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Quinta-feira, 17 de Outubro de 1996 II Série-RC - Número 40

VII Legislatura 2.ª Sessão Legislativa (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional

Reunião de 16 de Outubro de 1996

SUMÁRIO

A reunião teve início às 10 horas e 20 minutos.
Procedeu-se à discussão dos artigos 124.º, 125.º, 127.º, 128.º, 129.º, 135-A, 143-A e 136.º constantes dos diversos projectos de revisão constitucional.
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Presidente (Vital Moreira), os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Osvaldo Castro (PS), Barbosa de Melo (PSD), João Amaral (PCP), José Magalhães (PS), Jorge Ferreira (CDS-PP), Francisco Martins (PSD), António Filipe (PCP) e Pedro Passos Coelho (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 12 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente (Vital Moreira): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 125.º da Constituição, que diz o seguinte: "São elegíveis os cidadãos eleitores, portugueses de origem, maiores de 35 anos". Para este artigo existe uma proposta de alteração do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, ao abrigo da metodologia que V. Ex.ª tem estipulado para estas reuniões, queria retomar o artigo que foi visto ontem e que, na minha ausência…

O Sr. Presidente: - Qual?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O artigo 124.º.

O Sr. Presidente: - Está encerrado, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, tem sido acertado que nós, na reunião seguinte, podemos voltar atrás na discussão de assuntos que…

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado! O que está assente é que, quando algum artigo se ultrapasse por não estarem cá os proponentes, se volta atrás, mas não foi esse caso.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, estive ausente na reunião de ontem…

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, mas o PSD não esteve ausente!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Eu sei!

O Sr. Presidente: - Portanto, a questão foi discutida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se não me deixa falar sobre o artigo 124.º, pedia-lhe autorização para fazer uma declaração política.

O Sr. Presidente: - Pode fazer a declaração política que quiser, Sr. Deputado, a título perfeitamente excepcional e sem precedente.
Aquilo que o Sr. Deputado está a pedir não tem precedente, não está de acordo com as regras e penso que não tem qualquer justificação. Mas, como apesar de tudo, não quero limitar a capacidade de intervenção dos Deputados, não o vou impedir de falar, peço, no entanto, que não aceite isto como o exercício de uma faculdade que lhe assiste, porque, de facto, até agora, não tem existido.
Aquilo que tem acontecido é que, quando há propostas relativamente a artigos em cuja discussão os proponentes não estejam presentes e os artigos tenham sido ultrapassados, então os partidos têm a faculdade de fazê-las discutir no dia seguinte. Ora, este não é o caso, uma vez que esta questão foi discutida e as conclusões foram apuradas.
Agora, se o Sr. Deputado entende que é uma questão de honra fazer uma declaração política, pode fazê-la, mas peço que seja breve.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não é por uma questão de honra. Agradeço-lhe ter-me dado a palavra, mas, já agora, em relação à sua intervenção, queria acrescentar que não é uma questão de honra.
De facto, ontem, quando foi suspensa a reunião, a meio da tarde, por causa da audiência marcada com o Sr. Professor Jorge Miranda, não fiquei com a noção de que a reunião se retomaria depois e isso foi uma situação excepcional.
De facto, como o Sr. Presidente sabe, não tem sido comum esse tipo de situações na Comissão. Tratou-se, repito, de uma situação excepcional a audição de ontem, a meio da reunião, com o Sr. Professor Jorge Miranda e eu não pensei que os trabalhos fossem retomados.
Sr. Presidente, penitencio-me por isso, eventualmente, mas, de facto, foi uma situação sui generis. Não se trata, portanto, de uma questão de honra.

O Sr. Presidente: - Está ultrapassadíssimo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, soube hoje de manhã que ontem, no final da reunião, ainda se discutiu o artigo 124.º.
Ora, relativamente a este artigo, ainda não falei como Sr. Deputado Barbosa de Melo, mas falei já com o Sr. Deputado Francisco Martins, meu colega de bancada, que me informou sobre a discussão de ontem.
Queria deixar claro que, independentemente de, em termos de conteúdo, entender que os emigrantes devem votar necessariamente ao lado de todos os outros cidadãos nacionais e em igualdade de circunstâncias nas eleições de âmbito nacional, nomeadamente na eleição do Presidente da República e que qualquer avanço nessa matéria é sempre um avanço de conquista de direitos fundamentais dos cidadãos, e, nesse sentido, o PSD só se pode congratular, politicamente o PSD não aceitará em definitivo na discussão da alteração da Constituição qualquer alteração ao actual texto que não seja a da consagração real e efectiva dos direitos de todos os emigrantes em situação de plena igualdade.
Independentemente de quaisquer considerações relativamente a ganhos ou a avanços, o que é evidente, politicamente, para o PSD é que a alteração da situação não pode ser feita criando-se aí... Ou melhor, não se pode alterar a Constituição apenas para criar a ilusão política de que se está a ir ao encontro do desejo, que, do nosso ponto de vista, é um direito fundamental dos cidadãos nacionais que residem no estrangeiro.
Portanto, nunca aceitaremos, em termos definitivos, uma alteração à Constituição que não seja a da consagração, sem qualquer tipo de divisão entre os cidadãos nacionais residentes no estrangeiro. A posição do PSD sobre essa matéria decorre de um discurso político e de uma atitude de reivindicação política com muitos anos, e não será, seguramente, com o aval do Partido Social-Democrata que se tentará iludir a situação em termos de revisão constitucional, dando a ideia de que se acabou com a memorização a que estão votados actualmente os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro em eleições como a do Presidente da República. Não pactuaremos com alterações que tragam essa ilusão.
Ou há, de facto, disponibilidade para acabar, pura e simplesmente, em termos de direito, criando o direito na própria Constituição, com a discriminação negativa que lhes é feita, independentemente de, depois, ter de se encontrar em termos de lei eleitoral e de recenseamento os

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mecanismos adequados para garantir a seriedade e a correcção do acto eleitoral que se venha a realizar para esses nacionais, ou então...
É que, independentemente de tudo isso, para nós, mexer na Constituição só pode ser sinónimo de acabar com a discriminação, não pode ser sinónimo de aumentar diferenças, de criar novos graus. Costuma dizer-se que os emigrantes são cidadãos de segunda, ora, nunca aceitaremos que o texto constitucional crie uma terceira categoria e passe a haver emigrantes de segunda e emigrantes de terceira.
Portanto, esta posição que fique clara. Tenho pena de não ter podido participar no debate deste artigo 124.º.
Mas, para que não haja interpretações menos exactas sobre aquele que é o pensamento do PSD sobre esta matéria, pedi ao Sr. Presidente para fazer esta declaração, apenas para deixar em acta que o PSD só aceitará mexer neste artigo da Constituição em definitivo, independentemente de todas as considerações sobre avanços ou não avanços nesta matéria, em votação final, com uma alteração que, pura e simplesmente, acabe com a diferenciação. Não aceitaremos soluções ilusórias.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, está esclarecida a posição do PSD.
Passamos, agora, ao artigo 125.º, relativamente ao qual há uma proposta do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho que diz: "São elegíveis os cidadãos eleitores, portugueses de origem, maiores de 18 anos". Bom, não sei esta proposta é para ser levada a sério...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só o próprio é que pode defendê-la!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ontem levantei uma questão para o caso, que aparentemente não se irá verificar, face à última declaração, de ser aberta a possibilidade de participação eleitoral dos cidadãos residentes fora do território nacional, pois, se isso viesse a verificar-se, a meu ver, teria de se encarar a possibilidade das suas repercussões sobre o artigo 125.º, já que ele hoje está feito, obviamente, em congruência com o artigo 124.º.
Portanto, no caso de haver participação de portugueses residentes no estrangeiro, o problema que se põe é se eles também podem ser candidatos à Presidência da República e isso decidir-se-á face à opção que for tomada quanto ao artigo 124.º.
Da minha parte fica feito o memorando para a interligação necessária entre os artigos 124.º e 125.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, permita-me uma precisão, para ver se entendi exactamente aquilo que acabou de dizer.
Do seu ponto de vista, portanto, o problema do artigo 125.º abrange também a capacidade eleitoral passiva?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que o artigo diz hoje é que é candidato quem é eleitor. Ora, se vai alargar o universo dos eleitores alarga também o universo dos candidatos. Quero saber se os partidos que propuserem o alargamento do universo dos eleitores querem também o igual alargamento do universo dos candidatos e, portanto, se o cidadão nascido nos Estados Unidos, de terceira geração, senador americano e, porventura até Presidente da República americano, pode ser candidato às eleições da República Portuguesa. É essa a questão que estou a pôr. Como o problema do artigo 124.º não está resolvido…

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro que, pela proposta do PSD, pode!

O Sr. Presidente: - Pode! Este problema ainda não está assente, de qualquer modo equaciono o problema de saber exactamente se os Deputados que propuseram isso admitem que, para o alargamento da capacidade eleitoral activa, vale igual alargamento para a capacidade eleitoral passiva. Não vale a pena discutir isso hoje, porque o artigo 124.º ficou em stand by.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, mas posso, desde já, aproveitando a questão que V. Ex.ª lança para a Mesa, dar a opinião que temos sobre a matéria.
É evidente para nós que, dentro do princípio que penso que ficou perfeitamente claro, que é o pensamento do PSD sobre esta matéria, não deve haver qualquer menorização dos cidadãos nacionais qualquer que seja o local da sua residência. Ora, esse princípio aplica-se quer à capacidade eleitoral activa quer à passiva, independentemente de uma ou outra especificidade que possa haver em situações em concreto.
Devo dizer que não tenho problema absolutamente nenhum, pelo contrário, em ver, de hoje a amanhã, um cidadão emigrante português no estrangeiro, que mantenha a cidadania nacional, candidatar-se à Presidência da República, penso até que esse é um direito fundamental que lhe assiste…

O Sr. Presidente: - Mesmo que tenha a cidadania de um outro país ou do país onde reside?!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mesmo que não fale português, por ser da 5.ª geração!

O Sr. João Amaral (PCP): - E mesmo que não saiba onde é Portugal!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém quer falar mais?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, levemos as coisas a sério!
Pode terminar a sua intervenção, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É por estar a levar as coisas a sério é que eu acho que o Sr. Presidente me devia deixar falar.

O Sr. Presidente: - Está a falar! E até já lhe dei a palavra à bocado, quando, na verdade, podia não lha ter dado. Sr. Deputado, não invoque essa questão! Pode continuar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É evidente que, se o cidadão tem a nacionalidade portuguesa, tem o direito de se candidatar aos órgãos constitucionalmente previstos em termos de elegibilidade pela Constituição Portuguesa. Essa é uma posição de fundo, que não tem, do nosso ponto de vista, qualquer tipo de contestação.
A submissão ao sufrágio eleitoral é que fará com que, depois, a globalidade da comunidade nacional e dos eleitores nacionais afiram da valia e da capacidade desse seu cidadão compatriota em assumir ou não determinado tipo

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de funções. É essa decisão soberana da parte do eleitorado português que o PSD defende e não qualquer consideração apriorística sobre a capacidade maior ou menor de um qualquer cidadão nacional para exercer um determinado cargo.
A questão devia ser colocada ao contrário, ou seja, porque é que a um cidadão, sendo nacional, à partida e a priori, pode ser feito um juízo sobre a sua incapacidade para exercer uma função em que ele democraticamente se pretende candidatar. Sendo cidadão nacional, penso que ele está no seu legítimo direito e caberá, única e exclusivamente, ao eleitorado português, ao povo português, soberanamente decidir se sim ou não esse seu compatriota reúne ou não as condições necessárias para exercer o cargo a que se candidata. Para nós, isso é a essência da democracia.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado, portanto, está contra o actual artigo 125.º da Constituição, que deveria determinar "são elegíveis os cidadãos eleitores". Isso é uma discriminação antidemocrática contra os cidadãos que não nasceram portugueses?

O Sr. José Magalhães (PS): - Contra os cidadãos portugueses não de origem?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ó Sr. Presidente, manifestei uma posição de fundo da nossa parte.
Como o Sr. Presidente sabe há, depois, também, relativamente a cidadãos nacionais, no que se refere à capacidade eleitoral passiva, algumas regras que, obviamente, terão de ser preenchidas e analisadas caso a caso.

O Sr. Presidente: - Questões que estiverem na Constituição!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à primeira questão de fundo colocada ao PSD sobre a capacidade eleitoral passiva de cidadãos emigrantes, a nossa posição é aquela que expressei. Se o Sr. Presidente quer começar a ver em pormenor o que é que se faz relativamente ao problema da idade e da origem, como vem aqui no artigo 125.º, podemos entrar nessa discussão, mas a primeira questão que foi colocada não foi essa, foi a outra.

O Sr. Presidente: - Não, é essa! A Constituição é que determina as inelegibilidades. Ora, se a Constituição as não prever, a lei não pode estabelecê-las. É tão simples quanto isso! Não tergiversemos sobre questões tão simples quanto estas!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A primeira questão que foi colocada, Sr. Presidente, foi a questão de saber se, do ponto de vista do PSD, os emigrantes poderiam ou não ter capacidade eleitoral passiva. A resposta está dada! Se agora quer analisar outra questão, evidentemente que o PSD terá também uma posição sobre as outras questões que o Sr. Presidente colocar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a forma como o Sr. Deputado Luís Marques Guedes deu réplica às questões suscitadas deixa-me muitas dúvidas sobre a prévia consideração pelo PSD de algumas dessas questões, designadamente a que foi deduzida pelo Sr. Presidente. E a forma como acabámos de ter, para efeitos de acta, a resposta de chofre a essa pergunta, francamente não me conforta quanto à fundamentação, solidez e boa forma de equacionar a questão e deixa-me, sobretudo, dúvidas de que o PSD tenha uma posição deste tipo sobre esta matéria.
Portanto, faço votos de que não tenha e de que venha a considerar todas as consequências e todas as implicações de uma boa solução para aquilo que consideramos um passo sério, prudente e efectivo e não uma ilusão. Mas, obviamente, nada disso é compatível com a precipitação, com a rigidez maximalista e com as respostas de chofre a questões que sofrem de grande complexidade jurídico-constitucional e que não podem ser resolvidas de uma assentada e menos ainda de uma penada.
Temos pena que seja assim! Deixemos passar algum tempo. Pensemos colectivamente, ajudemo-nos reciprocamente e ultrapassemos os maximalismos e as simplificações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, queria subscrever o que acaba de ser dito pelo Sr. Deputado José Magalhães, mas também acrescentar uma outra questão, que tem a ver com o seguinte: o Sr. Deputado Luís Marques Guedes começou a reunião com uma declaração, dizendo que só aceitaria uma alteração ao artigo 124.º com aquele conteúdo, o voto dos emigrantes, desde que isso correspondesse àquilo que o PSD entende que é o normal reconhecimento do direito de voto dos emigrantes, do ponto de vista do PSD.

O Sr. Presidente: - Desde que fosse aprovado!

