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Sexta-feira, 19 de Fevereiro de 2010 II Série-OE — Número 5

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS

Reunião de 18 de Fevereiro de 2010

SUMÁRIO O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto) declarou aberta a reunião às 15 horas e 7 minutos.
Prosseguiu o debate, na especialidade, da proposta de lei n.º 9/XI (1.ª) — Orçamento do Estado para 2010, tendo o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado) apresentado o orçamento do seu Ministério.
O Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado da Cooperação e das Comunidades (António Braga) e dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (João Gomes Cravinho) deram, depois, resposta às questões que foram colocadas pelos Srs. Deputados Carlos Alberto Gonçalves e Luísa Roseira (PSD), Paulo Pisco (PS), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), José Manuel Pureza (BE), José Soeiro (PCP), José Cesário (PSD), Teresa Damásio (PS), João Serpa Oliva (CDS-PP), Cecília Honório (BE) e Vânia Jesus (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 13 minutos.

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O Sr. Presidente (Paulo Mota Pinto): — Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, está aberta a reunião.

Eram 15 horas e 7 minutos.

Começo por cumprimentar os Srs. Deputados da Comissão de Negócios Estrangeiros, da Comissão de Orçamento e Finanças, o Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, bem como o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e os Srs. Secretários de Estado, e agradecer a vossa presença.
Vamos dar início às audições na especialidade previstas no artigo 211.º do Regimento. Trata-se de uma audição conjunta com a Comissão de Orçamento e Finanças com a equipa do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
De acordo com a grelha de tempos que acordámos, seguiremos com a intervenção inicial do Sr. Ministro.
Depois há uma ronda de 8 minutos, e uma segunda de 5 minutos com possibilidade de intervenção de Deputados, havendo depois uma conclusão de 3 minutos também com possibilidade de resposta.
Assim sendo, passo a palavra ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Luís Amado): — Muito obrigado, Sr. Presidente da Comissão de Orçamento e Finanças.
Cumprimento também o Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e os Srs. Deputados das duas comissões.
Como é habitual, em termos regimentais, farei uma exposição rápida e ficarei à disposição dos Srs. Deputados das diferentes bancadas para esclarecer as dúvidas que entendam ver esclarecidas.
Em primeiro lugar, eu gostaria de dizer que este orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros é, naturalmente, um orçamento que tem em consideração o contexto de restrição orçamental que o País conhece — não podia ser de outra forma, atendendo à situação orçamental e financeira do País e também à necessidade, já em 2010, de nós termos de dar sinais claros de contenção da despesa pública. Portanto, essa realidade não podia deixar de estar presente no processo de elaboração do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, embora se reconheça que o Ministério dos Negócios Estrangeiros acaba por ter um orçamento com algum incremento de despesa previsto, sobretudo tendo em consideração a avaliação que é feita hoje também no contexto desta crise que valoriza o papel da acção externa do Estado no esforço necessário para que o País recupere em termos económicos e em termos financeiros.
Essa perspectiva está presente no reforço que o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros conheceu, embora ele seja naturalmente condicionado nalguns aspectos estruturais, o que deve ser evidenciado.
Desde logo, a despesa consolidada para funcionamento do Ministério e para investimento em PIDDAC sofre um aumento relativamente significativo no actual contexto, mas não podemos ignorar o facto de o Ministério ter assumido competências que eram do Ministério da Educação — e 30 milhões de euros que reforçam o orçamento do Instituto Camões representam sobretudo uma transferência de uma dotação que era afecta ao Orçamento do Estado na área do Ministério da Educação e que agora é inscrita no orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Gostaria ainda assim de sublinhar o facto de o orçamento contemplar verbas significativas para responder a questões pontuais que se têm colocado nos últimos anos, em particular ao funcionamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros; a criação, pela primeira vez, de uma dotação específica para seguros — um dos problemas mais delicados com que nos confrontávamos, em termos internacionais, era decorrente do facto de o pessoal diplomático em missões não ter cobertura de risco em termos de saúde, e várias situações ocorreram ao longo dos últimos anos que evidenciaram situações de insegurança em que, ao contrário de outros representantes do Estado em missões paralelas tinham, o pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros não tinha esse benefício. Trata-se de uma verba de 1,3 milhões de euros que está inscrita nos Serviços Gerais de Apoio do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Há uma verba de 1,2 milhões de euros para reforço do pessoal, o que representará um esforço de adaptação a um quadro de restrições que, em termos de recursos humanos, o Ministério dos Negócios Estrangeiros tem vindo a conhecer desde 2002, e que é conhecido. De facto, o Ministério dos Negócios

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Estrangeiros tem vindo a conter a sua actividade, sobretudo em missões externas, com o recurso significativo a pessoal contratado ao abrigo de aquisição de serviços, mas este ano há aqui uma dotação de 1,2 milhões de euros para fazer face a problemas específicos com que o Ministério se tem confrontado em alguns sectores, não incluindo nem o IPAD (Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento, IP) nem o Instituto Camões, havendo ainda uma verba de 200 mil euros para estágios de jovens licenciados no âmbito do programa que foi apresentado há pouco tempo pelo Governo.
Além disso, reforçam-se as comunicações em meio milhão de euros; faz-se o reforço das rendas que o Ministério tem de pagar, existindo também uma verba para novas embaixadas e para visitas de Estado, igualmente em processo de aumento. Trata-se de dotações específicas que acautelámos no sentido de evitar situações mais negativas como algumas que encontrámos na gestão do funcionamento do Ministério ao longo do último ano.
Também no domínio da cooperação e das relações externas, há que salientar o reforço das verbas do IPAD, com mais 1,7 milhões de euros, para projectos de cooperação, e do Instituto Camões, para além da dotação correspondente ao pagamento dos professores, dada a transferência dessas competências do Ministério da Educação para o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Além disso, há o reforço de 1,5 milhões de euros no orçamento corrente do Instituto Camões e uma dotação específica para a campanha para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, actividades de campanha que nos são exigidas, e também para as comemorações que vamos desenvolver a partir já deste ano com algumas regiões da Ásia.
Trata-se, como tive oportunidade já de anunciar à Comissão, de um dos objectivos também do Ministério dos Negócios Estrangeiros ao longo dos próximos anos: reforçar as nossas relações com o continente asiático, dada a extraordinária vitalidade económica que o continente tem revelado — e a nossa relação não está à altura do desafio com que nos confrontamos na representação nessa vasta região do mundo.
As verbas do PIDDAC são também reforçadas especificamente em dois sectores: o da informática e o das obras, tendo em consideração alguns projectos que devem ser concluídos o mais rapidamente possível, de acordo com o que são as orientações definidas pelo Ministério.
No essencial o orçamento cresce aproximadamente 13%, o que não deixa de ser um crescimento muito significativo num contexto de restrições orçamentais.
Como disse, esse crescimento deve-se ao facto de se reconhecer que, no contexto do País e das grandes mudanças que estão em curso no sistema internacional, se deve valorizar mais a acção externa do Estado português e, nesse sentido também, se deve valorizar mais o papel da política externa no conjunto das políticas do País.
O que interessa, do nosso ponto de vista, é registar as políticas ao serviço das quais este orçamento se deve ajustar. E eu gostaria de sintetizar, no essencial, essas políticas em quatro vectores fundamentais que ao longo do próximo ano terão um desenvolvimento particular — aliás, ao longo deste ano, uma vez que estamos a discutir o orçamento para este ano.
Em primeiro lugar, devemos continuar a fazer um esforço significativo no sentido de promover uma mais rápida internacionalização do País em todos os seus sectores; aprofundar o relacionamento que o País hoje tem com vastíssimas regiões do mundo; e, em particular, dar projecção internacional ao nosso País no contexto de rápidas mudanças no sistema internacional, de reconfiguração geopolítica que o mundo hoje conhece e em que, por força da globalização dos mercados e da economia, a acção externa dos Estados é determinante também na afirmação da personalidade própria dos mesmos.
É essa a política que tem vindo a ser seguida em muitos aspectos ao longo dos últimos anos e queremos dar-lhe continuidade. É nesse sentido que, na sequência de um conjunto de eventos que organizámos ao longo dos últimos anos, também este ano, no final do ano, em Novembro de 2010, organizaremos, pela primeira vez, a Cimeira da Aliança Atlântica em Portugal. Trata-se de uma Cimeira de grande importância: Portugal é um País fundador da NATO, nunca tinha organizado uma cimeira da Aliança, e fá-lo num momento em que a Aliança está num processo de debate sobre a sua existência e sobre o seu futuro.
Em Lisboa, será aprovado o conceito estratégico da Aliança, que, seguramente, dominará a vida da Aliança ao longo da próxima década. E esta realização segue-se a um conjunto de eventos que calendarizámos ao longo dos últimos anos. Depois da Presidência da União Europeia, tivemos a Presidência da CPLP, a Presidência da Conferência Ibero-Americana e agora realizamos a Cimeira da NATO. O País precisa de, sistematicamente, ter a sua bandeira desfraldada na relação com o sistema internacional e, no quadro das

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alianças que integra, é absolutamente fundamental que o País esteja em condições de assumir as responsabilidades de liderança em alguns dos processos de mudança que estão em curso nessas alianças e nessas organizações.
A realização da Cimeira da NATO não está orçamentada no Ministério dos Negócios Estrangeiros e por isso deve valorizar-se mais o plafond que o Ministério hoje apresenta, uma vez que ele não integra a orçamentação da Cimeira — ela está inscrita na dotação provisional do Ministério das Finanças — , mas será seguramente uma verba expressiva, cuja avaliação estamos neste momento a procurar fazer em conjunto com os nossos aliados e, em particular, com o Secretariado da Aliança. A primeira missão estará em Lisboa já na próxima semana.
A realização desta Cimeira será uma exigente tarefa, que mobilizará o Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas não só; também o Governo no seu conjunto será chamado a acompanhar de perto uma Cimeira com a importância da Cimeira da NATO.
Está em curso a campanha para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. Portugal é candidato a um lugar no Conselho de Segurança para o biénio 2011/2012. Trata-se também de uma candidatura muito exigente, já que há duas vagas para três candidatos do grupo ocidental — para além de Portugal, a Alemanha e o Canadá são dois candidatos muito fortes, com muito peso e com grande expressão na comunidade internacional. Por isso, essa candidatura é um trabalho exigente que o Ministério dos Negócios Estrangeiros, no seu conjunto, o Corpo Diplomático tem insistentemente acompanhado e que deve ser um objectivo assumido pelo País no seu todo.
Neste contexto, nós procuramos valorizar muito as relações com o continente africano, com a Ásia e com o espaço latino-americano. É sabido que o potencial de relacionamento do nosso País com estas regiões tem estado bastante aquém das expectativas e das possibilidades de reforço que a boa imagem do nosso País em muitas destas regiões hoje tem e, por isso, nós faremos ao longo de 2010, associado ao esforço de campanha para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, um esforço muito grande no sentido de reforçar as nossas relações, seja com o mundo árabe islâmico, seja com o continente africano, seja, em particular, com o continente asiático.
Pensamos que até ao final do mês de Março estaremos em condições de aprovar novas orientações relativamente ao reforço das relações estratégicas de Portugal com o continente asiático. No actual contexto parece-nos absolutamente indispensável não perdermos mais tempo e a circunstância de iniciarmos, a partir de 2010, um vasto programa de celebrações de chegada a várias regiões do continente asiático impõe-nos também alguma atenção a iniciativas e a acções que possam valorizar a nossa relação com essa região.
No domínio da política de cooperação e da política das comunidades, trabalharemos sempre nessa perspectiva: valorizar o potencial estratégico que quer as comunidades quer a nossa política de cooperação representam para a valorização da imagem internacional do País, para a sua projecção como um actor de relevo, sobretudo no esforço de facilitação das relações entre vários espaços geopolíticos que estão, neste momento, em gestação e em que, seguramente, Portugal terá um papel fundamental a desempenhar.
Um segundo vector de orientações que estará presente na acção do Ministério ao longo deste ano é, sem dúvida, o relacionado com o esforço de recuperação económica do País, que deve mobilizar todo o Governo, todo o País. Nesta perspectiva, também a política externa, a acção externa do Estado português deve, necessariamente, ter em consideração esse esforço. Por isso, seja no âmbito da implementação das orientações recentemente assumidas pelo Governo, seja com a criação do Conselho para a Promoção da Internacionalização, que faz uma gestão diferente das relações com o mundo empresarial e com as empresas, seja no âmbito da coordenação interministerial que se impõe, no sentido de aproveitar todos os recursos do Estado ao serviço desse objectivo, de apoiar a internacionalização da nossa economia, parece-nos absolutamente indispensável que o reforço da diplomacia económica esteja no centro das preocupações do Ministério ao longo deste ano. O País, como todos sabemos, precisa de exportar mais, de captar mais investimento externo, de promover sustentadamente a internacionalização das nossas empresas e, como tal, esse esforço deve estar também no centro das prioridades da acção externa do Estado português. É uma frente muito importante de recursos humanos e financeiros de que o País dispõe e, por isso, consistentemente, continuaremos, ao longo de 2010, a dar maior visibilidade e prioridade à acção externa do Estado português no apoio à internacionalização das empresas e da economia do País.

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Em terceiro lugar, ao longo de 2010, vamos dar grande atenção à projecção internacional da língua portuguesa. O reforço do Instituto Camões, a reforma orgânica e a sua implementação ao longo de 2010, bem como as iniciativas previstas já para os próximos meses de Março e Abril, em Brasília, através da Conferência Internacional sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, organizada, em conjunto, pelo Governo do Brasil e pelo Governo português, e também da ministerial, que se realizará em simultâneo, procurarão dar continuidade a um trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, consistentemente, ao longo dos últimos anos, no sentido de promover a língua portuguesa enquanto língua com vocação universalista, presente nas principais organizações internacionais, língua de trabalho, já hoje, das principais organizações internacionais e que, sobretudo com a valorização estratégica quer do Brasil quer de Angola, particularmente, mas também de outros países de expressão portuguesa, tem vindo a adquirir uma actualidade na cena internacional que se nos impõe registar. Em particular no continente africano, esse esforço deve ser continuado muito de perto nas regiões que têm hoje, efectivamente, o Português como língua em expansão, seja na África Austral, seja na África Ocidental. Tenho sido surpreendido, aliás, por colegas meus, de países anglófonos e de países francófonos, que querem, de facto, introduzir o Português nos seus sistemas de ensino, pela circunstância de a integração económica nestas regiões africanas se estar a desenvolver com particular dinamismo nos últimos anos.
Vamos também valorizar muito, já este ano, a consolidação de uma rede de escolas portuguesas.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, resta-lhe 1 minuto.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O sistema tem algumas insuficiências, como é sabido, pelo que vamos dar particular atenção à consolidação de uma rede de escolas portuguesas no espaço da CPLP, começando, naturalmente, por responder desde já a situações de inexistência, como é o caso, por exemplo, da Guiné-Bissau.
Por último, não podemos deixar de acompanhar muito de perto, até pela responsabilidade que temos na implementação do Tratado de Lisboa, o desenvolvimento do projecto europeu. O projecto europeu entrou numa fase significativamente diferente a partir de agora e o Governo português tem a responsabilidade de acompanhar muito de perto o desenvolvimento deste projecto, a implementação do Tratado de Lisboa, e todas as suas consequências, designadamente na frente externa, com particular atenção a tudo o que tem a ver com o desenvolvimento da política externa e de segurança comum e da política comum de segurança e defesa.
Estou à vossa disposição para esclarecimentos e dúvidas mais pontuais que queiram suscitar.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Passamos, então, à fase de perguntas, mas, antes de dar a palavra aos Srs. Deputados, quero cumprimentar o Sr. Presidente e os Srs. Deputados da Comissão de Assuntos Europeus, a quem não fiz referência inicialmente.
Na primeira ronda de perguntas, cada grupo parlamentar disporá de 8 minutos e avisarei quando faltar 1 minuto para o fim do tempo, apenas por uma questão de informação.
Seguindo a regra da rotatividade, intervirá, em primeiro lugar, o PSD, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves.

O Sr. Carlos Alberto Gonçalves (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Srs. Secretários de Estado, quero informar que vamos repartir os 8 minutos do Partido SocialDemocrata por dois Deputados, porque há duas áreas e duas comissões, hoje, aqui, a tratar da questão do Orçamento do Estado.
Tentando ser breve, gostaria de dizer, em primeiro lugar, Sr. Ministro, depois da sua intervenção, que é evidente que este Orçamento do Estado tem a ver com uma ambiciosa agenda internacional. E nós, em face das rubricas que estão integradas no Orçamento do Estado, concordamos genericamente e entendemos que essa agenda internacional é importante para o País. Como esta é uma área de consensos, terá sempre, da parte do Partido Social-Democrata, toda a contribuição necessária para a promoção de Portugal e para a representação do Estado português no estrangeiro.

