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RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.
Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes precisão de que lhes seja transmitida a informação circunstanciada sobre o modo, pelo qual a Commissão do terreiro publico verificou a compra de cereaes dentro do Reino para que foi autorizada pela resolução tomada em Cortes aos 11 de Outubro de 1822. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Corte 3 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
Para o mesmo
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes precisão de que lhes sejão transmittidos os documentos relativos ao objecto de que trata o incluso requerimento de Custodio José da Costa Braga. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Majestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 3 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
Para o mesmo.
Illustrissimo e Execellentissimo Senhor. - As Corres precisão de que lhes sejão remettidos os documentos, consultas, e informações que se achão na junta do commercio, e concelho da fazenda, relativos ao objecto de que trata o requerimento incluso e documentos juntos do Luiz Antonio Maigre. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 3 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
SESSÃO DE 4 DE JANEIRO.
ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Margiochi, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
1.° Um officio do Ministro doa negócios da justiça, com um requerimento da abbadeça e religiosos do convénio da Conceição da cidade de Béja, e informação a elle junta, do chanceller da casa da supplicação, sobre a intelligencia do §. 8.° titulo 117 do livro V da ordenação: mandou-se á Commissão de justiça civil.
2.º Outro officio do mesmo Ministro, com uma conselho do conselho d´Estado sobre a duvida em que entrou o juiz de fóra da villa de Cintra, no cumprimento de uma provisão expedida pelo conselho da fazenda e Estado: mandou-se á Commissão de agricultura.
3.º Outro officio do mesmo Ministro, com a relação das paroquias do bispado d'Aveiro, que podem subsistir na futura regulação sem terem de ser desmembradas ou unidas: mandou-se á Commissão ecclesiastica de reforma.
4.° As felicitações das camaras constitucionais do concelho do Gestaço, Loutinhã, Covilhã, e Guimarães, das quaes todas se fez menção honrosa; e igualmente as felicitações do juiz ordinario e camara do Villar de Perdizes, que ao mesmo tempo representa que deve ser conservado aquelle concelho com as justiças que ora tem, e não annexado a outro; fez-se menção honrosa das felicitações, e a representação foi mandada á Commissão de petições.
5.º As felicitações do pároco de Mogofores, do juiz de fóra de Gouvêa, do juiz de fóra de Esposende, e do juiz de fóra de Celorico, que todas forão ouvidas com agrado.
6.° Uma felicitação dos estudantes da Universidade, que tambem se offerecem para se armarem, como fizer ao todos as vezes que a patria foi ameaçada: foi ouvida com agrado a felicitação, e se mandou ao Governo a parte que respeitava ao offerecimento.
7.° A participação de molestia que fizerão os Srs. Deputados Tavares Lyra, Duarte Machado, Gomes Ferrão: ficárão ás Cortes inteiradas.
O Sr. Borges Carneiro; - He constante que os Srs. Deputados da Bahia não tem recebido as suas diarias em consequencia de terem sido suspendidas as correspondencias, pelas quaes elles as recebião, e neste caso parece que visto aquella província se achar em communhão comnosco, e com o nosso thesouro, se dissesse aos Srs. Deputados da Bahia que fossem á secretaria dar seus nomes para receberem suas diarias.
O Sr. Gyrão; - Eu apoio isto mesmo que acaba de dizer o Sr. Borges torneiro porque he justamente a indicação que eu ontem queria fazer.
O Sr. Pereira do Carmo: - Como ha uma indicação sobre este mesmo objecto, mande V. Exca. lê-la, e então se decidirá se ha de ser remettida á Commissão de fazenda, para interpôr seu parecer.
Leu-se a seguinte
INDICAÇÃO.
Como o commerciante, por cuja via os Deputados da provincia da Bahia receberão como taes as suas prestações, lhes declarasse no mez proximo passado, que lhes não pagaria mais as ditos prestações: proponho que se mandem metter em folha os ditas Deputados, para recearem as mensaes prestações pela thesouraria das Cortes, participando-se ao Governo, não tanto para fazer indemnizar o Erario pela fazenda da provincia da Bahia, como para conhecer da junta daquella província, ou porque mandou suspender aos seus Deputados o pagamento das devidas prestações, ou porque não tomou as medidas, e dou as providencias para não haver falta em um tal pagamento.
Sala das Cortes 27 de Dezembro de 1822. - O Deputado Gyrão.
Mandou-se remtter á Commissão de fazenda.
Feita a chamada, achárão-se presentes 98 Deputados; faltando com causa os Srs. Guimes Ferrão,
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Bernardo da Silveira, Gouveia Durão, Boto Pimentel, Almeida e Castro, Innocencio António de Miranda, Segurado, Cavalcante, Rodrigues Bastos, Teixeira de Sousa, Duarte Machado, Manoel Antonio de Carvalho, Filippe Gonsalves, Correia de Castro, e Lira; e sem causa os Srs. Antonio José Moreira, Borges de Barros, Aguiar Pires, Assis Borbosa, Moniz Tavares, Sousa Moreira, Villela, Seixos, Ferreira da Silva, Lemos Brandão, Pinto de Magalhães, Avillez, Cirne, Fernandes Pinheiro, Alencar, Fagundes Varella, Castro e Silva, Zeferino dos Santos, Marços Antonio, Borges Leal, Vergueiro, Araujo Lima, e Rodrigues Bandeira.
O Sr. Presidente fez saber que na sala proxima se achavão João Baptista Fieira, capitão da 2.ª companhia do 2.º batalhão de caçadores da província de Pernambuco, e Luiz Antonio do Rego, capitão da 6.ª companhia do batalhão de caçadores da provincia do Rio de Janeiro, mandados ambos retirar das ditas províncias, e vinhão felicitar o soberano Congresso, tendo para esse fim mandado pôr na meza as suas felicitações por escrito: deu-se ás felicitações a consideração do costume, e saiu o Sr. Secretario Thomaz de Aquino a participalo assim aos ditos officiaes.
Passando-se á ordem do dia, leve segunda leitura o programma do codigo criminal, e foi admittido á discussão.
Teve segunda leitura o projecto de decreto adoptado pela Commissão do Ultramar sobre o commercio da reexportação da ilha da Madeira; e foi admittido á discussão.
Teve segunda leitura o projecto de decreto para a abolição de pastos communs; e foi admittido á discussão.
Teve segunda leitura o projecto de decreto para dispensa do terceiro anno malhematico aos estudantes ale medicina; e foi admittido á discustão.
Teve segunda leitura o projecto de decreto, offerecido pelo Sr. Soares Franco, para estabelecimento das sciencias filosoficas e naturaes, e de uma cadeira de economia politica na academia do Porto.
Terminada a leitura, disse
O Sr. Thomaz de Aquino: - Parece-me que se não deve admittir á discussão este projecto; não porque eu duvide da utilidade delle, mas porque assento que deve ser remettido a uma Commissão para ella dar o sou parecer, e então sobre elle be que poderá haver discussão.
O Sr. Soares Franco: - Por estar encommenda-do a uma Commissão apresentar um plano sobre instrucção publica, não he vedado a um Deputado apresentar outro qualquer; eu tenho trabalhado a este respeito alguns annos, e parece-me que não deixará do se aproveitar alguma cousa deste projecto.
O Sr. Rocha Loureiro: - Eu sou da opinião do Sr. Secretario, e estou porque não soja admittido o projecto á discussão, porque terá de imprimir-se, o que he uma grande despeza. Pois que ha uma Commissão encarregada de apresentar um plano de instrucção publica, vá este projecto para lá, ella apresenta-o com o seu parecer, e ao illustre Deputado fica livre o fazer as observações que julgar convenientes.
O Sr. Serpa Machado: - Examine-se a doutrina do projecto; se ella não he digna de ser admittida á discussão, não sã approve, porém se ella he digna, não se deve mandar a uma Commissão, porque he tirar a iniciativa directa ao Deputado. Não importa que se faça alguma despeza, quando ella he necessaria.
O Sr. Borges Carneiro: - Não deve passar aqui o principio de que he inconstitucional, e que se tira a iniciativa ao Deputado em se mandar a uma Commissão o projecto que elle propõe: isto não lhe tira a iniciativa, porque elle póde ir á Commissão, e em todo o caso lhe fica livre fazer quaesquer emendas ou additamentos na discussão. Quanto ao actual projecto como o mesmo Sr. Soares Franco reconhece que elle contém muitas cousas puramente regulamentares, e geralmente mo parece que em todos os projectos sobre maiorias vastas, convém mais tratar só das bases, deixando os detalhes ao Governo, que os póde regular nomeando commissões que o ajudem, por tudo isto opinaria eu que o presente projecto voltasse ás mãos de seu illustre autor, para delle separar tudo quanto he regulamentar. He este o meio de se abreviarem as discussões.
