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Quarta-feira, 11 de Janeiro de 1989 II Série - Número 66-RC
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
II REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
ACTA N.° 64
Reunião do dia 6 de Dezembro de 1988
SUMÁRIO
Procedeu-se a nova discussão e à votação dos artigos 12. °, 13.°, 16.°, 17.º e 18.° e respectivas propostas de alteração e de substituição e das propostas de artigos novos - 13.°-A e 16.°-A -, apresentadas, respectivamente, pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, do PS, e pelo PCP.
Deu-se início a nova discussão e à votação dos artigos 15. ° e 19." e respectivas propostas de alteração e de substituição.
Durante o debate intervieram, a diverso título, para além do vice-presidente Almeida Santos, no exercício da presidência, pela ordem indicada, os Srs. Deputados José Magalhães (PCP), Maria da Assunção Es tevês (PSD), Raul Castro (ID), António Vitorino (PS), Costa Andrade (PSD) e Pedro Roseta (PSD).
Foram os seguintes os resultados das votações realizadas: N.° 2 do artigo 12.°, proposto pelo CDS, n." 2 do artigo 13.°, proposto pelo CDS, artigo 13. °-A, proposto pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, do PS, n.° 3 do artigo 15.°, proposto pelo CDS, proposta de eliminação do artigo 17. °, apresentada pelo CDS, e n.° 2 do artigo 18.°, proposto pelo CDS - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registados os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID; Proposta de substituição do n.° I do artigo 13. °, apresentada pelo PCP, e n.° 2 do artigo 13. °, proposto peto PEV - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, os votos a favor do PCP e da ID e a abstenção do PS; N.° 2 do artigo 13.°, proposto pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, do PS, e n.° 2 do artigo 13.°, proposto pela Sra. Deputada Independente Helena Roseta - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e os votos a favor do PS, do PCP e da ID; N.° 3 do artigo 15.º, proposto pela ID - obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID; Artigo 16.°, proposto pelo CDS, n.° 1 do artigo 16.°, proposto pelo PSD, n.° 1 do artigo 13. °, proposto pelo CDS, e artigo 17.° (20.° no projecto n.º 4/V), proposto pelo PSD - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e os votos contra do PS, do PCP e da ID; Artigo 16.°-A, proposto pelo PCP - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e do PS e os votos a favor do PCP e da ID; N.ºs 2 e 4 do artigo 19. °, propostos pelo CDS - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS e do PCP; N.ºs 3 e 5 do artigo 19.°, propostos pelo CDS - não obtiveram a maioria de dois terços necessária, lendo-se registado as abstenções do PSD, do PS e do PCP; N.° 6 do artigo 19.°, proposto pelo CDS - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PS e do PCP e a abstenção do PSD; N.° 9 do artigo 19.°, proposto pelo PCP - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e do PS e os votos a favor do PCP; N.° 3 do artigo 19.°, proposto pelo PS, e proposta de substituição dos n.ºs 5, 6 e 7 do artigo 19.°, apresentada pelo PS - obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS e do PCP; Proposta de substituição do n.° 9 do artigo 19.°, apresentada pelo PCP e pelo PS - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e os votos a favor do PS e do PCP.
Em anexo à presente acta, são publicadas propostas de substituição dos artigos 13.°, 19.° e 20.º (PCP), uma proposta de substituição do n.° 9 do artigo 19.° (PCP e PS), uma proposta de substituição do n.° 7 e de eliminação do n.° 8 do artigo 38.° (PSD e PS) e propostas de substituição dos artigos 39.°, 40.° e 52.°, bem como uma proposta de disposição transitória a incluir na lei de revisão (PSD e PS).
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O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Srs. Deputados" temos quorum, declaro aberta a reunião.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Vamos começar por proceder à votação das propostas apresentadas quanto ao artigo 12.°, uma vez que resolvemos começar por aqui.
Em relação a este artigo há apenas uma proposta do CDS no sentido de se acrescentar ao actual n.° 2 a expressão "de acordo com a Constituição e com a lei".
Isto foi discutido, tratar-se-á agora, uma vez que parece não haver matéria superveniente, de votar esta proposta. Não sei como querem que se façam as votações. Poderíamos estabelecer um critério que fosse do maior para o menor, ou da esquerda para a direita, ou da direita para a esquerda. Ou então todos ao mesmo tempo: quem vota a favor, quem vota contra, quem se abstém. Talvez seja melhor assim.
Uma voz: - Sim, é o melhor.
O Sr. Presidente: - Infelizmente, o CDS não está presente para votar a sua própria proposta. Lamentamos, vota no Plenário.
O Sr. Deputado José Magalhães não está presente, aguardemos um instante.
Pausa.
O Sr. Deputado já chegou, vamos começar pela proposta do CDS em relação ao artigo 12.° É a única proposta que existe de aditamento ao n.° 2 da expressão "de acordo com a Constituição e com a lei". A matéria foi discutida; portanto, propunha que iniciássemos a votação.
Vai proceder-se à votação da proposta do CDS relativa ao n.º 2 do artigo 12.°, que prevê a expressão "de acordo com a Constituição e com a lei".
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
2 - As pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza, de acordo com a Constituição e com a lei.
Passando ao artigo 13.°, temos as seguintes propostas: pela parte do CDS a proposta de alteração ao n.° 1 do artigo 13.° no sentido da eliminação da palavra "social".
Antes de procedermos à votação da proposta, penso ser indicado fazer o resumo das propostas para que cada um possa balancear o sentido do seu voto.
Já vimos qual a proposta do CDS quanto ao n.° 1. Quanto ao n.° 2, elimina a referência à "língua" e corta também a palavra "beneficiado".
O PCP acrescenta um n.° 3, que diz: "Incumbe ao Estado garantir o princípio da igualdade, designadamente através da remoção de obstáculos sociais à sua realização."
Os Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta têm uma proposta para o n.° 1 que é igual. No n.° 2 do artigo 13.° incluem a expressão "atitude perante a religião" a seguir à palavra "religião" e incluem uma referência ao "estado civil".
O Partido Ecologista Os Verdes também inclui uma referência ao estado civil e à língua.
Iríamos votar proposta a proposta e número por número. Em todo o caso queria dizer que há uma proposta de substituição apresentada por deputados do PS, no sentido de fazer a junção da palavra "religião" e de "atitude perante a religião", e também do estado civil. Creio que é a única proposta em que se juntam estas duas referências.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de chamar a atenção para alguns aspectos. O primeiro é o de que, na sequência do debate que travámos na primeira leitura sobre a proposta originariamente apresentada, o Grupo Parlamentar do PCP deliberou apresentar uma reformulação do texto constante do seu projecto.
O Sr. Presidente: - Acabo de constatar que foi entregue agora à última hora.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa reformulação foi entregue dentro do prazo que tinha sido acordado na Comissão. Visa, precisamente, ter em conta as observações e objecções surgidas durante o debate, em particular da bancada do PS e do PSD. Como se reparará, este texto surge como um aditamento não ao n.° 3 mas ao n.° 1. Devo dizer, de resto, que o facto de termos incluído a norma como número autónomo se deveu apenas a preocupações gerais que estão subjacentes ao nosso projecto de revisão constitucional de clareza de exposição pedagógica, quase diria, das nossas propostas. Em bom rigor, a nossa ideia sempre foi a de fazer um aditamento que caberia muito bem, a nosso ver, no n.° l, utilizando-se, como é próprio da linguagem e da técnica normativa constitucional, um gerúndio para acoplar o segmento aditado.
Esse segmento tem muito em conta, insisto, as observações feitas durante o debate, tal qual pode ser encontrado no Diário da Assembleia da República, 2.a série, n.° 5-RC, pelo que me dispenso naturalmente de reeditar a argumentação então produzida.
Gostaria, tão-só, de sublinhar nesta sede e neste momento que, por um lado, utilizamos a noção de contribuição estadual. Tem-se em atenção aquilo que dispõe o artigo 9.° quanto às tarefas fundamentais do Estado. Tem-se em conta qual o papel do Estado tal qual ele pode resultar de uma interpretação rigorosa da própria Constituição. Procura-se, como foi sugerido por alguns dos Srs. Deputados, não se ser redutor em relação à elencagem dos obstáculos que podem impedir a própria realização dos direitos fundamentais. Elencam-se quatro tipos de obstáculos e isso pareceu-nos melhor, contra uma sugestão de um dos Srs. Deputados, do que aludir em abstracto e em bruto a obstáculos, porque isso poderia ser excessivamente indefinido, uma vez que haverá inclusivamente obstáculos de carácter político, psicológico ou mesmo situados em outras esferas que não seria curial trazer à colação nesta sede.
O sentido da nossa proposta é, portanto, o de construtivamente acolher aquilo que nos pareceu ser um resultado positivo ou relevante do debate travado na primeira leitura.
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Teria uma segunda questão, Sr. Presidente. Talvez seja melhor introduzi-la de imediato...
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para tal, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, verificamos que a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia colhe o consenso do PS. É esse o significado que se pode atribuir ao texto subscrito por aquele Sr. Deputado do PS, sob o título "Proposta de substituição do n.° 2 do artigo 13.°"
Em bom rigor, não é possível sequer fazer-se isso nessa sede, dada a natureza e dado o conteúdo do projecto do PS, que é omisso quanto a esse ponto. Não obstante, neste caso nem há problema algum, uma vez que o texto do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia constitui base bastante para introduzir a questão.
O Sr. Presidente: - Foi pura inadvertência a apresentação de uma proposta que coincide com a proposta do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Pois, nós calculámos isso, Sr. Presidente. Gostaria de sublinhar que pela nossa parte nos parece importante que se faça luz sobre a natureza exacta e os limites do direito de reformulação. Neste caso a questão resolvida está. Como veremos adiante há problemas de tipo similar que posem ser dilucidados na sede própria, pelo que não adiantarei nada mais neste momento.
Gostaria também se saber, Sr. Presidente, qual o grau de acolhimento que uma proposta de segundo grau como a que apresentamos pode merecer das diversas bancadas. Estamos evidentemente disponíveis para fazer acertos de redacção, se for caso disso.
O Sr. Presidente: - Ia dar a palavra, não sobre a proposta do PS. Julguei que no mínimo era o somatório de duas propostas anteriores que tinham sido discutidas, mas vejo agora que ela coincide, inclusivamente, com uma proposta que tinha sido apresentada. Portanto, não foi discutida obviamente a proposta apresentada agora pelo PCP. Quem quiser usar da palavra faça favor de a pedir.
Pausa.
Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): Sr. Presidente, Srs. Deputados: E para nos pronunciarmos contra a proposta de aditamento ao artigo 13.° nos termos em que o faz o PCP.
Em primeiro lugar porque, exactamente como o Sr. Deputado José Magalhães admite, o artigo 9.°, quando comete ao Estado tarefas fundamentais, indica já como uma delas o promover o bem-estar e a qualidade de vida e a igualdade real entre os Portugueses. Essa ideia de igualdade real é, no fundo, o que resume toda a preocupação do acrescento proposto pelo PCP, daí a desnecessidade deste.
Há uma outra razão pela qual o PSD vota contra esta proposta. O artigo 13.° tem, no nosso entender, e tem objectivamente, como destinatário fundamental o Estado. Dizia o Sr. Deputado José Magalhães que este aditamento tinha uma preocupação fundamental de sublinhar a tarefa do Estado e o papel do Estado na promoção da igualdade entre os cidadãos. Ora nós entendemos que decorre do teor e do contexto do artigo 13.° que o Estado é o destinatário fundamental desta disposição e daí a desnecessidade de referi-lo de modo mais explícito tal como o PCP pretende.
Há ainda outra razão: o Estado é o principal mas não o único destinatário do artigo 13.° da Constituição; todos os agentes públicos e privados devem promover a igualdade!
São estas as razões fundamentais por que o PSD rejeita esta proposta.
O Sr. Presidente: - Mais algum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (ID): - A proposta que agora é apresentada pelo PCP conta com a nossa aprovação porque, por um lado, não se limita a estabelecer uma intervenção estadual, o que aliás está implícito, mas sim a consignar aquilo que é um papel específico do Estado nesta matéria, na medida em que propõe que essa intervenção, essa contribuição do Estado, seja em ordem a remover os obstáculos de natureza económica, social, jurídica e cultural à realização dos direitos fundamentais. Afigura-se-nos que uma disposição destas é uma disposição que efectivamente melhora substancialmente o texto constitucional, na medida em que não se vêem mesmo razões que possam conduzir à sua exclusão, e, pelo contrário, ela não é de forma alguma uma proposta que não tenha justificação, mas que, pela sua própria natureza, pelo seu próprio conteúdo, vem efectivamente referir expressamente qual é o papel do Estado em relação aos obstáculos de diversa natureza que cumpra ao Estado contribuir para remover em ordem a que efectivamente todos os cidadãos possam ter a mesma dignidade social.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, porque se nos afigura altamente positiva a proposta apresentada pelo PCP, a ID votará favoravelmente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, apenas duas rápidas observações.
A primeira em relação à referência que o Sr. Deputado José Magalhães fez quanto à proposta de substituição que o PS apresentou. É óbvio que ela coincide com propostas que já estavam colocadas à consideração da Comissão e nesse sentido será inútil eventualmente votá-la, bastando votar apenas as propostas dos projectos iniciais dos Srs. Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta. Seja como for, não é meu entendimento, antes pelo contrário, o próprio Regimento permite-o, que deputados de um grupo parlamentar cujo projecto não tenha inicialmente contemplado um dado preceito, neste caso o n.° 2 do artigo 13.°, como é o caso do projecto do PS, não possam apresentar agora uma proposta referente a esse mesmo número, porquanto essa proposta representa, na nossa óptica,
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o resultado útil do debate já travado na Comissão. Não foi intenção inicial dos deputados socialistas alterarem este artigo, mas o debate em comissão provou que se justificava tomar uma iniciativa em termos que contemplassem uma determinada ordem de preocupações emergente desse debate. Quis só dar este esclarecimento, embora seja uma consideração que neste caso concreto não tem nenhum efeito prático, já que a nossa proposta coincide exactamente com outras propostas que já estão em cima da mesa, mas sobretudo porque este raciocínio poderá mostrar-se relevante noutros casos, tendo em linha de conta que não nos parece que se deva fazer uma interpretação excessivamente limitativa das faculdades que assistem aos membros da Comissão em termos de capacidade de apresentarem propostas de alteração que decorram essencialmente da primeira leitura, e não apenas dos seus próprios projectos iniciais.
Quanto à proposta do PCP, vamos abster-nos na votação deste inciso apresentado pelo PCP, não só pelas razões que já foram invocadas no sentido de que o seu conteúdo útil, em termos práticos, já está consumido pelo artigo 9.°, alínea "O, da Constituição, mas também porque nos parece, tal como aliás já dissemos no decurso da primeira leitura, como consta do Diário da Assembleia da República, n.° 5, que o aditamento ao artigo 13.° de uma obrigação de f acere do Estado em matéria de remoção de obstáculos que garanta o princípio da igualdade, podendo parecer à primeira vista uma proclamação generosa, tem, contudo, algumas ponderosas contra-indicações que não podem deixar de ser levadas em linha de conta. E nessa altura dissemos que o problema da aplicação do princípio da igualdade é um problema particularmente complexo, melindroso, e que às vezes se defronta com relevantes dificuldades em virtude dos contornos difusos do seu conteúdo preceptivo. Ao contrário do que aparentemente a proposta do PCP pretenderia, o aditamento de uma obrigação estadual a um princípio deste tipo tornaria ainda mais difícil a própria interpretação jurisprudencial do princípio da igualdade e poderia, inclusive, ser um factor adicional de incentivo a que se abdicasse da utilização do princípio da igualdade como critério aferidor da conformidade à Constituição dos actos normativos. Porque sempre se teria que reconhecer o alto e elevado grau de subjectivismo da apreciação de uma determinada norma jurídica que não violasse directamente o princípio da igualdade na óptica da consagração de um direito fundamental e na óptica da esfera subjectiva dos particulares, mas que poderia ser considerada como violando o princípio da igualdade por, numa interpretação parcial, não conduzir directamente ou até primordialmente à remoção de concretos obstáculos de natureza jurídica, cultural, económica ou social que dificultam a efectivação prática dessa igualdade idealmente desejada. Essa dimensão material do princípio da igualdade está, no que diz respeito à conformidade da actuação do Estado com a Constituição, garantida cabalmente pelo artigo 9.°; a amálgama com a consagração do direito fundamental no artigo 13.° poderia ter efeitos perversos, perniciosos e, naturalmente - faço justiça -, não pretendidos pelos autores da própria proposta.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos já em condições de votar. Começaremos pela proposta do CDS para o n.° 1, ou seja, a eliminação da palavra "social".
Vamos proceder à votação do n.° 1 do artigo 13.° proposto pelo CDS.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É o seguinte:
1 - Todos os cidadãos têm a mesma dignidade e são iguais perante a lei.
Vamos votar o n.° 2 do artigo 13.° proposto pelo CDS, ou seja, a eliminação da referência à "língua" e também da palavra "beneficiado".
