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Quarta-feira, 27 de Novembro de 1996 II Série - RC - Número 58

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 26 de Novembro de 1996

S U M Á R I O


A reunião teve início às 10 horas e 40 minutos.
Procedeu-se à discussão do artigo 232.º constante dos diversos projectos de revisão constitucional.
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Presidente (Vital Moreira), os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Medeiros Ferreira (PS), Moreira da Silva (PSD), Lalanda Gonçalves (PSD), Luís Sá (PCP), Luís Marques Guedes (PSD) e Cláudio Monteiro (PS).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 12 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente (Vital Moreira): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados, retomamos os trabalhos no ponto onde os deixámos na reunião anterior, sendo que o tema é o estatuto do Ministro da República, cuja discussão já foi iniciada.
Antes, porém, quero chamar a atenção para o facto de o nosso mandato ter sido prolongado até 24 de Dezembro, o que quer dizer que coincide com as férias de Natal. Penso que seria negativo que não terminássemos a primeira volta até essa altura, embora, pelo ritmo a que vamos, veja isso com alguma dificuldade. Por isso, apelo ao vosso sentido de economia e contenção na discussão dos assuntos que nos restam, sem prejuízo da importância de matérias como a das regiões autónomas.
Quanto à matéria relativa ao Ministro da República há, como sabem, quatro propostas que vou resumir para poupar argumentos.
A proposta mais radical, do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, é a de eliminar, pura e simplesmente, o Ministro da República, trespassando os poderes parapresidenciais para o Presidente da República e os paragovernamentais para o Governo.
A segunda, do PSD, é no sentido de substituir os Ministros da República por um ministro do governo da República com as funções actuais, ou seja, com a dupla função parapresidencial e paragovernamental. A proposta sugere que haja apenas um Ministro do Governo da República e não os dois Ministros residentes.
A terceira, do Sr. Deputado Guilherme Silva, consiste em substituir os Ministros da República por dois delegados do governo da República, com funções apenas na área administrativa, entregando ao Presidente da República os poderes parapresidenciais.
Há uma proposta mista do Sr. Deputado António Trindade, embora aparentada com a anterior, que substitui também o Ministro da República por dois Ministros residentes, embora uma parte dos poderes parapresidenciais passem a ser exercidos pelo Presidente da República.
Finalmente, a quarta proposta é do Partido Socialista, no sentido de manter os Ministros da República com a sua configuração actual, com poderes parapresidenciais e paragovernamentais, mas reformulando a sua definição.
Eis as quatro propostas que já foram apresentadas pelos seus proponentes. A discussão já se iniciou e por isso peço que poupem repetições.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, na última reunião V. Ex.ª fez algumas observações relativamente ao projecto de revisão que subscrevo no que diz respeito às regiões autónomas e ao Ministro da República e adiantou que o meu projecto pretendia consagrar o Estado federal.
Ora, sem prejuízo de já aqui ter dito que, mesmo no status actual, a solução autonómica que a Constituição consagra nalguns aspectos talvez até vá mais longe do que as soluções do Estado federal, devo dizer que não é meu propósito consagrar uma solução desse tipo, embora, do ponto de vista teórico e doutrinário, não me repugne considerá-lo. Não vejo, no entanto, pelo menos de momento, que seja a solução adequada à evolução das autonomias regionais.
Penso que este modelo sui generis pode e deve ser aperfeiçoado. O meu projecto tem como propósito evoluir nesse sentido, mas não pretendo transformar as actuais regiões autónomas em Estados federais e, apesar da proposta que fiz, e que já expliquei, de substituição das regiões autónomas por Estados regionais, nem sequer parece que este projecto veicule a ideia de Estados autonómicos.
Em todo o caso, V. Ex.ª atribui-me uma solução radical, mas a leitura de V. Ex.ª é ainda mais radical, o que quer dizer que, se o meu projecto fosse consagrado, a doutrina do constitucionalista Vital Moreira ainda seria mais avançada do que a própria letra da minha proposta. E, nesse aspecto, a autonomia regional teria a ganhar também nessa construção, para que V. Ex.ª brilhantemente com certeza contribuiria.
Invocou V. Ex.ª o Direito comparado para dizer que nas soluções europeias de regiões não havia nenhuma situação em que não existisse uma figura similar à do Ministro da República, mas, salvo o devido respeito, não é inteiramente verdade a afirmação que V. Ex.ª fez. Há, efectivamente, quer no direito italiano, quer no direito espanhol, figuras próximas, mas lembro-lhe a solução espanhola em que há uma figura, em grande parte, próxima daquela que aqui veiculo, ou seja, a dos delegados do governo.
Portanto, resolvia-se assim o problema da coordenação dos serviços periféricos do Estado e da sua articulação, eventualmente, em parte com os governos regionais, com as autoridades regionais, por via do delegado do governo. E é também a solução espanhola que aponta para a representação do Estado ser feita pelo Presidente do governo - e V. Ex.ª sabe que é assim.
V. Ex.ª teve alguma reticência em relação à referência que fiz porque era feita a terceiros, isto é, à doutrina defendida pelos Profs. Barbosa de Melo e Cardoso da Costa no projecto de revisão que fizeram aquando da revisão constitucional de 1982. Efectivamente, eles afirmam que não se ignora o desajustamento desta espécie de alto comissário a um sistema de autonomia regional propriamente dito e adiantam que o estádio das autonomias, naquela altura, não justificava ainda que se evoluísse para uma solução que levasse à extinção deste cargo.
Naturalmente, passados 20 anos, e de acordo uma leitura actualística desta doutrina, ela irá - eventualmente, sem querer ser abusivo relativamente ao pensamento dos seus autores - no sentido de admitir a extinção deste cargo.
Mas é interessante que a solução espanhola insira uma componente que sinto que repugna os constitucionalistas, e designadamente V. Ex.ª, que é a de a representação do Estado ser assegurada por uma figura que tem uma legitimidade autonómica, por um lado, e uma legitimidade democrática, por outro, porque é o Presidente do governo regional eleito que assegura a representação do Estado.

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Temos algum medo deste tipo de solução. Considero que, do ponto de vista do Estado unitário, que defendemos - embora se trate de Estado unitário regional, como defendo - esta solução é bastante mais acertada do ponto de vista das relações entre o Estado e as regiões autónomas e seria, eventualmente, se esse problema da representação do Estado se mantiver ou se colocar, uma via adequada para as autonomias regionais dos Açores e da Madeira.
Temos, então, uma razão para argumentar com o Direito comparado, já que existe uma solução no Direito comparado. Temos no Direito espanhol uma solução deste tipo que não vejo que possa repugnar relativamente à solução que deveríamos encontrar em sede de revisão constitucional.
Portanto, gostaria que ficasse claro que não veiculei uma solução de Estado federal, embora no domínio da consideração teórica não me repugne que isso seja trazido à colação, e não é verdade que as soluções de Direito comparado se desviem da solução proposta, porque não proponho a extinção do cargo do Ministro da República, proponho, sim, a extinção do cargo do Ministro da República e a criação de um delegado do Governo.
Nessa medida, não me afasto de soluções de Direito comparado que V. Ex.ª invocou para rebater a minha posição e, ao fim e ao cabo, parece que não era tão linear que desse Direito comparado resultassem soluções opostas ou desviadas daquelas que eu próprio proponho.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, como a intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva foi feita em relação a observações suas, não sei se quer ou não responder.

O Sr. Presidente: * Prescindo de qualquer resposta já que deve começar por mim a ideia de contenção e de economia.
Tem a palavra, Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Mas a economia também não pode ir ao ponto de se deixar de discutir estes assuntos.

O Sr. Presidente: * Penso que a sua intervenção enriquece sempre o debate, não leve a economia ao ponto de empobrecer o debate.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * A questão da existência dos Ministros da República, nos Açores e na Madeira, tem sido, desde o seu início, bastante discutida. É óbvio que há aqui várias visões e também um contexto político da sua apresentação.
Creio que temos que ver, como é óbvio, que, até aqui, a própria experiência indica que a existência dos Ministros da República - e não é por acaso que falo no plural, porque me parece, obviamente, deslocada a proposta do PSD, que não é a do Sr. Deputado Guilherme Silva, de reduzir para um o cargo de Ministro da República, o que seria, no fundo, talvez uma nostalgia de uma antiga coordenação dos territórios ultramarinos, aqui no sentido francês, de outremer, que não me parece ser de acolher…
Mas, como estava a dizer, a solução proposta pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, quanto a mim, cai por base, tendo em conta as competências do Ministro da República e a necessidade dessas competências que, no fundo, derivam da sua dupla condição de representante do Presidente da República e, tal como dizemos na nossa proposta, também de representante do Governo, superintendendo aos serviços da República na região.
Portanto, segundo creio, essa dupla função do Ministro da República tem sido, até aqui, de facto, bastante positiva para as relações mútuas entre as regiões autónomas e a República, pelo que creio ser errado tocar nesta experiência - que tem dado bons resultados, independentemente das polémicas políticas - para além daquilo que são lacunas ou precisões. Razão pela qual, como já se verificou, a proposta do Partido Socialista, nesse domínio, é bastante cautelosa e minguada.
Pensamos que os dois Ministros da República devem manter-se residentes nas respectivas regiões, o que afasta, desde logo, a questão de um só Ministro da República, pelo que essa hipótese, quanto a mim, está logo fora de consideração.
Quanto à questão de ter dois Ministros da República nas regiões autónomas com funções derivadas das funções presidenciais, como a da nomeação de um governo regional, como a questão, embora mais polémica, da constitucionalidade das leis...

O Sr. Presidente: * A assinatura dos decretos.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sim, a assinatura dos decretos e das leis, tudo isso são funções derivadas das competências presidenciais que não me parece serem de eliminar por uma questão de cautela e de previdência política nas relações mútuas entre a República e as regiões.
Não podemos colocar o símbolo da unidade do Estado, que é o Presidente da República eleito directamente por todo o país, a pronunciar-se, em primeira leitura, sobre matérias que terão sempre uma carga que poderá ser polémica, quando contrariam, por exemplo, uma maioria, quando se trata de uma contradição entre uma lei elaborada pela Assembleia e um decreto regional. Seria errado colocar o Presidente da República como primeiro interveniente desse processo.
O Ministro da República deve continuar a ter essas funções e, portanto, também aqui não me parece correcta a ideia do Sr. Deputado Guilherme Silva. Quando tenta substituir os Ministros da República pelos delegados do Governo está exactamente a eliminar as funções que acabo de descrever e a acentuar o lado do governo central e isso, sim, é que me parece surpreendente, tendo em conta toda a filosofia que o Sr. Deputado Guilherme Silva tem vindo a desenvolver com perícia e até contenção, por aquilo que resultou das suas últimas palavras.
Portanto, a existência de um delegado do Governo da República junto dos governos regionais é que, sinceramente, me parece paradoxal, embora o Ministro da República tenha também funções, como dizemos na nossa proposta - e aí há uma modificação -, de superintendência dos serviços do Estado na região. Parece-nos que "superintender" é uma expressão mais correcta do que a que consta do texto constitucional, que, como sabemos, fala de coordenação com a competência ministerial.
Pensamos que podem ser mondadas as expressões mais expressivas (passo a tautologia), razão pela qual falamos apenas de superintendência dos serviços e das funções administrativas do Estado na região, exactamente para que isso não venha a brigar com qualquer competência atribuída aos poderes próprios da região.
É por isso que penso que o principal problema é, de facto, aquele de que a proposta do Partido Socialista trata, ou seja, a duração do mandato do Ministro da República.

