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N.º 26

EM 9 DE MARÇO DE 1899

Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Berquó Poças Falcão

Secretarios - os exmos. srs.

Frederico Alexandrino Garcia Ramirez
Manuel Telles de Vasconcellos

SUMMARIO

Approvada a acta, o sr. presidente dá conta á camara de que a deputação que foi ao paço apresentar a El-Rei a resposta ao discurso da corôa se desempenhou da sua missão, e que lhe foi entregue uma representação dos povos da villa da Feira, - Em seguida têem segunda leitura dois projectos de lei. - O sr. Antonio Cabral apresenta um projecto de lei sobre o processo a seguir na cobrança de dividas commerciaes, e pede o prolongamento até Monsão do projectado caminho de ferro de Braga a Ponte da Barca, ficando o sr. ministro da guerra de transmittir esses pedido ao seu collega das obras publicas. - O sr. visconde da Ribeira Brava apresenta um projecto de lei que favorece a casa pia de Beja, e uma representação da camara municipal de Moura, contra a fiscalisação exercida pela companhia dos phosphoros. - O sr. Simões Baião requer varios esclarecimentos sobre aforamento de baldios, e pede que se dê parecer sobre o seu projecto de lei referente ao concelho de Figueira dos Vinhos. - O sr. Eusebio Nunes apresenta um projecto de lei sobre a desamortisação dos bens pertencentes ás corporações de mão morta. - O sr. Teixeira de Sousa requer varios esclarecimentos, e troca explicações com o sr. ministro da fazenda ácerca de questões financeiras. - Pelo sr. ministro da fazenda é apresentada uma proposta de lei sobre habilitações dos credores do estado, e pelos srs, Antonio Cabral e Ressano Garcia são mandados para a mesa pareceres de commissões. - O sr. Alexandre Cabral participa a constituição de uma commissão, e os srs. Marianno de Carvalho e Ressano Garcia requerem varios esclarecimentos.

Na ordem do dia entra em discussão a interpellação annunciada pelo sr. João Franco ao sr. ministro da fazenda sobre ou contratos da prata, usando da palavra os srs. João Franco, ministro da fazenda e Luciano Monteiro.

Chamada - Ás tres horas da tarde.

Abertura da sessão - As tres horas e dez minutos da tarde.

Presentes - 60 srs. deputados.

São os seguintes: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alexandre Ferreira Cabral Paes de Amaral, Alfredo Cazimiro de Almeida Ferreira, Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Augusto Gonçalves Braga, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Carlos José de Oliveira, Conde de Paçô Vieira Francisco de Almeida e Brito, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal Francisco Silveira Vianna, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda João Baptista Ribeiro Coelho, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lobo de Santiago Gouveia, João Marcellino Arroyo, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Eduardo Simões Baião, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Gonçalves Pereira dos Santos, João Maria de Oliveira Matos, José Mathias Nunes, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Alvaro de Castellões, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Conde de Burnay, Conde de Silves, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, João de Mello Pereira Sampaio, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Ornellas de Matos, José Adolpho de Mello e Sousa, João Alves Pimenta de Avellar Machado, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Malheiro Reymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Pereira de Lima, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho e Sebastião de Sousa Dantas Baracho.

Não compareceram á sessão os srs.: - Alfredo Carlos Le-Cocq, Anselmo de Andrade, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Tavares Festas, Conde de Idanha a Nova, Conde da Serra de Tourega, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Furtado de Mello, Francisco Manuel de Almeida, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, João Catanho de Menezes, João Joaquim Izidro dos Reis, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Bento Ferreira de Almeida, José da Cruz Caldeira, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Cumpre-me communicar á camara que a deputação encarregada de entregar a Sua

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Magestade a resposta ao discurso da corôa se desempenhou da sua missão, sendo recebida por El-Rei com a affabilidade do costume.

Communico tambem á camara que fui procurado por uma commissão, representante dos povos do concelho da Feira, que se reuniram em comicio no dia 5 do corrente, para protestarem contra o projecto de lei, que tem por fim erigir a freguezia de Espinho em concelho autonomo, que me entregou uma representação n´esse sentido.

Esta representação vae ser enviada á commissão que tem de apreciar o referido projecto de lei.

Vae, por extracto, no fim da sessão.

EXPEDIENTE

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - O codigo administrativo de 17 de julho de 1886 organisou os tribunaes administrativos districtaes sob novas bases, e dispoz no artigo 269.° que os seus vogaes seriam nomeados pelo ministerio do reino, mediante proposta, em lista triplice, do ministerio da justiça, de entre os candidatos legaes á magistratura judicial. Esses candidatos legaes os delegados do procurador regio com seis annos de serviço, e os conservadores do registo predial com as habilitações para serem nomeados juizes.

Os candidatos assim nomeados para aquelles tribunaes, segundo o disposto no artigo 270.° do referido codigo, ficavam, para todos os effeitos, considerados juizes de direito de 3.ª classe.

Era praxe antiga nomearem-se os juizes de direito de 3.ª classe dos delegados do procurador regio mais antigos, e segundo os seus merecimentos e serviços feitos ao estado.

Publicado aquelle codigo, que no artigo 269.° chamava para os tribunaes creados os candidatos legaes á magistratura judicial, e como no $ unico d´este artigo estatuia que os juizes de direito de 3.ª classe podiam ser transferidos para os logares creados, se o requeressem, e igual disposição se encontrava no artigo 279.° em relação aos delegados do procurador regio para exercer as funcções do ministerio publico junto d´aquelles tribunaes, por boa logica se concluiu que não era preciso requererem aquelles logares os outros candidatos á mencionada magistratura.

Porém, no ministerio da justiça pensou-se de outra maneira, e publicou-se no Diaria do governo de 30 de julho do referido anno de 1886 um annuncio convidando, para os effeitos do artigo 269.º e $ unico do referido codigo, todos os candidatos legaes á magistratura judicial, que pretendessem ser nomeados para os lugares dos tribunaes administrativos, a fazerem n´o no praso de trinta dias.

Alguns d´esses candidatos, residentes então nas comarcas ruraes da ilha da Madeira, não tiveram conhecimento d´aquelle annuncio a tempo de poderem requerer pela escassez do tempo, pela demora dos paqutes e dos correios para as villas ruraes da Madeira n´aquella epocha, a sua nomeação para os ditos tribunaes, sendo assim preteridos na sua carreira judicial, sem darem causa para isso, por delegados e conservadores com muito menos tempo de serviço.

N´esse tempo o bacharel Bernardo Vieira Pinto d´Andrade era delegado do procurador regio na comarca de Ponta do Sol, da ilha da Madeira, com mais de 10 annos de effectivo serviço, com serviço de juiz ordinario na fórma do decreto de 28 de dezembro de 1869, e de administrador do concelho, e foi preterido no grande despacho de 1 de novembro de 1886 para aquelles tribunaes, porque não requereu, e o não fez, porque o Diario do governo não chegou á Ponta do Sol com aquelle annuncio a tempo de poder fazel-o.

Foi mais tarde, em 27 de janeiro de 1887, despachado, juiz de direito, mas os delegados e conservadores mais modernos despachados em 18 de novembro de 1886 para os tribunaes administrativos já o tinham precedido, e o tempo de serviço publico de mais de treze annos ficara perdido para a sua carreira judicial.

Para evitar-se este grave damno, para que não concorreu o referido bacharel, e ser-lhe contado para os effeitos da antiguidade na magistratura judicial o tempo, que pela actual legislação se mandou contar, como se tivesse sido despachado em 18 de novembro de 1886 com posse no praso legal, se apresenta á esclarecida apreciação da camara o projecto de lei abaixo exposto. O praso para os candidatos a qualquer emprego, residentes nas ilhas, sempre foi de sessenta dias, porém o annuncio de 30 de julho de 1886 foi indistinctamente de trinta dias, e ainda esta circumstancia concorreu poderosamente para o referido bacharel não poder pedir a sua nomeação para os ditos tribunaes administrativos já referidos.

Sempre, desde a lei de 28 de fevereiro de 1835 até ao presente, se attendeu para marcar a antiguidade dos juizes de direito aos serviços por estes prestados ao estado.

Isto se observou na lei de 21 de julho de 1855, e em todas as outras providencias posteriores, e ainda em relação aos magistrados do ultramar, postos á disposição do ministerio da justiça para ser-lhes contado o tempo de demora que houve na sua collocação na magistratura do continente pela lei de 7 de agosto de 1890, artigo 1.°, modificação 9.ª

Para que seja contado ao referido bacharel, actual juiz do direito na 2.ª classe, todo o tempo de serviço publico, que a actual legislação manda contar aos magistrados judiciaes, como se fosse despachado em 18 de novembro de 1886, temos a honra de propor-vos o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É contado para o effeito de fixar a antiguidade e classe na magistratura judicial ao bacharel Bernardo Vieira Pinto de Andrade, actual juiz de direito de 2.ª classe, todo o tempo de serviço publico, que a actual legislação manda contar para a antiguidade, concessão do terço e aposentação dos magistrados judiciaes, como se fosse despachado juiz em 18 de novembro de 1886 e tomado posse no praso legal.

Art. 2.° O governo mandará fazer a referida classificação no ministerio da justiça, em vista do que lá constar e dos documentos que provem o alludido serviço, e o dito bacharel apresentar no praso de trinta dias, a contar da publicação d´esta lei no Diario do governo.

$ unico. Os interessados podem reclamar, segundo a legislação actual, a fim de mostrarem que houve erro e indevida classificação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 6 de março de 1899. = João Pinto Rodrigues dos Santos = Conego Alfredo Cesar de Oliveira = João Catanho de Menezes.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de legislação civil.

Projecto de lei

Senhores. - Estava em vigor a reforma dos serviços de obras publicas, determinada pelo decreto de 24 de julho de 1886, quando veiu o executivo em diploma de 1 de dezembro de 1892 alterar algumas das suas disposições.

Todavia, o primeiro providenciou quanto ao modo de fixar e attender os direitos de cada funccionario, tomando em consideração os seus meritos e aptidões para que não faltasse o estimulo que é um factor importante para todas as classes, visto que do zêlo e do adiantamento do individuo depende muitas vezes o interesse do estado. É sempre acertado conjugar as conveniencias de uns com o interesse do outro para que a administração caminhe e seja efficazmente coadjuvada por todos os elementos officiaes.

