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Quarta-feira, 23 de Abril de 1997 II Série - RC - Número 78

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 22 de Abril de 1997

S U M Á R I O


O Sr. Presidente (Jorge Lacão) deu início à reunião às 10 horas e 30 minutos.
Foram debatidas e votadas as propostas de alteração relativas aos artigos 28.º, 30.º, 31.º, 32.º, 34.º, 35.º e 36.º.
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Barbosa de
Melo, Guilherme Silva e Luís Marques Guedes (PSD), Odete Santos (PCP), José Magalhães e Cláudio Monteiro (PS), Luís Sá (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), António Filipe (PCP), Miguel Macedo (PSD) e Ferreira Ramos (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 19 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos, começando pela apreciação do artigo 28.º, relativamente ao qual não há propostas de substituição que tenham dado entrada. Pergunto aos Srs. Deputados se podemos iniciar o processo de votação relativamente a este artigo, sendo a situação a seguinte: havia uma proposta de alteração para o n.º l, entretanto retirada pelo seu autor, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro; relativamente ao n.º 2, há duas propostas, uma do Partido Socialista e outra apresentada pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
Chamo a vossa atenção para a circunstância de, na primeira leitura, ter sido admitido, em princípio, que uma proposta de alteração, constante da primeira parte do n.º 2 da proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, pudesse vir a ser admitida na Comissão.
Srs. Deputados, já estão em condições de passarmos à votação?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Retomando a primeira leitura, gostaria de dizer que a expressão "manter" já está no texto actual. Mas, se vamos melhorar o texto actual, não sei se este "manter" terá cabimento, isto é, o texto ficaria "(...) não será decretada sempre que possa ser substituída...". Ora, a prisão preventiva tem de ser decretada. Por isso, pergunto: o "mantida" faz aqui algum sentido?

O Sr. Presidente: - É por isso que na proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, consta a expressão "A prisão preventiva não deve ser ordenada (...)

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - "Nem mantida"!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente a solução actual do n.º 2 não me parece inteiramente correcta. Refiro-me, apenas, à expressão "não se mantém". Mas, mesmo a inversa, usando a palavra "decretar" em vez de "manter", também é incompleta e por uma razão simples: é que o juiz pode decretar num determinado momento a prisão preventiva face a um determinado condicionalismo que se pode alterar e tendo-se alterado esse condicionalismo, deve justificar-se também a alteração dessa situação, ou seja, deve justificar-se que não se mantenha a prisão preventiva.
Penso que, se passássemos apenas à referência "ao não ser decretada" e retirássemos a referência ao "mantém", estaríamos a corrigir uma situação de forma incompleta, criando, outra vez, outra lacuna. Penso que as duas referências se justificam.

O Sr. Presidente: - Suponho que esta nota do Sr. Deputado Guilherme Silva é concordante.
Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, desejava falar dos outros elementos da proposta que, para além desta questão, já foi aqui...

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado Marques Guedes, não há propostas novas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não, Sr. Presidente, refiro-me aos outros elementos da proposta, porque antes de se colocar a proposta a votação, há várias questões que queria colocar em separado precisamente para facilitar a votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Guedes, então, se não se importa, vamos por partes.
Relativamente ao n.º 1, a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, está retirada, pelo que vamos centrar-nos no n.º 2.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Do Partido Socialista?

O Sr. Presidente: - Sim. Faz favor, então, Sr. Deputado, de usar da palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para além da questão que acabou de ser debatida com as intervenções dos Srs. Deputados que me antecederam, o conteúdo da proposta do Partido Socialista inclui ainda dois outros aspectos: por um lado, a inscrição na Constituição do princípio de que a prisão preventiva assume sempre um carácter excepcional, ou seja, tem natureza excepcional, princípio ao qual o Partido Social-Democrata, já na primeira leitura, manifestou a sua receptividade e ao qual nada temos a opor, pois entendemos, de facto, que o princípio geral é o do direito dos cidadãos à sua liberdade, princípio fundamental da Constituição, tendo, obviamente, qualquer forma de privação da liberdade de assumir natureza excepcional.
Por acréscimo de razão, no caso da prisão preventiva, que, como todos sabemos, é uma medida especial de segurança antes de um cidadão ser julgado e eventualmente condenado, embora haja a presunção de inocência para todos os cidadãos antes de qualquer sentença em contrário, trata-se de um instituto que preenche determinados objectivos, ou seja, é uma situação em que, da tensão entre o direito do cidadão à liberdade e outros direitos sociais em presença, se opta por privar preventivamente da liberdade um cidadão antes mesmo do seu julgamento.
É evidente que com este conteúdo e com estes contornos, do ponto de vista do Partido Social-Democrata, esta proposta do Partido Socialista é uma proposta azada, uma proposta que faz todo o sentido. Acentuar a natureza excepcional de uma situação como esta, do nosso ponto de vista, colhe e pode resultar numa real benfeitoria para a Constituição.
Quanto à segunda parte, e por isso pedia ao Sr. Presidente que inferisse desta intervenção, em nome do Grupo

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Parlamentar do PSD, o pedido para os proponentes, eventualmente, ponderarem a votação em separado.

O Sr. Presidente: - Das várias componentes da proposta, não é, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sim, das várias componentes da proposta.
Quanto à parte final do acrescento "só por absoluta necessidade tem de ser aplicada a menores", exactamente como tínhamos deixado reservas aquando da primeira leitura, da reflexão que fizemos chegámos à conclusão que isto não é uma benfeitoria mas, pelo contrário, seria até um princípio perigoso a introduzir na Constituição - De resto, até vai a contrario da realidade recente.
De facto e por coincidência, ontem, a televisão anunciou para hoje um programa sobre a delinquência juvenil e o crescimento dramático e assustador da utilização de jovens por organizações criminosas precisamente como forma de tentar fugir um pouco, em vários países e não só em Portugal, obviamente, onde o flagelo ainda assume pequena dimensão quando comparado com outros países mais evoluídos nesta matéria, em termos de criminalidade.
Portanto, o aliciamento e a utilização de jovens é precisamente uma forma de ladear, e, em alguns casos mesmo, fugir aos arquétipos legais e às formas de prevenção da criminalidade.
Portanto, sobre este que foi, obviamente, um princípio reconhecido aquando da primeira leitura e foi aqui sugerido pelos proponentes, com a melhor das intenções e pensando no lado bom que poderia resultar de um princípio como este, o PSD, após ter reflectido, pensa que, de facto, ele comporta efeitos perversos, não desejados pelos proponentes e não desejáveis, em abstracto.
Nesse sentido, não podemos estar em acordo. E se os proponentes, nesta segunda leitura, estiverem abertos para retirar esta segunda parte, tanto melhor, do nosso ponto de vista; caso contrário, o PSD votará contra esta segunda parte e pedia, desde já, ao Sr. Presidente para promover a votação em separado.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Em relação à primeira parte, obviamente que estamos de acordo, e em relação à segunda, penso que haveria toda a vantagem em autonomizar no artigo um regime especial para os menores, menos em relação à prisão preventiva.
As nossas preocupações não têm o mesmo sentido das do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, bem pelo contrário, e penso que, de facto, no âmbito da justiça de menores quanto ao regime prisional, estamos a assistir, e com preocupação, a uma escalada no sentido de ir cada vez mais aproximando o regime dos menores do regime dos adultos. Primeiro, pretendiam alguns que se baixasse a idade relativamente à qual eles passariam a estar submetidos à legislação penal, ultimamente assistimos ao abandono dessa tese para reivindicar medidas na legislação ordinária, como, por exemplo, o endurecimento do regime prisional de menores, tratando-os quase como adultos.
Compreendemos que, nesta proposta, está, de facto, uma preocupação de carácter positivo em relação aos menores que reforça a excepcionalidade da sua prisão preventiva. Agora, da maneira como isto vem proposto, pensamos que nada garantirá que a lei ordinária não procure ajeitar aquilo que, efectivamente, a lei pretende - isto é claro em relação à Organização Tutelar de Menores.
Eu baseio-me naquilo de que tenho conhecimento, embora não directamente, da grande discussão que se trava, neste momento, em relação à questão dos menores e isto poderá vir a ter um efeito perverso se, depois, a legislação ordinária vier a aumentar incomensuravelmente o número de excepções, por forma a, também, vir acolher os menores nas malhas da prisão.
Por isso, em relação a esta segunda parte, embora percebendo a intenção da proposta, pensamos que não é a melhor maneira de fazer o tratamento dos menores no âmbito do processo criminal. Por isso, se esta parte for votada em separado, mas por motivos diferentes daqueles que o PSD enunciou, votaremos contra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, há vários problemas de redacção e o debate ocorrido desde a primeira leitura, designadamente o contacto de entidades que se pronunciaram sobre esta matéria em várias sedes, conduz-nos às seguintes conclusões: primeiro, a redacção que tínhamos adiantado originariamente e que agora tem vindo a ser glosada de várias formas, acentua, provavelmente mal, o carácter subsidiário da prisão preventiva, como, aliás, o Sr. Deputado Barbosa de Melo adiantou com a sua solução.
De facto, vimos sistematicamente dizendo "não será decretada", "não será ordenada" ou expressões equivalentes, sempre que possa ser substituída por outra medida mais favorável. A expressão "substituída" inculca mal, não é essa a nossa vontade, mas a verdade é que inculca que se parte do raciocínio da prisão preventiva para depois se chegar a uma situação de substituição por outra medida de coacção e o nosso Direito Penal corrente ensina que não é assim, mas é o contrário; ou seja, o raciocínio deve ser exactamente simétrico a este, isto é deve chegar-se à prisão preventiva depois de se terem percorrido as várias etapas das medidas de coacção que podem atingir o objectivo...

O Sr. Presidente: - Sempre que possa haver lugar a...

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto.
Portanto, não devemos utilizar, em caso algum, a expressão "substituída". Eu, francamente, acolho essa lição, porque me parece razoável e não muito polémica entre nós. Assim, só verificada a insuficiência de outras respostas de tipo processual ou de tipo, neste caso, cautelar e de carácter garantístico é que, então, há que recorrer a essa outra fórmula, a qual, como sabem, tem vantagens mas também tem um preço e um inconveniente.
Tudo ponderado, da nossa parte, propunha que fôssemos para uma redacção do tipo "A prisão preventiva tem natureza excepcional e não deve ser ordenada ou mantida..."

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ou, então, não sendo "decretada nem mantida..." - como, aliás, sugere o Prof. Barbosa de Melo, e é mais germanístico e coaduna-se com outras formas de redacção da Constituição nesta parte - "...sempre que possa ser imposta caução ou qualquer outra medida mais favorável".
Portanto, em suma, e repito, penso que deveríamos ir para uma redacção do tipo: "A prisão preventiva tem natureza excepcional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser imposta caução ou qualquer outra medida mais favorável" - aliás, também não vejo qualquer inconveniente em que se aditasse a expressão "prevista na lei".

O Sr. Presidente: - "Imposta" ou "estabelecida", Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - O termo "imposta" sublinha o carácter coactivo, mas o termo "estabelecida" também exprime cabalmente a decisão tomada pelo juiz.

O Sr. Presidente: - "Estabelecida", talvez?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - "Aplicável".

O Sr. Presidente: - "Sempre que possa ser aplicável".

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, aplicável é sempre. Não é assim? Expressões como "imposta" ou "estabelecida" têm a vantagem de sublinhar o acto ou a decisão através da qual, em concreto, uma medida aplicável é aplicada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - "Estabelecida", talvez seja melhor, pois "imposta" pode sempre ser.

O Sr. José Magalhães (PS): - "Estabelecida". Perfeito!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, suponho que a redacção para que estamos a apontar...

O Sr. José Magalhães (PS): - Só um momento, Sr. Presidente, porque a Sr.ª Deputada Odete Santos está a procurar...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Aqui, no artigo 197.º do Código de Processo Penal, está "impor (...) a obrigação de prestar caução".

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não, não. Quando fala da prisão preventiva?

O Sr. José Magalhães (PS): - A expressão que está a ser usada aqui, directamente, em correlação é "caução ou qualquer outra medida".

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Certo. Mas, tenho a impressão que o Código de Processo Penal refere que a prisão preventiva só é aplicada quando os objectivos que visa não podem ser atingidos com outros meios menos gravosos, designadamente com caução ou outra medida.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Srs. Deputados, no artigo 202.º do Código de Processo Penal lê-se: "Se considerar inadequadas ou insuficientes, no caso, as medidas referidas nos artigos anteriores (permanência domiciliária e o termo de residência), o juiz pode impor ao arguido a prisão preventiva".

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Bom, se não é expressão utilizada no Código de Processo Penal, então é expressão doutrinária sobre essa matéria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, porventura não recolhemos aí ensinamento suficiente. A leitura da proposta na formulação que está a ser tentada será provavelmente a seguinte: "A prisão preventiva tem natureza excepcional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser estabelecida caução ou outra medida mais favorável prevista na lei".

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - "Aplicada"!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto. "Aplicada", está perfeito. É o acto concreto através do qual o Juiz...

O Sr. Presidente: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não se importa de repetir.

O Sr. Presidente: - Vou repetir: "A prisão preventiva tem natureza excepcional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei".
Esta proposta, se estivessem de acordo, valia como proposta de substituição da proposta originária apresentada pelo PS.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Dada a excelente melhoria que se pretende agora introduzir ao artigo, eu, por um lado, retiraria a minha proposta quanto ao n.º 2, que foi consumida, na parte inicial, nesta proposta de substituição que foi agora apresentada pelo Partido Socialista, e, por outro lado, também o inciso final que acrescentava a expressão "excepcional", que agora é aditada ao preceito constitucional em vigor, dado que, no fundo, o que se pretendia com esta proposta era evitar o raciocínio que, frequentemente, o intérprete, em particular o intérprete judicial, faz, um pouco tributário, do antigo conceito de pena maior, segundo o qual, para determinados crimes haveria automaticamente a aplicação da prisão preventiva.
Ora, salientando-se o carácter excepcional da prisão preventiva, julgo que essa interpretação deixa de ser possível e, portanto, deixa de ser necessário introduzir o aditamento que propunha.

O Sr. Presidente: - Portanto, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro admite que a sua proposta também possa ser substituída por esta?

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, assim sendo o que subsiste é uma parte com um conteúdo não enquadrado nesta nova proposta. Sobre o conteúdo relativo à parte final da proposta inicial do PS quanto à questão dos menores, a Sr.ª Deputada Odete Santos fez uma intervenção chamando a atenção para esse facto; por sua vez, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes já manifestou a razão pela qual o PSD não iria aderir a esta solução.
Assim, a via que vejo, se a Sr.ª Deputada Odete Santos estiver de acordo, é apresentar uma proposta autónoma relativamente a esta matéria, porque a proposta do PS, como viu, acaba de ser substituída integralmente pela versão actual.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Nós temos uma proposta mas não é a este respeito.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, gostava de dar um esclarecimento, a este respeito, à Sr.ª Deputada Odete Santos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, e peço-lhe celeridade, na medida do possível.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tanto quanto percebi das considerações que a Sr.ª Deputada teceu sobre a questão dos menores, também se colocava um problema de ordem sistemática. Tanto quanto percebi, entendia - e penso que bem - que não era aqui a sede própria para se tratar desta questão.
No entanto, queria dizer que estou de acordo com as considerações que fez e parece-me, de qualquer forma, que poderia interessar - e interessará, com certeza - retomar esta questão, não aqui, eventualmente, porque a tendência que referiu de se assemelhar cada vez mais, contrariando, aliás, um regime legalmente estabelecido, a situação de prisão ou de medidas deste tipo em relação aos menores às que são aplicadas aos adultos, deve ser contrariada, e não haveria mal, bem pelo contrário, que a Constituição desse um sinal de prevenção nesse particular. Teríamos era de ver a localização onde devíamos inserir essa matéria e depois formular uma proposta.
A Sr.ª Deputada, tem alguma ideia em relação à inserção sistemática desta proposta?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado, estou de acordo com o esclarecimento e penso que entendeu a minha intervenção.
De facto, estamos de acordo no sentido de elaborar uma norma na Constituição para inverter uma tendência, que não é só de cá mas que se passa também noutros países, em relação à questão da justiça dos menores.
Neste momento, em relação à inserção, apenas posso dizer que o PCP tinha uma norma, que não dizia respeito à prisão preventiva, mas, sim, a um artigo novo sobre a questão da jurisdição penal para menores, que era o artigo 32.º-A que tínhamos proposto logo a seguir às garantias do processo criminal - aliás, não sei se esta será a melhor inserção mas é um assunto para pensar.
Na verdade, julgo que seria importante introduzirmos um artigo só dirigido a menores para evitar que, depois, hajam algumas tentativas de ir pela parte mais fácil, dizendo que, enfim, já que há delinquência juvenil, já que há crimes graves praticados por menores, então vamos tratá-los como se fossem adultos. Aliás, foi assim que foram tratados, perante o tribunal inglês, os dois menores que cometeram o crime horrível de matar um outro menor.
Contudo, a solução também não é tratá-los como se fossem adultos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Portanto, isto está na vossa proposta para o artigo 32.º-A.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Nós tínhamos, de facto, uma proposta para o artigo 32.º-A.

O Sr. Presidente: - Lá chegaremos!
Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de substituição para o n.º 2 do artigo 28.º, implicando a substituição, paralelamente, das propostas originais constantes dos projectos do PS e do Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência do CDS-PP.

É a seguinte:

A prisão preventiva tem natureza excepcional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar, agora, ao artigo 30.º.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Presidente, peço desculpa, temos ainda o n.º 4 do artigo 28.º.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado.
Tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Em relação ao artigo 28.º, e ainda na continuação dos ecos do debate sobre esta matéria, temos vindo a ser alertados - e essa questão, que me lembre, não foi aflorada na primeira leitura - para um problema de redacção do actual n.º 4, que tem a ver com a incidência relativamente limitada.
A verdade é que, uma vez que a prisão preventiva é uma medida cautelar aplicável a uma solução determinada por exigências processuais, não faz - diz a doutrina - sentido distinguir entre prisão preventiva antes e prisão preventiva depois da formação da culpa. E há mesmo quem entenda que isso pode colidir com a presunção de inocência tal qual está consagrada alguns artigos à frente.
Essa distinção, sabemos todos, vem do antigo Código de Processo Penal, o Código de 1929, e não tem hoje expressão nem impacto no Código em vigor. Portanto, se alguma benfeitoria aclaradora aqui se justifica é a eliminação do inciso "antes e depois da formação da culpa" e no preceito deveria passar a constar "A prisão preventiva está sujeita aos prazos estabelecidos na lei".

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

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O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, tem, por acaso, a referência da origem? Isto está desde 1975? Vem desde a Constituinte assim ou foi introduzido depois?

O Sr. José Magalhães (PS): - Vem da Constituinte; eram os artigos 273.º-A e 291.º-B do Código de Processo Penal de 1929.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Julgo mesmo que foi o Código do Processo Penal, na altura vigente, que teve essa influência.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Foram mesmo fiéis ao Código do Processo Penal.

O Sr. Presidente: - Da altura!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, da altura. No entanto, essa metalinguagem e essa conceptologia foi alterada e não regressará. O preceito, como tal, está preparado.
Mas, aqui, francamente, é a chamada benfeitoria que tem em conta um agiornamento que está consumado no foro externo e em sede infralegislativa.
Porém, já que estamos tocando o artigo, deixar-lhe-ia um vestígio arqueológico em homenagem ao velho Código de Processo Penal de 1929.
Finalmente, Srs. Deputados, suponho que a proposta é eloquente e fala por si.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa de Melo, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Para dizer, Sr. Presidente, que o PSD na linha que segue sempre, dirá aqui que tudo o que são "galhos secos", partes obsoletas da Constituição, devem cair, por isso esta também deve cair.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta apresentada tem o aspecto técnico de uma proposta de eliminação da expressão "antes e depois da formação da culpa" constante do n.º 4 do artigo 28.º.
Vamos passar à votação.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, gostaria que esta proposta de eliminação fosse formulada por escrito e fotocopiada para efeitos de registo do texto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a redacção para o n.º 4 do artigo 28.º terá a seguinte: "A prisão preventiva está sujeita aos prazos estabelecidos na lei", sendo que a proposta de eliminação prevê a eliminação da seguinte expressão: "antes e depois da formação da culpa".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, pedia também que essa proposta fosse distribuída.

O Sr. Presidente: - A proposta vai ser distribuída, Srs. Deputados.
Podemos, então, passar ao artigo 30.º.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PS): - Uma vez que vem a talhe de foice e, há pouco, quando discutimos este artigo, não abordamos a questão, queria dizer que há também um problema - segundo me dizem, mas gostaria que pudéssemos trocar impressões sobre a matéria - no n.º 1, podendo estabelecer-se alguma confusão entre o conceito de prisão preventiva e o conceito de detenção.
Como se lembram, no artigo 27.º eliminámos, por consenso, aliás, a confusão, mas, no fundo, deixamo-la subsistir agora no n.º 1 do artigo 28.º - aliás, o n.º 1 do artigo 28.º até podia ser um número do artigo 27.º, por inserção sistemática, mas isso parece-me ser uma questão menor nesta sede.
Ora, sucede que é a detenção e não a prisão que tem de ser técnico-juridicamente validada pelo juiz. Por outro lado, parece fazer pouco sentido falar em manutenção porque, a continuar a haver privação da liberdade, é sempre por aplicação judicial da prisão preventiva.
Chegados a este ponto crítico e analítico, não chegamos infelizmente a uma redacção...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Do artigo 28.º, Sr. Deputado José Magalhães?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não têm já uma proposta feita?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, infelizmente não. Gostaria muito que tivéssemos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes...

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, desculpe, mas gostaria de fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Sá (PCP): - É que a questão que se coloca, efectivamente, é a seguinte: é apresentada uma proposta oral pelo Sr. Deputado José Magalhães. Com todo o bom espírito de colaboração, a proposta é votada como proposta do Sr. Deputado José Magalhães e, depois, é-nos distribuída uma proposta comum do PS e do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sobre quê?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sobre o artigo 28.º, n.º 2. A questão é meramente formal mas há questões formais que têm a ver com o respeito para com os outros Deputados.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, peço-lhe desculpa, mas se há algum reparo a fazer...

O Sr. Luís Sá (PCP): - O reparo efectivamente é este!

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, já o fez. Dá-me, agora, licença que lhe responda?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Mas, Sr. Presidente, deixe-me só acrescentar uma questão ao reparo: há um problema que foi aqui repetidamente referido e colocado que tem a ver com a necessidade, a vantagem, a imprescindibilidade de, à semelhança do que aconteceu, aliás, na revisão constitucional de 1989, as propostas serem distribuídas na reunião anterior à da sua discussão e votação.

O Sr. José Magalhães (PS): - De facto,...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, peço-lhe desculpa, mas não lhe dei a palavra. O Sr. Deputado Luís Sá está a interpelar a Mesa.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, não me foi dito, nem pelo Sr. Presidente nem pelo Sr. Deputado José Magalhães, que se tratava de uma proposta comum do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, no diálogo aqui travado em torno dessa proposta, houve contributos orais, como bem referiu, a partir de uma sugestão inicial do Sr. Deputado José Magalhães, nos quais, inclusivamente, participou o presidente com algum contributo, porventura útil, e também o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
Daí que, no rescaldo da proposta verbalmente trabalhada, o presidente tivesse feito a distribuição dela atribuindo-a àqueles Deputados que deram algum contributo para a mesma. Mas, se os Srs. Deputados querem ligar-se como autores originários da proposta, não há, acerca disso, nenhuma limitação. Portanto, Sr. Deputado Luís Sá, convido-o a ser subscritor originário da proposta que verbalmente aqui estivemos a trabalhar.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Se me permite, Sr. Presidente...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ainda não acabei.
No que diz respeito à distribuição prévia das propostas, isso, naturalmente, tem todo o significado, excepto quanto resulta do próprio debate a construção de uma proposta de substituição, como foi manifestamente este o caso.
Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, para futuro, creio que, numa situação deste género, há uma de duas coisas a fazer: ou distribuir a proposta escrita destes dois partidos, antes da votação, ou o Sr. Presidente dizer que, na sequência do debate, os deputados do PS e do PSD apresentam uma proposta comum que vai ser distribuída. Não é posteriormente à votação, que a proposta deverá ser distribuída; creio que isto tem uma elementar lógica.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, terei esse cuidado de futuro. Aliás, como há-de reparar, a proposta do n.º 4 que, entretanto, foi votada, aparece inclusivamente subscrita por mim, tendo sido o resultado de uma sugestão inicial do Sr. Deputado José Magalhães.
Foi, portanto, por razões de mera entrada técnica da proposta na Mesa. Mas o presidente passará a ter o cuidado sugerido pelo Sr. Deputado Luís Sá.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, também sob a forma de interpelação, quero adiantar o seguinte: no decurso da discussão, não sei se o fizemos de uma forma inteiramente explícita que tivesse evitado esta dúvida do Sr. Deputado Luís Sá, ficou claro que nós pusemos o problema de se redigir esta proposta, que estava a ser oralmente formulada, adiantando que a subscreveríamos, como, aliás, subscrevemos, e fizemo-lo livremente e não necessariamente como partido. Foram os Deputados que, por acaso, integram os Grupos Parlamentares do PS e do PSD que a subscreveram, pelo consenso que se viu e que se estava a desenhar. Não sei se, nestas situações e de futuro, o Sr. Presidente não poderá anunciá-la como proposta da CERC, salvo a oposição de algum Deputado ou grupo parlamentar na adopção dessa fórmula.

O Sr. Presidente: - Terei esse cuidado, Sr. Deputado.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro deseja também pronunciar-se sobre este assunto?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Julgo que é bom voltar a esta questão já que não foram tidos em conta, anteriormente, alguns alertas de alguns Deputados relativamente a este procedimento, pelo que, repito, julgo que deverá ser repetida tantas vezes quantas as necessárias para que o entendimento se faça em todas as bancadas.
Efectivamente, é do mais elementar consenso o dever de respeito pelos outros e assim se há consenso substantivo em relação a certas questões, elas devem constar e convergir numa proposta, a ser subscrita por todos quantos o queiram fazer.
Já, anteriormente, houve outras matérias em relação às quais as propostas e o acordo entre o PSD e o PS eram rigorosa e substantivamente iguais a outras que existiam.
Portanto, não querendo fazer dos outros meros espectadores de uma encenação, há que prová-lo e prová-lo é, portanto, fazer isso e não distribuir fotocópias e dizer quem quiser pode, eventualmente, subscrever a proposta. Isso é um insulto, isso é uma grosseria, é manifestamente deselegante e, portanto, se assim for, então, escusa-se de ter os outros grupos parlamentares presentes na discussão ou na votação seja do que for.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar adiante que talvez a natureza do debate ganhe com isso.

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Portanto, vamos retomar a questão que tinha sido colocada há pouco pelo Sr. Deputado José Magalhães quanto ao n.º 1 do artigo 28.º.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, aí colocava-se a questão que enunciei, não tanto como referi na proposta, de, naturalmente, estarmos abertos a contribuições, pelas razões que são óbvias, mas se elas não forem possíveis, então o preceito fica obviamente como está, o que seria pena neste caso.
Suponho que talvez fosse possível agenciar uma redacção que substituísse o n.º 1 actual por outra que estatuísse que a detenção ou prisão preventiva será submetida, no prazo máximo de 48 horas, a decisão judicial de validação, devendo o juiz conhecer das causas e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa.
Superava-se o conceito de...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - ...de culpa formada!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, exactamente, de culpa formada. Não se reincidia no conceito de manutenção porque, é óbvio nessa matéria, intervindo-se já numa área em que há actuação judicial, isso está assegurado. Não sei se isto se repercute ou não na epígrafe do artigo, mas creio que esta é uma benfeitoria consonante com o que fizemos por mero arbítrio no n.º 4, antes de o termos feito no n.º 1.
Portanto, Sr. Presidente, é-me literalmente indiferente quem manuscreve a proposta...

O Sr. Presidente: - Sugeria que fosse o Sr. Deputado, porque foi quem suscitou a questão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, se for o caso, tenho todo o gosto.

O Sr. Presidente: - Retomando a discussão, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, penso que estamos a falar da eventual sugestão de alteração do n.º 1. É correcto?

