-me ao problema dos fundos de investimento imobiliário para arrendamento.
A questão é esta: estes fundos, o preço de venda, a renda e o preço de compra dos andares pelas famílias vão ser regulamentados pelo Governo? Vai haver uma portaria de regulamentação para impedir situações como as que foram levantadas aqui? Se existe esta portaria, está o Governo está na disponibilidade de a fornecer à Assembleia da República, com mostrou estar relativamente ao crédito dos 20 000 milhões de euros? Esta é a primeira questão concreta, a que gostaria que o Sr. Ministro respondesse também de uma forma concreta.
A segunda questão é relativa aos salários da Administração Pública.
O Sr. Ministro com certeza que se lembra do compromisso tomado pelo Sr. Primeiro-Ministro publicamente, no sentido de que os trabalhadores da Administração Pública, em 2008, não sofreriam uma nova redução do poder de compra.
Nesta Assembleia, primeiro, confrontei o Sr. Ministro, cuja resposta foi que, como a inflação, de acordo com o Governo, ia aumentar 2,1%, aumentando os salários, não havia diminuição. A questão com que o confrontei imediatamente – aliás, primeiro, o Sr. Secretário de Estado e, depois, o Sr. Ministro – foi: se a inflação fosse superior a 2,1%, como suspeitávamos que seria, estaria o Governo disponível para fazer uma revisão intercalar? A resposta do Sr. Ministro, recordo, foi que o Governo não estava aberto a uma revisão intercalar, mas isso iria ser tomado em consideração aquando da revisão para 2009. Foram estas as palavras, textuais, do Sr.
Ministro das Finanças.
A questão que agora quero levantar é a seguinte: para o Governo cumprir o compromisso tomado pelo Sr.
Primeiro-Ministro, ter-se-ia que retirar 0,8 da proposta de aumento feita pelo Governo para 2009, isto para compensar os trabalhadores, embora com atraso, pelo que ficariam apenas com 2,1%, com uma inflação anunciada para 2009 de 2,5%. Estive a analisar com cuidado os dados que constam dos documentos que o Governo entregou aqui, na Assembleia da República, e comparei os dados que constam do mapa da página 138 do Relatório do Orçamento, onde estão as despesas por classificação económica, portanto, está já distribuída a dotação provisional, com os dados que constam dos mapas de informação do sistema dos serviços integrados. A conclusão a que cheguei relativamente a remunerações certas e permanentes foi que o valor constante do mapa que está no Relatório do Orçamento, com a dotação provisional, é superior em 5,1% ao valor que está em remunerações certas e permanentes nos mapas dos serviços integrados.
A questão que coloco é a seguinte: o Governo disse que ia propor aos sindicatos um aumento de 2,9%.
Isso é uma proposta para negociar, tendo em conta esta diferença que está aqui, ou é uma imposição? O Governo vai negociar ou, à partida, vai impor os 2,9%, não respeitando o compromisso assumido pelo Sr. Primeiro-Ministro? Passando para outras questões, também de natureza concreta, devo dizer que todos os anos venho aqui à Assembleia e todos os anos ouço o Sr. Ministro falar da redução do défice. Até o percebo! Como não tem mais nada de que falar, fala da redução do défice. Isso não me espanta. O que me espanta, e isto já do ponto de vista económico, é que o Sr. Ministro tire conclusões de natureza económica que, a meu ver, não têm consistência técnica. Uma dessas conclusões é que o País está mais preparado para enfrentar a crise.
A pergunta que lhe faço é como é que o País pode estar mais preparado para enfrentar a crise com famílias e empresas mais endividadas, com um País mais endividado externamente? Como é que é possível compaginar uma coisa com outra, como aquela que o Sr. Ministro afirma?! Em relação a estas questões e ao endividamento, queria aprofundar uma outra questão que o Governo não analisa mas que, a meu ver, é extremamente importante e grave. Refiro-me ao défice elevado e contínuo das nossas contas externas.
Tive o cuidado de somar os saldos negativos da balança corrente referentes aos três anos completos do Governo e constatei que esse saldo negativo correspondia a cerca de 45 800 milhões de euros, ou seja, cerca de 27% do PIB de 2007. E para 2008, de acordo com os dados previstos e constantes do Boletim do Banco de Portugal, onde fui buscar aqueles dados para somar, o saldo negativo da balança corrente deverá andar à volta dos 20 000 milhões de euros, o que somado aos 45 800 milhões, dá cerca de 66 000 milhões de euros, que correspondem a cerca de 38% do PIB. Portanto, o problema da balança externa é um dos problemas mais graves que temos.
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Pergunto como é que é possível o Governo dizer que o País está mais preparado para enfrentar a crise com situações destas. As suas consequências são dramáticas para o País! Se analisarmos as transferências para o exterior resultantes deste endividamento tão grande, constatamos, por exemplo, que, em 2007, elas atingiram cerca de 20 000 milhões de euros, sendo grande parte de juros.
Portanto, grande parte da nossa riqueza está a ser transferida para o estrangeiro devido ao endividamento, o que tem reflexos nas famílias e na capacidade de desenvolvimento.
Se em vez de utilizarmos o indicador habitual, PIB/habitante, calcularmos o rendimento nacional bruto/habitante, que é aquele que reflecte mesmo o que fica em Portugal, constatamos que há uma estagnação nestes anos do seu Governo. Pergunto como é que é possível, tendo por base esta análise técnica, chegar à conclusão e afirmar, como o Sr. Ministro faz, que o País está mais preparando para enfrentar uma crise desta natureza? Finalmente, porque o meu tempo está quase no fim, uma outra questão, relativa à redução da taxa de IRC.
Uma das medidas anunciadas pelo Governo é a redução da taxa de IRC para 12,5% apenas relativamente à matéria colectável até 12 500 euros. Estive a analisar, com base nos dados divulgados pela Associação Portuguesa de Bancos, a taxa efectiva de IRC paga pela banca e, apesar daquela promessa feita pelo Sr. Ministro das Finanças e pelo Sr. Primeiro-Ministro, a taxa efectiva de IRC que a banca pagou, de acordo com os dados da Associação, foi de 19%, em 2006, de 14%, em 2007 e a previsão para 2008, com base no 1.º semestre, é de apenas 12%.
Ora bem, as pequenas e médias empresas vão ter uma redução para uma taxa de 12,5% até 12 500 euros de matéria colectável e a banca vai pagar uma taxa efectiva de 12% sobre todo o lucro tributável.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, hoje da parte da manhã, coloquei-lhe um conjunto de questões, umas sobre a maquilhagem presente no Orçamento e outras sobre a eficácia das medidas aí previstas.
Não posso deixar de salientar que o Sr. Ministro afirmou aqui que, em relação às despesas com pessoal, se têm de considerar as saídas do perímetro do Estado. Calculou-as em 0,3% do total, mas nós temos dúvidas em relação a este número.
Mas, já agora, gostaríamos de saber se esse mesmo cálculo foi feito, por exemplo, em relação ao número dos funcionários públicos, porque os funcionários da Estradas de Portugal deixam de estar contabilizados nos funcionários públicos, o mesmo acontecendo com os dos hospitais EPE. Ou seja, dos tais 51 000, quantos pertenciam à Estradas de Portugal e aos hospitais que passaram a EPE? Também não podemos deixar de salientar a referência que fez relativamente à carga fiscal no IRS, no imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, que aumenta — e isso foi aqui também assumido — 4,7%. Ora, se a isso juntarmos também aquilo que está a ser pago no ISP para a contribuição rodoviária, vamos chegar a um aumento da carga fiscal não de 2,7%, como aqui está no seu relatório mas, sim, de aproximadamente 3,9%, isto é, acima do PIB nominal e do seu crescimento. Portanto, é por essa via, Sr. Ministro, que temos um aumento da carga fiscal.
O Sr. Ministro apresentou-nos aqui, mais uma vez, um conjunto de medidas, umas para as famílias, outras para as empresas. Para as famílias, a questão do fundo tem sido aqui muito debatida. A aplicação deste Fundo de Investimento Imobiliário é uma confissão por parte do Governo do enormíssimo falhanço da reforma do arrendamento. Se tivéssemos a lei do arrendamento a funcionar e tivéssemos obtido todos os objectivos que nos foram aqui apresentados inicialmente aquando da reforma, não era necessário estar a recorrer a uma solução como esta do Fundo de Investimento Imobiliário.