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Mas, senhores, nem sempre as reformas introduzidas no serviço e aconselhadas pela experiencia, têem na pratica a expressão do pensamento do legislador. Entre o principio e a sua execução, levanta-se muitas vezes obice irreductivel. Ou porque aquelle seja mal interpretado, ou porque d´elle resultem offensas de direitos, suppostos reaes, que se reputam prejudicados pela nitida observancia das leis organicas, ou, finalmente, por outras quaesquer rasões que escapam á observação dos mais conhecedoras dos assumptos technicos ou de pura administração, é incontroverso que algumas reformas de serviço se impõem como inadiaveis por não se terem cumprido, ou por se terem cumprido mal algumas das disposições mais ou menos essenciaes dos diplomas que avolumam a nossa legislação.

E descendo da these para a hypothese, basta apontar poucos artigos dos decretos de 24 de julho de 1886 e de 1 de dezembro de 1892, para se ficar concluindo que ha sempre conveniencia em manter e pôr em vigor as garantias conferidas ao funccionario, não só como estimulo, mas tambem como premio á diuturnidade dos seus serviços.

Exigir-lhe habilitações para a sua admissão e impor-lhe responsabilidades, sem o estado cumprir pela sua parte as promessas que lhe faz ao crear hierarchias, e ao fixar direitos e obrigações, é faltar á fé de um contrato e collocar-se na dependencia dos que se vêem prejudicados sem vantagem da causa publica.

Na organisação dos serviços technicos de obras publicas de 1886, estabeleceu-se o quadro auxiliar de conductores, dividindo-os em classes. Para a l.ª e para a 2.ª a nomeação dependia de circumstancias que a propria reforma não definio, como se vê do capitulo II, artigo 56.° e 57.°, por que comprehendia os empregados que áquella data faziam serviço no respectivo ministerio e que foram reputados idoneos para desempenhar incumbencias especiaes, sendo então dispensados de provar os seus conhecimentos, não se lhes exigindo exame nem apresentação de titulos de frequencia nas escolas superiores.

Mas, para os conductores de 3.ª classe, alem de concurso de provas praticas, exigia-se dos candidatos a apresentação de carta do curso de conductor, passada, pelos institutos industriaes de Lisboa ou Porto ou habilitações equivalentes em qualquer escola superior nacional ou estrangeira, ou serem áquella data conductores auxiliares com cinco annos de bom e effectivo serviço em obras publicas, o que quer dizer que se dispensaram a estes as habilitações obtidas nos mesmos cursos, exigindo-se-lhes, porém, exame que nunca teve logar, por que nunca para elle se fez programma, não obstante a ultima parte do $ 1.º do artigo 64.° do regulamento de 1 de dezembro de 1892. E em 1898, ao refazer-se o quadro dos conductores de 3.ª classe, foram, providos nas vagas os conductores auxiliares que por falta de trabalhos, se achavam alguns na disponibilidade, prescidindo-se tambem de habilitações e de exames, como se taes formalidades não fossem substanciaes.

São em pequeno numero os conductores de 3.ª classe que têem o curso que os recommendava como candidatos legaes nos termos dos citados decretos.

O de 1886, estabelecia no artigo 59.° que a promoção da 3.ª para a 2.ª classe se fizesse alternadamente, tres quartos por merito e um quarto por antiguidade. Era este o meio de dar a preferencia aos que tinham frequentado com aproveitamento as escolas de habilitação sem todavia os sujeitar á antiguidade, que nunca foi incentivo nem póde suppor merito quando para a admissão se dispensam os exames que eram o modo pratico de conhecer e apreciar a capacidade dos candidatos.

Fica pois demonstrado que os conductores de 3.ª classe que obtiveram os seus diplomas dos institutos industriaes de Lisboa ou Porto, foram os unicos prejudicados e acham-se n´uma situação bem precaria para que aos poderes publicos não occorra providenciar de modo a garantir-lhes melhor futuro.

N´estes termos e para obviar ás difficuldades que provem do actual estado de cousas, o que se afigura mais consentaneo com a justiça que lhes assiste, é que os conductores de 3.ª classe, que estejam nas mencionadas condições, e contem mais de dez annos de bom e effectivo serviço, sejam graduados em 2.ª classe com os competentes vencimentos. Esta providencia é como que a observancia do referido artigo 59.° da organisação de 1886 e a compensação aos prejuizos que desde então têem soffrido por falta de execução dos preceitos que não admittiam sem exame previo aos logares de conductores de 3.ª classe, individuos que não tinham titulos alguns de capacidade, theoricos ou praticos, o que não obstante a sua insufficiencia foram nomeados para o preenchimento de vagas ocorridas no quadro.

Fundado, pois, nos principios de justiça tenho a honra de submetter ao conhecimento e approvação da camara dos senhores deputados da nação portugueza o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Serão graduados, logo que o requeiram, em 2.ª classe, com os competentes vencimentos, os conductores da obras publicas que, tendo o respectivo curso pelos institutos industriaes de Lisboa ou Porto, contem á data d´esta lei mais de dez annos de bom e effectivo serviço, como conductores de 3.ª classe.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 6 de março de 1899. = O deputado, J. Oliveira Matos.

Lida na mesa, foi admittido e enviado á commissão de obras publicas.

O sr. Antonio Cabral: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei que passo a ler.

(Leu.)

Sr. presidente, o fim que tenho em vista, ao apresentar este projecto de lei, é facilitar a cobrança das dividas commerciaes do pequeno valor, por isso que a actual fórma de processo, pelas despezas que acarreta, traz gravissimos inconvenientes.

Este projecto tem, portanto, por fim obstar a estes inconvenientes e é resultado de uma representação que recebi da esclarecida e conspicua associação commercial de Braga, que me pede para eu me entender com o sr. ministro da justiça sobre este assumpto.

Mando o projecto para a mesa, a fim de s. exa. o fazer seguir o devido destino.

Continuando no uso da palavra, desejo chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre um assumpto em que tambem é interresada a cidade de Braga, que represento n´esta casa. Como não está presente o sr. ministro das obras publicas, peço ao sr. ministro da guerra que communique a s. exa. as considerações que vou fazer.

É com respeito á rede dos caminhos de ferro que se está estudando e que deve ser posta em pratica o mais breve possivel. N´esta rede está incluida uma linha ferrea que parte de Braga e que vae até Ponte da Barca.

Ora, o fim a que tenho em vista, é pedir ao sr. ministro das obras publicas que attenda a que essa linha ferrea deve prolongar-se até Monção, indo entroncar nas linhas ferreas hespanholas, de maneira a que a importante e formosa cidade de Braga se desenvolva o mais possivel.

Braga é um centro commercial e industrial de primeira ordem. Para não cançar a attenção da camara, bastará dizer que a media diaria dos carros entrados em Braga é de 702 e, pagando cada um 20 réis, eleva-se a importancia d´este rendimento a 1:870$000 réis por semestre.

Já v. exa. vê o importante movimento commercial que tem a cidade de Braga. Alem d´isso, só o ramal da linha ferrea de Nil até Braga rende por dia 500$000 réis,

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Na estação de Braga embarcam, por anno, termo medio, 60:916 passageiros. Ora, comparando este movimento com o da estação de Vianna, que é apenas de 38:148 passageiros e com o da estação de Barcellos, que é de 25:754 passageiros, já v. exa. vê a importancia que tem a estação de Braga, e se a bella capital do Minho é, ou não, o principal centro commercial e industrial d´aquella fertil e formosissima região do paiz.

Portanto, repito, desejo chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para este assumpto, e, expressando aqui os desejos dos bracarenses, pedir ao illustre ministro que faça com que a linha ferrea, a que me referi, não termine na Ponte da Barca e se prolongue até Monção, construindo-se de via larga, de fórma a poder dar vasante ao enorme movimento commercial d´aquella região.

Tambem desejava pedir a s. exa. que a outra linha ferrea projectada, que vão de Braga a Chaves, siga pelos concelhos de Povoa de Lanhoso, Vieira, Montalegre até Chaves, e seja de via reduzida, attentas as grandes difficuldades de construcção que offerece a região montanhosa que deve atravessar. Esta região é muito fertil, e por isso torna-se indispensavel que a linha ferrea se faça, para beneficio dos povos d´aquelles concelhos, e progressos materiaes de Braga e de Chaves.

Não está presente o sr. ministro das obras publicas, mas peço ao nobre ministro da guerra a fineza de communicar ao seu collega estas minhas considerações, e o empenho que puz em que ellas mereçam a attenção de s. exa.

O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Pedi a palavra para declarar ao illustre deputado, o sr. Antonio Cabral, que communicarei, na primeira occasião, ao sr. ministro das obras publicas, as considerações que s. exa. acaba de fazer com relação ao prolongamento do projectado caminho de ferro de Braga a Ponte da Barca.

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Manda para a mesa o seguinte projecto de lei:

(Leu.)

Artigo 1.° Fica exonerada a casa pia de Beja de todos os encargos com que para ella foram transferidos os bens e rendimentos das extinctas misericordias e confrarias do districto, e isenta de pagar os que estiverem vencidos.

Art. 2.° É revogada a legislação em contrario.

Camara dos deputados, 9 de março de 1899. = Libanio Antonio Fialho Gomes = Antonio de Vasconcellos = Francisco Ravasco = Manuel Telles de Vasconcellos = Visconde da Ribeira Brava.

Este projecto, observa o orador, tendo por fim melhorar a situação da casa pia de Beja, não aggrava os encargos do thesouro, e por isso espera que sem difficuldades logrará ser approvado.

Pede que seja declarada a sua urgencia, pare que sem demora seja apresentado á respectiva commissão.

Envia tambem para a mesa uma representação da camara municipal de Moura contra a fórma abusiva por que é feita a fiscalisação dos phosphoros e isca.

Está certo de que as reclamações, feitas pelos seus collegas, representantes de Evora e Beja, bastarão para que o sr. ministro da fazenda tome providencias a este respeito; mas pede a s. exa. que não as demore, porque os pobres trabalhadores dos campos estão sendo perseguidos até pelo cotão que têem nos bolsos.

