Página 1
Terça-feira, 15 de maio de 2018 Número 91
XIII LEGISLATURA
S U M Á R I O
Projeto de lei n.º 843/XIII (3.ª):
Lei de Bases da Habitação (PS).
Nota: prorrogação do prazo para apreciação pública publicada em suplemento.
Página 2
SEPARATA — NÚMERO 91
2
Nos termos e para os efeitos do artigo 140.º do Regimento da Assembleia da República, avisam-se os cidadãos de que se encontra para apreciação, de 15 de maio a 13 de julho de 2018, o diploma seguinte:
Projeto de lei n.º 843/XIII (3.ª) —Lei de Bases da Habitação(PS).
As sugestões e pareceres deverão ser enviados, até à data limite acima indicada, por correio eletrónico dirigido a: discussaopublica-habitacao@ar.parlamento.pt; ou em carta, dirigida à Comissão do Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, Assembleia da República, Palácio de São Bento, 1249-068 Lisboa.
Página 3
15 DE MAIO DE 2018
3
PROJETO DE LEI N.º 843/XIII (3.ª)
LEI DE BASES DA HABITAÇÃO
Exposição de Motivos
I — Antecedentes
I.1 A Constituição, os direitos sociais e culturais e as leis de bases
O direito à habitação está consagrado desde 1976 na Constituição da República Portuguesa, juntamente
com outros direitos sociais e culturais da maior importância, como os direitos à segurança social, à saúde, à
educação, à cultura, ao ordenamento do território ou ao ambiente.
No entanto, enquanto para os restantes direitos sociais e culturais foram sendo criadas sucessivas leis de
bases gerais, que constituem uma orientação geral para as respetivas políticas públicas, nunca houve entre
nós uma lei de bases da habitação. A lei de bases da segurança social existe desde 1984 (Lei n.º 28/84, de 14
de agosto), a do sistema educativo desde 1986 (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro) a do ambiente desde 1987
(Lei n.º 11/87, de 7 de abril), a da saúde desde 1990 (Lei n.º 48/90, de 24 de agosto), a do ordenamento do
território e do urbanismo desde 1998 (Lei n.º 48/98, de 11 de abril), a do património cultural desde 2001 (Lei
n.º 13/85, de 6 de julho).
Mas para a habitação nunca houve até hoje um quadro geral que, desenvolvendo os preceitos
constitucionais, corresponda ao conjunto de princípios e regras gerais e norteadoras da legislação
subsequente e da atuação dos poderes públicos e privados. Ao invés, ao longo de décadas, foram aprovados
programas e medidas específicas, que foram durando enquanto houve vontade política e capacidade
orçamental, ou regimes jurídicos dirigidos a aspetos parciais, embora muito importantes, da política de
habitação, mas aos quais sempre falta um enquadramento global.
I.2 Políticas públicas pioneiras
Tivemos, é certo, políticas pioneiras na habitação, lançadas por membros do governo que as assumiram
com coragem e visão. Recordam-se em especial o programa SAAL e a lei de solos de Nuno Portas, logo a
seguir ao 25 de Abril, ou a prioridade à reabilitação dos centros históricos de Fernando Gomes, nos anos 80.
Mas foi só em 2007 que João Ferrão lançou os trabalhos do Plano Estratégico da Habitação (PEH), um
documento que previa que o Estado apostasse na reabilitação do parque habitacional, nas parcerias público-
privadas e na dinamização do mercado de arrendamento, conferindo um papel central às autarquias locais. É
no quadro do PEH que surge a figura dos «programas locais de habitação» como instrumentos essenciais das
políticas públicas de habitação.
I.3 O apelo da sociedade civil
Entretanto, também em 2007 e face ao agudizar de carências habitacionais, foi entregue no Parlamento a
petição n.º 399/X (3.ª), dinamizada pela Plataforma artigo 65. Os seus 4460 peticionários pediam à AR
medidas legislativas e políticas urgentes para garantir o direito à Habitação e sugeriam a possibilidade de se
avançar para uma lei de bases à habitação. A petição foi bem acolhida por várias bancadas, mas não deu
lugar a nenhuma iniciativa legislativa. E o Plano Estratégico da Habitação lançado em 2007 e amplamente
debatido na altura não foi validado. A Resolução do Conselho de Ministros que o haveria de fazer nunca
chegou a ver a luz do dia.
Página 4
SEPARATA — NÚMERO 91
4
I.4 A Estratégia Nacional de Habitação de 2015
Só em 15 julho de 2015 foi aprovada, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 48/2015, a Estratégia
Nacional para a Habitação (ENH) para o período de 2015-2031. Esta estratégia assentava em três pilares: a
Reabilitação Urbana, o Arrendamento Habitacional e a Qualificação dos Alojamentos. Não foi apresentada,
nem debatida no Parlamento.
O diagnóstico associado à ENH era muito revelador da fraca relevância da ação do Estado, ao longo dos
anos, nas várias tarefas que o artigo 65.º da Constituição lhe comete. Entre 1987 e 2011, foram orçamentados
pelo Estado 9,6 mil milhões de euros. Destes, 73,3% foram para bonificações de juros no crédito à habitação,
14,2% para programas de realojamento, 8,4% para incentivos ao arrendamento, 2,0% para programas de
promoção direta e 1,7% para programas de reabilitação de edifícios. Os subsídios de renda da segurança
social e os contratos de desenvolvimento de habitação tiveram uma expressão residual, ao longo destes 24
anos, de, respetivamente, 0,3% e 0,1%.
I.5 O crescimento das dificuldades e desigualdades no acesso à habitação
Com a crise de austeridade de 2011-2015, as dotações orçamentais para as políticas públicas de habitação
foram-se reduzindo cada vez mais, se não mesmo desaparecendo, ao mesmo tempo que se agravavam as
condições de vida e diminuíam os rendimentos de muitos agregados familiares.
A liberalização do arrendamento levada a cabo a partir de 2012 criou uma pressão adicional sobre as
famílias, que se acentuou nas áreas urbanas com a atratividade de novos setores económicos, como o
alojamento local, e com a procura imobiliária externa. As desigualdades no acesso à habitação alargaram-se e
atingem hoje, não apenas as camadas mais vulneráveis, mas também as classes médias urbanas.
Entretanto, o território foi-se despovoando, como dramaticamente foi patente com as tragédias dos
incêndios de 2017.
I.6 O problema do acesso à habitação por resolver
O país chega assim a uma situação paradoxal. Em 1970, faltavam mais 500 000 casas em Portugal. Entre
1970 e 2011, o número de indivíduos em Portugal cresceu 21,9%, mas o número de famílias cresceu 72,4%.
Mudou a natureza dos agregados familiares. Entretanto, o número de alojamentos passou de 2,7 milhões para
5,9 milhões (65% em áreas urbanas e 35% em áreas rurais). Há hoje em Portugal mais casas que famílias.
Tal está longe de significar que o problema da habitação está resolvido. Entre 1981 e 2011, quadruplicou o
número de fogos vagos, que eram em 2011 eram 735 128. Isto indicia que o atual problema da habitação em
Portugal não é tanto de falta de habitações, mas de falta de habitações onde elas sejam necessárias, em boas
condições e a preço acessível.
Entretanto, o paradigma da forma de acesso à habitação também mudou. Em 1970, 46% da população
tinha casa arrendada e 54% casa própria. Em 2011, só 25% tinha casa arrendada e 75% casa própria. Mas na
verdade a casa não é integralmente «própria», uma vez que cerca de metade dos «proprietários» portugueses
estava então a pagar empréstimos à banca, com todas as dificuldades e sacrifícios que, durante o período de
austeridade, levaram à quebra dos rendimentos familiares.
I.7 A nova geração de políticas de habitação
O XXI Governo assumiu desde o início o compromisso de relançar uma visão global sobre as políticas
públicas de habitação, a que chamou «nova geração de políticas de habitação». Este compromisso traduziu-
se na criação da Secretaria de Estado da Habitação, em julho de 2017, que imediatamente deitou mãos à obra
e apresentou um documento estratégico, intitulado precisamente «Nova Geração de Políticas de Habitação»
(NGPH), aprovado em Conselho de Ministros em 4 de outubro de 2017 para submissão a consulta pública.
A NGPH visou:
Página 5
15 DE MAIO DE 2018
5
• Garantir o acesso de todos a uma habitação adequada, alargando o parque habitacional com apoio
público;
• Criar condições para que a reabilitação urbana passe de exceção a regra.
Para o efeito a NGPH previu vários programas, instrumentos e medidas, desde a promoção de mais
habitação pública a incentivos financeiros e fiscais ao arrendamento e à reabilitação. Alguns destes
instrumentos já existem, outros foram alargados e reformulados, outros ainda estão a ser propostos de novo,
estando iminente a já anunciada aprovação, em Conselho de Ministros, do correspondente pacote de
medidas, para além das que já foram publicadas sob a forma de decretos-leis.
I.8 O processo participativo lançado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista
A fim de alargar o debate sobre a NGPH, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista levou a cano um
processo participativo, intitulado «Política de habitação – Dar voz aos cidadãos», que permitiu recolher mais
2000 respostas a um questionário sobre direito à habitação e mais de 400 comentários escritos com sugestões
concretas de atuação pública. A análise destas respostas e comentários, disponível no relatório final da
iniciativa, teve um impacto direto na formulação do presente diploma.
II — Compromissos internacionais de Portugal e legislação comparada
Para além das obrigações constitucionais em matéria de direito à habitação, Portugal está vinculado por
compromissos internacionais, através da adesão e ratificação dos seguintes documentos fundamentais:
Nas Nações Unidas:
• Carta Internacional dos Direitos do Homem, constituída pela Declaração Universal dos Direitos do
Homem (1948);
• Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (1966);
• Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (maio de
2013).
No Conselho da Europa:
• Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (1950);
• Carta Social Europeia (ratificada em 1991);
• Carta Social Europeia Revista (ratificada em 2001).
A pedido da Coordenadora do Grupo de Trabalho da Habitação, Reabilitação Urbana e Política de Cidades,
constituído no âmbito da 11.ª Comissão Parlamentar na presente Legislatura, os serviços de apoio à
Comissão elaboraram uma «Nota Técnica sobre Direito à Habitação», a disponibilizar no sítio eletrónico do
Parlamento, que sintetiza os compromissos internacionais de Portugal e apresenta os resultados de uma
consulta promovida que promoveram, em dezembro de 2016, junto do Centro Europeu de Pesquisa e
Documentação Parlamentar (CERDP), que compreende 47 países membros, três Parlamentos internacionais
(o Parlamento Europeu, a Assembleia da União da Europa Ocidental e a Assembleia Parlamentar do Conselho
da Europa) e conta ainda com a participação de três países observadores.
Através da consulta promovida, visou-se a recolha de elementos que possibilitassem uma análise
abrangente de direito comparado em matéria de direito à habitação, designadamente no que se refere ao
respetivo tratamento constitucional e à existência de leis de bases de habitação nos ordenamentos jurídicos
dos Parlamentos abrangidos.
Nesse contexto, foram remetidas para circulação na rede CERDP cinco questões sobre a temática da
habitação e facultado um modelo de resposta sucinta que atendeu à realidade nacional, tendo sido obtidas
respostas de 29 Parlamentos nacionais.
Página 6
SEPARATA — NÚMERO 91
6
III — A questão da «habitação acessível»
III.1 O regime de casas de renda limitada de 1948
O conceito de «habitação acessível», tal como o plasmamos no presente diploma, surgiu na legislação
portuguesa em 1944, com o Decreto-Lei n.º 36 212, de 7 de abril de 1947, que criou o regime de «casas de
renda limitada». Destinava-se a proporcionar às famílias «habitação condigna com rendas compatíveis com os
rendimentos». Estava previsto que este regime funcionasse durante dez anos, até ao fim de 1957, mas foi
prorrogado por mais 10 anos pelo Decreto-Lei n.º 41 532, de 18 de fevereiro de 1958. O regime continha
associado um conjunto de benefícios fiscais e facilidades de licenciamento desde que fossem respeitados os
valores de renda pré-estabelecidos. Em 1958 introduziu-se a possibilidade de alienação das habitações por
sorteio público.
III.2 A reforma do regime em 1973
Em 1973, o regime da renda limitada foi reposto em vigor através do Decreto-Lei n.º 607/73, de 14 de
novembro, com uma ampla reforma estrutural que visava pôr termos às fraudes detetadas até 1967. Tratava-
se de um «sistema de locação e construção» e instituía-se o conceito de agências concelhias ou «bolsas de
habitação» para intervir «direta e objetivamente, na seleção de inquilinos e na formação do contrato.»
Segundo este diploma, a Administração, através do Fundo de Fomento da Habitação, entretanto criado,
assumiria a garantia do pagamento das rendas não satisfeitas pelos inquilinos através do sistema de depósito
da caução. Já nessa altura se falava de «vir a ser posto em prática um outro sistema de seguro a favor do
inquilino colocado involuntariamente na situação de não poder pagar a renda e, consequentemente, sujeito a
despejo.» O regime fixava os limites mínimo e máximo dos rendimentos dos agregados e proibia a
sublocação. O ónus da renda limitada era de 30 anos.
III.3 O debate atual sobre habitação acessível
Atualmente, o debate sobre habitação acessível é generalizado, no quadro da OCDE e da União Europeia.
Apesar de a UE não ter mandato oficial em matéria de habitação, que pertence ao âmbito nacional, constituiu
no final de 2016 um conjunto de parcerias europeias para dar conteúdo a doze temas prioritários da Agenda
Urbana Europeia, entre os quais a habitação.
Segundo Orna Rosenfeld, perita da OCDE e membro da parceria sobre Habitação da UE, a discussão
sobre a fixação de limites específicos da percentagem do rendimento familiar em despesas de habitação
apenas é usada, no seio da UE, para fins estatísticos e no âmbito do Eurostat. Neste quadro, o limite de 40% é
considerado como a taxa de esforço máxima a partir da qual as famílias estão em sobrecarga de despesas
com a habitação. O mesmo conceito é usado pelo INE desde 2015. Em Portugal, segundo o relatório da
NGPH, a percentagem de famílias em sobrecarga de despesas com a habitação é de 35%, o que representa
mais de um terço. A NGPH fixa como meta reduzir a médio prazo esta percentagem para 27%, que é a média
europeia.
Em França foi estipulado legalmente o limite máximo de 30%, quer para arrendamento quer para compra
através de crédito. No entanto, esta fixação só por si não garante, segundo aquela autora, a regulação do
mercado. Na ausência de outras medidas, o que acontece é que sempre que há subida de preços a
consequência acaba por ser a saída das pessoas dos locais centrais para locais periféricos, onde os custos de
habitação são mais baixos.
Esse é, aliás, o desafio de qualquer política de condicionamento ou tabelamento de rendas que não seja
acompanhada de outros instrumentos efetivos de promoção pública, de apoios fiscais ou financeiros à procura
ou à oferta ou de regulação do mercado.
Página 7
15 DE MAIO DE 2018
7
IV — Estrutura e conteúdo do projeto de lei de bases
IV.1 Estrutura
A estrutura do presente diploma desenvolve e densifica o artigo 65.º da CRP e é a seguinte:
• Capítulo I – Direito à habitação
• Capítulo II – Da habitação e do «habitat»
• Capítulo III – Agentes da política de habitação
• Capítulo IV – Políticas públicas de habitação
• Capítulo V – Instrumentos e transversalidade das políticas públicas de habitação
• Capítulo VI – Acesso ao arrendamento
• Capítulo VII – Acesso à casa própria
• Capítulo VIII – Programas especiais de apoio
• Capítulo IX – Disposições finais e transitórias
IV.2 Conteúdo dos Capítulos
Capítulo I – Direito à habitação
Este capítulo tem como objetivo apresentar o objeto do diploma, as definições usadas no mesmo e os
princípios gerais que devem reger a promoção do acesso à habitação. Destaca-se neste capítulo a afirmação
da função social da habitação. Inova-se com a introdução do conceito de requisição temporária pelas
entidades públicas, para fins habitacionais, mediante indemnização, de habitações injustificadamente
devolutas ou abandonadas, dada a enorme quantidade de habitações nessa condição em Portugal. A
possibilidade de requisição de bens de propriedade privada está de resto prevista no número 2 do artigo 62.º
da CRP e encontra-se já contemplado no Código das Expropriações, embora com um alcance limitado.
Capítulo II – Da habitação e do «habitat»
O capítulo II, na sua seção I, concretiza as soluções e conceitos do número 1 do artigo 65.º da
Constituição. Define o que será a dimensão adequada da habitação e em que termos deverão ser garantidas
as suas condições de higiene, salubridade, conforto, segurança e acessibilidade, incluindo o acesso a serviços
públicos essenciais, como água, energia, saneamento básico e comunicações. Estipula o que se entende por
preservação da intimidade pessoal e privacidade familiar, bem como proteção do domicílio. Inova-se com a
introdução do direito à morada como condição da cidadania e definem-se os mecanismos essenciais de
proteção e acompanhamento no despejo, seguindo de perto a compilação de 2008 da jurisprudência do
Comité dos Direitos Sociais do Conselho da Europa sobre o direito à habitação na Carta Social Europeia
Revista. Finalmente, consagra uma distinção entre uso habitacional, decorrente dos instrumentos de gestão
territorial, e autorização de utilização para fins habitacionais, a conceder pelos municípios e que exclui fins de
natureza turística.
