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Sexta-feira, 26 de Maio de 1989 II Série - Número 111-RC

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

II REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

ACTA N.° 109

Reunião do dia 30 de Março de 1989

SUMÁRIO

Concluiu-se a discussão e votação do artigo 108.° e respectivas propostas de alteração e de substituição.

Intervieram no debate, a diverso título, para além do presidente, Rui Machete, pela ordem indicada, os Srs. Deputados José Magalhães (PCP) e António Vitorino (PS).

Foi o seguinte o resultado da votação realizada: proposta de substituição do n.° 6 do artigo 108. °, apresentada pelo PSD - obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e do PS e os votos contra do PCP.

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O Sr. Presidente (Rui Machete): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, vamos retomar os nossos trabalhos para resolvermos o único ponto que formalmente faltava votar, que é o n.° 6 do artigo 108.° constante da proposta de substituição do PSD.

Como VV. Exas. se recordarão, foi suscitada uma questão por parte do PCP no sentido de poder haver o risco de na execução do Orçamento que o direito concedido ao Governo de introduzir algumas alterações pudesse ser demasiado alargado em termos de poder, de algum modo, introduzir desfigurações ao mesmo. A questão, aliás, traduziu-se na ideia, apenas explicitada a título de ensaio, de introduzir um inciso, que poderia ter uma redacção deste tipo: "[...] presidir às alterações que durante a execução e sem prejuízo da repartição entre a despesa de funcionamento e de investimento poderão ser introduzidas pelo Governo nas rubricas de classificação orgânica", etc..

Nós que. como VV. Exas. se recordarão, subscrevemos esta proposta de redacção e de alteração do artigo 108.° e que é de algum modo uma fórmula compromissória entre aquilo que tinha sido proposto pelo PS e aquilo que nós tínhamos proposto estivemos a ponderar os diversos aspectos do problema e a nossa proposta tem a seguinte motivação: não se pretende um jus variandi ou um direito de alteração na execução do Orçamento que possa introduzir desfigurações orçamentais, não é esse o propósito, mas sim o de permitir que numa administração financeira dinâmica, gerida por programas que têm em vista a consecução de determinados resultados, haja a maleabilidade suficiente, e, por outro lado, considerando que esses programas serão naturalmente sempre discutidos e aprovados pela Assembleia da República e que entre os programas não poderá haver esse jus variandi, nós entendemos que ficam suficientemente acautelados os interesses que foram manifestados a propósito das observações o PCP e naquilo nos parece merecer a nossa concordância e que, aliás, já era nossa intenção. Se a redacção do preceito tiver uma modificação no sentido de lhe ser inserido um inciso que a seguir passo a referir, julgo que o nosso objectivo fica conseguido. Quando se diz "e os critérios que deverão presidir às alterações que durante a execução poderão ser introduzidas pelo Governo nas rubricas de classificação orgânica a que se refere o número anterior", deve acrescentar-se no "âmbito e tendo em vista a plena realização dos programas orçamentais aprovados pela Assembleia". Quer-se claramente significar que essa possibilidade de alterações se circunscreve ao âmbito de cada programa, que, naturalmente, é aprovado pela Assembleia da República.

Queríamos ainda acrescentar que toda a economia do artigo, no que diz respeito aos aspectos novos que foram introduzidos, tem um ponto saliente neste aspecto, que é inovador em relação à administração pública financeira do Estado e que, de resto, se nos afigura extremamente importante, o de introduzir a figura dos programas com tudo aquilo que significa em termos de uma gestão por objectivos e para obter a consecução dos resultados propostos. Essa é a nossa proposta.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, permita-me que, antes de fazer qualquer observação sobre a fundamentação e o anúncio que o Sr. Presidente acaba de fazer, diga que a ideia que V. Exa. acaba de exprimir, provavelmente, em matéria de formulação, seria susceptível de ter uma outra expressão. Creio que dizer "no âmbito e tendo em vista" coloca alguns problemas. São, porém, problemas pura e simplesmente de expressão em português.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Se a ideia que querem exprimir é essa, então provavelmente seria melhor dizer "no âmbito de cada um dos programas aprovados pela Assembleia da República e tendo em vista a sua plena realização".

O Sr. Presidente: - Com certeza! O nosso propósito foi sermos extremamente sintéticos em relação à redacção proposta, mas é evidente que os aperfeiçoamentos de forma são bem-vindos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É essencial que mesmo os textos cujo alcance é negativo sejam inequívocos...

O Sr. Presidente: - Nós preferíamos "de cada um dos programas orçamentais". Penso que se trata apenas de uma questão de forma.

Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a nossa preocupação nesta matéria foi efectivamente a de que fosse feita uma clarificação integral dos propósitos exactos dos autores do texto, tendo presente, designadamente, a jurisprudência do Tribunal Constitucional, muito em especial o Acórdão n.° 144/85, publicado no Diário da República, n.° 203, de 4 de Setembro de 1985, o qual dirimiu, pela primeira vez, algumas das questões que agora são objecto de apreciação.

Devo dizer que a experiência que nós temos de programação até agora se circunscreve às realizações do mapa vil, integrante do Orçamento do Estado. Em todo o caso, aquilo para que se aponta aqui é alguma coisa de mais inovador e tem a ver com o que se prevê no n.° 5 deste mesmo artigo, na proposta cuja aprovação foi ontem feita (de resto, por unanimidade).

A questão do papel dos orçamentos de programas e da programação orçamental estará, nestes termos, delimitada constitucionalmente. Evidentemente, o espaço de decisão que terá de ser preenchido pela Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado é sensível, é significativo.

Pela nossa parte, não temos uma postura contrária à utilização de instrumentos de programação, de resto, em articulação com os planos, nos termos decorrentes do texto dos artigos 91.° e seguintes. É isso mesmo que caracterizará estes programas na experiência portuguesa se se for por este caminho, como tudo indica que se irá. Não será, pois, uma via que se assemelhe às experiências da Administração norte-americana ou mesmo da RFA. Aproximar-nos-emos de outras experiências

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e teremos em conta que, no nosso caso, o planeamento existe como elemento conformador e está estreitamente ligado (como de resto este mesmo artigo 108.° clarifica) a toda a problemática do Orçamento do Estado. Esse nexo indissolúvel continuará a existir e aprofundar-se-á, tendo como instrumento de mediação os programas orçamentais.

A solução que vem proposta merece particular atenção neste n.° 6. Cruzam-se aqui não só a problemática dos orçamentos de programas, como o que decorre do facto de a Constituição, em relação à classificação das receitas e despesas, apontar para a existência de classificações orgânica e funcional, não obrigar à existência de classificação económica em todos os casos (foi recusada essa consagração explícita constitucional). Caberá ao legislador ordinário definir rigorosamente o conteúdo dessas classificações, o que é um elemento de flexibilidade e de disponibilidade do legislador ordinário, que tem como limite apenas o de que o Orçamento, como é evidente, tem de ter discriminação. Essa discriminação há-de ser significativa para poder merecer o nome de discriminação. Assim terá de ser! Dessa baliza não nos esquecemos, mas isso leva-nos a ter alguma apreensão.

Aquilo que se pretende aqui, conforme anunciou o Sr. Deputado Rui Machete, é permitir, não que o Governo altere a classificação funcional, porque essa é inalterável, mas que possa, no quadro da (e no que diz respeito à) classificação orgânica, fazer certas alterações, de acordo com certos critérios, os quais hão-de ser limitados legalmente, de acordo com certos objectivos ou finalidades. Há, portanto, uma limitação adicional de carácter teleológico para estas alterações. A nossa preocupação é que, além da limitação de carácter teleológico, fique muito claro que não se pretende fazer transferências de despesas entre aquilo a que chamaríamos o Orçamento, que não está submetido ao princípio da programação, e o Orçamento programa, nem transferências anárquicas entre despesas de funcionamento e despesas de investimento, nem entre programas, fazendo saltitar verbas de programas para programas, o que tornaria a aprovação pela Assembleia da República numa ficção, alterável livremente pelo Governo.

Não é isso que se pretende.

Em primeiro lugar, é claro que esta matéria só abrange o Orçamento na parte em que esteja estruturado por programas, isto é líquido. Em segundo lugar, os programas têm de ser estruturados de acordo com a classificação das despesas e receitas, portanto, orgânica e funcional no mínimo, e porventura económica, nos termos da Lei de Enquadramento do Orçamento. Essa classificação é inevitável e tem de ser feita nos termos do n.° 5. A obrigatoriedade de classificação aplica-se tanto às despesas das outras componentes do Orçamento como, evidentemente, às despesas na parte em que o Orçamento está estruturado por programas. Em terceiro lugar, não se visa permitir a transferência de verbas entre programas, como V. Exa. acabou de sublinhar agora mesmo - o mecanismo aprovado é um mecanismo intraprogramático, funciona dentro de cada programa. Os critérios para a alteração devem constar, por um lado, da Lei de Enquadramento e, por outro, da lei do orçamento de cada ano. Não se remete unicamente para a lei do orçamento anual (a menção contida no n.° 6, "definindo a lei", tanto se aplica ao Orçamento do Estado a elaborar e aprovar cada ano como à Lei de Enquadramento, na parte em que ela tem de definir, em geral, as regras aplicáveis a estas alterações e à margem de manobra do Governo nesta esfera).

