Página 2489
Sexta-feira, 9 de Maio de 1997 II Série - RC - Número 87
VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
IV REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
Reunião de 8 de Maio de 1997
S U M Á R I O
O Sr. Presidente (Jorge Lacão) deu início à reunião às 21 horas e 50 minutos.
Concluiu-se a discussão e votação das propostas de alteração ao artigo 59.º e foram apreciadas e votadas as relativas aos artigos 60.º, 61.º, 62.º e 63.º
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Odete Santos (PCP), Calvão da Silva, Barbosa de Melo, Francisco José Martins e Luís Marques Guedes (PSD), Luís Sá (PCP), Cláudio Monteiro (PS), Guilherme Silva (PSD), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Moreira da Silva (PSD) e Rodeia Machado (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 0 horas e 35 minutos do dia seguinte.
Página 2490
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 21 horas e 50 minutos.
Sr. Deputado José Magalhães, importa-se de me ajudar a clarificar este ponto sobre o qual existem algumas dúvidas: por Deputados do PS, foi apresentada uma proposta de alteração à alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º, que visava acolher uma sugestão designadamente da Associação das Mulheres Juristas. Esta proposta será, em princípio, para submeter hoje a votação, Sr. Deputado José Magalhães, uma vez que tinha ficado adiada da última reunião?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, ou há consenso para a viabilizar ou não há!
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, teve ocasião de reflectir sobre o alcance da norma?
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Consideramos que a expressão "valor" piora a redacção actual, porque é uma expressão, até face à realidade actual das metas da competitividade e da produtividade, causadora de maiores discriminações. Por isso, não estamos de acordo com a proposta apresentada.
O Sr. Presidente: - Pergunto aos Srs. Deputados do PSD, particularmente ao Sr. Deputado Calvão da Silva, que terá tido atenção a esta matéria na última reunião, se aquela possibilidade de alterar a expressão constitucional constante do artigo 59.º, n.º 1, alínea a), que afirma "(...) observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual (...)", foi por vós reflectida com vista à eventual substituição dessa referência pela seguinte expressão proposta pelo PS: "observando-se o princípio de que para trabalho de valor igual salário igual".
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, temos alguma reflexão, mas o coordenador, com certeza, exprimirá a posição do PSD. Se não se importam, ele deve estar quase a chegar…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me importava muito, se, entretanto, pudéssemos dar andamento aos nossos trabalhos. Mas não estamos em condições de saber qual a orientação do PSD? Porque se a tivéssemos, assim o PS manteria a proposta ou não.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Aliás, de acordo com o que tive ocasião de dizer, a actual Constituição já traduz essa materialidade, com a vantagem de adiantar três critérios na concretização da ideia de valor igual. Portanto, não se vê melhoria no texto constitucional, senão agravando a discricionariedade deixada ao legislador ordinário ou até ao julgador.
Nessa medida, penso que a orientação do PSD será no sentido de não ver vantagem na substituição do texto, mas, mesmo assim, ressalvo a posição do nosso coordenador.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, acabo de ser informado que o PS, em todo o caso, deseja que a proposta seja submetida a votação, portanto, é isso que vamos fazer.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD e do PCP e a abstenção do CDS-PP, não tendo, no entanto, obtido a maioria de dois terços.
Era a seguinte:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho de valor igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna.
O Sr. José Magalhães (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PS): - É para uma declaração de voto.
Pela nossa parte visava-se prevenir, como ficou registado na acta, interpretações mecanicistas e discriminatórias, designadamente lesando interesses legítimos de mulheres.
Só numa interpretação perversa é que a nossa proposta podia ser vista como diminuidora, pelo contrário era acauteladora. Temos a nosso favor - creio - a reflexão em curso em instituições nacionais e no âmbito da União Europeia e fazemos votos para que, algum dia, seja possível que uma clarificação deste tipo venha a ser introduzida - repito - não para diminuir conteúdos constitucionais mas para clarificá-los, enriquecê-los e densificá-los.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, era também para fazer uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, os Deputados Constituintes portugueses, desde o princípio, perceberam que esta fórmula "para trabalho igual salário igual" tinha de ser concretizada através de parâmetros definidos no Texto Constitucional e assim, muito antes dos textos europeus, se disse que o trabalho se aprecia segundo a quantidade, a natureza e a qualidade.
A ideia de que, com isto, se ia diminuir as discriminações reais que existem na nossa sociedade, aliás, como em todas elas, entre homens e mulheres e entre outros grupos sociais não seria modificada com esse acrescento do PS e prejudicaria aquilo que, desde o princípio, desde 1976, está no texto da nossa Constituição.
O trabalho distingue-se, de acordo com o Texto Constitucional, segundo a quantidade, a natureza e a qualidade. Esse é que é o seu valor.
Página 2491
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra à Sr.ª Deputada Odete Santos, o que farei já de seguida, tenho de fazer uma correcção ao que há pouco referi. A proposta votada anteriormente não foi rejeitada, como referi, foi, sim, aprovada, não tendo, no entanto, obtido a maioria qualificada de dois terços, dado que foi votada favoravelmente pelo PS, tendo sido rejeitada pelo PSD e pelo PCP e tendo tido a abstenção do CDS-PP.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, aquilo que os proponentes dizem querer obter já se encontra na Constituição, com a expressão "para trabalho igual salário igual".
Por outro lado, continuo a afirmar que a expressão "trabalho de valor igual" é equívoca e que pode não ter o significado que os proponentes lhe pretendem atribuir.
A questão da aplicação do princípio "trabalho igual salário igual" não é uma questão da Constituição; é, sim, uma questão da vida real, da prática corrente e da infracção ao que vem na Constituição. Achamos que esta alínea da Constituição não deve ser mexida.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há uma outra questão que está em aberto neste artigo, se bem estão recordados, que resulta de uma proposta constante do projecto n.º 9/VII do Sr. Deputado Arménio Santos e outros, relativamente à protecção das condições de trabalho prestado pelos trabalhadores-estudantes.
Esta questão ficou também de ser ponderada nesta reunião, por isso pergunto aos Srs. Deputados se têm alguma perspectiva nova sobre o problema.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Martins.
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Sr. Presidente, eu estava na expectativa de ver se o PSD e o PS tomavam a iniciativa de desenvolver aquilo que ficou realmente pendente, por isso a minha intervenção tem tão-somente a ver com o seguinte: eu próprio também reflecti à luz daquilo de que ontem aqui falámos, concretamente o enquadramento desta proposta no artigo 59.º ou, eventualmente, analisá-la na óptica do artigo 74.º. Quero, contudo, dizer que entendo que esta proposta, tal como está redigida, só tem enquadramento neste artigo, porque visa essencialmente consagrar direitos para os trabalhadores que assumam o estatuto de trabalhadores-estudantes.
Por conseguinte, trata-se essencialmente, como disse, de uma questão que se reporta a uma relação laboral, a trabalhadores no âmbito da relação laboral e, por isso, só aqui tem enquadramento.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, quer dar uma sugestão?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, exploratoriamente, uma vez que considerámos esta questão vista do ângulo do ensino e vista do ângulo do mundo laboral e os Srs. Deputados inclinavam-se, tanto quanto me apercebi ontem, para que a questão fosse equacionada e "fotografada", vista do mundo laboral, então, provavelmente, a solução operacional seria incluir uma alínea nova com a inserção que, depois, se veria. Enfim, nem propugnaria que fosse em último lugar por uma razão de dissidência histórica, que não é vergonha, que, no n.º 2, estabelecesse, segundo a técnica do mesmo normativo, a "protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes e garantias da sua adequada formação".
A expressão "garantias da sua adequada formação" já abrangeria, obviamente, a proposta, a desenvolver mais um bocado, do Sr. Deputado Francisco Martins, pois está hoje explicitada como formação profissional, cultural e intelectual, mas é óbvio que é essa e as outras todas.
Que é que vos parece, Srs. Deputados, uma solução deste tipo?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, quer pronunciar-se?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, pela parte do PSD, confesso que não tivemos oportunidade de debater internamente o assunto, portanto, se o Sr. Presidente puser a proposta a votação, o PSD abster-se-á, porque, embora sejamos sensíveis à questão de fundo, temos dúvidas quanto à solução final. Portanto, se houver alguma proposta concreta, abster-nos-emos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, formula a proposta?
Aproveito para repescar, porque ainda não foram votadas - foi um lapso da minha parte e dele peço desculpa -, a propósito da alínea a) do n.º 1, uma vez que já votámos a proposta de substituição apresentada pelo Sr. Deputado José Magalhães, as propostas originárias constantes dos projectos n.os 1/VII, do CDS-PP, e também do projecto do Sr. Deputado Arménio Santos, uma vez que também tinham ficado pendentes na reunião de ontem.
Vamos, portanto, votar a alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da proposta originária do CDS-PP, que diz: "à retribuição do trabalho prestado, segundo a sua quantidade, natureza e qualidade".
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do PCP e votos a favor do CDS-PP.
Era a seguinte:
a) À retribuição do trabalho prestado, segundo a sua quantidade, natureza e qualidade.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, já tinha sido votada!
O Sr. Presidente: - Não, Sr.ª Deputada! Ainda não tinha sido votada!
Vamos, agora, passar à votação da alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo do projecto originário apresentado pelo Sr. Deputado Arménio Santos. Trata-se de uma ligeira adaptação semântica, por isso propunha que a retirassem.
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Retiramo-la, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos submeter à votação a proposta apresentada pelo Sr. Deputado José
Página 2492
Magalhães, na sequência da proposta de aditamento de um novo n.º 3 do projecto originário do Sr. Deputado Arménio Santos.
Pergunto ao Sr. Deputado Francisco Martins se estaria de acordo com esta redacção de uma nova alínea f) para o n.º 2 do mesmo artigo, que diz o seguinte: "A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes e as garantias da sua adequada formação".
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Estou de acordo.
O Sr. Presidente: - Vamos, então, votar esta proposta.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP e do Deputado do PSD Francisco Martins, e abstenções do PSD e do CDS-PP, não tendo obtido a maioria de dois terços.
Era a seguinte:
f) A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes e a garantia da sua adequada formação.
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, antes de dar-lhe a palavra, pergunto-lhe se, nesta circunstância, retira o n.º 3.
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra para uma declaração de voto.
O Sr. Francisco Martins (PSD): - Sr. Presidente, quero manifestar a minha satisfação por ver consagrada uma nova proposta e ela ter sido aprovada, embora por maioria simples. O importante era realmente fazer vingar a ideia de que os trabalhadores-estudantes mereciam também protecção enquanto trabalhadores e isso foi conseguido.
Por outro lado, fico ciente de que a reflexão permitirá também ao PSD o necessário para que esta proposta venha de facto a vingar a final.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 60.º. Informo os Srs. Deputados que deverá entrar em breve na Mesa uma proposta de substituição relativamente à matéria deste artigo.
Mas, enquanto a referida proposta não entra na Mesa, informo os Srs. Deputados que para o n.º 1 não existem quaisquer propostas de alteração e que para o n.º 2 há propostas nos projectos originários do PCP, de Os Verdes, do PS, que, certamente vai ser substituída, e ainda uma outra do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Enquanto não chega a proposta de substituição para o n.º 3, pergunto se relativamente ao n.º 2, para o qual não há, que se saiba, propostas novas, poderíamos passar à votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de recordar que, na primeira leitura, houve uma abertura de princípio designadamente da parte do PS e do PSD em relação a esta proposta, independentemente de terem ficado de apresentar, eventualmente, propostas alternativas. Nesse sentido, gostaria de ouvir os Srs. Deputados sobre a sua posição actual nesta matéria.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, alguém deseja pronunciar-se?
Tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - É sobre o n.º 3, não é?
O Sr. Presidente: - O artigo 63.º está em apreciação! Os Srs. Deputados só têm como proposta nova a matéria para o n.º 3, mas continuo a aguardar que ela dê entrada na Mesa.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, sobre o n.º 3 recordo-me de que usei da palavra na primeira leitura e propus uma redacção diferente. Isso não está nas actas? Sobre o n.º 3 demos a nossa adesão, mas com uma nova redacção e usando linguagem própria técnico-jurídica de legitimidade processual, e nada está aqui. Aqui continua com a redacção primitiva, que está um bocado deficiente. Na altura, isso deve ter ficado em acta. Quem é que tem isso?
Pausa.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ou aparece a proposta ou passo adiante!
Pausa.
Srs. Deputados, a proposta que deu entrada na Mesa vai circular pelas bancadas, mas permitia-me lê-la desde já, para que possa ser do conhecimento geral. É um aditamento ao n.º 3 actual com o seguinte teor: "(...) sendo-lhes (...)" - aos consumidores evidentemente - "(...) reconhecida legitimidade processual para defesa dos seus associados ou de interesses colectivos difusos".
Uma voz não identificada: - É aos consumidores?
O Sr. Presidente: - É às associações de consumidores!
Eu vou ler a norma por inteiro, que é preferível. "As associações de consumidores e as cooperativas de consumo têm direito, nos termos da lei, ao apoio do Estado e a ser ouvidas sobre as questões que digam respeito à defesa dos consumidores, sendo-lhes reconhecida legitimidade processual para defesa dos seus associados ou de interesses colectivos ou difusos".
Esta proposta está em apreciação.
Srs. Deputados, enquanto a proposta não circula, proponho que passemos já à votação da matéria relativa às alterações propostas para o n.º 2. Há uma proposta nesse sentido apresentada pelo projecto originário do PCP. Vamos votá-la.
Página 2493
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, coloquei há pouco uma questão à qual os grupos parlamentares do PS e do PSD não responderam. Gostaria de ouvi-los previamente.
O Sr. José Magalhães (PS): - E o CDS-PP também não!
O Sr. Luís Sá (PCP): - O PCP pronunciou-se sobre a matéria na primeira leitura e o PS e o PSD pronunciaram-se no sentido de abertura à proposta do PCP.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, como reparou, passaram largos minutos e eu não tive qualquer manifestação de acolhimento de outras soluções!
O Sr. Luís Sá (PCP): - É porque estavam a negociar, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Mas sobre matéria que acabei de referir qual foi!
O Sr. José Magalhães (PS): - Escabrosamente, em plena Comissão!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, alguém deseja responder ao apelo do Sr. Deputado Luís Sá?
Como vê, não há eco quanto ao seu apelo, o que significa que não há, portanto, admissão de outras soluções que não aquela que acabei de referir.
Assim sendo, vamos passar efectivamente à votação da proposta de alteração do n.º 2 constante do projecto originário do PCP.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e a abstenção do CDS-PP.
Era a seguinte:
2 - A publicidade é disciplinada por lei, sendo proibidas todas as formas de publicidade enganosa, oculta ou dissimulada, indirecta ou dolosa.
