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Terça-feira, 2 de Fevereiro de 2010 II Série-OE — Número 1

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 1 de Fevereiro de 2010

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto) declarou aberta a reunião às 10 horas e 17 minutos.
No âmbito da discussão prévia ao debate, na generalidade, das propostas de lei n.os 8/XI (1.ª) — Grandes Opções do Plano - Principais Linhas de Acção para 20102013 e 9/XI (1.ª) — Orçamento do Estado para 2010, o Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos) apresentou o Orçamento.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos) e dos Srs. Secretários de Estado Adjunto e do Orçamento (Emanuel Augusto Santos) e dos Assuntos Fiscais (Sérgio Vasques), os Srs. Deputados Duarte Pacheco (PSD), Victor Baptista (PS), Assunção Cristas (CDS-PP), José Gusmão (BE), Honório Novo (PCP), José de Matos Rosa (PSD), João Galamba (PS), Isabel Sequeira (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), Bruno Dias (PCP), Paulo Batista Santos e Cristóvão Crespo (PSD) e Afonso Candal (PS).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 14 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.

Eram 10 horas e 17 minutos.

Vamos dar início à primeira reunião sobre o Orçamento do Estado de 2010, que está prevista no artigo 206.º, n.º 6 do Regimento, com a presença do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, sendo que, como cabem, haverá uma outra reunião com o Sr. Ministro responsável pela área da segurança social, que é uma reunião aberta à participação de todos os Deputados.
Quero começar por cumprimentar todos, dar as boas-vindas aos Membros do Governo, em particular ao Sr.
Ministro de Estado e das Finanças, e fazer uma pequena observação em relação à forma como decorreu a última reunião desta Comissão na sala 4.
Manifestei aos serviços da Assembleia o meu desagrado pelo facto de não ter havido lugar para todos os Deputados e membros da comunicação social. Penso que é bom dizer isto, nesta sala, onde há muito espaço.
Na outra sala estávamos um pouco apertados, pelo que espero que não se repita a mesma situação.
Srs. Deputados, os tempos de que os Srs. Deputados dispõem são os constantes da grelha, que aprovámos na Comissão, e haverá, primeiro, uma intervenção do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, depois, uma primeira ronda de perguntas, com 8 minutos por grupo parlamentar, a respectiva resposta, ainda uma segunda ronda por grupo parlamentar, e uma possível terceira ronda, sendo que, se necessário, poderemos prolongar a reunião para a tarde.
Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começamos, hoje, a nossa discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2010. Trata-se de um orçamento que, sem dúvida, inicia uma Legislatura que se afigura difícil, mas que apresenta uma proposta de confiança aos agentes económicos, às famílias e às empresas.
Uma mensagem de confiança na recuperação da economia e na correcção das nossas finanças públicas.
Sem uma e sem outra, não teremos crescimento económico sustentado, não teremos, de novo, convergência, com os países mais desenvolvidos da União Europeia e não teremos sustentabilidade das políticas conducentes ao desenvolvimento económico e social do nosso país.
Para conquistar e manter esta confiança, quer em Portugal, quer internacionalmente, a política económica terá de se concentrar, neste e nos próximos anos, na promoção da competitividade e na recuperação da rota de consolidação das contas públicas.
É o que este orçamento inicia, com a urgência necessária.
Desde logo, é essencial promover a competitividade a curto prazo. Nesse sentido, a proposta do Orçamento do Estado para 2010 prevê medidas como: os programas e incentivos à internacionalização e à promoção das exportações; os incentivos fiscais à capitalização das pequenas e médias empresas através do mercado de capitais; as linhas de crédito para facilitar o financiamento às micro, pequenas e médias empresas; a possibilidade de compensação de dívidas tributárias com créditos não tributários; o apoio fiscal ao investimento; o reforço dos benefícios fiscais à criação de emprego, o enquadramento fiscal dos Business Angels, e à Investigação e Desenvolvimento (I&D); e também a exploração de novos mercados.
Apesar desse efeito esperado, serão mantidas, em 2010, as políticas activas de promoção do emprego, sendo que renovamos o programa Qualificação Emprego; reduzimos a taxa contributiva para empresas que contratem desempregados; promovemos o empreendedorismo e a integração profissional de beneficiários do rendimento social de inserção, entre várias medidas constantes da proposta em apreciação.
No sentido de contribuir para uma efectiva solidariedade social, o Governo continuará também a apoiar os cidadãos e famílias mais afectados pelos efeitos da crise económica e financeira, nomeadamente através do reforço da equidade fiscal, de novos investimentos em equipamentos sociais, como sejam as creches e lares, e do fomento da poupança interna.

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Para além da promoção da competitividade e do apoio ao emprego, é imperioso recuperar a rota de consolidação das contas públicas, num esforço efectivo e coordenado.
Assim sendo, já em 2010, no domínio das finanças públicas, é necessário assegurar a conciliação entre, por um lado, a manutenção da disponibilidade dos instrumentos de estímulo orçamental à recuperação da actividade económica e do emprego e, por outro lado, o início imediato de uma nova fase da consolidação orçamental, reduzindo, desde já, o défice público.
Esta conciliação exige contenção e rigor na despesa pública, nomeadamente no que respeita à política salarial, ao chamado phasing out das medidas anticrise ao longo de 2010, e à estabilidade fiscal, de modo a que os estabilizadores automáticos possam operar em pleno, agora no sentido inverso ao que operou durante 2009.
Algumas linhas de força da consolidação, através do controlo da despesa pública, passam pela forte contenção das despesas com pessoal, através do aumento salarial nulo e do reforço do controlo das admissões, pelo controlo da despesa do Serviço Nacional de Saúde e das prestações da segurança social e, em geral, pelo reforço do controlo do Ministro das Finanças relativamente à despesa corrente, aos investimentos e às parcerias público-privadas e concessões.
Passa pelo estabelecimento das portagens já previstas nas SCUT e o estudo de novas portagens noutras SCUT, a par da revisão do regime de financiamento da Estradas de Portugal, num contexto em que a infraestrutura rodoviária nacional está em fase de conclusão.
Numa perspectiva de médio e longo prazo, a actuação no domínio das finanças públicas visa assegurar o cumprimento dos compromissos de Portugal, no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento, nomeadamente corrigindo a situação de défice excessivo até 2013.
Está já em preparação o novo Programa de Estabilidade e Crescimento 2010‐ 2013, que conterá a trajectória e as medidas concretas previstas para chegarmos a 2013 com o défice excessivo resolvido.
Alguns exemplos de medidas já previstas nesta proposta do Orçamento do Estado contemplam: a aceleração da convergência do regime de pensões da Caixa Geral de Aposentações relativamente ao regime geral da segurança social, contribuindo para melhorar a sustentabilidade de médio e longo prazo do sistema de pensões; a melhoria e reforço do quadro orçamental, quer no que respeita à orçamentação, quer à execução e à monitorização, através da formulação de um enquadramento orçamental plurianual, que inclua regras de despesa e programação por objectivos; e o rigor na análise e selecção dos investimentos públicos e dos projectos em parceria público privada.
Um orçamento de confiança, portanto. Já está em preparação, um exigente Programa de Estabilidade e Crescimento, que terá de reforçar essa confiança na recuperação da competitividade e das finanças públicas.
Com o empenhamento de todos, com o rigor na escolha e no financiamento das políticas económicas e sociais, começando aqui mesmo na Assembleia da República, conseguiremos assegurar essa confiança aos agentes económicos nacionais e também aos agentes e mercados internacionais.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Segue-se a primeira ronda de perguntas, para o que tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Caros Colegas: Estamos a iniciar, hoje, uma maratona que, durante os próximos 40 dias nos vai levar a várias reuniões. Espero que todo o processo corra com normalidade.
Sr. Ministro, agradecendo, mais uma vez, a sua presença, permita-me que diga que o Orçamento que nos apresenta evidencia três características: a falta de rigor e transparência manifestada quer neste documento, quer noutros que apresentou à Assembleia da República; o fracasso do modelo de desenvolvimento económico da política orçamental prosseguida nos últimos cinco anos; e a inversão dos caminhos antes

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traçados, nomeadamente nas preocupações com o défice, com o endividamento do País e com os grandes investimentos públicos.
Quanto à falta de transparência e de rigor, é necessário reflectir sobre o valor do défice identificado para o ano de 2009. É importante lembrar que as previsões do Governo, ao longo do ano, foram sucessivamente revistas pelo próprio Governo. Eram 2,2% no Orçamento do Estado para 2009; 3,9% no primeiro orçamento rectificativo; 5,9% no relatório de orientação e da política orçamental; 8% aquando da aprovação do segundo orçamento rectificativo, a 11 de Dezembro; e 9,3% em Janeiro.
Já não é esconder a realidade por motivos eleitorais, é mais grave. Alguém acredita que o défice tenha agravado em 1,3% do PIB em apenas 20 dias?!... Ou o Sr. Ministro sabia já, no dia 11 de Dezembro, qual era a realidade e escondeu essa informação da Assembleia da República ou, então, algo de muito extraordinário aconteceu nos outros 15 dias e o Sr. Ministro deve-nos uma explicação! Para além disso, neste Orçamento, repete-se a manipulação da informação e a ausência de explicações que já tinham caracterizado os orçamentos anteriores. Há n exemplos que podem ser dados, mas vou referir apenas alguns: um, comparar números de agregados, como as despesas com o pessoal ou as despesas correntes, assentes em bases metodológicas diferentes para dar a ideia de que a despesa está a diminuir, o que alguns espectadores menos atentos podem acreditar; o mesmo acontece com o número de funcionários do Estado ao não se referir o números dos colaboradores, por exemplo, dos hospitais empresa, que, como sabem, continuam a ser funcionários do Estado, mas que, ao saírem do Serviço Nacional de Saúde, fazem baixar artificialmente o número de funcionários públicos.
E que dizer dos valores que surgem em vários indicadores e agregados sem qualquer justificação?! Exemplos: o deflactor do produto, que está inflacionado; as receitas do IVA, que aumentam 3,6%, com um crescimento da actividade económica em 0,8%; as receitas do IRS, que crescem 1,1% quando temos uma estabilização do emprego; o aumento do limite do endividamento do Estado dos 15 000 milhões, aprovados no último orçamento rectificativo, para quase 17 500 milhões de euros, o que corresponde a um acréscimo de cerca de 16%. O que é que justifica isto? Ou ainda os encargos com as parcerias público-privadas, cujos valores, agora estimados, não apresentam qualquer justificação e são substancialmente diferentes dos apresentados em Junho último, baixando, por exemplo, os encargos em cerca de 48% em 2010. Como explica tudo isto, Sr. Ministro?! O segundo ponto que não queremos deixar de referir é o fracasso do modelo económico e da política orçamental dos últimos cinco anos Durante os últimos cinco anos, o Governo prosseguiu uma política orçamental que promoveu a redução do deficit essencialmente através do agravamento da carga fiscal sobre os portugueses.
Se compararmos os dados de 2004 com os de 2008, antes da crise internacional, esta situação é bem evidente, e, em consequência, o País cresceu menos do que a média europeia, a dívida pública aumentou e o rendimento per capita dos portugueses diminuiu.
Vejamos, Sr. Ministro, os anos de 2004 e de 2008: as receitas fiscais passaram de 22,7 para 24,5; as receitas correntes de 39,6 para 42,3; as despesas correntes de 42 para 43,2; a dívida pública de 58,3 para 66,3; e o rendimento por habitante baixou de 76,1 para 72,3.
Claro que a crise internacional só veio acentuar esta situação e, por isso mesmo, a trajectória errada só se veio a agravar, prevendo o FMI que o nosso processo de divergência face à União Europeia continue, pelo menos, até 2014. E, aliás, o próprio Governo português prevê que a dívida pública atinja, em 2010, 85,4% da riqueza, num contexto em que o endividamento externo ultrapassará os 100% do PIB.
É importante dizer que a crise internacional afecta a todos, mas uns apresentam indicadores bem mais simpáticos do que Portugal.
Porque, Sr. Ministro, nós podemos dizer que há países que têm um défice maior do que o de Portugal, como é o caso da Espanha, do Reino Unido, da Irlanda e da Grécia, mas deixe-me recordar que, no espaço da União Europeia, a Letónia, a França, a Roménia, a República Checa, a Polónia, a Eslovénia, a Eslovaca, a Bélgica, a Itália, a Holanda, Malta, a Áustria, a Hungria, o Chipre, a Alemanha, a Estónia, a Finlândia, o

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Luxemburgo, a Suécia, a Dinamarca, a Bulgária — e devem chegar para exemplo — têm, em 2009, um défice inferior ao português.
Aliás, mesmo quanto ao défice de 9,3%, é importante dizer que é o mais alto da nossa democracia. E, no ano passado, o Estado endividou-se ao impressionante ritmo de 1,75 milhões de euros por hora. Esta situação é insustentável!... E tinha sido possível evitá-la se outras opções tivessem sido tomadas, como, repetida e atempadamente, o PSD defendeu.
Inversão da rota, Sr. Ministro, é também uma característica deste Orçamento.
Na verdade, obrigado por uma conjuntura internacional adversa e pela colagem que tem sido feita à situação grega, o Governo viu-se forçado a inverter a rota orçamental prosseguida nos últimos cinco anos e, nestes termos, propõe-se reduzir em 1% o défice público em 2010, o que saudamos, embora continue a assentar 60% dessa descida no lado da receita.
É necessário aguardar pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento para o período 2010/2013, que o Governo se comprometeu a entregar na Assembleia da República antes da aprovação final do Orçamento, para confirmarmos essa mesma trajectória.
É igualmente importante que esta conjuntura externa tenha conseguido acordar o Governo para a realidade quanto à gravidade do endividamento externo do País, nomeadamente suspendendo, equacionando e adiando investimentos públicos megalómanos, que, podendo alguns ser necessários, não se enquadravam na realidade financeira do País.
Saudamos o Governo por esta evolução verificada nos documentos que nos enviou e nas palavras do Sr.
Ministro de Estado e das Finanças recentemente publicadas na comunicação social e que eu gostaria de citar.
Sobre as concessões rodoviárias, disse o Sr. Ministro: «Não vemos necessidade de lançar novas iniciativas»; «é preciso ajustar o esforço de investimento»; «a existência deste quadro orçamental obriga a ter opções claras de definições de prioridades»; «dado o enquadramento orçamental temos de ser mais selectivos e criteriosos nas escolhas que fazemos«» Bem-vindo, Sr. Ministro! Sempre o dissemos, os senhores é sempre o negaram.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já excedeu em 1 minuto o seu tempo. Peço-lhe que termine.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, se me der licença, estou mesmo a terminar.
De igual modo, os mecanismos propostos para controlar as parcerias público-privadas parecem bem intencionados. E questiono já o Sr. Ministro de Estado e das Finanças se está disponível para aceitar uma proposta, que o PSD já apresentou no passado, fixando um tecto, um limite, para os encargos a assumir pelo Estado no âmbito das parcerias público-privadas.
Face ao exposto, Sr. Presidente e Sr. Ministro de Estado e das Finanças, estão claras as nossas justificadas dúvidas quanto ao rigor do Orçamento que nos apresenta e a nossa crítica ao modelo económico e de política orçamental prosseguido nos últimos cinco anos, que conduziram à estagnação e ao endividamento do País.
Mas a vontade de realizar uma consolidação orçamental assente na contenção da despesa e de estabelecer prioridades quanto ao investimento público merecem a nossa concordância.
Este é mais um contributo que o PSD está a dar para que o interesse nacional seja salvaguardado e para que Portugal não receba severas sanções dos mercados internacionais, as quais provocariam graves consequências para as famílias e para as empresas, que são, afinal, o alvo da nossa maior atenção.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Duarte Pacheco, gostaria de responder às questões que foram suscitadas pelo Sr. Deputado, começando pelas questões que têm a ver com a falta de rigor e transparência.

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Em primeiro lugar, chamo a atenção do Sr. Deputado para o facto de que se há área na qual o País progrediu de forma significativa e internacionalmente reconhecida foi na melhoria da informação que tem vindo a ser prestada, quer interna, quer internacionalmente, no domínio da execução fiscal. O próprio Eurostat reconhece isso, e não é por acaso que, nos últimos anos, o reportes que têm vindo a ser feitos pelo INE têm sido reportes que não têm suscitado reparos ou correcções por parte do Eurostat, que, explicitamente, reconheceu a qualidade da informação.
Quanto à questão das previsões, e apenas a título de enquadramento, gostaria de chamar a atenção do Sr. Deputado para o que se passou um pouco por todo o lado.
Por exemplo, quando, nos finais de 2008, estávamos a elaborar o Orçamento para 2009, a previsão da Comissão Europeia para o saldo orçamental da União Europeia era de um défice de 2,3% e a última estimativa é de 6,9%; a Alemanha, nessa altura, tinha uma previsão de um défice de 0,2% e a última é de 3,4%; a Espanha tinha uma previsão de um défice orçamental de 2,9%, a meio do ano era de 9,5% e, ainda há dois dias, a ministra anunciou um défice de 11,4%; a França tinha uma previsão de um défice de 3,5% e a última previsão aponta para 8,3%.
O mesmo se diga quanto às estimativas e às previsões referentes ao crescimento económico. Eu recordo que, inicialmente, previa-se na zona Euro, para 2009, um crescimento positivo de 0,1% e a última previsão é um crescimento negativo de 4%. Previam também, na altura, que Portugal, em 2009, pudesse crescer 0,1%, mas baixámos 2,6%. E poderia continuar a dar-lhe vários exemplos, Sr. Deputado, em como as previsões, de facto, falharam redondamente em todo o lado. E não foi porque houvesse o intuito de enganar fosse quem fosse.
Em boa verdade, as circunstâncias, a incerteza e os eventos com que fomos confrontados ao longo de 2009 foram característicos de uma realidade que mudou, de forma muito significativa, para além do expectável, obrigando a sucessivas correcções das previsões.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E em Dezembro?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu já respondo, Sr. Deputado. Tenha calma! Eu ouvi-o com paciência. Também irei dar essa informação ao Sr. Deputado.
Quando o Governo apresentou o orçamento rectificativo para apreciação da Assembleia, a informação disponível na altura era uma informação na qual os saldos, por exemplo, do Estado, da segurança social e dos fundos e serviços autónomos, eram negativos em 9700 milhões de euros. Estes eram os saldos que tínhamos nessa altura e com os quais fizemos as projecções.
O saldo em Dezembro, que foi conhecido a 20 de Janeiro deste ano, no Boletim Informativo de Execução Orçamental, da Direcção-Geral do Orçamento, é de 13 295 milhões de euros negativos. Tivemos um agravamento nestes saldos da ordem dos 3500 milhões de euros entre Outubro e Dezembro. E daí, Sr. Deputado, que, na altura do Orçamento rectificativo, quando se falava num défice que estaria acima dos 8% — recordo ao Sr. Deputado que eu não avancei com qualquer estimativa do défice e, quando fui questionado sobre isso, disse que não tinha uma actualização da estimativa do défice e que ela seria feita na apresentação da proposta de Orçamento para 2010 —, recordei que, na altura, a estimativa mais recente era a da Comissão Europeia, mas tive o cuidado de chamar a atenção que só o subsector Estado, em contas públicas, já apresentava um défice da ordem dos 8,5%. Chamei a atenção para isso, Sr. Deputado. Isto foi o que se passou de facto, Sr. Deputado. Nós, no fim do ano, fomos confrontados» Vou dar-lhe um exemplo: se olhar para o relatório que acompanha o Orçamento rectificativo que discutimos no fim do ano, o Sr. Deputado verá que tinha uma previsão de queda da receita fiscal, para o ano de 2009, de 13,2%. Se verificar no Boletim Informativo de Execução Orçamental de Janeiro, da Direcção-Geral do Orçamento constatamos que a queda da receita foi de 13,9% e não de 13,2% e 0,7 pontos percentuais representam mais de 265 milhões de euros de receita a menos.

