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8 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

O Orador: - Eu agradeço a concessão da Câmara; e agradeço-a, tanto mais quanto é certo que não podem ficar de pé as afirmações que na penúltima sessão o Sr. Ministro das Finanças fez. V. Exa., Sr. Presidente, compreende que as afirmações que S. Exa., na sessão de anteontem aqui produziu, foram tam extraordinárias, que eu poderia, ainda mesmo quando não devesse, fazer largas considerações sôbre política financeira; mas apesar de poder, e até talvês de dever, não as quero fazer, e simplesmente, por assim dizer, à vol d'oiseau, referir-me hei a essas medidas financeiras, porque sei bem que se está aproximando o termo da sessão legislativa, muitos, assuntos há a tratar, e alguns de natureza inadiável. É só por isto que não faço um longo discurso, que forçadamente teria de fazer se me referisse, como desejava, às medidas de finanças que, pelo menos desde 1890 até agora, pelos diversos titulares da respectiva parte foram apresentadas às câmaras do meu país.

O Sr. Ministro das Finanças disse na sessão de anteontem cousas que eu tenho textualmente reproduzidas nas notas que então tomei e que não condizem absolutamente em nada com o extraio que do seu discurso publicou o jornal que representa a política em que S. Exa. está integrado. Provavelmente S. Exa. arrependeu-se da forma e maneira por que as disse. Ainda bem que essas afirmações só ficaram aqui dentro, que lá fora o país não teve delas conhecimento. Do que S. Exa. disse aqui, todos os Srs. Deputados hão de estar lembrados. Disse S. Exa. que não era verdade ter prometido o equilíbrio orçamental. Ninguém lhe disse que S. Exa. o tinha prometido ; o que se lhe disse foi que S Exa. tinha prometido solenemente apresentar propostas de fazenda que tendessem para o restabelecimento do equilíbrio orçamental. São cousas bem diversas. Hoje, e serenamente, S. Exa. faz decerto, a justiça de acreditar que não foi feliz na expressão que ante-ontem empregou, dizendo que eu imaginava que com uma varinha mágica se podia de repente equilibrar o orçamento.

S. Exa. há-de fazer-me a justiça de acreditar que eu não sei tam pouco destas cousas que não reconheça a impossibilidade de instaneamente extinguir-se o déficit orçamental.

S. Exa. fez uma afirmação solene, quando da apresentação da reorganização da guarda fiscal, reorganização de tal forma extraordinária que teve de dormir no seio da comissão, não digo o sono dos justos, mas o sono das cousas menos bem trabalhadas. S. Exa. fez por essa ocasião as mais extraordinárias afirmações, êste é o termo, a propósito da reorganização do serviço fiscal. Não vale a pena estar a reproduzir essas afirmações, porque os poucos que ouviram S. Exa., estão delas ainda bem lembrados.

S. Exa., depois, vendo que essa reforma não podia, é claro, sequer merecer o parecer da comissão, prometeu trazer outra. Estamos esperando. Continuaremos esperando!...

S. Exa., mais tarde, apresentou a proposta para o pagamento dos direitos em ouro.

E é tudo.

S. Exa. disse ante-ontem que as propostas de fazenda eram um caso que precisava ser maduramente pensado, que não se fazem propostas de fazenda de repente, e que era preciso que fossem viáveis.

Como modelo de viabilidade temos a proposta da guarda fiscal, sôbre a qual S. Exa. concordou não deveria, sequer, a comissão dar parecer!

Como modelo de morosidade, consegui-o S. Exa. apresentar-nos o melhor: Ficou parado!

Disse-nos S. Exa.: "talvez não saibam que não há assim tantas propostas de fazenda que se possam apresentar para diminuir o déficit orçamental". Efectivamente, eu sei que não há assim tantas propostas de fazenda; mas tambêm sei que há algumas propostas de fazenda que podiam já estar em vigor.

S. Exa., por acaso, pensou, dalguma maneira, em remodelar o regime das classes inactivas?

S. Exa., por acaso, pensou em fazer a revisão de todos os empregos públicos, fazendo como por assim dizer o nivelamento das diversas situações, dos funcionários, tendo todos, dentro de cada uma dessas situações o mesmo vencimento e a mesma categoria?

S. Exa., por acaso, pensou em fazer a reforma da Caixa das Aposentações?

S. Exa. sabe que nos ordenados dos funcionários públicos há, dentro da mesma categoria, diferenças como as que vou ler à Câmara?

Sabe a Câmara qual é o ordenado líquido dos juizes do Supremo Tribunal de Justiça? 2:600$000 réis.

Há juizes do cível que chegam a ganhar 4:000$000 réis emquanto que juizes do crime, da mesma classe, recebem liquido 1:700$000 réis.

Sabe a Câmara, e isso, infelizmente, é já por uma reforma da República, quanto fazem os inspectores de finanças de Lisboa e Pôrto? Perto de 5:000$000 réis.

Vozes: - Mais, mais.

O Orador: - Sabe a Câmara quem fez esta reforma? Quem foi que arranjou as cousas a poder receber êstes vencimentos que antigamente nem a um torço chegavam?

Foi um dos interessados. Ainda que pareça extraordinário, infelizmente é um facto. O Sr. Ministro das Finanças do Govêrno Provisório, que é claro não podia pelo seu próprio punho fazer todas as reorganizações de serviços, incumbiu dalgumas funcionários que eram tidos como conhecedores dos respectivos assuntos, e em que supunha poder depositar absoluta confiança. E assim S. Exa. indicava-lhes as bases em que deviam assentar as diferentes reformas de serviços e deixava-lhes a contestura do decreto, visto que êstes Senhores é que melhor e mais própriamente conheciam as necessidades dos serviços.

Mas ao passo que êste funcionário talhava para si tam fabulosos vencimentos, com quanto ficavam os recebedores dos bairros de Lisboa? Com alguns centos de mil réis! E há um que para manter os seus empregados, tem de pagar 7$000 réis do seu bolso.

Sabe a Câmara qual é o vencimento do secretário geral do governo civil do Pôrto, qual a soma de todos os seus honorários? Vai acima de 4:000$000 réis. Êste funcionário tem a compensação de emolumentos dos passaportes.

Ora, desde que o Sr. Ministro saiba esta e outras cousas- e decerto não as ignora - há-de pensar na reorganização de todo o funcionalismo português.

Outra reforma de fazenda, de que eu me lembro, e em que o Sr. Ministro pensou por certo, é a reorganização do regime bancário, não só no continente, como no Ultramar e, especialmente as reformas do Banco de Portugal e do Banco Ultramarino.

S. Exa. certamente, já pensou tambêm na participação crescente e progressiva do Estado, nos lucros das grandes companhias. E quando êsses lucros atingissem uma quantia exageradamente remuneradora dos capitais nelas empregados, necessária se tornava uma medida, regulando a forma por que o Estado neles ficaria interessado.

S. Exa. pensou, por certo, em alguma operação a fazer com as linhas férreas, mantendo é claro, e até alargando a propriedade do Estado e seus direitos.

S. Exa. pensou, com certeza, na conversão da dívida flutuante externa, que é sempre a espada desembainhada sôbre a cabeça do Ministro das Finanças, com a reforma das letras e cujos juros, na sua maioria eram ao tempo da implantação da República de 6 por cento e mais, e