Na secção II, o diploma prevê expressamente a introdução, no ordenamento jurídico português, do conceito
de «habitat» aplicado ao contexto territorial das habitações, distinguindo entre «habitat urbano» e «habitat
rural». Este é um conceito diferente do de urbanismo, previsto constitucionalmente, e que não o substitui, na
medida em que pretende enquadrar políticas de valorização do contexto de proximidade das unidades
habitacionais, quer se trate de solo urbano ou rústico, tal como definidos na lei de bases da política publica de
solos, de ordenamento do território e de urbanismo. Esta distinção é relevante nos nossos dias, porque a
habitação em contexto rural carece de acesso a serviços públicos essenciais, embora de forma distinta da que
é obrigatória em meio urbano.
Não se desenvolve a situação de «habitats» intermédios ou mistos, de povoamento disperso ou
urbanização difusa, que se deixa em aberto para eventual especificação e desenvolvimento em fase posterior
desta iniciativa.
Página 8
SEPARATA — NÚMERO 91
8
Capítulo III – Agentes da política de habitação
Neste capítulo pretende-se a valorização e esclarecimento do papel que cada agente privado ou público
dispõe no conjunto global da política de habitação, identificando as incumbências do Estado previstas no artigo
65.º da Constituição, bem como das regiões autónomas e autarquias, visando clarificar quem faz o quê. Faz-
se igualmente referência ao relevante papel das famílias e do restante setor privado, bem como do setor
cooperativo e social. Destaca-se a possibilidade de contratos administrativos entre entidades do setor público
e do setor social, que incentivem e vinculem estas à colaboração em programas considerados prioritários.
Inova-se em matéria de competências das freguesias, que por razões de proximidade deverão ter um especial
papel na identificação das carências e recursos habitacionais dos seus territórios.
Capítulo IV – Políticas públicas de habitação
Este é um capítulo central do diploma, que estabelece o modo como se desenvolvem as políticas publicas
de habitação de âmbito nacional regional e local. Prevê-se a criação de um novo órgão, o Conselho Nacional
de Habitação, com competências de acompanhamento e de envolvimento da sociedade civil na programação
de políticas de habitação.
No presente capítulo pretende-se, desde logo, obrigar à existência de uma efetiva política de habitação,
que se desenvolva de acordo com as melhores práticas do que vem sendo designado o ciclo de políticas
públicas, incluindo o diagnóstico das carências e recursos, a definição das metas e prioridades, a identificação
e desenvolvimento das melhores soluções e uma efetiva aplicação e monitorização. Inclui-se a necessária
participação cidadã ao longo de todo o ciclo.
Neste capítulo diferenciam-se:
• A política nacional de habitação, que tem como instrumento essencial a Estratégia Nacional de
Habitação, documento estratégico de médio prazo a aprovar por lei da Assembleia da República, e os
Relatórios anuais de Habitação, a submeter à apreciação do Parlamento;
• As políticas regionais de habitação, que seguirão, com as necessárias adaptações, o estipulado para a
política nacional;
• As políticas locais de habitação, com destaque para o nível municipal, cujo principal instrumento será o
Programa Local de Habitação, exaustivamente detalhado.
Inova-se no âmbito municipal com a possibilidade de a assembleia municipal, por proposta da câmara
municipal, poder aprovar «declarações fundamentadas» sempre que se verificar uma situação de défice
habitacional, falha ou disfunção de mercado ou risco de declínio demográfico, habilitando os municípios a
lançar mão de instrumentos e recursos que lhes permitam enfrentar tais situações.
Define-se um modelo de participação cidadã através dos Conselhos de Habitação, sendo obrigatório o
Conselho Nacional de Habitação e facultativos os de nível regional ou local.
Define-se também um conjunto de programas especiais de apoio, de âmbito nacional, a que poderão
recorrer regiões autónomas e municípios.
Finalmente, consagram-se alguns princípios em matéria de financiamento, incluindo a possibilidade de
flexibilização dos limites de endividamento municipal e a criação de Fundos de Habitação e Reabilitação, de
nível nacional, regional e local.
Capítulo V – Instrumentos e transversalidade das políticas públicas de habitação
Na Seção I deste Capítulo, enunciam-se os principais instrumentos das políticas públicas de habitação, que
se distribuem por quatro tipos:
• Promoção de habitação pública;
• Fiscalidade;
• Apoios financeiros e subsidiação;
• Instrumentos de regulação.
Página 9
15 DE MAIO DE 2018
9
Esta sistematização, bem como grande parte das medidas aqui incluídas, resultam diretamente da consulta
pública promovida pelo GPPS referida em I.8. Constitui, ao fim e ao cabo, a «mala de ferramentas» de
qualquer política pública de habitação, aqui ou em qualquer parte do mundo, sejam os governos de esquerda,
de centro ou de direita. É no «mix» adequado dos 4 tipos, em cada momento, que está a chave das boas
respostas.
Na subseção sobre «promoção de habitação pública», incluem-se princípios essenciais de gestão do
parque habitacional público, bem como orientações para a descentralização. Insere-se também aqui o dever
de promoção da utilização de habitações abandonadas ou injustificadamente devolutas.
Na subseção sobre «fiscalidade» apresentam-se as linhas gerais a que deve obedecer o sistema fiscal,
incluindo os benefícios fiscais, de forma a que a política fiscal seja compatível e convergente com a política de
habitação, enquanto na subsecção «apoios financeiros e subsidiação» se exemplificam medidas desta
natureza. A defesa do interesse geral impõe que os benefícios e incentivos fiscais sejam avaliados em função
do seu contributo efetivo para a garantia do direito à habitação; e que a concessão de apoios financeiros ou
subsídios possa determinar o condicionamento do uso das habitações que os tenham recebido para habitação
própria permanente ou arrendamento acessível e de longa duração.
Na subsecção sobre «instrumentos de regulação» destaca-se o dever do Estado disponibilizar
regularmente informação pública transparente e fiável sobre o mercado habitacional, defende-se a
necessidade de compatibilizar os diferentes regimes jurídicos, a começar pelo do arrendamento urbano, com a
presente lei de bases da habitação, estipulam-se os deveres dos proprietários e enunciam-se incentivos ao
melhor uso dos recursos habitacionais, incluindo o direcionamento de investimento imobiliário estrangeiro para
os territórios de baixa densidade ou para habitação acessível onde ela faça falta.
A seção II deste capítulo elenca as políticas setoriais com as quais a política pública de habitação tem de
se articular e a seção III enuncia matérias relacionadas com informação, participação e tutela de direitos,
incluindo o sistema de reclamações coletivas previsto no Protocolo Adicional à Carta Social Europeia,
ratificado por Portugal em 1997.
Capítulo VI – Acesso ao arrendamento
Tendo presente o destaque que o número 3 do artigo 65.º da Constituição dá ao arrendamento e à renda
compatível com o rendimento familiar, bem como a relevância que o arrendamento assume no panorama
habitacional português, definem-se os princípios gerais a que o Estado deve subordinar a política de
arrendamento e prevê-se a criação de um novo regime especial de fixação de renda, o regime da renda
acessível ou limitada, para património publico ou privado, para além dos já existentes regimes de renda
apoiada ou social e condicionada ou técnica.
Numa segunda seção enumeram-se os instrumentos para a promoção pública do arrendamento, bem
como os incentivos e garantias do arrendamento privado, prevendo-se a criação de seguro sou mecanismos
de garantia mútua alternativos ao fiador. Para além de vários tipos de subsídios de renda, admite-se em certos
casos a compensação financeira destinada a senhorios pobres.
Capítulo VII – Acesso a casa própria
A par da promoção do arrendamento, a Constituição determina também a existência de uma política
tendente ao acesso à habitação própria. Inclui normas dedicadas ao mercado privado, incluindo matéria do
crédito à habitação e dos condomínios, mas também regras para a alienação de habitação pública. O regime
de propriedade resolúvel insere-se neste capítulo, sendo especialmente vocacionado para o setor social e
cooperativo.
Capítulo VIII – Intervenções prioritárias
Vivemos um tempo de urgência e desigualdades, com situações habitacionais precárias inaceitáveis no
século XXI e pessoas em situações de risco que precisam de apoio expedito. Este capítulo enuncia as
seguintes intervenções prioritárias: casos de emergência por razões de proteção civil ou de humanitária; apoio
prioritário para pessoas em risco de despejo forçado e sem alternativa habitacional; pessoas sem-abrigo;
áreas urbanas de génese ilegal ou bairros precários; territórios prioritários por diversas razões, incluindo os
Página 10
SEPARATA — NÚMERO 91
10
territórios de baixa densidade ameaçados de desertificação; e situações de habitações devolutas ou
degradadas por causa de processos de partilhas sucessórias excessivamente prolongados.
O Estado deve atuar nestes casos, provendo habitação ou apoio, regulando processos e fazendo valer o
interesse geral sobre os interesses particulares.
Capítulo IX – Disposições finais e transitórias
Inclui-se aqui o objetivo de garantir o progressivo reforço da dotação do Orçamento do Estado para a
habitação, de modo a aproximar Portugal da média europeia e ultrapassar a condição de penúria a que a
habitação tem sido votada nas prioridades nacionais.
IV.3 Notas complementares sobre o articulado proposto
• Artigo 2.º – Definições
b) «AUGI»
1984 é a data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 400/84, que estabelece o novo regime jurídico das
operações de loteamento urbano e revoga o Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de junho; 1965 é a data da entrada
em vigor do Decreto-Lei n.º 46 673, que concede às autoridades administrativas responsáveis os meios legais
que as habilitem a exercer eficiente intervenção nas operações de loteamento urbano;
c) «Carga das despesas associadas a habitação»
Esta definição acompanha o conceito estatístico usado pelo INE desde 2015.
g) «Habitação a custos controlados»
O regime da Habitação a Custos Controlados (HCC) foi lançado e desenvolvido nos anos 80, tendo-lhe
sido associados os Contratos de Desenvolvimento de Habitação (CDH). Para mais informação ver:
https://www.portaldahabitacao.pt/pt/portal/programas_de_financiamento/custoscontrolados.html
o) «Preço de mercado declarado»
Pretende-se que o preço de mercado declarado passe a ser uma informação publicamente disponível para
efeitos de informação ao consumidor e regulação do mercado habitacional. A sua eventual discrepância com o
preço de mercado, tal como ele é anunciado e praticado no mercado, indicia uma disfunção do mercado ou
uma fuga ao fisco.
q) «Privação severa das condições de habitação»
Esta definição acompanha o conceito estatístico usado pelo INE desde 2015.
x) «Sobrecarga das despesas em habitação»
Esta definição acompanha o conceito estatístico usado pelo INE desde 2015
• Artigo 3.º – Princípios gerais
1. O Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais foi
aprovado, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 3/2013, ratificada pelo Decreto do
Presidente da República n.º 12/2013, ambos publicados no Diário da República, 1.ª série, n.º 14, de 21 de
janeiro de 2013.
2. O artigo 31.º da Carta Social Europeia Revista estabelece o seguinte:
Página 11
15 DE MAIO DE 2018
11
«Artigo 31.º
Direito à habitação
Com vista a assegurar o exercício efetivo do direito à habitação, as Partes comprometem-se a tomar
medidas destinadas a:
1) Favorecer o acesso à habitação de nível suficiente;
2) Prevenir e reduzir o estado de sem-abrigo, com vista à sua eliminação progressiva;
3) Tornar o preço da habitação acessível às pessoas que não disponham de recursos suficientes.»
• Artigo 5.º – Dimensão adequada da habitação
A existência de uma área útil inferior a 11 m2 por pessoa pode determinar uma ocupação patológica. Cf.
definição de «tipologia adequada» no artigo 2.º, alínea aa) do Regulamento de Operações de Realojamento do
Município de Lisboa.
• Artigo 9.º – Proteção do domicílio
Cf. artigos 82.º e seguintes do Código Civil.
• Artigo 11.º – Proteção e acompanhamento no despejo
Cf. Compilação de 2008 da jurisprudência do Comité dos Direitos Sociais relativa ao artigo 31.º da Carta
Social Europeia revista: «O despejo forçado pode ser definido como a privação da habitação ocupada por uma
pessoa devido a uma situação de insolvência ou de forma ilícita. A proteção legal das pessoas sujeitas a
despejos forçados deve incluir, em particular, a obrigação de consultar as partes afectadas no sentido de
serem encontradas soluções alternativas ao despejo e a obrigação de fixar um período de pré-aviso razoável
relativamente à data do despejo. A lei deve igualmente impedir despejos realizados durante a noite ou o
inverno e proporcionar os meios de ação e o apoio legais necessários ao recurso aos tribunais. Deve ser
facultada uma compensação por despejos ilegais. Quando o despejo seja justificado por interesse público, as
autoridades devem adotar medidas no sentido de realojar ou assistir financeiramente as pessoas visadas.»
• Artigo 12.º – Uso habitacional
Cf. definição de «alojamento local» no Decreto-Lei n.º 128/2014, de 29 de agosto, na sua redação atual.
• Artigo 13.º – Conceito de «habitat»
A consideração do «habitat» como urbano ou rural, para efeitos do presente diploma, corresponde à
classificação do solo como «urbano» ou «rústico» na lei de bases gerais da política pública de solos, de
ordenamento do território e de urbanismo (Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, artigo 10.º).
• Artigo 21.º – Sector social
Cf. Lei de bases da Economia Social, Lei n.º 30/2013, de 8 de maio.
• Artigo 22.º – Associações e organizações de moradores
Ver artigo 263.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
Página 12
SEPARATA — NÚMERO 91
12
• Artigo 27.º – Municípios
j) Cf. com a definição de «Imóvel em situação de disponibilidade» como «prédio urbano ou misto que, no
todo ou em parte, tenha sido declarado como devoluto ou se encontre sem utilização por um período não
inferior a três anos consecutivos, e para o qual não exista um projeto concreto de ocupação a executar no
prazo máximo de um ano, bem como a fração autónoma que se encontre na mesma situação», constante do
Decreto-Lei n.º 150/2017, e que se aplica aos imoveis do domínio privado da administração direta e indireta do
Estado, incluindo os institutos públicos.
o) Existe gentrificação quando uma área ou um bairro são afetados pela alteração das dinâmicas locais
que, ao valorizá-los, afetam os residentes, devido ao aumento de custos da habitação e outros bens e
serviços, dificultando ou impedindo a sua permanência no local; existe turistificação quando o processo de
alteração é originado pela substituição do uso habitacional por usos turísticos, com o consequente aumento de
custos da habitação e serviços, dificultando ou impedindo a permanência dos residentes no local.
p) Considera-se aqui o conceito de «rede social» constante do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 115/2006, de 14
de junho, que regulamenta a rede social, definindo o funcionamento e as competências dos seus órgãos, bem
como os princípios e regras subjacentes aos instrumentos de planeamento que lhe estão associados, em
desenvolvimento do regime jurídico de transferência de competências para as autarquias locais.
• Artigo 28.º – Freguesias
2. Ver artigo 12.º, n.º 1, alínea r) da Lei da reorganização administrativa de Lisboa (Lei n.º 56/2012, de 8 de
novembro) na redação atual
3. Cf artigo 265.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
• Artigo 39.º – Programa Local de Habitação
2. O conceito de «Área de Reabilitação Urbana» é o que consta dos artigos 13.º e seguintes do Regime
Jurídico da Reabilitação Urbana, na sua redação atual. São exemplo do tipo de planos especiais referidos no
final do nº 2: os Planos Estratégicos de Desenvolvimento Urbano ou PEDU, que dão suporte à
contratualização de estratégias de desenvolvimento urbano para os centros urbanos de nível superior, no
âmbito do Portugal 2020; os Planos de Ação para a Regeneração Urbana ou PARU, que dão suporte à
contratualização de ações de regeneração urbana para os centros urbanos complementares no âmbito do
Portugal 2020; e os Planos de Ação Integrada para as Comunidades Desfavorecidas ou PAICD, que dão
suporte a ações para a integração de comunidades desfavorecidas no âmbito do Portugal 2020 e podem estar
integrados em centros urbanos complementares ou de nível superior.
• Artigo 43.º – Endividamento municipal
O artigo 107.º da Lei do Orçamento do Estado para 2018 (Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro) majorou
até 30% o limite de endividamento municipal fixado na alínea b) do n.º 3 do artigo 52.º da Lei das Finanças
Locais (Lei n.º 73/2013, de 3 de setembro, na redação atual), desde que se trate, exclusivamente, de
empréstimos para financiamento de operações de reabilitação urbana.
• Artigo 44.º – Fundos de Habitação e Reabilitação
2. Cf. com o «fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística» previsto no artigo 62.º, n.º 4, da
Lei n.º 31/2014, de 30 de maio — Lei de bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território
e de urbanismo.