Propoz o Sr. Presidente a votos o projecto, e não foi admittido á discussão, mandando-se remetter á Commissão encarregada da reforma dos estudos,
Fez-se 2.ª leitura do projecto para declarar-se onde devem ser passadas as patentes dos officiaes de marinha; e foi admittido a discussão,
Fez-se tambem 2.ª leitura do projecto de porto franco, e foi admittido á discussão.
Entrou em discussão o seguinte
PARECER.
A Commissão especial encarregada de examinar as indicações apresentadas ao Soberano Congresso pelos seus illustres membros os Srs. Xavier Monteiro; Borges Carneiro, o Pato Moniz, sobre as exequias do illustre Deputado, ora fallecido, Manuel Fernandes Thomaz, e sobre a subsistencia de sua deploravel familia, considerou com a devida attenção as diversas propostas lembradas nas mesmas indicações, e dictadas pelo nobre, e um nime pensamento de dar um testemunho anthentico da gratidão e reconhecimento nacional ás virtudes civicas, que adornarão aquelle benemerito Portugez, um dos principaes, e mais activos restauradores, e zelosos defensores dos direitos e liberdades patrias.
A Commissão se gloria de que os seus particulares sentimentos coincidão perfeitamente com os dos illustres autores daquellas indicações, com os do augusto Congresso, e com os da Nação inteira; e paga com gosto o justo, e devido tributo de sua admiração e louvor, ás eminentes qualidades, que o illustre cidadão, cuja perda lamentamos, desenvolveu, principalmente nos ultimos dois annos da sua existencia, afrontando com sublime audácia os mais imminentes riscos pela regeneração da patria, e supportando com superior constancia os assiduos, e penosos trabalhos de sua legislatura, tão extensa na sua duração, como importante nos seus resultados.
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A Commissão por tanto desejaria dar toda a latitude possivel á manifestação dos sentimentos nacionaes, e igualar os testemunhos da gratidão publica aos distinctos merecimentos do illustre cidadão, e á illimitada extensão da generosidade portuguesa: mas devendo ao mesmo tempo respeitar os limites, que imperiosamente lhe prescreve a estreiteza das circunstancias publicas, tem a honra de propor á approvação do Soberano Congresso o seguinte projecto de decreto.
As Cortes ordinarias considerando que he um dever nacional honrar a memoria, e premiar os serviços dos varões illustres, que em beneficio da patria desenvolverão eminentes qualidades, e emprehendérâo árduos, e perigosos trabalhos, decretão o seguinte.
1.° Incumbe-se ao Governo mandar fazer á custa do thesouro publico nacional as exequias funeraes do illustre cidadão Manuel Fernandes Thomaz, evitando toda a vã ostentação de uma pompa inutil, e conformando-se com a nobre simplicidade, que he propria deste acto religioso, e analoga aos habituaes sentimentos de moderação, que professou em toda a sua vida o mesmo benemerito cidadão.
2.º Incumbe-se outrosim ao Governo mandar erigir em sua memoria um monumento sepulcral, simples e modesto, sobre o qual se lea gravada esta inscripção - A Manuel Fernandes Thomaz - As Cortes ordinárias de 1822.
3.° Do thesouro publico nacional se dará annualmente á viuva, em quanto viver, um conto de reis, a titulo de alimentos; e a cada um de seus dois filhos quinhentos mil reis para alimentos, e educação.
4.º As Cortes recommendão á protecção do Governo esta infeliz, familia, e em especial o cuidado de dirigir a educação dos órfãos, de maneira que sejão um dia fieis imitadores das virtudes de seu pai, e dignos herdeiros da sua gloria.
Paço dos Cortes 5 do Dezembro de 1822. - O Bispo Conde, Informador Reitor; João de Sousa Paulo de Magalhães; Francisco Soares Franco; Bento Pereira do Carmo; Francisco de Lemos Bettencourt.
Lido o artigo primeiro do projecto de decreto, disse
O Sr. Pato Moniz: - He preciso francamente dizelo: tarde o mui tarde se faz esta segunda leitura, nem ou tenho por mui decoroso ao Congresso que tanto se demorasse a resolução de honrar a memória, e amparar a familia de um homem tal como Manoel Fernandes Thomaz, de quem já agora podemos falar sem incorrer em nenhum dos perigos do odio nem da inveja, porque em fim diz-se, e he mui verdade que livor post falta quiescit; e assim já seguramente o podemos acclamar por sobre todos benemerito da patria. Quando por primeira voa se leu este projecto que dos tres refundiu-a Commissão, logo eu insisti n'um dos artigos da minha indicação sobre este assumpto, isto he, insisti em que se decretassem ires dias de luto por Manoel Fernandes Thomaz; e então produzi o exemplo de Franklin, por quem o congresso dos Estados Unidos da America decretou dois mezes de luto era todos os quatorze estados da confederação, e por quem a assemblea nacional de França decretou três dias de luto, não obstante ser elle um extrangeiro. Agora produzirei outros dois exemplos. A assemblea nacional de França decretou que os restos de Voltaire fossem trasladados da igreja de Romilly para a de Santa Genovefa, e uma deputação da assemblea assistiu á apotheose de Voltaire, feita como maior enthusiasmo; pompa, e solemnidade. A assemblea nacional de França adoptou sem discussão um projecto de decreto para se mandar erigir uma estatua, e se fazerem honras publicas a João Jaques Rousseau, e tudo isso se fez com grande solemnidade. Diga-se agora: e por grandes que se considerem os serviços públicos de Rosseau, e de Voltaire, por muito que lhe devão, como realmente lhe devem as letras, e a liberdade, podem por ventura esses serviços equiparar-se áquelles que devem os Portugueses no sobre todos benemerito da patria Manoel Fernandes Thomaz? Eu creio que certamente não. E pois só áquelles se fizerão taes honras publicas com tamanha solemnidade, porque não decretaremos nós tres dias de luto nacional em honra de Manoel Fernandes Thomaz? A mim parece-me que este publico testemunho de consideração não sómente he devido aos meritos relevantes de tão illustre cidadão, senão que he necessario por timbre deste soberano Congresso, e credito da briosa Nação, que por elle recobrou os seus direitos, e se vê felizmente regenerado. Por tanto a minha opinião he, que o primeiro artigo deste projecto deve ser aquelle em que se decretem tres dias de luto nacional.
O Sr. Moura: - Sr. Presidente, sendo tão notorias as minhas connexões com o grande patriota cuja falta deploramos, seria affectação em mim se não falasse no assumpto que faz, hoje o objecto da ordem do dia. Protesto porém que o faço unicamente para honrar os princípios que elle desenvolveu e que elle sustentou até ao fim da sua vida. Não me proponho fazer aqui o elogio fúnebre de Fernandes Thomaz: deixemos essas amplificações de panegyricos para as academias; nesta assemblea só cumpre racionar acerca da necessidade, e da utilidade das leis. Não pertendo tambem á custa de declarações, attrahir a vossa piedade sobre o estado de abandono a que ficou reduzida a familia deste famoso patriota, porque neste particular assas de justiça, de amor da pátria, e de generosidade mostrou toda esta assemblea, quando se trotou do admitir este projecto á discussão. Tratemos por tanto das cousas e deixemos as pessoas. Racionemos tão sómente no que respeita a rectidão dos principios; e a exacta applicação que delles faz a Commissão especial nomeada para propor este decreto. Para melhor o fazer proponho-me desenvolver tres considerações que naturalmente se apresentão ao espirito, no exame desta renumeração patriotica. Primeira. - Devem ser renumerados os que fazem á patria serviços importantes? He a Constituição quem o determina. Segunda. - No caso presente está bem applicada esta lei da Constituição? Responda a notoridade do facto; responda o grito de toda a nação, com as pequenas excepções da emulação e da inveja. Tereire. - A renumeração arbitrada pela Commissão he correspondemnte aos serviços que se renumeração? A´s Cortes compete
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decedilo, pesando todo na balança da sabedoria; e escusamos sobre isto fazer grandes discussões.
O primeiro ponto está per si mesmo demonstrado. He a Constituição quem determina no parágrafo 5.°, que todo o Portuguez tem direito a ser remunerado por serviços importantes feitos á patria. E quando a Constituição estabelece um direito a favor de quem faz estes serviços, ella constituo ao mesmo passo um dever para com a pátria que lhes remunera, e nunca jamais se estabelece um direito sem se constituir um dever correspondente. He tão rigoroso o dever, como o direito. Neste ponto he por consequencia escusado raciocinar por mais tempo, visto ser couta patente de si mesma; e como a Constituição o manda está dito tudo.
