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Sábado, 15 de Novembro de 2008 II Série-OE — Número 7
X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 14 de Novembro de 2008
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 9 horas e 55 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009, tendo o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Jaime Silva) apresentado à Comissão o orçamento respeitante ao seu Ministério.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro e dos Srs.
Secretários de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas (Luís Vieira) e do Desenvolvimento Rural e das Florestas (Ascenso Simões), os Srs. Deputados Carlos Poço (PSD), Jorge Almeida e Miguel Ginestal (PS), Hélder Amaral (CDSPP), Agostinho Lopes (PCP), Alda Macedo (BE), Lúcio Ferreira e Horácio Antunes (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Justiça, pronunciaram-se, além do Sr. Ministro (Alberto Costa) e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto e da Justiça (Conde Rodrigues) e da Justiça (João Tiago Silveira), os Srs. Deputados Fernando Negrão (PSD), Ricardo Rodrigues (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), João Oliveira (PCP) e Helena Pinto (BE).
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda) encerrou a reunião eram 18 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.
Eram 9 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, vamos iniciar a nossa reunião hoje com a audição do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento rural e das Pescas, a quem agradeço a presença, bem como a dos Srs. Secretários de Estado.
O orçamento do Ministério da Agricultura foi objecto de um relatório da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, que, em traços muitos gerais, elenca o seguinte: em 2009 o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas dará continuidade às grandes linhas de orientação que constam do Programa do Governo com iniciativas centradas na área do desenvolvimento rural, desenvolvimento sustentável do território e fileiras agrícolas e com prioridades específicas em matéria de segurança alimentar e qualidade dos produtos e processos, bem como na execução das estratégias definidas na área das pescas, designadamente no que respeita à exploração sustentável dos recursos biológicos, à melhoria da competividade e sustentabilidade, a prazo, das empresas do sector, à inovação e na qualidade dos produtos ao reforço, inovação e diversificação da produção aquícola, à criação de valor e diversificação da indústria transformadora e ao desenvolvimento das zonas costeiras.
A despesa total consolidada do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para 2009 é de 2047,4 milhões de euros, o que corresponde a 1,2% do PIB e a 2,5% da Administração Central. Só para termos uma ideia comparativa o orçamento com uma verba mais avultada no Orçamento do Estado é o do Ministério da Saúde que tem alocada uma verba, em termos de despesa, na ordem dos 8500 milhões de euros, a que corresponde cerca de 5,1% do PIB, e isto é importante para termos uma ideia da grandeza do que está alocado ao Ministério da Agricultura por cotejo com outros ministérios. Claro que o Ministério da Saúde é o maior em termos da fatia orçamental, seguindo-se o Ministério da Educação.
A despesa consolidada do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas é composta por despesas do subsector Estado, 23,72%, e Serviços e Fundos Autónomos, 76,38%, havendo um enfoque maior nos fundos autónomos do que propriamente no subsector Estado, sendo que os investimentos representam 8,43% do total do ministério.
A despesa total do sector Estado totaliza 485,7 milhões de euros, despesas de funcionamento e de investimento e do plano 172,6 milhões de euros, que teve um decréscimo de 0,8 pontos percentuais em relação ao ano anterior devido à diminuição significativa do financiamento comunitário por força do encerramento do III QCA, tendo neste orçamento um peso residual de investimento de 1,5%.
O sector Fundos e Serviços Autónomos mantém assim um maior peso da despesa total consolidada, 89,95% com 1841,6 milhões de euros, sendo que a variação em relação ao ano anterior é residual – aliás, também pelos elementos que nos foram facultados pelo Ministério da Agricultura se constata que as variações são diminutas, sendo esta, aliás, a expressão utilizada nos elementos que nos foram distribuídos pelo Ministério.
Gostaria, ainda, de relevar em matéria orçamental que o PIDDAC afecto ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para o ano de 2009 é de 672,09 milhões de euros dos quais 495,9 milhões de euros são referentes a financiamento comunitário.
As verbas disponíveis no Capítulo 50 do Orçamento do Estado para financiar estes projectos são de apenas 25,68% correspondendo a 162,6 milhões de euros.
Relativamente aos programas os mais relevantes, dos vários elencados na documentação distribuída pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, são, porventura, o Programa PO22 – Agricultura e Desenvolvimento Rural com 612, 29 milhões de euros e no tocante às pescas o PO23 – Pescas, com uma dotação de 51,01 milhões de euros.
Estes são, em traços gerais, alguns dos elementos mais significativos do orçamento do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, que foram objecto do crivo e reporte por parte da Comissão de Assuntos Económicos no que concerne à agricultura, mas para uma exposição mais detalhada daquelas que são as linhas de força orientadoras do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, vis-à-vis o Orçamento do estado para 2009, nada melhor do que ouvir o Sr. Ministro.
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Todavia, antes de conceder a palavra ao Sr. Ministro eu gostaria de esclarecer os Srs. Deputados que o modus operandi desta reunião, na esteira, aliás, do que tem ocorrido com as reuniões com os demais Srs.
Ministros, é o seguinte: o Sr. Ministro fará uma exposição inicial de cerca de 10 a 15 minutos, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas, cabendo 10 minutos a cada grupo parlamentar, começando, naturalmente, pelo maior partido da oposição, o PSD, seguindo-se o PS, o CDS-PP, o PCP e o BE, às quais o Sr. Ministro responderá em bloco e depois teremos uma segunda ronda de 5 minutos a cada grupo parlamentar, novamente agrupadas em bloco, a que o Sr. Ministro responderá após o que se encerrará a reunião.
Sr. Ministro, mais uma vez, agradecendo a sua presença, bem como a dos Srs. Secretários de Estado, concedo-lhe a palavra para a sua intervenção inicial.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Jaime Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Presidente acabou de fazer um resumo global daquilo que é o orçamento do Ministério da Agricultura e desse resumo global sobressaí, claramente, que o Ministério da Agricultura tem um orçamento importante, que estabiliza e reduz as despesas de funcionamento e, simultaneamente, tem um grande esforço orçamental concentrado no investimento, o que só foi possível, porque há uma mudança estrutural de fundo no Ministério da Agricultura que resultou da reforma do Ministério da Agricultura.
Chegámos ao fim da reforma do Ministério da Agricultura que, como sabem, tinha, em 2004, 11 870 funcionários e que tem, neste momento, menos de 7000, ou seja, tivemos uma redução substancial dos efectivos do Ministério, mas acautelando as funções essenciais do Ministério da Agricultura para a agricultura portuguesa.
De facto, descentralizámos o Ministério e hoje poderemos anunciar que vamos iniciar, a partir do próximo ano, em termos de funcionamento e de gestão de pessoal, uma outra caminhada, pois este orçamento contempla nos seus detalhes verbas reservadas para a promoção e recompensa do mérito dos funcionários, sendo que temos, pela primeira vez, e isto é muito importante, a possibilidade de fazer novos recrutamentos.
E isto é possível porque já podemos colher os frutos de toda a reestruturação que fizemos. É evidente que o recrutamento de novos funcionários também tem regras e o primeiro princípio é o de que respeitaremos os diplomas referentes ao SME (situação de mobilidade especial) e terão prioridade os funcionários que estão no SME e só depois é que abriremos concursos ao exterior caso não encontremos os funcionários que procuramos para os diferentes organismos.
Há ainda uma outra orientação para esta nova fase do Ministério da Agricultura no que se refere aos recursos humanos que é a de que o reforço de novos meios humanos deve obedecer ao princípio da descentralização, isto é, irá ocorrer, em primeiro lugar, nos organismos descentralizados, em regiões, e não em Lisboa. E já agora, posso informar os Srs. Deputados que as orientações dadas compreendem recrutamentos no início do próximo ano em duas direcções regionais.
Portanto, Srs. Deputados, estamos a chegar ao fim da nossa reorganização no Ministério. Não foi fácil o caminho percorrido, mas os resultados, hoje, permitem olhar para os funcionários do Ministério da Agricultura e mostrar que a reforma tinha como primeiro objectivo, o da racionalização de recursos e o de adaptar a dimensão do Ministério às suas funções e, como segundo objectivo, o de dar perspectivas de carreira aos funcionários, e isso aí está com os preços à promoção e com os novos recrutamentos.
É evidente que isto e os quadros que vos irão ser distribuídos permitem verificar que, globalmente, o Ministério reduz em 30 milhões de euros a sua parte do Orçamento do Estado, que continua, mesmo assim, a ser o quarto ministério em termos de despesa global, e que, em termos de investimento, em termos de PIDDAC, somos o segundo ministério, e isto significa que o Governo continua a considerar a agricultura portuguesa como um sector importante.
E estas verbas no PIDDAC vão-nos permitir, encerrado o III QCA, um acréscimo de investimento de 61% no próximo ano, isto é, nós tivemos de fazer face a um conjunto de compromissos que vieram do quadro anterior, tivemos de fazer um esforço de concretização desses investimentos, que são investimentos privados, e isso levou-me a dar uma volta pelo país, por todos os organismos, no sentido de levar à concretização dos projectos de investimentos aprovados para pagarmos todas essas verbas e libertar o máximo possível para o novo PRODER, que é prioritário, e dentro deste Programa quisemos dar um sinal claro – e desse ponto de vista a resposta é francamente positiva – de que temos de apostar na competitividade e de acreditar na agricultura portuguesa. Aliás, só isso nos permitiu, por exemplo, receber um conjunto de candidaturas e de
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projectos muitos já analisados, alguns já aprovados, que ultrapassam os 1100 milhões de euros de candidatura.
De facto, isto veio dar-nos algum optimismo no sentido de que não obstante estarmos num quadro de crise financeira, não obstante o orçamento do Ministério da Agricultura estar enquadrado, e bem, no quadro de rigor de gestão das contas públicas e do controlo do défice, temos do lado do mundo agrícola – agricultores, empresários agrícolas, cooperativas – quem acredita que somos capazes de produzir mais e melhor e só assim se compreende que o montante de candidaturas que temos.
Os quadros que vos serão distribuídos também indicam que, pela primeira vez, teremos periodicamente a possibilidade de ver onde é que se traduz a aplicação dos 612 milhões de euros de despesa pública em investimento, que, com capitais privados, poderão alavancar em termos de investimento quase 1000 milhões de euros no próximo ano.
Poderemos, pois, analisar aquilo que também é um princípio orientador deste governo, que é a coesão territorial na aplicação das verbas da agricultura e assim, um dos quadros indica, claramente, por região – Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo e Alentejo – onde é que o dinheiro vai ser aplicado.
Se reparem esse quadro indica, ainda, que há 223 milhões de euros que são disputados entre as diferentes regiões onde haverá da parte do gestor do PRODER um princípio orientador que se baseia no princípio de que todas as regiões serão tratadas em pé de igualdade, que todas as regiões se devem sentir com os mesmos direitos e as mesmas possibilidades de concorrerem e de beneficiarem das ajudas do novo plano de desenvolvimento rural.
De facto, este é um princípio que considerarmos fundamental que, evidentemente, não pode ignorar o número de agricultores que existe em cada região, a capacidade de esses agricultores, a capacidade organizativa que existem cada região, os capitais próprios disponíveis em cada região, e que nos permite identificar as fragilidades de umas regiões comparativamente com as outras para depois reintroduzirmos os elementos correctores de decisão que possibilitem que todas as regiões do país possam beneficiar do PRODER, possam analisar e ver onde é que o PRODER está a ser aplicado e em como a própria região tem a possibilidade de recuperar terreno de um ano para o outro face às verbas disponibilizadas para a respectiva região.
Este é também um outro sinal que queremos dar com este novo quadro comunitário de apoio, com o PRODER, por forma a permitir o escrutínio desta Assembleia e, sobretudo, das regiões e dos agricultores para ver onde está a ser aplicado o dinheiro público e onde é que estamos a fazer esforços para melhor podermos avaliar a reorientar, se for caso disso, muitos dos apoios em termos de investimento.
É evidente que o PRODER tem três grandes fileiras de entre as quais a da competitividade é a prioritária — e nunca o escondemos — num mercado globalizado onde cada vez mais há concorrência, mesmo dentro da União Europeia. Aliás, todos conhecem as orientações da Comissão Europeia em termos de propostas, o que nos dá um argumento adicional de que, de facto, a competitividade é o eixo fundamental.
Temos, pois, de preparar a agricultura para as propostas da Comissão Europeia já conhecidas, para decisões até anteriores — e lembro decisões, datadas de 2003, sobre a liberalização do mercado do leite.
Temos, pois, de nos preparar e ajudar os nossos agricultores a enfrentarem este desafio.
Como sabem, em matéria de gestão sustentável e de apoio ao mundo rural, temos também um importante fluxo de verbas que representam uma fatia importante do orçamento: para o ano serão 238 milhões de euros.
Temos, depois, a Abordagem LEADER que, ainda este mês, será objecto de uma sessão de aprovação de verbas, de cerca de 350 milhões de euros, para todo o período. Portanto, é um dos instrumentos do PRODER já aprovado e que tem uma importância fundamental para as regiões, nomeadamente quando um dos eixos fundamentais da Abordagem LEADER, contrariamente ao QCA anterior, é a criação de microempresas que valorizem os produtos agrícolas. Também neste caso, os projectos já estão analisados e as candidaturas aprovadas. Este eixo, a partir do próximo ano, conta já com 34 milhões de euros, o que significa mais 76% relativamente ao ano anterior.
Srs. Deputados, para concluir a apresentação do orçamento, há uma outra vertente, a das pescas, cuja dotação está incluída no valor global de investimentos que mencionei.
Como sabem, paralelamente ao que são os princípios da sustentabilidade do sector, apostamos também em dar-lhe competitividade, num quadro em que a referida sustentabilidade pressupõe uma gestão rigorosa dos recursos e uma análise profunda dos pareceres científicos emitidos sobre a situação das disponibilidades
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de pesca e uma boa gestão destas, o que, naturalmente, resultará num esforço adicional de pesca em relação a algumas espécies e quanto a outras, numa gestão mais rigorosa e, eventualmente, nalguma redução acompanhada de medidas de compensação de carácter social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, são estas as grandes linhas do orçamento para 2009, o qual, num quadro de crise financeira mas igualmente de rigor e de disciplina orçamental, permite aumentarmos grandemente o investimento na agricultura no próximo ano e enfrentar os novos desafios.
Em conclusão, no início deste ano, a agricultura e as pescas tiveram de enfrentar a crise dos combustíveis, o substancial aumento do preço das matérias-primas mas, globalmente, em termos de pescas, em Portugal, houve um acréscimo de 12%. Isto, associado às medidas que tomámos, nomeadamente, abertura de linha de crédito, isenção de pagamentos à segurança social, redução das taxas nos portos e, ainda, redução das taxas dos portos do IPPM, que está para publicação, permitiu-nos encarar a manutenção dos rendimentos do sector das pescas.
De igual modo, o ano agrícola e as colheitas deste ano permitiram-nos assegurar a estabilidade dos rendimentos dos agricultores portugueses.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro, por esta sua exposição inicial.
Vamos, então, iniciar a primeira ronda de perguntas, começando pelo PSD, pela voz do Sr. Deputado Carlos Poço.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, começo por fazer uma observação ao Orçamento do Estado para 2009.
O Governo refugia-se na turbulência internacional que todos conhecemos e vivemos para justificar a quebra do crescimento do Produto em 2008 e 2009.
No entanto, do nosso ponto de vista, o Governo é optimista em relação ao valor dessa quebra do PIB, ao prever, para 2009, um crescimento de 0,6%, se compararmos com a previsão de outras entidades, como o FMI ou a União Europeia, que é de 0,1%. Portanto, creio que haverá exagero.
Por outro lado, no que se refere ao mercado do trabalho, o PSD duvida das metas para o desemprego, porque prevê-se, para 2009, que a taxa de desemprego se mantenha ao mesmo nível da de 2008, isto é, nos 7,6%. Ora, perante uma forte desaceleração da economia, se não há crescimento do Produto, como é que se pode esperar um crescimento do emprego de tal forma que o desemprego não cresça? Em que medida este novo programa da economia mundial pode alterar o rumo da reforma da PAC? É uma questão que deixo ao Sr. Ministro da Agricultura. E qual a posição de Portugal perante este novo desafio? Recorde-se que a proporção das despesas em alimentação varia dentro da União Europeia consoante o Estado-membro e Portugal é um dos países da União Europeia em que maior proporção do rendimento disponível se destina à alimentação — estamos a falar de 25%.
Relativamente ao orçamento do Ministério da Agricultura e após vários orçamentos, dos quais este é o quarto que discutimos, pergunto qual é a vantagem, em termos financeiros e de organização, que o Ministério teve e onde se reflectem as reformas anunciadas, logo no início da Legislatura, pelo Sr. Ministro.
Em 2005, a despesa total consolidada do Ministério era 2566 milhões de euros, sendo 357,7 milhões de euros de investimento. Para 2009, estão orçamentados 2047 milhões de euros dos quais apenas 172 milhões de euros são destinados ao investimento. Significa isto que a despesa de investimento foi sacrificada, tendo passado de um peso relativo de 13% para 8%, sendo que eu penso que no investimento é que deveria haver uma aposta.
Em termos da despesa total de funcionamento, em 2005, o valor do orçamento era 229 milhões de euros e, para 2009, estima-se 313 milhões de euros, portanto, cerca de 80 milhões de euros a mais.
Perante estes números, importa que o Ministério da Agricultura explique os resultados das reformas anunciadas.
Como explica o aumento, em 11%, da despesa com pessoal do gabinete do Ministro da Agricultura prevista para 2009? Para quê 314 000 euros a mais, em 2009, para o gabinete do Ministro? Gostaria que nos explicasse a razão deste crescimento da despesa.
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Em relação aos serviços regionais, irá verificar-se uma redução das verbas em cerca de 4,5%. Uma vez que a política anunciada pelo Ministério era de descentralizar e concentrar algumas das funções desempenhadas pelas associações de agricultores nas zonas agrárias ou nas direcções regionais, qual o motivo técnico para a quebra desta despesa? Sabemos também que 2009 será o ano do recenseamento geral agrícola e as direcções regionais de agricultura têm um papel activo e colaborante em relação a este inquérito. Com a quebra de verba que referi vai garantir esse apoio — menos verba para mais trabalho? No que se refere ao Programa de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro, que, de facto, foi um falhanço, haverá, em 2009, uma redução de verbas com financiamento comunitário. Perante esta justificação, o que está previsto para o combate a esta doença do pinheiro? Que plano se prevê cumprir, em 2009, relativamente ao nemátodo do pinheiro após o falhanço dos anos anteriores? Analisando a natureza da despesa, verifica-se uma diminuição de 9% para despesas de capital ao mesmo tempo que as despesas com pessoal crescem 8%. Como se justificam estas variações à luz do PRACE, questão com o qual o Sr. Ministro iniciou a sua intervenção? No que diz respeito ao Instituto Nacional de Recursos Biológicos, qual é o balanço da fusão dos três institutos? Que progresso foi conseguido nos três laboratórios? Caso o processo ainda não tenha terminado, quando se prevê a sua conclusão? Investimentos a nível do PRODER: qual o balanço das candidaturas já entregues? Para quando a abertura de todas as vertentes do PRODER? Para quando se prevê a aprovação das candidaturas já entregues? No que se refere a jovens agricultores, entendemos que deverá ser uma aposta forte de qualquer governo.
Balanço das duas primeiras fases de candidaturas: está prevista alguma alteração no sentido de viabilizar mais a instalação de jovens agricultores? Mais uma vez o inquiro, Sr. Ministro, sobre o seguro de colheita e o SIPAC (Sistema Integrado de Protecção contra as Aleatoriedades Climáticas). Foi uma das suas primeiras promessa no início desta Legislatura. Ficou a aguardar que a União Europeia alinhasse pela política do Ministério e perguntamos, então, se a União Europeia já alinhou, se já deu orientações e o que será aprovado para o próximo em termos de sistema de seguros agrícolas.
Para um tecido empresarial agrícola tão envelhecido e com tão baixa qualificação — 45% dos empresários agrícolas têm mais de 65 anos e baixas qualificações, como é sabido —, como se poderá aplicar medidas correctas e direccionadas para esta população? Qual o montante que foi poupado com o fim da «electricidade verde»? Qual a composição da distribuição desta ajuda nacional — por região? Por agricultor? Por actividade? — e qual a maior concentração? Relativamente ao regadio, que investimento será feito e onde? Na bacia do Lis haverá algum investimento? Aguardo há muitos anos um pequeno investimento, uma pequena ajuda.
Em 2005, com o cancelamento das medidas agro-ambientais, milhões de euros foram devolvidos a Bruxelas. Por que foram aprovadas apenas 55 candidaturas e foram rejeitadas 25 588? Gostaria de conhecer a justificação técnica desta selectividade.
Qual o balanço do anunciado investimento em aquicultura? Qual tem sido o interesse dos privados em relação a investimentos nesta actividade? Sr. Ministro, já deixei um vasto leque de perguntas e, uma vez que ainda disponho de 3 minutos, gostaria de cedê-los ao Sr. Ministro para que possa responder às perguntas que fiz. Isto se o Sr. Ministro responder de facto mas, se for para não responder, não lhe cederei o tempo que me resta.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, Carlos Poço, convenhamos que é uma caterva infindável de perguntas, mas o Sr. Ministro lá saberá como responder.
Passamos, agora, às questões do Grupo Parlamentar do PS cujo tempo disponível vai ser repartido pelos Srs. Deputados Jorge Almeida e Miguel Ginestal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Almeida.
O Sr. Jorge Almeida (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, ouvi a intervenção inicial do Sr. Ministro sobre o orçamento e considero que fez uma abordagem das questões que me parecem essenciais no momento presente: o ano 2008; a operacionalidade da reestruturação dos serviços do PRACE;
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e a capacidade instalada que os serviços têm hoje no sentido de dar resposta às necessidades dos agricultores numa altura muito especial da evolução do sector agrícola em Portugal para os investimentos do PRODER.
De facto, a máquina do Ministério foi reestruturada e foi preparada no sentido de poder responder às necessidades dos agricultores, com assertividade, com celeridade, com uma boa funcionalidade.
É que a tramitação dos processos não pode ser a mesma de há 10, 15 ou 20 anos e está a ser introduzida modernização. É evidente que sempre temos de estar atentos às disfuncionalidades que o sistema ainda demonstra para podermos afiná-las.
Sublinho este aspecto porque temos esta reestruturação consolidada e vamos para o terreno, como estamos a fazer, dando respostas de eficiência para que o investimento na agricultura, derivado dos fundos do PRODER, constitua uma boa aplicação, no sentido de serem devidamente avaliados e conduzidos à reprodutibilidade desse mesmo investimento.
Quero sublinhar a reforma do PRACE, porque, quanto a nós, Partido Socialista, ela foi feita no sentido de melhorar os desempenhos da Administração e de encontrar as melhores respostas funcionais.
Digo isto neste momento, porque já é possível verificar, hoje, o que se passa, por exemplo, com os pagamentos aos agricultores, e era bom que a própria oposição fizesse este balanço, no sentido de saber se estamos a melhorar ou se estamos a piorar os pagamentos aos agricultores.
Neste momento, estamos a operacionalizar bem a reestruturação do sector agrícola, por exemplo na vitivinicultura. Existe, hoje, o VITIS, um programa específico de reestruturação do sector da vitivinicultura, uma fileira estratégica do nosso país, onde o País é competitivo e pode tornar-se ainda mais. É preciso saber se estamos a fazer bem ou mal a aplicação do VITIS, que é, de longe, um grande programa e, comparativamente, é o programa para a reestruturação da vinha com mais substância e com mais ajudas aos agricultores que até hoje foi feito.
Quanto à questão dos números do orçamento, sublinho dois ou três aspectos. Contrariamente ao que disse o meu colega do PSD, há um viés no seu discurso relativamente às verbas orçamentadas para investimento, as verbas crescem de uma forma muito substancial. Mas mais importante do que isso — porque esses são, de facto, fundos comunitários, que têm incorporação nacional, que também cresce — é verificar as rubricas que dizem respeito, por exemplo, aos serviços.
Segundo os números que nos são apresentados para 2009, vamos ter uma redução significativa da aquisição de bens e serviços externos e vamos ter ainda outra coisa, relativamente a alguns serviços, que gostaria de sublinhar, que é a investigação e a experimentação no nosso país.
Ao longo de algum tempo, pelo menos um ano, os partidos da oposição preocuparam-se — e bem! — com a questão da concentração dos serviços de investigação e experimentação e a partir daí fizeram um conjunto de acções e de críticas (e estão no seu papel») e levantaram problemas.
Ora, verificamos que, neste Orçamento, não só o sistema evoluiu para essa concentração, mas que está a ser dotado com mais e melhor capacidade instalada, e que no Instituto Nacional dos Recursos Biológicos, por exemplo, há um aumento significativo das despesas de pessoal e das despesas de capital, em 50%, e uma redução das despesas correntes.
Gostaria de o sublinhar, porque talvez o Instituto Nacional dos Recursos Biológicos seja significativo do novo paradigma que está a acontecer na Administração Pública, o qual nem sempre atingido, é certo, mas cujo caminho está a ser conduzido precisamente no sentido da redução das despesas correntes e do aumento das despesas de capital.
Gostaria, ainda, de abordar uma questão muito importante e de fazer uma pergunta ao Sr. Ministro relativa à fase actual do arranque e da concretização do PRODER. As candidaturas à competitividade estão no terreno. Há um volume de 1,100 milhões de euros candidatados e, estamos, neste momento, em fase de aprovação dos projectos e de arranque dessa instalação no terreno.
Uma das grandes preocupações no eixo da competitividade diz respeito às adegas cooperativas. Isto porque temos um tecido fundiário com uma média de cerca de 1,12 h por exploração. Na lógica dos mercados internacionais, e mesmo no mercado nacional, há a necessidade urgente de consolidar as estruturas associativas e sabemos que há um passivo significativo nas adegas cooperativas.
Sabemos que temos de modernizar — e o Sr. Ministro em tido um discurso muito dirigido à modernização, à concentração, à reestruturação, à gestão profissional destas organizações, que é fundamental para o futuro
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– e por isso questiono o Sr. Ministro relativamente ao modelo actual das cooperativas e à sua reestruturação, porque sabemos que há passivos, sabemos que há activos e sabemos que a organização actual exige uma grande reestruturação.
Peço, pois, ao Sr. Ministro que pormenorize os instrumentos, financeiros, por exemplo, que podemos utilizar no PRODER e os apoios e as orientações técnicas e políticas estratégicas que, neste momento, temos ao dispor no sentido de as adegas cooperativas, de estas grandes associações, que têm uma função social extraordinária, poderem reestruturar-se, resolver passivos e orientar a sua organização para o combate da competitividade, uma vez que estas têm de enfrentar grandes empresas e grandes grupos empresariais no sector vitivinícola.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, coloco duas questões para sectores concretos, que dizem respeito a pessoas em concreto.
Primeiro, sabemos que um dos desafios que condiciona o bom alcance dos objectivos do Governo e do País para os próximos cinco anos prende-se com o bom uso da água.
Muitos dos sectores tradicionais definidos como fileiras estratégicas da agricultura portuguesa estão dependentes da concretização de infra-estruturas hídricas e hidroagrícolas em concreto, que são determinantes para uma maior produtividade, que assegure uma maior competitividade, uma maior escala, para que o nosso país possa enfrentar e conquistar mercados tão agressivos como aqueles com que está hoje em dia confrontado. É por isso que água é um aspecto central da política agrícola nacional nos próximos anos.
Temos bons exemplos de esforço e de antecipação de calendários. É assim no Alqueva, é assim no regadio de Cova da Beira e estes aspectos são determinantes para apoiar as prioridades políticas nas fileiras estratégicas, no vinho, no olival, no sector hortofrutícola. São prioridades e são o essencial da economia agrícola deste país.
Mas, Sr. Ministro, há também que transformar em activos os passivos de empreendimentos hidroagrícolas que, tendo sido construídos, verificou-se que padeciam de problemas estruturais. Vou referir um em concreto: no meu distrito, no concelho de Mortágua, como o senhor sabe, existe a Barragem do Lapão, que estava terminada em Janeiro de 2003 e o primeiro enchimento teve de ser travado, porque a barragem de terra entrou em eminente colapso, e era uma barragem nova.
Com o governo do PSD nada foi feito e desde 2003 que o Presidente da Câmara de Mortágua, Dr. Afonso Abrantes, fez desta uma questão essencial. Todos sabemos que se aquela barragem, num ano de extraordinária pluviosidade, enchesse e se houvesse um colapso, toda a baixa da vila de Mortágua seria alagada. Portanto, desde essa altura que o Presidente da Câmara tem lutado muito para que a barragem seja reparada para fins agrícolas.
Quero cumprimentar o Governo, porque no Orçamento de estado para 2009, finalmente»
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Finalmente!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — », está inscrita no PIDDAC uma verba de 2 milhões de euros para assegurar a reparação da barragem. Mas, como sabemos, Sr. Ministro, os 2 milhões de euros não são suficientes para cobrir o total das despesas de reparação da barragem do Lapão, e é essencial que, para 2010, se preveja um montante de 2 milhões de euros, porque sabemos que os estudos e a reparação projectada vão ter um orçamento global de 4 milhões de euros. Então, se, para 2009, estão inscritos 2 milhões de euros, é preciso assegurar que no Orçamento para 2010 se inscrevam mais 2 milhões de euros»
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Isso já é para outro governo!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — » para pagar a reparação de forma a que, finalmente, a barragem esteja ao serviço daqueles a quem se destina, que são os agricultores da várzea de Mortágua.
Quero também sublinhar que, do nosso ponto de vista, é muito importante lançar os estudos e projectar a Barragem da Nave, em Moimenta da Beira, essencial para a maçã da Beira Alta, em concreto na região de
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Moimenta da Beira. E temos muita esperança que, no quadro dos financiamentos comunitários, até 2009, seja possível lançar esta infra-estrutura hidroagrícola, fundamental para aquela região.
Coloco uma pergunta ao Sr. Ministro sobre o nemátodo do pinheiro. Há a questão da doença das árvores, mas há a questão da economia real. Sabemos que a comercialização da madeira do pinheiro destina-se essencialmente à exportação para Espanha, 90%, e, como sabemos, para ser exportada, a directiva comunitária exige a certificação da madeira e para certificar a madeira é exigido um tratamento. Um dos tratamentos possíveis é em estufa, a 56ºC, e sabemos que a esmagadora maioria das serrações neste país não tem essa estufa. São pequenas serrações, pequenas economias familiares e um sector económico que depende em grande medida de se dotar rapidamente dessa estufa.
Pergunto ao Governo se está prevista alguma medida de apoio aos industriais das serrações da madeira que têm o pinheiro como a sua matéria-prima essencial, se está prevista alguma ajuda em concreto para rapidamente as serrações deste país terem a estufa, que faça o tratamento na madeira do pinheiro, para que ela esteja devidamente certificada no sentido de ser possível manter a exportação da madeira de pinheiro, que é uma matéria-prima essencial a uma actividade económica que tem um peso económico tão importante na economia real deste país, em concreto na região centro.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Miguel Ginestal. Fui, porventura, excessivamente benevolente com o Partido Socialista, pelo que vou tentar compensar os demais grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, cumprimento o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado.
Deixo uma nota prévia para fazer minhas as preocupações do Sr. Deputado Miguel Ginestal quanto ao nosso distrito, de Mortágua, e dizer que conto com o Sr. Deputado para me acompanhar na minha preocupação com a futura exploração de caulinos, da qual falaremos brevemente, para ver se não se repete o efeito da famosa barragem.
Passando ao Orçamento, não vou fazer considerações sobre a crise, mas há variadíssimas leituras. Ela é uma realidade, independentemente das nuances que cada um de nós terá dela, mas V. Ex.ª estará seguramente de acordo comigo quanto a uma questão: num momento de crise, o sector da agricultura é uma excelente resposta e pode ser uma excelente «almofada» para a solução de alguns problemas graves, nomeadamente no interior do País. Portanto, neste panorama, a importância do sector e do Ministério de V.
Ex.ª são enormes.
É por isso que vejo com alguma preocupação esta matéria, e não irei fazer uma análise dos números mas, sim, de resultados, pois o que importa é saber se conseguimos ter resultados e se há algum elemento de esperança numa melhor acção e numa melhor procura de eficácia do Ministério.
Há, de facto, um decréscimo do Orçamento, embora isso não seja significativo, mas também é verdade que, em termos de investimento, ele é o segundo mais importante.
Também não deixa de ser curioso, para quem dizia, com um tom até de algum orgulho, que o seu era o primeiro Ministério a cumprir as metas do PRACE, que tivéssemos ficado sem perceber por que é que em «Despesas de funcionamento» não se pode confirmar essa mesma eficácia. É que há aqui um aumento de 8%. Mas veremos» É, portanto, falando em resultados e tendo em conta a importância do sector, que é preocupante, Sr.
Ministro, saber que, desde 2005, não há investimento modernizador do sector. Já aqui foi dito que o sector não tem tido praticamente nenhum investimento na sua modernização, que temos hoje 45% dos agricultores portugueses com mais de 65 anos e que o sector não cria oportunidades para quem lá está e cria ainda menos oportunidades para que os jovens possam aderir ao sector. Ora, isto põe em causa o avanço do sector.
Isso tem a ver com o PRODER. O Sr. Ministro referiu que agora vai ser tudo tratado, o Partido Socialista diz que há dificuldades técnicas na avaliação dos projectos e que tudo isso será resolvido, mas a verdade é que a primeira fase terminou em 25 de Junho e continuamos sem saber qual o total de candidaturas aprovadas.
O Sr. Ministro referiu algumas — não sabemos quantas —, mas existem notícias de um elevado número de candidaturas não aprovadas e gostaríamos de saber exactamente quantas são. É que há notícias de que
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cerca de 80% das candidaturas vão ser reprovadas, pelo que gostaria de saber para quando uma resposta clara sobre quantas as candidaturas apresentadas e quantas as reprovadas.
