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Sábado, 22 de Junho de 1996 II Série - Número 10 - RC

VII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião do dia 21 de Junho de 1996

S U M Á R I O



O Sr. Presidente (Vital Moreira) deu início à reunião às 10 horas e 55 minutos.
Prosseguiu a apreciação do artigo 118.º.
Intervieram, a diverso título, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), José Magalhães (PS), Manuel Monteiro (CDS-PP),, Barbosa de Melo e Miguel Macedo (PSD), Alberto Martins (PS), Luís Sá (PCP),, Pedro Passos Coelho (PSD), Paulo Portas (CDS-PP) e Calvão da Silva (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião às 12 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente (Vital Moreira): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Quanto à convocação do referendo, recordo que a actual solução constitucional é a seguinte: o referendo realiza-se por decisão do Presidente da República sob proposta da Assembleia da República ou do Governo.
As propostas para modificar este estado de coisas são as seguintes: o PS, mais o Deputado Cláudio Monteiro e outros, mais Os Verdes e, ainda, se leio bem, mais o Deputado Arménio Santos e outros, propõem que o referendo seja decidido pelo Presidente da República, tal como hoje, mas não apenas por iniciativa da Assembleia da República e do Governo, também por iniciativa dos cidadãos, ou seja, por iniciativa popular.
O PSD, mais o Deputado Pedro Passos Coelho, propõem que a iniciativa seja restrita à Assembleia da República, embora desencadeada, aliás, nos termos das leis, pelos Deputados, pelo Governo e também por cidadãos, em número de 150 000.
O Sr. Prof. Jorge Miranda, para referir uma das propostas de cidadãos, propõe que a decisão do referendo seja tomada não só pelo Presidente da República mas também, separada e autonomamente, pela Assembleia da República e até, no caso do referendo ratificativo de leis ou decretos-leis, pelos próprios cidadãos.
São estes os termos do debate, ou seja, há propostas ampliativas quanto à iniciativa e há propostas restritivas. Entre as ampliativas estão as que admitem a iniciativa popular, ou seja, as do PS, do Deputado Cláudio Monteiro, de Os Verdes e, suponho, do Deputado Arménio Santos, e nas restritivas estão a do PSD e a do Deputado Pedro Passos Coelho, que restringem a iniciativa à Assembleia da República.
São estes os termos da questão. O debate iniciou-se já e não sei se o querem retomar ou se o dão por encerrado. Se as posições estão já definidas, passamos ao ponto seguinte.
Ainda em matéria de iniciativa, o ponto seguinte seria relativo a algumas propostas no sentido de a decisão da Assembleia da República de iniciativa do referendo ser tomada por maioria absoluta, num caso, e por maioria qualificada, de 2/3, noutro caso. Portanto, em matéria de iniciativa, é uma questão menor.
Srs. Deputados, no estado actual da questão, aparentemente, não tem viabilidade a proposta do PS, de iniciativa popular do referendo, nem a do PSD, de a restringir a iniciativa à Assembleia da República.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é como disse, só que, então, permitia-me acrescentar algo, que é o seguinte: o PSD obviamente que concorda com a alteração desta parte do artigo 118.º - de resto, este é um dos aspectos a que o PSD dá mais importância nesta matéria - no sentido de permitir que a iniciativa possa também partir dos próprios cidadãos eleitores, obviamente que englobados numa lista com um número mínimo, onde existem também algumas diferenças aritméticas quanto aos textos em presença, indo desde, salvo erro, os 25 000, propostos pelo PCP, até aos 150 000, e penso que a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro refere 2%, o que talvez seja um pouco mais do que 150 000.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que estamos a falar de coisas diferentes.
O PSD e o PCP limitam-se a atribuir aos cidadãos o direito de propor à Assembleia da República que proponha o referendo...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente, era aí que queria chegar.

O Sr. Presidente: - O Deputado Cláudio Monteiro, o PS, Os Verdes e Deputado Arménio Santos propõem que os cidadãos proponham directamente ao Presidente da República a realização do referendo, o que são coisas completamente distintas.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Isso verdade, Sr. Presidente, Os Verdes fazem essa proposta.

O Sr. Presidente: - Creio que a referi bem.
Queira continuar a sua intervenção, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é exactamente isso a que eu queria chegar, ou seja, embora haja essa diferença de circuito, chamemos-lhe assim, nós, como o PS, o PCP e a generalidade dos projectos, propomos que os cidadãos possam também ter algum poder de iniciativa. Refiro a iniciativa porque o projecto do PSD chama assim a esta parte, não sendo a iniciativa do Presidente mas da Assembleia, do Governo ou dos cidadãos eleitores e a decisão é que é... É uma questão de nomenclatura.
Creio, de facto, que há aqui um denominador comum praticamente em todos os projectos, o de se acrescentar a possibilidade de o referendo ser desencadeado ou da sua iniciativa ser desencadeada por um conjunto de cidadãos eleitores. Creio que esse é um denominador comum que o PSD não gostaria de ver perder-se pelo simples facto de, depois, o mecanismo que prevê o circuito até à decisão poder ser diferente nas várias propostas.
Como o Sr. Presidente disse, e bem, enquanto o PS, à semelhança, por exemplo, do que faz o partido de Os Verdes e outras propostas que aqui temos, que propõem a possibilidade desse desencadear da iniciativa por parte dos cidadãos ter um circuito que seja directamente para a decisão do Presidente da República, o PSD propõe que ela passe necessariamente pela Assembleia, assim como faz, segundo penso, o PCP.
Em qualquer circunstância, o que queria dizer, uma vez que o Sr. Presidente estava a fazer uma súmula, era que o PSD entende que deveria haver um esforço grande da parte desta Comissão e, nomeadamente, dirijo esse apelo ao PS, que é o partido que fará a maioria necessária para a inclusão desta alteração na Constituição, no sentido de relevar que o valor essencial nesta matéria, neste caso concreto, é permitir-se, de facto, o acrescento à legislação actual da possibilidade de a iniciativa do referendo ser desencadeada por um grupo de cidadãos eleitores e, nesse sentido, que pudesse acertar...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esclareça-me uma coisa: isso, que é novidade no vosso projecto, não é já hoje possível? Os cidadãos, hoje, não podem já pedir à Assembleia da República, mediante uma petição, o desencadear de um referendo?.O que acho que há de novo na

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vossa proposta é exigir 150 000 cidadãos, quando a lei geral do direito de petição exige menos do que isso!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, na prática, é evidente que o mecanismo de petição pode servir para isto como para qualquer outra coisa. Portanto, serve para tudo e não serve para nada!
É a mesma coisa que dizer-se que os cidadãos também podem propor decretos-leis, mas isso não tem a dignidade constitucional, que é uma coisa diferente. Os cidadãos, eventualmente, não estarão alertados democraticamente para este mecanismo de participação activa se a Constituição não o previr expressamente.
Há, de facto, uma diferença, do nosso ponto de vista!
Se o Sr. Presidente disser que, em termos de resultado final, se pode atingir também esse fim, que a Assembleia pode também propor ao Presidente da República a realização de um referendo mediante uma petição que tenha sido subscrita por 5 000 cidadãos, se calhar, o resultado final é o mesmo. Agora, entendo que, em termos de configuração do próprio regime e do sistema não é a mesma coisa. Para o PSD não é a mesma coisa porque o PSD não vê as coisas da mesma maneira.
De facto, entendemos que há um ganho nítido do próprio sistema e do texto constitucional pela previsão expressa deste tipo de participação directa dos cidadãos na democracia; entendemos que ela não deve pôr em causa a democracia representativa, como aqui discutimos na anterior revisão, mas achamos que o bem maior é, de facto, que se dê este sinal em termos constitucionais.
Portanto, terminava dirigindo um apelo ao PS, em nome deste bem maior, de que me parece que o PS também comunga na sua proposta, ainda que não queiram que as propostas do Governo venham também à Assembleia da República, utilizando também este argumento do Sr. Presidente de que, no fundo, actualmente sempre assim seria, ou seja, um grupo de cidadãos pode propor isto à Assembleia da República, então, consagremos, permitindo-o o PS, nesta parte do artigo 118.º que diz respeito à iniciativa, a possibilidade de grupos de cidadãos proporem directamente à Assembleia o fim expresso de ser realizado um referendo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, salvo o devido respeito, insisto em que não há denominador comum nenhum; antes existe uma diferença essencial entre as propostas do PSD e do PCP, por um lado, e as do PS e de Os Verdes, por outro, e omito a referência aos projectos do Deputado Pedro Passos Coelho, que é convergente com o do PSD, e dos Deputados Cláudio Monteiro e Arménio Santos, que são convergentes com o do PS e o de Os Verdes.
Essa diferença está numa proposta de iniciativa popular directa junto do decisor, que é o Presidente da República. Enquanto, de um lado, na proposta do PSD, está o simples direito de petição à Assembleia da República, que tem o exclusivo da iniciativa da proposta ao Presidente da República, no caso da do PS e das propostas convergentes existe uma iniciativa popular directa junto do Presidente da República.
Portanto, se leio bem, de facto, não há denominador comum nenhum, o que há é uma grande diferença nas duas propostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o estado da discussão, quando a encerrámos na passada reunião, foi sintetizado pelo Sr. Presidente em termos que dispensam reforço e, assim, gostaria apenas de responder directamente à interpelação que foi feita pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes e estabelecer em que é que deve e pode consistir o sinal e quais as diferenças respectivas.
Porém, antes disso, deixe-me, Sr. Presidente, que sublinhe que, estando nós a discutir o direito de iniciativa, há um conjunto de dados estruturais que é necessário ter bem presentes que diferenciam e dão diferente natureza às propostas.
Nessa matéria, há um partido que propõe, por um lado, uma presidencialização do referendo e, por outro lado, uma parlamentarização. O PP propõe - e essa proposta é inovadora, embora, na nossa óptica, rompa o equilíbrio previsto no artigo 118.º, que desse ponto de vista parece desejável - que o Presidente da República possa, ele próprio, por sua iniciativa e autodeterminação, desencadear um referendo.
É o que está previsto no artigo 118.º, embora se mantenha depois o n.º 4, cuja interpretação, aliás, suscita algumas dificuldades numa das leituras, pois esse n.º 4 obrigaria o Presidente da República a submeter a referendo questões que lhe fossem suscitadas pelo Governo ou pela Assembleia da República, esta em deliberação aprovada por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções e o Governo, presume-se, de acordo com as suas condições deliberativas próprias, o que lhe daria, no limite, o poder de impor ao Presidente da República a convocação do referendo, uma vez que não se especifica sequer qual seria a matéria sobre a qual tal iniciativa referendária poderia versar.
Portanto, digamos que esta proposta, embora, eventualmente, possa ser útil clarificar os seus contornos, até para suprimir dúvidas, alteraria significativamente os equilíbrios da repartição de poderes entre órgão de soberania quanto ao desencadeamento de referendos. Não a considerámos até agora e talvez a possamos considerar.
Mas o que é característico do projecto de revisão constitucional do PS é não perturbar equilíbrios desse tipo, pelo que fazemos aditamentos sem perturbar regras de separação de poderes que dizem que a Assembleia da República não colide com o Governo, o qual não colide com a Assembleia da República, ninguém impõe ao Presidente da República um referendo e o Presidente também não o impõe a ninguém, só pode agir sobre proposta do Governo ou da Assembleia ou - e é aqui o ponto inovador - dos cidadãos.
E é aqui que, de facto, as águas se separam. Pedimos ao PSD que ajude a dar um sinal significativo de participação popular, de concessão de um verdadeiro e próprio direito de iniciativa popular referendária que dê aos cidadãos, sem tutela, a possibilidade de se dirigirem ao órgão de soberania Presidente da República pedindo-lhe que submeta a juízo popular uma determinada questão nacional que tenha de ser decidida por convenção ou por lei.
O PSD propõe, o que é perfeitamente legítimo mas é uma solução completamente diferente, que seja concedido aos cidadãos um direito de petição especialmente exigente, na medida exacta em que para conseguir esse efeito é necessário, no vosso cenário, reunir 150 000 assinaturas e não 1000, 2000, 3000, 10 000, 15 000 ou 20 000. São 150 000 assinaturas para obter aquilo que o direito popular ordinário, vulgar, permite aos cidadãos, a não ser considerassem que essa petição obrigava a Assembleia a uma deliberação positiva, o que francamente não faria muito

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sentido e tal não foi dito pelos Srs. Deputados. É uma solução incongruente.
Portanto, neste ponto, os dados estão traçados e nós propomos que o sinal seja forte. Aparentemente, o PSD propõe que o sinal seja fraco; nós propomos que o povo possa propor ao Presidente e os Srs. Deputados propõem que o povo possa pedir à Assembleia que proponha ao Presidente.
Eis uma clarificação que tem de se fazer por vontade política e pela nossa parte apelamos que adiram a uma solução forte.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, o PP acaba de ser confrontado com uma dúvida de interpretação do seu próprio projecto. A leitura que o Sr. Deputado José Magalhães fez não é a minha e creio que se exige um esclarecimento.
Concretamente, estamos a tratar da questão da iniciativa do referendo. Da leitura que o Sr. Deputado José Magalhães fez, o projecto do PP diria o seguinte: primeiro, o Presidente da República tem direito livre de decidir desencadear o referendo, independentemente de proposta de quem quer que seja. É o n.º 1 do vosso projecto.
Segundo, haverá sempre referendo nos casos de transferências de poderes soberanos. Isso parece claro e consta do n.º 3 do vosso projecto.
Terceiro, o Presidente da República estaria vinculado a desencadear o referendo sempre que tal fosse solicitado pelo Governo ou pela Assembleia da República, sem poder decidir optar por não o convocar. Isto é o ponto n.º 4 do vosso projecto.
Creio que o segundo ponto, correspondente ao n.º 3 do vosso projecto, é claro e resta a dúvida de leitura quanto ao n.º 1 e ao n.º 4 do vosso projecto.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço imensa desculpa por ter chegado atrasado. Importa-se de clarificar o pensamento quanto à sua leitura, uma vez que não tive oportunidade de o ouvir.

