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Sexta-feira, 27 de Setembro de 1996 II Série - RC - Número 29
VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
IV REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
Reunião de 26 de Setembro de 1996
S U M Á R I O
O Sr. Presidente (Vital Moreira) iniciou a reunião eram 21 horas e 50 minutos.
Procedeu-se à conclusão da discussão do artigo 65.º e discutiu-se os artigos 66.º, 66.º-A, 67.º, 68.º, 69.º e 69.º-A constantes dos diversos projectos de revisão constitucional.
Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Luís
Marques Guedes (PSD), José Magalhães (PS), Luís Sá (PCP), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Calvão da Silva e Barbosa de Melo (PSD) e Odete Santos (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 00 horas e 35 minutos do dia seguinte.
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O Sr. Presidente (Vital Moreira): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 21 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados, na última reunião ficámos na alínea a) do n.º 2 do artigo 65.º da Constituição, que trata do direito à habitação, relativamente à qual há uma proposta de alteração, do PSD, para substituir a expressão "planos de reordenamento geral do território" por "planos de ordenamento do território".
Houve aqui algum qui pro quo, mas penso que não se apurou qualquer ideia consensual nesta matéria.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, pode ajudar-me a reconstituir o ponto da situação em que ficámos?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a indicação com que fiquei foi a de que não havia uma posição fechada por parte do PS, que iria reflectir sobre o assunto, não fechando para já a porta. Esta foi a indicação que tomei na última reunião relativamente a esta norma.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é correcto. Tem havido um desenvolvimento, designadamente ao nível de lei ordinária, de uma metalinguagem específica neste domínio, e sendo a expressão proposta pelo PSD uma das mais frequentes e com uma acepção que a lei especifica muito precisamente, estamos abertos a considerar a actualização, se quiserem, da linguagem constitucional.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, foi esta a questão que mais objecções levantou?
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, a questão que se coloca é a seguinte: a expressão "planos de ordenamento do território" está normalmente ligada a determinadas figuras sobre as quais, aliás, a doutrina, particularmente o direito urbanístico, trabalhou bastante. A expressão "reordenamento geral do território" foi objecto de esforços interpretativos no sentido de incluir não apenas os planos propriamente ditos mas também as acções de reordenamento que constam de outros instrumentos, como a Reserva Ecológica Nacional e a Reserva Agrícola Nacional. Naturalmente que, se ficar na Constituição "planos de ordenamento do território", terá de haver, na minha opinião, o correspondente esforço doutrinário no sentido de passar também a abranger figuras como esta.
Não é trágico, não é uma questão de princípio, simplesmente é daquelas alterações que não nos parece nem importante ser inserida nem trágico ser feita.
Portanto, não temos qualquer dificuldade num qualquer empenho em que fique ou não, embora não nos pareça particularmente importante que fique.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado não apoia, mas também não desapoia!
Tentar-se-á encontrar, portanto, uma formulação alternativa ou, então, o consenso quanto a esta formulação.
Srs. Deputados, vamos passar à alínea b) do n.º 2 do artigo 65.º, relativamente à qual o Sr. Deputado Cláudio Monteiro propôs a eliminação da expressão "e das populações" na frase "Incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações, (…)". Alguém se quer pronunciar sobre esta proposta?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a parte que diz respeito à eliminação daquilo que, no texto actual, vem entre vírgulas "com subordinação ao interesse geral", é uma proposta que, de resto, é comum com a proposta do PSD…
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, isso é na alínea c). Estamos a analisar a alínea b) do n.º 2 do artigo 65.º da Constituição, que é a seguinte: "Incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações, (…)". Para esta alínea o Sr. Deputado Cláudio Monteiro propõe a eliminação da expressão "e das populações".
Pausa.
Não havendo ninguém que adopte esta proposta, passamos à frente até haver condições de os proponentes o fazerem. É a política que tenho seguido quando não estão presentes os proponentes e não há quem perfilhe as propostas em causa.
Esta é uma posição coerente e que tenho seguido até agora.
O Sr. José Magalhães (PS): - É correcta!
O Sr. Presidente: - Suponho ser correcta, pois, aliás, ninguém…
O Sr. José Magalhães (PS): - Aliás, quanto a esta norma, Sr. Presidente, nem a adoptamos nem a votamos!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para actual alínea c) existem duas propostas de alteração, uma do PSD e outra do Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
A actual alínea c) é do seguinte teor: "Estimular a construção privada, com subordinação ao interesse geral, e o acesso à habitação própria". O PSD propõe o seguinte texto: "Estimular a construção privada e o acesso à habitação própria ou arrendada".
Para apresentar a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à parte que é comum à proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, ou seja a eliminação do inciso "com subordinação ao interesse geral", a razão de ser desta alteração tem a ver com toda a sequência lógica que o PSD entende dar a este n.º 2, e para isso também propomos a alteração da ordenação em que actualmente se encontram as alíneas b) e c). Parece-nos que a lógica deste…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tratemos primeiro do texto e só depois da ordenação das alíneas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em termos de texto, propomos a eliminação do inciso "com subordinação ao interesse geral", porque, a nosso ver, o
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objectivo já está na alínea a), que é a obrigação de o Estado executar uma política com determinados objectivos, e na alínea b) deve estar o estímulo ao acesso à habitação própria, através da construção privada, e também, propomos nós, ao arrendamento.
A construção para arrendamento é uma matéria que não está coberta pelo actual texto constitucional, e parece-nos que faz cá falta. É indiscutível que existe, desde alguns anos e mesmo no actual Programa do Governo, onde vem expressa de uma forma clara, uma política de incentivo ao fomento da construção para arrendamento, como uma das formas de prover o direito à habitação.
Neste sentido, o PSD propõe a eliminação da expressão "com subordinação ao interesse geral" por nos parecer que, no contexto desta alínea, está a mais e apenas pode relevar numa "desconfiança" à livre iniciativa dos particulares no que respeita à habitação, o que não faz qualquer sentido do nosso ponto de vista e muito menos no contexto deste artigo, e o aditamento da expressão "ou arrendada", pelas razões que acabei de explicitar, ou seja, por nos parecer que é uma vertente fundamental para a satisfação do direito à habitação e que actualmente não consta do texto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão esta proposta.
Neste momento, deu entrada na sala a Deputada do CDS-PP Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto é sempre bem-vinda!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Muito obrigado! Mas o Sr. Presidente já estava avisado de que eu viria.
O Sr. Presidente: - Exacto! Já mo tinham comunicado! Mas a Sr.ª Deputada é sempre bem-vinda por duas razões: pela Sr.ª Deputada e pelo facto de, nos últimos tempos, o PP não ter tido representação na Comissão.
Já agora, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Sá, informo a Sr.ª Deputada de que estamos a discutir a alínea c) do n.º 2 do artigo 65.º.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Também pela minha parte dou as boas-vindas à Sr.ª Deputada.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos abertos a este acrescento, pois parece-nos que a construção para arrendamento é uma via justificada e que não tem de haver apenas referências a outras formas de acesso ao direito à habitação.
Já quanto à expressão "com subordinação ao interesse geral" há um problema, sem prejuízo de esta obrigação resultar de outras normas constitucionais, que resulta nesta matéria, é que se impõe um particular esforço no sentido de que a construção privada respeite normas urbanísticas, determinadas regras gerais, que não têm de constar apenas de planos e do esforço de ordenamento do território. Por isso, como se costuma dizer que quod abundat non nocet, princípio que talvez neste caso também seja aplicável, não vemos grande razão nem grande benefício em retirar esta expressão.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, face a esta posição do Sr. Deputado Luís Sá, quero colocar-lhe uma questão directa.
No fundo, aquilo que há pouco eu disse em nome do PSD, de que a actual permanência deste inciso na Constituição apenas releva numa desconfiança perfeitamente inaceitável face à construção privada, esta minha suposição é cabalmente confirmada pela interpretação dada pelo Sr. Deputado.
Sendo assim, pergunto-lhe: será que essas mesmas regras urbanísticas, que, obviamente, a construção privada tem de respeitar, não são exactamente as mesmas que também devem ser respeitadas pela construção pública e pelas iniciativas do Estado ou de outras entidades públicas?! Ou será que o Sr. Deputado entende que é apenas a construção privada que está sujeita às regras do urbanismo definidas no nosso Estado de direito?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes é especialista em Direito público e sabe perfeitamente que, a propósito da actividade pública e da actividade administrativa, não é preciso dizer-se a todo o momento que ela tem de respeitar o interesse público. No entanto, também sabemos o que se passa em relação à construção privada. Sabemos de sítios onde se acabaram com as ruas para se construir um determinado prédio, onde a construção privada não respeita o respectivo alinhamento, a volumetria, etc.
Se desaparecesse a expressão "com subordinação ao interesse geral", proposta pelo PSD, não havia qualquer tragédia; os poderes de regulação da Administração Pública não iriam, com certeza, desaparecer. Mas eu coloco a questão nestes termos: qual é a vantagem de a retirar?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma desconfiança, Sr. Deputado!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Não é nenhuma desconfiança, Sr. Deputado! Não é nenhuma desconfiança! É apenas a reafirmação natural de que, numa matéria deste tipo, a construção privada, que é muito estimável, respeite o interesse público! Não é mais do que isto!
Repito, apesar de não achar que seja uma tragédia retirar-se a expressão, não vejo qualquer vantagem nisso!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, em relação ao primeiro aspecto, ao aditamento de uma alusão ao papel estadual de estímulo ao acesso ao arrendamento, creio que seria de ponderar cuidadosamente a redacção, porque os Srs. Deputados colocam uma conjunção disjuntiva, o que igualiza o acesso… Uma conjunção disjuntiva com o sinal próprio das mesmas! Ora, isso talvez possa acarretar alguma desvalorização no acesso à habitação própria, o que seria, seguramente, nefasto.
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Portanto, suponho que serviria melhor a vossa ideia, se bem a percebi - ideia que não suscita polémica -, uma conjunção copulativa, ficando "habitação própria e arrendada" em vez de "habitação própria ou arrendada", o que tem o seu alcance próprio.
Mas, volto a sublinhar, seria interessante que disto não resultasse a desvalorização, a diminuição ou a menor consideração do alcance actual da norma quanto ao acesso à habitação própria.
Quanto à outra questão, é óbvio que não é comportável com as regras do Estado de direito democrático, com elas ou com as que fluem, aliás, deste preceito, a ideia de um direito à livre construção irrestrita, indiscriminada, em qualquer sítio e em quaisquer condições, livre de quaisquer obrigações, livre de quaisquer limites. No entanto, também é óbvio, por outro lado, que toda a construção pública, privada, cooperativa e comunitária tem de estar subordinada, não é restrita, etc.
A não generalizar-se, francamente, também não vejo vantagem em fazer uma amputação, porque, mesmo que amputado, sempre seria assim o alcance do preceito. É uma obra que, francamente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não sei se não resulta numa excessiva desconfiança, que talvez hoje esteja pacificada.
O Sr. Presidente: - Então qual é a posição do PS, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PS): - É "não, mas…" quanto a uma e "sim, mas…" quanto a outra. Quanto à primeira é "sim, mas…", quanto à segunda é "não, mas…".
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, seguindo a ordem com que o Sr. Deputado José Magalhães abordou as alterações do PSD, devo dizer que, quanto à primeira questão, estou totalmente de acordo, apesar de não ver muito bem que fique bem substituir simplesmente o "ou" pelo "e". Porém, estou totalmente de acordo quanto ao espírito da observação que fez.
Como referi, o objectivo do PSD é apenas o de cobrir uma área muito importante para satisfação do direito à habitação, que actualmente nos parece a descoberto neste artigo. Quanto à sua formulação, seguramente que é aquela que for entendida por todos nós como a mais adequada, e o PSD não tem qualquer objecção a uma redacção adequada. Parece-me apenas que o "e" também não será suficiente, porque, depois, em termos de português, a expressão "e o acesso à habitação própria e arrendada" não fica bem. Não é bem isto! Portanto, teremos de tentar encontrar uma formulação diferente, mas temos total abertura para isso.
Quanto à segunda alteração, não deixando de registar que de facto não é uma questão fundamental em termos substantivos, de a Constituição ficar com este inciso, que já cá consta, também não deixa de ser verdade - e penso que o Sr. Deputado José Magalhães e o Partido Socialista o reconhecerão - que não faz sentido mantê-lo, atendendo à lógica deste artigo e ele tem várias etapas, já que na alínea anterior do texto em vigor, que é a alínea seguinte na proposta do PSD, fala-se nas iniciativas das comunidades locais e nada se diz sobre o respeito das tais regras, quando é evidente para todos nós que esse respeito também deve constar.
Portanto, não há dúvida alguma de que actualmente, no texto em vigor, há um desequilíbrio, como que caustica de uma forma, a nosso ver, perfeitamente desajustada - e penso que, hoje em dia, o PS não terá qualquer rebuço em nos acompanhar nesta leitura - aquilo que é a liberdade e o comportamento genericamente considerado em termos de obrigatoriedade de respeito pelo Estado de direito por parte de todos os agentes, neles se incluindo, naturalmente e até como primeira força a nível de iniciativa, os agentes privados.
Portanto, há de facto uma desproporção e um desequilíbrio no texto actual. Posso concordar em que a questão não é substantivamente crucial, mas, se reconhecemos que algo está errado - e é evidente que está errado -, parece-me que há toda a vantagem em, sem complexos, retirar esse aspecto que está menos bom.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a conclusão a tirar é de abertura ou mesmo de acolhimento quanto ao aditamento da menção à construção para arrendamento e de objecções, liminares por parte do PCP e menos definitivas por parte do PS, quanto à retirada da expressão "com subordinação ao interesse geral".
O PSD propõe ainda a troca da ordem das actuais alíneas b) e c), passando a actual alínea b) a c) e vice-versa.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, esta proposta mantém-se?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, mantém-se, uma vez que ainda não foi discutida!
Ainda na última reunião tive oportunidade de explicitar essa lógica, que tem a ver com aquilo a que o Sr. Deputado José Magalhães costuma chamar o programa normativo deste preceito. Equacionando isso nesta perspectiva, a razão de ser do PSD alterar a ordem da alínea b) com a alínea c) tem a ver exactamente com uma hierarquização, que nos parece ser a mais adequada, em termos da realidade daquilo que se pretende atingir com este n.º 2.
No corpo deste n.º 2 diz-se que "Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado:" e, do nosso ponto de vista, a hierarquização adequada é a de que incumbe ao Estado, em primeiro lugar, "Programar e executar uma política inserida em adequados planos de ordenamento de urbanização (…)", com as garantias que vêm explicitadas no actual preceito, em segundo lugar, "Estimular a construção privada e o acesso à habitação própria ou arrendada", enfim, no modelo que ficar redigido, porque nos parece, de facto, que, inequivocamente, é esta a fórmula pela qual 99,9% dos cidadãos portugueses satisfazem o seu direito à habitação, e assim deve continuar a ser sob pena de haver total incapacidade de o Estado prover à habitação de todos os cidadãos portugueses, e, em terceiro lugar, na alínea c), então, sim, ficar aquilo que são iniciativas das comunidades e das populações, colectivamente, que, de facto, são aspectos mais residuais, mais pontuais da realidade do direito à habitação em Portugal.
Portanto, a lógica do PSD é esta, e, como eu disse, já tinha tido oportunidade de a explicitar na última reunião.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração a proposta de troca da ordem das actuais alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 65.º.