O Sr. Ministro não considera também a hipótese, por exemplo, da existência de um apoio mais claro ao arrendamento? O Sr. Ministro não considera, por exemplo, que, para além deste tratamento fiscal privilegiado para este Fundo de Investimento Imobiliário, se deve dar também um tratamento fiscal ainda mais privilegiado àqueles que são senhorios e inquilinos, sem ser propriamente através de um fundo de investimento? Será que estas medidas não eram importantes para resolvermos o problema de fundo que temos relativamente ao arrendamento? Em segundo lugar, ainda no âmbito das medidas para as famílias, fica aqui, desde já, assumido que o CDS vai apresentar propostas quanto aos juros que os portugueses já pagaram, que foi um enormíssimo ónus que
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tiveram durante este ano. Quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que lamentamos que neste Orçamento não haja uma vertente de tributação que seja favorável à família. Mantém-se, de acordo com a sua proposta, por exemplo, a discriminação entre divorciados e casados, que eu sei que tanto preocupa o Sr. Ministro. Há decisões no próprio Orçamento, por exemplo, a nível do imposto de selo e do modo como se tratam as transmissões gratuitas e as doações, que penso que poderiam ser favoráveis às famílias e que, infelizmente, não são.
Vejo muito poucas medidas — e estou aqui a ser benévolo — de simplificação fiscal. Sr. Ministro, quais são as medidas de verdadeira simplificação fiscal que estão neste Orçamento? Desde logo, sob a óptica da simplificação, pode-se criticar a questão de estarmos a dividir a taxa de IRC para 12,5% para os primeiros 12 500 euros, porque isso vai aplicar-se a todos os contribuintes, tanto aos contribuintes que têm de pagar milhares como àqueles que têm de pagar milhões. Isto não é razoável! Era bem melhor que se encontrasse um regime de taxa mais baixa para aqueles que tem de pagar os tais milhares, independentemente de todas as críticas que fiz de manhã.
Continua a não ser uma preocupação deste Governo aquilo que se passa nos tribunais fiscais, com as empresas a perderem anos, anos e anos com os seus problemas com a administração fiscal e, curiosamente, não há qualquer avanço no sentido quer da arbitragem quer das comissões de conciliação, que, por exemplo, foram referidas pelo Sr. Presidente do Supremo Tribunal Administrativo.
Sr. Ministro, sobre a «taxa Robin dos Bosques», tive oportunidade de o questionar de manhã e o Sr. Deputado Francisco Louçã questionou-o agora à tarde, mas deixe-me que lhe diga que o facto de ter sido aprovada recentemente como uma medida anticíclica nunca deveria levar a que não estivesse expressamente prevista a sua cobrança, porque, senão, vamos chegar a uma conclusão, que é bastante curiosa: afinal, a nível de IRC — IRC em sentido estrito —, têm de se tirar 100 milhões de euros àquilo que está cobrado, portanto a variação é de menos 0,9%. É mais do que aquilo que está previsto. Já no IVA temos um aumento da cobrança, que continua, verdadeiramente, por explicar.
Sr. Ministro, porque é que neste Orçamento não há medidas de natureza fiscal que possam facilitar a poupança? Sr. Ministro, só peço uma que esteja aqui prevista no Orçamento! É possível fazer alterações, por exemplo, a nível das taxas liberatórias que os cidadãos têm de pagar a nível do IRS pelos seus depósitos a prazo ou por outros instrumentos de poupança. Porque é que não há qualquer medida em relação a todo um movimento de crédito facilitado, que gera imensos problemas aos portugueses e que, esse sim, necessitava de um quadro sancionatório que fosse claro, evidente e mais facilmente aplicável? Sr. Ministro, tenho pena que não me tenha respondido em relação ao programa Pagar a Tempo e Horas, que foi lançado por V. Ex.ª e que, de acordo com a tabela que também está no seu site, leva a que ainda existam entidades do Estado que demoram cinco anos, três anos ou um ano a pagar. Isto não é aceitável! Por isso mesmo e como as empresas necessitam de liquidez» O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Cinco anos?! Isso é de 2003!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — São cinco anos! São 1380 dias, Sr. Secretário e Estado!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento: — Isso é de 2003! Foram as dívidas que o senhor lá deixou!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Como não é possível continuarmos com esta situação, ela têm de ser revertida rapidamente, porque as empresas necessitam, e bastante, de liquidez. Gostava de saber a opinião do Sr. Ministro, senão em relação a toda a dívida pelo menos em relação a parte dela, sobre a possibilidade de emissão de dívida pública para trazer mais liquidez às empresas. Sei bem a resposta que é dada e a referência que é feita em relação à questão dos juros, mas aquilo que temos de comparar são os juros que vão ser pagos com aqueles que são os benefícios que se trazem neste momento para a economia real, que tanto deles necessita.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, ao longo deste debate, já foram revelados alguns dos pontos importantes do Orçamento e discutidos outros, mas quero dizer-lhe que, como compreenderá, a responsabilidade de uma bancada da oposição é analisar com muito detalhe a lei mais importante da legislatura, que corresponde, aliás, ao poder mais importante do Parlamento. Por isso, o Sr. Ministro não ficará surpreendido por encontrar exigência no debate sobre os números, sobre as políticas e sobre as alternativas.
Devo dizer-lhe que este Orçamento tem alguns «alçapões», que são até mais perigosos. O Bloco de Esquerda revelou hoje à tarde um documento do Ministério da Educação que avisa as escolas de que, na medida em que o Governo incluiu no Orçamento — que, se for aprovado, entrará em vigor no dia 1 de Janeiro — uma proposta de alteração a uma regra que afecta as escolas, essa regra entra em vigor retroactivamente e é reportada a 1 de Janeiro de 2008.
Não sei se o Orçamento vai ser aprovado, mas provavelmente sim, porque há maioria absoluta. Sendo aprovado, entrará em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009. Ora, o Governo já nos diz que há normas que entram retroactivamente em vigor antes de ele ser aprovado, pelo facto de estarem inscritas na proposta de lei, entrando em vigor no 1 de Janeiro de 2008. Não sei se são precisos exemplos mais claros do abuso orçamental que está em causa. Por isso mesmo é que lhe fiz perguntas concretas sobre normas, como, aliás, outras que foram feitas aqui.
Sobre a questão dos partidos, quero, para já, registar que a sua resposta foi precisa: o Governo quer introduzir uma referência não ao salário mínimo mas ao indexante e quer manter a obrigação do registo, mas deixar de tornar obrigatório que os pagamentos pecuniários, os donativos individuais, sejam feitos em cheque. É isso que está na lei.
Vamos, então, aos números, Sr. Ministro. O Sr. Ministro não me quer responder sobre o desemprego. Faz mal, porque a matemática não é uma batata, é rigorosa e a política tem de responder aos factos que são registados.
Sr. Ministro, se no 1.º semestre tivemos 7,3% de desemprego e se a média do ano vai ser 7,6%, os portugueses que nos ouvem sabem que o Sr. Ministro está a dizer, e não pode dizer outra coisa, que no 2.º semestre teremos 7,9% de desemprego. Lamento, mas não há volta a dar! O Sr. Ministro pode amofinar-se, pode não gostar, pode imputar-me conclusões, mas deixe de parte a política e responda-me sobre os factos, porque o Governo e nós preocupamo-nos e somos obrigados e responsáveis por uma resposta política à questão do desemprego. Portanto, o facto de o Governo assinalar hoje, aqui, o aumento do desemprego no 2.º semestre, consequência inevitável da estagnação económica, obriga-nos à resposta e tornará o Orçamento melhor – ou pior, como quiser.
Sobre a questão da Madeira e também, aliás, sobre a intervenção do Partido Socialista a este respeito, ontem o Presidente da Comissão Europeia anunciou que proporia o fim dos offshore, que proporia limitar os ganhos dos executivos, acabar com as comissões e com os prémios e limitar a alavancagem financeira. Já sei o que isto quer dizer! Quando a «casa está a arder», há imensas promessas. Por exemplo, George Bush prometeu o fim dos offshore depois do 11 de Setembro de 2001, passaram sete anos e não aconteceu nada. Mas ontem o Ministro das Finanças alemão propôs que a Suíça entrasse na lista negra. A Suíça!...
Dizem que não há problema algum com a Madeira mas eu vejo dois problemas: em primeiro lugar, a resposta do Sr. Ministro, porque o Sr. Ministro, reconhecendo que há 4% do produto que, passando pela Madeira, não paga imposto, disse-nos que, apesar de tudo, havia uma vantagem, que era o controlo.
Sr. Ministro, para um Ministro das Finanças, o controlo sobre o rendimento efectivamente gerado na economia exerce-se para uma função, a equidade fiscal, portanto, é para impor um controlo fiscal. Se o Sr. Ministro me diz: «sei quais são as operações que lá se fazem neste valor de cerca de 7000 milhões de euros, mas não pagam imposto», então, eu pergunto para que é que o senhor quer saber. É um voyeurismo fiscal com que efeito? Para que é que lhe interessa saber se eles vendem electrodomésticos ou se vendem carros, se vendem derivados ou se é um hedge fund? O que é que lhe interessa? Não pagam imposto! Na verdade, não há controlo; se houvesse controlo, todas as empresas financeiras registavam as suas declarações de IRC e os senhores sabem que elas não o fazem e tinham que fazer. Se houvesse controlo, o fisco brasileiro não andava a pedir, há anos, informações às autoridades portuguesas, pois há perdas de receitas fiscais no Brasil porque o offshore da Madeira é utilizado para a fuga ao fisco no Brasil. Ou, então, não havia polícias europeias que andavam a «bater à porta» das autoridades portuguesas para saber o que se passava em determinadas contas de offshore.