4. Cf. com o «fundo municipal de urbanização» previsto no Capítulo XIV do Decreto-Lei n.º 794/76, de 5 de
novembro, que aprovou a nova lei de solos do pós 25 de Abril. Este fundo devia ser criado em todas as sedes
de distrito e nos municípios com aglomerados superiores a 10 000 habitantes e era destinado «à satisfação
Página 13
15 DE MAIO DE 2018
13
dos encargos com o estudo e realização de projetos relativos a operações e trabalhos de urbanização,
construção e reconstrução de habitações a cargo da autarquia». Previa a afetação de uma série de receitas,
incluindo fiscais. O Decreto-Lei n.º 794/76 só viria a ser revogado com a Lei n.º 31/2014 — Lei de bases gerais
da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo, referida na nota anterior.
• Artigo 54.º – Informação sobre o mercado habitacional
2. a) Consideram-se aqui os conceitos de «sobrelotação habitacional» como definido no n.º 3 do artigo 5.º,
o de «privação severa das condições de habitação» como definido na alínea q) do artigo 2.º e o de
«sobrecarga de despesas com habitação» como definido na alínea x) do artigo 2.º.
• Artigo 66.º – Direitos processuais em matéria de habitação
O Protocolo Adicional à Carta Social Europeia, prevendo um sistema de reclamações coletivas, foi aberto à
assinatura pelos Estados-membros do Conselho da Europa, em Estrasburgo, em 9 de novembro de 1995, e
ratificado por Portugal através da Resolução da Assembleia da República n.º 69/97, aprovada em 2 de outubro
de 1997.
• Artigo 81.º – Pessoas Sem-Abrigo
Ver nota relativa ao conceito de rede social referida no artigo 27.º, p).
VI. A palavra aos cidadãos, aos demais poderes públicos e à sociedade civil
Esta proposta constitui igualmente uma saudação e um reconhecimento a todas as lutas cidadãs que ao
longo de décadas têm colocado o direito à habitação na agenda política: elas têm sido o principal motor de
todos os avanços e conquistas, bem como o grande aguilhão junto dos poderes públicos em defesa do direito
à habitação.
Agradecemos também todos os apoios e ensinamentos que nos permitiram chegar aqui, com destaque
para o cada vez maior número de estudos e investigações nas universidades portuguesas sobre esta
temática1. A elaboração deste projeto resulta da análise e maturação de numerosos trabalhos académicos
nacionais e internacionais e de vários documentos públicos produzidos a nível nacional e internacional sobre
temáticas de habitação, bem como da análise e comparação com os vários textos de leis de bases ou leis
quadro.
Esta iniciativa dirige-se ainda, em muito, à geração jovem. É cada vez mais tardio o seu ingresso numa
vida cativa com um mínimo de condições de estabilidade que lhes permita alcançar a sua autonomia
económica e social e o seu núcleo familiar. Temos a geração jovem mais bem preparada de sempre, mas, ao
mesmo tempo, a que mais tarde consegue aceder, quando acede, a um trabalho estável e a uma habitação
autónoma. É do êxito desta geração que depende o futuro de Portugal. É nosso dever criar todas as condições
para que o possam sonhar e construir.
Este diploma pretende ser um pontapé de saída para a concretização de uma Lei de Bases da Habitação,
há muito desejada e que seja participada e eficaz. Está por isso aberto não apenas ao debate parlamentar e
ao confronto com as iniciativas dos restantes grupos parlamentares, mas também às críticas, sugestões e
propostas dos cidadãos, poderes públicos e demais sociedade civil.
Só assim honraremos o mote da palavra de ordem do 25 de Abril de 1974, que de novo comemoramos: «O
povo é quem mais ordena».
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis as Deputadas e os Deputados do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista abaixo-assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
1 Agradecimento especial é devido a Gonçalo Antunes, pela excelente e inédita compilação e análise de 200 anos de políticas
públicas de habitação em Portugal, na sua tese de doutoramento intitulada “Políticas sociais de habitação (1820-2015): espaço e tempo no Concelho de Lisboa”, FCSH-UNL, 2017
Página 14
SEPARATA — NÚMERO 91
14
CAPÍTULO I
DIREITO À HABITAÇÃO
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece as bases gerais da política de habitação, com vista a garantir a todos o acesso
efetivo a uma habitação condigna.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos da presente lei entende-se por:
a) «Agregado familiar», o conjunto de pessoas que vivem na mesma habitação em economia comum e
que têm entre si laços familiares;
b) «Área urbana de génese ilegal» ou «AUGI», o prédio ou conjunto de prédios que, sem licença de
loteamento, tenham sido objeto de operações físicas de parcelamento destinadas à construção até 31 de
dezembro de 1984 ou que tenham sido parcelados anteriormente de 29 de novembro de 1965;
c) «Carga das despesas associadas a habitação», o indicador que traduz o rácio entre as despesas
anuais associadas à habitação e o rendimento disponível do agregado, deduzindo as transferências sociais
relativas à habitação em ambos os elementos da divisão;
d) «Colmatação urbana», a operação urbanística em terreno não edificado, localizado em contexto
dominantemente urbanizado, destinada a fomentar a regeneração de áreas urbanas e a consolidar e a
estruturar a cidade alargada;
e) «Habitação pública», o imóvel com vocação habitacional, propriedade de uma entidade pública,
independentemente do seu uso e forma de gestão;
f) «Habitação com apoio público», o imóvel com vocação habitacional, propriedade de uma entidade
privada ou social, que beneficia ou beneficiou na sua aquisição, construção, manutenção, reabilitação ou
arrendamento, de qualquer tipo de apoio público, nomeadamente em bens móveis ou imóveis, de natureza
pecuniária, fiscal ou outra;
g) «Habitação a custos controlados», a modalidade de habitação com apoio público, construída ou
adquirida com apoio específico do Estado no quadro do respetivo regime legal;
h) «Habitação acessível», o imóvel com vocação habitacional destinado a primeira habitação, em
condições de venda ou arrendamento compatíveis com o rendimento familiar;
i) «Habitação abandonada», imóvel com vocação habitacional que não seja legitimamente fruído por
qualquer pessoa e cuja conservação não é assegurada pelos respetivos proprietários;
j) «Habitação devoluta», o imóvel com vocação habitacional que se encontre injustificadamente
desocupado, sendo indícios de desocupação, nos termos e com as exceções legais, a inexistência de
contratos em vigor com empresas de telecomunicações, de fornecimento de água, gás e eletricidade e a
inexistência de faturação relativa a consumos de água, gás, eletricidade e telecomunicações;
k) «Habitação precária», a habitação que não reúne todas as condições legais exigíveis, nomeadamente
a que é obtida através de autoconstrução, mas que é utilizada de forma habitual e permanente;
l) «Habitação de utilização sazonal», a habitação que, não constituindo habitação permanente, é fruída
num período temporalmente limitado como habitual, ficando devoluta no resto do ano;
m) «Parque habitacional», o conjunto de todos os imóveis com vocação habitacional existentes num dado
território, independentemente de se tratar de património público, social ou privado;
n) «Pessoa sem-abrigo», a pessoa que, independentemente da sua nacionalidade, origem racial ou
étnica, religião, idade, sexo, orientação sexual, condição socioeconómica e condição de saúde física e mental,
se encontre sem teto, vivendo no espaço público, em abrigo de emergência ou com paradeiro em local
precário, ou sem casa, em alojamento temporário para o efeito;
Página 15
15 DE MAIO DE 2018
15
o) «Preço de mercado declarado», o preço de venda ou arrendamento no mercado habitacional
declarado pelos particulares à Autoridade Tributária;
p) «Primeira habitação», a habitação que é utilizada como residência habitual e permanente pelo
indivíduo, pelo agregado familiar ou pela unidade de convivência;
q) «Privação severa das condições de habitação», a condição da população que vive num espaço de
habitação sobrelotado e com, pelo menos, um dos seguintes problemas: inexistência de instalação de banho
ou duche no interior do alojamento; inexistência de sanita com autoclismo, no interior do alojamento; teto que
deixa passar água, humidade nas paredes ou apodrecimento das janelas ou soalho; luz natural insuficiente
num dia de sol;
r) «Renda apoiada», a renda resultante do regime do arrendamento apoiado, nos termos do qual o valor
da renda é função do rendimento do agregado familiar, independentemente do valor da habitação;
s) «Renda condicionada» ou «renda técnica», a renda calculada, nos termos da lei, em função do valor
patrimonial tributário da habitação, independentemente do rendimento do agregado familiar nela residente;
t) «Renda livre», a renda estabelecida por acordo entre o senhorio e o inquilino, nos termos do regime do
arrendamento urbano;
u) «Renda acessível», a renda que seja significativamente inferior ao limite de 40% do rendimento
disponível do agregado familiar;
v) «Serviços públicos essenciais», os bens e serviços como tal definidos na legislação respetiva,
nomeadamente: fornecimento de água; fornecimento de energia; comunicações; serviços postais; recolha e
tratamento de águas residuais; e recolha e gestão de resíduos sólidos urbanos;
w) «Sobrelotação habitacional», a situação de uma habitação cuja dimensão ou tipologia é insuficiente
para o número de pessoas e composição do agregado familiar ou unidade de convivência nela residente;
x) «Sobrecarga das despesas em habitação», a condição dos agregados familiares cuja carga das
despesas associadas à habitação é superior a 40% dos respetivos rendimentos.
y) «Taxa de esforço habitacional», a percentagem do rendimento disponível do agregado familiar afeta à
totalidade das despesas associadas à habitação;
z) «Uso habitacional», o uso a que se destina um imóvel, como tal definido nos instrumentos de gestão
territorial com vocação para o constituir;
aa) «Unidade de convivência», o conjunto de indivíduos que vive na mesma habitação de forma
habitual e permanente, independentemente da relação existente entre si.
Artigo 3.º
Princípios gerais
1. O direito a uma habitação condigna é um direito fundamental de todos os cidadãos portugueses,
reconhecido pelo artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, que deve ser garantido a todos nos
termos constitucionais, dos deveres e compromissos internacionais do Estado português, da presente lei e
demais legislação aplicável.
2. Com vista a assegurar o exercício efetivo do direito à habitação, o Estado deve tomar as medidas
adequadas que se destinem a favorecer o acesso à habitação de nível suficiente, a prevenir e reduzir a
situação de pessoa sem-abrigo, com vista à sua progressiva eliminação, e a tornar o preço da habitação
acessível às pessoas que não disponham de recursos suficientes.
3. A promoção e a defesa da habitação são prosseguidas através da atividade dos cidadãos, do Estado,
de outros entes públicos e de entidades privadas, podendo as organizações da sociedade civil ser associadas
àquela atividade, nos termos da lei.
4. A promoção do acesso à habitação obedece aos seguintes princípios:
a) Universalidade do direito a uma habitação condigna para todos os indivíduos e suas famílias, incluindo o
acesso aos bens e serviços essenciais que lhe são inerentes, nomeadamente o abastecimento de água,
saneamento básico, energia e, na área da habitação, transportes e comunicações;
b) Igualdade de oportunidades e coesão territorial, com medidas de discriminação positiva adequadas para
os territórios mais carenciados, independentemente de se situarem em meio urbano ou rural, central ou
periférico, litoral ou interior e continental ou insular;
Página 16
SEPARATA — NÚMERO 91
16
c) Sustentabilidade social, económica e ambiental, com vista a: garantir o acesso à habitação em todas as
idades da vida, incluindo a juventude e a terceira idade, bem como às camadas mais vulneráveis da
população; corrigir as falhas ou disfunções do mercado habitacional; e promover a melhor utilização e
reutilização dos recursos disponíveis;
d) Descentralização, subsidiariedade e cooperação, implicando todos os níveis da administração pública,
com vista a reforçar uma abordagem de proximidade e adequar as competências e recursos às necessidades
identificadas;
e) Transparência e participação dos cidadãos, tanto na definição das políticas públicas como nas
respostas concretas às carências habitacionais detetadas, apoiando as iniciativas das comunidades locais e
das populações.
Artigo 4.º
Função social da habitação
1. Considera-se função social da habitação o dever do proprietário de um imóvel ou fração habitacional de
fazer uso do seu bem de forma a que o exercício do direito de propriedade contribua para o interesse geral.
2. Sem prejuízo do direito à propriedade privada e à sua fruição, nos termos do artigo 62.º da Constituição,
os titulares de imóveis ou frações habitacionais que sejam detidos por entidades privadas devem participar, de
acordo com a lei, na prossecução do objetivo nacional de garantir a todos, para si e para as suas famílias, o
direito a uma habitação condigna.
3. As habitações que se encontrem injustificadamente devolutas ou abandonadas incorrem em
penalizações definidas por lei, nomeadamente fiscais e/ou contraordenacionais, e podem ser requisitadas
temporariamente, mediante indemnização, pelo Estado, pelas regiões autónomas ou por autarquias locais, nos
termos e pelos prazos que a lei determinar, a fim de serem colocadas em efetivo uso habitacional, mantendo-
se no decurso da requisição a titularidade privada da propriedade.
CAPÍTULO II
DA HABITAÇÃO E DO «HABITAT»
Seção I
Da Habitação
Artigo 5.º
Dimensão adequada da habitação
1. A lei define os requisitos mínimos para a qualificação das habitações, tendo em conta a respetiva
tipologia, o número e área das divisões e espaços complementares e a existência das correspondentes redes
de abastecimento de água, saneamento básico, energia, e transportes e comunicações.
2. Uma habitação considera-se de dimensão adequada ao agregado familiar ou à unidade de convivência
que nela reside se a área dos compartimentos e espaços complementares, o número de quartos e as redes de
abastecimento, saneamento e energia disponíveis forem suficientes e não provocarem situações de
insalubridade, sobrelotação ou risco de promiscuidade.
3. Existe sobrelotação habitacional quando a área útil ou o número de quartos de dormir da habitação não
for suficiente para o número de pessoas que nela reside, tendo em conta a respetiva idade, condição de
saúde, sexo e tipo de relações entre si.
4. Existe risco de promiscuidade quando não seja possível garantir quartos de dormir diferenciados para
preservar a intimidade das pessoas e a privacidade familiar.
5. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais desenvolvem uma política tendente à adaptação
dos fogos existentes que não cumpram os requisitos legais respeitantes à dimensão das habitações, a qual
assegurará incentivos à conversão e requalificação destes.
Página 17
15 DE MAIO DE 2018
17
Artigo 6.º
Higiene, salubridade, conforto, segurança e acessibilidade
1. O acesso à habitação importa a garantia de condições de higiene, salubridade, conforto, segurança e
acessibilidade e é promovido por todas as entidades públicas e privadas envolvidas no setor de habitação, no
âmbito das suas responsabilidades.
2. A garantia prevista no número anterior é prosseguida, nomeadamente, através:
a) Da definição, pela lei, de requisitos mínimos, nomeadamente no que concerne à implantação, acessos,
áreas mínimas, métodos construtivos, iluminação natural e ventilação, bem como das formas da respetiva
fiscalização por parte das entidades públicas competentes;
b) Do acesso generalizado a redes de abastecimento de energia, água, saneamento, comunicações e
demais serviços públicos essenciais;
c) Da promoção, por parte dos entes públicos, de políticas tendentes à eliminação de fenómenos de
segregação ou de criação de fogos habitacionais em áreas não destinadas a uso habitacional, nos termos da
legislação e regulamentação urbanística, ou não servidas por serviços públicos essenciais;
d) Do efetivo sancionamento das entidades que incumpram os seus deveres legais em matéria de
habitação ou que promovam a habitação em condições de higiene, salubridade, conforto e segurança
incompatíveis com a legislação vigente;
e) Da definição e implementação de regras de acessibilidade que garantam que quer o acesso ao fogo,
quer a respetiva fruição, são proporcionados a todos os cidadãos independentemente da sua condição física.
3. A lei e a atuação dos poderes públicos garantem ainda a promoção da sustentabilidade ambiental e o
reforço da resiliência sísmica dos edifícios.
Artigo7.º
Acesso a serviços públicos essenciais
O direito a uma habitação condigna implica o acesso universal a serviços públicos essenciais, definidos em
legislação própria, incumbindo ao Estado, em articulação com as demais entidades competentes, promover o
alargamento das redes de abastecimento de água, de saneamento, de energia e de transportes e
comunicações aos locais em que estas não existam.
Artigo 8.º
Intimidade pessoal e privacidade familiar
1. A lei e a atuação das entidades públicas competentes devem assegurar a preservação da intimidade
pessoal e da privacidade familiar, nos termos da Constituição e da lei.
2. A existência de sobrelotação ou risco de promiscuidade, definidos no artigo 5.º, relativamente a
agregados familiares ou unidades de convivência com carência económica, é tida em conta na atribuição de
habitação pública ou com apoio público.
Artigo 9.º
Proteção do domicílio
1. Todos os cidadãos têm direito a um domicílio, no lugar da sua residência habitual ou ocasional.
2. O domicílio goza de proteção contra o acesso ilegal de entidades públicas ou privadas.
3. Todos têm o direito de proteger o respetivo domicílio nos termos da lei.
Página 18
SEPARATA — NÚMERO 91
18
Artigo 10.º
Direito à morada
1. O Estado promove e garante a todos os cidadãos o direito a uma morada postal, inerente ao exercício
dos direitos de cidadania, incluindo o serviço de entrega de correspondência.