O Sr. Presidente: - Exactamente, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria acrescentar àquilo que o Sr. Deputado José Magalhães referiu o seguinte: de facto, esse assunto já tinha sido debatido na primeira leitura.
Com efeito, também da nossa parte, há o reconhecimento de que a formulação deste artigo, sendo embora a prisão preventiva, pela inter-relação dialéctica entre aquilo que é o instituto da detenção e a prisão preventiva, encontra sempre algumas dificuldades em termos da terminologia utilizada.
O PSD fez também essa reflexão entre a primeira e a segunda leituras, mas confesso que não chegámos a nenhuma solução totalmente satisfatória e a chamada de atenção que quero fazer ao Sr. Deputado José Magalhães é a seguinte: se no n.º 1 - e pensei nisto entre a primeira e a segunda leituras -, pusermos a expressão "detenção sem culpa formada", e depois, à frente, ainda no n.º 1, dizermos que a mesma está sujeita a manutenção ou validação, isso não é verdade porque não é mantida a detenção, porque esta, depois, transforma-se em prisão preventiva.
Portanto, a única dificuldade que o PSD teve, embora concordando com o espírito daquilo que o Dr. José Magalhães referiu, foi encontrar uma solução que, não prejudicando integralmente o conteúdo normativo do artigo e, portanto, não dando a ideia de que o legislador constituinte pretendeu retirar o que quer que seja desta norma, usando a terminologia adequada, resolva o problema.
E, sinceramente, não conseguimos encontrar uma solução exacta precisamente pela relação dialéctica que existe no nosso ordenamento jurídico entre o conceito de detenção e a sua passagem solene a prisão preventiva a partir da intervenção do juiz. O problema está todo aqui e se for encontrada alguma solução terminológica que resolva este problema, em termos de redacção, o PSD está aberto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço a vossa atenção para a leitura de uma proposta de substituição do n.º 1, que acaba de ser entregue pelo Sr. Deputado José Magalhães, e que é a seguinte: "A detenção ou prisão será submetida, no prazo máximo de 48 horas, a decisão judicial de validação, devendo o juiz conhecer as respectivas causas e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa".
Srs. Deputados, vou fazer circular imediatamente a proposta.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Penso que a proposta é passível da reflexão que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes fez e, de facto, a detenção, muitas vezes, até é feita para submeter o arguido a julgamento em processo sumário e nem é sequer para uma validação. O juiz pode é dizer se foi ou não mal detido, mas não é bem uma validação.
Assim, não sei se não seria preferível retirar só a expressão - também estou a pensar em voz alta - "sem culpa formada" e não nos metermos por esse caminho, porque, de facto, uma detenção não é para ser validada; a detenção é para ser transformada, se for caso disso, em prisão preventiva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tem de ser é apreciada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sim, é apreciada.

O Sr. José Magalhães (PS): - O problema é continuar a confundir detenção com prisão, que é um mal originário.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Um mal originário, não. O Código de Processo Penal é que tem um mal, ou seja, abriu distinções, à margem da Constituição, diferenciando prisão e detenção. E prisão, para mim, é detenção; a detenção é uma prisão. A pessoa não está livre para sair para sítio algum, logo está presa.

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Portanto, o Código de Processo Penal é que, de facto, procedeu mal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Temos aqui várias situações e, ao abordarmos esta questão, temos de ter cuidado na redacção pela qual viermos a optar.
Primeiro, temos de ter consciência que estamos a tratar da prisão preventiva e, consequentemente, qualquer fórmula que afaste essa ideia pode gerar confusões. Há a prisão já ordenada judicialmente e, portanto, essa prisão já não tem cabimento aqui, porque ela já resulta de uma decisão judicial.
Por outro lado, distingue-se prisão de detenção, embora em termos práticos, possam sobrepor-se. Há situações - e a Sr.ª Deputada Odete Santos há pouco referia isso -, por exemplo, em que o arguido está em liberdade mas começa a não aparecer no julgamento e o juiz pode ordenar a sua detenção para ser presente em julgamento. Portanto, há aqui um leque de situações que temos de ter presentes.
Para além disso, esta fórmula inculca um pouco a ideia de que essas situações de prisão e de detenção serão necessariamente validadas. É um problema de apreciação judicial dessas situações para validar ou para, pura e simplesmente, libertar o detido ou preso.
Parece-me que já fizemos algumas melhorias, designadamente afastando aquela ideia de substituição e, portanto, pondo o problema ao contrário, parece que a prisão preventiva é que tinha um carácter principal e as outras medidas um carácter subsidiário.
Ora, creio que temos, também aqui, de melhorar esta fórmula, não falando, do meu ponto de vista, em validação ou manutenção, mas tentando encontrar aqui uma expressão, que pode ser a de "submissão à apreciação do juiz", de modo a melhorar esta redacção, cujos objectivos, que nos preocupam, são os de acentuar a ideia de excepcionalidade e de afastar qualquer situação de prolongamento ilegal de situações de prisão e de detenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, da minha parte, acrescentava só mais uma coisa àquilo que foi dito agora pelo Sr. Deputado Guilherme Silva.
Se bem entendi a leitura da proposta, que o Sr. Presidente fez há poucos minutos, ela começava por referir que "A detenção ou prisão...." e chamo a atenção dos proponentes, ao mesmo tempo que faço um pedido de esclarecimento, para o facto de, eventualmente, o Sr. Deputado José Magalhães, ao redigir como redigiu esta proposta, manter o termo "prisão" no pressuposto de que a lei configura determinadas situações de prisão em flagrante delito.
Chamo ainda a atenção para o facto de nas alterações que propusemos - e já as votámos para o artigo 27.º - optámos por, na Constituição, separar, clarificando a terminologia, o que a "montante" irá obrigar o legislador ordinário a seguir a mesma terminologia.
A questão do "flagrante delito" (alínea a) do artigo 27.º), passa a ser apenas para a detenção, passando a ser "detenção em flagrante delito", deixando de haver "prisão preventiva em flagrante delito". Portanto, o "flagrante delito" passa para outro tipo de situações.
Ora, se assim é - e por isso é que disse que esta chamada de atenção era também um pouco um pedido de esclarecimento -, parece-me mais correcto optar, na linha daquilo que disse o Sr. Deputado Guilherme Silva, por uma alteração que diga apenas: "A detenção sem culpa formada será submetida no prazo máximo de 48 horas a apreciação judicial".
Depois, o problema, aqui, é aquilo de que eu falava há pouco, e em que a Sr.ª Deputada Odete Santos também corrobora, ou seja que essa apreciação judicial é para, das duas uma: ou para transformação em prisão preventiva ou para mandar a pessoa em liberdade.
Portanto, não se trata propriamente nem de validar nem de manter a detenção, porque, no rigor das coisas, ela não é mantida nem revalidada, pois do que se trata é de duas uma: ou mandar a pessoa embora, porque o juiz entende que não há motivos para continuar a privação excepcional da liberdade, a detenção; ou, então, o juiz entende que já razões e ordena a prisão preventiva, mas ordena ex novo porque ela não existe até então. É que, face à pureza da nossa ordem jurídica, a prisão preventiva só existe após a intervenção judicial.
Portanto, à laia de um pedido de esclarecimento, chamo a atenção dos autores deste proposta para o facto de nós, no artigo 27.º, já termos separado a prisão em flagrante delito. E, na pureza daquilo que expusemos atrás, deixa de haver prisão em flagrante delito, como acontece no texto actual da Constituição, mas que nós, aparentemente, já emendamos a mão, lá atrás.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, há pouco fui sensível à advertência do Sr. Deputado José Magalhães quando, por razões de coerência, referi que tínhamos retirado do n.º 4 a referência a "antes e depois da formação da culpa".
Agora, coloca-se a questão de saber se deveremos ou não retirar, também do n.º 1, a referência a "sem culpa formada". Só que há aqui esta referência a "sem culpa formada" tem virtudes no sentido de clarificar que se trata de situações de prisão ainda não avaliadas ou determinadas judicialmente.
Assim, ao retirarmos essa referência sem encontrarmos uma fórmula equivalente, corremos o risco de estar a referir, de uma forma global, toda e qualquer situação de prisão e detenção, designadamente aquelas que já resultem de decisão judicial.
Quero chamar a atenção para isto, porque estamos a tratar exclusivamente da prisão preventiva e se vamos, sem nenhuma explicação ou sucedâneo, retirar aqui a expressão "sem culpa formada", podemos inculcar a ideia ao intérprete da lei de que estamos a falar de toda e qualquer situação de prisão, o que me parece que, manifestamente, não deve caber aqui.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a questão é de saber se nós, face ao quadro constitucional tal qual se desenha, podemos conceber que possa haver prisão em situações em que, por exemplo, haja violação grave das obrigações impostas por aplicação de outra medida de coacção, que é uma outra situação além das enunciadas no artigo 27.º, tal qual vai resultar da votação indiciária que fizemos.
Então, tanto quanto sou capaz de analisar a questão, justifica-se a distinção que se faz entre prisão e detenção, embora esteja de acordo com o Sr. Deputado Guilherme Silva no sentido de que temos de encontrar uma forma de nos exprimirmos que diga que não estamos a aludir a todas as modalidades de prisão mas tão-só a algumas, ou seja as que se situam num determinado estádio de relacionamento com o aparelho de Estado.
Mas, francamente, esta questão da violação grave das obrigações impostas por aplicação de outra medida de coacção, ou seja, o caso daquele a quem se impõe uma caução e desaparece e, portanto, é inteiramente compreensível que deva ser privado de liberdade, porque está a tripudiar sobre princípios vários e já não de um, etc., etc.., configura uma situação. Então, qual é o caput constitucional que dá acolhimento à necessidade de intervenção?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Aí já houve uma apreciação judicial que fixa a caução e determina, por força legal, a prisão por quebra da mesma.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Odete Santos, pergunto aos Srs. Deputados se não estamos a caminhar para uma compreensão do problema no sentido em que a prisão só ocorre após decisão judicial e que, por isso, qualquer acto privativo da liberdade prévio à decisão judicial é detenção e não prisão preventiva.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, já estatuímos sobre essa matéria no artigo 27.º.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, mesmo no artigo 27.º, ao falar-se de prisão preventiva por fortes indícios da prática de crime doloso, porventura está a supor-se que a prisão preventiva por fortes indícios é determinada por decisão judicial, portanto qualquer acto de detenção prévio à decisão judicial continuaria a ser um acto de detenção natural e obrigatoriamente submetido a validação no prazo de 48 horas.
Dou, agora, a palavra à Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, penso que a questão e a interrogação que o Sr. Deputado José Magalhães deixou, perguntando qual era a cobertura constitucional para a situação em que uma pessoa violava os deveres impostos pelo juiz para ter liberdade provisória, acabou de ser dada na aprovação do n.º 2 do artigo 28.º porque, aí, cai perfeitamente uma vez que, tendo sido violadas as obrigações, pode o juiz decretar a prisão preventiva.
Contudo, não é isso que me preocupa nesta discussão mas, sim, o facto de, em vez de se discutir um quadro constitucional para o regime de privação da liberdade, primeiro fizeram-se discussões no âmbito do Código de Processo Penal e consagrou-se aí a diferença entre detenção e prisão preventiva, e, depois de conquistado isso nessa sede, então vai sujeitar-se a Constituição ao que o Código de Processo Penal determina.
Ora, acho que isso é completamente errado; a Constituição é que deve definir se há prisão preventiva, se há prisão preventiva e detenção ou o que é que há...! E continuamos agora a ter perante nós o Código de Processo Penal e a dizer que, para que o que vem no Código tenha cobertura constitucional, é preciso que... Tal como a história da detenção para apresentação do bilhete de identidade que, na altura, já em anotação ao Código, se dizia que era de duvidosa constitucionalidade, estamos agora a ajustar a Constituição a um Código que pode, em qualquer altura, ser alterado e até ter uma filosofia diferente.
É por isso que não estou de acordo com esta proposta e até chamo a atenção para o facto de não ser verdade que o quadro constitucional, até agora adquirido, só tenha detenção e prisão preventiva. E não é verdade porque a alínea c) do artigo 27.º contém também o conceito de "prisão" embora tout court, no sentido de privação da liberdade e não no sentido de prisão preventiva nem no sentido de detenção. E aí sim, penso que é bom continuar a ficar só expressão "prisão".
Por outro lado, penso que também é importante - e, aí, dou razão ao Sr. Deputado Guilherme Silva, embora, há um bocado, por causa do arredar da Constituição expressões do Código de Processo Penal, antigo, até admiti que se tirasse "culpa formada" - que, se não for esta expressão, terá de ficar outra de sentido equivalente.
Portanto, entendo que deve continuar a manter-se o termo "prisão", cujo conteúdo é de a pessoa não ter liberdade de movimentos, seja detenção seja prisão preventiva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há uma proposta, que constitui um contributo mais para reflexão, da parte do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, que, suponho, se separa da proposta do Sr. Deputado José Magalhães porque, enquanto esta fala de detenção ou prisão aquela fala apenas de detenção, ou seja: "A detenção será submetida no prazo máximo de 48 horas..."

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas, não é só isso!

O Sr. Presidente: - Mas era a questão essencial, não era, Sr. Deputado Luís Marques Guedes?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é porque o problema terminológico do início da norma está intimamente ligado com a questão da validação, ou seja, o princípio da validação será ou não correcto consoante a terminologia utilizada no princípio da norma seja uma ou outra. E é por isso que esse contributo para a reflexão ia mais longe e colocava a questão, que já foi aqui debatida, de se dizer que a "detenção será submetida no prazo máximo

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de 48 horas a apreciação judicial" para "restituição da liberdade ou eventual imposição da prisão preventiva". É que essas é que são as duas realidades a que o juiz é chamado.
Quando o cidadão, dentro deste prazo de 48 horas, é colocado perante o juiz, seja qual for a razão pela qual, num primeiro momento, ele lá é levado, o problema que se coloca ao juiz é o seguinte: ou restitui a liberdade ao cidadão ou - utilizando a terminologia que a Sr.ª Deputada Odete Santos há pouco nos retractou dos Códigos - impõe-lhe a prisão preventiva...

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou outra medida de coacção - aliás, de harmonia com o que acabámos de aprovar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sim, ou outra medida de coacção, mas, enfim, isso é residual.
Portanto, essas são as opções que são colocadas ao juiz. E penso que essa é que era a benfeitoria a fazer na norma para ficar claro que o juiz não está confrontado ali com uma questão de validação nem de manutenção, porque não é isso que se passa. O juiz está confrontado ali com uma de duas opções: ou restitui a liberdade - e essa devia ser a primeira das opções, atendendo à lógica de que a prisão é sempre uma medida de natureza excepcional, pois a normalidade é a liberdade e, portanto, em primeiro lugar, devia colocar-se no texto constitucional que "será submetido à apreciação judicial para restituição da liberdade" - ou, então, impõe outra medida que será a prisão ou, ainda, outra medida de coacção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - A contribuição parece-me interessante, ressalvada a questão de, quanto à prisão preventiva, ser necessário incorporar, digamos assim, a essência da benfeitoria que foi unanimemente consagrada há bocado, sob pena de estarmos a regressar ao favor da prisão preventiva que acabamos de eliminar.
Descontado isso, ficou identificado o problema. E o problema é que o artigo 28.º confunde prisão e detenção. Isso é um facto! Basta lê-lo alto para se ver que arranca com a noção de "prisão sem culpa formada" e daí a x palavras está a dizer "devendo o juiz conhecer das causas da detenção".

O Sr. Presidente: - A conclusão é de que sem culpa formada não há prisão; há detenção..

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - No sentido técnico rigoroso. Mas a verdade é que a legislação e a própria Constituição...

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso, Sr. Presidente, não é uma questão de ler a Constituição face à legislação ordinária. Há aqui um problema que é congénito e agora estamos confrontados com ele.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, depois desta discussão, quase que estava tentado a recuperar a minha proposta inicial que referia um conceito material de privação da liberdade sem prejuízo do formalismo das figuras processuais que hoje estão em vigor no Código de Processo Penal.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E eu, por acaso, acho bem, Sr. Deputado!

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Contudo retirei-a, por um lado pela interpretação perversa que lhe foi imputada na primeira leitura como querendo dizer mais do que aquilo que se queria dizer, e, por outro lado, por ter ficado com a minha consciência jurídica relativamente tranquilizada com a circunstância de, no artigo 27.º, n.º 2, alínea c), se ter feito menção expressa a que as outras medidas de coacção e privação de liberdade também estão sujeitas a controlo judicial, designadamente a famigerada "detenção" ou "prisão" ou "internamento em centros de acolhimento nos aeroportos"...
Foi, pois, por essa razão que retirei a proposta, mas continuo a encontrar-lhe a virtude de, referida a um conceito material e não a um conceito formal ou processual das figuras que hoje conhecemos na nossa lei orgânica e que amanhã podem ter outra configuração, resolver estes problemas, nomeadamente aqueles que resultam da confusão entre prisão propriamente dita e detenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Srs. Deputados, penso que há aqui um problema que tem a ver não apenas com o sentido originário das expressões "prisão" e "detenção" e da sua distinção técnica, mas com a seguinte questão: um indivíduo pode ser detido e, de imediato, conduzido à entidade judicial para ser apreciada a sua situação - e isto não passou de uma simples detenção.
Mas se o indivíduo é detido a um sábado ou a uma sexta-feira à noite e só na segunda-feira é presente à entidade judicial, então, pergunto: as 48 horas que passou num calabouço não foram de prisão? Há aqui também o problema da situação em que o indivíduo é colocado até que o juiz se pronuncie.
É, pois, preciso ter presente esta diferença que está adquirida e que, efectivamente, se traduz numa posição de privação da liberdade diferenciada por via do local a que um indivíduo recolhe nessa situação até que o juiz se pronuncie.
Acho que não havia mal em falarmos aqui das duas situações: prisão e detenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dá-me a ideia que a nossa dificuldade resulta de estarmos tradicionalmente habituados a utilizar o conceito de prisão como um conceito pré-constitucional de situação de facto. Isto é, a privação da liberdade para qualquer efeito era, em termos de facto, compreendida como a situação de prisão.
A verdade é que parece que estamos a querer caminhar para uma distinção em sentido técnico-constitucional entre o conceito de detenção e o conceito de prisão para admitir

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que o conceito de prisão só possa ser constitucionalmente reconhecido por decisão judicial.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente.

O Sr. Presidente: - E se, de facto, caminharmos nesse sentido, tem razão de ser a proposta do Sr. Deputado Luís Marques Guedes e, portanto, temos que optar entre manter na Constituição o conceito pré-constitucional de prisão ou fazer uma distinção constitucional, em sentido técnico-constitucional, de detenção e de prisão.
Algum dos Srs. Deputados deseja dar algum contributo neste sentido? Da minha parte, como se viu, estou sensível à proposta do Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

Pausa.

Srs. Deputados, temos uma proposta de melhoria, cuja formulação vou passar a ler: "A detenção será submetida no prazo máximo de 48 horas a apreciação judicial para restituição da liberdade ou eventual imposição de medida de coacção adequada, devendo o juiz conhecer das suas causas e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa".

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, há medidas de coacção que não pressupõe a privação de liberdade e, portanto, a alternativa, tal como consta da redacção, parece-me estranha.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, isso é um perfeccionismo, apesar de eu perceber o que o Sr. Deputado Cláudio Monteiro diz. No entanto, chamo a atenção para o facto de o texto actual já dizer que é "(...) decisão de validação ou manutenção (...)". E, na prática, esta alternativa também não é verdade, portanto é um purismo, ou seja é encontrar problemas onde eles não existem.
É evidente que se o texto ficar assim, não inibe o juiz de poder restituir a liberdade, impondo qualquer coisa. E isto porque senão teríamos de pôr "e" ou "ou"...,

O Sr. José Magalhães (PS): - Tudo ou nada!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - ... o que a Constituição não faz em lado nenhum. Mas, porque a Constituição nunca utiliza esta terminologia, isso seria um purismo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas o português tem este sentido...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pois tem, e a Constituição sempre o utilizou nestes termos, em todo o lado.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Então, como é que fica?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, volto a ler pela enésima vez: "A detenção será submetida, no prazo máximo de 48 horas, à apreciação judicial para restituição da liberdade ou eventual imposição de medida de coacção adequada, devendo o juiz conhecer das suas causas e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa".

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não sei se não podíamos manter a expressão "decisão judicial".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a expressão que está agora.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado Marques Guedes, é imprescindível a alusão à "confirmação"?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não existe ali nenhuma confirmação.

O Sr. José Magalhães (PS): - É que verdadeiramente não confirma nada.

O Sr. Presidente: - A expressão "confirmação" não está no texto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sim, não está lá "confirmação".

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, importa-se de olhar para o texto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Numa apreciação, ele vai conhecer as causas.

O Sr. Presidente: - Mas, então, não é medida de coacção?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, mas o "eventual" é que é dispensável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O "eventual" é só para acentuar que o normal é a liberdade.

O Sr. José Magalhães (PS): - Certo, mas se se faz apelo ao conceito de adequação enquanto manifestação do princípio da personalidade, ou é adequada e é aplicada ou não é adequada e não é aplicada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A medida de coacção ou de privação da liberdade. Não ponha isso; têm que ser só medidas de coacção...

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Como é que fica, então?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não se importa de ler.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois da distribuição da proposta de alteração como proposta nova, ou seja, uma nova proposta de substituição para alteração do n.º 1, do artigo 28.º, essa proposta vai ser submetida à votação.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, dito tudo isto, a melhor inserção sistemática dessa norma é no artigo 27.º.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, é uma proposta ou é apenas uma deriva.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não, é uma observação séria, como é óbvio, só para efeitos de redacção.

O Sr. Presidente: - Então, faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Assim configurada: primeiro, uma boa sede para essa matéria é o primeiro artigo capitular e, segundo, o direito à liberdade e à segurança. Mas essa questão é secundária, fica só para a memória e para os trabalhos. A revisão está só a começar de fazer-se.

O Sr. Presidente: - Não sei é se deveríamos mexer na epígrafe do artigo 28.º?
Srs. Deputados, depois de votarmos o n.º 1, talvez que tenhamos de pensar na epígrafe.
Antes de procedermos à votação da proposta de alteração ao n.º 1 do artigo 28.º, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para efeitos de redacção final, penso que deveria fazer duas observações: primeira, acho que deveríamos referir não "para restituição da liberdade" mas "para restituição à liberdade", que é a fórmula usada judicialmente, nestas situações; segunda, quando se fala em "o juiz conhecer das suas causas" deveria referir-se "o juiz conhecer das causas que a determinaram e comunicá-las ao detido".
Era só para ficar em acta estas duas sugestões de redacção.

O Sr. Presidente: - Mas, fazemos já a rectificação, Sr. Deputado, se não houver oposição.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ficaria assim: "Devendo o juiz conhecer das causas que a determinaram (...)" e, em cima, em vez da "restituição da liberdade", deverá constar "restituição à liberdade".

O Sr. Presidente: - Assim se procede e, portanto, esta votação será já com esta integração material.
Srs. Deputados, vamos passar, então, à votação.

Submetida a votação, foi aprovada por maioria qualificada de dois terços, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

A detenção será submetida, no prazo máximo de quarenta e oito horas, à apreciação judicial, para restituição à liberdade ou imposição de medida de coacção adequada, devendo o juiz conhecer das causas que a determinaram e comunicá-las ao detido, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos para fazer uma declaração de voto.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Penso que o artigo 28.ª contém, assim como está e tirando as melhorias que foram introduzidas, uma riqueza muito grande que foi manifestamente empobrecida por esta proposta.
E essa riqueza é que o artigo 28.º, com a epígrafe "Prisão preventiva", que acho que deve ficar porque destina-se a realçar, de facto, que a prisão preventiva exige uma intervenção judicial, tem um conceito material de prisão, como acto de privação da liberdade, independentemente do nome, até porque no n.º 3 se fala em "ordenar ou manter uma medida de privação da liberdade".
Portanto, tem um conceito material de privação da liberdade no termo "prisão", no n.º 3, e tem um conceito de uma prisão material que é feita por uma autoridade que não o juiz, quando usa o termo "detido".
Assim, penso, o n.º 1 do artigo, tal como está, tem todas as virtualidades para, depois, em Código de Processo Penal, se dizer qual é o regime que o legislador ordinário estabelece em relação aos actos de privação da liberdade em sentido material.
É nesse sentido que acho que a proposta aprovada empobrece o texto constitucional.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Guilherme Silva pede a palavra para que efeito?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, acho que as alterações que se fizeram agora a este artigo da Constituição, com incidência na área do Código de Processo Penal, têm virtualidades importantes e vêm na linha das alterações que já se introduziram no artigo 27.º, no sentido de acentuar o carácter excepcional da detenção, da prisão preventiva, das situações de privação de liberdade prévias a qualquer decisão judicial que aprecie e julgue os actos imputados a alguém, que constituam infracção criminal.
Portanto, não há aqui qualquer alteração que ponha em causa os conceitos fundamentais, quer constitucionais quer do processo penal. Lembro até que já se referia, de uma forma equivalente, no próprio n.º 1 da redacção actual, quando se falava em "prisão sem culpa formada" e `*a frente, nas "causas da detenção".
Portanto, não há aqui nenhuma alteração substantiva que possa introduzir malfeitorias à disposição; bem pelo contrário. Aliás, acentuou-se uma coisa que já atrás, nas alterações preconizámos e votámos, se frisou e que tem que ver, em primeira linha, com a preocupação que deve ser tida em conta pelo juiz deve ser a da restituição à liberdade e só se essa ideia e essa possibilidade não for a adequada e for mais adequada outra medida de coacção, que a situação imponha, é que o juiz deve lançar mão gradualmente até à situação de prisão, se for o caso, mas sempre com a ideia de carácter excepcional.

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Isto não é andar para trás nesta matéria mas, sim, avançar em termos de cidadania, em termos de Estado de direito, em termos de respeito por valores fundamentais que inspiram a nossa democracia.

O Sr. Presidente: - Para efeitos de declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o artigo que acabámos, tudo indica, de alterar, por largo consenso, não tinha uma definição cristalina e de sentido inequívoco, pois continha em si mesmo uma confusão, que era reconhecida pela doutrina.
Ao eliminar essa confusão, pratica-se, manifestamente e desde logo, a benfeitoria da clareza, em termos que afirmam relevância insubstituível da intervenção judicial, o que, de resto, é sublinhado a vários títulos e por várias formas, e, ao mesmo tempo, ressalva-se - aliás, enuncia-se, pela primeira vez, a palavra "liberdade" nesta sede, o que é obviamente positivo - e impõe-se o gradualismo à adequação, ou seja, princípios que preservam maximamente a liberdade onde é necessário articulá-la no binómio com a segurança e a repressão do crime.
Neste sentido, Sr. Presidente, esta proposta insere-se na filosofia de revisão constitucional que partilhamos e nas preocupações daqueles que desejam ver na revisão constitucional um instrumento que articule adequadamente liberdade e segurança e que corrija aquilo que na Constituição suscitou confusão.
Francamente, não vejo nenhuma vantagem em fazer uma espécie de endeusamento da confusão como se fosse cristalina.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes deseja intervir para que efeito?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não era propriamente para uma declaração de voto, até porque estamos...

O Sr. Presidente: - Então, para que é Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes ( PSD): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa, porque o Sr. Presidente disse que, a seguir à votação, iríamos, eventualmente, falar da epígrafe do artigo. E como na declaração de voto, nomeadamente da Sr.ª Deputada Odete Santos, o assunto já foi abordado, queria perguntar à Mesa se é oportuno falar-se sobre o assunto.

O Sr. Presidente: - É, com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Portanto, quanto à questão da epígrafe...

