Página 523
Quinta-feira, 16 de Junho de 1988 II Série - Número 18-RC
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)
II REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
ACTA N.° 16
Reunião do dia 17 de Maio de 1988
SUMÁRIO
Deu-se continuação à discussão do 6. ° relatório da Subcomissão da CERC, respeitante aos artigos 53.° a 62.º e respectivas propostas de alteração.
Durante o debate intervieram, a diverso título, para além do vice-presidente, Almeida Santos, no exercício da presidência, pela ordem indicada, os Srs. Deputados Marques Júnior (PRD), Miguel Macedo e Silva (PSD), José Manuel Mendes (PCP), Maria da Assunção Esteves (PSD), Nogueira de Brito (CDS), José Magalhães (PCP), Odete Santos (PCP), Rui Gomes da Silva (PSD), Sousa Lara (PSD), Pacheco Pereira (PSD) e Carlos Encarnação (PSD).
Página 524
524 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, deixámos para hoje a discussão da proposta de alteração do artigo 53.º apresentada pelo PRD. Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Dados os termos em que está redigida esta adenda ao artigo 53.°, penso que a proposta do PRD não precisará de muitas explicações. Talvez seja necessário sublinhar que a preocupação que nos levou a propor este aditamento adveio do que tem sido um manifesto desvirtuamento da celebração dos chamados contratos a prazo. Os contratos a prazo foram perspectivados e resolvidos numa altura em que, creio, poderiam justificar-se do ponto de vista político, a fim de resolver situações emergentes de algumas dificuldades resultantes daquele período mais conturbado a seguir ao 25 de Abril. Pensamos que a utilização dos contratos a prazo tem sido sistematicamente desvirtuada, na medida em que, como todos sabemos, a maior parte das empresas tem utilizado esta figura para evitar a constituição de um vínculo e de uma responsabilidade entre a entidade patronal e o trabalhador. Em nosso entender, essa situação deve ser perfeitamente limitada e caracterizada.
Propomos, pois, este aditamento no sentido de permitir a celebração de contratos a prazo apenas em situações comprovadamente transitórias ou sazonais ou para prover à substituição temporária de trabalhadores permanentes. No fundo remetemos para a característica intrínseca do contrato a prazo, não permitindo que esta figura seja desvirtuada e delimitando o âmbito da sua utilização. Creio que este aditamento e por si só suficientemente perceptível para não necessitar da minha parte - e provavelmente também não estarei em condições de o fazer, do ponto de vista técnico-jurídico - de outros esclarecimentos, para além deste.
O Sr. Presidente: - Pretendia saber, Sr. Deputado Marques Júnior, se a palavra "transitórias" cobre as prestações de trabalho por tempo determinado. Por hipótese, uma empreitada 6 transitória? Embora saiba que é isso que se pretende significar, será, todavia, que o termo "transitório" é correcto? Uma empreitada não tem nada de transitório, não transita de nada para nada. Tem é uma duração limitada no tempo. Será que o qualificativo "transitório" cobre todos estes casos?
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Desde que o objectivo que pretendemos seja alcançado, estamos abertos a qualquer sugestão, a qualquer proposta que permita substituir e aperfeiçoar esta redacção. Provavelmente a dúvida que V. Exa. levanta é pertinente, e estou tentado a dar-lhe razão.
O Sr. Presidente: - Não é a ideia que está em causa, mas sim a expressão. Pode haver contratos de natureza transitória, mas um contrato de duração limitada porque o trabalho é, ele próprio, de duração limitada não tem nada de transitório. A empreitada é o caso típico de um contrato por tempo limitado. Não é sazonal, porque o contraio sazonal corresponde a uma determinada época do ano, como é o caso das colheitas ou das sementeiras, da poda, da pesca do atum, e também não é transitório. Falta portanto aqui um outro conceito que é precisamente aquele que se refere ao caso de o trabalho ser ele próprio de duração limitada.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Se esta ideia vier eventualmente a ser acolhida, teremos toda a disponibilidade para encontrar uma outra redacção e admitimos à partida, face à observação do Sr. Presidente, que esta expressão pode não ser a mais feliz.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.
O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, pretendia colocar-lhe uma questão.
Em primeiro lugar, tenho certas dúvidas quanto à conveniência sistemática em integrar este n.º 2 no artigo 53.º, que diz respeito à segurança no emprego.
Em segundo lugar, pretendia expressar as minhas dúvidas e preguntar-lhe o seguinte: garantindo já a lei aquilo que o PRD propõe como n.° 2 do artigo 53.° entende que a constitucionalização - no fundo é disso que se trata - da matéria dos contratos a prazo constitui uma boa via? De facto, parecendo que o PRD pretende resolver esta matéria pela sua promoção a norma constitucional, pensa que a constitucionalização das condições para a celebração dos contratos a prazo é uma boa via para evitar os abusos por desrespeito da lei e das condições que a lei impõe, já hoje, para a celebração desses contratos a prazo?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - É evidente que, quanto à questão da sistemática, posso não estar nas melhores condições - e não estou certamente - para dizer se este é ou não o melhor local para introduzir esta norma. Ficaríamos, porém, satisfeitos com a introdução desta norma em ordem a não violar ou a melhor ordenar essa sistemática. Não fazemos nenhuma questão disso.
Quanto à questão da constitucionalização, que me parece ser mais relevante, pensamos que se deveria constitucionalizar esta matéria na medida em que a experiência nos diz que, apesar de a lei ser suficientemente clara, na prática não tem resultado. Embora admita que, do ponto de vista teórico - e só teórico -, poderíamos prescindir da constitucionalização desta norma, diria que se trata de uma precuação em ordem a procurar resolver uma das questões que tem levantado mais problemas ao longo dos últimos anos, não tendo sido objectivamente resolvida, mas sim sistematicamente desvirtuada. Parece-nos, portanto, que, se não se justifica uma constitucionalização demasiada relativamente a determinado tipo de normas que podiam perfeitamente passar sem esta constitucionalização, mas se existem normas desse tipo - e nós admitimos que sim -, parece-nos que esta se justifica pelos problemas que, como é do conhecimento de todos, têm sido criados ao longo do tempo, pelo facto de se tratar de uma das matérias que mais dificuldades tem criado, nomeadamente aos trabalhadores.
Consequentemente, pensamos que não é por "dá cá aquela palha" que se constitucionalizam todas as normas. Porém, à semelhança de outras normas já constitucionalizadas, parece-nos que esta, pelo seu impacte, pela sua importância e pela prática ao longo destes anos, não desmerece de outras normas que são eventualmente apontadas com tendo um caminho semelhante a este.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
Página 525
16 DE JUNHO DE 1988 525
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que a constitucionalização de algumas garantias adicionais de defesa do trabalhador, designadamente da sua situação laborai, proposta pelo PRD, é bem vinda, independentemente de alguns aperfeiçoamentos de natureza técnica. Creio, todavia, que quando há pouco o Sr. Presidente se referia aos contratos transitórios - que podiam, evidentemente, não ser transitórios e ser duradouros se a situação como tal fosse qualificada - se a tinha apertis verbis ao que está proposto pelo PRD, uma vez que, suponho, a expressão "transitórias" qualifica necessidades e não propriamente contratos. Julgo que a utilização do género feminino pretende estabelecer uma dimensionação a partir das necessidades e não da tradução que essas necessidades encontrem no universo jurídico contratual.
De toda a forma, penso que a redacção não é a mais escorreita e que devemos encontrar as soluções adequadas. Espero que este contributo, que se insere no paradigma da defesa dos direitos dos trabalhadores, possa acolher aprovação, designadamente por parte do PSD.
O Sr. Presidente: - Eu entendi que com a expressão "transitórias" se pretendia dizer isso. Simplesmente, a expressão não me pareceu feliz, pois transitório é algo que transita de para, e um contrato de empreitada não transita de nada para nada.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Pois não. É sempre necessário qualificar de forma mais correcta...
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, independentemente de estar ou não a defender esta proposta - que considero, aliás como o meu colega Miguel Macedo, mal situada em termos sistemáticos -, creio que o problema de o trabalho transitório não cobrir por exemplo o caso da empreitada não imporá, de certo modo, grande preocupação em matéria de política legislativa. De facto, creio que a legitimidade, por exemplo, de um contraio a prazo para uma empreitada, estará coberta por efeito da própria natureza das coisas. Pois o trabalho não se prolonga por mais do que aquilo que tem de se prolongar, é óbvio que a obrigação de emprego, pela natureza das coisas, se extinguira no termo do trabalho...
O Sr. Presidente: - Não é bem assim, Sra. Deputada, porque as empreiteiras tem várias empreitadas ao mesmo tempo, e muitas vezes os trabalhadores transitam de uma empreitada para a outra. Podem é só ter uma empreitada ou ter tantas que se justifique a manutenção de lodo o elenco de trabalhadores.
Os casos mais típicos do contrato a prazo são a empreitada e o trabalho sazonal. Aliás, fui eu quem infelizmente redigiu a lei em vigor. Também tenho essa "culpa". Mas, na altura, a lei dos contratos a prazo surgiu como instrumento de defesa contra a rigidez da Lei do Contraio Individual de Trabalho que então vigorava, e que ainda era mais rígida do que a lei actualmente em vigor. A ideia foi exactamente a de dar alguma flexibilidade à rigidez. E lenho impressão de que a Lei do Contrato Individual de Trabalho pôde, apesar de tudo, durar até hoje -como durou - porque disfrutou desse escape. Só que os tribunais vieram a fazer uma interpretação da Lei dos Contratos a Prazo muito para lá do espírito e até da letra da própria lei. E hoje, no Norte, nomeadamente as fábricas têxteis, quase não tem empregados, sobretudo quando do sexo feminino, que não sejam contratados a prazo, sem nenhuma espécie de justificação e fora do espírito e da letra da lei.
Por isso, a ideia de limitar na Constituição algumas balizas dentro das quais teriam de se situar os contratos de trabalho a prazo não seria em abstracto má. É uma ideia que encaro com alguma simpatia. Simplesmente, a redacção teria de ser tal que nela coubesse a necessidade do recurso a contratos a prazo, ainda que a título de excepção. Se o empreiteiro não puder contratar a prazo um trabalhador para trabalhar numa empreitada, não o contrata.
Consequentemente, creio que não seria mau deixarem-se aqui algumas balizas. Dariam dignidade às excepções e o contrato a prazo teria de situar-se dentro das excepções constitucionais. A regra tem de ser a estabilidade do contrato e a excepção a sua temporalidade. Seria pois positivo se encontrássemos uma formulação que metesse o legislador ordinário dentro de limites razoáveis.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.
O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Julgo que, a constitucionalizar-se esta matéria, ela caberá, em termos sistemáticos, muito melhor, por exemplo, no artigo 59.° que trata do direito ao trabalho. De facto, se pegarmos na conceptualização de toda a matéria atinente aos contratos a prazo, veremos imediatamente que o grande objectivo pretendido com, por exemplo, aquilo que está definido em termos legislativos nos contratos a prazo é o favorecimento do emprego, ainda que precário e nas condições que a lei define para salvaguarda de certas situações sociais que todos conhecemos e que infelizmente ainda subsistem.
Tenho dúvidas, julgo que fundadas, em que a constitucionalização da figura dos contratos a prazo, por si só, reverta numa maior garantia, em termos práticos, para os trabalhadores. Julgo que esta questão passa muito mais pela efectiva fiscalização e por mudanças mais profundas em lermos sociais, quer no tecido empresarial quer nos próprios trabalhadores, etc., do que propriamente pelo reforço, em meu entender, mais aparente do que real, das garantias dos trabalhadores contratados a prazo. Nesse sentido, mantenho as objecções que anteriormente expendi.
Porém, julgo que esta proposta do PRD ainda tem mais a seguinte carga negativa: no fundo, vai-se constitucionalizar uma situação que, julgo eu, todos reconhecemos não ser a mais benéfica para os trabalhadores e que a Constituição não consagrava. Penso que tem um quadro definido de forma relativamente correcta embora, como é óbvio, se possa melhorar. Em termos legais, é uma situação mais ou menos bem definida e julgo que com esta proposta se pode perder de vista aquilo que, no fundo, é essencial nesta matéria, ou seja, a segurança no emprego, a estabilidade do trabalhador no seu posto de trabalho.
Consequentemente, para além da questão sistemática que mantenho, seria de ponderar esta situação, que pode ter mais efeitos negativos do que positivos, na medida em que a intenção do PRD era, penso eu, a de transmitir alguma segurança acrescida aos trabalhadores. Porém, não vejo que com esta proposta possa ser esse o resultado alcançado.
O Sr. Presidente: - Para ser franco, julgo que até do ponto de vista sistemático está melhor aqui. Não defendo com ardor as questões sistemáticas, pois, se bem que importantes, nem sempre o são tanto como isso. Trata-se de um problema de segurança no emprego, de estabilidade do emprego. Ora, aqui estamos perante uma excepção a essa estabilidade.
Página 526
526 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - É instável por natureza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Não, deixa de ser estável. Trata-se de uma excepção à estabilidade. Penso que não estaria pior aqui, embora também não fizesse questão em que se consagrasse no artigo 59.°
Mas o facto de sé consagrar na lei ordinária ou na Constituição não é, evidentemente, a mesma coisa. Uma garantia com dignidade constitucional vale mais do que uma garantia com a fluidez e a relatividade das garantias da ordinária. O problema consiste em saber se deveremos ou não estabelecer balizas. Se são boas na lei ordinária, também não são más na lei constitucional. Se são tão boas que a lei ordinária não deva ir além delas, justifica-se a sua consagração constitucional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Pretendia voltar ao artigo 53.°, para o qual temos uma proposta de alteração...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Pretendia apenas fazer uma observação: se seguíssemos o critério de procurar completar o conjunto de observações sobre esta matéria...
O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado Nogueira de Brito não pretende pronunciar-se acerca desta proposta do PSD, é preferível terminar a respectiva discussão antes de voltarmos ao artigo 53.°
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Gostaria apenas de fazer duas observações, Sr. Presidente. A primeira é a de que nos parece que a inserção sistemática do preceito é a correcta. Ou seja, como é geralmente reconhecido, ao precisar os termos em que, no terreno da lei ordinária, podem ser admitidos os contratos a prazo, tem-se como objectivo garantir uma maior estabilidade, à luz de uma concepção que visa reforçar a segurança do trabalhador numa das suas dimensões mais relevantes e sobretudo num país em que a contratação a prazo veio a assumir a importância que toda a gente, por uma razão ou outra, lhe reconhece.
Não vou historiar o percurso que se fez nesta matéria desde a entrada em vigor da Constituição. Todos sabemos duas coisas: a primeira, que foi aqui evocada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, é a de que o regime dos contratos de trabalho a prazo que foi concebido em 1976 visou uma "flexibilização". Já aí se tratava de, ao abrigo de concepções "flexibilizadoras", procurar temperar aquilo que se entendia como sendo um "excesso constitucional". Em nossa opinião, não havia nenhum excesso constitucional, mas sim um perigo de não cumprir a Constituição nos seus precisos termos. Lamentavelmente, esse perigo...
O Sr. Presidente: - Isso não seria constitucional, Sr. Deputado. Isso apenas se passava em relação ao excesso de rigidez da lei ordinária. Portanto, não tinha nada a ver com a Constituição. Não era rigidez constitucional, mas sim rigidez da restritividade das justas causas de despedimento.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a campanha desenvolvida nessa altura não se situava, infelizmente, só em torno da lei ordinária, nem nesse ponto, nem na reforma agrária, nem em relação à delimitação de sectores, nem quanto a outros temas igualmente relevantes.
Em todo o caso, não era isso que nesta circunstância queria enfatizar, mas tão-só que as cláusulas criadas, no sentido de dar vazão àquilo que se considerava serem "necessidades impreteríveis do mercado", redundaram no alastrar de uma verdadeira mancha que poluiu o nosso panorama laborai e que se transformaram num seríssimo problema de carácter social. O problema é tão grande que não é por acaso que ele é hoje reconhecido e diagnosticado como tal por todos os quadrantes, sem excepção. O próprio Governo não se esqueceu de incluir, como peça integrante e indispensável, no pacote laborai uma alteração do regime dos contratos a prazo, porém num quadro geral que torna a liberdade de despedir no pilar essencial do nosso direito do trabalho. Assim, este reparo, este "penso" governamental no regime dos contratos a prazo coexiste com a abertura de uma enormíssima ferida, que torna desvaliosa a operação cirúrgica globalmente considerada. Em lodo o caso, eis um outro sintoma de que o problema existe.
Pela nossa parte estamos disponíveis para considerar todas as fórmulas de corresponder, no plano constitucional, a esse problema. Não alimentamos nenhuma ilusão jurídica quanto ao vigor absoluto de soluções deste tipo. Ouvi aqui ecoar na voz do Sr. Deputado Miguel Macedo um certo requiem pelas constituições, na parte em que cias representam uma garantia dos direitos dos trabalhadores, com o argumento nunca por de mais aduzido que é o que diz respeito nos "plenos poderes do mercado". Diz-se: o que é que garante a Constituição que a economia não garanta? O que e que garante a lei que a economia não engendre? A resposta dos que se situam nessa postura é tão-só a seguinte: nada! Aquilo que a lei estabeleça sem que a economia garanta é zero. Não temos essa concepção, em nome da qual os ventos neoliberais que vão soprando procuram demolir o edifício do Estado de direito democrático na parte em que ele é também Estado social. Em todo o caso, não alimentamos a ilusão de que a lei tudo possa resolver de um só golpe ou de uma só penada. Infelizmente, não e assim! Num país em que, além do trabalho a prazo, há já em expansão formas de trabalho mais precário do que o trabalho a prazo, inclusivamente sem qualquer espécie de vínculo, sem qualquer contrato, trabalho autenticamente negreiro, desumano e incompatível com um Estado democrático moderno e civilizado, o facto de o legislador nesta sede de revisão constitucional prestar atenção à problemática dos contratos a prazo apenas pode significar que ele está atrasado em relação à realidade social. Isto é, a nossa realidade social exige, neste momento, uma muito maior atenção a outros problemas, designadamente aos que resultam da proliferação incontrolada das chamadas agencias de aluguer de trabalho, das agências de trabalho temporário e outras modalidades que, de forma selvagem, vem infectando o nosso tecido empresarial e alterando o panorama do nosso "mercado laboral".
Portanto, parece-nos que a cláusula proposta pelo PRD é susceptível de ser trabalhada. A sua inserção em outra sede seria obviamente possível, designadamente naquela que o Sr. Deputado Miguel Macedo aqui situou. No entanto, pensamos que ela seria pior, desvalorizadora da menção constitucional que é desejada, aliás em extensão de qualquer coisa que já fluiria numa saudável hermenêutica do artigo 53.° É óbvio que a segurança no emprego é maior ou menor consoante a garantia concedida pelo vínculo. Ora,
Página 527
16 DE JUNHO DE 1988 527
sabemos que em certas modalidades essa garantia é praticamente nula. A mais plena das garantias é atingida quando o elemento do contrato relacionado com a sua duração é a máxima concebível em termos humanos e jurídicos.
