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Quinta-feira, 10 de agosto de 2023 Número 71
XV LEGISLATURA
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 855 e 871/XV/1.ª):
N.º 855/XV/1.ª (Cidadãos) — Alargamento da licença parental inicial. N.º 871/XV/1.ª (BE) — Estabelece medidas de proteção dos trabalhadores que prestam trabalho no exterior durante a verificação de fenómenos meteorológicos adversos, incluindo temperaturas extremas.
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ÀS COMISSÕES DE TRABALHADORES OU ÀS RESPETIVAS COMISSÕES COORDENADORAS, ASSOCIAÇÕES SINDICAIS E ASSOCIAÇÕES DE
EMPREGADORES
Nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º, n.º 5, alínea d), e 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição, do artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República e dos artigos 469.º a 475.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Aprova a revisão do Código do Trabalho), avisam-se estas entidades de que se encontram para apreciação, de 10 de agosto a 9 de setembro de 2023, as iniciativas seguintes:
Projetos de Lei n.os 855/XV/1.ª (Cidadãos)— Alargamento da licença parental inicial, e 871/XV/1.ª (BE)— Estabelece medidas de proteção dos trabalhadores que prestam trabalho no exterior durante a verificação de fenómenos meteorológicos adversos, incluindo temperaturas extremas.
As sugestões e pareceres deverão ser enviados, até à data-limite acima indicada, por correio eletrónico dirigido a: 10CTSSI@ar.parlamento.pt; ou em carta, dirigida à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão, Assembleia da República, Palácio de São Bento, 1249-068 Lisboa.
Dentro do mesmo prazo, as comissões de trabalhadores ou as comissões coordenadoras, as associações sindicais e associações de empregadores poderão solicitar audiências à Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão, devendo fazê-lo por escrito, com indicação do assunto e fundamento do pedido.
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PROJETO DE LEI N.º 855/XV/1.ª
ALARGAMENTO DA LICENÇA PARENTAL INICIAL
Exposição dos motivos
Do ponto de vista das famílias
Um inquérito sobre a fecundidade, levado a cabo em 2013 pelo INE, concluiu que, em média, as pessoas
gostariam de ter 2,31 filhos. No entanto, em 2013, ainda de acordo com dados do INE, o índice sintético de
fecundidade ficou-se pelos 1,21 filhos por mulher em idade fértil.
Ora, isto significa que os baixos níveis de natalidade, que se verificam atualmente, podem ser revertidos, se
as pessoas puderem aproximar o número de filhos que têm do número de filhos que gostariam de ter. E, se isso
acontecer, a substituição de gerações, que implica um número mínimo de 2,1 crianças por mulher, fica
salvaguardada, o que já não acontece em Portugal desde 1981, o que se reflete no envelhecimento da
população portuguesa.
Urge prosseguir políticas de proteção na parentalidade e de conciliação da vida profissional com a vida
familiar, através de medidas que permitam às famílias voltar a ter mais filhos e a conseguir fazer face ao inerente
encargo no seio familiar, designadamente por via de maior suporte económico aquando dos primeiros 6 meses
de amamentação.
Existem uma série de motivos que levariam as pessoas a ter mais filhos. Um deles seria a criação de
condições que respondam aos problemas reais que as pessoas sentem quando têm filhos. Todos os pais e
mães consideram fundamental serem capazes de proporcionar o melhor início de vida aos seus filhos. Uma das
formas de o fazer é, seguindo as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS), Fundo das Nações
Unidas para a Infância (UNICEF) e de várias associações de pediatria, manter a amamentação exclusiva até
aos seis meses.
São variados os benefícios do aleitamento materno, nomeadamente o facto de ser natural e sem custos:
diminui a incidência de diversas patologias e promove o bom desenvolvimento do bebé ao nível sensorial,
emocional, psíquico e físico; sendo ainda importante fonte de energia e nutrientes, diminui o risco de obesidade
nas crianças e adolescentes; reduz o risco de cancro da mama e ovário da mãe, por via de uma amamentação
bem-sucedida.
Para que a amamentação seja bem-sucedida, entre outros fatores, a amamentação deve ser em exclusivo
nos primeiros seis meses de vida do bebé.