E isto é importante, Sr. Ministro, pelo seguinte: por exemplo, um agricultor da Beira, que vê agora a abertura do segundo período de candidaturas e não tem qualquer ideia do que se passou anteriormente, o que é que deve fazer? Apresenta o mesmo projecto? Com que alterações? Com que melhorias? Em suma, como é que alguém pode candidatar-se à segunda fase, se há um total desconhecimento do que aconteceu na primeira? Há aqui, ou não, uma tentativa encapotada de poupar dinheiro e, pela secretaria, prejudicar eventualmente algumas candidaturas? É que há, de facto, algumas divergências. Há até aquela divergência em que os formulários que são preenchidos pelos candidatos nada dizem sobre o IRC. Mas, depois, aquando da avaliação feita pelos técnicos do Ministério da Agricultura, é obrigatória uma aplicação da taxa de IRC — e há queixas. Ora, este elemento faz com que muitas candidaturas morram à nascença.
Portanto, há aqui pouca clareza, há aqui um desconhecimento total. É que era perfeitamente legítimo que, quem visse o seu projecto chumbado, pudesse reestruturá-lo, reformá-lo e ir à segunda fase. Ora, isso não tem acontecido e gostava de saber porquê.
Depois, Sr. Ministro, quero também falar do Regime de Pagamento Único, o famoso RPU. Às vezes, fico com a sensação de que o Sr. Ministro, ou não quer ser Ministro da Agricultura, ou não é amigo dos agricultores portugueses — e já não vou tão longe, porque tenho por si grande consideração, achando que o Sr. Ministro tem alguma intenção de prejudicar o País» No entanto, gostava que me pudesse dar alguma explicação racional e dissesse por que é que, num momento de dificuldade económica, num momento em que a agricultura atravessa as dificuldades que todos os grupos parlamentares referiram, e depois do pedido das associações do sector, dos agricultores e até da disponibilidade da Sr.ª Comissária para que o Sr. Ministro pudesse antecipar pagamentos — nada mais nada menos do que 400 milhões de euros —, o Sr. Ministro não pede qualquer autorização e não utiliza essa ferramenta para poder ajudar os agricultores portugueses.
Quero chamar a atenção para – e tenho-a aqui cópia – uma carta em que a Comissária diz que a Comissão autoriza os Estados-membros a pagar adiantamentos antes de 1 de Dezembro, mas adianta que, até à data, as autoridades portuguesas não transmitiram aos serviços responsáveis da Direcção-Geral de Agricultura qualquer pedido nesse sentido.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — De que data é a carta?
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Ou seja, o Sr. Ministro deixou de lado e não conseguiu utilizar aquilo que é um elemento fundamental para a agricultura portuguesa.
Quero ainda dizer-lhe, Sr. Ministro, na mesma linha, e tendo em conta que, porventura, às vezes, pode ser só uma questão de distracção, o seguinte: o Banco Alimentar contra a Fome diz que, no ano passado, distribuiu cerca de 9000 t de fruta. Eu sei, o Sr. Ministro sabe, todos sabemos que há um conjunto de pessoas no País que, muitas vezes, não consegue ter à sua mesa, para a sua alimentação, uma peça de fruta. Gostava de saber se acha normal que o Ministério tarde a fazer uso dos instrumentos legislativos para que o Banco Alimentar contra a Fome ou seja quem for distribua essas frutas gratuitamente, ajudando não só os produtores, que podem eventualmente vender essas frutas a um preço mais reduzido, mas essencialmente as pessoas que delas precisam, fazendo chegar essas frutas à sua mesa.
A este propósito, quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, olhos nos olhos, se reconhece nessa matéria algum lapso, algum erro, algo que devia ter sido feito e não foi. É uma pergunta simples, mas sobre algo que é muito significativo para as pessoas.
Também não quero deixar de falar-lhe nos produtos tradicionais. Seguramente, o Sr. Ministro estava à espera desta minha pergunta, pelo que vou facilitar-lhe a vida. E também aqui lhe pergunto se reconhece, ou não, algum lapso, algum erro ou alguma distracção. É que o Sr. Ministro tem feito declarações, algumas com piada, do género «basta lavar as mãos e os produtos tradicionais estão salvaguardados», «basta um mero papel e nenhum produto tradicional está em risco», e até tem feito algum esforço para lançar algumas portarias.
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Por exemplo, o despacho normativo n.º 38/2008, em que, perfeitamente ao arrepio daquilo que é o espírito e até a letra da lei dos regulamentos comunitários, que são de simplificação e de derrogações generalizadas, para que, depois, todos possam encontrar a sua melhor forma de produzir, fazendo crescer a economia, mas, ao mesmo tempo, garantindo a segurança e a higiene alimentar, o Sr. Ministro prescreve coisas como as que constam, por exemplo, do artigo 2.º — Apresentação dos pedidos. Ou seja, um agricultor, um produtor de um queijo da Serra da Estrela ou de um queijo de Niza, que foi considerado um dos melhores queijos do mundo, é obrigado, no seu pedido, e de acordo com a alínea a) do n.º 3 do artigo 2.º deste despacho, a fazer a «apresentação sumária do requerente quanto à natureza, objecto social e representatividade sectorial e regional».
Ora, pergunto-me: mas o que é que este produtor vai pensar? Mas que representatividade? A que nível? Qual ç o volume de negócios? Qual ç o capital? Isto ç praticamente um estudo de viabilidade económica!» Não sei se um produtor destes tem capacidade ou até meios para ir procurar elementos da mais-valia do produto, da penetração no mercado, de tudo isso.
Assim sendo, parece-me que valia mais a pena que o Sr. Ministro adoptasse aquilo que está no espírito dos regulamentos comunitários, que é a simplificação.
Depois, gostaria de dizer-lhe que acho estranho que, por exemplo, no mesmo despacho, diga que podem ser reconhecidos como produtos tradicionais os produtos fabricados em unidades artesanais reconhecidas ao abrigo do decreto-lei que diz o que são produtos tradicionais. Sr. Ministro, parece-me que um produto artesanal pode ser, mas também pode não ser, tradicional. As famosas unidades de produção artesanal fazem coisas bastante modernas. Há, pois, aqui uma confusão.
E por que não referir-lhe até um outro despacho, da Direcção-Geral de Veterinária, relacionado com o famoso arroz de cabidela ou arroz de lampreia, que o Sr. Ministro dizia que não punha nada em causa.
O Sr. Ministro fez um despacho que, depois, corrigiu e que diz que já se pode consumir no local. A minha pergunta é simples: o que é «consumir no local»? Pode fazer-se um abate no local e oferecer, por exemplo, a uma IPSS? Pode comer-se só em casa? Pode vender-se no restaurante? É que são noções tão vagas que ficamos sem saber se este «consumo no local» se refere apenas à célebre matança do porco para distribuição gratuita ou se se pode comercializar. Se, por exemplo, um turismo de espaço rural, importante sector para a economia e para o turismo nacional, pode vender ou se pode até fazer doação dos excedentes para as IPSS.
Tudo isto não fica claro.
É que, por exemplo, não introduziu aqui os ciclóstomos, mais conhecidos pelas lampreias, que têm de ser cozidas vivas — e, como sabe, este é um sector importantíssimo para a economia no norte do País. Este despacho nada diz sobre isso e, assim sendo, Sr. Ministro, é bom que faça uma terceira redacção do despacho, pois tudo continua ainda muito vago, na defesa daquilo que são os produtos tradicionais.
Sr. Ministro, devo dizer-lhe que o seu Ministério tem grandes responsabilidades nesta matéria. E a melhor forma de o País combater a globalização é também por via do reforço e do melhoramento dos produtos tradicionais.
Termino com uma pergunta relacionada com as medidas agro-ambientais. Mais uma vez, de um conjunto vasto de candidaturas, cerca de 2000, apenas 55 foram aprovadas. O Sr. Ministro diz que tem um Ministério organizado, diz que tem um Ministério com verbas a aumentar e que o PIDDAC é disso exemplo, mas devo dizer-lhe que o Sr. Ministro corre o risco, tal é a frequência e a cadência com que o sector se queixa da falta de pagamento a tempo e horas e da falta de acesso aos instrumentos necessários para as candidaturas aos fundos comunitários, de, qualquer dia, ainda ter de ir a uma associação dos devedores do Ministério da Agricultura.
Portanto, gostaria que o Sr. Ministro desse um conjunto de respostas muito claras, naquilo que é um sinal de esperança e um sinal da sua preocupação com o sector e com os agricultores portugueses.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, começo por saudar o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado, nesta abordagem, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2009.
Sr. Ministro, estamos a concretizar o debate do quarto Orçamento do Estado apresentado por este Governo (além de um rectificativo), o último da Legislatura, e seria importante que o Governo pudesse, neste
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momento, fazer algum balanço da aplicação dos instrumentos orçamentais anteriores para a agricultura e para as pescas portuguesas.
Percebemos por que é que o Governo e o Ministro da Agricultura não fazem um balanço: é que a situação na agricultura nacional, ao fim de quase quatro anos de governo, é um desastre completo ao nível do rendimento dos agricultores, com uma subida brutal dos factores de produção e baixas dos preços dos produtos, ao nível da própria balança agro-alimentar portuguesa e ao nível dos serviços do Ministério da Agricultura, sujeitos a um profundo processo de desmantelamento, desorganização e até expulsão de bons profissionais.
O Deputado Jorge Almeida, do Grupo Parlamentar do PS, falou aqui na grande celeridade dos serviços, e eu vou ler uma carta que o Juiz Conselheiro Jubilado, Garcia Marques, do Supremo Tribunal de Justiça, enviou para os grupos parlamentares, e eu pensava que tivesse chegado a todos, mas vou pedir à mesa que faça distribuir esta carta notável, da qual passo a ler este excerto: «Resulta da situação exposta que nas delegações agrárias chamadas ao cumprimento desta missão para já impossível (»)« — era a recepção aos pedidos de reestruturação e arranque da vinha — «(») e muito particularmente na de Figueira de Castelo Rodrigo, onde acabo de passar três dias inacreditáveis, se vive um ambiente surreal com centenas de pessoas inscritas, a aguardarem atendimento dias seguidos, por horas a fio, em condições de crescente malestar, que levaram a inevitáveis afrontamentos que situações destas sempre geram, à medida que o cansaço e o nervosismo se apoderam das pessoas, temerosas de não serem atendidas, depois de mais de um dia de extenuante espera». Bom funcionamento dos serviços?!... Certamente não se duvida do testemunho de um Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça.
Vou pedir à mesa que distribua esta carta, pois já verifiquei que há grupos parlamentares que não a conhecem.
Uma política orçamental conduzida pela obsessão pelo défice e pela redução da despesa em que, para não se gastar alguns milhares de euros, se perdem milhões.
Em recente resposta a Deputados portugueses no Parlamento Europeu, a sua colega Comissária de Agricultura informou que, no âmbito do PDR, só em 2004 e 2005 (há, portanto, responsabilidades também do governo anterior), o País perdeu, definitivamente, nas palavras da Sr.ª Comissária, 73 milhões de euros. Com as dificuldades orçamentais que conhecemos, com as dificuldades que temos na área da agricultura, o País deu-se ao luxo de perder 73 milhões de euros. Isto até 2005, porque falta calcular de 2005 para cá. Portanto, são 73 milhões de euros que se deitaram fora e que vão ajudar a agricultura nos países ricos.
Mas isto, que é um crime económico, aparentemente não é problema para o Governo. Não se aprovaram projectos Agro e Agris de centenas de agricultores, porque não havia falta de verba, mas, entretanto, devolveu-se a verba a Bruxelas para ajudar os agricultores da Alemanha, de França e de outros países.
Gostaria, aliás, a propósito da reestruturação do Ministério da Agricultura (que já acabou, segundo o Sr.
Ministro nos referiu aqui hoje), que fosse capaz de nos dizer qual é o desenho final dos laboratórios do Estado sob tutela do Ministério da Agricultura, se esse processo está concluído e, já agora, por que razão os funcionários do Instituto Nacional dos Recursos Biológicos, um dos novos institutos, continuam com atrasos no pagamento dos seus salários.
O Governo e o Ministério, sujeitos a esta visão do défice orçamental, não cumpriram sequer as promessas eleitorais que fizeram em 2005. Pelo contrário: dificultaram e complicaram, como se verificou com o problema do acesso ao gasóleo este ano e com o acesso às ajudas; retiraram e reduziram apoios ao nível das medidas agro-ambientais e ao nível da electricidade verde; atrasaram para lá de tudo o que era admissível os apoios comunitários ao nível do PRODER, porque estamos a chegar ao fim do segundo ano e ainda não está produzida toda a regulamentação; e acabaram até por chocar com todas as estruturas e associações agrícolas.
Uma das promessas eleitorais do PS era a discriminação positiva da pequena agricultura. Gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse onde está isto no Orçamento do Estado, mais uma vez, depois de terem afastado 25 000 agricultores das ajudas, depois de terem impedido que os pequenos investimentos até 25 000 euros tivessem ajudas a fundo perdido.
Já agora, gostaria de saber se nos pode dar o esclarecimento definitivo relativamente ao problema da modulação obrigatória ou se este ano vamos assistir ao mesmo «filme» de um anterior Ministro do Partido Socialista que também avançou com a legislação e que a retirou ao fim de alguns meses.
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Relativamente ao Orçamento do Estado, Sr. Ministro, do ponto de vista da agricultura, o que temos é um quadro de estagnação dos investimentos do sector. O investimento, que já não era elevado anteriormente, permanece ao mesmo nível e tem, até, uma ligeira redução, mostrando-se manifestamente incapaz de responder às necessidades da agricultura nacional.
No que se refere ao combate ao nemátodo, já aqui foi referido, eu gostava de perceber como é que o problema se estendeu a todo o país e como é que o programa se reduz. Não se percebe, Sr. Ministro!... Mas certamente que o Sr. Ministro nos vai esclarecer esta questão. Aliás, no texto do orçamento fala-se em cumprir uma decisão da União Europeia de 2006, pelo que pergunto se não há outra decisão, de 2008, da mesma União Europeia, sobre esta matéria, para cumprir e que não é referida no documento.
Gostaria de saber quanto é que o Governo, que está muito preocupado com a gestão das matas públicas, vai investir em 2009 ao nível das matas públicas. Por exemplo, no Pinhal de Leiria, que é a principal mata pública do país.
Gostava de perceber, relativamente ao gasóleo agrícola, se há ou não medidas para reforçar os apoios a este importante factor de produção agrícola.
No que se refere a linhas de crédito, o Governo tem vindo a desencadear nos últimos meses linhas de crédito para pequenas empresas, sendo que está criada uma para a pecuária intensiva, pelo que gostaria de saber se está ou não em cima da mesa uma linha de crédito virada para o cooperativismo agrícola. Já agora, gostaria de perceber por que é que uma das linhas de crédito criada pelo Governo ao nível do Ministério da Economia não abrange a indústria de lacticínios.
Depois, ainda ligada com a questão orçamental, o Sr. Ministro não tem dúvidas de que as medidas fiscais são um importante instrumento económico da política agrícola.
Assim, gostaria que o Sr. Ministro hoje nos esclarecesse, porque, há um ano, no debate do Orçamento, não nos esclareceu» Peço ao Sr. Ministro que dê alguma atenção ao que estou a dizer, porque no ano passado, provavelmente, foi por não estar a ouvir o que eu estava a perguntar que depois não me respondeu.
Gostaria de perceber por que razão não me respondeu no ano passado, durante o debate do Orçamento do Estado, ao seguinte: foram colocados na Lista 1 do Código do IVA, o que significa a passagem à taxa reduzida do IVA, um conjunto de produtos ao nível dos lacticínios (se é que alguns deles se podem chamar lacticínios): iogurtes pasteurizados, produtos à base de soja e as chamadas sobremesas lácteas não refrigeradas. A minha pergunta é: por que é que passaram para esta lista? Qual foi a opinião do Ministério da Agricultura relativamente a estas medidas ao nível do IVA? Já agora, qual a consideração que o Ministério faz relativamente à possibilidade de os produtos biológicos certificados poderem encaixar na Lista 1 do Código IVA, ou seja, com uma taxa reduzida de IVA.
E porque tivemos aqui recentemente os seus responsáveis, gostaria de saber qual a opinião do Ministério relativamente às solicitações em matéria de benefícios fiscais em torno do projecto do Laboratório Interprofissional do Sector do Leite e Lacticínios.
Sr. Ministro, o Governo assumiu finalmente, ao fim de quatro anos, que o Estado devia dinheiro, que diversos Ministérios deviam dinheiro a empresas e a organizações privadas. Em face disto, gostaria de saber se o Sr. Ministro fez algum balanço das dívidas do Ministério da Agricultura — uma questão que esteve presente nos nossos debates ao longo destes quatro anos — e, se possível, que nos dissesse qual o valor dessa dívida.
Termino, Sr. Presidente, com uma questão muito rápida, a que certamente o Sr. Ministro gostará de responder, e que se prende com as questões da pesca.
A situação orçamental na agricultura não é boa, mas podemos dizer que na pesca é um afundamento completo, com a redução significativa das dotações do PIDDAC de 82 milhões de euros para 45 milhões de euros, isto é, temos uma redução de 45% das verbas do investimento no sector das pescas.
O PROMAR, os novos investimentos dos fundos comunitários, contrariamente até ao que acontece na agricultura, ficam na gaveta. Passam de 10 milhões de euros em 2008 para 7 milhões de euros em 2009.
Pergunto ao Sr. Ministro se não há qualquer ideia, qualquer orientação em torno da reprogramação, agilização do uso das verbas do PROMAR, concretamente, concentrando-as em 2008, 2009 e 2010, uma vez que o que está no Orçamento do Estado (se não há outros documentos) é o adiamento destes apoios para lá de 2010, não se vendo projectos novos!
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Depois, a grossa fatia do investimento no sector das pescas vai para a aquicultura, a outra parte fica no aparelho de Estado e, conclusão: sobram migalhas, mais uma vez, para a pesca artesanal e para a pesca costeira.
Gostaria, pois, que o Sr. Ministro nos pudesse esclarecer esta questão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, começo pela questão com que o Sr. Ministro abriu a sua apresentação aqui hoje: a reforma do Ministério da Agricultura.
Na verdade, a alteração introduzida na organização do Ministério da Agricultura foi produzida de uma forma extremamente violenta em relação aos funcionários do Ministério.
Tem sido dito aqui que o resultado desta reforma é um ganho de eficiência para o Ministério, mas aquilo de que vamos tendo conhecimento em relação ao PRODER e aos atrasos que vem sofrendo, nomeadamente no que se refere à ausência de regulamentação, por exemplo, no que diz respeito ao sector florestal, indicia que esta eficiência fica muito longe daquilo que seria desejável e de esperar e, ficando longe do que seria desejável, há aqui um tratamento de uma enorme violência para com os funcionários do Ministério.
O Sr. Ministro diz-nos hoje que se abre uma nova fase na vida do Ministério da Agricultura e que haverá um alargamento de quadros. A questão que lhe coloco é a de saber quantos funcionários do Ministério da Agricultura se encontram hoje no quadro de mobilidade especial e quantos é que o Ministério tem em perspectiva de poder recolocar neste processo de contratação de novos efectivos. Isto é, do seu ponto de vista, qual a sua perspectiva para esta capacidade de reabsorção de funcionários que foram colocados no quadro de mobilidade, ou seja, que número de funcionários virá a ser abrangido por ela.
Em relação às prioridades e ao que temos de propostas para o desenvolvimento rural, devo dizer-lhe, Sr.
Ministro, que a sua intervenção hoje vai bater num ponto que é justamente aquele que gostaria que o Sr.
Ministro desenvolvesse e em relação ao qual gostaria que nos respondesse a algumas questões.
O Sr. Ministro salientou, mais uma vez, a orientação estratégica para o seu Ministério no sentido de que é preciso apostar na competitividade. Na verdade, nas definições que o seu Ministério tem para o sector, há uma grande aposta no Eixo 1, que é o eixo da competitividade.
Gostaria, Sr. Ministro, de contrariar esta orientação do ponto de vista do desfasamento entre uma orientação no sentido de favorecer o reforço da competitividade num país com as características que Portugal tem no seu território rural, desenvolvendo nós a ideia de que o que deveria ser preciso reforçar seria o Eixo 3, que é o eixo que diz respeito ao reforço da diversificação, porque é o que tem a ver com o que é característico do tecido agrícola e rural no nosso país.
Portugal é, na Europa a 25, o sétimo país com maior área rural e, sendo um território dominantemente rural, que corresponde a 70% da sua área, é um país cada vez mais envelhecido, pois mais de metade dos agricultores portugueses são pessoas com mais de 65 anos. Portanto, somos um país com baixas perspectivas de dinâmica, com baixas perspectivas de desenvolvimento económico, pelo que a agricultura vai perdendo peso na economia e no emprego rural.
O reforço do Eixo 1 ao nível do reforço da competitividade, sabe o Sr. Ministro tão bem quanto nós, significa uma maior concentração da propriedade e do investimento e uma perda de emprego, de empregabilidade.
Esta é a consequência, isto é, como é que é possível manter esta orientação em relação a uma orientação estratégica, no sentido do reforço da competitividade, quando ela não tem a ver nem com a estrutura fundiária nem com a população rural no nosso país e quando o desenvolvimento mais dirigido para o desenvolvimento, para a melhoria da qualidade de vida de uma parte da população e para as economias dos agregados, que estão agora separados da agricultura, poderia fortalecer o nosso tecido rural.
Sr. Ministro, o que lhe pergunto é: como é que justifica que se continue a dar tão pouca importância, como se tem dado, para um desenvolvimento rural efectivo, fundado na diversificação e numa melhor sustentabilidade das populações na qualidade de vida? E, portanto, como é que explica esta orientação estratégica que, na verdade, privatiza, dá prioridade aos interesses mais associados a esta grande concentração do ponto de vista da produção agrícola?
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A terceira questão que gostaria de lhe colocar tem a ver com o facto de que o seu Ministério parece ter metido na gaveta o Plano Nacional para o Desenvolvimento da Agricultura Biológica.
E era, justamente, sobre isto que gostaria que nos respondesse, porque, na verdade, havia, de alguma forma, a promessa do seu Ministério, inclusivamente, da criação de uma divisão no seu Ministério, destinada especificamente a este segmento. De facto, esta divisão existia, na anterior lei orgânica mas, actualmente, nos últimos três anos, tem havido, em relação à agricultura biológica, um relegar para um papel absolutamente secundário, de menor interesse, o que revela que este assunto está ausente das preocupações do Ministro da Agricultura.
Sr. Ministro, pergunto-lhe: quando é que este sector poderá vir a conhecer um reforço e um apoio da parte do seu Ministério no sentido de uma lógica diferente? Passo, agora, à pergunta seguinte, porque, na verdade, o que tem sido a atribuição de subsídios à agricultura é muito na base de uma lógica rentista, pois as medidas agro-ambientais não se fundamentam tanto na apreciação, na avaliação dos resultados para o ambiente do desenvolvimento rural, mas, sobretudo, numa transformação da propriedade numa propriedade ambiental, sem uma verdadeira avaliação das consequências, o que nos parece que precisava de conhecer uma alteração.
Portanto, pergunto-lhe qual é a sua posição em relação à perspectiva de a reorientação do apoio às boas práticas ambientais na agricultura poder vir a ser feita através de um tratamento fiscal diferenciado como, por exemplo, retirando os benefícios, ao nível do Código do IVA, aos produtos químicos de síntese utilizados na agricultura, e permitindo que nos pedidos de reembolso do IVA não seja obrigatória uma garantia bancária para os pequenos agricultores de Modo de Produção Biológico ou de Produção Integrada, em virtude de investimentos elevados que têm de fazer na sua actividade.
Finalmente, Sr. Ministro, em relação à transformação no sector das pescas, o Sr. Ministro anunciou aqui, hoje, numa muito breve apresentação, a intenção de medidas de compensação ao sector das pescas num quadro de recomposição.
Na verdade, esta recomposição no sector das pescas é uma perspectiva em relação à qual tem havido um sistemático adiamento. Devo dizer que nos documentos produzidos pelo seu Ministério para este Orçamento do Estado, este objectivo de promover a melhoria de qualidade de vida, nas zonas mais dependentes da pesca, está mencionado.
Pergunto-lhe, pois, quais são as orientações? Qual é o plano? E qual é o programa para este sector específico, num quadro em que se adivinha que, em matéria não só de alteração dos procedimentos mas, sobretudo, das perspectivas em relação às alterações dos ecossistemas marinhos, tem de se perspectivar uma orientação, no sentido de mitigação de efeitos, que tem a ver com as recomendações da União Europeia e as recomendações relativas às alterações necessárias à salvaguarda dos ecossistemas marinhos.
Em suma, pergunto-lhe qual é o programa para este sector.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Para responder a este conjunto de primeiras questões, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há questões que são transversais e, por isso, se estiverem de acordo, pegarei nessas questões transversais e responderei horizontalmente.
A primeira questão é a seguinte: o Sr. Ministro fez a reforma do Ministério, qual é o grau de eficiência? Penso ser a altura de começarmos a analisar esse grau de eficiência e esse grau de eficiência é transparente.
Hoje, qualquer português vai à net e encontra lá todos os subsídios pagos pelo Ministério da Agricultura. Estão lá todos! Srs. Deputados, peço-lhes, quando se falar em atrasos, nesta Câmara, vão à net e vejam como é que está o RPU, por exemplo, e vão ter uma surpresa. É que, este ano, vamos pagar 804 milhões de euros e vamos pagá-los no ano das candidaturas. Foi o grande desafio que o Governo se propôs fazer. Candidaturas? Pagaremos dentro dos 12 meses. E fizemo-lo!
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Depois, há uma outra imagem que está a passar — não direi propositadamente mas, provavelmente, influenciados por algumas confederações —, que é a ideia de que até podíamos antecipar as ajudas e não o fizemos por distracção.
Srs. Deputados, em 2005, houve uma grande seca neste país, houve incêndios e quebras de produção significativas. Nós pedimos para Bruxelas, justificámos e fundamentámos que havia razões para pagar antecipadamente e Bruxelas deixou-nos pagar antecipadamente.
Este ano, não tínhamos um único argumento que justificasse pagar antecipadamente. De quando para quando? De Dezembro para 16 de Outubro. O «antecipado» significa, no orçamento comunitário, em vez de se começar a pagar em Dezembro, até Junho do ano que vem, poder pagar a partir de 16 de Outubro. Este ano, felizmente, não houve grandes incêndios, não tivemos secas, nem inundações, portanto, não havia uma argumentação.
A Sr.ª Comissária disse — e tem razão — «nós podemos pedir sempre»; o que ela não diz, na carta, è que, às vezes, a Comissão recusa, porque não há fundamento.
E há uma outra coisa que os Srs. Deputados e os agricultores têm de perceber: é que na programação do orçamento, quando nós dizemos que vamos pagar o RPU no dia 16 de Dezembro ou no dia 23 de Dezembro, sabemos que, quando pagarmos esse dinheiro, esse não é o dinheiro de Bruxelas, é o dinheiro adiantado do nosso orçamento. Bruxelas só nos dá o dinheiro um mês e pouco depois! Ou seja, quando antecipamos os nossos quadros financeiros, temos de ter orçamento adicional para cobrir os custos financeiros.
Portanto, Srs. Deputados, não houve, nem haverá, atrasos este ano. Vamos pagar, naquilo que dissemos que iríamos fazer: candidaturas de um ano, pagas dentro dos 12 meses. Pagaremos os 804 milhões de euros.
Srs. Deputados, está tudo na net. Os pagamentos de Dezembro concluídos, em Fevereiro estarão na net. E posso dizer-vos, quanto àquilo que pusemos na net, este ano, não recebi nem uma reclamação de nenhum agricultor a dizer: «está lá a dizer que eu recebi, mas eu ainda não recebi».
Os únicos que não recebem, e sabem bem, são aqueles que estão sob controlo, que não ultrapassam, na fase inicial, 10% dos agricultores portugueses. Portanto, aqui temos de esclarecer, claramente, de uma vez por todas: está na net a confirmação do que pagámos.
Um outro tema horizontal, colocado pelo Sr. Deputado Hélder Amaral, e pela sua importância social, é o da questão do Banco Alimentar Contra a Fome.
Nós temos um pacote financeiro de apoio aos mais carenciados no Ministério da Agricultura. Tivemos 14 milhões de euros, abrimos um concurso para a distribuição gratuita de arroz, açúcar, produtos lácteos, manteiga, bolachas e, obviamente, estes produtos são distribuídos pelo Banco Alimentar por associações de carácter social, pela Santa Casa da Misericórdia, etc.
Depois, existe, na legislação comunitária, o regime de retirada de frutas. Não é um regime de ajuda aos carenciados; é o seguinte: quando o preço cai, abaixo de um preço mínimo, os agricultores podem retirar esses produtos — e era um escândalo no passado, quando esses produtos podiam ser destruídos – e dá-los a associações de caridade. Para isso é preciso o quê? É preciso que haja lá produtos e que o preço tenha descido, no mercado, abaixo do tal preço mínimo.
Mudou o regime da OCM para este ano e o regime deixou de ser automático. A partir de 2008, os agrupamentos de produtores têm um pacote financeiro, que é um programa operacional, onde eles, com esse dinheiro, identificam onde é que o vão gastar e podem, inclusive, decidir que não há retiradas de fruta.
Para obstar a que não houvesse um problema, de que não houvesse fruta, eu disse, várias vezes, a título pessoal, que, independentemente da aprovação dos programas operacionais, que só ocorrerão no segundo semestre em todos os Estados-membros da União Europeia, as despesas decorrentes da distribuição de fruta de organizações de produtores, transmitidas ao Banco Alimentar ou a instituições de caridade, são elegíveis e serão pagas desde o dia 1 de Janeiro de 2008.
Portanto, já fiz o apelo, várias vezes: se alguma organização tem fruta, distribua-a e guarde os papéis, que são os mesmos do ano passado, porque nós temos de provar para Bruxelas que está tudo com traçabilidade, e nós pagamos. Eu disse isto na Páscoa, voltei a dizê-lo na semana passada e continuo a dizer. Agora, se as organizações de produtores não têm fruta, Sr. Deputado, se as organizações de produtores vendem no mercado toda a fruta que têm, porque tivemos quebra de produção este ano, não os posso obrigar a descobrir fruta...
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Agora, também já anunciei uma coisa muito simples: estamos a discutir com Bruxelas, não 14 milhões, mas mais de 30 milhões para o ano, e com co-financiamento nacional. Se reparar no orçamento, temos lá previstos 14 milhões de euros para os carenciados e virá de Bruxelas o dobro!... Se não houver fruta neste ano, para o ano incluiremos a fruta. Vou dizer, claramente, isto às organizações de produtores: nós iremos incluir fruta.
Portanto, face, digamos, a algum mal-estar, que eu possa compreender, porque, de facto, não houve distribuição até hoje, nós duplicamos a verba para o ano e incluiremos fruta se – e penso que não vai ser o caso – houver uma má produção ou um mau ano, em termos de fruta, claramente, não vai haver fruta e, aí, acudiremos, com meios financeiros para se comprar fruta.
Portanto, aqui temos, digamos assim, uma resposta horizontal, a duas questões que, para nós, são tão importantes, pois pensamos que, na questão da ajuda aos mais carenciados, não tem que haver politiquice, temos de ser claros e transparentes sobre o que se está a fazer.
Depois, sobre o PROLUNP (Programa Nacional de Luta contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro) e sobre o facto de as verbas desceram, quero dizer-vos que desceram as verbas, em termos do programa que vinha de trás, aprovado pela Comissão Europeia, mas se os Srs. Deputados, já leram a portaria das ajudas para o combate do nemátodo do pinheiro, inclusive o aviso do concurso, poderão verificar que, nas zonas críticas, a eliminação das espécies afectadas tem apoios a 100%, do PRODER, e que a reconversão dessas áreas tem apoios que podem ir até 100%, se bem que com a replantação das espécies previstas nos planos regionais de ordenamento florestal.
É uma excelente ocasião para ordenarmos a nossa floresta, porque, se está pinheiro bravo e, se calhar, deveriam estar folhosas, há que pôr folhosas. Portanto, os apoios podem ir a 100%. Os avisos já estão feitos e assinados e os proprietários florestais já contam não apenas com os instrumentos que a Comissão aprovou, e que vêm do ano anterior, mas com um instrumento novo, no PRODER, que é um apoio fundamental.
Relativamente a despesas com pessoal, o Sr. Deputado Carlos Poço referiu as verbas do meu gabinete.
Sr. Deputado, as verbas do meu gabinete são as mais baixas que já, alguma vez, algum ministro teve. No ano passado, tinha 1,041 milhões de euros e, agora, tenho 1,036 milhões de euros. Portanto, baixaram as verbas do meu gabinete, enquanto Ministro da Agricultura, pelo que, se se referia a estas verbas, e for ver as fichas, verá que baixaram. Mas, se vir os anos anteriores, vai ver uma coisa muito simples: baixaram em termos absolutos!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Então, temos quadros diferentes!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — No conjunto dos gabinetes, há um ligeiro aumento, porque há um reforço de competências num dos secretários de Estado, que tem a ver, nomeadamente, com a área da defesa da floresta contra incêndios e do nemátodo do pinheiro. Precisámos de um reforço nessa área de competências próprias, mas, enquanto gabinete ministerial, faço questão de precisar que nunca nenhum ministro teve verbas tão baixas.
Relativamente ao SIPAC, Sr. Deputado, fiz bem em esperar, fiz bem em me comprometer, porque o SIPAC vai mudar. Há uma comissão onde estão as confederações e há, finalmente, uma proposta de Bruxelas, no sentido de permitir, em primeiro lugar, um financiamento com fundos comunitários e, em segundo lugar, alargar o campo de apoio do SIPAC. Portanto, se o health check for aprovado para a semana, teremos, então, de facto, novas bases: mais dinheiro adicional e um maior leque de medidas de apoio através dos seguros agrícolas. Os seguros agrícolas não são para reduzir os apoios aos produtores de maçã ou aos produtores de vinha, são para podermos tornar elegíveis quebras substanciais da produção e quebras substanciais de rendimento.
Quanto à barragem do Lapão, o Sr. Deputado Miguel Ginestal tem razão, pois incluímos uma verba de 2 milhões de euros no Orçamento do próximo ano mas sabemos que a recuperação total da barragem implica, sensivelmente, 4 milhões de euros.
