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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

actual, que differença tanta nas chamadas medidas preventivas, como nas chamadas disposições repressivas, quando já nesse tempo se desenhava no ar, perfeitamente avolumada, a ideia da repressão, que o partido conservador vinha afirmando nas suas pugnas, tanto jornalisticas como parlamentares.

Depois dessa lei de 1840, reflexo dos verdadeiros principios liberaes, veio ao poder um Governo e um chefe politico para o qual o Sr. Conselheiro João Franco tem um atavismo e passado politico com o qual se quer emparelhar. Refere-se a Costa Cabral. Entretanto a lei de Costa Cabral está ainda superior, em principios liberaes, ao actual projecto em discussão.

Depois da lei de 1850, o decreto ditatorial da regeneração entendeu dever aboli-la, por ter ella constituido um dos planos inclinados, pelo qual se deslisara ex abrupto um partido que se julgava bem firme por todos os attaches que tinha a chamada opinião publica. E o que é certo é que então o marechal entendeu que não devia estar por mais tempo no poder e essa lei de imprensa foi das que mais concorreram para deitar abaixo a situação.

Por sua parte, o orador desejará que o Sr. Conselheiro João Franco, se chegar a ter o prazer de ver convertido em lei o projecto que se discute, não tenha tambem para lhe provocar a queda a pseudo-liberdade com que S. Exa. reveste esta lei de repressão.

O projecto em discussão é ainda menos liberal do que a lei de 1852. Não se comprehende, portanto, como um partido que pretende ser regenerador-liberal ousa mandar dizer aos ventos da publicidade que não houve nunca epocas de maior regime constitucional do que a de Saldanha e a do novo partido do Sr. João Franco. É isso apresentar-se com uma taboleta muito vazia de epistolas e com toda a sua bagagem, de tal maneira reles, simplificada e reduzida, a ponto de não se poder dizer que esse partido esteja á altura da tolerancia publica.

Comparando o actual projecto com a lei de 1866, de Barjona de Freitas, que foi um dos ornamentos mais brilhantes, não só das duas casas do Parlamento, como e principalmente do partido regenerador, ao qual honrou com todas as manifestações do seu talento, vê-se então não haver absolutamente paridade alguma.

Como se está longe d'aquelle tempo do debate sobre o projecto de 1866, magistralmente relatado nesta Camara por Thomaz Ribeiro e auxiliado por toda aquella pleiade de homens, dos quaes não restam infelizmente senão aquelles que disseram - approvo - porque os que entraram na discussão já não pertencem a este mundo real! E felizmente para elles, porque já não viram a toda a hora rasgar e vilipendiar a Carta Magna dos seus principios liberaes, vendo agora, passados sessenta e tantos annos retrogradar se a uns tempos e a uns principios que talvez Costa Cabral, se hoje estivesse nas cadeiras do poder, não tivesse adoptado.

Em 1898 - permittam-lhe a immodestia - foi o orador quem teve a coragem de atacar o projecto apresentado pelo Sr. Veiga Beirão, e quem proclamou, com toda a energia do seu credo liberal e desassombro das suas convicções, não só a necessidade da reforma da maior parte dos artigos desse mesmo projecto, mas tambem a defesa d'aquillo que a Associação dos Jornalistas, d'esse tempo, já pretendia.

Todos os pedidos, toda a orientação, que a Associação dos Jornalistas hoje apresenta, queixando-se do actual projecto, já o orador teve que defender, conforme pode e soube.

Não é portanto nova, nesta Camara, a sua maneira de pensar; e, neste momento, faz grande sacrificio, sobre o seu estado de saude, para; poder, como sentinela que de ha muito está sem dar alerta, vir gritar - alerta está - contra o ataque, que se projecta, á liberdade de imprensa.

Mal diria o orador, atacando o actual projecto, que o Sr. Beirão encontra-se nas circunstancias de poder repetir o annexim popular, que diz: "Atrás de mim virá, quem bem me fará!" Mas, com effeito, S. Exa. pode dizer isso, porque o projecto é um mosaico das leis mais retrogradas que até hoje se publicaram, com a aggravante de disseminar por tal forma as suas disposições que é necessario o trabalho de um benedictino para saber onde está o X da incognita.

Depois de apresentar um tal projecto, não se envergonha o Governo de vir dizer que esse projecto é altamente liberal, admirando-se, portanto, de que a imprensa portuguesa, num grande movimento de solidariedade e defesa propria, se levantasse e dissesse ao Governo: "As nossas liberdades vão ser offendidas, calcadas aos pés; mas nos somos tambem um grande poder social; havemos de lutar contra o Governo, e mostrar que não nos algemarão impunemente".

E essa imprensa, que tantas vezes se digladia, num meio cheio de insidias e de invejas, apesar d'isso, na hora do perigo, em que era preciso proclamar a guerra santa, reuniu fileiras e veio dizer ao Governo que, embora esse quisesse fazer acreditar que não tinha medo, tivera, entretanto, um calafrio, e tem-no ainda a esta hora.

Digam o que disserem, venham apresentar nesta Camara a coragem ficticia, que julgarem mais conveniente, desde a ironia até o ridiculo; mas emquanto a imprensa se. mantiver num silencio que é perfeitamente sepulcral, os defensores do projecto em discussão hão de ficar sepultados no ridiculo, mas no ridiculo da aniquilação pelo nada. Nestes tempos não se ataca impunemente a opinião publica.

Em que termos se apresenta uma lei destas ao Parlamento? Apresenta-se quando um Governo principia por um discurso mirifico, posto na boca do Chefe do Estado depois repetido nesta Camara, e até mandado affixar nas esquinas; quando esse Governo apparece sem resolver a crise agricola, nem a questão vinicola; quando, sobre questões economicas, vem trazer ao Parlamento o que os seus antecessores deixaram feito, em duas ou três medidas, que já estavam gisadas, construidas e preparadas.

Nestas circunstancias, merece porventura esse Governo a attenção do país, ou da Camara, quando vem apresentar uma lei de liberdade de imprensa, em nome de principios liberaes? E é esta a occasião para rever essa lei?

Lembram-se os Srs. Presidente do Conselho e Ministro da Justiça de que, em 1898, o partido regenerador negava-se á discussão da lei do Sr. Beirão? E por que motivo? Porque, dizia o Sr. Moraes Sarmento, em nome desse partido, e por inspiração dilectissima do leader nessa occasião, que era o Sr. João Franco, "o partido progressista compromettera-se a apresentar medidas de fomento economico e agricola, e, em vez de tratar desses assuntos, apparecia com uma lei de liberdade de imprensa".

Pois hoje a opposição parlamentar deve dizer ao Governo que, tendo elle falseado a sua palavra, de impulsor do movimento economico, de verdadeiro equilibrista das finanças da nação, não deve agora apresentar uma lei de repressão da imprensa, sob o pseudonymo de liberal, pondo de lado os problemas mais vitaes para a nação, e que, portanto, não só rejeita de principio a fim, mas nem admitte sequer a discussão dessa lei de imprensa.

Disse o Sr. Presidente do Conselho que o projecto que se discute era uma questão completamente aberta - das taes abertas fechadas -; mas isso quer dizer que as emendas, que por parte da opposição forem apresentadas, não são approvadas nem estudadas, e que o que está em discussão passará tal e qual, porque uma obra d'estas é necessario que fique sem retoques, para que o monstro seja mais completo.