Srs. Deputados, passamos à votação também de uma proposta de alteração ao n.º 2 constante do projecto de Os Verdes.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PCP e do CDS-PP e a abstenção do PS.
Era a seguinte:
2 - A publicidade é disciplinada por lei, sendo proibidas todas as formas de publicidade oculta, indirecta ou dolosa, bem como as que utilizem abusivamente a imagem da criança e da mulher ou veiculem quaisquer formas de discriminação sexual.
Srs. Deputados, a proposta de alteração do n.º 3 do mesmo artigo do projecto original do PS é substituída por aquela que agora aparece na segunda leitura, ou seja, pela nova proposta que há pouco li e que já foi distribuída. É, portanto, esta proposta de substituição apresentada pelo PS e pelo PSD que vamos passar a votar.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
É a seguinte:
3 - As associações de consumidores e as cooperativas de consumo têm direito, nos termos da lei, ao apoio do Estado e a ser ouvidas sobre as questões que digam respeito à defesa dos consumidores, sendo-lhes reconhecida legitimidade processual para defesa dos seus associados ou de interesses colectivos ou difusos.
Srs. Deputados, esta proposta representa uma inovação constitucional assinalável.
Srs. Deputados, para o n.º 3, há ainda uma proposta de alteração constante do projecto originário do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que vamos votar seguidamente.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e a abstenção do CDS-PP.
Era a seguinte:
3 - As associações de consumidores e as cooperativas de consumo têm o direito, nos termos da lei, ao apoio do Estado e a ser ouvidas sobre as questões que digam respeito à defesa dos consumidores e, sempre que estiverem em causa direitos dos consumidores, a defendê-los em todas as instâncias.
Srs. Deputados, há uma proposta de um novo artigo 60.º-A para a criação do Provedor do Consumidor, constante do projecto original do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. Propunha que votássemos na globalidade todo o artigo.
Como ninguém se opõe, vamos votar a proposta de artigo novo.
Submetida à votação, foi rejeitada por unanimidade.
Era a seguinte:
Artigo 60.º-A
Provedor do Consumidor
1 - Os consumidores, para defesa dos seus direitos, podem apresentar queixas ao Provedor do Consumidor, que as apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos e entidades competentes as recomendações necessárias.
2 - A actividade do Provedor do Consumidor é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis.
3 - O Provedor do Consumidor é um órgão independente, sendo o seu titular designado pela Assembleia da República.
Página 2494
4 - Os órgãos e entidades a quem forem dirigidas recomendações devem informar, em tempo útil, o Provedor do Consumidor das medidas tomadas no seguimento daquelas.
5 - Os cidadãos e as entidades para o efeito solicitadas têm o dever de cooperar com o Provedor do Consumidor.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão do artigo 61.º sobre "Iniciativa privada, cooperativa e autogestionária".
A Mesa agradecia que se houvesse quaisquer propostas de modificação deste artigo as mesmas fossem apresentadas.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, para encurtar razões e para adiantar trabalho, gostaria de dizer que esta proposta resulta da nossa discussão na primeira leitura, por isso, com total à-vontade, gostaria de dizer que foi atingido, de facto, como foi anunciado publicamente, consenso para aperfeiçoar o quadro aplicável ao cooperativismo, e esse aperfeiçoamento poderia traduzir-se no seguinte: admitir a necessidade de flexibilizar o n.º 3 actual para prever expressamente que, além de poderem agrupar-se em uniões, federações e confederações, as cooperativas podem dispor de outras formas de estruturação, sem que isso constitua atentado ou violação do quadro que hoje está tipicamente enunciado. Isto tem sobretudo em vista a existência daquilo a que se vem chamando entre nós regicooperativas.
Aprovámos recentemente um novo Código Cooperativo ou, melhor, uma revisão do Código Cooperativo, que, depois, originou a sua republicação integral, e é preciso acautelarmos, na nossa óptica, que a lei que regula regicooperativas possa estabelecer especificidades contrárias aos princípios cooperativos, aplicáveis às uniões e outras estruturas e às cooperativas de base, por assim dizer, desde que isso resulte necessariamente da natureza pública de uma parte dos seus membros, mas sem que essas estruturas deixem de pertencer ao sector cooperativo e social.
Essa benfeitoria pode, assim, agilizar o sistema e ter em conta a existência destas novas realidades e será, sem dúvida alguma, na nossa óptica, uma benfeitoria que aperfeiçoará o quadro aplicável a esse importante sector social.
A proposta que a Mesa vai receber exprime, sob forma jurídica, isto mesmo, dizendo, no n.º 3, que "as cooperativas desenvolvem livremente as suas actividades no quadro da lei e podem agrupar-se em uniões, federações e confederações e em outras formas de organização legalmente previstas", no n.º 4, que "a lei estabelece as especificidades organizativas das cooperativas com participação pública" e passando o actual n.º 4 a n.º 5.
Não se adoptará a expressão "regicooperativa" em sede constitucional, mas é, evidentemente, a estas que nos referimos dentro das balizas que acabei de anunciar sinteticamente.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, a explicação é certamente meritória, mas falta-nos, por enquanto, o apoio da proposta.
Pausa.
Srs. Deputados, há também propostas de alteração a outros aspectos desta norma, desde logo, à sua epígrafe. Por exemplo, o PSD, o CDS-PP e o Sr. Deputado Cláudio Monteiro propõem a supressão da expressão "e autogestionária".
Portanto, vamos votar em conjunto, se estiverem de acordo, estas propostas de modificação da epígrafe, constante dos projectos originários do CDS-PP, do PSD e do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, que ficaria a ser "Iniciativa privada e cooperativa".
Submetidas à votação, foram rejeitadas, com votos contra do PS e do PCP, e votos a favor do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS Cláudio Monteiro.
Eram as seguintes:
Artigo 61.º
Iniciativa privada e cooperativa
Srs. Deputados, passamos agora à votação da proposta de alteração do n.º 1 do mesmo artigo constante do projecto originário do CDS-PP.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do PSD.
Era a seguinte:
1 - A iniciativa económica privada exerce-se livremente no respeito pela Constituição e pela lei.
Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de alteração do n.º 1 do mesmo artigo constante do projecto originário do PSD.
Os Srs. Deputados do PSD mantêm esta proposta para votação?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mantemos, sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Vamos, então, votá-la.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do PSD e a abstenção do CDS-PP.
Era a seguinte:
1 - A iniciativa económica exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei.
Srs. Deputados, vamos agora votar o n.º 2 do mesmo artigo, para o qual há uma proposta de alteração originária do CDS-PP.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do PSD.
Página 2495
Era a seguinte:
2 - A todos é reconhecido o direito à livre constituição de cooperativas, desde que observados os princípios cooperativos e a lei.
Srs. Deputados, estamos agora no domínio de uma proposta que já vos foi distribuída e que é comum ao PS e ao PSD destinada à modificação do n.º 3 actual e ao aditamento de um novo n.º 4, passando, se vier a ser aprovada, o actual n.º 4 a n.º 5.
Srs. Deputados, vamos votar agora apenas o n.º 3 da proposta comum de substituição.
Submetido à votação, foi aprovado por maioria de dois terços, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e a abstenção do PCP.
É o seguinte:
3 - As cooperativas desenvolvem livremente as suas actividades no quadro da lei e podem agrupar-se em uniões, federações e confederações e em outras formas de organização legalmente previstas.
Srs. Deputados, vamos agora votar o aditamento de um novo n.º 4, proposto pelo PS e pelo PSD, ou melhor dito, um novo número que, se for aprovado, ficará com o n.º 4.
Submetido à votação, foi aprovado por maioria de dois terços, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do CDS-PP e do PCP.
É o seguinte:
4 - A lei estabelece as especificidades organizativas das cooperativas com participação pública.
Srs. Deputados, há uma proposta do CDS-PP para a eliminação do actual n.º 4.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, a nossa proposta também propõe a eliminação do actual n.º 4.
O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado.
Vamos, então, votar duas propostas de teor semelhante, uma do CDS-PP e outra do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, com vista à eliminação do actual n.º 4 do artigo 61.º
Submetidas à votação, foram rejeitadas, com votos contra do PS e do PCP e votos a favor do PSD, do CDS-PP e do Deputado do PS Cláudio Monteiro.
Srs. Deputados, decorre das votações feitas que, neste artigo 61.º, o actual n.º 4 passará a n.º 5.
Passamos agora ao artigo 62.º, para o qual havia uma proposta de alteração sistemática constante do projecto do PSD, que já foi votada oportunamente, e subsiste uma proposta de alteração do projecto originário do CDS-PP, com a alteração do n.º 1 e o aditamento de um novo n.º 3.
Pergunto aos Srs. Deputados se vêem alguma objecção em que esta proposta seja votada em bloco.
Os autores da proposta não têm objecções em que se vote em bloco. Alguém tem?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - O n.º 1 também?
O Sr. Presidente: - Exacto! Se os Srs. Deputados pedirem a votação em separado, ela far-se-á.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Peço, então, que ela seja feita em separado.
O Sr. Presidente: - Então, vamos votar, em primeiro lugar, a proposta do CDS-PP para o n.º 1 do artigo 62.º
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do PCP e votos a favor do CDS-PP.
Era a seguinte:
1 - A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida e por morte, nos termos da lei.
Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta do CDS-PP para um novo n.º 3 do mesmo artigo.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do PCP, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do Deputado do PS Cláudio Monteiro.
Era a seguinte:
3 - Qualquer redimensionamento ou o emparcelamento das unidades de exploração agrícola far-se-á sempre, nos termos da lei, sem prejuízo do direito de propriedade privada e do direito de indemnização se a esta houver lugar.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, o PSD votou contra esta alteração à Constituição não por estar contra o conteúdo da mesma. É evidente que em todas as operações que tenham a ver com alterações à propriedade privada, se houver lugar a indemnização, o direito à indemnização é um direito à justa indemnização, já constitucionalmente previsto, e é indiscutível para o PSD.
Portanto, o voto contra não tem a ver com qualquer dúvida relativa ao conteúdo desta proposta do CDS-PP mas, sim, quanto à curialidade da alteração, neste artigo, do direito à propriedade privada. Há um artigo próprio na Constituição que tem a ver com o direito à justa indemnização e que abarca todas as matérias que tenham a ver com eventuais desapropriamentos.
Quanto à questão do redimensionamento ou emparcelamento das unidades de exploração agrícola, é evidente
Página 2496
que, do ponto de vista do PSD, nem sequer é matéria que deva ter uma especial relevância constitucional. Nesse sentido, parece-nos um pouco despropositado que, no artigo do direito à propriedade privada, se dê uma ênfase específica a este tipo de situações.
Esta é uma entre muitas outras situações, onde terá sempre de haver lugar ao direito à justa indemnização, que a Constituição já prevê, e, portanto, pareceu-nos inoportuna esta alteração. Por isso, e apenas por isso, votámos contra.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, peço também a palavra para uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, era para dizer que não perfilho uma posição de princípio contrária à proposta de regular a matéria de reordenamento agrário, mas julgo que não é o local adequado para o fazer - e a inserção do artigo 62.º, tal como existe hoje, é lapidar e não vale a pena alterá-la -, portanto, julgo que a redacção mereceria algum reajustamento. Eu próprio, aliás, subscrevo um projecto que tem propostas nessa matéria, designadamente no artigo 98.º, por eliminação dos artigos relativos ao redimensionamento do minifúndio, que seria substituído por um artigo que trataria precisamente dos problemas do emparcelamento e do redimensionamento das explorações agrícolas, em moldes mais actuais e de maior garantia para os proprietários privados. Por essa razão abstive-me.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar agora a um novo capítulo dedicado aos direitos e deveres sociais. Está em apreciação o artigo 63.º
Registo que, até ao momento, não há qualquer proposta nova, para além das dos projectos iniciais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, entramos agora numa área da Constituição relativamente à qual, não tendo havido explicitamente, no acordo político entre o PSD e o PS, a aprovação de formulações em concreto, há, contudo, um compromisso conjunto dos dois partidos, de acordo com determinados princípios que constam do acordo, princípios, enfim, de natureza genérica, relativamente a esta parte da Constituição, de tentarem a formulação de propostas conjuntas que possam melhorar, modernizar até, nos termos do acordo, o texto constitucional.
Neste sentido, da parte do PSD, relativamente a este artigo 63.º, há duas questões fundamentais: uma delas, que já decorre da primeira leitura e que, na altura, foi uma matéria que ficou em aberto, o que consta, de resto, do guião do Sr. Dr. Vital Moreira, tem a ver com a incorrecta inserção que actualmente ocorre da matéria respeitante às instituições particulares de solidariedade social neste artigo. E incorrecta inserção por uma razão fundamental: as instituições particulares de solidariedade social são, hoje em dia, uma realidade com uma intervenção extraordinária na sociedade portuguesa e a sua intervenção alargou-se - e bem! - a todo o leque de direitos sociais existentes, nomeadamente neste Capítulo II da Constituição.
Quero recordar rapidamente que neste artigo da Constituição temos, para além da segurança social, a saúde, onde a intervenção das instituições particulares de solidariedade social é, hoje em dia, uma realidade extraordinariamente importante e que as comunidades locais bem conhecem e bem acarinham e fundamental, de resto, para o acesso universal e equitativo aos cuidados de saúde por toda a população, uma vez que, como é sabido, Portugal não tem ainda capacidade financeira, nomeadamente o Estado, de conseguir criar uma rede de cuidados de saúde que possa ser omnipresente e acorrer a todos e a cada um dos cidadãos.
A complementaridade da iniciativa privada, nomeadamente do sector social, como são as instituições particulares de solidariedade social, é fundamental também na área da saúde, bem como nos direitos sociais que têm a ver com a família, com a infância, etc.
Toda a gente conhece o papel fundamental que, junto de inúmeras comunidades do nosso país, as IPSS têm, no sentido de resolverem os problemas da infância, com as chamadas creches e jardins de infância por esse país fora, dos deficientes e da terceira idade.
Ora, acontece que o actual texto constitucional, ao incluir as IPSS como uma das normas do artigo da segurança social, embora desde já o fizesse, alargando a outros artigos da área social, isso, desde logo, denotava, como, de resto, ficou claro no debate da primeira leitura - e os Srs. Deputados que participaram nesse debate recordar-se-ão. De resto, o então Presidente da Comissão, que não era o Presidente actual, foi o primeiro a reconhecer que, de facto, até pelo próprio conteúdo, havia uma inserção sistemática incorrecta. O que é evidente é que, hoje em dia - e felizmente que assim é -, a realidade das IPSS já não toca apenas as matérias que aqui estão, desde logo a saúde, que foi aquela que já aqui citei, e que tem a ver com o artigo 64.º, relativamente ao qual, no actual texto constitucional, não vem uma menção expressa à prossecução desses objectivos por parte das instituições particulares de solidariedade social.