Foram feitos os estudos, sabe-se o que é preciso fazer, e só não começámos mais cedo, porque há um litígio jurídico e o Estado não pode substituir-se, sem ter segurança jurídica, ao construtor, pagando uma segunda barragem. Por isso é que, com alguma segurança jurídica, vamos começar as obras, uma vez que, se a responsabilidade for do empreiteiro, estes 2 milhões de euros, e os outros 2 milhões, não serão pagos pelo Estado nem pelos contribuintes nacionais. Daí que os estudos estejam feitos e as obras comecem com
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estes 2 milhões de euros. Compreendo a necessidade de haver já o compromisso, e assumi-lo-emos, em sede de Orçamento, no sentido de que, de facto, iremos assegurar os tais 4 milhões de euros para recuperar essa barragem.
No quadro do Orçamento do próximo ano, há mais algumas barragens identificadas, mas, Srs. Deputados, gostaria de ser muito claro: não são apenas as barragens que estão identificadas para conclusão ou início de obras desde o ano passado que iremos fazer no próximo quadro comunitário de apoio. Abrimos candidaturas e, portanto, o mérito de construir novos regadios vai surgir da análise dos próprios projectos e não apenas da decisão do Governo, que, sentado no Terreiro do Paço, olha para o mapa e decide que vai fazer uma barragem aqui e outra ali.
Iremos ver se há, em primeiro lugar, aquilo que é fundamental nas candidaturas, ou seja, uma associação de regantes, empresários agrícolas e agricultores que queiram a barragem, porque querem produzir. Aí é que vamos tomar uma decisão! E, nesse caso, tanto iremos para o Lis como para o Mondego, como para o Vouga, como voltaremos ao Alentejo — porque o Alentejo não é só o Alqueva nem Veiros —, ao centro e ao norte.
Tudo vai depender do mérito de cada uma das candidaturas.
Outra questão que me permito abordar com algum desenvolvimento é a das agro-ambientais, em que há poucas candidaturas, segundo uma das bancadas, ou em que o Ministério da Agricultura não dá prioridade às medidas agro-ambientais e prefere centrar-se na competitividade, conforme foi dito por outra bancada, a do Bloco de Esquerda.
Ora, permitam-me que seja muito claro: não se distribui riqueza que não se produz! Ninguém tenha essa ilusão! E as agro-ambientais, além do mais, não são uma distribuição de rendimentos! No âmbito do Eixo 3, segundo o qual diversificamos, apoiamos a pequena agricultura, apoiamos pequenas ou microempresas que valorizem os produtos agrícolas e duplicámos as verbas face do quadro anterior.
Mas o Eixo 3 não é o único, Sr.ª Deputada! Quem está no Eixo 3, os grupos LEADER, pode candidatar-se ao Eixo 1, porque, no Eixo 1, da competitividade, introduzimos a noção de fileira, ou seja, no Eixo 1, da competitividade, queremos produzir mais e melhor, queremos ter mais competitividade, numa lógica de fileira que inclui a transformação, a valorização dos produtos produzidos e a sua comercialização e promoção. E os que estão no Eixo 3, com quem até já tive ocasião de reunir, já foram desafiados a não ficarem acantonados, como no domínio do quadro anterior, com o seu Eixo, com as autarquias, com as associações, com as suas medidas, com alguma visibilidade mas sem impacto na criação de riqueza.
Levar os agricultores a passear é muito bonito mas, se calhar, não é o melhor; fazer alguns caminhos rurais é bom mas, se calhar, não é o ideal; proceder a alguma electrificação colectiva já é mais interessante; apoiar pequenas empresas familiares, para valorizar o pequeno produto, também é mais interessante.
Já agora, Sr. Deputado Hélder Amaral, o LEADER é fundamental para a valorização das pequenas produções. Quando falamos nos pequenos produtos, perguntamos: «Mas, afinal, o arroz de cabidela pode ser vendido ali ou um bocadinho mais ao lado?». Ora, o arroz de cabidela, sendo uma pequena produção, de um pequeno produtor de produtos tradicionais, pode ser vendido nos mercados locais, os quais podem ir a uma distância de quase 50 km. Não é necessário fazer legislação! Este pequeno produtor só tem de ir ao Ministério da Agricultura, fazer um registo e dizer assim: «Eu, Zç Manel»« ou «Eu, Sr.ª Maria não sei quantas, tenho uma pequena produção, tenho menos de 70 galinhas, que comercializo no meu local». Não precisa de dizer mais nada! Nem vamos pôr-lhe mais leis em cima! Que faça o seu arroz de cabidela e que o venda, fora da sua exploração! Se tivermos de detalhar isto tudo, temos de criar um exçrcito na ASAE,»
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Exército já há; é preciso é uma força de intervenção!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — » para ver se, afinal, está a 20 km ou a 30 km.
Mas – atenção! – não confunda isto com uma outra coisa: quando dizemos, e dissemos, às produções tradicionais que, consoante a dimensão da produção, têm de preencher os critérios de risco, o célebre modelo HACCP (Hazard Analysis Critical Control Points), essas, se já não são pequenas produções, se já não são apenas produções para o mercado local e regional e são, muitas vezes, produções para exportação, têm de pedir as derrogações como uma outra substância, porque temos de nos assegurar de que não vem, de
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repente, um importador de Espanha ou de França dizer que há ali um problema qualquer de salmonelas, já que é todo o sistema que é posto em causa. Aí, de facto, temos de ter uma outra exigência! Agora, como lhe expliquei, várias vezes, a sobrevivência desses pequenos produtos tradicionais, dos produtos DOP (Denominação de origem protegida) e IG (Indicação Geográfica) de pequena produção, é o mercado e a dimensão do mercado. Os grupos LEADER têm de ter sustentabilidade financeira para que esses produtos saiam do seu pequeno nicho de mercado de modo a terem outra visibilidade. É por aí que iremos ganhar os agricultores e defender as pequenas produções.
Ainda sobre as medidas agro-ambientais, decidimos reduzir o seu número. Porquê? Porque quisemos transmitir, claramente, a seguinte mensagem: há poucas medidas, das que eram aplicadas no quadro anterior, que protejam, verdadeiramente, o ambiente, que tenham, verdadeiramente, uma exigência adicional ou um custo adicional para o agricultor, mas têm repercussão no ambiente. E, por isso, dissemos que há duas que são emblemáticas: a agricultura biológica e a produção integrada. Relativamente a estas, ninguém tenha dúvidas: protegem os aquíferos e a biodiversidade. E estas, de facto, têm apoios adicionais importantes, porque o agricultor tem custos adicionais. Há ainda um terceiro elemento, que é o das raças autóctones, mediante a protecção do efectivo nacional, que é diferente e que, em muitos casos, está em risco de extinção.
Estas são as áreas em que é visível, incontestavelmente, que estamos a proteger o ambiente e a biodiversidade.
A agricultura biológica é o sector mais apoiado no PRODER, é um sector com apoios majorados no PRODER, é um sector prioritário, em termos de projectos de investimento, em termos de competitividade. É que, muitas vezes, olhamos para a agricultura biológica e pensamos que não precisa de competitividade, mas precisa! Precisa de concentrar a oferta, de ter capacidade de negociação com as cadeias de supermercados! Portanto, quando se candidata a agricultura biológica, ao nível dos Eixos 1 e 2, esta candidatura é prioritária, em face das restantes.
Já agora, a Sr.ª Deputada está convidada para, no próximo fim-de-semana, ir ao Terreiro do Paço, porque o Ministério da Agricultura apoia uma mostra de três dias, para promoção da agricultura biológica junto dos lisboetas, organizada pelas associações de agricultura biológica. Além do mais, vai reparar que se vai proceder à inauguração de um espaço magnífico, que é devolvido aos portugueses e aos lisboetas, que é a base de um torreão do Terreiro do Paço que nunca foi aberta ao público. E vamos abri-la, com o apoio do Ministério da Defesa, claramente, porque, sem eles, não poderíamos fazê-lo, justamente, com a agricultura biológica.
Como vê, Sr.ª Deputada, não precisa de um chat no Ministério da Agricultura para, digamos, mostrar a importância disto, pois tem um ministro que se envolve directamente nesta promoção. E, provavelmente, até vamos poder contar com a presença da Ministra da Agricultura espanhola, para ver que nós, em Portugal, estamos a um nível de agricultura biológica que já não nos envergonha e que já exporta, e bem. Alguns produtores mais profissionais exportam já hoje, e bem, para França, Alemanha e Holanda. Portanto, Sr.ª Deputada, pode contar com o Ministério da Agricultura na promoção da agricultura biológica.
Relativamente à pequena agricultura, o Sr. Deputado Agostinho Lopes continua a queixar-se de que, nestes anos todos, foi abandonada. Já referi, várias vezes, Sr. Deputado, que a pequena agricultura tem apoios diversificados e não apenas num dos eixos. A pequena agricultura viu aumentadas as ajudas ou as indemnizações compensatórias, em média, face ao quadro anterior, em 50%, embora, em alguns casos, ainda tenha sido mais. Neste quadro comunitário já pagámos 171 milhões de euros — isto foi directo para os pequenos agricultores! Depois, se for ao eixo LEADER, verificará que é claramente vocacionado para a pequena agricultura, pois impusemos uma regra neste novo quadro: que a representatividade das associações dos agricultores fosse maior do que no quadro anterior para que a tal valorização das microempresas fosse para os produtos agrícolas – valorização das pequenas produções – não para outros fins de valorização que não actividades ligadas directamente à agricultura. Portanto, não esquecemos a pequena agricultura.
Relativamente ao sector cooperativo, o Governo considerou-o, e considera-o, fundamental neste país. Já que mais não fosse, porque no sector vitivinícola o sector cooperativo ainda representa quase 40% da produção nacional comercializada.
O Governo deu duas mensagens ao sector, porque sabe que se este tem adegas cooperativas que são um exemplo de gestão até para os privados, exemplos de gestão financeira, de gestão na qualidade com
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enólogos dos melhores e com vinhos premiados (Monção, Pegões, Redondo, etc.), há, igualmente, muitas adegas que têm problemas financeiros, que pagam aos seus agricultores com prazos de quatro anos e que estão a caminhar para o abismo.
Por isso, definimos um conjunto de apoios majorados: redimensionamento das adegas; concentração das adegas; concentração da comercialização. Decidimos dar-lhe mais 10 pontos relativamente ao sector privado, com carácter temporário, porque o tempo não corre a nosso favor. Ou seja, as adegas que queiram dar um salto qualitativo, que queiram fundir-se, que queiram fazer a comercialização conjunta têm 50% a fundo perdido.
O Governo tem ouvido alguns ecos de que mesmo assim é capaz de não chegar, porque não há fundo de maneio em algumas delas, porque não têm capitais. E por que é que não incluímos outros sectores, inclusive o leiteiro, nas linhas de crédito anunciadas pelo Governo para as pequenas e médias empresas? Em primeiro lugar, como sabem, o sector agrícola, no quadro da legislação comunitária, tem regras específicas, ou seja, o sector agrícola, nas suas linhas de crédito, tem limites máximos de apoio.
Como alguns Deputados lembraram, neste momento, temos duas linhas de crédito no sector agrícola: uma para a pesca e outra para a pecuária, porque a pecuária intensiva sofreu o problema do aumento dos custos dos factores de produção como mais nenhum outro sector. Mas sabem que a pecuária e a pesca têm um limite de 7500 € por beneficiário.
Ora bem, neste momento, sabemos que apesar dos 50% poderá haver ainda a necessidade de fazer entrar aquele fundo de garantia que criámos, porque as instituições bancárias para darem crédito exigem garantias.
Criámos esse fundo e estamos a estudar a possibilidade de uma linha de crédito (mas não vai ser, porque o quadro do rigor orçamental ainda não acabou) e de ter aí uma ajuda adicional para quem seguir o caminho do tal sobressalto da fusão, do tal sobressalto de regular as contas, de equilibrar financeiramente as empresas e de pagar aos agricultores as colheitas no mesmo ano em que entregam as uvas. Não é para saneamentos financeiros, não é para ter mais um ano de folga para ver como vai ser o ano seguinte.
Este ano, há ainda um outro aviso que o mercado deu às nossas adegas: é que tivemos o sector privado a comprar as uvas directamente, a concorrer com as adegas. Mais uma razão para as nossas adegas e os nossos cooperantes pensarem que não podem adiar por mais tempo a solução, porque, se este ano tivemos os privados a comprar uvas, o certo é que, num ano de abundância, os privados têm as suas próprias uvas e, depois, ninguém compra as das adegas dos pequenos agricultores, e nós precisamos de ter lá as cooperativas e o sector cooperativo. Daí o nosso esforço adicional de estudar um complemento de ajuda suplementar.
Obviamente, não posso garantir aqui, hoje, em que termos é que será feito, porque não sabemos qual será a adesão do sector cooperativo.
No que respeita ao sector das pescas, o Sr. Secretário de Estado desenvolverá em pormenor algumas ideias relativas ao que já fizemos, embora eu já as tenha referido.
Permitam-me, ainda, falar sobre a reestruturação do Ministério.
Quando disse que a reestruturação estava concluída foi no seguinte sentido: já não há leis orgânicas que o Ministério tenha que aprovar. Estão, neste momento, em implementação os quadros de avaliação e de selecção no Instituto Nacional de Recursos Biológicos, no Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas e na Autoridade Florestal Nacional. Portanto, é a fase de execução e de conclusão pelo que não há, em termos de centralidade a nível do Ministério, novas leis orgânicas a fazer. Concluímo-las e o Instituto Nacional dos Recursos Biológicos vai ter a sua reestruturação, e vai tê-la com as linhas de orientação que indicámos desde o início.
A investigação no Ministério da Agricultura não é académica; é uma investigação para transmissão de conhecimentos; é uma investigação para preservação do património genético, para melhoria desse património genético; é uma investigação que vai privilegiar as parcerias e há financiamentos para essas parcerias, para essa investigação.
Vão ser salvaguardados os bancos. E que acabem de uma vez por todas esses rumores que andam por aí de que vamos meter a GNR, em Braga, no nosso Banco Português de Germoplasma Vegetal e de que este vai ser desmantelado. Não vai! Ele é demasiado precioso para algum dia passar pela cabeça de alguém que este Governo iria pôr em causa o nosso banco de germoplasma. Não vai! Que acabe esse rumor de vez! Tem excelentes técnicos, tem um excelente centro e é para ficar. E mais: é para aproveitar, pois os laboratórios que estavam nas direcções regionais irão reforçar o nosso Instituto Nacional de Recursos Biológicos.
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Agora, Srs. Deputados, permitam-me o desabafo: quando o Governo decidiu descentralizar; quando decidiu pôr no Vairão um centro de excelência veterinário num edifício que está feito (um edifício de luxo) praticamente vazio; quando o Governo decidiu pôr o centro da Estação Agronómica Nacional, em termos de investigação, em Elvas, porque lá temos edifícios, temos herdades e porque é lá que é o campo, não é em Oeiras; quando o Governo decidiu ir para a Olhão, porque temos lá um centro exemplar de investigação em offshore, exemplar até para outros centros de investigação na Europa, é evidente que sabia que teria obstáculos pela frente. Obstáculos dos funcionários, porque julgavam que lhes dávamos uma guia de marcha e os obrigávamos – aliás, não podemos obrigar ninguém, porque sempre dissemos que vamos respeitar a lei dos funcionários públicos e não vamos obrigar ninguém a ir de Oeiras para Elvas, mas vamos fazer novos recrutamentos e só nos organismos centralizados. É lá que se faz a investigação, é lá que se está próximo dos agricultores e dos pescadores, é lá que temos que fazer a transmissão de conhecimentos.
Há pouco, falei no PROLUNP e no nemátodo do pinheiro. Mas, Srs. Deputados, pela primeira vez, temos também um apoio à recuperação do montado de azinho e de sobro, com os mesmos apoios que o nemátodo do pinheiro, que podem ir a 100%. Vamos definir as zonas críticas, a Autoridade Nacional Florestal fixá-las-á, vamos pôr lá os investigadores e em alguns casos vamos dar apoio a 100%, pela primeira vez.
Se o Sr. Presidente permitir, talvez o Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas possa deixar ainda algum detalhe, porque foram colocadas muitas questões pelos Srs. Deputados e não queria deixar que algumas ficassem sem resposta.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas, tem a V. Ex.ª palavra.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas (Luís Vieira): — Sr. Presidente, em relação às questões formuladas pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes, gostaria de dizer que não partilho do seu ponto de vista quando fala no afundamento das pescas, pois os números não dizem isso. De acordo com os dados registados, as capturas de pescado no País, de 2006 para 2007, aumentaram 12,6%, sendo que só no primeiro semestre de 2008 já subiram mais de 23%, e, ao mesmo tempo, o valor da pesca descarregada, de 2006 para 2007, passou de 376 milhões de euros para 414 milhões de euros, isto é, mais de 10,6%.
Por outro lado, também não é certo que não haja resposta por parte dos armadores e dos pescadores em relação a este sector. O Programa Operacional Pesca 2007-2013 (PROMAR), que é para o desenvolvimento das pescas e que vigorará até 2013, neste momento está a funcionar em pleno. Temos intenções de investimento – candidaturas apresentadas – de 124 milhões de euros, o que mostra claramente que há uma resposta e uma dinâmica por parte dos armadores.
Mas não escamoteamos também que, por vezes, haja dificuldades, e este ano também as houve. Contudo, o Governo tem uma posição solidária para com o sector e por causa do aumento do preço dos combustíveis tomou um conjunto de medidas: definiu uma linha de crédito de 40 milhões de euros, da qual, neste momento, já estão autorizados 16 milhões de euros, continuando abertas as candidaturas até ao dia 15 de Dezembro; isentou os pescadores do pagamento da segurança social durante três meses, sendo que neste momento já pagámos 2 milhões de euros para a segurança social relativa aos pescadores; e ao mesmo tempo reduzimos as taxas do Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos (IPTM) e da Docapesca nalguns casos em mais de 50%.
Portanto, os compromissos que o Governo tinha com os pescadores e os armadores, fruto da situação difícil do aumento dos combustíveis, foram cumpridos integralmente. Neste momento, podemos dizer, efectivamente, que existe uma estabilidade no sector em relação às preocupações que existiam.
Isto é para dizer, efectivamente, Sr. Deputado, que não partilho a sua visão catastrofista no sentido do afundamento, porque essa é sempre a filosofia do Partido Comunista que no País nunca vê coisas positivas, nunca vê que o País anda para a frente, pois para ele o País anda sempre para trás.
Mas gostaria de referir que não é esse o entendimento nem do sector nem do Governo, porque este é um Governo determinado que conta com o empenhamento de todos para resolver os problemas do País. O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Responda às questões!
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O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — É isso que estamos a fazer e não posso partilhar de maneira nenhuma essa preocupação! Respondo, agora, à questão concreta que colocou em relação ao investimento, dizendo-lhe que no mapa que o Sr. Deputado tem é certo que, no que respeita à despesa pública em 2008, estão 81 milhões de euros e que, efectivamente, em 2009, estão 45 milhões de euros. É esse o valor que disse.
Mas esqueceu-se de ver que há uma alínea c) que refere que há 28 milhões de euros, em 2008, que estão incluídos nesses 81 milhões de euros, que resultam de fundos de investimento do Ministério da Economia para apoiar um determinado processo específico que não é da despesa pública do Ministério da Agricultura. Se retirar esses 28 milhões de euros, temos um valor afecto do Ministério da Agricultura de 52 milhões de euros.
Em 2009, temos um valor de 45 milhões de euros. Ora, como tenho também, em 2008, 10 milhões de euros do PROMAR que não gastei, faço uma transição de saldos de 10 milhões de euros de 2008 para 2009 e fico com uma verba de 55 milhões de euros. Se comparar os 55 milhões de euros de 2009 com os 53 milhões de euros de 2008, tenho ainda um aumento de 2 milhões de euros em 2009 que não tinha em 2008.
Estas são as contas sobre as quais queria informar o Sr. Deputado, dizendo-lhe que nesse mesmo mapa está a verba, em pé de página, desse montante, e só não está referida a transição de saldos de 10 milhões de euros para 2009. Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada Alda Macedo, do Bloco de Esquerda, gostaria de dizer que, em relação à preocupação demonstrada no apoio às zonas costeiras, pela primeira vez, este programa prevê um eixo distinto, que se chama desenvolvimento das zonas costeiras para apoio às comunidades piscatórias, para o qual temos uma verba de 25 milhões de euros que já está em aplicação neste momento.
Fundamentalmente, qual é o objectivo? É a criação de grupos costeiros de acção local. De norte a sul do País, vão constituir-se esses grupos costeiros de acção local nas comunidades piscatórias, com a participação das associações, dos empresários, das empresas, das instituições, no sentido de apresentarem projectos — nas suas vertentes ambiental, social e económica — que possam trazer complementaridade de rendimento aos pescadores destas zonas e, também, aumentar a coesão social dessas comunidades piscatórias.
Foi feito um caderno de encargos, que está publicado, e, neste momento, estão a concorrer aos vários grupos costeiros de acção local, período que encerra até ao final do mês de Dezembro. Findo este prazo, serão aprovados os grupos costeiros de acção local e, a partir daí, poderão apresentar candidaturas no âmbito das três vertentes que já referi (ambiental, social e económica), para permitir essa complementaridade de rendimento e trazer mais coesão a essas regiões.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Regional e das Pescas informou a Mesa de que ainda quer dar resposta a algumas questões que foram colocadas.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PCP quis dar o exemplo de Figueira de Castelo Rodrigo e eu gostaria de dizer o seguinte: em primeiro lugar, sou da região de Figueira de Castelo Rodrigo, mais concretamente de Almeida, e conheço bem a região, conheço bem o vinho de Figueira de Castelo Rodrigo — costumo dizer que o meu primeiro vinho branco é o de uma aldeia que faz parte do concelho de Castelo Rodrigo, Virmiosa. É um vinho excelente que aconselho a todos os portugueses! Portanto, conheço bem o problema de fundo que existe em Figueira de Castelo Rodrigo, que é a situação financeira da adega, e não a situação caricata que é descrita pelo Sr. Juiz Conselheiro na carta que aqui foi referida, tanto mais que Figueira de Castelo Rodrigo mantém um núcleo, uma zona agrária.
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
Sr. Deputado, oiça o que eu tenho para dizer! Figueira de Castelo Rodrigo tem uma zona agrária, só que há uma diferença de actuação, Sr. Deputado: antigamente, havia senhores que nem precisavam de deslocar-se à delegação porque alguém lhes tratava dos papéis; e agora, o que é que aconteceu? Agora, tivemos candidaturas para o programa VITIS, tivemos
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candidaturas para o arranque e tivemos muita adesão! Então, a zona agrária estabeleceu que haveria uma senha para os agricultores não estarem à espera e poderem lá ir durante vários dias.
O exercício concluiu-se, e bem. Felizmente, temos muitas candidaturas para a reconversão da vinha, não para o abandono, bem como para o arranque.
Já tive ocasião de explicar à própria adega de Figueira de Castelo Rodrigo, para que não houvesse equívocos, que a política do Governo é a produção, ou seja, a reconversão da vinha não é o arranque. E se há mais arranque naquela zona é porque, de facto, os agricultores entregam as uvas e só recebem o dinheiro passados dois, três anos!
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
Ora bem, a responsabilidade por os agricultores entregarem as uvas e só receberem o pagamento dois, três anos depois não pode ser assacada ao Ministério. Todos sabemos onde está o problema! Na sexta-feira da semana passada, em Pinhel, almoçando com os dirigentes da adega de Figueira, lanceilhes o repto. Eles estavam em negociações com um conjunto de adegas da Beira interior, para um plano que lhes permitisse darem um salto qualitativo, com uma outra gestão, uma outra dinâmica e, de repente, pararam! Este é que é o verdadeiro problema, não é o problema do Sr. Juiz Conselheiro, que ficou incomodado por ter de esperar!»
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
O verdadeiro problema, Sr. Deputado, é saber como vamos ajudar a adega de Figueira a seguir o exemplo da de Pinhel, que tem uma carteira de projectos de investimento para recuperar, pagar as uvas e apresentar vinhos de qualidade DOP (Denominação de Origem Protegida) — passar do granel para DOP ou para IGP (Indicação Geográfica Protegida). A adega do Fundão também está no mesmo processo e a adega de Figueira de Castelo Rodrigo não pode ficar para trás, porque o problema está aí! Se nós resolvermos esse problema, resolvemos todos os problemas.
Por último, o Sr. Deputado Carlos Poço colocou uma questão de fundo, porque estamos a falar do futuro da agricultura portuguesa e da agricultura europeia num quadro de crise financeira mundial, num quadro recente de uma crise de matérias-primas, com preços a subirem exponencialmente — bom para algumas produções e para alguns agricultores, mau para toda a fileira da produção intensiva. Estou a referir-me ao preço das matérias-primas de cereais e oleaginosas.
Qual é a resposta e como é que vemos o futuro, tanto mais que, na próxima semana, está em discussão, em Bruxelas, o famoso balanço ou exame de saúde da PAC — o chamado «health check» da PAC —, em que alguns Estados-membros, «alguma» Comissão Europeia entendem que, face à crise financeira, face à crise do mercado das matérias-primas, devemos, pura e simplesmente, acentuar a componente liberalização, liberalização e mais liberalização, ignorando que nem todo o mercado europeu é igual e nem todos os sectores estão preparados para essa liberalização como objectivo último.
Teria sido uma excelente oportunidade para a Comissão Europeia olhar para o que se passou no mercado das matérias-primas e tomar como orientação algo que é evidente para nós: todo o território da União Europeia tem de ter capacidades produtivas próprias. Não podemos, em nome do princípio de que a concorrência é dar resposta a tudo, acabar com a produção em regiões da Europa só porque não são competitivas, só porque têm uma estrutura fundiária de pequena propriedade.
A União Europeia não pode fechar os olhos a esta realidade, já o disse na discussão do «health check» da PAC O Governo português não aceitará que o que já ocorreu noutros sectores se faça no sector leiteiro nacional.
A União Europeia decidiu (o Conselho de Ministros, em 2003) liberalizar o sector leiteiro a partir de 2015.
Neste momento, não há uma maioria qualificada que obrigue a Comissão a rever esta posição, mas a liberalização total em 2015 significa, ou pode significar, se ficarmos parados, pôr em causa um dos sectores mais importantes da nossa estrutura produtiva, em valor, em emprego e em riqueza, nalgumas regiões.
A resposta do Governo é esta: nós temos de ter um plano de transição que prepare os agricultores do leite a enfrentar esse mercado liberal que outros, que não este Governo, decidiram que era o caminho certo.
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Quem fala no sector leiteiro fala em todos os outros sectores.
Não houve qualquer problema com o fim da produção da beterraba em Portugal, porque essa produção foi toda artificial, à custa de subsídios públicos: o agricultor que fazia beterraba hoje faz milho e ganha mais dinheiro; e a fábrica, apoiada com fundos públicos, não fechou e trabalha hoje com ramas e tem uma carteira de investimentos. Mas o mesmo já não se passa nos outros sectores produtivos, em que não há alternativa! A alternativa ao leite é o desemprego e a redução da riqueza nacional. Também no sector vitivinícola não há alternativa, nem no olival, nem na hortifruticultura.
Portanto, a estratégia global que a crise nos dá é a de constatar que, afinal, a agricultura é um sector importantíssimo.
As crises sanitárias, as crises fitossanitárias vêm dizer-nos que, afinal, em apenas dois anos, podemos passar de excedentes para défices. E têm de existir mecanismos de mercado que garantam que temos os instrumentos para épocas de crise. É por isso que não apoiamos o fim da intervenção, como a Comissão Europeia pretende.
Nós queremos que haja mecanismos de intervenção, stocks públicos que impeçam e nos preparem para crises de ausência de produção ou de quebras de produção. Temos de ter stocks públicos até para a ajuda alimentar ao terceiro mundo! Politicamente, a União Europeia não pode abdicar deste instrumento, uma vez que não houve ainda sucesso nos outros instrumentos de política — como, por exemplo, ajudar os países de África a desenvolverem capacidades produtivas próprias. E, enquanto tal não suceder, nós temos de ter ajuda alimentar.
Esta é a discussão de fundo.
Como verificaram, houve aumentos de preços, por exemplo, no trigo para pão: o trigo passou de 154 €/t para 300 €/t no ano passado e agora já baixou para 250 €/t. Mas isto não ç pretexto para alguns dizerem que os preços caíram. Não, não caíram!! Hoje, o preço das matérias-primas essenciais, mesmo do leite, é superior ao preço praticado antes do aumento artificial ou especulativo do ano passado — é ainda, em média, 22% superior! E o consumidor até se queixa.
É evidente que há uma outra coisa que tem de ser feita neste PRODER que é garantir que a produção se concentra, se organiza para que as mais-valias fiquem naquele que trabalha mais, que é o produtor. Também esta é a resposta à crise: dar ao agricultor meios para ele se organizar, para produzir mais, mas também para ter mais capacidade de negociação com as grandes cadeias de supermercados, de multinacionais, que são quem tem ficado com as mais-valias.
Um destes dias, Sr. Deputado, iremos discutir o azeite. Portugal está a dar um salto fenomenal no azeite, fruto de vários anos de políticas, não apenas deste Governo mas desde a Agenda 2000, quando o governo da altura negociou 30 000 ha suplementares de plantação.
Hoje, temos o mais moderno, temos investimentos em carteira que poderão fazer com que, a curto prazo, Portugal passe de uma auto-suficiência de 50% para 100%. Mas o desafio não está ganho, porque também há muita confusão no mercado sobre o azeite que estamos a consumir e há muita marca que está a iludir o consumidor, que consome pensando que está a consumir azeite português.
Temos de fazer um esforço enorme para explicar o que é uma DOP e uma IGP, e valorizar apenas esses! Porque azeite importado valoriza-se pelo preço da concorrência e aí, neste PRODER, também teremos de dar um outro salto e acabar com algumas ilusões que o mercado está a criar.
De facto, não podemos deixar que aconteça em Portugal o que aconteceu em Espanha, em que os azeites de maior qualidade espanhóis hoje são comercializados com marcas italianas. Não sei quem detém o capital dessas marcas, mas sei que está lá escrita uma palavra italiana! Ou seja, a mais-valia não está no produtor do olival em Espanha.
Ora, uma vez que estamos a dar um salto qualitativo enorme, também temos de entrar na promoção das DOP. O consumidor português, quando tem uma garrafinha no restaurante em frente, acha que está a consumir azeite português, mas não está! A probabilidade de o azeite ser português é inferior a 30%.
Também aqui iremos dar novidades brevemente, Srs. Deputados.
Portanto, o Sr. Deputado Carlos Poço colocou a questão de fundo, que é o futuro, e o futuro, como dizia um filósofo, é já hoje. No caso da agricultura portuguesa, é já na próxima semana, com a discussão do «health check» da PAC, em Bruxelas, que, por vontade da Presidência francesa, ficará já concluído. E nós estaremos atentos a isso.
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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, muito obrigado.
Recordo que foi John Kenneth Galbraith que uma vez disse que «o futuro começa hoje»... Era um economista famoso, salvo erro também guru do próprio Gordon Brown, e também filósofo.
Vamos entrar na segunda ronda de perguntas, para o que serão atribuídos 5 minutos a cada grupo parlamentar.
O Sr. Ministro, mais uma vez, responderá no final a todas as questões.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Poço.
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, começo por colocar uma questão prévia relativamente a uma questão, a que o Sr. Ministro respondeu, levantada pelo Partido Socialista durante cinco minutos e que se refere à barragem do Lapão, em Mortágua.
Chamo a atenção de que todos nós estamos aqui de boa-fé, queremos a verdade das questões e devemos ter respeito por elas. Ora, o Sr. Deputado quis deixar entender explicitamente que o governo do PSD, que esteve durante cerca de dois anos e meio, entre 2002 e 2004, à frente dos destinos de Portugal, pois as eleições foram em Fevereiro de 2005, que eu saiba, e o governo entrou em gestão a partir de Novembro de 2004»
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Esteve sempre!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Portanto, gostava de repor a verdade. A questão desta barragem foi, provavelmente — não tenho aqui os dados —, adjudicada pelo governo socialista do «pântano». Após a adjudicação, o governo do PSD esteve em funções durante dois anos e meio e o Governo do PS, de maioria absoluta, já está com esse problema há quatro anos. Era iminente que aquela barragem podia destruir Mortágua ou a baixa de Mortágua, mas este Governo teve de esperar quatro anos para ter este esclarecimento jurídico.
O Sr. Deputado Miguel Ginestal fez bem em levantar a questão, mas deve levantá-la com seriedade. Fale verdade e não deixe entender que a culpa é dos outros.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Os senhores fizeram zero!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — O Sr. Ministro tentou esclarecer que esperou quatro anos para encontrar a verdade jurídica. Esta foi a resposta que o Sr. Ministro tentou dar. Estamos à beira de eleições, que se realizarão no próximo ano, mas o Governo não esperou mais de um ano pela verdade jurídica e colocou isso no orçamento. Ficamos satisfeitos com esta decisão, pois é dinheiro de todos nós que vai ser dirigido para aquela barragem. Ficamos satisfeitos com a decisão, mas, Sr. Deputado, ponha as coisas com verdade.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Foi o que eu fiz!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — O PSD exige a verdade dos factos. Não faça chicana política, nem chame para aqui questões e não dê nomes a quem eles não lhe pertencem.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Os senhores fizeram zero! Meteram a questão na «gaveta»!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Foram quatro anos que este Governo não utilizou e o senhor preocupou-se com dois anos que o governo do PSD passou de repente pelo governo.
O Sr. Ministro utilizou parte do tempo que lhe concedi, mas apenas respondeu a 3 das 30 questões que lhe coloquei.
Eu terei o cuidado de lhe colocar as questões por escrito, para que, com calma, no seu gabinete, com os seus assessores e com o acréscimo de verbas de que o Gabinete dispõe, possa responder com mais calma e com verdade às questões que lhe vou colocar por escrito.
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A discussão com o responsável político da pasta da agricultura ao longo destes quatro anos revelou-se pouco interessante e intelectualmente frustrante. Não foi possível desenvolver discussões assentes em ideias para um modelo de desenvolvimento do sector agrícola, tendo muitas vezes ocorrido a distorção dos números e da realidade do sector agrícola português por parte do governante.