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Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, após esta explicação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, concordo inteiramente com a troca das alíneas, porque me parece mais consentâneo de facto com a priorização das obrigações do Estado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro não está presente, mas ele é autor de uma proposta que, aparentemente, leva até ao limite lógico - não estou a utilizar esta expressão no sentido de criticar esse limite - o enunciado. Há um aspecto curioso e peculiar neste n.º 2, porque, tratando-se de enumerar as incumbências do Estado, alude-se a várias delas que reúnem razoável consenso…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, peço a vossa colaboração para não estarmos uma hora a discutir a questão da ordem das alíneas b) e c). Peço-vos economia na discussão.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, serei fiel a esse pedido.
Mas o Sr. Deputado Cláudio Monteiro propunha que o retrato ficasse completo. Ou seja, o enquadramento inclui a iniciativa privada e as iniciativas das comunidades locais e das populações e, curiosamente, falta a iniciativa das autarquias locais e do Estado na construção das habitações económicas e sociais. Assim, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro propõe o aditamento dessa alínea.
Ora, o que pergunto aos Srs. Deputados - e esta é a única razão pela qual uso da palavra - é se essa operação global lhes parece sedutora para completar a narrativa constitucional. Não adiantámos uma proposta neste domínio, mas, reparem, se se trata de reequacionar tudo, então, neste retrato falta uma componente. Estamos disponíveis para considerar o completar-se o retrato e, eventualmente, reordenar-se as alíneas, ainda que, devo dizer, é preciso não atribuir um significado teratológico e de varinha mágica ao reordenamento das alíneas, uma vez que, como sabe, a função desta norma é a que é, o legislador ordinário, na decisão de prioridades, pode cumprir vários programas: um de incitamento entusiástico da construção privada em detrimento de outro; outro de incitamento entusiástico da construção cooperativa; outro menos entusiástico… Ou seja, não estamos aqui a fazer programas de Governo e menos ainda micropolíticas habitacionais. E neste nível, de topo, falta uma componente no retrato. Querem considerar isto globalmente, e nós também consideramos globalmente o ordenamento das alíneas?
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado a proposta de considerar conjuntamente com a de alteração da ordem das alíneas b) e c) a proposta apresentada pelos Deputados do PS Cláudio Monteiro e outros, de aditamento de uma nova alínea c), explicitamente adoptada e perfilhada pelo Sr. Deputado José Magalhães, se não houver objecções considero a discussão conjunta.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o PSD manifesta receptividade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero relembrar as questões que já aqui coloquei na última reunião, e que me dispenso de repetir, a propósito das autarquias locais, no contexto muito particular da sociedade portuguesa, uma sociedade semiperiférica, com problemas muito graves, em que se exige, naturalmente, uma profunda responsabilização e em que houve uma polémica recente, como é sabido, muito viva na sociedade portuguesa sobre as responsabilidades nesta matéria. Isto significa que o tratamento da questão da responsabilidade das autarquias neste contexto é inseparável, quer se queira, quer não, do quadro que aqui foi discutido e que me dispenso de relembrar.
Entretanto, em rigor, quando na actual alínea a) se fala em "Programar e executar uma política de habitação (…)", entendemos que aí está compreendida uma política de estímulo, por exemplo, ao sector privado, à aquisição privada de habitação, ao crédito bonificado, através do estímulo à aquisição da habitação no mercado privado. Obviamente que está! Estão aqui previstas diferentes formas de actuação e não apenas a promoção directa de habitação por parte da Administração Pública. Isto é algo que nos parece extremamente claro.
A inversão da ordem das alíneas poderia ter uma leitura, contra a qual lutaríamos, no caso de ser feita, que era…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, não foi proposta qualquer alteração de ordem para a alínea a), esta fica onde está.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Exacto. Mas eu refiro-me à alteração da ordem…
O Sr. Presidente: - A alteração é apenas para as alíneas b) e c) e a nova proposta pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Exacto, Sr. Presidente, e, sendo assim, vou referir-me à proposta de inverter a ordem das alíneas b) e c), mantendo a alínea a) como está.
Esta alteração poderia ter uma leitura, com a qual, obviamente, não concordaríamos, que era a de, em relação à garantia do direito à habitação, ser prioritariamente o sector privado a ir garanti-la. Em relação a grandes manchas da população portuguesa, é, sem dúvida alguma, através da aquisição de habitação no mercado que o problema é resolvido; mas, em relação às camadas carenciadas, aquelas que verdadeiramente precisam de apoio, não pode haver, de forma alguma, uma desresponsabilização, por um lado, da Administração Pública e, por outro, de outras estruturas, particularmente de pessoas colectivas privadas de utilidade pública, que colaboram com a Administração Pública.
Neste aspecto, a proposta do PSD poderia conduzir a uma leitura de desresponsabilização, com a qual, é e vidente, não estaríamos de acordo, isto sem que da minha intervenção resulte qualquer menor valorização do papel indispensável que o sector privado não pode deixar de ter neste sector, e creio que ficou claro de tudo o que referi.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, para encerrar o quadro, qual é a vossa posição quanto à proposta de aditamento de uma nova alínea c), do Sr. Deputado Cláudio Monteiro?
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que a alínea, nos termos em que está redigida, levantou dúvidas, na sequência da minha intervenção na última reunião, ao próprio Deputado Cláudio Monteiro.
Lembro que, depois de eu ter aqui descrito a situação existente na sociedade portuguesa e a polémica havida, em que, oficialmente, há uma carência estimada pelo anterior governo de 800 000 fogos - logo, não é uma qualquer sociedade, é uma sociedade com uma carência de 800 000 fogos - para uma população de 10 milhões, o próprio Deputado Cláudio Monteiro, na sequência da minha intervenção, disse que teria de rever a redacção da sua própria proposta. Chamo a atenção para este facto porque, eventualmente, pode haver leituras perversas e involuntárias que venham a ter uma utilização que não seja, inclusive, aquela que é desejada pelos proponentes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Peço-lhe que seja rápido.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não vou tomar muito tempo, é apenas para deixar uma nota.
Já manifestei a receptividade do PSD - e chamo a atenção para isto, porque a proposta foi-nos feita em termos de "desafio", não pelo proponente mas pelo PS -, que é grande, para a aceitar, embora gostássemos de poder reequacionar a redacção, uma vez que nos parece faltarem aqui as realidades tal como outras instituições de solidariedade.
Como sabe, actualmente, já há promoção da construção de habitações económicas e sociais nos termos da legislação em vigor, o que acontece, de resto, há vários anos, que conta já não só com a participação das autarquias como também de outras instituições de solidariedade, desde que sejam de fins não lucrativos. Portanto, gostaríamos que esta realidade também não deixasse de ser contemplada.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, posso fazer uma observação?
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Creio que qualquer redacção nesta matéria deveria partir de um pressuposto muito claro: numa situação de grandes carências, o papel dessas instituições, particularmente autarquias locais e outras, deve ser subsidiário e não desresponsabilizador, de quem não pode deixar de ter o papel fundamental no sentido de promover o direito à habitação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, temos uma dupla receptividade, na medida em que, como demonstra o debate de ontem, somos sensíveis às preocupações de não punir e hiper-responsabilizar quem não deve ser punido nem hiper-responsabilizado, como as autarquias locais, e, por outro lado, somos sensíveis à necessidade de ampliar o âmbito da norma e de a enriquecer no sentido que foi já expresso e que vai exigir trabalho complementar. Estamos disponíveis para isso.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, mantém-se a abertura à inversão da ordem das actuais alíneas b) e c) do n.º 2?
O Sr. José Magalhães (PS): - Não atribuímos a essa matéria um significado teratológica de adoração de bezerro de ouro, nem o contrário. Portanto, a resposta é "sim, mas…".
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação ao actual n.º 3 do artigo 65.º, há uma proposta de eliminação, apresentada pelos Deputados do PS Cláudio Monteiro e outros. Como ele não está presente, alguém adopta a proposta de eliminação do actual n.º 3.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! De forma nenhuma, Sr. Presidente, porque votaríamos contra.
O Sr. Presidente: - Há também uma proposta de alteração ao n.º 4 do artigo 65.º, apresentada pelos Deputados do PS Cláudio Monteiro e outros, que corresponde ao n.º 3 da proposta. Alguém a adopta?
O Sr. José Magalhães (PS): -Também não a adoptamos, porque não vemos que introduza uma benfeitoria em relação ao texto em vigor!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro apresenta ainda uma proposta de aditamento de dois novos números, os n.os 4 e 5. Alguém a perfilha?
Pausa.
Visto ninguém a perfilhar, não a vamos discutir e passamos ao artigo 66.º da Constituição.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é óbvio que, em relação à proposta de aditamento do n.º 5, se me permite, gostaria tão-só de dizer que as normas…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, ou adopta a proposta ou não lhe dou a palavra para a discutir, porque, se ninguém a perfilha, não está em discussão.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, com essa regra férrea, não podendo eu a adoptar, não posso falar!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação ao artigo 66.º, há uma proposta de reformulação da lógica do artigo por parte do CDS-PP. Ou seja, o actual artigo 66.º segue o paradigma dos restantes artigos desta parte, isto é, no seu n.º 1, enuncia um direito, "Todos têm direito a (…)", e, no n.º 2, prevê as incumbências do Estado para realizar esse direito. O PP, pura e simplesmente, elimina a parte do direito, deixando apenas as incumbências.
O Sr. Presidente: - Para apresentar a proposta e para a defender, se for caso disso, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
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A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, é uma tarefa ingrata…
O Sr. Presidente: - Não parece, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - É de facto, mas eu diria que se deve manter o direito, obviamente que sim, e mais ainda o dever, que também está consagrado e que, a meu ver, tem uma importância fundamental nesta questão ecológica.
O Sr. Presidente: - Então, a proposta fica retirada ou, pelo menos, não é defendida…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Fica retirada e passaria a ter a redacção…
O Sr. Presidente: - Ainda bem, Sr.ª Deputada.
Vamos passar, então, às propostas apresentadas às alíneas do n.º 2 do artigo 66.º.
Em relação à alínea a)…
Uma Voz: - Os Verdes apresentam uma proposta de alteração do n.º 2.
O Sr. Presidente: - Os Verdes têm uma proposta de alteração para um novo n.º 2, segundo me parece.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Tanto quanto percebi reescrevem o n.º 2.
O Sr. Presidente: - Não, têm um novo n.º 2…
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Têm um novo n.º 2 e reescrevem o n.º 3.
O Sr. Presidente: - Na proposta de Os Verdes, o actual n.º 2 passa a n.º 3 e aditam um novo n.º 2, que é do seguinte teor: "O ambiente deve ser protegido e preservado com vista à garantia dos direitos das gerações vindouras".
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro para explicar esta expletiva.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, o n.º 2 que propomos visa considerar o direito fundamental ao ambiente como direito individual e colectivo e com uma perspectiva intergeracional. É fundamentalmente isto que se procura introduzir com este novo número, que, em nossa opinião, enriquece o texto constitucional em termos do direito ao ambiente e à qualidade de vida que nos parece de todo o interesse considerar.
O Sr. Presidente: - Está à vossa consideração, Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, introduzindo aqui algum ambiente de descontracção, o PSD não concorda com esta norma, porque entende que a sua formulação é redutora, já que não é apenas com vista à garantia dos direitos das gerações vindouras que o ambiente deve ser protegido e preservado. Com alguma graça, poderia dizer que, a ser assim, esta proposta aconselharia à construção da barragem de Foz Côa para melhor preservar as gravuras, como está provado tecnicamente, por forma a que as gerações vindouras possam apreciá-las, porque, como se mantiveram durante 20 000 submersas, provavelmente manter-se-iam muito melhor outros 20 000 anos submersas do que ao ar livre.
Portanto, isto não é apenas para as gerações vindouras. O ambiente deve ser preservado não apenas nesta perspectiva. Chamo a atenção para o facto de o proposto não ser uma alínea mas, sim, um número autónomo, que tenderia a densificar a lógica da própria protecção e preservação ambiental, uma vez que nem sequer inclui aqui a palavra "nomeadamente" ou "designadamente" e orienta a defesa e a protecção do ambiente apenas para a garantia dos direitos das gerações vindouras. Por isso, a norma parece-nos redutora.
É evidente que, no princípio de que todos os homens e mulheres não são mais do que arrendatários do planeta, já que nós passamos por cá e ele fica, concordarmos com a norma, mas as questões ambientais terão sempre de ter esta valência de salvaguarda para as gerações vindouras.
De qualquer modo, consideramos a norma redutora porque não concordamos em colocar apenas a lógica de preservação ambiental sobre esta perspectiva.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, creio também que, nesta matéria, tratando-se de fazer uma revisão constitucional, há que adoptar três ou quatro cânones jurídicos. A Constituição, curiosamente, neste ponto não inclui um enunciado teológico em sítio algum, ou seja a justificação por que é que todos têm direito a um ambiente de vida, nas condições que o n.º 1 refere. E, depois, o enunciado das incumbências não é acompanhado da definição das finalidades magnas, grandes e pequenas, que justificam a tal opção constitucional.
Curiosamente, ao fazê-lo desta forma restringimos a uma, e uma apenas, e ainda por cima enroupada de uma retórica particularmente marcada e respeitável, naturalmente, nas sedes em que é usada, a definição do elemento teológico, do elemento justificacional de protecção constitucional do ambiente de forma hiper-redutora. Desde logo porque as gerações presentes, os vários tipos de gerações que fruem a Terra neste momento, também têm direito a um ambiente salvo e sadio, além de, naturalmente, todo o respeito que tenhamos pelas gerações vindouras, e são os actuais beneficiários e os actuais endividados, empenhados.
Portanto, Sr. Presidente, não vemos vantagem nesta proposta de aditamento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, não tenho qualquer dúvida de que, por detrás da proposta de Os Verdes, não está qualquer concepção própria das correntes ecologistas fundamentalistas, que têm uma concepção meta-humanista do direito ou da preservação do ambiente. Obviamente que não! E a prova disso é que uma outra proposta de Os Verdes, como, de resto, do PS e do PCP, é no sentido da consagração na Constituição do conceito de desenvolvimento sustentado ou sustentável. Já vamos ver qual das versões é preferível, mas aquilo que pergunto,
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designadamente à Sr.ª Deputada Isabel Castro, é se não considera que a ideia de protecção do ambiente, também para as gerações vindouras, além das actuais gerações, de todos nós, não está compreendida no conceito de desenvolvimento sustentado que adiante propõe - e bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, é óbvio que o desenvolvimento sustentado pressupõe uma perspectiva de presente e de futuro, em termos de satisfação das necessidades naquilo que é, comummente, o conceito adoptado.
No entanto, quero fazer uma pergunta ao PSD. Tendo para mim como certo que pode não ser forçosamente necessário haver um n.º 2 que especificamente coloque esta perspectiva intergeracional, ou seja, os direitos das gerações vindouras - e isto nada tem a ver com a intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, porque é óbvio que ter uma perspectiva de longo prazo não pressupõe a negação do presente, é o que consta no n.º 1, e, portanto, não é disto que se trata, como já todos perceberam -, a questão que coloco é se o PSD aceitaria, por exemplo, colocar no texto constitucional uma alínea ou uma explicitação desta perspectiva de longo prazo, com uma formulação que tivesse a ver com esta ideia das gerações vindouras.
Esta é a pergunta que faço em concreto ao PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, é evidente que é algo sobre o qual podemos reflectir.
À primeira vista, devo dizer-lhe, com toda a honestidade e frontalidade, que nos parece desnecessário, porque, enfim, essa lógica levar-nos-ia não apenas a esta sede do direito ambiental, do direito ao ambiente e qualidade de vida, mas, eventualmente, também a muitas outras áreas dos direitos dos cidadãos, nomeadamente em questões de património, de cultura e por aí fora.