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Mas, como o tempo é curto, vou deixar-lhe algumas perguntas bem concretas sobre matérias que nos preocupam, e gostaria que o Sr. Ministro nos respondesse.
Em primeiro lugar, seguindo a sua intervenção, quero referir-me ao ensino da língua portuguesa, com a transferência de tutela do ensino do Português no estrangeiro para o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
No Programa do Governo falava-se numa verba de 50 milhões de euros — era, talvez, tempo de campanha eleitoral» — , no ano passado, no Orçamento do Estado, estiveram agendados ou, pelo menos, previstos 40 milhões de euros e, agora, em 2010, a verba que, aparentemente, aparece nos documentos que nos chegaram é de 32,25 milhões. Gostaria, pois, que nos desse uma explicação sobre estes números díspares, conforme o momento em que se apresentou, na Assembleia da República, ao País, a questão do ensino do Português no estrangeiro, porque a alteração da tutela, como é evidente, não pode ter consequências em termos orçamentais.
Ressalvando o que vem no Relatório do Orçamento do Estado para 2010, gostaria de falar da reestruturação do Ministério. Está escrito que, em 2010, será reavaliada a possibilidade da rede de representação externa. O Sr. Ministro já deu uma pequena luz sobre a matéria, pelo que gostava que concretizasse, porque isto tem repercussões directas no Orçamento do Estado.
Também no Relatório, em dado momento, diz-se o seguinte: será dada continuidade à reforma do Estatuto da Carreira Diplomática. Gostávamos de saber, uma vez mais — já não é a primeira vez que o questionamos sobre a matéria — , como é que está a questão do estatuto dos diplomatas, de que forma está a ser tutelada, com o novo desafio relativo à implementação do Tratado de Lisboa e que tem a ver com o Serviço Europeu para a Acção Externa. Isto também pode ter consequências orçamentais, mas, como não as vemos na leitura do Orçamento, gostava que nos desse essa informação.
Relativamente à internacionalização da economia portuguesa, também no Relatório do Orçamento do Estado vem dito que as embaixadas serão mobilizadas para o apoio à internacionalização da economia portuguesa, pelo que serão mobilizados os serviços consulares e diplomáticos. A pergunta que lhe deixamos, Sr. Ministro, é esta: que meios, que pessoas, que formação profissional poderemos conceder às embaixadas e aos consulados, eventualmente, para a promoção externa e a internacionalização da nossa economia, quando sabemos que, em termos de recursos humanos, e o próprio Sr. Ministro o reconheceu, há pouca formação nesta área. O que é que vai acontecer? Que verbas estarão disponíveis para esta questão? Falando ainda da língua, quero lembrar o Fundo da Língua Portuguesa, sobre o qual gostaria de obter uma explicação, Sr. Ministro. O Fundo da Língua Portuguesa pode ter todos os seus méritos, mas é reclamado por dois dos seus Secretários de Estado: o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação e o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas. Gostávamos de saber qual a parte que fica para um e qual a que fica para o outro, porque não podem, na Assembleia da República, valer-se de uma verba para as duas áreas de governação.
Quero apenas lamentar que, no Orçamento do Estado, nada seja dito, nada seja contemplado em relação à questão social dos fluxos migratórios. Há matérias que, pela importância que têm, deveriam, claramente, merecer a atenção do Governo de Portugal.
Quero também lembrar o Conselho das Comunidades Portuguesas. Sem entrar em grandes explicações, recordo que estamos num ano de realização do seu plenário e parece-nos que, com a verba disponível, há algumas dificuldades, como é evidente, para que o órgão possa funcionar.
Para terminar, quero lembrar, uma vez mais — e o Sr. Secretário de Estado da Cooperação, realmente, na comissão, tentou explicá-la — , a questão dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio e o rácio que temos de cumprir, de 0,7 do rendimento nacional bruto até 2015. Continuamos a acreditar, pela leitura, que vamos cumprir esse compromisso, mas, Sr. Secretário de Estado, cada vez nos parece mais evidente que não vamos conseguir. Seria bom, talvez, falar verdade.
Eram estas as perguntas que pretendia formular, da parte da Comissão de Negócios Estrangeiros.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Roseira.

A Sr.ª Luísa Roseira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, o período de 2010 a 2013 será marcado, em toda a União Europeia, pela aplicação, logo que oportuno, de estratégias credíveis de saída da crise, combinadas com a aplicação de programas de consolidação

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orçamental que permitam o regresso a uma situação de crescimento sustentado. O Governo manifesta a sua intenção de participar activamente neste objectivo, sendo de destacar a sua intervenção na negociação do quadro financeiro plurianual pós-2013 e na decisão de implementação da nova estratégia Europa 2020, visando a competitividade das pequenas e médias empresas.
O PSD está de acordo, genericamente, com as linhas orientadoras, bem como com tudo o que o Sr.
Ministro já manifestou aqui, no sentido de uma participação activa no que concerne ao Serviço Europeu para a Acção Externa.
Todavia, o Governo salienta ainda o empenhamento e o esforço de Portugal em promover uma maior aproximação dos cidadãos à União Europeia, nomeadamente através do reforço de acções de informação e de formação. De facto, uma das críticas mais usualmente ouvidas quanto à União Europeia consiste no seu afastamento da realidade e dos problemas dos cidadãos europeus. Desta forma, permito-me efectuar uma breve intervenção, direccionada para um ponto, na minha óptica, nevrálgico para Portugal e para os portugueses: a execução dos fundos comunitários.
A proposta de Orçamento do Estado para o presente ano refere que o montante previsto para as transferências da União Europeia para Portugal, em 2010, traduz um crescimento de 10,3%, em face das transferências registadas em 2009, justificando-se este acréscimo pelo aumento expectável da aceleração da execução financeira, relativa ao período de programação 2007/2013, quer no que respeita ao FEADER e ao FEP quer ao QREN.
À primeira vista, os números a que aludi anunciam um aumento na ordem dos 10% e deveriam significar um regozijo para Portugal e para os portugueses, mas a questão não é tão simples nem tão linear, em primeiro lugar, porque os números significam um acréscimo, mas ficam muito aquém do que era desejável e minimamente expectável. Apenas uma ínfima parte do que poderia ser utilizado por Portugal foi aplicada até ao presente, verificando-se um baixíssimo valor médio da taxa de execução do QREN, que ronda os 6,6% (dados do final de Setembro de 2009). Esta situação, em termos de desvio face ao planeamento financeiro anual do QREN, traduz-se em perto de 7000 milhões de euros de fundos comunitários que ficaram por aplicar, em Portugal, ao longo do triénio de 2007/2009, contrariamente ao previsto e acordado junto da Comissão Europeia.
Acresce ainda que o QREN, contrariando as sucessivas orientações emanadas da Comissão Europeia, constituiu um verdadeiro «QREN Complex», ao apresentar uma tramitação e uma exigência administrativas excessivamente burocráticas, começando, desde logo, pela existência de perto de uma centena de regulamentos diferentes, o que acaba por tornar ainda mais complexo algo que deveria ser simplificado. Em suma: numa matéria vital e primordial para Portugal, o Simplex não existe!!

O Sr. Presidente: — Resta-lhe 1 minuto, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Roseira (PSD): — Outra situação preocupante é a de que este «QREN Complex» aponta para uma distribuição de responsabilidades de decisão que, de modo formal ou informal, se traduz, como nunca se vira anteriormente, numa clara centralização e intervenção do Governo e dos seus representantes em todos os processos de decisão.
Outra questão que não posso deixar de referir, também de um modo linear, é a da baixa execução do PRODER. Os PRODER, nos moldes existentes, são programas anti-desenvolvimento rural, como ainda recentemente foi anunciado pelo actual Ministro, e têm uns dados de execução que rondam, na área das florestas, os 0% e, na área da agricultura, os 2,6%. Portanto, Sr. Ministro, o que questiono, fazendo jus à sua condição de Ministro de Estado, são as medidas que o Governo vai empreender, no imediato, para alterar este quadro confrangedor e complexo de execução dos referidos fundos comunitários, atendendo a que estes constituem uma das derradeiras oportunidades para a nossa convergência com a média dos países da União Europeia.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Alberto Gonçalves, uma vez mais sublinho quão significativo é para o Ministro dos Negócios Estrangeiros saber que

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tem nessa bancada apoio para aquilo que designa — e que subscrevo — como uma ambiciosa agenda internacional.
Tenho dito que no contexto das relações internacionais competitivas e exigentes, como aquelas que temos pela frente, a existência de um consenso alargado ou o mais alargado possível em matéria de política externa é absolutamente determinante para a prossecução dos interesses estratégicos do País. Por isso, não posso deixar de saudar essa vossa abertura — a sua abertura, em particular — para sublinhar esse aspecto, independentemente das divergências pontuais que não deixam de alimentar permanentemente o nosso confronto nesta Comissão.
Sobre a Língua, não houve aqui nenhum exercício de má fé, Sr. Deputado. Nunca falei em 50 milhões de euros, nunca tive a mínima ideia sobre qual era a dotação do Ministério da Educação afecta a esse quadro de competências.
Mas o que posso dizer-lhe é que, efectivamente, a verba transferida é a que corresponde aos professores que estavam em exercício de funções no âmbito do programa de ensino do português no estrangeiro, que era tutelado pelo Ministério da Educação e agora passa a estar tutelado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, no âmbito do Instituto Camões (ICA). Não houve aqui nenhum exercício de má-fé relativamente a números que possam ter alguma disparidade, eventualmente a dificuldade em contabilizar alguns destes valores na própria sede, que era, à data, o Ministério da Educação.
Dir-lhe-ei apenas que a integração do ensino do português no estrangeiro no Instituto Camões é da maior importância para a política da língua. Não tínhamos a noção do efeito tão importante que poderia ter a sustentação de uma política da língua e do ensino do português no estrangeiro decorrente da integração do ensino do português, do nível primário ao secundário, no Instituto Camões aproveitando as sinergias que podem ser oferecidas, por um lado, pela integração de todo o ensino da língua e, por outro lado, pela promoção da acção cultural externa associada ao ensino da língua e pela envolvente de toda a política das comunidades, que pela primeira vez passa a estar também associada à dinâmica do Instituto Camões.
O Sr. Deputado era, aliás, um crítico, com toda a legitimidade, desse «divórcio» entre a política cultural que o Instituto Camões seguia, de promoção do País no estrangeiro, e a política das comunidades, porque temos de entender que onde há uma comunidade de portugueses, onde há um português, há um potencial de afirmação da nossa cultura, da nossa língua; e ele não era devidamente integrado precisamente porque estruturalmente estivemos, durante décadas, amarrados à dificuldade de transferir competências que eram do Ministério da Educação para o Ministério dos Negócios Estrangeiros. E o Sr. Deputado sabe muito bem como é difícil na dialéctica do poder dentro dos ministérios aceitar transferir competências de um ministério para outro.
Mas creio que essa reforma está feita e a partir de agora o Instituto Camões tem um conjunto de recursos humanos e financeiros que não tinha — basta ver que o orçamento do Instituto Camões triplicou. Temos a noção de que o Instituto tem hoje um escopo, do ponto de vista do ensino da língua, muito mais significativo.
A rede de representação externa será apresentada — até ao fim do mês de Março, penso transmitir à Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas um conjunto de orientações sobre três aspectos fundamentais da reorganização da política externa em sede de gestão e de organização: os estatutos tanto do pessoal dos quadros externos como da carreira diplomática; o sistema de incentivos, que tem de ser, do meu ponto de vista, actualizado e alterado — não podemos ter um sistema de incentivos totalmente desajustado das necessidades do País; e o quadro da rede de representação externa.
Como disse, estamos a avaliar todos estes aspectos de forma integrada. O mundo mudou muito nesta última década — em particular nestes últimos anos, está a mudar muito rapidamente, e a máquina diplomática, a máquina de representação externa tem de se ajustar com flexibilidade às mudanças que estão em curso na relação de forças no sistema internacional. Portanto, temos de rever a nossa rede de representação e mobilizar os nossos recursos para as regiões que têm um potencial mais significativo do ponto de vista da projecção dos nossos interesses, designadamente na área económica e na área cultural.
Mas, como disse, em matéria de carreiras, de redes e de incentivos, até ao final do mês de Março, terei oportunidade de na comissão dar expressão a um conjunto de orientações que o Governo pretende assumir nesta matéria.
Em relação à realidade dos fluxos migratórios, reconheço, como já lhe disse, que temos de acompanhá-la com particular atenção. De resto, o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas está a fazê-lo.

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Não concordo consigo quando diz que o Conselho das Comunidades Portuguesas não pode realizar o seu encontro anual com 200 000 €; os dados que temos de custos de outros eventos não nos confirmam essa tese.
No que respeita ao Fundo da Língua Portuguesa, devo dizer-lhe que não há qualquer problema relativamente à sua tutela. O Fundo é tutelado, neste momento, pelo Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD), está integrado na actividade deste Instituto pela razão que já tive a oportunidade de lhe transmitir e que se justifica ainda, do meu ponto de vista, ao longo do ano.
Os saldos transitados do IPAD têm estado a financiar, por autorização do Ministério das Finanças, os projectos do Fundo da Língua Portuguesa. E, como sabe, o próprio decreto que fixa o Fundo da Língua Portuguesa refere que o objectivo é, ao mesmo que promovemos o ensino da língua portuguesa, contribuirmos também para o nosso rácio de recursos afectos à política de ajuda ao desenvolvimento, por isso é nesse âmbito que o Fundo é gerido.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, só lhe resta 1 minuto.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Devo dizer que aprovámos 6,7 milhões de euros em projectos, já em 2009, ao abrigo do Fundo da Língua Portuguesa e estão previstos projectos no montante de 11 milhões de euros para 2010, com saldos transitados e fora do plafond do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Portanto, é este artifício que nos permite, apesar de tudo, ter uma «almofada» de recursos para financiar especificamente a área da promoção do ensino da língua portuguesa, o que de outra forma, no quadro dos orçamentos restritos que temos no Instituto Camões e no IPAD, não poderíamos fazer.
Para terminar, relativamente aos Objectivos do Milénio, temos vindo a consolidar a nossa posição: passámos de 0,20%, quando o Sr. Deputado era membro do Governo, para 0,27%, no ano passado. Mas não chega — estou de acordo consigo! — , precisávamos de ser mais ambiciosos!! Contudo, a crise chegou a todos e também chegou à ajuda ao desenvolvimento. Apesar de tudo, o referencial está lá e vamos tentar continuar a prosseguir por essa via, paulatinamente.
Sr.ª Deputada Luísa Roseira, já não tenho muito tempo, mas as questões que me colocou não são da minha directa responsabilidade. Como sabe, o Ministério dos Negócios Estrangeiros não tutela o QREN, nem a sua execução.
Efectivamente, houve algumas dificuldades na execução quer do PRODER quer do QREN, não vale a pena ignorá-lo, mas também não é crítico: temos 9,1% na taxa de execução, em 2009; temos 45% na taxa de compromissos efectivos, e acredito seriamente que com as medidas que estão a ser tomadas em sede ministerial própria vamos poder recuperar rapidamente as taxas de execução que referiu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Srs. Presidentes, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, começaria por fazer uma consideração à intervenção inicial do Sr. Ministro, referindo que este orçamento nos é apresentado num contexto de contenção orçamental, não obstante o que verificamos é que o peso relativo do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros na administração central aumenta. Portanto, inverte-se uma tendência, que se verificou em anos anteriores, de estagnação deste orçamento. Acho que esse é um facto assinalável pelo que é importante sublinhá-lo.
Ao analisar o orçamento que nos é apresentado, farei o que o Sr. Ministro fez há pouco, que é registar as políticas a que este Orçamento do Estado se deve ajustar. E nesse sentido perece-me importante sublinhar alguns dos aspectos que têm vindo a ser prosseguidos relativamente às prioridades da nossa política externa: a coerência e a capacidade de concretização.
E sublinho a coerência e a capacidade de concretização, porque, por exemplo, no ano anterior foi aqui discutido que seriam dados passos importantes no âmbito da língua e da cultura portuguesas, e na realidade isso verificou-se — e à frente já me referirei mais a esse facto — de uma maneira que marca uma viragem na afirmação de Portugal, da sua imagem, através da língua e da cultura portuguesas.

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Queria referir também que tem havido uma acção bastante ambiciosa e consequente na nossa afirmação externa desde a presidência portuguesa da União Europeia, em que há que assinalar, por exemplo, inovações ou semi-inovações: é o caso não só da primeira cimeira com o Brasil — com tudo o que isso significa para Portugal e para não só o Brasil mas todo o continente americano — e também da cimeira entre a União Europeia e África, e o prestígio que isso traz para Portugal. Aliás, o Sr. Ministro tem vindo recentemente a fazer o follow-up dessa cimeira, com aquilo que me parece ser um benefício próprio de Portugal na sua relação com os países africanos.
Além disso, o que verificámos relativamente ao ano transacto foi a realização de alguns dos aspectos que permitem uma projecção internacional de Portugal, com uma dimensão bastante importante, quer a nível da presidência da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), quer a nível da presidência da Cimeira Ibero-Americana e agora, para este ano, a nível da realização da cimeira da Nato, em Lisboa. Tudo isto são acontecimentos que marcam uma ambição estratégica relativamente à nossa política externa e julgo que isso é de saudar.
No entanto, o que refere a abertura do orçamento é que Portugal, agora, vai valorizar substancialmente as suas relações históricas fora do espaço europeu. E essa também parece uma acção bastante consequente na medida em que Portugal está firmemente ancorado no projecto europeu; deu mais do que provas da sua capacidade de influenciar o processo de construção europeia, quer através da participação no euro, quer através do método convencional que foi utilizado na Carta dos Direitos Fundamentais, quer na Estratégia de Lisboa e na ratificação do Tratado de Lisboa.
Há uma ancoragem absolutamente sólida que nos permite agora sair deste espaço europeu. E esta acção por parte do Ministério dos Negócios Estrangeiros revela uma visão estratégica de grande ambição, com uma grande solidez e bastante consequente — julgo que esse é um aspecto que deve ser salientado.
Nesta nova fase há vários aspectos que suscitam algumas interrogações. O Sr. Ministro já afirmou que será mobilizada toda a máquina diplomática para aumentar a nossa competitividade a nível económico e também para projectar a imagem de Portugal em termos externos.
Sendo certo que foi aprovado o novo Regulamento Consular, tenho uma dúvida relativamente a este aspecto, porque considero absolutamente essencial — e sobretudo na envolvência que o Sr. Ministro lhe dá — envolver as comunidades portuguesas.
A pergunta que gostaria de colocar ao Sr. Ministro neste contexto é a seguinte: para que seja atingido o desígnio estratégico de mobilização da máquina diplomática para projectar a imagem de Portugal e reforçar a nossa competitividade e a internacionalização da nossa economia, de que forma é que os diplomatas — os embaixadores, todo o pessoal dos postos consulares, os cônsules, etc. — vão ser mobilizados? Que instrumentos novos é que vão ser accionados? E que atitude é que os nossos diplomatas vão ter? Aquilo que me parece é que, embora haja uma diferença, uma mudança de atitude na nossa diplomacia, ainda me parece que eles precisam de um suplemento de alma, se assim se pode dizer, para que cumpram, cabalmente, estes objectivos a que, agora, o Governo se propõe, de uma maneira tão explícita.
Por outro lado, uma leitura que se faz — aliás, o Sr. Ministro, agora, já referiu isso aqui — , e que considero particularmente relevante, é a da forma tão explícita como as comunidades portuguesas acabam por ser envolvidas nesta projecção da imagem externa de Portugal.
O Sr. Ministro utilizou, até há pouco, uma expressão que me agrada bastante; disse o seguinte: «Onde há portugueses, há potencial de afirmação da nossa língua e da nossa cultura». Parece-me bastante relevante que haja, de facto, esta leitura do aproveitamento do enorme potencial económico e diplomático que têm as nossas comunidades.
Aproveito para deixar aqui uma pergunta relativamente ao Programa NETINVEST Portugal, bem como para relevar a importância que este problema terá e a importância que poderão ter todos os empresários da área das comunidades.