Em relação a esta questão, que é uma questão importante que o Sr. Ministro levantou, do «health check» que vai ser decidida para a semana, na questão de fundo nós estamos de acordo com o Governo, mas, provavelmente, não estaremos de acordo com a forma. Quando divergirmos, cá estaremos para mostrar a nossa divergência, mas em relação à questão de fundo estamos de acordo. E, quando estamos de acordo com as coisas, também dizemos que estamos de acordo.
A atitude arrogante indisfarçável e de mal-estar do político com todo o mundo rural inviabilizou as discussões das quais resultam soluções e convergências de opções que perduram por várias gerações.
Lamenta-se que, às questões e dúvidas de toda a oposição, o responsável do ministério responda sempre com desdém, próprio de alguém inseguro, que desconhece o sector e a sua vivência.
As opções políticas sobre as medidas agro-ambientais, sobre a electricidade «verde» e a definição de um novo quadro comunitário de apoio revelam insensibilidade agrícola e ambiental, desperdiçando-se a oportunidade de convergir em políticas acertadas para a especificidade da agricultura portuguesa.
Mas se o Ministério, por um lado, revelou insensibilidade agrícola, por outro, demonstrou também um profundo desconhecimento da história e do sentido que a agricultura desempenha em todas as sociedades modernas ou em vias de o ser.
A complexidade e a multifuncionalidade da agricultura obrigavam a políticas direccionadas para várias frentes, apoiando os novos investimentos, sem perder o rumo da agricultura familiar, que desempenha outras funções primordiais para a coesão e o equilíbrio do território nacional.
A adopção de uma política assente nas áreas onde residem as maiores vantagens comparativas poderia ser adequada, caso fosse suficientemente alargada a projectos de investimento sustentáveis.
A simples adopção de uma política e de um discurso assentes nos sectores competitivos peca pela falha de estratégia noutras áreas cuja importância económica, social e ambiental é inquestionável. Exemplo deste falhanço é o inexplicável atraso de quase três anos na implementação do PRODER.
Em suma: falharam as políticas que promovem uma alimentação equilibrada; falharam as políticas que incentivam o consumo regional, através de políticas coordenadas entre autarquias e Ministérios da Agricultura e do Ambiente; falharam as políticas de promoção dos produtos regionais e de qualidade aliados ao turismo e à cultura; falharam as políticas agrícolas aliadas ao meio ambiente; falharam as políticas que respondem aos novos e aos velhos desafios; falharam as políticas que promovem e incentivam os investimentos privados e a modernização das explorações agrícolas.
Principalmente, a política deste Ministério não acautelou medidas para incentivar o empreendedorismo rural, pois esta é uma das funções do Estado. Ao invés, verificou-se um aumento da burocracia e da dificuldade de os agricultores acederem ao Programa Comunitário de Apoio.
A política deste Ministério tentou destruir as associações e as organizações dos agricultores, através do sufoco financeiro. Não consegue ver que só com a colaboração e a participação activa das associações se poderá implementar uma política que aumente o rendimento dos agricultores e, simultaneamente, reduza os preços ao consumidor, que é a principal razão da política agrícola comum.
A política deste Ministçrio teve apenas um objectivo que foi destruir a agricultura portuguesa»
Vozes do PS: — Ehhh!»
O Sr. Carlos Poço (PSD): — » e não conseguiu ver que esta destruição arrasta a economia portuguesa.
Este foi o último orçamento desta Legislatura, que traz, simultaneamente, um sentimento de frustração, por ser mais uma oportunidade perdida, e um sentimento de esperança, por ser o último deste ministro e deste Governo.
É com mágoa e tristeza que assistimos a esta falta de estratégia para um País, que é de todos nós e que merecia muito melhor.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Carlos Poço.
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Fui condescendente consigo, Sr. Deputado, exactamente para o compensar dos três minutos que poupou na sua intervenção inicial.
Têm, agora, a palavra, por esta ordem, os Srs. Deputados Lúcio Ferreira e Horácio Antunes.
O Sr. Lúcio Ferreira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, tenho de começar a minha intervenção por referir que me espantou imenso o tom indignado com que o Sr. Deputado Carlos Poço se dirigiu ao meu colega de bancada Miguel Ginestal pela intervenção que fez aqui a propósito da barragem do Lapão.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — E com razão!
O Sr. Lúcio Ferreira (PS): — E também fico espantado por da bancada do PSD vir esta manifestação de indignação em relação a uma intervenção e, durante todo o tempo que teve para se pronunciar sobre o Orçamento do Estado relativamente ao Ministério da Agricultura, não vir uma palavra, uma observação, uma dúvida ou uma questão relativamente ao sector das pescas.
Que poderão esperar os portugueses de um partido, que é o maior partido da oposição, numa posição governativa, quando, na discussão do Orçamento do Estado para 2009, não tem quaisquer questões a colocar sobre as pescas?! Os pecadores que o estavam a ouvir, seguramente, saberão interpretar este silêncio.
Mas nós temos questões a colocar em relação ao Orçamento do Estado para o sector das pescas.
O Orçamento do Estado para 2009 contém um reforço de verbas para o sector das pescas. Isto é uma verdade indesmentível e é, necessariamente, a primeira evidência e uma boa notícia a retirar da sua análise.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Gostaria que me mostrasse esse aumento!
O Sr. Lúcio Ferreira (PS): — O Sr. Deputado Agostinho Lopes não conseguiu ver isto porque esteve mais atento a ler a carta do Sr. Juiz Jubilado e, por isso, falhou-lhe este pormenor.
Do PIDDAC/Pescas para 2009 emerge uma preocupação no reforço da competitividade e sustentabilidade do sector, colocando-se o enfoque no desenvolvimento da aquicultura, com uma dotação orçamental de 2,8 milhões de euros, e num melhor aproveitamento da possibilidade da pesca, e aqui encaixa uma dotação de 890 000 euros para a transformação e comercialização. Tudo isto está inserido no Programa Operacional Pesca (MARE).
Ora, ao colocar a tónica nestas vertentes, que têm vindo a ser, de resto, as duas metas defendidas pelo Governo para o sector, com um aumento de cerca de 52% na dotação orçamental em 2009, comparativamente a 2008, e, no que concerne ao Programa Operacional Pesca (MARE) para a aquicultura, com um reforço de 185%, isto faz pensar a produção aquícola como um sector estratégico em detrimento ou como componente alternativa à produção que era tradicional. Isto poderá ser uma preocupação para o sector pesqueiro tradicional, porque, ao colocar o enfoque na produção aquícola, parece que terá esquecido, em certa medida, o sector tradicional.
A preocupação do Governo na reestruturação da Docapesca, por outro lado, como uma medida essencial da competitividade e sustentabilidade do sector e da valorização e qualificação do pescado, elencando a qualidade e o valor acrescentado dos produtos de pesca como objectivos estratégicos, num quadro terrestre de gestão rigorosa dos recursos disponíveis, também são sinais que permitirão uma leitura mais animadora para o sector pesqueiro tradicional. Portanto, parece-me que esta vertente vem, em certa medida, dar resposta àquilo que poderia ser a preocupação da leitura de um reforço na aquicultura.
Porém, Sr. Ministro, as recentes notícias vindas de Bruxelas dão-nos conta de que há intenções da Comissão de propor uma redução de cerca de 40%, 10% e 15% nos totais admissíveis de captura de algumas espécies, nomeadamente na Madeira e nos Açores e mesmo do continente, e de 25% nas quotas de bacalhau.
Este é um quadro que nos parece preocupante para o sector, resultante da política comum de pescas.
Face àquela que será a preocupação do sector, eu gostaria de colocar ao Sr. Ministro as seguintes questões: vai a pesca tradicional ser, de algum modo, preterida em termos orçamentais, face ao reforço evidente de
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dotações para a aquicultura? Ou esta constitui uma medida necessária e indispensável como alternativa do abastecimento público, face às progressivas restrições às capturas que nos são impostas por Bruxelas? Uma outra questão que lhe quero colocar tem a ver com a preocupação da sustentabilidade da pesca costeira local, que é, sem dúvida, o sustento económico de muitas comunidades de norte a sul do continente e das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. O alvo das restrições de Bruxelas são as espécies de peixe que são, normalmente, objecto das capturas, o que faz pensar que é uma ameaça na redução das quotas, que será, seguramente, uma preocupação. Gostaria, por isso, de saber qual é a posição negocial do Governo português, face a estas condicionantes, e quais os apoios que estão previstos para o sector fazer face a este decréscimo. De resto, o Sr. Secretário de Estado já nos deu aqui alguma ajuda quando nos falou nos Grupos Costeiros de Acção Local, mas gostaria de ver este assunto mais aprofundado.
O Sr. Presidente: — O tempo já se esgotou mas, naturalmente, vou ser magnânime e vou conceder ao Sr. Deputado Horácio Antunes oportunidade para intervir durante 3 minutos.
O Sr. Horácio Antunes (PS): — Sr. Presidente, muito obrigado. Agradeço-lhe imenso essa benevolência, porque, de facto, o tempo é curto.
Quero passar das pescas para um outro sector extremamente importante do Ministério da Agricultura, a floresta, que ocupa 34% do território nacional e que vemos, neste Orçamento do Estado, com uma estratégia, com um programa e com um objectivo.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Onde?
O Sr. Horácio Antunes (PS): — Penso que, ao contrário do que se diz, o desenvolvimento sustentável da floresta está bem expresso neste Orçamento, onde se pretende a valorização e a expansão das superfícies florestais, a modernização das condições da colheita, transformação e comercialização dos produtos florestais e ainda a promoção, qualificação e certificação dos produtos florestais.
Para além de uma outra área extremamente importante, que é a da formação profissional, poderíamos ainda ver aqui o programa da protecção das florestas, o Programa LIFE, que contribui também para a execução e para a melhoria do treino e da prática da técnica do fogo controlado sem o ensaio teste; o Programa PROLUNP, que tem a ver com o problema do nemátodo do pinheiro, a erradicação e a monitorização da floresta nacional e a fiscalização e o controlo dos fluxos do material lenhoso; e o Plano Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, com o seu planeamento, projecto de educação e rede primária das faixas de gestão de combustível, portanto, o trabalho que tem sido feito, ao longo dos últimos anos, com este programa extremamente importante.
Também não devemos deixar de falar de um outro programa extremamente importante, o Programa de Desenvolvimento Rural-Continente (PRODER), que tem medidas muito importantes para a reflorestação, com programas que podem ir até 100%.
E é dentro desta panóplia de programas para a floresta que eu queria recolocar a questão dos incêndios florestais, que é uma das causas das ameaças à sustentabilidade da floresta e ao desenvolvimento do sector florestal.
Com a estratégia colocada pelo Governo após 2005, e que tem permitido obter resultados expressivos na diminuição da área ardida, o que incute confiança ao investimento no sector florestal, temos, relativamente ao ano de 2008, um registo de 14 410 ha de área ardida, que é a área mais pequena contabilizada depois de 1974. Podemos dizer que o caminho a percorrer quanto aos fogos florestais é ainda longo, mas há que salientar aqui a consolidação do Programa de Sapadores Florestais, com o reforço da capacidade da gestão dos combustíveis e com a técnica do fogo controlado.
E porque, efectivamente, o tempo urge, vou concluir finalizando com uma pergunta ao Sr. Ministro e que é esta: na perspectiva da sustentabilidade da floresta, quais foram as prioridades que o Ministério identificou nesta área, da prevenção estrutural, para a intervenção durante o ano de 2009? Reitero, Sr. Presidente, os meus agradecimentos por me ter permitido intervir.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, inicialmente, gostava de dizer que concordo consigo quando diz que é fundamental ajudar a agricultura e quando refere que as ajudas para o sector agrícola são diferentes e têm tectos no que se refere às PME, por exemplo. Mas julgo que o Sr. Ministro concordará comigo em que não é despiciendo perceber que é necessário injectar dinheiro no sector agrícola, e fazê-lo o mais depressa possível, da mesma maneira que o Ministério da Economia e da Inovação o faz em relação às empresas, com um conjunto vasto de linhas de crédito. Portanto, concordará comigo em que isso é fundamental.
E, por isso, a questão na discussão deste Orçamento, para mim, parece-me ser a da agilidade e da eficácia do próprio Ministério. Porque o que temos do passado, nomeadamente em vários programas, quer no PRODER quer nas ambientais, é sucessivos atrasos e uma ideia de ineficácia dos serviços do Ministério.
Se olharmos para o PIDDAC, que é praticamente o mesmo anos a fio, e verificarmos a sua eficácia ficamos com uma sensação aterradora: dos 650 milhões de euros apenas foram gastos 100 milhões de euros, isto para não falar que, em 2007, não foram pagas nem fiscalizadas medidas agro-ambientais. Portanto, há aqui um problema objectivo de desconfiança e de incerteza dos agricultores.
Gostava de juntar mais algumas perguntas curtas, por exemplo, sobre os apoios às organizações de produtores pecuários, as famosas OPP, em que faltam pagamentos da subvenção, conforme os protocolos assinados com a Direcção-Geral de Veterinária. A minha pergunta é esta: há cabimento orçamental? E, se há, quando serão pagas estas ajudas? Quero perguntar também se há ou não, dentro desta coerência do Ministério — uma coerência negativa —, atrasos na aprovação dos programas. Pergunto-lhe também se no caso da vacinação contra a doença da língua azul vão ser cumpridos os prazos. E, se não forem cumpridos os prazos, qual o risco do seu não cumprimento? Vão ou não acabar os financiamentos? Vamos ou não ultrapassar datas? Sr. Ministro, gostava também de colocar-lhe uma questão que não tinha aqui presente mas à qual fez uma referência na sua intervenção final — as raças autóctones. Aqui também temos um problema de competitividade, de protecção da biodiversidade e até de desertificação do interior.
Tenho a ideia de que o Ministério, durante muito tempo, deu mais apoios às raças exóticas do que propriamente às raças autóctones. Não falo daquelas que estão em via de extinção, falo daquelas, como algumas da Serra da Estrela, que precisam, de facto, de apoios claros e concretos para o melhoramento e a defesa da raça e até para uma recuperação das raças. Gostava de saber que apoios há em concreto nessa matéria para que os agricultores possam ter competitividade, porque aparecem outras raças que a podem prejudicar, sendo que o Sr. Ministro pôs uma ênfase muito grande na competitividade que queria que o sector tivesse.
Não queria deixar passar também, porque não ficou clara a resposta a uma pergunta colocada pelo Sr. Deputado do PS, a questão do nemátodo do pinheiro e sobre o PROLUNP.
Concordo em absoluto que temos de aproveitar, às vezes, as adversidades e o facto de termos uma oportunidade de fazer uma reflorestação correcta é uma oportunidade, mas ela surge num clima de grande desespero e de grande adversidade, que é o de uma doença, que afecta, em grande medida, a zona centro.
Não começa na zona centro, mas esta tem hoje um problema grave, havendo notícias de que há uma quebra de 50% na produção do pinheiro na zona centro. E há um outro problema que é a incapacidade, por força de um abate de grande escala, em dar resposta e saída a todos pinheiros.
O Sr. Deputado Miguel Ginestal falou aqui na necessidade das estufas — não estufas-frias mas, no caso, estufas quentes, estufas quentíssimas — e da dificuldade que vamos ter na erradicação da doença. E, portanto, concordo em que devemos ter uma atenção especial na reflorestação, um cuidado especial não só no pinheiro mas também no montado para avaliar e definir zonas de prioridade nos tratamentos fitossanitários.
Porque, Sr. Ministro, já levamos muitos anos de políticas erradas, de uma doença que começou numa zona do País e que afecta hoje todo o território, de graves prejuízos numa fileira, na fileira da madeira que tem um peso no PIB e uma importância para a economia portuguesa enorme.
Parece-me que o Sr. Ministro não deve olhar para este assunto com um olhar mais afável e mais simpático — para utilizar também palavras simpáticas. Acho que importava que o Sr. Ministro, junto dos seus parceiros europeus, tentasse que este fosse um problema urgente, de combate rápido e eficiente, para que o País não perca a posição que tem numa fileira importante como é a fileira da madeira.
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O Sr. Ministro diz que vamos ter apoios, que podem até chegar a 100%, que temos zonas de prioridade. O problema é que essa é uma conversa que sempre ouvimos mas, depois, na realidade, o que acontece é que fica tudo na mesma. Portanto, gostava que o Sr. Ministro fosse mais claro.
Outra pergunta rápida é sobre a electricidade verde. Foi aqui questionado sobre isto mas não respondeu.
Sr. Ministro, essa eficiência toda propalada no Ministério da Agricultura devia dar para uma coisa.
Sei que há abusos, é da natureza humana. A electricidade verde passa, às vezes, a «electricidade borla» — e a outras, eventualmente, embora eu prefira a cor verde. Mas os abusos têm apenas que ver com a capacidade de fiscalização, de controlo e de correcção desses abusos. Portanto, o que o Ministério da Agricultura deve fazer não é acabar com um instrumento de um factor de produção para os agricultores mas, sim, melhorar, eventualmente, a sua fiscalização.
Quero ainda dizer-lhe que fiquei curioso, com alguma «água na boca», para saber qual é o modelo que preconiza e quais os meios financeiros disponíveis para a recuperação das nossas adegas, que considero que são fundamentais para melhorarmos e para termos uma maior capacidade num produto de excelência, para mim dos melhores do mundo, que é o vinho português.
Mas também tenho uma pergunta a latere para colocar-lhe. O Governo avançou com uma acção executiva, uma penhora, sobre os vinhos da Casa do Douro. Espero que o Governo tenha a noção de que, num cenário de possível dificuldade,»
O Sr. Horácio Antunes (PS): — Tem, tem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — » a introdução desses vinhos no mercado pode vir a baixar o preço, pondo em dificuldade as adegas e, especialmente, os produtores que, de si mesmo, de uma região que me é cara, que é o Douro, estão cada vez mais abandonados.
Sr. Presidente, termino com uma pequena correcção, que reflecte o meu gosto pelos produtos tradicionais e que é uma questão muito breve. O Sr. Ministro voltou a repetir aquilo que nos tem dito sistematicamente.
Gostava só de ler-lhe uma portaria do Director-Geral de Veterinária, assinada por Carlos Agrela Pinheiro, que contraria aquilo que o Sr. Ministro diz, e peço a sua atenção para este caso.
O que diz no ponto 3.6 é o seguinte: «É expressamente proibida a comercialização ou a cedência das carnes obtidas nesta matança a terceiros que não participem no evento». Ou seja, aquela venda a 20 ou a 10 metros ou até a cedência gratuita está expressamente proibida.
Sr. Ministro, às vezes, é bom conversar com os vários serviços do Ministério da Agricultura e tentar concertar uma posição única para que os produtos tradicionais sejam competitivos, possam combater a globalização e ajudar muitas das economias locais.
O Sr. Presidente: — Para concluir esta segunda, e última, ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, não estamos propriamente preocupados com a situação do Sr. Juiz Conselheiro, mas gostaria que dissesse se é mentira a situação que ele descreve relativamente à delegação agrária de Pinhel, porque a mesma é um bom exemplo do resultado da reorganização dos serviços promovida pelo Sr. Ministro.
Gostaria de colocar-lhe mais algumas questões relativamente ao sector das pescas, que o Sr. Secretário de Estado pouco referiu.
Primeiro, o combustível. Sr. Secretário de Estado, concretamente em relação aos apoios aos barcos que ainda usam gasolina, que medidas estão em curso? Qual é o resultado dos acordos de Julho? O senhor falou do apoio, dos três meses de taxa social única. Sr. Secretário de Estado, isso já foi pago? Os do arrasto, pelos vistos, já receberam. Mas já foi paga à pesca de cerco essa ajuda? Já agora, por que é que ficou excluída desta ajuda a enorme maioria dos pescadores da pesca artesanal e costeira? Mais de 8000 barcos ficaram excluídos desta ajuda, por razões burocráticas, como o Governo sabe, e que, desde o início, eram conhecidas.
Gostaria de saber se avança ou não o velho projecto do novo navio de investigação.
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O Sr. Lúcio Ferreira (PS): — Está lá!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não! Está lá, certamente, é a continuação dos velhos, alguns remendos nos velhos.
Gostaria também, Sr. Secretário de Estado, de ter uma resposta relativamente à situação dos pescadores da ria de Aveiro e dos problemas que enfrentam. A questão da redução de quotas já foi colocada pelo Sr.
Secretário de Estado.
Para o mar, que apoios ou investimentos para este ano? O que está em cima da mesa, Sr. Secretário de Estado, é a redução. Mesmo a alínea c) o que diz, em relação ao Orçamento de 2008, é que se inclui este acréscimo de 28 milhões de euros. É no Orçamento de 2008, não é no de 2009. Aumenta a diferença! Mas, mais notável, é que este investimento de 28 milhões de euros agrava a distorção a favor da aquicultura! Isto é o apoio do projecto da aquicultura da Pescanova, em relação à qual, claramente, os senhores continuam a ter mãos largas enquanto que em relação à pesca costeira e artesanal não têm.
Mas o Sr. Secretário de Estado certamente vai dar-nos uma ajuda na compreensão desta questão.
Relativamente a outras matérias, o Sr. Ministro, que divagou em torno da carta do Sr. Dr. Juiz, disse pouco quanto à questão da taxa reduzida do IVA para um conjunto de produtos concorrentes com lacticínios nacionais. Mas eu insisto: qual é a opinião do Ministério da Agricultura sobre isto? Esteve ou não de acordo com a alteração que foi feita em 2008 e que, por aquilo que consta da proposta, vai permanecer em 2009? Relativamente ao investimento nas matas nacionais, pergunto: que verbas é que estão previstas para o investimento nas matas nacionais?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Tenha calma»!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Tenho calma? Quer dizer que certamente o Sr. Secretário de Estado me vai responder agora a esta matçria, pois não obtive resposta durante o anterior período de respostas» Quanto a atrasos no pagamento, neste momento, não há dívidas vencidas por pagar no Ministério da Agricultura? Seria bom, depois de três anos de dívidas permanentes, constantes, como foi sistematicamente dito, seria bom, dizia eu, que não houvesse. Por isso, eu gostaria que o Sr. Ministro me confirmasse se, de facto, o Ministério não tem neste momento dívidas vencidas por pagar, como têm outros Ministérios.
Relativamente às medidas agro-ambientais, o problema é o de que os senhores reduziram o leque de tal forma que criaram uma situação de profunda desigualdade com os agricultores de outros países. Por exemplo, a situação em Espanha não é a mesma. Há aqui uma desigualdade ou não há?! Os senhores eliminaram ajudas significativas para a pequena agricultura tradicional ao reduziram como reduziram o leque das agroambientais. E, já agora, Sr. Ministro, pode dizer-me, por exemplo, se aquele problema que o PRODER criou com a utilização das pastagens pobres vai ou não ser reformulado e considerado no cálculo das ajudas? Mas não foi só nas medidas agro-ambientais que os senhores eliminaram ajudas aos agricultores: os senhores deram alguma coisa e retiraram três vezes aquilo que deram a alguns deles, ao nível das indemnizações compensatórias — ao eliminarem todos aqueles que têm menos de 1 ha —, ao nível dos investimentos até 25 000 euros — que não têm apoios a fundo perdido, contrariamente à grande agricultura —, para não referir outros exemplos que não tenho agora tempo para enumerar, mas que o Sr. Ministro conhece.
Depois, o Sr. Ministro também não me respondeu a uma questão que torno a colocar-lhe de uma forma muito clara: modelação voluntária — vai ou não aplicar em 2008 e 2009? Quanto às linhas de crédito para as indústrias de lacticínios, tomo nota de que, segundo o Sr. Ministro da Agricultura, são as regras da União Europeia que proíbem o Estado português de abranger estas indústrias nas linhas de crédito avançadas pelo Ministério da Economia.
Uma outra questão tem a ver com o Banco Português de Germoplasma Vegetal, em Braga, que o Sr.
Ministro não vai desmantelar, porque se o fizesse isso seria certamente um crime, mas deu passos muito importantes nesse sentido. O Sr. Ministro, ao fazer o corte — e contrariamente até àquilo a que se tinha comprometido com os responsáveis do Banco — ao nível de pessoal essencial ao funcionamento daquele organismo deu um golpe de fundo no trabalho do Banco, como o Sr. Ministro, aliás, sabe e bem.
O Sr. Ministro falou muito aqui da importância do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária de Vairão e eu gostaria de saber se o biotério do Campus Agrário de Vairão, que está parado há não sei quantos
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anos, vai começar a funcionar ou se, já agora, primeiro vamos deixar funcionar o biotério da Fundação Champalimaud para depois não ser necessário pôr este a funcionar» Quanto ao PRODER, Sr. Ministro, gostaria de saber se vai ou não fazer a revisão global de todos os erros cometidos — e há bocado já referi um, o problema das pastagens pobres que não estão a ser consideradas pelos serviços do seu Ministério do ponto de vista das ajudas.
Sobre os jovens agricultores, o Sr. Ministro atrasou-se quase três anos na implementação do PRODER. O que lhe pergunto é se para os agricultores que fizeram mais de 40 anos entre Janeiro de 2007 e a data da nova regulamentação foi ou não encontrado um mecanismo que responda a um problema em que estes jovens não têm qualquer responsabilidade, pois a responsabilidade, Sr. Ministro, é, única e simplesmente, do Governo que se atrasou na implementação dessa regulamentação.
Quanto à questão dos vitelos nas zonas de exploração pecuária os senhores responderam-me que havia uma linha de crédito para apoio à pecuária intensiva para responder a este problema, só que, como os senhores sabem, não responde! Por isso, continuo a perguntar se, à semelhança de outros governos, inclusive de governos do PS, vão ou não intervir em relação a uma questão aguda nas bacias leiteiras do Minho e Beira Litoral.
Relativamente ao problema dos seguros agrícolas, Sr. Ministro, V. Ex.ª ao fim de quatro anos diz que valeu a pena esperar, que foi bom esperar. Mas foi bom esperar para quem, Sr. Ministro? Para as companhias de seguro que, ao longo destes quatros anos e com prejuízo do dinheiro dos contribuintes, meteram ao bolso 60 milhões de euros, Sr. Ministro? Sr. Ministro, se o seu Ministério, o Ministério da Agricultura portuguesa fizer um balanço a todos os prejuízos que os agricultores portugueses tiveram nestes quatro anos vai ver que comparando, esses prejuízos com o dinheiro que os senhores deram às seguradoras, somando-lhes os prémios que os agricultores deram às seguradoras, provavelmente o resultado é bastante favorável às seguradoras e não aos agricultores e também com enorme prejuízo para os contribuintes portugueses.
Sr. Presidente, se me permite, gostaria ainda de abordar duas questões muito rápidas, uma das quais tem a ver com o Centro Operacional do Regadio do Baixo Alentejo. O que é que o Sr. Ministro me tem a dizer sobre esse assunto? E sobre o cadastro florestal? Vai ou não avançar e, se sim, qual a verba que está prevista no Orçamento, no do Ministério da Agricultura ou no do Ministério do Ambiente?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Agostinho Lopes.
Para responder a este segundo conjunto de questões, concedo a palavra ao Sr. Ministro, que já me informou de que primeiro intervirão o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas e a seguir o Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas, e por último o Sr. Ministro.
Começamos então pelo Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas, Ascenso Simões.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas (Ascenso Simões): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Um cumprimento especial a todos os Srs. Deputados, a quem agradeço as questões que me foram colocadas a propósito do sector florestal, que representa 13% do PIB industrial e é um sector importante, onde neste momento estão a ser investidos mais de 1000 milhões de euros.
Gostaria de responder aos Srs. Deputados em duas notas muito rápidas, a primeira das quais tem a ver com a questão do nemátodo da madeira do pinheiro e para fazer um reparo à intervenção do Sr. Deputado Hélder Amaral.
Nós temos muitos problemas sanitários na floresta portuguesa» O nemátodo da madeira do pinheiro tem talvez um nome mediaticamente mais «interessante», mas efectivamente só 6% das árvores identificadas com declínio têm identificado o nemátodo da madeira do pinheiro e convém que isso se diga aqui, no Parlamento.
Não negamos que se trata de um problema grave que temos de atacar e estamos a atacar. E estamos a atacar numa perspectiva de conhecer melhor quer o insecto vector quer a doença e por isso mesmo acertámos já com todas as instituições de investigação o desenvolvimento de um programa que nos permita intervir de forma a controlar a doença e o seu insecto-vector, estamos a intervir também no âmbito da delimitação das áreas afectadas — o Sr. Deputado compreenderá que nós tenhamos de fazer um
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reconhecimento do País tendo em conta o Inventário Florestal» E já agora dou-lhe um dado: nos anos 2002, 2003 e 2004 o número de amostras feitas no âmbito da prospecção do nemátodo da madeira do pinheiro nunca ultrapassou as 300. A partir daí, progressivamente, nós chegamos a este ano com cerca de 4000 amostras feitas e foi esse intenso trabalho desenvolvido pelas organizações de produtores florestais em conjunto com a Autoridade Florestal Nacional, a Universidade de Évora e o Instituto Nacional de Recursos Biológicos que nos permitiu ter um conhecimento mais real, concreto e nos vai permitir uma intervenção neste período em que se deve atacar verdadeiramente a doença (quando o insecto-vector está controlado e nós podemos ir ao fundo da questão) começarmos a fazer os abates e o controlo respectivo.
Compreendo bem que o Sr. Deputado passe no IP3, olhe para os seus lados e veja algumas árvores em declínio, mas também lhe quero dizer, Sr. Deputado, que nós já iniciámos o processo de identificação das áreas. Com certeza que nos jornais regionais do seu distrito eleitoral já viu os editais que determinam as formas de intervenção e com certeza também sabe que os serviços da Autoridade Florestal Nacional em conjunto e em parceria com as organizações de produtores florestais irão iniciar o abate a partir do final deste mês de Novembro, que é o tempo necessário, adequado para até Março podermos fazer o respectivo controlo.
Também gostava de dizer-lhe, Sr. Deputado, que a questão do nemátodo da madeira do pinheiro é uma questão que merece uma atenção relativamente àquilo que foi feito durante um determinado tempo. Se reparar, o Sr. Deputado falou no PROLUNP, que é o Programa Nacional de Luta Contra o Nemátodo do Pinheiro, que foi iniciado em 1999, por um governo do PS, teve o seu desenvolvimento em 2000, 2001 e numa parte de 2002, e a partir de 2002 esse PROLUNP que tinha um grupo de acompanhamento chamado GANP (Grupo de Acompanhamento do Nemátodo do Pinheiro), pura e simplesmente, desapareceu. No governo que o seu partido apoiava, ninguém mais se lembrou do nemátodo, do PROLUNP ou do GANP! Pura e simplesmente, cortaram!! Portanto, convém que tenhamos memória quando agora falamos nas questões relacionadas com o nemátodo da madeira do pinheiro, que é importante, relevante e que estamos a acompanhar.
Gostava ainda de dizer-lhe, Sr. Deputado, que até ao final do ano vamos investir cerca de 5 milhões de euros no início dos abates e sabemos da sua preocupação, ou seja, os abates têm de ser acompanhados de uma colocação adequada no mercado dos produtos resultantes desses mesmos abates. Foi por isso também que criámos o Conselho Consultivo para a Fitossanidade Florestal, onde estão representados o Centro Pinus e a AIMMP com que fizemos um protocolo que nos permite conhecer as necessidades em madeira do pinheiro no âmbito do controlo e erradicação da doença, mas também numa perspectiva de sabermos quais são, nos próximos 20 anos, as necessidades de madeira de pinheiro para a indústria portuguesa e assim conseguirmos compatibilizar a produção com a transformação e podermos ter nessa sub-fileira do sector florestal maior competitividade.
A segunda questão muito importante tem a ver com os investimentos — e respondendo também à pergunta formulada pelo Sr. Deputado Agostinho Lopes, que não falou na «palavra mágica«, mas eu vou falar» Nós vamos fazer as concessões quer o Sr. Deputado Agostinho Lopes queira quer não queira»
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vão privatizar!
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas: — Não, não vamos privatizar, Sr. Deputado! O Sr. Deputado acha que privatizar é igual a concessionar, mas a única coisa que o Sr. Deputado quer é que nada se faça, mas nós vamos fazer!! E já agora também lhe vou dizer o seguinte: no próximo ano, vamos investir 13 milhões de euros nas matas públicas! E vamos saber quanto é que as matas públicas rendem e quanto é que as matas públicas nos dão de despesa, porque até agora as matas públicas e os perímetros florestais, os cerca de 600 mil hectares de áreas geridas pelo Estado, pura e simplesmente, ninguém sabia quanto se gastava nem qual era o resultado da sua exploração. E «isso é que dói»!... Porque agora vamos passar a saber quanto é que recebemos e quanto é que gastamos em cada sítio, porque é assim que se faz uma boa exploração florestal, é assim que podemos trabalhar bem com os conselhos directivos de baldios, é assim que nós vamos, com certeza, resolver o problema! Por fim, Sr. Deputado, nos próximos dois anos, nós vamos investir 133 milhões de euros de fundos públicos, a que se somarão 86 milhões de fundos privados e mais 31 milhões do Fundo Florestal Permanente, para fazermos na gestão e na defesa de uma verdadeira política de prevenção estrutural.
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Muito obrigado e peço desculpa por me ter alongado um pouco mais.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Concedo agora a palavra ao Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu gostaria de completar as minhas informações, uma vez que o Sr. Deputado Agostinho Lopes não percebeu ou não quis perceber.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Diga lá, então»!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Eu disse, em relação ao Orçamento para 2009, que as verbas que estão alocadas a 2009 são de 45 milhões de euros, tal como está definido no quadro que o Sr. Deputado tem, e que faltam mais 10 milhões de euros que são os saldos transitados de 2008 do Programa Operacional Pesca (PROMAR), o que perfaz um total de 55 milhões de euros. Mas como só posso transitar as verbas»
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mas isso não está aqui! Podiam ter posto aqui!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Estou a explicar-lhe que, como a transição do saldo só se pode fazer no final do ano, é a partir daí que podemos contar com essa verba de 10 milhões de euros. Assim, temos 45 milhões de euros mais 10 milhões de euros, o que perfaz 55 milhões de euros.