O Sr. Presidente: - A minha leitura é a de que, salvo no n.º 3, o PP não fazia alteração do status quo constitucional, isto é, o Presidente da República pode desencadear o referendo sob proposta do Governo ou da Assembleia da República.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - E é diferente do que o Sr. Deputado José Magalhães referiu?

O Sr. Presidente: - É e por isso é que me parece que, antes de avançarmos na discussão, é necessário...

O Sr. José Magalhães (PS): - Se o Sr. Presidente me permite e já que introduzi esse pedido de clarificação, que me parece útil, já agora, clarificava eu próprio os termos da dúvida, para permitir um esclarecimento mais célere.
A dúvida resulta do seguinte e confesso, francamente, que tive uma troca de impressões sobre esta matéria: a técnica utilizada pelo PP consiste em proclamar, no n.º 1, em termos diferentes do artigo 118.º, n.º 1, actual, aquilo que fica configurado como um direito do Presidente da República, aparentemente - os cidadãos são chamados a pronunciar-se por iniciativa do Presidente da República, nos termos,... etc., e no n.º 4 diz-se que o Presidente da República submeterá ainda a referendo nacional...

O Sr. Presidente: - O "ainda" é em relação ao n.º 3, na minha leitura.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - É em relação ao n.º 3.

O Sr. José Magalhães (PS): - É só em relação ao n.º 3?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Exactamente.

O Sr. José Magalhães (PS): - O esquema é o Presidente da República convocar obrigatória e necessariamente o referendo nacional sobre tratados ...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Deputado, permita-me que o interrompa mas é apenas para clarificação do raciocínio. A expressão "ainda" refere-se claramente ao n.º 3, como seu complemento, se quiser. É tão só isto.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito obrigado.
Isso significa que o Presidente da República, nos casos do n.º 4, tem o mesmo estatuto rigor que tem hoje em dia, por força do artigo 118.º, n.º 1, ou seja, convoca ou não, se entender, o referendo nos casos em que tal lhe seja proposto pela Assembleia ou pelo Governo? É que se fosse a leitura que aqui enunciei há segundos, o Presidente da República estaria vinculado, desde que a Assembleia da República, por maioria especialmente qualificada, ou o Governo, deliberando nos termos ordinários, lhe solicitassem a convocação do referendo, a essa convocação, que era necessária e obrigatória, pois que a norma constitucional proposta reza simplesmente "o Presidente da República submeterá", o que quer dizer que tem o dever de submeter.
Isto, repare, é o contrário da fórmula do artigo 118.º, que diz que o povo se pronuncia por decisão do Presidente da República, ou seja, por decisão livre. Neste caso, tudo inculcaria para que a decisão seria vinculada por um pedido feito pelo Parlamento ou pelo Governo.
Este é um ponto que, em relação à iniciativa, não tínhamos discutido e que suponho ser de decisão política.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, a diferença de redacção implica o conteúdo que o Sr. Deputado José Magalhães imputou à vossa proposta?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - De uma forma muito directa, queria dizer que nós próprios, dentro do PP, questionámo-nos muito antes da redacção final desta proposta de revisão constitucional, uma vez que, com aqui está explícito, de algum modo, se confrontavam as teses sobre as competências do Governo, da Assembleia da República e do próprio Presidente da República em relação a esta mesma matéria.
Houve quem entendesse que, dentro do actual quadro constitucional, não faria sentido dar ao Presidente da República a capacidade directa, independentemente daquilo que a Assembleia deliberasse ou não, para, por si só, poder convocar um referendo de âmbito nacional. Todavia, houve quem entendesse - e quero aqui explicá-lo - que isso não faria sentido, uma vez que o Presidente da República, alínea a), é eleito por todos os cidadãos e não está dependente única e exclusivamente da Assembleia da República e que não seria muito correcto coarctar, de algum

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modo, a iniciativa do Presidente da República também para matérias desta natureza, sendo certo, alínea b), que se partiria sempre do princípio de que o Sr. Presidente da República, fosse ele qual fosse, só recorreria ao estatuto do referendo sempre que considerasse que existiria uma matéria bastante não consensual e que requeresse uma eventual consulta dos cidadãos.
Acerca dessas duas posições, tivemos, abertamente, uma discussão muito clara dentro do próprio Partido Popular, antes da apresentação desta proposta.
A ideia final do PP foi a de que, sem qualquer posição definitiva e absoluta, gostaríamos de trazer este assunto à Comissão para a Revisão Constitucional, no sentido de o podermos debater abertamente, sem termos uma posição fechada, final, em relação a qualquer interpretação de fundo sobre essa mesma matéria. Ou seja, para nós, é claro que o instituto do referendo deve ser alargado perante o actual quadro constitucional, com mais ou menos capacidade de petição por parte dos cidadãos eleitores, embora não façamos uma previsão no nosso artigo 118.º quanto à possibilidade de cidadãos eleitores requererem, imporem ou solicitarem a possibilidade de realização do referendo.
Agora, independentemente disso, a nossa ideia, precisamente porque dentro da nossa própria casa existiam, objectivamente, dúvidas de interpretação quanto ao papel do Presidente da República e da Assembleia da República de o submeter ou não, não é, objectivamente, nesta matéria, uma ideia fechada, mas antes uma postura de diálogo - já que o termo está muito em voga -, para podermos clarificar posições e entendermo-nos, no melhor consenso possível.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, isso deixa-me numa posição muito delicada.
A leitura do Deputado José Magalhães é possível?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - A leitura do Deputado José Magalhães é possível. Mentiria se dissesse o contrário.

O Sr. Presidente: - Portanto, a vossa proposta é de geometria variável?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Poderá ser assim interpretada, mas só em relação a esta questão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, cheguei um pouco tarde e, portanto, como que mergulhando numa piscina com água muito fria, para mim, porque para vós ela já está bastante aquecida.
De todo o modo, gostaria de retomar um ponto que aqui foi referido sobre se esta iniciativa dos cidadãos, tal como consta da proposta do PSD, tem a ver com o direito de petição. Obviamente que não tem!
Esta é uma fase propulsiva de um processo de referendo e, portanto, tem uma função procedimental diferente. O direito de iniciativa é uma coisa, o iniciar, o desencadear, o propor, ou seja, a fase propulsiva de um processo de referendo é outra, é diferente.
É claro que a Assembleia recebe a petição e, como não se trata de um jogo fechado, o universo político é aberto, está lançado um desafio político à comunidade. Houve uns tantos cidadãos - fixe-se o numero que se fixar - que lançaram essa iniciativa e ela tem de ser discutida institucionalmente na Assembleia da República, no Parlamento. Esta é a nossa questão e é para evitar, desde logo, saltos. Aliás, surpreende-me algum tipo de argumentação, pois não podemos dar saltos no sentido da iniciativa popular, permitindo, por exemplo, movimentos caudilhistas, à margem da instituição parlamentar.
Estamos a fazer uma lei permanente, a Constituição, e ela permitiria uma iniciativa popular junto do Presidente da República sem que o órgão parlamentar se pronunciasse, para pôr à votação do povo português, eventualmente, uma modificação do regime político. É contra este tipo de coisas que queremos que a Constituição se precate, obrigando todos os referendos de iniciativa popular sejam objecto de uma discussão institucional, no Parlamento e não na praça público.
É esta a delicadeza de dar à iniciativa popular a possibilidade de obrigar o Presidente da República a fazer ou não o referendo.

O Sr. Presidente: - Para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Barbosa de Melo, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Deputado Barbosa de Melo, se bem entendi, o sentido da proposta referente ao artigo 118.º, n.º 1, do PSD, é de que a Assembleia da República discuta sempre a iniciativa dos cidadãos e que o Presidente da República não convoque o referendo apenas por essa iniciativa dos cidadãos, sem discussão na própria Assembleia da República.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A discussão na Assembleia da República é um passo necessário no procedimento referendário.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - E a proposta será sempre da Assembleia da República e não dos cidadãos?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A proposta é da Assembleia da República e a iniciativa é dos cidadãos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, há pouco, em aparte, chamei a tenção para a questão das consequências que advinham da diferença de regime estabelecido nas propostas quer do PS quer do PSD e, explicitando um pouco melhor algumas das matérias que o Sr. Deputado Barbosa de Melo acabou agora de referir, queria chamar a vossa atenção para aquilo que é a proposta do PS para o n.º 8 do artigo 118.º, que, do meu ponto de vista, não faz qualquer sentido com o regime que estabelecem no n.º 1 desse mesmo artigo.
Passo a explicar porquê. Se o PS entende que, por iniciativa directa, um grupo de cidadãos - no caso propõem 100 000 cidadãos - se podem dirigir directamente ao Presidente da República para uma iniciativa de referendo sem passar pela Assembleia da República, então, não faz sentido que no n.º 8 do artigo 118.º, por iniciativa desses cidadãos, sem passar pela Assembleia da República,

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à Assembleia fique vedada a capacidade de nova iniciativa sobre essa matéria, porque ela, na vossa proposta, não é chamada a intervir num processo destes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, do meu ponto de vista, isto significa uma amputação de um direito da Assembleia da República, que vê limitado o seu poder de iniciativa em relação a uma matéria tão relevante quanto é a do referendo, sendo ultrapassada pelo poder de iniciativa de 100 000 cidadãos directamente junto do Presidente da República.
E esta não conciliação de regimes, que descortino na proposta de alteração ao artigo 118.º, do PS, do meu ponto de vista, só pode ser resolvida através da solução proposta pelo PSD, justamente porque as consequências são diferentes, quando há uma petição ou um referendo. São diferentes a todos os níveis, têm consequências completamente diferentes. O processo é diferente, os fins em vista são diferentes, os objectivos são diferentes, a forma de se manifestar essa capacidade propulsiva, como chamou há pouco o Professor Barbosa de Melo, e as suas consequências são também diferentes. Entendo que também seja preciso esclarecer a questão que agora acabei de levantar em relação à proposta de alteração ao artigo 118.º, apresentada pelo PS. Porque, de facto, o que resulta deste artigo é o seguinte, Srs. Deputados, e esta é uma matéria política que temos de esclarecer aqui, na Comissão para a Revisão Constitucional: primeiro ponto, o PS está, no artigo 118.º, a dizer o contrário do que disse em relação à matéria de regionalização. Os senhores fizeram um discurso completamente contra a democracia referendária e propõem para o artigo 118.º, pura e simplemente, a democracia referendária, quando permitem que um número de cidadãos eleitores se dirija directamente ao Presidente da República, o que, mais do que isso, tem como consequência evidente, penso que isto é indesmentível, um reforço dos poderes presidenciais em desfavor dos poderes da Assembleia da República. Esta matéria está incluída na revisão constitucional que estamos a fazer, pelo que não podemos fugir dela.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão que coloco é esta: entende ou não o PS que com a proposta que faz, se fizermos a associação entre as duas questões, para o n.º 8 do artigo 118.º e para aquela que estamos a discutir, o n.º 1 do artigo 118.º, há uma amputação dos poderes da Assembleia da República relevante nesta matéria e se isto consagra ou não a tal democracia referendária, que ainda há poucas semanas os senhores denunciavam todos os dias na Comissão para a Revisão Constitucional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, antes de dar-lhe a palavra, atrevo-me a pedir que não voltemos reiteradamente às mesmas questões.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - De facto, a filosofia da proposta apresentada pelo PS foi explanada, mas vejo que o Sr. Deputado Miguel Macedo não descortinou o que já tinha sido aqui vivamente sublinhado, em vários momentos.
Deixo completamente de lado a famosa questão de saber se durante um mês e meio o PS abjurou a democracia referendária,…

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É público!