O Sr. Presidente: - Posso, então, fazer uma pergunta sobre essa matéria para o Sr. Deputado reflectir?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que acabámos de caracterizar a prisão preventiva como uma medida excepcional e passámos a fazer uma melhor regulação do conceito de detenção, passando a utilizar, com carácter de maior relevância constitucional, o tema das medidas de coacção, pergunto: manter a epígrafe com referência exclusiva à prisão preventiva não é, afinal, denegar na epígrafe aquilo que é o regime excepcional que resulta do conteúdo agora aprovado neste artigo? Uma epígrafe do género "Detenção e medidas de coacção" não acompanharia melhor o espírito da votação que acabamos de fazer, relativamente ao corpo do artigo 28.º?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, então, tentaria também ponderar a observação que acabou de fazer.
A posição que quero expressar, em primeira linha, é a de que, da parte do PSD, inclinamo-nos, de facto, no mesmo sentido da Sr.ª Deputada, para manter a actual epígrafe, por uma razão que, penso, decorreu também das declarações de voto dos Srs. Deputados Guilherme Silva e José Magalhães, que, pessoalmente, subscrevo.
Neste sentido, de facto, neste e noutros artigos da Constituição, independentemente de o programa normativo respectivo abordar mais do que um conceito, mais do que uma situação, as epígrafes têm que ver com aquilo que é o objecto principal, digamos, do programa normativo do artigo.
Neste caso, entendo que não houve nem se anunciam alterações no texto constitucional suficientemente importantes para retirar a este artigo da Constituição o seu objecto principal que é - e do meu ponto de vista continua a ser - a prisão preventiva.
De resto, retomo a linha de raciocínio expressa na declaração de voto do Sr. Deputado José Magalhães para frisar o seguinte: o conteúdo útil da redacção que, aparentemente, será a nova redacção do texto constitucional, na sequência das propostas aqui aprovadas, encadeia-se numa sequência que, a meu ver, é a sequência lógica das coisas. E, como os cidadãos entendem e apreendem, num primeiro momento existe uma detenção e a prioridade face a essa detenção é a submissão a um juiz que restituirá à liberdade ou imporá medidas de coacção.
No n.º 2 do artigo explica-se, então, que a coacção mais forte e que terá sempre de ter uma natureza excepcional pode chegar a ser a prisão preventiva.
A partir daí o artigo descreve essa prisão preventiva como sendo aquela medida que, por ser a mais forte, é, naturalmente, a mais excepcional face ao direito fundamental, que está no artigo anterior, que é o direito à liberdade.
Esta medida de prisão preventiva é a mais forte e é aquela em que o juiz fica obrigado a uma série de condicionamentos que, depois, decorrem dos n.os 3 e 4, sendo que o n.º 3 volta a não ser apenas para a prisão preventiva mas também para a prisão preventiva, por razões óbvias, só que o legislador constituinte - e nessa parte não mexeremos aparentemente - mantém uma utilização de termos literais que permite extravasar para além da prisão preventiva, estendendo-os a todas as outras medidas de privação da liberdade, mas, em qualquer circunstância, também se aplica à prisão preventiva.
Agora, tentando responder ao Sr. Presidente, penso que poderia perfeitamente a epígrafe de um artigo como este

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ser, por exemplo, "Privação de liberdade", uma vez que a do artigo anterior é "Direito à liberdade".
Este artigo poderia tratar, dentro da lógica de que agora falamos e na sequência de como as coisas, na prática, ocorrem para o cidadão, do seguinte: o cidadão é detido, se é detido, automaticamente está privado da liberdade e ao ser privado da liberdade ele tem a garantia constitucional de que, no prazo de 48 horas, tem de ser levado a um juiz e esse juiz, segundo a Constituição, ou o manda em liberdade ou lhe impõe qualquer medida de coacção e, depois, o n.º 3 deste artigo diz que essa medida de coacção, excepcionalmente, poderá ir ao ponto de ser a prisão preventiva e, se for prisão preventiva tem de ter regras próprias, tem de ter prazos, tem o direito de comunicar com a família, de comunicar ao advogado, e por aí fora, de acordo com dispostos nos números seguintes.
Portanto, poderia, em abstracto, no plano ideal, um artigo como este ter como epígrafe "Privação da liberdade", só que chamo a atenção do Sr. Presidente para que - e é a minha opinião mas gostaria de ouvir os outros colegas -, de facto, não estamos a elaborar uma Constituição ex novo, mas, sim, a alterar a Constituição e este artigo tem sido, desde sempre, na nossa história constitucional, o artigo que trata de prisão preventiva, sem embargo de também tratar de outras coisas, pois este n.º 3, que cá está, sempre cá esteve, tanto quanto sei, sempre tratou de alguns outros aspectos.
Todavia, o objecto principal deste artigo é o que condiciona a sua epígrafe, ou seja, a prisão preventiva, que é aqui a medida mais forte e aquela para a qual o cidadão tem de encontrar uma resposta no texto constitucional, quando o folheia na procura de saber como é que é e porque vão prendê-lo antes do julgamento. Até porque, na linguagem comum, há essa confusão, desde que a liberdade esteja restringida à prisão. O sentimento do cidadão é o de que "estou preso". E essa é que é a linguagem comum, embora com algumas nuances, relativamente ao preciosismo jurídico ou linguagem jurídica pura.
E tratando-se não de uma Constituição ex novo mas de uma alteração à Constituição, inclinar-me-ia, de facto, para manter a epígrafe "Prisão preventiva", porque, penso, continua a ser o objecto principal desta norma que, como já foi referido pelos Srs. Deputados que fizeram declarações de voto, foi melhorada sem alteração.
Pelo contrário, penso até que com uma melhor explicitação daquilo que é o seu objecto principal, que são as medidas de privação de liberdade, maxime a prisão preventiva, que é, de facto, aquela que mais importa e que mais influi na liberdade como direito fundamental dos cidadãos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pelas intervenções já produzidas, regista-se que não há consenso suficiente para uma possibilidade de alteração da epígrafe, e não havendo mais pedidos de palavra, vamos passar ao artigo seguinte - artigo 30.º, que tem a ver com os "Limites das penas e das medidas de segurança".
Suponho que a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Cláudio Monteiro, para o n.º 1, teria sido retirada, da sua parte, na primeira leitura, pelo que pergunto ao Sr. Deputado se se confirma ou não esta situação.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Confesso não me recordar se expressamente retirei ou se deixei esse propósito para um momento posterior, nomeadamente o presente.
De qualquer forma, posso confirmar a retirada dessa proposta, voltando a salientar aquilo que já havia salientado na primeira leitura, ou seja: tenho consciência de que o alcance técnico-jurídico desta proposta é limitado, tendo em conta que toda a pena e toda a medida de segurança constitui uma restrição a um direito fundamental e, concretamente, a um direito de liberdade e garantia e que, portanto, nos termos gerais do artigo 18.º, qualquer restrição aos direitos, liberdades e garantias já está sujeito a um princípio geral de personalidade.
De resto, esta proposta tinha ainda o significado político importante que era o de chamar a atenção para o facto de a imposição de penas e de medidas de segurança estar sujeita ao princípio da personalidade. Ora, tendo em conta os desenvolvimentos, em matéria de política criminal, mais recentes na nossa sociedade e na nossa classe política, parecia que começava a ser necessário recorrer-se a alguma ou algumas vozes contra a corrente, contra a histeria do reforço e do aumento das penas e das medidas de segurança, tendo sido, pois, com essa intenção que a proposta foi apresentada, sendo certo que não tendo ela, apesar de tudo, uma mais-valia significativa, por essa razão e apenas por essa razão, ela é retirada.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado.
A proposta está retirada e, portanto, não é objecto de apreciação.
A Sr.ª Deputada Odete Santos pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É sobre esta proposta.

O Sr. Presidente: - Mas ela foi retirada, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Está bem, mas era só para recordar que o PCP disse que não estava de acordo com a redacção do artigo 18.º da Constituição.

O Sr. Presidente: - Exactamente, é uma boa precisão, na verdade, que lhe reconheço.
Sr. Deputado José Magalhães, há propostas do PS e, por isso, pergunto se sustenta as propostas originárias tal como foram apresentadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, nós sustentar sustentaríamos, mas não creio que se tenha gerado um consenso indiciário para as serem aprovadas.

O Sr. Presidente: - Se não estou em erro, havia receptividade da parte, designadamente do PSD, a estas propostas do PS, ainda que com reserva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Estamos a falar de quê, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Estamos a falar das propostas de alteração ao artigo 30.º, Sr. Deputado Marques Guedes.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, no n.º 6, novo, nós tínhamos uma correcção a fazer: em vez da expressão "Só podem ser estabelecidas para crimes (...)", a expressão apropriada seria: "Só podem ser estabelecidas para infracções praticadas no exercício dessas funções (...)".
Quanto ao alcance desta nova redacção do artigo 30.º, ele já ficou claro também na primeira leitura, sendo, no entanto esta correcção ao n.º 6 fundamental.
No n.º 7 do mesmo artigo 30.º, da proposta do PS, há igualmente uma imprecisão de redacção, ou seja, onde se fala "(...) do consentimento do arguido", o termo "arguido", por uma questão de rigor, deve ser substituído por "condenado", tendo em conta o disposto no artigo 58.º, n.º 5, do Código Penal.
No entanto, como é óbvio, trata-se de uma disposição algo dispensável, porque esta solução decorre da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no seu artigo 4.º, e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, no seu artigo 8.º, bem como da própria Constituição, artigo 25.º, n.º 2, que, devidamente lida, já acarreta este tipo de solução.
Portanto, Sr. Presidente, em relação à última proposta, a n.º 7, se houver entusiasmo, simpatia ou quaisquer sentimentos ou atitude similar em relação à proposta, tudo bem; se não houver, retirámo-la pelas razões que já explicitei e que, neste caso, estão felizmente sustentadas pelo Direito Internacional vigente na ordem interna.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos por partes.
Para além das propostas apresentadas pelo PS, há também propostas para números novos relativamente ao projecto do PEV, que, neste momento, não se encontra presente.
Vamos, em primeira via, apreciar as propostas do projecto do PS, sendo que a primeira delas se reporta a uma alteração do n.º 3, no sentido de, onde se lê, "As penas são insusceptíveis de transmissão" passar a ler-se, "A responsabilidade penal é insusceptível de transmissão", proposta esta que, lembro, teve algum acolhimento durante a primeira leitura.
Alguém deseja expressar-se sobre esta proposta?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Esta proposta tem, eventualmente, um sentido mais amplo que a fórmula actual que se refere apenas à intransmissibilidade das penas, o que pressupõe, de certo modo, já uma situação de condenação relativamente a alguém que tenha cometido qualquer crime e que, entretanto, tenha morrido. Portanto, a pena não se pode transmitir - o que é, aliás, um princípio adquirido do Direito Penal e, de certo modo, um princípio universal dos direitos em geral.
Nesta proposta optou-se por preferir a fórmula "responsabilidade penal", sendo que, evidentemente, o falecimento extingue o procedimento criminal e a responsabilidade penal.
Na verdade, não vemos inconveniente em dar-lhe esta amplitude maior o que acaba por não só incluir a fórmula, hoje já estabelecida, que supõe uma condenação prévia como as situações ainda de não decisão judicial sobre qualquer responsabilidade imputada a alguém que, entretanto, falece.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação desta proposta de alteração do n.º 3.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

A responsabilidade penal é insusceptível de transmissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar agora ao n.º 6, novo, constante da proposta originária do PS, para a qual tinha havido acolhimento na primeira leitura, tendo o Sr. Deputado José Magalhães proposto, verbalmente, a alteração material da expressão "crimes" pela expressão "infracções".
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto aos n.os 6 e 7, de facto, na primeira leitura houve alguma receptividade da parte do Partido Social-Democrata, no entanto a reflexão por nós feita vai no sentido que procurarei agora explicitar.
Não temos qualquer discordância fundamental com o conteúdo útil, ou seja, com o objectivo dos proponentes na formulação destes novos n.os 6 e 7, no entanto faço a seguinte chamada de atenção: parece-nos, em abstracto, errado que na Constituição da República se concretizem determinados tipos de situações para além, enfim, daquelas que são, por exemplo, o elencar de direitos fundamentais e por aí fora.
Parece-nos errado explicitar o texto constitucional de tal forma que, na prática, ele vá, depois, a jusante, funcionar como uma restrição objectiva à margem de manobra do legislador ordinário para, em cada momento, formular as soluções mais adequadas.
E passo a exemplificar: o facto de, por exemplo, haver um n.º 7, novo, que fala na pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, se isto ficar na Constituição, até que o legislador constituinte altere o texto constitucional não mais o legislador ordinário terá qualquer liberdade para retirar ou deixar ou contemplar esta pena como efeito da prática de determinado tipo de crimes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço desculpa, mas está a falar de que norma?

O Sr. Presidente: - Está a falar da proposta de alteração ao n.º 7.
Mas, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, nós estávamos ainda no n.º 6...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas eu estava a falar dos n.os 6 e 7; estava a dar um exemplo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas no trabalho a favor da comunidade o Sr. Deputado está a ter em conta as

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mencionadas e já citadas e recitadas Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que, nessa matéria, limitam claramente...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não é esse o problema que estou a colocar; o problema que estou a colocar é o que dei a título de exemplo, como se poderá recordar quem esteve atento. Agora, se este exemplo não é o mais feliz, peguemos noutros acerca do n.º 6.
Portanto, a reflexão que quero aqui deixar é a seguinte: não havendo qualquer objecção ao objectivo dos proponentes, o que nos parece é que, de facto, a constitucionalização desta matéria, na prática, funciona não como qualquer benfeitoria real mas, apenas, como que uma restrição à margem do legislador ordinário para concretizar, de hoje para amanhã, determinado tipo de penas ou sanções a determinados comportamentos que são tidos como ilícitos nos termos do Código Penal.
Portanto, quando se fala, aqui, em "interdição do exercício da função pública" ou "interdição de cargos públicos", o que cito como exemplos, em abstracto, são exemplos de normas constitucionais que, do nosso ponto de vista, não trazem uma benfeitoria real ao nosso ordenamento jurídico, mas apenas criam entraves à eventual evolução normal do nosso ordenamento jurídico, de acordo com os princípios constitucionais.
O texto deste artigo 30.º, como o Sr. Presidente e os Srs. Deputados verificarão, fala em princípios e, normalmente, não desce nunca ao pormenor de falar de penas em concreto. E as propostas dos n.os 6 e 7, embora o objectivo não seja este, pela sua literalidade, acabam por citar penas em concreto, o que nos parece uma solução não útil mas até indesejável.
Portanto, nesse sentido, achamos que isto não traz, de facto, nenhuma vantagem palpável ao texto constitucional e, pelo contrário, colocando na balança os prós e os contras das alterações à Constituição, pode conter um efeito útil indesejado e indesejável que é o de restringir, de certa maneira, a margem de manobra do legislador ordinário na formulação das penas aos comportamentos que são, em cada momento, determinados como ilícitos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, suponho que o alcance útil desta proposta visaria introduzir na Constituição uma norma-garantia para evitar que certas penas acessórias pudessem ser prescritas em sede de legislação ordinária de forma a prejudicar núcleos fundamentais de direitos, liberdades e garantias.
Neste sentido, a norma tem um valor constitucional que fala por si, mas o Sr. Deputado Luís Marques Guedes...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas, então, devia ser "completada" nesse sentido. E, então, aquilo que o Sr. Presidente acabou agora de referir, aí, sim, já não se concretizavam situações mas falava-se apenas que penas acessórias de inibição devem ser cumulativas...
Enfim, essa ideia que agora exprimiu é que poderia ser uma formulação que, do nosso ponto de vista, teria alguma lógica de encaixe no texto constitucional.
A objecção que temos é a da concretização, porque nos parece que daí advém mais prejuízos do que vantagens, uma vez que a concretização de penas restringe a margem do legislador ordinário. Se ficarmos pelos princípios e pela afirmação dos princípios, aí sim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Desejava pedir um esclarecimento aos proponentes e, portanto, ao Sr. Deputado José Magalhães, em relação a este n.º 6.
Nesta proposta, há uma preocupação que é a de associar seriamente a interdição de determinados direitos ao prosseguimento de actividades ligadas à área interdita, ou seja, à área em que se inserem os direitos de que se decreta a interdição.
Ora, pergunto: esta interdição de direitos políticos, no entender dos proponentes, é reservada exclusivamente a quem exerça a actividade política, ou seja, a titulares de cargos políticos? É uma questão que se me põe, porque parece que se quer criar essa exclusividade.
É sobre isto que gostaria de ser esclarecido.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não, Sr. Deputado. Aliás, o debate na primeira leitura é bastante claro quanto a esse ponto, porque, quanto aos titulares de cargos políticos, esta norma tem que ser vista em articulação com outras disposições constitucionais bastantes exigentes e cuja exigência será reforçada, como tudo indica, nesta revisão constitucional, designadamente no artigo 120.º.
Quando estabelecemos uma norma com um princípio de um conjunto de regras como estas que se referem direitos políticos, referem-se, no seu sentido rigoroso, ou seja, só a alguém que cometeu um crime, por força de um abuso do exercício de direitos políticos, é que pode ser estabelecida uma sanção nessa específica esfera. Não pode ser alguém proibido de exercer direitos políticos, porque cometeu uma infracção rodoviária, porque conduziu sob influência de álcool e, logo, é privado de liberdade, não vota durante x anos... Essa correlação entre uma infracção, digamos, de delito comum e uma privação de direitos políticos não deve poder ser feita.
É essa a essência da proposta que, aliás, creio, em recta razão, já decorre, em boa interpretação, de preceitos constitucionais, nomeadamente do n.º 4, na medida exacta em que haveria aí, digamos, uma espécie de perversão porque não haveria uma relação sinalagmática entre uma coisa e a outra que se estava a impor.
As esferas são separadas e devem manter-se separadas, pelo que, creio, desse ponto de vista, este princípio é virtuoso embora em relação aos titulares de cargos políticos o seu regime seja mais complexo, porque há normas específicas sobre o exercício desses cargos -. aliás, não é por acaso que há uma lei dos crimes de responsabilidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Para além do que já foi dito, ainda desejava fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado José Magalhães.
Em abstracto, o Sr. Deputado entende, por exemplo - e porque penso que isso é o que resulta do conteúdo literal da proposta do n.º 6 - que, no caso de crimes como o de traição à pátria ou o de espionagem, não pode, de nenhuma forma, ser cominada a pena de interdição do exercício de função pública ou cargo público ou mesmo de direitos políticos? Eu penso que poderia. É que se o texto constitucional ficar como aqui está, o crime de traição à pátria ou de espionagem...
É evidente que estamos no plano dos exemplos para ver exactamente o resultado da benfeitoria que os proponentes desejam traduzir na Constituição.
Mas, dou-lhe ainda, como segundo exemplo, o crime de sabotagem económica, ainda que este não seja realizado no exercício, por exemplo, da actividade de banqueiro. Este crime não poderia, também, nunca vir a ter, de hoje para amanhã, como cominação a pena de interdição do exercício da actividade profissional?
Cito este último exemplo porque, como todos sabemos, em termos do ordenamento jurídico português, a actividade bancária tem uma protecção e uma restrição maior à liberdade do exercício profissional. Como sabem, nos termos da lei bancária, ninguém pode livremente, ainda que seja dono do banco, exercer a actividade de gestor do banco se o Banco de Portugal não validar essa candidatura.
Portanto, é um caso típico em que o ordenamento jurídico português restringe o acesso a determinado tipo de actividades profissionais em termos objectivos e com intuitos de sobrevalorização do interesse público que está subjacente ao exercício dessa actividade económico-financeira.
Eram estes os pedidos de esclarecimento que dirigia ao Sr. Deputado José Magalhães porque, parece-me, não deverá ser esse o sentido útil do proponente e que decorreria perigo da inscrição constitucional de uma norma como esta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a redacção desta norma teve em conta observações como estas agora formuladas pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Por um lado, em muitas das situações que referiu não há um crime mas há uma pluralidade de crimes e há crimes em concurso e, portanto, em muitos casos, a sua preocupação de estanquicidade acaba por ser satisfeita pela vida real em que o espião não pratica apenas um crime, pratica vários ao mesmo tempo e, de resto, será sancionado por eles.
Por outro lado, acautelamos precisamente este tipo de situações utilizando a cláusula de salvaguarda que está no segmento final da norma que diz especificamente: "ou em directa conexão com eles". A expressão "directa conexão" não sei se é perfeita mas visa, no fundo, salvaguardar que tem que haver um nexo. E se houver ou se puder provar-se esse nexo, o legislador pode determinar essa associação de sanções, ou seja, há aí francamente uma cláusula de salvaguarda que acautela as suas preocupações e, por outro lado, há o mérito de se estabelecer um princípio de relacionamento directo entre a sanção e o terreno em que o infractor se moveu e que merece censura penal.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, permite-me que peça um esclarecimento?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Face à expressão "ou em directa conexão com eles", desejava saber a que é que se reporta este "eles".

O Sr. Presidente: - Agora, era com "elas", as infracções.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem, neste caso, referia-se a crimes, mas tem de passar ao feminino.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Acho que tem de ser a crimes.

O Sr. José Magalhães (PS): - É que nós pretendemos substituir "crimes" por "infracções".

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Segundo a sua intervenção, penso que deverá ser em relação com o Código de Processo Penal que tem esta expressão, no caso até de apensação de processos, em que usa a expressão: "crimes com eles directamente conexionados". Portanto, entendi que tinha a ver com crimes, mas, no entanto...

O Sr. Presidente: - É, Sr.ª Deputada. Só que, quanto à expressão "crimes", há uma proposta para a sua substituição pela expressão "infracções".

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto.

O Sr. Presidente: - Portanto, em vez de ser "com eles" é "com elas", mas a lógica do raciocínio mantém-se.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso é que salvaguarda todos os problemas que se levantassem?

O Sr. José Magalhães (PS): - O sentido foi exactamente esse e a fonte de inspiração é aquela que, hoje em dia, tem doutrina e jurisprudência sedimentadas entre nós face ao Código de Processo Penal.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas, aqui, "o directa conexão com eles" refere-se a crimes?

O Sr. Presidente: - É.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Refere-se a crimes com "eles directamente conexionados", só que vai ser substituído "eles" por "elas".

O Sr. Presidente: - Exactamente.

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O Sr. José Magalhães (PS): - E a infracções, que podem nem ser crimes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos suficientemente esclarecidos sobre a natureza e o alcance da proposta.
Podemos passar à votação?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Pensamos que o actual n.º 4 já salvaguarda grande parte das preocupações que estão implícitas ou expressas neste n.º 6 e penso que há várias questões que este debate já suscitou pelo que nos parece cauteloso não avançar para esta fórmula proposta para este n.º 6.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Srs. Deputados.
Não há consenso para a fórmula e, por isso, pergunto ao Partido Socialista se deseja passar à votação ou retira a proposta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Retiramos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos ao n.º 7.
Suponho que as considerações para o n.º 7 também já estavam feitas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, só desejava perguntar se, em relação ao trabalho a favor da comunidade, acham que vale a pena qualquer coisinha ou que não vale a pena nada.
É que uma das soluções era dizer-se que o trabalho a favor da comunidade será incentivado, pois sabemos como tem sido relegado para quinto plano... Mas, atendendo ao argumento do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, podia convolar-se o comando num comando de sentido incentivador do trabalho a favor da comunidade, sendo que a norma faz depender o trabalho a favor da comunidade da vontade do condenado e, assim, ficaria em segundo plano. Ou seja: o âmbito principal da norma seria incentivar o trabalho a favor da comunidade; o âmbito secundário da norma seria, todavia, de não impor o "pontapé" e fazer depender isso de uma margem de consentimento do condenado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Este artigo, como está redigido, é contrário...

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, não. É que estou precisamente a saltar da redacção actual, verificando se é possível introduzir...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Srs. Deputados, se me permitem, gostaria de dizer que penso o seguinte: como o Sr. Deputado José Magalhães referiu, esta exigência do consentimento do arguido já decorre de Tratados e Convenções que a própria Constituição constitucionaliza, digamos assim.
Portanto, estamos aqui a pôr "um mais" desnecessário mas, indiscutivelmente, esta fórmula não é, de forma alguma, estimuladora ou estimulante da prestação de trabalho a favor da comunidade. Bem pelo contrário; a fórmula proposta parece inculcar a ideia de não recomendar ou de não ampliar a aplicação deste tipo de pena.
Não sei se haverá outra fórmula ou se o Sr. Deputado José Magalhães tem uma fórmula alternativa que dê...

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, estou a dizer que será incentivada a aplicação alternativa da pena de trabalho a favor da comunidade, o que corresponde, de resto, suponho, a um consenso bastante estabelecido na comunidade jurídica e nas várias famílias políticas.
Isso não contende muito com a lógica do artigo 30.º porque, neste artigo, há preocupações de salvaguarda e há uma directriz de política criminal no n.º 5, por exemplo, que foi aditado numa das revisões constitucionais, em que houve a preocupação de esclarecer o regime dos direitos fundamentais do recluso, etc., etc..

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sinceramente, parece-me que privilegiar, do ponto de vista constitucional, uma determinada forma de pena, por muito louvável que ela seja, parece-me poder introduzir restrições ao âmbito da política criminal em geral, introduzindo, eventualmente, desequilíbrios valorativos relativamente às penas.
Só se fosse um princípio geral que visasse, tal qual nós já determinamos, o problema da excepcionalidade da prisão preventiva, privilegiando as penas não privativas da liberdade em geral, mas, mesmo aí, parece-me que essa constitucionalização pode ser, um bocado, a de criar aqui uma situação estanque relativamente à ordem jurídica criminal que tem de, em cada momento, ajuizar da política criminal adequada às situações.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, doravante o debate tem um efeito menos útil, porque o autor da proposta acaba de comunicar que a retira.
Vamos passar, portanto, ao artigo 30.º...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Quer dizer que a pergunta era só ao PSD para saber se aceitava?

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, compreenda que também há um efeito muito útil em conhecer as posições de alguns partidos, particularmente pela razão de que há maiorias qualificadas indispensáveis à alteração do texto constitucional.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Mas, Sr. Presidente, esta matéria que estava em discussão é interessantíssima: saber até que ponto a Constituição poderia ou não consagrar já uma determinada política criminal em Portugal para certas penas em relação a trabalhos a favor da comunidade, etc., etc..
Por isso que eu gostaria de usar da palavra para fazer uma intervenção sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr.ª Deputada Odete Santos...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Estamos aqui - desculpe lá, Sr. Presidente - a debater coisas extremamente importantes em matéria de política criminal e de processo

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penal e penso que, de facto, não interessará só em termos imediatistas saber o que é que passa e o que é que não passa porque, senão, os Srs. Deputados chegam aqui e dizem assim: "nós chegamos a acordo só nisto e nisto e só estas propostas é que têm dois terços. Bom dia, passem muito bem"...
Então, nesse caso, tem o Sr. Presidente de esclarecer...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, por benevolência sua, dá licença ao presidente?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E o Sr. Presidente dá-me licença que eu, a seguir, diga mais alguma coisa.

O Sr. Presidente: - Dou, a seguir, dou-lhe toda a licença. Mas, agora, é só para dizer que a Sr.ª Deputada diz muitas e preciosas coisas e muito pertinentes mas a não pertinência da sua afirmação de agora é de que o debate que se propunha continuar a travar deixou de ter objecto a partir do momento em que o Sr. Deputado, autor da proposta, a retirou do debate e, portanto, estaríamos a fazer um debate no vazio.
Sr.ª Deputada Odete Santos, só por isso, eu estava a tentar interrompê-la, para lhe dar notícia de que a proposta tinha sido retirada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E eu fiz um sublinhado de que o que interessava aos proponentes eram só os votos de um partido.
Mas eu pedi só para me deixar dizer mais uma coisa: é que se o raciocínio fosse esse, isto é, só interessava aquilo em que havia dois terços, então, nem o Sr. Presidente estaria a apurar propostas que aqui não nasceram com a aprovação de dois terços e vão ser submetidas a Plenário.

O Sr. Presidente: - Não disse "que só", Sr.ª Deputada, disse "que também".
Srs. Deputados, peço a vossa compreensão para podermos passar adiante dado que a matéria relativa ao ponto 7 deixou de estar na agenda.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, permite-me que...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, suponho que compreendo o efeito para que está a pedir a palavra, mas peço o favor de contribuir para irmos até ao fim do artigo 30.º.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas, não se esqueça que há aí uma proposta de Os Verdes que não estando...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, tem razão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não se sabe, aliás, como é que o Sr. Deputado Guilherme Silva vai garantir a presença compulsiva de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa vai fazer diligências no sentido de saber se o Os Verdes poderão estar presente da parte da tarde, no reinício dos trabalhos, que terá lugar às 15 horas.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, quero aproveitar a oportunidade para, tendo em conta que foi distribuído - julgo que na última sessão - um conjunto de posições e propostas comuns do PS e do PSD, no qual manifestavam, designadamente, uma posição comum favorável à minha proposta para o artigo 32.º, n.º 6, de previsão de uma garantia específica da intervenção do ofendido no processo criminal, sendo certo que oferecem uma redacção de substituição ou alternativa mais abrangente do que a minha, dado que não circunscrevem essa garantia ao processo criminal mas a todo e qualquer processo e, portanto, dado que não faria sentido estarem as duas, retiro a minha proposta em benefício da outra, mantendo as restantes propostas que, mesmo na minha ausência, deverão ser objecto de votação.

O Sr. Presidente: - Portanto, quanto ao artigo 32.º, está retirada a proposta n.º 6.
Srs. Deputados, está interrompida a nossa reunião.

Eram 12 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados, vamos passar às propostas para os n.os 6 e 7 do artigo 30.º, apresentados pelo PEV.
Não há qualquer proposta de substituição, entretanto apresentada, para estes n.os 6 e 7 do projecto originário de Os Verdes, razão pela qual, se não houver objecções em contrário, e tal como tinha ficado indiciado de manhã, passaríamos à votação.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, só para me situar por não ter estado presente da parte da manhã...

O Sr. Presidente: - A posição é a seguinte: tivemos em discussão, da parte da manhã, o artigo 30.º. Desse artigo 30.º tudo está votado menos, por ausência momentânea dos proponentes, os n.os 6 e 7, que vamos agora discutir e votar.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro vê inconveniente em que sejam votados em bloco os n.os 6 e 7?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Bom, não sei se o apoio ou rejeição dos demais partidos está definido em bloco...

O Sr. Presidente: - Pergunto, agora, se alguém suscita a conveniência de a votação se fazer em separado.

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A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Não sei se a discussão se fez, se houve acordo sobre a ideia, em termos de redacção ou não...

O Sr. Presidente: - Não há nenhuma pretensão de votar, por necessidade de posição de voto, em separado, os n.os 6 e 7.
Assim sendo, passaríamos a votar em bloco os n.os 6 e 7, constantes do projecto n.º 10/VII de Os Verdes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, eu quero pronunciar-me sobre o n.º 7...

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado Luís Marques Guedes, tenho toda a estima pelas suas posições, mas quando há momentos...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não. É que o Sr. Presidente estava a perguntar se podia agregar os dois números e eu, como só estava em discussão o n.º 6 e sobre esse não pretendia usar da palavra, não percebi...