Espera que o sr. ministro da guerra transmitta estas considerações ao seu collega da fazenda.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - O sr. visconde da Ribeira Brava pediu urgencia do seu projecto de lei. Vou consultar a camara sobre se dispensa a sua segunda leitura.

Admittida a urgencia, leu-se na mesa.

É o seguinte

Projecto de lei

Senhores. - A casa pia de Beja, unico estabelecimento de caridade do districto, foi dotado na instituição com os rendimentos de algumas misericordias extinctas e com estes na sua totalidade tem podido viver até hoje, dando asylo e instrucção a um numero consideravel de orphãos inteiramente desamparados.

Mas a dotação foi desde o começo tão cheia de encargos, que desde logo e até agora teriam absorvido quasi a totalidade do rendimento, se porventura tivessem sido sempre satisfeitos. Se houvessem sido pagos estes encargos, nem a casa pia poderia ter subsistido, nem a beneficencia publica lucraria por outra fórma, porque os encargos referidos depois de uma distribuição que os torna insignificantes pela multiplicidade de localidades a que é feita, não satisfaz de nenhum modo os fins a que era destinada.

Como se vê do mappa junto, dois dos encargos são:

20$000 réis á villa de Callos e 24$000 réis á de Alvallade para dietas a pobres. Mas os doentes d´esta parochia são remettidos para o hospital de Beja onde são tratados, e os ,44$000 réis distribuidos pelas respectivas juntas de parochia para outras despezas.

Á parochia de Messejana eram distribuidos 60$000 réis e 130 alqueires de trigo para sangrador, medico e receituario; mas n´esta localidade não ha sangrador, é o facultativo de Aljustrel que visita algum enfermo em caso extremo.

Villa Nova da Baronia tinha 69$000 réis e 90 alqueires de trigo para sangrador, botica e medico, havendo ali apenas o partido medico, que é o da camara municipal do Alvito.

Villa Ruiva tinha a importante verba de 24$000 réis para sangrador, medico, botica e dietas a pobres, ignorando-se qual a applicação que a junta de parochia dava a esta verba, bem como a que dá á de 12$000 réis distribuida á villa de Panoias.

E eis aqui estão 425$000 réis anti-economicamente distribuidos, sem applicação proveitosa e exacta; disseminados por diversas localidades, nominalmente destinados a sangradores que não sangram, a medicos que não curam, a dietas e remedios que os pobres não disfructam.

Não podendo com taes desperdicios subsistir a casa pia de Beja, tanto a actual administração d´esta casa, como as anteriores, desde longos annos deixaram de pagar alguns d´aquelles encargos de utilidade publica mais que duvidosa.

A casa pia de Beja não é estabelecimento exclusivo da capital do districto, que por isso não mereça o auxilio de todos os concelhos e de todas as freguesias. As suas portas estão abertas para todos os orphãos de todo o districto, chegando, portanto, a sua acção benefica desde a cidade á mais recondita aldeia. Justo é, pois, que todos concorram para o seu engrandecimento, e que os fundos que dariam vida desafogada áquella caridosa instituição, não sejam d´ella desviados com futeis pretextos.

Pelas rasões expostas temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica exonerada a casa pia de Beja de todos os encargos com que para ella foram transferidos os bens e vencimentos das extinctas misericordias e confrarias do districto, e isenta de pagar os que estiverem vencidos.

Art. 2.º É revogada a legislação em contrario.

Camara dos deputados, em 9 de março de 1899. = Libanio Antonio Fialho Gomes = Antonio de Vasconcellos = Francisco Ravasco = Manuel Telles de Vasconcellos = Visconde de Ribeira Brava.

Foi enviado á commissão de fazenda.

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O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Pedi a palavra, simplesmente para declarar ao sr. Visconde da Ribeira Brava, que communicarei ao meu collega da fazenda as considerações que s. exa. acaba de fazer ácerca da representação que mandou para a mesa.

O sr. Simões Baião: - Pedi a palavra para mandar para a mesa um requerimento pedindo pelo ministerio do reino varios documentos que dizem respeito a uns contratos de aforamento de baldios celebrados pela camara municipal de Ourem.

Segundo informações que tenho, e que reputo fidedignas a referida camara municipal deixou de observar as disposições applicaveis do codigo administrativo, transgredindo as formalidades prescriptas no mesmo codigo para a realisação d´aquelles contratos, e assim fez os aforamentos a um limitado numero de pessoas, sendo uma a esposa do administrador do concelho.

Parece sr. presidente, que se vão introduzindo nos nossos costumes, como regra de direito, que quando um individuo não possa figurar em certos factos ou contratos por virtude dos cargos publicos que exerce faz apparecer a outorgar n´esses contractos a sua esposa, e assim apegado a este quasi direito consuctudinario, e á sombra do cargo que exerce, vão realisando os seus arranjos domesticos. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu tenho como disse, informações que a camara municipal de Ourem não cumpriu n´aquelle aforamentos as disposições do codigo administrativo, mas bem póde ser que a referida camara interpretasse o codigo, da mesma fórma como o sr. ministro da justiça o interpretou com respeito á collocação dos auditores para dar logar á promoção atrazada dos delegados do procurador regio. (Apoiados.)

É possivel que a camara municipal de Ourem, entendesse que aquelles baldios careciam de promoção (Apoiados.) e que estavam á muito tempo na posse de certos moradores da freguezia da Freixianda, e assim, pensou em os promover, em lhes dar passagem do poder dos povos que de tempos immemoriaes os usufruiam legitima e pacificamente para a mão de alguns amigos, afilhados ou parentes. (Apoiados.)

É tambem isto outra regra que se vae introduzindo entre nós! (Apoiados.) É o progresso, é a civilisação! impulsionados pela mão do actual governo. (Apoiados.)

Mas não quero agora entrar na apreciação dos contratos a que me referi; limito-me a pedir os documentos, e quando elles me forem fornecidos, examinarei e verei então, se são ou não legaes aquelles contratos, e pedirei ao sr. ministro do reino, caso não sejam legaes, providencias a este respeito.

E apesar de s. exa. não estar presente sempre quero narrar alguns factos que se relacionam com o assumpto.

Como disse a v. exa., um dos taes contratos foi feito em nome da esposa do administrador; isto começou a indignar os povos do concelho, e no dia 26 de fevereiro foram ao local onde o administrador do concelho já tinha feito um valado, em volta do respectivo baldio, que anda por 68:000 metros quadrados e desfizeram-o.

O administrador tentou então fazer algumas prisões, mas não o conseguiu e até os cabos de policia lhe desobedeceram.

Estes factos praticados em dezembro ultimo, já se repetiram, durante o corrente anno com manifesto desprestigio da auctoridade administrativa.

O administrador alludido exerce tambem na Freixianda, a 15 kilometros da séde do concelho, o logar de pharmaceutico do partido municipal, accumulando os vencimentos do partido com os do cargo de administrador do concelho, e isto não obstante haver na Freixianda uma outra pharmacia.

Ha ali mercado todos os domingos e nos ultimos d´esses mercados os povos têem feito manifestações de desagrado ao administrador do concelho, chegando a partir algumas vidraças da sua casa, e as portas da pharmacia; e, em um d´estes dias, quando o administrador do concelho mandou fazer uma prisão por dois guardas de policia civil que ali tem para sua guarda pessoal, o povo amotinou-se, espancou o regedor e um dos guardas de policia, e obrigou o administrador a soltar o preso, e tel-o-iam aggredido se não fossem os rogos da sua familia.

Tudo isto, sr. presidente, vem para dizer a v. exa. que o desprestigio d´este funccionario é completo, que a gravidade dos factos vae augmentando dia para dia, que vae crescendo a animadversão do povo contra o administrador, a quem já faltam força e auctoridade para se fazer respeitar e restabelecer o socego n´aquelle concelho, e que por conseguinte se torna indispensavel que o sr. ministro do reino adapte promptas providencias para pôr termo a este estado de cousas, a principal das quaes se me afigura ser a substituição d´aquelle administrador.

A sua continuação á frente do concelho de Ourem póde dar logar a conflictos graves; evital-os é o dever do sr. ministro do reino.

Narro os factos aqui publicamente, para que sejam conhecidos do sr. presidente do conselho, e s. exa. não possa allegar a uma ignorancia; e visto s. exa. não estar presente peço ao sr. ministro da guerra o favor de lhe transmittir as referidas considerações que acabo de fazer, para que o nobre presidente do conselho tome as providencias que melhor entender dever adoptar.

Eu bem sei que muitas vezes quando se lhe fazem pedidos d´esta ordem, s. exa., o sr. presidente do conselho, ou não dá providencias ou, se as dá, fal-o por fórma tão confusa que os seus subordinados as não comprehendem. Ou... quem sabe?! Talvez sejam bem claras o que a intilligencia obsecada das auctoridades não as comprehenda...

Por Villa Real, Bragança e Braga parece haver uma tal falta de comprehensão por parte das auctoridades que o sr. ministro do reino dá umas ordens e ellas fazem exactamente o contrario.

Mas... deixando isto e mudando de assumpto, direi que o anno passado tive, a honra de mandar para a mesa um projecto de lei a fim de remediar um erro, se não reparar uma grave injustiça feita pelo sr. presidente do conselho, na divisão das circumscripções administrativas, em relação ao concelho de Figueiró dos Vinhos.

Eu não sei se o meu projecto devia ser acceite ou não pela commissão, se ella lhe seria favoravel, mas, fosse ou não fosse, o que não acho rasoavel é que se mandem para as commissões projectos d´esta ordem, que tendem a remediar injustiças, que foram reconhecidas pelo proprio sr. presidente do conselho, e que não se apresente parecer sobre elles, quer seja favoravel ou não aos mesmos projectos.

Se eu tivesse algum peso ou influencia sobre os vogaes da commissão e sobre o seu relator, sobretudo, que era o anno passado o sr. Carlos João de Oliveira, eu pedir-lhes-ia que, sem demora, dessem parecer sobre o meu projecto, fosse elle de que natureza fosse, favoravel ou desfavoravel, porque o discutiriamos aqui e a alguma conclusão se chegaria talvez.