O Sr. José Magalhães (PS): - … porque verdadeiramente o PS, tanto no projecto de revisão constitucional de 1994 e como no actual projecto apresentado atempadamente, propunha o que propõe para o artigo 118.º, com o espírito já aqui explanado e que harmoniza a democracia representativa e de participação popular. É esse espírito de harmonia entre as duas coisas que consta, desde 1994, pacificamente, de cabeça bem pensada e fora de paixões casuais de direcções recentemente empossadas, como é o caso do PSD, do nosso projecto de revisão constitucional.
Atenho-me, portanto, à questão que está em cima da Mesa apenas, e essa diz respeito ao melhor mecanismo para garantir a iniciativa popular no desencadeamento de referendos. É isso que é suposto que estejamos aqui a discutir. E, nessa matéria, Sr. Presidente, o projecto do PS deve ser lido na sua inteireza. Por isso é que o Sr. Deputado Miguel Macedo não o percebeu.
Em primeiro lugar, propõe-se uma verdadeira e própria iniciativa popular referendária. É um facto! Ou seja, os cidadãos podem dirigir-se directamente ao Presidente da República. Mas não se propõe que isso ocorra independentemente do que ocorra no Parlamento ou no Governo, pelo contrário, como o n.º 2 do projecto de revisão constitucional neste artigo sublinha de forma clara, daí o mantermos, Sr. Deputado Miguel Macedo, na lógica do nosso projecto esse referendo, esse pedido, essa proposta de referendo dirigida ao Presidente da República tem de incidir obrigatoriamente sobre uma questão de relevante interesse nacional que deva ser decidida pela Assembleia da República ou pelo Governo, através da aprovação…

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Justamente! Mais grave ainda!

O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Deputado, em vez de fazer manifestações abundantes de voz, o Sr. Deputado já disse o que tinha a dizer e nós percebemos.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Estou à espera de uma resposta, que ainda não tive!

O Sr. José Magalhães (PS): - Vai tê-la.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito obrigado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou seja, não se faz independentemente da matéria que esteja em debate, pelo contrário, tem de se fazer em relação a um corpo de normas cuja aprovação esteja pendente e antes da respectiva aprovação, uma vez que não preconizamos referendos ab-rogatórios -…

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não!

O Sr. José Magalhães (PS): - … primeiro aspecto -, e por isso é que o Sr. Deputado não percebeu a proposta do PS…

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Onde é que está isso?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, isso decorre no n.º 2, que mantemos no nosso texto.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não decorre, não!

O Sr. Presidente: - É claro que decorre, Srs. Deputados. Por favor, não criem questões artificiais. Está em todos os comentários à Constituição.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Bom, façamos hermenêutica pré-primária. E por isso mesmo é que faz sentido o limite constante no n.º 8 do nosso projecto de revisão constitucional, onde se diz que "As iniciativas e as propostas de referendo recusadas pelo Presidente ou objecto de resposta negativa (…) não podem ser renovadas na mesma sessão legislativa (…)". Porquê? Porque o nosso referendo refere-se sempre, como no n.º 2 do artigo 118.º manda e obriga, a uma questão atinente a uma convenção ou a um diploma legislativo que esteja em apreciação. É este o aspecto basilar, é esta a nossa filosofia. Outra não é nossa.
Portanto, não se enganou.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo, devo dizer que ela é relevante e vai ter de ser decidida pela Comissão.

O Sr. Presidente: - É essa a questão relevante.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou seja, concretizando, o Sr. Deputado utilizou uma expressão que, aliás, me parece interessante. Uma petição qualificada num acto inicial, como activador de propulsão, vamos chamar-lhe assim em homenagem a…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Um acto propulsivo!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente, um acto propulsivo, Sr. Deputado Barbosa de Melo, é como os motores. Há motores muito propulsivos, há os pouco propulsivos e há ainda as pernas para pedalar nas bicicletas, que também são propulsivas. Na nossa fórmula propomos um acto muito propulsivo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Eu não inventei palavra nenhuma.

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu sei.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Qualquer manual de procedimentos traz uma fase propulsiva.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente. E por isso é que temos de distinguir. Como a expressão propulsão em si diz pouco, temos de discutir exactamente o modus da propulsão. E é por isso que o modus da nossa propulsão se distingue do modus da propulsão proposto pelo PSD, que se assemelha muito, muito, muito, talvez demais, a uma mera petição. Como os Srs. Deputados sabem, uma petição dos cidadãos à Assembleia da República, hoje em dia, sobretudo as petições colectivas, por força da Constituição e da lei das petições, tem um procedimento obrigatório. É objecto de um parecer instrutório e é necessariamente discutida, se subscrita por um número X de cidadãos, pelo Plenário da Assembleia da República. No vosso caso, só aditam dois elementos novos a isto: o primeiro é, em vez de 4000 assinaturas, 150 000; e fixam um prazo, que neste caso… Nem sequer fixam um prazo, quem o fixa é o PCP no seu projecto de revisão constitucional, que fixa um prazo de 60 dias para a deliberação obrigatória.
Portanto, a única diferença da vossa proposta é o número de assinaturas especialmente exigente, porque, depois, não fixam qualquer garantia de prazo e não fazem qualquer distinção em relação ao regime de uma petição. É uma questão de opção, e nós, pela nossa parte, vamos ponderar cuidadosamente os vossos argumentos.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não tem de haver uma lei que estruture o referendo?

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem, é a lei orgânica do referendo. É uma lei de maioria qualificada para a aprovação. Mas o espaço constitucional pode ser mais ou menos densificado, e, quando não é densificado, o legislador ordinário, Sr. Deputado Barbosa de Melo, fica inteiramente limpo para configurar o procedimento como entender, o que, no nosso caso, não merece suspeição, porque a nova maioria é claramente fã do referendo, mas noutros casos poderia não ser…

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio que os dados da questão estão clarificados. Em matéria de iniciativa do referendo, temos, portanto, três problemas.
Primeiro, a proposta, esclarecida pelo Sr. Deputado Manuel Monteiro, de admitir uma decisão de referendo presidencial por iniciativa própria.
Segundo ponto, a iniciativa popular do referendo, admitida pelo PS e por mais algumas propostas.
Terceiro ponto, retirar ao Governo o poder de propor ao Presidente da República a realização do referendo, constante do projecto do PSD.
Nenhuma destas três propostas, aparentemente, está em condições de obter viabilidade, dada a oposição cruzada que qualquer delas suscita.
Posto isto, é meu entendimento que seria perda de tempo continuarmos a repisar estas questões, pelo que passaríamos a novos pontos, a saber: existem propostas no sentido de a decisão da Assembleia da República de propor o referendo ser tomada por maioria qualificada, é o caso da apresentada pelo CDS-PP e… Há até uma proposta no sentido de ser de dois terços, se não estou em erro.
Srs. Deputados, esta proposta merece alguma discussão?
Está aberta a discussão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual é a proposta?

O Sr. Presidente: - A proposta é no sentido de a decisão da Assembleia da República propor ao Presidente da República a realização do referendo ser tomada por maioria qualificada, por maioria absoluta, no caso do PP, e por maioria de dois terços no caso do Deputado Arménio Santos.
Alguém se pronuncia sobre estas propostas?
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, apenas ficou uma questão por esclarecer, a de saber se esta proposta consta do projecto de revisão constitucional do CDS-PP, se flui da tal dualidade de posições, que o Sr. Deputado Manuel Monteiro aqui exprimiu, e qual é o seu alcance final, porque numa determinada leitura o Presidente da República era obrigado a convocar o referendo, se a Assembleia da República, por maioria qualificada, o propusesse. E aqui a maioria qualificada funcionava como uma explanação ou contrapeso para a obrigação imposta ao Presidente. Aí poder-se-ia discutir se essa obrigação estava imposta por maioria suficientemente qualificada ou não, e mesmo se isso se deve fazer. Ou seja, se na lógica

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do sistema político português, se deve impor ao Presidente da República a convocação do referendo, uma vez que isso acarreteria, nesta leitura, alguma parlamentarização do próprio processo e portanto uma reconfiguração das relações recíprocas Presidente/Assembleia.
Mais ainda, como a proposta está escrita com alguma ambiguidade e não se prevê maioria qualificada alguma para o Governo, nem fazia sentido que se prevesse, a ideia de um referendo convocado obrigatoriamente pelo Presidente sob intimação, seria assim, do Governo é completamente alheia ao nosso sistema político e ao equilíbrio entre órgãos de poder. E eu fiquei com muitas dúvidas de que fosse essa a ideia do PP. Mas teremos agora ocasião de clarificar este aspecto.
Isto tudo para dizer, Sr. Presidente, que uma maioria qualificada só faz algum sentido numa lógica de imposição ao Presidente da República da convocação de um referendo. Mas impor ao Presidente da República uma decisão convocatória de um referendo é uma ideia completamente oposta à conhecida no artigo 118.º, à qual somos fiéis, aliás, suponho que a maior parte das bancadas também o é. Portanto, não faz muito sentido e dificulta o processo de propositura do referendo pelo próprio Parlamento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, creio ser necessário esclarecer este ponto. Na ideia do PP, a proposta do referendo feita pela Assembleia da República ou pelo Governo impõe-se ao Presidente da República? Ele é obrigado a convocar o referendo sempre que tal proposta lhe seja feita ou mantém a liberdade de decidir "sim" ou "não" em relação à proposta?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, eu, com todo o respeito pela intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, confesso que não entendo a preocupação, porque há pouco o Sr. Deputado José Magalhães dizia que no actual debate constitucional - opinião que é, aliás, também partilhada por alguns elementos do meu partido - não fazia sentido que o Presidente da República por si só tivesse a iniciativa de convocar o referendo, ou seja, que essa incapacidade deveria estar cometida tão-só à Assembleia da República, e agora o Sr. Deputado José Magalhães parece já estar muito preocupado com o facto de o Sr. Presidente da República ter de convocar o referendo porque a Assembleia da República assim o decidiu e assim o propôs. Quer dizer…

O Sr. José Magalhães (PS): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Se o Sr. Presidente o autorizar, por mim…

O Sr. Presidente: - Se for para esclarecer exactamente o sentido da proposta…

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, é rigorosamente essa a lógica do artigo 118.º, e é uma boa lógica. O Presidente da República não desencadeia - e, como se percebe, foi a preocupação propositária de iniciativas do tipo bonapartista que presidiu à solução do actual artigo 118.º, que é uma boa solução, desse ponto de vista -, nem actua sem propositura ou sob intimação. Ou seja, não actua sem propositura, para evitar o plebiscitarismo bonapartista, nem actua sob intimação, para preservar a sua margem de actuação autónoma.
É uma lógica que, devo dizer, é muito razoável. É tão razoável que ninguém a quebrou, até agora, com aquilo que nós julgávamos ou tínhamos dúvidas que fosse uma excepção por parte do PP. Mas não há contradicção alguma no sentido constitucional e nesta lógica.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Deputado, com todo o respeito, duvido que o anterior Presidente da República, Dr. Mário Soares, não tivesse convocado por sua inciativa o referendo sobre o Tratado de Maastricht, se pudesse fazê-lo. Estou, aliás, convencido de que o Sr. Presidente da República, Mário Soares, tinha esse desejo, não essa intenção, e que só não o fez, porque estava constitucionalmente impedido. Esta é uma leitura que eu faço, porque, como deve calcular, o ex-Presidente da República nunca mo transmitiu, das várias intervenções que ele teve oportunidade de fazer, no momento em que foi discutida, por exemplo, a aprovação do Tratado de Maastricht aqui na Assembleia da República, sem que o povo português sobre tal fosse consultado. Portanto, essa autonomia do Sr. Presidente da República existe, por um lado, na preocupação do Sr. Deputado José Magalhães, mas já não existe, por outro.
Parto do princípio, com todo o respeito, de que a Assembleia da República não está a intimar o Presidente da República. A Assembleia da República, quando decide, por maioria qualificada ou absoluta, como aqui viermos a entender, exerce um direito que lhe está conferido pela Constituição e exerce, obrigatória e objectivamente, aquilo que vai ao encontro da capacidade activa dos Srs. Deputados de poderem decidir aquilo que entendem. Portanto, o Presidente da República não está a ser intimado pela Assembleia da República. O Presidente da República, num caso desses - e é esse o sentido claro da proposta do Partido Popular -, está a seguir uma orientação e uma deliberação políticas da Assembleia da República. E a orientação política da Assembleia da República não tem, em nossa opinião, qualquer carga de intimação, porque a Assembleia da República não intima o Presidente da República. A Assembleia da República delibera por livre vontade, após livre discussão, e, a partir do momento em que deliberou, o Presidente da República, no actual quadro constitucional, fará aquilo que a Assembleia da República entender, nomeadamente nessa matéria.
Pensamos, aliás, aqueles que entendem que o Presidente da República deve ter a iniciativa do referendo, que há aqui, se quiser, um novo equilíbrio: o equilíbrio de o Presidente da República poder, nos termos da Constituição e da lei, ter a iniciativa de convocar um referendo e, ao mesmo tempo, o dever de convocar esse mesmo referendo, sempre que a Assembleia da República, seja por maioria absoluta seja por maioria qualificada, assim o entender e deliberar - e não intimar, porque não se trata de intimação.
É esse o sentido claro da explicação que entendo dar à intervenção do Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o ponto de vista do PSD sobre esta matéria é o seguinte: é