O Sr. João Amaral (PCP): - E o que pergunto é isto: significa isso que só aceita essa proposta também com esta implicação no que toca à elegibilidade? Isto é: só aceita a alteração desde que não só seja reconhecido o direito de voto, como também o direito de ser eleito a todo esse universo de eleitores? É que se a proposta é configurada nesses termos, então, queremos dizer que é, de facto, uma proposta que não foi sequer pensada; é para efeitos eleitoralísticos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Posso responder, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Pode, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, respondendo directamente à questão que me foi colocada pelo Sr. Deputado João Amaral, diria o seguinte: aquilo que ficou claramente expresso na primeira questão que foi suscitada genericamente, na sequência da minha intervenção, ou melhor, na sequência das considerações que o Sr. Presidente lançou sobre o artigo 125.º, é a posição de fundo do PSD sobre o problema da capacidade eleitoral dos emigrantes.
Como o Sr. Deputado entendeu - e penso que toda a gente entendeu e não vale a pena tentarem alterar aquilo que é o pensamento do PSD, que, de resto, é conhecido há anos -, a posição do PSD é que não pode haver qualquer discriminação, qualquer diferença essencial.

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Se o conteúdo da sua pergunta tem a ver directamente com o saber se há ou não regras, como, por exemplo, o que está aqui no artigo 125.º sobre a idade ou sobre a origem dos cidadãos, que se aplicam ou não aos emigrantes, a resposta está-lhe dada pelo princípio da não discriminação. Se isso for uma regra que se aplique a todos os cidadãos portugueses, independentemente do sítio onde residam, é evidente que, nesse ponto de vista, não haverá discriminação.
Portanto, o PSD não terá nenhum óbice a qualquer regra que se aplique de uma forma perfeitamente igual a todos os cidadãos nacionais. Se houver uma regra que não se aplique de uma forma igual, por força dos cidadãos serem emigrantes, não residirem no território nacional, aí é que o PSD diz, como sempre disse, que há discriminação e que não concordamos ela. Assim, não aceitamos alterações à Constituição que dêem a ilusão de acabar com essa discriminação sem acabar com ela de facto.
Completamente diferente, como é evidente, é a situação de uma regra sobre capacidade eleitoral. Como referi aqui genericamente, há outras regras que decorrem da lei eleitoral em termos de capacidade eleitoral passiva, mas se elas forem iguais para todos os cidadãos, quer em termos de idade, quer em termos da origem, quer em termos, eventualmente, de determinado tipo de impedimentos ou incapacidades que resultem da lei eleitoral, e que sejam regras que se apliquem de uma forma perfeitamente igual a todos os cidadãos nacionais, sem discriminação entre aqueles que residem no território nacional e os que residem no estrangeiro, então o PSD não tem qualquer óbice.
Poderemos discutir a bondade das soluções, como penso que o PCP e todos os outros partidos também as discutirão. O que não aceitamos é uma discriminação, ou seja, que haja regras que impedem sobre uns e não sobre outros.
Penso que respondi com toda a clareza à questão que o Sr. Deputado me colocou.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 127.º, para o qual existe uma proposta de alteração do PS para o n.º 1.
O texto actual diz que "As candidaturas para Presidente da República são propostas por um mínimo de 7500 e um máximo de 15 000 cidadãos eleitores" e o PS propõe a elevação do mínimo de 7500 para 10 000.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a proposta auto-explica-se. Se entendemos que hoje devemos subir, não excessivamente, o limiar mínimo para solidificar a natureza e, em certo sentido, filtrar - é esta a expressão apropriada - as iniciativas tendentes a candidatar cidadãos a um cargo tão alto e tão relevante, não é, na óptica da filtragem, verdadeiramente um patamar que signifique uma mudança qualitativa é, sim, um ligeiro agravamento que, de forma alguma, não causará entraves à livre iniciativa dos cidadãos nem trará qualquer distorção em termos de candidaturas.

O Sr. Presidente: - Melhor dizendo, é para evitar a banalização das candidaturas prejudiciais!

O Sr. José Magalhães (PS): - Diria mesmo a perversão!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração esta proposta do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, posso colocar uma questão?

O Sr. Presidente: - Claro, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, com toda a franqueza, para entender melhor o objectivo, esta elevação do mínimo decorre de alguma necessidade de ajustamento face a alguma situação similar de propostas que tenham sido feitas noutra parte da Constituição?

O Sr. José Magalhães (PS): - Esta proposta, Sr. Deputado, foi concebida por nós bem antes, aliás, de outras questões de iniciativa se terem suscitado a propósito de outros temas da Constituição.
Creio que ela vale por si e é o resultado de uma reflexão sobre a maneira como, em Portugal, têm decorrido, em vários momentos, os processos de apresentação de candidaturas e haver, aqui ou além, sinais de um acordar para o uso banalizador de alguns sectores.
Felizmente isso não teve uma extensão chocante até agora em Portugal, mas esta pequena cautela, se quiserem, a cautela de garantir mais 2500 vontades é o que nos parece ser uma medida singela de prudência.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, face a esta explicação do PS, com toda a franqueza não… O Sr. Deputado José Magalhães terminou agora a sua intervenção com a expressão "uma medida singela de prudência". Sinceramente, que me recorde assim de repente, em nenhum acto eleitoral para a Presidência da República resultou do facto de o actual texto prever um mínimo de 7500 assinaturas uma qualquer utilização excessiva ou abusiva deste mecanismo para a formulação de candidaturas pouco reconhecidas ou pouco queridas pelo conjunto dos cidadãos eleitores.
Portanto, com toda a franqueza, não estou a perceber muito bem a necessidade de incluir aqui alguma prudência. A história até demonstra, porque já tivemos cinco actos eleitorais para a Presidência da República - dois do General Ramalho Eanes, dois do Dr. Mário Soares e um do Dr. Jorge Sampaio - e, que me recorde, sinceramente, nunca esta norma teve como resultado uma utilização "perversa".
Portanto, não percebo bem esse argumento da prudência, mas, enfim, também, aparentemente, nada há que nos leve a dizer liminarmente não, mas, com franqueza, pela argumentação expendida pelos proponentes, não fiquei muito convencido da vantagem ou da necessidade de fazer esta alteração no texto constitucional.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas fazer uma apreciação muito simples, uma vez que a proposta, como já foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães, apenas visa uma alteração qualitativa. É apenas a alteração de um número mínimo para outro, que não é muito distante, e, portanto, creio que se configurasse a possibilidade de alguém querer brincar com uma candidatura presidencial, recolhendo as 7500 assinaturas para esse

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efeito, não era a passagem de 7500 para 10 000 que tornaria isso impossível… Claro que era mais difícil, mas não era impossível! Era sensivelmente a mesma coisa!
Por outro lado, tendo sido apresentada como uma medida de prudência, de facto, não temos na história das candidaturas nada que justifique muito essa necessidade de prudência.
Recordo que, nas últimas eleições, houve o anúncio de umas candidaturas, enfim, de várias profissões, de pessoas que debitaram para os jornais e para as televisões a sua intenção de se candidatarem, mas, depois, não formalizaram a sua candidatura, porque eram precisas 7500 assinaturas com reconhecimento, creio eu, ou, pelo menos, com o número de cidadão eleitor... O processo ficou sem efeito, porque é bastante complicado de fazer.
Portanto, não vejo grande necessidade de isto ser alterado, tanto mais que pode ter um efeito perverso, porque, publicamente, pode dar-se a ideia de que se quer dificultar.
Agora, há um outro elemento, que não foi aqui trazido, que eu temo que também tenha estado subjacente a esta proposta, que é o de dar coerência a um conjunto de situações em que se designe um certo número de candidatos. Não me lembro quantos são, mas recordo-me que, quando se discutiram as candidaturas de independentes para as autarquias, essa questão foi muito debatida.
Não me recordo já porquê, creio que o número proposto era excessivamente alto, creio que eram 10 000 assinaturas para uma candidatura a uma autarquia, quando, dizia-se, para se ser candidato a Presidente da República bastavam 7500 e para se fundar um partido, portanto, para se apresentarem candidaturas à Assembleia da República por todos os círculos eleitorais, bastavam 5000 assinaturas.
Portanto, se há alguma ideia de coerência nisto, então, não estamos na altura de o fazer, talvez mais para o fim destes debates todos, quando tivermos um balanço de todas as situações.
Queria dizer que, sem este elemento de coerência, sendo apenas o da prudência, não vejo vantagem nesta alteração. Havendo esse elemento de coerência, então ele terá de ser explicado com outras propostas e num quadro mais alargado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exacto!

O Sr. Presidente: - O PP quer pronunciar-se sobre a matéria?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sobre a questão das assinaturas? Não ouvi a justificação.

O Sr. Presidente: - A justificação dada pelo PS é a de que com apenas 7500 assinaturas permiti-se, digamos assim, a banalização de candidaturas presidenciais e, portanto, uma ligeira elevação do número de assinaturas dificultaria isso.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, a banalização tem a ver com outros factores e não com o número de assinaturas. Quando me for dada a palavra para apresentar a nossa proposta, falarei, de facto, nos factores de banalização que me parecem mais vastos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta do PS não tem acolhimento, mas também não é liminarmente rejeitada. Fica, para já, com as reservas emitidas pelo PSD, pelo PCP e com a oposição do CDS-PP.
Vamos, agora, passar à proposta do CDS-PP para o n.º 2, segundo a qual não poderia haver desistência de candidaturas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira para apresentar esta proposta.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, o objectivo desta proposta é o de evitar, por um lado, a banalização das candidaturas à Presidência da República, que como todos nós sabemos e o Sr. Deputado João Amaral já referiu, têm um período de folclore… Habitualmente surgem 20, 30, ou 40 potenciais candidatos à Presidência da República que, depois, não concretizam formalmente junto do Tribunal Constitucional a sua candidatura, mas temos também existido a outro fenómeno, que é o de apresentação de candidaturas que, quase simultaneamente com o momento de apresentação, se torna público que não se destinam a ir a sufrágio, mas apenas a prosseguir finalidades adjacentes às finalidades essenciais da eleição e que, do nosso ponto de vista, não só banalizam como descredibilizam a eleição para a Presidência da República.
É por isso que pensamos que, sendo a candidatura presidencial um acto político da máxima responsabilidade, a Constituição deve impedir que essa responsabilização não seja traída por candidaturas cujo propósito seja desistir à boca das urnas, para finalidades legítimas, é certo, mas que, do nosso ponto de vista, conflituam com a credibilidade da eleição. São, regra geral, candidaturas que aproveitam legalmente todas as possibilidades e todos os direitos conferidos aos demais candidatos e que, nas vésperas da data da eleição, desistem de ir a votos e com isso, na nossa opinião, repito, descredibilizam a eleição presidencial.
Pensamos que é um fenómeno negativo que, obviamente, salvo casos de força maior, como problemas pessoais que aconteçam aos candidatos que os impeçam de ir a sufrágio depois de terem formalizado a sua candidatura, não deveria ser permitido. Na verdade, uma vez formalizada uma candidatura à Presidência da República, não deveria ser permitido retirá-la, legitimando com isso, de alguma maneira, um certo logro que se criou no eleitorado, muitas vezes até pela utilização dos tempos de antena e de faculdades conferidas aos candidatos pela lei, que muitas vezes, no momento em que são exercidas, já se sabe publicamente que são candidaturas que não vão concretizar a sua ida até ao final do processo, descredibilizando, por essa via, a eleição presidencial. É essa a razão da nossa proposta.
Mas isto não impede que haja ensaios de candidaturas presidenciais, uma vez que o que prevemos é que, a partir da formalização no Tribunal Constitucional, a candidatura não possa ser retirada. Isto não impede, portanto, o ensaio político de candidaturas e não limita o direito dos cidadãos a candidatarem-se, mas confere um grau suplementar de responsabilidade àqueles que concretizam a sua candidatura, que, em nossa opinião, a partir desse momento, não deverão ter possibilidade de a retirar e deverão normalmente cumprir as finalidades que iniciaram ao apresentá-la, que é disputar as eleições.

O Sr. Presidente: - E também, já agora, para esclarecimento, devia proibir os candidatos de apelar ao voto noutro candidato! Isso também devia ser proibido!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não! Não!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso já é uma limitação de um direito!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, esse era um dos aspectos que ia citar agora. Devo dizer que genericamente, não face ao texto, porque me parece que ele está um pouco empobrecido quanto àquilo que o PSD pensa sobre o assunto, mas face à explicação que o Sr. Deputado Jorge Ferreira acaba de dar, não tenho qualquer dúvida em, desde já, manifestar o apoio ao princípio ou ao objectivo desta proposta do Partido Popular. No entanto, com algumas notas que me permito acrescentar, até relativamente àquilo que o Sr. Deputado Jorge Ferreira acabou agora de explicitar, uma das quais o Sr Presidente avançou.
É evidente, para nós, que, politicamente, não está nem nunca pode estar em causa, numa disposição deste tipo, ou mais concretamente naquilo que a lei eleitoral subsequentemente vier a dispor sobre esta matéria - e já explicarei porque é que falo em lei eleitoral -, qualquer tipo de restrição à total liberdade política de todo e qualquer cidadão expressar a sua opinião sobre um acto eleitoral, nomeadamente sobre a eleição para Presidente da República, sobre o ensaio e a preparação de uma candidatura ou a intervenção política que todos os cidadãos, todos os partidos políticos e todos os grupos de cidadãos têm, porque o que aqui está em causa é uma eleição presidencial e, como sabemos, não são propriamente os partidos políticos que propõem o candidato mas, sim, os cidadãos eleitores que reúnem 7500 ou 10 000 assinaturas para formalizar essa candidatura, conforme os números que ficarem na lei.
Não está minimamente em causa, nem nunca pode estar - é esta a opinião do PSD e penso que também que foi claramente essa que o Sr. Deputado quis expressar - qualquer tipo de restrição.
Agora, há um outro aspecto que o Sr. Deputado Jorge Ferreira não falou e que me permitia acrescentar aqui para reflexão. Desde logo, porque é que me parece evidente que, em resposta à questão que o Sr. Presidente colocou, isso nunca pode estar contemplado? É evidente que o apelo ao voto noutro candidato faz parte de uma liberdade inalienável, em termos políticos, de todo e qualquer cidadão, inclusive de um cidadão candidato, e, portanto, o cidadão candidato não só não está obrigado a votar nele como nem sequer está restringido no seu direito de dizer publicamente que entende que há um candidato melhor do que ele. Essa é uma questão que, do nosso ponto de vista, é intocável em qualquer momento, quer até ao momento da votação, durante o momento da votação e depois do momento da votação. Isso que fique totalmente claro!

Aparte inaudível do Deputado José Magalhães, do PS.