O Sr. Presidente: — Tem 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Gostaria ainda de sublinhar a importância que teve o conjunto de instrumentos, aprovados na anterior legislatura, o que permite, com a reforma do Instituto Camões — algo que já foi aqui referido pelo Sr. Ministro — , passar a haver um maior envolvimento das comunidades portuguesas, fazendo

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igualmente com que o Instituto deixe de ter uma certa dimensão um pouco mais elitista, se assim se pode dizer.
Mais concretamente, gostaria de colocar ao Sr. Ministro duas questões.
Um problema que se põe à nossa comunidade em Inglaterra prende-se com as instalações e a funcionalidade do nosso consulado em Londres. Gostaria, pois, de saber o que está previsto para que essa situação mude.
Depois, Sr. Ministro, também no âmbito da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, perguntolhe o seguinte: quais são as implicações e a importância dos projectos referidos no orçamento no âmbito do consulado virtual, da «webização» do sistema de gestão consular, e noutros projectos de monitorização na área do registo e da identificação civil? Deixava só mais uma questão, relativamente aos assuntos europeus. Este ano, vão ser comemorados os 25 anos da nossa adesão, e eu pergunto o que é que isto vai implicar, em termos orçamentais e de iniciativas para concretização dessa comemoração por parte do Estado português.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Sr. Ministro, tem a palavra para responder.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Pisco, sobre essas perguntas em concreto, deixarei que o Sr. Secretário de Estado que acompanha mais directamente essas questões lhe dê os esclarecimentos.
Em relação ao consulado em Londres, uma preocupação que temos tido é a de criar um quadro de condições novas para responder a uma situação que, muito rapidamente, se tornou mais exigente do que era, há meia dúzia de anos, face à pressão migratória que essa região conheceu.
O Secretário de Estado tem soluções encaminhadas, relativamente a essa questão, bem como em relação às questões técnicas que colocou, na área da política consular.
Relativamente aos considerandos que fez, dir-lhe-ei, apenas, o seguinte: tem razão, nós temos uma preocupação muito grande no sentido de valorizar mais a nossa participação no projecto europeu — sendo um actor que tem capacidade de interlocução com outros actores e outras regiões do mundo, é absolutamente indispensável que Portugal seja capaz de o fazer nos próximos anos.
Por isso, o investimento na internacionalização do País, fora da Europa, é absolutamente uma exigência da afirmação do Estado português e dos nossos interesses nas próximas décadas. Por isso, o investimento que está a ser feito na relação com o espaço civilizacional mais próximo, designadamente o mundo latinoamericano, a África, mas também as relações com o mundo árabe, islâmico, e com o continente asiático, em algumas regiões particulares, são absolutamente indispensáveis para que o País, nos próximos anos e nas próximas décadas, consiga afirmar uma posição vincada num sistema internacional muito competitivo e muito exigente, como aquele que temos pela frente.
O papel dos diplomatas, naturalmente, tem de adaptar-se a um quadro de transformações muito importantes, a que a acção externa dos Estados está a ser obrigada.
O papel do Estado está sob uma enorme pressão. Como todos nós percebemos, esta crise veio evidenciar que o Estado está na primeira linha das preocupações dos cidadãos, porque, num contexto de crise, também não têm mais ninguém a quem recorrer; é, apesar de tudo, para o Estado que olham. Esta crise veio evidenciar isso com muita acutilância.
A União Europeia está distante, as Nações Unidas estão ainda mais distantes, as organizações de Bretton Woods não interessam, a não ser para os sectores directamente relacionados com essas organizações» Portanto, o Estado tornou-se, paradoxalmente, o centro das exigências colectivas nacionais; mas, ao mesmo tempo, os Estados nunca tiveram tão pouco poder para resolver os problemas como têm hoje. E, dada a natureza das transformações que a economia mundial conheceu, em particular também as transformações que esta crise evidenciou, o Estado nacional está muito condicionado na sua capacidade de solução e de resposta aos problemas. Ora, isso impõe, necessariamente, um esforço de internacionalização muito grande.
A forma de fazer política e a acção diplomática não vão, naturalmente, deixar de ser condicionadas por esta mudança de paradigma que está a ocorrer no sistema político internacional; esta mudança de paradigma no sistema político e na relação entre o Estado e as organizações multilaterais, sejam regionais sejam de

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âmbito global, impõe necessariamente uma mudança de paradigma também na acção político-diplomática. E vão também nesse sentido as exigências de formação do pessoal diplomático e do pessoal técnico dos ministérios, que têm de ser adaptados às exigências dessas mudanças.
Acredito que um dos grandes investimentos, que não enunciei na minha intervenção inicial mas que está em curso e vai ser concretizado, ainda este ano, é o relativo ao Instituto Diplomático.
No final do ano, vamos ter a primeira fase do Instituto Diplomático, o qual se acomodará no Convento do Sacramento; essa primeira fase estará concluída. E o Instituto Diplomático vai ter um programa absolutamente central na actividade do Ministério, ao longo dos próximos anos — terá de estar para a política externa como esteve nas últimas décadas o Instituto de Defesa Nacional para a política de segurança e de defesa nacional.
Nós temos tido falta de uma instituição capaz de projectar, sob a forma, até, de acção diplomática pública consistente, o papel importante que a política externa tem na afirmação dos interesses do País.
E, portanto, essa reforma estará em curso e a preparação do quadro de pessoal técnico e diplomático será necessariamente adaptada em função de uma instituição que, neste momento, não tem expressão na actividade do Ministério.
Dir-lhe-ei ainda que, relativamente à política das comunidades, de facto, o que tem estado no centro das nossas preocupações tem sido a valorização desse potencial estratégico que as comunidades representam para os nossos interesses, no domínio da projecção da língua e da cultura portuguesa e no domínio da projecção dos nossos interesses económicos. Não o temos aproveitado convenientemente, precisamente porque tem havido dificuldade de organização do sistema, seja do sistema ministerial seja do sistema de relação entre o Estado, as associações económicas e as empresas. E são essas reformas que, neste momento, foram feitas que vão ser implementadas, ao longo de 2010, e que poderão, do meu ponto de vista, mudar radicalmente a relação que tem existido entre as comunidades e as políticas internas do País.
O Sr. Secretário de Estado responderá — se fizer favor, Sr. Secretário de Estado, António Braga — , em concreto, às questões que me colocou.

O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra para responder, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (António Braga): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, relativamente às questões colocadas, quanto ao desenvolvimento de programas para modernização, actualização e crescimento — qualificando, por essa via, o serviço consular, designadamente com o investimento (que, aliás, transparece no orçamento) forte nas novas tecnologias — , enquadra-se no conjunto das reformas que têm vindo a ser estabelecidas nessa zona.
Essas reformas pretendem, finalmente — agora com os instrumentos mais completos, designadamente com o cartão do cidadão a ser também produzido na área consular e com o passaporte também biométrico que está já em execução, há muito tempo — , permitir, sobretudo, o desenvolvimento de soluções informáticas para que, através do uso da Internet, os nossos concidadãos possam beneficiar dos serviços, viáveis por via desse instrumento.
Ora, é sobretudo nessa área que está a ser feito um fortíssimo desenvolvimento, aquilo a que se designa o CIRIC, que é, no fundo, a capacidade que, hoje, os postos consulares têm de interagir, directamente, na base de dados da justiça, fazendo com que, por essa via, os actos consulares fiquem instantaneamente consolidados, em tempo real. Isto dá uma garantia de qualidade e de proximidade de serviço e é justamente nesse caminho que todos os instrumentos a montante estão, agora, a ser desenvolvidos no conjunto dessa reforma. E é por isso que aparece a inscrição dessas verbas.
Para além delas, naturalmente, como os Srs. Deputados sabem, há também a capacidade de recorrer ao Fundo para as Relações Internacionais — está previsto, justamente no acordo com as finanças, para que o Fundo possa ser utilizado para esse conjunto de reformas.
Relativamente ao NETINVEST, eu gostava de salientar dois pormenores muito relevantes.
Em primeiro lugar, o levantamento que foi feito pelos serviços, também já com o contributo do Observatório da Emigração, através de um protocolo, uma parceria com o ICSTE — como, aliás, é público — , que tem vindo a tratar os dados relativamente aos stocks populacionais, usando o critério internacional (designadamente, as Nações Unidas e com recurso às próprias fontes directas de informação), percebendo o

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fluxo migratório; em função desses estudos, retira conclusões que têm impacto nas políticas, as quais são dirigidas, nomeadamente, no contexto das comunidades portuguesas, e se enquadram, evidentemente, na defesa dos interesses portugueses no estrangeiro.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, dispõe ainda de 1 minuto.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: — Ora, à luz desse estudo, identificámos mais de 120 000 empresários portugueses na diáspora, o que justifica a existência de um programa que vá facilitar e permitir quer o investimento de portugueses no estrangeiro, em parcerias de empresários, quer o contrário, isto é, o investimento também em Portugal, em parcerias ou individualmente.
Este programa que também pretende dar um contributo para ajudar na internacionalização da economia portuguesa, atraindo também investimentos para Portugal do conjunto da diáspora portuguesa.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
Passando, agora, ao CDS, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo, naturalmente, por cumprimentar os Srs.
Presidentes das Comissões, o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e os Srs. Secretários de Estado.
Diria, Sr. Ministro, que este é um orçamento de continuidade — outra coisa também não seria naturalmente de esperar, nem o CDS esperaria que fosse de outra maneira nem, porventura, o Sr. Ministro esperaria que o CDS entendesse de outra forma»! Portanto, quanto a isso, pouco há a acrescentar.
Em todo o caso, Sr. Ministro, gostaria de dizer que, à primeira vista, tudo parecia fazer crer que este orçamento seria motivo mais do que suficiente para que pudesse, em nome do CDS, vir aqui felicitá-lo.
Afinal de contas, com um aumento global do orçamento, considerável em ano de enormes restrições orçamentais, V. Ex.ª teria vencido a sempre dura batalha entre ministérios, entre ministros, no que também é a negociação orçamental, bastante árdua e difícil. Mas, em todo o caso, Sr. Ministro, quando começamos a olhar com cuidado para este orçamento e a esmiuçar aquilo que é, sobretudo, um acréscimo de competências e de atribuições, que o próprio Ministério dos Negócios Estrangeiros acaba por assumir, confesso que ficamos — e fico — com algumas dúvidas e, naturalmente, hesitantes quanto a estas felicitações.
Por isso, queria dizer-lhe, Sr. Ministro, algo que, porventura, também não será nada de novo: o nosso entusiasmo é bastante moderado relativamente a este orçamento do Ministério.
Em todo o caso, não queria deixar de dizer que no CDS registamos com agrado o grau de prioridade que é dado e assumido no que diz respeito à internacionalização da economia portuguesa e estamos mesmo de acordo com a intervenção que o Sr. Ministro aqui fez relativamente à diplomacia económica e ao esforço que o Governo pretende introduzir nessa matéria.
Evidentemente, também registamos com agrado o aumento de 11,5% do orçamento do Ministério face a 2009, o que — nas palavras do Sr. Ministro — é, de facto, um «reforço condicionado». E registamos sobretudo uma certa ideia de estabilidade quanto à política externa portuguesa, à qual não podemos nem queremos deixar de associar-nos. Nos tempos que correm, em que esta ideia de estabilidade começa a ser tão escassa em diferentes áreas da nossa vida, este é um elemento bastante valioso e, portanto, não podemos deixar de o salientar nesta matéria.
Gostava de colocar algumas questões concretas, Sr. Ministro, cujo primeiro lote tem a ver, sobretudo, com algumas dúvidas orçamentais que temos.
O orçamento do Ministério prevê um aumento de 11,5% face a 2009, registando mais 41,9 milhões de euros. É um aumento que é justificado: o Sr. Ministro já aqui disse que se verificava por força da lei orgânica do Ministério e das novas atribuições no âmbito do ensino da língua portuguesa e do Instituto Camões.
Mas há algo que gostaríamos de saber e que é o seguinte: existe uma transferência da dotação orçamental do Ministério da Educação para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas também uma transferência da despesa com este tipo de atribuições e com esta actividade nova que o Ministério assume. Gostava de perguntar-lhe se é possível, hoje, concretizar essa despesa. O Sr. Ministro falou-nos na dotação com os

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funcionários, os professores e eu pergunto-lhe: face aos objectivos bastante ambiciosos, que também aqui foram expressos pela Sr.ª Presidente do Instituto Camões, este orçamento é suficiente? Por outro lado, em termos de despesas, a despesa consolidada do Ministério aumenta 13,3%, muito por força de um aumento de 37% na área da cooperação e da relação externa e de 9% nos serviços de apoio, estudos, coordenação e representação. A que se deve este aumento? Corresponde a uma estratégia específica? O que significa e a que se destina, em termos de cooperação e dos estudos que estão previstos? Sr. Ministro, do orçamento que nos apresenta, cerca de 50% diz respeito a despesas com pessoal, com recursos humanos, sendo certo que desses recursos humanos verificamos que apenas 12% correspondem a despesas com diplomatas, 11,7% com pessoal técnico e 11,5% com assistentes técnicos. Fará sentido esta proporção, do ponto de vista do que é o orçamento do Ministério? Por fim, queria formular-lhe um conjunto de perguntas quanto a alguns projectos e programas específicos, a que o Sr. Ministro já foi respondendo em parte, relacionados com a candidatura de Portugal ao cargo de membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU, estando consagrada, segundo percebemos, uma verba de 1,5 milhões de euros, o que nos parece manifestamente reduzido para o desafio, sobretudo tendo em conta a concorrência que o Sr. Ministro também já referiu.
Neste aspecto, gostávamos de saber que tipo de eventos Portugal tenciona realizar. Gostávamos que houvesse uma maior envolvência com esta candidatura, seja em termos nacionais seja em termos internacionais, e, obviamente, estamos disponíveis para esse desafio bastante importante.
Por outro lado, tendo em conta esta prioridade da internacionalização da economia, também não resulta claro qual é o investimento na promoção de Portugal na Ásia — a Expo Xangai 2010, o Ano de Portugal na China 2011, os 150 anos do Tratado de Paz, Amizade e Comércio Portugal/Japão ou a comemoração dos 50 anos de relações diplomáticas com a Coreia do Sul em 2011. Gostávamos, se fosse possível, que nos pudesse dar alguns elementos adicionais, até porque nas rubricas que estão previstas para estas matérias (salvo erro, acções diplomáticas extraordinárias, cimeiras e reuniões ministeriais) correspondem a um orçamento que é, mais ou menos, equivalente ao orçamento de dois membros dos quatro membros do Governo. Portanto, gostávamos de perceber um pouco mais sobre qual vai ser a dotação orçamental para estes projectos.
Quanto à política de representação do Estado português no estrangeiro, nomeadamente quanto às embaixadas, queria perguntar-lhe, Sr. Ministro, se fará sentido, em época de restrições orçamentais, manter três embaixadas nos três países bálticos — Letónia, Lituânia e Estónia — e se não fará sentido investir um pouco mais e introduzir melhoramentos significativos nas embaixadas portuguesas em Timor Leste e em Cabo Verde, onde, como sabe melhor do que nós, estão, inclusivamente, disponibilizados terrenos para este efeito.
Relativamente à língua portuguesa, queria registar o que o Sr. Ministro aqui disse. De facto, a língua portuguesa tem um potencial tremendo e talvez fosse interessante que Portugal fizesse o mesmo que fez a presidência espanhola recentemente — salvo erro, através de uma brochura de apresentação da própria presidência — , que disse claramente o peso que a língua espanhola assume relativamente ao PIB espanhol: 14%! Ora, talvez fosse tempo — e este é o desafio que gostava de deixar — , tendo em conta que a verba dos estudos aumenta, de o próprio Ministério dos Negócios Estrangeiros fazer um estudo sólido sobre o peso, o valor real da língua portuguesa face ao PIB, para que todos nós possamos ter também uma consciência da real importância estratégica do apoio à língua portuguesa.
Fica aqui o desafio, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila, este é um orçamento de continuidade, claro. Não podia deixar de sê-lo, uma vez que não houve qualquer ruptura governativa até ao momento. Portanto, é perfeitamente natural que este orçamento tenha elementos de continuidade em relação aos orçamentos dos outros anos. Apesar de tudo, é reconhecido o esforço feito num contexto de restrições orçamentais para reforçar algumas dotações do Ministério dos Negócios Estrangeiros face aos novos desafios com que estamos confrontados.
Posso dar-lhe conta de algumas dessas dotações.

