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pares nao haviam approvado o parecer da commissão', ap-parecendo grande maioria de espheras brancas contra sete pretas; alem d'isso diversos membros d'esta casa impugnaram o parecer da commissão, e por consequência a sua entrada n'esta camará; e é a estes dignos pares que o novo membro quer justificar a sua entrada n'ella. Entende pois que se o digno par teve isto em vista, o sr. presidente deve consentir que elle falle.

O sr. Conde da Taipa:—Entra n'esta questão para definir bem o direito do sr. presidente. Entende que o presidente não é senhor absoluto da camará, mas sim juiz da lei regulamentar d'ella; e quando se duvida das rasões que elle teve para usar d'esse direito, deve appellar-se para a camará. No que entende que o sr. presidente devia chamar á ordem o digno par, foi quando no seu discurso atacou a lealdade de um digno par que podia ter-se enganado.

O sr. Sebastião José ãe Carvalho: — Eu retiro essa expressão.

O sr. Conãe ãa Taipa: — Não podia o orador accusar de falta de lealdade um digno par que se podia enganar, e sobre isso o sr. presidente tinha obrigação de o chamar á ordem.

O sr. Presiãente: — Foi justamente por causa d'essas palavras que eu chamei o digno par á ordem.

Chamei á ordem o orador por ter empregado a palavra ãeslealdaãe para com um seu collega, o que de certo não tem nada de parlamentar (apoiaãos). Mas agora, visto que o digtfo par declara que retira similhante expressão, e que não teve intenção de offender nenhum dos membros d'esta camará, concedo novamente a palavra a s. ex.* para continuar o seu discurso, se assim o tiver por conveniente.

O sr. Sebastião José ãe Carvalho: — Retiro a expressão que proferi inconsideradamente no fogo e no calor da discussão, calor que é de certo justificado pela posição excepcionai em que estou collocado. Não é do meu intento ag-gredir o digno par que não conheço pessoalmente, mas a quem respeito muito, fazendo-lhe a justiça de o julgar um cavalheiro distincto, como todos os que têem assento n'esta casa; o que eu quiz provar foi apenas que s. ex.* não tinha produzido a favor de sua argumentação as rasões que era de esperar que produzisse, depois do exame dos documentos que tive a honra de apresentar á camará, exame que deveria ter sido circumspecto e reflectido, attenta a posição em que o digno par se havia collocado.

Sr. presidente, repito, retiro a expressão, e tenho muitíssimo prazer e grandíssimo orgulho em ver que v. ex.a com tanta imparcialidade como rigor zela a dignidade d'esta camará e cumpre com os deveres que a sua posição lhe impõe.

Para mim que estou resolvido a respeitar as disposições regimentaes d'esta casa, e que hei de timbrar sempre em que a liberdade de discussão se concilie com o respeito que reciprocamente nos devemos e com a dignidade da camará, é de certo lisonjeira a convicção de que me cercam homens animados por estes sentimentos de ordem, por estas idéas de liberdade, e por estes mesmos principios de rigor e imparcialidade de que v. ex.* acaba de dar testemunho.

Sr. presidente, estou n'uma posição excepcional, é o que pretendo provar á camará e é o que se deduz da impugnação que se me fez, impugnação que se não justifica, facilmente e que a convicção me diz que é injusta. Tenho pois rigoroso dever de justificar-me, a fim de zelar a minha dignidade, e a dignidade do logar que occupo.

Sr. presidente, a rasão justificativa da opposição que se me fez, não a encontro na lei, nem tão pouco nas argumentações dos discursos que foram produzidas contra o requerimento que eu tive a honra de apresentar á camará.

O sr. Vellez Calãeira: — E inútil; a camará já apreciou tudo.

O Oraãor: — Tenho a declarar ao digno par que com a consciência dos meus deveres, conheço que devo respeitar a resolução da camará e respeitoa. Sei mais, sei que devo ao testemunho de consideração que a camará me deu, o sentimento da mais profunda gratidão, mas porque a camará reconheceu a justiça, que me assistiu, e o direito que eu invocava, não se segue que eu deixe por isso de justificar-me, quando entendo que o devo fazer mostrando que requeri nos termos da lei de 13 de abril de 1845, e que assim respeitei as suas disposições.

O sr. Vellez Calãeira:—A camará já julgou.

