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8 | II Série B - Número: 136 | 26 de Julho de 2008

lêem, naturalmente, «cação» como «cá-ção» e «adoçar» como «á-dó-çar». Mas para os portugueses e também para os africanos dos PALOP e timorenses, que temos tendência para fechar as vogais, necessitamos da presença dos «c's» e dos «p's» para que possamos saber como se devem pronunciar essas palavras (evidentemente que a eliminação dos «c's» e dos «p's» em palavras em que eles não exercem a sua função não causará problemas nestes países — são exemplos as palavras «árctico», «didáctico» e «óptimo», em que o uso de acento agudo inutiliza o «c» e o «p».) Estranha e injustamente, o acordo só prevê que este sacrifício da pronúncia em primazia da ortografia se dê em Portugal, Timor e nos PALOP. Porque é que não está previsto no acordo que os brasileiros substituam o acento circunflexo das palavras «antônimo», «ténis», por acento agudo («antónimo», «ténis»)? Porque não é assim que os brasileiros pronunciam. E assim continuamos com duas ortografias diferentes no que concerne a estas palavras. Mas não era precisamente com a dupla ortografia que o acordo vinha acabar? Então e porque é que o acordo cede quando está em jogo a pronúncia brasileira e não cede quando está em jogo a pronúncia portuguesa, africana e timorense? Mais uma vez, onde está a coerência nisto? A implementação do acordo irá causar ainda outros estranhos fenómenos, tais como a eliminação de certos «c's» e «p's» em Portugal, mas que se manterão no Brasil, por serem lá pronunciados. Isto acontece em palavras como «recepção» e «infecção»: escrevem-se assim no Brasil, pois os brasileiros lêem o «p» e o «c», mas em Portugal passariam a ser escritas «receção» e «infeção» (mais uma vez, contradizendo as regras da pronúncia). No telejornal do passado dia 27 de Novembro, foi entrevistado um perito brasileiro que se questionava: «Como se escrevem os documentos das Nações Unidas? Em português do Brasil, em que se escreve «teto» sem «c» e «ótimo» sem «p»? Ou em português de Portugal, em que se escreve o «p» e o «c», mas não se lêem?" As duplas ortografias não existem apenas na língua portuguesa. A língua inglesa tem diferenças de ortografia (naturalmente menos que a língua portuguesa), mas nunca se viu isso como um empecilho, como um defeito do idioma a corrigir a todo o custo. Além do mais, existem profundas diferenças a nível gramatical entre o português de Portugal e o português do Brasil que também se reflectirão na escrita (exemplo: em Portugal escreve-se «Porquê?»; no Brasil escreve-se «Por quê?»). Não só o acordo prevê que continue a existir inúmeras diferenças na ortografia, como irá continuar a haver diferenças na gramática dos dois países, que farão com que continue a ser possível distinguir um texto em português de Portugal e um texto em português do Brasil. Então porquê implementar este acordo se ele não cumpre o seu suposto objectivo, o de unificar as ortografias de todos os países de língua oficial portuguesa? Através dos vários exemplos apresentados, parece-nos ser bem notório e visível que, ao contrário de facilitar, o acordo só vem dificultar ainda mais o ensino, a divulgação e a própria comunicação em português, além de apresentar absurdas incoerências. Uma língua não se reduz apenas à sua ortografia: há uma série de implicações directa e indirectamente inerentes a esta e que têm uma importância basilar. Se realmente se pretende alterar a ortografia, tem necessariamente de se alterar toda uma série de fundações da língua, isto para não falar na tradição etimológica e nas características próprias e intrínsecas de cada dialecto. A pronúncia é uma das, senão a base mais forte e fundamental de um idioma, e este acordo despreza-a e relega-a para um plano de fundo, pondo em causa toda a estrutura da língua e aumentando o risco do seu desmoronamento.
Pelo exposto, pode concluir-se que, não sendo por razões intrínsecas à própria língua que se promove este acordo, ele parece ter um objectivo simplesmente comercial e diplomático. Será razoável reduzir a língua portuguesa, com a sua riqueza e diversidade próprias, a uma mera moeda de troca? Solicitamos, pois, que seja suspensa a implementação do referido acordo.

O primeiro subscritor, Nuno de Mendonça Freire Nogueira Raimundo.

Nota: — Desta petição foram subscritores 5344 cidadãos.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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