Em 2008, tínhamos 81 milhões de euros e, se retirar os 28,9 milhões de euros que estão na nota de pé de página e que foram investimentos de outros ministérios, estou a comparar 53 milhões de euros com 55 milhões de euros. Portanto, Sr. Deputado, temos mais 2 milhões de euros em 2009. São contas, Sr. Deputado! Quanto à questão que colocou em relação às medidas que o Governo tomou por força do aumento dos combustíveis, já disse ao Sr. Deputado que o Governo cumpriu integralmente o acordo que estabeleceu com os armadores e com os pescadores em relação a essa situação.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Ficaram 8 000 barcos fora dos apoios!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Cumprimos integralmente! Criámos uma linha de crédito de 40 milhões de euros com bonificação a 100%. Neste momento, já temos 16 milhões de euros de candidaturas apresentadas pelos Srs. Armadores e as candidaturas estão abertas até 15 de Dezembro. Dissemos que íamos pagar e estamos a pagar as contribuições para a segurança social durante três meses. Neste momento, pagámos 2 milhões de euros.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Ainda não receberam!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Inclusive para armadores do cerco. Aliás, tenho aqui uma carta de agrupamentos de produtores a dizer que estão perfeitamente satisfeitos com a atitude do Governo em relação aos pagamentos atempados que fez. No entanto, vou dizer-lhe o seguinte: nós não gastamos o dinheiro, aplicamo-lo dentro de regras. Para as pessoas beneficiarem do apoio à isenção de segurança social têm de se candidatar e de ter descontado anteriormente para a segurança social.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — A pesca artesanal ficou de fora!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Portanto, nós só pagamos a pescadores e a armadores que também contribuírem e pagarem a segurança social. Isto é, devolvemos
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durante três meses aquilo que eles pagaram. E a todos aqueles que apresentaram as candidaturas e que pagaram a segurança social anteriormente ser-lhes-á devolvido o correspondente aos três meses.
Foi isso que, efectivamente, fizemos e estamos a fazer! Portanto, não há, da parte do Ministério, qualquer impedimento em relação a essa matéria.
Quanto à questão da gasolina, também foi um compromisso deste Governo assumido com os armadores e os pescadores, isto é, com a comissão negociadora, que iríamos reduzir a taxa paga à Docapesca para metade e já o fizemos para as embarcações a gasolina. Foi reduzida para metade, logo nessa altura, a taxa paga à Docapesca. Era esse compromisso que tínhamos em relação à comissão negociadora e, ao mesmo tempo, em relação aos pescadores.
Portanto, da nossa parte, as medidas que foram tomadas estão assumidas e aplicadas, nomeadamente em relação às taxas pagas ao IPTM (Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos) que sofreram uma redução de 50%.
Por outro lado, o Sr. Deputado Agostinho Lopes colocou outra questão sobre a Ria de Aveiro, mas por vezes — aliás, é a postura do Partido Comunista — não analisa bem as questões, não estuda bem as situações. É mais fácil ser «cata-vento» de reivindicações do que analisar as coisas como elas são. Em relação à Ria de Aveiro, tivemos o cuidado de que o Sr. Director-Geral das Pescas estivesse presente numa reunião em Aveiro para explicar aos pescadores da apanha de bivalves a situação que se estava a verificar. E o que se verificou foi que havia toxinas. O Instituto das Pescas da Investigação e do Mar (IPIMAR), que faz análises periódicas, disse claramente que, quando há problemas que põem em causa a saúde pública, é fechada a pesca. E, porque está em causa a saúde pública, não podemos pactuar com esta situação! Não podemos colocar no mercado um produto que não está em condições!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Têm de ter em conta a situação dos pescadores!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas: — Calma, Sr. Deputado! O Governo tem uma posição solidária com os pescadores e já há muito tempo criou o Fundo de Compensação Salarial que apoia os pescadores, durante 60 dias, quando não podem pescar. Essa compensação, que é paga durante o período de 60 dias, corresponde ao salário mínimo nacional. Há, portanto, uma postura solidária do Governo que sempre a demonstrou em relação a estas situações. Compete, no entanto, aos senhores pescadores apresentarem também as suas candidaturas para poderem beneficiar do Fundo de Compensação Salarial. Aliás, em anos anteriores também já o fizeram. O Governo não pretende estar fora desta situação, mas fazer o acompanhamento da mesma. Porém, não podemos colocar um produto no mercado que não está em condições, porque, em primeiro lugar, está a saúde pública dos portugueses.
Quanto à questão que foi colocada pelo Sr. Deputado do Partido Socialista em relação aos apoios à pesca tradicional, já foquei há pouco que os apoios estão definidos nos Grupos Costeiros de Acção Local e, como se pode ver no quadro, são de 25 milhões de euros. Já estão espelhados nos convites que foram feitos para as candidaturas até Dezembro, mas também podem ir procurar apoios em todos os eixos do PROMAR, desde a modernização das embarcações à variação do produto do pescado, ou seja, há um conjunto de medidas e acções previstas no programa operacional. Certamente, irão fazê-lo, como mostram as intenções de investimento, pois já temos 124 milhões de euros apresentados até ao momento.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Para concluir, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente, telegraficamente, gostaria de referir alguns pontos.
Em primeiro lugar, no que se refere às pescas, cada vez que a Comissão Europeia faz propostas de redução de cotas, corre toda a gente para a imprensa a pedir responsabilidades ao Governo. É boa altura de se perceber, ao fim de tantos anos de adesão, que têm é de «correr» para Bruxelas. Eu gosto de ser chamado aqui, ao Parlamento, e virei sempre com muito boa vontade, mas quem fez a proposta de reduzir a pesca do carapau em 40% foi Bruxelas. Convidem a Comissão de Bruxelas a vir aqui explicar em que parecer científico se baseou para propor uma redução de 40% para a pesca do carapau, em Portugal»!
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Portanto, este equívoco tem de ser, de uma vez por todas, esclarecido.
No ano passado houve, o mesmo equívoco. Vieram as propostas de cotas e «aqui d’el rei« que o sector iria acabar. Resultado da negociação: mantivemos o esforço de pesca, mantivemos as cotas, tendo, nalguns casos, aumentado. Qual o resultado da fauna deste ano? Muito simples: capturou-se mais 19%, gastou-se menos 28 milhões de euros na importação e mais 45 milhões de euros na exportação.
Deixemos de ser catastrofistas e passemos a olhar para as propostas da Comissão de uma outra maneira.
A sustentabilidade de recursos marítimos é também política do Governo, mas a política do Governo baseiase nos pareceres científicos dos nossos cientistas e na opinião do nosso sector das pescas, que é quem anda no mar e sabe se há mais ou menos peixe. Com base nesses dois apoios é que o Governo vai negociar as cotas. E vamos negociá-las com a mesma vontade de defender os interesses portugueses que tivemos no ano passado: sustentabilidade dos recursos marítimos, defesa do sector nacional das pescas.
Telegraficamente, quanto ao nemátodo do pinheiro, como sabem, o Governo adoptou medidas rígidas na salvaguarda do interesse de toda a indústria que anda à volta da indústria da madeira. Nomeadamente, fomos nós que introduzimos a certificação obrigatória quando exportamos. Temos de fazer um desabafo e um aviso claros: houve três empresas que certificaram lotes de madeira que foi exportada contaminada e fomos notificados pela Finlândia, pela Suécia e pela Espanha de que produtos que exportámos iam em paletes contaminadas. Isto significa que, um destes dias, serão impostas medidas mais drásticas ou pelo Governo ou pela própria União Europeia. Convém frisar que, das 120 serrações, apenas 20 exportam 80% do total e que a exportação de madeira bruta não é o essencial das nossas exportações de produtos da madeira, mas 3%, o que é pouco. No entanto, mesmo sendo pouco, temos de ser sérios nas regras, senão, um destes dias, fechamos a fronteira durante uns meses. O Sr. Secretário de Estado não o disse, mas vamos pôr dois inspectores em cada uma das serrações para termos a certeza de que não volta a haver prevaricadores, porque o interesse que está em causa é muito maior do que o dessas três serrações. E aí temos de ser duros! Ainda telegraficamente, vou responder ao Sr. Deputado Agostinho Lopes no que se refere à modulação. Na agricultura, Portugal pode aplicar a modulação voluntária, tem essa margem de manobra. Só que agora o regime de pagamento único (RPU) já não se refere só aos cereais, mas também ao sector leiteiro e a todos os sectores. Não somos insensíveis a duas coisas: à quebra de preços na produção do leite este ano e à descida dos preços dos cereais, que ainda não é dramática, mas que se tratou de uma descida. E outra coisa: na próxima semana, vamos decidir novos níveis de modulação. Portanto, face, sobretudo, à quebra de preços na produção do leite, decidimos adiar por um ano a modulação e dissemos isso numa reunião do sector leiteiro com a Associação Entre Douro e Minho. Entretanto, evidentemente que somos favoráveis a um ligeiro aumento da modulação obrigatória e é isso que vamos defender na próxima semana.
Quanto à electricidade «verde», telegraficamente, ela acabou. Beneficiava uma minoria de agricultores e o Governo não poupou nada com isso. Canalizámos o dinheiro da electricidade em investimento. E, além do mais, Srs. Deputados, convém lembrar que, de vez em quando, há umas surpresas. O dinheiro do orçamento foi canalizado para investimento, nada poupámos com a electricidade «verde» e agora apareceu-nos uma conta para pagar dos nitrofuranos. Portanto, de vez em quando, quando achamos que equilibrámos as contas todas, aparece-nos uma factura de gestões que não quero qualificar, mas são facturas que comprometem o Estado seja qual for o governo. Tivemos, agora, uma conta que já passa de um milhão de euros e sabemos que vai subir a vários milhões de euros. Por isso, Sr. Deputado, convém perceber que não temos «saco azul» no Ministério.
Finalmente, tomei boa nota de quando o Sr. Deputado Carlos Poço disse que o PSD partilha da estratégia para o «health check». Isso só nos pode regozijar, porque temos um larga maioria nesta Casa que percebe o que está em jogo em Bruxelas na próxima semana, que está de acordo sobre essa mesma estratégia e, desse ponto de vista, é bom para a agricultura portuguesa que haja um grande consenso político em Bruxelas sobre esta matéria.
Mas o Sr. Deputado também disse que este Programa de Desenvolvimento Rural era uma oportunidade política perdida e que, afinal, nada de novo tinha introduzido na agricultura. Aqui, tenho de ser muito duro: a oportunidade perdida foram três quadros comunitários de apoio com uma média de 3 mil milhões de euros de dinheiro público dos contribuintes portugueses e europeus que demos à agricultura portuguesa, e o produto agrícola português em termos reais não subiu. E isso levou-nos a um sobressalto, levou-nos a mudar o paradigma da política agrícola neste país. Mais importante do que distribuir dinheiro, seria muito bom para as
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eleições e podíamos fazê-lo. Nós, este ano, podíamos dizer: «Vamos mudar o PRODER! Vamos pôr tudo em indemnizações compensatórias e agro-ambientais para ganhar as eleições!» Mas, Srs. Deputados, o resultado seria menos produção agrícola, menos emprego e, a prazo, um país completamente dependente da importação. Este PRODER é uma mudança de paradigma que dá resultados a prazo, mas vai dá-los! Nesta Legislatura, vai dar ainda em algumas produções. Para o ano, iremos falar do produto agrícola. Mas vai dar seguramente, porque um pomar planta-se hoje e colhe-se em quatro anos; um olival planta-se hoje e colhe-se em quatro anos. Vai dar seguramente um aumento da produção real da agricultura portuguesa.
A oportunidade perdida seria mais do mesmo. Aí, Sr. Deputado, temos de ser muito claros: tínhamos de mudar.
E depois há a questão da coesão territorial. Hoje, o Ministério distribuiu, aqui, um gráfico para verem onde entraram os projectos de investimento no PRODER, para saberem quanto entra por cada região (norte, centro, Ribatejo litoral, Alentejo, Algarve). E podem verificar que há 225 milhões de euros em concorrência, em arbitragem para que chegue a todas as zonas do País. Aqui também tínhamos de dar um salto qualitativo.
Não é preciso lembrar onde se concentravam os apoios nos quadros anteriores (em regiões e em agricultores). Ora, aqui claramente o Governo mudou também o paradigma e tornou-o transparente, para esta Assembleia nos julgar, para os agricultores portugueses saberem para onde vai o dinheiro. E não me venham falar na burocracia que está a atrasar os pagamentos. Não há pagamentos em atraso nem se pretende, como alguns Deputados disseram, tentar aniquilar as confederações! Elas assinaram protocolos com o Ministério da Agricultura, com o IFAP (Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P.) para apoiarem aos agricultores e nós pagamos por isso.
O que queremos é confederações fortes, mas com uma gestão rigorosa dos dinheiros públicos. É porque o que está em causa não é o dinheiro do Ministério da Agricultura, mas dos próprios agricultores. Ora, também as confederações, como o Ministério da Agricultura, não podem gastar mais na máquina do que no apoio efectivo aos agricultores.
Aqui também houve uma mudança através da gestão rigorosa dentro e fora do Ministério, porque quem paga são os mesmos: os contribuintes, os portugueses! Aqui tivemos de mudar. Mudámos! As confederações são importantes, têm apoios e vão continuar a ter apoios para fazerem este papel.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que abordámos os princípios orientadores do orçamento para o próximo ano. Apesar da crise, apesar da gestão rigorosa do orçamento convém pô-los em evidência. É o segundo PIDDAC do Orçamento. Isso revela a importância que o Governo dá à agricultura portuguesa e às pescas.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de obter esclarecimentos relativamente à política fiscal e às suas aplicações no sector agrícola.
Será que a mesa poderia sugerir ao Sr. Ministro que nos fizesse chegar pelo menos a justificação do Ministério da Agricultura relativamente às opções de política fiscal em matéria agrícola?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Agostinho Lopes O Sr. Ministro já me deu nota de que poderá responder por escrito. De qualquer forma, se houver interesse da parte do Sr. Deputado, o Sr. Ministro poderá dar uma resposta breve no imediato. Como parece ser isso que o Sr. Deputado pretende, concedo a palavra ao Sr. Ministro, que dispõe de 2 minutos para responder.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Muito obrigado, Sr.
Presidente.
De facto, não respondi a duas questões: seja a da política fiscal seja a do escoamento do vinho do Douro.
Sr. Deputado, como se sabe, a fiscalidade para a agricultura é a mais baixa de todos os sectores de actividade. É essa a política do Governo. É pôr todo o sector agrícola e a comercialização dos produtos agrícolas com taxas mais baixas.
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Aquilo não são produtos agrícolas!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Ó Sr. Deputado, são produtos que também queremos vir a produzir neste País.
É uma resposta telegráfica, mas responder-lhe-ei também por escrito.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não responde à questão!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — No que se refere à penhora da Casa do Douro, Sr. Deputado Hélder Amaral, efectivamente há milhões de euros de dívidas, há muito dinheiro do Estado que está imobilizado e chegou a altura de executarmos essas penhoras. Está escrito no Orçamento, está lá identificado.
Depois de executada a penhora, a responsabilidade da gestão da comercialização destes vinhos vai ter um princípio, ou seja, esses vinhos não podem perturbar o escoamento normal da produção do Douro anual. Não podem nem vão perturbar! Ora, de certa forma, isso também determina a valorização dos vinhos, porque esses vinhos podiam ter sido vendidos progressivamente e as dívidas pagas. O Estado só intervém porque um destes dias nem os vinhos valem nem temos onde cobrar as dívidas. E são muitos milhões de euros! Esta penhora destina-se a uma gestão directa do vinho que está sob hipoteca e é para uma gestão que salvaguarde os interesses dos produtores do vinho e do comércio do Douro.
Sr. Deputado, pode estar descansado porque iremos assim gerir e tentar recuperar algumas das dívidas sem pôr em causa o rendimento dos produtores, o comércio e os preços no Douro.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
No final deste debate, creio que é uma realidade incontornável com que nos confrontamos. Já tivemos seguramente diversos olhares e diversas perspectivas e pontos de vista sobre as políticas na área da agricultura, das florestas e das pescas, o que é natural num «espectro parlamentar» tão diversificado.
Mas há seguramente algo que nos une a todos: é que todos desejamos que estas verbas, que estão alocadas no Orçamento do Estado para 2009 para estas áreas, constituam efectivamente um estímulo prestimoso à modernidade e ao progresso da agricultura, das florestas e das pescas em Portugal.
Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, muito obrigado.
Srs. Deputados, vamos interromper os trabalhos.
Eram 13 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Srs. Deputados, vamos reiniciar a nossa reunião.
Começo por agradecer a presença do Sr. Ministro da Justiça e dos Srs. Secretários de Estados. Agradeço também a presença do Sr. Presidente da 1.ª Comissão, ou seja, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Hoje, o debate é sobre o orçamento para a área da Justiça. Assim, começo por elencar, em traços muitos gerais, brevitatis causa, aqueles que são os aspectos essenciais do orçamento para a Justiça para 2009 respaldados no orçamento que foi patente e apresentado à Comissão de Orçamento e Finanças oriundo da 1.ª Comissão.
Esse orçamento releva, inter alia, que o Governo, em termos de acções prioritárias, para 2009, visa três eixos fundamentais: promover a desburocratização, a desjudicialização e a resolução alternativa de litígios;
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impulsionar a inovação tecnológica na Justiça e a qualificação da resposta judicial; promover o combate ao crime e justiça penal com o reforço da cooperação internacional.
Nesse sentido, o Orçamento do Estado para 2009 para a área da Justiça contempla uma verba em termos de despesa consolidada que ascende a 2249,1 milhões de euros, o que corresponde a 2,8% da despesa total da administração e 1,3% do PIB.
Para termos uma ideia comparativa daquilo que é o Orçamento do Estado para o Ministério da Justiça, importa referir que o orçamento mais avultado em termos sectoriais é o do Ministério da Saúde e esse representa cerca de 8500 milhões de euros, qualquer coisa como 11% da despesa da administração central do Estado e 5,1% do PIB. O orçamento mais avultado é o do Ministério da Saúde a par com o do Ministério da Educação, apesar de este ser ligeiramente mais baixo.
É ainda importante elencar em termos orçamentais — estamos na Comissão de Orçamento e Finanças a discutir o Orçamento do Estado, é bom não esquecer esse detalhe e, como dizia Mies van der Rohe, «Dieu est dans les détails» — que a despesa total considerada apresentou um crescimento de 60,5%, correspondente a cerca de 847,5 milhões de euros, traduzido num acréscimo de 4,6% na despesa subsector do Estado e no subsector dos serviços e fundos autónomos em 99,3%, resultante das actualizações financeiras a realizar pelo Instituto de Gestão Financeira e da infra-estrutura Justiça IP.
«Last but not least», parafraseando Shakespeare, um dos elementos mais relevantes do orçamento para a Justiça, para 2009 é, sem dúvida alguma, o seu crescimento. Enquanto o Orçamento do Estado para 2009 cresce 3%, o orçamento para a Justiça prevê um acréscimo significativo de 14,1%.
Ainda de acordo com o relatório da 1.ª Comissão, o orçamento para a Justiça, no que concerne ao orçamento por finalidades, refere que o seu valor ascende a 1366,984,498 milhões de euros, que corresponde a 86,1% do total, apresentando um acréscimo de 8,5% face a 2008, enquanto que o orçamento de investimento é de 222,110,999 milhões de euros, o que corresponde a 13,9% do total, apresentando um acréscimo de 86,5% face a 2008, como se pode constatar no relatório e nos gráficos que dele constam.
Relativamente às fontes de financiamento, as receitas gerais do Orçamento do Estado (545,582 milhões de euros) correspondem a 34,1% do orçamento para a Justiça. As receitas próprias da Justiça são de 27,289,895 milhões de euros, que correspondem a 64,2% do orçamento para a Justiça, e o financiamento comunitário é de 26,242,582 milhões de euros, o que corresponde a 1,6% do orçamento para a Justiça.
No que concerne às diversas actividades a que está alocada esta despesa orçamental, o relatório da 1.ª Comissão faz referência ao novo mapa judiciário e à fase experimental de implementação dos novos modelos de organização territorial de competência de gestão nas três comarcas-piloto (Alentejo Litoral, Baixo Vouga e Grande Lisboa-Noroeste).
Faz ainda referência à reorganização dos tribunais com a implementação do novo modelo de gestão e a digitalização total dos processos pendentes, à requalificação das infra-estruturas, ao apetrechamento dos tribunais inter alia.
No que concerne ao sistema judicial o relatório dá também nota das reformas legislativas e orgânicas em curso, da modernização tecnológica, do descongestionamento dos tribunais e da resolução alternativa dos litígios, designadamente no que respeita às instâncias de arbitragem.
No que se reporta ao sistema prisional é feita também uma referência à reforma do parque penitenciário, sendo que nesta sede vem também respaldada no orçamento a construção de nove estabelecimentos prisionais em todo o País.
Bom, isto é, em linhas muito profuntórias, aquilo que se respalda de essencial no Orçamento do Estado para 2009 na área da justiça. Mas para aprofundar as linhas de força que enformam a acção do Ministério para 2009, nada melhor do que ouvir o Sr. Ministro da Justiça.
Antes de dar a palavra a V. Ex.ª, gostava de dizer aos Srs. Deputados que o modus operandi destas reuniões, concretamente a de hoje circunscrita a um modelo específico, será o seguinte: o Sr. Ministro da Justiça fará uma primeira intervenção, entre 10 e 20 minutos, e seguir-se-á uma ronda de perguntas. Espero que seja apenas uma ronda de perguntas, sendo que cada grupo parlamentar disporá de 10 minutos para o efeito. As perguntas serão agrupadas em bloco e o Sr. Ministro responderá de seguida. Naturalmente, o Sr.
Ministro terá a faculdade, querendo, sempre que se justifique, de delegar essas respostas aos Srs. Secretários de Estado aqui presentes.
Muito obrigado. Seja bem-vindo, Sr. Ministro da Justiça, sejam bem-vindos, Srs. Secretários de Estado.
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Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça (Alberto Costa): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.
Presidente da 1.ª Comissão, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, muito obrigado, Sr. Presidente, pelas suas palavras que constituíram um óptimo intróito ao que temos para examinar.
Queria começar por recordar que este é o quarto, e último, orçamento que apresentamos nesta Legislatura.
Este orçamento só pode compreender-se como o resultado de um conjunto de acções e de reformas que foram sendo traduzidas nas propostas de orçamento anteriormente apresentadas e que também estiveram sob exame nesta reunião de duas Comissões que intervêm na preparação do orçamento.
Na verdade, continuamos a manter os objectivos essenciais que constavam do nosso Programa e que, a certa altura, foram enriquecidos com o compromisso que celebrámos no respeitante a um conjunto de reformas legislativas.
Sentimos que, no essencial, esses rumos foram prosseguidos e também queremos voltar a dizer que essas reformas legislativas foram realizadas e estão sendo acompanhadas com base no mesmo consenso que a elas presidiu, à excepção de uma dessas nove reformas legislativas.
Realmente, foram revistos o Código Penal, o Código de Processo Penal e introduzida a mediação penal. É uma área que se encontra sob acompanhamento e monitorização e que será objecto de aperfeiçoamento na altura própria, quando terminar o ciclo de observação e estudo da realidade.
O mesmo aconteceu com a autonomia administrativa e financeira atribuída ao Conselho Superior da Magistratura, de forma a dotar de instrumentos mais eficazes esse órgão constitucional de gestão da nossa magistratura, e o mesmo aconteceu com o acesso à magistratura que hoje está em vigor. Os auditores de justiça que actualmente estão no CEJ entraram sob as novas regras que a Assembleia da República aprovou.
Os estudos decorrem sob os novos princípios e a diferenciação entre Ministério Público e magistratura judicial, nos termos da lei, está a ser observada nessa preparação.
O mesmo se passa em relação a recursos cíveis, cuja reforma, obtida e aprovada pelo consenso que aqui mencionei, apesar de ter entrado em vigor em data recente, já fez chegar ao Supremo Tribunal de Justiça alguns recursos que vão ser decididos com aplicação das novas regras, o que significa um período relativamente curto em relação à trajectória dos processos da 1.ª para a última instância — dados colhidos e confirmados pelo Supremo Tribunal de Justiça.
O mesmo também em relação ao Estatuto da Magistratura, onde, nesta altura — e é preciso dizê-lo —, vigora um regime em que o acesso, quer à Relação quer ao Supremo Tribunal de Justiça, inclui uma defesa pública do currículo do candidato diante de um júri representativo. Também está assegurado que aquele quinto dos membros do Supremo Tribunal de Justiça que a Constituição prevê que não seja preenchido por magistrados, agora, por lei, não pode ser preenchido senão por magistrados.
Queria mencionar ainda o mapa judiciário, a que adiante dedicarei mais algumas palavras, e, last but not least, para continuar na mesma linha do Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, a reforma da acção executiva, cujo decreto-lei já foi aprovado pelo Governo e promulgado pelo Sr. Presidente da República, que irá permitir enfrentar um dos focos da problemática do sistema judicial português que tem constituído maior preocupação ao longo dos últimos anos e de vários governos.
Diria que este aspecto do balanço legislativo parece-nos francamente positivo e capaz de sustentar acções no terreno, acções práticas e resultados ao longo do resto da Legislatura. Isto, quando não está já a fazer efeito em relação àqueles diplomas que já entraram em vigor.
Em relação aos nossos grandes objectivos, permitam-me que isole alguns.
Primeira grande preocupação e primeiro grande objectivo: fazer com que um sistema que se congestionava passasse a ser um sistema em descongestionamento.
Saímos de um período de 10 anos em que, de forma constante, as pendências acresciam, entre 100 000 e 120 000, às do ano anterior. Esse ritmo precisava de ser interrompido e precisávamos de iniciar uma diminuição.
Em reuniões anteriores, disse aos Srs. Deputados que estávamos nesse caminho e, agora, gostaria de dizer-vos que diminuímos o número de pendências em 2006 e em 2007 e estamos muito confiantes em que a mesma tendência se confirmará em 2008 e prosseguirá em 2009. Isto porque a bateria de instrumentos —
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cerca de 20 medidas que foram distribuídas por dois planos — continua a produzir os seus efeitos e porque há novas medidas que vão agora produzir novos resultados.
A este propósito, posso referir os acidentes de trabalho sem grandes consequências, com pequenas incapacidades, que podem ter uma tramitação mais rápida; os processos de inventário em que, não havendo litígio, não havendo necessidade de intervenção judicial, outras entidades poderão encarregar-se, como prevê o diploma já aprovado no sentido de notários, conservatórias, etc., poderem ocupar-se de tais actividades que, como sabem todos os que exercem actividades ligadas aos tribunais, são extremamente consumidoras de tempo, extremamente dilatadas no tempo, talvez as mais morosas formas de processo de que há conhecimento na vida judiciária portuguesa.
Todas essas medidas, bem como outras que, com o tempo, produzem a plenitude dos seus resultados — recordo as medidas sobre contravenções e transgressões transformadas em contra-ordenações 25 anos depois de a ideia ter sido preconizada num Programa do Governo —, persuadem-nos que, no ano que vem, poderemos dizer que a 10 anos de aumento do número de pendências seguir-se-ão 4 anos consecutivos de diminuição do número das mesmas.
É importante dizer que, no plano internacional existe um reconhecimento desta realidade. O último relatório da Comissão para a Eficácia da Justiça do Conselho da Europa atribui a Portugal uma posição elevada em matéria de resolução de situações como as que descrevemos — trata-se de um coeficiente chamado clearance rate, que compara o número de processos findos com o número de processos entrados, sendo que Portugal se encontra na posição 112. Significa isto que o próprio peso das pendências e da luta contra as mesmas ajudou-nos a constituir uma capacidade de resposta que, hoje, é superior ao número de processos entrados.
Eis, portanto, um objectivo pelo qual pensamos continuar a combater através das medidas que indiquei e também das que constam de um segundo plano de acção contra o congestionamento e, ainda, através de outras medidas desencorajadoras do recurso excessivo, nomeadamente por parte de grandes litigantes, com a criação de alternativas.
Todos têm consciência, e é aqui dito muitas vezes, que há centenas de milhares de pequeníssimas acções executivas e declarativas que são introduzidas em tribunal por poucas dezenas de entidades, empresas, gerando um enorme efeito de congestionamento no sistema. Para resolver isso, temos procurado diversas alternativas, uma das quais mencionarei a seguir a propósito da acção executiva, já que é nessa sede que se tem concentrado o maior número desses espécimes.
Portanto, o primeiro grande objectivo, que queremos ganhar, é o descongestionamento do sistema: onde aumentava, queremos que diminua, uma diminuição consistente do congestionamento do sistema.
Segundo grande objectivo, que tem sido um traço constante da nossa actividade: libertar a economia e o cidadão do peso da burocracia dos serviços de justiça.
Empresas e cidadãos têm estado submetidos a milhões de exigências de documentos, de certidões, de deslocações, de repetições e de duplos controlos. Foi isso que procurámos ir demolindo do ponto de vista legislativo, por forma a obter resultados que nos permitam enunciar, num possível Livro Branco, a quantidade de milhões de actos dispensáveis, deslocações, cartões e controlos duplos, que foram eliminados.
Hoje, temos um documento único automóvel que já deu lugar a 5,329 milhões de emissões; no passado, tínhamos um pouco mais de 10 milhões de emissões (livrete e título de registo de propriedade).
Por exemplo, temos 1,004 milhões de certidões permanentes. Como sabem, trata-se de um instrumento que, mediante um código de acesso à Internet, permite dispensar certidões em papel. Este número de certidões permanentes representa, no mínimo, uma economia do dobro ou do triplo de certidões em papel.
As publicações em Diário da República foram substituídas por 1,354 milhões de publicações on-line.
Em matéria de informação empresarial simplificada, como cada informação destas substitui quatro emitidas em papel, significa que 2,8 milhões de documentos em papel foram substituídos por 792 000.
Ainda no mesmo contexto, já nem cito iniciativas como Casa Pronta ou Empresa na Hora, sendo que, hoje, esta última conta com a adesão de 73% das pessoas que constituem empresas, o que significa que a medida não só se instituiu numericamente — 60 900 empresas criadas por esta via — como também traduz uma grande participação de todos os que querem constituir empresas e que, agora, podem fazê-lo em cerca de 33 minutos. Aliás, como já tive o gosto de referir, trata-se de uma inovação com grande aceitação internacional junto de diversas estruturas como o Banco Mundial, a Comissão Europeia, havendo actualmente diversos
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países que estabelecem connosco acordos de transferência de tecnologia para permitir a utilização deste mesmo processo.
Relativamente a esta matéria, queria, sobretudo, sublinhar que, no nosso Programa, constava a ideia de libertar a economia do empecilho que possam ser os serviços de justiça, e, evidentemente, também os cidadãos, visto que estes se deslocam, são submetidos a duplos controlos, etc. Sentimos que esse objectivo foi cumprido.
Quando se analisa o que se passa no notariado, o duplo controlo, a escritura facultativa, etc., é de libertar a economia e o cidadão deste enorme peso aquilo de que falamos. Este trajecto vai continuar e estes números vão aumentar.
O número de deslocações, de cartões, de papéis, de certidões e de controlos, nomeadamente duplos, vai continuar a ser reduzido, realizando-se aqui não apenas um serviço ao cidadão e à sua qualidade de vida como também às empresas, que suportam custos de contexto elevados e que, por esta via, os vêem reduzidos.
Dizíamos que a justiça deve também dar um contributo líquido para a economia e não ser apenas um peso.
Sentimos que isso vai poder ser prosseguido com este orçamento, até porque verão que aquelas áreas do Ministério, nomeadamente o Instituto dos Registos e Notariado e, em particular, o Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça (ITIJ), que têm um grande papel neste domínio, vêem as suas dotações aumentadas de maneira a poderem corresponder integralmente a este desafio de libertação das empresas e dos cidadãos da acumulação da burocracia.
Queria referir ainda a qualificação da resposta judicial, que é também um dos nossos grandes objectivos.
Aliás, os tribunais correspondem a cerca de 40% das aplicações de fundos públicos na área da justiça, o que é significativo. É, portanto, o segmento mais utilizado desses fundos. Aí temos, no domínio tecnológico, um processo de desmaterialização em curso, a qual é o elemento fundamental para a aceleração da resposta, e vamos prosseguir não só com o projecto respeitante às entregas, que hoje já conduziu a que 408 000 peças e documentos dessem entrada nos tribunais por via electrónica e, no próximo ano, vamos avançar para a prática dos actos dos magistrados judiciais e do Ministério Público em suporte informático, o que nos colocará, segundo o Conselho da Europa, entre os cinco ou seis países europeus melhor colocados nesta matéria.
A este respeito, quero registar que, da parte dos nossos magistrados — e quero distinguir em especial os magistrados judiciais —, tivemos um óptimo acolhimento para esta meta e uma participação muito significativa nas acções de formação que requereram. Nomeadamente, registamos a realização de 139 sessões de formação e um número superior a 1 milhar de magistrados que nelas participaram. É, portanto, um dado muito significativo que torna possível avançar-se para essa nova plataforma e encontrar novos ritmos de resposta.
Quero também dizer que, no domínio das injunções, já tinha sido anunciada, aqui, no ano passado, uma plataforma deste tipo, que se encontra materializada, estando sedeada no Porto e já 305 562 injunções foram processadas electronicamente, com a emissão de 144 300 títulos executivos. Foi uma primeira experiência que funcionou com muito sucesso e estamos convencidos que, no próximo ano, se irá também manifestar nos nossos tribunais de 1.ª instância, onde vai vigorar essa obrigatoriedade de prática dos actos em suporte informático.
Temos também a registar a aplicação da reforma do mapa judiciário em três circunscrições piloto, que entrarão em funcionamento no próximo ao judiciário e que permitirão avaliar os aspectos positivos, também o que possa ter de ser aperfeiçoado, em relação a uma experiência e a um desenho de reforma que foi concebido para todo o País mas que, por razões de conceito, de prudência reformista e de necessidade de avançar gradualmente num domínio como este, começou por ser aplicada a três circunscrições piloto: Lisboanoroeste, Baixo Vouga e Alentejo Litoral.