Posto isto, termino aqui as minhas considerações, reiterando ao sr. ministro da guerra o pedido que já lhe fiz, de transmittir ao sr. presidente do conselho as minhas ligeiras observações sobre os factos occorridos no concelho de Villa Nova de Ourem.

O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Pedi a palavra a v. exa. para declarar ao illustre deputado que communicarei ao sr. presidente do conselho as observações que acaba de fazer a respeito das irregularidades notadas no concelho de Ourem, e estou certo de que s. exa., depois de devidamente informado, tomará as providencias que o caso reclame,

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O sr. Eusebio Nunes: - Venho cumprir a minha promessa de apresentar ao parlamento portuguez o meu relatorio e projecto de lei sobre os bens de desamortisação pertencentes ás corporações de mão morta.

O relatorio e projecto são do teor seguinte:

(Leu.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - Peço a urgencia do meu projecto.

Sr. presidente, nunca apresentei ao parlamento projecto algum de lei que me causasse a satisfação d'este, porque a verdade é tambem que nenhum mais sympathico do que este, pelas providencias que propõe e pelo fim a que mira, qual é o acabar com a especulação desenfreada dos emphyteutas, censoarios, quinhoeiros e pensionarios, modificando-se as disposições de uma lei defeituosa que permittia que se exercitasse a cobiça dos licitantes, quando não havia concorrentes em praça.

Atrás d'elles estavam muitas vezes os avarentos, como aquelle personagem dos Sinos de Corneville, com a sêde insaciavel do oiro, muito oiro e sempre oiro, sem se lembrarem uns e outros de que os bens das misericordias vendos ao desbarate, como até aqui, concorrerão, poderosa mente, para o aniquilamento d'essas piedosas instituições, que ámanhã teriam de fechar as suas portas, e assim os especuladores emphyteutas e os avarentos depois de vendididos os espolios e derretido o oiro da avareza pelos vae-vens da sorte ficariam privados de uma enxerga, se carecessem de dar entrada n'aquelles estabelecimentos de caridade, tendo de exhalar então o ultimo suspiro encosta dos á esquina de alguma rua! (Apoiados.)

Nada mais triste, sr. presidente, pois é bem certo que todos nós sabemos o que somos hoje, mas ignorâmos, em absoluto, o que poderemos ser amanha, podendo muito bem o rico de hoje ser o pobre do dia seguinte! (Apoiados.)

Sr. presidente: Ezequiel do Espirito Santo, na primeira metade deste século, foi na cidade de Elvas o primeiro capitalista e habitou no seu solar. .. (Ápartes.)

V. exas. assustaram-se, imaginando talvez que ia fallar no Solar da Barrigas?! Se assim foi, enganaram-se. Eu sou incapaz de offender os meus collegas.

Como ia dizendo: Ezequiel do Espirito Santo habitou no seu solar na rua dos Falcatos, onde ha um outro que hoje é meu, que pertenceu em tempos aos fidalgos d'aquelle titulo, e, o que v. exas. não sabem é que foi ali onde se escreveu o Hyssope, de Antonio Diniz da Cruz e Silva, esse immorredoiro poema heroe-comico, e um dos melhores da nossa litteratura n'esse genero, na opinião dos entendidos.

No solar de Ezequiel do Espirito Santo, n'esse tempo, o dinheiro em cobre
media-se aos alqueires! Mas os actos imprudentes da administração da sua casa, as obras mal emprehendidas, os emprestimos feitos ao governo de então - não eram regeneradores nem progressistas! (Risos.) e as fianças que acceitou pelo seu bondoso coração, levaram-o, mais tarde, a baquear estrondosamente, e a desventura foi tamanha, que teve de estender a mão á caridade publica, indo depois succumbir ao hospital civil da cidade de Elvas!

Que seria d'este pobre e desgraçado velho, sr. presidente, se não houvesse esses piedosos estabelecimentos de caridade, que servem de abrigo a tanto desconforto e de allivio a tanta desventura?!... (Apoiados.)

É, pois, a caridade, incontestavelmente, uma das mais bellas virtudes christas e humanas, a filha dilecta de Deus, e a flor mais mimosa dos jardins da christandade! (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - E visto que tanto fallo em caridade, seja-me permittido, sr. presidente, prestar aqui a homenagem do meu respeito e da minha admiração ás nossas duas rainhas que são verdadeiros anjos de caridade, (Apoiados.) porque assim foram cognominadas, não por convenções sociaes mas pelo povo portuguez, e que tanto me fazem lembrar a minha Santa Isabel de Aragão, a esposa de D. Diniz, aquella santa rainha, que, segundo a lenda, transmudava em moedas as rosas para dar esmolas aos pobres necessitados!

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - É nobre e penhorante, sr. presidente, ver as nossas rainhas deixarem os seus mantos roçagantes do poder, os seus ricos palacios, para subirem até á mansarda dos pobres e humildes, nos mais immundos bairros da capital, para ali enxugarem as lagrimas dos pobres desgraçados, levando-lhes não só o obolo da caridade, mas o que é mais, sr. presidente, acompanhando-o de palavras de consolação que tanto bem fazem ao espirito e ao coração dos pobres e - quem sabe? - talvez essas palavras saídas d'aquelles labios de anjos de caridade, tenham muitas vezes evitado muita desgraça, tranquillisando o espirito d'aquelles que pelo desconforto da vida e inclemencia da sorte, não duvidariam recorrer aos meios a que muitas vezes conduzem o desespero e a loucura!... (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - A verdade é esta: - Suas Magestades têem escripto o mais bello capitulo da assistencia publica, capitulo que consiste não só em saber dar, mas tambem em aconselhar o levar palavras de conforto ao coração dos infelizes!

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - A cidade de Elvas não esqueceu nem esquecerá nunca as suas duas rainhas, como não esqueceu nem esquecerá nunca a honrosa visita que Sua Magestade a Rainha a Senhora D. Amelia, ainda quando Princeza, fez aquella cidade, e a camara municipal d'esse tempo deu á rua principal da mesma terra, denominada o Chiado, o nome de rua da Princeza D. Amelia, e á primeira praça o nome de praça do Príncipe D. Carlos. (Apoiados.)

Isto é para mostrar a dedicação d'aquella cidade pelos nossos monarchas, dedicação justa e merecida, porque Suas Magestades, embora queiram a segurança do throno, querem ao mesmo tempo o bem da nacionalidade portugueza. (Apoiados de ambos lados da camara.)

Por essa occasião, em 1887, creio eu, em que recebemos tão honrosa visita, Elvas toda em festa, recebeu os Principes, de maneira que Suas Magestades não podem esquecer-se dos dias que passaram n'aquella cidade, assim como esta jamais esquecerá dias de tanta satisfação e de verdadeiro jubilo. (Apoiados.)

Eu sei que Sua Magestade a Rainha D. Amelia não esqueceu esses dias, e assim, Sua Magestade sabe tambem que de cada subdito elvense fez um servidor dedicado e fiel á dynastia. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - Um projecto d'esta ordem, sr. presidente, deve merecer a sympathia e o applauso de todos os membros d'esta casa (Apoiados de ambos lados.) e não póde, no meu conceito, deixar de ser approvado por unanimidade (Apoiados.) e é essa unanimidade - alem da urgencia que já pedi ao sr. presidente - que eu. peço a todos os membros do parlamento, pois certo estou eu de que todos seriam solicitados leias misericordias dos seus circulos para concorrerem para uma obra tão benemerente, como esta de salvar o sagrado patrimonio dos pobres, dos desgraçados, que o mesmo é dizer d'aquellas piedosas instituições, a que venho de referir-me, tão piedosas e tão santas, que convém por todos os modos livrar das garras aduncas da cobiça e da especulação. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Orador: - Vou terminar, sr. presidente, mas não o farei sem agradecer a v. exa. a sua benevola attenção, e a ambos os lados da camara a generosidade e benevolencia

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que por bizarria costumam dispensar sempre a todos e principalmente a este bisonho recruta da palavra.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado por ambos lados da camara.)

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa dois requerimentos pedindo varios esclarecimentos pelos ministerios da fazenda e das obras publicas.

São os seguintes:

Requerimentos

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja remettido a esta, camara, com a maior urgencia, uma nota das dividas do mesmo ministerio, a fornecedores e empreiteiros, referida a 28 de fevereiro ultimo. = Teixeira de Sousa.

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, me seja remettida, com a maior urgencia, uma nota nominal dos credores de divida fluctuante interna, referida a 31 de dezembro de 1898. = Teixeira de Sousa.

E já que estou com a palavra, não quero sentar-me sem me dirigir ao sr. ministro da fazenda.

A maneira descuidada e alegre por que o sr. ministro da fazenda, respondeu ao notavel parlamentar o sr. João Arroyo, quando este illustre caudilho do partido regenerador, com a sua superior eloquencia, poz em relevo a inanidade da obra do governo em frente da gravidade da nossa situação financeira, que ameaça levar-nos aos mais extremos perigos, fez com que eu pedisse a palavra, não porque julgue que possa modificar o modo de pensar e de sentir de s. exa. mas porque, para mim, o sr. ministro da fazenda é um peccador impenitente, e ainda porque não quero que o silencio da minha modestissima palavra possa ser invocado como cumplicidade na conservação d'esse governo, que eu reputo inteiramente nefacto para os interesses do paiz e a causa essencial dos nossos maiores males.

Eu não venho fallar do convenio, nem fazer ácerca d'elle perguntas ao governo, porque, sr. presidente, convenio, negociações, dia aprasado para a reunião de credores, tudo isso constitue uma verdadeira blague com que o governo quer entreter o espirito publico, com que o governo quer convencer o paiz, o parlamento e porventura alguem fóra do parlamento, do que a situação financeira não é gravissima, e de que o governo está fazendo alguma cousa no sentido de a melhorar, mas isto é falso. O governo não tem feito cousa nenhuma, não faz nada, absolutamente nada, para modificar a gravidade da nossa situação. (Muitos apoiados.)

Não venho, portanto, sr. presidente, fazer perguntas ácerca do convenio, mas não posso deixar de lastimar, que n'esta conjunctura gravissima para nós, conjunctura talvez a mais grave da nossa historia, a pasta da fazenda esteja entregue a um homem que não procede com a gravidade que devia proceder diante das difficuldades gravissimas que nos assoberbam, ora não fazendo nada para conjurar a crise financeira, ora, quando interrogado n'esta camara ácerca do que mais interessa á salvação publica, respondendo por uma fórma que mais parece zombar de quem o interroga, do que dar resposta precisa ás perguntas que lhe são feitas. (Apoiados.)

