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Quinta-feira, 13 de Novembro de 2008 II Série-OE — Número 5

X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 12 de Novembro de 2008

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 9 horas e 55 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009, tendo o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago) apresentado à Comissão o orçamento respeitante à sua área.
Usaram da palavra, para além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Helena Lopes da Costa (PSD), Luiz Fagundes Duarte e Manuel Mota (PS), José Paulo Carvalho (CDSPP), João Oliveira e Miguel Tiago (PCP), Cecília Honório (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Luísa Mesquita (N insc.), Sérgio Vieira (PSD), Bravo Nico (PS) e Eugénio Rosa (PCP).
Sobre o orçamento do Ministério da Educação, pronunciaram-se, além da Sr.ª Ministra (Maria de Lurdes Rodrigues) e dos Srs. Secretários de Estado da Educação (Valter Lemos) e Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira), os Srs. Deputados Emídio Guerreiro (PSD), Luiz Fagundes Duarte e Fernanda Asseiceira (PS), José Paulo Carvalho (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Cecília Honório (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Luísa Mesquita (N insc.), Manuela Melo (PS) e Miguel Tiago e Eugénio Rosa (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 19 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.

Eram 9 horas e 55 minutos.

Agradeço a presença do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Sr. Secretário de Estado e, ainda, a dos Srs. Presidentes das Comissões de Educação e Ciência e de Ética, Sociedade e Cultura.
O debate de hoje de manhã centra-se no orçamento relativo ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Recordo, em traços muito gerais, que, na Comissão de Orçamento e Finanças, foi entregue o relatório da Comissão de Educação e Ciência sobre as matérias que estão sob a égide do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Basicamente, poderemos dizer que a prioridade estratégica do Governo, para esta área, é o desenvolvimento científico e tecnológico nacional e o reforço dos níveis de formação avançada em Portugal.
Na área de Ciência e Tecnologia, é de sublinhar que, já no Orçamento do Estado para 2008, a dotação para Ciência e Tecnologia atingiu, pela primeira vez em Portugal, 1% do PIB, representando, então, 3,6% do total do Orçamento do Estado.
No que concerne à sociedade da informação, também respaldado no orçamento, está plasmado um objectivo de massificação da utilização de Internet de banda larga e a promoção de uma sociedade de informação inclusiva.
Ainda no que concerne ao ensino superior, a matéria central reporta-se, naturalmente, à conclusão da adaptação do sistema de graus e diplomas do ensino superior ao Processo de Bolonha, com vista a garantir a qualificação dos investimentos dos portugueses no espaço europeu, sendo o objectivo estimular a mobilidade internacional e alunos e de docentes.
Como também é do conhecimento dos Srs. Deputados, o Orçamento do Estado contempla uma alteração ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, concretamente ao artigo 82.º, que prevê um incentivo fiscal à aquisição de computadores para estudantes, inserindo-se no objectivo da massificação do acesso às novas tecnologias, e tem a particularidade de se traduzir em benefícios fiscais, em sede de IRS, para os estudantes que, num período temporal pré-delimitado — 2009 a 2011 —, adquiram um computador nas condições que estão previstas no artigo 68.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Ainda relativamente ao orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, importa ter em consideração, no que ao debate orçamental se reporta, os quadros apresentados, quer em termos de orçamento de funcionamento quer em termos de orçamento de investimento, quer, ainda, no que concerne à repartição do orçamento para 2009 por áreas e fontes de financiamento, com a comparação relativamente ao ano 2008.
Naturalmente, abstenho-me de fazer uma abordagem detalhada de cada uma destas matérias, mas recordo que, de uma forma geral, há um reforço das verbas em matéria de orçamento de funcionamento das áreas de Ciência e Tecnologia, Sociedade de Informação e Ensino Superior.
Feita esta apresentação perfunctória dos traços gerais do orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, é chegado o momento de dar a palavra ao Sr. Ministro que fará uma intervenção inicial de 10 a 15 minutos, como é norma nesta Comissão, apresentando as linhas de força do seu Ministério para 2009.
Seguir-se-á uma primeira ronda de perguntas – cada grupo parlamentar disporá de 10 minutos, começando pelo maior partido da oposição –, a que o Sr. Ministro responderá em bloco, seguindo-se uma segunda e última ronda de perguntas – 5 minutos a cada grupo parlamentar –, a que, uma vez mais, o Sr. Ministro responderá em bloco.
Quanto à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, habitualmente designada por Deputada não inscrita, pese embora seja uma designação que me suscita algum reparo mas é a designação corrente, naturalmente, terá direito a «igualdade de armas» relativamente aos demais grupos parlamentares, pelo que também disporá de 10 minutos na primeira ronda e 5 minutos na segunda.
Aqui chegados, Sr. Ministro, seja bem-vindo. Tem V. Ex.ª a palavra.

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Sr. Presidente, Srs.
Presidentes das Comissões aqui representadas, Sr.as e Srs. Deputados: Muito obrigado pela informalidade de trabalho com que o Sr. Presidente procura conduzir esta reunião.
Vou fazer uma intervenção, que trago escrita e que vou utilizar parcialmente, cujo texto ficará à disposição das Sr.as e dos Srs. Deputados e a qual sintetiza muito do que gostaria de dizer.
Como podem ver no orçamento, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior dará continuidade, em 2009, e reforçará uma das estratégias prioritárias do Governo nesta Legislatura: o desenvolvimento científico e tecnológico nacional e o reforço dos níveis de formação avançada.
No que diz respeito a Ciência e Tecnologia, as medidas a adoptar, em 2009, têm por objectivo, naturalmente, alcançar os compromissos assumidos e concretizar as metas definidas — se é preciso utilizar metas quantitativas — que são as que constam do Programa do Governo e que recordo: atingir 5,5 investigadores (ETI) por 1000 activos até 2010 – relembro que, em 2005, em Portugal, esse rácio era de 3,8; reforçar o investimento público em investigação científica e triplicar o investimento privado em I&D (investigação e Desenvolvimento) que, quando esta meta foi definida, estava reportado aos últimos dados publicados, de 2003, quando era de 0,24% do PIB.
Como o Sr. Presidente já referiu do relatório da Comissão, no Orçamento para 2008, o orçamento de Ciência e Tecnologia do Estado atingia, pela primeira vez na história portuguesa, 1% do PIB e representava 3,3% do total do Orçamento do Estado. Pois, nesta proposta de lei de Orçamento do Estado para 2009, reforça-se essa determinação.
Tenho o gosto de informar as Comissões que o orçamento, para 2009, de Ciência e Tecnologia que é remetido, em paralelo, formalmente, à Assembleia da República, e que foi apurado ontem, reporta um novo crescimento, atingindo-se pois, no próximo ano, um financiamento de 1,07% do PIB e de 3,4% do Orçamento do Estado. Em nossa opinião, este é um sinal claríssimo da concretização, para mais nas difíceis condições orçamentais de todos conhecidas, da prioridade do Governo ao desenvolvimento científico português.
Recordo que o orçamento de Ciência e Tecnologia é um instrumento definido no âmbito do Eurostat e engloba a totalidade das verbas para ciência e tecnologia em toda a Administração, não apenas no nosso Ministério.
Neste contexto, gostaria de salientar, para 2009: o reforço da contratação de novos doutorados para o sistema científico e tecnológico nacional. Serão, pelo menos, mais 500, entre o final deste ano e 2009, no sentido de se garantir o preenchimento competitivo de, pelo menos, 1000 novos lugares de investigação até ao final da Legislatura. Neste momento, todos os concursos estão lançados, e são-no pelas próprias instituições de investigação, segundo metodologias comuns; a atribuição de bolsas de integração na investigação, em centros de I&D reconhecidos, a estudantes dos anos iniciais do ensino superior. Esse processo também já está iniciado e lançado, mas o orçamento responde à sua concretização. Naturalmente, não ficámos à espera disso, senão, só daqui a um ano seria possível os alunos entrarem; a criação e financiamento de redes temáticas de Ciência e Tecnologia e de consórcios de I&D (incluindo, pela primeira vez, mecanismos de apoio à formação de escolas de pós-graduação em rede, portanto, envolvendo várias universidades em Portugal); o desenvolvimento de um novo programa mobilizador dos laboratórios de Estado, incluindo a criação dos consórcios com outras instituições de I&D previstos no processo de reforma; a entrada em funcionamento de novos laboratórios associados e o reforço das condições de funcionamento dos actuais laboratórios associados, hoje uma rede fundamental do nosso tecido científico; o desenvolvimento do programa de cátedras convidadas de investigação e para a atracção de grupos de I&D; a construção do Laboratório Internacional de Nanotecnologia (ITL) em Braga, já iniciada, assim como o seu equipamento e o estabelecimento de parcerias internacionais com vista à atracção e recrutamento de investigadores à escala mundial. Como vêem, este é um item muito importante do Orçamento do Estado para 2009.
Sublinha-se ainda, nesta área da ciência, a expansão da intervenção da Agência Ciência Viva para a promoção da cultura científica e tecnológica – aliás, devo referir ainda que, há poucos meses, iniciámos a presidência portuguesa da iniciativa Eureka, durante o 2.º semestre, à qual convidámos o Parlamento a associar-se através da organização da Conferência Interparlamentar Eureka que decorrerá em Portugal, no próximo ano; a revisão das modalidades de aplicação da lei do mecenato científico em estudo neste momento; e o reforço do Programa de Parcerias para o Futuro.

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Perante isto, ter-se-á um esboço da intensidade do esforço político e organizativo que procuramos dedicar ao desenvolvimento científico e tecnológico e da sua aceleração e reforço em 2009.
No que diz respeito à sociedade da informação, gostaria de fazer duas breves referências, não falando de nenhuns indicadores de progresso, porque são bem conhecidos e são referidos nos relatórios.
Primeiro, os programas orçamentais de investimento na área da sociedade da informação, designadamente o programa orçamental Sociedade da Informação e Governo Electrónico e o programa orçamental de Modernização e Qualificação da Administração Pública, mostram conjuntamente um crescimento de 23% face ao ano anterior ou de 22%, se apenas considerarmos o primeiro destes programas, assim como um envolvimento alargado de todos os sectores do Estado.
O programa orçamental Sociedade da Informação atinge 266 milhões de euros nesta proposta de Orçamento do Estado para 2009, de que uma parte importante está inscrita no orçamento do nosso Ministério mas está dividido por todos os outros Ministérios, face a 219 milhões de euros no ano anterior.
O investimento público em Sociedade da Informação é, contudo, ainda maior, já que importantes investimentos são contabilizados em outros programas específicos.
A segunda referência que gostaria de fazer nesta área diz respeito à reposição e ao reforço, para o próximo triénio, de uma importante medida de apoio fiscal à aquisição, pelas famílias, de computadores e outro material informático. Tivemos ocasião, há três anos, de discutir aqui a medida que, na altura, durava há três anos.
Essa medida é prolongada para os próximos três anos mas, enquanto, até agora, só podia ser utilizada uma vez por triénio, qualquer que fosse o número de membros do agregado familiar a estudar, neste momento é reforçada e pode ser utilizada tantas vezes quantas o número de elementos do agregado familiar inscritos em estabelecimento de ensino, assim beneficiando, naturalmente, as famílias mais numerosas e as que têm mais elementos a estudar, quer sejam jovens quer menos jovens.
Por último, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no que diz respeito ao ensino superior, em concretização da reforma do mesmo será integralmente concluída, em 2009, a adaptação do sistema de graus e diplomas de ensino superior ao Processo de Bolonha, com vista a garantir a qualificação dos portugueses no espaço europeu.
Em nosso entender, esta reforma abre o ensino superior à sociedade e a outros grupos sociais, à mobilidade e ao reconhecimento internacionais, ao reconhecimento de formações diversificadas e, ainda, à diversidade curricular.
O crescimento dos índices de sucesso escolar (tendo Portugal atingido valores médios no espaço dos países da OCDE, nesta matéria, o que não significa que não tenha de crescer), o esforço continuado de investigação e de intervenção correctiva sobre os factores de insucesso, a par da ampliação de novas formas de ingresso e frequência do ensino superior em Portugal, são alguns dos factores mais importantes para a concretização do Processo de Bolonha, em Portugal.
Passo às questões que têm mais impacto do ponto de vista orçamental.
Será promovida a criação de consórcios de instituições politécnicas de âmbito regional, reorganizando a sua oferta formativa, na sequência do diálogo já estabelecido com o CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos), e será estimulada a associação de instituições universitárias, designadamente com a participação de instituições científicas.
Serão desenvolvidos e apoiados os processos de internacionalização, que são bem conhecidos de todos, que não apenas reforcem as capacidades nacionais de ensino e investigação e a sua afirmação em redes internacionais mas, igualmente, induzam internamente formas avançadas de associação, que antes não existiam, entre as próprias instituições portuguesas.
Será apoiada a transição para o novo regime fundacional das instituições públicas de ensino superior que o tenham solicitado e que demonstrem dispor de capacidades para assumir níveis de autonomia mais elevados.
Será reforçada a qualidade, através da acção, que esperamos que esteja em pleno, da Agência de Avaliação e Acreditação, no próximo ano.
Será reforçado o sistema de empréstimos aos estudantes do ensino superior com garantia mútua, que hoje já beneficia 3 600 estudantes. Será reforçado o sistema de observação da procura de emprego de licenciados e de diplomados do ensino superior em Portugal, lançado em Setembro de 2007, através da análise dos cursos e instituições e dos inscritos em centros de emprego e estimulando o cumprimento da obrigação de as

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instituições de ensino superior, recordo, recolherem e publicarem informação sobre o emprego dos seus recém-diplomados.
Serão reforçadas as condições de ingresso e frequência do ensino superior – aliás, já tinha dado esta informação ao Parlamento há alguns meses.
Está em curso a revisão do estatuto do estudante-trabalhador, após a criação, que já foi concretizada, do regime do estudante a tempo parcial e do acesso à frequência de disciplinas avulsas.
Proceder-se-á, em 2009, à revisão dos regimes especiais de acesso, à revisão do regulamento de bolsas de acção social, após a extensão das bolsas de mérito ao ensino privado, a qual já está concretizada.
Será generalizada a atribuição do complemento de bolsa de acção social para estudantes Erasmus, já hoje a ser praticada, mas não de uma forma generalizada.
Na sequência da reforma já efectuada das condições de estágios profissionais, será revisto o sistema de estágios curriculares.
A oferta de Cursos de Especialização Tecnológica será ampliada, na sequência da enorme expansão verificada este ano e da procura crescente deste tipo de cursos de formação pós-secundária em estabelecimentos de ensino superior, designadamente nos institutos politécnicos.
Esteve em preparação durante todo este ano e será lançado no próximo ano o programa de novas residências universitárias e de cidades Erasmus em articulação com câmaras municipais.
No próximo ano, entrará em funcionamento o Conselho Coordenador do Ensino Superior como órgão de consulta do Governo em matéria de política do ensino superior, que contará com especialistas não apenas nacionais, mas também estrangeiros.
Serão revistos e actualizados os regimes legais das carreiras docentes e de investigação, muito especialmente do ensino superior à distância, e do ensino superior artístico, sendo que este trabalho estará concluído no próximo ano.
Foi regulada a atribuição dos graus de especialistas a conceder por institutos politécnicos, nos termos da lei.
A proposta do Orçamento do Estado para 2009 acresce 90 milhões de euros às dotações públicas para o ensino superior, para além do aumento das verbas destinadas a infra-estruturas, cujo programa de investimento é também fortemente acelerado. Trata-se de uma aposta no ensino superior e nas suas capacidades de reforma e modernização. Portanto, é um aumento de 90 milhões de euros de funcionamento, a que acrescem os aumentos no que diz respeito às infra-estruturas do ensino superior.
Ontem mesmo foi lançado o edital do novo programa de apoio à formação avançada de docentes do ensino superior politécnico, componente do financiamento competitivo introduzido, pela primeira vez, no orçamento do ensino superior. Aponta-se já no primeiro ano para 500 docentes em formação avançada ao nível do doutoramento, neste grau de ensino.
O programa legislativo e programático da reforma a que nos comprometemos, inscrito no Programa do Governo, está, portanto, hoje, largamente cumprido, acentuando-se, em 2009, as responsabilidades das próprias instituições, da comunidade académica e da sociedade no desenvolvimento e consolidação da reforma, para a qual as iniciativas propostas procuram contribuir.
É esta a minha intervenção inicial.
Fico naturalmente à disposição de todos para as perguntas que me queiram colocar.

O Sr. Presidente: — Vamos, então, iniciar a primeira ronda de perguntas, começando pelo PSD.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, ouvi a intervenção do Sr. Ministro, que falou muito em reforço, em crescimento, em reposição, em expansão, em concretização, em sucesso escolar e vou, exactamente, começar por pegar nos índices de sucesso escolar.
Quando o Sr. Ministro fala de rigor nada diz, por exemplo, sobre o parecer recentemente aprovado pelo Conselho Nacional de Educação, que aponta para a falta de estudos sobre o rigor dos critérios utilizados pelas instituições de ensino superior no processo de acesso dos alunos com mais de 23 anos, sendo que a entrada

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dos chamados alunos não tradicionais aumentou 20 vezes, Sr. Ministro, depois da alteração da proposta feita pelo Sr. Ministro relativamente ao regime de ingresso e acesso no ensino superior destes alunos.
Portanto, o novo quadro veio passar para as instituições de ensino superior a responsabilidade por todo o processo de admissão dos respectivos alunos.
De facto, dois anos depois de ter entrado em vigor, o Conselho Nacional de Educação alerta para o facto de ser necessário aferir sobre o rigor dos critérios de admissão e o nível de sucesso ou insucesso dos alunos acima dos 23 anos.
Como o Sr. Ministro sabe, este regime possibilita o acesso ao ensino superior de adultos que não têm o 12.º ano de escolaridade.
O resultado foi que, no ano lectivo de 2004 e 2005, entraram apenas 551 alunos com mais de 23 anos e, neste momento, em 2007/2008, entraram 11 773 alunos, segundo revela o relatório. Bom, penso que é um bom número para as estatísticas que o Governo tanto gosta de utilizar, mas, para mim é preocupante um aumento destes, principalmente quando se está a verificar mais a nível de instituições privadas, sendo de 87% a nível do ensino privado.
Sr. Ministro, a recuperação orçamental, que tanto foi falada para 2009, afinal não existe. A percentagem do PIB afecta ao ensino superior baixou 14% desde o início da actual legislatura, e não sou eu que o digo, é o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), é o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, é toda a gente, vem nos jornais, são os anteriores reitores, são todos. Neste momento isto é reconhecido por todos nós.
Não sei se o Sr. Ministro tem de memória, mas penso que esteve presente numa reunião, a 22 de Julho, com o Sr. Primeiro-Ministro, com o CRUP, em que o Sr. Primeiro-Ministro, sabendo das dificuldades que as instituições de ensino superior estavam a enfrentar, se comprometeu a criar um fundo de tesouraria em que todas as instituições teriam uma verba para pagamento das transferências para a Caixa Geral de Aposentações e para os aumentos salariais.
Como o Sr. Ministro sabe, no Orçamento do Estado para 2008, o desconto das instituições para a Caixa Geral de Aposentações aumentou de 7,5% para 11%, o que veio agravar a débil situação financeira em que a maioria destas instituições se encontrava.
Sr. Ministro, como sabe, 13,4% das despesas são com pessoal e por isso as instituições têm de recorrer a receitas próprias, porque o financiamento transferido pelo Ministério não chega para fazer face a estas despesas de funcionamento e, portanto, 13,4% dependem de receitas próprias das universidades.
Como o Sr. Ministro também muito bem sabe, há sete instituições que vão beneficiar de contratos de saneamento financeiro: a Universidade do Algarve, a de Évora, a dos Açores, a de Trás-os-Montes e os politécnicos de Bragança, Portalegre e Viana do Castelo.
Das 14 universidades, apenas três — Aveiro, Porto e ISCTE — decidiram avançar para o novo modelo fundacional que o Sr. Ministro tanto defende. Embora reconhecendo a pouca clareza a lei, resolveram aderir, principalmente a Universidade do Porto que teve muitas dúvidas relativamente a esta adesão, mas dos 15 politécnicos nenhum quer avançar já.
Sr. Ministro, pergunto em que fase se encontra o processo de transição destas três universidades. O plano para a transição destas universidades não deveria estar definido até Junho? Contudo, nada se sabe sobre a evolução do processo de transição e sobre as condições que vão presidir à mudança institucional destas instituições.
Outra questão no âmbito do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES), e que preocupa as instituições de ensino superior, é a falta de clarificação do Governo no que concerne à reorganização da rede do ensino superior, concretamente a não existência de regulamentação para a formação de consórcios.
O Sr. Ministro falou na possibilidade de formação de consórcios entre politécnicos. Posso depreender das suas palavras que se mantém a sua oposição à constituição de consórcios entre universidades e politécnicos.
Relativamente aos politécnicos, a situação também é gravíssima: entre 2005 e 2008, os institutos politécnicos sofreram uma redução efectiva do seu orçamento, de 18,9%. Em resultado de quê? O orçamento de receitas reduziu neste período em termos nominais, e o orçamento de despesas cresceu sem que tenha havido contrapartida do lado das receitas, nomeadamente através dos descontos para a Caixa Geral de Aposentações, que foi de 11%, dos aumentos de vencimentos e de outros encargos que até então não eram suportados pelos politécnicos.

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Sr. Ministro, em 2009, haverá ainda um impacto do descongelamento das carreiras docentes, que, em relação aos institutos politécnicos, representa cerca de 7,5 milhões de euros de encargos adicionais.
Portanto, a dotação final do Orçamento do Estado para os politécnicos é de 1,17 milhões de euros, a estimativa de despesas com pessoal é de 1 228 286 € e a taxa de cobertura das despesas com pessoal ç de 82,7%.
Portanto, as propostas entre 2005 e 2008 subiram 63% para compensar o desinvestimento do Estado.
A verba de 90 milhões, que o Sr. Ministro tanto refere, é o reforço que o Governo tem disponível no Orçamento do Estado para 2009 para as despesas de funcionamento das instituições de ensino superior, sendo que 10 milhões são para a acção social escolar, 36 milhões para a dotação de funcionamento e 20 milhões estão reservados para acudir a dificuldades financeiras das instituições.
Depois, temos os tais 24 milhões de euros destinados a um fundo específico de desenvolvimento do ensino superior, que é o tal orçamento competitivo, que irão ser distribuídos de forma competitiva mediante os projectos apresentados pelas instituições.
Sr. Ministro, diga-me quem são os verdadeiros destinatários deste fundo. Que critérios vão presidir às candidaturas? Quais os critérios de distribuição? Será que vão apenas beneficiar o ISCTE, Aveiro e a Universidade do Porto, universidades que estão a negociar a passagem a fundações? Sr. Ministro, esta proposta de Orçamento não chega para acautelar as despesas legais no próximo ano! Por que é que o Governo alterou novamente a fórmula de financiamento, retirando da fórmula os critérios de qualidade, penalizando, assim, as instituições mais qualificadas e agindo deste modo em sentido contrário às tendências internacionais de valorização da qualidade e da excelência? Substituiu-se um modelo de financiamento, que vigorou entre 1994 e 2005 e que era objectivo, matemático e que media tantos os indicadores quantitativos como os qualitativos, que obrigava ao cumprimento do Orçamento, por outro que, para além de falível, cria uma enorme dependência das universidades perante o poder político. E, Sr. Ministro, tanto quanto sei, foi a sexta mudança desta fórmula»! Portanto, considero que é preocupante e que as instituições de ensino superior ficam, neste momento, completamente à mercê do Ministério do Ensino Superior e vão andar de mão estendida para poderem receber algumas verbas que estão cativadas nesta parte do Orçamento.
Portanto, não consigo entender por que é que se mudou toda esta fórmula.
Por outro lado, tanto quanto sei, o Sr. Ministro já reuniu com a Associação Europeia de Universidades, que avaliou 13 instituições em Portugal, e conhece, como conheço, o relatório. Deve ter tido oportunidade»O Sr.
Ministro não teve acesso ao relatório?

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Peço desculpa, não há um relatório, há relatórios.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Então, há relatórios.
Bom, eu tive acesso a um deles, onde se refere que temos um sistema de governação muito complexo que limita a autonomia das instituições – aliás, esse é um dos pontos mais frágeis apontados pela instituição.
A falta de verba foi outro dos problemas detectados e nos politécnicos foi detectada a falta de planos estratégicos plurianuais, para além do subfinanciamento. Apesar desta avaliação internacional, não existe qualquer entidade portuguesa responsável pela avaliação dos cursos e das instituições.
A Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior ainda não começou a funcionar, Sr. Ministro.
Foram apenas nomeados os membros do Conselho de Curadores, presidido por Gomes Canotilho, e continua por designar o Conselho de Administração para que a nova estrutura comece a funcionar.
Este compasso de espera, Sr. Ministro, criou um vazio legal na avaliação do ensino superior. A estrutura que avaliava as instituições, o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior, foi extinta há mais de dois anos. Portanto, temos aqui um vazio enorme.
Para já, fico por aqui.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Partido Socialista pela voz dos Srs. Deputados Luís Fagundes Duarte e Manuel Mota.

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O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Como foi dito, a intervenção do Partido Socialista nesta primeira ronda vai ser dividida entre mim e o meu colega Manuel Mota.
O Orçamento do Estado constitui um instrumento fundamental para a execução em cada ano civil das opções políticas definidas no Programa do Governo – isto é básico, mas convém lembrar sempre que é assim –, por isso a sua discussão não deve ser feita sem ter presentes tais opções, o que, neste caso, obriga a que se estabeleça uma correlação entre a proposta de Orçamento e as medidas previstas no Programa do Governo para a área da ciência, tecnologia e ensino superior.
A intervenção que o Sr. Ministro acaba de fazer vem confirmar este entendimento e a intervenção que o PSD acaba de fazer vem confirmar que, de facto, está completamente «a leste» destas questões.
A educação, no seu sentido lato, envolve também o ensino superior e este, visto na sua vertente tanto pedagógica como de principal agente activo da investigação científica no nosso País, ocupa um lugar cimeiro no Programa do Governo, abrindo até o capítulo «Novas Políticas Sociais».
Neste Programa, destacarei, como vectores determinantes da política para o sector educativo e científico, na presente Legislatura, e para além daquilo que já foi dito pelo Sr. Ministro, a criação de um sistema nacional de garantia de qualidade e a promoção da igualdade de oportunidades no acesso ao ensino superior, como foi referido, salientando a modernização da rede das nossas instituições de ensino superior.
O facto de a proposta de Orçamento para 2009 o considerar um orçamento de rigor, que conjuga a responsabilidade financeira com a responsabilidade social, parece claramente representado nos quadros que a acompanham e que são do conhecimento de todos.
Tal como sempre foi afirmado e respeitado nos sucessivos orçamentos apresentados pelo XVII Governo Constitucional, os problemas da educação e da investigação científica em Portugal, lato sensu, nunca foram de carácter financeiro. Havendo vontade e capacidade de actuação por parte do Governo, como é o caso, não será por falta de dinheiro que as políticas educativas e de investigação científica, a que se vinculou programaticamente, deixarão de ser concretizadas.
Isso constata-se claramente na presente proposta de Orçamento: áreas como o ensino superior e a investigação científica terão, em 2009, aumentos consideráveis, numa variação relativa justificada pelas circunstâncias, com vista a ultrapassar factores impeditivos de um desenvolvimento harmónico do todo nacional, como sejam os factores geográficos, demográficos ou de cariz social, enfim, tudo aquilo a que o PSD acaba de chamar «estatísticas».
Deverão ser realçados os aumentos significativos na área do ensino superior, como sejam o reforço do investimento na investigação científica e, na globalidade, os aumentos dos orçamentos de funcionamento na ordem dos 12,4% para a ciência, tecnologia e sociedade de informação, e dos 8,6% para o ensino superior.
Esta preocupação com o ensino superior, envolvendo infra-estruturas, bolsas de estudo, no âmbito da acção social escolar, e o fundo para o desenvolvimento e reforço do ensino superior, torna-se particularmente evidente com o aumento do orçamento de investimento na ordem dos 113,4%, passando-se de 63 milhões de euros para 135 milhões de euros.
O reforço das verbas do PIDDAC também é significativo – na ordem dos 11,5% para a ciência, tecnologia e ensino superior – e deve ser enquadrado nas preocupações políticas do Governo, no sentido de melhorar as infra-estruturas educativas, no âmbito da melhoria geral da qualidade da educação para todos.
Comparando o quadro das opções orçamentais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior com a estimativa de execução do ano em curso, que é de 2501 milhões de euros, constata-se um aumento de 7,8% na despesa total consolidada proposta para o ano de 2009. Com efeito, para o ano de 2009, a proposta de orçamento prevê um montante de cerca de 2700 milhões de euros de despesa consolidada, que representará 1,6% do PIB e 3,4% das despesas da administração central.
Sr.ª Deputada do PSD, permita dizer-lhe que se isto são estatísticas, então, ainda bem que as estatísticas existem.
A informação relativa à despesa consolidada prevista para os fundos e serviços autónomos do Ministério apresenta um montante global de 2500 milhões de euros, o que representa um aumento da ordem dos 8,8% à estimativa de execução de 2008, que é de 2500 milhões de euros.
Visto no seu conjunto, e em particular para a área de competência da Comissão de Educação e Ciência, o Orçamento do Estado para 2009, tal como é proposto pelo Governo, é, na opinião do Grupo Parlamentar do

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Partido Socialista, mais do que um mero instrumento financeiro é um documento político (e assumimo-lo como tal) que consubstancia um conjunto de medidas que, estando previstas no Programa do Governo, encontram agora oportunidade de ser concretizadas, e estão a sê-lo.
Para o PSD, como se viu, isto são – e gostaria que se salientasse isto – estatísticas; para nós, isto é governar.
Mas talvez fosse bom — e é o desafio que deixo aqui ao Sr. Ministro e compreendo que é um desafio difícil — explicar ao PSD, que anda completamente arredado destas matérias, o que, de facto, determina a política para a ciência e o ensino superior, em Portugal, e como é que estes números, que aqui são dados e constam dos quadros da proposta de Orçamento do Estado, não são estatísticas, mas realidades com capacidade efectiva de serem concretizadas.
Passo agora a palavra ao meu colega, Manuel Mota.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr.
Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr. Secretário de Estado Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: Peço desculpa por fazer um pequeno intróito de 10 segundos, mas não posso deixar de partilhar convosco a minha estupefacção pelo início da intervenção do PSD.
Quando o principal partido da oposição decide colocar como elemento estratégico da sua intervenção aquilo que é reconhecido por todos como uma das grandes vitórias deste Governo e como uma vitória deste País, isso é absolutamente dramático.
Como é que a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa pode questionar o modelo de acesso dos maiores de 23 anos? Só pode fazê-lo não percebendo aquilo que são as políticas.
De facto, em 2004, quando VV. Ex.as deixaram o governo, o modelo de acesso dos maiores de 23 anos não permitia, de facto, o acesso»

Protestos do Deputado do PSD Hermínio Loureiro.

O regime ad hoc, em 2004, não permitia que ninguém, com mais de 23 anos, acedesse ao ensino superior, em relação áquilo que era a perspectiva daqueles que não tinham concluído o 12.ª ano»

Protestos do Deputado do PSD Hermínio Loureiro.

Sr. Deputado Hermínio Loureiro, se quiser falar, esteja à vontade! O que aconteceu foi que houve a percepção da necessidade de adequação desse acesso a um maior número de alunos, Sr.ª Deputada. E muitos daqueles que têm hoje a oportunidade de estar no ensino superior e que permitiram uma mudança radical na realidade do nosso ensino superior estão a ouvir e sabem que eles também são os principais responsáveis por que, em 2005, 2006, 2007 e 2008, tenha havido um aumento do número de alunos no ensino superior, Sr.ª Deputada.
E, sabe, se isso não tivesse acontecido, Sr.ª Deputada, provavelmente algumas das nossas instituições estariam numa situação financeira muito mais preocupante.
A segunda nota que quero deixar é que, em termos orçamentais, hoje, este orçamento responde com clareza àquilo que são os desafios do País. Em primeiro lugar, a uma aposta estratégica neste sector vital da nossa sociedade. O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior cresce, mais uma vez, em termos orçamentais, no caso concreto para 2009, em 8%.
O segundo mito que convém «desconstruir» é o de que é uma aposta só na ciência e não no ensino superior. Se olharmos para este orçamento, percebemos que o crescimento orçamental para o ensino superior é muito superior ao da ciência. De facto, o da ciência e tecnologia é de 5,4% e o do ensino superior é de 12,4%. Não esquecendo também que muitas das verbas colocadas em sede de ciência e tecnologia são depois transportadas para as universidades, como foi ontem referido pelo próprio presidente do CRUP, quando disse que 80% da investigação é feita pelos seus próprios docentes.
A terceira nota que convém «desconstruir» tem a ver com o seguinte: o investimento em ensino superior, em Portugal, está na média da União Europeia e manteve-se estável ao longo destes três anos — é o relatório do CNE que o diz. Portanto, a Sr.ª Deputada fará o favor de ler também o relatório do CNE, onde, na pág. 17,

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encontrará aquilo que é o acompanhamento da evolução do PIB. Portanto, o investimento do PIB é de 1,1% e tem-se mantido mais ou menos constante; aumenta para 1,2%, se incluirmos o PIDDAC; e para 1,4%, se incluirmos também as transferências para as universidades privadas, aliás, na linha daquilo que é feito em toda a Europa.
A quarta nota que convém «desconstruir» tem a ver com o seguinte: ontem, em sede de comissão, tivemos oportunidade de ouvir o presidente do CRUP e o presidente do CCISP. As notas finais dessas duas audições foram estas: em primeiro lugar, o presidente do CCISP disse que não haveria ruptura financeira de nenhuma instituição de ensino politécnico, para 2009, com este orçamento.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Por que é que não haveria? Diga lá!

O Sr. Manuel Mota (PS): — O presidente do CRUP reconheceu que as verbas orçamentadas eram suficientes, que estes 90 milhões de euros dariam resposta às suas necessidades, mas discordou do método.
E nós próprios assumimos que discordamos do método, ou seja, da visão que o CRUP tem em relação ao método. Nós achamos que as instituições que têm mais mérito, as que são mais capazes de se adaptar às realidades do ensino superior, devem ser valorizadas.
E lembrava só — e é uma questão que o Sr. Ministro coloca — aquilo que perpassou ontem pelo nosso debate na Comissão, que foi a sistemática má gestão. Quando os relatórios do Tribunal de Contas dizem coisas como «descentralização das aquisições dentro de cada universidade, com variações de preços de produtos a chegarem aos 2600% em consumíveis de informática e aos 275% em papel», isto não é um sinónimo de má gestão? Ou quando dizem: «Despesas e pagamentos ilegais, provenientes da celebração de contratos de aquisição de bens e serviços, com preterição de procedimentos legais, no valor de 2 milhões de euros» — isto é dito em relatórios do Tribunal de Contas sobre as universidades portuguesas. E continuam: «Despesas com aquisição de bens e serviços sem actos de autorização, no valor de 1,5 milhões de euros».
Bom, isto não quer dizer, como referi ontem, que sejam todas as instituições que não acompanham a necessidade de se reorganizar e adaptar à realidade, agora, há, de facto, instituições de ensino superior que foram capazes de se modernizar e de acompanhar aquilo que são as nossas necessidades e há outras que, infelizmente, não foram.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Srs. Presidentes das Comissões, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Ministro, V. Ex.ª veio aqui apresentar e discutir connosco o orçamento para 2009 do seu Ministério e parece que está a começar a exercer funções agora, como se, pelo estado actual nomeadamente do ensino superior, em Portugal, não tivesse o Sr. Ministro qualquer tipo de responsabilidade.
Portanto, pretende vir aqui fazer uma espécie de começo de vida nova, sem se responsabilizar pelos quase quatro anos de mandato que já leva neste Governo.
E a verdade é esta: nestes quase quatro anos de exercício de funções, do ponto de vista do financiamento, há uma conclusão, que é uma diminuição de 16% no financiamento do ensino superior. Esse é, neste momento, o seu principal legado. E o Sr. Ministro fala como se não tivesse qualquer responsabilidade nesta matéria e, portanto, fala apenas de previsões, de objectivos e de algumas disposições de carácter programático.
De facto, o ensino superior é, não só do ponto de vista orçamental, mas penso que até do ponto de vista da opção política deste Governo, o parente pobre do seu Ministério.
Já agora, gostava que se pronunciasse sobre esta questão. É recorrente e sistemático, na apresentação dos diversos relatórios do seu Ministério, que se diga que o Sr. Ministro apresenta opções políticas. Por exemplo, na página 283 do relatório do Orçamento do Estado para 2009 refere-se que, em 2009, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior terá uma intervenção direccionada para as áreas da ciência e tecnologia, da sociedade da informação e (já no fim) do ensino superior. Já no ano passado sucedeu o mesmo. Gostaria, pois, que me dissesse se esta ordem é aleatória e se, portanto, é uma mera coincidência que o ensino superior seja sempre a última referência das opções políticas do Ministério ou se isto revela uma hierarquização do ponto de vista das opções políticas. E não diga que é por retórica, porque atrás de um

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Orçamento estão opções políticas e é sobre essas opções políticas que gostaria que o Sr. Ministro aqui falasse e que nos dissesse se estou certo ou não quando digo que temos de concluir que o ensino superior é, objectivamente, o parente pobre do seu Ministério.
Ontem, como já aqui foi referido, por iniciativa do CDS-PP, reuniu esta Comissão com o CCISP e com o CRUP. Qual a razão de ser desta reunião? A razão de ser é a seguinte: das últimas vezes que reuniu nesta Comissão, o Sr. Ministro sempre negou que houvesse subfinanciamento das instituições de ensino superior e sempre negou que pudesse haver alguma instituição que estivesse em ruptura financeira. Por outro lado, as notícias que vinham a público e as intervenções dos Srs. Reitores diziam exactamente o contrário. E nós tínhamos de os ouvir. E a verdade é que depois de termos ouvido ontem o CCISP e o CRUP, tenho a dizerlhe, Sr. Ministro, que alguém está a faltar à verdade, porque não é conciliável o seu discurso com o que dizem os Srs. Reitores e os presidentes dos institutos politécnicos, que têm de gerir este ano e o próximo as universidades e os institutos. São discursos absolutamente inconciliáveis, de ruptura total.
Ora, acreditando na verdade do que nos foi dito ontem, nomeadamente pelo CRUP, tenho de dizer-lhe, com toda a clareza e frontalidade, olhos nos olhos, que estou convencido que o Sr. Ministro não nos disse a verdade toda sempre que aqui veio. Vou dizer-lhe porquê. Porque o Sr. Ministro disse-nos que não havia ruptura financeira quando já sabemos que, pelo menos, quatro universidades chegaram a essa situação durante este ano, mais duas chegarão a essa situação até ao final deste ano e o certo é que, de acordo com as verbas previstas para 2009 e segundo nos disse o Sr. Presidente do CRUP, mais três universidades entrarão em ruptura no próximo ano. Isto significa, Sr. Ministro, mais de metade das instituições e das universidades. Ora, isto é uma vergonha, Sr. Ministro! É lamentável que mais de metade das universidades portuguesas atinjam um ponto de ruptura financeira. A não ser que o Sr. Ministro nos diga que tudo isto não é verdade. Repito: a não ser que o Sr. Ministro nos diga aqui que tudo isto não é verdade. Mas, Sr. Ministro, vai ter de o provar! E, sinceramente, Sr. Deputado Manuel Mota, não devemos ter estado na mesma reunião, porque vir aqui dizer»

O Sr. Manuel Mota (PS): — Mas não disse que o orçamento chegava?

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Ó Sr. Deputado, é preciso ter um desplante monumental. Aliás, o Sr. Deputado deve ter estado ausente numa parte significativa da reunião, porque vir dizer que o CRUP não referiu subfinanciamento, ruptura financeira e incapacidade de ter receitas para suportar todas as despesas é, pura e simplesmente, primeiro, brincar com o CRUP, que aqui veio participar numa reunião connosco e, segundo, passar-nos um atestado de incompetência, porque nós estivemos na mesmíssima reunião.
Mais: o Sr. Presidente do CRUP fez uma referência que, sinceramente, o deve envergonhar. E se não o envergonha, lamento. Foi-nos dito que, se por acaso a percentagem de verba destinada do seu orçamento para o financiamento do ensino superior se mantivesse na percentagem do orçamento para 2005, não haveria em 2009 e também em 2008 qualquer ruptura financeira de nenhuma universidade portuguesa.

O Sr. Manuel Mota (PS): — Não disse isso!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Ministro, cabe-lhe explicar por que é que, entre 2005 e 2008 e agora para 2009 (anos da sua inteira responsabilidade), a situação financeira das universidades piorou. Ou então, repito, diga-nos que foi o Sr. Presidente do CRUP que ontem aqui faltou à verdade. Realmente, não há meias medidas. Ou a verdade está de um lado ou a verdade está do outro, Sr. Ministro, e este esclarecimento tem de ser prestado.
Mas há mais, a par do subfinanciamento, há uma outra questão que lhe tem sido colocada sucessivamente, por mim e por outros partidos da oposição, que é a seguinte: podemos trabalhar pela melhoria do financiamento, mas também pela própria racionalização da rede. Isto tem a ver com a racionalização dos cursos, com as próprias carreiras — matéria que o Sr. Ministro nos há-de explicar por que é que ainda está por rever. Até se prevê no Orçamento do Estado um possível adiamento genérico e geral para a revisão do Estatuto da Carreira Docente, mas a verdade é que, se há subfinanciamento e nada se fez para racionalizar a rede, o problema intensifica-se.

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O CRUP apresentou uma proposta com vista a favorecer a racionalização da rede, há quase três anos.
Essa proposta permitia uma diminuição de, penso, 600 a 700 designações diferentes. Era uma proposta, Sr.
Ministro. O Sr. Ministro até se pode rir do que os Srs. Reitores lhe apresentaram, mas há uma coisa que gostava que nos explicasse: por que é que o Sr. Ministro não fez rigorosamente nada para racionalizar a rede? Ora, isto é responsabilidade sua, porque quem decidiu suspender as funções e extinguir o CNAVES foi o seu Governo e quem decidiu que essas funções iam ser exercidas pela nova Agência de Avaliação e Acreditação foi também o seu Governo. Aliás, esta Agência, por acaso, ainda nem sequer exerceu praticamente funções nenhumas, como de resto já aqui foi referido. Portanto, repito, esta é uma questão da sua exclusiva responsabilidade.
Sr. Ministro, gostaria também que nos esclarecesse se considera que é verdade o que nos foi referido ontem, quanto ao facto de que as verbas orçamentadas, nomeadamente para os institutos politécnicos, apenas permitem suportar 82% da massa salarial. Refiro-me à totalidade da verba de funcionamento, obviamente. A minha pergunta é se isto é ou não verdade.
Para terminar, gostaria de saber, Sr. Ministro, qual a razão de ser das constantes alterações à fórmula de financiamento, que fazem com que qualquer universidade tenha uma total impossibilidade de conseguir antecipar, durante um ano, qual poderá ser a fórmula previsível que vai servir de base ao seu financiamento no ano seguinte.
Com isto termino, Sr. Presidente, sendo que as outras questões que quero colocar ficam para a segunda ronda.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, sendo este o último Orçamento do Estado apresentado por este Governo, importa fazer alguma análise do percurso desenvolvido para chegar a algumas conclusões em relação à política deste Governo.
Para além de manter como orientação e opção política o subfinanciamento, prosseguindo as políticas desenvolvidas por governos anteriores, este Governo agravou o subfinanciamento das instituições de ensino superior, transformando o subfinanciamento num instrumento de chantagem sobre as instituições, por uma via muito fácil. Aliás, quando o Sr. Deputado Manuel Mota fala na manutenção dos níveis de investimento no ensino superior, esquece-se de contabilizar o aumento das despesas impostas por este Governo! O facto de a rubrica no Orçamento do Estado ser ou poder ser sensivelmente a mesma, que não é, porque teve algumas reduções, a verdade é que a esta diminuição da receita acresce ainda o aumento brutal das despesas das instituições de ensino superior.
Portanto, uma consequência desta política do Governo do Partido Socialista foi a centralização na pessoa do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior da decisão de quais as instituições de ensino superior que sobrevivem e quais as que estão condenadas a passar dificuldades.
Portanto, em última análise, Sr. Ministro, o senhor e o Governo a que pertence condenaram Portugal a décadas de atraso pelas políticas que desenvolveram na área da ciência e do ensino superior.
Ao mesmo tempo que isto acontece, ou seja, ao mesmo tempo que as instituições não conseguem garantir níveis mínimos de funcionamento do ensino superior, o Sr. Ministro continua a falar em políticas de excelência na área do ensino e da investigação.
Em face disto, Sr. Ministro, gostaria de saber como é que consegue falar em políticas de excelência do ensino e da ciência quando as instituições de ensino superior não conseguem ter os meios mínimos para o seu funcionamento normal.
A sua política de «excelência» foi a política de estrangulamento das instituições de ensino superior, a política do aumento das propinas para pagar salários, a política dos despedimentos do pessoal docente e não docente e a do aumento da precariedade.
A sua política de «excelência», Sr. Ministro, foi a política de estrangulamento das instituições de ensino superior nacionais, ao mesmo tempo que se financiaram instituições de ensino superior estrangeiras.
Em resumo, Sr. Ministro, há uma belíssima caricatura daquilo que é a opção de investimento no ensino superior: a verba que o seu Ministério destina às instituições de ensino superior é uma vigésima quarta parte

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das verbas que, entre avales e linhas de crédito, foram concedidas à banca. Portanto, isto dá bem a noção da opção deste Governo em relação ao financiamento do ensino superior.