Creio, Sr. Presidente, que seria extremamente útil que conseguíssemos aditar à Constituição qualquer cláusula que explicitasse ideias deste tipo e que enriquecesse, portanto, o seu conteúdo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, como disse no início, é evidente que não tenho formação jurídico-constitucional suficiente que me permita pronunciar-me em relação à inserção desta norma, à sua sistemática. A minha sensibilidade comum aponta, porém, no seguinte sentido: trata-se de uma questão de segurança no emprego que, em termos sistemáticos, ficaria melhor neste artigo do que em qualquer outro, nomeadamente no artigo 59.º Parece-me que, de facto, ficaria melhor no artigo 53.° É evidente, contudo, que não fazemos disso um "cavalo de batalha". O que nos parece importante realçar - e creio que em relação a isso os Srs. Deputados deram um contributo válido- é que, sem prejuízo de entendermos que este texto não seja o mais adequado, todos concordamos que esta questão existe com uma dimensão muito maior do que aquela que desejaríamos e com uma dimensão diferente daquela que teve na génese da criação deste decreto. Essa dimensão foi, como todos sabemos, objectiva e claramente desvirtuada.
Relativamente à constitucionalização desta norma, também me parece que ela se comprova e se justifica por si só.
O Sr. Deputado Miguel Macedo suscitou aqui uma dúvida. Gostaria de dizer ao Sr. Deputado que não vislumbro como é que se pode extrair a ilação que V. Exa. tirou, que é a de eventualmente se poder pensar que esta norma, ao contrário do que se pretende, não dá segurança aos trabalhadores. O Sr. Deputado disse aqui que ela cria uma insegurança para os trabalhadores e que, em vez de os proteger, põe a descoberto a sua própria segurança. Foi isso o que deduzi da sua observação, mas, de facto, não vejo a questão nesses termos, porque, se eventualmente pudesse ser encarada assim, nós próprios teríamos de repensar tal situação. Não é esse o nosso objectivo! Todos nós temos a certeza de que este problema existe. Em termos teóricos, poderia aceitar que constitucionalizar esta norma teria força em demasia. No entanto, a prática diz-nos que, provavelmente, se trata de uma acção que se justifica plenamente.
Gostaria de sublinhar a nossa disponibilidade total para encontrar a melhor acção que cumpre tal objectivo e responda a esta nossa preocupação, que - vemo-lo com alegria - é também uma preocupação de todos os Srs. Deputados presentes nesta Comissão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, a justificação que vou dar para o n.º 2 proposto pelo CDS tem algo a ver com a observação que fizemos sobre o n.º 2 proposto pelo PRD.
Começaria por dizer o seguinte: entendo que, de facto, a inserção sistemática da norma do PRD é mais adequada. Louvou-me no argumento do Sr. Deputado José Magalhães, que se louvou, por sua vez, no argumento do Governo ao apresentar recentemente um diploma sobre cessação do contrato de trabalho, onde inseria todos os normativos respeitantes ao contrato a prazo (portanto, na perspectiva do termo do contrato) e um elemento de caducidade dos contratos de trabalho que afecta a sua estabilidade. Pensamos que esta norma constitui um passo no sentido da regulamentação da matéria a nível constitucional. Ora, esse passo é mais avançado do que aquele que, porventura, corresponde ao nosso n.º 2. Entendemos que esta é uma norma própria da lei ordinária, mas que em relação a esta matéria é uma norma fechada, uma vez que não há aqui nenhuma referencia a um possível preenchimento da mesma por via da lei ordinária. Deverá caber ao legislador ordinário fazer decorrer do princípio da segurança no emprego - estabelecido no n.° 1 do artigo 53.º do nosso projecto - qualquer regulamentação sobre o contrato de trabalho a prazo. Nessa perspectiva, pensamos que não é adequada a constitucionalização deste tipo de norma, muito embora acompanhemos o PRD nas preocupações que tem relativamente à eventual proliferação deste instrumento de trabalho a prazo.
Também se poderia entender que a nossa proposta caminha no sentido da regulamentação ou inserção no texto constitucional de normas próprias da lei ordinária. Tal proposta corresponde, efectivamente, ao esclarecimento de uma controvérsia sobre o sentido da norma constante do artigo 53.° Nós entendemos - e, pelos vistos, não somos só nós - que o sentido do artigo 53.º é apenas o de proibir o despedimento sem invocação de motivos, ou seja, o despedimento livre. Não se pretende fazer coincidir a justa causa com o facto culposo apurado em processo disciplinar. Entendemos também que é necessário estabelecer uma distinção entre os dois tipos de justa causa e aquela que tem sido designada por "justa causa objectiva". Há que reservar o mesmo tipo de tratamento para o despedimento com justa causa correspondente a facto culposo averiguado em processo disciplinar e para a chamada justa causa objectiva. Por isso inserimos este n.° 2, para que tenha assento na Constituição a distinção entre os dois tipos de justa causa ligados efectivamente às únicas possibilidades invocáveis para fazer cessar, nesta sede, o contraio de trabalho, ligando à invocação de justa causa objectiva a necessidade de pagamento de uma indemnização ao trabalhador.
É esse o sentido da nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Não fui só eu que não estive presente quando se discutiu esta vossa proposta. Pelos vistos, o Sr. Deputado também não esteve.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Pois não, Sr. Presidente.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que o CDS poderia ser um pouco mais franco na produção das razões pelas quais apresenta esta proposta. Estando todos os nossos espíritos bem avivados do debate realizado em Plenário sobre a malquistada proposta de lei de liberalização dos despedimentos, ninguém ignorará que se a Constituição estabelecer que "é garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos", e se a esta cláusula se aditar uma outra, na qual se diga que "quando a justa causa de despedimento não seja fundada em comportamento culposo do trabalhador este tem direito a indemnização", estar-se-á a escrever uma cláusula que se traduzirá em qualquer coisa como isto: "O despedimento
Página 528
528 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
pode fundar-se em comportamento não culposo do trabalhador, havendo em tais casos direito a indemnização". Eis o que qualquer, em reconversão simples, alcançará ao ler a proposta do CDS. Isto é, o CDS quer liberalizar os despedimentos em sede constitucional, mas não quer dar uma noção de justa causa "hábil", inquinada ou envenenada como aquela que o Govemo apresentou à Assembleia da República e que, quanto a nós, é rematadamente inconstitucional. O CDS mantém a noção de justa causa e, ao aditar um n.º 2 deste teor, visa, sem margem para qualquer dúvida, constitucionalizar a possibilidade de despedimentos não fundados em comportamentos culposos, garantindo ao trabalhador uma indemnização (mas nem sequer se fala em justa indemnização!). É um retrato do CDS em termos de classe. O trabalhador tem direito a uma indemnização, mas a uma qualquer indemnização, uma vez que não se define nenhum critério objectivo para a sua delimitação. De todas as cláusulas liberalizadoras esta é das mais liberalizadoras que é possível imaginar. Comportaria toda a espécie de despedimentos fundados em supostas causas objectivas e, em relação aos outros comportamentos ditos culposos, não os delimitando, apenas asseguraria uma qualquer indemnização. Não podemos senão estar em desacordo com um aditamento deste tipo, que nos parece extremamente grave.
O conceito de justa causa carece de determinação, de acordo com as regras constitucionais, isto é, há que remeter para um espaço semântico que deve ser identificado de acordo com as regras constitucionalmente obrigatórias e que é aquele em que o comportamento a pressupor, para se admitir que há uma justa causa, há-de ser um comportamento inequivocamente culposo, um comportamento censurável do próprio trabalhador, não sendo, portanto, atendíveis razões de carácter puramente objectivo, nem sendo entendíveis como comportamentos culposos aqueles que não possam, em termos de apreciação do quadro constitucional e legal vigente à entrada em vigor da Constituição, ser qualificados como tais.
Sendo assim, e tendo até sido produzido neste quadro o aleijão legislativo que é do nosso conhecimento e que, neste momento, está em sindicação constitucional, entendemos que abrir portas à entrada deste verdadeiro comboio cheio de vagonetas atreladas pelo CDS seria extremamente grave: arriscávamo-nos a que o comboio apitasse três vezes para liquidar ajusta causa constitucional. Pronunciamo-nos firmemente contra isso.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, o n.º 1 refere o seguinte: "são proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos e ideológicos". Separemos: temos, por um lado, a justa causa; por outro, os motivos políticos ou ideológicos. Parece que os motivos políticos e ideológicos nunca poderão ser uma causa justa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Caso contrário, isso estaria incluído na primeira parte. Quer dizer, nunca os despedimentos por motivos políticos ou ideológicos são fundados em justa causa. Diz-se na vossa proposta "quando a justa causa de despedimento não seja fundada em comportamento culposo do trabalhador, este tem direito a indemnização". Se assim é, parece que se admite que, quando o motivo político ou ideológico não for culposo, pode constituir justa causa. Só que seria indemnizável. Não é essa a vossa intenção? Muito bem. Mas do que cá está pode tirar-se essa conclusão. O que o CDS pretende é que sempre que haja causa permitida pela Constituição e pela lei, das duas uma: ou ela é fundada em causas objectivas ou em atitudes culposas. Se é fundada em atitudes culposas, não há direito a indemnização; se é fundada em causas não culposas, sejam objectivas ou não há direito a indemnização. É isto o que o CDS quer?
Vozes.
O Sr. Presidente: - Em rigor, não é isso o que cá está! No mínimo, teria de referir "sem prejuízo do disposto no n.° 1". Isto poderia afastar todos estes fantasmas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Admito que sim. Nós vemos a norma do actual artigo 53.º como uma norma de proibição de duas situações: do despedimento não justificado, não fundamentado, e do despedimento fundamentado por motivos políticos ou ideológicos. São, pois, proibidos o despedimento não fundamentado, sem justa causa - é nesse sentido que entendemos ajusta causa -, e aquele que tenha por fundamento motivos políticos ou ideológicos.
O Sr. Presidente: - Que nunca é justo! Essa causa nunca é justa!...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sim, essa nunca é justa. Mas o problema de o fundamento se reconduzir a um facto culposo ou a um facto não culposo coloca-se apenas em relação àquele que não invoca motivos políticos ou ideológicos, que estão à parte. Admito, porém, que a sugestão feita pelo Sr. Presidente seja realmente útil para a redacção deste preceito.
O Sr. Presidente: - "Sem prejuízo do disposto no n.º 1."
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exactamente, "sem prejuízo".
Qual é então a justificação daquilo que propomos? Repetir-me-ia um pouco, mas responderia também ao Sr. Deputado José Magalhães. Efectivamente, entendemos que não é clara a interpretação feita do artigo 53.º, restringindo o fundamento da justa causa ao facto culposo apurado em processo disciplinar. Isso nem sequer corresponde à tradição do nosso direito do trabalho - refiro-me não só ao direito do trabalho em que este conceito foi elaborado, que é anterior ao 25 de Abril, como até ao direito do trabalho imediatamente posterior ao 25 de Abril. A tradição do nosso direito do trabalho não vai neste sentido, mas apenas no da identificação da causa justa, do motivo invocável, com o facto culposo apurado em processo disciplinar. Nessa linha de pensamento entendemos que é perfeitamente natural a interpretação da norma do artigo 53.º como correspondendo apenas à exigência de fundamento para o despedimento. Não há despedimento livre, ao contrário do que se passa nos direitos laborais de muitos países. Aliás, também o direito comparado aponta no sentido da dupla possibilidade.
Entendemos que não se deve por esta via alargar inequivocamente o sentido da justa causa, que para nós já é claro. Estamos, aliás, à espera da lição do Tribunal Constitucional, que deverá estar a chegar - veremos em que sentido! - e que porventura virá corroborar o nosso entendimento. Simplesmente, o que entendemos é que as duas situações não podem ser tratadas da mesma forma. Daí termos proposto esta norma.
Página 529
16 DE JUNHO DE 1988 529
Agradeço, contudo a sugestão que V. Exa. fez, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Agora pergunto ao Sr. Deputado José Magalhães: supondo que o n.° 2 proposto pelo CDS começasse assim: "sem prejuízo do disposto no n.º 1", etc., isso dar-vos-ia satisfação ou mantinham as vossas reservas?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Vislumbro a totalidade e, portanto, acolho inteiramente a sugestão de V. Exa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente, por uma razão simples: se se trata de situações de despedimento colectivo, aí somos capazes de imaginar e até propusemos uma cláusula que procure acautelar - não proibir, mas acautelar - que, quando haja que realizar despedimentos colectivos, se operem em circunstâncias que garantam a não perversão da sua finalidade própria e da suma razão pela qual são realizados. Aliás, associámos a esse processo as comissões de trabalhadores, numa proposta apresentada noutra sede própria.
Isso é totalmente diferente daquilo que o CDS agora pretende viabilizar. Aparentemente, aquilo que preocupa o CDS é a realização de uma dupla distorção. O CDS, não contente com uma interpretação reducionista e sumarizadora do artigo 53.° no seu conteúdo actual (reduzindo a noção de justa causa a uma mera obrigação de motivação - o que não tem cobertura constitucional, porque o conceito constitucional é bastante mais rico do que isso), pretende dar cobertura, aberta e explicitamente, a que seja legalmente consagrada uma noção de justa causa "objectiva" para despedimento individual, noção esta que possa abranger situações ou circunstâncias relacionadas com a relação de trabalho - ligadas, designadamente, à aptidão do trabalhador, ou uma suposta aptidão do trabalhador, ou suposta inaptidão do trabalhador; ou assentes em motivos supostamente económicos, ou ditos tecnológicos, ou ditos estruturais, ou ditos de mercado; ou outros, relativos à empresa, relativos ao serviço, relativos ao estabelecimento. Legitimava-se assim uma qualquer ou várias formas de despedimento, por factos que não teriam absolulissimamente nada a ver com a conduta do trabalhador em termos concretos, medida por algo que lhe seja censurável em termos de responsabilização individual.
Aquilo que o CDS aqui quereria concretizar era a possibilidade de realização de despedimentos por factos não culposos - é tão simples como isso!
É tão grave como isso! E não há véu nenhum, por mais espesso que seja apresentado, que possa ocultar essa intenção, porque ela é descomunal. Ainda que se incluísse um inciso do tipo "sem prejuízo de", o efeito pretendido ou aludido pelo Sr. Presidente não poderia ter lugar, porque isso seria o mesmo que declarar pomposamente "É garantido o direito à felicidade, sem prejuízo da infelicidade e da amargura". Ou seja, há uma contradição nos termos - a primeira parte é contrariada pela segunda e é inteiramente esvaziada ou esvaziável. Percebo que isso encha de contentamento o CDS, porque seria uma cláusula pseudo-articuladora, mas não nos enche a nós de contentamento e, sobretudo, não passa ao crivo de uma análise, minimamente atenta, dos conteúdos normativos que vem propostos.
Parece-nos, portanto, Sr. Presidente, uma sugestão que procuraria articular a água e o azeite. Como se sabe, não é coisa muito exequível.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, não posso deixar de começar por prestar homenagem à habilidade do Sr. Deputado José Magalhães, que preencheu vários minutos do seu tempo a dizer sempre a mesma coisa, embora sob aparências diferentes. Felicito-o por esse facto.
Mas o que o Sr. Deputado José Magalhães tem estado a dizer, efectivamente, é que pretendemos alargar, com o n.° 2 que propomos, o conceito de justa causa. É este o sentido útil da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães. Não pretendemos - e sentimo-nos acompanhados nessa orientação por vários dos grupos parlamentares com assento na Assembleia - ...
A Sra. Odete Santos (PCP): - Vários?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Vários, sim!
O Sr. José Magalhães (PCP): - O CDS, o CDS e o CDS, além do PSD.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Alem do PSD e do PS, diria eu. Que entendem, efectivamente, esta exigência feita no artigo 53.°, que é a proibição do despedimento não fundamentado, como aliás, em meu entender, a redacção do preceito - "sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos" - claramente inculca. Não pretendemos acrescentar nada, a não ser um direito dos trabalhadores - clara e inequivocamente - que, realmente, queremos alargar. Mas que o sentido que atribuímos à actual proibição se compadece com o despedimento por motivos que radiquem em factos objectivos é verdade. Escusa o Sr. Deputado José Magalhães de enumerar os factos objectivos que podem ser motivo de despedimento e que vêm elencados numa proposta de lei recentemente aprovada pela Assembleia da República, com a abstenção do CDS. Essa é uma questão da lei ordinária, e admitimos até que em sede de lei ordinária não venha a ser consagrada essa possibilidade, que, porém, é acautelada na redacção que damos ao preceito constitucional.
É só isto o que queremos, que - supomos - é qualquer coisa favorável aos trabalhadores.
A Sra. Odete Santos (PCP): - Isso é que é uma grande cambalhota!
O Sr. Presidente: - Para fazer uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Deputado Nogueira de Brito, V. Exa. sustenta que o texto constitucional na sua redacção actual já comportaria este entendimento. Mas estamos em sede de revisão constitucional: se a proposta do CDS fosse consagrada, essa interpretação, que, pela nossa parte, é errónea, adquiriria ou não adquiriria cobertura constitucional inequívoca? A resposta, Sr. Deputado, há-de admitir e convir, é afirmativa. Adquiriria cobertura constitucional inequívoca! E mais: excluiria a boa solução que, em saudável hermenêutica constitucional - que aponta para um conceito exclusivamente subjectivo de justa causa, identificando-o com comportamentos culposos, censuráveis, dos trabalhadores -, vem sendo defendida. Portanto, o CDS, com isto, fecharia o espaço de interpretação constitucional dirimindo, no sentido perverso
Página 530
530 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
e negativo, um conflito interpretativo que não está dirimido e, que em nosso entender, deve sê-lo no sentido contrário. Sr. Deputado Nogueira de Brito, não repetirei - porque em sede deste debate não seria próprio - aquilo que é o nosso entendimento do conteúdo actual da Constituição neste ponto. Mas V. Exa. haverá de reconhecer, ao menos uma vez (não lhe peço que repita muito), que aquilo que o CDS pretende é trinchar, no sentido negativo e definitivizador, um conflito interpretativo que, quanto a nós, não tem fundamento, mas a partir de agora teria com a proposta do CDS. Isso seria, evidentemente, péssimo.