Não é este, não deve ser este o papel do ministro da fazenda n'uma occasião em que, de todos os lados, se levantam gritos afflictivos ácerca da nossa situação.

Nós temos visto, sr. presidente, que ha dois mezes, o sr. ministro da fazenda, dia a dia se levanta para fazer affirmações que brigam com a verdade dos factos, (Apoiados.) que não primam pela sua exactidão, parecendo esquecer assim o que deve ao seu paiz, a si proprio, ao parlamento, e o que deve á seriedade e dignidade do papel, que representa n'este momento. (Apoiados.)

Eu, sr. presidente, não quero fazer aggravo ao sr. ministro da fazenda; estou mesmo convencido de que s. exa., na sua vida particular, é incapaz de faltar á verdade, mas nós temos visto que, s. exa., querendo apresentar-se como ministro salvador, procura constantemente entrincheirar-se n'uma supposta conveniencia de reservas diplomaticas ou fazer affirmações, que brigam inteiramente com a verdade dos factos. (Apoiados.)

Pois o que vemos nós? Não vemos o sr. ministro da fazenda negar pela maneira mais formal que o comité dos oradores allemães exigiu uma commissão internacional para Portugal? (Apoiados.) Não vimos o sr. ministro da fazenda negar isto uma, duas, tres, quatro vezes? Pois, sr. presidente, este facto é absolutamente verdadeiro. (Apoiados.)

Não vimos o sr. ministro da fazenda negar insistentemente que se tivesse offerecido o acceitar uma commissão de estrangeiros, que a titulo de bureau no banco de Portugal, fiscalisasse a circulação fiduciaria e a entrada e saída dos fundos destinados ao pagamento da divida externa? Pois eu, respondo por esta affirmação, declaro que o facto é absolutamente exacto. (Apoiados.)

Não ouvimos nós o sr. ministro da fazenda dizer aqui que havia recebido a ultima adhesão dos credores para uma reunião em Paris, a qual teria logar em fevereiro, reunião em que s. exa. dizia que esperava chegar a um accordo com os credores estrangeiros? Pois, sr. presidente, a verdade é que esses credores ainda não foram convocados. (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda quer que nós tenhamos confiança nas suas affirmações, quando responde pela maneira como tem respondido aos deputados d'este lado da camara, e como respondeu ao meu illustre amigo o sr. Arroyo?! (Apoiados.)

Pois não ouvimos nós o sr. ministro da fazenda negar insistentemente que o governo tivesse empenhado notas do banco de Portugal para conseguir a reforma de um debito no estrangeiro? Não o ouviu v. exa. negar isto uma e muitas vezes? Pois este facto é perfeitamente verdadeiro. (Apoiados.)

Quando ha poucos dias, n'uma assembléa geral do banco de Portugal, o meu illustre amigo sr. Luciano Monteiro accusava a administração d'aquelle banco de ter interferido n'uma operação em que se empenhavam notas do banco de Portugal, taxando este facto de vergonhoso e de humilhante; quando s. exa. fazia esta accusação, quer v. exa. saber como respondia o governador do banco, do nosso principal estabelecimento de credito, do banco do estado, que tem uma alta situação na politica? Respondia que o facto era verdadeiro, que se tinham empenhado 1 :300 contos de réis de notas do banco, mas que a humilhação não era para o banco, mas para o governo. (Apoiados.)

O sr. Luciano Monteiro: - V. exa. dá-me licença para um accrescentamento?

A esse proposito, continuou o governador do banco dizendo que effectivamente se tinha feito um empenho de notas, mas que o banco não tinha responsabilidade nenhuma, porque o governo era senhor do saldo que tinha da sua conta corrente, podia fazer d'elle o que quizesse, constituir d'esse saldo um penhor.

E, perguntando eu, como se escripturou essa operação, o governador respondeu-me, que não se escripturou cousa nenhuma. (Vozes: - Ouçam, ouçam).

De fórma que no Diario do governo e por ordem emanada do sr. Espregueira, continúa a figurar como saldo uma quota que estava começada a liquidar por uma conta de penhor.

O Orador: - Veja v. exa., sr. presidente, a verdade

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com que o sr. ministro da fazenda ainda ha poucos dias negava absolutamente este facto. (Apoiados.)

Mas não ficâmos por aqui.

Ainda não ha meia duzia de dias que o sr. ministro da fazenda se levantava, e respondendo n'um tom verdadeiramente desusado a um deputado, que tem uma alta situação politica, e que nunca se dirigiu a nenhum ministro que não fosse com a mais extremada correcção, o sr. Dias Ferreira, dizia - eu tenho prestado enormissimos serviços ao meu paiz, o primeiro foi reduzir a divida fluctuante externa, e o segundo, que é evidente, foi fazer com que a situação da fazenda publica melhorasse notavelmente.

Sr. presidente, se eu não tivesse um grande respeito pelas conveniencias parlamentares, diria que affirmações d'esta ordem, quando nós nos encontrâmos em uma situação angustiosissima, não podem deixar de considerar-se imprudentes.

S. exa., da mesma maneira por que fazia affirmações, menos exactas, pela sua palavra, á camara, fazia-as igualmente menos exactas ao paiz, por intermedio do Diario do governo.

O sr. ministro da fazenda, longe de haver diminuido a divida fluctuante externa, augmentou-a enormemente, como eu lhe demonstrarei quando s. exa. o quizer.

V. exa. sabe que está dado para ordem do dia um caso que se prende com a venda da prata, de que o sr. ministro de fazenda se serviu para apresentar uma reducção na divida fluctuante, mas nem assim mesmo a reduziu. E desafio a s. exa. a que prove o contrario.

S. exa. reduziu no papel cerca de 500 contos de réis, mas só 800 deu a prata vendida.

Não ficâmos, porém, por aqui, sr. presidente. Em 7 de novembro o sr. ministro da fazenda contrahiu um supprimento de 100:000 libras, hypothecando o rendimento dos phosphoros e não o escripturou como divida fluctuante externa.

Mas a affirmação de que a situação da fazenda publica tinha melhorado, essa é que é absolutamente infundada.

Se eu não tivesse por v. exa. e pela camara um grande respeito, diria que a impressão que uma tal affirmação produz, é a do exercicio de um charlanatismo financeiro condemnavel.

A situação da fazenda publica, longe de ter melhorado, tem-se aggravado enormemente, como eu vou demonstrar, singelamente, e com algarismos de tal ordem verdadeiros, que desafio o sr. ministro da fazenda a que seja capaz de affirmar que ha n'elles a mais pequena inexactidão.

Não vou referir-me á nota da divida fluctuante, nem entro com ella em linha de conta pela simples e unica rasão de que não me merece absoluta confiança. Entretanto, nada mais simples para se apurar o estado da fazenda publica do que saber-se que o sr. ministro da fazenda consumiu toda a receita do thesouro. Vamos agora ver o que consumiu mais, pedido ao credito.

E pelo que vou dizer, v. exa. verá emquanto tem o sr. ministro da fazenda desequilibrado a fazenda publica.

Um orçamento, com o deficit annual de 12:000 contos de réis, não representa melhoria da fazenda publica, mas a nossa completa ruina.

Ha meia duzia de dias publicou-se o relatorio do banco de Portugal, e por esse relatorio vê-se o seguinte:

Em 6 de fevereiro de 1897, no dia em que o actual governo subiu ao poder, a divida do thesouro ao banco de Portugal era representada por 39:790 contos de réis, e no dia 31 de dezembro de 1898 essa divida representava-se por 54:077 contos de réis, o que revela um augmento de 14:287 contos de réis.

N'este periodo, portanto, de vinte e cinco mezes, a divida do thesouro ao banco de Portugal augmentou 14:287 contos de réis, mas em março de 1897 o governo vendeu titulos e na importancia que eu vou indicar á camara.

Leu.

Quer dizer, n'esta altura, pelo augmento do debito ao banco de Portugal e pelo apurado de titulos da divida publica vendidos ha um desequilibrio até 31 de dezembro de 17:641 contos de réis.

Mas não fica ainda aqui. Pelo contrato de 20 de março de 1898 com o Anglo Foreing Banking, que se refere ás obrigações dos caminhos de ferro, o governo obteve, ao cambio do dia, 4:160 contos de réis.

(Leu.)

Eu me explico. O supprimento foi de 450 contos de réis, mas em 31 de dezembro já a sociedade Torlades & C.ª tinha vendido o seguinte:

(Leu.)

Pelo que venho expondo já vimos que ha um desequilibrio de 23:889 contos de réis, mas como em novembro e dezembro, no banco Lisboa & Açores, por onde se fez o serviço do emprestimo dos fosforos, entraram duas prestações, sendo uma de 23 contos de réis, a fazenda publica foi desequilibrada, desde 6 de fevereiro de 1897 até 31 de dezembro de 1898, em 23:943 contos de réis, isto é, vinte e tres mezes incompletos de gerencia do actual governo, com um deficit annual de 12:000 contos de réis.

Ora, diga-me a camara se a fazenda publica está ou não arruinada, (Apoiados.) se é ou não é o exercicio de um charlatanismo financeiro condemnavel, vir affirmar á camara e ao paiz que a situação da fazenda publica tem melhorado, e isto quando as ambições externas se estendem sobre o nosso dominio colonial, quando a força do direito está sendo substituida pelo direito da força, quando a rasão e a justiça estão sendo sacrificadas á votade omnipotente dos senhores de grandes exercitos e de grandes esquadras, quando a historia nos mostra que as nações cheias de actos de humanidade e civilisação, são sempre esmagadas sob o poderio dos senhores dos grandes exercitos.

A nossa situação é tão difficil, que um simples descuido que em qualquer occasião não poderia produzir effeitos apreciaveis, póde n'este momento ser a determinante da nossa ruina e da nossa morte. E por ser assim, é que eu não posso deixar de dizer que é sobremaneira condemnavel que, em vez de se dizer ao paiz que é grave a sisituação da fazenda publica, para que todos nós nos possamos congregar em volta da bandeira nacional a fim de poder conjurar os muitos perigos que corremos, o sr. ministro da fazenda, ora se metta no caminho das evasivas, ora nos venha dizer, com um optimismo que parece doentio, que a fazenda publica tem melhorado.

Tenho concluido.

Vozes: - Muito bem.

O orador foi muito cumprimentado.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. ministro da fazenda, mas devo prevenir s. exa. de que faltam apenas cinco minutos para se passar á ordem do dia.

Vozes: - Falle, falle.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma proposta de lei, que é um additamento a outra que apresentei ha dias e que se refere ás habilitações dos credores do estado por quantias provenientes de legados ou heranças inferiores a 500$000 réis.

Peço a v. exa. que se digne mandar esta proposta á commissão respectiva, para que possa ser considerada conjunctamente com a outra ha dias apresentada.

Eu, realmente, pouco tenho que responder ao que disse o illustre deputado o sr. Teixeira de Sousa.

S. exa., sem necessidade nenhuma, e sem a menor prevenção, veiu misturar questões completamente estranhas; fallou do convenio, para logo em seguida declarar que nada perguntava sobre o assumpto. Evidentemente o que quiz foi fazer um discurso politico.

Fallou s. exa. das notas, do banco de Portugal, des pagamentos de despezas anteriores é minha gerencia, pois

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remontou até 1897, e por fim disse que o ministro da fazenda era optimista, que não dizia a verdade ao paiz e fazia affirmações gratuitas. Affirmações gratuitas fel-as o illustre deputado, procurando não esclarecer, mas enredar todas as questões, irritando o debate e produzindo uma impressão, talvez passadeira, n'aquelles que não conhecem bem estes assumptos, e que prova qual o auxilio, a cooperação que ha a esperar da parte de s. exas. para a solução da questão de fazenda.

S. exa. até me accusou de eu errar as contas que são publicadas no Diario do governo, quando é a direcção geral da thesouraria que as escriptura, e as do banco de Portugal, que são hoje escripturadas pela mesma fórma por que o eram antigamente.

Mas a que proposito veiu esta aggressão do illustre deputado?

Eu não vejo nenhum interesse em fallar nos assumptos a que s. exa. se referiu, principalmente nos que dizem respeito ao contrato para o supprimento dos phosphoros, que eu já expliquei á camara o que foi, e o que se fez com o Credit Lyonnais, porque quando se discutir a questão de fazenda, é que será occasião propria para isso, e então, se s. exa. quizer, lhe serão dadas todas as explicações.

O que eu não comprehendo, repito, é que, no fim do tempo marcado para antes da ordem do dia, se venha fazer um discurso tão vasto, tão politico, tão aggressivo.

Acredite s. exa. que com isso não melhora a situação da fazenda publica, e que, pelo contrario, apenas mostra que a opposição só tem em vista provocar escandalos, (Apoiados.) e não, de modo algum, contribuir para se melhorar a situação da fazenda publica, porque s. exa., com os os seus discursos inconvenientissimos, concorrem mais do que ninguem para o descredito do paiz. (Apoiados.)

Permitta-me a camara que eu não diga mais nada sobre o assumpto. Eu não faço affirmações gratuitas, (Apoiados.) Tenho o direito de pedir á camara que me attenda e ouça, e principalmente á opposição que deixe essas aggressões, que tendem mais a ser pessoaes do que politicas, porque se realmente pensam que o estado da fazenda publica é grave, o dever que sobre s. exas. impende é o de serem mais comedidos nas suas expressões.

O seu procedimento actual produz a discordia e não a concordia que s. exa. apregoam e dizem que desejam e é necessaria para a solução do nosso problema financeiro.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Antonio Cabral: - Mando para a mesa o parecer da commissão de legislação civil sobre a proposta de lei n.° 3-F, que estabelece a assistencia judiciaria civil.

Foi a imprimir.

O sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa a seguinte

Participação

Tenho a honra de participar a v. exa. que se acha constituida a commissão de redacção, tendo sido nomeado presidente o sr. João Pinto dos Santos e secretario o sr. Tavares Festas. = O deputado, Alexandre Cabral.

Para a acta.

O sr. Presidente: - O parecer vae a imprimir e o requerimento vae ser expedido, com urgencia.

Os srs. deputados que tenham papeis a mandar para a mesa podem fazel-o.

O sr. Ressano Garcia: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta de lei n.° 3-N, relativa ao praso dos editos das habilitações administrativas para averbamento de titulos de divida publica, de que tratam a carta de lei de 5 de agosto de 1854 e o artigo 38.° do regulamento da junta do credito publico de 2 de outubro de 1896.

Mando tambem para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados a esta camara, com urgencia, os seguintes documentos:

1.° Contrato de 19 de novembro de 1896 relativo á emissão e collocação de 40:000 obrigações da segunda serie do emprestimo dos tabacos;

2.° Obrigação geral dada aos tomadores d'esse emprestimo em 20 de novembro de 1896;

3.° Portaria de 19 de novembro de 1896 á companhia dos tabacos sobre o mesmo assumpto. = Frederico Ressano Garcia, deputado da nação.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados, com urgencia, a esta camara, os seguintes documentos:

Correspondencia trocada entre o sr. engenheiro chefe do serviço do Douro e Leixões e a empreza industrial portugueza a respeito do concerto de avarias soffridas em 1892 pelo Titan do molhe do norte de Leixões. = Marianno de Carvalho.

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados, com urgencia, a esta camara, os seguintes esclarecimentos: nota dos fornecimentos feitos nos caminhos de ferro do Minho e Douro e particularmente ás suas officinas no anno de 1898, indicando-se de quaes estejam já liquidadas as importancias e quaes tenham sido pagas e quaes as não tenham ainda sido. = Marianno de Carvalho.

Mandaram-se expedir

ORDEM DO DIA

Interpellação do sr. João Franco ao sr. ministro da fazenda ácerca da questão da prata

O sr. Teixeira de Sousa: - Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: - É ácerca da interpellação?

O sr. Teixeira de Sousa: - Sim, senhor.

O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se quer que se generalise a discussão do assumpto da interpellação do sr. João Franco ao sr. ministro da fazenda, e dado para a ordem do dia. = Teixeira de Sousa.

Consultada a camara, deliberou affirmativamente.

O sr. João Franco: - Sr. presidente, a camara acaba de ouvir ao sr. ministro da fazenda a declaração de que a opposição regeneradora o que procura n'esta casa, é fazer escandalos parlamentares!

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Apoiado.

O Orador: - Custa muito menos dar um apoiado, do que apresentar um facto demonstrativo d'essa asserção. (Apoiados.)

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Peço a palavra.

O Orador: - Esta camara está aberta desde o principio de janeiro, e v. exa., que tão digna e levantadamente tem presidido aos seus trabalhos, póde bem dizer se já teve de interromper alguma sessão ou de alterar a ordem dos trabalhos parlamentares em qualquer sessão, por virtude de qualquer escandalo ou de qualquer irregularidade praticada por este lado da camara.

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Se ha annos em que os trabalhos parlamentares da camara dos senhores deputados têem corrido com toda a regularidade e ordem, é incontestavelmente este anno que vae correndo, e, portanto, o sr. ministro da fazenda mal aconselhado andou quando, poucos minutos antes de se vir abrir uma discussão da importancia e gravidade d'aquella que se iniciou agora, julgou de bom tino e de bom tacto dirigir á opposição uma accusação tão infundada e desagradavel.

Eu não sei, sr. presidente, quem é que commette escandalos, mas se a camara quizer seguir com attenção a discussão que se vae abrir, poderá dizer no fim d'ella, mettendo a mão na sua consciencia e esquecendo a sua politica, se é a opposição quem commette escandalos, ou se, pelo contrario, elles são praticados pelo governo; e quem é que pratica actos que não só apressam a ruina da nação, mas que, quando conhecidos, quer no paiz, quer lá fóra, não poderão deixar de produzir a impressão triste e desgraçada de que não queremos ou não sabemos administrar-nos. (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda devia ser mais cauteloso em fazer affirmações d'esta natureza.

Foi devido exactamente a um mau movimento de inspiração, como este que acabou de ter, que s. exa. deve o ter vindo, mais depressa do que era sua vontade, ao conhecimento do parlamento e da nação este caso triste da liquidação do negocio da prata, (Apoiados.) porque, dirigindo-se a um parlamentar tão antigo e illustre, como é o sr. conselheiro Dias Ferreira, que já foi presidente do conselho, e que, pelo seu passado parlamentar, devia merecer o respeito, a consideração e a confiança de que era incapaz do commetter qualquer inconveniencia, ou prejudicar com as suas palavras os interesses do paiz, que já administrou superiormente, (Apoiados.) o sr. ministro da fazenda e provocou, dizendo-lhe que as palavras que elle tinha proferido eram inconvenientissimas, e que, conhecidas lá fóra, haviam de necessariamente prejudicar alta e poderosamente o credito do paiz, accrescentando que isto se fazia precisamente no momento em que as cousas melhoravam e em que a divida fluctuante externa, no fim de dezembro, tinha diminuido.

Foi em seguida a essa affirmação de s. exa. que um deputado se levantou para mostrar que a divida fluctuante externa não tinha tal diminuido e que o que se tinha feito era recorrer a uma verdadeira artimanha para conseguir uma diminuição simplesmente apparente, (Apoiados.) vindo o sr. ministro da fazenda gabar-se e honrar-se por ter praticado actos e realisado beneficios que, de fórma alguma, representavam uma melhoria na situação da fazenda publica, visto que só era real e verdadeiro que essa diminuição na divida fluctuante externa se tinha produzido á custa das receitas e dos rendimentos proprios do thesouro, pela alienação de titulos ou valores que, na posse d'elles, representavam um capital, e por fórma alguma um rendimento. (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda arrependeu-se certamente da sua imprudencia, das palavras que dirigiu ao sr. Dias Ferreira, e essa gloriola com que se tinha querido adornar e levantar os seus feitos como ministro da fazenda, a breve trecho era transmudada n'uma revelação que era verdadeiramente uma surpreza para todos os lados da camara, acarretando comsigo a necessidade de mandar os documentos que até ali o sr. ministro da fazenda, cuidadosa e intencionalmente occultára, e que nos permittem poder analysar agora esta questão da prata e ver o que são os negocios que este governo fez, e no que elle concorreu para a melhoria ou ruina da administração publica, o que foi e o que é, emfim, essa decantada diminuição da divida fluctuante conseguida pelo sr. ministro da fazenda. (Apoiados.)