Não, Sr. Deputado! Não torna! Porque há aqui uma questão fundamental. Para além da questão política que foi citada pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, que me escuso de repetir, há ainda uma outra questão que ele não colocou e que eu acrescento, que á a seguinte: para além do mais, a formulação dessas candidaturas, politicamente fraudulentas, têm como consequência um dispêndio perfeitamente desadequado, inapropriado e inaceitável do dinheiro dos contribuintes.
As candidaturas custam dinheiro ao País. A campanhas eleitorais e a utilização de tempos de antena custam dinheiro aos contribuintes e é totalmente inaceitável, do nosso ponto de vista, que, com a premeditação política de não levar até ao momento do voto uma determinada candidatura, estar a abusar-se e a utilizar-se abusivamente - esta é a expressão que me parece mais adequada - o erário público, enfim, o dinheiro dos contribuintes para finalidades políticas que, no caso de não se querer levar até às urnas a respectiva candidatura. Isto, do meu ponto de vista, é totalmente inaceitável e não tem justificação dentro da lógica do por que razão é que há-de o erário público suportar estas campanhas eleitorais, nomeadamente com tempos de antena, com todos os meios que são colocados pela máquina do Estado, pela máquina administrativa ao dispor dos candidatos, meios esses que são pagos pelos contribuintes, para suportar - e bem! - as questões políticas...
Portanto, não há óbice absolutamente nenhum do ponto de vista do PSD que um candidato chegue a páginas tantas da campanha eleitoral e decida apelar politicamente ao voto noutro candidato. É um direito político que lhe assiste, mas ele terá de se submeter a sufrágio, terá de ir até às urnas, terá de ter a votação que o eleitorado decidir atribuir-lhe por força do discurso político que ele fez durante a campanha, porque só assim é que poderá haver verdade.
Portanto, mais do que aquilo que o PP aqui propõe, sugeria que a alteração deveria ser formulada em termos tais que deixasse claro que a não ida até às urnas deveria acarretar, nos termos da lei, um ressarcimento, uma reposição - e, depois, terá que se ver como é que isso se poderá fazer -, porque esses candidatos andam a brincar com o dinheiro dos contribuintes e, do nosso ponto de vista, isso é algo totalmente inaceitável neste tipo de situações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta elucubração é a melhor demonstração de que a proposta tem um objectivo e um alcance e há uma total coincidência entre eles - aliás, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes entrou por ela e saiu noutra...
Trata-se de uma proposta de desafinamento, ou seja, pelo caminho o Sr. Deputado teve que dar um pontapé, porque fez a demonstração de que não é possível materialmente, fisicamente, impedir quem quer que seja de apelar aos seus apoiantes para tacticamente se orientarem para as urnas, para o lado das urnas, para cima das urnas ou para um outro candidato...
Como o boletim de voto captura o retrato, mas não aprisiona a bondade do legislador - isto é um facto -, logo o objectivo que o Sr. Deputado proclama é inalcançável como tal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é!

O Sr. José Magalhães (PS): - Por isso é que evoluiu para uma modalidade de sancionamento civil, suponho eu, de responsabilidade civil de ressarcimento e não por uma proibição que, em si mesma, é inexequível. Não há machado que corte, como sabe,…

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O Sr. Luís Marques Guedes (PS): - É essa posição que está em causa!

O Sr. José Magalhães (PS): - …uma coisa chamada pensamento nem é possível, tal como sucede a quem acredita que as fotografias aprisionam a alma dos fotografados, aprisionar o boletim de voto, a vontade política do candidato!
Portanto, esses objectivos, que, em determinados casos podem ser meritórios, são alcançáveis através da crítica da opinião pública, dos mecanismos legais e no voto, que é a sanção punitiva nessa matéria. Agora, a norma, ficou provado neste debate, é írrita!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agora estou eu inscrito.
Sinceramente, esta proposta não tem o mínimo merecimento, é inaceitável, não tem o mínimo de hipótese... É, obviamente um direito de toda a gente, em qualquer eleição e em qualquer lado. É universal o direito de se candidatar e de se descandidatar! Pode haver candidatos "verdes", gays, minoritários, de comunidades pequenas, que se candidatem apenas para defenderem uma ideia, defender uma candidatura de uma certa ideia e, depois, não quererem ir até às eleições, não se quererem fazer contar. Isso acontece em todos os países. Srs. Deputados, a que propósito é que íamos retirar essa possibilidade!? Isso não tem sentido!
Procurar resolver com uma norma geral constitucional o problema concreto que surgiu nas últimas eleições, isso não tem sentido! Sinceramente, isso seria instrumentalizar, banalizar e degradar a Constituição! Por mim, confesso que nunca acharia possível haver uma proposta desta natureza! Assim, creio que esta proposta não tem o mínimo merecimento, se a expressão me é permitida.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, quero dizer que faz parte dos mecanismos instituídos e normais de qualquer sistema eleitoral e dos sistemas eleitorais aplicáveis a todas as eleições - Assembleia da República, juntas de freguesia, câmaras - o direito de apresentação e o direito de desistência. Está, pois, previsto este direito.
Pergunto: por que é que não há uma norma paralela para os Deputados? E a resposta é simples: é que quer resolver-se administrativamente um problema que é político, é de conjuntura! Pode ser assim ou pode ser o contrário na próxima eleição! Ora, a Constituição não serve para isso! Isto seria uma restrição inaceitável e abstrusa, sem qualquer fundamento, ultrapassando tudo o que deve ser garantido no exercício de direitos fundamentais.
Portanto, da nossa parte, estamos radicalmente contra esta proposta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Martins.

O Sr. Francisco Martins (PSD): - Sr. Presidente, como princípio geral, nada nem ninguém, nenhum cidadão, pode ser coarctado naquilo que são os direitos e liberdades que a lei e, muito particularmente, a Constituição lhe consagra. Agora - e é esta a minha interpretação -, não posso dissociar esta proposta daquilo que é um exemplo prático que não deve existir.
De facto, o último acto eleitoral para as presidenciais, deixou perceber que aquilo que, naturalmente, é um direito de o cidadão se candidatar e de desistir pode ser utilizado para aquilo que considero uma prática abusiva, que é o propósito premeditado, firme e consciente de que uma candidatura em caso algum chegará ao fim. Isso é mau! E é mau porquê? É mau porque tem consequências, porque tem a ver com todos os cidadãos e com os seus interesses. A liberdade de qualquer cidadão termina quando essa mesma liberdade põe em causa as liberdades, os direitos e os interesses públicos de todos. É isso que está em causa!
Já aqui foi sublinhado pelo meu colega Luís Marques Guedes - e é isso que realmente importa - que quaisquer candidaturas que não cheguem ao fim, naturalmente que tiveram como pressuposto, nomeadamente a utilização de tempos de antena, digamos assim, beliscam inevitavelmente o erário público e aquilo que todos, naturalmente, têm de pagar.
Apesar de o Sr. Deputado José Magalhães ter saído, eu gostaria de colocar uma questão - e o PS tem de assumi-la, que é a seguinte: se o PS aceita e está de acordo que, nestas circunstâncias, o erário público, o dinheiro de todos, seja utilizado de uma forma que eu penso que é abusiva e não visa o interesse colectivo. Era esta a questão que gostaria de deixar no ar.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães não está, mas estou eu.

O Sr. Francisco Martins (PSD): - Não é a mesma coisa, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Para este efeito é, uma vez que não estou a falar como Presidente, estou a falar como Deputado, como, aliás, tenho feito ao longo destes trabalhos.
A meu ver, os senhores estão a confundir dois aspectos. A verdade é que a Constituição permite a 7500 cidadãos, que sejam representativos de uma ideia ou de uma corrente, fazerem-se apresentar às eleições presidenciais e defenderem as suas ideias. Esse é um valor democrático! Esse é um valor, em si mesmo, democrático! Tal como acontece para as campanhas para a Assembleia da República, um partido que se candidate e que retire a candidatura, ou se forem admitidas candidaturas de cidadãos que decidam apresentar a sua candidatura e que também gastam tempo de antena, também gastam tempo aos tribunais e, no entanto, os senhores não vai propor isso, de certeza, para as candidaturas à Assembleia da República. Pela mesma razão!
Um valor democrático é também a participação e a defesa de ideias, mesmo que os interessados, depois, cheguem à conclusão que essas ideias não são viáveis ou que não querem fazer contar o apoio que merecem ou querem fazer valorizar esse apoio fazendo-o carrear para um candidato em melhores condições de o defender. Isto é democrático! Pretender delimitar administrativamente a defesa de pontos de vista minoritários é que, a meu ver, é constitucionalmente inaceitável.
Por outro lado, invocar a questão do erário público, sinceramente, é uma questão que até agora nunca foi levantada nem é razoável levantá-la nesses termos. O erário público também serve para defender ideias. O direito de antena serve, aliás, só para defender ideias, nem está ligado só a candidaturas e, no entanto, essa defesa de ideias já é um valor democraticamente protegido, mesmo através do direito de antena!

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O Sr. Francisco Martins (PSD): - Mas os pressupostos da candidaturas visam já não…

O Sr. Presidente: - Mas porque não se isso está à vista de toda a gente!? Quer tirar a possibilidade de esclarecimento e de discernimento dos cidadãos aos cidadãos! Os cidadãos estão lá para discernir…

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, se me permite.
Quem é que ajuíza essa intenção inicial? Isto é: o pressuposto que está colocado na fundamentação que foi apresentada agora é a de que havia um juízo inicial, uma intenção inicial de retirar a candidatura. Isso aplica-se depois a todas as candidaturas que desistem? A consequência é que ninguém pode desistir? Como é que se faz a prova do contrário? É sobre os candidatos que recai a prova depois de que inicialmente não tinham a intenção de desistir e depois tiveram de fazê-lo?
Eu não estou a entrar nesse jogo, porque acho que a questão é de configuração. As candidaturas existem, nos termos em que existem, isto é, são apresentadas no quadro constitucional, como estão definidas, e isso implica para os cidadãos que se candidatam um conjunto de direitos, incluindo fazer campanha e desistir.
Portanto, não é no quadro de uma contabilidade, porque se fossemos utilizar a contabilidade íamos rapidamente mudar este sistema que é caríssimo. Juntávamos a Assembleia da República com um colégio de autarquias e elegíamos o Presidente da República! Saía mais barato! Muitíssimo mais barato! Portanto, não são regimes desse tipo que podem resolver problemas políticos!
Portanto, quando faço esta pergunta não estou a alinhar nos argumentos: como é que faz essa destrinça? Não há maneira alguma! É puro processo de intenções! Faz isso no quadro do puro combate político! Quando se apresenta uma determinada candidatura, por exemplo, uma candidatura de homossexuais, o Sr. Deputado diz "eles não querem ir verdadeiramente às eleições, vão chegar ao fim e vão apelar ao voto livre". Admitamos que eles dizem…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém proíbe!

O Sr. João Amaral (PCP): - … votem em quem quiserem! O Sr. Deputado proíbe essa candidatura de desistir?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro que não!

O Sr. João Amaral (PC): - A que título?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ninguém proíbe!

O Sr. João Amaral (PCP): - Ai ninguém proíbe!?

O Sr. Presidente: - É óbvio que está proibida! Não podem retirá-la!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Vão até às urnas!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vale a pena estarmos em diálogo. Cada partido toma a sua posição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, não posso deixar de fazer algumas observações relativamente a algumas afirmações que ouvi.
Em primeiro lugar, rechaçar liminarmente e com alguma indignação os argumentos que foram avançados contra esta proposta no sentido de que ela é limitativa do direito e da liberdade de candidatura e de expressão política de grupos minoritários e já agora - acrescento eu - maioritários, que normalmente em democracia até são os mais importantes. Isso tem de ficar liminarmente rechaçado.
Em segundo lugar, rechaçar o argumento de que se pretende resolver administrativamente um problema político. Na verdade, na maior parte das vezes verifica-se é que não há problema político algum e, portanto, não há resolução administrativa; o que estamos aqui a tratar é de saber se incluímos na Constituição uma norma relativa ao processo de eleição para o Presidente da República, que não só não é limitativa de direitos como não é nenhuma resolução administrativa de nenhum problema político, isto porque, por um lado, a Constituição não resolve administrativamente problemas e, por outro, porque os problemas políticos são de outra ordem que não desta que estamos aqui a discutir.
O Sr. Deputado João Amaral dizia que a existir uma norma destas ela teria de generalizar-se a todas as eleições. Ora, eu devolvo com este argumento: porque é que não são conhecidas nas outras eleições, seja para a Assembleia da República, seja para as autarquias locais, fenómenos de desistência nas vésperas das eleições?

O Sr. João Amaral (PCP): - Eu não disse isso!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, peço que não mantenhamos o diálogo.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Porque é evidente que o processo complexo político nestas eleições dá infinitamente mais trabalho do que uma candidatura à Presidência da República, que é especialmente atreita à sua utilização sem se chegar até ao fim, como, de resto, se tem visto em vários casos e não apenas no caso de candidatos apoiados pelo Partido Comunista. Há outros casos! Portanto, não estamos aqui a desenvolver argumentação política ad hominem, se bem que compreendamos que o Sr. Deputado João Amaral seja radicalmente contra, para citar as suas palavras.
Por isso, não há, Sr. Deputado João Amaral, que fazer a prova do contrário nos termos em que a pôs, porque, a partir do momento em que os candidatos não possam desistir, não há prova a fazer de que lançaram uma candidatura para desistir. Em todo o caso, quero dizer-lhe que me recordo, nas últimas eleições presidenciais, de ver citadas as afirmações de um candidato à Presidência da República anunciando que a sua candidatura era para desistir e, portanto, melhor prova do que esta julgo que não é possível, se houver lugar a ela, porque é o próprio candidato a assumir que vai desistir.
Quero reafirmar que também, ao contrário do que disse o Sr. Deputado José Magalhães, esta não é uma proposta de sancionamento.
Relativamente às afirmações do Sr. Deputado Luís Marques Guedes devo dizer que elas colocam-se noutro plano que não o constitucional, ou seja, colocam-se no plano legal e, portanto, a nossa proposta, como, aliás, é fácil de verificar pela sua leitura, não tem qualquer sanção adstrita à inovação que pretende traduzir.

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Sr. Presidente, tenho de dizer que inaceitáveis em democracia apenas são as propostas que visem limitar os direitos fundamentais dos cidadãos. Perdoe-me dizer isto, mas esse para nós é o critério da inaceitabilidade das propostas políticas em democracia, ou seja, quando essas propostas limitam a liberdade dos outros e não quando essas propostas responsabilizam e credibilizam os actos de todos os cidadãos na própria democracia.
Portanto, não concordo com os argumentos que foram utilizados, sobretudo com os adjectivos que me pareceram surpreendentemente excessivos para a bondade, diria, objectiva da proposta. Pareceram-me argumentos surpreendentemente excessivos e não quero ler nesse excesso qualquer permissividade relativamente à velha informação desta fórmula, através da apresentação de candidaturas que se destinam a defraudar o eleitorado, uma vez que não pretendem, de facto, atingir o fim a que formalmente se destinam, que é o de serem sufragadas.
Não quero ver nesse gesto qualquer permissividade especial relativamente ao florescimento deste tipo de fenómenos que se fossem generalizados como o são nas eleições presidenciais, e só nas eleições presidenciais, por muito que isso custe, mas é assim mesmo e os factos aí estão para o demonstrar...
De facto, a utilização exagerada por grupos de cidadãos deste mecanismo, que tem sido utilizado por dois ou três cidadãos de vez em quando, criaria um problema grave à credibilidade da eleição presidencial. Portanto, basta pensar nisso para chegar à conclusão de que esta proposta, para além de não ter em si os males que foram referidos por alguns Srs. Deputados, poderá revelar-se até preventiva do ponto de vista do próprio sistema.
Resta-me desejar, uma vez que verifico que não há consenso para que a proposta avance, que daqui a alguns anos, não haja necessidade de a retomar e, porventura, em termos um pouco mais duros do que aqueles que são aventados. Não era a primeira vez que isso acontecia com propostas nossas. Esperemos sinceramente que neste caso isso não venha a acontecer, porque seria sinal de que a eleição presidencial teria sido excessivamente utilizada para este tipo de manobra política.
Acho muito bem que cidadãos que entendem representar e dar voz a causas minoritárias se candidatem à Presidência da República e sufraguem essas causas minoritárias pelas quais se candidatam. Acho muito bem! Acho muito bem que candidatos que acham que devem ser eleitos Presidentes da República para tratar de harmonizar e fazer respeitar o passado dos telhados das casas de Portugal, porque acham que isso é uma causa nobre, que merece um magistério presidencial, que se candidatem, mas que vão até ao fim e assumam o sufrágio, que é aquilo, afinal, que visam quando apresentam a sua candidatura.
Portanto, não está minimamente em causa o facto de um cidadão achar que deve candidatar-se em nome de uma ideia, de uma causa, de um interesse minoritário ou de uma maneira peculiar de viver e de ver o mundo, porque isso não está em causa, mas o que se exige é responsabilidade a quem entende dar esse passo.
Finalmente, acho que deve permitir-se que as pessoas dêem esse passo, mas tem de exigir-se-lhes a responsabilidade de serem consequentes e evitar que se brinque com a eleição do Chefe do Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a nossa discordância está em que eu não vejo nem fraude, nem manipulação, nem brincadeira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Toda a gente sabe!