Portanto, do ponto de vista do PSD, desde logo, há essa questão, o que até leva a que a realidade das instituições particulares de solidariedade social, porventura, deva merecer um artigo final deste capítulo, precisamente para poder cobrir toda a realidade dos direitos sociais que estão presentes neste capítulo, como é hoje, penso que indiscutivelmente, pelo menos nunca o vi contestado por qualquer força política, o papel importante e fundamental desta realidade.
O sector social junto das comunidades devia estar, do nosso ponto de vista, na parte final. Portanto, em termos do artigo 63.º, é evidente. Essa a razão de propormos a retirada daqui do actual n.º 3.
Quanto à questão da segurança social propriamente dita, que é, como a epígrafe diz, o programa normativo deste artigo, devo dizer que, do ponto de vista do PSD - e penso que genericamente aceite, hoje em dia, na sociedade portuguesa -, é evidente que o sistema de segurança social, tal qual o conhecemos desde o 25 de Abril, nomeadamente, é um sistema que, por razões várias, que não interessa agora aqui estar a citar, carece de reformas profundas que permitam uma evolução saudável e a subsistência e a garantia desse papel fundamental de solidariedade entre gerações que a segurança social preenche.
Página 2497
Nesse sentido, há, do ponto de vista do PSD, dois aspectos fundamentais a reter na alteração da redacção deste artigo: por um lado, acentuando, embora, o princípio da universalidade que deve presidir e que é uma conquista, penso eu, importante da própria cidadania que resulta da actual Constituição, é necessário, para que as reformas a imprimir no sector da segurança social possam ter uma cobertura jurídico-constitucional adequada, uma vez que vivemos num Estado de direito, que queremos preservar, que se acrescente um outro princípio que, hoje em dia, de resto, já vem vindo a ser paulatinamente defendido pela generalidade dos sectores político-partidários nacionais, que é o princípio da equidade no sistema.
O que é que o PSD entende pelo princípio de equidade no sistema? O princípio da equidade no sistema tem a ver, digamos, com o abrir de portas à lógica de políticas selectivas no âmbito da segurança social que permitam que esta possa garantir todas as prestações aos cidadãos que, por não terem condições económicas muito abastadas, terão sempre de, ao abrigo do seu direito de cidadania, beneficiar desse apoio fundamental.
Portanto, do nosso ponto de vista, há que reconhecer que o sistema de segurança social tem de se fundamentar em dois princípios fundamentais: o princípio da universalidade - e quando falo em universalidade falo tanto na universalidade do acesso, ou seja, que todos os cidadãos têm de ter acesso à segurança social, como falo da universalidade da contribuição para o sistema de segurança social, porque esta é, do ponto de vista do PSD, uma questão fundamental de solidariedade que imana directamente do próprio conceito de cidadania, de solidariedade social, conforme nós o entendemos - e o princípio da equidade.
Portanto, o princípio da solidariedade e o princípio da equidade são os dois princípios que devem, nos termos do texto constitucional, presidir ao sistema de segurança social e, obviamente, também concordamos - isso está fora de causa - com a manutenção do princípio já existente no texto constitucional da participação das associações representativas de trabalhadores, das associações sindicais, das associações representativas e dos demais beneficiários.
É evidente que, tratando-se, como se trata, de um sistema de solidariedade, a participação de todos, uma vez que se trata de um sistema que é para todos, que deve servir a todos de uma forma equitativa, não é dispensável e é fundamental também do nosso ponto de vista.
Posto isto, Sr. Presidente, é evidente que haveria também vantagem, na nossa perspectiva, embora não coloquemos essa vantagem como um aspecto essencial, em o fazer também, uma vez afirmado esse princípio da universalidade e da equidade, em deixar também claro que o sistema de segurança social, como, de resto, é a realidade que conhecemos há vários anos, integra instituições de natureza pública e instituições de natureza privada, nelas se integrando, obviamente, as instituições, como uma força especial as instituições de carácter social, as chamadas instituições particulares de solidariedade social.
Essa é uma afirmação que nos parece também bastante vantajosa no texto constitucional, embora, do nosso ponto de vista, não seja por aí que o texto constitucional carece de modernização adequada.
Como diz o texto do acordo político entre o PS e o PSD, é evidente que nas áreas sociais deve reafirmar-se a iniciativa de toda a comunidade e a liberdade de iniciativa dos cidadãos e da comunidade para contribuírem para a prossecução dos direitos sociais. Isso, do nosso ponto de vista, fica salvaguardado, desde logo, pela definição clara do apoio e reconhecimento do Estado às instituições particulares de solidariedade social, com o tal "chapéu" para todos os direitos sociais, e também a afirmação do princípio da universalidade e do princípio da equidade.
Do nosso ponto de vista, são estas as alterações fundamentais.
Gostaria que o debate se alargasse e, na sequência desse mesmo debate, o PSD encarará a hipótese de formular, em conjunto, eventualmente, com outros Srs. Deputados, propostas concretas que possam concretizar estas, que são, do ponto de vista do PSD, com toda a lealdade, as questões fundamentais, independentemente daquele que é o nosso projecto inicial, com o qual fizemos a primeira leitura.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, depois destas operações lógicas que suponho serem evidentes, vamos apreciar em conjunto o artigo 63.º e a proposta também de um novo artigo 72.º-A, constante do projecto do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nesta matéria, o acordo político de revisão constitucional, celebrado entre o PS e o PSD, não incluiu qualquer disposição normativa, mas deu um sinal que, de resto, correspondia ao resultado da primeira leitura. Ou seja: o PS enunciou nessa altura o seu apego àquilo que é fundamental no regime constitucional actual em matéria de segurança social, que garante que todos os portugueses têm direito à segurança social e que obriga o Estado a, muito concretamente, tomar as medidas para assegurar que isso seja realidade, tanto nas condições em que a Constituição foi gerada como nas condições de hoje e do fim do século.
Nessa altura dissemos que consideraríamos que possibilidades é que haveriam e que poderiam ser admitidas para introduzir benfeitorias no texto. Sublinho "benfeitorias" porque para nós só de benfeitorias se pode tratar. Creio que deixámos claro logo nessa altura que não estávamos disponíveis para dualizar o sistema português de segurança social.
O PSD propõe essa dualização com um apagamento ou com a subalternização das responsabilidades públicas nesse domínio, e essa é uma posição filosófica da família a que o PSD pertence, simplesmente não é a nossa, não é a do PS. Nesse sentido, não poderíamos subscrevê-la, não poderíamos coonestá-la nem, a qualquer título, aceitá-la.
Estamos disponíveis, no entanto, e nesse sentido está uma proposta pendente na Mesa, para introduzir neste artigo as seguintes benfeitorias: a Constituição já hoje reconhece o papel das instituições particulares de solidariedade social não lucrativas, nos termos do artigo 63.º, n.º 3. Fá-lo, no entanto, em termos que podem ser de forma significativa melhorados, sem prejuízo da filosofia constitucional neste domínio e com valorização adequada do papel importante que as IPSS têm na sociedade
Página 2498
portuguesa, tendo em conta, simultaneamente, que há também outras associações de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo que desempenham funções de solidariedade que merecem igualmente protecção constitucional, o que hoje não ocorre em absoluto expressamente no texto constitucional, ao contrário do que acontece em relação às IPSS.
Nesse sentido, nos parece importante - e propomos isso à consideração de todos os partidos - fazer o seguinte: valorizar mais, não autonomizando num artigo constitucional, que, como sabem, de resto, tem um valor relativo (e não é um fetiche para nós criar um artigo especificamente para isto), no primeiro dos artigos da Constituição social a solidariedade, deixando de tratar apenas da segurança social em sentido restrito para passar a tratar da segurança social e da solidariedade.
Há, enfim, manifestamente, uma coincidência com a própria organização que concebemos no âmbito da nova maioria para o tratamento das questões da segurança social e da solidariedade. Isto tem uma expressão no Ministério, mas poderia não ter obrigatoriamente, mas tem-na conceptualmente. Portanto, segurança social e solidariedade tratadas no mesmo artigo da Constituição.
E, depois, assegurar claramente três coisas: primeiro, um dever de o Estado apoiar - nos termos da lei naturalmente e devolver para o legislador ordinário, como sempre terá de ser, o precisar das formas de apoio -, o funcionamento dessas instituições particulares de solidariedade social; segundo, assegurar simultaneamente que esse apoio se estende a outras instituições de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo - e estou a pensar em entidades tão importantes como bombeiros, como associações de protecção contra toxicodependência e toxicomania e outras ainda que desempenham um papel social relevante, tanto para a prossecução dos objectivos que estão hoje previstos no artigo 63.º, como de outros, designadamente alguns que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes acabou de enunciar.
Desta forma "económica" - e as normas constitucionais não se medem pelo número de caracteres que têm e não se medem, seguramente, pelo facto de terem alíneas e sub-alíneas -, esta norma que propomos condensa um significativo reforço da tutela constitucional de interesses legítimos e positivos daqueles de quem se tem recebido um contributo positivo para a defesa de interesses relevantes na área da solidariedade social.
Nada na actual norma constitucional - era a minha última observação, Sr. Presidente -, ao contrário do que inculca um pouco a intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, proíbe ou limita políticas selectivas e novos tipos de prestações na segurança social; nada impõe um paradigma de protecção imodificado, intacto, imóvel.
Digamos, aliás, que, durante anos, o problema aqui não foi o problema do paradigma rígido; foi o problema do não cumprimento do paradigma constitucional, do subfinanciamento e de uma perversão relativa de normas constitucionais, o que foi, obviamente, muito grave e, seguramente, não fez bem à saúde do sistema. A verdade é que se a Constituição não estava a ser cumprida era possível, como se viu, passar a cumpri-la.
Por outro lado, nada impedia e nada impede, como se acabou de demonstrar, a abertura de caminhos de reforma, introduzindo os tais novos tipos de prestação, a introdução de políticas selectivas nas prestações, algumas das quais, como sabem, foram agora anunciadas e vão ser testadas se obtiverem adequada aprovação, que, obviamente, podem ser diferenciadas sem qualquer colisão com o regime constitucional na redacção actual decorrente da Constituição.
Repito: não pode reduzir-se o texto constitucional a um paradigma rígido e imodificável; não pode fazer-se uma espécie de "fotografia de ano", decretando que a realidade é imóvel. Mais ainda: as mudanças demográficas, as mudanças do tecido económico e as mudanças sociais exigem, elas próprias, reformas que terão de ser feitas e nada impede na Constituição que elas sejam feitas.
Congratular-nos-íamos, Sr. Presidente, se estas nossas propostas obtivessem o mais alargado consenso.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, penso que a Constituição não pode ser alheia a determinados intuitos simbólicos. E, ao contrário do que disse o Sr. Deputado José Magalhães, não é despicienda a proposta que leva à criação de um artigo próprio para as instituições particulares de solidariedade social. Há um intuito simbólico nessa proposta do PSD pela importância cada vez mais recente destas instituições, por razões várias, mas designadamente também pela reconhecida ruptura do sistema público de segurança social e pelo papel complementar que estas instituições têm também nestas áreas.
Mas a própria circunstância de o n.º 3 do actual artigo 63.º fazer já uma referência a estas instituições, como foi explicado pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, é empobrecedor do seu papel, sem prejuízo das referências que lá se fazem a outras disposições da Constituição.
O Sr. José Magalhães (PS): - Com a nossa redacção não, Sr. Deputado!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Do ponto de vista sistemático, parece-me óbvio que um artigo próprio, mais à frente, que deixasse claro que estas instituições têm um papel nestes vários sectores, nos deficientes, na infância, na terceira idade, na saúde, etc., era perfeitamente o mais adequado e enriquecedor da maneira como olhávamos, do ponto de vista constitucional, para estas entidades.
Fazia realmente um apelo no sentido de nos associarmos todos a esta preocupação simbólica que a proposta do PSD também tem.
Aliás, quero lembrar que, no acordo com o PS, há uma referência expressa, onde se diz que os dois partidos empenhar-se-ão igualmente no aperfeiçoamento do regime relativo à realização dos direitos económicos e sociais constitucionalmente consagrados, no quadro de uma sociedade aberta, para um bom desenvolvimento económico e a conciliação da solidariedade com a liberdade de iniciativa dos cidadãos.
Página 2499
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ora bem! A nossa proposta de alteração em relação ao artigo 63.º, como também já aqui foi referido pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes, vão neste sentido. Reconhecemos uma cada vez mais importante necessidade de complementar a segurança social pública, em ruptura, como é sabido, mas queremos deixar aqui um sinal por parte dos constituintes de que não nos vamos demitir de garantir a universalidade e de garantir os direitos adquiridos nesta matéria, mas com uma flexibilidade e com uma visão mais aberta e mais identificada com as preocupações gerais da sociedade de hoje, que a actual redacção do artigo 63.º não tem.
Quero perguntar ao Sr. Deputado José Magalhães, que subscreve a proposta para um novo n.º 5 do artigo 63.º, o que é ele faz aos actuais n.os 3 e 5 do artigo 63.º, porque isso não está aqui explicitado na sua proposta.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para, muito rapidamente, dar esclarecimentos complementares ao Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a explicação é breve. Aquilo que o PS propõe é uma reinserção do conteúdo do actual n.º 3 do artigo 63.º, majorando o seu conteúdo. Não se trata apenas de uma reinserção, é uma reinserção com uma alteração qualitativa e, julgamos nós, uma melhoria ou uma benfeitoria do seu conteúdo.
Assim, o n.º 1 continuaria a regular o princípio da universalidade; o n.º 2 definiria a estrutura do sistema; o n.º 3 definiria os grandes objectivos do sistema, como a protecção na doença, a velhice, etc.; o n.º 4 definiria esta regra de equidade e de garantias, segundo o qual todo o tempo de trabalho contará, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez; e o n.º 5 definiria o dever do Estado de apoiar e fiscalizar o funcionamento das IPSS e de outras estruturas com relevância na área da solidariedade, ao mesmo tempo que a epígrafe do preceito era reformulada, no sentido de passar a abranger não apenas a segurança social em sentido restrito mas também a solidariedade com o sentido amplo que tem, conglobando os diversos sectores e áreas de actividade que, na nossa prática, são susceptíveis de ser englobados sobre a designação unitária de solidariedade.
Portanto, é uma reinserção com valorização de conteúdo e com renumeração das normas que estão na Constituição, as quais se manteriam intactas.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, sinto alguma perplexidade quando ouço as palavras nomeadamente do Sr. Deputado José Magalhães, porque tive o cuidado de reler o Programa Eleitoral do PS e o Programa do Governo e de me lembrar das diferentes intervenções feitas, nomeadamente nesta Câmara, mas não só, do Sr. Ministro da Solidariedade e Segurança Social.
