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13 DE JULHO DE 1988 711

numa cerimónia pública, não foram o resultado de um improviso - o Sr. Primeiro-Ministro não tem aqui sequer a atenuante do acaso - e são de uma extrema gravidade. Se se pode dizer, como o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, que "os responsáveis pela eventual não alteração da actual legislação laboral ocuparão, na nossa história, uma página tão negra como aquela em que hoje estão colocados" (sic) - segundo o entendimento do Sr. Primeiro-Ministro - "os que procederam às nacionalizações de 75", então será caso para aguardar explicações, e explicações em letra de forma, do Sr. Primeiro-Ministro sobre a maneira como encara o funcionamento normal dos órgãos de soberania e, em particular, como encara as atitudes dos órgãos de soberania, quando elas não coincidem, como é o caso, com o pensamento e orientação do Governo, que, no entanto, tem de estar submetido à Constituição.

Pedi a palavra, Sr. Presidente, para sublinhar a gravidade de isto ter sido dito e as respectivas implicações em relação ao próprio processo de revisão constitucional, uma vez que, para além do juízo que nos resta fazer sobre o respeito do PSD em relação às instituições, há uma interrogação a lançar: qual a atitude do PSD em relação à revisão constitucional neste ponto? Que projecção é que fará, no processo de revisão constitucional, deste entendimento? Já debatemos - como os Srs. Deputados se recordam - a questão da protecção constitucional contra despedimentos sem justa causa e, nessa circunstância, pudemos apurar quais as propostas do PSD nesse domínio. Essas propostas não cobrem de forma alguma aquilo que agora é objecto de críticas. O PSD não teve, na altura da grelha de partida da revisão constitucional, propostas que, de alguma forma, correspondessem ao entendimento - completamente inconstitucional, de resto, como se vê - do Primeiro-Ministro sobre o que deva ser o regime aplicável neste ponto. Isto nos conduz também a interrogarmo-nos sobre a maneira como o PSD encara o processo de revisão constitucional, uma vez que agora se trata de mais que um ultimato. É a passagem a uma guerra institucional aberta com implicações que nos deixam extremamente apreensivos. Parece-nos que o clima da revisão constitucional não pode deixar de ser, de alguma forma, condicionado, para não dizer mesmo inquinado, por esta concepção, nos termos da qual um primeiro-ministro e um chefe de partido se entende mandatado para lançar um desafio não só ao órgão superior de fiscalização da constitucional idade como às próprias instituições em geral, uma vez que a todos nos obriga o acórdão do Tribunal Constitucional que foi emitido a propósito do "pacote laboral" e cujo conteúdo ainda não é conhecido, mas que, em todo o caso, não justifica, a título nenhum, uma atitude deste tipo. Interrogo-me também se os Srs. Deputados do PSD, que são capazes desta postura enquanto membros de um determinado partido no exterior, guardarão aqui sobre esta matéria um silencio recatado e uma atitude de como se nada se passasse. Creio que se passa alguma coisa. Passa-sc um desafio extremamente negativo para a boa marcha dos trabalhos da revisão constitucional. Não se queixem os Srs. Deputados do PSD de que a revisão constitucional "não progride", porque quem impede o processo normal de revisão constitucional é quem lhe lança do exterior pedregulhos como este cuja gravidade aqui sublinhei em nome do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Primeiro-Ministro não é membro da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, que eu saiba.

Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro não é membro da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.

As nossas propostas, no que toca à parte da tutela constitucional do direito ao trabalho, foram apresentadas e debatidas. Não voltaremos a esse debate, a não ser na sede própria, ou seja, na altura da votação.

Quanto ao respeito pelas instituições, designadamente as instituições pelas quais passa o processo de feitura da revisão constitucional, posso tranquilizar o Sr. Deputado José Magalhães e o Partido Comunista que nunca o PSD cercará a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional; nunca cercaremos a Assembleia da República quando se discutir a revisão constitucional; nunca obrigaremos os deputados da Assembleia da República, nas suas vestes constituintes, a passar fome; nunca obrigaremos os deputados da Assembleia da República, quando assumirem vestes de legislador constituinte, a humilhações públicas; também não os privaremos do seu salário justo e não os sujeitaremos às humilhações a que fomos sujeitos enquanto constituintes e quando neste país o Poder estava nas mão do Partido Comunista.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

Mas não vamos prolongar muito este assunto, que está fora da ordem de trabalhos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Só não poderia deixar de anotar como protesto - que, creio, se compreenderá - o facto de, tendo colocado uma questão que é grave e preocupante do ponto de vista constitucional, não ter, da parte da bancada do PSD, outra defesa que não uma espécie de evocação saudosista, desforrista e inteiramente despropositada de uma circunstância histórica completamente perimida que nem foi o que aqui foi dito nem é chamada para o caso. Ai do PSD se, a cada desmando do Primeiro-Ministro, a cada afloramento daquilo a que o Sr. Dr. Rui Machetc, numa entrevista ao Primeiro de Janeiro, chama uma "concepção trauliteira da política" nas fileiras do PSD, vier buscar ao alforge o pão do famoso e pseudo "cerco de São Bento"! Para onde vai o debate político, para onde vai a imaginação constitucional do PSD se, quando o Primeiro-Ministro humilha os juizes do Tribunal Constitucional, o Sr. Deputado Costa Andrade tem necessidade de evocar um determinado período histórico, do qual dá uma visão horripilada (que é a sua, naturalmente tem o direito a ter os medos e os fantasmas que entende, a venerá-los e a cultivá-los), sem responder às objecções que verberam o escândalo institucional?! É uma fraca defesa, é uma pobre defesa e uma preocupante defesa, porque o Primeiro-Ministro se assume não como responsável pelo cumprimento da Constituição mas como um elemento que desafia as instituições e que, perante um acórdão do Tribunal Constitucional, lança um desafio desmedido e desbragado. Suponho que esta noite na televisão, ou amanhã, terá ocasião de dizer em extenso aquilo que disse em vitupério e em muito ácido, e logo veremos - em todo o caso, é inaceitável que se arrogue o direito de fazer um afrontamento institucional em tais termos. A "defesa" do Sr. Deputado Costa Andrade é a mais clara demonstração de que não tem argumentos para o futuro e que apenas pretende buscar na distorção da história uma espécie de "bill" de indemnidade para toda a espécie de despautérios, provocações e despropósitos. É um "bill" fraco, como se sabe.