Esta, apesar de dever ser uma escolha da família, neste momento, não é! Desde logo, porque, com a licença
parental que temos atualmente, amamentar em exclusivo até aos 6 meses implica um de dois cenários:
• A mãe opta pela licença alargada de 180 dias (levando a que o pai não possa gozar a sua licença inicial,
que terá de ocorrer imediatamente a seguir à licença inicial da mãe, o que em nada ajuda a manutenção
da amamentação exclusiva até aos seis meses, ao mesmo tempo que acentua a discriminação de género
de que as mães trabalhadoras muitas vezes são alvo). Esta é uma opção que não está disponível para
muitas famílias, uma vez que implica uma perda significativa de rendimento num momento em que há
sempre um aumento de encargos no seio familiar.
• Durante um ou dois meses a mãe tem de conciliar a amamentação com o regresso ao trabalho. Ora, isto
obriga, necessariamente, a que a mãe deva extrair leite durante a sua jornada de trabalho (tendo, para
isso, que adquirir uma máquina extratora de leite, que não está acessível a toda a gente). Além disso, tem
de ter condições de o fazer no seu local de trabalho, o que, infelizmente, não será a realidade na maioria
dos casos. Isto é fonte de grande ansiedade no seio das famílias, numa altura em que deveriam estar
focadas nos seus bebés.
Os resultados do Relatório Primavera 2018, do Observatório Português dos Sistemas de Saúde, espelham
bem esta dificuldade, quando mostram que, apesar de 48,6 % dos bebés serem amamentados em exclusivo
aos quatro meses, essa percentagem diminui para 30,3 % aos seis meses. O Relatório refere ainda que, apesar
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de se notar uma evolução positiva do aleitamento materno em Portugal, os resultados permanecem abaixo das
recomendações da OMS. A meta de aumentar para, pelo menos, 50 % a prevalência de amamentação exclusiva
nos primeiros seis meses de vida até 2025 só será alcançada se a proteção, promoção e apoio ao aleitamento
materno for, de facto, uma prioridade para a nossa saúde pública.
Sendo a recomendação da OMS tão explícita, no que diz respeito ao tempo de duração da amamentação
exclusiva, é urgente tornar essa escolha possível e acessível a todas as famílias, através de uma licença de
parentalidade ajustada a essa realidade: seis meses, remunerados na íntegra, para a mãe (independentemente
da licença que o pai usufrua).
Está na altura de olharmos para as decisões políticas, tendo em conta o superior interesse das crianças, que
são quem devem ser sempre colocadas em primeiro lugar.
Do ponto de vista da saúde materno-infantil
O aleitamento materno é um recurso natural de valor incalculável, porque não só promove a saúde como
previne a doença da mãe e da criança e poupa custos de saúde.
Os estudos feitos, ao longo das duas últimas décadas, têm demonstrado que nenhum comportamento
relacionado com a saúde afeta de uma forma tão variada e marcante o futuro dos dois indivíduos envolvidos.
Em Portugal, não existem até à data estudos que associem a amamentação à redução de gastos com a
saúde, nem com a morbi/mortalidade. Mas a nível internacional os exemplo são numerosos:
- Estima-se que, se aumentássemos a duração da amamentação dos níveis atuais para apenas 12 meses
em cada criança, nos países de rendimento económico elevado e para dois anos nos países de médio
e baixo rendimento salvar-se-iam mais 22 216 vidas por ano.
E porque seriam salvas todas estas vidas?
Pensando exclusivamente na mãe:
— Apenas com os números globais de amamentação que temos atualmente, e que são muito baixos,
consegue-se prevenir 19 464 mortes anuais por cancro da mãe, comparando com um cenário em que
nenhuma mulher amamentasse. Cada 12 meses de amamentação está associado a uma redução de
7 % (95 % CI 3 – 11) na incidência de cancro da mama invasivo. Para o cancro do ovário a redução é
de 30 % (95 % CI 25 – 36) quando associada a períodos mais prolongados de amamentação.