Por isso, com toda a franqueza, à primeira vista, devo confessar que temos algumas reservas, porque nos parece desnecessário. Agora, como não discordamos minimamente da substância da proposta, é algo em que podemos pensar. A nossa dúvida é saber se ela é de facto necessária, Sr.ª Deputada, e em que é que ela iria implicar em termos de releitura de muitos outros preceitos da Constituição.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero dizer que esta ideia intergeracional, que Os Verdes pretendem introduzir, me parece importante e que não é facilmente encontrável em outros direitos. Devo dizer que a degradação do património - e penso que está a falar do património construído - é, se pensarmos a longo prazo, praticamente inevitável nalguma parte. Nem o mal-estar ou o prejuízo que advém para as gerações vindouras a não existência, por exemplo, do Mosteiro da Batalha, o que nos causaria muita pena, será igual à possibilidade de respirarem com dificuldade.
Por conseguinte, penso que até a grande degradação e o menor cuidado que existiu em relação à preservação do ambiente aconselharia a pôr esta ideia intergeracional como o bem mais durável e como aquele cuja defesa se faz em cada geração. Não penso que haja uma comparação tão grande, e, portanto, também não penso que seja tão complicado introduzir aqui essa ideia, alegando-se a necessidade de, depois, se ir rever outros artigos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, não pretendendo insistir demasiado nisto, penso, apesar de tudo, que não há um quadro comparativo com outros direitos fundamentais, na medida em que são valores e valias que não são passíveis de troca. Ou seja, um rio morto é um rio que não é reversível, tal como um lago destruído.
É neste quadro que, a meu ver e apesar de tudo, deveria ser encontrada uma formulação, eventualmente não como número autónomo, que contivesse esta ideia.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, no actual estado da discussão, o PSD diz "não", embora não exclua a possibilidade de vir a considerar essa ideia com outra formulação; o PS diz "não", sem mais; o PCP diz "sim, mas…"…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O PSD não diz "não", sem mais!
O Sr. Presidente: - … e o PP mantém abertura.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, se se pusesse no n.º 1, depois do que lá está, "(…) tendo sempre presente os direitos das gerações vindouras." já satisfaria?
O Sr. Presidente: - Não me satisfaria a mim! O n.º 1 é lapidar, não lhe acrescento nada.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Penso que não poderia ser no n.º 1, que teria de ser numa alínea, eventualmente.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Autónomo?!
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Não é um número autónomo, mas penso que também não é…
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao n.º 2.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, posso pedir um esclarecimento?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, não percebi qual foi a posição do PSD.
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O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o PSD diz "não, mas…", mantém abertura a essa hipótese.
Srs. Deputados, em relação ao n.º 2 do artigo 66.º, Os Verdes e o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca propõem uma alteração ao proémio.
Os Verdes propõe um n.º 2 com a seguinte redacção: "Com vista a assegurar o desenvolvimento sustentado, incumbe ao Estado por meio de organismos próprios e com o envolvimento e participação dos cidadãos e das suas organizações:".
Ora, esta ideia de "desenvolvimento sustentado" é convergente com as propostas do PS para a alínea a), que acrescenta "Promover o desenvolvimento sustentável, (…)", e com a do PCP também para a alínea a), que adita "Assegurar o desenvolvimento sustentado e (…)". Portanto, há aqui uma ideia comum com colocações diversas.
Assim, proponho que, independentemente de se saber onde é colocada a questão, se discutisse a ideia de acrescentar este inciso, de desenvolvimento sustentado ou sustentável, em relação ao qual espero que se chegue a uma consenso, embora não me agrade a ideia da sua inclusão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, esta ideia de desenvolvimento sustentado ou sustentável - e já direi alguma coisa sobre isso, se mo permitirem - é uma ideia que tem hoje uma ampla consagração. E chamo a atenção, em particular, para os documentos da ECO 92 e designadamente para a Agenda 21, bem como para instrumentos de direito internacional aos quais Portugal está explicitamente vinculado.
Como é natural, nesta matéria, encontramos simultaneamente uma ampla teorização, mas também algumas dificuldades. É Edgar Morin, por exemplo, que diz, e com razão, que a ideia de desenvolvimento está um pouco subdesenvolvida, e creio que, de algum modo, este pensamento tem algo de verdadeiro. Simplesmente, esta ideia tem, neste momento, um conteúdo extraordinariamente rico e que, de algum modo, corresponde não apenas à consagração das ideias clássicas nesta matéria, não apenas ao crescimento económico, mas igualmente aos direitos económicos, sociais e culturais com que a ideia de crescimento foi enriquecida. Mas há a tese, que parece justa, de que o desenvolvimento económico, mesmo assim enriquecido, teria de ter em conta outros factores, designadamente os chamados direitos de 4.ª geração e as questões ambientais, acima de tudo.
Porquê a expressão "desenvolvimento sustentado"? Na tradução portuguesa, quer da Agenda 21, quer dos documentos das Organizações Não Governamentais, por exemplo, para a ECO 92, é frequente a ideia de desenvolvimento sustentável, o que levaria, provavelmente -…
O Sr. Presidente: - Em inglês, sustainable…
O Sr. Luís Sá (PCP): - … exactamente! -… a não adoptar a expressão "sustentado" mas, sim, "sustentável". Simplesmente, tem sido dito, e eventualmente com alguma razão, que por detrás da tradução "sustentável" - e creio que num certo discurso fundamentalista passou a ter este sentido - haveria a ideia de que "desenvolvimento sustentável" seria um desenvolvimento para as futuras gerações, sem ter em conta as realidades actuais. Isto é, em vez de procurar conjugar o direito ao ambiente hoje com o direito ao ambiente no futuro, haveria a ideia de ter em conta apenas as gerações vindouras e de tratar todas as questões e em geral todos os direitos fundamentais apenas em função dos direitos das gerações vindouras.
É neste sentido que propomos a expressão "sustentado", que preferimos, sem que resulte qualquer tragédia no caso de haver consenso para consagrar a expressão "sustentável" em vez de "sustentado".
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-vos que não se repita aqui uma longa elaboração teórico-filosófica sobre o conceito e as implicações do "desenvolvimento sustentável". Penso, aliás, que a revisão constitucional não é a melhor sede para a fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à fórmula sugerida pelo Partido Ecologista "Os Verdes", não concordamos, e não concordamos porque, segundo parece, empobrece claramente o conteúdo normativo do próprio artigo, uma vez que, do ponto de vista do PSD, o actual n.º 2, que diz "Incumbe ao Estado, (…)", tem matéria de direito ao ambiente e à qualidade de vida. E, portanto, nunca se poderia dizer, pois redundaria numa alteração do próprio conteúdo normativo actual do preceito, que essas incumbências do Estado não se referem ao ambiente e qualidade de vida em geral mas a assegurar o desenvolvimento sustentado.
Quanto a colocar a expressão no corpo do número, nem pensar, do nosso ponto de vista.
Quanto à hipótese de a colocar na alínea a), como fazem o PS e o PCP, seja ela "sustentável" ou "sustentado", pois, como o Sr. Presidente, disse, a sede para a discussão dos conceitos não é esta, parece-nos errado. E parece-nos errado porquê? Numa perspectiva ambiental, o que está em causa, do nosso ponto de vista, na ideia do desenvolvimento sustentável ou sustentado, seja ele qual for, é sempre o desenvolvimento, ou seja, isto, no fundo, não passa de uma adjectivação do desenvolvimento que se pretende.
Portanto, a incluir no texto constitucional esta valência, que hoje em dia resulta de algumas convenções internacionais a que Portugal tem aderido ou de que Portugal tem sido parte, do nosso ponto de vista, deve ser equacionada em sede, nomeadamente, do artigo 81.º da Constituição, em cuja alínea n) existe já a lógica do equilíbrio ecológico, mas apenas na perspectiva da política energética, o que nos parece curto.
Assim, a ideia de incluir a perspectiva do desenvolvimento ambientalmente sustentável ou ambientalmente sustentado - e não vou agora discutir a formulação mais adequada - deve ser equacionada no artigo 81.º, nomeadamente na actual alínea d), porque, de facto, é algo que ainda não está no artigo 81.º da Constituição. Logo, em sede do artigo 66.º, parece-nos, de facto, desajustado, pois este artigo tem a ver com as incumbências do Estado para salvaguarda do direito ao ambiente e à qualidade de vida, e a política de desenvolvimento ambientalmente sustentado ou não é uma consequência dessas incumbências do Estado.
O Estado, por ter estas incumbências em matéria de ambiente e qualidade de vida, na política de desenvolvimento vai ter também de salvaguardar a sustentabilidade do ambiente e da ecologia.
Em conclusão, do nosso ponto de vista, a questão não deve ser tratada em sede do artigo 66.º mas, sim, mais à
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frente, quando falarmos da política de desenvolvimento em matéria económica, porque é nessa sede que ela deve ser equacionada.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, muito rapidamente, gostaria de saber se garantir o direito ao ambiente nesta perspectiva não implica questões como educação, cultura, urbanismo, património, como saber se a camada de ozono e a respectiva protecção é uma questão económica, para lhe dar um exemplo, se a protecção do Mosteiro da Batalha, no caso de a considerarmos como parte do património, é igualmente uma questão económica. Faço esta pergunta porque tenho alguma dificuldade em ver a inserção desta questão…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - (Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar as palavras do orador).
O Sr. Luís Sá (PCP): - Não. O que eu acho…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - (Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar as palavras do orador).
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, essa é a nossa divergência. É que o conceito de desenvolvimento sustentável, ou sustentado, implica passar do plano estritamente económico para um plano mais vasto, ligado com o bem-estar global das gerações actuais e com o futuro da própria Humanidade. E o erro que eventualmente levou a muitos dos problemas presente, é exactamente o de tratar o desenvolvimento como questão meramente económica.
É esta a divergência fundamental.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - (Por não ter falado para o microfone, não foi possível registar as palavras do orador).
O Sr. Luís Sá (PCP): - Na parte económica, nunca. É esta a divergência. O desenvolvimento, nesta perspectiva, não é uma questão meramente económica.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de fazer duas observações, e começo pelo sentido da nossa proposta.
Não nos propomos fazer a reescrita ecológica da Constituição, o que queremos, muito obviamente e veremos até que ponto virtuosamente, é introduzir uma valorização da componente ecológica que a Constituição já tem. Deste ponto de vista, não deixo de sublinhar que toda esta discussão se faz confortavelmente, porque a nossa Constituição é, ecologicamente, extremamente rica e foi pioneira. Não estamos exactamente na posição de aprender, com a humildade, que sempre é indispensável, a enorme lição ecológica que nos foi trazida pela Conferência do Rio, porque verdadeiramente, do ponto de vista constitucional, tínhamos feito o caminho que, infelizmente, em muitos outros países não foi feito, e mesmo as conclusões da Conferência, como sabem, estão muitíssimo longe de terem feito o seu percurso de aplicação e desenvolvimento.
Em conclusão, temos uma Constituição ecologicamente muita rica, e a nossa proposta é pontual e limitada, num contexto rico.
Segunda observação: há uma relação de harmonia entre a Constituição ecológica, soi-disant, e a Constituição económica, e, de resto, as outras componentes da Constituição, como a do património, etc. Esta relação de harmonia faz com que, entre nós, não tenha sentido, por exemplo, importar conceitos "crescimentistas" com espezinhamento de recursos naturais e prejuízo do ambiente, porque essas concepções, essas orientações, são contrárias ao texto constitucional, sem alteração de uma vírgula. Sempre o foram, originariamente, e continuam a sê-lo, ainda que não acrescentemos a expressão "desenvolvimento sustentável".
A inclusão da expressão, nesta alínea ou noutra, ou no próprio proémio, suscitou, da nossa parte, a vontade de densificar e aditar uma nota de aperfeiçoamento do texto, mas, obviamente, sem qualquer sentido fundamentalista deste ponto de vista e, sobretudo, sem subordinação funcional do exercício de quaisquer direitos a imperativos ecológicos ou de virtude ecológica.
Portanto, não nos envolveremos em nenhuma refrega quanto à tradução. Há palavras cuja tradução para português não é especialmente fácil, é o caso desta.
Quanto ao conceito, é aquele que deixei expresso e que não se confunde com qualquer visão fundamentalista ou de limitação de direitos em nome desse tipo de concepção.
Estamos abertos a que se considere uma outra inserção e formulação - a formulação terá de estar próxima desta se queremos dar um sinal de simpatia em relação a um esforço em que Portugal participou, em que todos nós, seguramente, participamos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, tenho estado a ouvir VV. Ex.as com todo o interesse e proveito, mas a verdade é que as palavras "desenvolvimento socioeconómico" já se encontram no texto que estamos a discutir.
O Sr. José Magalhães (PS): - Acabei de o sublinhar, Sr. Deputado Barbosa de Melo!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - E, Sr. Deputado José Magalhães, eu queria saber o que é que se ganha, em termos ecológicos que não economicistas, em substituir o conceito de "desenvolvimento equilibrado" por "desenvolvimento sustentado ou sustentável".
Faço a pergunta por isto: será que nós já fomos ao futuro, como o Profeta Samuel, que tinha a máquina do tempo que o levava ao futuro?! Não será que às vezes o desenvolvimento tem de parar mesmo?! O que podemos pedir e exigir do Estado é que o desenvolvimento seja equilibrado, que tenha em conta todas as variáveis. Não será assim?! Quando dizemos "sustentado" partimos do princípio que temos de continuar a crescer economicamente, porque só vemos o sentido de económico.
Pergunto, o que é que se ganha com isso?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, tive o cuidado de sublinhar a riqueza do texto constitucional, designadamente na parte em que consubstancia o travejamento e todas as directrizes de um desenvolvimento, que, precisamente, é não apenas equilibrado como multidimensional, e, portanto, inclui várias dimensões. Também é verdade que o faz na linguagem da sua época; é uma boa linguagem, francamente.
Na linguagem da nossa época, passou, passa e está esta expressão, com um conteúdo que, de resto, já ficou exarado e que tem múltiplas dimensões e que até é objecto de uma querela hermenêutica de que o Sr. Deputado Luís Sá se fez porta-voz, enfim, de analítico, há pouco.
Nessa querela não participamos, e por esta refrega não daremos senão aquilo que enunciei.
Grupos, como, por exemplo, a QUERCUS, e outras pessoas que participaram na reunião que fizemos na Sala do Senado tiveram ocasião de nos propor que reescrevêssemos a Constituição para nela verter, com grande densidade e níveis de explicitação, um larguíssimo conjunto de conceitos, subconceitos e explicitações daquilo que é hoje o discurso ecológico partilhado por várias correntes, de resto.
De tudo isso propusemos extractar uma expressão, razoavelmente consensual, que, nos anos 90, exprime muitas das ideias que muitos de nós, nos anos 70, e, porventura, outros de nós, que não andavam de bibe na altura, nos anos 60 e ainda nos anos 50 já partilhavam e exprimiam. Esse aggiornamento, Sr. Deputado Barbosa de Melo, é alguma coisa que faz bem a todas as instituições quando elas são capazes disso, e até às Constituições! Não se deve exagerar, compreendo.
Vejo o olhar de preocupação do Sr. Presidente, vejo o olhar de preocupação do Sr. Deputado Barbosa de Melo, mas julgo…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Se me dá licença, gostaria que não confundíssemos o aggiornamento com actualidade das efemérides diárias. São duas coisas diferentes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, são várias as questões que estão ligadas a esta discussão.
Em primeiro lugar, a questão da explicitação do princípio de "desenvolvimento sustentado" - e eu diria "sustentado", independentemente de outras explicações e análises em torno da expressão mais correcta, optamos por esta - é, aliás, qualquer coisa que surge também no nosso projecto, nas próprias tarefas fundamentais do Estado, no artigo 9.º.
