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Quinta-feira, 20 de Novembro de 2008 II Série-OE — Número 10
X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 19 de Novembro de 2008
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 9 horas e 55 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 226/X (4.ª) — Orçamento do Estado para 2009.
O Sr. Ministro da Cultura (José Pinto Ribeiro) apresentou à Comissão o orçamento respeitante ao seu Ministério, tendo depois respondido a questões colocadas pelos Srs. Deputados Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Teresa Portugal e Manuela Melo (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP), João Oliveira (PCP) Cecília Honório (BE), Zita Seabra (PSD) e Marisa Macedo (PS).
Sobre o orçamento relativo aos Encargos Gerais do Estado, intervieram, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Teresa Morais Sarmento (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Luís Fazenda (BE).
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local (Eduardo Cabrita) respondeu aos Srs. Deputados Maria Ofélia Moleiro (PSD), Luís Pita Ameixa (PS), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Alda Macedo (BE) e Pedro Farmhouse (PS).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 21 horas e 5 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Neto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 9 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, iniciamos hoje os trabalhos com a audição do Sr. Ministro da Cultura, a quem começo por agradecer a presença. Além do mais, o Sr. Ministro da Cultura é meu amigo pessoal, portanto é com redobrado prazer que o revejo nesta Casa. Aproveito para cumprimentar igualmente a Sr.ª Secretária de Estado da Cultura e o Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura.
O Objectivo do debate desta manhã é, de facto, a discussão e apreciação do Orçamento do Estado no que respeita ao Ministério da Cultura.
Gostava de recordar aos Srs. Deputados que há um relatório elaborado pela Comissão, nos termos regimentais, relatório esse da autoria do Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, com a chancela do Sr.
Presidente da Comissão, o Sr. Deputado José de Matos Correia.
Esse relatório, em traços muito perfunctórios, elenca as linhas fundamentais de actuação do Ministério da Cultura respaldadas no Orçamento do Estado para 2009.
Permitam-me que destaque, inter alia, a língua como objectivo estratégico para o reconhecimento da importância cultural, geoestratégia e económica da língua portuguesa, matéria, aliás, que já foi objecto de debate aqui, na Comissão de Orçamento e Finanças, aquando da audição do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros — há, pois uma interacção entre o Ministério da Cultura e o Ministério dos Negócios Estrangeiros no que à língua portuguesa respeita.
O relatório faz ainda referência ao património como uma das linhas fundamentais da acção do Ministério da Cultura para 2009, com a conclusão de investimentos previstos no Programa Operacional da Cultura, e, ainda, às artes e indústrias criativas, fazendo referência, designadamente, ao lançamento de um instrumento de mercado dirigido ao investimento nas indústrias criativas e culturais e nas suas estruturas de apoio, sob a forma de Fundos de Capital de Risco.
Diz ainda o relatório, no que ao orçamento respeita, que a despesa considerada no Ministério da Cultura para o ano de 2009 atinge o montante de 212,6 milhões de euros, o que corresponde a 0,1% do PIB e a 0,3% das despesas da Administração Central, decrescendo 2,3% em relação à estimativa de execução de 2008, mas correspondendo a um aumento de 0,4% face ao orçamento inicial de 2008.
Para termos uma ordem de grandeza, destaco sempre, a título comparativo, o orçamento mais elevado em termos sectoriais, que é o do Ministério da Saúde, que tem qualquer coisa como 8500 milhões de euros afectos, representando 11% da despesa da Administração Central do Estado e 5,1% do PIB. Isto dá uma ideia de grandeza dos orçamentos afectos a cada um dos ministérios, sendo que o do Ministério da Cultura é, sem dúvida, o orçamento com o valor mais baixo, em termos sectoriais, do Orçamento do Estado para 2009.
Em relação aos Investimentos do Plano, o Relatório do Orçamento do Estado para 2009 refere que o crescimento de 18,6%, quando comparado com a estimativa de execução de 2008, decorrente da conclusão dos projectos previstos no Programa Operacional da Cultura e com o desenvolvimento dos projectos estruturantes de reabilitação do património arquitectónico e arqueológico.
Importa ainda relevar, do ponto de vista de despesa do Ministério da Cultura por grandes agrupamentos económicos, que, ao nível dos Serviços Integrados, o peso das despesas com pessoal ascende a 50,2 milhões de euros e em transferências a 47,2 milhões de euros, num total de 158,1 milhões de euros, o que representa mais de 50% do orçamento do Ministério da Cultura.
A nível de Serviços e Fundos Autónomos, destaca-se o peso das transferências — 24 milhões de euros — e das aquisições de capital — 17, 3 milhões de euros — , destinados a requalificação e a recuperação do património arquitectónico, histórico, artístico e cultural, num total de 88 milhões de euros.
O relatório dá ainda nota dos apoios para diversas instituições, designadamente a Fundação da Casa da Música — 10 milhões de euros — , a Fundação do Centro Cultural de Belém — 7,9 milhões de euros — , a Fundação de Serralves — 4,1 milhões de euros — e a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea (Colecção Berardo) — 3 milhões de euros.
No que concerne ao orçamento por acções, é mencionado o orçamento de PIDDAC, que desce 3%, de 79,1 milhões de euros para 77,1 milhões de euros, devido à descida das receitas próprias e da contrapartida comunitária.
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Srs. Deputados, em traços gerais, é isto que nos diz o Relatório do Orçamento do Estado relativo ao Ministério da Cultura, mas para aprofundar esta matéria, com mais densidade e, seguramente, com mais acerto, nada melhor do que ouvir o Sr. Ministro da Cultura, que fará uma exposição inicial como é, aliás, norma nestas audições, dispondo de 15 minutos para o efeito, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas com 10 minutos a cada grupo parlamentar, a que o Sr. Ministro responderá em bloco.
Os Srs. Deputados ainda terão direito a uma segunda ronda de perguntas, mais exígua no tempo, naturalmente (5 minutos a cada grupo parlamentar), a que o Sr. Ministro, uma vez mais, responderá, após o que se encerrará o debate.
Sr. Ministro da Cultura, uma vez mais, seja bem-vindo.
Tem V. Ex.ª a palavra.
O Sr. Ministro da Cultura (José António Pinto Ribeiro): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, meu caro amigo Dr. Jorge Neto, Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, Sr.as e Srs. Deputados: É um prazer estar nesta reunião conjunta das Comissões para discutir o Orçamento do Estado para o Ministério da Cultura em 2009.
Gostaria de começar por fazer uma apresentação sobre a leitura que deve ser feita, no meu entender, do orçamento do Ministério da Cultura, para depois responder a todas as perguntas que me queiram formular sobre este aspecto.
O orçamento do Ministério da Cultura para 2009 totaliza 212,7 milhões de euros, ou seja, mais 1 milhão de euros, mais 0,4% do que o orçamento inicial de 2008. Este número não inclui as entidades públicas empresariais: o Teatro Nacional D. Maria II, o Teatro Nacional São João e a OPART, que juntou, por um lado, a Companhia Nacional de Bailado e, por outro lado, o teatro onde está sediada a ópera, o Teatro Nacional de São Carlos, cujas indemnizações compensatórias e receitas próprias estavam orçadas em 34,8 milhões de euros em 2008.
Para funcionamento, o Ministério da Cultura conta com mais 3 milhões de euros, ou seja, mais 2,3% — o seu orçamento sobe de 132,6 milhões de euros para 135,6 milhões. Esta variação corresponde à subida das receitas gerais em 4,1 milhões de euros, ou seja, em mais 5,4%.
Há correcção em baixa da estimativa das receitas próprias em 900 000 €, menos 1,7%, decorrente de uma diminuição ou uma quebra do Fundo de Fomento Cultural, através dos jogos sociais, e há descida do financiamento da União Europeia em 200 000 €, ou seja 10,5%.
Para investimento, o Ministério da Cultura conta com menos 2 milhões de euros, ou seja, menos 2,6% — o seu orçamento desce de 79,1 milhões de euros para 77,1 milhões de euros. Esta variação corresponde à manutenção das receitas gerais em 54,5 milhões de euros, á descida das receitas próprias em 300 000 € (trata-se de um mecenato que desaparece por conclusão do projecto) e à descida em 1,8 milhões de euros da contrapartida comunitária.
No total do orçamento de funcionamento e de PIDDAC, as receitas gerais sobem 4,1 milhões de euros, ou seja, 3,2%, e sobem de 130 milhões de euros para 134 milhões de euros.
As receitas próprias descem 1,2 milhões de euros (de 56,1 milhões de euros para 54,9 milhões de euros) e o financiamento da União Europeia desce 1,9 milhões de euros (de 25,3 milhões de euros para 23,4 milhões de euros).
Um orçamento — e é isto que me parece importante — é uma previsão composta por três partes: as receitas gerais, que são certas e atribuídas em Conselho de Ministros; as receitas próprias, que são uma estimativa do que os serviços podem arrecadar; e o financiamento da União Europeia, que é também uma estimativa da comparticipação naqueles projectos que, no âmbito do QREN, venham a ser vitoriosos.
Esta é, por isso, a primeira conclusão que temos de tirar: o que sobe neste orçamento é a parcela certa, aquela que é certa e garantida, e o que desce é a parcela que é uma estimativa.
O que é certo e garantido são as receitas gerais, que sobem 4,1 milhões de euros. E, a propósito, quero referir que 95% deste acréscimo, 3,9 milhões de euros, destinam-se ao reforço, em funcionamento, do Instituto dos Museus e da Conservação, que sobe 142%, e dos respectivos museus e palácios, em 14%, o que permite, por exemplo, que se estabilize a situação dos recepcionistas vigilantes.
A estimativa, as receitas próprias e os fundos comunitários descem, em conjunto, 3,1 milhões de euros. Era perfeitamente possível orçar mais receitas próprias e fundos comunitários e estar aqui hoje a defender um
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orçamento que crescesse não 1 mas 5 ou 10 milhões. Como? Bastava estimar que as receitas dos serviços crescessem, e crescessem mais.
Por outro lado, era possível ter afectado o Orçamento do Estado, em matéria de PIDDAC, a um conjunto de projectos que fossem alavancados em verbas da União Europeia e, com isso, aumentar o orçamento.
No investimento, findo em 2008 o esforço do Programa Operacional da Cultura no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio III, foi nossa decisão política alocar ou manter a alocação da contrapartida nacional a projectos que não capitalizam tanto com base em fundos comunitários, mas que consideramos essenciais.
A saber: os novos cofres do Anime, a edificar pela Cinemateca, para neles incluir todo o acervo audiovisual da RTP e para permitir que ele, depois, seja usado por todos os agentes que queiram o serviço dele; a ampliação da torre de depósitos da Biblioteca Nacional de Portugal; o pagamento aos municípios no âmbito da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, através da DGLB e o aumento dos apoios às artes pela DG Artes.
Estes projectos somam 30 milhões de euros e não têm contrapartida da União Europeia.
Nas receitas próprias preferimos sempre o rigor e a razoabilidade, até para evitar que os serviços pudessem vir a comprometer meios que não têm e acabassem por gerar mais dívidas, como sucedeu no passado. Mas é verdade — e essa é a verdade essencial — que o orçamento de receitas próprias nem sequer vai descer em 2009; vai subir, porque este orçamento ainda não inclui as receitas de 2,5% do imposto especial sobre o jogo.
Caso os Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas aprovem esta proposta de lei do Orçamento do Estado, estima-se que de 3,5 milhões de euros a 5 milhões de euros de receita adicional passará a reverter para o Fundo de Fomento Cultural a partir de 2009, e que antes eram afectados ao Fundo de Turismo.
Vai subir, também, porque ainda não inclui o financiamento estimado em 5 milhões de euros do Programa Inovarte, cuja contrapartida começou agora a ser transferida do Instituto do Emprego e Formação Profissional para a DG Artes.
Esta é a segunda conclusão: para nós, o orçamento é um ponto de partida e não um ponto de chegada, é o mínimo que devemos executar e não o máximo que esperamos alcançar. E, para 2009, estão a ser negociadas parcerias que também aumentarão os meios financeiros ao dispor do Ministério da Cultura. É o caso do Fundo de Artes e Indústrias Criativas e é o caso dos Cheque-Obra.
A prova de que o orçamento é um ponto de partida está já à vista em 2008, ano em esperamos executar mais de 100% do orçamento inicial. Se o conseguimos fazer é graças à compreensão, à colaboração e ao apoio prestados pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças, pelo seu Secretário de Estado do Orçamento e por toda a equipa no domínio da gestão flexível.
Foram eles que tornaram possível (e queria que isto ficasse bem claro) que o Ministério da Cultura pudesse executar mais, isto é, pudesse ter reforço orçamental através da transferência de saldos, seja de receitas gerais, seja de receitas próprias, e dispusesse de uma gestão flexível que faz com que todas as alterações no orçamento que são necessárias para assegurar a efectiva execução, a perfeita e a rigorosa execução de despesa, tenham sido concedidas, e sempre concedidas rapidamente e em tempo record — não raro acontece que os pedidos de flexibilização orçamental, de alteração orçamental são feitos num dia e no dia seguinte o despacho encontra-se já no Ministério da Cultura.
Por isso, é necessário chegar a uma terceira conclusão: o orçamento não é sinónimo de despesa. A verdade é que a defesa do orçamento, mais do que em Novembro no Parlamento e em Setembro no Conselho de Ministros, faz-se durante o ano seguinte, todos os dias, através da sua aturada e rigorosa execução.
A verdade é que o orçamento é apenas uma previsão do que vai ser a efectiva despesa do Ministério da Cultura no ano seguinte. Para já, o que tenho aqui hoje para oferecer é uma execução acima de 100% do orçamento inicial de 2008 em, pelo menos, 6 milhões de euros.
Se nós compararmos este ganho com o que aconteceu nos últimos anos, temos este panorama: em 2000 foram orçamentados 249 milhões de euros e executados apenas 233 milhões de euros; em 2001 foram orçamentados 294 milhões de euros e executados 240 milhões de euros; em 2002 foram orçamentados 294 milhões de euros e executados 233 milhões; em 2003 foram orçamentados 255 milhões de euros e executados 230 milhões; em 2004 foram orçamentados 273 milhões de euros e executados 224 milhões; em 2005 foram orçamentados 285 milhões de euros e executados 249 milhões, em 2006 foram orçamentados 261 milhões de euros e executados 255 milhões, e em 2007 foram orçamentados 243 milhões de euros e executados 232 milhões.
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Ou seja, entre 2000 e 2007, ficaram por executar, no total, 259 milhões de euros. Isto significa que entre o que foi discutido aqui, no Parlamento, e o que foi realmente gasto em cada ano houve uma diferença para menos, no total destes oito anos, de 259 milhões de euros.
Isto significa, também, que nos últimos oito anos se desperdiçou a oportunidade de executar, de gastar bem, um orçamento anual inteiro do Ministério da Cultura.
Bem sei que é difícil executar, que há cativações e orçamentos rectificativos, procedimentos e autorizações, mas bastavam 5% ou 10% desta verba que ficou por executar nos últimos oito anos para poderem ser pagas todas as dívidas às autarquias ou recuperado todo o património em risco.
Gostaria de realçar que apenas 20% desta verba foi objecto de cativação e de impedimento de execução por orçamentos rectificativos, o que significa que, mais uma vez, gostaria de realçar o papel extraordinário do Governo, durante o ano de 2008, em reforçar o orçamento do Ministério da Cultura. E, quando digo reforçar, não me refiro a aumentar, à partida, o orçamento do Ministério da Cultura mas, sim, a ir disponibilizando meios e permitindo uma gestão flexível orçamental, que foi aquela que facultou ao Ministério da Cultura não só o reforço de verbas como também lhe permitiu executar mais do que aquilo que ele tinha, isto é, executar 104% a 105% num ano, quando no orçamento inicial não tínhamos essa expectativa.
Esta não execução é também aquilo que retira capacidade negocial para se defender a existência de um reforço orçamental ao nível do Orçamento. A não execução hipoteca os orçamentos futuros. Assim, o atraso na execução das obras do POC, com que me confrontei em 2008, impediu, por exemplo, a afectação de verbas de investimento para outros novos projectos que fossem co-financiados e alavancados em verbas da União Europeia, por exemplo, através do QREN.
Sistematicamente, a ineficiente execução tem contribuído para a perda de peso do Ministério da Cultura no total do Orçamento do Estado. A média de desvalorização dos últimos oito anos foi de 11%, tendo o Ministério da Cultura passado de um peso médio de 0,55% para 0,49% do orçamento de execução.
Quero chamar a atenção para o facto de ter havido um grande esforço de execução já durante todo este Governo, nomeadamente em relação aos anos de 2006 e 2007. Posso dizer que a desvalorização ocorrida em 2002, 2003, 2004 e 2005 situou-se sempre entre os 24% e os 16% e 22%. Em 2006, não houve desvalorização e, em 2007, a desvalorização foi de apenas 5%. Isto é: a margem de execução veio, em 2006 e em 2007, a afunilar-se, de modo que a execução aproximou-se mais do orçamentado. Mas só em 2008 é que temos, pela primeira vez, uma valorização da execução relativamente ao orçamentado. E esta valorização é de 2%.
Por isso, permitam-me chegar a uma quarta e essencial conclusão: é na execução e não na orçamentação que se faz mais com menos. É por isso que este orçamento é apenas o princípio da nossa agenda para 2009.
O nosso objectivo para 2009 é superar o máximo de despesa executada num único ano pelo Ministério da Cultura nesta década. Esse máximo foi alcançado em 2000, quando se executaram 233 milhões de euros, que significam, a preços de hoje, 303 milhões de euros. Para 2009, o nosso objectivo é igualar ou superar este valor. Incluindo as EPE, estamos apenas a 55 milhões de euros de o alcançar. Com 303 milhões de euros, o peso da cultura no Orçamento do Estado será de 0,5%.
Gostaria ainda de chamar a atenção e de pedir às Sr.as e Srs. Deputados que compreendam que aquilo que acabo de dizer parece contraditório com uma entrevista que foi publicada num jornal semanário durante o fim-de-semana passado.
Essa entrevista tem várias declarações que são referidas como minhas, mas que não são minhas. Começa com uma declaração a dizer «o meu ministério não tem credibilidade» e acaba com uma declaração a dizer «não tenho paciência para esperar pelo despacho do Sr. Ministro das Finanças». Pelo que aqui disse, isto é absoluta mentira. Gostava só de dizer que tenho a entrevista toda gravada, tenho-a transcrita e tenho aqui um CD com ela, se alguém tiver interesse em ver, poderá fazê-lo. Aliás, isto está em vias de ser esclarecido com o referido jornal.
Gostaria, no entanto, de dizer que, relativamente à declaração «o meu ministério não tem credibilidade», aquilo que eu disse foi «a falta de execução orçamental é o principal factor para não termos credibilidade para pedir mais».
Quanto à declaração «estou farto de estar à espera do despacho do Sr. Ministro das Finanças», não só nunca me referi ao Sr. Ministro das Finanças como o que disse foi isto: «Tudo tem sido conduzido com o acordo do Ministério das Finanças, há regras orçamentais e este entendimento tem de ser validado pelo
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Ministério das Finanças, estamos à espera dessa validação. Das coisas para mim mais difíceis de alcançar é a paciência necessária para que tudo corra nos conformes. Trata-se de uma questão procedimental». E isto foi transformado pela jornalista em «estou farto de estar à espera do despacho do Sr. Ministro das Finanças», coisa que nunca foi referida.
Queria apenas dizer isto, para que não se baseassem nessas declarações, que não têm qualquer fundamento e que já serviram de base a textos de outros comentadores sobre essas declarações.
Com isto, dou por terminados os meus, salvo erro, 15 minutos.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Cultura, agradecendo, desde já, a sua disciplina relativamente ao tempo que lhe foi cometido. Foi, de facto, muito rigoroso no acatamento dessa minha sugestão, pois não passou disso.
Vamos, então, iniciar o nosso debate, começando pelo maior partido da oposição, o PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, permitam-me que comece por citar o Programa de Governo do Partido Socialista: «A política cultural para o período 2005-2009 orientar-se-á por três finalidades essenciais. A primeira é retirar o sector da cultura da asfixia financeira em que três anos de governação à direita o colocaram.
O compromisso do Governo, em matéria de financiamento público da cultura, é claro: reafirmar o sector como prioridade na afectação dos recursos disponíveis. Neste sentido, a meta de 1% do Orçamento de Estado dedicada à despesa cultural continua a servir-nos de referência de médio prazo, importando retomar a trajectória de aproximação interrompida no passado recente.» Isto para dizer que, no entender do PSD, o Governo falhou o seu compromisso, que, conforme o seu Programa, era a sua primeira finalidade essencial.
Contrariamente ao que foi prometido, o orçamento do Ministério da Cultura tem seguido uma trajectória claramente descendente. No Orçamento de 2005, a percentagem do Ministério da Cultura na despesa total da administração central representava 0,6%; no Orçamento de 2006, representava 0,5%; no Orçamento de 2007, representava 0,4%; no Orçamento de 2008, mantiveram-se os 0,4%; e no último Orçamento do Estado da Legislatura, aquele que nos é proposto para discussão e votação, que é o Orçamento para 2009, essa percentagem desde para 0,3%.
Não vamos, Sr. Ministro, perguntar-lhe se este orçamento o satisfaz, porque o Sr. Ministro já assumiu publicamente que não, por isso lamentamos que o Sr. Primeiro-Ministro não tenha, também nesta matéria, cumprido o Programa de Governo. Este é um facto indesmentível, tente-se dar as voltas que se entenderem.
Por isso, Sr. Ministro, entrando em algumas questões muito concretas, após esta breve introdução de carácter mais geral, permita-me que a primeira questão seja sobre os museus. A situação de carência financeira e de recursos humanos nos museus é por demais conhecida.
Ao longo desta Legislatura, sentiu-se um clima de instabilidade que levou a maioria dos directores dos museus a assinar uma carta conjunta de protesto e alguns museus a encerrarem alas ou a encerrar mesmo durante alguns dias da semana por falta de vigilantes. Com o reforço da anunciada dotação do Instituto respectivo, proveniente da distribuição das receitas gerais, o Sr. Ministro garante-nos que esta situação vai, de vez, ser resolvida? Aliás, este problema que se arrasta já há tantos anos não é o único problema nos museus portugueses, refira-se também o modelo de gestão. Sr. Ministro, sem referir a importância estratégica e cultural dos museus, porque julgo que isso é consensual em todos nós, perante esta situação, qual é o futuro e a estratégia que tem para apresentar para os museus portugueses? Defende, por exemplo, uma maior autonomia? A segunda questão é sobre o Fundo de Fomento Cultural, que, para 2009, aumenta consideravelmente.
Com certeza que este aumento não está dissociado de ser um ano de eleições legislativas. Aliás, no Fundo de Fomento Cultural estão previstas rubricas como cerca de 3 milhões de euros para a Casa da Música, 700 000 € para a Fundação de Serralves, 200 000 € para Fundação Ricardo Espírito Santo, 500 000 € para o Museu Colecção Berardo — Arte Moderna e Contemporânea, 1 milhão de euros para outras e quase 18 milhões de euros para diversas instituições sem fins lucrativos. Sr. Ministro, pode explicar-nos estas rubricas? Quem são os destinatários, sobretudo desta última verba volumosa?
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Terceira questão: Sr. Ministro, da análise do orçamento, que, confesso, às vezes não é fácil fazer-se, ressaltam algumas necessidades de esclarecimento, nomeadamente as de saber onde está prevista a verba que sairá para o funcionamento e manutenção do Museu Colecção Berardo — Arte Moderna e Contemporânea. É que apenas encontrámos uma verba de cerca de 500 000 € referentes ao Fundo de Fomento Cultural, que deve destinar-se a aquisição de novas obras de arte.
Aliás, questionado pelo PSD sobre a contribuição do Estado no que concerne ao funcionamento e manutenção deste museu, o Sr. Ministro respondeu na nossa Comissão, em 14 de Maio, que a mesma custa anualmente cerca de 6 milhões de euros. Então, onde está prevista esta rubrica no Orçamento do Estado para 2009? Por outro lado, o Sr. Ministro afirmou que essa contribuição «deverá progressivamente diminuir à medida que a própria entidade conseguir angariar receitas, através de lojas, dos bilhetes, da criação de exposições, que sejam exportadas, vendidas».
Tendo em conta que a entrada do museu continua gratuita, logo não existem receitas de bilheteira, gostaríamos de saber qual é a sua perspectiva a curto e médio prazos para esta desejada diminuição da contribuição do Estado para o funcionamento do Museu Colecção Berardo.
Quarta questão: qual o objectivo do Ministério da Cultura para 2009 em relação à abertura do pólo da Cinemateca no Porto? Está orçamentado? Qual o calendário deste projecto? Quinta questão: em relação ao Teatro Nacional D. Maria II, gostaríamos de saber o ponto da situação após a demissão do anterior conselho de administração e o início de funções do novo. Está assegurado o desenvolvimento dos projectos artísticos do Teatro Nacional D. Maria II, mesmo sem director artístico? Quanto tempo acha que vai decorrer até à sua nomeação? É que lemos numa entrevista, que o senhor, há pouco, tentou aclarar, que lamentava a espera pela assinatura do Sr. Ministro das Finanças.
Sexta questão: Sr. Ministro, foi anunciado, há mais de um mês, que ia ser criada uma linha de crédito para as empresas da cultura que não têm acesso ao financiamento por via do QREN. Pode também ajudar-nos a esclarecer alguns requisitos e qual é o ponto da situação sobre esta linha de crédito? Sétima e última questão, embora haja muito mais questões a colocar-lhe, mas outros colegas meus o farão em intervenções posteriores: Sr. Ministro, quero dizer-lhe que não achamos de bom tom — permita-me que lhe diga, com toda a frontalidade e respeito — que um titular de um órgão de soberania, como é o caso do senhor em exercício de funções no Governo, seja tão deselegante com os seus antecessores.
Alguns de nós, que já fomos membros do governo, não perdemos muito tempo a acusar os nossos antecessores com alguns problemas que herdámos e, por isso, para além dessa nota, gostaria, ao terminar, de lhe ler aquilo que um titular antigo do seu ministério disse: «Este ministro mostra não ter noção de como se orçamenta, cativa e executa na Administração Pública, mas a pouca verba que recebeu não deve afligi-lo, porque prometeu fazer mais com menos e o Ministro das Finanças fez-lhe a vontade». Acabei de citar a sua antecessora e nossa colega Dr.ª Isabel Pires de Lima, que o disse recentemente.
Gostaria que o Sr. Ministro, se puder, comentasse estas declarações.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
Tem, agora, a palavra, pelo Partido Socialista, a Sr.ª Deputada Teresa Portugal.
A Sr.ª Teresa Portugal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Sr.ª Secretária de Estado, num período que felizmente não é de nojo da democracia, aproveito para fazer aqui uma intervenção inicial que faz uma ligação directa com o que vou dizer a seguir sobre o Orçamento.
Tenho gosto em expressar que sou dos que pensam que cabe à cultura um papel estratégico. Tem sido muito falado o estudo da União Europeia que deu ânimo àqueles que têm esta visão sobre a cultura, porque já não se pode ignorar o importantíssimo factor de desenvolvimento social e económico com que é encarado hoje o papel da cultura.
Esse estudo termina com uma conclusão muito importante que abala os olhares da cultura considerada como uma área de despesismo, de desperdício. De facto, é hoje unanimemente reconhecido que não se gasta com a cultura, investe-se no País e na economia.
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Por isso, alguns actos, sejam eles políticos, de governação ou mesmo conceptuais, que sugerem alguma marginalização do papel do Estado na cultura, são, do meu ponto de vista, uma má escolha, porque também nesta área da cultura o Estado não pode ficar de fora.
Assim, a minha leitura deste Orçamento leva-me a destacar alguns aspectos que considero serem um esforço engenhoso na busca das necessárias soluções de financiamento para um orçamento que, reportandome às palavras do Sr. Presidente da Comissão de Finanças, comparando, é mais baixo do que o orçamento da saúde. Considero que esse esforço engenhoso vem constituir um verdadeiro reforço orçamental. Estou a referir-me, por exemplo, ao fundo das artes — que, se bem interpretei as declarações do Sr. Ministro, consistirá numa considerável doação em espécie para a área da recuperação do património, num país que tem tanto património como o nosso — , ao fundo de capital de risco dirigido ao apoio às indústrias criativas ou mesmo ao Fundo da Língua Portuguesa.
Na mesma linha, esta área do Ministério da Cultura beneficia ainda de outras fontes de financiamento vinda de outras instituições públicas ou de outros ministérios, como é, por exemplo, o financiamento dirigido ao próprio Instituto de Cinema, Audiovisual e Multimédia (ICAM), os 25% do imposto de jogo, que esperemos que seja agora dirigido na totalidade ao Ministério da Cultura, ou o programa Inovarte, financiado em 5 milhões de euros pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional.
Portanto, estas iniciativas, que estão para além do orçamento, contribuem para a subida das receitas próprias e funcionam como uma espécie de contrabalanço. Isto é tão mais importante quanto vêem no momento em que há uma descida dos fundos comunitários por encerramento do Programa Operacional da Cultura.
Um outro aspecto que destaco é a linha de execução orçamental que aparece com uma marca diferenciadora de governos anteriores, porque aponta para uma previsão de execução de 100%.
Considero igualmente muito importante uma área que foi referida pelo Sr. Deputado Feliciano Duarte que é a atribuição de 95% para o Instituto Português de Museus e para os seus serviços dependentes a partir das receitas gerais, porque é uma área na qual é preciso investir na contratação de mais vigilantes e também porque estamos num tempo de finalização de obras de grande vulto nesta área patrimonial, como, por exemplo, a obra do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra, o Museu Machado de Castro ou o Museu do Côa.
Gostava, agora, de me referir a um dos eixos prioritários definidos pelo Sr. Ministro e que constam do Programa do Governo que tem a ver com a língua portuguesa. Houve uma importante reunião internacional com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, depois da qual foram anunciadas, pelos meios de comunicação social, algumas medidas nesta área. Por isso, gostava de pedir ao Sr. Ministro que nos fizesse um ponto da situação que, contemplado ou não no Orçamento, tenha directa ou indirectamente a ver com esta área, nomeadamente o ponto da situação sobre o Acordo Ortográfico e os vários passos para a sua execução, o destino do Fundo da Língua Portuguesa e o estudo do valor económico da língua portuguesa com uma rede escolas anunciada para alguns países no estrangeiro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para usar do tempo remanescente, a Sr.ª Deputada Manuela Melo.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, registo, antes de mais, a nova técnica de «infiltração» noutros ministérios e nos privados que o Sr. Ministro põe como prioridade na gestão de um orçamento, que, obviamente, não nos satisfaz.
Também queria registar, quando se referem dados sucessivos e se diz que em termos de percentagem do PIB as verbas da cultura diminuem, ao mesmo tempo, os sucessivos aumentos de execução orçamental na cultura. E, no final, isso é o que vale, porque é esse o dinheiro que efectivamente o País gasta com a cultura, ou seja, aquele que é executado, e não aquele que, de qualquer maneira, com as técnicas mais variadas, se inclui no início de um orçamento.
Em relação à existência do Ministério da Cultura é interessante, porque a própria técnica de «infiltração» utilizada é mais do que suficiente para justificar a existência de um Ministério da Cultura. É ao convencer outros colegas ministros de que o investimento dos seus ministérios na cultura é importante para o desenvolvimento que o Ministério da Cultura justifica por inteiro a sua existência.
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Por outro lado, é também importante, porque o Ministério da Cultura tem por dever, por objectivo, manter a natureza específica dos projectos culturais. Ou seja, por exemplo, a lógica patrimonial pode ser cruzada com outras lógicas, mas não deve ser subvertida por outras lógicas. Não me refiro simplesmente à promoção turística, que tem sido uma parceria fundamental no desenvolvimento e na recuperação do nosso património, mas a muitas outras coisas. É importante que se mantenha a lógica própria da natureza e do objecto das diferentes áreas da cultura.
Realizou-se, segunda-feira, um importante colóquio sobre património, nesta Assembleia da República, e foi focado, na sua parte final, um aspecto importante. Apesar de se ter relativamente pouco dinheiro, com o dinheiro que se tem conseguem-se resolver algumas coisas que se vêm arrastando há muito tempo. Falo, por exemplo, da rede de bibliotecas públicas, da torre da Biblioteca Nacional. Ou seja, o Ministério não foi atrás da lógica fácil de dizer: «Para que é que há dinheiro comunitário? É para isso! Então, subverto as minhas prioridades em função do dinheiro que existe.» Não! Mantêm-se, como projectos a financiar pelo Estado, projectos essenciais e que há muito tempo se vinham arrastando.
No entanto, além disso, penso que há outra forma, que é importante e que gostaria que comentasse: de como fazer uma nova aproximação da reabilitação do património? É evidente que é um desígnio nacional recuperarmos o máximo do património que temos, mas é muito importante que isso não fique por aí, ou seja, que a recuperação do património tenha um objectivo que esteja associado a um projecto cultural que se mantém e, sobretudo, que se valoriza depois da obra acabada.
Finalmente, queria perguntar sobre a Cinemateca do Porto. Não lhe vou perguntar quanto dinheiro tem para ela ou qual é o calendário previsto, porque mais importante do que isso o que importa às populações do norte, em global, que vai ser servido a partir de uma qualquer coisa no Porto, é que seja permitido o acesso a um espólio histórico importante do cinema, sobretudo numa área onde os cursos de audiovisual obrigam os alunos a ter contacto com ele e que sem a sua existência não poderiam ter. Pergunto, portanto, qual a natureza do «projecto cinemateca» que pretendem implementar no Porto.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Manuela Melo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, antes de mais, muito obrigado pela sua exposição. Penso que foi muito útil.
Há, no entanto, um ponto sobre o qual queria começar. Estamos a discutir o Orçamento do Estado. Não estamos a discutir a Conta Geral do Estado. Parece-me muito importante percebermos o que está previsto para o ano de 2009 e o que vai acontecer no ano de 2009. Porque, Sr. Ministro, não se trata apenas de saber quanto se executa, mas também de como se executa e, acima de tudo, se se executa o que se andou a prometer.
Por esse ponto mesmo, gostava de lembrar um conjunto de declarações que o Sr. Ministro tem vindo a fazer, ao longo do seu mandato, e que agora, pelos vistos, dão em nada ou quase nada.
No dia 6 de Abril de 2008, pouco tempo depois de ter tomado posse, o Sr. Ministro anunciava, com alguma pompa e circunstância, que ia lutar pelo objectivo de ter 1% do Orçamento do Estado no Ministério da Cultura.
No dia 12 de Julho de 2008, deu uma entrevista a um jornal semanário de referência, que não foi desmentida, como a da semana passada — aliás, penso até que nesta altura já estaria a negociar e a preparar, como é normal, o seu orçamento para 2009.
Dizia, na altura, o Sr. Ministro: «Objectivo do Ministçrio: 1% do Orçamento. Aliás,»« — lembrava o Sr.
Ministro — «» isso ç que nós inscrevemos no Programa do Governo!« É, de facto, verdade. Dizia o Programa do Governo, que o Sr. Ministro está obrigado a cumprir, que a meta era de 1% do Orçamento do Estado afecta à despesa da cultura, num quadro de médio prazo. Considerando que este é o quarto orçamento do Partido Socialista, mais médio prazo que este orçamento não pode existir. Este é, aliás, para o Programa do Governo, o orçamento do longo prazo e nem sequer do médio prazo.
No entanto, quando olhamos para o Orçamento do Estado, o que é que vemos? Vemos 0,3%, Sr. Ministro, menos de metade do que queria, menos de metade do que, pelos vistos, pediu. A resposta do Sr. Ministro foi: «Que culpa tenho eu?!»» Como se a culpa de todas estas declarações, de todos estes objectivos fosse,
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porventura, dos seus antecessores. Não foi a hoje Sr.ª Deputada e ex-Ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, que disse e que deu estas entrevistas.
Mas pior, Sr. Ministro: o que me parece, de facto, assombroso, neste momento, é perceber um conjunto de prioridades que o Sr. Ministro assumiu e que agora, pelos vistos, desapareceram.
Primeira prioridade: Museu Mar da Língua. O que é que o Sr. Ministro prometeu e o que é que, neste momento, se está a fazer.
No dia 19 de Março, nesta Comissão, a pergunta do CDS, o Sr. Ministro respondeu e eu passo a citar: «O Museu Mar da língua está orçamentado e será apoiado pelo Plano Operacional da Cultura. As obras estão em curso relativamente ao Museu de Arte Popular. O Mar da Língua está previsto que seja terminado até ao dia 31 de Dezembro deste ano».
No dia 16 de Julho num diário de referência dizia o Sr. Ministro: «Sendo financiado por dinheiros comunitários através do Plano Operacional da Cultura terá de estar executado até ao dia 31 de Dezembro.» No dia 12 de Julho, numa entrevista ao mesmo semanário, que também não foi desmentida, disse: «Acontece que o Plano Operacional da Cultura termina a 31 de Dezembro e 2008 e nessa data se o Museu não estiver aberto ao público teremos de devolver o dinheiro e pagar do bolso aquilo que não tivermos acabado.» Sr. Ministro, eu gostava de lhe perguntar o seguinte: até ao dia 31 de Dezembro vai estar aberto o Museu Mar da Língua? Todas estas promessas que o Sr. Ministro fez, que assumiu, vão estar cumpridas, vão estar executadas ou não? Mas vamos a outras promessas, Sr. Ministro. Estava inscrito no orçamento para este ano e para ser executado o seguinte: terminar as obras no Museu do Côa, terminar as obras no Museu de Évora, terminar as obras no Museu de Aveiro, terminar as obras no Museu Nacional Machado de Castro, terminar as obras no Mosteiro de São Martinho de Tibães. Está no orçamento para 2009 o seguinte: concluir as obras no Museu do Côa, concluir as obras no Museu de Aveiro, terminar as obras no Museu de Évora, concluir as obras no Museu Nacional Machado de Castro, concluir as obras no Mosteiro de São Martinho de Tibães.
Em que ficamos, Sr. Ministro? Estava previsto para este ano concluir» O Sr. Ministro vem aqui anunciar a maior execução e eu gostava de lhe perguntar se estes objectivos que estavam no Orçamento do Estado para este ano vão ser executados até ao final do ano ou não.
Mais uma promessa, entre aspas, inscrita no Orçamento do Estado: exposições do Hermitage. Estava previsto para este ano uma exposição do Hermitage no Porto, no Museu Machado Soares, que foi anulada, portanto havia uma inscrição orçamental que não foi executada.
Dizia o Sr. Ministro, na altura: vamos ver, está tudo em aberto para 2009. E agora, Sr. Ministro? Estamos perante o orçamento de 2009 e eu gostava de lhe perguntar: está prevista para 2009 alguma exposição do Hermitage em Portugal? Onde? Em Lisboa? No Porto? Seguindo o programa da sua antecessora? Num programa novo? O que é que está a acontecer? Continuando nas promessas que o Sr. Ministro fazia há relativamente pouco tempo e que agora não vemos em sítio nenhum, pergunto-lhe o que se passa, por exemplo, com a regulamentação da Lei do Património.
O Orçamento do Estado para 2008 previa a regulamentação da lei do Património, o Programa do Governo, apresentado em 2005, previa a regulamentação da Lei do Património, em pergunta que lhe dirigimos por escrito no dia 8 de Abril de 2008 o Sr. Ministro assumia que «as Grandes Opções do Plano para 2008 prevêem que se publique até ao final do ano a regulamentação da Lei do Património», na mesma entrevista de 12 de Julho dizia o Sr. Ministro, com alguma bonomia que lhe é característica, que «esta é uma das tarefas que acho essencial e é uma das tarefas para a qual se a profissão tem alguma coisa a ver, eu estarei um pouco mais preparado.» Pergunto, Sr. Ministro: até ao dia 31 de Dezembro de 2008 estará publicada a regulamentação da Lei do Património? É que, penso, até será escusado relembrar, Sr. Ministro, que já em Setembro deste ano, o Provedor de Justiça dirigiu uma carta ao Ministério da Cultura alertando para os inconvenientes do arrastar deste vazio legislativo.
Mas há mais coisas que me parecem importantes perceber na lógica do que vão ser as tarefas do Ministério da Cultura para 2009.
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A saber, Sr. Ministro: há relativamente pouco tempo, tivemos notícia de que um particular teria adquirido um quadro de Vieira Proença e que o Estado tem um ano para exercer sobre esse quadro uma opção de compra, portanto será até meados do próximo ano.
Na verdade, este quadro foi adquirido por 210 000 euros, na altura o Ministério da Cultura não tinha capacidade financeira para adquiri-lo e conseguiu que um mecenas o comprasse, ficando o Estado com opção de compra pelo prazo de um ano.
Gostava, pois, de saber se essa opção de compra vai ou não ser exercida em 2009. É que me parece muito importante saber o que vai acontecer neste particular.
Segunda questão também muito importante, Sr. Ministro: o senhor anunciou que tentaria negociar já ao longo de 2008 — e não tenho nenhuma notícia disso pelo que gostava de saber se vai acontecer em 2009 — um conjunto de linhas de crédito especialmente dirigidas para a cultura, tentando que estas linhas de crédito tivessem taxas semelhantes, dizia na altura o Sr. Ministro, às taxas do crédito à habitação.
Ora, eu gostava de perguntar: o que é que aconteceu em 2008? Já conseguiu que alguma instituição bancária abrisse essas linhas de crédito? Está prevista alguma coisa para 2009? Mais uma promessa de execução orçamental que o Sr. Ministro assumiu e sobre a qual nada sabemos: Museu dos Coches.
No dia 9 de Julho foi afirmado pelo Sr. Ministro que as obras começariam em Setembro deste ano, mas, neste momento, ao que sabemos, o ex-Instituto Português de Arqueologia ainda está à espera que se encontre um local para poder sair de onde está em Belém.
Gostava de lhe perguntar: já passou o mês de Setembro, já passou o mês de Outubro, estamos no mês de Novembro e como é que está a situação do Museu dos Coches? Última questão. O Sr. Ministro desmentiu aqui a entrevista que deu ao Expresso — aliás, cedeu, e eu quero agradecer-lhe, à Comissão o CD com essa gravação e eu creio que os serviços da Comissão vão distribuir cópias por todos os grupos parlamentares — , mas há uma questão a que o Sr. Ministro não respondeu e que é tão simplesmente esta: como e que está neste momento a situação da nomeação do director artístico do Teatro Nacional D. Maria II? Já sabemos que, pelos vistos, o culpado não ç o Ministro das Finanças» Vá lá, já há alguma coisa em Portugal em que o culpado não ç o Ministro das Finanças»! Mas eu gostava de saber da sua responsabilidade, porque esta é uma matéria da sua tutela, o que é que aconteceu e qual é a situação neste momento, como é que prevê desbloquear e em que prazos esta nomeação.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quero começar por cumprimentar o Sr. Ministro, os Srs. Secretários de Estado e os Srs. Presidentes das Comissões de Orçamento e Finanças e de Ética, Sociedade e Cultura.
Sr. Ministro, sendo este Orçamento de Estado para 2009 o último apresentado por este Governo do PS importa ter em conta aquilo que foi o ponto de partida deste Governo, aquelas que foram as promessas no inicio desta Legislatura e o ponto a que chegámos em 2009.
De facto, o Sr. Ministro já aqui deu conta de alguma suborçamentação que existiu — aliás, falou no ano passado da necessidade de executar mais verbas do que as que estavam orçamentadas no orçamento anterior, dando conta de alguma preocupação por parte da equipa ministerial na resposta a alguns compromissos do Estado.
Mas, há uma questão à qual é impossível fugir e que tem de ver com aquilo que o PS, e isso já hoje foi aqui referido, inscreveu na base programática que o PS apresentou às eleições legislativas de 2005 e no Programa de Governo e que apontava para a meta de 1% do Orçamento do Estado dedicado à despesa cultural.
E a verdade, Sr. Ministro, é que ao longo dos anos, já nem tendo em conta o orçamento rectificativo de 2005 e só tendo em conta os orçamentos de Estado apresentados pelo PS e da sua inteira responsabilidade, verificamos que em 2006 esta percentagem, que deveria ser de 1%, foi de 0,37%, em 2007 foi de 0,32%, em 2008 foi de 0,32% e em 2009 será de 0,27%.
Portanto, há uma clara violação do compromisso eleitoral e da meta que o PS pretendia atingir. E não é só uma violação de um compromisso; é o afastamento fase ao compromisso, pois nós não só não ficámos perto
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dos 1%, tendo crescido, como, pelo contrário, tivemos um processo de decréscimo da despesa pública destinada à cultura e esta é uma evidência, é um dado objectivo ao qual não se pode fugir.