É uma matéria que já foi muito discutida, não vou debruçar-me sobre ela. Esta entrada em funcionamento tem um conjunto de implicações em matéria logística e um conjunto de pormenores que estão a ser examinados com o Conselho Superior de Magistratura em todos os seus aspectos. Definimos como sendo para nós da maior importância que o tipo de entendimento que pudesse ser alcançado sobre essas soluções fosse o mais largo possível e estamos convencidos que poderemos iniciar este processo gradual de implementação em condições auspiciosas, dada a boa colaboração que temos tido da parte do Conselho Superior de Magistratura e de outras entidades que têm colaborado connosco neste domínio.
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Quero também referir a revisão da acção executiva. Falámos várias vezes da acção executiva no passado, no que ela constituía de grande problema do ponto de vista maioritário, dado que a maioria das acções de que falamos são pequenas acções emanadas dessas empresas que já referi.
A Assembleia aprovou, no quadro do conjunto de reformas legislativas, uma lei de autorização legislativa.
Preparámos, na sequência disso, um decreto-lei, que já foi aprovado, que já foi promulgado e estará brevemente em condições de poder ser preparada a sua aplicação.
Para além de uma correcção e de uma modernização de todos aqueles aspectos que, ao longo dos últimos sete ou oito anos, concitaram críticas e observações de reforma, teremos uma grande novidade, que é a possibilidade de criação de centros de arbitragem na área executiva. Para além da célebre lista de execuções frustradas, que também já foi muito falada, temos esse centro de arbitragem da acção executiva.
Como disse, trata-se de uma solução que já venceu todos os testes, nomeadamente de constitucionalidade, e estará pronta a servir as diversas associações que queiram recorrer a esta forma mais expedita de eliminar centenas de milhares de acções executivas, em geral muito pequenas, que hoje empecilham a vida dos tribunais.
Devo dizer que temos, da parte dos grandes litigantes, algumas manifestações de interesse na criação de entidades deste tipo. Temos reunido com uma certa frequência com representantes dos grandes litigantes. Na verdade, o sistema judicial tem uma vintena de grandes «clientes», que fornecem centenas de milhares de acções com muita regularidade.
Deve dizer-se também que prevíamos, quanto às custas, que eles pagassem um pouco mais, porque são um pouco mais responsáveis pelos custos de congestionamento do sistema, que são elevados, princípio foi aceite, não tendo sofrido rejeição nem contestação de constitucionalidade.
Portanto, temos aí uma alternativa que nos pode conduzir a um alívio e a uma melhoria sensível do nosso sistema judicial, que há um bom número de anos vive com uma sobrecarga de acção executiva. Quem compare a acção executiva em Portugal com o que se passa noutros países verá como temos sabido concentrar indevidamente nos tribunais e nos juízes um conjunto de missões e de decisões que, noutros países, não têm estado atribuídas a juízes. Há aqui um elemento de modernização que gostaria de sublinhar e também um factor contribuinte para a redução das enormes pendências de que falei há pouco.
A propósito do centro de arbitragem, gostaria de dizer que uma das outras orientações do trabalho que temos sustentado ao longo destes anos é a do apoio às formas alternativas de resolução dos litígios e isso tem tido numerosas expressões em sede de mediação, arbitragem, etc.
Queria referir ainda, uma vez que já falei da acção executiva e que o principal projecto para o próximo ano é o centro de arbitragem da acção executiva, os julgados de paz, que foram uma criação, por unanimidade, da Assembleia e que, ao longo desta legislatura, duplicam o seu número: no próximo ano, ficaremos com 24 julgados de paz, passando, portanto, de 12 para 24. Anunciámos há pouco e protocolámos com 12 presidentes de câmara a instalação de cinco — o que acontecerá obviamente em 2009 — e, com esses cinco, passaremos para 24 julgados de paz.
Por último, mas não em último lugar, quero dedicar uma palavra à investigação criminal, à justiça criminal, ao sistema prisional e à reinserção social, aquilo que nos países anglo-saxónicos se chama o sistema de justiça criminal – o caso, desde que ele entra na Polícia até que sai da porta da prisão. Nesse conjunto, é importante dizer que se despende mais de 26% dos fundos públicos nesta área, que ocupa a segunda posição a seguir aos tribunais. Os tribunais ficam em primeiro e esta linha fica em segundo.
É claro que existe uma faixa da justiça criminal que não está contabilizada aqui porque já está integrada no primeiro cálculo, dos tribunais.
Temos uma subida global dos recursos afectos a esta linha, desde a investigação criminal até à reinserção, da ordem dos 10%, e encontramos não só condições para modernizar, melhorar, operacionalizar, como também temos notícia, por exemplo, do aparecimento da base de dados para fins genéticos, que vai ocorrer no próximo ano, depois de todo o percurso legislativo, logístico e regulamentar feito.
Gostava também de sublinhar, porque julgo que isso merece voltar a ser dito, que criámos em Portugal, no ano passado, por acordo internacional, um organismo de grande importância, o MAOC-N, isto é, o Centro de Análises e Operações contra o Narcotráfico Marítimo. É um centro dirigido por Portugal, instalado em Lisboa, criado por iniciativa e muita pressão da parte de Portugal, dele fazendo parte sete países e tendo os Estados
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Unidos como observador, que, até ao momento, tem um número de operações superior a 140, sendo responsável por uma retoma muito significativa do combate ao narcotráfico por via marítima.
A esse respeito, gostava de dizer que o documento que falta nesta actualização dos vários códigos é o da revisão do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade. Esse trabalho está concluído.
Já foi, aliás, há algum tempo, objecto de comentários por antecipação em vários jornais, mas isso é mais um motivo para poderem ser maturadas e ponderadas as várias opções.
A breve trecho, esse documento, que está praticamente concluído, será aqui apresentado no Parlamento e a sua aprovação permitirá modernizar e actualizar alguns dos conceitos que vigoram nesta matéria e que ainda datam dos anos 70.
Entretanto, temos em curso um processo ambicioso de renovação do parque prisional. Já houve oportunidade de encerrar sete estabelecimentos prisionais, o que é um número significativo — é difícil encontrar um momento em que possa ter ocorrido um encerramento tão significativo —, e, evidentemente, temos planos de construção de novos estabelecimentos prisionais, de entre os quais gostaria de mencionar o de Grândola, o de Almeirim e o de Angra do Heroísmo, que se encontram na primeira linha. Também há outros planos de requalificação de outros estabelecimentos.
Portanto, este sistema está, todo ele, em profunda modernização: do quadro legislativo aos estabelecimentos e aos conceitos aplicáveis quer aos estabelecimentos, quer à ocupação do tempo dos reclusos e ao acompanhamento dos reclusos.
Acredito que, a partir do momento em que se efectuou a revisão do Código Penal e do Código do Processo Penal, na base daquela plataforma política que aqui referi, se abriu um período reformista, um período em que o estímulo para reformar melhorou enormemente, e estamos convencidos de que, em poucos anos, a realidade nesta matéria será substantivamente diferente. Já há muitos factores que permitem dizer que o é, mas permitam-me que deixe para os anos seguintes a caracterização objectiva, na realidade, de todo este conjunto de mudanças.
Na esfera da reinserção social, e como elemento que desempenha e continuará a desempenhar um papel em franca expansão relacionado com a utilização de penas e medidas alternativas à pena de prisão, gostaria de voltar a mencionar o nosso compromisso no sentido do alargamento da vigilância electrónica à violência doméstica, que é uma matéria onde estão em curso aquisições, no sentido de 2009 ser o ano em que realmente se tornará visível esse passo.
Para terminar, diria que, não obstante este processo de crescimento e de cumprimento de objectivos, inserimo-nos num processo de descida dos efectivos humanos ao serviço do Ministério da Justiça, uma descida significativa (na última meia dúzia de anos, houve um pendor que se acentuou), mas sem prejuízo de admissões selectivas em várias áreas que gostaria de lembrar — desde os inspectores da Polícia Judiciária e de pessoal de apoio à investigação até aos guardas prisionais e também aos técnicos da reinserção social e oficiais de justiça. Estes são alguns dos exemplos em que se verificou uma admissão criteriosa de elementos para áreas onde faziam falta, não obstante a racionalização dos meios humanos ter constituído uma preocupação e algo que é consistente com o que se passou nos últimos anos.
Sr. Presidente, já abusei do meu tempo, pelo que ficaria por aqui e passaria a responder às perguntas dos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Justiça pela sua exposição inicial.
Vamos, então, iniciar o debate, tout court, começando pelo PSD, a que se seguirão o PS, o CDS, o PCP e o BE, cabendo 10 minutos a cada grupo parlamentar para formular as suas perguntas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, saúdo-o com amizade e saúdo igualmente o Sr.
Presidente da 1.ª Comissão e meu presidente; cumprimento o Sr. Ministro, os Srs. Secretários de Estado; e quero congratular-me com esta oportunidade de podermos dar resposta a algumas preocupações que temos em matéria de orçamento.
Se me permite, Sr. Ministro, vou directamente ao assunto, ou seja, às nossas preocupações que resultaram da análise do orçamento no que à Justiça diz respeito.
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As primeiras preocupações prendem-se com a questão do parque judicial. Embora o orçamento nos dê pouca informação nessa matéria, a ideia com que se fica é que o Ministério da Justiça terá optado não pela compra de edifícios para instalação dos tribunais mas, sim, pelo arrendamento de edifícios para o exercício de competências de soberania.
Sr. Ministro, parece-me que esta não será a melhor solução, uma vez que estamos a falar de órgãos de soberania e, portanto, de matérias de soberania. Permita-me que lhe dê dois exemplos. O primeiro tem a ver com uma ideia importada de Espanha, que é a do campus de justiça e que vai ser instalada, pela primeira vez no País, em Lisboa — o Campus da Justiça de Lisboa —, num edifício arrendado, com a concentração de vários tribunais, com várias competências, e que começará a funcionar, conforme notícias da comunicação social, no primeiro semestre de 2009.
Na segunda-feira passada, o Sr. Secretário de Estado visitou estas instalações, juntamente com magistrados judiciais e magistrados do Ministério Público. Ora, nós não temos a informação de qual é o montante da renda deste edifício e temos recebido muitas informações, provindas dos mais diversos sectores, no sentido de que o Ministério da Justiça já estará a pagar renda há alguns meses, quando o funcionamento só começará no primeiro semestre do próximo ano.
Por isso, Sr. Ministro, pedia-lhe que esclarecesse esta situação para que não ficassem dúvidas sobre o pagamento das rendas deste edifício, que, parece-nos, são rendas de elevado valor.
Uma outra questão — e não poderia deixar de falar nela — tem a ver com o edifício que irá eventualmente albergar a comarca da Grande Lisboa-noroeste. As últimas informações que tivemos, também através da comunicação social, foram as de que se trata de instalações (e permita-me usar o termo) «encalhadas» há cerca de quatro anos, que agora terão sido objecto de algumas obras para virem a ser a sede deste tribunal que acabo de referir, sendo que, nos últimos quatro anos, só houve uma entidade interessada na aquisição do edifício e essa entidade, em princípio interessada, desinteressou-se, depois de ter inspeccionado o edifício e ter verificado que as obras a realizar, designadamente por deficiências nas paredes estruturais internas do edifício, são incomportáveis do ponto de vista económico. Também através da comunicação social, obtivemos a informação de que a renda mensal é de 23 000 €. Sr. Ministro, pedia-lhe igualmente que nos esclarecesse esta situação.
Terminava este ponto dizendo que estas situações de arrendamento têm de ser devidamente esclarecidas.
É que arrendar edifícios para o exercício de funções de soberania pode ser perigoso, pois é sempre mau ver um tribunal, por exemplo, ser objecto de uma acção de despejo, seja por que motivo for, designadamente porque o proprietário gosta de litigar, o que, como sabemos, pode acontecer.
Uma outra preocupação tem a ver com a alienação do património. O Ministério da Justiça foi o ministério que, no ano de 2008, maior receita arrecadou de venda de património, tendo acumulado cerca de 117 milhões de euros, o que significa cerca de 60% do valor total da alienação de imóveis do Estado. Deste lote de imóveis vendidos, a única informação que temos é que foi vendido o Estabelecimento Prisional de Lisboa por 58 milhões de euros e o Estabelecimento Prisional de Custóias, em Matosinhos, por cerca de 1,5 milhões de euros. Não temos mais informação do que esta.
Permita-me, Sr. Ministro, que lhe diga o seguinte: nos Orçamentos do Estado para 2006 e 2007, existia uma norma que obrigava o Ministério das Finanças e da Administração Pública a publicar a lista dos imóveis do património público alienado. Curiosamente, nos Orçamentos do Estado para 2008 e 2009, essa norma deixou de existir, quando seria importantíssimo, designada e principalmente, na área da Justiça, sabermos quais foram os imóveis da Justiça alienados.
Por isso, Sr. Ministro, pedia-lhe se seria possível municiar-nos com a lista dos imóveis alienados, incluindo o valor da venda, as condições do processo de alienação e também a identidade do comprador. Calculo que isso possa ser difícil neste momento, mas seria importante termos todos esses elementos. De qualquer modo, peço-lhe que nos dê os elementos possíveis neste momento, para termos esta questão esclarecida, uma vez que, também através da comunicação social — e vamos tendo notícias desta matéria de uma forma muito pontual —, concretamente através do Diário Económico, soubemos que o Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz iria ser alienado pelo valor de 80 milhões de euros. No entanto, não temos qualquer informação oficial no que diz respeito a esta matéria e, por isso, pedia-lhe que nos desse a que, neste momento, lhe fosse possível.
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Passo, agora, a um outro ponto, relativo ao sistema prisional. O Sr. Ministro, quando fez o balanço de um ano de governo, na publicação Justiça de A a Z — Um Ano de Governo, fez aí constar, a propósito do mapa penitenciário, o seguinte: «A revisão do mapa penitenciário existente, de forma a encerrar estabelecimentos prisionais degradados e de pequena dimensão e construir novos estabelecimentos prisionais de média/grande dimensão, numa óptica de optimização dos meios existentes, modernização de instalações e melhoramento das condições de segurança nos estabelecimentos, consta de um plano de acção que ficará concluído em 2006.».
Em 27 de Junho de 2008, em Viseu, o Sr. Ministro apresentou um plano sumário daquilo que seria a reforma do sistema prisional. Falou num investimento de 450 milhões de euros, na redução dos actuais 50 estabelecimentos prisionais para 32, no aumento de lotação de 12 258 para 14 192 lugares, com um acréscimo de 1907 lugares, e a construção de 10 novos estabelecimentos prisionais.
Porém, não foi referido quais os estabelecimentos que falta encerrar, os 21 estabelecimentos prisionais que falta encerrar, quando serão encerrados e para onde serão transferidos os respectivos reclusos. É que o Sr.
Ministro prometeu a apresentação deste plano no ano seguinte ao de 2006 e ele ainda não foi apresentado.
Por isso, pergunto-lhe por que não foi apresentado e, não o tendo sido, se já estão definidas estas regras relativamente aos 21 estabelecimentos prisionais que falta encerrar.
Uma outra preocupação diz respeito ao Conselho Superior da Magistratura. O Conselho Superior da Magistratura tem vivido sem verbas adequadas ao seu próprio funcionamento e com enormes dificuldades.
Não só na 1.ª Comissão como também em entrevistas, o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura tem referido as dificuldades com que tem vivido — inclusive, vai ao ponto de dizer que não têm «dinheiro» (a palavra é prosaica, mas é essa, são estas as expressões usadas pelo Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, Conselheiro Ferreira Girão).
Também no relatório anual do Conselho Superior da Magistratura vem dito que o período já decorrido no ano de 2008 veio confirmar essas dificuldades, estando impossibilitada, em grande medida, a materialização da autonomia consagrada na lei orgânica. Ou seja, é importante que a autonomia financeira dada ao Conselho Superior da Magistratura seja acompanhada do devido aumento das verbas financeiras, não porque lhe foi consagrada autonomia financeira mas, sim, porque lhe foi dado um quadro organizativo superior àquele que tinha, que implica despesas de natureza financeira, e também porque a própria lei do mapa judiciário implica novas competências, designadamente no que se refere aos gabinetes de apoio aos juízes, ao Conselho Superior da Magistratura e à necessidade de aumento de encargos de natureza financeira.
Por isso, Sr. Ministro, fica esta pergunta: será que os 30% de aumento previstos para o Conselho Superior da Magistratura serão efectivamente suficientes para estas necessidades? Não sendo suficientes, qual a solução que o Sr. Ministro pretende dar a este problema? Outro ponto que merece a nossa preocupação refere-se ao mapa judiciário. O mapa judiciário, que é a Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, prevê a implantação de um novo modelo organizativo judiciário a implementar de forma gradual no País. Irão entrar em funcionamento três comarcas piloto, que são a do Alentejo Litoral, a do Baixo Vouga e a da Grande Lisboa-noroeste.
O problema que se põe aqui é que deveria ter sido regulamentado no prazo de 60 dias o funcionamento ou a organização destas três comarcas piloto. Ora, os 60 dias decorreram e terminaram no dia 27 de Outubro do corrente ano; estamos já praticamente em meados de Novembro e a regulamentação ainda não existe. Por isso, Sr. Ministro, pergunto-lhe se a regulamentação é para sair em breve e se, mesmo saindo em breve, é possível pôr a funcionar estas comarcas piloto ainda no tempo previsto pelo Ministério superiormente dirigido por V. Ex.ª. Isto porque me parece que há aqui um problema grave, que é o problema da movimentação dos magistrados e dos próprios funcionários judiciais. Uma vez que esta situação poderá envolver a necessidade de movimentos extraordinários dos magistrados, o que lhe quero perguntar é se estão compatibilizadas todas essas situações para que, na data prevista, estas três comarcas piloto possam começar a funcionar.
Gostaria ainda de focar um ponto relativo à Polícia Judiciária, que tem a ver igualmente com a regulamentação da lei orgânica dessa polícia.
Lembro-me bem dos debates em sede da 1.ª Comissão relativamente a esta lei orgânica e dos à partes que muitas vezes foram feitos relativamente à necessidade e à pressa que a Polícia Judiciária tinha de ter uma lei orgânica. Porém, acontece que a Polícia Judiciária ainda não tem regulamentada a sua lei orgânica. Daí que lhe pergunte, Sr. Ministro, em que ponto se encontra a elaboração da lei orgânica da Polícia Judiciária,
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que estabelece as competências das unidades territoriais, regionais e locais, e a portaria que estabelece a sede e a área de intervenção das unidades da Polícia Judiciária, que é da maior importância para o funcionamento dessa polícia.
No que diz respeito à aplicação do SIADAP na Polícia Judiciária, gostaria de colocar as seguintes questões: na Lei da Organização da Investigação Criminal (LOIC) e na Lei de Segurança Interna (LSI), a avaliação do desempenho dos elementos das forças e serviços de segurança e do pessoal oficial de justiça é regulada por lei especial. Porém, neste Orçamento, no artigo 20.º n.º 1, diz-se que se aplica a avaliação e a definição dos objectivos à Polícia Judiciária. Por isso, o que quero perguntar é se vamos ter uma repetição na Polícia Judiciária daquilo que aconteceu à ASAE, que tinha objectivos concretos a definir e que passavam pelo levantamento de um determinado número de processos de contra-ordenações.
A minha pergunta é se vamos cair na situação em que vamos obrigar os agentes da Polícia Judiciária a cumprirem um número mínimo de detenções ou um número mínimo de inquéritos-crime. Coloco esta questão porque me parece que é importante que isto seja esclarecido.
Outra questão prende-se com os preços do registo predial, matéria que me parece sobejamente importante uma vez que o Ministério da Justiça anunciou que o preço do novo registo predial, a vigorar a partir de 21 de Julho, é fixo e único. Ou seja, não resulta da soma de várias parcelas, é mais barato, transparente e claro.
Preços mais baratos e transparentes na compra de casa, por exemplo. Só que hoje verificamos que o mesmo Ministério da Justiça que diz isto vem dizer, no relatório que acompanha o Orçamento do Estado, que o novo enquadramento legal do registo dos automóveis e predial, que se traduziu no aumento de receita prevista por parte do Instituto dos Registos e Notariado, em face das alterações nas tabelas de preços e o número de actos sujeitos a pagamento, fez com que a verba aumentasse. Pergunto-lhe, Sr. Ministro, o que tem a dizer relativamente a isto.
Se me permite, Sr. Presidente, uma última nota, só para dizer que, obviamente, estamos perante um orçamento que é generoso para a justiça. Com este orçamento, esperamos e contamos que a justiça tenha melhorias substanciais, mas parece-me, Sr. Ministro, que há um problema a resolver, que é um problema base que tem a ver com a questão da celeridade da justiça e com o tocar no que é fundamental e que não se tem tocado, penso, por duas razões: a primeira tem a ver com aquilo a que costumo chamar o «síndroma Alberto dos Reis» e as nossas leis processuais. Continuamos a trabalhar com leis processuais que impedem o funcionamento da justiça e que afastam os agentes económicos de investir em Portugal, muitas vezes por causa da falta de resposta adequada da justiça. Basta lermos os relatórios do Banco de Portugal, os relatórios de entidades empresariais e, inclusive, os relatórios de sindicatos e de organizações sindicais para verificarmos esta realidade.
Para além do problema do «síndroma Alberto dos Reis», Sr. Ministro, quero falar-lhe do problema de alguma falta de confiança nos juízes, porque, havendo mais confiança nos juízes e leis processuais mais simples e mais adequadas a um funcionar célere da justiça, teremos uma justiça feita para as empresas, para as famílias, no fundo, para os utentes. Daí que lhe pergunte, Sr. Ministro, se, nesta matéria, que foge um pouco à matéria do orçamento, existem ideias para pôr a funcionar a justiça ao serviço do utente e não a justiça ao serviço do aparelho da justiça.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Secretários de Estado, agradeço a disponibilidade, que constitui regra, de virem ao Parlamento para avaliarmos, discutirmos e trocarmos impressões sobre o Orçamento do Estado.
Começo pelas últimas palavras do meu distinto colega Fernando Negrão, dizendo que este orçamento é, de facto, generoso para a justiça. Este facto, por si só, contrasta com outros orçamentos para a justiça em que Portugal teve de fazer alguma contenção, sendo que nesta área houve realmente alguma contenção em anos anteriores. Este ano, no entanto, o orçamento para a justiça contempla um aumento de 14,1% quando a despesa pública aumenta 3%. Portanto, é um orçamento em que, à primeira vista, não vai faltar aquilo que às vezes falta, que é o dinheiro, na medida em que o aumento é considerável.
Depois, gostaria de dizer que é curioso verificar que durante anos e anos a justiça teve problemas de congestionamento. Ou seja, assistimos a uma década em que, sucessivamente, de ano para ano, os
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processos aumentavam nos tribunais e os juízes, os funcionários e os advogados, isto é, todas as pessoas que trabalhavam na área da justiça, não eram capazes de inverter essa situação em que o número de processos aumentava.
Verificamos que o que se passou com este Governo foi o contrário. Ou seja, quer por causa das medidas de descongestionamento, quer devido à reorganização, a verdade é que, de ano para ano, tem vindo a diminuir o número de processos nos tribunais. E se é verdade que é sempre possível a um advogado, a um juiz, a uma pessoa em concreto dizer que o seu processo está atrasado, também é verdade que, genericamente, o que se passa nos tribunais é que se inverteu a «maldição» que os tribunais tinham de aumentar todos os anos o número de processos e a pendência processual.
O Sr. Ministro referiu que esse facto foi realçado pelo Conselho da Europa num relatório, que é público, e que diz que Portugal se tem comportado bem no que se refere à diminuição do número de processos e pendências nos tribunais.
As reformas que têm sido feitas, nomeadamente em relação ao descongestionamento, têm, por isso mesmo, produzido resultados. E embora esses resultados não sejam, na prática, o que todos gostaríamos, porque a pendência de uma acção é ainda estatisticamente elevada, o que é facto é que se têm feito progressos significativos.
No que diz respeito ao assunto edifícios e soberania, gostaria de referir que o Partido Socialista nada tem contra a que os edifícios sejam propriedade ou arrendados. O que entendemos é que a soberania e, neste caso, a justiça como elemento da soberania, tem de desempenhar as suas funções em boas instalações. Isto, para nós, é importante. Se essas instalações são arrendadas ou se são compradas, não me parece que essa seja a questão importante. De qualquer maneira, Sr. Ministro, gostaria de lhe perguntar, nessa ordem de ideias, se este Governo procedeu a alguma alteração estratégica. Ou seja, em relação a outros governos, este passou a arrendar em vez de comprar? O Sr. Ministro tem alguns dados que nos possam informar sobre qual tem sido a prática governativa? Penso que possa ter. A verdade é que sempre vi governos a arrendar, não é a primeira vez que ouço falar de governos que arrendam e, portanto, gostaria de saber se houver alguma alteração de estratégia por parte do Governo.
Gostaria também de anunciar que faz parte do programa de actividade da Subcomissão de Justiça e Assuntos Prisionais a visita ao campus da justiça em Lisboa. Qualquer dia tomaremos a iniciativa de pedir ao Governo a sua colaboração para podermos também visitar o campus da justiça de Lisboa, porque nos parece uma obra que merece que a Assembleia da República acompanhe a sua execução.
Relativamente a várias reformas que foram feitas, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se, por exemplo, na área da investigação criminal, em que procedemos a alterações significativas no que diz respeito ao Código Penal e ao Código de Processo Penal, os números que V. Ex.ª possa ter são alarmantes no sentido de termos mais evadidos das prisões, de termos aumentado o número de prisões.
Recordo que, durante muito tempo, em Portugal, se debateu com alguma insistência o facto de termos números muito altos, em termos de prisão preventiva. Por isso, gostaria de saber se o Sr. Ministro tem alguma ideia dos efeitos que terá produzido essa reforma que operámos na área do Código de Processo Penal. Já passa um ano sobre a entrada em vigor do novo Código Penal e, em suma, gostaria se saberá que efeitos é que ela produziu.
Gostaria de dizer que, genericamente, por força desse aumento de verbas a que assistimos na área da justiça, podemos verificar que há um aumento significativo de verbas na área de investigação criminal, quer para a Polícia Judiciária quer para o Ministério Público que, cronicamente, se queixavam. Pelo menos aqui, há dois anos, isso era tema de discussão e, até, de propostas de alteração do Orçamento, por parte de outros grupos parlamentares, para tentar dar mais dinheiro à Polícia Judiciária — embora, enfim, a Polícia Judiciária sempre tenha dito que aquele que tinha era o suficiente para o desempenho das suas funções. Mas hoje, por força desse aumento, também vamos ter, naturalmente, uma boa investigação criminal, na medida em que, pelo menos, não vão faltar os recursos financeiros para essa área.
Farei ainda uma pergunta final, Sr. Ministro.
Na verdade, percebemos do Orçamento do Estado que as receitas da justiça têm vindo, cada vez mais, a auto-sustentar o próprio funcionamento da justiça, rondando os 60% dos custos e da despesa do próprio funcionamento da área da justiça. Mas farei uma pergunta, não concreta mas talvez teórica, porque não sou dos que perfilham a ideia de que, quanto mais auto-suficiente financeiramente for o sistema na área da justiça,
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melhor o caminho que estamos a percorrer, porque acho que, nessa área, se calhar, o Estado tem deveres e obrigações que deve continuar a manter. Ou seja, a justiça deve ser e é acessível a todos e, portanto, não perfilho a ideia de que o aumento das custas judiciais seja um bom caminho a percorrer, pelo que não devemos estar todos felizes quando achamos que o sistema se auto-financia.
Talvez por deficiência de ser advogado, há muitos anos, e por sentir que muitas pessoas têm dificuldade, às vezes, em pagar as custas judiciais, devo dizer que esse não é o caminho que perfilho o de que o sistema se deve auto-financiar. De qualquer maneira, em termos teóricos, que não concretos, gostava também de ouvir a opinião do Sr. Ministro sobre essa matéria.
De resto, penso que temos um bom orçamento e que não vai ser por aqui que vamos ter problemas na área da justiça.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Justiça, algumas questões muito sucintas.
A primeira prende-se com este crescimento deste orçamento. Causou-me alguma curiosidade a circunstância de, quando um orçamento cresce, se referir logo, a abrir, que a contabilização dos activos financeiros dá integral cumprimento às bases da contabilidade pública e aos princípios de enquadramento orçamental. Isto é só para eu tentar perceber – pode ser meramente intuitivo – se este aumento do orçamento, de facto, se traduz em receita, em dinheiro que entra, ou se é em algum outro critério orçamental que permita que, no final, do lado da receita, esse aumento se verifique. Porque, de outra forma, parece-me que bastaria dizer, no documento que nos serve de base ao debate, que o orçamento cresce x por cento e que o montante é y, sem necessidade de salientar aquilo que é suposto ser pressuposto de um Orçamento do Estado.
Depois, quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, sobre a remodelação de tribunais referida na pág. 4 do Orçamento do Estado, onde se diz que 13 tribunais são remodelados, quais vão ser esses tribunais.
Um outro esclarecimento que pretendia obter é acerca do apetrechamento dos tribunais que se refere na mesma página. Sobre isto, quero perguntar ao Sr. Ministro, no tocante à gravação digital, se todos os tribunais do nosso país já estão dotados da gravação digital da prova ou se ainda há tribunais que recorrem ao velho sistema das cassetes, que, como sabemos bem, principalmente em alguns processos mais mediáticos, acabam por ser fundamento não só para vários incidentes processuais como para o protelamento dos julgamentos, com impossibilidade da justiça feita de forma célere, como é suposto.
Em relação ao novo Regulamento das Custas Processuais, que é referido na pág. 5 deste documento, o que pergunto é se o Governo tem alguma estimativa da consequência da entrada em vigor deste novo regulamento na duração das pendências. Recordo-me que, à data, quando o regulamento foi anunciado, um dos factores de grande mérito do dito regulamento era o das pendências e do resultado que teria para esse efeito. E, tendo em conta, mais que não seja, o facto de se pagar, de uma só vez aquilo que, antes, era dividido em duas prestações, reduzindo-se aí essa circunstância, pergunto ao Sr. Ministro se há algum estudo a este propósito.
Sr. Ministro, tenho uma curiosidade quanto a um novo centro que aqui se consagra, que é este Centro de Controlo Nacional de Segurança dos Tribunais. Já se percebeu que ficará instalado em Lisboa e pergunto-lhe em que é que consiste, quem o dirigirá e em que termos é que este centro tratará da segurança dos tribunais? Sabemos que, no último ano, se registaram alguns incidentes muito graves, inclusivamente agressões a Srs. Magistrados Judiciais, pelo que pergunto ao Sr. Ministro em que é que consiste este Centro de Controlo Nacional de Segurança dos Tribunais, quem o dirigirá e como é que será feita a articulação e a implementação desse sistema de segurança em cada um dos tribunais. Sendo mais um centro, queremos saber como é que isso se verificará em cada um dos tribunais.
Já agora, Sr. Ministro, quero perguntar também por que é que deste Orçamento do Estado saiu o que no anterior se previa acerca da implementação do sistema de informação do Ministério Público. A este propósito, pergunto se já está completamente implementado este sistema de informação do Ministério Público, porque, de outra forma, não se perceberá que tenha saído deste documento e que constasse do Orçamento do Estado para 2008.
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Outra questão relevante, mais ainda em matéria de direitos, liberdades e garantias — aqui também temos o Sr. Presidente da 1.ª Comissão a partilhar connosco estes trabalhos —, é o que nos traz a propósito desta base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e de investigação criminal que o Orçamento do Estado para 2009 prevê mas que o anterior não previa. Isto muito embora me pareça que a discussão até teria sido prévia e, portanto, já devesse constar do anterior documento orçamental, se não me engano.
Mas independentemente do facto, quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, onde é que vai funcionar esta base de dados de perfis de ADN e em que termos se contabiliza o seu custo. Por ora, em relação à base de dados de ADN, ficaria por aqui.
Depois, Sr. Ministro, por que é que, deste Orçamento do Estado, saiu a elaboração do novo Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade? Constava do anterior documento, deste não consta.
Ora, sabendo nós que está em consulta pública e que, portanto, ainda não foram feitas as tais alterações que justificariam a sua saída — e não sabemos sequer do tempo dessa consulta e, portanto, o seu resultado, mais que não seja, no tempo desta sessão legislativa e da Legislatura, sendo que o objectivo é nesta sessão legislativa —, quero perguntar-lhe qual a razão de ter este novo código saído do documento.
Mais três perguntas, Sr. Ministro, sendo que a primeira tem que ver com esta nova forma de controlo electrónico dos presos, a da verificação biométrica de voz, mencionada na pág. 11 do documento. Perguntolhe, Sr. Ministro, exactamente, em que consiste esta verificação biométrica da voz. Tecnicamente, em que é que se traduzirá e como é que se articulará com as outras formas de vigilância electrónica que já estão implementadas? Uma outra pergunta, Sr. Ministro, tem que ver com o notariado. Em boa verdade, a simplificação administrativa, de que se trata na pág. 3, trata basicamente do desmantelamento da profissão dos notários, uma profissão que ia sendo exercida há muitos anos, neste país, com vantagem, julgava eu, para a segurança jurídica. Mas a verdade é que se cria uma série de serviços que, praticamente, tornam impossível a concorrência ao nível do notariado, pelas condições em que o Estado os presta e em termos que não concede aos notários, para além do mais fazendo tábua rasa dos compromissos assumidos por governos da República, independentemente de quem, em cada momento, os vai exercendo. Trata-se de compromissos assumidos em lei, assumidos pelo governo, assumidos perante as organizações representativas da profissão e a verdade é que se faz tábua rasa disso tudo e acaba-se com uma profissão.
Bom, menos mal! Mas, a este propósito, há uma questão que gostava de colocar ao Sr. Ministro e que é esta: sei que correm acções judiciais contra o Estado, exactamente tendo em conta este comportamento que o Governo de V. Ex.ª e V. Ex.ª, em particular, representa. Pergunto-lhe se foi ou não deferida recentemente uma providência cautelar, tendo como requerido o Estado, intentada pela Ordem dos Notários? Tendo sido deferida, qual o objecto dessa providência e em que é que o Estado foi compelido por decisão judicial — preliminar, necessariamente. E refiro esta providência, ou providências, e a esta acção, ou acções, tendo em conta que, em boa verdade, o Ministério ainda não deu conta, a este propósito, de quantas acções correrão contra o Estado português e de quantas providências. Esta era uma informação que, hoje, seria muito útil.