O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quanto ao n.º 6, mas convém votar em conjunto.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado se quer pronunciar sobre o n.º 7, considero que é indispensável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, era só porque a matéria do n.º 6 é nova, é diferente daquela que discutimos durante a parte da manhã nesta reunião, é uma matéria relativamente à qual não queremos acrescentar nada daquilo que dissemos na primeira leitura porque a nossa opinião, aí, não evoluiu e entendemos, de facto, que não é matéria que deva ter dignidade constitucional. É política penitenciária, como diz o Sr. Deputado Guilherme Silva.
Já quanto ao n.º 7, de algum modo, a questão relaciona-se indirectamente com aquilo que foi dito pelo PSD, de manhã, relativamente a uma proposta para um n.º 7 (novo), apresentada pelo PS.
Assim, e uma vez que a Sr.ª Deputada não pôde assistir a essa parte final da discussão, gostaria de reiterar que, do ponto de vista do PSD, aqui mais do que na proposta do PS, é claramente um problema de quase oposição, porque relativamente à proposta do Partido Socialista, nós tivemos oportunidade de dizer que nada temos contra, muito pelo contrário, de, no caso em que existam penas de prestação de trabalho a favor da comunidade, essas penas deverem sempre depender do consentimento do condenado, conforme propunha o Partido Socialista.
Daí o facto de não termos votado a proposta do Partido Socialista é que nos parece que não deve o texto constitucional condicionar positivamente o legislador ordinário a instituir, na nossa ordem jurídica, sempre e necessariamente este tipo de pena que, em determinado tipo de política criminal, pode justificar-se e com outra política criminal pode nem ser preconizada.
Mas, a proposta de Os Verdes vai mais longe e impõe mesmo o princípio de que, sempre que possível, as penas de privação de liberdade devem ser substituídas por penas de realização de tarefas úteis ou necessárias à comunidade.
A posição do PSD, na sequência daquilo que dissemos de manhã, é contrária porque entendemos, de facto, que isto é uma opção de política criminal que deve ser feita, em cada momento, pelo legislador ordinário, de acordo com aquilo que é democraticamente a maioria e a opção programática tomada pelo povo português em eleições.
Não nos parece que seja matéria de direitos fundamentais e não nos parece, de facto, que se deva inscrever como direito fundamental dos cidadãos, que é para isso que a Constituição serve, o princípio de que o cumprimento das penas deva prioritariamente ser feito através de trabalho em serviço da comunidade, sendo que essas são opções que devem ser deixadas ao legislador ordinário e de política criminal.
Portanto, votaremos contra esta proposta.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço-lhes o favor, aliás não é a primeira vez que o faço, de que, quando não há propostas de substituição, as declarações de clarificação da posição política de cada partido sejam, por utilidade para os nossos trabalhos, tomadas em sede de declaração de voto.
É um apelo que tem o valor de apelo e terá o acolhimento que os Srs. Deputados entenderem que ele merece.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, quanto a esta matéria entendemos que devia reflectir-se no texto constitucional porque, parece-nos, há todo um percurso no sentido de encarar diferentemente o sistema penal e as medidas de segurança, fundamentalmente repressivo, como uma herança que me parece que é extremamente negativa, quer em termos daquilo que depois consta dos relatórios do Provedor de Justiça, em matéria de violações dos direitos dos nossos reclusos, que são cidadãos, independentemente de estarem ou não privados de liberdade, quer em termos daquilo que me parece não ser cumprido o objectivo que a privação de liberdade deve ter implícita, que é a reinserção e a reintegração social do indivíduo, ou seja, não é só punir porque se transgride as normas sociais, mas também para favorecer, a prazo, a reinserção.
Julgamos que, do modo como o sistema tem sido entendido, é de completa falência e porque é essa a nossa convicção, julgávamos ser benéfico reflectir no texto constitucional uma outra perspectiva diferente de encarar as medidas de segurança e o cumprimento de penas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta para os n.os 6 e 7 do artigo 30.º, apresentada por Os Verdes.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e abstenção do PS.

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Era a seguinte:

6 - O Estado garante a dignidade humana e a integridade física e moral dos reclusos, o acompanhamento educacional e jurídico e assegura as condições necessárias à relação com os cônjuges, companheiros e restantes familiares.
7 - A lei assegura que as penas cumpram o objectivo principal da reinserção dos reclusos na sociedade e, sempre que possível, sejam substituídas pela realização de tarefas úteis e necessárias à comunidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, por um lado, esta proposta ia no sentido de densificar a Constituição no que diz respeito, designadamente à pena de prestação de trabalho, que é, digamos, uma das penas subentendidas na redacção específica do ponto 7, proposta por Os Verdes, e, por outro lado, suponho que essa discussão em nada prejudica esta exegese que é perfeitamente cabal e que resulta da revisão constitucional.
O artigo 30.º, n.º 5, da Constituição, francamente, não precisa de ser glosado e podia ser escrito, obviamente, de mil maneiras diferentes, mas está escrito como está e está bem escrito. De facto, o artigo clarifica que os condenados, em Portugal, mantêm a titularidade dos direitos fundamentais além de, naturalmente, serem pessoas humanas, ou seja, pessoas cuja dignidade deve ser respeitada e assegurada.
Pode, obviamente, escrever-se isto em estilos vários mas quanto ao conteúdo jurídico-constitucional preciso, este preceito é rico e desta votação não se chegava a "nadíssima" a não ser que não foi obtido consenso para escrever de outra maneira aquilo que flui rigorosa e precisamente do artigo 30.º, n.º 5.
Por nós, não tivemos a iniciativa de o alterar porque ele diz muito. Tudo que diz respeito à política prática, às reformas governativas em que o legislador, ao contrário do que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes sublinhou, não é livre, não é nada livre; é constitucionalmente determinado, afora contingências da miséria quotidiana e das dificuldades orçamentais e outras muitas de que todos somos testemunhas, essa política está submetida a ditames concretos num Estado de direito democrático.
Portanto, a rejeição desta norma é a rejeição de uma possível e, aliás, discutivelmente redigida benfeitoria, nada mais nem nada menos.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, votámos favoravelmente estas propostas, porque entendemos que elas contêm um princípio correcto quanto ao entendimento do sistema prisional e também generoso relativamente a objectivos como sejam, sobretudo, a reinserção social dos reclusos.
Nós também não entendemos o sistema prisional como um depósito de pessoas em cumprimento de penas. Naturalmente que deve haver garantias, tal como dispõe o actual n.º 5, de que os reclusos mantêm a titularidade dos seus direitos fundamentais, mas seria, do nosso ponto de vista, importante dar mais algum sinal e concretizar um pouco mais, em alguns aspectos particularmente sensíveis, as formas em que se traduz a concretização desses direitos fundamentais.
Assim, parece-nos particularmente significativa a referência que se faz nesta proposta de Os Verdes relativamente ao objectivo principal das penas que seria a reinserção dos reclusos na sociedade.
Na verdade, entendemos que as penas têm também uma função punitiva, como não poderia deixar de ser, mas entendemos que este sinal de que o essencial é que os reclusos possam encontrar condições através do cumprimento da pena para se reinserirem na sociedade e que o sistema prisional deve estar em condições de dar um contributo decisivo para isso, seria um sinal interessante a consagrar na Constituição.
Todavia, entendemos que, naturalmente, estes princípios poderão estar incluídos na formulação que está consagrada no n.º 5 do actual artigo 30.º.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passarmos ao artigo 31.º, quero colocar uma questão à Comissão, em resultado, aliás, de uma abordagem que já foi feita numa reunião da Mesa, no sentido de que, estando para breve, a abordagem do artigo 23.º, extremamente relevante e que estabelece o regime da extradição e da expulsão, sinto-me no direito de propor à consideração da Comissão que, na sequência aliás de um debate muito rico mas não inteiramente conclusivo, da primeira leitura, sobre esta matéria, a Comissão pudesse optar por, antes das declarações finais sobre a possibilidade de alteração do artigo, se ouvisse, em audiência, o Sr. Ministro da Justiça e o Sr. Procurador-Geral da República, sem embargo de outras entidades institucionais relevantes se, eventualmente, se careça do seu parecer.
Esta é a proposta que vos faço.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, quero adiantar, da parte do PSD, a total disponibilidade para manter a redacção que resultou do acordo feito com o Partido Socialista.
Todavia, não deixo, obviamente, de estar sensível a algumas tomadas de posições públicas de vários quadrantes, que se têm levantado, relativamente a essa questão e à opção que se tomou nesse acordo, lembrando que tudo isto resulta da circunstância de termos sido alertados, por parte do Governo, para o facto de Portugal ter, em sede de compromissos internacionais no âmbito e fora da União Europeia, um dever de cooperação com o fenómeno da acentuação do crime internacionalmente organizado e de terrorismo e actos dessa natureza e extensão, de modo a que o nosso regime de extradição não pudesse funcionar contra essa cooperação, transformando Portugal, em parte, num território que pudesse ser procurado em situações de subtracção à justiça de outros países, por força de uma orientação e de uma tradição humanitária em matéria de penas, que prezamos e que mesmo na solução proposta pretendíamos que fosse salvaguardada, quando se preconiza que, em caso de pena de morte ou de prisão perpétua,

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a extradição só se dará com a garantia do Estado, que formule o pedido de extradição, de que essa penas não serão aplicadas ou executadas.
Queríamos, obviamente, avaliar da posição do Estado português nesta matéria para orientarmos aqui uma posição definitiva que concilie essa tradicional posição portuguesa e de vanguarda, em matéria deste tipo de penas, com os nossos compromissos e com a nossa obrigação de cooperação na área do combate à criminalidade internacional.
Entendemos que a proposta do Sr. Presidente está certa e é um caminho que podemos seguir, no entanto, parece-nos que o elenco de entidades que devíamos ouvir deveria ser um pouco mais vasto.
Estamos de acordo em que se oiça o Sr. Ministro da Justiça, o Sr. Procurador-Geral da República, sendo que me parece que também deverá ser ouvido o Presidente do Tribunal Constitucional, que recentemente tem tomado posição sobre esta matéria, bem como o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Sr. Ministro da Administração Interna, porque trata-se de matérias que se coordenam entre a justiça e a segurança.
Pelo menos, estas entidades e, eventualmente, também o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que teve alguma intervenção no âmbito do acordo e que nos fez chegar as preocupações do Governo nesta questão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª. Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, estou de acordo com a sensatez da Mesa de não precipitar esta discussão sem ouvir algumas entidades relativamente a um artigo que me parece de extrema importância, sendo, pois, pacífica a proposta que foi feita.
Quanto às outras entidades que o Sr. Deputado Guilherme Silva propõe, nada tenho contra. Permitia-me, contudo, fazer uma proposta de alargamento das entidades a ouvir, designadamente a Amnistia Internacional, que se pronunciou sobre esta matéria, a Comissão Nacional Justiça e Paz, que também fez chegar a esta Comissão a sua posição sobre esta matéria, e alguém que me parece ter uma palavra a dizer sobre isto e tem-se pronunciado em artigos de opinião sobre esta matéria que é o Prof. Jorge Miranda.
Portanto, julgo importante que estas entidades fossem ouvidas sobre o artigo 33.º.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Creio que esta questão assumiu uma dimensão pública e até académica bastante significativa.
Estou de acordo com as propostas de audição apresentadas pelo Sr. Presidente, bem como com as apresentadas pela Sr.ª Deputada Isabel Castro - aliás, tendo em conta artigos de opinião, sugeria que, para além do Prof. Jorge Miranda, fosse também considerada a hipótese de audição da Prof. Teresa Beleza e do Dr. José António Barreiros, entre outros, para o que, naturalmente, também estarei aberto.

O Sr. José Magalhães (PS): - E o Dr. Pinto Ribeiro? Não?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Quanto ao Dr. José António Pinto Ribeiro, também estou de acordo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Estava a ver se era lapso. É que, por nós, se quiserem convocar 30 entidades, é perfeitamente possível.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Deputado, é um lapso momentâneo, mas estou de acordo. E mais: ouviremos todos os que queira propor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Concordo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes deseja usar da palavra para propor mais alguma entidade?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, Sr. Presidente. Para manifestar uma posição por razões que tentarei explicar e para fazer um comentário às propostas últimas que aqui surgiram.
Do ponto de vista do PSD, só fazem sentido, nesta fase de trabalhos, os contactos de natureza institucional, se é que me entendem. Ou seja: na primeira leitura, fizemos as audições que toda a gente sugeriu fazer em Comissão, tendo sido ouvidas todas as entidades sobre toda a matéria da revisão constitucional e não especificamente sobre esta da extradição. Não era isso que, na altura, estava em causa.
Do ponto de vista do PSD, nesta fase dos trabalhos - estamos na segunda leitura e os Srs. Deputados têm consciência disso -, o único problema, como o Sr. Deputado Guilherme Silva explicitou, que ao PSD, neste momento e numa óptica da situação em que se encontram os trabalhos, faz sentido equacionar, é a reponderação das entidades que institucionalmente lidam com esta matéria, uma vez que, no decurso da primeira leitura e da discussão totalmente alargada e aberta que foi realizada por esta Comissão, ouvimos toda a gente que o solicitou e não negámos audiências a ninguém, pelo que todos puderam pronunciar-se.
Neste momento, acontece que há alguns dados que o PSD considera que foram, supervenientemente, carreados publicamente para a discussão e que nos levam a considerar que não foi suficientemente reponderada a questão, pelo que se torna necessário ouvir entidades que, institucionalmente, têm que ver com esta matéria para saber até que ponto e em que extensão é que o Estado português pode ficar coarctado ou prejudicado numa situação delicada se forem ou deixarem de ser adoptadas determinado tipo de alterações ao texto constitucional.
Portanto, nesse sentido, entendo que nos merece total respeito a opinião de qualquer cidadão, e, por maioria de razão, das associações de cidadãos, de professores universitários e por aí fora.
Independentemente de já serem conhecidas as posições dessas pessoas, não era a reedição da discussão que o PSD desejaria ver realizada na segunda leitura mas, apenas, a

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clarificação de razões de Estado que podem estar ou não aqui em causa e que podem influir na nossa decisão final.
Nesse sentido, a posição do PSD é de que esta Comissão, nesta fase dos trabalhos, não se saísse de um conjunto de audições que forem tidas por convenientes pelos Srs. Deputados e que tenham que ver com aquilo a que chamaria entidades institucionais, de forma a poderem veicular razões de Estado e de interesse da justiça portuguesa que, eventualmente, estejam em causa nesta situação.
Quanto às outras opiniões, conhecêmo-las. Houve um tempo para as debater. Fizemo-lo com total abertura. Todos os Srs. Deputados sabem que não houve da parte desta Comissão nenhuma restrição à livre formação de opinião por qualquer cidadão, inclusive individualmente considerados, e, portanto, parece-nos, francamente, fora de sítio e despropositada a reabertura, com essa amplitude, de toda a discussão.
Era esta a precisão que queria fazer, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, penso que entendi o sentido da mensagem do Sr. Deputado Luís Marques Guedes e penso, também, que é bom falarmos claro das coisas claras, porque estamos num tempo diferente.
Se o Sr. Deputado pegar naquilo que são os projectos que estavam em discussão na primeira leitura, encontrará uma proposta do PS relativamente a esta matéria e nenhuma do PSD sobre o artigo 33.º.
Porém, neste momento, existe um quadro significativamente novo e diferente que é um acordo do PS e do PSD relativamente a esta matéria, o que é público.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Veja o guião da primeira leitura, Sr. Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Portanto, julgo que há um quadro diferenciado em relação àquilo que, hoje, era uma aproximação ou não aproximação de dois partidos, que podiam fazer ou não maioria sobre esta matéria, e aquilo que é hoje a realidade em que a discussão é feita. Este é, portanto, o primeiro registo.
Em segundo lugar, tenho franca dificuldade, mesmo tentando respeitar as diferentes perspectivas dos diferentes partidos e do modo como diferentemente encaram a sociedade e o papel dos cidadãos e das suas organizações, em ver como é que o PSD consegue entender que organizações como a Amnistia Internacional ou o Fórum Paz e Justiça são alheios a esta discussão.
É que o Sr. Deputado pode dizer, em relação ao Prof. Jorge Miranda, que a Comissão teve oportunidade de ouvir aquando da apresentação do projecto que ele, enquanto cidadão, entendeu apresentar. E eu, então, poderei dizer que faria sentido e fará sentido, porventura noutro momento da segunda leitura, ouvirmos o Prof. Jorge Miranda, porque me parece que a opinião dele não é dispensável e, nesse caso, como é provável, não estritamente sobre este artigo mas sobre um conjunto de propostas mais alargadas em relação às quais a posição dele me parece ser avisada e julgo que a reflexão que ele faça sobre um conjunto de propostas que estão acordadas entre dois partidos dos cinco aqui representados, pode ser uma opinião que julgo traria benefício à Comissão no seu todo poder colher e ter para si como reflexão.
Porém, a mim, independentemente das diferentes perspectivas, faz-me confusão como é que se entende sobre esta matéria que é importante ouvir determinadas entidades - e não pus em causa nenhuma das propostas da Mesa nem mesmo aquela que o Sr. Deputado Guilherme Silva acrescentou -, sendo certo que qualquer visão que se queira ter das coisas só se enriquece se se acolher a diversidade e o contraditório, sob pena de que aquilo que se propõe ser, no fundo, encontrar alibis para justificar e para que pese menos a consciência relativamente a uma proposta.
Julgo que não é disso que se trata e, portanto, nós mantemos a nossa posição e entendemos que era importante ouvir as entidades propostas mais as que nós acrescentamos.
De qualquer forma, se não houver consenso sobre esta matéria, então votemos e cada partido posiciona-se sobre quem é que deve ou não ser ouvido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou tentar fazer uma proposta de síntese...
Tem a palavra, o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, nesta matéria, por um lado, nós debatemos a questão, na primeira leitura, com actas, e o acordo político de revisão constitucional cinge-se estritamente ao que tinha resultado da primeira leitura, nesse facto. Isto é um facto que é objectivo, é incontroverso e, obviamente, é polémico, mas é um facto. E aí o grau de inovação é zero! Mas, obviamente, acho que devemos aplicar, nesta matéria, os princípios idênticos e uniformes que se aplicam a este ou a qualquer outro tema da revisão constitucional, ou seja, o princípio da porta aberta e o princípio do contraditório.
Portanto, pode ser infinito o rol das entidades a visitar a Comissão e a discutir esta matéria e todas as outras, desde que isso se faça à segunda-feira de manhã ou à tarde ou à noite ou ao sábado ou quando quiserem e não perturbe a discussão livre na Comissão... Por nós estamos aqui e não faltamos a nenhuma reunião até agora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - A questão que quero colocar é a seguinte: do ponto de vista formal, é claro que os Srs. Deputados podem dizer - e é verdade - que está tudo em acta e as propostas constam do guião do ex-presidente desta Comissão; agora é irrecusável que as actas são muito recentes, independentemente da qualidade péssima e da ilegibilidade que por vezes têm.
O guião do ex-presidente é conhecido há muito pouco tempo e há um facto totalmente novo, em relação à discussão aqui travada, irrecusável, que é a projecção pública que este assunto assumiu, designadamente o interesse de um conjunto de organizações, como as que foram aqui referidas, e o facto de, em face do que surgiu de novo,

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em matéria de propostas e do debate, pessoas muitos qualificadas, que não se tinham pronunciado antes, se terem pronunciado publicamente. Mais: foi realizado, inclusive ainda há pouco tempo, um debate de iniciativa académica com uma série de especialistas sobre esta matéria.
Se nós pretendemos recusar tudo isto, atrás da ideia de que há actas, de que houve um guião, de que numa determinada noite um conjunto de Deputados debateram a questão, tudo isso é verdade; e também é verdade que as portas estavam abertas; agora, é também verdade, que a questão não teve a projecção pública nem suscitou o interesse que, neste momento, está a suscitar.
Portanto, creio que o argumento, aqui utilizado, é de cariz fortemente formalista e acaba por corresponder a uma ideia de subtrair parcialmente ao debate público e ao tal princípio do contraditório aquilo que deveria beneficiar desse princípio.
De resto, quero sublinhar que considero positiva a proposta do Sr. Presidente de ouvir aqui um conjunto de entidades. Porém, creio que a coerência e os bons princípios deveriam levar a que fosse um pouco alargada, sem prejuízo para o trabalho da Comissão e, pelo contrário, beneficiando dele.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acontece que se tentarmos adiantar a conciliação das perspectivas em presença, argumento que não é formalidade adequada para uma análise a fazer dos trabalhos em segunda leitura, e lançar, a qualquer pretexto, novos processos de audição pública, uma vez que essa norma teve momento próprio, não podendo, em todo o caso, deixar de reconhecer que eu próprio, como presidente, e a título excepcional, suscitei esta questão a propósito de uma matéria tida entre todos como importante.
Para que não haja qualquer suspeição sobre as possibilidades de selecção em torno do tema, a proposta que vos faço é a seguinte: relativamente às entidades representativas de instituições relevantes do Estado, proponho tentar fazer uma síntese da minha proposta inicial e da proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva, medida que, em todo o caso, me parece adequada, admitindo, salvo prova em contrário, que o Governo pode fazer-se representar-se se um seu representante vier à Comissão.
Portanto, neste sentido, procurando conciliar a proposta inicial com a do Sr. Deputado Guilherme Silva, diria que a representação institucional se faria mediante audição do Sr. Ministro da Justiça, do Sr. Procurador-Geral da República, do Sr. Presidente do Tribunal Constitucional e do Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Para este efeito, proporia organizar uma sessão na quarta-feira da próxima semana, com início às 16 horas, que, com uma hora para cada entidade ouvir, nos permitisse proceder à audição das várias entidades que acabei de referir.
Por outro lado, tendo havido um conjunto de sugestões para entidades não institucionais que devem ser ouvidas pela Comissão, preferia, nessa circunstância, uma sessão extraordinária da Comissão para uma segunda-feira, à tarde, sendo a audição aberta, em simultâneo, para as entidades sugeridas, que seriam informadas para o caso de quererem vir depor à Comissão.
Portanto, fica-nos a possibilidade de conciliar, suponho, aquilo que é a prevenção útil das várias propostas apresentadas.
Srs. Deputados, o que vos peço encarecidamente é que não prolonguemos este debate, porque a proposta que vos acabei de fazer concilia todas as pretensões até agora apresentadas.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, era para ver se havia possibilidade de não ser à quarta-feira, na medida em que, de todo em todo, é-me impossível estar presente e eu gostava muito de participar nesse auditório.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, poderá ser na terça-feira da próxima semana.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Não poderá ser na terça-feira à tarde?

O Sr. Presidente: - Pode ser. E, sendo assim, está o problema resolvido.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, além do mais, na quarta-feira é capaz de haver uma sessão de Plenário que interessa a vários Deputados aqui presentes.

O Sr. Presidente: - Perante estes condicionalismos, creio que o melhor será marcarmos para a próxima terça-feira a audição das entidades institucionais e para segunda-feira, dia 5 de Maio, a partir das 15 horas a audição das entidades não institucionais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que, da parte da minha bancada, não colocaremos nenhum entrave até pela sensatez da proposta que fez e pelo manifesto esforço que tentou na conciliação das questões em presença.
Queria deixar aqui, apenas duas notas da parte do PSD: por um lado, a insistência de que, nas audições da Comissão às entidades institucionais, porque são essas que, pelas razões que explicitei são relevantes para o PSD, nesta fase, a insistência para que possa ser convidado a vir à reunião desta Comissão o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares. E isto, com toda a clareza e com toda a lealdade, porque, da parte do PSD, nos contactos que levaram à formulação do actual texto, houve uma grande intervenção pessoal da parte do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, com sentido de Estado, do nosso ponto de vista.
Portanto, se se trata de equacionar e de reflectir uma eventual alteração ou reponderação do texto a que foi possível chegar, é evidente que o PSD não o deseja fazer sem voltar a ouvir os membros do Governo que intervieram particularmente nesta matéria, porque a única intenção do PSD é averiguar sobre se, de facto, há alguma alteração de circunstância e, face a ela, ponderar uma reflexão em torno do abandono ou não do texto acordado e, portanto, pedia-lhe...

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se me permite a interrupção, digo-lhe que acolho imediatamente a sua sugestão apenas com a ressalva de que, nesse caso, não vejo inconveniente da presença na Comissão do Sr. Ministro da Justiça e, eventualmente, do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, se esse aceitar fosse simultâneo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Por nós, não há problema, como é evidente.

O Sr. Presidente: - Assim faremos, então.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a segunda questão que queria colocar é quanto à sugestão, que me parece, de facto, uma solução inteligente, de satisfazer a pretensão de alguns Srs. Deputados, através da "reabertura plenária" de uma reunião excepcional.
Porém, deixava só a nota de que, do ponto de vista do meu grupo parlamentar, tratando-se de uma segunda-feira, como propus, só não objectamos a que seja feita por se tratar de uma reunião perante o plenário normal da Comissão que, do nosso ponto de vista, conforme já deixamos claro nas reuniões de coordenadores, tem de ser feita dentro do calendário que está determinado, porque o meu grupo parlamentar não tem disponibilidade para alargar mais, por razões políticas que têm a ver com a trabalho normal da Assembleia da República, aquele que é o calendário semanal já acordado.
Portanto, nessa reunião de segunda-feira, o meu grupo parlamentar far-se-á representar, embora não possa assegurar a participação igual à que tem assegurado e continuará a assegurar em todas as reuniões plenárias desta Comissão.
E, sempre que haja reuniões que saiam fora do horário normal, pedia que ficasse claro, para depois não haver mal-entendidos que, relativamente à participação, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, far-se-á representar na medida das disponibilidades, mas não poderá assegurar uma participação plena.

O Sr. Presidente: - Inteiramente compreendido, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, queria saudar o esforço que fez com a proposta para adiantar a audição das entidades não institucionais para 5 de Maio.
Gostaria, entretanto, de recordar, com vista ao futuro - e na linha do que, aliás, acaba de dizer o Sr. Deputado Luís Marques Guedes -, que as reuniões de quinta-feira à noite foram marcadas na primeira leitura como alternativa à segundas-feiras porque, nessa época, nós manifestámos uma indisponibilidade completa por razões que não vou agora repetir.
Isto para dizer que aceitamos, dentro de uma proposta de compromisso, esta data de 5 de Maio, obviamente, mas julgo que é inteiramente justificada a questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, ou seja, que não se pode dar um "alastramento em mancha de óleo" dos tempos disponíveis para além daquilo que está fixado, pois todos os Deputados que aqui estão tem, naturalmente, outras ocupações, no plano parlamentar e noutros, que têm de ser atendidas.
Creio que este aspecto se é verdade para um grupo parlamentar como o do PSD, é mais verdade ainda para grupos parlamentares de menor dimensão, como se compreenderá.

O Sr. Presidente: - É, de facto, verdade que o óptimo é inimigo do bom, mas estamos a tentar, como se viu, conciliar todas as pretensões.

O Sr. Luís Sá (PCP): - E comecei por saudar esse facto, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, ficaria mal comigo se não confessasse que, fazendo muita força e apreciando que se tenha convergido no sentido de ouvir estas associações, eu própria, no dia 5, não vou poder estar em Lisboa, a essa hora.