Relativamente a algumas questões concretas quero recordar-lhe que o Sr. Ministro já hoje aqui anunciou o aumento de várias verbas respeitantes à contratação do pessoal necessário para museus.
Sr. Ministro, há um dado neste Orçamento do Estado que aponta para a necessidade de todos os erviços terem de proceder ao desconto de 7,5% dos descontos dos seus trabalhadores para a Caixa Geral de Aposentações.
Ora, tendo isto em conta, o aumento que existe nas dotações para remunerações certas e permanentes do Ministério da Cultura ascende a 1,2 milhões de euros entre serviços integrados, serviços e fundos autónomos.
A questão que lhe coloco, Sr. Ministro é se 1,2 milhões de euros é suficiente para fazer face às necessidades de pessoal que se verificam nos vários serviços afectos ao Ministério da Cultura quer nos serviços integrados quer nos serviços e fundos autónomos.
Em comparação com 2005 esta situação é, de facto, preocupante, porque se há um aumento de 1,2 milhões de euros em relação a 2008, devo dizer que a diferença entre 2009 e 2005 no que se refere às despesas com remunerações certas e permanentes é de 18 milhões de euros. Há 18 milhões de euros a menos para remunerações certas e permanentes no Ministério da Cultura.
E este é que é o problema, porque o problema não é o acréscimo que existe em relação a 2008; o problema é que o Orçamento de 2008 já era um orçamento de estrangulamento financeiro, do ponto de vista da satisfação das necessidades de pessoal que se verificam no Ministério da Cultura.
Há ainda um outro problema que se coloca: Sr. Ministro como é que se vão resolver estas carências de pessoal? É recorrente à precariedade? É recorrendo aos contratos de tarefa e de avença? É recorrendo a contratação de serviços externos? Como é que se vai dar resposta a estes problemas? Sr. Ministro, a falta de pessoal é, de facto, um problema confrangedor e estrangulador da actividade do Ministério da Cultura e dou-lhe em exemplo muito concreto e que tem de ver com a reabertura da Gruta do Escoural.
Sabe que este foi um problema a que dedicámos muita da nossa atenção e uma grande intervenção na Assembleia da República e há uns meses parecia ter uma resolução definitiva numa solução que passou por transferir para a autarquia responsabilidades que eram do Governo, mas o problema é que foi colocada uma única funcionária para garantir a abertura da Gruta do Escoural, as visitas e a abertura e funcionamento do centro interpretativo e a verdade é que esta funcionária, como mulher que é, adoeceu — são coisas que acontecem às pessoas — e a gruta fechou e ainda não foram tomadas por parte da Direcção Regional de Cultura até agora as medidas necessárias para garantir a reabertura da Gruta, sendo certo que só com uma funcionária aquela reabertura era muito precária.
Portanto, no que respeita à valorização do património a falta de pessoal, depois tem estes efeitos e naquele caso trata-se de património arqueológico ímpar, até do ponto de vista europeu e munida, pois é um património muito significativo, pelo que se justificava que fossem investidos meios por parte do Estado para garantir a sua valorização.
Uma outra questão, Sr. Ministro, sobre museus e satisfação das necessidades dos museus.
Se compararmos o orçamento do Instituto Português dos Museus em 2005 quer na sua versão inicial quer na estimativa de execução, que já é da responsabilidade deste Governo, verificamos que de 2005 para 2009, já sem ter em conta a inflação e o acréscimo dos custos decorrentes da subida dos preços que resultam da inflação, há uma redução absoluta de 1,2 milhões de euros face a 2005.
Sr. Ministro, muitos dos problemas com os museus hoje se confrontam, muitos dos quais põem em causa o funcionamento básico dos nossos museus, têm a ver com estas restrições orçamentais. Então, pergunto: como é que se justifica que em 2009 haja uma redução absoluta do financiamento, neste caso, do Instituto dos Museus e da Conservação? Uma outra questão, Sr. Ministro, tem que ver com o novo regime de apoio às artes.
De facto, foi recentemente publicado o Decreto-lei n.º 196/2008, que altera o regime financeiro de apoio às artes e eu quero dizer-lhe, como primeira nota, que esta alteração foi feita num quase total segredo — aliás, o parecer que foi solicitado à Associação Nacional de Municípios Portugueses foi-o com pedido de confidencialidade e nós gostávamos de saber o que é que neste processo de alteração do regulamento de apoio às artes tem de ser tão protegido com o segredo.
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Segunda questão, Sr. Ministro: houve uma opinião praticamente unânime de estruturas culturais, pelo menos das mais relevantes no nosso país, sobre os efeitos que podem resultar destas alterações e que podem pôr em causa o funcionamento de muitas das estruturas actualmente existentes, sobretudo — e espante-se! — as que têm organizações mais sólidas e que têm vindo a desenvolver um trabalho há mais tempo, com mais anos de actividade e com maior nível de profissionalismo. Pois são precisamente estas que são as mais afectadas.
Este novo regime de apoio às artes altera conceitos como o de núcleo profissional permanente, o de tempo integral ou equivalente, retoma a universalidade dos concursos, recuperando a fórmula dos júris nacionais, que existia há 10 anos, e confunde apoios à criação com apoios à regulamentação.
Sr. Ministro, gostávamos de saber relativamente a esta alteração que impactos é que o Ministério prevê que este novo regulamento de apoio às artes venha a ter e que medidas é que o Governo prevê tomar para compensar as estruturas que com maior solidez e com mais anos de actividade têm vindo a desenvolver o seu trabalho, caso se venha a comprovar que elas serão prejudicadas por este novo regulamento de apoio às artes.
Outra questão, Sr. Ministro, tem de ver com o regime laboral dos artistas.
A regulamentação deste regime estava prometida para o final de 2007, mas estamos no final de 2008 e continua por haver a regulamentação no que respeita aos apoios sociais no âmbito da Segurança Social e, por isso, pergunto para quando é que o Governo, porque esta não será exclusiva competência do Ministério da Cultura e terá de ser por consenso entre o Ministério do Trabalho e da Segurança Social, prevê ter pronta a regulamentação dos apoios sociais no âmbito da Segurança Social aos trabalhadores das artes e espectáculo e qual é a avaliação que o Ministério da Cultura faz do novo regime laboral, que foi aprovado em 2007, porque julgamos que ao fim de um ano já é tempo de começarmos a perceber quais são os impactos da legislação que foi aprovada na Assembleia da República, exclusivamente com os votos favoráveis do PS e que tanta contestação levantou.
Para terminar, gostaria de colocar uma questão relacionada com a Companhia Nacional de Bailado e com o Coro do Teatro Nacional de São Carlos.
O Sr. Ministro já afirmou na 12.ª Comissão, numa audição recente, que o Governo iria proceder à avaliação do modelo de gestão que resulta da criação da Opart, mas a verdade, Sr. Ministro, é que todos os dias se vão degradando as condições de funcionamento quer da Companhia Nacional de Bailado quer do Coro do Teatro Nacional de São Carlos e todos os dias vamos assistindo à degradação e ao definhamento destas duas estruturas, sobretudo do ponto de vista do papel que cumprem.
No que respeita à Companhia Nacional de Bailado a situação é dramática, porque transformar uma companhia de bailado clássico numa companhia de dança contemporânea pode ser uma opção artística, mas é certamente hipotecar uma companhia nacional de bailado que se dedicava ao bailado clássico e aquilo que verificamos é que, do ponto de vista da gestão e da organização, a criação da Opart trouxe, sim, um aumento dos comerciantes e dos negociantes do sector cultural, um aumento do número de gestores e do pessoal administrativo a esta estrutura, sendo feita à custa daqueles que são os verdadeiros artistas, daqueles que são os verdadeiros recursos humanos apostados na criação e na execução cultural.
Portanto, gostaríamos de saber qual é a avaliação que o Ministério faz dessa situação e que medidas é que vai tomar.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: É certo que o Sr. Ministro da Cultura revelou, desde o início a incomodidade de um orçamento que acabou por assumir como um princípio de agenda, mas o problema, Sr. Ministro, é que os orçamentos da cultura, desde que o PS é Governo, são sempre um princípio de uma agenda qualquer e a questão fundamental, para além das questões de dinheiro que aqui quero discutir consigo, é que continua a não se saber qual é a política do PS para o sector.
E por mais que tenha sido visível a sua relativa incomodidade é igualmente plausível e entendível o contentamentozinho do PSD quando recorda aquilo que o programa do PS definia muito claramente, ou seja, «retirar da asfixia de três anos de governo de direita o orçamento da cultura.»
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Porém, Sr. Ministro, por mais ziguezagues que faça em torno dos conceitos norteadores do orçamento, da execução e da previsão, por mais que jogue com estes conceitos, a verdade é que, entre 2005 e 2009, o orçamento da cultura relativamente ao PIB desceu de 0,2 para 0,1, e relativamente às despesas da Administração Central desceu de 0,6 para 0,3, havendo uma descido efectiva de -2,3% se compararmos com a estimativa de execução de 2008 e de 14,1% se compararmos com as estimativas de execução de 2005.
Ora, mesmo que este seja um orçamento miserabilista a questão de fundo continua a ser esta: que políticas para o sector? Sobre esta vertente, que é aquela que interessa verdadeiramente discutir, quero lançar-lhe algumas questões, sendo que a primeira tem a ver com o quadro legal de apoio às artes e com os resultados da alteração deste quadro em que o Governo consegue o malabarismo genial de alterar o próprio quadro legal que produziu sem o pôr em prática.
Para além deste dado que é, no mínimo, muito discutível, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro com que base é que sustenta o anúncio dos aumentos muito relevantes para o apoio às artes quando a alteração de critérios vem, claramente, reduzir, sensivelmente em 18 000 euros, o valor médio de financiamento de cada candidatura, quando, neste momento, há uma confusão instalada entre apoio a criação e apoio à programação, e quando há, efectivamente, uma descida, muito sensível, e um aprofundamento das assimetrias regionais, nomeadamente com uma descida na região centro, no Alentejo, no Algarve e mesmo o propagandeado aumento de 5% relativamente à região norte é, com certeza, propaganda, dado que o desfasamento da região era de 150%, a ter em conta os critérios justos e razoáveis que definem estes apoios.
Queria, pois, ouvi-lo sobre esta euforia possível que tem sido o seu discurso relativamente a estas vertentes do apoio às artes.
Ainda sobre a situação das EPE, o PS inventou esta nova realidade das entidades empresariais, mas convirá que o que se passa nos teatros nacionais é uma situação vergonhosa.
Continua por assinar o contrato-programa, continua por definir a data de assinatura dos contratos-programa e é óbvio que o Teatro Nacional São João se viu obrigado a cancelar parte da sua programação, que o Teatro Nacional D. Maria II está, neste momento, paralisado, que tudo isto continua a aguardar resposta, isto para além das questões que já lhe foram colocadas sobre a direcção artística deste teatro.
Se bem que a discussão seja já um pouco velha, sobre o seu famoso despacho de dissolução do Conselho de Administração do Teatro Nacional D. Maria II — que não é bem um despacho é mais uma peça de um pasquim — , eu gostaria de lhe perguntar, sobre esta peça de pasquim, se as acusações e os problemas eram tão graves quando aqueles que deram origem ao seu famoso despacho, por que é que, apesar de tudo, o país continua sem perceber que responsabilidades é que o Sr. Ministro da Cultura assacou ao Conselho de Administração.
De facto, a situação, por todas estas vertentes, dos teatros nacionais é vergonhosa, Sr. Ministro, e eu gostaria de o ouvir, com respostas muito claras, falar sobre o futuro destas estruturas ao nível das questões que lhe coloquei.
Há, ainda, uma outra questão que tem a ver com o desprezo do Governo do PS por este espaço fundamental que é o espaço cultural e museológico de Belém.
Alguns pequeninos passos foram dados — aliás, nem quero aqui falar hoje do Museu Nacional de Arqueologia — , mas é preciso perceber, muito claramente, esse pequenino sinal de esperança que era o Museu do Mar e da Língua, que era a obrazinha que poderia ser feita, que foi dando passos titubeantes, mas que era para ser inaugurada em Julho de 2008 e eu pergunto-lhe: afinal, é para quando? Como é que é possível, em, termos do seu discurso insuflado a propósito do projecto da língua e das suas políticas de língua, continuar a sustentá-lo sem qualquer espécie de clarificação relativamente à abertura deste importantíssimo projecto, que era um projecto do seu Governo e que era para ser inaugurado, repito, em Julho passado.
Ainda relativamente às questões do seu orçamento, quero perguntar-lhe como é que justifica a assimetria entre a atribuição de dotações às fundações, se contabilizarmos as dotações previstas para a Casa da Música, para o CCB, para a Fundação Serralves e para a Colecção Berardo temos 25 milhões, mas se compararmos esta quantia com o apoio às artes temos 22 milhões. Ora isto significa qualquer coisa, apesar do seu orçamento miserabilista, relativamente à sua política, nomeadamente ao apoio à Colecção Berardo. Como é que o Sr. Ministro sustenta o apoio de 3 milhões de euros sabendo claramente, como sabe, que este contrato
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é um contrato em que o Estado português tem alimentado os interesses de um investidor particular? Como é que justifica, por um lado, esta dotação e, por outro lado, há alguma disponibilidade da sua parte para rever este contrato ruinoso? Não posso deixar de questioná-lo sobre a forma como o PS foi enquadrando o trabalho das gentes das artes e do espectáculo, que é um trabalho particular, um trabalho altamente qualificado e precioso para o País e para o qual o Partido Socialista inventou um regime especial, o da intermitência, continuando vergonhosamente a deixar desprotegidos estes trabalhadores, que ficaram sem segurança social, mantendo um quadro global de precariedade.
Sendo esta invenção do Partido Socialista mais uma das suas habilidades quanto à precarização da mãode-obra qualificada, gostaria de saber qual é a avaliação que faz da implementação deste quadro e quantas pessoas aderiram a este regime tão especial.
É também difícil de compreender (e talvez tenha alguma explicação que possa dar) por que é que o observatório das actividades culturais não recebe qualquer dotação no seu orçamento? Gostaria ainda de o ouvir falar relativamente ao pólo da Cinemateca do Porto, em termos de quadro de financiamento e das suas previsões para este importantíssimo projecto.
O Sr. Presidente: — Acabámos a primeira ronda de questões.
Para responder a este acervo de perguntas, tem a palavra o Sr. Ministro, que tem o mesmo tempo de que dispõem todos os grupos parlamentares, ou seja 50 minutos.
O Sr. Ministro da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, obrigado pelas questões colocadas.
Vou tentar responder esclarecendo alguns aspectos que são comuns e transversais a todas as intervenções.
Começo por referir que o que se encontra no Programa do XVII Governo Constitucional — e que por razões de rigor passo a ler — é o seguinte: «O compromisso do Governo em matéria de financiamento público da cultura é claro: reafirmar o sector, com prioridade na afectação dos recursos disponíveis. Neste sentido, a meta de 1% do Orçamento de Estado dedicado à despesa cultural continua a servir-nos de referência de médio prazo, importando retomar a trajectória de aproximação interrompida no passado recente».
Pedi que fosse distribuído a todos os grupos parlamentares um gráfico em que está explicitado o que foi gasto pelo orçamento da cultura e pelo Ministério da Cultura em cada um dos anos. Se verificarem, a subida de gasto pelo Ministério da Cultura em 2005, 2006, 2007 e 2008, isto é, a despesa executada, representa um crescimento relativamente a toda a despesa anterior, o que é bem diferente da afectação dos orçamentos.
Significa que foram despendidos 249,2 milhões, em 2005, 254,5 milhões em 2006, 232,1 milhões, em 2007, e 252,7 milhões, em 2008, em termos de verbas do Orçamento do Estado. Significa que se despendeu mais significativamente.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que aquilo que aqui se refere é a afectação de recursos disponíveis à despesa cultural. Não se diz em parte nenhuma, nunca se disse, que se trataria de afectar 1% do Orçamento do Estado ao orçamento do Ministério da Cultura, mas, sim, à despesa cultural.
De facto, a despesa cultural não é apenas feita a partir do orçamento do Ministério da Cultura; a despesa cultural é feita a partir de outros orçamentos, de orçamentos de outros ministérios. A actividade cultural, por exemplo, no que diz respeito ao Instituto Camões, é uma despesa que é inscrita no orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros; e toda a despesa que tem a ver com as empresas públicas ou os entes públicos empresariais é inscrita no orçamento do Ministério das Finanças, havendo muita despesa cultural que é inscrita no Fundo de Turismo e que é realizada a partir da actividade deste Fundo.
Posso dizer, por exemplo, que os 30 milhões, que são a compensação a preços de 2002, que estavam previstos serem pagos pelo Casino de Lisboa, um somatório correspondente a 86,5% desses 30 milhões a preços de 2002, estão legalmente afectados à despesa cultural envolvendo o restauro do Capitólio, de um equipamento cultural no Parque Mayer e de um museu em Lisboa, mas esta despesa cultural não está inscrita no orçamento do Ministério da Cultura.
Também gostava de dizer que a despesa do Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual (FICA) é uma despesa cultural, que não está inscrita no orçamento da cultura.
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O Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual é financiado através de um conjunto de instrumentos que têm a ver com as televisões, com a divulgação de televisão por cabo e, portanto, esses fundos significativos relativamente ao financiamento da actividade do FICA não estão inscritos no orçamento do Ministério da Cultura.
Chamo ainda a atenção para o facto de aquilo de que aqui se falava não era dessa afectação; o que se dizia é que era importante retomar esta meta, ou seja a meta de 1% dedicada à despesa cultural continua a servir-nos de referência. Esta meta é uma referência. O português tem o seu peso, as palavras têm o seu peso, e importa retomar a trajectória de aproximação interrompida no passado recente. Essa trajectória de aproximação tinha sido interrompida. Vínhamos de 232 para 239, de 2000 para 2001, passamos para 232, em 2002, para 229, em 2003, para 223, em 2004, e subiu-se de 223, em 2004, para 249, para 254, para 232 e para 252, em 2008. Ou seja, interrompeu-se um caminho que havia e, agora, fez-se essa inversão. Estou a falar só do Orçamento do Estado. Não estou a falar sequer das verbas afectadas para fins de actividade de despesa cultural. Como disse, a despesa cultural é muito mais.
Para além disso, gostaria de chamar a atenção para o facto de uma das formas de utilizar o Orçamento do Estado ser a de usar estes fundos como fundos semente, isto é, tentando estabelecer parcerias com outras entidades.
Se repararem, o somatório das verbas públicas do Orçamento do Estado afectas às autarquias locais é de cerca de 800 milhões de euros, o que significa que o Orçamento do Estado tem afectado mais verbas para orçamentos culturais das autarquias do que estritamente ao Ministério da Cultura.
Também se quis chamar a atenção para a necessidade e a possibilidade de se estabelecerem parcerias, não só parcerias público-privadas com outros ministérios, com outros entes, com outras entidades públicas que podem desenvolver actividade na área da cultura, e de se estabelecerem relações com outras entidades da chamada economia social ou do mercado. Tem havido empenho também nesse campo.
O que penso ser um pouco surpreendente é que a crítica venha no sentido de dizer: o senhor tem pouco dinheiro para gastar e gasta pouco dinheiro do Estado, isto é, dos contribuintes. Aquilo que pensaria ser mais curioso era que me perguntassem: então, onde é que vai buscar o outro dinheiro? Onde é que faz as outras parcerias? Com que outros ministérios faz essas parcerias? Com que outros entes públicos faz essas parcerias? O que é que fez para fazer essas parcerias, nomeadamente com as empresas privadas, com o sector da economia social, com outras entidades que nem sequer sejam nacionais, por exemplo, com a União Europeia ou com a CPLP, para que consigamos desenvolver actividade cultural? Peço desculpa de o dizer, mas não vejo as Sr.as e os Srs. Deputados fazerem estas perguntas.
O Partido Socialista chamou a atenção para esta «infiltração» (a expressão foi mesmo esta), para falar com as empresas no sentido de se mobilizarem e de se usar o dinheiro do Orçamento do Estado para este efeito. É normal o Partido Socialista ter feito a pergunta, pois apoia o Governo, está de acordo, conhece e estudou esta realidade. Aquilo que me surpreende é que as críticas sejam no sentido de dizerem: querem pouco dinheiro do Estado. E riem-se de querermos pouco dinheiro do Estado e ter de ir buscar dinheiro a outras entidades para fazer esta actividade cultural.
Explico sumariamente o que é o projecto cheque-obra e o que é que está a ser contratualizado. O Inovarte está já contratualizado e já está terminado. Mas há outras formas, além destas, que vão permitir realizar fundos. Há um Fundo da Língua, que vai permitir alocar para fins culturais montantes que são da ordem dos 30 milhões de euros, os quais estão no Orçamento do Ministério das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, não estão no Ministério da Cultura. Mas o Ministério da Cultura quer que essas verbas sejam afectadas para fins e trabalho da língua.
Dito de outra maneira: vim dizer que esperava conseguir obter mais 55 milhões de euros destas parcerias, que não estão orçamentados no Orçamento e que permitiriam que, finalmente, tivéssemos a maior despesa que alguma vez esteve orçamentada, da ordem dos 303 milhões de euros. Ou seja, que chegássemos a ter uma despesa orçamentada, portanto, uma execução orçamental extraordinariamente rigorosa, que fizesse com que tudo fosse gasto e, por outro, que fizéssemos parcerias no sentido de ir buscar dinheiro, de conseguir convencer outros agentes culturais, outros agentes da sociedade, outros agentes económicos para que mobilizassem também os seus recursos para fazermos esta actividade.
Peço desculpa, mas era isto que gostava que me tivessem perguntado.
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É isto que nos dispomos a fazer, a ir buscar mais dinheiro e, por isso, é que é, através da execução rigorosa, das parcerias e da mobilização de outros recursos, nomeadamente de outras entidades, que quereremos realizar esta tarefa. Espero que isto seja clarificado como pano de fundo. O que não significa que não haja dificuldades em muitos sítios. É precisamente porque há dificuldades, mesmo na despesa orçamental, as quais referi e quero realçar e reafirmar e, sem a colaboração do Ministro das Finanças e do Secretário de Estado do Orçamento, não poderia ter sido feita esta afectação de recursos criteriosa, eficaz e competente para conseguir mobilizar o mais possível e aumentar a capacidade cultural da despesa que é feita.
Gostaria, por isso, de esclarecer aquela intervenção inicial em que se disse que as promessas do Partido Socialista e do Governo são completamente falaciosas. Pelo contrário; elas estão a ser cumpridas! Ora, quanto a uma crítica que me foi feita de que eu estaria a referir-me a antecessores com alguma falta de hombridade, ou mesmo de respeito, não tem nada a ver com isso. Estou a referir-me ao que foi executado.
Não estou a dizer que a culpa da execução foi do ministro a, do ministro b ou do ministro c. Estou a dizer que a execução no Ministério da Cultura levada a cabo pelos ministros e pelos governos anteriores subiu significativamente em 2005 e 2006, caiu em 2007 e voltou a subir em 2008. Esta execução orçamental é que é o critério e é na execução orçamental que se medem as coisas, não é no regateio, se quiserem, na disputa, em torno da afectação de verba só e, principalmente, no Orçamento.
Não fiz qualquer crítica, limitei-me a relevar um facto que me parece essencial de análise do trabalho orçamental e de cumprimento de metas. Esse trabalho está absolutamente em consonância com o Programa de Governo. É evidente que este programa foi feito antes do conhecimento exacto e rigoroso (como certamente, estão todos lembrados) de um défice de 6,9%. Um défice de 6,9% determinou a que a despesa pública fosse cortada; passou-se de 6,9% para 2,2%, de 2005 para 2008 e, portanto, foram obviamente orçamentos de grande restrição orçamental, como não podia deixar de ser.
Portanto, isso também foi tido em consideração. Se as pessoas fizerem contas dizendo que o orçamento do Ministério da Cultura desce no orçamento geral e não perceberem que, nesse orçamental geral, se incluíram 20 000 milhões de euros para assegurar a liquidez do sistema financeiro e impedir que o sistema financeiro entrasse em alguma dificuldade, prejudicando todo o tecido social (sejam as famílias sejam as empresas), se não compreenderem isso, repito, vão dizer que o orçamento do Ministério da Cultura desceu de 0,4% para 0,3%. Mas não, não desceu para 0,3%! A despesa no Orçamento do Estado é que passou de 60 000 para 80 000 milhões de euros, ou seja, acrescentaram-se 20 000 milhões de euros para que isso fosse feito. Mas esses 20 000 milhões de euros são, deste ponto de vista, completamente irrelevantes — estamos a comparar a mesma realidade e os 20 000 milhões de euros são uma realidade que acresce a isto e que, mais, retira dinheiro e disponibilidade financeira para outras coisas. No entanto, isso não é considerado — e isso é o aspecto relevante porque se tratou de uma intervenção preventiva de emergência — para o cálculo do défice.
Aliás, a própria União Europeia entendeu que estas medidas extraordinárias para assegurar a liquidez do sistema financeiro não entrariam para o cálculo do défice.
Com isto, gostaria de dar por encerrada esta explicação sobre a frase, relativa aos 0,3%, «Que culpa tenho eu?». Em primeiro lugar, chamei a atenção, pedi o favor e que houvesse a hombridade, mas não recebi uma resposta adequada ao meu pedido, de não ser feita qualquer menção à última entrevista ao Expresso, porque o que ali está não corresponde à verdade, é mentira. É lamentável que assim seja, nunca esperei que isso acontecesse com um jornal como o Expresso, mas aconteceu e isso será, em seu tempo e devidamente, corrigido e explicado. Portanto, pedi expressamente que não se baseassem em coisas» É que eu nunca disse, sobre os 0,3%, «Que culpa tenho eu?»! Aquilo que fiz foi uma execução rigorosa e criei credibilidade ao Ministério para fazer parcerias. Aquilo que a entrevista do Expresso, que é falsa, faz é diminuir e destruir a credibilidade do Ministério para fazer essas parcerias e essa execução.
Ora, o discurso é exactamente o oposto: é graças ao empenhamento do Governo, do Ministro das Finanças, do Secretário de Estado do Orçamento e de toda a equipa do Ministério das Finanças que se conseguiu fazer uma rigorosa afectação, uma rigorosa execução orçamental e, graças a essa execução orçamental perfeita e rigorosa, mobilizar fundos, mobilizar parcerias com outros ministérios e outras entidades.
Agora, vou responder às questões colocadas pelos vários intervenientes, começando pelo Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
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Quanto à primeira questão colocada, sobre o Governo ter falhado no seu compromisso, expliquei que não é verdade e que, pelo contrário, o Governo se aproxima desse compromisso, que é uma meta tida como referência a médio prazo, que nos serviu de referência e que se tem aproximado significativamente disso.
Devo dizer que, no modelo de financiamento para o património, os objectivos definidos pelo Ministério da Cultura são a língua, o património, as artes e as indústrias criativas e, do ponto de vista funcional e organizacional, abrir o mais possível todos os serviços do Ministério da Cultura à sua «contaminação social», isto é, ao público, aos cidadãos, portanto, abrir os museus, as bibliotecas, tudo isso.
A partir daqui, o que gostaria de explicar e que é, muitas vezes, transversal a várias perguntas é o seguinte: há um reforço para o Instituto dos Museus e da Conservação, reforço esse que é significativo e vai permitir que os problemas que eventualmente tenham aparecido, no que diz respeito à estabilização de algumas relações com funcionários ou com pessoas contratadas temporariamente, sejam resolvidos.
Esperamos ainda que, relativamente ao Instituto dos Museus e da Conservação, seja possível a sua progressiva qualificação. Uma das coisas que foi feita foi uma parceria com o ISCTE para que este leve a cabo um curso de pós-graduação, um mestrado em gestão de equipamentos culturais. E, através da parceria estabelecida com o Ministério da Cultura, vão surgir oito lugares que serão preenchidos por pessoas associadas à gestão do Ministério da Cultura, as quais poderão vir a qualificar-se e, portanto, a contribuir, também elas, para uma melhoria da gestão de todos os equipamentos culturais, nomeadamente e também do Instituto Português de Museus.
É evidente que esse modelo de negócio está em análise. O que gostaríamos era de assegurar a requalificação de todos os equipamentos, nomeadamente dos equipamentos acessórios dos museus, para além dos próprios museus. De facto, gostaríamos que os restaurantes, os cafés e as lojas fossem fonte de angariação de verba, fonte de receita própria, que pudesse também contribuir para o reforço da despesa cultural.
Relativamente ao Museu Colecção Berardo de Arte Moderna e Contemporânea, gerido pela Fundação de Arte Moderna e Contemporânea Colecção Berardo, gostaria de explicar aquilo que já disse e confirmo: o financiamento do Museu da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea Colecção Berardo é da ordem dos 6 milhões de euros. No ano de 2009, vai reduzir-se em 350 000 €, passando de 6 350 000 € para 6 milhões de euros, o que significa, naquela lógica do phasing out, a substituição.
Como é que isso é feito? A Fundação de Arte Moderna e Contemporânea explicará isso a seu tempo (a explicação é um problema dela). Quanto a mim, cabe-me explicar a diminuição deste financiamento. Este financiamento é feito através de fundos públicos, alguns dos quais não são do Ministério da Cultura mas são trazidos e aportados pelo Turismo de Portugal porque este entende que ali há uma actividade cultural como entende que existem noutros locais e, portanto, contribui com 1 milhão de euros para a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea.
Quanto às receitas de bilheteira, o que está desenhado é um modelo em que as receitas de bilheteira a pagar pelos visitantes sejam substituídas por receitas equivalentes pagas por mecenas, isto é, que haja um mecenas que, por cada visitante, pague uma quantia que substitua a receita de bilheteira e se veja se é possível fazer essa substituição por essa via.
Relativamente à, assim chamada, Cinemateca do Porto, gostaria de dizer que não se trata de uma cinemateca. O projecto que existe é o de ter um pólo expositivo e um pólo de exibição de cinema, no Porto.
Não se trata de uma cinemateca, pois uma cinemateca significa um acervo de filmes que não existirá no Porto.
Mas o acervo de filmes que existe no Anime e que é da Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema obviamente também estará disponível, como estão disponíveis todos os filmes de todas as cinematecas e de toda a rede da Federação Internacional das Cinematecas da FIAF.
O que é que isto tem por base? Em primeiro lugar, a compreensão de que 80% dos filmes exibidos na Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema não são da Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema, são filmes emprestados. Ou seja, há um circuito que é estabelecido e aquilo que a Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema fará é dar todo o apoio à integração nesse circuito do pólo expositivo do Porto, de modo a que ele tenha capacidade para expor, apresentar e exibir todo o cinema e toda a história do cinema de que nós queremos que o Porto e todo o Norte possa dispor.
Como é que é estabelecido isto? Através de um mecanismo que consiste em requalificar a Casa das Artes, no Porto. A Casa das Artes tem estado fechada e está, neste momento, a começar as suas obras. O autor do
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projecto tinha sido o Arquitecto Souto Moura, que fez agora uma alteração para que lá se estabelecessem os equipamentos que correspondem às necessidades para deficientes, pelo que será lá introduzido um elevador e haverá uma casa de banho especial para deficientes, e vão ser feitas reparações num dos tectos que estava em piores condições. Isto significa que vai fazer-se ali um pólo expositivo de cinema.
A obra já está orçamentada, já está prevista, já há verba para o orçamento dessa mesma obra e o que queríamos, mais uma vez, era estabelecer uma parceria, uma parceria com duas entidades, uma delas pública e a outra do domínio da economia social, concretamente com a Câmara Municipal do Porto e com a Fundação de Serralves. Com a Câmara Municipal do Porto para que ela disponibilize, para este mesmo pólo de exibição e de exposição de cinema, a Casa Manoel de Oliveira (que a restaure, termine e disponibilize e a integre neste pólo), e com a Fundação de Serralves, para que ela, por um lado, use o seu auditório, o seu local de projecção para aí também poder exibir cinema, e, por outro, use a sua capacidade de gestão para gerir com pessoas do Porto e a partir do Porto este pólo expositivo.
É através desta parceria que gostaríamos de levar isto a cabo. Esta parceria está em vias de ser negociada, já foi abordada com o Sr. Presidente da Câmara do Porto e com o Presidente da Fundação de Serralves, pelo que estamos a desenhar esse modelo que permita levar a cabo essa tarefa.
Relativamente a este objectivo, espero que ele esteja realizado no fim do primeiro trimestre de 2009, ou no fim do segundo trimestre de 2009, mal as obras estejam concluídas. Estas irão iniciar-se logo que possível e, como referi, o dinheiro para as mesmas já existe.
Depois, gostaria de abordar a questão do Teatro Nacional D. Maria II, integrando-a na análise das EPE. As EPE são o resultado de uma transformação de entidades públicas com natureza próxima de instituto público ou de direcção-geral e de uma sociedade anónima que era o Teatro Nacional D. Maria II numa figura de entidades públicas empresariais que foi levada a cabo pelo PRACE. De facto, quatro entidades — a Companhia Nacional de Bailado, o Teatro Nacional de São Carlos, o Teatro Nacional de São João e o Teatro Nacional D. Maria II — foram tornadas em EPE, sendo que as duas primeiras o foram numa só EPE, chamada Opart, e as outras em duas outras.
O que é que poderá ter estado na origem desta decisão? Em primeiro lugar, achar-se que se tratava de um modelo de organização que era mais compatível com a existência de receita através de bilhetes, na medida em que todas estas entidades prestam serviço ao público e esta prestação de serviço ao público fazia com que, razoável e logicamente, tivessem angariação de bilhetes.
Acontece que estes são equipamentos com custos de pessoal e custos fixos bastante elevados, o seu funcionamento tem custos muito elevados e são actividades que não podem existir sem forte subsidiação, aliás, não existem em parte alguma do mundo sem forte subsidiação. Aquilo a que os ingleses chamam de symphony orchestra and ballet são actividades que uma grande cidade europeia deve ter e que só podem existir qualificadamente com grande subsidiação.
A subsidiação que o Estado faz a estas actividades, para além de lhes fornecer as instalações, é orçamentalmente na ordem dos 30 milhões de euros/ano. É preciso também ter este facto em consideração quando comparamos isto com actividades artísticas e dizemos: «são 25 milhões de euros para as fundações e são só 21 milhões de euros para o apoio às artes». Ora, há um apoio directo às artes, quando há 30 milhões de euros que são afectados a todas estas actividades, 30 milhões de euros estes que não são do Ministério da Cultura, mas do Ministério das Finanças. As dotações de capital e as dotações com indemnizações compensatórias serão do orçamento do Ministério das Finanças e não do orçamento do Ministério da Cultura.
Relativamente às linhas de crédito com as empresas — e, agora, vou seguir mais a lógica de responder pontualmente — , o que foi pedido à CGD e ao Millennium BCP foi que estabelecessem linhas de crédito para apoiar, nomeadamente, artistas e artistas plásticos e quer uma quer outra entidade disseram-me que isso poderia ser feito e que seria feito. Julgo que os regulamentos para essas linhas de crédito estão em estabelecimento por parte destas duas entidades.
Mas compreendo que a perturbação que tem acompanhado o funcionamento dos bancos, das instituições de crédito e do mercado financeiro tenha levado a que estas preocupações (legitimíssimas e que não levantam qualquer problema) tenham ficado um pouco atrasadas em função de toda essa situação.
Gostaria de realçar, mais uma vez, que não fiz qualquer acusação a antecessores ministros e limitei-me a dizer que a execução foi esta, que esta deficiente execução ou que esta falta de execução legitima a
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desconfiança com que qualquer ministro das finanças olha para esta realidade e faz com que eu tenha menos credibilidade para pedir aumento de orçamento.
Relativamente às Sr.as Deputadas Teresa Portugal e Manuela de Melo eu gostaria de, em primeiro lugar, chamar a atenção para que o papel estratégico da cultura é algo claramente percebido pelo Governo. E por que é que isto é claramente percebido pelo Governo? Eu explico, muito sumariamente.
Primeiro, o Governo fez um esforço no sentido de criar ciência e conhecimento e para isso: reforma educativa. A alteração das regras de funcionamento de todo o sistema educativo, a avaliação dos resultados de todos os agentes no sistema educativo tirando daí conclusões e reformando o mais possível essa actividade.
Em segundo lugar, investimento na ciência, na tecnologia e no ensino superior. Esforço para que, do ponto de vista do conhecimento e da ciência, haja uma melhoria de condições, mas, sobretudo, eu diria, no ensino formal, nas regras formais de ensino e aqui houve um grande investimento.
Mas também há um grande investimento, como referi, nas formas informais de ensino ou, se quiserem, a formalização das formas de ensino informais, nomeadamente com as Novas Oportunidades, e com a tentativa de recuperação de pessoas para dentro de um sistema de ensino que as capacite, que as qualifique e que, automaticamente, assegure uma maior intervenção cultura e do conhecimento por parte dessas pessoas.
Mas também há uma outra área em que as parcerias estão em vias de ser formalizadas entre o Ministério da Cultura e o do Trabalho e da Solidariedade Social, nomeadamente na parte em que tem a ver com o Instituto de Emprego e Formação Profissional.
Um terço do ensino em Portugal é ministrado pelo Ministério do Trabalho e Solidariedade Social e esse terço tem a ver com esse Instituto. É preciso estabelecer mecanismos para que, através da colaboração entre o Ministério da Cultura e esse Instituto, venhamos a desenvolver acções de formação informal, e peço desculpa do aspecto contraditório, de agentes culturais, de pessoas e todos os domínios em que muitas vezes não existem, sequer, mecanismos de formação formal.
Se fizerem um levantamento e uma análise verificarão que a generalidade dos professores de música — uma actividade cultural essencial — não tem qualificação específica para o efeito, não tem formação formal para esse efeito.
É preciso, portanto, criar mecanismos, interstícios, furos, regras, que permitam às pessoas qualificarem-se através de mecanismos informais dessa qualificação e isso é um dos trabalhos que também tem sido levado a cabo pelo Ministério da Cultura. Quando colaboráramos com a Fundação Calouste Gulbenkian, quando colaboramos com a Casa Pia de Lisboa, nomeadamente através do Museu do Azulejo, quando colaboramos com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais para criar mecanismos de formação cultural e de ensino de artes e de actividades artísticas, estamos a tentar fazer qualificação dessas pessoas por via desses mecanismos e dessas parcerias.
Ora, isto significa um grande empenhamento na compreensão deste papel estratégico da cultura. A cultura e a criatividade são dos dois cês a acrescentar à ciência e ao conhecimento, através dos quais conseguimos fazer com que o conhecimento e a ciência se democratizem.
Um grande génio científico, um grande génio do conhecimento que não use aquilo, que não aplique esse conhecimento socialmente não produz grande efeito social. Essa promoção de efeito social é alcançada através da cultura e da criatividade, que significam aplicação de conhecimento e aplicação de ciência.
E é nisso que este Governo também tem apostado, ou seja criando as condições para que haja uma muito melhor execução orçamental e esta não me foi apenas favorecida a mim, pois este ministro das finanças não me disse apenas a mim execute melhor, faça uma melhor execução; já a ministra que me precedeu nos anos de 2005 e 2006 conseguiu uma grande melhoria nessa execução, que subiu significativamente, sendo que apenas em 2007 com as obras do POC é que me parece que houve uma diminuição da capacidade de execução, que teve uma quebra mas que se retomou, imediatamente, em 2008 e por isso é que se passou de 249 em 2005 para 252 milhões em 2008.
Portanto, há uma clara compreensão desse objectivo estratégico e este objectivo estratégico é também realçado e prosseguido através deste mecanismo que consiste em fazer parcerias com as autarquias locais.
Fiz uma reunião com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses no sentido de criar essas parcerias mobilizando em rede as autarquias locais para que o investimento que é feito, ou a despesa que é feita no domínio cultural, seja uma despesa multiplicada, seja uma despesa alargada.
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Relativamente ao Fundo de Capital de Risco, ao fundo para o património, aquilo a que se chama o chequeobra, isso significa a tentativa de estabelecer uma parceria e esta está a ser negociada com todos os grandes empreiteiros de obras públicas, que são titulares de alvarás da classe 9, no sentido de eles oferecerem, para efeitos de recuperação do património classificado, seja ele de natureza religiosa ou não, uma doação em obra ao Ministério da Cultura para que este a use para esse fim, sendo que 1% das empreitadas de obras públicas serão adjudicadas a esses empreiteiros.
Eles não entregam dinheiro ao Ministério da Cultura, eles disponibilizam obra a realizar pelas próprias empresas em restauro patrimonial e esse restauro patrimonial será valorizado, será avaliado ao preço de mercado e não ao preço de custo, o que significa que haverá aí uma margem que é diferencial a favor dos empreiteiros de obras públicas.
Aquilo que eles me entregam é obra ao valor de mercado e não ao seu valor de custo.
Em segundo lugar, porque se trata de mecenato, porque isso está previsto expressamente no estatuto dos Benefícios Fiscais, doações em espécie, elas serão majoradas de 120 a 130%, consoante o destinatário e os termos — aliás, julgo que serão todas majoradas em 130%, sendo esse o objectivo, de modo que haverá também aí uma comparticipação do Estado que sofrerá esse aspecto.
Gostaria de chamar a atenção para outro ponto muito relevante. Quem não acredita no mercado acha que os empreiteiros de obras públicas vão aumentar 1% e fazendo-o, automaticamente, nós perderemos esse 1%.
Isto é: vem das obras públicas para a cultura. Bom, isso não e verdade! Se os Srs. Deputados perceberem que o mercado tem exactamente, em função da concorrência, o objectivo de ganhar os concursos criando as condições mais económicas, não deixarei de ter a certeza de que haverá 1, 2, 3, 4 ou 5 concorrentes de todos esses empreiteiros que concorrem às empreitadas de obras públicas, que vão decidir não pôr o 1% a mais porque assim ganharão a obra e sabem que têm a capacidade para fornecer esse trabalho em obra e, portanto, oferecer o cheque-obra.
Aquilo que farei mais é chamar a atenção para isto, fazer anualmente com estas empresas, que venham a colaborar em todo este projecto, um jantar para dar a devida importância a este esforço e a esta colaboração e anunciarei através de placas visíveis quais foram as empresas que colaboraram no restauro desse património.
Entendo que o património é indispensável para a identidade portuguesa, para a nossa memória. Recuperar este património, nomeadamente o património edificado, é uma tarefa generalidade.
Relativamente às parcerias gostaria de chamar a atenção para as parcerias feitas no âmbito da CPLP. De facto, a língua é um dos vectores essenciais da nossa actividade — aliás, foram aqui feitas perguntas nesse domínio — e relativamente à língua temos o acordo ortográfico, relativamente ao qual estamos empenhados em que ele venha a entrar em vigor rapidamente em todos os Estados, sendo que a generalidade dos Estados já o ratificou, mas ainda não aprovou o 2.º adicional que fará com que ele entre em vigor imediatamente, o que significa que aos 4 que já aprovaram os adicionais, nos quais o acordo ortográfico já está em vigor (Portugal, Brasil, Cabo verde e São Tomé), esperamos que se juntem Angola e Timor e, provavelmente, a Guiné, que teve eleições no passado domingo, sendo que estamos à espera dos resultados eleitorais e da constituição do Parlamento para que esse processo de ratificação tenha lugar, uma vez que foi expressamente dito pelo representante da Guiné-Bissau, que esteve na reunião da CPLP que teve lugar na sexta-feira e no sábado passados em Lisboa, que não haveria qualquer objecção política e que o acordo ortográfico será rapidamente ratificado.
Ora, o que é que queremos? Queremos criar uma data de entrada em vigor desse acordo ortográfico em todos os jornais oficiais dos países que já o tiverem ratificado e em toda a documentação oficial que venha a ser produzida.
Em segundo lugar, queremos que o acordo ortográfico venha a ser apoiado, através da criação de uma comissão de vocabulário português, no sentido de haver um vocabulário ortográfico que tenha todas as palavras, isto é que seja tão exaustivo quanto possível e que se faça um léxico técnico-científico que seja comum e que impeça, juntamente de acordo com as regras do acordo ortográfico, as dificuldades de busca nos motores de busca ou as dificuldades na determinação de qual a grafia para todo o léxico técnico-científico.
Queremos, ainda, finalmente, produzir rapidamente um programa informático que permita a tradução, a adaptação, a adopção das regras do acordo ortográfico nos textos, uma espécie de corrector ou de adaptador ortográfico, uma espécie de dicionário da ortografia portuguesa, como é usado já nos computadores, que tenha já o acordo ortográfico incorporado.