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O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * O Sr. Deputado Medeiros Ferreira adiantou como crítica à solução que proponho a circunstância de se retirar a esta figura substitutiva do Ministro da República, decorrente da sua extinção, a representação da soberania, tendo falado na representação do Presidente da República. Mas não vejo que o projecto do Partido Socialista mantenha essa prerrogativa do Ministro da República, pelo contrário.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Por dois motivos, sim. Porque embora o n.º 1 seja mais "enxuto" do que o actual, não fizemos nenhuma proposta de alteração da efígrafe do artigo 232.º, continuando a ser "Representação da soberania da República" na região, mesmo que fosse do Estado. Mas sendo representação da soberania, por maioria de razão, sabemos que o órgão de soberania Presidente da República tem que estar representado e as próprias funções…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Mas V. Ex.ª sabe que as epígrafes é que se têm de adaptar ao texto e não o texto a uma epígrafe que está desfasada.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sim, mas se houver alguma dúvida sobre as competências derivadas das competências presidenciais o Partido Socialista está aberto a...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * A manter o que está.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Não direi a manter o que está, mas a colocar qualquer expressão que indique que essas funções continuam a ser mantidas pelo Ministro da República.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, ainda que tendo em conta uma perspectiva de contenção, não quero deixar de marcar a minha posição, que é ligeiramente diferente da que resulta das propostas apresentadas, designadamente da proposta do partido onde me insiro e por isso gostava aqui de dizer duas ou três palavras sobre esta alteração.
Relativamente às propostas em presença, penso que as apresentadas quer pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, quer pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, quer pelo próprio PSD têm uma grande vantagem que é a de clarificar a função do Ministro da República.
Concorde-se ou não - e veremos que não estarei totalmente de acordo com essas propostas -, penso que têm a vantagem de clarificar a função desta figura institucional, que todos concordamos que tem o seu quê de sui generis na nossa figura constitucional.
Penso que a proposta do Partido Socialista, por outro lado, vem, pelo contrário, tornar ainda mais complexa esta figura e direi sinteticamente porquê: por um lado, retira do texto do artigo a referência à representação da soberania da República, embora, por outro, a mantenha na epígrafe; depois, retira a referência à entidade com competência para nomear o Ministro da República, mantendo apenas a competência para a sua exoneração; por fim, retira a função de coordenação, mantendo a função de superintendência na actividade e nas funções administrativas, função essa cuja origem, isto é, o artigo 124.º da Constituição italiana, não é clara, e em Portugal também nunca o foi, e penso que a prática constitucional desta função do Ministro da República também não tem contribuído muito para a clarificar.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Moreira da Silva, devo fazer uma pequena correcção, que penso que não retira nada à sua argumentação. É que o PS não alterou o artigo 136.º na parte em que atribui ao Presidente da República a competência para nomear o Ministro da República.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Mas estou a referir que torna o artigo mais complexo porque omite essa referência.

O Sr. Presidente: * Trata-se de uma pura repetição.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Não sei se será repetição numa situação tão importante, e aliás temo-lo visto pela discussão que temos tido em torno desta figura.
Por isso, retirar essa referência tem que ter algum sentido e com certeza levará a algumas interpretações que poderão ser menos claras.
No fundo, a proposta do Partido Socialista é claramente incompreensível e penso que não traz nada de novo à figura tal como ela está hoje construída no nosso direito constitucional.
Embora considerando, como já disse, que as propostas do PSD, quer a do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, quer a do Sr. Deputado Guilherme Silva, quer a própria proposta oficial do Partido Social Democrata, clarifiquem esta figura, penso que pecam por retirar à figura aquilo que será a função principal da mesma, que é a de representação da soberania da República.
Penso, também, que, da experiência constitucional, também se tem verificado que essa é a principal função do Ministro da República e, no contexto Estado unitário regional em que Portugal se insere, penso que essa será a função principal a ser assegurada pelo Ministro da República.
Verificamos que noutras experiências, quer, como o Sr. Deputado Guilherme Silva referiu, na espanhola, quer na italiana, quer mesmo na dinamarquesa, quer noutros Estados não regionalizados em que existem figuras aproximadas, a figura ligada ao governo muitas vezes deriva do facto de o regime ser monárquico e não republicano e por isso o governo terá uma relevância maior do que o chefe de Estado. E noutros casos verificou-se que isso levará a uma subalternização deste representante do Estado na região, muitas vezes através de uma "governamentalização" do cargo ou, noutros casos ainda, de uma pura função de harmonização administrativa que, penso, até poderá trazer maiores problemas para a autonomia regional portuguesa do que a actual figura.
Por outro lado - e penso que o Sr. Presidente referiu isso e eu estou de acordo -, esta figura permite também que, no nosso sistema constitucional, o Ministro da República exerça uma função de ligação entre os governos das regiões autónomas e o Presidente da República e também

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entre os governos das regiões autónomas e o governo. E penso que transferir essa relação para uma relação directa entre os governos das regiões autónomas e o próprio Presidente da República ou o próprio governo tornaria mais conflituoso, directamente com órgãos de soberania, o nosso sistema constitucional e através disso poderiam também colocar-se alguns problemas de alguma gravidade para o sistema. Daí eu considerar que se deve manter a redacção actual.
Penso que a questão da soberania da República está suficientemente clara no texto constitucional. A questão das funções administrativas não o está, mas penso que nem seria necessário torná-la mais clara, porque tem, segundo penso, um peso menor na construção desta figura.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.

O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): * Sr. Presidente, partilho inteiramente a posição do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho relativamente à eliminação do cargo do Ministro da República, e faço-o por variadíssimas razões.
Penso que o cargo, da forma como está desenhado, tem múltiplas ambiguidades. A nomeação do Ministro da República pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, cria uma ambiguidade na actuação do Ministro da República que tem sido visível ao longo dos anos, dando origem, em muitos casos, a conflitos entre a própria administração regional e a administração central.
É também uma figura que, por não ter prazo, por vagamente superintender inclusive os serviços do Estado na República, entra também em conflito com a própria estrutura do governo, com os próprios Ministros que não estão impedidos de ter uma acção directa na região, ou nas regiões, e, por essa óptica de intervenção, a figura do Ministro da República é extraordinariamente ambígua.
Partilho de uma tese de cidadania plena dos açoreanos, ou dos madeirenses, relativamente à cidadania nacional e não vejo necessidade de haver uma especial representação de soberania.
As autonomias são definidas como contributivas para a unidade do Estado, para a unidade da Nação e a representação especial da soberania por parte do órgão Ministro da República é, em certa medida, um factor até inclusive de suspeição, porque lança a ideia de que nós, regiões autónomas, nós, populações das regiões autónomas, precisamos de uma soberania acrescida de representação ou uma representação acrescida de soberania, quando, de facto, sob o ponto de vista da concepção do Estado, penso que isso não é necessário.
Daí a eliminação do cargo de Ministro da República inserir-se numa lógica de reforço, não só da autonomia, mas de uma arquitectura de Estado mais estável.
De facto, o cargo do Ministro da República tem múltiplas instabilidades e uma delas é o facto de esta figura estar, como Ministro do Governo, responsável directamente por uma área e estar vinculado a programas de governo. O que acontece é que os governos sucedem-se e o Ministro da República passa de governo em governo, vinculando-se sucessivamente a programas de governo diferente.
Portanto, dentro desta óptica, e porque se trata de uma figura ambígua, não vejo necessidade de a manter na Constituição.
Não seria negativo que o Presidente da República assegurasse a promulgação dos decretos legislativos regionais e todos os outros tipos de legislação poderiam ter órgãos próprios para a sua promulgação, designadamente, o Presidente da Assembleia Regional e o próprio Presidente do Governo, em actos de menor importância, como as portarias.
Era este o ponto de vista que gostaria de exprimir neste momento.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, entendemos que a figura de Ministro da República deve ser mantida na dupla função que actualmente tem.
Por um lado, em relação à função "prefeitural" cremos que há especificidades de actuação e objectivos dos serviços da administração central justificados pelas características próprias e pela insularidade dos sistemas autonómicos e, por outro lado, em relação às funções comissariais, somos muito sensíveis à argumentação aqui produzida segundo a qual funções como o direito de veto devem ser exercidas por alguém que permita que o Presidente da República não seja envolvido no dia-a-dia e nos conflitos próprios do funcionamento das regiões autónomas.
A proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva vai no sentido de manter as funções "prefeiturais" e de eliminar as funções "comissariais". Ela tem exactamente este último defeito que acabei de referir.
Creio que seria, efectivamente, muito...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Será defeito?

O Sr. Luís Sá (PCP): - ... desvantajoso para a figura do Presidente da República este envolvimento em conflitos - que a prática já revelou que por vezes até são bastantes agudos - próprios do funcionamento dos sistemas políticos autonómicos.
O Sr. Deputado Pedro Passos Coelho, com o apoio que acaba de lhe ser dado, elimina as duas figuras, colocando, efectivamente, uma questão: é que se mantêm serviços periféricos da administração central nas regiões autónomas e, naturalmente, não havendo uma figura com possibilidades, por um lado, de exercer funções de coordenação destes serviços e, por outro lado, de os coordenar com os próprios serviços autonómicos, isto corresponde a uma perspectiva de forte centralização das funções que eram exercidas no terreno e, creio eu, com uma maior possibilidade de sensibilidade relativamente às realidades próprias de cada uma das regiões.
Por outro lado, julgamos que a proposta do PSD de criar um ministro para as regiões autónomas é, francamente, infeliz. Uma das vantagens da actual figura é exactamente o facto de residir no terreno e de, tendo funções de representante da soberania, do Estado, ter também uma sensibilidade quanto às realidades políticas locais, às especificidades da máquina administrativa regional, e, inclusive, uma capacidade negocial decorrente exactamente desta inserção no sistema político local, naturalmente, com funções específicas, com uma ligação também ao sistema político nacional.
Criar, como aqui já foi dito, um ministro do "ultramar" acaba, no fim de contas, por ter desvantagens, que, a nosso ver, sem razão, são apontadas ao Ministro da República, e elimina uma das actuais vantagens que o sistema tem,