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Tal como disse, o aumento significativo que referiu, de 49 milhões de euros, não pode ser interpretado como um aumento real das dotações do Ministério, uma vez que arrasta consigo 30 milhões de euros e arrasta consigo competências novas que não estavam tuteladas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e, portanto, não eram despesa do Ministério em 2009.
Apesar de tudo, ainda é preciso descontar nesta margem a reserva de 2,5%, ao abrigo da Direcção-Geral do Orçamento, e o aumento de 7,5% para 15% dos descontos para a Caixa Geral de Aposentações.
Portanto, realisticamente, as verbas que representam o aumento da dotação do Ministério são menores do que aquela que evidenciou. Por isso mesmo, é um orçamento de continuidade e não um orçamento que abre uma «página nova» na relação do Ministério com a estrutura da despesa do Estado.
Uma vez que manifestou essa curiosidade, sublinho-lhe apenas onde é que procurámos colocar as dotações novas, na margem que fica. Fizemo-lo em questões pontuais que disse que são de importância para a política do Ministério.
Assim, logo à cabeça, uma verba para seguros. Era inaceitável que tivesse diplomatas em missões sem qualquer cobertura de risco — em termos ilegais, uma vez que a lei dá cobertura à existência de um seguro de saúde para o pessoal em acção ou em missão diplomática externa e, de facto, isso não se verificava.
Estivemos à espera do estatuto (estatuto que se atrasou no ano passado por razões que expliquei à Comissão) e decidimos que era absolutamente imperativo, este ano, o Ministério inscrever uma dotação para acautelar essas situações.
Em segundo lugar, temos problemas pontuais de pessoal, uma vez que o quadro do Ministério tem vindo a sofrer uma «sangria» significativa: em 2002, tinha qualquer coisa como 4118 funcionários e hoje tem 3539 funcionários. No exercício de ajustamento dos recursos humanos às necessidades da Administração Pública, o Ministério dos Negócios Estrangeiros fez um esforço significativo ao longo destes anos. E, nesse contexto, há problemas pontuais em algumas categorias da estrutura de pessoal que temos de acautelar, sob pena de podermos vir a ter situações de ruptura caso não acautelássemos essa despesa.
Temos aqui, por isso, uma dotação de 1,2 milhões de euros, sem contar com o IPAD e o Instituto Camões, precisamente para fazer face a situações de ruptura de pessoal, uma vez que tem havido um processo de decréscimo de pessoal em algumas estruturas. Por exemplo, em Londres tivemos problemas sérios face à pressão enorme que o consulado recebeu pela pressão migratória dos últimos anos.
Em termos de comunicações do Ministério, reforçámos em meio milhão de euros a dotação, o que se compreende face ao alargamento da nossa base de relação política, sobretudo num ano de campanha eleitoral para o Conselho de Segurança.
Para reforço de rendas do Ministério precisamos de mais 1,1 milhões de euros. Temos ainda uma dotação de 1,5 milhões de euros para a abertura de novas embaixadas — já falarei sobre isso — e uma dotação de 1 milhão de euros para reforço de visitas de Estado, uma vez que, sendo um ano de campanha para o Conselho de Segurança, há mais visitas de Estado, tanto no âmbito do Presidente da República como do PrimeiroMinistro.
Portanto, no essencial, são estas as verbas que temos de «folga» relativamente aos ajustamentos decorrentes de imperativos, seja da reserva de 2,5%, seja do aumento das contribuições que são orçamentadas no Ministério pelos respectivos serviços, seja pela transferência de 30 milhões de euros, que é o significativo no aumento do orçamento do Ministério. Mas não esqueça que vamos ter uma despesa de mais de 20 milhões de euros, seguramente, na realização da cimeira da NATO, que é, de qualquer modo, uma despesa da actividade do Ministério que não está orçamentada.
Em suma, é um orçamento realista, de contenção, que tem em conta as necessidades pontuais do Ministério, mas também as necessidades de contenção que o País espera de toda a Administração Pública neste momento.
Por outro lado, o programa de iniciativas das candidaturas para o Conselho de Segurança tem esta dotação global. Quais são aqui as nossas preocupações? Elas são sobretudo com o quadro de países de pequena dimensão, porque, não tendo nós representação junto desses países ou tendo contactos muito esporádicos com esses países, apesar de tudo, eles são um voto! Quer no Pacífico quer nas Caraíbas, por exemplo, são dezenas de Estados com os quais, praticamente, não temos relações regulares: apenas temos relações neste momento em que precisamos de pedir o voto para o Conselho de Segurança.

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Há um conjunto de iniciativas programadas — depois terei oportunidade de informar a Comissão, em detalhe, sobre essas iniciativas — quer em Nova Iorque, quer em Lisboa, quer fora de Lisboa. Em Lisboa, nas áreas do turismo e das energias renováveis, por exemplo, já realizámos iniciativas em que convidámos representantes desses países para acompanharem a experiência portuguesa nesse sector, mas são iniciativas muito pontuais e com um orçamento muito limitado porque, de facto, não temos recursos para nos bater com orçamentos como os da Alemanha e do Canadá.
Apesar de tudo, vamos continuar a bater-nos por um lugar no Conselho de Segurança. Sabemos que não é fácil, mas teremos de fazer algum esforço nesse sentido.
Sobre a internacionalização e o programa específico da Ásia, informei — o Sr. Deputado não ouviu, com certeza — que até ao final do mês de Março teremos uma estratégia de relançamento das relações com a Ásia, preparada a nível do Governo. Tem de ser uma estratégia de médio prazo, eu diria que é uma estratégia que deve envolver os vários governos, daqui até ao horizonte de 2017, no sentido de projectar uma imagem do nosso País diferente daquela que hoje temos. Aliás, não é da imagem que se trata mas mais da representação dos interesses do nosso País.
O País tem uma imagem muito importante no continente asiático, é uma potência histórica, e é assim que lá nos vêem, como potência histórica, mas fomos perdendo contacto com esses países ao longo das décadas.
Primeiro, desde a Conferência de Bandung, em que persistimos na colonização forçada, perdemos muito contacto com todo o grupo de países que se alinhou, ou se desalinhou — neste caso, o movimento dos não alinhados — , perdendo contacto com Portugal; depois, a guerra colonial afastou muitos desses Estados da relação com Portugal; também como persistimos na luta por Timor, que era uma luta incómoda para muitos dos Estados dessa região, fomos perdendo lastro no relacionamento nessa região.
Portanto, a nossa perspectiva é a de que precisamos fazer um investimento renovado no relançamento da nossa relação com a Ásia. Assim, apresentarei em comissão, até ao final do mês de Março, um programa com um conjunto de acções, de iniciativas e de linhas estratégicas para os próximos anos.
Para este ano, temos previstos 700 000 € para iniciativas específicas que se relacionam com o lançamento deste programa em algumas destas regiões.
Há um conjunto de países referenciado e, naturalmente, a representação em Xangai vai ser importante para nós, mas dir-lhe-ei que a celebração dos 500 anos da chegada à Tailândia, ao reino de Sião, marcará um conjunto de iniciativas históricas que queremos sustentar ao longo dos vários anos. Espero que a oposição nos acompanhe nesse esforço, porque ele deve ser sustentado ao longo dos próximos anos, para dar de novo uma projecção à imagem de potência histórica que o nosso País tem nessa região.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, creio que terá ocasião, nas respostas seguintes, de voltar a esse tema.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, as minhas saudações.
Sr. Ministro, vou colocar-lhe quatro ordens de questões diferentes, que decorrem da leitura que fiz do Orçamento do Estado respeitante ao Ministério dos Negócios Estrangeiros.
A primeira ordem de questões prende-se, naturalmente, com a importância relativa que passa a ter, neste contexto, a verba atribuída ao Instituto Camões.
Creio que os dados são objectivos e que não merecem grande margem de apreciação no que diz respeito às verbas envolvidas, mas está em causa, isso sim — e gostava de ouvir da parte do Sr. Ministro alguma reflexão estratégica a este respeito — , aquilo que se refere à política da língua.
O Instituto Camões — disse o Sr. Ministro em resposta a uma pergunta anterior — tem como missão primordial defender a projecção da língua portuguesa não só enquanto língua de trabalho em organizações internacionais mas também enquanto língua em expansão.
Sucede, e o Sr. Ministro sabe-o melhor do que eu, que no actual contexto internacional, cada vez mais a língua portuguesa coexiste em contextos multilingues, pelo que insistir num exclusivo, ou num quase

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exclusivo, da política da língua na sua projecção como língua em expansão desconsidera outras áreas de projecção da língua portuguesa, designadamente o seu ensino como língua estrangeira e como língua segunda, em articulação com outros idiomas.
Sobre isto, até agora, Sr. Ministro, não tive oportunidade de ouvir da sua parte, ou da parte dos responsáveis por esta área, qualquer tipo de definição estratégica. Creio que ficaremos a perder, enquanto País, se não colocarmos estas outras áreas como prioridade.
A minha segunda área de perguntas diz respeito à política de ajuda pública ao desenvolvimento, para sublinhar um dado que me parece óbvio da leitura dos documentos orçamentais.
O Governo, no relatório, aponta para a fixação, até 2015, da rácio de 0,7 relativa ao rendimento nacional bruto, mas, feitas as contas, atingir essa meta revela-se muito mais do que ambicioso. É que, em bom rigor, os números que vamos conhecendo apontam para taxas de crescimento das verbas envolvidas em ajuda pública ao desenvolvimento que se situam em 0,06, de 2005 a 2008; depois, de 2007 para 2008, em 0,05; e, no actual momento, há uma descida da taxa de aumento para 0,03. Isto significa, concretamente, que, de 2008 para 2009, aumentámos de 0,27 para 0,30.
Ora, pelas contas que estão ao nosso dispor, essa meta implicaria que dobrássemos a taxa de aumento a partir de 2010-2011. Estamos com um crescimento anual de 0,03 — aliás, são essas as indicações que o Governo tem nos indicadores estratégicos — , teríamos de passar de 0,03 para 0,06 e, depois, nos últimos dois anos do período de referência, isto é, de 2013 a 2015,teria de haver um aumento súbito e inexplicável de 0,18.
Sr. Ministro, suponho que fazer assim as contas é dar margem a uma grande fantasia. Não desconsidero a ambição e apoio-a, mas aqui não é uma questão de ambição, é uma questão de fazermos as contas de maneira a que sejam aceitáveis à luz das nossas reais possibilidades.
Para além desta questão quantitativa também gostaria de saber, através do Sr. Ministro ou do Sr.
Secretário de Estado, quais são as perspectivas que têm para a aplicação destas verbas de ajuda pública ao desenvolvimento. Por outras palavras, vamos manter uma estrutura de ajuda pública ao desenvolvimento (APD) centrada, em grande medida — cerca de 62%, se não me falha a memória — , em bolsas para estudantes dos países em desenvolvimento virem até Portugal ou vamos alterar esse tipo de dados? Uma terceira ordem de considerações, Sr. Ministro, prende-se com a candidatura ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. Li com atenção o relatório e os documentos do Governo a respeito desta opção, pelo que gostava de ouvir da sua parte alguma reacção às considerações que vou tecer.
Sr. Ministro, na sua intervenção inicial, disse que esta candidatura se prende com «responsabilidades de liderança» e disse, logo no início, que «o País precisa de ver a sua bandeira desfraldada nos cenários de liderança internacional». Foi isto o que o Sr. Ministro disse (se não foi isto foi qualquer coisa muito próxima).
Em suma, tratar-se-á, da parte do Governo, de uma candidatura que se prende com o prestígio do País no sistema internacional. Sr. Ministro, eu não teria a descortesia de lhe pedir que nos lembrasse quem são os actuais 10 membros não permanentes do Conselho de Segurança, mas a verdade é que creio que essa pertença, como membro não permanente, ao Conselho de Segurança não oferece a nenhum país um prestígio tão elevado que mereça esta aposta estratégica por parte do Governo.
Quando Portugal foi membro não permanente do Conselho de Segurança ocupou, entre outras funções, a de presidente do Comité de Sanções contra o Iraque. Visto a esta luz, Sr. Ministro, não creio que possamos propriamente falar de prestígio, e digo-o da maneira mais suave que posso.
Nesse sentido, Sr. Ministro, creio que o Governo faria bem em considerar alternativas no que se refere a atingir prestígio para o País no sistema internacional.
Consideraria, por exemplo, o Sr. Ministro a possibilidade de a verba — que é pequena, é certo — que está afecta a este fim ser afecta, por exemplo, à formação de condições para a criação de competências no sentido de Portugal, finalmente, poder candidatar-se ao lugar de juiz no Tribunal Internacional de Justiça? Ou à criação, em Lisboa, de uma instituição internacional de referência em matéria de mediação de conflitos? Creio que, isso sim, Sr. Ministro, nos daria efectivo prestígio, ou seja, se Portugal fosse um lugar de referência em matéria de solução pacífica e jurídica dos conflitos internacionais.
Finalmente, uma última ordem de perguntas, Sr. Ministro, que diz respeito ao INOV Mundus.
O relatório do Governo em matéria de Orçamento fala de «inserção profissional de jovens licenciados que pretendam desenvolver a sua actividade na área da cooperação para o desenvolvimento», e nisto estamos totalmente de acordo. A questão, Sr. Ministro, está em saber que horizontes de durabilidade pode dar-nos

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para esse investimento na criação de competências e na formação em agentes de cooperação para o desenvolvimento. Que durabilidade pode ter este investimento?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, respondo com muito gosto às questões pertinentes que me coloca e que desenvolvem uma perspectiva diferente de alguns dos problemas com os quais me confronta.
Desde logo, em relação à política da língua, não tenhamos dúvidas de que o português é uma língua em expansão no sistema internacional. É uma língua em expansão porque o número de pessoas que falam hoje português nos países africanos de expressão portuguesa é cada vez maior, uma vez que esses países estão a desenvolver lógicas nacionais. O desenvolvimento de uma lógica nacional nesses países pressupõe uma língua nacional, e a língua nacional é a língua da potência colonial. O Sr. Deputado não tenha preconceito relativamente a essa questão, porque eles não têm. Acho absolutamente inaceitável que tenhamos um preconceito quanto a uma realidade que não é preconceituosa do ponto de vista das elites africanas.
Ora, isso não mata o problema da conciliação entre a língua nacional, que por acaso é a língua da potência colonial, e as línguas nacionais. Por isso, estou de acordo consigo em que nas estratégias de ensino do português devem estar presentes as soluções dirigidas ao seu ensino como língua estrangeira e como segunda língua, e isso tem estado presente nos centros de língua portuguesa, que têm já uma década de experiência em alguns países africanos de expressão oficial portuguesa. Eles têm tido em consideração esse facto. Aliás, seria ridículo se, do ponto de vista técnico, didáctico, não se tivesse em consideração essa realidade.
Por exemplo, o debate tem sido muito vivo no sistema de ensino cabo-verdiano, como sabe, precisamente pela força que o crioulo tem como língua nacional, circunstância, aliás, que se não repete em nenhum outro dos países africanos de expressão portuguesa, onde a única língua com verdadeira vocação nacional é, de facto, a língua portuguesa.
Por isso, estou de acordo consigo, ou seja, é preciso que a estratégia de ensino do português integre estas dimensões do ensino do português como língua estrangeira e como segunda língua, mas não tenhamos o preconceito de não aceitar que o português é uma língua em expansão. É uma língua em expansão do ponto de vista dos utilizadores da língua e é uma língua em expansão do ponto de vista das línguas do sistema internacional, porque é uma língua das organizações internacionais.
Estive em Addis Abeba, na Cimeira da União Africana, onde pelo menos três países da África Austral, anglófonos, me fizeram referência à necessidade que sentem de integrar o português como língua no sistema de ensino, porque, cada vez mais, sentem necessidade, na relação com Angola e com Moçambique, de terem mais utilizadores da língua portuguesa.
Para além disso, o português é uma língua das organizações internacionais, o que temos de valorizar, Sr. Deputado. Concorda, seguramente, que devemos valorizar esta circunstância, e devemos fazê-lo sem preconceito.
Eu não tenho nenhum preconceito sobre essa matéria e, curiosamente, o Sr. Ministro da Suazilândia, por exemplo, disse-me que estão a pensar em tornarem-se observadores da CPLP e em introduzirem também o português, porque a relação com Moçambique é de grande intimidade e também lhes custa não entenderem, do lado de lá da fronteira, a língua que é utilizada como língua oficial.
Portanto, há aqui uma realidade que não podemos ignorar e, na política da língua, seríamos inconsequentes se não respeitássemos esta orientação.
Devo dizer que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 188/2008, de 27 de Novembro, é talvez (não quero ser preconceituoso neste aspecto) — e o Sr. Deputado, se quiser lê-la com atenção, poderá constatá-lo — um dos momentos em que se reflecte maduramente sobre uma estratégia para a promoção da língua portuguesa, «com cabeça, tronco e membros». Acho que esse foi um trabalho prolongado, de muitos meses de reuniões com os Ministérios da Educação, da Cultura e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que produziu um bom resultado e que é um bom quadro de referência, sendo essa a orientação que vimos seguindo.

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Reconheço, de facto, a valorização do ensino do português como língua estrangeira e como língua segunda, até pela circunstância de ela ser uma língua cada vez mais procurada. Por isso, devemos ter em consideração que o Instituto Camões também deve orientar-se muito para essa valências do ensino do português como língua estrangeira e como língua segunda.
Claro que a circunstância de os países, sobretudo africanos, de expressão portuguesa e Timor-Leste terem ainda percentagens baixas de população que domina completamente a língua, nos obriga a investir bastante no apoio à expansão dos sistemas de ensino nesses países e, daí, a associação que fazemos à Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD).
Sobre a Ajuda Pública ao Desenvolvimento, o Sr. Deputado coloca duas questões. Numa delas, questiona a taxa de crescimento. Admito que haja excessivo voluntarismo face à análise crua das taxas de crescimento que se têm verificado. Mas, como sabe, apesar de tudo, temos sempre alguma dificuldade — e o Sr.
Secretário de Estado, depois, se quiser, dirá algo sobre isso — em gerir todo o financiamento da Ajuda Pública ao Desenvolvimento, pela natureza da nossa estrutura de financiamento da ajuda que, historicamente, se foi consolidando de forma muito dispersa e muito fragmentada pelos vários ministérios e serviços.
Durante muitos anos, nem sabíamos, nem tínhamos uma ideia aproximada do que era a ajuda ao desenvolvimento do que o País promovia, porque era muito na base de relações pessoais e afectivas entre membros do governo e instituições, a par da sociedade civil que também tem uma dinâmica muito própria na ajuda ao desenvolvimento.
Neste momento, o que podemos dizer é que as metas estão aí como referenciais e acho que devem manter-se, porque temos de manter esses compromissos. Admito que haja algum voluntarismo. O quadro de recessão em que estamos também não ajuda. Mas também a agenda de Copenhaga pode dar alguma contribuição para isso — se não muito significativa, mas poderá dar, uma vez que é ajuda que vai directamente consolidar o orçamento da APD.
Em relação à estrutura, não estou tão seguro de que, por exemplo, se não valorize a importância da atribuição de bolsas, que esteve implícita na pergunta crítica que fez. Acho que o investimento que fazemos em bolsas é muito significativo — não sei é se terá o peso que evidenciou na estrutura da despesa da APD.
Agora, acho que há um sector de inovação na Ajuda Pública ao Desenvolvimento que temos tentado promover e de que o Sr. Secretário de Estado seguramente dará conta à Comissão a breve trecho. Estamos a tentar promover com os países com que temos programas mais íntimos de cooperação uma cooperação de última geração, do ponto de vista tecnológico, que represente não a transferência de tecnologia desadequada, a qual tem estado muito no paradigma de cooperação entre o Norte e o Sul, mas a transferência de tecnologia de vanguarda, tecnologia de última geração. Portanto, para queimar etapas, em matéria de comunicações e de, por exemplo, energias, acho absolutamente indispensável que o País, Portugal, seja capaz de ter um pacote inovador, que tenha, depois, reflexo na própria estrutura do orçamento da cooperação.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Para terminar, quero só referir, quanto à candidatura ao Conselho de Segurança, que o Sr. Deputado fez uma interpretação equívoca, até porque, como sabe, posso ser acusado de muita coisa, mas não de megalómano, pelo que nunca poderei ter usado a expressão «liderança». Se usei, peço desculpa, porque nós não temos nenhumas ambições de liderança.
O que referi foi que nós temos de fazer um esforço de internacionalização do País e temos de ter a «bandeira desfraldada» no sistema internacional, temos de ter visibilidade. E, para termos visibilidade, temos de ser capazes de, nas organizações que integramos, mostrar que existimos — e que existimos com personalidade, com ideias próprias, com iniciativa, com capacidade de marcar a agenda. E creio que o temos feito: fizemo-lo na agenda da União Europeia, fizemo-lo na Cimeira Ibero-Americana, estamos a fazê-lo na CPLP (toda a temática da língua foi assumida por todos por iniciativa da presidência portuguesa), e vamos fazê-lo também no âmbito da NATO porque temos responsabilidades nesse âmbito.
Quanto á campanha para o Conselho de Segurança, se tivermos um lugar no Conselho de Segurança» E o Sr. Deputado não pode ignorar o papel do Conselho de Segurança. Até porque, sendo o Sr. Deputado um dos arautos da legalidade do sistema internacional, com certeza que dará ao Conselho de Segurança o valor que ele merece.