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evidente que nunca poderíamos concordar com quaisquer processos de intimidação ao Presidente da República ou a quem quer que fosse. Agora, também nos parece, com toda a franqueza, Sr. Deputado Manuel Monteiro, que, em qualquer circunstância, só fará sentido - e punhamos de parte a palavra "intimação", porque aí todos estamos de acordo - falar em leis de valor reforçado, quando, por alguma maneira, através desse valor reforçado, se vem, dentro do equilíbrio de poderes entre os órgãos de soberania, reduzir um pouco a margem de manobra do outro órgão de soberania que vai ter de se pronunciar a seguir. É que se não for assim, se não houver intenção de se reduzir um pouco essa margem de manobra, não faz sentido estar-se a exigir valor reforçado no primeiro órgão de soberania que se pronuncia. E é apenas por essa razão que o PSD tem uma posição totalmente concordante com a posição do PS nesta matéria. De facto, uma vez que o esquema do referendo está arquitectado de modo a que haja a necessária intervenção, por um lado, do órgão de soberania Assembleia da República e, por outro, do órgão de soberania Presidente da República, como o Sr. Deputado Manuel Monteiro disse, e muito bem, que têm legitimidades democráticas distintas e têm ambos de ser chamados a pronunciar-se para que possa haver esse mecanismo referendário de consulta popular, parece-nos que não se deve dar aqui valores reforçados a lado nenhum, sob pena de, aparentemente, pelo menos, ou em termos políticos, se quiser, na prática, esse valor reforçado sempre ter de ser entendido pela opinião pública e pelo Sr. Presidente da República como alguma redução da sua margem de manobra - mais ainda, se o valor reforçado for de dois terços, como consta de algumas propostas. É evidente que, numa situação dessas, ninguém duvida que o Presidente da República ficaria numa posição muito difícil para, politicamente, negar a decisão favorável à realização de um referendo, que fosse proposto por uma maioria superior a dois terços da Assembleia da República.
É precisamente por o PSD entender que esta questão do referendo é um mecanismo que deve existir no sistema político português sem pôr em causa o delicado equilíbrio de poderes que existe na Constituição portuguesa que não se deve caminhar para valores reforçados na aprovação da iniciativa por parte da Assembleia da República.
Evidentemente, concordo que nunca seria um caso de intimação que daí resultaria, mas acho, com toda a franqueza, que, não sendo intimação, haveria, em qualquer circunstância, alguma redução política, pelo menos, na margem de manobra do Presidente da República, o que, penso, não é desejável. De facto, o PSD entende que o referendo deve existir, quando os dois órgãos de soberania, que têm legitimidade democrática directa, se pronunciem ambos a favor, tout court, sem que haja aqui necessidade de um ser mais a favor do que outro. É só por essa razão. Nós entendemos que se deve manter uma decisão normal da Assembleia da República, sem recurso a valores reforçados, sejam eles de que valor forem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer um comentário ainda à proposta do CDS-PP, a qual me parece pôr em causa toda a lógica de harmonia constitucional e entre órgãos de soberania. É que, por um lado, facilita a convocação de referendos por parte do Presidente da República, o que lhe dá um poder extremo, total. Como já aqui foi dito, no fundo, consagra o princípio da democracia sem povo, o princípio bonapartista: o Presidente da República não dá satisfações a ninguém e, por um lado, pode fazer referendos quando entender. Por outro lado, no n.º 4, vem dar a solução de o Governo e a Assembleia poderem obrigar e retirar em absoluto os poderes ao Presidente, vinculando-o, tal qual caixa do correio, a cumprir os referendos que a Assembleia ou o Governo decidem. Isto é, na mesma solução, temos a situação do conflito institucional permanente e, por certo, havemos, relativamente a matéria relevante, de saber quem chega primeiro. Quem chega primeiro, se o Presidente da República a propor um referendo... Isto é, temos consagrada a situação institucional permanente de o Presidente ou ser Bonaparte ou caixa do correio. De facto, toda a lógica da guerrilha institucional estaria consagrada por esta solução referendária, o que é manifestamente inaceitável, porque a ideia do referendo é uma ideia de participação e de democracia directa, articulável com a democracia representativa, mas de acordo com uma solução de harmonização entre os órgãos de soberania, Governo, Assembleia e Presidente, e nunca instrumento de guerrilha e de combate de oposição a um órgão ou a outro.
Nesta solução do PP, que, já sabemos, pretendeu conciliar o inconciliável, o Presidente ou é Bonaparte e é o tudo, ou é o zero e é um agente caixa do correio, que apenas carimba aquilo que lhe é proposto, o que, na prática, vem a dar: Governo, Assembleia ou Presidente todos em corrida a ver quem manda, porque quem não chega primeiro, nesta matéria, não manda nada.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? É que já há uma inscrição anterior.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Para responder, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Responderá na altura própria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que a lógica das maiorias qualificadas na Constituição aponta normalmente para a exigência de maioria quando a decisão é definitva e particularmente importante. E poderia fazer sentido exigir uma maioria qualificada se a proposta da Assembleia não fosse uma proposta mas um acto vinculativo do Presidente, que "condenaria" naturalmente o Presidente da República à prática de um mero acto burocrático. Como nós excluímos que caiba no actual equilíbrio de poderes - e que, no fundamental, julgamos que é de manter -, uma situação deste tipo, isto é, de vinculação do Presidente da República a submeter a referendo, obrigado por uma decisão qualificada da Assembleia da República, excluímos também que exista a necessidade da aprovação da proposta por maiorias qualificadas. Trata-se de uma mera proposta - o Presidente da República julgará. Naturalmente, se a proposta for muito qualificada, de facto, tenderá a ter esse facto em conta; se for uma maioria tangencial, também poderá ter esse facto em conta, ou para convocar ou como fundamento para não convocar. Tratando-se, como se trata, em nossa opinião, de uma mera proposta, cremos que não há razão para a existência

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de maiorias qualificadas, nem para a vinculação do Presidente por actos da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria de clarificar um aspecto que me parece importante.
Primeira questão: poderão existir, eventualmente, nomeadamente em relação à questão do Governo, dualidades de critérios e de interpretação, quanto às redacções que estão quer na proposta do CDS-PP, designadamente no n.º 4, quer na proposta do PS, nomeadamente no seu n.º 1. O próprio Partido Socialista admite que o Governo possa solicitar a convocação do referendo em matérias das respectivas competências - nessa matéria, não há qualquer dúvida em relação àquilo que está escrito na proposta do CDS-PP. Portanto, quero que fique aqui muito claro que, quando o PS admite - como, aliás, já consta da actual Constituição, ainda que com outra redacção - que o Governo solicite a convocação do referendo...

O Sr. José Magalhães (PS): - Solicite!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Deputado, aqui não está "solicite", mas diz-se "mediante proposta". O Partido Socialista propõe a seguinte redacção: "Os cidadãos eleitores (...)

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, desculpe-me interrompê-lo, mas penso que continuamos com dúvidas de interpretação da proposta do PP.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, queria esclarecer...

O Sr. Presidente: - Então, esclareça-me também a mim. É que o actual regime constitucional é o seguinte: existe referendo, quando o Presidente assim o decida, sob proposta da Assembleia da República ou do Governo. A decisão é do Presidente, é uma decisão livre - não a pode tomar sem proposta, mas não é obrigado a tomá-la havendo proposta. Este é o regime actual. O PS e o PCP não a alteram nesse ponto e o PSD também não, salvo retirando a iniciativa do Governo...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é iniciativa!

O Sr. Presidente: - ... salvo retirando a proposta do Governo. O PP, aparentemente, altera. E altera, num duplo sentido: por um lado, admite referendo sob simples decisão do Presidente, sem proposta, e, por outro, admite referendo obrigatório para o Presidente, bastando haver proposta da Assembleia ou do Governo.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não, não!

O Sr. Presidente: - Esta segunda parte é assim ou não?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Em relação ao Governo, não é assim, Sr. Presidente. Em relação ao Governo, o sentido da nossa proposta é exactamente o mesmo da proposta do PCP.

O Sr. Presidente: - Portanto, é só assim em relação à Assembleia.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Só em relação à Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Estamos esclarecidos.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Portanto, em relação a essa questão concreta do Governo, queria esclarecer isso, porque me parecia importante, tendo em atenção a intervenção do Sr. Deputado Alberto Martins, quando dizia "andam todos a correr, o Governo, a Assembleia e o Presidente da República, para ver qual é o que manda primeiro fazer o referendo".
Em relação ao Governo, primeiro, que fique claro que o sentido objectivo da proposta do CDS-PP é exactamente aquele que o Sr. Presidente acaba de referir...

O Sr. Presidente: - Mas não está claro na vossa proposta. Agora, sim, ficou esclarecido.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): -É por isso que estou aqui, procurando esclarecer.
Em relação à Assembleia da República e ao Presidente da República, quero dizer aqui o seguinte: aí, de facto, há uma diferença de opinião entre o CDS-PP e, pelos vistos, o PCP, o PS e o PSD. Pela seguinte razão: quando o Sr. Deputado Alberto Martins diz que o Presidente, num caso, não dará satisfação a ninguém e, noutro, funcionará como mera caixa de corrreio, permito-me dizer que não se vê, em lado algum da proposta do CDS-PP, a possibilidade de o Presidente da República fazer referendos sobre tudo e mais alguma coisa. Aquilo que a proposta do CDS-PP diz é que o Presidente da República terá o direito de iniciativa de propor um referendo, nos termos da Constituição e da lei - nada mais do que isso. Portanto, não está previsto na nossa proposta, de modo algum, que o Presidente da República, acorde, um dia, de manhã, e diga que vai fazer um referendo sobre uma matéria qualquer. Aquilo que o CDS-PP propõe é que o Presidente da República possa ter o direito de iniciativa de propor a referendo determinadas matérias, nos termos da Constituição e da lei - ponto final. Agora, obviamente, pode ter esse direito de iniciativa, coisa que, actualmente, a Constituição, como já aqui foi referido, não prevê. É por isso que, há pouco, falava não de uma confusão institucional ou constitucional ou de um conflito institucional, como há pouco dizia o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, mas de um novo equilíbrio, se quiser. E um novo equilíbrio que permita dar mais liberdade e maior capacidade de actuação quer à Assembleia da República quer ao próprio Presidente da República. E porquê? Por um lado, porque, ainda nos termos da Constituição e da lei, permite ao Presidente da República ter o direito de iniciativa de fazer ou de propor os referendos e, por outro lado, diz ao Presidente da República que não faz sentido, se a Assembleia da República assim o entender e deliberar, que ele não convoque esses mesmos referendos se eles forem aprovados por maioria absoluta por parte da Assembleia da República.
É este o sentido da proposta do CDS-PP, em relação ao Governo, à Assembleia da República e à iniciativa própria do Presidente da República.