Em relação às crianças:
— A amamentação está associada, consistentemente, com um melhor desempenho nos testes de
inteligência em crianças e adolescentes, com um aumento de 3,4 (95 % CI 2.3 – 4.6) pontos no
quociente de inteligência. E os investigadores encontraram uma relação dose/efeito, atingida através
de amamentações mais prolongadas. Este efeito na inteligência teve repercussões nos ganhos médios
auferidos na adultícia, tendo sido esta consequência atribuída ao aumento da inteligência, com uma
contribuição de 72 %. Fazendo agora as contas a quanto perde um País por ter pessoas menos
inteligentes, encontramos um montante de 302 mil milhões de dólares anualmente ou 0,49 % do
rendimento nacional bruto mundial. As perdas nos países de baixo e médio rendimento, onde Portugal
se insere, seriam 70,9 mil milhões, ou seja 0,39 % do rendimento nacional bruto.
— A amamentação está relacionada com uma redução de 19 % (95 % CI 11 – 27) na incidência de leucemia
infantil.
— Dar leite materno aos recém-nascidos, internados nos cuidados intensivos, reduz a fatura hospitalar em
cerca de 23 mil euros por cada criança.
— Um aumento de 10 % na amamentação exclusiva até aos seis meses, ou o aumento da amamentação
até um ou dois anos (dependendo do país), traduzir-se-ia na redução dos custos de tratamento de
doenças infantis comuns, de pelo menos 312 milhões de dólares nos EU, 7,8 milhões no Reino Unido
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e 1,8 milhões no Brasil (valores de 2012). A proteção contra a mortalidade e morbilidade, por doenças
infeciosas (diarreia, otite, pneumonia, etc.), prolonga-se para além do segundo ano de vida e previne
metade das mortes causadas por infeções, entre os seis e 23 meses de idade.
— Os custos de saúde nacionais americanos para quatro doenças infantis muito comuns, em crianças não
amamentadas, foram estimados: diarreia 291,3 milhões, vírus respiratório sincicial 225 milhões, otite
média 660 milhões.
— Cada casal, e no primeiro ano de vida, quando a mãe amamenta poupa aproximadamente 1000 dólares
em serviços de saúde.
— As mães que amamentam têm menos absentismo laboral e estão mais focadas no trabalho, porque os
filhos adoecem menos.
— Em 2014 as vendas de leite artificial para lactentes foram de 44,8 mil milhões de dólares e estima-se
que em 2019 atinja os 70,6.
A posição de muitos profissionais de saúde e o tipo de propaganda agressiva das companhias que fabricam
leite artificial, cujos lucros, como se pode ver, continuam a aumentar, levam a que os pais achem que não
existem diferenças significativas entre ambos e que se trata, apenas, de uma escolha de estilo de vida e não de
uma decisão com consequências na saúde e económicas. Além disso, a amamentação é pensada como uma
decisão individual, tendo a mulher como única responsável para o seu sucesso ou falha, ignorando o papel da
sociedade no seu suporte e proteção.
Os políticos necessitam demonstrar que reconhecem que a promoção do aleitamento materno salva vidas e
dinheiro, exercendo a sua autoridade ao remover as barreiras sociais e estruturais, que incapacitam as mulheres
de amamentar. Os governos democráticos têm o dever de proteger e promover o bem-estar nas comunidades
que os elegem, e isso inclui a amamentação. A legislação deve promover a manutenção do aleitamento materno
exclusivo até aos seis meses e assegurar intervenções nos locais de trabalho que apoiem a amamentação.
Por todos estes motivos, e de acordo com o consagrado na Lei n.º 17/2003, de 4 de junho, com as alterações
introduzidas pela Lei n.º 26/2012, de 24 de julho, e Lei Orgânica n.º 1/2016, de 26 de agosto, os subscritores
deste projeto de lei vêm propor o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei alarga a licença parental inicial alterando o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro, e o Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
Os artigos 40.º e 44.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter
a seguinte redação:
«Artigo 40.º
Licença parental inicial
1 – A mãe e o pai trabalhadores têm direito, por nascimento de filho, a licença parental inicial de 180 ou 210
dias consecutivos, cujo gozo podem partilhar após o parto, sem prejuízo dos direitos da mãe a que se refere o
artigo seguinte.
2 – O gozo da licença referida no número anterior pode ser usufruído em simultâneo pelos progenitores entre
os 180 e os 210 dias.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
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7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]
Artigo 44.º
Licença por adoção
1 – Em caso de adoção de menor de 15 anos, o candidato a adotante tem direito à licença referida nos n.os
1 ou 2 do artigo 40.º e, com as devidas adaptações, à licença do artigo 43.º.