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas só dou esse!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Seria a maior surpresa para mim que o Sr. Deputado viesse agora desvalorizar o papel do Conselho de Segurança, independentemente da apreciação crítica que faz do seu modelo de decisão.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem mesmo de concluir.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Termino já, Sr. Presidente.
Mas, Sr. Deputado, não me diga que não era importante termos um lugar no Conselho de Segurança. É algo que dá grande visibilidade ao País — tenho grande experiência disso — e dá, sobretudo, pretexto ao País para ser capaz de, no core das instituições internacionais e do sistema de decisão internacional, projectar a sua função geoestratégica essencial, que é a de facilitação e de promoção de relações entre espaços civilizacionais geopolíticos e geoestratégicos diferentes.
E se tivermos a capacidade para ganhar esta candidatura, poderemos afirmar no Conselho de Segurança um papel muito importante que o País pode projectar. Poderá fazê-lo sem a presença no Conselho de Segurança, mas, se estiver no Conselho de Segurança, poderá fazê-lo melhor.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, este é, como o Sr. Ministro afirmou, um orçamento de continuidade, um orçamento que, aliás, merece o aplauso do PSD, como também já foi aqui sublinhado.
A primeira questão que lhe coloco tem a ver com uma afirmação hoje aqui feita pelo Sr. Ministro, que é inaceitável: quer pessoal, sem seguro, violando a lei. Não sei quando ç que o Sr. Ministro concluiu isto» É que, ao fim e ao cabo, é um Governo de continuidade, a caminho do sexto ano de mandato, de continuidade desta política. Portanto, o Sr. Ministro acaba por nos dizer que, na verdade, tivemos um governo que não atendeu á necessidade de garantir aos trabalhadores, ao corpo diplomático e aos professores» É que associo muito isto ao escândalo, que temos estado a viver e que infelizmente está nas páginas dos jornais, de termos professores a leccionar português (concretamente, no caso de Andorra) que mereciam uma explicação. Tenho aqui comigo uma resposta da Ministra da Educação (já do actual Governo), que diz que os professores que possuem cartão de beneficiários da ADSE podem recorrer aos serviços médicos daquele país (estou a falar de Andorra) e serão depois reembolsados. Esta é uma resposta do Governo. Entretanto, foi afirmado por pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros — incluindo o Sr. Ministro, que o referiu aqui — que, na verdade, é agora que o problema vai ser resolvido. Mas este problema é conhecido — aliás, já tenho uma resposta de Dezembro do ano passado! Ora, o que pergunto, Sr. Ministro, é se isto terá a ver com o facto, que o Sr. Ministro conhece bem, de termos hoje uma professora, em Andorra, que não tem acesso aos cuidados de saúde. Esta situação, por si só, chegava para podermos falar um pouco mais sobre isto. Portanto, esta é uma questão que, a meu ver, exige uma explicação. É que este é um problema que se arrasta e em relação ao qual não podemos ouvir apenas o Sr. Embaixador em Andorra dizer-nos que demorará mais uns dias, mais uma semanas, mais uns meses, não sei, para que isto seja resolvido. É que isto não deveria acontecer. Pura e simplesmente, não deveria acontecer, mas acontece. Esta é uma primeira questão.
O Sr. Ministro queixa-se da falta de pessoal. Então, se o governo anterior passou quatro anos a dizer que a regra era «saem dois, entra um« e, agora, atç dizem que ç «pelo menos por dois que saiam só entrará um«!» O Sr. Ministro tem falta de pessoal?! Então, isso quer dizer que o Sr. Ministro permitiu a dispensa de pessoal nestes últimos quatro anos, ou que a carência de pessoal só surgiu agora? É que se já vem das medidas que tomaram antes, isso só mostra que temos tido, no governo, uma «navegação à vista» pura e simplesmente casuística e pouco credível, pois não tem em conta uma questão essencial para o desenvolvimento de qualquer política que são os recursos humanos. O Sr. Ministro referiu a necessidade de qualificar, de reforçar,

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enfim, um conjunto de necessidades que ficam bem no discurso, mas cuja prática tem sido a negação daquilo que hoje aqui é afirmado no plano da retórica. E isso preocupa-nos.
A terceira questão tem a ver com o ensino do português e com as preocupações que a intervenção do Sr.
Ministro volta a acentuar nesta matéria. Temos ouvido as comunidades portuguesas queixarem-se da sistemática degradação do ensino do português, quer aos emigrantes portugueses espalhados pelo mundo, quer às comunidades lusófonas que querem aprender português, oportunidade que deveríamos «agarrar com as duas mãos», para podermos valorizar e afirmar a nossa língua, a nossa cultura e transformarmos cada um destes homens e mulheres nos tais «embaixadores» que todos dizemos querer que sejam.
Ouvimos declarações públicas inquietantes da Sr.ª Presidente do Instituto Camões, na medida em que o Sr. Ministro, na primeira reunião que tivemos sobre o assunto, relegou para o Sr. Secretário de Estado, o qual, na altura, não respondeu de forma tão clara, e chamámos aqui a Sr.ª Presidente que nos disse uma coisa tão simples que não percebemos porque isso não foi assumido claramente pelo Sr. Ministro ou pelo Sr. Secretário de Estado, dado que não mediou tanto tempo entre as reuniões que tivemos e a vinda da Sr.ª Presidente do Instituto Camões a esta Casa que se tenha alterado ou se tenha definido uma estratégia naqueles dias.
Presumimos, por isso, que se tratasse da continuidade da aplicação de uma estratégia que não tem tido prática até hoje.
Ora, o que a Sr.ª Presidente do Instituto Camões disse, referindo que o que foi dito não corresponde (ou corresponde pouco) àquilo que lhe foi atribuído (pela Agência Lusa, recordo), foi que o fim do ensino do português tinha de ser analisado caso a caso, que não seria para descontinuar em todos os casos (porque admitia que alguns iriam ser descontinuados) e que, enquanto língua materna, poderia acabar em alguns países. As declarações foram essencialmente estas, são textuais.
E naturalmente quando aqui esteve, tranquilizou-nos, dizendo-nos, de forma clara e inequívoca, que a qualificação e expansão da rede do ensino do português far-se-á não apenas nos países de expressão africana, mas também no mundo onde há portugueses, na comunidade portuguesa. Disse-nos isto e garantiunos que iriam trabalhar para a qualificação, a certificação e a facilitação da certificação do português no estrangeiro.
Ora, o Sr. Ministro, nem nos documentos nem nas respostas que até ao momento deu deixou dito, de forma tão clara e inequívoca, que o que iríamos ter era a rede, e a qualificação dessa rede, de expansão do ensino do português no mundo e, em primeiro lugar, naturalmente junto das comunidades portuguesas e das comunidades lusófonas, que são as que estão em primeiro lugar e em melhores condições de assumir a afirmação da língua e cultura portuguesas no mundo.
Isso não foi dito, pelo que gostaria de saber se o Governo partilha ou não das declarações feitas na Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas pela Sr.ª Presidente do Instituto Camões.
Isso é que tem de ficar aqui hoje claro, para percebermos do que estamos a tratar e como está a ser tratado. É que nós perfilhamos esta ideia, mas se isto não tem correspondência com o pensamento político do Governo, então, isso terá de ser clarificado e especificado e não há altura melhor para o fazer do que hoje. É que precisamos de saber mais alguma coisa — aliás, foram feitas perguntas — para sabermos onde estão os alunos, quantos são os professores, as escolas» Mas, apesar de já ter sido solicitado, ainda não conseguimos, até agora, obter resposta. Esperemos que, em breve, tenhamos a resposta a este tipo de perguntas, feitas por escrito. Não irei muito mais longe, mas deixo esta preocupação.
Quanto ao Conselho das Comunidades Portuguesas, o Sr. Ministro falou, creio, em 200 000 €. Mas 200 000 € para a reunião mundial, ou para todas as actividades do Conselho das Comunidades? É que foi entregue nesta Casa o orçamento, pelos representantes das comunidades portuguesas, a todos os grupos parlamentares, que aponta para 420 000 €.
De acordo com o que foi respondido, não faltaria dinheiro para as actividades do Conselho. Elas estão expressas na lei, não se trata de inventar nada; trata-se, apenas, de cumprir o que a lei estipula e, naturalmente, esse cumprimento, segundo os representantes das comunidades portuguesas, será de 420 000 €. Mas, segundo o Sr. Ministro, seriam 200 000 €. Não percebi, pelo que gostaria de obter este esclarecimento.
Os nõmeros que o Sr. Ministro hoje apontou mostram bem» Com o PSD estávamos em 0,20, passámos para 0,27 em 2009» Há um crescimento brutal, de um momento para o outro, apesar de o Sr. Ministro dizer

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que estamos em tempo de crise, de contenção. Como se consegue este milagre? Como é que se consegue num só ano mais do que se conseguiu em cinco anos consecutivos de governação do Partido Socialista?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado, as suas perguntas são todas muito sindicais, com o devido respeito pelos sindicatos. São, como é habitual, mais focadas nas questões de índole sindical do que propriamente de política externa. No entanto, na medida do possível, irei responder-lhe com muito gosto.
Em relação à questão do seguro, o que eu disse é que, de facto, não tinha sido até hoje implementada a legislação que já previa a necessidade da cobertura de riscos em missões diplomáticas e, por isso, este orçamento, pela primeira vez, procura criar as condições para a implementação dessa medida. Não é um problema de violação da lei, mas da sua inaplicabilidade prévia. Por isso mesmo, temos urgência em encontrar uma dotação específica para este fim. É o que fez este orçamento, e espero que o Sr. Deputado esteja satisfeito pela circunstância de, pela primeira vez, estarmos a dar resposta a um problema que era sentido também pelo pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Quanto ao problema da falta de pessoal, eu disse que tem havido um exercício, ao longo dos últimos anos, de redução de pessoal do MNE, como tem havido na restante Administração Pública. Há funções em algumas actividades do Ministério que têm tido, momentaneamente, algumas dificuldades e, por isso mesmo, identificamos uma dotação orçamental para responder a esses problemas.
O que pretendemos é ter estruturas de recursos humanos mais flexíveis do que as que tínhamos. Eu sei que o Sr. Deputado e o PCP não concordam muito com esta orientação, mas é um facto que não é possível gerir, do meu ponto de vista, estruturas em diferentes países, com diferentes ordenamentos jurídicos, com diferentes necessidades de adaptação a realidades que estão em mudança muito rápida sem flexibilizar as relações contratuais entre o pessoal (algum tipo de pessoal que exerce funções nas missões, nas embaixadas e nos consulados) e a realidade que temos neste momento. Por isso, tem havido uma orientação no sentido de dotar essas estruturas de gestão mais flexível, o que se tem reflectido também na forma como os recursos humanos têm sido geridos. Designadamente, há perda de pessoal em algumas funções, que têm sido substituídas por aquisições de serviços.
Sr. Deputado, em funções acessórias de actividades das missões e dos consulados há hoje serviços que são prestados e que representavam na estrutura de pessoal do passado recursos humanos afectos ao quadro de pessoal da embaixada ou do Ministério. É uma orientação que tem sido seguida, de flexibilização das situações contratuais com o Ministério, e que vai continuar a ser prosseguida. Acredito que o novo estatuto de pessoal vai ter em consideração esta realidade.
É absolutamente indispensável que a gestão de um Ministério, cuja complexidade está presente em dezenas de países, em regiões diferentes, com ordenamentos diferentes, tenha condições de flexibilidade de gestão que nem sempre se compatibilizam com uma gestão muito centrada num ordenamento jurídico específico e a partir da capital. Essa é uma realidade com a qual não estamos de acordo e é essa realidade que vamos adaptar na revisão de legislação que está em curso e que, como disse, será apresentada à Assembleia a breve trecho.
Sobre o ensino do português, Sr. Deputado, dir-lhe-ei — tal como já disse ao Sr. Deputado José Manuel Pureza — que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 188/2008 identifica o quadro de referência estratégica que assumimos. E, Sr. Deputado, nos quatro objectivos expressos no ponto três dessa Resolução — os objectivos prioritários definidos — , consta como primeiro objectivo a constituição de uma rede qualificada de ensino de Português no estrangeiro. Esse é o primeiro objectivo, prioritário, de uma estratégia ambiciosa de promoção da língua portuguesa. Naturalmente que para a constituição dessa rede qualificada temos que partir da realidade que temos. Mas não me diga que não há problemas na rede que temos, que não necessitam de acerto e de adaptação. Há situações que não são aceitáveis. Temos que ser mais rigorosos e exigentes em relação aos critérios com que instituímos essa rede. Não queira ver a realidade como um «cristal», imutável.
Não é assim que se faz a política. Há situações que têm de ser adaptadas, que têm de ser ajustadas.
Seguramente o Sr. Deputado está de acordo comigo em que o objectivo prioritário é a constituição de uma rede qualificada de ensino de Português. Se o Sr. Deputado transforma este objectivo prioritário num objectivo

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instrumental de defesa de um militante seu, eventualmente, que protesta porque é movimentado de Frankfurt para Berna, enfim, aí teremos sempre espaço para conflito e para contraditório. Mas, no essencial, o Sr. Deputado não pode contestar esta orientação política. E também não pode contestar a necessidade que temos de adaptar esta rede, porque as mudanças no sistema internacional estão muito rápidas e temos que nos ajustar a essas mudanças.
O que está em curso em relação ao que foi objecto da descrição que a Sr.ª Presidente do Instituto Camões disse é isto: estamos a trabalhar na rede qualificada de ensino de Português; vamos integrar a rede de ensino do Português, que temos junto das comunidades, na rede qualificada do ensino que estamos a projectar e vamos adaptá-la em função de critérios e de parâmetros exigentes do ponto de vista político e não adaptarmonos a uma realidade que se foi impondo pela natureza das coisas ao longo dos anos. É essa visão de conjunto integrador que o Instituto Camões neste momento projecta que, do meu ponto de vista, é a principal importância desta reforma.
Neste momento, o Instituto Camões tem sob rastreio a rede no seu conjunto, a rede de ensino qualificada nos ensinos pré-primário, primário, secundário e no ensino superior, onde, aliás, devem ser formados os professores para «alimentarem» a rede do ensino do português nos ensinos primário e secundário desses países. O «divórcio» que existia é que era absolutamente inaceitável do meu ponto de vista.
Se há reforma que era absolutamente indispensável fazer para a promoção do ensino do português era a do Instituto Camões nesta perspectiva. Creio que essa reforma está feita e vai ser implementada, mas não de imediato. Mas, passo a passo, vai consolidar-se uma realidade institucional completamente diferente da que existia no acompanhamento da política da língua.
Sobre as comunidades, Sr. Deputado, a nossa política é muito clara. Tem dois vectores essenciais: apoiamos a integração das comunidades portuguesas nos países de acolhimento e, ao mesmo tempo, pretendemos reforçar as relações da comunidade portuguesa com Portugal. Na segunda e terceira geração o ensino já não é como língua materna, mas como língua estrangeira. Não tenha ilusões sobre isso. Aí é que é preciso actuar, do meu ponto de vista, em muitos casos e em muitos países. É essa apreciação que está subjacente à política que está a ser implementada.
Sobre a APD e os considerandos que o Sr. Deputado fez, creio que também já respondi na resposta que dei ao Sr. Deputado José Manuel Pureza. Posteriormente, o Sr. Secretário de Estado terá a oportunidade de adiantar qualquer outra informação que julgue pertinente.
Sobre o orçamento para a realização do Conselho das Comunidades Portuguesas, creio que ele é perfeitamente compatível com esse evento.

O Sr. Presidente: — Passamos agora à segunda ronda de perguntas. Cada grupo parlamentar tem direito a 5 minutos e, se houver alguma nova inscrição, acresce a possibilidade de mais 2 minutos por Deputado. A resposta será conjunta, em tempo igual ao das perguntas.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, reafirmo aqui o que o meu colega Carlos Gonçalves já há pouco referiu: a área da política externa é para nós uma área que tem de implicar grandes consensos. A nossa manifestação de divergências tem fundamentalmente em causa melhorar os consensos em relação à representação externa do Estado. É nesta óptica que quero colocar ao Sr. Ministro algumas questões.
Primeira questão: o Sr. Ministro assumiu, e bem — concordamos em absoluto — , que o País tem de exportar mais, tem de captar mais investimento externo, que o Estado tem de ajudar as nossas empresas a serem mais competitivas no exterior. Ou seja, é absolutamente prioritário ter uma estratégia clara de afirmação externa do Estado, com implicações muito fortes no domínio da diplomacia económica e cultural, que têm de surgir, obviamente, conexas.
Simultaneamente, logo de seguida, o Sr. Ministro diz que não há crescimento do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, porque o crescimento que está visível no orçamento não existe, pois depende da transição de verbas para o Instituto Camões, do aumento dos descontos para as finanças, nomeadamente para a Caixa Geral de Aposentações, ou seja, não há crescimento real.