Gostava de lembrar aqui duas coisas que me parecem básicas: é que a segurança social tem duas vertentes e uma delas, que tem uma base contributiva, é contratual, não é um dogma, e é natural, pelo que se está a ver no mundo e não apenas por aquilo que ainda não se está a ver cá, que tanto o Estado, como os cidadãos, como os sindicatos, como as empresas procurem uma evolução nessa forma contratual.
Não se estão a pôr em causa os direitos; está-se apenas a dizer que haverá uma evolução nessa forma contratual. Aliás, penso que é isso que está a fazer o gigantesco Conselho de Reflexão no âmbito do Livro Branco. É exactamente isso que está a fazer. Está a ver como é que é possível, com os recursos disponíveis, conseguir assegurar qualitativamente os direitos que são essenciais, mas com uma evolução nas formas, que é aquela que sai menos cara, digamos assim, menos penosa para os cidadãos.
Portanto, barrar completamente esta matéria parece-me, no mínimo…
O Sr. José Magalhães (PS): - "Barrar"?! Ouvi bem?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Barrar, sim! Não tenha qualquer espécie de dúvida! Barrá-la, fechá-la, trancá-la!
O Sr. José Magalhães (PS): - Por favor!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não! Tranca-se de certeza, e esperaremos para ver!
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso significa?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Posso dizer-lhe, por exemplo, que o quadro das evoluções possíveis nesta base contratual serão os três pilares de que o Sr. Ministro Ferro Rodrigues tem falado; será, por exemplo, o seguro social obrigatório e será a possibilidade de o complementar com outras fórmulas que não só não estão aqui previstas como estão aqui impedidas!
O Sr. José Magalhães (PS): - Impedidas!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Claramente impedidas, Sr. Deputado José Magalhães!
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr.ª Deputada, o actual sistema é inconstitucional, sustenta V. Ex.ª? A actual realidade é inconstitucional?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não! A actual realidade…
O Sr. José Magalhães (PS): - Os sistemas complementares são inconstitucionais, Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Que sistemas complementares é que o Sr. Deputado tem consagrados? Nenhuns!
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr.ª Deputada, por favor!...
Página 2500
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não tem nenhuns! Se está a dizer isso, explique-se!
O Sr. Presidente: - A sua função neste momento - não me leve a mal - não é dialogar apenas com o Sr. Deputado José Magalhães!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas talvez seja o mais eficaz, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Não sei, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não sei! Virei-me para onde estava a maior intransigência!
O Sr. Presidente: - Há aqui outros espectadores atentos!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Portanto, isto para deixar claro que, do meu ponto de vista, a evolução previsível no âmbito do Governo, do seu governo, e não no âmbito da minha cabeça ou da minha vontade, estas formas contratuais evoluirão para formas mais sustentáveis e, por isso mesmo, mais justas, porque tudo aquilo que é insustentável redunda numa injustiça, pelo menos a médio e a longo prazos.
Depois, em relação à segunda vertente, ela já é hoje feita claramente em parceria. E não só a da segurança social, porque o pré-escolar é um exemplo disso. Todos os dias o Governo nos traz aqui propostas dessa parceria e como a segurança social não é uma abstracção, é um sistema, e é um sistema que tem de ser funcional porque é instrumental de um resultado final, e assim é que a Constituição tem de consagrar.
Como é que é possível considerar que se está a fazer um favor às IPSS ao colocá-las aqui ou acolá ou a dar-lhes mais isto ou aquilo, sempre com medo - não sei também porquê - de que elas possam assaltar o sistema estatal de segurança social e, ao mesmo tempo, o Governo trazê-las à colação como uma parceria institucionalizada e legalizada?
Tem o caso do pré-escolar, mas não só; tem as áreas da terceira idade, da toxicodependência num certo sentido e na saúde vai ter mais, como as misericórdias, os hospitais de retaguarda, etc.
Portanto, um sistema que tem claramente, hoje já, quer o consagremos aqui ou não, ele já é assim… Portanto, o mais que pode estar a acontecer hoje é estarmos a manter aqui qualquer coisa que já não tem relação com a realidade, não tem relação sequer com aquilo que é a vontade do seu Governo. Gostaria de chamar a atenção para isto.
Obviamente que as instituições particulares de solidariedade social, e não só, já fazem parte do sistema. Poderia falar também nas mútuas. Onde estão elas? Ficam excluídas? Não são IPSS, como sabe! Ficam excluídas as mútuas?
O Sr. José Magalhães (PS): - E as mútuas são inconstitucionais na sua leitura?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não! Não estão cá! E, ao não estarem cá,…
O Sr. José Magalhães (PS): - Portanto, tudo o que não está é inconstitucional!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não!
O Sr. José Magalhães (PS): - É um raciocínio sui generis!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não, não! Só estou preocupada com o que, não estando, faz efectivamente falta!
Portanto, neste momento o que vejo é, na parte não contributiva e da solidariedade social, um sistema que é claramente um sistema misto e integrado ou em vias de integração, com o Estado de um lado e com redes já perfeitamente em funcionamento do outro, convencionadas e articuladas, sem fins lucrativos, mas que realmente também não se esgotam na realidade das IPSS.
Posto isto, quero ainda dizer que o princípio da subsidariedade, do qual eu, eventualmente, posso prescindir, não quer dizer mais do que isto mesmo, ou seja, que o Estado faz segurança social, faz solidariedade social, segundo o princípio de subsidariedade, isto é, chamando o sector privado social, chamando as famílias, chamando a sociedade civil. É assim em todo o lado e vai ter de ser assim em Portugal.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, parece-nos evidente que não pode vigorar nesta matéria o princípio de que o que não está expressamente consagrado é proibido. Simplesmente a questão fundamental, quando estamos a tratar de direitos desta importância, é estabelecer como questão prioritária a responsabilidade do Estado e demais instituições públicas e não consagrado o princípio em que o papel de instituições privadas acabe por constituir um elemento de desresponsabilização do Estado e do sector público.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ora essa!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Como é sabido, nunca ninguém pôs em causa a conformidade com a Constituição de sistemas complementares. Não é isso que está em causa!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É, é!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Simplesmente a consagração de outro tipo de princípios teria claramente a possibilidade de uma leitura desresponsabilizadora, que muitos, aliás, defendem, como esteio fundamental de reformas nesta matéria e que nós, obviamente, não partilhamos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não nós! Não nos faça essa injustiça!
O Sr. Luís Sá (PCP): - Um outro aspecto que gostaria de referir neste âmbito é o seguinte: durante a primeira leitura, o problema fundamental que colocámos a respeito
Página 2501
da proposta do PSD de autonomizar no artigo 72.º-A (as instituições particulares de solidariedade social) foi o facto de, ao fazê-lo, esquecer, no fim de contas, toda uma série de outras pessoas colectivas privadas de utilidade pública às quais damos a maior importância no âmbito da concretização de direitos sociais.
Talvez, de resto, o Sr. Deputado Rodeia Machado, que é presidente de uma associação de bombeiros, possa ilustrar o que acabo de dizer, mostrando o papel efectivo que associações deste tipo têm na garantia de direitos fundamentais.
A nosso ver, acrescentar, como agora é proposto, às instituições particulares de solidariedade social outras instituições de reconhecido interesse público parece-nos de elementar justiça e absolutamente indispensável.
Por outro lado, julgamos também que ter na epígrafe do primeiro artigo da Constituição social, para além daquilo que está actualmente, a ideia de solidariedade corresponde àquilo que já actualmente era o conteúdo do artigo, designadamente quando, a propósito das instituições particulares, refere toda uma série de outras matérias em que elas intervêm, para além da actual. Nesse sentido apoiamos a alteração da epígrafe, até porque julgamos que corresponde à situação actual, mesmo sem a alteração que é proposta, e julgamos que este tipo de alteração corresponde às objecções que fizemos na primeira leitura, enriquece aquilo que actualmente está estabelecido no artigo 63.º. Por isso mesmo, daremos o nosso apoio à proposta que é feita.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, usando eu próprio da palavra, gostaria de começar por sublinhar o seguinte, em comentário inicial às palavras da Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto: não creio que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, nas preocupações que aqui nos trouxe, tenha alcançado demonstrar que a proposta de revisão do artigo 63.º, constante do projecto do CDS-PP, alcançasse algum efeito útil significativamente distinto do normativo actualmente vigente na Constituição.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Nem o Sr. Presidente imagina quanto!
O Sr. Presidente: - É porque, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, se o sistema de segurança social que ao Estado incumbe, e como tal é reconhecido na vossa proposta, implica, por um lado, garantir um sistema de segurança social com um conjunto de objectivos que não se afastam dos objectivos já traçados actualmente pela Constituição, não encontra nesta matéria inovação significativa. Se julga encontrar inovação na explicitação constitucional de que o Estado deve regular e fiscalizar um sector privado de protecção social, não dá aqui cobertura constitucional a uma realidade que não tenha já a sua efectividade possível. Ou seja: nada na Constituição vigente impede que haja, ao nível do sector privado, estruturas de protecção social que o Estado, por sua vez, deva fiscalizar.
Portanto, esta admissão constitucional que a Sr.ª Deputada visa alcançar já está alcançada na realidade. E também aqui não vem abrir um sistema que, pela sua natureza, não esteja já, neste ponto, ao nível de manifestações de complementaridade na protecção social, efectivamente aberto.
Por outro lado, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, peço-lhe que repare no seguinte: quando, em matéria de instituições de solidariedade social, a vossa proposta se refere apenas a uma obrigação do Estado de as regular e fiscalizar, esqueceu-se de admitir que o Estado deva positivamente apoiá-las na sua actividade. Ou seja: curiosa e singularmente, a proposta do CDS-PP relativamente às IPSS é um menos relativamente a outras propostas que neste momento estão em discussão.
Diria, por isso, que, por um lado, a vossa proposta não ajuda a criar qualquer possibilidade nova que a Constituição não admita já, em termos dos sistemas complementares de segurança social no sector privado, e, por outro, é um menos relativamente às possibilidades de apoio do Estado às instituições particulares de solidariedade social.
Permita-se-me que agora passe a comentar as posições do PSD.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não posso responder, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada poderá fazê-lo no final, com todo o gosto, pois ainda não concluí a minha intervenção!
O PSD nesta matéria visa admitir a criação de um sistema de segurança social que seja integrado por instituições públicas e privadas e vai alcançar a seguinte situação singular: incumbiria ao Estado, por efeito constitucional ou, melhor, por prescrição constitucional, organizar, coordenar e subsidiar o sistema, logo organizar e coordenar as próprias instituições privadas que integrasse no sistema de segurança social. O PSD talvez não tenha querido este objectivo, mas visa constitucionalmente estatizar, por via de tutela organizativa do Estado, as próprias instituições privadas de solidariedade social.
Não creio que este tenha sido o objectivo dos autores,…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não foi, não, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - … mas este era o resultado alcançado na adopção das formas que o PSD nos propõe de alteração do artigo 63.º quanto ao novo n.º 3 que aqui visa, na articulação com o n.º 2.
Por outro lado, Srs. Deputados do PSD, gostaria de chamar a atenção para o seguinte: relativamente à admissão constitucional relevante da função das instituições particulares de solidariedade social, verdadeiramente o que é que estará em causa? Do meu ponto de vista, o que está em causa, em primeiro lugar, não é, como a Constituição actualmente prescreve, reconhecer o direito de constituição dessas instituições, porque o direito à constituição de associações é um direito consignado de forma universal em matéria de direitos liberdades e garantias, tenham as associações a natureza que tiverem, desde que não sejam contrárias à ordem penal.
Como não é, obviamente o caso, quando a Constituição especificamente reconhece um direito de constituição de IPSS faz - reconheçamo-lo - uma certa redundância.
Havia, portanto, algum sentido útil em alterar a norma. E em que sentido? No sentido de consignar ao Estado um
Página 2502
dever de apoiar a actividade das instituições particulares de solidariedade social; um dever de apoiar na medida em que elas prossigam objectivos complementares relativamente às funções que, nos domínios gerais da segurança social e da solidariedade social, possam ser praticados.
Por outro lado ainda, Srs. Deputados, a norma constitucional vigente é taxativa. Os Srs. Deputados do PSD reconheceram - e penso que bem! - que, quando se admite apenas a possibilidade da participação das instituições de segurança social em objectivos expressamente delimitados na Constituição, no domínio da solidariedade social, isto talvez não seja suficiente, de onde, portanto, verdadeiramente o que poderia estar em causa, se me é permita a expressão, era abrir a torneira, era permitir que a possibilidade de partilha de funções no domínio da solidariedade social das IPSS fosse para além daquelas que estão constitucionalmente já admitidas.
Ora, em síntese, há dois princípios úteis na revisão deste normativo: em primeiro lugar, conferir ao Estado um dever de apoiar as instituições particulares de solidariedade social, quando elas cooperam para a prossecução de finalidades públicas no domínio da solidariedade social, e, em segundo lugar, admitir que essas finalidades públicas não sejam apenas aquelas que actualmente estão expressamente taxadas na Constituição.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados terão toda a dificuldade em não encontrar alcançados estes dois objectivos úteis na norma que vos é proposta pelo PS.
Em síntese: relativamente ao corpo geral do artigo 63.º, a vossa solução é mais estatista do que a manutenção da forma actual da Constituição.
Vozes do PS: - Muito mais!
O Sr. Presidente: - E relativamente às IPSS a nossa proposta alcança toda a utilidade daquilo que parece ser a vossa preocupação.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, o esclarecimento que lhe queria pedir é o de que, depois do seu discurso, penso que não tem qualquer relutância em aceitar o nosso n.º 1, ou seja, que todos têm direito ao acesso a um sistema de segurança social, com respeito pelos princípios da subsidariedade e da equidade. Já ficaria satisfeita. Não sei se o Sr. Presidente, enfim, tem o mesmo entendimento que eu do princípio da subsidariedade e da equidade,…
O Sr. José Magalhães (PS): - Dificilmente!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - … mas penso que, se tiver e o assumir, entendo o seu discurso. Se assim não for…
O Sr. Presidente: - É uma inovação constitucional positiva desta revisão constitucional admitir o princípio da subsidariedade como um princípio orientador do Estado em matéria de princípios fundamentais.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mais uma razão!
O Sr. Presidente: - E como esse princípio já está introduzido em matéria de princípios fundamentais, não vejo necessidade de, a propósito de tudo o mais, andar permanentemente a ter de o invocar.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Não é a propósito de tudo o mais, Sr. Presidente, é a propósito deste ponto concreto!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, não deixo de surpreender-me com as intervenções que acabei de ouvir.
De um lado, disse o Sr. Deputado Luís Sá que o PSD desresponsabilizava o Estado de uma incumbência que é sua e, do outro, V. Ex.ª acaba de dizer que estatizamos tudo. De modo que eu, perante estes dois argumentos, fico sem saber para quem me virar.
Risos do PSD.
Mas como estava virado para mim próprio, vou explicar a VV. Ex.as - oxalá o talento me ajude - qual é o princípio organizador da nossa proposta.