O Sr. Presidente: - Discutida mais esta proposta do PP, com o resultado à vista, passamos a outro ponto. Os

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projectos de lei do PS e do PCP têm em convergência uma alteração em matéria de iniciativa. De facto, esclarece-se nesses projectos que as propostas da Assembleia da República e do Governo devem ser feitas na área das respectivas competências. Suponho que essa alteração é coincidente.
Está em discussão essa alteração.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a filosofia inspiradora dessa proposta é a mesma que subjaz ao actual artigo 118.º e é um pilar fundamental do equilíbrio entre órgãos do poder.
O PSD, nesta matéria, propõe uma parlamentarização do sistema, ou seja, o Governo nem em matérias da sua competência, da sua área própria de intervenção e de actuação, poderia propor ao Presidente da República um referendo. Se desejasse realizar ou se entendesse benéfica a realização de uma consulta popular, teria de dirigir-se ao Parlamento e ver aprovada no Parlamento essa proposta de consulta popular, a fim de ser apresentada ao Presidente da República, o que contrasta veementemente com o estatuto próprio do Governo no sistema constitucional português. Mesmo prescindindo de elucubrar sobre os cenários possíveis de governos, dentro do sistema constitucional - governos de maioria absoluta, de maioria absoluta abundante, de maioria absoluta escassa, de maioria relativa, de maioria simples, etc. -, não faz sentido, creio, suprimir essa competência governamental de propor ao Presidente da República a realização de referendos na sua área própria. E também não faria sentido alterar a regra que diz: "Não promoverá ou proporá o Governo referendos em matérias da competência da Assembleia nem promoverá ou proporá a Assembleia referendos em matéria de competência governamental". São princípios sábios de equilíbrio institucional e de repartição e de separação de poderes, projectados aqui ainda no domínio da iniciativa referendária. Somos, portanto, fiéis a essa concepção e ela parece-nos essencial para a paz e para a estabilidade constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou fazer um ponto de ordem para saber o que estamos a discutir. A actual Constituição - e parece que, se não houver alteração de posições, assim vai ficar - permite que a Assembleia da República e o Governo possam propor ao Presidente da República a realização de referendos. A opinião dos comentadores - e, pelo menos na parte que me diz respeito, tenho-o por certo -, é a de que implicitamente a Assembleia e o Governo podem propor ao Presidente da República a realização de referendos na área das respectivas competências. O que o PS e o PCP propõem é explicitar isto, que, a meu ver, já resulta da Constituição, mas admito ser problemático. Portanto, é esta proposta concreta que está em discussão: é explicitar que a Assembleia da República, por um lado, e o Governo, por outro, só possam propor referendos na área da sua competência e que nem a Assembleia da República possa propor um referendo em áreas de exclusiva competência do Governo, nem o Governo possa propor referendos em áreas de reserva de competência da Assembleia da República.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - E no caso de serem os cidadãos eleitores a tomar a iniciativa?

O Sr. Presidente: - Aparentemente, essa proposta, neste momento, não está em discussão, uma vez que ficou para trás.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se me permite, essa é uma uma questão apaixonante e interessante, mas não é a que estamos a discutir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas essa é a questão nuclear.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas estão ligadas uma à outra!

O Sr. José Magalhães (PS): - Nós estamos disponíveis para discutir essa questão à saciedade e há harmonias e ligações que respeitamos sagradamente. Agora, não é essa a questão em discussão.
Sr. Presidente, antes de V. Ex.ª dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, até para ele poder pronunciar-se, tendo o mapa inteiro à frente,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já ouvi isso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não ouviu, seguramente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, está apenas a dar um esclarecimento?

O Sr. José Magalhães (PS): - Estou, sim, Sr. Presidente.
Gostaria apenas de sublinhar que não se trata apenas da opinião dos comentadores, por mais respeitáveis que eles sejam - e são-no; é a solução que o legislador ordinário, através da lei orgânica do referendo, já plasmou. O artigo 5.º da lei orgânica do referendo, a Lei n.º 45/91, de 3 de Agosto, teve ocasião de, nesta matéria, explicitar o seguinte - e vou ater-me apenas à parte relativa ao Governo: "Sem prejuízo do poder de inciativa a exercer perante a Assembleia da República, a proposta de referendo da inciativa do Governo pode incidir: a) sobre convenção internacional cuja aprovação não seja da competência da Assembleia da República ou que a esta não tenha sido submetida; b) sobre acto legislativo em matérias não incluídas na reserva de competência da Assembleia da República".

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a primeira consideração que gostava de fazer sobre essa matéria é a seguinte: o Sr. Deputado José Magalhães terminou a explicitação da propositura por parte do PS deste inciso, que o Sr. Presidente situou para a discussão, neste momento, em matérias das respectivas competências, dizendo que isso era para contribuir para a paz institucional e do próprio sistema democrático.
Gostava de recordar ao Sr. Deputado José Magalhães, como o Sr. Deputado Barbosa de Melo teve a oportunidade de referir, que é exactamente por isso: o perigo para a paz não vem tanto de um diferente posicionamento entre o Governo e a Assembleia, que são órgãos de soberania com uma legitimidade democrática comum; o perigo para essa paz vem, sim, se o referendo puder servir para legitimar

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a iniciativa de um órgão de soberania que tem uma legitimidade democrática diferente, que é a do Presidente da República, que pode deitar mão da sua base de apoio, da sua base eleitoral, e, por iniciativa directa, como os senhores propõem, da parte de um conjunto de cidadãos eleitores, poder contrariar o posicionamento político e as opções políticas da Assembleia da República e do Governo, que têm legitimidade democrática diversa da sua. Chamo-lhe a atenção para isto, porque esta reflexão ficou em aberto, mas tem necessariamente de ser feita.
Quanto à questão em concreto das matérias das respectivas competências, devo dizer que o PSD não vê qualquer problema no acrescento deste inciso, conforme é proposto pelo PS. De qualquer maneira, chamo a atenção do PS para o seguinte: não vendo inconveniente, também não achamos ser necessário. Por uma razão muito simples: porque, como o n.º 2 diz - e o PS também mantém este número -, as matérias que são objecto de referendo são matérias de relevante interesse nacional e, das matérias de relevante interesse nacional, as únicas que, do nosso ponto de vista, são competência do Governo, não o sendo também da Assembleia da República, são as matérias de foro íntimo do próprio Governo e não nos parece que essas possam, alguma vez, vir a ser propostas para referendo.

O Sr. José Magalhães (PS): - E a competência legislativa concorrencial?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Sr. Deputado sabe que o PSD não concorda com a propositura directa por parte do Governo ao Presidente da República.
Em qualquer circunstância, como já disse, não vemos inconveniente nesta precisão, neste inciso, que foi a questão colocada pelo Sr. Presidente. Só não o colocámos, na economia da nossa proposta, por entendermos que, por um lado, as matérias sempre passavam pela Assembleia e, por outro, o Governo só tem competências exclusivas que a Assembleia não tenha, em matérias legislativas, naquilo que concerne à sua organização própria e não nos parece que isso, alguma vez, possa vir a ser objecto de referendo. Foi por isso que não o pusémos lá, mas não vemos inconveniente em que lá fique.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, a partir do momento em que se mantém - e parece que se vai manter - o direito de iniciativa do Governo e da Assembleia da República nesta matéria, há vantagem em garantir que, por um lado, o Governo possa usar a propositura do referendo junto do Presidente da República como instrumento de eventual restrição de poderes parlamentares, visto que poderia fazer propostas em matéria da competência da Assembleia da República, deixando a Assembleia da República fora deste circuito e, por outro lado, eventualmente, a Assembleia da República também ela possa fazer propostas em matéria da exclusiva competência do Governo, porque também isso poderia eventualmente verificar-se em algumas matérias.
Nesse sentido, não sendo absolutamente indispensável este acrescento, propusemo-lo, tal como o PS, e julgamos que haveria vantagem nesta clarificação.

O Sr. Presidente: - É também a minha opinião.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas deixar uma nota de registo da posição do CDS-PP sobre esta matéria para dizer que concordamos consigo. Nós entendíamos que o actual texto constitucional, de algum modo, já previa aquilo que parece ser a preocupação do PS e do PCP, mas não pomos qualquer objecção a que exista esta maior clarificação, pretendida pelo PS e pelo PCP.

O Sr. Presidente: - Parece que, em princípio, está adquirida esta alteração, este esclarecimento constitucional.
Ainda em matéria de iniciativa, proponho que passemos aos casos propostos, nomeadamente, pelo PP, de referendo obrigatório. É o caso do n.º 3 da proposta do PP, sobre referendo obrigatório de tratados que tenham por objecto "(...) a atribuição a organizações internacionais de competências dos órgãos de soberania do Estado português".
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, como é conhecido, o PP tem-se batido, ao longo dos tempos, no sentido de que, sempre que Portugal aprove determinado tipo de tratados, esses tratados, quando impliquem transferências de soberania, sejam, antes de mais, submetidos a referendo para decisão do povo português.
Foi nesse sentido que propusemos o referendo aquando da discussão e aprovação, em Portugal, do Tratado da União Europeia. É nesse sentido que esperamos venha a ser feito um referendo quando for aprovado o tratado de revisão do actual Tratado da União Europeia.
E porquê? Em primeiro lugar, porque entendemos que estamos perante matérias que dizem respeito ao Estado e à Nação, não apenas aos órgãos de soberania mas a todo o povo, e que todo o povo sobre eles se deve pronunciar, sempre que essas mesmas matérias sejam discutidas ou estejam em cima da mesa. Por outro lado, porque, independentemente das opiniões - respeitáveis, sem dúvida - de outras pessoas, não nos parece que, no actual quadro político português e nos últimos anos - e não cremos que, no futuro, a coisa se possa alterar -, em campanhas eleitorais legislativas para a Assembleia da República, os programas dos partidos contemplem estas mesmas matérias e que os cidadãos eleitores votem, ou não, num determinado partido para o Governo ou para a Assembleia da República, única e exclusivamente, em função destas matérias ou sequer em função destas mesmas matérias. Razão pela qual nos parece essencial que o povo seja consultado, sempre que, como aqui foi referido, o País aprove tratados internacionais que impliquem transferências de soberania do Estado português.

O Sr. Presidente: - Recordo o seguinte: todos os projectos, se não estou em erro, contêm propostas, no sentido de admitir referendos sobre tratados desta natureza e outros. Portanto, o que está em causa não é isso mas, sim, saber se sobre essa matéria em concreto deve ou não haver referendo obrigatório.
Está aberta a discussão desta proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não consta do nosso projecto uma proposta no sentido de vincular

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o Presidente da República a desencadear o processo referendário, por uma questão de respeito pelo perfil de atribuições e competências do Presidente e pela forma de organização e princípios básicos de organização do sistema político.
Nesse sentido, temos uma proposta que viabiliza a convocação, conjugando-se os mecanismos constitucionais para tal, ou seja, proposta da Assembleia da República, desencadeada por quem o entender, e convocação pelo Presidente da República, o que terá aplicação em relação ao produto da revisão do Tratado da União Europeia, entre outros. No entanto, parece-me que uma norma deste tipo seria uma excepção e uma entorse a alguns princípios basilares em relação ao perfil do próprio Presidente da República e, nesse sentido, não subscreveremos uma solução impositiva deste tipo.
Aquilo que há de meritório nas preocupações de garantia de uma participação popular em relação à tomada de determinadas decisões está consumido e absorvido pela proposta que o Grupo Parlamentar do PS apresenta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, por parte do PSD, entendemos que, se faz algum sentido - pelo menos, foi essa a interpretação que fiz das palavras do Dr. Manuel Monteiro - ou se é entendível a proposta do Partido Popular no contexto da actual redacção do artigo 118.º, ela perde algum sentido na análise conjunta, como estamos a fazer nesta Comissão, das propostas que temos sobre a mesa, porque parece que já está adquirida, nas outras propostas, a necessidade de passar a haver referendos sobre os aspectos mais relevantes contidos em convenções internacionais que o Estado português venha a celebrar, isto é, sobre as chamadas questões determinantes ou mais relevantes.
Portanto, com todo o respeito, creio que o texto que consta do n.º 3 perdeu um bocado de sentido. Atrever-me-ia até a dizer mais: não só perdeu um bocado de sentido como até pode ser interpretado, no novo contexto em que há também outras propostas que conduzem a proposituras de referendo sobre os tais aspectos relevantes das convenções internacionais, como um libelo de suspeição lançado sobre os órgãos de soberania portugueses, que estariam como que predispostos, politicamente, a não vir a fazer esse referendo, e só o fariam porque o texto constitucional os obrigaria desde já a fazê-lo.
Penso que, sob o ponto de vista político, essas questões estão historicamente ultrapassadas. Como disse no início da minha intervenção, penso que fazia sentido e politicamente era respeitável a propositura deste n.º 3 do artigo 118.º por parte do PP no contexto anterior; no actual contexto, se o texto constitucional for aprovado com uma norma deste tipo, isso pode, amanhã, quando ele estiver em vigor, ser entendido como que um libelo de suspeição sobre os órgãos de soberania, no sentido de os amarrar a uma decisão a que eles, politicamente, não estaria favoráveis.
Neste momento, penso que esta questão já é pacífica na sociedade portuguesa e seria errado criar aqui como que um quisto acusatório, sem interesse para quem quer que seja, porque, hoje em dia, todos os partidos aqui presentes, que são os mais importantes, com representação parlamentar, estão de acordo sobre a necessidade de vir a realizar-se este tipo de referendos. Assim, entendemos ser errado que se inclua uma norma deste tipo na Constituição, embora reconheçamos que a sua propositura fazia sentido e era politicamente entendível, só que neste momento já nos parece um bocado ultrapassada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, permita-me, a título de comentário, dizer que, apesar de tudo, não seria o único caso de referendo obrigatório, já está um aparentemente adquirido em matéria de regionalização.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Infelizmente, foi preciso chegar-se a essa obrigação, porque não estava adquirido.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que neste momento a clivagem política que existe nesta matéria já não é entre fazer ou não o referendo, pois ele tornou-se politicamente obrigatório. A clivagem é de outra natureza: é entre colocar a referendo o tratado ou colocar a referendo questões determinantes do tratado.