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]»
Artigo 3.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril
Os artigos 12.º, 30.º, 35.º e 57.º do Decreto-Lei n.º 91/2009, de 9 de abril, com as alterações posteriores,
passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 12.º
Subsídio parental inicial
1 – O subsídio parental inicial é concedido pelo período de 180 ou 210 dias consecutivos, consoante opção
dos progenitores, cujo gozo podem partilhar após o parto, sem prejuízo dos direitos da mãe a que se refere o
artigo seguinte.
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
Artigo 30.º
Montante do subsídio parental inicial
O montante diário do subsídio parental inicial é o seguinte:
a) No período correspondente à licença de 180 dias, o montante diário é igual a 100 % da remuneração de
referência do beneficiário;
b) No caso de opção pelo período de licença de 210 dias, o montante diário é igual a 80 % da remuneração
de referência do beneficiário;
c) No caso de opção pelo período de licença de 210 dias, nas situações em que cada um dos progenitores
goze pelo menos 30 dias consecutivos, ou dois períodos de 15 dias igualmente consecutivos, o montante diário
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é igual a 100 % da remuneração de referência do beneficiário;
d) No caso de opção pelo período de licença de 240 dias, nas situações em que cada um dos progenitores
goze pelo menos 30 dias consecutivos, ou dois períodos de 15 dias igualmente consecutivos, o montante diário
é igual a 83 % da remuneração de referência do beneficiário.
Artigo 57.º
Montante do subsídio social parental inicial
O montante diário do subsídio social parental inicial é o seguinte:
a) No período de 180 dias, o montante diário é igual a 80 % de um 30 avos do valor do IAS;
b) No caso de opção pelo período de 210 dias, o montante diário é igual a 64 % de um 30 avos do valor do
IAS;
c) No caso de opção pelo período de 210 dias nas situações em que cada um dos progenitores goze pelo
menos 30 dias consecutivos, ou dois períodos de 15 dias igualmente consecutivos, o montante diário é igual a
80 % de um 30 avos do valor do IAS;
d) No caso de opção de pelo período de 240 dias, nas situações em que cada um dos progenitores goze
pelo menos 30 dias consecutivos, ou dois períodos de 15 dias igualmente consecutivos, o montante diário é
igual a 66 % de um 30 avos do valor do IAS.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Lisboa, 6 de julho de 2023.
Nos termos da lei constituiu-se uma comissão representativa dos subscritores integrada por: Ana Lúcia
Esteves Torgal — Ana Cristina Pereira Nogueira Leite Pincho — Filipe Boaventura Moreira — Graça Maria
Soares Gois Pereira Gonçalves — Jacqueline Marie de Montaigne — Margarida Pereira de Almeida e de Brito
— Maria Carlota Soares Martinez Veiga de Macedo.
–——–
PROJETO DE LEI N.º 871/XV/1.ª
ESTABELECE MEDIDAS DE PROTEÇÃO DOS TRABALHADORES QUE PRESTAM TRABALHO NO
EXTERIOR DURANTE A VERIFICAÇÃO DE FENÓMENOS METEOROLÓGICOS ADVERSOS, INCLUINDO
TEMPERATURAS EXTREMAS
Exposição de motivos
Os efeitos negativos da crise climática são já hoje notórios. Num planeta mais quente, aumenta a frequência
e a intensidade das tempestades, cheias, secas e ondas de calor. São estas novas dinâmicas climáticas que
estão a pôr em perigo os sistemas de proteção civil, de saúde pública, de saúde ambiental, de segurança e
saúde no emprego, de produção agrícola, e as condições de habitabilidade um pouco por todo o mundo.
Em julho de 2022, no Reino Unido, 39 membros do Governo assinaram uma proposta de lei que visava a
proibição do trabalho em temperaturas superiores a 30 graus ou a 27 graus no caso de trabalhos mais pesados.