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portanto, não vemos que estas propostas tragam qualquer melhoria à situação actual.
Como foi dito, designadamente pelo Sr. Presidente na última reunião, o sistema actual tem funcionado, tem especificidades em relação a outros, mas eu diria que os traços fundamentais nem sequer são completamente inéditos em termos de Direito comparado.
Quanto à proposta do Partido Socialista, não vemos, francamente, vantagens em eliminar do texto do n.º 1 do artigo 232.º a função de representante da soberania e em mantê-la na epígrafe. Enfim, o Partido Socialista lá saberá a razão profunda da sua proposta, mas, francamente, não vemos vantagens nesta matéria.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, o mal está em manter a representação na epígrafe ou em retirá-la do texto constitucional?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Não faço comentários, Sr. Presidente.
Quanto à segunda questão, que é colocada nesta matéria, actualmente a Constituição fala em superintender em funções administrativas. Isto tem um sentido: significa superintender nos fins da actividade administrativa, designadamente, de serviços desconcentrados da administração indirecta do Estado, etc.
Superintender na actividade dos serviços implicaria, eventualmente, alguma ambiguidade, porque normalmente a expressão superintender em Direito Público está ligada à fixação de fins, deixando às respectivas entidades que são objecto da superintendência a escolha dos meios para atingir estes fins. Ora, há uma linha hierárquica nesta matéria, ou, então, uma linha de superintendência exercida pelo órgão competente da administração central.
Falar em superintendência na actividade dos serviços é de duvidosa correcção técnica, e creio até que pode trazer ambiguidades em relação àquilo que está estabelecido actualmente, que é uma função de coordenação. No fim de contas, é uma função de exercício de diligências, para que não se verifiquem situações de descoordenação de funcionamento de serviços. Portanto, não vemos que esta proposta introduza qualquer mais-valia.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, para ir ao encontro do seu desejo de acelerar os nossos trabalhos, creio, sinceramente, e com o devido respeito pelas propostas que aqui foram avançadas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva e pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e outros, pela posição que me parece que o PSD toma nessa matéria - até pela apresentação que faz de uma proposta inerente ao artigo 232.º, o que demonstra aqui a pluralidade de iniciativas -, que, em termos de discussão útil, agora só devo pronunciar-me sobre a proposta do PSD, na medida em que as outras não vão ter vencimento, em termos dos necessários 2/3. Já referimos os principais argumentos sobre por que é que estamos contra, portanto, não vale a pena insistir.
Digo o seguinte ao PSD, em especial: não aceitamos, de maneira nenhuma, que se passe de dois ministros da República para um. Para nós, esta matéria é incontornável, o que quer dizer que não haverá consenso quanto a essa ideia.
Também não vemos que, a ter que ouvir-se alguém para a nomeação do ministro da república, no caso de ela ficar consagrada neste texto, tenham que ser os governos regionais. Sinceramente, também nos parece uma proposta com poucos "pés para andar".
A proposta estabelece que têm que ser ouvidos os presidentes dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas. Ouvidos é uma expressão geral e percebe-se a intenção, e presumo que a expressão presidentes dos órgãos de governo também se refere à Assembleia Legislativa Regional, mas isso não está claro, e também teríamos dificuldades em aceitá-lo.
Por último, embora o Sr. Presidente já tenha dito que esse tema será discutido posteriormente, a proposta do PSD para o n.º 3 do artigo 232.º também não está clara: se o ministro para as regiões autónomas exerce as suas funções pelo período de quatro anos, elas podem, ou não, ser renovadas? É isto que não se percebe nessa proposta.

O Sr. Presidente: * Já iremos a essa parte, Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: * Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, o senhor referiu mais uma vez o Direito comparado, pelo que queria que me desse um esclarecimento.
Como sabe, o direito constitucional não atribui, quer à figura do comissário italiano, que é um comissário do Governo, quer à do delegado do governo em Espanha, qualquer representação da soberania ou do Estado, e as comunidades autónomas e as regiões, em Itália, funcionam sem sobressalto neste particular, designadamente, no relacionamento das próprias com o Estado. Mais: como já disse, no caso espanhol, a representação ordinária do Estado é assegurada pelo presidente do governo regional.
Repugna ao Sr. Deputado uma solução deste tipo, já que nesta matéria invoca o Direito comparado com alguma frequência?
Estará, ou não, o Estado das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, passados estes 20 anos, em situação de também poder evoluir, neste particular, para este tipo de solução, que, no fundo, corresponde em parte àquilo que proponho?
No seu entender, o que é que obsta a que haja uma evolução neste sentido?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, creio que não sou propriamente eu que invoco o Direito comparado; são aqueles que combatem a existência de um Ministro da República, que afirmam que

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esta proposta é uma aberração que não existe em mais parte nenhuma do mundo.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Desculpe lá, mas é verdade!

O Sr. Luís Sá (PCP): - Ora, quer as funções "prefeiturais" quer as "comissariais" existem em muitos lados, e nesta matéria é de sublinhar, particularmente, a experiência de países que têm ilhas, como, por exemplo, a Dinamarca.
Isto para dizer que não se trata propriamente de um dinossauro muito estranho. Tem especificidades, pois tem, tem originalidades, pois tem, mas são originalidades que têm funcionado, e, como referi, não é propriamente uma aberração, não é algo que não exista em mais nenhuma parte do mundo.
Fala-se em representação da soberania, e parece que esta palavra cria grandes dificuldades aos Srs. Deputados. O problema que se coloca nesta matéria é, no fim de contas, saber quem exerce funções típicas de representação do Estado e, designadamente, quem exerce uma função típica de um órgão de soberania, que é, por exemplo, o direito de veto.
Efectivamente, é este o problema que está em cima da mesa. E, aqui, há duas opções: ou esta função é exercida pelo Presidente da República com todos os prejuízos que daqui resultam, designadamente, para a salvaguarda da própria figura do Presidente da República, ou é exercida pelo comissário que exerce estas funções de representação do Estado, ou de representação da soberania, para utilizar a palavra que parece incomodar, em particular, os Srs. Deputados. É esta a questão que está em cima da mesa.
A nossa opção nesta matéria é clara: é preferível salvaguardar o Presidente da República e manter a figura, nos termos em que está desenhada!

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva, para uma segunda intervenção.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, quer o Sr. Deputado Medeiros Ferreira quer o Sr. Deputado Luís Sá, disseram algumas coisas sobre a quais, penso, importa fazer aqui um esclarecimento.
Penso que o PSD não se sente, de forma nenhuma, envergonhado com a figura do Ministro da República e, como sempre e desde o início, é evolutivo e analisa a figura.
Recordo que a criação desta figura, em 1974, se deveu ao PSD Açores e que ela foi transposta para a Constituição quase ipsis verbis, tal como foi proposta pelos Srs. Deputados - entre eles o Sr. Deputado Mota Amaral, que actualmente é Deputado e que foi um dos autores desta proposta -, contrariamente à proposta apresentada pelo PS, na altura, que era de uma mera autonomia administrativa e muito envergonhada.
Parece-me que agora, 20 anos decorridos, há uma reflexão - embora eu não concorde inteiramente -, por parte do Partido Social Democrata, no sentido de fazer evoluir a figura para outros contornos. O que me parece é que o Partido Socialista e pelos vistos o PCP também continuam extraordinariamente conservadores. Se, na altura, eram conservadores para um Estado unitário e nem sequer pretendiam avançar para o Estado regional, agora, são conservadores para aquilo que temos e não querem avançar para outra realidade.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Agora, e sempre, para o Estado unitário regional!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Então, se calhar, não querem avançar para outro tipo de figura constitucional.
Por isso, penso que o PSD não se sente, de forma nenhuma, envergonhado com esta figura.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, eu não queria tomar-lhe muito tempo, mas penso que é sempre desagradável ouvir aqui referências, que nem sempre são muito rigorosas, sobre o papel que os diferentes partidos tiveram no estabelecimento da autonomia das regiões autónomas na Constituinte.
Como o Sr. Deputado possivelmente não se lembra, porque é muito novo, graças a Deus, mas há-de chegar à nossa idade, vou dizer-lhe como foi: o Partido Socialista, nessa matéria, teve uma posição que acabou por constituir o equilíbrio institucional em que vivemos.
Um dos últimos Títulos a ser discutido na Constituição de 1976 foi exactamente o das Regiões Autónomas. Nessa altura, viveu-se um período extremamente tenso e o Partido Socialista teve a lucidez de, apesar dessas tensões, manter o esclarecimento necessário para aprovar uma arquitectura de autonomia regional que mantivesse a unidade dos Estados e a autonomia que nós, hoje em dia, podemos observar como sendo uma das grandes realidades da arquitectura constitucional portuguesa. E até há certos países, hoje em dia, que gostariam de repetir essa experiência para resolverem diferentes soluções.
Portanto, intervim só para relembrar ao Sr. Deputado que o Partido Socialista era o maior partido da Constituinte e, já agora, gostava de dizer (aliás, também o disse por volta em 1977) que vejo a autonomia dos Açores e da Madeira como uma espécie de fermento na massa da soberania nacional - isto para responder ao Sr. Deputado Lalanda Gonçalves. No meu entender, as autonomias avolumam a soberania nacional, fazem-na crescer.
Disto não tenho qualquer dúvida, mas penso que, para além disso, têm que haver alguns mecanismos, sobretudo aqueles que têm dado boas provas. O Ministro da República, fora algumas polémicas circunstanciais, não tem provado bem.
Em relação à questão da expressão coordenação dos serviços - sinceramente, penso que é umas das que pode ficar em aberto, a superintendência ou a coordenação -, ela tem que ver com uma realidade que também não podemos esquecer.
Primeiro, nomeadamente nos últimos 10 anos, os serviços do Estado, nas regiões, nomeadamente nos Açores, degradaram-se, porque também houve - é preciso que se diga -, da parte do Governo central, o aproveitamento das autonomias para uma particular gestão do egoísmo continental.
Ah, é verdade: se os Srs. Deputados forem visitar os Açores e virem grande parte dos serviços do Estado na região hão-de verificar como é que eles estão agrupados.

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O Sr. José Magalhães (PS): * Há um relatório bem interessante!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Exactamente!
Isso só demonstra que o Estado, pelo menos nos últimos 10/15 anos - para não haver aqui qualquer tendência de partidarizar esta questão -, aproveitou as autonomias dos Açores e da Madeira para se desinteressar desses serviços.
Nesta coordenação, o Ministro da República também tem por função, exactamente, alertar os serviços do Governo para o estado dos serviços do Estado na região. Obviamente, esta coordenação também se faz em favor do bem público.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
Sr. Deputado, peço-lhe que não eternizemos a discussão, suponho que já estamos a repetir argumentos.