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É o seguinte:
Ninguém pode ser privilegiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.
Passamos agora à proposta de substituição, apresentada pelo PCP, para o n.° 1 do artigo 13.°, que substitui a sua anterior proposta de um novo n.° 3.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da referida proposta.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, os votos a favor do PCP e da ID e a abstenção do PS.
É a seguinte:
[...] devendo o Estado contribuir para a remoção dos obstáculos de natureza económica, social, jurídica e cultural à realização dos direitos fundamentais.
Vamos passar agora à proposta apresentada pelos Srs. Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta, depois de o PS ter retirado aquilo que julgou ser uma proposta de substituição, mas que, por inadvertência, e só por isso, apresentou, na medida em que coincide com a proposta dos referidos Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (ID): - Na proposta do PEV também figura o aditamento da expressão "estado civil" - não é só na proposta do Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.
O Sr. Presidente: - Mas, se esta for aprovada, sê-lo-á com a inclusão de dois itens; pode acontecer que alguém vote apenas a favor de um. Portanto, não creio que uma votação prejudique a outra.
O Sr. Raul Castro (ID): - A minha observação não era no sentido de prejudicar, mas no de incluir também a do PEV.
O Sr. Presidente: - Eu não deixaria de focar isso quando chegasse à votação da proposta do PEV.
Srs. Deputados, vamos votar conjuntamente, por serem de idêntico teor, as propostas de alteração apre-
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sentadas pelos Srs. Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta para o n.° 2 do artigo 13.°
Submetidas à votação, não obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e os votos a favor do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
2 - Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, atitude perante a religião, convicções políticas ou ideológicas, estado civil, instrução, situação económica ou condição social.
Temos ainda a proposta apresentada pelo PEV, que se refere apenas à inclusão do "estado civil", e não "à atitude perante a religião", a seguir à palavra "religião".
O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, agradecia-lhe o favor de repetir, para clarificar melhor o sentido da votação.
O Sr. Presidente: - Foi rejeitada a proposta dos Srs. Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta, que incluía duas expressões; agora vamos votar uma proposta que inclui apenas uma dessas expressões. Dado que não podemos votar palavra a palavra, mas só proposta a proposta, nada impede que quem votou contra vote agora a favor e vice-versa.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta do PEV, relativa ao n.° 2 do artigo 13.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, os votos a favor do PCP e da ID e a abstenção do PS.
É a seguinte:
Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, estado civil, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.
Completámos, assim, a votação deste artigo. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Importa que tenhamos plena percepção das razões e do próprio sentido de voto. Se bem percebi, o PS votou a favor de uma proposta apresentada por deputados independentes do PS e absteve-se em relação a idêntica proposta apresentada pelo PEV. Queria ter a certeza de que percebi bem...
O Sr. Presidente: - Tendo nós votado a favor a inclusão de dois itens, não se justificava que votássemos de outra forma; abstivemo-nos porque a proposta já foi rejeitada, portanto não tinha significado outro voto que não esse. Isto pensamos nós, mas também não tem grande importância; poderíamos dizer que também votaríamos a favor de um só. Tendo votado a favor de dois, obviamente que a votação estava prejudicada. É esta a razão para não votarmos a favor, expressamente. Mas este voto não tem grande significado, esta abstenção apenas significa que já tínhamos votado a favor da inclusão de dois itens e que considerámos esta proposta prejudicada pela votação anterior.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não duvido, Sr. Presidente. A única questão que gostaria de suscitar junto da bancada do PSD, em concreto, uma vez que dela depende uma inclinação favorável e eficaz nesta matéria, é a de saber se qualquer outra formulação que visasse ampliar o conteúdo do artigo 13.°, tendo em conta algumas das nossas preocupações, seria susceptível de poder ser apreciada com vista a um consenso deliberativo e eficaz. Ou trata-se de rejeitar em absoluto qualquer possibilidade de explorar vias de aperfeiçoamento deste artigo, tendo em conta as preocupações que fluiram ao debate constante do Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.° 5-RC? É extremamente importante que este ponto se clarifique para que possamos medir se há algum terreno de aperfeiçoamento possível, ou se não há terreno nenhum, e se o PSD está inteiramente indisponível para "tocar" na Constituição neste ponto.
O Sr. Presidente: - Para responder à pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Aquando da discussão, pronunciámos-nos, evidentemente, contra as duas alterações agora votadas, ou seja, contra a inclusão dos incisos "atitude perante a religião" e "estado civil", e foi só delas que tratámos. Pergunta agora o Sr. Deputado José Magalhães se a nossa atitude é fechada. A questão está em saber se outros itens podem ser discutidos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A minha pergunta era se, em relação a estes dois aditamentos, a objecção era tão total que implicasse a rejeição ou indisponibilidade para aceitar quaisquer soluções que em boa medida dessem ou procurassem dar resposta a objecções do PSD, formuladas durante o debate. Tive ocasião de relê-lo: a principal preocupação do PSD era a de que da fórmula "estado civil" pudesse resultar uma eventual inconstitucionalização de determinada legislação que trate de forma mais favorável os casais em detrimento de cidadãos individualmente considerados. Em relação à "atitude perante a religião", a preocupação dominante era a de que, no fundo, a questão já estivesse consumida: sendo a atitude perante a religião o contraponto do fervor religioso, do proselitismo, da crença, etc., no fundo admitiu-se que já está compreendida - o que, de certo modo, é sustentável, numa determinada parcela do conteúdo proposto. Não gostaria que da rejeição eventual de um inciso deste tipo viesse a resultar diminuída a própria dimensão das liberdades nesta esfera, uma vez que a liberdade de crer compreende também a liberdade de descrer, em absoluto ou em parte.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Estou inteiramente de acordo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Gostaria que, neste caso, o PSD pudesse precisar por inteiro se está inteiramente disponível para considerar clarificações circunscritas a estes dois pontos. Repare, Sr. Deputado Costa Andrade, que não propus que se aditasse qualquer outro ponto...
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O Sr. Costa Andrade (PSD): - No fundo, a resposta é a mesma, se bem que circunscrita agora a esses dois pontos: tudo depende! Indicámos, pelas razões que V. Exa. teve a amabilidade de nos recordar, os motivos por que nos opúnhamos a esses dois novos incisos. Se, no decurso do debate ou até no Plenário, surgirem fórmulas que debilitem ou impeçam as nossas objecções, a nossa atitude não será fechada, muito menos em matéria de direitos, liberdades e garantias, na qual - far-nos-ão essa justiça, pois também a fazemos a todos os Srs. Deputados e a todos os partidos - a atitude deve ser a do aperfeiçoamento da Constituição e do catálogo dos direitos, liberdades e garantias. Mas, pelas razões que tivemos oportunidade de explicitar na altura, opunhamo-nos a estas propostas, com este conteúdo. Se entretanto forem apresentadas outras propostas, veremos então qual a atitude a tomar. Não estamos fechados a outras propostas; apenas votámos aquilo que se mantinha e em relação ao qual mantemos a nossa atitude.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação do artigo 15.° Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - De um ponto de vista metodológico, gostaria de relembrar que, no dia 16 de Março, o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia (isto consta no Diário, n.° 5-RC, p. 74) apresentou um texto sobre esta matéria, ainda conexo com o artigo 13.°, cujo conteúdo haveria que ter em atenção.
Vozes.
O Orador: - Trata-se de um artigo novo. E, tal qual consta da página citada, o texto reza:
Artigo 13.°-A Princípio da liberdade
1 - No universo dos direitos, liberdades e garantias, a liberdade consiste na faculdade de fazer tudo quanto a Constituição não proíbe ou não autoriza proibir.
2 - Todos têm igual direito à liberdade.
O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Secretário o favor de, quando lá chegarmos, não se esquecer de anexar esta proposta, que já foi discutida na altura.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não poderia deixá-lo jazer nas páginas do Diário da Assembleia da República, pura e simplesmente. Mas creio que deveríamos ponderar se tem algum cabimento fazê-lo votar, por uma razão simples: a proposta foi apresentada com aparente conexão com o artigo 13.°, mas o debate demonstra que essa conexão é escassa e decorre de outro tipo de preocupações. Verdadeiramente, aqui pode colocar-se também (não decaio em relação às observações que fiz há pouco acerca dos limites e dos contornos do direito de reformular) a questão de saber se há legitimidade e se tem cabimento a apresentação de um texto cujo cunho é puramente inovatório. De forma alguma é sustentável que tal coisa se insira dentro da grelha de partida da revisão constitucional, tal qual ela, historicamente, se configurou. Deveríamos tomar uma deliberação sobre se, sim ou não, apreciamos a proposta. Creio não ter grande cabimento que isso se faça. Mas gostaria de suscitar a questão, para ela poder ser talhada frontalmente.
O Sr. Presidente: - Devemos ou não votar? Em que sentido se pronunciam V. Exas., uma vez que foi levantada a questão processual?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Se foi apresentada, e com alguma conexão com o artigo 13.°, reconheço que terá de ser votada...
O Sr. Presidente: - O problema da sistematização será de ver em último lugar, mas não podemos alterar o local proposto pelo próprio autor - se ele acha que é o 13.°-A, será mesmo o 13.°-A. O problema é de saber se vamos votar ou não, dado que a proposta foi apresentada de maneira formalmente correcta.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exacto, era isso o que eu ia dizer. Nós temos alguma dificuldade - embora estejamos à vontade, porque votaremos contra - em recusar a votação.
O Sr. Presidente: -- Quanto ao sentido do voto, ainda não chegámos lá. Mas entendemos que, se a proposta foi aceite naquela altura, deve ser votada - senão deveríamos tê-la rejeitado. Portanto, se V. Exa. as estão de acordo, iremos votá-la.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A ser assim, isso fixaria uma orientação: as propostas, com conexão directa ou indirecta com um determinado artigo tocado em sede de revisão constitucional pela grelha de partida, apresentadas na primeira leitura, e só no decurso da primeira leitura, e admitidas pela Mesa nessa altura, e só nessa altura, deverão ser submetidas a sufrágio para os devidos efeitos regimentais - e só isso.
O Sr. Presidente: - Se nós, nessa altura, não rejeitámos a proposta por não dever ser apresentada naquele momento, é porque considerámos que, um dia qualquer, teria de ser votada. Isto porque permitir a apresentação dela com a mente preparada para, na altura própria, não a sujeitar a votação é, na verdade, uma partida que não se faz a ninguém - muito menos ao deputado Cárdia e à sua boa-fé. Aquilo que eu acho é que, se nós entendermos que esta proposta deve ser discutida a propósito de outro artigo, então tomemos essa deliberação. Se ele a apresentou como artigo 13.°-A, devemos votá-la agora - se, porventura, for votável; mas eu acho que é e não vejo razão para não se votar. Foi admitida quando ele a apresentou, ninguém a rejeitou na altura - não vamos agora partir do princípio de que estávamos com reserva mental para o momento da votação. Parece-me que a maioria é favorável a que se vote.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, não estávamos com reserva mental - estávamos no fim de um debate, e o Sr. Presidente (que não era, aliás, o Sr. Deputado Almeida Santos) disse apenas qualquer coisa como: "[...] talvez haja vantagem em distribuir a proposta por escrito, acompanhada de fundamentação, para que todos possamos beneficiar e discutir em
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melhores condições, pois oralmente é muito mais difícil apercebermo-nos do sentido e do alcance destas mesmas intervenções." Assim disse, e por aí ficámos.
O Sr. Presidente: - Isso é muito difícil de dizer: "Desculpe, Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, não pode apresentar proposta nenhuma neste momento." Ele apresentou-a, bem ou mal; sujeitámo-nos a que ele o fizesse, portanto acho que não há mal em ser votada.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ninguém crispou, Sr. Presidente. Eu só queria que ficasse fixado um princípio, um precedente. Se o precedente ficar fixado nesses termos, não temos objecção.
O Sr. Presidente: - Também não há tantas propostas nestas condições. Há meia dúzia! Não há razão para não nos pronunciarmos sobre elas, em termos de votação. Por isso, votaríamos a proposta.
Srs. Deputados, vamos passar à votação do artigo 13.°-A, proposto pelo Sr. Deputado Sottomayor Cárdia, que foi lido há pouco pelo Sr. Deputado José Magalhães.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
Vamos passar ao artigo 15.°, em relação ao qual há uma proposta do CDS de alteração do n.° 3, no sentido de ser eliminada a expressão "o serviço nas Forças Armadas e a carreira diplomática"; o PS propõe um novo n.° 4, que foi discutido na devida altura, no sentido de a lei poder atribuir a estrangeiros, em condições de reciprocidade, capacidade eleitoral para a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais; a ID propõe que onde se diz "países de língua portuguesa" se diga "países de língua oficial portuguesa" - ficando entendido que esta expressão ficaria aprovada, no caso de o ser, relativamente a todas as disposições onde apareça, dado que teria de haver uniformidade de linguagem.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta do CDS para o n.° 3 do artigo 15.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
3 - Aos cidadãos dos países de língua portuguesa podem ser atribuídos, mediante convenção internacional e em condições de reciprocidade, direitos não conferidos a estrangeiros, salvo o acesso à titularidade dos órgãos de soberania, e das regiões autónomas.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que lamentamos bastante que o CDS não tenha produzido qualquer justificação adicional em relação a esta matéria. Entre a altura em que debatemos esta questão e este momento produziram-se diversas ocorrências, entre as quais, como se sabe, a aprovação da nova Constituição brasileira e também a apresentação a esta Comissão por um grupo de deputados da Comissão de Negócios Estrangeiros de uma sugestão de alteração ao artigo 15.°, que não veio a ter qualquer espécie de eco ou de reflexo no debate que travámos e portanto nesta segunda leitura. Creio que o facto de, no Ínterim, a Comissão das Comunidades Europeias ter junto do Governo Português adoptado algumas diligências, cujo conteúdo aliás não nos foi transmitido, mas que tem a ver com a possibilidade de invocação do dispositivo já hoje constante do artigo 15.° da Constituição da República Portuguesa para efeitos de penetração no mercado europeu de entidades de outros países, com implicações que têm sido qualificadas como preocupantes por essas entidades em termos que, repito, não são do conhecimento oficial da Assembleia da República, legitimaria em nosso entender algum cuidado e alguma análise mais aprofundada que permita a esta Comissão, uma vez concluído o seu relatório e ultrapassada esta fase dos seus trabalhos, dar um contributo útil à deliberação a ser tomada, a fim, no Plenário. Penso que seria francamente menos prestigiante que, tendo sido a questão colocada e tendo a Comissão de Negócios Estrangeiros recomendado à Comissão Eventual para a Revisão Constitucional a ponderação sobre uma proposta de alteração a este artigo 15.°, cujo teor, de resto creio seria útil vasar para a acta, não dedicássemos a isso o mínimo de atenção.
Verdade seja que o CDS não contribuiu para isso em nada, sendo, todavia, pai de uma proposta de alteração à Constituição neste ponto. Seria um tanto desresponsabilizante passar ao de leve sobre esta questão, que é bastante importante como se sabe, e em que o nosso juízo não é propriamente despiciendo e pode ter alguma importância até em sede de hermenêutica constitucional, valha o que valer.
Os Srs. Deputados da Comissão de Negócios Estrangeiros recomendam um texto, que tem no n.° 3 a seguinte redacção: "Aos cidadãos dos países de língua portuguesa podem ser atribuídos mediante convenção internacional e em condições de reciprocidade direitos não conferidos a estrangeiros, salvo o acesso à titularidade das presidências de órgãos de soberania, das regiões autónomas, as funções de ministro de Estado, o serviço nas Forças Armadas e a carreira diplomática."
No n.° 4 da mesma proposta prevê-se que "a reciprocidade pode decorrer de instrumentos internacionais já celebrados e de direitos efectivamente consagrados nas constituições dos países contratantes". Devo dizer, Sr. Presidente, que o texto da Constituição brasileira recém-aprovada, ele próprio, não permite reciprocidade senão obviamente em condições que tenham em conta o seu próprio conteúdo, e a verdade é que o conteúdo da Constituição brasileira no artigo pertinente apenas reserva aos brasileiros natos os cargos de presidente e vice-presidente da República, o presidente da Câmara dos Deputados e não deputado, presidente do Senado Federal, ministro de Estado, ministro do Supremo Tribunal Federal, membro da carreira diplomática, oficial das Forças Armadas - tão-só oficial. É patente a dissemelhança e é também patente a implicação disto para a futura aplicação de qualquer instrumento que vise efectivar a promessa ou a possibilidade contida no n.° 3 do artigo 15.° da Constituição da República Portuguesa.
Por outro lado, Sr. Presidente, creio que poderia ter alguma utilidade que indagássemos junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, visto que isso está dentro da competência da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (CERC), qual a situação e qual o quadro que presentemente se verifica na sequência
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das diligências da Comissão das Comunidades junto do Governo Português sobre este ponto. Penso que seria muito mais que a CERC tivesse conhecimento desta matéria através das páginas de algum semanário e não pudesse obter directamente do Governo informação sobre todos estes aspectos. Deixo, portanto, esta sugestão, uma vez que o sentido de voto indiciado não ultrapassa a problemática, não a supera, não a fecha nem poderia fechá-la.