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Recentemente, Espanha aprovou um diploma1 que proíbe a execução de algumas tarefas realizadas no
exterior durante condições de calor extremo, como é o caso da limpeza de ruas e a agricultura, uma vez que o
país enfrenta temperaturas elevadas, com cada vez mais frequência, devido às alterações climáticas. A nova
legislação prevê que esta medida de proteção dos trabalhadores é aplicada sempre que a agência meteorológica
nacional AEMET emite um alerta sobre um risco grave ou extremo de temperaturas elevadas.
Para Portugal, as previsões são claras: as temperaturas médias já aumentaram 0,5 ºC desde a década de
1950 (1 ºC no Mediterrâneo desde o início do século) e continuarão a aumentar durante o Século XXI. A
frequência, duração e intensidade de épocas quentes (até 5 ºC mais quente no verão) e ondas de calor agravar-
se-ão. Simultaneamente, a precipitação reduzir-se-á, colocando ainda maior pressão sobre zonas semiáridas,
como algumas zonas do Algarve e Alentejo. Na verdade, os últimos anos já demonstraram que as alterações
climáticas agravaram todas as fragilidades do nosso território e as vulnerabilidades das populações.
A preparação do País para um cenário e um clima diferente e muito mais adverso às atividades desenvolvidas
durante as últimas décadas é essencial. Este propósito tem de passar necessariamente pela adoção de
medidas, designadamente medidas de segurança e saúde no emprego, capazes de prevenir e reduzir o risco
que os trabalhadores correm quando prestam o trabalho em condições meteorológicas extremas.
A legislação nacional que regula esta matéria, não só tem várias décadas, como prevê normas genéricas, no
que diz respeito à temperatura que se verifica nos locais de trabalho em função dos métodos de trabalho e os
condicionalismos físicos impostos aos trabalhadores2 ou à necessidade do cumprimento de princípios gerais em
matéria de segurança e saúde no trabalho, por parte dos empregadores3.
Em vários pontos do País, é do conhecimento público que muitos trabalhadores prestam o seu trabalho
durante ondas de calor, com temperaturas extremas. A prestação de trabalho nestas condições está, muitas
vezes, associada a outras realidades laborais, como más condições de trabalho, jornadas de trabalho
intermináveis, más condições de alojamento, vínculos precários, desconhecimento dos direitos laborais, como
é exemplo o caso dos trabalhadores migrantes das explorações agrícolas no Alentejo.
A prestação de trabalho nestas condições terá um reflexo direto na saúde dos trabalhadores e são, aliás,
conhecidos alguns casos de morte por golpes de calor em Portugal. Estão em causa tarefas que exigem esforço
físico, que são executadas no exterior e, como tal, as condições atmosféricas em que ocorrem podem
representar um risco efetivo para os trabalhadores.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda pretende, com a presente iniciativa, proteger os trabalhadores
através da implementação de medidas que reduzam as situações de risco, quando o trabalho é prestado no
exterior, com esforço físico e durante fenómenos atmosféricos adversos.
Neste sentido, propõe que sejam condicionadas as atividades que se realizem no exterior, ou em espaços
que não se encontrem totalmente vedados, que envolvam esforço físico e exposição a fenómenos
meteorológicos adversos, incluindo temperaturas extremas.
Os empregadores são onerados com a obrigatoriedade de organizar os horários de trabalho, considerando
as condições atmosféricas, para que os trabalhadores nessas situações possam, designadamente, prestar o
seu trabalho no interior e não estarem sujeitos a riscos evidentes para a sua saúde.
Por fim, é ainda definida, à semelhança do que aconteceu em Espanha, que perante a emissão de avisos
meteorológicos, por parte da entidade a quem compete assegurar a vigilância meteorológica, ficam os
trabalhadores impedidos de prestar trabalho no exterior, com esforço físico, durante as horas em que se
verifiquem fenómenos meteorológicos extremos. Naturalmente que, nestes casos, pode e deve o empregador
organizar o trabalho, para que sejam executadas por estes trabalhadores outras tarefas ou as mesmas que não
impliquem esta exposição ao risco.