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Relativamente às técnicas de «infiltração», agradeço a intervenção da Sr.ª Deputada Manuela de Melo, sobretudo a chamada de atenção para esta preocupação por parte do Governo de utilização destes recursos não apenas para gastar mas também para fazer uma espécie de sementeira, chamando outros e colaborando com outros ministérios, bem como a preocupação de não permitir que a natureza específica dos projectos culturais seja subvertida pelo facto de fazermos parcerias.
É, pois, necessário assegurar que o carácter específico destes projectos seja salvaguardado e mantido não obstante haver o estabelecimento de parcerias. É preciso que o restauro patrimonial seja bem feito, não obstante ele ser feito por empresas privadas. Quem fará o projecto de restauro será o IGESPAR, quem fará o controlo da obra será o IGESPAR, quem verificará essa medição orçamental, para efeitos de determinação de qual o custo da obra, será o IGESPAR e depois será objecto de acordo, ou seja o restauro patrimonial não será feito de qualquer maneira pela empresa A, B ou C; será feito segundo um projecto de restauro que tem de ser feito com toda a qualidade ou seja não é por fazermos a parceria que o carácter cultural, o carácter rigoroso, o carácter exigente do restauro cultural será posto em crise.
O mesmo direi relativamente aos projectos que queremos levar a cabo com o fundo de capital de risco.
Temos prevista a criação de um fundo de capital de risco com capitais que não são do Ministério da Cultura e que esperamos que venha a reunir rapidamente entre os 25 e os 50 milhões de euros, que não será feito com menos de 25 milhões de euros e não é provável que seja feito com mais de 50 milhões de euros, sendo que esse fundo de capital de risco se destina a criar e a apoiar, em termos de funcionamento de mercado, as estruturas de apoio à criação e à actividade artística.
Trata-se de apoiar estruturas que sejam financiadas e apoiadas pelo Estado e não se trata de fazer, digamos, mecenato cultural. Trata-se de um fundo de capital de risco. O que é que isto terá como efeito? Libertar verbas, que, neste momento, o Ministério da Cultura tem de alocar à actividades que são sustentáveis pelo mercado, para apoio a actividades culturais que, sem esse apoio, não poderiam existir, não poderiam nascer, não poderiam subsistir, não poderiam crescer, não poderiam afirmar-se, não poderiam, muitas vezes, internacionalizar-se. Ou seja, é compreender que há actividades de natureza cultural que são essenciais à expressão artística, à expressão de identidade, à criação de identidade, à criação de cultura e ao enriquecimento daquilo que é a nossa especificidade, enquanto falantes do português e enquanto portugueses falantes do português. Essa especificidade deve ser realçada, através de toda esta actividade cultural e, muitas vezes, essa actividade cultural, essa criatividade não tem sustentação do ponto de vista do mercado.
Essa deve ser apoiada pelo Ministério da Cultura, com uma integração disso naquilo que é o objectivo público, o fim público dessa actividade e desse apoio; deve ser avaliada, deve ser contratualizada, mas deve ser apoiada. E deve ser apoiada sem qualquer critério de rentabilidade económica, mas apenas com um critério de rentabilidade cultural, de contágio cultural, de inseminação cultural, de contaminação cultural das populações.
Ao lado disto, há actividades que são apoiáveis e sustentáveis pelo mercado, e que podem ser desenvolvidas num contexto, que é diferente, sem que elas sejam alteradas. Refiro-me, muitas vezes, a actividades, por exemplo, de artes plásticas, em que é possível estabelecer apoios, ir buscar mercado e agentes de mercado que compreendam que existe um fosso de desconfiança, muitas vezes, entre a actividade artística e a actividade financeira e que esse fosso não tem razão de ser.
Não se trata apenas de dar mecenato; trata-se muitas vezes, mesmo, de investir nessas actividades — apoiar as galerias, as estruturas de internacionalização de artistas, as estruturas de exposição e de criação de lugares expositivos. Todas essas coisas não têm, necessariamente, de estar de costas voltadas para o mercado. E, portanto, tentaremos e esforçar-nos-emos por fazer isso.
Gostaria de dizer, relativamente à Rede Nacional de Bibliotecas Públicas e à Biblioteca Nacional, que entendemos que a nova Torre e a rede das bibliotecas públicas, juntamente com o apoio às artes e, ainda, outros investimentos que vão ser levados a cabo na região de Lisboa, ou que não vão poder ser comparticipados por verbas da União Europeia, eram centrais e essenciais, nomeadamente a Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, a Biblioteca Nacional de Portugal, os cofres do Arquivo Nacional das Imagens em Movimento (ANIM), onde as imagens em movimento que vêm do acervo e da história da RTP, são colocadas, preservadas e, depois, disponibilizadas a todos os operadores e a todas as pessoas que as queiram.
Gostaria de pensar que expliquei já o que tinha a dizer sobre a Cinemateca do Porto e sobre o «ChequeObra», como me foi pedido.
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Respondendo ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, gostaria de explicar que considero muito importante chamar a atenção para o que está previsto. Mas, importante, é exactamente o que se executa e sobretudo aquilo que se consegue ir buscar, a partir do que se executa e da maneira como se executa — são as parcerias que se estabelecem, é o envolvimento que se vai buscar.
Julgo que já estabeleci com clareza que a leitura do Programa de Governo, que é feita, era uma leitura sem qualquer fundamento e sem qualquer sentido. Portanto, será uma afectação de 1% do Orçamento do Estado para o orçamento do Ministério da Cultura. O que aqui se dizia — e repito, realço, chamo outra vez a atenção — era que a meta de 1% do Orçamento do Estado dedicada à despesa cultural continua a servir-nos de referência a médio prazo, importando retomar a trajectória de aproximação interrompida no passado recente, ou seja, era retomar a trajectória de aproximação. Essa trajectória de aproximação, trata-se de aproximar isso na despesa cultural e na dedicação à despesa cultural e não nos termos em que uma leitura precipitada — eu diria uma «leitura primária» — levou alguns a concluir.
Quanto à entrevista do Expresso aos 0,3%: que culpa tenho eu? Já disse, não preciso de abundar; já disse também que deixava o CD, se quiserem ouvi-lo ou a transcrição, isso será esclarecido» Não gostaria que fizessem referências a isso, porque é dar voz, amplificar uma coisa que é do domínio, eu diria, do difamatório, do calunioso, relativamente a mim e àquilo que ali está dito.
Relativamente ao museu mar da língua portuguesa,»
(Aparte inaudível por não terem falado para o microfone).
Não disse que culpa tenho eu relativamente aos 0,3%; portanto, essas coisas não estão assim! Os 0,3% decorrem de um aumento de mais 20 000 milhões para o Orçamento do Estado. Ou seja, como já expliquei, o Orçamento do Estado tem 60 000 milhões de despesa e este ano, já está prevista uma possibilidade de despesa de 80 000 milhões porque se juntam os 20 000 milhões deste plano. E, portanto, a descida de 0,4 para 0,3 nada tem a ver com a comparação de duas realidades iguais. Se compararmos o Orçamento do Estado com a despesa que estava no ano passado e a mesma despesa para este ano, os 0,4% mantêm-se! Há uma subida, como disse, de um milhão; a percentagem, dentro do Orçamento do Estado, é totalmente subvertida por isto que é o acrescentar no Orçamento do Estado desta despesa de 20 000 milhões e que leva à descida, dentro desta comparação, para 0,3%.
Para que é que quero chamar a atenção? Para o facto de que o museu mar da língua portuguesa sobre que fui interrogado tinha três empreitadas. Tinha uma empreitada de restauro do que era o antigo Museu de Arte Popular. O antigo Museu de Arte Popular tinha ali problemas graves, porque sempre que havia cheias no Tejo ou sempre que a água subia muito no Tejo, a água entrava por baixo do antigo Museu de Arte Popular e aquilo não era passível de ser utilizado nessas condições. Era uma primeira empreitada, uma empreitada de isolamento, requalificação de todo aquele espaço, criação de casas de banho, etc.
Uma segunda empreitada de adaptação das obras, que era subsequente porque só era possível quando a primeira estivesse feita, era a de adaptação daquilo para poder funcionar como museu, o museu mar da língua portuguesa.
Terceira empreitada: uma empreitada de natureza museológica a fazer depois destas. Quando cheguei ao Ministério, deste museu estava executado 1% e, no final de Fevereiro de 2008, estava executado 2% destas empreitadas. Isto significava que este dinheiro não poderia razoavelmente vir a ser executado, porque as empreitadas eram sucessivas.
O que é que se fez? Cancelaram-se os dois segundos projectos, ou seja, o projecto de adaptação do espaço foi cancelado e também foi cancelado o outro projecto no que dizia respeito ao aspecto museológico, que não era passível de ser realizado até 31 de Dezembro, tratava-se de financiamento através do POC (Programa Operacional da Cultura); o POC é o terceiro quadro comunitário de apoio, estava em phase-out, tem de estar terminado até 31 de Dezembro e, se não estiver executada a despesa até 31 de Dezembro, temos de devolver a despesa feita e perdemos em qualquer caso a outra.
O que é que fiz? Mandei cancelar esses dois projectos, peguei nessa verba e essa verba foi para outros projectos que estavam em espera e que pudessem ainda ser realizados — projectos do domínio cultural, POC da cultura (POC — Programa Operacional da Cultura), POC do III Quadro Comunitário de Apoio, mas que às
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vezes, não eram sequer do Ministério da Cultura, eram de autarquias locais, mas que estavam à espera de ter verba, tiveram verba, foi alocada essa verba.
Relativamente ao museu mar da língua ou museu mar da língua portuguesa, o propósito existe logo que esteja terminado — coisa que se espera que aconteça até 31 de Dezembro, é isso o que está previsto — o restauro e, portanto, o restabelecimento das condições de utilização de tudo aquilo que é, do ponto de vista do solo, das infiltrações, das casas de banho interiores, etc., o edifício que era do antigo Museu de Arte Popular.
Começaremos a tratar da alteração para museu mar da língua ou museu mar da língua portuguesa, em parceria, nomeadamente com o Museu da Língua Portuguesa, em S. Paulo, com quem falei, com a Fundação Roberto Marinho, com quem falei, e que disponibilizaram (porque é quem gere o Museu da Língua Portuguesa, em S. Paulo) todos os conteúdos para fazer parceria, para que estabelecêssemos um diálogo, para fazermos aqui o museu que entendermos, muito diferente, muito melhor, o que seja. Mas eles disseram: «disponibilizamos integralmente tudo aquilo que é nosso e, desde que seja feito em parceria, não há limitação alguma — os modelos, os mecanismos, os projectos, os programas informáticos, o que quiserem, a gente disponibilizará». E, portanto, também aí pretendemos fazer mais, através desta parceria, e mobilizar mais recursos — neste caso, recursos de uma entidade brasileira, que, aliás, já estão feitos, esse investimento já está feito por eles, para que possamos também fazer melhor.
Em relação ao POC, gostaria de dizer e explicar isto: no POC que termina a 31 de Dezembro, está previsto um conjunto de despesas que são despesas de obras com a realização de um conjunto de obras. A gente espera que essas obras estejam todas terminadas, foi um grande esforço de aceleração de execução dessa despesa, até 31 de Dezembro.
Temos problemas com o Museu de Évora, porque havia problemas arqueológicos no Museu de Évora; houve problemas arqueológicos, houve coisas para fazer, e admitimos que o Museu de Évora não consiga estar concluído a 31 de Dezembro. Vamos ver se conseguimos executar tudo até 31 de Dezembro, mas não temos a certeza.
De resto, as únicas dúvidas que temos são o assegurar a execução, mas julgamos que está garantido isso até 31 de Dezembro, relativamente ao Museu do Côa e do Monte Latito, Guimarães — mas esperamos que tudo isso esteja.
Os outros estarão concluídos, todos eles, até 31 de Dezembro. O que é que está previsto para esses museus, a partir de 1 de Janeiro de 2009? Trata-se da parte museológica, que nunca esteve orçamentada para antes. Isto é, quais são os equipamentos? O que é que lá se põe? Como é que lá se faz? As obras estão terminadas a 31 de Dezembro de 2009, como estava previsto no POC e, portanto, quando o Sr. Deputado diz «apresentaram isto em 2007 e 2008». Claro, 2005, 2006, 2007 e 2008! Durante todo o POC, foram feitas as obras; algumas, como disse, tiveram deficiências de execução muito graves e estamos a recuperar isso e julgamos que até ao fim do ano está toda essa execução recuperada. E, depois, temos os aspectos museológicos e, portanto, volta a falar-se em museu a, museu b, museu c, mas não é a mesma obra, é outra coisa. É preciso separar uma coisa da outra e compreender isso.
Quanto às leis do património, sim, é urgente fazer a sua regulamentação; a regulamentação está feita, estamos em consultas finais para a apresentar.
Relativamente ao Vieira Portuense, aquilo que quero dizer é que ele já está no Museu Nacional de Arte Antiga e vai ser apresentado publicamente, proximamente.
Quanto ao exercício do direito de preferência ou à opção de compra, para ser mais rigoroso (não se trata de um direito de preferência mas, sim, de uma opção de compra), essa opção de compra, exactamente nas mesmas condições em que ele foi comprado, está oferecida ao Estado e já há uma entidade fundacional, que se dispõe a exercer essa opção de compra e a deixar ficar o quadro exposto no Museu Nacional de Arte Antiga. Portanto, não se trata de uma verba do Ministério da Cultura, trata-se, mais uma vez, de uma parceria e de um envolvimento de uma entidade de natureza fundacional, que vai exercer essa opção de compra e vai deixar permanentemente esse quadro nesse museu.
Gostaria que o Vieira Portuense itinerasse, rapidamente, para o Museu Nacional Soares dos Reis, para aí poder ser utilizado, porque o maior número de quadros do Vieira Portuense que temos em museus portugueses estão no Museu Nacional Soares dos Reis, e talvez fosse um bom momento para utilizar e para relançar o discurso e, digamos, a narrativa sobre isso.
Quanto às linhas de crédito, já falei, estão com duas entidades bancárias que são absolutamente credíveis.
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Quanto ao Museu Nacional dos Coches, estava previsto que as obras começassem a 1 de Setembro, não começaram a 1 de Setembro, não começaram a 1 de Novembro; vão começar proximamente e, até essa data, será encontrada uma solução, que está negociada já com outro ministério, o Ministério da Defesa Nacional, para que haja local para se colocarem aí todas as obras.
Gostaria de chamar a atenção para que aí, por exemplo, haverá despesa do Ministério da Economia e da Inovação, no que diz respeito à realização da obra do Museu Nacional dos Coches. É o Ministério da Economia e da Inovação que suporta essa despesa, é através do Ministério da Economia e do fundo de turismo que isso será suportado, apesar de ser um equipamento cultural; o Museu Nacional dos Coches não é pago pelo Ministério da Cultura, o que não significa que o Ministério da Cultura não tenha custos, nomeadamente com a adaptação do novo sítio para lá pôr o Instituto Português de Arqueologia ou o antigo Instituto Português de Arqueologia e que não tenha também despesa com a própria mudança e que, para obter esse sítio, não tenha que dar um outro sítio em troca que era do Ministério da Cultura.
Quanto à nomeação do director artístico do Teatro Nacional D. Maria II está em curso, o director artístico disse que só quereria começar ou só admitiria ser director artístico a partir de 30 de Setembro, que era a data em que terminava a sua participação numa peça que tinha em cena no âmbito do Teatro Maria Matos. E, portanto, o processo de nomeação dele só começou a partir de 1 de Outubro, quando se negociou com ele as condições em que ele viria par o Teatro Nacional; e, depois disso, esse processo vai para apreciação pelos serviços do Ministério das Finanças, na medida em que o director artístico, nos termos das EPE, tem de ser nomeado por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Cultura. Isto é o que está previsto no regime do Teatro Nacional D. Maria II e no teatro nacional das EPE culturais, ou seja, é que é despacho conjunto; trata-se de u despacho conjunto por delegação de competência do Sr. Ministro das Finanças, mas é esse o regime que foi aprovado nesta Câmara, relativo à legislação, ou, se se não foi aprovado expressamente, foi, pelo menos, ratificado tacitamente, na medida em que ninguém levantou o problema da alteração disso.
Sr. Deputado João Oliveira, do PCP, quanto ao decréscimo do orçamento da cultura, peço desculpa, mas gostaria de dizer-lhe que é mentira. O que se está a fazer é um esforço para subir. Aquilo que digo, mais uma vez, é que o «dedo aponta a Lua e vocês olham para o dedo». Lamento que assim seja. Aquilo que se está a dizer é que há muito mais verba despendida na cultura nos últimos quatro anos do que havia, em média, nos anos anteriores. Há um reforço da execução.
Mas, além de haver um reforço da execução, há um esforço de «contaminação», de parceria com outros e de envolvimento de outras verbas para fazer isto. Aquilo que não compreendo é que achem que há uma inversão. Penso que se prenderam a uma leitura superficial, a uma leitura que já qualifiquei de primária, do Programa do Governo. Não compreenderam, não contextualizaram isto e não perceberam que isto foi feito antes da descoberta e da compreensão integral dos 6,9%. Acho que não compreenderam que aquilo que aqui se dizia era que se queria inverter, retomar a trajectória de aproximação interrompida, porque esse é que era o objectivo que aqui foi definido. Não se disse que era 1% para o Ministério da Cultura!»
Risos do Deputado do PCP João Oliveira.
Peço desculpa, eu estou a ler o que aqui está! Percebo muito bem que o Sr. Deputado queira dizer: «Está bem, mas o que a gente quer é que lá esteja 1% do Orçamento para o orçamento do Ministério da Cultura!».
Mas isso não é o que aqui está e, portanto, essa promessa nunca existiu.
Em segundo lugar, gostaria de dizer que as despesas para a Caixa Geral de Aposentações estão devidamente orçamentadas. O Ministério das Finanças, quando organizou o orçamento do Ministério da Cultura, aquilo que fez foi — eu tenho aqui a folha que foi distribuída no Conselho de Ministros — colocar 3,196 milhões de euros para a Caixa Geral de Aposentações.
Em terceiro lugar, quero dizer que muitos dos funcionários dependentes, digamos assim, do Ministério da Cultura — dos Fundos e Serviços Autónomos e não só — já descontavam para a Caixa Geral de Aposentações. Portanto, havia funcionários de muitas entidades — por exemplo, os da Cinemateca, na generalidade com contrato de trabalho — que já descontavam para a Caixa Geral de Aposentações.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não coloquei isso em causa!
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O Sr. Ministro da Cultura: — Portanto, isso está previsto, está tratado e não absorve o aumento do orçamento.
Gostaria ainda de dizer que recebemos, por exemplo, funcionários que eram da antiga Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN) ou que vieram para o Ministério da Cultura. Esses funcionários que vieram para o Ministério da Cultura não transitaram imediatamente, ficaram com o seu pacote financeiro ainda no âmbito dos serviços da ex-DGEMN e do Ministério do Ambiente, vão agora transferir-se, isto é, ficam agora cá e, ficando cá, ficam também com o pacote financeiro ou com a mochila financeira, como também se diz.
Relativamente à Gruta do Escoural, é verdade que só tinha uma pessoa, e essa pessoa ficou doente. É verdade! Essas coisas acontecem e, agora, é preciso encontrar uma solução diferente, havendo já contactos feitos com a autarquia local competente para ver como é que resolvemos este problema.
Mas quero dizer que não é possível pensar que todos os equipamentos culturais funcionem com um número de funcionários duplo do necessário só porque podem ficar doentes ou de férias! Não é possível fazer isso!! Essa despesa não é susceptível de ser suportada. Portanto, é necessário encontrar uma solução de «ir à dobra», ou seja, é preciso saber quem é que, quando aquele funcionário está doente ou não, pode desempenhar a função, pode substitui-lo. Essa é uma solução que julgo que conseguiremos encontrar com a câmara municipal. Precisamos de saber quem é que a câmara municipal poderá disponibilizar quando esse funcionário está doente, porque a câmara é que sabe, em primeiro lugar, quando é que o funcionário está doente e não pode ir trabalhar. Portanto, é ela que poderá disponibilizar uma outra pessoa — e, provavelmente, tem pessoas que podem desempenhar essa função com muito mais competência, em função de um critério de proximidade, do que o Ministério da Cultura.
Quanto ao regime de apoio às artes, quero dizer que acompanhei o processo da sua alteração. A confidencialidade, Sr. Deputado, é uma coisa absolutamente risível, eu diria mesmo caricata. O que é que se passou? Nós reunimos, durante o mês de Julho, com os artistas e com os agentes culturais e fizemos uma pergunta — foi feita por mim numa reunião em que estavam muitos presentes e muitíssimos representados, com representação formal: «Há risco de isto demorar temporalmente. Podemos começar os concursos imediatamente a seguir a 31 de Julho, abrir os concursos imediatamente, ou podemos alterar a legislação sendo que, alterando a legislação, existe um problema de tempo, porque, primeiro, vai a Conselho de Ministros e, depois, tem de ser promulgada, tem de ser publicada, temos de fazer a portaria, temos de fazer os regulamentos e, portanto, isto pode atrasar-se?» Querem o regime que está ou querem que a gente faça estas alterações que estamos aqui a discutir convosco?» E foi dito unanimemente: «Queremos as alterações.
Mesmo sabendo que vamos perder algum tempo, queremos as alterações!». Todos disseram isto! Nessa reunião havida na sala grande no Ministério da Cultura, não houve um único que tivesse dito: «Eu não quero».
Todos disseram: «Ah, queríamos que fosse mais depressa, mas, enfim, terá de ser, está bem, encurtem o tempo o mais que puderem, façam o esforço que puderem». Gostariam — isso era o ideal — que se tivesse substituído o regime velho pelo regime novo no dia 31 de Julho. Mas não estava e foi dito que não estaria.
O que é que aconteceu? Fizemos tudo o que estava ao nosso alcance para fazer isso. A 4 de Julho o novo regime foi aprovado em Conselho de Ministros, mas este é um diploma que está sujeito a consulta das câmaras municipais e, portanto, tem de ir para a Associação Nacional de Municípios Portugueses. O que é que fizemos? Mandámos a versão provisória às autarquias locais nos dias 6 e 7 de Agosto para cortar tempo.
Ainda não estava aprovado em Conselho de Ministros, mas foi mandado, por minha iniciativa, para as autarquias locais, onde eu dizia: «Vai aqui o diploma, mas ainda não está aprovado, ainda não sabemos se fica rigorosamente assim, porque tem de ser aprovado em Conselho, onde não estou eu só, e, portanto, pode ter alterações. Portanto, mantenham confidencialidade relativa a isto. Mas leiam, estudem e consultem quem quiserem para começarem a formar opinião e a opinar e eu direi, a 14 de Agosto, se isto sofreu ou não alterações». E, a 14 de Agosto, informei que não sofrera alterações.
As duas cartas que foram enviadas nos dias 6 e 7, uma para um lado e outro para o outro, diziam para manterem a confidencialidade apenas por isto, porque queríamos cortar tempo e não tínhamos a certeza da versão final.
Portanto, digamos que é uma psicose persecutória o achar que este Governo quer fazer coisas escondidamente, pelo contrário, aquilo que fizemos foi para consultar a Associação Nacional de Municípios
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Portugueses. Segredo?! Por amor de Deus! É exactamente o contrário! Como ainda não havia a versão final, quisemos, desde logo, revelar aquilo, para que pudessem começar a trabalhar para encurtar o prazo, para que, no dia 14, fosse aprovado e imediatamente remetido para Belém, para que pudesse ser promulgado pelo Sr. Presidente da República.
Ele só pôde ser promulgado mais tarde não por culpa do Sr. Presidente da República ou do Governo, porque o Governo remeteu-o quando pôde e, na primeira semana, o Sr. Presidente da República esteve em viagem oficial até ao dia 5 de Setembro — eu também não estive, mas também não era preciso estar, porque não promulgo, é ele que promulga — , portanto, só a partir do dia 8 é que foi possível a promulgação. Isto só para explicar que não há qualquer problema quanto a isso.
Depois, quero dizer que o apoio tem sido quase unânime. É certo que, quando se muda de critérios, quando se muda um regime, há sempre pessoas que ficam perturbadas.
Em primeiro lugar, ficam perturbadas pela mudança, porque vão ter de estudar, vão ter de aprender. E não é preciso contar que, quando entrou em vigor o Código Civil de 1867, houve uma geração de advogados com mais de 50 anos que desapareceu, por resistência à mudança.
Em segundo lugar, gostaria também de dizer que é possível que nem toda a gente seja tratada igualmente.
Claro que não! Aquilo que não creio é que haja queixas fundamentadas, isto é, queixas que não sejam de alteração de regime, em função de uma prossecução clara de uma política de interesse público de distribuição mais alargada e de subsidiação mais capaz, mais competente, mais criteriosa e mais rigorosa de todos os agentes culturais. Aumentou-se mesmo a verba para a Direcção-Geral das Artes em 10%, tendo-se passado de 20 milhões para 22 milhões, o que é um esforço extraordinário, como diria, num ano em que nas verbas para o Orçamento não há aumento. Há um aumento de 10% para o apoio às artes.
Finalmente, gostaria de dizer que o regime laboral dos artistas não é nada que tenha a ver comigo. Eu tenho grande empenhamento e grande interesse em apoiar e em facultar tudo aquilo que me parece que vai no sentido da protecção social e laboral dos artistas, tenho tido esse trabalho junto do Ministério do Trabalho, mas isso é competência do Ministério do Trabalho!» Quando esse trabalho estiver concluído por parte do Ministério do Trabalho e quando o Ministério do Trabalho entender que é possível criar condições especiais, depois de um esforço, que é esforço de todo este Governo, durante estes quatro anos, de tentar criar regimes-regra para toda a gente, um quadro único para o regime de trabalho, para o regime de segurança social e para o regime fiscal, porque havia centenas de regimes especiais — regimes especiais na segurança social, regimes especiais laborais, regimes especiais de toda a natureza» — , quando este trabalho estiver concluído, eu entendo que o Governo estará, seguramente, em condições de, relativamente às situações em que o tratamento diferenciado se justifique, sem constituir uma discriminação, criar regimes especiais.
Relativamente à Sr.ª Deputada Cecília Honório, gostaria de dizer que o seu tom de chacota me ofendeu.
Não compreendo as coisas que disse, os diminutivos que apoiou ou o tom. Claro que leu um documento escrito, não estou a dizer sequer que seja seu, estou a dizer que me surpreendeu, porque acho que aquilo que estamos aqui a discutir é uma coisa seriíssima. Estamos a discutir aqui a vida de dezenas de milhares de portugueses, a sua vida profissional e a trabalhar no sentido de criar condições para que eles possam desenvolver uma actividade, que é uma actividade essencial de Portugal. Numa situação de crise, acho que o trabalho em cultura, o trabalho em qualificação das pessoas, é absolutamente indispensável. Por isso, passando à frente do que V. Ex.ª disse, gostaria de explicar-lhe que a política para o sector foi plenamente referida — língua, património, artes e indústrias criativas.
O relatório apresentado, para este efeito, a estas duas comissões pelo Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura é claro quanto aos objectivos políticos. Estão lá todos, está lá tudo dito e a política está lá toda explicada. Quanto ao Orçamento do Estado também. Quanto ao esforço na execução e de contaminação de outros também.
Relativamente às parcerias, gostaria de chamar a atenção para as parcerias empresariais que já referi: parcerias para constituir um fundo para as artes e as indústrias criativas, fundo este que mobilizará empresas nacionais e entidades estrangeiras, como o Banco Europeu de Investimento, que se espera que participe com montantes para esse efeito; temos também um objectivo que é o de também aumentar o apoio às artes, como fizemos, através, nomeadamente, do aumento das verbas para a Direcção-Geral das Artes.
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Mas quero dizer-lhe que, além disso, fizemos também um aumento indo buscar fundos de outros, como fizemos para o Vieira Portuense. Posso dizer que, ontem, foi exercido, por parte do Estado, o direito de preferência ao espólio Pessoa, por parte do Estado, em relação a todas as obras que a Biblioteca Nacional nos informou que, em sua opinião e na de todas as entidades que consultou, havia interesse em assegurar que ficassem na Biblioteca Nacional. A comunicação foi feita ontem.
Esse direito de preferência será exercido com fundos que não são Ministério da Cultura. Portanto, não será dinheiro do Ministério da Cultura que será usado para isso, mas sim, mais uma vez, através uma parceria. Há um mecenas que contribui com esse dinheiro para que nós consigamos ter na Biblioteca Nacional esse espólio do grande poeta que foi Fernando Pessoa à disposição de toda a gente.
Gostaria também de chamar a sua atenção para aquilo que disse do despacho de dissolução, considerando-o uma «peça de pasquim«» Acho que não sabe do que está a falar, porque, senão, não diria coisas dessas. Há regras jurídicas para se fazerem as coisas, há regras que estão nos Estatutos quer do Teatro Nacional D. Maria quer das EPE. E aquilo que se fez foi seguir rigorosamente as disposições legais das alíneas a), b) e c).
Vou explicar, porque é muito importante que isto se perceba claramente: os entes públicos empresariais têm um regime legal que é semelhante — o Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças sabe isto tão bem ou melhor do que eu — ao do regime das sociedades comerciais anónimas. Nas sociedades anónimas existem sócios e nas EPE o sócio é o Estado. E diz-se que o sócio tem uma função como se fosse a função de accionista. Nas EPE o Estado, isto é, o órgão dessas EPE, que é composto pelo Ministro das Finanças e pelo Ministro da Cultura, pode, livremente, sem qualquer fundamento, dissolver o órgão Conselho de Administração. Sem qualquer fundamento! Que fique claro, porque é o que está na lei: é sem qualquer fundamento! Podem dizer basta, acabou, este órgão está dissolvido e todas as pessoas se vão embora!
O Sr. Presidente: — Queria só deixar um detalhe jurídico: é a chamada destituição ad nutum, é assim que se designa.
O Sr. Ministro da Cultura: — Portanto, isto é o que está previsto na lei.
O que é que nós entendemos fazer, porque também está previsto na lei? É que se a gestão tiver sido não rigorosa, com falta de rigor, podemos fazer essa mesma dissolução e nesse caso não há lugar à indemnização das pessoas que estavam a exercer aqueles cargos e cuja relação foi extinta por efeito dessa dissolução. Ou seja, é preciso dizer por que é que se faz isso, e isso é feito de acordo com regras de controlo financeiro, de controlo orçamental, que são regras jurídicas.
E o que se publicou, que é obrigatório publicar, foram os fundamentos que correspondem ao preenchimento das alíneas a), b) e c) do número do artigo que permite a dissolução sem lugar à indemnização, por isso é que tem um despacho conjunto de dissolução do órgão e nada mais.
Quando fala em «peça de pasquim», percebo que não faz ideia do que é o Direito e do que são estas regras, mas poupe-nos as qualificações que são absolutamente dispensáveis e que não têm qualquer razão de ser.
Relativamente ao espaço museológico de Belém, gostaria de referir o que disse sobre o museu «mar da língua portuguesa», sobre o Museu Nacional dos Coches, sobre as transferências, sobre tudo isso disse o seguinte: «já vai nascer a ‘obrazinha’ para que seja inaugurada em Julho de 2008». Mas eu já expliquei. De qualquer forma esses diminutivos que usou não diminuem a Câmara, nem diminuem o Governo, só diminuem quem os profere, portanto, não vale a pena usar um tom de chacota para se falar de coisas sérias.
Relativamente à atribuição de verbas às fundações, elas recebem 25 milhões de euros. O apoio às artes é de 22 milhões de euros, mas há despesa directamente ligada às artes, como acontece com o Teatro Nacional D. Maria II, com o Teatro Nacional São João, com o Organismo de Produção Artística (OPART), que é da ordem dos 30 milhões de euros. Contudo, há muita outra actividade que é assim apoiada e subsidiada.
Quanto ao apoio ao Museu Colecção Berardo, já o disse, passa de 6,350 milhões de euros para 6 milhões.
Esse apoio é feito numa parte pelo Ministério da Cultura directamente — estão orçamentados 3 milhões — e noutra parte através dos serviços comuns que existem no âmbito do CCB, que são pagos ao CCB pelo Estado e que o mesmo partilha com a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea — Colecção Berardo.
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Relativamente a esses montantes, queremos que eles sejam relevados nos beneficiários, isto é, são relevados na Fundação de Arte Moderna e Contemporânea — Colecção Berardo, porque, apesar de entregues ao CCB, são transferidos do CCB que os usa para pagar serviços que são prestados também à outra Fundação: serviços de segurança, serviços de contabilidade, serviços de telefone, serviços de electricidade, serviços de vigilância, serviços do que quer que seja que são pagos pela Fundação do CCB, mas que são, agora, partilhados com a outra Fundação, e daí os 6 milhões. Há um milhão, como disse, que vem do Fundo de Turismo.
Relativamente à Cinemateca do Porto, julgo que já foi referido tudo.
Quanto ao regime de intermitência das pessoas, também já falei.
Acho que com isto me expliquei e respondi, embora tenha excedido claramente o meu tempo, pelo que agradeço a complacência — aliás, julgo que estou mesmo a usar o tempo do Partido Ecologista «Os Verdes», porque não esteve presente. Peço imensa desculpa à Câmara e ao Sr. Presidente por ter abusado do tempo.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, muito obrigado.
Como é óbvio, o importante é que o esclarecimento se faça com toda a profundidade e sem qualquer tipo de espartilho de limitação. Portanto, pese embora tenha excedido o tempo que lhe foi cometido inicialmente, foi por uma boa causa.
Contudo, espero que na segunda ronda o Sr. Ministro seja um bocadinho mais cauto e consigamos, de facto, cumprir os tempos inicialmente programados Vamos passar, então, à segunda ronda de questões, para a qual cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos, começando pelo PSD.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Sr. Presidente, espero que seja tão complacente para com o PSD quanto foi para o Sr. Ministro da Cultura, que rigor no tempo teve zero. Mas vamos, então, ao rigor das verbas.
O Sr. Ministro, até com alguma deselegância, referiu-se a vários Deputados dizendo que leram o Orçamento de uma forma primária, que olharam para o dedo e não olharam para a lua» Vou ler o seu Orçamento de uma forma absolutamente primária, isto é, olhando para as verbas que lá estão.
O Sr. Ministro veio aqui com uma desculpa interessante, que nunca tinha ouvido a qualquer ministro, pois disse: «o meu orçamento é quase nulo, para a cultura não há dinheiro, o Governo à cultura não liga nada, mas os senhores não se inquietem, porque há imensos ministérios que têm imensas coisas de cultura», e falou imenso dos outros ministérios. Imagine que, então, tínhamos que comparar com os seus antecessores tudo aquilo»
Por interferência do telemóvel, não ficaram registadas as palavras da oradora.
Aliás, o Sr. Ministro ao falar, e falou largamente, da cultura nos outros ministérios, até dá vontade de lhe perguntar pelo Conservatório, pelo Instituto Camões» Se o Sr. Ministro fala disso tudo como cultura que não está na sua tutela mas que, segundo o senhor, está no orçamento da cultura (o senhor não manda nela, mas é cultura»!), por que ç que não mete tambçm as verbas do Ministçrio da Educação? Olhe que então o orçamento da cultura subiria imenso, cerca 6000 milhões de euros (penso que é o orçamento do Ministério da Educação), porque o Ministério da Educação também faz cultura, é difícil separar a educação da cultura!!
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Zita Seabra, apenas por uma questão de precisão, tenho a dizer-lhe que não chega 6000 milhões, são cerca de 5000 milhões de euros.
A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — São 6,6 milhões de euros — é o número que tenho.
Mas coloco-lhe perguntas sobre o seu orçamento, porque é perante o seu orçamento que o senhor responde nesta Casa. O que estamos a discutir é o Orçamento do Estado na parte relativa ao orçamento do Ministério da Cultura para o próximo ano, não é o orçamento da cultura que anda pelos vários ministérios e pelas câmaras municipais, felizmente.
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Sobre isso o Sr. Ministro disse muito pouco; sobre o seu ministério, que é a sua responsabilidade, disse muito pouco e tenho pena que não tenha dito aqui que lamenta ter um orçamento tão pequeno.
Há pouco tempo, um grupo de gente da cultura, que estava reunido e que discutia exactamente esta pequena verba para a cultura depois das promessas múltiplas que o Partido Socialista foi fazendo, fez comparações e concluiu uma coisa muito curiosa, que o orçamento do Ministério da Cultura é mais pequeno do que a maior parte dos orçamentos dos sub-secretários; que o orçamento do Ministério da Cultura é mais pequeno do que a verba para a construção da ponte Rainha Santa Isabel, em Coimbra. É, realmente, um orçamento praticamente inexistente! A cultura para este Governo não conta! E não se venham desculpar com a anterior ministra, porque era do mesmo Governo, o mínimo que se pede é alguma solidariedade num Governo que é o mesmo: mudou a pessoa, mas o Governo é o mesmo. Embora se note — e neste ponto penso que o Sr. Ministro respondeu, foi das poucas coisas que disse — que abandonou os projectos emblemáticos que vinham, neste mesmo Governo, da anterior ministra: o Hermitage foi-se.
Mas pergunto-lhe, Sr. Ministro, quanto custou ao Estado português — aos portugueses, aos contribuintes portugueses — essa história do Hermitage? Quanto custou? Quanto gastaram até agora? Já que fala em execução orçamental, pergunto-lhe quanto é que o Governo do Partido Socialista gastou no Hermitage, verba que foi retirada aos museus portugueses, ao seu funcionamento.
Segunda questão: o museu da língua portuguesa, museu virtual, foi-se.
Quanto custaram, até agora, essas duas obras que o senhor cancelou? Já que fala em execução orçamental, diga-nos! Em relação ao futuro, quais são os seu emblemas, aquilo que o senhor diz que é fundamental para a cultura deste país? Sr. Ministro, os museus estão como nunca estiveram!! O Sr. Ministro já foi ao Museu do Chiado? Já viu o estado em que se encontra este Museu do Chiado que em muitos fins-de-semana, de Verão não abriu as portas porque não tinha sequer funcionários?! Quanto ao Museu Nacional de Arte Antiga, o Sr. Ministro acha normal que uma família portuguesa que venha a Lisboa mostrar aos seus filhos esse museu emblemático português tenha de pagar bilhete para entrar e não pague bilhete para entrar no Museu da Fundação Berardo? Acha isto normal? Acha normal o estado em que está, neste momento, o Museu Nacional do Azulejo? O património está como nunca esteve Sr. Ministro! Os outros Ministérios, estão a alienar património todos os dias — antigos conventos onde existiam quartéis ou hospitais — e o Ministério da Cultura cala-se.
Mas pergunto-lhe, muito concretamente, sobre uma questão acerca da qual o Sr. Ministro não se pronunciou — vamos a ela muito clara e primariamente, olhando para o dedo e para a lua: o Museu Nacional dos Coches.
O Sr. Ministro tem os museus portugueses praticamente todos parados: não há funcionários; não há verbas; não há dinheiro para comprar peças; não há renovação; há tectos que caem; há museus fechados»! O Sr. Ministro tem o património todo a cair, pois não há verba para o património. Aliás, isso vê-se no seu orçamento. O património está como nunca esteve. Portugal é um país com um património rico, mas o património é o «parente pobre» do Ministério da Cultura.
Contudo, os senhores têm o projecto do Museu Nacional dos Coches. Todas as pessoas estão contra a construção das novas instalações do Museu Nacional dos Coches! Eu também estou contra, pois acho um disparate construir um museu, gastar milhões de euros de dinheiro do jogo numa instalação futura desse museu que é um dos poucos que funciona em Portugal e que está aberto ao público! Por que é que os senhores vão fechar as actuais instalações do Museu Nacional dos Coches e construir novas noutro lado?! E pergunto-lhe por que é que adjudicaram a um arquitecto brasileiro, sem concurso público, a construção desse edifício. Concorda que o Ministro da Economia faça isto? Concorda que as instalações do Museu fechem no sítio onde se encontra actualmente e onde, que se saiba, as pessoas gostam de ir? Todas as pessoas ligadas aos museus estão contra! Houve reuniões de directores dos museus onde todos se manifestaram contra! Como Ministro que tem a tutela da cultura, concorda que a obra emblemática do PS, depois do Hermitage e do museu da língua portuguesa, seja a mudança de instalações do Museu Nacional dos Coches, gastando milhões de euros do jogo, obra que foi adjudicada a um arquitecto brasileiro sem concurso público e que tem
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uma passagem aérea pedonal não se sabe bem para onde? Concorda com a instalação de um picadeiro no sítio onde o Museu se encontra hoje? O senhor concorda com isto? E quem é que vai proteger as pinturas que lá estão? Elas são compatíveis com a instalação de um picadeiro? Sr. Ministro, pergunto-lhe, muito sincera e primariamente, se concorda com esta obra pública e com esta prioridade no que respeita à cultura.
Agora, vou colocar-lhe uma última questão.
O Sr. Ministro comparou as execuções orçamentais anteriores com as do orçamento deste ano, tendo referido que a execução orçamental será excelente.
Sr. Ministro, comparando a execução orçamental dos anos anteriores com o que está orçamentado para este ano, mesmo que o senhor tenha uma execução orçamental de 100%, o orçamento destinado à cultura baixa. Não tem uma palavra de pena por isso acontecer? Acho que a questão que os portugueses colocam hoje é a de saber para que serve o Ministério da Cultura.
De real o Sr. Ministro anunciou uma medida, num jantar com os empreiteiros que fizerem obras, que talvez sejam pagos! Ó Sr. Ministro, será que eles gostarão de jantar consigo? Será que lhes dará assim um tão grande prazer jantar com um Ministro que tem um orçamento tão pequenino? Se calhar, preferiam jantar com o Ministro das Obras Põblicas, Transportes e Comunicação» Se calhar, era mais õtil que o Sr. Ministro jantasse com as pessoas da cultura, ouvisse os directores dos museus, ouvisse os arqueólogos, ouvisse a gente do teatro, ouvisse os artistas do Teatro Nacional, do Teatro Nacional São João, talvez isso fosse mais útil para o País, para nós e para a cultura nacional.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.
Como vê, fui magnânime consigo; concedi-lhe acima de 40% do tempo que estava inicialmente prédeterminado» Por isso, em termos de «igualdade de armas« com o Sr. Ministro, não ficou desfavorecida.
A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Exactamente!
O Sr. Presidente: — Queria, de facto, rectificar que a despesa total consolidada do Ministério da Educação — tenho os elementos aqui à mão — é de 6666,7 milhões de euros. É este o número exacto e preciso, tal como tinha dito, aliás, inicialmente.
Vou dar agora a palavra ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, pela voz da Sr.ª Deputada Marisa Macedo.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Marisa Macedo (PS): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Ministro da Cultura, a Sr.ª Secretária de Estado da Cultura, bem como V. Ex.ª, Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, e todos os Srs. Deputados e Sr.as Deputadas presentes.
Devo dizer que é incrível o que se ouve neste Parlamento: parece que a crise internacional «parou» hoje à porta desta sala, porque não houve ninguém que, até agora, tivesse referido a crise internacional que estamos a viver, a que Portugal está a resistir (de uma forma que considero estóica), mas à qual não estamos imunes, como é evidente.
Portanto, fazer de conta que não existe uma crise internacional neste momento parece-me lamentável, tanto mais que esse tem sido um «cavalo de batalha» de todos os partidos, em todos os debates que se travaram neste Parlamento, excepto no da cultura, o que tem a sua importância e merece ser referido.
Realmente, estarmos aqui a analisar o orçamento do Ministério da Cultura e não referirmos isso é, no mínimo, estranho.
O que os senhores nunca se esquecem de referir é o que consta no Programa do Governo, só que, tal como já aqui foi dito, o tal 1% era um valor de referência e, de facto, a verdade é que nós retomámos a trajectória, tal como está escrito no Programa do Governo. E quero lembrar — porque podem ter esquecido — que as condições em que o Partido Socialista está a governar são muito diferentes das que existiam no tempo do Dr. Cavaco Silva, em que entrava dinheiro a rodos no País vindo da Comunidade Europeia, o que não acontece hoje.
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Hoje, é esquisito ver o PSD — foi o que fez agora, pela voz da Sr.ª Deputada Zita Seabra — indignar-se com o facto de o Sr. Ministro da Cultura não se lamentar com o orçamento que tem. Então, no meio de uma crise internacional, em que estamos a resistir, o que é que se pede a um governante? Que se lamente?! É evidente que não! As crises não se governam com lamentos; as crises resolvem-se e enfrentam-se com determinação, com energia e com ideias.