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Como o Sr. Deputado saberá, a receita fiscal, em contas nacionais, que conta para o apuramento do défice de 2009 é não só a receita até Dezembro mas também a receita dos meses de Janeiro e de Fevereiro, designadamente o IVA, que é imputada ao ano de 2009.
Ora, esta quebra mais acentuada da receita no final do ano faz com que a projecção da receita de Janeiro e de Fevereiro imputada a 2009 seja menor. Este efeito de carry over, como tecnicamente é chamado, é agravado. Nós, no fim do ano, só no que se refere ao subsector Estado, temos uma quebra de receita que representará cerca de 0,2 pontos percentuais do PIB, mas verificamos também na segurança social, por exemplo, um saldo inferior ao previsto.
Também verificamos, Sr. Deputado, que, por exemplo, no que se refere à Estradas de Portugal, tivemos, nos resultados finais, um défice, em contas nacionais, de cerca de 0,3 pontos percentuais do PIB superior ao esperado.
Constatamos também, por exemplo, que, nas autarquias e regiões onde esperávamos um défice de 0,2 pontos percentuais do PIB, em contas nacionais, ele é de 0,4 pontos percentuais do PIB.
Sr. Deputado, foram estes factos que, no apuramento feito em Janeiro, com informação actualizada e já referente à execução obtida em 2009, nos levaram ao défice de 9,3.
Afirmo aqui com muita sinceridade, Sr. Deputado: eu engano-me, mas não engano. Que me possa enganar, admito, mas não engano! E não engano deliberadamente. O que se passou foi que fomos confrontados na parte final do ano com estes resultados finais que obrigaram aos ajustamentos da grandeza que ilustrei.
No que se refere ao número de funcionários, o Sr. Deputado está muito enganado quanto à presunção em que assenta o seu comentário. Nós reportamos uma descida na ordem dos 72 830 funcionários. Destes funcionários, todos os que desempenham funções públicas que estão nos hospitais empresa estão contabilizados, ou seja, não estão subtraídos. Portanto, esta redução refere-se a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, onde quer que estejam, o que significa que não há aqui esse efeito dos hospitais empresa no número de funcionários.
Quanto à questão dos valores das parcerias público-privadas, há, de facto, alguns valores que são mais baixos, porque há uma recalendarização que está subjacente e, em particular nas obras públicas (e direi isto rapidamente, porque não tenho tempo para entrar em pormenores), comparando com os valores do ano passado, verifica-se que os encargos apresentados são líquidos das receitas de portagens que se espera receber, o que não sucedia no ano passado. Ora, isto tem impacto no montante e justifica em grande parte essa redução.
Quanto às comparações que o Sr. Deputado faz da despesa corrente entre 2004 e 2008, gostaria de chamar a sua atenção para o facto de que já em 2008 tivemos despesas correntes adicionais significativas com um conjunto de medidas anticrise. Lembro, por exemplo, o aumento extraordinário do abono de família e o reforço da acção social escolar, entre outras medidas, já com incidência orçamental em 2008 e que aumentaram a despesa corrente e a despesa corrente primária em 2008 por causa da crise. Portanto, não podemos entender que 2008 seja um ano que possa servir de comparação com 2004, porque ainda não foi afectado pela crise, uma vez que já temos efeitos dessa crise.
Para terminar, quanto à estratégia económica penso que seguimos uma estratégia correcta. A estratégia de combate à crise foi reconhecida na União Europeia como sendo correcta, ajustada e em linha com as recomendações e com resultados. Espera-se que a Europa caia 4 pontos percentuais, nós cairemos somente 2,6 pontos, pelo que a estratégia seguida deu resultados.
No que diz respeito à inversão da consolidação orçamental, Sr. Deputado, não há uma inversão da orientação do Governo na política orçamental e não há essa inversão por causa das agências de rating. Aliás, eu recordo ao Sr. Deputado — e convido-o a ver os comentários e o que foi dito na altura da discussão do Programa do Governo aqui na Assembleia da República, bem antes destas notícias sobre as agências de rating, a propósito das recomendações da Comissão Europeia para a nossa política orçamental — que eu

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referi, na altura, que tínhamos de começar, já em 2010, a consolidar e a intensificar esse esforço de consolidação nos anos seguintes.
Portanto, isto foi dito nessa altura, bem antes de todas estas notícias que agora têm caracterizado os últimos dias.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Terá com certeza oportunidade de voltar depois a alguns temas, se assim entender.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Baptista.

O Sr. Vítor Baptista (PS): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Ministro de Estado e das Finanças e os Srs. Secretários de Estado, fazendo, desde já, a observação seguinte: há quem veja neste orçamento apenas defeitos quando, naturalmente, o orçamento tem muitas virtudes.
O certo é que não ouvi, da parte do PSD, a referência a qualquer virtude. Fiquei surpreendido, sobretudo, com a afirmação de que a política económica do Governo era errada e absurda.

Vozes do PSD: — E de que maneira!

O Sr. Vítor Baptista (PS): — Digo isto porque, se bem me recordo, em finais de 2007, em Nova Iorque, o economista Miguel Frasquilho, num encontro de investidores, fez uma afirmação que a comunicação social relatou. Referindo-se à economia portuguesa, disse que havia uma grande dinamização e transformação da estrutura da economia portuguesa.
Ora, o Sr. Deputado Miguel Frasquilho viu virtudes em Dezembro de 2007, mas, pelos vistos, isso não é reconhecido pela sua bancada parlamentar» Certo ç que a política económica do Governo em 2008 não foi diferente da política económica em 2006 e em 2007.
Penso que é importante fazer esta referência, porque teima-se e insiste-se em não distinguir a evolução da economia portuguesa num determinado momento em que é confrontada com uma crise internacional e pretende-se confundir tudo, misturar tudo.
E é curioso que esta referência em 2007 até coincide com um momento difícil da economia mundial, uma vez que foi em 2007 que se deu o dito choque petrolífero, mas, apesar disso, a economia portuguesa resistiu bem.
Portanto, o problema não está na política económica; o problema esteve na economia internacional e é evidente que, até finais de 2007 e ainda uma parte de 2008, tivemos crescimento na ordem dos 2%.
Quando hoje se fala na taxa de desemprego, é espantoso a forma como esta matéria é abordada, porque, em tempo de crise nacional, numa altura em que não existia crise internacional, num governo do PSD a taxa passou de 4,3% para 7,6%. Nós temos memória, e também não nos esquecemos disso.
Bom, mas é evidente que temos de falar do futuro e é o futuro que importa.
Estamos perante um orçamento que eu diria que é o orçamento possível. Trata-se de um orçamento que tem um conjunto de iniciativas que revelam preocupação pela economia portuguesa e pelas empresas, mas que, ao mesmo tempo, é um orçamento de rigor, revelando disciplina orçamental.
É relevante a cativação de 12,5% das despesas afectas ao capítulo 50, excepcionando as questões de estudos, pareceres e projectos de consultadoria. Porquê? Evidentemente devido aos investimentos do QREN.
É relevante a cativação de 2,5% das despesas correntes dos serviços e organismos da administração central, exceptuando o Serviço Nacional de Saúde.
É relevante a cativação de 40% das dotações iniciais para estudos, pareceres, projectos e consultadoria dos serviços integrados, serviços e fundos autónomos e ainda 25% das deslocações e estadias. Estas são, claramente, medidas de precaução e de acompanhamento.
Refiro ainda a cativação de 1,5% das dotações de remunerações certas e permanentes e abonos variáveis ou eventuais dos orçamentos integrados e fundos autónomos com suporte da regra prevista no n.º 1 do artigo

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20.º – e aqui, Sr. Ministro, penso que há um lapso no texto, pois creio que não se trata do n.º 1 do artigo 20.º mas, sim, do n.º 1 do artigo 21.º.
Gostaria de referir que, como todos sabemos, o Estado tem um vasto património, sendo relevante a intenção de modernizar e alienar os edifícios que constituem esse mesmo património, permitindo aos municípios a possibilidade de utilizarem o direito de preferência. Realçamos o facto de que, nestas vendas, 50% é receita do Estado e que isso permite a redução da dívida pública, salvaguardo a questão da defesa, da justiça e da administração interna, em que se permite a remodelação.
Um outro aspecto importante para as famílias portuguesas na área do arrendamento é o que diz respeito à transferência do património habitacional do Estado no que se refere ao arrendamento público para as empresas municipais, instituições particulares de solidariedade social ou pessoas colectivas de utilidade pública. Aqui, numa fase posterior e mediante um acordo a subscrever, os bens poderão ser alienados aos próprios arrendatários, sendo que a renda continuará num regime de renda apoiada. Isto é relevante para muitas famílias que há muitos anos têm o seu arrendamento e que podem agora sonhar com a aquisição dos imóveis, havendo a faculdade de este parque habitacional poder ser transferido desde as tais empresas municipais às instituições particulares sem fins lucrativos.
Quanto ao emprego na função pública, independentemente da relação jurídica do emprego público, é bom que os trabalhadores possam inscrever-se na ADSE. Este Orçamento consagra essa matéria, mantendo a manutenção da regra de uma admissão por cada duas saídas.
No que diz respeito ao endividamento municipal, os limites de endividamento preocupam-se com a excepção das operações associadas a operações de requalificação urbana e aquisição de fogos, sendo que nos distritos de Leiria, Lisboa e Santarém, há uma preocupação com os acontecimentos e a excepção dos financiamentos relativos à reposição das infra-estruturas e equipamentos municipais.
Há também uma preocupação quando à recuperação de créditos das empresas e é relevante e deve ser realçada a possibilidade de operações de redefinição das condições de pagamento de dívidas no caso em que os devedores se proponham pagar a pronto ou a prestações. Há a possibilidade de regularização destas dívidas e também a possibilidade, por parte do Estado, de converter uma parte destes créditos em capital social das empresas quando as mesmas estão em processo de recuperação. É um passo importante para ajudar as pequenas e médias empresas.
Em relação ao BPN, há uma preocupação neste orçamento no caso de substituição do beneficiário da garantia que o Estado já prestou. Permite-se a sua transferência, reduzindo a exposição do próprio Estado e há um limite para a concessão de garantias, que se mantém neste orçamento.
Na possibilidade de garantias pessoais extraordinárias do Estado ao financiamento da liquidez da economia tenho uma dúvida, Sr. Ministro, que precisa de uma ligeira explicação, porque, nos artigos 72.º e 73.º, temos o mesmo montante, ou seja, num lado fala-se em garantias e no outro fala-se em reforço de liquidez.
Quanto ao problema que existe na sociedade portuguesa e que muitas vezes vemos na comunicação social em relação ao BPP este Orçamento dá resposta a uma parte do mesmo ao assumir garantir aos titulares das contas de retorno absoluto de investimento indirecto garantido que sejam participantes do fundo especial de investimento, que venha a ser constituído para a recuperação das respectivas aplicações, recuperarem 250 000 euros por titular de conta.
Relativamente às necessidades de financiamento das regiões autónomas pretende-se o endividamento líquido zero, esclarecendo-se a forma do seu cálculo de acordo com o SEC 95.
Quanto à compensação de dívidas fiscais com créditos não tributários por iniciativa dos contribuintes – e há muito que todos desejariam que isto fosse resolvido – passa a haver a possibilidade para um contribuinte que tenha dívidas de poder ceder créditos que não sejam créditos fiscais, por exemplo, créditos sobre terceiros, sobre empresas, desde que os mesmos sejam certos, líquidos e exigíveis, e ainda se incluem as dívidas do Estado para fazerem a compensação com a dívida fiscal.

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Há, ainda, uma medida de repatriamento de capitais que permite o retorno a território português de valores de depósitos, valores mobiliários, mediante o pagamento de uma taxa.
Portanto, há um conjunto de medidas que estão adequadas aos problemas de hoje, de resolução dos problemas da economia.
Termino com duas questões, Sr. Ministro, realçando o orçamento por programas, sendo que a pergunta vai no sentido de saber se este Orçamento por programas não é fundamental para a consolidação das contas públicas. É que, que me recorde, é a primeira vez que é apresentado, nesta Assembleia da República, um orçamento por programas mais exaustivo e que penso ter subjacente uma preocupação de consolidação das contas.
Quanto à criação de uma unidade de acompanhamento das parcerias público-privadas, que tantas vezes são suscitadas, como já hoje aconteceu, aquilo que pergunto ao Sr. Ministro é qual o objectivo da criação desta unidade de acompanhamento e se isso não é também relevante, do ponto de vista do equilíbrio das contas públicas, a médio e longo prazo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Baptista, começo por comentar alguns aspectos que referiu na sua intervenção relativamente à situação económica e à forma como a nossa economia tem vindo a evoluir ao longo dos últimos quatro ou cinco anos.
Com efeito, após um período de estagnação que caracterizou a nossa economia, tivemos uma recuperação gradual do crescimento, que se verificou nos anos de 2006 e 2007 — atingimos taxas de crescimento próximas dos 2% —, mas este processo, como sabemos, foi interrompido pela crise económica e financeira e pelas consequências que teve, já que inverteu aquele movimento e levou a que Portugal, como muitos outros países no mundo e em particular na Europa, apresentasse uma recessão no ano de 2009. Temos, com certeza, de retomar o caminho de recuperação, e é nisso que estamos empenhados.
O Sr. Deputado Duarte Pacheco, há pouco, referiu-se à estagnação e ao endividamento da economia, mas isso não são problemas de agora, são problemas crónicos, pelo que, neste domínio, temos de reconhecer que os sucessivos governos, incluindo os Governos do PSD e CDS-PP, não foram capazes de resolver as questões associadas a esse perfil de estagnação económica e de crescente endividamento do País, os quais têm a ver com problemas mais estruturais de falta de competitividade, que se traduzem em fraco crescimento e em agravamento do endividamento externo.
Aliás, o PSD aponta para este problema, e não quero dizer que faz mal em apontar para ele, mas entendo é que faz mal em querer dar a entender que é o Governo do PS o único responsável. Não! Sr. Deputado Duarte Pacheco, sejamos um pouco mais responsáveis e assumamos, todos nós, as nossas responsabilidades por este registo da nossa economia, que me parece ter a ver com todos.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Mas vocês têm de assumir a vossa responsabilidade!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Com certeza! Não tenho qualquer pejo em assumir a minha quota-parte, mas também gostaria de ver essa frontalidade da parte de VV. Ex.as, assumindo a vossa e não disfarçando, querendo dar a entender que nada têm a ver com isso. Se assumirem também a vossa quotaparte, estaremos, com certeza, todos de acordo.
Portanto, reconhecemos que, de facto, temos aqui dois desafios importantes – aliás, essa é uma das nossas preocupações, conforme procurei realçar na minha intervenção inicial, ao referir a necessidade de vencermos o desafio da competitividade.
Sr. Deputado Vítor Baptista, com efeito, temos uma estratégia de consolidação orçamental, que já iniciámos este ano, com um enfoque muito particular em medidas de contenção da despesa, como aquelas

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que referiu, nomeadamente a das cativações, a da regra «2 por 1», etc., e também em medidas de racionalização da gestão que passam pelo imobiliário.
O Sr. Deputado referiu a questão do imobiliário e gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados para uma mudança que tem vindo a ser feita na gestão do imobiliário e que começa a dar resultados que me parecem interessantes.
Nós introduzimos o princípio do pagamento de renda pela utilização do espaço e o universo dos serviços que pagam renda pelo espaço que ocupam tem vindo a crescer. Há, aliás, uma coisa curiosa: se compararmos o número de metros quadrados ocupados por funcionário no universo dos serviços que pagam renda com o do universo dos serviços que não pagam renda, constatamos que o número de metros quadrados, em média, por funcionário, na área que paga renda é de cerca de metade do do outro universo.
Ora, isto revela bem o impacto que a medida tem na racionalização do uso do espaço e numa melhor utilização do espaço. É um princípio que estamos a aplicar, porque, muitas vezes, as operações sobre o imobiliário visam, de facto, colocá-lo nas mãos de entidades que têm uma gestão imobiliária adequada, que são mais eficientes nessa gestão e que, através da cobrança de rendas, podem introduzir um factor de racionalidade que é benéfico e positivo.
O Sr. Deputado referiu também as questões do endividamento e, de facto, Sr. Deputado, temos de fazer um esforço para curvarmos o andamento da nossa dívida pública no PIB. O esforço tem de ser de todos, do Estado e também das autarquias e das regiões autónomas, conforme o preceito do endividamento zero que consta da proposta e que referiu, porque temos de imprimir, tão cedo quanto possível, uma trajectória de redução do peso da dívida pública.
Na verdade, as dívidas públicas dos vários países, por todo o mundo, inclusive na Europa, aumentaram o seu peso no PIB, em Portugal isso também aconteceu, mas gostaria de frisar o seguinte: apesar de, em Portugal, ter aumentado o peso da dívida pública no PIB, Portugal não está, depois de tudo isto, em termos relativos, isto é, em comparação com os seus parceiros, pior do que estava antes, uma vez que antes da crise tínhamos uma dívida pública no PIB abaixo da média da zona euro e depois da crise temos uma dívida pública abaixo da média da zona euro.
Está previsto que a dívida pública na zona euro atingirá, em 2010, os 86% ou 87% e, na previsão para 2009, estaria em 78% e nós fechámos o ano com 76,6%, ou seja, abaixo dos 78%. Mais: estes 78% são previsões, o nosso resultado já é um resultado final e os indicadores que temos são os de que os eventos efectivos em 2009 tenderão a fazer com que, de facto, a zona euro possa até situar-se acima daquela previsão, a qual tem já alguns meses.
Portanto, apesar de ter havido um agravamento da dívida, que tem a sua justificação nos efeitos da crise, como nos outros países, não agravámos mais do que os outros países.
O mesmo se diga quanto à variação ou agravamento do défice, em comparação com a zona euro, com a União Europeia, com os países da OCDE ou com as economias industrializadas. Creio que Portugal, neste domínio, não destoa, tendo sofrido as consequências da crise em linha com o que ocorreu naqueles conjuntos de países.
Relativamente à unidade de acompanhamento das parcerias público-privadas no Ministério das Finanças, de facto, esta concentração permite uma maior eficiência na condução dos processos e até, diria também, um rigor e coerência acrescidos na sua análise. Procedemos a uma reflexão profunda sobre um conjunto de critérios de avaliação quer do investimento, quer das concessões, a qual me parece ajudar, e muito, a estimar e apurar os impactos dos projectos de investimento e de parecerias público-privadas a todos os níveis, desde o emprego até ao reforço da competitividade, aos impactos orçamentais, etc. Penso, por isso, que temos uma valência acrescida com esta unidade.
Finalmente, quanto às instituições financeiras, conforme referiu, há disposições na lei de Orçamento que visam avançar com as soluções necessárias para resolvermos os dois casos pendentes, no âmbito do BPN e do BPP – alias, em particular no BPP, de acordo com informações vindas a público, a CMVM efectuará hoje o registo do fundo especial, haverá um período para os clientes do retorno absoluto aderirem a este fundo e, até

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ao fim de Março — é este o compromisso assumido no âmbito da solução que está a ser implementada —, estes clientes poderão recuperar parte do dinheiro que aplicaram, pondo, assim, em marcha a implementação de uma solução que urge e que há que compreender, porque é urgente que estas pessoas vejam atendidas as suas pretensões de reaver o máximo possível do dinheiro que aplicaram.
É evidente que este não é um problema criado pelo Estado, quem tinha o dinheiro não era o Estado, era a instituição, é um problema altamente complexo e, por isso, demorou tempo a resolver, mas também temos de compreender, obviamente, a situação das pessoas e de fazer com que possam reaver, rapidamente, pelo menos parte do seu dinheiro.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, em nome do CDS-PP, a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Sr.
Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: É um gosto poder debater neste espaço a proposta de Orçamento do Estado para este ano, que é um orçamento muito diferente do que seria se tivesse marcas do CDS, mas é um orçamento que vamos debater com vigor e com espírito construtivo, como, aliás, foi referido, quando o CDS anunciou o seu voto de abstenção na votação na generalidade do documento.
A intervenção do CDS será focada, neste primeiro dia, em questões macroeconómicas e será dividida entre mim e a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, sendo que eu, nesta primeira intervenção, vou tratar de quatro pontos gerais, colocando com duas questões prévias.
A primeira questão prévia é a seguinte: esta proposta de Orçamento do Estado, para quem a lê, hoje, soa a uma confissão pública. O Governo confessa agora aquilo que omitiu aos portugueses durante o ano passado e, muito particularmente, durante a campanha eleitoral.
Em meados de 2009, o CDS fez contas muito simples e sustentou, publicamente, que o défice andaria à volta dos 8,5%. Na altura, somámos ao défice do ano anterior, de 2,7%, o valor das receitas extraordinárias de 2008, que era de 1,1% do PIB, acrescemos a diminuição do saldo da Segurança Social, que era de 0,4%, e ainda 1% do aumento da despesa pública, assumido, então, pelo Governo.
Ora, isto já representava 5,2% do PIB. Bastou verificar que, no 1.º semestre, a receita fiscal caiu 20% para perceber que nunca se terminaria o ano sem que o défice entrasse na casa dos 8%.
Tenho, pois, de perguntar, novamente, e perante os dados assumidos neste Orçamento, por que razão não teve o Governo a frontalidade de assumir e de prestar toda esta informação aos portugueses. O Sr. Ministro já admitiu, no Plenário, que se tratou de um erro de previsão, pelo que gostaria de saber se assume, agora, que este Orçamento do Estado é uma confissão, ainda que tardia, do que já poderia ter dito aos portugueses há muito tempo e só não disse por razões puramente eleitorais.
A segunda questão prévia tem a ver com aquilo que já tive oportunidade de dizer ao Sr. Ministro: a única utilidade de cometer erros é aprender com eles. Esperávamos, pois, um Orçamento do Estado com grande rigor nas previsões; constatamos, no entanto, que os cenários macroeconómicos traçados pelo Governo, quando comparados, por exemplo, com as projecções recentemente divulgadas pelo Banco de Portugal, nos deixam preocupados.
O Governo prevê uma variação negativa do investimento em 1,1%, enquanto o Banco de Portugal a prevê em 3,4%; o Governo prevê um aumento das exportações em 3,5%, o Banco de Portugal prevê-o apenas em 1,7%; o Governo prevê um aumento das importações em 1,5% e o Banco de Portugal em 0,3%.
Então, concorda ou não, Sr. Ministro, que, em virtude dos recentes erros de previsão, há razões para estarmos preocupados quanto ao rigor dos dados agora apresentados pelo Governo? E pergunto-lhe se devemos acreditar mais no Governo ou no Banco de Portugal.
Passo, agora, às questões gerais.
Quanto ao crescimento económico, este Orçamento constrói-se sobre um défice de 9,3% – enfim, o Sr.
Ministro já explicou o que é que se terá passado no final do ano – e prevê um défice de 8,3%, para 2010.