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É claro que o controlo é insuficiente. Porquê? Porque são contas secretas, são contas fechadas. Foi para isso que inventaram os offshore, não foi? Não foi para isso mesmo? Mas o facto é que agora dizem-nos que há 7000 milhões de euros que não pagam imposto e vêm dizer que é uma grande vantagem para a economia portuguesa. Extraordinário! A minha última questão tem que ver com o fundo imobiliário. O Sr. Ministro já avançou e muito, acho eu, mas este assunto está longe de ser esclarecido.
Na opinião do Bloco de Esquerda, o que não está esclarecido é o seguinte: primeiro, por que é que não pagam impostos? Por que é que este fundo, contrariando a doutrina fiscal, a tradição fiscal, as regras fiscais, as leis fiscais não paga imposto? O senhor podia dizer-me que baixam o IRC para favorecer a implantação de fundos, como baixam ao interior, que isso tem vantagens, pode argumentar o que quiser, mas 0% de IRC, de mais-valias, de todo o tipo de tributação?! Os senhores foram tão cuidadosos que foram buscar todos os impostos possíveis que aquele fundo podia pagar para garantir que nunca os pagariam.
Isto nunca aconteceu! O Sr. Ministro tem três anos de exercício de mandato e nunca fez uma coisa destas, nunca propôs uma regra de fisco zero sobre activos e operações – excepto os offshore, claro. O Sr. Ministro nunca propôs isso, está a fazer uma coisa absolutamente excepcional e tem de nos dar razões absolutamente excepcionais.
Disse-nos que é redistribuição. Redistribuição com um «lucrozinho», não é verdade? É para isso que há um investimento de capital e, portanto, está a favorecer uma oportunidade de capital numa falha de mercado. Claro que sim! Agora, vamos discutir como.
A resposta do Sr. Ministro à pergunta mais difícil, o que é que vale a casa que é entregue por quem tem dificuldade em pagá-la, disse-me que era o valor em dívida.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Podia ser! O Sr. Francisco Louçã (BE): — Podia ser o valor em dívida. Então, vamos discutir o valor em dívida, para o Sr. Ministro nos esclarecer, porque os esclarecimentos têm de ser dados.
O que é uma dívida? Sr. Ministro, uma dívida de uma casa é o total ao longo do tempo, até ao terminus do crédito, do capital e o juro composto sobre o capital. Por isso é que, quando o crédito é, por exemplo, a 45 anos e as pessoas contraem um empréstimo de 100 000€, vão pagar três casas. Nos primeiros 15 anos pagam uma parte, a seguir pagam outra, etc., e quando chegam ao fim pagaram três vezes o capital inicial, por causa do efeito do juro composto.
Ora, num determinado momento, se elas entregaram a casa, que sentido tem contar o valor em dívida? Isto porque o valor em dívida é o total até 45 anos do juro composto sobre o capital pedido, como se percebe facilmente, mas o capital deixou de ser exercido, porque a propriedade já não é dessa pessoa. Então, por que é que a pessoa tem de atribuir à casa o valor de um juro que não está a pagar sobre uma propriedade que já não tem? Não tem sentido nenhum a sua resposta, a sua resposta é o absurdo fiscal e o absurdo contabilístico, que só pode prejudicar a pessoas e, aliás, criar diferenciações, conforme o tempo de pagamento que as pessoas tiveram até então.
Depois, o Sr. Ministro respondeu-me que quando a pessoa recompra, se conseguir ter poupança apesar de só ter 25% — diz o Sr. Ministro — de redução do pagamento sob a forma da nova renda, quando, em 2020, puder recomprar (se puder!) vai pagar o resto, porque o que já está pago fica pago. Se o que já está pago fica pago, como é que se actualiza o que já está pago? Dou-lhe um exemplo: uma pessoa já tinha pago 80% da casa, não consegue continuar a pagá-la, entrega-a ao banco e, em 2020, quer recomprar a casa, mas o mercado caiu 20% – neste momento já caiu 20% –, a casa é-lhe entregue «de borla»? Não tem de pagar nada? Isto porque o valor do mercado nessa altura já é de 80%, que ele já tinha pago. Garante que se entregam as casas às pessoas sem pagar nada? Acha que o seu «banqueirozinho» está de acordo com isso? Acha que a apreciação real do valor patrimonial, que é a sua prioridade na defesa desta regra, se pode impor sobre a vantagem da rentabilização de capital investido do ponto de vista do banco? Como é que o Sr. Ministro explica este processo? Mas é verdadeiramente isto que o senhor tem de explicar, porque se esta operação é feita para «limpar» os valores dos balanços dos bancos e para lhes dar uma nova oportunidade de negócio, entregando-lhes um parque habitacional, portanto um valor patrimonial muito grande, que eles vão gerir e que é garantido, porque são
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eles que vão definir as regras para o contrato, são eles que vão definir o que vai ser pago pelas rendas e são eles que vão, no fim, beneficiar do processo no seu conjunto.
Portanto, esta é, evidentemente, uma operação lucrativa, se não ninguém pegava nela, e sendo lucrativa o Sr. Ministro deve explicar-nos, em primeiro lugar, o que é que todos nós, contribuintes, perdemos, porque estamos a pagar sobre isso, porque não há impostos nesse processo e é a primeira operação do banco que não tem impostos; em segundo lugar, como é que estas operações procedem e, em terceiro lugar, qual é a garantia para o património das pessoas e para a protecção das suas poupanças.
O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de questões, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, gostaria de começar por responder ao Sr. Deputado Duarte Pacheco dizendo-lhe que o senhor manteve, na sua intervenção, o tom que a bancada do PSD teve durante a manhã, que foi um tom de grande desrespeito pelos membros do Governo.
Isto porque, em primeiro lugar, procurei responder às questões e só ouvi ruído e protestos da bancada, não permitindo que a resposta fosse dada em boas condições; em segundo lugar, chamaram o Ministro das Finanças de merceeiro; em terceiro lugar, puseram em causa a capacidade intelectual do Ministro da Economia, em várias explicações, e esta tarde começam por acusar o Ministro das Finanças de desonestidade intelectual.
Registo o tom de desrespeito que a bancada do PSD revela pela bancada do Governo.
Quanto à questão da perda de competitividade que foi referida, chamo a atenção do Sr. Deputado que, ao longo destes anos, a nossa economia, em particular o sector exportador, tem revelado uma grande capacidade de inovação, de modernização, de conquista de novos mercados e de se abalançar em novos produtos que, em boa verdade, valorizam o conteúdo tecnológico do nosso sector exportador.
Isso é algo que não podemos ignorar, é algo que está claramente expresso nos números que evidenciam a evolução do sector exportador nestes anos, evolução essa interrompida, desacelerada, em virtude das circunstâncias externas que, neste momento, nos rodeiam, mas a inovação, a modernização e a capacidade estão presentes e há que reconhecer a capacidade e o esforço que essa comunidade empresarial tem vindo a desenvolver nestes anos, fazendo justiça e reconhecendo-lhe isso mesmo.
Chamo também a atenção para o facto de que o Governo tem levado a cabo políticas importantes e decisivas para o reforço da nossa competitividade. Diria que esta batalha pela competitividade é permanente, é uma batalha que obriga a reformas e a mudanças importantes cujo fruto não é necessariamente imediato, é um fruto que vem a prazo.
A aposta que o Governo tem vindo a fazer no sector da educação, de melhoria do nosso sector de educação e formação profissional, a aposta clara, que tem estado presente nos sucessivos Orçamentos que este Governo tem apresentado a esta Assembleia, no reforço da nossa capacidade científica e tecnológica, o esforço que temos vindo a fazer na simplificação, desburocratização, de melhoria da eficiência e de modernização da nossa Administração Pública, são factores decisivos para o reforço da nossa capacidade competitiva.
As reformas estão em marcha, as reformas já estão a evidenciar resultados e com certeza que iremos colher os frutos do esforço que hoje estamos a desenvolver nestes domínios.
Quanto às contas da saúde, Sr. Deputado, e até quanto a questões que aqui foram suscitadas relativamente a outros ministérios, permitam-me que, acima de tudo, remeta para a oportunidade que terão de, com os respectivos ministros, em detalhe, poderem discutir e esclarecer essas questões.