O segundo ponto abrange a enumeração dos grandes e importantes serviços que fez este illustre patriota. Como eu não quero fazer hoje o seu elogio, não serei longo; quero somente chamar a vossa attenção para as cousas mais prominentes; e pelo que respeita á verdade dos factos basta appellar para o reconhecimento publico de toda a Nação, para o testemunho da vossa consciencia; falo dos muitos que me ouvem, e que o ouvirão aqui mesmo nesta cadeira, e bem junto de mim, advogar os direitos do homem, e as liberdades publicas; aqui mesmo foi elle muitas vezes o implacavel inimigo dos abusos e dos privilegios. Elle foi, Senhores, um dos que primeiro levantárão o grito da liberdade em 24 de Agosto... Mas se esta gloria lhe he commum com outros; ha outra, que talvez he sua propria, e de que talvez ainda se não tenha feito commemoração. Elle foi talvez o primeiro que soube achar a época, e o termo precito, em que o direito da insurreição contra o tyrannia, he não só uma virtude digna do applauso dos presentes, da commemoração gloriosa dos vindouros, e mesmo da apotheosis, mas he tambem o exercicio de um direito politico. Esta época, e este preciso termo de que falo he aquelle em que o grito da insurreição ainda que seja levantado por um ou por poucos, he todavia seguido ou por todos ou por muitos. Se todos ou se a maior parte o seguem, a acção he gloriosa. Se um só individuo, ou se uma só facção o reclama, he um crime que mereço castigo. Ninguem explicou molhar o caracter destas crises do que um elegante escriptor da nossa revolução de 1640: "estava (diz elle) chegado o dia 1.º de Dezembro em que o resultado havia de decidir se o duque de Bragança era um traidor, cujo destino era morrer sobre o cadafalso, ou se havia de ser um heróe digno de um throno, e de governar com gloria sobre uma nação generosa." A aurora do dia 24 do Agosto de 1920 devia tambem realizar a crise dos regeneradores do Porto, e devia decidir, se o patriota nosso collega, e seus coadjuvadores, havião de morrer sobre um cadafalso, ou se havião de merecer a approvação dos seus concidadãos; e a gloria da posteridade. Nisto calculou exactamente o nosso patriota, e este he o seu maior merecimento. Elle se torna porém muito maior quando se reflete qual foi o assenso unanime, que lhe deu toda a Nação. A que nos convidou pois o grito do dia 24 de Agosto? a manter a nossa santa religião, a manter o mesmo Rei, e a mesma dynastia com as convicções porém de se fazer uma lei nacional pelos Representantes da Nação livremente eleitos, que nos restituisse as nossas antigas assembléas nacionaes, modificadas segundo o estado da politica actual; Cortes n´uma palavra, não como as dos seculos passados, que só se queixavão e pedião, mas Cortes legislativas que bem longe de representarem (como nos tempos antigos) tão somente as classes poderosas e privilegiadas, representassem a todos, já que devião tratar dos interesses de todos. Em fim Cortes, que reconhecessem a soberania da Noção, e que recebessem por delegação expressa o exercício desta soberania.
Eis os grandes esforços deste illustre varão no governo provisorio para se convocarem estas Cortes: e nellas sua constante linguagem foi sempre a de reconhecimento dos direitos do homem, a de segurança das liberdades publicas, e de todos os direitos politico; vós os vistes, e ouvistes muitas vezes trovejar daquella cadeira contra os abuzos, e contra os privilegiou. Ah! quão grande exemplo nos deixou elle do todas as virtudes cívicas de coragem, e patriotismo! Se ainda póde haver alguem que duvide da importancia destes serviços, e que não cabe nelles a remuneração proposta, ha um padrão, Srs. com que os comparar. Talvez a minha ideia vos tenha passado pela imaginação; ruas talvez lhe não tenhais dado uma particular attenção. Ha um padrão exactissimo para confrontar com elle a extenção, e a importancia dos serviços deste patriota; eu o offereço a vossa consideração, não porque assim seja preciso para vós, que abundais nestes sentimentos; mas para acabar de confundir o emulos, e os invejosos. O destino dói oradores nas assembleas legislativas não he só levar a discussão a um exito; he também satisfazer aos nossos mandantes; sejão elles quaes forem, sobre a justiço dos actos legislativos. O padrão de que trato he este. Qual seria o fatal destino deste patriota; e dos seus consócios, se elles não podessem trazer ao seu fim a obra da regeneração politica? O seu destino, vós bem o sabeis, seria o cadafalso, seria o do nosso vizinho Por ter na Galiza: supponhamos que a regencia de Portugal nessa época frustrava suas patrioticas tentativas; supponhamos que a noção não attendia ao seu grito, porque era indifferente á mudança, ou porque não tinha chegado ainda a época propria ou porque em fim a influencia dos aristocratas, e dos privilegiados podia suffocar os impulsos do patriotismo, qual seria o fim deste patriota? O cadafalso torno a dizer: pois ahi está a verdadeira medida do seu merecimento, e de todos os mais, que estão no mesmo caso. Sim, todos aquelles, que pelo papel principal que representarão neste acontecimento, devião necessariamente encontrar o destino do cadafalso no regime arbitrario, são aquelles que merecem as coroas cívicas no regime da liberdade. Se exemplos são necessarios para fortificar esta verdade importante, nós os temos em Hespanha nos acontecimentos de 1814. Vós todos sabeis a coragem, e a sabedoria, com que as Cortes de Cadiz souberão conservar o trono de Fernando VII, e cooperar na expulsão das tropas do usurpador para fora da Península. Vós todos conheceis as estrellas lucidissimas, que brilhavão na-
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quelle Congresso. E que lhe succedeu? Permitti que vos recorde o seu destino. O Rei, relaxada a prisão de Valencey, tornou para a Hespanha, e á sua entrada fez as maiores protestações de adhesão á causa da Constituição. Vendo-se porém rodeado de satellites do poder arbitrario, e fazendo uma volta por Valença em vez de ir directamente a Madrid, recebeu naquella cidade a representação de 69 Deputados de Cortes chamados Persas, que lhe aconselharão reassumir o poder absoluto, destruir o systema constitucional, e castigar os seus cooperadores.
O Rei assim o fez, e logo que chegou a Madrid instituiu uma commissão inquisitorial dirigida pelo pérfido e infame D. Pedro Macanez, para indagar sobre as opiniões criminosas dos Deputados das Cortes de Cadiz. E que pensais vós quaes serião os quesitos, que se fazião ás testemunhas nesta horrível commissão? Eu vo-lo digo. Perguntava-se-lhe, quaes erão os Deputados de Cortes que advogavão em Cadiz a soberania da Nação, as restricções do poder do Rei, a queda da inquisição, a extincção dos abusos, e a destruição dos privilegios.
Eis os crimes que levavão os Argueles, os Martines de la Rosa, os Calatravas, os Alvares, Guerras, e outros aos calabouços da costa de África, e aos presidios das ilhas Baleares, e da Catalunha. Este seria pois o destino que nós todos devíamos esperar, se aqui acontecesse o mesmo. Por tanto, Senhores, o mesmo principio he confirmado pela historia de todas as revoluções. Os delictos que merecem estes castigos debaixo da influencia do poder absoluto, são os que constituem o merito o mais verdadeiro, e o mais puro debaixo da influencia do poder constitucional. Tenho repetido esta verdade por mais de uma vez, por isto que a julgo muito importante, o muito exacta. Vamos á 3.ª condição, que versa sobre o arbítrio do quanto que a commissão julga necessario para a remuneração destes serviços. He pouco, Senhores, se compararmos com o merito do patriota famoso cuja falta lamentamos. He porém sufficiente, se attendermos a que com elle se fornece uma honesta subsistencia a sua deploravel familia. Dar-lhe mais, alem de se não compadecer com o estado das rendas publicas, seria debilitar em seus filhos o estimulo, que lhe de necessario para se aproveitarem da preciosa herança, que lhe deixou seu illutre pai no duravel exemplo das suas virtudes civicas, e da sua moral particular. Estes não, Senhores, os votos de toda a Nação, que representamos, salvas aquellas pequenas excepções, que fazem tanto effeito nos sentimentos públicos, como faz uma gota de agua no meio do Oceano.