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Ora, todos sabemos que só há duas maneiras de baixar o défice: reduzindo a despesa ou aumentando a receita. O Governo afirma repetidas vezes que o objectivo de reduzir o défice em 1% é alcançado exclusivamente por via da compressão da despesa, uma vez que sustenta que não há aumento da receita através do aumento dos impostos.
Mas, na verdade, há duas maneiras de aumentar a receita: aumentando ou cobrando mais impostos ou criando condições para gerar crescimento económico que permita arrecadar mais receita fiscal.
Ora, é precisamente no que toca ao crescimento económico, Sr. Ministro, que o presente Orçamento é muito falho, pois assenta no pressuposto único de que o crescimento económico se faz, essencialmente, à custa do investimento público e parece esquecer-se que o grande motor do crescimento e do emprego são as empresas privadas e que estimular essas empresas pode passar, precisamente, por aliviar a carga que o Estado exerce sobre elas, tal como pode passar por deixar mais rendimento disponível às famílias e às pessoas, sobretudo aquelas que têm uma maior propensão marginal para o consumo, o que pode ter um efeito indutor do crescimento.
Neste contexto, pode ser muito útil baixar, ainda que selectivamente, os impostos na convicção de que haverá retorno ao nível do crescimento da receita fiscal como consequência do crescimento da riqueza.
Pergunto-lhe, Sr. Ministro, se não considera que este Orçamento está a desperdiçar estes mecanismos muito úteis numa altura em que todas as ajudas são poucas para promover o crescimento económico e, logo, para favorecer a consolidação das contas públicas.
Provavelmente, o Sr. Ministro responderá, como pude ler no Relatório do Orçamento, por quatro vezes (nas páginas 24, 42, 51 e 53, se não me falhou alguma), que o investimento público é mais eficaz do que a baixa de impostos na promoção do crescimento económico.
Mas numa altura em que vemos o PIB de 2010 situar-se ao nível do PIB de 2007; em que vemos o crescimento de Portugal a divergir da média da União Europeia; e em que vemos os governos a lançar mão de todas as combinações de possíveis soluções (e lembro que ainda recentemente o Presidente dos Estados Unidos anunciou uma baixa de impostos), pergunto, Sr. Ministro, se um peremptório não a uma baixa selectiva dos impostos não é, no fundo, excessivamente ideológico.
Sr. Ministro, o que está no Orçamento do Estado, como, aliás, se viu no ano passado, não chega, na perspectiva do CDS, para garantir o crescimento económico.
O segundo ponto que quero referir é relativo à despesa e ao endividamento.
Para a riqueza crescer é preciso também que a despesa do Estado baixe. Ora, o Estado gasta hoje quase mais 21,5% do que as receitas que tem; em 2010 todos os impostos e contribuições recolhidos só chegam para pagar 91% de salários, juros e prestações sociais. Em 2009, a despesa ascendeu a 49,1% do PIB, em 2010 situar-se-á, previsivelmente, em 48,5%. Isto significa também que em dois anos a dívida pública subiu 19% e o Relatório do Orçamento do Estado, nas páginas 16 e 17, enuncia um conjunto de medidas para assegurar também a médio e a longo prazo a «estabilização do rácio da dívida pública no PIB».
Em primeiro lugar, gostaria que o Sr. Ministro, se pudesse, me esclarecesse sobre o que entende por «estabilização do rácio da dívida pública no PIB». Pretende o Governo que haja uma estabilização em que valor? Suponho que não seja nos actuais ou nos previsíveis 85,4% do PIB. Portanto, que valor está em mente para essa estabilização? Em segundo lugar, tenho que perguntar se crê que as medidas de controlo e diminuição da despesa enumeradas são suficientes para assegurar esse peso relativo da dívida.
A verdade é que a proposta de Orçamento do Estado tem sido muitíssimo criticada por ser tímida nos cortes da despesa.
A verdade é que, mesmo sem contar com o custo da Iniciativa para o Investimento e o Emprego, a despesa em 2009 cresceu 4,2% — página 135 do Relatório — e para 2010 prevê-se um aumento da despesa na ordem dos 2,7% — página 136 do Relatório.
Pergunto-lhe ainda, quanto à dívida pública, Sr. Ministro, o seguinte: se a dívida pública dentro do perímetro orçamental corresponde a 85,4% do PIB, quanto corresponderia se no perímetro orçamental

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estivessem também a Estradas de Portugal, hospitais, laboratórios do Estado, universidades, fundações e ainda diversas empresas públicas, nomeadamente nos sectores dos transportes.
O terceiro ponto é relativo ao investimento.
O Relatório do Orçamento do Estado sustenta uma grande fé nas suas vantagens, evidencia os benefícios do investimento de proximidade para a recuperação económica, os benefícios dos grandes investimentos como factores críticos para a competitividade do País, mas, por outro lado, cerca-se de cautelas no que diz respeito à avaliação dos projectos — e bem — e à necessidade de articulação dos mesmos com os objectivos de consolidação orçamental.
Sr. Ministro, compreendo bem as explicações dadas, os critérios de escolha e de hierarquização dos investimentos enunciados nas páginas 23 e seguintes. O que não compreendo e gostaria de compreender, Sr.
Ministro, se fosse possível, é a aplicação prática dessas orientações e desses critérios.
O que significa, por exemplo, que o TGV tem de se adaptar à realidade orçamental? Isso já foi aqui referido.
Lembro que na quinta-feira passada o Sr. Ministro aprovou, em Conselho de Ministros, a primeira concessão do TGV para o troço Poceirão-Caia. Na sexta-feira deu uma entrevista ao Expresso onde afirmou precisamente a necessidade de compaginar os projectos com o esforço de consolidação orçamental. E friso, como parece decorrer do Relatório do Orçamento do Estado, que a consolidação orçamental de que se fala aqui é a médio e a longo prazo, por isso também não colhe o argumento de que o TGV, em 2010, não terá qualquer impacto no Orçamento.
Por fim, no que respeita ao desemprego, a estimativa apresentada de 9,8% é optimista face à realidade.
Aliás, todos os dias há quem fale na passagem para os dois dígitos e os recentes números do Eurostat apontam para 10,4%. Penso que neste domínio o ponto mais relevante é perceber quando, na perspectiva do Governo, estará o País em condições de criar emprego.
Ainda na semana passada o Sr. Ministro disse numa entrevista televisiva que estava convencido de que com o crescimento de 1% já seria possível aumentar o emprego. Está o Sr. Ministro convencido desse número, quando o mínimo apontado pelos economistas é de 1,5% de crescimento e muitos só reconhecem a criação líquida de emprego acima de um crescimento de 2%? Acredita — e termino — o Sr. Ministro que o Programa que o Governo lançou para 2010, que é essencialmente igual ao que já tinha para 2009, vai conseguir produzir este ano o resultado de estancar a subida do desemprego, coisa que não conseguiu produzir no ano passado?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, relativamente à questão dos números, das previsões e dos valores que constam quanto aos resultados de 2009, creio que já dei esclarecimentos suficientes na altura em que respondi ao Sr. Deputado Duarte Pacheco sobre uma questão análoga.
Chamo a atenção da Sr.ª Deputada para o seguinte: a informação foi prestada mensalmente no âmbito dos boletins de execução orçamental da Direcção-Geral do Orçamento. Portanto, toda a informação quanto ao decorrer da execução orçamental, não só do Estado mas de outros subsectores, foi publicitada. Nada foi escondido, a informação encontrava-se aí.
Por outro lado, chamo a atenção da Sr.ª Deputada para a explicação que várias vezes dei quanto à situação da execução orçamental em meados do ano passado.
De facto, constatámos, no início do ano, uma quebra da receita superior a 20%, e isso teve a ver com o esforço muito significativo feito no ano passado, por parte da Administração fiscal, em acelerar os reembolsos, designadamente do IVA e do IRS, a par de algumas medidas pontuais, como foi a própria redução do IVA em um ponto percentual, que teve ainda impacto no andamento da receita fiscal no 1.º semestre do ano passado.

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Contudo, chegados ao mês de Maio, aproximadamente, começámos a constatar — e a informação reportada mensalmente permite fazê-lo — que a receita depois de ter batido no fundo, se me permite o termo, começou a recuperar e a melhorar gradualmente nos meses seguintes, denotando uma trajectória de recuperação que nos permitia projectar uma receita para o fim do ano em linha com aquilo que consta no Relatório de Orientação da Política Orçamental, que foi apresentado em Maio a esta Assembleia.
E foi relativamente a essa projecção que nós, de facto, fomos surpreendidos, pois constatámos que a previsão feita nessa altura não foi acertada em função dos desenvolvimentos posteriores; foi uma previsão que teve a falibilidade de muitas outras, como há pouco referi, por todo o mundo, inclusive as dos nossos parceiros, nos mais variados domínios.
Constatei no mês de Outubro, já no âmbito da elaboração do relatório da Direcção-Geral do Orçamento que foi publicado nesse mês quanto ao andamento da receita fiscal no mês de Setembro, que esse movimento de recuperação da receita, que verificámos durante os meses de Maio e seguintes, era interrompido em Setembro. E verificámos que em Outubro não se retomava de forma significativa a recuperação, o que nos alerta para esta realidade. Não vamos chegar ao fim do ano com a receita que projectámos em Maio passado, daí termos de imediato avançado com uma iniciativa que foi a de fazermos uma proposta de alteração ao Orçamento. Portanto, o orçamento rectificativo que foi apresentado no final do ano.
Mesmo em comparação com o próprio trabalho feito no âmbito desse orçamento rectificativo (já tive oportunidade de lhe mostrar), continuamos a ser surpreendidos mesmo na parte final do ano, até no âmbito da receita, com uma perda de receita que corresponderia a cerca de 0,2 pontos percentuais do PIB no seu impacto.
Portanto, reafirmo o que disse ao Sr. Deputado Duarte Pacheco: engano-me. Sim, admito. E admito que o ano de 2009 foi particularmente difícil em termos de previsões, quem teve que apresentar previsões nesse ano teve que correr o risco de se enganar. Corri esse risco e assumo-o. Contudo, daí a dizer-se que se andou a enganar penso que vai um passo muito grande, Sr.ª Deputada. E não foi esse o intuito, o de andar a enganar, mas estivemos, sim, perante uma realidade com grande nível de incerteza, com muitos imponderáveis que nos surpreenderam ao longo do ano. Logo, os números não são uma confissão, são tão-somente o reporte de resultados efectivos, de resultados observados.
Quanto ao cenário macroeconómico, Sr.ª Deputada, com certeza que as várias entidades têm metodologias e pressupostos diferentes na elaboração dos seus modelos. Temos um modelo de projecção para a economia no qual assentamos o nosso cenário macroeconómico que assenta num conjunto de pressupostos quanto à economia internacional, pressupostos esses que são comuns no âmbito da Zona Euro.
Portanto, há um entendimento entre os países da Zona Euro de que no âmbito destes exercícios de défices excessivos e de elaboração dos orçamentos usamos um conjunto de pressupostos comuns relativamente à envolvência externa. São esses os pressupostos que utilizamos no nosso modelo de projecção, que deu os resultados que deu.
Recordo à Sr.ª Deputada que, exceptuando o ano de 2009, que foi francamente anómalo, e em parte também o ano 2008 (ambos já afectados pela crise), se olhar para as previsões que fizemos em 2006/2007, tivemos erros de previsão muito diminutos usando como base este modelo. Tivemos quase sempre erros muito pequenos em cima daquilo que se observou. Portanto, o modelo, com exclusão destas circunstâncias excepcionais que marcaram a nossa vida económica mais recente, é adequado num quadro que diria de mais estabilidade.
É natural que este modelo dê resultados diferentes dos que dá o modelo usado pelo Banco de Portugal, pelo Fundo Monetário Internacional, pela Comissão Europeia ou por outra qualquer entidade. É natural, Sr.ª Deputada, não estranhemos isso. Mas não me pergunte, a mim, se deve acreditar no do Governo ou no do Banco de Portugal. Essa será uma escolha que competirá à Sr.ª Deputada fazer, não a mim, porque eu optarei pelo do Governo, como é óbvio, porque é aquele que apresento.
Pergunta: o défice reduz-se como? O défice reduz-se com o esforço de contenção e de redução da despesa, que é significativa, é patente em várias medidas. Mas, atenção, não exclusivamente! Quando digo

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isto, não quero dizer que seja só do lado da despesa. Não! Também contamos com o contributo da evolução de algumas receitas, mas o grosso da redução do défice tem a ver, de facto, com o esforço concentrado no lado da despesa.
Quanto à questão do investimento, Sr.ª Deputada, acredito muito na importância do investimento privado.
Penso que, sem a dinâmica do investimento privado, não há economia que tenha crescimento, que reforce a sua competitividade, etc. Mas temos de reconhecer que vivemos uma conjuntura onde o investimento privado teve uma contracção significativa, denota dificuldades em retomar um ritmo significativo que assegure uma rápida recuperação da economia e daí a necessidade do investimento público que possa suprir essa falta de dinamismo do investimento privado.
Quanto à importância dos impostos como estímulo à economia versus despesa, a Sr.ª Deputada fez-me uma pergunta para a qual já tem a resposta no próprio relatório. Portanto, esta não é uma questão de ideologia, ç de realismo. Sinceramente, não acredito» Entendo que o efeito de uma descida dos impostos não iria, na actual conjuntura, estimular o crescimento; iria, isso, sim, agravar ainda mais o défice! Quanto ao nível da dívida, quando falo em estabilizar — e é evidente que a dívida não vai começar a descer de imediato, ela tenderá, inclusive, a ter alguma progressão positiva durante algum tempo — é, de facto, no sentido de dar-lhe uma trajectória para, primeiro, parar o crescimento e, depois, inverter o seu andamento — e é isto que se pretende. As projecções quanto ao andamento da dívida estarão presentes no Programa de Estabilidade e Crescimento.
Quanto ao TGV, a questão que suscitou é respondida nos termos que referi nessa entrevista, isto é, tratase de um projecto que consideramos importante para o reforço da nossa competitividade e para melhorar a acessibilidade do País aos mercados internacionais, que são importantes para a nossa exportação, ou seja, ligarmo-nos às redes europeias, e é um esforço de investimento que tem de ser levado a cabo dentro, obviamente, do quadro orçamental que definimos — e, chamo também a atenção, não é só investimento público.
Quanto à taxa de desemprego de 10,4%, o que foi reportado ultimamente, é a taxa de desemprego num mês, é uma taxa mensal. Falo em 9,8% para a média de todo o ano. Isto quer dizer que temos uma taxa de desemprego que se situará em níveis dessa grandeza mas, à medida que a recuperação se vá consolidando, contamos que haja, na parte final do ano, uma quebra na taxa de desemprego, contamos que ela desça relativamente a estes valores iniciais e que a média, no ano, se situe nos 9,8%.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, antes de mais, um ponto prévio: o Bloco de Esquerda não ignora que, sobretudo num período turbulento como aquele que acabamos de atravessar, é difícil fazer previsões rigorosas em relação a uma matéria como a receita fiscal, que é profundamente influenciada pelo ciclo económico.
Porém, aquando da campanha eleitoral, o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro não avançaram com estimativas cautelosas ou, mesmo, com dúvidas sobre esta matéria. Não disseram: «Esperamos que o défice venha a ser de mais ou menos 6%, talvez um pouco mais. É muito difícil prever». As declarações que ouvimos durante a campanha eleitoral eram taxativas no sentido de um défice de 5,9%.
Portanto, tem de compreender a estranheza do Bloco de Esquerda e de outras forças políticas, porque o mesmo Governo, concretamente o mesmo responsável das Finanças, que, no mês de Dezembro de 2009, não queria arriscar um valor para o défice de 2009, tivesse avançado de forma tão categórica, quando esteve em campanha eleitoral, para outros valores. Não fazemos juízos de intenção, mas compreenda que este erro de análise e esta diferença de atitude e de nível de prudência entre a forma como se avançava com estimativas em Setembro e em Dezembro do mesmo ano — quando tudo indicaria que, no final do ano, seria possível ter estimativas mais rigorosas —, permite levantar toda a espécie de dúvidas e suspeitas.

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Quero ainda dizer que este Orçamento consagra um conjunto de escolhas políticas que o Bloco de Esquerda regista mas que não correspondem ao rumo que o Governo tinha anunciado na última campanha eleitoral. Penso que é um pouco à luz dessas escolhas políticas e daquelas que tinham sido anunciadas no período de campanha eleitoral que temos de analisar algumas estimativas.
Recentemente, o Eurostat divulgou uma taxa de desemprego, para Portugal, de 10,4% para Dezembro de 2009. A previsão do relatório do Orçamento do Estado para o final do ano 2010 é de 9,8%. Significa, portanto, que o Governo acredita que, com um crescimento de 0,7% ao longo do ano de 2010 vai ser possível reduzir o desemprego em 0,6 pontos percentuais. Isto não apenas desafia algumas regularidades, que têm vindo a ser estudadas ao nível da relação entre crescimento e criação de desemprego, como revela um optimismo que não tínhamos visto em momentos anteriores.
Tendo em conta que o relatório do Orçamento do Estado terá sido elaborado há algum tempo — e essas estimativas também —, gostaria de saber se o Governo mantém as suas previsões para o desemprego, ou seja, se acredita que, num contexto em que o próprio Governo espera que a economia cresça a 0,7%, é realista prever, no mesmo período, uma redução do desemprego em 0,6 pontos percentuais.
A segunda questão é relativa ao investimento público.
O investimento público era, de facto, uma questão estratégica no discurso do Partido Socialista durante a campanha. Aliás, foi dito, por várias vezes, que o Governo não tencionava retirar os estímulos ao relançamento da economia no ano de 2010. Inclusive, pode até registar que o Bloco de Esquerda considera que o investimento público, sobretudo num ciclo económico como aquele em que estamos, é muitíssimo mais eficaz no relançamento da economia do que políticas de redução de impostos e, sobretudo, de reduções mais ou menos indiscriminadas, como aquelas que a direita tem proposto. Portanto, na recusa dessas propostas, pode contar com o acordo do Bloco de Esquerda.
Já não pode contar com o acordo do Bloco de Esquerda no que diz respeito a uma política de contracção de investimento público, que é aquilo que iremos, efectivamente, observar ao longo do ano de 2010. Aliás, se o Sr. Ministro das Finanças nos pudesse dar alguns dados mais sólidos sobre essa matéria, gostaríamos de ter acesso a eles, porque os dados constantes do relatório do Orçamento do Estado sobre investimento público comparam valores executados com valores orçamentados, o que, muito particularmente em matéria de investimento, não nos permite ter uma noção muito concreta do montante da contracção do investimento público. Para além disso, existe ainda o facto de, sobre as despesas de investimento público, incidir uma significativa cativação, que também faz antever uma redução ainda maior.
À luz dos próprios argumentos que o Sr. Ministro das Finanças apresentou neste debate, respondendo sobre a questão do investimento público, e tendo em conta coisas que o Sr. Ministro das Finanças também já tinha dito sobre a importância de redinamizar a economia para que o crescimento económico, a criação de emprego e o aumento de receita fiscal pudessem ser um grande instrumento de combate ao défice — e nós concordamos com essa análise —, pergunto como explica esta opção em torno do investimento público para o ano 2010, quando ela parece tão incoerente com o discurso do Partido Socialista durante a campanha eleitoral e com o que parece ainda ser o discurso em torno das virtudes dessa opção estratégica.
Inserida nesta questão, queria também obter alguns esclarecimentos sobre o que esperaríamos que fosse — talvez seja, talvez não seja — uma profunda inversão na política deste Governo em relação às parcerias público-privadas.
Registámos que, no relatório do Orçamento do Estado, é dada conta da criação de uma Unidade que permita trabalhar de forma mais competente — e isso é, de facto, uma urgência, porque os interesses públicos têm sido muito mal defendidos nestas parcerias —, pelo menos, no acompanhamento destas parcerias, no futuro.
Também registámos que o Sr. Ministro das Finanças disse ao Expresso que, no que diz respeito a concessões para obras rodoviárias, o que estava feito estava feito e que não havia intenção de prosseguir essa política.

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Gostaria de saber se aquilo que disse em relação ao sector rodoviário se pode alargar a outras áreas onde têm sido celebradas parcerias público-privadas, ou seja, se há outras áreas em que estejam a pensar inverter esta política e travar este tipo de negócios, nomeadamente com particular destaque para a área da saúde, onde os resultados têm sido particularmente negativos e particularmente lesivos dos interesses do Estado e dos próprios utentes.
Digo isto porque — e esse é talvez um debate de fundo que a Assembleia terá de fazer — o Orçamento do Estado prevê mais de 700 milhões de encargos com parcerias público-privadas e, de acordo com dados da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, estão previstos, se não estou em erro, 48 000 milhões de euros até 2050. Esses dados não batem certo com os que constam do próprio Orçamento do Estado — é, aliás, uma questão para a qual a Unidade Técnica de Apoio Orçamental chama a atenção e estaríamos muito interessados em ouvir esclarecimentos do Ministro das Finanças. E isto porque não se trata de pequenas divergências de valor, são divergências muito significativas e gostávamos de saber o que o Ministro das Finanças tem a dizer e como explica, então, os dados da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças que, penso, é uma entidade de reconhecida idoneidade.
De qualquer forma, estes números mostram que é impossível discutir, por um lado, investimento público e, por outro, endividamento sem discutir a política de parcerias público-privadas, as quais têm sido utilizadas para, de alguma forma, evitar determinado tipo de constrangimentos orçamentais mas também têm consequências muito significativas no longo prazo. Actualmente, estamos a falar de, praticamente, 30% do PIB, já comprometido neste tipo de negócios e, de acordo com as várias auditorias que o Tribunal de Contas foi realizando, sabemos que têm sido executadas de forma particularmente despesista. Ou seja, hoje, não se pode falar de despesismo público sem falar das parcerias público-privadas, onde o interesse público tem sido sistematicamente lesado — e, mais uma vez, sublinho que falo com base em pareceres que o próprio Tribunal de Contas elaborou a este respeito. Se o Sr. Ministro das Finanças estiver em condições de dar algumas luzes sobre o que irá ser a orientação do Governo nesta matéria, nós gostaríamos de saber quais são.
Quero registar, finalmente, que, tendo sido um dos primeiros sinais da frágil retoma que observamos actualmente o aumento do consumo privado e tendo sido um ponto importante do discurso do Partido Socialista, ao longo da campanha eleitoral, a questão da redistribuição de rendimentos, da importância de uma política mais justa ao nível de rendimentos como uma forma de estímulo ao consumo, haja dados tão negativos do ponto de vista da actualização dos salários dos trabalhadores da função pública, em todos os níveis.
Gostaria de saber qual é a abertura do Ministro das Finanças para, em sede de negociação com os sindicatos, poder flexibilizar a posição do Governo, pelo menos, no que diz respeito aos trabalhadores com rendimentos mais baixos — e falo dos trabalhadores da Administração Pública, mas é evidente que, como sabemos, esta política terá as suas repercussões junto de todos os trabalhadores, inclusive do sector privado, onde estes dados e estes sinais do Governo não deixarão de ser interpretados e propagados.
Esta pergunta estende-se também, obviamente, à política de actualização das pensões, que será a mais reduzida de sempre.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Gusmão, mais uma vez, a sua e as demais bancadas, com a excepção da bancada do Partido Socialista, levantam a questão dos números quanto ao défice, sempre um pouco na ideia de que houve uma gestão eleitoral desses números.
Creio, no entanto, que já esclareci, nas respostas que tive oportunidade de dar, quer à bancada do PSD quer à bancada do PP, as condições em que as previsões tiveram de ser feitas e da forma como fomos sendo confrontados, ao longo do ano, com os resultados efectivos da execução orçamental neste domínio.
O historial está feito.