Há aqui, no nosso texto, um primeiro valor, que foi, de resto, tocado pela intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva. Esta temática também é uma temática simbólica, tem a ver com os nossos símbolos, que fazem parte da nossa cultura. Hoje, de manhã, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, foi produzido, por um ilustre Deputado do PS, um notável texto sobre voluntariado social. E ele teve ocasião de ir repescar à nossa História aquilo que nos caracteriza neste domínio. Houve um autor inglês, especialista na expansão portuguesa - os historiadores conhecê-lo-ão pelo nome, mas tenho medo de errar a pronúncia -, que disse que nós por onde passamos pelo mundo deixamos duas instituições que marcam a nossa presença: uma as câmaras municipais e a outra as misericórdias.
É esse sentido global da solidariedade social, que é nossa, e que nós, no n.º 2 do artigo 72.º-A salientamos, que VV. Ex.as recusam reconhecer aqui.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Completamente!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Dão à expressão "instituições particulares de solidariedade social" uma estreiteza de alcance de tal forma que ela já não compreende sequer associações humanitárias, assim chamadas na nossa língua, dos bombeiros voluntários.
O Sr. Presidente: - Isso não é razoável, Sr. Deputado Barbosa de Melo!
Página 2503
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - VV. Ex.as não querem ver este valor da nossa cultura solidária, da nossa cultura das misericórdias - são 14, segundo o velho catecismo, que abrange todas as áreas em que um pode servir o outro -, reconhecido na Constituição.
Era isto que tinha de vos dizer. É claro que agora há muitos argumentos, muitos e belíssimos argumentos, argumentos formais, mas o nosso valor simbólico era este e VV. Ex.as mudaram a gramática, discutiram tudo, mas aconselho aos membros do PS que leiam atentamente o parecer hoje produzido pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro.
O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado Barbosa de Melo, consente-me agora que lhe faça uma pergunta?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Com todo o gosto, Sr. Presidente. E ainda por cima feita…
O Sr. Presidente: - Mas não nessa condição, como é evidente!
Ó Sr. Deputado Barbosa de Melo, V. Ex.ª destaca-se, e nós ouvimo-lo sempre com a máxima atenção e consideração, por fazer a interpretação mais rigorosa possível dos normativos constitucionais, e muito nos ajuda nessa exegese. Como é que o Sr. Deputado interpreta a vossa própria proposta quando ela diz que incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar o sistema de segurança social…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Equilibrado!
O Sr. Presidente: - Não entra para o efeito do meu raciocínio, para a pergunta que lhe quero fazer!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas era bom que o dissesse!
O Sr. Presidente: … e, depois, ao definir os factores ou os vectores, melhor dito, que integram o sistema de segurança social, diz que eles são os das instituições públicas e os das instituições privadas,…
O Sr. José Magalhães (PS): - Não lucrativas!
O Sr. Presidente: - … de onde decorre que o Estado que organiza o sistema, organiza os vectores do sistema? E se organiza, coordena e subsidia os vectores do sistema, o que os senhores estão a dizer - e na minha leitura isto parece-me incontornável - que o Estado organiza e coordena as entidades privadas que actuarem no quadro do sistema de segurança social. Foi a isto que chamei um excesso de estatização.
Quis, aliás, ser benevolente com os autores e até admiti que eles talvez não tivessem querido produzir esta intenção na fórmula e talvez a fórmula carecesse, por isso, de ser corrigida.
O Sr. Deputado Barbosa de Melo não me acompanha nesta preocupação?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Deus me livre! Estou em total oposição ao que acaba de dizer! Posso dizer-lhe que, da concepção hermenêutica da Constituição, tenho uma visão segmentarista: trata artigo por artigo, alínea por alínea e não joga com o baralho todo!
O Sr. Presidente: - Sistemática, Sr. Deputado Barbosa de Melo!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A racionalidade da Constituição, apesar de sistémica… Se V. Ex.ª quer saber da nossa proposta como é que o Estado organiza, coordena,…
O Sr. José Magalhães (PS): - E subsidia!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - … e subsidia um sistema onde há instituições públicas e instituições privadas, tem de ir ver no mesmo texto constitucional onde é que, na nossa proposta, é regulada a relação do Estado com as instituições privadas. Esse é o n.º 2 do artigo 72.º-A da nossa proposta, que diz que…
O Sr. Presidente: - Não resolve o problema!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - … "o Estado estimula e apoia o desenvolvimento das misericórdias (...)" - palavra terrível - "(...) e demais instituições particulares de solidariedade social e fiscaliza a sua actividade, nos termos da lei". Aí tem como é que as duas áreas se conciliam.
O Sr. Presidente: - Creio que há uma proposta nova do PSD que, eventualmente, superou a formulação originária, não?
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Estou a ler o texto apresentado em 2 de Março de 1996!
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, estamos a ler o mesmo texto!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Barbosa de Melo acabou de responder à minha questão.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, ainda queria fazer um pedido de esclarecimento!
O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, mas, agora, até com prejuízo da minha própria intervenção, não vai a tempo. Eu, há pouco, usei da palavra a título de pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Barbosa de Melo e já obtive a resposta e agora tenho de dar a palavra ao Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
Para uma intervenção autónoma, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, autónoma no verdadeiro sentido da palavra, porque eu, porventura, sinto que me encontro neste momento relativamente equidistante em relação aos dois blocos que se desenham.
Página 2504
Talvez por defeito de formação, a discussão tem sido, de facto, viva e muito interessante, e seguramente a minha intervenção está ofuscada pelo brilhantismo da intervenção produzida pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo, mas julgo eu que está um pouco deslocada, porque isto é o preâmbulo da discussão da reforma da segurança social, não sei se isto é exactamente a discussão da reforma do artigo 63.º da Constituição. Pela razão muito simples de que este artigo contém a consagração de um direito numa dupla dimensão: numa dimensão subjectiva de consagrar o direito à segurança social a todos os cidadãos e numa dimensão institucional de estabelecer a estrutura base do sistema se segurança social.
E todos nós sabemos que os direitos económicos e sociais, ao contrário dos direitos, liberdades e garantias, não têm eficácia horizontal e, portanto, exercem-se fundamentalmente contra o Estado. São direitos contra o Estado que pressupõem o direito a uma prestação do Estado e não propriamente a outra coisa, muito menos um direito a obter uma prestação de terceiros ou de outrem que não o Estado.
E nesse sentido, a circunstância de o artigo 63.º regular a matéria da segurança social pública significa apenas e só isso, porque é só isso que, no capítulo dos direitos fundamentais e, em particular, no capítulo dos direitos económicos e sociais, deve ser regulado, o que significa que a circunstância de o artigo 63.º não regular aquilo que é a intervenção do sector privado ou do sector cooperativo e social em matéria de segurança social obviamente que não o exclui.
E isso também significa que a circunstância de eu não aderir integralmente às propostas do PSD e do PP não tem rigorosamente nada a ver com o conteúdo das mesmas, às quais globalmente não sou propriamente alheio, neste sentido em que obviamente reconheço e valorizo o papel do sector cooperativo e social, por um lado, e do sector privado, por outro, no âmbito de prestações sociais aos cidadãos em geral.
Agora, o que não me parece necessário é consagrar na Constituição essa matéria à exaustão, por um lado, porque, de acordo com o princípio da autonomia privada, essas entidades, excepto na parte em que diz respeito ao exercício de poderes de autoridade ou à permissão constitucional de que o Estado fiscaliza a sua actividade, regem-se por um princípio de auto-organização e, portanto, não é a Constituição que tem de estruturar ou que tem de estabelecer a estrutura do sector cooperativo e social e do sector privado em matéria de segurança social, por outro lado, porque aquilo que é fundamental na Constituição é consagrar o direito do cidadão a uma prestação do Estado, porque a Constituição não pode, obviamente, nesta matéria, consagrar o direito do cidadão a uma prestação de terceiros, designadamente do sector cooperativo e social ou do sector privado.
Era muito bom que a Constituição pudesse consagrar direitos meus contra a minha companhia de seguro, mas, infelizmente, não me parece ser esta a sede. Portanto, julgo que a discussão está um pouco desviada neste sentido, porque não é, de facto, aqui que tem de se discutir qual é que é a estrutura global do esquema de segurança social e qual é o papel do sector privado nesse sistema.
A única coisa que a Constituição tem de regular é, por um lado, quais os poderes que o Estado exerce em relação a estas entidades, e os poderes de fiscalização estão cá; por outro lado, a possibilidade de elas exercerem o papel complementar e subsidiário em relação ao Estado, e isso está cá; e, por outro lado ainda, a possibilidade de o Estado, em função dessa utilidade social da sua actividade, subsidiar o exercício dessa mesma actividade, e isso também cá está.
A circunstância de não se regular à exaustão como é que se estrutura o sector cooperativo e social e como é que se estrutura o sector privado em nada prejudica que o sistema de segurança social se desenvolva no sentido de uma maior complementaridade do sector cooperativo e social ou do sector privado.
Portanto, não tendo qualquer rejeição de princípio quanto aos valores fundamentais que enformam as propostas do PSD, designadamente quanto à valorização da intervenção dessas entidades no sistema de segurança social, em nada diminui a circunstância de isso não estar regulado à exaustão, porque não é esta a sede para regular essa matéria à exaustão. Esta é a sede para consagrar o direito dos cidadãos a uma prestação do Estado, e esse é um direito universal e tem de estar consagrado como tal. Mais do que isso, julgo que é redundante e irrelevante.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Era apenas para perguntar ao Sr. Deputado Cláudio Monteiro, autor de uma proposta de alteração ao artigo 65.º, como é que foi incluir no n.º 2 o seguinte: "Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado: a) Estimular a construção privada (…). Como é que foi meter aqui isto, Sr. Deputado?
O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Deputado Barbosa de Melo, porque precisamente o que está regulado nessa proposta que eu subscrevo é qual é o papel do Estado em relação à actividade privada, não é como é que essa actividade privada se estrutura e se desenvolve.
Vozes do PS: - Claro!
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Francamente não percebi!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, queria aqui também referir apenas uma questão que tem sido debatida em torno deste artigo e que fundamentalmente foi trazida aqui a esta discussão pelo Sr. Deputado José Magalhães, inclusivamente, por escrito, com o acrescento na epígrafe deste artigo 63.º do termo "solidariedade", fazendo aqui apelo, como referiu, a mudanças orgânicas do Governo socialista.
Penso que o grande erro…
O Sr. José Magalhães (PS): - Erro?!
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - … social do Partido Socialista é a duplicação deste termo solidariedade. Se
Página 2505
bem se recorda - e recorda-se, com certeza, porque estava aqui na Legislatura anterior -, os Ministros do Emprego e da Segurança Social dos governos do PSD trouxeram a esta Assembleia na Legislatura anterior um termo que me parece muito mais bem empregue do que o agora repescado pelo PS. Refiro-me ao termo Estado-providência, em substituição do termo Estado-solidariedade. Penso que isso é o âmago da discussão em torno deste artigo 63.º e da questão do direito à segurança social e da fórmula de organização do sistema de segurança social.
Porque solidariedade não é apenas, como aqui também tem sido referido, o direito que os cidadãos têm a obter solidariedade do Estado, mas também a solidariedade entre os próprios cidadãos e, por isso, não é só um direito a uma prestação do Estado mas também um dever de os cidadãos contribuírem para o seu semelhante. E essa função social de solidariedade está claramente descurada nas propostas do PS.
Por isso, afirmar claramente, como pretendemos, que não há apenas um único sistema de segurança social - o estatal -, mas há o estatal e outros, e esses outros com uma clara preponderância, com base nas instituições particulares de solidariedade social, penso que é claramente um ganho que esta revisão constitucional poderia trazer.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, a questão que queria colocar ao Sr. Deputado era a seguinte: se entende ou não que, estando actualmente já referido no n.º 3 do artigo 63.º o conceito de solidariedade a propósito das instituições particulares de solidariedade social e estando aí uma alusão ao papel que elas devem desempenhar no âmbito da família, da infância, da juventude, no aproveitamento dos tempos livres da juventude, no que toca a acções para os deficientes, etc., a epígrafe actual já não reflecte o conteúdo do artigo, designadamente ao referir esta questão. Este o primeiro ponto.
Segundo ponto: gostaria que o Sr. Deputado, até como administrativista, respondesse a esta questão concreta: se o conceito de instituições particulares de solidariedade social esgota todas as associações humanitárias que intervêm nestes domínios que aqui são referidos.
Estes são os dois problemas fundamentais que estão em causa quando falamos deste ponto concreto. A verdade é que, ao contrário do que parece resultar, eventualmente, da intervenção do Sr. Deputado Barbosa de Melo, com todo o respeito, o conceito de instituição particular de solidariedade social tem um sentido técnico preciso e que não compreende designadamente toda uma série de associações humanitárias que intervêm neste domínio.
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - É o sentido que lhe dá uma lei própria! Não legalize a Constituição!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, começando já por essa última questão, o Sr. Deputado Barbosa de Melo, num aparte, já respondeu. O conceito de instituição particular de solidariedade social é um conceito legal, porque, se alterarmos a lei, eventualmente, terá outro conceito.
Se abrangermos, como, por exemplo, penso que o Sr. Deputado se está claramente a referir, aquilo que hoje são as instituições particulares de utilidade pública administrativa, ainda previstas no Código Administrativo, como associações de bombeiros voluntários, etc… Mas se houver uma lei que regule toda essa matéria - e urge regulamentar essa matéria de forma diferente, porque penso que não está claramente já na altura de regressarmos ao Código Administrativo de 1936/1940, pois é altura de regular de novo essas matérias…
Todo esse conceito, se calhar necessita de ser reformulado, por isso a Constituição não pode estar atenta apenas a um conceito legal. Se mudarmos a Constituição, a lei, eventualmente, terá de se adaptar a ela e não o contrário.
Por isso, penso que não se deve fazer aqui apelo a conceitos legais, porque, se calhar, com a alteração da Constituição passam a ser leis supervenientemente inconstitucionais.
No que se refere à questão do conceito de solidariedade, repito o que disse: este conceito, se vir bem, até na forma como está explícito este artigo 63.º, com o n.º 2, onde se fala de um sistema de segurança social unificado, e o n.º 3, onde é também reconhecido o direito de constituição de instituições particulares de solidariedade social… Aliás, se for ver a lei das instituições particulares de solidariedade social, vai ver como elas regulam de forma extraordinariamente limitativa a constituição de instituições particulares de solidariedade social.
O Sr. José Magalhães (PS): - É do "cavaquismo"!
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - É de 1983 a primeira versão, por isso não é "cavaquista"!
E ainda bem que, pela primeira vez, foram criadas essas instituições! Mas penso que é altura de as reformular. Se reparar nisso é o Ministro da Solidariedade e Segurança Social agora que tem o direito - eventualmente, depois, contestável, nos tribunais - de rejeitar a inscrição de uma instituição particular de solidariedade social, completamente diferente do direito de associação que normalmente está para os bombeiros voluntários ou para outras instituições. Por isso claramente essa matéria implica também alterações nos dias de hoje.
Por isso, este conceito de solidariedade constante deste artigo 63.º é claramente um conceito de solidariedade restrito a essa visão, clara e ideologicamente ultrapassada - e a prática tem-se demonstrado também ultrapassada -, de que a solidariedade não é apenas solidariedade do Estado com os cidadãos mas é também e fundamentalmente cada vez mais solidariedade entre os cidadãos e os cidadãos têm de se ver não apenas com o direito de exigir do Estado mas também com o dever para cada um dos seus concidadãos de contribuir para essa segurança social.
O Sr. José Magalhães (PS): - Mas onde é que isso está na proposta do PSD, Sr. Deputado?
Página 2506
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Mas isso tem de estar aqui ao afirmar-se claramente que não é um sistema único…
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso não está na sua proposta!
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Está na proposta que o PSD apresentou! Não é um sistema único - alteração do n.º 2 - e a afirmação autónoma das instituições particulares de solidariedade social no artigo 72.º-A.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, efectivamente a proposta do PSD que está em apreciação talvez levante um novo problema. O Sr. Deputado Moreira da Silva acaba de chamar a atenção para que agora, manifesta e intencionalmente, o sistema deixaria de ser constitucionalmente um sistema único,…
O Sr. José Magalhães (PS): - Seria dual!
O Sr. Presidente: - … o que significaria que a gestão do sistema poderia ser dual ou mais do que isso. Poderia ser um sistema compartimentado, através de estruturas de gestão autonomizadas entre si.
E se há matérias, Srs. Deputados, onde o Estado-providência deve garantir o respeito pela igualdade do tratamento dos cidadãos deve ser a de concessão de prestações básicas. É por isso que o princípio da unidade do sistema é fundamental à salvaguarda do princípio da igualdade.
Quando os Srs. Deputados retiram o princípio da unidade do sistema, implicitamente admitem que o princípio da igualdade possa entrar em crise no tratamento dos cidadãos, em função das funções sociais que ao Estado incumbe atribuir.
Srs. Deputados, esse foi, porventura, um novo ponto de preocupação que acrescentaram efectivamente à vossa proposta.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Não lhe queria tirar o sono!
O Sr. Presidente: - Não, não! Não me tirará efectivamente o sono por causa disso, porque, nesta matéria, tenho, como sabe, uma possibilidade de bloquear esta vossa proposta, que resulta do significado da representação popular e da expressão do voto do Grupo Parlamentar do PS.
Srs. Deputados, pergunto se desejam continuar o debate ou se podemos passar às votações.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, devo dizer que estou perplexo com as "cambalhotas" sucessivas…
O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é insultuoso!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - … que não só o PS tem dado ao longo das intervenções que se têm sucedido, porque isso já seria normal, mas devo dizer que estranho muito a "cambalhota" que o Sr. Presidente acaba de dar nesta sua última intervenção.
O Sr. José Magalhães (PS): - Especificamente!?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Especificamente!
O Sr. Presidente, na sua primeira intervenção, acusou - e está em acta, está gravado, e o Sr. Presidente recordar-se-á - a proposta do PSD de ser estatista, porque dizia que ao Estado incumbia organizar, coordenar e subsidiar, e nesta segunda intervenção acusou…
O Sr. Presidente: - Não!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, estou a repetir aquilo que ouvi. Se ouvi mal, o Sr. Presidente terá ocasião de esclarecer!
Estava eu a dizer que, nesta segunda intervenção, o Sr. Presidente virou em 180º a sua posição e acusou a proposta do PSD de atentar contra a unidade do sistema, de permitir gestão diferenciada, dual - utilizou um termo deste género - e, portanto, completamente ao contrário do que foi a sua intervenção inicial, que acusava o PSD de colocar o Estado a controlar as entidades privadas e, nesse sentido, ser estatista. Vem agora dizer que a proposta do PSD põe completamente em liberdade de curso total as entidades privadas, retirando ao Estado qualquer hipótese de coordenação e de controlo do sistema de segurança social. Foi isto que ouvi nas duas intervenções que o Sr. Presidente aqui proferiu.
Se para mim seria motivo de perplexidade, mas não de estranheza, confesso, que ouvir posições diferenciadas por parte da bancada do PS, foi de facto motivo de grande estranheza para mim ouvir posições diferenciadas e de uma forma tão brutal no conteúdo da parte do Sr. Presidente. Isso de qualquer Deputado seria grave, mas do Sr. Presidente é-o em particular.
É preciso que haja um bocadinho de seriedade nesta discussão, porque acho que fica patente, pelas próprias declarações que sucessivamente, como acabou de ficar demonstrado, o PS tem vindo a produzir em torno deste artigo 63.º, que o PS não quer discutir com seriedade a questão, porque utiliza todos os argumentos em cada momento de uma forma diferente…
O Sr. José Magalhães (PS): - Protestamos por este tipo de metodologia!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Protesta a seu tempo, Sr. Deputado, se não se importar!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Protestamos já!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E todos os argumentos são válidos, um argumento e o seu contrário é igualmente válido sucessivamente, o que denota, do meu ponto de vista, uma falta de seriedade preocupante para mim e inaudita até este momento na revisão constitucional, devo dizer, nomeadamente por parte do PS, na discussão dos assuntos. Ainda por cima numa matéria como esta onde…
Página 2507
O Sr. António Reis (PS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa? Queria fazer-lhe uma pergunta a propósito do que acaba de dizer.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se é uma pergunta, faça-a no final, se não se importa!
O Sr. António Reis (PS): - Não admite que a contradição que acaba de apontar à posição do Sr. Presidente não é mais do que o reflexo da vossa própria contradição interna sobre essa matéria?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não há qualquer contradição interna da parte do PSD sobre essa matéria. Sobre isso fique descansado, Sr. Deputado. Sobre isso pode dormir descansado, porque o PSD sobre essa matéria não tem posições contraditórias.
Posto isto, repito, há que retomar alguma seriedade na discussão do assunto, especialmente atendendo ao facto de este assunto ser matéria que, por opção das duas partes, deve ser discutida no seio da própria Comissão e se deve tentar encontrar a concretização nos termos explícitos no acordo. Mas para que isso seja possível, evidentemente, é preciso que haja seriedade na discussão, porque, se não houver seriedade na discussão, estamos aqui todos a perder tempo.
Portanto, ou há seriedade e, de facto, se expõem as posições, se analisam os argumentos e se vêem os prós e os contras das posições de cada um ou, então, há aqui um claro distanciamento das partes que não procederem dessa maneira relativamente ao resultado útil do trabalho desta Comissão.
Para além da estranheza e analisando agora em concreto as críticas, porque da parte do PSD não abandonaremos essa postura de não utilizar argumentos em que não acreditamos e de tentar esgrimir com seriedade as ideias e as opiniões, devo dizer, quanto à primeira acusação do Sr. Presidente, na sua primeira intervenção, e que outros Deputados também aqui fizeram, de que a proposta do PSD era de um estatismo inaudito, no sentido de que colocava entidades privadas sob a coordenação do Estado, devo dizer, Sr. Presidente, que o PSD fá-lo e fá-lo conscientemente, à semelhança, por exemplo, só para recordar ao Sr. Presidente e aos outros Srs. Deputados, do que acontece, logo no artigo seguinte da Constituição, em que, no n.º 3, alínea d), se diz que incumbe prioritariamente ao Estado "disciplinar e controlar (...)" - veja bem! - "(...) as formas empresariais privadas na área da medicina (...)". Veja bem até que ponto é que é "tão estranha" esta disposição a propósito de um sistema social!
A saúde para nós não é nem mais nem menos importante do que a segurança social; é um sistema social idêntico em termos de cobertura de direitos fundamentais dos cidadãos. Veja-se bem o "estranho" e o "inaudito" desta posição do PSD que, aparentemente, durante 22 anos nunca foi estranhada nem discutida por ninguém!
Portanto, Sr. Presidente, penso que não vale a pena esgrimir mais argumentos para demonstrar a falência da oportunidade, no mínimo, da crítica que encerrou essa primeira observação.
A segunda observação foi ao contrário, como já aqui deixei claro também. A segunda observação foi a de que a proposta do PSD acabava, pura e simplesmente, com a obrigação que o Estado tem em resposta ao conteúdo útil que a segurança social tem na lógica da cidadania, isto é, a crítica de que o PSD - aqui del-Rei! - acaba, na sua proposta, que entretanto entrou na Mesa, mas, como o Sr. Presidente ainda não anunciou, não tive oportunidade de explicitar de uma forma clara, porque é uma proposta nova relativamente à proposta inicial que estivemos a discutir até agora e que o Sr. Presidente tanto criticou... Esta proposta já deu entrada na Mesa, de resto foi também subscrita por Deputados do PP...
O Sr. Presidente: - Já foi distribuída!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Já distribuída! Exactamente! Mas como o Sr. Presidente ainda não a enunciou, ainda não tive oportunidade de a apresentar!
Ao contrário dessa segunda crítica, dizia eu, a verdade é que o PSD mantém o tal crime de lesa-Pátria de continuar a conferir ao Estado a incumbência de organizar e coordenar todo o sistema de segurança social, acrescentando, obviamente, o princípio da universalidade que já tinha sido explicitado aqui por mim na minha primeira intervenção, que não constava, de facto, da proposta inicial do projecto do PSD, como tal o Sr. Presidente não pôs em discussão quando introduziu este artigo 63.º, nem o poderia ter feito, mas que, logo na minha primeira intervenção, dei nota de que o PSD entendia que essa seria uma evolução possível para tentar chegar a um entendimento em torno desta questão, como é a função do que aqui estamos a fazer, mas que depois formalizei em concreto.
Mas, desde já, devo dizer ao Sr. Presidente o seguinte: para nós, o conteúdo útil de mantermos a incumbência ao Estado de organizar e coordenar todo o sistema de segurança social, à semelhança do que acontecerá no artigo seguinte relativamente à saúde, onde, obviamente, sendo, como já é no actual texto constitucional, um sistema onde coexistem entidades públicas e entidades privadas na área da medicina, como o texto constitucional actualmente já o diz - e o PSD, obviamente, mantém-no, isso está fora de causa -, que essa coexistência é sempre sob a coordenação e a disciplina, nos termos do artigo seguinte, e até fala no controlo da parte do Estado.
Quanto à segurança social mutatis mutandis, e, portanto, Sr. Presidente, se é esse o grande óbice do PS, ou seja, se o grande fantasma é que não se pode quebrar a clareza da Constituição de que o sistema de segurança social tem de ser um sistema que é único, no sentido de que tem uma gestão perfeitamente coordenada e centrada no Estado, se é esse o grande óbice da parte do PS, desde já deixo claro que o PSD não tem qualquer óbice aí. Era, de resto, esse o conteúdo útil da sua primeira crítica.
O Sr. Presidente primeiro começou por perceber que o PSD não tinha qualquer crítica aí, depois entendeu utilizar um outro argumento.
Portanto, que fique claro da parte do PSD que, obviamente, isso não é óbice, Sr. Presidente! Se o problema é deixar claro que é o Estado que coordena todo o sistema de segurança social, independentemente de no sistema
Página 2508
coexistirem instituições sociais ao lado das instituições públicas, pode ficar descansado que nós aí não temos qualquer contradição. E, portanto, com certeza que encontraremos uma redacção que consiga solucionar esse problema.
A questão, Sr. Presidente, é que o que não está no texto constitucional. E isso, sim, é o que o PSD defende que passe a estar e que é fundamental, do nosso ponto de vista, para acabar, ao contrário do que aqui foi dito, com alguma ironia que eu penso despropositada, de que as evoluções recentes que têm levado o legislador ordinário a que, sucessivamente - e o actual legislador até é do partido a que o Sr. Presidente pertence -, tenha tomado iniciativas legislativas nesse sentido, que é a busca da equidade no sistema, pela consciência clara de que, face à evolução até da própria idade etária nacional, o sistema, tal qual foi concebido em 1975/1976, tem de sofrer evoluções, tem de sofrer necessariamente reforma.
É evidente que a equidade é algo que o texto constitucional tem de absorver. Do meu ponto de vista, também é um problema de constitucionalidade, e se até agora nunca foi questionada a constitucionalidade dessas medidas foi porque, felizmente, existe um sentido de responsabilidade dos partidos que concordam com essa equidade e nunca ninguém suscitou o problema, porque, do meu ponto de vista, o problema jurídico-constitucionalmente existe se alguém o suscitar, porque não foi esse o conceito que presidiu ao espírito dos Deputados Constituintes em 1975, quando redigiram o que aqui está. Não foi esse sentido de equidade, não foi o sentido que aqui na primeira leitura o PS, de uma forma clara, aceitou e também no próprio acordo.
Relia apenas uma passagem do acordo, que fala, por exemplo, na necessidade de ajustar às necessidades do tempo presente certas disposições. E se, hoje em dia, a introdução da lógica da equidade no sistema é uma prática, de resto, do próprio PS, é evidente que ajustar o texto constitucional a essa realidade que o próprio Governo do PS sente a necessidade de praticar não é mais, seguramente, do que ajustar as disposições, no caso concreto esta do artigo 63.º, às necessidades do tempo presente, porque, se não fosse necessário, o Governo actual do PS não o estava a fazer - e o Sr. Presidente sabe-o bem!
Portanto, terminava, uma vez que o Sr. Presidente, no meio da minha intervenção, já deu indicação, anunciando que existe uma proposta de substituição relativamente à proposta inicial do n.º 2 do projecto do PSD, subscrita, de resto, pelo PSD e pelo PP, que evolui já no sentido que deixei mais ou menos entrevisto na minha intervenção inicial de abordagem a este artigo e que, na devida sequência, concretizei, que, mantendo o sentido útil da norma que actualmente cá está, tem a ver com o intercalar o respeito pelo princípio da universalidade e da equidade.
Devo apenas acrescentar, Sr. Presidente, como última nota desta minha intervenção, na sequência daquilo que eu disse há pouco, que se o tão grande problema é a questão do unificado, no sentido que o Sr. Presidente lhe deu, no sentido de que, obviamente, é incumbência do Estado fazer a coordenação e a gestão global do sistema, é evidente que não existe qualquer problema em arranjarmos uma solução para continuar a manter neste texto essa vertente, embora entenda que, quando se diz que o Estado organiza e coordena, é evidente que todo o sistema continua a ser controlado por parte do Estado, porque é isso que quer dizer organizar e coordenar o sistema.