Em relação à proposta do PS, creio, Sr. Presidente, que teria alguma justificação que o PS pudesse clarificar alguns aspectos que ficaram em branco durante o debate que pudemos travar e que está reflectido no Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.° 5-RC, páginas 79 e seguintes. Porquê? Porque essa discussão deixa em aberto múltiplos aspectos, e o PS, ao contrário do que indiciaria o debate na sua complexidade, não apresentou qualquer proposta de reformulação, não apresentou qualquer proposta de substituição.
Creio que o debate travado justificaria plenamente que se trabalhasse a redacção proposta, nós compreendemos e partilhamos algumas das preocupações subjacentes à produção de uma norma deste tipo. Consideramos que é da vantagem do Estado Português introduzir na Constituição dispositivos que tenham em conta uma certa prognose de futuro nesta matéria. Mas entendemos que essa prognose de futuro não deve ir além daquilo que a própria marcha das instituições comunitárias indicia nesta matéria, designadamente tal qual ela resulta do relatório da Comissão das Comunidades ao Parlamento, das resoluções de 7 de Junho de 1983 e de 9 de Maio e 14 de Novembro de 1985 do Parlamento Europeu, do relatório intercalar da Comissão Jurídica dos Direitos dos Cidadãos de 1987 e do parecer da Comissão Política do Parlamento Europeu sobre esta matéria e também da resolução sobre o direito de voto nas eleições municipais por parte dos cidadãos de Estados membros da Comunidade aprovada em Dezembro de 1987, a qual apontava para a elaboração futura de uma directiva sobre esta matéria. A respectiva proposta devia ser apresentada no decurso do 1.° semestre de 1988 e a verdade é que viria a sê-lo com algum atraso [cf. Boletim das Comunidades, suplemento 2/88, COM (88) 371]. O texto aponta para o reconhecimento de capacidade eleitoral aos cidadãos de países comunitários residentes (ininterruptamente) em Estado de que não sejam nacionais durante certo número de anos (correspondentes à duração de um mandato dos órgãos municipais quanto à capacidade activa e de dois quanto à passiva); as eleições abrangidas são apenas as municipais (as referentes aos órgãos electivos "com poderes para gerir e administrar o primeiro escalão da organização política e administrativa" - cf. artigo 1.°, n.° 2); permite-se que o legislador nacional prive os eleitos estrangeiros do exercício de certas funções públicas que, extravasando o âmbito municipal, possam ter a ver com o exercício da soberania nacional (por exemplo, participação na eleição de representantes do município em estruturas de poder nacionais); exige-se que o eleitor estrangeiro deixe de exercer o direito de voto no seu país de origem, para evitar o voto duplo (artigo 3.°, n.° 2); propõe-se um regime transitório extremamente complexo: os Estados em que os estrangeiros residentes excedam 20% da população total podem não aplicar a directiva nas primeiras eleições em que esta seja obrigatória (artigo 11.°); nas duas eleições subsequentes à entrada em vigor da directiva os Estados membros poderão limitar o número de mandatos a distribuir a estrangeiros eventualmente candidatos (25% do total). A directiva deve ser transposta para a lei interna no prazo de três anos a contar da data em que seja notificada (artigo 14.°).
Resta dizer que não é previsível a data em que a directiva virá a ser aprovada e é bem natural que o seu conteúdo final incorpore ainda mais cautelas que as agora adiantadas. As fórmulas encontradas nas disposições transitórias revelam bem as melindrosas questões subjacentes à directiva e deixam antever dificuldades na sua concepção e aplicação (que só os mais oníricos prosélitos das eurocidadanias poderão imaginar como não irregular e acidentada em função das situações de cada Estado e do conjunto dos Estados da CEE).
Creio que tudo isto deveria ser ponderado tendo em atenção o relatório provisório que referi, redigido em nome da Comissão de Assuntos Jurídicos e dos Direitos dos Cidadãos, sobre o direito de voto nas eleições autárquicas dos cidadãos dos Estados membros da Comunidade, o chamado "Relatório VETTER" (Documento A-20197/87, série A/Parlamento Europeu/ documentos de sessão), e, por outro lado, também, além da directiva proposta nos termos que resumi, o relatório apresentado pela Comissão ao Parlamento Europeu e transmitido ao Conselho para informação em 1986 [documento COM (86) 487, versão final], além de outros documentos que têm sido produzidos no âmbito das Comunidades sobre esta matéria. Em fins de Janeiro de 1989, por exemplo, será dado novo passo na apreciação no Parlamento Europeu do Relatório VETTER [COM (88) 371, final - documento C2 - 104/88), segundo informa o boletim das Comissões (n.° 10/C-88).
Dito isto, Sr. Presidente, apelo a que o PS possa aprofundar e eventualmente explicitar as razões pelas quais aparentemente manteve a formulação que apresentou.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado António Vitorino, talvez fosse clarificador um esclarecimento.
É que, sempre que o PS não altera a sua formulação inicial constante das propostas que apresentou, é porque considera que não encontrou nem deseja uma formulação melhor. Esta formulação parece-nos bastante clara e penso que não deve ficar tudo na Constituição. Abre-se uma porta para a lei e todos esses aspectos devem ser previstos e considerados na lei. Isto é o mínimo necessário e também suficiente. É claro que nenhum outro partido está impedido de apresentar propostas de substituição, como é óbvio. Quem quiser apresentar propostas de substituição às nossas próprias propostas, desde que sejam valorizadoras das nossas, só temos que ficar gratos. Não vale é a pena perguntar por que é que não alteramos. A resposta é sempre esta: quando não alteramos é porque concordamos com o que está e não encontramos proposta melhor.
Sr. Deputado António Vitorino, tem a palavra.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, tentando seriar as questões, uma vez que se trata de duas observações em relação a dois números distintos deste artigo 15.°, e começando pela questão colocada pelo
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Sr. Deputado José Magalhães quanto à proposta do CDS, ela tem naturalmente o mérito de suscitar a questão, mas a solução que o CDS preconiza vai, por exemplo, em sentido completamente contrário àquele para que aponta a Constituição brasileira de 1988, na medida em que o que o CDS pretende é alargar a possibilidade de acesso à carreira diplomática e às Forças Armadas de cidadãos de países de língua oficial portuguesa, enquanto que essas duas categorias são expressamente excluídas pela Constituição brasileira de 1988. Portanto, não há coincidência de sentido entre a proposta do CDS e aquilo que consta da Constituição brasileira e que é em certa medida retomado no ofício da Comissão de Negócios Estrangeiros da Assembleia da República que nos foi dirigido.
Por outro lado, presumo que haja uma divergência entre a edição da Constituição brasileira que tenho e aquela que o Sr. Deputado José Magalhães tem, porque na minha o artigo a que se referiu é o artigo 12.° e não o artigo 11.°, e o elenco de matérias também não coincide totalmente, na medida em que na minha edição não consta a referência a ministro de Estado que o Sr. Deputado José Magalhães referiu. Seja como for, o problema que está aqui colocado, no fundo, é que aparentemente a Comissão de Negócios Estrangeiros seguiu demasiado perto o texto da Constituição brasileira. Porque, por exemplo, o que é, no sistema jurídico-constitucional português, "ministro de Estado"? Ministro de Estado tem um conteúdo completamente diferente no sistema jurídico-constitucional brasileiro e no sistema jurídico-constitucional português. Ministro de Estado é um ministro como os demais, que tem essa designação por força da Lei Orgânica do Governo e não por força da Constituição.
Digamos, portanto, que a proposta da Comissão de Negócios Estrangeiros nem é clara nesse aspecto, já que só refere ministros, e não o faz em relação aos secretários de Estado. Também estão excluídos ou estão abrangidos?
Quem pode o mais pode o menos?! Se se pode ser ministro também se pode ser secretário de Estado? A designação técnico-jurídica correcta no nosso sistema é a de membro do Governo. Embora não evite discutir a questão em causa, gostaria de salvaguardar as diferenças que existem entre a proposta da Comissão de Negócios Estrangeiros e aquilo que poderia ser uma proposta conforme às regras do sistema jurídico-constitucional português. Hoje todos estes aspectos que ficam abertos pela Constituição brasileira, presidente e vice-presidente da República, presidente da Câmara dos Deputados, presidente do Senado Federal, presidente do Supremo Tribunal Federal, carreira diplomática e oficial das Forças Armadas, estão de facto excluídos pela Constituição portuguesa e nem mesmo em condições de reciprocidade haverá possibilidade de conferir essa qualidade a cidadãos de países de língua oficial portuguesa sem alteração do artigo 15.° actual. Pelo que não adiantaria mais nada por ora, embora reconheça que, em relação à primeira leitura, a solução que então tínhamos avançado não responde cabalmente ao problema colocado.
Pessoalmente, não veria obstáculos a que se ponderasse um eventual alargamento no sentido preconizado pela Constituição brasileira, embora reconheça que isso levanta questões de algum melindre, como já foram sublinhadas. Se alguém formular a proposta concretamente (porque a Comissão de Negócios Estrangeiros não tem o direito de iniciativa de apresentar propostas a esta Comissão), então ponderaremos qual deva ser a sua adequada formulação.
Quanto à questão colocada pelo projecto do PS em relação ao novo n.° 4, a minha preocupação é a de reafirmar aquilo que já foi dito na primeira leitura. O que se trata é de criar uma norma de habilitação constitucional que comporte diferentes possibilidades de evolução no plano normativo corrente ou comum. De facto, continua a parecer-nos que há vantagens em que se consagre uma fórmula deste tipo, que é uma fórmula aberta, uma fórmula que não fecha portas, mas que deixa nas mãos do legislador ordinário o controlo total sobre a forma de efectivação da concessão da capacidade eleitoral a estrangeiros residentes no território nacional.
Se é activa e passiva, ou se é só activa ou se é só passiva, o legislador o dirá! Se é para todas as instâncias dos órgãos de poder local ou se é só para algumas, e como aqui inclusivamente falamos em condições de reciprocidade, estamos a contemplar quer a solução de acordos bilaterais, convenções internacionais de natureza bilateral entre o Estado Português e outros Estados, quer a possibilidade de evolução neste sentido no âmbito das Comunidades Europeias na sequência das recomendações votadas pelo Parlamento Europeu em 7 de Junho de 1983 e em 9 de Maio e 14 de Novembro de 1985. Porque sempre se deverá entender que, no caso de serem adoptados mecanismos no âmbito das Comunidades Europeias tendentes a considerar este desiderato, a condição de reciprocidade está automaticamente satisfeita pela natureza do direito comunitário, aplicável, por definição, sem restrições a todos os membros das Comunidades Europeias. Portanto, esta norma aberta permite o controlo por parte do legislador ordinário no quadro da negociação de acordos bilaterais e permite uma directriz que contempla uma solução deste tipo no âmbito do direito comunitário europeu. Aliás, três países das Comunidades Europeias já aceitam irrestritamente a possibilidade de cidadãos de países das Comunidades Europeias votarem para os órgãos das respectivas autarquias locais, a Holanda, a Irlanda e a Dinamarca, independentemente de qualquer condição de reciprocidade, sublinho. No plano europeu, a Suécia e a Noruega contemplam também a mesma possibilidade, tal como Israel. No Reino Unido há um direito de voto nas eleições locais restrito aos cidadãos oriundos da Irlanda e dos países do Commonwealth. Há debates sobre a matéria noutros países europeus, como a República Federal da Alemanha, tendentes a consagrar nível local soluções deste género.
Portanto, pensamos que o panorama europeu aponta no sentido da proposta do PS e que aquilo que poderia ser aparentemente o seu carácter vago é também a sua grande virtude. O que pretendemos é deixar ao legislador ordinário o controlo sobre as formas concretas de que pode vir a revestir-se a concessão desta capacidade eleitoral e criar a indispensável habilitação constitucional para qualquer solução deste jaez que venha a ser encontrada no âmbito das Comunidades Europeias, sem a necessidade de abrir neste terreno uma frente de eventual conflitualidade entre o ordenamento
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jurídico interno e o ordenamento jurídico comunitário como ele pode vir a ser definido num prazo que cremos relativamente curto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, dirijo-me também à Comissão solicitando a devida compreensão e as desculpas pelo facto. Queremos, de resto em conformidade com o sentido de uma intenção de voto por nós claramente expressa na primeira leitura, fazer uma pequena correcção no respeitante ao artigo 13.°, n.° 1. Em relação à proposta do CDS relativa ao artigo 13.°, o PSD mantém o seu voto contra o n.° 2, mas - embora tal facto não modifique o resultado da votação para efeitos de revisão constitucional - votamos a favor do n.° l, por fidelidade ao nosso pensamento e à nossa posição sobre a matéria.
O Sr. Presidente: - Do n.° 1 do projecto do CDS?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exacto. De resto, foi esse um dos poucos momentos da primeira revisão em que antecipámos uma atitude inequívoca. Emendamos assim o nosso erro, pedindo que o atribuam apenas ao facto de ainda não estarmos perfeitamente sintonizados com o mecanismo da votação.
Quanto à proposta do PS em discussão, manifestámos na primeira leitura uma atitude de abertura e prometemos que iríamos repensar a nossa atitude. Fizemo-lo e chegámos à conclusão, tudo ponderado, de que haveria vantagens em aprovar um preceito como este.
Reconhecemos todo o sentido das preocupações que o Sr. Deputado José Magalhães formulou, mas penso que a fórmula constitucional, na medida em que remete para a lei, se reveste de toda a plasticidade e deixa ao legislador português a possibilidade de qualificação das soluções dos ordenamentos jurídicos com que entrarmos em contacto para efeitos de reciprocidade e a resolução da questão de saber em que medida estão ou não, do ponto de vista do legislador português, satisfeitas as exigências da reciprocidade.
Por isso, Sr. Presidente, votaremos a favor desta proposta do PS.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães, queria dizer alguma coisa na sequência daquilo que já disse há dias, quando a Comissão de Negócios Estrangeiros nos propôs que consagrássemos na Constituição a dupla cidadania para os brasileiros, em homenagem à generosidade da Constituição brasileira. Em primeiro lugar, o critério diplomático não é, necessariamente, coincidente com o critério jurídico-constitucional; a visão diplomática é uma visão de amabilidade, de cortesia, de defesa de valores que nem sempre são aqueles que estão na base das cautelas do legislador. Não é a mesma coisa um país de 150 milhões ser generoso relativamente à concessão de direitos a um país de 10 milhões - já não me refiro a outros requisitos ou características dos dois países - ou um país de 10 milhões "reciprocar" (como eles costumam dizer) em relação a um país de 150 milhões e com as características que tem o Brasil. A generosidade
é muito bonita, mas a prudência também o é. De modo que, mais uma vez, chamo a atenção para o facto de nesta matéria não se poder ser excessivamente "generoso" na adopção de medias que, aparentemente, são simpáticas, mas podem ter consequências que podem chegar a ser desastrosas e até dramáticas. Não direi que exista a necessidade de fechar portas, mas talvez não se deva abri-las com uma generosidade que pode ser excessiva, em determinados casos, conjugando a relatividade de que o que é um país e o que é o outro e não menos a nossa posição em relação aos países de língua portuguesa. Porque generosidade que se tenha em relação a um destes países dificilmente se poderia pensar em recusar a qualquer dos outros. A Comissão de Negócios Estrangeiros que tenha a sua visão diplomática; que tenhamos nós a visão jurídico-constitucional mais centrada, talvez, nos eminentes interesses do Estado do que nas conveniências imediatas de uma visão gentil, diplomática. Esse é o papel da diplomacia.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP); - Pedi a palavra para abordar duas questões. A primeira talvez valha a pena encará-la já, na sequência das observações que o Sr. Presidente acaba de fazer. Gostaria que à intervenção que produzi fosse atribuído apenas este significado: não deixar de lembrar o que está colocado. Creio que isso não tem confusão possível com qualquer espécie de proselitismo proponencial. Como V. Exa. terá reparado, não me encontro entre os subscritores da proposta...
O Sr. Presidente: - Pelo contrário! Até tenho aqui uma nota sua, dizendo: "O que é isso? A Câmara de Vila Real de Santo António presidida por um espanhol?" Como vê, tenho boa memória.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente. Essa observação está trocada. A observação que citou agora aplica-se ao artigo 15.°, na proposta do PS; não se aplica à proposta atinente à sugestão da Comissão de Negócios Estrangeiros!
O Sr. Presidente: - Isto é só para dizer que não desconheço o seu estado de espírito.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação a essa matéria, gostaria tão-só de insistir na proposta que fiz - e que, creio, não provocará particular emoção negativa em ninguém - de que aprofundemos alguns dos aspectos que V. Exa. acaba de enunciar na sua intervenção. Há documentação sobre esta matéria, e essa documentação é útil para podermos levar ao cabo o trabalho de deliberação que temos entre mãos. Deveríamos solicitá-la. Nesse sentido, suponho que, no âmbito da Mesa, podemos tomar alguma medida.