A terminar, uma última pergunta que tem que ver com o apoio judiciário, para saber em que ponto está a regularização dos pagamentos aos advogados que patrocinaram defesas oficiosas e que, apesar de o terem feito, têm anos de atraso, num dos piores exemplos que este Estado pode dar, neste caso, através de V. Ex.ª e do seu Ministério, porque o Estado, que é implacável quando cobra, é, designadamente neste Ministério, completamente relapso quando é chamado a cumprir. Isso é inaceitável num Estado de direito.
É que o Estado, que, quando lhe devem, cobra juros — e agora, ao que parece, por via deste Orçamento do Estado, até quer cobrar multas que podem ir até ao dobro do valor do imposto, como é o caso do IVA —, é o mesmo Estado que se permite estar anos — anos! — sem pagar aquilo que é devido, designadamente, para o que importa, a defensores oficiosos, advogados, que, no exercício da sua profissão e do apoio judiciário, permitem que o Estado preste um serviço e garanta as suas próprias competências. Portanto, devo dizer, Sr.
Ministro, que V. Ex.ª representa, neste ponto, aquilo que o Estado não pode ser e o contrário daquilo que o Estado está disposto a dar.
E, Sr. Ministro, não venha com o «canal memória», nem com a «velha história», nem com a «pesada herança», o que interessa é a avaliação, ao fim de três anos, daquilo que V. Ex.ª significa no Governo. Na verdade, ao fim de três anos, já não pode vir aqui com o que herdou, o que interessa mesmo é aquilo que já foi capaz de fazer.
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A verdade é que, através de V. Ex.ª, há advogados, alguns deles advogados-estagiários, que mal ganham para pagar os escritórios, muito menos para terem funcionários e pagarem as restantes despesas, e que, para além de não receberem de muitos clientes, graças à tal malfadada crise que o Governo tantas vezes invoca, nem sequer do próprio Estado recebem por aquilo que fazem os tribunais, ao serviço do interesse público.
Portanto, quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, a este propósito, se estão pagas essas defesas, se estão regularizadas essas dívidas, e, se o estão, desde quando?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo. Apenas para lhe esclarecer que, por ora, estamos em directo, mas é no Canal Parlamento não é no «canal memória».
Risos.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Por ora!
O Sr. Presidente: — Por ora, por ora!
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Mas vai ver, Sr. Presidente, que, não tarda, entraremos no «canal memória», pela resposta.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, quero cumprimentar os Sr. Ministro da Justiça e os Srs.
Secretários de Estado e começo esta minha intervenção, precisamente, levantando um problema que resulta daquilo que foi identificado pelo Sr. Ministro como a primeira preocupação do Governo, o descongestionamento dos tribunais.
De facto, o Governo optou por duas linhas fundamentais para promover o descongestionamento dos tribunais: por um lado, retirou muitos dos processos que cabiam aos tribunais, e retirou-os das mais diversas formas, nomeadamente através de mecanismos de promoção da desistência de acções, através da transferência de competências de actos anteriormente jurisdicionais que passaram a ser da competência, por exemplo, das redes de arbitragem e mediação de conflitos, retirando dos tribunais muitas questões que, em nosso entender, deviam ser da competência dos tribunais e passaram para outros órgãos; por outro lado, adoptou medidas de encarecimento da justiça que dificultam, de facto, o acesso dos cidadãos à justiça, não apenas por termos hoje, ainda, um regime de apoio judiciário muito restritivo mas também pelo aumento dos custos com a justiça.
Por isso, a primeira questão que quero colocar ao Sr. Ministro diz respeito às receitas do Estado, nomeadamente com as taxas cobradas no âmbito do sistema de justiça, ou seja, as taxas de justiça, as taxas de vários tipos de registos, nomeadamente taxas de registo notarial, de registo predial, de registo civil e de registo comercial. E, Sr. Ministro, fazendo uma comparação — uma vez que este é o último Orçamento do Estado do Partido Socialista, penso que faz sentido fazer esta comparação — com a situação que existia, quando este Governo do Partido Socialista assumiu funções, em 2005, o montante destas taxas era de 11 096 milhões de euros, sendo que, neste momento, o Orçamento do Estado prevê 146 108 milhões de euros. Ou seja, passámos de 11 para 146 milhões de euros de taxas, o que dá bem conta do que foi o encarecimento da justiça com este Governo. Portanto, gostaria que o Sr. Ministro pudesse dar alguma explicação sobre esta situação.
Por outro lado, gostava ainda que pudesse também relacionar esta questão, se ela, de facto, tiver alguma relação, com o aumento para mais do dobro das receitas próprias do Instituto de Gestão Financeira e de InfraEstruturas da Justiça. Em relação a 2008, há um aumento das receitas próprias, de 708,9 milhões de euros para 1429 milhões de euros, pelo que gostaria que o Sr. Ministro pudesse dar alguma explicação sobre a origem desta duplicação de receitas no orçamento do Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça.
Já agora, relativamente aos mecanismos de resolução alternativa dos litígios — a mediação, a arbitragem e outros —, gostaríamos de saber quanto é que o Estado irá gastar com eles, concretamente, qual é a verba
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que o Estado vai despender com a transferência de competências, em muitas situações, dos tribunais para estes mecanismos de resolução alternativa de litígios, fazendo uma distinção entre os julgados de paz e estes outros mecanismos de mediação e de arbitragem.
Há uma questão que já foi colocada, que tem a ver com a locação de edifícios, e que gostaria de colocar numa perspectiva mais ampla, fazendo uma comparação entre a situação do ano em que nos encontramos e a situação que se verificava em 2005.
Relativamente a 2008, há, neste Orçamento, um aumento de 3 milhões de euros, previstos nas verbas para locação de edifícios, mas, face a 2005, há um aumento de 27 milhões de euros. É que, em 2005, a verba destinada à locação de edifícios era de 9,3 milhões de euros e, neste momento, o Estado prevê gastar, em 2009, 36 milhões de euros. A questão que se coloca, Sr. Ministro, é a de saber se é uma orientação política correcta a de o Estado gastar, sucessivamente, dezenas de milhões de euros com a locação de edifícios e não investir na sua construção.
Até que ponto é que esta orientação que o Governo assume, de gastar dezenas de milhões de euros, todos os anos, em locação de edifícios, não significaria uma poupança para o Estado se este gastasse, sim, na construção de edifícios em vez de ter de recorrer à locação a privados? Gostaria que nos pudesse dar nota disto, sobretudo porque há uma quadruplicação das verbas que, em 2005, estavam destinadas à locação de edifícios.
Concretamente, em relação à questão dos novos tribunais a instalar no Parque das Nações, gostaríamos de saber se, entretanto, já foram ou não efectuadas diligências no sentido de os instalar, de facto, porque a informação que temos é a de que o Estado está já, há alguns meses, a pagar as rendas daqueles edifícios sem que os tribunais estejam ainda instalados. Portanto, gostaríamos de saber qual é a justificação para isso e se, entretanto, já foram tomadas medidas para promover a referida instalação.
Uma outra questão, Sr. Ministro, tem a ver com despesas de pessoal. Há uma norma, este ano, no Orçamento do Estado, que prevê que todos os serviços da Administração Pública, em 2009, tenham de proceder ao pagamento de 7,5% da Caixa Geral de Aposentações de todos os seus funcionários. Isto significa que há uma diminuição real nas verbas previstas no orçamento do Ministério da Justiça, no que diz respeito às remunerações certas e permanentes, ou seja, às despesas com o pessoal: em 2008, essa verba era de 822 716 milhões de euros, para 2009, a verba que está prevista é de 849 835 milhões de euros, o que significa que, se descontarmos a transferência que terá de ser feita para a Caixa Geral de Aposentações, que é de 63 000 milhões euros, na realidade, este ano, para remunerações certas e permanentes, há uma verba de 786 097 milhões de euros e, portanto, há, de facto, menos despesas previstas com pessoal. Gostaríamos que o Sr.
Ministro nos pudesse dar alguma explicação sobre o que está na origem disto. Será, de facto, a continuação da não contratação de funcionários? Será restrição de pessoal? Mas onde? Onde é que o Ministério da Justiça está a prever reduzir o pessoal? Essa situação é preocupante sobretudo em relação à Polícia Judiciária. E gostava de suscitar esta questão com particular preocupação, porquê? Relativamente ao orçamento da Polícia Judiciária, em 2008, para as despesas com remunerações certas e permanentes, a verba inscrita era de 77 milhões de euros e, para 2009, prevê-se que haja um aumento de 81 123 milhões de euros. A fatia destes 81 milhões que corresponde àquilo que terá de ser transferido obrigatoriamente para a Caixa Geral de Aposentações, Sr. Ministro, é de 6084 milhões de euros, ou seja, 6 milhões de aumento da despesa da Polícia Judiciária. Portanto, Sr. Ministro, perante um quadro em que o orçamento global da Polícia Judiciária tem um aumento de 1403 milhões de euros, isto significa uma redução real, uma vez que a despesa que acresce à Polícia Judiciária é de 6084 milhões de euros. Gostaríamos, pois, de perceber como é que se vai garantir que, de facto, não há uma diminuição, sobretudo, dos recursos, dos meios humanos ao dispor da Polícia Judiciária.
Para terminar, Sr. Ministro, uma questão que também já foi aqui colocada mas cuja importância não queremos deixar de reforçar, que tem a ver com o pagamento aos defensores oficiosos.
De facto, há uma situação que consideramos muito pouco aceitável, que é a de os defensores oficiosos que são nomeados pelo Estado, no âmbito de processos – e não está em causa a dificuldade económica dos arguidos, não é isto que está em causa, porque há uma nomeação de um defensor oficioso quando ele é necessário para a defesa do arguido, porque a lei assim o prevê e porque o arguido não tem advogado constituído e, nessa medida, o Estado indica um advogado que defenda aquele arguido —, constituírem uma
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despesa suportada pelo arguido, a menos que peça apoio judiciário, no pagamento da conta ao Estado, nas custas que tem a pagar no final do processo.
A verdade é que se continuam a verificar atrasos no pagamento desta despesa, por parte do Estado, aos advogados. E, recordando que esses defensores oficiosos são, sobretudo, advogados mais jovens, em início de carreira, que têm mais dificuldades, do ponto de vista económico, para manter a sua actividade e para se poderem sustentar, esta situação assume, obviamente, uma dimensão ainda mais preocupante. Portanto, Sr.
Ministro, gostaríamos de perceber qual é o ponto da situação, em concreto, relativamente a esta questão e que medidas é que o Governo vai tomar para que o pagamento aos defensores oficiosos possa ser, de facto, mais atempado e possa garantir a estes profissionais a justa retribuição pelo trabalho que desenvolvem.
Muito obrigado pela sua compreensão, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado João Oliveira.
Para concluir esta ronda de questões, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, V. Ex.ª começou, na sua intervenção, por fazer referência a que este era o último orçamento nesta Legislatura, querendo dizer, de alguma maneira, que também seria esta, no futuro mais próximo, a última oportunidade para se apresentarem as grandes propostas do Governo para a área da justiça.
Permita-me que lhe diga, como comentário geral, que o Sr. Ministro, ao longo destes três anos e meio de Legislatura, e mesmo nos anteriores orçamentos, deu sempre uma importância muito grande – aliás, notou-se hoje também, no seu discurso – à simplificação dos procedimentos, à libertação dos cidadãos e das empresas da burocracia administrativa, enfim, deu um peso enorme a esta área do seu Ministério e da sua governação.
Não quero dizer que não se trata de uma área importante, nem quero que o Sr. Ministro retire essa ilação, mas percebo por que é que dá toda esta ênfase à questão da simplificação administrativa e dos procedimentos. É que, de facto, de alguma forma, pode aqui trazer e mostrar uma série de gráficos que têm sempre o seu indicador a subir, a subir, como factor positivo.
Porém, Sr. Ministro, não deixando de dizer, como é óbvio, que a simplificação e o combate à burocracia são importantes e, de facto, estão até na ordem dos dias de hoje, os objectivos na área da justiça, mesmo aqueles a que o Governo se propunha, no seu Programa do Governo, nas primeiras edições do Justiça de A a Z, de que o Sr. Deputado Fernando Negrão já falou, não se limitam, simplesmente, a esta área. Há outras áreas muito importantes na justiça e não vi, no que li do Orçamento do Estado para 2009, nem ouvi, na intervenção do Sr. Ministro, o empenhamento e a relevância que essas questões me parecem dever merecer.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues disse, com um tom positivo, que o dinheiro não vai faltar. Era quase caso para dizer: Deus o ouça, Sr. Deputado, Deus o ouça! Mas permita-me que entre numa questão concreta e para a qual gostaria de ouvir a explicação do Sr.
Ministro, até porque não a encontrei na documentação.
No âmbito da investigação criminal, o Sr. Ministro deu os números da subida significativa de investimento para a Polícia Judiciária, para o Ministério Público, etc. No documento que nos distribuiu, que tenta desdobrar essa verba, encontramos 728 000 euros de investimento da Polícia Judiciária em actividades científicas e periciais.
Ora, Sr. Ministro, nos debates que se têm realizado sobre as questões relacionadas com a investigação criminal são geralmente apontados como um ponto fraco da investigação criminal os recursos existentes nestas áreas científicas e periciais.
Gostava de saber, se o Sr. Ministro nos puder dizer, como é que chegaram a este valor ou o que é que este valor significa em termos de actividades científicas e periciais. Isto está conforme o quê? Precisamos saber isto para percebermos e avaliarmos se o investimento em investigação criminal é aquele que é necessário ou se não é, se fica aquém disso. Portanto, estes 728 000 € significam exactamente o quê? Porque, por exemplo, são mais fáceis de identificar os 1,1 milhões de euros destinados à renovação da frota automóvel. Neste caso, percebemos muito bem que são para comprar novos automóveis. Também não sou contra, como é óbvio. Mas quero perceber em que é que os 728 000 € vão ser investidos.
Passemos a outras questões, pois não quero ultrapassar o tempo de que disponho.
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Sr. Ministro, gostava de lhe falar em três áreas que vão um pouco além da simplificação dos procedimentos.
Primeira área: prisões.
Sr. Ministro, o seu Governo e o seu Ministério começaram a Legislatura a falar da reforma do sistema prisional, baseando-se num relatório que ficou conhecido como o «relatório Freitas do Amaral».
O Sr. Ministro da Justiça: — Não é verdade!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O Sr. Presidente tem que me dar autorização para ir buscar os livros, porque por acaso não os trouxe, mas está escrito pelo Sr. Ministro. Aliás, já tive ocasião de o dizer, inclusivamente, em Plenário. Está escrito e eu vou buscar os livros para o demonstrar. Que houve alteração de posição já nós reparámos. Já reparámos que houve alteração de posição e de orientação do Governo sobre esta matéria.
Houve sucessivos recuos, inclusivamente quando aqui se discutiu um projecto de lei de reforma do sistema prisional da autoria, neste caso, do PSD. Estamos a chegar ao fim da Legislatura e eu queria que me fizesse o ponto de situação sobre esta matéria.
O Sr. Ministro refere, ainda, que vai haver um grande investimento, nomeadamente, na área da saúde. Li o relatório e verifiquei que lá o Sr. Ministro diz que é para aproximar as prisões dos serviços prestados pelo Serviço Nacional da Saúde. Já fiz esta pergunta muitas vezes, Sr. Ministro, mas vou fazê-la de novo para perceber se, neste último Orçamento, ficamos com a certeza absoluta não que vai haver aproximação ou meia aproximação mas, sim, de que, finalmente, o Serviço Nacional de Saúde vai entrar nas prisões e vai prestar aos cidadãos e às cidadãs que, como é óbvio, estão presos a cumprir uma pena os cuidados de saúde em igualdade de circunstâncias.
Além disso, Sr. Ministro, o objectivo de erradicar o balde higiénico desapareceu do Orçamento, não encontro a referência em lado nenhum.
Uma vez que o Sr. Ministro começou a Legislatura a dizer que ia erradicar o balde higiénico no prazo de um ano, salvo erro (isso também está escrito), a pergunta que lhe faço é se o Sr. Ministro garante à Assembleia da República que vai terminar a Legislatura erradicando o balde higiénico. Espero que, pelo menos, possa dar essa garantia.
Segunda área: centros educativos.
Os centros educativos estão em situação de ruptura, o que é perfeitamente inadmissível. O Sr. Ministro conhece os protestos e a situação, que tem vindo a público, que se vive internamente nos centros educativos.
Sr. Ministro, digo-lhe, com toda a franqueza, que acho que esse é um problema de extrema gravidade, é um problema que nos deveria preocupar a todos, à sociedade em geral, porque se nós falharmos (e quando digo «nós», refiro-me a cada um de nós na medida das suas responsabilidades, e das responsabilidades políticas com certeza, embora também nos esforcemos para que as coisas não falhem) naquilo que os centros educativos devem fazer, falhamos em tudo. É o investimento naqueles jovens que tem que ser fundamental e para isso têm que existir todos os meios! É claro que tem que dar prejuízo! É claro que tem, porque o benefício dessa intervenção vê-se a longo prazo e é toda a sociedade que ganha! Sr. Ministro, todos sabemos que há problemas sérios de falta de pessoal nos centros educativos e o Sr.
Ministro diz que vai abrir mais três centros. Diz que vai abrir o da Madeira. Em relação a esse, convenhamos, é a quarta vez que o diz no Orçamento do Estado. Mas porque está pronto e mobilado, como sabemos, que abra! Relacionando com um outro ponto, o do recrutamento moderado e selectivo —, de facto, acho que tem um certo encanto esta maneira de falar do recrutamento! — constante da nota explicativa, na qual se refere que até 2009 estarão em curso, ou serão concluídos, os processos de recrutamento, gostaria que me dissesse se garante que, nestes processos de recrutamento, estão os de admissão de pessoal técnico especializado, e não só, de modo a que os centros educativos funcionem com todas as condições de segurança, de intervenção social e pedagógicas que nos são exigidas no trabalho e na intervenção junto desses jovens como sociedade moderna e civilizada.
A terminar — e serei breve, Sr. Presidente —, tenho que voltar à questão que coloco sempre, a da vigilância electrónica, ou, falemos em linguagem mais corrente, a das pulseiras electrónicas para agressores no caso de violência doméstica.
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Já conseguimos saber, após várias insistências, através do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, que, no concurso internacional, serão atribuídas para esse fim 50 pulseiras electrónicas. Sr. Ministro, tenho que dizer, com toda a franqueza, que esse número de pulseiras electrónicas, para simplificar a linguagem, é irrisório perante o volume e a dimensão que a violência doméstica está a assumir no nosso País. Pesem — faço o parêntesis — todos os avanços registados, nunca tivemos um ano como este em termos de homicídio conjugal. Já coloquei estas questões directamente ao Sr. Ministro da Presidência.
O que pergunto, para ver se nos entendemos, é, se dos 2 milhões de euros previstos para investimento no alargamento da vigilância electrónica, qual é a parte que cabe ao combate à violência doméstica.
Por aquilo que percebo e leio dos documentos do seu Ministério, pretendem o «Alargamento do sistema de vigilància electrónica á fiscalização da pena acessória de proibição de contacto como a vítima (»)«.
Sr. Ministro, a questão que lhe coloco é a seguinte: e a aplicação da vigilância electrónica à medida de coacção de obrigação de permanência na residência (o n.º 3 do artigo 201.º do Código de Processo Penal), que foi um avanço significativo na reforma? Então, quando é que vem essa medida? Porque essa medida é que é a preventiva! Essa medida é que é muito importante, Sr. Ministro! Gostaria de obter resposta a estas questões. Penso que já são algumas e fico por aqui.
O Sr. Presidente: — Para responder a este acervo de questões, vou conceder a palavra ao Sr. Ministro da Justiça. O Sr. Ministro, querendo, naturalmente, poderá delegar nos Srs. Secretários de Estado.
Por uma questão de igualdade de «armas», o Sr. Ministro tem o mesmo tempo somado destas intervenções, que é 50 minutos, cum grano salis 60 minutos. Mas V. Ex.ª saberá como usar criteriosamente esse tempo.
A seguir a conceder a palavra ao Sr. Ministro terei que me ausentar por razões de natureza pessoal, mas a reunião será conduzida superiormente pela Vice-Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr.ª Deputada Teresa Venda, que está ao meu lado.
Sr. Ministro, tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, abordarei um número significativo de questões e, depois, pedir-lhe-ei que autorize que os Srs. Secretários de Estado se debrucem sobre algumas matérias que lhes estão especialmente atribuídas.
Sr. Deputado Fernando Negrão, a propósito da questão que introduziu — arrendamento versus investimento em regime de propriedade —, queria dizer-lhe que o exemplo que citou não é um exemplo de que tenha aumentado o número de arrendamentos existente; é, pelo contrário, um exemplo de que diminui significativamente o número de arrendamentos que tinham sido anteriormente feitos.
Portanto, em matéria de arrendamento, a soma é a redução do arrendamento. Não se trata de uma brincadeira mas de demonstrar a racionalidade de uma operação que passa de muitos arrendamentos para um só arrendamento num contexto de melhores condições e melhor qualidade. O balanço com a realidade existente é positivo.
Em todo o caso, não existe nenhuma opção exclusivista neste sentido. Pelo contrário, a proposta de Orçamento atribui um valor superior a 55 milhões de euros a investimentos em propriedade — investimentos em obras de raiz, em tribunais novos, etc. — e não em matéria de arrendamento. Logo, neste domínio, não existe uma ortodoxia mas, sim, uma abertura a oportunidades que podem dar soluções mais expeditas e mais funcionais do que outras.
Como o Sr. Deputado sabe, hoje em dia circulam muito as orientações, em diferentes países, no sentido de os próprios edifícios públicos darem lugar a rendas que são pagas pelas entidades utilizadoras. Será uma situação para a qual também evoluiremos necessariamente, em 2010. Por conseguinte, toda esta matéria adquire, hoje, novos contornos, novos parâmetros e é nesse quadro que ela terá que ser avaliada e não necessariamente nos termos em que o era no passado.
Em relação ao exemplo que referiu, que não tem a ver com a instalação da Comarca da Grande Lisboa Noroeste, cuja sede é em Sintra, mas tão-somente com o Tribunal de Família e Menores da Amadora, queria dizer-lhe que, logo que tomei conhecimento dos contornos que a situação oferecia, ou parecia oferecer, determinei a suspensão dessa operação.
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Portanto, uma decisão final sobre esta matéria será tomada tendo em consideração todos os aspectos relevantes, porque, na realidade, os elementos que não tinham sido conhecidos devem ser ponderados e resolvidos de uma outra forma. Era essa circunstância que queria, aqui, referir. Ela já é pública, mas no Ministério esses aspectos são ponderados, avaliados e decididos por forma a que não se gerem ambiguidades ou suspeições acerca do grau de exigência que deve rodear estas operações.
Em relação às alienações, todas são publicitadas num site do Ministério das Finanças e da Administração Pública. Nós não fazemos alienações fora do circuito do Ministério das Finanças, nunca tivemos qualquer relação directa com nenhuma entidade imobiliária ou outra. É sempre uma entidade pública, uma entidade de capitais públicos, que se encarrega desta operação, uma operação cujo titular público não é o Ministério da Justiça mas, sim, o Ministério das Finanças. Logo, essa lista existe. Contudo, há também um site onde as alienações são tornadas públicas, mas, Sr. Deputado, se houver dificuldade, estamos perfeitamente em condições de fornecer a totalidade dos elementos relevantes sobre esta matéria.
Em relação ao mapa judiciário, fiz um enunciado das principais medidas que ele compreendia e das suas implicações em data, já este ano, e, na altura, foi dito, e eu aqui repetiria, que os encerramentos, para além dos sete que já foram feitos, terão de ser ponderados em função do momento da disponibilização das novas infra-estruturas.
Muitas vezes, enuncia-se primeiro o que vai ser encerrado, promove-se o encerramento e anuncia-se para uma data posterior o que vai ser feito. Realmente, esse procedimento é sempre fonte de alguns equívocos e dificuldades. Pensámos, por isso, que os encerramentos deverão ser decididos e efectivados, porque existem muitos estabelecimentos sem condições e que não se justificam com as novas construções, em função dessa disponibilização das novas instalações.
Quanto ao Conselho Superior da Magistratura, diria que a subida de 5 milhões de euros para 7 milhões de euros é já um elemento significativo de receptividade em relação às observações que foram feitas. E, embora o Conselho, autónomo, não esteja sob a tutela do Ministério da Justiça, nunca nos pusemos de fora de todas as diligências e iniciativas no sentido de melhorar a posição financeira e o orçamento do Conselho Superior da Magistratura junto do Ministério das Finanças e contribuímos — estamos certos disso — para a resolução desses problemas, e é o que continuaremos a fazer.
Esta subida consiste numa boa demonstração de uma situação diferente daquela que existia no ano passado.
Queria dizer que temos mantido um diálogo muito constante sobre os problemas da implementação das circunscrições-piloto e do novo mapa judiciário com o Conselho Superior da Magistratura, temos comparecido em diversas reuniões, em grupos de trabalho, fomos ao Plenário e ponderámos atentamente, como referi no princípio, todas as sugestões que nos foram feitas.
As últimas foram apresentadas exactamente na quarta-feira — um documento bastante completo e com novos problemas — e nós damos toda a prioridade ao encerramento das questões que envolvem todos os aspectos que o Sr. Deputado Fernando Negrão referiu. Será, portanto, numa data muito breve que encerraremos esta matéria, sendo certo que, para nós, o bom relacionamento com o Conselho Superior da Magistratura e com os magistrados é um elemento fundamental para que esta experiência arranque bem. Já noutros casos, como o caso feliz da utilização pelos magistrados do sítio dos magistrados judiciais, ficou bem demonstrado que o esforço de aproximação em relação a certas funções, calendários, etc., foi um bom elemento para a aceitação, para a legitimação e para o bom resultado.
Sr. Deputado, a nova legislação prevê expressamente uma adaptação em legislação especial, a editar até Junho do próximo ano, às particularidades das forças de segurança. Ou seja, o princípio que se encontrava adquirido na Lei de Segurança Interna, de que é a legislação especial que regula esta matéria, vai manter-se.
Portanto, estão em causa princípios e preocupações gerais que devem ser adaptados às necessidades próprias de qualquer força de segurança na legislação que sairá até essa altura.
Concordo com o Sr. Deputado quando diz que se trata de situações que têm particularidades e não podem ser reconduzidas a soluções rígidas, que serão próprias para outro tipo de funcionários públicos.
Finalmente, o Sr. Deputado fez referência à regulamentação da PJ. A regulamentação da PJ está concluída e está a cumprir os últimos passos para a sua próxima publicação.
Também gostava de corresponder à sua ideia, embora tivesse gostado de ouvir, sobretudo, as sugestões do Sr. Deputado sobre como pode reforçar-se a confiança e trabalhar a pensar nos utentes»
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O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Não tive tempo. O Sr. Presidente não me deu tempo!
O Sr. Ministro da Justiça: — Digo isto com sinceridade.
Na óptica do Governo, há que implementar certos valores — responsabilidade, avaliação e transparência.
Estamos convencidos de que introduzimos muitas soluções de responsabilidade, muitas soluções de avaliação, em vários momentos — até fizemos algumas em documentos cujos conteúdos foram obtidos em conjunto —, como também em matéria de transparência, onde, por exemplo, se tornará possível, até com esta nova base tecnológica, verificar em que ponto se encontram e como avançam os processos em que as partes são intervenientes, que é um elemento de controlo e de avaliação do trabalho dos juízes que não tem estado disponível e que pode ser muito importante para ajudar a criar também uma consciência pública de responsabilidade e de serviço aos cidadãos.
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, está convidado — e a comissão pertinente — para uma visita ao Campus de Justiça. É com muito gosto que veremos concretizar essa visita.
Indo directamente às suas questões, queria dizer-lhe que os dados que temos sobre o número de evadidos e sobre o número de saídas precárias sem retorno nos colocam nos melhores dos últimos oito anos. Portanto, não temos razão para pensar que o sistema penitenciário se tornou mais permissivo ou menos eficiente, antes pelo contrário.
Em relação à prisão preventiva, reafirmo que estamos agora na casa dos 19%, o que nos situa entre os países da Europa com boas marcas neste domínio, mas não sem que países como a Alemanha ou o Reino Unido se encontrem em melhor posição do que nós.
O Sr. Deputado solicitou algumas notícias em relação à investigação criminal e eu aproveito para dizer algo que é muito reconfortante: o facto de, neste momento, já existirem muitos actos praticados pelo Ministério Público por via electrónica. Portanto, podemos dizer que hoje já existem novas funcionalidades, como as pesquisas nacionais de arguidos e a comunicação electrónica de inquéritos com a PSP, algo que era identificado como uma dificuldade séria em termos de tempo, burocracia, etc.
Desde 17 de Julho, já registámos 76 pesquisas nacionais de arguidos, que quer dizer, no fundo, consultas ao conjunto do sistema sobre a existência destas posições dos arguidos, e, simultaneamente, registámos 8502 inquéritos que já foram recebidos do órgão de polícia criminal para o Ministério Público por via electrónica, o que significa que está a chegar a esta área um instrumento muito mais célere e muito mais eficiente, que pronuncia, no futuro, melhores resultados e resultados mais rápidos.
Dirigindo-me agora ao Sr. Deputado Nuno Melo, responderei a algumas questões e, depois, deixarei aos Srs. Secretários de Estado o encargo de referir as outras questões colocadas.
Quando se fala em dar integral cumprimento, e quero ir directo à preocupação manifestada pelo Sr. Deputado» Ao longo dos anos, no Ministçrio da Justiça fizemos uma tarefa de visibilização e aplicação do princípio da transparência a muitas matérias que não se encontravam contabilizadas. Isto aconteceu, por exemplo, com as conservatórias, onde nem a receita nem a despesa eram directamente contabilizadas.
Imagine o que isso não significava!? E esse princípio continua a ser aplicado neste Orçamento, de maneira a transmitir uma imagem muito mais real do que são os movimentos financeiros, num sentido e noutro, que decorrem sob a égide do Ministério.
Sobre a informática do Ministério Público, que foi também uma questão que colocou, a resposta anterior dá bem a ideia do que está a ser feito neste domínio. Embora o Sr. Deputado tenha falado na inexistência de referências em relação ao Ministério Público, devo esclarecer que há rubricas gerais que compreendem todas estas inovações — há mesmo uma autónoma no valor de 240 000 €. Mas queria dizer-lhe, sobretudo, que, neste momento, a aplicação sítios electrónicos do Ministério Público tem sido muito utilizada, registando-se a prática de 400 000 actos por parte do Ministério Público em 2008, o que para uma aplicação nova é, certamente, um acolhimento surpreendente da parte dos Srs. Magistrados.
Não volto a repetir os números das pesquisas nacionais de arguidos ou da comunicação electrónica de inquéritos, que são novas funcionalidades de grande importância para a investigação e a instrução de processos, nem vou referir os números dos actos respeitantes aos funcionários do Ministério Público, que se traduzem em muitos milhões.
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Creio que pode dizer-se, em relação ao Ministério Público, à investigação criminal e à transferência de elementos por via electrónica entre órgãos de polícia criminal e Ministério Público, que estamos a atingir um momento bastante auspicioso. Nós não tínhamos essa funcionalidade, não tínhamos este instrumento e agora já estamos a utilizá-lo.
O Sr. Deputado fez ainda referência ao Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, cujo prazo da consulta pública já terminou — foi aqui referido já há vários meses atrás — e cuja proposta, portanto, virá à Assembleia da República. Não posso garantir-lhe, exactamente, se será até ao dia 31 de Dezembro ou se será logo a seguir, mas ele faz parte do nosso caderno de encargos, faz parte dos nossos compromissos e, além de mais, o trabalho está feito.
Portanto, aqui o terá, com toda a possibilidade de discutir as suas soluções.
Em matéria de apoio judiciário, temos um novo sistema em vigor desde Setembro. Queria dizer que, este ano, já pagámos 29 milhões de euros e tencionamos, até ao dia 31 de Janeiro, liquidar todas as notas de honorários ou facturas existentes neste domínio.
No passado, já tínhamos pago 105 milhões de euros, o que significa que o nosso pagamento neste domínio representa um interesse muito elevado pelo cumprimento, que compara bem com todos os números anteriores. Gostaríamos de fazer melhor e ainda queremos fazer melhor, mas não sentimos que, em qualquer das etapas anteriores, existam números comparáveis com aqueles que aqui apresentamos.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Falou em 29 milhões de euros pagos agora e 105 milhões de euros em dívida. É assim?
O Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Tiago Silveira): — Não, Sr. Deputado. São 105 milhões de euros pagos até final de 2007 (desde Abril de 2005) e 29 milhões de euros desde Janeiro deste ano.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Falta quanto?
O Sr. Ministro da Justiça: — O Sr. Secretário de Estado dará depois conta dos pormenores.
O Sr. Deputado João Oliveira não tem razão quando diz que o apoio judiciário é hoje mais restritivo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Eu não disse isso! Disse que era restritivo.
O Sr. Ministro da Justiça: — Ainda bem que o diz! O apoio judiciário não é mais restritivo, é menos restritivo. Nós imaginamos que cerca de 30% mais de beneficiários tenham surgido com esta nova regulamentação.
Em relação às taxas, quero referir o fenómeno de há pouco, que é o de que, até data recente, as receitas das conservatórias não iam directamente ao orçamento, só os saldos entre as receitas e as despesas é que iam — foi uma modificação que se verificou não neste orçamento, mas no último, o tal princípio da transparência —, além de ter havido, como o Sr. Deputado bem sabe, o aparecimento de um conjunto de serviços, de inovações e de produtos com valor acrescentado, que estiveram na origem de novas fontes de receita que fazem parte das receitas próprias da justiça.
Há pouco, tinha sido colocada a questão de saber se eram as receitas próprias ou as receitas gerais. Num momento difícil para o Estado e para as finanças públicas em Portugal, trata-se de encontrar os meios de financiamento apropriados para a situação que se vive e, sobretudo, de resolver os problemas da justiça, fazendo combinar os apports das receitas próprias e das receitas gerais.
O número que o Sr. Deputado refere em relação à locação é um número que não pode estar certo.