2. As autarquias têm o dever de garantir a identificação toponímica de todas as habitações existentes na
sua área, incluindo zonas urbanas recentes, áreas urbanas de génese ilegal, núcleos de habitação precária,
habitação dispersa ou habitações isoladas.
3. As organizações de moradores têm o direito de participar no processo de nomeação e identificação
toponímica dos respetivos bairros ou zonas de intervenção.
4. As pessoas sem-abrigo têm o direito de indicar como morada postal um local de sua escolha, ainda que
nele não pernoitem.
Artigo 11.º
Proteção e acompanhamento no despejo
1. Os cidadãos gozam legal de proteção contra o despejo quando esteja em causa a sua primeira
habitação.
2. O despejo de primeira habitação não se pode realizar nos meses de inverno nem no período noturno,
depois das 20 horas ou antes das 8 horas, salvo em caso de emergência, nomeadamente incêndio, risco de
calamidade ou situação de ruína iminente.
3. Considera-se que o despejo é forçado quando a privação da habitação habitual e permanente é devida
a uma situação de insolvência ou insuficiência económica do indivíduo ou agregado familiar nela residente, ou
ao facto de se tratar de uma habitação precária.
4. As entidades públicas não podem promover o despejo forçado ou a demolição de habitações precárias
de indivíduos ou agregados familiares vulneráveis sem garantir previamente soluções alternativas de
alojamento.
5. Em caso de ocupação ilegal de habitações públicas, o despejo deve obedecer a regras procedimentais
previamente estabelecidas.
6. São garantidas, nomeadamente:
a) A impenhorabilidade da casa de morada de família para satisfação de créditos fiscais ou contributivos,
nos termos da lei;
b) A obrigação de consultar as partes afetadas no sentido de serem encontradas soluções alternativas ao
despejo e um período de pré-aviso razoável relativamente à data do despejo;
c) A existência de meios de ação e apoio legais necessários para o recurso aos tribunais;
d) A existência de serviços públicos de apoio e acompanhamento em caso de despejo forçado, os quais
devem procurar ativamente soluções alternativas de alojamento ou apoio financeiro, por forma a evitar que
indivíduos ou agregados familiares vulneráveis caiam na condição de pessoa sem-abrigo;
e) A proteção legal e os apoios necessários para garantir estabilidade e segurança na sua primeira
habitação aos inquilinos com mais de 65 anos ou com deficiência com grau comprovado de incapacidade igual
ou superior a 60%, incluindo a obrigatoriedade de retorno à mesma habitação, após obras profundas ou
coercivas, se ela se mantiver, ou, se tal não suceder, o realojamento em condições análogas às que
anteriormente detinha.
Artigo 12.º
Uso habitacional
1. A vocação do solo ou dos imóveis para uso habitacional depende da sua conformidade com os
instrumentos de gestão territorial.
2. A utilização concreta de um imóvel ou fração para fins habitacionais carece de autorização de utilização
conferida pelo município, nos termos da lei e salvas as exceções nela previstas.
Página 19
15 DE MAIO DE 2018
19
3. A utilização de um imóvel ou fração habitacional como estabelecimento hoteleiro ou como alojamento
local temporário, cedido a turistas mediante remuneração, requer autorização de utilização específica para
esses fins, a conferir pelos municípios da área, e implica o cumprimento dos respetivos requisitos legais e
regulamentares.
Seção II
Do «Habitat»
Artigo 13.º
Conceito de «habitat»
1. Entende-se por «habitat» o contexto territorial, exterior à unidade habitacional, em que esta se encontra
inserida, nomeadamente no que diz respeito às infraestruturas e equipamentos coletivos existentes, ao acesso
a serviços públicos essenciais e a redes de transportes e comunicações.
2. O «habitat» pode ser urbano ou rural.
Artigo 14.º
Valorização do «habitat»
1. A garantia do direito à habitação compreende a existência de um «habitat» que assegure condições de
salubridade, segurança, qualidade ambiental e integração social, permitindo a fruição plena da unidade
habitacional e dos espaços e equipamentos de utilização coletiva, e contribuindo para a qualidade de vida e
bem-estar dos indivíduos, bem como para a defesa e valorização do território e da paisagem, a proteção dos
recursos naturais e a salvaguarda dos valores culturais e ambientais.
2. A valorização do «habitat» urbano compreende:
a) A existência de redes e serviços de apoio à infância, nomeadamente no que concerne ao acesso a
creches, jardins infantis e espaços e instalações públicos dedicados à criança;
b) A proximidade de equipamentos de ensino pré-escolar e obrigatório, em número e dimensão adequados
ao núcleo residencial ou ao aglomerado urbano que servem;
c) A proximidade de equipamentos de saúde, nomeadamente ao nível dos cuidados primários e
continuados, bem como de equipamentos ou serviços de apoio aos idosos e às pessoas com deficiência;
d) A garantia das condições de salubridade e higiene urbana;
e) A proteção adequada contra riscos ambientais, naturais ou antrópicos;
f) A manutenção de condições de calma e tranquilidade públicas, nomeadamente no tocante à limitação
dos fatores de ruído.
3. A valorização do «habitat rural» compreende:
a) A existência de um sistema ordenado de gestão do espaço rural envolvente, garantindo a sua
sustentabilidade e segurança;
b) A proximidade de um aglomerado urbano que disponha de cuidados de saúde primários e continuados e
de equipamentos de ensino pré-escolar e obrigatório, equipamentos ou serviços de apoio aos idosos e às
pessoas com deficiência, bem como a existência de transportes públicos que garantam a respetiva
acessibilidade;
c) A proteção e preservação das características do território e da paisagem que lhe confiram identidade
cultural própria;
d) A proteção adequada contra riscos ambientais, naturais ou antrópicos.
Artigo 15.º
Rede adequada de equipamentos e serviços sociais e de transportes
Página 20
SEPARATA — NÚMERO 91
20
1. Para salvaguarda da qualidade do «habitat», incumbe ao Estado assegurar uma rede adequada de
equipamentos e serviços sociais e de transportes.
2. Para efeitos do número anterior, são garantidas pelas entidades públicas competentes:
a) A previsão das redes de infraestruturas e de espaços para instalação de equipamentos sociais no
âmbito dos instrumentos de gestão territorial à escala regional e local;
b) A criação e manutenção de sistemas de transportes, incluindo públicos, que permitam, nomeadamente,
as deslocações quotidianas entre a habitação e o local de trabalho, bem como o acesso a outras zonas do
país.
3. A lei estabelece os requisitos técnicos a que devem obedecer as servidões de passagem e em geral os
acessos às habitações, tendo em vista a circulação, em segurança, de pessoas e veículos automóveis,
nomeadamente serviços de emergência e socorro a qualquer hora do dia ou da noite, bem como define as
autoridades competentes para fiscalizar e intervir na defesa da legalidade.
Artigo 16.º
Direito à escolha do lugar de residência
1. O Estado respeita e promove o direito dos cidadãos à escolha do lugar de residência, de acordo com as
suas necessidades, possibilidades e preferências, e sem prejuízo dos condicionamentos urbanísticos.
2. Em caso de realojamento habitacional por entidades públicas, no âmbito das respetivas competências, é
obrigatória a auscultação dos envolvidos por forma a respeitar o seu direito à escolha do lugar de residência,
assegurando sempre que possível a permanência dos agregados a realojar na proximidade do lugar onde
anteriormente residiam.
3. Em caso de realojamento por entidades privadas, determinado por imperativo legal, é promovida a
permanência dos arrendatários ou cessionários de habitações na proximidade do lugar onde anteriormente
residiam, sem prejuízo do disposto na alínea e) do número 6 do artigo 12.º.
CAPÍTULO III
AGENTES DA POLÍTICA DE HABITAÇÃO
Seção I
Entidades Privadas
Artigo 17.º
Pessoas e famílias
1. O Estado promove a política de habitação direcionada para as pessoas e famílias, nomeadamente para
assegurar a estabilidade e segurança da primeira habitação.
2. As unidades de convivência gozam de proteção legal relativamente à primeira habitação.
3. Todos têm direito a:
a) Usar e fruir as suas habitações, nos termos da lei;
b) Beneficiar, nos termos da lei, dos bens do domínio público e usar as infraestruturas de utilização
coletiva;
c) Aceder, em condições de equidade, a espaços coletivos e de uso público, designadamente espaços
verdes, outros espaços de utilização coletiva e equipamentos sociais e culturais.
4. Os jovens gozam de especial proteção no acesso à habitação com vista à promoção da sua autonomia
e independência social e económica.
5. Os cidadãos com deficiência têm direito a medidas de discriminação positiva no acesso à habitação e à
garantia de condições físicas de acessibilidade nas respetivas habitações, no espaço público e nos
equipamentos de utilização coletiva.
Página 21
15 DE MAIO DE 2018
21
6. As pessoas idosas gozam de especial proteção no acesso e manutenção de habitação adequada e
adaptada às suas condições de saúde e mobilidade.
Artigo 18.º
Empresas e outras entidades privadas
As empresas e outras entidades de direito privado, nomeadamente dos setores imobiliário e conexos,
financeiro e de prestação de serviços e bens essenciais, participam na promoção do direito à habitação e na
valorização do «habitat», no âmbito da prossecução do respetivo objeto social, e com respeito pelas leis e pelo
interesse geral.
Seção II
Setor social
Artigo 19.º
Liberdade de organização e associação
Os cidadãos têm direito a organizar-se livremente de forma a promover respostas habitacionais e medidas
de apoio à habitação, bem como de preservação ou melhoria do respetivo «habitat», incluindo o acesso a
redes de infraestruturas e equipamentos coletivos e a fruição de zonas verdes e espaços públicos.
Artigo 20.º
Cooperativas de habitação e autoconstrução
1. O Estado fomenta a criação de cooperativas de habitação e a autoconstrução, nos termos da
Constituição e da lei.
2. As cooperativas de habitação contribuem para a melhoria da qualidade habitacional dos espaços em
que se integram, promovendo o tratamento das áreas envolventes dos empreendimentos por que são
responsáveis, incluindo as zonas de lazer, e assegurando a manutenção permanente das boas condições de
habitabilidade dos edifícios.
3. Às cooperativas de habitação que tenham por objeto principal a promoção, construção, aquisição e
arrendamento ou gestão de fogos para habitação acessível, bem como a sua manutenção, reparação ou
remodelação, são garantidos incentivos e apoios públicos, nomeadamente:
a) Um regime tributário que assegure discriminação positiva aos seus projetos;
b) Incentivos específicos;
c) Simplificação dos procedimentos administrativos.
4. As autarquias locais estimulam a participação do setor cooperativo nas suas políticas de habitação, no
quadro das respetivas prioridades, nomeadamente através da cedência de terrenos ou imóveis municipais
destinados à construção ou reabilitação de habitação acessível, e de benefícios tributários ou outros
incentivos.
5. O Estado e as autarquias locais respeitam a capacidade de autoconstrução dos cidadãos e suas
famílias, promovem medidas de apoio adequadas ao enquadramento desta capacidade no âmbito do direito à
habitação e no cumprimento das normas urbanísticas e contribuem para o financiamento das respetivas
soluções habitacionais.
Artigo 21.º
Setor social
1. As entidades dotadas de personalidade jurídica, que respeitem os princípios orientadores da economia
social, nomeadamente as associações mutualistas, as misericórdias, as fundações, as instituições particulares
de solidariedade social, as associações com fins altruísticos que atuem no âmbito cultural, recreativo, do
Página 22
SEPARATA — NÚMERO 91
22
desporto e do desenvolvimento local e as entidades abrangidas pelos subsetores comunitário e
autogestionário, participam na satisfação do direito à habitação e na valorização do «habitat», cooperando
com o Estado, as autarquias e outras entidades públicas em projetos e ações que visem esse objetivo.
2. As entidades do setor social podem incluir nos seus objetivos estatutários a promoção e/ou a gestão de
habitação acessível.
Artigo 22.º
Associações e organizações de moradores
1. As associações e organizações de moradores gozam do direito de petição perante as autarquias locais
relativamente a todos os assuntos da competência destas que sejam do interesse dos moradores.
2. As associações e organizações de moradores, bem como as suas estruturas federativas, são
auscultadas e participam na definição das políticas de habitação.
3. As associações e organizações de moradores beneficiam de apoios à respetiva constituição e atividade,
nomeadamente:
a) Isenção de custos na respetiva constituição;
b) Benefícios fiscais respeitantes à sua atividade;
c) Participação no Conselho Nacional e nos Conselhos Locais de Habitação;
d) Audição no âmbito da elaboração da Estratégia Nacional de Habitação e dos programas locais de
habitação.
4. As associações e organizações de moradores participam na identificação das carências habitacionais
nas áreas que lhes correspondem e nos levantamentos locais dos recursos habitacionais disponíveis,
nomeadamente habitações devolutas ou abandonadas.
5. As associações e organizações de moradores podem propor aos municípios a requisição temporária
para fins habitacionais, nos termos da presente lei, de imóveis devolutos ou abandonados com vocação
habitacional.
6. Cabe às assembleias de freguesia, por sua iniciativa ou a requerimento de comissões de moradores ou
de um número significativo de moradores, demarcar as áreas territoriais das organizações de moradores de
âmbito territorial inferior ao da freguesia, solucionando os eventuais conflitos daí resultantes.
Artigo 23.º
Contratos administrativos com entidades do setor social
A fim de assegurar o cumprimento das prioridades definidas nas polícias nacionais, regionais e locais de
habitação, o Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais devem promover a celebração com
entidades do setor social de contratos administrativos, de cooperação ou de incentivo, que as incentivem e/ou
vinculem a colaborar na execução de programas considerados prioritários.
Seção III
Setor público
Artigo 24.º
Estado
1. O Estado é o principal garante do direito à habitação, o decisor da política nacional de habitação e o
incentivador e fiscalizador das políticas de regionais e municipais de habitação.
2. Para o cumprimento do disposto no número anterior, incumbe ao Estado:
a) Proceder anualmente ao levantamento rigoroso e público da situação existente no país em matéria de
habitação;
b) Programar e executar as políticas nacionais de habitação e de ordenamento do território;
Página 23
15 DE MAIO DE 2018
23
c) Promover, em colaboração com as regiões autónomas e as autarquias locais, a construção e
reabilitação de habitações públicas em número e dimensão suficientes;
d) Garantir as condições para a valorização do «habitat» urbano e rural, em colaboração com as regiões
autónomas e as autarquias;
e) Garantir as condições para um ordenamento do território sustentável e para a defesa da paisagem, dos
recursos naturais e dos valores ambientais e culturais;
f) Definir uma política de solos compatível com os objetivos das políticas de habitação e de ordenamento
do território;
g) Garantir, em colaboração com as regiões autónomas e as autarquias, a cobertura integral do território
em matéria de acesso a redes de infraestruturas, serviços públicos essenciais e equipamentos e serviços
coletivos, nomeadamente no quadro das políticas de educação, saúde, segurança social e cultura;
h) Regular a atividade do setor da construção, reabilitação, promoção, gestão e mediação imobiliária,
através da participação das respetivas estruturas associativas e com subordinação à lei e ao interesse geral;
i) Definir os regimes legais de arrendamento e as modalidades de apoio ao arrendamento e ao acesso à
habitação própria, e assegurar a estabilidade e segurança da primeira habitação das pessoas e famílias;
j) Combater todas as formas de discriminação no acesso à habitação, nomeadamente sancionando-as
através de via penal ou contraordenacional;
k) Promover a compatibilidade das rendas com os rendimentos familiares;
l) Criar e desenvolver os instrumentos necessários, incluindo financeiros, para a concretização da política
nacional da habitação;
m) Promover a transparência do mercado imobiliário, divulgando regularmente informação estatística, de
origem pública, sobre os valores de venda e arrendamento;
n) Promover a inovação tecnológica e social no domínio da satisfação das necessidades habitacionais da
população.
Artigo 25.º
Regiões Autónomas
As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira garantem a definição e promoção das respetivas políticas
regionais de habitação e ordenamento do território e regulam a organização e funcionamento dos instrumentos
promotores do direito à habitação.
Artigo 26.º
Autarquias locais
1. Os municípios e as freguesias participam na efetivação da garantia do direito à habitação, nos termos
da Constituição e da lei, sendo-lhes atribuídas as necessárias competências e respetivos meios para o seu
desenvolvimento, com obediência aos princípios da descentralização, da subsidiariedade e da autonomia do
poder local.
2. O disposto no número anterior à aplicável, com as necessárias adaptações, às associações de
municípios, uniões de freguesias e outras entidades públicas interautárquicas.
Artigo 27.º
Municípios
1. Os municípios programam e executam a respetiva política municipal de habitação, identificando as
carências habitacionais quantitativas e qualitativas bem como as suas dinâmicas de evolução, com vista a
assegurar respostas adequadas no âmbito das políticas municipais ou intermunicipais ou no quadro de
programas nacionais.