O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Está a misturar alhos com bugalhos!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E, Sr. Ministro, já que tanto gosta de falar em boa gestão, gostaria de colocar algumas questões. É boa gestão fazer um Orçamento do Estado que prevê uma verba de 27 milhões de euros para reservas de recuperação institucional e reforços orçamentais das instituições? É boa gestão guardar verbas que à partida se sabe que vão fazer falta às instituições de ensino superior? É boa gestão fazer orçamentos de instituições que já se sabe que não chegam para pagar a totalidade dos salários? É boa gestão fazer chantagem com as instituições de ensino superior, através dos contratos de saneamento e dos reforços orçamentais? É boa gestão obrigar as instituições de ensino superior a aumentar as propinas dos estudantes para pagar salários? É boa gestão utilizar seis fórmulas de financiamento em cinco anos de governo, sem se explicar nem discutir quais os critérios e quais as razões que levam à alteração dessas fórmulas, Sr. Ministro? Aliás, esta questão das verbas destinadas à recuperação institucional e aos reforços orçamentais das instituições é caricata, Sr. Ministro. Então, é boa gestão garantir 27 milhões de euros para se distribuir discricionariamente pelas instituições, a partir da decisão unipessoal do Sr. Ministro, quando esta verba é superior àquilo que, desde o início, podia ser garantido às instituições para assegurar o seu funcionamento normal?! É que, no tocante às verbas, para que as instituições do ensino superior, pelo menos as universidades, não entrassem em ruptura financeira não necessitavam destes 27 milhões de euros, Sr. Ministro! É o que foi ontem afirmado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
Portanto, o Sr. Ministro considera ser boa gestão manter esta situação inaceitável de chantagem sobre as instituições, com o seu próprio funcionamento básico, para que o Sr. Ministro possa ter o poder de decidir quais são aquelas que sobrevivem e as que não sobrevivem?! Por que é que não se distribui este dinheiro, logo à partida, se se sabe que ele vai ser preciso? E a resposta a isto é simples: porque só assim é que se consegue colocar as instituições de ensino superior no ponto onde o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior as quer, que é no ponto de terem que pedir esmola para garantirem o desenvolvimento do País! É transformar as instituições de ensino superior em alvos fáceis da chantagem inaceitável do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior! A situação é muito clara, Sr. Ministro: vamos chegar a 2009 com oito ou nove universidades a necessitarem de reforços orçamentais, sob pena de não conseguirem pagar salários e de não conseguirem cumprir os seus compromissos mais básicos.
Quanto aos institutos superiores politécnicos, estes poderão não chegar a esta situação de ruptura financeira; mas só poderão não chegar a esta situação, porque, entretanto, reduziram pessoal docente, aumentaram a precariedade do pessoal docente e dos funcionários e aumentaram em 63% as propinas dos seus estudantes.
Portanto, Sr. Ministro, pergunto-lhe: isto é política de excelência? Não é! Isto é política de penúria! Isto é política de chantagem e é política de condenação do País ao atraso!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, vou referir breves questões sobre a ciência e tecnologia que, de acordo com algumas intervenções, pareceria que é o parente rico.
Portanto, se o ensino superior é o parente pobre, pareceria que há um que é o parente bem tratado, mas, infelizmente, a realidade também não comprova isso. E, quando olhamos para a área da ciência e tecnologia, também não ficamos descansados, nem podemos ficar.
Quero, desde já, dizer isto: o PCP não é dos partidos que «engoliu» – passo a expressão – o embuste de 1% do PIB para a ciência e tecnologia. O PCP denunciou, na altura do Orçamento do Estado para 2008, que o 1% do PIB engloba verbas que não são directamente investidas no sistema científico e tecnológico nacional, pois engloba verbas que vão desde a recuperação dos tectos de cantinas até ao financiamento aos laboratórios do Estado. E foi assim que o Ministério conseguiu – aglomerando todo o tipo de verbas que estavam sob a alçada deste Ministério – dizer que alcançara o 1% do PIB. Portanto, não somos daqueles que

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vamos louvar a iniciativa do 1% do PIB, pelo simples motivo de que ela não teve, de facto, expressão alguma.
Aliás, basta olharmos para o sistema científico e tecnológico nacional, hoje, para verificarmos que a evolução não é quantificável.
Mas, Sr. Ministro, relativamente às metas que aponta no Orçamento do Estado – ambiciosas, é certo, aliás, a par daquilo que foi anunciado com a Estratégia de Lisboa, para os 3% do PIB, em 2010, segundo o Ministro dá a entender –, devemos ser sérios na discussão destas metas.
O Sr. Ministro acabou de anunciar, novamente, 5,5 de investigadores ETI por mil activos para 2010 e isso é o que consta no relatório do Orçamento do Estado.
Sr. Ministro, em 2005, temos 21 126 ETI no sistema; em 2003, tínhamos 20 000. Ou seja, em dois anos, foram conseguidos pouco mais de 900 investigadores. E o Sr. Ministro quer-nos fazer crer que, agora, vai conseguir aumentar 9000 investigadores no sistema, em menos de dois anos? E digo 9000 investigadores para chegar aos 30 600 que são os necessários para fazer os 5,5 ETI! O Sr. Ministro diz que vamos ter 5,5 investigadores por cada mil activos e, portanto, é preciso acrescentar 9000 investigadores ao sistema. Ora, a pergunta é muito clara: como é que vai assegurar este crescimento, cerca de 9000, em dois anos? Como?! Mas, Sr. Ministro, a questão não termina aqui. É que todos sabemos que, para ter estes investigadores com alguma eficiência no sistema, é necessário que estes investigadores tenham apoio técnico, humano e material. Ora, o apoio humano – não vamos agora falar do técnico – em Portugal, como sabe, tem um rácio técnico por investigador muito acima daquele que está indicado como sendo a média da União Europeia. E, portanto, há um défice estrutural de técnicos no sistema científico e tecnológico – aliás, em comparação com a média europeia, estima-se esse défice em 8000 técnicos. Pergunto: Como é que vai assegurar a entrada desses 8000 para suprir as falhas actuais e garantir que há um número de técnicos adequado aos novos 9000 ETI que o Sr. Ministro diz que vai conseguir até 2010? Portanto, Sr. Ministro, como é que, em dois anos, vai conseguir produzir no sistema científico e tecnológico cerca de 9000 investigadores? Bom, já pode ter havido algum crescimento e, portanto, talvez sejam menos de 9000, mas não será significativo. Então, pergunto: como é que vai injectar a capacidade humana, no plano técnico, para assegurar esse crescimento? Sr. Ministro, além disso, 180 000 € per capita de investigador é a média da DIDE (despesa com investigação e desenvolvimento experimental) europeia. Se isto fosse cumprido, significaria que, em Portugal, teria de ser aumentado em 5,5 mil milhões de euros o orçamento em vigor na Investigação & Desenvolvimento, ou seja, os tais 3% do PIB, que a Estratégia de Lisboa anuncia, mas dos quais estamos ainda longe.
Como é que o Sr. Ministro vai assegurar 5,5 mil milhões de euros no sistema científico e tecnológico, 180 000 euros per capita, para fazer esta média da DIDE? Sr. Presidente, peço desculpa pela demora, mas vou terminar inquirindo sobre os laboratórios do Estado. O dinheiro não vai para as universidades – já todos perceberam!; não vai para os politécnicos – ainda menos!; não vai para os laboratórios do Estado. Então, para onde vai o dinheiro?!

O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Vai para o bolso do Ministro»!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não, eu sei para onde vai! Eu tenho aqui a lista para onde vai: para os laboratórios associados, para entidades estrangeiras» Aproveito para lhe perguntar, Sr. Ministro: quanto ç que custa um doutoramento nas universidades de parcerias internacionais estabelecidas por este Ministério? Fiz-lhe essa pergunta, por requerimento, e fui presenteado com uma declaração política de propaganda, sem referir um único número do custo desses doutoramentos.
Sr. Ministro, a forma como distribui os fundos nos laboratórios do Estado e pelos laboratórios associados, investindo, claramente, nos laboratórios associados, revela, uma vez mais, grandes arbitrariedades e grandes discricionariedades na política deste Ministério.
O Sr. Ministro financia onde quer e como quer; não promove a elevação estrutural da qualidade científica do País e da interacção do sistema científico e tecnológico com o tecido produtivo; recorre a bolseiros para suprir necessidades permanentes das instituições em tudo quanto é alugado; não abre lugares nos quadros; não reclassifica carreiras, etc. Portanto, há um claro desinvestimento naquilo que é o sistema nacional, a

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estrutura nacional. E, depois, o Sr. Ministro vem anunciar um suposto reforço em instituições estrangeiras, em instituições privadas» A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, é também esta: como é que justifica que, uma vez mais, haja um défice nos laboratórios do Estado que ascende aos 73 milhões de euros, quando comparado com o financiamento de 2006? É que temos de ter em conta que o Instituto Nacional de Medicina Legal, em 2006, não estava no «bolo» dos laboratórios do Estado e que, só a meio de 2006, aliás, só em 2007, é que enquadra esse estatuto.
Portanto, fazendo as contas, há menos 73 milhões no sistema dos laboratórios do Estado.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Miguel Tiago.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Srs. Presidentes da Comissões, Srs. Membros do Governo: O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, durante dois terços da sua intervenção inicial falou da sua «bolha especulativa» preferida, que é a ciência e registei o seu ar agastado quando disse: «(») e, por fim, o ensino superior». É compreensível, Sr. Ministro. O Sr. Ministro «comprou uma guerra» com o ensino superior, muito particularmente com os reitores, a quem, ainda há muito pouco tempo, acusou de má gestão, fazendo pender sobre as suas cabeças a ameaça de substituição. Má gestão! Tinha alguma curiosidade, Sr. Ministro, em saber ao abrigo de que quadro legal é que poderia prever a substituição destes dirigentes — se calhar, porventura, através do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, invocando a degradação institucional. E gostaria de saber, Sr. Ministro, se tem condições para apresentar aqui os quadros de degradação institucional que justificam as suas afirmações. Se não for capaz de o fazer, convenhamos que degradação governamental é o quadro de que estamos a falar neste preciso momento.
Posto isto, falemos, então, do Sr. Ministro, como gestor. Vamos à gestão! É irrecusável o decréscimo de 16% do PIB de investimento no ensino superior; é irrecusável que o estrangulamento financeiro das instituições é, claramente, uma opção política. Aliás, há aqui uma espécie de darwinismo que o Sr. Ministro, depois, fará o favor de explicar. É estrangulando, estrangulando, estrangulando» Vamos ver quem sobrevive, qual é o prémio, qual é o castigo nesta estratégia de sobrevivência.
É irrecusável também, Sr. Ministro, que os orçamentos da maior parte das instituições já não pagam os salários e que as propinas que dispararam vergonhosamente – vergonhosamente, Sr. Ministro! – já não chegam, sequer, para pagar o funcionamento das instituições.
Não sei se tem memória, provavelmente tem, daquilo que no tempo de Guterres, em que o senhor foi ministro, era uma garantia: que as propinas jamais pagariam os custos de funcionamento das instituições! Não foi assim há tanto tempo, Sr. Ministro»! Posto isto e dado que o estrangulamento financeiro das instituições é um claro objectivo político, quero perguntar-lhe: como é que entende que não há uma desfiguração da missão pública do próprio sistema, quando, com o seu Governo e nos últimos anos, as famílias têm claramente pago, suportado, as suas políticas. São as famílias, Sr. Ministro, que pagam o seu desinvestimento no ensino superior! O Sr. Ministro gosta ainda de falar dos parâmetros definidos pela OCDE e pela proximidade de Portugal nesse quadro da modernidade procurado, mas a verdade é que, entre 2005 e 2008, as transferências do Orçamento do Estado diminuíram de 428 € para 382 €, por aluno.
As famílias, Sr. Ministro, pagam as suas políticas como gestor! Depois, o senhor fará o favor de fazer a sua auto-avaliação.
E quando se alimentou também o discurso, dizendo que as instituições deveriam aumentar as sua receitas próprias, a verdade é que, durante este período as receitas próprias aumentaram; o que não aumentou, Sr.
Ministro, foi o investimento público em bolsas para os estudantes do ensino superior. 5% de investimento público para bolsas, à revelia dos ditos países da modernidade, nomeadamente a Noruega, a Dinamarca, o Reino Unido, em que a percentagem de investimento público para bolsas e para a acção social é muito maior do que em Portugal.

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Não me recordo se, na altura, o Sr. Ministro distribuiu alguns «Magalhães», mas recordo-me de que apresentou, há algum tempo, com o Sr. Primeiro-Ministro, a hipótese de 200 000 a 300 000 – uns números muito grandiosos! – para a concessão de empréstimos aos estudantes de ensino superior.
Os números eram muito significativos e muito expressivos, Sr. Ministro: 200 000, 300 000! Eram assim uns nõmeros muito «gordos«»! Com um spread, enfim, acima daquilo que era previsível conceder-se aos alunos.
Mas o anúncio era de que esta era uma estratégia fundamental da sua aposta de apoio aos estudantes, de desenvolvimento da componente social das suas políticas.
Pergunto: qual foi, Sr. Ministro, o número de alunos que recorreram a estes seus «fabulosos» empréstimos? E por que é que teima em não mexer naquela que é a questão fundamental, que é a acção social? A este nível, o Sr. Ministro tem na sua mão tudo o que é necessário para proceder a uma alteração. O Sr. Ministro sabe que, para além de a percentagem da acção social não ter crescido durante estes últimos anos, o regulamento da acção social é uma vergonha. É um regulamento cheio de arbitrariedades, as normas são definidas quadro a quadro, há situações absurdas e escandalosas, como, por exemplo, a de, entre dois irmãos, oriundos do mesmo quadro familiar, em instituições diferentes, um poder ter bolsa e outro não» Enfim, há critérios, neste regulamento, para além das dotações, que são arbitrários e justificavam, da parte do Sr. Ministro, uma intervenção urgente. E o Sr. Ministro tem toda a informação de que carece para fazer essa intervenção. Pergunto-lhe por que é que não o fez e se ainda tenciona fazê-lo até ao final do próximo ano.
Recordando o ar agastado com que dizia, no início, «enfim, vamos lá falar do ensino superior», talvez o Sr.
Ministro possa, ainda hoje, aqui, prestar contas sobre a leitura que faz da sua relação com a autonomia das instituições, constitucionalmente consagrada.
Gostaria, se possível, que nos explicasse a intervenção dos controladores financeiros, encomendados para a fiscalização das instituições que foram financeiramente estranguladas pelo seu Ministério. Qual é o seu papel e como é que os enquadra na autonomia? E também gostaria, evidentemente, que explicasse por que é que recusa um sistema plurianual de financiamento e prefere ter os seus dirigentes, os ditos «maus gestores», a pedir, com a mão aberta, a contagotas, mais qualquer coisa para a sobrevivência das instituições. Não sei se considera que isto é manter o respeito pela autonomia, constitucionalmente consagrada» Mas aquilo que o Sr. Ministro tem, de facto, alguma dificuldade em explicar é como é que faz a gestão dos dinheiros, numa clara perspectiva de prémio e castigo. E tem de o explicar! O Sr. Ministro tem de prestar contas desses critérios, que continuam a ser muito pouco claros.
Quando se discutiu o regime jurídico das instituições de ensino superior, há algum tempo, as perguntas eram muitas, nomeadamente sobre a adaptação daquele modelo e daquele quadro às expectativas das instituições. A quem serviria esse regime jurídico? Seria uma lei à medida das expectativas do técnico? Qual era o ajustamento previsto para o RJIES? Enfim»! E quando se dizia ao Sr. Ministro, na altura, que aquele enquadramento iria provocar uma hierarquia entre as instituições, iria criar instituições de 1.ª, de 2.ª e de 3.ª categorias, o Sr. Ministro respondia: «Nem pensar nisso! Isso é um disparate! Isso é uma coisa reaccionária! Esse é um raciocínio reaccionário da vossa parte, porque o RJIES não vai fazer nada disso, não vai criar fracturas e divisões entre instituições de 1.ª, de 2.ª e de 3.ª. Isso é mentira!».
Bom, a verdade, Sr. Ministro, é que está na hora de esclarecer quais são, do seu ponto de vista, as instituições de 1.ª, de 2.ª e de 3.ª. É que é difícil perceber por que é que as maiores universidades públicas do País receberam um aumento nominal de 2% e outras instituições, como a Universidade de Aveiro ou o ISCTE, receberam muito mais, Sr. Ministro. Está por explicar o que vai fazer com o dito orçamento competitivo. O que é que vai fazer? Quais são os critérios? Vai compensar o quê e ao abrigo de quê, Sr. Ministro? Explique lá, afinal, de uma vez por todas, que rede de 1.ª, 2.ª e 3.ª é que tem em mente com este orçamento.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, com efeito, há coisas que não colam, nem que usemos cola de contacto, cola de sapateiro» Há coisas que não colam! As declarações de propaganda do Governo, em afirmações públicas e inscritas no Orçamento do Estado, ou as declarações, já hoje, do Partido Socialista, aqui, nesta reunião, não colam com a

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realidade que, depois, quem está no terreno, designadamente os reitores e os presidentes do politécnico, traz à Assembleia da República, revelando a verdade do ensino superior em Portugal.
A propaganda não cola nem consegue desmentir a pretensa grande aposta no ensino, na educação e na investigação, que o Governo pretendeu arvorar como grande vencedor, em tempo de crise, neste Orçamento do Estado para 2009.
E não cola, porque os números não iludem, Sr. Ministro! A realidade é que os cortes sucessivos, ao longo dos anos – e, aliás, a direita também nada tem para ensinar ao Partido Socialista nesta matéria –, têm conduzido a uma situação profundamente instável e de ruptura, a todos os níveis, nas instituições do ensino superior.
Esta política de desinvestimento, de sucessivos cortes, associada ao aumento de novos encargos – e é preciso relembrar que, aos 2,9% de aumentos salariais, acrescem uma inflação de 2,5% – as promoções obrigatórias e as transferências para a Caixa Geral de Aposentações de 11%, tudo isto se junta a sucessivos cortes, de 6,4% em 2007 e de 11% em 2008, num total de 20%, entre 2005 e 2008. Aliás, o Sr. Presidente do CRUP refere ainda outros números, menciona que, cumulativamente, desde 2005, são 16% de cortes, segundo valores do Produto Interno Bruto.
Os resultados estão à vista: dispensa de docentes e não docentes; universidades e politécnicos sem materiais para dar aulas, aliás, já há aulas que estão a deixar de ser dadas, por exemplo, na faculdade técnica da Universidade de Lisboa, por falta de material, e podiam referir-se outros exemplos; ruptura de saldos de gerência; cancelamento de projectos, etc.
Toda esta conjuntura revela que o ano de 2009 será mais um ano de diminuição efectiva da dotação para o ensino superior, malgrado aquilo que o Sr. Ministro poderá vir dizer ou «tirar da cartola» na sua intervenção seguinte.
A verdade é que bastava vontade política para mudar as coisas e apresentar um Orçamento do Estado, no mínimo, realista, que garantisse, ao mínimo, a sustentabilidade e a estabilidade das instituições, mas essa não foi, claramente, a opção do Governo.
O Governo prefere fazer o jogo de sujeitar as instituições à sangria e ao estrangulamento, a orçamentos fictícios, à ruptura financeira. Tenta colocá-las de joelhos, forçando-as a seguir o caminho da empresarialização e da privatização.
Senão, veja-se: o Sr. Ministro entende que o problema das instituições é a má gestão — já o disse! — e não os cortes orçamentais que têm sofrido. E diz mais o Sr. Ministro: «esses dirigentes corrigirão essa atitude ou serão substituídos» — palavras do Sr. Ministro! Isto, do nosso ponto de vista, é um perfeito ataque à autonomia das instituições universitárias, independentemente das tentativas posteriores que o Sr. Ministro tenha encetado para explicar o que pretendia dizer. Isto revela bem a postura deste Governo relativamente às instituições, tal como o revela a imposição de controladores financeiros, passando às instituições financeiras um atestado de menoridade, não sabendo o que é melhor para o desenvolvimento científico e para o ensino superior no nosso País.
Por isso mesmo, a grande solução do Sr. Ministro é o autofinanciamento e, por isso mesmo, o Orçamento do Estado para 2009 prevê aumentar o autofinanciamento das instituições. Só nas universidades públicas, esse aumento é de cerca de 20%. O problema, Sr. Ministro, é à custa de que é feito este aumento do autofinanciamento. E, mais uma vez, é à custa das famílias! Basta ver o aumento das propinas, sendo que Portugal é já dos países onde os estudantes e as famílias mais pagam pelo ensino superior – quase 20% do custo de frequência. As propinas vão continuar em alta e continuarão a servir não, como a lei prevê, para melhorar o ensino público superior, mas para custear custos fixos, designadamente salários das instituições de ensino superior.
Na verdade, a política de autofinanciamento das instituições desvirtua por completo aquela que é a sua missão. É que, de duas uma, Sr. Ministro: ou temos os alunos a estudar para a sua formação e os professores a aprofundar a investigação e a sua função docente, ou temos um corpo universitário a prestar serviços, para a universidade se custear com a venda de bens e serviços para fora. Não sei se é por causa disto que há tantas reticências em relação à revisão do Estatuto da Carreira Docente, não sei se, nessa revisão, os senhores estarão a ponderar incluir algo que obrigue os professores, para além das suas funções docentes, a prestar outro tipo de serviços para custear a universidade e até, se calhar, para custear os seus próprios salários, o que é verdadeiramente vergonhoso.

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Perante esta situação de ruptura, Sr. Ministro, e já aqui foi dito mas não podemos deixar de referir que algumas instituições estão já em ruptura e outras lá chegarão a breve prazo, como é que se explica que o Governo venha anunciar um aumento mas as cinco maiores universidades do País — a Universidade do Porto, a Universidade Técnica de Lisboa, a Universidade de Lisboa, a Universidade de Coimbra e a Universidade do Minho — de apenas 2% da dotação? Sr. Ministro, já aqui referi outras despesas que vêm por acréscimo, mas bastava referirmos a inflação prevista pelo Governo, que também, invariavelmente, erra e, por isso, situa-se sempre acima daquilo que os senhores prevêem. Bastava isso, para percebermos que estas instituições vão ter uma diminuição no seu investimento, uma diminuição nas transferências do Estado. E é em face dessa diminuição, em face desse estrangulamento, que as instituições têm de encarar aquilo que o Sr. Ministro diz ser um aumento de qualidade e responder ao desafio de competição das instituições, não só a nível europeu mas em todo o mundo. Esta é, francamente, uma missão impossível e aquilo que o Governo pretende é trilhar um caminho que permita conduzir as instituições para aquilo que não querem fazer.
Outra questão que se prende com o que acabei de dizer é a da existência de um orçamento competitivo ou, melhor, de um fundo específico de desenvolvimento do ensino superior.
Gostaríamos de perceber, claramente, Sr. Ministro, quais os critérios que vão estar na base da distribuição deste fundo, porque existe já a noção de que o Ministério da Ciência pretende beneficiar, com a atribuição automática de parte deste fundo, as instituições que se transformem em fundações públicas de direito privado.
Ou seja, tendo falhado a meta inicial que pretendia atingir, de ver uma transferência massiva de instituições do regime normal para as fundações, o Governo acena, agora, com uma «cenoura«» Aliás, não sei se, no futuro, daqui a um ou dois anos, não estaremos a discutir a obrigatoriedade de algumas instituições, eventualmente por maus resultados de gestão, causados pela vossa política de corte de financiamento, mudarem para outro modelo de funcionamento, mais próximo da noção de empresarialização, mais próximo da noção de privatização, que os senhores preconizam, certamente, para o ensino superior público e para a educação.
Pergunta-se, Sr. Ministro, o que é que justifica esta opção e quais são os critérios que vão presidir à distribuição deste fundo.
Finalmente, Sr. Ministro, o Governo tem um compromisso e tinha um prazo de 180 dias, já ultrapassado, para adaptar a legislação das carreiras especiais e para rever o Estatuto da Carreira Docente Universitária; agora, no Orçamento do Estado para 2009 volta a referir-se esse compromisso mas sem qualquer data.
Já a revisão do Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica nem sequer é referida, apesar de a Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), depois de uma reunião que teve com o Secretário de Estado, ter entendido que havia a hipótese e a abertura deste Governo para promover a revisão desse Estatuto, aliás, já proposta por partidos políticos, nesta Assembleia da República, no sentido de acabar com a vergonhosa situação dos «falsos bolseiros» — semelhante à dos falsos recibos verdes —, que são pessoas que, já depois do fim da sua formação, para responderem a necessidades efectivas do sistema, estão a trabalhar como bolseiros, quando deviam estar a trabalhar com um contrato efectivo de trabalho, que garantisse todos os seus direitos sociais e a protecção no desemprego.
Assim, Sr. Ministro, a pergunta que lhe faço é esta: vão ainda rever, até ao final desta Legislatura, quer o Estatuto da Carreira Docente, quer o Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica?

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, so called Deputada não inscrita, que considero inscrita, embora não inscrita em nenhum grupo parlamentar.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Sr.
Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, bom dia a todos.
Estamos em condições de discutir a política pública para o ensino superior, para a ciência e para a tecnologia e o Sr. Ministro perdeu esta oportunidade, pois ocupou a sua intervenção inicial, quase na sua totalidade, com a ciência e a tecnologia e, no fim, como adenda, como nota de rodapé, referiu o ensino superior em Portugal.
Naturalmente, não tem a mesma opinião do Sr. Primeiro-Ministro que considera, por exemplo, que as políticas públicas são a trave-mestra deste Orçamento e que, inclusivamente, confirmou, junto dos reitores, que a diminuição do esforço público no ensino superior é um facto. Reconheceu isso como um facto e

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comprometeu-se que o ano 2009 seria, efectivamente, o da recuperação dessa diminuição para que, de uma forma mais folgada, as instituições pudessem enfrentar a sua missão social de desenvolvimento do País, de sustentáculo económico do País na área da formação dos quadros qualificados e do que é internacionalmente entendido como o melhor investimento reprodutivo – aquele que é garantido sem quebras de bolsas nem outras maleitas que acontecem a outros investimentos.
Esta leitura teria permitido que, particularmente, o Sr. Ministro, que pelos vistos tem uma posição diferente do Sr. Primeiro-Ministro, entendesse o ensino superior como sustentáculo desse mesmo desenvolvimento económico.
Nesse sentido, gostaria de saber, em primeiro lugar, como é que é plausível o Sr. Ministro defender o orçamento que tem para o ensino superior, quer politécnico quer universitário, com o aumento do número de alunos e a diminuição das verbas.
O Sr. Ministro não pode, correndo o risco de pensar que não sabemos fazer contas e de julgarmos que o Sr. Ministro também não as fez, considerar que há aumento no ensino superior. O Sr. Ministro só poderia considerar que há aumento se não tivesse investido no subfinanciamento desde que tomou posse. Então, poderia considerar que face à crise económica, às dificuldades do País, os aumentos não seriam tantos quanto os que desejaria.
Contudo, o Sr. Ministro sabe que as instituições de ensino superior estão a sofrer de subfinanciamento há anos e que o que é previsível aumentar este ano não cobre minimamente a necessidade de sobrevivência destas mesmas instituições.
E o Sr. Ministro conhece, porque sabe fazer contas, porque é investigador, porque tem domínio científico dos números, que o que aconteceu foi um desinvestimento escandaloso, nos últimos anos, no ensino superior.
Gostaria, aqui, de dizer que, pelos vistos, nenhum de nós esteve na mesma reunião em que esteve o Sr. Deputado Manuel Mota do Partido Socialista.
Mas também percebi ontem, Sr. Ministro, por que é que durante meses a oposição pediu a presença do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos e, sistematicamente, o Partido Socialista votou contra.

Protestos do PS. Percebi ontem porquê! Porque o CRUP e o CCISP vinham dizer exactamente o contrário daquilo que o Sr.
Ministro afirmou e reafirmou em reuniões sucessivas: que não era verdade – o que vinha na comunicação social e que era afirmado pelos senhores reitores e pelo CCISP – que havia situações de rotura financeira nas instituições. Portanto, finalmente ontem, na véspera, porque já não havia mais condições para protelar esta vinda, soubemos qual é a vida das instituições.

O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Isso não é honesto vindo de si!

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Até soubemos outra coisa, Sr. Ministro, e também gostaria de ouvi-lo pronunciar-se sobre isto: foi-nos dito que a fórmula que vigorou até ao início desta década, por volta de 2000/2001, que tinha o orçamento padrão, como o Sr. Ministro bem se lembra quando era Ministro da Ciência e Tecnologia, que tinha dados de natureza objectiva e rigorosa que permitiam não uma fórmula distributiva do dinheiro mas uma fórmula distributiva – o Sr. Secretário de Estado tem boa memória também – de acordo com itens de rigor e transparência, tem vindo, por decisão unilateral do seu Ministério, a ser alterada nos últimos anos de forma perfeitamente casuística e, neste momento, nem os itens de qualidade já fazem parte dessa fórmula de financiamento.
Seria extremamente importante perceber por que é que o Sr. Ministro prefere um bolo global que distribui a seu bel-prazer, como quer, pelas instituições em vez da forma rigorosa e transparente que permitia que as instituições recebessem com itens que todos conheciam.
Também soubemos ontem que, ao contrário do Serviço Nacional de Saúde e de outros sectores da Administração Pública portuguesa, as universidades não tiveram a mínima derrapagem enquanto tiveram esta forma de financiamento. Não houve derrapagem nas administrações universitárias e politécnicas. E agora não há derrapagem, agora há luta pela sobrevivência, mas uma luta pela sobrevivência, Sr. Ministro – e também

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gostaria de ouvi-lo pronunciar-se sobre isto –, que põe em causa a qualidade do ensino ministrado! Dizia, ontem, o Sr. Presidente do CRUP que tudo farão para que isso não aconteça.
Mas lia-lhe só uma breve passagem de um texto do CCISP que nos foi deixado em papel, e que não pode ser desmentido pelo Sr. Deputado Manuel Mota, que diz o seguinte: «Nós não estamos ainda em rotura financeira, mas o que é que temos vindo a fazer? Aumento de propinas: entre 2005 e 2008, as propinas aumentaram 63%. Quanto ao pessoal docente, fizemos o seguinte: reduzimos o pessoal docente; substituímos o pessoal docente mais qualificado por pessoal docente menos qualificado; contratámos não professores a tempo inteiro mas a tempo parcial; e agravámos a precariedade dos vínculos».
Ao contrário do que aqui foi dito pelo Partido Socialista, efectivamente, o Presidente do CCISP disse que para não haver rotura financeira em 2009 e para que as instituições não continuem a tomar estas medidas, porque não podem subir mais as propinas, não podem despedir mais docentes e não podem pôr docentes a fazer prestações de serviços de uma ou duas horas como se fingissem ser professores, só há uma medida: é que o seu Ministério se entenda com o Ministério das Finanças e da Administração Pública e seja capaz de considerar integrados no quadro os cerca de 60% de pessoal docente que o CCISP e que todas as instituições juntaram à sua proposta orçamental.
E, Sr. Ministro, é muito boa vontade para a crise, porque, como o senhor sabe, não há quadros de pessoal no ensino politécnico! Cerca de 85% desse pessoal tem vínculo precário. Se o Sr. Ministro e o Sr. Ministro de Estado e das Finanças se entenderem, poderão recuperar pelo menos 60% desse pessoal. E é só isto, Sr. Deputado Manuel Mota, para que tem falta de memória e consegue alterar o que foi dito, que evitará a rotura financeira!

O Sr. Manuel Mota (PS): — Isso são só contradições!

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sobre o ensino superior, Sr. Ministro, gostaria que pudesse desmentir o que foi dito, para que possamos concluir que o CRUP não falou verdade à Comissão quando disse que, no ano de 2009, 14 das universidades portuguesas poderão estar em rotura financeira e rotura financeira significa não pode pagar salários. Em 2009, 14 universidades portuguesas poderão estar em rotura! Isso foi dito! Sr. Ministro, não acho nada divertido, acho o que é uma tragédia, um escândalo e desejo ardentemente que o Sr. Ministro diga que isso não é verdade! Portanto, é isso que estou à espera que diga.
Sr. Ministro, gostaria também que se pronunciasse sobre o orçamento do ensino superior agora, finalmente, na segunda intervenção que vai ter. E diga-me por que é que o Sr. Ministro não optou por ter um orçamento-base capaz de responder às necessidades das instituições e depois, sobre esse orçamento-base, não criou o chamado orçamento competitivo. Por que é que o Sr. Ministro preferiu ficar no «bolso» do seu Ministério com milhões e milhões de euros para o orçamento competitivo e para o reforço às instituições quando já sabe, e tem a certeza absoluta, que vai ter que pegar nesse dinheiro para começar a «apagar os fogos» em Janeiro de 2009, tal qual como fez em 2008 e tal qual como fez em 2007?! Não seria mais sério e rigoroso que o Sr. Ministro, sabendo que teve que dar verbas extraordinárias em 2007 e em 2008, não optasse novamente pelas verbas extraordinárias e indexasse às instituições o que elas necessitam para, efectivamente, trabalharem e poderem sobreviver? Ou o Sr. Ministro considera que os reitores estão a pedir todo o dinheiro do mundo e não há nenhuma razão para aumentar a qualidade do ensino superior, porque podemos viver só à custa dos Laboratórios Associados? Porque, ao contrário também do que aqui foi dito pelo Partido Socialista, o que o Conselho de Reitores disse ontem aos Deputados da Comissão é que o Sr. Ministro tem um «saco» permanentemente aberto para os Laboratórios Associados e a iniciativa privada e tem um «saco» perfeitamente fechado para as instituições de ensino superior públicas e para as unidades de investigação públicas! E disse, inclusivamente, que estas instituições, como não têm saldos de gerência, como não têm dinheiro para avançar nos projectos de investigação, normalmente ficam à espera que as verbas possam chegar para poderem concorrer a esses programas, enquanto que os Laboratórios Associados, sempre com dinheiro disponibilizado pelo Orçamento do Estado, podem, efectivamente, concorrer a todos os concursos na área da investigação! Portanto, também gostaria que o Sr. Ministro me dissesse se isto é verdade ou mentira.

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Finalmente, o Sr. Ministro pôs controladores do seu Ministério nas instituições que, na sua opinião, gerem mal os dinheiros públicos. Teria sido extremamente interessante que hoje pudéssemos ter ouvido aqui o Ministro dizer que agora tem os relatórios desses controladores e que descobriu que as instituições a, b, c e d gerem mal e que vai tomar medidas no sentido de essas instituições passarem a ser melhor geridas. Era bom que soubéssemos desses relatórios também.
Penso que já ultrapassei os meus 10 minutos, mas vou só colocar a última questão que se prende com a distribuição das verbas do Orçamento do Estado.
Ficámos a saber, ontem, que, em 2009, há instituições que recebem 0%, as cinco maiores universidades públicas recebem 2%, mas há outra instituição que recebe 24% do «bolo». Não ponho em causa que a instituição que recebe 24% não precise do que recebe, só preciso é de saber se nos anos anteriores, por acaso, o seu Ministério se esqueceu dessa instituição e, como se esqueceu, agora precisa de colocar nessa instituição 24%...!? Ou se o Sr. Ministro reconhece que essa instituição é uma das muito mal geridas e que precisa de ser recuperada economicamente. Era preciso que entendêssemos por que é que o Sr. Ministro divide o «bolo» entre 0% para algumas instituições, 2% para as maiores universidades públicas e 24% para uma instituição, bem como quais são os seus critérios de divisão desse mesmo orçamento.

O Sr. Presidente: — Está encerrada a primeira ronda de perguntas.
Para responder a esta plêiade de questões, Sr. Ministro, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas vossas questões. Procurarei responder a todas elas. Peço desculpa se alguma ficar por responder, mas passará, com certeza, para a ronda final.
Começo pela ordem inversa das intervenções, porque muitas das questões levantadas são repetidas por muitos das Sr.as e dos Srs. Deputados.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, tal como outros Deputados, disse-me que devo saber de números, que eu não disse quase nada sobre o ensino superior na minha intervenção e que só falei de ciência e tecnologia, dizendo que devia haver aqui uma sanha qualquer contra a ciência e a tecnologia.
Bom, enquanto a Sr.ª Deputada falava, de facto, eu contava e devo dizer-lhe que a minha intervenção tem 4 páginas, das quais cerca de 2 são dedicadas ao ensino superior, ou seja, mais precisamente 72 linhas – e, Sr.ª Deputada, não tive tempo de contar os caracteres – e para a ciência e tecnologia são 49 linhas.
Portanto, há aqui um erro, interessante aliás, de percepção por parte da Sr.ª Deputada que, de cada vez que se fala um pouco de ciência e de tecnologia, vê um abuso e que cada vez que se dedica metade da intervenção ao ensino superior acha pouco.
Mas, enfim, essa é, provavelmente, uma questão analítica a que não sei responder de todo. Não é da minha especialidade, mas já é da minha especialidade responder a algumas provocações – e o termo é forte e eu não gostaria de utilizar nesta minha intervenção termos fortes, apesar de VV. Ex.as terem tentado levar-me para esse terreno.
Dizem as Sr.as Deputadas Luísa Mesquita e Cecília Honório e diz o Deputado Francisco Madeira Lopes que a fórmula de financiamento tem vindo a ser modificada casuisticamente. Julgo que, no vosso léxico, casuisticamente significa o que os dicionários dizem — caso a caso, á vontade do freguês»! É isso que querem dizer, sendo o «freguês» o Ministério.
Provavelmente, VV. Ex.as desconhecem a lei da Assembleia da República. O orçamento de funcionamento básico das instituições do ensino superior, definido pela lei que define as bases de financiamento do ensino superior, deve ser baseado em critérios objectivos, consultadas as instituições de ensino superior.
Posso dizer-vos, é público – mas é preciso ler os documentos sobre a fórmula de financiamento para a entender –, que é uma fórmula relativamente simples do ponto de vista aritmético, porque tem apenas contas de somar e de multiplicar, mas exige um mínimo de estudo.
Essa fórmula baseia-se nos seguintes critérios básicos: no número de alunos, no tipo de cursos (há cursos em padrão mais caro do que outros) e nos custos médios do pessoal docente e não docente de cada instituição.
A razão de ser proporcional ao número de alunos parece óbvia e a razão de ser ponderada directamente pelos diferentes tipos de cursos e agregar esses cursos em diferentes escalões também parece óbvia – aliás,

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devo lembrar que essa distribuição segue os padrões internacionais, classificando os diferentes cursos em grupos e ponderando o seu custo relativo médio.
O terceiro critério, o da ponderação por custo efectivo médio, reportado aos anos anteriores, de pessoal docente e não docente, tem uma vantagem para as instituições que querem reforçar a qualificação, porque impede que a fórmula privilegie quem tem menos custos; pelo contrário, ela compensa directamente aquelas instituições que, de um ano para o outro, reforçaram a qualificação do seu pessoal e, portanto, o custo do seu pessoal.
Esta é a fórmula de financiamento e os ajustes que têm vindo a ser feitos são meros ajustes técnicos, curiosa e espantosamente, Sr.as e Srs. Deputados, propostos pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e pelo Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP).
Na fórmula de financiamento que foi utilizada este ano não só foi pedida essa alteração pelo CRUP e pelo CCISP, como foi acordada! Eu próprio reuni duas vezes com a totalidade do CRUP e do CCISP, e não apenas com os presidentes — e o Sr. Secretário de Estado também. Existem notas dessas reuniões e podem conversar com as pessoas que nelas participaram.
Foi pedido que fossem introduzidas certas alterações, e isso foi feito. Como devem imaginar, não compete ao Ministério fazer alterações casuísticas sobre uma fórmula objectiva de financiamento. Aliás, posso entregar aos Srs. Deputados, porque talvez não o tenham, o documento que todas as universidades e todos os institutos politécnicos conhecem e que têm à sua disposição sobre esta matéria.
Com efeito, há dois anos, houve dúvidas sobre o cômputo do número de alunos. Naturalmente, não é o Ministério que vai contar os alunos de cada instituição, são as próprias instituições que reportam ao sistema estatístico nacional o número de alunos inscritos nos diferentes ciclos. E, tendo-se verificado algumas discrepâncias, no entender das próprias instituições (que entendiam que algumas instituições teriam alunos a mais do que aqueles que reportavam e outras alunos a menos), foi pedido ao Ministério que procurasse fazer uma verificação, que não pode deixar de ser uma verificação aproximada, da razoabilidade desses números.
Esse trabalho foi feito com as instituições de ensino superior, a pedido delas, no sentido de verificar se aqueles indicadores eram consistentes com outros indicadores – de graduação, de receitas, etc. – que existem nas próprias instituições e foram corrigidos esses erros e essas anomalias do passado.
Todavia, esse assunto já está tratado desde há um ano. A dúvida que existe, todos os anos, é a de saber se o número de alunos contabilizado na fórmula deve ser o do ano anterior ou uma média dos anos anteriores.
E o acordo do ano passado (não deste), mais uma vez a pedido das instituições do ensino superior, foi que deveria ser uma média dos últimos três anos. Porquê? Por causa da introdução do processo de Bolonha, pela alteração significativa em muitas instituições da duração dos cursos. Portanto, a fórmula do ano passado recorreu à média dos últimos três anos.
Este ano foi acordado com as instituições que era possível e razoável que passasse a ser contabilizada a média dos últimos dois anos porque, quando comparado apenas com o registo do último ano, se verificou que havia flutuações, de ano para ano, nas instituições que eram inconvenientes serem introduzidas e repercutidas sem nenhuma atenuação na fórmula de financiamento.
Isto para explicar aos Srs. Deputados que a fórmula de financiamento é uma fórmula de distribuição do plafond definido para a totalidade do ensino superior na qual há decisões políticas.
Desde logo, a decisão política que determina, face ao plafond do ensino superior, qual o montante que é afecto à acção social escolar. Isto é, da globalidade do orçamento dos fundos disponíveis para o ensino superior, em orçamento de funcionamento, que parte é afecta à acção social escolar.
Disse a Sr.ª Deputada Cecília Honório que não tinha aumentado o investimento público em bolsas. Ora, eu diria que há uma tentação de converter aumentos em diminuições – provavelmente, noutras circunstâncias e noutros debates, não naqueles em que eu participo, as diminuições convertem-se em aumentos para que o equilíbrio fique restaurado e, no fim, as contas do Orçamento batam certas! Mas, de facto, de 2008 para 2009, verifica-se um aumento de 7,9% no investimento público em bolsas.
Portanto, não sei de onde vem a possibilidade de dizer o contrário.
Retomando a questão da fórmula de financiamento, depois de ser definido qual é o plafond que fica livre para o funcionamento, depois da decisão política tomada sobre a acção social escolar (sempre a aumentar ao longo dos últimos anos), o que se faz, todos os anos, é a discussão sobre se há aperfeiçoamentos a introduzir na fórmula de financiamento, ou não.