Portanto, a estratégia do PSD é sempre a mesma: desistir e baixar os braços. Só ontem inovou, porque agora passa a ser, tambçm, «interromper a democracia«!» Não se compreende.
De facto, várias coisas distinguem o PS do PSD, e uma delas é que nós estamos dispostos a enfrentar a crise com esperança, trabalho e ideias.
Dito isto, quero felicitar o Sr. Ministro da Cultura pelo facto de estar a aplicar no orçamento do seu Ministério para este ano a criatividade na política, que é algo que julgo fundamental. Numa situação como a que estamos a viver, há que ser criativos a nível das políticas apresentadas ao País. E, nesta criatividade, verificamos que o Ministério da Cultura conta com as verbas que lhe são atribuídas mas, também, com o financiamento externo de vários organismos, que passa por outros ministérios, o que faz com que o Ministério da Cultura fique dotado de verbas substancialmente superiores às que uma leitura menos atenta poderia concluir.
Já agora, queria referir que o que interessa em política é executar. É evidente que podemos ter orçamentos «lindos», como, por exemplo, no tempo do PSD, em que eram bem grandes — o problema é que não se executava! Só que as pessoas vivem com o que se executa, com o que se faz, e não se resolvem, propriamente, os problemas com aquilo que se diz, que é aquilo que está previsto no orçamento.
Se formos olhar para o executado, o que é que acontece? No mapa da execução orçamental, a curva entre o estimado e o executado aproxima-se mais nos governos do Partido Socialista. E, este ano, ocorre um facto extraordinário: a execução consegue ultrapassar o orçamentado, o que é inédito — aqui, o Sr. Ministro da Cultura deve ter tido mérito para chegar a este resultado.
Também gostaria de dizer que a intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra me suscitou diversas interrogações. Uma delas prende-se com o facto de a Sr.ª Deputada ter dito que o património está a cair. Mas o património começou a cair ontem? Começou a cair quando este Governo iniciou funções? E, quando os senhores estiveram no governo, como estava o património? O património está pior do que no Estado Novo? Como ç que ç isto?!» É evidente que se tem feito um esforço enorme na recuperação do património do País, esforço que tem de ser reconhecido. E não só tem sido feito esse esforço como foi criado o «cheque-obra», uma iniciativa do Sr.
Ministro, que é uma medida absolutamente fundamental para fazer com que as empresas participem na recuperação deste património. Porque dizer que o património tem de ser recuperado é fácil; agora, dizer como é que se faz e arranjar financiamentos para o fazer numa altura como esta, isso, sim, é difícil, e aí tem de ser reconhecido o mérito! Em todo o caso, gostava de perguntar ao Sr. Ministro da Cultura qual é o património que pretende recuperar com este «cheque-obra».
Por outro lado, recentemente realizou-se a Cimeira da CPLP em Lisboa, que juntou Ministros da Cultura e da Educação de todos os países desta Comunidade, e eu queria saber qual é o rumo traçado em conjunto para a cultura nestes países. Temos um património extraordinário, que é a nossa língua, que pode ser potenciada e fazer-nos sair deste «pequeno rectângulo» para o mundo inteiro. É esta língua que temos de acarinhar, juntando-nos aos que a falam como nós e fazendo com que ela seja cada vez mais falada no mundo inteiro, porque só juntos conseguiremos fazer com que a língua continue viva e actuante no mundo inteiro.
Além da língua, há o próprio património imobiliário, os monumentos que existem não só em Portugal como no mundo inteiro e que reflectem a presença de Portugal no mundo É, pois, um património inestimável, que faz de nós um País grande e que tem um valor económico, cultural e social que temos de preservar, até para a nossa auto-estima.
Queria saber, também, o que foi decidido nessa Cimeira da CPLP em relação aos monumentos portugueses espalhados pelo mundo.
No Colóquio sobre o Património Mundial, que decorreu recentemente na Assembleia da República, a maior parte dos participantes concluiu que, de facto, a Lei de Bases do Património Cultural é excelente, mas falta a
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regulamentação, que é uma tarefa difícil porque implica a feitura de vários regulamentos, que não é uma coisa que se faça «do pé para a mão»! Pergunto, Sr. Ministro, em que estado está esse complexo acto de regulamentar a Lei de Bases do Património Cultural.
Para terminar, gostava de colocar-lhe a seguinte questão: o que é que o Sr. Ministro pretende fazer para que o Museu do Côa e as pinturas rupestres apareçam como um factor que potencie o desenvolvimento daquela região? De facto, é preciso investirmos na cultura, termos óptimos projectos de museus e de outro tipo, mas é preciso saber o que fazer com eles depois de edificados — há que potenciar as diversas obras que estão a ser feitas. Pergunto, por isso, Sr. Ministro, como é que o Museu do Côa e as pinturas rupestres podem servir para que toda uma região se desenvolva.
Para completar, porque não se percebeu muito bem, como é que vão funcionar os Fundos de Capital de Risco que serão aplicados nos eixos prioritários do Ministério da Cultura — no apoio às artes e às indústrias criativas.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, sabe que tenho estima pessoal por si — e a Câmara sabe-o — , mas devo dizer que, pela primeira vez, desde que está em funções, vi o Sr. Ministro usar uma linguagem, um conjunto de argumentos e, acima de tudo, adoptar uma postura que, sinceramente não lhe reconhecia.
Primeira questão: quem disse que queria dobrar o orçamento do Ministério da Cultura para 1% não foi qualquer um dos Deputados desta Câmara, foi o Sr. Ministro, no dia 6 de Abril de 2008, numa entrevista à Antena 1. Pergunto-lhe, por isso, Sr. Ministro: quem é «primário»? Quem tem aqui um argumento «primário»? As frases são suas!» O Sr. Ministro ç que, em Abril deste ano, depois de ter tido tempo para conhecer o Ministério e a agenda, assumiu publicamente que queria aumentar para 1% a verba do Ministério da Cultura — não a verba das despesas culturais, mas a verba do Ministério da Cultura.
Ora, não o tendo conseguido, Sr. Ministro, a primeira coisa que, eventualmente, deveria fazer junto da Câmara era um gesto de alguma humildade. Nós não vimos esse gesto e, sinceramente, fiquei decepcionado com isso.
Segunda questão, que não estava habituado a ver em si: o Sr. Ministro veio à Câmara dizer uma coisa espantosa, veio dizer o que é que gostava que lhe tivessem perguntado. Sr. Ministro, bem sei que, nos últimos dias, a democracia não é um valor em alta, mas, pela minha parte, continuo a defendê-la! Gostava, por isso, de relembrar-lhe que quem está aqui para responder a perguntas é o Governo. É a Assembleia da República que fiscaliza o Governo e fá-lo colocando as questões que entende importantes e necessárias.
Percebo que o Sr. Ministro fique admirado por só os Deputados do Partido Socialista lhe fazerem as perguntas que gostaria, mas o Sr. Ministro não está aqui para responder ao que gostaria; está, sim, para responder às perguntas que os representantes eleitos do povo português entendam fazer.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Fale por si!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Se não compreende isto, talvez devesse ter mais cautela quando critica os outros que falam de democracia,»
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Não é verdade!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » porque democracia ç isto, exactamente! Pergunto-lhe, de novo, como está a situação do Hermitage. Já lhe fiz esta pergunta directamente e, até agora, não obtive resposta. Concretamente, ao longo deste ano, o Sr. Ministro assumiu que, em 2009, haveria a possibilidade de se fazer a segunda fase desta exposição, mas, até agora, não sabemos de nada e estamos aqui para obter respostas.
Terceira questão: o Sr. Ministro usou um termo que, em política, é muito duro, e que eu, pessoalmente, não me lembro de ter usado. Disse que houve um jornal — no caso, estamos a falar do jornal Expresso — que
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mentiu, que publicou um conjunto de notícias que eram uma mentira. Porém, o jornal Expresso já disponibilizou online, no seu site, a gravação da entrevista com o Sr. Ministro — era isso que a estava a ouvir, o que não é muito normal numa reunião da comissão parlamentar. E, Sr. Ministro, há um conjunto de coisas que é dito naquela entrevista que, pelos vistos, está reflectido — e bem — no texto jornalístico.
Por exemplo, relativamente à nomeação do director nacional do Teatro D. Maria, o Sr. Ministro diz, primeiro, que tentou contratar o José Mourinho, mas não conseguiu (matéria não publicada por critério editorial), e, segundo, que uma das coisas mais difíceis é ter a «paciência necessária para que as coisas corram nos conformes«,»
O Sr. Ministro da Cultura: — Eu disse isso aqui, há pouco!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » adoptando já, pelos vistos, uma linguagem do novo acordo ortográfico.
O Sr. Ministro assume, nesta entrevista, que o problema relativo às verbas é um problema de perda de eficiência do Ministério, do organismo. Por isso mesmo, Sr. Ministro, penso que é preciso alguma cautela quando se usam termos desta natureza, como é o caso do termo «mentira», porque, de facto, muitas vezes, vamos ouvir as gravações e elas mostram algo diferente — eu tive oportunidade de a ouvir aqui.
Mas, por isso mesmo, Sr. Ministro, voltando aqui a um conjunto de questões, penso que é essencial que se fale de coisas reais. Sr. Ministro, eu tenho aqui comigo o Orçamento do Estado para este ano de 2008 e o orçamento do Ministério da Cultura diz o seguinte: «Museu de Arte Popular — Recuperação e Requalificação (3.ª fase) 900 000 €« e «Mar da Língua — Centro Temático das Descobertas 2,6 milhões de euros». A verdade, Sr. Ministro, é que estas verbas não foram executadas.
O Sr. Ministro pode queixar-se da «pesada herança«», veio aqui ensaiar o discurso da «pesada herança», mas, no seu caso muito particular, a «pesada herança» não é relativamente a anteriores governos mas, sim, relativamente à sua antecessora. Mas eu peço-lhe desculpa, Sr. Ministro. Ao longo de todo este ano, grande parte da execução orçamental prendeu-se com a sua actividade e, portanto, se o Sr. Ministro não conseguiu executar, peço-lhe desculpa, mas não pode passar essa responsabilidade para os seus antecessores. Essa é uma responsabilidade que é sua, e eu penso que, em política, quando assumimos as coisas com transparência, a primeira coisa que temos de fazer, quando falhamos, é assumir o erro, porque é a única forma de continuarmos em frente.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, para estas questões muito concretas, peço-lhe respostas concretas.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, de facto, compreendemos que V.
Ex.ª quisesse que nós contabilizássemos como despesa cultural toda a despesa que o Estado faz, por exemplo, nos sectores da educação, do ensino superior e da ciência e tecnologia ou, até mesmo, as verbas transferidas para as autarquias a que elas dão um uso cultural. Seria, certamente, um entendimento que nós partilharíamos, mas não é esse o entendimento das bases programáticas do PS nem é esse o entendimento que se pode retirar do Programa do Governo.
Estamos de acordo que a consideração da cultura não se pode cingir àquilo que são as actividades de mais imediata produção e criação artística ou de conservação do património, pois a cultura vai bem para além disso.
Agora, aquilo que as bases programáticas do Partido Socialista e o Programa do Governo diziam, quando se referiam a 1% do Orçamento do Estado dedicado à despesa cultural, não era isto que o Sr. Ministro está a dizer. Aliás, a sua antecessora apontava precisamente, com um entendimento diferente do seu, o orçamento de 2006 como o primeiro passo que era dado na convergência com 1%.
O problema é que, de 2006 para cá, a trajectória, como aqui se diz também, como o Sr. Ministro acabou de ler é de divergência. Nas bases programáticas do Partido Socialista e no Programa do Governo fala-se em retomar a trajectória de aproximação, que foi interrompida com o governo do PSD — com o governo do PSD é
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acrescentado por mim — , mas essa trajectória de aproximação é, afinal, Sr. Ministro, uma trajectória de divergência.
Ó Sr. Ministro, o exercício que aqui fez com a estimativa de execução e aquilo que estava inicialmente orçamentado é um exercício interessante, mas o que o Programa de Governo diz é 1% do Orçamento do Estado e, em relação a isso, houve uma trajectória de divergência.
Portanto, Sr. Ministro — e aproveito a metáfora que aqui nos deixou — , só mesmo «olhando para a Lua» é que podemos aceitar que este Governo fez uma convergência com este 1% de despesa cultural no âmbito do Orçamento do Estado.
Aliás, a Sr.ª Deputada Marisa Macedo trouxe-nos aqui um dado que eu julgo que é interessante, que é o dado da crise na discussão da cultura. Sr. Ministro, não sei se já se deu ao trabalho de fazer esta comparação ou não, mas aquilo que o orçamento do Ministério da Cultura representa, quando comparado com os créditos e avales dados à banca, é menos de 1%. Portanto, comparemos os 24 000 milhões de euros disponibilizados à banca entre créditos e avales com o orçamento do Ministério da Cultura. É este o peso que tem o Ministério da Cultura e a política cultural deste Governo? Não sei se era a isto que a Sr.ª Deputada Marisa Macedo se queria referir concretamente ou não, mas este é um dado objectivo.
Sr. Ministro, obviamente que criticamos o Estado por gastar pouco e por investir pouco em cultura.
Obviamente que fazemos esta crítica, tendo em conta o papel que deve caber ao Estado no investimento na política cultural, pois entendemos que o investimento público é fundamental no plano cultural. Também não entendemos que o investimento público possa ser substituído por investimento privado, porque a sua natureza é diferente e porque os objectivos que têm à partida são radicalmente diferentes.
Portanto, obviamente que entendemos que o Estado deve ter um investimento relevante em política cultural, que não se pode ficar por 0,27% da despesa pública.
Sr. Ministro, relativamente ao regime de apoio às artes, V. Ex.ª falou aqui na resistência à mudança e disse que muitas das entidades que contestam as alterações é porque resistem à mudança. Ó Sr. Ministro, sejamos sérios, a mudança que o senhor introduziu foi a recuperação das regras anteriores. A mudança que o seu Ministério introduziu foi a recuperação das regras que existiam antes de 2006, isto é, as regras que existiam antes da primeira reforma introduzida pelo Governo do Partido Socialista. Não se trata, portanto, de qualquer resistência à mudança, Sr. Ministro, trata-se de uma resistência àquilo que estava para trás e que já era errado.
O Sr. Ministro fala de uma discussão participada. Ora, em relação a isto, quero colocar-lhe três ou quatro questões muito simples.
Recebeu ou não, em Outubro, na sequência de três outras que já tinham sido entregues, uma carta de cinco companhias de teatro descentralizadas, que são a ACTA (Companhia de Teatro do Algarve), a Escola da Noite (de Coimbra), o CENDREV (de Évora), a Companhia de Teatro de Braga e o Teatro das Beiras? Já tinha ou não recebido, em Julho, destas mesmas cinco companhias uma carta protestando contra a forma como o processo de discussão política da revisão do regime de apoio às artes estava a ser conduzido? Recebeu ou não, em Agosto, mais uma carta destas cinco companhias com preocupações, interrogações e, inclusivamente, propostas concretas de alteração do regime de apoio às artes? É ou não verdade que nenhuma destas propostas apresentadas por estas companhias foi aceite e foi integrada naquele que veio a ser o decreto-lei aprovado em Agosto? Sr. Ministro, já agora, gostávamos de saber com quem é que discutiu esta revisão e quem é que lhe deu tão boa opinião dela, porque nós não conseguimos ainda encontrar qualquer entidade que nos tivesse dito que esta alteração é positiva porque vai garantir mais apoios às entidades que se encarregam da produção e da criação artística. Não encontrámos uma e, portanto, gostaríamos de saber com quem é que foi feita esta discussão e quem é que deu estes pareceres «tão favoráveis».
Sr. Ministro, esta questão relaciona-se com uma outra, que tem a ver com aquilo que já era uma política da sua antecessora, por isso é uma perspectiva de orientação política deste Governo, que é o afunilamento dos apoios em grandes instituições. E já aqui foram referidas, por exemplo, as situações da Colecção Berardo e da exposição do mobiliário com que o Hermitage financia a colecção que tem no museu.
O Sr. Ministro referiu aqui os 22 milhões de euros destinados ao apoio às artes. Esta verba é inferior em 3 milhões à verba que é destinada ao apoio às cinco maiores instituições, como, aliás, consta do orçamento por acções com muita clareza. Portanto, esta perspectiva de afunilamento dos apoios em algumas instituições,
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despreocupando-se com tudo aquilo que é a realidade cultural do interior e, em alguns casos, com tudo aquilo que é o trabalho histórico de instituições sediadas no interior do País, é, em nosso entender, errado e preocupante.
Para terminar, Sr. Presidente, até porque já ultrapassei o meu tempo, gostava de colocar ao Sr. Ministro duas situações concretas: Mosteiro de Tibães e Convento de Tarouca. Estas são duas situações em que a falta de pessoal é gritante, o que cria problemas gravíssimos.
O primeiro problema é o da vigilância. O Grupo Parlamentar do PCP já teve ocasião, no início do mês de Outubro, de enviar um requerimento ao Sr. Ministro com algumas destas situações concretas. Há situações no Mosteiro de Tibães em que grupos com pessoas de quatro autocarros são guiados por três vigilantes. E no Convento de Tarouca a situação ainda é mais preocupante, pois as obras de Grão Vasco que aí se encontram, cuja segurança, numa recente exposição em Espanha, teve de ser garantida por uma coluna militar, não têm qualquer segurança, estão acessíveis a qualquer pessoa e sujeitas a serem roubadas, destruídas ou a o que quer que seja, porque não há vigilância, não há guarda, não há qualquer garantia de segurança.
Em relação ao Mosteiro de Tibães, Sr. Ministro, sabe em que é que dá a precariedade e a rotatividade dos vigilantes, que é assegurada, nomeadamente, através dos POC? O que acontece é que os códigos de segurança de acesso às instalações e outras medidas de segurança, que deviam ser reservadas, tornam-se, afinal, do conhecimento público.
Portanto, gostávamos também de saber, relativamente a estas questões, que medidas é que o seu Ministério está a pensar tomar.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado João Oliveira.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, eu peço-lhe imensa desculpa, mas vou ter de lhe devolver a incompreensão relativamente à sua intervenção.
O que é que o Sr. Ministro entendeu como ofensivo ou chacota? Foi o facto de eu ter utilizado as suas próprias palavras, quando diz que este orçamento é «o princípio de uma agenda», e de lhe ter perguntado se não achava que é excessivo o Governo do Partido Socialista andar sempre a fazer princípios de agenda em matéria cultural? Achou isto ofensivo?!» Achou ofensiva a citação relativa ao Programa do Partido Socialista, que assume claramente «retirar o orçamento da cultura da asfixia de um governo de direita», que é o que está escrito no Programa do Partido Socialista?!» Ou achou ainda ofensivo que os números que foram aqui apontados, comparando 2005 e 2009, sejam de uma clareza que não tem discussão, apesar das voltas conceptuais que o Sr. Ministro deu sobre execução e estimativa?!» Se achou ofensiva esta realidade, peço desculpa.
Quero ainda voltar àquilo que me devolveu, ironicamente, sobre o despacho de dissolução do conselho de administração. Não sei se é entendimento do Sr. Ministro que isto é uma «pérola jurídica»: «As actas n.os 1 a 33 do conselho de administração contêm diálogos, que nada têm a ver com a gestão de entidades, e expressões insultuosas entre os membros do conselho de administração, nomeadamente entre o Sr.
Presidente e o Sr. Vogal». Ó Sr. Ministro, isto é uma «pérola jurídica»? Talvez agora possa entender melhor a minha afirmação, mesmo que considere a comparação, do seu ponto de vista, de mau gosto»! Mas as questões fundamentais em relação ao Teatro Dona Maria II eram outras. É porque, se a realidade é aquela que está aqui espalhada, eu perguntei-lhe por que não assacou responsabilidades, porque é que não pediu responsabilidades. Esta a primeira questão.
A segunda questão — e estamos a falar de contratos-programa — é esta: quando é que são assinados, Sr.
Ministro? Esta era a questão de fundo. Ou, então, deve assumir que, de facto, é uma situação vergonhosa a paralisia da programação dos nossos teatros nacionais. Se o Sr. Ministro entende que isto é chacota, enfim, não posso ajudá-lo nesta matéria.
Disse-nos aqui que o regime jurídico que enquadra o trabalho das artes e do espectáculo não é da sua responsabilidade, não é problema seu. «Não é comigo», disse o Sr. Ministro. Se me permite alguma arrogância nesta atitude, estes trabalhadores das artes e do espectáculo são trabalhadores altamente
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qualificados, são os tais que deveriam ser «protagonistas de primeira» num projecto cultural para o País, que o Governo do Partido Socialista continua a deixar no quadro de precariedade e de desprotecção relativamente à segurança social. O Sr. Ministro entende que este é um problema que não lhe diz respeito.
Mas já lhe diz respeito ter aqui um discurso encantatório sobre as grandes mudanças da educação e as grandes mudanças e o investimento na área da ciência! Sr. Ministro, entendamo-nos: afinal o que é que é da sua conta? É da sua conta, por exemplo, a redução em cerca de 18 000€ para as candidaturas, quando anda a falar tão empolgado dos apoios às artes? É da sua conta ou não o acentuar das assimetrias regionais na distribuição destes apoios, de que lhe falei aqui no início desta conversa? O Sr. Ministro disse, por exemplo, que fez uma reunião em que teve o acordo de todas as entidades. Mas diga-nos, Sr. Ministro, as entidades foram todas convocadas? Quais foram as entidades que foram convocadas para este acordo, que lhe permite aqui dizer que a generalidade das entidades convocadas e consultadas assumem esta sua leitura? Finalmente, se me permite, há uma questão que deixou em branco. Não me explicou, por exemplo, o que é que aconteceu ao Observatório das Artes e da Cultura. Não há dotação orçamental porquê? O Ministério da Cultura é uma entidade responsável por este órgão e pelo seu trabalho.
O Sr. Ministro deixou em branco em nome de um discurso que preferiu dedicar não às minhas perguntas mas às respostas que lhe apeteceu dar.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Cecília Honório.
Acabámos a segunda e última ronda de questões.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura. Se puder cumprir o tempo que estava programado, ficar-lhe-ia, naturalmente, grato.
O Sr. Ministro da Cultura: — Sr. Presidente, vou tentar responder por ordem e vou começar pela intervenção da Sr.ª Deputada Zita Seabra, a quem cumprimento.
Sr.ª Deputada, no meu entendimento, faz parte da minha função tentar encontrar as soluções que permitem ir buscar mais fundos para fazer actividade cultural, mesmo que esses fundos não sejam do Orçamento. Dizme que venho cá falar dos outros ministérios. Claro que venho também falar dos outros ministérios com os quais faço parcerias, isto é, em cuja actividade, por via das parcerias, tenho alguma interferência.
Quando se fala do Instituto Camões, aquilo que está em curso é a sua reestruturação para que a cultura tenha aí alguma interferência. Aquilo que foi aprovado em Conselho de Ministros é uma reestruturação do Instituto Camões, em que o Ministério da Cultura, o Ministério da Educação e o Ministério dos Negócios Estrangeiros vão participar activamente na condução desses trabalhos e, portanto, naquilo que é a actividade do Instituto Camões, para assegurar que seja o mais motivado na aplicação desses fundos, numa lógica de activação da actividade cultural.
Relativamente ao fundo da língua, é exactamente a mesma coisa. O fundo da língua não está no orçamento do Ministério da Cultura, mas quero que o fundo da língua sirva exactamente para uma actividade de língua, que é central para a formação cultural e para o desenvolvimento cultural do País.
Portanto, a Sr.ª Deputada diz que «não está no Orçamento, não interessa». Não! Não está no Orçamento, mas é extraordinariamente relevante. E aquilo que quero é estabelecer essas parcerias para que possa ter interferência e assegurar que esses fundos sejam utilizados para fins culturais. É, pois, exactamente o contrário do que disse.
Eu diria que faz parte da minha função não só gerir e executar muito bem aquilo que é o Orçamento do Estado, mas fazer mais do que isso, ou seja, ver se consigo parcerias com outras entidades para poder aumentar a verba disponível para despesa cultural, mesmo que essa despesa cultural não esteja inscrita no Orçamento do Estado, não venha do Orçamento do Estado, não venha dos contribuintes. Quanto mais eu conseguir alocar e mobilizar verbas que não venham dos contribuintes melhor, pois penso que estarei a fazer aquilo que é a minha função: conseguir mobilizar fundos da sociedade para realizar a tarefa de política cultural.
Gostaria de dizer que usar esse fundo da língua, usar esse dinheiro também tem a ver com criação de uma «rede de contaminação»» É evidente que gostaria de ser só um louco e não de ter três ou cinco vezes mais dinheiro. O que quero dizer é que tenho a tarefa de tentar aumentar não o Orçamento do Estado no sentido
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estrito mas o orçamento disponível, as verbas disponíveis para uma actuação cultural por parte do Ministério da Cultura, com intervenção do Ministério da Cultura. A minha função é aumentar esse montante o mais possível. No entanto, não falei sequer do «cheque-obra». Basta pensar que, se o «cheque-obra» for realizado, como tudo indica que será, e corresponder a 1%, significa uma verba disponível para restauro patrimonial que permitirá a recuperação de todos os 55 monumentos em risco, com uma relativa facilidade, isto é, pelo menos com algum desafogo. Ou seja, entendo que faz parte da minha função como Ministro tentar «contaminar» a sociedade para que ela se envolva nestas tarefas e nestes projectos.
Tenho pena de que estejamos num período de «vacas magras», tenho pena de que, quando este Governo tomou posse, o défice fosse de 6,9%, tenho de pena que haja a crise financeira, tenho pena dessas coisas todas, mas não é uma questão de ter pena. Revolto-me contra elas e podia ficar quieto. Não, aquilo que faço é tentar ultrapassar isso, criando mais investimento!! Gostaria de lhe dizer uma coisa que me parece que é central destes dois aspectos, respondendo também à intervenção do Sr. Deputado Mota Soares. No que se refere à Hermitage, é muito claro. Despesa total do Hermitage: 2 707 192,84 €. Esta foi a despesa total imputada ao Hermitage, mesmo que nesta despesa estejam 950 000 € de restauro da galeria D. Luís, isto ç, a criação de condições para a galeria D. Luís poder funcionar para esta exposição. Estou a incluir coisas que não pertencem aqui, porque se trata de restauro, mas estão nas contas. O que é que veio de receita total? Veio 1 820 000 € — receita de bilheteira, mecenato e contributos em espécie, que não foi despesa do Estado.
Ou seja, se percebermos que o investimento feito na galeria foi pago com verbas de investimento para esse efeito, temos um saldo positivo de cerca de 40 000 €, isto ç, não deu origem a custos. Mas podem dizerme, com toda a razão, que este mecenato, se não fosse para isto, se calhar, era mobilizado para outra coisa, se calhar, se calhar» O que estou a dizer ç que a exposição do Hermitage, contando absolutamente tudo, mesmo o investimento que não deveria aqui ser contado, dá 2 707 000 € e a receita foi de 1 820 941,85 €.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E em 2009, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Cultura: — Já lá vamos! Relativamente ao Museu dos Coches, peço desculpa, mas não me vou pronunciar sobre se gosto ou não gosto, se acho bem ou se acho mal.
Risos da Deputada do PSD Zita Seabra.
Mas vou dizer-lhe uma coisa, Sr.ª Deputada, que penso que a vai encher de prazer. A solução foi desenhada num decreto-lei subscrito pela Sr.ª Dr.ª Maria Manuela Ferreira Leite, pelo Sr. Dr. Carlos Tavares, pelo Sr. Dr. Pedro Roseta e pelo Sr. Dr. Isaltino Morais. Esta solução consta de um decreto-lei, que diz assim: «Os montantes dos financiamentos a conceder ao abrigo do número anterior, bem como os prazos e as condições de utilização, serão definidos por despacho do Ministro da Economia, ouvida a Câmara Municipal de Lisboa, considerando-se perdidas a favor do Fundo de Turismo as verbas que não forem utilizadas nos prazos estabelecidos naquele despacho.» É o que diz o decreto-lei aprovado por um dos partidos da coligação base do governo, e foi decidido assim.
É, portanto, o Ministro da Economia que, por este decreto-lei, tem o poder de, através de despacho, definir essas condições, e ele é que pegou em verbas para fazer o Museu dos Coches. Portanto, é papel dele e não do Ministério da Cultura. Foi com o acordo do então ministro da Cultura Pedro Roseta. Não quero dizer se acho bem, se acho mal. Se calhar, se estivesse no governo nesta altura, teria feito diferente, mas não adianta nada, porque é assim que está legislado! Não faz sentido pensar em alterar a legislação. Mais: as escolhas, quanto ao Museu dos Coches, foram feitas antes, sequer, de ter a pasta da Cultura.
Protestos da Deputada do PSD Zita Seabra.
Mas não por mim! Eu, enquanto Ministro da Cultura, não pude fazer uma parceria com o Sr. Ministro da Economia Manuel Pinho e dizer-lhe: «Gostaria que fizéssemos, antes, assim ou assado.» Eu não estava cá para fazer essa parceria.
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Acho que a lógica de parcerias é uma lógica de infiltração, como aqui foi referido e penso que com justeza.
É uma lógica de que, quanto a tudo o que foi feito antes de mim, não pude infiltrar-me para fazer nada, não pude contaminar, não pude fazer parceria, não pude envolver, não pude apelar a que aquilo fosse feito desta ou daquela maneira. Portanto, este é um regime definido por um diploma legal, que não é, sequer, deste Governo, mas do governo anterior.
Relativamente ao meu orçamento, compreendo que não é tudo o que eu gostaria de ter, mas julgo que ninguém teve alguma vez um orçamento que fosse o que queria. Se calhar, bastava-me ter na proporção do crescimento que houve nos orçamentos dos anos de 1996, de 1998, de 1999, de 2000. Talvez! No entanto, neste momento, não é esse o orçamento disponível e é por isso que penso que a minha responsabilidade política é executar bem, ir buscar mais dinheiro, encontrar soluções, para, aí sim, no orçamento que disporei globalmente considerado e não em sentido estrito, obter esse crescimento.
Sr. Deputado Mota Soares, não considero que se justificasse aqui nenhum exercício de especial humildade. Não sinto que tenha incumprido nenhum dos objectivos ou dos propósitos a que me tinha proposto.
Isto é, se eu disse o que refere, fui mal interpretado ou formulei mal e justifiquei essa má interpretação. Nunca quis que o orçamento crescesse para o 1%, pois, para que isso acontecesse, precisava de ter 550 milhões de euros. Portanto, não era sequer pensável que isso fosse acontecer. O que eu pretendia dizer é que queria mobilizar verbas de que o Ministério da Cultura pudesse dispor ou ter influência na forma como fossem aplicadas que se aproximassem ou chegassem a 1%. Gostaria de ter esse montante, e quero-o. Por isso, quando eu digo que vou tentar chegar lá, através do cheque-obra, através dos fundos de capital de risco, através das parcerias, através da mobilização das autarquias, através de um conjunto de mecanismos, é porque espero chegar lá, mas não dentro do orçamento que me é atribuído no Orçamento Geral do Estado.
Espero que haja um conjunto de mecanismos de envolvimento que permitam dispor desses montantes, como a contribuição europeia ou a CPLP.
Gostaria também de dizer que, quando há pouco referi o que gostava que me perguntassem, não tinha a ver com gostar que me perguntassem. Estava a fazer uma avaliação política e não uma avaliação pessoal nem anti-democrática. Os senhores são completamente soberanos, representam o povo e tenho imenso prazer em estar nesta Câmara, que o representa. Esta é uma democracia parlamentar. O poder está no Parlamento. Disso não haja dúvida nenhuma!
Risos de Deputados do CDS-PP, do PCP e do BE.
Peço desculpa, não estou a irritar ninguém. O regime é parlamentar. Não tenho dúvida nenhuma quanto a isso! É aqui que está o poder legislativo.
Portanto, o que estou a dizer é que, para mim, o que fazia politicamente sentido era que me colocassem questões como: «Mas, então, como é que arranja essas verbas? Mas, então, como é que executa? Mas, então, em que é que gasta esse dinheiro? Mas, então, o que é faz? Qual é a eficácia cultural do que está a fazer?» Isto era o que eu esperava, que gostava e que acho que devia ser feito. Mas, obviamente, estou a discutir politicamente convosco e não a fazer qualquer crítica de natureza ética ou moral ao funcionamento.
Relativamente ao Hermitage, julgo que está explicado.
Quanto ao Expresso, quero que fique muito claro que eu não disse — os senhores lerão tudo — «é-me difícil ter paciência para esperar pela assinatura do Ministro das Finanças». Não disse! Isto está entre aspas e é mentira! Também é dito que eu disse: «O meu Ministério não tem credibilidade» (está na primeira página, entre aspas). Mas eu nunca disse isso! Quer dizer, vamos admitir que eu digo «estou preocupado»; se o jornalista publicar «está desesperado», está a mentir, pois eu não disse que estava desesperado! Mesmo que esteja a fazer graduação de emoções. Se eu disser que vou à lua, ele não pode dizer que vou ao sol. Não é a mesma coisa! Portanto, não cabe ao jornalista interpretar, torcer, alterar as palavras e, depois, pô-las entre aspas na boca de quem acha ou a quem imputa isso.
Isso é gravíssimo e há-de ser corrigido. Por isso, eu disse que, como agora já está disponibilizado online, será mais fácil fazer essa correcção, que será feita, suponho que através do meio necessário, e isso vai ficar resolvido. Quero explicar, contudo, que não tive qualquer vontade de conflitualidade nesse sentido.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra?
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O Sr. Presidente: — Com que objectivo, Sr. Deputado?
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Ministro, já lhe coloquei a mesma questão do Hermitage três vezes. O Sr. Ministro disse que, para 2009, estava em aberto a possibilidade de haver uma exposição. Já lhe perguntei três vezes e gostava de ter uma resposta directa.
Já agora, Sr. Ministro, diga-nos quanto do mecenato do Hermitage foi mecenato público, nomeadamente do Turismo de Portugal. Tirando o dinheiro que o Turismo de Portugal colocou, qual é que seria o saldo da exposição, Sr. Ministro?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Sr. Presidente, quero dizer que não tenho aqui os nõmeros» Foram 500 000 euros do Fundo do Turismo, diz-me a Sr.ª Secretária de Estado.
Relativamente ao Museu Hermitage, quero dizer o seguinte: há um protocolo estabelecido entre o Museu Hermitage e o Ministério da Cultura.
Entendo que os museus portugueses devem fazer um esforço de abertura e exibição daquilo que têm e que isso, no que diz respeito à actividade internacional, deve passar pelo estabelecimento de parcerias com outros museus. Não acho que seja especialmente positiva a mera importação paga de colecções ou de exposições de outros museus para Portugal. Embora esse tipo de exposições tenham um papel a desempenhar e é importante que os portugueses possam ver todas essas exposições e beneficiar delas, pessoalmente, acho que o mais interessante e importante é que os museus portugueses, em parceria com outros, façam essas exposições, usando peças suas e de outros museus e as exportem também.
Ora, isso não está previsto nos objectivos do Hermitage. Aquilo que o Hermitage tem como objectivo é rentabilizar as suas colecções através da sua exportação, contra pagamento, para outros países.
Independentemente disto, o museu Hermitage, depois desta primeira exposição, fez saber que achava que ela tinha sido mal paga, que devia ter sido mais bem paga, mas o Estado português não está disponível para despender as verbas que o Hermitage acha necessárias para realizar essas exposições.
Por outro lado, não tem havido da parte do Hermitage grande disponibilidade para fazer parcerias que não fossem económica ou financeiramente dispendiosas para o Estado português. Mas nós estamos abertos, como sempre estivemos, mesmo no quadro do protocolo celebrado, para fazer as exposições com o Hermitage em Portugal, em 2009.
Quero dizer-vos que o Hermitage não tem reagido positivamente a esta nossa pretensão, por razões que não sei quais são, mas, como não há um contrato, como não está estabelecido que é assim ou assim, estamos dependentes da sua vontade, que é uma vontade permanentemente posta em causa e permanentemente reafirmada, e, por isso, não sabemos se vai haver ou não a exposição. Mas, independentemente disso, dentro de critérios de razoabilidade financeira e de eficácia cultural, estamos abertos a todas as exposições com o Hermitage, em 2009, que estiverem ao nosso alcance.
Relativamente ao Mar da Língua, gostaria de lhe dizer que havia três empreitadas e que, dessas empreitadas, duas estão integralmente executadas e a terceira vai ser executada até 31 de Dezembro.
Quanto às outras empreitadas, que eram sucessivas e estavam programadas temporalmente, por alguma descoordenação, para acontecerem depois — só podiam acontecer depois e esta só terminava no fim deste ano — , aquilo que foi feito foi avisar que seriam canceladas e as verbas utilizadas para fins culturais dentro do próprio Ministério da Cultura; a parte que não foi utilizada no Ministério da Cultura foi para outros programas culturais que estavam em lista de espera das autarquias.
Portanto, a parte do dinheiro que era do Ministério da Cultura foi usado para despesas culturais do Ministério da Cultura e todo o dinheiro que era da União Europeia e era financiado através do POC foi usado para outros programas que estavam em lista de espera. Por isso, todo ele foi aproveitado para esse efeito.
Sr. Deputado João Oliveira, quanto à alteração do apoio às artes, vou explicar duas coisas quanto aos museus, porque também isto é horizontal: todos os museus têm reforço de verba — repito, todos — de 2008 para 2009. O Instituto dos Museus e da Conservação, enquanto Instituto dos Museus e no total dos serviços
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dependentes, sobe 14%, mas o Paço dos Duques de Bragança aumenta 26%; o Palácio Nacional de Mafra, 35%, o Palácio Nacional da Ajuda, 10%; o Palácio Nacional de Queluz, 14%; o Palácio Nacional de Sintra, 29%; a Casa-Museu Anastácio Gonçalves, 10%; o Museu Abade de Baçal, 13%, e por aí fora. Há, no entanto, dois que descem: o Museu de Arte Popular, que está encerrado, desce 36%, porque não se faz aquilo que estava previsto, ou seja, o Museu do Mar da Língua, como já disse, e o Museu Francisco Tavares Proença Júnior, que desce 7% por critérios de execução da despesa, passando de 323 000 para 300 000. Todos os outros, sem excepção, sobem! Todos! Os únicos que estão a vermelho neste gráfico são estes dois que referi; todos os outros estão a negro e sobem.
Gostava de explicar que, em relação ao património em risco inscrito em PIDDAC, em 2009, vamos fazer obras de recuperação, que já estão incluídas no património para esse efeito. Se pudermos fazê-las através do cheque-obra, fá-las-emos, mas, se tal não for possível, temos já em PIDDAC verba prevista para elas. Estão aqui incluídas a Sé de Coimbra, o Mosteiro de Santa Cruz, o Palácio Manique do Intendente, a Sé de Évora, o Castelo de Mértola, a Casa Nobre de Burgos e mais uma lista que me dispenso de ler, porque é bastante extensa.
Gostaria também de dizer que as entidades recebidas e ouvidas pela Direcção-Geral das Artes, entre 14 de Abril e 31 de Julho, foram 63 e que, destas, uma delas era uma rede que representava organicamente 18 entidades e outra, chamada Plateia, representava 19 associados colectivos e 139 associados individuais. As entidades ouvidas foram o ACEP, a ACTA, a Artemrede, a Artistas Unidos, a Associação Comédias do Minho, a Associação Cultural Número, a Associação Internacional de Música da Costa do Estoril, a Associação de Produtores de Espectáculos, a Barraca, a Bomba Suicida, o Consulteiro, o CDC, a CEM, o CENDREV, o Centro de Dança e por aí abaixo. Vou também ler as últimas entidades para não prejudicar sempre quem vem no fim do alfabeto: Teatro de Braga, Teatro Virgínia, Teatro Viriato, Transforma, Visões Úteis e Vórtice Dance.
São ao todo 63 entidades, todas elas foram ouvidas, entre as quais aquela que referiu, ou seja, a ACTA — Companhia de Teatro do Algarve. Foram todas recebidas entre 14 de Abril e 31 de Julho, pela Direcção-Geral das Artes.
Todas as cartas que foram recebidas foram remetidas para a Direcção-Geral das Artes. Até à sua elaboração, tudo o que teve a ver com o decreto-lei foi considerado. Em 31 de Julho o decreto-lei ficou pronto, foi mandado para as associação de municípios para poderem ser ouvidas todas as entidades que quisessem»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Quais foram as opiniões dessas entidades?!
O Sr. Ministro da Cultura: — As opiniões destas entidades foram favoráveis! É isso que estou a dizer.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Acabei de lhe dar cinco que estão contra!
O Sr. Ministro da Cultura: — Peço desculpa, talvez digam agora o contrário. A informação que tenho é esta! Aqui diz entidades recebidas pela Direcção-Geral das Artes, entre 14 de Abril e 31 de Julho, com opinião favorável. Estão aqui, portanto, não tenho mais para dizer a não ser dar este esclarecimento.
Se houver alguma dúvida, eles serão recebidos, o Director-Geral das Artes recebê-los-á e esclarecerá o que houver para esclarecer. O prazo para estas candidaturas terminou ontem, dia 18. Agora, vamos proceder á avaliação dessas candidaturas e talvez não valha a pena, suponho eu» Não estou a dizer que isto não possa ter resultados que não sejam exactamente os previstos, é possível que tenha, não sou capaz de antever e de controlar o futuro totalmente, mas, se isso acontecer, estaremos atentos para fazer uma avaliação das modificações e alterar essas modificações. Parte disto decorre também de portaria e, portanto, se houver necessidade de fazer adaptações em portaria, elas, certamente, serão feitas.
Finalmente, gostava de dizer que as verbas alocadas, por exemplo, a Serralves ou ao CCB não são alheias à actividade artística. Serralves e o CCB contratam imensa actividade artística e imensos artistas para a actividade artística. É uma forma de descentralização da aplicação de fundos, que são aplicados localmente.
Em vez de ser eu — eu, a Direcção-Geral das Artes, os júris da Direcção-Geral das Artes — a decidir isso, a Fundação de Serralves contrata muita gente para fazer muita actividade artística, tal como o CCB.
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Quando o CCB faz o «CCB fora de si», espectáculos de música, espectáculos de teatro e essas coisas todas, um número significativo desses espectáculos não são feitos por pessoas que vão lá alugar salas — e também é relevante que haja salas para se fazerem os espectáculos, é por isso que ele também necessita desse dinheiro — , essas salas são geridas pelo próprio CCB, e, portanto, o CCB faz actividade cultural. É reducionista dizer que isto é um afunilamento por contraposição àquilo que é o apoio às artes. Isto também é uma forma de apoio às artes, é uma forma de os artistas serem contratados, de fazerem espectáculos e terem local para fazer esses espectáculos.
Relativamente à Sr.ª Deputada Cecília Honório, gostaria de dizer o seguinte: os contratos-programa foram assinados pelo Ministério da Cultura e foram remetidos ao Ministério das Finanças para aí também serem assinados. Os contratos-programa têm de ser assinados por duas entidades. Já estão assinados pelo Ministério da Cultura, já foram remetidos ao Ministério das Finanças e, portanto, estão à espera de serem aprovados e assinados por parte do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, que é quem tem competência delegada do Sr. Ministro das Finanças para este efeito.
No que diz respeito à OAC, deixe-me esclarecê-la: a OAC é uma associação, não é um organismo do Ministério da Cultura. É uma associação feita entre três entidades, que são o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, o Instituto Nacional de Estatística e o Ministério da Cultura. Portanto, a OAC não é mandada pelo Ministério da Cultura, não faz parte do Ministério da Cultura, apesar de o ministério lhe dar as instalações, pagar as despesas de funcionamento, pagar todos os estudos e essas coisas todas.
Apesar de ter feito isso no passado, entendi que era necessário, como também já disse a propósito da Fundação Eça de Queirós, avaliá-la e chamá-la, tendo-me reunido já com ela. Já me reuni com a OAC presente, com a OAC passada, com o ISCTE, com o ICS. As três entidades vieram falar comigo, não veio o INE, para se determinar se a função da OAC está a ser cumprida ou se deve ser outra.
Por exemplo, para explicar, gostaria que a OAC fizesse uma coisa que me parece absolutamente indispensável para que as parcerias possam ser agilizadas e tornadas mais eficazes, que é a identificação e o levantamento de toda a despesa cultural feita por outros ministérios, por outras entidades, no âmbito da despesa pública — por exemplo, por parte do Fundo do Turismo, por parte do Ministério da Ciência, por parte do Ministério das Obras Públicas, por parte do Ministério da Educação — , para que possamos ter uma visão horizontal e transversal dessas despesa e consigamos perceber onde é que estamos a fazer «sementeira» de actividade cultural. Este, por exemplo, é um trabalho que eu gostaria que a OAC fizesse. Vamos ver se é possível A OAC é composta por investigadores universitários, por professores universitários. São pessoas que não estão ao meu serviço, não são meus funcionários, não são pessoas a quem eu dou ordens. Portanto, que isto fique claro.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — (Por não ter falado para o microfone, não possível registar as palavras do orador).