Mas sem prejuízo da oportunidade que terão de aprofundar as questões com os ministros sectoriais — e penso ser essa a sede própria para que algumas das questões que aqui foram apresentadas possam ser esclarecidas, não esperem que o Ministro das Finanças esteja em condições de aprofundar com detalhe matéria de natureza sectorial que não seja das finanças, obviamente —, gostaria de chamar a atenção para o seguinte: a unidade de missão que refere foi entretanto substituída, no âmbito do PRACE, por uma entidade, a Administração Central dos Serviços de Saúde, que, de facto, leva a cabo o acompanhamento do sector da saúde, da sua evolução em termos financeiros, que detém e dispõe de informação relevante para sabermos o que aí se passa.
Quanto às reduções de pessoal e aquisição de serviços que o Sr. Deputado referiu, gostaria de chamar a atenção que, de acordo com a nova lei dos vínculos, carreiras e remunerações, não será possível contratos de prestação de serviços a nível individual, conforme refere. Esse subterfúgio deixará de ser possível.
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Acerca dos investimentos públicos, repito o que disse a propósito do BEI. Não falei em relatórios ou estudos, o BEI fará a sua análise, tem a sua documentação, e não me compete a mim, obviamente, estar a exigir ao BEI que divulgue seja o que for e é ele que poderá dar esses esclarecimentos.
Sr. Deputado, quanto à questão do défice da Estradas de Portugal, chamo a atenção para as páginas 122 e 123 deste relatório, que fala sobre a Estradas de Portugal e o sector rodoviário. De facto, contrariamente ao que os sectores tentaram fazer no Orçamento de 2005, que foi tirar a Estradas de Portugal do perímetro, desde o Orçamento Rectificativo de 2005 que mantemos a Estradas de Portugal no perímetro de consolidação. E mais: de acordo com informação que aqui está, o impacto é de um endividamento previsto de 231 milhões de euros.
Acerca da alienação do património, creio que já a enquadrei numa reforma importante que o Governo está a levar a cabo no domínio do património e do imobiliário do Estado e chamo a atenção para o potencial que ainda temos.
A título de exemplo, temos em curso as acções que estão a ser desenvolvidas, designadamente, no Ministério da Defesa Nacional, com a Lei das Infra-Estruturas Militares, e no domínio da justiça, de modernização das instalações de suporte da actividade do Ministério da Justiça, havendo aqui uma série de imóveis que, de facto, não são necessários ao Estado no desenvolvimento da sua acção e, portanto, o Governo entende que estes imóveis serão necessariamente mais bem utilizados se alienados, permitindo à sociedade que lhes dê outro uso que não o que até agora lhes tem vindo a ser dado.
Quanto às propostas do PSD que o Sr. Deputado comentou, devo realçar que constatei que o PSD avançou com as propostas sem fazer contas. Penso que foi manifesto o embaraço do Sr. Deputado seu colega de bancada, esta manhã, quando fiz algumas perguntas, por exemplo, quanto ao impacto do IVA de caixa, e creio que até foi com algum espanto que tomaram conhecimento dos números que avancei. Muito embora entendam que eram «contas de merceeiro», não é verdade. Trata-se de contas feitas pelo Ministro das Finanças que teve o cuidado de, junto dos serviços, se informar dos valores que estão em causa. Assim, não são contas feitas «em cima do envelope», mas contas que estão fundamentadas.
Com efeito, constatei que o PSD não fez contas e, esta tarde, que nem sequer quer saber das contas. Diz que a situação ç extraordinária e, portanto, se pusermos o País em dçfice excessivo, seja!» Portanto, o PSD não quer saber do défice das contas públicas. Considera que, se atingirmos ou ultrapassarmos os 3% de défice, não é mal nenhum e, até, que devemos ultrapassar essa fasquia do défice. O Sr. Deputado foi muito claro quando invocou a situação extraordinária para justificar o impacto que teriam as medidas.
Relativamente ao imposto do selo, que referiu, e à questão com a Comunidade, a proposta de lei de Orçamento clarifica e, no fundo, corrige a questão, acabando com a situação que deu azo à tomada de posição a nível comunitário quanto a uma irregularidade, no seu entender, no âmbito a aplicação do imposto do selo. Isso fica corrigido e resolvido com a proposta legislativa que aqui é apresentada.
Sr. Deputado Maximiano Martins, cumpriu-se a Lei de Finanças das Regiões Autónomas e a Lei das Finanças Locais. Os valores das transferências que aqui temos são calculados com a aplicação escrupulosa do que está na lei.
Quanto à questão que levantou da diferenciação dos valores do PIDDAC entre a Região Autónoma da Madeira e a Região Autónoma do Açores, a justificação, ao que pude apurar, tem a ver com o facto de ser necessário investir em duas prisões nos Açores. Essa necessidade não existe na Madeira, dado que, ao que também fui informado, já tem as instalações prisionais adequadas. Como nos Açores há carências dessas instalações, há a necessidade de fazer um investimento nesse sector, o que justifica a discrepância que notou.
Sr. Deputado, no que se refere ao offshore da Madeira, creio que as considerações que fez estão muito em linha com o que há pouco tive a oportunidade de dizer ao Sr. Deputado Francisco Louçã. O que está aqui em causa é encontrar uma solução à escala global e comum para a questão dos offshore. As acções individualizadas, aqui, não terão qualquer eficácia. Trata-se de sectores que estão devidamente fiscalizados, supervisionados e, conforme disse, cooperantes, prestando às autoridades as informações necessárias.
Sr. Deputado Eugénio Rosa, quanto ao fundo de investimento imobiliário para o arrendamento, permita-me que responda também ao Sr. Deputado Francisco Louçã. Obviamente que não há soluções únicas, mas há um princípio que há pouco referi e que reafirmo: os interesses patrimoniais têm de ser acautelados, têm de ser defendidos.
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Relativamente à questão da regulamentação, chamo a atenção de que o que está na lei e na proposta de lei dá-nos o enquadramento legal e o que já está previsto no Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário dá-nos o necessário enquadramento para o processo de avaliação dos imóveis, protegendo, nesse domínio, os interesses patrimoniais. Na questão que há pouco foi referida da transferência do imóvel para o banco, tendo em conta o esforço que já foi desenvolvido, terá de haver uma separação entre o que são juros de uma dívida e o que é a amortização do capital em dívida, e com certeza que, se deixa de haver dívida, deixa de haver necessidade de pagar os juros. Portanto, obviamente que tudo isso tem de ser tido em conta. E, quando digo que se tem de acautelar os interesses dos proprietários, refiro-me, precisamente, a ter em conta o conjunto de questões que foram suscitadas.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Por que é que não está regulamentado?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Em particular, o exercício da opção de compra é uma matéria que será regulamentada também para que haja transparência e sejam acautelados os interesses patrimoniais.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Só essa?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, é essa a matéria que, neste momento, vejo que é necessário regulamentar para acautelar os interesses patrimoniais, dado que, quanto ao resto, o enquadramento jurídico já existente dá protecção. Porém, também lhe digo, com toda a sinceridade, que, se houver necessidade de esclarecer matérias que possam surgir, com certeza que aqui estarei para esclarecer e adoptar as iniciativas que forem necessárias para assegurar que esses interesses patrimoniais são defendidos. Não tenhamos dúvidas quanto a isso, Sr. Deputado! Ora, quanto à questão das actualizações salariais e da inflação, permita-me que lhe diga que o Sr. Deputado veio confirmar aquilo que eu, de manhã, tinha dito ao Sr. Deputado Honório Novo. Perdoe-me a expressão, mas eu estou «bom da cabeça», sei o que digo e sei o que disse. O Sr. Deputado veio precisamente confirmar aquilo que eu disse, ou seja, veio confirmar a resposta que dei ao Sr. Deputado Honório Novo, esta manhã.
De facto, foi dito que, sendo a inflação esperada de 2,1% e havendo um aumento de 2,1%, será assim garantido o valor real dentro desse quadro. Questionado sobre se, no caso de a inflação ser maior, vou corrigir, eu disse que não haverá correcções intercalares. Normalmente, todos os anos, quando há negociações salariais, essa é uma matéria que é sempre levantada pelos sindicatos e será nesse momento que vamos discutir.
Vamos começar amanhã as negociações salariais e essa questão vai ser levantada e discutida.
Foi isso que foi dito e não mais do que isso, Sr. Deputado, o Sr. Deputado confirmou, de facto, aquilo que eu há pouco tinha dito ao Sr. Deputado Honório Novo, e agradeço que o tenha feito.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Mas vai negociar ou impor?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — No que se refere à diferença de dados de 5,1% que refere entre o quadro da página 138 do Relatório do Orçamento e os mapas dos serviços integrados, há aqui várias matérias que a justificam. Em primeiro lugar, é preciso ter em conta que, para além dos aumentos salariais que venham a ser acordados, há lugar a pagamento de prémios, a progressões em termos de carreiras e, no quadro da página 138, também a cativações, que não podemos ignorar.