O Sr. Presidente: - Para mais uma pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sob pena de estar a repetir algumas das intervenções anteriores - embora não pense que isso aconteça -, porque estive ausente da sala durante a sua intervenção inicial, aquilo que gostaria de lhe perguntar é o seguinte: no n.° 2 do artigo 53.9 da proposta do CDS, o que se pretende, penso eu, numa interpretação meramente subjectiva, e que para ajusta causa não culposa que poderá dar indemnização poderá haver só duas situações - por um lado, uni despedimento colectivo fundamentado ou, então, um despedimento político-ideológico. A pergunta que eu faria é esta: se esta alteração não terá também a ver com a própria alteração do n.º 2 que o PSD propõe e que, embora proibindo o despedimento por motivos ideológicos, permite, de alguma maneira, que isso aconteça quando se verificarem determinadas condições, que são todas as referidas no n.° 2 in fine do próprio projecto do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É evidente que, partindo a nossa proposta do entendimento - que julgamos ser pacífico - da proibição do despedimento sem justa causa e distinguindo duas situações em relação a essa justa causa, ela constitui a afirmação inequívoca de que são possíveis esses dois tipos de justa causa. Isso e evidente!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Aí está o que é mau.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Para nós não é mau, mas bom, o sentido actual da norma de segurança constante do artigo 53.° da Constituição; para VV. Exas. é mau. Entendemos, pois, que essa polémica constitucional não tem sentido. Esperemos pela interpretação autorizada do Tribunal Constitucional! O objectivo da nossa proposta não é tanto o de esclarecer a controvérsia, mas sim o de afirmar a distinção entre os dois fundamentos potencialmente invocáveis. Essa é a nossa intenção, muito embora resulte daí, inequivocamente, que o texto constitucional fica com o sentido de existir uma dupla justa causa invocável para o despedimento.
No que respeita à outra observação que me foi dirigida, o nosso n.º 2 não tem nada a ver com o despedimento por motivos políticos ou ideológicos. No entanto, a possível confusão foi já aqui sugerida pelo Sr. Presidente e nós, efectivamente, aceitamos a sugestão de V. Exa. no sentido de desfazer definitivamente qualquer equívoco nessa matéria acrescentando ao preceito uma referencia ao n.º 1 do tipo "sem prejuízo do disposto no n.º 1". Mas não tem o mesmo alcance do n.º 2 proposto pelo PSD. Entendemos que nessa matéria nada há a acrescentar e que não se deve fazer qualquer concessão para distinguir as possibilidades de despedimento por motivos políticos ou ideológicos em certas circunstâncias. Não foi esse, de forma nenhuma, o objectivo do nosso n.° 2, que tem apenas a ver com o despedimento com justa causa e prevê - voto a repetir - que tal despedimento possa ocorrer por justa causa correspondente a um facto culposo apurado em processo disciplinar ou a um facto não culposo e que pode até não consistir num comportamento do trabalhador. Prevemos na nossa proposta que o despedimento tenha um regime jurídico diferente e entendemos que isso deve ter assento constitucional, embora também admitamos que seja caminhar no sentido da pormenorização dos normativos constitucionais, porventura pouco compatível com a própria natureza da Constituição. Entendemos, porém, que isso é necessário em relação a esta norma de segurança.
O Sr. Presidente: - Penso não podermos avançar muito mais, porque nos confrontamos com duas concepções completamente divergentes: quem entenda que a Constituição consagra uma tónica preferentemente subjectiva, no sentido de que a regra é que os despedimentos tem de ter uma causa subjectiva ou um comportamento culposo, tem de admitir que isto vinha abrir a poria às causas objectivas; para quem entenda que já hoje a Constituição não inviabiliza causas objectivas de despedimento, consagráveis na lei ordinária como justas, não há dúvida de que o que eu propus "sem prejuízo de" resolveria o problema. Mas não vale a pena adiantarmos mais. São duas concepções completamente diferentes e, portanto, pararíamos aqui.
Vamos passar ao artigo 54.° Quanto ao n.º 1, o CDS propõe que, em vez de "intervenção democrática na vida da empresa", se diga "participação na vida da empresa". É um conceito limitativo. Uma coisa é intervenção, outra participação. O PSD não altera o n.º 1; o PRD também propõe "participação", tal como o CDS. Portanto, no fundo, o problema que temos é este: de um lado, a Constituição actual, consagrando o conceito de intervenção democrática; de outro, as duas propostas de alteração do n.º 1, substituindo o conceito de intervenção pelo de participação democrática. Está caracterizado o tema.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Entendemos que a redacção do actual n.9 1 tem ainda a ver com o regime jurídico que, no plano do direito ordinário, está estabelecido para as comissões de trabalhadores e que as concebe não como órgãos de agregação dos trabalhadores da empresa, destinados a canalizar a sua participação e a exprimi-la na vida de um empreendimento que também lhes é comum, mas como órgãos de combate dos trabalhadores, transferindo, pois, para as comissões de trabalhadores características que, a nosso ver, são mais próprias da organização sindical - a qual, aliás, também tem assento na Constituição, e muito bem, no âmbito dos direitos dos trabalhadores. Por isso mesmo, entendemos substituir, para tornar inequívoca esta disposição correspondente ao n.91, a expressão "intervenção democrática", que pode ter a ver com realidades como os poderes de controle das comissões de trabalhadores - entendemos preferível defini-los como poderes de participação na vida da empresa. É esse o sentido da modificação que pretendemos introduzir.
O Sr. Presidente: - Para a justificação, rápida se possível, da proposta do PRD, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
Página 531
16 DE JUNHO DE 1988 531
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Quando se fala em "intervenção democrática na vida da empresa", entende o PRD que isso talvez seja mais próprio dos sindicatos do que das comissões de trabalhadores; é mais restritiva a "participação" do que a "intervenção". Relativamente à intervenção, cremos que, do ponto de vista legal, ela não tem sido suficientemente regulamentada, em ordem a que tal intervenção seja hoje assumida de uma forma inequívoca. Para evitar esses equívocos, entendemos como mais positiva a substituição da expressão "intervenção" por "participação", para que, efectivamente, tal direito possa ser exercido em toda a sua plenitude. É isto o que se me oferecia dizer sobre a questão. Aliás, em mais dois ou três artigos adiante o PRD substitui a palavra "intervenção" por "participação" exactamente com o mesmo sentido.
O Sr. Presidente: - Isso repete-se várias vezes em várias propostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É interessante que o CDS venha propor a alteração de diversos aspectos do regime constitucional das comissões de trabalhadores, embora traduza um processo de maquilhagem desnaturadora, próprio de certa metodologia de actuação. Dela naturalmente, discordamos.
Seria curioso, num processo constituinte, ver, da parte do CDS, defender uma concepção participativa. Diria até que lhe ficaria bem, do ponto de vista da concepção do moderno universo empresarial: não a autocracia patronal, não a plenitude de poderes do proprietário, mas a empresa como espaço de participação em que há lugar à expressão livre de formas de intervenção dos próprios trabalhadores, como sujeitos do processo produtivo, como entidades responsáveis, como criadores, com direito a ver projectada a sua intervenção para além da própria esfera produtiva, recusando reduzi-la ao mais subordinado dos espaços imagináveis.
Apenas sucede que o CDS vem apresentar propostas de revisão de uma constituição laborai que tem as mesmas raízes e o mesmo conteúdo das demais dimensões da Constituição de 1976. Portanto, a proposta de alteração é também uma proposta de superação constitucional, de desnaturação constitucional, de redução constitucional (não apenas semântica mas também conceptual).
Assim, não vemos senão inconvenientes na substituição da noção de intervenção democrática pela noção reduzida e redutora de participação, ainda que não tenhamos qualquer puridade contra esta última, pelo contrário. Mas acontece que a forma de participação prevista constitucionalmente é a intervenção democrática dos trabalhadores na vida da empresa. É essa a forma que assume a participação no direito laborai português plasmado constitucionalmente. Portanto, ou isto pretendia significar exactamente o mesmo que a expressão "intervenção democrática", em boa hermenêutica, ou quer dizer menos, ou quer dizer diferente. Se pretende significar menos, discordamos; se quer dizer diferente, também.
A segunda coisa que o CDS pretende relativamente ao n.° 2 do artigo 54.º é a eliminação da primeira parte que diz o seguinte: "Os plenários de trabalhadores deliberam a Constituição e aprovam os estatutos das comissões de trabalhadores".
O Sr. Presidente: - Ainda lá não chegámos, Sr. Deputado. Estamos a apreciar o n.° 1. De seguida colocarei à discussão o n.º 2.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Nesse caso, Sr. Presidente, em relação ao n.9 1, é este o conjunto de observações que gostaria de fazer neste momento e nesta sede, isto sem prejuízo de outras.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, curiosamente, o PS e o PSD coincidiram em não alterar o referido n.º 1, certamente por terem tomado consciência de que se há alterações que valem a pena há outras que criam mais problemas do que resolvem. Eu tenderia a incluir estas propostas no grupo daquelas que são mais polémicas do que aquilo que valem.
Se pretendêssemos estabelecer uma distinção conceptual rigorosa entre os conceitos de intervenção democrática, e de participação democrática, diria também que intervir é mais do que participar.
De qualquer modo, as propostas são redutoras, e quer nós quer o PSD devemos ter tido a premonição de que vale a pena enveredar por este tipo de preocupações. Para quê discutir conceitos que apesar de tudo são próximos, tornando-se em última análise difícil determinar qual deles vale mais, qual deles, em bom rigor, representa uma interferência maior?
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, para nós há diferença nas propostas em apreço, que aliás tem a ver com as alterações introduzidas no elenco do artigo 55.º Se é certo que o PS não propõe alterações ao elenco deste artigo - e supomos que isso é coerente com a circunstancia de não propor também alterações ao artigo 54.º, e está indiscutivelmente na linha daquilo que o Sr. Deputado acaba de dizer -, já em relação ao PSD estranhamos um pouco que não tenha tentado dar redacções coerentes aos dois textos em questão.
Neste âmbito, entendemos que o que distingue a intervenção democrática (aqui afirmada e depois traduzida no elenco de direitos ou poderes do artigo 55.8) da participação é que ela permite uma intervenção não responsável neste sentido, ou seja, não há uma co-responsabilização dos trabalhadores na vida da empresa, contrariamente ao que acontece no intervenção participativa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esse é um notável esforço de inteligência e de exegese, mas não é necessariamente como V. Exa. diz.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, agradeço muito o elogio, mas suponho que não o mereço.
O Sr. Presidente: - Merece, merece, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não o mereço porque este conceito de participação é um conceito elaborado, tem várias traduções noutros países do mundo. Não tenho, pois, mérito nenhum ao referir este aspecto.
Ora, a diferença que referi há pouco implica que se elimine do elenco de poderes das comissões de trabalhadores o controle de gestão, porque ele não faz sentido numa gestão participativa, que é uma gestão co-responsabilizante na vida da empresa. É com essa coerência e esse sentido global que apresentamos a nossa proposta.
Penso que esta minha intervenção servirá também de esclarecimento às questões colocadas pelo Sr. Deputado José Magalhães. E agradeço-lhe muito o elogio que fez do apoio à "participação" por parte do CDS.
Página 532
532 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente: - De qualquer modo, há aqui uma pequena diferença: enquanto o PRD mantém o qualificativo "democrático", o CDS propõe apenas "participação". Aqui é que talvez esteja uma diferença considerável.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Gostaria apenas de dizer que este esclarecimento prestado pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito em contraposição com as interrogações e as dúvidas do Sr. Presidente sobre o alcance da disposição actual da Constituição pode suscitar alguma perplexidade.
Não deixo de reconhecer que o CDS pretende, relativamente a este ponto e nesta revisão, levar ao moinho a mesma água que cobiçou aquando da primeira revisão constitucional e que pretende no terreno da lei ordinária. Essa pretensão traduz-se na emasculação das comissões de trabalhadores, na redução drástica dos seus poderes, na alteração da natureza dos mecanismos de intervenção previstos constitucionalmente. Baptizemos isto de participação, de subjugação ou de outro nome qualquer, mas esta é uma questão marcadamente ideológica e a referida água é exactamente a mesma.
De facto, há uma diferença conceptual entre a intervenção democrática tal e qual ela se encontra consagrada e a noção de participação tal e qual ela vem agora definida, reveladoramente acompanhada da mutilação de direitos de intervenção concreta, designadamente dos direitos de controle que não se identificam com a participação no sentido que o CDS acabou de definir. Mas, como sabemos, também é verdade que podem compatibilizar-se com certas formas de participação, qua tale, em termos constitucionais, o que resultou adensado pela primeira revisão constitucional, concretizado parcialmente pela lei ordinária e inteiramente frustrado na prática pela Administração.
Em termos de construção constitucional, substituir o conceito de intervenção democrática por participação democrática poderia ser rigorosamente o mesmo. Não fosse o PRD também suprimir o "controle de gestão" (que substitui por um outro conceito, coisa de que também discordamos), a solução seria mera alteração semântica.
O CDS vai mais longe, o que também não é de surpreender. Agora está tudo explicado mais claramente. Isto, uma vez que o CDS acaba de sublinhar - admito que não pretendesse esconder excessivamente porque isso é demasiado visível - que esta proposta vai de par com a supressão directa e aberta da alínea b), a qual prevê como poder das comissões de trabalhadores (CTs) o exercício do controle de gestão. Refiro-me, naturalmente, ao artigo 55.°, alínea b).
Por isso, Sr. Presidente, é que creio que a rejeição da proposta há-de fazer-se porventura com mais veemência, porque não se trataria apenas de um não valer a pena ou de uma alteração "mais polémica que útil". Tratar-se-ia, sim, de uma alteração "ultima" na óptica da supressão dos poderes das CTs. Mas aí julgue-se útil quem puder, porque realmente não o podemos fazer, bem pelo contrário!
O Sr. Presidente: - Dois caminhos conduzem à rejeição da proposta em causa: um é o seu alto significado; o outro é o seu nenhum significado. Ambos servem.
Vamos agora apreciar o n.º 2 do artigo 52.°, relativamente ao qual há duas propostas. Uma delas é apresentada pelo CDS, que propõe a eliminação da primeira parte do texto, ou seja, "os plenários dos trabalhadores deliberam a constituição, aprovam os estatutos", e reformula a segunda, ficando o preceito a ter a seguinte redacção:
2 - Os membros das comissões são eleitos em plenário de trabalhadores, por voto directo e secreto.
Refere-se portanto e apenas à eleição das próprias comissões.
O PSD elimina a referência "aos plenários" e substitui-a por "os trabalhadores da empresa". Em resumo é isto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de informar que a nossa proposta tem um lapso. Aliás, por isso é que eu pretendia antecipar-me há pouco ao Sr. Deputado José Magalhães, para dizer que há aqui um lapso.
O Sr. Presidente: - Qual é, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não sei se lapsus linguae se calam, Sr. Presidente, mas o certo é que - e acabamos por espelhar isso na nossa proposta - não pretendíamos eliminar o recurso ao voto secreto do plenário, da totalidade dos trabalhadores da empresa...
O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, o voto secreto está aqui referido.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas não também no sentido da aprovação dos estatutos e das formas orgânicas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não pretendiam então alterar a proposta?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não queríamos sobretudo que ela tivesse esse sentido redutor, eliminando a intervenção, por voto secreto, em relação à aprovação dos estatutos e à criação da própria comissão.
O Sr. Presidente: - No entanto, há um sentido relativo à proposta que se mantém válido. Uma coisa é referir os plenários como entidade a se e outra é referi-los como locais onde se exerce o voto, como locais de reunião.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, o que pretendemos pura e simplesmente é caracterizar o plenário de trabalhadores como uma realidade perspectivada em função da organização comissão de trabalhadores e não apenas como entidade a se...
O Sr. Presidente: - Não referiu os "plenários" como sujeito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exactamente. Não pretenderíamos mais do que isso, mas, no entanto, retiramos realmente mais do que isso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Se me permite, gostaria de dizer o seguinte: creio que conhecemos a acidentada história da elaboração do projecto de lei de revisão constitucional do CDS e seguramente que o Sr. Deputado Nogueira de Brito a conhece melhor do que nós.
Mas sucede que há certas coisas relativamente às quais esse projecto permite a qualquer, até a nós, tudo compreender. Se se atentar na redacção proposta pelo CDS para
Página 533
16 DE JUNHO DE 1988 533
o artigo 55.°, logo se verifica que este partido, quando elaborou o respectivo projecto, pretendeu remeter toda a matéria de carácter estatutário para o domínio da lei. Há disso indícios ou sinais - que talvez sejam também lapsus calami, mas esses calçam andam calamitosos no CDS, porque neste caso "calamaram" mal em dois pontos, ou seja, nos artigos 54.º e 55.º
Quanto ao artigo 54.º, a intenção é inequívoca: o que se pretende é reduzir a margem de auto-organização das comissões de trabalhadores. O artigo 54.º do CDS contém, em todas as suas normas e não somente numa, vários princípios constitucionais que consagram o direito dos trabalhadores à auto-organização.
Esta figura, como sabemos, tem um momento essencial na definição estatutária. É evidente que o legislador tem uma determinada margem de conformação, mas o que não pode, nos termos do actual texto da Constituição, é substituir-se aos trabalhadores e obrigá-los a sujeitarem-se a uma determinada disciplina quanto, por exemplo, à definição, ao âmbito e ao objectivo da CT que pretendem constituir, bem como quanto à sua forma de constituição, à sua composição e à sua organização. Ele não pode substituir-se designadamente quanto à imposição à CT da prática de determinados actos que se traduzam numa autorização que numa qualquer forma de ratificação por um órgão exterior à própria comissão de trabalhadores.
Assim, ao propor a supressão desta cláusula respeitante à liberdade estatutária, o que o CDS está a fazer é tentar diminuir drasticamente a margem de auto-organização dos trabalhadores e a aumentar drasticamente, e pela medida correspondente, a margem de regulamentação cometida ao legislador ordinário, o que naturalmente e pernicioso.
O Sr. Deputado Nogueira de Brito, sendo evidentemente sempre livre de substituir ou de retirar as propostas que apresentou originariamente - e se isso acontecesse seria positivo -, traz-nos, no entanto, uma interpretação correctiva, que tem de ser ou desmentida ou acompanhada por uma retirada da proposta constante do artigo 55.º, caso em que tudo ficará reposto saudavelmente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, qualquer que seja a interpretação ou a intenção que decorre de elemento sistemático, não podemos, contudo, deixar de dar o valor devido à declaração proferida pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, no sentido de que não houve intenção aqui de eliminar nem a referência à Constituição nem à aprovação dos estatutos. Estamos autorizados pelo CDS a não mexer nessa vertente. Posteriormente veremos o que acontece em relação ao artigo 55.º
O Sr. José Magalhães (PCP): - Então, Sr. Presidente, se bem entendi, a proposta apresentada pelo CDS e virtualmente retirada.
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, é apenas mantida no que diz respeito à substituição da referencia aos plenários como sujeito, o que também parece acontecer em relação ao PSD. Portanto, o conteúdo único da proposta em questão fica reduzido a isso. Depois veremos o que fazer no que se lhe refere.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a disposição actual e a disposição do CDS fazem a mesma menção aos plenários dos trabalhadores.
O Sr. Presidente: - Não fazem, Sr. Deputado. O respectivo texto do CDS refere "em plenários", enquanto o actual texto diz "os plenários". Essa é a diferença fundamental das duas redacções, ou seja, uma menciona os "plenários" como sujeito e a outra refere-os como local, como quadro.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Como órgão, Sr. Presidente. Como quadro orgânico no qual têm lugar as referidas eleições.