O Sr. Presidente: - Pedia à Sr.ª Deputada Isabel Castro e ao Sr. Deputado Luís Sá particularmente, que fizeram sugestões sobre a audição de um conjunto de entidades não institucionais, que deixassem uma nota na Mesa de concretização das entidades que, efectivamente, propõem para que elas sejam informadas da audição que faremos na segunda-feira, dia 5 de Maio.
Srs. Deputados, com a vossa aquiescência, passamos, agora, ao artigo 31.º.
Este artigo tem, como propostas originais de alteração, uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Passos Coelho e outros a que se refere o projecto n.º 2/VII, uma outra do projecto do Partido Socialista e ainda uma terceira constante do projecto do Partido Comunista.
Srs. Deputados, não há propostas de substituição entretanto apresentadas.
Chamo a atenção de que, no que diz respeito à proposta apresentada pelo Deputado Pedro Passos Coelho, ela tem como objectivo útil suprimir a referência "aos tribunais militares" .
A proposta do PS bem como a do PCP, neste ponto, resolvem o problema da seguinte maneira: no caso da proposta do PS, por referência "ao tribunal competente", e no caso da proposta do PSD, por referência "a tribunais" tout court.
Finalmente, as propostas do PS e do PCP convergem ambas, no que diz respeito ao habeas corpus, por retirar a expressão "abuso de poder" na caracterização das situações susceptíveis de habeas corpus.
Srs. Deputados, é isto que está em apreciação e pergunto se alguém deseja usar da palavra para alguma clarificação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, não vou clarificar; queria era ser clarificado.
Compreendo esta ideia, que percorre duas das propostas, de se eliminar a referência ao abuso de poder. A jurisprudência, por vezes, e até se calhar generalizadamente,

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tem sido demasiado restritiva através desta qualificação e, portanto, jogando com os dois requisitos "abuso de poder" e "legalidade" não tem sido generosa na concessão do habeas corpus.
Todavia, há o outro lado das coisas: se vamos admitir que uma simples ilegalidade - e nós somos um país que temos a cultura jurídica que temos, nomeadamente uma eiva fortíssima burocrática e formalisma - na detenção ou prisão de alguém é motivo para, só por isso, fazer funcionar o habeas corpus, podemos ter, neste domínio, que, normalmente, em presunção, pelo menos, tem a ver com questões graves da comunidade, pois estão em causa crimes e etc., problemas sérios de funcionamento do sistema judiciário.
Lembro apenas uma coisa, que foi só ultrapassada há um ano atrás, de uma outra área aparentemente distinta desta, a respeito do exercício do mandato dos titulares dos órgãos autárquicos, em que a nossa lei gerava ilegalidade, em que rapidamente se instalou na nossa comunidade uma interpretação da "grave ilegalidade" como sendo uma coisa patente. Isto é, a infracção a um preceito menor deu origem a que fosse considerada grave ilegalidade uma questão simples que enxovalhou a dignidade das pessoas. Finalmente, na VII legislatura fez-se a correcção desse texto.
Portanto, julgo que o bom equilíbrio constitucional - a nossa jurisprudência não é fabulosa neste domínio e, bem pelo contrário, precisa de uma tremendíssima reformulação, mas acho que o habeas corpus tem de estar ligado a um momento material, que é o abuso de poder, e um momento formal, que é a violação da lei.
Do ponto de vista da nossa bancada, será útil não mexer. Já o mesmo não digo em relação à parte final, uma vez que se propõe a supressão dos tribunais militares, aliás, recordo, contra a minha opinião pessoal expressa na reunião. Mas, uma vez que nos encaminhamos para a eliminação dos tribunais militares, é claro que tem de haver aqui uma obra correspondente. E, na verdade, como, apesar de tudo, ainda poderá haver tribunais militares, em teatro de guerra pelo menos, então, a fórmula correcta está aí, na parte final da proposta do PS, com a expressão "perante o tribunal competente". A proposta do PCP também iria lá, mas não diria "perante os tribunais", porque entendo que a lei tem de dizer qual é o tribunal competente para este remédio excepcional que é o habeas corpus.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, não fazemos questão que fique "perante os tribunais" ou "perante o tribunal competente".
Creio que a finalidade que pretendemos fica preenchida com qualquer das formulações e, portanto, admitimos perfeitamente, por exemplo, que se utilize a formulação "perante o tribunal competente".
Outro aspecto que gostaria de sublinhar é o de que a figura do habeas corpus, com toda a tradição que tem, vale perante situações de prisão ou detenção ilegal, independentemente de existir ou não o abuso de poder e, designadamente, valerá fora das situações previstas no artigo 27.º.
Creio que este aspecto deve ser sublinhado, porque, independentemente de ser alterada ou não a redacção do artigo no sentido que propomos, creio que o sentido ou o alcance da norma vai ser fundamentalmente o mesmo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nessa circunstância, vamos passar à votação.
E para ser feita chamo a atenção do seguinte: pela ordem da votação a primeira proposta a ser votada é a do Sr. Deputado Pedro Passos Coelho. Como ela tem um alcance coincidente com a proposta do Partido Socialista, mas o seu autor não está presente para uma retirada da proposta, teremos, naturalmente, que a votar.
Todavia, suponho poder deduzir-se das palavras do Sr. Deputado Barbosa de Melo - e para isso peço a atenção do Sr. Deputado Barbosa de Melo - que a fórmula que o PSD prefere é aquela que consta da parte final da proposta do PS.
Nesse caso, penso que a consequência, não por efeitos de discordância material mas por efeitos de melhor solução formal, tem de ser a de vir a encontrar-se uma solução que rejeite a proposta do Deputado Pedro Passos Coelho, que tem precedência na ordem de votação.
Não vejo solução a não ser que esta proposta fique pendente, sob responsabilidade dos Deputados do PSD, no sentido de que será retirada oportunamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, Sr. Presidente.
Com toda frontalidade da parte do Grupo Parlamentar do PSD, nós, sem qualquer tipo de problema, votaremos contra a proposta do Deputado Pedro Passos Coelho, porque é feita no pressuposto - esse é o conteúdo útil do projecto de lei do Deputado Pedro Passos Coelho e outros - de que, lá à frente, se extinguiria, em absoluto, os tribunais militares.
Ora, como o PSD tratará essa matéria de forma diferente daquilo que é a proposta do Deputado Pedro Passos Coelho e outros, lá à frente, é evidente que ela, para nós, não pode ser aceite nos termos em que está.
Agora, embora o Sr. Presidente não tenha chamado a atenção, há também aqui um pormenor, que não foi citado pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo na sua intervenção, que é o da proposta do Partido Socialista de substituir o termo "interpor" por "requerer" .

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Tem razão, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Embora nos pareça que esta alteração não seria estritamente necessária, somos, por duas ordens de razões, receptivos a ela, e passo a explicar porquê.
Primeira, porque, de facto, a tradição na ordem jurídica portuguesa é a de que "interposição" é um termo que se utiliza mais para os recursos e o habeas corpus é uma providência que não tem que ver expressamente com recurso e, portanto, material e processualmente a questão é diferente; segunda, por uma questão de harmonização com

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o próprio texto constitucional que no n.º 2 deste mesmo artigo refere "que a providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio".
Portanto, pelas duas razões apontadas, embora não nos parecesse que como está estivesse mal, votaremos favoravelmente, quanto o Sr. Presidente assim o entender, também esta proposta, no sentido de substituir "interpor" por "requerer" .

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Srs. Deputados, vamos, então, votar a proposta constante do n.º 1 do projecto n.º 2/VI, do Deputado Pedro Passos Coelho.

Submetida a votação, foi rejeitada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos, agora, passar à votação da proposta constante do projecto originário do PS.
Esta proposta tem aspectos relevantes, traduzindo-se em ser uma proposta verdadeiramente de eliminação da expressão "contra o abuso de poder" e, para viabilizar as soluções de votação, uma vez que certamente o PSD não votaria a fórmula tal como está apresentada, proporia um desdobramento técnico desta votação, começando, então, por votar...
O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para efeito do processo de votação?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, hesito em usar da palavra porque, por um lado, não gostaria de corroborar a ideia de que haja uma espécie de patamar distintivo entre ilegalidades, ou seja, ilegalidades muito ilegais e ilegalidades pouco ilegais, no sentido de que "estás privado de liberdade e boa tarde". É pena que isto seja assim! Portugal é um país com debilidades..., "Bom, até logo e não tens habeas corpus".
Por outro lado, há outras ilegalidades, as grossas, as gordas, que legitimariam esse tipo de meio, e isto porque o que está aqui em causa é a ilegalidade que é tomada como um abuso de quem tem o poder. A ilegalidade é o abuso! E não há um abuso paralegal ou com cobertura legal ou com tolerância legal, ou seja, um abuso contra a lei mas coberto pela Constituição.
Não gostaria, portanto, de submeter a votação nada que introduzisse dúvidas sobre este ponto. E é nesse sentido que me preocupa, inquieta e incomoda a votação do PSD, que, aliás, na primeira leitura, tinha dito que votava a favor da eliminação desta fórmula constitucional.
Isso está na acta, obviamente, mas sobretudo está na memória de todos nós e, francamente, parecia-me uma evolução positiva, porque tenho dificuldade em consentir que, em recta hermenêutica, possa inventar-se essa tal dualização que é, no fundo, uma degradação e a invenção de um patamar que o constituinte não lobrigou nem quis criar.
Nesse sentido, francamente, preocupa-me a manutenção da proposta, ou seja, gostaria de um consenso para a eliminação das dúvidas, mas coloco a questão em termos de consagração de uma espécie de segundo género.
Enfim, Sr. Presidente, francamente não gostaria que isso ficasse sagrado por uma votação.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa de Melo, pedia vénia para sublinhar o seguinte: se bem percebi, o alcance da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães é como se, depois do debate travado até agora, o PS preferisse - até porque tem originariamente preferido -, para efeitos de consolidação da solução, não alterar a substância do n.º 1 do artigo 31.º, mesmo na parte em que se refere às pessoas.
Sendo assim, Sr. Deputado Barbosa de Melo, reincorporamos materialmente a expressão "contra o abuso de poder" na proposta originária do PS, ficando ela assim: "Haverá habeas corpus contra o abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente", sendo esta a fórmula que passaríamos a votar.
Se mais ninguém pretende usar da palavra a este respeito, passaremos à votação.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.

O Sr. Presidente: - Suponho que o Sr. Deputado Luís Sá terá o entendimento de que a sua proposta se encontra prejudicada.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, a nossa proposta foi consumida pela aprovação da proposta do PS.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Dr. Deputado Luís Sá.
Srs. Deputados, vamos passar agora ao artigo 32.º, para o qual há uma proposta de substituição apresentada, no decurso da segunda leitura, por deputados dos PS e do PSD, com um conjunto de soluções bastante compósitas relativamente à estrutura deste artigo.
Assim sendo, Srs. Deputados, procuraríamos ver, com algum método, ponto por ponto.
Relativamente ao n.º 1, há uma proposta de substituição que reza o seguinte: "O processo criminal assegura todas as garantias de defesa incluindo o direito de recurso".

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, Sr. Presidente, se bem percebi, aí há um problema de redacção.

O Sr. Presidente: - Qual é, Sr. Deputado José Magalhães?

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O Sr. José Magalhães (PS): - Só para termos a certeza exacta do encontro colectivo de vontades nesta matéria, direi que é o problema de saber se, em casos como os dos artigos 310.º e 400.º do Código de Processo Penal...

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vamos ver que surpresa nos traz o Sr. Deputado José Magalhães!

O Sr. José Magalhães (PS): - "Artigo 310.º, n.º 1 - A decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público, é irrecorrível e determina a remessa imediata dos autos ao tribunal competente para o julgamento"; 2 - É recorrível o despacho que indeferir a revisão da nulidade cominada no artigo anterior".
"Artigo 400.º (Decisões que não admitem recurso) 1 - Não é admissível recurso: a) De despachos de mero expediente; b) De decisões que ordenam actos dependentes da livre resolução do tribunal; c) De decisões proferidas em processos sumaríssimos; d) De acórdãos das relações em recursos interpostos de decisões proferidas em primeira instância; e) Nos demais casos previstos na lei".
Ou seja, Sr. Presidente, é preciso ter em conta que a enorme supremacia do legislador em sede de revisão constitucional tem de exercer-se tendo em conta o campo operatório tal qual é, rigorosamente delimitado, e existem casos que, com o consenso da comunidade jurídica, não tem motivado especial escândalo nem necessidade de intervenção.
Quando se faz a ablação, em termos totais, de cláusulas de salvaguarda, as consequências podem ser indesejadas pelo legislador constituinte.
Portanto, Sr. Presidente, propunha que ponderássemos com rigor a forma. Não é por acaso que nós falávamos acerca de sentença condenatória...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, desejava dizer que, no fundo, o problema que é levantado tem sentido, mas, diria eu, numa certa hermenêutica e a verdade é que nós aqui não estamos perante o Código Penal.
O que estamos a redigir é um princípio constitucional e usam-se aqui três frases que, no fundo, apontam para conjuntos mais ou menos abertos. Nós não podemos exaurir numa enumeração. O que é o processo penal? Quais são as fases, as garantias, os elementos que constituem o processo penal? Há muitas maneiras de modelar o processo penal.
Segundo um conjunto aberto, há muito tipo de processo penal, há muitas garantias de defesa, todas as garantias de defesa. Todas!... Mas quais? E porque são tais e tantas? É o direito de defesa, é o direito de recurso...! Bom, tudo isto para dizer que este princípio é aberto e passa pela interposição legislatória e, por isso, acho que está bem assim.
Todavia, isto não significa que tenha de haver sempre recurso, não significa que uma garantia que a gente imagine e que faça parte das garantias de defesa se tenha de verificar em todos os casos, não significa que o processo criminal tenha de ter sempre aquelas fases todas e exactamente iguais, não significa que não possa haver vários tiranos...

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado Barbosa de Melo, se passa, como efectivamente passa, pela interposição legislatória, eventualmente seria mais prudente, então, acrescentar a expressão: "(...) incluindo o direito de recurso nos termos da lei" .

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sim, sim.

O Sr. Presidente: - Essa parece ser a cautela necessária para a qual me chamou a atenção o Sr. Deputado José Magalhães!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Acho que seria uma interpretação a partir de um texto que chegasse à conclusão que em todos os processos criminais haveria direito de recurso de...

O Sr. José Magalhães (PS): - "(...) todas e quaisquer decisões", o que esteve a mil anos luz da proposta originária.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Isto não fazia sentido. É um rigorismo formalista que está fora do propósito de uma boa hermenêutica jurídica.

O Sr. Presidente: - Mas, Srs. Deputados, chamo-lhes a atenção para a proposta originária do PS que dizia: "incluindo o direito de recurso de sentença condenatória". E, fê-lo por uma questão óbvia: haver alguns aspectos difíceis no exercício do direito de recurso de toda e qualquer sentença condenatória, pelo que ficamos apenas pelo "direito de recurso". Isto é, quisemos resolver um problema e, eventualmente, estamos a suscitar um problema novo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Permita-me, Sr. Presidente, que diga qual foi a razão.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A razão foi esta: quem é declarado absolvido numa sentença criminal pode ter todo o interesse, em defesa da sua dignidade, em recorrer. Nem se sabe, muitas vezes, quem é que tem mais interesse: se aquele que foi condenado que quer o seu nome limpo, provando por A mais B que não cometeu o crime, se aquele que foi absolvido da instância de que realmente foi absolvido mas mal absolvido, porque realmente ficaram dúvidas.
Ora, foi na base disto que reduzir o direito de recurso a quem é condenado era excessivamente estrito e, por isso, é que alargamos aqui.

O Sr. Presidente: - Exacto. Até aí estamos plenamente de acordo.

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O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas, agora, alargar até ao ponto de dizer "bom, então isso significa que, daqui por diante, sempre que haja uma decisão num processo criminal, um qualquer interessado pode recorrer, a lei tem de garantir o recurso"? O direito de recurso é um direito que, como sucede com quaisquer outras garantias, depende sempre da modelação da lei.
Mas, enfim, se entenderem que se deve acrescentar "nos termos da lei" é uma redundância, julgo eu, mas está bem.

O Srs. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria intervir face aos dados novos que foram lançados pelo Sr. Deputado José Magalhães, no sentido de, do meu ponto de vista, corroborar inteiramente aquilo que é a leitura que o Prof. Barbosa de Melo faz, ilustrando ainda melhor, para que fique em acta, porque acho que é importante, em matérias delicadas como esta para efeitos interpretativos até, amanhã, daquela que é a vontade do legislador constituinte.
Assim, queria chamar a atenção para o seguinte: levada à exaustão a preocupação que o Sr. Deputado José Magalhães aqui nos trouxe, e que, obviamente, tem razão de ser, como foi referido já, mas, repito, levado à exaustão esse argumento, sempre se teria de concluir que, então, o texto constitucional, tal qual está em vigor, quando diz que "o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa", já implicaria, por absurdo, que em todos os processos crimes, teria de haver réplica, tréplica, quadrupla... isto só para dar um exemplo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - No direito de recurso!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Portanto, é evidente, como diz o Prof. Barbosa de Melo, com toda a razão, que o texto constitucional, como está escrito, não está mal.
Todavia, a ênfase que foi proposta no processo inicial do Partido Socialista é uma ênfase especial ao direito de recurso. E eu recordo aqui que vem na sequência de outras propostas em outros artigos mais lá para trás que, inclusive, nesta segunda leitura já votamos, e em que se falava, por exemplo, na obrigatoriedade da existência de segunda instância em todos as causas, e por aí fora.
Chamou-se a atenção de que o princípio do recurso era o princípio de que se poderia enfatizar, em sede dos artigos do processo crime e não em sede do acesso à justiça, como estava lá atrás, no artigo 20.º, salvo erro, em outras propostas.
Portanto, o que me parece, com toda a franqueza, é que, conforme o Prof. Barbosa de Melo disse, e eu subscrevo, o texto constitucional fica melhorado, de facto, com o acrescento de "incluindo o direito de recurso", mas este acrescento não poderá implicar uma leitura restritiva no sentido de que, com isto, passa a dizer-se que "terá de haver sempre e em todas as circunstâncias direito de recurso", embora também reconheça que o que o Sr. Presidente sugere de se acrescentar a expressão "nos termos da lei" também não ficaria mal.
Contudo, a única chamada de atenção que faço é a seguinte: parece-me, de facto, inútil acrescentar a expressão "nos termos da lei", pois é uma redundância que pode ter, aí sim, uma leitura perversa, que é a leitura de que as garantias que actualmente estão no n.º 1 deste artigo da Constituição, que não estão remetidas para os termos da lei, porque estão aqui inscritas em termos de princípio de direito dos cidadãos, direito aberto ou conjunto aberto, se se utilizar a expressão do Prof. Barbosa de Melo, passará a ser condicionado pela leitura do legislador ordinário, em termos eventualmente restritivos.
Penso, por isso, que ponderadas as coisas é uma redundância que pode ter mais efeitos perversos do que vantagens, embora tal não fosse errado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa de Melo, se se não importa, punha ainda à sua consideração o seguinte: aparentemente, caso não incluirmos a referência à lei, podemos estar colocados perante uma situação de necessidade de interpretação da Constituição, conforme a lei do processo penal. Portanto, interpretações da Constituição conforme a lei, em matéria de direitos, é sempre, como sabemos, algo de melindroso.
Mas, por outro lado, como o n.º 1 já refere, sem qualquer limitação, todas as garantias de defesa, pergunto se o novo inciso, em vez de ficar "incluindo o direito de recurso", ficasse apenas "incluindo o recurso", entendendo isto já como uma garantia de defesa, não seria de aceitar. Portanto, suprimiríamos a expressão "direito de" para passarmos ao instrumento recurso no quadro das garantias gerais de defesa em processo penal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, apenas desejava fazer um raciocínio elementar: o texto vigente, assegura no processo criminal "todas as garantias de defesa". Pergunto, pois, se o direito de recurso é ou não uma garantia de defesa.

O Sr. Presidente: - É.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Pois é! E o texto vigente diz: "Todas as garantias de defesa". Portanto, nós estamos apenas a explicitar algo que já está contido no enunciado vigente.

O Sr. Presidente: - Por isso é que tinha sugerido a expressão "incluindo o recurso".

O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Deputado Barbosa de Melo entende que, da norma actual, flui o direito de recurso em todas e quaisquer circunstâncias de todos e quaisquer actos?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não.

O Sr. José Magalhães (PS): - É que, se V. Ex.ª entende isso está singularmente solitário no conspecto da hermenêutica constitucional o que, aliás, pode não ser desonra.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Nunca me aflige estar sozinho. Pelo contrário, mais vale só que mal acompanhado, muitas vezes.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Naturalmente, mais vale só do que acompanhado pelo demo. Mas, no caso concreto, Sr. Deputado, se vai inovar constitucionalmente, já agora, convém que isso seja feito em termos de não surgir equívoco hermenêutico - é esta a única preocupação.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - O problema é muito simples: é que isto é uma lembrança dirigida ao legislador ordinário para que ele não se esqueça de que o direito de recurso também é uma garantia do processo criminal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou seja, Sr. Presidente e Sr. Deputado Barbosa de Melo, não haveria nenhuma inovação em relação aos status quo do ponto de vista hermenêutico, porque a única coisa que se fazia era uma espécie de explicitação daquilo que está contido na cláusula actualmente constante do artigo 32.º.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - De lembrar ao legislador ordinário que o direito de recurso também faz parte das garantias de defesa!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, em relação ao recurso como um dos institutos incluído no regime jurídico das garantias de defesa e não tomado como direito subjectivo qua tale, pelo menos nesta norma. Não está aqui estatuído nesse sentido.
Creio que se é essa a solução ela não prejudica a interpretação do actual artigo 32.º e, nesse sentido, Sr. Presidente, preserva aquilo que me preocupava, sem introduzir nenhum problema de querela hermenêutica.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo, estamos provavelmente a encontrar a via de solução, qual seja a de darmos uma particular ênfase ao recurso e o enquadrarmos de forma inequívoca nas garantias de defesa.
E, então, a expressão a ficar poderia ser "incluindo o recurso" com a supressão da expressão "o direito de".
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, desejava dizer só o seguinte: não me parece que se coloque verdadeiramente, no âmbito da alteração que estamos a discutir, algum dos problemas que, pelo menos, levados ao absurdo do limite, consentiria uma interpretação como já aqui ouvimos. Não me parece, pois, que esse tipo de problemas possam razoavelmente levantar-se na doutrina, porque também se não levantaram, até hoje, na jurisprudência.
É certo que, porventura em desespero de causa, em algumas causas, se tentaram interpretações que levaram à exaustão aquilo que está contido na Constituição, neste artigo 32.º. Mas, para quem tem uma visão da vida prática, designadamente do Direito e dos tribunais, bem percebe as motivações de algumas dessas tentativas de interpretação de todo irrazoáveis e assim consideradas até hoje pela jurisprudência.
O que quero aqui dizer é que é bom não esquecer que, ao abrigo deste artigo 32.º, mudou, por exemplo, a configuração da fase instrutória do processo penal que, como sabem, por exemplo, tem, agora debate instrutório. E isto significa acrescidas garantias de defesa em relação a quem é arguido num processo a que se tem de atribuir especiais garantias de defesa, como a Constituição já previa, mas isso não impediu que o legislador ordinário, em sede de processo penal, mudasse as condições em que se processa a fase instrutória, que é muito importante, que é decisiva porque fixa os factos pelos quais alguém é acusado em determinado tipo de processo, permitindo a evolução, que todos saudámos na altura, para um debate instrutório que não existia na anterior configuração do processo penal.
E queria chamar a atenção para isto, justamente porque entendo que o acrescento que aqui se está a discutir e que aqui se está a propor é bem vindo no sentido daquilo que era já o conteúdo útil, e consensualmente aceite na jurisprudência, daquilo que já constava no artigo 32.º da Constituição.

O Sr. José Magalhães (PS): - Só nessa medida, portanto.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Só nessa medida com a explicitação que isso representa.
Não estou a dizer que é irrelevante; estou a dizer que por via desta alteração ao n.º 1 do artigo 32.º não vai ser consentido, como é óbvio e compreensível, interpretações irrazoáveis do preceito constitucional, tanto mais que se quisermos fazer esta leitura paralela dos textos da lei ordinária, designadamente do Código de Processo Penal, bem podemos ver que essa evolução, designadamente na fase instrutória, foi no sentido inequívoco do reforço dos direitos daqueles que são arguidos em processo penal.
Portanto, a questão que queria colocar é a de que não se podem tirar algumas das consequências que tenhamos imaginado nesta Comissão, porventura e por breves momentos, por via desta alteração que agora se quer introduzir e com a qual estou inteiramente de acordo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, volto a lembrar que parece fazer algum consenso entre os autores da proposta o facto de o inciso, que agora se visa aditar, ser mais enxuto sendo apenas o seguinte: "incluindo o recurso".

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, se me dá licença, ainda no seguimento da minha intervenção, desejava apenas dizer que concordo com a proposta que o Sr. Presidente fez, porque, de facto, é a melhor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, queria declarar que não nos opomos a este acrescento, entendendo, entretanto, que a preocupação que temos nesta matéria é mais vasta.
Quero recordar a proposta de consagração, com carácter geral, do duplo grau de jurisdição, proposta essa que apresentámos a propósito do artigo 20.º. Julgamos, de resto, que o recurso já era uma garantia de defesa e não podia deixar de se entender que era nos termos da actual redacção do artigo 32.º.

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Entretanto, a densificação, em matéria de direitos fundamentais, geralmente é bem-vinda. Esperemos que, noutras questões, haja igual disponibilidade nesse sentido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, julgo que podemos passar à votação da proposta de alteração do n.º 1 do artigo 32.º, que é do seguinte teor: "O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso".
Srs. Deputados, vamos votar.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Passamos, agora, ao n.º 3, relativamente ao qual existe uma proposta de substituição, apresentada por Deputados do PS e do PSD, havendo, igualmente, nos projectos originários uma proposta apresentada pelo PCP, uma outra, apresentada pelo Deputado Guilherme Silva e ainda uma apresentada por Os Verdes.
Pergunto, particularmente aos Srs. Deputados do PCP, e não posso perguntar aos outros proponentes, porque não se encontram presentes, se, face ao conhecimento da proposta de substituição que foi apresentada, admitem ou não sustentar ainda as propostas originais.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, a proposta comum, que foi apresentada, tem uma formulação que nos parece razoável.
De facto, a nossa preocupação é de que, em primeiro lugar, o arguido tenha direito à escolha de defensor e que não se veja na contingência de ter de aceitar um qualquer defensor que seja nomeado pelo juiz na sala de audiências, o que não raramente incide sobre pessoas que não têm, de facto, a qualificação devida para poder proceder a essa defesa em termos convenientes e que garantam alguma sustentabilidade das posições dos arguidos.
Também nos parece importante que haja uma especificação na lei das situações em que a assistência por advogado se afigura, de facto, como obrigatória, pelo que nos parece que esta proposta retoma, no essencial, aquela que foi a nossa preocupação e que esteve na base da apresentação da nossa proposta constante do projecto de revisão constitucional.
Daí que nos parece que esta solução tem razoabilidade, pelo que estamos com total abertura para poder considerá-la positivamente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado António Filipe.
Srs. Deputados, estamos em condições de votar a proposta de substituição relativamente ao n.º 3.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, esta proposta é inovatória num detalhe relativamente aos textos que foram aqui discutidos na primeira leitura.
Na verdade, há aqui alguma alteração e por essa razão peço a palavra no sentido de explicitar que, para além daquilo que foi agora dito pelo Sr. Deputado António Filipe, essa questão é válida e já foi debatida na primeira leitura.
Todavia, há uma outra questão, cuja discussão, também na primeira leitura, foi suscitada pelo próprio Partido Social-Democrata e que é a seguinte: de facto, tanto a proposta do PCP como a proposta do Deputado Guilherme Silva, que discutimos na primeira leitura, apontavam para o direito de o arguido escolher advogado e depois remeter para a lei os casos em que a assistência é obrigatória.
Mas, o que está em causa, da parte do PSD, e já na primeira leitura tinha chamado a atenção para isso, é que, na sua literalidade, a propostas do PCP e a do Deputado Guilherme Silva, na prática, coarctavam um direito, que nos parece existir na ordem jurídica portuguesa, talvez desde sempre, que nos parece, apesar de tudo, um direito importante, que é o direito que os cidadãos têm, em algumas causas, de serem defensores em causa própria, isto é, de serem eles próprios os seus defensores.
E se o texto constitucional passasse, como era proposto pelo Deputado Guilherme Silva e como consta também da proposta do PCP, a dizer que o arguido tem direito a escolher advogado e a ser por ele assistido em todos os actos do processo, embora não fosse minimamente essa a intenção dos proponentes, poder-se-ia inferir desta alteração que se estava, de algum modo, a retirar alguma dignidade a essas situações em que o direito de escolha de um defensor, que pode não ser um advogado, permanece como direito fundamental de todas as pessoas no processo crime em alguns tipos de processo.
O que deve ser remetido para a lei, e aí, sim, subscrevo inteiramente, e é essa a razão desta proposta conjunta do PS e do PSD relativamente ao n.º 3, são as situações em que - e isto para que não haja essas utilizações, subscrevendo inteiramente aquilo que o Sr. Deputado António Filipe referiu, em que o juiz, em plena audiência, às vezes entre a assistência, nomeia ali um defensor como, aliás, se faz nos campos de futebol quando falta o árbitro em que se nomeia um espectador para servir de juiz -, são as situações em que, dizia, é evidente que a lei deve, atendendo à complexidade de alguns processos crime, estritamente obrigar a assistência por advogado para que a defesa seja realizada com todas as garantias que, de resto, decorrem do artigo.
Era apenas esta pequenina precisão que queria fazer, da parte do PSD, em defesa, passe a expressão, da proposta conjunta que surge subscrita pelo PS e pelo PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que podemos passar à votação do n.º 3 constante da proposta de substituição, apresentada pelo PS e pelo PSD.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência do Partido Ecologista Os Verdes.

É a seguinte:

O arguido tem o direito de escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos do processo, especificando

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a lei os casos e as fases em que a assistência por advogado é obrigatória.

Srs. Deputados, vamos, agora, ponderar o seguinte: o PCP, em função da votação que acabou de ter lugar, aceita retirar a sua proposta para o n.º 3?