Quanto à redução do défice, Sr. Deputado, quando digo que o País está mais preparado para enfrentar a crise porque reduziu o défice, isso tem a ver com questões tão simples como esta: primeiro, se o défice fosse superior a 3%, isto é, défice excessivo (e já nem falo nos 6,8% que tínhamos em 2005), estaríamos, neste momento, com taxas de juro bem mais elevadas do que as que já temos em virtude da crise financeira. Teríamos, certamente, e isso seria um ónus sobre todos nós: directamente, porque as pessoas, nos seus encargos com a habitação, teriam taxas ainda mais levadas, e também por via indirecta, porque a dívida pública pagaria mais juros e os juros são pagos com os impostos dos portugueses. Era um ónus sobre todos nós! Mas para além de podermos ter um quadro financeiro que é menos penalizador neste contexto internacional, se não tivéssemos baixado o défice para o nível a que baixamos, isto é, de 2,2%, não teríamos capacidade para aumentar o abono de família no primeiro e segundo escalões, não teríamos capacidade para alargar os
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apoios à acção social escolar, não teríamos possibilidades de ter a política de apoio ao transporte escolar das nossas crianças e dos nossos jovens, não poderíamos ter majorado as deduções à colecta em IRS pelas despesas da habitação, não poderíamos ter baixado o IMI, não poderíamos ter alargado os períodos de isenção do IMI, não poderíamos ter baixado o IRC para as pequenas e médias empresas, não poderíamos ter baixado o pagamento por conta, não poderíamos ter baixado sequer o IVA em 1%.
Sr. Deputado, como há pouco referi, tudo isto representa cerca de 1100 milhões de euros que o Estado deixa na economia»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Deixa muito mais nos offshore!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » para a poder dinamizar. Se não tivçssemos feito essa correcção do défice, não poderíamos ter feito isto. Por isso mesmo, quando digo que o facto de termos reduzido o défice nos permite estarmos mais preparados para enfrentar esta situação, tem a ver, tão simplesmente, com estas questões.
No que se refere ao saldo externo, Sr. Deputado, gostaria, em primeiro lugar, de chamar a atenção para o facto de que não podemos ignorar que o encarecimento de um conjunto de produtos internacionais que importamos (bens alimentares) e, designadamente, o encarecimento do petróleo tem um impacto nas nossas contas externas e agrava essa nossa situação. Mas quero chamar também a atenção do Sr. Deputado para o facto de que o saldo externo é uma coisa que não depende só do Governo mas da economia no seu conjunto: do comportamento das empresas, das famílias e do Governo.
O Sr. Deputado, há pouco, falava na obsessão do Governo pelo défice. No entanto, o facto de o Estado baixar o défice público contribui para que a situação externa não se agrave tanto.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Disparou! O défice externo disparou!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — É um contributo positivo! O facto de reduzirmos o défice das contas públicas é algo que beneficia a nossa situação externa. Portanto, o contributo que o Governo tem vindo a dar com a sua política orçamental neste domínio é positivo.
Relativamente ao IRC da banca, já falámos muitas vezes sobre isso. O Sr. Deputado invoca os números da Associação Portuguesa de Bancos (APB) e eu invoco os números dos serviços, que têm um cálculo de determinação da taxa efectiva de IRC e, conforme já foi dito, a taxa efectiva de IRC paga pela banca aumentou nos últimos anos. Isso é inquestionável.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Qual é, em 2007?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Diogo Feio, quanto à questão que levantou das entidades que foram externalizadas e dos funcionários públicos, quando falei numa redução de 51 486 funcionários, se esses trabalhadores são funcionários públicos continuam a ser contados como tal. Esse número de redução de 51 486 funcionários conta com eles, porque eles continuam a ser funcionários públicos, a estar sob o regime de trabalho em funções públicas. Portanto, não tenhamos dúvidas quanto a essa matéria.
O Sr. Deputado, de alguma forma, repetiu os argumentos da manhã. Penso que continua a querer confundir aumento da carga fiscal com melhoria da eficiência fiscal, porque nem todo o aumento da receita é um aumento de carga fiscal. Trata-se de um aumento da eficiência da administração na capacidade de colectar, de receber os impostos que são efectivamente devidos e de receber também os impostos em atraso.
O Sr. Deputado estranha que, sendo o crescimento de 0,6%, com uma inflação 2,5% conforme prevemos, com um crescimento nominal do PIB de 3,1% ou de 3,2% — não tenho aqui presente o factor do PIB, que não é necessariamente igual à inflação, mas a diferença não será grande, será mais décima menos décima —, a receita possa crescer 3,9%. Mas, Sr. Deputado, em 2005, o crescimento nominal do PIB foi de 3,2% e da receita foi de 7%; em 2006, o crescimento nominal do PIB foi de 4,4% e o crescimento dos impostos foi de 7,6%; em 2007, o crescimento nominal do PIB foi também de 4,4% e o crescimento dos impostos foi de cerca de 7%.
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Sr. Deputado, não vejo onde está aqui a estranheza de, face a estes números, com um crescimento nominal de 3,1%, podermos ter um crescimento de 3,9% da receita.
Quanto à questão do apoio ao arrendamento, estão previstos apoios fiscais, com a dedução em sede de IRS dos encargos com o arrendamento. O Sr. Deputado tem um pouco a visão de que tudo se resolve com mais benefícios fiscais e mais apoios. Temo muito pelos efeitos orçamentais que tal panóplia de soluções que sempre apregoam teria, porque tudo se resolveria ou com mais despesa ou com mais benefícios fiscais, conforme preconizam.
Consideramos que a solução que aqui temos, apostando na reabilitação urbana, por um lado, e, por outro, nos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, é importante para dinamizar o arrendamento.
Aproveito para responder ao Sr. Deputado Francisco Louçã relativamente à razão pela qual estes fundos não pagam impostos. Não pagam impostos precisamente para que as pessoas que neste momento têm problemas com a sua habitação possam ter acesso a uma habitação com uma redução significativa de encargos.
É por isso que não há impostos. Efectivamente, este regime fiscal foi definido para permitir esse alívio aos encargos com a habitação.
Sr. Deputado, quanto ao Pagar a Tempo e Horas, é um programa que foi iniciado este ano e que irá prosseguir um esforço de correcção desses atrasos de pagamento.
Penso que esta recta final do ano é importante porque muitas vezes os serviços, na sua gestão de tesouraria, guardam para o fim do ano a regularização de algumas situações dessa natureza.
No entanto, quero chamar a atenção do Sr. Deputado, quando fala em prazos de cinco anos, que se arrisca a «dar um tiro no pé». É que dívidas com cinco anos são dívidas do tempo do vosso governo.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Vocês estão no Governo há quatro anos!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Atenção! Não esqueça esse pormenor, Sr. Deputado.
Sr. Deputado Francisco Louçã quanto à questão do desemprego, permita-me que lhe diga que a taxa de desemprego de 7,3% que referi diz respeito ao último trimestre do ano. Não é a taxa média da primeira metade do ano.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Mas foi o que disse!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — A taxa média do primeiro semestre é de 7,5%. Portanto, para ter 7,6% no fim do ano bastará ter 7,6% nos dois trimestres que faltam. Isto é matemática! Citando o ilustre Deputado Francisco Louçã, «a matemática não é uma batata» e muito menos «uma batata a murro».
O Sr. Francisco Louçã (BE): — O Sr. Ministro arredonda como os bancos!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quanto à Madeira e à manutenção do offshore, a questão que se coloca não é propriamente um problema de receita fiscal.
Como disse, e não tenhamos ilusões, alterar o regime tributário da Madeira é fazer com que as operações que ali se fazem sejam feitas noutro sítio, é ter a ilusão de que vamos recuperar receitas quando essas operações fogem para o exterior. É que o controlo que é possível fazer não é um controlo de natureza fiscal mas da licitude e de combate ao branqueamento de capitais e a operações ilícitas.
O regime do offshore da Madeira permite-nos velar pela licitude de operações que seriam feitas noutros offshore, e com o mesmo impacto em termos da fiscalidade, sendo melhorada a nossa fiscalização sobre entidades portuguesas quanto ao seu envolvimento em operações de branqueamento de capitais. Isso é algo que penso ser relevante referir quanto ao offshore da Madeira.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Houve uma única pessoa presa por branqueamento de capitais! Uma única!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quanto à questão que levantou acerca do Ministério da Educação, creio que a Sr.ª Ministra da Educação também terá oportunidade de o esclarecer. No entanto, a infor-
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mação que entretanto obtive, muito rapidamente, foi que não irá haver qualquer alteração ou antecipação de aplicação da lei ou da discussão legal que está no Orçamento do Estado para 2009, nem sequer há aqui qualquer aplicação de natureza retroactiva. Todavia, esta é uma matéria que remeto para o debate sectorial que terão oportunidade de ter com a minha prezada colega da Educação.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
No domínio dos contratos internacionais, é frequente, nas negociações, haver uma versão e uma contraversão, até que, a determinada altura, se chega à versão final. É o chamado fecho do contrato. Essa versão costuma ser designada por last shot. Aqui não estamos perante o last shot, estamos no fecho do debate e, portanto, no last round.