O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): * Sr. Presidente, apenas quero pedir um esclarecimento.
Sr. Deputado Medeiros Ferreira, vejo com agrado que refere que os serviços do Estado na região se encontram num estado muito degradado, pelo facto de, quando se argumenta em relação à superintendência do Ministro da República nos serviços do Estado na região, esta ser a maior prova de que essa superintendência não se efectiva pela dificuldade que existe, neste momento, de articulação do próprio Ministro da República com a restante acção do Governo da República. Aliás, é pelo facto de ser uma figura sui generis nesse domínio que a superintendência dos serviços do Estado na região não tem a eficácia que poderia ter se houvesse uma outra forma de relacionamento.
E aí discordo frontalmente, porque não será pelo reforço ou pelo redesenho da figura do ministro mas, sim, pela sua eliminação e por passar a haver uma efectiva cooperação entre os organismos da administração regional e do Governo da República, que se resolverá esse problema. De facto, a maior prova de que a superintendência dos serviços do Estado não funciona é exactamente o estado em que se encontram todos estes serviços nas regiões autónomas.
Aliás, refira-se o seguinte: nesse aspecto, a figura do Sr. Ministro da República encontra-se muitas vezes em conflito e, inclusive, como o Sr. Deputado sabe, é difícil fazer a fiscalização democrática que nós, Deputados da Assembleia da República, podemos fazer da sua acção, dados os contornos ambíguos da própria figura.
Portanto, é uma figura que escapa ao controlo democrático da Assembleia da República; é uma figura que é membro do Governo, mas que não o é; é uma figura vinculada ao programa do Governo, mas que não pode ser responsabilizada directamente.
É, pois, por causa de todas estas ambiguidades que proponho a extinção desse mesmo cargo e a sua substituição por uma outra forma de funcionamento do Estado.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Eu pensei que o que propunha era a fiscalização do Ministro da República pelos Deputados da Assembleia da República, o que eu era capaz de aceitar.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, ouvi a intervenção do Sr. Deputado Medeiros Ferreira e fez aqui um retrato tão cor-de-rosa das virtualidades da figura do Ministro da República, que confesso que fiquei um pouco com a sensação - o que é paradoxal, porque sei que é uma pessoa interessada nas questão das autonomias, até pelas suas funções - de que não conheceu todas as situações de conflito que se deram no passado recente à volta da figura do Ministro da República, e penso que é preciso ter isto presente.
Se estamos preocupados com questões que andam à volta da unidade nacional, parece-me que não é minimamente salutar manter o "recorte" do Ministro da República que se deu inicialmente, quando os últimos 20 anos revelam, efectivamente, que, quer no que respeita ao relacionamento dos órgãos regionais com o Ministro da República e com a República, por intermédio dele, quer do ponto de vista da sua função de coordenação e superintendência dos serviços periféricos do Estado - como aqui foi referido pelo Sr. Deputado Lalanda Gonçalves -, não foi uma solução benéfica para a democracia e para as instituições.
Do ponto de vista da sua função de coordenação e superintendência dos serviços periféricos do Estado quem conhecer o que se passa no relacionamento do Ministro da República com os sucessivos membros do governo dos vários sectores que têm serviços periféricos do Estado nas regiões autónomas vai perceber que essa intermediação é considerada quase sempre um empecilho. Os ministros preferem até, eventualmente, em alguns aspectos, tratar directamente com as autoridades regionais, apesar de tratar-se de matérias de serviços periféricos do Estado, do que fazê-lo por intermédio dos Ministros da República - aliás, muitas vezes há um esvaziamento concreto destas competências.
Num determinado dia, estive com uma representação da Assembleia da República numa reunião com um Ministro da República, sobre um serviço periférico do Estado numa região autónoma, que tinha um projecto urgente para ser concretizado. Nessa reunião os Srs. Deputados perguntaram várias coisas sobre esse projecto e o Ministro da República respondeu: "Ah, isso é lá para as Calendas. Não se sabe nada disso...!". No dia seguinte, os jornais noticiaram que esse projecto tinha sido aprovado, ia arrancar e tinha sido adjudicado. O Sr. Ministro da República não sabia uma linha do que estava a passar-se, porque os Ministros do Governo da República trataram directamente das questões.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, posso fazer só uma pergunta?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Srs. Deputados, realmente, ou andamos aqui à volta de fantasmas e metemos a cabeça na areia como a avestruz, para não ver a realidade, ou temos que assumir aqui a nossa responsabilidade.
Penso que, felizmente, as autonomias regionais e as instituições democráticas atingiram uma maturidade relativamente à qual não há mais lugar para suspeições. Portanto, não há que ter esta ideia de um fiscal, de um representante do Estado, genuinamente com estes contornos, há

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que acabar com isto! Quer dizer, temos que ser realistas e não vamos eternizar esta figura à volta de fantasmas!

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, não vamos eternizar a discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Tenho muita consideração pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira, sei quanto ele sente as suas autonomias regionais, e confesso que fiquei muito surpreendido com a sua intervenção sobre esta matéria!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, eu também fico surpreendido, porque não sei porque é que atribui tantas malfeitorias à figura do Ministro da República quando ele não é apenas o representante do Governo, como faz na sua proposta, e como é que os efeitos positivos dessa figura do delegado do governo da república que propõe, no aspecto particular que referiu, seriam maiores.
Sinceramente, não vejo em quê é que o Ministro da Justiça, o Ministro da Defesa, o Ministro da Administração Interna, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, se sentiriam, digamos, mais articulados com a passagem das funções do Ministro da República a meras funções governamentais.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Vou dizer-lhe porquê?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Digo isto, porque, pelo contrário, esse delegado do Governo, tendo menos competências, seria tentado, como é óbvio, a concentrar os seus esforços, porque com certeza não quereria ser delegado junto do governo da Madeira sem ter uma actividade digna de registo na superintendência desses serviços governamentais.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Pelo menos, ficava claro que era só isso!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Esta bem, era mau, mas era só isso!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * É que uma das razões que leva a que não seja nada, é querer ser tudo! Essa é que é a questão, porque ninguém sabe muito bem o que é!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Limitei-me a pretender compreender a coerência interna da sua proposta, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Guilherme Silva, está explicado. Se me permite,...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, permita-me.
Sou sensível aos problemas que aqui são colocados da promulgação dos diplomas regionais e do impacto dessas questões com o Presidente da República, mas, obviamente - que diabo -, temos sempre imaginação para encontrar soluções sucedâneas, nomeadamente, a de ser uma outra entidade a promulgar ou a assinar estes diplomas. Há formas, que não são necessária e exclusivamente a subsistência do Ministro da República, para resolver essas questões!
Mas também lembro que a circunstância de, por um lado, não ser Governo, rigorosamente, e de, por outro lado, não ser Presidente da República, rigorosamente, de não ser uma coisa nem outra, é um tampão, mas é um tampão excessivo! Por não ter essa responsabilidade em relação à solução directa de uma coisa e outra, ou de uma das coisas, vai podendo servir de mola e alimentar estes conflitos sem qualquer consequência, porque as confianças Governo/Presidente da República vão sendo ciclicamente mantidas, portanto, isso só estimula o acentuar desses conflitos, o que não me parece que seja benéfico.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, quero referir três questões, muito sinteticamente.
A primeira é a seguinte: creio que o problema da degradação dos serviços periféricos da administração central na região é um problema político, de vontade política dos titulares dos órgãos e da própria administração central e do Governo, e não do próprio modelo e das suas potencialidades. E bom é que o PSD reconheça que há dificuldades nesta matéria, porque esteve no governo durante 10 anos e, naturalmente, há responsabilidades que resultam do seu próprio governo, inegavelmente, tal como há dificuldades actuais que podem resultar do Governo de agora.
A segunda questão é a seguinte: o Sr. Deputado Guilherme Silva referiu a existência de situações de conflito entre os órgãos autonómicos e o Ministro da República. Sr. Deputado, creio que as situações de conflito são inerentes a um sistema democrático, só não há conflito quando há poder absoluto! Isto é evidente! Creio também que o facto de haver uma forma de Governo...

O Sr. Presidente: - Para haver conflito são sempre precisas duas pessoas, tal como para dançar o tango!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Há pessoas que dançam consigo próprias!

O Sr. Luís Sá (PCP): - Também me parece evidente que o facto de existir uma forma de governo de tipo parlamentar com maioria absoluta, como aconteceu durante tanto tempo, com liderança da própria maioria parlamentar pelo líder regional do respectivo partido maioritário, significa uma forma de poder absoluto, se não houver, naturalmente, outras situações, a que alguns chamariam forças de bloqueio, mas ainda bem que existem, porque são inerentes a um sistema democrático.
já agora, Sr. Deputado, digo o seguinte: há questões deste tipo que resultam também, por um lado, de projectos políticos muito próprios e, por outro lado, de configurações, até de tipo pessoal, muito especificas.
Tive oportunidade de ler um artigo acerca do Sr. Presidente desta Comissão, no qual é chamado de perigoso colonialista, depois de ter avançado, inclusive, com propostas que enriqueceriam, com certeza, a competência legislativa das regiões autónomas.
Portanto, há conflitos que resultam de situações deste género, isto é, de projectos políticos muito particulares, que

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não da questão de qualquer problema de existência de um Estado unitário regional fortemente descentralizado. Isso, hoje em dia, é perfeitamente consensual. É o problema de haver, eventualmente, outro tipo de feitios pessoais, por um lado, e de projectos políticos muito particulares, por outro lado.
A terceira questão que queria referir e que, de algum modo, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira abordou há pouco e que eu não referi na minha primeira intervenção, é a de ouvir órgãos de governo próprio das regiões acerca da nomeação do ministro da República.
Nesta matéria, o próprio grupo parlamentar do PCP adiantou uma proposta com maiores preocupações de pluralismo do que ouvir apenas o Presidente do Governo Regional ou o Presidente da Assembleia Legislativa Regional, no sentido de ouvir, pura e simplesmente, a Assembleia Legislativa Regional, pois todos os partidos representados nas respectivas assembleias se pronunciariam.
Tivemos a oportunidade de retirar esta proposta com base na ideia de que todas as divergências acerca da existência do ministro da República poderiam desaguar numa emissão de opinião que, mais do que a pessoa em concreto e as suas qualidades, teria em vista a própria configuração institucional do cargo. Mas, mais, criar-se-ia o seguinte conjuntura muito especial: qual seria a situação do Ministro da República que viesse a ser nomeado pelo Presidente da República após a emissão de um parecer negativo? Portanto, ou isto se configura como um direito de veto, na prática, ou então configura-se como uma situação em que a pessoa é nomeada para o cargo com um conflito declarado à partida. Por isso mesmo retirámos esta proposta e por maioria de razão nos pronunciaremos contra as outras propostas.
Tivemos a preocupação naturalmente de procurar criar uma situação de maior consenso em torno das figuras, de maior participação, de maior intervenção dos órgãos do governo autonómico, mas nesta situação concreta ponderámos devidamente e apelamos a que os outros partidos nela ponderem também, pois cremos que não seria uma mais-valia, que não seria um benefício, introduzir qualquer figura de audição prévia de qualquer órgão de governo autonómico sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, a discussão conduziu à revelação da inviabilidade das propostas feitas no sentido de eliminar a figura do Ministro da República, de o substituir por um ministro único da República, de o substituir por dois delegados do Governo com simples funções governamentais e à manutenção da figura do Ministro da República com a dupla face que ele tem.
Resta, portanto, a proposta do Partido Socialista em dois pontos: em primeiro lugar, quanto à explicitação ou não da função de representação do Estado por parte do Ministro da República, que o PS eliminou da definição do n.º 1, do artigo 232.º, ponto que, na semana passada, eu apelei ao PS que reconsiderasse; em segundo lugar, o emagrecimento que o PS propõe para as funções de representação governamental do Ministro da República, nomeadamente eliminando as funções de coordenação da actividade dos serviços centrais do Estado e a referência à competência ministerial.
Gostaria de começar por ouvir o Partido Socialista sobre estes dois pontos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Penso que, de facto, poderão haver algumas melhorias na redacção da proposta do Partido Socialista. De facto, chegámos à conclusão que a expressão "A soberania da República" tem motivado algumas incompreensões e podemos aceitar que venha a ficar qualquer coisa como "O Estado é especialmente representado".
Em relação às funções de superintendência e coordenação, as duas propostas conjuntas querem exactamente clarificar a competência do Ministro da República em relação aos ministros do governo regional, o que, aliás, foi uma preocupação aqui manifestada, sobretudo por parte dos Deputados do Partido Social-Democrata.
Portanto, quando retiramos a expressão "da competência ministerial" fazemo-lo exactamente para que se entenda que quando Ministro do Governo da República actua não o faz em cooperação ou em tutela dupla com o Ministro da República, actua, sim, por direito próprio. Consequentemente, mantemos a retirada da expressão "dispondo para isso da competência ministerial".