O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) é atualmente a entidade a quem compete assegurar a
vigilância meteorológica e emitir avisos meteorológicos sempre que se prevê ou se observam fenómenos
meteorológicos adversos. A emissão destes avisos tem por objetivo alertar as Autoridades de Proteção Civil e
a população em geral para a ocorrência de situações meteorológicas de risco, que nas próximas 72 horas
possam causar danos ou prejuízos a diferentes níveis, dependendo da sua intensidade. Os trabalhadores que
prestam o seu trabalho durante estes fenómenos são quem se encontra mais exposto aos danos e prejuízos
1 Real Decreto-ley 4/2023, de 11 de mayo. 2 Artigo 7.º da Portaria n.º 987/93, de 6 de outubro. 3 Artigo 281.º do Código do Trabalho, aprovado Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
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que estes avisos pretendem evitar.
As alterações climáticas estão já a afetar as pessoas e, em consequência, os trabalhadores e as condições
em que o trabalho é prestado. Por isso, é urgente a adoção de medidas específicas que garantam uma maior
proteção a quem se tem de sujeitar às condições existentes para executar seu trabalho.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto e âmbito
1 – A presente lei estabelece medidas de proteção dos trabalhadores que prestam trabalho no exterior
quando se verifiquem fenómenos meteorológicos adversos, incluindo temperaturas extremas, procedendo para
o efeito à nona alteração à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, que aprova o regime jurídico da promoção da
segurança e saúde no trabalho.
2 – A presente lei aplica-se, igualmente, aos empregadores públicos, nos termos da Lei n.º 79/2019, de 2 de
setembro, que estabelece as formas de aplicação do regime da segurança e saúde no trabalho previsto no
Código do Trabalho e legislação complementar, aos órgãos e serviços da Administração Pública, alterando a
Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
Artigo 2.º
Nona alteração à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro
O artigo 79.º da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 79.º
Para efeitos da presente lei, são considerados de risco elevado:
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
l) […]
m) […]
n) Atividades executadas no exterior que envolvam esforço físico e exposição a fenómenos meteorológicos
adversos, incluindo temperaturas extremas.»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro
É aditado o artigo 48.º-A à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 48.º-A
Exposição a fenómenos meteorológicos adversos
1 – São proibidas ou condicionadas aos trabalhadores as atividades que se realizem no exterior, ou em
espaços que não se encontrem totalmente vedados, que envolvam esforço físico e exposição a fenómenos
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meteorológicos adversos, incluindo temperaturas extremas.
2 – Compete ao empregador a adoção de medidas preventivas de proteção dos trabalhadores que se
encontrem na situação descrita no número anterior, designadamente a reorganização do horário de trabalho
através da prestação de trabalho no interior.
3 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, os alertas meteorológicos, emitidos pela entidade a quem
compete assegurar a vigilância meteorológica, que sinalizem a verificação de fenómenos meteorológicos
adversos com impacto direto na prestação de trabalho determinam a impossibilidade da sua execução durante
as horas em que se verifiquem.»
Artigo 4.º
Negociação coletiva
O regime previsto na presente lei é supletivo quanto às normas resultantes de instrumentos de
regulamentação coletiva que regulem ou que venham a regular as mesmas matérias em sentido mais favorável
aos trabalhadores.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 31 de julho de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina
Martins — Joana Mortágua.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.
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CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA
Artigo 54.º Comissões de trabalhadores
5. Constituem direitos das comissões de trabalhadores:
d) Participar na elaboração da legislação do trabalho e dos planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector;
Artigo 56.º Direitos das associações sindicais e contratação colectiva
2. Constituem direitos das associações sindicais:
a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;
REGIMENTO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Artigo 134.º Legislação do trabalho
1 — Tratando-se de legislação do trabalho, a comissão
parlamentar promove a apreciação do projecto ou proposta de lei, para efeitos da alínea d) do n.º 5 do artigo 54.º e da alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º da Constituição.
2 — As comissões de trabalhadores, as associações sindicais e as associações de empregadores podem enviar à comissão
parlamentar, no prazo por ela fixado, nos termos da lei, as sugestões que entenderem convenientes e solicitar a audição de representantes seus.
3 — Para efeitos do disposto nos números anteriores, os projectos e propostas de lei são publicados previamente em separata electrónica do Diário.
4 — A data da separata é a da sua publicação, coincidente com a do seu anúncio, entendendo-se como tal o dia em que fica disponível no portal da Assembleia da República na Internet.