O Oraãor:—A camará julgou! Ê verdade e é em virtude d'esse caso julgado que eu estou aqui discutindo com o mesmo direito com que os dignos pares discutiram a sentença passada em julgado, e com a qual eu provava a condição do rendimento marcada na lei. Eu bem comprehendo o que o digno par quer dizer com a sua interrupção, mas comprehendo melhor os meus deveres e os direitos que me assistem. Não me estreio hoje na vida parlamentar, tenho já uma vida publica, comquanto curta e modesta e o próprio digno par sabe de certo que militei nas fileiras da politica por algum tempo. Fui apenas soldado raso n'essas fileiras, mas ainda assim aprendi a conhecer ahi o que era a vida publica no systema liberal; e se o não tivesse aprendido da lição dos factos, tinha o exemplo em casa e basta-va-me isso! A dignidade do systema parlamentar não está na cortesia das deferências pessoaes; e creio que os membros d'esta camará podem respeitar-se mutua e reciprocamente, sem que seja necessário andar sempre em zumbaias de etiquetas que para nada servem e que nada provam. Que desaire resulta á camará de que eu justifique as rasões com que requeri, provando que estava nas circumstancias da lei de 11 de abril de 1845? Se isto me não fosse permittido nada teria que dizer, e seria escusado occupar a tribuna, porque creio que os dignos pares me fazem a justiça de acreditar que não pedi a palavra para apresentar a minha profissão de fé politica. Com quanto podesse usar também d'esse direito, não estou resolvido a exerce-lo.

Sr. presidente, v. ex.* que tem um longo tirocínio parlamentar sabe que por muitas vezes se têem apresentado a esta camará requerimentos como o que tive a honra de apresentar ha poucos dias, e sabe como esses requerimentos têem sido documentados, as duvidas e apprehensões que muitos d'elles podiam levantar no espirito da camará; mas nenhum de certo d'esses requerimentos foi como o meu impugnado com tanto fogo, contra nenhum se levantou tão grande opposição, tendo eu satisfeito aos requisitos da lei. E não me constituirá este facto n'uma posição excepcional! E ainda se me ha de estranhar que eu use da palavra para me justificar?

Sr. presidente, a lei de 11 de abril de 1845 apresenta como condições principaes para exercer o pariato a condição do rendimento e a condição das habilitações litterarias: nenhuma duvida se offereceu sobre os documentos com que eu provava que tinha as habilitações litterarias, mas offe-receram-se algumas duvidas e apprehensões sobre os documentos com que eu provava a condição do rendimento.

Sr. presidente, esses documentos consistiam em uma certidão passada em juizo, e pela qual se mostrava quaes as propriedades que me haviam cabido em legitima, e as peças do processo da avaliação que requeri perante o juizo ordinário com audiência do ministério publico, avaliação que por mira foi requerida para o fim especial marcado no requerimento, para execução da lei de 13 de abril de 1845. Essa avaliação, julgada por sentença, dá aos bens que me foram aformalados um valor e um rendimento superior ao que a lei exige; e dispensando-rae de repetir os argumentos produzidos pelos dignos pares que apoiaram o parecer da commissão, perguntarei só ao illustre signatário do parecer em separado; são admissiveis esses documentos como prova do rendimento que a lei exige? A camará resolveu já que sim; mas se o não houvesse resolvido, como pretendiam os dignos pares que impugnaram o parecer,' que principio teria a camará sanccionado? O principio absurdo de que não faziam fé os documentos passados em juizõ, de que não tinham força as sentenças do poder judiciário! E não seria isso uma desconsideração lançada sobre esse poder, que somos obrigados a respeitar pela constituição do estado? Não teria esse principio como consequência absurda o despreso pela lei, e a impossibilidade absoluta em que ficarão os successores ao pariato de justificarem perante a camará o rendimento que a lei lhes exige? Que meios de prova consideraria a camará?

E porque não disseram também os impugnadores do parecer da commissão, que não eram admissiveis os documentos com que eu provava as minhas habilitações litterarias? Porque não levaram o principio'que estabeleceram ás suas ultimas consequências. Pois os documentos que saem da chancella da universidade têem mais auctoridade para os dignos pares que a verdade dos documentos que portam por fé os escrivães do juiz civil!