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Devo dizer-vos que os aperfeiçoamentos à fórmula de financiamento – insisto – são acordados, formalmente, com as instituições de ensino superior, através dos seus órgãos representativos.
Este ano, para não haver dúvidas, porque o pedido tinha sido, inicialmente – designadamente do CRUP e do CCISP –, para que a aplicação da fórmula de financiamento incorporasse alterações significativas, eu próprio reuni com a totalidade dos membros do CRUP e do CCISP sobre esta matéria e o resultado é aquele que está a ser aplicado.
Vários Srs. Deputados fizeram a seguinte pergunta, do ponto de vista da gestão: é razoável que exista uma verba de reserva no Ministério da ordem de 10 ou 20 milhões de euros? Recordo que, em 2008, essa reserva era de cerca de 10 milhões de euros no orçamento do Ministério (e estamos a falar de uma dotação global de 1300 milhões de euros, grosso modo, com a acção social).
Eu diria que é um acto de boa gestão mínima. Seria absolutamente extraordinário e irresponsável que algum dos Srs. Deputados que gerisse um Ministério desta natureza não considerasse a possibilidade de haver uma verba de reserva. E porquê? Os Srs. Deputados devem compreender que as universidades não são direcções-gerais, mas, sim, instituições autónomas. Isto é, as universidades não são instituições em que nós, a meio do ano, tiremos de umas para dar a outras, caso se verifique um problema grave de descalabro orçamental em alguma instituição, por ter tido menos receitas próprias do que aquelas que tenha previsto inicialmente.
Portanto, este é um problema muito sério e acho absolutamente extraordinário que haja Deputados que aconselhem o Governo a praticar um acto de gestão lesiva dos interesses públicos, que conduziria a ter de vir aqui dizer: Srs. Deputados, houve umas instituições que, de facto, ultrapassaram largamente o que tinham inscrito no orçamento e eu não tenho solução. Isto não é razoável, Sr.as e Srs. Deputados, face a instituições autónomas! Em segundo lugar, julgo ter explicado, mas gostava de insistir, porque este assunto é repetido em muitas intervenções, por que razão houve um aumento de apenas 2% em algumas das maiores universidades portuguesas e por que razão houve aumentos muito superiores noutras, etc. Eu explico, mas os Srs. Deputados sabem porquê! Aliás, creio que as pessoas que fizeram estas perguntas sabem perfeitamente qual é a resposta, mas explico porque é minha obrigação explicar de novo.
A razão é muito simples: porque a aplicação desta fórmula de financiamento, desejada pelas instituições de ensino superior – que é desejada até ao momento em que se aplica, depois aplica-se! –, fazia com que algumas instituições tivessem menos do que o que tinham no ano passado. E porquê? Face aos critérios objectivos, umas tinham menos e outras»

O Sr. João Oliveira (PCP): — E os critérios objectivos foram alterados!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não, não!» Posso terminar, Sr. Deputado? Com certeza, o Sr. Deputado irá ter mais uma ronda de perguntas e eu também, para responder.
Portanto, face a estes critérios, desejados pelas instituições, o resultado foi este.
Nos anos anteriores, como é que isto se fazia? Fazia-se da seguinte forma: depois de aplicada a fórmula de financiamento, havia um acordo entre todas as instituições, proposto ao Ministério, que se chamava a fórmula de coesão, que estava para lá da fórmula de financiamento.
O acordo funcionava assim: se a fórmula de financiamento der a uma instituição um aumento superior a 3%, então ela não recebe acima de 3%; se der uma diminuição superior a 2%, também não se lhe aplica uma diminuição superior a 2% e recalculava-se tudo.
Ora, os Srs. Reitores e os Srs. Presidentes dos Politécnicos pediram que essa fórmula de coesão deixasse de ser utilizada. Ou seja, pediram que se aplicasse a fórmula de financiamento e, depois, logo se via como funcionava.
Quando se chegou ao fim, verificou-se, como era de prever, que havia instituições – como tinha acontecido, aliás, nos anos anteriores, sem que fosse aplicada – que iam diminuir bastante. Porquê? Porque tinham menos alunos, porque, de facto, tinham tido custos no ano anterior que tinham aumentado. E, naturalmente, do ponto de vista da gestão, para elas terem mais dinheiro significava que tinham de tirar às outras, pura e simplesmente. Isto é, tinham de tirar dinheiro àquelas que, pela fórmula, ou seja, pela sua capacidade de gestão através de critérios objectivos, tinham mais dinheiro.

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A diferença foi que este ano, a pedido dos presidentes dos politécnicos e dos Srs. Reitores, deixou de se criar o limite que havia de uma instituição só poder aumentar 3%. E havia instituições que estavam a aumentar apenas 3% há vários anos, quando a fórmula dava sempre aumentos de 15% para elas, porque tinham muito mais alunos e porque tinham custos muito significativos.
As propostas do Sr. Presidente do CRUP e do Sr. Presidente do CCISP, que o Governo aceitou, foram no sentido de que, pelo menos, se criasse um mecanismo de coesão, num ano em que havia, manifestamente, um aumento orçamental, que era o seguinte: que ninguém pudesse descer, antes pelo contrário, que todas as instituições aumentassem, pelo menos, 2%. Isso foi proposto e foi aceite. Foi proposto pelo Conselho de Reitores, pelo CCISP e pelos seus presidentes, tendo significado uma redução de transferências para as instituições que, pela fórmula objectiva, deveriam ter mais dinheiro e que o perderam para o entregar a instituições que, em muitos casos, deviam baixar e noutros deviam ficar iguais.
Não há aqui qualquer critério casuístico de dizer «esta instituição tem isto» ou «esta instituição tem aquilo».
E, honestamente, convido os Srs. Deputados a lerem os documentos, a aplicarem a fórmula e a verificarem qual era a consequência, instituição a instituição.
Esta é a verdade sobre a aplicação da fórmula de financiamento ao abrigo da lei de financiamento do ensino superior, a cujo cumprimento estou obrigado e a que os Srs. Deputados também estão obrigados, porque é a lei da República que está em vigor sobre esta matéria.
Outra questão diz respeito ao fundo específico para o desenvolvimento do ensino superior.
Quando este debate começou e foi anunciado que havia uma disponibilidade para funcionamento de um aumento de 90 milhões de euros para este ano, nestas condições difíceis de preparação e de execução orçamental — e muitos Srs. Deputados confundem aumento com diminuição (é um problema que eu não consigo explicar, pois trata-se de um aumento de 90 milhões de euros —, pôs-se a pergunta. Toda a gente no Conselho de Reitores e no Conselho dos Politécnicos entendeu que deveria haver um orçamento competitivo, que esse aumento deveria ser, no essencial, distribuído competitivamente.
Quando os resultados da aplicação da fórmula foram conhecidos e isso foi discutido, houve um pedido por parte do Presidente do Conselho de Reitores, posteriormente também secundado pelo Presidente do Conselho dos Politécnicos, no sentido de que o orçamento competitivo não fosse tão grande. Foram os próprios que pediram um orçamento competitivo que tivesse o essencial do aumento que agora pediam que o orçamento competitivo fosse mais pequeno.
Devo dizer-lhes que eu próprio tinha reunido com os plenários do CRUP e do CSISP para pedir as indicações desses dois órgãos sobre a afectação e os critérios de afectação das verbas do orçamento competitivo. E essa resposta veio. Essa resposta é a seguinte: no que diz respeito aos institutos superiores politécnicos, o pedido que é feito é que três rubricas possam ser contempladas no orçamento competitivo — um programa de formação e de qualificação do pessoal docente do ensino superior politécnico, o crescimento dos cursos de especialização tecnológica e, eventualmente, se for necessário, o financiamento inicial do lançamento dos consórcios de institutos politécnicos. Mas, digamos que o grosso estaria nas duas primeiras rubricas, ou seja, ampliação dos cursos de especialização tecnológica e programa de formação de docentes.
Tal como vos disse, saiu já, ontem, para ser lançado em Dezembro — porque os prazos dos concursos, que são individuais, demoram tempo e têm de se fazer com alguma antecedência para ser possível terem aplicabilidade no orçamento de 2009 —, o edital que define as condições do Programa de Qualificação de Recursos Humanos dos Institutos Politécnicos.
No que diz respeito às universidades, o que está definido, depois de discussão no CRUP, que não foi unânime — eu estive com o plenário do CRUP —, foi que uma componente importante deveria ser a criação de redes de pós-graduação entre universidades, isto é, que várias universidades conjugassem os seus esforços para fazer em conjunto pós-graduações, e que a criação dessas pós-graduações em conjunto fosse financiada por concurso, definindo-se quais eram aquelas que tinham condições para avançar já e aquelas que deviam ser melhor preparadas.
Verificou-se que algumas propostas do CRUP não tinham de ir ao orçamento competitivo, porque havia, em algumas universidades, outras verbas, designadamente em programas operacionais, para as financiar, e que — uma coisa que tanto chocou alguns Srs. Deputados — entrariam a concurso as propostas de contratosprograma que as universidades que passassem a fundações têm direito nos termos da lei. E aquilo que se disse, precisamente, foi que elas entrariam nesse orçamento competitivo com esses contratos-programa. E

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entram em competição com quê? Com todos os outros itens, com a criação de programas de pós-graduação avançadas e com aquilo que há para os politécnicos. Não se definiu uma quota para politécnicos e outra para universidades. E há apenas 24 milhões de euros para o ano que vem. Espera-se que algumas destas medidas tenham, obviamente, repercussão plurianual nos anos seguintes.
Srs. Deputados, se me alonguei muito sobre este ponto, foi porque ele foi muito repetido em muitas intervenções.
O Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes disse que o aumento do auto-financiamento vem das propinas. É falso, Sr. Deputado. As propinas representam, neste momento, se não considerarmos o PIDDAC, representam entre 10% a 12% do orçamento das instituições. Já tive ocasião, nesta Assembleia, de fornecer os dados. E esse número ainda é menor se for reduzido do montante de propinas de doutoramento, que não são pagas pelos estudantes, são pagas directamente pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia às instituições.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Deve ter estado a gerir o ensino superior espanhol nos últimos anos!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, gostaria que me informasse de quanto tempo ainda disponho.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, em tese, dispõe de mais 45 minutos, na exacta medida em que dispõe do mesmo tempo que somaram as sete intervenções dos Srs. Deputados. Todavia, sem, naturalmente, coarctar o seu direito de resposta às questões que lhe foram colocadas, solicito-lhe alguma colaboração, porque às 15 horas tem lugar, nesta Comissão, uma audição da Sr.ª Ministra da Educação. Como ainda irá haver uma segunda ronda de perguntas, seria bom que os trabalhos encerrassem por volta das 13 horas e 30 minutos.
Portanto, se o Sr. Ministro puder, em cerca de 30 minutos, encerrar a sua resposta, ficar-lhe ia muito grato.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, tentarei ser o mais rápido possível.
Vou, então, passar a outros assuntos.
Foi colocada uma pergunta sobre os empréstimos a estudantes, que julgo que foi feita pela Sr.ª Deputada Cecília Honório, mas, se não foi, peço desculpa. Estes empréstimos são garantidos pelo Estado em condições que não existem no mercado, ou seja, sem garantia patrimonial por parte dos estudantes ou das suas famílias.
Estava previsto no plano de financiamento que houvesse 3000 empréstimos nos primeiros 12 meses, mas passaram-se apenas nove meses e eles, neste momento, já são 3600.
Há uma informação, certamente errada, que alguns Srs. Deputados têm, mas julgo que é por falta de leitura da lei. A legislação prevê que, em todos os ministérios, haja uma entidade, chamada controlador financeiro, designado conjuntamente pelo Ministério das Finanças e pelo Ministro da tutela, que tem por função acompanhar os serviços de planeamento do ministério e produzir para o ministro uma informação detalhada sobre as modalidades de execução e os problemas de execução do seu ministério. É a isso que se chama controlador financeiro. Não há controladores financeiros nas universidades mas, sim, em cada um dos ministérios, em todos os ministérios.
Julgo, pois, que se tratou de uma dificuldade de leitura da parte de alguns Srs. Deputados.

O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): — Foi um lapso!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não existe qualquer controlador financeiro ou administrador nomeado pelo ministério em nenhuma universidade.
Os serviços de planeamento do ministério fazem a recolha de informação junto das instituições, pedem-na às instituições e, depois, existem os serviços do Tribunal de Contas, da Inspecção-Geral de Finanças, etc., que elaboram relatórios sobre essa matéria. E, em alguns casos, existem relatórios de auditorias de natureza financeira especiais que são pedidas pelas universidades e feitas pelo ministério, que são entregues às universidades e ao ministério. É tudo o que existe.
Os Srs. Deputados ficam muito aflitos cada vez que se procura ter cuidado com a gestão dos dinheiros públicos e ficam particularmente ofendidos pelo facto de isso poder perturbar ou ferir a autonomia universitária.

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Srs. Deputados, sabem aquilo que pode vir a ferir a autonomia universitária? É haver falta de cuidado nessa matéria. Isso é que pode vir a ferir a autonomia universitária.
A Sr.ª Deputada Cecília Honório pergunta — julgo que é uma pergunta de retórica — ao abrigo de que quadro legal é que se pode substituir os dirigentes que sejam maus. Essa pergunta foi-me feita publicamente e com grande inocência — e é muito engraçado como é que se «enfia a carapuça» tão facilmente — na última reunião do encontro nacional de dirigentes associativos, no domingo passado: «Mas, então, Sr. Ministro, nós todos sabemos que existem gestores maus nas universidades. Porque não os substitui?» Vou responder-lhe, Sr.ª Deputada, tal como na altura respondi: dizendo que acreditava na autonomia universitária.
Existem gestores que são nomeados directamente pelos reitores. Por exemplo, os gestores dos serviços de acção social são nomeados pelos reitores. Por outro lado, existem auditorias, que o Sr. Deputado Manuel Mota indicou, absolutamente extraordinárias, por exemplo, do Tribunal de Contas e da Inspecção-Geral de Finanças, que nos deviam preocupar.
Portanto, espero que os reitores, os responsáveis das instituições, resolvam esse problema internamente, ou corrigindo os mecanismos ou substituindo as pessoas, que são da sua livre e inteira nomeação a partir deste novo quadro legal, que, ainda por cima, lhes dá uma autoridade acrescida nessa matéria, ao contrário do que acontecia no passado, em que em alguns casos dependiam deles para serem eleitos. Não é esse o caso agora.
Ao abrigo de que quadro legal se prevê a substituição de dirigentes? Ao abrigo das eleições, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — A carapuça não é nossa!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — As instituições saberão resolver esses problemas. Nós acreditamos na autonomia universitária.
Houve vários Deputados do PCP — peço desculpa mas estou a falar, mais uma vez, na ordem inversa das intervenções — que falaram da centralização das decisões no Ministério. Suponho que estavam a falar da reserva de 20 milhões de euros (em 1300) em função das necessidades das instituições e do parecer dos serviços técnicos do Ministério. Suponho que era disso que falavam.
Preferiam, com certeza, que a reserva não fosse pública e que houvesse, como acontecia antigamente, uns contratos-programa feitos «debaixo da mesa» com as instituições. Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado, mas isso não é maneira de trabalhar.
Portanto, esta centralização de decisões é uma ficção que alguns Deputados gostam de usar como espantalho. É precisamente este mecanismo que permite garantir a autonomia das instituições.
Depois o Sr. Deputado há-de explicar-me uma coisa. Peço desculpa, mas não sei se foi o Sr. Deputado Miguel Tiago ou o Sr. Deputado João Oliveira quem falou, com uma expressão colorida, do embuste de 1% do orçamento da ciência e tecnologia, que envolve verbas que não são de ciência e tecnologia.
Ó Sr. Deputado, tenho todo o gosto em fornecer-lhe os critérios do Eurostat que somos obrigados a respeitar, que respeitamos e que os nossos serviços, que são independentes nesta matéria, respeitam, mas se V. Ex.ª tem alguma denúncia a fazer sobre a falta de aplicação desses critérios agradeço que a faça imediatamente para eu mandar uma inspecção analisar esta questão, como é minha obrigação.
O custo dos doutoramentos no estrangeiro é fixado pelas universidades estrangeiras, Sr. Deputado. O que as parcerias internacionais fazem é reduzir esse custo, porque quando um estudante concorre à Fundação para a Ciência e a Tecnologia para fazer um doutoramento numa universidade estrangeira apresenta como custos não apenas a bolsa do doutoramento mas também o valor das propinas. Como devem imaginar, a nossa influência universal é muito grande enquanto País mas não vai ao ponto de alterar a política de propinas dessas universidades.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas queria saber quanto é!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Depende das universidades. Existem universidades onde as propinas são nulas. Temos uma lista, que posso fornecer-lhe, com 300 universidades e as respectivas propinas. Existem universidades onde são nulas e existem universidades onde são caríssimas.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é muito pouco rigor!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, se ler o regulamento verá que está tudo lá! Está mesmo indicado um plafond.
De facto, apesar de entendermos que, em certas universidades, é extremamente importante que haja alunos que demonstraram, em regime competitivo, terem mérito para isso — e entendemos que deve continuar a haver uma percentagem significativa de estudantes a doutorar-se no estrangeiro porque isso significa transferência de conhecimento para Portugal —, é verdade que o regulamento impõe limites e plafonds nesses financiamentos. Mas, insisto, esses custos dependem das políticas de propinas das instituições, estão é limitados por regulamento.
Foi feita uma afirmação extraordinária pelo Sr. Deputado em relação a duas matérias — aliás, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita também o disse. Foi dito que havia uns concursos para investigação científica que estavam reservados a umas instituições. O Sr. Deputado vive noutro mundo! Os concursos para financiamento de investigação, quer seja de pessoas, de instituições ou de projectos, estão abertos a todas as instituições científicas. Por lei, os júris desses concursos, que dizem respeito a instituições e a projectos, são quase integralmente constituídos por cientistas de instituições estrangeiras, embora haja alguns portugueses, para não haver a mais pequena dúvida de que não voltamos ao passado, em que tínhamos as próprias instituições a decidir como é que se repartiam as verbas entre elas. Não queremos, com certeza, regressar a esse passado.
Um dos Srs. Deputados do PCP manifestou a sua perplexidade e questionou como será possível passar dos números de 2005 para aqueles previstos para 2010, com o aumento de uns quantos milhares de investigadores.
Vamos aos investigadores, Sr. Deputado. Sabe quantos doutoramentos se fazem, neste momento, por ano? 1500. Sabe quantos novos doutorandos são financiados por ano pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia? 2000. Julgo que é razoável fazer contas: se multiplicar 2000 por 5 dá 10 000; se multiplicar 1500 por 5 dá 7500. E deve saber que há doutorados que vêm para Portugal. Há um número grande de doutorados, centenas, que, neste momento, por concurso, entram nas instituições portuguesas.
V. Ex.ª fez a pergunta sobre os doutoramentos e os investigadores. Eu respondi-lhe com os dados relativos não apenas aos investigadores todos, mesmo os não doutorados, como também aos investigadores doutorados. Portanto, eu diria que este número vai até ser largamente ultrapassado.
Depois, o Sr. Deputado, não gostando da resposta, protestou e falou logo dos técnicos.
É verdade que o Sr. Deputado tem ainda uma visão antiga de laboratórios de investigação, de um investigador rodeado de miríades de técnicos que fazem o trabalho por ele, que vão ver os instrumentos» Isso é nos filmes antigos, Sr. Deputado, em que o investigador era o professor que entrava no laboratório e que, depois, tinha os técnicos, que faziam as manipulações e que iam apresentar ao «Herr professor» os resultados para ele os validar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Tenha vergonha, Sr. Ministro!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Pois, Sr. Deputado, não é assim que isto acontece. Aliás, o Sr. Deputado deveria saber, se tivesse estudado este assunto, que o rácio de investigadores por técnicos de investigação é precisamente uma variável que tem vindo a modificar-se muito significativamente em todo o mundo.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quanto é na União Europeia a 25?

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Pois é, Sr. Deputado, eu posso discutir consigo essa questão quando quiser! Não vou comentar algumas frases menos polidas e expressões como «chantagem», etc. Acho que não vale a pena, portanto passarei a responder a outro orador.

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Sr. Deputado José Paulo Carvalho, a muitas das questões que me colocou já respondi, designadamente no que se refere às fórmulas de financiamento.
Quanto à rotura financeira e aos reforços, o Sr. Deputado tem à sua disposição a totalidade das informações sobre a execução financeira de todas as instituições de ensino superior. E quando os Srs. Deputados recebem representantes de um grupo de instituições em vésperas de debate orçamental julgo que seria normal solicitarem-lhes os elementos objectivos da execução financeira, que estão, aliás, disponíveis no site da Direcção-Geral do Orçamento e pelas próprias instituições.
Esta é uma questão que interessaria discutir com seriedade, porque tem a ver com o modelo de ensino superior no que diz respeito às receitas próprias.
Dentro de dois meses, teremos esta informação fechada relativamente a 2008, agora temos as contas até Setembro de 2008. Mas em 2005, 2006 e 2007, anos em relação aos quais as contas estão fechadas, temos uma receita cobrada nas instituições de ensino superior que inclui as transferências do Orçamento do Estado e muitas outras receitas cobradas, das quais as propinas, repito, são apenas uma pequena parte, 10% ou 12%, consoante se inclua ou não o PIDDAC.
Portanto, temos umas verbas que, no total, orçamento e investimento, passam de 1800 para 1860 e para 1867» Estamos a falar das contas fechadas. Se olharmos apenas para o orçamento inicial destas instituições verificamos que este é menor, ou seja, as instituições, no orçamento inicial, declaram menos receitas esperadas do que aquelas que realmente cobram, com uma diferença muitíssimo significativa. E, no que diz respeito ao Orçamento do Estado, este é apenas uma parte de todas as receitas cobradas.
Respondendo a uma questão que vários Srs. Deputados levantaram, sobre a passagem a fundações, posso dizer que são pouquíssimas as instituições em Portugal que, nesta fase, têm condições para ter receitas próprias com um nível de 50% da totalidade do seu orçamento realizado. Além das três instituições que o solicitaram, haverá talvez mais uma, neste momento, a ter essas condições. Estamos a falar de universidades ou de politécnicos no seu conjunto. Claro que no interior de um politécnico ou de uma universidade existe uma ou outra escola que poderia ter essa função, mas quanto a universidades ou politécnicos no seu conjunto basta ver as contas.
Alguma vez esperávamos que pudesse ser diferente? Não, Srs. Deputados. Estas são as instituições, talvez com mais uma ou duas, dependendo da sua evolução orçamental, que tinham condições mínimas — já não falo de planos estratégicos de gestão, etc. —, orçamentais e financeiras, que garantissem aos cidadãos que esse estatuto de autonomia reforçada tinha, pela sua história, condições de realização.
O Sr. Deputado colocou-me uma questão sobre a racionalização da rede, dizendo que a intervenção feita a esse nível não chega. Aliás, o Sr. Deputado não disse que não chega, eu é que estou a traduzir o que disse benevolamente.
Sabe, Sr. Deputado, é que isso não tinha sido feito antes!» E, portanto, os mecanismos de racionalização de rede que já foram feitos, quer ao nível das pós-graduações e da investigação, quer ao nível das licenciaturas, fizeram com que as instituições tivessem de acabar com a pulverização de recursos em cursos que ninguém queria, com excepção, naturalmente, daqueles cursos que têm de existir em Portugal qualquer que seja o número de alunos, e essas excepções são largamente contempladas hoje na lei. Pois isso foi aplicado, está a ser aplicado, e foi aplicado de uma forma decisiva. Portanto, neste momento, temos uma maior concentração de recursos, mas isso não chega.
E a primeira reorganização, para quem apela para a reorganização, é a reorganização que as próprias instituições têm de fazer dentro de si mesmas, muitas delas com uma miríade, uma plêiade, como diria o Sr.
Presidente, que gosta da linguagem clássica, de unidades orgânicas. Podemos ver que os grandes «campeões» da reorganização são aqueles que fizeram estatutos agora em que aumentaram o número de unidades orgânicas. Da boca para fora dizem «Governo, reduza, faça lá a reorganização», mas na sua própria casa onde é que está essa reorganização? E não deve o Governo, no pleno respeito pela autonomia universitária, insistir para que haja uma maior concentração de esforços, para que não haja uma proliferação de unidades orgânicas e para que haja uma redução desse número quando isso se justifica? O movimento, provavelmente mais interessante neste momento, de resposta ao apelo do Governo nesta matéria vem dos institutos politécnicos, na tentativa de se começar a criar pontes para a criação de consórcios entre institutos politécnicos com base regional. E este trabalho e este diálogo tem vindo a ser feito entre o

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Governo e o Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos, e estou convicto de que chegará a bom porto, porque o queremos fazer em conjunto com os institutos politécnicos no próximo ano.
Pergunta a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa: «Sr. Ministro, mas porque é que não faz consórcios mistos, juntando institutos politécnicos e universidades?» Sr.ª Deputada, não quer, com certeza, acabar com o ensino superior politécnico em Portugal! No dia em que acabar com um instituto superior politécnico — não sei se leu as actas de cada um deles — e fizer com que entre numa universidade significa que acabou a prazo e tem de criar um instituto politécnico para que haja ensino superior politécnico.
Este é um problema de respeito pela lei de bases do sistema educativo, a que todos estamos obrigados, e de respeito pelo sistema binário, que procurámos reforçar.
Que haja escolas politécnicas que se integraram em universidades na ausência de institutos politécnicos na sua região é uma coisa, que haja institutos politécnicos no seu conjunto que se integrem completamente em universidades é acabar com o ensino superior politécnico e dar voz àqueles que querem acabar com o sistema binário e que querem, de facto, acabar com o ensino politécnico em Portugal. E isso, lamento muito, não será este Governo que o vai fazer.
Porque é que os Srs. Deputados não perguntam a esses dirigentes universitários porque é que não fazem consórcios com as outras universidades? Várias vezes o Governo solicitou às universidades de Lisboa — quatro (três universidades e o ISCTE), se não considerarmos a Universidade Aberta, porque tem um âmbito diferente — para encontrarem formas de colaboração mais estreitas, designadamente a possibilidade da criação de consórcios. Não o fez por decreto, como foi feito noutros países, por exemplo na Dinamarca. Não, fê-lo no pleno respeito pela autonomia institucional, sobretudo num processo de transformação como este, em que entendemos que o primeiro movimento deveria vir das próprias instituições. Como está a vir da base das instituições, porque os respectivos professores estão já a tentar fazer doutoramentos em conjunto. Mas não têm um quadro legal encorajador desse movimento. Esse quadro legal é, neste momento, da responsabilidade das próprias instituições, e tudo faremos para que elas o aproveitem.
Seguidamente, gostaria de responder em relação aos pontos que ainda não foram abordados.
Os Srs. Deputados Fagundes Duarte e Miguel Mota referiram-se à questão, de que irei falar mais adiante — peço desculpa por não responder directamente —, dos maiores de 23 anos.
No que diz respeito aos chamados relatórios da EUA (Associação Europeia das Universidades), julgo que a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa confundiu»

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Sr. Ministro, tenho aqui o documento!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Como deve compreender, conheço bem os relatórios. Aliás, foi o meu ministçrio que os colocou em põblico» Mas, porque, certamente, não leu todos os relatórios, gostava de lhe explicar que foi o ministério que, pela primeira vez, fez com que passasse a haver avaliação institucional em Portugal feita por entidades externas.
Antes, tal nunca tinha acontecido. Como sabe, eram as universidades e os politécnicos que designavam colectivamente os avaliadores que os avaliariam a eles próprios. E avaliavam cursos, não instituições. Isso está a ser feito, é um processo que está em curso, e que tem tido um impacto significativo nas instituições.
Este processo já começou há mais de dois anos, antes do RJIES (Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior) e apela, em todos os relatórios iniciais, do primeiro ano (são os que estão neste momento disponíveis), a uma grande confusão institucional» Leiam o relatório sobre a Universidade de Coimbra! É de uma tristeza o relatório de avaliação que é feito, sobre a proliferação de poderes e contrapoderes numa universidade! A leitura desse relatório deve-nos encher a todos de tristeza! E deve, com certeza, encher de brios a Universidade de Coimbra no sentido de resolver esse assunto, agora, que tem um quadro legal que não só encoraja como incita a que esse problema seja resolvido! A resposta está dada, precisamente no novo regime jurídico; mas a verdadeira resposta tem também de ser dada pelas próprias instituições.
Já falei da forma de financiamento, do fundo específico, das receitas próprias»

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Sr.ª Deputada, é absolutamente extraordinário que se possa imaginar esta ideia de instituições autónomas para as quais as receitas próprias seriam uma espécie de trocados para ir ao cinema no fim do dia, ou seja, que as receitas próprias não eram parte integrante das verbas de funcionamento e de investimento das próprias instituições. Em todo o mundo as universidades públicas, designadamente na Europa, têm receitas próprias muitíssimo superiores em percentagem às portuguesas.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Sr. Ministro, aquilo que lhe disse é que 13,6% vem de receitas próprias para pagamento de salários.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr.ª. Deputada, deixe-me continuar senão não conseguirei terminar dentro do período de tempo que o Sr. Presidente me pediu.
A Sr. ª Deputada não estava presente no encontro que teve lugar com o Primeiro-Ministro em Julho, mas não houve nenhum compromisso de criação de um fundo de tesouraria nem de outra coisa parecida. Pode confirmar com qualquer pessoa que tenha estado presente — e estavam presentes dezenas.
A Sr.ª Deputada também diz que a recuperação orçamental do ensino superior não existe. Pois não, só existem mais 90 milhões de euros! Gostaria de terminar a minha intervenção referindo-me a uma questão que me preocupa muito do ponto de vista político para o futuro. E espero que, simplesmente, nos tenhamos compreendido mal em relação a esta matéria, que considero ser uma questão crítica. O Sr. Deputado Manuel Mota levantou esta questão e eu gostaria, portanto, de me referir a ela.
O parecer do CNE que referiu — que é extremamente elogioso para a política do ensino superior do Governo — diz que seria bom que houvesse mais estudos, feitos e definidos pelas próprias instituições, sobre a qualidade dos mecanismos de selecção dos alunos. Estamos, mais uma vez, a falar de qualquer coisa que está dentro do regime legal geral. Quer dizer, as universidades devem escolher os seus próprios alunos.
Mesmo em relação aos alunos de 18 anos que entram nas universidades, são estas que decidem como os escolhem. Podiam fazer exames próprios»

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Uma média nacional!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Não, peço desculpa, mas está equivocada.
A lei manda que as universidades façam o processo de selecção.
As universidades — podem decidir de forma diferente de um ano para o outro — é que decidiram usar as médias dos exames nacionais como elemento para a entrada no ensino superior. Mas nada impede as universidades, este ano, para o ano que vem — é pura decisão delas próprias! —, de decidirem: «Desculpem, mas não vai ser assim, vai deixar de ser assim.» Por exemplo, as faculdades de Direito ou de Engenharia podem juntar-se e fazerem exames próprios de admissão. A lei diz que é isso que deve acontecer, ou seja, as universidades dizem: «Não queremos fazer isso e basta-nos aceitar os exames nacionais», para que os alunos não tenham uma carga de trabalhos, não tenham mais de dois exames, etc. Por muito boas razões decidem, portanto, fazer isso. É o que acontece em Portugal e é assim que acontece em muitos países da Europa, ou seja, além das médias nacionais existem exames feitos pelas instituições.
No que diz respeito aos maiores de 23 anos, como há as notas dos exames nacionais, precisamente porque há um regime diferente, são as universidades que decidem do seu mecanismo de aferição.
Mas também devo dizer, Sr.ª Deputada, que a Direcção-Geral do Ensino Superior e a inspecção do meu ministério têm feito acções de controlo do respeito da legalidade dos mecanismos de entrada dos maiores de 23 anos em todas as instituições públicas e privadas de cada vez que existem indícios de que esse número possa ser maior do que aquelas que são as capacidades da instituição ou de que há alguma anomalia na progressão desses números. E esses relatórios, nalguns casos, têm dado lugar a averiguações que têm sido transmitidas às próprias instituições, que, por seu lado, têm introduzido mecanismos correctivos.
No essencial, as universidades e os institutos politécnicos, com base nesses trabalhos inspectivos, têm cumprido, no essencial, aquilo que está estritamente previsto na lei. Mas só há uma maneira de, realmente, aferir da bondade destes mecanismos: a de, ao longo do tempo, as instituições, como são obrigadas, viremnos a dar informação sobre o sucesso escolar dos alunos que entraram por essa via.

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Mas há uma coisa que lhe peço, Sr.ª Deputada: não junte a sua voz e a voz do PSD ao concurso das vozes conservadoras que, na sociedade portuguesa, estão apenas contra que pessoas de classes sociais que nunca tinham entrado na universidade passem a entrar.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Não diga uma coisa dessas!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Porque este número — 11 000 alunos —, por comparação internacional, é muito pouco! Envergonha-nos entrarem apenas 11 000 alunos fora da via normal de acesso ao ensino superior dos estudantes que terminam o 12.º ano e que concorrem ao ensino superior! É pouco! Em termos internacionais, mostra que a universidade e o ensino superior português ainda não respondem às necessidades sociais de formação superior da população portuguesa, apesar de estarem, sim, a fazer um enorme esforço. E sabemos que grave é o défice de qualificação dos adultos trabalhadores em Portugal! Portanto, dizer-me que é preocupante este aumento — escrevi-o entre aspas — e que é um número para as estatísticas, lamento muito, mas não lhe fica bem, Sr.ª Deputada. Gostaria que, se fosse possível, me esclarecesse e me sossegasse, dizendo-me que o PSD está com o Governo no sentido de aumentar o acesso ao ensino superior dos adultos que não tiveram condições de o fazer.
Deveria também virar-me para as outras bancadas a pedir essa confirmação.
Sr. Presidente, muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro ter respeitado o meu pedido, dado estarmos com o tempo limitado.
Agora vou pedir também aos Srs. Deputados que cumpram rigorosamente os 5 minutos que lhes estão acometidos para intervirem.
A Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa pediu a palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro falou na posição conservadora do PSD, quando apenas levantei uma questão que é levantada pelo Conselho Nacional de Educação.
Diz o Conselho Nacional de Educação que falta aferir rigor no acesso depois dos 23 anos. E porquê? Porque em 2004/2005 entraram 551 adultos para o ensino superior, mas deixou de haver exames de aferição e, no último ano, entraram 11 733.
Como é evidente, eu e o PSD ficaremos satisfeitíssimos se todos conseguirem ter uma licenciatura, mas com rigor e não de qualquer maneira, como acontece com as Novas Oportunidades. Acabam-se os exames de admissão e temos as universidades a colaborarem com estas estatísticas vergonhosas. Vemos que pessoas que não estão minimamente preparadas tiram uma licenciatura. Mas depois vão fazer o quê? Ainda ontem nos foi dito aqui, por alguns dirigentes, que há pessoas que entram para algumas destas universidades fazendo apenas uma redacção ou uma entrevista. Pergunto ao Sr. Ministro se isto é normal.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, fiquei bastante mais preocupado.
Em primeiro lugar, permita-me que lhe dê uma informação. Como sabe, sou professor do ensino superior e, durante vários anos, dei aulas a alunos trabalhadores, na minha escola. Fiz mesmo os exames próprios da escola que complementavam o exame nacional ad hoc. Ou seja, havia um exame nacional ad hoc e, além disso, os alunos faziam exames específicos na minha escola. Hoje, continuam a fazer exames específicos, apenas não existe o chamado exame nacional ad hoc. Essa é a diferença.
Qual era a situação? É que o exame nacional ad hoc, o tal que deixava passar 500, era — pasme-se, Sr.ª Deputada! — um exame de Literatura Portuguesa. Eu tinha alunos que eram técnicos de radar do aeroporto

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de Lisboa ou chefes de oficinas de electrotécnica que sabiam mais do que muitos dos meus assistentes sobre essas matérias, mas que, de facto, não passavam no chamado exame ad hoc e tinham de ter explicações durante um ou dois anos para o conseguirem fazer. Era assim que, depois, entravam. Este era um mecanismo natural de selecção social que tinha de ser removido.
Percebo todas as preocupações e que tome as dores desta situação, mas são as próprias instituições que têm essa responsabilidade. Acredita na autonomia das instituições ou não?

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Acredito!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Acredita nos mecanismos de inspecção de cada vez que existe uma denúncia ou não?

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Não existem!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Peço desculpa, Sr.ª Deputada, existem.
Portanto, o que me parece extraordinário são as suas palavras: «vergonhoso», «preocupante», «número para as estatísticas». Isto ficará para a história e só espero que o seu partido não a siga nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.

A Sr.ª Helena Lopes da Costa (PSD): — Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada usou o direito de defesa da honra como muito bem entendeu, a que o Sr. Ministro respondeu. Se houver lugar a réplica, vou ter de dar a palavra ao Sr. Ministro para a tréplica, e isto é infindável. Portanto, vamos ficar por aqui, sem prejuízo, naturalmente, de a Sr.ª Deputada, se quiser, poder voltar a intervir na segunda ronda.
Vamos, então, começar a segunda ronda de perguntas. Cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos.
Começando novamente pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Vieira.

O Sr. Sérgio Vieira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o problema que se coloca ao ensino superior não é o de saber quantas páginas ou quantas linhas ele tem lugar nas intervenções que V. Ex.ª profere. O problema do ensino superior é a grave situação financeira em que vivem as nossas universidades e os nossos institutos politécnicos devido a cortes de investimento que o Governo de V. Ex.ª tem feito ao longo destes últimos anos.
De resto, se poderíamos dizer, em 2006, que o ensino superior era o parente pobre deste Governo, hoje, com o Orçamento do Estado que discutimos, dizemos que é o filho rejeitado deste Governo nas áreas que V.
Ex.ª tutela.
A situação é grave e preocupa o Grupo Parlamentar do PSD. Sabemos que também preocupa o Governo.
Mas o que fez o Governo? Fez, uma vez mais, uma acção de propaganda nesta matéria.
Senão, vejamos! Em Janeiro deste ano, o Sr. Primeiro-Ministro, conjuntamente com V. Ex.ª, faz uma reunião com os reitores. Dessa reunião fica marcada uma segunda reunião para Março para continuarem a discutir as mesmas matérias. Não houve reunião em Março, só em Julho, quatro meses depois, porque, durante este tempo, não houve espaço na agenda do Sr. Primeiro-Ministro para se sentar com os reitores.
Tudo o que estou aqui a dizer hoje, Sr. Ministro, são dados que foram transmitidos ontem à comissão, numa reunião em que nem todos estivemos presentes, pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.
Sr. Ministro, foi-nos transmitido que o Sr. Primeiro-Ministro, nessa reunião em Janeiro (a de Julho não conta muito, porque foi somente um remake da reunião de Janeiro), disse três coisas essenciais: primeiro, elogiou os reitores pela forma como estavam a gerir as suas universidades em termos de contenção financeira; segundo, disse que reconhecia que tem havido um desinvestimento público no ensino superior; terceiro, disse que o ensino superior ia ser uma prioridade orçamental.

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Ora bem, posto isto, o que é que acontece? Em Janeiro, temos o Sr. Primeiro-Ministro a elogiar os reitores pela sua gestão e, há dias atrás, temos o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a dizer que existe uma má gestão nas universidades. Temos o Sr. Primeiro-Ministro a dizer que o ensino superior será uma prioridade orçamental, mas vemos no Orçamento do Estado que não é uma prioridade orçamental.
Primeira pergunta: para que é que serviram estas reuniões com os reitores? Se é verdade que o Sr.
Primeiro-Ministro elogia o trabalho dos reitores na administração das suas faculdades, como se explica a intervenção recente de V. Ex.ª pondo em causa (foi o que transpareceu para todos) o trabalho dos reitores nas suas universidades? Sr. Ministro, tendo em conta a situação em que vivem as nossas universidades e os nossos politécnicos, o colapso financeiro que atinge algumas universidades e que pode vir a atingir outras no futuro, queria colocarlhe duas questões.
Primeiro, Sr. Ministro, perante a situação em que vivem as nossas faculdades e os nossos politécnicos, temos uma intervenção de V. Ex.ª a criticar a gestão dessas universidades. Mas esse é um gesto político de V.
Ex.ª e necessitamos de uma avaliação técnica, rigorosa sobre o que se está a passar nas faculdades.
A minha colega Helena Lopes da Costa falou do estudo da Associação Europeia das Universidades. A verdade é que o Governo criou a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, mas essa Agência tarda em aparecer. Já foi nomeado o conselho de curadores, falta nomear o conselho de administração. Falta essa Agência começar a trabalhar! De há três anos a esta parte que não há avaliação do que está a acontecer no ensino superior.
Por isso, Sr. Ministro, pergunto-lhe: quando é que, de uma vez por todas, esta Agência começa a funcionar no terreno e a avaliar o que está a acontecer no ensino superior? Para terminar, Sr. Ministro, quero deixar-lhe uma preocupação do Grupo Parlamentar do PSD. Em relação ao que está a acontecer nas universidades e nos politécnicos, julgo que a autonomia universitária começa, se não a ser beliscada, a ficar em risco, porque é preocupante ver as universidades reféns em termos orçamentais de decisões casuísticas do Ministério de V. Ex.ª e compreendo quem possa pensar que exista aqui uma tentação de querer dominar, domar, domesticar, silenciar as universidades que temos em Portugal.
Na verdade, Sr. Ministro, a preocupação que fica é esta: as universidades servem para formar homens e mulheres livres; as universidades nunca podem vir a ser qualquer direcção-geral que sirva para pagar salários e para, através de um qualquer computador Magalhães, formatar homens e mulheres em Portugal. Esta é uma preocupação que deixo a V. Ex.ª, porque ficámos preocupados com a exposição que ontem ouvimos quer dos reitores das universidades portuguesas quer dos responsáveis pelos politécnicos em Portugal.

Entretanto, assumiu a Presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.

O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, com base no último recenseamento geral da população feito pelo Instituto Nacional de Estatística em 2001, existiam em Portugal mais cidadãos analfabetos que cidadãos licenciados. Esta era a nossa fotografia em 2001, uma fotografia muito cinzenta.
Em 2002, 2003, 2004 e 2005, o PSD e o CDS, então no governo, não contribuíram para o aumento do número de licenciados, proporcionalmente, bem pelo contrário. De acordo com os dados que tenho, entre 2003 e 2005, diminuiu consecutiva e sistematicamente o número de ingressados no ensino superior na primeira fase, já para não falar dos adultos. Ou seja, Portugal necessita urgentemente de qualificar a sua população e estivemos perante políticas que fizeram com que as universidades não pudessem contribuir para essa qualificação.
De 2005 a 2008, este Governo possibilitou que as universidades e os politécnicos pudessem abrir-se a novos públicos e captar novos estudantes e hoje temos um aumento constante da qualificação entre os anos de 2006 e de 2008.
Esta realidade é muito importante para percebermos o contexto em que estamos a trabalhar, o País que somos e a importância estruturante da aposta na qualificação que é feita por este Governo.

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Permitir-me-ia referir, aqui, Sr. Presidente, que não é verdade quando se diz que não há uma aposta significativa na qualificação, no conhecimento e na ciência, neste país. Dou apenas esta analogia: o Programa Operacional do Potencial Humano, que foi negociado em Bruxelas no âmbito do QREN, tem inscritos 8,8 mil milhões de euros para a qualificação dos portugueses. Para quem tem dificuldades com números, traduzo isto em realidades bem mais palpáveis e concretas: significa, aproximadamente, dois aeroportos e meio internacionais de Lisboa, de acordo com o valor estimado para a sua construção. E, para pessoas que ainda tenham mais dificuldade em compreender, significa cerca de 20 barragens do Alqueva.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Água têm vocês metido!