O Sr. Presidente: - Pode tomar a iniciativa que quiser, mas penso que, se vamos, nesta hora da revisão constitucional, lá fora buscar aquilo que ainda não tenhamos, precisamos de uma grande justificação. Neste caso, parece-me não haver hesitações quanto ao sentido da votação; as propostas também não são assim tão abundantes. Todos estamos conscientes do que significam, quer a proposta do CDS, quer a do PS.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, não. Quanto à do PS, ainda não entrei na consideração do que quer que seja.
O Sr. Presidente: - Mas essa também é claríssima. Está votada e sem grandes hesitações, aparentemente, dado que não nos dividimos. Portanto, passaríamos à votação.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação à proposta do PS, se me permitisse, gostaria ainda de fazer uma observação - precisamente no sentido de que não se passasse à votação por uma razão que gostaria de enunciar.
É evidente que a plasticidade, flexibilidade, preocupação de não conflitualidade e todos os demais aspectos que o Sr. Deputado António Vitorino atribuiu à fórmula proposta pelo PS têm sido objecto de estudo por parte do Grupo Parlamentar do PCP. E é evidente que, como resultou do debate e resulta, mais uma vez, das observações do Sr. Deputado António Vitorino, a flexibilidade pode ser maior ou menor. Por exemplo: se fosse proposto um texto que rezasse "a lei pode atribuir a estrangeiros residentes", essa qualificação seria útil e suponho que não sairia das preocupações que o Sr. Deputado António Vitorino enunciou.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sim, sim. Mas eu estou de acordo. A residência é concedida ao fim de um ano, pelo menos esse é o prazo normal para que se faça a actualização do recenseamento, que é anual; portanto, não vejo objecções nenhumas em acrescentar esse inciso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Os órgãos comunitários têm apontado para um período de cinco anos como regra (é esse o prazo previsto na Holanda, país pioneiro neste domínio) e a proposta de directiva refere a duração do mandato dos órgãos municipais. É de ter tudo isto em conta. Eis um exemplo dos aperfeiçoamentos possíveis.
O Sr. Presidente: - Mas estava implícito; é uma explicitação.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que não estava, não, Sr. Presidente. A margem de manobra concedida ao legislador ordinário com o qualificativo "residentes" e sem o qualificativo "residentes" é, apesar de tudo, como V. Exa. facilmente reconhecerá, diferente.
Em relação à questão da capacidade eleitoral, a fórmula do PS é realmente flexível porque não explicita a dimensão, o nível. Isso é susceptível de permitir as adequadas leituras ao legislador. Já em relação à gama de órgãos autárquicos susceptíveis de serem abrangidos, a fórmula, para obedecer aos requisitos de plasticidade que os Srs. Deputados enunciaram, haveria de rezar qualquer coisa como "os titulares de órgãos de autarquias locais", porque isso permitiria matizar, abrangendo desde todas até só algumas das autarquias que, entre nós, correspondem às previstas no âmbito comunitário ou as que nós entendermos, se a opção for alargar - se assim for o caso. Em todo o caso, creio que, para a opção ser coerente, a partícula deveria ser "de", para permitir excluir as regiões administrativas, muito em concreto.
O Sr. Presidente: - "A eleição dos titulares dos órgãos" refere-se a todas as eleições. Quanto a isso não há dúvidas, o que também aumenta a flexibilidade.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que seria útil que todos os partidos pudessem ponderar este aspecto.
O Sr. Presidente: - Nós já ponderámos. O que é que pensa o PSD?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é isso, Sr. Presidente. Para a direcção do PCP poder tomar uma posição definitiva sobre esta matéria, nós precisaríamos de colher a vossa ideia sobre um texto "afinado". A nossa avaliação "final" está bastante dependente disso. Tudo aquilo que eu disse na sequência do debate anteriormente travado procura apurar o espírito subjacente à proposta do PS, aliás, agora reafirmado pelo Sr. Deputado António Vitorino. Mas creio que seria bastante importante para nós termos uma noção mais sólida e alargada da vossa posição, porque (repito) partilhamos a preocupação de criação de um instituto que permita resolver certos problemas futuros. Não temos, nesta matéria, uma posição que possa ser qualificada como de rejeição de um texto que dê resposta às questões que suscitei. Gostaríamos, por isso, de saber a vossa inclinação em relação a uma redacção que contemplasse as preocupações que exprimi. Peço que, feito isso, se assim o entenderem, o Sr. Presidente e os Srs. Deputados aceitem que a indicação do voto, em relação a esta questão, pelo menos no que diz respeito ao Grupo Parlamentar do PCP, não tenha que ser feita neste exacto momento. Como disse, terei de transmitir à direcção do grupo parlamentar e do meu partido o saldo deste debate, para ser apurada a nossa posição na sede própria.
O Sr. Presidente: - Antes de me pronunciar sobre isso, gostaria de ouvir o PSD e também a ID, relativamente aos dois aspectos: quanto ao reforço da flexibilidade: onde se diz "estrangeiros" dir-se-ia "estrangeiros residentes" e onde se diz "dos órgãos das autarquias" dir-se-ia "dos titulares de órgãos de autarquias". Seria um reforço de flexibilidade. E também relativamente ao adiamento. São estes os dois aspectos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Quanto à primeira questão parece-nos que há consenso nesse sentido. Não pode, por exemplo, um turista, que por casualidade se encontre em Portugal no dia das eleições, votar ou, por maioria da razão, ser eleito.
Quanto à segunda questão, confesso que ainda não percebi bem a diferença. Qual é a diferença entre "a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais" e "a eleição dos titulares de órgãos de autarquias locais"? Em relação a quais é que se pode com o "das" e deixa de se poder com o "de", ou o contrário?
O Sr. Presidente: - Pode sugerir que só pode a totalidade e não pode a parte.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Se dizemos que "a lei pode", é evidente...
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O Sr. Presidente: - É óbvio, mas fica mais claro que não pode só a totalidade, pode também a parte.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Mas não nos opomos...
O Sr. Presidente: - "A lei pode tornar elegíveis os loiros"; mas, se disser "pode tornar elegíveis loiros", não é a mesma coisa - "os" são todos; "loiros" podem ser alguns.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, se, com estas alterações, o PCP estiver em condições de votar já, poderemos passar à frente.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Costa Andrade, isso não acontece, pela razão que já invoquei. Útil é que tenha sido acolhida a vossa inclinação e a vossa disponibilidade - que, de resto, aprecio. Se for aquilo que parece, haveria uma inclinação positiva no sentido da flexibilização que sugeri...
O Sr. Presidente: - Ficaria apenas suspensa a votação, não reiniciaríamos o debate.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas existe essa inclinação positiva em relação à flexibilização quanto aos "dês" e quanto aos "residentes". Isso é que me parece positivo.
O Sr. Presidente: - Qual é a posição da ID sobre isto?
O Sr. Raul Castro (ID): - Pensamos que as duas alterações contribuem, efectivamente, para flexibilizar mais a disposição, podendo mesmo contribuir para pôr mais de harmonia com certas normas de direito internacional, nomeadamente da Comunidade. Pela nossa parte, somos sensíveis às duas propostas e também compreendemos que o PCP tenha necessidade de suspender a votação quanto a esta parte, para tomar uma posição futura.
O Sr. Presidente: - Portanto, fica adiada a votação para a próxima reunião. Depois disso, veremos como é que se hão-de formalizar as alterações de correcção - algum de nós propõe, e fica o caso arrumado.
A proposta da ID para o n.° 3 ainda não foi votada, mas penso que todos estamos esclarecidos sobre ela.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.
O Sr. Raul Castro (ID): - Queria apenas lembrar que, há pouco, V. Exa. salientou, oportunamente, que na realidade esta nova redacção deve ser para todas as disposições, sob pena de criar uma desarmonia.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta da ID para o n. ° 3 do artigo 15.°
Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É seguinte:
No artigo 15.°, "Estrangeiros e apátridas", no n.° 3, a expressão "países de língua portuguesa" é substituída pela expressão "países de língua oficial portuguesa".
Fica entendido que, em todos os casos em que esta expressão surja, se fará a correcção correspondente. Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Só para que fique registado em acta a nossa posição, uma vez que terminámos a discussão do artigo 13.°, dando o nosso voto favorável à proposta da ID, diria que, quanto à sugestão de redacção da Comissão de Negócios Estrangeiros, o PSD ainda não tornou sua esta proposta e mantemo-nos, até à ultima, abertos a outros textos. Mas, por princípio, vemos alguns inconvenientes na proposta tal como vem formulada, e louvamo-nos nos argumentos, que nos convenceram, do Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Nós, PCP, na Comissão de Negócios Estrangeiros vamos suscitar esta questão e propor a realização de um segundo debate sobre esta matéria. Talvez isso possa ter algumas vantagens também para os nossos trabalhos, sobretudo para os trabalhos do Plenário, como é óbvio, já não para esta segunda leitura. Esta proposta tem, aliás, como primeira subscritora a Sr,a Deputada Manuela Aguiar...
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Temos consciência disso.
O Sr. Presidente: - Mas são ópticas diferentes.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Aliás, o primeiro subscritor é o Sr. Deputado Dias Loureiro.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ah! É o deputado Dias Loureiro?!
O Sr. António Vitorino (PS): - Mais alto ainda! Depois disso, só o Papa.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Temos consciência disso!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em todo o caso, como o Sr. Presidente e o Sr. Deputado António Vitorino (suponho) puderam observar, a questão não está colocada formalmente à Comissão, uma vez que nenhum deputado com assento nesta Comissão subscreveu e fez seu este texto que, portanto, não está introduzido como objecto de votação. É, quanto muito, tema de debate, como ficou provado. Contudo, gostaria de manifestar sobre essa matéria que temos também uma posição de inclinação dubitativa negativa.
O Sr. Presidente: - Vamos passar ao artigo 16.°, em relação ao qual há uma proposta do CDS de substituição do actual artigo, no sentido de, onde está "regras aplicáveis do direito internacional", incluir "e das convenções internacionais de que Portugal seja parte ou decorrentes da dignidade e inviolabilidade da pessoa humana". Há também uma proposta do PSD de alteração do n.° 1, acrescentando também "ou decorrentes da inviolabilidade da pessoa humana". Isto foi discutido oportunamente, vamos passar à votação da proposta do CDS.
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Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta do CDS relativa ao artigo 16.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e os votos contra do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
Artigo 16.°
Os direitos fundamentais consagrados na Constituição não excluem quaisquer outros constantes das leis e das convenções internacionais de que Portugal seja parte ou decorrentes da dignidade e inviolabilidade da pessoa humana.
Há uma proposta do PSD para o n.° 1, contendo também o acrescento da expressão "decorrentes da inviolabilidade da pessoa humana".
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta do PSD para o n.° 1 do artigo 16.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e os votos contra do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
Artigo 16.°
1 - Os direitos fundamentais consagrados na Constituição não excluem quaisquer outros constantes da lei, das regras aplicáveis do direito internacional ou decorrentes da inviolabilidade da pessoa humana.
Há um artigo 16.°-A, proposto pelo PCP, do seguinte teor:
Artigo 16.°-A
1 - Além dos previstos na Constituição, a lei só pode criar deveres públicos dos cidadãos quando e na medida em que tal se torne necessário para satisfazer as necessidades públicas de importância fundamental.
2 - As leis que instituírem deveres terão carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo.
Isto foi oportunamente discutido.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O debate desta matéria provou, infelizmente, que não havia quem tivesse boas soluções, mas também que há aceitáveis razões subjacentes ao nosso texto. Todos admitiram o óbvio, ou seja, que a Constituição é incompleta neste ponto, que a própria definição de qual seja o quadro aplicável aos deveres fundamentais suscita algumas dificuldades. Em bom rigor, não há quem defenda a possibilidade de impor aos cidadãos toda a espécie de deveres, mesmo que com carácter retroactivo, mesmo que com carácter individualizado e, porventura, discriminatório por efeito indirecto.
Em todo o caso, há dificuldades na configuração de soluções concretas. Devo dizer que chegámos a trabalhar alguns textos alternativos para poder dar resposta a algumas das observações feitas pelos Srs. Deputados. Seja como for, o esforço de tipifícação de regras nesta matéria não conduziu, no primeiro momento em que o tentámos, a qualquer resultado que nos parecesse
melhor do que aquele de que tínhamos partido. Chegou a ser aventada por alguns dos Srs. Deputados uma formulação que não esquecesse os "pequenos e médios deveres", como lhes chamava o Sr. Deputado Almeida Santos, aqueles que não fossem necessários para satisfazer "necessidades públicas de importância fundamental", mas fossem necessários, apesar de tudo. Os esforços alicerçados na tentativa de utilizar um critério de pura necessidade, de mera necessidade, não nos pareceram excessivamente frutuosos. Isto porque, verdadeiramente, chegaríamos àquilo que hoje se alcança pela aplicação das regras de hermenêutica constitucional, ou seja, à insustentabilidade da imposição de deveres disparatados, despropositadamente, et cetera. O trabalhar a cláusula do n.° 1 afigurou-se-nos bastante difícil e, por outro lado, não encontrámos da parte de outras bancadas sugestões materializadas ou explicitadas. Reconhecem a existência dos problemas, declaram-se insatisfeitos, reconhecem a razão ou alguma pertinência na colocação da questão, mas depois há uma extraordinária mudez quando se trata de falar de soluções críticas positivas.
A mesma coisa em relação ao n.° 2. Compreendo que os Srs. Deputados tenham alguma preocupação em relação à proibição da instituição de deveres com carácter ou efeito retroactivo; no entanto, basta figurarem a solução contrária para se aperceberem de que é preciso imaginar limites a esse poder; alguns, são os decorrentes da natureza humana e da natureza das coisas, mas, além disso, é possível e é necessário construir, juridicamente, uma armadura que impeça a imposição arbitrária, desproporcionada, de deveres.
Perguntava, portanto, se as preocupações expressas durante o debate da primeira leitura não conduzem da vossa parte à conclusão da necessidade de algum contributo constitucional para a dilucidação desta questão, em relação à qual é preciso chegar a conclusões. A elas se chega por via hermenêutica, mas em termos que não são satisfatórios, como toda a gente reconheceu.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): (Por motivo de falha técnica não foi possível registar as palavras iniciais do orador.)
O problema é este (provavelmente não me fiz explicar com suficiente clareza): não há uma lacuna no ordenamento jurídico-constitucional português em matéria de deveres fundamentais, não há!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu não disse "lacuna", Sr. Deputado. Referi-me à "incompletude".
O Sr. António Vitorino (PS): - Mas é que é uma benfeitoria sumptuária e perfeccionista que, não tendo uma fórmula suficientemente feliz, não merece o nosso apoio.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD):- Também já nos pronunciámos durante a primeira fase da discussão dos trabalhos sobre a nossa posição relativamente à rejeição do artigo 16.°-A proposto pelo PCP.
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Teria, em relação a esta formulação, uma posição mais negativista do que a revelada pelo Sr. Deputado António Vitorino. Penso que esta disposição não só é desnecessária como é perversa. É desnecessária porque a nossa Constituição consagra o princípio fundamental in dúbio, pró libertate. O próprio conjunto de normas sobre direitos, liberdades e garantias apresenta claramente uma estrutura formal de princípios e não de regras, o que conduz a que tais normas tenham uma aplicação que não é uma aplicação "tudo ou nada", mas uma aplicação de peso e medida. Desse princípio in dúbio, pró libertate e do que decorre da maioria dos direitos, liberdades e garantias resulta o carácter restritivo dos deveres e o carácter excepcional dos mesmos deveres. Daí a desnecessidade de ter de consagrar uma norma deste tipo.
Parece-me que é aqui oportuno referir desde já também a nossa posição relativamente à proposta que o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia fez a propósito do artigo 13.° sobre o princípio da liberdade. Rejeitamo-lo com o mesmo fundamento por que rejeitamos o artigo 16.°-A proposto pelo PCP, embora obviamente a propósito de questões de sistemática diferente.
Mas o efeito perverso decorrente do artigo 16.°-A é também claro no nosso entender. Dado o aspecto de a Constituição consagrar esse princípio de in dúbio, pró libertate e dada, como disse, a estrutura formal de princípios que caracteriza as regras sobre direitos, liberdades e garantias e em geral sobre direitos fundamentais, o que o PCP está a fazer aqui é metamorfosear aquilo que tem a ver com os limites imanentes dos direitos e com a sua ponderação em caso de eventual colisão, isto é, transforma uma certa técnica de concordância prática na emergência de deveres fundamentais de carácter absoluto. Quando se prevê nesta proposta "na medida em que tal se torne necessário para satisfazer necessidades públicas de importância fundamental", o PCP está a desdobrar na caracterização de deveres, no fundo, a concordância que se há-de estabelecer caso a caso sempre que haja necessidade de compatibilizar direitos fundamentais, casos em que obviamente um direito terá de recuar de certo modo perante outro mais importante. Esta metamorfose aqui criada, esta transmutação da concordância prática em deveres fundamentais é nociva à própria intenção que o PCP parece ter na formulação deste artigo.