O Sr. Presidente: - Exactamente, Sr. Deputado, as duas propostas apresentadas têm esse sentido, e é isso que temos de encarar. Ao apreciarmos o artigo 55.º veremos qual a ilação a tirar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, a proposta de substituição do n.º 2 do artigo 54 8 apresentada pelo PSD quase se esgota, como V. Exa. disse, pela leitura do respectivo preceito.
Com efeito, aquilo que se pretende é estender o voto secreto e directo dos trabalhadores da empresa não só como o texto anterior da Constituição previa relativamente à eleição dos membros das CTs mas também em relação à deliberação da constituição das próprias CTs e à aprovação dos respectivos estatutos. Portanto, como disse, penso que ela se autojustifica apenas pela sua leitura.
O Sr. Presidente: - Não estende, porque já o actual texto vai nesse sentido. O texto diz: "[...] deliberam a constituição, aprovam os estatutos e elegem por voto directo [...]"
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Apenas a eleição é que se processará por voto directo. Aquilo que se pretende é que o voto directo e secreto funcione também nos plenários dos trabalhadores para a constituição das CTs e para a aprovação dos próprios estatutos, já que a forma de redacção da própria Constituição permitiria entender que somente a eleição seria por voto directo e secreto.
Por outro lado, o PSD também propõe a eliminação do n.º 3 do artigo 54.º da Constituição, e fá-lo porque entendemos que a hipotética criação de comissões coordenadoras para garantir a intervenção...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ainda não chegámos à apreciação do n.º 3. Estamos a discutir número a número. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Nogueira de Brito quanto a esta questão que resultou da troca de impressões com o Sr. Presidente relativamente à expressão "plenários de trabalhadores".
O Sr. Presidente: - Os plenários e em plenários.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exactamente. É que, tanto quanto pude entender, o CDS tem uma determinada óptica acerca da composição desses plenários e, aparentemente, visa dar inequívoca cobertura constitucional à redução ou circunscrição do universo dos trabalhadores abrangidos. Por outras palavras, o que o CDS visa é dar plena cobertura constitucional à ideia de que as comissões são eleitas pelos trabalhadores permanentes da respectiva
Portanto, o CDS, ao querer alterar esta redacção, visaria forçar as razões constitucionais para que tal entendimento seja consagrado. Ou não será assim? Creio que a discussão sobre isto poderia ter alguma utilidade.
Página 534
534 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, o esclarecimento da questão colocada pelo Sr. Deputado José Magalhães leva-me, desde já, a justificar a relação existente entre as propostas apresentadas pelo meu partido para os artigos 54.° e 55.°
Entretanto, devo dizer que não tomámos posição nesta sede sobre essa questão porque é manifesto que não pode haver na inversão da sintaxe deste n.8 2 qualquer intenção do tipo da que foi expressa pelo Sr. Deputado José Magalhães. Acontece, todavia, que entendemos que sobre esta problemática das comissões de trabalhadores há dois planos a ter em conta: o plano constitucional e o da lei ordinária. Por isso, julgamos que, muito embora a lei ordinária deva fixar o regime das comissões de trabalhadores, ou seja, o seu estatuto e direitos, em termos de legislação ordinária, isso não impede que cada comissão de trabalhadores, no seu âmbito, aprove a sua criação e o seu próprio estatuto, no quadro fixado pela lei ordinária. Consideramos isso como perfeitamente natural, até porque referimos na nossa proposta de substituição do corpo do artigo 55.º que o elenco dos direitos das comissões a fixar pela lei é exemplificativo. É isso o que decorre da utilização da palavra "designadamente" no texto por nós apresentado relativo ao corpo do artigo.
Portanto, não tomamos posição sobre a questão que o Sr. Deputado José Magalhães suscitou. Não tenho de dar nenhuma resposta a essa pergunta, uma vez que da procura desvendar alguma intenção redutora do CDS nesta matéria, para além das intenções espelhadas na referida proposta de substituição.
Em relação ao n.º 2 do artigo 54.°, devo dizer que a nossa proposta de eliminação da primeira parte e alteração da parte final corresponde ao que o Sr. Presidente defendeu. Entendemos que o plenário de trabalhadores é um elemento de um todo orgânico, ao qual também pertencem as comissões de trabalhadores; não existe como ente a se, mas sim para estes precisos efeitos, ou seja, é tido como uma assembleia geral em relação à qual a comissão funciona com funções idênticas às de um executivo. Nessa parte a nossa proposta de alteração corresponde à do PSD. O plenário de trabalhadores deve proceder à eleição dos membros das comissões, por voto directo e secreto, e deliberar sobre a criação das comissões e aprovação dos respectivos estatutos no quadro legal para que aponta o artigo 55.º
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, talvez pudéssemos extrair a seguinte conclusão...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Desculpe interrompê-lo, Sr. Presidente, mas antes de V. Exa. tirar a conclusão gostaria de perguntar ao PSD qual é o seu entendimento sobre esta matéria.
De facto, note-se que a redacção proposta pelo PSD para o artigo 54.° - e o Sr. Deputado que a apresentou só referiu um dos aspectos e não aludiu a este - visa generalizar o uso de voto secreto para tudo o que diga respeito à instituição das CTs entendida em sentido lato.
No entanto, ao operar este efeito, o PSD suprime a noção de plenário dos trabalhadores e utiliza a expressão "dos trabalhadores da empresa".
Ora sabemos que, em termos de interpretação do que haja de entender-se por trabalhadores e direito deles, a Constituição não distingue neste artigo 54.° os trabalhadores segundo o seu vínculo e, designadamente, segundo a durabilidade do vínculo de emprego que tenham. Isto leva naturalmente a que, se atentarmos na redacção numa outra dimensão, se admita que não façam parte do colectivo trabalhadores que não sejam da empresa, isto é, estão a trabalhar nela num determinado momento mas não lhe pertencem como tal. Pode, de facto, acontecer que estejam cedidos a ela a título muito temporário ou "pertencem" a um outro empregador, etc. Contudo, não há nenhuma razão para entender que se deva adoptar uma interpretação restritiva de "trabalhador" como abrangendo apenas o permanente, porque isso significaria integrar nesse colectivo dos trabalhadores da empresa apenas uma parte deles, excluindo aqueles que podem até ser a maioria, ou seja, a quase totalidade dos trabalhadores, por estarem a prazo, por serem tarefeiros, assalariados, etc. As vezes, em certas empresas, são, pura e simplesmente, todos os trabalhadores, como, aliás, sabemos. Se interpretássemos a norma desse modo, estaríamos a erradicar as CTs através da restrição do universo dos integrantes da empresa. Creio que não há nenhuma razão constitucional para fazer essa distinção.
Assim, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado se na proposta de alteração apresentada pelo PSD a noção de trabalhador é restrita ou se, ao invés, é a noção ampla que abrange aqueles que tenham um vínculo com a empresa, independentemente da natureza deste último e desde que não seja uma coisa purissimamente conjuntural.
O Sr. Presidente: - Se bem entendi, o Sr. Deputado José Magalhães defende que todos deveriam ter esse direito, independentemente da natureza do vínculo. É isso?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente. Entendo que não há nenhuma razão para excluir e restringir este direito aos trabalhadores que tenham o mais durável de todos os vínculos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): -Sr. Deputado José Magalhães, penso que a intervenção de V. Exa. refere-nos dois problemas: por um lado, questiona acerca do sentido do termo "plenário" e a razão de seu desaparecimento na proposta de alteração da autoria do PSD; por outro, interroga-se sobre a consideração que poderemos ter no respeitante ao voto directo e secreto dos trabalhadores da empresa, ou seja, se isto é ou não um conceito restritivo.
Vamos então deter-nos no primeiro caso, que tem a ver com os plenários de trabalhadores. Penso, de facto, que quanto a este ponto há três interpretações ou posições.
A primeira é a da Constituição, que define terminologicamente o momento de reunião dos próprios trabalhadores.
A segunda é a que o CDS perfilha, ou seja, é o local onde os trabalhadores são eleitos. Já o PSD não refere a expressão "plenários de trabalhadores", mencionando, ao invés, que as decisões quanto às comissões de trabalhadores no concernente à aprovação dos respectivos estatutos e à eleição dos seus membros são tomadas por voto directo e secreto dos trabalhadores.
Ora, penso que todos aqueles que conhecem a realidade actual das empresas sabem que os plenários de trabalhadores existem, única e simplesmente, para decidir sobre o recurso à greve e à determinação de posições em certas questões candentes. Já quando se trata de votações, etc., os plenários de trabalhadores são um mero pró-forma, abrindo e fechando umas em diferentes locais da empresa. No fundo, quando
Página 535
16 DE JUNHO DE 1988 535
isso acontece entende-se em termos jurídicos que está reunido o plenário de trabalhadores, não tendo, porém, essa reunião nada de semelhante com qualquer plenário. Portanto, é por isso que o PSD retira a expressão "plenário de trabalhadores" da sua própria proposta de substituição do n.º 2 do artigo 54.°
A segunda posição prende-se com o facto de saber se o conceito de empresa é ou não restritivo neste caso, de acordo com a primeira interpretação formulada pelo Sr. Deputado José Magalhães. Quanto a este aspecto, aquilo que penso é que a proposta de substituição atrás referida, quando se refere a "trabalhadores da empresa", está, no fundo, a situar, a balizar e a marginalizar o que entende por aquilo que serão os trabalhadores de uma determinada empresa, isto é, há conceitos que em termos de direito laborai, referidos nomeadamente pela LCT, nos dão a definição de trabalhadores de uma dada empresa. Portanto, não poderemos ser nós, em sede de comissão, a alterar o conceito de trabalhador, a relação que se estabelece entre a entidade empregadora e o trabalhador. É por isso que a proposta de substituição da autoria do PSD não altera em nada a lei ordinária. Pelo contrário, continua a referir ou a considerar como trabalhadores todos aqueles que em termos de LCT são considerados como trabalhadores, mantendo uma determinada posição de subordinação do trabalho como é de todos conhecida em termos jurídicos.
Assim, não haverá nenhuma confusão nesta problemática. Os plenários de trabalhadores desaparecem do texto constitucional pelas razões expostas, porque, hoje em dia, cies não existem praticamente enquanto plenários em concreto, salvo raríssimas excepções - e essas não são para a eleição das comissões de trabalhadores.
A terceira posição que quero referir prende-se com o conceito de trabalhador da empresa. E quanto a isto devo dizer que o nosso entendimento é o que deriva da lei ordinária.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E são todos abrangidos pela lei ordinária, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD):-Posso ler-lhe, Sr. Deputado, o conceito ínsito no artigo 1.° da LCT.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.8 Deputada Odctc Santos.
A Sra. Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, o conceito de trabalhador da empresa usado pelo PSD na redacção da sua proposta de substituição do n.º 2 do artigo 54.º corresponde à noção de trabalhador constante dos artigos 1.° e seguintes do Decreto-Lei n.º 49 408.
O Sr. Presidente: - Se a ideia do PSD não é fazer distinções quanto ao vínculo contratual, teríamos então de entender a sua proposta de substituição no sentido do voto directo e secreto dos trabalhadores da empresa, independentemente do seu vínculo.
Sr. Deputado José Magalhães: está agora a entender a proposta de substituição do PSD?
O Sr. José Magalhães (PCP): -Sim, Sr. Presidente. Porem, quero que fique clarificado esse aspecto porque ele é extremamente relevante e pode ser razoável.
O Sr. Presidente: - Está clarificado, Sr. Deputado. Sendo assim, os únicos problemas que subsistem são os seguintes: o primeiro é saber se se deve referir o termo "plenário" como sujeito ou, ao invés, como órgão; o segundo é se o voto directo e secreto dos trabalhadores da empresa, independentemente do seu vínculo, se deve referir só à eleição ou também à orgânica da criação das comissões e aprovação dos respectivos estatutos.
Ora, esta distinção, constante da Constituição, está de acordo com a tradição, segundo a qual o voto secreto está ligado apenas à eleição de pessoas. Não quer dizer que não se possa estender também a outras entidades, aos estatutos, etc. Acontece que o que está consignado na Constituição foi querido assim. Isto é: tratando-se da eleição de pessoas o voto é secreto; tratando-se de discussão de um estatuto, quanto mais discutido e de braços no ar, melhor. Perante isto, tudo depende de saber se vale ou não vale a pena alterar neste aspecto a Constituição.
A nossa posição, como VV. Exas. já sabem, é que em matéria de direitos dos trabalhadores só se deve alterar o que for absolutamente necessário e justificado. Caso contrário, vamos envolver-nos em polémicas inúteis.
Relativamente a este segundo ponto, temos tendência para confirmar a prática corrente, ou seja, o voto secreto para a eleição das pessoas, o voto normal para o resto. Veríamos, porém, com alguma simpatia, que o plenário dos trabalhadores não fosse encarado como sujeito, mas como órgão. Pretende-se, pois, que fique claro que os trabalhadores da empresa são todos aqueles que trabalham nela, independentemente do vínculo. E digo isto porque o plenário dos trabalhadores não sei o que seja. Sei, sim, o que é uma assembleia geral. E, embora isto seja um pouco datado, poderíamos referir este direito aos trabalhadores e não à reunião dos mesmos.
Não vale muito a pena ir contra a tradição.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, diria que a justificação do voto secreto nesta questão não se prende com a pretensão de se eliminar o mesmo tipo de melindre existente em relação ao voto respeitante à eleição de pessoas. De facto, o que há é uma questão de facilidades, pois uma empresa tanto pode ser uma realidade que abarque meia dúzia de pessoas como, ao invés, muitas centenas, porventura dispersas.
É, pois, mais eficaz prever o voto secreto como uma manifestação efectivamente autentica da vontade dos trabalhadores do que a pura manifestação em plenário com votação por braço no ar. Pode, na realidade, fazer-se assentar a aprovação do estatuto de uma comissão de trabalhadores nos votos de apenas meia dúzia de pessoas, ao passo que o voto secreto daria nesta sede garantias de uma participação mais intensa e, porventura - passe o pleonasmo - mais participada dos trabalhadores da empresa
O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-lo mas, como sabe, o voto secreto é aquele que permite esconder a vontade. Julgo, assim, que não devemos estimular a cobardia no voto. Já nos casos em que há melindres pessoais é a protecção das pessoas visadas que está em causa. Não da pessoa que vota, mas daquela sobre a qual incide o voto.
Quem não tem coragem e frontal idade trate de as arranjar.
Página 536
536 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
No entanto, devo dizer que isto é um ponto de vista pessoal, pelo que também não me repugna nada que se estabeleça o voto secreto no n.° 2 do artigo 54.° Não deixo, todavia, de referir que não vejo uma boa razão para alterarmos o que está previsto na redacção actual do citado preceito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, suponho que neste momento não se trata de uma questão de coragem, mas sim de funcionalização.
O Sr. Presidente: - É uma pequena coragem, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mais do que isso, Sr. Presidente, penso que o que está em causa é a maior facilidade que se dá à possibilidade de votar ou não, se acaso o voto for efectivamente secreto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, em relação à questão da utilização do voto secreto não apenas para os aspectos relacionados directamente com as pessoas, a nossa posição é conhecida. De facto, esta matéria foi amplamente discutida na altura em que a actual lei das CTs, foi aprovada, ou seja, a Lei n.º 46/79, de 12 de Setembro. Sabe-se que a lei no seu artigo 1O.S prevê que as comissões de trabalhadores se rejam pelos estatutos aprovados, nos termos e de acordo com os requisitos estabelecidos nos artigos 2.° a 5.º, ou seja, por voto directo e secreto. É uma solução que na altura desencadeou viva polémica. Consultando as respectivas actas, é possível ver os alinhamentos das votações partidárias em tomo desta questão. Deste modo, não vemos grandes razões para se alterar a Constituição neste ponto. Aliás, a referida lei não foi declarada inconstitucional como VV. Exas. sabem.
Em todo o caso, é nosso entendimento que a opinião emitida pelo Sr. Presidente seria a mais compatível com uma interpretação saudável da Constituição neste aspecto. No entanto, não foi ela que, infelizmente, prevaleceu entre nós, pelo menos até à presente data.
Quanto à possibilidade de se substituir a noção de "plenário" é evidente que não estamos apegados a expressões, mas também não as enjeitamos "por dá cá aquela palha". E, portanto, estimando, acima de tudo, os conteúdos constitucionais e não tanto as formulações, não as tendo por imutáveis, nem por absolutamente fixadas, só por manifesta vantagem de alteração de formulação - o que teria de estar associado a questões de conteúdo -, é que poderíamos propender a considerar favoravelmente a alteração.
Nesse sentido, se os Srs. Deputados do PSD, como aparece enunciado e fundamentado nas intervenções produzidas pela respectiva bancada e, em particular, pelo Sr. Deputado Rui Gomes da Silva, entendem definir o conteúdo, ou seja, o universo dos abrangidos, que é, no fundo, um universo pleno ou plenário, então não haveria virtualmente nenhum inconveniente na substituição da expressão "plenário de trabalhadores" pela noção de trabalhadores como um universo pleno. Com isto não se perderia nada, antes pelo contrário, em termos de conteúdo, e, aparentemente, extrair-se-ia um problema que só existe para o PSD e, em certa medida, também para o CDS, mas por razões que considero mais traumáticas do que tácticas. Aliás, poderia haver razoável vantagem nisso.
Em todo o caso, a consideração final de tal matéria depende dos factores que os Srs. Deputados conhecem.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Mas a expressão "universo pleno" é diferente do termo "plenário".
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em quê, Sr. Deputado? Dir-lhe-ei que é diferente apenas no estatuto e na formalização em termos institucionais desse universo de pessoa, que não é encarado só atomisticamente. Se depois lhe damos o carácter de um órgão ou se lhe facultamos, sem baptismos e formalização orgânica, determinados poderes, isso é uma coisa totalmente diferente. Acontece que o que me preocupava mais não era a questão do estatuto, mas sim da composição, isto é, da delimitação do universo dos abrangidos. E, nesse ponto, a interpretação que nos traz é razoável. Pode, sem dúvida, merecer consagração, uma vez que é "pleno" no sentido que usou e é importante, quiçá mais importante do que a palavra "plenário" no entendimento orgânico. Estamos, assim, perfeitamente disponíveis para considerar esse aspecto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o n.º 3 do artigo 54.º prevê a criação, como faculdade, não como obrigação, de comissões coordenadoras. Acontece que tanto o CDS como o PSD eliminam a previsão dessa faculdade. Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que o PSD elimina o actual n.º 3 do artigo 54.º da Constituição por entender que a sua formulação teve a ver com condições bem localizadas no tempo. Hoje, em dia, entendemos que a reestruturação económica poderá passar pela intervenção das comissões de trabalhadores, considerando cada empresa em termos individuais. E é nesse sentido que alteramos posteriormente a alínea b) do artigo 55.° De facto, não concordamos que a existência de comissões coordenadoras nos apareça como uma cúpula das diferentes comissões de trabalhadores das diversas empresas, uma vez que somos de opinião que estas devem estar vocacionadas para a resolução dos problemas de cada uma das empresas. Por isso, propomos a eliminação do actual n.º 3 do artigo 54.°
O Sr. Presidente: - Penso que o CDS propõe a eliminação do n.º 3 pelas mesmas razões. Não é assim, Sr. Deputado Nogueira de Brito?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sim, Sr. Presidente, elas vão na mesma linha de pensamento, mas são um pouco diferentes. E digo isto porque este n.8 3 pressupõe realmente que as comissões de trabalhadores funcionem através dele como uma organização paralela da organização sindical, vocacionada fundamentalmente para o conflito e para a luta, mas não para a participação e cooperação dentro da empresa.