O Sr. Presidente: - Veremos isso mais tarde, Sr. Deputado. Peço-lhe que não introduzamos essa questão agora.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, apenas estou a referir esta questão para dizer que, quanto ao problema de haver ou não referendo sobre matérias envolvidas em tratados deste tipo, está completamente adquirido que, pelo menos por agora, não se justifica a imposição de referendo obrigatório, o qual, creio, não terá as leituras de suspeição sobre órgãos de soberania. Em minha opinião, deve evitar-se, em geral, salvo situações muito particulares, criar uma obrigação de referendar quando se confia em que, sendo uma questão importante e relevante, como é, os órgãos de soberania não deixarão de colocar a referendo.
Gostaria ainda de chamar a vossa atenção, se me permitem, para a formulação utilizada pelo PP nesta matéria.
O n.º 6 do artigo 7.º da Constituição tem uma fórmula extremamente burilada e cautelosa, como é sabido, que refere, designadamente, "convencionar o exercício em comum de poderes necessários à construção europeia", a observância do princípio da subsidariedade, a coesão económica e social. Como é do conhecimento geral, esta fórmula é muito discutida. Há quem defenda, por exemplo, que não se trata de transferência de poderes soberanos mas, sim, de uma mera delegação de poderes. Creio que não é, de forma alguma, uma questão despicienda e que deve merecer muita atenção no momento oportuno. De resto, foi a consideração de questões deste tipo que nos levou a fazer uma mera remissão para o n.º 6 do artigo 7.º e não nomear e caracterizar autonomamente este tipo de tratados. Sem dúvida alguma, a forma de os caracterizar é extremamente delicada e aquilo que fizermos tem de ser objecto de grande cuidado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas, respeitando as opiniões que aqui foram expressas, manifestar um princípio fundamental, que é este:

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o Partido Popular, quando propõe este n.º 3 do artigo 118.º, não se reporta apenas ao actual momento político. Quando fazemos uma proposta desta natureza, não estamos a pensar se a Assembleia da República tem uma maioria branca ou uma maioria menos branca, se tem uma determinada composição ou outra. Quando fazemos uma proposta desta natureza, temos em mente prever sempre para o futuro aquilo que poderá vir a acontecer.
Quando se trata da aprovação de tratados ou de convenções de natureza internacional que impliquem transferências de soberania, o Partido Popular entende que os portugueses devem ser sempre consultados, independentemente da transitoriedade de quem num determinado momento está na Assembleia da República. Hoje pode existir consenso quanto à realização de um referendo sobre esta mesma matéria, mas amanhã pode não existir esse consenso.
Uma matéria desta natureza, que diz respeito à soberania do Estado, não pode estar dependente da vontade política do momento, tão-pouco da vontade partidária do momento do partido A, B ou C. Esta questão é, talvez, com todo o respeito pelas outras, uma das mais importantes para o Partido Popular, é uma questão política relevante para nós e da qual, com todo o respeito pela Comissão, não abdicaremos, pelo que procuraremos até ao fim, ainda que respeitando a regra democrática, levar a nossa dama por diante.
Finalmente, registamos com curiosidade a consonância de pensamento do PSD e do PS nesta matéria, o que, aliás, não é de estranhar, tendo em atenção que as opiniões do PSD e do PS têm sido sempre consonantes em relação a esta matéria no passado e no presente e sê-lo-ão, provavelmente, no futuro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer um comentário que permita apurar os dados inovadores resultantes do debate.
Primeiro dado inovador: o objectivo útil pretendido pelo CDS-PP pode ser alcançado sem sacrifício de qualquer equilíbrio constitucional, confiando-se, com todas as cautelas, aliás, em que os órgãos de soberania são capazes de exercer as competências para as quais foram eleitos, isto é, confiando-se em que o Sr. Presidente da República poderá exercer activamente as suas competências, em que a Assembleia da República terá as iniciativas que é suposto ter, em que os cidadãos terão as iniciativas que lhes permitirmos, na sequência desta revisão constitucional, e em que eles tê-las-ão activamente.
As normas de imposição podem ser encaradas, mas como ultima ratio e a título excepcional, uma vez que implicam uma compressão da capacidade de iniciativa e de actividade autónoma dos órgãos de soberania, neste caso, do Presidente da República.
Em segundo lugar, esta discussão foi muito interessante, para lançar luz sobre as consequências da redacção proposta pelo PP, porque, além da virtude da propositura, ainda há o chamado rigor e carácter certeiro das fórmulas propostas.
A fórmula proposta pelo PP tem como característica a terrível dificuldade hermenêutica, porque nela cabe virtualmente tudo, sem, de resto, um rigor mínimo, pois referem-se "tratados que comportem atribuição a organizações internacionais de competências dos órgãos de soberania do Estado português".
Sendo certo que o Estado português tem muitos órgãos de soberania, incluindo os tribunais e que a atribuição a organizações internacionais de competências é alguma coisa que abre uma discussão bastante interessante, que em sede de revisão constitucional tivemos o cuidado de não fechar em termos excessivamente sumários, pergunto: o que é a "atribuição a organizações internacionais de competências", uma vez que, como se sabe, determinados tratados podem permitir a organizações internacionais o exercícios de competências ou certas formas de actividade que podem, desta ou daquela forma, implicar acções em comum, partilha de competências, esforços que requerem uma visão diferente da actuação na cena internacional, a caminho do fim do século? É uma questão espessa, complexa, e a expressão "atribuição" é tudo menos inequívoca, antes pelo contrário.
Por isso mesmo é que, quanto ao artigo 7.º, n.º 6, da Constituição, tivemos o cuidado de, em sede própria, na III Revisão Constitucional, utilizar a expressão "convencionar o exercício em comum dos poderes necessários à construção da união europeia" em certas condições.
A fórmula do PP aplica-se a tratados que tenham este objecto, mas também a quaisquer outros. Ou seja, é totalmente lata. Uma convenção numa qualquer área, por exemplo, nas áreas agrícola, aeroespacial, marítima, monetária ou da circulação, pode caber, nesta leitura laxista, globalista, informe e não densificada, na noção dada pelo PP, o que significa que entraríamos no chamado ciclo referendário quotidiano.
Se bem que não é isso que quer o PP e trata-se apenas de uma questão de imprecisão da fórmula. Então, se é uma questão de imprecisão da fórmula, vamos para uma solução precisa e rigorosa. E qual é a que está ao nosso alcance, através do mecanismo que propomos, em geral, para referendar tratados? Essa questão está colocada adiante, no nosso projecto de revisão constitucional, de forma cuidadosa, metricamente precisa e que não suscita qualquer destes problemas que agora seriam resultantes do esforço hermenêutico, que é um esforço muito exigente, quase diria dramático, em relação a uma proposta totalmente rombuda, como a que o PP adiantou.

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, fico sempre muito feliz quando ouço o Sr. Dr. José Magalhães, com a sua capacidade oratória de nos colocar bem dispostos.
Sr. Dr. José Magalhães, como deve calcular, o Partido Popular não quer referendar se há cintos de segurança atrás ou à frente...

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas é o que resulta da vossa proposta!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não, não resulta. Sinceramente, penso que não resulta, até porque, como deve calcular, ao fazermos esta proposta, fazemo-la proposta no sentido claro de que os tratados, hoje em dia, nomeadamente ao nível da União Europeia, dispõem em

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termos monetários, financeiros, comerciais, agrícolas, de segurança, de política de defesa. Hoje há, aliás, quem queira chamar constituição ao Tratado, como sabe. O partido europeu a que vai aderir o PSD, em vez de lhe chamar tratado, chama-lhe constituição, ou, pelo menos, entende que será uma futura constituição.
Portanto, como deve calcular, o PP não pretende saber se os pneus são carecas ou deixam de o ser, se o tubo de escape dos automóveis tem uma dimensão...

O Sr. Strecht Ribeiro (PS): - Pode!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não pode! Como é evidente, não é esse o alcance nem a noção clara da proposta que o PP aqui faz.
A este propósito, o PS diz: estamos disponíveis para fazer referendos sobre determinados aspectos do Tratado que eventualmente venha a ser revisto. Ao contrário, o PP diz: não, senhor, não se fazem referendos avulsos, não se fazem referendos como uma lista de supermercado; vamos referendar o carrinho de compras mas não as compras que metemos lá dentro. Para o PP, a haver um referendo, deve ser um referendo global, sobre todo o tratado, que implica, no seu conjunto, a transferência de competências e de soberania dos órgãos de Estado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Um referendo sobre os 400 itens?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Os outros países, quando fizeram referendos na União Europeia, que eu saiba, referendaram todo o Tratado, não fizeram referendos ao artigo 1.º ou ao 5.º mas, sim, ao Tratado todo. E não me consta que deixassem de ter capacidade para o fazer, independentemente da complexidade. Mas essa questão não vem agora aqui ao caso.
O que é pertinente, sob o ponto de vista político, para o Partido Popular, neste momento, é apenas isto: uma norma desta natureza deve existir na Constituição da República Portuguesa, independentemente do cenário político-partidário do momento e de ser o PS, o PSD, o PP, o PCP, o partido maior ou o partido menor. E essa é uma questão fundamental, que diz respeito ao Estado, à Nação, independentemente de quem é Presidente da República, Primeiro-Ministro ou Deputado num determinado momento. Essa é a ideia política subjacente fundamental à proposta do Partido Popular.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Quero fazer uma pergunta, apenas para precisar o n.º 3 da proposta do CDS-PP, que tem por base uma questão concreta: a ratificação por Portugal, por exemplo, do Protocolo n.º 11 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que atribui um papel ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Portugal assinou a Convenção, ela está em vigor, e essa matéria está relacionada com a da competência dos órgãos de soberania - tribunais - em Portugal. É uma matéria nova do Tratado, podemos dizer que é um novo ponto do Tratado, que implica questões de soberania. De acordo com esta regra, teríamos de fazer um referendo. É ou não verdade?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é verdade. Sobre essa matéria muito concreta, teríamos de fazer um referendo não obrigatoriamente mas sim se essa fosse a decisão da Assembleia da República ou se os cidadãos assim o entendessem, indo ao encontro de propostas, quer do PS quer do PSD, que prevêem a possibilidade de cidadãos requererem...

O Sr. José Magalhães (PS): - Está aqui!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não está. O senhor está a falar de um protocolo e não de um tratado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ó, Sr. Deputado...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não, desculpe, não é um tratado! Portanto, aquilo que pretendo dizer é que...

O Sr. Alberto Martins (PS): - Protocolo é a revisão do Tratado de Maastricht!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Desculpe, mas vai haver um novo tratado.
Sr. Deputado, sabe perfeitamente que não é como diz. Estamos a "misturar alhos com bugalhos", com todo o respeito. Vamos avançar.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Deputado, o Protocolo n.º 11 atribui ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem o poder de decidir directamente estas matérias, em termos de recurso dos cidadãos nacionais. Portanto, implica uma alteração substancialmente distinta das competências dos tribunais portugueses e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - O que pretendo esclarecer é isto: sobre essa matéria concreta existirá ou não um referendo se a Assembleia da República o entender, por proposta de algum partido ou de cidadãos eleitores. O que o CDS-PP propõe, no n.º 3 do artigo 118.º do seu projecto de revisão, não é fazer referendo sobre essa questão concreta mas, sim, sobre tratados globais, sobre o Tratado da União Europeia ou sobre um tratado global de revisão da União Europeia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, em todo o caso, a dúvida colocada é consistente e pertinente.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Se não o fosse, eu não teria respondido.

O Sr. Presidente: - Salvo o devido respeito, creio que as dúvidas de interpretação se mantêm, porque, na realidade, o caso concreto colocado cabe no âmbito da vossa proposta.

O Sr. José Magalhães (PS): - É obrigatório um referendo!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é esse o nosso entendimento.

O Sr. Presidente: - Abre o caminho a uma interpretação restritiva, mas gostaria saber onde fica a interpretação restritiva do PP.