O Sr. António Filipe (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.
A proposta do Sr. Deputado Guilherme Silva foi, com efeito, tecnicamente substituída, porque é subscritor da outra acabada de votar. Relativamente aos Verdes não posso, infelizmente, fazer a pergunta, porque não tenho interlocutor, neste momento.
Assim sendo, esta proposta terá de ser submetida a votação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É igualzinha à do Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: - É, mas só porque não a posso manter pendente, apesar de o seu verdadeiro alcance útil estar esgotado pela votação anterior.
A não ser que os Srs. Deputados convenham com a Mesa que podemos consultar a Sr.ª Deputada Isabel Castro para uma retirada voluntária da proposta; se tal não acontecesse, submetê-la-íamos posteriormente a votação.
Então, uma vez que há alguma complexidade, vamos passar a votação...

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas vamos submeter à votação a proposta porquê se ela tem um conteúdo idêntico no âmbito material à que acabou de ser votada e aprovada por unanimidade?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a figura da substituição existe. Agora, a figura do prejuízo não existe, nesses precisos termos, e cada autor de uma proposta é livre de a submeter a votação, se assim o entender,
Como não houve manifestação em contrário, vamos passar à sua votação.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e abstenções do PCP e do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe para uma declaração de voto.

O Sr. António Filipe (PCP): - Queria só, numa breve declaração, exprimir que esta abstenção, como se compreende, não é explicada por qualquer discordância relativamente ao conteúdo material da proposta mas apenas pelo facto de ter já sido aprovada, com os nossos votos, indiciariamente, uma proposta que contém basicamente o mesmo efeito útil.

O Sr. Presidente: - Sem dúvida, Sr. Deputado António Filipe.
Srs. Deputados, passamos agora a um outro ponto e que consta do projecto do CDS-PP que é uma proposta de um novo número. Simplesmente a matéria a que esse novo número se reporta tem por sua vez conexão com a proposta nova do n.º 5-A da proposta de substituição subscrita por deputados do PS e do PSD, que é do seguinte teor: "A lei define os casos em que, assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em actos processuais incluindo a audiência de julgamento".
Srs. Deputados, se estiverem de acordo, vamos deixar esta proposta um pouco mais para a frente, uma vez que se trata de matéria nova, para chamar a atenção que há ainda outras propostas relativamente ao n.º 4 actual.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não é nova; é uma evolução do n.º 4 da proposta do CDS-PP e é uma evolução do n.º 4-A da proposta do PS.

O Sr. Presidente: - Não é isso, Sr. Deputado José Magalhães. É que há uma proposta para modificação do n.º 4 actual, da parte do Sr. Deputado Guilherme Silva, que está pendente, suponho, a não ser que os Srs. Deputados do PSD tenham notícia de que ela tenha sido retirada pelo proponente - trata-se de uma proposta de alteração ao n.º 4.

O Sr. José Magalhães (PS): - Por exemplo, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro retirou a proposta dele.

O Sr. Presidente: - Sim, o Sr. Deputado Cláudio Monteiro retirou a proposta na sessão da manhã.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, mas ele disse-me para votá-la! Ele disse que confiava em mim para eu a subscrever!

O Sr. Presidente: - Qual? Há aqui uma informação dada à Mesa de que foi retirada a proposta do n.º 6 e não a do n.º 4. Talvez o Sr. Deputado Luís Marques Guedes tenha, portanto, inteira razão. E, na dúvida, é preferível mantê-la em apreciação.
Srs. Deputados, temos, portanto para o n.º 4 uma proposta do Deputado Guilherme Silva e uma proposta do Deputado Cláudio Monteiro. No caso de não haver objecções, vamos passar à votação destas propostas.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Guilherme Silva não está cá para retirar a proposta.

O Sr. Presidente: - Pois não. E eu perguntei aos Srs. Deputados do PSD se tinham algum mandato para em nome dele retirar a proposta e não vi nenhum sinal nesse sentido. Pois não, Sr. Deputado Luís Marques Guedes?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não!

O Sr. Presidente: - Vamos, portanto, passar à votação da proposta para o n.º 4, apresentada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos favoráveis do PSD e a abstenção do CDS-PP e do Deputado Osvaldo Castro.

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Vamos, agora, votar a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a outra é que, agora, está prejudicada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o melhor é agirmos em termos de votos porque, de facto, a figura do prejuízo, em matéria técnica de apreciação de propostas, é sempre duvidosa.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes pede a palavra para que efeito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para uma declaração de voto relativamente à votação que acabámos de fazer.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, era só para reiterar, em nome do PSD, que, como já tinha ficado claro na primeira leitura, o PSD é receptivo ao princípio de que todos os actos susceptíveis de violarem direitos, liberdades e garantias devem ser validados ou confirmados por uma autoridade judicial, por um juiz, isto é, devem ser da competência do juiz em coerência com aquela que tem vindo a ser a posição do PSD ao longo do tempo, inclusive em legislação ordinária já presente na actual legislatura.
Estou a recordar-me, por exemplo, do debate interessante na 1.ª Comissão, aquando das alterações à chamada lei da droga. O PSD tem esta posição como posição de princípio e foi na afirmação desse princípio que votámos a favor.
Também foi, e os Srs. Deputados estarão recordados disso, com a total lealdade que o PSD tem chamado a atenção para que uma alteração deste tipo seria uma alteração com vastas e amplas implicações em termos de revisão de alguma lei ordinária avulsa existente no nosso País sobre matérias conexas com a restrição de direitos, liberdades e garantias - recordo, por exemplo, a autorização de buscas, a violação do sigilo bancário e outras, para não falar nos agentes infiltrados e por aí fora, em que, actualmente, algumas dessas matérias podem, de facto, ser sancionadas por autoridade judiciária e não apenas por autoridade judicial.
É uma posição de fundo, é uma posição de princípio, e era apenas nestes termos que queria aqui justificar o voto favorável a este princípio na Constituição, embora o PSD esteja perfeitamente consciente de que a adopção de um princípio como este, que esperemos que um dia possa vir a ser instituído na nossa ordem jurídica, implicará profundas alterações em alguns dos institutos regulados, hoje em dia, por lei ordinária.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, não tendo sido possível gerar o consenso constitucional ampliado, que teria sido necessário para conseguir aquilo que, numa expressão muito curiosa se tem vindo a chamar "o acabar de vez com a querela hermenêutica" em torno deste problema.
E esta tentação ou esta aspiração de acabar de vez com determinadas querelas é inteiramente compreensível e, da nossa parte, é, até certo ponto, sufragado. Ora, tendo, entretanto, assentado as paixões que essa querela suscitou em determinados momentos históricos, conformamo-nos com o resultado.
Portanto, nada resulta desta revisão constitucional que não fosse já completado pelo texto actual e ele está aberto às boas, más, médias e grandes hermenêuticas, comportadas pelo seu próprio teor.
Por isso, Sr. Presidente, à falta do óptimo, que fique pelo menos o bom.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar agora a proposta constante do projecto n.º 8/VI do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, também relativa ao n.º 4.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não a considera prejudicada, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, vamos ter que votá-la.

Submetida a votação. foi rejeitada, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes, votos a favor do PSD e as abstenções do CDS-PP e do Deputado Osvaldo Castro.

Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do n.º 5 relativamente ao qual há uma proposta de um novo n.º 5-A, constante da proposta de substituição apresentada na segunda leitura e há também, na propostas originais, uma proposta com o n.º 4, apresentada pelo CDS-PP e uma proposta com o n.º 5, apresentada pelo PSD, que está substituída.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, confirmo que a proposta inicialmente apresentada pelo PSD está substituída.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pergunto se alguém, subscritor da proposta, deseja usar da palavra.
Tem a palavra o Sr. José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, para sublinhar, com brevidade, que considero vantajosa a solução que está expressa na chamada proposta comum. Adiantamos dois números, o n.º 5-A e o n.º 5-B, para dar resposta a esta questão, que é crucial para o bom funcionamento do sistema judicial. É uma chaga fundamental, direi mesmo um flagelo do nosso sistema processual penal, neste momento, direi até que é um dos nós górdios que há que cortar, mas cortar com sageza.
Neste sentido, os processos que adiantámos eram excessivos, designadamente ao preverem os que previam no n.º 5-B e, por outro lado, é possível que o legislador possa ser munido de um instrumento deste tipo, sem utilizar obrigatoriamente o mecanismo de repetição obrigatória do julgamento a que fazíamos menção na nossa proposta.

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O texto final não tem nenhum deste inconvenientes e visa viabilizar ao legislador ordinário a invenção de um sistema que, sem deixar de ser garantístico, seja, simultaneamente, viabilizador da adequada celeridade e, sobretudo, do fim da fuga à justiça.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Pessoalmente, e em nome da bancada do PSD, saúdo o aditamento deste número ao artigo 32.º.
Efectivamente, todos quantos têm experiência, ainda que mínima, da prática forense, sabem da quota-parte de responsabilidade que tem na inércia dos nossos tribunais, no atraso das decisões, uma norma que permita o julgamento, nomeadamente a audiência de julgamento, sem a presença do arguido ou do acusado, garantindo-lhe a lei protecção necessária aos seus direitos de defesa, nomeadamente um novo julgamento se ele assim o requerer e tiver razões específicas para o fazer.
Todavia, ele, tendo essa possibilidade, se faltar, deve ser julgado à mesma e, depois, em recurso, tratará de obter uma nova decisão se tiver para isso os fundamentos necessários.
Com este passo julgo que a lei constitucional deixa de ser um empecilho, digamos assim, ao regular funcionamento da justiça e passa a colaborar activamente, ela lei constitucional, no desenvolvimento da acção dos tribunais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para explicar que consideramos, de facto, que este é um dos problemas que mais tem afectado o funcionamento da justiça nos últimos anos e que, aliás, tem suscitado amiúde críticas, perfeitamente legítimas, da parte dos cidadãos que vêem no actual estado de coisas a eternização dos processos criminais mediante a ausência dos arguidos no julgamento, sendo, de facto, hoje aceite consensualmente na sociedade portuguesa que há que fazer algo para impedir que essas situações continuem.
Daí que também estamos receptivos a uma proposta desta natureza.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, consideramos que esta proposta de alteração responde, de alguma forma, às preocupações que motivaram a proposta de alteração apresentada pelo CDS-PP, no sentido de considerar que alguns entraves do sistema judicial estavam centrados também naquilo que era o texto constitucional e que, com esta alteração, poder-se-á, de alguma forma, obviar no sentido de evitar esses entraves.
Portanto, consideramos este texto, que nos é apresentado, como passível de responder às nossas preocupações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferreira Ramos, julgo poder deduzir das suas palavras que retiram a vossa proposta.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado.
Srs. Deputados, nesta circunstância, está apenas em votação a proposta para um novo número, provisoriamente classificado como n.º 5-A, constante do projecto de substituição.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual é que estamos a votar?

O Sr. Presidente: - A proposta do n.º 5-A, do projecto de substituição.
Srs. Deputados, vamos votar.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

5-A - A lei define os casos em que, assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em actos processuais, incluindo a audiência de julgamento.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, iremos agora votar o n.º 5-B, apresentado na proposta de substituição, que tem como conteúdo o seguinte texto: "O ofendido tem o direito de intervir no processo nos termos da lei", sendo que o Sr. Deputado Cláudio Monteiro retirou na sessão da manhã a sua proposta por considerá-la substituída por esta nova redacção.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a proposta do CDS-PP foi retirada?

O Sr. Presidente: - É, aliás, uma posição comum muito semelhante à proposta originária do Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
Srs. Deputados, podemos passar à votação?

O Sr. António Filipe (PCP): - A proposta é esta que diz que "O ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei"?

O Sr. Presidente: - Exactamente, Sr. Deputado.
Vamos, então, passar à votação.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

O ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei.

Srs. Deputados, relativamente ao artigo 32.º estão ainda pendentes propostas de um novo número, constantes do projecto originário do PCP, cujo conteúdo é o seguinte: "7 - A lei estabelecerá garantias efectivas de fiabilidade das provas e actos obtidos através de meios tecnológicos".

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Algum Sr. Deputado deseja referir-se a esta proposta?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, de facto, queríamos manter esta proposta na medida que nos parece que este problema das provas e actos obtidos através de meios tecnológicos, aos quais se recorre crescentemente, por razões compreensíveis, merece, de facto, ser devidamente regulada por lei.
Há diversas situações em que estes meios são utilizados. Estou a lembrar-me, por exemplo, da gravação de audiências, que mais tarde ou mais cedo, será generalizada, até situações tão comuns como os testes de presença de álcool no sangue, que são feitos pelas brigadas de trânsito aos condutores e que têm suscitado diversos problemas, depois, na sua aplicação prática, na medida em que são reiteradas as impugnações de provas obtidas por esses meios, invocando a falta de viabilidade dos mecanismos e dos instrumentos que são utilizados para sua captação.
Daí que nos pareça que, efectivamente, para evitar que estas situações possam ser utilizadas, muitas vezes de má fé, ou em processos de chicana destinados a evitar decisões finais sobre esta matéria ou a ilibar eventuais responsabilidades, pensamos que faz todo o sentido que a lei se debruce adequadamente quanto à viabilidade dos meios pelos quais são obtidas provas através de meios tecnológicos.
É este basicamente o fundamento da proposta que fazemos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, em relação a esta proposta do PCP devo dizer que o PSD reflectiu sobre esta matéria e chegou à conclusão - e essa era a opinião que aqui queria expressar, em termos definitivos, para além daquela que aqui expressámos na primeira leitura - de que sendo legítima e sendo de atender a preocupação expressa pelo PCP nesta proposta, entendemos, no entanto, que este tipo de matéria não tem dignidade constitucional e, por isso, que não tem sentido consagrar constitucionalmente esta preocupação, que é legítima, na medida em que a lei já hoje dispõe e, aliás, a Administração está crescentemente desperta para este tipo de problemas que a tem a ver, na maioria dos casos, com questões de certificação dos instrumentos diversos que servem para detectar irregularidades e infracções.
Portanto, entendemos que não faz sentido que se eleve à dignidade constitucional este tipo de preocupação, uma vez que, como todos sabemos, este tipo de matéria já também tem acolhimento legal.
Esta é, pois, a posição do Partido Social-Democrata quanto a esta matéria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do n.º 7, constante do projecto originário do PCP.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, com votos a favor do PCP e de Os Verdes e abstenções do PS e do CDS-PP.

Srs. Deputados, está esgotada a votação em torno do artigo 32.º. Há, no entanto, uma proposta de um artigo 32.º-A, constante do projecto originário do PCP relativamente a garantias especiais dos menores sujeitos a jurisdição penal, e há, depois, outra proposta do PCP para um artigo 32.º-B, relativamente a garantias dos processos sancionatórios.
Srs. Deputados, na segunda leitura, não há novas propostas relativamente a estes dois artigos? Estamos em condições de votar?

Pausa.

Sr. Deputado António Filipe, não tendo sido suscitada qualquer dúvida sistémica sobre a vossa proposta, poderemos votá-la em bloco?

O Sr. António Filipe (PCP): - A nossa proposta do artigo 32.º-A?

O Sr. Presidente: - Exactamente.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, se ninguém requerer uma votação separada das várias alíneas, pela nossa parte, não vemos inconveniente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostava só de evitar um equívoco nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Na segunda revisão constitucional, em 1989, foi consagrado no artigo 32.º, alguma coisa cuja filosofia é idêntica à do artigo 32.º-B agora proposto, porque, quanto a processos disciplinares, já foi interpretação pacífica da Constituição que estas regras são elas próprias aplicáveis, por força desta fonte e, aliás, por força de outras.
Pergunto: neste contexto, o PCP, mantém esta proposta?
Em relação ao agora proposto artigo 32.º-A, esta manhã, a Sr.ª Deputada Odete Santos teve ocasião de discutir a filosofia que lhe preside, mas não deixou fechada a questão do volume e da métrica da proposta.
A proposta, é a criação de uma espécie de constituição dos menores, uma espécie de mini-constituição processual penal das crianças ou dos jovens, ou melhor, dos menores em sentido técnico, o que coloca alguns problemas. Nós temos algumas normas aparelhadas da primeira leitura para o artigo 69.º. Há uma margem de benfeitoria, tudo o indica, a obter aí. Mas uma mini-constituição processual penal dos menores, com este formato, é a vossa ideia inarredável? Isto não ficou claro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço para circunscreverem os temas. Neste sentido, pedia ao Sr. Deputado

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António Filipe que se reportasse, para já, à proposta do novo artigo 32.º-A.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, permitir-me-ia devolver a questão, isto é, nós efectivamente apresentamos esta proposta com o objectivo claro e assumido de estabelecer algumas normas especiais aplicáveis aos menores sujeitos à jurisdição penal.
Tendo em conta que as razões se compreendem, não nos reportávamos apenas ao facto de, infelizmente, ser cada vez maior a frequência com que os menores são sujeitos à jurisdição penal, como, aliás, se refere no mais recente relatório de segurança interna, mas a questão não é essa.
A questão é que, de facto, entendemos que a situação específica dos menores justifica que sejam assumidas algumas especificidades, pelo eu que procurámos apresentar uma proposta, o mais completa possível, sobre esta matéria.
Se os Srs. Deputados entendem que esta norma está excessivamente completa ou que é demasiado extensa, nós naturalmente que podermos considerar propostas que sejam feitas no sentido de acolher algumas destas disposições nesta ou noutra sede. Naturalmente que haverá disponibilidade da nossa parte para isso.
Mas, nesse caso, é importante que os Srs. Deputados clarifiquem um pouco também o que pretendem relativamente a esta matéria.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães tem alguma coisa a clarificar sobre este artigo?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Presidente.
É que não havendo nenhuma reconfiguração, a ideia de uma mini-constituição, em quatro alíneas, para exprimir princípios que decorrem basicamente de outras normas constitucionais, não nos parece uma benfeitoria imprescindível.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, assim, passar à votação da proposta do artigo 32.º-A, constante do projecto do PCP.

Submetida a votação, foi aprovada com maioria simples, com votos a favor do PCP e de Os Verdes e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.

É a seguinte:

Artigo 32.ºA
Garantias especiais dos menores sujeitos à jurisdição penal

Aos menores sujeitos a jurisdição penal é especialmente garantido:

a) A liberdade provisória em substituição da prisão preventiva, só aplicável em casos de ponderosa necessidade;
b) O cumprimento de pena privativa da liberdade em estabelecimento adequado;
c) A frequência de estabelecimento de ensino e o exercício de actividades profissionais, no exterior do meio prisional, salvo os casos de perigosidade;
d) A confidencialidade do processo sempre que a mesma se revele útil à sua reinserção social.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar agora à proposta para o artigo 32.º-B, também da iniciativa do PCP.
Permito-me chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de, no rescaldo da primeira leitura, se ter admitido que a norma em vigor com o n.º 8, do artigo 32.º, que se refere aos processos de contra-ordenação, eventualmente poder ser melhorada com o acrescento de um novo inciso relativamente às questões disciplinares ou, em todo o caso, às questões dos demais processos sancionatórios.
A questão ficou em aberto na primeira leitura e, por isso, Srs. Deputados, antes da votação da proposta do PCP, peço que ponderarem se há ou não disponibilidade para uma integração material do n.º 8, que se reportasse aos processos disciplinares a que, aliás, um pouco nesse sentido, se reporta a proposta do PCP para o artigo 32.º-B.
Algum Sr. Deputado deseja usar da palavra?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, para uma reflexão positiva sobre a proposta relativa a um artigo 32.º-B, apresentada pelo PCP.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, como dissemos na primeira leitura, esta norma gerada na revisão constitucional de 1989 (refiro-me ao n.º 8 do artigo 32.º) explicita o que explicita, porque não foi possível que explicitasse mais, nesse contexto.
Se se gera disponibilidade para explicitar mais aquilo que flui da Constituição, pela nossa parte, cooperaremos com prazer e lealdade nesse processo.
Portanto, uma norma que diga que nos processos de contra-ordenação e demais processos sancionatórios são assegurados ao arguido designadamente os direitos de audiência, defesa e produção de prova, isso não nos suscita senão simpatia.

O Sr. Presidente: - Creio ter havido também um movimento, pelo menos, de disponibilidade para reflectir também sobre este tema na primeira leitura por parte dos Srs. Deputados do PSD.
A sugestão do Sr. Deputado José Magalhães seria então, a seguinte: "(…) nos processos de contra-ordenação e nos demais processos sancionatórios".

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma evolução que deixei à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, deve haver lapso, se bem entendi das suas palavras.

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O Sr. Presidente: - Será um excesso de leitura da minha parte, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente. Deve haver lapso do Sr. Presidente na interpretação da posição do PSD, na primeira leitura.

O Sr. Presidente: - Eventualmente, eventualmente…!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A posição do PSD é contrária a esta proposta, não por crueldade nem maldade mas porque, desde logo - e chamo a vossa atenção - há uma contradição manifesta da parte dos proponentes deste artigo 32.º-B, entre a formulação desta proposta e a manutenção do actual n.º 8 do artigo 32.º, ou seja, o n.º 8 do artigo 32.º especifica, relativamente aos processos contra-ordenacionais, que também são processos com carácter sancionatório, como é evidente, que esses processos têm do processo crime alguns dos direitos mas não todas as garantias de defesa típicas do processo crime. E isto está lá por alguma razão. E, de facto, o Partido Comunista mantém essa formulação no seu projecto de lei de revisão constitucional, ou seja, não propôs a revogação, pelo contrário, propõe a manutenção, embora renumerando, passado a ser n.º 9 o actual n.º 8.
Ora, se assim é, e assim ao PSD parece formulação inteligente e correcta a de que, nomeadamente os processos contra-ordenacionais, evidentemente, uma vez que se incluem nos processos de carácter sancionatório, devem ir buscar às garantias típicas dos processos crime alguns do actos processuais, mas não todos.
Por maioria de razão, também outro tipo de processos sancionatórios, nomeadamente os processos de natureza disciplinar, não podem, do nosso ponto de vista, ainda que apenas para efeitos processuais, ser equiparados ao processo-crime.
Seria de todo em todo errado, do nosso ponto de vista, em termos processuais, criminalizar todo o tipo de processos, tais como processos disciplinares e contra-ordenacionais, ou seja, todo o tipo de processos sancionatórios conforme se propõe no texto do Partido Comunista.
Mesmo a formulação adiantada pelo Partido Socialista, pela voz do Sr. Deputado José Magalhães, nos parece, desde logo, errada, porque o simples acrescento ao actual n.º 8 do artigo 32.º da produção da prova implicaria, por exemplo, que nos processos contra-ordenacionais, à semelhança do que acontece actualmente nos processos crime, a produção da prova tivesse que ser gravada, o que eventualmente o Sr. Deputado José Magalhães não estava a equacionar quando, generosamente, avançou com a sua proposta.
Por todas essas razões, o PSD entende que a fórmula inteligente é a do actual texto constitucional, ou seja, não há em termos processuais nenhuma "criminalização" (no sentido de equiparação ao processo criminal) de todos os outros processos sancionatórios, nem sequer apenas os contra-ordenacionais.
Assim, a formulação correcta é aquela que a Constituição actualmente faz, que é a de verter para os processos contra-ordenacionais algumas das garantias típicas do processo crime, mas não todas. E, por maioria de razão, também não para os processos disciplinares que assumem, obviamente, uma natureza completamente diversa dos processos crime e nem sequer podem ser entendidos uma simplificação.
Como todos sabemos, historicamente, a origem dos ilícitos de mera ordenação social decorrem de uma tentativa de simplificação, até para efeitos de desburocratização da justiça, de determinado tipo de causas que não devem ter que merecer um tratamento necessariamente criminal em termos processuais e podem merecer um processo mais expedito, mais ágil e mais flexível.
Essa é que é a formulação correcta do ponto de vista do PSD. Vemos a proposta do Partido Comunista como uma qualquer tentativa de repescagem, ainda que parcial, desta proposta, como, de certa forma, um retrocesso relativamente à evolução histórica que foi feita nesta matéria, citando o exemplo dos ilícitos de mera ordenação social.
Por essa razão, o Partido Social-Democrata, já na primeira leitura, tinha sido contrário a esta alteração constitucional e mantém essa posição.

O Sr. Presidente: - Pedia a atenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes para o seguinte: o Sr. Deputado referiu, e bem, que os processos de contra-ordenação também são sancionatórios, no entanto nem todos os processos sancionatórios são de contra-ordenação…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, ainda há mais!

O Sr. Presidente: - Se é verdade que na sua proposta o PCP visava que uns e outros tivessem todas as garantias do processo criminal - e quanto a isso, pelas razões aduzidas, o PSD está contra -, julgo que, todavia, ficou ainda por alegar se, de facto, o PSD está contra a possibilidade de, tomando como referência o n.º 8 do artigo 32.º, na sua formulação actual, acrescentar aos processos de contra-ordenação os "demais processos sancionatórios".
Portanto, já não era relativamente a todas as garantias do processo criminal, mas à formulação do n.º 8, de que "são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa".
É, pois, para esta formulação restritiva que acho que o PSD, na primeira leitura, deixou alguma possibilidade de abertura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, acho que quer o n.º 8, em vigor, quer a obra que se pretende fazer agora, não introduz nada de novo na nossa ordem jurídica.
É verdade que, desde há muitos anos, há décadas e décadas, que o princípio da audiência do arguido num processo disciplinar, num processo sancionatório é um princípio geral de observância absoluta - aliás, dizia o velho diploma disciplinar que era a única nulidade insuprível no processo disciplinar.
É, pois, um princípio geral de direito, na nossa ordem jurídica - e isto tem a ver com a dignidade humana -, que ninguém pode ser punido, seja a que título for, seja na empresa, seja na Administração ou seja onde for, ninguém pode ser desfavorecido por acto unilateral de outrem,

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sem ser ouvido e sem se defender daquilo que lhe é imputado.
Esta é a ideia geral e a que emana directamente do Direito, considerado como uma esfera da cultura que é autónoma daquilo que o legislador, que somos nós, ou os constituintes, estabelecem a cada momento.
É uma matriz cultural onde toda a gente - o cidadão, o juiz, o administrador - bebe. E daí a razão pela qual nos batemos sempre para que a nossa Constituição consagre - finalmente, em forma directa, por causa da cultura que por aí impera, dos reflexos condicionados que aí vigoram - que o Estado deve obediência à lei e ao Direito. Isto nunca passa e nós vamos sempre entendendo positivamente as fórmulas da Constituição, como se isto fosse um BGB, o código civil germânico do fim do século, que recolhe a cultura jurídica alemã do fim do século XIX, como se aqui tivesse que estar tudo.
Esta é a lógica e este tipo de preocupações constitucionais não fazem sentido na nossa cultura jurídica correctamente entendida, mas uma vez que se deu o passo, na revisão anterior, no sentido de pôr aqui "que na contra-ordenação...", pelo que eu diria que, por maioria de razão, também se deveria ter logo incluído o processo disciplinar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Parece, portanto, que não há qualquer objecção, pelo menos da minha parte e suponho que da nossa bancada, em que se faça este aditamento ou intercalar no n.º 8 do artigo 32.º, de que estamos aqui a tratar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Filipe, a benefício deste debate e desta possibilidade de conclusão, pergunto-lhe se admitiria - e é apenas uma sugestão - retirar o vosso artigo 32.º-B, que, pelo resultado do debate, se revela inviável, para podermos todos partilhar, por aquilo que pareceu ser uma possibilidade de apoio comum, o aditamento do processo disciplinar ao n.º 8 do artigo 32.º na formulação constante desse artigo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, creio que é uma evolução positiva, congratulando-me, de facto, com essa inclusão.
Gostaria, ainda assim, de chamar a atenção para o seguinte: naturalmente que as garantias de defesa são levadas ao máximo no nosso sistema jurídico no que se refere, de facto, aos processos criminais.
Agora, creio que vale a pena, apesar de tudo, lembrar que nem sempre os processos disciplinares assumem uma menor gravidade e menores consequências para o arguido no seu efeito sancionatório de certos processos disciplinares. Isto é: é verdade que também há bagatelas em penas, em grande número, sem que com isso sejam arredadas as garantias próprias de defesa do processo criminal, e também é verdade que, no processo disciplinar, uma pena de demissão para um funcionário poderá ter na sua vida consequências muito mais graves do que a aplicação, inclusivamente, até de uma pena de prisão ou de uma multa pesada.
Daí que era esse o fundamento da nossa proposta de equiparação dos procedimentos disciplinares, em termos de garantia de defesa, aos processos-crime.
Naturalmente que esta evolução de inclusão dos processos disciplinares no n.º 8 é uma evolução positiva e, portanto, poderemos ponderar face ao grau de satisfação obtido com o melhoramento do n.º 8, na retirada desta proposta. Mas, creio que, nesse caso, deveríamos tentar apurar sobre qual a sua formulação concreta.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado António Filipe.
Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Filipe, ainda que não convencido relativamente aos argumentos contrários ao artigo 32.º-B, admite compartilhar um consenso, se consenso houver, relativamente à reformulação, por aditamento, ao n.º 8 do artigo 32.º.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A formulação, tal qual aparece aqui, deixa-me um bocado... Ela está assim: "Nos processos de contra-ordenação e demais processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa". Ora, este texto parece-me pouco lapidar e pesado.
Julgo que melhorava se fizéssemos a inversão da fórmula nos seguintes termos: "Aos arguidos são assegurados os direitos de audiência e defesa nos processos de contra-ordenação, bem como nos demais processos sancionatórios". Creio que ficava uma fórmula talvez mais escorreita.
De qualquer modo, ainda fica pesadota…!