Um sistema é coordenado quando em todas as suas partes é articulado por uma mesma entidade e é isso que se continua a dizer que ao Estado incumbe fazer. Mas, enfim, se há qualquer preocupação fundamental da parte do PS em manter cá o termo e se incluir aqui os princípios da universalidade e da equidade é a abertura às necessidades dos tempos recentes. Penso que essa é uma obra fundamental, que nos pode pôr de acordo em termos da alteração mínima para ajustar o actual texto do artigo 63.º às evoluções dos tempos recentes e às políticas necessárias que precisamos para entrar no terceiro milénio.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a paciência é o que cumpre ter nestas circunstâncias.
Vou usar da palavra a título de exercício do direito de defesa, figura não muito utilizada - e bem! - nesta Comissão e, singular e ironicamente, pela primeira vez nesta segunda leitura, pelo menos pelo seu Presidente.
O Sr. Deputado Luís Marques Guedes excedeu-se. O Sr. Deputado Luís Marques Guedes não tem qualquer legitimidade para acusar de falta de seriedade os argumentos expendidos quando eles não são intelectualmente concordantes com os seus.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não foram na mesma linha!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem toda a legitimidade para, criticamente, se opor a argumentos diferentes dos seus, mas não pode fazer imputações subjectivas sobre o grau de convicção ou de elaboração que outros Deputados fazem, particularmente eu próprio, aquando da intervenção que fiz.
Mas uma vez que talvez seja necessário demonstrar ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes a consistência dessa intervenção, vejo-me na necessidade de reproduzir alguns dos argumentos que anteriormente aqui salientei, naturalmente beneficiando agora das considerações proferidas pelo Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes achou que não havia razão para a minha crítica, quando estranhei que o PSD pretendesse estender a função organizativa e coordenadora do Estado às instituições privadas que integrassem o sistema de segurança social,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É ao sistema!
O Sr. Presidente: - … lembrando que já no domínio da matéria de serviço nacional de saúde se fala em disciplina e controlo de formas empresariais. Ó Sr. Deputado Luís Marques Guedes, disciplina e controlo é uma função de natureza jurídica, enquanto organização e coordenação é uma função de natureza gestional, da área da gestão,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Do sistema!
O Sr. Presidente: - … o que significa colocar o Estado não numa função jurídica mas numa função administrativa,
Página 2509
a utilizar uma direcção administrativa sobre as instituições privadas que integrassem o sistema de segurança social.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não! Não é isso que cá está!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, peço-lhe desculpa! Ouvi-o com a máxima atenção e o Sr. Deputado também tem o dever de me ouvir com a máxima atenção!
Portanto, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, desde logo, não tem razão em procurar querer assimilar os conceitos de organização e coordenação na função administrativa do Estado, que é o que verdadeiramente são, aos conceitos de disciplina e de controlo, que não advêm necessariamente nem essencialmente dessa função administrativa.
Por outro lado, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, permita-me que lhe chame a atenção de que a existência ou não de um sistema unificado de segurança social pode caracterizar em definitivo a natureza desse sistema, porque abolirmos o princípio constitucional da unidade do sistema significa, de facto, a possibilidade de fazer sistemas vários em domínios de protecção social, onde o cidadão deve estar perante o Estado numa posição básica de igualdade.
E quando falo em igualdade refiro-me a um conceito material de igualdade, portanto, a um conceito material de justiça e não a um conceito meramente formal de justiça, e naturalmente pretendo que o conceito material de justiça seja aferível à luz de um princípio unificado de segurança social e não na base em sistemas vários de segurança social que não permitiriam aquilatar dessa básica justiça material.
É esta, Sr. Deputado, a razão essencial da divergência. Ora, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes há-de compreender que esta divergência é política e é como tal que ela aqui deve ser tratada. Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se ela é política, a questão está em saber se politicamente optamos ou não por manter na Constituição a existência de um sistema de segurança social unificado e essencialmente da incumbência do Estado.
Permita-me que também agora entre em linha de consideração, mais uma vez, com a filosofia aqui expressa nas propostas do PP,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não está assinado por mim!
O Sr. Presidente: - Não está! Mas eu também chamei a atenção de que esta não era uma proposta vossa!
…, onde ele vai ao ponto de admitir que o sistema esteja subordinado neste particular ao princípio da subsidariedade, ou seja, dando o sinal constitucional de que o Estado era supletivo mesmo em funções de segurança social. Isso, obviamente, é um conjunto de orientações que não partilhamos…
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - É a interpretação que o Sr. Presidente faz!
O Sr. Presidente: - É, Sr.ª Deputada! Com certeza!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - São os privados que são subsidiários do Estado!
O Sr. Presidente: - Com certeza! É uma interpretação que eu faço!
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Já são!
O Sr. Presidente: - E, portanto, neste sentido, evidentemente que não estranhamos a circunstância de nos aparecerem novas propostas assinadas agora em comum pelo PSD e pelo PP, porque realmente há aqui uma certa "comunhão espiritual" relativamente aos objectivos políticos de transformação do sistema de segurança social.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, falemos com clareza: politicamente falando, não vos acompanhamos neste ponto. E porque não vos acompanhamos neste ponto, dificilmente o Sr. Deputado alcançará da parte do PS uma maioria para modificar a natureza do sistema de segurança social que constitucionalmente está previsto, convido-o - e convido-me a mim também e a todos - a tentar descortinar se, de facto, temos ou não uma margem de encontro e de consenso possível. Eu sinceramente creio que temos uma margem de encontro e de consenso possível e ela, do meu ponto de vista, está na relevância do papel das instituições particulares de solidariedade social e de saber qual a maneira de as associar às funções dos sistemas públicos de solidariedade social.
Para isso apresentámos uma proposta e o Sr. Deputado José Magalhães há pouco convidou-vos a ponderá-la e até - desejávamos nós - a poder admiti-la. Essa é a parte útil deste debate, Sr. Deputado. Tudo o resto - não me levará a mal e até falo em prejuízo da minha própria intervenção - é alguma retórica que se escoará, sem consequência útil neste processo de revisão constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, como foi o exercício do direito de defesa, tenho direito a responder.
O Sr. Presidente: - Tem, com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, vou apenas dar uma explicação, sem outras considerações, em termos estritamente objectivos, porque V. Ex.ª, do meu ponto de vista, elaborou aí num erro no exercício do seu direito de defesa ao vir dizer aquilo que não é de facto nem o objectivo nem o conteúdo da proposta da PSD, ao defender a tese de que o PSD defende que o Estado tem direito de organizar e de coordenar instituições particulares.
O que o PSD propõe - e bem! - é que o Estado tem o direito de organizar e coordenar o sistema, que é integrado por vários tipos de instituições. Mas o que o Estado organiza e coordena é o sistema e não cada uma das instituições. Não me peça para dizer que tenho a certeza de que o Sr. Presidente não pensa assim, porque faço-lhe justiça…
Página 2510
O Sr. Presidente: - Não faz justiça nenhuma!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Por outro lado, também não tem razão quando diz que existe um paralelismo com o exemplo que citei da saúde, porque na saúde quando se diz "disciplinar e controlar" aí já não é o sistema, aí é que são mesmo as empresas. Exactamente ao contrário do que o Sr. Presidente, na sua intervenção de defesa, disse…
O Sr. Presidente: - Funções jurídicas!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - … não é na proposta para segurança social que o PSD propõe que o Estado organize e coordene as entidades privadas; é exactamente o contrário, é mesmo no artigo 64.º da Constituição que se diz que o Estado disciplina e controla as entidades privadas de medicina. Aí, sim, as empresas privadas na área da medicina...
E a proposta do PSD para a segurança social…
O Sr. Presidente: - É uma função externa a elas próprias, enquanto a organização e coordenação é interna!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Eu estou a falar de factos, estou a ler, e não a fazer interpretação!
Risos do PS.
E para a segurança social o que o PSD propõe é que o Estado organize e coordene o sistema de segurança social. É evidente que o sistema terá uma lógica. O Sr. Presidente aí fez a justiça, mas aproveitou para baralhar os dados, metendo no meio da sua intervenção uma proposta que não está assinada pelo PSD, está subscrita pelos Deputados do PP, para tirar a conclusão de que o PSD quebrava a unidade do sistema.
Não foi por acaso que o PSD não subscreveu essa proposta. O PSD não subscreveu essa proposta precisamente porque… De resto, quando a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto a formulou e deu conhecimento prévio ao PSD, o que eu lhe disse foi que não podia assiná-la, porque o princípio da subsidariedade tal qual nela estava era susceptível de interpretações diferentes, embora a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto me tenha explicado que a interpretação dela era aquela que agora, em aparte, já deu ao Sr. Presidente.
No entendimento do PP são as empresas privadas que são subsidiárias numa lógica de complementaridade com a acção do Estado e não o contrário. De qualquer maneira, como também reconheci pela leitura da proposta que ela, no mínimo, era dúbia, disse que não a subscrevia e que se a apresentassem eu diria qual era a minha dúvida, que era exactamente esta, Sr. Presidente.
Portanto, não impute ao PSD a quebra da unidade do controlo do Estado sobre o sistema de segurança social, porque essa consta da proposta do PSD. O PSD mantêm-na e, como já aqui disse, se há, inclusive, a preocupação de também inscrever aqui ao lado do princípio da equidade o princípio da unidade do sistema, inscreva, Sr. Presidente, porque não temos aí divergência e não vale a pena fingir que o PSD não concorda com isso, pois o PSD concorda.
O PSD desde o princípio que está a dizer que há, neste artigo, fundamentalmente duas obras a fazer: por um lado, retirar, por estarem aqui incorrectamente, as instituições particulares de solidariedade social e, por outro, deixar aqui a adequação destas disposições à necessidade do tempo presente, para citar os termos do acordo, introduzir aqui o princípio da equidade.
Pode ser no n.º 1, por exemplo, quando se diz que "todos têm direito à segurança social", acrescentávamos "de acordo com o princípio da equidade". Mas penso que ficava melhor quando se fala no sistema, que é o n.º 2, porque o n.º 1 é lapidar para mim e acho que não se devia mexer nele, sinceramente. Ficava melhor no n.º 2, quando se fala no sistema, dizer que esse sistema inclui dentro de si, além do princípio da unidade, o princípio da universalidade e o princípio da equidade.
Terminava como o Sr. Presidente terminou a sua intervenção: à volta de uma qualquer formulação que consiga este desiderato, penso que há um denominador comum onde nos podemos entender, assim haja boa vontade de todas as partes.
O Sr. Presidente: - Congratulo-me muito, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, porque, depois deste debate, tirando o papel constitucional a dar às instituições particulares de solidariedade social, já tudo apenas está em torno de ficar ou não o princípio da equidade…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Desde o princípio que está!
O Sr. Presidente: - … no contorno normativo do artigo sobre a segurança social. Quero dizer que ele está a ser razoavelmente defendido, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Desde o princípio que está!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, creio que é importante estarmos aqui hoje a debater este artigo da segurança social, por isso queria fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, com duas ou três questões principais.
Creio que o sistema que temos - e é aquele que diferencia efectivamente a proposta do PSD da alteração - é, de facto, um sistema unificado de segurança social. Quando falamos da questão das IPSS e de outras entidades, elas são entidades que prosseguem fins ou objectivos de segurança social e, portanto, não podem nem devem ser, em meu entender, entidades que para o sistema funcionam de uma forma diferente do de serem incentivadas e apoiadas na sua acção.
Creio que as propostas que o PSD faz sobre esta matéria, ao retirar o princípio do sistema unificado e o sistema de equidade, que o Sr. Deputado propõe também ou
Página 2511
que o seu grupo parlamentar propõe, é, em meu entender uma questão de má consciência também daquilo que se passou nos 10 anos de governação do PSD, porque, efectivamente, a segurança social tem um défice extremamente elevado que não existiria se tivessem tratado das coisa em tempo útil.
Queria também perguntar ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, quando fala desta questão da solidariedade, se, efectivamente, com um sistema que passe a ter um sistema privado de segurança social, se há solidariedade dessa entidades para com a segurança social e se no sistema universal ou no sistema unificado essa solidariedade não é efectiva. Ao introduzir no sistema um sistema privado de segurança social, como é que entende que essa participação pode ser feita uma vez que é feita por empresas seguradoras ou outras entidades que não contribuem directamente para o sistema? Onde é que está, então, o sistema solidário?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Não me leve a mal que lhe peça que seja tão sintético quanto possível.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, vou simplificar o mais possível, apenas chamava a atenção do Sr. Presidente de que foi V. Ex.ª que criou o atraso, por ter permitido mais intervenções, quando elas deviam ter passado para amanhã porque já passa da hora regimental. Uma coisa foi a defesa da honra…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, vá direito à matéria.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quanto às três questões que o Sr. Deputado Rodeia Machado me coloca, devo dizer o seguinte: quanto à primeira questão, já deixei claro - e penso que o Sr. Deputado entendeu bem a minha intervenção - que, obviamente, para o PSD não existe querela quanto à unidade do sistema. Não existe! Se é esse o problema, não existe querela! E, portanto, com toda a franqueza, já deixei clara a posição do PSD. Por exemplo, no conteúdo útil da proposta diga-se "no respeito pelo princípio da unidade e da equidade do sistema". Tudo bem! Sr. Deputado, quanto a isto não vale a pena alimentar equívocos, porque da parte do PSD não há qualquer dúvida de que deve haver unidade e que essa unidade é uma incumbência que o Estado tem de prover, porque a segurança social é um direito de todos os cidadãos. Portanto, tem de haver unidade na gestão do sistema, sem dúvida alguma! Isto não inibe que o sistema, de facto, tenha depois no seu seio, à semelhança do próprio sistema de saúde, a coexistência de formas diferenciadas, atendendo à titularidade das entidades em presença.
Quanto à segunda questão, ou seja, as dificuldades criadas no sistema, o Sr. Deputado trouxe à colação os últimos 10 anos. Eu direi apenas que nem o PSD nem qualquer outro partido tem controlo sobre a evolução da natalidade e da pirâmide etária, e as principais dificuldades do sistema…
O Sr. José Magalhães (PS): - O problema não é do sistema!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É, é! O sistema não tem qualquer falência financeira! O problema do sistema é que já se sabe, por força da evolução estrutural da sociedade portuguesa, que ele, tal qual está concebido, se não for reestruturado ou reformado nos próximos 5 ou 10 anos, vai entrar naturalmente, por força de causas naturais, em falência. Isso é o que se sabe! Porque actualmente não há qualquer falência, não vale a pena vir com a tese dos buracos orçamentais e das rupturas financeiras, porque elas não existem.
Ainda hoje de manhã, por acaso, ouvi o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social falar nos noticiários dizendo que o sistema não tem qualquer falência financeira. Não existe esse mito! Foi um mito utilizado no início da governação do PS, mas ele não existe.