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Ora, como é que a inexistência deste crescimento real é compatível com uma estratégia clara, de afirmação da nossa economia no exterior, de reforço das nossas posições no exterior? Considero que esse aspecto é hoje central em relação à recuperação do País da terrível crise em que estamos envolvidos.
Segunda questão: ensino do português e a divulgação da cultura portuguesa no estrangeiro.
Em primeiro lugar, que tem de ficar claro que quando o Deputado Carlos Gonçalves referiu a questão de 50 milhões de euros para este sector, não fez mais que a citação do que está no Programa do Governo, que diz que o Estado, até aqui, gastava por ano 50 milhões de euros na área do ensino de português no estrangeiro.
Também sabemos que, no Orçamento do Estado do ano transacto, o Ministério da Educação tinha inscrito mais de 40 milhões de euros para esta área. Ora, transitam 32 milhões de euros para o Instituto Camões.
Sr. Ministro, a questão que lhe coloco, de uma forma muito clara, tem a ver com essa diferença de cerca de 8 milhões de euros. Nomeadamente, gostaria de saber quem vai tutelar as escolas portuguesas de Maputo, Díli, Macau e Luanda, se elas continuam no Ministério da Educação ou se transitaram para o Instituto Camões e, se não transitaram ou não vão transitar, como é que essa não transição é compatível com a visão correcta, integradora para o Instituto Camões, relativamente a estas políticas, de criação — como o Sr. Ministro diz, e bem — de uma autêntica rede de escolas portuguesas no estrangeiro.
Também ainda relativamente ao Instituto Camões, é bom que aqui fique clara uma questão: não há nenhum reforço do seu orçamento. Nenhum! Aliás, tem havido um claro decréscimo na sua execução: em 2003, o Instituto Camões executava 14,6 milhões de euros; em 2008, 13,69 milhões de euros; em 2009, executou 12,9 milhões de euros. É isto que está em causa neste momento. Portanto, não há reforço. Isto preocupa-nos também por causa da estratégia de afirmação económica do País no exterior, porque, Sr.
Ministro, volto a dizer-lhe que diplomacia económica sem diplomacia cultural não terá resultados.
Terceira questão: em 2010 chegam ao fim os planos indicativos de cooperação relativamente a Angola, Timor, Guiné, Moçambique. Vai iniciar-se um novo ciclo. Gostaríamos de saber que prioridades, que perspectivas existem para este novo ciclo e que implicações podem ter, neste orçamento, como base, evidentemente, para os orçamentos seguintes.

O Sr. Presidente: — Dispõe de 1 minuto, Sr. Deputado.

O Sr. José Cesário (PSD): — Com certeza, Sr. Presidente.
Quarta questão: relativamente às acções especiais de promoção de Portugal no Oriente, há uma de fundamental importância e que passa praticamente despercebida a nível interno — o ano de Portugal na China em 2011. Como é que o Governo está a perspectivar um desafio desta natureza? Que investimentos e que respostas tem preparados? Quinta questão: a dotação fixa para seguros de saúde. O Sr. Ministro referiu várias vezes que esta dotação é para cobrir, e bem, seguros de saúde para os diplomatas. No entanto, o Sr. Ministro sabe que não tem só diplomatas no exterior. Gostava que clarificasse que situações é que estão em causa e se se referem ou não só a diplomatas.
Finalmente, gostaria de lhe colocar uma questão de pormenor. O Sr. Ministro diz que, até final de Março, apresentará, na Comissão, as orientações relativas à revisão dos estatutos das carreiras, quer da carreira diplomática quer da carreira do pessoal dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Pergunto-lhe se isso continua a implicar ou não — perspectiva que tinha no ano passado e há dois anos — a apresentação de uma proposta de lei sobre alguma destas matérias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Damásio.

A Sr.ª Teresa Damásio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, falou-nos aqui, ao longo das suas várias intervenções, no que representa para o Estado português a visão estratégica para a cooperação portuguesa e as várias medidas que têm vindo a ser encetadas desde 2005.
No quadro deste Orçamento do Estado, gostaríamos de realçar duas medidas: o INOV Mundus e a agenda da Cooperação para o Desenvolvimento. Ambos os programas se enquadram na responsabilidade que o Estado português assumiu, ao assinar a Declaração do Milénio em 2000, de, em 2015, juntamente com todos os outros Estados signatários, cumprir com os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

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Gostava de perguntar ao Sr. Ministro, tanto no âmbito do INOV Mundus, em que há o objectivo de capacitar os estagiários beneficiários desse programa no âmbito da Cooperação para o Desenvolvimento, como no âmbito da agenda da Cooperação para o Desenvolvimento, de que forma é que o Estado português estará a cumprir com os oito pontos constantes dos Objectivos do Milénio, dizendo o Governo no Orçamento que naturalmente não conseguiremos ainda atingir na medida das nossas expectativas e dos nossos objectivos que entroncam na exigência da rápida internacionalização e projecção internacional do nosso país.
Gostaríamos de saber de que forma é que estes dois programas e as medidas que estão contidas na agenda da Cooperação para o Desenvolvimento podem, efectivamente, ajudar Portugal a alcançar o cumprimento dos oito Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Serpa Oliva.

O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, penso existirem apenas 12,9% de diplomatas nas nossas 130 embaixadas, consulados e representações. Este número elevado deve-se, provavelmente, a uma história que nos dignifica e de que muito nos honramos e, portanto, é uma mais-valia que, penso, deverá ser devidamente aproveitada. Teremos 11,9% de técnicos e 11,5% de assistentes técnicos.
A questão que lhe coloco — e não me diga que o vou aborrecer outra vez com esta pergunta, visto que já a coloquei da última vez que estivemos juntos — é até que ponto o Ministério aposta efectivamente na formação. Pelo que sei, houve um concurso para 30 vagas em que concorreram cerca de 1000 candidatos.
Também sei que, desses concursos, os candidatos aprovados passam três anos após a obtenção do grau no Ministério dos Negócios Estrangeiros e só depois é que são colocados como diplomatas. Sr. Ministro, gostaria de saber como é que pensa ultrapassar esta situação e se efectivamente teremos os próximos diplomatas verdadeiramente de carreira, isto é, aqueles que são essenciais para a abertura do espaço não só diplomático, como económico — as nossas grandes lutas, neste momento, são económicas e a diplomacia económica é fundamental — , visto que, penso, estes diplomatas só entrarão provavelmente em acção dentro de quatro anos.
Sr. Ministro, uma outra pergunta que também já coloquei e que vou repetir tem a ver com o grande espaço que se abriu na União Europeia com o Tratado de Lisboa dos vários quadros intermédios. Gostaria de saber até que ponto é que este Orçamento contempla efectivamente esses quadros intermédios. Como o Sr.
Ministro, no início da sua apresentação, falou num aumento de verbas de 1,1 milhão de euros, pergunto-lhe se se destinam para a formação específica destes quadros intermédios, que nos parece fundamental ter em atenção.
Por outro lado, queria também perguntar-lhe o que é que está a ser feito no sentido de facilitar efectivamente a diplomacia económica. Penso que o nosso país tem de gerir esse dossier com muito cuidado, na medida em que o nosso futuro passa pela parte económica se calhar mais do que tudo o resto, infelizmente para nós. O caso mais recente na questão da não entrada é o da Líbia, cujo problema foi provocado pela Suíça. Assim, gostaria de saber o que é que o Ministério dos Negócios Estrangeiros está a fazer neste momento para que se crie a possibilidade de desbloquear este tipo de situações e criar um visto diplomático para os nossos homens ligados à parte económica, de forma a não terem estes dissabores, que são efectivamente impeditivos. A Líbia teria, com certeza, imenso interesse em receber-nos e fomos retidos por algo que nos ultrapassa.
São estas as questões que lhe queria colocar, Sr. Ministro.
Se não se importa, Sr. Presidente, passo agora a palavra ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila.

O Sr. Presidente: — Com certeza.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, aproveitando este minuto de que ainda dispomos e prescindindo da terceira volta, queria apenas dizer-lhe que as duas questões concretas que colocámos quanto às embaixadas ficaram sem resposta. Estamos convencidos de que certamente não será por ausência de resposta por parte do Sr. Ministro, mas porventura pelo cumprimento escrupuloso do tempo por parte do Sr. Presidente. Em todo o caso, muito gostaríamos, se possível, que nos pudesse responder à

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questão das embaixadas e, já agora, também à questão do desafio que lhe lancei relativamente ao estudo sobre o valor real da língua portuguesa no PIB em Portugal.
Para finalizar, quanto aos oficiais de ligação do SEF, tendo em conta que são indicados pelo Sr. Ministro da Administração Interna mas que a nomeação é da responsabilidade do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, gostava de lhe perguntar quantos é que existem neste momento e se está previsto o alargamento da rede actual.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, apresentou aqui o seu orçamento, relevando que traduzia a contenção que o quadro de crise obriga, mas ao mesmo tempo passou parte da sua intervenção a justificar que ele materializa um crescimento muito significativo. Se me permite, Sr. Ministro, este não é bem o orçamento em contexto de crise que os portugueses poderiam esperar, e menos o será quando o Sr. Ministro tiver de anunciar que estão fora deste quadro orçamental os 20 milhões de euros que o País vai gastar com a Cimeira da NATO. Não sei que adjectivo pensará usar quando responder a estas questões, mas gostaria de lhe perguntar se considera razoável, no contexto da crise económica, anunciar uma verba desta grandeza para a Cimeira da NATO, que, provavelmente, embandeirará também como forma de consagração do lugar de liderança de Portugal à escala do planeta e do mundo.
Como já percebeu, Sr. Ministro, as questões relativas ao Instituto Camões justificam, de facto, uma preocupação generalizada neste Parlamento e, se me permite, nem sempre a sua resposta foi clara. Em primeiro lugar, dá de alguma forma a sensação que o Sr. Ministro não tem muito a noção de que esta rede de escolas, de equipamentos e de oferta é sua responsabilidade doravante e que, relativamente ao ensino do português no estrangeiro, as comunidades não podem ver qualquer perda quanto aos direitos e à oferta que têm neste momento e não podem assistir, de forma nenhuma, à degradação do pessoal, do equipamento e de direitos fundamentais que estão conquistados e que deveriam ser melhorados.
Sobre estas duas questões, a resposta deveria ser muito clara, Sr. Ministro. As verbas transferidas são as verbas necessárias para a gestão desta rede, destes equipamentos, destes recursos humanos? Elas correspondem claramente às expectativas das comunidades? Por outro lado, como é que a ambiciosa política da língua do seu Governo, que o Sr. Ministro aqui evocou recordando as resoluções recentemente tomadas, se articula com a perspectiva, também enunciada por si, de a prazo converter o Instituto Camões no modelo fundacional? Onde é que a ambição de política da língua e de modelo fundacional para um instituto desta natureza se conjugam e se harmonizam? Ainda relativamente às propostas de Orçamento, gostaria, Sr. Ministro, que aprofundasse melhor os termos do estatuto da diplomacia económica e deste perfil que é consagrado na proposta que faz da internacionalização da economia portuguesa. É com certeza um slogan que, como tal, e mesmo que fosse uma prática consistente, reuniria o consenso. Não é a proposta em si que está em causa, Sr. Ministro, mas a necessidade que os portugueses têm de reconhecer os passos que são dados neste caminho e, nomeadamente, de reconhecer a sua materialização quer no Orçamento que aqui nos traz quer nos conteúdos desta diplomacia económica, isto é, como é que o seu Governo a perfila.
No mesmo sentido, relativamente às dotações, talvez nos pudesse esclarecer, no que diz respeito à Direcção-Geral dos Assuntos Europeus, o cabimento das verbas apontadas pelo seu orçamento, quando nos parece que elas justificam fundamentalmente os novos projectos do Centro Delors. Sobre esta matéria, gostaria de o ouvir com muita clareza.
Finalmente, Sr. Ministro, evocando a sua qualidade, para além de Ministro dos Negócios Estrangeiros, de Ministro de Estado, gostaria de lhe perguntar ainda quando é que o seu Governo tem condições para discutir, neste Parlamento, as propostas que negociará no Programa de Estabilidade e Crescimento. Estas matérias dizem respeito ao dia-a-dia de cada português e de cada portuguesa, têm a ver com o aumento dos impostos, com o congelamento dos salários, com o tempo para atingir as reformas. Nesse sentido, Sr. Ministro, talvez seja esta a oportunidade de o poder ouvir também sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

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O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, registei que considera que o desenvolvimento e aprofundamento da língua portuguesa junto das comunidades lusófonas é uma questão sindical. E eu a pensar que era uma questão estratçgica da nossa política externa! Imagine, Sr. Ministro»! Registei esse seu entendimento.
Fiquei também a saber, a não ser que os consulados sejam imóveis, que a qualificação e o reforço do pessoal diplomático que nos representa pelo mundo e a sua qualificação e existência em quantidade, e com respeito dos seus direitos, era uma questão sindical.
Fiquei a saber, Sr. Ministro, que as propostas que faz com voluntarismo em relação aos objectivos do milénio são de âmbito sindical.
Fiquei a saber que a protecção dos professores portugueses no estrangeiro, que são hoje alvo de uma imagem negativa para o País porque pertencem a um País cujo governo não é capaz de salvaguardar os seus direitos, é uma questão sindical.
O que é que o Sr. Ministro pretende, então, que não seja sindical? A continuidade da abdicação da nossa soberania no quadro de integração da União Europeia? A continuidade do envolvimento de Portugal em conflitos, como tem acontecido no passado? A subordinação às estratégias da NATO, que muitas vezes passam bem ao lado dos interesses do País? Penso que o Sr. Ministro pode tentar desviar as atenções, invocando que poderia estar em causa o interesse de um qualquer militante do PCP, fosse ele professor ou trabalhador das missões diplomáticas no estrangeiro, mas isso não «cola», Sr. Ministro! O Sr. Ministro fica aqui com a imagem de que quem não respondeu às questões concretas que lhe foram colocadas, de quem deu respostas evasivas e isso, Sr. Ministro, não pode passar em claro, pelo que terá de responder. Ou o Sr. Ministro quer que lhe forneça por escrito aquilo que li há pouco e que fez que não percebeu?! Sr. Ministro, disse-lhe que a Sr.ª Presidente do Instituto Camões referiu, na Comissão de Negócios Estrangeiros, que a estratégia do Instituto era a da qualificação e a expansão da rede de ensino português em todo o mundo e perguntei ao Sr. Ministro se o assumia. O Sr. Ministro respondeu procurando dar a ideia de que, se agora fizermos um esforço — e bem — junto dos países de língua portuguesa, através de vários investimentos, no sentido de uma melhor afirmação da nossa língua e da nossa cultura, isso se contrapõe ao que lhe perguntei, mas não se contrapõe, Sr. Ministro.
Quero a resposta à outra parte da questão e o Sr. Ministro diz-nos que sim ou que não.
Ouvi nesta Casa — aliás, todos nós ouvimos — os representantes das Comunidades Portuguesas a queixarem-se dos muitos anos de discursos sucessivos, não só deste Governo, de que não têm tido compreensão pelos direitos, pelos princípios, pelas associações, quanto ao esforço que desenvolvem para afirmar Portugal no mundo. Foi isso que eles nos disseram. Mentiram-nos? Não excluímos o ensino da língua portuguesa como língua estrangeira. Mas o Sr. Ministro não nos vai dizer que é a mesma coisa. Ou é?! Portanto, devia aproveitar-se o esforço extraordinário que os portugueses fazem por todo o mundo para manter a sua língua e a sua cultura e apoiar, em conjugação com as suas associações, reforçando o ensino da língua e da cultura portuguesas, Sr. Ministro. Este é que é o caminho, não é outro, pois todos sabemos qual é a diferença entre o ensino de português/língua materna e o ensino de português/língua estrangeira.
Mais: garantiu-nos já o Sr. Ministro que teremos professores de português a ensinar essas pessoas.
Sr. Ministro, fui emigrante e, portanto, sei do que estou a falar. Não andei nas embaixadas, nem os meus irmãos ou familiares estão nas embaixadas, são emigrantes, e sei o que é ter sobrinhos que não falam português. O Sr. Ministro sabe? Possivelmente não, senão não dizia o que disse, tinha um pouco mais de respeito.