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Sr. Deputado, todos nós nos enganamos em previsões» Tambçm me recordo de que, na altura da campanha eleitoral, os vários partidos tinham projecções de resultados eleitorais bem mais optimistas do que aquelas que obtiveram. Foi o caso, por exemplo, do PSD e até do Bloco de Esquerda. Aliás, recordo-me de ver algumas entrevistas ao líder do seu partido, em que ele quase já assumia uma postura de primeiroministro! Também andaram a enganar os vossos eleitores? Porque os resultados, ao fim e ao cabo, acabaram por ser muito diferentes...

O Sr. José Gusmão (BE): — Duplicámos o número de Deputados!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — As coisas são o que são: tiveram uma previsão mais optimista, mas que não se concretizou! O que não quer dizer que andassem a enganar os eleitores, mas também se enganaram.
Portanto, penso que todos temos as nossas fragilidades neste domínio e, portanto, só ganhamos em ter um pouco de prudência em não apontar apressadamente o dedo uns aos outros nestas matérias.
Quanto à questão do desemprego, creio que também já esclareci o assunto há pouco, no âmbito da resposta dada à Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
Com efeito, começámos o ano de 2010 com um nível de desemprego na casa dos 10%, conforme é sabido, mas este nível de desemprego reflecte, no fundo, o mais profundo da recessão que tivemos ao longo de 2009, dado o desfasamento que sabemos existir entre o andamento do crescimento económico e da taxa de desemprego.
Este número do desemprego, no início do ano (na casa dos 10%), é perfeitamente compatível com uma taxa média anual de 9,8% para o conjunto do ano de 2010, uma vez que, atingidos estes valores a que chegámos no início do ano, a recuperação económica prevista durante o ano de 2010 irá inverter estes números do desemprego. Esperamos que, em especial na segunda metade do ano, as taxas de desemprego já estejam abaixo dos 10%, o que fará com que, na média do ano, estejamos no valor que apontámos.
Quanto à questão do investimento público, penso que o Sr. Deputado ainda não terá tido tempo para analisar, em pormenor, a informação que consta do Relatório, mas procurarei ajudar o Sr. Deputado nesta matéria.
Não é certo que haja uma contracção do investimento — pelo contrário, há um aumento do investimento.
Para tanto, convidava o Sr. Deputado a dar uma vista de olhos na página 361 e seguintes, onde nós temos os quadros, quer em contabilidade nacional quer em contabilidade pública, das administrações, bem como a rubrica da formação bruta de capital fixo para 2009 e 2010.
Quanto a isto, Sr. Deputado, poderei dizer-lhe o seguinte: a formação bruta de capital fixo para o conjunto das administrações públicas aumenta o seu peso de 2,6% do PIB, em 2009, para 2,7% do PIB, em 2010. Isto quer dizer que o investimento nas administrações públicas, isto é, na administração central, na segurança social e nas autarquias e regiões, aumenta 3% entre 2009 e 2010. Mas, se olharmos exclusivamente para o investimento que será levado a cabo pela administração central e segurança social (por exemplo, os investimentos em creches, lares, etc.), constatamos que, entre 2009 e 2010, o investimento aumenta 12% nestes subsectores da Administração.
Sr. Deputado, PIDDAC não é sinónimo de investimento. E se, por acaso, o Sr. Deputado está a olhar para o PIDDAC para tirar ilações quanto ao investimento, isso é enganador porque só são financiadas através do Capítulo 50 do PIDDAC despesas que não têm a ver com o investimento no sentido económico de formação bruta de capital fixo.
Por exemplo, cerca de um terço do PIDDAC corresponde ao PIDDAC do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior — temos aí várias centenas de milhões de euros que têm a ver com o pagamento de bolsas. Sem dúvida, este é um esforço importante e significativo e corresponde a uma das prioridades do

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Governo, que é a de reforçar a nossa capacidade científica e tecnológica. Mas essa despesa não é classificada, no sentido económico, como investimento.
Portanto, não podemos confundir ou identificar PIDDAC com investimento. É, pois, necessária alguma prudência.
Os números do investimento são os que acabei de referir ao Sr. Deputado. Em contabilidade pública, numa lógica de «caixa», os números até seriam mais impressivos, mas creio que o que será aqui relevante é a referência em contas nacionais. É o que nos parece mais correcto.
Repito: 3% para o conjunto das administrações, 12% no âmbito da administração central e da segurança social.
Além do investimento público, também chamo a atenção do Sr. Deputado para a importância de um outro conjunto de investimentos, investimentos que não são públicos, mas que designaria como de iniciativa pública.
No fundo, são investimentos suscitados pela definição de prioridades de política económica, à qual o sector privado está a responder investindo. É o caso, por exemplo, dos investimentos na área da energia, nomeadamente na área das barragens. Não é o Estado que investe nas barragens, mas estes são investimentos que são suscitados por iniciativas de política e de definição de prioridades de política económica que catalisam iniciativas neste domínio.
Quanto à questão das parcerias público-privadas, nós mantemos a nossa orientação da política de parcerias público-privadas na área da saúde.
Recordo ao Sr. Deputado que há muitos anos que não se constrói um hospital de dimensão em Portugal, pelo menos no âmbito público. Há alguns hospitais que estão em marcha e nós vamos continuar o esforço financeiro nesses hospitais no quadro de parcerias público-privadas, porque entendemos que é fundamental dotar as populações dos equipamentos hospitalares que são necessários e relativamente aos quais existe uma aspiração de há muitos anos.
Tem havido, de facto, um atraso considerável nesta área. Há iniciativas de construção de hospitais (algumas delas) que não foram lançadas por este Governo, que já vêm de trás e cuja obra ainda está por fazer — e as pessoas continuam à espera dos hospitais. Ora, vamos manter aqui esse esforço, porque nos parece importante para melhorarmos a nossa assistência médica, em particular a hospitalar.
Quanto à actualização salarial, Sr. Deputado, devo dizer que os fundamentos desta actualização salarial já vieram a público.
Creio que, num ambiente de baixa inflação que caracteriza a actual conjuntura, atenta a melhoria real dos salários que ocorreu em 2009 e face à previsão de inflação para o ano de 2010, no conjunto dos dois anos (2009 e 2010), há um aumento real dos salários na função pública de 2,9%. Mais: há estabilidade de emprego na função pública e, portanto, o emprego público é um sector que, nesse sentido, está em melhores condições, tem menos riscos e menos incertezas do que aquelas que caracterizam, por exemplo, os trabalhadores do sector privado. Essa é uma razão.
Por outro lado, há um esforço orçamental que tem de ser feito desde já e, perante este quadro, não me parece que seja excessivo estar a pedir aos trabalhadores em funções públicas um contributo nesta matéria, atentos os desenvolvimentos salariais recentes neste sector.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, queria começar por cumprimentar o Sr. Secretário de Estado aqui presente e cumprimentar também, de uma forma especial, o Sr. Ministro — há quem diga que é o «superministro das finanças« que aqui hoje nos veio apresentar o Orçamento» Este é, de facto, um Orçamento de continuidade, que prossegue, portanto, a rota de divergência com a União Europeia; é um Orçamento que reforça e agrava as velhas receitas orçamentais; e é, para além do mais, o Orçamento das agências de rating: quem comanda e dirige as opções orçamentais do País já não é só

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Bruxelas, são também as agências de rating, isto é, os porta-vozes dos interesses financeiros ao nível mundial.
Falo das agências de rating, as mesmas empresas que, na véspera da falência de bancos (há um e pouco atrás), diziam que esses bancos tinham as notações máximas, e são estas empresas, estas agências de rating que comandam agora, a par das imposições do Pacto de Estabilidade e Crescimento, as opções orçamentais do País.
Há alguns dias, o Sr. Ministro manifestou-se muito preocupado e até indignado com alguns portugueses, políticos e comentadores, que descredibilizam o País através da amplificação das notações das agências de rating. Ora, devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que o PCP também está preocupado e solidariza-se com essa preocupação. Mas há duas questões a assinalar, para além desta manifestação de solidariedade.
Em primeiro lugar, os políticos que, em Portugal, amplificam o que as agências de rating dizem vão-lhe viabilizar o seu Orçamento. É com eles que o senhor vai viabilizar este Orçamento — «diz-me com quem andas e eu dir-te-ei quem és», Sr. Ministro! Esta é uma velha máxima que o senhor deve aliar à sua preocupação perante esses comentadores e políticos.
Em segundo lugar, se estou preocupado com esses comentadores e com esses políticos, ainda estou mais preocupado por ter, em Portugal, um Governo e um Ministro — ou um «superministro«» — das Finanças que, afinal, apesar da indignação, começa por obedecer estritamente às imposições dessas agências de rating.
É por isso que o Plano de Convergência, que começa em 2010 e tem de acabar em 2013, segundo o Governo, vai bem além do que era conhecido sobre as imposições do plano nominal de convergência orçamental decidido no âmbito da União Europeia.
A Comissão Europeia disse que os calendários de convergência deveriam começar em 2010, mas abria a hipótese de começarem em 2011, bem como que a convergência para os 3%, em termos nominais, deveria estar concluída em 2013, mas nós sabemos que há países que já dizem que não estará concluída em 2013 e que só o farão depois. Contudo, o Governo português, para além deste quadro, para além deste ritmo, utilizou um superior: o ritmo das agências de rating.
Portanto, está provado e demonstrado que, de facto, a indignação — com a qual nos solidarizamos — sobre a amplificação feita por comentadores e políticos portugueses, afinal, também é aplicável ao próprio Ministro que decide estas orientações relativas ao Orçamento do Estado.
A segunda questão que gostava de colocar-lhe, Sr. Ministro, refere-se ao cenário macroeconómico.
Sei, e compreendo, Sr. Ministro, que o modelo escolhido pelo Ministério das Finanças «raramente se engana e nunca tem dúvidas». Podemos teorizar sobre os falhanços do último ano ou dos últimos anos, mas não vou por aí. Nos prognósticos há sempre uma margem de controvérsia onde eu não queria entrar, pelo que não vou por aí.
De qualquer maneira, gostava de colocar-lhe três questões sobre três valores colocados no cenário macroeconómico e pedir-lhe explicações.
Primeiro indicador: exportações. O Governo prevê mais do dobro do que prevêem todos os outros organismos internacionais, incluindo o diligente Banco de Portugal. Gostava que o Sr. Ministro nos explicasse, a nós e ao País, em que é que se baseia para esta previsão, que é mais do dobro de todas as outras previsões internacionais. A Qimonda vai voltar a produzir? Vai haver algum investimento directo estrangeiro a operar e a produzir já em 2010 que desconheçamos? O que é que se vai passar para que estas exportações aumentem? Até porque, como se sabe, a Espanha, aqui ao lado, que é o principal mercado importador de produtos portugueses, vai continuar em recessão ou, pelo menos, prevê-se que assim seja. Portanto, gostava que nos explicasse isto.
Segundo indicador: consumo privado. Também aqui o Governo faz uma previsão substancialmente acima de qualquer das outras previsões.
Vamos colocar-lhe a questão nos seguintes termos, Sr. Ministro. Em 2010, os salários reais vão descer relativamente a 2009, com o congelamento dos salários dos funcionários públicos, é evidente. Portanto, em 2010, os salários, relativamente a 2009, vão descer. Sr. Ministro, se tem dúvidas, então vamos ver essas

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dúvidas: há um congelamento salarial, há uma diminuição dos salários reais em 2010 relativamente a 2009.
Não sei qual é o gesto de surpresa do Sr. Ministro! Não percebo! Por outro lado, as taxas de juro, tendencialmente, vão subir, mesmo que pouco — a partir de meio do ano, seguramente —, logo o rendimento disponível vai descer e o desemprego vai subir para cima dos dois dígitos (10,2% em Outubro, 10,3% em Novembro, 10,4% em Dezembro). Todos os organismos internacionais apontam para os dois dígitos, aliás, até o Governo, apesar de pouco — já lá vamos —, prevê um aumento do desemprego.
Neste quadro de diminuição de rendimento disponível, como é que o Governo explica o aumento tão acentuado do consumo privado? Terceiro indicador: taxa de desemprego, assunto já aqui falado.
Sei que o Governo tem a tendência de criar médias anuais e nelas se refugia dos valores reais, mas eu gostava de perceber se a expectativa de uma taxa de desemprego de 9,8%, comparando com as outras previsões existentes, não é aqui colocada, no fundo, para obter um outro objectivo — Sr. Ministro, é essa questão que lhe coloco —, ou seja, para não colocar em dotações orçamentais as verbas adequadas no subsídio de desemprego, que vão ser de facto necessárias para fazer face ao desemprego que vai ser criado em 2010, e se esta não é uma forma de esconder verbas insuficientes atribuídas ao subsídio de desemprego.
Sr. Ministro, este é um Orçamento de continuidade, naturalmente, e as linhas de força são as mesmas: contenção salarial; novos e profundos ataques à Administração Pública e à segurança social; contenção e corte no investimento público; privatizações em cerca de 1000 milhões de euros; e justiça fiscal com alguns «foguetes» mediáticos e não com a equidade fiscal que o Sr. Ministro anunciou.
Vamos por partes: é inqualificável justificar o congelamento salarial dos funcionários públicos com o pretexto de que, em 2009, tiveram um aumento real. Esqueceram a argumentação que os senhores usaram durante estes anos todos? Esqueceram que nunca fizeram uma actualização para a frente, tendo em conta as perdas reais de poder de compra nos anos imediatamente anteriores? Esquecem que, apesar de tudo, na última década, os funcionários públicos perderam entre quatro e sete pontos percentuais do seu poder de compra, desde 2000 até 2010, contando já com o aumento de 2009? Aliás, a execução orçamental demonstra bem o peso que as remunerações certas e permanentes têm. Na execução orçamental de 2009, dos 6% de acréscimo da despesa, só 0,3 pontos percentuais têm a ver com as remunerações certas e permanentes.
Mas as propostas para a função pública são bem piores do que isto, são propostas de destruição de postos de trabalho: destruíram 78 000 em quatro anos; no ano passado, em 2009, destruíram entre 17 000 e 19 000; e preparam-se para destruir 22 000 este ano, com ataques claros às reformas da Administração Pública.
Com este ponto termino, Sr. Presidente, deixando as restantes questões para a segunda volta de perguntas.
Os senhores alteram três critérios nas aposentações da Administração Pública: a fórmula de cálculo; a bonificação concedida aos trabalhadores com carreiras longas; e a penalização actual, que passa de 4,5% para 6% ao ano.
Estes dois últimos critérios, isto é, a alteração da bonificação concedida aos trabalhadores com carreiras longas e o agravamento da penalização — Sr. Ministro, peço-lhe atenção para esta questão em especial —, correspondem à quebra do princípio da segurança jurídica por parte do Governo.
A Lei n.º 11/2008, de 20 de Fevereiro, previa que estas duas alterações, a da bonificação concedida aos trabalhadores com carreiras longas e a da alteração da penalização, fossem apenas, eventualmente, aplicadas a partir de 2015. São aplicadas desde já. O que é que o País pode esperar de um Governo que não cumpre aquilo que contratualiza com os trabalhadores da função pública?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, falou em velhas receitas orçamentais. Pois, sim, Sr. Deputado, são as velhas receitas orçamentais, porque são estas as receitas que funcionam e que devem ser adoptadas. Aliás, isto não é muito diferente da culinária, em que todos nós gostamos muito das receitas da avó.
Na culinária, são as velhas receitas que, muitas vezes, são o sucesso da cozinha;»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas a minha avó sabia cozinhar!»

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — » aqui, infelizmente, tambçm são as velhas receitas orçamentais que já deram provas de funcionar e de permitir atingir os resultados.
Quanto à questão sobre as agências de rating, Sr. Deputado, não partilho da sua linguagem de que as agências de rating comandam as opções orçamentais e considerações do género. O que quero salientar, Sr. Deputado, é que precisamos de nos financiar e, quer queiramos quer não, é o exterior que financia, em parte significativa, a economia portuguesa. Assim, temos de assegurar que quer o Estado quer as nossas empresas e famílias se financiam no exterior em condições aceitáveis. Por isso temos de levar a cabo uma política financeira que impeça um agravamento excessivo e desnecessário dos encargos financeiros com o exterior.
Não obedecer às agências de rating, usando a sua linguagem — e aqui não é uma questão de obedecer ou de não obedecer —, implicaria ter agravamento de spreads, de juros e, ao fim e ao cabo, seriam as empresas e as famílias portuguesas a suportar os custos dessa desobediência.
Não coloco isto como uma questão de obedecer ou de não obedecer, não é isso que deve preocupar-nos; temos é de ter presente que precisamos de nos financiar em condições que possam ser suportadas pela nossa economia, pelas nossas empresas e pelas nossas famílias, sendo que não podemos correr o risco de ter um agravamento dos encargos, porque isso seria um agravamento de custos para as empresas e para as famílias, designadamente nas suas prestações no âmbito da habitação.
Quanto ao cenário macroeconómico, sim, temos uma visão positiva quanto à evolução da exportação, estamos a promover a internacionalização, estamos a tomar um conjunto de iniciativas no âmbito do reforço da nossa capacidade exportadora e de internacionalização, e acreditamos que isso se traduza em melhorias do nosso sector exportador, já visíveis em 2010.
No que se refere ao consumo privado, o Sr. Deputado pergunta como é que se justifica que o consumo privado cresça em 2010 se os salários reais, relativamente a 2009, baixam. Sr. Deputado, como é que justifica então que, tendo os salários reais subido em 2009 relativamente a 2008, o consumo tenha baixado? Já agora, seja consequente em toda a sua análise.
Espera-se que o consumo privado suba porque não houve perda de poder de compra ao longo da legislatura em termos do rendimento disponível. Chamo a atenção do Sr. Deputado para o facto de termos assistido, ao longo de 2009, a uma redução muito significativa dos encargos com a habitação nas famílias, que se traduziu num aumento da poupança. A poupança aumentou, em 2009, da ordem dos seis pontos percentuais do PIB para perto dos nove pontos percentuais, portanto, houve um aumento significativo da poupança.
O facto de as taxas de juro não subirem de forma significativa em 2010, conforme se prevê, permitirá que muitas famílias que tiveram esta melhoria do seu rendimento disponível devido à redução dos juros, e dada a durabilidade dessa poupança, em vez de pouparem efectivamente, possam afectar já uma parte disso ao consumo. Portanto, a taxa de poupança, muito provavelmente, não se manterá ao nível para o qual saltou, de nove pontos percentuais do PIB, poderá baixar um pouco, o que terá um efeito no consumo.
Temos de fazer um esforço para incentivar a manutenção de uma taxa elevada de poupança, e daí as iniciativas que o Governo se propõe levar a cabo como incentivo ao aforro e à poupança, através de uma emissão de retalho de obrigações de tesouro, por exemplo, ou da criação de uma conta poupança futuro que incentive a poupança para os mais jovens, como forma de podermos absorver uma maior parte da nossa

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poupança interna para o financiamento, também reduzindo assim, eventualmente, as necessidades de endividamento externo, o que também é importante.
Quanto à questão de a taxa de desemprego ser baixa, já respondi a isso. Não há aqui qualquer intuito de esconder as verbas de desemprego. Sr. Deputado, pode ficar tranquilo porque os desempregados terão o seu subsídio de desemprego assegurado nos termos previstos! O Sr. Deputado fala em corte de investimento público mas não justifica de onde vem esse corte. Já expliquei ao Sr. Deputado José Gusmão o que é que se passa com o investimento público, pelo que lhe peço que explique o que é isso do corte de investimento público. É uma afirmação que, a mim, me parece gratuita.
O Sr. Deputado não fundamenta por que é que fala em corte no investimento público, não demonstra onde está o corte no investimento público. Fala em corte no investimento público, mas não é por falar nisso que vai haver corte no investimento público, é preciso fundamentar.
Quanto à questão da função pública e dos postos de trabalho, Sr. Deputado, ao falar em destruição de postos de trabalho na função pública dá ideia de que acha que o Estado deve empregar mesmo que não precise; mesmo que não seja preciso temos de empregar e, depois, os contribuintes que paguem. Não há redução de postos de trabalho, pode é haver redução de empregos! E pego aqui um bocadinho de cuidado na distinção popular entre «ter trabalho e ter emprego», Sr. Deputado.
Temos os postos de trabalho que são necessários, e não me parece que seja bom princípio a ideia de que, se não é necessário, de qualquer modo, há que criar empregos e o contribuinte que pague. Não, Sr. Deputado! De uma vez por todas, temos de rejeitar concepções dessa natureza.
Relativamente à questão referida pelo Sr. Deputado acerca da evolução histórica dos vencimentos dos funcionários públicos, recordo-lhe que, de acordo com números recentes da OCDE que nos dão a evolução das remunerações médias dos trabalhadores do sector público e do sector privado na última década, a remuneração média dos trabalhadores públicos aumentou, na última década, em termos nominais, algo na ordem dos 50%, enquanto que, no sector privado, esse aumento foi algo na ordem dos 35%. Portanto, mesmo nessa perspectiva histórica da última década, a ideia da deterioração que procura transmitir não é tão forte quanto queria dar a entender, atentos os números que acabei de referir.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Efectivamente, em comparação com o sector privado, o aumento salarial médio, em termos nominais, na última década, das remunerações médias no sector público foi superior.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Obrigado! Obrigadinho!»