Quanto à terceira questão que o Sr. Deputado colocou, a questão da solidariedade que citou a propósito da existência de empresas privadas. Ó Sr. Deputado, é que a solidariedade… Tinha explicado isso! Quando, na nossa proposta, pomos lá o princípio da universalidade, a solidariedade está aí. A solidariedade é todos os cidadãos contribuírem para o sistema! Todos os cidadãos! O problema da solidariedade vê-se por aí, do nosso ponto de vista. Em nossa opinião, a solidariedade tem a ver com o facto de todos os portugueses terem de contribuir solidariamente para o sistema, independentemente de, atendendo, enfim, a opções pessoais, poderem contratualizar, para além dos plafonds que o sistema unificado nos garante, suplementos de reforma. Mas isso já existe há muito tempo! A solidariedade está na contribuição!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Após as palavras que o Sr. Presidente proferiu, penso que deveria de fazer aqui uma curta intervenção.
Gostaria de centrar a posição do PP, não obstante a confusão que se tem tentado fazer à roda dela, porque me parece que isso seria elementar.
Portanto, em primeiro lugar, penso que a universalidade está consagrada no actual n.º 1 e ninguém a põe em causa, embora em todo o artigo actual não haja aquilo que penso que é o mais importante, que é a garantia do acesso a este direito. Como é que ele se materializa? Não está cá. Portanto, estou mais preocupada com a garantia do acesso, mas a universalidade, enquanto, enfim, princípio abstracto, está aqui consagrada.
A equidade não é mais do que as chamadas desigualdades úteis, é aquilo que o Sr. Ministro Ferro Rodrigues está a fazer com o abono de família e que irá certamente fazer com o subsídio de casamento, etc. Portanto, são coisas que já estão a ser feitas. Já estão a ser feitas a título experimental, dirá o Sr. Deputado José Magalhães, mas eu não sei se é a título experimental, pois penso que os ministros não governam a título experimental. A equidade é alguma coisa que na prática governativa e na consciência das pessoas já está assumida. Porque é que ela não há-de figurar aqui? Não entendo.
Depois, um sistema unificado não é o mesmo que um sistema uno; o sistema tem de ser uno no sentido de que
Página 2512
o sistema tem de ter uma lógica intrínseca, mas não é uma unicidade, é uma unidade. É algo que penso que é diferente. A questão fundamental, do meu ponto de vista é a integração.
Ora, o Estado é, obviamente, o principal responsável pelo sistema. Ninguém aqui presente, penso eu, defende qualquer coisa diferente. Mas este sistema pode ser integrado por entidades privadas. É o Estado que regulamenta, daí que, na proposta do PP, esteja a regulamentação e a fiscalização. Portanto, o Estado cria, digamos, o normativo, cria o modelo e, depois, regulamenta, coordena e fiscaliza, coisa que não faz.
As instituições privadas não entram para dentro do sistema por sua livre iniciativa; entram para dentro do sistema exactamente de acordo com aquilo que parece ter sido muito mal entendido que é o princípio da subsidariedade. Isto é: quando o Estado pensa que em determinadas áreas pode recorrer a prestadores privados dentro de uma regulamentação que ele estabelece, dentro de um sistema que ele criou e coordena e com uma fiscalização apropriada, com uma creditação obviamente também adequada, isso também é o que está acontecer. Foi o que aconteceu no pré-escolar. Não é nada diferente daquilo que aconteceu no pré-escolar. Em vez de o Estado estender a sua rede, o Estado integrou nesta medida exacta que estou a referir a rede privada.
Portanto, para terminar, diria, se a memória não me falha, que o princípio da solidariedade não é mais do que isto, não é o contrário. Continuo a achar que o conceito de IPSS é redutor, pois estamos a falar de mais realidades para além das IPSS e obviamente que a solidariedade não é do Estado para com os cidadãos; a solidariedade é de todos para todos ou, então, não existe verdadeiramente solidariedade, como temos visto também.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães para concluir este debate.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é para fazer uma reflexão em benefício da votação que vamos fazer amanhã.
Sr. Presidente, neste debate, fizemos e faremos, aliás, aqui e no Plenário, um bom esforço para que se atinja uma benfeitoria constitucional neste ponto, mas é bom medir o que nos separa e o que nos une, para sabermos qual é o espaço de convergência possível, fazendo a discussão, naturalmente, em tom sério, no qual ninguém tem o monopólio da verdade e nem pode arrogar-se o direito de ser intolerante em relação a opiniões distintas.
Nesta matéria há várias grandes questões a dirimir, mas uma está dirimida. Está na Constituição da qual não nos separamos! É simples! É a nossa opinião, mas é também o nosso direito e a nossa coerência! E isso, seguramente, não nos deve ser criticado; pelo contrário, na nossa óptica, deve ser aplaudido ou pelo menos deve merecer, seguramente, o respeito dos nossos opositores.
As questões que estão ao nosso alcance ou que dependem de decisão neste momento: primeira, um sistema constitucional dual ou o actual sistema? A nossa resposta é: reconhecemo-nos no sistema constitucional. Não queremos dualizar, não queremos, neste sentido, distorcer aquilo que nos parece ser uma filosofia saudável, a qual não prejudica - repita-se! - o florescimento de outras estruturas, com autonomia, como também sublinhou o Sr. Deputado Cláudio Monteiro e, portanto, cuja natureza é revel e arredia ao regular minucioso de uma arquitectura na própria Constituição.
Segunda questão: o sentido das actuais normas. Nada na Constituição, na sua redacção actual - e imaginemos que não mudávamos uma vírgula ao actual texto constitucional -, impede a realização de reformas que garantam a performance do sistema e, designadamente, a resposta às mutações da economia e da democracia? Na nossa opinião, não, porque não vemos o sistema como um retrato fixista, cristalizado em 1976, 1977, 1978 e por aí adiante, incluindo, naturalmente, o período em que devia ter sido reformado e não foi. Por outro lado, não entendemos que nada exige a perpetuação do status quo; pelo contrário, é necessário que o sistema seja reformado para que possa realizar os seus objectivos constitucionais fundamentais.
Terceira questão: há balizas na actual Constituição? Sem dúvida alguma, mas são balizas virtuosas! Ou seja: nada nela impede evoluções positivas em relação às formas contratuais sustentáveis; nada impede parcerias produtivas e positivas com outras entidades, inclusive, naturalmente, IPSS; nada impede outras realidades, como as mútuas, com as quais a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto está muito preocupada, cuja proscrição constitucional não existe. Era o que faltava! Não há qualquer proibição constitucional desse ponto de vista! Não há é definição de uma arquitectura específica que as cristalize na Constituição.
Por outro lado, nada impede a selectividade das prestações e nada impede novas prestações, incluindo o rendimento mínimo garantido, que, todavia - permitam-me que o sublinhe - gostaríamos de ver elevado à categoria constitucional. Mas repito: ainda que isso não ocorresse, nada impede e nada na Constituição proíbe a consagração do rendimento mínimo garantido, como, aliás, é inteiramente óbvio e as pessoas, seguramente, apreciam e as oposições, de resto, não protestam excessivamente.
Quarta observação: em que é que podemos convergir? Creio que podemos convergir no alargamento do artigo 63.º ao seu âmbito real, que é não apenas a segurança social mas a solidariedade no sentido amplo, que aqui ficou analisado, dissecado, creio eu, bastante bem.
Podemos convergir, em segundo lugar, no alargamento do âmbito do preceito, no sentido de consagrar claramente um dever do Estado de apoiar. O Srs. Deputados não encontram esta palavra na Constituição, no n.º 3 actual. Não a encontram nem com a famosa "candeia de Diógenes"! Não está cá!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está na nossa proposta!
O Sr. José Magalhães (PS): - A proposta do PSD já merecerá uma conclusão brevíssima, não gostaria de reincidir
Página 2513
naquilo que ficou dito e bem analisado na minha leitura!
O dever de apoiar é uma importante contribuição positiva e revela da nossa parte não apenas solidariedade, mas não em relação ao PSD nem aos outros partidos, é reconhecimento do mérito das instituições particulares de solidariedade social. É uma homenagem justa e o reconhecimento do mérito! É por isso e não por qualquer convergência política ou por qualquer acordo político de revisão constitucional! É devido!
A outra coisa que é devida é o alargamento do universo das IPSS para abranger IPSS que hoje não estão abrangidas pelo artigo 63.º. Não estão, mas passarão a estar se esta proposta, naturalmente, merecer a vossa aprovação!
A outra inovação positiva é a inclusão de uma protecção constitucional explícita de outras instituições que, não sendo IPSS técnico-juridicamente - e por favor não digam que IPSS é tudo o que o legislador quiser, era a argumentação do Sr. Deputado Barbosa de Melo, que é uma argumentação excessivamente imaginativa, que assenta numa espécie de privilégio ou de arrogância do legislador constituinte - …
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Olhe que não! Olhe que não, Sr. Deputado José Magalhães!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! É que o cauteloso é o melhor! Se o legislador constitucional, além de dizer "IPSS pode ser tudo",…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Ninguém disse isso! Esse é um argumento ad terrorem!
O Sr. José Magalhães (PS): - … tiver o cuidado de dizer "há IPSS cujo conceito está bastante estabelecido e há outras associações de reconhecido interesse público sem carácter lucrativo", esta clarificação constitucional, Sr. Deputado Barbosa de Melo - reconheça -, é meritória, porque alarga o universo das entidades protegidas, reconhece-lhes o direito ao apoio…
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Então, e as misericórdias?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado, leio aqui um papel do PSD e não vejo as misericórdias, nem com uma lupa! Vejo o artigo 72.º-A que diz: "As instituições particulares de solidariedade social escolhem livremente as suas áreas de actividade e prosseguem automaticamente a sua acção".
O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Veja o n.º 2!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Barbosa de Melo, permita-me que clarifique: o texto de substituição do PSD que o Sr. Deputado José Magalhães estava a ler não contém aquela fórmula!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é verdade! Não há qualquer texto de substituição do PSD que não tenha dado entrada!
O Sr. Presidente: - Não admitido pela Mesa, mas nas mão do Sr. Deputado José Magalhães!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se não foi admitido, não o apresente!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, importa-se de clarificar que interpretação estranha é essa que está a fazer.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não foi presente a esta Comissão qualquer texto de substituição ao artigo 72.º-A!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só estou a salientar que o Sr. Deputado José Magalhães está a citar um texto…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, peço-lhe que interprete como deve ser as indicações do Presidente. Quer dizer: não há qualquer proposta do PSD que não conste das actas!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, peço-lhe desculpa! O Sr. Deputado José Magalhães é que está a ler um texto e não eu!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Sr. Presidente fez uma intervenção.
O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado José Magalhães, importa-se de clarificar a que texto é que se refere?
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Presidente, não gostaria de ferir a sensibilidade de ninguém. Se o Sr. Deputado…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é a sensibilidade, é a verdade! Diga a verdade! Diga a verdade!
O Sr. José Magalhães (PS): - Toda a verdade e nada senão a verdade?...
Risos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Diga a verdade! O PSD propôs algum texto de substituição nesta Comissão para o artigo 72.º-A?
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, tive esta manhã ocasião de transmitir aos meus colegas Deputados da Comissão de Revisão Constitucional - estão, aliás, todos aqui sentados, a maior parte, pelo menos, daqueles que esta manhã beneficiaram desse acto de transmissão - um documento que ontem à noite foi
Página 2514
transmitido à Direcção do Grupo Parlamentar do PS pelo Sr. Deputado e pelo Sr. Deputado Luís Marques Mendes e, naturalmente, julguei que esse documento exprimia neste ponto uma posição consolidada do PSD, mas se V. Ex.ª me diz que não referia uma posição consolidada…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Acha que o PSD tem posições irredutíveis quando negoceia com os outros partidos?
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Deputado, certamente que não!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, isso que o Sr. Deputado está a dizer não faz sentido! Não há qualquer proposta do PSD!
O Sr. José Magalhães (PSD): - Por isso é que estamos aqui, às 00 horas e 25 minutos, a apurar o que é que o PSD propõe! Se o PSD me diz que propõe o texto da página qualquer coisa daqui do canhenho antológico da Comissão de Revisão Constitucional, aceito esse facto, aceitamos todos. Temos de aceitar! Se V. Ex.ª me diz que o texto é outro…
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, para efeitos metódicos, proponho que as propostas que o PSD entregou ao PS não sejam havidas como referência no nosso debate de revisão constitucional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem! Essa observação devia tê-la feito há cinco minutos!
O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Presidente, estou inteiramente de acordo com V. Ex.ª, só que não me tinha apercebido de que o PSD não sustentasse uma posição homogénea nessa matéria. Mas se constato que não, Sr. Presidente, com toda a simplicidade com que disse o que disse, digo outra coisa, que vou passar agora a enunciar, para concluir.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é habitual!
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Tem de ter em conta, se V. Ex.ª me muda de chuva para sol, eu fecho o guarda-chuva,…
Risos.
… passo automaticamente e tiro a gabardina! É simples! E carrego no botão! É simples, Sr. Deputado!
Regressemos à questão que eu estava a enunciar.
Sr. Presidente, esta proposta que apresentamos e que, sintetizando, alarga o âmbito do preceito do artigo 63.º para, inequivocamente, consagra não apenas a palavra "solidariedade" mas o conceito de solidariedade; consagra, inequivocamente, o direito ao apoio do Estado a IPSS e a outras entidades meritórias de natureza similar; consagra, inequivocamente, a existência destas outras entidades meritórias sem carácter lucrativo e o dever de apoio do Estado a essas entidades; permite ampliar esse leque através de lei ordinária e obriga o legislador ordinário a definir um regime de apoio e um regime de fiscalização; não vem bulir em nada com as boas filosofias de reforma do sistema. De resto, também vos digo que não cristaliza um só conceito - o nosso -, mas é um sistema pluralista e aberto à reinvenção, e neste sentido não quer cristalizar a História; visa permitir reformas, mas não comanda um sentido único de reforma; define balizas positivas que garantem os direitos dos cidadãos.
Este conjunto de propostas, Srs. Deputados, merece atenção séria. Congratulamo-nos que tenha tido apoio já, neste momento, de um dos partidos com assento nesta Câmara e nesta Comissão, mas fazemos apelo a que possa ainda ter o vosso voto, Srs. Deputados.
Mas também com a mesma lisura vos dizemos que desnaturar o sistema, diminuir a responsabilidade do Estado, dualizar o funcionamento do sistema não conta, não contou e não pode contar com o nosso voto, aqui ou no Plenário.
O Sr. Presidente: - Alguém mais pede a palavra? Se alguém ainda quiser alegar alguma coisa em torno do debate sobre o artigo 63.º, está no momento de o fazer ainda.
Pausa.
Como ninguém mais pede a palavra, dou por encerrado o debate do artigo 63.º
Está encerrada a reunião, Srs. Deputados.
Eram 0 horas e 35 minutos do dia seguinte.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL
Página 2515
Página 2516