Não desejo que nenhuma das minhas affirmações deixe de ser seguida da exposição dos factos e das circumstancias em que se baseia. Eu disse que o sr. ministro da fazenda occultava, calculada e propositadamente, os documentos sobre a questão da prata, porque pouco tempo antes do sr. conde de Burnay ter dito qual o destino que havia tido a prata comprada primitivamente á sua casa, e qual a maneira verdadeiramente estranhavel e singular por que o sr. ministro conseguira diminuir a divida fluctuante, um digno par pediu, na outra casa do parlamento, documentos relativos á questão da prata, e pediu, não só copia do contrato realisado, mas nota da applicação que se tinha dado á prata comprada, e não lhe foram enviados todos os documentos, os que se referiam á venda da prata comprada pela casa Burnay.

Porque é que o governo não mandou os documentos que lhe foram pedidos? Porque mandou outros e não aquelles que indicavam a applicação e destino que a prata teve?

Não era obrigação do sr. ministro da fazenda, se queria fallar a verdade aos representantes da nação, e, por consequencia, ao paiz, mandar, não os documentos que enviou, mas os documentos finaes, aquelles que, effectivamente, demonstrassem qual a applicação e o destino que teve a prata comprada pela casa Burnay?!

Pois esses não se enviaram, e se não fosse a declaração aqui feita por um sr. deputado, que d'este facto teve conhecimento, não por actos de origem parlamentar, mas extra-parlamentares, ainda hoje o paiz desconhecia como isto se tinha feito.

Tratar d'estes negocios é, sr. presidente, segundo a phrase do sr. ministro da fazenda, fazer escandalo parlamentar!

Se aqui ha algum escandalo não é parlamentar, nem feito no parlamento, é feito no ministerio da fazenda.

É d'esta maneira, negando documentos, e occultando a fórma por que os negocios correm, que o sr. ministro da fazenda quer concitar todas as boas vontades, todas as energias e todos os esforços em favor da questão de fazenda, que é gravissima?!

Pois póde alguem collaborar com outro sobre negocios que não só ignora, mas cujos detalhes lhe são propositadamente occultados?!

Affirmações da natureza das que o sr. ministro da fazenda acaba de fazer não se fazem, (Apoiados.) ou se se fazem é necessario fazel-as acompanhar de provas sufficientes e bastantes, porque não só isso é uma obrigação que impende sobre qualquer dos membros d'esta camara, mas muito mais sobre os membros do governo, que devem procurar conduzir-se por maneira que possam dar explicações sinceras, francas, claras, completas e precisas, e nunca possam irritar a discussão parlamentar com interjeições e com palavras que podem mais facilmente ser desculpadas quando partam da opposição que do governo. (Apoiados.)

Quem é que pratica actos inconvenientes para o credito do paiz, e os actos valem mais do que as palavras, res non verba, segundo a phrase latina, é a opposição ou o governo?

Nos contratos que vamos analysar, o que é que lança, não só no paiz, mas no estrangeiro, um pregão de descredito contra a nossa administração, são as palavras dos deputados da opposição, ou são os actos do governo?! (Apoiados.)

É o que vamos analysar.

Quem é que falla verdade ao paiz, são os deputados da opposição que affirmam que as circumstancias do thesouro são cada vez mais calamitosas e desesperadas, ou é o sr ministro da fazenda dizendo que a melhoria da situação financeira se tem accentuado consideravelmente nos ultimos tempos, que tudo caminha pelo melhor o que elle não desespera, porque as circumstancias o aconselham a ter esperança e não a perdel-a?

Os documentos que tenho aqui nos darão uma resposta

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completa e precisa. Elles valem mais do que as minhas palavras ou do que as palavras do sr. ministro da fazenda, porque qualquer de nós póde ser suspeito de paixão politica. Os documentos, na sua imparcialidade absoluta e irrefragavel, é que não soffrem accusações d´esta natureza. (Apoiados.)

O que é a questão da prata? Nos seus termos mais precisos é o seguinte. O actual governo, porque o governo presidido pelo sr. José Luciano é um só, (Apoiados.)

podem ter mudado alguns dos figurantes, mas o chefe é o mesmo, as maiorias que o acompanham são do mesmo partido, e, portanto, a situação politica é perfeitamente definida nas mesmas condições, (Apoiados.) fez dois contratos da prata, um em fevereiro de 1897 e o outro em outubro de 1898.

No primeiro, o governo comprou prata, que nunca recebeu, nem viu, nem nunca teve em seu poder, (Apoiados.) e depois vendeu-a a quem a tinha comprado, resultando para o thesouro um prejuizo de 662 contos. (Apoiados.)

Quem é que pratica actos inconvenientes e que concorre para a ruina do paiz? (Apoiados.) Então isto pratica-se, quando o thesouro não vive desafogado? (Apoiados.)

O sr. Vilhegas do Casal: - Venham as provas.

O Orador: - O illustre deputado tem a bondade de me acompanhar até ao fim e depois fará o seu juizo. (Apoiados.)

O sr. Vilhegas do Casal: - Os comentarios são para depois.

O Orador: - Eu faço as affirmações e depois vou dar as demonstrações. (Apoiados.)

A outra questão da prata é a compra realisada já pelo actual ministro da fazenda, quando ainda tinha a primeira prata comprada em 20 de fevereiro de 1897, e comprada por preço mais alto do que aquelle por que vendeu a que já possuia, em circumstancias taes que d'esta operação resultou tambem para o thesouro um prejuizo de 120 contos de réis. Quer dizer a questão da prata, sob o ponto de vista do thesouro, affirma-se pela seguinte fórma: um prejuizo net, completo, irremediavel de 782 contos de réis para o thesouro portuguez. (Apoiados.)

Eu lerei logo os detalhes das minhas contas.

O sr. Ressano Garcia: - De quanto diz v. exa. que foi o prejuizo?

O Orador: - De 782 contos de réis. Eu fallo para a camara e para quem me ouve, e desejo que esta questão fique tratada, por parte da opposição, com clareza e precisão, afim de que possam haver votos contrarios, mas não possam haver duvidas sobre ella. (Apoiados.)

Dizia eu que a questão da prata consiste n'estes dois contratos, e na venda da primeira prata comprada ao mesmo que a tinha vendido, feita pelo sr. ministro da fazenda, a fim de poder diminuir na divida fluctuante uma importancia de letras, que não se venciam senão em 20 de fevereiro de 1899, e dando como realisada e liquidada até 31 de dezembro uma operação, que ainda se estava tratando, e escripturando no 1.° de janeiro d´este anno. (Apoiados.)

Esta é que é a questão da prata. Vamos a ver se a puz nitida, clara e precisamente, e se o que eu disse se tira e deduz dos documentos, que foram mandados á camara.

Em 20 de fevereiro de 1897 realisava-se o primeiro contrato da compra de prata feito pelo governo portuguez, compra na importancia de 1.350:000 onças, que ao preço de 38 pences davam 1:386 contos de réis, numeros redondos. N'esse mesmo contrato estipulou-se que o governo não recebia a prata e que o vendedor ficava auctorisado a poder servir-se d'ella como de caução, sob sua responsabilidade, a uma futura transacção; e estipulava-se mais que a prata seria paga, dentro de um certo praso, em especie, ou em titulos da divida interna de 3 por cento, calculados dois pontos abaixo da cotação.

Quatro dias depois de realisado este contrato o vendedor perguntava ao governo qual o meio porque queria pagar a prata, e o governo respondia que por meio da venda de inscripções.

Foram vendidas inscripções no valor nominal de réis 4.207:850$000, mas os dois pontos a menos da cotação davam uma perca de 84:157$000 réis.

Depois, durante muito tempo, nem o governo pediu a prata, nem com a casa vendedora se trocaram sobre esse assumpto quaesquer pontos de vista ou se fizeram quaesquer exigencias para a entrega, da prata, até que entrando no ministerio, como ministro da fazenda, o sr. Espregueira, perguntou-se á casa vendedora se ella estava disposta a entregar a prata ao governo substituindo-a na caução a que ella estava destinada por titulos da divida interna fundada de 3 por cento, com uma cotação que consta tambem dos documentos publicados no Diario do governo.

Em seguida, tendo-se perguntado em 29 de setembro de 1898, se em vista da exposição feita, o vendedor estava disposto a entregar a prata nas condições estabelecidas n'essa exposição, antes de se receber resposta, pelo menos não consta dos documentos que a houvesse, o governo comprou, por intermedio de outra casa, uma porção igual de prata, ou seja 1.350:000 onças, pelos preços que constam das facturas que estão publicadas no Diario do governo.

Em 5 de dezembro de 1898, o mesmo ministro da fazenda, sr. Espregueira, perguntava á casa com a qual se fizera o primeiro contrato, se ella estava disposta a entregar a prata ao governo, substituindo a sua caução por titulos.

Isto foi em 5 de dezembro de 1898. Ora convindo ao governo, n'esta data, entrar desde logo na posse d'essa prata, dias depois, em 13 do mesmo mez, já convinha ao sr. ministro da fazenda vendel-a á mesma casa a que a tinha comprado.

Effectivamente vendeu-se a primeira porção de prata para pagamento de uma letra de divida fluctuante externa, que a mesma casa tinha contra o thesouro e, a breve trecho, em 30 de dezembro, vendia-se o resto das 1.350:000 onças da prata comprada por meio do contrato de 20 de fevereiro de 1897.

Estes são os factos. Vejamos agora como é que as contas, que eu tive a honra de enunciar nos seus resultados á camara, se detalham por maneira a justificar esses resultados.

A prata foi comprada por 1:386 contos, como consta do documento n.° 4 publicado no Diario do governo, e foi vendida por 989 contos. Tal é a importancia da prata vendida em 13 e 30 de dezembro, reduzidas as libras e francos a réis, ao cambio de 37, que tinha sido o cambio marcado no contrato de 20 de fevereiro?