2. Para o disposto no número anterior, cabe aos municípios:
a) Proceder ao levantamento periódico da situação existente nos seus territórios em matéria de habitação;
Página 24
SEPARATA — NÚMERO 91
24
b) Integrar a política municipal de habitação nos instrumentos de gestão territorial de âmbito intermunicipal,
municipal ou inframunicipal e respetivos programas de execução, acautelando a previsão de áreas adequadas
e suficientes destinadas ao uso habitacional;
c) Promover a coexistência dos diferentes estratos sociais e etários, bem como a sua distribuição
equitativa no território, e zelar pela sustentabilidade demográfica da população e pela renovação geracional;
d) Promover a colmatação e a reabilitação urbana integrada, incluindo a reabilitação física, económica e
social do tecido urbano, sem limitação à reabilitação física de edifícios;
e) Construir, reabilitar, arrendar ou adquirir habitações destinadas às camadas mais vulneráveis da
população e garantir a gestão e manutenção do património habitacional municipal, bem como a sua adequada
integração urbanística;
f) Apoiar as cooperativas de habitação, nomeadamente nos termos do n.º 4 do artigo 20.º;
g) Promover a construção ou reabilitação de habitações a custos controlados, destinadas a habitação
acessível, própria ou para arrendamento;
h) Contribuir para a melhoria generalizada das condições de habitabilidade do parque habitacional e
fiscalizar o cumprimento das exigências legais por parte dos respetivos proprietários;
i) Zelar pela garantia da função social da habitação, nos termos do artigo 4.º;
j) Promover a requisição temporária para fins habitacionais de imóveis públicos em situação de
disponibilidade ou, mediante indemnização e na sequência de declaração fundamentada prevista na alínea a)
do número 8 do artigo 39.º, de imóveis privados que se encontrem injustificadamente devolutos ou
abandonados, sem prejuízo da manutenção da titularidade da propriedade;
k) Condicionar as operações urbanísticas ao cumprimento das metas habitacionais municipais,
nomeadamente incluindo nas contrapartidas legais exigíveis a inclusão de uma percentagem, com o limite
superior fixado por lei, destinada a habitação acessível;
l) Promover a regeneração urbana das áreas degradadas e a reconversão, sempre que possível, das
áreas urbanas de génese ilegal (AUGI);
m) Incluir os núcleos de habitação precária e as áreas degradadas ou as AUGI não passíveis de
reconversão em programas temporários de melhoria da habitabilidade até à prossecução do realojamento
adequado e suficiente;
n) Combater a segregação espacial e social e todas as formas de discriminação no acesso à habitação,
nomeadamente o assédio imobiliário, entendido como toda a ação ou omissão, praticada com abuso de
direito, que vise perturbar o uso legítimo da habitação pelos que nela residem ou forçá-los a abandoná-la sem
fundamento legal;
o) Prever, monitorizar e compensar as alterações da dinâmica urbana que tenham como consequência
uma valorização excessiva do custo da habitação, que dificulte a permanência no local dos residentes, em
resultado de processos de gentrificação e turistificação;
p) Participar, em articulação com os serviços e redes sociais locais, nos programas e estratégias nacionais
e europeus dirigidos às pessoas sem-abrigo e ao combate à discriminação racial ou étnica;
q) Praticar uma política de solos compatível com os objetivos e metas da política habitacional municipal e
adequar aos mesmos a política fiscal municipal;
r) Garantir no respetivo território o acesso universal às infraestruturas e serviços públicos essenciais, bem
como a adequada acessibilidade aos equipamentos coletivos de educação, saúde, segurança social e cultura
e aos sistemas de mobilidade e transporte público;
s) Proteger e salvaguardar os recursos naturais e culturais e a qualidade ambiental;
t) Assegurar uma permanente vigilância e proteção contra riscos naturais ou antrópicos.
Artigo 28.º
Freguesias
1. As freguesias cooperam com os municípios na programação e execução das políticas municipais de
habitação.
2. Para o disposto no número anterior, as freguesias participam nos processos de levantamento e
identificação das carências habitacionais, dispõem de competências em matéria de identificação, reabilitação e
Página 25
15 DE MAIO DE 2018
25
aproveitamento dos recursos habitacionais disponíveis e podem realizar intervenções pontuais para melhoria
das condições de habitabilidade de fogos nas respetivas áreas territoriais.
3. Os órgãos de cada freguesia podem delegar nas organizações de moradores as tarefas de
levantamento e identificação das carências e recursos habitacionais disponíveis nas respetivas áreas de
atuação, bem como a execução de tarefas para que se encontrem disponíveis e apetrechadas,
nomeadamente em matéria de limpeza e tratamento quotidiano de zonas verdes ou espaços semelhantes.
Artigo 29.º
Outras entidades públicas
1. Para a boa execução da política nacional de habitação, o Estado garante a existência de uma entidade
pública promotora da política nacional de habitação e reabilitação urbana, que coordene a estratégia nacional
de habitação, garanta a articulação com as políticas regionais e locais de habitação e promova o
arrendamento do património público, nos termos do número 1 do artigo 68.º.
2. O Estado, as regiões autónomas e os municípios podem constituir Fundos de Habitação e Reabilitação,
nos termos do artigo 44.º, para apoio das respetivas políticas públicas de habitação.
3. As demais entidades públicas participam na promoção do direito e acesso à habitação, nos termos dos
respetivos estatutos e de acordo com as metas e objetivos definidos na lei, nos instrumentos das políticas
públicas de habitação e em contratos interadministrativos de apoio à habitação.
CAPÍTULO IV
POLÍTICAS PÚBLICAS DE HABITAÇÃO
Seção I
Política nacional
Artigo 30.º
Política nacional de habitação
1. A política nacional de habitação é prosseguida pelo Governo, dentro dos princípios e normas constantes
da presente lei de bases, e concretiza as tarefas e responsabilidades do Estado, de acordo com a Constituição
e os compromissos internacionais de Portugal em matéria de direito à habitação.
2. A política nacional de habitação inclui, obrigatoriamente:
a) O levantamento anual da situação existente no país em matéria de habitação, com identificação das
principais carências quantitativas e qualitativas;
b) A promoção da construção ou reabilitação de habitação pública ou a aquisição ou arrendamento de
habitação privada para garantir o acesso e o direito à habitação das camadas mais vulneráveis;
c) A integração do direito à habitação nas estratégias nacionais de combate à pobreza e à exclusão social
e de erradicação da condição de pessoas sem-abrigo;
d) A inclusão do direito à habitação nas operações de reabilitação e colmatação urbanas, entendidas numa
perspetiva integrada e sustentável e que visem melhorar o «habitat», garantir habitação acessível e promover
a coesão social e territorial;
e) A melhoria das condições de habitabilidade do património habitacional dos setores público, social e
privado;
f) A regulação do mercado habitacional e o combate à especulação;
g) A divulgação regular de dados públicos sobre a evolução das carências habitacionais e sobre eventuais
falhas ou disfunções do mercado habitacional, nos termos do artigo 54.º;
h) A promoção da sustentabilidade e da resiliência sísmica das habitações e dos aglomerados
habitacionais.
Página 26
SEPARATA — NÚMERO 91
26
3. A política nacional de habitação articula-se com as grandes opções plurianuais do Plano e com os
orçamentos de Estado.
4. A política nacional de habitação articula-se com as políticas regionais e locais de habitação, de acordo
com os princípios da descentralização, subsidiariedade e cooperação.
Artigo 31.º
Estratégia Nacional de Habitação
1. A política nacional de habitação é definida na Estratégia Nacional de Habitação, que estabelece os
objetivos, prioridades e programas da política nacional de habitação de acordo com as obrigações do Estado,
nos termos da Constituição e da presente lei.
2. A Estratégia Nacional de Habitação, adiante identificada como ENH, é um documento plurianual,
prospetivo e dinâmico, que integra:
a) Um diagnóstico nacional das carências habitacionais, quantitativas e qualitativas, bem como das
eventuais falhas ou disfunções de mercado, nomeadamente decorrentes da rigidez da oferta ou da sua
escassez a preços acessíveis, da insegurança e instabilidade no uso das habitações, de dinâmicas de
construção e reabilitação insuficientes, da ausência de informação fidedigna ou da valorização súbita e
desajustada dos valores do imobiliário habitacional;
b) Informação sobre o mercado habitacional, nos termos do artigo 54.º;
c) Um levantamento dos recursos habitacionais disponíveis, públicos e privados, e o seu estado de
conservação e utilização;
d) Uma definição estratégica dos objetivos e metas a alcançar no prazo temporal de vigência da ENH,
tendo em conta a evolução do contexto económico e social e dos seus ciclos;
e) O elenco e calendário dos programas e medidas que se pretendem lançar ou desenvolver para cumprir
os objetivos e metas propostos;
f) O enquadramento legislativo e orçamental dos programas e medidas propostos;
g) A identificação dos recursos financeiros a mobilizar, quer em sede de Orçamento do Estado, quer em
sede de programas e estratégias plurianuais europeias, quer ainda através de crédito bancário nacional ou
internacional;
h) A identificação dos diversos agentes, públicos ou privados, a quem cabe a concretização dos programas
e medidas propostos;
i) O programa detalhado de descentralização para as regiões autónomas e as autarquias locais de
património habitacional ou de responsabilidades do Estado em matéria de habitação;
j) O relatório da participação pública na conceção da ENH;
k) O modelo de acompanhamento, controle e avaliação da aplicação da ENH.
5. O conteúdo da ENH é disponibilizado publicamente em sítio eletrónico próprio.
6. A ENH é um documento dinâmico, com um horizonte temporal não superior a 6 anos e que deve revisto
pelo menos de dois em dois anos.
Artigo 32.º
Elaboração, participação, aprovação e monitorização da Estratégia Nacional de Habitação
1. A Estratégia Nacional de Habitação é proposta à Assembleia da República pelo Governo, após consulta
pública e parecer do Conselho Nacional de Habitação, e aprovada por lei da Assembleia da República.
2. A Estratégia Nacional de Habitação é objeto de monitorização, nomeadamente através do Relatório
Anual de Habitação previsto no artigo seguinte.
3. Cabe ao Ministério competente nos termos da Lei Orgânica do Governo apresentar a proposta de
Estratégia Nacional de Habitação, bem como as propostas da sua revisão, promover, coordenar e vigiar a
respetiva execução e articular a sua preparação e execução com a ação dos ministérios que tutelam áreas
conexas.
Página 27
15 DE MAIO DE 2018
27
Artigo 33.º
Relatório Anual de Habitação
1. A entidade pública responsável pela monitorização da ENH assegura a elaboração de um Relatório
Anual sobre o estado do direito à habitação, designado Relatório Anual de Habitação, a apresentar ao
Governo e por este à Assembleia da República até ao fim do primeiro semestre posterior ao ano a que
respeita.
2. Para efeitos do número anterior, o Ministério responsável dá orientações à entidade pública referida no
artigo 29.º, n.º 1, alínea a), a qual pode pedir a colaboração de quaisquer entidades públicas, designadamente
no que respeita à obtenção de dados relevantes.
3. O Relatório Anual de Habitação é apresentado pelo Governo na Comissão parlamentar competente, a
qual emitirá parecer fundamentado sobre ele no prazo de 90 dias.
4. O relatório anual previsto no presente artigo inclui:
a) A avaliação do cumprimento das metas estabelecidas na Estratégia Nacional de Habitação, tendo em
consideração a evolução dos indicadores estatísticos referidos no número 2 do artigo 54.º;
b) Informação consolidada sobre as dotações públicas anuais destinadas às políticas públicas de
habitação a nível nacional, regional e local e sobre as taxas de execução no ano anterior;
c) Uma avaliação detalhada do estado de cumprimento da presente lei de bases;
d) Propostas e recomendações para o futuro.
5. A apresentação do relatório previsto no presente artigo é precedida de parecer do Conselho Nacional de
Habitação, que também será publicado no sítio eletrónico referido no n.º 5 do artigo 31.º.
Artigo 34.º
Conselho Nacional de Habitação
1. É criado o Conselho Nacional de Habitação como órgão de consulta do Governo no domínio da
habitação, no qual participam os membros do governo responsáveis pelo setor, bem como as organizações
profissionais, científicas, setoriais e não governamentais mais representativas e relacionadas com os setores
da habitação e do imobiliário, podendo também ter a participação, sem direito a voto, dos serviços relevantes
da administração pública.
2. O Conselho Nacional de Habitação integra ainda as associações ou estruturas federativas das
cooperativas de habitação e das organizações de moradores.
3. Do Conselho Nacional de Habitação farão parte as associações nacionais dos municípios e das
freguesias.
4. O Conselho Nacional de Habitação pode eleger, no seu seio, uma comissão permanente.
5. O Conselho Nacional de Habitação reúne por iniciativa do Governo ou a pedido de pelo menos um
quinto dos seus membros.
Artigo 35.º
Competência
Compete ao Conselho Nacional de Habitação:
a) Emitir parecer sobre a proposta de Estratégia Nacional da Habitação e sobre o Relatório Anual da
Habitação;
b) Propor medidas legislativas respeitantes à habitação;
c) Apresentar ao Governo as propostas e sugestões que tiver por convenientes.
Artigo 36.º
Composição e funcionamento
1. O Conselho é presidido pelo Ministro responsável pela área da habitação, com faculdade de delegação
Página 28
SEPARATA — NÚMERO 91
28
num Secretário de Estado.
2. A composição e funcionamento do Conselho Nacional de Habitação são objeto de regulamentação por
portaria do Ministro encarregado da área da habitação.
Seção II
Políticas regionais e locais
Artigo 37.º
Regiões Autónomas
Nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira a política de habitação obedece aos princípios
estabelecidos pela Constituição da República e pela presente lei, bem como pelas demais aplicáveis, sendo
definida e executada pelos seus órgãos de governo próprio e sujeita à aprovação das respetivas assembleias
regionais.
Artigo 38.º
Políticas locais de habitação
1. Os municípios programam e executam as suas políticas locais de habitação, no âmbito das suas
atribuições e competências e tendo em conta o artigo 27.º da presente lei.
2. As comunidades intermunicipais e as áreas metropolitanas podem definir políticas locais de habitação
para as respetivas áreas, aplicando-se com as necessárias adaptações os artigo 27.º e 39.º da presente lei.
2. As freguesias participam na definição e execução das políticas locais de habitação, no âmbito das suas
atribuições e competências e nos termos do artigo 28.º da presente lei.
Artigo 39.º
Programa Local de Habitação
1. A política municipal de habitação é consubstanciada num Programa Local de Habitação, adiante
identificado como PLH.
2. O PLH é um instrumento programático de caráter estratégico e de âmbito municipal, que deve estar
articulado com o plano diretor municipal, com as estratégias aprovadas ou previstas para as Áreas de
Reabilitação Urbana delimitadas no território municipal e com os demais planos territoriais ou especiais com
incidência na reabilitação urbana.
3. O PLH inclui obrigatoriamente:
a) Um diagnóstico com a identificação tão exaustiva quanto possível das carências habitacionais,
quantitativas e qualitativas, na área do município, bem como das eventuais falhas ou disfunções de mercado,
sinalizando as situações de desadequação entre a oferta e a procura em termos de quantidade, tipo e preço;
b) Um levantamento dos recursos habitacionais disponíveis e o seu estado de conservação e utilização,
identificando as situações de recursos habitacionais públicos ou privados que não cumprem a função social da
habitação ou careçam de ser abatidos ao stock por não terem viabilidade de reabilitação;
c) A definição estratégica das prioridades, dos objetivos e metas a alcançar no prazo temporal de vigência
do PLH, tendo em conta a evolução do contexto económico e social e dos seus ciclos;
d) O elenco e calendário dos programas e medidas que o município pretende lançar ou desenvolver para
cumprir os objetivos e metas propostos, incluindo, se for caso disso, propostas de alteração legislativa a
apresentar aos órgãos competentes;
e) As opções de política de solos e de gestão patrimonial necessárias para a concretização das metas
habitacionais propostas;
f) O enquadramento financeiro e orçamental dos programas e medidas propostos, tendo em conta a
capacidade de endividamento municipal, os programas plurianuais de investimento e a oportunidade de
Página 29
15 DE MAIO DE 2018
29
recorrer a financiamentos europeus, de âmbito nacional ou resultantes de contratos administrativos em vigor
ou a celebrar;
g) A identificação dos diversos agentes, públicos ou privados, a quem cabe a concretização dos programas
e medidas propostos, bem como dos serviços ou empresas municipais envolvidos e as modalidades de
cooperação ou delegação de competências entre o município e as freguesias da sua área;
h) A promoção de modalidades efetivas de cooperação, no âmbito municipal, entre o município, o setor
cooperativo, a rede social municipal e as associações ou organizações de moradores;
i) O modelo de acompanhamento, controle e avaliação do PLH.
4. O PLH é aprovado pela assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal, ouvidas as freguesias
e o Conselho Local de Habitação, quando exista, e após consulta pública.