Entendemos, pois, que a comissão de trabalhadores é fundamentalmente um órgão da empresa, pelo que não faz sentido a existência de organizações de comissões que transcendem o próprio âmbito da empresa, o que não significa que aquela comissão, reduzida ao núcleo empresarial, não possa ter participação em matérias que sejam de carácter geral ou que para ela tenham interesse. O que não se concebe é que haja uma organização de comissões a par de uma outra de cariz sindical e com esta vocação de conflito. A organização sindical tem uma vocação para a defesa de interesses na perspectiva de conflito, ao passo que, em
Página 537
16 DE JUNHO DE 1988 537
nossa opinião, a comissão de trabalhadores é uma realidade profundamente empresarial, sem uma vocação relacionada com o conflito.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois desta verdadeira lição de sindicalismo democrata-cristão, que é talvez uma variante anti-sindicalista, gostaria apenas de dizer que me parece fortemente castradora esta noção que é transmitida pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito do conteúdo da Constituição neste ponto.
De facto, se o objectivo das comissões de trabalhadores é, como reza o n.° 1 do artigo 54.°, a defesa dos interesses dos trabalhadores e da intervenção democrática na vida das empresas, e se constitucionalmente são atribuídos às CTs poderes de participação na elaboração da legislação do trabalho é dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector, bem como a intervenção na reorganização das unidades produtivas e outros aspectos relevantes, se para tudo isto é bom de ver que pode ser relevante a articulação entre comissões de trabalhadores, então a supressão da possibilidade de articulação e a tentativa de atomização da intervenção das comissões de trabalhadores diminuem substancialmente o seu papel, as suas possibilidades de intervenção e o resultado global possível dessa actuação. A Constituição já especifica no n.Q 3 do artigo 54.°, ora em discussão, que a possibilidade de criação de comissões coordenadoras visará a melhor intervenção na reestruturação económica e uma acrescida possibilidade de defesa dos interesses dos trabalhadores. O que é que se receia? Que intervenção na reestruturação económica -intervenção eficaz, admitamos -, é que é possível numa perspectiva atomística? Não repetirei a história das varas e do feixe mas, nesta matéria, a intervenção atomística é excessivamente limitada, sobretudo nos tempos modernos, face à transformação de sectores inteiros (e para quem esteja galvanizado pela problemática do mercado único europeu, não pode deixar de ser sensibilizante!). A transformação de sectores inteiros, a reflexão sobre essa transformação, pode fazer-se com eficácia numa perspectiva atomística? Isto é, pode a CT de uma determinada empresa reflectir utilmente sobre o destino e as perspectivas dessa empresa sem reflectir sobre o destino e a situação do sector? Parece-me difícil! É possível, mas é isolado, é espúrio, é diminuído. A possibilidade de troca de impressões, a possibilidade de acção articulada e conjugada, a possibilidade de criação de uma estrutura de nível superior, é uma necessidade mais do que uma faculdade, é uma necessidade em termos de defesa efectiva de interesses.
É evidente que, também aqui, a Constituição - não sejamos irrealistas - não é o bastante para edificar no terreno da realidade social toda uma pletora de comissões coordenadoras e portanto elas tem a vitalidade de que os trabalhadores sejam capazes, têm a influencia e a capacidade de acção que as organizações de trabalhadores conquistem. Não emana da Constituição, aqui, nenhum diktat nem pode insuflar-se verdadeira vida, aí onde ela não exista, no corpo social. Só que, ao contrário do que o Sr. Deputado Nogueira de Brito parece preocupado em sustentar, a Constituição não visou criar aqui nenhuma máquina de conflito. De resto, a diferença entre as CTs e as associações sindicais não reside no facto de umas serem "máquinas de conflito" e outras "máquinas de pactuação social". A diferença está, sim, na vocação de actuação de umas associações e de outras estruturas, sendo certo que a vocação de actuação das CTs não se define pelo conflito. A visão que o Sr. Deputado Nogueira de Brito aqui nos trouxe é francamente assustada em termos sociais e receosa em termos políticos - de classe, em suma.
Se é verdade que a diferença possível entre as CTs e as associações sindicais reside no facto de os sindicatos serem organizações de trabalhadores de uma certa categoria profissional ou de um determinado sector de actividade, constituídos para defesa dos interesses desses trabalhadores como categoria geral, independentemente da empresa onde trabalham, enquanto as CTs visam a realidade de uma determinada empresa, constitucionalmente não é obrigatória a circunscrição às fronteiras de uma empresa. E essa liberdade de associação das CTs, sujeita ao critério supremo da vida e da capacidade dos próprios trabalhadores, é um valor constitucional a preservar.
É esta, Sr. Presidente, a nossa posição face a propostas de eliminação das comissões coordenadoras que tanto preocupam, hoje como ontem, o PSD e o CDS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.
O Sr. Sousa Lara (PSD): - Pretendia apenas fazer dois pequenos comentários em tomo da eliminação deste preceito, proposta pelo CDS, que têm a ver com a leitura que faço do actual n.° 3 do artigo 54.°
Em primeiro lugar, é evidente que está constitucionalizada a intervenção - pressupõe-se - dos trabalhadores para além das comissões coordenadas. De facto, o inciso "melhor intervenção" significa que existe uma outra intervenção, pelo que não se levanta a dúvida de que a possibilidade de criação de comissões coordenadoras é instituída em paralelo com outras formas de organização para a referida intervenção. Não há dúvida de que há uma concorrência ou uma sobreposição com outras formas de intervenção.
Em segundo lugar, a meu ver, e numa leitura não jurídica, o conceito de reestruturação económica é extremamente transitório e abstracto e, como o Sr. Presidente referiu, tem uma data. E a leitura que se pode fazer deste conceito de reestruturação económica, referenciada a uma data, tem a ver com uma alteração profunda, num certo sentido, da estrutura económica. Num sentido não datado, a reestruturação apresenta-se-me como algo de profundamente transitório. Não podemos permanecer em reestruturação permanente e sistematicamente.
Em consequência, penso que estas duas considerações podem eventualmente justificar a eliminação proposta. Mas também não penso que esta questão constitua um "cavalo de batalha" fundamental.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Sousa Lara, esta possibilidade de intervenção (que, de resto, e posteriormente especificada e desenvolvida no artigo 55.º da Constituição, designadamente quanto à intervenção na reorganização das unidades produtivas) leva a que a lei estabeleça neste momento - se bem que haja outras formulações possíveis e imagináveis - as formulações que devem ser tidas em conta. De facto, a lei ordinária prevê a obrigatoriedade de parecer prévio escrito das comissões de trabalhadores em relação a actos como a celebração de contratos de viabilização ou de contratos-programa, a disso-
Página 538
538 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
lução da empresa ou declaração de falência, o encerramento de estabelecimentos ou de linhas de produção, medidas de que resulte uma diminuição sensível dos efectivos humanos da empresa ou um certo agravamento - agravamento substancial, diz a lei - das condições de trabalho, o estabelecimento do plano anual de férias, a alteração de unidades de trabalho, as mudanças de local de actividade da empresa ou estabelecimento - o que não é pouco importante -, a aprovação dos estatutos de empresas do sector empresarial do Estado e das respectivas alterações, a nomeação de gestores para o sector empresarial do Estado, etc. Isto diz respeito às comissões de trabalhadores como tais. Não lhe parece que muitos destes aspectos são de reestruturação económica em sentido lato, aludindo uma realidade passada, mas podendo aludir, e aludem seguramente, a uma realidade futura? Tudo isto tem uma enorme importância na óptica do futuro e na óptica de reestruturações económicas, que serão inevitáveis, qualquer que seja a posição que tenhamos - e temos seguramente posições opostas- quanto à questão do mercado único europeu e das transformações tornadas obrigatórias umas, imaginadas outras e aproveitadas outras ainda por quem gere os destinos do País. Não acha portanto que a norma constitucional tem um sentido renovado? Quanto a mim, não se pode encontrar aqui senão um sentido renovado, na medida em que o conceito constitucional não é um conceito fechado nem puramente apontado para o passado, mas sim um conceito obrigatoriamente virado para o futuro. Não lhe encontra V. Exa. nenhum sentido? Ou é apenas uma teima em relação a uma noção constitucional?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.
O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Deputado, penso que V. Exa. tem efectivamente razão quando refere que se trata de áreas importantes sobre as quais os trabalhadores devem expressar os seus pontos de vista e contribuir para a resolução dos problemas que se apresentem. Simplesmente, parece-me que no n.º 3 se propõe uma duplicação estrutural, através da qual os trabalhadores podem eventualmente - a questão está de certa forma posta em termos facultativos - expressar as suas opiniões. É na medida em que me parece ser supérfluo que justifico a eventualidade da supressão deste preceito. Mas, como já disse, não faço desta questão um "cavalo de batalha".
Deveria talvez ter feito uma introdução, que me parece útil, e que é a seguinte: a minha postura, e suponho que a postura do PSD, é a de, tanto quanto possível, simplificar o texto constitucional, expurgando-o de tudo aquilo que tem de supérfluo. E não veja nada mais, nem por estar a referir este princípio nesta sede, para além das minhas próprias palavras. Nessa medida, e na medida em que isto me parece supérfluo relativamente às outras estruturas através das quais os trabalhadores podem manifestar as suas posições, tanto nas áreas que referiu, como noutras, justifica-se, creio eu, a supressão deste preceito. Mas - repito - não faço disto "cavalo de batalha".
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sr.5 Maria da Assunção Esteves (PSD): - Pretendia dizer ao Sr. Deputado José Magalhães que a interpretação que faço desta supressão não se limita propriamente à noção de supressão. E isto porque, em primeiro lugar, o facto de no nosso projecto se eliminar o n.8 3 não impede que eventualmente os trabalhadores se possam constituir em comissões, espécies de comissões coordenadoras, no âmbito da liberdade de associação e como corolário dos direitos dos trabalhadores. Se o Sr. Deputado quiser reflectir um pouco, chegará à conclusão de que esta supressão não constitui um impedimento perceptivo da criação de comissões coordenadoras, pelo que não há que temer qualquer limitação nessa matéria.
Relativamente a uma questão que colocou ao Sr. Deputado Nogueira de Brito - e espero que daqui não depreenda qualquer forma de criação ideológica do anti-sindicalismo -, se é verdade que eu não quedaria a distinção entre sindicatos e comissões de trabalhadores pela sua vocação ou não para o conflito, já é também verdade que - temos de admitir - os direitos dos trabalhadores em se constituírem em comissões de trabalhadores são direitos situados no quadro da empresa ou do estabelecimento, contrariamente ao que acontece com o direito de associação sindical. Nesse sentido, é de ver se não será de certo modo despiciendo, se dada essa limitação, digamos, espacial ao estabelecimento ou à empresa, este alargamento constitucional à criação de comissões coordenadoras não será de certo modo inutilizado na prática. Coordenar o que? Em que espaço? Os direitos das comissões não são de facto definidos no espaço do estabelecimento ou da empresa? E, se mesmo assim se entender que há alguma coisa para coordenar, a Constituição não será, com esta supressão, um obstáculo a que essas comissões se constituam, por virtude da liberdade de associação e do corolário do próprio direito de constituição de comissões de trabalhadores.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A Sr.- Deputada Assunção Esteves equaciona aqui uma questão que não e despicienda em boa fé negociai, qual seja a das implicações de determinadas supressões. É evidente que estou ciente de que a supressão da cláusula alusiva à existência constitucional de comissões coordenadoras de CTs não impediria a criação de CTs, nessa forma de associação. Isto é, se bem que pudesse continuar a prever-se no terreno da lei ordinária a existência de CTs coordenadas, aconteceria contudo algo que não é, apesar de tudo, despiciendo. Em primeiro lugar, ocorreria a eliminação da categoria e do conceito constitucional "comissões coordenadoras de comissões de trabalhadores". É um primeiro aspecto, no que não vemos absolutissimamente nenhuma vantagem visto tender a um confinamento das comissões de trabalhadores ao universo, ao espaço - como a Sra. Deputada disse com propriedade - da empresa. E sucede que entendemos que se alguma coisa avulta é a importância de transcender o espaço da empresa, sobretudo na óptica das reorganizações das unidades produtivas. O próprio Govêrno reconhece a importância não do planeamento mas do seu "miniplancamento", o PCEDED e outros instrumentos do tipo, o que tudo aponta para a integração da actividade macroeconómica e dos agentes económicos dentro dos horizontes e das fronteiras que a macroeconomia define. Se assim é, a proposta do PSD não é inocente na medida em que obtém uma supressão a troco de uma mão cheia de nada, a troco de uma mão cheia de aquilo que a própria lei ordinária poderia vir a estabelecer em termos restritivos, mais restritivos do que aqueles que hoje são consentidos. Ou seja, a lei ordinária poderia estabelecer restrições mais fortes do que aquelas que hoje existem, sendo certo que hoje, por exemplo, se prevê, no artigo 32.° da Lei das CTs, que o direito de intervenção
Página 539
16 DE JUNHO DE 1988 539
na reorganização das unidades produtivas seja exercido através das comissões coordenadoras de CT, quando se trate da reorganização de unidades produtivas do sector de produção a que pertença a maioria dás empresas cujas comissões de trabalhadores sejam coordenadas por aquela comissão. E fá-lo por razões de eficácia, que nós entendemos serem respeitáveis. Idem aspas quanto ao direito de participação na elaboração de legislação de trabalho: o artigo 34.° da Lei das CTs prevê que as comissões de trabalhadores, directamente ou por intermédio das respectivas comissões coordenadoras, tenham o direito de participação na elaboração da legislação de trabalho, nos termos da lei aplicável. E idem, idem, aspas, aspas, em relação à participação na elaboração dos planos económico-sociais.
Sra. Deputada, a proposta do PSD não é inocente, como veremos quando chegarmos à discussão do artigo seguinte, referente aos poderes das CTs, preceito em que o PSD passa à eliminação dos poderes em muitas destas áreas. Portanto, não nos digam aqui, em tem sorridente, que não pretendem prejudicar no que quer que seja e que não desejam beliscar a "epiderme sensível" das comissões coordenadoras, porque aquilo que preparam não é uma beliscadela, é verdadeiramente uma nódoa negra. E é essa nódoa negra que nós não podemos coonestar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, a eliminação das categorias nunca é arriscada quando o direito continua aqui inequivocamente consagrado. E o problema do artigo 54.°, que referi, é diferente do artigo 55.°, o que veremos quando discutirmos este último preceito.
O Sr. Presidente: - Devo concluir que este é dos tais problemas, das tais alterações, que talvez não valham a pena. Este pecado, segundo os proponentes, não e um pecado original mas um pretenso pecado da primeira revisão, pelo que estaríamos a rever o revisto. Se é um texto datado, é-o de uma data em que já não estávamos tão dominados pelas preocupações que, neste domínio, impuseram algum cariz à Constituição originária.
A criação das comissões coordenadoras correspondeu a uma exigência dos sindicatos, do sindicalismo em geral e não de um sector do sindicalismo em especial, no sentido de que ou arranjávamos um órgão de coordenação das comissões, sobretudo das empresas com estabelecimentos dispersos pelo todo nacional, ou a confusão poderia dar pior resultado do que a tentativa de organizar um entendimento entre elas.
Por outro lado, quanto à reorganização por sectores, existem sectores e situações em que vale mais a pena criar quadros e órgãos para que os trabalhadores se entendam do que aceitar as consequências resultantes de não poderem dialogar. Qual é a vantagem desta supressão? Como é óbvio, os trabalhadores podem sempre criar comissões coordenadoras. Mas não poderiam obter, sem o n.º 4, a atribuição a essas comissões ou a esses membros do estatuto dos delegados sindicais. De facto, com a actual previsão pretende-se que os membros das comissões coordenadoras tenham o estatuto dos delegados sindicais. Porque fazerem as comissões coordenadoras fazem as que quiserem e coordenam como quiserem. É o princípio da livre auto-organização, amplamente reconhecido.
Quais os resultados práticos da eliminação das comissões coordenadoras que não seja um barulho infernal e inútil? Se não estivessem já consagradas, talvez tivesse sentido discutirmos a sua consagração. Mas já estão previstas! E ao eliminarmos essas comissões, sobretudo sem as ouvir, sem uma palavra dos sindicatos, eliminaríamos um direito adquirido. Dizermos-lhes agora: façam as comissões que quiserem mas lá direitos é que não têm! Repito que não vale a pena criarmos situações de conflito que não se justifiquem por razões suficientemente sérias. E esta razão não me parece sê-lo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, penso que a questão daqui emergente...
O Sr. Presidente: - Também devo dizer que, se desaparecerem da Constituição, não ponho luto...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, praticamente até nem teria por quem pôr luto...
O Sr. Presidente: - Teria, teria...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, não teria, Sr. Presidente...
O Sr. Deputado José Magalhães levantou há pouco o véu do dinamismo social desta matéria. Alguma coisa está efectivamente por detrás desta falta de dinamismo, que não existe, por exemplo, em relação a outros movimentos. Digo que V. Exa. não tem por quem pôr luto porque esta realidade das comissões coordenadoras praticamente não existe.
O Sr. Presidente: - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, Sr. Presidente. Ela leva a caracterizar...
O Sr. Presidente: - O que leva a distingui-las, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, nós propomos essa eliminação porque, ao caracterizá-las como organizações que transcendem a empresa, ela descaracteriza o que são as comissões de trabalhadores. É só por isso! Nessa perspectiva, sito, de facto, tilo pouco naturais que existem em reduzidíssimo número e têm uma escassa intervenção.
Também entendo que os sindicatos não iriam chorar nenhuma lágrima pelo desaparecimento desta realidade, que é a comissão de coordenação das comissões de trabalhadores, que não fossem lágrimas de crocodilo e que consideram isso como uma duplicação sem sentido da sua própria organização.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, penso que a objecção que V. Exa. levantou não tem muito sentido. Isto porque se pressupõe que os membros das comissões coordenadoras são também membros das comissões de trabalhadores e, portanto, gozam da protecção estabelecida pelo n.° 4. Ou seja, as comissões coordenadoras são comissões coordenadoras de comissões de trabalhadores. Não tem, pois, muito sentido que os membros dessas comissões coordenadoras não sejam cies próprios ... membros das comissões de trabalhadores.
Página 540
540 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente: - Não se diz aqui que eles têm de ser membros das comissões de trabalhadores, Sr. Deputado. A Constituição não o diz. Pode ser que o diga a lei ordinária.
Tem a palavra a Sr.1 Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais da oradora)... o artigo 56.° é capaz de salvaguardar essa situação, já que se refere a todos os representantes dos trabalhadores.