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos, agora, à segunda ronda de perguntas.
Quero apenas informar que todos os partidos excederam, por igual, em cerca de 2 minutos e 30 segundos, o tempo que lhes estava atribuído e que, a partir de agora, na segunda ronda, serei um pouco mais estrito no controlo do tempo.
Nesta segunda ronda, segundo o acordado, cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos para intervir, ao que acrescerão 2 minutos por Deputado, se assim o pretenderem.
O primeiro grupo parlamentar a intervir é o do PSD. Tem a palavra o Sr. Deputado José de Matos Rosa.

O Sr. José de Matos Rosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, espero que responda às questões que vou colocar-lhe, o que não aconteceu com o meu colega de bancada Duarte Pacheco.
Refere o parecer do CES sobre as Grandes Opções do Plano (GOP) que as mesmas «têm sido elaboradas»« nos õltimos anos «» de forma apressada, deficientemente sistematizada e insuficientemente integrada, não se afastando muito de um repositório de documentos sectoriais reunidos (»), como que para cumprimento de uma simples formalidade», não fugindo as GOP 2010-2013 a este figurino.

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Sr. Ministro, não posso deixar de concordar com o CES, uma vez que esta forma de elaboração do documento é incompatível com a importância e a dignidade que as Grandes Opções do Plano, nos termos da Constituição, deveriam assumir, na definição a médio prazo das políticas económicas e sociais.
A feitura de um documento como as Grandes Opções do Plano não deve transformar-se numa rotina cuja finalidade é a de se cumprirem formalmente requisitos constitucionais.
As GOP 2010-2013 não respondem à complexidade da situação e não cumprem, de forma satisfatória, o papel que lhes é atribuído pela Constituição da República.
Não abrangem sequer um cenário macroeconómico, com o argumento de que tal cenário era preparado no âmbito da proposta de Orçamento do Estado para 2010 e da actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento, o qual, segundo as últimas notícias, será apresentado durante a discussão, na especialidade, do Orçamento.
Constata-se que о documento (as GO P) não vai além de uma lista de intenções, sendo apenas uma compilação de ideias já conhecidas.
Um documento assim organizado dificilmente permite a identificação e a apreciação fundamentada das prioridades da acção governativa, não existindo qualquer diferença entre as linhas de intervenção para os quatro anos e aquelas que são as da resposta à crise.
Falta no documento a menção aos recursos financeiros e organizativos com que se conta para realizar as intenções constantes das GOP.
Este aspecto é tanto mais importante quanto o período que vamos atravessar deverá ser de contenção da despesa, o que obriga a avaliar de forma muito ponderada a utilização dos recursos públicos.
Verifica-se ainda a ausência de um quadro macroeconómico de curto e médio prazos, que permita avaliar a viabilidade das medidas anunciadas.
Falta no documento a avaliação das prioridades da acção governativa, em especial a forma como se prevê que sejam utilizados os recursos públicos disponíveis para atingir os objectivos.
Verifica-se, ainda, a total ausência de referência às medidas de carácter fiscal ou, pelo menos, rumos a adoptar nesta matéria em face da evolução económica de médio prazo.
Os últimos anos traduziram-se, em Portugal, por um avolumar de problemas, em matéria de crescimento, endividamento do País face ao exterior, queda da competitividade externa, desequilíbrio das contas públicas e aumento do desemprego e da pobreza, entre outros.
A situação económica do País chegou a uma situação de gravidade, reconhecida e alertada por inúmeras instituições internacionais e muitos responsáveis políticos.
Desde há muito que o PSD chama a atenção para a falta de sustentabilidade de uma política económica que tem conduzido a níveis excessivos de despesa pública e privada no País e que tem minado as condições de competitividade das empresas, com implicações graves no emprego.
O País está sob observação permanente por parte de todas as organizações internacionais, das agências de rating e dos investidores externos que são indispensáveis para o financiamento da nossa economia.
É neste quadro de grande preocupação que o PSD tem insistido numa redefinição de prioridades.
As consequências desta política, a manterem-se, poderão rapidamente tornar-se desastrosas no actual quadro da situação económica e financeira internacional.
O caminho que o Governo vai seguir afasta-se, em múltiplos aspectos, daqueles que o PSD escolheria. No entanto, face à actual situação do País, consideramos que o interesse nacional tem de ficar defendido.
Assim, importa colocar várias questões.
As GOP prevêem grandes projectos de investimento. Como o PSD sempre disse, com a presente situação económica, estes investimentos devem ser repensados e reavaliados e dever-se-á, em detrimento destes, proceder a investimento público centrado em projectos de investimento de dimensão limitada, espalhados pelo território, criando emprego localmente e estimulando de imediato a procura privada, e beneficiando desse modo as PME e a produção nacional. O Sr. Ministro já disse que concorda.

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Segundo declarações recentes, alguns destes projectos vão ser suspensos. Pergunta-se: quais os projectos a suspender e os critérios que levam a adiar os mesmos? O Governo tem centrado a sua política nos desempregados de longa duração e nos desempregados com mais de 55 anos, o que não é suficiente na situação actual, sem esquecer o desemprego jovem e aqueles que nunca conseguiram sequer o primeiro emprego. Nas GOP, quase nada é dito sobre a resposta das políticas de segurança social ao previsível aumento do desemprego, pelo que pergunto: quais as medidas que vão ser tomadas? Pergunto-lhe, ainda, Sr. Ministro, o seguinte: confirma as suas declarações da passada semana, nas quais criticou as agências de rating, questionando a sua credibilidade e referindo que as mesmas têm objectivos comerciais? A última questão é esta: concorda o Sr. Ministro que são necessárias medidas de curto prazo para responder à crise e potenciar a retoma, devendo estas ser enquadradas por uma estratégia orçamental a médio prazo que garanta a correcção do défice público, permitindo, em simultâneo, uma estabilização da dívida pública, sendo assim uma opção decisiva para voltar a merecer a confiança dos mercados e instituições financeiras internacionais?

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, começo por fazer uma crítica à posição do PSD na sua primeira intervenção, que é a ideia de que o nosso endividamento e a nossa dívida actuais são o corolário de políticas erradas durante quatros anos. Ao contrário do que diz o PSD, é preciso perceber uma coisa: o défice é o preço que pagámos para evitar uma recessão ou, pelo menos, para minimizar os efeitos da recessão.
Quero saudar o Governo por, neste Orçamento, ter conseguido duas coisas que me parecem fundamentais no contexto económico actual, a saber: por um lado, manter o apoio à economia, nomeadamente manter parte significativa do programa de investimento público, sem o qual a retoma da economia portuguesa ficaria comprometida e, ao mesmo tempo, dar um sinal claro de consolidação orçamental.
Isto é, o PS parece-me ser o único partido que, neste momento, consegue perceber que o Estado, apesar de precisar de gastar, não pode descurar o equilíbrio das contas públicas, ao contrário do que os partidos à nossa esquerda defendem, e, por outro lado, mais uma vez, ao contrário do que defende o PSD e o CDS, deve manter uma política activa quer de despesa quer de investimento público, sem o que a recessão se agravaria, pondo em causa a própria sustentabilidade das despesas públicas.
Ou seja, ao contrário do que dizem o PSD e o CDS, não é possível, como há pouco sugeriu a Sr.ª Deputada Assunção Cristas, ser mais ambicioso na redução da despesa pública e conter o aumento do desemprego, porque são políticas contraditórias.
Também ao contrário do que referiram aqui o PCP e o BE, há uma medida fundamental de equidade fiscal, que é o reforço da tributação sobre a banca. Há anos que a esquerda diz que o PS está refém da banca, mas este Orçamento mostra que isso não é verdade, havendo um reforço muito significativo da tributação sobre a mesma, nomeadamente através da imposição de uma taxa mínima de IRC, de 18,75%, se não estou enganado.
Quanto às obras públicas, quero saudar o Governo por manter, dentro de um quadro de responsabilidade, a aposta nas obras públicas. É importante enfatizar a ideia de que estas obras públicas não são uma megalomania do PS mas, sim, a resposta a um diagnóstico feito pelo Partido Socialista às carências, em termos de competitividade, deste País. Portanto, não são obras que, no contexto actual, devam ser revistas, senão mesmo abandonadas, porque são essas mesmas obras públicas que nos permitem ultrapassar a situação em que nos encontramos.
Em relação à consolidação orçamental, penso que há uma medida fundamental neste Orçamento do Estado que permite que o PS se distinga à direita. Para a direita, consolidar o Orçamento corresponde necessariamente a uma redução da despesa. Ora, acho que o PS, enquanto partido de esquerda, tem a

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responsabilidade de contrariar esta narrativa irresponsável e de ter uma abordagem totalmente distinta do que é a consolidação orçamental. Mais do que o nível quantitativo da despesa, importa a qualidade da despesa pública.
Nesse sentido, a orçamentação por programas é um passo decisivo na credibilidade, a médio e a longo prazos, das finanças públicas. É porque cortes cegos e irresponsáveis na despesa, como defendem o PSD e o CDS, não dão qualquer tipo de sinal, a médio e a longo prazos, aos mercados financeiros e só uma medida estruturante como a orçamentação por programas permite implementar, a médio e a longo prazos, mais uma vez, a desejada consolidação, a qual se em certas áreas poderá passar eventualmente por uma redução da despesa noutras não se justificará.
Ora, é sobre esta orçamentação por programas que queria questionar o Governo. Gostaria de saber se o Governo já tem um plano definido sobre como se irá processar a implementação desta reforma e se tem, a médio e a longo prazos, algum tipo de estimativa sobre uma eventual redução das despesas associada a este tipo de medida.
A segunda questão tem a ver com o aumento das exportações, referido, se não estou em erro, pelo Deputado Honório Novo. O Governo estima um crescimento das exportações acima do que algumas instituições internacionais apontam, pelo que gostaria que, se possível, o Sr. Ministro das Finanças nos falasse da relação entre este aumento das exportações e a política de diversificação de mercados, nomeadamente, a aposta em mercados emergentes como os do Brasil, de Angola e eventualmente de outros, na definição deste valor.

O Sr. Presidente: — Passo a palavra ao Grupo Parlamentar do CDS-PP, concretamente, à Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles intervirá, a seguir, naquele período adicional de 2 minutos.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.ª Deputada. Para já, estou a dar-lhe a palavra para o período inicial de 5 minutos; depois, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles usará os 2 minutos sucessivos.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, antes de avançar com novas questões, gostaria apenas de sublinhar que é sempre com agrado que oiço as suas respostas, uma vez que o Sr. Ministro responde a todas as questões colocadas, apesar de, muitas vezes, não responder exactamente ao que foi questionado.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não há tempo!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — E eu agradeço pela atenção de responder, mas tenho de sublinhar que não me respondeu (e tenho pena, mas, se o quiser fazer agora, agradeço, até porque dispõe de mais tempo) à questão sobre a dívida pública caso alargássemos o perímetro orçamental, não me respondeu (pelo menos, de uma forma que me tivesse parecido clara) à questão de saber qual o significado, na prática, de articular o investimento do TGV com a consolidação orçamental e também não me respondeu se considera que com um crescimento de 1% é mesmo possível aumentar o emprego ou se isso só será possível com um valor superior.
Quanto às questões que quero colocar-lhe agora, vou arrumá-las em dois grupos, a saber: «despesa e compressão da despesa», primeiro, e «receitas e afectação da receita», depois.
São questões que me suscitaram algumas dúvidas e, portanto, são questões avulsas.
Em primeiro lugar, no que respeita à compressão da despesa, afirma o Relatório do Orçamento, na pág.
17, que será feita uma «avaliação (») do modelo de financiamento da Estradas de Portugal, visando a

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racionalização e garantia da sua sustentabilidade». Suponho que isto seja o reconhecimento de que algo não correu bem e gostaria que o Sr. Ministro, se pudesse, nos explicasse o que se está a passar com a Estradas de Portugal e qual é a sua situação financeira.
Em segundo lugar, assumo também que haverá um novo enquadramento institucional, centralizado no Ministério das Finanças, para pensar as PPP (parcerias público-privadas). Pergunto-lhe se isto também quer dizer que há algum sentimento de descontrolo nestas estruturas de financiamento.
Terceiro: no que respeita às infra-estruturas rodoviárias, confrontando o que está no Orçamento com as recentes declarações públicas do Sr. Ministro, fiquei com dúvidas sobre se as estradas já acabaram, se estão prestes a acabar ou se acabarão no futuro e quando. Sr. Ministro, será possível que nos explique qual é a ideia do Governo? Já agora, sabendo que é sempre difícil voltar atrás, embora o Sr. Ministro não tenha dificuldade em reconhecer erros de previsões, pergunto: qual é a posição do Ministério das Finanças no que diz respeito às concessões chumbadas pelo Tribunal de Contas? Será um pretexto para as Finanças virem rectificar alguns erros? Quarto: Sr. Ministro, registamos com algum apreço que, pela primeira vez, num escrito socialista se faça menção à necessidade de fiscalizar o rendimento mínimo. Sr. Ministro, estaria disponível para acabar com a regra da renovação automática da prestação? Quando? Quinto: no que toca à unidose, também registamos o empenho do Governo. Todos sabemos que a unidose significa um corte relevante na despesa do Estado e significa também uma poupança para o orçamento das pessoas. Sr. Ministro, uma vez que está reconhecido implicitamente que a fórmula facultativa que até agora o Governo usou não funcionou, pergunto: o Governo está ou não disponível para impor legislativamente a obrigatoriedade de disponibilização dos medicamentos em unidose? Faço-lhe esta pergunta porque o CDS apresentará uma proposta nesse sentido.
Sexto: no que toca à «potencial despesa», como o Sr. Ministro gosta de frisar, qual é a intenção do Governo, relativamente à reprivatização do BPN, quando escreve no artigo 59.º da proposta de lei do Orçamento do Estado que é admitida a substituição do beneficiário da garantia na condição de que dessa substituição resulte uma diminuição da exposição financeira do garante. Está subjacente a esta disposição que o Estado admite, num quadro de reprivatização, continuar a ocupar a posição de garante dos financiamentos do banco? Ou seja, a Caixa-Geral de Depósitos pode «sair de cena», mas o Estado não? Sr. Ministro, neste momento, qual é a ideia do Governo e o que significa exactamente, na óptica do Governo, «diminuição da exposição financeira»? No que diz respeito à receita e à afectação da receita, gostaria de salientar quatro pontos. Em primeiro lugar, verificamos que nos últimos Orçamentos do Estado a previsão da receita ficou sempre aquém da receita efectivamente executada. Sr. Ministro, está convicto dos números que agora apresenta para a receita? Teve em conta a experiência dos anos anteriores? Em segundo lugar, verificamos que há um aumento exponencial das receitas extraordinárias que tanto foram criticadas no passado. Pode explicar-nos por que razão as receitas incluídas no quadro das receitas não fiscais aumentam em 540%, ou seja, de 198 milhões de euros para 1269 milhões de euros? Em terceiro lugar, considerando que a introdução nas portagens nas SCUT (auto-estradas sem custos para o utilizador) gerará um aumento de receita, o Sr. Ministro estaria disponível para acompanhar o CDS quando defende que uma parte da poupança que se pode obter por essa via deve ser afecta ao desagravamento fiscal das empresas? Por fim, estão inscritos no Orçamento do Estado 960 milhões de euros como receita de privatizações. O relatório do Orçamento é, no entanto, muito parco nas explicações neste domínio. Refere o caso do BPN, mas aí já sabemos que não trará receita mas provavelmente prejuízo. Já é conhecida a privatização da ANA como forma de financiamento do novo aeroporto de Lisboa — aqui também valeria a pena saber se é a totalidade ou se é apenas uma parte e qual é essa parte. Para além disso, já foi referida, hoje, creio, a questão da Galp.
Que outras empresas poderão estar aqui em causa para perfazer este valor? Se considerarmos que a EDP e

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a REN têm a ver com monopólios naturais e, portanto, talvez aí não seja tão fácil para o Estado abrir mão das suas posições, que tipo de empresas e quais são as empresas que o Estado está a pensar privatizar?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de agradecer as «simpáticas» explicações sobre as diferenças entre investimento e PIDDAC, pois são sempre explicações muito interessantes de ouvir da parte do Ministro das Finanças. No entanto, gostaria de dar-lhe um esclarecimento sobre a diferença entre «parte» e «todo».
Pelos vistos, a notícia de que o investimento público vai aumentar ainda não chegou à bancada do Partido Socialista. O Sr. Deputado João Galamba elogiou o Governo por manter uma parte significativa do programa de investimento público. Ora, uma parte significativa não é o todo.
Os quadros a que o Sr. Ministro se refere são quadros que comparam a estimativa para o investimento em 2009, ano que agora terminou, e a estimativa do Governo para o ano de 2010. Peço desculpa, mas compreenderá que os partidos da oposição tenham uma leitura cuidadosa — pelos vistos mais cuidadosa do que a do Sr. Ministro — em relação a esse tipo de estimativas. É que o que nós conhecemos é a relação entre as estimativas e os valores reais no passado, como, por exemplo, a do famoso plano anti-crise que ficou executado a 70%, e também entre orçamentações e execuções de anos anteriores, muito particularmente na área do investimento público.
O Sr. Ministro bem pode dizer que as previsões do Governo apontam para um aumento marginal de 3% no investimento público, mas a experiência que temos, e o Governo também, é a de uma grande diferença entre as estimativas e o que realmente acontece depois, bem como entre o que é orçamentado e as execuções efectivas.
Convinha que o Sr. Ministro, que deu tantas mostras de humildade ao pronunciar-se sobre os erros de avaliação do défice ao longo de 2009, fosse igualmente prudente nas estimativas em relação ao investimento público, sobretudo quando os próprios instrumentos de que o Governo se dotou para controlar a execução do investimento público ao longo do ano apontam no sentido contrário ao das previsões com que o Governo avança.
Na sequência da audição com o presidente da Caixa-Geral de Depósitos, dirigimos uma pergunta ao Ministro que ainda não foi respondida e, portanto, gostaríamos que fosse respondida, se possível, hoje. Essa pergunta vinha exactamente no sentido daquilo que está disposto no artigo 59.º do articulado, que diz que «nas operações que beneficiem de garantia pessoal do Estado por força do disposto no n.º 9 do artigo 2.º da Lei n.º 62 é admitida a substituição do beneficiário da garantia na condição de que dessa substituição resulte uma diminuição da exposição financeira do garante».
A «diminuição da exposição financeira do garante» é algo que não está quantificado de forma alguma e, para nós, é fonte de enorme preocupação. Isto é, o que nos preocupa não é a diminuição da exposição financeira do garante mas o facto de se admitir que, no final desta operação, o Estado possa ainda ter compromissos e possa, de alguma forma, continuar «amarrado» ao futuro deste banco.
É porque poderemos discutir todos os procedimentos desta operação e as consequências que irão ter para os contribuintes — e o Bloco de Esquerda foi apresentando as suas propostas alternativas na altura adequada —, mas sempre foi um dado adquirido, ou pelo menos uma presunção de todos os partidos e, tanto quanto percebi, também do Partido Socialista, que uma vez concluído este processo estava tudo terminado. Ou seja, o Estado deixaria de ter envolvimento no futuro do banco, o banco seria reprivatizado, seria a última vez que ouviríamos falar sobre este assunto e o assunto passaria a estar sob a alçada do regulador sem uma continuação do envolvimento do Estado nesta questão.
Gostaria de saber se os dados que tem neste momento permitem esclarecer esta Comissão sobre se esse envolvimento irá continuar, nomeadamente se a garantia irá prosseguir para o futuro.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, as consequências das velhas receitas orçamentais são conhecidas. De 2005 a 2008, se quisermos durante a década, a rota do País é de divergência face à União Europeia com a perda progressiva no ranking dos países da União Europeia a 27. Essas são as consequências para o País! De facto, mesmo que os empregos não sejam necessários não vemos problema algum. Mas vou dar-lhe um exemplo, Sr. Ministro: o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas tem 90 funcionários disponíveis. Na análise das candidaturas do PRODER, o que faz o Ministério? Contrata uma empresa de segurança para avaliar as candidaturas do PRODER, estando 900 funcionários na mobilidade» É esta a política de destruição de empregos que os senhores prosseguem!! O Sr. Ministro pode fazer de conta que não perguntei, mas pergunto outra vez. Os senhores, na reforma da Administração Pública, promovem duas alterações que vou recuperar: alteração da bonificação concedida aos trabalhadores de carreiras longas; agravamento da penalização de 4,5% para 6% ao ano nas reformas antecipadas. Está na Lei n.º 11/2008, de 20 de Fevereiro, que estas duas questões seriam avaliadas e alteradas a partir de 1 de Janeiro de 2015. Como é que o País pode reagir perante um Governo que faz «letra morta» dos princípios da segurança jurídica? Responda-me a isto, Sr. Ministro, se for capaz!...
Desafiou-me a demonstrar os cortes no investimento público. Aqui está: cativação de 7,5% para 12,5%. Em 2009, descontada a cativação, o investimento total real disponível era de 4,23 milhões dos 4300 previstos; em 2010, descontada a cativação, o investimento total real disponível é de 3921 milhões dos 4481 nominais previstos, isto é, menos 102 milhões reais disponíveis! Aqui está, Sr. Ministro!! Quer ver mais? Investimento, investigação e desenvolvimento. Há pouco o senhor disse que era uma das grandes apostas do Governo. Só o corte na Fundação para a Ciência e a Tecnologia é de 23%! Agora no PIDDAC — sei que não ç todo o investimento, Sr. Ministro, escusa de repetir o argumento» — desaparecem completamente distritos como Viseu, Vila Real, Bragança e Beja. Qual é o conceito que o senhor tem de coesão nacional? As cativações podem atingir o próprio QREN e podem comprometer a sua execução. O Sr. Ministro deve saber, mas quer que lhe diga onde está? Está no n.º 11 do artigo 2.º. Eu não digo «vão», eu digo «podem».
Ou seja, a possibilidade para o Governo, desde que seja para cortar investimento público, é seguramente uma realidade.
Gostaria também de saber qual é a lista de privatizações, Sr. Ministro: é a mesma de 2009 ou há alguma alteração? Mantendo-se a ANA nessa lista, diga-me como vai reagir o Sr. Ministro da Justiça. É porque durante a campanha eleitoral ele disse que a ANA não seria privatizada. O PS garantiu, por três vezes, que a ANA não seria privatizada e se o fosse era a parte comercial. O Sr. Ministro da Justiça vai demitir-se? Vai votar contra na reunião do Conselho de Ministros? Com é que o senhor vai confrontar o Dr. Alberto Martins? Relativamente à fiscalidade, em 2009, não houve apenas uma quebra de receita fiscal por causa da diminuição da actividade — eu já falei nisto, Sr. Ministro! Houve também, e hoje é cada vez mais consensual, aumento de evasão. Que medidas é que estão previstas no Orçamento para combater essa evasão fiscal? Relativamente às velhas amnistias fiscais que constam aqui, o crime fiscal volta a compensar. Não foi só Bagão Félix, não foi só Campos e Cunha, é também Teixeira dos Santos — que tinha resistido quatro anos à repetição da norma da amnistia fiscal para absolver os crimes fiscais — que vai recuperá-la.
E, quanto aos «foguetes para inglês ver», pergunto-lhe o seguinte: por que razão recai só sobre os administradores das instituições de crédito a taxa extraordinária de 50% sobre o bónus, em 2010? Os das outras empresas do PSI 20 não têm bónus nem prémios, Sr. Ministro? E por que razão há um País, o meu, que tem uma lei proposta por um Governo que em termos normais propõe 35% de taxação destes prémios, mas depois ensina a forma de não pagar? Como é que hei-de

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comentar um Governo que propõe na lei e depois diz também na lei como não se pagar? Sr. Deputado Galamba, Sr. Deputado Victor Baptista, é isto que está na proposta de lei! Quanto à taxa efectiva dos 18,75%, das duas, uma: os números da Direcção Geral dos Impostos dizem que a taxa efectiva do sector bancário, nos últimos anos, andou sempre à volta dos 20%. Se isto for verdade, ao proporem agora 18,75%, estão a propor uma baixa? Outra hipótese diferente é a realidade.
A passagem de 60% para 75%, de facto, só vai atingir uma parte dos benefícios fiscais e não vai mexer substancialmente na alteração da taxa efectiva. Se assim não fosse, as taxas efectivas divulgadas pela Associação Portuguesa de Bancos não andavam entre os 12,8% e os 13% nos últimos anos. Esta é que é a realidade dos «foguetes» em sede de fiscalidade para a banca.