5. No âmbito do PLH podem ser delimitados territórios ou bairros de intervenção prioritária a nível das
políticas públicas de habitação, nomeadamente:
a) Aglomerados, núcleos ou bairros de natureza precária ou informal, que careçam de requalificação,
regularização e/ou realojamento;
b) Aglomerados, núcleos ou bairros em situação de perda populacional significativa, por razões
demográficas, socioeconómicas ou urbanísticas;
c) Bairros ou zonas em risco ou processo de gentrificação
d) Aglomerados, núcleos ou bairros não integrados urbanística e socialmente ou que concentrem elevados
índices de pobreza e discriminação.
6. Os territórios ou bairros de intervenção prioritária reconhecidos pela assembleia municipal, sob proposta
da câmara municipal, podem ser alvo de medidas públicas de discriminação positiva ou de programas
especiais de apoio, para melhoria das respetivas condições.
7. No âmbito do PLH, a assembleia municipal pode aprovar, sob proposta da câmara municipal, uma
declaração fundamentada de que se verifica uma situação de défice habitacional, falha ou disfunção de
mercado ou risco de declínio demográfico, na totalidade ou em partes do território municipal, ouvidas as
freguesias abrangidas.
8. A declaração fundamentada referida no artigo anterior habilita o município, através da câmara municipal,
a recorrer aos seguintes instrumentos:
a) Requisição temporária para habitação, mediante indemnização a fixar nos termos legais, de imóveis
privados que se encontrem abandonados ou injustificadamente devolutos, de acordo com o disposto no
número 3 do artigo 4.º e na alínea j) do número 2 do artigo 27.º;
b) Reforço das áreas destinadas a uso habitacional nos PDM ou outros planos territoriais;
c) Discriminação positiva no acesso a financiamentos nacionais, comunitários ou privados destinados à
habitação ou reabilitação urbana;
d) Contratualização de programas especiais de apoio, de âmbito nacional ou europeu, previstos no número
2 do artigo 41.º, ou dos instrumentos para situações de intervenção prioritária, previstos no Capítulo VIII;
e) Flexibilização dos limites de endividamento municipal nos termos do artigo 43.º;
f) Condicionamento das operações urbanísticas em que tal se justifique ao cumprimento das metas
habitacionais municipais, nomeadamente, ao abrigo do disposto na alínea k) do número 2 do artigo 27.º,
incluindo nas contrapartidas legais exigíveis a inclusão de uma percentagem, fixada na declaração
fundamentada, destinada a habitação permanente e acessível;
g) Exercício do direito de preferência, nos termos do nº 7 do artigo 60.º da presente lei e demais
disposições legais.
Artigo 40.º
Conselho Local de Habitação
1. As autarquias locais podem constituir Conselhos Locais de Habitação, com funções consultivas,
aplicando-se com as necessárias adaptações o disposto nos artigos 35.º e 36.º.
2. A composição dos Conselhos Locais de Habitação é aprovada pela assembleia municipal, sob proposta
da câmara municipal.
Página 30
SEPARATA — NÚMERO 91
30
3. O funcionamento dos Conselhos Locais de Habitação é objeto de regulamento aprovado pela câmara
municipal.
Artigo 41.º
Programas especiais de apoio
1. O Estado apoia o desenvolvimento das políticas regionais e locais de habitação, sem prejuízo da
autonomia dos respetivos órgãos próprios e com respeito pelos princípios da subsidiariedade e da
descentralização, nomeadamente através da criação e contratualização de programas especiais de apoio.
2. Para efeitos do número anterior, e para além das situações de intervenção prioritária previstas no
capítulo VIII, o Estado desenvolve programas especiais de apoio às políticas de habitação regionais ou locais
que dele careçam, com as seguintes finalidades:
a) Promoção de construção, aquisição ou reabilitação de habitação pública destinada a suprir carências
habitacionais de pessoas ou agregados familiares ou a desenvolver operações de realojamento;
b) Regularização cadastral e regeneração de núcleos ou bairros informais;
c) Requalificação e integração urbana de bairros de habitação pública;
d) Promoção da sustentabilidade dos territórios de baixa densidade;
e) Erradicação da discriminação racial ou étnica no acesso à habitação;
f) Acesso à habitação das pessoas sem-abrigo.
Seção III
Financiamento das políticas de habitação
Artigo 42.º
Recursos financeiros públicos
1. O Estado assegura dotações públicas adequadas à concretização da política nacional de habitação.
2. As despesas públicas com habitação a cargo do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais
devem ser refletidas nos respetivos orçamentos anuais e programas de investimento plurianuais.
3. O Estado estimula o acesso das entidades públicas e privadas, e em especial das regiões autónomas e
dos municípios, a financiamentos comunitários na área da habitação, da reabilitação urbana e da
sustentabilidade ambiental, económica e social dos aglomerados.
4. O Estado garante a prestação de informação consolidada sobre as dotações públicas destinadas em
cada ano às políticas públicas de habitação a nível nacional, regional e local e sobre a respetiva taxa de
execução no ano anterior, através da sua inclusão no Relatório Anual da Habitação, conforme disposto na
alínea b) do número 4 do artigo 33.º.
Artigo 43.º
Endividamento municipal
Com vista a assegurar a capacidade de resposta municipal às situações de carência habitacional, a
capacidade de endividamento dos municípios estipulada na lei das finanças locais pode ser majorada, na
sequência da aprovação de uma deliberação fundamentada no âmbito do Programa Local de Habitação,
conforme o disposto nos números 7 e 8 do artigo 39.º.
Artigo 44.º
Fundos de Habitação e Reabilitação
1. O Estado garante a existência de um fundo nacional de habitação e reabilitação urbana para apoio das
respetivas políticas públicas.
Página 31
15 DE MAIO DE 2018
31
2. As regiões autónomas e as autarquias locais podem criar fundos regionais ou locais de habitação e
reabilitação urbana à escala dos seus territórios.
3. Os Fundos de Habitação e Reabilitação podem incorporar património imobiliário público e receitas
resultantes de empréstimos e financiamentos europeus e nacionais, destinadas a financiar as políticas
públicas de habitação e reabilitação.
4. Os municípios, por deliberação dos órgãos competentes, podem:
a) Incorporar nos seus fundos de habitação e reabilitação património municipal destinado à habitação, bem
como parcelas resultantes de cedências ao município e afetas, nos termos do número 9 do artigo 60.º, a
programas públicos de habitação;
b) Consignar aos seus fundos de habitação e reabilitação parte das receitas da tributação do património
imobiliário que lhes são afetas, bem como das receitas próprias resultantes da gestão do seu património
imobiliário.
5. Os Fundos a que se refere este artigo estão sujeitos às regras de funcionamento e supervisão definidas
na lei.
CAPÍTULO V
INSTRUMENTOS E TRANSVERSALIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE HABITAÇÃO
Seção I
Tipos de instrumentos
Artigo 45.º
Instrumentos das políticas públicas de habitação
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais desenvolvem os seguintes instrumentos com
vista à concretização das políticas públicas de habitação:
a) Programas ou medidas de promoção de habitação pública;
b) Medidas tributárias e política fiscal;
c) Medidas de apoio financeiro e subsidiação;
d) Medidas legislativas e de regulação.
2. Os instrumentos das políticas públicas de habitação podem ser dirigidos à oferta ou à procura.
Subseção I
Promoção de habitação pública
Artigo 46.º
Promoção de habitação pública
1. Compete ao Estado, em articulação com as regiões autónomas e as autarquias locais, a construção,
aquisição ou reabilitação de património habitacional público suficiente para garantir o acesso e o direito à
habitação, nomeadamente dos estratos sociais e etários mais vulneráveis.
2. Para efeitos do disposto no número anterior, a Estratégia Nacional de Habitação fixa as metas nacionais
da promoção de habitação pública, por forma a aproximar a percentagem do parque habitacional público dos
níveis médios europeus.
3. São instrumentos de promoção de habitação pública, a nível nacional, regional ou local,
designadamente os seguintes:
a) Programas e operações públicos de habitação, de reabilitação ou de realojamento;
b) Programas de repovoamento de territórios em declínio demográfico;
c) Programas de reconversão de AUGI ou regeneração de núcleos e bairros precários;
Página 32
SEPARATA — NÚMERO 91
32
d) Cedência de terrenos ou imóveis para habitação cooperativa;
e) Programas de reutilização de habitações abandonadas ou injustificadamente devolutas.
4. São ainda instrumento de promoção de habitação destinada ao arrendamento os programas municipais
de cedência a particulares de terrenos ou imóveis destinados à construção ou reabilitação de habitações para
arrendamento acessível, devendo essa finalidade ser expressamente contratualizada nas condições da
cedência.
5. A cedência a cooperativas, entidades do setor social ou entidades privadas de terrenos ou imóveis
públicos para fins habitacionais é sempre feita a título oneroso e, preferencialmente, sob a forma de direito de
superfície, devendo o ónus resultante ser devidamente registado.
Artigo 47.º
Gestão do parque habitacional público
1. Às entidades detentoras de parque habitacional público cabe assegurar:
a) A manutenção e conservação adequadas, a melhoria dos níveis de habitabilidade existentes e a
integração urbana dos conjuntos edificados ou bairros em que se inserem;
b) A gestão eficiente e de acordo com regras prudenciais, de transparência e de boa governação,
garantindo a prestação de contas às tutelas bem como a entidades fiscalizadoras;
c) A participação e envolvimento dos moradores na gestão e conservação dos imóveis, podendo delegar
nas suas associações ou organizações tarefas e recursos para o efeito;
d) O acesso à habitação pública em condições de igualdade de oportunidades, transparência e priorização
das situações mais carenciadas ou vulneráveis, nos termos da lei;
e) A prioridade adequada no acesso à habitação pública de pessoas com deficiência, famílias com
menores à sua guarda, famílias monoparentais, jovens e idosos;
f) Medidas de discriminação positiva no acesso à habitação pública de pessoas sem-abrigo e de vítimas
de violência doméstica, como condição de superação da respetiva situação.
Artigo 48.º
Descentralização
1. A propriedade do parque habitacional do Estado deve ser gradualmente transferida para o nível regional
ou local, no quadro das medidas de descentralização de competências, nos termos da lei.
2. O Estado assegura a descentralização da gestão do seu parque habitacional, de acordo com o princípio
da subsidiariedade, bem como os recursos adequados a esse fim.
Artigo 49.º
Promoção da utilização de habitações abandonadas ou injustificadamente devolutas
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais promovem a utilização para fins habitacionais de
habitações abandonadas ou injustificadamente devolutas, em especial nas zonas de maior défice habitacional.
2. O Estado pode afetar a um Fundo Nacional os imóveis públicos devolutos ou disponíveis, a fim de ser
avaliada a sua reconversão para uso habitacional, passando a integrar o património habitacional público, sem
prejuízo da faculdade da sua requisição pelos municípios prevista na alínea j) do n.º 2 do artigo 27.º.
3. Podem ser integrados no Fundo Nacional a que se refere o número anterior os imóveis devolutos de
propriedade municipal, bem como as habitações devolutas ou abandonadas de propriedade privada que
tenham sido requisitadas ao abrigo da presente lei, para efeitos da sua disponibilização e gestão para
utilização habitacional efetiva, durante um período de tempo a determinar, sem prejuízo da manutenção da
titularidade da propriedade.
4. Para efeitos do número anterior, as autarquias dispõem de acesso pleno à informação sobre os titulares
de direitos reais constantes do registo predial na sua área de jurisdição, bem como à informação, por parte das
Página 33
15 DE MAIO DE 2018
33
entidades distribuidoras, sobre a existência ou inexistência de contratos ou consumos de água, eletricidade e
gás.
5. Consideram-se património do Estado, a afetar nos termos dos números 1 e 2, os imóveis habitacionais
sem dono conhecido, ao abrigo do artigo 1345.º do Código Civil, ou adquiridos pelo Estado, nos termos dos
artigos 2046.º e 2152.º do mesmo diploma.
Subseção II
Fiscalidade
Artigo 50.º
Sistema fiscal
1. O sistema fiscal, em matéria de habitação, deve:
a) Incentivar a habitação acessível e penalizar a especulação imobiliária;
b) Estimular o melhor uso dos recursos habitacionais, penalizando as habitações abandonadas ou
injustificadamente devolutas;
c) Privilegiar a reabilitação e a colmatação urbanas, quando delas resulte o reforço da habitação
permanente e a dinamização do mercado de arrendamento, nomeadamente acessível e de longa duração;
d) Discriminar positivamente as cooperativas e outras organizações sociais para promoção de habitação
acessível;
e) Proteger o acesso a habitação própria;
f) Discriminar positivamente as despesas de conservação e manutenção da habitação permanente.
2. Os municípios, no âmbito da sua competência tributária, podem, nos termos da lei, fixar taxas
diferenciadas dos impostos cujo nível de tributação lhes esteja cometido, em função da utilização habitacional
efetiva dos imóveis.
3. A lei discrimina positivamente a tributação de rendimentos provenientes de arrendamentos de longa
duração relativamente aos rendimentos provenientes de outros modos de fruição de imóveis, nomeadamente
como estabelecimentos hoteleiros ou em regime de alojamento local com fins turísticos.
4. A atribuição de benefícios fiscais em matéria habitacional depende:
a) Da verificação do seu contributo efetivo para a garantia do direito à habitação;
b) Da não promoção de comportamentos considerados especulativos.
5. Os benefícios fiscais em matéria habitacional são concedidos por períodos temporais limitados e a sua
manutenção ou renovação dependem do cumprimento pelos interessados das condições que tenham sido
fixadas na atribuição dos benefícios.
6. Os benefícios fiscais são regularmente revistos à luz da variação do mercado habitacional a fim de não
se tornarem contraproducentes ou desproporcionados à luz do interesse geral.
7. As habitações que tenham sido alvo de medidas fiscais de discriminação positiva para a sua construção,
reabilitação, aquisição ou arrendamento são consideradas habitações com apoio público, nos termos do artigo
2.º do presente diploma.
Subseção III
Apoios financeiros e subsidiação
Artigo 51.º
Apoios financeiros
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem atribuir apoios financeiros, devidamente
justificados, no quadro das respetivas políticas públicas de habitação.
2. São considerados apoios financeiros públicos, nomeadamente:
Página 34
SEPARATA — NÚMERO 91
34
a) Os programas públicos de promoção da reabilitação, da eficiência energética ou da resiliência sísmica,
suportados por financiamento nacional ou europeu;
b) Os programas públicos de apoio à aquisição de casa própria, designadamente sob a forma de juros
bonificados ou de modalidades de propriedade resolúvel;
c) Os programas públicos de apoio à habitação acessível;
d) Os programas públicos de apoio à manutenção e conservação de imóveis habitacionais dirigidos aos
proprietários, aos condomínios ou aos inquilinos;
e) Os programas públicos de apoio, para fins habitacionais, às cooperativas de habitação, à
autoconstrução e às associações ou organizações de moradores.
3. São igualmente consideradas apoios financeiros públicos todas as modalidades de acesso a
empréstimos, apoiadas pelo Estado, no âmbito dos programas referidos no número anterior.
Artigo 52.º
Subsidiação
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem atribuir subsídios para apoiar o direito à
habitação de camadas populacionais que não consigam aceder ao mercado privado da habitação.
2. A subsidiação ao arrendamento é feita nos termos do artigo 71.º e pode ser dirigida à procura ou à
oferta de habitação.
3. Para fazer face a situações de vulnerabilidade e carência habitacional temporária ou iminente, a
segurança social e as autarquias locais podem providenciar subsídios de habitação.
4. A subsidiação pública confere à entidade prestadora do subsídio o direito e a obrigação de verificar
periodicamente se se mantêm as razões da sua atribuição e à entidade subsidiada o dever de prestar todas as
informações relevantes que lhe sejam solicitadas.
5. A necessidade de alteração de local de residência não deve prejudicar o direito a apoios públicos, desde
que se mantenham as condições que os determinaram.
Artigo 53.º
Defesa do interesse geral
1. Os apoios financeiros e a subsidiação são instrumentos das políticas públicas de habitação fundados na
defesa do interesse geral, devendo a sua atribuição ser feita de forma transparente, equitativa e proporcional
às necessidades dos beneficiários, consideradas à luz do interesse geral.
2. Os apoios financeiros e a subsidiação constituem encargos públicos que são inscritos nos orçamentos e
contas das entidades que os conferem.
3. Os apoios e a subsidiação são publicitados em listagens anuais, com identificação das entidades
beneficiárias e do respetivo montante, nos termos a definir por lei e com ressalva dos dados pessoais
protegidos por lei.
4. As habitações privadas que beneficiem de qualquer forma de apoio financeiro ou subsidiação pública
são consideradas habitações com apoio público, nos termos do artigo 2.º, sendo o seu uso condicionado,
durante um prazo a determinar pela entidade administrativa competente, à habitação própria permanente ou
ao arrendamento acessível e de longa duração.
Subseção IV
Instrumentos de regulação
Artigo 54.º
Informação sobre o mercado habitacional
1. O Estado assegura a transparência do mercado habitacional público e a produção e divulgação da
informação necessária ao regular funcionamento do mercado habitacional geral.