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, o Partido Socialista, relativamente aos dois pontos que mencionei da sua proposta, na especialidade, encara a possibilidade de manter uma referência à função de representação especial do Estado, substituindo a actual expressão "soberania da República" e mantém a ideia de eliminar a referência a "coordenação da actividade dos serviços centrais do Estado" e à ideia da "competência ministerial".
Gostaria que os demais partidos tomassem posição quanto a estes dois pontos, de forma breve.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, já agora, quero esclarecer que somos mais firmes na eliminação da referência à "competência ministerial" do que na questão da superintendência e da coordenação. Penso que aí, se encontrar até uma outra expressão, muito bem.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, peço tomadas de posição sobre estas matérias, da forma breve como, aliás, as questões têm sido sempre discutidas.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, penso que os dois pontos aqui colocados pelo Partido Socialista também não resolverão alguns conflitos que aqui já foram referidos. Isto muito sinteticamente, porque já teci algumas considerações sobre esta questão.
Mas o Sr. Deputado Luís Sá também já referiu aqui que as funções que estão especificadas no actual n.º 2 do artigo 232.º poderão trazer confusões, por exemplo, quanto à palavra "superintendência", tal como ela está integrada no artigo 202.º, alínea d) da Constituição, relativamente ao Governo.
Na verdade, penso que podem trazer algumas confusões - e trazem com certeza -, até porque se há alguma coisa de comum entre a "superintendência" da alínea d) do artigo 202.º e a do n.º 2 do artigo 232.º, é apenas porquanto esta superintendência traz também um poder de orientação e não na medida em que ela possa trazer, por exemplo, o poder de emissão de directivas. Julgo que isso

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estará aqui fora de causa relativamente ao Ministro da República.
É sabido que esta expressão foi transportada do artigo 124.º da Constituição italiana, que o termo "coordenação" encontra-se na Constituição espanhola e quer num quer noutro ordenamento constitucional também há, como já referi, problemas na transposição para a prática quanto ao que estas duas expressões querem exactamente dizer.
Penso que o que se tem concluído é que o Ministro da República, relativamente a estas funções administrativas, terá poderes de orientação, de harmonização, de informação, mas não de coordenação - a coordenação ministerial não é feita por ele - nem de superintendência, tal como a palavra está concebida para o Governo da República.
Por isso, estar aqui a alterar estas denominações trará, como referi anteriormente, mais problemas do que resoluções. Retirar um deles creio que não trará qualquer vantagem, a não ser que se alterasse totalmente o esboço do que aqui está construído. Agora fazer essa alteração, não.
Relativamente à atribuição de "(…) competência ministerial, tendo assento em Conselho de Ministros nas reuniões que tratem de assuntos de interesse para a respectiva região" penso que, pelo contrário e mais uma vez, a eliminação trará mais dificuldade do que vantagem.
Recordo que, no texto também inicial trazido à Assembleia Constituinte, a ideia foi - e penso que essa tem-se tornado útil -, a de permitir que o Ministro da República funcionasse como voz das regiões autónomas no Conselho de Ministros relativamente a propostas que tenham alguma relevância no interesse da respectiva Região.
Todavia, o que tem acontecido é que o Ministro da República tem permitido auscultar os governos regionais, sabendo as suas opiniões e transmitindo-as ao Governo, permitindo com isso alterar leis gerais da República, adaptando-as aos interesses específicos de cada região, por isso penso que também terá utilidade nesta matéria e não o contrário, mas esta é uma posição pessoal.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * A possibilidade de o Ministro da República ter a sede no Conselho de Ministros mantém-se na proposta do Partido Socialista!

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, é evidente que após ter proposto a extinção do cargo do Ministro da República é a contragosto que discuto as suas funções e a redefinição das suas competências. Em todo o caso quero aqui registar o seguinte: o Partido Socialista, aparentemente, teria alguma inovação e algum avanço no seu projecto nesta matéria.
Começo a ficar um pouco espantado, porque o normal nestas situações e nestas discussões é que da discussão nasçam avanços maiores do que aqueles que as bases de partida trazem, melhorias mais avançadas, designadamente nesta matéria das regiões autónomas. Mas verifico que, eventualmente, a proposta dos "pequenos avanços" feita pelo Partido Socialista nesta matéria terá como intuito apresentar, antes das eleições regionais, um texto que possa ter algum eco na opinião pública regional. E digo-o porque agora vejo, pela voz do Sr. Deputado Medeiros Ferreira, que o Partido Socialista está todo aberto a voltar para trás, está a retroceder em toda a linha, já aceita dar a representação da soberania ou do Estado ao Ministro da República, já aceita dar-lhe a coordenação dos serviços, já se vai de novo aproximando, já vai retrocedendo ao texto Constitucional. E é bom que isto fique claro, para se saber a boa fé, nesta matéria de autonomia, com que estas propostas e estes projectos são apresentados.
Estou realmente surpreendido que o Partido Socialista tenha, aparentemente, repito, aqui ou ali mostrado algumas relativas aberturas e que esteja agora, em sede de discussão, um pouco pela "mão" do Sr. Presidente, a anuir a tudo o que o Sr. Presidente alerte no sentido de reatar o texto actual, relativamente ao qual V. Ex.ª tem um carinho especial, compreensível. Mas a realidade mostra que ele tem de ser efectivamente alterado e é para isso que se fazem revisões constitucionais. Era esta a circunstância que queria aqui referir.
Quero também fazer uma observação em relação à intervenção ao Sr. Deputado Moreira da Silva que, obviamente, sei que foi bem intencionada e que resultou da leitura adequada e inteligente...

O Sr. Presidente: * Também está de má fé o Sr. Deputado Moreira da Silva?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Já vou dizer.
… da leitura adequada e inteligente da Constituição, porque ele disse aquilo que devia ser o papel dos ministros da República enquanto tendo assento no Conselho de Ministros e quando se trata de assunto das regiões autónomas.
Infelizmente, a prática vem revelando que essa intervenção do Ministro da República tem sido perniciosa e prejudicial às regiões autónomas, que não tem sido de identificação com as suas aspirações e com as soluções que, no domínio regional, se tem por mais adequadas a esses problemas. Mas, enfim, é um problema de divergência da prática, relativamente aquilo que o texto da Constituição inculca.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Medeiros Ferreira, antes de dar-lhe a palavra gostaria de dizer que esta discussão tem sido pautada sempre pelo peso e pelo mérito dos argumentos. Preferia que entre eles não estivesse a questão da boa ou má fé das posições que aqui são tomadas.
Tem a palavra, Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente é bastante contrafeito que continuo na discussão deste artigo. Penso que ele poderia ter sido discutido de maneira mais rápida. Porquê? Porque as minhas respostas e as minhas posições não têm nada a ver com as propostas do Sr. Deputado Guilherme Silva, porque já se viu que o Partido Social-Democrata as não perfilha. Eu estou a dialogar com a necessidade dos 2/3 para a revisão constitucional!… Portanto, a minha preocupação nesta discussão, talvez do ponto de vista táctico errada, foi tentar chegar a um acordo com o Partido Social Democrata! Assim tudo o que o Sr. Deputado Guilherme Silva diz em relação a mim...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): É a verdade, toda a verdade.

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O Sr. Medeiros Ferreira (PS): ... tem que pôr, em primeira instância, ao seu próprio partido. E é por isso que gostaria de ouvir o que é que o Partido Social-Democrata...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): Sr. Deputado Medeiros Ferreira, o Partido Social-Democrata não lhe pediu que atribuísse ao Ministério Público e à representação da soberania!… O Partido Social Democrata não lhe pede isso!…

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): Mas nós consideramos que talvez o texto fique mais esclarecido com a expressão, já não da soberania da República, mas de que o Estado é especialmente... Mas, enfim, da nossa parte é apenas uma clarificação sobre até onde estamos dispostos a ir. Mas não é como o Sr. Deputado Guilherme Silva acha. De certa maneira tenho defronte de mim, pelo menos, três vozes do PSD!…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): Tem mais, tem cinco.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): Tenho pelo menos três.
Portanto, é muito difícil saber quais os ajustamentos que vale a pena fazer para que haja alguma modificação no artigo 232.º que clarifique as funções do Ministro da República e lhes retire aqueles aspectos polémicos que o próprio Deputado Guilherme Silva referiu abundantemente.
Mas, pelo que estou a compreender da posição final do PSD, este partido quer manter tal e qual o artigo 232.º!…. Essa é a conclusão que retiro de duas horas de discussão.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como o Sr. Presidente bem explicitou aquando da introdução da discussão desta figura do Ministro da República, ou das suas substituições nos temas dos projectos que estão sobre a mesa, há uma dupla vertente na actual figura do Ministro da República.
Por um lado, tem uma função de representação dos órgãos de soberania, função essa onde se inscrevem poderes importantes, como o da promulgação e veto de iniciativas, a indigitação do presidente do governo regional, etc.
Quanto a essa vertente dos poderes da figura do Ministro da República, o PSD não propõe, na sua figura substitutiva dos ministros da República, alterações significativas no texto constitucional, ou seja, entendemos que essas são funções que devem manter-se e que, do ponto de vista do PSD, embora numa forma revista relativamente à situação actual, esse acervo de competências deve continuar a estar consagrado para uma figura de representação dos órgãos de soberania junto da região autónoma.
O outro lado do texto constitucional quanto a esta figura, como o Sr. Presidente referiu na sua apresentação desta questão, tem que ver com as funções que são, no fundo, tipicamente ministeriais, as que têm que ver com a coordenação dos serviços da administração pública central, com a coordenação quer internamente dentro desses serviços quer com os serviços da própria região autónoma e o princípio também da superintendência em toda a actividade administrativa, ou seja, nas funções administrativas exercidas pelo Estado na região autónoma.
Quanto a esta segunda vertente, o PSD propõe no seu projecto a sua eliminação, pura e simples, do texto constitucional e isso tem uma razão de ser fundada na experiência de funcionamento da figura do Ministro da República.
De facto, do nosso ponto de vista, é um dos aspectos onde, por vezes, são gerados alguns atritos, relacionados mesmo directamente da função de coordenação dos serviços da administração central, entre os ministros da República e os ministros competentes em razão da matéria dos respectivos ministérios, porque obviamente, havendo aqui uma dualidade de competências sobre os mesmos serviços, existe sempre, por natureza - não tem nada que ver com as pessoas, obviamente, pelo contrário, ainda bem que existem pessoas para superar exactamente esses atritos -, uma duplicação indesejável, que, porventura, se justificava em 1975, no início das autonomias, por força até dos mecanismos de comunicação existentes entre os serviços da administração central e os serviços regionalizados nos arquipélagos. Realmente, todas essas dificuldades de informação justificavam a necessidade de uma função de coordenação e de superintendência in loco, de um representante, que para efeito também tinha competência ministerial, como o texto constitucional dispõe, para o exercício de uma superintendência e de uma coordenação de toda essa actividade.
Ora, como pensamos que hoje em dia essa questão está perfeitamente ultrapassada, que não se justifica, nos termos do funcionamento dos mecanismos normais de gestão, superintendência e coordenação na administração central, a existência desse tipo de duplicação e a proposta do PSD é no sentido de, utilizando a explicação inicial que o Sr. Presidente deu relativamente ao que estava em questão sobre esta matéria, desapareça do texto constitucional a competência quanto a esta segunda vertente da figura do Ministro da República ou do Ministro para as Regiões Autónomas, qualquer que seja a sua denominação. Esta é, pois, a posição do PSD, como todos reconhecerão pela simples leitura dos projectos, face a esta proposta do Partido Socialista.
Aparentemente o Partido Socialista faz aqui uma redução de alguns desses poderes de coordenação, digamos desta vertente dos poderes do Ministro da República, mas penso também, se bem entendi, que o Partido Socialista não o faz com esse intuito político manifesto, fá-lo mais por uma questão de reformulação da redacção do que propriamente com o intuito de alterar substantivamente o actual acervo de competências do Ministro da República, intenção essa que, como o Sr. Presidente já referiu na última reunião e com a qual estou de acordo, acaba por ter um efeito perverso, porque, no fundo, sem querer alterar a substância das coisas altera a literalidade da norma, coloca novos problemas e novos equívocos.
Portanto, o que o PSD entende sobre essa matéria é que, independentemente de problemas de formulação ou de redacção da proposta do Partido Socialista, estas competências deviam desaparecer do texto constitucional. A figura do Ministro da República ou do Ministro para as Regiões Autónomas deve ser reconduzida, no seu perfil político, à representação dos órgãos de soberania, como foram aqui referidas na última reunião largamente, nomeadamente naquilo que tem que ver com poderes que são, no plano