Porque se levantam tantos escrúpulos no exame dos documentos com que provo a condição de rendimentos, quando nenhuns se levantam contra os documentos com que provo as habilitações litterarias? Quererão os dignos pares significar com isso, que a condição do rendimento, importa para a dignidade d'esta camará uma maior garantia que a condição das habilitações litterarias? Eu não o comprehendo assim, e se fosse permittida a distineção, diria .que antes queria uma camará de pares composta de homens illus-trados, do que uma camará de pares composta apenas de homens abastados.

As habilitações litterarias são um requisito mais importante que o da condição da fortuna para o homem que, sentado aqui, tem o rigoroso dever de discutir os negócios públicos, comprehendendo a sua importância. Póde-se ser muito rico de bens da fortuna, e muito pobre de dotes de espirito ; a natureza não tornou incompatível esta pobreza com aquella riqueza, di-lo a sentença de mais de um pensador, e de mais de um philosopho; e do nosso João Rodrigues de Sá se refere que em Almeirim dissera a D. Fernando de Menezes: «Não é, senhor, tão grande o vosso morgado que possaes ser tão parvo.»

Senhores! No regimen constitucional só o merecimento deve conquistar a posição; mas o merecimento próprio, o que resulta das qualidades do individuo, da valia dos seus serviços e da sua intelligencia, e todo o homem publico que alheio a estas considerações fizer carreira, não pela influencia do seu próprio merecimento, mas pela influencia poderosa a que se abrigue; esse homem em politica é um miserável, e qualquer que seja a consideração de reflexo que elle possa receber, se é li*onjeosa para quem de si irradia tamanha luz e tão grande esplendor, é soberbamente ridícula para o corpo em que ella se projecta, e que á custa d'ella tenta brilhar.

Perguntemos pois a qualquer individuo pelos actos da sua vida publica, pelas provas da sua independência, pelos documentos da sua illustração antes de inquirirmos em que condicções de fortuna o collocou o acaso.

Mas a dignidade e o lustre da posição de par!

A dignidade da posição de par sustenta-se mais que com as pompas da riqueza, com os dotes elevados de espirito e com os sentimentos nobres da alma. A dignidade da posição de par sustenta-se com a firmeza de convicção, com a elevação de idéas, com a lealdade de principios e com a nobresa de caracter. O pariato é uma funeção publica que se honra como todos os serviços públicos, quando o individuo que o exerce se compenetra bem dos seus deveres e os cumpre rigorosamente, ganhando assim para o logar que oceupa o prestigio da sua própria auctoridade. No regimen constitucional, e é essa a sua principal bellesa, não é a funeção publica que honra o individuo, mas é o individuo que a exerce quem a nobilita pelos seus actos.

Levantae da nullidade a que os seus próprios merecimentos

o teriam condemnado, guindando-o ás mais altas posições, qualquer homem sem merecimento para taes honras, que da altura a que subiu ninguém o verá se não for conhecida a rasão de tal ascensão. E que no regimen constitucional ha uma aristocracia superior a todas, é a do merecimento (apoiados). Para a aristocracia de sangue e para a aristocracia,de riqueza sem merecimentos não legislou a carta, e a lei que regula a disposição constitucional não pôde por forma alguma ir de encontro ao espirito d'essa disposição. A1 carta estabelece o pariato hereditário, e á dignidade de pàr ió são elevados os homens distinctos pelos seus serviços á*causa publica, mas se applicardes rigorosamente as disposições da lei de 1845 aos successores ao pariato, onde está nà maior parte dos casos a hereditariedade da carta?

Pois não Sabemos todos, e com magna o confes-o, que ém Portugal o homem que sobe ás mais elevadas posições na' categoria social, se não traz herdados os bens da fortuna chega ao termo da sua carreira cheio de honras, mas pobre de meios! Não sabemos todos que esse homem na hora extrema da vida sente confranger se-lhe o coração de tristesa e de dor ao lémbrar-se que deixa uma familia herdeira do-seu nome e'"díts suas honras a lutar com a moeria, se'os poderes públicos lhe não acudirem com uma pm-são!'Pois não temos todos a consciência d'esta verdade? Com quantos exemplos a não poderia eu abonar, invocando mesmo as tradições d'csta camará! L^mbram-se de Manuel Duarte Leitão, d'esse magistrado integCrrimo, desse funecionario probo, d'esse jurisconsulto distinctissmio?