O Sr. Bravo Nico (PS): — É esta a magnitude da importância do investimento na qualificação dos portugueses.
Obviamente, este número não tem qualquer suplemento de demagogia ou de populismo que VV. Ex.as utilizam. Esta é a realidade pura e dura.
Este é um elemento estruturante das políticas deste Governo. De facto, a aposta no conhecimento, na tecnologia, na inovação e na qualificação dos portugueses tem sido a marca não só do orçamento deste Ministério ou do Ministério da Educação. É a marca dos Orçamentos do Estado para 2006, 2007, 2008 e 2009.
É por isso que estamos aqui, durante o dia, no epicentro orçamental português e que VV. Ex.as têm uma enorme dificuldade em conseguir construir argumentos que rebatam uma evidência que é incontornável e indesmentível face à magnitude da importância que lhe é dada.
E o que resulta daí? É que poderia haver um enorme investimento em todo este cluster do conhecimento, da ciência, da tecnologia e da qualificação e não haver resultados nenhuns. Poderia acontecer, mas isso não acontece, porque a realidade é que verificamos que há mais doutores em Portugal, mais patentes registadas, mais publicação científica, mais alunos nas universidades, mais alunos nos politécnicos, mais alunos em Medicina, mais alunos em cursos de tecnologia, mais adultos no ensino superior,»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas há menos dinheiro para as universidades!

O Sr. Bravo Nico (PS): — » há mais escrutínio põblico das instituições, há mais avaliação internacional, há mais sucesso dos alunos que estão na universidade, colocando Portugal ao nível do patamar médio da OCDE, que é de 70%, há mais parcerias internacionais, há mais presença de portugueses e de instituições portuguesas nas redes científicas internacionais, há mais escrutínio e mais qualificação das instituições ao abrigo do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES).
Ao contrário do que muitos aqui disseram hoje, é obrigatório as instituições terem corpos docentes qualificados. Não é uma questão de opção, é uma questão de lei, de obrigação legal, e as instituições terão de cumprir essa lei. Estão previstos mecanismos de apoio para que as instituições públicas de ensino politécnico e de ensino universitário possam cumprir essa qualificação do seu corpo docente.
A realidade, em muitos casos, é completamente inversa ao discurso da oposição.
Gostaria de realçar algo muito importante: hoje, há uma atitude no País completamente diferente no que diz respeito à ciência, ao conhecimento e à tecnologia. O País, hoje, acredita que só terá futuro se apostar decisivamente neste cluster da agenda da Europa, da Agenda de Lisboa, que é a agenda dos países mais desenvolvidos.
Não podemos ter qualquer dúvida de que este Governo apostou e aposta naquilo que é estruturante do desenvolvimento económico, social e humano do nosso país. Ora, a oposição está contra este investimento, está contra esta opção»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!

O Sr. Bravo Nico (PS): — » e este País, com esta oposição, ficaria condenado a uma situação de subdesenvolvimento, que é perfeitamente inaceitável.
Gostaria agora de colocar algumas questões ao Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

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Em primeiro lugar, penso que é muito importante termos consciência de que parte significativa do orçamento da ciência é destinada também a ser utilizada pelas instituições do ensino superior. Gostaria que o Sr. Ministro pudesse explicar aqui de que forma é que as instituições têm recorrido aos financiamentos para a ciência e qual a importância que este financiamento para a ciência tem hoje nas instituições de ensino superior, não só nos seus planos de investimento como também ao nível do seu funcionamento.
Sr. Ministro, gostava de lhe colocar uma questão muito concreta, solicitando-lhe alguma informação relativamente ao papel e à importância que hoje é consignada, em termos de financiamento, às instituições de ensino superior que se localizam nas regiões do interior, particularmente em regiões com alguma fragilidade demográfica e em territórios de nível socio-económico mais desfavoráveis.
Sabemos que há, hoje, mecanismos suplementares de financiamento para fazer face a esta situação e, por isso, gostaria que o Sr. Ministro se referisse a este aspecto.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Jorge Neto.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, tentarei ser breve.
O Sr. Ministro tem o dom de responder e até de falar durante muito tempo, mas rodeia e torneia as questões sem nunca ir ao essencial daquilo que lhe foi perguntado, abordando os temas sem os esclarecer.
Mas já andamos nisto há vários anos e, sinceramente, não vou passar estes 5 minutos de que disponho a repetir apressadamente as perguntas que coloquei nos 10 minutos anteriores em que usei da palavra! Se o Ministro não quer responder não responde, pronto! Porém, ficamos todos sem saber por que razão o Sr. Ministro diz que há excesso de execução orçamental das universidades, enquanto os Srs. Reitores vieram, aqui, ontem dizer-nos que há uma parte muita significativa das universidades que podem entrar em ruptura financeira já no próximo ano. Algumas já entraram em ruptura financeira este ano, mais duas podem entrar agora e mais três ainda no próximo ano.
Tudo isto fica por esclarecer, Sr. Ministro. Mas, pronto, o que havemos de fazer?! O Sr. Ministro não quer responder, não responde! No entanto, devo dizer-lhe que isso não lhe fica nada bem.
Por outro lado, o Sr. Ministro acusa a oposição, ou pelo menos parte dela — penso que não fui incluído nesse número, e ainda bem —, de transformar aumentos em diminuições.
Mas a sua especialidade, Sr. Ministro, é transformar diminuições de financiamento em aumentos de financiamento. Esse é o verdadeiro «milagre» que o Sr. Ministro consegue fazer. É por isso que lhe vou colocar algumas questões muito concretas.
Em 2006, a percentagem da verba do orçamento do Ministério destinada ao ensino superior era, tendo em conta dados que ontem nos foram cedidos pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), de 49% e para 2009 é de 39%. Pergunto: Sr. Ministro, não vai transformar esta diminuição num aumento?! O CRUP disse-nos, que mantendo as percentagens anteriores, não havia problemas de financiamento no ensino superior.
Sr. Ministro, justifique — seguramente, esta diminuição é uma opção política da sua parte — por que razão é assim.
Por outro lado, o Sr. Ministro referiu — e é um dado positivo — o aumento quer de doutorados quer de doutorandos. Obviamente, este aumento a todos nos satisfaz. Mas a questão é que a remuneração de um professor que passe a doutorado passa para cerca do dobro. Ora, não há qualquer relevância orçamental para este facto.
Portanto, o Sr. Ministro, por um lado — e bem — tem capacidade de prever o aumento dos doutorados, mas não dá qualquer relevância a esse facto do ponto de vista orçamental.
Sr. Ministro, com esta falta de fundos, as universidades, por razões de impossibilidade de caixa, acabam por não poderem candidatar-se aos fundos europeus. Sr. Ministro, como pretende resolver esta questão? A outra pergunta que gostaria de lhe colocar é a seguinte: o Sr. Ministro já aqui falou um pouco sobre a Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior, mas a verdade é que, por decisão sua, foram perdidos, no mínimo, dois anos. Foram dois anos em que nada aconteceu, nem

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funcionou o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) nem esta nova Agência. Sr.
Ministro, como tenciona ultrapassar este atraso de dois anos, que é da sua exclusiva responsabilidade?

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, gostava por começar por tecer uma pequena consideração, constatando um facto que desmonta as declarações do Sr. Deputado Bravo Nico quando afirma que há 8000 milhões» Sr. Deputado, estamos a discutir, na especialidade, o Orçamento do Estado no que respeita ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Não venha para aqui com a propaganda do Governo! O programa operacional temático potencial humano desapareceu do PIDDAC deste Ministério. Sr. Ministro, tenha o mínimo de tino, vamos discutir o que está em cima da mesa e não venha para aqui fazer a propaganda a que já nos habituou, essa telúrica propaganda que vem da sua dessa sua magnífica câmara magmática com que todos os dias nos presenteia»

Protestos do Deputado do PS Bravo Nico.

Sr. Ministro, a desonestidade com que tentou distorcer aquilo que eu disse vai ser contraditada através da reiteração das perguntas que lhe vou colocar.
O que há pouco lhe perguntei foi o seguinte: vai assegurar 5,5 mil milhões de euros para garantir os 180 000 € per capita de investigador, que, aliás, é a meta colocada na Estratégia de Lisboa, que este Governo subscreve? Isto é, se cumprir o que diz, em 2010, o Sr. Ministro vai ter uma verba de 180 000 € per capita de investigador efectivo a tempo integral que corresponde a 5,5 mil milhões de euros. É isto? Sobre a ratio técnicos/investigadores, Sr. Ministro, a média da União Europeia a 25 — pelos vistos, quem não estudou a matçria foi o Sr. Ministro» Já agora, limite-se a responder às perguntas, em vez de tecer considerações dessa natureza.
Mas, dizia eu, na União Europeia a ratio técnicos/investigadores é de 1 técnico para 2 investigadores, enquanto que em Portugal é de 1 para 8. Sr. Ministro, vai dizer-me que os outros 24 países estão a tentar acompanhar Portugal, certamente, que somos pioneiros!? Que estão todos a diminuir o número de técnicos!?

Risos.

Ó Sr. Ministro, não ridicularize! Não quererá, certamente, que os investigadores façam a manutenção das máquinas, as análises» Ó Sr. Ministro, há um mínimo! Seja honesto! As pessoas que estão nos laboratórios sabem perfeitamente que a sua conversa não joga com a realidade.
Quanto às propinas e à degradação da qualidade, o Sr. Ministro acabou de dizer que as receitas próprias devem ser utilizadas pela instituição. Certo, as receitas próprias devem ser utilizadas pela instituição, mas diz a lei do financiamento que este Sr. Ministro não revoga nem altera que as propinas não podem ser aplicadas no funcionamento regular das instituições. Isso passa-se hoje. Que medidas vai tomar? A acção social escolar, de 2005 para agora, comparando com a estimativa de execução de 2005, diminuiu 35%. Quantos estudantes pediram empréstimos perante esta diminuição? Quantos estudantes «angariou» este Governo como clientes para a banca através da diminuição da acção social escolar no ensino superior? Quantos emprçstimos são concedidos»

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas pede-me o Sr. Ministro se não se importa de repetir a questão anterior.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O que eu disse é que, de 2005 até hoje, há uma diminuição acumulada de cerca de 29%» Peço desculpa, eu referi 35%, mas efectivamente ç de 29%. Enganei-me.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Da acção social escolar?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Da acção social escolar.

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Muito obrigado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quantos desses empréstimos foram contraídos por bolseiros neste sistema de angariação que o Governo conseguiu garantir à banca? Mesmo para terminar, Sr. Ministro, devo dizer que a questão dos maiores de 23 anos é muito simples.
Obviamente, toda a gente saúda a entrada de novas franjas da população no ensino superior. Aliás, até pode contar com um contributo para isso por parte deste grupo parlamentar. Com o que não pode contar é com o apoio à propaganda que é feita porque é cada vez menor o financiamento por estudante.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Eugénio Rosa, vou dar-lhe a palavra, mas o Sr. Deputado Miguel Tiago já excedeu em 1 minuto o tempo de que o PCP dispunha.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Vou ser telegráfico, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro afirmou que as outras fontes de receita não eram financiadas pelas propinas.
Vou levantar uma questão de forma objectiva.
Estive a olhar para os dados que nos foram fornecidos relativos a 2009 e verifico que o crescimento na rubrica «Outras fontes» é quase o triplo do verificado relativamente ao financiamento proveniente do Orçamento do Estado.
A este propósito, queria levantar uma questão que me parece que tem sido esquecida ou que, pelo menos, nunca vi ser tratada.
A introdução do Processo de Bolonha determinou que os cursos com duração de quatro ou cinco anos fossem repartidos por dois ciclos. O que está a acontecer, na prática — e gostava de ouvir o Governo dizer o que tenciona fazer —, é que, no mercado de trabalho, não a nível teórico, o 1.º ciclo corresponde mais ou menos ao bacharelato que existia e,»

Protestos do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.

» para se ter o ensino superior completo, ç preciso o mestrado. Na prática, o mercado está cada vez mais a adoptar esta filosofia — não estou a falar da concepção universitária, digo é que é o mercado que determina.
Os estudos a nível do 2.ª ciclo são pagos pelas famílias, custando, em mçdia, 5000 €. Portanto, a questão que coloco é a de saber qual é a percentagem de alunos licenciados com o 1.º ciclo que entra no 2.º ciclo.
Faço esta pergunta porque, segundo os dados que obtivemos, fica-se com a ideia de que o custo dos estudos ao nível do 2.º ciclo está a afastar parte crescente dos alunos que terminam o 1.º ciclo pois não têm dinheiro para custear a despesa.
Finalmente, coloco uma questão que está ligada com o financiamento.
Estive a comparar o financiamento previsto para 2009 com o que foi previsto quando este Governo tomou posse, em 2005, e, mesmo comparando dados desses dois anos relativos à execução e não à previsão, chego à conclusão de que o que está previsto para 2009 é 76 milhões de euros enquanto, em 2005, o investimento previsto mas repartido por universidades e politécnicos era 105 milhões de euros. Portanto, fica a ideia de que há uma clara diminuição do investimento. Não sei se o Sr. Ministro consegue, por milagre, transformar isto.
Mas a questão que quero levantar está ligada a outra.
A política do Governo tem levado a concentrar uma parte crescente do investimento — quase 82% — na Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Não é pacífica a questão da repartição do investimento aí concentrado e há muito quem tenha a opinião de que é pouco transparente.
Vou traduzir a questão em números.
Em 2008, dos 548 milhões de euros que estão no orçamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, qual é a parte que foi atribuída aos centros de investigação das universidades, qual é a parte que foi atribuída ao chamados laboratórios associados e qual é a parte que foi gasta com contratos com universidades privadas estrangeiras? Acho que a resposta a estas perguntas é que serve para aferir a forma como está a ser repartido o investimento.

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Espero que o Sr. Ministro me responda com dados objectivos e não apenas com ataques políticos pois agora tentei colocar as questões de uma forma objectiva.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, queria pedir-lhe se é capaz de fixar uma versão da realidade. É que, depois de o ouvir atentamente sobre todo o processo de concertação e de negociação, quer com o CCSISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos) quer com o CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas), nomeadamente sobre a natureza do orçamento competitivo, ficamos sem perceber qual é a sua versão. É «não há asfixia das instituições do ensino superior» — a versão A? Ou é «há asfixia das instituições do ensino superior e ela é resultado do diálogo com o CRUP e com o CCISP»? Ficámos sem saber, repito, qual é a sua versão desta realidade.
No entanto, há algumas afirmações do Sr. Ministro particularmente preocupantes, com as quais é difícil lidar mantendo a natureza jocosa, digamos, da sua análise.
Provavelmente, entende que é uma provocação dizer-lhe que este orçamento e toda a sua relação com o subfinanciamento tem uma perspectiva de castigo ou de prémio. E quando, no início, lhe perguntei quais eram, afinal, do seu ponto de vista, as instituições de 1.ª, de 2.ª e de 3.ª, o Sr. Ministro não respondeu.
Posto isto, queria fazer-lhe perguntas concretas sobre a Universidade de Lisboa.
Por exemplo, é facto — e o Sr. Ministro tem os números — que a verba disponível para esta instituição, para 2009, decresce substancialmente.
Provavelmente, conhecerá também quais são as previsões relativamente à Faculdade de Letras.
Provavelmente, recordar-se-á que, no passado, quando o inquiríamos sobre áreas de conhecimento, como Estudos Humanísticos, área de investigação em Estudos Humanísticos, em Literatura, em Ciências Humanas, e manifestávamos as nossas preocupações, o Sr. Ministro dizia que isso era reaccionário porque nada do estudo e do trabalho de investigação nestas áreas do saber estaria em risco.
Pergunto-lhe qual é, afinal, a leitura que o senhor é capaz de reconhecer que deve fazer em relação à Universidade de Lisboa, tendo em conta as suas próprias afirmações e, nomeadamente, sobre o quadro da instituição que estou a referir.
Seguidamente, vamos aos números, porque não sabemos fazer contas, não é, Sr. Ministro? Nós diminuímos tudo aquilo que o Sr. Ministro passa a vida a aumentar!» Disse-nos que as propinas constituem 10% do orçamento das instituições. Os dados são outros: as propinas correspondem a 15% do orçamento das universidades e, como sabe, a cerca de 55% das receitas próprias das instituições. À pergunta que lhe fiz a partir daqui, que foi a de saber se não é seu entendimento que são as famílias que andam a pagar as suas políticas, também não tive qualquer resposta.
Sobre a acção social, não sei se os números oficiais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior são os mesmos, para mim própria e para o Sr. Ministro. A informação que tenho é a de que, durante o seu mandato, e por conta da dotação do Orçamento do Estado, as verbas para a acção social escolar diminuíram 16%. Esta é a informação que consta a partir de informação do seu Ministério — não sei se o Sr. Ministro terá outras contas.
De qualquer forma, para além da realidade e desta sua habilidade em converter o que diminuiu em coisas que aumentam, fiz-lhe perguntas concretas sobre o regulamento da atribuição de bolsas e sobre o facto de o Sr. Ministro ter na mão todas as cartas para redefinir este quadro que é penalizador de inúmeras famílias, que introduz critérios arbitrários, e o senhor também não me deu qualquer resposta.
A última questão é sobre a «bolha» especulativa da Ciência – e o Sr. Ministro sabe muito bem que as metas estão longe do que deveriam ser as desejáveis para um país moderno.
Em todo o caso, quero perguntar-lhe se tem dados concretos sobre o aumento, por parte do sector privado, do investimento em I&D decorrente das suas políticas, porque o quadro era miserável, como bem sabe.
Por outro lado, não o ouvi dizer absolutamente nada sobre os bolseiros de investigação científica.
Coaduna esta «bolha» especulativa da Ciência com o facto de manter uma mão-de-obra altamente qualificada num quadro de imensa precariedade, alimentando, relativamente a estes investigadores, expectativas que depois não cumpre? É-lhe possível ter um discurso de coerência sobre esta matéria, Sr.
Ministro? Ou, ainda, sobre alguns das dezenas de investigadores e investigadoras que, como sabe, são pagos

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como quadros técnicos e que, ao abrigo do arrastado processo de reforma dos laboratórios do Estado, nem sequer sabem se podem ter expectativas de serem integrados na carreira de investigador? Portanto, vamos falar de Ciência, vamos falar desta mão-de-obra altamente qualificada e da forma como o Sr. Ministro tem integrado esses investigadores e como tem reconhecido o seu trabalho. É que isto é que é falar com seriedade e sem um espírito jocoso, que não é admissível quando as questões têm a gravidade das que aqui discutimos, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, começo exactamente por repetir o que a Sr.ª Deputada Cecília Honório acabou de dizer: que o Sr. Ministro, nesta segunda ronda, aproveite o tempo que ainda tem para dar resposta às nossas questões. Se não o fizer, naturalmente é uma opção política e é o entendimento de que as questões o incomodaram e não está disponível para falar sobre elas. Senão, teremos de concluir o que ontem foi reafirmado pelo Deputado Manuel Alegre: já não há paciência para os Srs. Deputados do Partido Socialista e para o Sr. Ministro Mariano Gago, já não há paciência para os senhores terem sempre razão e todo o resto da oposição e o País inteiro não falarem verdade e não terem razão. Ora, hoje, os senhores demonstraram isso mesmo, mais uma vez.
Gostaria de dizer, Sr. Ministro — e isto tem de ficar muito claro —, que, ontem, recebemos o CRUP e o CCSISP. O Sr. Ministro desmentiu, ponto por ponto, tudo aquilo que foi dito aos Deputados nessa reunião de ontem, na Comissão de Educação e Ciência. Portanto, é bom que saibamos se o Sr. Ministro fala verdade e se os Srs. Reitores e o Sr. Vice-Coordenador do CCSISP mentiram ontem ou vice-versa. Era bom que isto ficasse claro porque não é uma questão de entendimento, é uma questão de realidade e de factos.
Gostaria de repetir duas ou três questões que me parecem cruciais para percebermos o que se está a passar.
Queria que o Sr. Ministro dissesse, definitivamente, se considera ou não que há subfinanciamento no que tem que ver com o funcionamento das instituições de ensino superior politécnico e universitário.
Gostaria de saber, ainda, se o Sr. Ministro considera que as verbas que indexou a cada uma destas instituições têm condições de responder ao seu funcionamento normal, acrescido do pagamento de 11% à Caixa Geral de Aposentações, de 2,5% de inflação, oficial, de 2,9% de aumento dos salários e de progressões nas carreiras. Pergunto se o senhor considera que o orçamento indexado responde a estas necessidades de funcionamento na sua totalidade ou se, tal como em 2007 e em 2008, considera que são necessárias dotações extraordinárias. Se são necessárias, por que é que não as indexa já em vez de, depois, ao longo do ano, qual bombeiro a apagar fogo aqui e acolá, que é o que fez em 2007 e em 2008? Uma outra questão prende-se com os doutorados e o aumento da qualificação dos jovens no nosso país.
Ainda bem que assim é e é bom que assim continue. O que não consigo entender, Sr. Ministro, é para que é que eles estão a qualificar-se. Se é para serem bolseiros de investigação sem direito aos direitos constitucionalmente consagrados, se é para ficarem no desemprego, porque as universidades e os politécnicos não os podem contratar.
É que, e o Sr. Ministro sabe que é verdade, neste momento, a média de idades dos docentes, tanto universitários como politécnicos, é superior a 50 anos — pela sua expressão, considera mais uma mentira do CRUP e do CCSISP?! Sr. Ministro, não fui eu que disse, foram o CRUP e o CCSISP. À medida que vão saindo os mais velhos, as instituições não podem contratar jovens porque não têm dinheiro para isso.
Como o Sr. Ministro também não quis responder à proposta que foi feita pelo CCSISP tanto ao seu Ministério como ao das Finanças, repito mais uma vez: no politécnico, 85% dos vínculos dos docentes são precários; relativamente aos funcionários, ultrapassa os 90%.
Pergunto se o Sr. Ministro está disponível para, em articulação com o Ministro das Finanças, responder afirmativamente aos cerca de 60% de vínculos definitivos do pessoal docente dos politécnicos, cujos mapas foram anexados às propostas do Orçamento, enviados ao seu Ministério. Só assim é que não haverá ruptura, contrariamente ao que o Partido Socialista disse. Se esta questão não for definitivamente decidida, a ruptura financeira será uma realidade, em 2009, na generalidade dos politécnicos.
Levanto ainda a questão relativa ao aumento e à diminuição dos índices dos custos dos cursos, que, segundo disse o Sr. Ministro, foi um dos itens alterado na fórmula de financiamento. O Sr. Ministro já afirmou

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que a oposição não faz o «trabalho de casa», não estuda, não percebe, não sabe fazer contas, não sabe ler os papéis nem conhece as leis! Valha-nos o Ministro que o País tem, senão isto era uma desgraça, era uma tragçdia!» Então, explique-me devagarinho, Sr. Ministro: os estudantes de Engenharia viram o seu índice de custo aumentado 11%, os de Medicina viram-no reduzido 6%, os de Geografia e Línguas 10%, os de Matemática e Estatística 3% e os de pós-graduação em Medicina também reduzido em 20%. Foram ainda reduzidos entre 2% a 20% todos os índices de custo de todos os estudantes de pós-graduações do ensino superior público em Portugal.
Pergunto se foi feito algum estudo pelo Ministério, alguma auditoria ou se foi a mando da Comunidade Europeia, que tem isto para todos os países, independentemente da situação particular e real de cada um dos países que a integram.
Muito obrigada, Sr. Presidente, pela sua benevolência.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, há uma máxima em latim que reza assim: Fortiter in re, blanditer in verbis, forte no conteúdo, brando nas palavras. Apenas por uma questão de economia de tempo, dispõe de 15 a 20 minutos para responder a este segundo acervo de questões.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, começou por qualificar as perguntas que me fazem como uma plêiade de perguntas e, portanto, se me permite o desabafo, Sr.
Presidente, estamos em plena cultura clássica, apesar de ser um pouco desapropriada para aquilo que ouvimos.
Quanto às questões que foram colocadas, há muitas repetidas relativamente ao ano anterior e, por isso, tentarei concentrar-me nas questões novas às quais não consegui ter tempo para responder.
Deixarei para o fim a questão, mais política, do Deputado Sérgio Vieira relativamente ao ensino superior.
As figuras que utilizou foram coloridas: «é um filho rejeitado do Governo». É um «filho rejeitado» a quem se dá mais 90 milhões de euros?! O que diria o Sr. Deputado se tivéssemos um orçamento igual ao do ano passado, mais a inflação, em vez de termos mais 90 milhões de euros?! Ou se tivéssemos o mesmo Orçamento do ano passado, nominalmente?! Parece que não existem constrangimentos orçamentais em Portugal! Acho extraordinárias estas afirmações vindas de um partido que já esteve no governo» Bom, julgo que se trata apenas de uma figura de retórica que me abstenho de escolher do cardápio das figuras.
O Sr. Deputado Sérgio Vieira repete um pouco as afirmações feitas pelo PCP no sentido de as universidades ficarem reféns do Ministério. Peço desculpa, mas deve explicar-me por que razão é que prever no orçamento do Ministério cerca de 20 milhões de euros de reserva para um orçamento de 1300 milhões de euros não é um acto de gestão, é um acto de provocação à autonomia. Confesso que não entendo essa sua afirmação e, vindo de uma pessoa que tem certamente experiência nesta matéria, fico ainda mais estupefacto.
Se o Sr. Deputado tiver de gerir a distribuição do orçamento em qualquer grande organização ou conjunto de organizações seria extraordinário que não tivesse uma reserva. Podia criticar-me, isso sim, é pela reserva ser tão pequena. Mas o facto de a reserva ser tão pequena é um acto de confiança nas instituições, porque o que seria normal em matéria de gestão de um sistema desta natureza era ter uma reserva maior, em vez de decidir tudo à cabeça, porque decidir tudo à cabeça era ter de decidir que se iria alterar o Orçamento, que se iria fazer, depois, um Orçamento rectificativo.
Portanto, o facto de ter uma reserva significa necessariamente, na minha opinião, um acto de gestão prudente. Mais: de reduzidíssimo impacto, dentro do conjunto do orçamento das instituições. Julgo que esta questão deve ser esclarecida.
Considerei muito interessante esta sua afirmação, este seu discurso político: «Mas o Sr. Primeiro-Ministro elogia colectivamente os reitores e o Sr. Ministro diz que eles são maus gestores». Engraçado! Não fui eu que disse que eles eram maus gestores — longe de mim fazer essa afirmação —, foi o Tribunal de Contas, que disse que alguns eram, nalgumas instituições. Não deite o labéu às pessoas que não o merecem. Foi o Tribunal de Contas, foi a Inspecção-Geral de Finanças e a notícia que o Sr. Deputado refere tem origem em perguntas dos estudantes. Mas, de facto, foi o Tribunal de Contas e foi a Inspecção-Geral de Finanças, não fui eu!

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É claro que, em nome do respeito da coisa pública, que todos devemos ter, se existem indícios de má gestão nalgum sítio, temos de agir nessa matéria. Julgo que todos estamos de acordo. Agir sobre instituições independentes, autónomas, é completamente diferente do que agir sobre instituições que estão sob a tutela directa do Estado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não pode é fazer pagar todas por isso!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Para que o meu pensamento sobre esta matéria fique absolutamente claro, terminarei a minha intervenção repetindo exactamente, porque escrevi nessa altura, aquilo que há poucos meses disse aqui sobre esta precisa matéria.
O Sr. Deputados Bravo Nico fez-me uma pergunta e julgo que o Sr. Deputado Eugénio Rosa também me fez uma pergunta relacionada com o mesmo assunto, isto é, sobre a percentagem das verbas dos programas orçamentais de ciência deste Ministério que vai, após concurso, em última análise, para o ensino superior. O último apuramento sistemático que fizemos nesta matéria, que diz respeito às contas de 2007, referia 65%.
Inclui apenas as instituições que têm a ver directamente com o ensino superior.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Laboratórios e centros de investigação!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Laboratórios e centros de investigação das universidades.
É preciso clarificar algumas questões. Já respondo ao Sr. Deputado Eugénio Rosa, agora estou a responder ao Sr. Deputado Bravo Nico.
Como eu dizia, é de cerca de 65% a percentagem das verbas dos programas orçamentais de ciência que vai, após concurso, em última análise, para o ensino superior.
Devem acrescer-se as verbas que não estavam incluídas neste apuramento relativas ao financiamento, que, antes, era pago pelas instituições de ensino superior a 50%, da biblioteca pública on-line e da Rede Ciência, Tecnologia e Sociedade (RCTS) e que agora são integralmente pagos pelas verbas da ciência e não são facturados às instituições. Portanto, este número tenderia a aumentar ligeiramente.
O Sr. Deputado Bravo Nico pergunta-me também que outros mecanismos suplementares existem para o financiamento das instituições do interior. O primeiro mecanismo mais claro que é muito aplicado neste orçamento diz respeito ao PIDDAC, diz respeito ao investimento em infra-estruturas, equipamentos, sendo significativo em muitas regiões do interior. O próprio Quadro Comunitário de Apoio dirige-se privilegiadamente a regiões de Objectivo 1 e, portanto, cobre esse factor.
Também as verbas de formação e grande parte do programa de formação que acaba de ser lançado, que diz respeito aos institutos politécnicos, vão, com certeza, ter a sua aplicação em muitas instituições de ensino superior politécnico do interior do País.
Existem outros mecanismos, esses, sim, competitivos e em igualdade de circunstâncias.
Provavelmente, o mecanismo principal de apoio à manutenção de instituições de ensino superior no interior do País não diz respeito a matéria orçamental mas noutro factor: gestão das vagas à entrada dos estabelecimentos de ensino superior no País.
Hoje, tecnicamente, para a generalidade das formações em Portugal, não temos numerus clausus, ou seja, temos uma procura que, no sector público, é suficiente, globalmente, para responder à oferta neste sector.
Trata-se de decidir se queremos que esta ausência técnica de numerus clausus se traduza num total liberalismo na fixação, ou não, dos números de vagas em todos os cursos pelas instituições de ensino superior. O Governo decidiu que não devia ser assim para não conduzir a mais um factor de transferência de estudantes do interior para o litoral do País. Todas as simulações feitas nesta matéria conduziriam a que, se isso fosse feito, teríamos uma total absorção por algumas instituições do litoral, que cresceriam desmesuradamente e, portanto, seria preciso um investimento significativo num aumento de capacidade nessas instituições e uma degradação das capacidades instaladas noutras instituições onde essa capacidade foi instalada.
Portanto, este é talvez, neste momento, o maior mecanismo de reforço da economia de muitas regiões do País, designadamente, do interior, através de uma decisão de natureza política.

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O Sr. Deputado José Paulo Carvalho disse: «O Sr. Ministro não quer responder, não responde». Sr. Deputado, eu respondo sempre. O Sr. Deputado talvez não goste da resposta, mas eu não posso responder com a resposta que o Sr. Deputado gostaria que eu desse. Nesse caso, parecia que estávamos naquele universo da Campanha Alegre, do Eça de Queirós, que dizia que era próprio do Deputado dizer «apoiado».
Portanto, não era preciso estar lá ele em «carne e osso», bastava o busto de Camões para que o patriotismo ficasse esclarecido e punha-se um papagaio em cima do busto, que era mais barato!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Estamos a falar do Ministro e não do Deputado!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Exactamente, mas atiro as palavras para cima de mim, Sr. Deputado.
Não posso é dar a resposta que o Sr. Deputado gostaria, até porque não sei exactamente qual era a resposta que gostaria que eu desse.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Diga a verdade!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Mas, Sr. Deputado, só lhe digo a verdade e é isso que o choca.
O Sr. Deputado diz: «Foram perdidos dois anos de avaliação». Ó Sr. Deputado, o Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) fazia avaliações de cursos feitos segundo um regime de autoavaliação, eram as próprias instituições que nomeavam os avaliadores. Com certeza que é um trabalho meritório, sempre o disse, mas, do ponto de vista do interesse público, não chega, de todo. Se as instituições quiserem, continuam a fazê-lo, mas o que interessa ao País é que haja avaliação independente das instituições. Foi essa a transição que fizemos e trouxemos a lei de avaliação, depois, fizemos um decreto-lei e ficámos vários meses à espera que as instituições designassem os seus representantes para o Conselho de Coordenadores, o qual está nomeado e a funcionar. Não sou eu que intervenho, neste momento, na decisão do Conselho de Coordenadores.
Mais do que isso: sabíamos que era necessário fazer avaliações institucionais, e não apenas de acreditação de cursos, que é a função da Agência, isto é, fazer avaliação para acreditar. Não é fazer avaliações das instituições em geral, sem o objectivo da acreditação. Desencadeámos um processo junto da Associação Europeia das Universidades para que passasse a haver, em Portugal, pela primeira vez, avaliação institucional, feita, mais uma vez, por pessoas externas ao sistema português — e foi isto que aconteceu.
Portanto, estes dois anos foram dois anos ganhos para a avaliação, em Portugal. Não foram dois anos perdidos, não foram dois anos de entretém, em que andámos a fingir que avaliávamos cursos de uma maneira independente e que de nada servia para efeitos da acreditação de cursos, a qual continuava a ser feita por via burocrática.
O Sr. Deputado diz que o orçamento do Ministério — e reconhece que, ao longo destes anos, houve um aumento do orçamento do Ministério — teve um aumento significativo na área da ciência e tecnologia, ao longo destes anos, quando comparado com o aumento que agora se verifica para o ensino superior. É verdade, Sr. Deputado! Basta ver os números! Num ano, houve um aumento, só em verbas nacionais, de 160 milhões de euros e, no ano seguinte, de 50 milhões de euros. Portanto, foram 210 milhões de euros de aumento, apenas na área da ciência e tecnologia. E já ouvimos dizer que uma grande parte desse aumento entrou por via competitiva no ensino superior. Mas essa é a diferença, Sr. Deputado: é que entrou por via competitiva no ensino superior. E essa é a prática que defendemos: que uma parte do aumento para o ensino superior seja feita por via competitiva. E foi por via da ciência: esse dinheiro não ficou no Ministério da Ciência e Tecnologia; entrou nas instituições do ensino superior.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Se o funcionamento estivesse assegurado» Mas não está!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Entrou também para o funcionamento das instituições do ensino superior, porque, se os professores e os funcionários estão lá, é com certeza também para esse fim. Ou o Sr. Deputado acha que a investigação não é parte integrante e fundamental da qualidade

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do funcionamento de uma instituição de ensino superior, designadamente de uma instituição de ensino superior universitária?! O Sr. Deputado Miguel Tiago começou a sua intervenção com um «mimo» — mas já estou habituado — ao empregar a palavra «desonestidade».

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas é verdade. Foi desonesto!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Interessante, mas julgo que estava a referirse a outra pessoa. Portanto, não comento essas afirmações, porque elas não merecem comentário.
Agora, o Sr. Deputado Miguel Tiago poderia ler no orçamento — e pedi ao Sr. Secretário de Estado que, enquanto eu estava a falar, fosse ver as notas do orçamento — o seguinte: em Acção Social — Fontes nacionais e comunitárias —, temos: em 2006, 199,6 milhões de euros; em 2007, 209,0 milhões de euros; em 2008, 210,3 milhões de euros; e em 2009, 222,1 milhões de euros. Julgo que isto representa um aumento de cerca de 11%, ao longo destes anos, e não a diminuição anunciada por V. Ex.ª, que é falsa.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Transferências do Orçamento do Estado!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Estamos a falar de transferências do Orçamento do Estado, incluindo fontes nacionais e fontes comunitárias — como é óbvio! Acho absolutamente extraordinário que, quando o Fundo Social Europeu paga parte das bolsas de estudo em Portugal»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Estado retira-se!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Ah, V. Ex.ª acha que não devemos utilizar esse dinheiro, que ele não é nosso! O dinheiro europeu não é nosso!? Grande visão da Europa, Sr. Deputado! Grande visão da Europa! Nós pagamos os impostos, esse dinheiro vai para Bruxelas, vem para Portugal» e deixou de ser nosso!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Os fundos comunitários não podem substituir-se aos nacionais!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Extraordinário, Sr. Deputado! A sua visão antieuropeia surge a todos os momentos!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Desonestidade! Está a ver, Sr. Ministro?!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — O Sr. Deputado Eugénio Rosa fez-me várias perguntas, algumas das quais exigem alguma elaboração técnica, como deve imaginar.
Há, no entanto, uma pergunta a que posso responder-lhe já. A verba total atribuída à área de ciência e tecnologia no orçamento deste Ministério é de 665 milhões de euros [FCT+UMIC, uma vez que a UMIC paga as verbas para a Rede Ciência Tecnologia e Sociedade (RCTS), para a Biblioteca do Conhecimento On-line (B-On), etc.]. Desses 665 milhões de euros, a totalidade da cooperação internacional é de 52 milhões de euros, o que inclui as quotas aos organismos internacionais, tudo isso. E as parcerias internacionais não se traduzem apenas em dinheiro, nem especialmente em dinheiro pago para fora; as parcerias internacionais representam 12 milhões de euros, desses 52 milhões de euros, ou seja, 1,8% do total. Esta era uma das perguntas que me tinha feito.
A outra pergunta diz respeito à distribuição das verbas por objectivos da FCT. Mas esses números o Sr. Deputado encontra-os nos próprios documentos do Ministério e são fáceis de ler. Isto é, a formação avançada, que representa a maior fatia, é toda atribuída por concursos e, sendo formação avançada, diz respeito ao pagamento às pessoas e os custos de formação às universidades (e apenas às universidades), nacionais e estrangeiras (esmagadoramente, nacionais). Os projectos de investigação e desenvolvimento são todos atribuídos por concurso público e, portanto, todas as instituições científicas concorrem a estas instituições.

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É claro que o Sr. Deputado certamente sabe que existem universidades que criaram, elas próprias, instituições privadas, delas mesmas, detidas a 100%, por onde entram todas as verbas de uma faculdade. A Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa tem uma Fundação da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, por onde concorre (entende fazê-lo assim e tem esse direito) à totalidade das verbas que entram para a Faculdade de Ciências. Claro que, depois, a repartição interna, para saber o que fica na Fundação e o que vai, ou não vai, para essa Faculdade é uma decisão interna da Universidade de Lisboa, e não do Ministério.
Seguidamente, tem, para instalações, equipamentos e infra-estruturas (e aqui há uma fracção significativa), uma verba de 37 milhões de euros, prevista para 2009, que vai para a criação do Laboratório Internacional de Nanotecnologia, e, depois, tem as outras componentes que aqui estão, mas que são menos significativas.
Uma das componentes a que com certeza se referia é uma componente à qual foi atribuída uma verba de 94,8 milhões de euros, em 2008, e de 105 milhões de euros, em 2009, que é o programa de financiamento das instituições de I&D. O financiamento das instituições de I&D, que são, todas elas, financiadas directamente pela FCT e acreditadas pela FCT, é baseado na avaliação internacional, feita de três em três anos, dessas instituições, quer sejam, ou não, laboratórios associados. Todas as instituições, quer sejam centros das universidades quer sejam instituições privadas sem fins lucrativos, fazem parte de uma rede que é avaliada pela FCT. E é em função dessa avaliação que são atribuídos os respectivos financiamentos, em função, aliás, por um lado, da dimensão da instituição e, por outro, da classificação dessa instituição.
Esses números, aliás, são públicos e encontram-se junto da FCT e nos relatórios da FCT, que terei todo o gosto em fornecer-lhe.
A Sr.ª Deputada Cecília Honório fez-me uma pergunta sobre a Universidade de Lisboa. Terei todo o gosto, no final desta intervenção, em dar-lhe cópia da carta, que remeti (mas que é pública) de resposta ao Reitor da Universidade de Lisboa, que me pediu uma audiência para analisar este problema. Tem havido reuniões técnicas, o Sr. Secretário de Estado recebeu o Sr. Reitor recentemente, tem havido discussões com a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e, como a carta é relativamente extensa e bastante detalhada quanto aos números e aos elementos que servem de base para as reuniões, tenho todo o gosto em fornecer-lhe cópia dessa carta e terei todo o gosto em esclarecer qualquer elemento adicional.
A Sr.ª Deputada diz-me que no regulamento de atribuição de bolsas, que está em vigor e que depois é complementado pelas normas técnicas feitas por cada uma das instituições, há critérios que têm dificuldade de aplicação e que podem conduzir a arbitrariedades. Também acho, Sr.ª Deputada. Este regulamento foi aprovado com o apoio e, aliás, por unanimidade, do antigo Conselho de Acção Social. Este regulamento vai ser revisto e vai sê-lo ouvindo não apenas as associações de estudantes como os próprios serviços de acção social das instituições.
No que diz respeito às normas técnicas, naquelas que dependem estritamente de nós, que são as normas técnicas de aplicação para o privado, já se fez uma primeira revisão. Mas queremos chegar a um consenso com as instituições, com os serviços de acção social, as associações de estudantes e outras entidades, as próprias universidades e os politécnicos, no sentido de termos critérios justos, os mais justos possíveis, e menos arbitrários, os menos arbitrários possíveis, de interpretação por cada um dos serviços. Estamos completamente de acordo.
Relativamente ao aumento da percentagem de investigação no sector privado, terá de esperar que os serviços competentes publiquem e terminem o Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional, que, quando estiver publicado, será referente a 31 de Dezembro de 2007, ou seja, ao ano passado — e espero que, no próximo ano, tenhamos possibilidades de fazer um novo exercício sobre 2008. Assim sendo, enquanto esses dados estatísticos não forem publicados, não lhe posso responder. Mas espero que isso aconteça ainda este ano, necessariamente.
Quanto aos bolseiros de investigação científica, a Sr.ª Deputada reconhecerá com certeza que este Governo fez um enorme esforço, ao criar lugares num período de enormes restrições, ao criar 1000 contratos individuais de trabalho em condições de concurso ímpares no nosso País e de publicidade nacional e internacional, em que os júris e os seus currículos são públicos, em que a totalidade dos concursos é publicitada, não apenas nacional mas internacionalmente, com a devida antecedência, sendo que a responsabilidade da gestão dos concursos é das próprias instituições. Nesta matéria, tentou conseguir-se, e julgo que se conseguiu, a combinação de um sistema de regulação forte por parte da FCT com a autonomia

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natural das próprias instituições. Até agora, foram já contratados mais de 500 doutorados com contratos individuais de trabalho. Dizem-me que, neste momento, há concursos para mais 700 e, muito provavelmente, quando chegarmos ao final desta Legislatura, teremos ultrapassado a meta com que nos tínhamos comprometido.
No que diz respeito às condições sociais dos bolseiros, essa é uma questão que nos preocupa desde sempre, sendo que existem distinções — e temos acompanhado muito intensamente o debate internacional sobre esta matéria —, designadamente na separação entre bolseiros de doutoramento, que estão inscritos como estudantes numa universidade, e bolseiros de pós-doutoramento, que devem ter uma transição tão rápida quanto possível para contratos individuais de trabalho.
Existe uma discussão, que eu próprio, neste momento, corporizo no Conselho Europeu, porque fui encarregado disso, para a análise das condições sociais, designadamente da segurança social mínima, por parte de uns e de outros.
O diálogo com a associação dos bolseiros e com as instituições tem vindo a ocorrer. Cremos que grande parte deste processo pode vir a necessitar de uma alteração do estatuto do bolseiro, aqui aprovado por iniciativa, creio, do PSD, apesar de parte dela poder ser feita, provavelmente, por via regulamentar e programática. Mas esse processo está em curso, registando já um enorme avanço, nunca antes registado em Portugal, que foi a criação de um mercado de trabalho amplo, no que diz respeito aos doutorados, naturalmente em condições competitivas.
A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita perguntou-me sobre os índices de custos relativos. O Sr. Secretário de Estado, com certeza, poderá fornecer-lhe todos os dados sobre os índices de custos relativos dos diferentes países europeus e a sua evolução. Esses índices de custos relativos são apenas índices de custos relativos, ou seja, têm muito a ver com os valores médios da proporção professores/alunos e custo/aluno, nas diferentes áreas disciplinares.
As alterações que têm sido feitas são mínimas e são de convergência relativamente a índices, que estavam completamente desajustados em Portugal, dos custos efectivos que tinham sido medidos em Portugal. Era preciso encontrar um parâmetro. E os parâmetros que foram encontrados e propostos às instituições são os parâmetros internacionais — não podem ser outros — e estão a convergir uns com os outros. Os custos podem ser diferentes, mas as proporções dos custos dificilmente serão muito diferentes entre o que é formar um médico ou formar um operador de máquinas. Essas comparações podem fazer-se em termos internacionais, com alguma razoabilidade, tendo de ser aferidas, naturalmente, pelos custos reais das instituições.
Dou de barato quando diz que não consegue perceber por que é que os jovens doutorados estão a qualificar-se. Olhe, eu percebo, Sr.ª Deputada, e eles também percebem. Eles estão a qualificar-se porque sabem que é muito melhor estarem qualificados do que não qualificados, porque querem fazer ciência e trabalho de investigação e, aliás, estão a produzir muito boa ciência no nosso País.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Leia o resto da pergunta!