Por isso mantemos, como fizemos aliás na primeira fase da discussão, a nossa total rejeição em relação a esta fórmula.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, se me permite gostaria só de fazer uma observação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para tal, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de afirmar tão-só que lamento o facto de não se estabelecer em torno desta matéria um consenso que conduza a uma benfeitoria útil. Neste ponto não posso deixar de me congratular pelo facto de se sublinhar que o entendimento não perverso desta matéria já flui da Constituição por força de um conjunto de disposições que foram invocadas, em parte, por alguns dos Srs. Deputados. Gostaria de dizer que ponderaremos a solução a adoptar em termos de Plenário da Assembleia da República, uma vez que a nossa preocupação é salvaguardar a esfera jurídica dos cidadãos, impedindo a imposição arbitrária de deveres e impedindo a imposição desnecessária ou insustentável de deveres como forma de restrição e como forma de compressão da sua esfera de actuação livre. Rejeitamos naturalmente, por resultar de uma leitura deficiente, a imputação de "perversidade" ou de "coação a uma metamorfose da concordância prática" entre deveres fundamentais. Concordância prática é concordância prática, deveres são deveres; distingamos as duas coisas, vejamos onde é que se tocam e onde se separam. Aquilo que nos preocupou não foi a metamoforse kafkiana que percorria alguns espíritos, mas o impedir com rigor que o Estado, quebrando algumas das barreiras que decorrem do regime jurídico de tutela dos direitos fundamentais, venha a restringir a esfera jurídica de actuação livre dos cidadãos através da imposição de deveres, com preterição da regra da generalidade e da abstracção, com preterição até da regra da não retroactividade. E é a isto que o PSD não responde! O PSD nem sequer se mostra disponível para considerar noutra sede alguns dos casos em que clamorosamente essa retroactividade é aberrante. Provavelmente não considera que isso já decorra da Constituição, pelo menos em termos inequívocos. Em todo o caso, aparentemente, não é isso que preocupa o PSD neste debate de revisão constitucional. Tudo aquilo que nesta matéria constitua benfeitoria pura e simplesmente não interessa ao PSD. É uma atitude que entendo um pouco perversa, mas é típica do PSD como se está a ver!
Tomaremos, Sr. Presidente, na sede própria a decisão tendente a que essa perversão do PSD não seja nociva e nefasta para a Constituição da República neste ponto. Colho como contributo hermenêutico positivo para a boa interpretação da Constituição a ideia da Sra. Deputada Assunção Esteves na parte em que é boa, na parte em que é acolhível e na parte em que defende a esfera de actuação própria e livre dos cidadãos e em que sublinha que, na dúvida, prevalece a liberdade e não a intervenção restritiva do Estado. Penso que essa apreciável afirmação casada com a afirmação do Sr. Deputado António Vitorino e com aquelas que aqui estamos a produzir formam um consenso hermenêutico positivo e não perverso que já em si mesmo é um êxito da iniciativa do PCP. Ponderaremos, pois, a sua sequência exacta.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Já foram expressas as razões fundamentais por que votaremos contra esta proposta do PCP, razões essas aliás já invocadas pela minha colega Maria da Assunção Esteves durante a primeira leitura. De todo o modo, gostaria também de dar o meu contributo e de clarificar este aspecto.
Terá prevalecido na discussão até agora travada uma certa ideia de desnecessidade da norma, já decorrente de outros princípios. Isto vale, em nosso entender, fundamentalmente para o n.° 1 do artigo em análise. No que diz respeito ao n.° 2, queremos dizer, muito claramente, que a nossa razão de oposição deriva da não aceitação da consagração de um princípio constitucional de irretroactividade absoluta da criação de deveres. Para os devidos efeitos, designadamente para efeitos de sentido hermenêutico da vontade do legislador
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constituinte nesta fase da revisão, assumiremos, pois, a nossa posição quando o problema se voltar a colocar, que incide fundamentalmente na questão dos impostos. E penso que era esta a questão a que o Sr. Deputado José Magalhães se referia, classificando como aberrante o nosso eventual voto contra esta norma.
Quero apenas lembrar esta coisa curiosa: a AD propôs um preceito neste sentido, isto é, no sentido de inconstitucionalizar a possibilidade de criação retroactiva de impostos em 1982, e curiosamente o PCP votou contra tal proposta. Portanto, o PCP já nessa altura não terá considerado essa atitude como aberrante.
Em complemento da intervenção da minha colega Assunção Esteves, e em síntese, no que ao n.° 2 concerne, o nosso voto contra é ditado mais por razões de oposição de princípio ao conteúdo normativo do n.° 2.
O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação da proposta do artigo 16.°-A apresentada pelo PCP.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e do PS e os votos a favor do PCP e da ID.
É a seguinte:
Artigo 16.°-A
1 - Além dos previstos na Constituição, a lei só pode criar deveres públicos dos cidadãos quando e na medida em que tal se torne necessário para satisfazer necessidades públicas de importância fundamental.
2 - As leis que instituírem deveres terão carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo.
Vamos passar à discussão e votação do artigo 17.° Relativamente a este artigo há uma proposta do CDS de eliminação do preceito e uma proposta de alteração do PSD.
Podemos passar à votação, creio que não tem discussão, aliás foi discutido na altura própria, da proposta do CDS de eliminação do artigo 17.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID.
Votemos agora a proposta do PSD relativa ao artigo 17.° (artigo 20.° do projecto n.° 4/V).
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e os votos contra do PS, do PCP e da ID. É a seguinte:
O regime dos direitos, liberdades e garantias aplica-se aos enunciados no título n e aos direitos fundamentais de natureza análoga previstos na Constituição.
Relativamente ao artigo 18.° há uma proposta do CDS de alteração ao n.° 2, por forma a consagrar que "deverá ter a forma de lei orgânica" a lei a que se refere o n.° l, a qual só "poderá" (em vez de "pode") restringir os direitos, liberdade e garantias para salvaguarda de princípios e valores consagrados na Constituição, devendo a restrição limitar-se ao necessário e adequada a essa finalidade.
Passemos à votação do n.° 2 do artigo 18.° proposto pelo CDS.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS, do PCP e da ID. É o seguinte:
2 - A lei, que deverá ter a forma de lei orgânica, só poderá restringir os direitos, liberdades e garantias para salvaguarda de princípios e valores consagrados na Constituição, devendo a restrição limitar-se ao necessário e adequado a essa finalidade.
Em relação à sua proposta, o PSD na altura esclareceu-nos que se tratava de uma gralha. Creio que o melhor será retirar a proposta, pois será a maneira mais prática de evitar confusões, porque é apenas a eliminação da palavra "liberdade" antes de "garantias". Foi-nos dito que se tratava de uma gralha. Sendo assim, justificava-se...
Uma voz: - Há uma alteração sistemática. Vozes.
O Sr. Presidente: - Mas isso fica para outra altura. Resumindo: retiram a proposta, salvo na parte sistemática.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, vão suscitar-se agora, nos próximos artigos, algumas questões de pura natureza sistemática, uma vez que o projecto do PSD faz algumas circunvoluções para alterar a ordenação e a exposição do catálogo constitucional de direitos. Não sei qual é o critério que o Sr. Presidente tenciona seguir.
O Sr. Presidente: - A sistemática fica para o fim. Sempre partimos do princípio de que se não compreende que se encarem alterações sistemáticas sem se ter a visão global das alterações introduzidas. Penso que a Constituição desta vez terá de ser reescrita em termos sistemáticos, ou seja, com novas remissões de artigos para artigos. Não há possibilidade de se taparem, como na anterior revisão, os "buracos" que se foram criando. E mesmo assim foi preciso algum artifício, e há alguns artigos que só têm a explicação da necessidade de tapar um "buraco".
O Sr. José Magalhães (PCP): - Certo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Não há objecção?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que é prudente, embora naturalmente não possa partilhar o juízo que fez. V. Exa. está em melhores condições para avaliar esse tipo de "buracos" constitucionais decorrentes do acordo PS/PSD...
O Sr. Presidente: - Não só disso! Em relação a todas as propostas e da votação previsível quanto a elas, temos por certo que desta vez não é fácil manter a actual sistemática.
Vozes.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Em todo o caso, creio que será difícil estabelecer agora um juízo e um critério num momento em que ainda não está definida tal coisa em sede de articulado, uma vez que, como se sabe, o acordo político de revisão constitucional de 14 de Outubro é de grande parcimónia e de particular obscuridade em relação à questão do tamanho dos articulados, do volume de supressões, do volume de transposições e outros aspectos de jaez semelhante.
O que quer dizer, portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que qualquer juízo sobre esta matéria fica dependente do conhecimento, avaliação, inventariação e votação dos articulados em causa, os quais são ignotos, coisa que eu suponho só poderá alterar-se quando se chegar ao coração do acordo.
Estas as considerações, Sr. Presidente, que, creio, se justificam face ao que disse antes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Em nome dos meus companheiros do PSD, queria dar o nosso inteiro acordo àquilo que V. Exa., Sr. Presidente, disse há poucos momentos.
O Sr. Presidente: - Creio que não pode ser de outra maneira. Desta vez é previsível, e não vale a pena negar aquilo que se tornou óbvio desde a apresentação das propostas originárias.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sim, de acordo. E da qual resultará um encurtamento da Constituição, ainda que pequeno, o que é muito bom!
O Sr. Presidente: - Não acredito muito nisso, Sr. Deputado. Os artigos que se acrescentam são em número bastante elevado. E por vezes acrescentam-se em sítios diferentes daqueles onde foram retirados outros.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Em relação ao artigo 19.°, espero que tenham tido possibilidade de ler e estudar com atenção as diversas propostas apresentadas. Este artigo tem alguma complexidade técnica.
O CDS apresenta uma proposta de alteração para o n.° 2 do artigo 19.° em que elimina a referência ao estado de emergência. Assim, o n.° 2 da proposta do CDS refere o seguinte: "O estado de sítio é declarado quando se verifiquem ou estejam iminentes actos de força, insurreição ou agressão por forças estrangeiras que ponham em causa a ordem constitucional democrática, a independência ou a integridade territorial."
Para o n.° 3 o CDS propõe a seguinte redacção: "O estado de emergência é declarado quando ocorram aquelas situações com menor gravidade ou quando se verifiquem ou ameacem verificar-se casos de calamidade pública." O PS também faz uma proposta semelhante a este respeito.
O CDS altera o prazo previsto no n.° 4 de quinze para vinte dias e substitui a expressão "períodos com igual limite" por "por período com igual limite". Portanto, seria só um período de renovação e não dois. Não se percebe bem esta renovação única. Esse n.° 4 refere: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência é devidamente fundamentada e contém
a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso, não podendo prolongar-se por mais de vinte dias, sem prejuízo de eventual renovação por período com igual limite."
O n.° 5 diz que "a declaração do estado de sítio em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e religião". O CDS não se refere aqui ao estado de emergência.
Já é assim hoje, já é hoje um defeito da Constituição. Isto leva a pensar que o estado de emergência poderia afectar o direito à vida. O PS corrige esse erro. O CDS também substitui a expressão "e de religião" por "e a liberdade de consciência e religião". Também não se percebe bem por que é que o CDS elimina o "de". No entanto, esta é apenas uma questão formal.
Quanto ao n.° 6, o CDS adita a expressão "que forem objecto das medidas de excepção". Este n.° 6 corresponde ao actual n.° 5.
O n. ° 7 do projecto do CDS corresponde ao actual n.° 6 da Constituição.
O PCP mantém a actuai redacção dos n.ºs 1 a 6. Para o n.° 7 o PCP propõe o seguinte: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só pode alterar a normalidade constitucional nos termos previstos na Constituição e na lei, não podendo, nomeadamente, afectar a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e funcionamento dos órgãos de soberania e dos órgãos de governo próprios das regiões autónomas e imunidades dos respectivos titulares." Isto já consta da actual lei ordinária e há uma proposta paralela do Partido Socialista.
O PCP também apresenta um novo n.° 8, que também é uma reprodução daquilo que já consta da lei ordinária, e que refere: "Os cidadãos cujos direitos, liberdades e garantias tiverem sido violados por declaração do estado de sítio ou do estado de emergência ou por providência adoptada na sua vigência viciada por inconstitucionalidade ou ilegalidade, designadamente por privação ilegal ou injustificada de liberdade, têm direito à correspondente indemnização."
O PCP apresenta ainda um novo n.° 9, do seguinte teor: "A declaração do estado de sítio não pode afectar o acesso aos tribunais para defesa de direitos, nos termos previstos na Constituição e na lei."
O PS mantém os actuais n.ºs 1 e 2. No n.° 3 define o estado de emergência em função da menor gravidade relativamente ao estado de sítio e torna claro que só se podem suspender alguns direitos, liberdades e garantias. Assim, o n.° 3 refere: "O estado de emergência é declarado quando os pressupostos referidos no número anterior se revistam de menor gravidade, e apenas pode determinar a suspensão de alguns dos direitos, liberdades e garantias susceptíveis de ser suspensos."
No n.° 4 consagra-se o princípio da proporcionalidade e da necessidade. Este n.° 4 refere que "a opção pelo estado de sítio ou pelo estado de emergência, bem como as respectivas declaração e execução, devem respeitar o princípio da proporcionalidade e limitar-se, nomeadamente quanto à sua extensão, à sua duração e aos meios utilizados, ao estritamente necessário ao pronto estabelecimento da normalidade".
No n.° 5 exige-se uma fundamentação adequada da declaração do estado de sítio. Este n.° 5 tem algumas alterações de forma, que me parecem ter perfeita jus-
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tificação. Assim, o n.° 5 refere: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência é adequadamente fundamentada e contém a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso, não podendo o estado declarado ter duração superior a quinze dias, sem prejuízo de eventuais renovações por períodos com igual limite, desde que respeitadas as exigências constitucionais e legais." Isto já se diz hoje, mas torna mais claro o que se quis dizer.
O n.° 6 cria uma excepção relativamente ao estado de sítio e ao de emergência declarados em consequência de guerra. Assim, "a duração do estado de sítio ou do estado de emergência declarados em consequência de guerra está sujeita aos limites temporais previstos na lei". Temos uma proposta de substituição a apresentar em relação a este n.° 6.
O n.° 7 diz que "a declaração do estado de sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião". Portanto, nós neste n.° 7 também fazemos - como, aliás, não poderia deixar de ser - referência ao estado de emergência. Não é só a declaração do estado de sítio que em nenhum caso pode afectar o direito à vida. Mal fora que durante o estado de emergência se pudessem violar este e outros direitos.
Para o n.° 8 temos uma proposta semelhante à do PCP e diz: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só pode alterar a normalidade constitucional nos termos previstos na Constituição, não podendo, nomeadamente, afectar a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgãos de soberania e dos órgão de governo próprio das regiões autónomas e bem assim os direitos e imunidades dos respectivos titulares."
O n.° 9 do projecto do PS corresponde ao actual n.° 6.
Isto tudo que acabei de referir diz respeito à proposta originária, porque na proposta de substituição que apresentámos há algumas precisões e algumas melhorias que gostaríamos fossem tomadas em conta em termos de só esta proposta de substituição ser considerada pelos Srs. Deputados. Portanto, retiramos a nossa proposta originaria. A proposta de substituição prejudica, assim, a proposta originária. Penso que não é necessário dizê-lo, porque sempre assim sucede.
Espero que estejamos em condições de votar todas estas propostas.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a proposta apresentada pelo Partido Socialista, em sede de reformulação do texto originário, suscita alguns problemas...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Faça favor, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Peço desculpa, Sr. Deputado, mas esqueci-me de referir que o PCP também apresenta uma proposta de substituição do n.° 7, que refere: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só ocorrerá quando não possam ser eliminados por outra forma os actos que o justificam, não devendo, nomeadamente (...)"
Fica, portanto, feita a correcção. É uma proposta de substituição do n.° 7.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, como pudemos verificar durante o debate feito na primeira leitura, todos os partidos querem aperfeiçoar o artigo 19.°, salvo o PSD - mas apenas nesse momento originário, já que ulteriormente associou-se às preocupações enunciadas durante o debate e disponibilizou-se para encarar favoravelmente aperfeiçoamentos. Teve-se em conta o facto de entre a primeira revisão constitucional e o momento actual ter ocorrido a aprovação - de resto, com consenso alargado - da Lei n.° 44/86, de 30 de Setembro, que definiu o regime do estado de sítio e do estado de emergência.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Julgo que não teria sido bem assim, Sr. Deputado, mas, como sabe, nessa altura eu estava muito longe...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Foram todos os partidos, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mesmo os que não estão aqui presentes e que não fizeram propostas, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa lei não contou com nenhum voto contra e o processo de elaboração do seu texto representou um apreciável esforço no sentido de verificar quais os contornos e implicações do regime do estado de sítio e do estado de emergência, que suscitam, como o Sr. Deputado Pedro Roseta sabe, dificuldades constitucionais e práticas bastante apreciáveis. O trabalho da Comissão de Defesa Nacional, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e até mesmo o trabalho conjunto de ambas conduziu a uma razoável clarificação de alguns aspectos até então insuficientemente abordados em sede parlamentar, polémicos em termos doutrinais e extremamente melindrosos em termos institucionais e práticos. O nosso grupo parlamentar veiculou no seu projecto de revisão constitucional tão-só três das ideias que fluem da Lei n.° 44/86. Os Grupos Parlamentares do Partido Socialista e do CDS extraíram dessa lei outros aspectos e é por isso que as propostas são complementares e formam, no seu conjunto, uma apreciável contribuição para a modelação mais aperfeiçoada do regime do estado de sítio e do estado de emergência na Constituição portuguesa.