O Sr. Presidente: — Seguidamente, nos termos da grelha que acertámos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Sequeira.

A Sr.ª Isabel Sequeira (PSD): — Sr. Presidente, queria colocar umas questões ao Sr. Ministro das Finanças sobre assuntos fiscais.
Em primeiro lugar, vejo que há uma preocupação de tentar levar à comunicação social a ideia de que, este ano, não vai haver aumento de impostos, que os portugueses até estão com sorte, pois vão pagar um pouco menos e parece que está tudo a correr muito bem.
No entanto, analisando a proposta de Orçamento do Estado, verifica-se que há aqui uma autorização legislativa, através da qual o Governo pretende ficar autorizado a criar taxas na administração do Estado. Será que esta não é uma forma de criar taxas sem serem aprovadas na Assembleia da República e de pôr os contribuintes a pagar mais? Outra questão muito importante que lhe queria colocar tem a ver com o IRC. No período que atravessamos, as nossas empresas, nomeadamente as pequenas e médias empresas, precisam de estímulos e não de ter mais impostos, para poderem continuar a exercer a sua actividade. Segundo o artigo 92.º do Código do IRC, o imposto liquidado depois de as empresas terem utilizado os benefícios fiscais não pode ser inferior a 75% do montante que seria apurado se não tivessem usufruído desses benefícios fiscais. Acontece que, anteriormente, o montante que estava previsto neste artigo era de 60%. Ou seja, enquanto que, até 2009, a empresa podia usufruir de benefícios fiscais de 40%, com esta proposta só vai poder beneficiar de 25%. Ora, penso que não seria este o momento de estar a criar mais este entrave às empresas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de colocar duas perguntas muito concretas.
A primeira tem a ver com a concessão de garantias, Sr. Ministro. As págs. 184 e 185 da proposta de Orçamento têm um quadro muito interessante sobre o montante das garantias autorizadas, onde podemos ver que, no âmbito da iniciativa para o reforço da estabilidade financeira e, mais precisamente, da Lei n.º 60A/2008, foram concedidos de garantia 5 000 milhões de euros, em 2008, e cerca de 650 milhões de euros, em 2009. É-nos ainda dito que, a partir de Abril de 2009, ao abrigo da Lei n.º 60-A/2008, mais nenhuma garantia foi pedida e, consequentemente, nenhuma garantia foi dada.
Contudo, vemos que nos artigos 72.º e 73.º é autorizada a concessão de garantias no montante de 9 146 milhões de euros. Este montante também está previsto nas despesas excepcionais do Ministério das Finanças, precisamente nesta iniciativa de reforço da estabilidade financeira, que era, em 2009, de 1 000 milhões de euros. Vemos, aliás, que nas despesas excepcionais do Ministério das Finanças é precisamente esta rubrica que origina o maior aumento.
Portanto, em primeiro lugar, gostaria de saber o que explica esta previsão de garantias, a serem necessárias naturalmente, no montante de 9 000 milhões de euros.

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Em segundo lugar, no que toca ao sector empresarial do Estado, tendo em conta o relatório feito pela UTAO, verificamos que o esforço financeiro líquido do Estado aumentou 880 milhões de euros em 2009. Sr.
Ministro, gostava de saber se, para 2010, prevê que haja novamente um aumento do esforço financeiro líquido do Estado ou, pelo contrário, uma diminuição, e exactamente em que montantes está prevista a transferência, designadamente, em indemnizações compensatórias, que é a parte que me parece mais visível na proposta de Orçamento, mas também em dotações de capital, concessão de empréstimos e assunção de passivos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, queria colocar duas ou três questões muito rápidas.
A primeira é, no fundo, um convite ou um desafio. O Sr. Ministro Teixeira dos Santos ainda há pouco, voltando à questão da extinção de emprego e da destruição de postos de trabalho na Administração Pública, disse que o Estado não tem de andar a garantir emprego para pessoas quando não precisa delas. Gostava de convidar ou desafiar o Sr. Ministro a dizer isso aos 400 trabalhadores do Arsenal do Alfeite cujos postos de trabalho foram destruídos. Trata-se de pessoas que fazem falta pela sua formação, pela sua qualificação e pela sua experiência e em quem a Marinha portuguesa investiu na formação. Pergunto: para quê? Para irem para a rua, para irem para casa e para o Arsenal do Alfeite recorrer, agora, ao outsourcing? Esta é minha primeira questão e tem que ver com destruição de postos de trabalho de que o Governo se gaba no País e no estrangeiro.
A segunda questão é sobre o financiamento da rede rodoviária. A contribuição de serviço rodoviário, que foi criada pelo seu Governo na Legislatura anterior, em 2007, surgiu no Orçamento para 2008 com uma previsão de 600 milhões de euros para a Estradas de Portugal. Segundo o relatório de 2009, a execução dessa verba ficou-se pelos 525,8 milhões de euros e, nesse ano, a transferência para a Estradas de Portugal, fruto da contribuição de serviço rodoviário, já seria não de 600 milhões de euros, mas de 580,1 milhões de euros. Este relatório, aparentemente, nada diz sobre a execução dessa verba mas aponta para uma verba de 555 milhões de euros em 2010.
Ano após ano, as verbas apontadas para o financiamento da rede rodoviária, fruto desta contribuição imposta pelo Governo, vão baixando em termos de orçamentação e neste relatório aparece a intenção de o Governo, apenas três anos depois da entrada em vigor da legislação criada por VV. Ex.as, rever este modelo de financiamento. Pode ler-se no relatório: avaliação e revisão do modelo de financiamento da Estradas de Portugal. Gostava de lhe perguntar como explica esta matéria e em que sentido pretende fazer esta revisão.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de colocar ao Sr. Ministro uma questão que tem a ver com as parcerias público-privadas (PPP).
O relatório do ano passado apontava que, já a partir de 2020, as receitas para o Estado das concessões com portagem nas PPP seriam de algumas dezenas de milhões de euros por ano e em 2039 ficava tudo a zeros, não haveria nem receitas nem encargos. Ora, no relatório que agora nos apresenta, Sr. Ministro, diz-se que daqui por 20 anos o Estado começa a receber, mas que de um ano para o outro a receita triplica para quase 500 milhões de euros e que em 2041, quando V. Ex.ª tiver 90 anos, as receitas do Estado serão mais de 4 000 milhões de euros. Isto é um exercício de ficção. Assim, Sr. Ministro, pergunto-lhe em que é que se baseia para apresentar quadros destes e para os subscrever em documentos do Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista Santos. Dispõe de 2 minutos.

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O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a minha breve intervenção reparte-se por duas formas: uma constatação inicial e uma questão concreta ao Sr. Ministro.
Pretende-se que este seja um Orçamento de confiança e de dinamização da actividade económica, mas constato que, por estranho que pareça, são precisamente as funções económicas que registam maior quebra, nomeadamente a agricultura (menos 37,3%) e a economia, inovação e desenvolvimento (menos 55,5%). Aliás, somando o diferencial entre as duas, estamos a falar em cerca de 1% do PIB.
Com efeito, um cenário de crise económica, de excessivo défice externo e de elevada carga fiscal sobre as empresas fazia supor medidas concretas de estímulo à actividade económica. Pois bem, o Governo não só ignorou qualquer medida de incentivo no plano fiscal como reduziu drasticamente a despesa pública nas funções económicas. É pena que a consolidação orçamental se faça precisamente onde a economia devia ser estimulada.
Senão, vejamos: em sede de IRC, manteve-se, senão mesmo agravou-se, a carga fiscal sobre as empresas. Por exemplo, na alteração do artigo 92.º do Código do IRC, onde se propõe elevar de 60% para 75% a percentagem da limitação da taxa de IRC por via da utilização de benefícios fiscais, na prática estamos a aumentar a taxa mínima para 18,75%, face à que existia no anterior Orçamento do Estado, que era de 15%.
No entanto, nem tudo está mal, Sr. Ministro. Aliás, há medidas que o PSD sublinha e que vão no bom sentido, como, por exemplo, promover a eficiência energética. Entre outras medidas, o Governo prevê incentivar uma majoração de 50% na despesa pública para frotas de veículos eléctricos, como consta do artigo 153.º da proposta de lei do Orçamento do Estado. É uma boa medida, mas é pena que esses veículos eléctricos não estejam ainda disponíveis em Portugal e que, por isso, não tenha aplicação.
Vou referir-me agora ao que considero surpreendente neste Orçamento do Estado, também numa função económica importante. O Sr. Deputado Honório Novo já falou nela e queria sublinhá-la.
O seu colega de Governo, o Ministro da Agricultura, veio dizer aos jornais que há um lapso no Orçamento do Estado de cerca de 0,5% do PIB, 848 milhões de euros, que tem a ver com a desorçamentação do seu ministério. De facto, nada disto tinha muita importância se estas verbas não fossem fundamentais para a execução de importantes programas comunitários, nomeadamente do programa de desenvolvimento regional e do Programa Operacional para o Sector das Pescas (PROMAR).

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
A questão concreta é a seguinte: vai o Sr. Ministro das Finanças entregar a esta Casa ou o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentar, como anunciou o seu colega de Governo, uma alteração ao Orçamento do Estado para rectificar este lapso? Está o Sr. Ministro em condições de garantir a esta Câmara que não vamos perder, em qualquer circunstância, fundos comunitários por desorçamentação, quer para a agricultura quer para as funções económicas, no âmbito dos programas do QREN?

O Sr. Presidente: — Para terminar esta ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo. Dispõe de 2 minutos.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, antes de colocar as perguntas, gostaria de fazer uma nota prévia.
Sr. Ministro, a descredibilização contínua dos cenários do Ministério é uma constante. Se no Orçamento do Estado para 2009 a palavra de ordem era o rigor e, passado 15 dias, já tínhamos uma rectificação do Orçamento, veremos a confiança que nos vai inspirar este Orçamento.
Contudo, queria perguntar ao Sr. Ministro se vai criar as condições para que a taxa de execução do QREN entre definitivamente em valores aceitáveis, porque pode ser um instrumento fundamental para dinamizar o investimento, combater a crise e promover o emprego. Tendo em conta que as desigualdades sociais e as

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assimetrias não deixam de crescer, em particular no mundo rural, penso que era fundamental que houvesse a promoção da revisão do efeito spill over, porque vem afectar as regiões da coesão em detrimento da região de Lisboa e Vale do Tejo. Portanto, em relação ao QREN, era fundamental que esta situação pudesse ser revista, pois muito prejudica as regiões da coesão. De facto, a continuarmos assim, vamos manter-nos afastados, em matéria de crescimento, em relação à zona euro e à zona da União Europeia.
Em relação ao desemprego, gostava de saber se o Sr. Ministro fica satisfeito com o facto de, até há poucos anos, termos valores abaixo da média da União Europeia e agora nos contentarmos por apenas não sermos o primeiro ou o segundo Estado-membro com a taxa de desemprego mais alta. Para nosso mal, a rota tem sido sempre de ascensão em termos do ranking, e o mesmo se passa em relação à questão do défice público que, durante a Legislatura passada, era sempre dada como o bom exemplo – no exercício de 2008 para 2009, fomos o quarto país em que mais se deteriorou e passámos a ter um défice de 6,6% contra os 4,6% da União Europeia a 27.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Uma última pergunta, Sr. Ministro. Confrontando a medida de avançar nas grandes obras públicas, prevista no programa eleitoral do Partido Socialista, gostaria de saber se, nesta altura, está mais pela versão do PSD, ou seja, a recalendarização e a reprogramação das grandes obras públicas.
Era essencialmente isto, Sr. Ministro, que queria deixar à sua consideração.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, procurarei responder ao conjunto de questões que apresentaram. Espero responder a todas, mas se houver alguma que entendam importante e que falhe, peço o favor de chamarem a atenção. Não é porque queira fugir às questões.
Sr. Deputado Matos Rosa, quanto às GOP e aos investimentos, devo confessar sinceramente que o quadro de informação que deve e tem de ser apresentado tem previstos um conjunto de timings na sua elaboração que, penso, tornam difícil, e até diria justificável, que algumas coisas tenham de ser feitas, porque são duplicações.
Temos de o reconhecer, porque o Governo apresentou um Programa, apresentou um Orçamento para 2010 e apresentará o Programa de Estabilidade e Crescimento, que dá um quadro de objectivos, políticas e esforço financeiro a médio prazo, e, em cima disto, o Governo tem de apresentar as GOP. Não há uma visão integrada e articulada no nosso quadro jurídico de tudo isto, o que se traduz, depois, na forma como implementamos esta matéria. Penso que todos os que passaram pelo governo sentiram as debilidades desse enquadramento.
Devo dizer que penso que isto tem de ser revisto. Não faz sentido andarmos a repetir, de documento para documento, um conjunto de coisas que, penso, devem estar concentradas em documentos-base que devem fazer parte da nossa discussão política e avaliação, não faz sentido andarmos com sobreposições.
Penso que o caso das GOP é, claramente, um exercício de duplicação relativamente ao Programa do Governo e ao Programa de Estabilidade e Crescimento e, a mais curto prazo, à proposta de lei do Orçamento.
Temos de assumir isto e assumir a necessidade de revermos este quadro.
Não queremos desrespeitar a lei e os normativos constitucionais, mas creio que, eventualmente, em sede de revisão da lei de enquadramento, poderíamos coordenar melhor estas peças ou estes documentos.
Quanto à questão dos investimentos grandes versus pequenos, e respondendo, em parte, ao Sr. Deputado Cristóvão Crespo, entendemos que os grande investimentos, como são chamados, designadamente, o novo aeroporto e o TGV, são investimentos importantes para o reforço da competitividade da nossa economia.

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Portugal é um país geograficamente periférico e não podemos considerar que essa posição periférica em termos geográficos é uma fatalidade em termos económicos. Não temos, necessariamente, de ser periféricos em termos económicos.
Penso que Portugal pode ganhar uma grande centralidade no Atlântico, como ponto de ligação entre o Norte, o Sul, o Este e o Oeste, portanto, como ponto de ligação às Américas do Norte e do Sul e a África, como porta de entrada na Europa. Temos de apostar nisto.
A distância é um factor de competitividade, não a distância quilométrica mas a distância em tempo.
Portanto, termos boas infra-estruturas portuárias, ferroviárias, rodoviárias, aéreas, de banda larga, telecomunicações, etc., é fundamental para darmos centralidade a Portugal, para aproximarmos Portugal dos grandes mercados e, assim, termos um factor acrescido de competitividade da nossa economia.
É evidente que isto é um esforço que tem de ser feito no presente mas que trará um benefício, tendo em vista a melhoria da nossa capacidade externa, de redução do desequilíbrio externo e de resolução do problema estrutural do endividamento.
É esta a minha visão. A par disto, deverá haver, com certeza, uma aposta no sector energético, como forma de alívio de uma factura externa pesada em termos da energia.
Temos de assumir estes compromissos. Assumo-os, defendo-os e penso que os devemos levar a cabo.
Não há aqui qualquer inversão nas opções do Governo quanto a esta matéria.
Com certeza que este é um esforço que tem de ser levado a cabo num quadro orçamental que exige rigor nos encargos financeiros e na forma como os investimentos devem ser avaliados e executados.
A questão do enquadramento de médio prazo da correcção orçamental das finanças públicas, levantada pelo Sr. Deputado Matos Rosa, estará patente no Programa de Estabilidade de Crescimento, tal como tivemos oportunidade de referir, mas é um quadro de correcção que tem como objectivo, até 2013, procedermos à correcção do défice e termos um défice abaixo dos 3%.
Foi também referida a questão da tributação sobre a banca, que tem a ver também com as questões da redução dos benefícios fiscais. Com certeza que, nosso entender, há medidas de relevância no sentido de reforçarmos a equidade do sistema financeiro. Trata-se da questão da tributação dos bónus e, neste caso, da limitação do uso dos benefícios fiscais.
Não partilho da ideia expressa pela Sr.ª Deputada Isabel Sequeira e por outros Deputados, de que isto vai ser uma penalização para a generalidade das empresas. Não é, pois creio que a forma como os benefícios fiscais são usados, tendo em vista aliviar a factura fiscal, é mais relevante no sector financeiro, tendo a norma efectiva pouca incidência noutras empresas fora do sector financeiro. Portanto, ela acaba por ter relevância no âmbito desse sector.
Creio que temos de compreender que há um conjunto de custos acrescidos para a sociedade, a todos os níveis, os quais também têm reflexo orçamental, que têm a ver com um custo imposto por uma crise que teve origem no sector financeiro, sendo legítimo que reivindiquemos do sector financeiro uma participação no esforço financeiro que todos temos de enfrentar para combater a crise e os seus custos.
Quanto à questão das obras públicas e da bondade das nossas opções, só por ironia constato a grande preocupação de algumas bancadas, em particular do PSD, em investimentos que penso serem fundamentais para o reforço da nossa competitividade externa e para combater a questão do endividamento externo, sendo que o PSD não teve o mesmo nível de preocupação, nem se questionou, quando resolveu gastar 1000 milhões de euros em submarinos, que tiveram um impacto muito reduzido na produção nacional. Registo também estes aspectos um pouco mais laterais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso foi o CDS!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Era um governo PSD/PP, portanto, são ambos responsáveis por isso.