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — A Sr.ª Deputada fez-me uma pergunta estranha sobre a relação entre ruptura financeira e os vínculos nos institutos politécnicos. Não há, com certeza, qualquer relação entre uma coisa e outra, porque uma coisa tem a ver com dinheiro, outra coisa tem a ver com o vínculo contratual.
No que diz respeito aos vínculos contratuais, a Sr.ª Deputada sabe certamente, porque o Sr. Presidente do CSISP lhe deve ter explicado, que ontem de manhã houve uma reunião no meu Gabinete, com os responsáveis do meu Ministério e o Presidente do CSISP, sobre esta matéria com o objectivo de encontrar uma forma que seja justa para os que estão, mas que seja justa também para os que querem concorrer. Isto para que aqueles que são professores equiparados nos institutos politécnicos possam aceder a categorias de carreira mais estáveis e não tenham os seus contratos renovados todos os anos.
A concluir, gostaria de ler o que disse aos Srs. Deputados no dia 11 de Junho, para ficar clara a resposta, sobretudo em relação aos Grupos Parlamentares do PSD e do CDS, que colocaram esta questão.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Não vale a pena, Sr. Ministro. Já foi em Junho!

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O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Na altura, eu disse o seguinte, que agora confirmo: «Importa, por último, realçar a capacidade do sistema do ensino superior português, que soube, num período de exigente consolidação orçamental para a qual contribuiu de modo efectivo, acolher novos alunos e crescer, gerar mais e melhores resultados de investigação e desenvolvimento, diversificar-se e especializar-se, internacionalizar muitas das suas instituições e programas e associar-se muito mais estreitamente do que no passado aos processos de inovação empresarial e organizacional, gerando novos financiamentos e reformando a sua estrutura de despesa, arrecadando maiores receitas e conseguindo manter o seu peso global no Produto.
Para tanto contribuiu significativamente, como sabemos, a prioridade do Governo à ciência, cujos resultados são hoje já tão visíveis em tantos domínios».

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, é só para lembrar o Sr. Ministro que lhe fiz duas perguntas e que o Sr. Ministro não respondeu a uma delas.
Perguntei qual a percentagem de licenciados do 1.º ciclo que têm dinheiro para entrar no 2.º ciclo e tive uma resposta a 50%. Não sei se foi propositado ou se foi esquecimento devido à idade.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro quer responder a esta interpelação do Sr. Deputado?

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Deputado, essa pergunta é agora uma nova pergunta, não é a que tinha feito.
Se quer saber quantos alunos estão inscritos nos 1.º e 2.º ciclos das universidades, podemos dar-lhe já os números. Se quer saber quantos alunos transitam do 1.º ciclo para o 2.º ciclo em cursos que têm os 1.º e 2.º ciclos, também lhe podemos dar os números. Se quer saber as motivações dos alunos no fim do 1.º ciclo para o 2.º ciclo, será preciso perguntar-lhes.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Foi um debate vivo, intenso, acutilante, naturalmente com divergências e dissídios, mas isso faz parte da matriz idiossincrática do debate parlamentar. Não era de esperar outra coisa.
Agradeço ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado a presença.
Srs. Deputados, está interrompida a reunião.

Eram 13 horas e 50 minutos.

Sr.as e Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Temos connosco a Sr.ª Ministra da Educação, cuja presença desde já agradeço. Seja bem-vinda ao Parlamento, Sr.ª Ministra. Temos também connosco o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação. Seja bem-vindo também.
A Sr.ª Ministra já me deu nota de que o Sr. Secretário de Estado Valter Lemos vem do Porto e estará ainda presente em tempo útil na nossa reunião.
Agradeço, ainda, a presença do Sr. Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr. Deputado António José Seguro.

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Começo como habitualmente por, em traços muito gerais, relatar aquilo que o parecer da Comissão de Educação e Ciência transcreve como relevante do ponto de vista orçamental.
Basicamente, o parecer subscrito pelo Sr. Deputado Luís Fagundes Duarte e pelo Sr. Presidente da Comissão, António José Seguro, elenca como questões mais significativas do orçamento para a educação, desde logo, as prioridades da política de educação plasmadas nas alocações orçamentais em sede de despesa, que se reportam à igualdade de acesso à aprendizagem e melhoria da sua qualidade, organização e funcionamento das escolas, promoção da qualificação de jovens, modernização dos estabelecimentos de ensino e criação de oportunidades de aprendizagem ao longo da vida.
Exactamente porque estas são as prioridades do Ministério da Educação para 2009, verifica-se, com concretização no Orçamento do Estado, a existência de diversas rubricas que apostam no alargamento da acção social escolar a um maior número de famílias, a extensão do programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), a requalificação da rede escolar de ensino básico e educação pré-escolar, com a recuperação de mais de 26 escolas secundárias e ainda o objectivo de integrar, no próximo ano, 350 000 adultos na Iniciativa Novas Oportunidades.
Em termos de número, porque é significativo relevar este ponto, o orçamento para a educação é nada mais nada menos do que o segundo em termos de verbas do Orçamento do Estado alocadas à área sectorial.
O primeiro, como sabem, diz respeito à saúde. A saúde, se a memória não me atraiçoa, tem alocado em termos de Orçamento do Estado qualquer coisa como 8500 milhões de euros, que consiste em 11% da despesa da administração central do Estado e 5,1% do PIB.
Quanto à educação, que está em segundo lugar, quase a par com a saúde, o valor alocado em termos de despesa é de 6 666,7 milhões de euros, o que corresponde a 3,8% do PIB e a 8,3% das despesas da administração central. Trata-se, portanto, de um valor muito significativo em sede de Orçamento do Estado.
No que concerne ao cotejo com o Orçamento do Estado para 2008, releva aqui sublinhar que o orçamento do Ministério da Educação beneficia de um aumento de 7,2% relativamente à execução de 2008.
Estamos, pois, a falar de uma verba avultada, que naturalmente exige, do ponto de vista político, uma avaliação concreta, em termos de resultados. Aliás, é comum dizer-se que a educação tem um valor muito avultado em termos orçamentais, embora, infelizmente, nem sempre o resultado concreto dessa alocação de verbas corresponda aos objectivos políticos prosseguidos.
De qualquer modo, sublinho, porque tem interesse para esta discussão, que no Orçamento está ainda consignada uma verba decorrente do PIDDAC para 2009, que prevê um crescimento de 162,3 milhões de euros na área da educação, mas também da ciência, tecnologia e ensino superior. Só no que concerne à educação, o PIDDAC comporta, por comparação com o Orçamento para 2008, uma variação de 55,1%.
Estes são os dados genéricos mais relevantes que importa, desde logo, ter presentes no início deste debate. Mas para o aprofundamento destas questões, nada melhor do que uma exposição inicial da Sr.ª Ministra e, naturalmente, a intervenção acutilante, profícua e elevada dos Srs. Deputados no debate que se seguirá.
Para fazer a apresentação inicial, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação, que usará da palavra pelo tempo que entender adequado, tendo em conta a necessidade de esclarecimento dos Srs. Deputados e dos cidadãos que nos ouvem. A seguir à sua intervenção, haverá uma primeira ronda de perguntas, pelo que é bom esclarecer desde já o modus operandi desta reunião.
Na primeira roda de perguntas, que serão agrupadas em bloco, cada grupo parlamentar disporá de 10 minutos para usar da palavra, começando pelo maior partido da oposição, o PSD. Seguidamente, a Sr.ª Ministra responde de uma só vez a esse primeiro acervo de questões, após o que teremos uma segunda ronda de perguntas em que cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos para usar da palavra, pela ordem referida, ou seja, PSD, PS, CDS-PP, PCP, BE, Os Verdes e Deputada Luísa Mesquita, a que a Sr.ª Ministra responderá, encerrando-se, então, de seguida, o debate.
Uma vez mais, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, sejam bem-vindos.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Educação (Maria de Lurdes Rodrigues): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, para mim, um enorme gosto estar aqui para este debate sobre o orçamento da educação para o ano de 2009.

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Num orçamento, os recursos financeiros são sempre um meio para a execução das políticas, pelo que procuramos, uma vez mais, com os recursos que o País disponibiliza para a área da educação, fazer mais e melhor.
No que diz respeito à política educativa, temos procurado seguir dois eixos.
O primeiro visa melhorar as condições de acesso à educação tanto para jovens alunos como para adultos.
É, portanto, diria, uma linha do acesso à educação em condições de igualdade de oportunidades. Esta preocupação justifica várias das linhas ou programas com visibilidade e tradução neste orçamento.
O segundo relaciona-se com a eficiência dos gastos e recursos públicos e com a necessidade de, com os recursos públicos, os recursos financeiros, melhorar a qualidade do sistema educativo, melhorar a qualidade do serviço público de educação. Também este eixo tem tradução no orçamento, em diferentes programas e rubricas.
Lembraria, em primeiro lugar, o acesso à educação, as condições de acesso em igualdade de oportunidades tanto para jovens como para adultos e, em segundo lugar, a preocupação com a eficiência dos gastos públicos e a melhoria da qualidade, uma exigência de aumento da qualidade do serviço público de educação.
Face à estimativa da despesa do corrente ano, já foi referido pelo Sr. Presidente que este orçamento representa um acréscimo de 7,2% em relação ao orçamento do ano passado, totalizando cerca de 6651 milhões de euros.
Neste orçamento, estão incluídas as verbas do Orçamento do Estado, as verbas provenientes de fundos comunitários, bem como verbas provenientes de outras fontes, tendo que se somar a este valor, ainda, os 136 milhões de euros destinados à empresa Parque Escolar.
A verba inscrita para investimento é de cerca de 200 milhões de euros, que corresponde a um acréscimo de 118% face ao ano anterior.
O que caracteriza este ano o orçamento de investimento do Ministério da Educação? Diria que a característica distintiva em relação à maior parte dos Orçamentos anteriores é a selectividade e a priorização.
Procurámos definir poucos programas, mas decisivos, para alterar a qualidade das escolas públicas, a qualidade do sistema educativo.
Portanto, encontra-se, pela primeira vez, no orçamento de investimento do Ministério da Educação, apenas quatro programas, não a infinidade de programas que sempre caracterizam o orçamento de investimento.
Trata-se de quatro programas que visam uma intervenção generalizada em todas as escolas que nos garanta a melhoria da qualidade, das condições físicas e tecnológicas, das condições de trabalho, de estudo e de aprendizagem de todas as nossas escolas.
Gostaria de referir o Plano Tecnológico da Educação, que nos permitirá equipar todas as escolas básicas e secundárias com os mais modernos meios tecnológicos de que, hoje, o País pode dispor; o Programa de Modernização das Escolas Secundárias, que, esperamos, no final de 2009, tenha em programa de intervenção cerca de 100 escolas secundárias, o que representará 25% da totalidade das escolas secundárias do País.
Isso significa também que, em dois anos, conseguimos programar uma intervenção de uma enorme dimensão, dando às escolas e ao País a garantia de que é possível, num espaço relativamente curto de tempo, modernizar todas as escolas, como é a ambição do Programa.
Depois, temos o programa de erradicação das escolas degradadas do ensino básico. O parque de escolas de ensino básico é um parque relativamente recente, é constituído, sobretudo, por escolas de tipo pavilhonar, construídas a partir do final dos anos 70, meados dos anos 80. Essas escolas foram tendo intervenções pontuais, mas, no conjunto das escolas, ainda existem cerca de 30 em estado de elevada degradação, que são escolas a necessitar de ser substituídas ou de terem intervenção de reparação profunda.
Ora, o Ministério da Educação desenhou um programa para erradicar estas escolas, que permita também que, relativamente ao processo de transferência das competências para as autarquias — como os Srs. Deputados sabem, o que está em causa é também a rede de escolas do ensino básico —, o possamos fazer com a garantia de que o património que estamos a transferir é um património em condições aceitáveis, a necessitar, evidentemente, de manutenção e conservação, mas não de manutenção e conservação profunda, como acontece com estas escolas.
Portanto, eu diria que há aqui uma concentração de esforços em programas que nos dão a garantia de intervir em todas as escolas de uma forma profunda para mudar o panorama das condições físicas das

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escolas, tirando o máximo partido dos recursos financeiros que o País coloca à disposição do Ministério da Educação.
No que respeita ao orçamento de funcionamento — que representa a grande, grande maioria do orçamento —, direi que apresenta um crescimento de cerca de 6,2% face ao ano anterior.
Destacaria os programas relativos ao reforço e ampliação da acção social escolar. É, talvez, a primeira vez em 30 anos que, no Ministério da Educação, se olha para o problema da acção social escolar.
A acção social escolar foi um programa definido há mais de 20 anos, no momento em que se definiu a escolaridade básica obrigatória de nove anos, e a partir dessa altura até hoje tem havido uma partilha de responsabilidades entre o Ministério da Educação e as autarquias, sem que se tivesse feito uma análise do impacto do esforço financeiro que se fazia e da possibilidade de, com esse esforço financeiro, alcançar os objectivos que se pretendiam, que eram os de apoiar as famílias no esforço de educação ao nível das escolaridades básica e secundária.
Aquilo que verificámos foi que havia uma enorme discrepância entre a sinalização feita pelo Ministério da Educação e pelo Ministério da Segurança Social, por exemplo, para efeitos de outros apoios quanto à forma como eram sinalizadas as famílias em relação aos seus rendimentos, sendo que a sinalização feita pelo Ministério da Educação, não tendo em 20 anos sofrido qualquer actualização, revelava sinais de desadequação em relação às reais necessidades sentidas pelas famílias e o esforço de educação que fazem.
Direi, pois, que representará um esforço financeiro muito, muito significativo, mas que permitirá ao País, com mais à vontade, digamos assim, dizer que se faz um apoio efectivo a todas as famílias que dele necessitam para a educação dos seus filhos.
A segunda iniciativa é a denominada Novas Oportunidades, que, como dizia, se insere no eixo relativo à igualdade de acesso, de oportunidades, aos recursos educativos à educação para jovens e para adultos. Se o alargamento da acção social escolar revela as nossas preocupações com a melhoria das condições de acesso à educação por parte dos jovens, o programa Novas Oportunidades é, digamos assim, o programa simétrico para os adultos.
Há muitos anos que o País faz um esforço de recuperação do défice de qualificação das gerações mais velhas. À medida que o País foi actualizando a sua ambição em termos de escolaridade para a população jovem, foi sempre desenhando programas de recuperação do défice para as gerações anteriores, que ficavam automaticamente desactualizadas sempre que se actualizava uma ambição de novo patamar de escolaridade.
No entanto, penso que, pela primeira vez, foi possível definir um programa com a dimensão das reais necessidades, com a dimensão do problema de défice de qualificação que o País tem.
Refiro, ainda, o reforço orçamental do apoio às escolas para a educação das crianças com necessidades especiais, que é muito significativo; o apoio de uma rubrica que, genericamente, designaria para o reforço dos recursos educativos na melhoria da qualidade da educação. Aqui apontaria programas como o Plano de Acção para a Matemática, que tem uma expressão orçamental da ordem dos 3 milhões de euros por ano, de reforço do orçamento das escolas; o Plano Nacional de Leitura — Rede de Bibliotecas Escolares, que tem um orçamento de cerca de 6 milhões de euros; o programa de discriminação positiva das escolas em meio difícil, que tem um orçamento de 29 milhões de euros.
Estes são programas que implicam a transferência de recursos financeiros para as escolas para que elas possam organizar as suas actividades de forma diferente e garantir a qualidade do ensino e de aprendizagem que é proporcionado nestas escolas.
Temos, depois, ainda neste eixo, alguns programas que gostava de sublinhar.
Em primeiro lugar, os recursos para o aumento e a melhoria do ensino especializado da Música. Tivemos um aumento do número de alunos, tanto no ensino público como no ensino privado; reformámos a fórmula de financiamento do ensino privado; e temos, já com tradução no Orçamento para 2009, um aumento de 8 milhões de euros para garantir o acesso ao ensino especializado da Música a mais alunos do sistema de ensino português.
Há, ainda, rubricas relativas à formação de professores, à avaliação das escolas, que cumprem o mesmo objectivo de apoio às escolas para a melhoria da qualidade do ensino.
Ficar-me-ia por aqui, Sr. Presidente, e estou à disposição dos Srs. Deputados para responder às dúvidas e às questões que, eventualmente, considerem levantar.

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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra, por esta sua exposição inicial.
Vamos iniciar a primeira ronda de perguntas, começando pelo Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação, Sr.ª Ministra da Educação, uma curta nota prévia apenas para registar que o PSD lamenta profundamente os acontecimentos ocorridos ontem. Pensamos que não é dessa forma que se contribui para resolver os problemas de que a educação portuguesa padece e que merecem, e devem, ser resolvidos.
Uma segunda nota para dar conta de que a grande marca diferenciadora deste Orçamento é que, para o ano, temos eleições legislativas e isso tem sido um traço comum nos vários sectores dos orçamentos multissectoriais que temos vindo a acompanhar, o que se compreende. Fazemos, todos, parte do jogo da política e sabemos que é assim: quando o ano é de eleições, há sempre um abrir de facilidades e, sobretudo, um abrir do Orçamento para que as eleições corram da melhor forma possível.
Sr.ª Ministra, hoje em dia, a escola pública portuguesa vive momentos muito difíceis, muito conturbados.
Permita-me que lhe diga que esta situação era mais do que previsível. Era previsível porque houve um conjunto de medidas, que foram sendo tomadas ao longo dos últimos três anos, que tinham que dar nisto. Foi o caso da alteração ao Estatuto da Carreira Docente, o Estatuto do Aluno e o modelo de avaliação que o Ministério resolveu implementar.
Ou seja, ao longo dos últimos tempos, o mal-estar tem vindo, de facto, a aumentar, resultante de uma desvalorização social da classe dos professores, que é contínua, por parte deste Ministério. Mês após mês, assistimos a várias intervenções, por parte dos responsáveis deste Ministério, a desvalorizar os professores. A Sr.ª Ministra conseguiu aqui uma coisa que nunca nenhum Ministério tinha conseguido, que é o facto de, num prazo relativamente curto de tempo, oito meses, ter mais de dois terços dos professores portugueses na rua, a protestarem; de ter também um número espantoso, e muito preocupante, de reformas antecipadas por parte de professores, sendo reformas antecipadas dos docentes mais qualificados, com mais experiência, aqueles que, de facto, eram baluartes da qualidade do ensino ministrado nas escolas. E fazem-no, como temos vindo a acompanhar pelas múltiplas entrevistas que muitos deles têm vindo a dar, porque perderam a paciência, porque estão cansados de serem maltratados por parte deste Ministério.
Ora, o que constatámos nos últimos dias? Foi que a Sr.ª Ministra e o Governo invocam que há aqui uns problemas com sindicatos, dizem que a oposição está a «cavalgar» as manifestações, ou seja, continua a desviar-se das responsabilidades que tem claramente nesta matéria.
Se a Sr.ª Ministra tem um problema com os sindicatos, é a Sr.ª Ministra que tem um problema com os sindicatos, não são os partidos da oposição. Não fomos nós que negociámos, não fomos nós que assinámos fosse o que fosse e não somos nós que temos que dar resposta a esse problema.
Se entende que a boa oposição é a oposição que diz e que faz o que o Governo quer, desta parte do Hemiciclo está completamente equivocada, porque nós não defendemos os interesses do Governo, defendemos, sim, os interesses dos alunos e das populações. Por isso, é importante começar-se a assumir as responsabilidades da condução política da educação portuguesa. E é isso o que tem vindo a faltar.
Mas, Sr.ª Ministra, o que também está aqui claramente em jogo, o que está em causa e motiva toda esta movimentação a que o País tem vindo a assistir de forma muito preocupante é que há um estatuto de carreira, que não mobiliza os professores, e tem também a ver com um modelo de avaliação, cuja patente é exclusivamente vossa.
A única, exclusiva, responsabilidade da existência deste modelo de avaliação é da sua equipa ministerial, que se alheou, na elaboração deste modelo, de tudo aquilo que se tem vindo a fazer pela Europa fora.
Poderiam ter copiado aquilo que tem dado resultado, aquilo que é seguido em países, como a Espanha, a Itália, a França, a Finlàndia, a Holanda» Tantos países, nossos parceiros da União Europeia que têm modelos de avaliação já testados e que funcionam, mas que os senhores não quiseram ter em conta. É que eles têm modelos muito diferentes daqueles que os senhores criaram.
Na verdade, também há aqui um traço que distingue o modelo que os senhores criaram relativamente a todos estes países, que são os nossos parceiros europeus e que nos deviam servir, pelos menos, nesta matéria, penso eu, de modelo. O que distingue o modelo que os senhores criaram é, claramente, a burocracia que lhe está inerente, porque a complexidade do modelo de avaliação não serve os interesses da própria avaliação.

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Penso que vale a pena recordar aqui só aquilo que tem vindo a público, ou seja, temos assistido, nos últimos meses, a uma tentativa de procurar pôr em prática o modelo de avaliação, por parte de um conjunto de especialistas e de outras pessoas, quantificando os caminhos que têm de ser percorridos. Penso que um exemplo que ainda recentemente foi publicado é bem claro quanto ao que não deve ser o modelo de avaliação: uma professora dos 1.º e 2.º ciclos, com seis turmas da sua área, mais uma de Formação Cívica, outra de Área de Projecto e outra de Jornalismo, e com apoio no ensino curricular, com um total de 193 alunos a seu cargo, tem de fazer 1456 fotocópias, introduzir manualmente 17 377 registos em documentos oficiais e participar em 91 reuniões apenas para se auto-avaliar. Portanto, os exemplos que têm vindo a público são, de facto, bastante claros relativamente àquilo que não deve ser o modelo de avaliação e, sobretudo, têm a ver com a originalidade do modelo que os senhores decidiram inventar e patentear mas que, com certeza, ninguém irá replicar, porque não funciona de forma alguma.
O que é que fomos vendo? Ao longo deste tempo, o Conselho Científico, que deveria ser um «braço armado» para a implementação do modelo de avaliação, pura e simplesmente, desapareceu. Começou mal, desde logo, porque, durante meses, funcionou só com uma presidente, que, ao fim de pouco tempo, depois de ter a sua equipa reunida, se reformou, foi-se embora, tendo-se assistido, seguidamente, a outras demissões.
Ou seja, aquele que deveria ser um «braço armado» para que um mau modelo ainda pudesse ser ensaiado é notícia apenas e só pelo registo que fazemos das saídas, das demissões dos vários protagonistas.
O que é que verificámos, sobretudo nos últimos tempos? Perante a dificuldade de aplicação do modelo em várias escolas, expressa por vários motivos, temos ouvido sempre a Sr.ª Ministra e os Srs. Membros do Governo, de uma forma muito clara e autoritária, donos absolutos da verdade e da razão, dizerem que não se passa nada e que tudo é para levar até ao fim. Ou seja, perante a complexidade do modelo, perante os pedidos para se olhar o que de bem se faz, nesta matéria, noutros países, a resposta foi sempre, sempre a mesma e foi sendo zero.
O que vemos é que existe, de facto, uma inflexibilidade brutal, associada também a algumas inverdades, porque, quando a Sr.ª Ministra diz que não há problema, que não se passa nada e que o processo está a decorrer em todas as escolas, há, no mínimo, um problema de informação. É que, sempre que ouço a Sr.ª Ministra dizer que está a correr tudo bem e que o processo está a ser desenvolvido em todas as escolas — e tenho-o ouvido várias vezes, a última das quais ainda ontem —, apetece-me dizer-lhe que alguma coisa está mal, que, provavelmente, no seu Gabinete, alguém lhe esconde a informação. Tenho aqui um conjunto de emails e de documentos que foram enviados para o meu grupo parlamentar, e também para a Sr.ª Ministra da Educação, com abaixo-assinados, com moções aprovadas por algumas escolas, a dar conta, exactamente, da suspensão deste processo. Portanto, para a Sr.ª Ministra dizer que tal não se passa em nenhuma escola, repito, é porque alguém, no seu Gabinete, lhe sonega a informação. Mas, como não quero que a Sr.ª Ministra continue sem informação, vou pedir aos serviços de apoio à Comissão que lhe façam chegar este rol de informações que nos foram enviadas, com conhecimento à Sr.ª Ministra, para que, de facto, não continue a negar.
Aquilo a que continuamos a assistir é a dificuldades e a «cortinas de fumo», que são verdadeiramente interessantes para distrair. O que ainda ontem se ensaiou, dizendo que a avaliação só terá impacto no concurso de 2013, foi mais uma «cortina de fumo» para ver se se apanha alguém desprevenido. Foi sempre assim, desde o início! Era óbvio, desde o início, que não teria qualquer impacto no próximo concurso, que será realizado agora, no final deste ano lectivo, porque não podia ter, uma vez que a avaliação ainda não estava concluída. Portanto, esta estratégia desta equipa ministerial, de ir descartando responsabilidades e de ir tentando criar a ilusão nas pessoas de que, afinal, até estamos a dialogar, até estamos a aproximar-nos e temos propostas concretas, é muito interessante mas não é assim.
Sr.ª Ministra, entendo que é muito importante começarmos a procurar estabilizar as nossas escolas, pacificar o clima e devolver esperança e confiança às escolas e à educação, porque o que se torna mais do que claro, neste momento, é que a Sr.ª Ministra já deixou de fazer parte da solução, a Sr.ª Ministra, neste momento, é a principal parte do problema. Aquilo que o Deputado Manuel Alegre disse, ontem ou anteontem, é o que vai na alma de muitos agentes do sector. E é uma pena que, de facto, a equipa do Ministério da Educação continue a fingir que nada se passa, a fingir que não vê nada.
A sua actuação, nas últimas semanas, Sr.ª Ministra, fez-me recordar aquele ministro da propaganda iraquiano, que dizia, na televisão iraquiana, que estavam a ganhar a guerra, no momento em que as tropas

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americanas já derrubavam as estátuas de Saddam, em Bagdade. É isto que esta equipa faz lembrar, quando diz que nada se passa, que não se sabe de rigorosamente nada. Isto tem de terminar, porque, desta forma, há uma coisa que fica claramente prejudicada: a qualidade do ensino que é prestado nas nossas escolas, a formação dos nossos jovens. E esta tem de ser a nossa principal preocupação! Mas, Sr.ª Ministra, sem estabilidade nas escolas, sem a pacificação do sector, não há políticas que resistam!

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Educação, depois de ouvirmos o PSD, neste debate, ficamos com a impressão de que o Orçamento do Estado é inatacável, do ponto de vista do PSD, uma vez que não apontaram um único aspecto negativo, o que é de estranhar e me leva a pensar que andamos em países diferentes, ou seja, há o País do PSD, há o País do Partido Socialista e há o País do Governo, quando, de facto, estamos todos aqui a tentar discutir um documento fundamental para a vida do País, que é o Orçamento do Estado para 2009.
O Orçamento do Estado é um instrumento técnico — é verdade! —, mas tambçm político,»

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Claro! Ora aí está!

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — » que tem por objectivo dar corpo ás opções e medidas previstas no Programa do Governo, que foi sufragado nesta Casa.
A educação, no Programa do Governo, que foi submetido a votação, ocupa um lugar cimeiro. E foram assumidos, como vectores fundamentais da política para o sector educativo, alguns aspectos que, embora a Sr.ª Ministra já tenha referido, convém sempre sublinhar, porque o PSD e, normalmente, os outros partidos da oposição, que estão formalmente contra tudo o que venha do Governo, parecem esquecê-los. Ou seja, falamos na aposta em mudanças estruturais, com vista a conseguir uma educação de qualidade para todos, na submissão das escolas ao serviço da aprendizagem dos alunos, na consolidação da educação básica, na expansão da educação e da formação de nível secundário, na promoção da qualidade educativa, na colocação da administração educativa ao serviço das escolas e das comunidades, na criação de um sistema nacional de garantia de qualidade e na promoção da igualdade de oportunidades. Tudo isto são linhas-mestras do Programa do Governo e deste Orçamento do Estado.
O facto de a proposta de Orçamento para 2009 considerar um orçamento de rigor, que conjuga a responsabilidade financeira com a responsabilidade social, parece representar, claramente, um dos quadros que acompanha o documento.
Tal como sempre foi afirmado e respeitado, nos sucessivos Orçamentos apresentados por este Governo — e agora, uma vez mais —, os problemas da educação em Portugal, lato sensu, nunca foram de carácter financeiro. E, já que estamos a falar em Orçamento do Estado, convém salientar que, havendo vontade e capacidade de actuação por parte do Governo — e é o que acontece —, não será por falta de dinheiro que as políticas educativas a que se vinculou, programaticamente, deixarão de ser concretizadas. E isto vê-se, claramente, nesta proposta de Orçamento do Estado.
Gostaria de salientar alguns aspectos concretos, para além daqueles que a Sr.ª Ministra já salientou, como, por exemplo, os aumentos significativos na educação pré-escolar, na cooperação, na acção social escolar e nos investimentos do Plano, que ultrapassam os 100%, pois são cerca de 119%, o que define, claramente, o perfil social das opções do Governo para a área da educação.
Também a nível do PIDDAC, que é fundamental, em termos de infra-estruturas, temos um aumento de 55%, o que deve ser enquadrado nas preocupações políticas do Governo no sentido de melhorar as infraestruturas educativas, no âmbito da melhoria geral da qualidade da educação para todos.
Entre as medidas do Orçamento do Estado para o sector, em 2009, e que dão corpo a orientações políticas muito específicas do Governo, destacam-se: alargamento da acção social escolar a um maior número de famílias, sendo os seus benefícios concedidos aos alunos do ensino secundário em condições idênticas aos da escolaridade obrigatória; a extensão do programa dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária a mais escolas em meios desfavorecidos; a concretização do processo de transferência de competências para as autarquias e de um novo modelo de autonomia, gestão e administração das escolas; a requalificação da

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rede escolar do ensino básico e da educação pré-escolar; a recuperação de mais 26 escolas secundárias; o objectivo de integrar 350 000 adultos, no próximo ano, na iniciativa Novas Oportunidades. É evidente que tudo isto tem expressão orçamental e, nesta matéria, o Orçamento é muito claro.
Na proposta de Orçamento para 2009, temos uma despesa total consolidada de 6666 milhões de euros, o que, como, de resto, já foi referido pelo Sr. Presidente da Comissão, corresponde a um aumento de cerca de 7,2% relativamente à estimativa de execução de 2008, e não ao Orçamento inicial. E prevê-se que esta estimativa aponte para 6218 milhões de euros.
Deste modo, a despesa em educação representará, como já foi dito, mas convém repetir, porque, normalmente, as pessoas esquecem-se, e o nosso colega Emídio Guerreiro, por exemplo, esqueceu-se completamente de que estava a falar do Orçamento do Estado, 3,8% do PIB e 8,3% da despesa da administração central.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Mas já falou do Orçamento?!

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Curiosamente, no que diz respeito à despesa orçamentada, de 167 milhões de euros, para os serviços e fundos autónomos do Ministério da Educação, verifica-se um decréscimo de 21,6%. De facto, há aqui um decréscimo, só que se trata de uma questão meramente técnica, na medida em que essa verba passa para a Parque Escolar, ou seja, o dinheiro está lá, as preocupações do Governo, no sentido de disponibilizar à educação e aos agentes educativos os meios e as infra-estruturas necessárias, estão salvaguardadas.
Visto no seu conjunto e, em particular, na área de competência da Comissão de Educação, e é disto que estamos a falar, este Orçamento é mais do que um mero instrumento financeiro, é um documento político — e gostaria que isto ficasse bem claro — que consubstancia um conjunto de medidas que, estando previstas no Programa do Governo, encontram agora oportunidade para serem concretizadas. A isto, Sr.ª Ministra, em meu entender, chama-se governar! É evidente que não se trata de governar ao sabor dos acontecimentos, como, muitas vezes, em tempos não muito remotos, era frequente, trata-se de governar de acordo com um programa político que foi discutido e aprovado nesta Casa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Fernanda Asseiceira.

A Sr.ª Fernanda Asseiceira (PS): — Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Educação e Ciência, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Educação, na realidade, a razão de ser desta audição é a de discutir o Orçamento do Estado para 2009.
O PSD não começou com essa orientação — vamos aguardar pela orientação das restantes bancadas» —, em todo o caso, começou, e bem, por lamentar as ocorrências de ontem em Fafe, pelo que me associo a esse lamento. Sem dúvida alguma que as ocorrências no exterior da escola até têm aumentado — é do conhecimento de todos, pelos últimos dados do Observatório de Segurança na Escola de que temos conhecimento —, mas ainda não incluíam este tipo de ocorrências. É, de facto, lamentável! Todos aqueles que temos manifestado preocupação pela disciplina nas escolas, pelo respeito pelos outros, pelo cumprimento de regras, pelo desenvolvimento da participação cívica de todos — jovens e adultos — só podemos lamentar aquele tipo de ocorrências.
Começou o PSD por lamentar e referir, sobretudo, a questão da avaliação. Também não sabemos o que o PSD defende: se é o modelo que existia, que é o de que satisfaz todos; se é o que agora foi anunciado na Madeira, que é o de que é bom para todos. Acabamos por não saber o que o PSD defende.
O certo é que o Partido Socialista defende que haja uma valorização do bom desempenho. E quem cumpre os objectivos, quem assume a verdadeira missão de uma escola, não pode ter medo da avaliação.
O que é responsável e sério é disponibilizarmo-nos para ajudar, para colaborar, para que o modelo seja implementado e para que a avaliação se faça. Contudo, criticar e repudiar a avaliação só por oportunismo político não parece ao Partido Socialista sério.
Disse também o Sr. Deputado Emídio Guerreiro que a Sr.ª Ministra tem um problema com os sindicatos.
Não me parece que seja a Sr.ª Ministra que tem um problema com os sindicatos. Quem tem um problema com os sindicatos são os professores, e parece ser a sociedade.

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O Professor Marçal Grilo, ele próprio — não fui eu! —, disse que, quando se quebra um acordo assinado na sequência de uma manifestação, parece o PREC (Processo Revolucionário em Curso).
Portanto, volto a referir que não é a Sr.ª Ministra da Educação que tem um problema com os sindicatos.
Mas, porque estamos nesta audição para falarmos do Orçamento do Estado para 2009, importa ter presente o acréscimo que este Orçamento prevê em várias áreas, em praticamente todas.
Um acréscimo de 7% na educação pré-escolar é de desvalorizar? Um acréscimo de 6,6% nos ensinos básico e secundário também é de desvalorizar? Até o ensino particular e cooperativo tem um acréscimo de 3,1%, que deve satisfazer a bancada do CDS.
O ensino especial, que tanto tem sido criticado, tem um acréscimo de 5,4%.
A iniciativa Novas Oportunidades, a formação de jovens, a formação de adultos e a valorização da educação ao longo da vida têm também um acréscimo de 27,6%. Será de desconsiderar? A acção social escolar tem um acréscimo de 17%.
São, realmente, áreas em que o acréscimo é significativo e tem reflexo na melhoria das condições das escolas neste País, na nossa sociedade.
A igualdade de oportunidades é, efectivamente, uma marca. Disse a Sr.ª Ministra que se trata de uma igualdade de oportunidades no acesso. Mas também é uma igualdade de oportunidades no sucesso por criar melhores condições nas instalações, melhores condições nos equipamentos, melhores condições com diversidade de ofertas educativas. Tudo isto está, efectivamente, em curso. Tudo ficará diferente, mas tudo ficará melhor.
Sr.ª Ministra, a terminar, gostaria muito que pudesse concretizar e salientar o esforço que está a ser feito para reforçar o apoio às escolas, nomeadamente no que respeita ao alargamento dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária. E é um reforço que se faz nas áreas dos recursos humanos, dos recursos materiais, dos equipamentos e das instalações.
Sr.ª Ministra, agradecia que salientasse o que de muito positivo está a ser feito. É um facto que se vai reflectir na melhoria das condições, dos resultados e do sucesso, que é o verdadeiro desígnio que nos deveria envolver a todos.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Paulo Carvalho.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.
Presidente da Comissão de Educação e Ciência, Sr.ª Ministra da Educação, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, começava por dizer que, depois de ter ouvido mais de 12 minutos de intervenção de dois Deputados do Partido Socialista, que disseram que iam falar sobre o Orçamento mas a única coisa que fizeram foi ou criticar a oposição ou louvar o Governo, se percebe por que é que o sistema educativo não está bem. É que nenhum dos Srs. Deputados falou de qualidade, de exigência, de rigor, de promoção de mçrito»

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — O Sr. Deputado devia estar a ler o jornal!

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Não falaram de nada disso. Limitaram-se a tecer umas quantas considerações.
Mas, já que o Orçamento do Estado é, como, aliás, o Sr. Deputado disse, um instrumento de concretização de opções políticas, é óbvio que temos que falar aqui sobre a condução da política do Governo em matéria de educação.
Sr.ª Ministra, queria começar por lhe dizer que as divergências com o Governo podem ser muitas e grandes (aliás, penso que não só as do CDS mas até as de vários sectores da sociedade), mas considero que nada justifica uma reacção de falta de educação, de violência ou de agressividade perante quem quer que seja.
Portanto, é óbvio que, relativamente aos acontecimentos deploráveis de ontem à tarde, em Fafe, o que temos que deixar aqui bem claro é que geram a nossa maior censura e até alguma repugnância, muito sinceramente.
Contudo, há um facto que a Sr.ª Ministra não pode fingir que não vê. É que há um clima de tensão brutal em todos os agentes do sistema educativo, sejam os professores, sejam os pais, sejam os alunos. Mas a

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verdade é que para este clima de tensão, de grande animosidade e até de conflitualidade, que não justifica reacções como as que já lamentei, muito tem contribuído a actuação de V. Ex.ª Por isso, a Sr.ª Ministra, neste momento, é, de facto, uma parte que contribui para o problema e não propriamente um agente que pretende resolver esses mesmos problemas. E tem vindo a agravar sucessivamente este clima, em vez de, pelo contrário, tentar desanuviá-lo ou desincentivá-lo.
Gostava, pois, de perguntar-lhe como é que a Sr.ª Ministra pretende continuar a dirigir o sistema educativo português se os agentes que nele intervêm — professores, pais e alunos — vêem em si o seu principal obstáculo e o seu principal adversário! O clima é absolutamente impossível e insustentável! E para este clima muito tem contribuído a actuação do Governo, particularmente da Sr.ª Ministra e dos Srs. Secretários de Estado! Não ver isto é não só uma grande inabilidade como uma insensibilidade absolutamente lamentável.
Aliás, estou à vontade para falar sobre isto porque, muito antes dos acontecimentos desagradáveis, já tinha avisado, em declarações que vêm na comunicação social, que o clima estava absolutamente insustentável.
Sobre a questão da avaliação de desempenho, que vem muito a propósito, porque o Governo pretende alterar o decreto regulamentar precisamente em sede de Orçamento do Estado, o Governo comporta-se como um «afogado». Ou seja, esbraceja, agarra-se a toda a gente, tenta que todos fiquem colados às asneiras que está a fazer, mas, na verdade, trata-se de matéria da exclusiva responsabilidade do Governo.
O Sr. Secretário de Estado veio dizer, em face das manifestações, que o modelo não estava a funcionar porque havia escolas que tinham excesso de zelo; portanto, aplicavam o modelo complicando-o. Disse, ainda, que outras escolas não o aplicavam porque tinham preguiça e não queriam fazê-lo, pois não desejavam a avaliação. Depois, veio fazer umas comparações com os impostos, como se esta matéria tivesse alguma coisa que ver com a avaliação.
A verdade é que se esqueceram de uma coisa: quem aprovou este modelo foi o Governo! E quem tem que explicar é o Governo! Por isso, faço-lhe um pedido muito simples, Sr.ª Ministra, que acho que vai ser útil para os trabalhos da nossa Comissão: indique-nos uma escola onde o modelo de avaliação de desempenho definido pelo Governo esteja a ser aplicado cabalmente para podermos visitá-la. Porque, se se diz que umas escolas não o aplicam por excesso de zelo, outras porque não se querem aplicar nisso, então valia a pena que a Sr.ª Ministra nos indicasse uma escola que pudéssemos visitar e ver se é possível ou não fazê-lo! Repare, Sr.ª Ministra: se o problema não estivesse no modelo, não tinha havido necessidade de constantes declarações, esclarecimentos, protocolos, memorandos, acordos com sindicatos, adiamentos» Agora, afinal, já é só em 2013 que a avaliação de desempenho vai ter eficácia! Se tudo isto fosse simples, se tudo isto fosse eficaz, se tudo isto fosse claro, não seria necessária tanta trapalhada da parte do Governo! Tivemos a informação de que há mais de 500 escolas que iniciaram um processo que tem em vista uma decisão de suspensão do modelo de avaliação de desempenho. Há toda a probabilidade de estas escolas virem a decidir pura e simplesmente não aplicar este modelo. A pergunta que lhe coloco é a seguinte: Sr.ª Ministra, o que é que vai fazer? Como é que vai resolver este problema? Porque, digo-lhe sinceramente, isto é a ingovernabilidade total no sistema educativo! Isto é o caos generalizado! E o que é absurdo, repito, é que, perante tudo isto, com duas manifestações com mais de 100 000 professores, em Lisboa, a Sr.ª Ministra ainda não tenha percebido que talvez não tenha toda a razão! Depois da primeira manifestação, teve que vir o Sr. Ministro Vieira da Silva «deitar água na fervura».
Gostava de saber, Sr.ª Ministra, quem é que desta vez, no Governo, vai ter que ajudá-la a resolver o problema, porque da outra vez foram 100 000 professores, mas desta vez foram 120 000 professores.
Recebi também a informação de que os presidentes dos conselhos executivos abrangidos pela Direcção Regional de Educação do Norte (DREN) que têm esse processo interno com vista à suspensão do processo de avaliação foram convocados para terem, hoje, uma reunião na DREN com a Sr.ª Directora Regional.
Gostava que me dissesse se é ou não verdade, se a reunião é só para os presidentes dos conselhos executivos que têm esse processo e, já agora, qual a finalidade de chamar esses e não todos os demais.
Outra questão tem que ver com o facilitismo, que já referi. Sr.ª Ministra, há avisos que se fazem no momento certo. A Sr.ª Ministra não os ouve, mas depois acaba por pagar por isso! Quando se discutiu, aqui, o Estatuto do Aluno, com aquela trapalhada monumental em que o Governo decidiu acabar com as faltas injustificadas, portanto com a relevância pedagógica das faltas, desde logo

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dissemos que isto era uma mudança de paradigmas que traria consequências gravíssimas de perda de qualidade e de exigência do sistema educativo.
O curioso, Sr.ª Ministra, é que agora são os próprios alunos a manifestarem-se contra isso e a dizerem que já nem eles próprios querem a tal prova de avaliação que é uma «válvula de escape» que o Governo resolveu criar com vista a recuperar todos os alunos, inclusive aqueles que tenham acumulado imensas faltas.
Sr.ª Ministra, tudo isto é um conjunto de sintomas maus, sobre os quais era importante que nos desse um esclarecimento.
Gostava de terminar com duas perguntas, que, aliás, já lhe dirigi formalmente e para as quais ainda não tive resposta.
A primeira pergunta tem a ver com o facto de termos recebido a informação de que uma escola — penso que não será a única — tem passado credenciais para que as famílias possam comprar os livros, mas apenas numa livraria, escolhida aleatoriamente por essa escola, não se sabe com que critérios. A pergunta que lhe coloco é esta: este procedimento é correcto? Há alguma instrução nesse sentido? Sr.ª Ministra, uma vez que não me ouviu, vou repetir a pergunta.
Tivemos a informação de que, no âmbito da acção social escolar, nomeadamente no que se refere a apoios na aquisição de manuais escolares, tem havido escolas que passam as credenciais às famílias para a aquisição dos manuais com a indicação, já seleccionada, da livraria ou do estabelecimento comercial onde esses manuais deverão ser adquiridos.
A pergunta que lhe faço é esta: há ou não alguma instrução do Ministério sobre esta matéria? Parece-lhe correcto que a escola não abra, pelo menos, um mínimo de possibilidade de concurso, de participação dos vários estabelecimentos? Por que razão a escola pode, livre e arbitrariamente, escolher uma livraria, deixando de fora todas as outras? A segunda pergunta muito concreta, que também foi uma pergunta que lhe dirigi por escrito, Sr.ª Ministra, prende-se com as famosas acções de formação do Magalhães. De quem foi a iniciativa? De quem foi a ideia? Quem é que pagou? Quem suportou todos os custos e quem definiu os conteúdos daquelas acções? Penso que estes esclarecimentos são de máximo relevo.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, de facto as circunstâncias em que discutimos este Orçamento do Estado deixam-nos demasiadamente preocupados em relação ao que vai acontecendo nas nossas escolas, sobretudo à escola pública.
Sr.ª Ministra, é tempo de dizer que alertámos o Governo para esta situação, alertámos o Governo para as consequências das medidas que estava a tomar. Aliás, nesta Assembleia, quando discutimos a revisão do estatuto da carreira docente, ficou claramente demonstrado que o Governo tinha definido os professores como um alvo preferencial e a escola pública como um alvo a destruir. Alertámos para as consequências que aquele estatuto da carreira docente teria na vida dos nossos professores e das nossas escolas mas, ainda assim, estávamos longe de imaginar que as consequências fossem estas.
Em todo o caso, já era clara a estratégia do Governo.
Na altura, apresentámos 70 propostas que permitiriam solucionar muitos dos problemas que hoje estão criados, mas o Partido Socialista ignorou-as olimpicamente, o que fez com que hoje estejamos confrontados com esta situação.
Os resultados estão à vista: temos escolas com professores desmotivados; professores saturados de serem permanentemente mal tratados pelo Ministério da Educação; professores que aceitam aposentar-se com reformas antecipadas e com penalizações, porque já não aguentam mais continuar nas escolas; professores que, durante anos, deram o seu melhor e ajudaram a construir uma escola pública com qualidade e que hoje se vêem forçados a sair da escola, a aposentarem-se, porque já não aguentam o que o Ministério tem feito.
Sr.ª Ministra, a situação é, de facto, preocupante, sobretudo tendo em conta aquele que é um dos motivos principais, que tanta instabilidade tem gerado nas nossas escolas: o modelo de avaliação. E, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte há pouco, não é descabido que discutamos hoje, aqui, também a avaliação. É que — não sei se a Sr.ª Ministra se deu conta — a proposta de lei do Orçamento do

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Estado tem um célebre artigo 138.º, que faz uma alteração ao decreto regulamentar da avaliação dos professores.
Estranheza das estranhezas: o Orçamento do Estado altera o regime da avaliação! E fá-lo porquê? Porque o Ministério identificou um problema nas escolas que se prende com a tal burocracia de que falávamos — Sr.ª Ministra, quando dizíamos que este modelo de avaliação era burocrático, também era disto que falávamos! Confrontado com este problema de excesso de burocracia do modelo, o que é que o Governo faz? Envergonhadamente, e quase à surrelfa — passe a expressão —, mete um artigo na proposta de lei do Orçamento do Estado, na esperança de que ele seja aprovado e o problema burocrático ultrapassado. E como é que o Governo pretende que se ultrapasse o problema burocrático? Pondo de parte o Código do Procedimento Administrativo, essa regras que não interessam»

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, pela prática que tem sido seguida no Ministério, já estávamos habituados a que, da parte desta equipa ministerial, não houvesse qualquer preocupação com o respeito pela Constituição e a lei. Mas não estávamos à espera que a própria equipa ministerial desse ordem às escolas para praticarem ilegalidades. A coberto de quê? A coberto de uma alteração que há-de ser aprovada! Sr.ª Ministra, sabe o que diz às escolas uma informação da Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação? Diz o seguinte: «Nesta conformidade, as delegações de competências previstas nos n.os 2 e 4 do artigo 12.ª do Decreto Regulamentar n.ª 2/2008»« — o tal decreto regulamentar da avaliação — «» deverão ser afixadas pelas escolas em local que possibilite a sua consulta pelos interessados». Isto é o quê? É uma ilegalidade! É a própria Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação que determina às escolas que pratiquem ilegalidades! Porquê? Porque há-de vir uma lei que deixe todas essas ilegalidades para trás, como se nada disto tivesse acontecido.
Portanto, Sr.ª Ministra, infelizmente, esta matéria também cabe na discussão do Orçamento do Estado, porque estou a falar de um artigo que consta da proposta de lei. Obviamente, iremos apresentar uma proposta de eliminação deste artigo e esperamos que outros partidos acompanhem esta nossa posição.
Isto é, de facto, Sr.ª Ministra, o exemplo do desnorte e da desorientação que vai no Ministério da Educação.
E a pergunta que se impõe é esta: até onde vai levar-nos este desnorte e esta desorientação, a teimosia e a arrogância com que o Ministério da Educação continua a tratar estas questões? Que prejuízos mais é que as nossas escolas, os nossos professores e os nossos alunos, o nosso sistema educativo, afinal de contas, tem de sofrer para que o Ministério ponha travão ao que está a fazer e que está a contribuir aceleradamente para degradar a qualidade da escola pública? É preciso que o Ministério da Educação assuma, sem vergonha, os erros que comete, porque, Sr.ª Ministra, corrigir os erros não é um sinal de fraqueza, é um sinal de humildade, de inteligência e de responsabilidade na actuação política.
Vou passar a algumas questões sobre os números do Orçamento do Estado (apesar de não ser só disso que trata este Orçamento), que, infelizmente, parece ser o que mais preocupa o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e, em concreto, o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.
Primeira questão, Sr.ª Ministra: olhando para os mapas informativos dos serviços integrados do Ministério da Educação, damo-nos conta que há uma redução de 115 milhões de euros em remunerações certas e permanentes, isto face apenas ao orçamento do ano passado, porque se tivermos em conta o orçamento de 2006 (o primeiro inteiramente da autoria do Partido Socialista), então, a situação ainda é mais calamitosa. E esta redução de 115 milhões de euros resulta do quê? Em primeiro lugar, de 82 milhões de euros a menos que, pura e simplesmente, desaparecem do Orçamento do Estado, e, em segundo lugar, de uma outra norma que, este ano, vai passar a abranger todos os serviços da Administração Pública: a necessidade de contribuir com 7,5% das remunerações certas e permanentes para a Caixa Geral de Aposentações.
Portanto, isto traduz-se em 115 milhões de euros a menos no orçamento para remunerações certas e permanentes — vejo que o Sr. Secretário de Estado está à procura da página, por isso informo-o que está na página 32 dos mapas informativos.