O Sr. Galvão Palma: - Sem se punir o crime, e premiar o merito, não póde prosperar nem mesmo existir qualquer sociedade. Logo que elle se não firme nesta base eu a abandonarei para viver em florestas no meio de feras selvagens. A convicção desta verdade he que obrigou João II a trazer sempre uma memoria em que descrevia os serviços dos subditos para os premiar; estilo que antes guardavão os Reis do Egypto. He de igual evidencia que não são mais dignos de recompensa heroísmos militares, do que gentilezas de heroismo civil, que nascem de almas fortes, briosas, e honradas a quem o enthusiasmo patriotico abraza; pois a coragem de talento em proporção com a das forças, não prospéra menos um Estado, visto que offronta igualmente os, maiores perigos, quando se trata de o salvar. O que supposto, ninguem poderá duvidar que Fernandes Thomaz foi um dos principaes autores da nossa regeneração, que levantou a patria do tumulo, quebrou as pesadas cadeias com que o despotismo nos algemára, restituiu a soberania á Nação, e plantou a arvore da liberdade, de que já colhemos sasonados frutos, não merecerá essas recompensas que propõem os illustres autores da indicação? Ellas nem pelo menos se assemelhão as que o capitolio decretou a favor dos Manlios que o salvarão; são muito mesquinhas em proporção das que forão arbitradas aos Portuguezes que sustentárão o throno no tempo de João I e IV, e Affonso VI. Eu desejaria pois, que se ampliassem, se a escacez e mingoa do thesouro não obstasse; mas seja qualquer que for o deficit he um acto de justiça soccorrer, e alliviar a fome da viuva, e filhos do libertador da patria: e os representantes da Nação não devem faltar a justiça.
Voto pois que se dê o que o projecto insinua, e bem assim que se levante um monumento sepulhral, que apezar de simples, e modesto será mais recommendavel á posteridade, que esses que no deserto do Egypto parecem pela sua elevação e arquitectura zombar das iras do seculo. Erija-se esse monumento para conservar ( já que não podemos a vida) os despojos da mortalidade, as preciosas reliquias de quem, cooperou para nos libertar. Até por motivos politicos, Sr. Presidente, em monumento se deve erigir, pois elle será orador, ainda que mudo eloquente, que diga aos povos = aqui jaz o heroe que resgatou a patria; que abreviou sem dias para a salvar. Até por motivos politicos, Sr. Presidente, para que os poderosos gigantas da terra, os aristocratas, esses balões aerostaticos, se persuadão que não he a orgulhosa genealogia, esclarecida linhagem, eminentes empregos, que a patria só valorizo, mas sim todo o cidadão que desempenha os seus deveres; para que conheção que só he nobre, que só merece as honras da pátria, quem a prol della dedica e sacrifica seus dias. Aprenda o mundo inteiro que Portugal, como a Grecia, se a religião lho não vedasse, até erigiria altares aos seus benemeritos. Conheção os inimigos dos systema que uma Nação, que he capaz de honrar tanto os seus libertadores, lerá também coragem para só defender dos que a pertenderem opprimir: que assim; como tem ouro para premiar, terá brome e aço para se defender.
O Sr. José Liberato: - Eu não me levanto para fazer o elogio de Manoel Fernandes Thomaz, pois que para se conhecer o merecimento deste não são precisos elogios.
Nós mesmos os que aqui estamos, somos as testemunhas mais evidentes dos serviços que elle fez: elle concorreu, e foi o primeiro que levantou, o grito da liberdade no dia 24 de Agosto; e sabendo-se isto, não erão precisos mais elogios: elle não os necessita, e por mais que nós lhos queiramos fazer, diminuiremos a sua gloria. Por conseguinte, levanto-me.
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sómente para dizer que approvo tudo o que propõe a Commissão; por isso que as circunstancies actuaes do thesouro não permittem que nós façamos á sua familia maiores interesses: não devemos avaliar o pouco dinheiro que se lhe dá; mas devemos olhar ao modo, como a Nação agradecida lho offerece. Limito-me pois a dizer, que apoio de todo o meu coração o parecer da Commissão, e desejava que elle fosso approvado por acclamação, e não tivesse discussão alguma, por isso que cousas de tal natureza e tão palpaveis não a necessitão.
O Sr. Rocha Loureiro: - Também não quero fazer o elogio do patriota Fernandes Thomaz, porque seus merecimentos são bem notorios: basta só accrescentar um elogio mui simples, que ainda aqui se não tocou, e he que serviu grandes cargos e morreu pobre. Não sou do voto do illustre collega meu, que propor o luto nacional; mas por additamento ao paragrafo 1. do parecer da Commissão, proponho, que á imitação do que se decretou em Hespanha ácerca dos martyres da patria e da liberdade, Lacy, Porter, e Azevedo, que tem na sala do Congresso em lapides de marmore negro e sepulcral seus nomes gravados em letras de ouro: da mesma forma na parede desta sala se entalhe uma lapide sepulcral, que tenha no centro em letras de ouro o nome de Manoel Fernandes Thomaz, e seja a pedra angular deste edificio. Espero que este Congresso approve a minha idéa para que a elle se não possa applicar o psalmo lapidem quem reprobaverunt exdificantes. Tenho pois a honra de remetter para a mesa o seguinte additamento (leu-o).
Declarada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente o artigo á votação e foi approvado.
Lido o artigo segundo, disse
O Sr. Brandão: - Neste segundo parágrafo vem Fernandes Thomaz recommendado á posteridade. Esta recommendação inculca-se neste paragrafo por dois modos: no primeiro vê-se a elevação a Fernandes Thomaz, e na base as Cortes Ordinarias de 1822. Esta inculcação he digna do gosto, e do juizo dos seus collaboradores abaixo assignados, que são bem conhecidos polo seu cabedal, dado a conhecer á Nação; porém aproar de que pela maior parte em minha mocidade tive alguma negação e desgosto para as bellas artes, no entanto parece-me que vou offerecer uma indicação que embellecerá mais esta honra que se pretende fazer aos manes de Fernandes Thomaz. Eu offereço-a talvez debaixo de engano meu; mas tomo por censor a este soberano Congresso, depois de estabelecer alguns principios previos. Esta recommendação he feita no estilo lapidar: ella recommenda-se pelo pintoresco, pelo emphatico, e breve. Com effeito, quando se deixa ao homem pensar sobre o pouco que se disse, he no que está o melhor merecimento de delicadeza, e conceito; tal era o estilo no tempo dos antigos, estilo que umas vezes calava, e outras falava pouco; de maneira que o estilo lapidar he sempre grande, quer por aquillo que se diz, quer por aquillo que se deixa de dizer. Escuso repetir muitas inscripções da antiguidade, porque ellas são sabidas, mas lembrarei o sepulcro de Attila, que tem: aqui está Attila.... e depois de uma grande reticencia, tu sabes o resto. O mesmo se lê no pedestal da estatua do marquez, de Caraccioli em Veneza. Ora pois, se em lugar de Cortes Ordinarias de 1822, se pozesse as Cortes de Portugal, ou deste Reino, sem mais nada, ficaria muito melhor esta inscripção; vou dar a razão. Pondo as Cortes de Portugal, ou deste Reino, e Fernandes Thomaz, recommendado em globo, sem se dizer especificamente quaes são os dedicadores, esta falta especifica involve não só as Cortes de Portugal, ou deste Reino passadas, mas as presentes, e as futuras. Esta he a verdadeira ficção poetica, e a melhor parte da elegancia, eis a primeira razão. A segunda he, porque nesta inscripção deve appareccr só este patriota, a esconder-se tudo o mais; e por isso pondo-se as Cortes de Portugal, esconde quem ellas forão, e disperta no leitor quando queira ter curiosidade o desejo de saber, e fazer averiguações exteriores de quem forão estas Cortes, e nisto mesmo se conserva uma politica para aquelles Srs. Deputados das Cortes passadas que não forão reeleitos, e que quererão ter nisto uma parte. Deste modo fica Fernandes Thomaz nesta inscripção apparecendo em toda a sua grandeza, occultada a pequena gloria de serem estas Cortes quem o passou á posteridade.
O Sr. Xavier Monteiro: - Concordando nos principios sobre os quaes se funda o artigo, digo em primeiro lugar que se devem substituir as palavras incumbe-se ao Governo, etc., por outras que denotem a ordem positiva; pois sempre se entende que ao Governo cumpre executar: todavia como isto pertence á redacção, passo adiante. As idéas do Sr. Brandão são muito adoptaveis; porém eu creio que elle na expressão não foi tão longe, como foi com o pensamento. O valor de um donativo cresce á proporção que he maior o numero dos que offerecem, e menor o daquelles que tem de o acceitar. Nós não podemos neste caso diminuir o numero daquelles que tem de acceitar; porque já está por sua natureza reduzido á menor expressão; mas em quanto aos que offerecem, podemos em lugar de direi que ao as Cortes ordinarias, affirmar que são todos os Portuguezes, os quaes se achão legitimamente representados em Cortes, e conseguintemente substituindo a Nação portuguesa às Cortes ordinarias que se achão no projecto toma então, a meu vêr, a expressão maior gráo de magestade: eu diria por tanto que se pozesse = A Manoel Fernandes Thomaz, a Nação portugueza. = Penso ser tambem conveniente tirar as palavras simples e modesto, e dizer-se unicamente, um monumento sepulehral; por quanto, quando uma Nação offerece, o que deve ser raras vezes, tudo deve respirar a grandeza do principio donde parte.