O Sr. Presidente: - O problema, Sr. Deputado Barbosa de Melo, é que este n.º 8 é entendido, digamos, como uma norma já um pouco supletiva relativamente às garantias do processo criminal.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Pois é. É que esta é uma extensão do processo criminal.

O Sr. Presidente: - E talvez por isso, embora não seja...

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Por isso é que a sistemática do Partido Comunista...

O Sr. Presidente: - Se calhar, era melhor mantermos a formulação tal como está na matriz do n.º 8.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Eu não sei se não era de pegar na sistemática do PCP e fazer um artigo autónomo em que se dissesse isto em geral.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já temos aqui o n.º 8, que no programa do artigo 32.º já aparece relativamente deslocado, uma vez que se trata das garantias do processo criminal. Em todo o caso, era o mínimo de "obra" possível, Sr. Deputado. Sr. Deputado Barbosa de Melo, eu aqui tentaria arguir a favor do mínimo de "obras" possível na Constituição e entre a autonomização do artigo e o aproveitamento do número existente, preferia...

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O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Então, seria: "Nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa" .

O Sr. Presidente: - Muito bem. Julgo ser essa a fórmula partilhável por todos os Srs. Deputados.
A fórmula que o Sr. Deputado Barbosa de Melo acabou de referir, pode ser subscrita em comum por todos os Srs. Deputados da Comissão?

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, esta proposta será aceite por todos os Deputados da Comissão e, para facilitar, será subscrita pelo Presidente.
Srs. Deputados, vamos, então, passar à votação da proposta de substituição, subscrita por unanimidade dos Deputados da Comissão para o n.º 8 do artigo 32.º, com a formulação que acabou de ser referida.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

Nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Filipe retirou, entretanto, a sua proposta do artigo 32.º-B.
Assim, Srs. Deputados, dando um salto sobre o artigo 33.º, pela razão já conhecida, passamos ao artigo 34.º.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, há uma proposta de um artigo 33.º-A, apresentada por Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Creio que essa proposta poderá ficar para quando da discussão do artigo 33.º.
Passamos, agora, ao artigo 34.º, que tem uma proposta de substituição relativamente ao n.º 4, no sentido de se aditar, entre a expressões "telecomunicações" e "salvos", constante desse n.º 4, o inciso "e nos demais meios de comunicação" .
Para além desta proposta, haveria uma outra originária do PS que é substituída, do que peço confirmação ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, essa proposta enfermava de um lapso de escrita, pois tinha sido omitida a transcrição do segmento final da norma no original entregue na Mesa da Assembleia da República, em Março de 1996.
Esse segmento diz o seguinte: "(…) salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal", o que gerou em pessoas sem acesso à documentação integral e, portanto, à versão corrida dos textos, profundíssimas dúvidas, como é óbvio, pois, nesse cenário, a norma constitucional acarretaria como consequência inequívoca o fim de qualquer possibilidade de escuta telefónica, mesmo que necessária, para combate ao crime.
Obviamente, não era isso que estava em causa na proposta. Pelo contrário, o que estava aqui em causa era, muito mais precisamente, explicitar dimensões já hoje contidas no artigo 34.º, n.º 4, no sentido de acompanhar a inovação tecnológica, que é um pouco frenética nesta área, em que estão a aparecer criaturas híbridas já sem nada a ver com a correspondência, no sentido clássico nem com as telecomunicações tais quais as conhecíamos nos anos da graça de 1966, 1982 ou 1989 - aliás, ninguém chega a saber qual será bem o conspecto mundial quando for feita a próxima revisão constitucional.
Esta cláusula é abrangente e tendente a criar uma espécie de actualização automática do alcance da norma, abrangendo aquilo que a tecnologia for permitindo e estendendo a esses novos espaços tecnológicos o espaço de liberdade que é próprio do artigo 34.º. E isso não prejudica, como é natural, os casos previstos na lei, em matéria de processo criminal.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado José Magalhães.
Srs. Deputados, suponho que a proposta é suficientemente explícita e mais explícita ficou com esta apresentação, pelo que vamos passar à sua votação.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas fica com os dois "es", ou seja, "na correspondência e nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação"?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não. Deve ficar "na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação".

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas, na redacção da proposta que nos foi distribuída não consta a vírgula a seguir a "correspondência" mas sim um "e" .

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas tem que ficar com uma vírgula a seguir a correspondência, retirando-se o "e".
Portanto, o melhor, aliás, é que a proposta completa comece no segmento que diz "na correspondência" .

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Então ficará: "na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos...".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora ao artigo 35.º, relativamente ao qual existe uma proposta de substituição quase integral de todo o artigo e há ainda, nos projectos originários, múltiplas propostas.
A sugestão metodológica que faço, Srs. Deputados, é que passemos à votação ponto por ponto. E se estiverem

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de acordo, será assim: relativamente ao n.º 1, há uma proposta de substituição. Relativamente aos projectos originários não havia qualquer outra proposta de alteração que devesse ser considerada.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, se bem me recordo, relativamente ao artigo 35.º, quase não houve primeira leitura, na medida em que houve uma decisão tomada precocemente, e bem, para que a Comissão considerasse esta matéria.
Acontece que a Comissão fez uma proposta que vai muito para além daquilo que eram os projectos de revisão constitucional e que, em alguns termos, embora não nos termos exactos, é acompanhada por esta proposta comum.
Agora, esta proposta comum é uma novidade em termos de debate de revisão constitucional, e creio que se justificaria, da parte dos proponentes, alguma apresentação, ainda que sumária, das razões daquilo que propõem.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães deseja usar da palavra a instâncias do Sr. Deputado António Filipe?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, por um lado, temos, o benefício de tudo o que temos lido e de estar nos autos o parecer elaborado pela CNDPDI, cujas sugestões foram ponderadas cuidadosamente nesta proposta, como denota a sua leitura, e há, curiosamente, nesta matéria, uma componente de flexibilização e de regidificação, sendo esta a que no n.º 7 visa estender aos dados pessoais reportados em ficheiros manuais, a protecção que a Constituição originariamente previu para os dados sujeitos a tratamento automatizado.
É uma medida que, de resto, consta da directiva europeia vigente e aplicável nesta matéria. A directiva, do meu ponto de vista, parece extremamente razoável, sensata e adequada e ainda que ela não existisse, seria positivo consagrar este princípio na ordem jurídica portuguesa.
Na verdade, quem não prestar atenção aos ficheiros manuais num horizonte e num mundo digitalizado, viabiliza operações em que estes sejam usados em conjugação com os outros para produzir um resultado danoso que o legislador constituinte quis evitar.
Este o novo elemento de alargamento da protecção dos dados pessoais. Vê pouco quem subestimar os ficheiros manuais, sobretudo em países como o nosso, cujo nível de administração electrónica é ainda limitado e baixo.
Em relação ao n.º 5, não há qualquer alteração, ou seja, a Comissão chegou a aventar que se suprimisse a menção à proibição de atribuição de um número nacional único aos cidadãos.
A origem desta norma é bem conhecida. Exorcisamos ainda aqui o espectro de alguns projectos do governo de Marcelo Caetano, cuja lembrança nesta matéria é muito oportuna na data em que a estamos discutir, mas cujos efeitos estão também dissolvidos.
Em todo o caso, percebendo o que o legislador constituinte quis, pela nossa parte, decidimos não tocar nesta proibição.
Flexibilizam-se como é sugerido vários aspectos, mas não sem elementos de garantia. Por exemplo, introduz-se, pela primeira vez, no n.º 2 a menção ao facto de dever haver num sistema de garantia da aplicação efectiva destas normas, sem o que a Constituição seria, seguramente, um documento exaltante mas de eficácia nula, ou seja, haver uma entidade administrativa independente, além, naturalmente, do papel que cabe aos tribunais, aos órgãos de poder, à opinião pública e a cada um de nós que intervenha neste domínio.
Não se especifica nem se dá nomen juris a essa autoridade, a que se chama, com um acrónimo complexo, CNDPDI, neste momento, em Portugal. Pode vir a chamar-se outra coisa qualquer, mas não é o nome da coisa que é importante mas a consagração da ideia de que deve haver uma entidade administrativa independente velando pela aplicação.
E quanto à aplicação, a importância desta autoridade é talvez, neste domínio, acrescida - e por isso quer-se constitucionalizá-la - porque há elementos de flexibilização. As proibições essenciais são mantidas e até alargadas, passando a incluir-se a origem étnica entre os dados que a informática deve ver limitados quanto ao seu tratamento, mas introduzem-se, como é sugerido, e parece realista, cláusulas de salvaguarda ou de excepção, desde que haja consentimento expresso do titular ou uma autorização legal, em termos do legislador, com garantias de não discriminação nestas áreas ou, então - e isso é quase uma evidência porque aí o carácter identificável dos dados fica desnaturado ou desaparece - quando haja necessidade de processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis.
No n.º 4, proíbe-se, em regra, o acesso de terceiros a dados pessoais mas não se deixa de salvaguardar a possibilidade de o legislador, em determinados casos, qualificados como excepcionais, poder autorizar esse tipo de acesso. Obviamente, estamos a pensar em lei material, em lei aprovada pela Assembleia da República, no sentido, portanto, verdadeiro e próprio.
Os direitos fundamentais dos cidadãos, em matéria de acesso, rectificação, actualização, direito ao conhecimento da finalidade, são salvaguardados inteiramente pelo n.º 1.
Por fim, Sr. Presidente, permita-me que sublinhe como interessante, adequada, moderna e nem constava de nenhum projecto de revisão constitucional, o reconhecimento a todos daquilo que se chamou um direito de livre acesso às redes informáticas do uso público. É uma matéria em que um princípio de universalidade e de liberdade em sociedade de informação tem cada vez mais importância, e os cidadãos, nessa matéria, não podem ser impedidos burocrática e sensorialmente de aceder às redes.
Outra coisa distinta são as obrigações estaduais de promoção do acesso à informação, matéria que não é tratada directamente neste preceito, ou seja, não se trata neste processo de todas as dimensões do acesso. Mas trata-se de algumas importantes, utilizando-se a mesma exacta formulação que nesta parte da Constituição é típica para proclamar figuras jurídicas com dignidade e importância similar.

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Portanto, creio que o acesso às redes informáticas de uso público entra bem na Constituição. O artigo muda também a epígrafe. O ângulo do artigo desloca-se da utilização da informática, que, hoje em dia, é o seu âmbito único, para a protecção de dados quer se trate de dados contidos em suporte e sujeitos a tratamento informático ou contidos em ficheiros manuais.
Portanto, não fazia sentido manter a mesma epígrafe quando se alterou e ampliou, aliás, o objecto do artigo. Por outro lado, a preocupação garantística não está dominada por uma obsessão e por isso é que se consegue articular, por um lado, as normas garantísticas com uma norma, a do n.º 6, que é uma norma de proclamação da liberdade de acesso e, nesse sentido, uma garantia anti-obstáculo administrativo, censura ou impedimento abusivo ao acesso que deve ser livre.
Creio, Sr. Presidente, que se trata de um conjunto de normas equilibradas, num domínio em que qualquer veleidade de fechar olhos às necessidades de utilização destas novas tecnologias acarreta crise da lei, incentivo ao desrespeito pela lei e debilidade do Estado de direito democrático.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado José Magalhães, pela sua apresentação detalhada e exaustiva.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, começo por dizer que não vou discutir o fundo da questão, pois acho o texto equilibrado. O que me aflige é a maneira como está ordenado e organizado.
E chamo a atenção, por exemplo, para duas fórmulas, uma no n.º 1, que diz que "Todos os cidadãos têm o direito de acesso…" e outra no n.º 6. onde se diz que "A todos é garantido livre acesso". Ora, num caso só se refere a expressão "acesso" e noutro "livre acesso" e também é diferente dizer "todos os cidadãos" ou dizer "todos".
No primeiro caso, estamos em presença de quem tem um direito de cidadania, ao passo que, no segundo caso, "a todos" é um direito do homem - aliás, dizia a primeira Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na assembleia constituinte francesa. "A todos", portanto, é diferente de"todos os cidadãos".
Depois, no n.º 7, também não me agrada nada este a expressão "estruturados". O ficheiro tem uma estrutura, fundamentalmente a estrutura alfabética. Portanto, deveria ser "os dados pessoais constantes de ficheiros" e não "estruturados em ficheiros" .
Pergunto: são intencionais essas diferenças, há razões para ser assim ou poderia ter sido de outra maneira do ponto de vista formal? E as minhas objecções são apenas formais.

O Sr. Presidente: - Trata-se de um pedido de esclarecimento pelo que tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, quanto à menção feita ao n.º 7, francamente, não tenho qualquer objecção quanto à redacção apontada pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo. O jargão da profissão não tem que se impor ao legislador, em sede de revisão constitucional, e creio que a ideia que exprimiu através da expressão "constantes" é perfeitamente correcta e diz, em português correcto e não excessivamente apegado à metalinguagem desta área do conhecimento, aquilo que é preciso dizer, ou seja, que "os dados constantes de ficheiros manuais gozam de protecção idêntica à prevista nos números anteriores, nos termos da lei". Isso, francamente, parece-me uma redacção perfeitamente correcta.
Quanto à preferência pela fórmula do n.º 6, verdadeiramente pensa-se aqui em pessoas singulares, em cidadãos, em todas as pessoas, incluindo, portanto, as pessoas colectivas, ou seja, a liberdade de acesso a áreas informáticas é hoje tão importante nas sociedades modernas e nas ditas sociedades da informação...

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - E considera que este "livre acesso" é prejudicado se tiver de pagar uma taxa?

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Deputado Barbosa de Melo, eu percebi qual era a sua preocupação, mas, nessa matéria, não se proclama o princípio da gratuitidade do acesso irrestrito nesse sentido, ou seja, livre de constrangimentos materiais.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Então, é livre!

O Sr. José Magalhães (PS): - Daquilo que se fala é do livre acesso neste sentido: a proibição - tal como acontece à liberdade de expressão, tal como acontece em relação a outros direitos desta natureza na Constituição - de impedimentos de carácter burocrático, censório, ou outros através dos quais, a força repressiva ou ingerente do Estado se interponha entre o cidadão e o acesso a um bem sem o qual será algum dia inteiramente impossível ter uma informação cabal.
Portanto, aqui se preserva uma das formulações aplicadas à sociedade digital mais tradicionais das Constituições em que nos reconhecemos - e a palavra liberdade entra aqui bem com a tradição e com o cunho que ela teve na tradição histórica vinda da Revolução Francesa e da Declaração Universal.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Muito rapidamente, para dizer que aqui o sentido técnico desta expressão tem o significado de um direito cívico, isto é, o direito a uma prestação de alguém.
A liberdade é um direito, desde logo a liberdade como independência, uma liberdade no Estado e, eventualmente, contra o Estado… E aquilo que aqui se consagra é uma liberdade de acesso. E pergunto-me se isto está bem. Percebo o que o que VV. Ex.ªs querem, porém julgo que a expressão correcta não é esta.

O Sr. Presidente: - O direito de acesso!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Correcto, o direito de acesso. A todos é garantido o acesso às redes informáticas. O livre acesso é uma coisa excessiva.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, Sr. Deputado, não tem nenhuma das componentes que pareciam preocupar-me. É tão enfático como falar-se em livre expressão do pensamento.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas aí é que está! É que a livre expressão do pensamento é uma liberdade e não um direito cívico no sentido técnico-jurídico.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, talvez todos pudessem perceber, independentemente de outras interpretações mais subtis que, para efeitos de interpretação prática do n.º 6, nada colhe de diferente se ficar "A todos é garantido o acesso às redes informáticas" .

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - "de uso público".

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães admite que não há alteração da interpretação prática do n.º 6, se ficar "A todos é garantido o acesso...".

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas eu francamente preferia...
Quer dizer: se há alguma coisa na proclamação enfática que deva ser preservado, é isso. Obviamente, não farei finca-pé, porque é uma questão de expressão, na minha óptica, mais adequada. Fracamente preferia..., mas, enfim...

O Sr. Presidente: - Gostaria de ouvir o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, como co-autor da proposta, sobre se fica a expressão "o livre acesso" ou fica só "o acesso".
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que a minha primeira inclinação é para concordar com o Sr. Deputado José Magalhães, porque, de facto, na co-autoria que o Sr. Presidente me imputa, esteve presente alguma discussão, alguma reflexão e alguma troca de impressões e eu revejo-me no argumento e nas preocupações que o Dr. José Magalhães tem produzido neste debate, tentado explicitar em defesa desta ideia.
No entanto, também sou de certa forma sensível às preocupações do Sr. Deputado Barbosa de Melo.
Portanto, diria, Sr. Presidente, com vantagem para o andamento dos trabalhos, que isto é matéria que pode ser votada tal qual está, com a expressão "o livre acesso" e na redacção final que todos os processos de revisão constitucional não podem deixar de comportar, será uma matéria que poderemos equacionar para não perder o ritmo dos trabalhos aqui.
Porém, tinha outras questões que gostava de suscitar.

O Sr. Presidente: - A propósito deste artigo?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sim, Sr. Presidente. A primeira questão, à laia de fundamentação, era a resposta ao repto do Sr. Deputado António Filipe, enquanto comentário por parte do PSD e da sua proposta; a outra, era uma dúvida que, de facto, gostaria de colocar ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes quer formular algumas reflexões, designadamente com vista às observações do Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quanto às reflexões, subscrevo tudo aquilo que foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães relativamente à razão de ser das opções, norma a norma, que aqui estão inscritas, nesta proposta de redacção do artigo 35.º.
Contudo, gostaria de referir-me, apenas, a um aspecto que não foi citado pelo Sr. Deputado José Magalhães, e que, para o PSD, é uma questão colocada relativamente à proposta oriunda da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, contrariamente à inovação da redacção que, por esta Comissão, era proposta relativamente ao n.º 4, em que a Comissão, salvo erro, propunha uma redacção do tipo "a lei regulará nos casos em que...".
De facto, para o PSD é importante que se mantenha a redacção, no fundo, seguindo a lógica da nossa proposta que é a de que estatui o princípio da interdição.
Ao PSD não parece, de facto, indiferente redigir ao contrário esta norma porque o que está aqui escrito, na forma de "É proibido" , não é utilizado em muitos casos pela Constituição. Não são muitos os casos e a esses casos, ao contrário de serem selectivos, deve ser dado um peso jurídico-constitucional mais relevante em termos do nosso arquétipo constitucional e da estrutura dos direitos dos cidadãos no nosso País ou do actual Estado de direito.
E é essa diferença de opiniões à proposta da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados que queria aqui enfatizar para a acta porque, de facto, ao PSD, parece importante.
Já, a contrario, devo dizer que, para o PSD - mas as propostas comuns e os seus textos evidentemente são isso mesmo - já teria sido perfeitamente dispensável o actual n.º 5 que diz que "É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos", conforme o Sr. Deputado José Magalhães referiu.
Esta norma tem um contexto próprio, contexto que ao PSD não pesa nem o PSD tem qualquer tipo de complexos ou de peso histórico em torno do que está por trás desta norma e, por nós, esta norma podia perfeitamente - penso que, de resto, conforme a redacção da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados - ter-se deixado cair, digamos assim, na revisão constitucional.
Por último, reiterava também, em nome do PSD, conforme também já fez o Sr. Deputado José Magalhães, que entendemos como muito importante este avanço constitucional no sentido de expressamente se excepcionar situações de um sentimento muito particular para vir a dar acolhimento e guarida constitucional àquilo que é uma necessidade fundamental, nos dias de hoje, nomeadamente com a organização interna dos partidos políticos, dos sindicatos e por aí fora, que, actualmente, se viam, de certa forma, constrangidos constitucionalmente a não poder socorrer-se dos meios informáticos para os processos de organização interna, obviamente com prejuízo do funcionamento, da operacionalidade e da modernização dos seus próprios serviços.

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Entendemos, portanto, que essa matéria é importante.
E posto este ênfase, deixava apenas uma questão ao Sr. Deputado José Magalhães que, confesso, por lapso meu, aquando da leitura da proposta que me foi colocada, embora tenha por hábito não proceder assim, não me apercebi na altura.
Penso que a epígrafe não deve ser "Protecção de dados", mas deve manter-se a epígrafe actual de "Utilização da informática", desde logo pela seguinte razão: a não ser assim, o texto para o n.º 4 passaria a ser um texto muito perigoso, ou seja, o n.º 4 faz sentido - e recordo-me que na redacção conjunta que trabalhamos para este artigo simplificamos o texto actual quando fala na posição de acesso a ficheiros e registo de informática - porque o contexto do artigo é a utilização da informática.
Se o contexto do artigo for alargado - e penso que o Sr. Deputado José Magalhães apenas terá feito questão sobre a epígrafe tendo em vista um número...

O Sr. José Magalhães (PS): - O n.º 7.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - ... penso que para "tapar" - passe a expressão, o n.º 7 -, destapa-se de mais, pois parece mais relevar do objecto principal deste artigo. Este artigo tem que ver, de facto, com a utilização da informática. O facto de ter aqui o n.º 7, sobre outras matérias, não é preocupante e faz-nos lembrar o artigo 32.º, que trata do processo crime e depois trata dos processos sancionatórios também num número final.
O que me parece já mais perverso seria a alteração da epígrafe porque, apesar de a leitura do n.º 4 falar na proibição do acesso a dados pessoais, trata-se de qualquer tipo de dados pessoais e não apenas os dados pessoais informatizados constantes de ficheiros de registos informáticos de dados pessoais.
Penso que dada a resistematização e certificação a que estamos a proceder, da forma como acabei de referir, suponho que a epígrafe "Utilização da informática" deve ser mantida e, portanto, embora já tendo assinado esta proposta, devo dizer que o fiz por lapso, pois não tive em conta a alteração da epígrafe.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está feito um amplo debate de esclarecimento entre os autores da própria proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, sobre algumas destas questões que foram suscitadas e sobre outras que o não foram, desejava fazer breves considerações acerca desta proposta.
Primeiro, logo no início do texto do n.º 6 diz-se: "A todos é garantido livre acesso às redes informáticas de uso público...". E não terei nada a opor naturalmente a que uma norma destas conste da Constituição, mas questiono-me sobre a utilidade prática deste inciso, isto é, em que é que consiste a garantia de acesso ao que é de uso público? Ou seja, vale a pena fazer uma norma na Constituição a dizer que é livre o acesso aos bancos de jardim, quando as câmaras puseram os bancos no jardim para as pessoas se sentarem…? Mais: o que é que o Estado faz para garantir o meu acesso, por exemplo, à rede Internet? Aliás, os operadores estão desejosos de me vender o acesso e até a preços acessíveis!
Portanto, creio que é verdade que é garantido o acesso às redes de uso público, mas é garantido pela força natural das coisas porque elas são para as pessoas lhes terem acesso senão não o seriam. E, portanto, não sei em que é que consiste o dever do Estado de garantir o acesso àquilo que está por natureza garantido. Mas, como disse, não é questão a que tenha oposição de princípio a que isto esteja consagrado.
Agora, sobre outras questões mais relevantes, direi que não vejo grande vantagem na constitucionalização da protecção dos dados, designadamente através da entidade administrativa independente, sem ter absolutamente nada contra a autoridade em causa que até nos deu uma contribuição muito útil para a discussão deste artigo.
Mas, porque abre a porta, designadamente para que possam existir outras formas de protecção, e depois porque esta foi uma solução a que se chegou através da Lei n.º 10/91, como se poderia ter chegado a outra, e, portanto, não creio que haja uma grande vantagem em estarmos a constitucionalizar uma forma específica de protecção através de entidades x, y ou z. Aliás, creio que existem diversas entidades administrativas independentes com as mais diversas funções e não nos passa pela cabeça constitucionalizá-las todas.
Portanto, tenho alguma dúvida...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas esta é importante!

O Sr. António Filipe (PCP): - As outras também o serão.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado António Filipe o favor de concluir.

O Sr. António Filipe (PCP): - Relativamente à epígrafe, não nos parece mal esta epígrafe que é proposta na medida em que ela corresponde, de facto, ao conteúdo do artigo porque se o artigo não se limita a regular a utilização da informática, também tem um número relativamente aos ficheiros manuais e, então, das duas uma: ou se faz um artigo sobre a utilização da informática com essa mesma epígrafe e se faz um artigo autónomo com o n.º 7, ou então, de facto, parece mais lógico que a epígrafe passe a exprimir aquilo que, de facto, é regulado.
Finalmente, duas questões que, creio, relevantes. Primeira, relativamente à conexão de ficheiros, verifico nesta proposta - e creio que é talvez a inovação mais relevante embora, em nosso entender, não seja propriamente de aplaudir - a retirada da proibição da conexão de ficheiros. A conexão de ficheiros, no actual texto do artigo 35.º, é proibida, na medida em que o n.º 2, diz que "É proibido o acesso a ficheiros e registos informáticos para conhecimento de dados pessoais relativos a terceiros e respectiva interconexão, salvo em caos excepcionais previstos na lei".
Ora, aquilo que se faz agora é inverter as coisas, isto é, era proibido, salvo casos excepcionais, e agora passa a ser permitido, podendo a lei naturalmente estabelecer os casos em que o não será.

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Portanto, há que ter em conta o melindre de que se reveste a interconexão de ficheiros de dados pessoais e o que isso pode significar em termos de devassa da vida dos cidadãos. Importa não esquecer que a todo o passo deparamos com situações que configuram eventuais situações ilegais e inconstitucionais de interconexão de ficheiros. Basta pensar no caso de quem for a uma grande superfície comercial e pagar com um cheque que terá de esperar que a empregada da caixa folheie a lista negra das pessoas que passaram cheques sem cobertura o que configura, evidentemente, uma situação de interconexão de ficheiros, creio que ilegal e inconstitucional.
Mas, portanto, importava que esta matéria não fosse flexibilizada por forma a desproteger ainda mais os cidadãos que já estão excessivamente desprotegidos face à interconexão de dados pessoais constantes de ficheiros informáticos.
Daí que não nos parece bem que haja esta inversão de regra, passando a ser, em regra, permitido o que actualmente é, em regra, proibido.
Como última questão, relativamente ao n.º 3, na medida em que nos parece também excessiva a possibilidade de autorização legal com garantias de não discriminação relativamente ao tratamento de dados pessoais, particularmente sensíveis, como o são as convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem étnica, estamos perfeitamente de acordo que seja incluída aqui a referência "origem étnica", pois tem plena justificação.
Agora, o que nos parece também excessivo é permitir, com uma formulação tão ampla, a possibilidade de autorização legal para que a informática possa ser utilizada para tratamento destes dados. Parece-nos excessivo e, de facto, acaba por fazer sair pela janela aquilo que entrou pela porta, no resto do artigo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos colocados na seguinte situação e pedia-lhes apenas para colaborarem, agora, metodologicamente com o processo de votação.
O Sr. Deputado Marques Guedes continua a decair da epígrafe que subscreveu ou decai na objecção à epígrafe que subscreveu?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, coloquei a questão da epígrafe como uma chamada de atenção ao Sr. Deputado José Magalhães.
Portanto, estará da parte dele a manutenção ou não da epígrafe do texto actual.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tal como a directiva europeia trata do tratamento automatizado de dados e trata, por apenso, dos ficheiros manuais, francamente não me repugna que isso suceda com este processo de revisão constitucional.
Portanto, regressamos à fórmula primitiva. Obviamente, o objecto da norma é o que está delimitado pelos seus números e, quanto a isso, não há dúvida nenhuma hermenêutica. Portanto, cai a epígrafe e volta a epígrafe com o conteúdo transmudado que é fundamental.

O Sr. Presidente: - Portanto, Srs. Deputados, voltamos à epígrafe inicial.
Por sugestão, relativamente ao n.º 7, há a substituição material da expressão "estruturados em ficheiros" pela expressão "constantes de ficheiros" .
Finalmente, no contexto do artigo 35.º há uma proposta de novo número, que seria um novo n.º 2, constante do projecto originário do PCP.
Pedia ao Sr. Deputado António Filipe se, para efeitos de votação, aceitaria que se votasse a proposta de substituição integralmente apresentada na segunda leitura e como a proposta do vosso projecto é sempre uma proposta que tem um valor autónomo ela seria votada depois.