Poderemos, depois, ver isso, mas não pode estar certo, porque o arrendamento mais dispendioso que foi negociado é o que diz respeito ao Campus da Justiça de Lisboa. Posso dar-lhe os números depois, mas não há possibilidade de esse número ser real. Posso verificar, mas não é correcto esse número, não há possibilidade de ele ser correcto.
Em relação às despesas de pessoal, é verdade que existe esse pagamento dos 7,5%, mas também existem, como viu, taxas e formas de crescimento que vão para lá disso e este valor só se aplica às remunerações certas e permanentes, como bem sublinhou.
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A este respeito, quero, sobretudo, dizer que, em relação à Polícia Judiciária, existe no orçamento um artigo que, expressamente, prevê um reforço da ordem dos 8 milhões de euros, tendo em vista apoiar a investigação da criminalidade grave e violenta, que visa, exactamente, reconstituir a um nível mais elevado o conjunto de apoios e de suporte financeiro à Polícia Judiciária.
Sr.ª Deputada Helena Pinto, devo dizer-lhe que teria um grande gosto em discorrer sobre as reformas legislativas, até por razões profissionais. Só não o faço para não utilizar tempo de um órgão legislativo, que tem intervenção nessas matérias. Mas, realmente, o meu gosto não vai para outra área por qualquer razão, considero-a muito importante, mas até nas reformas legislativas no seu conjunto, a começar pelas modificações na esfera do Direito Penal e do Direito Processual Penal, o meu entusiasmo poderia apresentarse de maneira mais completa.
Portanto, a sua interpretação, a meu ver, não assenta na realidade. Esses sistemas, que, aliás, se ligam, como se diz agora, «à minha história de vida», é que me dizem mais. Não posso aceitar a sua referência de que haveria uma inflexão para as outras matérias por não haver resultados. Não! Há muitos resultados, há muita legislação, há muita reforma legislativa.
Gostaria de dizer que uma das áreas mais prestigiadas da Polícia Judiciária é o Laboratório da Polícia Científica, que tem um histórico muito valioso neste domínio. Obviamente que carece de alguns apoios — não é demais lembrá-lo no orçamento — para favorecer esse tipo de desenvolvimento, que passa por automatizações periciais, que, quando o laboratório foi criado há uma dezena de anos atrás, não eram absolutamente exigíveis para desenvolver o seu trabalho, mas que agora são, por sistemas automatizados de impressões digitais e por informatização de ficheiros. Tudo isso são elementos que têm de ser apoiados e referidos no orçamento e que demonstram esse interesse pela Polícia Judiciária. Com uma particularidade: qualquer destas verbas pode ser objecto de um reforço, seja qual for a rubrica em que se encontre, de harmonia com uma cláusula expressa que contempla a Polícia Judiciária.
Sobre as prisões, quero dizer-lhe que não seguimos a lógica do projecto que referiu. A lógica era assim: primeiro, uma lei-quadro e, depois, ao longo dos anos, ir-se-iam cumprindo os seus passos. Desde o princípio que eu disse que a lógica é ir tomando as medidas.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O Sr. Ministro disse o contrário!
O Sr. Ministro da Justiça: — Desculpe! Tem de ouvir isto! Essas medidas estão diagnosticadas há muitos anos. Quem quer que ande com estes problemas há uma ou duas décadas conhece essas medidas. Conhece-as tanto como as medidas sobre a prisão preventiva.
Conhece-as todas e, portanto, não faz muito sentido reportar isso a estar ou não com um certo documento.
Mas quero dizer-lhe o seguinte: em relação ao balde higiénico, hoje já só existem reclusos em cela sem instalações sanitárias num único estabelecimento prisional, que é o Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, que vai ser substituído num prazo máximo — esperamos — de dois anos por um outro estabelecimento cujo concurso já se iniciou. A notícia que tenho, de hoje, é a de que, fora o estabelecimento de Pinheiro da Cruz, não existe nenhum recluso que esteja numa cela sem instalações sanitárias.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas em Pinheiro da Cruz ainda existe!
O Sr. Ministro da Justiça: — É isso que eu estou a dizer! Só em Pinheiro da Cruz!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas o Sr. Ministro propôs-se erradicar!
O Sr. Ministro da Justiça: — Eu acabei de dizer que Pinheiro da Cruz era a única excepção!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas não erradicou!
O Sr. Ministro da Justiça: — Mas eu não estou a dizer que erradiquei! Estou a dizer que não há ninguém, sem ser em Pinheiro da Cruz, que esteja numa cela sem instalação sanitária! É o que me assegura o sistema prisional. É essa a notícia, e espero que seja uma boa notícia. Para mim, já é uma boa notícia. Havia 1600
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celas num horizonte de intervenção e, portanto, aquilo que fizemos até hoje é algo que é incomparavelmente diferente daquilo que tinha sido feito anteriormente.
Em relação ao sistema de saúde, quero dizer-lhe que o grupo de trabalho que se encarregou de estudar e propor a solução para esses problemas, já concluiu o seu trabalho e já o entregou e, em data próxima, será aprovada uma resolução, prevendo o conjunto das intervenções necessárias para assegurar essa transição, que é complexa, onerosa e que envolve muitos investimentos. Portanto, também já não estamos exactamente no ponto em que estávamos.
Sr.ª Presidente, se me permitir, passo a palavra aos Srs. Secretários de Estado para completarem as minhas respostas.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente da Comissão de Economia e Finanças, Teresa Venda.
A Sr.ª Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça (Conde Rodrigues): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, vou tentar completar algumas respostas que o Sr. Ministro já deu.
Em relação à questão dos investimentos, quero, de facto, sublinhar que nós, mesmo no que diz respeito à remodelação de equipamentos — e posso referir não só equipamentos judiciais mas também equipamentos na área da medicina legal, da reinserção social, etc. —, temos uma verba prevista, que, especificamente no que diz respeito apenas ao sistema judicial, como foi sublinhado, é de 55,4 milhões de euros. Temos tribunais novos em construção, por exemplo, em Gouveia e em Cabeceiras de Basto, e, fora do âmbito que foi aqui referenciado da modernização dos espaços para a implementação da reforma do mapa judiciário, muitos outros estão a ser remodelados. Posso dar exemplos de grandes obras neste momento em curso: Amarante, Vila do Conde, Caldas da Rainha, isto só para dar exemplos em três pontos diferentes do País.
Portanto, como podem ver pela descrição do PIDDAC, há dezenas e dezenas de intervenções em todo o País na remodelação do parque judicial existente, na criação de tribunais novos e naturalmente que, em outros casos, a solução do arrendamento está sempre presente. Posso referir, por exemplo — é, às vezes, não se tem esta noção —, que, de 2002 a 2005, o Ministério da Justiça tinha, por mês, compromissos com rendas de 1,131 milhões de euros e, de 2005 a 2008, os nossos compromissos com rendas, excluindo o Campus da Justiça de Lisboa, de que já falámos e que a seguir abordarei um pouco, são, em média, da ordem dos 427 000 €/mês.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Excluindo!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Justiça: — Portanto, como vêem, temos menos contratos de arrendamento e mais edifícios em construção, o que é um ponto importante.
Quando ao Campus da Justiça de Lisboa, toda a gente se lembra de se falar na ideia de ter um espaço para uma cidade judiciária em Lisboa. Aliás, o Sr. Procurador-Geral da República dizia, numa visita, esta semana, que há 30 anos que ouvia falar nisso, com soluções, com projectos feitos para Chelas, para as Olaias, para Telheiras, para Monsanto, isto só para dar alguns exemplos.
Com esta solução que se encontrou, num edifício arrendado a fundos públicos, porque, com excepção da Calouste Gulbenkian, os outros três fundos são a Caixa Geral de Depósitos, o Fundo de Estabilização da Segurança Social e o Fundo do Banco de Portugal, a renda é de 1,568 milhões de euros/mês, mas nós cessámos contratos de arrendamento que tínhamos para este fim no valor de 664 000 € e vamos ter tambçm em poupanças correntes de cerca de 330 000 €.
Além disso, funcionávamos em edifícios velhos e inapropriados e, agora, passamos a funcionar num espaço novo e integrado, que tanto o Conselho Superior de Magistratura, que visitou o espaço, como o Conselho Superior do Ministério Público e o Sr. Procurador-Geral da República acharam adequado para esta finalidade.
Portanto, não só temos ganhos no funcionamento como ainda temos melhores instalações e organizadas num espaço diferente.
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É claro que, neste momento, todo aquele espaço, que são cerca de 65 000 m2, está arrendado — e com isto respondo também à outra questão que foi colocada pelo Sr. Deputado do PCP — precisamente para que se possa fazer a adaptação e se possa preparar a transferência. Ninguém imagina transferir serviços de 25 edifícios de um dia para o outro e sem as necessárias adaptações. Nós, quando fazemos o arrendamento de uma casa, se a quisermos adaptar, naturalmente que o faremos depois do contrato estabelecido. Também é isso que acontece aqui.
A programação para a mudança dos edifícios está estabelecida. Há um grupo de trabalho que envolve o Conselho Superior de Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público e contactos com a Ordem dos Advogados, e toda a adaptação interior do edifício, quer para a área de registos, quer para a área judicial, quer para a área dos serviços da justiça, tem sido feita em conformidade com os diferentes parceiros que, no futuro, usarão aquele espaço. Portanto, é esta a nota que queria deixar aqui.
Gostaria de deixar aqui também uma nota importante, julgo eu, para a questão que foi colocada sobre a gravação digital. Tínhamos dito que nesta Legislatura substituiríamos as cassetes existentes para a gravação dos julgamentos pela gravação digital, mas, de facto, a 31 de Julho deste ano, colocámos em todos os tribunais do País o software para a gravação digital. Portanto, temos cerca de 730 salas de audiência já com gravação digital, tendo antecipado esta solução num ano.
Como o Sr. Ministro, há pouco, aludiu a esta questão, quero referir que também no PIDDAC o sistema informático do Ministério Público tem inscrita uma verba de 240 000 €.
Gostaria de referir-me, ainda, às Despesas com o Pessoal. Gostaria que pudessem, depois, verificar com mais atenção a rubrica Despesas com o Pessoal. Em 2008, tínhamos inscritos 924 milhões de euros para Despesas com o Pessoal. Se somarmos os 7,5% que agora acrescem para a Caixa Geral de Aposentações, dá 994 milhões de euros. Ora, a verba inscrita em Despesas com o Pessoal, no Ministério da Justiça, é de 1016 milhões de euros. Portanto, estamos a falar de uma diferença, neste caso positiva, de 22 milhões de euros entre as despesas de pessoal inscritas para 2009 e as inscritas para 2008. Portanto, julgo que a verba é suficiente. Este é o quarto orçamento e o Ministério da Justiça nunca deixou de cumprir as suas obrigações.
Nesta matéria de pessoal, como o Sr. Ministro referiu, temos tido uma política, que é normal na Administração Pública nestes últimos anos, de redução de pessoas em muitas áreas, mas porque há, todos os anos, centenas de aposentações. E, como sabe, há, em muitas áreas, a não entrada de novos efectivos, bem como uma legislação que diz que os efectivos são substituídos numa razão de duas saídas por uma entrada.
Como também o Sr. Ministro referiu, isso é salvaguardado e têm existido entradas justamente nas áreas especiais que foram evidenciadas. Esta é uma nota que gostaria de deixar.
Uma outra questão colocada diz respeito aos centros educativos, que, penso, é um ponto importante.
Estamos a trabalhar para os modernizar. Em matéria de recursos humanos, com todas as limitações, abrimos agora um concurso para 25 novos técnicos de reinserção social para os centros educativos e o orçamento da reinserção social sobe significativamente. Temos um acréscimo, no orçamento da reinserção social, na ordem dos 4 milhões de euros, para 2009. O mesmo acontece, aliás, na medicina legal e nas outras áreas já aqui sublinhadas. Mas, particularmente, nesta área, julgo que isto deve ser sublinhado.
Quero deixar, ainda, uma nota sobre duas questões colocadas.
Uma delas é relativa à segurança nos tribunais. Como podem ver pelo orçamento, vamos fazer um investimento significativo nesta matéria. O orçamento tem inscritos 300 000 € para sistemas de intrusão, 270 000 € para pórticos detectores de metais, 2 milhões de euros para sistemas de videovigilància e 300 000 € para o Centro de Controle Nacional de Segurança dos Tribunais.
O que está aqui em causa, com esta designação, é algo que hoje existe, de um modo muito limitado, na Direcção-Geral da Administração da Justiça, ou seja, um ponto para onde as centrais de alarme comunicam e onde se faz uma monitorização da situação de cada tribunal. Ora, como vamos também criar sistemas mais integrados de segurança, isso justificará, necessariamente, ter um acompanhamento para os vários tribunais do País, sem que isso signifique qualquer recolha ou tratamento de dados ou qualquer sistema de informação.
É apenas um centro para gestão desse tipo de equipamentos e das várias soluções, o que, no sistema português, e de acordo com as leis orgânicas, é da competência do Ministério da Justiça, porque tem a ver com a logística dos tribunais, não interferindo em nada com matérias que têm que ver com o próprio sistema judicial no que diz respeito à função jurisdicional ou às funções de investigação.
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A segunda nota diz respeito à verificação biométrica de voz. Neste momento, temos sistemas de vigilância electrónica, que eram bastante avançados quando surgiram, mas hoje há soluções que passam, por exemplo, pelo GPS ou pela geo-orientação, e há agora, também, a hipótese de estudar a solução alternativa através do contacto aleatório por telefone ao longo das 24 horas. Portanto, é uma solução que faz o registo e a verificação biométrica de voz, a qual já está a ser usada em alguns países. Fazemos aqui referência à possibilidade de vir a estudar essa solução como alternativa à vigilância electrónica. Portanto, estamos a ponderar soluções que possam ser complementares nessa matéria.
Uma última nota ainda sobre o Conselho Superior da Magistratura. O Conselho Superior da Magistratura tem um reforço orçamental, que decorre de duas vias: por um lado, dos Encargos Gerais da Nação, onde está previsto em termos orçamentais; por outro lado, das transferências do Ministério da Justiça para o Conselho Superior da Magistratura de verbas das suas receitas próprias. O acréscimo previsto, de 2008 para 2009, nas verbas transferidas pelo Ministério da Justiça para o Conselho Superior da Magistratura é de 83,4%. Julgamos que isso também significa um esforço adicional da nossa parte para que possa haver capacidade de resposta do Conselho para os novos desafios.
Sr.ª Presidente, estas são as questões que gostaria de sublinhar.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça, que quer completar alguns aspectos.
O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, quero agradecer as questões que colocaram e referir-me especificamente a algumas delas.
Não vejo como é que a solução de problemas possa ser algo de mau.
Em matéria de descongestionamento dos tribunais, aquilo de que estamos a falar é de restaurar a capacidade de resposta dos tribunais. Sabemos que, durante um período de mais de 10 anos, a pendência processual aumentou cerca 100 000 processos, várias vezes, todos os anos. E, nos últimos três anos, em 2003, 2004 e 2005, sabíamos que esse aumento era mesmo de cerca de 120 000 processos em média. Isto não significava que estavam a entrar mais processos; significava, sim, que havia uma diferença entre o número de processos que entravam e o número de processos que eram devolvidos na ordem dos 100 000 a 120 000 processos por ano.
O que aconteceu em 2006 e 2007, com uma política de descongestionamento dos tribunais, foi ter-se conseguido restaurar a capacidade de resposta dos tribunais. Em 2006, houve mais processos a terminar do que a entrar; em 2007, houve mais processos a terminar do que a entrar. Ou seja, conseguiram-se bons resultados e, sobretudo, evitar aquele crónico crescimento das pendências de 100 000 a 120 000 processos por ano. Isto não pode ser mau. Isto é animador para continuarmos a trabalhar neste sentido e é bom para todos aqueles que utilizam os tribunais e que precisam que estes tenham capacidade de resposta.
Sei que o PCP e o Sr. Deputado João Oliveira têm frequentes críticas à política de descongestionamento, mas a verdade é que ela tem um resultado. E este é o resultado para as pessoas que utilizam os tribunais.
Dir-me-á: «ainda estamos longe do objectivo, que é termos os tribunais a funcionar com uma eficácia maior». De acordo. Temos de continuar a trabalhar, e é isso que estamos aqui a fazer. Temos a noção de que este é um passo muito importante, mas que há outros a dar a seguir. Porém, Sr. Deputado, não era sistema que 10% dos processos penais fossem processos de transgressão. O que isso significa, na prática, é que 10% dos processos penais eram de pessoas que utilizaram os transportes públicos sem pagar bilhete.
Seguramente, o Sr. Deputado sabe que o sistema não era semelhante ao das coimas e contra-ordenações de trânsito, em que há uma entidade administrativa que aplica uma multa, como vulgarmente se diz, e em que se permite à pessoa pagar essa multa antes de o processo ir para tribunal. Não. Aqui era diferente: quem utilizasse um transporte público sem bilhete tinha de ir a tribunal para resolver aquele problema. Era preciso? Muitas vezes, as pessoas precisam é que este tipo de situações possa ser resolvido mais eficazmente e de uma forma mais acessível.
O Sr. Deputado colocou questões relacionadas com os mecanismos de resolução alternativa de litígios.
Quero dizer-lhe que os mecanismos de resolução alternativa de litígios têm aqui um papel para nos ajudar e ajudar as pessoas a poder resolver os problemas da sua vida, de todos os dias, de forma mais próxima, mais
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rápida, se calhar, às vezes, tentando-se promover um acordo. É isso que se quer com a política de desenvolvimento da rede de julgados de paz.
Quero referir novamente aquilo que o Sr. Ministro já disse, ou seja, que, em 2009, teremos duplicado a rede de julgados de paz e sistemas de mediação que, de forma rápida e acessível, permitam fomentar o acordo entre as pessoas, por exemplo, nas áreas de Direito do Trabalho — isto é muito importante —, nos conflitos entre trabalhador e empregador, aliás, na sequência do acordo feito com todos os parceiros sociais, incluindo todas as centrais sindicais e todas as confederações patronais, e em matéria de natureza familiar.
Aquilo que temos previsto, para o próximo ano, no orçamento do Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios é, para os julgados de paz, cerca de 1 230 000 € e, para os sistemas de mediação, cerca de 605 000 €, o que corresponde a um crescimento do investimento nestas áreas, as quais penso que ajudam os cidadãos.
Penso que o PCP tem condições e razões para mostrar contentamento e apoio a estas medidas, não fosse o PCP um dos partidos que, desde o início, muito por iniciativa da ex-Deputada Odete Santos, esteve na linha da criação dos julgados de paz, em Portugal. Recordo que os julgados de paz foram uma criação parlamentar com aprovação e reconhecimento unânime nesta Câmara, o que é muito bom e nos estimula a continuar.
Recordo que os julgados de paz resolvem litígios em dois meses, de tempo médio; cerca de 50% dos seus litígios conseguem resolver-se por acordo e os outros 50% são resolvidos pelo juiz de paz. E estamos a falar de pessoas, de conflitos muito próximos da sua vida, de conflitos em torno dos condomínios e da não prestação das rendas dos condomínios, de questões relacionadas com as rendas dos arrendamentos, portanto, de questões muito ligadas às pessoas.
O Sr. Deputado falou da questão dos custos. Quero dizer-lhe que, em matéria de custos, há uma verdade que precisa de ser reposta. É que foi este Governo, do Partido Socialista, que criou condições para haver reduções de preços e de custos em muitos domínios. Por exemplo, na própria matéria da resolução alternativa de litígios, dos julgados de paz e dos sistemas de mediação. Como sabe, as custas, nos julgados de paz, são muito reduzidas e, nos sistemas de mediação, as custas, as taxas também são muito reduzidas. Por iniciativa do Governo do Partido Socialista, passámos a ter a possibilidade de haver apoio judiciário nestes sistemas, coisa que não havia. Aliás, há vários exemplos de redução de custos muito importantes.
Foi por iniciativa deste Governo e por aprovação desta Câmara, aliás, com vários votos favoráveis, que a Lei do Apoio Judiciário foi alterada. Antes, um agregado familiar com um rendimento líquido de 9000 € por ano, o que dá, mais ou menos, 375 € líquidos por mês por pessoa, não tinha consulta jurídica gratuita e não tinha dispensa total de pagamento de custas. Não tinham, Sr. Deputado, e passaram a ter. Porquê? Por causa de uma lei aprovada nesta Câmara por iniciativa do Governo e que o PCP criticou.
O Sr. João Oliveira (PCP): — E com razão!
O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Agora passaram a ter, quando antes, para poderem ter este benefício — consulta jurídica gratuita e dispensa total do pagamento de custas —, precisavam de ter um rendimento anual inferior a 6350 € por ano no agregado familiar. Agora, estas pessoas, com um rendimento líquido do agregado de 9000 € por ano, passaram a ter este benefício. Antes, só o tinham em condições muito difíceis, situação que resolvemos.
Alargámos o benefício do apoio judiciário, alargámos as situações em que não se paga custas, alargámos as situações em que há consulta jurídica gratuita,»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não é verdade!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — É verdade, é!
O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — » aliás, numa boa deliberação desta Càmara.
Lamentavelmente, o Sr. Deputado do PCP não se uniu a esta decisão, o que foi pena.
Sr. Deputado, as custas judiciais têm uma redução de 25% a 50%, utilizando o sistema informático. O Sr.
Ministro citou números muito impressivos, que demonstram que a generalidade dos advogados, dos utilizadores, está a utilizar muito estes meios. E estes meios significam uma redução de custas judiciais de
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25% a 50%. É uma grande redução e um grande esforço financeiro que é feito aqui e em muitas outras áreas, como, por exemplo, nos sectores dos registos.
Por exemplo, há reduções de 50% das taxas de registo automóvel e de 50% das taxas do registo comercial quando são utilizados serviços on-line. Esta é uma grande redução de preços e cria condições para que os preços dos registos sejam bem mais baratos do que eram antes.
Quanto à questão dos preços do registo predial, que foi referida, há reduções de preço, mas, além de haver reduções de preço, há condições para uma maior transparência. Não somos nós que o dizemos. Quem o diz é a Deco, que, na sua revista, disse que os nossos serviços Balcão Único não existiam antes e que passaram a existir ou o serviço Casa Pronta, para compra de casa, tem reduções de preço. Os nossos números não vão tão longe, mas vão também no sentido de uma redução de preço de 60 a 70%. Isto não pode ser mau!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Então, o relatório do Orçamento está mal!
O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Isto é bom para as pessoas! Não somos nós que o dizemos, é a Deco.
Em relação aos preços específicos do registo predial, vou referir o caso mais frequente em Portugal, que é a compra de casa com financiamento bancário. São 85% das situações, em Portugal.
Sr. Deputado, antes, nunca se percebia qual era o preço e, às vezes, é esse o problema. É que o preço era tão confuso e havia tão poucas pessoas que conseguiam perceber o que realmente iam pagar»
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Agora percebem, só que pagam mais!
O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — » em tantas entidades diferentes, tantas vezes diferentes, que não se apercebiam quanto iam pagar.
Mas eu digo-lhe, Sr. Deputado: antes, pagava-se 125 € pelo registo provisório da aquisição na Conservatória; depois, pagava-se 135 € pelo registo provisório da hipoteca, num acto diferente; depois, pagava-se 25 € por um averbamento à descrição, porque o valor patrimonial tributário do imóvel, em regra, aumenta e esta é a larguíssima maioria das situações; depois, pagava-se 10,98 € por emolumentos pessoais, que é a larguíssima maioria das situações nas conservatórias; depois, tinha de se pagar uma certidão de registo predial, no valor de 31,50 €; depois, em despesas notariais, tinha de se pagar um «bolo« global superior a 400 €, embora nunca se soubesse bem qual era, «bolo« esse que estava dividido — era preciso ser um cientista para saber fazer estas contas — era preciso pagar 176 € e 47 € para uma compra e venda, por exemplo, de uma casa no valor de 150 000 € — 30 000 contos —, mais 143,20 € de mõtuo com hipoteca; 24,30 € de assessoria, 70,58 € de duas certidões da escritura, com 10 páginas, porque, atenção, o preço variava consoante a página — portanto, até aqui era um fenómeno críptico perceber quanto é que se pagava —, mais 9 € do registo da escritura.
Mas, depois, ainda era preciso cancelar a hipoteca, que o anterior proprietário tinha feito, o que ocorria em 85% das situações, porque em regra, em Portugal, compram-se casas com financiamento bancário. Depois, tudo somado, o que aqui dava, só em despesas de registos, eram 526,98 €.
Qual é o custo agora? Agora, o custo é fixo. Agora, é possível percebermos qual é o resultado de toda esta disparidade de valores. Agora, o custo, fixo, ç de 500 €. 526,98 € para uma casa de compra e venda, com financiamento bancário no valor de 150 000 € para um valor global de 500 €. Menos 5,1%.
Mas a questão que o Sr. Deputado colocou foi a de que o relatório falava num aumento de receitas do Ministério, dizendo que isto devia acontecer porque os preços aumentaram. Os preços não aumentaram e o que diz o relatório é o seguinte — foi, aliás, a parte que o Sr. Deputado citou: «O novo enquadramento legal do registo automóvel e predial que se traduziu num aumento da receita prevista por parte do Instituto de Registos e Notariado, IP,»« — e aqui é que está a chave! — «» em face das alterações da tabela de preços e do número de actos.» A questão é a seguinte: muitas destas receitas deixaram de ser receitas gerais do Ministério e passaram a ser receitas afectas ao IRN. Por exemplo, as receitas do Registo Automóvel on-line, um novo serviço que não existia e que passou a existir, são receitas do Instituto de Registos e Notariado. Isto significa que houve um exponencial aumento da receita do Ministério por causa destas receitas? Em relação a serviços novos,
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criados, houve. Agora, isto não significa que os preços tenham aumentado para as pessoas. Significa, sim, que houve afectação de receitas dentro dos serviços do Ministério, passando o IRN a ter algumas receitas que, antes, eram receita geral do Ministério. É isso que aí está escrito. Não significa que haja um aumento geral da receita.
Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado Nuno Melo em relação às expectativas dos notários. Sr. Deputado, isso, pura e simplesmente, não é verdade; pura e simplesmente, não é assim.
Vou dar-lhe sete boas razões — que, sei, o Sr. Deputado conhece — que demonstram que todos sabiam qual era a política do PS e o que ia passar-se nesta matéria.
É muito claro: em primeiro lugar, os notários não foram «empurrados» para uma privatização. Só se foram pelo governo do partido de que o Sr. Deputado faz parte, porque nessa altura a privatização foi levada a cabo pelo partido que então estava no governo e não era o do PS!?» Optaram pela privatização, não foram «empurrados». Tiveram opção de ir para o notariado privado ou permanecer no sector público. Foi uma opção livre de todos. Puderam escolher, não foram «empurrados».
Em segundo lugar, os notários não foram impedidos de exercer as suas competências para a prática dos actos correspondentes à sua actividade. O que se fez foi dar a opção às pessoas quando, antes, não tinham.
Antes, as pessoas, em matéria de actos da vida das empresas, em matéria de actos relacionados com a compra de casa, estavam obrigadas a celebrar uma escritura. Estavam obrigadas, não tinham hipótese de optar. A única coisa que se fez foi dar a opção às pessoas de fazer a escritura ou de não a fazer. As pessoas são livres de decidir. São livres de decidir se fazem ou não essa escritura, havendo, naturalmente, por parte de entidades públicas o controlo da legalidade por razões de segurança, que têm de existir e que continuam a existir. Mas as pessoas passaram a ter uma opção quando, antes, não tinham. Nenhum notário foi impedido de fazer escrituras. Aliás, os notários passaram a ter competências que, antes, não tinham. Por exemplo, em matéria de registo automóvel, passaram a poder promover actos de registo automóvel através da Internet, coisa que, antes, não podiam fazer. Passaram a ganhar novos mercados, por uma proposta de lei, matéria que, aliás, será, submetida a esta Assembleia brevemente, a possibilidade de levar a cabo processos de inventário, daqueles processos que muitos ajudam, como o Sr. Ministro referiu, em matéria de descongestionamento dos tribunais. Os notários passam a poder realizar esses actos, quando, antes, não podiam.
O Sr. Deputado, se calhar, desconhece ainda aquilo que foi referido na Assembleia da República no momento em que foi votada a privatização do notariado. No ano de 2004, penso, nenhum notário tinha ainda optado por ir para o notariado privado ou permanecer no sector público. Está escrito no Diário da Assembleia da República aquilo que então foi dito pelo então líder do Grupo Parlamentar, António Costa, que disse o seguinte, antes de todos fazerem qualquer opção por ir para o sector privado ou por ficar no sector público: «É por isso essencial que fique muito claro que não reconhecemos os direitos adquiridos ou sequer a expectativa legítima à manutenção do duplo controlo. Quem agora optar pela privatização sabe que o monopólio legal tem os dias contados. Não poderá invocar desconhecimento ou alteração imprevista das circunstâncias. O risco fica, desde já e muito claramente, definido. A desburocratização da sociedade e a competitividade da economia não ficarão presas aos interesses corporativos que a actual maioria serve»« — na altura, a «actual maioria» era a do PSD/CDS — «» e que uma próxima maioria revogará«. Repito, «que uma próxima maioria revogará». Atenção: «Não poderá invocar desconhecimento ou alteração imprevista das circunstâncias.» Isto está escrito. É conhecido de todos aqueles que na altura ainda não tinham optado e que, com esta informação e com aquelas que constam do programa eleitoral do Partido Socialista, podiam conscientemente fazer uma opção: a alicerçada no conhecimento de que o PS, no governo, como está, eliminaria o duplo controlo de legalidade e faria com que as pessoas deixassem de estar obrigadas a fazer escrituras públicas para poderem optar por não as fazer, na sua livre escolha. Dar uma escolha às pessoas — é isso que está em causa.
Aliás, quem conhece e tenha visto aquilo que sucedeu poucos dias antes da tomada de posse do novo governo sabe o que aconteceu junto do Ministério da Justiça. Houve, inclusivamente, manifestações de notários que queriam rapidamente tomar posse. O Sr. Deputado deve saber que foi dada posse, pelo governo PSD/CDS, aos primeiros 57 notários privados, quando ainda estava em gestão. Por que é que se queria tão rapidamente tomar posse? Seria por ter receio daquilo que aconteceria caso o PS chegasse ao governo, como já se sabia que ia acontecer, nomeadamente porque as eleições já se tinham realizado em relação a várias dessas posses?!
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Sr. Deputado, a verdade é que isto revela que havia conhecimento quanto ao que ia acontecer e quanto às políticas seguidas pelo PS e, depois, pelo governo da actual maioria do Partido Socialista.
Aliás, o Sr. Deputado sabe, seguramente, também que estes notários privados, hoje, podem voltar todos, se quiserem, durante um prazo de 5 anos — esse prazo de 5 anos ainda está a correr — ao sector público.
Hoje, todos os notários privados, que eram notários públicos antes, podem voltar ao sector público, com manutenção do vencimento que tinham à época. Esta é verdadeiramente uma privatização que não tem riscos ou tem riscos muitíssimo diminuídos, porque todos estes notários podem voltar para o sector público.
Mas, atenção, há um aspecto muito importante, que é o de saber quantos, neste momento, voltaram. Até agora, Sr. Deputado, voltaram zero! Zero, notários privados, voltaram, neste momento, para o notariado público, para o sector público. Porquê? Não sei, mas o que é facto é que, pelos vistos, continuam com interesse em exercer as funções que hoje exercem!!» Sr. Deputado, queria também referir que tivemos o cuidado de levar a cabo todas estas reformas alicerçados em várias opiniões que disseram que não havia qualquer ilegalidade ou qualquer inconstitucionalidade. E tanto não há ilegalidade ou inconstitucionalidade que, na larguíssima maioria das acções movidas por notários — entre pedidos de providências cautelares, pedidos avulsos, acções principais são cerca de 47, nas variadíssimas decisões em matéria de providências cautelares, em matéria de incidentes que os tribunais já adoptaram em número de 34 —, foi dada razão ao Estado. Aliás, aquilo que os notários queriam nestas acções era impedir a prestação do serviço Casa Pronta, impedir a prestação do serviço Balcão Único que a DECO reconheceu como mais barato e melhor para os cidadãos.
Portanto, verdadeiramente, era isso que estava em causa. Não são as expectativas dos notários. O que estava em causa era impedir a prestação do serviço Balcão Único, que é bom para os cidadãos.
Ora, Sr. Deputado, já houve 34 decisões, em incidentes, em providências cautelares que foram favoráveis ao Estado. Sr. Deputado, não tente vir com uma decisão não definitiva que não nos 34 casos em que foi dada razão ao Estado e incidentes, providências cautelares, tomar a parte muito minoritária e minúscula pelo todo.
Lamento, mas não venha tentar criar ou fazer de conta que a situação não é a que é. A situação, tal como existe, é esta. Perguntou números e eu dei-lhe: 47 pedidos de providências, acções; destas decisões já, houve 34 favoráveis ao Estado.
Portanto, não venha invocar uma decisão não definitiva de um incidente para tentar demonstrar-nos o contrário. Aliás, como já disse, Sr. Deputado, o que está aqui verdadeiramente em causa — e a isso o CDS teria e tem, algum dia, de responder — é saber se o CDS, alguma vez no governo (e nos próximos tempos não será, segura e felizmente!), vai ou não repor a obrigatoriedade de escrituras públicas, passando os cidadãos, as empresas deste País a estarem novamente obrigados a celebrar escrituras públicas nos cartórios notariais e a pagar por elas.
Essa é a resposta que o CDS tem e precisa de dar e que aqui não deu.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Secretário de Estado.
Creio que foram muito desenvolvidos os esclarecimentos do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado, que agradecemos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Para uma verdadeira interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.
Queria apenas entregar ao Sr. Ministro duas páginas dos mapas informativos sobre a locação dos edifícios.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito bem, Sr. Deputado.
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67 | II Série GOPOE - Número: 007 | 15 de Novembro de 2008
Agradeço a participação dos Srs. Deputados no esclarecimento do orçamento do Ministério da Justiça.
Agradeço também a participação e o empenho do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado.
No âmbito do Orçamento do Estado, as audições retomam na próxima segunda-feira, às 9 horas e 30 minutos, com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 18 horas e 10 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL