Página 1
Sábado, 13 de Fevereiro de 2010 II Série-OE — Número 3
XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 12 de Fevereiro de 2010
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto) declarou aberta a reunião às 9 horas e 45 minutos.
Deu-se início ao debate, na especialidade, da proposta de lei n.º 9/XI (1.ª) — Orçamento do Estado para 2010, tendo a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social (Helena André) e os Srs. Secretários de Estado da Segurança Social (Pedro Marques) e do Emprego e da Formação Profissional (Valter Lemos) dado resposta às questões que foram colocadas pelos Srs. Deputados Miguel Laranjeiro (PS), Maria das Mercês Soares e Adão Silva (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Jorge Machado (PCP), Hortense Martins (PS), Francisca Almeida (PSD), Catarina Marcelino (PS), Maria Conceição Pereira (PSD), Honório Novo (PCP), José Pereira Marques (PS), Margarida Almeida (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Isabel Coutinho (PS), Teresa Santos (PSD) e João Paulo Correia, Teresa Venda, João Paulo Pedrosa, Anabela Freitas e Jamila Madeira (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Cultura pronunciaram-se, além da Sr.ª Ministra (Gabriela Canavilhas) e do Sr. Secretário de Estado da Cultura (Elísio Summavielle), os Srs. Deputados Maria Conceição Pereira (PSD), Inês de Medeiros (PS), Teresa Caeiro (CDS-PP), Catarina Martins (BE), João Oliveira (PCP), Amadeu Soares Albergaria (PSD), Rui Pereira (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Celeste Amaro (PSD), Honório Novo (PCP), Teresa Venda (PS), Raquel Coelho (PSD), Bernardino Soares (PCP) e Nuno Encarnação (PSD).
Sobre o orçamento relativo aos Encargos Gerais do Estado, intervieram, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão), os Srs. Deputados António Leitão Amaro (PSD), Vítor Fontes (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), Catarina Martins (BE), Rita Rato (PCP) e Carla Rodrigues (PSD).
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda) encerrou a reunião eram 20 horas e 20 minutos.
Página 2
2 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, está aberta a reunião.
Eram 9 horas e 45 minutos.
Começo por cumprimentar o Sr. Presidente da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, os Srs. Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças, os Srs. Deputados da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social e os Srs. Secretários de Estado, e agradecer a vossa presença.
Vamos dar início às audições na especialidade previstas no artigo 211.º do Regimento. Hoje trata-se de uma audição com um objecto diferente, uma vez que é na especialidade, embora seja também com a equipa do Ministério do Trabalho.
De acordo com a grelha que acordámos, seguiremos os mesmos tempos da última reunião, mas sem a intervenção inicial da Sr.ª Ministra.
Assim sendo, vamos começar pelo Partido Socialista, seguindo a ordem de representatividade parlamentar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Trabalho, Srs. Secretários de Estado, estamos agora na fase da discussão na especialidade do Orçamento do Estado e gostaria de referir inicialmente que, para o Partido Socialista, este é um Orçamento exigente, rigoroso e de confiança. Exigente, tendo em conta a crise internacional que estamos a viver; rigoroso, porque parte de premissas macroeconómicas prudentes e cautelosas; e de confiança, porque tem em si apoios à recuperação da economia e das empresas e apoio às empresas e ao emprego.
Se este Orçamento do Estado para 2010 pode ser acusado de alguma coisa é de ser exigente e rigoroso na sua concepção e virado para o emprego e para as questões sociais na sua execução. Lembro, aliás, que no capítulo das funções sociais que estão inscritas no Orçamento, nomeadamente na educação, na saúde e na acção e segurança social, há um crescimento em termos da percentagem do PIB, a qual passa de 18,4% em 2009 para 18,5%. São funções sociais que o Partido Socialista cumpre e que o Estado deve cumprir da melhor forma. E ao nível da segurança e da acção sociais esse aumento em percentagem do PIB ainda é mais significativo, passando de 6,9% para 7,1% do PIB, ou seja, um aumento de 0,2%, que tem aqui incluídos 185 milhões de euros no âmbito da Iniciativa para o Investimento e o Emprego. Aliás, são as medidas de apoio ao emprego e à protecção social que completam o aumento que acabei de referir.
No entanto, mesmo com este aumento de medidas e com o aumento dos apoios sociais, o sistema global da segurança social mantém num saldo positivo, o que também é uma preocupação importante para o Partido Socialista. Por isso, na óptica da contabilidade pública, temos um saldo positivo de cerca de 294 milhões de euros, sendo certo que diminui relativamente ao anterior, mas fá-lo por razões objectivas e por opções políticas assumidas, como o apoio às empresas e às famílias nos momentos em que mais precisam e que é mais necessário apoiar. É uma opção que faz toda a diferença. E foi assim também em 2009 — aliás, na execução orçamental da segurança social, no que diz respeito à despesa efectiva, é referido claramente que parte do aumento da despesa tem a ver com as pensões, mas uma parte significativa tem a ver com o aumento dos subsídios de desemprego e o apoio ao emprego, na casa dos 30,5%, e ainda com os subsídios às acções de formação profissional, na ordem dos 73%.
Portanto, há opções políticas claras no orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social que resultam no aumento, por exemplo, do complemento solidário para idosos em 5,8% e dos abonos de família em 7,7%, aqui incluindo apoios às famílias com jovens a frequentar os 10.º e 11.º anos, abrangendo mais de 70 000 estudantes. No rendimento social de inserção, como sabem, há uma ligeira redução que tem a ver com a acção fiscalizadora, o que será referido, mais tarde, por outro colega do Partido Socialista. Não aceitamos, no entanto, as críticas que muitas vezes nos são feitas pelos partidos à nossa direita, porque críticas radicais ao rendimento social de inserção podem ser populares, mas são certamente populistas.
Ainda ontem, no segundo dia do debate do Orçamento do Estado, foi referido que este não é um Governo só deste ano, pois já tem cinco anos de exercício de funções. E foi exactamente pelas medidas e pelas políticas sociais que têm vindo a ser tomadas nos últimos anos que foi possível reduzir significativamente a
Página 3
3 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
taxa de risco de pobreza em todo o País, sobretudo nos idosos, redução que tem a ver objectivamente com as medidas sociais que foram implementadas pelo Governo.
Como referi, é um Orçamento de confiança com apoios à recuperação da economia e à recuperação do emprego.
Falemos de emprego. Para todos os partidos certamente, mas para o Partido Socialista inegavelmente, o desemprego é a situação social mais difícil e mais grave que Portugal tem estado a viver. Perante o discurso dos vários partidos da oposição, os portugueses até poderiam concluir que é um problema exclusivo de Portugal, mas obviamente que não. Aliás, é muito interessante percepcionar os níveis de desemprego de Portugal, da zona euro e da Europa a 27, visto que as curvas seguem o mesmo nível, ou seja, o crescimento do desemprego em Portugal está, infelizmente, em linha com todos os países europeus. Como o combate a esta situação não nos pode fazer descansar um minuto, o orçamento do Ministério contempla medidas de apoio à manutenção do emprego, à inserção de jovens, ao regresso ao mercado de trabalho e de apoios sociais aos desempregados.
Gostaria de lembrar o relatório do Conselho Económico e Social (CES) que é muito claro nesta matéria, ao referir que se justifica a continuação e mesmo o alargamento das medidas de apoio ao emprego, à inserção no mercado de trabalho e aos desempregados. Nesse sentido, o CES considerou positiva a manutenção das medidas de protecção aos desempregados que estão inscritas no Orçamento do Estado para 2010.
De entre as várias medidas — e porque não terei muito mais tempo disponível — destaco a de reforço em 50 000 das pessoas abrangidas pelo contrato emprego/inserção, devido à importância que tem no trabalho, na dinamização e na activação destas pessoas no mercado de trabalho. São opções políticas claras, como referi.
Quanto ao salário mínimo nacional, queria realçar a decisão do seu aumento em 5,6% para 2010. Trata-se também de um elemento poderoso no combate à pobreza e no apoio aos que estão no mercado de trabalho. É uma questão de justiça social e de combate efectivo às desigualdades.
Sr.ª Ministra, gostaria de deixar aqui uma pergunta relativamente ao impacto que as medidas de âmbito social, de activação no mercado de trabalho e também as relativas ao salário mínimo nacional têm na economia e nas pessoas.
Quando falamos de empregabilidade, todos sabemos a importância da formação profissional. Neste Orçamento, há um claro e significativo apoio, e até reforço, das verbas para a área da formação profissional, com o aumento de cerca de 67,5%. Gostava que também houvesse algum comentário ou reflexão por parte do Governo relativamente a esta matéria.
Nesta fase da economia nacional e internacional, estamos em crer que a aposta na empregabilidade e na criação do próprio emprego, ou seja, na capacitação das pessoas para que elas próprias activem o seu posto de trabalho, são também medidas fundamentais. Assim, deixo uma questão à Sr.ª Ministra relativamente ao programa de apoio ao empreendedorismo como uma das matérias que nos parece muito relevante nesta altura de crise, nomeadamente com várias medidas na linha do microcrédito e do apoio à criação do próprio emprego.
Finalmente, está no relatório do Orçamento do Estado o pacto para o emprego. Como já o dissemos aqui, num país moderno e capaz de modernizar a sua própria economia, parece-nos fundamental associar sindicatos, empresários, associações de empregadores, a própria banca, partidos políticos e a sociedade em geral para um pacto que, para além de ser um pacto para o emprego, é um pacto de futuro. Portanto, deixo também aqui uma questão quanto ao caminho que poderá ser feito neste ano de 2010 e ao posicionamento do Governo no pacto para o emprego.
Tentando cumprir os tempos, Sr. Presidente, termino esta minha intervenção. Muito obrigado.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social (Helena André): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, muito bom-dia.
Sr. Deputado Miguel Laranjeiro, relativamente aos comentários e às questões que colocou, gostaria de reforçar algumas notas quanto à filosofia deste Orçamento do Estado na área da política social e do emprego.
É claramente uma filosofia de exigência, de rigor e de confiança, mas sobretudo de escolhas e de opções
Página 4
4 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
políticas muito claras relativamente ao que tem de ser, por um lado, a necessidade da resposta do Estado, mas também dos agentes económicos e sociais a uma situação de crise profunda que tem um impacto negativo no mercado de trabalho e, em especial, nas pessoas.
Por essa razão, a opção fundamental do Governo neste Orçamento do Estado é claramente uma opção nas pessoas. É uma aposta que pretende apoiar as pessoas não só a manterem o seu emprego, mas também a criarem o seu próprio emprego, apoiar as empresas com as condições necessárias para que possam manter o maior número de empregos possível, tendo ao mesmo tempo uma preocupação com os mais desfavorecidos da nossa sociedade, através de uma política clara de continuação do investimento no apoio às famílias, às populações mais idosas, às pessoas com deficiência e sobretudo às pessoas que estão desempregadas. Essa é, claramente, uma marca deste Orçamento do Estado.
É também cada vez mais claro que temos hoje, no nosso país, um conjunto de apoios na área social muito diversificado e que, quando é utilizado da forma como está a ser, minora claramente os impactos negativos desta crise com profundas consequências sociais. Portanto, a opção número um é claramente aumentar o orçamento relativo às funções sociais do Estado e a opção número dois é claramente neste momento tudo fazer para revitalizar o emprego e combater o desemprego.
O Deputado Miguel Laranjeiro recordou-nos que a tendência para o desemprego continua ainda, infelizmente, a ser observada em praticamente todas as economias, nomeadamente nos países da União Europeia. Portugal não está livre dessa tendência, independentemente de ter alguns sinais encorajadores quanto ao seu potencial de crescimento económico. No entanto, também gostaria de recordar que as próprias instituições internacionais aconselham a que, independentemente de haver cenários macroeconómicos difíceis com os quais a maior parte dos países está confrontada, não chegou ainda o momento de se retirarem os apoios e os estímulos à economia, e sobretudo de se retirarem os apoios ao emprego.
É nesse sentido que o nosso Orçamento tem o emprego como a prioridade das prioridades. Iniciámos já, no ano passado, as discussões na concertação social para respeitar o acordo de concertação social relativamente ao salário mínimo e temos, de facto, um aumento histórico para o ano de 2010 de 5,4% do salário mínimo. Isso é significativo e importante numa perspectiva de valorização do que são os salários mais baixos da nossa economia, mas sobretudo numa perspectiva de apoiar as famílias mais desfavorecidas no mercado de trabalho em termos de salário. Temos a Iniciativa para o Investimento e o Emprego que, se for utilizada no seu máximo potencial, tem a capacidade de apoiar 760 000 pessoas e tem um orçamento de 417 milhões de euros, e não é de forma alguma marginal pensarmos que, nesta Iniciativa Emprego, temos a possibilidade, através das medidas de manutenção ao emprego, de manter 130 000 postos de trabalho, de inserir 35 000 jovens no mercado de trabalho, de apoiar um universo de mais de 84 000 pessoas nas medidas de criação ao emprego e de combate ao desemprego.
Temos, também, através das medidas extraordinárias do Governo em relação ao aumento da protecção social e, nomeadamente, ao aumento do subsídio social de desemprego e de abaixamento do prazo de garantia do subsídio de desemprego, um potencial de apoio a essas pessoas.
Portanto, isto tem de se espelhar nos orçamentos para as medidas de política activa de emprego, e o orçamento do Instituto de Emprego e Formação Profissional sofreu um crescimento de 19%, para 2010, com todas as medidas activas de emprego que têm sido potenciadas.
É claro que estas medidas da Iniciativa Emprego são extraordinárias. Não nos podemos nunca esquecer de que estamos a falar de um pacote de medidas extraordinárias que terão em seu apoio as medidas ordinárias de políticas activas de mercado de trabalho e que elas próprias também têm um impacto positivo na criação e na manutenção do emprego.
No final da semana passada, no âmbito das preocupações do Governo relativamente às suas parcerias com a economia social e ao seu apoio, o Governo lançou o seu programa de apoio à economia social, que tem vários objectivos, através de várias linhas de crédito bonificadas. Saliento que um dos objectivos principais deste pacote de medidas relativamente à economia social tem a ver com o microcrédito, que é uma medida de incentivo de empreendedorismo das pessoas que estão desempregadas e de apoio à criação do autoemprego por essas pessoas, que pode ter, a médio e a longo prazos, efeitos mais sustentáveis não só a nível da criação de emprego como de desenvolvimento económico. É porque, nesta proposta de microcrédito que lançámos, propomo-nos não só apoiar os desempregados a lançarem a sua iniciativa, mas também a apoiar e a fazer um seguimento no tempo das condições para o sucesso dessa própria iniciativa.
Página 5
5 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Portanto, aliamos, de alguma forma, o empreendedorismo à capacidade de inovação social, que, sabemos, está sempre por detrás destes projectos.
Finalmente, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, uma palavra sobre o pacto para o emprego. É profunda convicção do Governo que chegou o momento, face aos desafios económicos e sociais — sobretudo os que têm a ver com a necessidade de termos um equilíbrio sustentado e sustentável da nossa economia, da nossa sociedade e do nosso meio ambiente no médio e no longo prazos — , de termos uma discussão com os parceiros sociais em sede de concertação social, justamente para discutirmos quais são as nossas opções enquanto País em termos de desenvolvimento e de crescimento económico e social.
Portanto, o pacto para o emprego é justamente a possibilidade de suscitar esse debate na concertação social, de tirarmos conclusões comuns relativamente aos nossos desafios comuns e de identificarmos quais são as respostas que temos de dar, cada um na esfera das suas responsabilidades, mas numa base de aproveitamento de sinergias e de complementaridade entre as acções do Estado e as acções dos agentes económico e sociais, nomeadamente no que respeita ao modelo de desenvolvimento do nosso país e ao ajustamento, caso seja necessário, das políticas e dos instrumentos que temos à nossa disposição.
Portanto, o pacto, neste momento, é um processo de identificação de necessidades, de identificação comum de respostas e será, na sua última fase, um processo de acção comum entre o Estado e os parceiros económicos e sociais para o desenvolvimento sustentado do nosso País.
O Sr. Presidente — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria das Mercês Soares.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Sr. Presidente, Sr.a Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Referiu a Sr.ª Ministra, na sua intervenção, que este era um Orçamento que tinha subjacente uma filosofia de exigência e de rigor.
Nesse sentido, Sr.ª Ministra, vou referir alguns considerandos para que nos esclareça algumas dúvidas que persistem.
No Orçamento do Estado para 2009, o Governo, contra todas as evidências, fez finca-pé numa taxa de desemprego de 7,6%.
No Orçamento do Estado para 2010, referem que a taxa de desemprego, em 2009, foi de 9,5% — mais 1,9% do que o inicialmente previsto.
Para o ano de 2010, prevêem uma taxa média de desemprego de 9,8% — somente três décimas acima da taxa de desemprego registada em 2009.
Sr.a Ministra, como é que explica esta situação, com a previsão de um crescimento da economia de apenas sete décimas, com o emprego a cair uma décima, segundo o Governo, mas que, segundo o Banco de Portugal, é de 1,3 pontos percentuais?» Citando uma fonte que é cara à Sr.ª Ministra, os indicadores da OCDE apresentam, para 2009, uma taxa de desemprego de 9,6%, mas com uma tendência de crescimento acentuado a partir do mês de Julho de 2009, fixando-se nos dois dígitos, de Setembro a Dezembro, sendo, no mês de Dezembro, de 10,4%.
Sr.a Ministra, como é que justifica a avaliação destes indicadores, com uma economia anémica, sem força para preservar os postos de trabalho e gerar novos e, segundo o Boletim de Inverno do Banco de Portugal recentemente publicado, irá continuar a perder postos de trabalho? Só no ano de 2009, foram destruídos 145 000 empregos e prevê-se que, no ano de 2010, venham a ser destruídos 66 000.
Como é que, com estes indicadores, consegue justificar uma previsão de crescimento da taxa de desemprego, para 2010, de apenas três décimas? Provavelmente, com uma leitura refrescada dos números do desemprego»! Só que quando falamos em números de desemprego falamos em pessoas que sofrem e que todos os dias perdem a esperança num futuro melhor.
Para que a economia volte a recuperar, não é permitido ao Governo voltar a errar nas suas previsões. É preciso muito rigor na definição das premissas, que devem estar na base das medidas que o Governo se propõe executar.
Para nós, fica aqui bem demonstrado que a previsão do Governo para a taxa de desemprego está desajustada da realidade.
Página 6
6 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr.a Ministra, vi respondida uma questão, mas continuo sem obter resposta a esta que tenho vindo a dirigirlhe relativamente à necessidade de se proceder à avaliação das medidas previstas na Iniciativa Emprego 2009. Esta Iniciativa tinha um orçamento de 580 milhões de euros, tendo apenas sido executada uma verba de aproximadamente 260 milhões de euros. Por isso, foi apoiado menos de metade do número de beneficiários inicialmente previsto.
Como podemos constatar, apesar do esforço do Governo com a Iniciativa Emprego 2009, o desemprego continuou a crescer, o que nos leva a concluir facilmente que alguma coisa falhou.
Por isso, volto a questionar a Sr.a Ministra: não considera que algumas dessas medidas poderão não estar ajustadas às reais necessidades dos trabalhadores desempregados e das empresas? Não considera ser da maior urgência proceder a uma avaliação rigorosa e isenta das medidas contempladas na Iniciativa Emprego 2009 e que, em parte, se mantêm para 2010? Não persistimos na necessidade desta avaliação por teimosia, Sr.a Ministra, mas porque estamos preocupados com a situação económica e social do nosso país, e porque acreditamos que, se houver uma avaliação isenta e rigorosa, ela contribuirá para ajustar algumas das medidas previstas na Iniciativa Emprego 2010 e, assim, poder corresponder às reais necessidades de todos aqueles que se encontrem numa situação de desemprego.
Não somos só nós que pensamos deste modo. Permita-me que cite o parecer emitido pelo Conselho Económico e Social sobre o Orçamento do Estado para 2010, onde, na página 9, se diz que «o CES recomenda que, a exemplo da doutrina que o tem norteado sobre a necessidade de transparência e de avaliação dos resultados das políticas públicas, também nesta matéria de disponibilidade de meios financeiros públicos para o apoio ao emprego, bem como nos domínios dos apoios à inserção no mercado de trabalho e aos desempregados, se proceda à avaliação cuidada dos resultados e se garanta a necessária transparência da afectação dos meios financeiros.» Sr.ª Ministra, a evidência da continuidade do crescimento do desemprego, tal como aqui se demonstra, requer rigor e avaliação.
O PSD vê com bons olhos o aumento de oito pontos percentuais na despesa com as medidas sociais de apoio ao emprego e aos desempregados, pois é aqui que se tem de investir para apoiar os que mais necessitam. Por isso, espero que não reste a ninguém qualquer dúvida sobre a nossa posição nesta matéria.
Contudo, relativamente às verbas previstas na Iniciativa Emprego 2010, a Sr.ª Ministra cautelosamente utilizou a expressão «se for», que gostaríamos que passasse a «tem de ser», que as verbas e que estas medidas «têm de ser aplicadas» porque se elas estiverem ajustadas às reais necessidades, como devem estar, serão poucas, pois lá fora são muitos os que precisam deste apoio.
Apoiar as pessoas desempregadas é o fim a que as verbas se destinam; contribuir para a sua reinserção profissional é a necessidade mais premente; e preservar o maior número de postos de trabalho é a missão que se espera desta Iniciativa! Uma outra questão que gostaria de colocar à Sr.a Ministra tem a ver com a previsão do Governo para 2010 em recuperar 400 milhões de euros de dívida.
Sr.a Ministra, no Orçamento do Estado para 2009, os acordos prestacionais previam uma prestação mensal alargada até 96 prestações. Ora, o artigo 48.º da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2010 prevê que o pagamento da dívida pode ser alargado até 120 prestações mensais, o que implica que o montante cobrado vai ser menor, portanto, vai ser mais dilatado no tempo.
Perante a deterioração da economia com que estamos confrontados, vemos como positivas todas as medidas que possam ajudar as empresas a preservar os postos de trabalho e a vencer as suas dificuldades.
Contudo, na mesma base de análise de que um bom planeamento só é possível fazer-se a partir de indicadores muito rigorosos, explique-nos, Sr.a Ministra, como vai recuperar estes 400 milhões de euros, com este ambiente económico tão hostil em que as empresas enfrentam inúmeras dificuldades, com uma economia enfraquecida, em que todos os dias há notícias de encerramento de empresas, infelizmente, com muitos trabalhadores no desemprego.
Só o seu voluntarismo não chega, Sr.ª Ministra. É preciso muito rigor e muita determinação na execução.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Segurança Social.
Página 7
7 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Segurança Social: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mercês Borges, devo dizer que folgo muito em ouvir o apoio do PSD às políticas de emprego incluídas na Iniciativa Emprego do Governo. Penso que esse é um sinal positivo e esperamos que possa ser alargado a todos os partidos da posição, porque o nosso objectivo é contribuir positivamente para que a situação do desemprego se inverta e para que as pessoas, que são também a nossa preocupação, e que são a preocupação de todos — não aqui há «proprietários» dos interesses das pessoas, pois todos estamos preocupados com as pessoas nas nossas políticas e nas nossas acções — , possam ter direito a trabalhar e a de ter uma vida digna.
Portanto, esse é um objectivo partilhado e gostei de ouvir a Sr.ª Deputada reforçar esse aspecto na sua intervenção.
Relativamente às questões que me colocou, sobretudo no que se refere à previsão do Governo para a taxa média de desemprego para o ano de 2010, limito-me a reiterar aquilo que já disse nesta Comissão, quando fizemos a discussão, na generalidade, do Orçamento do Estado: aquilo que levou o Governo a apontar esta taxa de desemprego para 2010 foi a sua profunda convicção de que o pico da crise foi atingido em 2009 e também de que o ano de 2010 vai ser um ano de crescimento muito moderado do produto interno bruto.
Face ao comportamento do mercado de trabalho e à avaliação do desemprego em termos médios no ano de 2009, nada há que nos leve a concluir que estas previsões relativamente ao ano de 2010 são erradas.
Portanto, tudo faremos, através das políticas que temos em prática no terreno, para que, efectivamente, possamos atingir estas taxas que estão previstas, em termos médios, para o ano de 2010.
Aliás, se olharmos, por exemplo, para aquilo que foi um comportamento mais atípico no último trimestre no ano de 2009, relativamente ao aumento do desemprego, nunca podemos esquecer que existem aspectos, como, por exemplo, a sazonalidade, com os quais também temos de entrar em linha de conta quando fazemos estes cálculos relativamente às taxas de desemprego reais e previstas.
Mas aquilo que temos no terreno como políticas, nomeadamente as políticas activas, são, claramente, do nosso ponto de vista, um incentivo que nos pode apoiar a inverter a situação do desemprego.
Gostaria de relembrar que a Iniciativa Emprego 2009 foi avaliada com os parceiros sociais em sede de Conselho Permanente de Concertação Social e que a proposta da Iniciativa Emprego 2010 foi também discutida com os parceiros sociais em sede de concertação social.
Também o impacto das medidas da Iniciativa Emprego 2009 — e o mesmo acontecerá relativamente às medidas Iniciativa Emprego 2010 — é escrutinado regularmente pelo Conselho de Administração do Instituto de Emprego e Formação Profissional, onde, mais uma vez, têm assento os parceiros sociais.
Também sempre foi dito claramente pelo Governo que teria uma abertura total para avaliar, corrigir e propor novas medidas se todos chegássemos à conclusão de que isso era necessário. Portanto, não há obstinação da parte do Governo relativamente às suas medidas; há, sim, claramente, o desejo profundo e o trabalho feito por todos os elementos do Governo e por todos os serviços de apoio do Ministério, para que as pessoas e as empresas que são potenciais beneficiárias destas medidas as conheçam em profundidade, as possam utilizar, e que essas medidas possam alcançar os objectivos e os resultados que todos pretendemos que tenham.
É inquestionável que o Governo, quando discute essas medidas com os parceiros sociais e quando as aprova, pretende, claramente, que elas tenham impacto e sejam avaliadas. Não se trata de medidas que existem por existir; elas têm de ser utilizadas. Daí que tenhamos já, também em concertação com os parceiros sociais, discutido a necessidade de um programa agressivo de informação relativamente às medidas de emprego em 2010, de irmos mais ao terreno, de irmos mais junto das empresas e de podermos, efectivamente, dar a conhecer o potencial destas medidas.
Por isso, penso que a declaração feita pela Sr.ª Deputada de apoio às medidas poderá, em si mesma, também ter um efeito positivo junto dos agentes económicos e sociais do nosso país,»
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Apoiei o esforço!
A Sr. Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » porque ç muito importante que todos possamos ter, num espírito de construção e de colaboração, a possibilidade de dar um efeito positivo a essas medidas.
Página 8
8 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr.ª Ministra.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, é apenas para interpelar a mesa no seguinte sentido: estamos num debate de especialidade do Orçamento do Estado para 2010 e, por isso, consideramos que a Iniciativa Emprego 2009 e a Iniciativa Emprego 2010 são instrumentos muitíssimo importantes, dada a situação de desemprego que se verifica. Por isso, se existe uma avaliação feita em relação à execução de 2009, insistimos — e estamos absolutamente de boa-fé — para que esse documento de avaliação nos seja enviado. É porque, de duas, uma: ou há um documento de avaliação ou não há um documento de avaliação — »
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, mas trata-se de uma nova intervenção»!
O Sr. Adão Silva (PSD): — » e a avaliação pode ser feita de uma forma informal e não tão consubstanciada num documento formal — , mas se há esse documento formal, gostávamos de tê-lo, porque estavam orçamentados 580 milhões. Se não há um documento formal»
O Sr. Presidente: — A mesa perguntará isso, Sr. Deputado.
Não sei se alguçm pretende»
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Obviamente que o documento que foi distribuído à concertação social será facultado aos grupos parlamentares, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Tem, agora, a palavra, em nome do CDS-PP, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, estamos agora numa fase diferente do debate, estamos numa fase de especialidade, e hoje já temos mais informações, quer aquelas que o Governo, entretanto, remeteu à Assembleia, quer declarações que a Sr.ª Ministra foi proferindo ao longo desta semana.
Gostava de começar, Sr.ª Ministra, por confrontá-la com uma matéria que referiu não nesta Comissão, mas numa entrevista que deu na terça-feira à noite, à Rádio Renascença. Nessa entrevista, a Sr.ª Ministra dizia que, relativamente ao rendimento social de inserção, a vontade do Governo era alargar as inspecções «a todas as famílias». Dizia mesmo a Sr.ª Ministra que, no caso do rendimento social de inserção, o objectivo do Governo era que esta fiscalização semestral que está prevista pudesse chegar a todas as 155 000 famílias.
Isto é: apontava para um universo de 150 000 acções de fiscalização e contaria para isso com a ajuda da Inspecção Fiscal.
Eu gostava de questioná-la sobre isto, Sr.ª Ministra, porque V. Ex.ª, na segunda-feira, disse-nos algo de diferente. Quando a bancada do CDS lhe perguntou em que é que se consubstanciava a fiscalização semestral que está prevista no Orçamento, a Sr.ª Ministra disse que, afinal, a única coisa que o Governo podia fazer era chegar a 40 000 famílias, isto é, qualquer coisa como mais cerca de 3000 acções inspectivas do que em 2009.
Sr.ª Ministra, este é um tema sério e acho que vale a pena ser abordado de forma séria.
Em 2005, as pessoas que estavam a auferir o rendimento social de inserção eram qualquer coisa como 173 000; em 2006, eram 264 000; em 2007, eram 311 000; em 2008, eram 352 000; e, em 2009, eram 388 000. Ora, isto quer dizer que esta prestação tem vindo a ter, ao longo destes últimos anos, um crescimento sistemático e sólido, e, de facto, não tem sido possível, pelos vistos, controlar o crescimento desta prestação.
Eu percebo e aceito que exista uma prestação, um apoio, do Estado a quem está transitoriamente abaixo do nível de pobreza, mas não compreendo como é que uma prestação como esta, que devia ser uma prestação transitória, que, como prestação social, já existe há cerca de 10 anos, e, por isso, já devia ter
Página 9
9 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
atingido uma zona estável, um patamar estável, continua a subir todos os anos, independentemente dos anos da crise, que foram os anos de 2008 e de 2009.
A verdade é que em 2005 se gastavam 285 milhões de euros e no ano passado gastaram-se 507 milhões de euros. Isto, para mim, Sr.ª Ministra, é sinal de que há um descontrolo nesta prestação.
Por isso mesmo, quando vi no Orçamento do Estado que o Governo queria fazer para este ano uma fiscalização semestral, achei que isto era uma medida positiva, só que nas declarações que a Sr.ª Ministra fez aqui, na Comissão, não disse isso — disse algo muito diferente. Disse que a única coisa que o Governo quer é fazer mais cerca de 3000 acções inspectivas.
A Sr.ª Ministra pode responder-me que, em 2004, só existiam 17 000 acções inspectivas, mas, Sr.ª Ministra — e Sr.as e Srs. Deputados, se querem entrar nesta discussão, que é muito interessante — , de acordo com os dados da segurança social, sabe quantas pessoas é que, em 2004, estavam inscritas no rendimento mínimo?
Vozes do PS: — Diga o senhor!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sabem esse número? Digam-me lá o número! Digam-me lá o número! Estavam inscritas 75 000 pessoas. Eram 75 000 pessoas e foram feitas 17 000 acções inspectivas!!
Risos do Deputado do PCP Jorge Machado.
O Partido Comunista Português também já vai poder falar! Portanto, por aqui vimos claramente quais são o índice e a proporção relativamente ao número de beneficiários.
Sr.ª Ministra, sobre esta matéria, quero fazer uma discussão séria. E acho que, em nome de uma discussão séria, Sr.ª Ministra, não podemos ver declarações do Sr. Director da Segurança Social, que diz que já sabe que este ano a percentagem vai descer. Ele diz: «Vamos fazer mais acções inspectivas, mas já sei que este ano a percentagem de fraude vai descer». Como é que isto é possível, Sr.ª Ministra?!» Ou queremos fazer isto de forma séria ou não queremos!!» Portanto, a pergunta muito clara que lhe faço, mais uma vez, Sr.ª Ministra, é a seguinte: em que é que se consubstancia a fiscalização semestral? São 155 000 acções de inspecção conjuntamente com as finanças ou são as 40 000 acções de inspecção que a Sr.ª Ministra anunciou na segunda-feira? Pergunto-lhe isto, Sr.ª Ministra, porque esta é uma questão que tem reflexos e repercussões nos orçamentos da segurança social. Nós achamos que é possível gastar menos, para se gastar melhor. A nossa opção, Sr.ª Ministra, passaria, por exemplo, por dar um pouco mais nas pensões mínimas. Sei que essa não é a opção do Governo, o que é legítimo — e não ponho isso em causa, Sr.ª Ministra! — , mas também sei que o Governo tinha outras opções que este ano ainda não têm repercussão orçamental. E é por isso mesmo, Sr.ª Ministra, que gostava de fazer-lhe uma segunda pergunta, que é a seguinte: com muita pompa e circunstância, a pompa e circunstância que geralmente o Primeiro-Ministro traz ao Parlamento, foi anunciado no Programa do Governo que o Governo queria criar duas novas prestações sociais: uma para famílias trabalhadoras que tenham filhos a cargo e que estejam abaixo do limiar da pobreza e outra para pensionistas com pensão de deficiência que tenham dificuldades e que não tenham outros rendimentos.
Não conheço estas medidas na sua concretização — e «à cabeça» não estarei contra elas, como será óbvio — , mas, olhando para o Orçamento do Estado para 2010, não vejo qualquer verba para estas medidas.
Por isso, gostava de lhe colocar, concretamente, duas questões, Sr.ª Ministra: primeira, qual é o empate financeiro que o Governo estima relativamente a estas duas novas medidas sociais que foram anunciadas; e, segunda, onde é que estas medidas estão inscritas no Orçamento do Estado para 2010, porque eu, sinceramente — e pode ser por lapso de entendimento meu — , não as consigo encontrar? Já agora, e também relativamente ao problema das pessoas com deficiência, gostava de lhe fazer, Sr.ª Ministra, uma pergunta adicional, que é a seguinte: ontem deu entrada na Mesa da Assembleia da República um projecto de lei subscrito pelo meu grupo parlamentar que altera o Decreto-Lei n.º 464/80, que, acima de tudo, pretende permitir uma acumulação da pensão social de invalidez com rendimentos do trabalho. Gostava
Página 10
10 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
de perguntar-lhe qual é a opinião do Governo relativamente a esta matéria. Está ou não o Governo disponível para alterar as regras que hoje existem, que são muito limitadas, pois não permitem que alguçm que tenha»
Aparte do Deputado do PCP Jorge Machado inaudível na gravação.
Sr. Deputado, está aqui»! Se o Sr. Deputado quiser propor uma medida como esta, venha a jogo,»
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Já vou!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » mas não esteja agora aí, na bancada, com apartes» Apresente propostas, porque não conheço qualquer proposta do Partido Comunista Português.
Esta proposta, como sabe, Sr. Deputado, foi apresentada o ano passado, na legislatura passada, e obteve os votos negativos do Partido Socialista. Vejo aqui, e fico contente» Temo que o Partido Socialista tenha, pelos vistos, uma guarda-avançada, que é o Partido Comunista Português.
Gostava de lhe perguntar, Sr.ª Ministra, o que é que pensa relativamente a uma proposta como esta.
Estaria ou não disponível para viabilizá-la? Terceira questão, Sr.ª Ministra: gostava de obter um comentário seu relativamente a um documento que já foi aqui citado hoje, que é o parecer do Conselho Económico e Social. Diz o Conselho Económico e Social que o número que o Governo aponta relativamente à taxa de desemprego é um número que não é realista, é um número que padece de irrealismo. E também diz que até a previsão do Banco de Portugal relativamente ao desemprego vai mais longe. Aliás, é curioso ver que o próprio Secretário-Geral da UGT, o Dr. João Proença, considera que as previsões do Governo são irrealistas — a expressão é dele, não é minha — e que é muito difícil manter o desemprego abaixo dos 10%.
Gostava de perguntar-lhe, mais uma vez, Sr.ª Ministra, se insiste neste número (9,8%) que está no Orçamento do Estado, até porque as perspectivas da OCDE já vieram negar esta previsão. A Sr.ª Ministra vai insistir neste número ou não? Sr. Ministra, outra questão que também gostava de colocar-lhe é esta: ainda ontem a Sr.ª Ministra disse a uma revista, em nome do Governo, que as empresas que têm níveis de produtividade e de rentabilidade altos devem aumentar as remunerações. Sr.ª Ministra, a declaração é sua, está na revista Sábado de ontem. Eu não acho mal, pelo contrário até acho positivo, que se possa ligar o aumento dos ordenados ao aumento da produtividade e da rentabilidade das empresas — não ponho isso em causa. No entanto, gostava de perguntar-lhe o seguinte: a Sr.ª Ministra defende que este princípio só se deveria usar no sector privado ou também no sector público? Acha que no sector público, nos serviços onde se verifique um alto nível de produtividade e de rendibilidade, os funcionários públicos deviam ter um aumento dos seus vencimentos ou, pelo contrário, entende que esta medida só se deve aplicar no sector privado, desligando-a, assim, do sector público? Para terminar, Sr. Presidente, só mesmo duas questões muito concretas. A primeira prende-se com o seguinte, Sr.ª Ministra: no Mapa X, que nos foi distribuído, «Segurança Social — Classificação Económica», estive a comparar o Orçamento do Estado de 2009 com o Orçamento do Estado de 2010 e verifiquei que nos regimes complementares especiais há uma subida de cerca de 5,5 milhões de euros neste regime. Penso que isto tem a ver com a subida das taxas que o Estado vai pagar pelos seus funcionários, de 7,5% para 15%, mas gostava de colocar-lhe concretamente a questão, porque tem importância no global do Orçamento. É o que está previsto no Mapa X.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, quando falo à comunicação social ou aqui, neste Parlamento, falo sempre em nome do Governo, não falo em nome pessoal. Imagino que as minhas opiniões pessoais relativamente a certas matérias não devem ser do interesse público.
De qualquer maneira, passando áquilo que são as suas questões»
Página 11
11 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Ó Sr.ª Ministra, nós revelamos muitas vezes as nossas opiniões pessoais.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Muito bem, muito bem» Relativamente ao RSI (Rendimento Social de Inserção), tem sido uma questão recorrente que me tem acompanhado desde a primeira vez que entrei nesta Assembleia e sobre a qual tive o prazer de dialogar com os diferentes grupos parlamentares. Gostaria de relembrar — e o Sr. Deputado Pedro Mota Soares já me ajudou a relembrar alguns desses dados — aquilo que entendo ter sido uma má gestão da parte dos governos do PSD e do CDS, relativamente a esta prestação.
Primeiro, houve a discussão sobre a necessidade de existência ou não da prestação. Bom, o PSD estava no Governo em 1992, quando, pela primeira vez, Portugal teve a presidência da União Europeia. O rendimento mínimo garantido, na altura, foi aprovado, a nível europeu, através de uma presidência portuguesa e por uma proposta apoiada por Portugal, o que na altura foi avaliado muito positivamente em todos os países da União Europeia. Portugal deu o exemplo, com o governo de António Guterres, de implementação, na prática, daquilo que tinha sido uma decisão tomada a nível europeu, durante um governo do PSD, para pôr em prática o rendimento social de inserção.
Penso que, às vezes, este enquadramento histórico é importante para também meditarmos claramente sobre o que estamos a fazer, mas a realidade é que esta prestação social se destina a apoiar as pessoas mais pobres da nossa sociedade, as pessoas mais necessitadas. Sobre isso, estamos de acordo.
Depois, tivemos uma gestão do governo do PSD/CDS sobre esta matéria que foi uma gestão que tenho de considerar, analisando à distância, pouco cuidada, naquilo que era a utilização desta prestação social.
Primeiro, fiscalizou pouco e agora o CDS é o arauto do rigor na fiscalização. E nós estamos de acordo! Nós estamos de acordo! Mas, porque os números são sempre importantes, fiscalizou, em 2004, 17 000 famílias. Já recordei»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Eram 75 000 pessoas. São dados da segurança social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » eram 316 000 pessoas, no total, em 2004.
A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Exactamente!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Aquilo que se passou foi um descurar na fiscalização. Mas outra coisa que ainda é mais grave e que depois teve de ser recuperada pelo governo do Partido Socialista foi o atraso, em mais de seis meses, do pagamento da prestação. Tínhamos casos em Lisboa e no Porto, em que havia um ano de mçdia de espera para pagar »
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » a prestação e no restante País havia uma média de seis meses. Portanto, é óbvio que o Partido Socialista, quando chegou ao Governo, teve de pagar 37 milhões de euros, para recuperar os atrasos de pagamento, que tínhamos herdado do governo do PSD e do CDS.
Mas também tínhamos de analisar, de uma forma um bocadinho mais detalhada, aquilo que foi o aumento da despesa, entre 2004 e 2008, de que o Deputado Pedro Mota Soares nos fala num total de 184 milhões de euros. Se olharmos para esse aumento de despesa, vemos que 2/3 dessa despesa correspondem ao aumento da pensão social, ou seja, 39 milhões de euros. Acho que ninguçm está em desacordo, relativamente a isto»! Aplicaram-se 37 milhões de euros na recuperação do atraso de pagamentos, a que já me referi, e 14,5 milhões de euros em apoios complementares que foram incluídos, pela lei, em 2003, uma vez mais pelo governo do PSD/CDS »
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Que insensibilidade social!»
Página 12
12 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » e o governo do Partido Socialista» O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Agora, está contra o aumento da despesa!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » o governo do Partido Socialista respeitou e pagou. E mais: 25 milhões de euros, com os protocolos feitos com as IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social), para o acompanhamento das famílias!» Daquilo que tem sido o aumento do orçamento do RSI, 70 milhões estão destinados ao aumento das famílias apoiadas e sobre essa matéria estamos, penso eu, conversados.
Também não nos podemos esquecer de que, independentemente de estarmos perante o aumento de desemprego — e, obviamente, de um aumento de pressão sobre todas as prestações sociais e, consequentemente, do rendimento social de inserção — , a proposta do Governo no Orçamento do Estado para 2010 é uma proposta de reforço da fiscalização, não só na duplicação do seu rigor, como também da tempestividade dessa mesma fiscalização.
Dizemos que sim que vamos continuar a fiscalizar o número de famílias que são fiscalizadas todos os anos. Já disse que passámos de 17 000 para 36 000 e propomo-nos chegar, em 2010, a 40 000. Mas para além disso, e porque a nossa preocupação é o rigor, propomo-nos fazer a verificação semestral das condições de atribuição de recursos a todos os beneficiários do rendimento social de inserção. Esta é, claramente, a proposta do Governo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Está no nosso caderno de encargos!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Também posso anunciar aqui, neste Parlamento, que o Instituto da Segurança Social vai abrir um concurso interno para 50 inspectores, cujo objectivo será também o de reforçar a fiscalização e a verificação semestral dos recursos do rendimento social de inserção.
Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, uma das grandes preocupações do Governo relativamente a esta prestação é também apoiar a inserção social e profissional dos beneficiários do RSI. Se calhar, fomos os primeiros a dizer nesta Câmara que achamos que esta é uma prestação transitória, de apoio num determinado momento de necessidade das pessoas.
O nosso objectivo é, claramente, que possamos apoiar os beneficiários a saírem da prestação e a terem uma inserção social e profissional. Por isso, fizemos já um esforço, em 2009, de termos 72 000 beneficiários, em idade activa, do RSI, que estão em acções de capacitação profissional. E propomo-nos, em 2010, chegar a 100 000 pessoas. Propomo-nos também não só a dar capacitação profissional, mas sobretudo a apoiar a capacitação individual e familiar e a formação parental.
Sr. Deputado, penso que, sobre esta matéria, estamos de acordo com o objectivo do rendimento social de inserção, bem como na necessidade de sermos rigorosos na sua atribuição e também no facto de que esta é uma prestação que deve conduzir à inserção das pessoas na vida activa.
Relativamente às duas novas prestações sociais e à proposta que o CDS apresentou ontem na Assembleia, só tenho uma palavra a dizer: a primeira é agradecer o apoio que o CDS claramente aqui deu ao Governo, na apresentação das suas propostas das suas novas prestações sociais de combate à pobreza. E o Governo vai e está neste momento a estudar a melhor forma de pôr em prática as suas prestações — estão no Programa do Governo e serão certamente discutidas no decorrer no ano de 2010. Também a questão da pensão social de invalidez está no Programa do Governo.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E no Orçamento do Estado! E no Orçamento do Estado.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Esta é uma questão que o CDS apresentou ontem, mas que nós temos já no Programa do Governo e, portanto, temos que analisar algumas questões relativamente a essa matéria. O nosso objectivo é claramente de reabilitação, mas essa proposta é uma proposta que o Programa do Governo também prevê.
Página 13
13 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, solicito-lhe que seja distribuído um documento, que é uma notícia do dia 2 de Fevereiro (de há relativamente pouco tempo), em que o Sr. Director da Segurança Social, Dr. Hermínio Martinho, pelo qual todos temos enorme estima, nessa notícia disse que não iria haver um aumento de inspectores da segurança social para o rendimento mínimo. Dizia mesmo, passando a citar a notícia: «(») Não se trata de aumentar o nõmero de inspectores. Trata-se fundamentalmente do modo como organizamos internamente a nossa fiscalização».
Sr. Presidente, uma vez que a Sr.ª Ministra anunciou hoje o aumento de 50 novos inspectores da segurança social, e há uma divergência entre as declarações da Sr.ª Ministra e as do Sr. Director da Segurança Social, eu pedia que este documento fosse distribuído à Mesa para que todas as bancadas possam ter acesso à informação.
Já agora, Sr. Presidente, pedia também que, através de V. Ex.ª fosse também feita a distribuição deste documento à Câmara e à Sr.ª Ministra para que tomem conhecimento de que, já na Legislatura passada, o CDS-PP tinha apresentado iniciativas legislativas que iam exactamente no sentido de permitir a acumulação dos rendimentos da pensão de invalidez com os rendimentos de trabalho. Assim a Sr.ª Ministra pode ficar saber» De qualquer forma, registo, com muito agrado, que o Governo está aberto e disponível para discutir essa matéria no Parlamento.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que faça chegar o documento à Mesa para que seja distribuído e discutido.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, nesta primeira ronda, Sr.ª Ministra, gostaria de lhe falar ou de me centrar apenas em duas questões: na questão do desemprego, do lay-off, e nas questões da segurança social. Deixaria depois algumas perguntas concretas, nomeadamente na área da deficiência, para uma segunda ronda.
Na questão do desemprego, Sr.ª Ministra, pese embora as perguntas das várias bancadas, fica por clarificar se a Sr.ª Ministra acredita mesmo que, com os despedimentos de que todos os dias ouvimos falar — a Alisuper, a Lear, os próprios trabalhadores do Casino Estoril, a Rodhe, a Oliva, e isto ç todos os dias» e chamo a atenção até para uma curiosidade, que se entrecruza com as declarações da Sr.ª Ministra, relativamente aos salários — , as empresas que têm situações económicas desafogadas ou lucros poderiam aumentar os salários. Olhe, Sr.ª Ministra, dou-lhe o exemplo do Casino Estoril, que teve no ano passado um lucro enorme e se prepara para fazer — aliás, notificou já os trabalhadores — um despedimento colectivo.
Portanto, mesmo com lucros, os despedimentos colectivos continuam a acontecer e gostaria até de um pronunciamento da Sr.ª Ministra sobre estas situações, que são, de facto, no nosso entender, situações de recurso, em alguns casos, ao lay-off indevido e noutros casos aos despedimentos colectivos também indevidos.
Aliás, no ano de 2009 tivemos bastos exemplos que nos remetiam para empresas com lucros que, efectivamente, despediam e tivemos até a figura, inventada pelo Grupo Amorim, dos «despedimentos preventivos», que aqui também vimos.
A Sr.ª Ministra, de facto, não se tem pronunciado sobre estas questões, que são muito preocupantes e muito concretas e talvez, por este pronunciamento, se justificaria ou não a sua previsão dos 9,8% do desemprego. Neste âmbito, Sr.ª Ministra, quero fazer-lhe uma pergunta muito clara, que tem a ver com a verba que vem atribuída para o subsídio de desemprego.
Numa primeira leitura, disse a Sr.ª Ministra, nesta verba dos 2000 milhões, com o aumento de 8% face a 2009, estavam englobados o subsídio de desemprego e também as questões do lay-off — aliás, o próprio relatório do CES nos diz isso. Ora, do quadro que nos facultou, de facto, o que consta é o subsídio de desemprego. Precisava, pois, de saber onde está o apoio ao lay-off, sendo que o lay-off está a crescer sem grande fiscalização. Neste domínio, tinha algum interesse, efectivamente, fiscalizar as «condições de recurso
Página 14
14 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
ao lay-off» versus «o estado dos lucros de algumas empresas que a ele recorrem». É porque ouço as bancadas da direita, particularmente a do CDS, apoiada pelo Governo, falar em fiscalização semestral, rigorosa das condições de recurso das pessoas ao rendimento social de inserção — e devo dizer que, obviamente, não somos contra as fiscalizações — , mas, curiosamente, não se vai aferir a condição ou o estado dos lucros, diria eu, das empresas que recorrem ao lay-off. Para aí não tem havido, de facto, qualquer fiscalização e o Bloco de Esquerda propõe que haja, efectivamente, fiscalização nessa área, a qual até pode ser cruzada com as Finanças, como a Sr.ª Ministra bem propõe para outras situações. Era assim que deveria ser.
Portanto, o que lhe deixo relativamente ao desemprego é que há, entre nós, uma contradição de leitura. O Bloco de Esquerda considera que o desemprego vai aumentar, acredita até nas projecções da OCDE e do Conselho Económico e Social, que vão nesse sentido; são a vida e os dados das empresas que, quotidianamente, nos confrontam com mais desemprego que nos remetem para esta nossa leitura.
Assim sendo, o que vamos ter é uma verba claramente insuficiente para o desemprego. Por outro lado, Sr.ª Ministra, aumentando o desemprego, e não obstante ter havido alguma alteração às regras, na nossa perspectiva, as regras actuais continuam a ser insuficientes e penalizadoras, nomeadamente dos trabalhadores precários, que, como bem sabe, crescem, e muito, na sociedade portuguesa. Sabemos que a maioria do desemprego advém da cessação de contratos de trabalho de curta duração. Por isso mesmo, impunha-se uma alteração excepcional às regras de atribuição — é porque o que está previsto, na nossa perspectiva, ainda é curto.
Dir-nos-á que o Bloco de Esquerda desistiu da proposta do pleno emprego. Não é disso que se trata, Sr.ª Ministra! O Bloco de Esquerda entende que as medidas, mesmo as de incentivo ao emprego, são insuficientes, que o investimento público na criação de emprego é muito modesto, é muito pouco — e até desceu, como temos vindo a referir. É porque em situações excepcionais, num país onde o contingente de pobres aumenta a cada dia que passa, impõe-se a protecção.
A minha segunda questão tem a ver com a segurança social, Sr.ª Ministra. É verdade que ainda temos um saldo global positivo, mas também é verdade que esta proposta de Orçamento para 2010 faz uma previsão em baixa sobre a sustentabilidade da segurança social.
No ano passado, assistimos aqui a uma aguerrida discussão em que o Ministro Vieira da Silva garantia a pés juntos que a sua proposta de sustentabilidade da segurança social nos remeteria para um saldo negativo apenas no ano de 2049. Em 2007, essa previsão era para o ano de 2045, mas, no ano passado, já era uma coisa muito importante, aliás, com as alterações que fizeram baixar as pensões, como a do factor de sustentabilidade e outras.
Afinal, não é assim e corremos, de facto, riscos graves, relativamente aos quais o Governo tem de estar atento e tem de tomar outro tipo de medidas, se quer garantir a sustentabilidade da segurança social no futuro.
E o Bloco de Esquerda reafirma aqui a proposta, que tem vindo a apresentar, de diversificação das fontes de financiamento da segurança social. Não é possível querer garantir a segurança social apenas com a introdução de factores de sustentabilidade, porque isto é, claramente, insuficiente. Tem de haver uma outra forma de olhar a segurança social e a solidariedade tem de vir de todos os agentes da sociedade. Daí a nossa proposta de que é necessário alterar as fontes de financiamento, no sentido de que as contribuições para a segurança social tenham outra base, porque esta base é perfeitamente desajustada aos dias de hoje. E a base de financiamento da segurança social que propomos tem de incidir sobre as mais-valias das empresas.
Portanto, Sr.ª Ministra, em síntese, o que gostaria de perguntar-lhe era se está disponível para rever as fontes de financiamento da segurança social, como o Bloco de Esquerda tem vindo a propor, e se está disponível para, numa situação excepcional, rever as regras de atribuição do subsídio de desemprego.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, partilhamos, claramente, as nossas preocupações relativamente à situação do emprego. E gostaria de lhe dizer, claramente, que, sobre essa matéria, nomeadamente sobre as questões que estão relacionadas com despedimentos colectivos e lay-off, o Governo está a seguir com muita atenção aquilo que se passa.
Página 15
15 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Por exemplo, em relação ao caso mais recente de que falou, o do despedimento colectivo no Casino Estoril, o Governo está a acompanhar a situação a par e passo e a trabalhar a matéria tanto com a comissão de trabalhadores como com a administração. Estamos, portanto, a fazer um acompanhamento claro da situação e não admitimos qualquer atropelo à lei, no que se refere a este tipo de situações.
Quero reafirmar, como já tive oportunidade de dizer na última reunião que tivemos aqui, na segunda-feira, que uma das prioridades da Autoridade para as Condições do Trabalho, no próximo ano, e que está inscrita no seu orçamento, tem a ver com a fiscalização das empresas em lay-off. Propomos um aumento de 20% da fiscalização das empresas em lay-off, havendo, portanto, da parte do Governo, uma preocupação muito grande sobre aquilo que está a ser feito nesta matéria. E digo-lhe, claramente, Sr.ª Deputada, que seremos implacáveis relativamente aos abusos que existirem e às ilegalidades que forem praticadas no âmbito desta matéria.
Quanto à questão do subsídio de desemprego, às propostas do Bloco de Esquerda e também à sustentabilidade do nosso sistema de segurança social, penso que a reforma que foi feita, com o apoio dos parceiros sociais, é uma reforma importante e tirou o nosso País da lista negra dos países onde poderá, a curto prazo, haver graves problemas de sustentabilidade do sistema de segurança social. Essa reforma foi feita e, no nosso País, temos de aplicar as reformas que fazemos, temos de aplicar as leis que fazemos e temos de lhes dar tempo para que surtam efeito.
Obviamente, como em tudo na vida, nada há que esteja escrito no mármore, mas, neste momento, com um sistema que está sólido, que tem tido a capacidade de responder, claramente, à situação de urgência a que foi chamado a intervir, no âmbito desta crise, não há razões objectivas que nos levem a concluir que estão reunidas condições para alterar aquilo que consta, neste momento, da Lei de Bases da Segurança Social.
Portanto, independentemente de termos tido alguma redução nas receitas da segurança social, não consideramos que haja qualquer risco de sustentabilidade, a médio e a longo prazos.
Passámos um ano difícil, com altos níveis de desemprego e de crise económica, mas a segurança social respondeu a esta crise, como tinha a obrigação de responder, pelo que esse facto não pôs em causa a sustentabilidade, a longo prazo, do sistema.
Portanto, neste momento, repito, não há nada que nos leve a concluir que temos de partir para análises de outro tipo de fontes de financiamento ou de outras formas de utilização do nosso sistema de protecção social.
Mas, como digo, o Governo está atento e analisará, a par e passo, a evolução da aplicação da sua legislação.
Relativamente ao subsídio de desemprego, o valor que foi dado aqui na segunda-feira foi um valor de 2,061 milhões de euros, só para o subsídio de desemprego, de um total de 2 208 572 milhões de euros. Este é o total e, neste total, estão incluídas as verbas para o subsídio de desemprego»
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E o lay-off?!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » e todas as restantes verbas, não só do layoff mas também de garantia salarial, de compensações de salários em atraso, etc. Ou seja, estão incluídas todas as verbas relativas ao subsídio de desemprego.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Então, o desemprego baixa»
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Em relação às medidas de reforço do subsídio de desemprego, também já tivemos oportunidade de relembrar, nesta Câmara, as medidas extraordinárias tomadas pelo Governo no que se refere à cobertura do subsídio de desemprego. Fizemos uma extensão do subsídio social de desemprego, baixámos o prazo de garantia do subsídio de desemprego, de 450 para 365 dias, para além das medidas extraordinárias que tinham sido tomadas já em 2009.
Portanto, com o índice elevado de taxas de substituição e de temporalidade que são permitidas pelo nosso subsídio de desemprego, a que se somam todas as outras prestações sociais, pensamos que temos um nível correcto de apoio a uma situação lamentável para as famílias e que, através das medidas de incentivo ao emprego, esperamos minimizar o mais rapidamente possível.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
Página 16
16 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, a primeira questão que lhe quero colocar é precisamente relativa ao desemprego. Não vou discutir consigo a perspectiva das previsões do Governo, de 9,8%, sendo que o PCP não acredita nelas, pura e simplesmente, e a realidade demonstra-o: hoje, o desemprego já anda perto dos 10%, a perspectiva do Governo é a de que o desemprego vai aumentar e, portanto, aumentando, nunca chegará aos 9,8% que aqui estão previstos.
Não entrando nessa discussão, a nossa preocupação é a seguinte: Orçamento do Estado, no que diz respeito ao subsídio de desemprego.
Bem sei que a Sr.ª Ministra, na segunda-feira passada, disse que o montante previsto para o subsídio de desemprego é de 2060 milhões. Tenho, no entanto, uma pequena dúvida: se somarmos o subsídio de desemprego dos mapas desagregados com a prestação do subsídio social de desemprego, obtemos 1959 milhões e não os tais 2060 milhões de euros, mas admito que haja uma explicação para isso. Já agora agradecia, se pudesse, que me explicasse o porquê Mas, mesmo partindo do pressuposto de que estão disponíveis no Orçamento do Estado 2060 milhões de euros, quero deixar-lhe uma pergunta.
Sr.ª Ministra, em 2009, houve 327 000 desempregados que receberam qualquer uma das prestações sociais — subsídio de desemprego, subsídio social de desemprego, o subsequente, etc.
Ora, tendo em conta, por um lado, que com estes 327 000 desempregados foram gastos 1815 milhões (considerando que havia 575 000 desempregados, em sentido estrito, e que havia cerca de 700 000, em sentido lato, o que demonstra que cerca de 50% dos desempregados não tiveram acesso a qualquer prestação de desemprego) e, por outro lado, as perspectivas de crescimento, como é que justifica a verba de 2060 milhões? É que isto não chega, não estica, Sr. Ministra! Há ainda uma outra questão que queria deixar-lhe.
A Sr.ª Ministra acabou de dizer que considera que temos o nível correcto de apoio aos desempregados. A Sr.ª Ministra convive bem com o facto de 50% dos desempregados não terem acesso a qualquer tipo de prestação de desemprego? Foi isso que aconteceu no ano passado, este ano vai repetir-se e a verba do Orçamento do Estado para o subsídio de desemprego não aumenta.
Sr.ª Ministra, estas medidas de reforço da protecção no desemprego são claramente insuficientes e todos os meses cresce o número de desempregos que não tem acesso ao subsídio de desemprego e ao subsídio social de desemprego, seja ele inicial ou subsequente. Logo, temos situações dramáticas de pessoas que não têm qualquer protecção social. E, depois, o CDS, que não concorda com o aumento da protecção no desemprego, fica surpreendido com o aumento do rendimento social de inserção. Mas aí também está uma explicação.
Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se está ou não disponível para, de uma vez por todas, alterar as regras de atribuição do subsídio de desemprego, o que é fundamental nos tempos que vivemos.
Uma outra questão que queria deixar-lhe diz respeito à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).
Embora isso não conste nos mapas nem nos quadros que nos apresentou, a Sr.ª Ministra disse, na segundafeira passada, que o orçamento da Autoridade para as Condições do Trabalho iria aumentar de 45,8 milhões, verba de 2009, para 47 milhões.
Os mapas e as informações que nos transmitiu dizem que vão existir os 150 novos inspectores prometidos há 3 ou 4 anos atrás, mais 65 técnicos de contra-ordenações, mais 25 técnicos da área da saúde. Ora, são 240 novos trabalhadores para a ACT e isto está muito longe de preencher o quadro que o próprio Governo tem para a ACT. Já não falo dos rácios internacionais, que exigiam um nõmero de inspectores muito superior,»
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Não é verdade!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — » salvo erro, 750, e não existem nem de longe nem de perto 750 inspectores.
Mas a pergunta que lhe queria deixar é a seguinte: a verba prevista no orçamento da ACT passa de 45,8 para 47 milhões. São 240 novos trabalhadores. Se os encargos com cada um destes trabalhadores forem de 1000 €/mês — e até admito que até seja um valor superior — e multiplicar estes encargos por 14 meses, há um aumento da despesa de 3,360 milhões de euros. Ora, Sr.ª Ministra, o Orçamento do Estado não comporta
Página 17
17 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
esta despesa.
Portanto, a pergunta que lhe quero deixar é a seguinte: quantos trabalhadores vão sair da ACT? Quantos inspectores? Quantos técnicos? Pergunto-lhe isto porque o Orçamento não chega nem sequer para pagar salários. Logo, Sr.ª Ministra, diga lá qual vai ser o saldo final. É que anuncia 150 novos inspectores, mas quantos é que saem? Claramente, o orçamento não chega, e não é preciso ser especialista nesta matéria para perceber isto.
A segunda questão é sobre a sustentabilidade financeira da segurança social.
A Sr.ª Ministra sabe que, quando houve um aumento do IVA de 17% para 19% e de 19% para 21%, foram consignadas receitas do IVA para a segurança social. Sei que se mantém um ponto percentual para as prestações familiares, mas quando terminou o último aumento, de 19% para 21%, em Dezembro de 2009, a segurança social deixou de receber um ponto percentual do IVA, perdeu um ponto percentual do IVA, Sr.ª Ministra. Que impactos que isso terá na segurança social? É que do aumento de 17% para 19% e de 19% para 21% aumentou, respectivamente, um ponto percentual, agora mantém apenas um ponto percentual.
Quais os impactos que isto terá? Ainda no que respeita às medidas de apoio ao emprego, consideramo-las insuficientes. Não estamos contra elas, mas são claramente insuficientes. A questão que lhe coloco é a seguinte: por que razão é a segurança social que paga estas medidas? Bem sei que disse, na segunda-feira passada, que 50% das medidas eram pagas pelo Orçamento do Estado e 50% pela segurança social. Quero perguntar-lhe o seguinte: e as contribuições? A Sr.ª Ministra estipula um conjunto de isenções e de benefícios no que diz respeito à taxa contributiva — de 3 anos, de 26 meses, de 36 meses. Qual é a estimativa de perda de receita para a segurança social? Não é precisamente a mesma coisa e, portanto, queria deixar-lhe esta pergunta.
No que diz respeito à dívida, a Sr.ª Ministra anunciou, também na segunda-feira passada, o objectivo de cobrar cerca de 400 milhões de euros da mesma, mas também disse que a dívida era de 3268 milhões, o que, na nossa opinião, revela bem quanto insuficiente é esta recuperação da dívida.
Contudo, a Sr.ª Ministra esqueceu-se de referir — e foi também confrontada pela comunicação social e não respondeu — qual foi o montante da dívida cobrado em 2009, para sabermos se estes 400 milhões de euros são uma meta real ou ilusória.
Portanto, gostaria de saber qual foi a evolução da dívida durante o ano de 2008/2009, qual foi a dimensão do seu crescimento, e quanto foi recuperado pela segurança social.
Já agora pretendia saber se tem alguma intenção de anulação da dívida, se é este o caminho que tem previsto.
Sr.ª Ministra, por fim, no que diz respeito à segurança social, queria deixar-lhe uma nota sobre a necessidade de moralizar o dinheiro da segurança social.
O dinheiro da segurança social é dos trabalhadores, é especificamente atribuído para as prestações que dizem respeito aos trabalhadores, portanto tem que haver uma moralização.
Vimos assistindo, há alguns anos, à utilização abusiva, na nossa opinião, de dinheiro da segurança social para pagar medidas que não deveriam ser pagas pelo orçamento da segurança social. E, ao contrário do que a Sr.ª Ministra disse, é verdade que a segurança social tem registado saldos positivos, mas temos que ter preocupações no que diz respeito ao futuro. Não entramos em alarmismos, mas queria deixar-lhe uma questão que já foi aqui colocada.
A Sr.ª Ministra diz que não há perigo para a sustentabilidade da segurança social. Mas há uma necessidade que é premente, a diversificação das fontes de financiamento. O Livro Verde da Segurança Social apontava para este caminho.
Apresentámos, há cerca de três legislaturas, uma medida que visava diversificar estas fontes de financiamento. Hoje, já há sectores da sociedade que consideram que esta medida é importante. Qual é a medida? É a de o sistema das contribuições para a segurança social ter em conta não apenas os salários mas também a mais-valia, o valor acrescentado líquido das empresas.
A Sr.ª Ministra convive bem com o facto de hoje existirem sectores, como o da energia, o da indústria tabaqueira e outros sectores especulativos, que têm um valor acrescentado gigantesco mas que, porque têm poucos trabalhadores, descontam muito pouco para a segurança social? Por que não criar um sistema que tenha em conta a riqueza criada e que ponha quem tem muita riqueza e poucos trabalhadores a descontar de
Página 18
18 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
uma forma mais justa para a segurança social, assim encontrando a resposta para aumentar a sustentabilidade financeira de segurança social?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Srs. Presidentes, Sr. Deputado Jorge Machado, relativamente às questões que me colocou, sobretudo no que diz respeito ao seu desencontro de contas sobre o que está inscrito na verba do Orçamento do Estado para o subsídio de desemprego, tem que juntar a essa verba os complementos que são pagos quando o subsídio está abaixo do valor mínimo, e aí chegará ao valor correcto.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Assim não chega!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Chega, chega! Gostaria de relembrar, relativamente às questões sobre o subsídio de desemprego e o seu aumento, que o que o Governo fez foi seguir uma proposta que tinha sido apresentada pelo PCP e também pela CGTP respeitante à redução do prazo de garantia para a atribuição do subsídio de desemprego.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Uma!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Seguimos com muita atenção o debate que se fez sobre essa proposta e considerámos que era uma medida justa. Por isso, o Governo apresentou uma proposta para que essa medida fosse extraordinariamente posta em vigor no ano de 2010.
Mas também gostaria de relembrar houve um aumento da taxa dos desempregados cobertos pelo subsídio de desemprego, que, durante o ano de 2009, passou do 67%, em Janeiro, para 75% em Dezembro. Portanto, tem havido um esforço claro nesse sentido, ao longo do ano de 2009.
E sabemos que com as medidas que poremos em prática em 2010 esta taxa de continuará a melhorar e também, como já foi reconhecido nesta Câmara, temos toda uma série de outros instrumentos de apoio social claramente destinados às pessoas que não estão cobertas pelo subsídio de desemprego. Alguns exemplos claros são as propostas da Iniciativa Emprego 2010, que se destinam claramente a esse público. Logo, há, pela parte do Governo, uma preocupação clara em atentar às situações das pessoas que ficam no desemprego.
Em relação ao orçamento da Autoridade para as Condições do Trabalho, queria dizer ao Sr. Deputado Jorge Machado que os 150 inspectores estão a terminar o seu estágio, portanto fazem já parte »
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Finalmente! Aleluia!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » dos quadros de pagamento da ACT.
Pretendia ainda dizer-lhe que, com a entrada destes inspectores, Portugal alcança a média recomendada pela Organização Internacional do Trabalho, bem como que não houve despedimentos de inspectores na ACT — se fica mais tranquilo com esta declaração.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — E aposentação?
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Para além dos 150 inspectores, temos também 25 técnicos superiores para a área da segurança e saúde no trabalho, porque não é suficiente punir, é necessário prevenir e sensibilizar para que possamos evitar chegar ao ponto da punição. E tudo isto passa por um trabalho muito importante de sensibilização das empresas e dos trabalhadores relativamente à necessidade de respeitar integralmente a legislação laboral, nomeadamente a legislação na área da higiene e saúde no trabalho.
Portanto, sobre essa matéria tem havido um esforço muito grande no sentido de dotar a Autoridade para as Condições do Trabalho»
Página 19
19 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Jorge Machado (PCP): — E como é que justifica?
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social — » com os recursos humanos que são fundamentais para podermos claramente combater os abusos na área laboral.
Passarei, agora, a responder às questões sobre o pagamento, ou não, pela segurança social, pelo Orçamento do Estado ou por outras fontes de financiamento das opções políticas que o Governo tem feito em relação à necessidade de aumentar a segurança e os rendimentos, sobretudo das pensões.
Relembro que foi uma opção política o que foi decidido em relação ao aumento extraordinário das pensões mais baixas para o ano de 2010, quando não correriam o risco de baixar. Isso é já, claramente, uma diversificação de uma fonte de financiamento, onde é o Orçamento do Estado a pagar uma parte dessa decisão política.
Sobre essa matéria, temos as nossas decisões políticas e temos tido, claramente, uma política de reforço das transferências do Orçamento do Estado para a segurança social. Portanto, no ano de 2010 continuamos a ter essa política de aumento das transferências globais do Orçamento do Estado para a segurança social, que compensam claramente aquilo que não vem do IVA.
Portanto, em relação à sua questão sobre as reduções da taxa social única, a estimativa de perda de receita é equivalente a 77 milhões de euros no tal, dos quais 50% serão pagos por transferências do Orçamento do Estado.
Lamento não poder dizer-lhe qual é o valor da dívida cobrada pela segurança social em 2009, pois não temos ainda os apuramentos finais relativamente a esses dados. Mas em 2008 tínhamos claramente um valor de dívida de empresas e de trabalhadores independentes à segurança social na ordem dos 3,233 milhões de euros, como sabe, e a meta que estabelecemos de recuperação para 2010 é de 400 milhões de euros de dívida, não havendo, claramente, qualquer intenção de anulação de dívida por parte do Governo.
Aquilo que há, por parte do Governo, é a intenção de negociar as dívidas e proporcionar a possibilidade de pagamento dessas dívidas à segurança social. Com esta política de recuperação de dívidas pretende-se não só recuperar as dívidas do passado mas começarmos a entrar no cumprimento daquilo que são as dívidas correntes à segurança social. Portanto, sobre essa matéria, a política é muito clara.
Em 2008, a recuperação de dívidas à segurança social foi da ordem dos 368 milhões de euros.
O Sr. Presidente: — Concluímos assim a primeira ronda, pelo que passamos à segunda ronda de questões. Como é hábito, agora as respostas serão conjuntas.
Tem a palavra a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, se me dá licença, queria fazer uma interpelação à Mesa para esclarecer uma informação que erroneamente foi dada à Comissão, começando por cumprimentar o Sr.
Presidente, a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, há pouco, o CDS deu aqui uma informação que não está correcta e considero que devo esclarecer a Mesa, a Comissão e quem nos está a ouvir em sua casa.
No anúncio, ontem ou anteontem, da entrega de uma proposta de aditamento ao Orçamento relativa à acumulação da pensão social de invalidez, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, por quem tenho muita consideração — como, aliás, pela bancada do CDS e por todos as outras, pelo que não posso consentir que seja dita uma falsidade ou dada uma informação menos correcta — disse que a iniciativa apresentada pelo CDS na anterior legislatura tinha sido recusada pelo PS.
Gostava de registar que aquela iniciativa tinha sido entregue 15 dias antes pelo PS. Portanto, tratou-se de um plágio enriquecido pelo CDS-PP, entregue 15 dias depois da iniciativa do PS. As duas iniciativas caducaram porque não foram agendadas em Plenário. A do PS chegou a ter como Deputado relator o Deputado Adão Silva, aqui presente, e, para comprovar estes factos, queria fazer chegar à Mesa os dois projectos para serem distribuídos.
Página 20
20 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Gostava ainda de registar que o Governo, no seu relatório apresentado no Orçamento do Estado, a páginas 295, prevê precisamente esta iniciativa.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, dado que o Sr. Deputado Mota Soares não está aqui presente neste momento e eu não estava cá na anterior Legislatura, queria solicitar à Mesa a benevolência de permitir, quando o Sr. Deputado Mota Soares chegar, que ele responda pessoalmente a esta questão.
O Sr. Presidente: — Para já, serão distribuídos os documentos que a Sr.ª Deputada Teresa Venda fez chegar à Mesa e depois o Sr. Deputado poderá prestar os documentos que entender.
Pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Durante este debate, por vezes, fico um pouco baralhada, não com a Sr.ª Ministra mas com as bancadas da oposição.
Parece que não houve uma crise internacional, porque o BE refere-se à curva, às perspectivas e à trajectória da sustentabilidade da segurança social como se não tivesse havido uma crise e, portanto, com muita admiração por as declarações do Sr. ex-Ministro da tutela, Vieira da Silva, não serem coincidentes com a actual curva. Naturalmente, não poderiam ser! E quando houver recuperação, naturalmente também, as projecções serão afectadas e a curva será outra. Mas essa será outra questão» Mas, para nós e para todo o mundo, houve mesmo uma crise internacional e essa crise internacional reflecte-se em questões muito pertinentes e fundamentais, que dizem respeito ao apoio e ao relançamento económico, o que consta do Orçamento do Estado para 2010.
Aqui queria destacar várias medidas que considero especialmente importantes, porque são dirigidas ao universo mais frágil das micro, das pequenas e médias empresas, as quais são dirigidas à reabilitação das empresas em situação de dificuldade ou de colapso eminente.
Porque estamos numa discussão no âmbito da especialidade, vou passar a referir concretamente o artigo 47.º, que trata do regime excepcional de redução da taxa de juros de mora. Relembro que, neste momento, a taxa de juros de mora praticada é de 12% ao ano, o que acaba por afectar fortemente as unidades produtivas que até são viáveis no médio e no longo prazo.
Ora, esta questão de o Orçamento do Estado conter agora a previsão da redução desta taxa para 1% e 3% ao ano, na nossa óptica, assume uma relevância fundamental, porque é importante a cobrança de dívidas mas não deixa de ser importante o objectivo da manutenção da actividade.
E aqui dirijo-me também à Sr.ª Deputada do PSD, que referiu uma preocupação com a cobrança de dívidas, porque me parece que devemos ter preocupação com a cobrança de dívidas mas, essencialmente, devemos ter uma preocupação com a manutenção do emprego e das empresas e esta medida, na nossa óptica, é exactamente dirigida ao essencial. Assim, gostava de perguntar ao Governo se tem noção de quanto é que representará este benefício, esta descida da taxa de juros de mora.
Uma outra questão prende-se com a alteração ao artigo 48.º. No fundo, trata-se de alterar o regime prestacional previsto também no artigo 196.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que permite actualmente o pagamento das dívidas fiscais exigíveis em processo executivo até ao máximo de 60 prestações mensais, claro que em determinadas condições, perante um plano de recuperação económica ou de reestruturação empresarial.
Muitas empresas apresentaram-nos estas queixas relativamente às dificuldades deste plano de pagamento em 60 prestações. Afectadas pela situação internacional, seria necessário que fossem introduzidas regras mais flexíveis para poderem pagar essas dívidas, o que também consta do actual Orçamento do Estado, passando de 60 para 120 o número máximo de prestações permitidas.
Página 21
21 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Quanto a isto, a minha pergunta é sobre quanto pode representar a recuperação de créditos tributários em termos da arrecadação das receitas fiscais e se esta medida será também aplicada aos planos de recuperação de empresas já acordados.
Por último, queria referir o que consta de uma outra medida bastante relevante e que diz respeito ao IVA.
No artigo 78.º do Código do IVA prevê-se o alargamento da dedutibilidade do IVA aos créditos incobráveis.
Como se sabe, tal não era totalmente possível e isso gerava algumas dificuldades. Ora, as empresas, perante essas dificuldades, em vez de serem ajudadas a prolongar a sua existência, viam apressado o seu términos.
Ora, este Orçamento contém também uma questão fundamental, que é o facto de permitir essa dedutibilidade em créditos reconhecidos como tal no âmbito de procedimentos extrajudiciais de conciliação.
No fundo, são medidas que atendem à viabilização das empresas perante a situação de dificuldades económicas transitórias mas que previnem a contaminação das dificuldades aos respectivos credores e, consequentemente, a outras empresas.
Portanto, a proposta de Orçamento do Estado para 2010 entregue pelo Governo dá atenção às pequenas e médias empresas, que são mais de 98% do nosso tecido empresarial.
O Sr. Presidente: — Passo a palavra à Sr.ª Deputada Francisca Almeida, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quer na sequência da primeira intervenção do PSD de hoje quer na passada segunda-feira, a Sr.ª Ministra já nos deixou aqui bem claro que acredita verdadeiramente que durante este ano não iremos além de uma taxa de desemprego de 9,8%. Quanto a nós, esta é uma revisão em baixa, mas, enfim, cá estaremos no final do ano para aferir do acerto desta previsão. Espero, sinceramente, cá estar para lhe dar razão no final do ano.
Mas ainda acerca dos 9,8% que constam do Relatório, gostava de colocar uma questão à Sr.ª Ministra, a que não respondeu na passada segunda-feira. Perguntei se deste Orçamento constava alguma medida para os mais de 90 mil portugueses desempregados em Espanha, na sua maioria oriundos do sector da construção civil, como sabe. Tendo em conta que pelo menos uma boa parte deles voltará a Portugal para um sector que já de si dá mostras de debilidade, pergunto se esta taxa de 9,8% contempla já a possibilidade de estes trabalhadores voltarem a Portugal e ainda, tal como perguntei na passada segunda-feira e a Sr.ª Ministra não respondeu, se já encetou contactos com o seu homólogo espanhol no sentido de coordenar esforços e políticas de apoio a estes cidadãos portugueses.
A segunda questão que gostava de colocar tem a ver com a fiscalização e com a renovação automática do rendimento social de inserção.
Na proposta de lei, o Governo mantém o princípio da renovação automática e propõem-se reforçar o rigor na atribuição desta prestação através da tal fiscalização semestral de que aqui já se falou. Os últimos anos — a Sr.ª Ministra concordará comigo — demonstraram que o Governo não foi capaz de compensar esta renovação automática com uma fiscalização capaz e actuante, o que, na verdade, acaba por tornar o Governo cúmplice, verdadeiramente cúmplice, do descrédito e da desacreditação em que caiu esta prestação social.
Disse-nos a Sr.ª Ministra na segunda-feira, e reportando apenas àquilo que deixou aqui claro em Comissão, que esta fiscalização abrangerá, em 2010, mais 40 mil famílias, portanto, um quarto das que em Novembro estavam inscritas nos centros de emprego e recebiam o RSI.
Disse-nos hoje aqui, como novidade, que a fiscalização será reforçada através de 50 novos inspectores, contradizendo aquilo que disse o Presidente do Instituto da Segurança Social, Dr. Edmundo Martins, pelo que ficamos sem saber, e gostava que confirmasse, se estes 50 novos inspectores avançam ou não.
O certo é que, ainda que assim suceda, não nos parece que seja um reforço substancial nos meios de fiscalização, parece-nos claramente insuficiente, e, não havendo este reforço substancial, continuará a agravar-se a despesa com o rendimento social de inserção e o Governo continuará a contribuir para descredibilizar esta prestação social, concorrendo para este sentimento que, infelizmente, grassa na nossa sociedade de que quem recebe o RSI não quer trabalhar, o que cremos que manifestamente não sucede na grande maioria dos casos.
Página 22
22 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Portanto, Sr.ª Ministra, o que lhe pergunto é se neste Orçamento, a par da fiscalização que se propõe fazer, está disponível para reequacionar o mecanismo da renovação automática do RSI, ressalvando, naturalmente, a agilização dos procedimentos para que não fiquem processos pendentes eternamente e não fique ninguém em situação de carência por deixar de receber esta prestação.
Finalmente, gostava de lhe colocar uma questão que tem a ver com o funcionamento dos centros de emprego. Não vi nas GOP nem no Relatório nem na proposta de lei qualquer referência a esta matéria nem à procura activa de emprego, dando até a ideia de que tudo vai bem no «reino do Eng. José Sócrates.» Mas não vai, e a este propósito gostava de lhe citar e chamar a atenção para uma notícia publicada ontem no jornal i que diz o seguinte: «Chamam-lhe ‘chapa 5’. É uma prática de algumas empresas da região de vale do Cávado conhecida pelos desempregados da zona. Não se trata de pagar para trabalhar mas de pagar para provar que se está à procura de emprego. As empresas cobram aos desempregados 5 euros por um carimbo na declaração que têm de entregar ao centro de emprego». E diz mais à frente: «o esquema é simples. Seja por iniciativa do desempregado ou porque é convocado pelo centro de emprego, o desempregado, quando chega à empresa, é convidado a trabalhar à experiência para que possa comprovar junto do IFP que respondeu à convocatória e está activamente à procura de emprego.» A Sr.ª Ministra sabe tão bem como todos nós que é em momentos de crise que se abre espaço para os maiores abusos, mas a notícia que ontem li — e que me preocupa particularmente porque se reporta ao círculo por que fui eleita, em que as empresas do sector têxtil, vestuário e calçado estão a passar situações verdadeiramente desesperantes — dá conta do aproveitamento injustificável e infame dos cidadãos que, numa situação de vulnerabilidade, são obrigados à procura activa de emprego. E o mais grave é que, paradoxalmente, os casos relatados reportam-se, na sua grande maioria, à comparência a ofertas de emprego divulgadas justamente pelos próprios centros de emprego.
Portanto, a pergunta que lhe deixo é apenas uma, a de saber se está disponível para rever a política de procura activa de emprego no sentido de prevenir estes abusos e se a fiscalização (de que tanto falou e que hoje reforçou) não poderá ser alargada às empresas que procuram candidatos junto dos centros de emprego.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, se me permite, gostava de dar uma resposta à Sr.ª Deputada Teresa Venda, por quem tenho imensa estima pessoal, mas posso inscrever-me para mais tarde, aquando do uso dos 2 minutos adicionais.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Pedro Mota Soares, vamos aguardar que sejam distribuídos os documentos.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, o tempo de que disponho é curto.
Em primeiro lugar, com muita tristeza e para encerrar este capítulo do rendimento social de inserção (RSI), dado o crescente e galopante número de portugueses abrangidos pelo RSI, só posso concluir uma de duas coisas: ou há (o que é negado pelo Governo) muita gente a receber o rendimento social de inserção que não teria direito a ele, objectivamente, e, portanto, há situações de fraude no RSI, o que me entristece e revolta como português, porque estão em causa recursos públicos que poderiam ser canalizados para outras áreas mais necessitadas, ou então estes quatro anos de políticas de emprego, sociais e económicas do Governo foram um redondo falhanço, porque há cada vez mais portugueses empobrecidos e a depender do RSI.
Não posso tirar uma terceira conclusão. Qualquer uma destas conclusões entristece-me, revolta-me e mostra que, de uma maneira ou de outra, algo está a falhar nas políticas do Governo. Não há terceira possibilidade, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra, na sua primeira intervenção e em resposta ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, não respondeu a questões (vou ser sucinto e telegráfico a enumerá-las) que foram colocadas e às quais agradecia que respondesse agora, na sequência desta minha intervenção.
Desde logo, a Sr.ª Ministra não respondeu à questão sobre a declaração que fez quanto ao facto de entender que deveria haver aumento dos salários nos sectores da actividade privada em que haja aumento de produtividade. Ora, o que foi perguntado foi se a Sr.ª Ministra, tendo esse entendimento, tirava a consequência lógica e defendia que tal medida deveria ser aplicada também aos sectores da Administração Pública em que
Página 23
23 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
houvesse aumento da produtividade.
Em segundo lugar, quando foi confrontada com o parecer do Conselho Económico e Social (CES), que refere que as previsões do Governo de 0,1% quanto à queda no volume de emprego parecem, em termos objectivos, excessivamente optimistas face às condições do mercado, da economia e à própria previsão do Banco de Portugal, que aponta para 1,3%, mais uma vez, a Sr.ª Ministra não respondeu a essa questão.
Por fim, a Sr.ª Ministra não respondeu à questão relativa ao Mapa X, com que o Deputado Pedro Mota Soares a confrontou, no sentido de explicar se o regime complementar especial é o que o Governo vai pagar a mais derivado do aumento da taxa de 7% para 15%.
Sr.ª Ministra, estas são as questões que já lhe foram colocadas e que gostaria de ver respondidas.
Queria agora colocar-lhe mais duas ou três questões novas.
Para além da consideração geral que já tinha feito anteriormente, na Comissão de Trabalho, no sentido de que o pacote de medidas que o Governo agora apresentou, tirando uma ou outra pequena inovação, mais não é do que a repetição do pacote de medidas que já existia em 2009, em relação ao qual está demonstrado que a taxa de execução foi muito baixa, o que revelava alguma desadequação às condições de mercado, acrescento que consideramos essas medidas inadequadas.
Uma vez que as repetiu, vamos cingir-nos, em concreto, ao que temos.
Quanto à medida dos estágios profissionais, gostaria de saber se, para além de prever (como já previa em 2009) proporcionar estágios profissionais a jovens, medida paliativa, transitória e com um fim à vista de seis meses, que é o período de duração do estágio, o Governo prevê alguma continuidade nesse tipo de política, de forma que, passados esses seis meses, os jovens não voltem à situação em que estavam anteriormente, ou até pior em termos emocionais por, tendo-lhes sido aberto um estágio e uma possível perspectiva de poderem exercer uma actividade profissional em continuidade, ao fim de seis meses, se encontrarem exactamente no mesmo ponto em que estavam antes.
Ainda relativamente aos estágios profissionais, pergunto se o Governo considera que os jovens que vão integrar esse programa podem fazer descontos para a segurança social e daí retirar, posteriormente, o benefício de virem a receber subsídio de desemprego, o que actualmente não acontece, também porque não fazem descontos.
Quanto ao apoio às famílias, embora haja medidas que, indirectamente, a Sr.ª Ministra possa indicar que têm em vista incentivar essa área específica, directamente não há qualquer linha no Programa do Governo que se refira ao incentivo à natalidade e ao problema grave que temos, em Portugal, do envelhecimento da população e da baixa taxa de natalidade. Há medidas que, indirectamente — poderão dizer-me — têm em vista ajudar os jovens casais nesta nova fase da sua vida e o aumento da taxa da natalidade. Mas directamente não há qualquer indicação quanto a isso, facto que tenho de registar.
Por outro lado, sendo de louvar o esforço — ninguém pode escamoteá-lo — que o Governo tem desenvolvido na criação de uma rede nacional de creches, de infantários para ajudar as famílias portuguesas, no entanto continua a verificar-se ainda um factor de exclusão relativamente a muitos milhares de famílias portuguesas que a ela não têm acesso.
Sabendo nós que o recurso a estabelecimentos privados é oneroso e representa uma significativa parcela dos rendimentos dos jovens agregados familiares, gostaria de saber se o Governo contempla alguma forma de apoio ou subsidiação, pelo menos parcelar, das prestações que comprovadamente esses casais paguem nessas situações.
Finalmente, no que diz respeito ao círculo eleitoral pelo qual fui eleito, o Algarve, o Governo anunciou que iria ter um pacote de medidas especiais para ajudar a combater o problema social e o flagelo do desemprego no Algarve, que, como se sabe, tem características totalmente diferentes das do resto do País e tem, neste momento, uma taxa de incidência também muito superior.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira fazer o favor de concluir, uma vez que já excedeu o tempo em 2 minutos.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Em relação ao Algarve, queria pedir à Sr.ª Ministra se me podia dizer, em concreto, quais seriam essas medidas especiais para o Algarve, nomeadamente em relação ao problema que agora se enfrenta da Alicoop.
Página 24
24 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Está previsto algum tipo de intervenção de forma a salvar os 400 postos de trabalho que vão perder-se naquela que é a maior empregadora privada do Algarve?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, começo por fazer uma pequena referência à intervenção da Sr.ª Deputada Hortense Martins: o Bloco de Esquerda sabe que houve uma crise internacional, verdadeiramente a primeira crise global, conhece exactamente a sua natureza, bem como os reflexos que ela também teve em Portugal.
Sr.ª Deputada, posso dar-lhe o primeiro reflexo: a nacionalização do prejuízo do BPN, 450 milhões de euros do dinheiro de todos nós! Esse é um grande reflexo da crise.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Se não fosse feita, nem os depósitos se salvavam!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Também conhecemos bem a sua natureza, que advém da economia de casino e da especulação que por todo o mundo aconteceu.
Portanto, não vale a pena fazer esse «número», porque não podemos desculpar tudo com a crise internacional, naturalmente.
Sr.ª Ministra, do que falei, exactamente, foi da sustentabilidade da segurança social e, a este propósito, queria voltar a clarificar o seguinte: eu não disse que a segurança social não estava a cumprir o seu papel, e longe de mim pensar que a Sr.ª Ministra quer uma segurança social que não seja esta, universal e com todas as suas características. Mas a verdade é que temos de acautelar, não no imediato — e os dados são preocupantes — o saldo global positivo que existe, os 293 milhões de euros, saldo este que reflecte um decréscimo de 47,5% face a 2009. E esta é uma situação preocupante! Também o relatório com estes números constata que o primeiro saldo global negativo ocorrerá em 2036; por isso, ou se acautelam rapidamente as questões da sustentabilidade ou poderemos ter mais surpresas.
Veja-se que, num ano, a perspectiva desce de um primeiro saldo global negativo em 2049 para 2036»
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Pedro Marques): — 2039!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Eu sei, Sr. Secretário de Estado. Bem recordo a discussão do Orçamento, em 2009.
Continuamos a reafirmar que a sustentabilidade da segurança social não passa apenas pelas medidas já tomadas na introdução de mecanismos como o factor de sustentabilidade ou outros, porque foi disso que se tratou.
Sabemos que foram esses factores e, também, a antecipação da aplicação da fórmula de cálculo das pensões que fez com que, no ano passado, o Governo viesse reconhecer e fazer uma certa marcha atrás no recalculo das pensões.
No ano passado, reconhecendo o seu erro relativamente às pensões e aos pensionistas, que ficaram prejudicados por via de lhes ter sido introduzida uma nova fórmula no cálculo das suas pensões, o Governo veio dizer que esse recalculo, então, a partir de 1 de Janeiro de 2009, seria reposto. Mas a verdade é que muitos pensionistas foram afectados desde Junho de 2008, data em que o Governo alterou as regras.
Portanto, deve-se ainda dinheiro às pessoas, porque essa alteração teve um impacto — reconhecido pelo Governo — extremamente negativo.
Portanto, Sr.ª Ministra, reafirmo que é preciso ir mais além na segurança social e é preciso fazê-lo já, porque corremos sérios riscos de, para o próximo ano, podermos estar aqui a discutir um saldo global positivo bem menor e, também, perspectivas bem piores para a segurança social. Esta é uma urgência.
Relativamente ao desemprego, faço-lhe uma pergunta muito simples: pode dizer-nos qual será, efectivamente, a majoração que os casais desempregados vão ter? É uma majoração de 20%, conforme a proposta que aqui foi aprovada, ou há outra perspectiva por parte do Governo? É que essas verbas têm de
Página 25
25 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
estar espelhadas no Orçamento.
Por outro lado, da tal entrevista que o Sr. Deputado Pedro Mota Soares referiu, onde falou do rendimento social de inserção — e penso que o episódio estará arrumado, e é bom que assim seja — queria recordar-lhe uma outra afirmação. Disse a Sr.ª Ministra que vai introduzir medidas para travar as reformas antecipadas.
Ora, gostaria que me explicasse que medidas serão essas e como é que vai fazer: vai alterar a Lei de Bases da Segurança Social, no sentido de não permitir que as reformas antecipadas ocorram nos exactos termos nela previstos? Como é que vai fazer, dada a situação relativa ao desemprego de que aqui já falámos? Por outro lado, nesta entrevista, a Sr.ª Ministra referiu o Bloco de Esquerda — e estamos agradados — dizendo claramente que não vai aprovar a proposta do BE no sentido de o complemento solidário para idosos ser pago 14 vezes por ano. Ainda bem que já nos deu a sua opinião, mas relembro, Sr.ª Ministra, que este complemento representa muito pouco dinheiro e que o 13.º e o 14.º meses são direitos conquistados em Portugal. É lamentável que o Governo não tenha esta sensibilidade social numa prestação, que, afinal, é tão diminuta e tão modesta, de combate à pobreza.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, no que diz respeito ao subsídio de desemprego, registamos as suas declarações a dizer que concordou com o PCP na alteração do prazo de garantia, mas a senhora altera o prazo de garantia com uma perspectiva: é só durante o período de um ano, o que é errado. Para além do mais, esta alteração não pode ser desenquadrada de um conjunto de alterações que o PCP propôs. É que no nosso projecto de lei, Sr.ª Ministra, esta medida de redução do prazo de garantia estava consagrada juntamente com um conjunto muito vasto de outras medidas (dou-lhe um exemplo, a alteração dos prazos de atribuição, que é fundamental), e o efeito conjugado dessas medidas é que iria traduzir-se numa inversão da tendência registada de diminuição de trabalhadores com subsídio de desemprego, com protecção social.
A Sr.ª Ministra pode dar as voltas que quiser mas, no ano passado, em 2009, 327 000 pessoas desempregadas beneficiaram de algum tipo de protecção social — subsídio de desemprego, subsídio social de desemprego, inicial e subsequente. Porém, o desemprego em sentido restrito atingiu 575 000 pessoas.
Se somarmos ao desemprego em sentido restrito os desmotivados e os inactivos, que não contam mas que estão efectivamente desempregados, dá cerca de 700 000 pessoas, sendo que chegamos à triste conclusão que temos cerca de 50% dos desempregados sem protecção efectiva, Sr.ª Ministra. Pode a Sr.ª Ministra não contar os inactivos e os desmotivados, mas garanto-lhe que essas pessoas estão desempregadas e contam, ou deveriam contar, para efeitos de protecção social. Assim sendo, é urgente alterar as regras de atribuição de subsídio de desemprego.
Passo a uma outra questão, pendente da primeira ronda, relativa à dívida à segurança social cobrada em 2008. Finalmente, temos um dado: 368 milhões de euros. Muito bem, Sr.ª Ministra! Então, se foram cobrados 368 milhões de euros em 2008 vem aqui anunciar, como uma grande meta para a cobrança 400 milhões de euros em 2010 quando a dívida à segurança social é de 3262 milhões de euros?! Então, se em 2008 conseguiram cobrar 368 milhões de euros, por que é que não tem metas mais ambiciosas quando tem tanto onde ir buscar dinheiro, quando tem mais de 3000 milhões de euros de dívida para ir buscar? Por que é que apresenta uma meta, Sr.ª Ministra? É que, na segunda-feira passada, quem a ouviu pensava que 400 milhões de euros era a grande meta de cobrança da dívida. Então, Sr.ª Ministra, se cobraram 368 milhões de euros em 2008 por que é que não tem uma postura, uma meta, mais optimista? Passo à questão das pessoas com deficiência, registando novamente o facto de não estar presente a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação. Mas está a Sr.ª Ministra, e isso é que é importante.
Reforço ao apoio social, apoio à activação profissional e uma nova prestação social são metas anunciadas pelo Relatório (página 291, creio) e pelo Orçamento do Estado. Sr.ª Ministra, no que respeita a esta nova acção social, onde está o dinheiro no Orçamento do Estado? O que é que pretende realmente fazer? Sr.ª Ministra, quanto a emprego, é fundamental combater o desemprego entre as pessoas com deficiência.
A Sr.ª Ministra tutela a área relativa às pessoas com deficiência e quanto à quota de emprego na Administração Pública, pergunto: que medidas vai tomar para que a Administração Pública cumpra, de uma vez por todas, a quota de emprego?
Página 26
26 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr.ª Ministra, dou-lhe um exemplo que é um escândalo nacional. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras abriu um concurso com 170 vagas para admissão de trabalhadores. Sabe qual é a quota para pessoas com deficiência? Zero, Sr.ª Ministra! Nem uma pessoa com deficiência é referida no concurso. Isto é um escândalo, é uma violação à lei e é um contributo que o Governo dá para a não empregabilidade das pessoas com deficiência. Sr.ª Ministra, diga lá se vai resolver este problema em concreto e se vai obrigar os seus colegas de Governo a tomarem medidas para cumprir a quota para pessoas com deficiência nos concursos públicos.
Quanto a benefícios fiscais ilegitimamente retirados em 2006, Sr.ª Ministra, houve um saldo positivo de 28 milhões de euros. Pretende ou não redistribuir, repor esta verba que foi ilegitimamente retirada? Por fim, tenho diversas questões ainda a abordar.
Sr.ª Ministra, deu uma entrevista à revista Sábado, na crónica Explique lá melhor, em que o mote da entrevista era a questão da contradição por parte do Governo entre o aumento de salários que propõe e aquilo que pratica. Já não vou recuperar esse tema e essa contradição, que não conseguiu explicar, mas peço-lhe que explique melhor, outra vez, como é que se justifica que diga que o Governo tem acompanhado todas as situações de despedimentos colectivos através da Autoridade para as Condições do Trabalho, que actua quando há violações da lei.
Sr.ª Ministra, dou-lhe vários exemplos, porque não tenho tempo para mais. Grupo Amorim: despedimento colectivo em Santa Maria da Feira e no Seixal; uma trabalhadora lactante foi despedida sem parecer da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE); despedimento colectivo. Mais: esta empresa até tinha um conjunto de apoios públicos bastante avultados.
Por fim, Sr.ª Ministra, há ainda duas perguntas muito rápidas que quero colocar-lhe.
Quanto ao programa Conforto Habitacional para Idosos, qual é a taxa de execução em 2009? A Sr.ª Ministra apresentou o conjunto de metas para 2010 mas não disse qual foi a taxa de execução. Existe alguma coisa por parte do Governo ou o que temos são algumas iniciativas das câmaras municipais, que são de louvar? No que se refere ao rendimento social de inserção, em 2009, foram gastos 507 milhões de euros; em 2010, está previsto gastar-se 495 milhões de euros, portanto, há uma redução da verba.
A Sr.ª Ministra, por causa do acordo orçamental, fez claramente cedências ao CDS-PP no que diz respeito ao montante mas também no que diz respeito à fiscalização.
Quanto à fiscalização, Sr.ª Ministra, estamos em acordo pleno, mas quero chamar-lhe aqui a atenção para um facto: e a inserção? Sr.ª Ministra, se falar com quem trata da pobreza, com quem está no terreno, se falar, por exemplo, com organizações ligadas à igreja — pelos vistos, o CDS está divorciado das instituições ligadas à igreja — verifica que colocam a tónica num aspecto. Sabe qual é, Sr.ª Ministra? A inserção das pessoas que recebem o RSI. Como é que vai fazer a inserção efectiva, Sr.ª Ministra? Com que meios, quando não existem meios para essa mesma inserção? Sr.ª Ministra, queremos aqui repudiar o combate do CDS-PP contra o RSI. É preciso fiscalizar e moralizar a prestação, mas também é preciso dizer que não aceitamos que num programa de televisão, por exemplo, pelo que me recordo, um dirigente da Juventude Popular tenha dito que o RSI é para calões que não querem trabalhar. Isto é ofensivo, é uma saga inaceitável contra o rendimento social de inserção.
Sr.ª Ministra, quero ainda dizer-lhe que não partimos do mesmo princípio que o CDS-PP parte, ou seja, que todas as pessoas que estão a receber o rendimento social de inserção estão de má fé neste processo.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, uma vez que já excedeu o tempo de que dispunha.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, para concluir, quero dizer-lhe que é preciso combater as situações em que são indevidamente atribuídas as prestações, mas igualmente importante é apostar na inserção social, e isso, infelizmente, não acontece.
O Sr. Presidente: — Antes de passar a palavra à Sr.ª Ministra para a resposta conjunta, tenho ainda um conjunto de inscrições para intervenções de 2 minutos, segundo a grelha de tempos que acordámos.
Seguindo o princípio da rotatividade, e pela ordem de inscrição, tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª
Página 27
27 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Deputada Catarina Marcelino.
A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, para o PS torna-se cada vez mais claro e evidente que o CDS gostaria de acabar com o rendimento social de inserção.
Pergunto aos Srs. Deputados do CDS por que não acabaram com a medida quando tiveram oportunidade.
Não é sério andar a propor alterações à medida, mascaradas de rigor e de seriedade, como a proposta de a renovação anual da prestação deixar de ser automática, quando os senhores sabem, por experiência própria, que isso não é operacional e que cria o caos no rendimento social de inserção.
No tempo da coligação PSD/CDS, em 2003, quando era Ministro Bagão Félix, ao serem alteradas as regras, foi criada uma situação de balbúrdia, à qual o PS, quando chegou ao Governo, em 2005, teve de deitar mão e corrigir.
Os senhores deixaram cair a inserção: em 2002, 54% dos beneficiários tinham acordo de inserção; em Fevereiro de 2005 eram apenas 20%.
Quanto à fiscalização, já hoje aqui sobejamente falada, em 2004 foram realizadas 17 000 acções, mas em 2008 foram realizadas as 36 000 de que a Sr.ª Ministra falou e, em 2009, foram realizadas mais 38 000. É uma diferença, neste momento, relativamente a 2004, de mais de 20 000 acções de fiscalização. Os senhores têm a ousadia de vir falar de falta de fiscalização, mas não ouço o CDS, com tanto afinco, falar de fiscalização na fuga ao fisco, que atinge o erário público de forma incomparável à fraude do RSI.
Quero também agradecer o mail que o Sr. Deputado Pedro Mota Soares distribuiu, referindo, no entanto, que quando se está a falar em irregularidades na medida não se está necessariamente a falar em fraude, e isso deve ficar aqui bastante claro.
Parece-me que, para o CDS-PP, os pobres devem ser mais fiscalizados do que os outros cidadãos portugueses, e isso não me parece nada sério.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — O tempo médio de atribuição da prestação, no início de 2005, era de seis meses, sendo que em locais como Lisboa e Braga ultrapassava um ano; hoje, o tempo médio é de 51 dias.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua, pois já excedeu o tempo de que dispunha.
A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Concluo já, Sr. Presidente.
Como é possível que o CDS venha propor novamente que termine a renovação automática da prestação sabendo muito bem, por experiência própria, que essa decisão instalaria, de novo, uma situação que faria com que todo o processo ficasse paralisado? Os senhores não defendem as políticas sociais, os senhores fazem uma gestão oportunista das políticas sociais.
Sr.ª Ministra, esta aposta na medida, quer do lado do controlo quer do lado da inserção, é acompanhada, neste Orçamento, por uma descida, relativamente à execução de 2009, de 2,5% no valor orçamentado. Peçolhe que nos explique a estratégia que o Ministério definiu para uma maior eficácia do RSI tendo em conta, por um lado, a descida da despesa e, por outro lado, uma melhor eficácia no combate da pobreza em Portugal, que o RSI reduz em 25%, chegando a 54% no que respeita às famílias numerosas.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a mesa.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada, legitimamente, colocou uma pergunta ao CDS. Gostava de saber como posso responder a essa pergunta não gastando o tempo de que disponho para fazer perguntas à Sr.ª Ministra.
Sr. Presidente, não me leve a mal mas, que eu saiba, estamos numa sessão de perguntas ao Governo.
Percebo que o PS tenha poucas coisas para perguntar ao Governo, pois não está muito interessado no
Página 28
28 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Orçamento, e que pergunte ao CDS. Nesse sentido, peço-lhe, Sr. Presidente, que dê ao CDS algum tempo para responder, da mesma forma que deu tempo à Sr.ª Deputada.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado está inscrito para falar imediatamente a seguir à próxima intervenção, altura em que terá tempo para responder à questão.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Srs. Presidentes, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, continuo a congratular-me por ter dado início, nesta Legislatura, à preocupação com os problemas da deficiência, aquando da presença da Sr.ª Ministra, e por ver agora que todas as bancadas estão preocupadas com essa área.
Voltando novamente aos problemas da deficiência, de acordo com o Orçamento do Estado, um dos objectivos estratégicos das políticas do Ministério para 2010 é reforçar esse apoio social aos cidadãos com deficiência e incapacidades. Mas, Sr.ª Ministra, o Decreto-Lei n.º 290/2009, de 12 de Outubro, no seu artigo 29.º, prevê apoios financeiros para os centros de recurso, a serem disponibilizados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional. Ora, como todos sabem, os centros de recurso são indispensáveis para as acções de informação, avaliação e orientação para a qualificação e o emprego, bem como, acima de tudo, para o apoio à colocação e acompanhamento pós-colocação das pessoas com deficiência.
Penso que esta tarefa é indispensável, tendo em conta a problemática que rodeia muitas vezes a inserção no meio profissional das pessoas que nasceram diferentes.
Esse apoio é, pois, indispensável e a própria legislação, embora venha agora diminuir o período de duração dessas acções, pelo menos, vem dar alguma possibilidade à sua realização.
Sabemos que muitos centros de recursos apresentaram os seus projectos para o período 2008-2010, mas, até à data, ainda não tiveram qualquer informação sobre a aprovação desses mesmos projectos.
O Instituto do Emprego e Formação Profissional tem adiantado algumas verbas aos centros de recursos, mas não informa exactamente se os projectos estão aprovados e qual o montante da verba. Isso, como é óbvio, provoca uma instabilidade no trabalho e na sequência do projecto.
Por isso, Sr.ª Ministra, gostaria de saber quais as verbas que são destinadas à formação profissional na área da deficiência, se os centros de recursos também têm verbas previstas para 2010 e quando vão ser aprovados os referidos projectos (os projectos apresentados pelos diferentes centros de recursos para o período 2008-2010).
Já agora, Sr.ª Ministra, queria colocar-lhe uma outra questão. A Sr.ª Ministra, na segunda-feira, foi questionada sobre os apoios à aquisição de veículos para deficientes. Peço-lhe que me dê só um esclarecimento: sei que a proposta de lei n.º 9/XI (1.ª), nos seus artigos 97.º e 98.º, não refere qualquer ponto sobre esse benefício aos deficientes, embora a Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, o refira. Gostaria de ter aqui uma confirmação da parte da Sr.ª Ministra, para sossego dos deficientes, de que efectivamente esse benefício se vai manter.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Termino, dizendo-lhe, Sr.ª Ministra, que a questionei, aquando da sua primeira intervenção nesta Assembleia, sobre a caderneta individual de competências, que a Sr.ª Ministra disse que haveria de se fazer.
Espero que venha mesmo a fazer-se porque o CES, no seu parecer à proposta de lei de Orçamento do Estado para 2010, diz apenas isto: «O CES não pode deixar de expressar a sua preocupação pelos atrasos nos processos de reconhecimento, validação e certificação das competências profissionais».
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de terminar.
A Sr.ª Maria da Conceição Pereira (PSD): — Portanto, Sr.ª Ministra, perante esta preocupação que demonstrei no início e que, pelos vistos, também é partilhada pelo Conselho, espero que, muito em breve, vejamos a caderneta individual de competências concretizada.
Página 29
29 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, não me leve a mal que use parte desta intervenção para poder responder»
O Sr. Presidente: — Use-a para o que pretender, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Começo por pedir desculpa à Sr.ª Deputada Teresa Venda, por quem tenho imensa estima. Muito sinceramente, acho que a Sr.ª Deputada — e sabe que é verdade, que o penso — é um exemplo para esta Câmara. A Sr.ª Deputada Teresa Venda faz parte da bancada do Partido Socialista, ainda que seja independente, e é um exemplo pela dedicação que põe em todos os assuntos, pela seriedade intelectual que traz sempre a estes assuntos e, muitas vezes, até, pelo manancial de ideias que traz (algumas vezes, com iniciativas isoladas, muitas vezes, com a Sr.ª Deputada Rosário Carneiro, a quem aproveito para cumprimentar, e, outras vezes, até «trazendo atrás de si» a bancada do PS). Quero felicitá-la por isso. E há um conjunto de exemplos que têm marcado essa actuação. Um dos bons exemplos que, a meu ver, já marcou essa actuação nesta Câmara tem sido o da defesa das pessoas que têm rendimentos de pensões de invalidez. Mas poderia falar de outras matérias, como, por exemplo, uma batalha que sei que partilha comigo (tal como partilho essa outra consigo), que é a de permitir que os casais possam apresentar as declarações de IRS em separado para não serem penalizados, tal como, por exemplo, a quota de contratação na Administração Pública de pessoas portadoras de deficiência. São batalhas que nós, felizmente, partilhamos.
E sabe, Sr.ª Deputada, nós, nesta bancada — e não faço acusações a qualquer bancada — fazemos sempre uma coisa: olhamos para as propostas pelo mérito que elas têm e não pela assinatura que trazem.
Nesse sentido, já votei a favor de propostas do Bloco de Esquerda, do Partido Comunista Português, do PSD, do PS, de todos os partidos. Infelizmente, Sr.ª Deputada, acho que nem sempre acontece a mesma coisa por parte da bancada em que a Sr.ª Deputada se senta — não digo da Sr.ª Deputada.
Ainda na semana passada, depois de o CDS ter suscitado uma questão que, para nós, era essencial, a de se poder contratualizar com as misericórdias a realização de mais 40 000 cirurgias — e dissemo-lo durante a campanha eleitoral, inscrevemo-lo no nosso programa de governo e levámos esta matéria a negociações sérias que fizemos com o Governo (e, curiosamente, sabemos que o Governo pensa exactamente isto, até porque já está em vias de estabelecer um protocolo idêntico, até na data, ao que o CDS sugeriu) — , como é que o Partido Socialista votou esta ideia? Chumbou-a! Ora, não acho que isto acrescente seriedade e credibilidade à política.
Da mesma forma, Sr.ª Deputada — e vou pedir que seja distribuída uma iniciativa legislativa à qual, há pouco, me referi, e que tem a ver com uma alteração à lei do IAS — , no ano passado, quando nos apercebemos de que, se houvesse deflação (inflação negativa), as pensões poderiam ser prejudicadas, o CDS apresentou nesta Câmara um projecto de lei, cuja discussão teve lugar no mês de Junho, projecto esse que introduzia uma cláusula de salvaguarda no IAS, não permitindo que as pensões baixassem. Sabe qual foi o sentido de voto do Partido Socialista, Sr.ª Deputada? Votou contra! Curiosamente, hoje, do artigo 50.º da proposta de lei de Orçamento do Estado, consta exactamente uma cláusula de salvaguarda. Sabe como vou votar esta matéria? Vou viabilizá-la, porque acho que isto é justo.
Veja, Sr.ª Deputada, a seriedade e a credibilidade que todos nós temos de pôr nestas matérias!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, termino já. Peço-lhe só que me dê a mesma tolerància que foi dada»
O Sr. Presidente: — Estou a dar a mesma tolerância.
Página 30
30 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Nesse sentido, se vê também a seriedade e a credibilidade que nós pomos nas matérias.
Sr.ª Deputada, nunca olho para as assinaturas, mas para o mérito das propostas. Sei que a Sr.ª Deputada também o fará. Esperava que na sua bancada outras pessoas também tivessem essa postura, pois as coisas seriam muito diferentes.
Voltando ao tema do rendimento mínimo,»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Para terminar, Sr. Presidente»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo está esgotado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Então, Sr. Presidente, invoco a defesa da honra da bancada face à consideração que foi feita pela Sr.ª Deputada Catarina Marcelino.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que seja breve. Tem 30 segundos, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Gostaria de pedir um comentário à bancada do Partido Socialista.
Um eminente dirigente socialista, chamado Carlos César, disse que o rendimento mínimo é dado a meia dúzia de preguiçosos. Ora, eu nunca disse isto.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Disse pior!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O Dr. Carlos César disse-o. Gostaria que comentassem esta afirmação. É que eu pedi um comentário à Sr.ª Ministra e ela não mo deu.
Continuando, queria ainda que a Sr.ª Deputada comentasse a seguinte afirmação: o PNAI previa que, até 2008, 90% dos portugueses que estão no rendimento mínimo estivessem inseridos em contratos de inserção.
Sabe qual a percentagem dos que estavam, em 2008, ano de governação do Partido Socialista? 40%! Gostava que me comentasse a seguinte afirmação»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua. Já excedeu o seu tempo.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Gostava que me respondesse à seguinte questão, Sr.ª Deputada: acha normal que, em 2009, só 3% das pessoas que estavam no rendimento mínimo estivessem em acções de formação profissional?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, conclua, por favor.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Eu não acho! E são dados oficiais.
Já agora, gostava que comentasse»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, por favor, já excedeu o seu tempo. Peço-lhe que conclua.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vou terminar mesmo.
O Sr. Presidente: — Já excedeu o seu tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, então, peço para exercer o direito de defesa da honra da bancada, para poder responder. Não me dá outra oportunidade.
Protestos do PS.
Página 31
31 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Vou passar ao orador seguinte.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, se me retirar a palavra»
O Sr. Presidente: — Retiro-lhe a palavra e passo ao orador seguinte.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra para a defesa da honra e consideração da bancada.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, penso que esteve a utilizar os 2 minutos para a defesa da honra.
Portanto, já usou da palavra para esse efeito.
Assim sendo, vou passar ao orador seguinte.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, a minha bancada foi directamente citada. Foi acusada de ser populista, demagógica» Sr. Presidente, respeitei sempre as decisões da mesa. Perguntei como me podia inscrever. Nesse sentido, peço a palavra para defesa da honra e consideração da bancada, Sr. Presidente. Se entender dar-ma, muito bem. Se não»
O Sr. Presidente: — Entendo que o Sr. Deputado usou o tempo que lhe foi atribuído para a defesa da honra da bancada. Acabou de usar esse tempo, pelo que penso que essa defesa da honra já foi efectuada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, gostaria de retomar um tema que suscitei aqui na segunda-feira, quanto ao imposto de selo sobre os contratos de trabalho, e perguntar se o Sr. Secretário de Estado ou a Sr.ª Ministra se informaram junto dos colegas das Finanças sobre a situação potencial que ocorre nesta área e se, eventualmente, a Sr.ª Ministra ou o Sr. Secretário de Estado consideram que a eliminação da verba 8 satisfaz plenamente a dúvida colocada por nós na segunda-feira.
Devo adiantar, desde já, que, quanto a nós, não satisfaz.
A segunda questão tem a ver com o seguinte: confesso-lhe que não fiquei nada tranquilo com a explicação dada (suponho que foi a que vou transmitir) sobre a eliminação, a partir do final de 2009, da consignação de um ponto percentual do IVA às receitas da segurança social. Esta norma caducou em finais de Dezembro e devo dizer-lhe que, para quem tem a noção, como a Sr.ª Ministra tem, de que o financiamento da segurança social tem problemas, porque tem (e os senhores têm uma opção diferente da nossa, mas essa é outra discussão), eu não ficava nada garantido deixando de ter consignada uma verba que tinha consignado. Não é uma coisa menor, Sr.ª Ministra.
Diz a Sr.ª Ministra que há uma transferência adicional do Orçamento do Estado. Aceito a explicação. Em termos de tese, em termos contabilísticos, assim é. Mas, em termos substanciais, não é, Sr.ª Ministra. E a senhora sabe tão bem como eu que, se amanhã, por exemplo, entrarmos em recessão e as receitas fiscais diminuírem, o Orçamento do Estado pode não transferir, para si, o acréscimo que tem, hoje, na dotação para 2010. Mas se a verba estivesse consignada, seguramente essa transferência seria feita. Portanto, a senhora, ao não se revoltar contra o seu colega das Finanças, quando ele lhe elimina essa consignação de um ponto percentual do IVA, está a criar potencialmente uma diminuição da garantia das receitas do IVA. Queria chamar a sua atenção para este aspecto, porque isto é claro.
Nós, por exemplo, consideramos a hipótese de manter essa consignação para a segurança social.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Pereira Marques.
Página 32
32 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. José Pereira Marques (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, lamento, mas penso que já se falou aqui hoje demais — e, por vezes, de forma descabida — do rendimento social de inserção.
Sr.ª Ministra, parece-me, pelas palavras aqui utilizadas pelo Deputado Mota Soares, que deveria ser criada uma figura amiga ou, digamos, um policiamento a cada novo titular beneficiário do RSI e com certeza que deveria propor que fosse novamente substituída a designação de rendimento social de inserção, se calhar, por «rendimento economicista», porque o que parece aqui é que, se criarmos essa figura de policiamento, ao fim de 30 dias, teríamos um problema resolvido: acabávamos com a pobreza no País, acabávamos com o rendimento social de inserção e a única coisa positiva que teríamos é que, neste Parlamento, o Deputado Mota Soares e a bancada do PP passariam a falar de temas importantes, nomeadamente do reforço da protecção social, em especial às famílias desfavorecidas, que é uma bandeira deste Governo e dos governos do Partido Socialista.
Essas apostas dão legitimidade à exigência e ao rigor de que, hoje, a Sr.ª Ministra falou aqui, nomeadamente por causa do Orçamento para 2010, e não só reflectem que os idosos passaram a ser lembrados como reforçam esse apoio.
A aposta no complemento solidário para idosos, que, em 2010, passará a contemplar mais 40 000 beneficiários, é um sinal claro de que o Governo está atento, de que estamos atentos àqueles que são mais desfavorecidos.
Assim como os apoios que resultam na área da saúde, em que os idosos vêem o reembolso de 75% das despesas de medicação, próteses, entre outras.
E a isenção das taxas moderadoras? E os genéricos gratuitos? E o reforço do programa do complemento habitacional para idosos, com mais 500 novas habitações para qualificar, em 2010? Este programa é, para mim, um passo importante e, para o Governo, sem dúvida, uma bandeira bastante positiva no combate a essas desigualdades.
E por que não falar da valorização das pensões mínimas? Numa altura em que, curiosamente, acontece uma situação única na história da democracia portuguesa, de evolução negativa do índice de preços no consumidor, em 2009, o que levaria a um congelamento da subida das pensões, o Governo decidiu, mesmo assim, fazer um aumento de 1,25% nessas mesmas pensões.
É claro o rumo traçado pelo Governo: é um rumo para criar mais justiça social e garantir uma sociedade mais justa.
Sr.ª Ministra, na sua perspectiva, quais as metas, não para 2010 mas para a Legislatura, quanto ao número do complemento solidário para idosos, quanto ao reforço do Programa Conforto Habitacional para Pessoas Idosas e a articulação com as câmaras municipais e quanto ao reforço das pensões mínimas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Almeida»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, percebi pela conversa que tivemos que o Sr.
Presidente entende que há pouco usei da palavra para fazer uma pergunta ao Governo.
Não vou questionar os entendimentos da Mesa, mas há uma questão que, muito sinceramente, não quero deixar de lhe colocar. Já vi que é a segunda intervenção na qual o Partido Socialista se refere directamente à bancada do CDS e a mim próprio.
Nesse sentido, Sr. Presidente, sempre que a bancada do PS citar, em termos que considero injuriosos, a minha bancada, vou pedir a palavra para defender a honra e consideração da bancada, coisa que neste momento faço, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Dispõe de 2 minutos, Sr. Deputado.
Tem a palavra.
Página 33
33 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, mais uma vez, o Partido Socialista traz o tema do rendimento mínimo e diz que o CDS tem posições demagógicas ou populistas.
Gostava de lhe perguntar, Sr. Deputado, que comentário é que faz ao seu camarada Carlos César, que diz que o rendimento mínimo é dado a meia dúzia de preguiçosos.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Isto é inadmissível!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não conheço nenhuma afirmação de um dirigente do CDS que tenha dito que o rendimento mínimo é dado a meia dúzia de preguiçosos.
Segunda questão, gostava que o Sr. Deputado fizesse um comentário sobre a seguinte matéria: no PNAI (Plano Nacional de Acção para a Inclusão), previa-se que, em 2008, 90% das famílias deviam estar inscritas em programas de inserção, isto é, ter um conjunto de obrigações e também de deveres relativamente à prestação que recebem. Nesse ano de 2008, o número de famílias que tinha um programa de inserção era menor do que 40%. Como é que o Sr. Deputado comenta o facto de, em 2009, só 3% das pessoas que estavam inscritas no rendimento mínimo estarem a auferir formação profissional? 3%! Acha que isto é normal? Acha que isto é justo? Acha que isto é uma forma de se dar a prestação? Termino, Sr. Presidente, não esgotando os 2 minutos, fazendo uma pergunta ao Sr. Deputado, que, pelos vistos, entende que a sua bancada tem mais consciência social do que outras. Vou pedir-lhe um comentário: de 2002 a 2005, anos em que o CDS pôde influenciar»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, penso que não está a fazer uma defesa da honra. Está a aproveitar para, numa intervenção, fazer perguntas.
Tem a palavra para defender a honra, desde que se considere ofendido.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É o que estou a fazer, Sr. Presidente.
Vozes do PS: — Não está, não!
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, há pouco perguntei-lhe como é possível que Deputados do PS, em vez que fazerem perguntas ao Governo, as façam ao CDS e o Sr. Presidente disse-me que não se intrometia nas intervenções. Muito bem, respeito isso. Peço que agora tenha o mesmo respeito por esta bancada.
Mas, como eu estava a dizer, gostava que o Sr. Deputado fizesse um comentário sobre o seguinte: de 2002 a 2005, as pensões mínimas, que abrangem cerca de 900 000 pessoas em Portugal, subiram 37,23 €; de 2005 a 2009, anos de governação do Partido Socialista, as pensões subiram muito menos»
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, vou retirar-lhe a palavra, porque não está a fazer uma defesa da honra da bancada. Lamento, mas passarei à intervenção seguinte.
Sr.ª Deputada Margarida Almeida, tem a palavra.
A Sr.ª Margarida Almeida (PSD): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estados, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, mais uma vez, Sr.ª Ministra o problema que me traz aqui hoje tem a ver com o desemprego, particularmente o desemprego feminino, que é maior do que o masculino e que castiga duplamente a sua condição.
Quando empregada, a mulher é discriminada por auferir menor salário. Notícias recentes referem que há mulheres a ganhar menos 169 € do que os homens Uma outra notícia refere: «Discriminação na cortiça está inscrita no contrato colectivo e só acabará em 2015 (»)».
Portanto, começa a sentir-se que, em Portugal, há uma desigualdade — para igual trabalho salários diferentes — , em que o género, a mulher neste caso, acaba por ser vítima desta mesma diferenciação.
Página 34
34 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
É a primeira a ser dispensada no desemprego e a ser duplamente penalizada no trabalho e na família, onde arca com a maior parte do trabalho, ingrata tarefa de fazer esticar o magro orçamento familiar para fazer face aos seus encargos do dia-a-dia e conseguir o pão que lhe falta para os seus familiares.
Esta situação é cada vez mais habitual e impõe que a questione sobre não só que política de apoio vai o seu Ministério promover para as mulheres trabalhadoras, portuguesas e estrangeiras, que todos os dias são lançadas, às centenas, para o desemprego e também discriminadas, mas também que discriminação positiva equaciona para equilibrar o prato da balança social, cada vez mais pendente em desfavor das mulheres.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, começo por saudar a Sr.ª Ministra e os Srs. Secretários de Estado.
Sr.ª Ministra, gostaria de lhe colocar questões relativas aos recursos humanos dos seus departamentos, mais concretamente do departamento do Ministério do Trabalho do distrito de Braga.
As delegações de Barcelos e Guimarães continuam, em determinados dias do mês, com os utentes a terem de se deslocar às 5 e 6 da manhã para arranjarem lugar. Pergunto à Sr.ª Ministra se vai haver resposta a este problema nestas duas delegações.
O Centro Regional de Segurança Social de Braga continua a ter índices de ratio trabalhadores/beneficiários claramente abaixo da média do País. Eu até temo, até duvido do que lhe vou perguntar, mas gostaria que a Sr.ª Ministra me dissesse que não é verdade. É verdade que o Centro Regional de Segurança Social de Braga está a utilizar 20 trabalhadores da Select, uma empresa de trabalho temporário, para prestar serviço de funcionários da segurança social naquele Centro Regional?
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Um escândalo!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Ministra, diga-me como é que o Governo quer acabar com o trabalho precário neste País.
Relativamente ao mesmo Centro Regional de Segurança Social, os serviços de inspecção têm a seu cargo 68 000 empresas e muitos, muitos milhares de beneficiários. Diga-me, Sr.ª Ministra, como é que 8 equipas de inspecção — e já foram 15 — respondem a esta situação, inclusive aos problemas que, depois, servem de argumento ao CDS-PP para pôr em causa o rendimento social de inserção.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Ministra, relativamente à Autoridade para as Condições do Trabalho, continuam a faltar meios técnicos e humanos e as organizações sociais dizem que os inspectores não respondem a problemas de salários em atraso, violação de direitos individuais e colectivos, trabalho clandestino. Aliás, dizem que o trabalho clandestino não é com eles mas com a segurança social, a qual depois, como não tem meios, também não fiscaliza.
Diga-me, Sr.ª Ministra, quantos, dos 150 novos inspectores e técnicos superiores, que hoje anunciou, vão ser destinados à Autoridade para as Condições do Trabalho no distrito de Braga.
Passo a uma segunda questão relativa aos investimentos PARES e MASES no distrito de Braga. Sobre esta questão, fiz uma pergunta no passado dia 30 de Novembro, decorreram dois meses e, Sr.ª Ministra, não obtive resposta do Ministério. Gostaria de saber se vou ou não ter resposta. Pergunto-lhe, ainda, quanto é que foi gasto relativamente aos compromissos em 2009 e quanto é que está previsto no Orçamento para 2010.
Finalmente, coloco-lhe uma questão ligada ao pagamento de retroactivos de reformas.
Na legislatura anterior, o PS alterou a legislação. Veio a corrigi-la tardiamente no Orçamento do Estado de 2009, mas há um conjunto de milhares de trabalhadores que ficaram com retroactivos por pagar, devido aos erros de avaliação das reformas. Particularmente durante o debate político eleitoral, Deputados da maioria, que suportam o Governo, diziam que esse problema ia ser colocado no Orçamento do Estado para 2010.
Página 35
35 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Pergunto: estão no orçamento para 2010 do Ministério do Trabalho verbas para pagar os retroactivos a esses trabalhadores?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Coutinho.
A Sr.ª Isabel Coutinho (PS): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho, Segurança e Administração Pública, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, também gostaria de me referir a uma questão bastante importante e que se prende com a acção da ACT. Vou ter muito cuidado para que não continuemos com estes incidentes de defesa da honra, não vou colocar qualquer questão, mas vou referir que é estranho que o CDS e o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, quando a Sr.ª Ministra anunciou, no caso da fiscalização do RSI, o acrescento de 50 inspectores, tenham confrontado com uma outra entrevista que dizia que não era preciso inspectores.
Portanto, há aqui qualquer coisa que não se compreende: quando não há, é porque não há e, quando é afirmado, questionam por que razão é atribuído.
Por outro lado, também gostaria de dizer ao PCP que estranho que, na legislatura anterior, até planos de emergência apresentaram e agora não sabiam que já estavam em estágio 100 inspectores e, depois do acordo com os parceiros sociais, está aprovado e concertado que vão entrar 50 inspectores, por ano, até 2011, o que nos permite ficar com um ratio equiparado ao resto dos países europeus.
Sr.ª Ministra, é também importante dizer que a ACT tem, nos seus planos de acção inspectiva, por um lado, a promoção do trabalho digno, a garantia das condições de trabalho seguras e saudáveis, o combate ao trabalho não declarado e irregular, a protecção dos grupos frágeis, e, por outro, uma acção formativa no que respeita à prevenção e dissuasão dos comportamentos irregulares.
Nesta linha e tendo em vista o melhor funcionamento da ACT, gostaria de saber Sr.ª Ministra em que termos é possível o cumprimento do acordo com os parceiros sociais, que evolução está prevista no orçamento da ACT em função deste mesmo acordo e se existem dados concretos no que respeita à fiscalização da contratação, nomeadamente no que concerne ao trabalho não declarado e aos falsos recibos verdes.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Santos.
A Sr.ª Teresa Santos (PSD): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Presidente da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Caros Colegas Deputados e Deputadas, no início da intervenção, a Sr.ª Ministra fez questão de referir que uma marca do Orçamento do Estado para 2010 era a aposta nas pessoas.
O Sr. Ministro das Finanças, na apresentação deste mesmo Orçamento, foi bem claro ao referir que, em cada duas saídas da Administração Pública, entrará, no máximo, um trabalhador.
Se analisarmos os dados da informação mensal do mercado de emprego, do Instituto do Emprego e Formação Profissional, no final de 2009, podemos verificar que a variação do desemprego registada relativamente aos quadros superiores da Administração Pública é mais 19,1%, já as colocações destes quadros superiores é de 0% relativamente a Novembro e Dezembro de 2009 e 2008.
Sr.ª Ministra, foi recebido em Janeiro de 2010, um e-mail de uma ex-estagiária, a nível dos programas de estágio da Administração Pública, estágio esse que decorreu entre Maio de 2006 e 2007, em que refere: «Tenho 32 anos, sou licenciada, eu, bem como centenas de estagiários da Administração Pública, ficámos aprovados nos estágios e constamos da bolsa de emprego. Até à data, nunca nos foi dada qualquer preferência ou prioridade». E remete uma interrogação, à qual eu também gostaria de lhe fazer: «Já que os estagiários adquiriram alguma experiência de trabalho na Administração Pública, o Governo investiu, dandolhes formação, e os objectivos foram superados. Então, por que razão esquece o Governo estes estagiários?» Considerando também o Orçamento do Estado para 2010, Sr.ª Ministra, o Governo continua a apostar no alargamento da rede de equipamentos sociais, em que se espera sejam criados, até 2013, 14 600 empregos permanentes, o que se perspectiva a necessidade de mão-de-obra qualificada nesta área ao nível das entidades que promovam actividades no âmbito social.
Página 36
36 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr.ª Ministra, que critério esteve na base da decisão para que o programa Iniciativa Emprego 2010, já que foi um reforço do Inov-Jovem, contemplasse apenas 1000 jovens a nível do Inov-Social, o que não dá um estagiário por IPSS, e 5000 estágios na Administração Pública, o que faz com que, no final, ao nível da execução do programa, se calhar, tenha uma boa execução, mas ao nível da inserção é que falha, tanto mais que os jovens ficam desprotegidos, dado que os estágios profissionais não estão abrangidos pelos descontos do regime geral da segurança social?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, sabemos bem que o combate à corrupção é uma obrigação de qualquer governo, mas também sabemos bem que esse combate dá-se, em grande medida, pela aposta e pelo investimento em equipamentos sociais.
Melhorar a rede de equipamentos sociais significa reforçar a protecção social e também a protecção à família.
Foi esta convicção que norteou o anterior governo numa aposta clara e forte na ampliação e na melhoria da rede de equipamentos sociais do nosso País. Permito-me, no entanto, fazer aqui um parêntesis para refrescar a memória colectiva, recordando que o período de 2001 a 2004 foi de uma tendência de desinvestimento protagonizada pelo governo de coligação PSD/CDS, tendo o investimento em equipamentos sociais descido 70%.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Bem lembrado!
O Sr. João Paulo Correia (PS): — O anterior governo rompeu com essa tendência de desinvestimento protagonizada pelo governo de coligação de direita: apostou num programa que, apesar de ambicioso, foi ao encontro das principais necessidades do lado da infância, do lado dos idosos e do lado da deficiência; conseguiu criar milhares de lugares em creches, melhorando e apoiando jovens casais; conseguiu criar milhares de lugares em centros de dia, lares e ampliar até a rede de apoio domiciliário a idosos, melhorando a capacidade de resposta ao envelhecimento. Enfim, com este governo aumentou-se e melhorou-se a protecção social e a protecção à família. Foram investidos cerca de 360 milhões de euros. A par de tudo isto, foi também conseguido, através de um esforço notável, criar postos de trabalho na fase de construção desses mesmos equipamentos e também já na fase de funcionamento de alguns desses equipamentos sociais.
Sr.ª Ministra, o desígnio da solidariedade social é uma marca distintiva dos governos do Partido Socialista.
Foi uma marca do anterior governo e é com certeza uma marca deste Governo. Mesmo em anos de dificuldades orçamentais, como estes últimos que estamos a viver, o Governo do Partido Socialista não desacelera no investimento em equipamentos sociais. Essa vontade está bem plasmada nas Grandes Opções do Plano e no Orçamento para 2010.
A pergunta que lhe coloco é a seguinte, Sr.ª Ministra: que tipo de respostas vai continuar a ser desenvolvidas para o investimento em equipamentos sociais do lado da infância, do lado dos idosos e do lado da deficiência e quantos postos de trabalho irão ser criados até 2013? Parece-me que esta questão merece ser várias vezes respondida, porque ainda continuam a persistir, nesta Câmara, muitos incrédulos e muitos cépticos em relação à capacidade de resposta do Governo no investimento dos equipamentos sociais.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, antes de lhe colocar duas questões, se permitir, gostaria de me dirigir ao Sr. Deputado Pedro Mota Soares, dizendo-lhe que fiquei sensibilizada pelo reconhecimento público que fez do nosso trabalho, mas para concluir este processo registo que o Partido Socialista e o CDS comungam do mesmo interesse em viabilizar a integração das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, aceitando que podem acumular a pensão social de invalidez até determinado montante.
Portanto, deixando agora de lado as autorias, estamos em comum neste desiderato e é isso que é de louvar.
Sr.ª Ministra, queria colocar-lhe duas perguntas que resultam de duas preocupações.
O emprego e o crescimento são dois desafios grandes que a nossa economia atravessa. Estão plasmados no Orçamento do Estado em termos de um conjunto de medidas e para os atingir é fundamental a qualificação
Página 37
37 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
dos recursos humanos. Esta é já uma verdade de La Palice, mas é perfeitamente assumida no Orçamento do Estado para 2010, conforme reconhece o Conselho Económico e Social que, na página 13 do seu relatório, regista a avultada importância que é dada à formação profissional, educação e investigação científica, estando previstos dedicar a estes investimentos públicos 6,5% do PIB. Dentro deste montante, destaca-se a formação profissional com 1691,5 milhões de euros, ou seja, com um acréscimo de 67,5%. Esta é uma medida louvável e importante e será tanto mais importante quanto a eficácia da sua aplicação no terreno.
A minha pergunta resulta de uma preocupação. Em campanha ou quando visito o distrito pelo qual sou eleita, que é o distrito de Braga, frequentemente visito, juntamente com outros Deputados, centros de formação profissional e, quando assistimos a acções de formação, há uma pergunta que nos surge sempre, a de saber o que esperam as pessoas que estão a fazer aqueles cursos de formação profissional fazer a seguir.
É triste vermos que a maioria das pessoas sente que não há um estímulo, não há uma visão de futuro daquela acção de formação. Muitas vezes, algumas respostas imediatas que nos são dadas são: «estamos aqui, porque senão perdemos o subsídio de desemprego».
Estou certa de que a Sr.ª Ministra tem consciência deste problema. Há pouco até referiu a necessidade de fazer o acompanhamento do desenvolvimento das medidas e dos seus resultados. Gostava de perceber se há já medidas previstas para haver uma maior adequação entre as acções de formação e a possibilidade de integração no mercado de trabalho, porque é fundamental que um investimento deste montante tenha uma aplicação real.
Sei que já usei todo o meu tempo, mas tenho apenas mais uma pergunta muito curta para colocar, que tem a ver com o empreendedorismo e com as duas iniciativas recentes que o Governo aprovou: a promoção do microcrédito na lógica do estímulo ao desenvolvimento da economia e a criação de sociedades financeiras para elas próprias poderem ser fornecedoras de microcrédito.
Esta matéria também me suscitou uma preocupação que tenho acompanhado ao longo dos anos, que é a de saber como é que tem sido desenvolvido o microcrédito no território português. Há uma associação que tem feito um trabalho meritório, mas temos de reconhecer que o índice médio de aprovações daquela associação, ao longo de 10 anos, não ultrapassa os 120 a 130 projectos por ano. Verifica-se aqui um esforço grande por parte do Governo de criação de alguns milhares de postos de trabalho através destas medidas, mas gostava de sensibilizar o Governo para o estudo que fiz, pois, para além de haver esta ferramenta importante do microcrédito, é preciso reduzir alguns custos de contextos de forma a que estes pequenos empreendedores possam, de facto, ser estimulados a ter o seu auto-emprego ou a formar as suas microempresas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Pedrosa.
O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, foi dito neste debate que este é um Orçamento de rigor, mas é importante dizer que é sobretudo um Orçamento de rigor que reforça a coesão social. E para reforçar a coesão social em tempo de crise é fundamental concretizar políticas de família e, dentro destas, políticas de família que conciliem a vida familiar com a vida profissional. E aqui, caros Srs. Deputados, só o PS tem resultados para apresentar.
Gostaria de dizer que este foi o incómodo que transpareceu no debate, porque não houve uma única palavra dos partidos da oposição para valorizar as políticas de família e as políticas de conciliação da vida profissional e familiar que este Governo apresentou.
No PSD e no CDS, ou seja, à direita, a família é uma bandeira, mas quem desfralda os resultados são os governos do Partido Socialista. O PCP e o BE têm uma espada de Dâmocles sobre as suas bancadas, porque nunca aprovaram nenhuma das medidas de luta contra a desigualdade social que foram aprovadas e concretizadas pelos governos do Partido Socialista.
Protestos da Deputada do BE Mariana Aiveca.
Sim, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, nunca. Essas medidas são plasmadas em Orçamento com a respectiva definição de verbas, mas nunca tiveram o voto favorável nem do Bloco de Esquerda nem do Partido Comunista Português.
Página 38
38 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Relativamente a questões que aqui foram referidas sobre o rendimento social de inserção, não gostaria de enfatizá-las muito, mas é preciso dizer que a desconfiança perante os mais pobres é um atentado à dignidade dos cidadãos que recebem essas prestações. E, mesmo correndo o risco de nesta metáfora o Sr. Deputado Pedro Mota Soares evocar a honra da bancada, quero dizer que, relativamente a estas matérias, o CDS tem uma posição ontológica e inerente ao seu ser que se assemelha muito a uma pequena história que se contava e que era a seguinte: havia um ancião que gostava muito de bater palmas. Toda a vida bateu palmas e, portanto, a sua grande ambição era bater palmas. Até que, já nos últimos dias da sua vida, chegou à conclusão de que, afinal, só tinha um braço. Com esta história, quero dizer que os cidadãos deste País concluem que o CDS, relativamente a esta matéria, anda sistematicamente a bater no vácuo, e essa é que é a questão essencial.
Para que esse vácuo não persista na afirmação política do CDS, lembro aqui as quatro medidas essenciais para este Orçamento para 2010: aumento de 8% para o abono de família, acrescendo aos 50% que já tinha aumentado nos anos anteriores; aumento de 8% na acção social; duplicação de creches com horário alargado, o que não tem em vista as crianças ficarem mais tempo nas creches mas a conciliação da vida profissional dos seus pais; bolsas de estudos generalizadas ao 11.º ano.
Para terminar, Sr. Presidente, quero ainda dizer que este Orçamento contém mais prestações sociais, nomeadamente as que servem para o apoio a trabalhadores com filhos e pessoas com deficiência, em relação às quais gostaria que a Sr.ª Ministra se referisse.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.
A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, já hoje aqui foi falado e tem sido falado recorrentemente que as verbas inscritas no Orçamento do Estado para pagamento das prestações do subsídio de desemprego e a previsão que o Governo faz de 9,8% é uma previsão em baixa.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me dizer-vos que tomáramos todos nós que o dinheiro inscrito em Orçamento seja mais do que suficiente para pagar as prestações, porque era sinal que as pessoas ingressaram no mercado de trabalho. É isso que os portugueses precisam e esperam, ou seja, políticas activas de emprego que lhes resolvam o seu problema de desemprego e não de políticas passivas.
Dentro das políticas activas de emprego, a qualificação assume um papel relevante não só para quem está desempregado, porque, como sabemos, quem tem menos qualificações tem mais dificuldade em ingressar no mercado de trabalho, mas também para o País. Estamos a atravessar uma crise, mas precisamos saber onde queremos estar quando sairmos desta crise. Temos de ter um rumo. E aqui, permitam-me, o Governo apresenta uma medida relevante que pela primeira vez vem contemplada no Orçamento do Estado e é falada e debatida enquanto política activa de emprego. O desemprego tem uma franja — que já não é franja, atendendo ao volume que tem — que diz respeito aos licenciados e no Orçamento do Estado vem inscrita a requalificação de 5000 licenciados em áreas de baixa empregabilidade. Isto demonstra que o Governo está atento à evolução do desemprego, nomeadamente neste segmento de inscritos, e também às necessidades do mercado de trabalho. Temos desempregados que têm qualificações elevadas, mas que não se inserem no mercado de trabalho. Há, pois, que requalificá-los para a sua inserção no mercado de trabalho.
Sr.ª Ministra, a minha questão é precisamente na área da requalificação dos licenciados. Gostaria de saber como é que se vai processar este programa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, antes de mais, queria agradecer-lhe o Orçamento que nos traz que tem em conta que estamos num ano difícil, num ano de crise ou de tentativa de sairmos da crise. Julgo que os efeitos da crise económica e financeira ainda não estão completamente superados, mas os sinais da economia portuguesa já são positivos ou, pelo menos, de recuperação.
Nesse sentido, o Governo e, concretamente, a segurança social têm procurado dar respostas e uma das mais importantes, que procura responder aos desafios dos sectores mais afectados, tem a ver com a Iniciativa Emprego 2010. Trata-se de uma iniciativa crucial que investe cerca de 30 milhões de euros e que apoia cerca de 20 000 pessoas. É um desafio muito importante que pretende encontrar respostas activas de emprego,
Página 39
39 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
paralelamente com todas as iniciativas que têm sido criadas no âmbito do PARES e que cabe sublinhar, como, aliás, já aqui foi feito.
A Deputada Teresa Venda teve oportunidade de falar das iniciativas do microcrédito e colocar-me-ia na posição de acrescentar uma questão suplementar. Sabendo que o microcrédito é, sobretudo, uma iniciativa económica em articulação, neste momento, com os fundos estruturais, é crucial perceber de que forma é que esta saída coordenada do desemprego e a utilização do microcrédito para a promoção do auto-emprego é utilizada com a pasta da Sr.ª Ministra e a pasta da Economia.
Este é um instrumento muito importante e estes objectivos têm vindo sempre a ser cumpridos numa lógica de prosseguir o Estado-providência e não numa lógica de Estado assistencialista. É muito importante sublinhar isto numa altura em que não sei se temos uma lógica de coligação negativa, se temos uma lógica de resposta ofensiva permanente da oposição ao Governo, independentemente das respostas de um Estado-providência cada vez mais activo que o Governo tem procurado promover. Nesse sentido, foram criados mais instrumentos que temos procurado implementar.
No contexto destes números de desemprego, existe alguma perspectiva de, caso seja necessário, se poder accionar o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização, dado que os nossos efeitos sobre o desemprego têm muito a ver com a crise económica e financeira que vivemos e tendo em conta que foi para isso que ele foi agilizado e que deve ser também para isso que ele poderá ser usado? Para rematar, gostaria de sublinhar a questão da Alicoop, que foi levantada por outra bancada e que julgo ser importante.
Trata-se de um problema que temos vindo a acompanhar desde há muito, desde que ele começou — e não foi hoje — e não tem a ver com a crise económica e financeira nem com o Governo. É um problema de gestão.
O problema foi referido hoje — e daqui endereço, uma vez mais, a máxima solidariedade para com os trabalhadores — , mas não é ainda um problema de segurança social, e espero que não venha a ser. Mas, uma vez mais, se tiver alguma iniciativa que deva ser coordenada, deve sê-lo com os credores numa perspectiva económica, ou seja, no sentido de encontrar soluções para o problema e não numa perspectiva derrotista em que assumimos que vamos fechar o problema e relegá-lo, uma vez mais, para a segurança social.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Srs. Presidentes, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de tranquilizá-los relativamente à ausência da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Notória e evidente!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Não se trata de nenhuma deserção relativamente ao Governo nem nenhuma falta de solidariedade para com a equipa. A Sr.ª Secretária de Estado está em representação oficial do Estado e, por isso, está ausente desta reunião.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Que grande representação!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Voltemos agora às questões que nos foram colocadas, às quais procurarei responder em cooperação com os Srs. Secretários de Estado do Emprego e da Formação Profissional e da Segurança Social.
Comecemos pela primeira questão abordada esta manhã, a da cobrança de dívida.
Às vezes, nestes debates, tenho dúvidas sobre se devemos ou não fazer. Se cobramos é porque cobramos, mas, se cobramos pouco, se calhar, era melhor não cobrar. Por isso, penso que temos de ter algum rigor nesta matéria e, sobretudo, temos de avaliar os dados. E os dados são os seguintes: a iniciativa do Governo relativamente à cobrança de dívida é nada mais nada menos do que a continuação da política do Partido Socialista desde que chegou ao Governo, em 2005.
Gostava de dizer claramente que, relativamente à evolução da eficiência contributiva, o Governo do Partido Socialista ficou sempre acima do PIB nominal, o que não aconteceu até 2005. Por isso, é nossa intenção
Página 40
40 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
continuar nesta senda e, se quiserem consultar números relativamente à eficiência contributiva, tenho um quadro que posso disponibilizar aos grupos parlamentares e às Sr.as e aos Srs. Deputados. Foi neste espírito de rigor que introduzimos uma norma no Orçamento do Estado deste ano, que vai exactamente no mesmo sentido e que cria um regime excepcional de redução da taxa do juro de mora. Trata-se do objectivo de cobrar as dívidas passadas, mas, sobretudo, de criar, também, a obrigatoriedade de continuarem a ser pagas as dívidas correntes.
Portanto, temos, ao mesmo tempo, um objectivo de moralização relativamente às obrigações para com o Estado.
Foi-me feita uma pergunta sobre o que o Governo vai fazer aos 90 000 desempregados em Espanha.
Sobre a disputa quanto aos dados, não entrarei. Usarmos os dados positiva ou negativamente conforme nos convém não me parece bem. Uma das respostas claras do Governo relativamente ao problema do desemprego, sobretudo na área da construção civil, passa pelo investimento público de proximidade e, sobretudo, pelo investimento público em geral, tendo sido discutidas e anunciadas, ontem e anteontem, no âmbito do debate do Orçamento do Estado, uma série de iniciativas nesta área. Alguns partidos da oposição estavam contra o investimento público do Estado para criar emprego, mas, pelos vistos, parece que querem que se crie emprego na construção civil» Temos uma série de investimento de proximidade: falámos do Programa de Aprendizagem de Jovens, falámos da renovação do parque escolar, e o Governo tem uma aposta no investimento público que pode ajudar os desempregados da área da construção civil que sejam forçados a vir de Espanha para Portugal.
Sobre o rendimento social de inserção, parece-me que temos de ter também alguma honestidade moral quando discutimos esta matéria. Nunca existiu, no âmbito do rendimento social de inserção, a renovação automática. Tanto o PSD como o CDS sabem que anualmente não há qualquer renovação automática do rendimento social de inserção.
Portanto, reafirmo o que disse na minha primeira intervenção e, sobretudo, reafirmo que terá lugar a abertura de um concurso interno para 50 novos inspectores no Instituto da Segurança Social. Mas a fiscalização não é feita exclusivamente com inspectores, mas também através da utilização de utensílios informáticos que nos permitem trabalhar na fiscalização.
Gostaria de repor alguns dados, porque me parece que continua a haver dúvidas sobre algumas matérias que estão inseridas no Orçamento do Estado e que, entre nós, também têm sido alvo de algumas discussões sobre o rendimento social de inserção.
Reafirmo que a aposta do Governo nesta matéria é na inserção e, por isso, gostaria de relembrar que existem 70 000 pessoas em acções de activação — 40 000 em acções de educação de adultos e os restantes em acções de formação profissional — e propomo-nos passar, em 2010, para as 100 000 pessoas.
Gostava também de dizer que, em 2005, tínhamos 20% das famílias com acordos de inserção; em 2008, estávamos em 81% e, em 2009, em 88%. Parece-me um pouco longe dos 40% que foram adiantados pelo Sr. Deputado Mota Soares! Portanto, reafirmo que não há renovação anual automática do rendimento social de inserção, que vão existir concursos para 50 novos inspectores, que existe um aumento das famílias com acordos de inserção e que existem 70 000 beneficiários do RSI em acções de inserção e que nos propomos passar, em 2010, para 100 000.
Relativamente às notícias, publicadas ontem, sobre o Vale do Cávado, a nossa política, quanto a esta matéria, é de rigor e de fiscalização. Estamos conscientes de que, no que se refere às políticas de inserção, há abusos da parte das empresas e, às vezes, da parte dos próprios beneficiários. Estamos atentos a essas matérias, mas também já é público que o Instituto do Emprego e Formação Profissional denunciou estes casos que vieram ontem a público sobre o Vale do Cávado. Estamos a analisar a situação, estamos a apurar as responsabilidades e, neste momento, não pensamos que haja lugar para rever as políticas de procura activa de emprego por causa deste caso.
Portanto, reafirmo que há uma grande atenção da parte do Governo sobre estes abusos que têm vindo ao nosso conhecimento e que são também detectados pelas nossas equipas.
Gostaria de passar à política de apoio às famílias somente para reafirmar que a política de apoio à natalidade reclamada pelo Sr. Deputado Artur Rêgo está a ser implementada no terreno. Quando falamos de 50% de aumento do abono de família, no aumento das creches e dos horários alargados nas creches, no
Página 41
41 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
aumento de equipamentos sociais para idosos ou no aumento de equipamentos sociais para pessoas com deficiência, não estamos a fazer mais do que a promover a política de apoio à natalidade.
Ao momento tempo, relembro que, ao nível do próprio funcionamento do mercado de trabalho, existe uma série de políticas de apoio à conciliação entre a vida familiar e a vida profissional, elas próprias políticas de incentivo à natalidade.
Sr.ª Deputada Margarida Almeida, o problema da desigualdade salarial é tão velho como a existência de mulheres no mercado de trabalho. Não é uma característica de Portugal mas de todos países. Não somos uma excepção, fazemos parte da regra geral. Estamos conformados com isso? Obviamente que não, mas a questão da discriminação salarial e de tudo o que tem a ver com a discriminação das mulheres no mercado de trabalho não é combatida por decreto-lei mas por acções claras, feitas ao nível dos mercados de trabalho e através das políticas activas no emprego. Sobretudo, também não nos parece que seja correcto estar a fazer distinção entre uma política de apoio ao desemprego entre homens e mulheres. São todos desempregados, têm todos igualdade de direitos.
Trata-se, pois, de uma matéria que nos preocupa e que tem a ver com a tendência geral da discriminação das mulheres no mercado de trabalho, na vida política, no acesso às posições de chefia nas empresas, etc.
Não podemos singularizar um aspecto, é um problema de sociedade, é um problema que tem de ser resolvido pela sociedade e não por decreto-lei.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — E o Governo nada faz!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Não é verdade. Os senhores sabem que o Governo tem feito muito quanto a esta matéria.
Relativamente à Alicoop, como é sabido, o Ministério da Economia está a seguir este assunto e o objectivo é o de promover a viabilização do grupo. Portanto, esta é uma matéria que está a ser seguida com toda a atenção.
Em relação à questão que me foi colocada sobre a utilização ou não pelo Estado do Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização, a resposta é claramente «sim». Sempre que isso é possível, o Estado tem apresentado as suas candidaturas a esse Fundo.
Sobre a sustentabilidade da segurança social, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, reafirmo, mais uma vez, que temos confiança no nosso sistema e na sua solidez, mas também não ignoramos que se colocam desafios à sociedade portuguesa, que têm a ver, sobretudo, com o envelhecimento da nossa população e que temos de fazer uma discussão sobre como respondemos em Portugal, mas também na Europa, à questão do envelhecimento das populações não só activas mas também inactivas.
Relativamente à pergunta que me colocou sobre a majoração para casais, respondo exactamente da mesma maneira que lhe respondi na segunda-feira: é uma matéria que está em discussão na Assembleia da República e o Governo tomará as suas decisões, depois de ter havido uma decisão da Assembleia da República sobre esta matéria.
Sr. Deputado Jorge Machado, quanto ao subsídio de desemprego, é óbvio que, se as pessoas não estiverem inscritas nos centros de emprego do Instituto do Emprego e Formação Profissional, não podem receber apoio. Sabe isso tão bem quanto eu.
No entanto, reafirmo aquilo que dissemos desde sempre sobre esta matéria: o Governo considera que as medidas que, neste momento, tem no terreno relativamente ao subsídio de desemprego são medidas que dão garantias de apoio às pessoas que estão desempregadas e também que a nossa aposta é na reactivação, o mais rapidamente possível, das pessoas que estão a receber o subsídio de desemprego. E não é através de aumentos de verbas que vamos resolver esse problema mas, sim, através da criação de postos de trabalho e da capacidade de inserção das pessoas nos postos de trabalho.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — O problema é que nem é uma coisa nem é outra!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Por isso, a questão do subsídio de desemprego também tem de ser vista à luz das medidas activas do mercado de trabalho e das medidas excepcionais que foram aprovadas pelo Governo através da Iniciativa Emprego 2010.
Página 42
42 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Gostaria de reafirmar que as quotas na Administração Pública para pessoas com deficiência são de 5% e que são cumpridas no que se refere aos concursos públicos. Se esta quota não estiver a ser respeitada nos concursos que existem na Administração Pública, averiguarei os casos em que tal esteja a suceder.
Gostaria também de dizer que o benefício de apoio à aquisição de veículos para pessoas com deficiência vai continuar.
Sobre a Autoridade para as Condições do Trabalho, é verdade que vão entrar 150 novos inspectores, 25 novos técnicos de segurança e saúde e 65 novos técnicos para contra-ordenações.
Em Braga, temos, actualmente, 9 inspectores da ACT»
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Um por cada 1000 empresas!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — » e teremos mais 4, quando os inspectores que estão neste momento a terminar o seu estágio entrarem em efectividade de funções.
Também gostaria de relembrar que a ACT tem, na sua acção inspectiva, um objectivo muito importante, que é o combate ao trabalho não declarado e ilegal, o combate pela igualdade e contra a discriminação — é também uma preocupação da Autoridade para as Condições do Trabalho — e a redução da sinistralidade laboral.
Relativamente a concursos na segurança social para reforço dos efectivos, gostaria de dizer que, neste momento, existem cerca de 500 lugares.
Sr. Presidente, gostaria ainda de deixar alguns dados, porque me parece que, por vezes, não são claros, em relação aos investimentos dos programas PARES e MASES.
O Orçamento é de 107 milhões de euros para todo o País. É verdade que, quando todos os equipamentos estiverem em funcionamento, o Governo pretende criar mais de 14 000 postos de trabalho permanentes e postos de trabalho qualificados.
Também reafirmo que, em relação às três iniciativas que temos no terreno — infância, deficiência e idosos — , o número total de lugares que pretendemos é de cerca de 50 000 ou, para ser mais precisa, de 49 379. No final do programa, teremos, em relação aos lugares de infância, 18 414 novos lugares, em relação a equipamentos sociais para pessoas com deficiência, 5751 lugares e, em relação a idosos, 24 962 novos lugares.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: — Sr. Presidente, em breves palavras, até porque o Sr.
Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional, seguramente, terá outras questões sobre a área do emprego para responder a seguir, quero deixar três esclarecimentos muitos concretos.
O primeiro é sobre uma das primeiras perguntas da sessão da manhã sobre a tal receita do Mapa X. Esta receita nada tem a ver com as contribuições para a Caixa Geral de Aposentações, que são inscritas directamente no orçamento da Caixa Geral de Aposentações, que, como sabe, não está neste orçamento da segurança social, tem, sim, a ver com uma correcta orçamentação e contabilização de antigos fundos especiais complementares que ainda subsistem em alguns sectores profissionais e que a segurança social tem a responsabilidade de cobrar e de pagar a respectiva despesas. Portanto, esta orçamentação não corresponde a um acréscimo de contribuições efectivas mas a uma melhor contabilização de verbas que eram incorrectamente contabilizadas em contribuições para o regime geral até ao início do ano passado.
A melhoria do sistema de informação contabilística da segurança social permitiu apurar agora, com todo o rigor, as contribuições propriamente ditas para estes regimes, o que faz com que, em relação à execução de 2009, este valor cresça apenas 0,13%.
Tratou-se, portanto, de uma melhoria e de uma afinação do processo contabilístico, fruto das melhorias do sistema contabilístico da segurança social, do chamado Sistema de Informação Financeira (SIF) da Segurança Social.
O segundo esclarecimento tem a ver com afirmações dos Srs. Deputados Honório Novo e Jorge Machado a propósito do financiamento da segurança social através de 1 ponto percentual do IVA.
Página 43
43 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Gostava de vos dizer que não acompanho a vossa reflexão, acho que é exactamente o contrário. Se há coisa que, do meu ponto de vista, não nos defendia era a volatilidade da receita concreta de um imposto concreto. Por exemplo, no ano passado, com a quebra significativa do IVA, se não tivéssemos feito a alteração que fizemos à Lei de Bases da Segurança Social, se não recebêssemos por transferência do Orçamento do Estado aquilo que não recebíamos por IVA, teríamos uma quebra do financiamento da segurança social.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, permita-me que esteja em desacordo!
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social: — A nossa receita, agora, é em função de despesas que o Orçamento do Estado deve financiar e, por isso, estamos melhor defendidos, porque ela tem de vir da colecta geral e não de uma receita em concreto. Estamos, pois, melhor defendidos. Como sabe, está numa lei desta Assembleia, que é a Lei de Bases da Segurança Social, que aquele financiamento é em função das despesas de solidariedade, da protecção social de cidadania e da acção social. Se não viesse do IVA, como não podia vir, no caso concreto do ano passado, devido à quebra de receita, tinha de vir da transferência do Orçamento do Estado.
Portanto, esta Lei de Bases defende mais a segurança social e responsabiliza mais o Estado pelo financiamento das despesas que não são de natureza previdencial. Acho que este é o bom caminho e esta foi uma boa evolução da Lei de Bases da Segurança Social.
Apesar do aumento da receita fiscal ser, em termos globais, salvo erro, de 1,2% do IVA ou um pouco mais, a transferência do Orçamento do Estado para 2010 para a segurança social cresce 10%, porque é na óptica da despesa que ela deve ser financiada pelo Orçamento do Estado, e assim não estamos dependentes da evolução concreta de um imposto concreto.
Esta adequação selectiva de fontes defende melhor a segurança social pública, defende melhor as responsabilidades do Estado nesta matéria.
O terceiro e último esclarecimento tem a ver com o imposto de selo, questão que já foi colocada pelo Sr. Deputado aquando da discussão na generalidade e que agora, na especialidade, voltou a colocar. Posso adiantar que, de acordo com a informação que obtivemos junto do Ministério das Finanças, que tem a competência para esta proposta, a tal verba 8 deixa de existir e, portanto, ao ser revogada esta verba, não se coloca a questão da partilha entre as duas partes.
Na especialidade e no pormenor, poderá recolocar a questão, se for o caso, ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, mas essa verba que dizia que tínhamos de partilhar entre as partes foi simplesmente revogada e, portanto, o valor de 5 € deixa de existir nos contratos de trabalho. Portanto, do nosso lado, a questão está resolvida.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional (Valter Lemos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Sr. Deputado Artur Rêgo não se encontra na Sala neste momento, mas, apesar disso, vou responder à sua pergunta.
Em relação à Iniciativa Emprego 2009, aqui invocada várias vezes como não tendo atingido os objectivos que se pretendia, gostaria de dizer que, durante o ano de 2009, foram abrangidos por Medidas de Emprego 413 000 pessoas e, destas, mais de 300 000 foram abrangidas pela Iniciativa Emprego 2009. É evidente que se pode considerar sempre que é pouco ou muito, mas para cada um destes 300 000 portugueses que tiveram medidas de apoio à manutenção do seu emprego ou à criação de novo emprego com certeza que foi muito.
É verdade que, na Iniciativa Emprego 2010, reforçámos significativamente medidas da Iniciativa Emprego 2009, exactamente porque estas, em alguns aspectos, funcionaram e, nos casos em que funcionaram menos bem, pretendemos corrigir. A Iniciativa Emprego 2010 tem, realmente, a maioria das medidas que já estavam previstas em 2009 reforçadas e tem novas medidas. Gostava de referir, designadamente, os aspectos relacionados com as medidas de apoio à contratação para desempregados com mais de 40 anos de idade, as medidas de apoio à contratação de desempregados de longa duração, com mais de nove meses, e as medidas de apoio à contratação dos jovens, que também são significativamente reforçadas.
Página 44
44 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A questão referida pelo Sr. Deputado Artur Rêgo sobre os estágios, parece-me uma infelicidade, porque a Medida Estágios é precisamente uma das medidas mais eficazes na história da inserção de pessoas no mercado de emprego. A Medida Estágios tem uma taxa de inserção de cerca de 70% e há poucas medidas que tenham eficiências tão elevadas. Nesse sentido, há, realmente, um reforço significativo desta Medida Estágios.
Já agora, gostava também de dizer que a Medida Estágios não deve ser desvalorizada, como o Sr. Deputado desvalorizou, até porque os estágios não tinham seis meses, como já aqui reconheceu, tinham nove meses e, agora, na Iniciativa Emprego 2010, todos os estágios vão ter 12 meses. Os Estágios INOV já tinham 12 meses e, agora, todos os estágios passam a ter esta duração.
Também são criados novos estágios para jovens com cursos profissionais do ensino secundário e cursos tecnológicos, com os quais pensamos abranger 10 000 jovens.
Aproveito para responder à Sr.ª Deputada Teresa Santos em relação ao Inov-Social. Referiu a Sr.ª Deputada que o Inov-Social prevê 1000 jovens estagiários e que a Administração Pública prevê 5000. Gostava de dizer que o Inov-Social prevê mais de 5000 jovens dos programas INOV, porque, além do Inov-Social que já está no terreno, estão previstos, como se sabe, na Iniciativa Emprego 2010, programas INOV nas áreas da mediação sociocultural — e aí, uma vez mais, as instituições da economia social são especialmente atendidas — , da energia, das energias renováveis, do ambiente, da protecção civil. Tudo isto está na Iniciativa Emprego 2010.
Para além destes programas, na Iniciativa Emprego 2010, está, naturalmente, o programa de requalificação de licenciados, que também foi referido pela Sr.ª Deputada Anabela Freitas e não sei se por mais alguém, que é uma medida que pretende abranger 5000 licenciados e que vai ser posta no terreno num programa conjunto que envolve as associações empresariais, as empresas, as universidades, os institutos politécnicos, precisamente para usar medidas de activação para jovens que, nas suas qualificações, têm neste momento dificuldades de inserção no mercado de trabalho.
Gostava ainda de referir que a Medida Estágios é alargada a desempregados com mais de 35 anos que tenham obtido novas qualificações. Esta Medida, que tem funcionado muito bem, é alargada a populações que tenham obtido novas qualificações e não só a populações jovens. Portanto, esses desempregados têm agora possibilidade de ser abrangidos por um estágio.
Acrescento que todas estas medidas são seguidas de medidas de apoio à contratação. Todas estas medidas têm a jusante — e respondo à Sr.ª Deputada Maria da Conceição Pereira — medidas de apoio à contratação. Ou seja, no final dos estágios, quer em relação aos jovens, quer em relação aos desempregados, as empresas e as instituições beneficiam de mecanismos de apoio á contratação de 2500 € de prçmio por posto de trabalho e de 24 ou 36 meses de isenção de contribuições para a segurança social, precisamente para alavancar o potencial de inserção da Medida Estágios.
Embora o Sr. Deputado Artur Rêgo não esteja presente, gostava também de dizer que, relativamente a outras medidas, o Programa Qualificação-Emprego para o Sector Automóvel é reforçado, abrangendo diversos outros sectores como, por exemplo, o têxtil, o vestuário, o mobiliário, o comércio e, especialmente, o turismo, uma medida desenhada especialmente para o Algarve. Esta medida no que diz respeito ao turismo é especialmente desenhada para o Algarve, até porque as questões relacionadas com o desemprego na área do turismo não atingiram o País de maneira uniforme, há regiões onde o emprego no turismo cresceu. Portanto, esta medida está direccionada especificamente para o Algarve.
Relativamente aos centros de recursos, questão levantada pela Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira, não tenho, neste momento, dados específicos, mas posso dizer que o orçamento para as acções de desenvolvimento pessoal e profissional de pessoas com deficiência, onde estão incluídos estes centros de recursos, passa de 17 milhões de euros para 23 milhões de euros, ou seja, sobe 35%, o que significa que há uma colocação de recursos adicional significativa nos aspectos que se relacionam com os apoios à formação profissional e de desenvolvimento pessoal das pessoas com deficiência.
Em relação à questão da caderneta individual de competências, posso dizer que está já convocado um Conselho Nacional de Formação Profissional na próxima semana onde o projecto de caderneta individual de competências é apresentado a esse Conselho para análise, como, aliás, está previsto no acordo de formação profissional com os parceiros sociais.
Página 45
45 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Em relação à questão do microcrédito, colocada pelas Sr.as Deputadas Teresa Venda e Jamila Madeira, posso referenciar que, neste momento, há, no terreno, várias acções de microcrédito, algumas apoiadas directamente pelo Estado e outras apoiadas pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional e há também acções que têm iniciativas exclusivas de entidades da sociedade civil e, até, de instituições de crédito, exclusivamente.
No entanto, a acção com a Associação Nacional de Direito ao Crédito, que tem o apoio do Instituto do Emprego e Formação Profissional — ainda que, como referiu, a sua dimensão seja insuficiente e, por isso, vamos tomar medidas para alargar — tem corrido bem, bem como a própria acção do Microinvest do Instituto do Emprego e Formação Profissional, que é uma variante, digamos assim, de apoio ao microcrédito e que também está alavancada na Iniciativa Emprego 2010, como sabe, com o reforço de 14 milhões de euros.
Chamo a vossa atenção para facto de o Conselho de Ministro ter aprovado uma resolução para a economia social onde uma das medidas essenciais é a criação de um programa nacional de microcrédito, que será conduzido para Cooperativa António Sérgio para a Economia Social, recentemente constituída e que é inovadora porque dela faz parte o Estado e todos os parceiros da economia social — as confederações de cooperativas, as IPSS, a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a União das Misericórdias, a União das Mutualidades, etc. A Cooperativa António Sérgio vai gerir, designadamente, o programa nacional de microcrédito, que tem uma novidade em relação às situações anteriores e que é a de incluir as IPSS na gestão do programa, designadamente, nos aspectos relacionados com o acompanhamento das iniciativas de microcrédito que, como sabemos, são descentralizadas por todo o País. Portanto, é criada uma rede nacional de apoio e acompanhamento centrada fundamentalmente nas instituições de economia social, designadamente, nas IPSS.
Esta iniciativa vai, pois, garantir-nos não só articular todas as iniciativas que já estão no terreno como reforçar e alavancar de uma forma significativa a rede de microcrédito.
O Sr. Presidente: — Nesta ronda de perguntas, cada Sr. Deputado dispõe de 3 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, o PS defende os direitos sociais que estão consagrados na Constituição, nomeadamente a segurança social pública. Cremos que é mesmo o pilar do Estado social e uma base de confiança entre os cidadãos e o próprio Estado. É um contrato de confiança que nunca deve ser posto em causa. O PS fará todo o esforço para manter esse contrato de confiança entre os cidadãos e o Estado. Ora, o Orçamento do Estado para 2010 é disso exemplo, com a concretização de medidas sociais, com o alargamento dessas mesmas medidas, com o apoio a áreas do emprego, com o apoio aos desempregados.
Foi aqui também referida a questão do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social que, queria lembrar, continua a reforçar-se, embora menos do que gostaríamos, é certo, mas todos reconheceremos que, fruto da crise internacional, é, neste momento, o possível. Mas é também, hoje, que as pessoas precisam de ser ajudadas e, portanto, é preciso ter a noção de que o dinheiro da segurança social serve também para ajudar as pessoas no momento em que elas próprias precisam.
Rendimento social de inserção. Chega! Chega! Nós não aceitamos a demagogia neste preciso ponto. Foi aqui referido pelo seu líder, durante esta semana, que o CDS-PP cortaria 80 milhões de euros no RSI.
Rasgaria, cortaria, pouparia 80 milhões de euros. Nós estamos contra esta cruzada contra os beneficiários do RSI e este discurso não ajuda a quem precisa de ser ajudado. Este estigma é um erro, do nosso ponto de vista.
Há fraudes? Há, certamente. Como há fraudes noutras prestações sociais. Há fraudes nos subsídios às empresas. Há fraudes e elas devem ser combatidas. Por isso, foi aqui referido o aumento do número de inspectores, que tem também a ver com este combate à fraude nesta prestação do rendimento social de inserção.
Mas para o Partido Socialista não há fraudes de primeira categoria e fraudes de segunda categoria. São todas fraudes e todas devem merecer o seu combate. Por isso, para nós, é, obviamente, importante e fundamental que, neste domínio, a fiscalização seja uma realidade.
Página 46
46 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr. Deputado Pedro Mota Soares, não sei se a seguir vai pedir a palavra para defesa da honra, mas, porque referiu o nome de um camarada meu, Carlos César, Presidente do Governo Regional dos Açores, eu queria referir uma declaração, em plena Assembleia Legislativa dos Açores, há dois dias, em que o Presidente do Governo Regional dos Açores, sobre o rendimento social de inserção, disse, e passo a citar, — «que reputamos de grande importância no aparato e no dispositivo do apoio social nos Açores». E disse mais: «Feliz da região, feliz do país, feliz da sociedade que tem instrumentos de apoio, porque isso quer dizer que é uma sociedade que conhece os seus pobres e reconhece os seus direitos.» Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, termino dizendo o seguinte: no Orçamento de Estado para 2010 seria possível reduzir o número de idosos com o complemento solidário para idosos? Sim, era possível. Mas nunca com o PS! Seria possível diminuir o universo dos portugueses com acesso ao subsídio de desemprego? Sim, era possível. Mas nunca com o PS! Seria possível não apoiar mais as famílias dos 1.º e 2.º escalões a nível do abono de família? Sim, era possível. Mas não com o PS! Seria possível acabar com os apoios à manutenção do emprego, à inserção de jovens no mercado de trabalho ou diminuir ou, mesmo, acabar com o rendimento social de inserção? Sim, era possível. Mas nunca com o PS! O PS escolheu outro caminho!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria das Mercês Soares.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, em sede de Comissão e não de Plenário e porque consideramos que um dos pontos que ressaltou claramente do debate foi a questão, entre outros, da diferença de entendimento quanto ao valor da taxa do subsídio de desemprego — mas aí já vimos que não podemos avançar muito mais — , gostava de colocar à Sr.ª Ministra a questão da dívida cobrada em 2009 e como renová-la, porque não nos sentimos completamente esclarecidos. Como é que pensa recuperar os 400 milhões de euros de dívida, porque este valor entra para os 2,4% de aumento das contribuições e, como tal, é muito importante. É importante numa altura em que, como já referi no início, a conjuntura económica não permite apertar, sufocar as empresas porque elas já de si estão, na maioria dos casos, ou mortas ou semimoribundas.
Por isso, Sr.ª Ministra, para podermos formular a nossa opinião com o maior rigor possível e com seriedade, uma vez que já disse que não tem neste momento esses dados, pedimos a gentileza de nos fazer chegar, até ao final da discussão do Orçamento do Estado na especialidade, o montante da dívida cobrada em 2009.
Um outro assunto que ressaltou deste debate e que foi aqui muito falado tem a ver com a execução da Iniciativa Emprego 2009 e 2010. Sobre a Iniciativa Emprego 2009, já dissemos o que tínhamos a dizer; sobre a Iniciativa Emprego 2010, gostávamos de renovar o nosso pedido ao Governo no sentido de que seja criado um sítio onde se possa acompanhar permanentemente, mensalmente, o grau de execução das diferentes medidas, garantindo desta forma uma transparência da actividade da Administração Pública para todos os portugueses.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr.ª Ministra, gostava de fazer-lhe pela terceira vez a mesma pergunta. Não sei se foi por lapso, mas a Sr.ª Ministra acabou por não responder à minha pergunta.
Ontem mesmo, a Sr.ª Ministra defendia, numa revista, que, nas empresas privadas onde se registam níveis de produtividade e rentabilidade altos, estas mesmas empresas deviam aumentar as remunerações dos trabalhadores.
Página 47
47 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Gostava de lhe perguntar, pela terceira vez — e espero que agora me responda directamente — , se defende a aplicação do mesmo princípio no Estado, isto é, nos serviços do Estado que tenham altos níveis de produtividade defende que se possa aumentar as remunerações dos trabalhadores. É uma pergunta muito concreta que gostava de lhe deixar.
Já agora, também gostava de fazer-lhe uma outra pergunta mais retórica, respondendo com amizade ao Sr. Deputado Miguel Laranjeiro. Seria possível, num ano de crise, olhar para os 900 000 portugueses que trabalharam uma vida inteira, têm pensões de reforma pouco acima dos 40 contos, em moeda antiga, que em 2005, 2006 e 2007 viram decrescer realmente o seu poder de compra, que hoje estão confrontados com uma dificuldade enorme, que é a que, na melhor das hipóteses, o que têm é a manutenção do seu poder de compra porque não podem subir realmente o seu poder de vida, seria possível dar a estes portugueses mais 10 € por mês? Era possível. Mas não com o Partido Socialista!
Risos do Deputado do PS Miguel Laranjeiro.
Já agora, também pergunto: seria possível tentar combater de alguma forma fraudes de 118 milhões de euros no rendimento social de inserção — e não sou eu que o digo, é um jornal português que o diz — , seria possível olhar para o rendimento mínimo de forma diferente tirando do rendimento mínimo o que é fraude, o que é abuso, o que é injusto para se poder salvaguardar verdadeiramente as situações que existem no rendimento mínimo e que são a maior parte das situações que existem no rendimento mínimo de quem precisa? Era possível. Mas não com o PS! Termino, Sr. Presidente, agradecendo porque, finalmente, ao terceiro dia, houve um Deputado do Partido Socialista que teve a coragem de citar neste Plenário, pelos vistos, um nome maldito sobre o rendimento mínimo, que é o nome de Carlos César. Só que, infelizmente, continuou sem responder directamente à questão.
O Dr. Carlos César disse que o rendimento mínimo é atribuído a meia dúzia de preguiçosos.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Não disse nada disso!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Quero fazer aqui uma declaração: não concordo com o Dr. Carlos César. Não acho que o rendimento mínimo seja atribuído a meia dúzia de preguiçosos, mas acho, sinceramente, que era possível fazer muito mais para controlar esta prestação. Era possível. Mas não com o PS!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, nos parcos 3 minutos de que disponho, aligeirando a discussão, diria que também era possível ao Partido Socialista um Orçamento do Estado que não ficasse marcado pela aliança com a direita! Gostaria, Sr.ª Ministra, de lhe fazer duas perguntas sobre as pessoas com deficiência e retomar o tema da precariedade ligado não só à Inspecção-Geral do Trabalho mas também às equipas de fiscalização da segurança social, que vão ter que, com certeza, actuar em conjunto.
Sobre as pessoas com deficiência, registamos — e já foi aqui referido pela Sr.ª Deputada Teresa Venda o episódio de que haveria uma iniciativa legislativa coincidente com o CDS — que o Bloco de Esquerda, exactamente a 12 de Julho de 2006, apresentou, na Mesa do Plenário, o projecto de lei n.º 289/X (1.ª), em que fazia, de facto, esta proposta, que nunca foi discutida, da possibilidade de acumular pensões, nomeadamente as parcas pensões que as pessoas com deficiência recebem, com rendimentos do trabalho. Sr.ª Ministra, é uma situação absolutamente insustentável cortar a pessoas com deficiência o complemento de pensão quando essas pessoas têm uma pensão muito baixa, porque não advém de um período com descontos, é uma pensão de cento e tal euros, e quando essas pessoas têm potencialidades e deveriam ser incentivadas a trabalhar. Acho que o Governo do Partido Socialista teve uma grande falha nesta inclusão das pessoas com deficiência.
Página 48
48 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
É que, ao ser-lhe retirado este complemento, quando apenas têm um part-time, cria-se uma situação de profunda injustiça. Por isso mesmo, logo em 2006 apresentámos o projecto que, agora, este Orçamento, no fundo, contempla, e vamos ver em que termos, Sr.ª Ministra, e se os cidadãos com deficiência vão ser tratados com a dignidade que merecem.
Nesta matéria, remeto justamente para os benefícios fiscais, que também foram retirados, debaixo de uma grande polémica, aos cidadãos com deficiência. Ser-se professor com uma incapacidade, como é o caso, nomeadamente, de um professor cego ou de uma professora cega, e tomemos como bom este exemplo, não é a mesma coisa que não ter nenhuma incapacidade. Os custos dessa incapacidade são imensos e, portanto, deveriam ser espelhados nos benefícios fiscais que, há três anos, o Governo do Partido Socialista retirou.
Para finalizar, Sr.ª Ministra, relativamente ao combate à precariedade, deixo-lhe um desafio e uma proposta concreta: não entende que é chegado o momento de haver equipas compostas por elementos da segurança social, da inspecção do trabalho e das actividades económicas, para ser feito um combate à séria aos falsos recibos verdes? É que, mês após mês, há pessoas que passam um recibo da mesma quantia à mesma entidade — «está na cara» que são falsos recibos verdes — e não se faz rigorosa e absolutamente nada para penalizar as empresas que usam e abusam deste mecanismo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social, há diversas questões que ficaram por responder, mas há duas que quero reiterar nesta intervenção final, com a esperança de obter uma resposta. A primeira foi suscitada pelo meu camarada Agostinho Lopes e tem a ver com a utilização de empresas de trabalho temporário no Centro Distrital de Segurança Social de Braga, isto é, há 20 trabalhadores da Select Vedior; uma outra prende-se com a questão de saber como é que a Sr.ª Ministra lida com a perspectiva da regra introduzida na Administração Pública de que só entra um trabalhador, no máximo, por cada dois que saem e quais os impactos que isso está a ter na segurança social.
No que diz respeito ao Orçamento do Estado, este é um Orçamento que agrada à direita. E não é por acaso que, hoje, depois do ataque que o PS fez aos horários de trabalho e à desregulamentação das relações laborais, a direita tem condições, tem à-vontade para iniciar um ataque a outra conquista dos trabalhadores: o 13.º mês. Não é por acaso que isto surge; é porque o PS criou as condições para a direita iniciar este ataque a todos os trabalhadores, o que ç bem revelador do tipo»
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É para os políticos, Sr. Deputado! Seja sério nas discussões!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Nós sabemos bem qual é a intenção inicial: atacar o 13.º mês.
O Sr. Deputado Pedro Mota Soares pode utilizar a figuração e as expressões de «sim, era possível, com ou sem o CDS» e o PS também pode dizer «sim, era possível, mas não sem o PS». A verdade é que este Orçamento só é possível, porque quer o PS, quer o PSD e o CDS-PP estão de acordo na manutenção da política de direita.
Este Orçamento, Sr.ª Ministra, não responde aos milhares de desempregados que estão no desemprego, sem qualquer tipo de protecção social, é um Orçamento do Estado de perpetuação de baixos salários, é um Orçamento do Estado que aumenta a precariedade laboral, com a promoção do contrato de trabalho intermitente, por parte do Governo, é um Orçamento do Estado onde o Governo mostra de que lado se encontra: o Governo é ambicioso na fiscalização do rendimento social de inserção e das baixas fraudulentas, e muito bem, mas quando falamos dos milhões de apoios dados a diferentes grupos empresariais, aqui, a fiscalização é de 20%, quanto muito, e o Governo não tem a coragem que demonstra face aos desempregados, face às pessoas que recebem o rendimento social de inserção ou que estão com baixa. Digase o mesmo em relação ao lay-off e, já agora, também no que diz respeito à cobrança da dívida, porque a cobrança da dívida de 400 milhões de euros é muito, muito, muito pouco, em face do montante total da dívida.
Disse a Sr.ª Ministra que a discriminação salarial é uma característica da sociedade e que o problema não se resolve por decreto. Pois o PCP já denunciou a discriminação salarial das trabalhadoras do sector da cortiça, com fortes implicações no distrito de Aveiro. Sabe qual foi a resposta do Governo, Sr.ª Ministra? Nula! «Não mexeu uma palha» para resolver o problema! Portanto, a Sr.ª Ministra pode anunciar aqui as muito boas
Página 49
49 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
intenções que com certeza tem, mas, na verdade, a prática do seu Governo é precisamente contrária ao que diz.
Este é um Orçamento do Estado em que as pessoas com deficiência irão continuar a ser as mais discriminadas entre os discriminados e que aumenta as injustiças sociais.
Para terminar, Sr. Presidente, dado que já excedi o tempo de que dispunha, quero dizer que este Governo não toma as medidas necessárias para prevenir os futuros ataques que vão ser feitos à sustentabilidade financeira da segurança social e, mais uma vez, abre, claramente, a porta à direita para promover as medidas de cortes nas pensões, de quebra nas receitas, de desvio de receitas para o sector privado.
Sr.ª Ministra, nesta ronda final, não foi ainda feita nenhuma alusão cinematográfica e preparei uma que não queria usar mas que me sinto tentado a usar. Por isso, se tivesse de escolher um filme para caracterizar este Orçamento do Estado, escolheria, não pelo seu conteúdo mas pelo título, o seguinte: Este país não é para velhos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho e Segurança Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho e Segurança Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, infelizmente, tenho pouco tempo para ir ao cinema, razão pela qual não posso usar exemplos de filmes.
No final deste debate, quero, em primeiro lugar, agradecer as sugestões e os comentários que foram feitos pelas Sr.as Deputadas e pelos Srs. Deputados e, em segundo, reafirmar algumas coisas que têm sido ditas pelo Governo relativamente a esta matéria e, sobretudo, relativamente a este Orçamento.
A primeira coisa que quero dizer é que a prioridade do Governo, neste Orçamento, é o emprego, tendo plena consciência de que o emprego depende do crescimento económico e que a distribuição dos «lucros» do emprego depende da capacidade de lucro das empresas. Por isso, reafirmo, mais uma vez, que sempre que haja lucros das empresas em sectores de crescimento económico e em sectores que possam ter uma política redistributiva correcta nós todos e a economia temos a ganhar.
Reafirmo também que o nosso modelo de desenvolvimento económico precisa da reflexão de todos e é por isso que o Governo pretende lançar uma reflexão, no âmbito do «Pacto para o Emprego», sobre as políticas de distribuição e de redistribuição. O emprego é, claramente, a nossa primeira prioridade.
Mas também é importante dizer que este Orçamento do Estado, tendo o emprego como primeira prioridade, não descura, antes pelo contrário reforça, as políticas e os apoios à protecção social. E, nesta matéria, às vezes, fico um pouco perplexa com a discussão que temos neste Parlamento, sobre se devemos ou não manter os incentivos, sobre se devemos ou não manter as políticas sociais, sobre se devemos ou não tirar a uns para dar a outros.
Não é essa a nossa política nesta área e, por isso, gostaria de aproveitar este momento para, sobretudo em relação à área da deficiência, reiterar que, entre 2007 e 2008, mais de 25 000 agregados foram abrangidos pelos benefícios fiscais de que a Sr.ª Deputada falou, o que representou um aumento de 26%.
Mas quero também dizer que as políticas do Governo relativamente às pessoas com deficiência têm a ver com claros incentivos à contratação de pessoas com deficiência, matéria à qual o Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional teve ocasião de fazer alusão.
Portanto, a nossa política, no domínio da protecção social, é não só a de manter a via da sustentabilidade do nosso sistema mas também a de apoiar as famílias, os idosos, as crianças e as pessoas com deficiência, e de as apoiar quando elas mais necessitam, nomeadamente quando estão em situação de desemprego.
Ainda em relação à protecção social, gostaria de dizer, claramente, que, com a reforma da lei da segurança social, as pensões não perdem poder de compra. Penso que isto é algo muito importante e que não existia antes da reforma.
Ainda nesta matéria, gostaria de perguntar o seguinte: então, não é meia dúzia de preguiçosos que o RSI premeia? É uma dúzia? Quantos são? Estamos ou não de acordo relativamente ao objectivo social da prestação? É mais uma confusão que me saiu no final deste debate, sobre a qual gostaria também de dizer que o Governo desmentiu, claramente, os dados apresentados sobre as fraudes no rendimento social de inserção.
Sr. Presidente, quero ainda reafirmar que o terceiro grande objectivo do Governo é o rigor na utilização dos recursos. E, mais uma vez, tivemos mensagens contraditórias sobre esta matéria.
Página 50
50 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Governo, por um lado, diz que pretende fazer acordos com as empresas e com os trabalhadores independentes, para que possam pagar as contribuições em dívida à segurança social e também as contribuições correntes e, com isto, estamos a ter em atenção a necessidade de não pôr em perigo a sustentabilidade das próprias empresas, ou seja, estamos a dar-lhe oportunidade de honrarem as suas obrigações para com o Estado, fazendo com que, ao mesmo tempo, continuem viáveis. Saímos de 2004 com uma recuperação de 60 milhões por ano, mas, aqui, tenho dois sinais completamente diferentes: o PCP entende que recuperar 400 milhões é pouco; o PSD considera que é muito.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Queria saber como!
A Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social: — Também eu fico com algumas dúvidas no final deste debate.
Este Orçamento pretende, obviamente, concretizar prioridades políticas muito claras, mas, ao mesmo tempo, tem a clara consciência da necessidade de rigor orçamental e sustentabilidade das contas públicas, a médio e longo prazo.
Devo, no entanto, dizer que também houve aspectos positivos neste debate, os quais me levaram a concluir que, na generalidade, os partidos da oposição não discordam das opções políticas do Governo e que temos preocupações partilhadas relativamente a algumas matérias.
Por isso, Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, Sr.as e Srs. Deputados, o que espero é que esta partilha de preocupações nos possa levar também a uma partilha de responsabilidade relativamente à prioridade da manutenção do emprego e de uma protecção social justa e equitativa.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Sr.as e Srs. Deputados, concluímos esta audição e, desde já, agradeço a presença de todos, nomeadamente da Sr.ª Ministra e dos restantes membros do Governo.
Vamos, agora, interromper os nossos trabalhos, que retomaremos pelas 14 horas e 30 minutos, com a audição da Sr.ª Ministra da Cultura.
Eram 13 horas e 45 minutos.
Srs. Deputados, declaro reaberta a reunião.
Eram 14 horas e 45 minutos.
Queria começar por dar as boas-vindas aos Srs. Deputados e ao Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura e agradecer a presença da Sr.ª Ministra da Cultura e do Sr. Secretário de Estado da Cultura.
Vamos iniciar a discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Cultura, prevista no artigo 211.º do Regimento. Seguiremos a grelha de tempos acordada, começando com a intervenção inicial da Sr.ª Ministra, para o que dispõe de 20 minutos.
Tem a palavra, Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura (Gabriela Canavilhas): — Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças, Sr. Presidente da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, Sr.as e Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Cultura, enquanto principal instrumento de execução da política cultural do Governo, reflecte a orientação estratégica que tive oportunidade de transmitir na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura no passado dia 21 de Dezembro e que hoje, com o maior gosto, venho aprofundar.
Recordo que é nossa intenção desenvolver uma política orientada para a requalificação das infra-estruturas dos serviços estruturais do Ministério da Cultura e a inovação dos modelos de gestão, de modo a promover a sua melhor fruição pública, a promoção do rigor na gestão, no aumento das parcerias público-privadas e no
Página 51
51 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
funcionamento em rede, a afirmação do potencial da cultura como recurso económico num contexto particularmente sensível a esta visão.
Neste sentido, o orçamento do Ministério da Cultura em 2010 é de 236,3 milhões de euros, crescendo 12,8% quando comparado com a estimativa de execução em 2009, representando, portanto, 0,4% da despesa total da administração central e 1% do PIB. Lembro que o orçamento em 2009 representava 0,3% da despesa total.
Todas as fontes de financiamento do orçamento da cultura registaram um crescimento. Contudo, faço notar que a fracção do Orçamento do Estado afecta a despesas de investimento, que são 88 598 679 €, representa 37,5% do orçamento global e regista um crescimento de 15% face à dotação inicial de 2009.
Relativamente às receitas, sublinho que as receitas gerais do Orçamento do Estado — 147 580 000 € — , que correspondem a 62,4% do Orçamento do Ministério da Cultura, registam um crescimento de 13,1 milhões de euros relativamente à dotação inicial de 2009, portanto um aumento de cerca de 9,8%.
No que respeita ás receitas próprias, no valor de 64 513 177 €, correspondentes a 27,3% do seu orçamento, acrescem 9,7 milhões de euros face a 2009. Portanto, há um aumento de 17,6%.
Sectorialmente, e numa lógica integrada com as prioridades políticas já definidas, o domínio de intervenção patrimonial representa cerca de 35% do total do orçamento, logo seguido do apoio às artes, que representa 30%.
Ainda no âmbito da intervenção cultural, mas num outro quadro de acção, o Ministério da Cultura mantém apoios a actividades de 11 fundações, que envolvem um montante de 28,8 milhões de euros e que corresponde a cerca de 12% do seu orçamento.
Em traços muito gerais, são estes os números mais relevantes que gostaria de destacar pelas razões que há pouco anunciei.
Terei muito gosto em deter-me também sobre as linhas estratégicas gerais, aspectos mais concretos, sectoriais. E não queria deixar de sublinhar que o aspecto-chave, que também foi defendido na última vez que me dirigi à Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, foi precisamente o de salientar a transversalidade da acção da cultura, que se reflecte igualmente na forma como o orçamento é gerido, na forma como o orçamento da cultura beneficia da mesma.
Quanto às ideias-chave em termos programáticos, e que importa sublinhar nesta Comissão, saliento o acréscimo da dotação orçamental de 2010 face ao ano passado, a constituição do plenário do Conselho Nacional de Cultura, das respectivas secções especializadas, o novo modelo de organização e gestão dos museus, que já foi apresentado e que está em curso.
Para este ano, sublinho ainda a abertura dos museus do Côa e da arte popular; o lançamento da construção do novo edifício do Museu Nacional dos Coches; a definição dos programas museológicos e arquitectónicos do novo Museu de Arqueologia, a instalar na Cordoaria Nacional; a criação da casa do cinema, no Porto; a estruturação da gestão do património em torno da definição de rotas, de que é exemplo a rota do património mundial; a recuperação do património classificado, através do Programa Cheque-Obra e do Fundo de Salvaguarda do Património Cultural; a edificação de novas instalações destinadas aos Arquivos Distritais de Évora e de Viseu; a conclusão, pela Direcção-Geral de Arquivos, do projecto de digitalização de dois milhões de imagens alusivas à inquisição em Lisboa; o apoio a 97 municípios no âmbito da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, no montante total de 3,2 milhões de euros; e o reforço do Programa INOV-ART ao nível do orçamento e realização da segunda edição.
Refiro também a ampliação do Arquivo Nacional das Imagens em Movimento (ANIM); a modernização tecnológica e a simplificação administrativa no quadro do relacionamento entre os diversos organismos do Ministério da Cultura — Secretaria-Geral e Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológica (IGESPAR) — e a sociedade civil e entre os organismos do Ministério da Cultura e as autarquias; e o lançamento da segunda fase do projecto Portal da Cultura, que permitirá adquirir bilhetes online para eventos culturais e criar um cartão associado ao Portal da Cultura, estabelecendo, assim, uma relação continuada, presencial e online com os utilizadores.
Lembro que o Ministério da Cultura preparou um dossier bastante detalhado que previamente foi enviado aos Srs. Deputados e que poderá servir de bom suporte para esta audição.
Estou, pois, à disposição dos Srs. Deputados para responder às questões que entendam colocar.
Página 52
52 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Vamos começar, então, a primeira ronda de perguntas.
Em primeiro lugar, pelo PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidentes, Sr.ª Ministra da Cultura, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.
Na verdade, Sr.ª Ministra, quem vê o Orçamento do Estado para 2010 na área da cultura verifica que ele atinge um montante de 236,3 milhões de euros, como muito bem referiu, e que regista um aumento de 12,8% em relação ao 2009.
À primeira vista, isto parece uma coisa óptima, mas depois, se começarmos a analisar os números e até a cativação prevista no projecto de lei, que, como sabe, é de 12,5% e que apenas o Sr. Ministro de Estado e das Finanças poderá, eventualmente, descativar, e se constatarmos também que no ano de 2009 houve um desvio de execução — a retenção foi de cerca de 3 milhões de euros — ficamos com alguma preocupação quanto à sua realização orçamental.
Já agora, até porque o PS gosta muito de comparar os seus números com os do PSD, será bom lembrar que o último governo do PSD tinha um orçamento para a cultura de 285,1 milhões de euros, o qual, a partir do ano de 2006, tem vindo sempre a descer, e que por este andar dificilmente atingiremos essa verba — se calhar, só em 2012. E não conseguiu atingir a nossa perspectiva e a de muitas pessoas nesta Casa, que era de 1%. Aliás, a Sr.ª Ministra já referiu que era totalmente incomportável.
Mas passemos a analisar as várias áreas e os vários eixos que a Sr.ª Ministra referiu, começando pela língua.
Realmente, são interessantes as propostas relativas às realizações com os países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), nomeadamente com Cabo Verde e Moçambique. Gostaríamos de saber exactamente quais são as verbas envolvidas nessas actividades que se vão realizar, nomeadamente nas feiras do livro que terão lugar nos países da CPLP, bem como nas feiras internacionais do livro, onde muitas vezes a presença portuguesa tem estado em risco e em dúvida. Constatámos a intenção de estarmos presentes, mas gostaria de saber qual é a verba envolvida.
Na área das bibliotecas, o Ministério da Cultura, na sua proposta de orçamento, prevê um apoio de 3,2 milhões de euros para 97 municípios. Claro que, se dividíssemos equitativamente o montante, isso daria cerca de 300 000 € para cada município. Certamente, não será dividido desta forma, mas gostaríamos de saber se este apoio será para novas construções ou para fundos bibliográficos, isto é, qual a percentagem atribuída para cada uma das áreas.
Estamos de acordo com a lei das bibliotecas, é com certeza uma lei interessante. Desconhecemos ainda qual o seu teor, mas ficamos a aguardar no sentido de verificar se essa lei vem realmente, como propõe, definir os mecanismos de gestão e funcionamento das bibliotecas e a sua articulação com o poder local.
Na área dos arquivos, Sr.ª Ministra, esperávamos mais um pouco de ousadia e que nos apresentasse, finalmente, uma proposta semelhante à da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas. Mas vamos ficar pelos arquivos principais e não vimos uma proposta de criação dessa rede, que seria tão importante para o nosso país e para a preservação da memória.
Quanto aos museus (que, como já referiu, têm um peso de 30% na área do património), foi apresentado, no final de 2009, pelo Instituto dos Museus e da Conservação (IMC), o Plano Estratégico «Museus para o Século XXI» e é bem clara a intenção da Sr.ª Ministra de transferir alguns dos 28 museus dependentes do IMC para a tutela das autarquias ou das direcções regionais, transferência acompanhada de um envelope financeiro.
Sr.ª Ministra, gostaria que informasse esta Assembleia do que é que estamos a falar. Estamos a falar do Museu do Abade de Baçal, em Bragança? Do Museu de Alberto Sampaio, em Guimarães? De que museus estamos a falar? O PSD gostaria de ter acesso à lista, se é que ela já existe, e também os autarcas e as populações — não sei se a Associação Nacional de Municípios Portugueses já foi informada e abordada sobre essa transferência de competências.
E a quê é que se refere o envelope financeiro? Está previsto neste Orçamento do Estado para 2010? É retirado do orçamento do IMC, caso se essa transferência se efectue? São respostas que gostaríamos de obter.
Página 53
53 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Pretendíamos ainda saber se essas transferências vão ser as reais, as de funcionamento, com os museus na sua plenitude.
Como disse, o Orçamento do Estado prevê 11 milhões de euros para museus e palácios, desde o Palácio Nacional de Mafra ao Museu da Terra de Miranda. E também para o Museu José Malhoa — que, como sabe, conheço bem — , o qual já foi inaugurado com pompa e circunstância há mais de um ano. Portanto, não sei a que se destina essa verba. Só se ainda existe alguma dívida para com algum empreiteiro, dado que o Museu já foi inaugurado há bastante tempo. E não sei se nas verbas definidas para os outros museus existem situações semelhantes.
Também não sabemos exactamente qual é a verba inscrita para a recuperação e a instalação do Museu de Arte Popular — a Sr.ª Ministra acabou de afirmar que será reaberto este ano.
De qualquer das maneiras, queremos felicitar o Ministério da Cultura por saber aproveitar as boas ideias. É, pois, de felicitar o trabalho já iniciado pelo Conselho Internacional dos Museus (ICOM) de aproveitar o plano integrado do eixo Ajuda/Belém. Foi com satisfação que vimos isso na proposta do Ministério da Cultura.
Referiu ainda a Sr.ª Ministra que vai disponibilizar 28,8 milhões para 11 fundações dependentes do Ministério da Cultura. Uma delas é a Fundação de Arte Moderna e Contemporânea, mais conhecida por Colecção Berardo, para a qual vimos no orçamento 3,5 milhões de euros. A informação de que dispomos é a de que o custo anual da mesma é praticamente o dobro. Onde é que vamos buscar o resto das verbas? Não é certamente às receitas das entradas.
Por último, gostaria de saber como é que estamos em relação ao museu da viagem, se é ou não para concretizar. Aliás, na última vez que aqui esteve, a Sr.ª Ministra disse-nos que «o meu mandato é para a concretização». Pretendíamos obter informação em relação a esse museu, bem como ao alargamento do Museu do Chiado, porque não vimos qualquer referência no orçamento relativamente aos mesmos.
Já agora, muito rapidamente, porque o tempo é escasso, referirei o Museu Nacional dos Coches, se me permite. Foi lançada a primeira pedra — o Ministério da Cultura foi a reboque do Ministério da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento — nas comemorações dos 100 dias do Governo. Queria saber se o projecto já está acabado, se já temos projecto de arquitectura, os projectos de especialidade ou se estamos apenas a deitar abaixo alguns edifícios.
O mesmo pergunto em relação ao Museu Nacional de Arqueologia, pois não vimos inscrita a verba.
Soubemos que há um estudo do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) sobre a sua passagem para a Cordoaria Nacional. Gostaríamos que nos dissesse se é efectivamente um estudo do LNEC ou se se trata apenas de um estudo elaborado a título pessoal por um geólogo reformado do LNEC.
Na área do património, a Sr.ª Ministra referiu que vai continuar, e bem, o programa Cheque-Obra, que foi lançado pelo seu antecessor. O presidente da FEDICOPE (Federação Portuguesa da Indústria da Construção e Obras Públicas) já chamava a atenção para que esse projecto não fosse apenas aplicado em obras, em grandes monumentos, na cidade de Lisboa, mas que fosse extensivo a todo o País, nomeadamente aos nossos centros históricos.
Porque o tempo é curto, gostaria agora de passar, muito rapidamente, à matéria relacionada com o apoio às artes.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, pedia-lhe o favor de concluir, porque já excedeu o seu tempo.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Serei muito breve, Sr. Presidente.
O Sr. Primeiro-Ministro, na comemoração dos 100 dias do Governo, disse que ia ser lançado o estatuto do artista. Também estamos de acordo com isso, mas gostaríamos de saber de onde vêm as verbas para essas alterações: vêm do orçamento do Ministério da Cultura ou do orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social? Para terminar, em relação à área do cinema, refiro que também não vimos no orçamento qualquer referência ao novo pólo da Cinemateca no Porto nem à Casa Manuel de Oliveira, que a Sr.ª Ministra referiu.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, por favor, peço-lhe que conclua.
Página 54
54 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, vou concluir, dizendo que, já que se falou de filmes, esperemos que a Sr.ª Ministra não seja a protagonista de um filme Nas Nuvens e que, depois, não acabemos num filme de suspense sem saber o que é que vai acontecer a seguir.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, tem a palavra para responder.
A Sr.ª Ministra da Cultura — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, muito obrigada pelas suas questões.
A perspectiva de eu poder ser actriz num filme entusiasma-me particularmente. Quem sabe! «O futuro a Deus pertence», como se costuma dizer.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Veja lá quem ç o realizador, Sr.ª Ministra!»
Risos da Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura — Relativamente às várias questões que a Sr.ª Deputada colocou, devo dizerlhe que foram tantas e tão em catadupa que me vai ser difícil responder a todas de seguida. Naturalmente, ao longo desta audição, iremos ter ocasião de ir acudindo a várias das questões colocadas.
Informo ainda que partilharei com o Sr. Secretário de Estado as respostas às questões relativas ao património.
Respondendo à questão das verbas para as medidas apresentadas que a Sr.ª Deputada gostaria de saber onde estão no orçamento, refiro-lhe que elas estão lá todas, bastante claras. E constam também do documento que apresentei, onde, de alguma maneira, se faz a alocação do orçamento.
Mas vou começar um pouco mais pelo princípio, pela sua chamada de atenção relativamente a esta conquista — não são 11,8%, mas 12,8% de aumento do orçamento. E, Sr.ª Deputada, chamo a atenção para que, finalmente, voltámos aos valores do PSD. Devo dizer-lhe, sobre os valores do PSD, que 2004, ano a que se refere, foi um dos anos de menor execução do Ministério da Cultura. Ou seja, em 2002, a execução foi de 79% e em 2004 a execução foi de 82%, pelo que, concluo, não vale a pena ter orçamentos grandes quando não se consegue executá-los.
Ora, a verdade é que a execução do orçamento da cultura, em 2008, por exemplo, foi de 103%, em 2009 está muito perto de ultrapassar os 90% e a nossa expectativa é a de verdadeiramente conseguirmos executar esta verba.
Às vezes, criam-se ideias sobre orçamentos míticos, mas a verdade é que não é só preciso «conquistar» a verba, é preciso saber executá-la. E, de facto, no seu último governo, o PSD executou muito mal a verba do Ministério da Cultura. Quem sabe se esse não terá sido o princípio de uma escalada negativa para os orçamentos seguintes da cultura! É, de facto, uma conquista importante, sobretudo no panorama de crise instalada — nacional e internacional — , em que a maior parte dos ministérios teve decréscimos significativos, que o orçamento da cultura tenha registado uma subida, sendo um dos poucos que subiu. Considero-me, pois, bastante satisfeita com esta atenção especial a que sempre aludi.
Para além disso, volto à palavra-chave deste Ministério, que é a transversalidade. Este é um dos segredos, uma das estratégias que podemos defender e implementar e que tem sido, de alguma maneira, a nossa «bandeira». A transversalidade do Ministério da Cultura, não só na sua linha de actuação, mas no seu objectivo, na sua acção, é, claramente, uma acção transversal a todas as áreas da sociedade, como também a forma como podemos a articular e a forma como podemos beneficiar dessa articulação em termos de beneficio financeiro.
Posso também já dizer-lhe que, para além do nosso orçamento em sede de PIDDAC, para além deste orçamento que foi acabado de descrever, ainda temos mais 63,5 milhões de euros, que provêm das parcerias com os outros ministérios. Portanto, é essa transversalidade que nos permite pôr em curso todos estes projectos apresentados.
Página 55
55 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Se o orçamento do Ministério da Cultura tivesse em conta estes 63,5 milhões de euros, que provêm dos outros ministérios — turismo,» enfim, posso descrevê-los todos um a um — , o nosso orçamento chegaria aos 0,5% e portanto, ultrapassaria — e de que maneira! — os orçamentos mais auspiciosos dos últimos anos.
Relativamente a esta matéria, não posso, pois, deixar de referir que, face à situação que estamos a viver, não estou em condições (nem quero) de me queixar neste momento. Neste quadro de rigor, o Ministério da Cultura tem, neste momento, meios para poder implementar uma política cultural séria, estruturada e criteriosa.
A Sr.ª Deputada queria saber, exactamente, quanto se gasta nas fundações. Deixe-me dizer-lhe: os 28,8 milhões de euros aqui descritos como sendo a verba alocada ás fundações são»
Aparte inaudível da Deputada Maria Conceição Pereira.
Passo, então, a outro assunto e a Sr. ª Deputada, depois, poderá esclarecer.
Em relação à minha expressão, proferida em anterior reunião, de que o meu mandato era para concretização, penso que os três meses que passaram provam bem a nossa capacidade e o nosso ímpeto de concretização. Em três meses, pusemos uma série de projectos a andar, concretizámos alguns, fechámos alguns, e tivemos capacidade de desbloquear situações, algumas delas que se arrastavam há imenso tempo.
Portanto, espero que já tenhamos dado provas quanto à nossa capacidade de concretização, ou seja, de que ela existe e de que estamos profundamente empenhados em dar-lhe seguimento.
Em relação ao Museu Nacional dos Coches, a situação foi tornada pública. Claro que existe um projecto de Paulo Mendes da Rocha, que é um excelente projecto de arquitectura. Claro que existe um projecto de execução e a adjudicação já está em curso. A obra não é só demolições. Há um conjunto de empreitadas que irão dar origem ao novo museu, pelo que, dentro de, aproximadamente, 30 meses, talvez, teremos o novo Museu Nacional dos Coches inaugurado para enriquecimento do nosso país e da nossa capital.
Relativamente ao Museu Nacional de Arqueologia, refiro que o ano de 2010 é um ano de preparação de estudo museológico para a transição do espólio que está nos Jerónimos para a Cordoaria Nacional e que as obras propriamente ditas vão apenas decorrer a partir do próximo ano. Por conseguinte, temos tempo para o adequar a receber o novo museu. Temos verbas, sim, no IMC (Instituto dos Museus e da Conservação), entre as várias verbas, algumas delas com subidas significativas. Elas já estão a contar com o projecto para acolher o Museu Nacional de Arqueologia na Cordoaria Nacional.
Em relação ao estatuto do artista, como a Sr.ª Deputada sabe, está a ser preparado um diploma pelo Grupo Parlamentar do PS que irá regular, irá dotar de melhores mecanismos quer a protecção social quer a regulamentação dos contratos de trabalho dos trabalhadores do sector artístico. Seguir-se-á a elaboração de uma portaria pelo Ministério da Cultura, que irá definir o quadro das certificações e que, depois, irá abrir caminho para a preparação de um estatuto dos artistas, que incluirá a situação dos bailarinos, que é a mais premente e a que mais nos preocupa.
Este é, pois, um processo legislativo que está em curso e que está entregue à Assembleia. Estamos todos ansiosos para ver o seu resultado, porque me parece que será um primeiro passo muito significativo para melhorar a qualidade de prestação dos artistas em Portugal.
Quanto à Casa do Cinema, no Porto, a nova directora da Cinemateca Portuguesa, de Lisboa, sugere a designação «Casa do Cinema do Porto», que me parece bastante feliz. Quanto às verbas para esta instituição, obviamente que elas também estão inseridas no nosso orçamento.
Devo-lhe dizer que contamos com cerca de 500 000 € para a adaptação final de equipamentos na Casa das Artes e a Direcção Regional de Cultura do Norte já está a empreender, com a Cinemateca Portuguesa, as medidas necessárias para fazer um levantamento para a preparação do documento de empreitada.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, muito obrigado pelos seus esclarecimentos. Teremos ocasião, com certeza, de desenvolver novos pontos sucessivamente.
Vou agora dar a palavra à Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, Sr. Secretário de Estado da Cultura: Sr.ª Ministra, queria começar por salientar, no documento que nos apresentou, logo o primeiro
Página 56
56 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
parágrafo, que é, de facto, a cultura como factor de desenvolvimento social e económico. E porquê? Porque considero ser neste sentido que pode haver uma grande mudança de perspectiva nas políticas culturais, em que a transversalidade é importante, mas não só.
A esse respeito, começo por lembrar que o próprio Conselho da Europa tem apontado como linha inadiável de orientação determinante a de que a política cultural passe a integrar-se no conjunto da actividade governamental como elemento central e não subalternizado. Tenho a certeza, pelo que vejo do Orçamento do Estado, de que essa é uma das opções.
Claro que é de salientar o esforço financeiro que foi feito em período de crise: os 12,8% de aumento. E, claro, todos sabemos que não chegamos ao 1%, mas sabemos também que há várias maneiras de calcular esse 1%.
Quero só lembrar, neste ponto — no fundo, é isto que leio neste orçamento — , que as intenções são as de garantir a sustentabilidade do desenvolvimento das capacidades culturais, assegurando uma política persistente e continuada de aposta na avaliação e na qualidade; assegurar a transversalidade das políticas culturais, garantindo a coordenação dos ministérios e departamentos envolvidos em políticas sectoriais relevantes para a cultura; promover o aumento e a diversidade das práticas culturais através de políticas transparentes de apoio aos criadores; e estimular a apropriação económica e social dos resultados, através da criação de empregos culturais.
Não vou entrar no detalhe propriamente dito de todos os factores, tanto mais que a Sr.ª Deputada do PSD já o fez. No entanto, quero voltar a um ponto específico que a Sr.ª Ministra, aliás, também já referiu, que é questão da transversalidade e dos fundos — outros, que não estão presentes no Orçamento do Estado, mas que, como a Sr.ª Ministra diz, podem representar verbas significativas a serem canalizadas para o sector da cultura através de parcerias.
De facto, a Sr.ª Ministra falou do Fundo de Salvaguarda do Património Cultural e, nesse sentido, gostaria de questioná-la, pedindo-lhe que aprofundasse mais a sua resposta às perguntas seguintes: que parcerias são essas e com que fundos se pode contar quando nos fala das verbas de 63 milhões de euros a mais? Pode dizer-nos, claramente, de onde provêm, o que já está em curso e com o que é que podemos esperar mais de realização dessas parcerias? Para ser totalmente honesta, já que falámos de cinema, não posso deixar de fazer o reparo de que as respectivas verbas não aumentaram, são as mesmas. Mas também é importante, com a baixa do investimento da publicidade, reconhecer o esforço do Ministério, que vem completar os rendimentos que eram dedicados ao cinema para, pelo menos, estabilizarmos as verbas dedicadas ao cinema e audiovisual. Isso é tanto mais importante, porque consideramos que uma das prioridades para que a cultura e o sector da cultura se possam desenvolver é que haja uma certa estabilidade para as pessoas poderem fazer projectos, pelo menos a médio prazo.
Sr.ª Ministra, deixo-lhe estas duas questões.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.
Sr.ª Ministra, tem a palavra para responder.
A Sr.ª Ministra da Cultura — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Passo, então, a descrever um pouco o vasto leque de parcerias instituídas de que o Ministério da Cultura dispõe e que, concretamente, interagem com o nosso orçamento, beneficiando-o, e que aumentam a nossa capacidade de acção.
Desde logo, é que acontece com o turismo. Aliás, na última reunião da Comissão, a propósito de um comentário de uma Sr.ª Deputada, que dizia que a cultura deve muito ao turismo, tive ocasião de lembrar que é o turismo que deve muito à cultura, ou que, cada vez mais, irá dever à cultura, na medida em que, cada vez mais, se pretende um turismo orientado para a fruição cultural e para o conhecimento da nossa identidade cultural. Daí que tudo quanto o turismo fizer hoje para beneficiar e aumentar a nossa qualidade de oferta cultural mais o irá beneficiar.
Portanto, não lhe chamarei um empréstimo mas, sim, uma sinergia que é benéfica para ambas as partes e que tem como benefício último, do meu ponto de vista, a afirmação da cultura e da identidade portuguesas.
Página 57
57 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Para 2010, só do turismo temos uma comparticipação de 17,7 milhões de euros: 10 milhões de euros para o Museu Nacional dos Coches, 1 milhão de euros para a Colecção Berardo, 2,8 milhões de euros para Guimarães, 209 000 € para o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, 428 000 € para o Palácio da Pena, 805 000 € para o Mosteiro dos Jerónimos, 50 000 € para a Fundação de Serralves, 170 000 € para a Orquestra Metropolitana de Lisboa, 1 milhão de euros para Foz Côa e 4,7 milhões de euros para o Promontório de Sagres e a Fortaleza de Sagres.
Do Ministério das Finanças temos 4 milhões de euros para o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural; do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, relativamente à sua relação com o Teatro da Trindade, temos por volta de 4 milhões de euros; do Ministério da Educação, temos meio milhão de euros, que respeita ao apoio pedagógico de algumas orquestras; isto para além das receitas próprias e do mecenato das nossas EPE, que se estimam em 5 milhões de euros.
Portanto, se juntarmos tudo isto, temos 65,3 milhões de euros, o que faz atirar o orçamento do Ministério da Cultura para o patamar dos 0,5% do Orçamento do Estado.
Relativamente ao cinema, partilho a sua preocupação. A razão pela qual há um pequeno abaixamento da previsão de investimento no cinema em 2010 prende-se com o facto de este investimento estar directamente indexado às receitas de publicidade das televisões. E, nesta situação de continuada crise, as expectativas são que as receitas de publicidade continuem a decrescer em 2010, tal como decresceram em 2009.
Apontando, apesar de tudo, para uma previsão similar à de 2009, temos um pequeno decréscimo no cinema. Claro que tudo faremos para, com uma execução flexível e com uma capacidade de gerir de forma concertada as várias verbas que temos à nossa disposição, desviar alguma verba para o Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA), caso seja necessário equilibrar um decréscimo mais acentuado nas receitas de publicidade.
O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, gostaria de começar por saudá-la nesta que é a sua primeira apresentação do orçamento.
Muitas questões já aqui foram colocadas e algumas delas já foram respondidas, no entanto, no que se refere ao montante global previsto para o orçamento da cultura, e não vale a pena repetir que continuamos muito aquém do objectivo proposto e reivindicado pelo Partido Socialista, de 1% do Orçamento da administração central — já compreendemos que essa não vai ser uma realidade, pelo menos com os governos socialistas, e sei que, para o justificar, vão escudar-se, tanto quanto puderem, na crise que vivemos — , de facto, assistimos a um aumento estimado de 9,7 milhões de euros, que representa um aumento de 12,8%.
Ora, o que me faz ter algumas dúvidas é o facto de fazerem, constantemente, a comparação entre a previsão do executado e o orçamento que está previsto, porque o que me parece sério e justo seria fazer a comparação entre orçamento afecto para a área da cultura, como sinal político, e o executado.
O que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, é o seguinte: mais de um quarto deste aumento (dos 9,7 milhões de euros) é de receitas próprias do Ministério da Cultura. Ora, tendo em conta a actual situação económica, que, tal como a Sr.ª Ministra acabou de referir, justifica uma redução das contribuições resultantes das receitas de publicidade para o Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual (FICA), como é possível estimar este aumento tão grande de receitas próprias? Onde é que a Sr.ª Ministra pensa que os vai recolher? Relativamente a iniciativas legislativas, gostaria de a saudar por ter reactivado o Conselho Nacional de Cultura — saúdo-a muito vivamente por o ter feito — , através da nomeação de individualidades e de representantes que constituem o respectivo plenário e as secções. De facto, esta decisão só peca por ser tardia.
O que pergunto, Sr.ª Ministra, é se, antes de apresentar o novo Plano Estratégico para os Museus nacionais, consultou a secção de museus deste Conselho Nacional de Cultura e, se o fez, qual foi o parecer desta secção.
Quanto à Lei do Património Cultural (que é, também, uma odisseia e que tem tido um percurso bastante acidentado), é verdade que já saiu alguma regulamentação, mas falta a regulação da área fiscal dos proprietários privados, nomeadamente no que se refere à execução de obras de salvaguarda — obras que, aliás, são exigidas por lei. Portanto, este impasse está a criar uma penalização não só para o nosso país, para
Página 58
58 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
o nosso edificado como também para os proprietários. Pergunto, por isso, Sr.ª Ministra, quando é expectável que seja feita a regulamentação desta área fiscal.
Voltando à questão dos museus, e reiterando a nossa concordância com o princípio que está subjacente a esta nova estratégia de ligação à comunidade, entendemos que podem gerar-se alguns problemas com uma gestão que poderá, porventura, ser bicéfala, havendo uma parte mais ligada à gestão e outra mais ligada à parte artística. Em todo o caso, volto a repetir que, no essencial, concordamos com esta nova abordagem, isto é, que os museus sejam vistos como agentes turísticos, voltando a colocá-los sob a alçada e numa relação de maior proximidade com as autarquias nas quais se inserem.
Concordando com este princípio, pergunto-lhe então quais são os critérios para a devolução dos museus à tutela das autarquias. Existem alguns critérios, ou as negociações são casuísticas e o autarca que mais reivindicar e mais «berrar» mais depressa receberá o seu museu? Já agora, no Museu de Évora demitiu-se o director e foi nomeado outro director. Pergunto se isso foi feito interinamente ou se foi aberto concurso. Gostaria de ser esclarecida sobre este ponto.
Relativamente ao aumento das receitas próprias, a Sr.ª Ministra disse — e, mais uma vez, concordo consigo — que o seu sonho é que haja um aumento (senão a totalidade) de entradas gratuitas nos museus, Ora, isto veio reforçar a minha pergunta de há pouco: como é que há um aumento tão grande de receitas estimadas na área da cultura neste contexto económico e, ao mesmo tempo, prevê poder realizar este sonho (que já se tem vindo a verificar) de aumento de entradas gratuitas nos museus? Parece que há aqui uma discordância: por um lado o orçamento do Ministério da Cultura prevê um aumento de receitas próprias, por outro lado, incrementando um sistema de entradas gratuitas, tal irá diminuir, como é óbvio, as receitas próprias do Ministério.
Se me conseguir explicar como faz esta «ginástica» orçamental» Para concluir esta primeira ronda de perguntas, gostaria de falar da questão do estatuto dos profissionais das artes do espectáculo — o relatório do Orçamento refere-se ao «estatuto dos artistas», porventura um conceito já ultrapassado, visto que não se trata de regular apenas o estatuto dos artistas em sentido estrito mas de todos os profissionais das artes do espectáculo.
Como sabemos, as questões que estão pendentes representam dinheiro, têm um encargo, tal como sabemos que a parte que se segue (a parte fiscal) pressupõe um acordo prévio, uma disponibilidade prévia por parte do Sr. Ministro das Finanças, sem o qual qualquer apresentação de um estatuto de salvaguarda destes profissionais não fará sentido.
Pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, qual é a expectativa realista de como vai solucionar esta parte do estatuto dos profissionais das artes do espectáculo e se já falou com o Sr. Ministro das Finanças, porque, mais uma vez, neste contexto deficitário, imagino que haverá alguma relutância. Mas, melhor do que ninguém, a Sr.ª Ministra poderá esclarecer se há ou não relutância.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, como sempre, as suas perguntas vão ao cerne da questão e são muito úteis para o esclarecimento destas matérias.
Começo por dizer-lhe que o sonho é isso mesmo, é quando a gente projecta um desejo e, sobretudo, concebe uma situação ideal. É isso que define de alguma maneira (ou em parte, pelo menos) o sonho. E quando referi que gostaria de, a médio ou longo prazos, encontrar uma forma de financiamento direccionado exclusivamente para os museus, tal como se encontrou o programa Cheque-Obra, direccionado exclusivamente para a recuperação do património, aí iríamos conseguir viver sem os tais 7, 8 ou 9 milhões de euros de receitas de bilheteira que os museus e palácios fornecem ao nosso orçamento e aí, sim, finalmente, poderíamos abrir as portas das nossas instituições sem a necessidade do bilhete e, certamente com isso, aproximar muito mais os cidadãos portugueses do nosso universo museológico, do qual, infelizmente, se mantêm um bocadinho arredados.
Um número significativo dos nossos visitantes são estrangeiros e nós queríamos muito encontrar uma forma de atrair os cidadãos portugueses aos museus. É claro que, muitas vezes, ouvimos o argumento de que, para os visitar, se tem de pagar. É certo que, mesmo custando o bilhete 3 € ou 4 € (o que, aparentemente não é muito), para uma família com dois, três filhos, uma família de quatro, cinco pessoas, que vai almoçar
Página 59
59 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
fora ao domingo e passa por um museu, torna-se um pouco mais pesado, razão pela qual gostaria muito de encontrar uma fórmula, e estamos a trabalhar nela.
Para fechar o assunto: tratou-se de uma projecção, é um desejo e tudo farei para o materializar nestes quatro anos da Legislatura.
As alterações que estão a ser feitas relativamente à segurança social e aos contratos de trabalho dos artistas vão significar um acréscimo significativo para a segurança social e para o Ministério da Cultura: na segurança social, na medida em que a protecção social vai ser alargada a um número mais elevado de cidadãos e, portanto, o orçamento do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social vai ter de ter esses valores em consideração — o nosso estudo preliminar aponta para um valor de cerca de 3 milhões de euros de acréscimo de despesa. Mas este é apenas um estudo preliminar; no Ministério da Cultura vai ter de haver um aumento, pelo menos de 28%, nas verbas destinadas à actividade artística, nas que dizem respeito à realização de contratos de trabalho.
Portanto, já estou a contar que, a partir do momento em que consigamos implementar uma regulação que obrigue a contratos de trabalho, com as devidas consequências, nomeadamente a protecção social, nós, no Ministério da Cultura, vamos ter de aumentar, pelo menos 28%, as verbas de apoio às artes, no que respeita aos itens direccionados para as contratações.
Vou ter de ter isto em conta e esta será, obviamente, uma matéria incontornável para o Ministério da Cultura, que terá de fazer face a este aumento que resulta da realização de contratos de trabalho — os 28% de desconto para a segurança social.
De facto, em matéria de receitas próprias, projectamos um aumento para este ano, que, como lembrou — e bem — , é um ano de crise, um ano em que, nomeadamente, as receitas da publicidade vão decrescer.
Portanto, tudo indicaria que teríamos uma restrição também a este nível. As nossas receitas próprias estão estimadas em 9,7 milhões de euros, decorrendo de 6 milhões de euros de financiamento extra vindo do Instituto do Emprego e Formação Profissional para o programa INOV-ART e de 3,5 milhões de euros das receitas dos jogos sociais e do imposto especial sobre o jogo, inscritos no Fundo de Fomento Cultural.
O financiamento comunitário, que corresponde a 24 milhões de euros, representa 10,3% na estrutura de financiamento da cultura, o que significa que também há aqui um aumento das receitas previstas por via do QREN, que, fundamentalmente, estão distribuídas pelas várias direcções regionais da cultura do Norte e do Centro e que esperamos poder devidamente executar até ao final do ano.
Gostaria de passar agora a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Cultura para responder às questões relativas aos museus.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Elísio Summavielle): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, boatarde.
A Sr.ª Deputada Teresa Caeiro levantou duas questões, uma delas relacionada com a regulamentação da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, a Lei de Bases do Património Cultural, e que, salvo erro, diz respeito a proprietários privados e a questões de fiscalidade. Ora, essas questões não são do âmbito da Lei de Bases do Património Cultural mas, sim, do âmbito da lei sobre benefícios fiscais, sobre mecenato, etc. Estamos a trabalhar nessa matéria mas, evidentemente, num quadro de constrangimentos financeiros globais complicado. De qualquer modo, não diz directamente respeito à regulamentação da Lei de Bases do Património Cultural.
Sobre esse aspecto quero referir que, quer na área do património imóvel — regulamento para projectos e obras; criação do Fundo de Salvaguarda do Património Cultural; regulamentação e classificação das zonas de protecção de imóveis a classificar ou em vias de classificação — quer na área do património imaterial, todos os decretos regulamentares foram já publicados e estão em vigor. Apenas um está por fazer, que é o regulamento dos trabalhos arqueológicos. Trata-se de uma matéria complexa, na qual estamos a trabalhar com as associações profissionais dos arqueólogos e com as universidades, e estamos a preparar uma minuta de um regulamento que crie esses consensos para regular a actividade arqueológica em Portugal.
Sr.ª Deputada, a outra questão que colocou, e que havia sido colocada também pela Sr.ª Deputada do PSD, refere-se à passagem de alguns museus da rede nacional para autarquias.
Criou-se, provavelmente a partir de notícias, algum ruído à volta desta questão. Como a Sr.ª Deputada pôde testemunhar enquanto vereadora de uma autarquia, numa reunião que ocorreu no meu gabinete e na
Página 60
60 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
qual esteve o Sr. Presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, que é um caso concreto, a nossa ideia não é, de modo algum, transferir uma série de museus, em pacote financeiro, para a esfera de competência das autarquias. Não é disso que se trata mas, sim, de analisar, caso a caso — não é casuisticamente mas, sim, caso a caso — , formas de cooperação com uma autarquia, elaborando um plano estratégico para determinado equipamento, para determinado museu, havendo o acolhimento óbvio, a disponibilidade por parte da autarquia para trabalhar neste processo, o que culminará com a celebração de um contrato-programa em que estará prevista a transição da tutela final do equipamento para a esfera autárquica.
Isto vem na lógica daquilo que é visível para todos nós, que é, cada vez mais, uma apropriação do património pelo poder local. Do nosso ponto de vista, isto é positivo, é bom, é aquilo que nos distingue como identidade. O património começa a ser entendido como uma aposta para o futuro.
Portanto, temos constatado, concretamente no caso das Caldas da Rainha, onde já houve reuniões de trabalho — penso que há cerca de uma semana o Director do Instituto dos Museus e da Conservação (IMC) esteve lá a trabalhar neste processo — , que este é um processo sempre acompanhado, que é transitório e que se fará ao longo desta Legislatura. Se, porventura, este ano se conseguir chegar ao fim de um ou dois processos já é bom, mas este é um caminho que se deve percorrer. Não se trata pura e simplesmente de entregar um museu»
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, já esgotou o tempo de que dispunha, mas penso que terá tempo, nas perguntas seguintes, para responder a essa questão. Talvez na resposta seguinte, ou na próxima ronda de questões, pudesse retomar essa matéria, mas agora preciso de passar a palavra ao Bloco de Esquerda.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, muito rapidamente, gostava só de me referir ao Museu de Évora.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado, mas peço-lhe que conclua.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Obrigado, Sr. Presidente.
No Museu de Évora houve um vazio, criado pela saída do director. É um assunto do próprio IMC. Foi nomeado um director interinamente mas, nos termos da lei, tem de haver sempre concurso público, pelo que está aberto concurso para o lugar de director do Museu de Évora, muito embora o lugar esteja ocupado interinamente por alguém designado pelo Instituto, tal como decorre da lei.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, gostaria que fosse um prazer estar a discutir o orçamento da cultura, mas devo dizer-lhe que, infelizmente, embora tenha ficado entusiasmada com as suas palavras iniciais — quando disse que sabia que com menos não se fazia mais, quando disse que quando aceitou o cargo não pediu quaisquer garantias sobre o orçamento porque achava natural, se o PrimeiroMinistro reconheceu o erro da Legislatura anterior, que agora tivesse mais dinheiro — , estamos aqui com um orçamento que não subiu. Podemos fazer a ginástica que quisermos com os números, mas o orçamento desceu.
O erro do desinvestimento reconhecido foi de 238 milhões de euros, em média, na Legislatura. Este ano, temos 236 milhões de euros, o que é menos, não é mais.
Também gostei de ouvir dizer que o Estatuto do Artista — também não gosto muito desta expressão, prefiro designá-lo por estatuto dos profissionais das artes, do espectáculo e do audiovisual — seria revisto, tendo ficado entusiasmada. Confesso que é também com pena que não vejo nada, neste Orçamento do Estado, que tenha a ver com a protecção social desses profissionais.
Aproveito para dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que neste momento não há qualquer proposta do PS em relação a essa matéria. Há duas propostas, sim, mas do BE: uma sobre protecção social para os profissionais do espectáculo e do audiovisual e outra sobre estatuto e protecção aos bailarinos de bailado clássico e
Página 61
61 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
contemporâneo. Partilhamos com a Sr.ª Ministra a visão da urgência de protecção desta profissão de desgaste rápido e da sua reconversão. Terei todo o prazer em enviar-lhe os diplomas.
A minha primeira pergunta, olhando para este orçamento, é no sentido de saber se a Sr.ª Ministra considera mesmo que tem condições para cumprir o seu mandato. É preciso compreender que numa casa em que não havia dinheiro nenhum para pagar as contas, que foi ficando sem luz e sem água, que começou a ter infiltrações, não é por haver uma subida ligeira em relação ao ano anterior que muda qualquer coisa. Nos últimos quatro anos já não se conseguiu pagar nenhuma das contas, a casa está a cair. Quando este orçamento é inferior à média dos últimos quatro anos o que temos é menos, não é mais, pelo que não vale a pena fazer grandes ginásticas.
Também é preciso dizer que aquilo que temos representa 0,4% do Orçamento do Estado e não 1%, como já foi, em tempos, promessa do PS. É preciso dizê-lo porque não vale comparar orçamentos do Ministério da Cultura com orçamentos transversais. Todos os anos houve, eventualmente, investimentos transversais na cultura, mas o problema é que o Ministério da Cultura é que tem de ter uma política cultural sustentada e com sentido. Aliás, pôr a política cultural nas mãos de outros ministérios deu resultados estranhos, como se tem visto, dos quais falaremos à frente.
Também espero, Sr.ª Ministra, que não ponha toda a sua esperança nos privados, porque sabe os momentos de crise que vivemos e sabe, com certeza, que em todo o mundo, como na Europa, o investimento privado em cultura e arte está a descer. Pelo menos é o que nos dizem todas as associações e plataformas do sector.
Lembro, por exemplo, que, em Portugal, todas as empresas que financiam cultura e arte já financiam grandes projectos, pelo que não terão grande disponibilidade para muitos mais projectos. Basta pensar, por exemplo, no caso da Fundação de Serralves, em que 150 privados financiam tanto a Fundação como o Estado sozinho, ou seja, por cada 1 € dos privados temos de ter 150 € dos contribuintes. Portanto, ç preciso termos alguma calma quando neste País e neste tempo estamos a pôr tantas esperanças no financiamento privado da cultura e da arte.
É preciso analisar e fazer escolhas, tendo o seu Governo e os partidos que com ele viabilizam este Orçamento, o PSD e o CDS-PP, decidido abandonar a cultura. Na última Legislatura, em consultorias externas, o Governo gastou quase três orçamentos do Ministério da Cultura e as derrapagens em seis autoestradas representaram cinco anos de orçamentos do Ministério da Cultura. Isto não é investimento na cultura, com certeza.
Será que se arrependeu, Sr.ª Ministra, de não ter pedido garantias mínimas de que teria orçamento para trabalhar? Ou será que confunde cultura com construção e betão? Isso é muito perigoso, e a cerimónia de lançamento da primeira pedra do Museu Nacional dos Coches faz-nos pensar.
O Museu Nacional dos Coches é um museu que ninguém pediu e que ninguém quer, decidido por um ministro da economia que já não o é, que vai custar 31 milhões de euros e que vai alterar o perfil de um museu que dá lucro em Portugal, com tantos museus, com tantas necessidades e com tantas faltas. E não sou eu quem diz que este plano «Museus para o Século XXI», com este investimento que não se percebe, parece não estar pensado para este País.
Cito o que disse Luís Raposo, presidente do ICOM-Portugal (International Council of Museums), na última edição do Jornal de Letras: «O principal problema dos museus portugueses é serem instituições de longo fôlego num País dominado por lideranças de vistas curtas, sempre ciosas de posarem para o retrato. A palavra de ordem devia ser ‘nem mais um museu’ para quem não sabe cuidar do que já tem, para quem tem a desfaçatez de lhes exigir que pesquem sem lhes dar uma cana, retirando-lhes até linhas e anzóis».
Sr.ª Ministra, tem sentido gastar 31 milhões de euros no único museu que tem lucro? E a que se refere a Sr.ª Ministra quando fala de direcções bicéfalas? O que é que vai ter predomínio: a museologia ou a gestão? Corremos o risco de direcções em confronto, como no British Museum? Qual é o papel dos privados neste conceito de gestão? Temos nós a certeza de que colecções públicas não vão servir interesses privados? Como é que vão ser escolhidas estas direcções? Vamos ter concursos? Todas estas perguntas precisam de uma resposta urgente.
Sr.ª Ministra, é preciso haver resposta a estas questões, porque nos perguntamos todos, com este orçamento, quanto tempo vai passar até voltar a demitir um director de museu dizendo que ele não teve a capacidade de gerir porque não soube fazer omeletas sem ovos? E quem o sabe, Sr.ª Ministra? Nenhum de
Página 62
62 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
nós o sabe! Como é que o Ministério da Cultura pode pôr o ónus da vida dos equipamentos culturais nos ombros de quem tenta, todos os dias, que os equipamentos não fechem, quando não têm condições objectivas para estar abertos? Finalmente, Sr.ª Ministra, vai activar o Conselho Nacional de Cultura, e ainda bem. Mas vai activá-lo para que o mesmo possa dar parecer ou para caucionar uma política de facto consumado? O plano para os museus está em aberto ou é um facto consumado? Os modelos de direcção vão ser discutidos? Os museus a serem criados vão ser debatidos? Pensando, por exemplo, no eixo Belém-Ajuda ou naquilo que a Prof.ª Raquel Henriques da Silva diz, também no Jornal de Letras, ou seja, que «as mudanças resultam de circunstâncias e não têm inscrição numa política para o sector. Discordo veementemente do novo Museu dos Coches, que é uma desnecessidade mal programada, imposta à cultura pelo Ministério da Cultura», vamos discutir isto no Conselho Nacional de Cultura, ou não? Tem sentido colocar o Museu Nacional de Arqueologia na Cordoaria Nacional? Foi feito algum estudo, ou não? Tanto quanto sabemos, há pareceres que dizem que o espaço é muito vulnerável, tanto em caso de sismo como de inundação. Não há um estudo do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) das fundações. Vamos ter esse estudo, ou não? E mesmo que a Cordoaria seja um lugar seguro para um espaço museológico, tem sentido que seja o Museu Nacional de Arqueologia? Teria sentido o Museu da Indústria? Haverá necessidade do museu da indústria náutica, por exemplo, cujo património temos andado a desbaratar e que, do ponto de vista histórico e de identidade, tem tanto impacto? Não tenho as respostas, Sr.ª Ministra, mas o que sei é que o Conselho Nacional de Cultura devia debater estes temas. O que sei é que nenhum conselho de sábios, por mais experientes que as pessoas sejam, por mais respeitáveis que sejam — e garanto-lhe que me merecem todo o respeito e sei que são pessoas conhecedoras do terreno — , substitui os formalismos democráticos, mas que são democráticos e que garantem que realmente as coisas se discutem como devem ser discutidas. Nada substitui um parecer das secções competentes do Conselho Nacional de Cultura nesta matéria.
Por isso, muito rapidamente, recapitulando, Sr.ª Ministra, considera que com este orçamento de miséria tem condições mínimas para cumprir o seu mandato? Sr.ª Ministra, terá o Conselho Nacional de Cultura um papel activo? Está o plano estratégico para os museus ainda em aberto, ou não? Pedirá ao LNEC uma análise geotécnica da Cordoaria Nacional, ou não? Nos novos modelos de gestão anunciados existem garantias de que prevalece sempre o interesse público e cultural, ou não?
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Vou só fazer uma última pergunta, Sr. Presidente.
Para quando a autonomia dos equipamentos culturais face à tutela política? Para quando o fim das «danças» das demissões? É tudo, Sr.ª Ministra.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, as suas últimas perguntas foram feitas tão rapidamente que não consegui anotá-las. Mas percebi o tom geral e vou responder tentando generalizar, o que, de alguma maneira, foi o que a Sr.ª Deputada fez.
Deixe-me dizer-lhe que a primeira resposta é «sim». Lembra-se de qual foi a pergunta? Já não sabe» Qual foi?
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Foi se considera que tem os meios orçamentais necessários para cumprir o seu mandato.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Exactamente. E a minha resposta está dada: sim! E se conseguirmos executar a 100% este orçamento, se executarmos estes 300 milhões de euros que temos à nossa disposição,
Página 63
63 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
vai haver um novo panorama cultural, uma nova estratégia em curso concretizada neste País. A capacidade de execução deste orçamento será o grande desafio. E, aí, eu posso, no próximo ano, reclamar mais. De facto, se executarmos a verba toda que nos foi dada, coisa que não é habitual no Ministério da Cultura, poderei, no próximo ano, reclamar mais.
Quando me diz que temos um orçamento com um valor abaixo da média dos últimos quatro anos, devo dizer-lhe que isso é errado. A Sr.ª Deputada não tem os mesmos números que eu. E, sobretudo, não tem os números da execução — estes é que envergonham a acção, a capacidade de concretizar.
Agora, relativamente ao estado depauperado dos museus, não é por acaso que alocamos 19,5% de aumento no IMC (Instituto dos Museus e da Conservação), é precisamente para poder fazer face a esse panorama neo-realista que a Sr.ª Deputada fez o favor de nos apresentar em relação aos museus.
Quanto aos novos museus, diz-me que o Director do Museu Nacional de Arqueologia não quer um novo museu e defende que não devem fazer-se novos museus. No entanto, ouvi-a defender vários novos museus e o próprio Director do Museu Nacional de Arqueologia pede-nos um museu novo para a arqueologia. Portanto, há aqui alguma contradição nas posições apresentadas pela Sr.ª Deputada.
Relativamente à velha máxima «estamos a gastar dinheiro com o Museu Nacional dos Coches», quantas vezes vamos ter de repetir, repetir e repetir que o dinheiro não vem do Ministério da Cultura?! Não estamos a gastar 1 € com o Museu Nacional dos Coches! Portanto, esse dinheiro não sai do orçamento do Ministçrio da Cultura.
Quanto à «dança» dos directores dos museus, ainda não os vi «dançar». O que aconteceu foi que houve duas alterações: uma, pedida pelo próprio; e, outra, pedida por mim, no sentido em que ela se enquadraria numa nova estratégia para os museus.
Para mais detalhes em relação aos museus, passo a palavra, com a permissão do Sr. Presidente, ao Sr.
Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Muito brevemente, Sr.ª Deputada, a questão do orçamento, da miragem mítica de 1%, é uma questão recorrente, de todos os anos, há décadas que se fala disto.
Tanto a Sr.ª Ministra da Cultura como eu temos um percurso profissional que nos ligou à execução.
Portanto, falamos naquilo que executamos e não naquilo que temos e que, depois, não executamos.
No que diz respeito ao tal ano, aqui há pouco referido, em que o orçamento do Ministério da Cultura foi de 285 milhões de euros, devo dizer que, no fim desse ano, tomei posse como dirigente de um instituto, o antigo IPPAR, e que este tinha 600 000 € de dívidas em contas de luz (à EDP) e de água.
Portanto, não adianta termos orçamentos «gordos» ou «engordurados»; queremos é ter capacidade para executar e não nos crivarmos de dívidas por falta de competência na execução.
Isto leva-me a crer que o orçamento actual — sobretudo o reforço efectivo que foi dado à área patrimonial e dos museus, a qual tem dificuldades que conheço bem — vai garantir, pelo menos, o arranque do plano estratégico, chamado «Museus para o Século XXI».
Ora, o que está a ser referido tem a ver com o século XX, com o imobilismo e com o deixar as coisas como tal como estão no funcionamento dos museus, o que, penso, ninguém, na área dos museus, deseja.
Portanto, este plano diz respeito ao próprio funcionamento dos museus e à forma como se pode inovar e renovar esse funcionamento. Não se trata, de modo algum, de uma privatização, não se trata de uma lógica de gestor económico à frente dos museus, mas de uma área de gestão cultural, de museologia, áreas novas e recentes no nosso universo profissional, que irão, cada vez mais, tomar conta de todo este sistema museológico.
No que diz respeito à localização do Museu Nacional de Arqueologia no actual edifício da Cordoaria Nacional, também há notícias, soltas, aqui e acolá, que suscitam alguns equívocos. Foi colocada a questão de saber se os terrenos da Cordoaria Nacional agravariam os riscos de sismo, de tsunami, etc., relativamente à sua localização actual, no Mosteiro dos Jerónimos, onde o Museu Nacional de Arqueologia nunca teve espaço para o ser efectivamente e um espaço onde não há uma colecção permanente, onde não se conta a história da formação de Portugal, do homem português, nas exposições que vão rodando, e não há a possibilidade física de haver um espaço coerente.
O próprio Director do Museu Nacional de Arqueologia, que também é presidente do ICOM (às vezes, dizemos umas coisas numa qualidade e, outras vezes, noutra, pelo que, por vezes, se confunde), reconhece
Página 64
64 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
que é necessário e reivindica um museu de raiz para a arqueologia. Isto não é possível, mas a Cordoaria Nacional tem condições para acolher uma grande casa da arqueologia portuguesa, o que é um desígnio de décadas.
Foi solicitado um parecer a um ex-Director do Departamento de Geotecnia do LNEC, o Prof. Gomes Coelho (que não está aposentado, está no activo, o que aconteceu foi que deixou o LNEC). Segundo este parecer, não há agravamento de condições pelo facto de o Museu mudar dos Jerónimos para a Cordoaria (de Algés até Vila Franca de Xira, na zona ribeirinha, há sempre riscos). Mais, a Cordoaria Nacional tem uma estanquicidade e uma invulnerabilidade maiores do que o Mosteiro dos Jerónimos, que tem aqueles grandes vãos góticos em vidro, etc., pelo que, em caso de inundações, até tem mais estanquicidade o edifício da Cordoaria Nacional, que sempre se portou muitíssimo bem nos seus 200 anos de vida, durante os quais ocorreram vários sismos em Lisboa.
Foi este o parecer: efectivamente, não há um agravamento relativamente à situação actual. Isto fez-nos «fechar» esta decisão. E do que se trata, neste momento, é de preparar um programa museológico, um programa de ocupação, de forma a que se lancem os concursos públicos necessários, de arquitectura, de especialidades, de reforços de fundações, de sondagens, de tudo isso, e que, prevemos, entre em obra no próximo ano, em 2011.
É isto o que se passa relativamente à localização do Museu Nacional de Arqueologia no actual edifício da Cordoaria Nacional.
São estes os esclarecimentos que pretendia dar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, começo por cumprimentá-los e por dizer que, dado as questões concretas que temos para colocar serem muitas e o tempo disponível para o fazer ser pouco, irei, nos próximos dias, entregar um conjunto de perguntas escritas ao Governo relativamente a matéria orçamental. Assim sendo, deixo aqui um apelo a que o Ministério responda ainda em tempo útil, para que essas respostas sejam consideradas ainda no processo de discussão orçamental.
Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, a avaliação que fazemos deste orçamento é que ele está adequado às perspectivas políticas que o Governo tem. Só que, em nosso entender, essas não são perspectivas correctas relativamente à política cultural. Consideramos que estamos perante um orçamento de desinvestimento do Estado na Cultura, de desresponsabilização do Estado em matéria de política cultural e de mercantilização de importantes domínios da política cultural. E vou explicar-lhe porquê, Sr.ª Ministra.
Começo pela eterna discussão dos valores do orçamento e das comparações entre o que foi orçamentado e o que está executado. Sobre isto, Sr.ª Ministra, deixo apenas este desafio à Sr.ª Ministra e a todos os membros do Governo: analisem as intervenções na Comissão de Ética da anterior Ministra da Cultura, pois ela explicou muito bem a razão pela qual estas comparações não podem ser feitas entre orçamentos previstos e orçamentos executados. Julgo, pois, que essas intervenções da anterior Ministra da Cultura são muito adequadas a esse respeito.
Mas, Sr.ª Ministra, quero perguntar-lhe se tem, ou não, consciência de que o orçamento que traz a esta Assembleia é, em termos de valor, o segundo mais baixo desde 2005. Aliás, não querendo meter-me nessa «guerra fratricida» entre PS e PSD, tenho de dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que orçamento que nos traz aqui a discussão tem um valor mais baixo do que a execução de 2005. Se a Sr.ª Ministra tiver interesse em analisálo, tenho em meu poder um quadro com esse histórico e posso dar-lhe esses valores.
A verdade é que este orçamento é o segundo mais baixo desde 2005, mas, ainda assim, consegue representar um aumento. E porquê? Porque o mais baixo de todos foi o do ano passado. Portanto, se o do ano passado foi o mais baixo de todos, estaríamos «em muito maus lençóis» se o deste ano fosse ainda pior. Mas a verdade é que este que a Sr.ª Ministra aqui nos traz é o segundo mais baixo desde 2005, o que, julgo, não pode ser motivo de satisfação para ninguém.
Página 65
65 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr.ª Ministra, é preocupante que nos traga este orçamento em concreto por aquilo que ele significa relativamente à desresponsabilização do Estado, o que é confirmado por esta lógica de parcerias que a Sr.ª Ministra ainda hoje voltou aqui a reforçar.
É que, infelizmente, Sr.ª Ministra, o que a experiência nos mostra é que as parcerias, no âmbito da cultura, têm servido para que o Governo atire para outros — principalmente para as autarquias — as responsabilidades que lhe cabem em matéria de política cultural. Dou-lhe apenas dois exemplos, regionalmente limitados, os de São Cucufate e da Gruta do Escoural, onde aquilo a que o Governo chamou de «parcerias» significou, de facto, transferir para as autarquias responsabilidades que anteriormente cabiam ao Governo. E, Sr.ª Ministra, na nossa lógica, esta não é uma boa perspectiva de desenvolvimento da política cultural.
Neste orçamento, ficamos a saber que as parcerias já vão nas paróquias. No entanto, ficamos sem saber qual é a intervenção real do Ministério da Cultura nos vários tipos de parceria estabelecidos, tenham eles a ver com a política da língua, com o património ou com as chamadas «artes e indústrias criativas e culturais».
Mas, Sr.ª Ministra, para nós, são particularmente preocupantes as parcerias em matéria de recuperação do património classificado. E quando se percebe que a recuperação de monumentos como o Palácio de Queluz, a Torre de Belém ou a torre norte da Sé de Lisboa só tem perspectiva de concretização por via do famoso «cheque-obra», isto preocupa-nos.
Ora, a questão que quero colocar-lhe, Sr.ª Ministra, é se entende mesmo que o Estado deve desresponsabilizar-se desta maneira em relação à recuperação do seu património classificado, se acha mesmo que é aceitável que o Estado se demita das suas responsabilidades e passe a fazer depender a recuperação do seu património classificado dos negócios das obras públicas, particularmente através do programa Cheque-Obra.
Ainda sobre este assunto, e já que o Cheque-Obra assume um significado tão importante em matéria de recuperação do património classificado, gostaríamos de saber quais são os valores que estão efectivamente na disponibilidade do Ministério da Cultura para essas intervenções.
A Sr.ª Ministra, em relação às questões do património, deixou aqui uma outra nota, que tem a ver com o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural e que não parece «bater certo» com os números do orçamento.
A Sr.ª Ministra falou em 4 milhões de euros, com origem no Ministério das Finanças, à disposição do Fundo de Salvaguarda. Gostaria que clarificasse esta questão, pois, no Orçamento, nos Serviços e Fundos Autónomos, só há referência a 1 milhão de euros.
Relativamente ao património, gostaria que clarificasse uma outra questão. No orçamento do Ministério da Cultura, refere-se a recuperação do Castelo de Serpa e o projecto Acrópole XXI (de recuperação do Centro Histórico de Évora), mas não há previsão de verbas no Orçamento para nenhuma destas intervenções — para nenhuma delas! De facto, seja no PIDDAC regionalizado, seja nos vários distritos, não há referência a nenhuma delas. Gostaria, pois, de saber se há, ou não, perspectivas de financiamento por parte da administração central destes dois projectos em concreto.
Uma outra questão para nós preocupante, e já aqui hoje referida pela Sr.ª Ministra a propósito de uma pergunta feita pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a ver com uma lógica de concentração de recursos num orçamento que, de si, já é curto, face às necessidades que existem. E esta concentração de recursos, Sr.ª Ministra, é assumida no próprio orçamento por acções que nos entregou, quando se refere que 12% do orçamento do Ministério da Cultura são entregues a 11 fundações. Para nós, Sr.ª Ministra, isto é preocupante, porque entregar 12%, num orçamento que já é curto, a 11 fundações é muito limitador do desenvolvimento de uma política cultural abrangente.
Sr.ª Ministra, ainda é mais preocupante quando, desses 28,8 milhões de euros, 3,5 milhões são entregues à Colecção Berardo, que é um negócio ruinoso para o Estado.
A questão que quero colocar-lhe é muito simples: qual é a perspectiva que a Sr.ª Ministra tem relativamente a este financiamento da Colecção Berardo? Isto porque se a Sr. Ministra tiver em conta o historial dos últimos anos relativamente a esta colecção vai perceber que o Ministério da Cultura está a financiar uma colecção que foi dada como garantia a uma instituição bancária num processo de crédito para aquisição de participações sociais num banco. A Sr.ª Ministra sabe que o que se está a fazer é — ainda por cima com direito de preferência na aquisição da Colecção — financiar uma colecção que foi dada como garantia ao próprio
Página 66
66 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Estado. Isto é um negócio ruinoso, Sr.ª Ministra. Por isso, preocupa-nos que 3,5 milhões se destinem à Colecção Berardo.
Uma outra questão que quero colocar — já tenho pouco tempo, pelo que colocarei as outras questões na segunda ronda — tem a ver com os apoios às artes. Depois das declarações do Sr. Primeiro-Ministro no final da anterior Legislatura ficámos com a sincera expectativa que, deste ponto de vista, houvesse um acréscimo substancial no financiamento do apoio às artes.
O que verificamos, infelizmente, Sr.ª Ministra, é, mais uma vez, a insuficiência das verbas face às necessidades das instituições a apoiar. Em declarações, relativamente à situação concreta do Alentejo, a Sr.ª Ministra manifesta-se insatisfeita com a discrepância existente no que respeita aos apoios previstos para o Alentejo, dizendo que não ficaria nada satisfeita por saber que há uma região do país que, à partida, é condicionada, do ponto de vista dos apoios, e que iria procurar resolver a situação.
Vou colocar duas questões muito concretas, Sr.ª Ministra. Fala-se em 30% do orçamento do Ministério da Cultura para o apoio às artes, pergunto: onde estão previstos estes 30%? Onde está previsto o aumento de 1,627 milhões de euros no apoio às artes? É que, Sr.ª Ministra, nos quadros do PIDDAC, conseguimos encontrar, em relação a 2010, exactamente os mesmos 22,1 milhões euros que existiam em 2009. Portanto, a verba inscrita para o apoio às artes é exactamente a mesma que existia em 2009. Como é que há este aumento?! Onde estão os 30% do Ministério da Cultura?! Esta é uma verba que não conseguimos encontrar.
É certo que o Orçamento do Estado tem muito «gato escondido com o rabo de fora», mas gostaríamos de saber, Sr.ª Ministra, se este será, ou não, um destes casos, porque esta é, obviamente, uma questão que nos preocupa.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, ç, aliás, a primeira vez que questiona,»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Que trocamos impressões!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — » que nos cruzamos nesta situação.
Ora bem, vou tentar responder a todas as questões.
Começo pelo desinvestimento. O Sr. Deputado diz que este é o segundo orçamento mais baixo dos últimos quatro anos. Mas será, certamente, o orçamento que irá fazer a diferença. Conte connosco para isso.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Esperemos que sim!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Relativamente ao Cheque-Obra, já foram investidos 2 milhões e temos ainda no Fundo 2 milhões para investir. Aliás, já estão identificadas três obras, cuja intervenção será feita por esta via.
No que toca ao Fundo de Salvaguarda, está inscrito no orçamento do Ministério da Cultura 1 milhão e temos mais 4 milhões que virão, portanto, nesta plataforma interministerial de que há pouco falei, do Ministério das Finanças. Portanto, o Fundo é constituído por 5 milhões, 1 já se encontra no orçamento, os outros 4 virão do Ministério das Finanças.
Relativamente às fundações, não há dúvida de que 12% do nosso orçamento é uma percentagem bastante elevada, mas olhemos para as fundações e vamos ver, com transparência e seriedade, se essas fundações não são um dos principais alicerces da actividade de apoio às artes que está a decorrer no nosso país; estou a falar do CCB, da Casa da Música, de Serralves, do, mais recentemente, Museu Berardo e de muitas outras fundações. Não quero fazê-lo gastar o seu tempo, mas temos uma lista de pequenas fundações, onde grande parte destes 12% também se distribui, para além destas grandes fundações. Mas a verdade é que estas grandes fundações foram consideradas, e, do meu ponto de vista, justamente, como alicerces fundamentais para a aplicação de uma determinada política cultural, e esta política cultural é feita também por esta via, pela via das fundações.
O que está neste momento determinado é o seguimento que estamos a dar; e cá estaremos para cuidar de que este investimento continue a ser bem aplicado e atinja os objectivos que estão estatutariamente previstos
Página 67
67 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
e que constituem, portanto, este eixo fundamental da política cultural e da dinamização cultural do Ministério da Cultura.
Relativamente à Colecção Berardo, o que estamos a financiar por via deste acordo, desta fundação e deste protocolo entre o Ministério da Cultura e a Fundação Berardo é o espaço de exibição da colecção, para além dos 500 000 €/ano para a aquisição de novas obras. Mas o grosso do nosso investimento, quer por parte do desvio de verbas do CCB (Centro Cultural de Belém) alocadas a este projecto, que, apesar de tudo, ainda é bastante significativo (é à volta de 1,8 milhões o que o CCB gasta com a alocação da colecção naquele espaço), mais os 3 milhões que o Ministçrio da Cultura paga para este projecto» No todo, estamos apenas a sustentar e a financiar a exibição da Colecção, e, portanto, não estamos, neste momento, a financiar a Colecção em mais do que estes 500 000 €/ano para a aquisição de novas peças.
A verdadeira questão vai colocar-se dentro de três ou quatro anos, em 2015, a altura em que tudo isto tem de ser renegociado, reavaliado; nessa altura o Estado terá de tomar a decisão, terá de dizer se quer ou não adquirir a Colecção, que está orçamentada em 360 milhões, se a memória não me falha, ou se pretende continuar com esta ligação por via de outro protocolo, eventualmente noutros termos, ou até mesmo por via da continuação dos termos que estão em vigor.
Portanto, é um problema que terá de ser encarado muito seriamente em 2015 e só espero que tenhamos outras circunstâncias financeiras e económicas, que o nosso país esteja numa dinâmica, e estará com certeza, que nos permitam tomar uma decisão baseada em critérios do quão importante aquela colecção pode ser para o nosso país e não meramente em questões como a de se temos ou não dinheiro para a pagar. Temos de pensar também na importância que aquela colecção possa vir a ter para o nosso país, mas esta é uma decisão que, neste momento, não me preocupa, porque tenho outras preocupações mais urgentes.
Quanto ao apoio ao Alentejo, a forma como queremos minorar este desfasamento entre a verba que é aplicada no Alentejo e no resto do país, devo dizer que vamos encarregar as Direcções Regionais do Alentejo, do Norte, do Algarve e do Centro de preparem uma temporada das artes, onde participarão, quase exclusivamente, os artistas e as entidades locais, para ser mais uma fonte de rendimento e, simultaneamente, mais uma estrutura de oferta cultural, paralela, portanto, àquelas que já estão em curso.
O Alentejo muito particularmente preocupa-me porque não gostei de constatar esta debilidade, digamos assim, nesta região do país, face à distribuição das verbas. A explicação que me foi dada pela DGArts (Direcção-Geral das Artes) é séria e rigorosa e respeita o número de agentes culturais que estão activos naquela região. Portanto, se todos eles, este ano, beneficiassem outra vez dos apoios na medida da sua actividade, dos fundos que a sua actividade necessita, provavelmente o valor não iria ser muito superior. Tem a ver também com a dimensão e com a extensão da actividade artística no Alentejo.
No entanto, comprometi o Ministério da Cultura e a minha pessoa relativamente à necessidade de se programar uma temporada local distribuída pelas várias direcções regionais, com vista a criar mais uma oportunidade quer de rendimento quer de oferta cultural para essas regiões.
Inquiriu-me sobre o orçamento da DGArtes. A verdade, Sr. Deputado, é que a DGArtes teve este ano uma subida, que, apesar de tudo, não foi despicienda, passou de 59,9 para 71,1. Estamos a falar de uma subida considerável e só relativamente aos apoios anuais houve um aumento de 300 000 euros. Nos apoios pontuais houve um aumento de 800 000 euros. Portanto, nós fizemos um aumento.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas os quadros mostram os mesmos valores!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Deputado, vou consultar os meus quadros»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, tenho todo o gosto em fazer chegar-lhe estas cópias dos quadros do PIDDAC, que têm exactamente o mesmo valor em 2010 e em 2009, ou seja, 22 100 000 euros, para o apoio às artes!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Não estou a encontrar os quadros e não vou agora perder mais tempo, mas daqui a nada já procuro e, nessa altura, dar-lhe-ei a resposta.
Sr. Deputado, a subida que aqui está consignada é uma subida efectiva e já vou demonstrá-lo com os números.
Página 68
68 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Penso que o Sr. Deputado não tem mais nenhuma questão, a não ser que haja questões relativas ao património que possam ser respondidas pelo Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Muito brevemente, quanto à Acrópole XXI, está prevista uma participação do Ministério da Cultura de 380 000 euros, em Évora, quer no museu, quer na biblioteca pública.
São dois dos projectos que estão envolvidos no programa Acrópole XXI.
Relativamente às observações do Sr. Deputado, que são sempre bem-vindas e pertinentes, tais como as do Bloco de Esquerda e do PCP, constato, com algum conforto, que não vem referido o recorrente apelo aos recursos humanos, e convinha sublinhar o esforço que está a ser feito no reforço dos recursos humanos, nomeadamente na área dos museus, pois é um facto. E, portanto, congratulo-me com isto.
Quanto às questões de transversalidade, é exactamente aquilo que acaba de dizer. As grutas do Escoural e de São Cucufate são dois projectos que foram criados na década de 90, no âmbito do POOC, no Ministério da Cultura, em que não houve transversalidade. Ou seja, foram projectos do IPPAR (Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico), na altura, e, portanto, não houve nenhum programa, nem contratoprograma com a autarquia, nem envolvimento» Foram lá feitos uns centros interpretativos, que, por razões diversas, deixaram de ter pessoal e que eram apoiados pelos programas operacionais do Instituto de Emprego, e que estavam fechados — lembro-me de em 2005, quando cheguei ao IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico)» Neste momento, muitos desses centros interpretativos, com o concurso das autarquias, estão a funcionar e abertos ao público. Não se trata de o Estado passar para as autarquias a responsabilidade do que não quer assumir; trata-se, e isto deve ser visto por todos, é de uma apropriação lógica, legítima e histórica, que cada vez será maior (e o PCP é, de certeza absoluta, sensível ao que estou a dizer), do património pelo poder local.
Assim, o Ministério da Cultura tem de estar no cerne de toda esta mudança, de toda esta transição, tem de ser o catalisador, e, na área do património, isto acontece todos os dias, ao contrário do que se passava no século XX.
Portanto, neste caso específico, de centros interpretativos, etc., tudo aquilo que está a ser programado no QREN (e, felizmente, o QREN impõe a parceria, o que, penso, é um bom hábito para os portugueses) passa por uma negociação e por uma co-responsabilização do Estado com o poder local.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, se me dá licença, gostaria de dizer ao Sr. Deputado que já encontrei a tal informação, que é tão pequenina, mas consegui encontrá-la.
De facto, nós temos 31 998 212 euros para a DGArtes, o que significa que se passou de 22 milhões para quase 32 milhões. Há, portanto, um acréscimo significativo, 23% de aumento, no apoio às artes.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à segunda ronda de perguntas, para a qual cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos, sendo a resposta conjunta.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria.
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, Sr. Secretário de Estado, quero aqui também dar o meu contributo para esta questão orçamental, dizendo concretamente que penso que a Sr.ª Ministra tinha no seu poder e no seu conhecimento alguns argumentos para que este orçamento da cultura pudesse ser maior do que efectivamente se verificou vir a ser.
O conceito de «indústrias criativas» (aliás, um conceito que tem estado na base de diversos estudos internacionais e nacionais) integra um alargado leque de actividades que, normalmente, se apresentam com grande diversidade entre si e que têm uma característica que lhes é comum: estão suportadas na imaginação e na criatividade individual, associadas à habilidade e ao talento e (muito importante no contexto actual que vivemos) produzem riqueza e postos de trabalho através da geração e da exploração de novos conteúdos e propriedade intelectual.
Página 69
69 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A economia criativa é motor de inovação, de progresso, garante patamares de desenvolvimento humano e de melhoria da qualidade de vida das populações, crescimento das exportações e contribui para a inclusão social, para a diversidade cultural e para o desenvolvimento intelectual.
De acordo com um estudo produzido para a Comissão Europeia, em que se fala também obviamente de Portugal, este sector contribuiu com 1,4% do PIB em 2003, correspondendo a mais de 6000 milhões de euros.
Em 2004, as indústrias criativas, em Portugal, empregavam 76 000 pessoas. Se a este sector associarmos o turismo cultural, o volume de emprego total atinge as 116 000 pessoas.
No entanto, também o Ministério da Cultura, através do seu Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, desenvolveu e apresentou um estudo sobre a dimensão do sector cultural e criativo. Neste estudo, que é mais amplo e mais recente, apresentaram-se dados interessantes, que podem revelar-se surpreendentes para algumas pessoas, particularmente aqui, na Comissão de Orçamento e Finanças, e que são importantes referir. Em 2006, o sector cultural e criativo foi responsável por 2,8% de toda a riqueza criada nesse ano em Portugal, superando o contributo dado pelas indústrias alimentares, pelas indústrias de bebidas e pelas indústrias dos têxteis e do vestuário. O sector cultural e criativo foi ainda responsável por 127 000 empregos, representando, deste modo, 2,6% do emprego nacional total. O seu contributo no plano do emprego é, assim, superior ao dos sectores da alimentação e bebidas e do imobiliário.
Sr.ª Ministra da Cultura, sabemos que estes dados têm de ser actualizados, sabemos que o período que vivemos é diferente, mas a verdade é que o papel económico da cultura e das indústrias criativas é enorme e os números apresentados comprovam-no. Vários municípios portugueses já há muito que o perceberam e traçaram estratégias de desenvolvimento baseadas precisamente no apoio a estes agentes criativos. Veja-se o caso da região Norte que desenvolveu toda uma estratégia para a criação de um cluster das indústrias criativas, associando desde a Fundação de Serralves à Área Metropolitana do Porto, às autarquias, aos agentes criativos e às empresas, ou seja, um conjunto enormíssimo de forças. É uma área onde precisamos de novas dimensões, de libertar iniciativas criativas, de abrir potencialidades, de gerar capacidade de inovação e de gestão.
Sr.ª Ministra, há uma aposta que tem de ser feita, há um investimento que tem de ser feito, há parcerias com diferentes organizações que têm de ser feitas. E, sinceramente, neste orçamento não se vislumbra esta aposta, não se vislumbra este investimento ou estas parcerias. Existe, de facto, a referência à prioridade. Ela está lá. Mas não se alcançam as medidas que concretizam essa prioridade.
Se este sector criativo, como, de resto, vieram a comprovar os estudos, é tão relevante, Sr.ª Ministra, têm de ser criadas políticas públicas de incentivo. E parece-nos que estes estudos, incluindo o do próprio Ministério da Cultura, não tiveram qualquer impacto na política governamental e, em concreto, no orçamento do Ministério da Cultura, um orçamento que gerou expectativa, mas cujo pequeno aumento, quanto a mim, serve apenas para justificar uma pretensa prioridade e não para o desenvolvimento de uma política cultural efectiva e eficaz para o País, frustrando-se, assim, algumas das expectativas criadas.
Pergunto-lhe, então, Sr.ª Ministra: que impacto é que tiveram estes estudos nas políticas governamentais e que traduções tiveram neste Orçamento? Que políticas públicas de incentivo a este sector estão criadas? Tenho também nota que, no final da anterior Legislatura, o Ministério da Economia e da Inovação e o Ministério da Cultura apresentaram um Fundo Capital Criativo com um capital inicial de 22,5 milhões de euros.
Este Fundo foi criado para colmatar uma falha no financiamento e partilha do risco de projectos inovadores no sector das indústrias criativas e culturais. Este Fundo visava apoiar o aparecimento de novos actores e novos agentes empresariais nas indústrias culturais tradicionais, mas também nas artes performativas e nas indústrias criativas. Ao que julgo saber, este Fundo foi suspenso poucos dias após o seu anúncio. Não nos interessa aqui saber as razões que levaram ao seu cancelamento, mas, Sr.ª Ministra, pergunto: está previsto avançar com este Fundo e para quando? Por último, dado todo o esforço que um conjunto importante (Fundação de Serralves e Área Metropolitana do Porto, que congrega 16 municípios) está a tentar fazer para o desenvolvimento de um cluster de indústrias criativas na região Norte (uma região que está, como sabem, com dificuldades económicas) e sabendo-se que a Comissão de Coordenação para o Desenvolvimento da Região Norte (CCDR-N) teve, nesta matéria, um papel importante, pergunto: podemos ter aqui uma declaração da Sr.ª Ministra de apoio incondicional à criação deste cluster das indústrias criativas na região Norte dado o impacto económico positivo que este cluster pode trazer para aquela região?
Página 70
70 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pereira.
O Sr. Rui Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, começo por a cumprimentar, porque na primeira audição que tivemos nesta Comissão assumiu claramente o compromisso de lutar e fazer todos os possíveis para que o aumento do orçamento da Cultura fosse real no ano 2010, e o orçamento que hoje estamos aqui a discutir vem, de facto, demonstrar que esse compromisso foi cumprido. Podemos, eventualmente, ter mais ambição e considerar que deveríamos ir mais longe, mas o que, na minha opinião, vale a pena sublinhar é o facto de, em contraciclo, numa altura de crise económica e financeira, se conseguir que o orçamento do Ministério da Cultura tenha um crescimento real. E este crescimento real é importante porque deve-se não só ao crescimento estimado de cerca de 12,8%, em relação à estimativa de execução de 2009, como também a outros factores que vêm relevar este crescimento, sendo um deles, e para mim é o mais importante, o crescimento no orçamento de investimento, que é aproximadamente de 15%, face à dotação inicial de 2009 — deixamos aqui a comparação com a estimativa de execução de 2009 — , o que sublinha a importância e o êxito da Sr.ª Ministra no desenvolvimento deste orçamento.
Quero sublinhar uma crítica que aqui foi feita e que tem a ver com a comparação entre o orçamento para 2010 e a estimativa de execução. Tenho aqui também os números, todos temos os números, e a comparação entre o orçamento para 2010 e estimativa de execução é, apesar de tudo, interessante, porque, se formos avaliar a taxa de execução dos orçamentos, numa série de 1995 a 2008, verificamos que as taxas de execução mais baixas não ocorreram no ano de 2004, que foi o ano aqui referenciado, mas em vários anos da gestão de governos PSD/CDS, tendo as duas taxas mais baixas de toda esta série ocorrido, nomeadamente, nos anos de 2002 e 2004.
Há, aqui, claramente, uma perspectiva que convém sublinhar: não podemos avaliar o desenvolvimento cultural apenas pelas boas intenções, pela iniciativa de propor, em sede de orçamento, um pacote financeiro, temos é de avaliar a capacidade política de executar, porque a vontade política vê-se no que se faz, na obra que fica, no desenvolvimento cultural que o Estado consegue induzir em Portugal. E, para isto, é absolutamente essencial vermos qual foi, do ponto de vista real, o investimento do Ministério da Cultura, e, de facto, é lamentável as taxas de execução que existiram nos governos do PSD e do CDS.
Quero ainda referir, Sr.ª Ministra, um outro aspecto, que me agrada sobremaneira neste orçamento e, sobretudo, nas suas intervenções, que tem a ver com a vontade já expressa pela Sr.ª Ministra de mobilizar recursos e fontes de financiamento para além do Orçamento do Estado. Na minha opinião, esta perspectiva é de facto muito importante, porque, quando a Sr.ª Ministra assume a necessidade de estabelecer parcerias e de procurar desenvolver estratégias de financiamento que permitam integrar no sistema de financiamento da cultura em Portugal outros actores, outros agentes, outros financiadores, todos sabemos que este esforço não deve ser exclusivamente do Estado, pois sabemos que há subsectores que têm uma importância cada vez maior no desenvolvimento cultural do País.
Em relação a esta matéria, gostava de sublinhar a importância das autarquias, dos municípios. As autarquias têm hoje a responsabilidade de gerir um grande parque patrimonial e têm uma importância muito relevante sobretudo nas políticas da preservação da memória e do desenvolvimento local, utilizando a cultura como um factor de desenvolvimento.
Neste sentido, Sr.ª Ministra, pergunto: de que forma prevê poder incluir, mobilizar e dinamizar algumas das políticas autárquicas e municipais no sentido de reforçar a estratégia cultural que nos apresentou? O Ministério da Cultura tem assumido, nomeadamente neste orçamento, esta área como uma área importante de mobilização do todo nacional para aquilo que é um desígnio que não pode ser só do Ministério da Cultura, nem do Norte ou do Sul, mas, sim, nacional. Por isso, os municípios têm, de facto, uma importância crescente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, se assim o permitir, vou dividir o tempo atribuído ao CDS-PP com a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
Página 71
71 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Sr.ª Ministra, tenho algumas dúvidas. Ao longo da discussão deste orçamento, o CDS tem insistido muito, tem-se preocupado em saber não só o que está no orçamento mas também o que vai para além do orçamento e que não é tão nítido.
Neste sentido, gostava de fazer-lhe algumas perguntas no que toca às três empresas públicas que desempenham uma importante função na área cultural, tais como o Organismo de Produção Artística (OPART), o Teatro Nacional D. Maria II e o Teatro Nacional São João, porque, para discutirmos de forma séria este orçamento, temos de saber o que se passa. Vi, no Relatório, que serão elaborados com estas três empresas contratos-programa, mas a verdade é que isto já estava no orçamento do ano passado, e até hoje, tanto quanto sei, não existe esse contrato-programa»
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Já existe!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Já existe?
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Já!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pronto.
O que eu gostava de saber é se já há contrato-programa para este ano e que indemnizações compensatórias estão previstas, ou seja, qual é o valor desta dotação. Também gostaria de saber se o valor dessas indemnizações compensatórias está inscrito na despesa total do orçamento do Ministério da Cultura ou se, pelo contrário, está inscrito nas indemnizações compensatórias do Ministério das Finanças, que é o que me parece. Peço-lhe esta desagregação, porque, como sabe, daquele montante muito volumoso é difícil destrinçar o que é destinado à Cultura.
Ainda sobre valor de dotações, verifica-se, relativamente ao Fundo de Fomento Cultural, um grande decréscimo desta dotação. Contudo, consultei o Relatório de 2009 e vi que a dotação inicialmente prevista para 2009 era também de 24 milhões de euros, ou seja, praticamente igual à que está inscrita para este ano, mas a estimativa de execução atinge mais de 31 milhões de euros. Pergunto: o que justificou este grande aumento na execução do orçamento? Estes 24,1 milhões de euros, que estão inscritos este ano, vão ser mesmo assim ou está a prever que haja grandes alterações? Por último, quanto à criação da Casa do Cinema do Porto, uma intenção já várias vezes anunciada, até pelo seu antecessor, e que está novamente neste orçamento, pergunto: que dotação é que está prevista para a criação desta casa do cinema? Quando é que começa a obra ou, pelo menos, para quando a abertura do concurso público, porque, suponho, a obra terá de ser precedida de um concurso público? Sr. Presidente, da minha parte é tudo, se permitir, a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro irá colocar outras questões.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, muito brevemente, apenas para reiterar algumas das perguntas que fiz há pouco, aquando da primeira ronda, e que, confesso, não fiquei cabalmente esclarecida.
Sr. Deputado Rui Pereira, não vale a pena também estar a forçar demais uma realidade que não existe. A verdade é que a vossa vontade, a vontade política do Governo socialista, para o orçamento da Cultura, é de 0,4% do total, e isto tem uma simbologia, isto tem um significado político.
O Sr. Deputado pode falar de uma execução melhor ou menor» Pergunto, Sr.ª Ministra: como ç que reage às declarações recentes da sua antecessora, ex-Ministra Isabel Pires de Lima, sobre este orçamento em concreto, segundo o qual estamos nuns tímidos 0,4% do Orçamento do Estado e, em 2005, estávamos em 0,6%? Este é um sinal decrescente. Sei bem o que é que os senhores, ao longo das várias campanhas eleitorais e dos vários programas eleitorais, têm dito, que era preciso sair do sufoco e do estrangulamento.
Sr.ª Ministra e Sr. Secretário de Estado, confesso que não fiquei esclarecida relativamente aos critérios para o regresso dos museus da rede nacional às autarquias. Quando perguntei se havia critérios, a Sr.ª Ministra disse «sim» com a cabeça, mas, depois, o Sr. Secretário de Estado veio dizer que não, que era
Página 72
72 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
avaliado caso a caso. Posso concluir que o critério é o da avaliação caso a caso? Peço desculpa, mas não fiquei esclarecida.
Julgo que não responderam à pergunta sobre se, antes da apresentação do novo Plano Estratégico dos Museus, foi ouvida a secção de museus do Conselho Nacional de Cultura e qual foi o seu parecer.
O Sr. Secretário de Estado disse que a regulação da área fiscal, ao contrário da elaboração e aprovação do regulamento de trabalhos arqueológicos, no âmbito da regulamentação da Lei do Património, é feita através do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Mas os senhores hão-de ter uma percepção do que está a acontecer, porque, se não (e também lhe devolvo a pergunta), no que se refere ao Estatuto dos Profissionais das Artes do Espectáculos, quem, em última análise, vai decidir e «dar luz verde» a uma alteração da protecção social é o Ministério do Trabalho e da Segurança Social e, antes deste, o Ministério das Finanças.
Também não fiquei esclarecida sobre o ponto da situação, o ponto das conversações, entre o Ministério da Cultura e o Ministério das Finanças/Ministério do Trabalho e da Segurança Social relativamente a uma maior protecção social e a um diferente regime fiscal para os profissionais das artes do espectáculo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, são tantas as perguntas que o Orçamento do Estado me sugere, mas vou repetir, porque nos interessa muitíssimo, uma pergunta que fiz e que é muito simples e para a qual não obtive resposta.
Como saberão, o Bloco de Esquerda pediu uma audição precisamente para falar do Plano Estratégico para os Museus, pelo que não poderíamos deixar de falar deste tema no âmbito do Orçamento.
Perguntamos: o Plano Estratégico para os Museus para o século XXI ainda está em aberto, ou não? Ou seja, o Conselho Nacional de Cultura vai debatê-lo e terá uma palavra activa, ou a reactivação do Conselho Nacional de Cultura é um mero exercício de retórica? Gostaria de ver estas perguntas respondidas, porque me parecem essenciais.
Sobre o património, gostaria de falar sobre os equipamentos ligados às artes, nomeadamente às artes cénicas.
O Teatro Nacional São João anunciou, no início desta semana, que a sua programação internacional está em risco, ao que sei, será cancelada, está também em risco a participação em programas co-financiados e a programação e manutenção dos três espaços, o espaço do próprio Teatro Nacional São João, o do Teatro Carlos Alberto e o do Mosteiro de São Bento da Vitória.
Como sabem, a indemnização compensatória do Teatro Nacional São João mantém-se nos mesmos valores. O Teatro Nacional São João tem o mesmo montante para trabalhar há mais de cinco anos, mas, neste período de tempo, triplicou o número de espaços, a equipa não reduziu, continua a ser a mesma, e agora tem de gerir e programar três espaços. Nunca foi posto em causa a qualidade da programação do Teatro Nacional São João, nunca foi posto em causa o rigor da sua gestão e não se percebe o por quê deste injusto asfixiamento de uma instituição tão importante para a cidade do Porto, mas também para a região Norte e para o País.
Pergunto, Sr.ª Ministra: será aumentada a indemnização compensatória do Teatro Nacional São João? Sim, ou não! Também quero falar da Companhia Nacional de Bailado. Confesso, ao contrário de outras bancadas, que não percebo muito bem por que é que o OPART é assim tão importante e para que serve exactamente, mas, um dia, a Sr.ª Ministra terá ocasião de mo esclarecer.
De todas as formas, a Companhia Nacional de Bailado, desde que existe o OPART, tem vindo a ser asfixiada, tem cada vez menos circulação nacional e, praticamente, não tem circulação internacional. O Teatro Camões, que era suposto ser o teatro da dança, na realidade, nunca teve orçamento para funcionar autonomamente; não é o teatro da dança, aluga-se o teatro para eventos publicitários, para estúdios de televisão. Os bailarinos ensaiam em salas sem ventilação, sem janelas, e soubemos agora que os bailarinos estão a ser chamados individualmente por um consultor externo chamado pelo OPART para dizerem se querem, ou não, reconverter a sua carreira.
Portanto, estamos muito preocupados com o estado da Companhia Nacional de Bailado.
Página 73
73 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Como sabe, com a extinção do Ballet Gulbenkian, a Companhia Nacional de Bailado é o garante de que temos programação de qualidade deste género no território nacional. Portanto, queremos saber se a Sr.ª Ministra dá garantias de que a Companhia Nacional de Bailado vai continuar a trabalhar e em que condições.
Por último, os teatros e os cineteatros espalhados por todo o País são equipamentos muito importantes, que dão acesso, em todo o território, às artes do espectáculo, mas, neste momento, não têm regras, nem equipas, nem funcionamento assegurado. Existem muitas salas de espectáculo subaproveitadas, equipamentos técnicos parados por falta de equipa que os saiba utilizar, profissionais e público em risco, porque estão em salas onde nem sequer existe direcção técnica e, portanto, não se sabe os riscos que as pessoas correm. Temos espaços que estão a desbaratar recursos, outros que estão vazios, temos espaços completamente sujeitos à lógica da sala de visitas do poder local. No entanto, também temos maravilhosos exemplos — é preciso dizê-lo — em todo o território, que constituem uma verdadeira frente de democracia cultural e da qualidade da programação, os quais devem ser premiados e encorajados.
Porém, é preciso que estes exemplos de qualidade existam em todo o território, e para isto é preciso haver uma solidariedade que é garante de coesão territorial, de cidadania e de acesso à cultura de toda a população, na dupla vertente de promoção e de fruição.
Portanto, é preciso que o Estado central tenha um papel activo nestes teatros e cineteatros, não substituindo a autarquia mas participando financeiramente, e, portanto, tendo a capacidade de exigir contrapartidas do ponto de vista da autonomia, da programação, da sua pluralidade, das equipas técnicas, da sua qualidade e do seu funcionamento.
Portanto, Sr.ª Ministra, a minha última pergunta é a seguinte: teremos, nesta Legislatura, uma rede de teatros e cineteatros neste País?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, relativamente ainda ao apoio às artes, apelo a que nos distribua, se tiver, algum documento que demonstre este acréscimo das verbas disponíveis para o apoio às artes, porque estive de novo a consultar os dados do Orçamento do Estado e os números não batem certo. Os valores dos orçamentos privativos da Direcção-Geral das Artes e dos quadros do PIDDAC são exactamente iguais aos de 2009.
Portanto, faço, hoje, este renovado apelo para esclarecer esta questão, e se, eventualmente, tiver algum documento de suporte que possa distribuir, agradeço que o faça, pois é fundamental que esta questão fique esclarecida, até porque, de acordo com as informações que vários agentes culturais nos têm feito chegar, a abertura dos concursos refere-se precisamente aos mesmos montantes. Assim, gostaria que nos confirmasse se assim é.
Sr.ª Ministra, passo a uma questão relacionada com as entidades públicas empresariais e a adopção destes modelos de gestão.
Prevê-se no Orçamento do Estado, pela segunda vez consecutiva, a celebração de contratos-programa para o triénio 2010/2012. Questionámos o anterior Ministro da Cultura, que não nos deu resposta, e gostaríamos de saber qual a avaliação da Sr.ª Ministra desta opção e da constituição das entidades públicas empresariais, não só do ponto de vista económico mas, sobretudo, do ponto de vista do cumprimento dos objectivos de política cultural, porque, Sr.ª Ministra, temos as maiores reservas quando a isto.
Não acompanhei inteiramente a abordagem aqui feita relativamente à questão do OPART, mas já anteriormente manifestámos esta preocupação ao ex-Ministro da Cultura e, agora, tendo em conta que houve alteração da tutela, gostaríamos de manifestá-la a si pessoalmente. O que se passa com a Companhia Nacional de Bailado é sério e é grave, porque o que está em causa com a integração da Companhia Nacional de Bailado no OPART pode constituir a desvirtuação do projecto artístico e pôr em causa a existência de uma companhia nacional de bailado de repertório clássico.
Se a Sr.ª Ministra estiver atenta às alterações que a Companhia Nacional de Bailado tem sofrido no seu funcionamento, nas suas produções, reparará que há um privilégio à dança contemporânea, que tem a ver não só questões de direcção artística mas também com os objectivos e a missão de política cultural atribuída àquela instituição.
Página 74
74 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Isto preocupa-nos quanto a um aspecto que aqui já foi abordado, que tem a ver com os recursos humanos da Companhia Nacional de Bailado, porque, Sr.ª Ministra, as chamadas individuais dos bailarinos, relativamente às suas perspectivas de carreira, são, sobretudo, preocupantes se a Sr.ª Ministra reparar na norma do regime laboral aprovado na anterior Legislatura, naquilo que tem a ver com a reconversão. De acordo com a lei aprovada exclusivamente com os votos do Partido Socialista nesta Assembleia, aqueles bailarinos podem ser obrigados a ser reconvertidos, por exemplo, em vendedores de bilhetes e, se não o aceitarem, podem ver os seus contratos rescindidos por justa causa.
Isto é preocupante, Sr.ª Ministra, num quadro em que o Ministério da Cultura, na Legislatura anterior, optou por estes modelos de gestão, queremos saber qual a avaliação que o Ministério da Cultura faz particularmente em relação a esta questão, ao cumprimento dos objectivos de política cultural que estão adstritos a cada uma destas entidades.
Esta é uma questão muito séria à qual entendemos que o Ministério deve dar muita atenção.
Sr.ª Ministra, uma outra questão tem a ver com dois planos estratégicos, o primeiro é o Plano Estratégico de Cultura para o Algarve, previsto no orçamento. Gostaríamos de saber o que justifica que a região do Algarve tenha um plano estratégico de cultura e que as outras regiões do País não tenham. O que distingue assim tanto a região do Algarve em relação às outras regiões do País, em termos de necessidade de haver um plano estratégico de cultura.
O segundo é o Plano Estratégico dos Museus para o século XXI. Sr.ª Ministra, não vou chamar «dança das cadeiras das direcções dos museus», mas preocupa-nos que haja directores de museus demitidos pelo Ministério ou directores que apresentam a sua demissão ao Ministério por entenderem não ser admissível, nem aceitável, um novo modelo de gestão com os objectivos de transformação (e este era o aspecto de mercantilização de que falámos há pouco) dos museus em pontos de angariação de financiamento privado, particularmente mecenático.
Sr.ª Ministra, isto preocupa-nos, tal como nos preocupa a questão dos museus da zona de Belém e do Museu do Côa. Qual é o modelo de gestão definido para o Museu do Côa? Em relação aos museus de Belém, tal como, na Legislatura anterior, plasmámos no nosso projecto de resolução, o problema não está em saber qual é a «guerra que se vai, ou não, comprar» com este ou aquele director de museus mas, sim, em saber por que é que foi o Ministério da Economia a impor a construção do Museu dos Coches, quando há, até do ponto de vista das várias sensibilidades que existem em relação aos directores de museus nacionais, mais vantagens em serem outros museus objecto desta possibilidade.
Até mesmo no que respeita ao projecto de transferência do Museu Nacional de Arqueologia, e a Sr.ª Ministra sabe das muitas resistências que este projecto continua a sofrer, por que é que o Ministério não repondera este projecto? Por que é que o Ministério da Cultura há-de ficar arredado da definição das orientações estratégicas em relação à matéria de política cultural e há-de ser o Ministério da Economia a ditar as regras? Era isto que gostaríamos de ver o Ministério da Cultura a fazer, Sr.ª Ministra.
O Sr. Presidente: — Nesta segunda ronda, cada Deputado dispõe de 2 minutos para a formulação das perguntas, seguindo-se a regra da rotatividade.
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Celeste Amaro.
A Sr.ª Celeste Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, se me é permitido, começo com uma rectificação: o orçamento do último governo do PSD, elaborado em 2004, foi executado pela ex-Ministra da Cultura, Dr.ª Isabel Pires de Lima, a partir de Abril. Portanto, a execução de 2005 já foi feita por um governo do PS, pelo que a baixa execução não é da responsabilidade do PSD.
Depois, Sr.ª Ministra, todos nós ficamos muito contentes pela criação do Conselho Nacional da Cultura, como é lógico, independentemente das personalidades que foram escolhidas pela Sr.ª Ministra.
No entanto, no artigo 14.º do Decreto Regulamentar n.º 35/2007 fala-se em despesas de funcionamento.
Sei que é algo um pouco comezinho, mas, como estamos a discutir um orçamento do Estado em situação de crise, gostaria de saber quanto é que nos vai custar este Conselho Nacional da Cultura, que é meramente consultivo. Será que estas personalidades se disponibilizaram para, graciosamente, pertencerem ao
Página 75
75 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Conselho? De qualquer maneira, as suas despesas de deslocação e de funcionamento — conforme o artigo 14.º — são da responsabilidade ou irão sair do gabinete do membro do Governo.
Por último, porque não posso falar muito mais tempo, fico muito satisfeita quando a Sr.ª Ministra fala na transversalidade, porque, na última vez em que nos encontrámos, eu disse que a cultura devia ao turismo, enquanto a Sr.ª Ministra dizia que era o contrário. Muito bem! Nesta questão do Deve e Haver, julgo que ficam quites, uma vez que o Sr. Ministro da Economia irá dar-lhe 31 milhões de euros da área da cultura, que vêm, como todos sabemos, do dinheiro do jogo. Portanto, esperemos que quem ganhe nesta transversalidade seja o País e os turistas que nos visitam.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, começo por cumprimentá-la e por dizer que vou colocar-lhe quatro questões.
A primeira questão tem a ver com as transferências financeiras para várias fundações, Casa de Serralves, CCB, Casa da Música, etc. Penso que é uma modalidade acertada, se se tiver em linha de conta que os anos passam e as transferências financeiras continuam a ser, do ponto de vista nominal, rigorosamente iguais às que sucediam anos atrás. Por exemplo, a Casa da Música tem 10 milhões em 2010, e tinha 10 milhões em 2006.
Ó Sr.ª Ministra, sem querer puxar os números para uma discussão cultural, mas, sem dinheiro, não há cultura, chamo a atenção para o facto de isto representar, no final de 2010, uma transferência de 9,2 milhões de euros, isto é um corte real de 800 000 euros. Quero sensibilizá-la para isto, porque há que começar a entender que o tempo passa e estas transferências têm de ser aumentadas, quanto mais não seja — já não irei para mais — , da inflação prevista, o que significaria que a Casa da Música deveria receber não 10 milhões mas, sim, 10,9 milhões de euros.
A mesma questão das indemnizações compensatórias relativamente ao Teatro Nacional do Porto, e ainda ontem lhe dirigi uma pergunta sobre esta matéria. Aqui acontece o mesmo problema: em 2010, a indemnização compensatória representa menos 500 000 euros, em termos reais, e não foi apenas a internacionalização, como disse a Sr.ª Deputada Catarina Martins, há, de facto, uma intenção da Presidente do Conselho de Administração de reduzir, substancialmente, o número de espectáculos. Ora, isto não é bom para o panorama cultural nacional; não é do programa cultural do Porto, nem da região Norte.
A terceira questão tem a ver com a recuperação da Casa das Artes. A Sr.ª Ministra, há pouco, disse que iria fazer uma dotação de 500 000 euros. Ora, a recuperação da Casa das Artes está intimamente ligada com a casa do cinema do Porto, de cuja criação se fala. Chamo a atenção para uma coisa, Sr.ª Ministra: não pode ser criada ou instalada uma casa de cinema sem que esteja concluída a recuperação da Casa das Artes.
Como é que vai compatibilizar a recuperação patrimonial da Casa das Artes em tempo útil, para, em 2010, ter concluído o processo de instalação da casa do cinema?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já ultrapassou o seu tempo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Finalmente, se o Sr. Presidente me der licença, há um problema pendente,»
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que formule apenas a pergunta.
O Sr. Honório Novo (PCP): — » que ç o das indemnizações relativas aos concursos de apoio ás artes de 2001 e 2004. Quanto ao de 2001, foram fixadas as indemnizações pelo tribunal; em 2004, há uma condenação do Ministério da Cultura pelo tribunal. Pergunto, Sr.ª Ministra: vai adoptar a mesma estratégia, de deixar que seja o tribunal a fixar indemnizações ridículas, passados 10 anos sobre o assunto, ou vai adoptar um critério efectivo de negociação que fixe indemnizações reais e úteis para os grupos?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Venda.
Página 76
76 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar a Sr.ª Ministra da Cultura e o Sr.
Secretário de Estado.
Sr.ª Ministra, na sua intervenção de há pouco, registei a forma como valorizou o contributo da cultura com o turismo. De facto, o turismo é hoje, reconhecidamente, um excelente veículo de transmissão dos nossos valores culturais, os quais assumem importância para a competitividade do próprio sector.
Portanto, conscientes deste valor acrescentado que estes dois sectores económicos têm para o desenvolvimento da economia do País, a Subcomissão de Turismo, na passada Legislatura, concretamente em Maio de 2009, promoveu uma conferência subordinada ao tema «Economia do Turismo e da Cultura».
Tivemos, aliás, o prazer de contar com a presença do Sr. Secretário de Estado, na altura como Presidente do IGESPAR, que, precisamente, nos veio ajudar a reflectir sobre a importância do património no desenvolvimento do turismo local e regional.
Neste enquadramento, gostava que a Sr.ª Ministra, se pudesse, desenvolvesse melhor os dois programas que vêm mencionados a págs. 213 do Relatório do Orçamento do Estado, que falam da implementação da Rede de Cidades e Mosteiros Portugueses, cujo timing é 2009-2012, e do protocolo de colaboração com a Conferência Episcopal Portuguesa na Rota das Catedrais Portugueses.
Espero, pela consideração que tenho pelo Sr. Deputado João Oliveira, que não tenha sido a este protocolo que, há pouco, se referiu depreciativamente como «o acordo das paróquias».
O Sr. João Oliveira (PCP): — O quê?! Eu não falei em paróquias!
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Falou, falou! Não sei se foi sobre isto, mas»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Falei em parcerias com paróquias!
A Sr.ª Teresa Venda (PS): — Pergunto, Sr.ª Ministra, se nos pode dar, então, uma informação mais pormenorizada destes programas.
Invoco, nomeadamente, o projecto, que será o grande tema de 2012, «Guimarães — Capital Europeia da Cultura 2012», porque penso que estas redes, se estiverem estruturadas, serão, de facto, uma valorização do nosso património cultural, como veículo de transmissão, na publicidade que vai ser dada ao nosso território no ano deste grande evento.
Gostava também de registar que, do ponto de vista quer do turismo quer da cultura, consideramos a importância da valorização do factor patrimonial e da transmissão dos nossos valores como um factor positivo de desenvolvimento do nosso território mais profundo e a nível de toda a mancha territorial, potenciando, assim, o afastamento daquelas regiões tradicionais — Algarve, Lisboa e Madeira — e a criação de novos pontos de interesse turístico em Portugal. E, neste aspecto, turismo e cultura têm, de facto, de entrosar-se.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Raquel Coelho.
A Sr.ª Raquel Coelho (PSD): — Sr. Presidente, a Sr.ª Ministra da Cultura disse que o sonho é quando se concebe uma situação ideal. De facto, disse o poeta: «Pelo sonho é que vamos». E é grave quando não deixamos de realizar aquilo que sonhamos mas quando deixamos de sonhar aquilo que podemos realizar.
Nesta medida, permita-me, Sr.ª Ministra, que a felicite pelo seu espírito optimista e criativo, próprio de uma mulher das artes, para que, com tão parco orçamento, possa, de facto, fazer, executar,»
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — É preciso sonhar muito!
A Sr.ª Raquel Coelho (PSD): — » apesar de, nas palavras do Sr. Secretário de Estado, não ter um orçamento «gordo» ou «engordurado».
A Grécia é conhecida pelos maus motivos, mas tem um homem que a consagra a nível mundial, que V.
Ex.ª conhecerá muito melhor do que eu: Lambis Vassiliadis. Espero que a Sr.ª Ministra, protagonista desta pasta tão nobre, seja capaz de inverter a imagem negativa que Portugal tem vindo a consubstanciar no
Página 77
77 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
mundo, por tantos óbvios e conhecidos motivos, e consiga, de facto, colocar Portugal no panorama da cultura, no desempenho das suas nobres funções nesta área.
Após esta introdução, passo às perguntas muito concretas.
Analisando as orientações estratégicas, por domínio de intervenção, para o património, verificamos o seguinte: prevêem-se intervenções na requalificação e manutenção do património classificado de uma forma generalizada, não se definindo levantamentos de prioridades; as intervenções, aparentemente dirigidas a imóveis mais específicos, recaem em bens afectos às direcções regionais de cultura das regiões Centro e Sul; o património a Norte é englobado de uma forma que me parece exageradamente abstracta — património religioso de Entre Douro e Minho e o leste transmontano.
Pelo que, no meu entender, o mesmo será dizer: Ponto um, prevêem-se intervenções no património religioso apenas para o Norte de Portugal, mas não são identificados os locais e quais os monumentos. Refira-se que, no Norte, a totalidade do património classificado representa cerca de 35% do total nacional.
Ponto dois, não se identificam, nem se hierarquizam, os principais projectos estruturantes, que traduzem opções estratégicas de base territorial regional.
Ponto três, não se determinam os recursos-âncora nos diferentes territórios.
Tendo o Ministério da Cultura por missão a definição e execução de uma política global para área da cultura nos domínios da salvaguarda e valorização do património cultural e integrando na sua estrutura orgànica serviços centrais, como o IGESPAR,»
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, formule as perguntas para concluir.
A Sr.ª Raquel Coelho (PSD): — » e serviços perifçricos, como as direcções regionais de cultura, questiona-se: na prática, qual o tipo de participação das direcções regionais da cultura relativamente aos projectos de carácter regional e intermunicipal, designadamente as redes temáticas de interpretação e fruição, sustentadas numa estratégia de ordenamento do território e, simultaneamente, como instrumento de protecção e salvaguarda de bens e envolventes, como o caso da Rota do Românico do Vale do Sousa? Que políticas existem para o património classificado, que não tem qualquer tipo de afectação, isto é, nem estão afectos ao IGESPAR nem ás direcções regionais de cultura,»
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Raquel Coelho (PSD): — » quanto às intervenções de protecção e salvaguarda?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, começo por cumprimentá-la, com toda a simpatia, pois tenho muito gosto em vê-la aqui, neste debate orçamental.
A minha pergunta muito concreta é sobre o Museu do Côa. Trata-se de uma unidade que esteve para ser inaugurada antes das eleições, foi isto que foi prometido às populações daquela região, mas, naturalmente, isto não foi possível, era de facto» Eu visitei as obras e faltava uma grande parte da zona museológica, com todos os instrumentos tecnológicos e pedagógicos que ali vão ser instalados. De qualquer maneira, as grandes questões de fundo que nesse momento se punham continuam a pôr-se, e a principal é saber qual é o modelo de gestão que aquela unidade vai ter. É uma unidade que vai ter de congregar a actividade, até aqui, do Parque com a actividade do Museu, porque só assim é que, na nossa opinião, faz sentido, tem de estar inserida regionalmente, aproveitando sinergias de outras unidades que ali existam, mas, certamente, verá pervertido, pelo menos em parte, o seu objectivo se se avançar, tal como se tem vindo a falar na região e no País (e falava-se disso na Legislatura anterior), para um modelo de gestão em que o sector privado tenha um papel muito relevante. É evidente que têm de se incluir nesta gestão as autarquias e as entidades regionais públicas que têm um papel relevante na região, mas não pode ser um museu em que o Estado tenha um papel secundário e que, de alguma forma, esteja numa segunda divisão em relação à Rede Nacional de Museus.
Página 78
78 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Penso que não é esta a forma como ele foi concebido, não está de acordo com a sua importância científica, cultural, económica e até turística e com o seu impacto na região.
Portanto, é necessário clarificar rapidamente qual vai ser o modelo de gestão, defendendo nós que o Estado deve ter um papel preponderante na sua gestão, independentemente de outras parcerias.
Gostaria também de saber qual é, neste momento, o prazo previsto para a sua abertura.
Vou terminar, Sr.ª Ministra, com a seguinte pergunta: quando é que vamos resolver, em termos de recursos humanos, a questão do aumento suficiente não só para dar resposta à abertura do Museu mas também para pôr fim à situação de extrema precariedade, que se arrasta ao longo de anos e que se mantém, para muitos dos profissionais do Parque, que também estão ligados ao Museu, designadamente na área da arqueologia mas também noutras, que é totalmente incompatível com a manutenção de uma elevada qualidade e com a estabilidade dos técnicos e dos profissionais que ali trabalham?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, tenho pena que hoje não tivéssemos discutido um orçamento de 1% para a Cultura em vez dos 0,4% apresentados por este Governo. Razão tinha a ex-Ministra Isabel Pires de Lima, num artigo que escreveu no passado dia 30, intitulado Errar de novo na Cultura. Este artigo tinha tanto de demolidor como de verdadeiro. Quem ama a Cultura não pode concordar com um orçamento destes, não deve continuar com um sorriso nos lábios.
Sr.ª Ministra da Cultura, o Eng.º José Sócrates prometeu-lhe um Stanley e deu-lhe um sintetizador. As notas não soam da mesma maneira, como sabe. Mas, Sr.ª Ministra, já estamos habituados a promessas, que não passam disso mesmo.
A Cultura é, mais uma vez, relegada para último lugar, como se não existisse, como se fosse um mal para o Sr. Primeiro-Ministro.
É natural! Nem todos nós estamos sensíveis para os mesmos problemas e para as mesmas causas» Para este Primeiro-Ministro conhecer escritores portugueses não faz, porventura, parte da sua agenda» Pode chamar-se Jorge ou José Luís Peixoto e nem, tão-pouco, sabe que é autor de um livro intitulado Cemitério de Pianos.
Uma última nota, Sr.ª Ministra: tenho estado atento aos seus sonhos, gostaria que um dia as entradas fossem gratuitas em todos os museus em Portugal» Podemos sempre sonhar, Sr.ª Ministra — é legítimo que o façamos, mas é inconsciente fazê-lo numa altura destas. Prescindir de 7 milhões de euros anuais de receitas é um acto de irresponsabilidade. «O sonho comanda a vida», diz o poeta, mas não comanda o seu Orçamento! Sr.ª Ministra, como pergunta final e por este mesmo assunto, apenas gostava de saber se a Fundação Berardo vai continuar a ter um tratamento diferenciado do dos restantes museus em Portugal, isto é, se vai continuar a ter entradas gratuitas no ano 2010.
Uma nota breve no que diz respeito à transversalidade, que a Sr.ª Ministra tanto evocou aqui. Este não é um ano novo e um ano diferente. Todos os orçamentos foram feitos assim e a Sr.ª Ministra, ainda há bocado, também esclareceu isso. Seria bom, isso sim, comparar todas as transfusões que se fizeram no passado e ver se, de facto, aumentou ou não o Orçamento nesta altura.
O Sr. Presidente: — Para responder às questões em conjunto, tem a palavra a Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de facto, a lista de questões é longa, pelo que vou tentar ser sucinta e, sobretudo, genuína e honestamente, tentar responder a tudo. Vou talvez começar pelo fim.
Evidentemente que as entradas gratuitas, e este paradigma de situação ideal, só serão possíveis quando forem possíveis. Sempre foi dito isto e nunca de outra maneira. Portanto, será quando for possível, se for possível, mas podemos caminhar para lá e podemos ter este objectivo. Como disse, é necessário encontrar uma fonte de financiamento paralela, para além das fontes habituais, para reforçar o IMC (Instituto dos Museus e da Conservação) e, com isso, podermos abrir as portas dos nossos museus. No fundo, é tentarmos encontrar qualquer coisa como 8 ou 9 milhões de euros, que venham de outro tipo de programas, que
Página 79
79 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
envolvam, quiçá, empresas ou os próprios cidadãos.
Há vários modelos. Temos de ser criativos e encontrar forma de tornar possível este sonho, se lhe quisermos chamar assim» Quanto a saber se no Museu Berardo, no próximo ano, vão haver entradas gratuitas ou não, isso seria uma ingerência do Ministério da Cultura que não podemos fazer; isso compete ao Conselho de Administração, razão pela qual os conselhos de administração são designados, numa determinada proporção, pela tutela — e, neste caso, pelo Comendador Berardo. O novo Conselho de Administração, que tomou posse agora, começa a funcionar no início de 2010, tomando as medidas que entender necessárias relativamente a essa matéria.
Espero que o Museu Berardo encontre uma solução que continue a granjear o sucesso e o número de visitantes que tem tido, mas, simultaneamente, que a fonte de receitas se alargue e não seja exclusivamente do Ministério da Cultura e, neste caso, também do Turismo.
Quanto ao Museu do Côa, Sr. Deputado, concordo inteiramente consigo: este é um caso muito particular, e até atípico, no panorama dos nossos museus. É um parque, no seu todo. É um museu que é mais, sobretudo, um centro interpretativo daquele espaço. É, de facto, um espaço, no seu todo, muito estimulante, em termos de criatividade, no sentido de o tornar atractivo e de tornar todas estas valências conjugadas para um projecto cultural, este sim, plenamente transversal.
Quanto ao modelo de gestão, já temos assegurados financiamentos do Ministério do Ambiente e do Turismo, obviamente. Do Ministério da Cultura temos 1 milhão de euros separado no orçamento para esta matéria e vamos envolver também — como é óbvio e o Sr. Deputado muito bem disse — os municípios locais.
Esse modelo de gestão vai ser tornado público, provavelmente, em Maio, data que estamos a apontar para a inauguração daquele espaço. Desde já lhe digo que queremos que seja um modelo com gestão financeira autónoma e que tenha uma participação maioritária do Estado, participação maioritária pública e, portanto, será ou uma SA, ou uma fundação.
Quanto ao modelo definitivo, confesso-lhe que ainda não tomámos a decisão final, mas muito em breve será tomada — é uma questão de um ou dois meses. Será certamente uma conjugação de esforços, quer do Estado quer dos municípios, e, tal como também já fui adiantando na outra reunião com a Comissão de Ética, onde tive ocasião de explanar, com um pouco mais de tempo, questões que tinham a ver mais com estratégia.
Nessa ocasião, chamei a atenção para o interesse do Ministério da Cultura em alargar aquele espaço, ao nível tanto da sua gestão como da sua fruição, do lado de lá da fronteira, isto é, encontrar aqui sinergias com os dois países, naquela zona, o que poderá potenciar bastante mais a sua fruição e alargar os públicos e a sua capacidade de chegar a mais população.
Não posso deixar de fazer aqui um pequeno comentário sobre a imagem negativa que Portugal tem no mundo. Sr.ª Deputada, ainda não viajei muito, pois estou há 3 meses no lugar, mas devo dizer-lhe que, de facto, Portugal não tem uma imagem negativa, muito menos do ponto de vista cultural. Tem uma imagem de grande dignidade e respeitabilidade e, portanto, a imagem negativa de Portugal infelizmente acontece quando há certas intervenções, nomeadamente no Parlamento Europeu, que mancham a imagem de Portugal» Temos, de facto, do ponto de vista da cultura uma respeitabilidade e uma dignidade que muito nos orgulham.
Ainda recentemente, em Istambul, tive ocasião de constatar o quanto, por exemplo, naquela parte do mundo, somos respeitados pela nossa cultura. Queremos estreitar muito mais os laços internacionais e optimizar este património, que já existe, de respeitabilidade e a imagem positiva de Portugal no mundo.
Para o turismo e a cultura, como já aqui foi dito bastamente, temos uma estratégica absolutamente incontornável, por todas as razões: porque queremos um turismo mais rico, no sentido do seu objectivo, um turismo cultural, que pretenda conhecer a nossa identidade e a nossa cultura — e isso só se faz com uma oferta cultural, com características particulares, também para atrair turismo, oferecendo melhores condições e melhor capacidade de fruição.
Também foi aqui abordada a questão de «Guimarães — Capital Europeia da Cultura 2012», com a qual temos, de facto, um compromisso. O Ministério da Cultura, nestes 4 anos, irá alocar 20 milhões de euros a este projecto, sendo também uma afirmação da nossa cultura, do nosso País — por via da cidade de Guimarães — na Europa e no mundo.
Sobre as questões do protocolo com o Patriarcado de Lisboa, da Rede de Museus, do património e das direcções regionais da cultura, o Sr. Secretário de Estado irá pronunciar-se.
Página 80
80 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Acerca da questão colocada pelo Sr. Deputado Honório Novo, sobre indemnização no apoio às artes, na realidade, estes conflitos judiciais remontam a casos ocorridos de há alguns anos a esta parte. Infelizmente, arrastam-se, como, aparentemente todos os problemas que têm a infelicidade de ir parar ao tribunal. Então estes casos de 2001 não se podem repetir. Não podemos permitir que se deixe passar tanto tempo sem se encontrar uma solução. Inclusivamente, já dei orientações expressas ao Director-Geral das Artes para entrar em negociações, nomeadamente com o TEP (Teatro Experimental do Porto), que é a situação que mais me preocupa, porque é a que se conhece há mais tempo e que se vem prolongando, sem resolução. Espero que essas negociações cheguem a bom termo, porque os resultados judiciais raramente satisfazem as partes — nem o Governo, nem os grupos ou agentes culturais que sofrem perdas derivadas de concursos instruídos com algumas deficiências ou que resultem em prejuízo para os agentes culturais. Não ganha ninguém, nem os agentes culturais, nem o Governo. Sou favorável a tudo o que seja evitar o recurso aos tribunais.
Espero que o TEP, muito em breve, se sente à mesa da negociação com a DGArtes (Direcção-Geral das Artes) e que ambos encontrem uma solução para ultrapassar este problema.
Quanto à Casa das Artes e casa do cinema do Porto, durante 2010, o que vai acontecer é a reconversão daquele espaço. A Casa das Artes é um projecto do arquitecto Souto Moura e, neste momento, precisa apenas de consolidação em algumas partes que caíram no telhado. Não é, digamos, uma intervenção de grande monta. A grande intervenção que tem é a adaptação do seu objectivo para uma casa de cinema. É mais a nível de equipamento e tecnologia. Todo esse trabalho será feito durante este ano e a verba necessária está, como disse há pouco, alocada também no nosso orçamento. O nosso objectivo é o de que este espaço seja aberto ao público no final do ano de 2010 e espero que consigamos, pois é uma prioridade nossa.
Relativamente à Casa da Música e aos aumentos da verba da fundação, quando o Estado estabelece estes protocolos com as fundações estabelece-os numa perspectiva de parceria público-privada, que, ao longo dos anos, garante sustentabilidade a estas fundações, mas que conta também com um desígnio normal e natural nas fundações: o de continuarem a granjear e aumentar o seu próprio património, a sua própria capacidade de angariar receitas, alargar o seu leque de financiadores, promotores e patrocinadores. A lógica não é a de um instituto público, cujo financiamento vai subindo à medida que a inflação sobe e que vai acompanhando os aumentos de custos dos outros institutos da função pública. Não é essa a lógica. A lógica é a de ter uma verba que dê garantias de sustentabilidade e que permita à fundação, com a sua capacidade de interacção com a sociedade civil, ir desenvolvendo a sua actividade e aumentando o seu leque de financiamentos.
Isto tem acontecido com Serralves, que tem conseguido aumentar o seu leque de financiamentos — inclusivamente, a dotação anual do Ministério da Cultura para 2010 para Serralves até diminuiu ligeiramente, porque não é preciso o mesmo valor do ano passado, o que só mostra uma gestão e uma capacidade de interacção com a sociedade civil fortes, indo ao encontro do que é o objectivo deste contexto de fundação.
Esperemos que a Casa da Música também o consiga fazer. Até agora, não o fez ainda. De qualquer maneira, se fosse uma questão de inflação, no próximo ano, como sabemos, esse problema, infelizmente ou felizmente — depende do ponto de vista — não se coloca. Quando a inflação está abaixo do limiar é que o problema fica bastante mais grave. Neste momento não se coloca. Espero que não seja preciso aumentar a verba e que a Casa da Música consiga angariar novos patrocinadores para fazer face ao seu plano de actividades.
Resta-me lembrar que, para além dos 10 milhões de euros que o Ministério da Cultura dá à Casa da Música, ainda dá mais 1,250 milhões de euros anuais, que é um acordo para a integração da ONP (Orquestra Nacional do Porto) na Casa da Música.
O Conselho Nacional de Cultura usufrui de participações graciosas, sem custos. Os custos que tem são de deslocações ou de eventuais estadias fora feitas por algum dos Conselheiros. E aí nem vai haver, sequer, senhas de presença»! Nem sequer senhas de presença! Apenas em situações em que haja necessidade de comparticipar nas despesas de deslocação. Nesses casos, aplicar-se-ão as regras da Administração Pública, sem qualquer outro tipo de encargo.
Quanto ao Museu dos Coches, Sr. Deputado, não vale a pena voltarmos a discutir a decisão que foi tomada. Está tomada, está encerrada. As decisões da eventual ingerência do Ministério da Economia no passado na escolha daquele espaço, daquele museu, arrumou, está passado. Queremos encarar o futuro e concretizar as planificações que estão em curso e optimizar todas as estratégias. Não quero discutir o que
Página 81
81 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
está para trás.
Temos o Museu dos Coches, que já arrancou com o lançamento da «primeira pedra«», as demolições estão a andar, e dentro de 30 meses, como disse, vamos ter um novo museu, que será certamente um benefício particularmente rico para a nossa cidade, ainda por cima com um projecto de arquitectura tão interessante, de um reputadíssimo arquitecto mundial.
Quanto à questão da demissão do director do Museu de Évora — não eram «demissões de directores», Sr. Deputado!» Foi um director que se demitiu. E este director demitiu-se numa atitude de humildade que eu atç»
O Sr. João Oliveira (PCP): — E o do Museu Nacional de Arte Antiga?
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Não. Évora, Évora! Foi o único que se demitiu. No Museu de Arte Antiga não houve uma demissão, mas uma não-recondução, que ç diferente. Demissão ç interromper» De qualquer maneira, Sr. Deputado, queria voltar a Évora. O único director que se demitiu foi este director de Évora e, enfim, foi um gesto cuja grandeza até reconheço» Foi: «Não me apetece. Prefiro continuar no museu como técnico superior. Não quero ter esta responsabilidade acrescida». E pronto! Mantemos um excelente relacionamento e não há aqui nenhum tipo de bloqueio de relacionamento entre este director e o IMC.
Relativamente ao Museu de Arte Antiga, foi uma opção da Ministra, na medida em que o lugar que o director ocupa é um lugar que é reconduzido pelos novos ministros e, portanto, a opção da nova tutela foi não o reconduzir. Estou certa de que esta minha opção irá contribuir para uma revitalização daquele espaço, que é a nossa «jóia da coroa» e que precisamos muito que seja um espaço extremamente atractivo, dinamizador e aglutinador de vontades, de energias. Quero realmente pôr o Museu de Arte Antiga no mapa, porque, neste momento, está muito obscuro e muito esquecido.
Mas vamos arranjar dinheiro para isso, Sr. Deputado, verá que sim.
Quanto à Companhia Nacional de Bailado, reconheço que existe, realmente, um problema. Temos neste momento, para já, uma Companhia sobredimensionada, com 70 bailarinos, quando apenas 20 ou 25 é que dançam, o que, à partida, já mostra a falta que está a fazer um estatuto da carreira dos bailarinos que possa trazer outra dignidade à actividade.
Relativamente à sua programação, insere-se na lógica manietada da própria essência da Companhia. Isto é, se é uma Companhia que se torna pouco operacional, porque tem gente a mais, que não produz, que quer fazer parte de um projecto mas que não pode, por razões da sua longevidade e da sua desadequação a uma profissão de curta duração, há um problema que tem de ser resolvido de raiz: encontrar uma forma de a Companhia Nacional de Bailado se optimizar nos seus bailarinos, dando dignidade às soluções opcionais que os bailarinos que já não dançam poderão fazer e tornando a Companhia mais leve, mais ágil e mais capaz de se abalançar a uma dinâmica que, neste momento, não tem.
Quanto à reconversão das carreiras, o estatuto dos bailarinos irá, espero eu, encontrar forma de garantir dignidade à opção que os bailarinos façam, numa determinada altura das suas vidas, por outras carreiras.
Relativamente aos contratos-programa das EPE, o último contrato-programa terminou no final de 2009 e estamos à espera dos relatórios e contas relativos a 2009. O próximo contrato-programa das EPE tem início agora, em 2010, e é trienal, ou seja, por três anos. Nestes contratos-programa ficam estabelecidos os objectivos da tutela relativamente às suas equipas de gestão.
Não me recordo se foi colocada alguma questão específica sobre esta matçria»
O Sr. João Oliveira (PCP): — A avaliação do modelo.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Como disse, estamos à espera do relatório e contas para ver se os objectivos que foram traçados no último contrato-programa foram atingidos, de modo a que, na elaboração do novo contrato-programa, isso seja tido em conta e façamos uma análise do que foi executado e qual foi a dimensão da concretização dos objectivos anteriores.
Quanto à rede dos cineteatros, a verdade é que não são nossos, são das autarquias. Há aqui uma preocupação complexa de resolver, que é a seguinte: ou o Estado está em tudo, ingere-se em tudo, financia
Página 82
82 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
tudo e torna-se omnipresente ou o Estado partilha as responsabilidades com a sociedade civil, com as autarquias e com os artistas.
Portanto, este é um balanço delicado e a verdade é que o Estado tem de estar na retaguarda para poder intervir sempre que estiverem em causa quer a sustentabilidade do sector, quer as garantias básicas dos trabalhadores envolvidos, neste caso, nos projectos do sector artístico. Mas temos de estabelecer uma linha de equilíbrio no sentido de fixar até onde vai o Estado e até onde vão a sociedade civil e as autarquias. E, neste momento, os teatros não são nossos, enfim, nós temos os que temos, e toda a gente sabe, os outros são das autarquias ou têm protocolos das autarquias e até têm modelos de gestão de diversa natureza.
Nas minhas várias reuniões com artistas e com associações, temos colocado várias hipóteses ou tenho auscultado opinião sobre várias hipóteses de financiamento do sector. Por exemplo, até coloquei a hipótese de, em vez de financiarmos os grupos A, B e C, financiarmos os teatros espalhados pelo País, com um contrato-programa em que se obrigue os teatros a contratar uma percentagem x, de 80% ou 90%, de agentes locais, etc. Podem encontrar-se aqui vários modelos de compromisso» O Estado, em vez de patrocinar os agentes, pode patrocinar os teatros, garantindo, assim, a sustentabilidade dos teatros e de, por via de um contrato-programa, se estabelecer um compromisso com o Estado em que os teatros se comprometem a introduzir nas suas programações uma percentagem altíssima de agentes locais. Esta é uma possibilidade, mas junto de uma parte do sector obtive anuência, junto de outra parte a ideia não foi bem acolhida. Portanto, ando à procura e a ouvir, verdadeiramente, as pessoas que estão no terreno, para encontrar, com elas, as melhores soluções.
Agora, que os teatros estejam numa situação de falta de programadores, de falta de financiamento, e alguns deles correm até o risco de poder começar a ter problemas de estrutura, da sua sustentabilidade enquanto edifício, é uma preocupação que temos.
Mas, como lhe digo, neste domínio, colocam-se sempre estas duas questões: até onde o Estado deve estar, sempre; até onde devemos estimular a actividade privada, autárquica e associativa e de que forma é que podemos, através do apoio às artes, dividir essa responsabilidade, financiando os teatros e os agentes, de maneira a que ambos se comprometam a uma actividade comum.
O Teatro Nacional de São João tem este mesmo valor de indemnização compensatória. E, já agora, respondo também a outro Sr. Deputado ou Sr.ª Deputada que me falou dos valores: o Teatro Nacional de São João tem 4,9 milhões de euros por ano, o Teatro Nacional D. Maria II tem 5,175 milhões de euros e a OPART tem 19,293 milhões de euros.
Portanto, o Teatro Nacional de São João tem, de facto, o mesmo valor, desde há alguns anos, como todos os outros, mas, nos outros anos, o que tem acontecido, sobretudo desde que passaram a gerir três espaços, é o seguinte: há sempre um reforço de verba a meio do ano ou no final do ano, para o Teatro Nacional de São João, o qual vem, normalmente, das dotações provisionais do Tesouro. Aquilo que não pode acontecer é ser inscrito no Orçamento ou garantido pelo Sr. Ministro das Finanças que aquele Teatro vai ter um reforço.
Portanto, do meu ponto de vista, é preciso que o Teatro Nacional de São João tenha calma, porque estamos aqui para ajudar a resolver o problema. Mais clara do que isto não posso ser. O que não me parece bem é este alarde público da Presidente do Conselho de Administração, devo dizê-lo aqui, publicamente, uma vez que esta situação já aconteceu em todos os outros anos e ela teve sempre o dinheiro de que precisou quando foi necessário. Portanto, quando ela precisar, cá estaremos para contribuir.
Quanto à questão do Plano Estratégico para os Museus, ficará para o Sr. Secretário de Estado, bem como os critérios para os museus e a sua relação com as autarquias.
Relativamente ao projecto Serralves 21, trata-se de um projecto fascinante. Fiz questão de ir conhecê-lo pessoalmente, estive em Serralves, a inteirar-me dos contornos deste projecto e é, realmente, um excelente mecanismo de dinamização daquela zona. O próprio projecto de arquitectura, salvo erro, de um arquitecto japonês, será também, certamente, mais um símbolo da arquitectura no Norte e é, de facto, fascinante, só que custa muito dinheiro. Já há financiamento do QREN para este projecto, mas a contrapartida nacional terá de ser nossa ou, melhor, não terá de ser do Ministério da Cultura, mas foi-nos pedido e nós comprometemo-nos, obviamente, a fazer o que pudéssemos para nos juntarmos a este projecto, no qual acredito a 100%, porque é um projecto excelente. Neste momento, não temos os 11 milhões que nos foram pedidos para garantir a contrapartida nacional, mas estamos a estudar, antes com o Dr. Gomes de Pinho, agora com o Dr. Braga da Cruz, o modelo de participação do Ministério da Cultura nesses 11 milhões, seja através de um empréstimo
Página 83
83 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
bancário, seja atravçs de uma garantia, seja atravçs de um pagamento faseado, a 20 anos» Enfim, não sei, mas estamos a estudar uma forma de contribuirmos para que este projecto seja possível, porque consideramos que ele, de facto, é extraordinário e vai desenvolver — e de que maneira! — quer o conceito de indústrias culturais, que, depois, se pode replicar noutras zonas do País, quer a própria morfologia daquela zona do Norte, no sentido estético, com aquele novo edifício, em Matosinhos, a dar continuidade à ambição arquitectónica pela qual o Norte é tão conhecido.
Quanto ao Fundo para as Indústrias Criativas e Culturais, há outros programas espalhados pelas direcções regionais do Ministério da Cultura que se destinam, de facto, a fundos para indústrias criativas. Devo dizer que também tenho o maior gosto e interesse em desenvolver, a breve trecho, com o Ministério da Economia um fundo para a internacionalização dos artistas portugueses. É uma matéria que também me interessa bastante e a que iremos dar seguimento dentro dos constrangimentos que todos conhecemos.
Agora, gostaria de finalizar da forma como todos os Srs. Deputados começaram: com este vaticínio da desgraça, porque o orçamento não subiu mais do que 12,8%»! Lamento muito, Srs. Deputados, mas o País está mergulhado numa crise financeira, a Europa está mergulhada numa crise financeira»! Não percebo como é possível não se ter isto em conta quando se avalia a dotação do Ministério da Cultura! Nós temos de ser solidários! A maior parte dos meus colegas de Governo teve cortes significativos e em áreas tão importantes como a cultura. Portanto, nós temos de ser solidários, entender o tempo que estamos a atravessar e considerar que estes 12,8% são, apesar de tudo, uma distinção que nos feita e provar que com ela podemos contribuir para aquilo que é o objectivo máximo da cultura: a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos por via da aquisição de saber, do conhecimento de si próprios, sobretudo, do enriquecimento individual que advém da cultura.
Peço agora ao Sr. Presidente que permita que o Sr. Secretário de Estado da Cultura complemente as minhas respostas em relação à matéria do património.
Muito obrigada, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra.
Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Penso que o tempo de que dispomos está praticamente no fim, portanto, muito telegraficamente, gostaria de esclarecer alguns pontos.
Sobre a fiscalidade, o que está em questão é um alargamento do desconto do IVA que já existe em intervenções em áreas de reabilitação urbana para os imóveis classificados também serem abrangidos por esse benefício. Este é um ponto que está a ser conversado com o Ministério das Finanças. O outro ponto é a majoração para 140% dos benefícios fiscais do mecenato. Enfim, na conjuntura actual isso não será fácil, mas em termos relativos pode significar mais investimento.
Portanto, é preciso avaliar todas essas valências.
Quanto à lei do património o diploma que falta é o da regulamentação de trabalhos arqueológicos.
Sobre os critérios da progressiva passagem dos museus para a esfera autárquica tenho a dizer que o caminho que estamos a seguir, em primeiro lugar, tem em consideração que é preciso avaliar a natureza das colecções e a sua dimensão cultural — se tem implantação nacional, regional ou local. Portanto, há museus da rede nacional, desde o Museu de Miranda do Douro ao Museu Nacional de Arte Antiga, que têm colecções de natureza diversa e com implantação e valia cultural distinta, com isto não se menorizando uns nem outros, mas considerando que têm escalas diferentes e que alguns só ganham em ser geridos numa escala de maior proximidade e dinamismo. Este é um critério: natureza e avaliação cultural do interesse das colecções.
O segundo critério é o da disponibilidade das autarquias em conversar e em estabelecer contratosprograma com a administração central, neste caso com o Instituto dos Museus e da Conservação. Isso nunca será feito sem um contrato-programa entre o Instituto dos Museus e da Conservação e a autarquia local respectiva, contrato-programa esse que pressupõe um plano estratégico de desenvolvimento patrimonial local, onde o museu tem o seu protagonismo próprio. Portanto, é esta a perspectiva.
O Plano Estratégico de Museus para o Século XXI, antes de ser apresentado, foi objecto de discussão, não só com a tutela e o IMC, mas dentro deste houve reuniões com directores de museus que delinearam, pelo
Página 84
84 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
menos, seis eixos fundamentais. Portanto, são seis eixos, não estão fechados e dentro de cada um deles, como é óbvio, haverá discussão. Muito embora já estivesse prevista na Lei-Quadro dos Museus Portugueses, há muitos anos, só agora foi accionado o Conselho Consultivo, digamos assim, do Instituto dos Museus e da Conservação. Portanto, foi accionado, vai funcionar e de certeza absoluta que terá uma palavra a dizer sobre o Plano estratégico de Museus para o Século XXI.
Há pouco foram referidos os encargos do Conselho Nacional de Cultura, que é um conselho que se desdobra em secções especializadas. Tal como o antigo Conselho Consultivo do IGESPAR, será agora a secção especializada de arquitectura e arqueologia do conselho Nacional de Cultura. No âmbito dos institutos essas despesas estão previstas — no Conselho Consultivo do IGESPAR há senhas de presença no valor de 50 euros/presença que o limite da tabela no quadro da Administração não pode exceder e que às vezes não cobre as despesas feitas pelos conselheiros que vêm do Norte, de comboio, etc., etc.
Portanto, há esta tabela, e estão previstas no orçamento de funcionamento de cada instituto as despesas com as secções do Conselho Nacional de Cultura.
A Sr.ª Deputada questionou-se sobre como é que se enquadra esta estratégia de envolvimento e de parcerias com o poder local.
Ela existe nas áreas patrimoniais. Relativamente ao Norte, foi referido que é a zona com mais densidade de património religioso. Precisamente por isso a Direcção Regional de Cultura do Norte tem um aumento significativo de PIDDAC que corresponde a 77,4 milhões de euros, ou seja, é quase 7,5% do PIDDAC do Ministério da Cultura, o que dá a noção da escala e da importância das intervenções em património classificado no Norte.
Está estabelecida a rede de Monumentos Património da Humanidade — em Alcobaça; na Batalha; o Convento de Cristo, em Tomar; o Mosteiro do Jerónimos e a Torre de Belém, em Lisboa — , monumentos que estão a trabalhar em rede.
Há uma parceria entre as autarquias de Lisboa, de Tomar, da Batalha e de Alcobaça e o Instituto do Turismo nas áreas de valorização. Portanto, é esta parceira que partilha entre si contrapartidas nacionais em projectos de QREN de diversas naturezas, com diversos tipos de intervenções, parceria essa que até 2013 fará a valorização de todo este património com trabalho em rede.
O mesmo se passa com a Rota das Catedrais, um projecto que nasceu de um acordo de cooperação entre o Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR) e a Conferência Episcopal Portuguesa. Segundo esse acordo, os Cabidos das 24 sés catedrais dos 18 distritos existentes, com as autarquias que têm a cargo os espaços públicos, as envolventes e a própria valorização dos imóveis — que pertencem ao Estado, embora estejam afectos permanentemente à igreja, nos termos da Concordata, até 2013/2014 — irão fazer o que foi necessário para recuperar, conservar, valorizar as colecções e mostrar as sés da Rota das Catedrais, que estão em rede e de que o Instituto de Turismo também será um aliado.
Este turismo cultural é o turismo do futuro, não é o sol e a praia, portanto essa aliança está cada vez mais consolidada.
A ideia é que todas estas catedrais estejam devidamente recuperadas e valorizadas numa linha comum, digamos assim com um layout comum de linha gráfica, de valorização de colecções; que ganhe coerência uma riqueza arquitectónica muito grande que existe no nosso país — são todos monumentos nacionais, desde a Sé de Lisboa (curiosamente, está localizada na nossa capital, mas é caso mais crítico das 24 sés) até á Sé de Vila Real, que está em excelente «estado de saúde» — ; que se possa intervir em todo este património. Logo, é nesta perspectiva que entendemos as parcerias com as autarquias locais.
Concluo, rematando a intervenção da Sr.ª Ministra. Não vejo o Sr. Deputado António Filipe, mas na última reunião colocou — e muito bem — a perspectiva gramsciana da nossa atitude, do optimismo da vontade e da prudência da razão, portanto continuamos gramscianos na nossa atitude.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, se me permite, gostaria de, em interpelação à mesa, perguntar pela terceira vez — a menos que possa concluir que a resposta é não — à Sr.ª Ministra ou ao Sr.
Secretário de Estado da Cultura, se a Secção de Museus do Conselho Nacional de Cultura foi consultada.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, vamos agora para a terceira ronda.
Para concluir o debate, cada grupo parlamentar pode usar da palavra durante 3 minutos, após o que há
Página 85
85 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
uma possibilidade de resposta pelo máximo de 10 minutos. É a grelha que foi distribuída, enviei-a a todos os Srs. presidentes das comissões e penso que dela terá sido dado conhecimento a todos.
Usando a ordem que tenho seguido, dou a palavra à Sr.ª Deputada Maria da Conceição Pereira, do PSD, por 3 minutos. A Sr.ª Maria da Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, ainda bem que está satisfeita com este orçamento, ainda bem que ç uma mulher feliz, com vontade» Normalmente, quem ocupa estes cargos gostaria de ter mais, mas a Sr.ª Ministra está satisfeita»! Quero dizer-lhe que não fiquei muito esclarecida com as intervenções que aqui fizeram: o Sr. Secretário de Estado da Cultura chamou à colação a situação das Caldas da Rainha na área das transferências.
Sr. Secretário de Estado, quero dizer-lhe que se for questionada, como já fui, pela população ou pelos autarcas de Trás-os-Montes não lhes sei dar resposta, porque o Sr. Secretário de Estado voltou a referir que era caso a caso, que não era casuisticamente mas, sim, caso a caso, que os critérios seguiam a colecções, seguiam a vontade dos autarcas.
Quero dizer que o que foi perguntado ao Presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, e a que ele respondeu, foi se estava disponível. E normalmente os autarcas estão disponíveis, porque são gente com vontade de verem resolvidos os problemas da sua terra, portanto dizem que sim. Mas quais eram as condições? Isso era um assunto a discutir.
Na reunião com o Sr. Director do Instituto dos Museus e da Conservação (IMC) esse assunto acabou por não ser abordado. Portanto, se me perguntar não sei qual é o tal contrato-programa que vai ser apresentado.
Acho que a Associação Nacional de Municípios Portugueses também não o conhece — pelo menos o seu Presidente, Fernando Ruas, disse que até à data não conhecia. Logo, não fiquei perfeitamente elucidada, tal como não sou capaz de esclarecer se for questionada sobre essa matéria.
Em relação aos novos museus, não queria dar um conselho à Sr.ª Ministra nem ao Sr. Secretário de Estado, mas se calhar recomendava que houvesse alguma prudência, alguma avaliação, que não fossem excessivamente voluntariosos. Porque, Sr. Secretário de Estado, no caso do Museu Nacional de Arqueologia tem esse estudo, mas também deve saber que o Grupo dos Amigos do Museu Nacional de Arqueologia tem um outro estudo, realizado por dois professores catedráticos do Instituto Superior Técnico, respectivamente Presidente e Vice-Presidente da Sociedade Portuguesa de Engenharia Sísmica, que diz precisamente o contrário — se quiser, depois dou-lho. O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem apenas mais 1 minuto.
A Sr.ª Maria da Conceição Pereira (PSD): — No que respeita ao programa das artes, a Sr.ª Ministra disse que o da rede de cineteatros não era seu. É verdade, mas também é de uma entidade pública, é do poder local.
E há o Programa Território Artes, mas, como sabe — e quem o diz é o Sr. Director-Geral das Artes — , só em 2010 vamos ter, pela primeira vez, os dados comparáveis da situação nacional. Embora exista desde 2005 (a Sr.ª Ministra não estava nesse governo, mas em 2005 o governo era socialista), nunca foi avaliado, só agora é que vai ser. E há muito dinheiro envolvido. Se calhar, falando em desperdícios, era bom para a rede de cineteatros que esse programa fosse bem utilizado, maximizado e que se pudesse tirar um real proveito dele.
Sr.ª Ministra, também quanto aos acordos não a ouvi referir-se — e até em relação aos agentes locais — aos acordos tripartidos, onde se calhar os agentes locais seriam melhor aproveitados.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria da Conceição Pereira (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr.ª Ministra, concluo dizendo-lhe o seguinte: já que há pouco ficou entusiasmada com o facto de ser protagonista de um filme, espero que este filme tenha um happy ending e não um fim triste.
O Sr. Presidente: — Pelo Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pereira.
Página 86
86 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. Rui Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, a cultura constitui, no ano de 2010, uma prioridade do Governo no quadro das políticas de desenvolvimento, de qualificação e de formação do País. A progressiva e efectiva integração da dimensão cultural no quotidiano dos portugueses constituirá necessariamente uma aposta estratégica na qualificação dos mesmos e no desenvolvimento do País.
Queria aproveitar este momento final para realçar um aspecto que nos parece importante, porque a cooperação internacional que o Ministério se propõe realizar no ano de 2010 visa a internacionalização da Língua e da cultura portuguesas e deverá ser percepcionada como um instrumento de afirmação da identidade de Portugal no mundo.
Devemos realçar as apostas do Ministério não só no âmbito da Língua, tendo aqui uma perspectiva muito particular no que diz respeito aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), mas também na área do património e das artes.
A internacionalização da cultura portuguesa é uma aposta importante, porque por aí também passa o nosso desenvolvimento como povo, bem como o desenvolvimento e a afirmação dos nossos criadores.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro. Dispõe de 3 minutos. A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, penso que não precisarei de tanto tempo.
Há pouco, tive a oportunidade de colocar uma pergunta, através da interpelação à mesa, e gostaria de vêla respondida nesta terceira ronda de respostas. A outra questão que queria colocar já foi em certa medida colocada pela minha colega do Partido SocialDemocrata e prende-se com a avaliação e o funcionamento do Programa Território Artes, porque se em bom rigor não nos podemos queixar de não ter uma rede de cineteatros que cubra o País, a verdade é que muitos deles pecam por falta de programação. E o Programa Território Artes se bem gerido, se bem avaliado, se bem conduzido, penso que será porventura a forma ideal de preencher esses espaços que tantas vezes são abandonados.
Passarei a colocar a terceira e última questão.
Volta e meia fala-se do estado avançado de degradação dos monumentos nacionais (o Sr. Secretário de Estado já aqui abordou essa questão): património classificado, património universal e mesmo património edificado — monumentos, igrejas, sés. Ainda há pouco tempo, há cerca de um ano, vieram a lume várias notícias até antecipando porventura a desclassificação de algum património classificado pela UNESCO.
O que responderia se batesse à sua porta e lhe perguntasse: «Sr.ª Ministra, qual é o trajecto do financiamento? Qual é a fórmula para o financiamento do património classificado e dos monumentos classificados em Portugal? Como cidadã portuguesa, como é que posso ter a garantia de que não vai haver uma degradação irreversível do nosso património, sobretudo do mais valioso, como, por exemplo, o Convento de Cristo, que está num estado avançadíssimo de degradação, e de que há um cabal aproveitamento do financiamento?».
Sr.ª Ministra, esta questão é muito importante, porque ouvi várias fontes referirem que nem todo o financiamento internacional disponível, nomeadamente o comunitário, é aproveitado — por inércia, por mau funcionamento, por falta de candidaturas. Portanto, gostaria mesmo que me esclarecesse sobre se isto é verdade — asseguram-me que é, que há muito dinheiro desperdiçado — e sobre qual é a garantia que os cidadãos têm de que o nosso património é salvaguardado.
O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins. Tem igualmente 3 minutos para intervir.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado da Cultura, noto alguma contradição entre a ideia de que ainda será possível auscultar e de que os eixos ainda serão programados e a ideia de que o Museu Nacional dos Coches é um facto consumado, isto porque um edifício não é um programa e, como sabem, se é verdade que os 31 milhões de euros das contrapartidas do Casino de Lisboa terão de ser necessariamente para a construção do museu naquele sítio, não é obrigatório que o programa seja o que está determinado e isso deveria ser discutido.
Página 87
87 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Devo ainda dizer, Sr.ª Ministra, que vejo com muita estranheza que entenda que o Teatro Nacional São João não deve ser discutido, que depois mais para a frente se verá», e atç que estão a ser um pouco rudes, porque mais para a frente a coisa pode resolver-se» Ó Sr.ª Ministra, os agentes e as instituições culturais merecem transparência nos recursos que têm à sua disposição, bem como o respeito de poderem planear a sua actividade com independência relativamente àquilo que a cada momento a tutela política possa pensar da sua acção.