O Sr. António Filipe (PCP): - De acordo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, era só para perguntar ao PCP se mantém a proposta porque, quando esta proposta apareceu não estava previsto nem aprovado indiciariamente aquele preceito que prevê a instituição de procedimentos céleres e adequados para obter determinados efeitos benéficos em matéria de protecção de direitos pessoais, mas agora já está.
E este direito é um dos direitos que, obviamente, está contemplado na gama dos que são susceptíveis de serem protegidos por esse mecanismo adjectivo. E, portanto, a ideia de um "mandado" para este efeito, de um writ, à anglo-saxónica, está contemplado e incorporado na possibilidade genérica aberta atrás.
Portanto, não sei se é absolutamente indispensável, mas isso, obviamente, está na disponibilidade do proponente.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, manteria a proposta porque esta figura que aqui propomos tem um valor autónomo, próprio, muito conhecida por habeas data, que consiste, de facto, na possibilidade de o cidadão a quem é negado o acesso a dados constantes de ficheiros informáticos a seu respeito possa obter um procedimento judicial célere e autónomo, específico, com efeito de ter acesso a esses dados.
Assim, a nossa posição é de manter essa proposta neste artigo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, então, votar de acordo com a metodologia que estava a propor e para a qual proponho ainda um outro aspecto: porque o artigo 35.º representa uma substituição integral do actual artigo 35.º da Constituição, excepto na epígrafe, e de qualquer maneira há uma absorção integral da parte não modificada constante desta proposta, pergunto se alguém se opõe à sua votação em bloco.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, preferia que se votasse separadamente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Filipe quer que se vote número a número. É assim?

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente.

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O Sr. Presidente: - Então, terá que ser.
Srs. Deputados, vamos. então, passar a votar o artigo 35.º, no que diz respeito à proposta de substituição dos deputados do PS e do PSD, votando número a número.
Vamos votar o n.º 1 da proposta.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhe digam respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade a que se destinam, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação do n.º 2 da proposta.

Submetido a votação, foi aprovado por maioria qualificada de dois terços, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP e do PEV e abstenção do CDS-PP.

É o seguinte:

A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção, designadamente através de entidade administrativa independente.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à votação do n.º 3 da proposta.

Submetido a votação, foi aprovado por maioria qualificada de dois terços, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP e do PEV.

É o seguinte:

A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização legal com garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis.

O Sr. Presidente: - Vamos, agora, votar o n.º 4 da proposta.

Submetido a votação, foi aprovado por maioria qualificada de dois terços, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP e do PEV.

É o seguinte:

É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei.

O Sr. Presidente: - Dado que estamos a votar número a número, não é necessário votar o n.º 5 dado que não regista qualquer alteração em relação ao n.º 5 actual.
Passamos, assim, à votação do n.º 6 da proposta.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

A todos é garantido livre acesso às redes informáticas de uso público, definindo a lei o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras e as formas adequadas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifique por razões de interesse nacional.

O Sr. Presidente: - Vamos, finalmente, votar o n.º 7 da proposta, com a nova redacção que é a seguinte: "Os dados pessoais constantes de ficheiros manuais gozam de protecção idêntica à prevista nos números anteriores, nos termos da lei" .

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora à votação da proposta do projecto originário do PCP, com um novo número classificado com o n.º 2.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP e do PEV e abstenções do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, as restantes propostas constantes dos projectos originários foram consideradas substituídas da parte do PS.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, não pôs à votação a proposta de alteração da epígrafe do artigo.

O Sr. Presidente: - A proposta de alteração da epígrafe não chegou a merecer alteração, pelo que se mantém a epígrafe originária.
Srs. Deputados, passamos, portanto, ao artigo 36.º, sob a epígrafe "Família, casamento e filiação".
Há uma proposta de substituição para o n.º 7 de deputados do PS e do PSD e há outra proposta de substituição para o n.º 3 da Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Além destas, há propostas dos projectos originários, desde logo, para o n.º 1, constante do projecto de Os Verdes.
Srs. Deputados, a proposta constante do projecto originário de Os Verdes tinha um aditamento com a seguinte expressão "de acordo com a sua livre opção" que se seguia ao texto em vigor do n.º 1 do artigo 36.º.
Os Srs. Deputados, estão certamente cientes da matéria que está em apreciação, ou seja, a proposta de alteração ao n.º 1, constante do projecto originário de Os Verdes, que vamos passar a votar.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e do PEV e abstenção do PS.

Srs. Deputados, passamos agora ao n.º 3, sendo que para este número há igualmente uma proposta de Os Verdes, mas registando-se uma substituição.

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A Sr.ª Deputada Isabel Castro deseja usar da palavra?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, penso que o sentido da proposta, na sua essência, está explicado.
De facto, é nosso entendimento que, hoje, a família não se restringe a uma única expressão. É uma forma de organização da sociedade que tem múltiplas expressões, sendo que qualquer que ela seja, em nossa opinião, deve ser devidamente protegida e salvaguardada.
Esta formulação, julgo, acolhe aquilo que foi o resultado da discussão, designadamente de quem a fez no sentido construtivo e chamou a atenção para aspectos que não estavam devidamente clarificados, do ponto de vista de que a união de facto, tendo todo o interesse em ter idêntica protecção em relação à família constituída tradicionalmente, devia ser sublinhada nas duas vertentes dos deveres e direitos das partes envolvidas.
Julgo que esta questão que hoje estamos a discutir e, portanto, o tempo que medeia entre a primeira e a segunda discussão sobre esta matéria é, aliás, um tempo enriquecido por debates, designadamente o havido nas Cortes Espanholas sobre esta matéria, reflectindo a necessidade de protecção jurídica às famílias constituídas em união de facto.
A densificação e a clarificação no texto constitucional, permitindo que aquilo que são alguns afloramentos da lei ordinária em termos de resposta à protecção que a união de facto carece mas que, manifestamente, não respondem às múltiplas vertentes do problema, do ponto de vista do texto constitucional penso que o enriquecia, donde não só mantemos a proposta como nela acolhemos, na sua diferente formulação, aquilo que nos parece que de positivo alguns Deputados trouxeram para o debate, designadamente o Sr. Deputado Cláudio Monteiro, que levantou algumas dúvidas relativamente à formulação que nós tínhamos inicialmente previsto e que julgo estão, desta forma, melhor clarificadas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, só para dizer que a proposta não tem em conta algumas das soluções e confunde o plano da lei ordinária com o plano constitucional. Não é por acaso que é mencionada a discussão das Cortes Espanholas a qual, obviamente, teve lugar em torno da lei ordinária e não em torno do ordenamento constitucional.
A nossa posição nessa matéria é simples e tive ocasião de a enunciar: nem guerra ao casamento, nem guerra à união de facto. O status quo constitucional não impede tratamentos distintos das situações de união de facto e não impede níveis distintos consoante as perspectivas dos governos, dos parlamentos e dos partidos políticos, sobre o nível de protecção a atribuir às situações que, de resto, podem ser muito distintas de uniões de facto.
Essa diversidade, esse pluralismo de soluções, essa paleta de mais ou menos intensidade na protecção resulta prejudicada no actual quadro constitucional e, tudo indica, nesta revisão constitucional.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Compreendo as razões da proposta, mas preferiria, no entanto, que a proposta tivesse uma outra redacção, até porque a lei assegura à união de facto protecção adequada e porque, penso, os objectivos desta proposta acabam por não ser atingidos.
Assim, gostaria que ficasse claro que se esta proposta não passasse, a Constituição, tal como está, já consagra as uniões de facto como família no n.º 1 do artigo 36.ª. E é por isso que, penso, é empobrecedor equiparar a união de facto ao casamento porque pareceria, assim, que, no n.º 1, o constituinte deu supremacia, em matéria de família e de direitos decorrentes do agregado familiar, à união baseada no casamento e parece-me que não é essa a leitura que se deve tirar do n.º 1.
Por isso, estamos abertos a uma consagração que reforce o sentido do n.º 1, mas não no sentido de uma equiparação ao casamento porque acho que, de facto, ainda não se avançou em termos de legislação ordinária quanto baste em matéria de uniões de facto, nem mesmo no sentido defendido pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, que chamou à colação um debate que, penso, foi muito importante nas Cortes Espanholas sobre aquilo a que eles chamaram as parejas de echo e que, penso, em termos de legislação ordinária, devemos, de facto, desenvolver, em todos os sentidos e não só união de facto do mesmo sexo.
Por isso, face a esta proposta e porque acho que é empobrecedor dar uma equiparação ao casamento quando, acho, o casamento está a perder na sociedade portuguesa - e é só vermos a realidade sociológica - e funciona mais como uma forma de se receberem subsídios de casamento e coisas do género...

Aparte inaudível.

Mas, funciona! Conheço muita gente que só se casou para receber o subsídio e até para ter férias, desculpem lá!

O Sr. José Magalhães (PS): - Ou até por motivos mais mesquinhos, de resto!

Risos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não. E há outros direitos que, julgo, é necessário começar a estender, como sejam as questões da assistência à família, as questões dos subsídios das pensões de sobrevivência que já está resolvido mas mal sob o aspecto processual. Mas, por isso mesmo, embora concordássemos com uma redacção que embora reforçasse a ideia de que a lei ordinária devia repensar o assunto, nós vamos abster-nos nesta proposta.

O Sr. Presidente: - Se os Srs. Deputados estivessem de acordo, até porque estamos, neste momento, perante

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uma ligeira dificuldade, rapidamente suprível quanto às condições da votação, propunha que apreciássemos já também o número seguinte que é igualmente constante da proposta de Os Verdes, mas, agora, da sua proposta originária.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, a formulação técnica da sua proposta, independentemente do resultado da votação que ela possa vir a merecer para o n.º 4, não parece ter sido a mais feliz e tal foi registado na primeira leitura.
Suponho que, nessa ocasião, tinha ficado a disponibilidade de Os Verdes para reverem essa mesma formulação, mas não vejo nenhuma proposta de substituição.
Assim, recordo-lhe o que estava em causa.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Em relação aos pais biológicos ou não?

O Sr. Presidente: - Não, o que estava em causa é que o que se pretende, suponho eu, na vossa proposta é garantir os iguais direitos e deveres dos pais relativamente à manutenção e educação dos filhos e não apenas nos cônjuges. Mas, fica conglomerado aqui a questão da igualdade dos direitos e deveres quanto à capacidade civil e política que, neste aspecto, não se refere à circunstância de ser pai ou mãe, mas à circunstância de ser cônjuge e, portanto, ter um estatuto de igualdade dentro do casamento.
E se assim é, suponho que a formulação que terá resultado da primeira leitura era alguma coisa como isto: "Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e os pais iguais direitos e deveres quanto à manutenção e educação dos filhos".

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Tem razão, mas não reformulei o texto da proposta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas isso é o texto da Constituição, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Não é não, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - O n.º 3, que citou no início, é o texto da Constituição.

O Sr. Presidente: - Com certeza, mas não é depois quanto ao desiderato útil que o PEV visava alcançar com o seu n.º 4.
Sr.ª Deputada Isabel Castro, seria "Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto á capacidade civil e política e os pais iguais direitos e deveres quanto á manutenção e educação dos filhos" .

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exacto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já estamos em condições de votar?

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas essa versão corrigida, Sr. Presidente, se bem entendo...

O Sr. Presidente: - Esta versão corrigida, suponho, será admitida pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, na correcção material da sua proposta originária.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exacto.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Gostava de pensar um bocadinho nisso.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pelo que ouvi da parte final - e peço desculpa por não ter assistido a toda a discussão -, não concordo nada com o que foi dito.

O Sr. Presidente: - Não estou a perguntar se concorda ou não. Estávamos só a fazer uma precisão quanto à intenção originária do PEV.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, pedia que precisasse, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Portanto, o que está agora em causa quanto à formulação correctiva do n.º 4 da proposta originária do PEV, será uma proposta para o n.º 4, com a seguinte redacção: "Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e os pais iguais direitos e deveres quanto à manutenção e educação dos filhos".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Tudo no n.º 4?

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, é no n.º 3!

O Sr. Presidente: - Tendo em vista a sistemática, esta proposta seria para o n.º 3 da versão actual da Constituição, e, embora esteja na proposta do PEV com o n.º 4, seria para modificação do n.º 3, actual.
Srs. Deputados, alguém deseja pronunciar-se sobre este n.º 4, corrigido?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não é por teimosia, mas à falta de um texto escrito, pedia que lê-se devagar para eu poder tomar nota.

O Sr. Presidente: - Então, vou ler novamente: "Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e os pais iguais direitos e deveres quanto à manutenção e educação dos filhos".

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não seria possível pôr essa parte noutro sítio qualquer e deixar isto intocado?

O Sr. Presidente: - A proposta não é minha, Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, mas eu vou explicar. É que o sentido do n.º 3, tal como está foi de acabar na célula familiar com a estrutura hierárquica, em que o pai tinha mais direitos relativamente aos filhos do que a mãe. E, por isso, é que me parece que esse n.º 3 é lapidar e deve ficar.

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O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, sabe o que é que estamos todos a descobrir? É que parece haver na Constituição actual uma redundância já entre o n.º 3 e o n.º 5.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não há não.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, não há redundância.

O Sr. Presidente: - Há a manutenção e a educação dos filhos e os pais têm o direito e o dever.

O Sr. José Magalhães (PS): - São duas coisas diferentes: uma sublinha a igualdade e outra sublinha o dever.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exacto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente. São coisas completamente diferentes.

O Sr. Presidente: - É a questão da igualdade, sim, senhor!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E que não pode ser quebrada, do nosso ponto de vista.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Pois não, Sr. Presidente. Por isso, retiro a nossa proposta.

O Sr. Presidente: - Portanto, fica retirada a proposta do n.º 4.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exacto.

O Sr. Presidente: - Assim se averbará e acabarão todas as dúvidas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Portanto, da proposta originária fica só o n.º 3. É isso?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Exacto. Nos termos em que foi formulada.

O Sr. Presidente: - Exactamente. O n.º 3 da proposta de substituição do PEV, já foi debatido, mas não chegou a ser votado pelo que o vamos votar, agora.

Submetido a votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PEV e abstenções do PS e do PCP.

Era o seguinte:

A união de facto é equiparada ao casamento, assegurando a lei a sua protecção adequada e idênticos direitos e deveres.

O Sr. Presidente: - A proposta n.º 4, como acabamos de referir, foi retirada, pelo que passamos para uma proposta constante do projecto originário do Deputado João Corregedor da Fonseca, de alteração ao n.º 7, e a uma proposta de substituição também para alteração ao n.º 7, subscrita por Deputados do PS e do PSD.
As propostas são bastante claras quanto ao seu alcance.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, Sr. Presidente, quanto ao 36.º há uma proposta nova apresentada por Deputados do Partido Socialista e do PSD.

O Sr. Presidente: - Foi o que acabei de dizer, Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas, Sr. Presidente, essa proposta não tem de facto a ver com a postura adoptada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Não disse tal coisa, Sr. Deputado José Magalhães; só disse que ambas as propostas eram de interpretação clara.

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, Sr. Presidente, se me permite, nesta matéria, ser, se possível, sobreclaro, direi que a proposta do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca suscitava um problema que, aliás, foi abordado ao de leve na primeira leitura: criava uma espécie de obrigação, cuja densificação infraconstitucional suscitaria alguns problemas, sobre de que estímulo à adopção, ou seja, a articulação entre o estímulo e a adopção assim concebida e a apropriação natural, a maternidade e a paternidade biológica poderia causar melindrosos problemas.
Ora, todos nós sabemos que não é aí que reside o problema; o problema reside na lentidão exasperante da tramitação burocrática dos processos de adopção. Um sinal constitucional contra a lentidão, parece-nos, francamente, que resulta bem da primeira leitura e dos estudos que estão a ser feitos, no âmbito deste Parlamento, em torno do instituto da adopção.
Portanto, o sinal que é preciso dar, pareceu-nos, não é quanto ao instituto da adopção, cuja sede constitucional e regulamentação do artigo 36.º, n.º 7, é correcto, ou seja, o facto de a Constituição dizer - e diz desde o início - que a adopção é regulada e protegida, dando ao legislador ordinário a missão de estabelecer os níveis de protecção adequados, passado o legislador ordinário a gozar de flexibilidade considerável mas não é livre. Se for complementado com uma directriz que diga que a lei deve assegurar formas céleres para a tramitação dos processos - e aí talvez a redacção possa ser melhorada -, teremos reunido aí o melhor dos dois mundos.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado José Magalhães, pelo seu contributo para a hiperclareza na compreensão das duas propostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Acho a doutrina correcta e oportuna.
Na verdade, passa-se qualquer coisa no domínio do tratamento legislativo e administrativo da adopção que surpreende pelos empecilhos que tem criado ao desenvolvimento deste instituto, que, como sabem, foi retomado no nosso Direito pelo Código Civil de 1966 - aliás. durante

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os 100 anos que o antecederam, esse instituto praticamente desapareceu do nosso direito.
Portanto, quanto à doutrina nada tenho a opor; acho que é fundamental dizer-se que é preciso que a lei trate este processo de forma a assegurar a celeridade da sua conclusão.
Agora, quando à forma, o Sr. Deputado José Magalhães já aludiu e percebi que estava aberto a sugestões.

O Sr. José Magalhães (PS): - E aos respectivos processos e à alusão a celeridade.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não. Eu começaria, talvez, por substituir o "assegurar" por "estabelecer" , e o "que" por "a qual". Assim, a redacção, seria "(...) a qual deve estabelecer formas céleres para a sua tramitação".

O Sr. José Magalhães (PS): - Para a sua tramitação? De quê? Da adopção ou dos processos da adopção?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Da adopção - é o sujeito.
Seria assim: "A adopção é regulada e produzida nos termos da lei, a qual (lei) deve estabelecer formas céleres para a sua tramitação". Ou melhor, talvez que em vez de "sua tramitação" fosse melhor "a respectiva tramitação"; é que senão podia julgar-se que era a lei.

O Sr. José Magalhães (PS): - Certo. Parece-me bem.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, salvo qualquer observação estão ainda para votação as propostas do projecto originário do Deputado João Corregedor da Fonseca.
Porque alguns Srs. Deputados desejam saber a hora da sessão de amanhã, quarta-feira, devo informar que a mesma está marcada para as 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não pode ser à tarde!

O Sr. José Magalhães (PS): - Pode, pode. De manhã é que não pode.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não vou dirimir essa questão neste momento. Estamos em processo de votação.
Srs. Deputados, vamos concluir a votação, começando pela votação do n.º 7 da proposta do Deputado João Corregedor da Fonseca.

Submetida a votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, e abstenção do PCP.

Srs. Deputados, vamos votar a proposta de aditamento de um novo segmento do n.º 7 do artigo 36.º, apresentada por deputados do PS e do PSD, com a seguinte redacção "... a qual deve estabelecer formas céleres para a respectiva tramitação".

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Srs. Deputados, está agora em questão a nossa reunião de amanhã. A Comissão já tinha deliberado no sentido de a sessão das quartas-feiras, cujo princípio se mantém, ser ou da parte da manhã ou, quando não houvesse essa definição na semana anterior aos nossos trabalhos, manter-se, como regra, às 17 horas e 30 minutos.
Não havendo qualquer alteração da regra na semana anterior, suponho que se deve manter para amanhã, às 17 horas e 30 minutos, porque esse é o regime-regra do trabalho da Comissão, por ela própria tempestivamente estabelecida.
Srs. Deputados, assim sendo, darei por terminada...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Permite-me que peça um esclarecimento, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o regime-regra, se bem interpreto - e o Sr. Presidente corrigir-me-á - é decidir de semana-a-semana se à quarta-feira se reúne de manhã ou de tarde. Não é, no silêncio, ser da parte da tarde; o regime não é esse.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado Marques Guedes.
Acabei de esclarecer que o que tínhamos consensualmente admitido é que a opção pela manhã ou pela tarde, tendencialmente seria pela tarde, mas passaria a ser de manhã se, na semana anterior, já no conhecimento prévio dos trabalhos da semana seguinte se optasse por fazer esse bloco de sessão na parte da manhã.
Ocorre que, na semana passada - e era isso que tinha registado -, não houve qualquer decisão nesse sentido. E estou a dizê-lo até porque esta antecipação é necessária para efeitos de organização dos serviços de suporte à Comissão, particularmente os serviços de gravação.
É por isso que esta marcação das sessões das quartas-feiras, designadamente, importa ser estabelecida com a antecedência possível. Não é por capricho do presidente, como calculará…!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, agradeço essa precisão. Penitencio-me porque, como o Sr. Presidente sabe, na primeira reunião desta Comissão, em que foram discutidas matérias que têm a ver com o horário semanal do funcionamento da Comissão, não estive presente e, portanto, escapou-me essa nuance que o Sr. Presidente acabou de precisar. E por tal facto, não tomei a iniciativa, na passada sexta-feira, de comunicar ao Sr. Presidente e à Comissão que, do ponto de vista do PSD, a tarde desta semana, atendendo ao agendamento do Plenário, haverá alguma dificuldade da nossa parte em participar nesta reunião. Pelo menos, da minha parte, devo dizê-lo com toda a lealdade, é-me praticamente impossível estar presente, bem como a outros deputados.
Mas, de qualquer maneira, penitencio-me face a essa precisão que o Sr. Presidente agora faz e de que eu não estava pessoalmente a par. Peço, por isso, desculpa por não ter alertado antes.
Ainda de qualquer maneira, face à questão, pergunto ao Sr. Presidente se acha que ainda é temporâneo ou se já é

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totalmente extemporâneo e inadmissível sugerir que a reunião seja feita na parte final da manhã.

O Sr. Presidente: - O que é que o Sr. Deputado Marques Guedes entendia por parte final da manhã?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, eventualmente das 11 horas e 30 minutos às 13 horas ou à 13 horas e 15 minutos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Então, mas nós temos a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Deputado Marques Guedes, é impossível dar vazão a iniciativas importantes da oposição, designadamente e também a velhíssima e vetusta proposta de lei do Tribunal de Contas sobre a qual temos vindo a desenvolver discussões - ainda na semana passada ouvimos o Presidente do Tribunal de Contas, etc., etc. -, sem, pelo menos, alguns minutos - no caso da lei do Tribunal de Contas bastantes minutos - de consideração concreta de normas que são de complexidade bastante óbvia. E esse trabalho foi agendado para amanhã, o que me parece razoável. E há outras iniciativas agendadas para discussão, amanhã, na primeira Comissão. Isso estava perfeitamente estabelecido entre nós.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É por isso que eu sou a favor da clonagem!

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacta. Felizmente não está cá o jornalista Daniel Reis e, portanto, nessa matéria...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, eu punha ao contrário!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr.ª Deputada, ainda outro dia o Sr. Deputado Guilherme Silva disse que era suspeita e eu começo a concordar com ele!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamo-nos circunscrever ao tema.
Sr. Deputado Marques Guedes, como reparou, a sua proposta tem algumas dificuldades de acolhimento geral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa mas, com toda a franqueza e com toda a lealdade, o argumento que o Sr. Deputado José Magalhães acabou de esgrimir é exactamente o mesmo que eu esgrimi. Ou seja: reconheço, e não o ponho minimamente em causa, nem o fiz na minha intervenção inicial, que estão agendados, na especialidade, para a reunião de amanhã na 1.ª Comissão, projectos que são muito caros à maioria governamental. Não estou a dizer o contrário.
Agora, o que referi aqui - e o argumento é rigorosamente o mesmo - é que, quer seja da parte do Partido Socialista, quer seja da parte do Partido Social-Democrata, quer seja da parte do Partido Comunista, que também tem um projecto no Plenário de amanhã como, ainda hoje no final da reunião, o Sr. Deputado Luís Sá, que não está agora presente mas também não cometo qualquer inconfidência, com quem falei e me disse que ambos, amanhã, somos autores de projectos que vão estar em Plenário.
Portanto, o argumento do Sr. Deputado José Magalhães é válido para a bancada do Partido Socialista, o argumento que aqui esgrimi é válido para a minha bancada, como qualquer outra bancada pode esgrimir um argumento idêntico.
Todos sabíamos, quando se aventou a marcação de reuniões para as quartas-feiras - e por isso é que elas ficaram volantes entre a manhã e a tarde - que, de acordo com os agendamentos da 1.ª Comissão e do Plenário, podia haver empecilhos políticos para esta ou para aquela bancada.
Portanto, não se venha aqui erigir as prioridades do Partido Socialista como prioridades que se impõem à Comissão, sem sequer se ouvir as prioridades, também políticas e com igual valor, que são levantadas pelos outros partidos.
Portanto, o argumento do Sr. Deputado José Magalhães é rigorosamente idêntico ao argumento que aqui despendi. Peço ao Sr. Presidente que, pelo menos, reconheça isso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Guedes, creio que acreditará que o presidente procura dirigir os trabalhos sempre com uma preocupação de equidade. E, nesse sentido, a única dificuldade que aqui temos é que a observação do Sr. Deputado Marques Guedes se reportava a alterar alguma coisa que estabelecemos como regime-regra. A alegação do Sr. Deputado José Magalhães ia no sentido de manter o regime-regra.
Não vejo como possamos sair disto, uma vez que há uma conflitualidade de interesses entre dois grupos parlamentares que têm idêntica relevância, aliás como qualquer outro, nos trabalhos da CERC.
O que pergunto ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes é se houvesse amanhã um atraso relativo no início da sessão não às 17 horas e 30 minutos mas às 18 horas, também com um prolongamento de mais 30 minutos no final dos nossos trabalhos, isso cooperaria para resolver a sua dificuldade no Plenário.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em resposta à sua sugestão que, enfim, tenta conciliar as coisas, eu não faço ideia alguma, como nem Sr. Presidente nem nenhum de nós faz, a que horas é que a questão, que estou a suscitar relativamente ao agendamento do Plenário de amanhã, vai a terminar. Não posso dizer, sinceramente, se é às 17 horas e 30 minutos ou se é às 18 horas... São os diplomas que têm que ver com os quadros dos municípios e por aí fora. Aliás, há um projecto do PCP, um projecto do PSD, o dos secretários-gerais, o dos directores de serviço municipais, etc..
De qualquer maneira, se o Sr. Presidente coloca, como colocou na sua introdução, a questão de dizer que há um problema de regra, disciplinadamente, sugeria ao Sr. Presidente

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que se entender, no seu critério, que para a reunião de amanhã não haverá nada a fazer porque era um princípio que vinha detrás e que eu, por ignorância pessoal, de que já me penitenciei, não estava alertado, obviamente que acatarei a decisão do Sr. Presidente. Isso está fora de causa.
Agora, desde já, se for esse o seu entendimento e o seu critério, pediria que fosse, a partir de amanhã, imediatamente reaberto esse princípio, porque é evidente que eu não me posso conformar que o princípio e o critério assentes nesta Comissão seja o da prioridade dos agendamentos da 1.ª Comissão, face aos agendamentos do Plenário.
De facto, não posso concordar com esse princípio e se foi esse o princípio-regra que foi aqui estabelecido, para já, acato-o porque não é de véspera que se altera - e o Sr. Presidente tem todo o meu apoio para a decisão que entender tomar sobre isto - mas, reabro imediatamente a partir da semana que vem, pelo menos, a revisão por parte desta Comissão do critério, porque não posso aceitar que o critério seja o de privilegiar a 1.ª Comissão relativamente aos trabalhos do Plenário.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permitam-me só que faça uma pequena lembrança relativamente à maneira como decorreram os trabalhos a semana passada porque tem alguma coisa a ver com o que estamos a debater.
Em regra, nós decidiremos do regime de trabalhos das quartas-feiras na última sessão da semana anterior que acontecerá às sextas. Acontece que, por acaso, na semana anterior, não houve sessão à sexta-feira pela razão que os Srs. Deputados do PSD bem conhecem. E, por isso, não houve, aliás, possibilidade de alterar, de facto, o tal regime-regra da sessão das quartas-feiras à tarde. A partir desta dificuldade, que é uma dificuldade prática e de difícil compatibilização, não deixo de estar de acordo com a sugestão do Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Vamos fazer a sessão de amanhã que, em vez das 17 horas e 30 minutos, ficará aprazada para as 18 horas e vamos procurar, sempre por antecipação, no limite das sextas-feiras de cada semana, ou pelo menos na última sessão de cada semana, ver o que se pode prever para a semana seguinte relativamente ao regime de trabalho das quartas-feiras, que, nesta semana, volta a ser à quinta-feira dado o feriado da sexta, 25 de Abril.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, concordo obviamente como já tinha pré-anunciado, mas só acrescentava uma coisa ao que o Sr. Presidente acabou de dizer: isso implica o decair da regra que, na falta de acordo, prevalecerá a reunião da tarde, porque isso implica, indirectamente, estarmos a reconhecer que o agendamento da 1.ª Comissão é mais importante e prevalece, em última instância, sobre o agendamento do Plenário.
Considero que, se o Sr. Presidente deseja manter essa regra, se mantém o meu desejo abrir o debate sobre ela para, depois, ser votada com o carácter de emenda.

O Sr. Presidente: - Compreendo, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, mas a dificuldade é a seguinte: por mim, posso reabrir a regra e até admito que não haja regra alguma e se decida caso-a-caso, mas, na circunstância de poder haver posições inconciliáveis entre os grupos parlamentares, compreenderá que, em última instância, arbitrará o presidente para vir a decidir as reuniões de quarta-feira de acordo com aquilo que, ainda que de forma falível, lhe vier a parecer o melhor critério, isto, naturalmente, sem abdicar de procurar gerar a máxima conciliação possível de posições na Comissão.
Srs. Deputados, chegamos ao final da reunião de hoje, muito boa tarde a todos.
Está encerrada a reunião.

Eram 19 horas e 15 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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