Faz-me alguma confusão esta grande inquietação em torno da introdução deste conceito, o qual significa, pelo menos em termos formais, e não na assunção prática, uma evolução assumida pela comunidade internacional de que, hoje, o desenvolvimento tem uma caracterização comummente assumida - e quando digo "comummente assumida" não me refiro só à Conferência do Rio mas àquilo que está na Lei de Bases do Ambiente, que é de 1987 e que já fala em desenvolvimento sustentado, e também ao Tratado de Maastricht. São documentos com que me identifico mais, se calhar outros grupos parlamentares identificam-se com outros, mas não estamos propriamente a falar de uma linguagem que signifique ruptura de concepção e de caracterizações. Significa ruptura nas práticas, mas introduz ou introduziu, quando colocada, outras dimensões do desenvolvimento, outros indicadores que não aqueles que, tradicionalmente, até determinada altura, a ele estavam associados.
Portanto, naquilo que é uma evolução normal, naquilo que é comummente assumido, designadamente em termos de documentos que Portugal subscreve, em termos do Tratado da União, que, enfim, para alguns tem a importância de referência que tem, em termos da compatibilização com a própria Lei de Bases do Ambiente aprovada, com a abstenção do CDS, por esta Assembleia, em termos daquilo que pensam as próprias associações cívicas, nomeadamente um conjunto de associações de defesa do ambiente, não vejo como é que não se evolui no sentido de introduzir a questão do "desenvolvimento sustentado" no texto constitucional, que, a meu ver, é um elemento que não traz uma polémica nova mas, sim, aquilo que, pelo menos formalmente, é assumido. E, por isso, não vemos, de modo algum, por que razão é que esta questão não se reflecte no texto constitucional.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, telegraficamente, quero apenas dizer que não está em causa a riqueza e o carácter pioneiro da constituição ambiental portuguesa e a homenagem que é devida aos constituintes nesta matéria. O que está em causa, isso sim, é o facto de este artigo sobre o ambiente e qualidade de vida abrir com uma alínea que coloca, em primeiro lugar, "Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão.", quando, o que é verdade é que, neste momento, há algo de muito mais rico, de muito mais abrangente, que tem a ver com a Humanidade no seu conjunto, com as relações internacionais, com a política interna, que não tem a ver apenas com a Conferência do Rio, que tem a ver com um grande movimento que leva a que o direito ambiental seja hoje em dia qualquer coisa que é sentida como algo muito importante.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, não é verdade que a componente ambiental é apenas uma das componentes do desenvolvimento sustentado? Não estamos a inverter completamente as questões ao incluir aqui, em sede de direito ao ambiente, a componente do desenvolvimento sustentado? Não estaremos a pôr a coisa virada "da cabeça para os pés"?
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, é uma das componentes, o que não significa que não seja uma das componentes mais importantes e significativas.
O Sr. Presidente: - Mas aqui estamos a pôr a coisa ao contrário.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, não temos qualquer problema em que, em relação a outros pontos, designadamente ao artigo 81.º, por exemplo, seja reconsiderada esta questão.
Agora, há uma questão que o Sr. Deputado Barbosa de Melo coloca, e que, naturalmente, merece ser ouvido com extrema atenção, que é o facto deste mesmo artigo referir a ideia de equilibrado desenvolvimento socioeconómico.
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No entanto, chamo a atenção para o facto de a ideia de equilibrado desenvolvimento socioeconómico aparecer claramente ligada à ideia de ordenar e promover o ordenamento do território e não propriamente à ideia de que se deve tratar de uma política que deve estar presente no conjunto de outras políticas. Isto é, a nossa ideia é a de que, numa série de outras matérias, deve estar presente a preocupação do desenvolvimento sustentado e do ambiente, e é isto mesmo que justifica a apresentação desta proposta.
É evidente que não é trágico que esta proposta não seja consagrada. Direi, no entanto, que se perde uma oportunidade de ir ao encontro de um grande movimento nacional e internacional nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas fazer uma pergunta muito breve.
Sr. Deputado Luís Sá, compreendo as vossas preocupações, mas coloco uma questão elementar.
O Sr. Deputado Luís Sá minimizou o alcance da alínea a). E eu pergunto, e pergunto-me: será que o Estado está a cumprir, hoje, ontem ou eventualmente amanhã, esta incumbência de prevenir a poluição? Estará a cumprir as formas prejudiciais de erosão?
Srs. Deputados, devemos pôr na Constituição aquilo que seja exequível. A Constituição é um texto programático, decerto, mas não é um texto para os anjos celestiais ou para o profeta Samuel como dizia há bocado. É um preceito que tem de ter um mínimo de realismo no seu meio.
Assim, pergunto-me se este programa normativo, o que aqui está, não estará longe da realidade que nos cerca, se não está longe de tudo isto, se já não está aqui uma fortíssima exigência a quem e em cada tempo - e somos todos, não é só quem está no Governo, não também somo o Estado - está a tentar responder a elas.
Apenas lhe pergunto isto.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, agradeço-lhe as questões que coloca, pois são extremamente importantes.
É evidente que as responsabilidades do Estado não estão a ser cumpridas nesta matéria. Por exemplo, parece-me óbvio que a política florestal não corresponde ao objectivo de prevenir e controlar formas prejudiciais de erosão. Agora, a questão que se coloca é saber se, para além da grande importância dos problemas que aqui estão em causa, os problemas da camada de ozono, do efeito estufa, do sobreaquecimento, da perspectiva do desaparecimento de partes de continentes inteiros, da destruição à escala internacional de grandes massas florestais e até do problema que foi colocado na Conferência do Cairo sobre o risco da explosão demográfica, o problema do dumping ambiental levantado, por exemplo, com a liberalização do comércio internacional, os Acordos de Marraquexe, o GATT, etc., estão esgotados por este conjunto de questões que aqui estão colocadas e se não são problemas que se têm revelado de tal forma graves que têm de ser tomados como questões primeiras quando se fala de ambiente e desenvolvimento. Mas, sem dúvida, estou de acordo consigo quando diz que o que cá está é muito importante, obviamente.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - São questões relacionadas com o direito ao ambiente!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero apenas fazer notar que a associação ambientalista que teve a iniciativa de apresentar um projecto de revisão constitucional não refere este conceito no artigo 66.º mas, sim, no artigo 9.º - e, a meu ver, bem! -, porque, de facto, o desenvolvimento sustentado não tem a ver com o direito ao ambiente. O direito do ambiente é que é uma componente do desenvolvimento sustentado, pelo que, em minha opinião, me parece completamente insensato, em termos de lógica constitucional, incluir aqui este conceito, ou até mesmo no artigo 81.º.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, aquando da discussão do artigo 9.º, esse facto foi equacionado e foi rejeitado na altura própria.
O Sr. Presidente: - Mas não foi por essa lógica. Ficaria pior aqui, no artigo 66.º, do que no artigo 9.º.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Mas no artigo 9.º foi rejeitado!
O Sr. Presidente: - E bem, Sr.ª Deputada.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Reserve para o artigo 81.º.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, pedi a palavra não só para rematar como também, se não importa, para defender a margem de sensatez que normalmente perpassa pelas propostas apresentadas pelos diversos partidos, com algumas excepções, que vai calhando um pouquinho a todos.
Neste caso, Sr. Presidente, retiro a seguinte conclusão: primeiro, a desvalia total da querela em torno do "sustentado" ou "sustentável". A Sr.ª Deputada Isabel Castro, no artigo 81.º, propõe taxativamente "Assegurar o desenvolvimento sustentável capaz de satisfazer as necessidades (…)", pelo que não vale apenas fixarmo-nos numa grande querela, de que nenhum de nós partilha e que não tem, aliás, em si mesmo, uma grande valia.
Quanto à inserção mais adequada de uma expressão que materialize este espírito do tempo na Constituição, talvez o artigo 81.º seja de facto a sede apropriada e que satisfaria as nossas preocupações. Como disse, queremos enriquecer a dimensão ecológica e não disse, Sr. Presidente, em nenhum momento, que queríamos obrigatoriamente, nesta alínea e apenas nesta alínea e por razões infalíveis nesta alínea, aditar o que queremos aditar.
Portanto, se os Srs. Deputados consentem em aditar no artigo 81.º uma alusão, ficaremos hipersatisfeitos e ecologicamente equilibrados.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, consideraremos, a propósito do artigo 81.º, esta possibilidade, mas, para já, fica registada a oposição do PSD e do PS a essa inclusão.
Srs. Deputados, terminada a discussão da alínea a) do artigo 66.º, passamos às alíneas b), c) e d), para as quais não foram apresentadas propostas de alteração, mas há propostas de novas alíneas.
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O PCP propõe nada menos do que três novas alíneas e o PSD e Os Verdes propõem uma.
Para apresentarem as propostas relativas a estas novas alíneas, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá, não só por uma prioridade cronológica mas também por dar a maior contribuição para o aumento da extensão da Constituição.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a primeira alínea que propomos é, no seu conteúdo substancial, não formal, coincidente com a proposta apresentada por Os Verdes, e talvez, por isso, possam ser discutidas em conjunto.
O problema de tratamento de resíduos, neste momento, é, sem dúvida alguma, um dos problemas ambientais mais graves que é conhecido, como é do conhecimento de todos, e estamos inteiramente abertos a uma redacção que funda a preocupação que temos com a gestão e o adequado tratamento com a referência à promoção da redução, reutilização e reciclagem, os célebres três r, que Os Verdes adiantam. Aliás, suponho que há uma gralha na nova alínea e) proposta por Os Verdes quando se diz "recuperação", porque penso que é "redução".
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, o que Os Verdes querem dizer à mesmo "recuperação", o "aumento da recuperação".
O Sr. Luís Sá (PCP): - O que é normal nesta matéria é referir a "redução, reutilização e reciclagem"…
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é melhor perguntar à Sr.ª Deputada de Os Verdes, visto ela se encontrar presente.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o normal nesta matéria é referir a "redução, reutilização e reciclagem", mas podemos, naturalmente, examinar qualquer outra proposta.
Simplesmente, o conteúdo substancial da minha proposta implica a abertura a outra redacção, fundindo eventualmente as duas, se houver disponibilidade dos outros partidos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, pode apresentar as restantes duas novas alíneas?
O Sr. Luís Sá (PCP): - Começo pela alínea f), que é relativa à gestão dos recursos hídricos, questão que, como é sabido, é particularmente grave para Portugal, que até tem a maior parte dos seus recursos hídricos partilhados com a Espanha. Este problema tem vindo a tornar-se cada vez mais relevante e mais grave. Existem, como é do conhecimento de todos, directivas comunitárias sobre a qualidade da água, mas, apesar da publicação da legislação de 1990 e posterior, estão muito longe de estar cumpridas.
O problema da desertificação, e, em geral, da carência de recursos hídricos, é um dos problemas mais importantes também no nosso País.
O problema da educação ambiental - alínea g) - é algo que já está presente noutras disposições, mas julgamos ser de tal forma importante que se justificaria a autonomização.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes para, em nome do PSD, apresentar a proposta de aditamento da alínea e) ao artigo 66.º.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para ganhar tempo, começo por deixar uma primeira abordagem da posição do PSD face a estas propostas de aditamento já apresentadas.
O Sr. Presidente: - Pode fazê-lo e agradeço-lhe que o faça.
O Sr. Luís Marques Guedes (PCP): - Sr. Presidente, quanto às alíneas e) e f), a posição do PSD é de não concordância por parecer que, verdadeiramente, nada acrescentam ao que já não esteja no actual texto.
No que toca à questão do tratamento dos resíduos urbanos e industriais, temos dúvidas não só com a formulação com que se apresenta - e o próprio Sr. Deputado Luís Sá já disse que isto pode ser escrito de outra maneira - mas também em que faça sentido introduzir isto no texto constitucional.
No entanto, manifesto, desde já, a total receptividade do Partido Social Democrata quanto à educação ambiental, eventualmente não nesta formulação, pois não entendo muito bem o que se quer dizer com "(…) o respeito cívico pela natureza" e parece-me, enfim, uma coisa um bocado arrevesada. De qualquer modo, o objectivo, o alcance do acrescento de uma alínea na vertente da educação ambiental tem o total apoio do PSD, que procurará, em conjunto com os proponentes, encontrar uma formulação que genericamente salvaguarde esta valência.
Passo agora a apresentar a alínea e) proposta pelo PSD. Direi que, nesta versão ou noutra, o PSD entende que se deve acrescentar uma valência a este artigo, que actualmente falta de uma forma gritante e que hoje é manifestamente uma das formas de expressão evidente da qualidade de vida - e chamo atenção para o facto de este artigo não ser só ambiente mas ambiente e qualidade de vida -, e que tem a ver com aquilo a que eu chamaria de preocupações de natureza paisagística e de gestão espacial do urbanismo. Hoje em dia são vertentes fundamentais, são áreas que começam a ser exploradas pela própria legislação ordinária em Portugal há vários anos. É algo que está intimamente ligado à qualidade de vida e do ambiente nessa perspectiva da qualidade de vida das pessoas.
Este artigo versa, além do ambiente, também a qualidade de vida, e parece-nos que, nesta ou noutra formulação, tem de se lhe acrescentar uma alínea com esta nova valência nas incumbências do Estado, por forma a deixar claro, no texto constitucional, que a qualidade de vida também passa pela qualidade da gestão espacial dos centros urbanos, das povoações.
No entanto, estamos abertos à exacta formulação desta alínea.
O Sr. Presidente: - Para apresentar a proposta de Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a alínea que propomos visa tocar numa questão-chave em matéria de política ambiental, que tem a ver com a utilização racional de recursos, e que, portanto, está intimamente ligada à produção de resíduos. É nesta óptica que se coloca a questão do combate ao desperdício,
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a diminuição do desperdício e do aumento dos níveis da redução, reutilização e reciclagem.
É este o objectivo da alínea que propomos.
Sr. Presidente, penso que, desde já, poderia aflorar e dar a nossa opinião sobre as outras propostas ora em discussão.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, estamos de acordo com a proposta relativa à educação ambiental, apresentada pelo PCP. Fazemos esta proposta não em sede do artigo 66.º mas em termos do ensino, porque nos parece que a educação ambiental é uma componente fundamental em matéria de defesa do meio ambiente.
Também nos parece importante a proposta relativa aos recursos hídricos.
Em relação à alínea proposta pelo PSD, devo dizer que ela nos parece ser uma proposta globalmente positiva, pelo que estamos de acordo. De algum modo, não deixa de ser curioso que o PSD, que não quer entrar em detalhe, compreenda, em relação a esta matéria, como é importante fazê-lo e enriquecer o texto constitucional; também é nossa perspectiva que o texto constitucional deve ser enriquecido e que não se deve perder esta oportunidade.
De qualquer modo, independentemente deste comentário lateral e de estarmos de acordo com esta alínea, julgo que, por poder parecer demasiado vaga a expressão "povoações", deveria ser encontrada uma solução melhor para aquilo que se pretende com ela.
Por outro lado, parece-nos que a questão da paisagem e tudo o que está implícito nesta proposta é uma ideia interessante, que acolhemos positivamente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, talvez seja suficientemente eloquente o nosso silêncio, por positivo, nesta matéria. É que, tendo ponderado cuidadosamente as possibilidades de enriquecimento, chegamos à conclusão de que não valeria a pena ser redundante. Por exemplo, a diminuição do desperdício e os demais conceitos constantes na alínea e) do n.º 3, proposta apresentada por Os Verdes, estão, creio eu, compreendidos numa hermenêutica normal, bem feita, da norma que prevê a obrigatoriedade de aproveitamento racional de recursos naturais que salvaguarde esta capacidade de renovação e a estabilidade ecológica. Se isto não está compreendido nisto, qual é o alcance da norma actual? Não devemos fazer da Constituição uma espécie de vulgata que desenvolva, numa explanação, aquilo que podemos fazer através de lei e, em alguns casos, de folheto, os conteúdos constitucionais.