A reformulação que apresentámos visa contemplar um aspecto que consta do n.° 1 do artigo 8.° da lei que referi. Esse artigo estabelece o seguinte: "O estado de sítio é declarado quando se verifiquem ou estejam iminentes actos de força ou insurreição que ponham em causa a soberania, a independência, a integridade territorial ou a ordem constitucional democrática e não possam ser eliminados pelos meios normais previstos
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na Constituição e na lei." A discussão desta cláusula, que aponta para o uso, para o esgotamento, para a utilização máxima possível daquilo que só podem ser considerados meios normais previstos na Constituição e na lei - e muitos são -, é uma contribuição bastante importante do debate feito, designadamente na Comissão de Defesa Nacional. Trata-se de uma componente extremamente útil para modelar os próprios contornos do estado de sítio e tem uma matriz inspiradora explícita no actual n.° 6 do texto em vigor quando aponta para a ideia de normalidade constitucional e fixa como meta suprema em estado de sítio a busca da normalidade. No entanto, isto tem um contraponto: assim como a declaração do estado de sítio deve buscar o restabelecimento da normalidade no mais curto prazo possível, também o decretar do estado de sítio só deve ocorrer quando a normalidade constitucional não permita enfrentar os actos que legitimam a declaração do estado de sítio. Esta ideia de normalidade, funcionando num sentido e noutro, funcionando tanto no sentido de se regressar à normalidade decretada pelo estado de sítio como no de não se caminhar para o estado de sítio se se puder manter o País na normalidade, parece-nos um dos pontos mais clarificadores e úteis do debate que fizemos na Assembleia da República sobre esta matéria.
O debate que fizemos na primeira leitura reforçou em nós esta convicção. Creio que no apuramento que se pode fazer a partir da leitura das actas um dos aspectos para que deveríamos caminhar, por razões de coerência e de rigor, deveria ser precisamente esse. Por isso nos permitimos adiantar uma proposta de formulação que assim substituiria o texto originariamente apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP.
Em relação às propostas apresentadas pelos Srs. Deputados do Partido Socialista, gostaria de dizer que elas colocam questões bastante diferentes. Começaria talvez pela mais simples. A questão colocou-se há pouco, mas foi dirimida em termos satisfatórios. Creio que neste caso também o será. O Partido Socialista utilizou aqui uma técnica que nos suscita alguma apreensão. Quem ler o n.° 9 da proposta do Partido Socialista poderá de imediato verificar que ele reproduz o texto do n.° 8 apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. António Vitorino (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. António Vitorino (PS): - Neste caso o Sr. Deputado não tem razão, porque este n.° 8 reproduz exactamente o n.° 8 da nossa proposta do projecto de revisão constitucional. Aqui não piratiámos nada ao Partido Comunista e o "bem assim" já vem desde o início da nossa própria proposta. Não houve aqui nenhum gesto inamistoso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Refiro-me ao n.° 9, Sr. Deputado.
Em relação ao n.° 9 suscita-se a questão, que, por todas as razões e por todas as regras aplicáveis ao caso, desde logo pelo facto de quanto à iniciativa reformulatória, quanto às implicações em termos de ordem de votação, uma solução desse tipo poderia conduzir a uma certa distorção das regras sobre a propositura inovatória, a uma alteração menos devida da ordem de votação das propostas. Nem sequer sou capaz de imaginar os efeitos dessa opção na sua pluralidade e no seu desenvolvimento em espiral, porque ela implicaria que qualquer partido, através da técnica da adopção ou da absorção, poderia fazer suas as propostas originariamente apresentadas por outro, assumi-las para só votar essas propostas se suas, isto é, se adoptadas, em detrimento dos que as apresentaram originariamente. Creio que isso contraria a lógica do processo de revisão constitucional, que é um processo de acumulação em que os contributos originários podem, evidentemente, ser objecto de enriquecimentos. Se não são objecto de enriquecimentos comuns hão-de ter de ser votados os textos originariamente apresentados pelos seus autores por uma questão de quase copyright, aplicado mutatis mutandis aos direitos de iniciativa em sede de revisão constitucional.
Creio que só por lapso é que tal coisa terá podido ocorrer. De resto, isso tem a importância que tem e apenas gostaria de sinalizar que como regra a absorção nos pareceria uma solução inteiramente irrazoável. Sabendo nós que há um acordo político de revisão constitucional, acordo, ainda por cima, aberto a ulteriores entendimentos da mesma e de outra natureza, seria extremamente nefasto, negativo que a viabilização de propostas apresentadas por "partidos terceiros" passasse por uma absorção prévia (por algum ou ambos os partidos subscritores do pacto) do texto originário apresentado por esses outros partidos. Creio que isso está fora das considerações dos proponentes e que não estará subjacente a esta absorção aqui praticada no n.° 9 do Partido Socialista. Quero crer...
Em todo o caso, Sr. Presidente, creio que seria útil que este aspecto pudesse ser clarificado.
Em relação ao texto apresentado pelo Partido Socialista quanto a outros aspectos, gostaria de dizer que não nos oferece nenhuma objecção o proposto no n.° 3. Esse n.° 3 parece-nos positivo, tem em conta aquilo que a lei estabeleceu, aperfeiçoa, através de um recorte mais preciso do que seja o estado de emergência, a actual redacção constitucional.
Em relação ao n.° 4 da versão reformulada do Partido Socialista, gostaria de perguntar aos proponentes se consideram que a norma está compatibilizada, em bons e devidos termos, com o actual n.° 6, que passaria a n.° 10 do texto proposto pelo PS. Esse n.° 6 reza: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência confere às autoridades competência para tomarem as providências necessárias e adequadas ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional." Esta norma que consta do n.° 4 tem a ver com a instituição do princípio da proporcionalidade em todas as suas dimensões, recorrendo-se ao conceito de estrita necessidade para qualificar o modus agendi dos órgãos de poder durante o período de estado de sítio e de estado de emergência. Em todo o caso, a compatibilização entre um texto que estabelecesse o que estabelece esse n.° 4 e outro que estabelecesse o que estabelece o actual n.° 6/n.° 10 foi pensada pelos proponentes? Entendem que a concordância prática é total, é rigorosa, ou seria necessário fazer uma compatibilização em melhores termos?
Por outro lado, em relação ao n.° 5 creio que já flui da Constituição o segmento que os Srs. Deputados aditaram. Como é óbvio, não virá mal ao mundo se ele for aditado expressis verbis. É evidente que as renova-
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coes dos estados de excepção têm de ser feitas respeitadas as exigências constitucionais e legais. Aliás, nem poderia ser de uma outra forma. Não poderia o estado de sítio, uma vez declarado, ser renovado senão exactamente com o cumprimento das mesmas regras e formalidades que presidiram à sua declaração originária. Em todo o caso, não vemos nenhum inconveniente na explicitação.
Quanto a outra inovação, o estado declarado "ter duração superior", é uma outra redacção para aquilo que decorre da Constituição. A redacção actual diz: "(...) não podendo prolongar-se por mais de quinze dias". Aqui substitui-se esta expressão, por "não podendo o estado declarado ter duração superior a quinze dias". Não percebo porquê e para quê. Dentro deste género literário muitas correcções poderiam ser feitas à Constituição. Em boa verdade, poderia reescrever-se de cabo a rabo a Constituição, adoptando esse critério. É uma expressão equivalente!
O Sr. Presidente: - Não é equivalente, Sr. Deputado. O que não pode prolongar-se...
O Sr. José Magalhães (PCP): - De qualquer forma, seria útil, se é essa a opinião do PS, a clarificação do porquê.
O Sr. Presidente: - O estado é que não pode prolongar-se. Trata-se de uma precisão. O que não se pode prolongar é o estado declarado e não a declaração. Parece a mesma coisa mas não é. E então na segunda parte não é mesmo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito obrigado. Na segunda parte há uma explicitação de qualquer coisa que de todas as letras haveria de decorrer da Constituição. Seria absurdo que, tendo o estado de sítio sido declarado pela acção conjunta de três órgãos de soberania, pudesse um deles, por si só, ulteriormente, renovar essa declaração. Isso está absolutamente fora de questão face ao próprio conteúdo da Constituição na sua redacção actual. Pela nossa parte não vemos nenhuma objecção em explicitar melhor e oxalá assim aconteça por parte das outras bancadas.
O Sr. Presidente: - Nem pensámos que fosse mais do que isso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação ao n.° 6 do artigo 19.°, creio que o problema suscistado é realmente um problema!... Ele é sério! A formulação que agora é adiantada é um pouco diferente da que consta do texto originário apresentado pelo PS. Este referia: "A duração do estado de sítio ou do estado de emergência, declarados em consequência de declaração de guerra, está sujeita aos limites temporais previstos na lei." Agora diz-se: "(...) poderá ser sujeita por lei a limite superior a quinze dias". Devo dizer, francamente, que parece a mesmíssima coisa, porque das duas uma: ou a Constituição fixava um limite base diferente de quinze dias para o caso de guerra, ou se não o faz a duração terá sempre de ter limite superior a esse período de tempo... É óbvio que superior a quinze dias sempre teria que ser, caso contrário infringia-se o limite que é geral. O PS não propõe agora que haja um limite base mais dilatado para tempo de guerra fixado na Constituição.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se do problema da falta de lei. Pode dizer-se que enquanto não houver lei terá de aplicar-se o prazo geral. Pretende-se também aí fazer uma precisão, e não mais do que isso.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Obviamente. A proposta apresentada parece sensata e razoável, e penso que seria bastante útil se pudéssemos reflectir sobre ela.
Em relação ao n.° 7 do referido artigo, Sr. Presidente, creio que a respectiva explicitação é susceptível de induzir a uma certa confusão. Por outras palavras, o Partido Socialista copiou, bem, presumo eu, o artigo 2.° da Lei n.° 44/86.
O Sr. Presidente: - Nem copiámos, Sr. Deputado, coincidimos. Na altura não tínhamos isso presente, mas imaginámos que a restrição teria de ser aplicável aos dois estados e não a um somente. A única dispensabilidade era a maioria de razão: se o maior não pode afectar, naturalmente que o menor também não pode. Mas, como há sempre intérpretes sofistas...
O Sr. José Magalhães (PCP): - É essa exactamente a questão, Sr. Presidente. De facto, chegou-se a consenso em sede de elaboração de lei ordinária quanto a esse raciocínio de maioria de razão e tudo o que diz respeito à análise da génese e do processo de aprovação do artigo 19.° aponta nesse sentido. Sereia absolutamente absurdo que relativamente ao estado de emergência, o qual tem por definição uma natureza menos grave que o estado de sítio, se pudesse extrair da lei, a contrario, que nele seria possível fazer aquilo que a nenhum título é possível fazer em estado de sítio. É totalmente absurdo e não tem a mínima cobertura.
O Sr. Presidente: - Só que o mesmo argumento se aplicaria à declaração - a Constituição menciona os dois estados de excepção - e há outros números que referem o estado de sítio e o estado de emergência. Por que é que no caso em que se prevê a impossibilidade de restrição de direitos fundamentais apenas se menciona um? Nessa linha de raciocínio era dispensável isso em todos os casos, considerando-se o estado de sítio o mais, como tal incluído o menos. De qualquer modo, não vem mal ao mundo se ficarem expressos os dois estados em vez de um apenas. Não lhe parece, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sim, Sr. Presidente. Se houver consenso alargado nesse sentido, parece-me que isso poderá ser virtuoso. De contrário, não o será, seguramente.
Por outro lado, em relação ao n.° 8 do artigo 19.° nenhuma objecção podemos ter porque somos "almas gémeas". De qualquer modo, o projecto de revisão constitucional do PCP foi apresentado em primeiro lugar.
Risos.
O Sr. Presidente: - A nossa redacção não é rigorosamente coincidente com a vossa. E o nosso português é melhor!
O Sr. José Magalhães (PCP): - De facto, dizem "é bem assim", com o que estou inteiramente de acordo, literariamente.
Risos.
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Pode-se perfeitamente fazer um consenso em torno desse "e bem assim".
Congratulo-me pela adesão do Partido Socialista à nossa ideia. Em todo o caso, esta não pode ser a fórmula a adoptar. Ficaríamos muito honrados se o PS votasse a nossa proposta, como seguramente deverá suceder. No entanto, pediria que, por favor, não a absorvessem. Teríamos também muito gosto que o fizessem em relação ao texto do n.° 9 apresentado pelo PCP.
O Sr. Presidente: - As vossas propostas serão votadas antes das nossas, como é óbvio.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Aliás, isso acontecerá sempre, desde o início até ao final.
Sr. Presidente, deixaria no ar estas interrogações, que sobretudo no que se refere aos primeiros artigos envolvem algum melindre. A matéria é realmente importante.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de dizer algo a propósito deste último ponto para esclarecer a questão da susceptibilidade do copyright em relação ao texto deste n.° 8 apresentado pelo PCP e aquilo que está estabelecido como n.° 9 do nosso projecto.
Não pretenderia fazer comentários acerca da qualidade do português deste n.° 8 do projecto do PCP. Ele consiste num certo emaranhado de "por's" e "de's" - por inconstitucionalidade ou de ilegalidade - que torna imperceptível parte do preceito. Mas há, apesar de tudo, uma diferença de ordem substantiva entre os referidos textos, que é a seguinte: na nossa proposta não optámos por nenhuma especificação das circunstâncias que podem dar origem à excepção que vem prevista no n.° 8, isto é, não vamos fazer referência à privação ilegal ou injustificada de liberdade. Este foi o conteúdo útil do debate que travámos aquando da primeira leitura. De facto, dissemos que estávamos de acordo com a proposta do PCP mas que considerávamos que este inciso não deveria constar do texto da Constituição, porque haveria que perguntar porquê incluir este e não outros.
Assim, para além de tornar confusa a redacção do próprio preceito, deve-se sublinhar que há uma diferença substantiva entre as duas propostas. Não pretendemos retirar o copyright da ideia ao Partido Comunista, que é dele, em matéria de indemnização às vítimas. No entanto, há uma diferença entre as ditas propostas. Por exemplo, não votaremos contra a proposta apresentada pelo Partido Comunista, mas também não votaremos a favor porque temos a nossa própria proposta. Entendemos que o texto que propomos contempla o essencial do proposto pelo PCP, em melhor português, e retirando um inciso que dele poderia, em meu entender, ser retirado com vantagens e sem qualquer prejuízo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, se me permite a interrupção, dir-lhe-ia que a boa solução nesse caso seria, talvez, caminhar-se para aquilo a que se pode chamar, com respeito pelas autorias, a proposta comum.
O Sr. António Vitorino (PS): - Com muito gosto, Sr. Deputado. Nós não aspirávamos a tanto, mas se quiser dar-nos o prazer de nos acompanhar na apresentação de uma proposta comum só nos sentiremos com isso honrados.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não vejo, neste ponto e neste quadro, inconveniente, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães levantou um problema que pode ter alguma razão de ser. Mas, no fundo, creio que não se justifica a eliminação, ou melhor, não me parece que haja uma verdadeira repetição entre o nosso n.° 4 e o actual n.° 6 no que se refere ao artigo 19.° O n.° 4 que propomos diz respeito à opção entre o estado de sítio e o estado de emergência, bem como às respectivas declaração e execução. Na referência à execução passaria a poder dispensar o actual n.° 6.
Em todo o caso, o actual n.° 6 o que é que diz? Que a declaração do estado de sítio deve conferir poderes e competências às autoridades. Essa atribuição de poderes deve ser feita com o mesmo respeito pelo princípio da necessidade e da adequação. Poderá haver alguma repetição, mas é saudável. De qualquer modo. se em sede dê redacção finai víssemos que haveria duplicação desnecessária, teríamos sempre a oportunidade de eliminá-la. No entanto, creio que não se verifica verdadeira duplicação. Trata-se aqui apenas de vincular as autoridades que têm de declarar o estado de sítio a não se esquecerem também, e nomeadamente na atribuição de competências, de respeitarem o princípio.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que o conteúdo útil do actual n.° 6 é fundamental na lógica de todo o preceito. O conteúdo útil é grande e é um dos aspectos basilares para a definição da própria natureza do estado de sítio que define a teleologia na concessão dos poderes às autoridades.