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A pergunta que fazemos é esta: a redução nas remunerações certas e permanentes vai reflectir-se em quê, Sr.ª Ministra? Em menos pessoal ao dispor do sistema educativo? Numa aposta do Ministério da Educação na precarização, como parece resultar de uma leitura rápida destes quadros, ou isto tem a ver, também, com as limitações às progressões nas carreiras docentes que resultam do novo estatuto da carreira docente? Qualquer destas dúvidas é susceptível de corresponder à realidade, por isso gostaríamos que a Sr.ª Ministra esclarecesse esta redução.
Ainda em relação aos números do Orçamento do Estado, e sendo este o último Orçamento do Estado deste Governo do Partido Socialista, obviamente, importa comparar os dados deste Orçamento com a situação existente quando o Partido Socialista chegou ao Governo.
Infelizmente, Sr.ª Ministra, há coisas que não batem certo, nomeadamente: como se compatibiliza o discurso da prioridade à educação pré-escolar com a redução (que é uma redução em termos absolutos) das verbas disponíveis para o funcionamento da educação pré-escolar, face ao que foi a execução em 2005? Há, de facto, uma redução absoluta em 2009, comparando com as verbas que foram executadas em 2005! Como é que se compatibiliza esta prioridade com menos dinheiro? É uma questão que não conseguimos compreender.
O mesmo se diga em relação aos ensinos básico e secundário, onde também há uma redução de verbas face às previstas para 2005. Portanto, ao fim de quatro anos de Governo do Partido Socialista, temos menos dinheiro, mas temos uma prioridade!» Aliás, se a Sr.ª Ministra comparar a despesa total consolidada prevista para 2009 com aquela que foi executada em 2005, verificará que há uma redução de 560 milhões de euros. Isto traduz, de facto, a perspectiva de desinvestimento deste Governo na educação.
Há um outro dado que resulta do orçamento por acções que o Ministério da Educação entregou na Assembleia da República. Refiro-me ao investimento de que fala a Sr.ª Ministra no programa Novas Oportunidades, que, mais uma vez, é a grande bandeira do Governo. A questão que lhe coloco é muito simples, Sr.ª Ministra: quantos mais alunos vão ser «empurrados» para os cursos profissionais para sustentar esta propaganda do Governo? Nas escolas portuguesas, há alunos que estão a ser obrigados a inscrever-se nos cursos profissionais; há cursos que não abrem propositadamente para «empurrar» os alunos para os cursos profissionais, para sustentar a propaganda do Governo em torno do programa Novas Oportunidades, e isto, Sr.ª Ministra, é inadmissível! É inadmissível, sobretudo, que se registem situações como algumas que foram relatadas ao Grupo Parlamentar do PCP, de crianças e jovens com necessidades educativas especiais a quem é dito que nunca vão ter capacidade para concluir outro curso e, portanto, devem frequentar os cursos profissionais: «Assim, têm a possibilidade de concluir o 12.º ano, porque o curso até é mais fácil e está adaptado às vossas responsabilidades» — alegam. Sr.ª Ministra, isto passou-se numa escola de Oeiras.
O que é que o Ministério tem a dizer em relação a esta situação? É disto que o Ministério da Educação fala quando se refere ao investimento no programa Novas Oportunidades? Relativamente aos aumentos da acção social escolar — e para terminar, Sr. Presidente —, apenas queria dizer o seguinte: ontem, ficámos esclarecidos, uma vez mais, com as declarações do Sr. Secretário de Estado sobre os aumentos da acção social escolar. Na perspectiva do Ministério da Educação, um estudante carenciado que tenha direito ao escalão máximo da acção social escolar, apesar de ser um estudante carenciado, não tem direito ao pagamento dos manuais de aquisição facultativa. Porquê? Porque para aos estudantes carenciados garante-se o mínimo, os manuais de aquisição obrigatória, porque os manuais de aquisição facultativa são para quem tiver dinheiro! Esta é uma situação inaceitável, Sr.ª Ministra, e ilustra bem a perspectiva com que o Ministério encara os apoios da acção social escolar, como ilustra bem uma outra questão: o «milagre» da duplicação dos beneficiários da acção social escolar, de que o Ministério continua a falar, não bate certo com os aumentos que se registam do ponto de vista financeiro, porque a duplicação dos beneficiários não corresponde, sequer, a um aumento em mais metade dos apoios da acção social escolar. E isto significa que, afinal, muita gente terá acesso a menos apoios do que aqueles que tinha.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do Grupo Parlamentar do BE.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, o Sr. Primeiro-Ministro, no início deste ano lectivo, andou 600 km pelo País para lhe dar apoio. São muitos, muitos, muitos quilómetros. E, nesse longo percurso, a preocupação do Sr. Primeiro-Ministro foi com a motivação dos professores e com a sua mobilização para a nova escola que quer construir.
Sr.ª Ministra, de mobilização, por sua conta e do Sr. Primeiro-Ministro, estamos conversados! Quanto a capacidade de mobilização, não há uma capacidade de mobilização, quer sua quer do Sr. Primeiro-Ministro, tão grande como a de sábado passado! E, Sr. Ministra, não esquecemos que a senhora, sobre essa mobilização que se conseguiu fazer, disse que os 120 000 professores não faziam mais nada na rua do que chantagem sobre os outros professores que queriam, desesperadamente, ser avaliados.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Palavras suas!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não sei se a senhora pensa que os professores e as professoras deste país, que garantem a qualidade das escolas públicas, se vêem à sua imagem e semelhança.
Mas vamos falar da motivação. Da motivação de um estatuto, que é da sua exclusiva responsabilidade, que fracturou uma carreira, de forma completamente arbitrária, com critérios sobre os quais gostaria muito de ouvir uma explicação que tivesse algum senso, criando professores titulares e professores não titulares. Os pedagogos e os cientistas que a senhora deve ter à sua volta devem ter-lhe dado orientações de laboratório que justificam uma divisão que mais ninguém percebe. Este é o seu estatuto de carreira; esta é a sua oferta de motivação.
Para além desta realidade, a Sr.ª Ministra sabe que o clima que se vive nas escolas públicas, em Portugal, é verdadeiramente insustentável, que as pessoas estão a ser esmagadas com trabalho e com burocracia sem sentido e que as pessoas estão, como é evidente, disponíveis — e sempre revelaram essa disponibilidade — para um modelo de avaliação que seja credível e que qualifique a escola pública, que não é, garantidamente, aquele que a Sr.ª Ministra tem para oferecer às escolas. Mas a resposta que tem dado a tudo isto é que os professores que saíram à rua no sábado passado fazem chantagem sobre os outros.
Mas vamos continuar a falar de motivação, Sr.ª Ministra, que era a grande prioridade do Sr. PrimeiroMinistro. Motivação, quando a senhora tem centenas e centenas de professores que foram obrigados, porque não suportam mais a indignidade e a humilhação, a sair do sistema e a reformarem-se, perdendo 20% ou 30% do seu vencimento? Provavelmente, esta conversa não agrada ao Partido Socialista, como ouvimos aqui há pouco a Sr.ª Deputada, mas, como sabe, foi a Sr.ª Ministra que introduziu a questão da avaliação no orçamento e não nós.
Explique-nos, então, qual é o estatuto dos avaliadores que, por sua pressão, foram obrigados a desempenhar funções, uma vez que as suas competências não foram publicadas no Diário da República? Aquilo que os senhores fizeram foi um quadro de uma total confusão e arbitrariedade, sustentado na campanha de desinformação que mandam para as escolas. E o Bloco de Esquerda disse isto aqui desde a primeira hora, Sr.ª Ministra.
Os senhores mandam uma informação para as escolas, dizendo que no orçamento sairá a dispensa da publicação da delegação de competências em Diário da República, um orçamento que não foi aprovado, mas que tem efeitos retroactivos e altera e desrespeita os conteúdos do decreto-lei que regulamenta a avaliação. É óbvio que é necessário e urgente que a Sr.ª Ministra explique qual é a qualidade e a situação de todos os avaliadores que neste momento não têm a sua delegação de competências publicada em Diário da República.
Mas há outras questões. A senhora falou tanto em igualdade de oportunidades e no reforço do acesso, como as suas grandes prioridades políticas, mas há alguns números sobre os quais podemos e devemos falar aqui. Quero lembrar-lhe, por exemplo, Sr.ª Ministra, que a senhora tem menos 12 146 professores do que tinha o governo do PSD, tem menos 1803 auxiliares de acção educativa do que tinha o governo do PSD e tem menos 9,6% de encargos com a educação especial do que tinha o governo do PSD.
Vamos, agora, falar da qualidade da educação desta nova escola de que o Sr. Primeiro-Ministro falava no início do ano, quando estava preocupado com a mobilização e com a motivação dos professores.
A Sr.ª Ministra garantia, por exemplo, há muito pouco tempo, em Outubro de 2006, que «não há quaisquer objectivos de redução do número de professores», não há o objectivo genérico de reduzir o número de

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professores. A Sr.ª Ministra não fez outra coisa senão isto: reduzir o número de professores e aumentar a sua carga horária de trabalho, obrigando as pessoas a uma relação pesadíssima com a escola, tendo sobre o seu pescoço o ónus dos resultados escolares, porque esta é a sua visão do seu milagre do sucesso educativo.
O seu milagre do sucesso educativo assenta, mais ou menos, neste triângulo: distribui os computadores — e é mais trabalho com os computadores, porque obriga os professores a tarefas que não estavam previstas, como é evidente –, coloca na avaliação de desempenho o peso dos resultados escolares dos alunos e, ao mesmo tempo, aumenta a pressão vertiginosa para os alunos da escolaridade obrigatória saírem para os cursos de educação e formação. Este é o seu triângulo milagroso. Não sabemos que cientistas e que pedagogos iluminados lhe disseram que, com esta «varinha mágica» — uns chefes para aqui, uns computadores para ali e os professores «com a corda na garganta» —, o sucesso aumentava milagrosamente.
Este é o seu conceito.
Quero perguntar-lhe, Sr.ª Ministra, se considera, no quadro actual da pressão sobre as escolas para o alargamento dos cursos de educação e formação nos 7.ª, 8.ª e 9.ª anos de escolaridade» Não sei se me está a ouvir, Sr.ª Ministra»

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sim, sim! A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Dizia eu que, com o governo do PSD, tínhamos cerca de 4260 alunos em cursos de educação e formação. De acordo com as estatísticas oficiais, dado que a Sr. Ministra tem sempre outras estatísticas que mais ninguém conhece senão a Sr.ª Ministra, em 2006/2007, o número de alunos em CEF eram 21 301. A senhora sabe, com certeza e garantidamente, que esta oferta estava prevista para alunos com 15 anos, com percursos complicados, em risco de abandono e com histórias de insucesso. Este era o perfil desta oferta. No entanto, os números falam por si. O que o ministério tem feito é pressionar as escolas para que as crianças, à menor dificuldade, sejam empurradas para esta oferta escolar, que, garantidamente, é uma oferta que não lhe permite dizer que a escolaridade é obrigatória e universal.
Gostaria também de lhe perguntar, Sr.ª Ministra, tal como fiz já a um responsável desta área, se o Partido Socialista acha que a melhor oferta para os «pobrezinhos» é a oferta de CEF, se esta é a perspectiva do Partido Socialista, que este ano deixou fora dos apoios milhares de crianças com necessidades educativas especiais, que tem um conceito de necessidades educativas especiais que não lembra a mais ninguém e que deixou desprotegidos todos estes milhares de alunos. A perspectiva do Partido Socialista é esta: eles são de contextos desfavorecidos, são pobrezinhos, mas nós temos os CEF para garantir que eles não abandonam precocemente o sistema.
Que milagre é este que a Sr.ª Ministra, no seu laboratório da 5 e Outubro, acha que pode produzir, perante o desprezo que teve pela maior manifestação de professores de que há história e memória? É de convir, Sr.ª Ministra, que, se não fosse o trabalho de todos os dias desses professores e dessas professoras, jamais poderia falar de sucesso.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Cecília Honório.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Edução, gostaria de começar por dizer, à semelhança de outras bancadas, que, naturalmente, também não temos qualquer prazer com o tipo de episódios que sucederam ontem, também os lamentamos, mas não podemos deixar, simultaneamente, de lamentar — e muito mais — as políticas que este Governo tem implementado e que dão origem a estas legítimas manifestações de repúdio e de revolta por parte da comunidade escolar.
Sr.ª Ministra da Educação, o «bodo» em ano de três eleições não convence. Não convence ninguém, Sr.ª Ministra. Primeiro, porque o aumento que a educação conhece não chega sequer para colmatar a política de desinvestimento que os senhores têm promovido desde 2005. Só para ficar com uma ideia, em 2006, o orçamento para a educação correspondia a 4,1% do PIB; em 2007, correspondia a 3,7% do PIB; em 2008, a 3,5% do PIB, o que significa que houve uma descida total de 0,6% do PIB, e agora, para 2009 sobe apenas 0,3% do PIB.

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Portanto, se quiser comparar esses números com a criação de riqueza em Portugal, a realidade é que o pequeno aumento que o orçamento da educação agora conhece não chega sequer para colmatar aquilo que tem vindo a perder ao longo destes anos.
Nós já estamos habituados a esta táctica da política de restrição, para, depois, aliviar um bocadinho o «garrote» no final da legislatura, em tempo de eleições, para tentar enganar os portugueses, mas eles não são tolos, Sr.ª Ministra. Por isso, este é um orçamento de propaganda. Depois do «garrote» vem o «unguento».
Depois das ditas reformas de encerramento de escolas, de se tentar acabar com o ensino artístico público especializado, da redução dos apoios a alunos com necessidades educativas especiais, da exclusão de muitos alunos destes apoios apenas por não serem elegíveis, porque não padecem de uma deficiência grave, apesar de, reconhecidamente, do ponto de vista social e cognitivo poderem beneficiar, para o seu sucesso escolar, desses apoios, depois de uma reforma economicista do estatuto da carreira docente, que partiu a carreira em duas e impôs quotas na progressão, mandando o tão propalado princípio do mérito para o caixote do lixo, e depois de se ter tentado impor um processo de avaliação extremamente burocrático, moroso, complexo e eivado de contradições e ilegalidades no final do ano lectivo passado, tendo o início da sua implementação, este ano, revelado as grandes dificuldades porque passam as escolas e os professores neste momento, o Governo vem tentar eleger a educação como a grande prioridade deste Orçamento do Estado.
Mas esta operação, Sr.ª Ministra, não esconde o fundamental, não esconde a visão arrogante, autoritária e mistificadora deste Governo em relação à educação e, em particular, em relação aos professores e à classe docente.
O sinal que nos dá aposentação em massa dos professores mais antigos e com mais experiência, que se sentem aviltados e que colocam a sua dignidade, a dignidade da sua importantíssima função — dignidade essa que o Ministério da Educação bem tenta mas não lhes pode roubar —, e o direito de acabarem a sua carreira ainda como bons professores e professoras, que foram e são, à frente do direito de terminarem a carreira, à luz das regras em que a iniciaram, com a aposentação completa, é muito significativo em relação ao que é hoje a motivação da classe docente.
Antes, a Sr.ª Ministra dizia que as críticas eram dos sindicatos, não eram dos professores, e que os sindicatos nem representavam os professores, mas, depois de duas manifestações no mesmo ano, com cerca de dois terços dos profissionais da escola pública, já não é possível dizer o mesmo.
Esta visão do Governo, que acha que pode fazer reformas sem pessoas, que bastam quadros interactivos, obras em 30 escolas, computadores Magalhães e planos miraculosos que sobem as notas de todo o País de um ano para o outro, é uma visão irrealista e que já não convence ninguém, a não ser, talvez, porventura, o próprio Governo.
Em relação a isto, há uma nota assinalável neste Orçamento do Estado que, mais uma vez, define, de certa maneira, aquela que é a política e a visão deste Governo para a educação. Este é o terceiro ano consecutivo em que se verifica uma descida da despesa orçamental com pessoal. Esta rubrica volta a diminuir e este corte determina muitíssimo, Sr.ª Ministra da Educação.
É certo que as escolas padecem de muitas carências, é certo que os bens materiais são fundamentais, que a recuperação do parque escolar é fundamental, mas sem os professores a educação e o ensino não se fazem, não estão garantidos, tal como sem o apoio dos funcionários não docentes, naturalmente.
Assim, o que eu gostaria de perceber, Sr.ª Ministra, é o que é que esta lógica de redução da rubrica da despesa com pessoal significa, em termos do ano de 2009, no que se refere à redução em pessoal docente e não docente. O Governo gosta muito de alardear números, dizendo que temos mais alunos no sistema de ensino, e isso sem dúvida que é um objectivo importante a prosseguir, mas o que é significativo é que a esse acréscimo de alunos no sistema educativo corresponde um decréscimo de professores.
Ora, Sr.ª Ministra, face aos atrasos de que Portugal padece em termos da comparação que é feita com outros países da OCDE, é fundamental que esse investimento seja feito para recuperar esse atraso e não nos parece que isso possa ser feito com o corte na despesa com pessoal docente e não docente.
A situação que neste momento se vive nas escolas e que o debate da avaliação vem mostrar, de facto, é a de que existe nas escolas muito trabalho burocrático, para o qual os professores «não têm mãos a medir».
E só se explica que o Governo insista nesta visão porque demonstra não saber, ou não querer saber, qual é o trabalho de um professor numa escola. É que até se pode compreender que parte da população não

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conheça e não compreenda o trabalho invisível de preparar aulas, mas o Ministério da Educação já não tem essa desculpa.
A Sr.ª Ministra decidiu ignorar esse trabalho invisível, dizendo que os professores, simplesmente, não fazem e que, portanto, têm muitas horas para dedicar a reuniões e ao processo da avaliação, e isso não é verdade.
Das duas, uma: se os professores estão a fazer a avaliação, vão estar a prejudicar as aulas dos seus discentes. Esta é a opção fazer: ou as escolas têm professores em condições de dar aulas e assegurar todas as funções inerentes a uma escola pública democrática, com uma gestão democrática e participada pelos professores ou, então, vamos por um caminho de degradação do ensino.
Em relação ao Orçamento do Estado, outra questão que se põe é a das transferências de competências na área da educação para as autarquias. Gostaria de começar por dizer que este processo – e este é o primeiro Orçamento do Estado em que esta questão aparece reflectida – não é uma verdadeira descentralização de competências mas, sim, uma mera delegação de execução de competências do Ministério da Educação nos municípios. Foi isto o que fez o Decreto-Lei n.º 144/2008.
Do nosso ponto de vista, este processo representa mais uma tentativa de desresponsabilização do Estado de mais algumas tarefas públicas sem que estejam garantidas às autarquias as condições para, no mínimo, cumprirem o mesmo que o Estado vinha a fazer deficitariamente – isto no mínimo! E o problema não é apenas, mas essencialmente, o da transferência de meios, e infelizmente a experiência anterior com outras transferências de meios do Estado para as autarquias revela que os resultados nem sempre são os melhores.
Com efeito, a transferência de competências no apoio à família, na educação pré-escolar e na acção social escolar dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, por força da lei, ou nas competências relativas ao pessoal não docente, às actividades e enriquecimento curricular ou à gestão do parque escolar dos 2.º e 3.º ciclos através de contratos de execução, não só são feitas partindo de uma base subavaliada, devido à penúria a que o Estado tem vindo a sujeitar a escola pública ao longo dos anos, com a degradação do parque escolar, falta de equipamentos e recursos básicos e educativos em escolas em escolas, carências de pessoal não docente e insuficiência da acção social escolar, mantendo à partida essa mesma penúria nas transferências.
Mas, acima de tudo, o que não há neste Orçamento do Estado é nenhuma garantia de que as transferências financeiras devidas se irão operar e era em relação a isto que queria uma resposta muito concreta, Sr.ª Ministra, porque a única coisa que está no articulado é a autorização para que o Ministério da Educação faça a transferência dessas verbas para as autarquias e o que importava saber era que verbas serão essas, onde é que elas estão, quando serão transferidas e de que modo. Por outro lado, onde é que estão as verbas para material didáctico e pedagógico do ensino pré-escolar?

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N.Insc): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, mais uma vez gostaria de lembrar, até em consonância com a Sr.ª Ministra, que estamos a tratar do Orçamento do Estado mas, naturalmente, estamos a tratar em primeira mão daquilo que são as políticas públicas traduzidas em verbas.
De facto, é de políticas públicas que estamos a tratar porque, naturalmente, mesmo com o aumento que o Ministério refere no Orçamento do Estado, o que é importante é saber como essas verbas são distribuídas para a escola que temos hoje.
E a escola que hoje temos, em Portugal, não é aquela que a Sr.ª Ministra encontrou em 2005, é uma escola sobejamente diferente. A escola que tínhamos em 2005 era uma escola com lacunas e fragilidades mas com um corpo docente mais motivado, com alunos que tinham condições para aprender e professores que tinham condições para ensinar. Era uma escola mais tranquila e mais serena e por isso cumpria melhor os programas educativos.
A escola que temos hoje, em 2008, é uma escola de que não há memória, Sr.ª Ministra! É uma escola de onde saíram, em dois anos, milhares e milhares de docentes e, ao contrário do que foi dito pela sua equipa na Comissão de Educação, não porque a lei se alterou mas porque estes professores preferem sair com prejuízo, penalizados na sua carreira profissional, com penalizações elevadas, muito elevadas, mesmo, porque não têm condições para continuar a trabalhar, porque a senhora não os deixa trabalhar, nem deixa fazer aquilo que é

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fundamental no sistema educativo, um professor mais antigo passar o testemunho aos professores com menos experiência, aos mais jovens que estão a chegar ao sistema.
Mas, Sr.ª Ministra, também não há memória, no regime democrático, de assistirmos a manifestações como aquelas duas que aconteceram no ano 2008. Naturalmente que, para a Sr.ª Ministra, não sei o que serão essas manifestações, se de repúdio ou de chantagem – e de chantagem já sabemos que são –, mas é no mínimo lamentável que uma Ministra de um governo democrático, num regime democrático, não se sinta minimamente incomodada, ficando pela chantagem simplista, quando vê 120 000 professores na rua! E sabe perfeitamente que não tem que ver com os sindicatos nem com os partidos da oposição, tem que ver com milhares e milhares de docentes que não estão de acordo com aquilo que são as medidas da Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra pode não estar minimamente interessada com as questões que lhe são colocadas mas podia pelo menos ouvi-las.
Quando se fazem citações, normalmente, acabamos por citar aquilo que nos interessa e esquecer aquilo que foi dito. Mas a avaliação que é feita da política educativa extravasa muito aquilo que se tem vindo a dizer, ou seja, que estamos a reduzir as críticas a uma panóplia de agentes educativos ou de agentes na área dos sindicatos. Aquilo que o Sr. ex-Ministro Marçal Grilo disse ontem para quem o quis ouvir, num canal de televisão, é bem diferente daquilo que a Sr.ª Deputada Fernanda Asseiceira, há pouco, aqui disse. O que o Sr.
ex-Ministro disse também, para além do memorando de entendimento, foi que é muito preocupante que esta equipa governativa tenha avaliado o sucesso educativo a Matemática como se pudéssemos estar a falar de melhorias resultantes de varinhas de condão. Não há, efectivamente, varinhas de condão capazes de alterar resultados de sucesso ou de insucesso de alunos, só com estatísticas feitas à medida para que esses resultados assim aconteçam.
E esta é a escola de hoje! Ou, então, aquela outra em que, segundo se afirma hoje na comunicação social, a Direcção Regional do Centro proíbe reuniões de professores dentro das escolas e eles têm de encontrar infra-estruturas públicas para reunir, ou a outra – e esta oriunda do PS, segundo o Sr. Deputado Manuel Alegre – a Sr.ª Ministra utiliza uma linguagem imprópria, como titular da pasta da Educação, e incompatível com a cultura democrática.
Esta, Sr.ª Ministra, é a escola de hoje, a escola que a senhora produziu, a escola que produziu com as suas atitudes, com as suas metodologias, com a legislação que aprovou no Governo que integra.
Naturalmente, Sr.ª Ministra, valia a pena falar das políticas públicas que este orçamento traduz. E eu iria reduzir as políticas públicas a três ou quatro áreas: ensino especial; estatuto da carreira docente, tendo em atenção a própria divisão da carreira docente e a avaliação, considerando que a Sr.ª Ministra ainda considera importante, no sistema educativo, a existência de docentes e que não consegue substitui-los por Magalhães a 100%; aquilo que é a redução clara dos recursos humanos, quer dos docentes, quer dos docentes especializados, quer ainda de auxiliares de acção educativa.
Começaria exactamente pelo ensino especial. Este Governo produziu legislação para um novo ensino especial, um novo ensino especial que maltrata as nossas crianças e os nossos jovens com necessidades educativas especiais, que transforma em crianças deficientes aquelas que não o são e que, pura e simplesmente, ignora as necessidades educativas de muitas e muitas crianças.
Ao contrário do que a Sr.ª Ministra diz, é muito frequente recebermos, na Assembleia da República e na Comissão de Educação, emails sobre imensas crianças que, este ano, não têm apoio para as necessidades educativas especiais. E não o têm porque o Ministério não colocou docentes especializados ou, pura e simplesmente, não renovou destacamentos ou contratações ou não admitiu as sinalizações feitas pelos agrupamentos e pelas escolas.
Naturalmente que a Sr.ª Ministra conhece os processos individuais porque lhe têm sido feitos requerimentos e as situações têm sido denunciadas pelo próprio grupo de trabalho, mas, inclusivamente, a alguns a Sr.ª Ministra prefere até nem responder.
Porém, dou-lhe dois exemplos: a prova evidente de que a Sr.ª Ministra reconhece que a legislação que hoje existe para o ensino especial não responde às necessidades das crianças e dos jovens com necessidades educativas especiais pode confirmar-se com a produção de dois despachos feitos pelo Sr. Secretário de Estado Valter Lemos, que admitiu, em 31 de Julho e em 21 de Outubro deste ano, um voltar atrás nas decisões tomadas relativamente a duas crianças com necessidades educativas especiais e que o Governo

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tinha pura e simplesmente ignorado, tomando medidas de natureza administrativa e financeira, e não tendo nenhum respeito pela Constituição da República Portuguesa.
Esta é uma prova, mas podia dar outros exemplos de que, efectivamente, esta é a realidade e que aquilo que é a poupança em recursos humanos na educação especial vai ser paga pelo País a um preço muito caro a curto e médio prazo, naturalmente numa altura em que a Sr.ª Ministra já cá não estará, numa altura em que já terá reconhecido todas as malfeitorias que produziu e se tenha retirado. Nessa altura, iremos ver as consequências práticas desta medida.
Outra medida na área do ensino especial foi, por concurso e por legislação, a Sr.ª Ministra impedir que professores especializados, com pós-graduações, com mestrados e doutoramentos na área da educação especial, possam exercer a sua função porque à Sr.ª Ministra convém que professores com horário zero, sem nenhuma especialização mas a quem se deu, de repente, algumas horas para essa especialização (era demasiado escandaloso não terem nenhuma!), estejam a substituir professores especializados, enquanto estes estão no desemprego, sem nenhumas condições para exercerem aquilo que aprenderam.
Ouvindo há pouco o Sr. Ministro do Ensino Superior a falar dos quadros qualificados percebemos bem para que servem os quadros qualificados neste país, quando depois não têm condições para exercerem aquilo para que se formaram.
Outra questão que gostaria de levantar, ainda dentro da área do ensino especial, prende-se com os cortes orçamentais feitos no apoio às instituições de solidariedade social e às cooperativas, para apoios a crianças com necessidades educativas especiais.
A não ser que a Sr.ª Ministra considere que a federação destas cooperativas não fala verdade, são cortes entre 60 a 80%. Ficaram dezenas e dezenas de projectos com zero euros! Gostaria que a Sr.ª Ministra se pronunciasse sobre esta matéria, dado que coloquei a questão ao seu Ministério e ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e este último considera que é da exclusiva responsabilidade da Sr.ª Ministra os cortes que foram efectuados. Portanto, gostaria de saber porquê e se isto se prende com a existência de escolas de referência e de centros de recursos, dado que a Sr.ª Ministra vem respondendo a alguns requerimentos dizendo que um conjunto de crianças, neste país, não tiveram apoio especializado nas escolas onde estavam, quer em instituições de solidariedade social, quer em cooperativas de reabilitação, porque foram colocadas em escolas públicas especializadas, que têm centros de recursos, e não há nada mais falso, Sr.ª Ministra. Em todas as respostas a todos os requerimentos que lhe fiz, não corresponde à verdade que qualquer escola daquelas que a Sr.ª Ministra referiu tenha efectivamente um centro de recursos. Está previsto que o tenham mas até agora não têm.
Finalmente, Sr.ª Ministra, para falar de avaliação, o que gostaria de lhe perguntar era se a Sr.ª Ministra não é minimamente sensível a que 120 000 pessoas na rua peçam a suspensão da avaliação, depois da discussão que houve nesta Casa, em que, com excepção do PS, todos os grupos parlamentares apresentaram projectos de suspensão da avaliação, ou então se a Sr.ª Ministra, tal como diz o Deputado do PS, considera que razão só a senhora tem, que medidas políticas só a senhora tem e que o resto do país, toda a gente que a critica, são todos uns incompetentes que não sabem nada de educação, que o génio ficou exclusivamente consigo, sabe-se lá porquê, provavelmente por algum apuramento de espécie. O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de questões, tem a palavra a Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados que publicamente e de forma explícita lamentaram as ocorrências de ontem, numa escola, que também lamento, e agradeço muito o apoio manifestado pelos Srs. Deputados que o fizeram.
Penso que nem os Srs. Deputados nem os membros do Governo aqui presentes necessitamos de qualquer desculpa nem de nenhum artifício para falarmos daquilo que é, de facto, o tema de actualidade na área da educação, que são as questões da avaliação do desempenho. Não é preciso invocar o que está no artigo 139.ª»

Vozes do PCP e do BE: — 138.º!

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A Sr.ª Ministra da Educação: — » da lei do Orçamento para requerer algum comentário por parte do Governo. Faço-o com gosto, porque entendo que é meu dever explicar e reflectir sobre os problemas que nos preocupam, que preocupam os Srs. Deputados e que me preocupam a mim.
Aquilo que aqui foi afirmado muitas vezes, ou seja, que a Ministra da Educação teria dito que não existe nenhum problema, que está tudo bem, não é verdade. É muito diferente dizer que a avaliação está em concretização em todas as escolas de dizer que, em todas as escolas, tudo se está a passar muito bem. Não me ouviram nunca, em momento nenhum, dizer que não havia problemas, que a concretização do modelo de avaliação não é difícil. Nunca me ouviram dizer isso! Pelo contrário, o que tenho dito desde a primeira hora é que, apesar de difícil, é necessário fazer.
A questão é esta: necessitamos ou não de concretizar o modelo de avaliação de desempenho dos professores? Se a resposta a esta pergunta, que é aquela que interessa, for sim, então, a nossa obrigação, a nossa responsabilidade tem de ser a de apoiar as escolas, apoiar os professores para ultrapassarem as dificuldades e concretizarem a avaliação da melhor forma possível, que é certamente a forma como as escolas e os professores o querem fazer.
Portanto, em primeiro lugar, não são necessários artifícios nem desculpas para discutir aquilo que é um tema que nos preocupa a todos e também não é verdade que a preocupação com o que se passa seja um exclusivo dos Srs. Deputados, é também uma preocupação do Governo, o que não significa que tenhamos uma visão igual relativamente àquilo que estamos a observar.
De facto, misturam-se muitas coisas. A Sr.ª Deputada pergunta, à maneira dos jornalistas, se a Ministra da Educação não é sensível. A questão não é de sensibilidade, Sr.ª Deputada! A questão é mesmo de visão, é mesmo de acção e de vontade de intervir e de fazer, que são questões muito difíceis.
Podemos até compreender, o que não significa que tenhamos de estar de acordo com aquilo que compreendemos. São atitudes muito diferentes, bem mais complexas do que a simplicidade a que os Srs. Deputados, tão sensíveis, procuram reduzir um problema.
Neste momento, gostava de aproveitar para falar claro aos Srs. Deputados e para lhes dizer, com toda a franqueza, aquilo que é, de facto, a minha percepção do problema.
Desde há muito que me ouvem dizer sempre uma e a mesma coisa: é necessário não ter nenhuma ideia da natureza das mudanças que se estão a fazer nas escolas para pensar que tudo se resolve com muita facilidade. A natureza das mudanças, a sua profundidade, o facto de elas introduzirem fortes perturbações ou alterações naquilo que é o quotidiano da vida dos professores só pode resultar em que haja perplexidades e grandes dificuldades.
Lembro apenas duas grandes mudanças, sendo a primeira a alteração das condições de reforma.
Os Srs. Deputados dizem agora que os professores se estão a reformar de forma antecipada, esquecendo ou procurando ignorar que, se não tivesse havido alteração da lei das condições de reforma, os professores que estão agora a reformar-se com antecipação estariam na idade própria de se reformar. Portanto, é natural e compreendo que as pessoas que têm uma carreira longa em que a expectativa de reforma era de determinado tipo, quando vêem essa expectativa frustrada, tenham um necessário ajustamento e reequacionamento do que se passa.
A minha pergunta é: precisava ou não o País de fazer as alterações que foram feitas às condições de reforma de todos os funcionários públicos, não dos professores exclusivamente? Esta é que é a questão: estão ou não de acordo os Srs. Deputados que o País necessitava de introduzir uma alteração nas condições de aposentação de todos os funcionários públicos? Isto provoca alteração na vida das pessoas, traz perturbação, altera aquilo que era até uma programação de vida, com certeza, e temos que aceitar que isso assim é. Mas, de novo, a pergunta é se o País precisa ou não destas alterações.
Lembro uma outra mudança, que foi a regulamentação da componente não lectiva do trabalho dos professores. Essa alteração foi introduzida há 3 anos, por este Governo, e provocou muitas transformações naquele que é o quotidiano do trabalho dos professores. Lembro aqui que o que se passava era que as horas de redução, por efeito de desgaste na profissão, da componente lectiva do trabalho dos professores, acumulada com reduções associadas ao exercício de alguns cargos, levava a que, em muitos casos que não em todos, mas muito frequentemente, houvesse professores que, em fase de pré-aposentação, não tivessem horário lectivo distribuído e, em fases anteriores a essa, trabalhassem na escola, se tivessem horário nocturno,

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4 horas por semana, se tivessem horário de outro tipo, 8 ou 10 horas semanais. Ora, 10 horas por semana significa duas manhãs de trabalho na escola.
O que é que o Governo fez? Regulamentou a componente não lectiva, criando condições para que das reduções da componente lectiva resultassem horas de trabalho para o estabelecimento de ensino, para a escola.
A minha pergunta aos Srs. Deputados é se esta mudança é ou não necessária. Precisa ou não o País destas horas de trabalho dos professores? Precisam ou não as escolas e os alunos destas horas de trabalho dos professores? É disto que estamos a falar, é de uma mudança de que o País precisa mas que afecta o quotidiano, a vida dos professores, sobretudo quando estão já nos anos finais da sua carreira, tendo ainda associada a esta situação situações de possibilidade de acumulação de actividades lectivas em colégios privados e de possibilidade de acumulação com explicações. Ora, tudo isso mudou.
É nosso entendimento que as escolas precisam do trabalho das pessoas mais qualificadas do País, que são os professores. As escolas precisam do seu tempo de trabalho, pelo que criámos condições para que as escolas pudessem beneficiar desse tempo de trabalho.
Isto provoca insatisfação, desmotivação, como os Srs. Deputados gostam de dizer. Compreendo que possa ser esse um dos efeitos, mas a minha pergunta é: interessa ao País, precisa o País, precisam os alunos, as escolas? Acho que essa é que deve ser a nossa preocupação. Não temos um exclusivo de preocupações sobre a insatisfação que provocámos num determinado de grupo de profissionais. Isso é verdade, mas há muitos outros profissionais no País que foram afectados por mudanças deste tipo a quem os Srs. Deputados não dão, talvez, tanta atenção.
Peço desculpa pela minha franqueza, mas, neste momento, não posso deixar de lembrar aos Srs. Deputados que há várias coisas deste tipo que estão em causa. Que provocam muita insatisfação, provocam, com certeza e peço desculpa. Peço desculpa aos Srs. Professores por ter causado tanta desmotivação, mas é do interesse do País, é do interesse dos alunos, é do interesse das escolas. E o que eu espero é que as escolas, os alunos e o País possam beneficiar desta disponibilidade dos professores para estarem mais tempo na escola. É isso que eu espero! Em cima de tudo isto, há várias outras alterações, incluindo a alteração associada à avaliação de desempenho docente, que traz com certeza mais carga de trabalho, que traz mais tempo de trabalho na escola, que traz preocupações sobre as condições da avaliação.
Nunca disse que era fácil, nunca disse que não havia nenhum problema, estive sempre disponível para apoiar as escolas e os professores para fazerem bem e tenho a minha consciência tranquila em relação a uma coisa fundamental: este é um modelo de avaliação que não foi pensado contra os professores, pelo contrário, ele foi pensado para dignificar e valorizar a profissão de docente, mais do que o anterior modelo.
Tenho ouvido muito sobre este modelo dizendo que é injusto. Mas há coisa mais injusta do que um modelo de avaliação que não permite premiar os melhores?! Há coisa mais injusta?! Estamos a falar de quê quando dizemos que o actual modelo é injusto? O actual modelo, que apenas permite discriminar positivamente, não faz discriminação negativa, não prejudicará um único professor, pelo menos neste primeiro ciclo de avaliação, dá todas as garantias de protecção do interesse dos professores, apenas permite distinguir os muito bons e os excelentes, é um modelo injusto? Mas injusto em relação a quê? Porque distingue, porque trata como diferente aquilo que é diferente, ou é injusto porque deixa de tratar todos os professores de forma igual? Mas os professores não são iguais! Têm motivações diferentes, têm graus de envolvimento diferentes, têm resultados e competências diferentes! É justo, na minha opinião que isso seja reconhecido, que tenhamos um instrumento que permita distinguir e premiar os melhores.
Dizem-me que o modelo é burocrático. Com certeza que tem uma carga de trabalho associada, que tem sido, em muitos casos, levada ao extremo, ridicularizada. Mas lembro aqui uma outra medida de política educativa que foi ridicularizada à exaustão, nesta Câmara: as aulas de substituição. Foi ridicularizada à exaustão! Eram professoras de Matemática a fazer Educação Física de salto alto — ouvi isso nesta Câmara! –
, professoras de Matemática de salto alto que eram obrigadas a ir dar aulas de Educação Física, passando um atestado de menoridade aos professores e às escolas para se organizarem. E, um ano depois, Srs. Deputados, as escolas organizaram-se, os professores organizaram-se e, hoje, ninguém fala das aulas de substituição.