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nacional, do Presidente da República, com vantagem para a existência de um representante com este perfil nos órgãos de soberania que possa exercer esse tipo de competências.
Quanto às competências de natureza administrativa e de coordenação, elas são focos de conflitos, nomeadamente nesta função, que o actual n.º 3 do artigo 232.º dispõe, de coordenação das próprias funções administrativas do Estado, com as funções administrativas exercidas pela própria região autónoma. É evidente que tudo isto gera problemas de conflitualidade latente, que, do nosso ponto de vista, hoje em dia, não têm justificação exactamente pela evolução dos meios de comunicação.
Assim, a nossa proposta é no sentido de o Partido Socialista reequacionar o seu projecto, eventualmente não no sentido de alterar a redacção do que cá está mas, sim, no de reconduzir as competências à representatividade dos órgãos de soberania, pois parece-nos ser esse, pelo menos numa perspectiva de evolução gradual desta figura, o passo que a actual revisão constitucional devia dar.
Agora alterar só para dizer que se mexeu na redacção parece-nos, com franqueza, muito pobre.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, quero apenas esclarecer que a minha observação crítica em relação ao projecto do Partido Socialista só teve a ver com a questão da eliminação da representação da soberania da República.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Mas que o Partido Socialista mantém nos artigos à frente.

O Sr. Presidente: Mas penso que, estando ela aqui e sendo retirada...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Pois, é só uma alteração de redacção.

O Sr. Presidente: Portanto, quanto às funções governamentais, digamos assim, do Ministro da República, eu não me pronunciei sobre elas. Aliás, acentuei que, a meu ver, a principal função do Ministro da República é a primeira e não a segunda.
De resto, a posição do Sr. Deputado Luís Marques Guedes converge com a observação do Sr. Deputado Cláudio Monteiro no sentido de eliminar a função governamental do Ministro da República.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): Sr. Presidente, só gostava de perguntar ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se bem entendi a sua posição, se ele pode explicar-me porque é que não aceita a redacção do Partido Socialista, cuja finalidade é a de diminuir as funções de tipo governamental do Ministro da República. Daí a conjugação da introdução da "superintendência" em lugar da "coordenação" e da retirada das competências ministeriais para que não haja confusão com as tutelas dos Ministros do Governo da República.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes aceita essa atenuação das competências governamentais do Ministro da República ou, tendo uma posição radical de eliminação de todas as competências governamentais do Ministro da República, por amor e por afeiçoamento à proposta do PSD, prefere manter o actual texto constitucional, que dá todos os poderes actuais de ordem governamental ao Ministro da República?

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Deputado, agradeço-lhe a questão que me coloca mas, com toda a franqueza e sem tentar politizar a discussão, parece-me que a proposta do Partido Socialista, na prática, do meu ponto de vista, não registará nenhuma evolução relativamente à situação actual, com a desvantagem de ser menos clara. Bem ou mal, o que é um facto é que, ao longo de 20 anos da persistência destas disposições na Constituição, criou-se um modelo de cujos contornos as partes estão esclarecidas.
Existe um modelo que está colocado na prática e o que penso, com toda a franqueza, é que, a mexer-se nisto, Sr. Deputado - e era isso, no fundo, que queria transmitir em nome do PSD -, será para dar o passo no sentido de reconhecer que, hoje em dia, este tipo de competências não se justificam e apenas servem para tentar manter alguma densidade administrativa à figura do Ministro da República.
Portanto, esse é que é o passo a dar. Quando houver disponibilidade para que esse passo constitucionalmente seja dado, o PSD aplaudirá seguramente; enquanto não houver disponibilidade política para dar esse passo, penso que criar a ilusão - com toda a franqueza, Sr. Deputado, sem com isto tentar politizar demasiado a discussão - de que se altera a situação actual dos ministros da República quando, na prática, ela não se vai ser alterada significativamente em nada, parece-me, com franqueza, ser um exercício político de vantagem duvidosa.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): Sr. Presidente, queria dizer só o seguinte: no caso de o PSD não aceitar a proposta de alteração do Partido Socialista, estamos dispostos a ir ao encontro do PSD e aceitar a retirada de todas as competências do Ministro da República nas funções de superintendência dos serviços centrais na região.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Desculpe, Sr. Deputado, agora não consegui perceber exactamente.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): Por outras palavras, aceitamos, no caso de o PSD não aceitar a graduação da diminuição das competências de ordem governamental que o PS propõe com a sua actual redacção, portanto, retirando a coordenação, retirando a competência ministerial do Ministro da República, ir ao encontro da vossa proposta, ou seja, eliminarmos as referências às funções administrativas e governamentais dos Ministros da República.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não sei se a ideia que faço…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, acaba de ganhar a proposta do PSD.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não se trata de ganhar! Sr. Presidente, penso que a função da primeira leitura é muito esta.
Com toda a franqueza, percebi o que disse o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, no entanto, penso que deveria manter-se como resultado político desta primeira leitura a solicitação do PSD para que se dê, de facto, o passo verdadeiro. O problema não é acabar com a linguagem da superintendência ou da coordenação, mas, sim, acabar pura e simplesmente com esta vertente das competências, ou não, porque manter a palavra coordenação, superintendência ou outra qualquer, na prática, Sr. Deputado, com toda a franqueza - e politicamente sabemos do que estamos a falar; o Sr. Deputado sabe-o, e eu também -, não alterará significativamente a realidade da posição desta figura constitucional.
Portanto, o que estará aqui em causa, muito mais do que criar a ilusão de que se alteram as coisas, é saber se há ou não vontade política para se avançar e retirar esta densificação de competências administrativas da figura. Se houver, depois encontraremos a redacção; não vale a pena estar agora a discutir se é coordenação, se é superintendência, se é isto ou aquilo, o que interessa aqui é balizarmos as nossas posições.
Entendemos que esta revisão constitucional devia servir, pelo menos, para retirar esta segunda vertente das competências actuais da figura dos Ministros da República. Se for possível é, se não for possível equacionaremos face aos dados que forem colocados pelo Partido Socialista.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, havendo abertura dos dois lados, como parece ser óbvio neste momento, penso que será matéria para compromisso na segunda leitura da revisão.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, se bem entendi, para esclarecimento e para que não fiquem quiproquós, há abertura do PS para encarar a proposta do PSD que visa eliminar a vertente administrativa do Ministro da República.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sim, é isso!

O Sr. Presidente: - Importa clarificar esses pontos para que não fiquem quiproquós.
Srs. Deputados, vamos passar à nomeação e mandato do Ministro da República.
Hoje, os Ministros da República são nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, ouvido o Conselho de Estado. O PSD propõe que eles sejam nomeados pelo Presidente da República, sob proposta do primeiro-ministro, ouvidos os presidentes dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, em vez do Conselho de Estado.
Srs. Deputados, estão à consideração estas alterações. Sr. Deputado Medeiros Ferreira, quer pronunciar-se sobre elas?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, estamos em que artigo?

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, estamos a falar da nomeação do Ministro da República. Hoje, ele é nomeado pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, ouvido o Conselho de Estado.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Mas não temos nenhuma proposta sobre isso!

O Sr. Presidente: * Mas há uma proposta do PSD, Sr. Deputado, e é essa que está à discussão!…

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * O PSD já a apresentou?

O Sr. Presidente: * Há uma proposta do PSD para eliminar a participação do Conselho de Estado, substituindo-a pela audição dos presidentes dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Têm a palavra os proponentes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * O Sr. Presidente tem uma certa razão, porque esta apresentação já foi genericamente feita aquando da exposição por parte do Partido Social Democrata da proposta referente ao n.º 1 do artigo 232.º.
Repetia o que disse, aproveitando já para avançar também, face ao que o Sr. Presidente referiu, quanto ao problema do período do mandato.

O Sr. Presidente: * Então, está à consideração também o n.º 3 da proposta do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Quanto à primeira parte, o problema da audição do Conselho de Estado, o PSD já tinha proposto lá atrás, em coerência com esta proposta, a retirada de uma alínea das competências do Conselho de Estado que fala na obrigatoriedade de audição deste órgão para a nomeação dos Ministros da República.
O PSD entende que isto não faz sentido. Existe já nas competências do Conselho de Estado uma alínea residual de competências onde, obviamente, o Sr. Presidente da República sempre poderá integrar, se entender vantajoso ou necessário, a audição do Conselho de Estado antes da nomeação a que será chamado constitucionalmente.
No fundo, eu diria que a questão do Conselho de Estado, politicamente, em termos substantivos, é uma falsa questão, uma vez que este é um órgão consultivo do Presidente para os seus actos políticos. Este é claramente um acto político, o acto político de nomeação, pelo que o Presidente sempre poderá, se assim o entender, ouvir o Conselho de Estado sobre a nomeação dos Ministros para as regiões autónomas.
Já o que não está na Constituição, mas que nos parece que dela deve passar a constar, é a audição dos órgãos de governo próprio das regiões. De resto, embora já retiradas, havia da parte de outros partidos propostas em sentido congénere, ou seja, para passar a constitucionalizar a audição dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Devo dizer que não compartilho das razões aduzidas pelos partidos para retirarem essas propostas, ou seja, a preocupação de que essa audição pode servir para um confronto ou um combate político contra a figura do Ministro da República. Com franqueza, penso que o confronto é o "sal" e o bem da democracia.