O Sr. Ministro da Cultura: — Não! Na sua intervenção disse expressamente «este seu órgão»! Não é um órgão meu!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Tinha orçamento atribuído e deixou de ter!
O Sr. Ministro da Cultura: — Não, não! Peço desculpa! O orçamento deste ano da OAC está integralmente pago, está assegurado! Nada tem a ver com isso! Para o ano vamos ver como é que pagamos à OAC, o que é que pagamos à OAC e como é que o faz. Mas a OAC até tem instalações e funcionários! Tudo isso é fornecido pelo Ministério da Cultura e não está posto em causa! Portanto, vamos ver é como é que fazemos isso.
Outra coisa que se prende com a OAC é que não só o Ministério da Cultura paga todas as despesas de funcionamento como, depois, também tem de pagar todos os estudos que pede. Parece-nos que, se calhar, é preciso repensar o modo e o modelo de funcionamento e de financiamento desta entidade.
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Mas não acho que a OAC seja dispensável, acho que a OAC é muito importante e, quer se chame OAC ou outra coisa qualquer, aquela função tem de ser preenchida. Se esta associação conseguir preencher as funções eficazmente do ponto vista cultural, da informação e financeiro, óptimo.
Quero dizer que, no âmbito do PRACE, foi reformulada uma coisa chamada Gabinete de Relações Internacionais, que passou a ser Gabinete de Planeamento, de Estratégia, de Avaliação e de Relações Internacionais, hoje GPEARI. Portanto, grande parte destas funções passaram a estar cometidas a um órgão próprio do próprio Ministério da Cultura e nós temos de ver também como é que conciliamos — aliás, as instalações são as mesmas — a OAC com o GPEARI, nomeadamente se integramos a OAC na GPEARI, que é uma solução possível. Mas isso está tudo por definir, pois estamos em processo de avaliação.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro e Sr.ª Secretária de Estado.
Penso que foi um debate vivo, intenso e enérgico, naturalmente com disparidade de interpretações, de pontos de vista e de olhares sobre a cultura, mas isso faz parte da essência e da dialéctica parlamentar e, portanto, não é de estranhar.
Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos da parte da manhã, pelo que interrompemos aqui a reunião, que retomaremos à tarde.
Eram 13 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, vamos retomar os nossos trabalhos.
Eram 16 horas e 40 minutos.
Vamos dar início à audição com o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, cuja presença agradeço. Aliás, o Sr. Ministro é uma visita habitual da Comissão de Orçamento e Finanças, quanto mais não seja para trazer cá os demais ministros para as audições sectoriais dos diversos ministérios. É sempre com redobrado prazer que o vejo.
Também agradeço a presença do Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, a Comissão que, naturalmente, tem sob a sua égide as matérias da tutela do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Nos termos regimentais, foi apresentado um relatório à Comissão de Orçamento e Finanças, relatório esse que traduz o que há pouco tive oportunidade de dizer ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, isto é, uma estabilização das verbas do orçamento — em algumas rubricas, inclusive, o valor orçamentado corresponde exactamente ao valor do ano anterior, de 2008, com um montante de 0% em termos de variação orçamental.
Em traços muito gerais, ç um orçamento que contempla um valor de 863 000 € no orçamento de funcionamento do gabinete do Ministro; um valor de 10 milhões de euros no orçamento de funcionamento corrente do gabinete de meios de comunicação social, também com uma variação de 0% em relação ao ano anterior; 8 milhões de euros no orçamento de funcionamento de apoios diversos à comunicação social, também com a variação de 0%. No PIDDAC, encontramos uma verba com uma variação negativa de menos 52%: 860 000 € por contraposição a 1,8 milhões no ano transacto.
A verba mais significativa é a que se reporta ao sector empresarial do Estado na comunicação social — reporto-me, naturalmente, à RTP e à Lusa — , com as indemnizações compensatórias e a dotação de capital no tocante à RTP, num valor somado de 205 milhões de euros. E, no que concerne à Lusa, em termos de indemnização compensatória, é-nos apresentado um valor de 17 910 milhões de euros.
Estes são os dados mais significativos do Orçamento do Estado para a área do Ministério dos Assuntos Parlamentares, grosso modo, relativos à comunicação social, uma matéria central da nossa audição.
Para aprofundar um pouco mais estes números, vou conceder, como é timbre desta Comissão, a palavra ao Sr. Ministro, que fará uma primeira exposição, um intróito ao tema, com a duração de 15, 20 minutos. A seguir teremos uma primeira ronda de perguntas, dispondo cada grupo parlamentar de 10 minutos, perguntas essas agrupadas em bloco, a que o Sr. Ministro responderá, e, sendo esse o caso — logo se verá — , haverá uma segunda ronda de perguntas, dispondo agora de 5 minutos cada grupo parlamentar, com as perguntas agrupadas também em bloco, a que o Sr. Ministro responderá, encerrando o debate.
Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente Sr.as e Srs. Deputados: Farei umas explicações breves sobre a proposta de Orçamento para 2009, no que me concerne.
Este orçamento tem a ver, sobretudo, com a área (que é perfeitamente residual) que se prende com o custo de funcionamento do gabinete do Ministro dos Assuntos Parlamentares, e com uma outra área (que é a parte mais importante) relacionada com as minhas responsabilidades no que diz respeito à política pública para a comunicação social.
No que diz respeito à despesa do gabinete, nada há a justificar-se que não seja a de continuar a tendência de contenção de despesa, o que explica que esteja prevista para 2009 exactamente a mesma verba que foi orçamentada para 2008, no valor de 860 000 €.
No que diz respeito à política pública para a comunicação social, diria que ela tem duas dimensões principais: a primeira prende-se com o sistema de apoios à comunicação social, local e regional, assim como com o acesso à comunicação social de populações residentes em certas áreas do território nacional; a segunda tem a ver com as indemnizações compensatórias e as outras formas de financiamento público dos órgãos de comunicação social que prestam serviço público, seja na área da imprensa seja na área da rádio e da televisão.
No que se refere ao sistema de apoios, temos uma primeira dimensão, que é a dos apoios aos órgãos de comunicação social, com duas alíneas principais.
A primeira alínea tem a ver com o incentivo à leitura, isto é, a comparticipação por parte do Estado nos custos com a expedição postal de imprensa regional. E o que prevemos para 2009 é um valor inferior ao orçamentado para 2008; prevemos, portanto, uma verba na ordem dos 6,1 milhões de euros para o incentivo à leitura. A razão desta diferença de 441 000 € tem a ver com este facto simples: ç que, á luz da lei em vigor, a comparticipação do Estado nos custos da expedição postal passará de 50% para 40%, a partir de 1 de Janeiro de 2009.
A execução orçamental ao longo deste ano diz-nos que a despesa realizada está em linha com o orçamentado e, portanto, que o orçamento para este ano vai cumprir-se confortavelmente. É por isso que se prevê essa redução de despesa para 2009, que, como disse, tem a ver com o facto de, em 2009, a percentagem de comparticipação pública descer para 40% à luz da lei em vigor.
A segunda alínea do sistema de apoios aos órgãos de comunicação social tem a ver com os chamados sistemas de incentivos, que são, sobretudo, incentivos à modernização organizacional ou tecnológica de jornais e rádios locais ou regionais. No que diz respeito a este sistema de incentivos, prevemos para 2009 a afectação de uma verba na ordem dos 570 000 €.
A segunda dimensão do sistema de apoios diz respeito às populações residentes nas regiões autónomas, de forma a garantir o seu acesso, nas melhores condições possíveis, a órgãos de comunicação social de âmbito nacional. Esses sistemas de apoios têm duas componentes.
Uma delas é a comparticipação pública nos custos da expedição por via aérea das publicações de informação geral para as regiões autónomas e a verba orçamentada para 2008 é de 1,1 milhões de euros.
Também a execução orçamental diz-nos que essa verba é suficiente e, portanto, a execução orçamental corre com toda a normalidade.
Contudo, considerando as perspectivas de aumento, designadamente nas taxas de combustíveis e noutros custos no transporte aéreo, que eram perspectivas realistas na altura da elaboração da proposta de Orçamento do Estado (numa altura de crescimento quase constante dos preços do petróleo e seus derivados), optámos por pedir à Assembleia da República a definição de um plafond um pouco mais alto do que aquele que consta do orçamento inicial para 2008. É essa a razão porque está prevista, para 2009, uma verba na ordem dos 1,3 milhões de euros para a comparticipação do Estado no custo da expedição aérea de publicações de informação geral para as regiões da Madeira e dos Açores.
O segundo pilar, digamos assim, deste sistema de apoios públicos, não aos órgãos de comunicação social, local e regional em si mesmos mas, sim, ao sistema de apoios que procura garantir o acesso das populações residentes nas regiões autónomas aos órgãos de comunicação social de dimensão nacional, prende-se com os protocolos que envolveram o Governo da República, os governos regionais e as empresas de distribuição de televisão e que procuraram garantir o acesso das populações residentes na Madeira e nos Açores aos canais generalistas de dimensão nacional.
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Esse acesso estava, tradicionalmente, limitado ao primeiro canal do serviço público e, através destes protocolos, passou a ser possível aos interessados terem acesso aos dois canais de serviço público e aos dois canais privados de dimensão nacional, que funcionam em sinal aberto e são generalistas.
Ora, esses protocolos, a sua despesa na parte que compete ao Governo da República foi financiado por verbas do PIDDAC. O programa está concluído e as despesas que implicavam pagamentos por parte da Administração Pública nacional ocorrem (as últimas) em 2008. Ora, é a conclusão desse programa que explica que haja uma redução para menos de metade nas verbas do PIDDAC do gabinete para os meios de comunicação social.
Tal permite-nos, também, um outro conforto financeiro que usamos, em primeiro lugar e sobretudo, para continuar a reduzir a despesa pública e, em segundo lugar, numa pequena parte, para aumentar um pouco as verbas da cooperação portuguesa para o desenvolvimento na área da comunicação social, permitindo-nos introduzir um programa de cooperação na comunicação social com a República de Cabo Verde. É isso que explica que as verbas previstas para a cooperação portuguesa para o desenvolvimento, em sede de PIDDAC, passem de 640 000 € para 700 000 €.
Finalmente, no que diz respeito ao sector empresarial do Estado na comunicação social, a questão é esta: a Lusa é uma sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos que beneficia de apoio público através de um contrato de prestação de serviços de interesse público. Esse contrato está em vigor, terminará no próximo ano de 2009 e, à luz do disposto nesse contrato, a indemnização compensatória deve ser actualizada à taxa média da inflação prevista, o que explica que a indemnização compensatória para a Lusa seja, sem IVA, próxima de 15 milhões de euros (e, com IVA, cerca de 18 milhões de euros) em 2009.
A RTP é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, detentora concessionária do serviço público de rádio e de televisão. À luz do acordo de reestruturação financeira celebrado em 2003, a empresa beneficia de dotações de capital para a sua recapitalização e o valor previsto para 2009 é de 62,4 milhões de euros. O Governo tem cumprido escrupulosamente esse acordo de reestruturação financeira, inscreve a verba no Orçamento para 2009 e pede autorização à Assembleia da República para o fazer.
No que se prende com as outras duas fontes de financiamento, a contribuição para o audiovisual é actualizada segundo a lei e, portanto, segundo a inflação prevista, o que dá um valor de 1,75 € mensais para 2009. Também pedimos a competente autorização à Assembleia da República e, no que diz respeito à indemnização compensatória, valem os termos definidos no contrato que está em vigor e que representam um montante, com IVA, de 142 milhões de euros para 2008 — o que significa, sem IVA, perto de 120 milhões de euros.
No caso da indemnização compensatória, como já expliquei no ano passado na apresentação do Orçamento para 2008, o Governo de um lado e a concessionária do outro (a administração da RTP) entenderam — e entendem — que hoje há condições para que os valores da indemnização compensatória sejam inferiores aos que estavam previstos no acordo de reestruturação financeira, o que explica que o valor para o orçamento inicial de 2009, os 143 milhões de euros, seja inferior em cerca de 9 milhões de euros ao último valor do anterior contrato, que é o valor relativo a 2007. Isto do ponto de vista orçamental.
Do ponto de vista das medidas de política, as tarefas principais que nos ocuparão em 2009 são, de um lado, a transposição do que falta transpor da directiva sobre os serviços de comunicação social audiovisual, que consiste, essencialmente, em dois pontos: as mudanças que foram introduzidas na directiva em matéria de regulação da publicidade televisiva e a regulação dos serviços não lineares de comunicação social.
A segunda iniciativa legislativa que estará em curso em 2009 é a relativa à revisão da Lei da Rádio. Penso estarmos hoje em condições para proceder à revisão desta Lei, que é, aliás, algo que esteve no espírito de sucessivos governos e julgo haver agora condições para a realizar.
Portanto, a minha expectativa é que, ao longo do primeiro e do segundo trimestres do próximo ano, possa ser apresentada à Assembleia da República a tempo de esta discutir e, se o entender, aprovar nesta Legislatura uma nova proposta de Lei da Rádio e a lei que transporá a directiva de serviços de comunicação audiovisual nos aspectos relativos à regulação da publicidade e dos serviços não lineares.
O Sr. Presidente: — Agradeço ao Ministro dos Assuntos Parlamentares por esta sua exposição inicial.
Vamos, então, iniciar a nossa primeira — e espero que seja a última — ronda, pois ainda temos o Sr.
Secretário de Estado da Administração Local a seguir.
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Tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, caros colegas, começando precisamente pelo fim, o Sr. Ministro voltou hoje a anunciar que é intenção do Governo proceder à revisão da chamada Lei da Rádio. Aliás, desde que o actual Governo tomou posse, em Março de 2005, tivemos oportunidade de ouvir várias vezes que era intenção do Governo fazê-lo.
Tomámos conhecimento, nos últimos dias, que o Sr. Ministro afirmou, permita-me que o diga — um pouco em sede própria, aquando da sua participação no congresso da Associação Portuguesa de Radiodifusão — , que assim iria acontecer no início do próximo ano.
Esta primeira questão leva-me a pedir-lhe que, se fosse possível, nos falasse um pouco mais de quais são, em termos de conteúdo, as alterações que o Governo procurará fazer e apresentar para discussão pública durante o ano de 2009.
Como o Sr. Ministro deve saber, os anteriores governos apresentaram, por duas vezes, aqui, no Parlamento, duas propostas. Mas, por vicissitudes políticas — uma vez porque um governo terminou o seu mandato, pelo que caducou a discussão da proposta no Parlamento e, da segunda vez, o Sr. Presidente da República dissolveu o Parlamento — , não pudemos proceder à sua discussão.
Gostaria de dizer-lhe que, mesmo antes de conhecermos a proposta do Governo, estamos disponíveis para, de forma construtiva, contribuir para que Portugal fique com uma Lei da Rádio mais consentânea com a actual realidade.
Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro era se nos pode fazer, de forma sumária, o ponto da situação sobre o processo do chamado 5.º canal da TV.
A terceira questão tem a ver também com o que nos é proposto para 2009. Ou seja, o Governo assume que, a partir de Janeiro de 2009, irá haver uma diminuição de cerca de 10% no apoio às empresas jornalísticas que têm beneficiado do chamado incentivo à leitura, o porte pago, na prática.
Pergunto ao Sr. Ministro, em nome do PSD, se o Governo conta, em simultâneo, com este abaixamento, pôr à disposição do sector, de forma apenas transitória, outros mecanismos de apoio para a sua modernização e profissionalismo, nomeadamente a possibilidade de existir um plano de apoio à formação, pois existem grandes necessidades a esse nível, e, ao mesmo também, se há possibilidade de alguns dinheiros públicos poderem ser disponibilizados para, de forma transitória, esses meios de comunicação social poderem ter apoios, por exemplo, para a contratação de jornalistas ou de outros profissionais para o sector.
Terminando esta terceira questão, em termos práticos, pergunto ao Sr. Ministro se nos poderia explicar qual é o modelo que o Governo tem para este segmento dos media, se é um modelo mais liberal, se mais amador ou proteccionista.
Por último, pergunto ao Sr. Ministro se, perante cerca de 143 milhões de euros alocados à RTP, cuja política comercial, através de grandes descontos, lesa não só a chamada imprensa de proximidade mas também a imprensa em termos gerais ao criar condições de preço que permitem um investimento de pequenos anunciantes locais num espaço televisivo de cobertura nacional, o Governo não põe a possibilidade de tentar encontrar um mecanismo que ajude a corrigir esta situação. Nomeadamente, considerando os valores positivos da exploração comercial da RTP, parte deste apoio à RTP não deveria ser canalizado, por exemplo, para apoiar as famílias portuguesas no acesso a publicações periódicas através do sistema de assinaturas? Entendemos que uma das grandes debilidades do nosso país, também neste sector, é a dos baixos níveis de leitura. Nesse sentido, acompanhamos a generalidade da sociedade portuguesa: ao nível das políticas públicas, faz todo o sentido que os governos promovam o incentivo à leitura de várias formas.
Portanto, Sr. Ministro, considerando que o Sr. Presidente da Comissão do Orçamento apelou para sermos sintéticos, por agora é isto que quero perguntar-lhe.
O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, particularmente por ter começado por dar um bom exemplo na sua intervenção, não utilizando os 10 minutos que lhe foram concedidos. Espero que este exemplo seja replicado pelas outras bancadas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Morais Sarmento.
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A Sr.ª Teresa Moraes Sarmento (PS): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Director do Gabinete para os Meios de Comunicação Social, gostaria desde já de agradecer e felicitar o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pela proposta de orçamento apresentada.
Como já vem sendo hábito, é uma proposta que se caracteriza pela contenção da despesa, não descurando, contudo, os apoios que tem de dar aos órgãos de comunicação social, tal como foi já foi relatado pelo Sr. Ministro, nomeadamente quanto ao sistema de incentivos, havendo um aumento significativo de 54%, e até mesmo o cumprimento de todos os acordos relativamente ao passado no que respeita às empresas do sector empresarial do Estado, a RTP e a Lusa.
No entanto, apraz-me aqui relembrar que é extremamente significativo que os Srs. Deputados presentes nesta Comissão tenham bem presentes todas as questões no que concerne à comunicação social, questões essas que têm levado a cabo um cabal cumprimento do Programa do Governo relativamente a esta área.
Aliás, devo dizer que ele está praticamente finalizado, à excepção dos dois pontos que o Sr. Ministro acabou de focar.
Não quero deixar de relembrar a criação do Provedor do Ouvinte e do Telespectador no que respeita aos serviços públicos de rádio e de televisão, isto já em 2006, com uma existência firmada com os programas semanais a que todos assistimos, quer na rádio quer na televisão. Não quero deixar de relembrar os Srs. Deputados que, em sede de comissão, já tivemos ocasião de ouvir quer o Provedor do Ouvinte, quer o Provedor do Telespectador relativamente à execução das competências inerentes aos respectivos mandatos.
Também convém relembrar a alteração do Estatuto do Jornalista, sobretudo no que concerne a algumas melhorias, nomeadamente o aumento dos poderes do conselho de redacção, do poder sancionatório da comissão da carteira e a limitação da margem de avaliação por parte dos juízes aquando decretam a quebra do sigilo profissional.
Não nos podemos esquecer da criação da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o novo órgão regulador dos media que veio substituir a alta autoridade para a comunicação social com um novo figurino, mais consentâneo com o das entidades congéneres nesta área.
Permitam que faça uma observação no que concerne à ERC. A ERC tem sabido granjear adeptos, muito embora com algumas críticas no início da sua actividade, até mesmo aquando da sua criação. Esse granjear de adeptos tem sobretudo a ver com a qualidade, até mesmo técnica, das suas deliberações e dos relatórios que tem apresentado, que tem aumentado grandemente a nível deste sector, e também me apraz referir o facto de os relatórios serem aproveitados a nível académico, o que também é uma nota inovadora relativamente a entidades reguladoras.
O destaque ainda vai para a proposta de lei apresentada no passado mês de Junho sobre a lei do pluralismo e da não concentração dos meios de comunicação social, que tem como inovação o desenvolvimento de um preceito constitucional que diz respeito não só à liberdade de imprensa mas também à liberdade de informação.
O pluralismo de expressão, a transparência da titularidade e do financiamento dos órgãos de comunicação social é um registo desta proposta de lei, apresentada pelo Governo e que já está nas mãos dos Srs. Deputados, sendo extremamente relevante, pelo que não quero deixar de a apresentar como nota de referência.
E por que não também o 5.º canal generalista de acesso não condicionado, portanto, de acesso livre, e uma apresentação de plataforma digital? Tentando ser o mais sucinta possível, de acordo com as indicações do Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, não quero, contudo, deixar de fora a Lei da Televisão e a lei que procede à reestruturação da concessionária do serviço público de rádio e televisão, que assegurou a fusão da RTP e da RDP, não deixando, no entanto, de fora a autonomia de cada um destes meios.
Neste sentido, coloco uma questão ao Sr. Ministro, que tem a ver com o acompanhamento necessário que o Governo tem de levar a bom porto no que concerne a uma exigência da Lei da Televisão, exigência essa que tem por base os princípios e as obrigações do serviço público, até mesmo no desenvolvimento do contrato de concessão.
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Pretendemos saber exactamente qual é o acompanhamento que o Governo tem feito relativamente à concessão do serviço público de televisão e respectiva avaliação.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, continuarei esta senda de ser muito sintético e, por isso mesmo, só lhe quero colocar três perguntas muito específicas e muito dirigidas a V. Ex.ª.
Mas, antes, permita-me que faça apenas três observações prévias.
A primeira é que já ganhei o dia. Depois de ouvir este elogio do Partido Socialista à ERC, nomeadamente face a algumas coisas que lemos no passado e às suas intervenções nesta mesma Comissão em audições da ERC, já ganhei o dia, já vi que há aqui, pelo menos, uma novidade no seu discurso.
A segunda observação é esta: o Sr. Ministro anunciou aqui, com alguma pompa e com alguma circunstância, que 2009 seria o ano da nova lei da rádio, que um objectivo muito importante para o Governo em 2009 é a nova lei da rádio. Ora, neste momento, estou a ler o relatório do Orçamento do Estado deste ano, que foi discutido, há um ano atrás, nesta Câmara, que diz, na sua página 187, que um dos objectivos para 2008 era — pasme-se! — a nova lei da rádio.
Por isso, Sr. Ministro, gostava de lhe perguntar o que é que aconteceu, o que é que se passou, para que, passado um ano, estejamos aqui de novo com o mesmo objectivo, com a mesma pompa, com a mesma circunstância, a anunciar que em 2009 é que vai ser, que em 2009 é que é, porque, em 2008, não deu para fazer.
Terceira observação: o Sr. Ministro, na sua intervenção, disse que o apoio económico e financeiro para a área da comunicação social subia 54% e mostrava alguma congratulação relativamente a isso.
É, de facto, verdade! Mas não podemos esquecer que esta verba do apoio económico e financeiro à comunicação social foi, em 2007, de € 1 001 270 euros, desceu no orçamento deste ano 63% e, em 2009, vai ser de 570 000 euros, portanto estamos a falar para 2009 de uma verba que é de cerca de metade da que foi atribuída em 2007.
Gostava que ficasse com estas observações que são factuais.
Vamos, agora, colocar três questões, que são muito específicas.
A primeira delas prende-se com a licença para o 5.º canal. Esse foi um concurso que, salvo erro, terminou no dia 29 de Agosto deste ano, há relativamente pouco tempo, mas a verdade, Sr. Ministro,»
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Deputado, ele abre na próxima sexta-feira! Se ele fechou a 29 de Agosto, ninguém me informou!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Obrigado pela correcção, Sr. Ministro. Fico muito contente.
Mas reforço a minha pergunta, Sr. Ministro, porque era aqui que eu queria chegar: neste momento, estamos a atravessar uma crise internacional e uma crise nacional, e um dos mercados que, muito provavelmente, mais vai sofrer é o mercado publicitário Neste momento, nota-se que várias empresas, nomeadamente empresas de comunicação social, estão a atravessar algumas convulsões, um período menos bom das suas vidas, exactamente face a esta crise nacional.
Ora, o que gostava de lhe perguntar, Sr. Ministro, é se, face a este cenário de crise, face a este cenário que é para muitas pessoas uma coisa relativamente nova, o Governo mantém na íntegra o concurso do 5.º canal ou faz uma nova avaliação do que se está a passar, nomeadamente do impacto que o 5.º canal pode ter sobre os operadores que já estão no terreno. É uma pergunta muito focada, para a qual peço também uma resposta muito focada.
Segunda pergunta, Sr. Ministro: estamos, neste momento, já em vésperas do switch off, já não falta tanto tempo quanto isso, e da implementação da televisão digital terrestre. Pelo concurso, a televisão digital terrestre portuguesa vai operar num sistema operacional que é o sistema do MPEG-4, que não é muito normal na Europa — por exemplo, em Espanha o sistema é diferente. Ora, o que se tem passado é que, porventura, a esmagadora maioria dos equipamentos que já foram vendidos, que continuam a ser vendidos e que vários portugueses têm comprado, convencidos de que, com eles, podem aceder à televisão digital terrestre, são do
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sistema MPEG-2. Servem em Espanha para a TDT espanhola, mas não servem em Portugal para a TDT portuguesa.
Portanto, Sr. Ministro, gostava, em primeiro lugar, de perceber qual é a estimativa do Governo sobre quantos portugueses estarão em condições de aceder à TDT com os equipamentos que estão neste momento à venda e, em segundo lugar, se não lhe parece — e esta foi um sugestão que não foi feita pelo CDS mas, sim, pela DECO, na consulta pública — que seria de estudar a possibilidade de dar informação aos consumidores que estão neste momento a comprar muito televisores, pensando que, com eles, podem aceder à TDT, quando, na verdade, isso não acontece, porque a tecnologia é diferente. Não lhe parece que seria de estudar a sugestão que a DECO fez em consulta pública — e eu gostava de saber se o Governo reflectiu sobre essa consulta pública ou não — de, por exemplo, introduzir um logótipo nas televisões dizendo «Preparada para a TDT portuguesa», quando ela vier a acontecer? Já sabemos que o Governo não quer financiar as Set-Up Boxes, mas o problema que está a acontecer neste momento é um problema diferente: muitas pessoas estão a investir pensando que estão a comprar um equipamento que lhes permite ligarem-se à TDT e, porventura, vão ter uma surpresa. Neste momento, há muito pouca informação para os consumidores.
A terceira questão, Sr. Ministro, é muito política: descobrimos hoje que a televisão espanhola — a TVE — vai encerrar a sua delegação em Lisboa. Nós descobrimos isso hoje, Sr. Ministro! Eu não questiono nem posso questionar se os critérios são ou não económicos, mas, obviamente, estamos a falar de um serviço público espanhol e estamos a falar de um serviço público que tem uma leitura política. Esse encerramento não pode deixar de ter uma leitura política.
Ora, gostava de lhe perguntar o que é que o Sr. Ministro acha que o serviço público português devia fazer.
Sei que o Sr. Ministro não é presidente da RTP, mas há uma questão eminentemente política aqui. Sr.
Ministro, não acha que, numa lógica de reciprocidade, o serviço público também devia fazer o que neste momento a TVE está a fazer em Lisboa, isto é, encerrar a sua delegação em Madrid? Esta é, de facto, uma pergunta eminentemente política, não é sobre opções de gestão da RTP, é sobre a gestão política de um dossier que penso que tem essa mesma relevância.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, vou ser telegráfico, pois tenho apenas uma consideração a fazer e uma questão a colocar.
A consideração é para lamentar esta tendência que se tem vindo a verificar sistematicamente, desde há vários anos, de reduzir a comparticipação do Estado nos incentivos à leitura, ou seja, na expedição de publicações periódicas, que, de facto, se tem vindo a traduzir num empobrecimento da chamada imprensa regional.
Não é esse o único factor, sabemos que há outros, designadamente a proliferação da imprensa gratuita, que prejudica muito o acesso da imprensa com menores recursos económicos à publicidade, que, obviamente, faz com que também os anunciantes com menos poder económico, que poderiam difundir as suas mensagens publicitárias através da imprensa regional, prefiram fazê-lo através da imprensa gratuita, mais aliciante e que, obviamente, chega a mais pessoas. Portanto, temos vindo a assistir a vários factores que contribuem para crescentes dificuldades para a imprensa de menor dimensão, vulgo imprensa regional.
Quero salientar a importância que, a vários níveis, esse tipo de imprensa ainda assume, desde logo porque é um elemento de diversidade local, é um elemento de dinamização das comunidades locais, noticia factos da vida local que não têm qualquer tipo de possibilidade de ter expressão a nível da imprensa nacional, e, portanto, haveria todas as razões para que o Estado pudesse dar a sua contribuição positiva para dinamizar a comunicação social de âmbito local, até pela outra vertente que poderia ter de criação de postos de trabalho.
Ora, o que temos vindo a assistir é que o Estado, sob os mais diversos pretextos, tem vindo a reduzir sistematicamente a sua comparticipação no chamado «porte pago», que sendo, até há meia dúzia de anos, de 100%, já está nos 50% e o Sr. Ministro já nos anunciou que vai ser reduzido para 40%, o que nos parece que é um mau caminho, porque, apesar de toda a gente reconhecer que houve abusos cometidos à sombra do
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«porte pago» — isso nunca deixou de ser reconhecido — , a forma de atacar ou evitar esses abusos não é prejudicar toda a gente, não é prejudicar sobretudo os que nunca abusaram.
No entanto, aquilo que tem vindo a acontecer é precisamente isso, é que aqueles que não abusaram do «porte pago» e que o usaram legitimamente para fazer chegar os seus jornais até às quatro partes do mundo — sabe-se muito bem que os assinantes da imprensa local são cidadãos portugueses residentes no estrangeiro que mantêm aquela relação com Portugal e com as suas terras de origem, os quais têm sido os mais prejudicados quando não contribuíram em nada para os abusos de que os sucessivos governos têm vindo a falar — são os que se vêem efectivamente prejudicados no seu trabalho, estando alguns deles na contingência de fechar, outros a terem de os vender a grupos económicos que os consigam suportar ou a reduzir drasticamente a sua qualidade, porque muitos deles são feitos com meios absolutamente exíguos.
Portanto, quero lamentar esta linha que o Governo continua a seguir de reduzir sistematicamente a sua comparticipação na difusão da imprensa regional e local.
A questão que quero colocar tem a ver com isto: há uns anos atrás, a Rádio Difusão Portuguesa (RDP), que hoje, como sabe, é uma das vertentes da RTP, fez um investimento tecnológico considerável naquilo que, há uns anos atrás, se considerava que era o futuro da rádio, que era o DAB, mas deixou de falar-se disso de há uns anos para cá, provavelmente, a evolução tecnológica não foi por aí.
Mas, porque, na altura, foi feito um investimento considerável — aliás, a RDP orgulhava-se, legitimamente, de estar na vanguarda da inovação tecnológica, tendo em conta o futuro da rádio, tendo em conta a generalização do DAB — , gostaria de saber o que é que se passou. No plano tecnológico chegou-se à conclusão de que o caminho não era esse ou, sendo esse o caminho, foi abandonado? Gostaria da saber qual é o ponto da situação relativamente a esta matéria e quais são as perspectivas futuras quanto à evolução tecnológica a nível radiofónico, tendo sobretudo em consideração o serviço público de radiodifusão.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado António Filipe.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, não irei acompanhar o balanço governativo que já aqui foi feito pelo Partido Socialista. A seu tempo, demarcámo-nos daquilo que consideramos restrições inadmissíveis à profissão do jornalista no respectivo estatuto, da lei dita de combate à concentração da propriedade nos media — suposto combate, não efectivo combate. Enfim, a seu tempo, demarcámo-nos de um conjunto de iniciativas legislativas do Governo.
E hoje, muito genericamente, gostaria de colocar ao Sr. Ministro apenas duas questões, acompanhando também algumas que já foram feitas.
A primeira delas, de razão puramente técnica e desconhecendo as adaptações fiscais do contrato com a Lusa, tem a ver com o facto de a variabilidade percentual do orçamento me parecer algo distante da inflação prevista, embora admita que tal possa resultar da adaptação fiscal do contrato. Gostaria que me informasse a este respeito.
A segunda tem a ver com uma matéria a que ultimamente o Bloco de Esquerda, por razões práticas, políticas e materiais diversas, tem dado uma grande atenção. Para além da modalidade de existência da RTP Açores, creio que está implícita aqui uma matéria de coesão nacional e de totalização do serviço público, independentemente da modalidade de existência da RTP Açores e do seu enquadramento empresarial, etc.
Na realidade, dizer que a estação tem material e equipamento obsoleto é dizer pouco. As condições de operabilidade são infra, isto é, não tem as condições mínimas. A situação é verdadeiramente desastrosa e creio que, independentemente das opções empresariais, num esforço e numa óptica nacional, os poderes públicos deveriam ter, todos eles, um olhar diferente para a situação da estação. É nesse sentido que deixo um apelo ao Sr. Ministro para que a questão possa vir a ser considerada nos seus respectivos trâmites.
Para terminar, gostava de apelar a que, no debate das alterações à Lei da Rádio, já aqui anunciado, possamos ter, independentemente da proposta do Governo (e é uma sugestão que deixo à Comissão), um conjunto de audições alargadas. Recentemente, realizou-se um congresso em Vila Real, onde o Sr. Ministro esteve presente e onde também o estiveram muitos dos interessados no sector, e ouviram-se já opiniões muito contraditórias e controversas acerca das intenções do Governo.
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Talvez a Assembleia, por uma vez, possa antecipar-se e, antes mesmo de receber a proposta de lei do Governo, ter um conjunto de informações que venham a ser prestadas por vários dos produtores desse meio de informação.
Há críticas acerca das intenções do Governo, nomeadamente beneficiariam os maiores grupos multimédia e prejudicariam as rádios e as empresas mais pequenas. São matérias que deveríamos aprofundar, antes mesmo até de conhecermos em primeira mão a proposta de lei do Governo.
O Sr. Presidente: — Para responder a este acervo de questões, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, agradeço as questões e vou responderlhes pela ordem que foram formuladas.
Em relação às quatro questões colocadas pelo Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, tenho a dizer que é intenção do Governo proceder à revisão da Lei da Rádio, que é uma intenção tanto mais forte quanto está inscrita no respectivo Programa e o nosso propósito é concretizá-la durante o nosso mandato, que termina no próximo mês de Outubro. Isso significa que os trabalhos finais de redacção do anteprojecto de proposta de lei para a necessária consulta pública estão a terminar e, logo que eles estejam terminados, essa consulta pública será aberta.
As linhas de orientação fundamentais são as seguintes: em primeiro lugar, ser mais exigente no que diz respeito às obrigações do serviço público de rádio. Em segundo lugar, ser mais rigoroso no que diz respeito aos termos e ao volume do financiamento público do serviço público de rádio, assim como as condições de fiscalização da utilização desse financiamento.
Em terceiro lugar, permitir às rádios que aproveitem e que ganhem, quando entenderem necessária, alguma escala. Isso passa por remover alguns dos obstáculos da actual lei — que se explicam no momento e no processo em que ela foi aprovada — relativamente ao funcionamento em cadeia, 24 horas por dia, por rádios temáticas de concelhos que não sejam contíguos ou de funcionamento em cadeia parcial entre rádios locais e rádios locais, regionais ou nacionais.
São exemplos de ganhos de escala que é possível fazer e que, do nosso ponto de vista, responderiam bem a uma das características que os estudos disponíveis e os interessados nos transmitem, que é a ideia de uma excessiva pulverização e de uma dimensão muito micro no universo das rádios locais. Basta pensar que, das 347 rádios que transmitem em frequência modelada, só 23 pertencem a proprietários que detêm mais do que uma estação e só 5 apresentam uma facturação superior a 500 000 euros anuais. Esse caminho já tem sido desenvolvido pelo sector. Basta pensar no sucesso que constitui o projecto Rádios On Line na Internet (ROLI), nos termos do qual 183 rádios locais têm hoje em permanência emissão na rede Internet.
Este projecto começou por beneficiar de apoio público, no âmbito do Programa Operacional Sociedade da Informação (POSI), e hoje existe sem necessitar desse apoio público porque, entretanto, ganhou uma dimensão tal que pôde contratar com o operador privado de telecomunicações condições absolutamente aceitáveis para as rádios.
Finalmente, a quarta grande linha de orientação é a de dar mais flexibilidade, do ponto de vista da regulação normativa, às regras que hoje existem relativamente, sobretudo, às rádios locais. Dou dois exemplos.
Em primeiro lugar, a lei actual diz que uma rádio local não pode ser temática se não houver uma generalista no respectivo município. Julgo que isso tem como consequência que, hoje, só quatro rádios locais estejam classificadas como temáticas. Provavelmente, essa limitação pode ser, hoje, removida sem prejuízo.
Outra ideia é a de que, do ponto de vista técnico, é possível, fazendo as alterações necessárias no CNAF, licenciar rádios locais, não município a município, mas para municípios contíguos. Aliás, o Sr. Deputado reparará, nesta minha breve apresentação, que também estudei com cuidado as duas propostas de autorização legislativa que foram formuladas pelo XV e XVI Governos Constitucionais. Nalguns casos vou ainda mais longe, noutros não, e noutros ainda estou a estudar a virtualidade e a exequibilidade das medidas então propostas. Estou a pensar designadamente na figura do agrupamento de rádios locais.
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Quanto à segunda questão, a do ponto da situação relativamente ao concurso do 5.º canal, a portaria que abriu o concurso, aprovou o respectivo regulamento e caderno de encargos foi publicada no dia 31 de Outubro. Com a publicação dessa portaria, terminou a intervenção do Governo neste processo.
Nos termos da portaria, a partir da próxima sexta-feira, os candidatos podem apresentar as suas candidaturas num período de 60 dias úteis e, uma vez apresentadas as candidaturas, compete à Entidade Reguladora para a Comunicação Social escrutiná-las, segundos os critérios da lei e do regulamento, decidir quem é o vencedor do concurso e emitir a respectiva licença. A partir da emissão da licença, o vencedor terá um período de 12 meses para iniciar as emissões.
Do ponto de vista daquilo pelo qual posso responder, a intervenção do Governo, ela cessou no passado dia 31 de Outubro.
Quanto à terceira questão, relativa aos incentivos à leitura, confesso que tendo o cuidado — que é o mínimo que se exige a um membro do Governo — de examinar com atenção aquilo que governos anteriores fizeram e também beneficiar em muito das considerações e das propostas do Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, que, enquanto secretário de Estado, teve competências delegadas nesta matéria, não fui tão longe quanto essas suas considerações indicariam.
O Sr. Deputado Barreiras Duarte escreveu que o porte pago é hoje, de forma clara e inequívoca, a sobrevivência de um modelo de atraso estrutural. Portanto, defendia, julgo, uma revolução no sistema de apoios à comunicação social local.
Eu, que sou muito mais gradualista, preferi fazer um ajustamento importante no sistema de porte pago, mas mantendo-o numa lógica de degressividade no que diz respeito à comparticipação do Estado. É isso que explica que, mais modestamente, me tenha ficado por uma redução da comparticipação do Estado no porte pago em vez de seguir o seu pensamento. Julgo que, neste momento, o porte pago continua a ser um instrumento importante de que as empresas de comunicação social local carecem.
Estou totalmente de acordo consigo quando diz que este movimento implica outras formas de apoio e de incentivo à comunicação social de proximidade.
Portanto, ao mesmo tempo que procedemos a esta intervenção no porte pago, criámos o portal da imprensa regional. Hoje, a informação que tenho é a de que já foram apresentadas 42 candidaturas ao portal regional e que foram deferidas 26.
A segunda medida foi a de desenvolver o plano de apoio à formação que já vinha de governos anteriores e, nessa matéria, o Centro Protocolar de Formação Profissional para Jornalistas (CENJOR) tem instrução expressa dada pelo Gabinete para os Meios de Comunicação Social que designa um dos administradores para colocar o foco da sua atenção nesse plano de formação.
Também o Estado, através do Instituto de Emprego e Formação Profissional, tem um sistema de incentivos de comparticipação no recrutamento de jornalistas e de oferta de estágios na imprensa local.
Às medidas que mencionou, e com as quais estou de acordo e procuro cumprir, acrescentaria mais duas. A primeira é o Plano Nacional de Leitura, uma iniciativa conjunta do Ministério da Educação e da Cultura que procura intervir do lado da formação da procura, também muito importante para a comunicação social. A outra é a continuação e o aprofundamento do serviço da Lusa a preços substancialmente reduzidos dirigido à imprensa regional, um serviço que hoje representa um encargo mensal para o Estado de 118 000 euros, isto é, de 1,4 milhões de euros.
Isto é, dos 18 milhões que o Estado dá, com IVA, à Lusa para o contrato de prestação de serviço público, 1,4 milhões destina-se a pagar esse serviço que a Lusa presta a preços reduzidos à imprensa regional.
Já não sou tão favorável a incentivos financeiros do tipo que referiu. Portanto, este não parece ser nem um modelo liberal, se liberal significar dizer que o Estado se desinteressa do desenvolvimento deste sector, que deixa entregue apenas à lógica da iniciativa privada, nem me parece, longe disso, um modelo proteccionista. É um modelo pelo qual o Estado incentiva, estimula, acompanha e monitoriza processos de transição que parecem necessários e que, aliás, têm dado resultados, como explicarei na resposta à questão do Sr. Deputado António Filipe.
Quanto à questão a publicidade da RTP, ela define-se nos termos precisos do acordo de 2003. Portanto, as receitas da publicidade são afectas ao serviço da dívida, também nos termos do protocolo assinado pelo Governo, ainda durante o seu governo, de colaboração entre a RTP, a TVI e a SIC, que reduziu a publicidade no 1.º Canal a seis minutos por hora.
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Como sabe melhor do que ninguém, a minha linha de actuação na RTP é de continuidade absoluta no que diz respeito às questões de organização e financiamento, porque julgo que a empresa só beneficia de alguma estabilidade que sobreviva à normal alternância política. Da minha parte, tenho feito tudo para que essa estabilidade se concretize.
Respondo, agora, às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Teresa Moraes Sarmento, relativamente ao acompanhamento do serviço público.
Como a Sr.ª Deputada sabe, o novo contrato de concessão marca uma estabilidade do ponto de vista organizacional e financeiro e uma ruptura do ponto de vista das obrigações em termos de conteúdos, é muito mais exigente em relação ao serviço público televisão e, finalmente — aliás, respondendo a insistentes recomendações do Tribunal de Contas, nesse domínio, e a compromissos assumidos pelo Estado português na União Europeia em termos de auxílios de Estado, correspondendo, portanto, a essas insistentes recomendações do Tribunal de Contas — , este contrato de concessão, pela primeira vez, define objectivos quantificados que a programação na RTP, nos seus diferentes canais, deve garantir e também define critérios para a avaliação do cumprimento desses objectivos.
O nosso esforço foi no sentido de criar um sistema de acompanhamento que dependesse não do Governo mas, sim, de múltiplas instâncias de regulação e de fiscalização. No que diz respeito à fiscalização financeira, ela é assumida pela Inspecção-Geral das Finanças e é também assegurada externamente por uma auditoria anual às contas da empresa.
No que diz respeito às instâncias de regulação, reforçámos as competências, os poderes do Conselho de Opinião, criámos os Provedores, que também produzem relatórios anuais de acompanhamento da prestação de serviço público por parte da rádio e da televisão pública, e, evidentemente, uma das missões essenciais da entidade reguladora para a comunicação social é a de assegurar que o serviço público de rádio e televisão cumpre os seus objectivos constitucionais.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares, temos aqui uma divergência. Se o Sr. Deputado acha que estou a ser pomposo quando falo com esta tranquilidade, conversando com amigos queridos na comissão parlamentar e prestando contas,»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vê como está a ser pomposo, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — » então, o Sr. Deputado, quando ouvir a marcha de pompa e circunstância propriamente dita, o que é que o Sr. Deputado achará? Deve achar que é o fim do mundo que se aproxima.