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O que é que foi necessário? Que o Ministério, a Ministra e o Governo resistissem às pressões para acabar com as aulas de substituição, normalizando-as e regulamentando as aulas de substituição, para retirar autonomia às escolas, para tratar os professores como profissionais pouco capazes de organizar o seu próprio trabalho. Resistimos e vencemos porque, hoje, nas escolas, todos os alunos têm garantido o acompanhamento de um professor nos tempos lectivos, nos tempos de trabalho, quando estão presentes nas escolas. E ninguém fala disso porque se faz de uma forma confortável para todos os professores, visto que os professores combinam entre si as ausências às aulas, que são processos normais que tocam a toda a gente.
O que é preciso, Srs. Deputados, na minha opinião, é ter presente o que é fundamental. A avaliação de desempenho é ou não necessária? Uma avaliação de desempenho que proteja e respeite o que são alguns elementos essenciais na cultura profissional dos professores, que os trate, nas escolas, de uma forma diferente das condições que são proporcionadas, por exemplo, ao pessoal não docente, mesmo quando é pessoal técnico superior. Este modelo de avaliação também respeita isso.
Uma das críticas feitas ao modelo, relacionando esta característica com a complexidade que o modelo tem, é o facto de haver (já ouvi ser expresso desta forma) duas «cabeças» a fazer a avaliação: o órgão de gestão, ou seja, o conselho executivo e o conselho de departamento. Pois, na minha opinião, este é um mecanismo que protege e respeita os professores, porque, se tivéssemos apenas a possibilidade de uma avaliação centrada no órgão de gestão, na hierarquia administrativa e funcional da escola, era um modelo igual ao dos funcionários das escolas. O modelo dos professores é um modelo diferente, que dá mais oportunidades, que respeita a especificidade de uma profissão altamente qualificada. Por isso, permite uma avaliação relativa à participação na organização mas também uma componente de avaliação relacionada com aquilo que é o exercício da actividade profissional em sala de aula, que é a essência, o que há de mais nobre na actividade docente.
Portanto, é necessário, evidentemente, sobretudo no plano da concretização, encontrar equilíbrios, mas não vale a pena deitar tudo a perder, porque há elementos essenciais neste modelo que foram concebidos não para prejudicar os professores, não para transformar a vida das escolas num inferno,»

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Mas foi o que fez! Não fez outra coisa!»

A Sr. Ministra da Educação: — » mas para proteger os professores, para lhes dar a garantia de que a complexidade da sua actividade tem uma tradução, tem uma cobertura neste modelo de avaliação.
Portanto, Srs. Deputados, não gostava de fugir ao tema. Gostava, aliás, que tivéssemos oportunidade de ter uma conversa tranquila, que nos permitisse identificar com mais clareza quais são os objectivos, quais são os princípios e, sobretudo, qual pode ser o nosso contributo para apoiar as escolas.
Mas há outro elemento que causa grande perplexidade. Por que é que temos uma parte dos problemas que temos? Porque apostamos na autonomia das escolas. A autonomia das escolas, para nós, não é retórica.
Não tem, para mim, sentido que a avaliação dos professores seja feita fora do quadro da escola em que exercem a sua actividade. Os professores exercem a actividade, hoje, numa escola que é uma organização complexa, que tem demasiadas responsabilidades e exigências. Deve caber à escola a avaliação de desempenho dos seus recursos humanos, de todos, os professores e os restantes técnicos e pessoal auxiliar.
Não tenho, para mim, que o modelo centralizado no Ministério da Educação seja melhor. Não criei condições para que fosse o Ministério da Educação a avaliar os professores, ou as direcções regionais, ou as universidades, ou as empresas privadas. Apostei que as escolas, no quadro da sua autonomia, o faziam e o faziam bem, mesmo que não o conseguissem fazer de uma forma perfeita no primeiro ciclo de avaliação. E insisto nesta tónica: se queremos caminhar para dar mais autonomia às escolas, devemos ter a perseverança, a paciência, a disponibilidade para ajudar as escolas a construir o seu espaço de autonomia. E a autonomia das escolas é também a autonomia para fazer a avaliação de desempenho dos seus professores.
Tenho muita pena que não tenhamos tempo para falar mais longamente, que não tenhamos tempo para apurar qual é, de facto, a nossa disponibilidade para apoiar as escolas a fazer a avaliação de desempenho, a construir, no fundo, a sua autonomia e, desta forma, a participar também no esforço que temos todos de fazer de valorização da actividade docente.
Tudo o resto, Srs. Deputados, que aqui ouvi — que o Conselho Científico não funciona, que desapareceu, que a presidente se reformou — é do mundo da intriga pura. A presidente do Conselho Científico reformou-se

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depois de fazer, de organizar e de coordenar o essencial do trabalho do Conselho Científico, que foi produzir as recomendações. E produziu todas as recomendações que eram necessárias para que o modelo fosse concretizado nas escolas. E fê-lo a tempo, fê-lo até Julho.
Não está previsto que esta comissão científica reúna semanalmente, Sr. Deputado. Não está previsto, sequer, que reúna mensalmente ou de dois em dois meses. Este Conselho Científico reuniu as vezes necessárias, até ao Verão, para dar às escolas todos os instrumentos de que necessitava para concretizarem a avaliação. E, depois, a Sr.ª Presidente reformou-se tranquilamente e nós aguardámos o tempo de fazer as substituições necessárias para que a comissão científica voltasse ao trabalho, que é agora um trabalho diferente: é um trabalho de acompanhamento da concretização da avaliação junto das escolas.
É pura intriga, Srs. Deputados, e não vale a pena escondermos aquilo que deve ser a nossa posição clara perante as escolas. Queremos ou não a avaliação de desempenho? Queremos ou não ajudar as escolas a fazer a avaliação de desempenho, por trás de uma intriga como a de que a presidente se reformou, aposentou-se ou a comissão reuniu duas vezes por mês ou duas vezes por semana? Tudo isso é o mundo dos blog, que percebi que o Sr. Deputado leu atentamente antes de preparar a sua intervenção»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quer dizer que a Sr.ª Ministra também lê!

A Sr. Ministra da Educação: — » e que, de facto, inspira boas frases mas não nos ajuda a resolver os problemas.
Gostava de referir, Srs. Deputados, que nunca disse que o modelo era fácil nem simples, porque os professores merecem mais do que facilidade e simplismo, para lembrar a facilidade com que os Srs. Deputados gostam de falar de facilitismo.
Há ainda uma questão a que gostava de responder, pois considero-a uma questão de fundo.
Diz o Sr. Deputado do Partido Comunista que há escolas que obrigam os jovens a inscrever-se em cursos profissionais, fazendo aquilo que é uma orientação vocacional desadequada. Faz a mesma acusação a Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda, agora em relação aos cursos de educação e formação.
Aquilo que quero deixar claro, desde já, Sr. Deputado, é que estou de acordo consigo, pois, se isso se está a passar, é absolutamente inadmissível. Gostava muito que o Sr. Deputado indicasse qual é a escola, exactamente, em que a orientação vocacional se está a fazer de forma não adequada

O Sr. João Oliveira (PCP): — A da Quinta do Marquês é uma delas!

A Sr. Ministra da Educação: — Gostava ainda de dizer duas coisas.
Há muito que a OCDE recomenda ao País a diversificação da oferta formativa, sobretudo ao nível do secundário, para poder, de forma mais eficaz, responder às expectativas dos jovens. Há muito! Durante 10 anos consecutivos, tivemos uma taxa de insucesso ao nível do 10.º ano da ordem dos 50%. Metade dos nossos alunos que procuravam o ensino secundário desistiam no final do primeiro ano e abandonavam a escola.
E, sobre isto, não ouvi nada! No momento em que o Governo concretiza uma recomendação da OCDE, de vários organismos internacionais, para que se dêem oportunidades de formação aos jovens, no momento em que o Governo tem mais alunos no ensino secundário, em todas as vias de formação — repito, em todas, nos cursos gerais de prosseguimento de estudo como nos cursos profissionais —, os Srs. Deputados levantam aqui o problema de estarmos perante a organização de um sistema com escolhas de primeira e escolhas de segunda.
Srs. Deputados, já tínhamos um sistema com escolhas de primeira e escolhas de segunda, só que era a seguinte distribuição: a escolha de primeira era para os meninos que ficavam na escola e a escolha de segunda era o mercado de trabalho para aqueles que não tinham sucesso na escola. Hoje, felizmente, temos ainda um programa dual mas que oferece a todos uma oportunidade de formação.
Gostava muito de ouvir se os Srs. Deputados valorizam ou não esta possibilidade de, no quadro da escola, podermos ter mais alunos em todas as vias profissionais e alunos com melhores resultados escolares.
E isto vale também para os cursos de educação e formação, Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda. Se a orientação vocacional está a ser feita de forma inadequada, serei a primeira a procurar corrigir essa situação.

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Mas não posso aceitar, Sr.ª Deputada, que diga que estou a pressionar as escolas ou os professores para encaminharem as crianças para cursos de educação e formação. Gostaria que fizesse o favor de provar que a Ministra da Educação ou o Ministério da Educação pressionaram as escolas.
Aquilo que demos às escolas, Sr.ª Deputada, foi um instrumento para combaterem o insucesso e o abandono, porque a alternativa para muitas destas crianças era a rua, o mercado de trabalho desqualificado.
Os 32 000 alunos (pois não são 20 000, mas mais!) que tivemos, no ano passado e este ano, nas nossas escolas, são alunos que acrescem aos alunos que estavam nas vias regulares, são alunos que as escolas e os professores conquistaram ao abandono,»

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Isso não é verdade!

A Sr. Ministra da Educação: — » são alunos que as escolas e os professores recrutaram para a escola, fazendo um trabalho de mobilização, de valorização da escola absolutamente inovador. Nunca antes, na sociedade portuguesa, tinha havido um programa desenvolvido pelas escolas e pelos professores de combate ao abandono e ao insucesso com tantos resultados. Trouxe muitos problemas para as escolas, muitas dificuldades, até de como fazer, mas tem milhares de alunos e milhares de professores a fazer este trabalho, que é o trabalho de que os portugueses precisam! E isto deve ser objecto da nossa admiração, do nosso louvor e do nosso agradecimento e não de uma acusação sem sentido de que estamos aqui a criar uma oportunidade para meninos pobres.
É verdade que muitos meninos são pobres, Sr.ª Deputada. É verdade! Mas de novo lhe respondo: a alternativa, antes de haver cursos de educação e formação em todas as escolas básicas, para estes menino pobres, era a rua e prefiro, apesar de tudo, que estes meninos pobres estejam todos na escola.
Com a licença do Sr. Presidente, gostaria de passar a palavra aos Srs. Secretários de Estado, se ainda dispusermos de tempo, para que possam responder às questões relacionadas com o ensino especial, com a acção social escolar e com os manuais.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Efectivamente, ainda tem tempo. Respeitando a igualdade de «armas» entre as intervenções dos Srs. Deputados e do Governo, o Governo ainda dispõe de cerca de 20 minutos e, portanto, Srs. Secretários de Estado, poderão distribuir os tempos como muito bem entenderem.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação, Valter Lemos.

O Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começaria pela questão do artigo do Orçamento relativo à delegação de competências, de que falou o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP, e outros.
A crítica que aqui ouvi hoje e que tem sido repetida é de que o modelo de avaliação é muito burocrático. O que acontece é que a possibilidade de as escolas terem que fazer dezenas de milhares de publicações em Diário da República relativas aos actos de delegação de competências é simplificada e, assim, as escolas não precisam de fazer essas publicações porque elas interessam às escolas e aos professores envolvidos nas escolas. Portanto, fiquei muito surpreendido por o PCP ser contra a publicitação nas escolas da delegação de competência que só interessa aos professores da escola. A não ser que o PCP quisesse esconder a delegação de competências...

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Sr. Secretário de Estado devia conhecer a Constituição e a lei!

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Do que estamos a falar é exactamente da possibilidade de retirar burocracia ao processo, facilitando às escolas o seu trabalho sem alterar em nada o conteúdo do processo.
Aliás, a Sr.ª Deputada do BE chegou a dizer que a lei do Orçamento desrespeita o decreto regulamentar, o que é uma coisa que me deixa bastante surpreendido porque é ao contrário, ou seja, a lei estabelecerá e o decreto regulamentar tem que a cumprir.

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Sobre a questão das verbas de pessoal, gostaria de dizer aos Srs. Deputados Madeira Lopes e João Oliveira que, se repararem, as verbas estão nas transferências para as autarquias.
O Sr. Deputado João Oliveira disse que havia 115 milhões de euros a menos nas verbas de pessoal, mas não reparou que temos 130 milhões de euros a mais nas verbas de transferência para as autarquias. Como sabe, os vencimentos do pessoal não docente, que vão ser transferidos para as autarquias, constam, exactamente, das verbas que vão ser transferidas para as autarquias – 124 milhões num sítio mais 6 milhões, na acção da educação pré-escolar, noutro sítio. Era bom fazer bem as contas e por isso mesmo queria responder ao Sr. Deputado Madeira Lopes que é aí que está a transferência.
O Sr. Deputado Madeira Lopes disse que não há transferência de meios, mas está explícita no Orçamento.
Estão lá mais de 130 milhões de euros para as novas competências das autarquias»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não é verdade!

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — » e tambçm gostava de dizer que estão rigorosamente de acordo com aquilo que foram os contratos de execução estabelecidos com as autarquias. Portanto, as autarquias sabem os valores que aí constam, porque assinaram os contratos de execução, e isto está de acordo com aquilo que foi o contrato entre o Governo e as autarquias nesta matéria.
No que respeita à questão do ensino especial, gostaria de dizer que fiquei um pouco surpreendido com o facto de a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita ter dito que este regime transforma crianças normais em deficientes, porque a acusação que foi feita ao Ministério da Educação e ao Governo durante estes anos todos foi o contrário, ou seja, que retiramos crianças com dificuldades do universo em causa. Agora, é ao contrário! Agora, diz-se que, afinal, o regime funciona ao contrário! Vamos lá perceber qual é a questão!

A Sr.ª Luísa Mesquita (N.insc): — O Sr. Secretário de Estado da Educação tem de estar com atenção às perguntas!

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Também quero dar nota que a Sr.ª Deputada diz que dois casos foram objecto de decisão do Secretário de Estado – não sei bem ao que se está a referir, mas tomando como bom aquilo que disse – no sentido de os incluir. Aqui diria que o argumento é muito claro: nesses casos e ao contrário daquilo que a Sr.ª Deputada disse, dado que o Secretário de Estado é membro Governo, a atitude do Governo vai exactamente no sentido daquilo que a Sr.ª Deputada advoga e a crítica é dirigida a uma escola específica, não sei qual, que não terá feito bem o seu trabalho, neste aspecto, e teve de ser corrigida.
Quanto à questão das habilitações dos professores, gostaria de dizer, já que tenho tempo, que as habilitações dos professores para a educação especial, como a Sr.ª Deputada sabe certamente, porque fala muitas vezes nisso, resultam de uma disposição da Lei de Bases do Sistema Educativo, que estabelece que, obrigatoriamente, só podem adquirir formação especializada em educação especial professores que tenham experiência como tal. Daí decorreu um decreto-lei, em 1997, que estabeleceu que a experiência era de um mínimo de 5 anos e o Governo, nessa matéria, cumpriu rigorosa escrupulosamente a lei – sempre, como a Sr.ª Deputada sabe. Sempre! Mais do que uma vez foi aqui dito que, relativamente ao próximo concurso de professores, estamos a organizar o trabalho para verificar se poderemos, eventualmente, introduzir alguma modificação, dado que verdadeiramente existem alguns candidatos ao concurso que têm essas habilitações mas não cumprem o tempo de experiência docente que o decreto-lei de 1997 estabelece e que a Lei de Bases fundou.
É isso que está a acontecer e a Sr.ª Deputada sabe bem o que se passa em relação a essa matéria, não há nenhuma atitude do Ministério da Educação de discriminação desses professores. Isso é rigorosamente o que está na lei.
Quanto aos cortes orçamentais às instituições, gostaria de dizer que a Sr.ª Deputada deve olhar um bocadinho melhor para o que está no Orçamento, porque, em 2008, as CERCI, as APPCDM e as IPSS tinham 21,215 milhões de euros para 2230 alunos e para 2009 estão previstos 21,951 milhões – portanto, mais! – e somente para 1920 alunos. Depois, é preciso dizer que a esta verba – que cresce, como se vê, basta olhar

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para o Orçamento – acrescem as verbas para projectos (suponho que era a isso que a Sr.ª Deputada se estava a referir), que crescem de 19 para 25 milhões. Portanto estamos a falar de um aumento de 6 milhões.
No que respeita à questão da DREC e à acusação que foi feita de esta não permitir reuniões de professores, com a insinuação de que seria o Ministério da Educação que não as permitia, quero ler aqui o primeiro parágrafo de uma notícia publicada no Público, às 12 horas e 57 minutos de hoje, que tem o seguinte título: Sindicato dos Professores da Região Centro admite que acusação da FENPROF à DREC não corresponde à verdade. «Luís Lobo, dirigente do Sindicato dos Professores da Região Centro e membro do Secretariado Nacional da FENPROF admitiu hoje que não correspondem à verdade as acusações feitas pelo dirigente daquela Federação, Mário Nogueira, à Direcção Regional de Educação do Centro, segundo as quais esta teria dado instruções aos conselhos executivos das escolas para não cederem instalações para reuniões gerais de professores».
Por agora, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação, Jorge Pedreira.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira): — Sr. Presidente, gostaria de responder às questões levantadas sobre a acção social escolar.
Como disse a Sr.ª Ministra este orçamento consagra o maior alargamento da acção social escolar desde que ela foi instituída no País. Trata-se, de facto, de uma enorme mudança, que se verificou ao longo dos últimos anos, em particular neste ano e no próximo.
O Governo, desde que tomou posse, procedeu a uma actualização das capitações sempre acima da inflação e aumentou sempre significativamente o valor dos auxílios económicos no sentido de apoiar as famílias. Neste último ano, com consagração já no reforço do orçamento de 2008, procedeu a uma mudança significativa, tomando como critério para a atribuição dos escalões de beneficiários da acção social escolar os mesmos critérios da concessão do abono de família.
Em resultado dessa mudança, o alargamento do número de beneficiários é muito considerável e há uma duplicação do número de beneficiários dos escalões A e B da acção social escolar. Mas não se trata apenas de um alargamento da base de beneficiários, trata-se de também de um reforço dos benefícios, ao contrário daquilo que foi dito.
Enquanto o governo anterior, em dois dos três anos em que esteve no poder, não actualizou sequer os valores dos auxílios económicos, o Governo actualizou-os substancialmente, tanto no ensino básico como no ensino secundário, e aqui muito em particular.
Trata-se, pois, de um alargamento da base e do número de beneficiários, mas também de um alargamento dos benefícios, que, naturalmente, conta com a cobertura dos manuais escolares de adopção obrigatória no ensino básico mas ainda não dos manuais de aquisição facultativa.
E isto não apenas por razões de ordem orçamental mas também porque é necessário que, neste primeiro ano, tenhamos a previsão correcta dos encargos, porque ainda temos apenas estimativas, e ainda por uma outra razão: é que, do ponto de vista do Governo, não se justifica a adopção de manuais escolares – por isso mesmo publicámos uma portaria para que isso não aconteça – num conjunto de disciplinas que representam um encargo inútil para as famílias, na medida em que a maior parte desses manuais não são sequer utilizados.
Portanto, não se justifica estar a fomentar a aquisição desses manuais quando, do ponto de vista do Ministério da Educação, esse é um encargo excessivo e inútil.
Portanto, é disto que se trata, Srs. Deputados. Não há nenhuma redução, não nenhuma diminuição de apoios, pelo contrário, há um aumento muito significativo de apoios que encontra plena tradução no orçamento.
Como este ano já houve um aumento de encargos que foi suportado por um reforço do orçamento para 2008, temos de comparar não a execução do orçamento de 2008 mas o orçamento inicial para esse ano com o inicial para 2009. Ora, nesta comparação, para os manuais escolares, temos um aumento de 94% da verba inscrita e, para o conjunto dos apoios económicos, temos um aumento de 70% dos encargos. No conjunto da acção social, temos mais 27%.

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Portanto, há uma tradução clara do aumento do esforço que o Estado faz com a acção social escolar, que, repito, é o maior alargamento e o maior reforço. Como disse a Sr.ª Ministra, pela primeira vez, considera-se a acção social escolar como uma ferramenta fundamental para o apoio às famílias, em conjunto com outras medidas que o Governo tomou, designadamente a generalização do 13.º abono de família no momento da abertura do ano lectivo, que permitirá apoiar as famílias, designadamente, na situação difícil que a crise económica e financeira criou.

O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado Valter Lemos pediu para fazer uma correcção. Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado da Educação: — Sr. Presidente, queria fazer uma correcção relativamente aos números do orçamento para a educação especial.
Em 2008, para as IPSS e as CERCI, tínhamos 21,215 milhões de euros para 2230 alunos e, para 2009, temos 21,951 milhões de euros para 1920 alunos.
Para os projectos ao abrigo da Portaria n.º 1102, a dotação foi 5 milhões de euros em 2008 e, para 2009, será 6,5 milhões de euros, o que, portanto, é um aumento de 1,5 milhões de euros em relação a 2008.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Educação.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Intervenho apenas para retomar algumas questões que, de facto, ainda não foram respondidas e que foram colocadas pelo Sr. Deputado do CDS-PP.
Uma das questões é relativa ao facto de existirem escolas que estão a dar a indicação de livrarias para a aquisição de manuais.
Ora, já estamos a tratar de fazer uma acção inspectiva a essa situação. Tínhamos recebido a informação e, portanto, estamos a agir para perceber o que se passa, pois não houve qualquer orientação do Ministério da Educação no sentido de serem dadas aquelas indicações.
Uma outra questão é relativa às acções de formação para a generalização do acesso ao computador Magalhães por parte das escolas do 1.º ciclo, formação essa que foi feita junto dos professores do 1.º ciclo.
Gostava de lembrar que, há mais de 10 anos, os professores do 1.º ciclo têm tido programas de formação contínua em tecnologias de informação e comunicação — e lembro-me dos primeiros programas de formação que foram lançados, ainda eu própria desempenhava funções no Ministério da Ciência.
Foi feita a ligação à Internet de todas as escolas do 1.º ciclo, nas quais foi colocado o primeiro computador para o efeito. Desde então, não tem cessado o apoio, até das autarquias — em algumas, não muitas, escolas do 1.º ciclo, todas as salas foram equipadas com computadores individuais pelos próprios autarcas.
Depois dessa fase inicial, muito evoluiu a utilização de computadores e de tecnologias de informação nas escolas do 1.º ciclo e os programas de formação foram continuados.
Mesmo já na vigência do actual Governo, durante os dois primeiros anos, mantivemos um programa de apoio que envolvia os centros de competência e as universidades na formação dos professores do 1.º ciclo em tecnologias de informação.
O que aconteceu agora foi uma acção de formação de muito curta duração, organizada pelas empresas que têm envolvimento no projecto relativo ao computador Magalhães — Intel, Microsoft, Caixa Mágica —, ou seja, as empresas que, por questões relacionadas ou com hardware ou com software, decidiram organizar uma formação que permitisse explicar as especificidades deste computador e a importância da sua generalização através da escola e não através das famílias — porque este programa tem essa diferença. Tem esta diferença porquê? Porque consideramos que é muito importante que, desde estas idades, o computador seja visto como um instrumento de aprendizagem, um instrumento de ensino e, por outro lado, é absolutamente necessário garantir a todas as crianças o acesso em condições de igualdade, o que só a escola pode assegurar.
Portanto, esta formação, que foi organizada, programada, cujo conteúdo foi definido pelas referidas empresas em razão do seu envolvimento com o próprio computador, não é a primeira do género para professores do 1.º ciclo, é uma formação específica para as características deste computador e para o seu potencial de utilização em sala de aula.

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Gostava de recordar que foram centenas os professores que, de livre vontade, frequentaram esta formação, portanto, não foram obrigados nem a frequência da mesma dá créditos, ao contrário do que acontece com outras.
Esta acção de formação foi organizada para os chamados coordenadores TIC que são professores a quem no agrupamento são atribuídas determinadas funções de integração das tecnologias de informação no projecto educativo.
O que visávamos era que os coordenadores TIC apoiassem os professores do 1.º ciclo na integração do computador Magalhães no projecto educativo em termos do que poderia haver de novidade. Foi uma acção de formação com grande êxito.
A este propósito, lamento de novo um simples episódio, que durou segundos, de um professor que entendeu fazer o que, do ponto de vista ético, é absolutamente reprovável — e espero que nunca nenhum aluno se lembre de fazer a um professor o que aquele fez em acção de formação.
Aliás, recordo episódios absolutamente lamentáveis que já ocorreram no nosso sistema educativo e que não devemos deixar que se «naturalizem» porque não são naturais, são más práticas, são comportamentos negativos e devemos aproveitar para denunciá-los.
É a primeira vez que me pronuncio sobre esta matéria, mas faço-o com bastante sentido de responsabilidade e por considerar ser meu dever, porque é uma má prática quebrar todas as regras de confiança que é um elemento fundamental em sala de aula, quer envolva crianças quer adultos. Quem é professor sabe bem o que isso significa. Portanto, quebrar a regra de confiança sem o consentimento dos colegas professores é uma má prática, repito.
Foi utilizada uma má prática para fazer a divulgação, em segundos, de um episódio descontextualizado — não sei se foi, se não — de uma acção de formação que envolveu centenas de professores, durante centenas de horas, que teve uma avaliação positiva — os formadores foram avaliados pelos próprios formandos que preencheram um formulário, avaliando o conteúdo das aulas e a performance dos primeiros —, sobre a qual há um vastíssimo conjunto de informação.
Todavia, um episódio de segundos, que, insisto, resulta de uma má prática, faz com que se tenha ficado com uma ideia muito distorcida em relação ao que foi esta acção de formação.
Como já disse, o Ministério da Educação, por considerar importante que a acção fosse feita, apenas criou as condições para as empresas terem oportunidade de explicar as especificidades do computador Magalhães, não foi quem teve a maior responsabilidade por esta acção de formação nem por a mesma se ter transformado numa questão tão ridícula e tão incómoda, felizmente, apenas num caso e que durou segundos.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Vamos, então, passar à segunda ronda de perguntas, para o que cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos.
Começando pelo PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, começo com uma pequena nota para corrigir uma informação que aqui foi dada.
Não fui eu que disse que o Conselho Científico para a Avaliação de Professores reunia de dois em dois meses ou de duas em duas semanas. O que disse foi que, por parte do Conselho Científico, fomos ouvindo menção à reforma da Sr.ª Presidente e à demissão de alguns dirigentes.
A este propósito, não posso deixar de referir a figura do Prof. José Matias Alves e as declarações que fez no momento da saída. Recordo que ele foi nomeado para o cargo por indicação expressa da Sr.ª Presidente do Conselho Científico para a Avaliação de Professores e, directamente, pelo Gabinete da Sr.ª Ministra.
Tendo feito esta precisão, também devo dizer que fiquei com muita curiosidade em saber a que blogue é que a Sr.ª Ministra se referia já que, de facto, leio muitos blogues mas não sei se leio ou não esse. Se puder dar-me o endereço, irei verificar se consta da minha lista de favoritos e, se não, adicioná-lo-ei porque já vi que merece ser consultado com alguma regularidade.
Fica, pois, a nota de que, hoje, a Sr.ª Ministra reconhece que há problemas e que o modelo de avaliação é de difícil aplicação.

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Não deixa de ser curioso que, ao nível da percepção que tem do problema, a Sr.ª Ministra continue a lançar uma «cortina de fumo» sobre esta questão.
Ou seja, é percepção da Sr.ª Ministra que, em função das alterações que foram feitas no sistema de educação, os Srs. Professores, que «não estavam habituados a trabalhar» — mais uma vez! —, «reagem mal, não querem, de facto, ter de fazer mais estas horas». De igual modo, acha «normal», o que é notável, que as pessoas se reformem antecipadamente, perdendo dinheiro.
Não acho isso nada normal, até porque esse fenómeno, por a comunicação social lhe ter dado algum destaque, tem vindo a ser acompanhado de múltiplas entrevistas a muitos professores que optaram por se reformar mais cedo perdendo dinheiro. Penso também que todos nós conhecemos ou temos na família professores que fizeram essa opção e quais foram as razões, e não é um acto de normalidade, Sr.ª Ministra! Por mais candura que a senhora ponha nesta sua percepção da realidade, não é normal que, depois de terem trabalhado a vida inteira, as pessoas decidam ir para a reforma antes do tempo, perdendo dinheiro. Não! As pessoas vão para a reforma recebendo tudo a que devem ter direito. Por isso, estes casos significam um acto voluntário em função do que está a acontecer no meio escolar.
Sr.ª Ministra, a verdade é que o modelo de avaliação, para além de difícil, é muito mais do que isso: não contribui para a melhoria do sistema. Bem pelo contrário, está a criar uma grande entropia no sistema porque o problema é a exequibilidade, ou seja, a questão de passar o modelo à prática. E, mais uma vez, verificamos que se continua a adiar a resolução deste problema fugindo à questão.
O que está em causa é, de facto, o modelo de avaliação e continuo a não perceber por que é que não se seguiu o que tem vindo a ser feito noutros países onde nada disto há, não há estas horas todas, não há a necessidade de tanto papel.
O modelo de avaliação é tão bom, tão bom que, depois, cada um interpreta-o à sua maneira e faz o que faz, e depois a culpa, mais uma vez, ç das escolas e dos professores que têm interpretações várias» Se o modelo fosse de facto claro, se não fosse burocrático e contribuísse para a melhoria do sistema educativo, nunca poderia acontecer o que está a acontecer. Por isso, continuar a dizer que o modelo está a ser aplicado em todas as escolas é uma manifestação de cegueira.
Aliás, basta recordar que a escola pública mais bem colocada no ranking tomou uma decisão formal acerca desta questão, tomou a decisão de suspender o processo. Ou seja, os senhores estão a fazer de conta que nada se passa e que nada está a acontecer à vossa volta.
No entanto, a «cortina de fumo» que é lançada sobre esta matéria tem uma particularidade: a dada altura, a Sr.ª Ministra pediu desculpa aos professores e quero dizer-lhe que fez bem — mas, depois, continuou, dizendo que o faz porque «é do interesse do País». É mentira, Sr.ª Ministra! O único interesse que existe no que diz respeito à sobrevivência deste modelo de avaliação é, de facto, o da sobrevivência política da actual equipa do Ministério da Educação, mais nada!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É esse o único interesse que está a ser salvaguardado por esta teimosia. E é lamentável que, por tal razão, os senhores não sejam capazes de dar o passo em frente, isto é, fazer um novo modelo de avaliação.
Sr.ª Ministra, nunca ouviu nem ouvirá ninguém desta bancada rejeitar a avaliação! Rejeitamos completamente, sim, este modelo de avaliação que não funciona e que, sabe-se lá por que razão, é uma invenção exclusiva do Ministério da Educação, em Portugal.
Sr.ª Ministra, é pena que continue nesta sua teimosia e é lamentável que o Sr. Primeiro-Ministro, apenas por uma questão de assegurar a sobrevivência política desta equipa ministerial, não seja capaz de dar o salto em frente.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo, do Partido Socialista.

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, queria começar por registar três coisas.

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Primeiro, depois da longa e detalhada explicação dada pela Sr.ª Ministra sobre o contexto em que todo este mal-estar está a perpassar as escolas, uma vez mais, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaria de dizer-lhe que sempre estaremos disponíveis para ajudar as escolas e os professores a levarem até ao fim, com qualidade, este modelo de avaliação, com as eventuais alterações que sejam necessárias, visando a sua concretização da melhor forma possível.
Em segundo lugar, muito me admira a posição do PSD. Quer dizer, não consigo perceber qual é a posição do PSD sobre a avaliação porque tem dito que é a favor da avaliação e da progressão pelo mérito — estamos de acordo — e que isso tem de ser avaliado — estamos de acordo. Mas, depois, há um líder do PSD que diz: «Vamos é privatizar a escola. A educação é uma das áreas a privatizar em absoluto», sem nada dizer como é que se procederá a essa privatização.
Depois, diz a actual líder, primeiro: «Esta avaliação não pode regredir, tem de ir para a frente». Presumo que quando ela fala, lê e sabe do que está a falar. Nesta manifestação já cavalga alegremente o descontentamento que se gera para dizer exactamente o contrário»! Mas, finalmente hoje, tenho uma ideia do modelo do PSD... Efectivamente, ele preenche todas as coisas que o PSD tem dito: é um extraordinário modelo de avaliação, que é participada, que é baseada no mérito e que acaba «orgulhosamente» de ser concretizada pelo Governo Regional da Madeira.

Risos do PS.

É muito simples e nada burocrática; não faz perder tempo algum aos professores nem às escolas: é que por decreto todos os professores da Madeira são avaliados com «Bom»!!

Risos do PS.

A isto é que chamo um verdadeiro, simples, não burocrático, participado processo de avaliação e extremamente «democrático»...!

Risos do PS.

E não vi ninguém na bancada do PSD demarcar-se deste «grande avanço democrático» da escola!!...
Outra coisa: sobre a Deputada Luísa Mesquita, dado o conhecimento que ela tem desta área, oiço sempre há muitos anos, com muita atenção, o que ela diz e hoje criei um filtro em relação ao que ela diz, porque ouvia durante os dois governos anteriores dizer «cobras e lagartos» do que se passava na educação e, hoje, resumiu a situação da escola em 2005, dizendo: «Havia algumas lacunas, mas boas condições de aprendizagem e os professores estavam motivados». Vou reler de novo as suas intervenções para ver se consigo perceber se a tradução tem um sentido lógico ou se tenho andado muito distraída em relação à sua intervenção.
Gostaria ainda de dizer que, do nosso ponto de vista, este Orçamento para 2009 é muito claro naquilo que significa traduzir num Orçamento, portanto, em verbas, em prioridades, um programa político e, gostem ou não as pessoas, contestem ou não esse programa político, não podem dizer que as coisas não batem certo.
Já aqui foi lembrado o grande investimento em infra-estruturas. Não acredito que, em 2005, algumas lacunas que existiam na escola fossem apenas as decorrentes do «miserável» estado em que se encontrava uma grande parte da rede de ensino público. Não estou a culpar qualquer governo. Estou é a dizer que é uma responsabilidade que temos de assumir globalmente, só que agora este Governo está a resolver de uma forma planeada, constante e já financiada até ao fim do programa, o que é uma novidade.
A acção social escolar já aqui foi muito falada. Ninguém, nesta Sala, de certeza, pode dizer que, quando se facilita a vida dos alunos, das famílias em relação às suas possibilidades de mais facilmente serem transportados, de estarem numa escola, de comprarem manuais com os aumentos que aqui foram registados, isso é uma coisa contra a escola pública. Não é, obviamente, e todos, de uma forma ou de outra, defendemos há muito tempo que se tratava de elementos essenciais para que a escola pública fosse feita com sucesso e com a sua natureza, democrática, real que ela obviamente comporta.

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Não vou falar mais das Novas Oportunidades, apenas direi, em relação a esta matéria, que, quer nos adultos quer nos jovens, há uma continuidade na abertura de novas vias, ao contrário de todos aqueles que durante anos disseram que o grande problema do nosso ensino pós-25 de Abril foi exactamente acabar com os cursos técnicos e que isso tinha feito uma enorme brecha, inclusivamente na ligação ao tecido empresarial, mas não só, nas possibilidades de os alunos percorrem até ao fim o mínimo considerado necessário para serem cidadãos a tempo inteiro.
Em relação ao ensino artístico, que foi muito debatido ao longo deste ano, há um mapa muito curioso, que tem a ver com um aumento de mais 46% no ensino artístico especializado na área da música. Refiro-me apenas ao ensino especializado da música. Mas, lembro que, curiosamente, os aumentos mais significativos são na iniciação e no articulado integrado, da ordem dos mais dos mais de 70% ou 80 %. O único que baixa é o supletivo, o que é exactamente a concretização da política no ensino artístico.
Finalmente, quero lembrar algo que nunca foi aqui falado, mas que é um ponto muito importante neste Orçamento, que diz respeito aos professores. Há uma longa luta dos professores deste país para que haja mais lugares de quadro preenchidos, e essa luta é justa. Já foram dados sinais muito claros sobre a estabilização do corpo docente através das colocações plurianuais.
Há um pormenor que ninguém referiu e que gostaria de terminar a minha intervenção salientando-o: no ano que vem, 35 000 professores passam dos quadros das zonas pedagógicas sendo integrados nos quadros ou de agrupamento ou de escolas, na sua quase totalidade. Penso que é um passo muito importante para que os professores deste país tenham as condições de estabilidade por que sempre lutaram.

O Sr. Presidente: — Vamos passar ao PCP pela voz dos Srs. Deputados Miguel Tiago e Eugçnio Rosa»

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Peço desculpa, tem toda a razão, Sr. Deputado. Tem a palavra.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, temos de fazer valer os nossos direitos, e digo-o com todo o respeito.
Sr.ª Ministra, gostaria de começar esta minha segunda intervenção dizendo que há um vício que a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretários de Estado têm na abordagem dos problemas, que é o de deitar sempre as culpas para os outros. E vou utilizar como exemplo a resposta que a Sr.ª Ministra me deu sobre a acção de formação por causa do computador Magalhães.
A Sr. Ministra diz que se trata de uma iniciativa de umas empresas, que o Governo aceitou, considerou boa, divulgou e criou condições para que os professores lá pudessem ir. Há várias opiniões no sentido de os conteúdos serem inúteis e de alguns momentos (reconheço que não foi a totalidade) terem sido ridículos e a Sr.ª Ministra diz que o problema foi que houve um professor que filmou. Sr.ª Ministra, isto, de facto, mostra bem a forma como aborda os problemas, arranjando sempre uma desculpa para não os enfrentar, nomeadamente culpabilizando terceiros. Mais valia perceber o que é que aquilo tinha tido de bom ou de mau, para que não se voltasse a repetir ou, se se repetisse, perceber o que é aquilo tinha de útil.
Quanto ao facto de a Sr.ª Ministra fazer uma certa equiparação entre os problemas da avaliação de desempenho e toda a contestação que se gerou com as aulas de substituição, permita-me que lhe diga que essa comparação não é muito feliz, pelo seguinte: é que a Sr.ª Ministra disse que, um ano depois, após umas resistências — que são naturais e que eu aceito e penso que toda a gente aceita, pois as estruturas reagem sempre com alguma resistência à mudança —, as coisas funcionavam. Sr.ª Ministra, o problema é que a avaliação de desempenho já está no «ano depois». Este modelo de avaliação de desempenho foi aprovado em Janeiro de 2008, Sr.ª Ministra, e já estamos em Novembro! Estamos quase a completar um ano e não só não está melhor como está muito pior, Sr.ª Ministra! A contestação vem em crescendo» Eu disse à Sr.ª Ministra que tinha conhecimento de centenas de escolas que se estavam a opor e que tinham um processo para a suspensão. Mas a verdade é que, ontem mesmo, em Braga, reuniram 600 professores, por sua iniciativa, sem enquadramento sindical, votaram uma proposta de realização de greve geral até que a Sr.ª Ministra mude de opinião, até que o Governo mude de opinião ou a Sr.ª Ministra se demita.

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Digo constantemente que não tenho uma perspectiva de classe na avaliação do sistema educativo. A Sr.ª Ministra talvez tenha, mas eu não tenho e a verdade é que não perceber estes sinais, não perceber este crescendo de revolta genuína, que já nem sequer é organizada, ou, na expressão da Sr.ª Ministra, «manipulada por sindicatos» (e estou à vontade para o dizer pois nunca fui sindicalizado, nunca pertenci a um sindicato, nem nunca fui a uma manifestação sindical), não perceber estes sinais é cegueira, Sr.ª Ministra! É absoluta e total cegueira! Por outro lado, também lhe digo que não percebo esse estilo paternalista com que fala, dizendo: «sei o que é que melhor. As pessoas não gostam, mas eu sei o que é melhor para os professores, para os pais, para os alunos». Devo dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que se assume como uma espécie de vanguarda esclarecida da classe docente e esta ideia de alguém se considerar vanguarda esclarecida seja do que for é uma manifestação de prepotência política, seja em que altura for! Já tivemos isto em Portugal e, sinceramente, para mim, não é de boa memória» Portanto, Sr.ª Ministra, de facto, reconheça que é altura de manifestar pelo menos alguma abertura para mudar o modelo, para tentar salvar a avaliação de desempenho, porque, tal como lhe disse várias vezes, na altura em que aprovou este modelo, parecia que o Governo estava a fazer de propósito para que tudo corresse tão mal que nem sequer viesse a haver avaliação de desempenho, e, no fundo, parece que estão a cumprir essa missão triste de fazer com que não haja avaliação de desempenho.
Sr.ª Ministra: para tentar salvar a avaliação de desempenho proponho-lhe que manifeste abertura para alterar este sistema, no sentido de ele se tornar praticável e exequível pelas escolas.
Com isto termino, porque já excedi o meu tempo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Paulo Carvalho, queria só penitenciar-me pelo meu erro de há pouco, mas não houve qualquer vontade, nem expressa nem subliminar, de o ostracizar. Só que, como o Sr. Deputado não se manifestou, pensei que prescindia da segunda ronda e foi por isso que passei automaticamente para Partido Comunista.
Vamos agora, sim, passar ao PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, boa tarde, antes de mais, já que é a primeira vez que me dirijo à bancada do Governo.
O seu discurso foi quase «tocante«» Tentou de alguma forma convocar o País, os pais, as famílias contra os professores, é uma instrumentalização a que já vamos estando habituados, tentando de alguma forma fazer crer que os professores não reflectem minimamente as preocupações do País. Pois engana-se, Sr.ª Ministra! E até já são muitas as cartas, inclusivamente de associações de pais e de assembleias, que se solidarizam com a luta dos professores, exactamente por perceberem que não é possível beneficiar a escola pública, como a Sr.ª Ministra diz que beneficia, enquanto a faz parar na sua missão, porque ataca no mais íntimo possível os direitos dos trabalhadores da educação.
Sr.ª Ministra, também é muito «tocante» o seu discurso no que diz respeito à inclusão na escola pública dos jovens mais carenciados, fazendo alusões ao facto de este esforço ter ido buscar jovens dos mundos mais pobres para a escola. É que, Sr.ª Ministra, basta olhar para os números que são divulgados pela própria Agência Nacional da Qualificação para perceber de onde vêm os estudantes nas Novas Oportunidades: vêm dos cursos tecnológicos que a Sr.ª Ministra agora impede de abrir e das científico-humanísticas, por via do mecanismo, já referido pelo meu camarada João Oliveira, de empurrar os estudantes para as vias profissionais, e vêm destas vias que estão a ser objectivamente suprimidas e estranguladas para engrossar o caudal da Iniciativa Novas Oportunidades, para a propaganda deste Governo ter mais cabimento!! Sr.ª Ministra, não é certamente à custa das crianças e dos jovens que estão na rua que está a engrossar a Iniciativa Novas Oportunidades. Veja os dados do seu próprio Ministério: os 20 000 estudantes que desaparecem dos cursos tecnológicos são os 20 000 estudantes que aparecem na Iniciativa Novas Oportunidades — é tal e qual isto.
Sr.ª Ministra, refiro agora algumas outras questões. Quanto ao Parque Escolar, EPE, uma das outras linhas centrais da propaganda do Governo que caracteriza como espectacular porque vai intervir em dezenas de escolas, pergunto: e até quando, Sr.ª Ministra? É porque, no orçamento por acções, parece que vai haver

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intervenções em 32 escolas. Porém, Sr.ª Ministra, quando olhamos para o relatório e contas desta própria empresa, afinal, o que encontramos são apenas duas intervenções por empreitada, outras muito pequenas empreitadas assumidas e centenas de intervenções que são projectos — projectos! —, são 211 projectos em 230, no total.
A Sr.ª Ministra pode escudar-se na lei e dizer que a lei permite que este valor de obras possa ser destinado e adjudicado por ajuste directo. Mas pergunto-lhe: acha ético milhões e milhões de euros serem, por via desta desagregação em pequenos programas, projectos e estudos, atribuídos por ajuste directo a um grupo reduzido de empresas, e a Sr.ª Ministra utilizar isto, que, muitas vezes, se traduz em pequenas intervenções como a pintura de uma parede numa escolas, para dizer que está a fazer uma intervenção sistemática no sistema educativo? Esta é mais uma das falsidades deste Governo.
Aproveito também para perguntar com base em que prioridade orçamental é que justifica o decréscimo de 2,8% no apoio ao ensino especial e de 18,1% nos investimentos do plano afectos a esta área.
Para terminar, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe o que tem a dizer sobre a sobrelotação e a ausência de pessoal auxiliar nas escolas do sistema público de ensino.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa.