Agora, cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos. Espero que respeitem da mesma forma o rigor com que cumpriram esta segunda ronda. As perguntas serão agrupadas em bloco e o Sr. Ministro responderá de uma só vez.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, permita-me um primeiro comentário às suas observações iniciais: para se ser respeitado é preciso darmo-nos ao respeito.
Assim, Sr. Ministro, coloco esta questão: não considera que são intervenções menos correctas, por exemplo na sua conferência de imprensa, apresentar quadros? É que o Sr. Ministro é responsável por aquilo que diz, por aquilo que é escrito em nome do Governo e do Ministério das Finanças e por aquilo que é apresentado.
Ora, não é correcto apresentar quadros em que se comparam realidades não comparáveis para depois escrever que a despesa pública baixou como nunca tinha baixado!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu não escrevi isso!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Desculpe, quem apresentou este quadro que tenho aqui? Está aqui dito que a fonte é o Ministério das Finanças. O senhor responde pelo Ministério das Finanças ou, então, já está a desautorizar os seus Secretários de Estado ou alguns funcionários.
O relatório que acompanha, na página 2 do sumário executivo, é igual. Ou seja, compara os dados de 2008 e de 2009, despesa que não é comparável.
Mas posso dar-lhe mais exemplos de intervenções — para utilizar uma linguagem soft — menos correctas do Sr. Ministro, quando, por exemplo, faz referência a que há diminuição de funcionários (mais de 50 000), não fazendo referência também que houve pessoas que saíram do universo do Estado, por exemplo, para os hospitais. Era também bom fazer essa referência para todos recebermos a informação completa.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Já lhe respondi!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Ou, por exemplo, quando se compara a receita fiscal de 2005 com a de 2009, fazendo referência que ela se deve única e exclusivamente à eficiência fiscal. Obviamente, houve melhorias na máquina fiscal, mas, Sr. Ministro, também houve um agravamento de nove impostos. Portanto, essa é a informação total. Dizer só metade da realidade é, no mínimo, Sr. Ministro, uma intervenção menos correcta.
A segunda observação que gostaria de fazer é sobre comentários que fez às minhas perguntas, nomeadamente sobre a perda de competitividade da economia portuguesa, que, aliás, é um facto que todos lamentamos e, julgo, até mesmo o Governo.
O que constatei da sua resposta foi que a perda de competitividade é da responsabilidade de toda a gente menos do Governo, quando o Governo tinha a obrigação de criar um cenário favorável às empresas portuguesas, o que, infelizmente, pelos resultados concretos da competitividade, não ocorreu.
O terceiro comentário é sobre as propostas do PSD. Sr. Ministro, mais do que perda de receita, o que elas provocam é diferimento de receita. E isso é um facto. Mas o Sr. Ministro não negou que são propostas positivas para a poupança, para as famílias e para as empresas. Quanto à sua praticabilidade, repito aquilo que disse e que o meu colega afirmou: Sr. Ministro, estamos disponíveis, obviamente em sede de especialidade,
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para encontrar a redacção que possa ajudar a poupança, as famílias e as empresas e que, de acordo com o Governo, também possa ser aprovada e incluída neste Orçamento.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Duarte Pacheco.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, o Partido Socialista pensa que o Orçamento aqui discutido hoje, na generalidade, é um Orçamento que enfrenta uma situação actual de grande incerteza da conjuntura internacional.
É um Orçamento responsável, que tem algumas medidas que permitem ajudar as famílias e as empresas, e relevo a questão do IRC, nomeadamente na importante fase que a economia atravessa no que diz respeito à competitividade. Nessa área, são criadas várias medidas.
Portanto, discordamos do que aqui foi dito pelo PSD porque, embora possa haver outras medidas que auxiliam as empresas, elas comportam um nível de despesa bastante elevado e não entendemos como é que, criticando o aumento da dívida pública e da despesa pública, ao mesmo tempo, não consideram o que comportam essas medidas que hoje apresentaram.
Assim, Sr. Ministro, pensamos que este Orçamento está na linha do que é necessário. Teremos de aprofundar as medidas que tentam ajudar a resolver o problema com que nos defrontamos, que é um problema complexo e que só com responsabilidade conseguiremos ultrapassar, nomeadamente no que diz respeito à produtividade, sem a qual não poderá haver aumento de salários.
O Sr. Presidente: — Como o CDS-PP não pretende usar da palavra, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em primeiro lugar, gostaria de me referir à questão dos fundos. O que concluímos deste debate, e é um princípio de debate, é que está muito mais fora da lei do Orçamento do que dentro da lei do Orçamento.
Ora, o que o senhor e o seu Governo pretendem aqui é que «passemos mais um cheque em branco» ao Governo nesta matéria. «Cheque em branco» agora aliado a uma outra componente, ou seja, a criação de uma espécie de paraíso fiscal sectorial em benefício dos parceiros deste fundo. Isto é, de sectores da banca, de empresas ligadas à banca e de grandes grupos imobiliários que vão ser os gestores reais dos fundos de investimento.
Quanto ao repto que aqui lhe lançamos sobre a razão pela qual estes fundos de investimento não podem surgir na periferia das administrações públicas, o senhor respondeu «nada»! Relativamente à questão que aqui lhe lançamos sobre o motivo pelo qual os benefícios fiscais não atingem e beneficiam directamente as famílias endividadas, o senhor respondeu-nos com um argumento verdadeiramente espantoso: o que seria das autarquias se isentassem de IMI os particulares? Então, não vai isentar do mesmo imposto, do IMI, os fundos de investimentos? Sr. Ministro, como é que explica este argumento? Enfim, deve ter sido uma distracção, credito-lho no rol das distracções!» Em segundo lugar, Sr. Ministro, os nossos números relativos à taxa efectiva da banca são fornecidos pela Associação Portuguesa de Bancos, enquanto o senhor invoca números provenientes dos serviços do seu Ministério. Sr. Ministro, de uma vez para sempre, mostre-nos os seus números, porque é verdadeiramente espantoso que um sujeito passivo diga que quer pagar este ano 12,5% e os senhores «não, não, coitadinhos! Não paga 12,5%, paga 17%, ou 18%, ou 19%!» Alguém acredita nisto, Sr. Ministro?! Estamos a enganar quem? Nós próprios ou quem nos ouve? Terceira questão: offshore.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não se zangue! Não vale a pena zangar-se!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não estou zangado, estou veementemente a afrontar os seus argumentos, se me permite.
Há umas horas, o Sr. Ministro disse que, se houvesse uma proposta de eliminação global dos offshore, estava disponível para a aprovar e apoiar. O senhor não é Ministro das Finanças de um Governo que pode
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propor isso? Por que é que não o propõe, Sr. Ministro? O que é que o impede de propor? Mais: mostrava logo a disponibilidade de fazer encerrar o offshore da Madeira — era uma iniciativa concreta. Desafio-o a levar esse debate à União Europeia! Outra questão: desemprego.
Coloquei-lhe a questão dos 150 000 novos postos de trabalho. Ora, é espantoso porque, indirectamente, a forma como o Sr. Ministro me responde mostra que, de facto, o Governo já abandonou este compromisso; se não estivesse em vias de o fazer, tinha dito, liminar e frontalmente, que «o senhor não tem razão, nós mantemos o compromisso». Não disse! Portanto, a conclusão que tiramos do que o Ministro das Finanças hoje disse sobre tal compromisso é a de que não vai cumprir, não está em condições de cumprir.
Mas o senhor disse uma coisa que eu queria contestar em termos de números. Anunciou que, até há pouco tempo, tinham sido criados 133 000 novos postos de trabalho.
Sr. Ministro, tenho aqui comigo o boletim do INE, segundo o qual são 118 000 os trabalhadores em formação. Como deve saber, a maior parte destes trabalhadores em formação são desempregados. Admitamos agora que metade destes, isto é, 60 000, deixam a formação. Se assim for, qual é a sua taxa de desemprego? Finalmente: planeamento fiscal — vou dirigir-me ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
A propósito da eliminação do regime simplificado, disse aqui que uma das razões que estava na base da sua proposta era o combate ao planeamento fiscal. Sr. Secretário de Estado, é verdadeiramente espantoso que diga isso! O senhor devia estar preocupado com o planeamento fiscal dos grandes grupos económicos! O senhor vem a esta Casa dizer que elimina o regime simplificado em sede de IRC por causa de empresas cujo volume de negócios é inferior a 150 000 €?!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não se zangue!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, de duas uma: ou o senhor se enganou, e admito que tenha tido um lapso, ou vir falar-nos de planeamento fiscal de empresas cujo volume de negócios é inferior a 150 000 € por ano ç verdadeiramente inaceitável.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Honório Novo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Ministro, vou fazer observações brevíssimas, a primeira das quais sobre o Ministério da Educação.