O Sr. Presidente: — Uma vez que não há mais inscrições para esta segunda ronda, tem a palavra, para responder conjuntamente, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, para o que dispõe de um total de 25 minutos.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, começo por responder ao Sr. Deputado José Soeiro serenamente, porque ele está exaltado, não sei porquê, tendo ralhado connosco sem

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qualquer necessidade. Estamos numa câmara política, estamos a discutir políticas e orientações e não percebo de maneira nenhuma a sua exaltação. O Sr. Deputado tem de ter mais serenidade quando debatemos questões sérias.
Sr. Deputado, tenho muito respeito pelas comunidades emigrantes, tenho uma visão política rigorosa do que deve ser a acção junto das comunidades portuguesas. Sublinhei que onde há um português e onde há uma comunidade portuguesa há um potencial estratégico de afirmação dos nossos interesses. Essa referência para mim é fundamental. O Sr. Deputado não faça demagogia em torno de situações que são absolutamente incontornáveis. Temos 5 milhões de portugueses fora do País, não podemos ter um professor de português junto de cada comunidade ou de cada família. O Sr. José Soeiro (PCP): — Ninguém defendeu isso!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Deputado, deixe-me falar, não o interrompi e o senhor até se exaltou comigo. Não precisa de se exaltar, somos adultos, podemos discutir sem nos exaltarmos.
Sr. Deputado, o objectivo prioritário da reforma da nossa estratégia da língua portuguesa é a promoção de uma rede qualificada do ensino do português.
Temos de ser capazes de construir, a prazo, uma rede qualificada que responda às necessidades do ensino do português como primeira língua — e, junto de algumas comunidades emigrantes, isso é possível e necessário — mas, ao mesmo tempo, indo de encontro à preocupação legítima do Sr. Deputado José Manuel Pureza, temos de ser capazes de responder também à necessidade de, nessa rede, integrar valências importantes para o ensino do português como língua estrangeira e como segunda língua.
O Sr. Deputado sabe muito bem que, em várias situações de comunidades de emigrantes, há, hoje, necessidade de responder à educação das novas gerações mais na forma do português como língua segunda ou como língua estrangeira do que propriamente como língua materna. Foi isso que eu disse, não sei por que é que o Sr. Deputado se incomodou e se exaltou com o que eu disse.
Esta é uma realidade que o Sr. Deputado não pode contestar. Ando por esse mundo fora, encontro emigrantes portugueses em toda a parte e sei a realidade que cada uma dessas comunidades representa.
Reconheço que há comunidades emigrantes que se sentem abandonadas, mas o País não tem capacidade nem recursos para responder à dispersão extraordinária das nossas comunidades pelo mundo.
Portanto, a racionalização política das intervenções relativamente ao ensino do português é uma exigência do Estado português neste momento, face à ambição que tem de promover o português e de fazer do português uma língua com vocação universal. O que está em causa, neste momento, é fazer esse exercício de racionalização.
Primeira etapa absolutamente indispensável (não faríamos nada sem aquilo que fizemos): é preciso integrar numa mesma instituição e sob uma mesma tutela o ensino do português, e foi isso que foi feito. Foi dado este primeiro passo relativamente à integração das diferentes valências do ensino do português numa mesma instituição. O que é um facto é que se passaram anos e anos e não fomos capazes de o fazer, foi feito agora, é muito importante, e as sinergias que podemos identificar na utilização dos recursos, quando integramos a acção de ensino do português nas universidades com o ensino do português nos outros escalões de ensino, com o ensino do português junto das comunidades e com a acção cultural externa, são de uma enorme importância do ponto de vista integrador das várias valências desta política.
Portanto, o Sr. Deputado também não pode reduzir esta acção a «terra queimada», que o seu discurso desenvolve sempre, em torno de uma carta ou de uma queixa que um ou outro emigrante lhe pode fazer chegar.
Sabemos que é impossível satisfazer as necessidades individuais de cada emigrante. Mas não pode ignorar o esforço feito relativamente à solução para os problemas com que se confronta.
Do meu ponto de vista, a dignificação de uma política da língua dirigida às comunidades passa muito pelo exercício, que foi feito, de não divorciar o Instituto Camões, como uma instituição de vanguarda e de elites, do potencial estratégico, que, do ponto de vista da língua e da cultura, representam as comunidades portuguesas.
Por isso é que considero injusta a forma radicalizada com que o Sr. Deputado invectiva uma observação que

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fiz, a qual é absolutamente pertinente, e que tem em consideração os interesses e, mais do que isso, a dignidade dos nossos emigrantes. Não vejo, por isso, razão para a sua indignação.
Em relação às outras questões, Sr. Deputado José Cesário, estamos de acordo quanto à necessidade de procurarmos, na medida do possível, forçar ou materializar consensos em relação a aspectos importantes da afirmação do Estado português.
Qualquer pessoa responsável tem noção de que é preciso fazer isso em todas as frentes. Aliás, gostaria de ver o seu partido mais aberto internamente a soluções absolutamente indispensáveis para a garantia dos nossos interesses estratégicos.
Em relação à política externa, não pode é continuar a querer fazer política barata com estas questões.
Há um crescimento real do orçamento do Ministério. Por que é que o Sr. Deputado não o reconhece? Fui muito honesto, descontando à cabeça as questões estruturais que têm incidência orçamental. Apesar de tudo, dei-lhe um conjunto de verbas, que são reforçadas precisamente para responder a problemas mais concretos com que nos confrontamos.
Quando o Sr. Deputado diz que não há crescimento real, é falso, não é rigoroso, porque há um crescimento real. Portanto, seja também um bocadinho rigoroso. Estamos a falar do orçamento, estamos a falar de números. Portanto, é possível dizer que há um crescimento real e não há necessidade de o escamotear.
O Sr. Deputado considera que é insuficiente. Porventura, gostaria que ele fosse maior. Mas, no contexto de restrições e de dificuldades que o País conhece, ainda há tanto a fazer relativamente a outras áreas de organização e de gestão que, confesso, convivo bem com este orçamento. Se vivêssemos num período de crescimento, estaria mais disponível para exigir outro crescimento.
Sr. Deputado, em relação ao ensino do português no estrangeiro, não há nada escondido. Para já, os valores existentes referem-se ao momento em que o orçamento é aplicado. Como sabe, os professores, actualmente, estão a ser pagos ainda pelo orçamento do Ministério da Educação, uma vez que a aplicação dos duodécimos a isso impõe. Relativamente à dotação do ensino do português no estrangeiro, foi transferida para o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros a dotação necessária para pagar os custos da rede de português que era alimentada pelo Ministério da Educação. Se assim não foi, teremos eventualmente de avaliar essa situação no final do ano. Mas, parto do princípio de que as pessoas estão de boa fé e que, se o orçamento era aquele cujo valor o Ministério da Educação identificava, não vai transferir uma dotação deferente da que estava.
Não vale a pena fazermos uma guerra sobre esta questão. Os professores não deixarão de ser pagos no final do ano, se isso se vier a verificar.
Do meu ponto de vista, foi importante integrar as valências do ensino do português no orçamento do Instituto Camões.
Sr. Deputado, as escolas portuguesas continuam sob tutela do Ministério da Educação precisamente porque é uma área técnica, os currículos são os do Ministério da Educação e, se elas pudessem ter sido transferidas também com o aparato técnico exigente para manter a sua tutela, não me importava. Mas esta questão de entrar no território alheio» O Sr. Deputado já foi Secretário de Estado, já foi membro do Governo, tem experiência política, sabe que isto é muito complicado e, portanto, do mal o menos: como as escolas portuguesas aplicam o currículo português e são escolas iguais às que temos no nosso sistema de ensino, não me repugna que, numa fase como esta, possam ainda ser geridas pelo Ministério da Educação. E é com o Ministério da Educação que vamos trabalhar a constituição de uma rede de escolas portuguesas, porque temos de ser mais ambiciosos e de ser capazes de ter uma escola de referência do ensino do português em particular nos países da CPLP, ou até mais do que uma. Penso que, em países como Angola, Moçambique ou Timor Leste, devíamos ter mais escolas portuguesas.
O orçamento do Instituto Camões aumenta, ainda que aumente pouco, Sr. Deputado. Também não me preocupo muito com isso porque «arrumar a casa» numa fase tão exigente desta instituição só por si já vai dar muito trabalho, porque integrar todas estas valências do sistema de ensino do português numa única instituição já vai ocupar muito a casa. Mais dinheiro era mais dispersão e mais problemas.
Em relação ao plano de 2010, aos PIC e à área de cooperação, terei oportunidade de dar a palavra ao Sr.
Secretário de Estado.
Em relação às acções no Oriente, estou muito consciente da importância de preparar bem o ano de Portugal na China. Como disse, terei oportunidade de dar conta, em primeira mão, à Comissão de Negócios

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Estrangeiros e aos Srs. Deputados das orientações que vou propor para reforçar as nossas relações com o continente asiático e, necessariamente, com a China e Macau. E, no âmbito da nossa relação com a China, quer a Exposição de Xangai quer, sobretudo, o Ano de Portugal na China serão importantes, e, por isso, terá de ser identificado um orçamento próprio para 2011. Quando, em Outubro ou, eventualmente, em Novembro discutirmos a proposta de Orçamento para 2011, teremos oportunidade de voltar ao tema.
Os seguros de saúde abrangem o pessoal técnico no exterior e os diplomatas.
No que se refere ao estatuto será, necessariamente, uma proposta de lei a apresentar à Assembleia da República. Entendo que poderei dar conta à comissão das orientações que proporei ao Governo até ao final do mês de Março, mas as propostas quer do estatuto da carreira diplomática quer do quadro de pessoal têm de ir ao Governo e, depois, à Assembleia.
À Sr.ª Deputada Teresa Damásio responderá o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
Sr. Deputado Serpa Oliva, em 3500 funcionários do Ministério de Negócios Estrangeiros tínhamos, em 31 de Dezembro de 2009, 452 diplomatas. Pelas comparações que temos com outros ministérios de negócios estrangeiros de outros países, não há um grande desfasamento na estrutura do seu pessoal, mas reconheço que, por ter havido alguns anos sem concursos para diplomatas, o número destes baixou significativamente.
No último ano, só perdemos quatro diplomatas, mas perdemos umas dezenas de diplomatas desde 2002, não tenho aqui o número exacto.
Durante alguns anos não houve concursos, mas nós todos os anos temos aberto um concurso. Trata-se de um concurso bastante exigente e em que o número de candidatos é bastante grande. São seleccionados pelo respectivo júri 30 diplomatas que têm, primeiro, uma formação específica de três meses e, depois, uma preparação de dois anos no Ministério, para, a seguir, poderem iniciar a sua carreira fora do País.
Estamos atentos, necessariamente, como lhe disse, ao Serviço Europeu de Acção Externa. Estamos a trabalhar num relatório, que será apresentado às comissões respectivas — Assuntos Europeus e Negócios Estrangeiros — sobre as implicações da entrada em vigor do tratado em todos os sectores, cujo trabalho está a ser coordenado pelo Sr. Secretário de Estado. Ainda antes da apresentação, pela Sr.ª Ashton, a Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros, do respectivo relatório ao Conselho, teremos o nosso trabalho de casa feito.
Sobre a diplomacia económica — respondo a si e também aos outros Srs. Deputados que me questionaram sobre o assunto, à Sr.ª Deputada Cecília Honório e ao Sr. Deputado José Cesário — , a minha convicção é a de que precisamos de optar por um modelo de acção económica externa, que não está estabilizado. Eventualmente, há países que integraram as instituições de acção económica externa nos respectivos ministérios dos negócios estrangeiros, mas há outros que não optaram por este modelo, como é o caso português. Nem a AICEP — anteriormente ICEP — nem, por exemplo, a Secretaria de Estado do Comércio Externo estão no Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Portanto, uma das dificuldades estruturais que o Ministério dos Negócios Estrangeiros tem sentido é a de lidar com uma realidade que é tutelada por outro ministério, sendo, apesar de tudo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros um actor importante na promoção dos nossos interesses económicos no estrangeiro.
O facto de, há muitos anos, se ter também suprimido a Direcção-Geral para os Negócios Económicos, a par da Direcção-Geral de Assuntos Políticos, deixou o Ministério dos Negócios Estrangeiros sem uma estrutura que, directa e funcionalmente, se ocupasse destas situações. O que é que está a ser feito? Primeiro, criou-se a Direcção-Geral dos Assuntos Económicos, precisamente para dar ao Ministério uma valência própria de direcção também neste domínio. Mas isto não basta, porque, como as outras estruturas que têm músculo para promover o País, na área do turismo, na área do comércio externo, na área das exportações, na área das pequenas e médias empresas, na área da angariação do investimento externo, estão, em particular, no Ministério da Economia, é absolutamente indispensável que haja um trabalho de coordenação interministerial e uma estrutura interministerial, que, neste momento, já foi criada.
Finalmente, temos uma estrutura interministerial — amanhã mesmo terei uma reunião com o Sr. Ministro da Economia precisamente sobre esta questão — , que é absolutamente indispensável para poder fazer a coordenação de rotina, que tem de ser feita todos os meses, e o acompanhamento de todo o trabalho da promoção económica externa. E, depois é preciso gerir o interface da relação do Estado com o associativismo empresarial e com as empresas. Este divórcio também existia e a criação do Conselho para a Promoção da

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Internacionalização, que é presidido pela Sr. Van Zeller é um instrumento fundamental para gerir este interface, para que o Estado defina os seus objectivos em consonância com os objectivos das empresas, e vice-versa, para que as empresas saibam quais são os objectivos estratégicos do Estado e para que a acção diplomática e a acção política, numa dada região, não sejam descoordenadas da acção das associações empresariais e das empresas.
Portanto, havia, na minha óptica, os dois instrumentos fundamentais para gerir a política de promoção económica externa com racionalidade: o interface da relação entre o Estado e as empresas e o interface das instituições do Estado entre si. Mas cada um andava por si: as empresas andavam por si; as associações andavam por si e os diferentes ministérios e as diferentes instituições também andavam desfasadas.
Isto não vai ser fácil, porque o trabalho de coordenação interministerial e o trabalho de gestão num País de «capelas» é sempre difícil. Sabemos que esta é uma cultura dominante e pesada quer na nossa Administração quer na sociedade portuguesa em geral. Mas não temos outra alternativa, o País não tem recursos para se dar ao luxo de dispersar meios e instrumentos de acção entre diferentes instituições da sociedade civil, da economia, das empresas e do Estado.
Portanto, com paciência e com persistência, acho que este trabalho vai produzir resultados, não imediatamente mas a prazo. Pelo menos, temos um quadro estratégico que vai permitir compatibilizar os objectivos de planeamento estratégico das empresas e dos sectores com o Estado e com a máquina políticodiplomática. Não faz sentido eu andar a promover o País no Golfo Pérsico e, ao mesmo tempo, as empresas estarem na Ásia Central.

Risos da Deputada do BE Cecília Honório.

Não faz sentido! Portanto, temos de nos entender relativamente às prioridades da acção do Estado e das empresas.
Acho que, neste momento, este trabalho tem dimensão institucional para poder desenvolver-se e penso que isto, a seu tempo, poderá dar resultados. Ainda ao longo do ano, acredito que este novo modelo possa funcionar. A opção por um modelo integrador de todas estas funções no mesmo ministério é sempre uma tentação e, eventualmente, poderá haver um governo, no futuro, que tome esta decisão, mas este Governo não tomou esta decisão nem esta orientação, e, portanto, do meu ponto de vista, temos de gerir, nesta perspectiva, a situação que temos.
Sobre a Líbia, dir-lhe-ei que foi muito desagradável a situação que seis empresários ou seis quadros viveram no sábado passado, porque foram apanhados justamente no momento de uma decisão visando a União Europeia, aliás, visando o espaço Schengen, a partir de um conflito com a Suíça. Apesar de tudo, a feira de produtos portugueses está a decorrer normalmente. O que posso dizer é que o meu colega líbio quis vir dar explicações directas, pelo que vou recebê-lo logo, no fim desta sessão, no Ministério, uma vez que veio deliberadamente a Madrid e a Lisboa para se encontrar connosco, o que reflecte, apesar de tudo, a preocupação que têm em manter connosco uma relação de abertura, face aos interesses que neste momento já estão a desenvolver-se, do ponto de vista económico, com a actividade de algumas empresas interessadas por aquele mercado, que é um mercado, apesar de tudo, regulado por critérios que não são os critérios que conhecemos.
A Líbia é um país com algum exotismo, do ponto de vista político-normativo, é o que posso dizer neste momento, mas é o que todos sabemos. No entanto, temos feito um esforço grande no sentido de inserir o mais rapidamente possível a Líbia no quadro normal das relações no espaço mediterrânico e fazemo-lo sem qualquer preconceito, fazemo-lo com a convicção de que estamos a proteger os interesses da Europa e os interesses do relacionamento entre o mundo ocidental e o mundo islâmico. E este caminho tem vindo a ser prosseguido com persistência, não apenas por Portugal mas também por muitos outros países da bacia mediterrânica europeia, e vai ter continuidade. É absolutamente indispensável que também a Líbia se encaixe com normalidade política e institucional no sistema euromediterrânico. Não podemos correr o risco de ter um País vizinho totalmente desinserido, do ponto de vista geoestratégico, daquilo que é o espaço de referência euro-atlântico.
O Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila será informado, a seu tempo, das opções em matçria de embaixadas.
Eu disse que, até ao final do mês de Março, relativamente aos estatutos, ao sistema de incentivo e à rede de

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representação diplomática, teremos opções para propor e para apresentar. Posso dizer que, ao longo deste ano, vamos abrir duas ou três embaixadas e vamos rever a rede diplomática em função de critérios que vão orientar-se muito para a dinâmica da economia mundial e para a dinâmica da representação necessária dos nossos interesses económicos em algumas regiões, onde estamos sub-representados, do ponto de vista político-diplomático.
O estudo sobre o valor económico da língua portuguesa, que foi financiado pelo Instituto Camões, existe, talvez não tenha sido suficientemente divulgado, daí o Sr. Deputado não o conhecer»

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Poderia enviar-mo?!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Tenho todo o prazer em lho enviar logo que chegue ao Ministério, se o encontrar» Vamos ver se o encontro.
Sr.ª Deputada Cecília Honório — procurando cumprir o tempo — , a nossa divergência, em relação à NATO, é insanável, é existencial, temos perspectivas completamente diferentes. Portugal é um País fundador da NATO, é um País que partilha o sistema de segurança colectiva, que é o sistema da NATO.
Acreditamos que, independentemente da controvérsia sobre o futuro da Aliança Atlântica, o modelo em que se inspira a cooperação, a partilha de soberania, em matéria de defesa e segurança é fundamental para a paz e para a estabilidade do sistema internacional e será, do meu ponto de vista, um modelo que vai ter réplicas noutras regiões do sistema multipolar em gestação. Não tenho sobre isto grande dúvida. E se a própria NATO puder, em termos conceptuais e teóricos, influenciar o modelo de segurança e defesa colectivo, que, em muitas regiões do mundo, terá de seguir o paradigma europeu e ocidental, tanto melhor, será sinal de que os nossos valores e os nossos princípios podem ser repercutidos à escala global.
Não vou desenvolver a minha opção sobre a NATO. Não sou a favor de uma organização que tenha de ser «o polícia do mundo», sou contra esta dinâmica, que está implícita em muitas das tentativas de desenvolvimento da Aliança, mas, no quadro do debate que se vai abrir sobre o conceito estratégico da NATO, teremos oportunidade, seguramente, de discutir, também com o Bloco de Esquerda, algumas das ideias que estão presentes nas nossas posições.
Sobre o ICA, o modelo fundacional, é o modelo ao qual faço referência, mas no plano puramente pessoal.
Acredito que, a prazo, outros governos poderão tomar esta opção. A janela ficou aberta para vários desenvolvimentos que o ICA possa ter. Agora, acho que esta reforma do ICA deu-lhe dignidade do ponto de vista institucional e orgânico que lhe permite aspirar a tornar-se uma instituição com várias opções de modelo no horizonte.
Quanto ao Centro Jacques Delors, não posso dar-lhe em pormenor os programas que estão implícitos.
Sobre o PEC, a Sr.ª Deputada já sabe que o PEC tem aumento de impostos, cortes de salários reais, e, portanto, não precisa de o conhecer, porque já o elaborou na sua cabeça. Mas, como sabe, eu não tenho a responsabilidade directa do PEC. Não vale a pena» Estamos num debate do Orçamento, e o Sr. Ministro das Finanças terá oportunidade, a seu tempo, de dar respostas sobre essa matéria.
Sr. Presidente, se for possível, gostava que o Sr. Secretário de Estado João Cravinho desse ainda, num minuto, uma resposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (João Gomes Cravinho): — Srs. Presidentes, Srs. Deputados: Umas breves palavras para manifestar agradecimento pelas perguntas colocadas pelos Srs. Deputados José Cesário, Carlos Gonçalves, José Manuel Pureza, Teresa Damásio e José Soeiro.
Em primeiro lugar, sobre os montantes da APD, gostaria de dizer que vale a pena começar por fazer um pouco o historial do percurso da APD portuguesa. Para não ser muito exaustivo, nós aumentámos, no final dos anos 90, chegámos a 2002 com 0,27%. Entre 2002 e 2005, baixámos de 0,27 para 0,20%. De 2005 para 2008 aumentámos de 0,20 para 0,27%.
Fico muito satisfeito pelo interesse manifestado pelos Srs. Deputados Carlos Gonçalves e José Cesário, quanto à necessidade de cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, a necessidade de