O Sr. Presidente: - O n.° 3 do artigo 56.° da Constituição refere:
A lei assegura protecção adequada aos representantes eleitos dos trabalhadores contra quaisquer formas de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, mas não tem de ser representantes sindicais.
O Sr. Presidente: - Sra. Deputada, o que está em causa é o exercício das funções, a protecção legal, o que e diferente.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é por acaso que a lei "já pôs pó" no terreno que o Sr. Deputado Pacheco Pereira agora percorre. O artigo 75.° da Lei das CTs distingue claramente o estatuto e a situação dos membros das CTs e o estatuto e a situação dos membros das comissões coordenadores. Aliás, estabelece, cautelosamente, que a composição de cada comissão coordenadora não pode exceder o número das CTs por ela coordenadas até ao limite máximo de onze membros. Depois, a alínea c) do n.° 1 do artigo 20.º estabelece que para o exercício da actividade disporão de credito de horas de entre o horário normal de trabalho cada um dos membros das seguintes entidades e não inferior aos seguintes montantes:
c) Comissões coordenadoras - 50 horas mensais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, penso que já estamos esclarecidos.
Em relação ao artigo 55.°, o melhor é discutirmos proposta por proposta. São muitas as alíneas, umas são eliminadas e outras introduzidas ...
Vamos passar à análise da proposta do CDS, segundo a qual "a lei definirá o estatuto e direitos de participação das comissões de trabalhadores, garantindo-lhes designadamente: [...]". Portanto, há aqui um mínimo e remete-se o resto para a lei. A Constituição define ela própria quais são esses direitos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - De facto, esse parece-me ser um método errado; este método "regulamentar" da Constituição parece-nos, efectivamente, errado. Entendemos que deve haver aqui um espaço aberto à legislação ordinária.
No que diz respeito aos direitos, os enunciados na proposta do CDS são o mínimo e, portanto, a preocupação que há pouco foi manifestada não tem razão de ser. O que é que o CDS faz? Na alínea a), conjuga alguns desses direitos na perspectiva da participação, que foi a expressão adoptada para a definição do próprio objectivo da comissão de trabalhadores. Não faz referência ao controle de gestão porque entende que ele é a expressão acabada do que seja uma intervenção não participativa na vida da empresa. Admite que possa haver participação na elaboração da legislação do trabalho, o que não é incompatível com a tal atomização na fase de discussão pública a que, por exemplo, está sujeita a legislação laboral.
Portanto, é este o sentido da nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, mas é que também substitui o conceito de "controle de gestão" pelo de "acompanhamento de gestão". Estabelece o direito das organizações a serem ouvidas, mas deixariam de participar na elaboração dos planos económicos e sociais. Nos lermos desta proposta, elas participariam só na elaboração da legislação relevante e no quadro das suas funções.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, isso também tem a ver com o alcance e com o sentido que reservamos ao plano como instrumento de intervenção.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães,
O Sr. José Magalhães (PCP): -Não há mais propostas, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, como neste caso há um cruzamento de alíneas, podíamos discutir proposta a proposta.
Neste momento está, portanto, a ser analisada a proposta do CDS.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte entendemos que essa é uma solução péssima, embora percebamos, naturalmente, qual a motivação apresentada agora pelo CDS. Ela insere-se numa filosofia de alargamento da margem de conformação legislativa de direitos fundamentais dos trabalhadores e das suas organizações. O CDS pretende remeter -assim reduzindo a margem de auto-organização das organizações de trabalhadores - para a lei ordinária a definição do estatuto e dos direitos de participação das CTs. Não nos parece que daí possa vir senão uma catadupa de restrições, uma vez que o CDS nem sequer define limites e parece pretender dar ao legislador - como e evidente, neste caso seria sempre a Assembleia da República, o que em nada nos conforta - poderes acrescidos numa área sensível. Não podemos, portanto, manifestar aqui a nossa adesão. Pelo contrário, manifestamos a nossa frontal discordância com a orientação que o CDS aqui nos propõe.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, percebo as objecções do Sr. Deputado José Magalhães, que são objecções de quem pretende conceber as comissões como órgãos de controle, órgãos nunca comprometidos nas suas intervenções, mas sim órgãos de fiscalização ou de controle.
Página 541
16 DE JUNHO DE 1988 541
Não é essa a nossa intenção. Entendemos que há que não transferir o poder dentro da empresa. Pensamos que devemos associar ao exercício dos órgãos de poder na empresa a participação responsabilizada dos trabalhadores. Há aqui uma clara diferença que não queremos escamotear. E é uma diferença de concepções que está na base da nossa oposição ao PCP. Portanto, a nossa 'proposta é realmente diferente.
O Sr. Presidente: - Penso que vamos encontrar esta diferença de concepções mais adiante.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exacto, Sr. Presidente.
Simplesmente, há um mínimo de direitos que impomos ao legislador que defina como direitos das comissões de trabalhadores.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à análise da proposta do PCP, cuja alínea c) pretende conferir às comissões de trabalhadores o direito de intervirem nos processos de introdução de novas tecnologias.
Esta proposta introduz também nova alínea, que garante o direito de estes intervirem nos processos disciplinares e naqueles que envolvam redução de pessoal.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que haveria vantagens em que o conteúdo desta disposição constitucional sofresse uma explicitação que tivesse em atenção a questão da introdução de novas tecnologias.
A atitude dos trabalhadores em relação à introdução de novas tecnologias não é de hostilidade. As novas tecnologias podem desempenhar um papel importante, designadamente nos acréscimos de produtividade, podem facultar melhores resultados e podem ter grande importância para a própria viabilização das empresas, para o processo de modernização das empresas. Não há, obrigatoriamente, uma antítese entre a introdução de novas tecnologias e a defesa dos direitos dos trabalhadores. As comissões de trabalhadores podem nessa medida desempenhar um papel relevante, pronunciando-se, caso a caso, sobre as ideias e os projectos de introdução de novas tecnologias numa determinada empresa ou mesmo num determinado sector, o que poderá ter todas as vantagens, não na óptica da domesticação das comissões de trabalhadores e da sua colocação ao serviço do patronato, mas na óptica do reforço da participação democrática dos trabalhadores na vida da empresa e na economia nacional, nas suas diversas dimensões.
Não é que o actual conceito constitucional, ao referir a reorganização das unidades produtivas, não comporte já certos aspectos que podem precisamente dizer respeito à introdução de novas tecnologias. Creio mesmo que esse poderá ser um dos aspectos mais relevantes da reorganização das unidades produtivas. Nós não a vemos como uma mera supressão de postos de trabalho, encerramentos, sequências de falências e de medidas de destruição. A reestruturação económica pode ser ou pode ter um carácter criativo e inovador, mas, se sublinharmos e enfatizarmos isso, a Constituição resultará explicitada num sentido muito positivo.
Em relação à alínea g) apresentada pelo PCP, gostaria de dizer o seguinte: a intervenção das CTs nos processos disciplinares e naqueles que envolvam redução de pessoal decorre da necessidade de reforço de protecção dos trabalhadores em situações de crise do vínculo laborai. Isto 6, se há algum momento em que a multiplicidade de intervenção pode ser favorável aos trabalhadores - não se restringindo aqui a protecção ou a intervenção às associações sindicais -, é precisamente quando o vínculo é posto em causa pelo desencadeamento de um processo disciplinar ou pela introdução na vida da empresa de outros momentos em que pode estar colocada no horizonte a questão da redução de pessoal. As comissões de trabalhadores podem aqui - é a lei, de certa maneira, já aponta para isso - ter uma intervenção positiva.
Devo dizer que a lei aponta nesta matéria para uma certa margem de intervenção. Essa margem de intervenção deveria ter alguma transposição constitucional. Refiro-me ao n.° 1 do artigo 24.° da Lei das CTs em vigor. Esse artigo aponta, parcialmente, para uma solução que teria aqui uma cláusula constitucional de cobertura bastante satisfatória. Assim haja, naturalmente, vontade e consenso (designadamente por parte do PSD, que está mais empenhado na destruição de direitos do que no seu alargamento), para fazer o aperfeiçoamento que agora é pretendido pelo PCP, com uma preocupação que a todos será transparente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, dado que reconhece que na actual redacção da alínea c), que refere "intervir na organização das unidades produtivas", já se inclui a referência à introdução de novas tecnologias, não pensa que, no mínimo, ficaria melhor se se dissesse "nomeadamente" em vez de "e nos processos de introdução"?
Por outro lado, não lhe parece que "a introdução nos processos que envolvam redução de pessoal" ficaria melhor na alínea c) do que na alínea g), com a qual tem mais afinidades? No fundo, e mais um problema de reorganização da empresa do que um processo disciplinar, já que este pode nem sequer ter lugar.
Terceira questão: refere-se aqui "intervir nos processos disciplinares". O verbo "intervir" não será demasiado indefinido para que a Constituição aponte no sentido de que e de verdadeira intervenção que se trata? Quem é que decide? Quem é ouvido como parte? Quem é que tem legitimidade processual? O que é "intervir nos processos disciplinares"? Não lhe parece que isto poderia ser clarificado no sentido de despertar menos resistências?
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Magalhães exprimiu há pouco na sua intervenção a convicção de que nem toda a reorganização das unidades produtivas ou a introdução de novas tecnologias implicaria a redução do número de postos de trabalho, manifestação de convicção que foi, aliás, apoiada pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação. Que sentido tem esta intervenção, Sr. Deputado José Magalhães? Na concepção que tem e que se espelha nas disposições actuais da Constituição, qual é o conteúdo desta intervenção na reorganização da actividade produtiva e na introdução de novas tecnologias? Que conteúdo é que o Sr. Deputado e o PCP dão a esta intervenção? Será um parecer? Será uma opinião? Será uma intervenção que vai responsabilizar as comissões de trabalhadores? Elas serão ou não responsabilizadas na reorganização adoptada ou na nova tecnologia que vai ser utilizada pela empresa? Gostaria de ser esclarecido sobre esta questão.
Por outro lado, gostaria que me esclarecesse a questão dos processos disciplinares, embora suponha que sobre ela o Sr. Deputado José Magalhães está, no fundo, a reflectir aquilo que hoje se encontra consagrado na lei em matéria de processos disciplinares e de despedimento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
Página 542
542 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, concordo substancialmente com algumas das afirmações do Sr. Presidente, mas não queria deixar de o dizer de viva voz, porque penso que a proposta do PCP em relação à alínea c) é redutora e não ampliativa. Creio que deixar como estava tal alínea seria muito melhor do que introduzir esta alteração. É que há que ter em atenção não só a introdução de novas tecnologias como também, por exemplo, o regresso a velhas tecnologias. E nesse sentido os trabalhadores já não estariam protegidos.
Em relação, por exemplo, à alínea g), creio ser evidente que a redacção proposta pelo PCP é inaceitável, ambígua, equívoca, e que, portanto, nos termos em que está redigida, não merece a nossa aceitação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, a introdução de novas tecnologias sempre foi factor de considerável resistência pelo movimento sindical. É que, na maioria dos casos, essas tecnologias traduziam-se numa diminuição do emprego, pelo menos no período imediatamente posterior à sua aplicação. Como é evidente, todo o pressuposto desta proposta de alteração tem a ver com a manutenção de uma ideia de exercício do controle de gestão, mantendo a exterioridade da actuação das comissões de trabalhadores. Isto e, estas exercem direitos de fiscalização e de veto, mas nunca se co-responsabilizam pelos resultados da sua intervenção, na medida em que eles são considerados como pertencendo ao domínio da acção patronal numa lógica de não colaboração.
Percebo o sentido da proposta, mas da e inaceitável para o PSD, porque colide com outras propostas, como a que diz respeito à alteração da alínea b)do artigo 55°, que substitui o controle de gestão pelo pronunciamento sobre a reorganização das unidades produtivas, ou seja, por um princípio de intervenção cooperativa na gestão das empresas, e não por uma mera acção exterior a essa cooperação, que, no fundo, se exerceria apenas sob a forma de direito de veto no sentido da gestão das empresas. Tenho dúvidas de que se deva dar dignidade constitucional a uma intervenção nos processos de introdução de novas tecnologias, na medida em que isso apenas poderia, na prática, traduzir uma resistência ao direito dos sindicatos e das comissões de trabalhadores de controlar as transformações tecnológicas nas empresas, para além da sua intervenção geral no domínio da reorganização económica daquelas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É evidente que as propostas do PCP não implicam nenhuma alteração do sentido e do alcance do controle de gestão, constitucionalmente estabelecido, nem poderiam coerentemente representar qualquer alteração nessa esfera, nessa matéria. Não deixa de ser, no entanto, curioso observar que haja no PSD posições tão diferentes em relação à questão das reorganizações das unidades produtivas e em relação à visão do papel dos trabalhadores nesses processos reorganizativos. É curioso que, da parte do Sr. Deputado Carlos Encarnação, seja encarada com benevolência a participação e a atenção das CTs em relação à introdução de novas tecnologias e, da parte do Sr. Deputado Pacheco Pereira, não enquanto PSD, mas como deputado independente, haja uma atitude de resistência a essa intervenção de recusa de aceitação de qualquer intervenção significativa dos trabalhadores em relação às novas tecnologias. Pela nossa parte não vemos, repito, que se possa conceber modernamente â reorganização das unidades produtivas sem ter em conta a questão das novas tecnologias.
O Sr. Presidente terá razão num ponto. Creio eu, a benefício de reflexão ulterior, que à partida será justa a sugestão de que se converta, ou de que se dê carácter enfatisadamente exemplificativo, à cláusula cujo aditamento é proposto pelo PCP. Com isso, não se reduzirá o conteúdo do preceito, ao contrário do que acabou de sustentar o Sr. Deputado Carlos Encarnação, porque, se se reduzisse, o Sr. Deputado Carlos Encarnação deveria coerentemente votar a favor e, tanto quanto me pareceu, não está grandissimamente predisposto a tal coisa.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - A questão não é essa, Sr. Deputado. Eu disse que, na sua lógica, era uma hipótese reducionista. Não estou a dizer se votaria contra ou a favor. O que digo é que, na sua lógica de construção do preceito, era uma hipótese reducionista.
Explico-lhe porque (o que até já fiz, embora em síntese). É que, nesta altura, o problema que se coloca em muitas das empresas portuguesas é o da reconversão da empresa utilizando velhas técnicas, como, por exemplo, técnicas artesanais. Há algumas reconversões de unidades industriais que põem os trabalhadores a praticar, por exemplo, operações de natureza artesanal. Era apenas isto o que eu lhe estava a dizer. É que isto significava uma desprotecção dos trabalhadores em relação àquilo que V. Exa. queria defender.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que a explicitação que faz é saborosa, embora seja amarga para os trabalhadores porque não assenta em mais do que num jogo de palavras. É evidente que, face a esta norma assim redigida, se porventura alguém preconizasse o regresso a velhas tecnologias, seriam novas tecnologias no sentido da norma - seriam tecnologias introduzidas de novo. Tal como o regresso dos velhos senhores pode ser uma "novidade (triste)", o regresso de velhas tecnologias pode ser uma inovação tecnológica - é, sem dúvida, uma ruptura com as tecnologias em vigor num determinado momento. Nesse sentido, repito, seriam novas tecnologias.
Aliás, como sabe, até há propostas de regresso a outras modalidades de trabalho que também lembram o século XIX, designadamente o trabalho aos sábados e domingos - não por acaso, o Diário de Notícias conta a paradigmática história, no seu suplemento económico de ontem, se não estou em erro, daquela entidade patronal da Amadora que, recentemente, num debate televisivo, apareceu gabando-se do facto de ter conseguido esta coisa verdadeiramente espantosa - é um patrão "moderno", com uma concepção "diferente" da empresa! - convenceu os trabalhadores a trabalhar ao domingo e sem horário, porque assim conseguem dar resposta ás carências da empresa em termos mais adequados. É esta a noção da empresa com a qual se pretende inserir Portugal, de pleno, nas Comunidades Europeias - com conceitos de estratégia empresarial agressiva, "nova", feita naturalmente à custa da sobreexploração dos trabalhadores. Este é um conceito, neste caso não de velhas tecnologias, mas de velhas modalidades de exploração dos trabalhadores, das quais discordamos completamente.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Não tem nada a ver com aquilo de que estávamos a falar.
Página 543
16 DE JUNHO DE 1988 543
O Sr. José Magalhães (PCP): - Obviamente, aludo a um fenómeno que, só por paralelo, é que tem a ver com aquele que o Sr. Deputado Carlos Encarnação referiu.
Sr. Presidente, em relação à sugestão feita quanto à melhor inserção de norma proposta sobre redução de pessoal, esta redução pode inserir-se ou significar uma reorganização, de certo modo, e nesse caso poderia ter cabimento. Vamos ponderar naturalmente a sugestão.
Em relação à noção de intervenção, creio, talvez valha a pena procurar alguma margem de explicitação. Não creio que possamos utilizar a expressão num sentido diferente daquele que, já hoje, consta do artigo 55.°, alínea c) - quando aí se refere o direito de as CTs intervirem na reorganização de unidades produtivas, quer com isso significar uma certa capacidade de influenciar as decisões finais do empregador ou da entidade que a ele deva ser equiparada.
O Sr. Presidente: - Quando falei no verbo, era o verbo relativo aos processos disciplinares e não á reorganização. Isso já cá está.
O Sr. José Magalhães (PCP):-Eu sei, Sr. Presidente, mas nós utilizámos a mesma expressão, o mesmo verbo exacto que é utilizado na alínea c), que prevê a intervenção na reorganização.
O Sr. Presidente: - Mas são realidades muito diferentes! Uma coisa é um processo judicial, ou disciplinar, outra um processo administrativo de reorganização do trabalho numa empresa. São realidades distintas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, o sentido é exactamente o mesmo do artigo 55.Q, alínea c). Isto é, não e, como V. Exa. sabe, o de uma intervenção com carácter vinculativo, alterador do conteúdo da decisão da entidade patronal, empregadora ou equiparada; é um poder não só de ser ouvido, como de influenciar, numa determinada medida, que deve ser projectado na fundamentação, designadamente da decisão final, pela entidade que é o dominus do processo.
O Sr. Presidente: - É que, se V. Exa. aceitar substituir "intervir" por "ser ouvido", o resultado é completamente diferente.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E com toda a franqueza lhe respondo que estamos inteiramente disponíveis a considerar a hipótese de viabilização do aditamento de um quid ao conteúdo actual, desde que seja um mais em relação ao conteúdo actual. Se V. Exa. me diz que não quer o muito mais mas quer o mais, devo dizer que eu quereria o muito mais mas aceitarei de bom grado o mais.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Em relação à vossa redacção agora proposta.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Nesse caso, isso implicaria aceitar alterações à alínea b) do artigo 55.°, na medida em que teria de se modificar a ideia de exercício do controle para a compatibilizar com as outras fórmulas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas porque?