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O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, penso ter contribuído minimamente para o esclarecimento, dizendo que o PP, ao fazer a proposta clara que consta do n.º 3 do artigo 118.º, pretende referir-se a tratados da União Europeia, a tratados internacionais globais e não apenas a um protocolo que altere uma determinada disposição de uma certo tratado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, independentemente do âmbito concreto da proposta do PP, parece que não há abertura para estabelecer referendos obrigatórios nesta matéria.
Creio que, em matéria de iniciativa, nada mais há a considerar. No início, coloquei as propostas dos cidadãos exteriores à Assembleia à consideração, mas como nenhuma delas foi adoptada, considero que implicitamente estão afastadas, pelo que passaremos a outra matéria.
A matéria seguinte é a de saber quem decide o referendo. Nesta área há apenas uma proposta de alteração, que é apresentada pelo PSD. No actual regime constitucional, o referendo é decidido pelos cidadãos recenseados no território nacional. Nenhum dos projectos de revisão constitucional altera este ponto, salvo o PSD, que elimina este inciso, admitindo explicitamente a participação no referendo de cidadãos portugueses recenseados fora do território nacional.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, é justamente essa alteração que o PSD propõe para o n.º 1 do artigo 118.º.
Começo por referir que em reuniões anteriores, ainda o Sr. Presidente não era membro da Comissão, o PP deu assentimento a esta proposta do PSD, tendo concordado com ela expressamente.
Quero muito brevemente fundamentar esta proposta do PSD, dizendo o seguinte: estamos a falar de matérias que, nos termos do n.º 2 actual do artigo 118.º da Constituição, o qual não alteramos, vão incidir sobre questões de relevante interesse nacional que devam ser decididas pela Assembleia da República ou pelo Governo. Os cidadãos portugueses com os requisitos legais para votarem votam para a Assembleia da República e, indirectamente, escolhem o Governo, e aí estão incluídos todos os cidadãos, sejam ou não residentes no território nacional.
Portanto, não vemos qualquer razão para que, sendo substancialmente as mesmas as matérias sobre as quais os cidadãos eleitores se vão pronunciar, não o possam fazer quando se trata de um referendo. O universo de questões é o mesmo, por isso entendemos que o universo de cidadãos chamado a pronunciar-se sobre esta matéria deve também ser correspondente.
Acresce que aquilo de que estamos a tratar é de um referendo nacional, e, se é assim, entendo que toda a Nação, todos os cidadãos em condições legais de exercício do direito de voto devem ser chamados a participar e a decidir sobre as matérias objecto desse mesmo referendo.
Esta é uma posição que, desde há muito,...

O Sr. Presidente: - Desde há muito? Em 1994 não constava do vosso projecto.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - ... temos defendido em relação ao outras matérias, Sr. Presidente, não na questão do referendo, mas, por exemplo, no que toca à eleição do Presidente da República.
Assim, entendemos que é pertinente esta nossa proposta quando estamos a discutir esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, é para aderir a esta proposta?

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Não, era apenas para dizer, justamente porque o Sr. Presidente ainda não presidia a esta Comissão quando esta matéria foi aflorada pela primeira vez, embora isso já conste da Acta, que, da minha parte, no projecto que subscrevo, evoluo com gosto favoravelmente a esta pretensão do PSD.
De resto, aproveito apenas para acrescentar que, estando o instrumento do referendo nacional, nesta revisão constitucional, a ser alargado no seu âmbito da forma como está, abrangendo inclusive questões atinentes a convenções e a tratados internacionais, parece-nos imprescindível garantir que o universo eleitoral seja correspondente ao dos eleitores que se manifestam quanto a órgãos de soberania, como a Assembleia da República. É nessa medida que nos parece fazer sentido que, neste caso, os emigrantes também possam votar em referendos nacionais relativos a matérias da competência da Assembleia da República, pois os emigrantes já são chamados a votar para este órgão de soberania.
Aproveito, já agora, embora não tenha a ver com esta matéria, para anunciar que irei apresentar uma proposta de alteração ao projecto que subscrevo nesta matéria, bem como mais adiante, quando se chegar às matérias que dizem respeito ao artigo 164.º da Constituição, portanto, à reserva absoluta de competência da Assembleia, para que venha a ser possível também realizar referendos sobre a obrigatoriedade ou não do serviço militar, na medida em que, mesmo que seja desconstitucionalizada a obrigatoriedade, mantendo-se, se não estou em erro, na alínea c),...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Alínea d).

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - ... na alínea d) do artigo 164.º, as matérias que tem a ver com a organização das Forças Armadas...

Vozes não identificadas: - Do artigo 167.º!

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Do artigo 167.º, na alínea c) ou d), não tenho a certeza, pois não tenho aqui, neste momento, a Constituição.
Como dizia, ainda que, quando mais à frente discutirmos esta matéria, se chegue a consenso para a desconstitucionalização da obrigatoriedade do serviço militar, seria em qualquer caso, na prática, impossível decidir por via referendária a obrigatoriedade ou não do serviço militar.
Queria apenas anunciar esta intenção.

O Sr. Presidente: - Fica o anúncio feito. Independentemente da discussão que tenha havido noutra sede, suponho que se justifica reabri-la agora, quanto à proposta do PSD, que acaba de ter a adesão do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Registámos a abertura! Embora não propondo o que consta do nosso projecto.

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Vozes não identificadas: - Abertura, não. Assentimento. É mais do que abertura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, off the record, o Sr. Deputado Paulo Portas diz que manifestou abertura para esta proposta do PSD.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Foi on the record, face a uma reunião anterior desta Comissão!

O Sr. Presidente: - Fica on the record.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não só tínhamos manifestado abertura - e utilizo a palavra "abertura" - porque não está previsto no nosso projecto, como, quando a questão foi discutida a propósito da regionalização, manifestámos a simpatia pela ideia de que "à nação que partiu" fosse dado o mesmo direito que "à nação que ficou", para ser exacto e citar o que foi dito na altura.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, na verdade, começámos a discutir esta matéria numa reunião anterior desta Comissão e já nessa altura tivemos ocasião, a várias vozes, de adiantar alguns comentários às propostas que estão neste momento pendentes. E retomo essas considerações quase nos mesmos termos.
Em primeiro lugar, a proposta do PSD tem não uma mas várias componentes. O PSD propõe uma intervenção alargada neste sentido em relação a vários tipos de referendos, inclusive referendos de revisão constitucional, a referendos constitucionais, propriamente ditos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nem vale a pena discutir isso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não é indiferente, porque, quando se propõe o alargamento do colégio eleitoral, esse alargamento tem um significado ou outro consoante a natureza das decisões admissíveis a esse colégio eleitoral.
Parece-me que, deste ponto de vista, a proposta do PSD é hipermaximalista, sobretudo em contraste com a sua própria história, porque como, aliás, já foi relembrado, na Legislatura passada, o PSD não alterava uma vírgula do texto constitucional nesta matéria, o texto constitucional, ou seja, não propunha qualquer alargamento do colégio eleitoral referendário. Portanto, a proposta não pode ser sustentada, como o foi aqui pelo Sr. Deputado Miguel Macedo, invocando uma tradição continuada do PSD nesta matéria, porque quanto a isto não há qualquer tradição continuada no PSD, a não ser precisamente em sentido contrário. Ou seja, esta proposta é, desse ponto de vista, totalmente inovadora e não pode ser encarada como uma espécie de legado histórico do PSD, sedimentado pelo caldo de cultura de não sei quantos argumentos favoráveis e trazido à nossa apreciação com essa roupagem, essa tradição, e essa consistência sedimentada de uma hermenêutica.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sabe bem que o PS é que nunca quis!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, nem no passado isso aconteceu.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não foi possível.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não foi por não ter sido possível, mas porque não foi proposto, o que é totalmente diferente. Portanto, não vale a pena fazer um ar contrariado, de quem viu uma proposta briosa e positiva rejeitada por alguém caracterizado pela incompreensão. O PS não pode ser acusado disso. É uma proposta que o PSD agora adiantou.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado Miguel Macedo teve ocasião de adiantar um princípio de filosofia fundamentadora, cuja exegese é necessária para se chegar a uma boa solução nesta matéria. Esse princípio é o de que todos em condições iguais devem poder intervir nas tomadas de decisão colectivas. O problema tem existido desde o momento fundacional da Constituição e o conjunto de soluções que ela tem em matéria de residentes em território nacional e residentes fora do território nacional tem como consequência precisamente esta questão: é que, como sabem, não se verificam condições iguais em diversos pontos, designadamente nos que são cruciais em termos de proximidade temática, de liberdade de actuação dos partidos políticos e dos proponentes de diversas posições. E isso, que acontece em relação a diversos actos e tomadas de posição, incluindo naturalmente o sufrágio do Presidente da República, acontece também aqui nesta matéria.
E o princípio de prudente abertura que o PS enuncia na alínea b) do n.º 1 do artigo 124.º do seu projecto de revisão constitucional em relação à participação de recenseados no estrangeiro quanto à eleição presidencial procura precisamente salvaguardar estes princípios.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é abertura nenhuma!

O Sr. José Magalhães (PS): - Em matéria de intervenção referendária, tive aqui ocasião de sublinhar que há referendos e referendos e que, por exemplo, a intervenção de residentes no estrangeiro na União Europeia em referendo sobre matéria europeia é uma questão que poderia provavelmente ser considerada à parte. Quanto à intervenção generalizada e indiscriminada, precisamos de ser convencidos sobre a possibilidade de ultrapassem dos factores de não proximidade, de não acumulação com a nacionalidade dos outros Estados, de liberdade de esclarecimento, de liberdade de voto e de liberdade de realização de sufrágio em territórios que se regem por princípios muito diferentes dos do território nacional, o que o PSD ainda não produziu. São, por isso, para nós, estes os termos da discussão, sem prejuízo naturalmente da continuação do debate.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas rebater algumas das afirmações do Sr. Deputado José Magalhães e dizer o seguinte: este entendimento que temos de que todos os cidadãos portugueses que tenham as condições legais para o exercício do voto devem poder fazê-lo, designadamente para a eleição do Presidente da República - já o fazem para a Assembleia da República -, julgo ter uma extensão natural quando estamos a tratar, e queria explicitar isto bem, de matérias,