O Sr. João Victorino: - Parece-me demasiadamente simples a emenda que se tem feito ao parecer da Commissão. A mim já me tinha lembrado substituir á expressão as Cortes ordinarias, a palavra Nação; mas uma das qualidades que devem ter as inscripções lapidares, he dar a entender qual he a razão por que ellas se erigem e exárão. Quando nós dizemos = a Fernandes Thomaz, as Cortes ordinarias = isto dá a entender que elle fez serviços pelos quaes se
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inttallárão as Cortes: e dizendo a Noção portugueza, talvez nos seculos futuros a que lia de chegar esta inscripção, os que a lerem não atinem a razão principal porque se erige esta memoria: parece-me pois que em lugar de se Nação portuguesa = se deve conservar = as Cortes portuguezas a Manoel Fernanda Thomaz =; ou então = a Nação portugueza a Manoel Fernanda Thomaz. = He com tudo muito necessario, pois a inscripção terá duas linhas, que só diga em primeiro lugar = as Cortes = ou = a Nação = e depois = a Manoel Fernandes Thomaz = e não o inverso, que supponho pouco decoroso.
Procedeu-se á votação, e não foi approvado o artigo como estava, vencendo-se na maneira seguinte: "erigir-se-ha em sua memória um monumento sepulpulchral, sobre o qual esteja gravado - A Nação portugueza a Manoel Fernandes Thomaz."
Entrando em discussão o artigo terceiro, disse
O Sr. Borges Carneiro: - Estas palavras = para alimentos e educação = podem involver alguma duvida, sobre não serem estas duas pensões vitalicias, porque a educação cessa com a idade, o os alimentos tambem por direito cessão logo que os alimentados tenhão um officio publico ou outro fundo de grande rendimento. Como pois eu penso que não he esta a mente da Commissão, julgo dever-se dizer = uma pensão vitalicia =, supprimidas as ditas palavras para alimentos e educação.
O Sr. Bettencourt: - A Commissão teve em vista muito particularmente a triste situação em que ficou es ia desgraçada familia pela morte do benemerito cidadão chefe della, e que faz hoje o objecto desta discussão. A Commissão sabe que os bens que tem este estatuto não chegão para o pagamento das dividas, a maior parte destas contrahidas desde o dia 24 de Agosto de 1820; e por isso serviu-se a Commissão do termo alimentos, pois he bem claro, que os alimentos, pelas nossas leis sempre se devem pagar, com preferencia a toda e qualquer pensão. Entretanto eu como relator da Commissão, cedo em nome della de muito boa vontade, da redacção deste artigo, e que se substitua outra que melhor designe o vontade do soberano Congresso em favor de uma família que faz hoje o objecto das suas attenções.
O Sr. Xavier Monteiro: - Eu estou persuadido que no tempo em que existimos, não só devem fazer esta distincções, que só se usavão nos tempos arbitrarios, nos quaes se promettia com tenção de não cumprir; por conseguinte, em quanto á expressão, digo que não se fale em alimentos, e que se diga = se dará á viuva tanto, e aos filhos em cada anno tanto = A Commissão está persuadida e muito bem, que os merecimentos de Fernandes Thomaz são superiores a esta quantia. A Nação para premiar serviços extraordinarios, sempre tem muito; para premiar os ordinarios, como atégora tem feito, he que nada devia destinar, e he para que tudo tem sido pouco. Trata-se pois do evitar o labéo á Nação, de deixar na indigencia a familia de um tão distincto patriota. Para este fim a quantia proposta he sufficiente; pois que se fosse mais avultada, poderia produzir a ociosidade da descendencia deste varão que tão laborioso foi. Tal tem sido o destino das familias com quem por contemplação com o seu fundador se tem usado de larga munificencia: era por esta razão que eu fui de opinião, no projecto que offereci, que se lhe não desse tanto. Approvo porém que se lhe conceda a quantia proposta; pois me não parece extraordinariamente excessiva.
Propoz o Sr. Presidente o artigo á votação, e foi approvado com a suppressão das palavras a titulo de alimentos, substituindo-se-lhes a palavra vitalicia.
Passando-se ao artigo quarto, disse
O Sr. Xavier Monteiro: - Eu reputo superfluo e pouco conforme á Constituição elle artigo: 1.º porque o Governo tem muita cousa a tratar de mais necessidade do que dirigir orfãos, que pelas leis do reino devem ter juiz e tutor aquem estejão sujeitos: 2.º porque não he attribuição do corpo legislativo nomear tutores aos orfãos que delles carecem.
Propoz-se á votação o artigo, e não foi approvado.
O Sr. Manoel Pedro de Mello propoz um additamento para que se tomassem em consideração as duas irmãs donzellas do benemerito defunto, que vivião era sua companhia: não se tomou em consideração.
O Sr. João Francisco de Oliveira offereceu um additamento relativamente aos benemeritos da patria, que se mandou unir ao projecto de decreto sobre recompensa de beneméritos. Ao mesmo projecto se mandou juntar outro additamento do Sr. Rocha Loureiro para que se entalhe uma lapide de marmore, em cujo centro se léa insculpido com letras d'ouro o nome do regenerador Manoel Fernandes Thomaz.
O Sr. Presidente disse que se achava á porta da sala o juiz do povo, que vinha felicitar o soberano Congresso, e tinha mandado para a meia a tua felicitação por escrito: mandou-te dar a esta a consideração do costume, e foi um dos Srs. Secretários a participar-lhe isto mesmo.
O Sr. Silva Carvalho, como relator da Commissão dos poderes, leu os seguintes
PARECERES.
Primeiro. A' Commissão das procurações foi remettido um requerimento do Sr. Deputado Fernando Martins do Amaral Gorgel e Silva, que foi eleito por Angola para as Cortes Constituintes: diz elle, que tendo partido para Lisboa, fazendo escalla pelo Rio de Janeiro, chegara ali, e por mudança de circunstancias pelos inesperados acontecimentos, se demorou, esperando instrucções da sua provincia: agora allega a sua muita idade, e esta cercada de molestias attestadas por facultativos: pede a sua demissão. Parece pois á Commissão, que o soberano Congresso deve deferir-lhe, como elle requer: 1.º porque elle diz ser velho, e mostra que he doente: 2.° porque a lei das eleições determina que Angola dê um Deputado, e esse he o Sr. Manoel Patricio: em 3.º e ultimo lugar, porque ainda que o Congresso lhe não conceda a sua escusa, elle forçosamente a tomará, attentas as razões que allega, e circunstancias que o rodeião no Rio de Janeiro aonde está: além de que os procurações daquelle Deputado parece terem acabado com a legislatura para que foi eleito.
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Sala das Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João da Silva Carvalho, Francisco Rebello Leitão Castello Branco.
Foi approvado.
Segundo. A' mesma Commissão das procurações foi remettida uma carta do Sr. Deputado Marcos Antonio de Sousa, dirigida ao Sr. Deputado Secretario, em que diz, está doente, e que os facultativos lhes prohibem applicações litterarias; porém não ajunta attestado algum dos facultativos, ou outro documento, além daquella carta em que pede a sua demissão: parece pois á Commissão, que não obstante o bom conceito que merece a carta do Sr. Deputado, todavia o Congresso lhe não deve dar a demissão; e nem o motivo de molestia (a não ser permanente) he bastante, para pedir demissão.
Sala das Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João da Silva Carvalho; Francisco Rebello Leitão Castello Branco.
Foi approvado.
O Sr. Martins Basta, corno relator da Commissão de justiça criminal, leu o seguinte
PARECER.
O desembargador José Ignacio de Mendonça Furtado sendo pronunciado e obrigado a prizão e livramento no juizo da correição do crime do Corte e casa em consequencia de denuncia dada por José de Sousa ferreira, ex-escrivão do bairro de Belem, que o arguiu de ler falsamente mandado fazer um exame, sendo corregedor de Belém, em Joanna Carlota donzela desta cidade, só com o fim de a desacreditar, figurando-a pejada no dito exame, pediu carta do seguro o homenagem, que lhe forão negadas pelo Ministro, a quem recorreu: pediu depois ao Governo alvará do fieis carcereiros que tambem lhe não concedeu: e agora pode a este soberano Congresso que lhe faça agraça de lhe mandar conceder o seguro que até ao presente não pode obter. Ainda que pelos documentos, que ajunta, faz presumir a sua innocencia, com tudo a Commissão he de parecer que não compete ás Cortes a concessão do que pede o supplicante.