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Porque exercer o controle e ouvir não são a mesma coisa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A comissão exerce o controle e, quanto à questão dos despedimentos ou dos processos disciplinares, tem o direito de ser ouvida - não há contradição nenhuma entre uma coisa e outra. Não nos proponham, a troca do mais por um zero - seria péssimo negócio. A nós, não nos horripila, como ao Sr. Primeiro-Ministro, a alusão à expressão "negócio", embora não vejamos a revisão constitucional como um negócio, também não a vemos como um ócio - pelo trabalho que está a dar, vê-se bem porquê.
O Sr. Presidente: - Nec otium! Vamos agora à proposta do PSD, que, fundamentalmente, se resume no seguinte: na alínea a), ficaria só "receber as informações"; na alínea b), em vez de "intervir", "pronunciar-se"; na alínea c), em vez de "participar", "pronunciar-se"; mais abaixo, seria "promover a eleição para os órgãos de fiscalização" e não "para os órgãos sociais". Temos em causa três conceitos: o actual - "intervir" -, o de há pouco e de agora - "participar" - e o de só agora - "pronunciar-se". São três conceitos graduados do mais para o menos; é sobre eles que vamos ter de nos entender.
Para defender a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Contamos com o PCP para enriquecer as razões da nossa proposta. Tentemos justificar ou, simplesmente, enumerar as alterações que o PSD apresenta neste artigo 55.º: pensamos que da intervenção se deverá caminhar no sentido da reorganização, como aliás se diz na própria proposta, deixando de intervir na organização das unidades produtivas e pronunciar-se sobre a reorganização das unidades produtivas; na alínea e), deixamos de ver referidos "órgãos sociais", para passar a constar da própria norma constitucional "órgãos de fiscalização das empresas", porque entendemos que nos órgãos sociais deverá haver uma noção restrita da fiscalização a exercer pelas próprias comissões de trabalhadores; eliminamos o controle de gestão nas empresas, por entender que, hipoteticamente, este entendimento, sem ser contra o controle de gestão - tal qual o entende o PSD - ou contra a autogestão - quaisquer que sejam as formas que venha a assumir, nomeadamente nos termos da lei ordinária - poderá "violar" algumas disposições da própria lei ordinária, nomeadamente em relação à gestão das próprias sociedades, qualquer que seja o tipo com que ela se nos apresente. Muito rapidamente, é esta a justificação do PSD em relação às propostas que apresenta.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não percebi: a Constituição viola as disposições da lei ordinária relativas aos poderes das empresas?!
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Não, Sr. Deputado, não disse isso. O que eu disse é que haverá determinados sentidos do controle de gestão das empresas, tal como poderão ser entendidos, da Constituição, que poderão "violar" de alguma maneira algumas normas - "violar" não será bem o termo, não quereria dizer "violar" -, poderão estar em contradição com algumas normas daquilo que se entende por actuais poderes de gestão em termos societários. Portanto, o controle de gestão deverá ter outra vertente, outra aplicação que não esta aqui referida. Por isso a nossa proposta de eliminação.
Página 544
544 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Gostaria de colocar algumas questões ao Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
Percebi o sentido da proposta do PSD, que, aliás, em alguns aspectos é coincidente com a proposta do CDS. Mas pergunto-lhe o seguinte: porquê esta redução do poder das comissões de trabalhadores de se pronunciarem sobre a legislação do trabalho? Pensa o PSD que a legislação do trabalho será o sector legislativo mais adequado à normal actividade das comissões de trabalhadores? Ou será melhor como o CDS diz, ou seja, a participação na "elaboração da legislação relevante no quadro das suas funções"?
Por outro lado, quanto às observações que fez em relação aos poderes de controle das comissões de trabalhadores e aos poderes de gestão da própria realidade empresarial, entendidos tais poderes de controle como uma limitação dos poderes de gestão da própria empresa ou uma tentativa de limitação da fiscalização exterior, em nome de outros interesses que não os da empresa e dos seus poderes de gestão, pergunto-lhe se isso é compatível com a manutenção desses poderes em relação à gestão das obras sociais ou se não seria mais adequado poderem participar ou ser ouvidas na gestão das mesmas obras sociais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr José Magalhães (PCP): - O PSD explicita abertamente as razões que o levaram a propor o que propõe. No entanto, em relação à primeira das propostas creio que ou há obsessão ou há confusão porque, quanto à alínea a), o PSD limita-se a eliminar o inciso "todas". Não sei qual é o alcance que pretende dar a esta proposta porque, se não, é a mesmíssima coisa, apenas impressiona o PSD o carácter um Limo "totalitário" da alusão decorrente da palavra "todas", que todavia é uma bela palavra, é uma palavra catita, não podendo significar que o patronato seja obrigado a devassar completamente os seus segredos. Ainda ninguém sustentou essa lese, que seria aberrante: a norma tem o significado, que lhe e comummente atribuído, de que devem ser fornecidas todas as informações necessárias ao exercício da sua actividade. Como a finalidade das CTs, a sua finalidade nobre, e o exercício do controle de gestão, para que este seja eficaz, e na medida exacta da sua eficácia devem ser-lhes facultadas as informações necessárias e adequadas. A norma não quer dizer outra coisa. O PSD, aparentemente, visu reduzir-lhe o alcance, dar aqui a base para que a lei ordinária venha estabelecer restrições, mais do que as que já estabelece - só posso ver aí algum sentido útil, ou então isto e inteiramente redundante e, mais do que luxuoso, enchundioso.
Mas a questão colocada pela alínea b) e mais grave e mais relevante - visa-se suprimir pura e simplesmente qualquer forma de controle de gestão; elimina-se expressa, directa, aberta e totalmente o controle de gestão, com todas as implicações. O PSD acha isso bom, do ponto de vista ideológico, porque "desideologiza": essa é a sua batalha - nós achamos que muito ideologicamente o define e, pela nossa parte, opomo-nos à retirada da Constituição de lodo o conjunto de disposições que consagra o controle de gestão e designadamente esta que o enuncia, com todas as implicações que conhecemos. Trata-se de uma norma que pode ser restringida apenas de acordo com as regras constitucionais: tem o estatuto, a protecção e o grau de vinculatividade e eficácia que todos conhecemos, foi inserida nesta sede na primeira revisão constitucional - aliás, com o voto do PSD. Trata-se de um passo atrás, mas não é um pequeno passo atrás, é um grandíssimo passo atrás e isto queria sublinhar: não há passo deste atrás sem dois terços de revisão constitucional. Portanto, a questão da obtenção desses dois terços é a questão chave, aqui como noutros sítios, mas aqui é. uma questão central, é uma questão fulcral. Era isto que gostaria de sublinhar.
Em relação às outras alíneas, é evidente que o PSD visa restringir seriamente o alcance da intervenção das CTs (já sem controle de gestão, "naturalmente"!). Mesmo fora desse quadro, pretende restringir adicionalmente a margem de intervenção das CTs, arredando-as do planeamento económico e social. É evidente que tomando-se as normas constantes do projecto do PSD, quanto ao planeamento económico e social, rapidamente se descobre que para o PSD não há planeamento económico-social e que todo o conjunto de disposições constitucionais alusivas ao Plano é, pura e simplesmente, reduzido à sua expressão, não mais simples, mas mais simplória, isto é, mais desprovida de alcance e de conteúdo. O legislador ordinário ficaria de mãos livres para fazer os seus PCEDEDs, PDESRESDs e outros instrumentos de pscudoplaneamcnlo, sem ter de se incomodar com essa realidade terrível, que são os trabalhadores, e com essa organização, extremamente incomodativa, que são as comissões de trabalhadores.
Lamentavelmente, Sr. Presidente, não ignoramos - nenhum de nós ignora - que a lei ordinária já neste momento dá escassa razão a este direito constitucional das CTs. O artigo 35.º da Lei das Comissões de Trabalhadores prevê que as CTs participem na elaboração dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector ou região plano e participem nos órgãos de planificação sectorial ou regional "nos termos da lei aplicável". Mas como todos sabemos, a lei aplicável não existe e o planeamento sectorial ou regional em Portugal é uma nulidade. Isto é, o edifício previsto na Lei n.º 31/77, designadamente na parte em que ela previa a criação de regiões plano, e uma inexistência jurídica, com graves inconvenientes para o País, seguramente. Um dos quais, e não dos menores, é o facto de serem apresentadas em Bruxelas, com o nome de "planos regionais", coisas inteiramente confeccionadas em gabinetes, sem a mínima expressão, sem a mínima participação de quem quer que seja, salvo dos burocratas e dos membros ligados ao Governo e aos amigos respectivos, baptizando-se o produto de tudo isso pomposamente. As comissões de trabalhadores são inteiramente alheias aos processos de elaboração desses instrumentos, cuja propriedade, utilidade e pertinência são também nulas. Mas isso constitui uma outra questão, que tem a ver com o desnaturamento do planeamento democrático, matéria que poderemos abordar em altura mais apropriada.
Verifico também, Sr. Presidente, que, em relação à promoção da eleição dos representantes de trabalhadores para os órgãos sociais de empresas pertencentes ao Estado ou outras entidades públicas, o PSD visa restringir a representação dos trabalhadores aos órgãos de fiscalização. Trata-se de um efeito de limitação da possibilidade de intervenção dos trabalhadores, que se pode compreender numa óptica de adversão, de animadversão em relação aos trabalhadores, mas que, pela nossa parte, não poderíamos, a título nenhum, coonestar.
Creio que a discussão sobre esta matéria pode revelar as significativas diferenças de posicionamento que existem nesta matéria, bem assim como um grandíssimo non liquet. Porque se houvesse, nesta matéria, um liquet, um acordo para dois terços, isso seria muito inquietante para os direitos constitucionais dos trabalhadores portugueses e motivar-nos-ia fundíssimas preocupações.
Página 545
16 DE JUNHO DE 1988 545
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Pretendia responder muito rapidamente às duas questões colocadas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito e às três questões colocadas pelo Sr. Deputado José Magalhães.
A primeira questão, colocada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, prende-se com a relação existente entre a alínea b) da proposta do CDS, nomeadamente quando refere a "elaboração da legislação relevante no quadro das suas funções", e a alínea c) da proposta do PSD, onde se estabelece que as comissões de trabalhadores deverão "pronunciar-se, nos termos da lei, sobre as iniciativas legislativas em matéria de trabalhão que contemplem o respectivo sector". Sr. Deputado, penso que poderemos chegar à conclusão de que defendemos ambos a mesma coisa (ou de que a proposta do CDS é mesmo mais restritiva do que a do PSD).
Como aliás referi na minha primeira intervenção, o Sr. Deputado José Magalhães ajudou a justificar a proposta do PSD. É evidente que o nosso entendimento dos planos económicos e sociais leva-nos, de alguma maneira, a retirar a expressão "planos económicos e sociais" da Constituição. Nessa medida, entendemos que as comissões de trabalhadores deverão pronunciar-se sobre as iniciativas legislativas em matéria de trabalho. Aquilo que se poderá retirar da proposta apresentada pelo CDS é que a "legislação relevante no quadro das suas funções" poderá ter o entendimento tão restritivo que as comissões de trabalhadores se limitem a responder ou a participar em legislação única e exclusivamente no quadro das próprias comissões de trabalhadores. Poder-se-á objectar que a expressão "participar" vai mais além do que "pronunciar". Poderá ser uma interpretação, mas, de qualquer forma, em termos objectivos e sem levar a interpretação literal às últimas consequências, poderemos entender que também a "legislação relevante no quadro das suas funções" é, nomeadamente, a matéria de trabalho. Em consequência, as comissões de trabalhadores, quer num, quer noutro caso, pronunciam-se sobre matérias de direito de trabalho.
A segunda referência feita pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito tem a ver com "gerir ou participar as obras sociais da empresa". Como é evidente, entendemos que, muitas vezes, as comissões de trabalhadores poderão, pelo interesse social que representam, estar vocacionadas para gerir as obras sociais da própria empresa. É essa a razão pela qual o PSD permite na própria Constituição a hipótese de as comissões de trabalhadores poderem "gerir ou participar na gestão". Isto é, consideramos as duas hipóteses, a gestão e a participação na gestão.
Em relação ao Sr. Deputado José Magalhães, penso que as suas questões estão genericamente respondidas pela minha primeira intervenção. Se o PSD entende que não existe planeamento nos lermos em que actualmente a Constituição o consagra, deverá, evidentemente, retirar essas consequências em termos constitucionais, pelo que o eliminará da alínea d) do actual artigo 55.°
Penso que também já me pronunciei sobre a limitação de fiscalização.
Quanto à eleição de representantes dos trabalhadores para os órgãos sociais das empresas pertencentes ao Estado ou a outras entidades públicas, é evidente que, se as comissões de trabalhadores são de carácter fiscalizador, não há justificação para que tenham um objectivo de gestão da própria empresa. Consequentemente, em nosso entender, as comissões de trabalhadores elegerão os seus representantes só para os órgãos de fiscalização e é nesse sentido que fazemos a alteração.
Por último, relativamente ao controle de gestão, o Sr. Deputado referiu tratar-se de uma norma restritiva. É evidente que sim. Pelo facto de desaparecer o controle de gestão da Constituição, não se impede que as comissões de trabalhadores, trabalhadores, individualmente ou em lermos colectivos, sem se reunirem em comissões de trabalhadores, exerçam controle de gestão, exerçam ate a própria gestão, sob a forma cooperativa, sob qualquer forma pela qual entendam organizar-se. Mas entendemos que, tal como em relação a outras normas - e estava a lembrar-me precisamente das comissões coordenadoras das comissões de trabalhadores -, o controle de gestão não deverá constar da própria Constituição.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Em relação à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de dizer que, neste caso particular, ele próprio, pela ênfase que pôs nos dois terços, chamou a atenção para o facto de esta ser uma das questões cruciais na sua interpretação do processo de revisão constitucional. Anotamos essa chamada de atenção, se bem que, evidentemente, não nos seja directamente dirigida.
No que concerne à alínea a) do artigo 55.º, a eliminação da expressão "todas" pode parecer apenas uma pequena alteração semântica. Todavia, essa supressão vai mais longe, na medida em que reforça o princípio da necessidade, ou seja, o facto de que devem ser entregues às comissões de trabalhadores as informações necessárias ao exercício da sua actividade. Nesse sentido, a proposta de alteração do PSD encerra uma restrição semântica e real.
Relativamente ao exercício do controle de gestão nas empresas, não é por acaso que a legislação nunca implementou a alínea b) do artigo 55.° Efectivamente, trata-se da manutenção na Constituição da conquista revolucionária do controle operário de 1975, que daria às comissões de trabalhadores a capacidade de gestão real das empresas. E, como isso entrava em colisão com o funcionamento do tecido económico-social, com a realidade social e ate com o recuo político-sindical das forças que propunham esse controle operário, a sua implementação revelou-se completamente impossível.
Em nome daquilo a que o Sr. Deputado várias vezes chama "a vida", "a realidade", talvez fosse bom ter em conta as virtualidades do controle e de gestão nas empresas, que é uma formulação inteiramente abstracta e impossível de implementar, e a sua substituição por um princípio efectivamente mais redutor de pronunciamento sobre a organização das actividades produtivas, mas que, se exercido completamente, terá com certeza um impacte profundo no modo de funcionamento das empresas e na defesa dos direitos dos trabalhadores, o que, presumo, é aquilo que essencialmente nos preocupa e nos une quanto à participação dos trabalhadores e das comissões de trabalhadores nas empresas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.
O Sr. Sousa Lara (PSD): - Pretendia apenas congratular-me com a natureza da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, que de facto centrou o seu ponto essencial na questão, na opção e no modelo políticos que os partidos aqui representam. Penso que a tecnicidade da discussão não deve fazer esbater a diferença política, o combate ideo-
Página 546
546 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
lógico, sendo muito útil que ele seja debatido aqui. Mas gostaria de ter sido o pai da iniciativa. Tenho pena que se tenha antecipado o que é, no fundo, um apelo ao outro grande partido aqui representado, igualmente com vocação de poder - que queremos ver com essa vocação -, cuja vocação europeia é tão interiorizada, a nosso ver, na necessidade de uma alternativa do modelo estatuído na Constituição quanto ao futuro de Portugal e da nossa economia.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Se o Sr. Presidente desejar, uso da palavra em último lugar. Compreensivelmente...
O Sr. Presidente: - Não faço questão, Sr. Deputado, uso da palavra quando houver oportunidade. Se quiser usar da palavra em último lugar para tomar em conta aquilo que eu puder dizer, terei muito gosto nisso...
O Sr. José Magalhães (PCP): - É compreensível, Sr. Presidente, uma vez que havendo uma tão acesa concorrência entre os Srs. Deputados do PSD para o papel de sereia do PS nesta matéria, não quereria eu, de forma alguma, prejudicar que o PS possa apreciar, serena e isentamente,...
O Sr. Presidente: - Nem sereia, nem acicate...
O Sr. José Magalhães (PCP): -... ao som da campainha que eu tangi, segundo o Sr. Deputado Pacheco Pereira, e tangi com muita honra e por dever político. Cumpro-o gostosamente, porque o que está em causa 6 naturalmente importante.
Em primeiro lugar, o PSD torna a discussão desta matéria bastante mais simples ao explicitar inteiramente o alcance das suas propostas. O Sr. Deputado Pacheco Pereira diz, sem qualquer espécie de anteparo, que aquilo que se visa é reforçar a obrigação de adequação das informações a finalidade das CTs e que, consequentemente, o objectivo da proposta apresentada para a alínea a)& a diminuição dos direitos destas e a limitação da sua margem de actuação.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado confessa e afirma explicitamente que aquilo que se pretende é pôr cobro, liquidar sem reversão possível, todo o sistema, toda a arquitectura, todo o modelo de intervenção das comissões de trabalhadores, propondo um modelo alternativo que se considera, agora na formulação do Sr. Deputado Sousa Lara, "mais apto à realidade e ao modelo europeu". É uma reflexão apaixonante, a de saber se o modelo europeu deverá ser um modelo escravocrata, assente em formas de não participação. Pela nossa parte, não o vemos assim e acreditamos que, a nível europeu, se caminhará para a intensificação de diversas modalidades e formas de intervenção dos trabalhadores. Em Portugal, por força da ruptura revolucionária de 1974-1975, foi possível consagrar constitucionalmente um esquema, um determinado modelo dessa intervenção que, em nosso entender, não deve ser desconstilucionalizado, alterado, suprimido ou mutilado. Afirmar, como fez o Sr. Deputado Pacheco Pereira, que a lei "nunca consagrou" o direito de representação dos trabalhadores nos órgãos de gestão das empresas do sector empresarial do Estado é inteiramente inexacto e constitui uma pura questão de não conhecimento da legislação em vigor. Mas também não faz mal - não é realmente obrigatório, porque a lei não implementou esse direito consagrado no artigo 31.°, isto é, o direito de eleger pelo menos um representante para
o órgão de gestão das empresas do sector empresarial do Estado. Sabemos que em torno desta questão se travou e trava uma batalha que tem passado pelo bloqueamento, por sucessivos governos, da tomada de posse dos gestores eleitos. A história do bloqueamento dessa tomada de posse é seguramente, em termos de luta pela aplicação do direito, uma das mais lamentáveis que é possível imaginar na nossa história recente. Nela se registará uma multiplicação de instrumentos do direito ordinário - alguns bastante pouco nobres e como tal merecedores desse objectivo que utilizei, mas no sentido comum - por parte de determinadas entidades governativas, bem como o impedimento prático, a obstaculização concreta. Noutros casos, há representantes cuja actuação não é despicienda nem negativa. Assim, entendemos que a supressão da cláusula constitucional que permite essa intervenção é, evidentemente, indesejável.