O Sr. Presidente: - A concepção constitucional das candidaturas eleitorais não é essa! Os senhores é que têm outra concepção e, portanto, entendo que já aqui duas concepções completamente diferentes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria dizer…

O Sr. Presidente: - Por favor, as posições já estão tomadas. Acham que acrescentamos algum coisa, continuando a discussão?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, acho que a discussão é política e há aqui dados políticos…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a quem peço que seja breve.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para além de concordar genericamente com aquilo que foi agora dito pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, há um aspecto sobre o qual tenho de deixar aqui expressa a minha surpresa face ao que foi dito por alguns Srs. Deputados.
Questionou-se aqui a democraticidade - foi este o termo utilizado - de uma norma deste tipo. Para além das explicações que já foram dadas pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, que o que está aqui em causa é uma responsabilização e não minimamente qualquer restrição aos direitos democráticos inalienáveis das pessoas, queria devolver a questão, porque essa devolução é que me parece correcta, para dizer o seguinte: qual é a democraticidade, se é que é possível falar-se em democraticidade, quando, falando obviamente a própria Constituição da República na necessidade de utilização em campanhas eleitorais de direitos de antena, nomeadamente, em tempos equitativos, há um candidato, como toda a gente sabe, porque já houve situações destas em Portugal, que tem um determinado tempo de antena quando o outro candidato objectivamente beneficia de três ou quatro tempos de antena, porque são todos eles utilizados expressa e claramente - não é uma questão de opinião política ou de defesa de uma lógica política - num apelo ao voto em outro candidato?
Se isto não é o defraudar das regras democráticas da equidade, que até são regras constitucionais, durante as campanhas eleitorais, pergunto onde é que está a falta de democraticidade nesta proposta. Onde há falta de democraticidade é na situação actual que é explorada, do meu ponto de vista abusivamente, pelo silêncio da Constituição e da lei sobre situações deste tipo.
É por isso que, claramente, nos parece que a alteração proposta pelo Partido Popular é não só totalmente pertinente como faz falta ao nosso sistema eleitoral, precisamente para devolver a democraticidade que, hoje em dia, em determinado tipo de circunstâncias é posta em causa - e todos as conhecemos, não são etéreas nem suposições insinuantes, são situações objectivas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, vou ser muito breve.

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O Sr. Presidente: - Não vamos gastar tempo com isto! As posições já estão tomadas! Desta maneira, nunca chegaremos ao fim! Se queremos reiterar três vezes o mesmo argumento, como aqui já foi produzido…

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, já cedi ao seu apelo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo Castro.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sr. Presidente, vou ser, como habitualmente, muito breve.
Agora, a verdade é que a democracia tem destas circunstâncias e destas coisas: eu ainda agora vinha a ouvir na rádio que, apesar de o Partido Socialista ter tido uma margem folgada de votos nos Açores, pode vir a ter por diante uma coligação do PSD com o PP, com base nos mandatos e num sistema muito peculiar que existe nas regiões autónomas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é falta de democracia!?...

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não! O que eu estou a dizer é que a democracia…

O Sr. Presidente: - É uma minoria a governar em vez da maioria! Isso é democracia!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O que quero dizer com isto é o seguinte: evidentemente que a candidatura a Presidente da República é uma faculdade atribuída aos cidadãos mediante certas condições, ao conjunto dos cidadãos, não a um, é a um conjunto entre 7500 e 15 000, que resolvem propor uma candidatura. Se esses cidadãos, eventualmente, são defraudados, são apenas esses e não quaisquer outros.
Parece-me que o direito de renúncia à candidatura é um direito indisponível e que, contrariamente ao que o Sr. Deputado Jorge Ferreira pensa, tem-se verificado mais frequentemente do que ele pensa e diz quer em autarquias, quer em legislativas, por razões muitas vezes de saúde. Entre o prazo de candidatura e o prazo de eleição houve certos candidatos que descobriram ou chegaram à conclusão, ou até às vezes por razões de ordem política, que devem renunciar à candidatura.
Nós não podemos retirar esse direito aos cidadãos, portanto parece-me que a regra constitucional, tal com está, está correcta e o que se passa em democracia tem aspectos que alguns poderão não gostar em determinado momento, mas não é isso que está em causa em sede constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 128.º, relativamente ao qual existe uma proposta do PS de eliminação do n.º 4.
Como sou autor desta proposta, permitam-me que a justifique. O actual n.º 4 diz o seguinte: "A data da realização do primeiro dos dois possíveis sufrágios será marcada de forma a permitir que ambos se realizem dentro dos períodos referidos nos n.os 1 e 3". Esta norma, quanto ao n.º 3, é impossível, porque não é possível meter 15 dias num espaço de 10. Portanto, é um claro lapso da revisão de 1989, entre vários dessa revisão.
E, independentemente disso, quanto ao n.º 1, o que ela obriga é que a primeira volta da eleição presidencial tem de ser marcada para 45 dias, pelo menos, antes do termo do mandato presidencial, o que quer dizer que, tal como tem acontecido, temos dois presidentes, um cessante e outro eleito, durante nada menos do que 45 dias, o que não tem paralelo em lado nenhum.
Em termos de Direito Comparado, normalmente o Presidente ou é eleito já depois da cessação do mandato do anterior, que se prorroga para assuntos correntes pelo tempo necessário, ou é eleito uns dias antes, 15 dias antes, no máximo, antes do termo do mandato presidencial.
Portanto, o que o PS propunha, por sugestão minha, é que as eleições presidenciais possam ser marcadas, mesmo a primeira volta, até 30 dias antes do termo do mandato, sabendo-se que, no caso de haver necessidade de segunda volta, elas ainda podem ser realizadas até uma semana antes do termo do mandato, o que, quando muito, irá implicar a prorrogação de uns dias do mandato do Presidente cessante.
Elimina-se desse modo este enorme hiato entre a eleição presidencial e a tomada de posse e a existência de dois presidentes, um em exercício, que ainda está em plena legitimidade, e outro eleito cujas orientações podem ser completamente distintas. E no caso de haver qualquer crise governamental, crise do Estado ou a necessidade de tomada de decisões fundamentais há clara inibição do presidente cessante e o Presidente eleito que ainda não pode ter qualquer intervenção na matéria.
Portanto, a redução da sobreposição de mandatos tem esta situação, a meu ver, vantajosa para a estabilidade democrática. Mas, independentemente disso, como já disse, esta norma não é articulável com o n.º 3, porque, quando o n.º 3 diz que "(...) a eleição efectuar-se-á entre o nonagésimo e o centésimo dia posteriores à data das eleições para a Assembleia da República (...)" quer dizer que em 10 dias não se podem realizar duas eleições, que entre elas têm de mediar 21 dias. Portanto, é impossível realizar o n.º 4 na hipótese o n.º 3.
Quanto ao n.º 1, é obviamente realizável. A eleição presidencial tem de ser marcada, a primeira volta, para...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Entre 60 e 30 dias!

O Sr. Presidente: - Tem de ser marcada para 60 dias, dois meses antes. Portanto, temos dois meses um Presidente eleito e um Presidente cessante.
Esta situação não me parece vantajosa e não tem lugar no Direito Comparado e, portanto, o PS propõe a eliminação do n.º 4, que não causa qualquer prejuízo, pelo contrário, só traz vantagens e elimina uma incongruência grave do actual texto constitucional.
Srs. Deputados, está à discussão esta proposta de eliminação do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas fazer uma pergunta, se me permite.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quanto à necessidade de eliminação do n.º 4, fiquei perfeitamente esclarecido pela exposição do Sr. Presidente.
Já quanto à questão da sobreposição de mandatos, confesso que não fiquei nem esclarecido nem, enfim, convencido - mas quanto ao convencido, lá iria porque é uma questão mais subjectiva. Mas, objectivamente nesta fase, a questão que queria colocar é esta: sinceramente, não

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percebo muito bem por que é que a simples eliminação do n.º 4 altera qualquer coisa relativamente ao problema da sobreposição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, hoje o n.º 1 diz o seguinte: "O Presidente da República será eleito entre o sexagésimo e o trigésimo dia anteriores (...)". Como, para a hipótese da segunda volta, terá de haver três semanas de intervalo, para o Presidente estar eleito até ao trigésimo dia, a primeira volta tem de ser marcada até...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, já estou a perceber!

O Sr. Presidente: - … três semanas mais quatro semanas, portanto, 75 dias, não 45 dias.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só alterando o n.º 4, como é que o Sr. Presidente alcança isso?

O Sr. Presidente: - Porque permite que só a primeira volta seja marcada até ao trigésimo dia. Se houver necessidade de segunda volta, o n.º 1…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, porque o n.º 1 diz "será eleito"!

O Sr. Presidente: - Mas deixava em aberto!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A eleição só ocorre...

O Sr. Presidente: - Tem razão! Não ficava absolutamente ganho esse pormenor!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Salvo melhor opinião, o problema principal põe-se no caso em que há segunda volta, porque não tempo para os 21 dias.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza! Isso já percebi!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isto é uma questão meramente algébrica!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso percebo, mas, sem mexer no n.º 1, não se pode…

O Sr. Presidente: - Mas tirando o n.º 4, o n.º 1 poderia ser interpretado no sentido de marcação da eleição. Isso podia ser.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, não ficaria "será eleito"!

O Sr. Presidente: - Sim, será eleito! Era uma questão de interpretação! Na minha interpretação, chegava-se aí, mas se acham que não, não faço disso questão.
Portanto, proponho a eliminação do n.º 4, independentemente disso. Só pelo valor da incongruência.

O Sr. João Amaral (PCP): - Então, acho que é melhor dizer expressamente o que é que se pretende. A primeira volta da eleição ocorrerá entre tantos a tantos. De outra forma…

O Sr. Presidente: - Sim! Se todos estivermos de acordo em clarificar esse ponto, não tenho qualquer dúvida em tentar encontrar uma redacção para o n.º 1. Se estivermos de acordo em que este objectivo é razoável. Eu penso que é. Esta situação actual que já tivemos em três ocasiões ou quatro…

O Sr. João Amaral (PCP): - Na última eleição foram quatro meses! A eleição foi a 14 de Janeiro e a posse foi em 9 de Março!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para a questão de fundo ficar esclarecida há necessidade de alterar o n.º 1.

O Sr. Presidente: - Acho que tem razão! É necessário alterar o n.º 1 para obter aquilo que eu queria! Tem razão!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Atendendo ao resultado pretendido, enfim, faremos as "obras" necessárias.
Quanto à questão de fundo, queria expressar aqui o seguinte: é evidente que concordo que a existência de um período demasiado longo de sobreposição, utilizando a expressão do Sr. Presidente, de Presidente eleito e de Presidente em funções é indesejável, é democraticamente não displicente, mas não deixava de afirmar aqui que, em qualquer circunstância, é útil e necessário haver algum espaço temporal para a transposição de dossiers, como acontece na generalidade dos regimes presidencialistas - e o Sr. Presidente também sabe que é assim. A democracia presidencial mais conhecida é a dos Estados Unidos e também assim é. Há um período necessário em que existe a tal sobreposição para a transposição de dossiers e para a própria organização da sua estrutura de apoio, para que o início do exercício de funções seja de facto imediato após a posse e não prolongado por quaisquer dias.
Portanto, a questão que colocava era a seguinte: o que devíamos discutir, concordando com a preocupação de fundo suscitada pelo Sr. Presidente, é qual o período de tempo - e, do ponto de vista do PSD, terá sempre de prever-se um qualquer período de tempo, não pode ser automático - aceitável e desejável em que essa sobreposição exista e, a partir daí, constrói-se o artigo, no sentido de deixar claro que a posse…
O problema está em marcar a posse para um determinado período impreterivelmente após a eleição, ocorra ela no primeiro ou no segundo sufrágio, porque isso não decorre do legislador mas, sim, da vontade soberana do eleitorado nas eleições.
Portanto, as "obras" que teremos de fazer…

O Sr. Presidente: - Isso já está feito no artigo 130.º, n.º 2, Sr. Deputado! Este número diz o seguinte: "A posse efectua-se no último dia do mandato do Presidente cessante (...)" - caso ele já esteja eleito, claro - "(...) ou, no caso de eleição por vagatura, no oitavo dia subsequente ao da publicação dos resultados eleitorais".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, se me permite, Sr. Presidente, é aí que, eventualmente, poderemos mexer. A discussão de conteúdo que temos de ter em termos político é qual é o prazo aceitável, para atender ao

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problema que o Sr. Presidente coloca, que me parece um problema real. Depois de firmarmos aqui qual é o prazo aceitável, o que se deve é, em termos da posse, deixar claro que a posse realiza-se x dias depois da eleição. Essa é que me parece a forma mais adequada e não equívoca.
O que está em causa é uma semana ou duas! Eu não teria problemas desse tipo. É como no mandato do Governo. O mandato do Governo também não é por mais semana menos semana que está em causa! Isso é uma falsa questão. A questão verdadeira é aquela que o Sr. Presidente coloca. Essa é uma questão verdadeira! E, portanto, acho que a maneira de a atacar de uma forma perfeitamente linear é através da posse. É estipular um prazo entre a eleição e a posse e aquele prazo que for consensual entre nós tem de vir na Constituição. A posse realiza-se x dias após a eleição!

O Sr. Presidente: - Mas as soluções no Direito Comparado não passam por aí, isto é, pela diminuição do mandato do Presidente que está; passam é pela eventual prorrogação por alguns dias, pelo tempo necessário para que o Presidente eleito esteja em condições de tomar posse.
Portanto, eu por aí não iria. Admitir a tomada de posse do Presidente eleito ainda em tempo do mandato do Presidente cessante não me parece uma boa solução, não é a solução normal do Direito Comparado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, mas não é o que acontece nomeadamente nos outros actos eleitorais, na Assembleia da República?