Paço das Cortes 11 de Dezembro de 1822. - Manoel Corréa Pinto da Veiga Cabral; Doutor Francisco Xavier de Sousa Queiroga; Luiz Martins Basto.
Terminada a leitura, disse o Sr. Secretario Basilio Alberto que não era conforme ao regulamento lerem-se pareceres de que não compete ás Cortes.
O Sr. Martins Basto: - Pela maneira em que se acha expendido o parecer, importa um verdadeiro indeferimento; e por isso está nos termos de dever ser lido, não obstante a reflexão que acaba de fazer o illustre Deputado.
Poz-se a votos o parecer, e foi approvado
Leu mais o Sr. Martins Basto, por parte da mesma Commissão, os seguinte
PARECERES
1.° Joaquim Antonio da Silva, da cidade de Coimbra, requereu as Cortes Extraordinárias e Constituintes declarasse nulla a resolução do Governo, tomada em consulta do desembargo do Paço, pela qual se indeferia o requerimento do supplicante, para senão expedirem por aquelle tribunal alvará de fiança a certos réos, presos por querella de falso testemunho contra elle dado em juizo em causa capital. Novamente se queixa o supplicante e outros interessados da Commissão criminal a que fôra remeittilo aquelle requerimento, porque tendo subido ao Congresso os alvarás em questão, a mesma Commissão (diz elle) os fizera novamente remetter ao tribunal, para sortirem o seu effeito.
Parece á Commissão, que não havendo lei que prohiba passar-se alvará de fiança por crime de falso testemunho, o sendo aliás constante em contrario a pratica do tribunal do desembargo, deve um e outro requerimento ser indeferido. Paço das Cortes 6 de Dezembro de 1822. - Manuel Corrêa Pinto da Veiga Cabral João Pedro Ribeiro Luiz Martins Basto Joaquim Antonio Vieira Belford Dr. Francisco Xavier de Sousa Queiroga.
Foi approvado.
2.° A Commissão da justiça criminal viu o requerimento de Francisco Caetano Ribeiro coelho, do logar de Covas, comarca da Villa Real, Real se queixa de lhe terem faltado á justiça na relação do Porto nas sentenças das causas de adulterio, que intentou contra sua mulher, D. Maria Rita de Almeida, e Manoel Joaquim Guedes Cabral; e pede que; os autos sejão mandados vir a este soberano Congresso para serem revistos, e se lhe darem às providencias, que julga terem logar. A commissão he de parecer que este requerimento seja indeferido em observancia da §. 176 da Constituição. Paço das Cortes 7 de Dezembro de 1822. - Manoel Corrêa Pinto da Veiga Cabral; Dr. Francisco Xavier de Sousa Queiroga; Carlos Honorio de Gouvea Durão; João Pedro Ribeiro; Luiz Martins Basto.
Venceu-se que não havia logar a votar sobre este parecer.
O Sr. Brandão, como relator da Commissão de pescarias, leu os seguintes
PARECERES.
Primeiro. O cabido da sé cathedral do Porto representa que por concordata com o bispo feita no anno de 1446 lhe pertencem os dizimos da pescaria de Ovar (antigamente S. Christovão de Cabanões) os quaes o Santo padre Paulo 2.º no anno de 1468 uniu in perpetuum ao mesmo cabido que os tem desfrutado desde então: e que elle cabido ouvindo que se trata de isentar de dizimos a pescaria, excita a attenção deste Soberano Congresso para que haja de deixar-lhe o pacifico gozo dos referidos dizimos. Parece á Commissão que o cabido não póde ser attendido em sua pertenção, por quanto, qualquer que seja o seu direito este não póde fazer variar a disposição geral que o Soberano Congresso sanccione ao dito respeito.
Segundo. O anais da companha do camarão estabelecida na praia de Boarcos pede providencias con-
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tra as violencias do rendeiro do mosteiro de S. Cruz de Coimbra. Parece á Commissão que o supplicante tem remédio na lei, e que não he das attribuições das Cortes o appliça-lo.
Terceiro. O juiz e deputados da nacional e real casa do compromisso da cidade de Tavira pedem a confirmação dos seus antigos privilegios de que apresentão certidão. Parece á Commissão que não he deferivel este requerimento porque lhe resiste a lei e o systema de Governo adoptado pela Nação. Paço das Cortes 30 de Dezembro de 1822. - Rodrigo de Sousa Castello Branco; Manuel Aleixo Duarte Machado; João José Brandão Pereira de Mello.
Forão todos approvados.
O Sr. Girão, como relator da Commissão de agricultura, leu um parecer nobre a representação da companhia dos vinhos do Alto Douro, terminando com um projecto de decreto, que ficou para segunda leitura.
O mesmo Sr. Deputado leu outro parecer sobre outra representação da dita companhia, que ficou adiado.
O mesmo Sr. Deputado, como relator da Commissão das artes e manufacturas, fez uma indicação para que cada um dos membros da mesma Commissão fosse autorizado por portaria do Governo para entrar e tomar conhecimento do estado de laboração de cada uma dellas: foi approvada.
O Sr. Camillo, como relator da Commissão de commercio, leu um projecto de decreto sobre a intelligencia do § 16 do decreto de 31 de Outubro de 1822: ficou para segunda leitura.
O mesmo Sr. Deputado leu um parecer sobre o requerimento de Francisco Joaquim Maya, negociante da cidade do Porto, concluindo com um projecto do decreto, que firou para segunda leitura.
O mesmo Sr. Deputado leu um projecto de decreto sobre tendeiros volantes, ou vendilhões; que ficou para segunda leitura.
O Sr. Almeida Serra, como relator da Commissão ecclesiastica do expediente, leu um parecer sobre o requerimento do paroco da freguezia do Zambujal Antonio da Costa Gião, que se queixa de se lhe exigir decima da pequena côngrua que tem: mondou-se voltar á Commissão.
O mesmo Sr. Deputado leu outro parecer sobre o requerimento de João Evangelista Gomes, vigario da freguezia de Poçacos do Arcebispado de Braga, que pedia aumento de côngrua: foi approvado.
Leu mais o Sr. Almeida Serra, por parte da mesma Commissão, o seguinte
PARECER.
Fr. André Gonçalves da Silveira, prior da igreja de S. Tiago de Portalegre, representa ao soberano Congresso que o rendimento do seu priorado he de duzentos e trinta mil réis, dos quaes satisfeitas as despezas para a fabrica da igreja a que he obrigado, e paga a competente decima, lhe ficão tão sómente cento e oitenta mil réis, o que não póde chegar para a sua decente sustentação, como bem reconheceu este augusto Congresso fixando o minimo das congruas dos parocos em 200$ réis, accresce ter elle arrematado o anno de morto por duzentos e trinta e um mil réis, o que torna ainda mais diminuto o rendimento indicado, e por consequência não poder viver com a decencia, e consideração que exige o seu estado e logar: pede por tanto ao soberano Congresso que dispense com elle a lei do anno de morto, como o praticou já com o beneficiado Fr. João da Cruz da villa de Niza. Parece á Commissão que não tem logar o requerimento das dispensas da lei; e quanto á congrua deve esperar pelas providencias geraes a este respeito. - Sala das Cortes 17 de Dezembro de 1822. - Joaquim de Oliveira e Sousa, João Pedro Ribeiro, Pedro Paulo de Almeida Serra.
Foi approvado.
O Sr. José de Sá como relator da Commissão ecclesiastica de reforma, leu um parecer sobre a representação que ao poder executivo dirigiu o bispo do Funchal, que pedia se mandassem prover com urgencia duas dignidades ao menos, visto terem vagado tres e uma prebenda na cathedral daquella cidade: ficou adiado.
Leu mais o Sr. José de Sá, por parte da mesma Commissão, os seguintes
PARECERES.
Primeiro. A´ Commissão ecclesiastica de reforma foi presente um requerimento, que a este soberano Congresso dirigiu o clero da cidade, e bispado de Aveiro, em que diz: que sendo o bispado de Aveiro desmembrado do de Coimbra pela bulla de 18 de Abril de 1774, o cabido de Coimbra, não obstante aquella desmembração, continuou a receber as terças dos dizimos de varias freguesias comprehendidas nos limites do novo bispado de Aveiro, e que estas terças devião pertencer ao clero do dito novo bispado, por isso mesmo que os dizimos, donde procedem as terças, são determinados para o culto divino, e sustentação do clero do bispado, onde os fructos são nascidos, e creados; que a fabrica do novo bispado não tem de rendimento mais que seis centos mil réis, que não chega para as despezas de todos os paramentos, e outras da primeira necessidade, faltando alguns paramentos para as funções episcopaes, e que assim mesmo está empenhada; que a igreja da misericordia, que lhe serve de Sé, apenas tem oito capelães, sendo necessário, para se fazerem as funcções episcopaes, chamarem-se com bastante incommodo clerigos das freguesias visinhas; e que não sendo justo que o cabido da Sé de Coimbra receba as terças do seu bispado, e bispado alheio, pretendem que as terças das preditas freguezias, que o cabido da Sé da Coimbra está recebendo, sejão daqui em diante applicadas para a fabrica da Sé de Aveiro, para se crear com o seu rendimento ao menos uma collegiada de beneficiados, que satisfação com a decencia devida aos divinos officios, e pontificaes.
Parece á Commissão ser justo o requerimento doa supplicantes, porque pela desmembração de corta porção de terreno para a creação de um novo bispado,
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ficão logo pertencendo a este as terças dos dizimos do territorio do dito novo bispado, a que injustamente está o cabido do Coimbra percebendo as terças dos dizimos do bispado de Aveiro. Mas como consta á Commissão, que não he só este o cabido, que em Portugal está percebendo as terças dos dizimos de bispado alheio, acontecendo o mesmo ao cabido de Evora, que se acha comendo as terças dos dizimos do bispado de Beja, que comia antes da desembração daquelle bispado; e como esta materia he de alguma circunstancia, he necessario que o Governo passe ordens positivas aos cabidos de Coimbra e Evora, para mostrarem os titulos que os autoriza para continuarem a perceber as terças dos dizimos de bispado alheio; para que depois de ouvidos estes, possa a Commissão, com conhecimento de causa interpor o seu parecer sobre o destino daquellas terças.
Paço das Cortes 2 de Janeiro de 1823. - Manoel da Rocha Couto; João Manoel de Freitas Branco; Joaquim Anastacio Mendes Velho; Manoel Dias de Sousa.
Decidiu-se que não competia ás Cortes.
Segundo. A Commissão ecclesiastica de reforma forão presentes os requerimentos do padre José Vicente Coelho, que pede ser admittido á colação da coadjutoria da igreja paroquial de S. Tiago da cidade de Portalegre, em que foi apresentado em Dezembro de 1820, e tendo as deligencias feitas, não foi admittido a colação por lhe obstar o decreto de 26 de Junho de 1821.
Do padre Antonio Theodoro de Oliveira, que se acha aposentado pelo Excellentissimo Bispo de Coimbra no priorado da igreja paroquial de S. Christovão da mesma cidade, e tendo feito as deligencias necessarias, não fora colado por lhe obstar a disposição do sobredito decreto, pedindo ser admitido a colação.
Do padre Antonio Marçal de Mesquita Moraes, que tenho obtido as licenças necessarias para impetrar a bulla de renuncia, que nelle fazia seu tio Marçal José Marques, da freguesia de Santa Maria de Idaens no arcebispado de Bragra, fôra concedido o regio beneplacito em 16 de Abril de 1822, e fazendo as mais deligencias, só lhe resta ser colado na dita igreja, a que não foi admittido em virtude do citado decreto, pedindo ser admittido a colação por lhe haver sido conferida a dita igreja antes do mencionado decreto.
Do padre Luiz Pereira Monteiro, que pede ser admittido á execução da bulla que impetrou, e confirma a apresentação, que nelle fizera o padroeiro da abbadia de S. Pelagio de Fornos no bispado de Lamego, a qual obtivera o regio beneplacito em 26 de Abril de 1811, visto que já, estava feita a graça antes do referido decreto.
Do padre Luiz Antonio de Carvalho, que pode ser colado na freguezia de S. Romão de Armamar, comarca s bispado de Lamego, em que fóra apresentado pelos freguezes em 6 de Janeiro do anno passado, e que não fôra logo colado por lhe obstarem, os beneficiados da mesma igreja com quem correu litigio, que venceu: mas não junta documento algum.
Perece a mesma Commissão, que todos elles devem ser referidos, porque o decreto das Cortes de 26 de Junho do anno passado de 1821, prohibe indistinctamente, ou suspende as colações de todos os beneficios ecclesiasticos, de cuja generalidade nenhuma he exceptuado. Esta suspensão não prejudica o direito dos supplicantes que devem ser admittidos, logo que o soberano Congresso levante esta suspenção.
Paço das Cortes 21 de Dezembro de 1822. - Anastacio Mendes Velho; Manoel Dias Sousa; José de Sá Ferreira das Santos do Valle; João Manoel de Freitas Branco; Manoel da Rocha Couto.
Foi approvado.
O Sr. Presidente convidou a Commissão ecclesiastica de refórma a dar o seu parecer com brevidade, sobre a consulta que na mesma está relativa á reforma de regulares; e tendo dado a palavra á Commissão de fazenda, leu o Sr. José Liberato, como relator da mesma, um parecer sobre a proposta que ao Governo fez o Dr. Thomé Rodrigues Sobral para só dar uma gratificação ao bacharel Francisco Thomaz da Silveira Franco ficou para segunda leitura.
O mesmo Sr. Deputado leu outro parecer sobre o requerimento de Joaquim Tiburcio de Carvalho, juiz da balança da prata, que pedia ser promovido ao logo de juiz da balança do ouro; e concluindo com um projecto de decreto, o qual ficou para segunda leitura.
Leu mais o Sr. José Liberato, por parte da mesma Commissão, o seguinte
PARECER.
Em data de 28 de Abril de 1821 representou ás Cortes constituintes José de Sousa e Oliveira, administrador da fabrica dos vidros da Marinha grande, termo de Leiria, que a importação dos vidros estrangeiros augmentava todos os dias, e que na proporção deste augmento diminuia a venda dos nossos, chegando já por esta causa o progressivo empate da fabrica a 200:000$ réis. Pediu, por conseguinte, para acautelar a inevitavel ruina da fabrica, que o soberano Congresso prohibisse, quanto antes, a importação de vidro estrangeiro, como único remedio capaz de salvar aquelle tão util estabelecimento. Accrescentava mais, que á execução desta medida, de uma necessidade absoluta, não devia obstar o tratado de 1810 com Inglaterra, porque os vidros de França, Alemanha, e outros paizes, por muito mais baratos, erão os que embaraçavão o consumo dos nossos.
Passou este requerimento por ordem das Cortes á Commissão de fazenda, a qual, pedindo informações do rendimento dos vidros estrangeiros, excepto inglezes, e ouvindo o administrador da alfandega grande, veio no conhecimento, que o rendimento médio dos direitos dos vidros pagos na alfandega em seis annos, desde 1815 até 1820, fora de 7:367$704 réis.
Foi mais a Commissão informada que era muito consideravel o consumo dos vidros estrangeiros; e que a causa principal deste grande consumo procedia de que os seus valores nas pautas erão muito baixos. Até aquelle tempo pagavão por arroba os vidros cristalinos de toda a qualidade 2$800 réis: os de vidraças, brancos, e verdes 1$600 réis: e os inglezes metade des-
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tes direitos. Em consequencia destas informações deu a Commissão o seu parecer em 16 de Maio de 1822, e foi elle: que se dissesse ao Governo que exigisse da Commissão das pautas aquella parte de seus trabalhos relativa aos direitos dos vidros, para que, sendo apresentados ao soberano Congresso, podesse este com conhecimento de causa estabelecer sobre seus valores os correspondentes direitos, tendo sempre em consideração o tratado de 1810. Com este mesmo parecer se conformou a Commissão do commercio, depois de ambas terem ouvido o da junta do commercio que foi da mesma opinião.
Em 2 de Agosto de 1822 se fez ao Governo a participação acima mencionada; e em 12 de Novembro do corrente anno respondeu o mesmo Governo, remettendo o officio da Commissão das pautas com a parte de seus trabalhos relativa aos direitos dos vidros. Diz ella no dito officio, que dividiu a pauta geral em quatorze classes, compondo cada uma dos géneros, matérias, e especies mais homogeneas; e que á classe 12.ª ficão pertencendo os vidros, sobre os quaes teve ordem para informar. Desejando pois a mesma Commissão apresentar um trabalho mais perfeito e regular, determinou concluir esta parte segundo o mesmo plano que ella deverá occupar na pauta geral. Para poder sobre esta matéria, como sobre todas as mais, marchar com segurança, e conhecimento de causa, antes de formar o seu juizo sobre cada um dos objectos, diz a Commissão que procurara recolher as mais escrupulosas informações; e por isso póde affirmar que seus trabalhos são, e serão sempre o resultado da maior somma possivel de conhecimentos adquiridos. Em resultado das tuas indagações achou ella, que actualmente existem em nossas fabricas grandes porções de vidros estagnados, e com especialidade dos de vidraça, pela grande concorrencia dos estrangeiros: he por tanto de opinião, que só por um direito maior poderão ter ajudados os da nossa manufactura; e muito mais quando acontece chegarem estes sobejamente para o consumo do paiz.