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como estas do referendo nacional, que são, uma vez mais, e insisto citando o texto do n.º 2 do artigo 118.º da Constituição, questões de relevante interesse nacional. Não vejo por que é que - para utilizar uma expressão do Deputado Paulo Portas - a Nação que partiu não tem de pronunciar-se sobre questões de relevante interesse nacional. Não vejo qualquer argumento sólido para que assim não seja. Nós sabemos que não há, nem tem havido, grande abertura do PS para encarar esta matéria, mas deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado José Magalhães, que não posso deixar de assinalar aqui alguma falta de sintonia entre o discurso actual do Governo, designadamente do responsável pela área das comunidades portuguesas, e aquilo que o Sr. Deputado aqui veio fazer.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pelo contrário!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Há uma falta de sintonia com o discurso, puro, duro, velho e caduco, que o Sr. Deputado José Magalhães aqui veio fazer em relação a esta matéria. Como V. Ex.ª sabe, o arejamento e a abertura do discurso do Governo socialista em relação a esta matéria, neste momento, é bem diferente. O que gostaríamos de encontrar por parte do PS era o abandono de posições que não têm qualquer sentido, não são sólidas e não têm qualquer fundamento sério, em relação a questões como estas que estamos aqui a discutir. Estamos a falar de um referendo nacional, não estamos a falar de uma consulta local ou de matéria de menor importância. Estamos a falar sobre questões que afectam o destino da Nação e do País e não vemos nenhuma razão para que uma parte da Nação fique excluída da decisão sobre matérias tão importantes.
E, já agora, Sr. Deputado José Magalhães, diga-me por que é que se regozija tanto quando, por exemplo, ao abrigo de tratados internacionais, cidadãos portugueses que residem noutros espaços em países de acolhimento podem votar nesses países, em matérias que dizem respeito, por exemplo, à vida local - e V. Ex.ª fica muito satisfeito com isso -, e quer negar a esses mesmos portuguesas, que estão nesses países, a possibilidade de se pronunciarem sobre questões que dizem respeito ao destino do seu próprio país. Isso não faz qualquer sentido.
Em relação a esta matéria, temos posições diferenciadas há muito tempo. Pensei que V. Ex.ª hoje vinha aqui manifestar alguma abertura e tenho a enorme esperança que esta tenha sido uma pontuação do PS em relação a esta matéria, mas que o PS mantenha uma abertura para, no fim desta revisão constitucional, podermos chegar a um entendimento muito razoável sobre esta matéria. Em nosso entender, todos ficaríamos a ganhar: o País e todos os portugueses.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de acrescentar duas ou três coisas ao que o Deputado Miguel Macedo acabou de dizer, com o qual, obviamente, estou em perfeita sintonia. O Deputado José Magalhães disse e bem que há vários tipos de referendo, o que, de resto, tinha sido já detectado pela nossa parte quando começámos a discutir o artigo sobre o referendo, dado que o PS propõe que se retire para uma artigo final, para as disposições transitórias, o eventual referendo sobre as questões resultantes da revisão do Tratado de Maastricht. Concordo que há vários tipos de referendo: há referendos locais, regionais e nacionais. Agora, o que para nós não faz sentido - pelo menos, não o estamos a encarar quando discutimos aqui esta matéria - são referendos continentais ou continentais e das regiões autónomas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Convém inclui-las!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pois, mas o que não faz sentido é começar a fazer aqui divisões intercalares.
Para nós, faz sentido haver referendos locais, regionais e nacionais. Se o referendo é nacional é para nós evidente - e é um ponto de honra - que toda a Nação, todos os cidadãos portugueses, vai ter de pronunciar-se. E esta questão não é uma questão de somenos para o PSD. O que está sobre a Mesa é isto e não vale a pena estarmos a falar das posições do passado. Todos sabemos que o PS, durante muito anos, sempre rejeitou a simples ideia do referendo - mas não vem ao caso estar agora a falar disso. Neste momento, concorda com ele e o que estamos a debater é como é que ele ficará depois desta revisão constitucional. Para o PSD é um ponto de honra a participação dos cidadãos eleitores em todos os referendos de âmbito nacional, pois, como o próprio nome indica, a participação dos cidadãos eleitores nesse referendo tem de ser de âmbito nacional, ou seja, de todos os cidadãos que façam parte da nação portuguesa, seja a tal nação que peregrina, a nação que partiu ou a nação que ficou. Se o referendo é nacional, todos os cidadãos vão ter de pronunciar-se, independentemente de qual for a matéria objecto do referendo em causa. O que interessa é o tipo do referendo. Se se tratar de um referendo local ou regional, pois, obviamente, será circunscrito a essa área. Agora, se é um referendo nacional, a circunscrição é a nação portuguesa e nós entendemos que não há cidadãos portugueses de primeira e de segunda.
E acrescentaria ainda um argumento já aqui utilizado pelo Deputado Pedro Passos Coelho e que não foi retomado por ninguém: se as matérias do referendo são matérias de relevante interesse nacional, que devem ser decididas pela Assembleia ou pelo Governo, quero chamar a atenção do PS para o facto de os emigrantes já votarem, ou seja, estarem na base democrática que legitima quer a Assembleia quer o Governo. Portanto, não faz sentido absolutamente nenhum que, fazendo eles parte da base democrática que legitima a Assembleia e o Governo - e, segundo a abertura já expressa pelo Governo do PS, em que foi dito claramente pelo Secretário de Estado das Comunidades, por esse mundo fora, que os emigrantes votarão nas próximas eleições presidenciais, também farão parte da base democrática que legitimará o Presidente da República, o terceiro órgão de soberania que, como vimos nas discussões anteriores, participa neste mecanismo de referendo -, não há razão absolutamente nenhuma para que esses cidadãos portugueses, que legitimam democraticamente a Assembleia e o Governo e que irão também legitimar o Presidente da República, não participem em referendos que têm por objecto matérias decididas por essa Assembleia e pelo Governo. É um contra-senso total e continuamos a não perceber por que é que nos enredamos nesta distinção entre os cidadãos portugueses, uns de primeira classe e outros de segunda. Não podemos concordar com ela e é evidente que, para nós,

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mexer na matéria do referendo sem incluir também esta alteração é uma situação inaceitável.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de fazer dois comentários.
O programa da nova maioria nesta matéria é bastante claro - eu diria mesmo que é cristalino - e distingo rigorosamente e sem demagogia tudo o que deve ser objecto de distinção. Por um lado, alguns dos arautos de uma putativa participação de residentes no estrangeiro na vida política não tomaram enquanto foram governo quaisquer medidas eficazes para assegurar que tal ocorresse em relação às áreas em que essa intervenção estava prevista e garantida por lei. E é por isso mesmo que o Secretário de Estado das Comunidades teve de tomar as medidas que anunciou publicamente e está a fazer os esforços que está a fazer para alterar essa situação. O número de recenseados é diminuto e seguramente não por responsabilidade do PS. Assim sendo, não entraria em pormenores nessa matéria.
Agora, se os Srs. Deputados querem discutir aqui a situação em matéria da evolução do voto dos residentes no estrangeiro nas eleições legislativas, nós discutimos. Esses dados estão disponíveis e são dados altamente desfavoráveis a qualquer demagogia ou surto demagógico por parte da bancada que liderou esse processo durante anos e que, agora, não o lidera.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não sei do que é que tem medo!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não temos medo, Sr. Deputado. Nessa matéria temos um programa claro, que é para honrar escrupulosamente e para cumprir. E, mais ainda: o nosso projecto de revisão constitucional e o Sr. Secretário de Estado das Comunidades não estão em dessintonia, mas sim em pura sintonia - nem outra coisa seria concebível. Por isso é que propomos o que propomos em sede da alínea b) do n.º 1 do artigo 124.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já lá iremos!

O Sr. José Magalhães (PS): - Gostaria que os Srs. Deputados não obrigassem esta bancada a repetir incessantemente o que consta desse artigo. Mas esse artigo também diz o que diz e não outra coisa e obedece a preocupações de rigor, de distinção, de adequação, que nos parecem de elementar bom-senso. São essas preocupações que me levaram a dizer, como, de resto, já tinha sido afirmado em nome da bancada, que não vale a pena nesta matéria adoptar qualquer atitude que seja de pura e enfrenesiada demagogia.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem direito a toda a retórica que entender apropriada, aqui ou fora daqui, mas dizer que para o PSD é ponto de honra e que é evidente que a solução constitucional tem de ser a que o PSD agora propõe é francamente deslocado. A solução que o PSD agora propõe - e, de facto, só agora propõe - tem aspectos positivos e têm aspectos negativos, sobretudo na confecção que lhe deu originariamente e que é: Todos em tudo, em quaisquer circunstâncias e em quaisquer condições. Ou seja, é a tese da indiferenciação total porque, ao contrário do que disse, não há apenas uma distinção entre referendos nacionais, regionais e locais dado que os referendos também são distintos em função da sua matéria e essa distinção não é irrelevante.
Em terceiro lugar, o argumento, que é fácil e profundamente irrigoroso, de que os portugueses residentes no estrangeiro já podem votar em tudo e mais alguma coisa na vida local e que é irrefragável e absurdo que não o possam fazer na vida nacional, é inválido para os dois lados. Aliás, nem isso é verdade num dos campos nem daí resultaria, ainda que fosse verdade, uma participação irrestrita, indelimitada, e em quaisquer condições, em decisões nacionais e desde logo porque, como sabem, no referendo por um voto se ganha, por um voto de perde.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É esse o medo?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não. É uma preocupação que o legislador constituinte deve ter em relação às condições de liberdade, esclarecimento, igualdade de condições, não tratamento discriminatório dos participantes no referendo, os adeptos dos "sim", dos "não", das abstenções e em relação à regras de enquadramento democrático das campanhas e de liberdade de formação da vontade popular, que são o apanágio da Constituição da República Portuguesa e princípio basilar e fundador do direito eleitoral constitucional.
Ora, é esse legado do direito constitucional eleitoral que é necessário ponderar quando se está a discutir o alargamento do colégio eleitoral. E é isso que o PSD não faz e também não adiantaram nenhum argumento que nos confortasse em relação a estas questões, a da igualdade real de condições entre os que têm que participar no mesmo colégio eleitoral para discutir a mesma questão em relação à qual tem que haver a mesma panóplia de condições.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Bem lembrado! Só falta excluir os analfabetos que não estão em igualdade de circunstância connosco.

O Sr. José Magalhães (PS): - Espero que não utilizem esse argumento porque é de uma grande grosseria lógica.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Calvão da Silva, peço-lhe que seja breve, pois conto encerrar a reunião às 12 horas e 55 minutos.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, talvez tivéssemos toda a vantagem em equacionar o problema do referendo tendo em conta duas ideias de fundo. Já de outra vez tive que dizer isto ao Deputado José Magalhães, estamos aqui para encarar os problemas do futuro e não agarrados a amarras do passado, se no passado fizemos isto, se não fizemos. Aliás, esse é um problema de amanhã e não de ontem, e é aquele que interessa.
As duas ideias de fundo que estão em causa, uma é a revisão total do instituto do referendo e julgo que todos os partidos entendem que a nova cultura democrática tem uma ideia de aprofundar e aperfeiçoar ao máximo a democracia representativa sendo o instituto do referendo um desses bons instrumentos.
Nessa medida compreende-se que se possa evoluir e não que estejamos agarrados a coisas que no passado não fizemos. Estender ao máximo o âmbito do referendo em matérias

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de relevante interesse nacional é, pois, uma boa ideia que nos deve libertar de certos fantasmas do passado.
Em segundo lugar, a ideia da globalização do mundo, não é só na área económica que isso acontece e se estamos nessa ideia é bom que em Portugal, que preza a sua soberania, que preza a sua identidade, a sua cultura e a sua história, encontre mecanismos para que a nação universal que somos e não a nação que partiu, como dizia o Deputado Paulo Portas, possa encontrar razões e tempos para se sentir mais forte e mais agarrada a Portugal. Com a globalização, com tudo o que se está a passar no mundo de hoje, deixar disseminar a ideia de Portugal já tem esse risco. Se nós dermos a Portugal inteiro, espalhado pelas sete partidas do mundo, razões e tempos e modos para se sentirem mais ligados a Portugal todos ganhamos.
Nessa medida, tem sentido que não entremos na guerra de estrangeirados e não façamos dos portugueses no mundo também estrangeirados. Queremos que eles sejam cada vez mais portugueses...

O Sr. José Magalhães (PS): - Não é esse o nosso argumento.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sei que não, por isso é que estou a pôr isto noutros termos.
Como dizia, queremos que eles sejam cada vez mais portugueses na ideia global de que Portugal universal, se tiver opções em questões de relevante interesse nacional, num mundo e num tempo de globalização total, temos todos a ganhar com isso. Por isso faz sentido, na perspectiva dos problemas de amanhã, vermos a proposta do PSD e julgo que o Partido Socialista não vai deixar de ponderar isso.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, sem grandes considerações sobre esta matéria, quero reiterar aquilo que foi dito pelo Deputado Paulo Portas mas acrescento que é verdade para nós que os portugueses são portugueses com os mesmos direitos e deveres estejam onde estiverem, estejam eles no território nacional ou no território estrangeiro, embora também, com toda a sinceridade, me permita dizer que o problema dos emigrantes não é apenas o problema do voto, o problema dos emigrantes, no presente e no passado, foi saber se as condições que lhes davam para investir ou não investir no seu próprio país eram as mais correctas e nem sempre, apesar de não interessar o passado às vezes importa um pouco recordá-lo, essas mesmas condições foram as melhores para que os emigrantes pudessem sentir no seu próprio país todas as condições que eventualmente gostariam.
Feita esta breve consideração, se me permite, Sr. Presidente, gostaria de fazer uma simples pergunta ao PSD, uma vez que não tenho a noção de qual é o sentido final do PSD sobre esta matéria. O PSD dá ou não o seu consenso ao artigo 118.º ou faz depender o seu voto, quanto à possibilidade de realização do referendo e do seu alargamento, tal qual aqui está a ser definido, em função desta questão concreta?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, quer responder?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado Manuel Monteiro, embora não estejamos ainda em fase de voto, como o Sr. Presidente enunciou na anterior reunião, estamos a terminar a primeira leitura sobre a regionalização e o referendo, mas como esta é uma questão de princípio e como tal, para o PSD, em princípio, condicionará de facto toda a sua votação sobre as alterações a fazer sobre esta matéria. É uma questão de princípio e estamos convencidos...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP) : - Portanto, não poderá haver referendo, nem sobre a regionalização nem sobre o Tratado da Maastricht, se os cidadãos eleitores residentes fora do território nacional não puderem votar?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A conclusão que tem que tirar é que haverá referendo...
O referendo só faz sentido quando todos os cidadãos se pronunciarem. Não pode ser parte dos portugueses a decidir sobre Maastricht, não pode ser parte dos portugueses a decidir sobre a regionalização; não pode ser parte dos portugueses a decidir sobre as matérias de mais relevante interesse nacional. Essa é que é a conclusão a tirar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar por terminada esta reunião, quero chamar a atenção para que foi distribuída uma folha com o novo regime de reuniões: ganhámos mais uma reunião semanal. Estão desde já marcadas as reuniões para o período sucessivo ao encerramento dos trabalhos do Plenário da Assembleia da República bem como o regime que seguiremos em Setembro, pois reuniremos a partir do dia 3 de Setembro.
A próxima reunião será na próxima terça-feira de manhã, às 10 horas.
Srs. Deputados, estão encerrados os nossos trabalhos.

Eram 12 horas e 55 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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