Sr. Presidente, permita-me referir que, em nome da vida, não matamos, nem facilitamos a morte e, designadamente, não facilitamos que, por via constitucional, se procure impulsionar um processo de desmantelamento prático e conquistar para a maioria conjuntural do PSD prerrogativas que da pretende usar no sentido de uma "chacina ordinária" (através da lei ordinária), prerrogativas que hoje são constitucionalmente consagradas.
Por outro lado, gostaria de observar que é muito interessante o facto de o PSD aqui revelar que abandonou, à puridade e aparentemente para sempre, quaisquer laivos de proclamação co-gestionária. Quem folhear os debates da elaboração da Lei das CTs verá que o PSD fez todo esse debate na óptica e sob o estandarte da co-gestão - não encontrou melhor forma de empanturrar o controle de gestão do que a co-gestão. Assim, co-gestionando, desviçava o exercício normal dos direitos de fiscalização que o controle de gestão pressupõe. Procurou amalgamar a co-gestão e o controle de gestão, A Constituição não o permite, a lei não o permitiu. O máximo que permitiu foi fórmulas - que depois evoluíram e vieram a ser consagradas na primeira revisão constitucional - de participação na gestão de obras sociais da empresa, o que nada tem a ver com a co-gestão com que o PSD em determinado período da sua vida sonhou. Neste momento, o PSD abandona esse estandarte, o que é mais significativo e nos deixa antever com alguma curiosidade o que possa vir a ser o seu programa, uma vez que o PSD, neste momento, virtualmente não tem programa. O seu programa é a sua prática, a sua prática é aquilo que sabemos e que consta do Programa do Governo, pelo que a intervenção agora feita pela bancada do PSD é significativa de um determinado rumo, que posterga e encerra por completo um determinado ciclo de história em que o PSD era, em palavras, co-gestionário, mas sempre adversário do controle de gestão.
O Sr. Presidente: - Estamos perante uma operação que não é certamente de pequena cirurgia. Não se traia de eliminar uma verruga, mas sim de uma operação às coronárias. A verdade é que não vale a pena fazermos apelos uns aos outros e, quando chegar a altura, cada um de nós terá de assumir, quer individual quer colectivamente, as suas responsabilidades.
É evidente que estamos aqui perante duas linhas de conceitos: por um lado, intervir, participar e pronunciar-se; por outro, controle de gestão, co-gestão, simples fiscalização ou simples participação nos órgãos de fiscalização. São realidades que lemos de enfrentar, devendo cada um, na altura, assumir as suas responsabilidades.
Chamo mais uma vez a atenção para a circunstância de o meu partido nada ter proposto neste domínio. Alguma razão
Página 547
16 DE JUNHO DE 1988 547
houve. Não julguem que não meditámos sobre esta questão. Tivemos tempo para meditar e meditámos. Se apesar disso não propusemos alterações, já aqui têm alguma orientação, embora a discussão exista para nos esclarecermos.
Uma coisa é certa: até hoje, a co-gestão, ou seja, a participação nos órgãos da administração das empresas públicas, embora consagrada na lei, não passou à realidade. E julgo que temos de tomar uma atitude clara sobre isso. Ou assumimos a responsabilidade de concretizar aquilo que está consagrado na Constituição e na lei, ou retiramos da Constituição e da lei o que está estabelecido sem a vontade política de o passar à realidade. Hipocrisia é que não! Uma destas opções tem de ser tomada.
Temos também de nos pôr de acordo sobre qual é o caminho. Se o de controle de gestão que actualmente se consagra na Constituição, se o de co-gestão que se estabelece na lei ordinária e noutros aspectos da Constituição, como por exemplo, na alínea e) - "participar nos órgãos de gestão" -, se o de simples participação nos órgãos de fiscalização. São opções que temos de tomar muito seriamente. São as da revisão constitucional, não a verruga. Temos de optar.
Talvez não valha muito a pena dizermos como é que vai ser, na medida em que, muito provavelmente, queremos discutir no seio dos nossos partidos todas estas propostas. Trata-se de matéria bastante delicada e, por agora, ficaríamos por aqui.
Quanto à proposta do PRD, também aqui [a alínea b)] surge um novo conceito. Já não se trata de "intervir", "participar" ou "pronunciar-se", mas sim de "acompanhar". Temos igualmente de ter em consideração este acompanhamento, que e porventura o mais "português-suave" de todos! ...
Risos.
Quanto ao "pronunciar-se sobre a organização das empresas", o "intervir" nunca foi encarado de outra maneira que não fosse como pronunciar-se a título não decisório. Nunca ninguém concebeu que a intervenção significasse outra coisa que não a faculdade de ser ouvido e poder emitir opiniões e não de decidir. No fundo, "intervir" e "pronunciar-se" são expressões que, na prática, podem equivaler-se. Sendo assim, para que se mexe no "intervir"? . Em segundo lugar, diz-se "pronunciar-se", nos lermos da lei, sobre as iniciativas legislativas e "participar". O que é que tem feito até hoje senão pronunciar-se? Trata-se mesmo de "pronunciar-se", não obstante a Constituição refira "participam.
Entre participar nos órgãos de gestão ou somente nos órgãos de fiscalização medeia já uma significativa diferença. Temos de esclarecer se pretendemos pôr a Constituição e a lei de acordo com a realidade que não fomos capazes de modificar, ou seja, com a realidade que subsistiu contra o que está estabelecido na lei e na Constituição, acabando assim com a inerente hipocrisia, ou se inversamente pretendemos honrar a Constituição e a lei pondo a realidade de acordo com ela.
Quanto ao artigo 55.º, o PRD defende que se deva dizer "acompanhar a gestão das empresas e pronunciar-se livremente sobre ela". Ainda mais "português-suave". Além disso, propõe a substituição do termo "intervir" por "participar". O PRD sugere também a eliminação da alínea d), que diz respeito à participação na gestão das obras sociais da empresa. Deve existir uma boa razão para a apresentação desta última proposta. Só que não sei qual seja, e parece-me que de algum modo se justifica, mais do que em qualquer outro sector, a participação dos trabalhadores.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Não é essa alínea d), Sr. Presidente, é a que se refere à participação na elaboração de legislação do trabalho e de planos económico-sociais.
O Sr. Presidente: - Tem razão.
Nesse caso, já compreendo melhor a proposta do PRD. A alínea actual consagra uma audição um pouco teórica, mas, de qualquer modo, depois de estabelecida, para quê tirá-la?
Se o Sr. Deputado pretender justificar a sua proposta, faça o favor de usar da palavra.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, concordo consigo quando diz que estas são questões importantes. E, em função das propostas de alteração apresentadas pelos outros partidos políticos, teremos de repensar e reflectir acerca das alterações que propusemos, relacionando-as com aquelas. A nossa posição definitiva relativamente a esta questão será tomada, pois, em melhor oportunidade.
O objectivo das propostas que apresentámos é, no fundo, o de tentar coadunar um pouco aquilo que é uma realidade objectiva, ou seja, constatar um facto e dar-lhe forma. Tal facto diz respeito ao exercício do controle de gestão nas empresas. A lei prevê a eleição de representantes dos trabalhadores nos órgãos de gestão, mas na maioria dos casos esses representantes foram eleitos e nunca se permitiu que tomassem posse. No fundo, gostaríamos de saber se será correcto manter na Constituição estas disposições, quando constatamos que não são cumpridas na prática. Não sei de que ano é a legislação citada pelo Sr. Deputado José Magalhães, mas já tem muitos anos. Inclusivamente, já vários partidos políticos, várias coligações e diversas formas de exercício governativo passaram pelo poder e nunca se concretizou esse preceito. Certamente que alguma razão objectiva haverá para que isso tenha acontecido.
Gostaríamos de saber, portanto, se essa alínea b) é suficientemente importante e relevante para ser aprovada no âmbito desta revisão da Constituição. Caso seja, haveria que levá-la à prática e todos teriam de assumir a responsabilidade de concretizar essa disposição constitucional. Ou, então, leremos de chegar à conclusão de que, por alguma razão, não foi possível, durante dez anos, que os representantes dos trabalhadores eleitos nas empresas tomassem posse e assim tal norma se concretizasse. Há que adaptar a realidade à referida disposição, porque, como disse o Sr. Presidente - e eu concordo com ele -, o facto de constar da Constituição e não ser aplicada revela um sentido de hipocrisia muito grande. Os trabalhadores reivindicam a sua concretização, mas, pura e simplesmente, fingimos que não os ouvimos.
Relativamente à alínea d), referente à participação na elaboração da legislação do trabalho, devo dizer que vai exactamente no mesmo sentido da anterior. Essa participação está prevista no direito das associações sindicais e, portanto, trata-se aqui de uma adaptação a essa realidade objectiva.
A nossa proposta vai no sentido de tornar estas disposições num todo coerente e, no fundo, de procurar fazer com que a Constituição possa objectivamente ser cumprida e não se encontrar elementos que evitem o seu cumprimento. Esse é o sentido positivo da nossa proposta de alteração, embora não possamos ser alheios às propostas ou omissões dos outros partidos políticos em relação a problemas desta importância. E, no que respeita ao problema em causa, aproveitaremos naturalmente lodo o tempo disponível para o debater.
Página 548
548 II SÉRIE - NÚMERO 18-RC
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do artigo 56.°
Quer o CDS, quer o PCP, quer o PSD propõem a eliminação da expressão "condição e garantia da construção da sua unidade". Descarga ideológica.
O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, gostaria apenas de referir que existe uma gralha no texto da proposta relativa ao n.° 1 do artigo 56.° apresentada pelo PSD, que consiste na palavra "reconhecido". O termo correcto é "reconhecida".
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, V. Exa. resumiu perfeitamente a questão. De facto, tem de se deixar de instrumentalizar estes dois objectivos fundamentais aqui expressos - a liberdade sindical e a independência dos sindicatos - a um chavão ideológico e fazer com que eles subsistam como realidade de per si valorizadas e defendidas na Constituição. É essa a intenção da proposta apresentada pelo CDS, tanto em relação ao n.º 1 como ao n.º 4 do artigo 56.º
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sr.8 Maria da Assunção Esteves (PSD): - A expressão em causa de certo modo caiu em desuso, por várias razões: porque ela em princípio enfatiza a liberdade sindical, como contraposição a uma ideia de unicidade, e nasceu para afrontar, no plano ideológico - dadas as condições históricas em que a Constituição de 1976 foi elaborada -, um certo modelo autoritário de socialismo. Já não faz sentido, tem um excessivo conteúdo declaratório, é caracterizada por uma ideia combativa provinda de uma situação que passou à história. Por tudo isto eliminamo-la.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Sr. Presidente, diria, quase que remetendo-me a uma afirmação bastante simples, que pelas razões inversas acabadas de invocar pela Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves - de facto, não partilhamos delas - estamos contra as propostas formuladas pelo CDS e pelo PSD.
Ainda assim, vale a pena acrescentar o seguinte: o dizer-se, como hoje se diz no texto constitucional, que aos trabalhadores é reconhecida a liberdade sindical, que ela é condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses, não contém um inciso pauperizador, enfraquecido sequer pela vida. Suponho que as circunstâncias tem revelado que ele é perfeitamente necessário, para além de útil e positivo, razão pela qual, nada nos movendo, evidentemente, contra o PSD e o CDS, enquanto partidos políticos, tudo nos move contra a queda desta formulação contida na Constituição, a qual entendemos ser insonegável.
Desideologizar, sim, na vossa óptica, mas o sentido que acaba de ser apontado para essa desideologização é de tal forma constrangente que, por motivos óbvios, nos bateremos contra ela.
O Sr. Presidente: - A nossa posição tende a ser esta: entendemos que tão sem significado é retirar essa expressão do articulado como permanecer nele. Estamos abertos às duas hipóteses, tudo dependendo do balanceamento final da carga e descarga ideológica verificada em resultado do conjunto das propostas de todos os partidos. Veremos, depois, na altura própria, o que é que se deve fazer.
Quanto ao n.º 4 do artigo 56.°, verifica-se o mesmo. Tanto o CDS como o PSD propõem a eliminação da parte final do preceito, na parte em que diz "fundamento da unidade das classes trabalhadoras". Não vale a pena repetir a discussão respeitante a estas expressões, a não ser que o Sr. Deputado José Magalhães, que esteve ausente, pretenda dizer alguma coisa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, perdi, por necessidades de trabalho no meu grupo parlamentar, a fundamentação apresentada pelo PSD sobre esta matéria, e não requeiro a título nenhum -nem isso seria legítimo - qualquer refundamentação.
De qualquer modo, pude aperceber-me das razões invocadas, o meu camarada José Manuel Mendes resumiu-mas. O que ele disse foi bem dito, e gostaria apenas de sublinhar que estranhamos muito esta proposta apresentada pelo PSD. Porque se esta expressão constitucional tem algum sentido é em termos de perceptividade. Como sabemos, não é propriamente das máximas constitucionalmente imagináveis: a norma é caracterizada por uma perceptividade de intensidade baixa e pouco significativa, mas ela tem um alcance. E o que é curioso é que o PSD, além de ser amnésico de várias coisas, é também amnésico em relação a este aspecto, o que já não é muito perdoável.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, diz-se unidade para não se dizer unicidade. É isso?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Presidente. É que a norma proíbe ao Estado a promoção da divisão sindical, o que afoitamente já admitiríamos, porque isso decorreria até de compromissos internacionais, nomeadamente de múltiplas convenções da Organização Internacional do Trabalho. O Estado não poderia ingerir-se na vida sindical a ponto de se converter em arauto do divisionismo sindical ou da injecção de novas correntes sindicais (isto apesar de o Sr. Deputado Duarte Lima injectar o que pode em matéria de terceira central sindical, e pelos vistos não poder demasiado!).
O elemento tem algum interesse pelo facto de corresponder, como sublinham os respectivos comendadores, à superação histórica da unicidade sindical. Portanto, a alteração em causa poderia porventura ter um significado, com um cunho mais emblemático do que prático, de um determinado retrocesso. Mas o que é curiosíssimo é que seja o PSD a propor tal coisa, o que quer dizer que o PSD ou é um caso monumental de distracção, ou um caso monumental de ilusão, ou um caso monumental de ignorância. Ou, então, há qualquer outra intenção subjacente, mas não somos suficientemente argutos para lobrigá-la, e talvez a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves nos sirva de guia nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, resumindo a intervenção que fiz há pouco, diria que este atributo criado na Constituição para a liberdade sindical se torna neste momento desnecessário por evidente que é, apenas por isso.
Página 549
16 DE JUNHO DE 1988 549
O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, está de acordo com todos os outros aspectos, designadamente com a não promoção da divisão sindical...
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): -Estou de acordo com o facto de a liberdade sindical significar ou ser uma condição e garantia de construção da unidade dos trabalhadores. Somente, isso é tão evidente que não vale a pena estar a manter este tipo de atributo na Constituição.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sra. Deputada, V. Exa. assume e chama-se Assunção e essa não é uma razão para cortar o seu nome. A Sra. Deputada assumirá tudo, mas não cortemos. Não se compreende a razão dessa pretensão.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, não resisto a fazer um comentário àquilo que o Sr. Deputado José Manuel Mendes disse, porque, de facto, é muito significativo já que é a primeira vez que o PCP diz isto na Comissão. E fê-lo porque mudou porventura de voz. Na verdade, o Sr. Deputado José Manuel Mendes referiu textualmente, ignorando que ficasse registado: "Desideologizar, sim!" Pela minha parte, direi que isso é óptimo e uma excelente intervenção.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Diria que não há nenhuma surpresa nisso, pois sou contra a desideologização sempre que ela signifique desforrismo em relação à ideologia constitucional.
O Sr. Presidente: - Cometi um pequeno lapso em relação ao PRD, uma vez que faz exactamente as mesmas propostas e não as considerei incluídas nas duas anteriores. De facto, elas suprimem as mesmas expressões.
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, quero apenas referir que o PRD faz a mesma coisa que o CDS e o PSD. Gostaria de sublinhar, contudo, aquilo que foi agora dito pela Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves, ou seja, que o único motivo pelo qual o PRD reduziu esta expressão apenas pode ser entendido no sentido de a considerar desnecessária.
O Sr. Presidente: - Também é desnecessário cortar! O Sr. Marques Júnior (PRD): -Exacto!
O Sr. Presidente: - Vai-se dizer que a Constituição passa a consagrar a unicidade porque se cortou a palavra unidade.
O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, o objectivo é claramente esse, embora no que respeita a este artigo o PRD diga o mesmo que disse em relação ao artigo anterior.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Consideramos que é desnecessário manter-se aqui a referida expressão porque ela encerra estigmas de combatividade
contra uma certa ideia de central sindical única e contra um certo modelo - repito - de socialismo autoritário que já não existe na sociedade portuguesa neste momento. Portanto, essa expressão entrou em desuso e é caduca nesse sentido.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, sugeriria que seguíssemos a metodologia estabelecida há pouco em relação à calendarização dos trabalhos devido a necessidades de trabalho do meu grupo parlamentar.
O Sr. Presidente: - No sentido de interrompermos agora, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Presidente. Quanto à questão da caducidade do artigo 56.º estamos bem conversados, porque é evidente que não se elimina aquilo que se entende como caduco, e o PSD entende eliminar uma coisa que pelos vistos estaria em estado de caducidade adiantada, coisa que não se lobriga muito bem.
O Sr. Presidente: - Todos nós expressámos as nossas razões livremente e, quando chegar o momento adequado, cada um fará a sua opção neste domínio. Este não é um problema de difícil resolução, e parece-me que é tão desnecessário cortar o preceito em causa como deixá-lo ficar no articulado. Mas, já que cá está, cortar para quê?
Quanto ao artigo 57.º, apreciá-lo-emos na reunião de amanhã, que terá lugar às 15 horas e 30 minutos.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 19 horas e 25 minutos.
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional
Reunião do dia 17 de Maio de 1988
Relação das presenças dos Srs. Deputados
Carlos Manuel de Sousa Encarnação (PSD).
António Costa de Sousa Lara (PSD).
Carlos Manuel Oliveira da Silva (PSD).
Fernando Manuel Cardoso Ferreira (PSD).
José Álvaro Pacheco Pereira (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
Miguel Bento da Costa Macedo e Silva (PSD).
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva (PSD).
Rui Alberto Limpo Salvada (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
António Manuel Ferreira Vitorino (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
José Manuel de Melo Antunes Mendes (PCP).
António Marques Júnior (PRD).
José Luís Nogueira de Brito (CDS).