Lei n.º 7/2009
de 12 de Fevereiro
APROVA A REVISÃO DO CÓDIGO DO TRABALHO
CAPÍTULO II Participação na elaboração da legislação do trabalho
Artigo 469.º Noção de legislação do trabalho
1 — Entende-se por legislação do trabalho a que regula os direitos e obrigações dos trabalhadores e empregadores, enquanto tais, e as suas organizações.
2 — São considerados legislação do trabalho os diplomas que regulam, nomeadamente, as seguintes matérias:
a) Contrato de trabalho; b) Direito colectivo de trabalho; c) Segurança e saúde no trabalho; d) Acidentes de trabalho e doenças profissionais; e) Formação profissional; f) Processo do trabalho.
3 — Considera-se igualmente matéria de legislação de trabalho o processo de aprovação para ratificação das convenções da Organização Internacional do Trabalho.
Artigo 470.º Precedência de discussão
Qualquer projecto ou proposta de lei, projecto de decreto-lei ou projecto ou proposta de decreto regional relativo a legislação do trabalho só pode ser discutido e votado pela Assembleia da República, pelo Governo da República, pelas Assembleias Legislativas das regiões autónomas e pelos Governos Regionais depois de as comissões de trabalhadores ou as respectivas comissões coordenadoras, as associações sindicais e as associações de empregadores se terem podido pronunciar sobre ele.
Artigo 471.º Participação da Comissão Permanente de Concertação Social
A Comissão Permanente de Concertação Social pode pronunciar-se sobre qualquer projecto ou proposta de legislação do trabalho, podendo ser convocada por decisão do presidente mediante requerimento de qualquer dos seus membros.
Artigo 472.º Publicação dos projectos e propostas
1 — Para efeitos do disposto no artigo 470.º, os projectos e propostas são publicados em separata das seguintes publicações oficiais:
a) Diário da Assembleia da República, tratando-se de legislação a aprovar pela Assembleia da República;
b) Boletim do Trabalho e Emprego, tratando-se de legislação a aprovar pelo Governo da República;
c) Diários das Assembleias Regionais, tratando-se de legislação a aprovar pelas Assembleias Legislativas das regiões autónomas;
d) Jornal Oficial, tratando-se de legislação a aprovar por
Governo Regional.
2 — As separatas referidas no número anterior contêm, obrigatoriamente:
a) O texto integral das propostas ou projectos, com os respectivos números;
b) A designação sintética da matéria da proposta ou projecto; c) O prazo para apreciação pública.
3 — A Assembleia da República, o Governo da República, a Assembleia Legislativa de região autónoma ou o Governo Regional faz anunciar, através dos órgãos de comunicação social, a publicação da separata e a designação das matérias que se encontram em fase de apreciação pública.
Artigo 473.º Prazo de apreciação pública
1 — O prazo de apreciação pública não pode ser inferior a 30 dias.
2 — O prazo pode ser reduzido para 20 dias, a título excepcional e por motivo de urgência devidamente justificado no acto que determina a publicação.
Artigo 474.º Pareceres e audições das organizações representativas
1 — Durante o prazo de apreciação pública, as entidades referidas no artigo 470.º podem pronunciar-se sobre o projecto ou proposta e solicitar audição oral à Assembleia da República, ao Governo da República, à Assembleia Legislativa de região autónoma ou ao Governo Regional, nos termos da regulamentação própria de cada um destes órgãos.
2 — O parecer da entidade que se pronuncia deve conter:
a) Identificação do projecto ou proposta; b) Identificação da comissão de trabalhadores, comissão
coordenadora, associação sindical ou associação de empregadores que se pronuncia;
c) Âmbito subjectivo, objectivo e geográfico ou, tratando-se de comissão de trabalhadores ou comissão coordenadora, o sector de actividade e a área geográfica da empresa ou empresas;
d) Número de trabalhadores ou de empregadores representados;
e) Data, assinatura de quem legalmente represente a entidade ou de todos os seus membros e carimbo da mesma.
Artigo 475.º Resultados da apreciação pública
1 — As posições das entidades que se pronunciam em pareceres ou audições são tidas em conta pelo legislador como elementos de trabalho.
2 — O resultado da apreciação pública consta:
a) Do preâmbulo do decreto-lei ou do decreto regional; b) De relatório anexo a parecer de comissão especializada da
Assembleia da República ou da Assembleia Legislativa de região autónoma.