Mas, tirando isso, pergunta por que é que a proposta de Lei da Rádio não vem já, em 2008. Exactamente porque tem havido um trabalho, que tem demorado tempo e demorará o tempo que for necessário, com a Associação Portuguesa de Radiodifusão e os diferentes operadores de rádio, também como a ARIC, que é a Associação de Rádios de Inspiração Cristã que não pertence à Associação Portuguesa de Radiodifusão, no sentido de procurar que a revisão da Lei da Rádio possa responder a alguns dos problemas e a explorar algumas perspectivas de desenvolvimento do sector.
Há uma diferença substancial entre a Lei da Rádio e a Lei da Televisão; a revisão da Lei da Televisão era urgente. E era urgente porquê? Porque, sem rever a Lei da Televisão, sem a nova lei da televisão, não era possível lançar o concurso para a televisão digital terrestre, e na Lei da Televisão, no sector da televisão, o que era preciso era preciso acentuar o lado da regulação.
Ora, esse lado está muito bem acentuado na Lei da Rádio de 2001. Portanto, na Lei da Rádio de 2001, o que é preciso mudar é de uma natureza bastante diferente daquilo que era preciso mudar na Lei da Televisão, é justamente no sentido de, usando estes sete anos de aplicação da lei e a experiência que deles resulta, criar as melhores condições possíveis para que as rádios — em particular, as rádios locais — respondam, hoje, melhor aos desafios que lhes coloca a convergência tecnológica, de telecomunicações e de comunicação social e também as dinâmicas empresariais.
A profissionalização das rádios locais, o seu ganho de escala, a possibilidade de encontrar também aí não só economias de escala, como disse, mas economias de gama, tudo isso implica alguma mudança na Lei da Rádio — uma mudança que queremos que possa responder às questões colocadas, hoje, ao sector.
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Em relação aos incentivos à comunicação social, o Sr. Deputado diz que esses incentivos são, hoje, em valor inferior ao que eram há dois ou há três anos. É verdade! Se o Sr. Deputado tomar em consideração os registos dos quatro Orçamentos do Estado nesta área, pelos quais sou responsável, portanto, tirando o Orçamento rectificativo — já lá vamos! — , notará que neste sector, em todas as suas dimensões, tem havido quebra da despesa pública. Aliás, não se compreenderia que, sendo eu Ministro dos Assuntos Parlamentares, sendo, portanto, o Membro do Governo sempre disponível para defender as suas políticas e dar as devidas justificações aqui, no Parlamento, não acompanhasse na minha área o esforço global de redução da despesa pública. E, portanto, tem o Sr. Deputado toda a razão nisso.
A lógica dos apoios públicos é uma lógica degressiva, de incentivar a modernização, de incentivar a adequação às novas procuras, de incentivar as transformações profissionais e empresariais, mas não é uma lógica de continuação de uma relação meramente proteccionista e de anquilosamento no sector. Portanto, estou plenamente de acordo consigo e agradeço ter chamado a atenção para o facto de estes sistemas de apoio virem baixando do ponto de vista financeiro global.
Quanto à sua questão relativa ao 5.º canal, os nossos pontos de vista são bastante diferentes nesse aspecto. Sei que a crise económica e financeira internacional terá também profundos efeitos em Portugal, sei que esses efeitos se repercutirão também no domínio da publicidade e, portanto, também no domínio das receitas que são as mais importantes dos órgãos privados de comunicação social.
Mas acontece, Sr. Deputado, que não posso impedir que o segmento de televisão paga vá conquistando, como está a conquistar, quota de mercado publicitário, não posso impedir — e seria inconstitucional — que se fundem novos semanários com o argumento de que isso pode prejudicar as receitas dos semanários existentes.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas não está a confundir licenças atribuídas pelo Estado?!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não, não! O que estou a separar é a lógica do condicionamento industrial, que comete ao Estado o poder de decidir quem está presente no mercado, e a posição que este Governo e eu, em particular, defendemos, que é uma lógica exactamente contrária ao condicionamento industrial.
Devo chamar a atenção do Sr. Deputado para o facto de, no processo de constituição da televisão digital terrestre e, depois, no lançamento do 5.º canal, o Governo ter sido extremamente sensível aos interesses manifestados pelos operadores durante a consulta pública, tendo-se confrontado com dois interesses fundamentais: os interesses dos operadores já existentes, que nos disseram, ao longo da consulta pública, que temos de aproveitar a televisão digital terrestre para ir difundindo em Portugal emissões digitais, que implicam mais capacidade espectro nos termos das tecnologias actuais.
Por isso é que aproveitamos a televisão digital terrestre, Plataforma A, portanto, em sinal aberto, não para ocupar todo o espaço remanescente, depois de os quatro operadores existentes lá serem colocados, com novos canais, mas para reservar, nesse espaço remanescente, o espaço necessário para que as emissões digitais dos actuais operadores e do novo possam ser transmitidas.
E confrontamo-nos com um outro interesse, o interesse dos Newcomers, os novos interessados, que nos diziam «estamos interessados em fazer televisão e como agora há, finalmente, espectro para que se possa fazer nova televisão, queremos que este espectro não nos seja vedado».
Até mesmo o argumento das receitas publicitárias, Sr. Deputado, é um argumento que joga, na minha modesta opinião, a favor do concurso do 5.º canal, porque, se é verdade — e é verdade — que a televisão tem hoje a parte de leão nas receitas publicitárias, não vejo por que devo, por decisão política, impedir grupos que hoje estão na imprensa e na rádio de também poderem ter um acesso à televisão e, portanto, à principal fonte de financiamento da sua actividade na comunicação social, como grupo.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Nessa lógica, não deveria dar mais licenças!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Já lhe expliquei: são dois interesses divergentes que o Governo, como, aliás, é típico de um governo democrático, procura compatibilizar.
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Em relação à questão técnica que coloca sobre a televisão digital terrestre, não sei se a compreendi totalmente, não sei se não estaremos aqui a, não digo confundir, porque o Sr. Deputado não confunde, mas talvez a misturar ou a cruzar-se duas questões distintas: uma é o acesso a equipamentos que permitem receber televisão digital; outra é o acesso aos descodificadores que sejam necessários, a partir do momento em que a televisão digital terrestre esteja em prática, as chamadas set up boxes, que podem ser externas ou, em evolução tecnológica, internas.
Gostaria de chamar a atenção para que um dos compromissos assumidos pelo candidato vencedor no concurso foi justamente o de garantir também apoios às pessoas com menores capacidades económicas no que diz respeito a esses descodificadores, coisa que me permite (não com pompa, mas com uma pequenina pontinha de orgulho) dizer que razão teve o meu colega Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, e também, em parte, eu próprio, quando não fomos no «canto de sereia» daqueles que diziam «seja o Estado a financiar as set up boxes». Nós dizíamos: «Não, vamos pôr isso como um dos critérios de selecção no concurso para que aqueles que vão beneficiar dessa procura assumam também os custos da sua formação».
Quanto à questão que coloca relativamente à televisão espanhola, à TVE, e o Sr. Deputado é um Deputado informadíssimo, tenho a dizer-lhe que, segundo sei por informação dada pela TVE hoje, ao princípio da tarde, a TVE não vai fechar a delegação em Lisboa. Portanto, quanto a saber o que a RTP há-de fazer se a TVE fechar a sua delegação em Lisboa, confesso que ainda não pensei neste problema pela simples razão de que o problema, para mim, não existe. O Sr. Deputado tem outras informações fidedignas? Veremos! Para mim, o problema não existe, porque, evidentemente, acredito nas fontes oficiais da televisão pública espanhola.
Agora, devo dizer que, mesmo que o problema existisse, essa seria uma decisão da RTP. Está a ver até onde levo a minha completa adesão aos preceitos constitucionais e legais!? Não sei o que é que a RTP decidiria, nunca o perguntei, porque o problema não existe. Perguntarei, evidentemente, se ele alguma vez existir. Mas, do meu ponto de vista e em primeira mão, deverá ser a Direcção de Informação a ajuizar da importância, ou não, de se ter correspondentes em Madrid.
Aliás, lembro que uma das crises — pequena, aliás — por que a RTP passou, em 2004, teve justamente a ver com a questão de saber quem é que deveria desenhar a rede de correspondentes da empresa pública.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado António Filipe, percebo a sua preocupação relativamente ao porte pago e vou dar-lhe conta da minha.
Quando assumi funções, em Março de 2005, tinha um orçamento inicial para o porte pago da ordem dos 4 milhões de euros, que, aliás, devo dizer, correspondia exactamente ao valor que eu próprio tinha inscrito no orçamento inicial para 2002.
Portanto, não há aqui, como, aliás, tenho dito ao longo destes anos, nenhuma espécie de debate entre governos. O que me limito a constatar é que vários governos de várias orientações, ao longo dos últimos anos, quando foram confrontados com a verdadeira questão de saber qual a parcela que se pode afectar ao porte pago, responderam sempre da mesma maneira, ou seja, umas vezes eram 5 milhões, outras vezes eram 4 milhões — chegou a ser 3 milhões — , verba que é manifestamente insuficiente.
No Orçamento rectificativo para 2005, tive de inscrever 9 milhões para pagar dívidas do porte pago; no Orçamento inicial para 2006, para que não houvesse suborçamentação, tive de inscrever 12 milhões de euros e logo aqui, na defesa do Orçamento para 2006, disse que este era o valor necessário nos termos actuais.
Trata-se de um valor insustentável, do ponto de vista do controlo da despesa pública, pelo que vamos reduzir a comparticipação do Estado.
Neste momento — e julgo que já posso dizer isto — , ficarei com o registo de ser, em muitos anos, o primeiro-ministro responsável pela área da comunicação social que pode chegar ao fim do mandato e dizer «o meu sucessor não tem dívidas com o porte pago». É isto que pretendemos dizer quando usamos a expressão «sustentabilidade das políticas públicas»: não vale a pena comprometermo-nos com valores que não temos.
Depois, há também uma diferença de concepção. Entendo que aquilo que é determinante no futuro da imprensa regional são os seus leitores e não o subsídio do Estado e, por isso, considero que esse subsídio do Estado deve ser parcial, deve ser degressivo e deve ser visto como um incentivo. Devemos dizer, com tempo, como dissemos, que este ano será de 70%, para o ano será de 50%, em 2010 será de 40% e o sector tem de se adequar a isto. E repare que, hoje, beneficiando do porte pago, temos 273 jornais regionais. Portanto, o
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argumento segundo o qual isto seria a hecatombe do sector da imprensa regional — e não foi o Sr. Deputado que o disse agora, já o ouvi antes — , tem apenas um pequeno problema: não resiste aos factos.
Quanto ao DAB (Digital Audio Broadcasting), a tecnologia DAB é uma das tecnologias possíveis para a rádio digital. A RDP fez um investimento importante nessa rede, de que, aliás, é concessionária, mas essa tecnologia viu a sua penetração no mercado barrada pelo facto de não ter sido acompanhada do lado dos produtores de receptores. Portanto, hoje, temos uma rede que permitiria difundir emissões digitais, recorrendo ao DAB, mas não temos receptores generalizados que permitam receber essas emissões em DAB. Por outro lado, os interessados privados não acompanharam a rádio pública.
Portanto, o investimento da rádio pública no DAB é um investimento que existe, é um activo da empresa, desde o fim dos anos 90, mas carece de rentabilização.
Quando se colocou a questão da TDT (Televisão Digital Terrestre), o accionista não deu nenhuma indicação à empresa pública no sentido de concorrer ou não à TDT, porque entendeu que era uma decisão profissional, da administração, a de saber se o activo que tem, que é o DAB, será suficientemente importante para sustentar uma candidatura à distribuição da TDT. A decisão da administração da empresa foi «não» e o pouquíssimo que sei de economia e de gestão de empresas permite-me percebê-la facilmente, ou seja, não estava à espera de qualquer outra decisão por parte da administração.
A RTP tem em curso, junto da ANACOM, outra tentativa de ver se os termos da licença de que é detentora podem ser mudados justamente para se poder rentabilizar a rede DAB.
Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado Luís Fazenda, a questão técnica é muito simples. Se o Sr. Deputado consultar a página 8, onde a indemnização compensatória para a Lusa está apresentada sem o IVA, descontado o IVA, verá que o valor do aumento é de 2,5%, ou seja, é exactamente igual ao da inflação prevista para o próximo ano. Por que é que, com IVA, é só de 1,7%? Justamente porque o IVA, a partir de 1 de Janeiro, tem a taxa reduzida de 20%. A redução da taxa normal de IVA, neste ano de 2008, só incidiu no 2.º semestre, ao passo que, para 2009, incide sobre todo o ano. Quando comparamos os dois valores, o aumento, com IVA, é inferior à actualização da inflação, pelo seguinte: porque a empresa terá o benefício de 1 ponto percentual do IVA em todo o ano de 2009, ao passo que em 2008 só o teve no 2.º semestre.
Devo dizer também, porque ambas as administrações merecem um apreço público da minha parte, que agora, com a redução do IVA, o Ministério das Finanças transferiu as indemnizações compensatórias tomando em conta o novo valor do IVA, mas, quando se aumentou o IVA, em 2005, não financiámos adicionalmente, não assumimos esse ónus do accionista. Ora, as duas administrações assumiram-no e conseguiram integrar e internalizar esse novo custo, sem com isso deixarem de obter valores operacionais positivos.
Quanto à questão do centro de produção da RTP nos Açores, o Sr. Deputado tem toda a razão. Também já tive oportunidade de visitar, mais do que uma vez, as instalações da RTP nos Açores e penso que carecem de modernização.
O plano que a administração está a seguir, segundo a informação de que possuo, passa pelo seguinte: ao invés do que acontece com o centro de produção de televisão, o centro de produção de rádio, nos Açores, está muito bem instalado, num edifício moderno que, com umas ligeiras obras de remodelação e aumento, poderá servir também para a televisão. É neste trabalho que está envolvida a administração da Rádio e Televisão de Portugal. Aliás, este é um dos domínios que mostra quão inteligente foi — e não estou a falar de mim, pelo que posso qualificá-la assim — a orientação estratégica da administração presidida pelo Dr.
Almerindo Marques, no sentido de fundir as duas empresas numa só, a qual me limitei a inserir em lei que apresentei à Assembleia da República e que a Assembleia aprovou, embora apenas com os votos do PS mas penso que, hoje, todos os grupos parlamentares têm consciência do ganho que se obteve nesta sinergia, se me permitem o palavrão técnico.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Creio intuir do silêncio cúmplice e cooperante dos Srs. Deputados que não teremos uma segunda ronda de perguntas. Se non è vero, è bene trovato.
Pausa.
È vero e bene trovato.
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Dado que não há mais inscrições, agradeço aos Srs. Deputados e ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e dou por encerrado este debate.
Vamos aguardar breves instantes para, em seguida, procedermos à audição do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local.
Pausa.
Srs. Deputados, antes de mais, agradeço a presença do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local — seja sempre bem-vindo, Sr. Secretário de Estado — , bem como do Sr. Presidente da Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, Sr. Deputado Ramos Preto.
O objecto desta audição incide sobre o poder local, havendo um relatório e parecer elaborado pela Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território que foi, nos termos regimentais, entregue na Comissão de Orçamento e Finanças para instruir este debate, o qual, em traços muito perfunctórios, elenca o seguinte: «Na óptica da contabilidade pública, o subsector da Administração Regional e Local deverá apresentar em 2008 um défice de 300,8 milhões de euros, equivalente a 0,3 p.p. do PIB. A estimativa da conta consolidada para este subsector aponta para uma inflexão da posição orçamental excedentária alcançada em 2007. Para este resultado contribuiu, em boa parte, conforme é explicado pelo Executivo, o Programa Pagar a Tempo e Horas (PTH), o qual apoiou os municípios e regiões autónomas no pagamento de dívida a fornecedores».
Releva ainda um traço distintivo do Orçamento do Estado para este sector, que é o seguinte: «No cumprimento do estatuído na Lei das Finanças Locais, a transferência do Orçamento do Estado para a Administração Local em 2009, totalizará 2330,1 milhões de euros, excluindo a participação variável no IRS.
A totalidade das verbas disponibilizadas às autarquias, no cumprimento da Lei das Finanças Locais (incluindo a participação em sede de IRS), regista um crescimento de 4,8% face ao ano anterior».
Ainda na proposta de lei de Orçamento do Estado, concretamente nos mapas XIX e XX, «(») encontramse as transferências para os municípios e para as freguesias, 2 513 722 014 euros e 208 128 907 euros, respectivamente».
Importa ainda referir, no que ao orçamento da administração pública local se reporta, que, em 2009, será «(») iniciado o exercício de competências por parte dos municípios na área da Educação, designadamente na gestão do pessoal não docente e dos equipamentos educativos do ensino básico, na sequência de legislação aprovada em 2008. Em 2009 será dada continuidade ao processo de descentralização de competências da Administração Central para a Administração Local, designadamente nas áreas da Acção Social, da Saúde, do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Agricultura, em articulação com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses, e será concretizado um novo quadro de competências para as Freguesias, em articulação com a Associação Nacional de Freguesias».
Last but not the least, na esteira de Shakespeare, direi que o Executivo refere ainda que «(») no próximo ano será dada continuidade à abertura, em articulação com os municípios, de Lojas do Cidadão de Segunda Geração, que contribuem para a modernização da administração local, disponibilizando serviços municipais nas suas instalações».
Refira-se ainda que, em 2009, «(») estará inteiramente operacional o Portal do Licenciamento, permitindo a total desmaterialização e crescente simplificação dos procedimentos relativos ao Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação».
Em traços muito breves, isto é aquilo que de mais relevante foi plasmado no relatório da Comissão de Poder Local, relativamente ao orçamento desta área, mas, naturalmente, para aprofundar melhor este tema, nada melhor do que ouvir, em primeiro lugar, o Sr. Secretário de Estado, numa exposição inicial de 10 ou 15 minutos, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas para aprofundar e densificar estas questões, por um tempo máximo de 10 minutos, e uma segunda ronda, se for o caso — esperemos que não, pois será bom sinal — , por um tempo de 5 minutos a cada grupo parlamentar. As perguntas serão sempre agrupadas em bloco e obterão resposta também de uma só vez, por parte do Sr. Secretário de Estado.
Sr. Secretário de Estado, uma vez mais, seja bem-vindo e faça favor de usar da palavra para a sua exposição inicial.
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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local (Eduardo Cabrita): — Muito obrigado, Sr.
Presidente.
Saúdo-o também, bem como ao Sr. Presidente da Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, às Sr.as Deputadas e aos Srs. Deputados.
Estamos naquele que é o último debate de apreciação da proposta orçamental desta Legislatura. Este debate, de alguma forma, permite-nos fazer, nesta área das finanças locais, porque isso é consubstanciado na proposta orçamental submetida à vossa apreciação, fazer aqui uma caracterização de quais são as linhas de força da actuação do Governo com matéria orçamental no domínio da administração local.
Essas linhas de força são marcadas pela concretização de uma estratégia de credibilização e reforço das competências da administração local que tem manifestação em sede directa de Orçamento quer na concretização daquela que é uma experiência do terceiro ano de aplicação da Lei das Finanças Locais, quer na consubstanciação de uma estratégia sustentada de descentralização de competências para os municípios e de discussão, com a Associação Nacional de Freguesias, de um novo quadro de acção das freguesias, dando concretização efectiva a desejos muito anunciados, reiteradamente reafirmados, designadamente nas pretensões locais, de concretização dos objectivos definidos há muito na Lei n.º 159/99, que estabelece o quadro de transferência de competências para a administração local.
Por outro lado, é também consagrado no texto orçamental um conjunto de matérias que correspondem a uma avaliação da incidência da experiência destes anos no que respeita ao modelo de reforço da autonomia financeira local e de reforço da transparência na relação entre os vários subsectores da Administração Pública e às exigências de balanço do processo de descentralização administrativa.
Passando a concretizar um pouco mais estas linhas fundamentais de uma estratégia coerente e sustentada desenvolvida ao longo de toda a Legislatura, diria que, quanto ao primeiro ponto a que me referi, ou seja, concretização da experiência já de um terceiro ano de aplicação da Lei das Finanças Locais, este Orçamento confirma, consolida as expectativas apontadas pelo Governo no início da Legislatura quando essa Lei marcou o debate orçamental nesta matéria e a experiência resultante da sua aplicação, designadamente no ano de 2008. Isto é, a concretização de um princípio de reforço da autonomia financeira dos municípios, de perfeita caracterização da sua relação quer com o Estado quer com entidades integradas no sector municipal e fora do sector administrativo municipal, designadamente no sector empresarial local — relação do Estado com outras entidades.
No que diz respeito às transferências orçamentais, em primeiro lugar, a consagração de um princípio de solidariedade entre o Estado e as autarquias locais que leva a que as autarquias, num quadro de crescimento das receitas fiscais relevantes, acompanhem significativamente o quadro de crescimento das receitas transferidas para os municípios. Após um crescimento de 4,7%, em 2008, verifica-se um crescimento de 4,8% nas transferências para os municípios em 2009.
Em segundo lugar, a consagração de um princípio de justiça e de coesão territorial marcado por um princípio de redistribuição de recursos que se manifesta, em termos de valor global, no maior crescimento das transferências para os municípios verificado ao longo de toda a Legislatura, diria mesmo verificado desde o início deste século, com um crescimento de 115 milhões de euros, correspondentes aos tais 4,8%.
Se olharmos para a redistribuição entre municípios, afirmam-se os princípios de coesão territorial e de solidariedade intermunicipal consagrada na Lei das Finanças Locais. Isto é, dos 308 municípios do País, 295 têm um crescimento significativo nas suas transferências, sendo que em 293 esse crescimento é correspondente a 5% relativamente ao verificado em 2008. Três municípios têm uma estabilização nas suas transferências — são municípios com mais de 50% da sua área correspondente a Rede Natura ou a áreas protegidas — e apenas 10 municípios têm uma redução nas suas transferências (correspondente a uma redistribuição de recursos em benefício de municípios mais dependentes das transferências do Orçamento do Estado, ou seja, com menor capacidade fiscal própria), pois têm recursos próprios significativos. São todos eles municípios que em 2006/2007, que aqui é o ano relevante, e, diria, mesmo no 1.º semestre de 2008 (para os qual já existem dados disponíveis), beneficiaram de um significativo crescimento dos impostos locais.
Outra nota que quero deixar nesta matéria de autonomia local é a seguinte: este é o primeiro Orçamento em que se verifica um dos aspectos inovadores da Lei das Finanças Locais, ou seja, a decisão de poder prescindir de parte da parcela de receita de IRS cobrada, que é atribuída ao próprio município, que se manifestará não já na esfera de decisão municipal mas na esfera jurídica dos cidadãos. No primeiro ano em
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que tal foi possível, há um ano, 42 municípios decidiram em graus diferentes — entre 0,5% e 5%, conforme o mapa XIX demonstra — prescindir de parte da sua receita fiscal, o que se traduz numa redução daquilo que em 2009 será transferido para esses 42 municípios e irá traduzir-se também, no que respeita ao apuramento do IRS dos cidadãos aí residentes, numa redução correspondente na colecta de IRS que lhes será aplicada em 2009, que é relativa ao ano de 2008.
Outro ponto que gostaria de referir brevemente tem a ver com a concretização de uma estratégia de descentralização.
No congresso que celebrou os 30 anos do poder local democrático, realizado em Dezembro de 2006, o Governo lançou um desafio à Associação Nacional de Municípios Portugueses, que foi o de estabelecer em conjunto uma estratégia de trabalho para uma efectiva descentralização em áreas significativas em que entendemos que, a nível local, é possível decidir e gerir com maior eficácia e com maior proximidade.
Elegemos como áreas prioritárias para essa estratégia as da educação, da acção social e da saúde, sem embargo de outras poderem ser igualmente consideradas. A Associação Nacional de Municípios Portugueses respondeu de forma extremamente positiva a esse desafio no último congresso ordinário realizado em Ponta Delgada.
Nessa medida, o Orçamento para 2008 criou condições para a concretização desse processo de descentralização no que respeita à sua incidência financeira. Em 2009, confirma-se essa matéria.
Foi publicado, entretanto, o Decreto-Lei n.º 144/2008, que veio estabelecer as regras de descentralização de competências relativamente à área da educação, designadamente no que tange à gestão dos equipamentos educativos, ao pessoal não docente no ensino até ao final do 3.º ciclo do ensino básico e a matérias complementares — na acção social, nos transportes escolares, nos apoios educativos — , as quais que já eram em parte geridas pelos municípios.
Em 2009, teremos, a partir de Janeiro, uma experiência significativa de exercício de competências alargadas nessas áreas pelos municípios. Cerca de uma centena de municípios já celebraram contratos de execução com o Governo e a partir de Janeiro poderão exercer essas competências. Alguns mais, já após esse momento, aprovaram nos órgãos municipais decisões também querendo acompanhar o exercício descentralizado de competências nessas áreas.
Portanto, em 2009 iremos acompanhar com muita atenção esse alargamento de competências, o que significa que três centenas de escolas serão geridas pelos municípios, cerca de 12 000 trabalhadores, integrando os grupos de pessoal não docente, passarão também a ser acompanhados pelos seus municípios no exercício das suas actividades.
Mas não ficámos por aqui.
Em matéria de saúde, foi publicado o diploma relativo à criação de agrupamentos de centros de saúde, que prevê a participação dos municípios na gestão dos centros de saúde agrupados. Esse processo tem vindo a decorrer em diálogo com os municípios.
Também na área da acção social se tem verificado um trabalho extremamente positivo, que se traduzirá na aprovação da figura de uma carta social municipal com funções, de alguma forma, análogas àquela que desempenhou, com extrema utilidade para a parceria entre o Estado e as autarquias locais, a carta educativa municipal em sede de educação.
Uma outra área a que queria referir-me brevemente nesta intervenção inicial é um conjunto de questões que foram discutidas ao longo deste ano.
Este é um processo dinâmico em que surgem questões que carecem de uma intervenção que é concertada, em larga medida, entre os municípios e o Governo. Isso tem reflexo em várias disposições do Orçamento do Estado, nomeadamente no prolongamento em mais um ano do período de adaptação do regime de taxas e regulamentos municipais; na clarificação de que a transferência do pessoal para os municípios — e que aumenta a proporção das despesas com pessoal nas despesas municipais — não é contabilizada nos limites legais para as despesas com pessoal dos municípios; na clarificação, por norma interpretativa, de regras aplicáveis à autorização de recursos a título excepcional, ao crédito por parte de municípios que, tendo esgotada a sua capacidade de endividamento, não podem deixar de recorrer a endividamento para desenvolvimento de projectos com o apoio de fundos comunitários, quer no âmbito do encerramento do QCA III, quer já, nalguns casos que começam a surgir, no âmbito da execução do QREN e de programas de reabilitação urbana.
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Uma última nota, de alguma forma já antecipada no intróito que, com argúcia, foi feito pelo Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, é sobre o balanço do programa Pagar a Tempo e Horas.
Como sabem, o programa Pagar a Tempo e Horas constava do Orçamento do Estado para 2008, tendo 43 municípios apresentado candidaturas, dos quais 39 concluíram o processo, isto é, celebraram contratos com o Estado que permitiram uma autorização específica para pagamento a fornecedores correspondente a cerca de 80 milhões de euros em 39 municípios — 40% suportados pelo Tesouro, 60% suportados por entidades bancárias.
Ora bem, o Governo decidiu recentemente alargar este programa no seu âmbito e na sua dimensão financeira, visando ter em conta não só a avaliação desta primeira experiência de 2008 mas também, relativamente à administração local, a incidência da situação financeira internacional e o seu reflexo no País.
Portanto, o regime previsto nesta dita, por facilidade, 2.ª fase do programa Pagar a Tempo e Horas caracteriza-se, antes de mais, por uma maior abertura relativamente às condições de candidatura, isto é, praticamente a quase totalidade dos municípios, mesmo aqueles que têm excedido os limites de endividamento líquido, terão condições para, desta vez, se candidatar ao programa, ao contrário do que sucedia no primeiro; um alargamento significativo do montante global disponível, isto é, está previsto que até 1250 milhões de euros de dívidas a fornecedores possam ser apoiados por este programa; e, em último lugar, existe a possibilidade de, supletivamente, aqueles que recorreram à primeira fase do programa, poderem vir a utilizá-lo.
Portanto, também neste particular, faria um balanço positivo (que permitiu o seu alargamento), fruto da experiência interna e fruto da adequação de um conjunto de medidas que esta Comissão, certamente, já discutiu no âmbito geral, mas que tem incidência, também, na situação financeira das empresas que desenvolvem a sua actividade junto das autarquias locais.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, estou agora à vossa disposição para responder a todas as questões que entenderem colocar, naturalmente.
O Sr. Presidente: — Vamos, então, iniciar o debate propriamente dito.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, do Partido Social Democrata.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, Caros Colegas, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, no início da sua intervenção, realçou o facto de estarmos aqui no último debate sectorial do Orçamento do Estado para 2009.
Ora, sempre que se encerra uma questão, um debate, ou seja o que for, desejamos que isso se faça com «chave de ouro». Infelizmente, não é o caso. Para o PSD, vamos fechar este debate com «chave de lata»! E digo «chave de lata» porque, apesar de tudo o que o Sr. Secretário de Estado nos disse e desejou relevar de positivo neste orçamento (na parte em que é responsável ou detém a tutela), a verdade é que ele bate nos mais fracos, penaliza-os e desprotege-os. Essa «pancada» orçamental verifica-se nas freguesias e nos municípios, principalmente nos municípios mais pobres e de zonas desertificadas.
Portanto, este é um orçamento que, no que diz respeito ao poder local e à administração local do nosso território, revela uma enorme falta de cultura autárquica por parte do poder central, por parte do Governo de que V. Ex.ª faz parte.
Os comentários e as questões que o PSD quer colocar começam, precisamente, pelo elo mais fraco deste orçamento: as freguesias.
As freguesias estão na base do edifício autárquico e do edifício do poder em Portugal e, estando na base, são os vizinhos de todos nós. Mas as freguesias são sempre as mais penalizadas, as mais sacrificadas, o parente mais pobre de todo o edifício autárquico — são as mais fracas, as que têm menos dinheiro e as instituições cujos presidentes e cujos membros executivos são constantemente confrontados com a população nas portas das suas próprias casas, dado a proximidade.
Neste domínio, gostaria de colocar três questões ao Sr. Secretário de Estado.
A primeira diz respeito aos protocolos de modernização administrativa, anunciados e assinados por centenas de freguesias, com grande espaço mediático. Este processo não está completo e, pior do que isso, muitas freguesias reclamam que, tendo assinado os protocolos, constantemente são confrontadas com atrasos nos pagamentos. Existem, portanto, muitos valores por pagar por parte do Estado.
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A segunda tem a ver com os chamados «kits de primeira intervenção». Foi uma medida anunciada para que as freguesias fossem parte activa na resolução de um problema grave no nosso País, que é o dos fogos florestais. E a sua participação, para além de outras formas, seria através da utilização destes kits de primeira intervenção. Mas o certo é que, depois de anunciados, propagandeados e mediatizados, sabemos que muitas candidaturas, apesar de terem sido apresentadas e aprovadas em devido tempo, não foram ainda objecto de cumprimento por parte do Estado.
A terceira questão, ainda relativa às freguesias, prende-se com uma medida extremamente injusta (é o que acham o PSD e todas as freguesias, pelo menos na amostra que já auscultámos) que está plasmada neste orçamento. Refiro-me às remunerações dos membros eleitos dos executivos.
Esperamos que tenha sido um lapso deste orçamento, como outros que já houve e que, em devido tempo, foram corrigidos — como, por exemplo, em relação ao financiamento dos partidos políticos. Sinceramente, esperamos que seja um lapso e que ele seja corrigido ainda antes de o PS aprovar o Orçamento do Estado com este erro gravíssimo.
Na verdade, este orçamento, por um lado, reserva uma pequena transferência para as freguesias (por causa do «travão» dos 5%), visto que só aumenta as transferências em cerca de 4%, quando elas deveriam subir 11,9%, de acordo com a subida das receitas fiscais, e, por outro lado, retira-lhes o montante correspondente às remunerações, o que significa que as freguesias vão ter orçamentos muito mais pequenos para as obras, para o atendimento aos seus munícipes e para a satisfação das necessidades dos seus fregueses. Além de mais, ao retirarem parte das transferências ao orçamento das suas juntas, podem ser acusados pelas populações de estarem a retirar uma parte do orçamento para pagar as suas remunerações.
Isto é extremamente injusto, até porque sabemos que as remunerações são extremamente baixas se tivermos em conta o que hoje é exigido a um presidente de junta, ou mesmo a outro membro da junta, que aí esteja a tempo inteiro ou parcial.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, aqui está a primeira demonstração de como este orçamento, no que diz respeito à área da sua tutela, bate, e bate forte, nos mais fracos.
Em suma, Sr. Secretário de Estado, em relação às freguesias, gostaríamos de saber em que ponto estão os pagamentos dos protocolos de modernização administrativa, o cumprimento dos compromissos assumidos em relação aos kits de primeira intervenção e, sobretudo, se está disposto, durante a discussão do orçamento, a corrigir esta falha grave quanto às remunerações dos membros eleitos dos executivos.
Em matéria de municípios, o Sr. Secretário de Estado referiu, há pouco, o quão importante é, neste orçamento, a experiência entretanto adquirida, visto ser este o terceiro ano consecutivo de aplicação da Lei das Finanças Locais. Pois então, Sr. Secretário de Estado, se já tem uma experiência de três anos e se, segundo as suas palavras, isso está a reverter-se no orçamento, faça as correcções e os aperfeiçoamentos necessários a esta Lei das Finanças Locais! Na verdade, falando de montantes da participação das autarquias locais nos impostos do Estado, o que verificamos é que, apesar de, desde 2005, o Sr. Primeiro-Ministro, José Sócrates (depois secundado por afirmações do Sr. Secretário de Estado), ter dito que era injusto que a Lei das Finanças Locais travasse o aumento das transferências para os municípios, não as deixando acompanhar o aumento das receitas fiscais, isso continua a ser feito! Ou seja, continua a transferir-se uma percentagem que é bastante menor — no caso concreto, cerca de 4% — quando, na realidade, as receitas fiscais sobem 11,9%, segundo os vossos próprios dados.
Sr. Secretário de Estado, há aqui uma injustiça, uma falta de cultura autárquica e, sobretudo, um desconhecimento do que é exigido às autarquias — as populações reconhecem-nas como solução dos seus problemas. A aplicação da lei deste modo cria desigualdades nos municípios e faz com que estes não possam cumprir as suas obrigações perante os seus munícipes.
O Sr. Secretário de Estado falou há pouco da acção social das autarquias e da necessidade de transferir competências para as autarquias. Pois bem, ainda ontem ou anteontem, saiu nos jornais um artigo sobre a repetida e crescente afluência das populações às câmaras municipais para tratar de problemas como arranjar um emprego ou pagar uma dívida pessoal, pedindo à câmara um empréstimo que poderia ser pago em prestações. Ora, isto significa que as populações reconhecem no poder local, nos municípios a possibilidade de serem apoiadas socialmente, apoiadas no que é mais básico nas suas vidas e na satisfação das suas necessidades.
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Apesar disso, o Sr. Secretário de Estado continua a falar na transferência de competências sem que se façam as devidas transferências que permitam aos municípios acompanhar as populações.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, chamo a sua atenção para o tempo de intervenção já gasto.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Termino já, Sr. Presidente. Antes, porém, gostaria de concluir esta questão.
Sr. Secretário de Estado, se as populações reconhecem nos municípios a capacidade, a possibilidade e a disponibilidade para as ajudar, por que é que o poder central continua a desenvolver políticas de apoio social centralizadas, não descentralizando? Aliás, há pouco, o Sr. Secretário de Estado referiu-se à descentralização, mas o que tem existido é uma delegação de competências, uma delegação de poderes, o que não é bem a mesma coisa, porque descentralização implica autonomia, o que não acontece na delegação de poderes.
Ora, se os senhores insistem em continuar a apoiar as populações só através de políticas centrais, a minha pergunta é esta: qual é o sector de proximidade que o seu Governo tem, como conhece as populações? Ou, então, para quando esta transferência de competências, nomeadamente no que diz respeito à acção social? Sr. Presidente, para já, ficaria por aqui, pedindo desculpa por ter tornado negativo o tempo do PSD.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Menos que o Governo!»
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, concedi 15 minutos ao Governo, portanto mais 5 minutos para além dos 10 minutos que constavam do quadro dos tempos. Para uma exposição inicial, creio que os 15 minutos são razoáveis.
De qualquer modo, tambçm fui condescendente com a Sr.ª Deputada»
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, se disponho de mais 5 minutos, queria utilizá-los já.
O Sr. Presidente: — Não, não dispõe, Sr.ª Deputada. Dispõe apenas de 10 minutos na primeira ronda e de 5 minutos na segunda ronda. O Governo é que tem, para a exposição inicial, 15 minutos.
Eu tenho de ser muito rigoroso no controle dos tempos da primeira pergunta porque a primeira pergunta produz o chamado «efeito tsunami». A partir do momento em que a primeira pergunta excede o tempo, tenho, por igualdade de «armas», de dar exactamente o mesmo tempo aos demais grupos parlamentares, e isto começa, de facto, a deslizar, porque, depois, tenho de respeitar esse equilíbrio.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pita Ameixa, do Partido Socialista, a quem peço o máximo de rigor possível, mas com a condescendência que dei ao PSD, porque nem podia ser de outra forma.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Sr. Presidente, quero começar por saudar V. Ex.ª, o Sr. Secretário de Estado e também todos os colegas Deputados e dizer que, da parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, vemos neste Orçamento do Estado, aliás, numa linha de continuidade, uma aposta forte no reforço da autonomia do poder local.
Um poder local com mais capacidade de intervenção, com mais verbas financeiras aos seu dispor e com mais competências para o seu trabalho é um poder local que ganha relevância política na sociedade portuguesa e relevância social junto das populações do nosso País. Um poder local que intervém cada vez mais em mais áreas é um poder local que será cada vez mais respeitado e mais querido pelas nossas populações, e esse é o caminho certo que o Governo e a maioria prosseguem na política local.
Este é, sem dúvida, um orçamento bom neste sentido, porque, depois da intervenção do PSD, só podemos chegar a esta conclusão. O PSD não fez qualquer crítica relevante a este orçamento, julgo até que as coisas mais importantes que disse referem-se aos kits de primeira intervenção das juntas de freguesia ou ao facto de as câmaras terem pessoas que vão pedir emprego e dinheiro, coisa que sempre aconteceu desde que há poder local. Portanto, se essas são as grandes críticas ao orçamento, não vejo nisso qualquer crítica relevante.
Protestos da Deputada do PSD Maria Ofélia Moleiro.
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Relativamente ao acréscimo de transferências, quero dizer que a discussão que havia quanto ao seu acompanhamento nas receitas fiscais foi uma discussão que se centrou no âmbito da Lei das Finanças Locais.
Ora, uma vez aprovada esta Lei pela Assembleia da República e tendo essas regras entrado em vigor, essa discussão morreu e, portanto, hoje temos de discutir é se esta Lei é cumprida. E, de facto, a Lei é cumprida, como, aliás, reconhece a Associação Nacional dos Municípios Portugueses no seu parecer, com um aumento significativo e consecutivo das transferências que são feitas para as finanças locais. Nestes anos de cumprimento da Lei das Finanças Locais, tem havido sempre um aumento consecutivo e significativo, acima da inflação, aliás, tem sido o dobro da inflação prevista e mais do que a inflação verificada no ano anterior. E este é um aspecto muito importante no que diz respeito à participação das autarquias nos impostos do Estado.
Aliás, a primeira questão que gostava de deixar ao Governo era justamente esta: como é que o Governo vê o futuro em relação a esta matéria? Porque, de facto, a aplicação da nova Lei das Finanças Locais, todos os anos, está a fazer bater no tecto da Lei a capacidade de transferência do Estado para as autarquias. Há, portanto, um forte aumento das transferências.
E isto para já não falar — e é preciso que não se esqueça — na parte que são as receitas próprias das autarquias locais. Discute-se aqui muito esta parte da transferência constante do Orçamento do Estado, mas há uma parte muito significativa da receita autárquica, que são as receitas próprias, que não consta da transferência do Orçamento do Estados e que, por várias medidas políticas e legislativas, também têm vindo a ser incrementadas para as autarquias locais.
Um segundo aspecto que quero referenciar diz respeito ao IRS. Temos, pela primeira vez, uma consequência de uma decisão que aqui tomámos, que foi dar mais autonomia fiscal aos municípios, porque eles agora podem ter uma margem de manobra para decidir sobre a cobrança de IRS aos seus munícipes.
Neste primeiro ano, tivemos quase meia centena de municípios que usaram essa prerrogativa e, agora, temos cerca de 7,6 milhões de euros que serão devolvidos aos habitantes destes concelhos, por decisão autónoma e livre dos municípios, em virtude de uma lei que nós aqui aprovámos. Trata-se, portanto, de um reforço da autonomia fiscal e também de um reforço da interacção social que os municípios podem ter com os seus próprios habitantes.
No que diz respeito às freguesias, também foi aprovada uma medida nova, que reputo de bastante importante, pelo menos, para um núcleo grande de freguesias, que é a sua participação no IMI. Aliás, isto é histórico, porque, pela primeira vez — e isto tem um valor teórico muito importante — , as freguesias têm um direito próprio a um imposto do Estado, coisa que nunca tinha acontecido. Ora, isto tem um significado só por si, independentemente do valor.
Mas a questão que também gostava de deixar ao Governo é esta: qual é o ponto da situação em relação a isto e, em relação ao futuro, que perspectiva é que as freguesias podem ter no que diz respeito à sua participação própria na receita do imposto municipal sobre os imóveis rústicos? Também quero renovar outro ponto que está no orçamento e que diz respeito ao facto de o aumento das despesas com pessoal que existirá com a transferência de novas competências não contar para os limites da lei. Esta é uma questão que acho que é relevante também para futuro. Gostava, por isso, de perguntar-lhe como é que o Governo pensa que esta situação poderá ser dirimida em termos futuros, se, com o incremento de mais transferência de competências e de mais funcionários da administração central para a administração local, devemos continuar num regime de excepção ou, eventualmente, ter uma regra geral.
Também gostava de sublinhar o programa «Pagar a Tempo e Hora», que é um programa muito importante para a sanidade financeira das autarquias locais, mas também para a sociedade civil, para as empresas, para os fornecedores das autarquias locais, para os empreiteiros e para o comércio local das comunidades. O Governo deve ser elogiado por o ter criado. Ele já funcionou em 2008 e vai continuar a funcionar em 2009.
Mas, neste último ano, vai funcionar com um aumento do universo a que se aplica e com um aumento das verbas disponíveis para isso. Digamos que é uma capacidade financeira para limpar a situação das dívidas municipais, como, aliás, acontece com o Estado em termos centrais, que será muito importante para a nossa economia, até como medida anticíclica para combater a crise mundial em que estamos e que afecta também o nosso País.
A questão que lhe quero colocar, Sr. Secretário de Estado, é, justamente, esta: como é que vê que as autarquias possam vir a aderir a este Programa, tendo em conta a experiência do ano que está a decorrer, e
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qual o ponto da situação daquelas autarquias que disse que tinham beneficiado desse pagamento? Gostava de saber, pelo menos, quais foram as autarquias que, em 2008, tiveram uma participação mais significativa ou que recorreram com mais significado a este programa «Pagar a Tempo e Horas».
Também seria interessante ouvirmos da parte do Sr. Secretário de Estado uma palavra acerca da forma como está a funcionar o Fundo de Regularização Municipal, que também foi uma criação nova, decorrente da Lei das Finanças Locais, que vem criar novos equilíbrios na relação entre os municípios e na equação financeira entre os municípios. Por se tratar de um Fundo novo, era interessante que a Assembleia da República pudesse ter uma informação a esse respeito.
Este orçamento tem uma outra medida, que é a dilação do prazo para actualização dos regulamentos de cobrança das taxas municipais. Essa é uma medida de dilação, de extensão, que pode ser importante, para os municípios e as freguesias que ainda não tiveram tempo de actualizar esses regulamentos. No entanto, não quero deixar de dizer que, do nosso ponto de vista, devia haver uma palavra da Assembleia da República e também, naturalmente, do Governo para que se tome consciência de que esta não é uma dilação para se repetir mais vezes, é uma dilação para passar a haver uma disciplina também nesta matéria, para passar a haver uma responsabilidade dos órgãos autárquicos. Esta é uma medida excepcional e devemos ser rigorosos no seu cumprimento, tal como os partidos devem ser rigorosos na ocupação do seu tempo, por isso me calo.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Luís Pita Ameixa. Folgo muito em verificar que as minhas recomendações foram seguidas à letra.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro, do CDS-PP.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, começo por cumprimentá-lo.