Quanto às operações de microcirurgia densificadora, compreendo a dificuldades do PSD, porque ela pode ser criticada nos mesmos exactos termos, designadamente por introduzir uma metalinguagem que é ela própria de grande especiosidade - "desenho urbano (…) espaços públicos (…)"… E quanto à "protecção das zonas históricas", Srs. Deputados, ela pode estar incluída, e está, noutras sedes da Constituição e, provavelmente, estará, em parte, abrangida pela alínea c), in fine.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas nós mostramos abertura para a redacção!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não tenho qualquer dúvida sobre a importância dos recursos hídricos, resta-me saber se a normação sobre esta matéria tem sede própria apenas em ambiente. Visto tratar-se de uma componente estratégica e crucial, provavelmente a sua sede própria será outra. Ou seja, a dimensão ecológica não esgota a questão crucial dos recursos hídricos, designadamente para um país como Portugal.
Uma voz: - Sr. Deputado, o que é isso da "metalinguagem" de que falou?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, os conhecimentos básicos de linguística damo-los por reproduzidos, geralmente para ilustres membros da escola de Coimbra.
Risos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para fazer uma pequena anotação a esta nossa proposta, que foi apresentada pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O que há de essencial na proposta do PSD é a palavra "povoações"…
O Sr. José Magalhães (PS): - A sério?!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - … por uma razão muito simples, Sr. Deputado José Magalhães. V. Ex.ª lê este artigo e verifica que se fala em território, em parques naturais, em sítios, em paisagens, em tudo onde passa o urbano, o burguês, no bom sentido da palavra (o homem do burgo), e as povoações não contam, e é esta dimensão que falta no texto constitucional.
Um dos direitos, eu diria, naturais, das comunidades é preservarem a sua própria imagem, o seu próprio desenho, a figura com que se apresentam diante dos outros e perante as outras povoações, e falta, na constituição, esta palavra e a característica própria de cada uma delas.
Dir-se-ia que o texto é redigido por quem circula nas estradas de automóvel e vai para a província divertir-se; não está redigido por quem vive nos sítios.
Por isso, saúdo a Sr.ª Deputada Isabel Castro por ter rapidamente intuído da importância da nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, começo por dizer que, quanto à questão da promoção da educação ambiental, relativamente à qual, creio, o PS não se pronunciou, estamos inteiramente abertos quanto a eliminar a segunda parte da norma. Creio, aliás, que, em rigor, a ideia de respeito pela natureza, que é uma componente da educação ambiental, é redundante.
Por outro lado, quero declarar que estamos abertos à ideia, o que não significa exactamente à formulação, contida na proposta do PSD, mas não sem uma observação. Estamos abertos a esta ideia com base num propósito
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o de contribuir para densificar e melhorar a Constituição, porque, em rigor, entendemos que o conteúdo da proposta do PSD está na alínea b), quando se refere ao ordenamento do território, tendo em vista a correcta localização das actividades. Isto porque "localizar actividades" significa localizar correctamente actividades…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Pessoas! As povoações localizam pessoas!
O Sr. Luís Sá (PCP): - As povoações não localizam, Sr. Deputado!
Entendo que a proposta do PSD é útil porque vem clarificar algo que já aqui está. Mas é exactamente neste propósito que adiantamos também outras propostas, que, de algum modo, já aqui estão contidas numa correcta hermenêutica, para utilizar a expressão do Sr. Deputado José Magalhães, e nem por isso deixaria de se ganhar com o facto de ficar actualizado, clarificado e devidamente especificado.
Quanto à observação de que a gestão dos recursos hídricos é tão importante que não tem uma componente exclusivamente ambiental, estou inteiramente de acordo, Sr. Deputado José Magalhães, e o desafio que coloco é o de se inserir uma norma sobre gestão de recursos hídricos da qual constasse a componente ambiental e todas as outras componentes. Uma vez que não há abertura da parte do PS para a inserir aqui, eventualmente num outro lado haja em relação a esta…
O Sr. José Magalhães (PS): - É uma boa ideia!
Se o Sr. Presidente mo permitir, gostaria de fazer uma proposta concreta.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado José Magalhães. É bem-vinda!
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, creio que podemos ser sensíveis à preocupação do Sr. Deputado Barbosa de Melo. Ou seja, se a ideia, como ele a exprimiu, é a essencialidade de introduzir no léxico constitucional a expressão "povoações" há um bom sítio para o fazer, fiel e inteiramente à preocupação do PSD, que é a alínea c); adita-se ao elenco e ao léxico desta alínea, que já inclui "paisagens" e "sítios", a palavra "povoações", ficando "(…) proteger povoações, paisagens e sítios, (…)" ou "(…) paisagens, sítios e povoações (…)"… No "proteger" incluo tudo o que os Srs. Deputados incluem, como proteger através da arquitectura, do desenho urbano, do arranjo dos parques públicos, da protecção das zonas históricas e do mais que VV. Ex.as não referem e que também é susceptível de ser incluído.
Agora, o conceito de "qualidade ambiental" parece-me francamente um pouco esotérico. "Qualidade", sabemos o que é; "ambiente", também sabemos o que é; o casamento entre estas duas expressões dá "qualidade ambiental" naturalmente, ambiente com qualidade, qualidade com ambiente, mas, a certa altura, a construção destes casamentos lexicais não leva a grande rigor.
Era esta a proposta, Sr. Presidente, que eu queria fazer, a de aditar "povoações" na alínea c), de forma económica, cirúrgica…
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, registo a disponibilidade de todos os partidos. Agora, para não perdermos tempo aqui, hoje, pois a disponibilidade é que interessa, alerto para o facto de o aditamento dessa expressão não poder ser, minimamente, na alínea c), com toda a franqueza, isto porque esta alínea tem a ver com uma lógica que existe já na legislação ordinária relativa à paisagem protegida. A própria utilização da palavra "sítios" aqui nada tem a ver com povoações. Isto tem uma densificação própria na legislação ordinária.
Ou seja, esta alínea c) tem exclusivamente que ver com legislação já existente sobre a paisagem protegida e, portanto, com reservas naturais… Há já toda uma classificação hierarquizada na legislação, que decorre da densificação do legislador comum, e a alínea c), de facto, nada tem a ver com o que o PSD pretende na alínea e). É uma redacção diferente, mas, como disse o Sr. Deputado Barbosa de Melo, é algo que não está em nenhuma das alíneas.
Mas, depois, veremos em conjunto com os outros partidos a formulação adequada.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em conclusão, há a registar a não abertura para as alíneas e) e f), propostas pelo PCP, e para a alínea e), apresentada por Os Verdes, e a abertura para a alínea g), proposta pelo PCP, e para a alínea e), do PSD.
Sr. Deputados, vamos passar à proposta de aditamento do n.º 3 ao artigo 66.º, apresentada pelo PCP, que é convergente com o artigo novo, o artigo 66.º-A, proposto por Os Verdes.
O n.º 3, proposto pelo PCP, tem a seguinte redacção: "As organizações não governamentais de ambiente e desenvolvimento têm direito, nos termos da lei, a serem ouvidas sobre as questões que digam respeito à defesa do ambiente."; o artigo 66.º-A, é do seguinte teor: "A lei assegura a participação democrática dos cidadãos e das suas organizações na tomada de decisão sobre política do ambiente".
Para apresentar a proposta do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em rigor, a proposta do PCP é algo que já decorre dos conceitos de democracia participativa, de Estado democrático participado, que está consagrado na Constituição, e que também já decorre da legislação ordinária, que, nesta matéria, como é sabido, concede amplos direitos às associações de defesa do ambiente, dando-lhes por vezes, num ou noutro caso, um tratamento demasiado lato, no concreto.
Entretanto, parece-nos que a participação no domínio das políticas de ambiente é de tal forma importante que justifica uma consagração autónoma na sequência do direito internacional, do direito ordinário e da importância que têm vindo a assumir as questões ambientais.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro para apresentar a sua proposta.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, penso que não vale a pena fazer a apresentação, porque o texto é claro.
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Posso dizer que, se a participação dos cidadãos é importante em qualquer domínio, quanto se trata de modificar formas de viver, produzir e consumir, onde a visão cultural implícita obriga à participação dos cidadãos, individualmente considerados ou através de associações, parece-nos que merece um tratamento autonomizado.
Portanto, penso que é disto que se trata e foi para isto que as diversas associações chamaram a atenção na audição que ocorreu.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração estas propostas convergentes, do PCP e de Os Verdes, para o direito de participação das associações de ambiente.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta proposta suscita apenas uma questão de tratamento equânime, se se quiser. Ou seja, temos espaço, pela Constituição, a um conjunto de direitos sociais e, obviamente, em relação a muitos deles ou a todos eles seria configurável a elaboração de normas participatórias. Vamos fazê-lo? Eis a questão que está em aberto. É um esforço, em igualdade de tratamento, enorme.
A nossa simpatia, em relação à participação democrática dos cidadãos, é pública, notória e conhecida. Temos alguns afloramentos, através de propostas concretas, que foram muito medidas, precisamente por entendermos que, se abríssemos um precedente de consagração ou de ampliação, teríamos de ser equânimes e de fazer um tratamento esparso. É este o problema que temos entre mãos e, francamente, resolvemo-lo, como é público, no nosso projecto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, no fundo, a posição do PSD, nesta matéria, não é muito diferente daquela que o Sr. Deputado José Magalhães acaba de explicitar. Sendo certo que, como disse o Sr. Deputado Calvão da Silva, há na nossa Constituição vários exemplos, nomeadamente no direito dos consumidores, no artigo 60.º e, mais à frente, no artigo da família, há vários preceitos da Constituição, nomeadamente nos capítulos que, nesta parte, temos vindo a analisar, que tocam de formas diversas essa audição das associações representativas dos interesses em causa.
É evidente que, sob esse prisma - até porque a legislação ordinária já o faz e é das tais coisas aonde nunca haverá um retrocesso em termos de direitos de participação das organizações de cidadãos -, nesta matéria é impensável, diga a Constituição o que disser sobre esta matéria, retroceder face àquilo que foi a evolução natural da participação dos cidadãos nestas áreas.
Porém, temos alguma dúvida sobre a exacta forma de inserção e se se justifica fazer aqui um número autónomo ou o quer que seja. Portanto, há da parte do PSD, quanto à questão de fundo, óbvia concordância. De resto, isto não será novidade alguma porque já está consagrado em todos os diplomas relevantes sobre esta matéria do ambiente e qualidade de vida.
Há, de facto, algum precedente em termos deste capítulo da Constituição, nomeadamente quer no artigo 60.º quer no artigo 67.º.
O Sr. Luís Sá (PCP): - E também no artigo 77.º, já agora, Sr. Deputado, por exemplo!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente. Dei dois exemplos, mas haverá vários.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Há muitos!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - De qualquer modo, deixo a disponibilidade do Partido Social Democrata para reflectir, reservando para uma segunda leitura uma posição definitiva. Portanto, não estamos contra a proposta, mas gostaríamos de ponderar melhor sobre a sua eventual inserção e o modelo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, concluindo, há disponibilidade para considerar as propostas quer do PSD quer do PS…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, deixo só mais a nota: não é para as organizações não governamentais. Portanto, a própria formulação a ser apurada terá, obviamente, de…
O Sr. Presidente: - Claro! Aliás, como há duas propostas diferentes, teremos sempre de encontrar uma formulação alternativa.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, proponho, em nome do PCP, que seja adoptada a formulação da lei ordinária, que me parece perfeitamente adequada, independentemente da formulação "organizações não governamentais" ser uma expressão consagrada. Por exemplo, como é sabido, na Conferência do Rio houve um fórum das organizações não governamentais paralelo às instituições oficiais e que teve um grande papel. Mas eu proponho que seja adoptada a fórmula que consta da lei ordinária.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fica em aberto essa questão.
Em conclusão, não há obstaculização liminar, há objecções de "mas", o que significa abertura para considerar as propostas.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 67.º, cuja epígrafe é "Família", em relação ao qual há duas propostas, uma do CDS-PP e outra do PSD.
O CDS-PP, além de eliminar o n.º 2, propõe a substituição do n.º 1, com a seguinte redacção: "A família, como elemento natural e fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado, com especial incidência na criação de condições de efectivo cumprimento dos direitos e deveres decorrentes da maternidade e paternidade.", enquanto a Constituição diz: "A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros".
Para apresentar esta proposta de substituição do n.º 1, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
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A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, não sei se o que vou fazer é ou não regimental, mas considero esta proposta do CDS-PP minimalista, além de não estar de acordo com os princípios democrata-cristãos sobre a família. Portanto, deve ter sido um equívoco, e, enfim, como estou mandatada para este assunto, vejo-me na contingência de ou propor uma outra redacção ou, então, considerando que algumas das propostas do Partido Social Democrata estão conformes àquilo que é entendido nesta matéria pelo meu partido, acrescentar-lhes algumas sugestões que eventualmente poderão ser aceites pelo PSD, o que seria talvez um processo mais expedito.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, sendo assim, a proposta apresentada pelo CDS-PP considera-se prejudicada, mas será considerada válida na parte da proposta do PSD.
Em relação ao n.º 2 do artigo 67.º, o CDS-PP propõe a eliminação deste número, a qual, penso, também se deve considerar retirada. É assim, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Em nome do CDS-PP…
O Sr. Presidente: - Retira a proposta de eliminação.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Exactamente, porque o n.º 2 não só não se pode eliminar como até tem de ser melhorado.
O Sr. Presidente: - Hesitei por não saber se não seria um equívoco, mas não é. Propõe claramente a eliminação, como está visto, mal…
Srs. Deputados, quanto ao n.º 2, o PSD propõe, para a alínea d), a seguinte redacção: "Garantir, no respeito pela liberdade individual, o direito ao planeamento familiar, promovendo a informação e o acesso a meios que permitam o exercício de uma paternidade…" e maternidade "… consciente".
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta proposta, há, por um lado, um intuito claro de reforçar o princípio que actualmente está na Constituição, o qual nos parece demasiado tímido, pois aponta apenas para a incumbência do Estado de "Promover, pelos meios necessários, a divulgação dos métodos (…)". E o PSD propõe que se dê um passo em frente, pondo-se, como incumbência do Estado, o garantir de um direito ao planeamento familiar.
Portanto, o que propomos é um claro reforço daquilo que actualmente consta na alínea d) do n.º 2 do artigo 67.º.
Por outro lado, agora já não propriamente com um alcance substantivo, aproveitamos para reformular a expressão "organizar as estruturas jurídicas e técnicas" por "informação e o acesso", porque, a nosso ver, não basta organizar meios que permitam uma adequada informação dos cidadãos, é preciso garantir-lhes o acesso a meios que permitam o exercício da paternidade consciente.
Portanto, no fundo, a proposta do PSD, nesta matéria, fica explicitada com aquilo que acabo de dizer, sendo certo que já houve uma chamada de atenção, não só do Sr. Presidente mas ainda há pouco eu e a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto falámos disso, para o termo "paternidade consciente". Nesta matéria, o PSD limitou-se a repetir o actual texto constitucional, que é, manifestamente, insuficiente, pelo que dever-se-ia fazer um acrescento, sugestão que o PSD desde já aceita, por modo a ficar "(…) o exercício de uma maternidade e paternidade conscientes;".