O Sr. Presidente: - Não! A Assembleia da República normalmente toma posse muito depois do início da sessão legislativa! Por exemplo, esta tomou posse em 21 de Outubro, quando a sessão legislativa começa a 15 de Outubro. Portanto, é a Assembleia anterior que é prorrogada e não Assembleia seguinte que toma posse antes!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é o próprio Partido Socialista e o seu Secretário-Geral que querem encurtar o mandato da…

O Sr. Presidente: - Mas exactamente por isso, com uma norma transitória! Mas com uma norma transitória constitucional!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, estamos aqui a discutir uma semana ou duas!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, claramente não nos entendemos. Retiro a proposta. Se, para cada proposta, se levantam imediatamente segundas intenções, etc., francamente não vale a pena defender muito as propostas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é isso que está em causa, neste momento!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, creio que o mandato do Presidente da República não deve ser encurtado por esta forma. Ele tem um mandato deve cumpri-lo integralmente. Creio que o problema levantado pela proposta deve ser resolvido provavelmente com o encurtamento dos prazos que estão previstos no n.º 1.

O Sr. Presidente: - O n.º 1 do artigo 128.º!

O Sr. João Amaral (PCP): - Penso que se for uma formulação do género de entre o trigésimo quinto dia e o décimo quinto dia anteriores, já se atinge o objectivo.

O Sr. Presidente: - Ganham-se 15 dias!

O Sr. João Amaral (PCP): - Disse estes dois em termos aleatórios!

O Sr. Presidente: - Ganham-se 15 dias!

O Sr. João Amaral (PCP): - Não! Em relação ao prazo mais largo são 25 dias!

O Sr. Presidente: - Sim! Mas o que interessa aqui é o prazo mais curto.

O Sr. João Amaral (PCP): - De qualquer forma, penso que é em torno destes prazos…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Sim! Se houver obra a fazer também me parece que é neste sentido, Sr. Presidente! Parece que só pode ser nesse sentido!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só chamava a atenção de que se continuar a ser eleito à primeira volta… Nesta proposta do Sr. Deputado João Amaral, como o Sr. Presidente explicou e bem, o primeiro sufrágio terá sempre de ser marcado para o trigésimo quinto dia antes do quadragésimo dia anterior, precisamente para prever a hipótese da segunda volta, porque quem marca as eleições não pode deixar de prever a hipótese de uma segunda volta,…

O Sr. Presidente: - Sim!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - … portanto, continuaremos sempre a ter quarenta dias de sobreposição. A única maneira de resolver o problema - e insisto que não é uma questão de artifício, não é uma questão de tentar contrariar o que quer que seja - é dizer que entre a eleição e a tomada de posse há x dias. É a única maneira de resolver o problema ou, então, não se resolve o problema de facto.

O Sr. Presidente: - Pronto, não se resolve, Sr. Deputado. Eu retiro a proposta, não tem sentido. Mantenho apenas a proposta de eliminação do n.º 4.
Srs. Deputados, vamos, então, apenas à proposta de eliminação do n.º 4, sem alterar o resto.

O Sr. João Amaral (PCP): - Como é que fica, então, a outra proposta, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não fiz proposta nenhuma! Mantive apenas a proposta de eliminação do n.º 4!

O Sr. João Amaral (PCP): - Retira-a?

O Sr. Presidente: - Suponho que há certas questões que não valem a pena, portanto acabou. Avancemos! Não estou para estar aqui até ao próximo ano para fazer a revisão constitucional.

O Sr. João Amaral (PCP): - Mas qual é o apuramento da…

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O Sr. Presidente: - O apuramento não é nenhum, Sr. Deputado! Eu fiz uma proposta de eliminação do n.º 4 a que tinha de dar sentido. Esse sentido, obviamente, não é viável, dado que era necessário alterar o n.º 1.
Ora, como isso não é viável, a proposta mantém-se para o n.º 4 sem o sentido que eu lhe tinha dado. É apenas a eliminação do n.º 4, mantendo o n.º 1 com o sentido que tem.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Mas qual é o sentido, Sr. Presidente, se me permite o esclarecimento? V. Ex.ª também apresentou que, no caso da segunda volta, tal qual como está, era preciso meter, aliás, na esteira da revisão, 10 dias em 21...

O Sr. Presidente: - Está bem, mas se quiser eliminar isso, está à consideração a proposta de eliminação do n.º 4, mas, se não quiserem, o sistema tem estado até agora com aleijões, continua com eles sem grandes problemas.
Srs. Deputados, está à consideração a proposta de eliminação do n.º 4.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à proposta de eliminação do n.º 4 o PSD está totalmente de acordo.
Expressava, em qualquer circunstância, também a nossa abertura para encontrar uma solução para a questão de fundo que o Sr. Presidente colocou e que nos parece pertinente, sem qualquer tipo de preocupações, pelo que existe a nossa abertura política para isso. Agora, quanto à eliminação, desde já, dizemos que sim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, damos abertura à eliminação, embora subscreva a tese de que a eliminação não resolve o problema…

O Sr. Presidente: - Não resolve!

O Sr. João Amaral (PCP): - … quanto à expressão "será eleito"!

O Sr. Presidente: - Confesso que não resolve! Concordei com o Sr. Deputado Luís Marques Guedes de que não resolve o problema que eu julguei que resolvia também. Só resolve a incongruência do n.º 3…

O Sr. João Amaral (PCP): - Só se resolveria com uma alteração do n.º 1 que desse sequência à alteração.

O Sr. Presidente: - Não tem a abertura do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não é não tem a abertura do PSD; é o contrário. Acabei de dizer que há abertura política do PSD para tentar encontrar uma resolução para a questão política que o Sr. Presidente colocou. Agora, quando o PSD chama a atenção de que passar de 60 para 30 e de 40 para 20 pode manter o problema de quarenta dias de sobreposição, não penso que isso seja…
Com franqueza, temos toda a abertura, que se quiserem diminuir para 40 e 20, para 35 e 10 ou para 35 e 15 têm a nossa anuência. Agora o que o PSD chama a atenção é que isso, por si, não resolve o problema. A maneira de resolver o problema era, claramente, dizer-se que entre a eleição e a posse só podem decorrer x dias. No entanto, há a nossa abertura para encurtar os prazos como os senhores quiserem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há propostas para o artigo 129.º, relativas ao prazo entre as duas voltas. Talvez seja conveniente só voltarmos ao n.º 1 do artigo 128.º depois de decidir a questão do intervalo entre as duas voltas.
Há uma proposta de alteração do PP para 31 dias. Não percebo porquê 31 dias!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É um mês!

O Sr. Presidente: - Para 30 dias! O prazo normal de um mês é de 30 dias!
Para este artigo também existe uma proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro que reduz o prazo para 14 dias - e lembro que o actual prazo é de 21 dias.
A proposta de redução para 14 dias, já foi feita em anteriores revisões constitucionais, tendo-se levantado, na altura, a ideia de dificuldades técnicas. Não sei se essas dificuldades técnicas de realizar a segunda volta em 14 dias se mantêm ou não. De qualquer modo é conveniente ouvir o STAPE quanto a esse propósito.
Em todo o caso, há a proposta do PP que é a de alargar este prazo para 30 dias.
Para apresentar a proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, porque nos parece excessivamente curto o período entre a primeira e a segunda voltas, sobre todos os pontos de vista, inclusive o do cansaço dos eleitores.

O Sr. João Amaral (PCP): - Desculpe, não percebi!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sobretudo, sobre o ponto de vista do problema da excessiva mobilização dos eleitores em períodos muito curtos, que nos parece que pode fomentar ou, explicitando melhor, pode desmotivar, na segunda volta, uma afluência expressiva ao acto eleitoral, não podendo nós antecipar a polémica que cada um deles envolverá e se está em presença de uma eleição onde há uma grande concretização de alguma questão concreta polémica que produza essa mobilização.
Desta vez, nas últimas eleições presidenciais, não se colocou o problema da segunda volta e, portanto, se calhar, sobre o ponto de vista estritamente da eleição presidencial, não há ambiente para representar o excesso de actos eleitorais consecutivos, que podem derivar do facto de haver uma segunda volta da eleição presidencial encaixada numa sequência de eleições europeias, autárquicas, legislativas, etc.
Mas o intuito principal da nossa proposta é o de não sobrecarregar excessiva e consecutivamente o eleitorado com actos eleitorais. Por isso, parecer-nos-ia mais motivador para a afluência às urnas haver um maior espaço.

O Sr. Presidente: - Acrescentar mais 15 dias de campanha eleitoral ou mais uma semana de campanha eleitoral!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Não, porque isso, hoje em dia, é irrelevante! Como o Sr. Presidente sabe,

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hoje em dia, as campanhas eleitorais formais são uma ficção! Portanto, esse não pode ser o argumento, porque a um ano de distância normalmente já se está em campanha. Veja, aliás, o que está a acontecer para a Câmara de Lisboa…
Portanto, esse é um argumento puramente formal. Sabemos hoje que, dadas as circunstâncias da vida, as campanhas eleitorais na opinião pública têm uma duração muito superior ao período formal e, portanto, não é esse o problema.
A razão essencial é que nos parece que pode favorecer a mobilização e a participação eleitoral o facto de haver um intervalo superior entre ambas as voltas. Não é a primeira nem a segunda vez que eu oiço, aqui e ali, eleitores desmotivarem-se quando há eleições sucessivas. É esse o único intuito da proposta.
Se calhar, isto levanta problemas, tendo em conta a discussão anterior da reanálise ou da reavaliação de todos os prazos que têm de estar aqui presentes, mas, da nossa parte, não qualquer problema em reaquacionar esta proposta à luz de um novo calendário de eleição e posse presidencial. Portanto, não é uma questão essencial, transcendente, nem uma questão que, para nós, seja definitiva, portanto, estamos disponíveis.
Também achamos que, no quadro do artigo anterior, alguma coisa tem de ser feita relativamente à combinação dos prazos, por isso estamos perfeitamente disponíveis para reenquadrar esta nossa proposta ou até prescindir dela se se encontrar um novo calendário que faça sentido sobre todos os pontos de vista e não apenas sobre o ponto de vista que esta proposta visa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está a consideração esta proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, pegava nesta disponibilidade manifestada agora, no final da sua intervenção, pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, para apelar politicamente ao seguinte: compreendo, em abstracto, o argumento de alguma desmotivação que decorre para os eleitores do facto da sucessão de actos eleitorais, mas penso que ela ocorre, por um lado, quando é uma sucessão de actos eleitorais perfeitamente distintos, em que o equacionamento das opções de voto por parte dos eleitores são necessariamente distintas.
O que os eleitores têm manifestado é pouca predisposição para sistematicamente serem levados a ter de se posicionar e a ter que equacionar determinado tipo de opções sobre situações muito variadas. Já sobre o mesmo acto eleitoral, porque aqui trata-se do mesmo acto eleitoral, a eleição do mesmo órgão e, ainda por cima, de um órgão unipessoal em que as escolhas, normalmente, são mais fáceis, mais personalizadas - é essa, de resto, a intenção da nossa Constituição, ao não permitir a candidatura por partido políticos, mas apenas por cidadãos, os cidadãos é que são candidatos -, ao abrigo da mesma argumentação que o Sr. Deputado Jorge Ferreira acabou de expender, a lógica apontaria, do meu ponto de vista, para o encurtamento e não para um alongamento dos prazos.
Ou seja: penso que a melhor maneira de evitar a tal desmobilização dos eleitores neste caso concreto é aproximar o mais possível os dois sufrágios para que os eleitores tenham a perfeita noção de que face à conjugação de vontades da totalidade do eleitorado não foi possível ainda obter 50% mais um, mas para a semana - enfim, para a semana penso que é tecnicamente impossível por causa do apuramento geral que tem de obedecer a algumas regras de garantia e de segurança - ou para daqui a 14 dias, que me parece um prazo perfeitamente plausível hoje em dia, elas são repetidas, independentemente da cautela que o Sr. Presidente coloca - e bem! - de devermos ouvir o STAPE sobre esta matéria.
Acho que o argumento utilizado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira será mais atingido e mais prosseguido por nós se optarmos não pelo alongamento do prazo mas, sim, pelo encurtamento, para ficar claro na mentalidade e no espírito do cidadão eleitor que o problema da eleição será rapidamente encerrado, porque essa é que é a motivação fundamental, segundo percebi, da explicação do Sr. Deputado Jorge Ferreira.
Acresce apenas uma outra consideração de ordem geral, que é a seguinte: o problema fundamental da desmobilização dos eleitores é exactamente prolongar estados de campanha eleitoral que afectem, de certa forma, o dia-a-dia, o quotidiano do cidadão eleitor, que é bombardeado com determinado tipo de mensagens e discursos políticos e da necessidade participativa que ele sente politicamente de se posicionar face a uma opção da sua comunidade e da sua sociedade.
É totalmente indesejável, do nosso ponto de vista, genericamente sempre e em qualquer circunstância, o prolongamento desta situação dos períodos eleitorais. Também por essa razão de fundo me parece que a nossa opção deverá ir sempre no sentido de um encurtamento do prazo, quer face à questão colocada pelo Sr. Presidente no artigo 128.º, quer quanto a esta questão que agora é colocada pelo Partido Popular.
Portanto, o PSD dará apoio a uma proposta como a do Sr. Deputado Cláudio Monteiro de preferência à do PP em termos claros, embora, face à explicação do Sr. Deputado Jorge Ferreira, pareça que o Partido Popular também não terá, no fundo, grande dificuldade em aceitar este tipo de argumentação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo de Castro.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Sr. Presidente, tendo em conta as razões aduzidas quer pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira, evitar o cansaço, a desmotivação do eleitorado, etc., mas com este entendimento que foi imprimido a essa ideia pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, nós, ainda que devendo ser ouvido o STAPE a este propósito, assumíamos a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, porque nos parece que, se também for entendimento do STAPE e se não houver dificuldades de qualquer natureza, que tem de se ver, designadamente em relação à questão dos emigrantes, se for possível e viável reduzir de 21 para 14 dias, tal qual como consta da proposta, pensamos que isso era mais vantajoso para a mobilização do acto eleitoral.
Tenho a impressão de que as razões que o Sr. Deputado aduziu, acabam por traduzir a conclusão, um pouco diferenciada daquela que colocou - não ir para o alargamento mas para um encurtamento do prazo. Nós assumimos a proposta, com este condicionamento de ouvir o STAPE para o n.º 2, apresentada pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não será por razões de natureza subjectiva que se conseguirá resolver esta questão porque é muito difícil avaliar se isto é mais ou menos mobilizador. Provavelmente, com a mesma facilidade com que, na rua, se encontram eleitores que dizem que gostavam de mais uma semana, que mais uma semana seria melhor, também se encontram muitos outros que dizem que isto nunca mais acaba, acabem lá com isto! Como se trata de elementos de natureza subjectiva, creio que vamos ter muita dificuldade em decidir. Penso que a experiência que tem havido, é a que é, mas sem nada de especial quanto a isso.
Quanto à possibilidade de encurtar o prazo, talvez fosse conveniente saber quais são os efeitos de natureza técnica que isso tem, pelo que, creio, uma consulta ao STAPE seria útil. O quadro com que nos defrontamos aqui é o de alguma tendência para manter a situação actual, admitindo, no entanto, que, com a resposta do STAPE, possamos evoluir no sentido de baixar, nunca no sentido de aumentar este prazo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a conclusão a tirar é no sentido da abertura para considerar o encurtamento do prazo para 15 dias. Para isso, ouviremos o STAPE sobre a viabilidade técnica, incluindo a possibilidade de agora participarem residentes no estrangeiro nesta eleição.
Voltando, então, ao artigo 128.º, eu proporia o seguinte: combinando esta diminuição de três para duas semanas, acrescentando também aqui uma diminuição de 15 dias, ganharíamos três semanas na eleição do Presidente da República.
Assim, ficaria: "o Presidente da República será eleito entre o 45.º e o 15.º dias anteriores ao termo do mandato do antecessor", o que significaria ganhar 15 dias aqui e uma semana no artigo seguinte, pelo que ganhávamos três semanas na antecipação em relação à décalage entre a eleição do Presidente... Isto quer dizer que a primeira volta poderia ser marcada para um mês antes do termo do mandato, reduzindo até um mês a sobreposição de mandatos.
Sr. Deputado João Amaral, acabo de fazer uma sugestão concreta, para considerarmos depois, em conjunto com esta. Esta proposta permitiria reduzir em 15 dias a antecipação e, se viesse a ser combinada com uma diminuição de três para duas semanas entre as duas voltas, ganharíamos três semanas em relação ao actual, o que, creio, já é um ganho substantivo.
Srs. Deputados, deixo esta sugestão em aberto, pois suponho que houve abertura de todos os partidos para considerar esta hipótese, sem compromissos, para já, e com as reservas que todos estabeleceram. De qualquer modo, deixo em aberto esta sugestão para ser considerada em conjunto.
Quanto ao n.º 3, o PP propõe a eliminação da parte final, que está congruente com a ideia de retirar candidatos, proposta esta que, suponho, está prejudicada.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS PP): - Para efeitos de primeira leitura.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, o PP não retira a proposta? Apenas para efeitos de primeira leitura.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 135.º A, apresentado pelo PS, sobre autonomia administrativa e financeira dos serviços do Presidente da República. Trata se da constitucionalização de um instituto que já existe hoje a nível legal.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, permita me lembrar que nós temos um artigo, que é o 143.º A, que se refere à autonomia financeira dos serviços próprios do Presidente da República.