Devo também dizer que acho estranho que a criação de uma rede de cineteatros lhe cause tanta confusão.
Pergunto-lhe se a Rede Portuguesa de Museus está em causa, porque, como sabe, nesta rede há museus que são das autarquias, portanto estamos a falar exactamente do mesmo tipo de relação, e ou a Sr. Ministra quer acabar com a Rede Portuguesa de Museus ou não se percebe porque é que não acha normal pensar-se numa rede de teatros e de cineteatros.
Sr.ª Ministra, acho igualmente complicado que confunda o apoio à criação com o apoio à circulação. Essa tem sido uma confusão feita nos apoios da Direcção-Geral das Artes, confusão que até deveria acabar. Como sabe, são duas formas de financiamento da criação artística que se complementam e não se excluem.
Finalmente, a Sr.ª Ministra insiste em comparar o incomparável e continua a achar que o orçamento do seu Ministério cresceu.
Imaginemos por um momento que cresceu. Então, se cresceu, faço-lhe um desafio. Como sabe, os concursos para a criação artística, tanto os da Direcção-Geral das Artes, que apoia o teatro, a dança, as artes plásticas, áreas transdisciplinares, arquitectura, etc., como os do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) para atribuição de apoios à produção cinematográfica abriram, um, em Dezembro do ano passado e, outro, em Janeiro deste ano, antes de se conhecer este orçamento.
Se este orçamento tem mais verbas (não as descubro), então desafio-a a reforçar os orçamentos destes concursos, porque são a forma mais transparente e clara de financiar a criação.
Portanto, Sr.ª Ministra, vai reforçar as verbas desses concursos? Vai criar uma linha de financiamento também para a circulação e para os teatros, já que tem mais dinheiro?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, para o que dispõe igualmente de 3 minutos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura quero acreditar que foi por esquecimento que não deu resposta à minha reformulação da questão do apoio às artes, portanto ainda lhe pedia que, se pudesse, clarificasse essa questão do aumento. Se puder fornecer o documento, melhor ainda.
Sr.ª Ministra, estamos perfeitamente conscientes da situação de crise em que se encontra o nosso país, mas também estamos conscientes das opções que o Governo faz. E este Governo do Partido Socialista é o mesmo Governo que opta por dar ao Ministério da Cultura 236 milhões de euros e por prescindir de 1090 milhões de euros em benefícios fiscais no offshore da Madeira — e estas, Sr.ª Ministra, são as opções com as quais não estamos de acordo.
Sr.ª Ministra, lamentamos que não esteja disponível para repensar a questão do Museu Nacional dos Coches porque, infelizmente, só o Governo e o Partido Socialista é que continuam a considerar que é uma boa opção. Todos os outros partidos e todos aqueles que se têm pronunciado sobre esta matéria manifestam-se contra esta opção. Portanto, julgamos que ainda iríamos a tempo de repensar esta decisão, de forma enquadrada numa política museológica, numa política que servisse, de facto, as necessidades dos nossos museus, sobretudo com os recursos que parecem estar disponíveis para o projecto dos Coches, sem pôr em causa, obviamente, o projecto concreto, nomeadamente o projecto de arquitectura, que não é isso que fazemos.
Sr.ª Ministra, é preocupante a resposta que deu em relação à Companhia Nacional de Bailado porque, se olhar para o que era e para o percurso que foi trilhado a Companhia Nacional de Bailado antes da constituição da OPART e se olhar para o percurso que a Companhia Nacional de Bailado teve depois de constituída a OPART, a Sr.ª Ministra vai perceber que foi este percurso da OPART que tornou a Companhia Nacional de Bailado sobredimensionada em relação àquele papel que está a cumprir, e é preocupante que a Sr.ª Ministra assuma aqui esta perspectiva, infelizmente. Não queríamos acreditar que fosse essa a perspectiva que estava
Página 88
88 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
por detrás da constituição do modelo do OPART mas, agora, parece não restarem dúvidas relativamente aos objectivos que se pretendiam e que já vinham da anterior legislatura.
Quanto a recursos humanos, há 131 vagas para museus e palácios nacionais. O Governo está em condições de garantir que não se repetirão as situações de museus e palácios encerrados por falta de pessoal? Essas 131 vagas chegam ou não para as necessidades existentes nos museus nacionais? Há 80 postos de trabalho que serão incluídos nos mapas de pessoal dos serviços e eu pergunto, Sr.ª Ministra, se isso chega, face à destruição de postos de trabalho no Ministério da Cultura nos últimos 5 anos.
Sr.ª Ministra, só no IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico) a situação criada, relativamente à dispensa de pessoal que estava contratado em regime de tarefa, chega quase aos 80 postos de trabalho. Pergunto-lhe, pois, se estes 80 postos de trabalho satisfazem as necessidades do Ministério.
Para terminar, Sr. Presidente, perguntas concretas relativas aos serviços de arqueologia, aos laboratórios de arqueociências e à arqueologia náutica e subaquática, com a transferência para as instalações do MARL.
Em primeiro lugar, como é que se vai resolver o problema de recursos humanos, particularmente nos laboratórios de arqueociências? Em segundo lugar, com que custos, com que perspectiva temporal e em que condições foi feita aquela transferência para as instalações do MARL? Por õltimo, Sr.ª Ministra»
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr. Presidente, perguntando, sobre a questão do regime laboral dos trabalhadores das artes e do espectáculo relativamente à segurança social, se já não há mais nada a discutir em relação aos problemas. Queremos saber se há mesmo disponibilidade do Governo para alterar o seu regime laboral e para lhes dar uma resposta em relação à protecção social a que todos estes trabalhadores continuam sem ter acesso.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, se me permite, gostaria de passar de imediato a palavra ao Sr. Secretário de Estado para responder às questões que dizem respeito aos postos de trabalho no IGESPAR que o Sr. Deputado mencionou e para responder às questões que têm a ver com o observatório do património e o sistema de financiamento da recuperação do património. Depois, o Sr. Secretário de Estado devolver-me-á a palavra e eu terminarei a resposta às restantes questões colocadas.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, serei muito breve, dizendo-lhe, Sr. Deputado, que, sinceramente, desta última vez, não percebi a sua pergunta.
Então, houve um esforço de integração de quadros, que não eram quadros, eram avençados, que vinham no mapa de pessoal do ex-Instituto Português de Arqueologia; estão praticamente concluídos esses concursos e, portanto, as pessoas estão integradas. Houve reforço e concursos, que estão a decorrer, de guardaria nos monumentos. Não estou a perceber qual é concretamente a questão. Está a falar-me em que houve 80 despedimentos?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Estou a perguntar se chega para dar resposta às necessidades.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Não, é evidente que as realidades são completamente distintas antes do PRACE e depois do PRACE; antes do PRACE, não estavam resolvidas essas situações, neste momento estão resolvidas e num quadro complicado de restrições na administração, como bem sabe.
Portanto, nesse aspecto, esse esforço foi conseguido e está a resolver-se. Há situações de renovações de quadros, de aposentações que vão acontecendo, sendo que vão acontecer mais, e isso exige um esforço de
Página 89
89 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
renovação e de passagem, de substituição de quadros por outros quadros. Mas as situações que estavam irregulares, em 2005, desde a fundação do extinto Instituto Português de Arqueologia, estão completamente resolvidas.
Quanto aos problemas guardarias, quer nos monumentos do IGESPAR quer no Instituto dos Museus e da Conservação, estão a ser, neste momento, completamente resolvidos.
Relativamente à questão da avaliação do património edificado, queremos (e isso, de certo modo, foi iniciado há cerca de 2 anos) criar um sistema nacional de conservação preventiva. Não é só o conceito que é muito bonito mas, no património, aquilo que é mais importante é a «medicina preventiva», é um trabalho que não se vê, é um trabalho invisível.
Este sistema está a ser implementado pela avaliação, para já, de todo o estado de conservação do património classificado do Estado, esteja ele afecto ou não ao Ministério da Cultura, porque cabe ao Ministério da Cultura avaliar essas situações e monitorizá-las.
Portanto, se isso for feito de uma forma eficaz e coordenada entre todas as direcções regionais de cultura e o IGESPAR, obviamente (pensamos que em Maio esse levantamento estará feito), podemos saber em cada momento quais são as prioridades de intervenção, uma a uma, e ordenar melhor a repartição das despesas e o investimento que isso implica em conservação e recuperação.
Quanto à questão do conselho nacional de museus, penso que só na próxima semana — segundo disse o Director do IMC, o Prof. João Brigola — irá começar a funcionar e será convocado o primeiro conselho; só agora foi nomeada essa secção e é óbvio que se pronunciará sobre os assuntos que o IMC muito bem entender. A tutela não vai interferir minimamente nas discussões dos conselhos consultivos ou das secções do Conselho Nacional de Cultura dos institutos que gere. Portanto, são órgãos consultivos da direcção dos institutos e compete à direcção dos institutos preparar a agenda de trabalhos. Obviamente, todos estes assuntos serão lá discutidos.
Quanto à questão dos museus, Sr.ª Deputada, sinceramente estranho muito a sua posição aqui, uma vez que é testemunha. Se diz que a única coisa que perguntou ao Sr. Presidente da Câmara das Caldas da Rainha foi se estava disponível para negociar, para isso bastava um simples telefonema, não eram precisas duas horas de reunião no meu gabinete com a sua presença, mais uma reunião de trabalho nas Caldas da Rainha com o Director do IMC, que disse que se deram passos importante, que se iria mobilizar, que iriam fazer um plano estratçgico»
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Nas Caldas, foi apenas a ampliação do Museu de Cerâmica!
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sinceramente, não entendo!» A Sr.ª Deputada está aqui na qualidade de Deputada, evidentemente, faz essa avaliação política, mas não corresponde àquilo que me foi reportado e tenho por fiel a minha fonte, que é o director do Instituto de Museus e Conservação. Portanto, não vamos falar mais nessa questão.
Mas os critérios estão perfeitamente delimitados.
Se a Sr.ª Deputada ou o seu Grupo Parlamentar acha que essa é uma matéria para ser tratada pela Associação Nacional de Municípios Portugueses como uma pura e simples transferência de instituições, como foram as escolas, com o respectivo pacote financeiro, aí, penso que a nossa posição não será assim. Penso que não se pode fazer este processo sem o envolvimento do poder local, a cumplicidade e a celebração de contrato-programa, caso a caso. Portanto, não é uma questão da Associação Nacional de Municípios Portugueses, não é um pacote global, é um pacote pontual, digamos assim.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, quanto às questões que eu gostaria de esclarecer, comecemos pelo Programa Território-Artes: é uma iniciativa da DGARTES (Direcção-Geral das Artes) que pretende cobrir o território em iniciativas tripartidas, portanto, com apoios divididos. Devo dizer que, para esta rubrica, a DGARTES investe 665 000 € mais as acções tripartidas, que são outros 600 000, portanto, há aqui um investimento de 1,2 milhões de euros no Território-Artes.
Página 90
90 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
É bom que o relatório da DGARTES sobre esta matéria nos chegue, e rapidamente (embora concorde inteiramente com a Sr.ª Deputada quando diz que este relatório de apreciação já devia ter vindo há mais tempo), para vermos se 1,2 milhões de euros anuais estão ou não a ser bem aplicados.
Evidentemente, o que nos tem faltado — isto no âmbito geral, não me refiro à cultura, refiro-me à organização da nossa sociedade, dentro e fora do Governo — é avaliação. Precisamos de estar mais disponíveis e mais estimulados por uma avaliação para tirar as devidas ilações e saber fazer melhor. Portanto, é preciso que este relatório nos seja entregue rapidamente para percebermos, relativamente a estes 1,2 milhões de euros anuais, o que é que está a acontecer a este investimento.
É que, de facto, há aqui uma verba que é investida, é gasta e revitaliza também a tal rede de cineteatros — que a Sr.ª Deputada Catarina Martins assinala que significa uma estratégia confusa para a Ministra da Cultura — , e, portanto, há aqui verba que está a ser aplicada que tem de ser devidamente avaliada, e sê-lo-á! Relativamente à confusão da rede de cineteatros, Sr.ª Deputada, não estou confusa sobre esta matéria; penso é que a Sr.ª Deputada poderá estar a fazer alguma confusão. Os cineteatros não são do Ministério da Cultura.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Eu sei!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Muito bem! Portanto, não sendo do Ministério da Cultura, vou repetir o que disse há pouco e que não significa confusão, significa uma aferição muito clara de que, não sendo nossos, assumimos a responsabilidade para que eles encontrem uma forma de serem úteis aos cidadãos. E é nesse reconhecimento dessa responsabilidade que temos de encontrar uma forma de, simultaneamente, apoiar os agentes e os teatros, e interagi-los de maneira a que estes dois vectores indispensáveis para a sustentabilidade do sector funcionem.
Este reconhecimento existe e não há nenhuma confusão: não são nossos mas podemos dar passos no sentido de ultrapassar este problema. Mas, volto a dizer, não são nossos! Não estou a imaginar, a minha confusão não chega a este ponto! Olho para os números e vejo que o orçamento da cultura cresceu 12,8% e, portanto, acabemos com esta ideia falsa de que eu estou a imaginar que ele cresceu! Cresceu pouco, mas cresceu 12,8%.
Vamos, pois, clarificar este assunto de uma vez por todas: o orçamento da cultura cresceu 12,8% e cresceu mais do que a maioria dos outros ministérios. Portanto, não há aqui imaginação, Sr.ª Deputada! Quanto ao apoio às artes, ele foi reforçado em 1,1 milhões de euros. Este ano, no tal cenário em que não existe aumento, em que estamos todos «a imaginar», já aumentámos o apoio às artes em 1,1 milhões de euros, ou seja, 800 000 no apoio semestral e mais 300 000 no apoio anual. Em suma, há, de facto, um aumento clarificado e quantificado no apoio às artes.
Quanto à língua, património, artes, internacionalização, de facto, está inscrito no Programa do Governo e é um objectivo importante. Como há pouco falei, estou a envidar esforços no sentido de se criar também um fundo de internacionalização das artes portuguesas.
Entretanto, a língua, património e artes estão englobados e têm subsectores previstos nas rubricas quer do Fundo da Língua Portuguesa, que é uma das parecerias que temos com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, quer da DGARTES quer do GPEARI (Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais). Serão, pois levadas a cabo uma série de iniciativas, que incluem o Brasil, Moçambique e a Ásia. Particularmente em 2010, as iniciativas serão mais centradas no Brasil e em África, havendo duas ou três iniciativas em que estamos a apostar. Também em Cabo Verde está em curso uma iniciativa importante de recuperação de património.
Isso faz parte dos nossos objectivos, das nossas estratégias, com pouca ou mais verba, e também estaremos à altura de corresponder a esta obrigação de assegurar a visibilidade dos nossos artistas fora das nossas fronteiras e também de assegurar que os vestígios da passagem dos portugueses no mundo sejam salvaguardados.
Gostava de terminar com uma pequena chamada de atenção que me parece muito importante e que muitas vezes não é tida em conta.
A verdade é que o Ministério da Cultura — contrariamente a algumas opiniões que, às vezes, são expressas em colunas, talvez opiniões menos fundamentadas — apenas gasta 7% com as chamadas áreas
Página 91
91 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
de suporte. Portanto, o Ministério da Cultura tem uma divisão entre os arquivos e bibliotecas, o património, o apoio às actividades socioculturais, o apoio às artes e, até, ao cinema, ficando apenas uma «fatia da laranja», de 7%, para apoio aos seus próprios sistemas de suporte, o que significa uma gestão rigorosa e uma contenção de custos que queria aqui sublinhar, para ficar o mais liberto possível para aquilo que é o objectivo máximo da nossa actividade que é o investimento na cultura.
O Sr. Presidente: — Agradecendo a presença de todos, concluímos assim a nossa audição. Os nossos trabalhos prosseguem já em seguida com a audição do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Pausa.
Continuamos com a discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2010, com a presença do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, relativamente ao orçamento para a comunicação social. Seguiremos a grelha de tempos acordada.
Começo por cumprimentar e agradecer a presença do Sr. Ministro e de todos os Srs. Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura e, sem mais, passo a palavra ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, para uma intervenção inicial.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me, então, que passe a apresentar as linhas gerais do orçamento na área da comunicação social.
Como é evidente, à luz da informação que foi distribuída, trata-se de uma área em que a valência orçamental é bastante limitada. Permitam-me até lembrar que, na orgânica do Governo, vivemos na singularidade que resulta da circunstância de o Ministro dos Assuntos Parlamentares se integrar no Ministério da Presidência, não tendo, portanto, um Ministério autónomo, o que também não precisa, organicamente, sem embargo de ao Ministro dos Assuntos Parlamentares estar distribuída a área da comunicação social e, nela, o Gabinete para os Meios de Comunicação Social, organismo em relação ao qual se reporta o essencial da matéria orçamental, sem embargo dos aspectos que têm a ver com as empresas do serviço público de comunicação social, a RTP e a Lusa.
No que diz respeito ao orçamento de funcionamento, o chamado funcionamento corrente, gostaria de vos dizer que ele se reporta ao Gabinete os Meios de Comunicação Social, sendo que o orçamento previsto para 2010 é idêntico, no seu significado, ao orçamento estabelecido para 2009. Segundo me pude aperceber, há uma ligeira variação entre as verbas que estão indicadas no documento que distribui à Comissão e aquelas que estão consignadas no Relatório apurado em sede de Comissão, e isto por uma razão muito simples: o Relatório da Comissão leva em conta uma verba marginal de receitas próprias resultantes da actividade deste Gabinete, que tem a natureza de Direcção-Geral, como sabem, enquanto que o documento que fiz circular não leva em conta esse acréscimo marginal de receitas próprias. Estamos a falar de uma oscilação muito reduzida, de 10,086 milhões de euros, para 10,290 milhões de euros. Aproveito para esclarecer isto desde já porque não há razão para haver aqui qualquer dúvida, na medida em que esta diferença, de cerca de 200 mil euros, é sobretudo proveniente da actividade do Gabinete, que, como sabem, faz a gestão do edifício do Palácio Foz, e da facultação das suas instalações para eventos vários que têm a sua contrapartida no aproveitamento dessas instalações resulta uma verba de receitas próprias que justifica este diferencial.
Dito isto e sublinhando que há uma total simetria quanto às verbas orçamentadas em 2009 em relação àquelas que ocorrem em 2010, gostaria de fazer um paralelismo, que se reporta a um ciclo gestionário nesta área dos meios para a comunicação social.
Permitam-me que tome como referência o ano de 2005, ano em o governo anterior iniciou funções, e aquele em que agora nos encontramos. O orçamento que foi necessário inscrever — e isso foi feito por via do Orçamento rectificativo que foi aprovado no início de 2005 — implicou ainda consignar para esta área uma verba muito próxima dos 20 milhões de euros, mais precisamente 19 736 929 euros, para fazer face ao conjunto dos encargos que, na altura, implicava a actividade do sector.
Página 92
92 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Com as reformas entretanto produzidas, nomeadamente as reformas relativas ao sistema de apoio ao que antigamente era conhecido por «porte pago» e que hoje designamos de outro modo, bem como as relativas aos apoios à comunicação social que é transferida entre o continente e as regiões autónomas, ou vice-versa, e uma solução de maior rigor na gestão de subsídios, permitiu ao Estado uma poupança muito significativa, praticamente da ordem de metade do orçamento de 2005 face ao orçamento com que nos confrontamos no presente. Esse é certamente um sinal positivo relativamente ao rigor das nossas contas públicas, em particular neste sector.
Mais em detalhe, o que poderemos verificar das rubricas que estão ao vosso dispor é que se prevê um aumento de 2009 para 2010 na rubrica «pessoal». Isto resulta de uma necessidade sentida pelo Gabinete para os Meios de Comunicação Social que tem a ver com o seguinte: como sabem, este Gabinete surgiu na sequência de uma reforma do antigo Instituto da Comunicação Social, que viu, aquando da concretização dessa reforma, algumas das suas funções transferidas para a ERC.
Portanto, o âmbito de atribuições do Instituto de Comunicação Social no passado passou a ser mais restrito, por esta divisão de missões, relativamente ao actual Gabinete para os Meios da Comunicação Social.
Mas, ainda assim, em 2006 e já depois desta transição ter sido feita, este Gabinete contava no seu quadro com um número de efectivos de 52 unidades e em 2009 conta apenas com 41 unidades. Naturalmente, o Gabinete tem vindo a chamar a atenção da tutela para as dificuldades funcionais que experimenta e é sua expectativa que ao longo do ano de 2010 pudéssemos reforçar, ainda que de maneira modesta, a possibilidade de incrementar o pessoal qualificado no âmbito do Gabinete.
Há assim uma proposta para que tentemos recrutar um número não superior a seis efectivos — é apenas disso que estamos a falar — ao longo do ano de 2010.
Por outro lado, gostaria de sublinhar que as verbas crescem também em função das taxas de contribuição para a Caixa Geral de Aposentações, que, como sabem, em 2010 sobem para 15 % quando antes eram apenas de 7,5% e, consequentemente, isso irá onerar também as despesas com pessoal, embora no equilíbrio geral do Estado seja um jogo de soma zero.
Finalmente, estando em curso um programa de estágios na Administração Pública, há também o propósito deste Gabinete vir a poder acolher alguns estagiários desse programa, sendo que, se tal se concretizar, deverá suportar o equivalente a 50% dos encargos daí derivados, e isso significa o aumento da despesa prevista com pessoal que está consignado na estrutura orçamental.
Em contrapartida, no que diz respeito aos bens e serviços, temos uma situação mais ou menos equivalente ao ano anterior. Por outro lado, gostaria de sublinhar que no domínio das transferências correntes há também um aumento da dotação aqui prevista em contrapartida da diminuição dos apoios diversos à comunicação social. Trata-se exclusivamente — exclusivamente, repito — de uma forma diferente de proceder à arrumação de rubricas, e isto em resultado de um parecer do Tribunal de Contas quanto ao melhor modo de tornar transparentes as contas do Gabinete para os Meios de Comunicação Social.
Estou a falar em concreto daquilo que antes era averbado na rubrica «apoios diversos à comunicação social» e que agora aparece em «transferências correntes», de forma que podemos identificar da seguinte maneira: quais são as transferências correntes que se fazem através do Gabinete? São verbas para quatro entidades: o CENJOR, que é, como sabem, o Centro Protocolar de Formação Profissional para Jornalistas; a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, entidade independente estabelecida nos termos da lei; o Observatório para a Comunicação Social, que é também uma entidade independente e que resulta, aliás, da concertação com entidades privadas do meio da comunicação social; e, ainda, a Associação Museu da Imprensa, que também implica uma transferência anual regular.
Estas quatro entidades são beneficiárias de transferências correntes perfeitamente limitadas e estas rubricas deixam de estar consignadas nos «apoios diversos à comunicação social», que por isso têm uma diminuição relativa relativamente ao orçamento de 2009, aparecendo agora nas «transferências correntes», que por esta razão têm um acréscimo relativo.
Da compensação destas rubricas resulta, como disse, um jogo de soma zero, dado que há uma equivalência completa na matéria das despesas de funcionamento corrente entre o orçamento para 2009 e o orçamento para 2010.
Dito isto, passo à matéria relativa aos apoios à comunicação social, que são de dois tipos: os chamados incentivos directos e os chamados incentivos indirectos.
Página 93
93 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Nos incentivos directos temos os incentivos à consolidação e desenvolvimento das empresas de comunicação social regional e local, temos incentivos à edição de obras sobre comunicação social e temos os chamados incentivos específicos, que têm, aliás, um significado muito diminuto em relação ao conjunto das verbas neste sector.
No que diz respeito aos incentivos à consolidação e desenvolvimento das empresas de comunicação social regional e local há uma verba orçamentada de cerca 1,296 milhões de euros. Esta verba trás consigo um elemento de acréscimo para permitir que o esforço para apoiar a modernização das empresas do sector regional e local da comunicação social possa ser mais efectivo em 2010.
Portanto, no esforço relativo dos incentivos à consolidação, nos incentivos à comunicação social, o domínio do apoio directo às empresas é aquele em que procuraremos fazer um esforço mais significativo, dadas, por um lado, as dificuldades que o sector atravessa, face às dificuldades gerais da nossa própria economia, e, por outro, os desafios de modernização, nomeadamente a tecnológica, que está em curso nos meios de comunicação social, fazendo por isso todo o sentido que seja aqui que estabeleçamos a nossa prioridade.
Também ao nível dos incentivos à edição de obras sobre comunicação social a verba mantém-se muito semelhante ao esforço que tem vindo a ser feito para apoiar a edição de obras e estudos que valorizem a componente de investigação, de ensaio, de reflexão na vasta área da comunicação, dando assim um contributo de apoio quer aos autores quer às editoras que se ocupem destes domínios. É um esforço que tem vindo a ser feito todos os anos e que, naturalmente, procuraremos manter em 2010.
Os incentivos específicos são aqueles que são mais reservados às iniciativas que têm a ver com conferências e outros eventos vários com relevo na área da comunicação social.
No domínio dos apoios indirectos, gostaria de sublinhar o seu desdobramento.
O antigo regime do porte pago, hoje designado como incentivo à leitura, é aquele onde manifestamente tem sido possível desenvolver uma orientação com resultados financeiros muito significativos. Se em 2005 a verba alocada ao regime do porte pago teve de ser superior a 11 milhões de euros, estamos hoje com uma verba da ordem dos 5 milhões de euros, portanto, menos do que em 2005, graças a soluções mais rigorosas no modo de estabelecer estes apoios e no modo de, em concreto, lhes dar a devida ênfase.
Também tem havido um rigor muito significativo relativamente aos incentivos à expedição das publicações periódicas para as regiões autónomas. Tomando também 2005 como ano de comparação, enquanto nesse ano a verba alocada foi da ordem dos 2,5 milhões de euros, para 2010 temos um verba de 1,120 milhões de euros e isso também resulta do facto de, em função da revisão do regime legal que apoia esta área, se ter vindo a estabelecer que o apoio é apenas devido às publicações periódicas de informação geral, o que quer dizer que as publicações especializadas que não tinham a ver com o grande público e não resultavam num incentivo à comunicação social propriamente dita, tendo sido possível fazer esta distinção entre as publicações realmente merecedoras de apoio e aquelas que, pela sua natureza, não justificavam este tipo de apoio, resultou uma política real de poupança para o Estado que está agora consignada nas verbas que acabei de vos referir.
Quanto ao PIDDAC deste sector, ele é realmente muito modesto, como todos poderão convir. É por isso mesmo um PIDDAC que tem um significado muito restrito, baixando em relação a 2009 cerca de 23%, mas é um PIDDAC que, sendo de 699 mil euros, não altera nada de significativo em relação ao que tem sido o esforço de investimento dos últimos anos.
Chamo a atenção para o facto de esse esforço de investimento estar ligado numa parte significativa à cooperação que se faz com os órgãos de comunicação social dos países de língua oficial portuguesa, sendo que esse esforço continua a manter-se para o ano de 2010, havendo ainda rubricas onde é possível baixar o esforço de anos anteriores, nomeadamente quanto à aquisição de equipamentos para o próprio Gabinete, dado que esse esforço de convergência tecnológica está agora mais assegurado pelo que não carece do mesmo montante de anos anteriores.
Queria também chamar a atenção para o facto de o esforço para a criação do portal para as publicações periódicas de âmbito regional e local não carecer do mesmo montante, uma vez que esse portal entrou agora em «velocidade de cruzeiro». Precisa ainda de alguns incrementos de qualidade tecnológica para melhorar o seu serviço, mas já não com o mesmo esforço financeiro.
Há duas áreas de inovação neste PIDDAC, com a criação de dois portais, um a que chamamos portal para a literacia dos media, e outro, já aqui referido por mim em reunião anterior, que é o que virá a consignar o
Página 94
94 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
registo da publicidade institucional. Ambos os portais têm agora uma previsão orçamental de investimento para poderem ser criados em 2010.
O restante das verbas é alocado à conservação do Palácio Foz e do seu património móvel. Como sabem, é um Palácio que está submetido à gestão do Gabinete para os Meios de Comunicação Social, sendo que é aí que o Gabinete está instalado, e, portanto, para obras de manutenção, está aqui também uma janela financeira para permitir que esse esforço de boa gestão do Palácio possa continuar igualmente em 2010.
De maneira sucinta, aqui têm aquilo que é o orçamento para a aérea da comunicação social, que, conforme disse no início, é naturalmente um orçamento limitado no seu alcance, visando, todavia, prosseguir os objectivos de serviço público que estão legalmente consignados manifestamente com um propósito de rigor que se traduz nesta significativa diminuição de despesa, quando comparada a lógica plurianual da sua evolução.
Como sabem, além destas matérias, temos ainda as matérias ligadas à área da televisão e da Lusa.
Basicamente, o que está aqui em causa é a componente que diz respeito à concretização daquilo que foi o acordo para a reestruturação financeira da RTP, acordo esse que, como sabem, resulta de uma solução legal que foi estabelecida em 2003, ao definir o novo modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão, sendo que desde esse ano essa disposição legal tem vindo a ser cumprida ano a ano, através das indemnizações compensatórias e através do reforço do capital.
É, portanto, no cumprimento estrito da lei que estas soluções de financiamento têm vindo a ser executadas e o ano de 2010 será, por isso, semelhante àquilo que tem sido o esforço pedido ao Estado em anos anteriores.
Mesmo no que diz respeito à taxa do audiovisual, que foi também criada a partir dessa Lei n.º 30/2003, há uma variação muito ligeira, para menos, relativamente à previsão de receitas a arrecadar que tem uma explicação muito simples. Considerou-se no Orçamento do Estado uma solução para a taxa do audiovisual visando desonerar o sector económico da agricultura do pagamento duplicado e às vezes triplicado desta taxa, dado que os agricultores eram onerados pelo pagamento desta taxa nas explorações agrícolas. Essa sempre foi uma crítica legitimamente feita que procuramos agora corrigir e daí uma diminuição marginal da contribuição da taxa do audiovisual.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, pedia-lhe que concluísse dado que o seu tempo se esgotou.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Dado que estas transferências também são do conhecimento dos Srs. Deputados, penso que posso evidenciar apenas que os resultados de actividade, ano económico após ano económico, da parte da RTP, tirando, naturalmente, a carga financeira negativa que vem de trás, têm sido resultados positivos em 2005, 2006, 2007 e 2008, não estando ainda apurados os de 2009. Porém, estou em condições de informar a Câmara, segundo informação do Conselho de Administração da RTP, que eles serão igualmente positivos no ano de 2009.
Para concluir, em relação à agência Lusa, em que há uma contribuição pública, como sabem, também no que diz respeito à sua fonte de financiamento há uma componente que tem a ver com a indemnização compensatória pela área de serviço público que a Lusa também concretiza. É uma componente fixa da ordem dos 17,965 milhões de euros para o ano de 2010, em tudo em linha com o que tem ocorrido em anos anteriores.
Os resultados de actividade da Lusa, tomando também como referência os anos de 2005 até hoje, têm sido também eles positivos em cada um dos anos, o que me apraz sinalizar por ser positivo.
Creio que esta é a forma sintética de vos apresentar o Orçamento na área da comunicação social.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, muito obrigado pela apresentação do Orçamento que efectuou.
Passamos agora à primeira ronda de perguntas, em que cada grupo parlamentar tem 8 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Leitão Amaro, do PSD.
Página 95
95 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Vou começar exactamente por aquele tema a que o Sr. Ministro dedicou menos tempo mas que representa, naturalmente e de longe, o maior montante, que é o serviço público de rádio e televisão.
Segundo as contas enviadas pelo seu Ministério, no ano de 2010 a RTP vai receber do Estado, isto é, dos contribuintes, 319 milhões de euros. Repito, 319 milhões de euros, que serão pagos pelos portugueses. São 145 milhões de euros de indemnização compensatória, 112 de contribuição para o audiovisual e 63 em aumento de capital.
A RTP é, de longe, a empresa que mais vai receber em indemnização compensatória. Ora, o Estado é o accionista da RTP, o seu Governo é o responsável pela gestão desta participação e o seu Ministério é quem tem de responder por este gigante sorvedouro de recursos públicos, de 319 milhões de euros só num ano.
Vamos por isso escrutinar esta situação da RTP e perceber como é que é possível que este «monstro» tenha continuado a crescer.
Olhando para as contas de 2008, percebemos que a situação económica e financeira da empresa se começa a degradar e, permita-me que alerte para esta correcção, não está a ser escrupulosamente cumprido o acordo de reestruturação financeira de 2003.
Se não, vejamos: o resultado líquido de 2005 está muito abaixo do previsto no acordo de reestruturação — são menos 30%, menos 15 milhões de euros.
Os resultados operacionais de 2008 ficam 21% abaixo do previsto, com menos 2,3 milhões de euros.
O resultado financeiro piora 23% de 2007 para 2008 e se voltarmos atrás percebemos que o resultado de 2008 é negativo em mais do dobro em relação aos anos de 2005 e 2006.
Há uma grande quebra no investimento, com menos 74% no ano de 2008, sem se perceber como é que assim se vai avançar com os investimentos necessários para a transição para o digital.
Houve uma pequena redução dos custos operacionais em 2008 face a 2007, mas foram sobretudo devidos à alteração ao regime de IVA. A verdade é que se olharmos para trás, para os anos de 2005 e 2006, vemos que há um aumento brutal dos custos operacionais em 2008 em relação a esses anos — de 264 milhões de euros passámos para 290, ou seja, 25 milhões de euros a mais.
O número de trabalhadores continua a aumentar — e tem vindo a aumentar nos últimos dois anos — , os resultados operacionais, como referi, caíram e registou-se uma quebra nas receitas comerciais de cerca de 4,9%, mesmo com a contribuição para o audiovisual.
Sr. Ministro, também lhe peço que não responda a esta questão invocando a existência desse acordo de reestruturação e que, sobretudo, não faça o truque habitual de tentar atirar as responsabilidades para os governos do PSD. É que, repare-se, este acordo de reestruturação era, na altura, a única maneira de a empresa sobreviver, foi absolutamente necessário — e, naturalmente, para reparar uma situação que tinha muito a ver com a gestão levada a cabo nos anos da anterior governação socialista.
Mas o problema é que a RTP nem sequer está a cumprir esse acordo — nem a RTP, nem o Estado. Como já referi, os resultados operacionais e os resultados líquidos estão abaixo do previsto no acordo, estão longe de ser atingidos. Mas também o Estado não tem cumprido escrupulosamente as suas obrigações ao abrigo do acordo. Como consta do Relatório e Contas do ano de 2008, e até segundo parecer do Conselho de Opinião da RTP, o Estado não cumpriu (pelo menos, atempadamente) a sua obrigação de, designadamente, fazer uma dotação de capital de 56 milhões de euros.
Ora, o que tem feito o Governo para melhorar esta situação? Nada! Não resolve o descontrolo financeiro da RTP, como devia, na qualidade de accionista, e não cumpre atempadamente as suas obrigações.
Sr. Ministro, as primeiras perguntas são, portanto, as seguintes: que pensa fazer o Sr. Ministro para evitar o aprofundamento deste descontrolo financeiro da empresa de que o Estado é accionista? Que medidas tomará para que a RTP regresse ao cumprimento — escrupuloso, sim — do acordo? E não acha que é tempo de repensar eventualmente uma revisão — como, aliás, tem sido sugerido pelo Presidente da RTP — deste acordo? Tendo passado sete anos, tendo-se verificado alguns dos pressupostos, mas tendo havido uma evolução natural, até do desempenho da empresa, não faria sentido pensar numa revisão? Numa outra dimensão, gostaria ainda de questioná-lo sobre estes mesmos 319 milhões de euros. Antes, porém, aproveito para fixar o seguinte: o Partido Social Democrata não contesta a importância de haver um apoio do Estado ao serviço público de rádio e televisão; exige, sim, que este apoio, o dinheiro dos
Página 96
96 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
contribuintes, não seja desperdiçado por gestões menos exigentes, mas sirva, sobretudo, para apoiar o que é verdadeiro, bom e necessário serviço público.
Ora, gostava de lhe perguntar o que pensa sobre a RTP2 e a forma como está a cumprir, ou não — todas as vozes o dizem — , o objectivo que lhe foi determinado, designadamente a sua vertente de programação comunitária e colaborativa.
As rádios Antena 3 e Antena 2 são frequentemente acusadas — designadamente, no relatório do Conselho de Opinião — de não terem rumo, não se sabendo exactamente sequer qual é o público-alvo a que se dirigem, pelo que todas as métricas que estão a ser usadas para, eventualmente, as considerar um sucesso estarão incorrectas.
Mas, mais, quanto à RTP Internacional, o Conselho de Opinião diz que tem um modelo esgotado, já não sendo sequer a televisão de Portugal para o mundo.
A RTP N tem um tipo de produto que já é oferecido por concorrentes. Ora, não estaremos perante um caso de concorrência desleal, de uma empresa que está, com dinheiros públicos, a concorrer com empresas privadas que oferecem exactamente o mesmo produto concorrencial e, com isso, com essa concorrência desleal, a enfraquecer esses grupos de comunicação social, sabendo que a sua situação económica e financeira já é tão frágil e que, naturalmente, essa fragilidade prejudica também o seu grau de independência face ao poder político e ao poder económico? Finalmente, Sr. Ministro, a RTP África é suposto ser um espaço de comunicação também de Portugal para África, mas a sua programação é cada vez mais local e menos de Portugal.
Consideramos que é importante e defendemos o esforço feito para apoiar os meios de comunicação social dos países de língua oficial portuguesa. Mas, Sr. Ministro, para isso, existe outra verba de 500 000 € no orçamento. Não considera que a RTP África poderia ser muito mais uma televisão de Portugal para o mundo e de Portugal para África? O que pensa fazer sobre estes temas? Um outro tema sobre o qual gostaria de interrogá-lo, Sr. Ministro — e porque, a propósito desta questão, já aqui falámos em independência da comunicação social da RTP N — tem a ver com a publicidade do Estado.
O Sr. Ministro, e bem, na sequência da promessa que fez a esta Comissão, consagrou no orçamento o tal portal para a publicidade. Em primeiro lugar, gostaria de saber quais os prazos para a sua entrada em funcionamento. Presumo que, havendo um valor, já haja estudos que suportem o desenvolvimento deste portal e, por isso, uma data estimada para o seu início.
Mas, mais importante, muito mais importante, Sr. Ministro, gostaria que me dissesse quais são os tipos de fluxos financeiros que irão ser divulgados neste portal. Obviamente, não podemos contentar-nos, simplesmente, com a publicidade institucional. A publicidade institucional é importante, seja no caderno principal, seja nos classificados, mas não chega. Há muitos outros fluxos financeiros, através de patrocínios, apoios a produções ou serviços encomendados aos órgãos de comunicação social, que são relevantíssimos.
Ora, Sr. Ministro, a minha pergunta é esta: pode assegurar-nos que todos os fluxos financeiros do Estado, entidades públicas e entidades controladas pelo Estado, todos os fluxos financeiros sem excepção, vão constar deste portal da publicidade? Finalmente, e gozando um pouco da mesma tolerância atribuída ao Sr. Ministro, quero fazer-lhe uma pergunta sobre a Televisão Digital Terrestre (TDT). Sr. Ministro, como todos sabemos, daqui a dois anos, cessarão as emissões da televisão analógica. Isto significa que todos aqueles que não tenham comprado televisões digitais ou descodificadores ficarão «às escuras». Isto é relevante para aquelas populações que são particularmente dependentes da televisão para entretenimento, informação e, até, inclusão na comunidade.
Sr. Ministro, o que é que o Governo está a fazer para assegurar que as camadas sociais mais desprotegidas e mais frágeis não tenham de pagar e possam estar em condições para suportar esta transição? É que, pela nossa parte, não vemos qualquer benefício que não seja para a operadora de Televisão Digital Terrestre: não vai haver quinto canal; não vai haver alta definição, pelo menos, em todos os canais; e já não vai haver televisão digital paga.
Portanto, Sr. Ministro, qual é o apoio que o Estado está a pensar conceder à transição para o digital, designadamente apoio económico-financeiro às famílias mais desprotegidas e também apoio técnico à instalação? E vai ou não exigir da Portugal Telecom comunicações que se associem ao esforço para apoiar esta transição?
Página 97
97 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Entretanto assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente, Teresa Venda.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Leitão Amaro, sobre a RTP, quero dizer-lhe aquilo que, em meu critério, conta. Ora, aquilo que, em meu critério, conta é que, de facto, o Acordo de Reestruturação Financeira está a ser integralmente cumprido por parte do Estado, como resulta, aliás, dos números consignados no Orçamento do Estado para 2010 em matérias de indemnização compensatória e de reforço de capital e também de um acordo celebrado, em relação a ano anterior, quanto à compensação prevista relativamente aos valores do IVA, a que, creio, há pouco, também aludiu.
E, mais, se o resultado operacional da empresa, de ano para ano, tem vindo efectivamente a ser positivo, e se estou em condições de assegurar — porque assim me assegura também o Conselho de Administração da RTP — que será igualmente positivo em 2009, apesar da crise que afectou o conjunto dos órgãos de comunicação social e, particularmente, como os interessados têm referido, as próprias televisões do sector privado, isto significa que, de facto, temos tido uma preocupação em manter uma gestão adequada segundo o compromisso assumido de cumprirmos esse acordo — e, volto a sublinhá-lo, ele tem sido cumprido à risca.
Se o Sr. Deputado quiser discutir aquilo que são os critérios internos de gestão da RTP, vou dizer-lhe, com muita frontalidade, que não deve fazê-lo comigo. É que a RTP é uma empresa do sector público, é uma sociedade anónima, relativamente à qual há uma relação que não é de tutela directa, e os critérios de gestão são da responsabilidade do seu Conselho de Administração. E o Sr. Deputado certamente não ignorará que, apresentado o relatório do ano correspondente, que deverá ser feito em Março deste ano, esta Comissão, perante a qual agora me encontro, tem a prerrogativa de chamar o Conselho de Administração e de, com ele, avaliar, em concreto, os seus critérios de gestão.
Do que se trata, portanto, comigo, Sr. Deputado, é de podermos avaliar se ainda há consenso — e julguei ouvir da sua parte uma afirmação nesse sentido — quanto a mantermos o compromisso, que vem desde o ano de 2003 e que foi celebrado, então, por um governo do seu partido, no que diz respeito a este esforço financeiro por parte do Estado em relação à Radiotelevisão Portuguesa. E se assim é, vamos procurar manter este esforço.
Também não digo que o acordo não venha a carecer de ser revisto, quanto ao tipo de relações de financiamento que foram inicialmente estabelecidas, sobretudo se, face à evolução dos mercados, tal se revelar necessário e se da parte do próprio Conselho de Administração vier a haver uma efectiva solicitação à tutela — neste caso, à área do Tesouro — para que possa haver um trabalho de revisão das soluções correspondentes ao acordo de financiamento da empresa.
Veremos isso com cautela, com prudência. Não descarto essa possibilidade, mas, se me permite, cada coisa a seu tempo.
Relativamente ao ponto que referiu sobre a posição da RTP N, a verdade é que, como sabemos, o âmbito do serviço público de televisão que se inscreve no conceito europeu de âmbito do serviço público permite que as operadoras de televisão definam com autonomia o seu modelo de serviço público. Ora, este modelo, tal como está definido, é um modelo que corresponde inteiramente a um critério europeu de serviço público.
Portanto, essa alegação, de que o facto de existir a RTP N implica uma atitude de concorrência desleal, não tem fundamento em relação àquilo que é, ao nível dos vários operadores de televisão num modelo de serviço público europeu, a correspondência justamente nesses modelos de serviço público. E se não tem fundamento num quadro comparativo europeu, não vejo por que haveríamos de importar para Portugal esse conceito de concorrência desleal que o Sr. Deputado referiu, mas que não tem correspondência naquilo que é o âmbito de serviço público em muitos dos operadores de serviço público num quadro europeu.
E sendo que justamente este âmbito de serviço público é também o âmbito que, hoje, é reconhecido pela própria Comissão Europeia, não vejo, portanto, qual o critério, qual a bitola, qual o entendimento para podermos retirar a ilação que retirou. Não o acompanho, pois, nesse seu juízo.
Já quanto aos canais internacionais — e não diria apenas o canal RTP África mas também a RTP Internacional — , penso que faz todo o sentido que possamos reflectir sobre a importância de termos um conceito estratégico relativamente à vocação dos canais internacionais.
Página 98
98 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
O serviço público na esfera internacional passa certamente muito pela valorização da posição de Portugal no mundo. Nesse aspecto, já faço parceria consigo relativamente à evidência de uma preocupação neste domínio. É, pois, também uma preocupação minha.
Assim, penso que poderemos vir a reflectir sobre esta matéria — e creio que também será um bom tema para, se o entenderem, aprofundarmos na Comissão — justamente para procurarmos definir um conceito que possa ser de afirmação estratégica de Portugal no contexto internacional e também na relação com os países de língua oficial portuguesa, particularmente no que diz respeito ao canal RTP África, e para que possamos criar, também aqui, um consenso bastante amplo em torno de uma matéria que, faz-me sentido, possamos sobre ela reflectir. Devo, aliás, chamar a atenção para o facto de o próprio Conselho de Administração da RTP, no seu programa de actividades e nos objectivos de aperfeiçoamento do serviço público, inscrever a qualificação e a requalificação dos canais internacionais como o objectivo da sua actividade para o ano 2010.
Quanto à publicidade do Estado, creio que o Governo está precisamente a cumprir aquilo que aqui disse em comissão. Tomámos a iniciativa de preparar uma revisão da disposição legal em vigor, que era, aliás, muito restritiva, como sabemos, no que dizia respeito ao acompanhamento das acções de publicidade, reportado apenas à sua colocação na imprensa regional e local. Por outro lado, foi o Governo que tomou a iniciativa de lançar, de forma inovadora, a perspectiva da criação de um portal para identificar as acções de publicidade por parte dos organismos públicos. E, Sr. Deputado, francamente, ainda não concretizámos essa disposição legal — e não vou entrar agora numa matéria que há-de resultar de uma solução legislativa — e já o Sr. Deputado está a perguntar-me se esse portal vai resultar na colocação de todos os fluxos financeiros do Estado?! Eu não sei se percebi bem o alcance da sua pergunta nem sei se o Sr. Deputado também percebeu bem o significado do que estava a perguntar-me!? Os fluxos financeiros do Estado são os mais variados, nas mais variadas áreas dos sectores de actividade e há muitíssimas instâncias de publicitação desses fluxos financeiros, através dos diversos Ministérios, através de muitas outras plataformas electrónicas, através de outras soluções justamente pensadas para garantir o princípio da transparência e não faria qualquer sentido vir a transformar uma plataforma electrónica justamente para tratar da matéria da publicidade na plataforma na qual se concentrassem todos os fluxos financeiros do Estado.
Não é disso manifestamente que se trata, não é essa a sua vocação e, portanto, Sr. Deputado, a seu tempo, quando da concretização da solução legislativa, voltaremos, se o entender, a falar sobre o assunto.
Uma coisa é certa: com o propósito claro de concretizar aquilo que disse, o Governo já consignou a verba que, como o Sr. Deputado identificou, já está neste Orçamento para o efeito.
Em relação à Televisão Digital Terrestre, é, bem o referiu, e também estou de acordo consigo quanto a isso, um desafio de muito significado podermos operar, como está previsto, o switch off em 2012 e podermos fazê-lo em condições adequadas para que da Televisão Digital Terrestre possam beneficiar todos os portugueses, sem que haja um corte, uma ruptura nas transmissões televisivas, e estamos a falar de canal aberto.
Foi criada pela ANACOM, que é a entidade reguladora que tem a competência técnica na gestão deste processo, uma comissão de acompanhamento, que, aliás, foi prevista numa resolução do governo anterior para, justamente com o operador de sinal, que, como sabem, é a PT, vir a definir todas as condições de uma boa transição. Essa comissão de acompanhamento tem vindo a reunir com uma regularidade trimestral e a informação que tenho sobre os seus trabalhos é a de que têm estado a decorrer de forma satisfatória, de modo a garantir, em tempo adequado, não só a cobertura integral de todo o território em matéria de Televisão Digital Terrestre como todos os aspectos técnicos que suportem uma transição adequada.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Sr. Ministro, pedia-lhe para terminar.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Relativamente ao modo como se há-de perspectivar a acessibilidade por todos os cidadãos, será também o resultado desse relatório que essa comissão de acompanhamento que está a avaliar todos os seus aspectos nos virá a dar informação e eu aguardo também a informação adequada da dita comissão para todos podermos concluir — e assim espero que o possamos — que, em matéria de sinal aberto, tudo se fará nas melhores condições para servir os espectadores portugueses.
Página 99
99 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Fontes.
O Sr. Vítor Fontes (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, o âmbito de competência do Ministro dos Assuntos Parlamentares e dos serviços sob sua tutela explica a exiguidade dos recursos financeiros que lhe são afectados.
Ainda assim, são relativamente expressivas as verbas que nesta via são destinadas ao apoio à comunicação social e é particularmente meritório o esforço prosseguido desde 2005 e confirmado no Orçamento do Estado presente de definição e aplicação rigorosa e clara desses apoios, traduzidos numa redução substancial dos montantes aplicados no chamado «porte pago», ou seja, cerca de 50%, desde o momento em que o XVII Governo Constitucional iniciou funções.
A redução e a generalização do esforço de gestão rigorosa de todas as actividades conduzidas sob a direcção do Ministro dos Assuntos Parlamentares permitem, com a ampliação do seu âmbito e com a expectativa fundamentada e dos ganhos qualitativos, que o Orçamento do Estado para 2010 conserve exactamente a expressão quantitativa fixada para o Orçamento do Estado de 2009. Em tempos de redobrada necessidade de contenção da despesa pública e melhoria da eficiência da sua acção, é esse esforço que julgamos dever ser saudado e aplaudido.
Apesar da redução referida, no Orçamento do Estado para 2010 podem ser contempladas verbas para incentivos directos aos órgãos de comunicação social, verbas, essas, como o Sr. Ministro já teve oportunidade de afirmar, que são significativamente reforçadas. Se, em 2009, esta rubrica contou com uma dotação de cerca de 570 000 €, em 2010 este apoio quase triplica, atingindo o montante de cerca de 1,4 milhões de euros.
No contexto de crise generalizada, esse esforço do Governo é de assinalar como um forte instrumento de promoção do desenvolvimento do País à escala regional, distrital e local.
Pergunta-se, portanto, que objectivos, Sr. Ministro, espera o Governo alcançar com este reforço significativo e em que medida poderão esses incentivos colaborar para o desenvolvimento-modelo do tipo empresarial que permita a comunicação social regional e local portuguesa ser um verdadeiro agente de desenvolvimento e de promoção do emprego, particularmente entre jornalistas.
Aproveito o ensejo, Sr. Ministro, para saudar V. Ex.ª pela prontidão com que honrou um compromisso assumido aqui recentemente de adoptar medidas com vista à concretização da transparência da publicidade do Estado. Essa preocupação e esse compromisso político estão reflectidos no Orçamento do Estado e saúdo V. Ex.ª por essa resposta pronta e imediata, honrando, mais uma vez, o compromisso que assumiu perante esta Câmara de criação do portal, o qual se destina a ser um passo na divulgação pública, de forma transparente e exaustiva, das entidades com investimentos em publicidade, através de órgãos de comunicação social, identificação destes e os montantes envolvidos.
Trata-se, portanto, de um passo pioneiro e fundamental no sentido de tomar publicamente claro quais são as fontes de financiamento da comunicação social e, como tal, passo pioneiro e fundamental no reforço da sua independência e das liberdades de expressão e de imprensa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Vítor Fontes, começo por agradecer as suas palavras.
O Governo está a preparar, como já tive ocasião de dizer em intervenção anterior, a revisão de alguns instrumentos legislativos e um deles é a Lei da Rádio. O objectivo dessa revisão, como a seu tempo a Câmara tomará conhecimento até porque será concretizada na modalidade de uma proposta de lei e, portanto, será objecto necessário de debate parlamentar, visa criar uma maior robustez para a actividade de radiodifusão ao nível local, um dos objectivos significativos na revisão da lei, e, assim, criar condições para que o sector empresarial das rádios locais possa ter mais flexibilidade, se possa desenvolver melhor, se possa consolidar.
Por isso mesmo queremos associar a revisão da Lei da Rádio, criando maior flexibilidade e possibilidades de maior robustez à actividade da radiodifusão local, com a possibilidade de colocar mais instrumentos de apoio financeiro ao dispor da modernização das empresas de âmbito regional e local, nomeadamente esse sector dinâmico das rádios. Aqui tem, Sr. Deputado, uma das razões que nos levou estrategicamente a
Página 100
100 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
robustecer, como referiu, o segmento dos apoios económicos e financeiros na área da comunicação social a este sector das empresas de comunicação social regional e local.
Relativamente ao que referiu sobre o portal da publicidade, é como disse: procuraremos concretizar aquilo que foi o nosso desígnio e, para que disso não restassem dúvidas, as verbas aparecem já consignadas neste Orçamento do Estado.
Igualmente fiz referência, há pouco — se me permitem voltar agora a chamar a atenção para o efeito — , à criação, também inovadora, de um outro portal, o portal da literacia para os media. Trata-se de, também por aqui, contribuir para ajudar a um esforço de cidadania, ou seja, permitir que aos cidadãos, de uma maneira geral, possam ser disponibilizados os meios de reflexão, de informação, de aprofundamento de tudo o que tem a ver com as capacidades e as competências para a melhor acessibilidade ao mundo da comunicação social, que é um mundo, como todos sabemos, em profunda transformação tecnológica e que vai exigindo cada vez mais saberes, capacidades e competências para a sua melhor acessibilidade por parte dos cidadãos em geral.
Nada melhor, portanto, que, numa contribuição para a cidadania, podermos, com este portal da literacia para os media, dar, no fundo, uma linha de concretização do que vem sendo o apelo, por parte da União Europeia, do Conselho da Europa, da Unesco, no sentido de que os Estados possam colocar ao serviço das respectivas populações informação relevante nestes domínios.
Sistematizar informação existente no domínio da literacia para os media, disponibilizar ferramentas aos professores e aos educadores, criar as possibilidades de plataformas de trabalho comum e de coordenação aos próprios grupos que venham a dedicar a sua investigação nestes domínios, ajudar a que o portal seja também um fórum de discussão aberto a todos os interessados nesta temática, a maneira de suportar a realização de iniciativas que visem promover a literacia para os media, é por isso também uma área de inovação do reforço da cidadania que queremos igualmente poder concretizar em 2010.
Serão, ao nível destes instrumentos tecnológicos ao serviço dos cidadãos, três os portais em relação aos quais damos a nossa maior importância: o portal da publicidade institucional, o portal da literacia para os media e, igualmente, o portal para as publicações periódicas de âmbito regional e local, que, como sabem, foi uma iniciativa concretizada pelo governo anterior e que teve também um desenvolvimento já no quadro deste Governo, ao ter celebrado um acordo que envolveu a Associação Portuguesa de Imprensa e que com ela estabeleceu um protocolo, envolvendo-a na dinamização do portal que tem como vocação permitir à imprensa regional uma divulgação integral das suas publicações.
Este conjunto de três portais representa, assim, o nosso contributo para uma visão moderna e aberta da nossa sociedade de informação.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, em relação à RTP, eu tinha também a colocar algumas questões que já foram parcialmente respondidas.
Gostava só de dizer que, penso, o que aqui está em causa não é o princípio de que — pelo menos, para o CDS não é, para os outros grupos parlamentares não sei — a RTP presta um serviço público e que esse serviço público deve ser pago. A questão é a dos custos associados ao serviço público da RTP e se faz sentido a manutenção deste nível de custos no actual estado financeiro do País que, como sabemos, é difícil e que implica sacrifícios para tanta gente. Obviamente que o Sr. Ministro respondeu que acha que sim, é legítimo, mas também é legítimo da oposição questionar essas opções.