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Não concebo democracia e regime democrático sem confronto de ideias e sem debate. Portanto, com toda a franqueza, esse tipo de argumento para justificar que não se ouçam as pessoas, isto é, para não haver problemas, embora não acredite que tenha sido essa a razão dos proponentes que falaram neste argumento, parece-me, isso sim, antidemocrático. Não fazer as coisas para evitar discórdias e debates parece-me antidemocrático.
Penso que a justificação da audição dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas tem que ver com o preenchimento de uma lacuna e, do meu ponto de vista, com a superação de algumas das dificuldades que às vezes têm surgido na escolha e no funcionamento destas figuras, exactamente por poder criar-se a ideia de que elas são impostas contra a vontade política de quem quer que seja, contra quem quer que seja. Não é nada disso que está em causa, portanto, o princípio da audição parece-nos salutar.
Quanto à questão do mandato, Sr. Presidente, a nossa proposta é muito simples.

O Sr. Presidente: * Iremos lá depois, Sr. Deputado, porque isso tem que ver também com a proposta do PS para a mesma área.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Mas eu responderia a isso em 30 segundos, se o Sr. Presidente mo permitisse, porque ganhávamos no debate!

O Sr. Presidente: * Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, o PS propõe a coincidência com o mandato do Presidente da República, o problema, no entanto, é só este - e vou referi-lo de uma forma perfeitamente desaromatizada: existe, e continuará a existir, necessariamente, tanto no projecto do PS como no do PSD, uma dupla dependência desta figura do Governo e do Presidente da República. Havendo essa dupla dependência, sendo que os mandatos do Governo e do Presidente da República não têm a mesma dimensão (um tem uma dimensão menor que outra), é evidente que temos que ir pelo denominador comum, e o denominador comum aqui é de quatro anos. Se o Governo tivesse um mandato de seis anos, proporíamos que fosse o mandato do Presidente, obviamente, que é de cinco anos.
Portanto, o problema, para nós, decorre da dependência conjunta dos dois órgãos de soberania. Se há, de facto, uma dependência conjunta dos dois órgãos de soberania parece-nos evidente que nenhum deles pode ser posto fora da nomeação e, nomeadamente, da subsistência do mandato do Ministro para as regiões autónomas. É por essa razão apenas que propomos um mandato de quatro anos, sem qualquer tipo de politização fora deste argumento.

O Sr. Presidente: * Mas será inamovível durante os quatro anos?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, a única coisa que o PSD propõe é a duração do mandato, portanto, a temporização do mandato.
Como o Sr. Presidente sabe, uma das questões suscitadas por vários dos Ministros da República, que ao longo da nossa História democrática têm assumido esse cargo, é a da não previsão constitucional de um termo para o seu mandato. Isto coloca-lhes, em termos pessoais, por razões evidentes que todos compreendemos, com toda a simplicidade, problemas manifestos, porque eles não podem deixar de assegurar um cargo de Estado tão importante como este, não podem abandonar funções, mas a não temporização dessas funções coloca problemas às pessoas na aceitação e, depois, no próprio…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, essa preocupação é comum ao PS e ao PSD. De resto, a pergunta que lhe fiz não tinha razão de ser, porque o PSD mantém o n.º 1, ou seja, o Ministro da República é nomeado e exonerado pelo Presidente da República, sob proposta do primeiro-ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Sr. Presidente, gostaria de pedir um esclarecimento.
A posição que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes ainda agora reflectiu como sendo a do PSD, embora pudesse caber na proposta que o PSD apresentou inicialmente, apesar de tudo não deixa de ser uma evolução, em certo sentido, em relação à proposta que apresentou inicialmente.
O que pergunto é se, na perspectiva de uma eventual supressão dos poderes de representação do Governo da figura do Ministro da República, ou seja, das funções que este actualmente desempenha, continua a fazer sentido a dupla dependência em relação ao Governo e ao Presidente da República e se continua a fazer sentido que a nomeação pelo Presidente seja condicionada por proposta do primeiro-ministro ou do Governo, consoante a perspectiva.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, responderei rapidamente.
O simples direito de assento nas reuniões do Conselho de Ministros, do nosso ponto de vista, justificará sempre a dupla dependência.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Mas, então, a pergunta tem de ser esclarecida.
Deixando de ter funções de representação do Governo da República, deixando de ter a função de prefeito, continua a ter assento no Conselho de Ministros?

O Sr. Presidente: * Isso está no n.º 2 da proposta do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente! Está, e tem que estar!…

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * A proposta do PSD não corresponde exactamente…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Por amor de Deus! Corresponde exactamente a isto!… Posso explicar, para clarificar a articulação.
As competências de representação dos órgãos de soberania, nomeadamente de promulgação e veto, são competências que mexem com problemas legislativos. Portanto,

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o assento do Ministro das regiões autónomas no Conselho de Ministros quando está em causa a discussão de aspectos que têm que ver com as regiões, do nosso ponto de vista, é uma componente essencial para o bom exercício das funções que o Ministro das regiões autónomas manterá no projecto do PSD.
Portanto, não é por um problema da actividade administrativa da Administração Central nas regiões, é pelas outras funções, essas sim, mais relevantes, que o PSD entende manter no seu projecto. Para essas, é fundamental, do nosso ponto de vista, continuar a haver uma ligação e um acompanhamento por parte do Ministro para as regiões autónomas de toda a política do órgão de soberania Governo relativamente a matérias que tenham interesse para as regiões, porque, senão, como exercerá ele correctamente as competências do artigo 235.º?!

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Sr. Deputado, quando a sua proposta diz, no n.º 1 do artigo 232.º "(…) ouvidos os presidentes dos órgãos de governo próprio (…)" está a referir-se ao presidente dos governos, no plural, das regiões autónomas ou…

O Sr. Presidente: * Aos dois! Aos presidentes de governo e aos presidentes de assembleia regional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Refere-se aos dois, Sr. Deputado, ou melhor, aos quatro!

O Sr. Presidente: * Aos dois, para cada um.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Em relação ao n.º 3, parece-me que o Sr. Presidente não quer que se fale nele ainda.

O Sr. Presidente: * Não, admiti-o à discussão. Está à discussão a forma de nomeação e o mandato dos Ministros da República.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Em relação ao período de quatro anos, o Sr. Presidente já colocou uma das questões, que é a de saber se torna inamovível o Ministro nomeado, embora já se saiba que o Presidente da República pode exonerá-lo. Mas neste período de quatro anos está ou não encarada a possibilidade de renovação do mandato, e de quantos mandatos? Ou é só um mandato?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Deputado, o mecanismo que nos parece mais correcto é o de nomeação sempre por um mandato a termo, portanto, por um mandato de quatro anos.
No fundo, se bem entendo, a situação que está a colocar-nos é a de deixar de haver uma sintonia entre o mandato de quatro anos do Ministro da República e o mandato de quatro anos do Governo, que inicialmente o nomeou. É essa a questão que está a colocar-nos, não é?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Coloquei várias questões!
Quanto a essa, vamos admitir que há um Ministro da República nomeado por quatro anos. Gostava de saber se esse mesmo Ministro da República pode voltar a ser reconduzido por um novo período de quatro anos e por quantas vezes ele pode ser reconduzido. Penso que nada disto está contemplado na proposta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, não colocamos qualquer tipo de entrave à recondução, à renovação de mandatos. De facto, a proposta do PSD sobre isso não constitucionaliza nenhuma imperatividade.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Então, devia estar escrito na proposta "por períodos de 4 anos"!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Há uma outra questão que o Sr. Deputado coloca também e que penso ser uma decorrência do princípio que enforma esta proposta do PSD, embora não esteja constitucionalizada (penso que a Constituição não pode prever as situações todas nem descer aos pormenores todos).
No caso de acontecer, por exemplo, a substituição por motivo de força maior - vamos supor por motivo de força maior, para não estarmos aqui a criar cenários esquisitos - de um Ministro da República a meio de um mandato governamental, a meio de uma legislatura, é evidente que o Sr. Deputado poderá dizer "bom, então, o mandato dele vai entrar pela legislatura do Governo que se siga, que não tem necessariamente de ser o mesmo Governo ou um Governo identificado politicamente com ele". Isso é verdade.
Penso que o Partido Socialista coloca aqui o princípio da exoneração com o termo do mandato do Presidente da República. Face à lógica que presidiu à apresentação da proposta do PSD, isto é, a chamada de atenção para a dupla dependência dos dois órgãos, não sei se a demissão de qualquer dos dois órgãos de soberania, portanto, quer o termo do mandato do Presidente da República quer o termo do mandato de um Governo da República, não deveria colocar sempre um termo no mandato do Ministro para as regiões autónomas. Enfim, esta é uma questão que podemos estar abertos a ponderar.
Penso, de qualquer maneira, que o texto constitucional deve ser aqui o mais singelo possível. A justificação do mandato de quatro anos está apenas na questão da dupla dependência, mas tem razão o Sr. Deputado quando chama a atenção para o facto de poder haver situações concretas em que essa dupla dependência também é ultrapassada se olharmos para uma lógica quadrienal pura e dura, mas não é isso o que o PSD propõe.
O PSD chama a atenção para o facto de dever haver aqui um termo, uma temporização do mandato e, havendo dupla dependência, dever atender-se às vicissitudes dos dois órgãos de soberania.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

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O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Medeiros Ferreira, gostaria de acabar a matéria do Ministro da República, que já vem da reunião anterior. Não podemos continuar a gastar mais do que uma reunião por artigo.
Portanto, gostaria que o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, em nome do Partido Socialista, tomasse posição quanto a todos os temas em causa, ou seja, nomeação do Ministro da República, eliminação da audição obrigatória do Conselho de Estado, adopção da audição obrigatória dos presidentes dos órgãos de Governo das regiões autónomas. Quanto ao mandato, é indexado ao do Presidente da República, fixado em quatro anos, independente do mandato do Governo, ou indexado ao Governo que o nomeou? Gostaria de ter resposta para estas questões.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, em primeiro lugar, embora na nossa proposta se preveja ainda que o Conselho de Estado deva ser consultado, podemos encarar a supressão dessa obrigatoriedade.
Depois dos esclarecimentos dados, em que foi referido que na proposta do PSD estão contempladas, além dos presidentes dos governos regionais, as próprias assembleias regionais, parece-me, apesar de tudo, em relação à nomeação e ao problema da cessação de funções dos Ministros das regiões autónomas, que a proposta do Partido Socialista é mais adequada, porque é a que contempla aquilo que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes acabou por dizer - aliás, foi por isso que fiz as perguntas, não para fazer perder tempo à nossa Comissão, foi para que os argumentos se fossem desenvolvendo, conhecendo-se as aporias das respectivas propostas.
Portanto, há nesta proposta do mandato por um período de quatro anos uma lacuna, porque não tem em conta exactamente a dupla dependência do Ministro da República, que na proposta do Partido Socialista parece melhor articulada. É por isso que manteríamos o n.º 5 da nossa proposta, sobre a forma de cessação das funções do Ministro da República. Como não é necessário ouvir o Conselho de Estado para a sua nomeação, talvez também não seja necessário ouvir o Conselho de Estado para a sua admissão ou cessação de funções.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * O PSD vai ponderar a proposta do PS.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, em primeiro lugar, tratando-se de um representante do Estado, creio que é particularmente adequado ouvir o Conselho de Estado. Substituir a audição do Conselho de Estado pela audição dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas corresponde a uma de duas coisas: ou a dar um direito de veto aos órgãos de governo próprio das regiões; ou a fazer com que o Ministro da República seja nomeado numa situação que, à partida, é de conflito com os órgãos de governo próprio.
Não tenho qualquer receio de conflitos, discórdias e debates, de resto, creio que quando o Sr. Deputado Luís Marques Guedes referia esta matéria visava criticar o seu colega Guilherme Silva, que ainda há bocado quis acabar com o Ministro da República em nome do fim dos conflitos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Foi uma questão completamente diferente!