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Quanto à questão da exportação, com certeza que temos um esforço grande de internacionalização, de exploração de novos mercados, de upgrade de conteúdo tecnológico de exportação. É uma tendência que começámos a sentir antes da crise e que terá de ser retomada. Daí vermos aqui potencial de recuperação das exportações.
Quanto à orçamentação por programas, levámos a cabo um trabalho significativo no sentido das melhores práticas neste domínio. Criei um grupo de trabalho que, nos últimos anos, se debruçou sobre isto, teve uma cooperação estreita com a OCDE nesta matéria e temos já linhas de orientação e propostas neste domínio que penso que terão de se traduzir numa iniciativa legislativa, dado que isto terá implicações ao nível do próprio enquadramento orçamental.
Mas, na organização deste Orçamento, procurámos avançar já com a orçamentação por programas, não numa lógica transversal, como muitas vezes ela é entendida, mas ainda numa lógica vertical, ministério a ministério, que já introduz um conjunto de princípios que serão importantes na forma de pensarmos o orçamento e de o gerirmos, que será positivo para outras mudanças posteriores.
Sr.ª Deputada Assunção Cristas, aqui, a dívida pública é a dívida das administrações públicas em contabilidade nacional. Portanto, a dívida de todas as entidades empresariais, como, por exemplo, a Estradas de Portugal, que consolidam em contas nacionais para o apuramento do défice, consolida para o apuramento da dívida pública para efeitos de cômputo do rácio da dívida pública no PIB.
Quanto à avaliação financeira da Estradas de Portugal, digo que sim e respondo, de alguma forma, ao Sr. Deputado Bruno Dias. Com certeza que há um modelo de financiamento que foi abalado por esta crise, porque as condições de acesso a financiamento externo foram altamente perturbadas pela crise financeira e também as condições em que esta entidade se poderia financiar foram profundamente alteradas em virtude da crise financeira. O próprio desenvolvimento dos mercados petrolíferos e a contracção da procura acabou também por ter efeitos, conforme referiu, na sua receita própria, que é a contribuição dos serviços rodoviários, que ficou aquém da expectativa porque houve uma redução do consumo de combustíveis que se reflectiu nisso.
O reflexo disto teve a ver com um factor que há pouco referi. Um dos elementos que acabou por nos surpreender no apuramento do défice teve a ver com o facto de a Estradas de Portugal, em contas nacionais, ter um défice superior relativamente ao que esperávamos, de cerca de 0,2 ou 0,3 pontos percentuais do PIB, que reflectem estes efeitos, por exemplo. Daí a necessidade de revermos o modelo de financiamento da Estradas de Portugal, no sentido de podermos ter um modelo que assegure a sustentabilidade do financiamento nesta área.
No domínio das PPP, não há descontrolo. O que pretendemos, isso sim, é ter uma melhor cooperação e coordenação dos projectos, uma maior coerência no acompanhamento e também maior agilidade e qualidade – há que o dizer.
Preferimos ter uma unidade permanente de técnicos conhecedores do que ter, muitas vezes, equipas de acompanhamento que são nomeadas caso a caso. Portanto, penso que há um know-how importante que é preciso consolidar e manter no âmbito da nossa administração, em particular no domínio do acompanhamento que as finanças têm de fazer nesta área.
Quanto à questão da fiscalização do rendimento social de inserção, damos nota da necessidade de uma fiscalização acrescida, de contenção de gastos neste domínio. Os beneficiários vão estar sujeitos a uma fiscalização semestral para averiguação e comprovação da condição de recursos que está subjacente à aplicação desta prestação e que permitirá averiguar se as condições de renovação estão verificadas.
Quanto à unidose, entendemos também que, no âmbito da política do medicamento, é uma medida importante, tendo em vista a redução das despesas com o medicamento, a par de outras. Propomo-nos ultrapassar algumas dificuldades que se sentiram na implementação desta medida, que já foi, no fundo, de alguma forma, sinalizada, e temos de tomar iniciativas que levem a uma efectiva implementação da unidose para, obviamente, podermos beneficiar das economias que isso implica.
Quanto à questão da reprivatização do BPN, levantada também pelo Sr. Deputado José Gusmão, e ao problema de se poder substituir o beneficiário da garantia, devo dizer que temos um processo de

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reprivatização do BPN, o qual, no seu balanço, tem alguns passivos que, à luz da lei que o nacionalizou, beneficiam do aval do Estado. Com certeza, temos de acautelar aqui — e não é certo que ainda venha a ocorrer — que, no âmbito da reprivatização, tenhamos de fazer um recorte de activos e passivos e transferir esses activos e passivos para outras entidades, para fora do universo do BPN, sendo certo que a garantia que lhes está subjacente não pode ser eliminada de um momento para o outro e terá de ser mantida, mas com esse condicionalismo que é referido, isto é, desde que haja uma redução da exposição do garante e que não se traduza em ónus acrescido para o garante, mas, pelo contrário, haja uma redução desse ónus.
Diz que não está quantificado. Mas não é preciso quantificar, tem é de ser menor. É quanto basta para que, obviamente, se acautele o interesse do Estado, que é não ter ónus acrescidos nesta matéria.
No que se refere à questão das receitas que referiu, de aumentos da ordem dos 540%, creio que a Sr.ª Deputada terá sido influenciada por notícias dos jornais sobre esta matéria. Gostaria de dizer que, em contas nacionais e para o conjunto das administrações públicas, estas receitas de capital sobem apenas 387,8 milhões de euros, que eram as receitas relativamente às quais se referia essa notícia.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Ministro, estou a referir-me ao quadro da pág. 149 — Receitas de capital sem activos!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Então, se o Sr. Presidente me der licença, esclareço que irei passar a palavra aos Srs. Secretários de Estado, que poderão complementar um pouco as minhas respostas.
Peço, portanto, aos Srs. Secretários de Estado Adjunto e do Orçamento e dos Assuntos Fiscais que, relativamente a algumas questões, se preparem para acrescentar mais alguma coisa ao que eu digo.
Quanto às receitas das portagens, esperamos que elas melhorem a situação financeira da Estradas de Portugal e aliviem o seu peso orçamental, porque é esse o objectivo. Acho que os ganhos que se obtenham aqui têm de ser prioritariamente utilizados para reduzir o desequilíbrio orçamental e não para outra finalidade.
No que se refere ao Sr. Deputado José Gusmão, creio que, de alguma forma, já respondi à questão do BPN.
No que diz respeito à questão levantada pelo Sr. Deputado Honório Novo, relativamente às medidas no âmbito da função pública, gostaria, em primeiro lugar, de dizer que a bonificação será dada, sendo aqui igualado o regime da função pública ao regime da segurança social. Portanto, aos 55 anos, os funcionários públicos, tal como os privados, têm direito a uma bonificação, que até agora não tinham.
Quanto à questão da penalização por reformas antecipadas, há, de facto, aqui uma antecipação da entrada em vigor da penalização prevista no regime geral, mas ninguém tem de ser penalizado, porque trata-se, obviamente, de uma opção que as pessoas terão de tomar no sentido de solicitarem ou não a reforma antecipada. Chamo a atenção para o facto de, passando de uma penalização de 4,5% ao ano para uma penalização de 0,5% ao mês, isto não implica, necessariamente, uma penalização para todos ou em todas as circunstâncias. Basta pensar que, por exemplo, um funcionário que se aposentasse um trimestre antes do tempo tinha uma penalização de 4,5% e agora passa a ter apenas uma penalização de 1,5%, porque a penalização é contada mensalmente. Há muitas situações possíveis e isto não implica, necessariamente, uma penalização para todos e, obviamente, a dimensão dessa penalização será sempre gerível por quem toma a decisão de se aposentar antecipadamente.
No que se refere às questões fiscais colocadas pela Sr.ª Deputada Isabel Sequeira, peço também ao Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que complete a minha resposta, mas poderei dizer, desde já, que a autorização legislativa das taxas é para dar um enquadramento ao lançamento de eventuais taxas por entes da Administração Pública, porque temos várias taxas já existentes em relação às quais alguns constitucionalistas chamam a atenção para a necessidade de termos, conforme está previsto, um enquadramento para a questão das taxas, uma lei geral de taxas. Esta iniciativa não visa criar novas taxas mas, sim, enquadrar as actuais e dar um enquadramento para taxas que, muitas vezes, ao nível local e mesmo ao nível da administração central, possam vir a ser lançadas. Mas não é para lançar novas taxas.

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Sr.ª Deputada, no que diz respeito à concessão de garantias, há aqui alguns pequenos acertos de contas, mas, em linhas gerais, tínhamos um nível de garantias que foi reduzido no Orçamento rectificativo, no final do ano, e temos aqui 9000 milhões que é um pouco manter o remanescente, ou seja, a possibilidade de garantirmos os montantes remanescentes previstos no âmbito da iniciativa de reforço da estabilidade do sistema financeiro.
Quanto às indemnizações compensatórias e às injecções de capital, isso consta do Capítulo 60. Portanto, os valores estarão aí disponíveis.
No que diz respeito à questão do lapso da agricultura, o que se passa aqui, em boa verdade, é o seguinte: na generalidade dos países da União Europeia, as verbas comunitárias não são inscritas no Orçamento, porque elas normalmente dão origem a uma receita e a uma despesa correspondente.
E, por recomendação do Tribunal de Contas, o que é feito aqui é que as verbas comunitárias deixam de ser inscritas ou deixam de ser consideradas nestes mapas. Mas continuam a existir! Não há corte de verbas, Sr. Deputado. Só que, no tratamento contabilístico e de inscrição no Orçamento, de acordo com essa recomendação, elas deixaram de ser inscritas.
Aquilo a que o Sr. Ministro da Agricultura se queria referir era que deveria ter sido dada uma nota explícita disso, porque isso, de facto, não é claro no relatório e deveria ser clarificado.
Portanto, não é uma questão de corte de verbas, que não existe, mas, sim, um critério ou uma regra de apresentação ou de contabilização, atendendo àquilo que é a prática generalizada na Europa e à recomendação do Tribunal de Contas em relação a esta matéria.
Quanto às taxas de execução do QREN, queremos, com certeza, melhorá-las e estamos empenhados nisso, muito em particular o Sr. Ministro da Agricultura. Creio que reconhecem o esforço que ele tem vindo a desenvolver, esforço esse que estará também presente neste Orçamento.
Não estou satisfeito com os valores do desemprego, tal como ninguém pode estar, os quais estão a um nível elevado. Recordo que houve um salto no nosso nível de desemprego de pouco mais de 4% para cima de 7% durante o governo do PSD e estes são saltos que ficam e condicionam os valores actuais.
Quanto às obras públicas, creio que já respondi.
Sr. Presidente, estou quase a acabar o meu tempo, por isso peço-lhe a sua condescendência para dar mais uns minutos, atentos aos excessos dos outros grupos, para os meus Secretários de Estado poderem acrescentar alguma coisa.

O Sr. Presidente: — Tendo em conta que foram também utilizados tempos a mais pelos Deputados, vou ser um pouco condescendente.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento (Emanuel Augusto Santos): — Sr. Presidente, muito brevemente, sobre a questão das outras receitas correntes do Estado, gostava de chamar a atenção para os quadros das págs. 363 e 364, onde se apresentam as contas do Estado — administração central, segurança social e autarquias locais — em finanças públicas, isto é, onde se apresentam as receitas efectivas que o Estado espera cobrar.
Nesses dois quadros, a Sr.ª Deputada pode verificar que, no ano de 2009, a estimativa de execução das receitas correntes é de 3275,4 milhões de euros e que, em 2010, se espera cobrar 3276,8 milhões de euros.
Como a Sr.ª Deputada pode constatar, não há praticamente qualquer aumento. O aumento que está previsto não chega a 2 milhões de euros, é, aliás, de cerca de 1,8 milhões de euros.
Portanto, gostava de sublinhar que, onde a Sr.ª Deputada vê algo de extraordinário, eu não estou a vislumbrar nada de extraordinário.
O que posso dizer, em primeiro lugar, por questões de metodologia, é que onde há maior uniformidade e maior credibilidade do ponto de vista económico-financeiro é num quadro de contas nacionais, que é harmonizado com o sistema de contas europeu, e, em segundo lugar, onde há coerência, mas numa óptica de

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caixa, é nos quadros que se apresentam para todas as administrações públicas numa óptica de contabilidade nacional. Estes quadros obedecem a metodologias diferentes, mas são coerentes no seu conjunto.
Os quadros auxiliares, não integrados em quadros de contas nacionais ou de contas públicas, que aparecem no relatório poderão, porventura, em alguns casos — e a maior parte deles estão explicados —, apresentar valores diferentes. Trata-se, efectivamente, de contabilizações diferentes. Como a Sr.ª Deputada sabe, por exemplo, as receitas de vendas de imobiliário, em contas nacionais, não aparecem tão-pouco nas receitas, são abatidas às despesas de capital.
Naturalmente que estes são pormenores técnicos que convém ter em conta na análise que se faz das nossas contas. De qualquer modo, estarei sempre disponível para explicar – não sabendo de imediato, posteriormente, poderei dar todas as explicações necessárias – porque é que, num quadro auxiliar, poderá aparecer o aumento de receitas que a Sr.ª Deputada refere que existe na pág.148.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Sérgio Vasques): — Sr. Presidente, quero apenas deixar aqui duas notas muito rápidas para responder às observações da Sr.ª Deputada Isabel Sequeira relativamente às taxas que o Governo, como sugere, pretenderia criar.
Sr.ª Deputada, do que se trata, efectivamente, não é, de todo, de criar novas taxas mas simplesmente de aplicar à administração central do Estado o mesmo regime que já vale para a administração local e obrigar, portanto, à edição de um diploma semelhante à Lei n.º 53/2006, que surge em cumprimento de um comando constitucional e que obrigou, ao fim e ao cabo, as autarquias a fundamentar, do ponto de vista económicofinanceiro, as taxas que cobram dos cidadãos. Julgamos que é a altura de a administração central do Estado fazer o mesmo, e suponho que a Sr.ª Deputada não terá, seguramente, nessa matéria qualquer objecção.
Mais surpreendentes foram as observações formuladas pelo Sr. Deputado seu colega de bancada, que disse que este Orçamento do Estado não compreende medidas de apoio às empresas em matéria fiscal.
Sr. Deputado, julgo que, com uma leitura atenta da proposta orçamental, terá notado ou irá notar que o Governo se propõe prolongar por mais um ano o regime fiscal de apoio ao investimento (RFAI 2009), que vigorou para 2009 e que pretendemos que vigore também para 2010.
Aliás, pretendemos alargar alguns benefícios, de forma selectiva, tais como o benefício fiscal à criação de emprego, consignado no Estatuto dos Benefícios Fiscais, no artigo 19.º, até agora não cumulável com os apoios em matéria de segurança social.
Pretendemos ainda alargar, também de forma selectiva, o SIFIDE, isto é, o sistema de incentivos fiscais à investigação e desenvolvimento empresarial, fomentando a contratação de doutorados pelas empresas portuguesas, porque nos parece que vale a pena fazer despesa fiscal nesta matéria. E pretendemos também, como terá notado, alargar os apoios fiscais aos chamados business angels, que podem ter um papel importante no relançamento da nossa economia e, sobretudo, das pequenas empresas.
Mais do que isso, propomos uma racionalização, há muito tempo esperada, do imposto do selo, eliminando verbas que incidem sobre os escritos dos contratos, os emolumentos notariais, as entradas de capital, fazendo, aqui sim, uma despesa fiscal selectiva que, sem qualquer dúvida, beneficiará, de imediato, as nossas empresas. Portanto, julgo que, se fizer essa leitura mais atenta, verá que não é exactamente como diz.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos a possibilidade de concluir os trabalhos hoje de manhã, o que, penso, deveríamos fazer com esta ronda de intervenções finais.
Gostaria de pedir aos Srs. Deputados que trouxeram intervenções escritas o favor de as fazerem chegar aos serviços da COF, para facilitar a transcrição e elaboração da Acta da presente reunião.
Assim, darei a palavra, por um período máximo de 3 minutos, a cada grupo parlamentar, a que se seguirá um período de 10 minutos para respostas, se pretenderem utilizar esta terceira ronda.
O Sr. Deputado Duarte Pacheco pediu a palavra para que efeito?

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, para uma interpelação no sentido de saber se todos os partidos vão intervir. No fundo, para saber se vamos ter uma terceira ronda, porque, se sim, nós participaremos, naturalmente.

O Sr. Presidente: — Sim, Sr. Deputado. A Mesa tem indicação que há partidos que pretendem utilizar esse tempo.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Duarte Pacheco, tem então a palavra por um período máximo de 3 minutos.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sei que o PSD está de acordo! É uma espécie de orçamento PS/PSD!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, se me permite, até para responder a este aparte, hoje tem início um processo em que vamos ter muito tempo para analisar, na especialidade, todo o documento. Vamos ter debates na generalidade, todos os Srs. Ministros irão passar por esta Comissão, o Sr. Ministro das Finanças voltará cá e, portanto, vamos ter muitas oportunidades para voltar a colocar questões. Daí eu ter colocado a questão que coloquei há momentos.
Mas visto que vamos iniciar uma terceira ronda, em primeiro lugar, Sr. Ministro, gostaria de lembrar que os investimentos a que fez referência na área da defesa enquadram-se na Lei de Programação Militar, aprovada com larguíssimo consenso, nomeadamente com os votos favoráveis das duas maiores bancadas, tratando-se de uma matéria que não tem estado no âmbito do debate político-partidário.
Quanto às questões que gostaria de voltar a colocar, resultam da falta de resposta em todas as intervenções que o Sr. Ministro já aqui proferiu. Com toda a franqueza, aguardei. Poderia ter acontecido o Sr.
Ministro não ter tido oportunidade, naqueles primeiros minutos, de responder a todas as questões que coloquei, mas, visto que chegámos a este momento sem ter obtido ainda essas respostas, volto a colocá-las.
Sintetizando, são quatro as questões.
Primeira questão: qual a justificação para o aumento das receitas de impostos, nomeadamente do IVA, do ISV e do IRS, quando temos um crescimento mísero da economia e um crescimento do emprego inexistente? Portanto, a pergunta que coloco é como é que justifica este aumento de receitas, uma vez que, no passado, quando da aprovação do Orçamento do Estado para 2009, já tínhamos muitas dúvidas sobre como seria possível haver um grande crescimento ao nível das receitas de impostos.
Segunda questão: qual a justificação para o aumento do limite de endividamento que nos pede, visto que, há poucos meses, no Orçamento rectificativo, aprovámos um limite de endividamento de cerca de 15 000 milhões de euros e agora vêm pedir-nos um aumento desse limite de endividamento para 17,25 milhões euros? Portanto, a questão é qual a razão por que o Estado pretende este reforço do limite de endividamento? Terceira questão: saudamos, e bem, que a postura de euforia de criar concessões rodoviárias e construir linhas TGV sempre, já e a toda a pressa, é alterada para uma atitude de «vamos equacionar», «vamos analisar cautelosamente», «vamos, porventura, adiar alguma coisa». Neste sentido, Sr. Ministro, a pergunta concreta é: quais as concessões rodoviárias que vão ser repensadas e adiadas? Quais as linhas de TGV que vão ser repensadas e adiadas? É a linha do TGV Lisboa/Porto/Vigo? Pode dar-nos esta informação, Sr.
Ministro? O meu colega Matos Rosa colocou esta questão mas o Sr. Ministro não teve oportunidade de lhe responder.
Quarta questão: em relação às parcerias público-privadas, perguntei-lhe, Sr. Ministro, se está disponível para aceitar a fixação de um tecto, de um limite, aos encargos com as PPP. Entendemos que esse limite deve

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vigorar para o País, independentemente do Governo, de modo a não estarmos sistematicamente a comprometer outros governos e o futuro das próximas gerações? São estas as questões que lhe deixo, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, gostaria de começar por fazer uma nota prévia, porque têm sido feitas algumas referências ao relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental que penso que não existe. Portanto, Sr. Presidente, peço uma clarificação sobre o assunto.

O Sr. Presidente: — Posso esclarecer, Sr. Deputado.
Não foi feito qualquer relatório. Enviei para os coordenadores uma informação preliminar sobre a necessidade de mais informação, tendo assinado hoje um ofício a pedir essa informação ao Ministro dos Assuntos Parlamentares, designadamente para tornar comparáveis alguns valores. Portanto, tratou-se de uma mera informação técnica preliminar, pedindo mais alguma informação o que enviei aos coordenadores, pelo que as referências ao «relatório» são inexactas, dado que não há qualquer relatório sobre a proposta de lei do Orçamento do Estado para 2010.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Nesta última ronda, Sr. Ministro, penso que se demonstrou uma vez mais como é importante esta primeira vinda de V. Ex.ª à Comissão de Orçamento e Finanças, antes da apresentação pública do Orçamento do Estado, porque permite, desde logo, clarificar algumas dúvidas, para não dizer algumas leituras enviesadas do documento, o que também se compreende, de certa forma, considerando o seu volume, a sua densidade e muitas vezes a escassez de tempo para tomar posições e reagir a notícias várias e algumas especulações.
Portanto, penso que fica claro da sua intervenção inicial e das suas respostas que há de facto uma aposta no investimento público. Independentemente das tentativas para justificar e desvalorizar aquilo que é a aposta do Governo e para justificar o contrário, a verdade é que a aposta do investimento público sempre foi uma questão central para o Governo, para o combate à crise que atravessamos, e fica hoje mais uma vez evidente que encontra neste Orçamento uma resposta concreta e real.
Mas há outras questões, nomeadamente a que se refere aos incentivos à economia, à exportação, às empresas em sede fiscal, e ainda uma novidade, que tem passado um pouco despercebida, que é a possibilidade da compensação dos créditos sobre o Estado que as empresas têm para mais facilmente recuperarem o que é seu, ou seja, mais um passo em frente e um passo determinado e novo, reforçando esta componente, para que o Estado se assuma como bom pagador e, também por essa via, apoie as empresas, o que vem na linha do esforço que V. Ex.ª, enquanto Ministro das Finanças, tem feito nos últimos anos.
Fica também evidente que não há aumento da carga fiscal e há alguns apontamentos de equidade e de justiça fiscal que não têm sido de todo contestados, e ainda bem.
Há um elemento importante de reforço do apoio ao emprego e à contratação, nomeadamente conciliando forças da área fiscal com forças da área da segurança social, matéria que o Sr. Secretário de Estado fez questão de referir, e bem. Ou seja, há também aqui um avanço por parte do Governo como um todo, conjugando esforços, acumulando benefícios em duas áreas que não eram passíveis de acumular, os benefícios fiscais e os benefícios da segurança social.
Há ainda o seguimento da importante aposta ao nível das energias renováveis, que deve ser destacada porque é fundamental para ultrapassarmos as nossas dificuldades, para contrabalançar os nossos défices não só da balança de transacções correntes mas também de eficiência energética. Há um esforço importante em sede de benefícios fiscais para o aumento da eficiência energética geral ao país, nomeadamente nos edifícios e nas habitações, e há clara contenção de despesa.