Onde está que o não vejo o seu representante n'e-ta casa! (sensação) Oh! que se elle requeresse para tomar as>eato n'esta camará, eu queria vêr o que lhe respondia a consciência rigorosa dos dignos pares! Se elle nos viesse dizer aqui: requeiro para occupar o logar de meu pae a cuja memoria todos prestaes um sincero testemunho de veneração e respeito (apoiados). A camará havia de lhe responder : ide-vos que nada temos com isso! Mas appello para os actos de uma vida publica honrada, appello para a< habilitações litterarias que me deu a esmerada educação que recebi? A camará havia de lhe dizer: ide Vos não e-taes Comprehendido na lei, a carta é por vós, mas á lei d<3 45 não o é, ide-vo3 que para ÀÕs a independência' é menos uma qualidade de espirito que um attributo da^^ondição de fortuna. A camará havia de lhe dizer isto,- haiftft de proclamar esse absurdo principio^que faz de um Creso um Catão? Por mim confesso que.o-não farei nunca.

Sr. presidente, felizmente eu não estava n'esse caso; requeri porquê tinha também, para poder requerer, as condições'de fortuna herdadas de meu pae. Legbu-m'as elle por que' as trouxe- herdadas e não porque as ganhasse no longo tirocinio de uma carreira de cincoenta annos de serviços. Digo-o com orgulho, da vida publica o maior thesouro que para a sua familia trouxe, foi o da consideração que o seu nome merece e que tem merecido a esta camará, que tanto honrou, ainda na sessão passada, a sua memoria; honra que lhe tem sido dispensada em ambas as casas' do parlamento^ ficando comemorada a sua morte n'um trecho de eloquência do primeiro orador portuguez.

Os grandes serviços, e por maiores qua elles sejam, ficam pagos quando a consciência publica os reconhece, em tão grandioso testemunho de consideração. /

Sr. presidente, sei que os oradores que sustentaram o meu direito appellaram para as tradições do riome que herdei f mas os rigorosos zeladores das prescripções da lei não se moviam de certo por isso; fechariam os olhos a estas considerações quando eu necessitasse appellar para ellas para me não applicarem o rigor da lei; como deixariam igualmente de considerar outros factos, pelos quaes aliás deveriam fazer obra, quando não fosse necessário apenas, para me fazer justiça, fechar os olhos a quaesquer considerações e applicar a lei.

Estes factos a camará sabe bera quaes elles sejam, e entres estes apontarei um. Votou a camará já alguma pensão á viuva do barão de Chancelleiros? Ninguém o dirá. Pois bem, appello para o testemunho dos dignos pares que me ouvem. Não foi já aqui approvado sem discussão, sem controvérsia um parecer da commissão, relativo á admissão de um par, a cuja mãe pouco depois se votou uma pensão?... A camará fez muito bem com o votar porque considerou os serviços de um homem illustre; mas pergunto: esses precedentes são desconhecidos? Pois os dignos pares zelosos da dignidade da camará tapam os ouvidos a todas as considerações, fecham os annaes parlamentares para os não consultarem, empenhando-se só em contrariar, não digo com acinte, mas apparentemente com todas as demonstrações de acinte a minha entrada n'esta camará. Porque é força confessa-lo a maior impugnação que ella soffreu não foi a dos argumentos produzidos pelos dignos pares que fallavam contra o parecer, a maior impugnação que ella soffreu está na opposição surda, latente, anonyma que se lhe fez, opposição que de envergonhada se furtava ao debate para só descobrir o rosto nos corredores d'esta casa. (Uma voz:—Isso ó insinuação). Não é insinuação é a verdade. Se eu podesse ter orgulho com isso, tinha-o; tão estranho, tão notável foi o facto a que deu azo a minha entrada n'esta camará!...

Sr. presidente, bati ás portas d'esta sala, e poz-se a camará em sobresalto.

Uma voz:—A camará não.

O Orador:—A camará não com effeito, mas alguns dos dignos pares que me ouvem.

Para uns eu era o democrata exaltado, e vinha com exageradas theorias acordar os echoé d'esta casa á voz de Prou-dhon:

Para outros eu era o homem excêntrico, sem bandeira nem norte politico, e vinha lançar nas hostes aguerridas o exemplo de indisciplina e insubordinação.