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, em primeiro lugar, gostava de cumprimentá-la — encontramo-nos aqui de ano a ano.
Gostava de colocar-lhe uma questão relativa à educação, mas numa óptica diferente, na óptica de desenvolvimento, e ao que está a acontecer relativamente à população activa. Estive a analisar a variação da população activa no período de funções deste Governo e, embora o período seja muito curto para tirar conclusões consistentes, já nos permite tirar alguns alertas. A conclusão que os dados do INE nos levam a tirar é a de que, neste período de três anos (um período curto, mas importante), a população activa com o ensino básico diminuiu em 54 000; com o ensino secundário, aumentou apenas em 54 000; e, surpreendentemente, com o ensino superior, aumentou para o dobro do ensino secundário.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Claro!

O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — E se analisarmos a estrutura da população activa, constatamos algo muito importante: relativamente à população activa com o ensino básico, ela passa de 72% para 70%, portanto, tem uma redução de poucos pontos percentuais. Se dividirmos isto por três (que são os três anos de funções deste Governo) e tivermos em conta que 70% da população só tem o ensino básico, enquanto a média na União Europeia é de 30%, se este ritmo se mantiver, vão ser precisos 50 anos para chegar a essa média.
Sei que não é desta forma que isto se deve ler, mas é um alerta muito importante. Por isso, parece-me extremamente importante alterar-se esta situação. Mas alterá-la não de qualquer maneira; alterá-la com qualidade. E era nesta óptica que gostava de analisar o problema da Iniciativa Novas Oportunidades. Tenho experiência de formação — dediquei mais de 10 anos da minha vida à formação — e também tive experiência de cursos de dupla certificação, portanto, de educação e formação.
Outra coisa que quero deixar aqui claro é que sou um adepto fervoroso do ensino profissional, mas de um ensino profissional com qualidade e que não corte a possibilidade de que, aqueles que querem, continuem a estudar. Portanto, a meu ver, o ensino profissional é fundamental, mas nesta óptica.
Ora, é neste contexto que quero analisar a Iniciativa Novas Oportunidades. São cursos de dupla certificação, como todos sabem, mas, para se obter o 12.º ano, é necessário fazer um curso de cerca de 1600 horas. Estas 1600 horas correspondem a cerca de dois anos lectivos. Portanto, se compararmos estes cursos da Iniciativa Novas Oportunidades com a educação formal, há uma redução de um ano, que não deixa de ser importante.
Outro aspecto com o qual acho que é preciso ter muito cuidado é o currículo destes cursos. Se analisarmos o currículo destes cursos e o currículo da chamada «educação formal», chegamos à conclusão de que estes cursos têm um currículo muito menos exigente. São apoiados numa vivência pessoal (pelo menos, há essa orientação) e, quando se passa à prática, os efeitos, a qualidade e a exigência diminuem muito.

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A questão que quero colocar à Sr.ª Ministra tem a ver com o seguinte: apesar de o período ainda ser curto, gostaria de saber que avaliação está a ser feita, que acompanhamento está a ser feito e quais são as conclusões dessa avaliação, para que não mudemos as coisas só no papel, nas estatísticas, e haja uma mudança real neste campo.
É esta a questão sobre a qual gostava de ouvi-la. É que tenho recebido informações extremamente contraditórias sobre a falta de qualidade desta formação.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, não precisa de pedir desculpa aos professores. Dedique o seu pedido de desculpas ao País, porque o País em que a Sr.ª Ministra e os seus Secretários de Estado vivem é outro, não é este; dedique o seu pedido de desculpas ao País, pelo facto de ser responsável por ter criado a maior instabilidade de sempre nas escolas públicas portuguesas; e dedique ainda, se quiser, o seu pedido de desculpas ao Sr. Primeiro-Ministro, que, afinal de contas, percorreu 600 km, no início do ano, em sua defesa e em seu apoio — e imagine lá, Sr.ª Ministra, quantos quilómetros vai ser necessário percorrer, a partir de agora!» A Sr.ª Ministra optou por fazer-me as perguntas e dar a resposta e, como é seu hábito, fazer constatações.
Constatou que a avaliação está em curso. Porém, passou ao lado de 700 escolas que ou pediram ou suspenderam a avaliação de desempenho ou adiaram os prazos que ela implica. Esqueceu, nomeadamente, o exemplo da Escola Secundária Infanta D. Maria, que é um exemplo único e importantíssimo da coragem que é preciso ter no actual contexto, em que a senhora continua a ignorar aquilo que se passa efectivamente nas escolas portuguesas. Depois perguntou: mas esta avaliação não é necessária? E deu a resposta: sim, claro que é! Então, recorde-se e assuma lá por que razão ela é tão necessária para si, Sr.ª Ministra!? É necessária porque a senhora sabe perfeitamente que ela é uma guilhotina poderosa na progressão na carreira, porque ela implica poupanças em custos de pessoal muito elevados para o seu Ministério e porque a Sr.ª Ministra está convencida de que, colocando o ónus dos resultados na avaliação dos professores, consegue alterar os resultados com esta penalização. É por isso que é tão necessária para si esta avaliação de desempenho.
Uma outra pergunta mais óbvia é a seguinte: esta avaliação de desempenho é necessária em nome da qualidade da escola pública, em nome da tranquilidade da escola pública? É evidente que não, Sr.ª Ministra! Depois, como é também seu hábito, teve ainda a arrogância (se me permite) de dizer que as Sr.as e os Srs. Deputados desconhecem completamente a realidade, nada sabem do que se passa nas escolas. A verdade, Sr.ª Ministra, é que toda a sua intervenção à volta do modelo de desempenho que impôs, que não negociou, que não é credível e que assenta numa fractura da carreira docente que não tem qualquer espécie de sentido, todo esse seu discurso é o testemunho daquilo que o País já sabe: quem nada sabe do que se passa nas escolas é a Sr.ª Ministra e os seus Secretários de Estado. A realidade das escolas portuguesas não é convosco.
Mas gostaria ainda de aproveitar esta oportunidade para lhe colocar algumas questões que deixou em aberto, «enxotando», se me permite a expressão, a questão dos CEF (Cursos de Educação e Formação de Jovens) como uma visão distorcida da realidade. A verdade, como a Sr.ª Ministra sabe — e a Sr.ª Ministra diz que não pressionou ninguém para este tipo de formação, para esta oferta no 3.º ciclo —, é que estes alunos não são sujeitos a exames, pelo que, como é evidente, não distorcem tanto os resultados finais dos exames do 9.º ano, além de que, como a Sr.ª Ministra também sabe, estes alunos transitam para o ensino secundário e podem frequentar os cursos de natureza profissional.
A Sr.ª Ministra tinha de, «a martelo», alterar o quadro de oferta do ensino secundário. O que queria perguntar-lhe é se, neste momento, tem alguma avaliação dessas alterações estatísticas que precisava de fazer de qualquer maneira e se acha que a oferta profissional do ensino secundário, neste momento, dignifica o ensino profissional e reconhece o trabalho de tantos profissionais pela sua dignificação ao longo de tanto tempo.
Também não me respondeu a uma pergunta que fiz, que era muito simples e que é a seguinte: a Sr.ª Ministra tem ideia dos pedidos que foram feitos para atribuição de computadores e é capaz de dizer quantos computadores foram atribuídos? Sendo que também escolheu não responder a esta articulação «milagrosa», aquela que caracteriza a sua política educativa, que é: os CEF, os computadores e os professores «com a

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corda na garganta» são a varinha mágica que a Sr.ª Ministra tem para tentar alterar resultados a qualquer custo, nem que seja por despacho? Não se esqueça, Sr.ª Ministra: é da realidade das escolas portuguesas de que estamos a falar; não se esqueça, Sr.ª Ministra, de pedir desculpa aos alunos, e aos pais das crianças deste País, pela responsabilidade, que tem de assumir, de ter gerado nas escolas portuguesas a maior instabilidade de todos os tempos.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, também tenho de começar pelo facto assinalável de a Sr.ª Ministra da Educação ter pedido desculpa aos professores pelas reformas que implementou. Não quero dizer que não haja razão para pedir desculpa, pois acho que tem muitas razões para pedir desculpa aos professores; não sei é se deve pedir desculpa, porque acho que pede desculpa quem se arrepende, quem reconhece que errou e quem está disposto a corrigir o erro. Ora, sinceramente, tenho muitas dúvidas de que seja esse o caso da Sr.ª Ministra da Educação — não me parece» De resto, a visão que a Sr.ª Ministra aqui trouxe, ao referir que é uma questão de visão, de opinião diferente, sem dúvida que é uma questão de visão, e é aí que estamos em campos perfeitamente opostos. A Sr.ª Ministra partilha uma visão de que os professores não cumpriam, de que os professores passavam alegremente, sem quaisquer peias, progredindo na carreira, o que não era verdade, pois tinham de fazer acções de formação, pois tinham elevadas responsabilidades na escola e tinham de responder. E a visão que temos é a de que a função docente não precisa destas peias, desta divisão na carreira docente. A única razão para isto é economicista: para poupar recursos ao Estado! Portanto, estas reformas trazem perturbações. Não trazem perturbações como a Sr.ª Ministra diz, e poderia querer fazer entender, por se tratar de uma mera reforma, dado que todas as reformas ou alterações de algo que existia anteriormente trazem perturbações. Estas reformas trazem perturbações para além disso, Sr.ª Ministra, dado que introduziram no quotidiano da escola uma situação muito mais gravosa do que aquela que já existia.
É reconhecido que as escolas padecem há muitos anos de carência de meios e de condições de trabalho — isto é conhecido, todos partilhamos desta análise e desta preocupação — e o que o Governo fez não foi melhorar a situação mas, sim, agravá-la com perturbações ao nível do corpo docente.
Ora, não me parece que o País precisasse destas alterações. Talvez o défice do Governo precisasse delas, mas o País, a escola, a estabilidade do ensino certamente que não precisavam destas alterações, Sr.ª Ministra! Em relação à resposta que o Sr. Secretário de Estado trouxe sobre os 115 milhões euros a menos para o pessoal e os 130 milhões de euros de transferência para as autarquias, não sei se devo depreender que a intenção do Governo é a de que não há qualquer redução em termos de gastos com pessoal neste Orçamento do Estado»! Não sei se ç isto que o Governo está a tentar dizer ou se deu esta resposta para fugir um bocadinho à questão. Não sei se a interpretação é que estes 115 milhões de euros a menos para o pessoal estão todos nos 130 milhões de euros e que, portanto, os 15 milhões de euros que sobram dizem respeito à verba que irá responder às actividades de enriquecimento curricular, aos apoios à família no âmbito do préescolar, à acção social escolar, à construção, manutenção e apetrechamento de escolas. Não sei se são estas as contas que o Sr. Secretário de Estado tem de fazer, por isso, agradeço que esclareça, para sabermos do que estamos a falar.
Finalmente, mais uma nota, que foi suscitada por aquilo que a Sr.ª Deputada Manuela de Melo veio dizer na sua última intervenção e que tem a ver com a integração futura de professores que são do quadro de zona pedagógica para o quadro de nomeação definitiva. A Sr.ª Deputada (que já não está presente, infelizmente) referiu que se trata de 35 000 professores.
Considero esta medida positiva — aliás, defendo-a há muitos anos, designadamente porque temos quadros de zona pedagógicos numa área tão elevada que traz dificuldades a muitos desses professores.
A questão aqui, penso, é que é no âmbito da mesma reforma que o Governo vai inverter as prioridades, designadamente no que diz respeito ao destacamento por condições específicas, em que os docentes possuidores de uma situação de saúde incapacitante, que até agora passavam à frente dos professores em

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situação de quadro de zona pedagógica podiam ser colocados aquando da colocação de docentes na bolsa de recrutamento.
Ora, com esta reforma que o Ministério está a promover, parece-me que estes professores, que são muito menos em termos de número do que os de quadro de zona pedagógica, vão ficar sem qualquer hipótese de obter colocação através deste meio, uma vez que as vagas vão ser todas ocupadas por professores de quadro de zona pedagógica.
Penso que se trata de uma reforma a que o Ministério deveria também dar uma resposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, gostaria de começar por ler um pequeno texto e que a Sr.ª Ministra pudesse ouvir.
O texto diz o seguinte: «Seria desejável que, a médio prazo, para além dos princípios agora formulados, se venham a estabelecer padrões nacionais face aos quais as escolas possam situar e aferir as suas decisões.
Um processo para a construção de padrões de desempenho num plano nacional deve ser amplamente discutido e aprofundado, como sucedeu em países com muitos anos de prática de avaliação de desempenho dos docentes. A este propósito, a entidade entende que se poderia desenvolver um trabalho sistemático de preparação, com recolha das práticas entretanto concretizadas, beneficiando da experiência e dos resultados de trabalhos idênticos levados a efeito a nível internacional. Nesse caso, a partir de 2009 e 2010 seria de equacionar a possibilidade de definir um conjunto de padrões nacionais fundados na investigação, no debate alargado e no resultado das práticas desenvolvidas nas escolas».
Sr.ª Ministra, estou a ler não um texto de um Deputado da oposição, não um texto de um manifestante do último sábado, mas nem mais nem menos do que um texto do Conselho Científico para a Avaliação de Professores. E quero dizer-lhe que estas recomendações constavam da maioria dos projectos de resolução que o Partido Socialista chumbou liminarmente, na defesa do modelo que está agora a criar esta conflitualidade no País.
Já vimos hoje que a Sr.ª Ministra não é sensível. Ao menos poderia ficar preocupada. Mas também já vimos que não fica! E não fica preocupada por uma razão muito simples (a Sr.ª Ministra é egocêntrica e, por isso, conclui desta forma interessante). Esta avaliação não é do interesse dos 120 000 que estiveram na rua, mas é do interesse do País, porque é do seu interesse, Sr.ª Ministra.
E, por isso, afirma: o modelo, ao contrário do que dizem os 120 000, não é injusto, antes pelo contrário; eles ç que não percebem»! Dignifica, na sua opinião, aqueles que estiveram na rua, mas eles, «coitados«, não percebem»! Depois, eles lamentam-se porque não ensinam e só tratam de papéis, porque eles não sabem, «coitados«» São professores, mas não sabem simplificar, porque se soubessem não preencheriam tanto papel. Depois, é preciso (imaginem!) que a Sr.ª Ministra ajude, com perseverança, com persistência, porque, «coitados«!, eles não percebem»! Temos aqui milhares e milhares de pessoas «deficientes», desde os Deputados da oposição aos 120 000 que andaram na rua e, contrariamente, a esta deficiência, só se sabe que se safa a equipa ministerial.
Mas a Sr.ª Ministra também não conseguiu fugir à tentação de dizer mal da classe docente. Não há uma vez, mesmo que seja só assim, a fugir, ao de leve, um mero toque. A Sr.ª Ministra teve de dizer acerca dos docentes que estas medidas que eles não estão a perceber, que o País não percebe, que os pais não percebem e que estão a criar esta conflitualidade toda, só foram tomadas porque eles não trabalhavam, porque eles não faziam as horas que deveriam fazer, porque eles trabalhavam no ensino privado em vez de trabalharem na escola pública, porque eles só trabalhavam quatro horas por semana, porque eles escolhiam, vergonhosamente, horários nocturnos em vez de horários diurnos, porque eles juntavam compensações da sua idade a compensações de cargos e, portanto, face a este regabofe docente, a estes docentes que não merecem o mínimo de respeito, a Sr.ª Ministra foi «obrigada» às aulas de substituição, à definição da componente lectiva, ao exame de ingresso na carreira docente, a esta avaliação e a todas as malfeitorias para «pôr os docentes no sítio». E agora os docentes, «colocados no sítio» pela Sr.ª Ministra, vêm dizer à Sr.ª Ministra que se vá embora para não continuar a dar cabo da escola pública. E isto foi o que a Sr. Ministra disse hoje. Não estou a citar ninguém!

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A Sr.ª Ministra da Educação: — Que falta de paciência!»

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — E isto foi o que a Sr.ª Ministra veio aqui dizer.
Para concluir, gostaria de dizer ao Sr. Secretário de Estado Valter Lemos que terei muito prazer em explicar-lhe o que me pediu. Estive em alguns congressos em que o senhor também esteve e onde estiveram presentes especialidades internacionais de Educação Especial, mas terei todo o prazer em explicar-lhe o que é um deficiente permanente e um deficiente não permanente, até porque é uma invenção do seu Governo. Um deficiente com carácter permanente é, por exemplo, um deficiente motor que, em termos de QI, pode não ter qualquer problema e não ter qualquer necessidade educativa especial ou necessidade de um professor especializado. Por outro lado, uma criança com dislexia ou com problemas neurocientíficos pode ter necessidades educativas especiais.
Ora, o que é que o senhor e o seu Governo fizeram? Entenderam que os deficientes permanentes, mesmo que não queiram, têm necessidades educativas especiais. E outros deficientes que têm necessidades educativas especiais não as têm porque os senhores não querem. Esta é que é a verdade.
Quanto aos despachos que o senhor fez, o senhor sabe que é assim porque o senhor é que os fez. Os despachos que o senhor fez servem para contrariar os seus despachos anteriores. Porque o senhor tinha inventado um centro de recursos num determinado distrito que não existe. E como tinha inventado um centro de recursos, teve de dar o dito por não dito e teve de deixar a criança na instituição de solidariedade social onde ela estava, contrariando o seu despacho inicial.
Quanto ao outro, havia uma unidade de surdos que o Sr. Secretário de Estado ignorou. Queria pôr as crianças de 4, 5, 6, 7 e 8 anos a caminhar cerca de 100 quilómetros diários e como a população do concelho e os pais não quiseram, o senhor teve de recuar em relação ao seu despacho e teve de deixá-los na mesma unidade de surdos, feita a expensas dos pais e da autarquia.
Agora, se o Sr. Secretário de Estado não conhece sequer a lei e não sabe o que anda a fazer nos seus despachos, isso é problema seu. Mas não diga que eu disse e não disse, contrariando aquilo que disse, porque isso é perfeitamente falso e está gravado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação (Jorge Pedreira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de responder a algumas questões que foram colocadas sobre o modelo de avaliação e o que aqui foi dito acerca do mesmo.
De facto, o modelo de avaliação apostou na autonomia das escolas. O entendimento do Ministério da Educação foi o que de que a avaliação de desempenho dos professores deve ser feita no contexto da escola, dado que é nesse contexto que se consegue conhecer a plenitude do trabalho dos professores e é nesse contexto que se desenvolve a actividade dos professores, tanto no domínio organizacional como no domínio pedagógico.
Naturalmente que foi dada autonomia às escolas para que procedessem à produção dos seus instrumentos de registo e dos critérios que permitem responder às exigências que o modelo tem. Para responder ao Sr. Deputado José Paulo Carvalho, quero dizer-lhe que há muitas escolas — a Sr.ª Ministra disse que depois diria quais. Mas, repito, apesar de ser a primeira vez que o modelo está a ser implantado na sua totalidade, há muitas escolas que fizeram esse modelo sem burocracia e sem grande dificuldade»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas «muitas» são quantas?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — » e têm os seus instrumentos aprovados que permitem o registo dos objectivos dos professores, porque o modelo implica a participação dos próprios professores na definição dos seus objectivos, como é natural, como deve ser e como é relativamente aos demais funcionários põblicos,»

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Mas qual modelo?

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — » porque o modelo baseia-se em objectivos e competências.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quantas?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Naturalmente que há escolas que têm o processo completo e há escolas que já têm realizada observação de aulas. O problema não é o dessas escolas. O problema está no facto de que as escolas terem a intenção de fazer bem, dado tratar-se da primeira vez que o modelo está a ser aplicado, e estarem com a ideia de que quantos mais papeis e quanto mais indicadores houver, mais rigorosa será a avaliação. Há, pois, uma ilusão de objectivismo, que se introduziu em muitas escolas, que leva à complexificação excessiva, desnecessária e desadequada do processo.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É a «virtuosidade» do modelo!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Neste sentido, a missão do Ministério da Educação é ajudar as escolas a fazer bem e a simplificar. É por isso que o Ministério da Educação tem no terreno um conjunto de equipas das direcções regionais, da direcção-geral de recursos humanos, justamente para ajudar as escolas a fazer bem e a não complexificar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E tambçm tem «inquisidores«»!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — E é esta a questão que temos de prosseguir. Os Srs. Deputados dizem que o Ministério da Educação é absolutamente insensível ao que se passou. E dizemno como se no ano passado, em Março e Abril, não se tivesse passado nada. Dizem-no da mesma forma que o diziam em Março e Abril.
Ora, o que aconteceu em Março e Abril foi que o Ministério da Educação reuniu com os sindicatos, acordou com os sindicatos um Memorando de Entendimento que previa as regras para aplicação do modelo e essas regras foram acordadas com os sindicatos e foi publicado um decreto regulamentar para aplicação dessas regras, neste primeiro ciclo de avaliação, ou seja, nos anos lectivos de 2007-2008 e 2008-2009, que prevê, entre outras coisas, que os eventuais efeitos negativos que resultam da aplicação do modelo podem não produzir efeito, e só produzirão efeito se forem confirmados por uma segunda aplicação; e que prevê que, em Junho e Julho, o Ministério da Educação negociará a sua revisão com os sindicatos, em função da experiência de aplicação do modelo; e que prevê que exista uma Comissão Paritária constituída pelos sindicatos (que, ao contrário do que foi dito, reuniu sempre que estava previsto — uma vez por mês), para acompanhar o processo. E, portanto, os Srs. Deputados dizem que o Ministério é completamente insensível, que faz tudo como estava previsto, desde o início, como se nada disto tivesse acontecido! E, como os sindicatos resolveram não cumprir o Memorando de Entendimento, resolveram abandonar a comissão paritária — espaço que tinham para participar no acompanhamento do modelo, nunca se tendo uma vez queixado do seu funcionamento, até ao dia em que resolveram abandoná-la —, vêm as Sr.as e os Srs. Deputados dizer que é preciso, outra vez, voltar tudo atrás e parar tudo novamente.

Protestos do PSD, do CDS-PP, do PCP e do BE.

Ora, aquilo que o Ministério da Educação está a fazer é a cumprir as regras que acordou com os representantes legítimos dos professores para a concretização do modelo — e é aquilo que fará, porque não há outro modelo disponível. Não há outro modelo disponível!

Protestos do PSD, do CDS-PP, do PCP e do BE.

Os Srs. Deputados dizem muita coisa, mas não apresentaram um único modelo disponível. E ouvimos, mesmo»

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Protestos do PSD, do CDS-PP, do PCP e do BE.

Nem os sindicatos têm outro modelo disponível! O único modelo disponível existente é o do passado! O único modelo é o do passado que o Sr. Deputado do Partido Ecologista «Os Verdes«»

Protestos do PSD, do CDS-PP, do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço alguma serenidade! O Sr. Secretário de Estado está no uso da palavra. Compreendo a reacção dos Srs. Deputados, é natural, mas têm de ter alguma parcimónia na exteriorização dessa reacção, porque o Sr. Secretário de Estado está no uso da palavra e, com estas interrupções, naturalmente, não se faz ouvir.
Queira prosseguir, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Estava eu a dizer que o único modelo disponível, além do que está aprovado em lei, é o do passado, e o do passado era um simulacro. Houve, na sua vigência, provavelmente, mais de meio milhão de progressões.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ah, afinal o problema eram as progressões!...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Eu desafio a que me digam quantos professores, que tenham cumprido os requisitos, não progrediram. Quantos? E, portanto, não existia avaliação! Agora, ouvimos»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, mas o modelo era do PS!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Ó Sr. Deputado, se me deixar falar, eu falo; se não me deixar falar, falará o Sr. Deputado!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os apartes são fundamentais, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Pois, mas os apartes não são intervenções paralelas, creio eu! A minha ideia do Regimento é a de que os apartes não são intervenções paralelas.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, faça favor de prosseguir. Eu já pedi aos Srs. Deputados silêncio, moderação nos apartes. Os apartes, de facto, fazem parte da dialéctica parlamentar. É uma realidade incontornável, e ainda bem que existem, porque, de facto, fazem parte desta cultura, que é uma cultura viva do debate parlamentar.
Mas, naturalmente, quantum sapis com alguma moderação e sem excessos e, fundamentalmente, é preciso que o Sr. Secretário de Estado possa usar livremente da palavra. Portanto, peço alguma contenção por parte dos Srs. Deputados.
Sr. Secretário de Estado, queira prosseguir.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Ouvimos, agora, o PSD voltar a uma ideia, que, aqui há meses, apresentou o seu anterior líder, Dr.
Menezes, de uma avaliação externa, sem nunca se perceber qual é o contorno dessa avaliação.
Ouvimos, de resto, uma reprodução — que julgávamos impensável — do episódio lamentável do Dr.
Menezes, de braço dado com o Dr. Nogueira, agora, com uma ligeira mudança de protagonistas, entre a Dra.
Manuela Ferreira Leite e os sindicalistas docentes do PSD.
E ouvimos, mesmo, o impensável! Ouvimos que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, anterior Ministra das Finanças e da Administração Pública, que concebeu o SIADAP (Sistema de Avaliação de Desempenho da Função Pública) e o sistema das quotas, vir agora defender que não deve haver quotas para os professores! Ouvimos isso tudo.

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E continuamos a interrogar-nos: que é isso da avaliação externa? Feita por quem? Por uma empresa privada, como defendia o Dr. Menezes? Vamos pedir à Deloitte — passo a publicidade — que avalie 150 000 professores?

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Já pediram tanto!»

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Ou vamos pedir a quem?! Ninguém sabe! Por acaso, hoje, fez-se uma luz! É que, de facto, há um outro sistema de avaliação externa, que é o do Dr.
Alberto João Jardim. Esse é que é o grande sistema de avaliação externa, que o PSD defende. É, de facto, notável a atitude do PSD nesta matéria.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — O Sr. Secretário de Estado, que é o «engenheiro do modelo», é que sabe tudo!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Deputado, o Sr. Deputado começou por dizer que o orçamento era eleitoralista. Não há mais despudorado eleitoralismo do que a atitude da Dr.ª Manuela Ferreira Leite: na véspera de uma manifestação, pôr-se ao lado dos sindicatos de professores a pedir a suspensão da avaliação, a pedir aquilo que é a falta de rigor, que seria impossível e que levaria, mais uma vez, à indistinção e à indiferenciação.
A Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado falarão a seguir.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Educação.

O Sr. Secretário de Estado da Educação (Valter Lemos): — Sr. Presidente, são apenas duas pequenas notas para dizer ao Sr. Deputado de Os Verdes que, verdadeiramente, não há diminuição das verbas com pessoal, há mais transferências para as autarquias, como poderá reparar na organização do orçamento e em mais os outros sectores. E o que lhe posso dizer é que essas transferências ainda podem crescer, como sabe, porque a própria lei autorizará, em princípio, que o Ministério da Educação transfira ainda mais competências ao longo do ano para mais câmaras municipais. Estas que aqui estão são aquelas para as quais já está assente a transferência de competências para o próximo ano.
Só uma pequena nota também, porque creio que o Sr. Deputado Miguel Tiago terá dito que havia uma diminuição no orçamento da educação especial; e eu gostaria de citar, uma vez mais, para dizer que o orçamento de funcionamento da educação especial cresce 5,4% e o orçamento de investimento da educação especial cresce 5,3%.

Protestos do PCP e do BE.

Também gostava de deixar esta nota: acrescentar o facto de que o ano passado foi o único orçamento de actividade que também teve crescimentos deste género, porque houve menores crescimentos no resto do orçamento.
Portanto, estes crescimentos fazem-se sobre crescimentos idênticos, que, como foi dito, já no ano passado existiram.
Creio que disse tudo, em relação aos esclarecimentos que tinha para dar. Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado Valter Lemos.
Sr.ª Ministra da Educação, tem a palavra.

A Sr.ª Ministra da Educação: — Sr. Presidente, gostava de fazer uma intervenção final para responder ainda a alguns questões que ficaram por responder.

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Antes de uma intervenção sobre as questões, gostava de fazer também uma observação sobre uma prática sistemática, tanto dos Srs. Deputados do Partido Comunista como da Sr.ª Deputada do BE — e, até, a têm em comum aqui com o Sr. Deputado do PSD —, que é a da reinterpretação daquilo que é dito.

O Sr. João Oliveira (PCP): — «Quem com ferro mata, com ferro morre!».

A Sr.ª Ministra da Educação: — É colocar na boca de quem falou uma forma mais expressiva, caricatural e, infelizmente, lamentável, daquilo que não foi dito.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é preciso caricaturar, basta mostrar a verdade!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Nada foi dito aqui daquilo que os Srs. Deputados exprimiram. E, portanto, se gostam de caricaturar para forçar que as medidas tomadas e a forma como as explicamos são paternalistas, são contra os professores, são para dizer que ç por» — nem sei!» —, por más práticas, que elas ocorriam, isso fica com os Srs. Deputados.
Vou dar, apenas, o exemplo daquilo que disse a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita: que eu terei dito que os senhores professores não gostavam de trabalhar, estavam quatro a oito horas na escola, porque não gostavam de trabalhar.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Está gravado!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Só esta expressão, só isto! Eu nunca disse que os senhores professores não estavam na escola porque não gostavam de trabalhar.
Aquilo que sempre tenho dito é que eram as regras: as regras de progressão, as regras de distribuição do serviço, as regras disponíveis para os senhores professores, tinham este resultado; eram as regras, e os senhores professores cumpriam, escrupulosamente, as regras.
Não havia regulamentação da componente não lectiva, as acumulações eram permitidas, tudo era um quadro regular.

Vozes do PCP e de Os Verdes: — Não é verdade!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Nunca acusei qualquer professor de cometer uma irregularidade. Mesmo os professores que não tinham componente lectiva no período de pré-aposentação não o faziam porque eram malandros, faziam-no porque estava nas regras. Era assim que as escolas se organizavam. É de regras que estamos a falar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Vem a Sr.ª Ministra pôr ordem nisto!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Mas os Srs. Deputados, que enchem tanto a boca com a vida democrática, depois, não compreendem a diferença entre uma regra e uma opinião ou uma valorização de um comportamento. Eram as regras!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A sua expressão foi «faltosos»!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Aquilo que o Ministério fez foi o seguinte: alterou o quadro de regras e, tendo alterado o quadro de regras, perturbou a vida das pessoas, evidentemente! Só não compreende quem não quer! Se os Srs. Deputados, quando se fala de regras, aquilo que entendem é que se está a insultar os professores, é convosco; são os senhores que insultam, as frases que aqui foram ditas, foram ditas pelos Srs. Deputados, e não por mim. Peço desculpa!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quem é que está a caricaturar?!

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A Sr.ª Ministra da Educação: — Peço desculpa também aos Srs. Deputados, que se incomodam muito com regras um pouco mais bem educadas também.
Depois, gostava ainda de referir uma outra coisa: incomodaram muito a Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda os 600 kms que, pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro percorreu — não sei se percorreu, se não; deve ter sido uma conta que o Bloco de Esquerda se encarregou de fazer, devia estar incomodado com os quilómetros que ele fazia!» Agora, de novo, gostava de dizer à Sr.ª Deputada: eu não disse que os Srs. Deputados, não conheciam a realidade.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Disse, disse!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Nunca estou a discutir com quem quer que seja quanto é que cada um de nós conhece mais ou menos a realidade. Agora, a Sr.ª Deputada é que acusou, claramente, os membros do Governo de viverem noutro país e de não conhecerem as escolas.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Exactamente!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Se alguém fez essa afirmação foi a Sr.ª Deputada, peço desculpa.
A mim, nunca me passou, sequer, pela cabeça fazer uma afirmação desse tipo. Mas os Srs. Deputados, gostam de interpretar expressivamente e, na minha opinião, lamentavelmente, porque dão uma fraca ajuda para a valorizar a actividade política — é isso que tenho para dizer. A actividade política é difícil, como a actividade dos professores, mas precisamos todos de dar um contributo para a valorizar.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Agora, também vem aqui dar lições, já não é só aos professores!

A Sr.ª Ministra da Educação: — E isto leva-me à questão colocada pelo Sr. Deputado sobre a Parque Escolar. Eu já aqui ouvi muito sobre a Parque Escolar. O que eu ouvi sobre a escola D. João de Castro! O que eu ouvi! Desde os interesses imobiliários à venda em curso o que eu ouvi, Sr. Deputado!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E ouviu bem! O que é que teria acontecido à escola?

A Sr.ª Ministra da Educação: — E, agora, que a escola está linda, que a escola está arranjada, que está cheia de alunos, que têm uma escola nova, um centro profissional ao lado; agora, que tudo funciona de acordo com aquilo que foi projectado, trabalho feito pela Parque Escolar, só aconteceu porque o Sr. Deputado do Partido Comunista tinha avisado do risco que todos estávamos a correr!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas tem dúvidas?

A Sr.ª Ministra da Educação: — Não foi obra da Parque Escolar, não senhor! Foi só obra do Sr. Deputado do Partido Comunista!...
E continuamos no mesmo tom: o Sr. Deputado do Partido Comunista já nos está a avisar de que o programa de intervenção da Parque Escolar em relação às 100 escolas não é um programa de intervenção, porque o Sr. Deputado desconhece, pelos vistos, que um programa de intervenção em obra, seja na parte eléctrica, seja na parte acústica, seja na parte relativa a obra civil, requer projecto de engenharia — vejam lá! —, requer projecto de arquitectura, e é necessário mandar fazer ambos os projectos antes de mandar fazer a obra. E — pasme-se! — já há 100 escolas em que há projecto de engenharia e de arquitectura mas ainda não há obra e todos corremos o risco de, de facto, não vir a haver obra. Felizmente, para todos nós, temos a garantia de que as obras se realizarão, porque o Sr. Deputado do Partido Comunista já aqui alertou para o grande risco e, portanto, todos estamos seguros de que a obra da Parque Escolar se vai realizar!»

O Sr. João Oliveira (PCP): — Olhe que já pegou outra vez no ferro da caricatura, Sr.ª Ministra!

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A Sr.ª Ministra da Educação: — Estamos conversados, Sr. Deputado, sobre as suspeições que, permanentemente, levanta relativamente a todos e mais um! Gostava de responder ao Sr. Deputado Eugénio Rosa, que também corre o sério risco de trabalhar apenas para as estatísticas, porque, quando se fala em números, nesta Câmara, estamos todos a trabalhar para as estatísticas» Compreendi as suas observações e aquilo que observou foi, de facto, o que aconteceu com o sistema de afunilamento que tínhamos no ensino secundário. Tivemos, durante mais de 10 anos, um ensino secundário que permitiu apenas o acesso. Só concluíam com êxito o ensino secundário os alunos que transitavam para o ensino superior; todos os outros, que o frequentavam e não o concluíam, engrossavam as fileiras do trabalho desqualificado no mercado de trabalho. Foi isso que encontrou nos números que observou.
Aquilo que espero, e penso que todos esperamos, é que a situação mude e o ensino secundário constitua um nível de formação e de qualificação que alimente também o mercado de trabalho, mas um mercado de trabalho mais qualificado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com que qualidade?!

A Sr.ª Ministra da Educação: — Colocou também uma outra questão, que é, igualmente, crítica, que é a da valorização do programa Novas Oportunidades. Como sabem, porque também foi anunciado nesta Assembleia, foi lançado um programa de avaliação e acompanhamento do programa Novas Oportunidades, justamente para dar confiança aos portugueses de que o trabalho que, hoje, é feito nos centros, nas escolas, nos centros de formação, é um trabalho de qualidade.
Muito em breve, penso que no mês de Dezembro, será apresentado um relatório com os primeiros resultados desse acompanhamento e avaliação e a nossa expectativa é a de que eventuais casos de más práticas possam ser corrigidos, também com o apoio das equipas de peritos que acompanham o programa.
Finalmente, quanto à questão suscitada pelo Bloco de Esquerda, ainda sobre o ensino profissional, temos, no País, há muito tempo, um problema de valorização das vias vocacionais. Desde há muito, muito tempo, provavelmente desde o período do Estado Novo, o sistema de ensino organizava-se de uma forma muito dual, que impedia milhares de jovens de prosseguirem os estudos e os orientava muito precocemente para vias vocacionais. Felizmente, hoje, a configuração do sistema é completamente diferente, não há um aluno que tenha a via de prosseguimento de estudos bloqueada, todos poderão aceder aos estudos. Agora, temos de ter consciência de que as vias vocacionais são vias socialmente desvalorizadas, por muitas razões, algumas das quais de natureza histórica. Porém, não contribuem para valorizar as vias profissionais os discursos que, permanentemente, sublinham que se trata de vias de segunda escolha, de vias com mais dificuldades.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não foi isso que lhe perguntei!

A Sr.ª Ministra da Educação: — O contributo que podemos dar é o de uma maior integração, um maior paralelismo entre as diferentes vias. O esforço que fizemos, de criar os cursos profissionais nas escolas públicas, corresponde, justamente, à opção de promover uma maior integração destes cursos.
No próximo ano, comemorar-se-ão os 20 anos do ensino profissional e espero que possa ser uma oportunidade de o valorizarmos, de apresentarmos os casos de percursos de sucesso — porque, hoje, ao fim de 20 anos deste tipo de formação, já há muitos jovens adultos no mercado de trabalho que dela beneficiaram —, para que possa, aos olhos de todos os jovens, surgir como via de ensino qualificada.
Gostava de dizer uma última palavra sobre o sentido das políticas e a questão da escola pública. É muito importante que o discurso sobre a escola pública seja um discurso associado a factos e não apenas a elementos retóricos, sem desvalorizar, permanentemente, o esforço de construção da escola a tempo inteiro, que tem, hoje, uma tradução estável, em termos orçamentais, as actividades de enriquecimento curricular, que permitem dar um conteúdo substantivo à escola a tempo inteiro e, com isso, mudar a oportunidade de sucesso das crianças do 1.º ciclo, as refeições, a ocupação plena dos tempos escolares, os planos de recuperação, a reorganização da rede dos centros escolares, o programa de modernização das escolas, enfim, um conjunto de programas vastíssimo, que, estes, sim, valorizam a escola pública.

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Portanto, diria que este não é um orçamento eleitoralista, é, sim, um orçamento que prossegue o caminho por nós iniciado, de valorização da escola pública, com programas concretos, com resultados evidentes, que vão desde o edifício escolar ao equipamento que lá é colocado, às oportunidades de formação para os jovens, às oportunidades de formação para os professores, às oportunidades de melhoria da qualidade do ensino.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente, sobre a condução dos trabalhos e sobre algumas considerações que foram aqui feitas pelo Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dispõe de 2 minutos para interpelar a Mesa, mas que seja uma interpelação tout court e não aquela figura»

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Mas, Sr. Presidente, se quiser, posso utilizar outra figura, como a da defesa da honra da bancada, até porque o que foi dito aqui foi suficientemente grave para o efeito. Delego esta questão regimental no Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, quero apenas dizer-lhe que aqui, em termos regimentais, não é, à la carte, ora interpelação à Mesa, ora defesa da honra. Mas intuo, premonitoriamente — poderei estar errado —, que o Sr. Deputado pretende defender a honra da bancada e, portanto, é essa figura que deve utilizar.
Assim, tem a palavra, Sr. Deputado, dispondo, para o efeito, de 2 minutos.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de dizer que não deixa de ser engraçado que a Sr.ª Ministra da Educação acuse os Deputados de reinterpretarem aquilo que acaba de dizer, e que, felizmente, está gravado, e que, em simultâneo, o Sr. Secretário de Estado teça juízos de valor sobre pessoas que cá não estão, e que, sobretudo, até já nem têm funções partidárias, para justificar o injustificável.
Considero isto perfeitamente lamentável! Penso, sinceramente, que não dignifica de forma alguma o debate! Quero dizer ao Sr. Secretário de Estado que, se há dois modelos em cima da mesa, estão lá por sua opção. Mas até percebo por que é que isto existe! É que o Sr. Secretário de Estado foi dirigente sindical durante muito tempo e já todos percebemos que os senhores têm um problema com os sindicatos. Mas o problema, como digo, é vosso e não de mais alguém que aqui esteja presente. E, com toda a certeza, não é nosso! É um problema que os senhores têm de resolver! Porém, o Sr. Secretário de Estado esqueceu-se também de um outro modelo, que era aquele que existia antes de o Partido Socialista acabar com ele, ou seja, aquele que tinha, de facto, uma avaliação externa e uma prova pública de acesso aos escalões superiores. Pode utilizar também este! E não vou, sequer, cometer a indelicadeza de sugerir que, se pagarem a alguma das pessoas que aqui estão presentes o mesmo que pagaram ao Dr. João Pedroso para fazer manuais de legislação da educação, rapidamente surgirá um modelo.
Mas por que é que não usam o modelo francês? Ou o de outros países? Esta é que é a grande questão! Por isso, o que temos em cima da mesa é o que existe e tudo o mais são «cortinas de fumo»! Reinterpretar palavras ditas por pessoas que não se encontram aqui é, no mínimo, indigno de um membro do Governo.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Se o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação pretender dar explicações, tem a palavra, também por 2 minutos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, aquilo que fiz não foi nem reinterpretar»

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Foi, foi!

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Não, não foi reinterpretar! Referi-me a factos, Sr. Deputado! Foram as palavras que foram ditas e se o Sr. Deputado quiser ver a comunicação social, da altura, verá o que foi dito.
Portanto, Sr. Deputado, não reinterpretei nada, limitei-me a referir a posição daquele que era, na altura, e daquela que é, hoje, a dirigente institucional do partido. E o partido é uma instituição que não muda consoante as pessoas que estão à sua frente! Por isso, referi-me a posições do Partido Social-Democrata, do líder do Partido Social-Democrata.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — O Código do Trabalho é um bom exemplo disso!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Educação: — Relativamente à questão dos sindicatos, não temos qualquer problema com os sindicatos, os sindicatos é que têm um problema com eles mesmos, Sr. Deputado, que é o de terem assinado um Memorando de Entendimento e, agora, sem nenhuma razão, o terem rasgado. Portanto, o problema dos sindicatos é com eles mesmos, nós não temos qualquer problema com os sindicatos.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Antes de dar por encerrado o debate, gostava de expressar à Sr.ª Ministra, na qualidade de Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, e também a título pessoal, a minha solidariedade relativamente àquilo que se passou ontem. Enfim, na esteira do que algumas bancadas já manifestaram, foi, de facto, um comportamento vil e soez, intolerável em democracia, pelo que tem a minha solidariedade. Isto, naturalmente, não bule com as discrepâncias ou divergências que, provavelmente, possam existir, quer da minha parte quer da parte das bancadas parlamentares, nomeadamente da bancada do PSD, que se expressou no mesmo sentido, relativamente à política de educação. Mas comportamentos daquele jaez são absolutamente intoleráveis e é fundamental que o debate se faça com elevação e civilidade, como, aliás, hoje, aqui decorreu.
Foi um debate vivo, acutilante, muito intenso, mas foi um debate feito com elevação. É assim que se prestigia a democracia, é assim que se prestigia também a escola pública, é assim que se enobrece o País, é assim que, de facto, se faz o debate democrático na Casa das liberdades, na Casa da democracia.
Muito obrigado, Srs. Deputados.
Está encerrada a reunião.

Eram 19 horas e 5 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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