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2752 I SÉRIE-NÚMERO 85

periência holandesa: memorandos sucessivos são apresentados ao Parlamento sobre a situação prisional; dos debates sobre os mesmos, apresentados em 1964, 1976 e 1982, saíram novas regras para o sistema prisional. A política penitenciária foi-se, assim, adaptando à evolução da realidade e não se limitou - como se faz entre nós - a um encolher de ombros perante a falência do ideal de reabilitação.
Entre nós, porém, o descrédito na capacidade redentora da prisões aumenta por inércia do próprio Governo, que constata apenas a incapacidade de resolver o problema e procura passar as culpas, suspirando, ainda que silenciosamente - para não haver escândalos! -, por uma salvadora amnistia que alivie as prisões da sobrecarga. Por uns tempos apenas! Porque não se procedendo à humanização da prisão, não se reduz os efeitos nocivos desta, não se ganha o recluso para a sua ressocialização e não se prepara o seu regresso à Comunidade.
E vivendo nós numa situação de crise, por desgraça da política anti-social do Governo, artigos da proposta, como o 40.º sobre a finalidade das penas e o 41.º sobre a execução da pena de prisão, nos quais se aponta - e bem! - como finalidade a reinserção social do delinquente, poderão não passar de artigos emblemáticos, enquanto perdurar esta politica, pois, como já o disse a Professora Doutora Teresa Beleza, a propósito do actual Código Penal e daquilo a que chama o «Mito da Recuperação do Delinquente », recupera-se este para o desemprego, devolve-se o delinquente contra a propriedade a uma sociedade baseada na desigualdade económica, devolve-se o violento a uma sociedade geradora e cúmplice de toda a espécie de violências, de violações de direitos humanos.
Assim, a prosseguir-se a feroz política anti-social em que mergulha o povo português, estas alterações ao Código Penal falharão o objectivo a que, honestamente, se dedicou a Comissão Revisora.
O Código reformulado poderá transformar-se, como qualquer outro produzido em idênticas circunstâncias, num «subtil mecanismo » utilizado não para tutelar os valores pessoais e comunitários para a convivência, mas para fomentar ou a confiança do cidadão a respeito do sistema e das instituições, ou a submissão do cidadão a esse mesmo sistema.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Membros do Governo: No sentido de que as penas privativas da liberdade fossem usadas como a última ratio da política criminal, as propostas de alteração à parte geral do Código vêm abrir a possibilidade de aplicação da pena de multa alternativa ou sucedânea da pena de prisão.
Em termos teóricos, as opções parecem-nos correctas, pese embora uma ou outra melhoria, nomeadamente no sentido de impedir que o delinquente economicamente carenciado, normalmente mal esclarecido quanto às saídas legais, se possa ver preso - como acontece hoje - porque não teve a iniciativa de provar ao tribunal que não podia pagar a multa.
No entanto, há que impedir, nomeadamente analisando com detalhe as molduras penais da parte especial do Código, que as alterações sejam um convite ao uso da pena de multa como forma de obter a contenção das despesas públicas com o sistema prisional, como forma de conter os custos desse mesmo sistema, quer no que toca às condições que são dadas aos condenados, quer no que toca à assistência social às suas famílias.
O alargamento dás possibilidades de aplicação das penas não privativas da liberdade não pode conduzir ao abandono da reinserção social, não pode significar, como aconteceu nos Estados Unidos da América, a construção de prisões de segurança máxima, instrumento de puro terror penal.
Devo dizer que a manifesta inércia do Governo, no que toca ao sistema prisional é às necessárias alterações no direito penitenciário, faz recear, seriamente, que o uso da pena de multa passe a cumprir, primordialmente, objectivos perversos que não estão na sua índole: a morte da ideologia da recuperação, com todas as funestas consequências sobre a segurança dos cidadãos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Batemo-nos, desde o início, para que nas alterações ao Código Penal fosse introduzido uni capítulo relativo aos ilícitos penais laborais.
Se nos socorremos do direito comparado, vemos que em França se criminalizaram, no Código Penal, infracções contra os direitos dos trabalhadores, e o mesmo aconteceu no projecto de código penal espanhol.
Na proposta que nos é presente, não só não se avançou devidamente na tipificação do crime de exploração do trabalho infantil - estamos a referir-nos ao crime de maus tratos a menor - como, para além do crime de perigo resultante da inobservância de regras de construção, nada mais temos no que toca à protecção penal dos direitos dos trabalhadores.
Há, no entanto, nesta matéria - para usar uma expressão do Prof. Doutor Figueiredo Dias, não em relação ao direito penal laboral, como é óbvio, mas em relação ao direito penal em geral - «lesões insuportáveis das condições comunitárias essenciais de livre desenvolvimento e realização da personalidade de cada homem ».
Há novos fenómenos sociais, como o não pagamento doloso de salários aos trabalhadores, que desencadeiam consequências comunitariamente insuportáveis. É o próprio direito à vida dos trabalhadores e das suas famílias que está em causa. É inequívoco que merece a tutela penal.
Há, também, fenómenos já antigos, mas que adquirem um novo significado, como a discriminação no trabalho em razão da actividade sindical, da ideologia e do sexo, que merecem a tutela penal.
Existem ainda infracções às regras de saúde, higiene e segurança no trabalho que colocam em perigo, por vezes muito grave, os trabalhadores, constituindo autênticos crimes de perigo, a merecer a tutela penal.
Vamos, por isso, na especialidade, propor, na parte dos crimes contras as pessoas, um novo capítulo concernente aos ilícitos penais laborais.
Algumas considerações merecem, ainda, nesta breve passagem pela parte especial do Código, os crimes contra a honra e a reserva da vida privada, os crimes sexuais, bem como os crimes patrimoniais.
No que toca a estes últimos, manifestamo-nos, desde já, contra a qualificação dos mesmos em função de unidades de conta processuais. O actual sistema, deixando ao critério do julgador a qualificação dos mesmos, permite uma maior justiça.
É ainda nos crimes patrimoniais que encontramos o que maior estupefacção nos causou. É aqui, enquanto a orientação geral do Código é a de estabelecer pena de multa alternativa para as penas de prisão até 3 anos, na burla grave e no abuso de confiança de certa gravidade que se prevê que uma pena de prisão até 5 anos possa ter uma pena de multa em alternativa. Ainda nenhuma justificação nos foi dada para tal desacerto.
Constatando-se que nos crimes contra as pessoas houve uma agravação das molduras penais, surge como irrazoável que se tenha abrandado a punição no rapto e na ajuda e incitamento ao suicídio de menores.

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