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SESSÃO N.º 22 DE 15 DE ABRIL DE 1898 197

fico; falla mais do que todos os relatorios do sr. ministro da fazenda, e digo isto, sem desdouro para s. exa., pois sou um dos maiores admiradores do seu trabalho;

Sabe v. exa. o que está aqui n’este folheto? Vou dizel-o a s. exa. e á camara.

Uma pequena sociedade durante treze annos seguidos administrou-se por fórma que foi esgotado o seu capital, 77 contos, e quasi mais 50 por cento d’esse capital.

No fim do decimo quarto da nova gerencia, o deficit, que era de 6 contos de réis ficou reduzido, v. exas. vão ficar pasmados, — ficou reduzido a 63$000 réis!

Esta administração, rigorosamente economica, apresentou um saldo de cerca de 440$000 réis em 1897.

Regenerou-se a dita sociedade, augmentando a receita, e diminuindo a despeza.

Porque não faz o governo o mesmo, dispondo de maiores recursos?!

Porque não segue os principios consignados no relatorio d’esta sociedade?

Depois, e só depois, é que seria justificada a sua proposta.

Assim o governo teria a gloria de salvar o paiz da situação gravissima em que se encontra.

São seis homens os que estão aqui que davam optimos ministros e que eu recommendaria respeitosamente a El-Rei, se tivesse influencia para tanto. Mas na politica não ha homens que tenham coragem para cortar a direito e fazer economias; e não a têem, porque os partidos que governam querem ter amigos e para os não perderem são sempre mãos rotas.

O exemplo que apresentei é bem caracteristico. E note-se que o paiz tem outros recursos que faltam a uma sociedade particular.

Se não adoptam os principios indicados n’este relatorio é porque não querem; mas depois não se admirem se vier a administração estrangeira.

Considero infallivel a guerra entre uma nação poderosa e egoista e a cavalheirosa e heroica nação hespanhola, nossa irmã nas tradições gloriosas, que n’esta questão internacional e lamentavel tem dado sobejas provas de sensatez e acrisolado patriotismo. N’estas dolorosas circumstancias, o exito d’esse projecto de conversão seria desastroso.

E como eu não pretendo carregar o quadro, que é muito sombrio, muito cheio de nuvens negras e tenebrosas, permitta-me a camara ao menos para eu a tirar do peso em que a deixo, que lhe apresente uma nota alegre.

Este relatorio é da sociedade do jardim zoologico, onde ha muitos bichos.

Sem offensa para ninguem, peço licença á camara para estabelecer uma comparação entre o jardim zoologico e o jardim da politica. Todos nós sabemos que os animaes racionaes têem ás vezes uns certos traços dos irracionaes, e então permitta-me a camara a comparação;

No jardim zoologico ha aguias; tambem as ha no jardim politico e sobem ás altas regiões aereas. Tenho por exemplo a quidiante de mim p sr. Antonio Candido, que se eleva ás mais altas regiões da eloquencia parlamentar.

Mas temos ainda n’esta camara outras aguias; temos o meu amigo o sr. bispo de Bethsaida, o meu amigo o sr. visconde de Chancelleiros, que muito me alegro de ver presente, o meu amigo o sr. Thomaz Ribeiro e outros.

Ha, papagaios, e é natural que eu pertença a esse numero, porque venho papaguear para a camara, e é o mesmo que ír papaguear para o deserto. (Riso.) Ha caranguejos, tambem os ha aqui, e esses são os srs. ministros. (Riso.) Ha araras lá e cá, chimpanzés é que creio que não registam.

Ha gansos como houve no Capitolio com a differença que os de cá gritam e os de lá estão calados depois que comem o milho das sociedades anonymas.

Mas cousa singular: no jardim zoologico, onde ha tanta especie de animaes, não ha uns certos a que Virgilio e Camões chamavam centimanos, e Victor Hugo pieuvres e a que um nosso classico chamava briareus, mas no jardim politico é que elles não faltam: abundam e até se reproduzem como os coelhos na Australia. (Riso.)

Sr. presidente, restam-me apenas dez minutos para terminar, pois eu impuz a mim mesmo a obrigação de não fallar mais de uma hora, e vou agora referir-me, sem com isto pretender censurar ninguem ás proximas festas do centenario da India, e oxalá que ellas correspondam á grandeza do assumpto e da alta personagem que vamos celebrar.

Não seria maior gloria para aquelle illustre e grande homem de Portugal saber que, em logar d’estas festas se tinham todos applicado em satisfazer os nossos compromissos? Não seria isto muito melhor?

Sr. presidente, esta opinião não é só minha é tambem de um illustre membro d’esta camara, de um inspirado poeta, do meu particular amigo o sr. Thomaz Ribeiro, que dizia:

Antes d’isso e emquanto os seus credores
o trouxerem de rastos e aos pedaços,
e lhes não validarmos seus penhores,
e nos chamarem — pobretões devassos,
emquanto lhe apuparem desprimores
nos Circos d’essa Europa, os vis palhaços,
o convite é baixeza de villão!
«Senhor, não!»

E peço licença tambem ao illustre poeta para citar ainda a epigraphe do seu primoroso folheto, que eu adoptaria tambem para o meu discurso, se elle tal nome merecesse.

«Senhor, disse demais talvez,
mas não imaginaes um velho portuguez
que amor á patria tem?...

Sr. presidente, nós devemos tambem celebrar o centenario de outro grande portuguez, se porventura n’esta occasião estiver restaurada a nossa fazenda publica; é uma divida talvez para daqui a muito longe, mas se não podermos celebrar esse centenario, façamos ao menos uma homenagem.

É uma estatua n’esta casa; que fique defronte do srs. ministros.

Sabe v. exa. de quem?

De D. João de Castro, que empenhava as barbas, a fim de salvar o paiz, emquanto que os governos que ultimamente têem gerido a administração publica, com raras excepções, tem empenhado o paiz para salvar as barbas, como eu já disse n’outra occasião aqui no parlamento. (Riso.)

Esta era a estatua que devia estar n’esta casa defronte das cadeiras dos srs. ministros.

Sr. presidente, estou cansado, mais de espirito que de corpo, alquebrado pelos annos e pelos desenganos da vida parlamentar.

Creio que não proferi nenhuma phrase que melindrasse os srs. ministros, ou qualquer dos meus collegas.

Não quiz susceptibilisar ninguem.

O meu proposito é o de pugnar pelos interesses e dignidade da nação.

É isto o que eu quero e sustento, e hei de sustentar sempre n’esta camara.

Sr. presidente, prezo tanto os srs. ministros como homens particulares, quanto os desadoro como politicos.

Terminando, faço sinceros votos para que s. exas. sejam mais felizes em relação ao projecto que se discute do que o foram por occasião do ultimatum, em 1890.

Desejarei que não seja agora a humilhação maior do que aquella por que então passou a nação portugueza.

Foi muito cumprimentado o digno par por todos os lados da camara.