Sr. Ministro, é muito grave e mesmo muito preocupante que um qualquer Ministério possa entender que, com a apresentação de uma proposta de lei não aprovada, tem legitimidade para aplicá-la, e nas circunstâncias em que entende.
O Sr. Ministro remeteu para a Sr.ª Ministra da Educação a resposta a esta questão. Com certeza, ela terá de responder, mas deixe-me dizer-lhe que o Sr. Ministro, juntamente com o Sr. Ministro da Presidência, o Ministro dos Assuntos Parlamentares e o Primeiro-Ministro, é que assinou a proposta de lei do Orçamento do Estado, não foi a Ministra da Educação, portanto, há uma responsabilidade de conjunto, que também é sua, em relação ao articulado e a esta proposta de lei.
Por isso, vale a pena trazer à discussão este facto inédito, que nunca vi na democracia portuguesa, de uma lei ainda não aprovada mas que é aplicada pelo facto de estar a ser discutida havendo maioria absoluta no Parlamento. Isto é algo que nunca vi.
Sr. Ministro, em relação a todas as questões que lhe foram colocadas, pelo Bloco de Esquerda e por outras bancadas, há uma certa vantagem no prolongamento da discussão — tão cansativa que ela é! —, porque o Sr.
Ministro funciona muito a «saca-rolhas«,»
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Realmente, às vezes, o Sr. Deputado é muito retorcido!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — » ou seja, ç por insistência sucessiva que vamos vendo alguns vislumbres da sua proposta. É que é preciso perceber bem tudo o que este Governo faz!
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Reparemos no que nos diz. Primeiro, o desemprego subiu mesmo: 7,3%, mas era só no 2.º trimestre, e vai ser 7,6%, nos 3.º e 4.º trimestres. Subiu! A lógica matemática é implacável, por mais que lhe dê voltas.
Ainda mais «saca-rolhas»: para que é preciso o offshore da Madeira? Muito perguntado, acabou por dizernos que era para apanhar o branqueamento de capitais que se não fosse feito lá era feito noutro sítio.
Deixe-me dar-lhe uma notícia, Sr. Ministro. O senhor sabe, como eu próprio, que não há uma única operação de capital registada no offshore da Madeira que seja feita na Madeira. Nenhuma! São todas feitas noutros locais e até posso dizer-lhe quais as sedes dos bancos onde são feitas essas operações, como o senhor sabe, aliás.
Se o critério é apanhar o branqueamento de capitais — o Sr. Ministro insiste na importância desse «D. Quixote» contra o crime, ou seja, considera que o offshore da Madeira é um «pote de mel» para apanhar as «moscas» que ali aparecem a querer fazer branqueamento de capitais —, então, é um fracasso, Sr. Ministro.
Não apanhou ninguém! Há algum processo relativo a branqueamento de capitais durante a longa existência do próspero offshore da Madeira? Rigorosamente nenhum! Se o critério for esse, não serve para nada! Finalmente e o mais importante, a questão do fundo imobiliário.
O Sr. Ministro respondeu a muitas questões, dando respostas mais ou menos claras, sendo que nada do que disse está na proposta de lei.
Por exemplo, perguntado sobre a valorização da casa, quando é entregue ao fundo que passa a ser proprietário da mesma, disse-nos que podia ser o valor em dívida e, depois, explicou — ainda bem! — que o valor em dívida excluía os juros, portanto, era o capital que não estava pago. Registo essa resposta porque, em algum momento, tem de ser incluída na lei, e não pode ser de outra forma.
No entanto, o que nunca nos garantiu foi que o valor pelo qual o fundo vai ficar com a casa não possa ser inferior ao valor da compra pela pessoa. É que se o valor, antes de juros, do capital comprometido, isto é, o que a pessoa pediu, o que é o seu crédito original que, depois, é agravado ao longo do tempo pelos juros, é superior ao valor que lhe atribuem quando o fundo fica com a casa, compreenda, Sr. Ministro, que esta é a questão fundamental e dela não podemos sair. Significa isto que, se assim puder acontecer, porque o mercado evoluiu, porque a avaliação foi negativa, pelo que seja, as pessoas terão uma renda e terão, ainda, uma dívida.
Portanto, temos de ficar com uma resposta categórica sobre a questão de saber se o valor pelo qual o fundo valoriza a casa de que passa a ser proprietário pode ou não ser inferior ao valor do capital que deu origem ao crédito, caso em que as pessoas ficam com uma dívida, além de terem perdido o seu património e de estarem a pagar uma renda sobre o mesmo.
A este propósito, queria fazer um pouco mais de «saca-rolhas» para ver se o Sr. Ministro ainda nos diz mais alguma coisa de economicamente razoável para o futuro dos portugueses.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Francisco Louçã.
Queria agradecer-lhe, bem como aos que os precederam, Deputados Honório Novo, Hortense Martins e Duarte Pacheco, o rigor com que acataram o limite temporal que lhes foi cometido.
Vou agora conceder a palavra ao Sr. Ministro, para responder, mas, se quiser, naturalmente pode delegar no Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, fá-lo-ei. Mais uma vez, pedirei ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que tome a palavra para complementar as minhas próprias respostas em matéria fiscal.
Sr. Deputado Duarte Pacheco, pior do que, esta manhã, ter mostrado a grande falta de respeito da bancada do PSD pelos membros do Governo, penso que, esta tarde, foi um pouco querer reincidir.
É que o Sr. Deputado faz acusações, em particular a mim próprio, de desonestidade intelectual mas esconde ou ignora questões — aí, dou-lhe o benefício da dúvida e admito que possa ter dito o que disse por ignorância ou por erro.
Por exemplo, no que se refere às questões dos números, o Sr. Deputado com certeza não reparou que, na pág. 138 do Relatório, se diz que «a despesa do subsector Estado para 2009 tem subjacentes duas alterações de natureza contabilística, as quais têm associados montantes significativos que condicionam a respectiva análise face aos anos anteriores», apontando-se em seguida as alterações contabilísticas que foram feitas, entre as quais a obrigatoriedade da contribuição para a Caixa Geral de Aposentações.
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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E só era sério se a legenda estivesse ao pé do quadro!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, por favor não me interrompa porque estou a chamar a atenção para um esclarecimento que está contido no Relatório. Assim como não se pode invocar a ignorância da lei para justificar que se incumpra a lei, também não pode invocar a ignorância da totalidade do Relatório para só invocar parte dele, tendo obrigação de o ter lido todo e de o comentar na sua globalidade. No fundo, o Sr. Deputado acusa-nos de esconder e deturpar a informação, mas faz pior.
O Sr. Deputado disse, relativamente à competitividade, que é inadmissível que o nosso país baixe, como baixou, nos índices de competitividade — disse-o aqui e está registado, espero —, tendo afirmado que passámos do 25.º para o 43.º lugar.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — De acordo com o Fórum Económico!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, baixámos do 40.º para o 43.º lugar e, no seio da União Europeia, mantivemo-nos no 17.º lugar. Mais: entre 2007 e 2008, período em que passámos do 40.º para o 43.º lugar, o universo, em 2007, era de 131 países e, em 2008, passou a ser de 134 países; entraram 3 países. Ora, o Sr. Deputado deu de barato tudo isto.
O Sr. Deputado faz uma afirmação que, de facto, não corresponde aos números e à evolução e vem acusar-me de andar a deturpar e de fazer indevidas comparações de números. Sr. Deputado, estamos conversados quanto a isso!
Protestos do Deputado do PSD Duarte Pacheco.
E não agrave mais a situação, porque acho lamentável esse comportamento do PSD e a falta de respeito, diria até de seriedade, com que enfrenta este debate.
Mas mais: devo dizer também que, dado o tipo de questões que levanta, acho que o PSD não apresentou aqui argumento algum de peso que, de facto, seja uma crítica séria à proposta de Orçamento que apresentamos. Pelo contrário, não criticou e manteve-se silencioso.
Depois de, esta manhã, eu próprio ter perguntado ao PSD o que acha das propostas do Governo, mantevese silencioso quanto a esta matéria. Durante a tarde, não veio criticar as medidas de apoio às famílias e às empresas que o Governo avança nesta proposta de lei de Orçamento, veio, sim, com novas propostas que, Sr. Deputado, não são só de diferimento da receita são de perda de receita, por exemplo, do pagamento especial por conta, e são de agravamento de despesa.
De facto, o PSD veio revelar que não está preocupado com o défice das contas públicas. Acho que, quanto a isso, os portugueses ficam esclarecidos pelo debate que travámos durante o dia de hoje.