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Mas, Sr. Ministro, há um outro elemento que penso ser fundamental destacar relativamente a um traço novo que este Orçamento traz, os claros estímulos à poupança.
Portanto, Sr. Ministro, à laia de nota de encerramento desta intervenção, peço-lhe que nos fale também desta componente fundamental que este Orçamento traz, como nenhum outro alguma vez trouxe (pelo menos, que eu me recorde), de estímulos verdadeiros à poupança.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, permita-me um aparte — já que o mar está tão na moda, e nisso todos concordamos —, lembrando ao Sr. Ministro que o lançamento do processo para a compra de submarinos terá começado em 1998. Creio que o Sr. Ministro era na altura Secretário de Estado e nessa época a opção era de três submarinos mais quatro. Depois, durante o governo PSD/CDS, quando esse número baixou para 2, o PS criticou muitíssimo essa opção. Portanto, já que estamos aqui em partilha de memórias, gostaria que ficasse também esta referência, para que a memória não seja tão selectiva.
Em relação ao que nos ocupa hoje, gostaria apenas de perguntar se nesta ronda final o Sr. Ministro poderá eventualmente ter algum tempo para nos esclarecer em relação a alguns pontos que ainda ficaram em aberto.
Muito sumariamente, são os seguintes: que privatizações, para atingir aquele montante previsto no Orçamento do Estado? Quanto é que o Governo está a pensar transferir para o sector empresarial do Estado? Como se explicam os 9000 milhões de euros para garantias? Como se explica o quadro da página 149 – provavelmente é dúvida nossa, mas este momento também serve para tirarmos dúvidas – no que se refere às receitas de capital sem activos. Ou seja, na receitas não fiscais, como se explica o valor que há pouco referimos? Já agora, quando lhe perguntei sobre a dívida pública e o Sr. Ministro explicou que a Estradas de Portugal consolidavam, quero lembrar que lhe perguntei para além da Estradas de Portugal, nomeadamente em relação às empresas públicas no sector dos transportes. Portanto, se tudo isso estivesse incluído, é um exercício de pensar exactamente de que dívida estaríamos a falar. Portanto, se o Sr. Ministro tiver agora essa oportunidade, muito agradecia que nos pudesse esclarecer.
Por fim, uma outra questão que ficou também sem resposta, que é a seguinte: a partir de quando, em termos de crescimento, é que se pode falar em aumento do emprego?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Gusmão.

O Sr. José Gusmão (BE): — Sr. Presidente, antes de mais, registo, da intervenção do Sr. Deputado Afonso Candal, que terminou o «jogo do sério» em torno da evolução das despesas de investimento público.
Portanto, é manter uma parte significativa, manter a aposta. Desde o princípio desta reunião, já mudou um bocadinho o discurso, no que se refere à evolução efectiva das dotações.
De qualquer forma, sobre as diferenças entre previsões e execução efectiva, poderemos falar no final do Orçamento. Ficaram aqui, pelo menos, alguns compromissos que será interessante confrontar com a realidade dos factos, daqui a um ano.
Mas gostaria de aproveitar esta última intervenção para falar sobre a questão da fiscalidade.
O Bloco de Esquerda já disse, e pode dizer outra vez, para que fique registado, que tanto a medida de tributação dos bónus aos administradores no sector financeiro (porquê no sector financeiro é uma coisa que ainda não percebemos muito bem), como a medida de redução do acesso aos benefícios e deduções fiscais em todo o lado, são medidas positivas — aliás, já eram medidas positivas quando o Bloco de Esquerda as propôs e quando o Partido Socialista disse que eram medidas radicais, populistas e demagógicas. Talvez, no futuro, o Partido Socialista queira economizar nos adjectivos, porque é capaz de ter de os vir a engolir.
Por falar em futuro e em medidas que o Bloco de Esquerda tem apresentado, gostaria de colocar a mesma questão que o Bloco de Esquerda colocou na reunião que teve com o Sr. Ministro, a pedido do Sr. Ministro dos

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Assuntos Parlamentares e depois, mais uma vez, na reunião que realizámos para efeitos da apresentação do Orçamento do Estado, que é o que é que é feito da tributação das mais-valias bolsistas.
O articulado da proposta de lei do Orçamento do Estado segue uma recomendação do grupo que elaborou o relatório sobre política fiscal, no sentido de harmonizar taxas liberatórias, seguindo uma sugestão desse grupo, harmonização que deveria ser feita a uma taxa de 20%. Inclusive, introduz uma medida, também ela positiva, que é a de a opção por defeito passar a ser o englobamento, tendo as pessoas que destacar rendimentos que queiram tributar fora do regime de englobamento. Mas há uma parte que fica de fora, que é a parte das mais-valias, e nós ainda não conseguimos perceber qual é que é o argumento de natureza económica ou de natureza fiscal com base no qual o Partido Socialista não avança com essa tributação agora.
Foi dito, aliás, por um dos responsáveis do grupo que elaborou o já referido relatório, que as experiências internacionais de introdução da tributação das mais-valias bolsistas não dão qualquer motivo para pensar que, dessa introdução, pudesse decorrer alguma instabilidade nos mercados bolsistas. Nenhuma experiência internacional aponta nesse sentido e a receita fiscal que decorreria dessa tributação é muito necessária, no actual momento, para que o próprio Governo possa prosseguir políticas públicas.
Por isso, gostaríamos de perceber a razão pela qual pode prosseguir aquilo que o grupo que elaborou, a pedido do Governo, o relatório sobre política fiscal classificou como uma inaceitável entorse à justiça do nosso sistema fiscal, ainda por cima num momento em que o Governo enfrenta uma enorme quebra da receita fiscal.
E quero referir, desde já, na expectativa de que o Governo vá reagir dizendo que a medida será implementada até ao final do mandato, que essa resposta não nos satisfaz, em primeiro lugar, porque temos formada convicção de que o Governo não tem a mais pequena intenção de terminar o mandato – tem, aliás, multiplicado os esforços no sentido de criar uma crise política nesse sentido, pelo que esse tipo de garantias não nos conforta particularmente – e, de qualquer forma, isso também não ajuda a explicar por que é que tal medida, após um ano em que se registou uma enorme quebra na receita fiscal, não é adoptada agora e vai ter de aguardar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, ainda sobre a Administração Pública, o que me preocupa é que o Sr. Ministro evita a questão política da quebra de compromisso pela segurança jurídica das leis da República, o que se traduz, de facto, na antecipação em cinco anos daquilo que os senhores tinham feito aprovar na lei de 2008 e que representa, para os reformados da Caixa Geral de Aposentações, em 2010 — que serão cerca de 22 000, segundo a previsão da Caixa Geral de Aposentações —, uma quebra anual na reforma, pela introdução destas duas normas, de 1124 €/ano, isto ç, mais de 100 €/mês.
Gostava de ouvir o Sr. Ministro sobre a ausência de transferências para o Fundo de Equilíbrio Financeiro da Segurança Social dos 2 pontos percentuais dos descontos dos trabalhadores. Neste Orçamento, nem 2, nem 1, nem nada! É esta a real intenção do Governo em relação aos 2 pontos percentuais dos descontos dos trabalhadores para a segurança social, que fazem parte da Lei de Bases da Segurança Social, como V. Ex.ª bem sabe, Sr. Ministro? Terceira questão: como é que pensam aplicar a regra de «2 por 1» nas autarquias locais? Em face, por exemplo, das transferências acrescidas de competências e atribuições relativas às escolas, em face, por exemplo, daquilo que é uma prioridade do Governo, que é o alargamento do pré-escolar, com que pessoas é que as autarquias vão responder, perante a regra de «2 por 1»? Ou, então, em face das anunciadas intenções de transferir competências e atribuições na área da saúde — veja-se, por exemplo, a participação da Sr.ª Ministra da Saúde no Congresso da ANMP, que quer dizer, certamente, alguma coisa —, o que é que isto implica em relação à aplicação da regra de «2 por 1» nas autarquias locais? Outra questão: era interessante perceber como é que, em 2009, com um défice orçamental de 9,3%, o limite do endividamento para financiar o Orçamento do Estado era de 15 000 milhões de euros, aprovados no

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Orçamento rectificativo, e agora, com um défice previsto de 8,3%, o limite do endividamento para financiar exactamente o Orçamento do Estado passa para 17 000 milhões de euros.
Outra questão ainda: importava perceber se, de facto, a lista de privatizações previstas para 2010 é a mesma de 2009. A isto, o Sr. Ministro não respondeu. Já agora, também importava saber como é que o Sr.
Ministro vai tratar o seu colega da Justiça, que disse que a ANA não iria ser privatizada.
Sexta questão: espanta-me como é que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais não comenta nenhuma das minhas afirmações sobre matéria fiscal, desde a evasão, à amnistia por crimes fiscais, às taxas e bónus sobre administradores, á taxa efectiva da banca. Talvez agora vá comentar» Finalmente, concluo, dizendo o seguinte: o Sr. Ministro não comentou a minha afirmação sobre os cortes no investimento público e sobre os cortes orçamentais na Fundação para a Ciência e a Tecnologia, o que, para bom entendedor — «quem cala, consente» —, significa que os números que dei estão correctos. Muito obrigado pela sua confirmação, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, não é «quem cala, consente», porque, aqui, não consente, de forma alguma.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ainda bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Duarte Pacheco e Sr.ª Deputada Assunção Cristas, referiram a LPM e os submarinos, tudo muito bem, mas recordo que há compromissos que se assumem, que têm uma duração que vai para além das legislaturas mas que, depois, podem ou não ser revistos, quanto à sua oportunidade, atendendo à avaliação que se faz da situação económica e financeira do País.
Aquilo que os senhores aconselham, neste momento, quanto ao TGV, dado que até aprovaram cinco linhas de TGV, é que deve ser repensado. Também podiam ter repensado a história dos submarinos no momento oportuno.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Repensámos!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, isto é válido para todos e o argumento não colhe.
Quanto a receitas de impostos, peço ao Sr. Secretário de Estado que diga alguma coisa sobre a matéria e deixo somente uma nota sobre o IVA, que também será válida, em parte, para o IRS, a qual tem a ver com o seguinte: no ano de 2009, fizemos um esforço para encurtar os prazos de reembolso desses impostos.
Portanto, houve um efeito-base, devido a esse esforço feito em 2009, que se traduziu na redução dos prazos de reembolso, o qual não se fará sentir em 2010. Por isso mesmo, não é de estranhar que, em 2010, em virtude disso, tenhamos uma taxa de variação ou de crescimento um pouco mais significativa.
Quanto à questão do limite do endividamento, que foi referida pelo Sr. Deputado Honório Novo, pela Sr.ª Deputada Assunção Cristas e pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, quero dizer o seguinte: uma coisa é o défice de 9,3% para o conjunto das administrações públicas em contabilidade nacional, outra coisa é o défice do Estado em contabilidade pública, que é aquele que é relevante para o cálculo das necessidades de financiamento ou de endividamento. E, em boa verdade, em termos nominais, essas grandezas, no que se refere ao Estado, não são muito diferentes em contabilidade pública.
Em segundo lugar, o nível de endividamento é superior ao nível do défice porque, para além de financiarmos o défice, há um conjunto de operações activas e passivas – por exemplo, os fundos de apoio às empresas para a internacionalização, os fundos que sustentam as linhas de crédito para empresas ou até entradas de capital que possam ser feitas em empresas fora da consolidação – que representam um esforço

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de financiamento que não está reflectido no défice mas para o qual o Estado, de qualquer modo, tem de arranjar meios financeiros. Isto também explica o diferencial entre o nível do défice e o nível do endividamento, porque há necessidades financeiras que têm a ver com estas operações.
O Sr. Deputado Duarte Pacheco perguntou que concessões vão ser repensadas, linhas ferroviárias, etc. O Sr. Deputado lembrou, e muito bem, no início da sua intervenção, que este é um primeiro debate e que todos os ministros cá virão discutir as questões, na especialidade. Portanto, Sr. Deputado, permita-me que o remeta, por razões que compreenderá, para o meu colega das Obras Públicas, que poderá entrar em mais detalhes e pormenorizações quanto às questões concretas que referiu. Estamos perfeitamente alinhados nestas matérias mas parece-me que, naquilo que tem a ver com política sectorial, de transportes, em particular, e com iniciativas particulares no âmbito do seu ministério, é melhor que seja ele a falar sobre o assunto e não eu, por razões óbvias, embora estejamos em perfeita consonância relativamente ao quadro geral que referi.
Quanto à questão do tecto para os encargos com PPP, recordo ao Sr. Deputado que a alínea e) do n.º 1 do artigo 31.º da Lei de enquadramento orçamental prevê já e estipula a definição de um tecto para estes encargos. Portanto, isto já está previsto na lei.
Sr. Deputado Afonso Candal, quanto ao reforço da poupança e aos estímulos, trata-se, de facto, de um aspecto que realçamos nesta proposta de Orçamento.
Como há pouco referi, constatámos um aumento da poupança em 2009, que tem muito a ver com a conjuntura que se viveu e com uma maior aversão ao risco por parte dos agentes económicos, em particular das famílias. O sentido da precaução saiu reforçado desta conjuntura, o que se traduziu, de facto, num aumento de, diria, quase 50% na taxa de poupança, que passou da ordem dos 6% para os 9% do PIB, não sendo de esperar que se mantenha ou sustente a este nível tão elevado. Portanto, à medida que se vai desanuviando, em parte, o ambiente económico-financeiro, será de esperar que esta taxa de poupança se reduza um pouco, pelo que temos, realmente, de tomar iniciativas para que a possamos manter a um nível mais elevado, de forma sustentada, e para que o ajustamento não seja, pura e simplesmente, o regresso aos níveis anteriores. Isto é bom para a economia, é bom para a capacidade de financiamento interno do nosso esforço de investimento, reduz as necessidades de financiamento no exterior e reduz o endividamento face ao exterior, o que é importante.
Por isso mesmo, lançamos aqui iniciativas que visam dar um estímulo à poupança interna. É o caso da emissão de obrigações do tesouro para o mercado interno, a retalho, dado que a emissão de dívida pública, com excepção dos certificados de aforro, está, neste momento, no mercado por grosso e para institucionais.
Iremos fazer essa emissão interna para retalho, procurando dar um estímulo e oferecer mais um produto para a poupança.
Propomos também a criação da Conta Poupança-Futuro, a chamada «conta-criança», decisão que foi anunciada e tomada, hoje, pelo Governo, em reunião. Aliás, esta iniciativa irá por diante, uma vez obtida a autorização legislativa que consta da proposta de lei, para lançarmos um produto que possa ter estímulos fiscais semelhantes aos que estão previstos no âmbito dos PPR e possa servir não só de estímulo para a natalidade mas, acima de tudo, para atrair e incentivar a poupança.
Estas são iniciativas que estão aqui presentes e que gostaria que referir, neste domínio.
Relativamente a privatizações, questão colocada pelos Srs. Deputados Assunção Cristas e Honório Novo, temos um programa de privatizações que não foi executado, em virtude das vicissitudes que tivemos nos mercados financeiros; esse programa de privatizações e as empresas que nele constam mantêm-se na nossa lista de privatizações e estamos a analisar outras possibilidades mas ainda é prematuro anunciá-las. Uma vez tomadas as decisões de avançar, eventualmente, com novas iniciativas de privatização, elas serão anunciadas, mas entendemos que temos de fazer um esforço neste domínio porque é importante que, também por esta via, possamos conter a evolução do rácio da dívida.
Sr. Deputado Honório Novo, com certeza, tratarei bem o meu colega da Justiça, como colega e como amigo, com toda a consideração e respeito institucional que lhe devo e não»

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Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Não, Sr. Deputado, não queira dar um ar trauliteiro. Não vale a pena ter uma atitude tão trauliteira em torno destas questões.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não é uma atitude trauliteira. É uma questão de honra!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Só lhe fica mal, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — É uma questão de palavra, Sr. Ministro. Permita-me a interrupção.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Não se zangue. Mantenha-se calmo!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não gosto é que me chamem trauliteiro!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Respondo, agora, às questões levantadas pela Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
Quanto às garantias, não sei se estava ou não presente na Sala mas quer eu quer o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento já tivemos oportunidade de referir o que está previsto.
No que respeita à questão do crescimento de 1%, respondo-lhe o seguinte: sim, acho que, na actual conjuntura, com um crescimento a partir e acima de 1%, assistiremos já a uma estabilização e, depois, a uma recuperação da taxa de desemprego. É esse o meu ponto de vista.
Quanto a taxas liberatórias, deixo a resposta para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Relativamente às mais-valias, não há nada a acrescentar. Entendo que o Sr. Primeiro-Ministro foi muito claro aquando do debate que tivemos sobre esta matéria. Se o Sr. Deputado não está satisfeito, problema seu.
A explicação está dada e não há mais nada a acrescentar.
Sr. Deputado Honório Novo, entendemos que, face à situação orçamental com a qual nos confrontamos e à necessidade urgente de iniciarmos um processo de consolidação orçamental, não podemos manter o período de transição previsto e daí a nossa medida.
A transferência para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social dos 2 pontos percentuais que referiu está já prevista na lei. Ela não precisa de estar prevista na lei do Orçamento, ela está prevista na lei, noutra sede legislativa, ela está assegurada por outra disposição legal.
A regra de dois por um é para ser aplicada na administração central. No domínio das autarquias, a norma tem, na proposta de lei, um carácter, diria, mais recomendatório do que propriamente injuntivo. Donde é apontada boa prática a ser seguida nas autarquias.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ao menos isso!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas é bom que a apliquem. Acho que o rigor também é desejável nas autarquias, Sr. Deputado.
Relativamente à questão do endividamento, já referi, assim como a questão das privatizações.
Quanto à questão da amnistia fiscal, como lhe chama, e repatriamento, estão sobre a mesa um conjunto de iniciativas importantes quanto ao papel dos offshore nos mercados financeiros internacionais. Entendemos que, face ao quadro de maior exigência que se espera venha a ser tomado quanto a offshore à escala internacional, este é o momento oportuno para podermos, de facto, fazer com que capitais que estejam, porventura, nessas praças regressem ao País. É isso que propomos, sendo certo que, na actual situação, não temos os capitais cá nem temos qualquer receita fiscal com isso, e creio que o influxo de capitais seria desejável.

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Sr. Presidente, peço 1 ou 2 minutos para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais poder complementar as minhas respostas em relação às questões fiscais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, pedindo brevidade na resposta.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Com certeza, Sr. Presidente.
Quanto às questões suscitadas pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, fiquei na dúvida, pelas observações que formulou, se nos acusava de sermos demasiado tímidos, se demasiado corajosos nas previsões que fazemos para o crescimento da receita fiscal. No todo, a receita fiscal que projectamos mostra um crescimento de 1,2%, o que está em linha com o PIB, e, no tocante aos impostos que citou concretamente, parece-nos que a previsão é também bastante razoável.
No tocante ao IVA, a previsão de crescimento é de 3,6%, porque acreditamos haver um crescimento maior das importações e também do consumo privado no ano de 2010.
No que respeita ao IRS, fazemos uma previsão de crescimento de 1,1%, não nos parece que seja propriamente uma previsão deslocada.
No tocante ao imposto sobre veículo, o crescimento é de 2,4%, por razões que são óbvias, quer pelo relançamento do mercado, que já está aí, quer também pelo adiamento de compras que foi feito no ano de 2009 e que depois tenderão a concretizar ao longo deste ano.
Portanto, em termos de crescimento da receita fiscal, parece-me que são previsões bastante realistas.
No tocante às questões suscitadas pelo Sr. Deputado Honório Novo quanto à fraude fiscal — e eu não quero que fique com um capital de queixa de não comentarmos essas questões —, queria dizer-lhe, em primeiro lugar, que o combate à fraude fiscal passa não apenas pela via legislativa mas por um trabalho quotidiano de administração que temos vindo a encorajar e que se traduz em muitas pequenas medidas que não têm consagração legal na proposta de Orçamento mas algumas delas figuram até em caixas informativas no próprio Relatório, do qual com certeza fez a leitura.
Em qualquer caso, julgamos poder atribuir a quebra de receita que verificámos ao longo do ano 2009 no tocante ao IVA, em primeiro lugar, ao efeito da descida da taxa, depois, a uma deslocação do consumo de bens de investimento para bens de consumo que são tributados com uma taxa de IVA mais baixa.
Logo, não conseguimos sentir que a quebra do IVA se deva a um fenómeno de recrudescimento da fraude fiscal em Portugal. Bem pelo contrário, a Comissão Europeia, há cerca de 1 mês, acabou por publicitar um estudo nesta matéria que mostra que em Portugal o gap diferencial entre a receita potencial e a receita efectiva do IVA é bastante baixo, mais baixo do que em economias que nos são vizinhas. Portanto, julgo que esses dados testemunham de certo modo o bom percurso que temos feito nesta matéria.
Em qualquer caso, sempre junto, com o pouco tempo de que disponho, que entre as medidas contempladas na proposta de Orçamento do Estado para este ano conta-se uma medida inovadora e que está com boa actualidade, que é a instituição do mecanismo de reverse-charge no tocante às transmissões das licenças de CO2, o que mostra como estamos em matéria de combate à fraude fiscal, ou seja, bem em cima da agenda comunitária.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro pretende ainda complementar uma resposta.
Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, gostava só de esclarecer uma questão que foi suscitada, que acabei por não abordar e que tem a ver com o deflator do PIB.
O deflator do PIB não tem que estar alinhado com a taxa de inflação.

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Como sabem, o PIB tem um conjunto de componentes que estão condicionados pela evolução interna dos preços, a dos bens de consumo, dos bens de investimento ou dos bens exportados. No fundo, isso tem a ver com a evolução interna dos preços.
A taxa de inflação é um índice de preços no consumidor, tem a ver com o consumo, e é uma média ponderada da evolução dos preços na economia, menos a evolução dos preços das importações. Recordo, em particular quanto a 2009, que, se olharmos para o quadro — e a informação está dada no quadro de pressupostos quanto à economia externa —, constatamos que, por exemplo, o preço do petróleo baixou um pouco mais de 30% entre 2008 e 2009. Ora em matemática menos com menos dá mais. Se temos um índice de preços que tem a ver com os preços internos, menos uma descida acentuada dos bens de importação, isto adiciona à evolução interna dos preços. Daí que tenhamos um deflator que está acima do índice de preços.
Portanto, isso não é de estranhar e é muito natural num período em que os preços dos bens importados desceram de forma muito significativa.

O Sr. Presidente: — Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Queria agradecer novamente a presença do Sr. Ministro e de todos os Secretários de Estado do Ministério das Finanças e da Administração Pública.
Haverá novas reuniões para discussão, na especialidade, também com a presença do Sr. Ministro de Estado e das Finanças, em que teremos ocasião de esclarecer alguns pontos, os que eventualmente entendam que tenham ficado por esclarecer.
Srs. Deputados, lembro que a próxima reunião ordinária se realiza quinta-feira, dia 4 de Fevereiro, a partir das 11 horas e 30 minutos.
Está encerrada a reunião.

Eram 14 horas e 15 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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