A mesma Commissão, attendendo que o methodo estabelecido dos valores, por estes serem muito diminutos, não era sufficiente no estado deplorável em que se achão as nossas fabricas de vidros, arbitrou a certas qualidades delles um direito liquidado desde tres mil réis por arroba até sete mil e duzentos réis, comprehendendo nestas diversas qualidades os vidros para vidraças, os cristalinos, lapidados, e coalhados e pintados. Sobre as outras qualidades seguiu o methodo dos valores, e lhes impoz, um direito de trinta por cento: he porém de opinião, que os vidros sejão pesados com as suas competentes taras; e que do peso bruto só abata a quinta parte para taras e avarias, o só do liquido se pague o direito correspondente.
Deste methodo, adoptado pela Commissão das pautas, segue-se: que os vidros para vidraças, que até aqui tem pago mil e seiscentos réis por arroba, devem agora pagar desde tres mil réis ate tres mil e oitocentos réis, segundo as suas diversas qualidades: e que os cristalinos, que só pagavão dois mil e oitocentos réis por arroba, devem tambem agora pagar de quatro mil e duzentos réis até sete mil e duzentos réis, segundo as suas mesmas diversas qualidades.
A actual Commissão de fazenda, expondo em resumo estes trabalhos da Commissão das pautas, he de parecer que elles passem para a Commissão do commercio, a fim de que ella, examinando este importantissimo assumpto, que he muito da sua competencia, haja também de informar o supremo Congresso para que elle, com pleno conhecimento de causa, possa resolver o que for mais util para o interesse nacional. Paço das Cortes 19 de Dezembro de 1822. - José Liberato Freire de Carvalho; Francisco Botto Pimentel; Francisco Xavier Monteiro; O Bispo Conde; Dr. Francisco Xavier de Sousa Queiroga.
Foi approvado.
Designou o Sr. Presidente para a ordem do dia o orçamento da despeza da repartição dos negocios do Reino.
Levantou a sessão depois das duas horas da tarde.
RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES
Para Filippe Ferreira de Araujo e Castro.
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes precisão de que lhes sejão transmittidos os documentos, em que a Commissão do terreiro publico se fundou para conceder a descarga de generos cereaes ao navio dinamarquez Fénix, vindo de Wolgast, e de que a mesma Commissão faz menção na sua conta de 10 de Dezembro de 1822, remettida ás Cortes pela secretaria de Estado dos negocios do Reino, com officio de 18 do mesmo mez. O que V. Exc. levará no conhecimento de Sua Magestade.
Deus guardo a V, Exca. Lisboa Paço dai Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
Para Sebastião José de Carvalho.
Illustrissimo e Excellentisumo Senhor. - As Cortes, tomando em consideração o officio do Governo expedido pela secretaria de Estado dos negocios da fazenda em data de 23 de Dezembro proximo passado acerca da arrematação do tabaco e saboarias, resolvem o seguinte:
1.º Além dai condições autorizadas por decreto das Cortes de 2 do Novembro de 1822, poderá o contrato do tabaco e saboarias ser arrematado com as seguintes faculdades: Primeira, quando o preço do tabaco do Brasil exceder a quantia do tres mil e duzentos réis por arroba, livre de fretes e captivo de direitos, poderá o contrato ser supprido com tabaco estrangeiro, pagando este os mesmos direitos que actualmente paga o tabaco do Brasil. Segunda, poderão os contratadores armar á sua custa duas embarcações para navegaram na costa de Portugal, e reatar ahi todos os barcos, muletas, e outras embarcações, que se empregão no contrabando do tabaco.
2.° Fica o Governo amplamente autorizado para promover os interesses nacionaes por todos os modos que julgar convenientes na arrematação do contrato do tabaco, podendo prescindir de quaesquer formulas até ao presente praticadas, com tanto que a ar-
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rematação se faça em publico. O que V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
Para o mesmo
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes resolvem que seja immediatamente verificado o offerecimento que fez a corporação dos alfaiates da quantia de setecentos mil réis a bem das despesas publicas, o qual para aquelle fim foi remettido ao Governo com a ordem das Cortes de 14 de Julho de 1821, e que o Governo remetta ás Cortes exclarecimentos dos motivos por que até agora não verificou o mencionado offerecimento. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
Para o mesmo.
Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes, deliberando sobre a ordem de discutir o orçamento da receita e despesa publica, resolvem o seguinte: 1.ª discussão começará pela despesa, e só depois de apurada esta, se tratará da receita: 2. assistirão á discussãao o Secretario de Estado dos negocios da fazenda e o daquella repartição, cuja despesa ou receita se discutir para que um e outro possão subministrar as informações necessarias: 3. a discussão se abrirá no dia terça feira 7 do corrente, e se continuará nos dias 9, e 11, e em todas as subsequentes terças e quintas feiras e sabbados, em quanto a experiencia não mostrar que não necessarios mais alguns outros dias, a fim de que a decisão se termino em tempo competente. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.
Deus guarde a V. Exca. Lisboa Paço das Cortes 4 de Janeiro do 1883. - João Baptista Felgueiras.
Para Marcos Antonio de Sousa
As Cortes não concedem a escusa que V, S.ª requer de Deputado ás Cortes, para que fôra eleito pela provincia da Bahia. O que participo a V. S.ª para sua intelligencia.
Deus guarde a V. S.ª Lisboa Paço das Cortes 4 de Janeiro de 1823. - João Baptista Felgueiras.
SESSÃO DE 7 DE JANEIRO.
ABERTA a sessão, sob a presidencia do Sr. Margiochi, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.
O Sr. Avillez observou que tendo obtido licença de oito dias do Sr. Presidente, antes que lhe fosse prohibido o concedelas, e tendo-se ausentado para o Alemtejo, não tinha sabido a resolução do Congresso, que prohibia taes licenças, que pedia portanto que se lhe não contassem aquellas faltas como feitas sem causa; e assim se decidiu.
O Sr. Secretario Felgueiras deu conta do expediente, mencionando
1.° Um officio do Ministro da marinha, com as partes do registo do porto tomado no dia 5 aos navios Incomparavel, vindo de Pernambuco; Conceição Oliveira, vindo da Bahia; e Ninfa, vindo do Faial; de que as Cortes ficárão inteiradas.
2.° Outro officio do mesmo Ministro, com a parte do registo do porto tomado no dia 6 ao brigue Treze de Maio, vindo do Rio de Janeiro: de que as Cortes ficárão inteiradas.
3.° Outro officio do mesmo Ministro; incluindo um officio, que por 2.ª via recebera do chefe commandante da esquadra do Brasil: que foi mandado reverter ao Governo.
4.° Um officio do general governador das armas da Bahia em data de 11 de Novembro, assim como a 2.ª via do officio do mesmo general em data de 6 do mesmo mez: que forão mandados remetter ao Governo.
5.° Um officio do ministro da guerra, com a copia do officio que em 11 de Julho do anno pasmado fôra dirigido ás Cortes constituintes, sobre o abuso que devia compelir a quatro officiaes inglezes demittidos do exercito, e que durante o guerra só tinhão servido entre nove, e onze mezes. Foi remettido á Commissão militar com os mais papeis respectivos a este assunto.
7.º Outro officio do mesmo Ministro incluindo um requerimento de Isidoro José da Cruz Ferreira, carcereiro das cadèas do castello de S. Jorge: que foi remettido á Commissão do fazenda.
8.º Um officio do Ministro da fazenda, concebida nestes termos: - Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - Tenho a honra do satisfazer á ordem das Cortes de 21 de Dezembro proximo, que manda informar o Ministério sobre o conteudo no projecto junto do regimento para o expediente da Commissão do thesouro publico. O Ministerio nas suas relações com a Commissão, tem-se cingido exactamente ao decreta da creação desta, mandando-lhe franquear todos os livros do thesouro; e quanto ás outras requisições, que as dirigisse ao Governo. A primeira requisição que se recebeu datada de 22 de Outubro, contando l5 artigos, a que o thesouro devia satisfazer, expediu-se logo para que fosse cumprida, combinando-se o trabalho de forma, que não parasse o expediente.
Bem viu o Governo, que pelo numero e qualidade dos objectos daquella requisição, a que teria muito difficultoso satisfazer em qualquer tempo, mas principalmente quando o thesouro tinha que subministrar os dados para o orçamento, a Commissão se envolvia em embaraços, que não se vencerião facilmente, augmentando tanto trabalho a uma repartição, que já não podia satisfazer aos seus ordinários deveres.
O remedio que ella procurou no projecto actual; offerece difficuldades de outra ordem, que consistem na grandeza do expediente de que se quer encarregar a Commissão, e no embaraço que deste resultará á