Quanto à questão dos fundos de investimento, o Sr. Deputado Honório Novo continua a repisar a ideia de que isto é só para benefício dos bancos e de que tudo é feito para apoiar, valer e dar benesses a essa «classe hedionda» dos banqueiros. Não, Sr. Deputado! Há aqui um mecanismo e um instrumento que se quer implementar na nossa economia e que é muito importante para apoiar as famílias que estejam em dificuldade no domínio da habitação, para lhes assegurar o acesso à habitação e até proteger o seu património habitacional.
Em relação a quem pode ter a iniciativa de constituição destes fundos, a lei é clara. O Sr. Deputado poderá não se ter apercebido disso, mas hoje de manhã, ou no início da tarde (já não sei, o dia já vai longo e o Sr. Deputado desculpar-me-á se houver alguma imprecisão da minha parte), referi que a iniciativa de constituição destes fundos é aberta a privados e a entidades no domínio público. Portanto, não há nada que impeça que possam surgir, usando a sua terminologia, na «periferia» da Administração Pública.
No que diz respeito ao IMI, penso que há uma diferença entre uma eliminação do IMI generalizado, para valer às famílias, ou o não haver pagamento de IMI em situações identificadas e limitadas, que é o caso daquelas pessoas que estão directamente afectadas pela situação.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas é nessas situações que estou a falar!
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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas os universos são muito diferentes e os impactos em termos de receita são também muito diferentes! Sr. Deputado, no que se refere à questão do IRC da banca, a taxa efectiva do IRC pago pelos bancos aumentou de 16% para 20%, designadamente para os 19 maiores bancos do nosso sistema financeiro.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Gostava de ver as contas.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quer que lhe mostre as contas? Mostrarei as contas ao Sr. Deputado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Quero, quero!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Secretário de Estado, registe por favor esta solicitação!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Há ano e meio que andamos a pedir isso!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não tenho qualquer problema em dar-lhe a indicação da taxa efectiva de IRC que tem vindo a ser tributada na banca, Sr. Deputado.
Quanto à questão da criação de emprego, penso que nenhum governo assume um compromisso de criar 150 000 novos empregos. O Sr. Honório Novo (PCP): — Ah não?!... Então, quem foi?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não é uma coisa que dependa da política do Governo. A criação dos 150 000 empregos depende do facto de a economia, no seu conjunto, promover uma dinâmica para criar emprego.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Já se percebeu que mais essa promessa foi para o caixote do lixo!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Uma coisa é o objectivo de política do Governo; outra coisa é apontar para uma dinâmica da economia e apostar num projecto de política que venha a traduzir-se na criação de 150 000 novos empregos. São coisas diferentes, Sr. Deputado e o Sr. Deputado sabe que assim é. E, em boa verdade, repito: já foram criados 133 000 novos empregos até agora e, mais, trata-se de criação líquida de emprego, por isso são mais empregos.
Sr. Deputado Francisco Louçã, quer em relação ao offshore da Madeira quer no que diz respeito aos fundos imobiliários já estamos numa espiral de saca-rolhas»
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Mas a rolha há-de sair!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não saímos do sítio, andamos à volta do assunto.
Sejamos claros: quanto aos fundos imobiliários, com certeza – repito – que o interesse patrimonial será acautelado, até porque temos um quadro legal que rege os sistemas de avaliação de imóveis para os fundos de investimento imobiliário.
Como referi, a questão do exercício do direito de recompra será devidamente regulamentada, sendo que também assumi o compromisso, se isso se vier a revelar necessário, de o Governo intervir para acautelar esses interesses.
Penso que é fundamental que isto seja dito com toda a clareza, porque este é um instrumento muito importante para muitas famílias. Penso que criar fantasmas ou temores»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não é fantasmas; é ilusões!
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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » ou querer assustar as pessoas em torno disto não se justifica, ainda por cima na base de preconceitos ideológicos que nos põem de pé atrás sempre que há uma intervenção de um banco. Aliás, se assim fosse, não sei por que é que as pessoas vão ao banco pedir dinheiro emprestado para comprar casa» Porque se ç gente da pior espécie, como os senhores querem insinuar, penso que os senhores atç deviam apelar ás pessoas para não o fazerem. Bom, só vos falta fazerem isso»! Quanto ao offshore da Madeira, penso que também estamos conversados. Julgo que fui muito claro quanto a esta matéria e não tomarei uma iniciativa unilateral e isolada de acabar com o offshore da Madeira. Não tomarei essa medida! O offshore da Madeira existe e continuará a existir enquanto houver offshores. Quando houver uma iniciativa global para acabar com o offshore da Madeira, então, nessa altura, acabaremos com o offshore da Madeira!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Por que é que não faz a proposta?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Foram ainda levantadas questões relativamente ao planeamento fiscal e ao IRC da banca, pelo que peço ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que complemente as respostas que dei.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Relativamente à questão do regime simplificado e do planeamento fiscal agressivo, quero dizer que a luta contra o planeamento fiscal agressivo é uma prioridade do Governo. Aliás, relembro que foi o Governo que criou o enquadramento legal desta matéria, foi o Governo que aprovou a portaria, regulamentou a legislação relativa ao planeamento fiscal agressivo e foi um despacho meu que clarificou as regras que se encontram em vigor e, neste momento, temos um funcionamento normal das comunicações nesta matéria. Ou seja, a luta contra o planeamento fiscal agressivo é um imperativo de um Estado democrático, de um sistema fiscal justo e, obviamente, que é nossa prioridade.
No que diz respeito à questão do regime simplificado, relembro que este regime não é um fim em si mesmo. Este regime foi criado para propiciar uma redução dos custos das empresas com o cumprimento das suas obrigações.
O Sr. Honório Novo (PCP): — E agora vai agravar-se!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Devo recordar o Sr. Deputado que o regime simplificado fiscal tinha como elemento essencial de relação os critérios técnico-científicos de determinação indirecta da matéria colectável.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Há 10 anos!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Era essa a relação.
É que, sem os critérios técnico-científicos da determinação indirecta da matéria colectável, o regime simplificado fiscal não é mais do que um desconto fiscal para aqueles que têm acesso à sua criação.
Portanto, relativamente a esta questão, nós evoluímos, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Está muito preocupado com o regime simplificado fiscal»!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O que é que verificámos? Verificámos que as empresas que eram constituídas no regime simplificado fiscal eram cada vez menos – eram 27 000 e, neste momento, são menos de 19 000, ou seja há um número decrescente de empresas constituídas ao abrigo do regime simplificado fiscal.
Depois, verificámos, ainda, que não havia nada de simplificado. As empresas tinham de manter as suas obrigações a nível contabilístico, a nível do próprio IVA, por isso o regime simplificado fiscal não era nada simplificado.
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Também verificámos que, das novas empresas que foram sendo criadas, muitas eram-no por uma operação em especial e não por uma continuidade da sua própria opção. Por isso, sim, Sr. Deputado, efectivamente, o volume de negócios é reduzido, mas há um outro aspecto, que não é contemplado pelo regime simplificado fiscal, que são as variações patrimoniais positivas e que podem ser bastante perigosas no sentido de um controlo contra o planeamento fiscal agressivo e é por essa razão que agora há uma nova situação.
Primeiro, a máquina de administração fiscal consegue hoje, de forma muito mais rápida e acutilante, descobrir o rendimento real dos sujeitos. Nessa perspectiva temos uma evolução face a 2001, altura em que foi criado o regime simplificado fiscal. Ou seja, privilegiamos o rendimento real face ao rendimento normal e, nesta perspectiva, a partir do momento em que temos a possibilidade de atingir o rendimento real, preferimos esse rendimento real.
Segundo, temos, efectivamente, à nossa disposição um regime simplificado, que é o regime simplificado contabilístico, que esteve em discussão pública durante três meses, de Maio a Julho de 2008.
De facto, trata-se de uma reforma muito importante ao nível do nosso tecido, que esteve em discussão pública, sendo que o Ministério das Finanças se encontra a analisar os resultados dessa discussão. Portanto, temos aqui uma alteração estrutural. É por esta razão que o Governo propôs a suspensão da inscrição das novas instituições no regime simplificado fiscal. Só por causa disso, porque há uma mudança estrutural.
No entanto, registo que o Sr. Deputado faz uma distinção entre o planeamento fiscal agressivo dos grandes e dos pequenos, tolerando o planeamento fiscal dos pequenos, quando, na prática, muitas vezes esses se encontram disfarçados de grandes.
Noto também que o Sr. Deputado prefere o sistema de tributação do rendimento normal, tal como o da reforma fiscal de 1958, do Prof. Teixeira Ribeiro, em desprimor do rendimento real.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, chegamos, assim, ao final da nossa reunião.
Em nome da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, resta-me agradecer ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado o contributo que deram para o esclarecimento destas questões.
É o início do debate do Orçamento do Estado, pelo que vamos ter seguramente outras reuniões para aprofundar este tema.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 18 horas e 35 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.