Gostava de dizer o seguinte: este é, evidentemente, o seu último orçamento, e, portanto, esta será uma boa ocasião para fazermos um balanço. Eu diria que este balanço é fácil de fazer, pois estamos a falar de uma história de fiascos.
Não vamos falar agora na Lei do Arrendamento, mas podemos perguntar o que é feito da reforma das freguesias. Ora, aqui está aquilo a que se chama uma «entrada de leão e saída de sendeiro». Que eu saiba, os princípios até chegaram a ser enunciados numa reunião com as freguesias. Sr. Secretário de Estado, estamos no final do mandato e fizeram «zero», não fizeram absolutamente nada em relação àquilo que era a reforma do funcionamento e do número de freguesias. Chegou a ser anunciado o princípio de que freguesias abaixo de x eleitores nem tinham razão de existir. Onde está a proposta? Onde está qualquer iniciativa por parte do Governo nessa matéria? Não existe.
Em relação à descentralização, eu diria uma coisa: o Sr. Secretário de Estado, quando olha para aquilo que tem feito em termos de descentralização, tem uma visão excessivamente benévola. Eu vejo mais uma delegação de competências da administração central nas autarquias locais do que uma verdadeira descentralização. Mas, se calhar, o Sr. Secretário de Estado está habituado a contentar-se com pouco, mas nós gostaríamos que houvesse mais! E, quando falamos das reformas que foram feitas, começando por aquela que, se calhar, é o cerne do debate neste Orçamento do Estado, que é a questão da Lei das Finanças Locais, eu diria, Sr. Secretário de Estado, que algo de estranho se passa quando temos uma Lei das Finanças Locais que é apresentada como sendo uma lei que vai estabilizar o funcionamento do financiamento das autarquias e da relação com a administração central e, depois, não há um único Orçamento que tenha sido apresentado depois dessa lei que não a altere. Alguma coisa se passa, Sr. Secretário de Estado, quando é necessário alterar essa lei em todos os Orçamento que aprovamos aqui.
Portanto, ou ela não era boa desde o princípio ou, realmente, a política em relação às autarquias locais está a ser gerida consoante o tempo vai passando, em vez de haver o tal quadro de estabilidade que era suposto esta lei consolidar.
Registamos também o reconhecimento pelo Sr. Secretário de Estado de que o aumento da receita dos municípios resulta, no fundo, do aumento da pressão fiscal do Governo do PS sobre os cidadãos. Ou seja, aquilo que temos não é uma racionalização da utilização dos recursos por parte do Estado e das autarquias locais, não temos o Estado a dizer que vai gastar menos porque descentralizou para as autarquias locais e
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porque as autarquias locais são mais eficientes a gerir determinadas matérias; aquilo que temos é um resultado directo da pressão fiscal do Estado sobre os contribuintes. E aquilo que sucede é que, depois, o Estado acaba por redistribuir uma parcela e não tudo aquilo que estaria inicialmente previsto na Lei das Finanças Locais. Portanto, as autarquias não beneficiam da totalidade daquilo que estava previsto inicialmente na Lei das Finanças Locais, mas apenas de uma parcela. Assim, as autarquias não beneficiam da totalidade do que estava previsto inicialmente na Lei das Finanças Locais mas de uma parcela (abaixo dos 5%) dessa pressão que é feita sobre os contribuintes.
Portanto, a constatação feita pela Associação Nacional de Municípios Portugueses de que a receita dos municípios não aumenta tanto como deveria face ao que estaria previsto inicialmente na Lei das Finanças Locais é verdade, mas é verdade também que, se aumentasse, seria o resultado do esforço dos contribuintes e da forma como acabamos por permitir que as autarquias beneficiem, nessa medida, desse esforço dos contribuintes.
Assim, é pena que alguns princípios que poderiam consolidar-se no que diz respeito à administração local acabem por se transformar numa cópia de vícios do que é a administração central, nomeadamente no que diz respeito ao reduzido número de autarquias que aceitaram reduzir a colecta de IRS por parte dos seus munícipes — aliás, até 5%, na sequência de uma proposta do CDS.
Registamos que voltamos a ter alterações na Lei das Finanças Locais no que diz respeito aos limites de endividamento, no artigo 37.º. No fundo, trata-se de uma forma de permitir que se consiga executar o QREN sem olhar para o limite de endividamento das autarquias previsto neste artigo. Consideramos que o artigo 37.º tem vantagens enquanto tal, porque é um limite de racionalidade daquilo que uma autarquia deve poder endividar-se. Registamos também a condescendência que há com o aumento das despesas com pessoal — que, aliás, foi ainda mais longe na intervenção do Partido Socialista, aqui, nesta reunião, e que, evidentemente, nos preocupa.
Temos ainda curiosidade em relação a algumas matérias que estão previstas na Lei das Finanças Locais e que, até hoje, não se verificaram. O artigo 12.º da Lei das Finanças Locais diz-nos que os edifícios do Estado que não estão afectos a actividades de interesse público deixam de estar isentos de IMI. A minha pergunta é esta: já algum edifício do Estado passou a pagar IMI? Há alguma lista dos edifícios que não estão afectos a actividades de interesse público, para que passem a pagar IMI, como devem e a lei prevê que paguem? Quando é que os edifícios do Estado vão começar na pagar IMI, Sr. Secretário de Estado? Até este momento, não temos a menor informação sobre essa matéria e penso que é altura de o Estado dar o exemplo e começar a pagar o IMI que deve pagar sobre os seus edifícios.
Por outro lado, em relação ao Fundo de Emergência Municipal (FEM), que foi também uma proposta do CDS, o pedido de autorização legislativa que, tarde e a más horas, o Governo do Partido Socialista faz neste Orçamento do Estado é, no mínimo, decepcionante. Sr. Secretário de Estado, ficamos sem saber em quanto é que este Fundo vai ser financiado, tanto que o artigo 36.º refere, especificamente, que os 5 milhões de euros inscritos são para as finalidades dos n.os 2 e 3 do artigo 8.º da Lei das Finanças Locais e o Fundo está previsto no n.º 4. Portanto, não responda que é em 5 milhões de euros.
Ficamos sem saber como se financia esse Fundo, em quanto, quais os seus critérios de distribuição, como é que ele vai, na realidade, funcionar. O Sr. Secretário de Estado teve dois anos inteiros para pensar neste assunto e a única coisa que nos traz, nesta altura, é um pedido de autorização legislativa, sem mais?! Sem, sequer, especificar como, quanto, quando?! Nada disso é explicado no pedido de autorização legislativa?! É uma verdadeira decepção, Sr. Secretário de Estado! Em relação às freguesias, para além de não haver qualquer reforma, como já constatámos, o Sr. Secretário de Estado reconhece o lapso de não constar do Orçamento do Estado a verba para o pagamento dos vencimentos dos titulares de cargos públicos? Foi um erro? Tencionam corrigir? Ou o Sr. Secretário de Estado tenciona propor a alteração da Lei n.º 169/99? É porque, nesse caso, já estamos a falar de uma outra questão, porque deveria constar também do Orçamento do Estado a iniciativa de se alterar a Lei n.º 169/99. Se não é um lapso, Sr. Secretário de Estado, é grave, muito grave. Se é um lapso, deverá ser corrigido o mais depressa possível.
Volto a repetir uma pergunta que já fiz no passado ao Sr. Secretário de Estado: quantas freguesias é que já se associaram, ao abrigo da Lei das Finanças Locais para maximizarem a receita que lhes vem do Orçamento do Estado?
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Sr. Secretário de Estado, no que diz respeito à repartição das verbas por diferentes autarquias, sublinho uma preocupação que o CDS tem neste momento. Temos três municípios que não recebem qualquer receita ao abrigo do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF), o que significa que ficam dependentes, única e exclusivamente, das receitas de impostos que incidem no imobiliário. Sr. Secretário de Estado, a ideia do Governo de reforma da Lei das Finanças Locais era, exactamente, a de evitar que isso acontecesse. E estamos a falar de que municípios? De Cascais, Oeiras e Lisboa, ou seja, de municípios que têm fortíssimas pressões sobre o imobiliário. Portanto, o que está a acontecer é preocupante, porque estamos a encurralar esses municípios e a fazer com que eles só possam recorrer a receitas do imobiliário.
Sr. Secretário de Estado, uma vez que se está a esgotar o tempo de que disponho, vou ficar por aqui, mas aguardo os seus esclarecimentos. São perguntas que há muito deveriam estar respondidas. Talvez se tivessem sido respondidas há dois anos atrás, nesta altura não estaria a insistir para que respondesse.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Honório Novo, do PCP.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, aceito o repto de seguirmos o roteiro de uma certa avaliação em termos financeiros do apoio que o Governo presta às autarquias. E, se me permite, isso mede-se não só através da Lei das Finanças Locais mas de outras decisões que influenciam directamente as receitas municipais.
Comecemos pela Lei das Finanças Locais. De facto, a avaliação que pode ser feita prenuncia aquilo que dissemos na altura da aprovação da lei. E vai pronunciar tanto mais quanto entramos num ciclo em que a evolução das receitas fiscais pode não ser a mesma de 2007 ou de 2006, anos em que atingiu os dois dígitos.
Nessa altura, iremos verificar que as transferências, além das situações que aqui já foram referidas, vão penalizar fortemente alguns concelhos do interior do País. Dou o exemplo de um concelho do interior, o de Fronteira, no distrito de Portalegre, que vai receber este ano de transferências do Estado menos cerca de 220 000 € do que recebeu no ano passado. Estou a falar do conjunto das transferências orçamentais, ou seja, das que estamos aqui a debater. Haverá outros, certamente.
A primeira questão é esta: se Lisboa tem a possibilidade de obter receitas decorrentes do imobiliário ou, então, da utilização do porto de Lisboa, Fronteira não tem porto nem mar e não tem receitas próprias para fazer frente aos encargos do seu concelho — e quem diz Fronteira diz outros concelhos do mesmo tipo.
A questão do cumprimento ou não da lei, o Sr. Secretário de Estado bem sabe, é uma conjugação de dois artigos: os artigos 19.º e 29.º. Se fosse aplicável o artigo 19.º, teríamos uma receita transferida bem superior à que é transferida, que é de 4,8%, ou seja, seria superior a 11%. O artigo 29.º é uma norma travão que impede o cumprimento daquilo que era o espírito da lei. O espírito da lei foi, aliás, bem caracterizado pelo Dr. Emanuel dos Santos, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, quando, em 2007 (nem foi em 2006), dizia que o crescimento das transferências se faz na mesma proporção do crescimento das receitas fiscais. Isto, naturalmente, não é verdade, porque a lei não o permite.
Eu não questiono a lei, mas chamo a atenção e coloco-lhe esta questão: estamos a entrar em crise, a previsão de subida de receitas já é pouco significativa e, certamente, falaciosa. Mas deixemos o falacioso. Se entrarmos em recessão técnica, se entrarmos em estagnação, daqui por dois anos como é que fará a transferência das verbas para as autarquias, na presunção de que continuaria no mesmo cargo, o que não desejo, naturalmente. Vamos, no entanto, imaginar essa tese, por momentos. Se assim fosse, Sr. Secretário de Estado, considera lícito e legítimo que agora, num quadro de aumento de receitas superior a dois dígitos, haja uma norma travão (que está na lei, não se discute) que barra mais ou menos em 5% a subida das transferências para as autarquias? Assim sendo, numa oportunidade em que as receitas fiscais não subam ou até desçam, o que é que se fará? Como é que se reagirá? Não há nenhuma norma legal que garanta que a subida deve continuar a ser de 5%, pois não? Gostaria, portanto, de ouvir os seus comentários num quadro em que há um plafonamento superior, como está na lei, mas em que não há um plafonamento, se quiser, inferior ou, pelo menos, que garanta uma subida de receitas. Esta é uma questão.
Agora, vou colocar-lhe outras questões decorrentes dos apoios às autarquias e às suas associações.
Sr. Secretário de Estado, no que diz respeito à verba inscrita para as áreas metropolitanas e para as associações de municípios, é capaz de garantir que corresponde ao que dizem as Leis n.º 45/2008 e 46/2008,
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que garante 0,5% do FEF dos municípios envolvidos no caso das áreas metropolitanas e 1% dos municípios envolvidos no caso das associações de municípios? Segunda questão, ainda relacionada com a anterior, uma lateralidade: por que é que o Sr. Secretário de Estado quer assinar, por portaria, a repartição entre os municípios das áreas metropolitanas e das associações de municípios? Por que é que não deixa os órgãos próprios dessas associações e dessas áreas metropolitanas gerirem a verba legal, a que têm direito de acordo com as leis, e repartirem entre si, de acordo com o que está na lei? Por que é que tem necessidade de estabelecer em lei orçamental que vai decidir a distribuição por portaria? Em que norma legal se baseia para fazer isso? Queria colocar-lhe outra questão que já foi aqui referida, mas que vou repetir brevemente, para não dizer que nos esquecemos. Trata-se da questão do pagamento dos eleitos das juntas de freguesia. Foi um lapso? Se foi, estamos dispostos a corrigir, porque vamos apresentar uma proposta nesse sentido.
Quanto ao artigo 135.º, que se refere ao imposto especial do jogo, Sr. Secretário de Estado, tem a noção de que vai haver uma diminuição de verbas transferidas para as autarquias abrangidas pelas receitas deste imposto, que vai passar de 20% para 15,5% das verbas afectas aos municípios implicados na área de influência deste imposto? Sr. Secretário de Estado, queria ainda questioná-lo sobre a isenção de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) por fusões empresariais, artigo 60.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Sabe bem que esta norma isenta às empresas objecto de fusões do pagamento de IMT, que é uma receita fiscal municipal. Ou seja, o Governo decide no Estatuto dos Benefícios Fiscais que nesta situação, por interesse nacional, sem ouvir — é o que diz o Estatuto — as autarquias, não há lugar a transferência de IMT.
Muito bem, pode decidi-lo. Onde estão as compensações? Nunca foram pagas, Sr. Secretário de Estado.
Nunca foram pagas a nenhum município implicado nessas fusões.
Outra questão: IMI. Vamos manter a não liquidação de IMI aos imóveis pertencentes ao Estado ou às regiões autónomas que não são objecto de utilização pública, que estão devolutos, ou vamos aplicar a norma que está na lei orçamental e no Código do IMI, que duplica o IMI nos casos em que há prédios devolutos ou não utilizados? Por que é que o Estado e as regiões autónomas têm um tratamento especial, discriminatório e eticamente reprovável perante as suas próprias propriedades? Propriedades não utilizadas, insisto, em serviços público, porque as utilizadas em serviços públicos têm todo o direito a ser isentas do pagamento do IMI, as outras não têm. Manda a ética, manda o espírito da lei, manda a lei, porque a lei prevê-o, só que depois não é cumprida! Como vê, enumerei um conjunto de questões que têm a ver com» Aliás, podia até falar da diminuição das taxas do IMI que todos aprovámos aqui recentemente e com as quais todos estamos de acordo, mas que, permita-se-me a expressão, significa o Governo legislar cortando nas receitas fiscais dos outros, isto é, cortando nas receitas fiscais de terceiros. Não corta na diminuição dos seus impostos mas corta na diminuição dos impostos de terceiros.
Não estamos aqui a questionar a justeza da diminuição das taxas, estamos, sim, a questionar a perspectiva do financiamento autónomo das autarquias que, afinal, é uma espécie de «balde» cheio de buracos em que o Governo tira as rolhas dos buracos à medida das suas conveniências mais ou menos tácticas do ponto de vista da governação.
Uma outra questão, que também tem a ver com receitas, Sr. Secretário de Estado: se, por um lado, o Governo tira algumas receitas, por outro, fica com aquilo que não devia ficar, e também tem a ver com a norma orçamental.
Fundos retidos do FEF: até agora, eram 0,2% — 0,1% (metade) para a sua Direcção-Geral e 0,1% para os chamados «gabinetes técnicos». Deixaram de existir os gabinetes técnicos e reduziu a metade (de 0,2% passou para 0,1% a retenção dos fundos), só que é integralmente para si, para a sua Direcção-Geral, o que significa que o senhor, que, no ano passado, recebia uma determinada verba, isto é, o seu orçamento era pago pelas autarquias, agora vai receber cinco vezes mais do que recebia no ano passado. Por que é que não recebe só mais 4,8%, Sr. Secretário de Estado?! Por que é que o senhor multiplica o seu orçamento, pago pelo dinheiro das autarquias, por cinco vezes?! Por que é que não aumenta só 4,8%?! Por que é que para si, salomonicamente, decide aumentar-se em cinco vezes e, quando se trata de transferir para outros, responde «levem lá 4,8%», que é o que a lei manda?! Acha isto justo, eticamente aceitável, politicamente defensável?! É preciso que todos saibamos que o orçamento da Direcção-Geral da Administração Local, o orçamento do Sr.
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Secretário de Estado, vai passar para 2 milhões de euros, financiado, esta parte, integralmente por transferências de dinheiro que pertencem às autarquias, e que, no ano passado, só foi financiado por 400 000 €. Isto ç, multiplicou-se por cinco.
Por agora, termino. Na segunda volta, continuo o meu roteiro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ao contrário do que o Deputado Luís Ameixa, do Partido Socialista, imagina, uma lei não é imutável nem sagrada para ficar ad eternum. Uma lei é avaliada constantemente, é testada. A iniciativa legislativa passa ou chumba de acordo com a aritmética política que consegue reunir à sua volta, mas a lei passa ou chumba de acordo com o confronto na sua aplicação.
E, na verdade, o Sr. Secretário de Estado colocou-a aqui em discussão, com a sua apresentação inicial, e ela chumba nesta discussão, porque o artigo 19.º da Lei das Finanças Locais diz, muito claramente, que 25,3% da média aritmética dos impostos — IRS, IRC e IVA— se destinam ao fundo de estabilidade financeira dos municípios.
Ora, Sr. Secretário de Estado, existe, na verdade, um travão que foi concebido, na altura, como medida de segurança face às variações das receitas destes impostos, mas, no concreto, na aplicação da lei, não é outra coisa que não um travão real àquilo que o Sr. Secretário de Estado tenta fazer acreditar aqui, que é esta vontade de descentralização para os municípios mas que não é descentralização. Na verdade, não se trata de outra coisa que não de um processo de delegação de competências em escada e com critérios absolutamente aleatórios.
A crítica que o Bloco de Esquerda lhe fez na altura da aprovação da Lei das Finanças Locais foi a de que ela incrementava a discricionariedade nos orçamentos e na negociação entre ministérios e os municípios sobre as transferências para os municípios, e é isto que tem vindo a acontecer. Este travão que aqui está situado nos 5% e que é cumprido neste Orçamento do Estado significa que a capacidade de os municípios, autonomamente, decidirem em função das suas prioridades de resposta a uma situação que é de crise económica profunda não é contemplado naquilo que é a aplicação da Lei das Finanças Locais, se assim o entendessem.
Deixe-me colocar uma pergunta muito simples e a sua resposta será, seguramente, da maior clareza. O Fundo Social Municipal, de acordo com a lei, destina-se a despesas com educação, saúde, acção social. Mais uma vez, o Orçamento do Estado vocaciona o Fundo Social Municipal, única e exclusivamente, a despesas com educação. Onde está a autonomia dos municípios, Sr. Secretário de Estado? Por outro lado, deixe-me dizer-lhe o seguinte: quando olhamos para as transferências para os municípios, o que vamos encontrar é que o Ministério da Educação tem 9 milhões de euros previstos de transferências para o alargamento da rede de educação pré-escolar. Pergunto-lhe: deste alargamento da rede de educação préescolar, o que é para os municípios e o que é para as IPSS? Destes 9 milhões de euros, o que é que cabe, na verdade, aos municípios e qual é o critério ao qual obedece a sua distribuição entre os municípios? É um critério de solidariedade intermunicipal, como é defendido na aplicação da Lei das Finanças Locais, ou é outro, é diverso? Mais: para despesas de enriquecimento curricular, o Ministério da Educação consigna 101,8 milhões de euros. Quero saber, mais uma vez, qual é o critério de distribuição entre os municípios, a que critério obedece.
É um critério que tem a em conta as necessidades dos municípios do ponto de vista do combate às desigualdades sociais na área do seu município ou é outro? Mais ainda: quero saber que percentagem cabe a cada município. Isto não está em lado nenhum e, portanto, não permite o crivo daquilo que é a avaliação política destes critérios de distribuição e, Sr. Secretário de Estado, essa avaliação política é determinante em relação à forma como a Lei das Finanças Locais é, depois, posta em prática.
Por exemplo, ao nível do montante destinado aos transportes escolares, o Orçamento do Estado determina 23 milhões de euros, mas já não fixa o montante para pessoal não docente, para gestão do parque escolar, para enriquecimento curricular»
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Portanto, há aqui toda uma discricionariedade que ficou agravada e não resolvida com a Lei das Finanças Locais.
Aliás, a Lei das Finanças Locais também é posta em causa pelo caso que já foi aqui chamado à discussão e que, seguramente, outros grupos parlamentares também foram alertados, que é o caso de Fronteira, um concelho pequeno, do distrito de Portalegre, com, como já foi dito, 3400 habitantes. Neste Orçamento do Estado, tem uma receita muito inferior, em (-)5%, face às transferências de 2008, o que em parte, repito, em parte, resulta do facto de ter optado por uma cobrança de 2,5% em sede de IRS na componente que é de decisão autónoma do município e, portanto, reduz para metade a sua participação nos 5% de IRS, mas em grande parte resulta do facto de ter conhecido excepcionalmente um aumento de receitas de IMT com receitas extraordinárias, o que significaram que estas receitas extraordinárias vieram condicionar aquilo que será, no próximo ano, a transferência para este município em sede de fundo de estabilidade financeira. Como se fosse um município que pertencesse aos clubes dos ricos!» Na verdade, não pertence, ç um pequeno município com dificuldades financeiras.
Portanto, há, no cálculo do fundo de estabilidade financeira, uma perversão que tem a ver com a contabilidade que é feita em função da colecta de impostos num ano determinado, quando essa estimativa devia ser feita de uma forma ponderada em relação à colecta de impostos num conjunto de anos. Isto é um defeito da Lei das Finanças Locais que vem comprovar a sua inadequação em relação às necessidades dos municípios.
Em relação ao célebre artigo, que está ausente do Orçamento do Estado, sobre as remunerações dos membros eleitos para as juntas de freguesia — e esta pergunta foi feita repetidas vezes — , parece-nos que deve ter havido um lapso. Aliás, este orçamento tem sido fértil em lapsos desde a hora da sua entrega à Assembleia da República. Queremos saber se é um lapso. O Bloco de Esquerda tem uma proposta a apresentar para correcção deste lapso, mas queremos saber se, na verdade, é mesmo de um lapso que estamos a falar.
Ainda em relação às freguesias, na verdade, Sr. Secretário de Estado, elas acabam por conhecer um aumento, face ao ano anterior, semelhante àquele que têm, em percentagem, os municípios. A percentagem de aumento para as freguesias não é muito diversa da percentagem de aumento para os municípios.
A autonomia das freguesias face aos municípios é um problema que se mantém não resolvido, Sr.
Secretário de Estado, é um problema que continua a colocar-se. Na verdade, sendo órgãos com especificidades próprias e com uma indefinição ao nível das suas competências — a clarificação das competências das freguesias perpetua-se ao longo dos anos — , há uma expectativa em melhorar esta clarificação de competências das freguesias que tem que ser equaciona ao mesmo tempo que se equaciona aquilo que é a necessidade de clarificar como se resolve este problema das freguesias que são inseridas em concelhos que se encontram numa situação de minoria política em relação à maioria política que determina a política na área do município e as freguesias que são politicamente minoritárias nos seus municípios continuam, sistematicamente, a ser vítimas de discriminações, de actos discriminatórios, na política municipal.
Portanto, este problema da concepção da autonomia dos municípios face ao Estado central vale da mesma forma para a autonomia das freguesias face aos municípios onde estão inseridas. Este é um problema que já se punha na altura da discussão da Lei das Finanças Locais e que hoje continua a fazer todo o sentido.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Para responder a este primeiro conjunto de questões, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local.
Face ao adiantado estado da hora, faço um apelo à sua sagesse e, em particular, à sua capacidade de síntese para, se possível, responder em 15 minutos a este primeiro conjunto de questões, porque já percebi que vamos ter uma segunda ronda de perguntas.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Sr. Presidente, começo por agradecer o conjunto de questões pertinentes colocadas pelas Sr.as e Srs. Deputados.
Permitam-me que as analise os grandes temas versados pela generalidade dos grupos parlamentares, sem deixar de, na parte final, responder a um conjunto de questões específicas e concretas que este ou aquele Deputado colocou.
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Parece-me que, relativamente às questões que têm um carácter mais geral, mais estruturante e que perpassaram por todas as intervenções ou, pelo menos, pela generalidade das intervenções, podemos identificar algumas áreas que mereceram a atenção desta Comissão.
Primeiro, a avaliação, no cumprimento da Lei das Finanças Locais, daquilo que é a evolução da situação financeira dos municípios quer para 2009 e, tanto quanto é possível fazer esta antecipação, para os próximos anos.
Segundo, a avaliação do processo de descentralização de competências e de várias questões relativas ao processo.
Terceiro, a caracterização do quadro de competências das freguesias e do tipo de evolução desse quadro.
Centrarei a primeira parte da minha intervenção nestes três pontos, passando, depois, às questões mais concretas que foram sendo abordadas, seguindo, sinteticamente, a ordem pela qual foram colocadas.
Direi que a Lei das Finanças Locais confirma plenamente o desmentido das intervenções catastrofistas de antecipação do quadro da sua aplicação e de penalização para os municípios das consequências dos princípios aí consagrados e estabelece um quadro de evolução positiva das receitas locais, das receitas dos municípios nesta fase, estabelecendo, ao contrário do que foi aqui dito em algumas intervenções, exactamente um quadro de estabilidade, sem oscilações bruscas para os anos subsequentes.
Assumindo-se na Lei das Finanças Locais que não se queria manter um modelo que era manifestamente injusto, quer na relação entre os municípios e o Estado quer na relação entre municípios, e que se traduzia numa óptica conservadora de manutenção inalterada da relação que existia entre municípios, quando a realidade dos mesmos é profundamente diferente, esta lei entendeu sempre ser necessário estabelecer mecanismos que, de alguma forma, funcionassem como estabilizadores automáticos, afastando evoluções bruscas, quer no quadro de um grande crescimento nas transferências num determinado ano, quer num quadro de um corte violento das transferências num ano subsequente.
Foi por isto que esse debate foi curioso» Não me esqueço — e tem hoje sentido falar disto aqui, porque estamos, de alguma forma, no último debate orçamental desta Legislatura — do que foi dito, não, eventualmente, pelos Deputados que hoje usaram da palavra mas pelos respectivos grupos parlamentares, aquando da discussão da Lei das Finanças Locais e dos debates dos Orçamentos do Estado para 2007 e para 2008.
Na altura, foi dito por muitos que a Lei das Finanças Locais — e isto era repetido, desinformadamente, fora desta Câmara — iria provocar uma brutal, terrível, perda de receitas para os municípios. Haveria uma perda de transferências na ordem dos 20%, 30% e 40%. Todos nos recordamos de ter ouvido a alguns grupos parlamentares a referência a esta situação catastrófica, que viria a caminho, e a importância que era dada a uma função estabilizadora para que as reduções nunca pudessem ser superiores a 5%, esquecendo-se aqui aquilo que era uma função também estabilizadora de um crescimento que também não poderia ser, em ano algum, superior a 5%.
Ora, recordo-me bem de, no debate em que, pela primeira vez, discuti esta matéria em comissão, ter dito que nos anos seguintes, tanto quanto era possível antecipar, face à expectativa do Governo, iríamos utilizar bastante mais o limite máximo de crescimento do que o tal terrível limite mínimo que protegia os municípios de cortes brutais nas transferências, o que, de uma forma desinformada, era propalado por algumas das bancadas. Assim se verificou em 2008, em que mais de 290 municípios tiveram um crescimento superior a 5% — 108 milhões de euros, globalmente 4,7% — e assim volta a suceder relativamente ao Orçamento para 2009, em que se verificou um crescimento global de 115 milhões de euros, um crescimento de 4,8%. Eu diria que foi um crescimento que, nestes dois anos, quase duplicou a inflação prevista e que, relativamente a 2008, esteve muito acima da inflação verificada.
Mas mais: permite justiça na redistribuição. Ao contrário de um deficiente estudo do que sucedeu em 2008 e em 2009 feito pela Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro, que é eleita por Leiria, o distrito de Leiria permite bem verificar a justiça dos critérios de coesão territorial da Lei das Finanças Locais. Escolheu bem o PSD ao designar para este debate a Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro, porque o distrito de Leiria é um daqueles em que melhor é possível verificar a profunda justiça da Lei das Finanças Locais.
Os municípios do interior, os municípios da área do pinhal, os municípios mais dependentes das transferências do Orçamento do Estado tiveram um crescimento de 5% em 2008, terão um crescimento de 5% em 2009 e, face aos elementos disponíveis, direi que continuarão a ter este crescimento nos próximos anos. É
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assim com Alvaiázere, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pêra. De facto, não é assim com Óbidos, município que tem uma capitação de impostos locais que, fruto do modelo de desenvolvimento que se verificou neste município, tem permitido um nível de receitas provenientes de impostos municipais muito superior às transferências do Orçamento do Estado e, por isso, está entre os 10 municípios que, quer em 2008 quer em 2009, tiveram uma redução nas suas transferências.
De facto, os municípios não são iguais e é esta questão que, com toda a franqueza e toda a transparência, os Srs. Deputados devem discutir e verificar, sabendo-se que, se olharmos para a capitação dos impostos locais por habitante relevante no ano de 2009, a mçdia nacional corresponde a cerca de 180 €/habitante e que a distribuição por municípios tem uma variação profunda, pois vai de aproximadamente 1000 €/habitante — há dois municípios algarvios que ultrapassam os 1000 €/habitante de capitação de impostos locais — até pouco mais do que 40 €/habitante, como acontece com o município de Cinfães e com um conjunto de municípios situados na região do Douro e na Região Autónoma dos Açores.
Por isso, a Lei das Finanças Locais faz aqui justiça redistributiva. E falo também no município de Fronteira.
Não sei qual é o conhecimento que os Srs. Deputados têm, mas verificou-se no município de Fronteira um crescimento em 220% das receitas de impostos próprios no ano de 2007, um ano relevante para a determinação da repartição de recursos entre municípios em 2009.
Portanto, o que é que sucede? Dos 15 municípios do distrito de Portalegre, 14 têm o crescimento máximo, um crescimento de 5%, e o município de Fronteira não o tem.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Tem uma diminuição de 5%!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Tem uma diminuição de 5%, correspondente àquilo que decorre de um crescimento que, admito, possa não se repetir todos os anos, mas ocorreu num ano relevante para esta matéria.
Portanto, Srs. Deputados, se estavam tão preocupados com as perdas de 30% ou de 40%, convém ver se querem olhar globalmente para uma situação de justiça fiscal, de justiça redistributiva na afectação destes recursos, ou se têm uma função parcial.
Faço este debate — e tenho-o, aliás, explicado — em qualquer região do País e posso fazê-lo, com todo o gosto, com todos os Srs. Presidentes de câmara do distrito de Leiria e com a presença dos Srs. Deputados do distrito de Leiria,»
A Sr.ª Ofélia Moleiro (PSD): — Eu entrego-lhes este documento!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — » porque eles serão os primeiros a perceber a coesão territorial, a justiça que distingue entre municípios ricos e municípios que dependem fortemente de receitas fiscais. É assim, o País não é igual! Há municípios em que 90% do seu financiamento depende de receitas do Orçamento do Estado e há municípios em que 90% do seu financiamento depende de impostos próprios.
Se me perguntam qual é a antecipação — e isto foi feito designadamente pelos Srs. Deputados Honório Novo e Luís Ameixa, e é uma questão interessante e relevante — que fazemos num quadro de plena vigência e de pleno cumprimento da Lei das Finanças Locais nos próximos anos, eu diria que a expectativa que poderemos ter face aos estabilizadores automáticos existentes, aos indicadores existentes, é a de que é possível antecipar, pelo menos durante os primeiros anos de uma próxima legislatura, um crescimento significativo, diria que tendencialmente próximo dos 5%, para a esmagadora maioria dos municípios, designadamente para aqueles que têm uma capitação de impostos locais inferior a 75% da média nacional.
Esta é a antecipação que fazemos.
Mesmo num quadro de não crescimento tão significativo, ou fruto da evolução da actividade económica, ou fruto de opções legítimas de um futuro Governo, de redução de receitas fiscais, eu diria que funcionarão sempre estabilizadores que impedirão, mesmo neste contexto, uma redução superior a 5% relativamente a qualquer município, mesmo aos que têm significativas receitas fiscais.
O que acontece em Oeiras, Cascais e Lisboa, apesar de ser uma situação muito pontual, tem consequência na afectação, à parte disponível pelos municípios, das transferências que são feitas pelo
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Orçamento do Estado, transferências estas que nestes três municípios têm a sua concentração na parcela correspondente ao IRS, devido ao significativo padrão de rendimento pessoal — não é do IMI, nem do IMT.
Em matéria de capitação de IRS, estes são os municípios com rendimentos mais elevados no País. Não seria aceitável a qualquer título que os três municípios mais ricos do País, em termos de capitação de IRS, tivessem um crescimento das suas transferências superior a 5%, quando, de acordo com os critérios estabelecidos na lei, é este o limite de crescimento estabelecido para a generalidade dos municípios, justamente para aqueles que mais dependem das transferências do Orçamento do Estado.
Passando ao segundo grande tema relativo à descentralização, ele deve ser visto, por um lado, fazendo uma apreciação global do movimento descentralizador profundo que, quer nestas matérias que referi, quer noutras, marca a diferença entre o actual Governo e governos anteriores. Entretanto, curiosamente, foi colocada a questão da dita delegação de competências a propósito da forma como se operou a descentralização na educação. Julgo que esta é a matéria central que justifica a forma como as questões foram colocadas.
Primeiro, quanto ao movimento global, para os Srs. Deputados do PSD e do CDS, seria aconselhável uma maior prudência na abordagem destas questões.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Porquê?! Só constatamos!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Porquê?! Porque, se há algo que é facilmente constatável, é uma profunda diferença entre as decisões apresentadas num famoso Conselho de Ministros, realizado há uns anos em Óbidos, em que se queria falar de descentralização, ou num outro Conselho de Ministros, realizado há uns anos em Fronteira, em que se pretendeu falar de alargamento de competências municipais em matçria de fiscal,»
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Agora! Estamos a analisar agora!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — » em que a descentralização acabava no licenciamento das queimadas ou na fiscalização dos elevadores. Foi esta a descentralização do período político anterior.
Agora, felizmente, estamos a discutir — e bem! — como é que se descentraliza todo o ensino até ao 9.º ano, como é que se descentraliza a gestão dos centros de saúde, como é que se dão competências adicionais aos municípios em matéria de acção social.
Mas podíamos falar em outras áreas. Poderíamos falar, por exemplo, como se dão competências aos municípios simplificando a revisão dos mecanismos de planeamento municipal, como se simplificou a vida dos municípios em matéria de licenciamento da urbanização e da edificação ou como se ultrapassou a reserva histórica, diria, quase uma reserva cultural, que permite que já este ano tenham sido transferidas para a gestão municipal parcelas significativas de áreas anteriormente sob gestão portuária e que permite aos municípios uma intervenção diferente nas zonas ribeirinhas sujeitas à jurisdição portuária, mas sem qualquer interesse comercial relativo à exploração portuária.
Ora bem, em matéria de educação, de facto, essa é aquela que aqui estamos a falar com uma dimensão mais significativa, e, Sr.ª Deputada Alda Macedo, o que se prevê no Orçamento do Estado é que os recursos que, em 2008, são geridos pelo Ministério da Educação relativamente à gestão de equipamentos, ao pessoal não docente, às actividades de enriquecimento curricular e a tudo aquilo que hoje está afecto ao Ministério da Educação possam ser transferidos para os municípios.
De acordo com a vontade manifestada pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, os municípios aderiram ao processo mas, a determinada altura, tomaram a seguinte posição: em matérias onde há uma grande experiência, como é a dos transportes escolares ou alguns aspectos de apoio social complementar, e onde a questão é essencialmente financeira a transferência pode já ser feita em bloco, com carácter universal, e é isto que está no Orçamento do Estado; em matérias complexas, onde a situação dos municípios não é igual, pretendem discutir caso a caso, daí ter-se encontrado o mecanismo do contrato de execução.
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O objectivo do Governo é claro, que essa transferência se torne permanente relativamente a todos os municípios, mas é extremamente importante que, em cerca de uma centena de municípios e a partir de Janeiro, competências relativas à gestão, às actividades de enriquecimento curricular e à gestão de pessoal não docente passem a ser exercidas pelas autarquias locais.
Estarão com o Governo nesta parceria para uma efectiva descentralização municípios tão distintos como Arcos de Valdevez, Arruda dos Vinhos, Mirandela, Santa Maria da Feira, Vila de Rei, Trofa, Paços de Ferreira, Nisa, Sines ou Ponte de Lima, para, deliberadamente, citar exclusivamente municípios que não são dirigidos por autarcas do Partido Socialista, para não me dizerem que foi isto que esteve em causa. Não! Todos os exemplos que dei (e poderia dar outros) são municípios dirigidos por autarcas que não são do Partido Socialista.
Confiamos que, a nível local, com base nas condições estabelecidas nestes contratos de execução, que estabelecem obrigações, transferências concretas de recurso, esses municípios, quer os que citei, quer os outros, cujos presidentes são do Partido Socialista, irão fazer melhor, fundamentalmente com os mesmos recursos.
Agora, o que o PSD não pode fazer é defender às segundas, quartas e sextas-feiras mais descentralização na saúde e às terças, quintas-feiras e sábados dizer que a participação dos municípios na gestão dos agrupamentos de centros de saúde se insere num processo de nomeação de comissários políticos para a gestão dos centros de saúde. Foi o PSD o único partido que, pública e recentemente, tanto quando sei, tomou esta posição. Estamos a trabalhar, neste momento, com o Ministério da Saúde, para que, também na saúde, a participação municipal nos agrupamentos de centros de saúde seja superior àquela que hoje se verifica.
O terceiro bloco de questões que aqui foi colocado tem a ver com o papel e com a vocação das freguesias.
As freguesias têm uma natureza muito distinta: são 4259 e a questão que tanto preocupa alguns dos Srs. Deputados tem a ver com 330 destas 4259 freguesias.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ó Sr. Secretário de Estado, é a lei!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Em termos orçamentais, as freguesias têm, nesta Legislatura, o maior crescimento de transferências, há um crescimento de 5% para todas as freguesias, porque não se colocam questões de compensação fiscal. Têm uma transferência global de 5%, correspondente a cerca de 10 milhões de euros. Este é o montante das transferências feitas para as freguesias.
O que estamos a fazer com a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias) é um processo que gostaremos de concluir e de trazer à Assembleia da República, nesta Legislatura, e que toca questões importantes que foram referidas com particular felicidade com a Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Esta matéria tem a ver também com a relação entre municípios e freguesias. Esta é uma questão por vezes não trazida a esta discussão.
Estamos a trabalhar com a Associação Nacional de Freguesias em matérias que assentam fundamentalmente em três pontos inovadores e que mereceram o acordo no congresso da Associação Nacional de Freguesias, que decorreu há alguns meses no Funchal.
Primeiro ponto: consolidar nas freguesias matérias que hoje, com carácter genérico, e entende-se até em documentos acordados entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses e Associação Nacional de Freguesias (as freguesias já fazem com base em delegação), têm mais sentido consolidar com carácter permanente nas freguesias.
Segundo ponto: estabelecer estabilidade dos protocolos, mesmo quando haja um protocolo de delegação de competências. O mandato quer do município quer da freguesia é de quatro anos. Se há uma decisão de delegação acordada entre as partes, com normas de reserva que tenham a ver com a garantia da prestação dos serviços públicos que estão em causa, tem todo o sentido que esses protocolos tenham a vigência do mandato e que não possam ser sujeitos a qualquer discriminação. São princípios deste tipo em relação aos quais estamos de pleno acordo com a ANAFRE no sentido de não se poder distinguir em função da circunstância de as freguesias eleitas serem ou não da mesma força política que o presidente de câmara eleito.
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Portanto, é um princípio fundamental de igualdade: estabilidade nas delegações, isto é, as regras são as mesmas desde que as freguesias as aceitam (podem não aceitar) e elas devem estar à disposição de todas as freguesias, e, em princípio, os protocolos devem ter a vigência do mandato.
Terceiro ponto: a admissão de diferenciação de funções entre freguesias. A função das freguesias, a sua natureza, é muito diferenciada.
Esta matéria está ligada às questões de reorganização territorial e, portanto, neste princípio, o que é novo? É o facto de a ANAFRE, neste momento, também estar a discutir connosco a reorganização territorial, que, obviamente, não afectará por razões, até de proximidade, o quadro eleitoral de Outubro do próximo ano, isto é, o quadro das freguesias a serem sujeitas a sufrágio nessa altura, mas é decisivo para a coerência, para a adequação àquilo que é hoje a realidade do País e das freguesias que se estabeleçam novas regras numa matéria que é, aliás, de reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia, isto é, na criação, extinção e modificação de autarquias locais.
Passemos a questões muito concretas, colocadas pelos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que o faça sucintamente, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Vou fazê-lo o mais sucintamente possível, mas não quero desiludir os Srs. Deputados.
Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, é verdade que, com toda a transparência e com base em processos de concurso (e não com base em atribuição casuística), foram celebrados, em 2006, cerca de 700 protocolos de modernização administrativa com freguesias, em todo o País. Algumas freguesias atrasaram-se na sua execução. Neste momento, estão por cumprir obrigações do Estado relativamente a 215 freguesias.
Esperamos que seja possível, ou ainda com a dotação provisional deste ano ou no início do próximo ano, dar cumprimento a esses encargos, que derivam não só da concentração neste ano da apresentação de contas pelas freguesias em protocolos que foram celebrados com todas em 2006, mas também de algum atraso de execução.
A segunda questão concreta colocada diz respeito aos kits de primeira intervenção. Os kits são uma matéria relevante e foi possível atribuí-los a cerca de 1050 freguesias, sobretudo em zonas rurais. Neste momento, está em curso um processo de aquisição e um processo de certificação pelas entidades distritais de protecção civil, estando por cumprir obrigações relativamente a 190 dessas 1050 freguesias, em parte também porque houve um atraso na apresentação desses encargos.
Colocou uma outra questão depois destas, da qual não me esqueço e à qual responderei mais tarde, pois foi colocada por vários outros Srs. Deputados.
O Sr. Deputado Luís Pita Ameixa colocou uma questão relativa ao IMI e aos impostos próprios. Quanto aos impostos próprios, regista-se aqui uma evolução. Eles tiveram um crescimento muito significativo em 2007 (cerca de 30% relativamente à evolução dos impostos próprios), continuando esta evolução a ser positiva no 1.º semestre de 2008. De facto, no 1.º semestre, o IMI cresceu ainda 10% e houve uma redução de 5% nas receitas de IMT, pelo que, globalmente, no 1.º semestre de 2008, o saldo ainda é positivo. Ora, tão cedo quanto as tenha, darei naturalmente informações sobre a evolução, no final do ano.
Quanto ao que perspectivo, acho que o IMI tem uma tendência de crescimento, fruto das cláusulas de crescimento gradual que continuam a verificar-se, mesmo com a redução das taxas máximas de referência, aqui aprovadas pela Assembleia da República. Admitimos que no IMT se irá consolidar, este ano, uma tendência de alguma redução, mas a nossa expectativa é a de que o crescimento do IMI compense esta evolução negativa de IMT.
Quanto à participação própria das freguesias na receita do imposto municipal sobre os imóveis rústicos, essa é uma questão diferente, é verdade. Foi uma alteração histórica que permitiu que 3,5 milhões de euros fossem pagos, pela primeira vez no ano passado, às freguesias rurais. Este ano, já foram pagos (e ainda falta a segunda prestação, que é paga em Novembro) cerca de 2,8 milhões de euros e admitimos que o valor global seja superior ao do ano passado. Agora, já sucedeu algo extremamente importante: com a colaboração das freguesias, concluímos já o processo de informatização das matrizes rústicas. Isto permitirá implementar aqui uma estratégia de verdade na determinação do valor destes prédios rústicos — de facto, grande parte deles não paga nada — e terá um efeito positivo no financiamento, sobretudo, das freguesias rurais.