O Sr. Presidente: - Exacto, é convergente - discutir se ão em conjunto.
Para justificar a sua proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo de Castro.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Sr. Presidente, o nosso objectivo é apenas constitucionalizar aquilo que está já na lei ordinária e que foi elaborado já nesta legislatura, no sentido de dotar, de facto, porque nos parecia ser uma situação um tanto caricata aquela que existia até agora, e deixar clara a autonomia financeira, administrativa e organizativa dos serviços de apoio à Presidência da República. A ideia que tenho, é a de que isso foi aprovado por unanimidade. Aqui, o sentido da nossa proposta é o de, meramente, dar força constitucional a este preceito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, tem a palavra para apresentar a proposta de artigo 143.º A do seu projecto.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, esta proposta tem, basicamente, o mesmo sentido, aditando, no entanto, algumas precisões que têm a ver com o relacionamento entre a Assembleia e a Presidência, quando define a forma de aprovação do orçamento da Presidência, que é apreciado directamente pela Assembleia, e quando define que é à Assembleia da República que compete aprovar a Lei Orgânica da Presidência da República.
Creio que serão essas precisões que aditam alguma coisa a uma ideia que é, no essencial, a mesma, ou seja a de consagrar constitucionalmente aquilo que a lei já hoje prevê, que é a autonomia organizativa, administrativa e financeira do serviços de apoio à Presidência da República.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão à consideração estas duas propostas convergentes: uma, mais sumária, do PS, e outra, mais densa, do PCP, nomeadamente aditando os elementos que o Sr. Deputado João Amaral acabou de sublinhar.
Estão à discussão em conjunto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, do ponto de vista do PSD, é aquilo que o Sr. Presidente começou por dizer: esta alteração está já hoje consagrada num diploma aprovado por unanimidade na Assembleia da República e, eventualmente, a proposta do PS, tal como a do PCP, terão sido pensadas e formuladas antes da aprovação - que foi no mês de Fevereiro, salvo erro, aqui na Assembleia da República - por unanimidade, do diploma que veio consagrar tudo isto. Portanto, penso que não se torna necessário, até porque me parece, desde logo, que este não é um tipo de matéria claramente de natureza constitucional.
Posso compreender, politicamente, a iniciativa que, quer o PS quer o PCP, tenham tido na formulação dos seus projectos de revisão constitucional, sem querer adivinhar se isto foi pensado antes ou não, mas, pelos prazos, quero crer que sim porque a lei só foi aprovada em Fevereiro aqui, nesta Casa, já depois da eleição do Sr. Presidente da República, altura em que estes projectos de revisão

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constitucional já estariam pensados, seguramente - aliás, nem sei se esta matéria não constava já dos projectos anteriores. A realidade é que o problema não se coloca hoje em dia, pois está perfeitamente adquirido numa lei aprovada por unanimidade pela Assembleia da República, como já referi.
Politicamente, não é sequer concebível, penso eu, ou dificilmente o seria, que esse tipo de situação pudesse ter algum retrocesso para o futuro e, em qualquer circunstância, não me parece que seja uma matéria com dignidade constitucional. Quanto muito, a haver alguma questão constitucional sobre esta matéria, do nosso ponto de vista, nem seria aqui mas sim, eventualmente, nos artigos das competências da Assembleia da República onde seria colocada uma alínea dizendo que cabia à Assembleia da República legislar sobre os serviços de apoio à Presidência da República com autonomia financeira. Aí é que, eventualmente, faria algum sentido colocar a questão. Aqui, em termos de Presidência da República, dado que o Presidente da República não tem competência legislativa, nunca poderá ser ele a adquirir este tipo de situações, terá de ser sempre a Assembleia da República, como já o fez.
Em qualquer circunstância, penso que, neste momento, o problema talvez esteja ultrapassado, mas os proponentes o dirão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS PP): - Sr. Presidente, concordo com as observações do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, uma vez que não vejo vantagem na constitucionalização desta matéria, que é, de resto, consensual, como já foi sublinhado.
Por outro lado, a haver alguma necessidade específica relativamente a ela, eu vê-la-ia mais como a introdução de uma nova competência da Assembleia da República do que propriamente com duas disposições deste tipo. Não me choca que, nas competências da Assembleia da República, se expresse a competência relativa à Lei Orgânica da Presidência da República mas fazer um artigo só com esta disposição não vejo necessidade nem jurídica nem política.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo de Castro.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Sr. Presidente, nós compreendemos bem a disposição que existe na lei ordinária e que vai neste sentido. O que nos parece, é que a manutenção ou a inclusão em sede constitucional desta ideia, dignificaria, de algum modo, também os serviços da Presidência da República - é esse o sentido. É claro que isto, como já foi dito, vem de projectos anteriores; entretanto, foi aprovada por unanimidade a lei, mas parece nos que havia vantagem na constitucionalização desta norma.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, lembro apenas que o ex Deputado Jorge Miranda, na seu petição, tinha uma norma genérica para o artigo 114.º onde se estabelecia que: "os serviços de apoio dos órgãos políticos de soberania, dos tribunais superiores e dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas gozam de autonomia administrativa e financeira". Esta era uma norma genérica que estava nos princípios gerais, artigo 114.º, para todos os órgãos de soberania, o que abrangia Presidência da República, Assembleia da República, Governo, os tribunais superiores e os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas.
Srs. Deputados, continuam à discussão estas duas propostas convergentes, do PS e do PCP. Foram levantados dois tipos de objecções: um, quanto à necessidade de constitucionalização desta matéria, e outro quanto à localização da norma que, eventualmente, viesse a estabelecer se. Não creio que a questão mereça que percamos com ela grande tempo, de qualquer modo, temos de apurar uma posição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, a incluir se este tema na Constituição (é um pouco duvidoso se isto merece ser consagrado na Constituição), então, deve ser dado o passo para que apontou o Sr. Deputado Luís Marques Guedes no sentido de incluir esta matéria na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República.
O problema que há aqui, por trás disto, é o problema político de, eventualmente, haver uma discrepância entre o Governo e o Presidente da República, ele mexer nas leis que existam, e não ser a Assembleia da República a fazer a lei. Então, reservava isto tudo à competência da Assembleia - isso ainda fará algum sentido. Seria uma alínea do artigo 167.º entre a alínea h) e a alínea i), eventualmente, a seguir aos partidos políticos e associações políticas, a incluir isto.
Contudo, um artigo próprio, aqui, a propósito do Presidente da República, não se dizendo nada sobre a Assembleia da República, não se dizendo nada sobre os outros órgãos a não ser o Governo, que tem autonomia própria para assumir, destoa. O que há aqui é reservar à Assembleia da República a competência para ser ela a definir a estrutura e a organizar um serviço da Presidência da República.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - Sr. Presidente, para encurtar razões, nós retiramos a proposta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não. Deixamos a norma de lado!… Se os Srs. Deputados não estão preparados para decidir nesta matéria, deixemo los reponderar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há uma proposta alternativa que acaba de ser feita pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo: que é transportar uma parte, que o Sr. Deputado Barbosa de Melo considera relevante, a da reserva de competência legislativa da Assembleia quanto aos serviços da Presidência da República, e incluir no artigo 167.º uma alínea que definisse essa reserva de competência para legislar sobre os serviços de apoio ao Presidente da República.

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma solução interessante.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, creio que a proposta é excessiva. Penso que teria alguma importância consagrar que esta matéria não ficaria na discricionariedade de qualquer governo mas seria matéria da competência reservada da Assembleia da República, desde

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que nessa norma ficasse clara a autonomia dos serviços. Isto é, creio que não deveríamos caminhar para uma formulação que se limitasse a conferir à Assembleia da República reserva de competência para legislar sobre os serviços da Presidência da República.
Parece me que o que é afirmado aqui, em ambas as propostas, que os serviços devem dispor de autonomia organizacional, administrativa e financeira, deveria ficar expresso na formulação encontrada; mas colocar esta matéria na reserva de competência parece me excessivo.

O Sr. Presidente: - Só não vejo como é que se encontra uma formulação que, além de consagrar a reserva de competência, consagre também uma questão de fundo.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, ao introduzir a norma de competência, seria a competência de legislar sobre o regime de autonomia dos serviços de apoio ao Presidente da República. Mas nós não nos fixaremos numa redacção. A sugestão é boa e a fórmula será encontrada com facilidade. Aliás, difícil foi ultrapassar a barreira que, no passado, tinha impedido que chegássemos sequer no plano da legislação ordinária a uma solução, a que chegámos por consenso total e sem nenhuma dificuldade assinalável. Trata se agora de lidar, quase diria minudentemente, com o eco constitucional decorrente disso. Pode ser, perfeitamente, nos termos que referiu o Sr. Deputado Barbosa de Melo com as planificações necessárias a um chamado mínimo existencial constitucional.

O Sr. Presidente: - Então, haveria duas formulações: uma, legislar sobre os serviços de apoio do Presidente da República e, outra, definir o regime de autonomia administrativa e financeira dos serviços do Presidente da República, sendo que esta última satisfazia mais o Sr. Deputado António Filipe, como é óbvio. Ficamos, então, em aberto quanto a estas duas formulações.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, é evidente que a nossa proposta de passar para uma alínea do artigo 167.º é porque o que está aqui em causa, claramente, é o problema da possibilidade real de haver uma autonomia e uma dotação orçamental própria que permita o funcionamento autónomo do órgão de soberania Presidente da República. Isso é atingido, obviamente, através da Assembleia, daí a nossa sugestão.
Assim, penso que a redacção mais adequada seria colocar se uma alínea a seguir aos partidos políticos falando no regime de autonomia organizativa, administrativa e financeira dos serviços de apoio do Presidente da República.
O PCP não utiliza, na sua proposta, o termo organizativo. Penso que a lógica de se falar aqui em organizativo tem validade porque tem a ver com a necessidade de estabelecimento da legislação sobre os serviços de apoio ter necessariamente de respeitar a proposta organizativa que venha da parte da Presidência da República. Independentemente da competência legislativa, sem dúvida, ter de pertencer à Assembleia da República (não faz sentido, no nosso sistema, darmos competência legislativa sobre uma matéria deste tipo ao Sr. Presidente da República através de um decreto presidencial), em qualquer circunstância, falar se em autonomia organizativa como o PS fala - mas o PCP não fala na sua proposta - se interpreto bem a ideia do PS, ela parece me válida e necessária.
Portanto, a sugestão é a de que o PCP aceite também a menção a esta ideia de autonomia organizativa, sendo certo que ficava, pelo menos em acta, que o entendimento que a Comissão faz deste princípio da autonomia organizativa tem a ver, obviamente, com a necessidade de audição por parte da Assembleia da República do Presidente da República sobre o próprio regime interno de organização dos serviços. Essa matéria deveria ficar clara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, pela nossa parte, não faremos qualquer oposição; pelo contrário, vemos com bons olhos a consagração da vertente organizativa da autonomia dos serviços da Presidência da República.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sem prejuízo de precisão na formulação, ficaria: definir o regime de autonomia organizativa, administrativa e financeira dos serviços do Presidente da República entre a competência reservada à Assembleia. Penso que é um bom ganho. Conseguiu se manter a proposta, sem esta fórmula um tanto esdrúxula de autonomizar um artigo no estatuto do Presidente da República.
Passamos ao artigo 136.º, competência do Presidente da República. Proponho o seguinte: as alíneas que implicam remissão de fundo para outras matérias, não as discutiremos nesta sede e voltaríamos a elas depois. Por exemplo, as que têm a ver com a dissolução da Assembleia da República ou com o Ministro da República para as Regiões Autónomas - neste caso, dado que adiante se propõe a eliminação dessa figura, não discutiríamos estas questões agora e voltaríamos a elas caso adiante, quando se discutir o artigo próprio sobre o Ministro da República, surgir alteração do respectivo estatuto.
Vamos, então, discutir aqui as alíneas que têm autonomia ou porque não estão previstas noutro lado ou porque assumem aqui uma independência sistemática.
A primeira alínea para que é proposta alteração é a alínea d), da proposta do Deputado António Trindade, que refere que "a competência para dirigir mensagens se estende às Assembleias Legislativas Regionais". O proponente não está presente, pelo que, se houver alguém que assuma esta proposta para efeitos de discussão, prosseguiremos este debate.
Tem a palavra o Sr. Deputado Osvaldo de Castro.

O Sr. Osvaldo de Castro (PS): - A minha dúvida fica em saber se não devíamos ver isto quando se tratasse das Regiões Autónomas.

O Sr. Presidente: - Esta é uma das que acho que não conexão directa - tem apenas uma conexão indirecta; digamos que se trata de um poder autónomo do Presidente. Adiante não teremos oportunidade de discutir isto, não há nenhuma sede onde isto se coloque mais à frente. Mas, se acharem que se deve discutir também em conjunto tudo o que respeite a áreas autónomas, não me oporei, até porque não estão aqui Deputados eleitos pelas Regiões Autónomas - isso talvez seja um bom argumento.
Pela minha parte e segundo critérios que defini, esta proposta deveria ser discutida agora, mas não faço questão nisso na orientação dos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, nós adoptámos um critério uniforme, que até agora não quebrámos, de reservar todas as questões que tenham a ver, por qualquer ângulo, com as Regiões Autónomas sejam discutidas quando presentes os seus proponentes. Sei que o Sr. Presidente já exprimiu orientação sobre essa matéria, mas, a não haver consenso sobre essa questão, nós, como temos sempre feito, não assumiremos esta proposta e, portanto, passaremos adiante.