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração a proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a proposta tem algumas vantagens que me permito sublinhar.
Por um lado, alude expressamente ao planeamento familiar como um direito, o que corresponde a uma filosofia que, de resto, está hoje consagrada na letra da lei e consta de múltiplos instrumentos internacionais - é, digamos, do ponto de vista da formulação constitucional, uma melhoria, um aperfeiçoamento claro. E quanto à alusão ao respeito pela liberdade individual, ele sempre fluiria de outras normas que em Portugal proíbem, de forma inequívoca, programas de esterilização forçada ou outras formas de aplicação de políticas coactivas para atingir objectivos de natalidade, quaisquer que eles sejam, e, enfim, dispenso-me de os enumerar por serem de todos conhecidos.
Por outro lado, não há diminuição de conteúdo e, pela sugestão do Sr. Presidente, haverá mesmo uma clarificação, que, de resto, é harmoniosa com aquilo que decorre, desde a primeira revisão constitucional, do artigo 68.º.
Compreendo que o Sr. Presidente se reconheça especialmente nisso, uma vez que esteve na base da melhoria do artigo 68.º, n.º 2, na altura própria. Mas creio que será positivo que clarifiquemos a Constituição neste sentido.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa posição, no que toca a esta proposta, tem duas partes: primeira, pensamos que há efectivamente melhorias em relação à actual alínea d) do n.º 2 do artigo 67.º, nomeadamente a consagração do direito ao planeamento familiar; segunda, relativamente à parte seguinte tenho algumas dúvidas…
O Sr. José Magalhães (PS): - Está a referir-se à alínea seguinte?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, refiro-me à segunda parte da alínea d).
Mas, como eu dizia, tenho algumas dúvidas de que seja o mesmo "direito à informação" e "divulgação dos meios de planeamento familiar", penso que se deveria conciliar as duas coisas. E também preferimos que se mantenha na alínea a expressão "organizar as estruturas jurídicas e técnicas que permitam o exercício de uma paternidade…", e, como é óbvio, deve ser acrescentado, "maternidade".
Devo ainda dizer, se mo permitem, que a questão da informação é importante, mas a divulgação é diferente.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - A Sr.ª Deputada não considera que divulgação está, num conceito mais lato, de informação?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - A informação pode ser individual; pode, por exemplo, ser numa consulta de planeamento
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familiar, e as consultas são num determinado sítio. Mas a divulgação é, por exemplo, através da televisão, divulgar o planeamento familiar. Em meu entender, é uma componente mais ampla.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, compreendo muito bem a dúvida da Sr.ª Deputada Odete Santos e creio que devemos transpor para aqui tudo aquilo que de meritório já discutimos quando tratámos do acesso ao direito, e fizemo-lo de uma forma muito interessante.
Por outro lado, creio que devemos tomar a proposta do PSD por aquilo que ela é; ou seja, ela não implica de facto, nesta área, nenhuma redução de conteúdo, tanto quanto sou capaz de interpretar correctamente, porque "promover a informação" significa promover todas as dimensões da informação - a divulgação genérica, a divulgação através dos media, a divulgação personalizada, a divulgação caso a caso, a divulgação através da consulta -, a activa, a personalizada e a genérica.
Portanto, a alusão, no texto constitucional, à divulgação no sentido lato era por nós objecto de reinterpretação no sentido de abranger também a divulgação personalizada, o que era já um grande esforço de hermenêutica, mas, enfim, com algum êxito. Porém, fazê-lo a partir desta base constitucional proposta pelo PSD terá a vantagem de transpor para aqui toda a hermenêutica sobre a multidimensionalidade do processo informativo.
Quanto à questão das estruturas jurídicas, etc., creio que não há qualquer diminuição do conteúdo da Constituição neste ponto, se tivermos em conta a justa hermenêutica do que é o acesso aos meios que permitam o exercício da paternidade e maternidade, sobretudo no quadro em que ele é proclamado como um direito (direito subjectivo) ao planeamento familiar; é impossível vislumbrar aqui a redução de conteúdo.
Quanto ao resto, não tenho qualquer fascínio pelas expressões estruturalistas ou "estruturas jurídicas", mas são de um tecnicismo bastante simpático, cuja origem histórica todos sabemos qual foi.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que estou de acordo com a redacção proposta pelo Partido Social Democrata.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, podemos concluir que a proposta de alteração à alínea d) do n.º 2 do artigo 67.º, apresentada pelo PSD, tem o acolhimento do PS e do CDS-PP e as objecções expressas, salvo quanto à primeira parte, do PCP.
Srs. Deputados, o PSD apresenta uma proposta de uma nova alínea, a alínea e), com a seguinte redacção: "Regulamentar as condições em que são permitidas técnicas de procriação assistida, por forma a salvaguardar a dignidade humana;".
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, esta proposta do PSD inscreve-se no âmbito de um conjunto de propostas, algumas delas já aqui discutidas em artigos anteriores, que tem a ver com a preocupação de, ao nível dos direitos pessoais, introduzir algumas matérias que não estão actualmente tratadas no texto constitucional e que, por força da evolução tecnológica, colocam hoje, no plano dos direitos humanos, genericamente considerados direitos pessoais, novos problemas, aos quais é necessário dar novas respostas.
Perante as técnicas de procriação assistida - é o termo genericamente utilizado e que abarca um conjunto vasto de realidades, como todos sabemos, embora algumas destas realidades ainda estejam por explorar em termos tecnológicos há já entrevistas em termos científicos -, parece-nos claramente necessário incluir aqui, na Constituição, uma incumbência nítida, por parte do Estado, de regulamentação, na perspectiva de salvaguardar a dignidade humana.
Portanto, o conteúdo útil da proposta do PSD é o de incluir na Constituição, como incumbência clara do Estado, a necessidade de regulamentar a utilização deste tipo de técnicas que, hoje em dia, estão em clara expansão e utilização com problemas complicados a vários níveis e que todos conhecemos.
Devo dizer ainda que, na formulação da alínea, procurou-se ser o mais genérico possível, atendendo à dinâmica e à evolução que estas matérias ainda hoje estão a sofrer, exactamente para que amanhã não resulte deste novo exercício constitucional uma qualquer desactualização em termos práticos, o que não desejaríamos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que concordamos com esta proposta do PSD. De facto, face à inovações tecnológicas, creio que é importante reafirmar aqui a salvaguarda da dignidade humana perante as técnicas de procriação assistida.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, poderemos encarar favoravelmente uma proposta deste tipo, sem prejuízo algum do seu eventual afinamento. Percebemos a sua finalidade, que é muito importante, e é um enriquecimento significativo da Constituição nesta parte, sem ser limitativo, não é exautora, pois é preciso ter cuidado com a formulação.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chamo a atenção, dos proponentes e dos seus apoiantes da proposta, para um pequeno aspecto: "Regulamentar as condições em que são permitidas técnicas de procriação assistida,…" não é apenas "… por forma a salvaguardar a dignidade humana;", este é um pressuposto, uma condição limite. Um dos objectivos é também garantir às pessoas que recorrem à procriação assistida o direito a ter filhos.
Portanto, não é apenas "por forma a", quando muito é "salvaguardando" ou "com salvaguarda da dignidade humana".
O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, sim!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O melhor é "com salvaguarda da dignidade humana".
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O Sr. Presidente: - Então, estamos entendidos. Penso é que a formulação não era a melhor.
Portanto, fica adquirida a proposta, salvo eventualmente algum afinamento ainda de linguagem.
Passamos, agora, ao artigo 68.º, em relação ao qual só há uma proposta de aditamento do n.º 4, apresentada pelos Deputados do PS Cláudio Monteiro e outros, que não se encontra presente.
Sendo assim, passamos ao artigo 69.º, relativamente ao qual foram apresentadas várias propostas de alteração.
Ao n.º 1 não foram apresentadas propostas de alteração, mas para o n.º 2 o PS, o PCP e o PSD apresentaram propostas de alteração.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, já não é possível acrescentar alguma coisa ao artigo da família, o artigo 67.º?
O Sr. Presidente: - Claro, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, relativamente à alínea b)…
O Sr. Presidente: - Para essa alínea ninguém propôs nada, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas eu posso propor?
O Sr. Presidente: - Só por consenso absoluto, Sr.ª Deputada. Não havendo propostas… Mas faça-a. Ouçamo-la.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, a meu ver, aqui também deveria vir a garantia do acesso e não apenas a promoção da criação, porque não basta criar estas redes, é preciso criar as condições de acesso. Penso que se poderia substituir a expressão "uma rede nacional de creches e de infra-estruturas de apoio à família" por "uma rede nacional de equipamentos sociais de apoio à família", uma vez que não são apenas as creches e os jardins de infância mas também os ATL. E, portanto, ficar só "creches" parece-me reducionista, enquanto "equipamentos sociais de apoio à família" engloba tudo.
Penso que a expressão "política de terceira idade" é para dar a ideia de que a família tem de facto gerações, mas, além de haver um artigo específico, no fundo, esta "rede de equipamentos sociais de apoio à família" inclui, naturalmente, equipamentos de terceira idade. Não sei se me fiz entender.
O Sr. Presidente: - Concretamente, a Sr.ª Deputada propõe a simplificação da alínea b), que ficaria com a seguinte redacção: "Promover a criação…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - "Promover a criação bem como o acesso a uma rede nacional de assistência materno-infantil e a uma rede nacional de equipamentos sociais de apoio à família.", não especificando…
O Sr. Presidente: - Terminaria aí.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Exactamente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, existe consenso para considerar esta proposta e aprová-la?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o PSD gostaria de ver a exacta formulação, mas existe toda a abertura face à explicação dada pela Sr.ª Deputada, porque, no fundo, trata-se apenas de clarificar melhor, sem reduzir conteúdos, actualizando-os eventualmente, face às realidades hoje existentes.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a operação que estamos a fazer é obviamente a título excepcional e exige o acordo expresso de todos os grupos parlamentares.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, damos o nosso acordo à formulação apresentada, mas também gostaríamos de ver a redacção final.
De qualquer modo, em princípio, estamos abertos.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, se me permitir, ainda teria uma outra proposta de alteração a apresentar ao artigo 67.º.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não se prevaleça da minha benevolência!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, vou cá estar tão pouco tempo, que talvez possa abusar um bocadinho…, e depois não o incomodo mais.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que, a meu ver, nesta alínea f), "Definir, ouvidas as associações representativas das famílias, e executar uma política de família com carácter global e integrado.", tendo em conta que, no fundo, todas as outras alíneas dizem respeito a uma política de família, talvez ficasse melhor…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Poder-se-ia eliminar a expressão "as associações representativas das famílias".
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, Sr.ª Deputada. Proponho que se inclua o dever da audição, o dever de ouvir as associações de famílias para definir as políticas de família com carácter global e integrado, porque tudo o mais também são políticas de família.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Então, ficava como?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr.ª Deputada, no fundo, a alínea f) consagraria a obrigação de ouvir as associações de famílias para definir as políticas de família com carácter global e integrado.
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O Sr. José Magalhães (PS): - Mas isso é o que decorre exactamente da norma, Sr.ª Deputada!
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Não. O que a Sr.ª Deputada quer é que se diga "Incumbe ao Estado ouvir…", em vez de "Definir…".
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Todas as outras alíneas, Sr. Deputado, já são política de família, ou não são?
Logo, uma alínea específica que diga "Definir políticas de família…" não faz sentido. O que se quer consagrar é a audição das associações para a definição das políticas, a fim de serem globais e integradas.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Bom, para mexer nesta alínea, não mostro abertura, a não ser num sentido…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O que é que a Sr.ª Deputada tem contra as associações para…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Oh, isso daria para uma grande discussão, pois tem a ver com determinados conceitos, que agora não vou trazer aqui. Aliás, o PCP votou contra.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como neste caso se trata de alterar normas para as quais não foram apresentadas propostas…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas aqui há uma proposta de alteração do PSD, que é alínea g), onde se propõe isto. Portanto, pode entender-se que a Sr.ª Deputada está a propor uma formulação da proposta do PSD para a alínea g)…
O Sr. Presidente: - Para a alínea f) não há nenhuma proposta de alteração.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, a actual alínea f) é igualzinha à alínea g) do PSD…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Há, a alínea g) do PSD.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, não é proposta nenhuma!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, mas a alínea g)!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não há qualquer proposta de alteração.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Nenhuma!
O Sr. Presidente: - O PSD limita-se a repetir a alínea f).
Basta que o Sr. Deputado diga que não está de acordo para que esta proposta fique precludida.
Srs. Deputados, voltamos ao artigo 69.º - Infância. Como já vimos, em relação ao n.º 1 não há propostas, vamos, então, passar ao n.º 2, relativamente ao qual há propostas do PS e do PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para, em nome do PS, apresentar a proposta de alteração.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a proposta é, aliás, de uma meridiana simplicidade, propõe a inclusão de uma alusão ao trabalho infantil.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E não só!
O Sr. José Magalhães (PS): - E isso dispensa - foi a nossa preocupação…
O Sr. Presidente: - Não é só isso, Sr. Deputado. Além disso propõe uma referência…
O Sr. José Magalhães (PS): - Faz uma alusão aos menores em risco, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - … aos menores órfãos, abandonados ou em risco.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto. Faz o alargamento do âmbito do preceito por um lado - isto é auto-evidente -, uma alusão à infância em risco.
Quanto ao inciso atinente ao trabalho infantil, visa-se, na sequência daquilo que foi alcançado no quadro da segunda revisão constitucional, de resto, por consenso, incluir mais uma referência à proscrição do trabalho infantil e às obrigações do Estado e da sociedade nesta matéria, enriquecendo assim a narrativa constitucional atinente aos direitos da infância.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estas duas ideias aparecem em várias outras propostas. Por isso, proponho que, em vez de discutirmos as propostas formais de cada partido, discutamos as ideias.
A primeira ideia é a de proibir o trabalho infantil, e é comum ao PS, ao PCP, ao PSD, que, aliás, tem um número autónomo, e ao Deputado João Corregedor da Fonseca.
Parece-me, portanto, que está adquirido um largo consenso nesta matéria e que a podemos dar por adquirida, independentemente da formulação, que trataremos mais tarde.
Assim, para discutir esta ideia, a proibição do trabalho infantil, a incluir no artigo 69.º, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, tal como o Sr. Presidente acaba, diplomaticamente, de dizer, é evidente que o PSD tem uma proposta clara sobre isto, e apenas deseja que isto seja mesmo um inciso constitucional sobre a proibição e não a protecção das crianças sobre o trabalho infantil.
O PSD pretende que o texto constitucional seja mesmo de proibição.
O Sr. Presidente: - É verdade, esta distinção existe. A proposta do PSD é, neste aspecto, a mais forte, a mais enfática, é no sentido de proibir o trabalho infantil.
Sendo assim, está em discussão a fórmula mais ou menos enfática de o fazer.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, concordo com a ideia, mas a proibição do trabalho infantil já está na Constituição, embora sem esta formulação assim tão enfática, num artigo, que foi até proposto pelo Deputado Raúl Castro, que foi saudado com uma consagração da proibição do trabalho infantil - é o que vem no n.º 4 do artigo 74.º: "É proibido, (…), o trabalho de menores em idade escolar".
O Sr. José Magalhães (PS): - Essa proposta foi do PCP!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Foi do PCP, mas o Deputado Raúl Castro também apresentou uma proposta neste sentido.
Sendo assim, não sei se, então, não seria melhor ir a esse artigo e substituir… Mas não há proposta alguma…
Sr. Presidente, penso que, na constituição, passa a haver duas normas a dizerem a mesma coisa. Então, em vez da formulação do PSD, eu preferia a formulação da protecção das crianças contra o trabalho infantil, e, deste modo, fugir-se-ia a essa duplicação.