Página 35
15 DE MAIO DE 2018
35
2. Para efeitos do número anterior, incumbe ao Estado, através do Instituto Nacional de Estatística,
providenciar regularmente informação fidedigna, gratuita e universalmente acessível, nomeadamente sobre:
a) Percentagem da população portuguesa em situação de sobrelotação habitacional, com privação severa
das condições de habitação ou em situação de sobrecarga relativamente às suas despesas de habitação, nos
termos do artigo 2.º;
b) Percentagem de alojamentos habitacionais devolutos ou abandonados;
c) Percentagem de habitação pública ou com apoio público no total de alojamentos habitacionais do país;
d) Percentagem de habitação própria, com ou sem hipotecas imobiliárias, e de habitação arrendada, pelos
anos dos respetivos contratos;
e) Percentagem de candidaturas satisfeitas e não atendidas relativamente aos programas públicos de
habitação de nível nacional, regional ou local;
f) Tempo médio de espera para alcançar apoio habitacional em programas públicos de habitação de nível
nacional, regional ou local;
g) Evolução do preço de mercado declarado para aquisição ou arrendamento de habitação, por tipologia
das habitações e por m2;
h) Relação entre a evolução do preço de mercado declarado da habitação para aquisição ou arrendamento
e a evolução dos rendimentos familiares no mesmo período temporal;
i) Evolução das despesas familiares, nomeadamente com habitação, transportes e educação, face aos
rendimentos familiares;
j) Tempo médio e modo de transporte usado, pelo menos nas áreas metropolitanas, nas deslocações
diárias entre o local de residência e o local de trabalho ou a escola.
3. A informação estatística disponibilizada publicamente é desagregada à escala territorial mais adequada
e deve pormenorizada, quando possível, por escalões de rendimento.
Artigo 55.º
Coerência dos regimes
1. Os princípios e normas do presente diploma serão salvaguardados na legislação sobre habitação,
nomeadamente em matéria de arrendamento urbano, reabilitação urbana, cooperativas de habitação e
propriedade horizontal.
2. As atribuições e competências das regiões autónomas e das autarquias locais em matéria de habitação
previstas na presente lei são salvaguardadas na legislação geral aplicável a umas e outras.
3. Os regimes de fixação de renda da habitação pública ou com apoio público, previstos no artigo 68.º, são
definidos por lei.
Artigo 56.º
Deveres dos proprietários
1. Os deveres de conservação, manutenção e reabilitação dos proprietários habitacionais relativamente
aos seus imóveis ou frações são definidos por lei e destinam-se a garantir um adequado nível de
habitabilidade nas habitações e nos espaços comuns, cabendo aos municípios promover a respetiva
fiscalização e cumprimento.
2. Os deveres referidos no número anterior abrangem os proprietários de habitações públicas, devendo a
lei estabelecer mecanismos adequados de fiscalização, envolvendo as juntas de freguesia e as organizações
de moradores.
Artigo 57.º
Incentivos à melhor utilização dos recursos habitacionais
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais promovem a recolha de informação sobre o
património edificado habitacional, público ou privado, nomeadamente quanto à afetação que é dada a cada
Página 36
SEPARATA — NÚMERO 91
36
fogo ou fração.
2. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais promovem a melhor utilização dos recursos
habitacionais disponíveis, nomeadamente dos que se encontrem devolutos ou abandonados, tendo em conta
o disposto no artigo 49.º.
3. Os proprietários de habitação pública têm o dever de manter os respetivos fogos ocupados, nos termos
legais, e de promover com celeridade a sua afetação, caso se encontrem desocupados ou devolutos.
4. Os municípios promovem a publicitação da listagem dos prédios urbanos que tenham sido declarados e
se mantenham devolutos ou abandonados nos termos do presente diploma.
5. Os instrumentos de captação de investimento imobiliário estrangeiro criados pelo Estado:
a) Privilegiam os territórios de baixa densidade, contribuindo para o desenvolvimento sustentável de áreas
deprimidas no território nacional;
b) Privilegiam o investimento na habitação acessível, evitando situações de concorrência assimétrica entre
estrangeiros e nacionais em zonas de elevada procura habitacional.
6. É protegida e incentivada a manutenção nas aldeias de habitações pertencentes a agregados familiares
com ligações afetivas ao lugar, ainda que não tenham nelas a sua primeira habitação.
Seção II
Articulação transversal
Artigo 58.º
Articulação com outras políticas públicas
1. O direito à habitação, reconhecido pela Constituição, exige a permanente articulação das políticas
públicas de habitação com as políticas de ordenamento do território e conexas, as políticas económica e fiscal,
as políticas de rendimentos e emprego e as políticas de proteção social, por forma a promover a coesão social
e territorial e a compatibilizar o preço da habitação com os rendimentos individuais e familiares.
2. São políticas conexas do ordenamento do território, nomeadamente, as seguintes:
a) Política de solos;
b) Reabilitação e regeneração urbanas;
c) Infraestruturas urbanísticas e equipamentos;
d) Mobilidade e transportes.
3. As políticas sociais, nomeadamente de proteção à família, de igualdade de género, de combate à
pobreza e à violência doméstica, de integração das minorias, de apoio às pessoas com deficiência, de
proteção das crianças e dos idosos e de autonomia dos jovens contribuem para a política habitacional,
implicando, sempre que necessário, medidas de discriminação positiva, nos termos da lei, para garantia do
direito à habitação.
4. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais asseguram a verificação das condições de
segurança das habitações, cabendo ao sistema nacional de proteção civil e aos municípios garantir a
disponibilidade de soluções habitacionais de emergência, nos termos do disposto no número 1 do artigo 80.º.
Artigo 59.º
Ordenamento do Território
1. As políticas públicas de habitação articulam-se com o sistema nacional de gestão territorial,
materializado nos programas estratégicos e planos de ordenamento territorial que o integram, nos termos da
lei.
Página 37
15 DE MAIO DE 2018
37
2. A Estratégia Nacional de Habitação e o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território
(PNPOT) devem ser articulados entre si, garantindo um compromisso recíproco de integração e
compatibilização das respetivas opções, objetivos e metas e o respeito das obrigações do Estado em matéria
de desenvolvimento sustentável e coesão territorial.
3. Os instrumentos de gestão territorial incluem, nos territórios a que se aplicam, as medidas necessárias
para o dimensionamento adequado das áreas com vocação habitacional, bem como a proteção e valorização
da habitação e do «habitat», vinculando a Administração Pública e os particulares nos termos previstos na lei.
4. A Estratégia Nacional de Habitação articula-se com os instrumentos setoriais e especiais que
concretizam a incidência territorial das políticas públicas de ordenamento do território, a prossecução dos
interesses públicos definidos na lei e a salvaguarda dos recursos e valores naturais.
5. A elaboração, o conteúdo, o acompanhamento, a concertação, a participação, a aprovação e a vigência
das normas reguladoras dos instrumentos de gestão territorial, incluindo os planos especiais e setoriais,
observam os princípios e normas constantes dos respetivos regimes legais bem como os previstos na
presente lei.
Artigo 60.º
Política de solos
1. A política pública de solos é um instrumento indispensável à concretização das obrigações do Estado,
das regiões autónomas e das autarquias locais em matéria de garantia do direito à habitação.
2. Todos têm o dever de utilizar o solo e os recursos naturais de forma sustentável e racional, respeitando
o ambiente, o património cultural e a paisagem.
3. O direito de propriedade privada do solo, garantido nos termos da Constituição e da lei, e os demais
direitos relativos ao solo são ponderados e conformados, no quadro das relações jurídicas de ordenamento do
território e de urbanismo, com os princípios e as normas constitucionais vigentes, incluindo o direito à
habitação e à qualidade de vida.
4. A imposição de restrições especiais ao direito de propriedade privada e aos demais direitos relativos ao
solo está sujeita ao pagamento de justa indemnização, nos termos previstos na lei.
5. O Estado, as regiões autónomas e os municípios promovem, no âmbito das respetivas atribuições e
competências e para os efeitos da presente lei, a disponibilização e reserva de solos de propriedade pública
em quantidade suficiente para assegurar, nomeadamente:
a) A regulação do mercado imobiliário, tendo em vista a transparência do processo de formação de valor e
a prevenção da especulação fundiária e imobiliária;
b) A realização de intervenções públicas ou de iniciativa pública, nos domínios da habitação e da
reabilitação e regeneração urbanas, que deem resposta às carências habitacionais e à valorização do
«habitat»;
c) a localização de infraestruturas, equipamentos e espaços verdes ou outros espaços de utilização
coletiva que promovam o bem-estar e a qualidade de vida das populações.
6. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem recorrer a todos os meios de intervenção
administrativa no solo previstos na lei para concretizar e viabilizar as políticas públicas de habitação.
7. Na transmissão onerosa de prédios entre particulares, a existência de Programas Locais de Habitação
aprovados habilita os municípios ao exercício do direito de preferência, nos termos da lei, para garantir a sua
execução.
8. O Estado, as regiões autónomas e os municípios promovem, através dos programas especiais de apoio
referidos no artigo 41º, a regularização patrimonial e cadastral dos solos onde estão implantadas áreas
urbanas de génese ilegal ou núcleos de habitação precária, suscetíveis de reconversão ou regeneração.
9. Nas operações de loteamento e nas operações urbanísticas de impacto relevante, as parcelas
destinadas a cedências gratuitas ao município para integrar o domínio municipal, nos termos da lei, podem ser
afetas a programas públicos de habitação.
Página 38
SEPARATA — NÚMERO 91
38
10. As compensações e contrapartidas urbanísticas podem ser adstritas pelos municípios, ao abrigo da
alínea k) do n.º 2 do artigo 27.º, à promoção de fins habitacionais, nomeadamente na sequência de
deliberação fundamentada no âmbito do Programa Local de Habitação a que se referem os números 7 e 8 do
artigo 39.º.
Artigo 61.º
Reabilitação e regeneração urbanas
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais estimulam a reabilitação de edifícios e a
reabilitação e regeneração urbanas, nos termos da lei, de forma a assegurar os princípios, objetivos e metas
das políticas públicas de habitação.
2. A construção nova é apoiada nos seguintes casos: em processos de colmatação urbana; quando o
património edificado é insuficiente face às necessidades e carências habitacionais; quando se impõe repor o
parque habitacional inabitável, a abater ao stock habitacional por não reunir condições mínimas para a sua
reabilitação e utilização pelas pessoas e pelas famílias.
3. Nos processos de reconversão de áreas urbanas de génese ilegal e de regeneração de núcleos de
autoconstrução e de habitação precária ou degradada, quando as habitações não sejam passíveis de
requalificação e regularização, o direito à habitação é salvaguardo recorrendo, sempre que necessário, a
operações de realojamento que respeitem o disposto no artigo 16.º.
4. Nas áreas de reabilitação urbana delimitadas nos termos da lei, os municípios podem adotar medidas
preventivas ou cautelares, por deliberação da assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal e
ouvidas as freguesias abrangidas, para evitar que a alteração das circunstâncias e das condições de facto
existentes possa limitar a liberdade de planeamento ou comprometer ou tornar mais onerosa a execução do
programa local de habitação.
Artigo 62.º
Infraestruturas urbanísticas e equipamentos
1. Os vários níveis de planeamento asseguram o planeamento das redes de abastecimento de serviços e
bens essenciais, garantem a sua regulação em função do interesse geral e preveem o seu desenvolvimento
com vista à satisfação das necessidades habitacionais presentes e futuras, bem como a garantia do direito à
habitação e à qualidade de vida, salvaguardando as necessárias reservas de solo, nos termos legais.
2. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais asseguram o planeamento e a disponibilização
das infraestruturas e equipamentos necessários para promover a qualidade de vida dos cidadãos,
designadamente em matéria de circulação, espaços verdes, estabelecimentos de ensino e de saúde e
equipamentos e serviços de apoio à infância e aos idosos.
Artigo 63.º
Mobilidade e transportes
1. A política de mobilidade e transportes assegura a oferta pública de transporte às populações, sem
prejuízo do acesso e fruição de veículos próprios.
2. As autarquias locais dispõem, nos termos da lei, de atribuições e competências próprias em matéria de
regulação e prestação de serviços públicos de transportes.
3. As políticas públicas de mobilidade e transportes privilegiam os meios de transporte não poluentes e
modulam os preços dos transportes públicos com medidas de discriminação positiva para crianças, jovens e
idosos.
Página 39
15 DE MAIO DE 2018
39
Seção II
Informação, participação e tutela de direitos
Artigo 64.º
Direito à informação
1. Os cidadãos têm direito à informação sobre as políticas públicas de habitação a nível nacional, regional
e local, bem como sobre os programas públicos existentes em matéria de habitação e reabilitação e respetivas
modalidades de acesso, execução e resultados.
2. Sem prejuízo de outros meios de divulgação, a informação referida no presente artigo e no artigo 53.º é
disponibilizada através de vários meios, nomeadamente no sítio das entidades públicas competentes, sob a
forma de dados abertos e com salvaguarda da proteção de dados pessoais, quando for caso disso.
Artigo 65.º
Participação dos cidadãos
1. Os cidadãos têm o direito de participar na elaboração e revisão dos instrumentos de planeamento
público em matéria de habitação, incluindo a Estratégia Nacional de Habitação e os Planos Locais de
Habitação.
2. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais promovem a participação ativa dos cidadãos e
das suas organizações na conceção e execução dos programas públicos de habitação.
Artigo 66.º
Direitos processuais em matéria de habitação
1. A todos é reconhecido o direito à tutela plena e efetiva dos seus direitos e interesses legalmente
protegidos em matéria de habitação, bem como os outros direitos processuais para defesa da habitação
previstos na lei, nos termos do número seguinte.
2. Os referidos direitos processuais incluem, nomeadamente:
a) O direito de ação para defesa de direitos subjetivos e interesses legalmente protegidos, assim como
para o exercício do direito de ação pública e de ação popular para defesa de interesses difusos, coletivos e
individuais homogéneos, nomeadamente ao nível da conservação do património habitacional e do habitat;
b) O direito a requerer a cessação imediata de uma situação de violação grosseira do direito à habitação
ou de uma situação violadora da dignidade da pessoa humana em matéria habitacional;
c) O direito de promover a prevenção, a cessação e a reparação de violações de bens e valores
habitacionais pela forma mais célere possível;
d) O direito de apresentar petições e exposições aos poderes públicos.
3. O direito a reclamações coletivas é garantido, nos termos do Protocolo Adicional à Carta Social
Europeia, que prevê um procedimento de reclamações coletivas.
4. As organizações de moradores gozam, nos termos constitucionais, do direito de petição junto das
autarquias locais em matérias de interesse dos moradores da sua área territorial.
Página 40
SEPARATA — NÚMERO 91
40
CAPÍTULO VI
ACESSO AO ARRENDAMENTO
Seção I
Princípios e regimes
Artigo 67.º
Princípios
1. O desenvolvimento, pelo Estado, de uma política tendente a estabelecer um sistema de renda
compatível com o rendimento familiar contempla:
a) A previsão legal de diferentes regimes de fixação de renda adaptados às realidades dos agregados
familiares;
b) A promoção de um mercado público de arrendamento dirigido às camadas mais vulneráveis;
c) A promoção de um mercado de arrendamento acessível e sem fins lucrativos, através do setor social e
cooperativo;
d) A regulação do mercado de arrendamento privado, com recurso aos instrumentos de informação,
promoção, apoio público e fiscais mais adequados, com vista à sustentabilidade das soluções habitacionais,
quer do lado da procura, quer do lado da oferta;
e) A promoção de apoios públicos à procura e oferta de arrendamento no mercado privado, privilegiando a
estabilidade contratual e valores de renda valores acessíveis aos níveis de rendimento dos agregados
familiares;
f) O melhor aproveitamento do património imobiliário público para promoção de habitação pública ou com
apoio público;
g) O desenvolvimento de medidas, de natureza legislativa ou fiscal, de prevenção e combate à
especulação imobiliária no mercado de arrendamento.
2. O Estado privilegia e discrimina positivamente, no âmbito da promoção do arrendamento, a existência
de contratos de arrendamento sem termo ou de longa duração, nos termos da lei.
3. A afetação de unidades habitacionais a atividade económica distinta da utilização habitacional, ainda
que de caráter temporário, carece de autorização de utilização, concedida pelos municípios, nos termos da lei
e de acordo com o disposto no artigo 12.º.
Artigo 68.º
Regimes de fixação de renda
1. A promoção de um sistema de renda compatível com o rendimento familiar implica a existência de
regimes de fixação de valores de renda mais favoráveis do que aqueles que resultem da livre negociação
entre as partes no mercado privado, sem prejuízo de esta se poder desenvolver livremente nos casos em que
outra solução não esteja legalmente estabelecida.
2. O Estado assegura, pelo menos, a existência das seguintes modalidades de regimes especiais de
fixação de valor da renda:
a) Renda apoiada, incluindo a renda social, em que o valor da renda é fixado em função do rendimento do
agregado familiar;
b) Renda condicionada, em que o valor da renda não pode exceder um limite fixado na lei, calculado em
função do valor patrimonial tributário do imóvel à data da celebração do arrendamento ou da sua renovação;
c) Renda acessível ou limitada, em que o valor da renda é fixado dentro de um intervalo de valores que
correspondam, consoante as tipologias, a uma taxa de esforço significativamente inferior a 40% do rendimento
disponível dos agregados familiares.