Estando nós esclarecidos quanto à questão da RTP, gostava de lhe colocar algumas questões em relação à Lusa. A Lusa tem indemnizações compensatórias bastante mais modestas que a RTP, como é, aliás, natural, e têm sido actualizadas a uma taxa que me parece razoável, ou seja, aumentam de acordo com o que me parece o nível geral dos preços.
A minha questão é a seguinte: verifica-se que os resultados operacionais da Lusa têm vindo a demonstrar alguma degradação ao longo dos anos. Por outro lado, chegaram-nos notícias — a par da criação da Lusa Corporate, mas não directamente relacionado com isso — do encerramento de algumas delegações da Lusa em vários pontos do País. Assim, Sr. Ministro, pergunto se considera que o serviço público prestado pela Lusa é de algum modo afectado pelo encerramento destas delegações e, havendo reestruturações ou modificações em curso na Lusa, o que se passa que justifique esta queda dos resultados operacionais.
Página 101
101 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Para além disto, tenho também algumas questões mais específicas que têm a ver com o orçamento propriamente dito.
Quanto ao Observatório da Comunicação Social, o Sr. Ministro falou de uma alteração contabilística. No entanto, é possível que tenha percebido mal, mas depreendi, pela leitura destes quadros, que estavam previstos para o Observatório da Comunicação Social e a Associação Museu da Imprensa 29 964 € em 2009 e agora estão, respectivamente, 89 000 € e 15 000 € em 2010. Gostaria de saber se isto ç assim e, sendo assim, o que é que justificou este aumento.
No que toca ao incentivo à leitura que substitui o porte pago, o Sr. Ministro falou numa aplicação mais rigorosa das dotações. Não podíamos estar mais de acordo, mas ficaria grata se pudesse dar alguns exemplos do que, na prática, significa esta aplicação mais rigorosa e que interpretação dos critérios está a se feita.
Quanto à regulamentação da publicidade do Estado, Sr. Ministro, compreendo que não possa pormenorizar nem entrar em todos os meandros do que vai ser a iniciativa legislativa do Governo. Contudo, e atendendo a que esta questão já foi levantada há algum tempo, esperava que nos pudesse densificar um pouco. Na altura, quando o Sr. Ministro veio à Assembleia, disse-nos que o Governo, em relação a esta questão da publicidade, iria ter uma iniciativa legislativa. No entanto, passaram alguns meses e ainda nada foi publicitado. Agora parece-nos, de novo, esta questão no Orçamento do Estado.
Assim, gostaria de saber para quando está prevista a publicação desta iniciativa legislativa, que, suponho, se tratará de um decreto-lei. Não querendo entrar nos meandros, chamo também a atenção de que esta não é uma questão de somenos. É essencial saber, quando estamos a falar de Estado, se vamos falar de Estado administração central ou também administração local e regional — suponho que o Sr. Ministro tem também em mente a administração local e regional. Como é importante saber se vamos falar também do que se chamam os fundos e serviços autónomos, institutos públicos e empresas públicas, porque, a não incluir esta dimensão, podemos estar a deixar fora da lei grande parte do problema — se existir um problema, porque a actual situação é de absoluto desconhecimento. Ou seja, chegam-nos rumores, mas não temos maneira nenhuma de ter absoluta certeza do que está a passar-se.
Quanto à questão dos fluxos financeiros, penso que ninguém pretende um portal com todos os fluxos financeiros do Estado. O que se pretende é que não seja restrito no portal o acesso à publicidade propriamente dita. Ou seja, há outras formas menos óbvias de publicidade, como, por exemplo, as parcerias.
Elas são absolutamente legítimas, é certo, mas também é absolutamente legítimo do Parlamento e do público em geral escrutinar que parcerias são feitas, por que entidades públicas e com que órgãos de comunicação social. Era este ponto que gostaria que esclarecesse.
Por último, no que toca à transição para o digital, creio que teremos oportunidade de discutir esse assunto com grande profundidade aqui, na Comissão de Ética, numa breve audiência, e certamente o Sr. Ministro também terá oportunidade de nos explicar com pormenor as ideias que tem para este sector. Contudo, gostaria de saber, quanto ao dividendo digital, como é que está a pensar utilizá-lo.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, começo por agradecer as questões que colocou.
Gostaria de dar uma palavra ainda sobre a questão do esforço financeiro, que reconheço que é, de facto, um esforço muito significativo da parte do Estado em relação à RTP. O tema não é um dogma. Considero, aliás, que este esforço que o Estado faz justifica-se em nome de um consenso que até agora foi possível estabelecer relativamente à importância de mantermos um serviço público de radiotelevisão e de radiodifusão.
Este esforço é justificado e tem havido uma grande convergência para que ele continue a ter lugar.
Trata-se, no entanto, de uma matéria que a todos responsabiliza e em relação à qual digo, com toda a franqueza, que, se houver dúvidas sobre critérios de gestão da RTP, como há pouco referi, há o momento certo para esta própria Comissão poder avaliar os méritos de gestão em concreto e, se houver dúvidas relativamente ao significado do esforço financeiro do Estado, que o digam também. O melhor é assumirmos,
Página 102
102 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
todos, plenamente as responsabilidades e a clareza das responsabilidades em relação a matérias sensíveis, e esta é, seguramente, uma matéria sensível. Nenhum de nós quer virar a cara a esse problema.
Relativamente à temática da Lusa, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que procurei informar-me junto da Agência relativamente a notícias que vieram a lume e também em resultado de alguns requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados, que em breve serão respondidos, sobre o significado de um eventual encerramento de delegações regionais da Lusa, particularmente em Coimbra, Évora e Faro. Quero dizer aos Srs. Deputados que a informação que obtive da parte de quem de direito me parece ser completamente tranquilizadora. Trata-se de eliminar custos supérfluos ao nível de instalações físicas — o que, tradicionalmente, era ligado à ideia de delegação — e não de eliminar, longe disso, a presença de jornalistas nas várias regiões do País, e nomeadamente nestas, para a cobertura adequada e suficiente do nosso território.
Estamos, assim, perante uma certa transformação qualitativa destas delegações em editores regionais, sendo que verdadeiramente o que estava em causa com estas delegações físicas era a necessidade de concentrar num ponto os meios de comunicação ou operacionais ao dispor dos jornalistas para exercerem as suas actividades. Ao longo deste tempo, houve uma modernização de meios tecnológicos por parte da Agência, permitindo hoje que, com muito mais flexibilidade e independentemente do local da cobertura dos factos, os editores regionais estejam plenamente em condições de editar directamente o seu material noticioso, não precisando, sequer, de se deslocarem fisicamente a um ponto para, a partir dele, fazerem um elemento referencial de emissão das suas notícias. De onde, portanto, é totalmente possível poupar em sede física o que foi possível gastar em melhores equipamentos, melhores tecnologias de comunicação e também em melhores condições de apoio aos correspondentes e jornalistas profissionais que trabalham nas diversas áreas e, consequentemente, garantir, de forma mais apurada, o esforço de cobertura do País em matéria noticiosa por parte da agência de informação.
Esta informação será, aliás, dada aos Srs. Deputados que a solicitaram através de um requerimento e poderão ter, nessa ocasião, também a confirmação destas minhas palavras.
Sr.ª Deputada, em relação ao que perguntou sobre o regime do porte pago, na verdade o que se vem a verificar de ano para ano é que o Estado optou por um novo regime jurídico que levou, de alguma maneira também, a uma situação que implicou um esforço pedido às próprias empresas para poderem conciliar a sua componente de comparticipação no então regime do porte pago com a contribuição do Estado. E foi criado um regime jurídico degradativo que implicou que em 2007 a comparticipação do Estado fosse de 60%, em 2008 fosse de 50% e que em 2009 e agora passe a ser de 40%. Portanto, a razão de ser de uma maior poupança é que foi possível reequilibrar o esforço pedido ao Estado e é esse esforço que agora se equilibra daqui para a frente, entrando, assim o espero, numa velocidade de cruzeiro na estabilização da aplicação do regime do incentivo à leitura.
Quanto à temática do portal relativo à publicidade, peço aos Srs. Deputados a paciência para aguardarem a definição do regime legislativo a que venho aludindo. No entanto, se melhor percebo agora a questão dos fluxos financeiros no que diz respeito exclusivamente ao que conta, e o que conta são os apoios à área da comunicação social, Srs. Deputados Cecília Meireles e António Leitão (que há pouco me colocou também a questão), não tenho nenhuma dúvida em considerar que este tipo de apoios merece ser subordinado ao princípio da publicidade. Julgo adequado, contudo, não confundir os planos nem a vocação deste portal para a publicidade institucional. Não terei também dúvidas em que noutro instrumento de acessibilidade, como seja o site do próprio organismo, isto é, do Gabinete para os Meios de Comunicação Social, haja uma evidenciação do que são os fluxos financeiros de apoio que estão a cargo do Gabinete para os Meios de Comunicação Social. Fica, assim, também da minha parte, com total transparência, a confirmação de uma orientação no sentido de que haja uma disponibilização do conhecimento desses fluxos de apoio aos organismos da comunicação social e a forma que me parece mais adequada é através do site do próprio organismo.
No que se refere à matéria do dividendo digital, penso que todos devemos aguardar com prudência um resultado de que tivemos notícia, qual seja, como todos sabem, a iniciativa que a PT teve de propor à entidade reguladora, a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), a reversão do licenciamento que tinha tido relativamente aos licenciamentos da autorização e de frequências que evolvem, numa componente, a ANACOM e, noutra componente, a ERC quanto à possibilidade de colocação no mercado de outros serviços de televisão através do sistema de pagamento. Como foi proposta uma reversão desse modelo, as entidades
Página 103
103 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
reguladoras estão agora a apreciar essa proposta. Estamos ainda na fase de consulta pública sobre o tema e devemos aguardar que os reguladores façam o seu trabalho, se pronunciem e, subsequentemente, veremos as orientações a tomar, sendo certo que não nos devemos afastar de um ponto essencial, que é o de alcançar a concretização da televisão digital terrestre na data que estava prevista e, ao mesmo tempo, procurar fazer o que estiver ao nosso alcance para que também possamos criar as boas condições para introduzir a televisão de alta definição no nosso País. Ao mesmo tempo, quando resultar daqui, como certamente irá resultar, uma reavaliação do quadro das frequências disponíveis para estes efeitos, naturalmente ponderaremos as melhores condições de reutilização do dividendo digital que daí vier a resultar.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, como saberá, o BE não tem qualquer dúvida sobre o interesse público do investimento do Estado em empresas como a Rádio Televisão de Portugal ou como a Agência Lusa. Esse é para nós um assunto importante. Cabe ao Estado prosseguir esse serviço público. Podemos ter dúvidas sobre a forma como ele está a ser prosseguido, mas não temos dúvidas sobre a necessidade do esforço do Estado para a existência desse serviço público. É precisamente por isso que estamos preocupados com a situação da Agência Lusa e estamos satisfeitos por perceber que o Sr. Ministro leu o nosso requerimento com atenção e também ficou preocupado e procurou esclarecimentos. Mas devo dizer que não fiquei esclarecida e, portanto, preciso de fazer mais algumas perguntas sobre esta matéria.
O encerramento de delegações no interior do País não é facto de somenos, ou seja, não é verdade que a Agência Lusa se possa desmaterializar com as novas tecnologias. Não estamos a dar menos importância às alterações tecnológicas, mas se fosse possível essa desmaterialização completa da Agência Lusa também não teríamos delegações da Agência Lusa em Lisboa, no Porto ou nas regiões autónomas e, portanto, reconhecemos a necessidade da existência de postos de trabalho dos jornalistas e da equipa da Lusa, que têm os meios técnicos à sua disposição para prosseguirem o seu trabalho. Se estão com problemas para o prosseguir, é preciso perceber o que é que falta e não simplesmente acabar com as delegações, porque as delegações da Agência Lusa são essenciais na coesão territorial. Encerrá-las é quase matar o interior, do ponto de vista informativo e noticioso.
Ora, o Sr. Ministro sabe tão bem como nós que a concentração dos órgãos de comunicação social torna essa regiões completamente silenciadas, na maior parte dos casos, se as delegações da Agência Lusa não funcionarem.
Portanto, se não estão a funcionar bem, põem-se as delegações a funcionar bem. Encerrar as delegações parece-nos estranho e muito perigoso.
Sr. Ministro, parece-nos estranhíssimo que a Agência Lusa tenha decidido fazer isso sem ouvir o Governo.
É que o contrato de prestação de serviço noticioso e informativo de interesse público celebrado entre o Estado e a Agência Lusa não só prevê as delegações no Porto, em Coimbra, em Évora, em Faro e nas regiões autónomas e os correspondentes em todos os distritos, mas também prevê que as alterações na rede de delegações, delegados ou correspondentes carecem de acordo prévio do Estado e constarão do relatório de actividades. Portanto, como é que a Agência Lusa começou a fechar delegações sem ter dito nada ao Governo? Parece-nos estranho e preocupante.
Também nos parece estranho e preocupante que um jornalista da delegação de Coimbra possa ter sido despedido por telefone. Sr. Ministro, gostaríamos de saber se tem conhecimento deste facto e se só soube a posteriori do encerramento das delegações e, nesse caso, se não considera que a Lusa não está a cumprir com o que está acordado.
Também gostaríamos que nos sossegasse, respondendo a esta questão: não está em marcha o processo de privatização da Lusa, pois não? Essa informação é, para nós, muito importante.
Sr. Ministro, ainda disponho de algum tempo e, sem querer ser insistente, não lhe vou perguntar pelos dados que estarão disponíveis no portal que anunciou, mas, como sabe, o Bloco de Esquerda apresentou já três requerimentos a pedir ao Sr. Ministro a lista da publicidade do Estado e dos institutos públicos, a sua distribuição e os gastos durante o ano de 2008 e no primeiro semestre de 2009. Até agora não obtivemos qualquer resposta. Congratulamo-nos com este portal para o futuro. Mas o Governo, que compreendeu a necessidade deste portal para o futuro, que compreendeu a necessidade desta transparência, com certeza
Página 104
104 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
também compreende a necessidade de fornecer os dados que pedimos e pelos quais já aguardamos há dois meses. Não temos qualquer justificação sobre por que é que os dados não chegam. É o terceiro requerimento que fazemos.
Lembro que acabámos de viver três ciclos eleitorais e, portanto, a transparência dos gastos do Estado é particularmente importante. Por isso, Sr. Ministro, sem querer ser insistente, mas sendo obrigada a sê-lo, pergunto-lhe quando poderemos dispor dos dados que solicitámos e por que é que ainda não os obtivemos até agora.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, começando por esta última pergunta, gostaria que compreendesse que nunca existiu da parte deste Governo e do anterior qualquer controlo centralizado acerca das acções de colocação de publicidade institucional por parte dos organismos públicos. Não é, por isso, fácil a um Governo que nunca centralizou esse tipo de matéria poder disponibilizar informação que ele próprio não tem. É tão simples como isto.
Como nunca foi matéria em relação à qual tivesse sido decidida uma fórmula de sistematização ou de registo desse tipo de operações, estamos empenhados em procurar uma solução adequada para o futuro, a partir do momento em que a questão se colocou e em nome dos objectivos, da transparência e dos actos da Administração Pública. Mas esta dificuldade que lhe refiro é a evidência de que nunca houve, como se procurou suspeitar, alguma orientação de controlo da parte do Governo relativamente aos modos de colocação de publicidade institucional na comunicação social.
A sua pergunta relativamente à Lusa permite-me tentar esclarecer um pouco melhor o que está em causa.
Deixe-me dar-lhe alguns dados de referência da própria agência noticiosa. Comparativamente à situação de 2006, a Lusa tem, hoje, mais 42 jornalistas profissionais. A Lusa, nos últimos dois anos, investiu 270 000 € na aquisição de novos equipamentos para a produção multimédia que distribuiu por todo o País. Este ano, de acordo com o seu orçamento, serão investidos mais 110 000 €, destinados á rede dos correspondentes. O que quer dizer que a Lusa produz hoje mais notícias do que produzia em 2006 ou em 2007, com temáticas mais variadas e com maior diversidade na sua origem geográfica.
Desde 2008, a Lusa, além de texto e de fotografia, produz também notícias em suporte áudio e vídeo, o que foi uma manifesta inovação. E fá-lo todos os dias e a partir dos mais variados pontos do País, onde a importância dos acontecimentos justifique a cobertura jornalística.
Portanto, Sr.ª Deputada, não se trata de uma regressão relativamente à questão das delegações quando se garante que a cobertura do território nacional é hoje mais eficiente, os meios tecnológicos mais adequados e mais flexíveis ao esforço da comunicação e, relativamente às áreas de cobertura que referiu, segundo a informação disponível, há hoje, em Coimbra, mais três jornalistas ao serviço da Lusa, mais um Évora e mais três em Faro.
Se esta é a realidade, então temos de nos congratular pelo facto de estarmos a fazer um verdadeiro up grade na qualidade dos serviços noticiosos emitidos a partir da Lusa e não de nos preocuparmos por, eventualmente, haver uma diminuição da cobertura territorial do País, o que, em função dos dados objectivos que acabei de referir, não acontece. A realidade não confirma, portanto, essas preocupações.
Sr.ª Deputada, quanto à questão da privatização, não encontra esse propósito em nenhuma orientação até hoje estabelecida e, portanto, creio que pode ficar tranquila.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Concluindo a primeira ronda de perguntas ao Sr. Ministro, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, gostaria de o cumprimentar e de começar por abordar a informação que nos fez chegar relativamente a este Ministério e ao sector da comunicação. Na página 3 do orçamento faz-se referência aos apoios diversos e, quando remete para a questão dos inventivos directos, gostaríamos de perceber qual a aplicação e a distribuição destes incentivos directos por sectores da comunicação social.
Página 105
105 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
A segunda questão que gostaria de colocar prende-se com o que já foi abordado também por outras bancadas parlamentares — e que, aliás, o PCP abordou através de uma pergunta escrita ao Sr. Ministro — , isto é, com a questão do encerramento das delegações da Agência Lusa. O Sr. Ministro já nos disse hoje que em breve teremos resposta, por isso vamos aguardar. No entanto, compreenderá que, tendo eu esta oportunidade de lho perguntar pessoalmente, não posso deixar de o fazer.
Percebo os argumentos do Sr. Ministro. Temos informação de que o que está em causa pode não ser, objectivamente, a perda de postos de trabalho, mas entendemos que o serviço público que a Lusa presta às populações representa um factor de coesão cultural e territorial e, portanto, vemos com alguma preocupação o encerramento físico destas delegações.
Considerando a natureza desta agência noticiosa, uma reestruturação deveria apontar não apenas no sentido do reforço dos meios humanos, apesar de estes serem importantes — e, segundo a sua informação, haverá um acréscimo — , mas também no sentido da existência de uma delegação física da Lusa, que tem inclusive um papel simbólico.
O Sr. Ministro compreenderá que os avanços da tecnologia e da qualificação das pessoas permitem que, hoje, muitos mais portugueses tenham acesso à Internet, mas, por exemplo, em distritos como o de Évora há um conjunto de população idosa e menos idosa em que a realidade da Internet não existe ainda, infelizmente, em todos os lares.
Portanto, no entendimento do PCP, é importante a própria existência física e simbólica de uma delegação de uma agência noticiosa que presta um serviço público.
A outra questão que lhe quero colocar tem a ver com a televisão digital terrestre, a qual também já foi abordada. A minha dúvida é muito concreta: relativamente ao Orçamento do Estado para 2010, não encontrámos qualquer referência orçamental a este projecto, mas poderá ser uma falha nossa. O Governo perspectiva algum tipo de intervenção directa e de execução nesta matéria que exija um reflexo no Orçamento do Estado ou, provavelmente, em orçamentos de Estado seguintes virá algum reflexo desta aplicação? Uma outra questão prende-se com a criação do portal para a publicidade institucional do Estado.
No dia 9 de Dezembro, aquando da sua audição regular nesta Comissão, tivemos oportunidade de a colocar. Aliás, foi quando o Sr. Ministro nos informou que iria ser criado o portal institucional.
A nossa dúvida não tem tanto a ver com a explicitação descritiva que poderá vir nesse portal, que será deveras importante. Mas, uma vez que o Sr. Ministro nos disse, no dia 9 de Dezembro, que não existiam critérios que determinaram a escolha de um determinado órgão de comunicação social em detrimento de outro para a publicação da publicidade institucional, pergunto se hoje já existem e se o Conselho de Ministros, o Ministério e o Governo já pensaram em definir alguns critérios. É que, quando tivermos oportunidade — e esperemos que isso aconteça em breve — de observar neste portal a distribuição, gostaríamos de perceber a razão de ser da mesma.
Portanto, compreendermos esta exposição descritiva ajuda-nos a perceber se existem critérios de conteúdo.
Sr. Ministro, a última questão que lhe quero colocar prende-se com a nossa preocupação relativa à crescente concentração dos órgãos de comunicação social nos grandes grupos económicos.
Como sabe, essa não é uma preocupação recente, é uma preocupação que o PCP tem desde sempre.
Aliás, sempre que entendemos colocar as questões da comunicação fazemo-lo com esta abordagem. Mas entendemos que esta crescente concentração tem contribuído, com reflexos negativos, para a qualidade dos media, para o pluralismo e para o rigor na informação, bem com para o agravamento das condições de trabalho dos profissionais deste sector da comunicação social.
Não vou abrir uma discussão ideológica consigo, tendo em conta as questões da precariedade, pois já tive oportunidade de, numa audição, de colocar estas preocupações do PCP. Gostaria, no entanto, de saber se o Sr. Ministro partilha também desta preocupação, porque entendemos que, num órgão de informação, que extravasa a venda de um determinado produto e de uma determinada troca comercial, é possível venderem-se ideias, formas de ver e de pensar o mundo, pelo que entendemos também que esta perspectiva de negócio e de domínio por parte dos grandes grupos económicos neste sector da comunicação social tem essa razão de ser, que é este valor ideológico de repercutir e de reproduzir ideias associadas à forma como vemos o mundo.
Entendemos, por isso, que o Estado não pode ficar indiferente a este processo de concentração na comunicação social por parte do poder económico, ainda mais porque entendemos que o que acaba por estar
Página 106
106 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
em causa é a própria questão da vida democrática, associada à liberdade de expressão e ao pluralismo democrático.
Sr. Ministro, como ainda disponho de um minuto e meio, coloco-lhe mais uma questão.
O PCP entende — legitimamente, e ainda bem — , ao contrário de outros partidos, nomeadamente do PSD e do CDS, que a valorização do serviço público de rádio e de TV não constitui uma despesa inútil e pesada para o Estado. Entendemos que a valorização da dotação de meios humanos e materiais para a RTP e para a RDP é fundamental para um investimento sério na cultura, na língua portuguesa e na coesão do nosso povo, tanto aqui como no estrangeiro. Também sobre isto gostávamos de ouvir a sua opinião.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Para responder a esta última pergunta da primeira ronda, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, relativamente aos apoios directos à comunicação social, eles reportam-se a cerca de 40 empresas da área da comunicação social regional e local no ano de 2009. Na área da imprensa, isso significou um esforço na ordem dos 146 000 € e, na área da rádio, um esforço na ordem de 944 000 €. O conjunto das empresas beneficiadas já consta do site do Gabinete para os Meios de Comunicação Social, que poderá consultar. Isso só convalida a minha própria disponibilidade para assegurar o princípio da transparência, a que, há pouco, aludi.
No que diz respeito à Lusa, creio que, face ao que eu já disse, temos de erradicar o «fantasma». Afinal, o que se demonstra é que a Lusa se equipou de forma bem mais adequada tecnologicamente nos últimos anos; que se modernizou ao ponto de poder ter agora a difusão dos seus conteúdos não apenas através das formas clássicas mas também de notícias no suporte do áudio e vídeo, como referi, o que constitui um acréscimo de qualidade dos serviços e não uma diminuição dessa qualidade; que aumentou, de forma significativa, a cobertura territorial do País, sendo, como disse, muito mais intensa a sua actividade noticiosa no conjunto do País do que era em relação ao passado; e que, mesmo naqueles distritos em relação aos quais poderia ter havido um alarme por causa das chamadas delegações físicas, se demonstra que, a partir desses mesmos distritos, os editores não só diminuíram como aumentaram.
Portanto, a cobertura noticiosa no espaço territorial é, assim, uma cobertura com uma malha mais apertada. É isso que volto a sublinhar.
Em relação à televisão digital terrestre, não há, de facto, qualquer matéria com consignação orçamental, nem tinha de haver, porque do que se trata aqui é de um desafio que não tem significado relativamente à realidade orçamental. Trata-se de passar da forma analógica para a forma digital, como sabemos. Isso implica, naturalmente, uma adaptação tecnológica e é essa adaptação tecnológica que, conforme referi, está a ser acompanhada, a partir da sua sediação na ANACOM, que é a entidade reguladora competente, por um grupo de trabalho interdisciplinar, do qual também fazem parte os próprios operadores de televisão, tanto do sector público como do sector privado, sendo que esse grupo de trabalho acompanhará tudo que seja a adaptação tecnológica para a cobertura integral do território e para as mutações a haver. E vamos aguardar que desse grupo resulte alguma recomendação de relevância pública, se for o caso e se for necessário, que, entretanto, a seu tempo, deveremos operacionalizar.
Sobre a temática da publicidade institucional, peço desculpa, mas acho que estamos a dar os passos que concretizam uma linha de orientação estabelecida. Falta dar agora o passo de estabelecer a actualização legislativa para a concretização do portal da publicidade, por isso deveremos aguardar que essa configuração jurídica se faça.
Quero, em todo o caso, contribuir para distinguir — até porque, há pouco, também houve um Sr. Deputado que fez alusão a isso — entre o que é publicidade institucional e o que é publicidade comercial.
Se tivermos empresas do sector público empresarial que façam publicidade comercial no âmbito normal das suas actividades, obviamente que esse tipo de publicidade não pode, de forma alguma, ser a publicidade pensada e enquadrada ao nível das preocupações, porque tem uma outra lógica, tem uma lógica que diz respeito aos critérios de gestão próprios das empresas onde tal possa vir a ocorrer, e temos de fazer essa separação de águas. No mais, os Srs. Deputados tenham a paciência de aguardar a regulamentação jurídica da matéria.
Página 107
107 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Relativamente à preocupação da Sr.ª Deputada quanto aos problemas derivados do risco da concentração ou do excesso de concentração dos órgãos de comunicação social, não posso deixar de sorrir com alguma ironia e lembrar-me de qual possa ter sido a posição de voto do PCP nessa célebre lei do pluralismo, que tão debatida foi nesta Casa e em relação à qual houve um propósito manifesto de definir regras para, justamente, evitar riscos de concentração ao nível dos órgãos de comunicação social.
Da parte do Governo, essa atitude corresponde a uma linha de coerência que é conhecida e, naturalmente, quando os Srs. Deputados quiserem recolocar na ordem do dia a temática que permita voltar a debater os princípios orientadores para evitar riscos de concentração nos órgãos de comunicação social, creio que estaremos todos disponíveis — o Governo está, seguramente, disponível — para poder reflectir com os Srs. Deputados, de forma inteiramente aberta, essa matéria.
Se me escapou alguma das questões suscitadas pela Sr.ª Deputada, peço desculpa e procurarei responder de seguida.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Ministro.
Srs. Deputados, concluímos a primeira roda de perguntas ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Vamos, agora, iniciar a segunda ronda de perguntas, tendo em vista aprofundar o orçamento de que o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares é responsável, designadamente na área da comunicação social.
Recordo que, para esta segunda ronda, foram fixados 5 minutos para cada grupo parlamentar.
Vou dar a palavra à Sr.ª Deputada Carla Rodrigues, a única Sr.ª Deputada que se encontra inscrita para a segunda ronda.
Peço aos Srs. Deputados que pretendam obter esclarecimentos que se inscrevam.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada Carla Rodrigues.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, muito boa tarde.
Já no final desta longa audição, quero aflorar aqui um aspecto que não foi abordado com a devida profundidade e que se relaciona com a imprensa local e regional. A imprensa local e regional, pela especificidade e proximidade com os seus leitores, desempenha um papel vital na vida, na formação e na informação das comunidades locais e das comunidades portuguesas no estrangeiro. É inquestionável o papel de imprensa regional, nomeadamente no incentivo à leitura, na defesa da língua e da cultura portuguesas, na facilitação e democratização do acesso à informação, na dinamização cultural e na pluralidade e diversidade da comunicação social. Penso que em relação a isto estamos todos de acordo.
No que discordamos, seguramente, é na forma como poderemos reforçar ou, pelo menos, manter o desempenho deste papel fundamental da imprensa local e regional.
De acordo com as principais linhas de actuação política do Governo, plasmadas nas Grandes Opções do Plano para 2010-2013, diz-se que é «preocupação do Governo incentivar o desenvolvimento empresarial do sector da comunicação social, assegurar condições para a efectiva democratização de acesso às novas plataformas de comunicação e zelar pela oferta, universal e igual, de uma diversidade substancial de serviços de comunicação social».
Mas, Sr. Ministro, se as linhas de orientação são estas, as opções do Governo parecem ir em sentido contrário, porque não há oferta igual, universal, nem diversidade de serviços de comunicação social sem a imprensa regional e local.
Da análise do Orçamento do Estado para 2010 para a comunicação social fica clara a opção do Governo pela RTP e pela RDP em claro detrimento da imprensa escrita, mais concretamente da imprensa local e regional e também das rádios locais.
O que pergunto é o seguinte: considera o Governo e o Sr. Ministro que os órgãos de comunicação social regional e local são, efectivamente, um importante serviço público? Se sim, então qual a estratégia do Governo para a imprensa local e regional, ressalvando que, no panorama nacional, existem mais de 4000 títulos publicados? Que fique claro que o PSD não preconiza uma política de subsidiodependência. O que preconizamos é que o Governo cumpra o que está determinado na lei. E estamos a falar concretamente do Decreto-Lei n.º 231/2004, de 13 de Dezembro, que fala da publicidade do Estado e que determina que uma percentagem
Página 108
108 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
mínima de 25% das campanhas de publicidade do Estado deve ser atribuída às rádios locais, à imprensa regional em suporte de papel e à imprensa regional em suporte electrónico. O Estado é o maior anunciante e devia usar esse potencial para incrementar o financiamento da imprensa local e regional. É isso que preconizamos. Não mais subsídios, mas um apoio, cumprindo apenas o que já está estipulado na lei. E verificamos que isso não tem acontecido, pois esta lei tem sido grosseiramente violada pelo Estado.
No âmbito do portal da imprensa regional, ele foi aqui aflorado, mas não fomos ao essencial. Ele foi criado sob a égide do apoio à leitura, mas visa, tão-somente, em nosso entender, a redução das despesas do Estado com a comunicação social, nomeadamente com a redução do porte-pago, que não é nem foi, efectivamente, a solução.
Ou seja, o que gostaríamos de saber é se já foi feita uma avaliação do período de funcionamento deste portal, se, nomeadamente, o Ministério dispõe de relatórios quanto à aderência das publicações, quanto ao impacto deste portal na sustentação financeira das empresas de comunicação regional e local, quanto ao número de visitas que o portal tem regularmente e quanto ao impacto deste portal no universo dos leitores.
De salientar apenas, Sr. Ministro, que os directores de vários órgãos de comunicação social regional e local referem coisas como esta: «o nosso leque de assinantes tem um nível cultural reduzido e a Internet passa ao lado de muitos, principalmente de comunidades no estrangeiro, que não têm computador».
O que lhe pergunto, Sr. Ministro, é se considera que, dada esta situação de a maior parte das populações que beneficiam da imprensa local e regional, apenas a exclusividade do suporte do portal para a imprensa regional é suficiente, se dá resposta a esta necessidade de uma informação regional e local.
Gostaria também de perguntar se o Sr. Ministro considera que foi dada a devida divulgação a este portal e se foi dada a devida informação e formação aos órgãos de comunicação social para aderirem a este portal.
Por outro lado, gostaria de saber se tem dados que lhe permitam afirmar que este portal é uma boa estratégia de incentivo à leitura e acesso à informação e se o portal consubstancia uma boa resposta à redução do porte-pago.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.
Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, em relação à questão da publicidade — voltando mais uma vez ao já famoso portal, embora ainda não existente — , gostaria de manifestar aqui uma discordância. Compreendo que o Sr. Ministro distinga entre publicidade institucional e publicidade comercial, mas, se bem me lembro, esta questão foi levantada pelo facto de haver algumas alegações de que o Estado ou entidades paraestaduais — embora juridicamente o conceito não seja correcto, aqui aplica-se — usariam a publicidade que punham nos órgãos de comunicação social como forma de pressão, com critérios não exclusivamente comerciais ou de audiência mas, sim, políticos.
Ora, penso que o Governo não terá qualquer interesse em restringir este portal à publicidade institucional, porque permanece a suspeição. Acho que a finalidade deste portal é precisamente para que não haja qualquer dúvida de que o Governo não utiliza ou não dá instruções para que a publicidade, quer institucional, quer comercial, seja utilizada como forma de pressão.
Considero, portanto, que o Governo tem todo o interesse em que este portal inclua não só a publicidade institucional mas também a publicidade comercial. Ou seja, aquilo que está em causa é o peso que as fontes de financiamento têm nas receitas de cada órgão de comunicação social, neste caso através de contratos publicitários, de parcerias comerciais, institucionais, e que o Estado pode utilizar dizendo, hipoteticamente — não estou a dizer que isto aconteça, estou a dizer que foi o que na altura suscitou a questão — , «atenção, o que gastamos em publicidade aí podemos gastar em outro sítio».
De forma a afastar qualquer suspeição, que não interessa nem ao Governo, nem à oposição, nem ao funcionamento de uma sociedade democrática de forma geral, o Governo teria todo o interesse em incluir todo o tipo de publicidade ou de apoios nesta página.
Por último, gostaria de dizer que o CDS nunca pôs em causa — nem eu disse isso; aliás, fiz questão de começar a minha intervenção por dizer que não está em causa — a existência de um serviço público de televisão. Isso implica, necessariamente, que haja investimento público nesse serviço, como é evidente. Aquilo que questionamos e iremos sempre questionar — independentemente de como possam as nossas palavras
Página 109
109 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
ser deturpadas — é a forma como é gerido esse investimento público e até que ponto seria possível, com menos dinheiro, prestar o mesmo serviço, ou prestar um melhor serviço, utilizando melhor as verbas. Lamento que isso possa desagradar a muitos, mas não é só um direito nosso, é sobretudo um dever, enquanto oposição, fiscalizar a forma como são geridos os dinheiros públicos.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, confesso que também fiquei um pouco desiludida com duas afirmações que fez sobre a transparência da publicidade.
Por um lado, com a afirmação de que no novo portal a publicidade comercial não vai constar, só a institucional. Portanto, pergunto-me até que ponto é que realmente teremos as exigências de publicidade e transparência, que pareciam ser consensuais e que, se calhar, afinal não são.
Por outro lado, também devo dizer que fico desapontada por o Governo não ser capaz de recolher os dados para responder ao requerimento do Bloco de Esquerda. Ou seja, o requerimento era bastante simples, não falava de fluxos financeiros; falava apenas da listagem das despesas em publicidade, discriminada pelos diversos órgãos de comunicação social de difusão nacional, dispendidas pelos diversos ministérios e seus organismos tutelados, institutos e empresas públicas, no ano de 2008 e primeiro semestre de 2009. Como vê, era algo que não nos parecia muito complicado. A revista Sábado fez um estudo, a Marktest fez outro — estudos contraditórios, como sabe.
A dúvida era grande e achávamos muito importante que o Governo a esclarecesse. Ficámos a saber que o Governo não vai esclarecer e achamos isso preocupante.
Fico muito contente que o Sr. Ministro me diga que esteja tranquila em relação à privatização da Lusa.
Queria perguntar-lhe se essa garantia sobre não equacionar a referida privatização se pode estender a toda esta Legislatura ou não? Espero bem que sim.
Ainda que fique tranquila em relação a esta matéria e gostasse da garantia de uma Legislatura de tranquilidade, devo dizer-lhe que estas funções múltiplas dos jornalistas da Lusa, se demonstram um grande empenho, não podem ser garantia de qualidade. Não pondo em causa, obviamente, a qualidade de cada um dos profissionais da Lusa, o Sr. Ministro compreende que um jornalista — que além de ser jornalista, é simultaneamente repórter de som e imagem — que não tem um posto de trabalho, que trabalha numa empresa desmaterializada, que muda o objecto do seu contrato sem avisar o Governo, não tem uma situação muito clara, do ponto de vista da qualidade da prestação do trabalho de jornalista e, portanto, da agência Lusa.
Nesse sentido, gostaria de saber também se o conselho de redacção da Lusa se pronunciou sobre estas matérias e qual foi o seu parecer.
Finalmente, passo a referir-me a assunto.
O Estado é, de facto, o principal anunciante, como já foi aqui dito, e se as regras sobre publicidade institucional vieram poupar dinheiro ao Estado, também é verdade que vieram reduzir as receitas dos órgãos de comunicação social, o financiamento do Estado à comunicação social ou, se quiser, os apoios do Estado à comunicação social. Acabava também por ser isso que acontecia e já sabemos que, às vezes, estudar estas coisas pode ser complicado para o Ministério.
Gostaríamos de saber se foi estudado o impacto nos órgãos de comunicação social o facto de haver menos publicidade institucional do Estado nos órgãos, quais são as suas consequências, se há algum estudo, se há números sobre essa matéria.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, peço desculpa, mas a resposta que nos deu relativamente ao encerramento de delegações da Lusa não nos satisfaz. O que o Sr. Ministro diz é que houve um investimento no reforço tecnológico dos meios. Na realidade, não podemos estar em desacordo relativamente a isso, mas a pergunta que lhe fiz, muito concretamente, é se o Sr. Ministro reconhece que há um recuo na prestação do serviço público quando há um encerramento de uma delegação física e material desta agência noticiosa.
Página 110
110 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Imagine que alguém se quer dirigir à Agência Lusa no distrito de Évora. A quem é que se vai dirigir fisicamente? De facto, entendemos que também deve ser uma preocupação do Governo e do Conselho de Administração da Agência Lusa não apenas o reforço efectivo dos meios humanos, que é muito importante, mas também o reforço efectivo dos meios materiais.
O Sr. Ministro fez uma alusão à posição do PCP sobre a proposta de lei apresentada na Legislatura passada. Gostaria, a esse propósito, de lhe dizer que, de acordo com o artigo 38.º, n.º 4, da Constituição, cabe ao Estado impedir a concentração dessas empresas. O que tivemos na Legislatura anterior foi uma proposta de lei que pretendia regular e estabelecer limites aceitáveis de concentração.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Estamos a falar de coisas diferentes, Sr. Ministro. Por isso, relativamente a esse aspecto, o PCP tomou, na altura, a posição que o senhor conhece e que continuará a tomar, porque estamos a exigir que se cumpra a Constituição.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, respondendo, em primeiro lugar, à Sr.ª Deputada Carla Rodrigues, peço-lhe que não me leve a mal que me ocorra a velha expressão «bem prega frei Tomás»«.
Deixe-me dizer-lhe o seguinte em relação a quando, há pouco, aludi aos termos de comparação entre aquilo que foi o percurso orçamental de 2005 até agora e aquilo que estava para trás: em 2005, tendo sido necessário um orçamento rectificativo, resultou que a verba efectivamente gasta com os vários aspectos dos apoios à comunicação social, implicou um orçamento muito perto dos 20 milhões de euros. Hoje, na sequência das reformas introduzidas pelo governo anterior, estamos a trabalhar com um orçamento muito mais austero, da ordem, como se viu, dos 10 milhões de euros. Mas sabe a Sr.ª Deputada quanto é que o seu governo tinha orçamentado para o ano de 2005 no seu orçamento? 7 400 000 €! Ou seja, bem pode a senhora achar que a mobilização dos recursos financeiros feitos agora não são suficientes para isto ou aquilo porque quando temos um termo de comparação em relação àquilo que foi a vossa política no passado verificamos que nem sequer orçamentavam as verbas indispensáveis para cumprir as exigências legais vigentes à época. Tinham até um orçamento completamente suborçamentado que, como se veio a revelar, no ano do confronto de realidades — esse ano de 2005 — teve que ser profundamente actualizado.
Sr.ª Deputada, quanto à maneira como o portal da imprensa regional cumpre ou não a sua missão, nada melhor do que aguardarmos aquilo que foi o resultado de algo que já aqui referi. Já na vigência deste Governo, o Gabinete para os Meios de Comunicação Social subscreveu um protocolo com a Associação Portuguesa de Imprensa e é esta própria Associação que vai assumir a dinâmica de gestão deste portal, naturalmente em cooperação com o gabinete.
Quer melhor empenhamento dos próprios representantes da comunicação social, regional e local para terem um contributo institucional efectivo na dinamização do portal? É assim que se faz a melhor parceria, numa lógica completamente sustentada e positiva. Resposta mais consistente sobre a melhor utilização do portal não tenho para lhe dar, quando a própria Associação Portuguesa de Imprensa se motiva na sua valorização.
Sr.ª Deputada Cecília Meireles, quanto à distinção — e aproveito para responder também a outros Srs. Deputados sobre isto — entre a publicidade institucional e comercial, acho que temos de ser razoáveis. O princípio da razoabilidade é bastante importante. Lembre-se, por exemplo, do que é a função típica de uma entidade do sector público como a Caixa Geral de Depósitos. A senhora acha razoável que a colocação no mercado de produtos financeiros da Caixa Geral de Depósitos, em concorrência com outras instituições do sector financeiro, tem alguma coisa a ver com a publicidade institucional, feita pelos órgãos da Administração Pública, em relação aos quais se exige um outro princípio de transparência e de conhecimento?
Página 111
111 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Não considera a Sr.ª Deputada que a lógica do mercado, do primeiro exemplo que lhe dei, não tem nada a ver com a outra lógica de referenciação, que é a da publicidade institucional? Se não sabemos distinguir a natureza das coisas, fazemos uma tal amálgama que, às tantas, em verdade, já não sabemos do que estamos a falar. É preciso, como lhe digo, ter a noção do discernimento para não confundir os planos. E aquilo que procuro fazer aqui é não deixar que os planos se confundam.
O que acabo de dizer vale também, de alguma maneira, para responder a uma das preocupações da Sr.ª Deputada Catarina Martins, para, precisamente, podermos fazer essa distinção. E acho que nada mais direi sobre esta matéria, senão justamente pedir, mais uma vez, aos Srs. Deputados que aguardem o momento de estabelecermos a actualização do instrumento legal regulador da matéria de colocação da publicidade e da subordinação dessa colocação ao princípio da publicidade e da transparência.
Sr.ª Deputada Rita Rato, temos de perceber os tempos em que vivemos. Se, antes, uma delegação regional não tinha como função primordial garantir a acessibilidade das pessoas a um determinado sítio, que normalmente era uma sala fechada onde não se encontrava, muitas vezes interlocutor, se agora é possível estabelecer os pontos de contacto por uma via muito mais acessível, em que os meios de comunicação social estão ao dispor de todos — ao dispor de todos! — , permitindo localizações com muito mais garantia de que possamos estabelecer as formas adequadas de intercomunicação recíproca e se isso, aliás, resulta claramente da demonstração de que a qualidade do serviço tem vindo, de ano para ano, a melhorar só temos que nos congratular e não fazer confusão de planos. Uma coisa é uma delegação entendida como uma sede física, outra coisa são editores regionais que estão disponíveis relativamente à acessibilidade e às formas de contacto, que têm muito maior flexibilidade, equipamento técnico disponibilizado para a sua actuação, que podem colocar as notícias a partir do sítio onde a notícia foi produzida, que não precisam de se deslocar quilómetros no Alentejo para irem à sede colocar a notícia para depois ser difundida — é difundida de imediato e directamente.
Estamos a falar de uma verdadeira qualificação do serviço noticioso a cargo da Lusa. E estamos a verificar que estamos numa fase de verdadeira requalificação da actividade noticiosa da Agência, só vendo razões para darmos uma resposta de sentido crítico positivo em relação ao resultado do trabalho feito e não o desmerecimento desse mesmo trabalho. Mas não lhe ouvi nenhuma palavra de referência positiva.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ouviu, ouviu!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Então, peço-lhe desculpa, estava distraído. Nesse caso, congratulo-me por a Sr.ª Deputada também reconhecer que a qualificação do serviço noticioso da Lusa, a sua diversidade e a cobertura que faz do território português têm vindo, claramente, a melhorar nos últimos anos.
Creio que não faz sentido repetir-me em relação a outras considerações que já fiz, pelo que dou por respondidas as questões que me foram colocadas, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigada, Sr. Ministro.
Pensava que, face à escalpelização que já houve das matérias, não fosse necessária uma terceira ronda de perguntas, mas há Deputados que se inscreveram.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Amaro.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, fiquei sem a certeza sobre se o Sr. Ministro e o Governo não querem saber ou se estão a fingir não saber de alguns destes problemas.
Relativamente ao desempenho da RTP, não querem saber destes 319 milhões e da importância que têm.
Não seria possível poupar aí?! Dizer que é um assunto que não interessa e que deve ficar para uma audição, no Parlamento, quando é ao Governo que cabe a gestão da participação accionista é estranho.
Mais: não querem saber ou fingem que não existe essa derrapagem para menos nos resultados líquidos (menos 30% e menos 21% nos resultados líquidos e nos resultados operacionais). Dizer, portanto, que o acordo está a ser cumprido é estranho, porque são menos 30% e menos 21%.
Página 112
112 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
Nos custos operacionais, comparando, por exemplo, 2005 ou 2006 com 2008, verifica-se que derraparam 25 milhões de euros. Sr. Ministro, 25 milhões de euros são duas vezes e meia o orçamento do seu Ministério para o ano de 2010, ou, mais, são 5 anos do ex-porte pago. Não quer saber destes 25 milhões de euros?! Sr. Ministro, estranho que esteja a tentar ensaiar aqui, outra vez, aquela estratégia de atirar para a oposição uma responsabilidade que é do Governo; gerir a participação accionista na RTP é responsabilidade do Governo. Nós, com certeza, iremos fiscalizá-la, mas é uma responsabilidade do Governo. Qualquer accionista, em qualquer parte do mundo, perante um investimento anual ou uma despesa anual de 319 milhões de euros numa empresa participada, preocupava-se; com 25 milhões de euros de aumento nos custos operacionais, preocupava-se.
Mas também me preocupam outras coisas que o Sr. Ministro disse, desde logo uma grande contradição nos comentários que fez relativamente à RTP N e à RTP África.
Em relação à RTP N disse: «nós não nos podemos meter nisso, porque há autonomia da RTP na definição do que é o serviço público». Já relativamente à RTP África e à RTP Internacional disse: «vamo-nos juntar e vamos definir juntos um conceito estratégico». Afinal, há autonomia ou não?! E, afinal, enquanto accionista mas, sobretudo, enquanto responsável pela injecção de 319 milhões de euros, o Estado deve ou não este ano estar preocupado com isto e querer saber o que é feito do dinheiro dos contribuintes?! Não seria possível prestar um serviço público, que tanto respeitamos, com muito menos?! Finalmente, Sr. Ministro, o Governo também parece não querer saber da situação de todas aquelas pessoas que caminham para, no dia 26 de Abril de 2012, ficarem com a sua televisão às escuras, ficando sem acesso à sua maior fonte de entretenimento, informação e inclusão comunitária. Sr. Ministro, trata-se, novamente, da estratégia de atirar a responsabilidade para outros. Então, Sr. Ministro, pode dizer-se que cabe à ANACOM e aos operadores preocuparem-se com o interesse público das populações que têm menos, em acederem à televisão?! Sr. Ministro, esta é, claramente, desde logo, uma responsabilidade do Governo, que foi o autor da decisão de transição para a televisão digital, por iniciativa comunitária, com certeza, mas com o cuidado de que não cabe no escopo de competências e de responsabilidades da ANACOM preocupar-se com a protecção das pessoas, dos cidadãos que têm, hoje, acesso à televisão e que, por dificuldades económicas, financeiras ou de instalação, designadamente técnica, não terão acesso à televisão digital e, naquele dia, ficarão desligadas da sociedade.
Preocupa-me muito, Sr. Ministro, que o Governo não queira saber ou finja não saber de todos estes problemas.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, noto que nada disse sobre se o Conselho de Redacção da Lusa terá sido ouvido ou não quanto a esta reestruturação e também que nada disse sobre o facto de, aparentemente, a Lusa estar a quebrar o contrato com o Estado, ao decidir algo que não pode decidir sozinha.
Mas quero fazer-lhe uma pergunta à qual o Sr. Ministro não respondeu por culpa minha, porque, claramente, não me expliquei e, por isso, teve toda a razão.
No fim da minha intervenção anterior, falei da publicidade dos actos públicos do Estado, naquelas páginas e páginas da imprensa escrita que costumávamos ter com os anúncios do Ministério da Justiça, etc., que era uma fonte de financiamento importante da imprensa que se altera, e as alterações são grandes (o que faz com que o Estado poupe bastante dinheiro, é certo!), e também uma forma de apoiar a imprensa escrita. No entanto, neste momento, o importava perceber se há algum estudo do impacto das novas regras nestas receitas e na sua distribuição.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Leitão Amaro, não me quero repetir e também não quero abusar da sua paciência, mas distingo as coisas. Aquilo que aqui referi, e repito, foi que os resultados da gestão da RTP, de 2005 até agora, têm sido positivos, em todos os anos
Página 113
113 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
desta série, sem excepção, incluindo o ano de 2009, em relação ao qual, no entanto, deveremos aguardar pela apresentação do respectivo relatório e contas, para que isto se torne totalmente evidente. E, se isto é assim, se estamos, portanto, a falar de resultados de actividade positivos, temos de discutir critérios de gestão, se for o caso, com a entidade própria, que, volto a sublinhar, é o Conselho de Administração da RTP, e os Srs. Deputados têm ao vosso alcance a possibilidade de interpelarem, se assim o entenderem, o referido Conselho de Administração.
Quanto à questão de uma aparente contradição entre o que eu disse sobre a RTP N e sobre os canais internacionais, não há qualquer contradição.
Em relação à RTP N insurgi-me sobre o seu conceito de concorrência desleal — foi o conceito que o Sr. Deputado utilizou! Portanto, o Sr. Deputado é que utilizou o seu critério do que seja o âmbito do serviço público, sobrepondo-o ao critério que, entretanto, foi estabelecido, com autonomia, naturalmente, por parte do operador, em relação a esse domínio, no respeito pelo contrato de concessão desse mesmo serviço.
Onde é que está a contradição, quando referi, e até sublinhei, uma preocupação, que me pareceu ser comum, relativamente à importância de todos — do lado do Governo, do lado dos Srs. Deputados, independentemente da bancada a que pertençam, e do lado do próprio Conselho de Administração da RTP, certamente, que já colocou esta questão quanto ao ano de 2010 — podermos contribuir para que haja uma valorização dos canais internacionais, seja o canal África, seja o canal Internacional propriamente dito, na perspectiva de uma boa afirmação de Portugal no mundo, tanto junto das nossas comunidades como no que se refere à própria projecção da imagem do nosso País?! Há aqui alguma contradição, ou há um interesse público em sentido amplo, sobre o qual, aliás, convido todos a reflectir, para podermos partilhar, se necessário e desejavelmente, uma atitude comum?! É disto que falo e não de outra coisa.
Uma observação ou, mais do que uma observação, uma afirmação que tenho de repudiar, Sr. Deputado, porque é totalmente alarmista: o Governo está completamente desinteressado do risco de a população portuguesa, de um dia para o outro, ficar às escuras, em matéria de emissões televisivas. Ó Sr. Deputado, por favor, informe-se!
Protestos do Deputado do PSD António Leitão Amaro.
Informe-se, por exemplo, de que a transição do sistema analógico para o sistema digital, prevista para Abril de 2012, é uma solução sustentada que leva a que, mesmo depois da transição e no ano subsequente, haja uma emissão em simultâneo, em simulcast, entre o analógico e o digital, precisamente para evitar qualquer risco de ruptura na acessibilidade dos telespectadores às emissões de canal aberto. E, sendo assim, isto desmente completamente o alarmismo que o Sr. Deputado colocou nas palavras que usou e que não tem qualquer razão de ser. Como, aliás, não tem qualquer razão de ser fazer uma crítica ao facto de eu ter dito que há uma comissão que está a acompanhar a incumbência do regulador, que é a ANACOM, garantir que o distribuidor licenciado, que, como sabe, é a PT, assegure integralmente a cobertura do território nacional em matéria de televisão digital terrestre e o faça em condições de não discriminação em todo o território nacional.
E a prova provada de que não há despreocupação sobre a matéria é que foi o Governo, através de uma resolução, que criou esta comissão de acompanhamento, na qual, aliás, os operadores privados também estão representados, precisamente para que a sustentabilidade no acompanhamento da transição seja, efectivamente, garantida.
Sr.ª Deputada Catarina Martins, não tenho, de facto, conhecimento sobre se o Conselho de Redacção da Lusa se pronunciou, ou não, e, por isso, não posso satisfazer essa sua pergunta.
Relativamente à publicidade dos actos do Estado e ao seu impacto, em concreto, nos órgãos de comunicação social, trata-se de uma matéria que não está avaliada nos termos em que perguntou. Estamos a fazer outros esforços, estamos, nomeadamente, através de um processo de consulta pública, que está em curso, a procurar avaliar o resultado dos nossos sistemas de incentivo e o impacto dos sistemas de incentivo, de acordo com os sistemas legais em vigor, no desenvolvimento dos órgãos de comunicação social. Estamos, pela positiva, como aqui referi, a reforçar a componente do apoio directo e vamos, através da revisão da lei da rádio — em breve, os Srs. Deputados terão esse diploma, como também referi na minha intervenção inicial — , criar mecanismos que, pela flexibilização, gerem melhores condições operacionais, nomeadamente para as
Página 114
114 | II Série GOPOE - Número: 003 | 13 de Fevereiro de 2010
rádios locais e para a possibilidade da sua dinamização e do seu fazer face aos desafios mediáticos que têm pela frente. Isto é o que estamos a fazer, pela positiva.
Mas não se peça demasiado ao Estado, não se peça ao Estado que tenha uma função totalmente paternalista e substitutiva da dinâmica da iniciativa dos particulares, porque isto é que não pode ser feito. E não se presuma que os critérios de transparência em relação à publicidade institucional devem, agora, ter um outro grau de exigência, discutindo como é que a actividade normal da publicidade institucional deve, ela própria, ser um factor autónomo de sustentabilidade dos órgãos de comunicação social. Isto já é outro tipo de avaliação, no âmbito da qual penso que temos de ser mais moderados, porque não vivemos numa sociedade colectivista. Não vivemos numa sociedade colectivista! Vivemos numa sociedade em que temos de saber, claramente, onde é a fronteira do esforço público e onde deve ser a fronteira da iniciativa dos particulares.
É com esta resposta, Sr.ª Deputada, que desejo terminar as minhas palavras. Para lhe falar com toda a franqueza e também com simpatia, não me importo que a Sr.ª Deputada divirja de mim, porque, por alguma razão, não temos orientações políticas comuns em muitas matérias e, se não tivermos nesta, também não virá mal ao mundo, embora, ao mesmo tempo, me congratule, por verificar que, em muitos outros domínios, há, nas suas perguntas e no modo como sustentou as questões que colocou, algo que me parece ser um grande grau de consensualidade relativamente às linhas de orientação dominantes, na área da comunicação social, que aqui pude expor.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Muito obrigado, Sr. Ministro.
A Mesa não regista mais inscrições, pelo que me cabe, em nome da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura e da Comissão de Orçamento e Finanças, agradecer os seus amplos esclarecimentos, Sr. Ministro, pois creio que foi bastante escalpelizada a área da sua intervenção e do Orçamento do Estado que gere.
Agradeço também aos Srs. Deputados da Comissão de Ética pela colaboração que deram, em conjunto com a Comissão de Orçamento e Finanças, para aprofundar este orçamento tão específico.
Desejo um bom fim-de-semana a todos e declaro encerrada a reunião.
Eram 20 horas e 20 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.