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Quanto ao Programa Pagar a Tempo e Horas, referi somente o valor global deste ano — cerca de 80 milhões de euros — , que foi distribuído por 39 municípios (e, se a Assembleia o entender, posso discriminar esses valores). Globalmente, o Programa Pagar a Tempo e Horas beneficiou, sobretudo, a Região Autónoma da Madeira, à qual couberam cerca de 250 milhões de euros, isto é, foi a que mais recebeu de todos os municípios que ao mesmo Programa se candidataram. De entre os municípios que se candidataram, vou apenas referir aqueles que tiveram empréstimos superiores a 5 milhões de euros, para termos uma dimensão mais significativa. Assim, temos o município do Funchal, com 10 milhões de euros (o valor mais elevado), seguido do município de Leiria, com pouco mais de 9 milhões de euros, e os municípios do Barreiro e de Santa Maria da Feira, cada um com 6 milhões de euros. Foram estes os quatro municípios financiados pelo Programa Pagar a Tempo e Horas com valores superiores a 5 milhões de euros. De qualquer maneira, posso discriminar os valores em relação a todos.
Quanto ao Fundo de Regularização Municipal, ele permitiu acumular, com base nas deduções feitas a 19 municípios, cerca de 4 milhões de euros. E a 12 destes 19 municípios, face à boa recuperação financeira que tiveram, não só lhes foram suspensas essas deduções como lhes foram devolvidos os recursos retidos, em alguns casos, na totalidade e, noutros, em parte, estando hoje no Fundo um valor de cerca de 2,5 milhões de euros. Cerca de metade dos municípios já actualizaram as suas taxas e regulamentos municipais e esperamos que este movimento prossiga.
Sr. Deputado António Carlos Monteiro, discutiremos a lei do arrendamento quando quiser, apesar de não se tratar de matéria orçamental. Mas julgo que, ao andar na rua, já pôde verificar o crescimento, em cerca de 40%, que o arrendamento já teve em 2008, o que é reconhecido pela generalidade dos operadores do sector.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Como é que está a actualização?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Relativamente à descentralização, também houve uma evolução: neste momento, na região Centro, por exemplo, já todas as associações de municípios concluíram com a CCR e com o Programa Operacional Regional a discussão que permitirá uma significativa descentralização de recursos em matéria de gestão do QREN, assim como concluíram o seu processo de organização.
Em matéria de endividamento, há uma norma clarificadora interpretativa, que visa, aliás, aqui, não alargar o volume de endividamento mas manter aquilo que sempre dissemos. De facto, os 31 municípios que, até hoje, tiveram autorizado um endividamento a título excepcional, apesar de terem esgotado o seu limite de recurso ao crédito, tiveram-no para financiar obras já realizadas e apoiadas pelo QCA III. Havia aqui algumas dificuldades interpretativas que levaram a jurisprudência contraditória do Tribunal de Contas, e, por isso, a norma ç clarificadora,»
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — É clarificadora num sentido!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — » já que vai no sentido do entendimento que o Governo sempre teve sobre esta matéria.
Em matéria de edifícios do Estado não afectos a serviços públicos que deixam de estar isentos de IMI, questão colocada pelo Sr. Deputado António Carlos Monteiro, este é o princípio que está na lei. Sabemos de municípios que já estão a fazer este levantamento. O princípio que defendo é o princípio geral de que o Estado deve pagar. Este é o princípio que assumimos e é neste sentido que evoluiremos. Entendo que, relativamente aos edifícios que não estão afectos ao serviço público, o Estado deve pagar. Por exemplo, o município de Lisboa está a proceder — e, tanto quanto sei, o senhor ç deputado municipal em Lisboa»
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não, não sou!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Então, peço desculpa. Mas já foi autarca no município de Lisboa, o qual está a proceder a esse levantamento.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Honório Novo, em matéria de evolução das receitas fiscais, faria aqui uma consideração em geral, que também só pode ter um sentido geral. O Sr. Deputado
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afirmou aqui a sua concordância — e ainda bem — com a medida de redução dos encargos sobre as famílias, em matéria de IMI. Porém, esta não foi a única redução de impostos verificada, numa conjuntura, aliás, complexa, em que as questões de consolidação orçamental não são ainda um processo concluído, independentemente do quadro internacional de abrandamento da actividade económica que hoje vivemos.
Também por isso, houve uma redução do IVA, em 2008, e se prevê, para 2009, relativamente a um conjunto significativo de contribuintes, uma redução de IRC.
Portanto, não sufrago minimamente — e esta é uma matéria que pode ser discutida com o Sr. Ministro das Finanças, mas, tendo sido aqui trazida, vou responder-lhe — a sua afirmação de que «o Estado faz redução de impostos á conta das receitas alheias«. Julgo que foi mais ou menos isto que referiu»
O Sr. Honório Novo (PCP): — Foi, foi!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Ainda bem! Gosto de citá-lo com propriedade! Como dizia, não sufrago minimamente essa afirmação e espero que reconheça a redução do IVA, a redução do IRC e também a alteração em matéria de tratamento fiscal das famílias, isto é, em matéria de IRS, em relação aos encargos com a habitação.
Quanto à questão das freguesias, não se aplica de modo algum. Estamos aqui a falar não das 4259 freguesias (não é disto, não é das pequenas freguesias) mas exactamente das freguesias, que são 330 neste momento, que têm autarcas que são remunerados nos termos estabelecidos pela Lei n.º 11/96, através do Orçamento do Estado.
Deve dar-se cumprimento à lei nesta matéria e, portanto, cabe aqui verificar qual é a forma de, através do Orçamento do Estado, cumprir esta Lei.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Ou seja, vai ter de se alterar, porque foi um erro! Já percebi!
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado. Enfim, os 15 minutos que tinha inicialmente pensado bastarem para responder não passaram de um wishful thinking. De facto, não era possível, em 15 minutos, responder a esta plêiade tão vasta de questões.
Vamos, então, passar à segunda e última ronda de questões. Peço rigor no tempo gasto nas intervenções.
Não se mudam as regras do jogo a meio do mesmo. No entanto, face ao adiantado da hora, se for possível abreviar para 3 os 5 minutos que inicialmente concedi para a segunda ronda, seria bom. Deixo isto, contudo, ao critério diligente e avisado dos Srs. Deputados.
Começando pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, tenho um elenco muito concreto de perguntas, que irei fazer rapidamente. Mas, uma vez que o Sr. Secretário de Estado desferiu um golpe sobre o meu coração político, terei de pedir a sua benevolência no sentido de me conceder um pouco mais de tempo só para responder a algumas afirmações feitas. Na verdade, não estou aqui a representar os distritos e todos eles naturalmente têm queixas. Mas, dado o facto de o Sr. Secretário de Estado se ter referido a Leiria e a coincidência de eu ser de Leiria, tenho de responder.
Sr. Secretário de Estado, Leiria promoveu um encontro de autarcas no passado sábado. Leiria tem 16 presidentes de câmara, dos quais só três não são do PSD — dois são do PS e um é do PCP — , os quais naturalmente subscreveriam tudo o que está escrito neste papel, que são as conclusões desse encontro. E, Sr. Secretário de Estado, sugiro que não leve o mesmo discurso para Leiria, porque os 14 autarcas presentes na reunião assinaram um documento onde dizem que o PIDDAC»
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Falei de sei de transferências!
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — O senhor falou de transferências, eu sei, mas, ao lado das transferências que referiu, o PIDDAC passou de 120 milhões de euros para 44 milhões de euros, entre 2005 e 2009, o que fez com que Leiria passasse para 18.º lugar.
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Passo agora a falar de transferências. O senhor disse que Leiria é um caso paradigmático de correcção de assimetrias através de transferências. Sr. Secretário de Estado, o Pinhal Interior Norte, que pertence ao distrito de Leiria, ocupa o 2.º lugar no ranking nacional da pobreza e parte dos municípios desta região receberam zero do PIDDAC, o que significa que as assimetrias não serão corrigidas através dos 5% de transferências que o senhor invoca.
O Sr. Secretário de Estado também falou no QREN. Estão aqui todos os atrasos e problemas com que os autarcas se defrontam em relação ao QREN. Por isso, dou um conselho, Sr. Secretário de Estado: por favor, não vá com esse discurso para Leiria. Leve este documento para casa, para a sua Secretaria de Estado, estude-o e corrija-o naquilo que os autarcas dizem que o Governo socialista está a fazer mal em Leiria.
Leiria está com a maior taxa de desemprego dos últimos anos, é a região do País que apresenta a maior variação positiva do número de falências de empresas e deixou de ser o «pulmão» empresarial da Região Centro do País. Há, portanto, um agravamento das assimetrias regionais, em resultado da ausência de verdadeiras políticas de discriminação positiva dos municípios, com problemas de isolamento e de falta de infra-estruturas.
É este o resultado do Governo socialista e das políticas socialistas em Leiria. Quanto a isto, estamos conversados, Sr. Secretário de Estado. Já lhe entrego o documento.
Passo agora às questões que ficaram para a segunda parte, e serei muito concreta.
Na primeira ronda de perguntas muito se falou do «travão» dos 5%. Pois eu vou falar de um travão que não existe na lei e que consiste na transferência para a competência na área da educação.
No relatório do Orçamento do Estado, o Governo diz (e isto prova-se pelos números) que o Ministério da Educação cresceu 7,2% neste Orçamento. Pergunto, Sr. Secretário de Estado: por que é que para a educação só vai exactamente o correspondente à inflação, ou seja, 2,5%? Onde é que fica a diferença? Por que é que fica esta diferença? Esta diferença entre os 2,5% e os 7,2%, na educação, é uma «comissão» que o Estado cobra às autarquias? Foi aqui dito, e bem, que, em tese, a descentralização de competências reduz a despesa do Ministério nessa competência. Ora, então deve haver uma «almofada» financeira correspondente. Por que é que fica lá mais do que aquilo que é preciso para esta competência? Passando à questão dos auxílios financeiros e à cooperação técnica e financeira, já nem vou fazer considerações, gostaria de saber quais são os critérios objectivos para a prestação de auxílios financeiros e/ou para a celebração de qualquer contrato ou protocolo. Onde é que está a publicação das listas trimestrais dos contratos? E o diploma de concessão dos auxílios financeiros? É o critério da cor partidária? Aproximam-se as eleições autárquicas» É o Orçamento das «eleições».
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de terminar.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, peço-lhe um pouco de benevolência, dado que tive de falar de Leiria e não estava para o fazer, porque não estou aqui a representar qualquer distrito.
O Sr. Presidente: — Naturalmente que terei toda a benevolência do mundo, mas chamo-lhe a atenção para o facto de que não dispõe de muito tempo.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Serei rápida, Sr. Presidente, porque já nem vou falar do PIDDAC.
No entanto, gostaria ainda de colocar uma questão sobre a situação paradigmática que todos ou quase todos os meus colegas aqui colocaram e que diz respeito ao caso do município de Fronteira.
O PSD fez uma proposta de alteração a um ponto da lei do financiamento local para obviar a casos tão escandalosos como este de Fronteira.
Se já tantas vezes foi proposta a alteração pontual da Lei das Finanças Locais, por que é que o Sr.
Secretário de Estado não vê o que é óbvio, ou seja, que Fronteira não é um concelho rico. Fronteira não será o «deserto» do seu colega das Obras Públicas mas é quase, porque não é, de facto, um concelho rico. A lei tem de ser vista pelo Sr. Secretário de Estado, porque, se basta um técnico fazer as contas e automaticamente escrever, então não é preciso a Secretaria de Estado!
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Pergunto, concretamente, Sr. Secretário de Estado: está disposto a analisar a nossa proposta de alteração e a falar com o Grupo Parlamentar do PS, sugerindo que o mesmo vote a favor a nossa proposta de alteração? Gostaria ainda de deixar uma observação, a juntar a tantas outras que já aqui foram feitas, para dizer que os senhores funcionam bem na casa dos outros, mas não tão bem na casa onde precisam de poupar. Isto porque os senhores não reduzem só taxas de imposto às autarquias, até se dão ao luxo de estabelecer isenções de IMI e de IMT. Isenções, Sr. Secretário de Estado! Isto é viver à custa das receitas dos outros ou, pelo menos, viver politicamente à custa das receitas dos outros.
Já agora, mesmo para terminar, quero referir a taxa de 0,1% que fica retida das autarquias para a sua Secretaria de Estado. Mas a Secretaria de Estado é o regulador das autarquias?! Normalmente, na regulação da actividade financeira e da actividade da concorrência são os próprios que contribuem. A sua Secretaria de Estado vai ser financiada pelos municípios, através desta verba?! Então, o senhor é o regulador?!
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — É!
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Então, se é o regulador, o senhor vai utilizar isto como regulação ou vai utilizar como benesses nos TNT neste ano eleitoral? É também mais esta pergunta que fica.
Agradeço ao Sr. Presidente a sua benevolência.
O Sr. Presidente: — De nada, Sr.ª Deputada, mas há-de convir que fui magnânimo para consigo, face ao tempo utilizado.
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Foram 3 Minutos!
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Pedro Farmhouse.
O Sr. Pedro Farmhouse (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, confesso que não resisto a começar por dizer que, pelos vistos, passados três anos, continuamos a discutir a Lei das Finanças Locais e, acima de tudo, ainda há quem não perceba qual é o mecanismo de funcionamento desta Lei.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Pedro Farmhouse (PS): — Ou seja, quando falamos de acréscimos e decréscimos, são aqui confundidos alguns aspectos que é importante clarificar.
O primeiro chama-se «travão», sendo também utilizada a expressão estabilidade ou estabilizador, segundo o qual nenhum município pode crescer mais ou decrescer menos de 5%. Trata-se de um mecanismo que vai sendo utilizado anualmente.
É importante ter em conta (e tenho pena que a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, do PSD, neste momento, tenha de se ausentar) que não se está a falar só em relação a matérias que têm a ver com as transferências do Estado para as autarquias mas também às receitas que os próprios municípios recebem através dos impostos locais.
Isto leva, obrigatoriamente, a que, de ano para ano, em função desses indicadores de capitação dos impostos locais, tenha de haver actualizações e de ser salvaguardada a situação de nenhum município descer mais de 5%/ano em relação ao que recebia no ano anterior.
Aliás, é curioso que a principal preocupação há três anos, aquando da discussão da Lei das Finanças Locais, tenha sido exactamente o descalabro que poderia ser esta Lei das Finanças Locais, razão pela qual foi criado esse estabilizador, que foi precisamente para salvaguardar uma situação de decréscimo não superior a 5% relativamente às transferências para os municípios.
Estes dois estabilizadores, abaixo e acima, permitem que os municípios tenham uma certa previsão do que vão sendo as suas receitas. E seria curioso (e há pouco o Sr. Secretário de Estado já deu uma ideia sobre
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isto) ver qual tem sido a evolução dos impostos locais. Ou seja, em relação ao IMI, ao IMT, ao IUC e à derrama seria interessante ver a evolução que tem havido nos últimos anos.
Podemos isolar as receitas, mas há, entre outros, um aspecto positivo trazido pela Lei das Finanças Locais e que consiste numa maior autonomia, o que implica uma maior responsabilidade na constituição da sua própria receita. Neste sentido, em 42 municípios, as autarquias tiveram, pela primeira vez, a possibilidade de, em sede de IRS, ter uma diferenciação positiva entre si. Isto permitiu uma maior autonomia e também uma maior responsabilidade perante os eleitores face às suas receitas, em especial aquelas que são obtidas através dos impostos locais.
Além da questão dos estabilizadores e do aumento da autonomia e da responsabilidade das autarquias, há uma maior transparência quanto à actividade autárquica e à sua relação com o sector empresarial local.
Quando se fala dos municípios, é bom que se conheça a dimensão da sua totalidade, na parte em que está envolvido o sector empresarial local, o que aumenta a credibilização do que se passa a nível das autarquias.
Mas o mais importante, e que às vezes é posto em causa, é o problema da solidariedade, por um lado, entre o Estado central e os municípios e, por outro, entre os próprios municípios. Ou seja, quando as receitas aumentam, os municípios têm um aumento de receita de transferências do Estado e, quando diminui a receita, em termos de impostos, o Estado central diminui, obviamente, as transferências, mas há a solidariedade entre os municípios, aqueles que têm maior autonomia, através dos impostos locais, contribuem para uma melhor distribuição e coesão territorial.
Em relação à Lei das Finanças Locais, pergunto, Sr. Secretário de Estado: qual tem sido a evolução dos impostos locais das autarquias? Sei que há pouco deu alguns indicadores sobre esta matéria, mas gostaria que nos dissesse o que tem acontecido nos últimos três anos, desde que a nova lei das finanças locais entrou em vigor, qual foi a evolução dos impostos locais.
Passo à descentralização, que está prevista na Lei das Finanças Locais. Gostaria que o Sr. Secretário de Estado, na área da acção social e na da saúde, pudesse ir um pouco mais longe do que as indicações que aqui deixou em relação ao que está a ser trabalhado com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e nos dissesse qual a evolução que poderá ser expectável para o próximo ano.
Uma outra nota que também me parece importante e que eu gostaria de destacar tem a ver com o pagamento a tempo e horas. Pergunto: em termos de operacionalização desta opção, como é que se podem simplificar alguns processos e que evolução está prevista para 2009? Como o tempo já está esgotado, para terminar, ouvimos aqui os partidos da oposição dizer sistematicamente que «está tudo mal» e eu não resisto a pegar no parecer que serviu um pouco como guião da ANMP e a fazer algumas referências.
O ponto 1 do parecer refere-se ao montante global a transferir, à distribuição de verbas entre municípios e diz: «o Governo cumpre o texto da Lei das Finanças Locais».
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Leia o resto!
O Sr. Pedro Farmhouse (PS): — Passando à frente, temos: encargos com o pessoal, regista-se como positivo; endividadamento municipal, regista-se como positivo; taxas municipais, regista-se como positivo; alterações aos artigos 77.º e 78.º do Código do IMI, registam-se como positivo; enfim, poderia continuar por aqui, com a reabilitação urbana, que também se regista como positiva.
Afinal, pelos vistos, só os partidos da oposição é que vêem defeitos no Orçamento do Estado para este ano. Felizmente que os parceiros mais importantes neste processo, que são as autarquias, não têm essa visão tão negra e catastrófica como a dos partidos da oposição.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, confesso que agora estranhei, porque já aqui ouvi falar em evolução de impostos locais, etc., e eu acho que o PS tem acesso a uma informação que nós não temos. Aliás, até costuma ser hábito haver uma nota explicativa do Orçamento e, confesso, não a vi, Sr.
Secretário de Estado, talvez seja melhor entregar essa nota justificativa, porque o PS parece tê-la.
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Mas, enfim, não vou entrar neste diálogo com o Partido Socialista, vou, antes, insistir em alguns pontos em que o Sr. Secretário de Estado, segundo me parece, ou não percebeu ou não quis explicar.
Em primeiro lugar, temos uma preocupação, porque o Sr. Secretário de Estado, quando anunciou a Lei das Finanças Locais, disse que iria diminuir ou acabar com a dependência de receitas do imobiliário. Aquilo que eu disse foi que, em alguns casos, está a ser dado um sinal contrário à intenção inicial da lei. Ora, em relação a isto, o Sr. Secretário de Estado disse zero.
Em segundo lugar, chamei a atenção para o facto de estarmos perante uma lei que tem estado a ser alterada em todos os Orçamentos do Estado — aliás, até durante a sua aprovação, mas, enfim, já nem vou entrar por aqui» — , quando aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse foi que a lei iria ter um quadro de estabilidade. Mas a Lei das Finanças Locais está sempre a ser alterada! Chamei a atenção para o facto de este aumento de receita — que, evidentemente, é elogiado pelos autarcas, Sr. Deputado Pedro Farmhouse, por ser receita — não corresponder a uma diminuição de despesa por parte da Administração central, nem a uma melhor gestão e distribuição de recursos por parte do Estado ou das autarquias. O que temos é que o aumento de receita corresponde ao aumento de esforço feito pelo contribuinte, porque todo ele se traduz num aumento de despesa quer pela administração local quer pela Administração central. Portanto, estamos a copiar aquilo que é criticável no Estado e que também passa a ser criticável nas autarquias.
É evidente que, quando é necessário fazer a tal clarificação de uma interpretação, o Sr. Secretário de Estado e o Governo optam por flexibilizar, no sentido de aumentar os limites de endividamento, não optam por tornar o tornar mais rígido. Ou seja, se fosse para o tornar mais rígido seria dizer que o artigo 37.º era aplicável independentemente de».
O mesmo acontece com a questão do pessoal.
Quanto à descentralização, Sr. Secretário de Estado, a verdade é esta: o Governo trata os municípios como as autarquias tratam as suas juntas de freguesia, ou seja, por protocolo! Isto é uma delegação de competências! A forma como o Governo trata o município é igual à forma como o município trata a freguesia! Agora, convém que tenhamos a noção de que, se assim é, então comece por dar o exemplo, Sr. Secretário de Estado, adopte também o princípio da estabilidade ao longo de todo o mandato. Mas isto não sucede, porque estas matérias estão a ser alteradas em todos os Orçamentos do Estado! Em relação à reorganização de freguesias, não consegue explicar por que é que disseram que iriam acabar com as freguesias abaixo de x número de eleitores e não o fazem?! Em que é que ficamos? Quanto ao IMI, estamos há dois anos com um calote por parte da Administração central para com a administração local, que é o de não pagar o IMI relativo àqueles edifícios» E o Sr. Secretário de Estado «sacode a água do capote» e diz: «Já há aí umas autarquias que estão a tentar ver se conseguem vir cá buscar o dinheiro»?! É este o raciocínio da Administração central?! Há uma lista de edifícios da Administração central, e a minha pergunta foi clara: alguma vez a Administração central pagou imposto sobre estes edifícios?! Vão fazer uma lista?! A estas perguntas não respondeu! Também não respondeu a nenhuma das questões que diz respeito ao Fundo de Emergência Municipal.
Tiveram mais de dois anos para pensar no assunto e a única coisa que agora pedem é uma autorização legislativa, que é impossível ser mais vaga?! Pergunto: de quanto é que vai constar no Fundo? Não tem verba prevista no Orçamento e já lhe disse porquê. Como é que ele vai ser financiado? Não explica! Como é que vão distribuir essas verbas? Quais vão ser os critérios? Não explica! Portanto, Sr. Secretário de Estado, realmente isto já não é só uma decepção, começa a ser frustrante. Em todos os Orçamentos eu perguntei a mesma coisa, Sr. Secretário de Estado, e a única coisa que tem para nos trazer ou é mais um adiamento ou é para nos enganar! Agora, quanto à remuneração dos titulares de cargos nas freguesias, Sr. Secretário de Estado, se houve um engano do Governo, pura e simplesmente, reconheçam-no! A resposta do Sr. Secretário de Estado é completamente vaga! Se houve um engano, diga: «houve um engano, houve um lapso, vai ser corrigido» ou «os grupos parlamentares terão de o corrigir». Agora, o Sr. Secretário de Estado andou à volta para não reconhecer aquilo que, evidentemente, para nós, era um engano, um lapso.
Sr. Secretário de Estado, para terminar, foi-lhe colocada uma questão, cuja resposta, confesso, tenho alguma curiosidade em ouvir, que é sobre as verbas relativas ao jogo. A interpretação que faço não é exactamente essa, pois, para mim, não pode haver essa redução, a redacção não permite retirar essa
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conclusão, e é exactamente por isto que considero importante que este assunto fique esclarecido aqui. Na minha interpretação, 20% da totalidade é equivalente aos 25% dos 80%. Agora, é importante que o Governo assuma aqui se está ou não a reduzir, porque, se a interpretação for a minha, ficamos tranquilos e não vamos questionar, se a interpretação for a da Associação Nacional de Municípios Portugueses e a do Partido Comunista Português, então, Sr. Secretário de Estado, a proposta do Governo é grave. Mas gostava de ouvir a sua resposta.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Eu dou-lha!
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, começando pela Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, creio que a melhor maneira de provar à saciedade que nem o próprio Secretário de Estado está confortado com aquilo que virá no futuro é reproduzir a sua ideia, dada na resposta a uma pergunta da 1.ª ronda, de que, pelo menos nos próximos anos, se antecipa o crescimento dos mais débeis em torno dos 5% — foram palavras suas! Portanto, esta é a melhor prova de que o senhor não tem a certeza.
De facto, Sr. Secretário de Estado, vamos falar claro: os termos desta lei envolvem critérios de transitoriedade, cuja verificação todos vamos ter oportunidade de constatar daqui por mais alguns anos, quando a situação do ciclo de crescimento das receitas fiscais — ou por se esgotarem ou por alguma coisa que foi constatada pelo Governo nas últimas semanas, a chamada «crise internacional» — registar uma «involução» nessa evolução de receitas.
De toda a maneira, Sr. Secretário de Estado, estamos muito preocupados com o futuro próximo das transferências para as autarquias e cremos que há margem na própria lei — e fazemos uma proposta de alteração ao Orçamento — para a criação de um fundo de estabilização orçamental dotado com a diferença positiva entre aquilo que resulta da aplicação directa do artigo 19.º e aquilo que resulta do «travão» decorrente da aplicação da norma do artigo 29.º. Esta diferença positiva, que, teoricamente, é dinheiro das autarquias que fica neste fundo, pode e deve ser utilizada para situações como a do município de Fronteira, que até é um município PSD. Enfim, fica bem ao PCP falar num município do PSD! Vêem-se os efeitos que uma receita extraordinária existente no ano de 2007, em sede de IMT, provoca passados dois anos: uma diminuição de 5% nas receitas normais das transferências para esse município. Estou correcto, estou a ler bem, não estou, Sr.
Secretário de Estado?! Mas a verdade é que este fundo de estabilização orçamental (chamemos-lhe isto ou outra coisa) — e é nisto que nos interessa falar — poderia, com esta verba, atender a questões deste tipo, a situações pontuais deste tipo, que a lei determina e provoca, e, no futuro, quando a evolução fosse negativa, poderia compensar de facto e colocar à disposição dos municípios — de todos os municípios — uma verba que é significativa e que, só no ano 2009, ronda os 170 milhões de euros, se não me engano, segundo as contas da própria ANMP.
O Sr. Secretário de Estado foi bem claro — não tenho a interpretação do Deputado António Carlos Monteiro — , dá-nos a possibilidade de corrigirmos um erro do Governo, em sede de juntas de freguesia, e, da nossa parte, já o fizemos.
Quanto aos outros impostos, às outras receitas, o Sr. Secretário de Estado, lamento dizer, não pode ter «sol na eira e chuva no nabal»! O senhor não pode dizer: «Ah! Temos aqui uma lei, a Lei n.º 2/2007, que conheço muito bem — e vou a qualquer sítio do País defendê-la, se for preciso — , que tem a ver com a capitação dos impostos, não apenas dos locais mas de todos os impostos daquele município». Isto significa que o senhor conhece bem todos os outros impostos. O senhor conhece bem os códigos dos impostos, porque tem de os conhecer para aplicar a sua própria Lei n.º 2/2007, mas, depois, quando é colocado perante questões concretas relativamente à diminuição do IMI, às isenções do IMT para fusões empresariais, faz de conta que não é consigo, faz de conta que não a conhece.
Enfim, há uma série de questões pontuais, respeitantes a estes códigos, que se têm traduzido na diminuição dos impostos locais, por intervenção do Governo, por decisão unilateral do Governo, mas aí,
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naturalmente, o senhor faz de conta que não conhece e endossa-nos — no caso, foi a mim — para o Sr.
Ministro das Finanças.
Ó Sr. Secretário de Estado, com o Sr. Ministro das Finanças eu tenho esta e outras conversas. No entanto, tenho de ter esta conversa consigo, porque o senhor conhece muito bem os códigos, e tanto assim é que os usa na aplicação da Lei das Finanças Locais.
Portanto, quanto a isto, fiquemos claros.
Já agora, e estou profundamente curioso, poder-nos-ia explicar, no que toca à verba das áreas metropolitanas das associações municipais, como é que se chega àquele número, como é que aplicam as leis e como é que se arroga o direito de partir o «bolo», de ser o homem que vai repartir as fatias do «bolo» pelo pessoal. Vai lá, numa cerimónia e tal, e diz: «para aqui ç isto, para ali ç aqueloutro»« em portaria. Deixe-os, eles têm órgãos próprios, Sr. Secretário de Estado! Respeite a autonomia das associações de municípios! Respeite a autonomia das áreas metropolitanas! Deixe os seus órgãos próprios distribuírem ou repartirem, entre si, no âmbito das suas competências, aquilo que é o seu próprio financiamento — financiamento que está na lei.
Quanto à questão levantada pelo Deputado António Carlos Monteiro sobre o imposto de jogo, Sr.
Secretário de Estado, eu tive oportunidade de falar com o seu colega do Turismo, ontem, aqui (estava eu, por acaso, a presidir à reunião da Comissão), e ele confirmou-me que, de facto, havia uma diminuição, só que era para o fundo de fomento cultural, e nós não podemos estar contra esta transferência. Portanto, o senhor tem de dizer aqui se é ou não verdade o que o seu colega do Turismo disse, ontem, em conversa, naturalmente privada, mas não é segredo.
Finalmente, termino esta segunda intervenção como comecei a primeira: o senhor nada tem a dizer sobre os 2 milhões de euros que leva para o seu orçamento, para o orçamento da sua Direcção-Geral? Não tem nada a dizer sobre o facto de se multiplicar por cinco a verba que tira às autarquias para levar para a sua Direcção-Geral?! Para que é isso, Sr. Secretário de Estado?!
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado Honório Novo.
Para a última intervenção desta segunda ronda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, serei muito breve, tenho apenas uma questão ainda a colocar ao Sr. Secretário de Estado.
No entanto, não posso deixar de retorquir, em relação à sua resposta, porque, na verdade, o Sr. Secretário de Estado não resolveu aqui o problema que, na óptica do Bloco de Esquerda, é um dos maiores desta Lei das Finanças Locais, que é o da discricionariedade desta delegação de competências para os municípios. Não é a mesma coisa garantir actividades de complemento curricular em concelhos, em municípios de zonas rurais do interior, onde há crianças deslocadas da sua área de residência, e garantir actividades de complemento curricular em áreas urbanas do litoral, de grande densidade populacional e onde há maior proximidade em relação aos locais de residência das crianças. São critérios diferentes! Do ponto de vista do Ministério da Educação, a visão é uma; do ponto de vista da acção face à coesão territorial, que tem de ser a da sua Secretaria de Estado, tem de ser outra.
Portanto, tem de haver critérios em relação à distribuição de receitas, que são receitas dos diferentes ministérios, neste processo de delegação de competências para os municípios. E, na verdade, existe um problema de discricionariedade, que o Sr. Secretário de Estado não resolveu. Não é a carta educativa dos municípios e a maior ou menor dinâmica de municípios ou de actores locais de desenvolvimento que vão resolver este problema, porque, na verdade, contrariar as desigualdades de desenvolvimento entre municípios do interior e municípios do litoral tem de obedecer a perspectivas e visões sobre formas de resolver este problema. E o Sr. Secretário de Estado não responde ao problema da discricionariedade.
A pergunta que quero deixar, para finalizar a questão que aqui colocamos, tem a ver com um problema que se suscita em relação a este Orçamento do Estado, que se situa no contexto ou na perspectiva de um ano de 2009 de grandes dificuldades, do ponto de vista social e económico, no nosso País. A pergunta que faço, com a maior frontalidade, prende-se com uma proposta que o Bloco de Esquerda apresentará, em sede de propostas de alteração à proposta de lei. Concordando nós com a necessidade de um «plafonamento» ao endividamento dos municípios, entendemos que se deve consignar ou, melhor, porque este não é o termo
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mais adequado, entendemos que se deve assumir um «plafonamento» suplementar para resolver o problema de municípios confrontados com situações de pobreza extrema. A proposta do Bloco de Esquerda é de que deve haver esta referência, deve haver um plafond diferenciado, quando ele se justificar por programas de combate à pobreza. Por isso, gostaria de obter a sua apreciação sobre uma proposta desta natureza. Do ponto de vista do Governo, o que se lhe oferece dizer sobre esta matéria?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Tem, agora, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, para responder a este segundo e último feixe de questões, a quem peço, naturalmente, sagacidade nas respostas mas também brevidade, em face do adiantado da hora.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, tentarei ser o mais directo possível, não voltarei a uma análise genérica e procurarei seguir as questões que me foram colocadas.
Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, não quero desfazer-lhe o coração, como julgo que disse, de Deputada leiriense. Não! Usei aqui Leiria»
A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): — Mal! Usou mal!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — » como um exemplo daquilo que ç a correcção dos critérios da Lei das Finanças Locais, e usei-o em termos gerais, da avaliação que fazemos, como poderia usar outras regiões do País. Mas Leiria, de facto, é um bom exemplo, porque todos os municípios do Pinhal Interior crescem 5% pelo segundo ano, como cresce a generalidade dos municípios pequenos, pobres, dependentes do Orçamento do Estado e sem significativas receitas próprias.
Aliás, não vale a pena trazer aqui um outro debate, sobre a matéria do PIDDAC, mas o distrito de Leiria é também um dos bons exemplos da estratégia de investimento do Governo na zona sul, quer no que tem a ver com o Programa de Acção para o Oeste, quer no que se refere aos investimentos significativos, a começar pela ligação entre a A8 e a A1, em auto-estrada, na zona de Leiria, para não darmos aqui outros exemplos.
Bom! E se quisermos ir à questão do QREN, então, aqui, a diferença é fundamental, é abissal: os autarcas da região participam na gestão — o seu companheiro de partido, ex-Presidente da Câmara Municipal de Tomar, é gestor a tempo inteiro do Programa Operacional da Região Centro — e os municípios do Pinhal Interior vão, pela primeira vez, gerir um montante extremamente significativo, que corresponde a cerca de 30%, do Programa Operacional regional, na parcela que tem a ver com a proporção da população do Pinhal Interior.
Isto nunca aconteceu nos quadros comunitários anteriores, vai acontecer com o QREN e com os municípios do interior de Leiria.
Na segunda questão que colocou, falou de contratos-programa e de critérios partidários. Não decidi qualquer contrato-programa em 2008, os últimos foram decididos no final de 2007, foram objecto de publicação no Diário da República de 3 de Abril de 2008, correspondem a sete municípios, de Águeda a Santiago do Cacém, que foram apoiados com base em critérios objectivos, face de situações de destruição de equipamentos municipais. Foi este o critério objectivo! Não foi decidido qualquer apoio deste tipo em 2008 e não será em 2009, salvo se situações excepcionais, semelhantes a esta, se vierem a verificar em algum caso.
Há uma questão que foi suscitada tanto pela Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro como pelo Sr. Deputado Honório Novo. Há uma redução na afectação de verbas ao funcionamento de estruturas de apoio aos municípios que eram anteriormente canalizadas para os gabinetes de apoio técnico e, em parte, para a direcção-geral. Há uma redução global nessas transferências, com o aumento, é verdade, da parcela afecta à direcção-geral, não é ao meu gabinete, não é a este Secretário de Estado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — De quanto?! Diga de quanto é esse aumento! É de cinco vezes!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Mas, se a quiserem eliminar, estou inteiramente de acordo. Agora, provavelmente, teremos de começar a aplicar taxas por serviços, que são inteiramente prestados de forma gratuita, e são serviços relevantes de apoio aos municípios, designadamente
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pareceres jurídicos e informações várias, por uma direcção-geral que, ao contrário do que sucede com muitos outros departamentos públicos, não cobra qualquer valor por esse apoio aos municípios em pareceres jurídicos, em consultadoria vária, na criação de um sistema de apoio ao licenciamento municipal desmaterializado, a que correspondeu um significativo investimento em 2008, o qual será completado em 2009, numa aposta do Simplex, porque será concretizada a possibilidade de declarações de utilidade pública por via electrónica. Isto é, temos aqui um mecanismo que, globalmente, pode ser equacionado como algo financiado pelo Orçamento do Estado, mas, se houver alguma dúvida sobre a finalidade desse apoio, poderá, por decisão dos Srs. Deputados, ser retirado. Bom, mas, se isto acontecer, teremos de financiar esta actividade de uma outra forma.
O Sr. Deputado Pedro Farmhouse falou da evolução dos impostos locais e devo dizer que, nos últimos anos, na generalidade dos impostos locais, ela foi extremamente significativa. Foi uma evolução próxima de 10%, em 2006, no IMI e no IMT, em 2007, ultrapassou os 25% e já referi os dados correspondentes ao 1.º semestre de 2008: crescimento do IMI de 10%, decréscimo do IMT de 5%. Prevejo que o IMI continue a crescer em 2009, apesar do novo limite que foi estabelecido. Cabe aos municípios impedirem esse crescimento, se, porventura, decidirem, no âmbito da sua autonomia, baixar as respectivas taxas.
Quanto à acção social e à saúde, questões complementares, o aspecto fundamental é pôr a funcionar os novos órgãos de gestão dos agrupamentos complementares de saúde. Na saúde, este é o grande desafio, porque significa acabar com as sub-regiões de saúde e criar mecanismos efectivos de gestão participada de conjuntos de centros de saúde.
No âmbito da acção social, responderei autonomamente a uma questão que foi colocada. Está a ser discutida com a ANMP uma intervenção acrescida dos municípios nos apoios sociais às situações de pobreza extrema, porque admito que a proximidade permite uma melhor avaliação dos mecanismos e dos apoios necessários às famílias. Mas isto também tem a ver com a criação da carta social municipal, que é relevante.
Não teremos uma efectiva intervenção do município na área social, enquanto o município não tiver um instrumento, negociado com o Estado, que defina, num horizonte de 10 anos, da creche ao centro de dia, quais são os equipamentos necessários e, face aos indicadores existentes, quer europeus quer nacionais, quais os objectivos a prosseguir.
Sr. Deputado António Carlos Monteiro, não concordo com a sua leitura, embora seja legítima, relativamente à dependência do imobiliário. Os municípios que carecem de significativo apoio têm tido significativo aumento de transferências, e continuarão a tê-lo — é esta a nossa expectativa.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Está enganado!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Já vou, Sr. Deputado Honório Novo, à minha limitada capacidade de oráculo mas provada capacidade de prever melhor do que o seu partido ou mesmo do que o Sr. Deputado, relativamente a estes três anos. Isto dá-me capital para dizer, relativamente aos anos seguintes, o que vai acontecer.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Está enganado!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — Os municípios que apostaram no imobiliário são os tais, eu diria, fiscalmente ricos e que, este ano, são 10. Têm um corte nas suas transferências?! Provavelmente continuarão a tê-lo, sujeitos ao estabilizador de redução máxima de 5%.
As transferências incorporam a redução de despesa na Administração central. Vai ser assim na educação, isto é, relativamente ao que está no orçamento do Ministério da Educação, e quanto aos municípios que celebraram contratos de execução — e celebraram porque o quiseram, porque a ANMP quis este modelo e disse que não existiam condições para uma transferência universal, porque cada município queria, neste primeiro ano, saber, com rigor, o que estava em causa no seu município e não ter um bolo global definido pelo Governo e aprovado pela Assembleia da República — , no futuro, o que haverá é uma estabilização definitiva, no orçamento municipal, destas transferências.
Quanto à questão do endividamento, não se trata de um endividamento mais liberal mas de assumir aquilo que está em causa e que vinha da Lei das Finanças Locais. Ou seja, apenas poderá haver recurso ao
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endividamento para assegurar a contrapartida municipal de projectos com apoio comunitário e para reabilitação urbana, mas não haverá para outras matérias. Portanto, não há qualquer liberalização nesta matéria.
Relativamente à contratação de pessoal, Srs. Deputados, o que se passa é uma coisa muito simples: os municípios tiveram uma fase em que tinham uma grande concentração de investimento, fase, esta, que, felizmente, em larga medida, está resolvida. Ora, se transferirmos 36 000 funcionários não docentes e se, no futuro, como sucede em muitos países da União Europeia, transferirmos os professores para o universo municipal, isto significa que a parcela de despesa corrente no orçamento municipal»
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Isso é o contrário daquilo que se quer para a Administração Pública!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — » cresce significativamente, sem qualquer aumento de despesa pública, mas com uma eficácia de gestão.
A reorganização de freguesias está associada à redefinição do universo das freguesias.
Perguntou-me sobre o IMI dos edifícios públicos desocupados. É de toda a justiça que o Estado pague.
Portanto, devem ser identificados esses imóveis.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Diga lá a sua maioria para votarem a nossa proposta para ver se isso deixa de ser conversa!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — No que respeita ao Fundo de Emergência Municipal, o que tem é uma autorização legislativa que define as finalidades. Haverá condições para que esse diploma seja aprovado ao longo do ano de 2009.
O Sr. Deputado Honório Novo perguntou-me qual era a evolução das receitas fiscais para 2015 ou para 2020. Não faço demagogia, o seu partido é que fez demagogia quando disse que 2009 iria ser o ano terrível.
Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.
Está em todas as declarações, está nas actas dos debates orçamentais: «Ah!, não é em 2008! Mas em 2009 é que vai ser! Vão perder 30% ou 40%!». Não perdem, quase todos ganham mais 5%.
O que posso dizer, considerando o funcionamento de um mecanismo que tem estabilizadores automáticos e que tem a ver com as receitas de IRS, IRC e IVA, é que em 2010, 2011 e 2012 a esmagadora maioria dos municípios, todos aqueles que têm uma participação nos impostos locais inferior a 75% da média nacional, continuará a crescer previsivelmente 5%. É isto que os elementos hoje disponíveis permitem avançar, eu diria que para pelos menos metade ou até mais da próxima legislatura, com o tipo de abordagem que em 2006 era possível fazer até 2009 e que hoje, face à experiência existente, é possível fazer até 2011/2012. Bom, é esta a garantia. Cá estaremos para ver, independentemente das funções que o Sr. Deputado ou eu próprio desempenhemos em 2011/2012. São estes os verdadeiros estabilizadores que já hoje existem na lei.
No que respeita às áreas metropolitanas e às associações de municípios, não respondi, de facto, e peço desculpa por isso. Mas é dado cumprimento àquilo que está na lei das associações de municípios e na lei das áreas metropolitanas, nas quais se estabelece um quadro de referência para financiamento dessas entidades, definindo-se um modelo de variação correspondente à variação das transferências para os municípios. É isto que é feito.
Agora, não me venha dizer que ç assim» O Governo vai cumprir a lei, e cumpriu este ano. Isto ç, quando novos municípios integraram a Área Metropolitana do Porto isso reflectiu-se no crescimento de transferências para a mesma em 2008. Bom, não haverá alterações em 2009 nessa matéria.
Relativamente às associações de municípios, as que se constituírem como associações de fins gerais, de acordo com a lei das associações, terão direito a esta transferência. Bom, nas regiões do País em que isto não existir, de facto não será possível a realização dessa transferência.
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O Governo cumprirá a lei, quer a lei orçamental, que prevê um crescimento correspondente ao crescimento das transferências para os municípios, quer a lei das associações de municípios, isto é, onde existirem as associações de municípios criadas nos termos da lei haverá lugar a essas transferências.
Sr.ª Deputada Alda Macedo, não há nenhuma discricionariedade. Não responderei, naturalmente, a matérias que assentam em conversas ditas privadas com o meu colega do Governo.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Mas a minha pergunta não era privada!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local: — A previsão, que me é indicada, é que não haverá perda de receita para os municípios, face até à própria evolução do imposto sobre o jogo.
Sr.ª Deputada Alda Macedo, não há nenhuma discricionariedade nos contratos de execução. Os contratos de execução foram celebrados em igualdade de circunstâncias, face à lei, e directamente, considerando a situação de cada município, exactamente porque os municípios aqui não quiseram a aplicação de critérios abstractos que, depois, recaíssem sobre eles.
Finalmente, respondo à última questão que levantou — de alguma forma já a antecipei — , que tem a ver com uma proposta que irá apresentar em sede de especialidade, pelo que percebo.
O Governo concorda, e está a discuti-lo com os municípios, com o alargamento da sua acção com a transferência de recursos do Estado relativamente a algumas áreas da acção social directa, designadamente no acompanhamento de situações de pobreza extrema. É uma das matérias que está em discussão com os municípios. Não concordamos que haja um alargamento do endividamento municipal para financiamento de despesa corrente nesta matéria.
Agradeço a todos. Julgo que o debate prova que o que se discutiu há três anos veio dar razão ao Governo, veio provar que os municípios têm a maior transferência de sempre, que a Lei das Finanças Locais abriu caminho para a descentralização.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado, pelo contributo que deu para o esclarecimento destas matérias.
Muito obrigado, Srs. Deputados, pela participação viva e interessada no debate.
Está encerrada a reunião.
Eram 21 horas e 5 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.