O Sr. Presidente: - Mas, Sr.ª Deputada, estando proibido, em que é que consistiria essa protecção contra o trabalho infantil? Não percebo o que é que acrescentaria?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O que é que acrescentaria a quê?
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, estando já proibido o trabalho infantil no artigo 74.º, não percebo o que é que as formulações do PCP e do PS acrescentariam?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, dizem que têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado contra o trabalho infantil.
O Sr. Presidente: - Mas se a Constituição, num outro artigo, já o proíbe?!
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, chamo a atenção exactamente para isso, para o facto de o texto actual ser profundamente insuficiente, desde logo, porque está inserido na questão do ensino, e para o facto de a idade escolar não existir por lei. Ou seja, a idade escolar decorre do ensino obrigatório, e actualmente este é de nove anos, o que faz com que uma criança, com um aproveitamento normal, acabe a escolaridade obrigatória aos 14 anos. E, actualmente, considera-se trabalho infantil aquele que é desenvolvido antes dos 16 anos, com pequeníssimas excepções. Mas, actualmente, o trabalho desenvolvido aos 15 anos ainda se considera trabalho infantil, o que não sucedia há uns anos; há uns anos atrás era a partir dos 14 anos, agora é a partir dos 16 anos, idade que, normalmente, ultrapassa a idade escolar, porque, hoje em dia, a idade escolar não é um conceito normativamente disposto em lei, decorre da lógica da escolaridade obrigatória. E essa escolaridade obrigatória, sendo de nove anos, acaba, para a generalidade das crianças com o aproveitamento escolar regular, aos 14 anos.
Portanto, actualmente, a norma é manifestamente…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - A nova reforma educativa creio que…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ó Sr.ª Deputada, olhe que não há idade escolar, não existe o conceito de idade escolar. Existe, sim, o conceito de escolaridade obrigatória, que é de nove anos.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Mas a questão é saber se o conceito de infância se aplica a um adolescente de 15 ou 16 anos…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - O problema é classificar o que é trabalho infantil!
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, isso tanto se põe em relação à norma que está como a que é proposta.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, Sr. Presidente. Em relação à norma que proíbe o trabalho dos menores em idade escolar, isso não se põe.
O Sr. Presidente: - Tem razão.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Aí está definido, e aí varia conforme a escolaridade obrigatória.
Agora, o que é trabalho infantil? Se vai buscar o conceito de criança da Convenção dos Direitos da Criança, é até aos 18 anos.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, vou, enfim, tentar dar uma pequena contribuição para clarificar a questão aqui colocada e que, sem dúvida alguma, é pertinente. Creio mesmo que há aqui um consenso, que é de saudar, de preocupação com esta questão.
Foi colocada a questão de saber se o problema da proibição não esgotava a obrigação do Estado de especial protecção às crianças, enfim, aos adolescentes que estejam nesta situação.
Creio que, em rigor, uma coisa é proibir, o que implica designadamente actuações de prevenção e de repressão de quem emprega crianças e adolescentes nestas condições, e outra coisa, diferente, é a especial protecção a quem está nestas condições, o que já não é propriamente apenas a proibição mas, sim, deveres da parte do Estado no sentido de garantir que, particularmente, crianças, que são compelidas a trabalhar, tenham esta protecção.
Há aqui duas questões que são, em rigor, talvez complementares. A proibição não esgota necessariamente o dever de protecção.
O Sr. Presidente: - Essa é prévia!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sem dúvida alguma que é prévia. E estamos todos de acordo em que a questão está cá, e está bem. Agora, o problema é saber se queremos ou não acrescentar à proibição um dever especial de protecção que implique, por exemplo, um esforço, da parte do Estado e de outras entidades, de criar alternativas que não conduzam ao trabalho infantil. Sabemos perfeitamente que há condições sociais que levam a isto. Podemos dizer que isto decorre da proibição? Não é completamente claro que
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decorra; eventualmente aquilo que decorre, sem dúvida alguma, é o dever de proibir, de reprimir quem empregue, etc., e não este dever de protecção, obrigatoriamente, pelo menos. Numa leitura mais redutora…
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, perante este argumento mais relevante, proponho a seguinte solução: a substituição da redacção proposta pelo PSD para o n.º 3 do artigo 69.º, "É proibido o trabalho infantil.", pela que já consta no n.º 4 do artigo 74.º da Constituição, "É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar.", e o aditamento ao n.º 1 de algo semelhante ao que é proposto pelo PS e pelo PCP, ou seja, "As crianças têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado contra todas as formas de discriminação e de opressão, nomeadamente contra a exploração do trabalho infantil (…)".
O Sr. Luís Sá (PCP): - Estamos de acordo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, genericamente concordo com a sua formulação, a única dúvida que subsiste - e, por isso, deixo a nota de que o PSD vai reflectir - tem a ver com o facto de a idade escolar poder não ser, e já não é actualmente, em muitas situações, suficiente para os avanços que já existem em matéria de legislação sobre o trabalho infantil.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas a legislação pode sempre avançar em relação à garantia constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Portanto, incluíamos o trabalho infantil no n.º 1, o que deixava margem para uma "interpretação" constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente. Por isso é que comecei por dizer que concordamos, mas peço apenas que fique em aberto…
O Sr. Luís Sá (PCP): - O programa eleitoral do PSD propunha a escolaridade obrigatória de 11 anos, até ao 12.º ano!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, congratulamo-nos com o facto de a discussão ser feita nestes termos. Como todos nos lembraremos, em 1989 não foi possível alcançar este resultado, seguramente não por falta de vontade política daqueles que tinham impulsionado as propostas neste sentido.
O resultado final, de qualquer das formas, foi bom, e não desvalorizo o alcance da inserção desta proibição constitucional no n.º 4 do artigo 74.º.
A reinserção sistemática, a ser aceite, parece positiva. De resto, tinha sido esse o sentido originário da démarche que diversas entidades fizeram aquando da outra revisão. Nunca me doerão as mãos por ter insistido o mais que pude, na circunstância, pela consagração da norma.
Quanto ao reforço proposta pelo Partido Socialista nesta sede, a ser feito nos termos que adiantamos ou onde o Sr. Presidente sugere, seria sempre positivo, seria sempre isso mesmo, ou seja, um reforço.
A formulação do PSD seria excessiva ela própria. Não podemos consagrar uma norma do teor "É proibido o trabalho infantil", ponto final, dadas as consequências que isso teria, pois teria de ser sempre nos termos da lei. E a fórmula que consagramos em 1989 visava precisamente tornear essas dificuldades e chegar a uma formulação equilibrada.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas em 1989 era de 14 anos e agora já não é.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, a lei ordinária, nessa matéria,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza.
O Sr. José Magalhães (PS): - … que dificuldade nos suscita? Nenhuma! Literalmente nenhuma!
Portanto, aderimos à proposta ou à tentativa de articulação apresentada pelo Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, sem prejuízo da reconsideração das formulações. É assim?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, embora a formulação do n.º 4 do artigo 74.º seja excelente, devo dizer. Reconhecemo-nos nela perfeitamente e, reinserida, melhor ainda naturalmente, porque era aqui que ela deveria ter estado sempre.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma outra ideia comum a várias propostas é a de retirar, do actual n.º 2, o inciso especial sobre os órfãos e os abandonados e passá-lo para um número autónomo.
O actual n.º 2 diz o seguinte: "As crianças, particularmente os órfãos e os abandonados, têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, contra todas as formas de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo de autoridade na família e nas demais instituições.". Há uma proposta, que, aliás, é comum a dois ou a três projectos, no sentido de o n.º 2 não particularizar ninguém, ficando algo do género "As crianças…", todas em geral, "… têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado contra todas as formas (…)". E, depois, aditar-se-ia um número autónomo para acrescentar uma protecção especial em relação aos órfãos, abandonados e em risco. Mas deixemos agora de lado a questão de saber se são só, ou não, os órfãos abandonados.
Srs. Deputados, ponho à vossa consideração esta ideia, que é comum aos projectos do PCP e do PSD: retirar do n.º 2 essa especial protecção de certos subconjuntos de crianças, passando este a ser geral, para todas as crianças, e autonomizar essa mesma protecção especial de crianças mais vulneráveis num número, que, no caso do PCP, é o n.º 3 e, no caso do PSD, é o n.º 4.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não quero ser desmancha-prazeres, mas…
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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, são Os Verdes que fazem essa proposta!
O Sr. Presidente: - Exactamente, são o PCP e Os Verdes. O PSD elimina.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Independentemente do esforço racional que o Sr. Presidente fez no sentido de delimitar a discussão, não quero ser desmancha-prazeres, mas, de facto,…
O Sr. Presidente: - Não, não! Eu estava a lavrar num equívoco. O PSD não propõe isso, quem o faz são o PCP e Os Verdes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é só isso, Sr. Presidente. Gostaria de perder aqui um bocadinho de tempo, que, a meu ver, não é tempo perdido, nesta matéria, para explicitar a posição do PSD sobre esta matéria, porque não me parece que fique suficientemente esclarecida pela proposta que o Sr. Presidente acabou de fazer. Perder-se-ia, na discussão, nos termos em que a colocou, a nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Sendo assim, está em discussão a proposta, do PSD, de substituição do n.º 2 do artigo 69.º.
Faça favor, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que é que o PSD aqui propõe? O PSD propõe que a eliminação do inciso "particularmente órfãos e abandonados", porque, mesmo com a proposta do PS, de acrescentar "ou em risco", é redutor, e prova disso é a necessidade que o PS sentiu em acrescentar ao inciso mais uma realidade.
Aqui, a posição do PSD é, pura e simplesmente, a de não particularizar nada, e isto tem uma razão de ser. Hoje em dia, é manifesto que, infelizmente - mas isto é verdade -, a esmagadora maioria dos maus tratos às crianças são feitos no próprio seio da família. Não são nem as crianças órfãos nem abandonadas, infelizmente, que hoje em dia constituem a esmagadora maioria na preocupação que a sociedade deve ter para com as crianças.
Neste sentido, o PSD entende, e é este o conteúdo e o sentido úteis da nossa proposta, que não deve haver aqui qualquer particularização, porque isso pode levar à ideia errada de que se está a deixar para segundo plano, para um plano residual, a protecção primeira que a família faz às crianças quando, na realidade, é no seio das famílias onde se encontra a esmagadora maioria das crianças vítimas de maus tratos.
Portanto, sem pôr em causa - e, obviamente, não quero com isto que haja interpretações erradas - o papel fundamental, e primeiro em todas as circunstâncias, da família na educação e salvaguarda dos direitos das crianças, parece-me evidente que, no contexto desta norma, esta particularização não atende à realidade das coisas hoje em dia. Assim, a proposta do PSD é, desde logo, retirar daqui, do n.º 2, esta particularização.
Por outro lado, na nossa proposta acrescentamos - e o Sr. Presidente não chamou a atenção para este facto - "as formas de abandono", para, de algum modo, cobrir o abandono que vai para além dos abandonados, porque, hoje em dia, também no seio das famílias há formas terríveis de abandono das crianças, nomeadamente em famílias monoparentais, onde, muitas vezes, por razões económicas ou de toxicodependência, são deixadas ao abandono, fechadas nas suas casas, situações que devem, por todas as formas, ser combatidas e às quais o Estado tem de dar uma atenção tão grande ou seguramente não menor do que aquela que dá às crianças órfãos ou abandonadas e que, portanto, não têm família.
Sr. Presidente, para já fico-me por aqui, para não ocupar muito tempo, e espero que tenha sido perceptível a preocupação do PSD e a razão pela qual não me revi na proposta do Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, pois eu tinha dado conta infiel da proposta do PSD.
A proposta do PSD é, portanto, para eliminar a referência especial aos órfãos e abandonados e acrescentar, quanto ao objecto da protecção, todas as formas de abandono, além daquilo que já lá consta, "de discriminação e de opressão".
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, há aqui dois movimentos contrastantes: um no sentido da autonomização e outro no sentido da eliminação. Talvez nós tenhamos a virtude de estar no meio, pois não vemos, francamente, que a operação de reescrita tenha enormes virtualidades.
A do PSD, por razões que não exigem especiais considerações, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, com grande força hermenêutica, chega ao ponto de considerar que o conceito de todas as formas de abandono poderia vir a abranger - pois ele o diz - as próprias formas de menor acompanhamento no âmbito da própria família.
O Sr. Presidente: - Não, não! É de abandono e não de menor acompanhamento. É abandono mesmo.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto. O "abandono interno", ou seja, no interior da família, o que é um sentido muitíssimo peculiar. Quando criamos um conceito podemos limitá-lo como quisermos, e, portanto, o Sr. Deputado criava um novo conceito e dava-lhe um sentido muito peculiar, o que me parece um tanto especioso.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, gostaria de pôr fim à reunião, mas determinei que só o faço depois de esgotarmos o artigo 69.º.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, penso que também poderíamos discutir o artigo 69.º-A, porque tem ligação com tudo isto, e, assim, amanhã eu ficaria liberta.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, vou-lhe prestar essa satisfação.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, peço desculpa por o ter interrompido, mas gostaria, se fosse possível, que economizasse tempo, sendo sintético.
O Sr. José Magalhães (PS): - Deste modo, Sr. Presidente, nesta matéria, não vemos que a operação de cirurgia proposta pelo PSD se não arriscasse a ter mesmo algum alcance equívoco.
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Pela nossa parte, vemos vantagem em acrescentar aos grupos aludidos no preceito o grupo das crianças em situação de risco, porque, por um lado, somos extremamente sensíveis ao alargamento, infelizmente, dessas situações, designadamente nos grandes meios urbanos, e, por outro, a fórmula constitucional parece-nos particularmente feliz, já que proclama que as crianças, todas, têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, evidenciando, depois, necessidades de superprotecção no que respeita a grupos em que há uma especial desprotecção. Há nisto alguma harmonia.
As fórmulas apresentadas em alternativa caracterizam-se por proclamarem em geral o direito a uma especial protecção e, logo a seguir, por afirmarem que o Estado assegura protecção especial. Ora, entre "especial protecção" e "protecção especial", por favor, a fórmula constitucional parece-nos, sinceramente, melhor e merece ser apenas acrescentada da alusão às crianças em risco.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, se me desse licença, abordava já a nossa proposta de aditamento do artigo 69.º-A, porque tem a ver com isto.
O Sr. Presidente: - O artigo 69.º-A, proposto pelo PCP, é uma norma especial sobre menores em situação de risco, pelo que, neste aspecto, converge, mas desenvolve muito a proposta do PSD…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É verdade, Sr. Presidente, mas nós entendemos que a proposta do PSD não contempla algumas das situações e pensamos que a Constituição deveria conter aqui uma referência aos menores em situação de risco. Ao dizer-se só "as formas de abandono" é demasiado vago e poderia não se incluir aqui as crianças em situação de risco, embora elas tivessem, de outra maneira, direito a essa especial protecção. Mas é uma realidade, uma realidade grave, e, por isso, penso que o nosso texto constitucional deveria ter uma referência à especial protecção de vida dessas crianças.
O facto de termos autonomizado, no artigo 69.º, esta matéria num número decorreu de nos parecer que a redacção do n.º 2 ficaria menos complicada, colocando-se a referência aos órfãos e abandonados no n.º 3. Foi tão-só isto.
Por outro lado, autonomizamos a referência aos menores em situação de risco social e à especial protecção, porque, depois, propusemos, no n.º 2 do artigo 69.º-A, as incumbências especiais do Estado relativamente a esses menores.