O Sr. Luís Sá (PCP): * O problema é completamente diferente: ou há um direito de veto na prática, que, eventualmente, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes não quer que exista; ou, então, há uma situação em que, à partida, o Ministro da República é nomeado em conflito aberto com os órgãos de governo próprio. Creio que qualquer das situações não é estimável e que, por isso mesmo, a nomeação ouvido o Conselho de Estado é a melhor solução nesta matéria.
Passo agora à matéria da duração do mandato. Creio que a situação desta figura, que é representante do Estado, é diferente da situação de outras figuras igualmente nomeadas pelo Presidente da República. No entanto, há uma dificuldade que tenho nesta matéria, que é a de compreender por que o PSD quer ao mesmo tempo eliminar as funções de tipo de coordenação de serviços e estabelecer um mandato limitado, não em função do mandato do Presidente da República, que é quem o nomeia, é a figura de topo do Estado e que, em última análise, é a figura que tem determinadas funções, designadamente de promulgação e veto, que o Ministro da República vai desempenhar, e, em vez disso, estabelece um mandato de quatro anos sem ligação ao mandato de qualquer outra figura e em termos que já ficou claro não serem propriamente transparentes.
Nesse sentido, a estabelecer-se uma duração do mandato, creio que é mais lógico que ela seja feita em função do mandato do Presidente da República, até atendendo às funções principais que cabe ao Ministro da República desempenhar.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vou deixar duas notas apenas.
Quanto à forma de nomeação do Ministro da República, portanto, quanto ao procedimento, não estou convencido sobre as propostas de alteração, nem quanto à eliminação da audição do Conselho de Estado, nem quanto à audição obrigatória dos presidentes dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.
Quanto à limitação do mandato do Ministro da República, creio que é bem vinda essa coincidência dos projectos do PSD e do PS para estabelecer um termo ao mandato. Penso que a proposta do PS é mais congruente com a figura do Ministro da República, mesmo que não alterássemos, isto é, mesmo que não lhe retirássemos a dimensão de representação governamental e ministerial.
A proposta do PSD tinha coerência dado que este partido, embora limitando as funções do Ministro da República às funções parapresidenciais, transformava-o num membro do Governo, embora num Ministro especial. Portanto, tinha lógica fazê-lo coincidir com o mandato do Governo, embora fosse mais lógico coincidir com o Governo que o nomeou, e não por um período de quatro anos à partida.
Em todo o caso, sendo as principais funções do Ministro da República parapresidenciais, aquilo a que o Prof. Jorge Miranda chama funções vicariantes do Presidente da República, penso que a solução mais congruente é, de facto, fazer com que o mandato do Ministro da República,

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seja qual for o momento em que ele seja nomeado, cesse com o mandato do Presidente da República que o nomeou, independentemente de isso ser por cinco, quatro, três ou dois anos. A cessação do mandato do Presidente da República que o nomeou implica a cessação automática do mandato do Ministro da República, sem prejuízo de, em qualquer momento, o Primeiro-Ministro ou o Governo poderem propor a exoneração do Ministro da República se considerarem ter motivo para isso.
Portanto, penso que a proposta do PS é a mais congruente com o perfil do cargo, no entanto, há alguma incorrecção técnica, a parte final é totalmente desnecessária. Coincidindo a sua exoneração com o acto de posse do Ministro da República é perfeitamente desnecessário a figura da prorogatio, que é uma figura comum do Direito Constitucional, implicando que, cessado o mandato, o seu titular se mantenha em exercício de funções até à posse do novo. Isso faz parte do Direito Constitucional comum, não era preciso referi-lo aqui, pelo que essa fórmula do PS é claramente desnecessária.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Sr. Presidente, penso que esta discussão à volta do mandato do Ministro da República, esta dificuldade de conciliação da dupla confiança Governo/Presidente da República, o desfasamento de mandatos do Governo e do Presidente da República, os incidentes de exercício de um e de outro, que pode ser interrompido e que pode gerar, e gera, questões relativamente à subsistência, ou não, do Ministro da República em funções e à continuação do seu mandato, revela bem o carácter híbrido desta figura e a pertinência da proposta de eliminação que apresentámos.
Queria colocar alguns pedidos de esclarecimento, designadamente ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Presidente: * É o que tem estado a fazer toda a manhã!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Não é verdade!…
Gostaria de pedir um esclarecimento quanto à razão - em parte talvez a compreenda, mas já agora coloco a questão, designadamente na medida em que está desenhada uma tendência para a manutenção dos Ministros da República - de o n.º 4 do artigo 232.º desaparecer na proposta do PSD, ou seja, a substituição do Ministro da República nas suas ausências.
Penso que tem sentido porque a sua proposta vai no sentido do Ministro não residente, mas se evoluirmos, infelizmente, ou se mantivermos a situação actual, gostaria de saber qual é a posição do PSD relativamente a essa questão.
No que diz respeito à audição, ou não, dos órgãos de governo próprio, gostaria de colocar uma questão ao Sr. Deputado Luís Sá. Sr. Deputado, por que apresenta o seu projecto a audição - sei que já o retirou - da respectiva assembleia regional? Estranho que tenha havido uma evolução em tão curto espaço de tempo. Ou será que a circunstância de o Governo ser apresentado antes das eleições regionais terá ditado este inciso aqui colocado, como reserva mental ou não (expressões que o Sr. Presidente já referiu que não gostaria que fossem aqui trazidas)?

O Sr. Presidente: * E repito, Sr. Deputado! Não tem sido o nosso estilo!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * A verdade é que há uma indiciação clara de que houve aqui uma intenção reservada quando se inseriu esta referência à assembleia regional, que subitamente o Partido Comunista, pela voz do Sr. Deputado Luís Sá, vem considerar extremamente perigosa e fonte de conflitos.

O Sr. Presidente: * Creio que isso merece um comunicado do PSD da Madeira, já!

Risos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * Vamos reservá-lo para coisas mais relevantes! Não podemos banalizar os comunicados, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: * Não ficarei satisfeito se não for objecto de, pelo menos, meia dúzia deles até ao final da revisão constitucional.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): * V. Ex.ª tem relevância bastante para isso!…
Eram estas as questões que queria colocar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Sr. Presidente, obviamente sem prejuízo de discussão posterior, mantemos a nossa proposta de ouvir o Conselho de Estado. Temos abertura à sua supressão, mas mantemos a nossa proposta.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, gostaria de responder muito brevemente à questão do Sr. Deputado Guilherme Silva dizendo o seguinte: do ponto de vista do PSD, o actual n.º 4 do artigo 232.º só se justifica, na pureza dos princípios, na acepção, que o PSD não partilha actualmente, da imprescindibilidade da figura do Ministro da República.
O facto de a Constituição prever aqui expressamente um mecanismo de substituição nas ausências e impedimentos só pode ser justificado no entendimento de quem parte do princípio de que "aqui d'el-rei" que se não está presente o Ministro da República, se não existe essa figura pode "cair o Carmo e a Trindade", que no caso da Madeira não será "o Carmo e a Trindade", será a Praça de Gonçalves Zarco ou outra qualquer...!
O PSD apenas propõe a supressão deste n.º 4, porque entende, mais ainda com a evolução que ele propõe deste modelo de representação dos órgãos de soberania nas regiões autónomas, que não há imprescindibilidade alguma da permanência de 24 horas sobre 24 desta figura e, portanto, com toda a naturalidade, se houver problemas de

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ausências e impedimentos seguramente haverão soluções adequadas para isso no exercício das competências que este ministro manterá.
Já agora permitia-me também, Sr. Presidente, uma pequena chamada de atenção a uma observação do Sr. Deputado Medeiros Ferreira.
Sr. Deputado, quando discutimos o Conselho de Estado, se bem se recorda, ficou já a abertura de princípio, a par dos presidentes dos governos regionais que já têm acento no Conselho de Estado, a passar a prever-se também na Constituição os presidentes de assembleias legislativas regionais...

O Sr. Presidente: * Não era a par, era em substituição de.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, não. O PSD disse que em substituição nunca. E foi o que ficou claro. O PSD manifestou abertura se fosse para acrescer e não para substituir. Portanto, a única chamada de atenção que fazia…

O Sr. Luís Sá (PCP): * E já agora também os membros do governo!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Deputado, a diferença em aqui se prever expressamente ou não é a seguinte: ou é a audição, que sempre se faz actualmente já no Conselho de Estado com os presidentes dos governos regionais e eventualmente também com os presidentes das assembleias legislativas regionais, ficar condicionada ao sigilo próprio das reuniões do Conselho de Estado ou ser uma consulta pública aberta e transparente.
A grande diferença, no fundo, é essa.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não se pronunciou novamente sobre a questão da indexação do mandato do Ministro da República.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, Sr. Presidente, eu, para encurtar razões, tinha-lhe dito bilateralmente, então para ficar em acta, que atendendo às explicações dadas pelo Sr. Deputado Medeiros Ferreira o PSD vai ponderar a redacção do n.º 5 da proposta do Partido Socialista, com as explicações que forem dadas. De facto, como a proposta do PSD é capaz de ser simples de mais e ponderaremos uma solução como esta, que poderá ter a mesma ou outra redacção.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Acho que é um óptimo final para esta reunião.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, em princípio, fica adquirida a fixação da ligação do mandato dos ministros da República na base da proposta do PS, para a qual o PSD manifesta abertura sob reserva de repensar uma outra formulação.
Quanto à forma de designação, o PS não exclui a hipótese de repensar a questão da audição obrigatória do Conselho de Estado e de consagrar a audição dos presidentes dos governos e das assembleias legislativas regionais.
Portanto, em matéria do Ministro da República falta-nos apenas ver a proposta feita pelo PSD no sentido de se eliminar o n.º 4.
Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): * Não, nós mantemos o n.º 4.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, as próximas reuniões terão lugar na quarta-feira de manhã e na quinta-feira à noite.
Por hoje, estão encerrados os trabalhos.

Eram 12 horas e 40 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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