O Sr. António Vitorino (PS): - A lógica do n.° 6 é a de que se refere à lei do orçamento.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Só à lei do orçamento?

O Sr. António Vitorino (PS): - Sim, porque nada impede que a Lei de Enquadramento defina critérios gerais para tudo o que diz respeito à elaboração do Orçamento, incluindo este aspecto específico também, claro! Agora o que não se poderá fazer é a utilização desta faculdade na directa decorrência de critérios genéricos da Lei de Enquadramento que não tenham uma concreta tradução na lei do orçamento anual. Portanto, a lei a que se refere o n.° 6 tem de ser a lei do orçamento anual.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Certo, Sr. Deputado António Vitorino. Era isso mesmo que estava a procurar clarificar, porque me parece que isso estabelece uma dupla exigência: a definição de um regime geral na Lei de Enquadramento e, depois, uma espécie de concretização anual, com critérios que poderão ser, em cada ano, distintos na sua materialização. Foi isto que percebi.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - A nossa reserva relativamente à alteração da regra em vigor não decorre, evidentemente, das precisões agora feitas e das limitações que sublinhei. Decorre, sim, de uma discordância em relação à alteração da actual solução constitucional quanto a este ponto.

O Sr. Presidente: - Suponho que o Sr. Deputado António Vitorino, na intervenção que fez, beneficiando da interrupção consentida pelo Sr. Deputado José Magalhães, já explicitou aquilo que parece ser a correcta interpretação do n.° 6. Assim, a Lei de Enquadramento pode ter - e provavelmente, se for uma lei de enquadramento suficientemente bem feita, deverá conter - critérios de carácter geral, mas, em primeiro lugar, nada impede que, mesmo na ausência desses critérios, parte da lei de enquadramento ou do orçamento os tenha - e parece que os tem de ter - e, em segundo lugar, pode haver concretizações ou precisões a propósito de cada orçamento. Efectivamente, esta menção que se faz aqui à lei é em relação à lei do orçamento e não à Lei de Enquadramento, já que essa existia anteriormente. Do ponto de vista da hierarquia das fontes e até do enquadramento lógico é este o processo que deverá ser tido em conta.

No que se refere ao problema que me colocou em matéria de programas, a redacção que agora se introduziu, e até beneficiando do contributo do seu aper-

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feiçoamento formal por parte do Sr. Deputado José Magalhães, é inequívoca no sentido de ser no âmbito de cada programa.

Vozes.

O Sr. Presidente: - Não há mais inscrições, Srs. Deputados?

Pausa.

Como não há mais inscrições, vamos proceder à votação do n.° 6 do artigo 108.° da proposta de substituição (n.° 196) apresentada pelo PSD.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD e do PS e os votos contra do PCP.

É o seguinte:

6 - O Orçamento deve prever as receitas necessárias para cobrir as despesas, definindo a lei as regras da sua execução; as condições a que deterá obedecer o recurso ao crédito público e os critérios que deverão presidir às alterações que durante a execução poderão ser introduzidas pelo Governo nas rubricas de classificação orgânica a que se refere o número anterior, no âmbito de cada um dos programas orçamentais aprovados pela Assembleia e tendo em vista a sua plena realização.

Srs. Deputados, com esta votação terminámos os nossos trabalhos por hoje.

Recordo-vos que amanhã teremos uma reunião da subcomissão às 10 horas da manhã. No dia 6 teremos ainda uma reunião que, como sabem, se destina a fazer formalmente a votação de todos os artigos que foram aqui votados na Comissão. Aí todos os partidos irão ter a oportunidade de introduzir alguma rectificação. Para essa reunião temos ainda agendada a aprovação do relatório da Comissão a ser entregue em Plenário. Por outro lado, temos ainda a eventual discussão e votação, se for caso disso, de uma proposta de substituição em relação ao n. ° 2 do artigo 234.°-A do Partido Socialista. Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Comissão Eventual para a Revisão Constitucional

Reunião do dia 30 de Março de 1989 Relação das presenças dos Srs. Deputados

Rui Manuel P. Chancerelle de Machete (PSD).
José Augusto Ferreira de Campos (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Guilherme Henrique Rodrigues da Silva (PSD).
António Jorge Pereira (PSD).
Cecília Pita Catarino (PSD).
Manuel António Sá Fernandes (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva (PSD).
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves (PSD).
José Leite Machado (PSD).
Pedro Manuel da Cruz Roseta (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (PS).
José Manuel dos Santos Magalhães (PCP).

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