O Sr. Presidente: - Por isso mesmo não propusemos a substituição.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, ele desempenha em toda a arquitectura do estado de sítio um papel fulcral. Nesse sentido, a não alteração do artigo é fundamental quanto ao seu conteúdo. É evidente que ele poderia ser expresso para manter a mesma utilidade, embora provavelmente houvesse alguma vantagem em fazê-lo acoplando-o a esta norma. Em todo o caso, compreendo que se pode tornar difícil fazer essa discussão porque isso originaria um preceito muito extenso.
O Sr. Presidente: - Temos de deixar alguma coisa par a sede de redacção. Srs. Deputados, iríamos passar agora às votações.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E em relação ao outro ponto, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Qual ponto?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em relação ao estado de guerra... De facto, o Sr. Presidente já se pronunciou acerca disso.
O Sr. Presidente: - Já sim, Sr. Deputado.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, sugeria que a bancada do PSD dissesse qualquer coisa acerca do preceito porque senão esta discussão parece um tanto bipolarizada, o que me parece redutor.
O Sr. Presidente: - O direito ao silêncio é um dos direitos fundamentais do homem e do cidadão.
Então, começaríamos por votar a proposta da autoria do CDS relativa ao n.° 2 do artigo 19.°
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, gostaria apenas de responder ao desafio - se assim lhe posso chamar - lançado pelo Sr. Deputado José Magalhães.
Como é conhecido do Sr. Presidente e da Comissão, o PSD não apresentou nenhuma proposta de alteração a este artigo. O PSD considerava, na altura da elaboração do seu projecto, que os actuais textos relativos ao artigo em causa, conjugados cada qual no seu devido lugar com a lei ordinária, serviam as exigências de uma ordem jurídica que se tem de pronunciar sobre a problemática do estado de sítio e do estado de emergência. De todo o modo, participámos na discussão na primeira leitura e trocámos alguns pontos de vista com as restantes forças políticas. Fomos convencidos da utilidade de introduzir algumas inovações nesta matéria, e só nesta, não noutras. Temos ainda, contudo, algumas dúvidas acerca deste artigo.
Sr. Deputado José Magalhães, reparo na sua expressão interrogativa...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mais que interrogativa, perplexa!
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Eu explico-lhe, Sr. Deputado.
Iniciámos o processo de revisão constitucional acreditando que não era necessário introduzir alterações à Constituição nesta parte. Participámos na discussão e, como em todas as discussões pode acontecer, fomos sendo convencidos, fundamentalmente, da necessidade de introduzir algumas alterações nesta matéria. Convencemo-nos e votaremos nesse sentido. Contudo, não fomos convencidos quanto à necessidade de outras alterações que não estas e votaremos também nesse sentido. Além disso, mantemos ainda em relação a outras alterações propostas um estado de alguma dúvida. Exprimiremos também essas dúvidas, solicitando, nomeadamente, o aditamento da votação do artigo 19.° Era isso que nos propúnhamos fazer quando lá chegássemos, mas antecipo já a sugestão e satisfaço com isso a curiosidade do Sr. Deputado José Magalhães.
Temos algumas dúvidas quanto ao n.° 7 proposto pelo Partido Comunista na parte em que é idêntico à proposta do Partido Socialista relativa ao n.° 8. E isto representa já um progresso da nossa parte, uma vez que durante a primeira leitura nos pronunciámos expressamente contra a introdução na Constituição de um texto como este, que, de resto, já consta da lei ordinária.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, o PSD tem dúvidas quanto ao n.° 7 do artigo 19.° expresso na proposta do PCP e ao respectivo n.° 8 proposto pelo PS. Qual é a segunda dúvida?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - É só isto, Sr. Deputado. Estava eu a dizer que aquando da primeira leitura nos opusemos a esta redacção, mas fomos convencidos das vantagens de reflectir a questão. Encontramo-nos ainda nesse estado. De resto, temo-lo feito activamente. Se tivéssemos de votar já hoje esse texto em definitivo - pela nossa parte não seria necessário adiar a votação da matéria -, votaríamos talvez contra. Mas estamos ainda a rever a matéria e a solicitar aos demais partidos formulações que respondam a algumas das objecções da nossa parte. Entendemos que, tal como está, para efeitos de lei constitucional - bem sabemos que já está assim consagrado em lei ordinária -, e como vem proposto tanto pelo Partido Comunista como pelo Partido Socialista...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, refere-se ao texto do n.° 8?
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente. Tal como está formulado - e isso será porventura reforçado com mais conhecimento de causa pelo meu colega Rui Machete- suscita-nos algumas reticências. Sr. Presidente, entendemos que não estamos ainda suficientemente amadurecidos para votar esta formulação.
Repito: estamos disponíveis para votar, concordando com umas alterações e votando contra outras, as propostas apresentadas. No entanto, solicitamos à Comissão que a votação das propostas relativas aos n.ºs 7 e 8 seja adiada.
O Sr. Presidente: - Está deferido, Sr. Deputado. Vamos então votar a proposta de alteração do n.° 2 do artigo 19.° apresentada pelo CDS.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS e do PCP.
É a seguinte:
2 - O estado de sítio é declarado quando se verifiquem ou estejam iminentes actos de força, insurreição ou agressão por forças estrangeiras que ponham em causa a ordem constitucional democrática, a independência ou a integridade territorial.
Srs. Deputados, vamos proceder agora à votação da proposta relativa ao n.° 3 do artigo 19.°, da autoria do CDS. Ela coincide em parte com uma proposta do PS, mas, enfim, tomaremos isso em conta para efeitos de votação. Nós vamos abstermo-nos.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado as abstenções do PSD, do PS e do PCP.
É a seguinte:
3 - O estado de emergência é declarado quando ocorram aquelas situações com menor gravidade ou quando se verifiquem ou ameacem verificar-se casos de calamidade pública.
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Srs. Deputados, na medida em que a proposta apresentada pelo CDS relativamente ao n. ° 5 do artigo 19.° trata de uma questão formal, não creio que valha a pena perdermos muito tempo com ela.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - E o n.° 4 proposto pelo CDS?
O Sr. Presidente: - Desculpem, Srs. Deputados. Trata do aumento para vinte dias do actual prazo estabelecido de quinze dias, e mediante apenas um período e não vários períodos.
Vamos então votar o n. ° 4 do artigo 19.° proposto pelo CDS.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS e do PCP.
É o seguinte:
4 - A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência é devidamente fundamentada e contém a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso, não podendo prolongar-se por mais de vinte dias, sem prejuízo de eventual renovação por período com igual limite.
Em relação à proposta apresentada pelo CDS para o n.° 5 do artigo 19.°, trata-se apenas de matéria de redacção e não vale a pena estarmos a pronunciar-nos acerca disto.
Vamos então votar esta proposta.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado as abstenções do PSD, do PS e do PCP.
É a seguinte:
5 - A declaração do estado de sítio em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e religião.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Não, não! É óbvio. Claro que sim. A comissão de redacção tem de ter poderes para corrigir e aperfeiçoar a linguagem.
Quanto ao n.° 6, acrescenta "que forem objecto de medidas de excepção". Também me parece que não é só formal, não é só de redacção - aqui tem significado importante.
Srs. Deputados, vamos então proceder à votação da proposta do CDS para o n.° 6 do artigo 19.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PS e do PCP e a abstenção do PSD.
É a seguinte:
6 - A declaração do estado de emergência apenas pode determinar a suspensão parcial dos direitos, liberdades e garantias que forem objecto das medidas de excepção.
A última proposta do CDS, porque é apenas sistemática - o n.° 7 passar a ser o actual n.° 6 -, não se vota.
Vamos agora passar à proposta do PCP relativa ao n.° 7 do artigo 19.°, que é uma proposta nova que corresponde ao n.° 8 e, portanto, estaria adiada.
Quanto à proposta do PCP para o n.° 8...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a proposta do PCP para o n.° 8 tem...
O Sr. Presidente: - Tem grande semelhança com a proposta...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não. Essa é a tal, Sr. Presidente, que daria origem, sem necessidade de formalização adicional, a uma proposta...
O Sr. Presidente: - Corresponde à nossa. Nós nisto íamos abster-nos, com a declaração de que entendemos que, em parte...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente. Se há uma proposta conjunta, não há necessidade de submissão a votação.
O Sr. Presidente: - Não, desculpe. Iríamos abstermos com essa declaração. Mas, uma vez que levanta a hipótese de uma proposta conjunta, nessa altura reservamo-nos para quando aparecer a proposta. Também fica adiado. Estão de acordo, Srs. Deputados?
O Sr. António Vitorino (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do Orador.)
O Sr. Presidente: - O melhor era ficar adiado até vir a proposta.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação da proposta do PCP para o n.° 9 do artigo 19.°
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e do PS e os votos favor do PCP.
É a seguinte:
9 - A declaração do estado de sítio não pode afectar o acesso aos tribunais para defesa de direitos, nos termos previstos na Constituição e na lei.
Passemos agora às propostas de alteração do PS relativamente ao artigo 19.°, n.° 3.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, queria só chamar a atenção, sobretudo do PS, para uma pequena deficiência de redacção, que, de resto, foi suscitada pela minha colega Assunção Es tevês. Nós estamos de acordo com o princípio e votaremos a favor. Mas suscitamos a seguinte questão: quando se diz que "o estado de emergência é declarado quando os respectivos pressupostos se revistam de menor gravidade", o que é que o PS entende por "respectivos pressupostos"? Quererá talvez dizer "quando os pressupostos fácticos se revistam de menor gravidade"? Será isto? Não são "os pressupostos respectivos", não é verdade?
O Sr. Presidente: - "Fácticos" é uma palavra feia!...
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O Sr. Costa Andrade (PSD): - Eu não estou a propor o inciso "fácticos", só estou a argumentar. Será melhor dizer "quando os pressupostos" no terreno "forem de menor gravidade"; não são os pressupostos "respectivos". É que existe aqui uma deficiência de formulação e até um vicio lógico.
O Sr. Presidente: - Eu acho que é "os respectivos", porque o estado de emergência, aqui, é no sentido de cada estado.
A Sr." Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, eu penso que o PS, quando formulou...
O Sr. Presidente: - Se quiserem, podemos pôr: "quando os pressupostos do estado declarado". Estará bem assim?
A Sr." Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, acho que a melhor solução é remeter para a proposta que tinham no projecto inicial, onde se dizia: "o estado de emergência é declarado quando os pressupostos referidos no número anterior(...)" (que são os de estado de sítio). Agora, aqui não podia ser assim porque é mesmo um vício lógico claro.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Muito bem.
Estamos então em condições de votar, com esta alteração, a proposta do PS em relação ao n.° 3 do artigo 19.°
Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS e do PCP.
É a seguinte:
3 - O estado de emergência é declarado quando os pressupostos referidos no número anterior se revistam de menor gravidade, e apenas pode determinar a suspensão de alguns dos direitos, liberdades e garantias susceptíveis de serem suspensos.
Temos agora a proposta do PS relativa ao n.° 4 do artigo 19.°: é o princípio da proporcionalidade e a regra da necessidade que me parece razoável - está na lei ordinária. É apenas a sua consagração constitucional.
Vozes.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas parece-nos que é matéria de lei ordinária.
O Sr. Presidente: - Querem adiar?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não. Mas parece-nos que é uma matéria que está bem na lei. A nossa deliberação, neste momento, é no sentido de votar contra, pois entendemos que não é necessário constitucionalizar esta norma.
O Sr. Presidente: - O problema é que este número é novo. O PSD tende a votar contra. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É que este aspecto é um aspecto crucial em relação ao qual, apesar de tudo, creio que se justificaria que o PSD pudesse - tal como não quis consumar, sensatamente, em relação ao n.° 7 proposto pelo PCP- fazer uma ponderação que conduza eventualmente a outra redacção, mas que preserve a ideia básica. Porque, reparem: o princípio da proporcionalidade é um dos princípios basilares que regem toda a matéria do estado de sítio, em todos os momentos. A lei, no seu artigo 3.°, e nesse ponto a lei foi unânime, refere: "a suspensão ou a restrição de direitos, liberdades e garantias previstos nos artigos 8.° e 9.° devem limitar-se, nomeadamente quanto à sua extensão, à sua duração e aos meios utilizados, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade". E o n.° 2, aprovado pelo PSD, diz: "A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só pode alterar a normalidade constitucional nos termos previstos na própria Constituição e na presente lei, não podendo nomeadamente afectar a aplicação das regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgãos de soberania e dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas e bem assim os direitos e imunidades dos respectivos titulares."
Devo dizer que não encontro qualquer razão de coerência, ou razão de princípio, que justifique o repúdio de uma solução deste tipo!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Já me referi à distinção entre o que deve ficar na Constituição e na lei ordinária. Não se podem constitucionalizar todos os princípios em todas as matérias!
Sr. Presidente, dá palavra à Sr." Deputada Assunção Esteves para completar a resposta a esta questão?
O Sr. Presidente: - Com certeza. Tem palavra a Sr." Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sr." Maria da Assunção Esteves (PSD): - Só para justificar a nossa posição, em relação à rejeição do n.° 4 do artigo 19.° proposto pelo PS, que é, da nossa parte, clara, e não nos levanta dúvidas esta tomada de atitude.
Quando, no n.° 4 desta formulação, se refere que a opção pelo estado de sítio ou pelo estado de emergência deve respeitar o princípio da proporcionalidade, parece-nos haver aqui uma repetição desnecessária. E isto porquê? Em primeiro lugar, a definição de estado de sítio e a de estado de emergência, que constam respectivamente do n.° 2 e do n.° 3 da mesma proposta, são em si definições que não existem ao acaso, não servem apenas para identificar o estado de sítio ou o estado de emergência; têm uma função óbvia de criação simultânea dos pressupostos da competência das autoridades que vão declarar o estado de sítio ou o estado de emergência. Isto é, ao definir-se, no n.° 2 e no n.° 3, o que são o estado de sítio e o estado de emergência, não se está a dar apenas a conhecer ao intérprete quais são os traços característicos de ambas as situações de excepção, mas está-se a criar, do ponto de vista do rigor da delimitação da competência das autoridades que optam, exactamente os limites de competência para essa opção.
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E, portanto, essa competência resulta directamente da definição quer do estado de sítio, quer do estado de emergência. A ideia da desnecessidade que nos decorre aqui é, sobretudo, fundamentada na noção de que, a não ser assim, as autoridades seriam incompetentes para a declaração quer, num caso, do estado de sítio quer, no outro, do estado de emergência, e teríamos exactamente aqui a figura da incompetência e, portanto, sem necessidade de apelo a princípios mais fluidos como o princípio da proporcionalidade. É uma razão técnica, clara, que acolhe a prudência do legislador constituinte - neste caso a nossa própria prudência.
Por outro lado, há a acrescentar neste sentido que, tal como disse o Sr. Deputado José Magalhães, o próprio n.° 6 tem aqui uma função conformadora que, obviamente, numa boa interpretação, deve ser acolhida no âmbito da opção pelo estado de sítio ou pelo estado de emergência. E essa ideia, a ideia de necessidade, a ideia de adequação, a ideia de uma adstrição aos fins para os quais é necessário declarar o estado de sítio e de uma adstrição à ideia de necessário e pronto restabelecimento da normalidade logo que se verifiquem as condições para esse restabelecimento. E, portanto, no nosso entender, para referir mais uma vez, já resulta das definições contidas nos n.05 2 e 3 a delimitação da competência, porque me parece que o n.° 4, aqui, ao falar da opção pelo estado de sítio ou pelo estado de emergência, não pode ter outra preocupação que não seja essa, isto é, a da necessidade de a autoridade competente escolher correctamente - e a escolha correcta é dada pelo pressuposto que constitui a definição quer dada no n.° 2 quer dada no n.° 3. Portanto, é totalmente desnecessário, no nosso entender, referir aqui o princípio da proporcionalidade.
Claro que o Sr. Deputado José Magalhães me vai dizer que a lei ordinária o consagra - obviamente que a lei ordinária tem capacidade de explanação, e até dever de explanação, que não é própria do legislador constituinte. Nós aqui vamos pôr os pontos de partida que tirem quaisquer dúvidas sobre o âmbito do desenvolvimento a nível da lei ordinária; não temos que decalcar a lei ordinária quando isso não é necessário.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - É uma intervenção muito curta, só para dizer o seguinte: é evidente que o texto actual do artigo 19.° da Constituição é todo ele tributário da lógica do princípio da proporcionalidade em matérias deste jaez, tão melindrosas como são as matérias da restrição do exercício de direitos em estado de sítio ou em estado de emergência. Portanto, o facto de o PSD não contribuir para a maioria de dois terços neste aspecto, defraudando alguma da expectativa com que eu tinha ficado da primeira leitura, não vai também fazer-me "carpir mágoas" pelo facto de não votarem favoravelmente o nosso n.° 4. Todo o princípio da proporcionalidade já se contém no articulado do artigo 19.° e fica salvaguardado, naturalmente, mantendo inalterado o n.° 6 deste artigo 19.° Seja como for, também devo dizer que, se há sítio onde na Constituição devia ser assumida claramente esta opção de política legislativa, era neste artigo 19.°, porque é aqui que exactamente se justifica, pelo melindre
e pela relevância da temática que está a ser abordada, que a Constituição ela própria acolha um critério de proporcionalidade. Claro está que está cá implícito, e a lei ordinária di-lo, e todos nós somos "pessoas de bem", e todos nós comungamos activamente desta convicção de que é o princípio da proporcionalidade que deve vigorar - muito bem! Mas reparem: tanta veemência contra esta numerozito, num ponto onde ele é talvez o frontespício de uma lógica constitucional! É aqui que ele se justifica, porque é aqui que exactamente está em causa a introdução de restrições a direitos fundamentais. Faça favor, Sr. Deputado Costa Andrade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - Só pretendia precisar um ponto: não há veemência da nossa parte contra o preceito - pelo contrário, estamos de acordo com o conteúdo. De resto, pergunto se haverá de facto verdadeira necessidade constitucional ou se, pelo contrário, haverá desnecessidade, sendo certo que todos os partidos - todos! - em sede de legislação ordinária estão de acordo quanto a isto.