O Sr. Presidente: - Passaremos então adiante.
Quanto à alínea e) esta é uma das tais que proponho que seja discutida a propósito do artigo 175.º - é o regime de fundo quanto à dissolução da Assembleia da República.
Passamos à alínea l): esta também a discutiremos na altura própria, porque tem a ver com proposta de eliminação do Ministro da República para as Regiões Autónomas.
Vamos então para a alínea m): "nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Presidente do Tribunal de Contas e o Procurador Geral da República", para o que existem propostas do PP, do PS, do PSD e do Deputado João Corregedor da Fonseca.
Os Deputados do PP propõem que o Presidente do Tribunal de Contas seja eleito sob proposta da Assembleia da República e que se acrescente, entre os poderes do Presidente da República, segundo o mesmo procedimento, o poder para nomear também o Governador e os Vice Governadores do Banco de Portugal.
A proposta do PS é acrescentar, pura e simplesmente, o Governador do Banco de Portugal, sem alteração do procedimento.
A proposta do PSD é a de nomear pelo tempo que a lei determinar e exonerar sem mais alterações.
A proposta do Deputado João Corregedor da Fonseca é apenas acrescentar também o Governador do Banco de Portugal.
Portanto, há três questões distintas: uma, acrescentar o Governador e os Vice Governadores do Banco de Portugal; outra, a questão do tempo que a lei determinar; outra a questão procedimental de saber se é sob proposta do Governo ou sob proposta da Assembleia da República.
Para apresentar as propostas, irei dar a palavra aos Srs. Deputados proponentes. Não estando presente o PP, que me garantiu que viria a tempo de participar nesta discussão, começo pelo PS que tem uma proposta de acrescento da alínea m) do artigo 136.º da Constituição - competência do Presidente da República para designar o Governador do Banco de Portugal.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a alínea m) do artigo 136.º suscita problemas vários que, significativamente, já discutimos ontem a propósito de propostas pelos diversos partidos para alterar a redacção do actual artigo 121.º. Discutimo las também a propósito de uma proposta do Sr. Prof. Jorge Miranda, que o Sr. Presidente teve a gentileza de introduzir no debate ontem.
Foi nossa iniciativa não introduzir nenhuma alteração ao regime de nomeação e exoneração das entidades que já o podem ser, ao abrigo do artigo 136.º, alínea m), o que significa que transpusemos e alargámos o universo das entidades nomeadas, não alterámos uma vírgula ao regime aplicável para esse efeito. Fizemo lo premeditadamente, não porque estejamos inscientes das questões que ele suscita - examinámo las ontem abundantemente e sem fechamento, aliás.
A introdução desta nova categoria, ou seja, alargar, sem alterar o estatuto do Presidente da República (coisa que não é típica do nosso projecto), ao Governador do Banco de Portugal o elenco das entidades que o Presidente deve poder nomear, tem hoje como tinha no passado, aliás, plena justificação. Esta é uma proposta reincidente, da nossa parte - é um objectivo que sustentámos, designadamente do quadro da pretérita tentativa de revisão constitucional que foi ultrapassada. O papel que é atribuído ao Banco de Portugal e que a revisão constitucional de 1992 reconfigurou para ter em conta o que decorria do Tratado de Maastricht, que todos tínhamos, politicamente, presente nos espíritos, justifica que haja uma alteração também do processo de nomeação do Governador do Banco de Portugal. Estamos cientes de que isso é uma mudança relevante.
A intervenção governamental, todavia, continua a ser significativa, imprescindível; ou seja, este é um acto de formação conjunta - o Presidente não intervém, no nosso cenário, senão sob proposta do Governo e esta entidade não pode ser removida sem uma intervenção conjugada dos dois órgãos de soberania necessários para a sua nomeação. É, portanto, um regime que parece adequado, não desnaturador do papel do Presidente da República, actual, actualizador. Fazemos votos de que seja possível um consenso em torno dele.

O Sr. Presidente: - Para apresentar a proposta do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, antes de fundamentar a nossa proposta, queria pedir um esclarecimento ao PS, pois confesso que não percebi nada do que o Sr. Deputado do PS disse. Problema meu, com certeza!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não! A culpa é, seguramente, nossa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, deve ser meu porque eu é que não percebi; mas o Sr. Deputado falou - falou e eu ouvi o falar, mas não percebi nada do que disse! Não percebi nada do que disse talvez por duas ...

O Sr. José Magalhães (PS): - Talvez lendo a acta isso seja facilitado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas tenho o direito de pedir um esclarecimento e o Sr. Deputado dar mo á ou não, conforme entenda.
Não percebi nada do que disse pelo seguinte: nós já ontem tivemos aqui uma discussão clara sobre qual é o entendimento mais adequado - ou, pelo menos, aquele que o PSD tem e da discussão de ontem ficou claro que não era só o PSD - que se deve ter do princípio da renovação do artigo 121.º.
A questão que foi colocada no artigo 121.º, do nosso ponto de vista, ficou em aberto, pois houve uma proposta, que foi avançada pelo Sr. Presidente desta Comissão, de, eventualmente, optarmos pela proposta apresentada pelo Prof. Jorge Miranda.
O Sr. Presidente disse que, do seu ponto de vista, não tinha pejo nenhum em adoptar essa proposta, excluindo a questão relativa aos limites, porque o problema do princípio da renovação não é um problema dos mandatos sucessivos

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mas sim de renovação do mandato, portanto, é o problema da temporalidade legal do exercício dos cargos.
O que está em causa, no princípio de renovação, primordialmente, é isso; acessoriamente, pode ser também o problema da sucessividade ou não sucessividade dos mandatos. Mas o fundamental do princípio da renovação é a temporalidade e a necessidade de renovação temporal dos mandatos, portanto, a temporalidade do exercício dos cargos.
Quanto a esse princípio, face à posição que o PSD teve sobre a matéria, e o Sr. Presidente também manifestou uma opinião pessoal, o PS acabou por, se bem me recordo, embora manifestando reservas, não fechar a porta a essa lógica. O que temos agora aqui sobre a mesa (daí eu não ter conseguido entender aquilo que o Sr. Deputado José Magalhães acabou de dizer) é uma situação concreta em que se procura dar expressão sem quaisquer fantasmas de ordem política - e não vale a pena (como já foi dito ontem pelo Sr. Presidente, na discussão do artigo 121.º) tentar transportar para aqui fantasmas de natureza política.
Esta é numa proposta perfeitamente objectiva, vale o que vale, e, como já foi dito no artigo 121.º, o que está aqui em causa é saber se vamos ou não, relativamente a alguns destes altos cargos públicos aqui colocadas, estabelecer inequivocamente, em termos constitucionais, a temporalidade do mandato, ou seja, respeitar o princípio da renovação do exercício dos cargos políticos, como o Sr. Presidente dizia ontem, retomando o velho e são princípio republicano (foi esta a expressão utilizada pelo Sr. Presidente ontem), que todos conhecem. Não vale a pena argumentar com fantasmas políticos para tentar negar o que está sobre a mesa. O que está em causa nas opções que aqui estão, é isto: optar ou não, clara e inequivocamente, pela consagração constitucional do princípio de renovação através da temporalidade dos cargos.
Já agora, aproveito para pedir ao PS para explicitar, porque não consegui entender, se, quanto ao problema da temporalidade, a questão que se coloca é esta.
Há ainda uma segunda questão quanto à proposta do PS no que se refere ao acrescento do Governador do Banco de Portugal, face ao actual texto. Desde logo, a questão que coloco ao PS, é a seguinte: por um lado, como sabemos, no artigo 105.º da Constituição, são cometidas ao Banco de Portugal responsabilidades e competências na definição e execução das políticas monetárias em colaboração - obviamente, leia se em colaboração com o Governo porque é o Governo que tem competências próprias sobre a política económica nacional, onde necessariamente a política monetária e a política financeira, a par de outras políticas de natureza económica, assumem um papel relevante. Daí que o texto constitucional, no artigo 105.º, fale em colaboração.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas que edição da Constituição é que o Sr. Deputado está a usar? Se me permite esta pergunta, que está nos limites da delicadeza!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Leio lhe o artigo 105.º da Constituição da República.

O Sr. José Magalhães (PS): - Em que versão, Sr. Deputado? De que ano é que está a ler a Constituição?

O Sr. Luís Marques Guedes: - Da Constituição! Não é do anterior texto da Constituição!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas a edição que está a usar, que data é que tem?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a da terceira revisão. Mas porquê? Não é esta?

O Sr. José Magalhães (PS): - Que redacção é que o Sr. Deputado está a ler?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - "O Banco de Portugal, como banco central nacional, colabora na definição e execução das políticas monetária e financeira e emite moeda (...)".

O Sr. Presidente: - Que é a versão vigente.

O Sr. José Magalhães (PS): - E onde é que está cláusula segundo a qual colabora com o Governo?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado, está brincar comigo, com certeza!
Retomo a minha intervenção...

O Sr. José Magalhães (PS): - É que a alusão ao Governo e às directivas do governo constava do texto anterior à revisão de 1992! Foi por isso mesmo que alterámos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Retomo a minha intervenção, dizendo que o texto constitucional fala na colaboração do Banco de Portugal na definição e execução destas políticas, políticas essas em que, obviamente, a colaboração só pode ser entendida com o Governo na medida em que a política económica é conduzida pelo Governo. Assim, a colaboração a que a Constituição faz menção não pode deixar de ser entendida como colaboração com o Governo da República, como é evidente.
Portanto, a primeira parte da questão que queria colocar ao Sr. Deputado é se o PS não entende que, numa matéria tão fulcral para a condição da política económica do Estado português, tem necessariamente de haver um qualquer tipo de harmonização para possibilitar esta colaboração em termos positivos, profícuos e adequados aos interesses nacionais, entre o Governo da República e o Banco de Portugal.
Nesse sentido, eu relembrava que há outro tipo de soluções, há outro tipo de instituições em que o reforço da proximidade, atendendo a determinado tipo de resultados que se pretende atingir para os interesses nacionais, há a clara competência do Governo da República para, em cada momento, nomear os responsáveis por determinados sectores. Esta é apenas uma questão em termos de reflexão.
A segunda parte da questão que coloco, que me parece também pertinente para auscultar a sensibilidade total do PS sobre esta matéria, decorre de outras propostas que o Sr. Presidente também pôs em discussão e que, no caso de se acrescentar o Governador do Banco de Portugal, apontam para o Governador e para os Vice Governadores.
Ora, todos sabemos que a realidade da actuação do Banco de Portugal, para além da tal colaboração muito próxima que tem de ter com o Governo e o Ministério das Finanças, tem também de reflectir estabilidade, extraordinariamente necessária a uma instituição como o Banco de Portugal, que será sempre um princípio fundamental e estruturante, sendo totalmente indesejável que possa haver

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um qualquer mecanismo em que a nomeação do Presidente e da restante equipa não seja coerentemente feita pelo mesmo órgão, pela mesma entidade.
Assim, se respondermos positivamente à primeira questão, de que não há problema em colocar a nomeação por parte da Assembleia da República, isso não inibe, nem impede, nem coarcta minimamente a colaboração necessária com o Governo sobre essa matéria, a segunda questão é: não faria mais sentido, em qualquer circunstância, cometer a competência de nomeação de toda a equipa administradora de uma instituição, como é o Banco de Portugal, a uma mesma entidade?

O Sr. José Magalhães (PS): - O PSD estaria disponível para considerar que essa entidade fosse o Presidente da República?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado, gostaria que respondesse primeiro às minhas perguntas. Depois, se quiser colocar me algumas, terei muito gosto em responder lhe.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, proponho que não misturemos duas questões: uma é a proposta do PS, de alargar a competência do Presidente da República para a nomeação do Governador do Banco de Portugal - é uma proposta conjunta ao PS, ao CDS PP e ao deputado João Corregedor da Fonseca; e outra é uma proposta do PSD, de introduzir a questão da temporalidade.
O Sr. Deputado José Magalhães já apresentou a primeira; o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a título de pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado José Magalhães, mas sem ter nada a ver com a questão, introduziu a segunda.
Ora, eu proponho que se separem as duas questões: vamos à questão do alargamento, independentemente da questão da temporalidade, que é outra e é a da proposta do PSD. Se quiserem, podemos começar por esta mas, dado que, por ordem de propostas, o alargamento de competência do Presidente da República para nomear o Governador do Banco de Portugal é a matéria que está em discussão, proponho que se discuta, para já, essa e depois a questão da temporalidade.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, nem outra coisa é possível porque, quanto à questão da temporalidade, ou seja, quanto àquilo a que, há pouco, se referia como o velho e são princípio, é excelente que nos reconheçamos todos nos velhos e sãos princípios republicanos. A nossa porta está exactamente no estado em que estava ontem - não se deslocou nem um milímetro, rigorosamente nada aconteceu durante a noite que levasse a qualquer alteração.

O Sr. Presidente: - O que não acontece com todos!