Chamo atenção para o facto de se falar muito nos menores em risco e pouco nas famílias em risco. E, portanto, a nossa alínea a) do n.º 2 do artigo 69.º-A realça que, onde há um menor em risco, há também uma família em risco. Quer dizer, não são só essas crianças mas também os progenitores e todos os que com ela vivem que estão em risco. E penso que isso mereceria também uma incumbência especial por parte do Estado no sentido de assegurar o acompanhamento dessas famílias.
Em relação às outras alíneas do n.º 2 do artigo 69.º-A, creio que não suscitam dificuldades de interpretação. Pode-se ou não concordar, mas, a meu ver, não há dificuldades de interpretação.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, faço duas observações: primeira, a ideia da protecção à família vem dois artigos atrás e não aqui, onde, em geral, se refere à protecção das crianças.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente.
O Sr. Presidente: - Em segundo lugar, com a formulação do PCP, em degrau, teríamos a seguinte redacção para o artigo 69.º: "1 - As crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado (…).
2 - As crianças, particularmente (…), têm direito a especial protecção (…).
3 - O Estado assegura protecção especial (…)."; e o artigo 69.º-A diria: "1 - Os menores em situação de risco social têm direito a especial protecção do Estado.
2 - Incumbe especialmente ao Estado:".
Sr.ª Deputada, não acha que são "especiais protecções" a mais, sucessivas?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, estou de acordo consigo, mas isto pode ser reformulado, o importante é saber se há ou não acordo nas ideias.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos aqui duas perspectivas completamente distintas: uma, a do PSD, propõe a eliminação…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para alargar.
O Sr. Presidente: - … da especificação da especial protecção aos órfãos e abandonados e, outra, a do PS, acrescenta ao artigo, mantendo-lhe a estrutura, as crianças em risco àquelas que, segundo o n.º 2, têm direito a especial protecção. E temos a proposta do PCP que autonomiza, em relação ao n.º 2, que já estabelece uma especial protecção, uma protecção especial para órfãos e abandonados num n.º 3.
Portanto, são estes os três enfoques que estão em discussão.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, devo dizer que concordo com a proposta do PSD, mas também devo dizer que a proposta do PCP elenca um conjunto de situações que são realmente importantes.
O que pergunto à Sr.ª Deputada Odete Santos é se a alínea a) do n.º 2 não deveria estar no artigo referente à família em vez de estar aqui, se a alínea b) não deveria estar na educação, se a alínea c) não deveria ser junta à ideia de… É que eu preferia a expressão "as crianças privadas de meio familiar normal, promovendo a colocação familiar e a adopção" à de "órfãos e abandonados". E, quanto ao trabalho infantil, que já tínhamos visto, eliminava, porque já estava…
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos por partes.
Primeiro, a proposta do PSD é no sentido de eliminar a referência particular, no actual n.º 2, a subconjuntos de crianças com direito a especial protecção. É, portanto, para eliminar esta particularização.
Quem apoia esta ideia?
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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, no sentido de se estender a todas as crianças.
O Sr. Presidente: - Claro. Quando se elimina uma particularização generaliza-se o que está.
Aliás, o que a norma diz é "As crianças,…" todas "… particularmente os órfãos e os abandonados, (…)". Logo, quando se elimina a expressão "particularmente os órfãos e os abandonados", significa que são as crianças todas.
Portanto, esta é a proposta do PSD, que, pelos vistos, não tem grande acolhimento.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não vejo vantagem nesta alusão específica aos órfãos!
O Sr. Presidente: - E a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, eu talvez gostasse de conciliar o inconciliável.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, a meu ver, é perfeitamente correcta a utilização de todas as formas de abandono, porque, hoje, nas sociedade modernas, o abandono reveste de facto muitas formas, como o Sr. Deputado explicou.
O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, Sr.ª Deputada, se me permite, a expressão constitucional que alude a "abandonados" fá-lo apenas a alguns abandonados ou a todos aqueles que por alguma desgraça são abandonados em todas as formas de desgraça e de abandono?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - A todos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Recuso-me a fazer uma interpretação restritiva do texto constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, o que está no texto constitucional é "os abandonados", não são as formas de abandono que se geram no seio família. Não é! Isto são formas de abandono, não são crianças abandonadas.
O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, salvo a mim, devo confessá-lo, e à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, não impressionou os restantes membros da Comissão. E temos de constatar os factos.
Portanto, a proposta não tem o acolhimento do PS e do PCP.
Agora, resta saber se mantendo…
Ó Sr.ª Deputada Odete Santos, o PCP elimina a particularização aos órfãos e abandonados do n.º 2, mas autonomiza-a no n.º 3!
O Sr. José Magalhães (PS): - Claro.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sim, Sr. Presidente, mas expliquei que fizemos esta separação por nos parecer que a redacção do n.º 2 ficava um pouco complicada.
Agora, penso que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto fez uma observação que me parece de acolher - e eu iria pensar nela -, que é redigir…
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, parece-me que está a adiantar-se, porque, até agora, ainda não houve abertura para a sua proposta, nem como artigo autónomo nem como número autónomo.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Então, nesse caso, calo-me.
Risos.
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, devo dizer que, por exemplo, não gostaria de ver a Constituição com mais um artigo ou com mais um número.
No entanto, desde já declaro aberta à consideração a proposta da Sr.ª Deputada Odete Santos do PCP, quanto ao aditamento de um número ou de um artigo para a protecção especial aos menores em situação de risco social, nos termos em que foram apresentados e que constam da proposta do PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, creio que a proposta que o Grupo Parlamentar do PS apresenta, e que é tributária da mesma preocupação, faz, de forma económica, aquilo que o PCP adianta com o carácter de uma espécie de codex constitucional dos menores em situações de risco e ainda por cima, ao alinhar e definir incumbências especiais do Estado, o faria com um grau de pormenor que está inteiramente alheio ao resto da narrativa constitucional, designadamente à que diz respeito às crianças em geral, as quais, com situações várias dos meios familiares e de carências, também têm direito a acompanhamento de famílias, a um sistema educativo decente, a, em certos casos, serem colocadas e adoptadas, porque há situações anómalas que podem, em geral, justificar isso, sem serem as situações de risco em sentido técnico, ao serviço de apoio, etc. Haveria, provavelmente, uma desproporção de códigos, de protecções e de densificações que não têm vantagem.
De tudo isto, extraímos a ideia de que a preocupação constitucional, em relação às crianças em risco, deve ser marcada e consagrada, evidentemente, com todas estas implicações para o legislador ordinário - todas estas e talvez outras.
O Sr. Presidente: - Portanto, estão em discussão duas formas de referência constitucional às crianças menores em risco: a fórmula económica do PS, constante do mero acrescento no n.º 2 "ou em risco", e a fórmula magna do PCP constante no artigo 69.º-A.
Srs. Deputados, gostaria que me dissessem qual delas preferem ou se nenhuma.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, face à não abertura do Partido Socialista para retirar a particularização, como o Sr. Presidente lhe chamou, no sentido de alargar o conteúdo da norma, é evidente que o PSD fica reduzido a estar ou não receptivo a acrescentar na particularização os menores em risco.
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Como a razão da apresentação da nossa proposta era já a de pressentir que esta particularização era redutora e estava curta, é evidente que o PSD está receptivo a qualquer alargamento, nomeadamente um tão genérico, como o das situações de risco, que, potencialmente, pode atingir as situações familiares. Assim, quanto ao acrescento a que, neste momento, penso eu, estamos reduzidos a equacionar no n.º 2 do artigo 69.º, o PSD manifesta a sua abertura.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso quer dizer que não dá acolhimento à proposta magna do PCP?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à proposta magna do PCP, devo dizer que achei perfeitamente pertinentes as observações que, há pouco, a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto fez num percurso rápido sobre os vários conteúdos das respectivas alíneas.
De facto, parece-me que o esforço do PCP, em tentar densificar as incumbências especiais do Estado relativamente aos menores em risco, acabou por só ser concretizado pelo recurso a uma série de matérias que, de facto, melhor caberiam noutras sedes.
Portanto, a conclusão que o PSD faz nesta matéria, por concordar com as observações que foram feitas, é que, nesta sede, o que deve estar é a regra geral, a de que incumbe ao Estado o dever de assegurar uma especial protecção às crianças em risco. As formas como essa especial protecção se desenvolve tocará, seguramente, vários aspectos, alguns, relevantes, daqueles que aqui estão, mas até a própria Sr.ª Deputada Odete Santos é capaz de ter a humildade, no bom sentido, de reconhecer que, porventura, não ficam esgotados no elenco que apresenta.
Portanto, o PSD, nesta matéria, preferia deixar a regra geral e não se aventurar numa explicitação, que, por um lado, pode ficar não taxativa e, por outro, tem os inconvenientes que já foram observados pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, que são os de invadir matérias que, porventura, ficariam melhor em sede de outros artigos.
Portanto, a nossa posição quanto a isso é desfavorável.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, começo por dizer que tenho tanta humildade que há pouco comecei a dizer que as observações feitas pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto eram de acolher, mas, depois, foi-me dito que a proposta não tinha sido acolhida, pelo que a minha intervenção não fazia sentido.
A humildade é tanta que vou acrescentar que, então, aceito a fórmula genérica proposta pelo PS, porque entendo…
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, é comum ao proposto pelo PCP para o n.º 1 do artigo 69.º-A.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exactamente, é comum.
Mas, como eu estava a dizer, entendo que deve ficar essa fórmula da especial protecção das crianças em risco.
O Sr. Presidente: - Fica adoptado, por generalizado acolhimento, o acréscimo de uma referência particular à especial protecção das crianças em risco…
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, a fórmula proposta pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, como substitutiva de "os órfãos e os abandonados", "as crianças privadas de meio familiar (…)", parece-me uma formulação interessante.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração a sugestão, apresentada pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, de substituir a fórmula "os órfãos e os abandonados" por "particularmente as privadas do meio familiar normal", que tem o acordo da Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - É um conceito mais abrangente.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, concordo até porque os órfãos… Há pouco dei comigo a pensar que há órfãos…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Há órfãos e órfãos!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - … que já estão integrados em famílias, e não é por isso que deixam de ser órfãos.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Exactamente.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Portanto, não devem merecer nenhuma particularização.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não é uma qualidade que justifique logo uma particularização.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente. A normalidade do acolhimento familiar é que deve ser o "nó górdio".
Portanto, concordo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é uma matéria em que há, tanto na lei ordinária como na doutrina, naturalmente, e na literatura da especialidade, correntes, escolas e múltiplas boas razões a favor de cada uma das expressões.
Creio que, nesta matéria, a ideia de respeitar patamares constitucionais e conceitos adquiridos e aditar a esses conceitos outros conceitos, enriquecendo, em vez de fazer ablações globais em função de correntes, escolas e outros conceitos respeitáveis. Passei interessantíssimas horas, ainda esta semana, na Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, a discutir a situação jurídica de crianças privadas de meio familiar.
Aditar a expressão "meio familiar normal" tem o voto a favor de algumas correntes de opinião e não tem de outras correntes.
Portanto, Sr. Presidente, não estamos fechados, temos a preocupação de não prejudicar conceitos adquiridos, de aditar-lhes outros já aprovados e não de substituir os actuais conceitos, já aprovados, por outros muito indeterminados e, menos ainda, polémicos.
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É uma atitude de "conservação positiva".
O Sr. Presidente: - Isso traduz a não adesão do PS a esta sugestão.
O Sr. José Magalhães (PS): - A expressão é positiva, é interessante, mas suscita alguns problemas.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas é preferível a órfãos!
O Sr. José Magalhães (PS): - Bem, a expressão "órfãos" tem um sentido jurídico muito preciso no Direito Civil, com todas as suas implicações.
Sei que há órfãos ricos, Sr.ª Deputada, e protegidíssimos e felicíssimos.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não há só ricos, há órfãos que têm outros familiares que os apoiam.
O Sr. José Magalhães (PS): - Até sei que há órfãos que, em circunstâncias um pouco bizarras, são causa da sua própria orfandade. Há todas as situações possíveis, mas não é isto que o texto constitucional visou salvaguardar.
O Sr. Presidente: - A posição do PS é, para já, a de não acolhimento à proposta nestes termos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Vamos ponderar.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para encerrar a discussão do artigo 69.º, temos ainda de analisar uma proposta de aditamento de um n.º 4, do PSD, que tem a seguinte redacção: "O Estado estimula a existência de estruturas de guarda das crianças, por forma a garantir a conciliação do trabalho profissional dos pais com o cumprimento dos seus deveres familiares".
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes para apresentar a proposta.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, como acabou de dizer, quanto ao objectivo não carece de explicitação. De resto, já tínhamos discutido isto a propósito de outras matérias aqui, na Comissão.
Quanto ao texto, registei a dúvida do Sr. Presidente quanto à palavra "guarda". É evidente que o objectivo fala por si, com uma grande clareza.
Não se trata aqui de alterar uma palavra ou um register da Constituição mas, sim, de inserir um novo número, e, se houver receptividade para ele, a abertura é total quanto à sua formulação nos termos que forem entendidos mais adequados pelos outros grupos parlamentares.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, temos grande simpatia por tudo o que implique reforço de níveis de protecção, mas não gostaríamos de incorrer em redundância.
O artigo 67.º, n.º 2, alínea b), estatui claramente que incumbe ao Estado promover a criação daquilo que, com uma terminologia específica, constitui precisamente "estruturas de assistência materno-infantil" - expressão que seguramente é melhor do que a de "guarda das crianças", que tem sempre os ecos carcerários, que estão, obviamente, fora do pensamento do PSD e do nosso.
Agora, a proposta da PSD tem a sua pepita na alusão à garantia da conciliação do trabalho profissional dos pais com o cumprimento dos seus deveres familiares. Mas esta pepita, Sr. Presidente, já estaria seguramente ou provavelmente no artigo 68.º, que regula a protecção da paternidade e maternidade. E nessa sede inseriremos, com muita facilidade, a alusão à útil e necessária conciliação do trabalho profissional dos pais com o cumprimento dos seus deveres familiares, coisa que obviamente este nosso horário de trabalho impossibilita consideravelmente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, é um pouco para dizer o mesmo que o Sr. Deputado José Magalhães.
Penso que a rede de equipamentos sociais de apoio à família contempla obviamente estes aspectos, o que seria uma redundância, e que a segunda parte também estaria melhor na protecção da maternidade e paternidade.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, está manifestamente deslocado aqui, neste artigo 69.º, que se refere às crianças, porque este n.º 4 diz respeito à conciliação da vida profissional dos pais, na óptica das mães e dos pais, e da sua realização pessoal e profissional. Portanto, está manifestamente desajustado, e parece-me uma redundância face ao que já consta na Constituição. Tem sido considerado que a Constituição já atribui uma incumbência ao Estado de garantir as infra-estruturas de guarda das crianças.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, recordo apenas que, face à proposta do PSD, mereceu o acolhimento do Partido Socialista, a inclusão, na alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º, do inciso "a organização do trabalho deve permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar".
A segunda parte desta proposta do PSD ficou salvaguardada pela aceitação do Partido Socialista desta proposta no artigo 59.º, e a primeira parte, como a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto referiu, consegue - e o PSD reconhece isso - ser salvaguardada pelo artigo 67.º. A grande intenção do PSD era juntar as duas valências, como a segunda parte acabou por ficar salvaguardada no artigo 59.º, o PSD reconhece, de facto, que, face ao trabalho que já tínhamos feito no artigo 59.º, esta precisão aqui é excedentária.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminamos o artigo 69.º.
Retomaremos os nossos trabalhos amanhã, às 10 horas, pelo artigo 70.º - Juventude.
Está encerrada a reunião.
Eram 00 horas e 35 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL
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