O Sr. Presidente: - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais do Orador.)... de acordo em que nos próximos cinco anos não possam deixar de estar.
O Sr. António Vitorino (PS): - A veemência não era propriamente sobre a argumentação contra a lógica do artigo; era pela profusão de argumentos, pela abundância de argumentos que foi carreada - era só por isso.
O que, desde já, lhes digo é o seguinte: se o PSD não vota este número, nós não o levaremos à votação até ao final, porque nunca poderíamos que uma rejeição deste número fosse interpretada como uma menor adesão ao princípio da proporcionalidade.
O Sr. Costa Andrade (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do Orador.)
O Sr. Presidente: - Pedia, por parte do PSD, uma segunda reflexão. E, já que adiámos um número, também não custa nada adiar o outro. Porquê? Porque há afirmações tautológicas que se devem fazer quando são tão importantes como esta! E eu não vejo nenhuma razão para os senhores dizerem: "isto é desnecessário". Não é, neste caso, um bom critério para não aprovar. É desnecessário porque está na lei ordinária? Então tínhamos de reduzir a Constituição a 10%, porque a maior parte do que está nela consta da lei ordinária! Pedia-vos que, já que adiamos - vão ter a liberdade de votar como quiserem, como é natural, da próxima vez -, fizessem uma reflexão mais profunda. Se estiverem de acordo, claro! Fica, portanto, adiada a votação deste n.° 4 do artigo 19.° proposto pelo PS.
Quanto ao n.° 5 do artigo 19.° proposto pelo PS...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do Orador.)
O Sr. Presidente: - Portanto, o n.° 5 e o n.° 6?
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O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E o n.° 7. Mas queríamos sugerir...
O Sr. Presidente: - Que ficasse também adiado?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não, não! Queríamos sugerir ao PS que, agora ou em sede de redacção, encarasse a possibilidade de fundir - porque tratam de matérias conexas - as propostas relativas ao n.° 5 e ao n.° 6. O argumento da extensão do preceito não colhe. Infelizmente, nós temos na Constituição alguns números que são muito mais extensos e muito mais prolixos do que o que dali resultaria, e nós entendemos que se ganhava com a síntese.
O Sr. Presidente: - Estamos de acordo. São matérias da mesma natureza.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Exacto, são matérias da mesma natureza. Sugerimos que, depois de "desde que respeitadas as exigências constitucionais e legais", se acrescentasse "excepto no caso de declaração de guerra, em que poderá (...)" - está a perceber a ideia?
O Sr. Presidente: - Estou, sim.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Portanto, se não houver objecção, nós propomos que sejam votados em globo os n.ºs 5 e 6, e que deles venha a resultar, com a redacção que vier a ser acordada entre nós, um só.
O Sr. Presidente: - A redacção não é problema. Faríamos o seguinte: púnhamos à votação, em conjunto, estes dois números, sob condição de serem fundidos numa redacção conveniente.
Sr. Deputado José Magalhães, acompanhou? Os n.ºs 5 e 6 seriam votados conjuntamente, com o compromisso de uma redacção conveniente, que qualquer de nós estará em condições de dar.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Nós, aliás, votámos favoravelmente os n.ºs 5 e 6, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Vamos então, Srs. Deputados, proceder à votação dos n.ºs 5 e 6 do artigo 19.° constantes da proposta de substituição do PS e cuja redacção, fundidos num só número, será apresentada posteriormente.
Submetidos à votação, obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS e do PCP.
São os seguintes:
5 - A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência é adequadamente fundamentada e contém a especificação dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso, não podendo o estado declarado ter duração superior a quinze dias, sem prejuízo de eventuais renovações por períodos com igual limite, desde que respeitadas as exigências constitucionais e legais.
6 - A duração do estado de sítio ou do estado de emergência declarados em consequência de declaração de guerra poderá ser sujeita por lei a limite superior a quinze dias.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta relativa ao n.° 7 do artigo 19.°, apresentada pelo PS.
Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS e do PCP.
É a seguinte:
1 - A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião.
A votação da proposta relativa ao n.° 8 do artigo 19.°, apresentada pelo Partido Socialista, fica adiada.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, posso levantar ainda uma dúvida para eventualmente a discutirmos e reflectirmos sobre ela?
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - A não ser que VV. Exas. me convençam do contrário, parece-me que esta matéria, para além de já constar, e bem, da lei, não deve ser tratada nesta sede. Eu sou daqueles que entendem que não temos de constitucionalizar todas as inovações legislativas, pois há um progresso legislativo natural que a Constituição não tem de reflectir sempre, até para não ficar monstruosa. Esta matéria do n.° 8 proposto pelo PS não tem muito a ver com a epígrafe e o conteúdo do artigo 19.°, e por isso gostaríamos de reflectir acerca disto e gostaríamos que também o fizessem. A epígrafe é "Suspensão do exercício de direitos". Estamos a apreciar agora uma matéria que não tem a ver com as regras constitucionais relativas à competência e ao funcionamento dos órgaso de soberania. De facto, verifica-se haver aqui claramente um enxerto, num capítulo que diz respeito aos direitos fundamentais, de algo que tem a ver com matéria da organização do poder político.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, teremos isso em conta. A votação desta proposta fica, assim, adiada para a próxima reunião.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, sem prejuízo dessa segunda reflexão, que obviamente é direito de todos, gostaria de procurar contribuir para ela alertando para um aspecto, em que o Sr. Deputado Pedro Roseta revela alguma rigidez, o que aliás é estranho.
Sr. Deputado, repare que o artigo 19.° é um artigo cuja lógica é profundamente compósita. Por outras palavras, o regime do estado de sítio e do estado de emergência na Constituição da República Portuguesa não é regido apenas pelo artigo 19.° mas também pelas normas que nas competências dos órgãos de soberania se conexionam com esta matéria. Portanto, encontraremos, órgão a órgão, as correspondentes projecções em matéria de competências do que flui da lógica e do conteúdo do artigo 19.°
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Mas o próprio artigo 19.°, no seu n.° 1, responde a uma importante questão orgânica, qual seja a de que nenhum órgão de soberania nem os órgãos de soberania todos (questão orgânica por excelência) podem suspender o exercício de direitos.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas isso é outra coisa!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é outra coisa, Sr. Deputado! O artigo 19.°, ao contrário do que disse, aborda um aspecto que, sendo obviamente relevante na esfera intersubjectiva, é também relevante em termos de repartição de poderes, em termos de arquitectura do poder na República.
Isto significa que as questões relacionadas com esta matéria ou são trinchadas aqui, ou depois o Sr. Deputado Pedro Roseta teria grande dificuldade em inseri-las onde quer que fosse - a não ser que as inserisse nos princípios gerais da organização do poder político.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Aí talvez, ou então não as inserir de todo!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Evidentemente que também pode não as inserir de todo, mas nesse caso a consequência é negativa ou, pelo menos, não é positiva. Aqui o PSD pode até ter especial responsabilidade de reflexão. O Sr. Deputado repare no que significa, só de leve, admitir-se, por exemplo, que a declaração do estado de sítio pode legitimar a alteração das regras de funcionamento dos órgãos de governo próprios das regiões autónomas...
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Deputado, a contrario sensu ninguém disse isso. A lei já contempla toda essa matéria.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, já alguém disse isso!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, se não se importa vamos prosseguir nas votações.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Vamos reflectir.
O Sr. Presidente: - Tenho em mão uma proposta de substituição conjunta, da autoria do PS e do PCP, que diz respeito à proposta referente ao n.° 9 do artigo 19.°, apresentada pelo PS.
A proposta conjunta diz o seguinte:
Os cidadãos cujos direitos, liberdades e garantias tiverem sido violados por declaração do estado de sítio ou do estado de emergência, ou por providência adoptada na sua vigência, viciadas por inconstitucionalidade ou ilegalidade, têm direito à correspondente indemnização.
O texto é idêntico ao da nossa proposta, apenas muda a autoria. Em vez de o texto ser somente do PS, passa a ser do PS e do PCP, porque parece que violámos aqui um direito sagrado de copyright do Dr. José Magalhães.
Vozes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Esperemos que o PSD vote favoravelmente esta proposta, que é perfeitamente razoável.
O Sr. António Vitorino (PS): - O PSD não pode aceitar isso, para não criar maus hábitos.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Maus precedentes!
O Sr. Presidente: - Vamos então proceder à votação da proposta de substituição conjunta do PS e do PCP relativa ao n.° 9 do artigo 19.°, que foi lida há pouco.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e os votos a favor do PS e do PCP.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, acabei de fazer uma observação que fica inteiramente desprovida de sentido se passamos a adoptar essa técnica.
O Sr. Presidente: - Faz o obséquio, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Trata-se aqui de uma questão de lisura de procedimentos. O Sr. Deputado Costa Andrade disse que não fazia na altura uma declaração prévia porque faria uma declaração de voto, e foi apenas com base nesse pressuposto que acedia que se passasse à votação.
Vozes.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do Orador.)
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, VV. Exas. podem entrar mudos e sair quedos!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não sabia que gostava tanto de ouvir a nossa voz!
O Sr. Presidente: - A proposta da autoria do PS relativa ao n.° 10 é apenas sistemática, bem como a do PSD. Não se justifica votação sobre elas.
Srs. Deputados, gostaria de vos informar que tenho de me ausentar às 19 horas. Se temos apenas dez minutos disponíveis não somos capazes de nos libertar do artigo 20.°, pois há quanto a ele muitas propostas. Assim, se concordassem, iríamos agora tratar da sequência dos trabalhos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, permite-me que faça apenas uma observação em relação a uma norma que ficou por votar?
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A nossa reformulação do n.° 7 do artigo 19.°, introduzindo-lhe uma ideia que reproduz essa outra que consta da lei, não foi objecto de apreciação, pelo menos que eu me tenha apercebido.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o problema é este: o vosso n.° 7 só pode ser considerado a propósito do nosso n.° 8, e foram ambos adiados.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, agradeço-lhe o esclarecimento. Era isso que pretendia clarificar.
O Sr. Presidente: - Eu tinha referido isso mas talvez de modo não muito claro.
Srs. Deputados, se estão de acordo vamos marcar a reunião de amanhã.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Então, Srs. Deputados, a reunião de amanhã terá lugar às 10 horas. Está encerrada a reunião.
Eram 18 horas e 50 minutos.
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional
Reunião do dia 6 de Dezembro de 1988
Relação das presenças dos Srs. Deputados
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD).
José Augusto Ferreira de Campos (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Luís Filipe Pais de Sousa (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
Miguel Bento da Costa Macedo e Silva (PSD).
Pedro Manuel da Cruz Roseta (PSD).
Manuel António de Sá Fernandes (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
Alberto de Sousa Martins (PS).
António Manuel Ferreira Vitorino (PS).
José Eduardo Vera Cruz Jardim (PS).
José Manuel dos Santos Magalhães (PCP).
Herculano da Silva Pombo Sequeira (PEV).
Raul Fernandes de Morais e Castro (ID).
ANEXO
Reformulação da proposta do PCP relativa ao artigo 13.°
Artigo 13.°
Princípio da igualdade
1 - (...) devendo o Estado contribuir para a remoção dos obstáculos de natureza económica, social, jurídica e cultural à realização dos direitos fundamentais.
Assembleia da República, 6 de Dezembro de 1988. - Os Deputados do PCP: José Magalhães - José Manuel Mendes.
Reformulação da proposta do PCP relativa ao artigo 19.°
Artigo 19.°
7 - A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência só ocorrerá quando não possam ser eliminados por outra forma os actos que a justificam, não devendo nomeadamente (...)
Assembleia da República, 6 de Dezembro de 1988. - Os Deputados do PCP: José Magalhães - José Manuel Mendes.
Reformulação da proposta do PCP relativa ao artigo 20.º
Artigo 20.º
1 - ............................................................................
2 - ............................................................................
3 - A lei assegura providências judiciais caracterizadas pela prioridade e especial celeridade processual para defesa da liberdade de reunião, manifestação, associação e expressão.
Assembleia da República, 6 de Dezembro de 1988. - Os Deputados do PCP: José Magalhães - José Manuel Mendes.
Artigo 19.°
9 - Os cidadãos cujos direitos, liberdades e garantias tiverem sido violados por declaração do estado de sítio ou do estado de emergência, ou por providência adoptada na sua vigência, viciadas por inconstitucionalidade ou ilegalidade, têm direito à correspondente indemnização.
Os Deputados do PCP e do PS: José Magalhães - António Vitorino.
Proposta de substituição do n.° 7 e de eliminação do n.° 8 do artigo 38.°
Artigo 38.°
7 - O Estado assegura a existência e o funcionamento de um serviço público mínimo de rádio e televisão, o qual será utilizado de modo a salvaguardar a sua independência perante o Governo, a Administração e os demais poderes públicos, bem como a assegurar a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião.
8 - (Eliminado).
Os Deputados do PSD e do PS: Rui Machete - Costa Andrade - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - Almeida Santos - António Vitorino.
Proposta de substituição do artigo 39.°
Artigo 39.°
Alta Autoridade para a Comunicação Social
1 - O direito à informação, a liberdade de imprensa e a independência dos meios de comunicação social perante o poder político e o poder económico, bem como a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião e o exercício dos direitos de antena, de resposta e réplica política, são assegurados por uma alta autoridade para a comunicação social.
2 - A Alta Autoridade para a Comunicação Social é constituída por treze membros, nos termos da lei, com inclusão obrigatória:
a) De um magistrado designado pelo Conselho Superior da Magistratura, que presidirá;
b) De cinco membros designados pela Assembleia da República eleitos segundo o sistema proporcional e o método da média mais alta de Hondt;
c) De três membros designados pelo Governo.
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3 - A Alta Autoridade para a Comunicação Social emite parecer prévio à decisão de licenciamento pelo Governo de canais privados de televisão, decisão essa que, quando favorável à outorga da licença, só pode recair sobre candidatura objecto de parecer favorável.
Os Deputados do PS e do PSD: Almeida Santos - António Vitorino - Costa Andrade - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - Rui Machete.
Proposta de uma disposição transitória a incluir na lei de revisão
Artigo...
Extinção do Conselho de Comunicação Social
O Conselho de Comunicação Social extingue-se e cessa funções, sem dependência de qualquer outra formalidade, com a tomada de posse dos membros da Alta Autoridade para a Comunicação Social.
Os Deputados do PSD e do PS: Rui Machete - Costa Andrade - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - Almeida Santos - António Vitorino.
Proposta de substituição do artigo 40.°
Artigo 40.°
Direitos de antena, de resposta e de réplica política
1 - Os partidos e as organizações sindicais, profissionais e representativas das actividades económicas têm direito, de acordo com a sua representatividade, e segundo critérios objectivos a definir por lei, a tempos de antena no serviço público de rádio e televisão.
2 - Os partidos políticos representados na Assembleia da República e que não façam parte do Governo têm direito, nos termos da lei, a tempos de antena no serviço público de rádio e televisão, a ratear de acordo com a sua representatividade, bem como o direito de resposta e de réplica política às declarações políticas do Governo, de duração e destaque iguais aos dos tempos de antena e das declarações políticas do Governo.
3 - Nos períodos eleitorais os concorrentes têm direito a tempos de antena, regulares e equitativos, nas estações emissoras de rádio e televisão de âmbito nacional e regional, nos termos da lei.
Os Deputados do PS e do PSD: Almeida Santos - António Vitorino - Costa Andrade - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - Rui Machete.
Proposta de substituição do artigo 52.º
Artigo 52.°
Direito de petição e acção popular
1 - ............................................................................
2 - A lei fixará as condições em que as petições apresentadas colectivamente à Assembleia da República são apreciadas pelo respectivo Plenário.
3 - É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, nomeadamente o direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial de infracções contra a saúde pública, a degradação do ambiente e da qualidade de vida ou a degradação do património cultural, bem como de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização.
Os Deputados do PSD e do PS: Rui Machete - Costa Andrade - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - Almeida Santos - António Vitorino.