O Sr. José Magalhães (PS): - Infelizmente, não aconteceu com todos…!
Mas, quanto à outra questão, devo dizer que ela é complexa, naturalmente, mas é comparativamente mais simples. Há pouco, fiz a pergunta - nos tais limites da delicadeza - ao Sr. Deputado Marques Guedes porque ele não dava excessivos sinais de apreender a diferença significativa que há entre a redacção que o texto constitucional tem hoje, no artigo 105.º, e a redacção que tinha a versão anterior, que correspondia ao artigo 105.º originário.
Nessa redacção, o Banco de Portugal tinha um determinado estatuto, que até foi aperfeiçoado na redacção constitucional de 1989, em determinados termos - aludiu se específica e densificadamente à colaboração do Banco de Portugal na execução das políticas monetária e financeira, não apenas de acordo com a lei mas de acordo com as próprias directivas do Governo. E foi a este último aspecto, a alusão ao poder de emissão de directivas do Governo, nos termos permitidos pelo quadro constitucional, na redacção de 1989, que a revisão constitucional de 1992 veio dar resposta em termos significativamente diferentes.
Hoje, estamos perante uma entidade, um corpo dirigente do Banco de Portugal, com a designação tradicional ou outra qualquer, que faz parte de um conglomerado cujas regras de funcionamento são as previstas no Tratado de Maastricht e nas regularizações comunitárias posteriores, cuja actuação é regida por uma massa muito complexa de regras e por dinâmicas em que a ponderação entre factores comuns e de estrita execução obrigatória no quadro dos tratados e factores que têm a ver com a política interna do Estado, em que o Banco de Portugal goza de considerável autonomia, não minguante mas pregnante, em dinâmica de reforço, exige uma alteração, segundo melhor critério, do regime de nomeação do mais alto responsável. A dualidade de nomeação reforça singularmente o estatuto dessa entidade, não temos nenhuma dúvida, alarga lhe e complexifica lhe a base de apoio e, simultaneamente, altera os poderes do Governo - é um facto, desgovernamentaliza, semi desgovernaliza, desabsolutiza, num certo sentido, os poderes governamentais nessa matéria.
A dualidade de nomeação não implica, todavia, obrigatoriamente, que adoptemos uma solução unidimensional ou monológica. É inteiramente possível que alguém, cuja base de nomeação é dual, forme uma equipa discutindo a sua composição com a entidade - Governo, neste caso - que tem ou que manteria competência para a sua nomeação.
Como sabem, é um processo negocial em que a entidade nomeada forma a sua equipa gozando de apreciáveis poderes, um dos quais é o de, no limite da discordância, não aceitar continuar a exercer funções. E há uma paleta de mil cores para fazer intervir os ajustamentos necessários num processo negocial desse tipo.
Diz me: mas nós estamos disponíveis para que a equipa toda seja objecto dessa nomeação. É preciso ter cuidado com o regime, com as configurações presentes e com as que imaginemos no futuro para essa equipa, Governador e Vice Governador - o corpo pode ter estatutos e estruturas diversas, há exemplos noutros Estados membros de várias composições para este tipo de equipas. A nomeação de toda a equipa pelo Presidente da República, provavelmente, seria excessiva, a não ser que adoptássemos a prática de fazer o Presidente da República nomear uma panóplia vastíssima de entidades titulares de órgãos institucionais mais diversos. Pareceu nos que o topo, a cabeça das cabeças, era o que estava de acordo em relação ao estatuto do Presidente da República, que estava consonante com alto papel desempenhado pelo Presidente da República no sistema orgânico institucional da República Portuguesa. Se o PSD está disponível para ir mais longe, consideraremos, óbvia e benevolamente, com preocupação todavia de não alargar do topo da pirâmide até à base.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

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O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, queria manifestar me sobre a proposta relativa à nomeação do Governador do Banco de Portugal e dizer que não vemos com especial entusiasmo tal proposta. Compreendemos que esta proposta surgiu historicamente como algum desagravo ao Governador do Banco de Portugal que, na altura, era fustigado por ofensivas governamentais.
E não vemos com grande entusiasmo esta proposta pelo seguinte: não vou utilizar abundantemente o argumento de que o Banco de Portugal tem vindo a ser desvalorizado, o que tem a ver com o Tratado de Maastricht e com a evolução, que temos vindo a seguir, que é a de desvalorizar cada vez mais o papel do Banco de Portugal, mas não é essa a questão nem é isso o que estamos a discutir aqui.
De facto, não vemos que haja grande justificação em atribuir ao Presidente da República, com o quadro de competências que ele tem no nosso sistema constitucional, também esta competência. Sabemos que o Presidente da República tem especiais competências sobretudo em duas matérias, que são a Defesa Nacional e a política externa - aí, de facto, tem poderes de nomeação, quer no caso de embaixadores, quer no caso de chefias militares - mas tal não se passa com a definição da política económica e monetária.
Assim, em nosso entender, também não faz grande sentido que se atribua especial competência ao Presidente da República nessa área. Daí que nos parece que esta nomeação dos responsáveis do Banco de Portugal - que releva, sobretudo, da definição dessa política - é um típico acto de governo, pelo que não nos parece que faça grande sentido estar a acrescentar esta competência ao Presidente da República.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, queria apenas manifestar não só a pouca simpatia por esta proposta de alargamento das competências do Presidente da República à nomeação do Governador do Banco de Portugal mas também para frisar que me parece politicamente desadequada.
Ainda agora o Sr. Deputado António Filipe referia, do meu ponto de vista impropriamente, um papel menor que, face à União Económica e Monetária, o Banco de Portugal virá a desempenhar. Por acaso, eu penso que é o contrário que, quanto mais caminharmos no sentido do aprofundamento da União Económica e Monetária, maior será a relevância e o papel que o banco central português, incluído no conjunto dos bancos centrais, virá a desempenhar de forma independente do Governo.
Ora, julgo eu que manda a prudência que, apesar de não termos dúvidas de que devemos caminhar para o aprofundamento da União Económica e Monetária, a verdade é que também sabemos que o papel que o próprio Governo de cada Estado deve desempenhar na construção dessa União, deve, tanto quanto possível, ser reforçado - não apenas o dos Parlamentos mas também o dos Governos.
Em primeiro lugar, que não impende sobre o Banco de Portugal qualquer suspeição de falta de independência ou de isenção, portanto, não seria com certeza por essa razão que se justificaria um reforço da sua independência, passando ao Presidente da República a competência da nomeação do seu Governador, porque o Banco de Portugal é uma entidade perfeitamente idónea, isenta e independente.
Em segundo lugar, reforçará os meios de política externa que competem ao Governo português e até de reforço da condução da política externa europeia no que respeita à questão da União Económica e Monetária, que se mantenha a ligação institucional do Banco de Portugal ao Governo do País.
Portanto, parece me, com sinceridade, muito desadequada no tempo a apresentação desta proposta de alargamento das competências do Presidente da República, se bem que, em qualquer outro tempo poderia trazer a suspeição da falta de independência do Banco de Portugal que julgo ninguém questiona. Com sinceridade, não vejo muito fundamento para esta proposta que o PS faz.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, hoje, se há alguma coisa que é uma tendência visível, geral e universal, é a independência dos bancos centrais em relação aos governos. A desgovernamentalização dos bancos centrais é hoje um dado adquirido e, no quadro da Europa de Maastricht, é o ainda mais. Os governadores dos bancos centrais vão ter um papel essencial no Banco Central Europeu e ele não vai depender do Governo da União Europeia, vai ter uma autonomia que as Constituições nacionais estão hoje a garantir aos bancos centrais e que a revisão de 1989 garantiu, formal mas não organicamente, ao banco central em Portugal.
Acontece que hoje, em termos gerais, se considera que os bancos centrais são o exemplo típico da chamada administração não governamental, da administração independente - a Ministerialfreiverwaltung.
Ora, não existe administração não governamental quando os dirigentes do banco central são nomeados livremente pelo Governo; essa desgovernamentalização passa hoje, em todo o lado, por soluções não estritamente governamentais de nomeação dos dirigentes dos bancos centrais; mesmo nos regimes parlamentares, está hoje a tentar se encontrar soluções não estritamente governamentais de nomeação dos governadores dos bancos centrais.
Num sistema de Governo como o nosso, em que o Presidente da República tem um papel não puramente representativo, uma solução normal seria esta - porventura outras há para estabelecer uma independência orgânica e funcional dos governadores do banco central. Não se será a mais adequada, mas esta é adequada a um regime como o nosso, sobretudo onde o Presidente não é puramente representativo e onde há outros titulares de órgãos públicos que são nomeados pelo Presidente da República.
Portanto, eu não poria essa questão em termos de alargamento ou não das competências do Presidente da República, porque isso é indiferente: há aqui propostas de relativo alargamento e há propostas de relativa diminuição, por exemplo, em matéria de dissolução da Assembleia da República. Não vamos utilizar o argumento de "aqui d'el rei" que não se pode mexer no elenco de poderes do Presidente da República - penso que não seria uma argumentação razoável, aqui ou noutro lado, para alargar ou para diminuir. Do que se trata, é de saber se é uma boa solução para garantir a independência orgânica do Banco de Portugal que hoje, a meu ver, é um valor geral do banco central e é uma ideia geral da concepção dos bancos centrais na União Económica e Monetária, a nível europeu.
De resto, devo dizer que a proposta do PS tem uma diferença essencial em relação à proposta do CDS PP: é que, se ambas retiram ao Governo o poder de nomeação, a do PS não retira o poder de proposta pelo que, de acordo com o PS, só é Governador do Banco de Portugal quem

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o Governo proponha - ninguém mais! O Presidente da República não tem liberdade de escolha - tem, quando muito, liberdade de não nomear os que lhe são propostos, mas não há nenhum Governador do Banco de Portugal que possa ser contra a vontade do Governo.
Coisa diferente é a proposta do CDS PP, que retiraria ao Governo, formalmente, a competência sequer para propor, pois, na verdade, o Governador do Banco de Portugal seria escolhido pela Assembleia da República e, depois, nomeado pelo Presidente da República. Há uma diferença essencial entre as duas propostas, se bem que o objectivo geral de desgovernamentalização da nomeação exclusiva do Governador seja comum. Portanto, isso vai implicar uma autonomização - é óbvio.
Para quem entende que tudo o que diminua a esfera de administração e do Governo é mau, tudo pelo Governo e nada contra o Governo, então, obviamente, esta proposta deve ser rejeitada ab initio, porque é má por princípio. Mas surpreendeu me um pouco o Sr. Deputado António Filipe a reivindicar esta ideia de que isto iria diminuir a capacidade de intervenção do Governo, pois vai, mas o que se pretende, na proposta do PS, é exactamente isso: diminuir, nessa área, a liberdade de que hoje goza o Governo de escolher discricionariamente os Governadores do Banco de Portugal. Livre nomeação implica dependência. E, de facto, afirmar na Constituição e na lei que o Governador do Banco de Portugal e o Banco de Portugal são independentes, quando o Governo tem livre competência para nomear e exonerar o Governador do Banco de Portugal, obviamente que é uma independência diminuída.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, parece me que colocou bem a questão mas depois concluiu de uma forma à qual não posso dar, minimamente o meu acordo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se há um representante dessa postura que referi, é claramente o Sr. Deputado Luís Marques Guedes! Admito claramente que esteja contra esta proposta. Será perfeitamente razoável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, repito o que disse: o Sr. Presidente colocou bem a questão só que, depois, retira uma conclusão, do meu ponto de vista, perfeitamente errada. Vamos lá a ver: a questão é bem colocada quando o Sr. Presidente diz que o que está aqui em causa é a tendência clara e inequívoca de autonomização e conferência de uma maior independência aos bancos centrais, em termos comparados, inclusive.
Mas a resolução deste problema, do nosso ponto de vista, será completamente errada se optarmos por essa independência fazendo impender sobre o Presidente da República a competência para nomeação de uma entidade que tem a ver, fundamentalmente, com a condução da política económica e financeira nacional, matérias onde, do nosso ponto de vista, o Presidente da República não deve ser tido nem achado. Com toda a franqueza!… Isto é que é preciso dizer se: quem é competente, em matéria de política económica e financeira do País, é a Assembleia da República e o Governo da República. Esses é que são os órgãos de soberania competentes sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, permita me dizer lhe - para que, na sua discussão, não seja tão afirmativo em certas coisas - que, mesmo em regimes parlamentares, hoje, há soluções que apontam para isto, para atribuir ao Presidente da República a nomeação do banco central.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Continuando, Sr. Presidente, a questão: quando o artigo 105.º fala em colaboração, é evidente que essa colaboração, que o Sr. Deputado José Magalhães acha que não deve ser com o Governo, no mínimo, tem de ser com o Governo e com a Assembleia da República porque são as entidades responsáveis e que têm competência em matéria da condução da política económica e financeira em termos globais, e também da monetária, e também da fiscal, e também das sub políticas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, curiosamente, é exímio nas palavras...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se me deixasse concluir... Eu estive calado mas, sistematicamente, interrompem quando o PSD está a formular uma opinião diferente da do PS! Acho isto curioso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Deve ser da manhã, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes hoje chegou crispado à Comissão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, fiquei crispado...

O Sr. Presidente: - Mas não termine crispado, por favor! Termine pacificamente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, uma coisa são as chamadas "bocas" parlamentares, comentários...

O Sr. José Magalhães (PS): - Chamam se apartes!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Outra coisa é desatar a falar e interromper totalmente!

O Sr. Presidente: - Por favor, prossiga o seu argumento e conclua a sua intervenção.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como eu estava a dizer, tal como o artigo 105.º refere, a colaboração, do nosso ponto de vista, só pode ser entendida entre o Banco de Portugal, o Governo e a Assembleia da República. Contudo, com o Presidente da República, independentemente de, em termos de direito comparado, noutros sistemas, como o Sr. Presidente nos indicou, poder haver soluções desse tipo, o que é verdade é que no nosso sistema, actualmente, o Presidente da República não tem competências sobre essa matéria - e o PSD entende que não tem, e bem, que não deve passar a ter.
E se o PSD entende esta competência que vem na actual alínea m) do artigo 136.º da Constituição, de o Presidente da República participar na nomeação, ter a competência de nomeação sob proposta do Governo de instituições como o Tribunal de Contas e o Procurador Geral da República, isso inscreve se numa lógica completamente diferente.
No caso do Tribunal de Contas, do nosso ponto de vista, a leitura que fazemos, tem a ver com o facto de este

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ser o órgão fiscalizador sobre a própria actividade financeira do Governo e da Assembleia da República - portanto, faz todo o sentido aqui, por força da actividade de um órgão fiscalizador ter uma independência à parte dos fiscalizados, não ser nem o Governo nem a Assembleia da República a nomear.
No caso do Procurador Geral da República, tem a ver com o princípio supremo da independência da justiça, independentemente de, neste caso, do meu ponto de vista, o problema não se ter colocado politicamente, em termos de sistema político, de uma forma tão decisiva; em muitos outros países, que têm sistemas perfeitamente idênticos ao nosso em termos democráticos, ou parecidos, o Procurador já não tem de ser nomeado necessariamente pelo Presidente da República e pode ser nomeado por outras entidades, inclusive pelo próprio Governo ou eleito directamente.
Mas, no caso do Tribunal de Contas, o que está em causa - isto para que não se diga que o Tribunal de Contas também é uma entidade do âmbito financeiro, da parte financeira da administração - é um órgão de fiscalização; o Banco de Portugal é diferente, tem competências completamente diferentes, pelo que a colaboração terá de se aferir sempre, do nosso ponto de vista, em relação ao Governo e à Assembleia da República.
Termino, dizendo que a conclusão a que o Sr. Presidente - e aí teria alguma abertura para reflexão da parte do PSD - deveria ter chegado depois de colocar o problema da independência, seria a de propor, se o objectivo é o problema da desgovernamentalização, se é a separação da dependência exclusiva ao Governo, que se coloque no plano da Assembleia da República. Nunca por nunca é de colocar no plano do Presidente da República, pelas razões que acabei de dizer, que não faz sentido, pelo menos para o PSD não faz sentido absolutamente nenhum.
Se colocar a questão em termos da Assembleia da República, poderemos pensar no assunto. Não tínhamos pensado porque a proposta não foi feita nesse sentido. Mas se o PS pretender, se o objectivo claro é o problema da governamentalização, então, à semelhança do que acontece com outros órgãos, como o Provedor de Justiça, como outras entidades, proponham a sua eventual nomeação não pelo Governo mas, sim pela Assembleia da República. Neste aspecto, poderemos equacionar esta questão, mas quanto à nomeação pelo Presidente da República, desde já, dizemos que não.

O Sr. José Magalhães (PS): - Se bem percebi, a filosofia que o PSD, nesta matéria, adopta é seguinte: nenhuma intervenção do Presidente da República no processo de desgovernamentalização, numa questão que tem a ver com uma dimensão essencial da vida do Estado português, mas admite a parlamentarização da nomeação da equipa dirigente do Banco de Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não admito é o alargamento da competência do Presidente da República à esfera económica e financeira do Estado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está assente que o PSD e o PCP não acolhem a proposta de atribuir ao Presidente da República a nomeação...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, continuaremos esta discussão na próxima reunião.

O Sr. Presidente: - Por favor, as posições estão tomadas, mas se quiserem retomá las, fá lo ão.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 12 horas e 50 minutos.

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