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cumprimento dos nossos compromissos. Não quero acreditar que sejam «lágrimas de crocodilo», quero acreditar que este interesse não seja apenas para utilização exclusiva no Hemiciclo mas também para utilização no diálogo com o povo português, porque, de facto, acredito que é um compromisso que devemos procurar, na medida das nossas possibilidades, honrar.
Estamos agora perante a possibilidade de voltar a aumentar. Aquilo que está orçamentado para 2010 representa um aumento na ordem dos 12%, face ao orçamentado em 2009; estou a falar do montante total, não apenas do montante que é afecto ao IPAD (Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento). Portanto, estamos a dar passos.
Devo dizer que acabo de chegar de uma reunião, em Segóvia, de ministros da cooperação para o desenvolvimento da União Europeia, em que esta preocupação é generalizada. 16 dos 27 países da União Europeia estão numa situação parecida com a nossa, com alguma dificuldade em atingir os seus compromissos e, ao mesmo tempo, também com défices mais elevados do que o esperado (o esperado em 2000, quando os compromissos foram assumidos), devido à necessidade, logicamente, de obviar ou de minorar os efeitos da crise internacional.
Em Junho, no Conselho Europeu, que reúne os primeiros-ministros da União Europeia, haverá oportunidade para discutir este tema e os compromissos assumidos por cada um dos países.
Em matéria de bolsas, devo dizer que tenho alguma dificuldade em compreender a resistência ou a ideia negativa que há.
Em primeiro lugar, devo corrigir um dado: estamos a falar de algo entre 1% e 2% da APD portuguesa, o que não tem rigorosamente nada a ver com os 60%.
Em segundo lugar, as bolsas estão hoje em dia, ao contrário do que era o caso no passado, ligadas à capacitação institucional. As bolsas são dadas em função não só do mérito individual dos candidatos mas também da sua ligação e inserção em instituições de acolhimento no regresso. Portanto, o que acontecia no passado, de alguma perda de utilização, para efeito dos próprios, do desenvolvimento dos países ditos beneficiários, hoje em dia já não acontece.
Relativamente a uma pergunta sobre o facto de estarmos no último ano de vários PIC (Programas Indicativos da Cooperação), Angola, Moçambique, Timor-Leste, Guiné-Bissau, devo dizer que este é o último ano. Já comecei a conversar, mas são conversas muito preliminares, com colegas desses países sobre novas prioridades. Portanto, a partir de Janeiro de 2011, durante este ano, vamos desenvolver os novos PIC. Quero sublinhar apenas de uma coisa: esses novos PIC serão feitos a partir de avaliações dos actuais PIC.

O Sr. Presidente: — Só dispõe de mais 1 minuto, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: — Este é o ponto de partida para o desenvolvimento de novos PIC, a par, naturalmente, de um diálogo intenso com as autoridades daqueles países. O que se prevê é alguma continuidade e algumas novas direcções e espero ter oportunidade de voltar a dialogar com os Srs. Deputados sobre estas matérias, na segunda parte do ano, quando tivermos algo de mais concreto para dizer.

O Sr. Presidente: — Para concluir este debate e segundo a grelha que definimos, os grupos parlamentares dispõem de 3 minutos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Jesus.

A Sr.ª Vânia Jesus (PSD): — Começo por cumprimentar o Sr. Ministro, os Srs. Secretários de Estado, Srs.
Presidentes de Comissão, Sr.as e Srs. Deputados.
Apesar de já muitas questões terem sido colocadas, gostaria de colocar duas questões muito concretas e específicas às regiões autónomas, aproveitando a presença do Sr. Ministro.
A primeira tem a ver com o QREN 2007-2013, aliás, uma matéria já hoje abordada nesta reunião, porque, se não me falha a memória, normalmente, a meio do funcionamento do quadro estratégico nacional é comum proceder-se a uma reavaliação do QREN. Aliás, esta reavaliação constitui uma importante actividade dos ciclos de programação das políticas públicas co-financiadas pela União Europeia, no sentido de se apurar e

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analisar os resultados dos programas e projectos e também de se aferir a eficácia dos mesmos, face aos respectivos objectivos e estratégias estabelecidos, ou mesmo, se necessário, de reajustá-los.
Pergunto, Sr. Ministro: sabe ou não se o Estado vai proceder a essa reavaliação? A existir, para as regiões autónomas, tendo em conta que elas, pelas suas especificidades, auferem o estatuto de regiões ultraperiféricas, consagrado no próprio Tratado de Lisboa, haverá ou não a possibilidade de haver um reforço dos poios, no que se refere ao Fundo de Coesão Europeu, que, como sabemos, é um pacote cuja redistribuição é feita pelos Estados-membros, e, neste caso, pelo Estado português? Por fim, uma questão muito concreta sobre a Região Autónoma da Madeira, da qual sou natural, e haverá, com certeza, resposta rápida por parte do Sr. Ministro, uma vez que é da competência e tutela do seu Ministério, e tem a ver com algo que temos visto passar constantemente para a opinião pública (e, a meu ver, incorrectamente), que é a introdução do critério do PIB. Ora, as regiões autónomas, Madeira e Açores, como já referi, são regiões insulares, têm especificidades próprias, e, no quadro comunitário, têm tido o PIB como factor de negociação.
Como sabemos, o PIB é um critério fixado pela própria União Europeia, está presente nos regulamentos europeus, mas, nesta matéria, tem havido sempre a tentação de alguns de acusarem, no caso particular, a Região Autónoma da Madeira de má negociação no último quadro comunitário. Por isso, Sr. Ministro, a minha questão é concreta: foi ou não o Estado português (aliás, é uma competência que cabe ao Ministério dos Negócios Estrangeiros) que negociou com a União Europeia, com sucesso ou não, esta é outra questão, mas que procurou que o PIB não fosse o único critério exclusivo, o que não foi aceite pela União Europeia?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, começo pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 188/2008, há pouco referida pelo Sr. Ministro, para colocar duas questões, porque, parece-me, esta Resolução é, de facto, de extraordinária importância, uma vez que marca uma viragem naquela que é a estratégia de afirmação e promoção de Portugal através da língua e da cultura. E aqui só não vê quem não quer a importância desta transformação. Estranho até que o Partido Comunista, e parece que só vê a realidade que quer ver, também não perceba que nesta Resolução está toda a orientação estratégica. Não quis ver que existe um quadro de referência do ensino do Português no estrangeiro, de 17 de Agosto de 2009, e que este fala, precisamente, da importância que tem a certificação e a valorização da língua portuguesa como instrumento de afirmação e também para as nossas comunidades.
Mas o que quero referir, neste contexto, é o seguinte: a Sr.ª Presidente do Instituto Camões e também o Sr.
Secretário de Estado, em algumas circunstâncias, referiram que o objectivo era reforçar e expandir a rede do ensino do Português no estrangeiro, como parte desta estratégia, integrada no Instituto Camões. E, neste contexto, haveria também um alargamento do ensino de Português no estrangeiro, pela primeira vez, para países como os Estados Unidos, o Canadá e a Venezuela. Pergunto: de que forma é que isto se vai fazer? Como é que esta expansão se vai realizar, pela primeira vez, nesses países também? «Não se pode confundir a árvore com a floresta», porque, se olharmos para os números de professores de Português no estrangeiro, vemos que existe um aumento constante. Por exemplo, desde 2004, o número de alunos passou de 59 300 para 63 000 e o número de cursos passou de 3000 para 7000, sem contar com o que acontece na África do Sul, onde existem cerca de 4000 alunos e 270 cursos. África do Sul, Suazilândia e Namíbia também são terrenos relativamente novos neste contexto, o que também é importante, e não se pode, em circunstância alguma «confundir a árvore com a floresta». Os problemas que existem serão, certamente, tratados.
Refere, ainda, a Resolução, em determinada altura, que: «(») no quadro do disposto nos contratos de concessão do serviço público de rádio e televisão, importará reforçar o desenvolvimento dos canais internacionais (RTP Internacional, RTP África, RDP Internacional e RDP África), em particular no tocante ao cumprimento das suas missões como plataformas de difusão mundial da língua portuguesa e de informação e criação em língua oficial portuguesa, projectando um olhar português sobre o mundo, favorecendo a cooperação entre os países de língua oficial portuguesa e promovendo a ligação às comunidades portuguesas residentes no estrangeiro.»

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Gostaria de ouvir um comentário ao Sr. Ministro, relativamente à RTP Internacional — e termino já, Sr.
Presidente — , na medida em que, em meu entender, o serviço da RTP Internacional, que tem total autonomia editorial, administrativa e financeira, cumpre tudo menos estes objectivos que estão consignados nesta Resolução. Se o Sr. Ministro pudesse também fazer um comentário, agradecia.

O Sr. Presidente: — O CDS e o BE prescindiram do uso da palavra.
Tem a palavra o Sr. Deputados José Soeiro.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro preferiu responder à forma e não ao conteúdo.
Espero que retenha o conteúdo daquilo que disse e espero que não diga que não compreendeu a forma como lhe respondi.
Sr. Ministro, não sou sindicalista, mas já fui e tive muito orgulho em sê-lo. Fui e tive muito orgulho em sê-lo! Por outro lado, mesmo que se tratasse de um emigrante português, de um emigrante que tivesse um problema, era meu dever expô-lo aqui e era dever do Sr. Ministro ouvir o problema, com respeito e consideração. Um emigrante que fosse! A «árvore», Sr. Deputado! Infelizmente, não é uma «árvore», são muitas «florestas», e, se não tivermos cuidado, o que ficará é «terra queimada», Sr. Ministro! Mas não é por aquilo que eu disse aqui, é pela falta de políticas concretas, que correspondam aos discursos e que respeitem as pessoas, em primeiro lugar. Esta é a questão de fundo! Nós vamos acompanhar, naturalmente. Vamos ver onde se vai fazer o reforço da rede escolar, não somos igualitaristas, Sr. Ministro, e já tive oportunidade de dizer isto na Comissão de Negócios Estrangeiros.
As realidades, naturalmente, que se alteram e, as políticas deveriam acompanhar essas realidades e, até hoje, não as têm acompanhado. Temos cada vez mais emigrantes e damos cada vez menos atenção aos nossos emigrantes. Esta é uma questão que exige, na verdade, respeito e consideração.
Portanto, o tom teve a ver com a forma displicente como o Sr. Ministro respondeu às questões que coloquei, e entendo, na verdade, que o Sr. Ministro, pelo cargo que ocupa, deve responder às questões que lhe são colocadas. Mas, se não quiser responder, também tem este direito, e nós retiraremos daí as ilações políticas que tivermos, como entendimento, de retirar.
O Sr. Ministro não é obrigado a responder, mas, e isto sim, tem o dever de ouvir com atenção o problema que lhe é colocado e não desconsiderar aquilo que é colocado.
Não colocar as questões que coloquei, como se estivesse aqui a tratar de uma questão de um militante do meu partido, o que, com muita honra, faria (repito, fá-lo-ia com muita honra!), questões que, seguramente, dizem respeito a muito mais homens e mulheres que mais têm apoiado, no passado, quer o PS quer o PSD do que, propriamente, o PCP» Não pergunto a ninguçm pelo cartão de militante quando trato de um problema nesta Casa. Todos os cidadãos que se me dirigirem, sejam de que partido forem, serão atendidos com o mesmo respeito e consideração. Não faço favores a ninguém! Cumpro o meu dever. Cumpro o meu dever, Sr.
Ministro!

Protestos das Deputadas do PS Maria de Belém Roseira e Teresa Damásio.

Não estou a ser indelicado. As Sr.as Deputadas estão incomodadas. É normal que estejam incomodadas, mas isso tratam no Partido Socialista.
Peço que, quando estamos aqui a tratar de assuntos sérios, como disse o Sr. Ministro, haja também a mesma atenção nas respostas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Soeiro, eu ouvi-o. Não pode dizer que o não ouvi com respeito e consideração. É isto que não entendo, Sr. Deputado.
Não percebo onde ç que o Sr. Deputado viu, na minha reacção»

O Sr. José Soeiro (PCP): — Foi a resposta que deu!

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O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Mas eu não posso dar a resposta que o Sr. Deputado quer. O Sr. Deputado até diz que eu posso não responder.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Exacto!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O Sr. Deputado quer que lhe responda»?! Não respondo a perguntas que não têm outro sentido que não seja o de uma certa querela sindical, porque estamos num debate político, estamos numa câmara política.
O Sr. Deputado do Bloco de Esquerda colocou-me um conjunto de questões de natureza política, estratégica, com incidência orçamental. O Sr. Deputado traz para aqui casos.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Casos?!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Casos sindicais! Não tenho de lhe responder! Nem estou dentro da carta que o Sr. Deputado leu, não sei qual foi a carta, não sei quem lhe escreveu a carta.
Há um caso-tipo? Há e procurei responder-lhe abstractamente, em termos genéricos.
Agora, Sr. Deputado, não me exaltei, não levantei a voz, respondi com respeito e consideração, mas respondi politicamente à sua questão. O Sr. Deputado está numa câmara política! As suas questões são sindicais!

O Sr. José Soeiro (PCP): — Não ouviu o que eu disse!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — E foi isto que eu disse, e digo. Aliás, até disse «com o respeito que tenho pela actividade sindical». Ressalvei! Mas não queira que eu venha responder a questões de índole corporativa ou sindical, porque não é este o ambiente para o fazer.
Tenho respeito e consideração pelo Sr. Deputado, como tenho por todos os Srs. Deputados.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Não se sabe!

O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O Sr. Deputado é que falou para mim, a ralhar comigo, não sei porquê. Ralhou, ralhou, ralhou! Parece que, hoje, está aborrecido. Não se aborreça tanto, Sr. Deputado! Já chegam os problemas da vida para nos aborrecerem.
Sr.ª Deputada Vânia Jesus, sobre o QREN, não posso responder, porque não é a minha área, não tutelo o QREN. Esses exercícios de avaliação são feitos e creio que alguns aspectos que têm a ver com a aplicação do QREN têm estado a ser objecto de permanente avaliação, por parte do Governo, sobretudo das instituições que têm a responsabilidade técnica pela sua execução.
Em relação ao critério do PIB, posso dizer-lhe que, tanto quanto sei, o PIB é um critério que a União Europeia utiliza na política regional e é verdade que o Governo, precisamente face à situação da Madeira, e pelas informações que me foram transmitidas, procurou negociar compensações à Madeira, designadamente no âmbito da política relativa às regiões ultraperiféricas. Isto é sabido, é do conhecimento público, mas o PIB é um critério incontornável da política regional da União Europeia. Foi este o critério que a União Europeia adoptou para gerir a sua política regional e a sua relação com as regiões, no âmbito da política de coesão.
Sr. Deputado Paulo Pisco, dir-lhe-ei apenas que, relativamente à estratégia da língua, este não é o momento adequado para implementar todas as orientações que vão ser adoptadas, do ponto de vista da rede.
Estamos num momento de implementação da nova orgânica do Instituto Camões (ICA), vamos ter de nomear, a breve prazo, os representantes do Conselho Estratégico e do Conselho Consultivo, que são dois importantes instrumentos de gestão do Instituto e de definição da sua política, pelo que, a seu tempo, o Instituto terá propostas concretas, neste domínio, que terei oportunidade de transmitir à Comissão, em momento adequado.
Sobre a comunicação social, vi, com satisfação, que o Sr. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros propôs um conjunto de audições que me parecem muito pertinentes neste momento. Nós necessitamos de ter uma comunicação social orientada para a promoção da imagem do País no estrangeiro — é esta a visão que tenho — , a par de outros países que têm a mesma ambição e estão a desenvolver uma

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estratégia muito ofensiva de ocupação do espaço mediático internacional. Penso que a reprodução dos problemas internacionais, a partir de um olhar português e da visão de um país que tem a história e a rede de relações com o mundo como tem Portugal, o justifica, e, neste contexto, parece-me que algum exercício de reforma terá de ser equacionado a prazo, com base num amplo consenso político-partidário na sociedade portuguesa e com o envolvimento das instâncias e das instituições adequadas para concretizar esse objectivo.
O País necessita, a prazo, de ter um sistema mediático global, de ter uma antena própria com uma visão do mundo, que é a nossa própria visão, a qual decorre de sermos um país que está no centro de uma comunidade que tem apenas oito Estados-membros — em comparação com o mundo da francofonia ou com o mundo anglo-saxónico — , mas são oito Estados que representam praticamente todas as principais regiões e continentes do mundo. Nesta perspectiva, do meu ponto de vista, justifica-se que, também no espectro do sistema mediático internacional, a voz em língua portuguesa seja mais bem percebida e ouvida.
Assim sendo, saúdo a iniciativa da Comissão de Negócios Estrangeiros e do Sr. Presidente, porque entendo que o Parlamento e a Comissão de Negócios Estrangeiros são, justamente, a sede própria para se começar a debater qual o nível de ambição que desenvolvemos em relação a esse sector tão importante para a afirmação dos nossos interesses estratégicos, a prazo, no sistema internacional, no quadro, naturalmente, da aliança da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, porque é também neste domínio que se deve fazer a afirmação universal.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Terminámos, assim, esta audição, pelo que agradeço a presença dos Srs. Presidentes e dos Srs. Deputados das Comissões de Negócios Estrangeiros e de Assuntos Europeus.
Peço aos Srs. Deputados da Comissão de Orçamento e Finanças que não se retirem, de imediato, uma vez que ainda temos alguns pontos da ordem do dia da manhã para tratar.
Está encerrada a reunião.

Eram 18 horas e 13 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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