Página 41
15 DE MAIO DE 2018
41
3. O património habitacional público é disponibilizado nos regimes de renda apoiada ou condicionada, à
exceção do disposto no número seguinte.
4. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem afetar parte do seu património a
programas públicos de renda acessível, sempre que a oferta privada de arrendamento seja insuficiente ou
atinja valores manifestamente superiores à capacidade económica de agregados familiares que careçam de tal
apoio.
5. Para efeitos do número anterior, é tida em conta a informação divulgada pelo INE, nos termos do artigo
54.º, sobre a relação entre a evolução do preço efetivo da habitação para arrendamento no mercado privado e
a evolução dos rendimentos familiares para o mesmo período temporal e para a mesma área territorial.
6. O disposto no presente artigo não prejudica a criação de outros regimes ou programas, através de
legislação própria.
Seção II
Instrumentos de intervenção pública
Artigo 69.º
Promoção pública de arrendamento
1. A promoção do arrendamento, através da gestão e disponibilização de património habitacional público e
com renda apoiada, condicionada ou acessível, é assegurada pelo Estado através de uma entidade pública ou
detida integralmente por entidades públicas, que pode assumir também as restantes missões previstas no
número 1 do artigo 29.º.
2. O Governo estabelece o modelo de governação e as regras prudenciais e de transparência aplicáveis à
entidade referida no número anterior.
3. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem afetar património imobiliário público ao
estabelecimento de contratos de desenvolvimento de habitação a custos controlados, a estabelecer com o
setor privado ou cooperativo, destinados ao arrendamento habitacional de longa duração e com renda
condicionada ou acessível.
4. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem afetar património imobiliário público a
programas de arrendamento acessível, nos termos dos números 4 e 5 do artigo anterior.
Artigo 70.º
Incentivos e garantias
1. O Estado promove condições de segurança, estabilidade e confiança no mercado privado que propiciem
a disponibilização de fogos para arrendamento.
2. Para efeitos do número anterior e para além dos incentivos, isenções e benefícios, no âmbito do sistema
fiscal, referidos no artigo 50.º, o Estado promove a existência de seguros de renda ou mecanismos de garantia
mútua alternativos à necessidade de obtenção de fiador.
3. O Estado garante a existência de instrumentos eficazes de defesa dos direitos das partes e de resposta
às situações de incumprimento, se necessário com recurso ao sistema judicial e através de processos
sumários.
Artigo 71.º
Subsídios de renda
1. Os subsídios de renda constituem uma das formas de subsidiação pública, prevista no artigo 51.º,
visando garantir o direito à habitação de grupos de cidadãos que não consigam aceder ao mercado privado de
habitação.
2. Os subsídios de renda podem ser dirigidos à procura ou à oferta de habitação, nomeadamente através
das seguintes modalidades:
Página 42
SEPARATA — NÚMERO 91
42
a) Subsidiação no âmbito do arrendamento apoiado, correspondente à diferença entre a renda técnica e a
renda efetiva, calculadas nos termos da lei;
b) Subsídio ao arrendamento jovem, nos termos da lei;
c) Subsídio de renda a atribuir aos inquilinos em situação de vulnerabilidade que gozem de especial
proteção, no âmbito do regime do arrendamento urbano, no final do período de proteção;
d) Subsídio ao arrendamento para idosos ou outros grupos de cidadãos, nos termos legais.
3. A lei do arrendamento urbano pode prever mecanismos de compensação financeira destinados a
senhorios com carência económica, cujos rendimentos sejam afetados por limitações legais à atualização de
rendas e sempre que estas se mantenham em valores inferiores aos que decorreriam da aplicação do regime
de renda condicionada.
4. O mecanismo previsto no número anterior não é acumulável com o subsídio de renda a que se refere a
alínea c) do número 3.
5. Os valores dos subsídios referidos nas alíneas b), c) e d) do número 2 têm em consideração o preço de
mercado declarado, divulgado pelo INE nos termos do artigo 54.º.
CAPÍTULO VII
ACESSO A CASA PRÓPRIA
Artigo 72.º
Acesso à habitação própria
1. O Estado promove, nos termos da Constituição, o acesso à habitação própria, nomeadamente através
dos instrumentos referidos no capítulo IV e no presente capítulo.
2. O acesso à habitação própria inclui o acesso à sua fruição em condições de legalidade, estabilidade,
segurança e salubridade.
3. O apoio do Estado à aquisição de casa própria deve ser enquadrado no âmbito das políticas públicas de
habitação e pode ser diferenciado geograficamente, em função das dinâmicas do território e das prioridades
de povoamento ou repovoamento de zonas deprimidas.
4. O apoio público do Estado à aquisição de casa própria privilegia a habitação acessível sem fins
lucrativos, produzida pelo setor cooperativo ou que resulte de processos de autoconstrução, sem prejuízo das
competências das regiões e das autarquias.
Artigo 73.º
Fruição da propriedade imobiliária habitacional
1. Aos proprietários e demais titulares de direitos respeitantes a imóveis habitacionais é reconhecido o
direito de deles fruir, nos termos e condições previstas na lei.
2. A fruição referida no número anterior não prejudica o reconhecimento da função social da habitação a
que se refere o artigo 4.º, e a subordinação da mesma ao interesse geral, nomeadamente no que respeita às
limitações impostas por instrumentos de planeamento, por deveres de conservação, ou por obrigações de
utilidade efetiva a dar aos imóveis.
3. A lei pode estabelecer a obrigatoriedade de verificação periódica do património edificado,
nomeadamente através de vistorias técnicas.
Artigo 74.º
Crédito à habitação
1. O crédito à habitação constitui um instrumento de acesso à habitação, sem prejuízo dos demais
instrumentos ao dispor dos cidadãos.
Página 43
15 DE MAIO DE 2018
43
2. A lei regulamenta a disponibilização de crédito, os critérios de solvabilidade dos bancos, as taxas de juro
máximas, bem como a exigência de garantias, e assegura a proteção do direito à habitação dos cidadãos em
caso de incumprimento dos respetivos contratos por parte destes.
3. No âmbito do crédito à habitação não podem ser concedidas aos fiadores condições mais desfavoráveis
de pagamento dos créditos, nomeadamente ao nível da manutenção das prestações, nem pode ser negado o
direito a proceder ao pagamento nas condições proporcionadas ao principal devedor.
4. A despesa pública com juros bonificados para acesso à aquisição de habitação através de crédito
constitui uma forma de apoio público, que pode limitar a posterior alienação ou arrendamento pelo beneficiário
nas condições definidas por lei.
Artigo 75.º
Condomínios
1. A garantia da conservação, manutenção, requalificação e reabilitação das habitações constituídas em
propriedade horizontal por condomínios contribui para a manutenção e melhoria das condições de
habitabilidade e nessa medida participa nas políticas nacionais, regionais e locais de habitação.
2. A lei estabelece as condições simplificadas para o desenvolvimento da atividade dos condóminos,
nomeadamente ao nível de organização interna, contabilidade, prestação de contas e fiscalidade.
3. Os condomínios beneficiam de condições preferenciais para acesso a programas de requalificação e
reabilitação urbana, nomeadamente em matéria de conforto térmico e acústico, eficiência energética,
acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida e reforço da resiliência sísmica dos imóveis e das
habitações.
4. O Estado regula a atividade profissional de gestão de condomínios e organiza e disponibiliza informação
sobre boas práticas nesse âmbito.
Artigo 76.º
Promoção de construção e reabilitação a custos controlados
1. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem desenvolver programas de promoção de
construção nova ou de reabilitação a custos controlados para habitação própria.
2. A promoção de construção nova ou reabilitação a custos controlados para habitação própria que
envolva apoios públicos pode implicar, para o fogo em questão, e a título perpétuo, a fixação de um preço
máximo respeitante à transmissão de direitos reais relativos ao mesmo, indexado à inflação.
Artigo 77.º
Condições de alienação de património habitacional público
1. Sem prejuízo das políticas que impliquem a permanência da propriedade pública de habitação, a lei
estabelece as condições de alienação de bens do património habitacional público.
2. O Estado e as demais entidades públicas podem alienar direitos reais respeitantes aos imóveis
habitacionais públicos, nomeadamente a propriedade, o direito de superfície ou outros direitos reais, sem
prejuízo da obrigatoriedade da existência de um património habitacional público suficiente, nos termos dos n.os
1 e 2 do artigo 46.º.
Artigo 78.º
Propriedade resolúvel
1. O Estado garante a existência de um regime legal relativo à disponibilização de fogos em propriedade
resolúvel, preferencialmente dirigido ao setor cooperativo ou social.
2. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais podem promover programas habitacionais de
propriedade resolúvel, subordinados aos princípios e metas das políticas públicas de habitação.
Página 44
SEPARATA — NÚMERO 91
44
CAPÍTULO VIII
INTERVENÇÕES PRIORITÁRIAS
Artigo 79.º
Intervenções prioritárias
Constam do presente capítulo as intervenções prioritárias do Estado, regiões autónomas e autarquias
locais que pela sua extrema necessidade e/ou urgência exijam a imediata intervenção pública fora dos termos
normais constantes dos capítulos anteriores da presente lei.
Artigo 80.º
Proteção em caso de emergência
1. O Estado assegura proteção e respostas habitacionais de emergência em caso de grave e súbita
carência habitacional em virtude de catástrofes naturais, acidentes ou outros factos imprevistos.
2. As pessoas atingidas por guerras ou perseguições nos seus países de origem, e admitidas em Portugal
por formas legais ou legalizadas, têm direito à proteção do Estado, que assegura respostas habitacionais em
articulação com as regiões autónomas, as autarquias locais e a sociedade civil.
3. Os instrumentos previstos no número anterior não dependem da nacionalidade das pessoas.
4. As pessoas e famílias carenciadas que se encontrem em risco de despejo forçado, definido nos termos
do número 3 do artigo 11.º, ou que dele tenham sido alvo e não tenham alternativa habitacional, têm direito a
atendimento público prioritário pelas entidades competentes e a medidas de discriminação positiva no acesso
a soluções ou apoios habitacionais.
5. A proteção prevista no presente artigo articula-se com as demais respostas das entidades públicas e
não as prejudica.
Artigo 81.º
Pessoas Sem-Abrigo
1. O Estado organiza e promove a Estratégia Nacional de Apoio às Pessoas sem-Abrigo (ENAPSA), a
definir por lei, em articulação com as regiões autónomas, as autarquias locais e a sociedade civil.
2. A ENAPSA é complementada pelas estratégias regionais e locais no âmbito das respetivas redes
sociais, de forma articulada e sem prejuízo da autonomia das organizações da sociedade civil que as
integram.
3. As estratégias de âmbito nacional, regional ou local de apoio às pessoas sem-abrigo visam a
erradicação progressiva desta condição, através de abordagens integradas que privilegiem o acesso à
habitação, no quadro dos programas especiais de apoio de âmbito nacional, a que se refere o artigo 41.º, e
das políticas regionais e locais, visando a saúde, o bem-estar e a inserção económica e social das pessoas
sem-abrigo.
Artigo 82.º
Áreas urbanas de génese ilegal e bairros informais
1. A lei estabelece condições específicas e favoráveis com vista à reconversão das áreas urbanas de
génese ilegal (AUGI) e à regeneração de bairros informais.
2. O Estado decide e promove a reconversão das AUGI e a regeneração dos bairros informais, cabendo
aos municípios desenvolver os respetivos processos.
3. Para efeitos do número anterior, os municípios identificam a existência nos seus territórios de AUGI e
bairros informais e verificam as condições da sua eventual reconversão ou regeneração, procedendo aos
necessários levantamentos e à adoção dos instrumentos de planeamento urbanístico adequados.
4. No quadro dos programas especiais de apoio, de âmbito nacional, previstos no artigo 41.º e das
políticas de reabilitação e regeneração urbanas referidas no artigo 61.º, o Estado pode conceder apoios para
Página 45
15 DE MAIO DE 2018
45
as operações de regularização cadastral e de realojamento inerentes aos processos a que se refere o
presente artigo.
5. Para efeitos do número anterior, os apoios do Estado podem ser atribuídos aos municípios, através de
contratos-programa, ou às organizações de moradores ou da sociedade civil envolvidas, também mediante
contratos, caso os municípios não o possam ou decidam fazer.
6. Nos processos a que respeita o presente artigo, o Estado, as regiões autónomas e os municípios têm o
dever de incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações na resolução dos seus
problemas habitacionais.
Artigo 83.º
Territórios e bairros de intervenção prioritária
1. Os territórios ou bairros de intervenção prioritária identificados, nos termos do número 5 do artigo 39º,
nos programas locais de habitação, podem beneficiar de programas de apoio próprios com vista à melhoria
das suas condições socioeconómicas e urbanísticas.
2. Na elaboração e execução dos programas referidos no número anterior participam as organizações de
moradores e da sociedade civil que atuem nas respetivas áreas.
3. Os territórios de baixa densidade que se encontrem em risco de declínio demográfico beneficiam de
medidas positivas, nomeadamente acesso a apoios públicos à manutenção e gestão eficiente de habitações
não permanentes, no âmbito de programas de dinamização e revitalização socioeconómica e cultural.
Artigo 84.º
Habitações devolutas ou degradadas à espera das necessárias partilhas sucessórias
1. Todas as habitações, ou conjuntos de habitações, que se encontrem devolutas, no todo ou em parte, ou
em visível estado de degradação, em consequência da demora de partilhas entre herdeiros, quer haja
processo judicial pendente quer não, há mais de 5 anos, ficam sujeitas a ser, findo o referido prazo, sujeitas a
uma ou mais requisições temporárias, mediante indemnização, para fins habitacionais, nos termos do número
3 do artigo 4.º, por decisão administrativa do Estado, da região autónoma ou do município, conforme os casos,
sem prejuízo do direito de propriedade que vier a caber a cada um dos herdeiros.
2. O procedimento administrativo que tiver por objeto casos do tipo referido no número anterior será
regulado por lei especial, não podendo ser tomada a decisão final sem prévia audiência escrita dos
interessados, a qual deverá ser precedida de certidão judicial do estado em que se encontra o processo de
partilha, caso tenha sido instaurado, ou de certidão da inexistência de qualquer processo com tal objeto.
CAPÍTULO IX
DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Artigo 85.º
Concretização e regulamentação
1. A concretização da presente lei é feita através dos instrumentos nacionais e locais nela previstos.
2. A produção de efeitos da presente lei não está dependente da sua regulamentação, salvo no que
respeita aos artigos … (a definir).
Artigo 86.º
Adaptação do quadro legal
1. O Governo, no prazo de seis meses contados a partir da publicação deste diploma, submete à
Assembleia da República as propostas necessárias à conformação do ordenamento jurídico com a presente
lei.
Página 46
SEPARATA — NÚMERO 91
46
2. O mesmo fazem, conforme os casos, os órgãos de governo próprio das regiões autónomas e os órgãos
competentes das autarquias locais.
Artigo 87.º
Dotação orçamental
O Estado promove o aumento progressivo das dotações públicas nacionais destinadas à habitação até
níveis iguais ou superiores à média dos países da União Europeia.
Artigo 88.º
Entrada em vigor
1. A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da respetiva publicação, salvo o
disposto no número seguinte.
2. As disposições deste diploma que tenham impacto orçamental, ao nível nacional, regional ou local,
entram em vigor simultaneamente com o primeiro orçamento de Estado, regional ou municipal, conforme o
caso, posterior à sua publicação.
Palácio de São Bento, 19 de abril de 2018.
As Deputadas e Deputados do PS: Carlos César — Helena Roseta — Susana Amador — João Torres —
Santinho Pacheco — José Manuel Carpinteira — Pedro Delgado Alves — Porfírio Silva — Tiago Barbosa
Ribeiro — Ricardo Bexiga — Idália Salvador Serrão — Carla Sousa — Maria Augusta Santos — Margarida
Marques — Ivan Gonçalves — Palmira Maciel — Jorge Gomes — Maria da Luz Rosinha — Miguel Coelho —
Fernando Anastácio.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.
Página 47
15 DE MAIO DE 2018
47
APRECIAÇÃO PÚBLICA
Diploma:
Proposta de lei n.º _____/XIII (….ª) Projeto de lei n.º _____/XIII (….ª) Proposta de alteração
Identificação do sujeito:
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
Morada ou Sede:
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
Local ________________________________________________________________________________
Código Postal _________________________________________________________________________
Endereço Eletrónico ____________________________________________________________________
Contributo:
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
Data ________________________________________________________________________________
Assinatura ____________________________________________________________________________
Página 48
SEPARATA — NÚMERO 91
48
REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Artigo 140.º
Discussão pública
1 — Em razão da especial relevância da matéria, a comissão parlamentar competente pode propor ao
Presidente a discussão pública de projetos ou propostas de lei, nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 134.º.
2 — O disposto nos números anteriores não prejudica as iniciativas que as comissões parlamentares
competentes em razão da matéria entendam desenvolver de modo a recolher os contributos dos interessados,
designadamente através de audições parlamentares ou do sítio da Assembleia da República na Internet.