Tendo o governo, portanto, comprado por 1:386 contos e vendido por 989, perdeu 397 contos.

Alem d'isso, como já tive occasião de observar, tendo pago a prata, não em moeda, mas em inscripções, na importancia de 4:210 contos nominaes, com dois pontos abaixo da cotação, esses dois pontos representam tambem uma perda para o thesouro de 84:157$000 réis.

Em seguida, como esta prata não foi recebida pelo governo, nem nunca lhe serviu para nada, não obstante dever ser, como se vê do contrato de 1891 em que se quer filiar o de 20 de fevereiro de 1897, destinada a reforçar as reservas do banco, porque a verdade, porém, é que nunca ninguem a viu o que se lhe póde applicar o caso da madame Benoiton, de quem se falla em toda a peça, mas que nunca ninguem a vê, que nunca está em casa quando é procurada e que nunca acompanha a familia a visitas, essa prata, digo, que ao estado nunca serviu para nada, custou mais 176 contos, que taes são os juros, com a diminuição de 30 % que o estado teve de pagar durante dois annos

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pelas inscripções na importancia de 4:207 contos, que foram logo vendidas em fevereiro á casa com quem contratou para pagamento da prata.

Essas inscripções foram lançadas no mercado e o governo d'ahi por diante teve de pagar os seus juros, o que representa mais uma parcella ajuntar ao prejuizo soffrido pelo estado, visto que o estado não tinha que pagar juros senão houvesse feito o contrato de 1897 e comprado prata que para nada lhe serviu, tendo de a vender com um prejuizo de 398 contos.

Em seguida, como as letras a que a prata estava servindo de caução, eram letras a tres mezes, que tinham sido reformadas em 20 de novembro e tinham vencimento em 20 de fevereiro, tendo-se em 20 de novembro feito o pagamento ou desconto a que eram sujeitas de 6 1/2 por cento, como o comprador da prata em dezembro apenas lançara á conta do governo 2 0/0 em vez de 6 1/2, ha mais a perda de 4 1/2, durante o praso decorrido de 1 de janeiro a 20 de fevereiro, o que representa 3:728$000 réis.

Sommando, portanto, todas estas verbas que eu acabo de detalhar, vê-se que esta operação deu para o thesouro uma perda perfeitamente irremediavel de 662 contos de réis. (Apoiados.)

Pergunto agora a v. exa. e á camara o que será mais inconveniente, as palavras dos deputados da opposição proferidas n'esta camara, embora sejam conhecidas no estrangeiro, ou estes factos que representam a maneira como se administra em Portugal? (Apoiados.}

Qual é a maneira de inspirar confiança? É estar todos os dias a occultar propositadamente a verdade e a proceder de maneira que tenham de publicar-se no Diario do governo documentos de que se tirem illações, como aquellas que eu tenho estado a tirar? (Apoiados.) Contra factos não ha argumentos. Diz o proverbio francez que não ha nada mais brutal que os factos. A rasões oppõe-se rasões, a factos não; contra estes não ha cousa alguma, porque se impõem por si mesmo, dominam pela sua força material. (Apoiados.)

Póde alguem negar que em fevereiro de 1897, quando a prata estava cotada a 29 3/4, o governo a comprava a 38 pelo preço de 1:386 contos, e em dezembro de 1898, menos de dois annos passados, vendia essa mesma prata a 27,25 pelo preço de 998 contos, perdendo assim 387 contos, n'uma prata que não tinha necessidade de comprar, porque nunca a recebeu, e a que não quiz dar emprego? (Apoiados.)

Haverá maneira de negar perante o estrangeiro que se pagou com inscripções, dois pontos abaixo da cotação, o que representa tambem um prejuizo, que é necessario juntar á differença entre a compra e a venda da prata? (Apoiados.) Póde alguem negar que o governo não utilisou essa prata e longe de reforçar com ella as reservas do banco de Portugal, foi vendel-a sem que nunca a tivesse recebido? (Apoiados.)

Póde alguem negar que os juros d'essas inscripções foram dinheiro perdido para o thesouro e que elle pagou sem d'ahi tirar vantagens nem lucros para o estado? (Apoiados.)

Se estes factos não poderem ser contraprovados por outros, que não por palavras, este contrato, ámanhã conhecido no estrangeiro, será o dobro funebre sobre a nossa situação perante os credores externos. (Apoiados.)

Quem terá a coragem, depois d'isto, de ir ao estrangeiro pedir dinheiro para o governo portuguez que assim se administra? (Apoiados.) Póde alguem estar a fazer economias no estrangeiro para as confiar a quem é por tal fórma prodigo e inepto? (Apoiados.)

Cada um de nós póde usar das palavras que quizer e entender nas questões parlamentares tomando a responsabilidade d'ellas, mas quando se está em presença de factos resultantes claramente de documentos emanados do proprio governo, como são aquelles a que me estou referindo, não ha que oppor senão factos a factos, ou mostrar que as illações que d'elles se tiram não estão em harmonia com a verdade, nem com os documentos publicados.

Emquanto isso não se fizer, o sr. ministro da fazenda póde accusar a opposição de querer fazer escandalos parlamentares, que eu responderei que s. exa. faz escandalos administrativos, que são bem peiores. (Apoiados.) Poderá s. exa. dizer que nós proferimos palavras inconvenientissimas para o credito do paiz, que eu responderei que quem pratica actos altamente inconvenientes, não só para o credito do paiz, mas até para o seu proprio credito, é s. exa. (Apoiados.) Poderá ainda s. exa. accusar-nos de não nos reunirmos em volta do governo para nos congregarmos todos para a solução de uma questão tão grave e importante como esta, que a isso respondemos que estamos promptos a congregar-nos e a contribuirmos com o nosso esforço, se nos provar sinceramente que quer melhorar a situação da fazenda publica. Agora, o que de fórma alguma podemos consentir, quer com a nossa annuncia, quer com o nosso silencio, é a que se pratiquem actos d'esta natureza.

A historia da prata, sr. presidente, está ainda em meio, mas já é sufficiente. O sr. ministro da fazenda, invejando as glorias colhidas pelo seu antecessor, quiz fazer mais e melhor do que elle, e conseguiu-o.

O seu antecessor fez um contrato ruinoso, e o sr. ministro da fazenda fez um contrato inutil por todas as rasões e por todos os motivos. (Apoiados.)

Bem ou mal comprada, o governo tinha adquirido em 20 de fevereiro de 1897, 1.350:000 onças de prata que não tinha pago, mas se é certo, sr. presidente, que o governo precisava da prata e que encontrou dinheiro para a pagar a outra casa, porque é que com esse dinheiro não pagou a prata que primeiro comprára? (Apoiados.) Pois ha alguem que se illuda com este subterfugio de estar a propor a substituição da garantia por titulos da divida interna?

Tinha ou não tinha recursos, tinha ou não tinha necessidade de prata? Se se tinha recursos, para a comprar, pagasse ao negociador de 1897 a prata que lhe tinha sido vendida, e que elle não negava, nem podia negar.

Que é isso, sr. presidente, de estar a fazer operações em duplicado para pagar novas commissões e dar novos lucros e novas vantagens? (Apoiados.)

Sr. presidente, ninguem póde negar nem contestar, que o governo quando comprou a segunda somma de prata, na mesma quantidade e preço por que adquiriu a outra em fevereiro de 1897, tinha direito, desde que pagasse essa prata, a exigir a sua entrega da parte do negociador, e não ha documento algum que prove que elle oppozesse qualquer negação a restituir essa prata.

Mas com que foi comprada a prata á segunda casa contratadora?

Tenho em meu poder a relação mandada pelo ministerio da fazenda, relativa á alienação dos titulos, e pela simples leitura d'essa relação se vê, que não foi com elles que ella foi comprada; foi, portanto, com papel cambial, com oiro que se comprou.

Mas então, pergunto. - Se o governo tinha papel cambial, se tinha oiro com que pagou, por intermedio da segunda casa bancaria, a prata de que carecia, porque não exigiu em 20 de fevereiro a entrega da prata que já estava comprada, e em vez de fazer isso deu á casa negociadora 2 por cento de commissão? Assim, o sr. ministro da fazenda, comprou prata, que com as alcavalas, commissões e emfim todas as despezas que a oneram e sobrecarregam, representa para o governo o preço de 28 5/8 para pouco mais de um mez e meio depois ir vender a 27,25 a prata que tinha comprado, perdendo simplesmente n'esta operação 8:607 libras - isto é, perto de 70 contos de réis.

Qual foi a rasão de estado, qual foi o motivo de inte-

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resse publico que aconselhou o sr. ministro da fazenda a entregar o dinheiro com que comprou a prata á primeira casa bancaria, á segunda casa, pagando assim commissão em duplicado, inuteis e dispensaveis, e indo comprar a, 28 5/8, o que vendeu depois a 27 4/4, perdendo só n'esta differença 8:607 libras?

Não parou, porém, aqui o prejuizo. A prata foi praga ao cambio do dia, e fazendo-se a comparação, tomando-se um termo medio do cambio do dia, do mez de outubro, a partir do dia 10, até que se approxima a epocha do pagamento, vê-se que esse cambio, termo medio, é de 34 5/8.

Ora o cambio a que se tinha contratado a operação de 1897 era o cambio de 37, portanto, mais um prejuizo com que o thesouro carregou, qual é o que resulta, da differença de comprar prata mais cara e vendel-a mais barata.

O prejuizo que d'essa operação resultou, custando a prata comprada á segunda casa bancaria 1:108 contos de réis, e sendo vendida a que tinha comprado em fevereiro de 1897 á primeira casa por 988 contos de réis, foi de 120 contos de réis; prejuizo não só absolutamente dispensavel e desnecessario, mas inexplicavel (Apoiados.) em quanto o sr. ministro da fazenda não der á camara as rasões porque tendo prata não usou d'aquella que tinha e foi comprar uma outra por um preço mais caro. (Apoiados.)

Pouco me importa saber o que ella custou ou deixou de custar, comprada por qualquer intermediario, porque os intermediarios tratam dos seus negocios, o que me importa é a quantia que o thesouro pagou.

Todos os documentos publicados no Diario do governo, analysados friamente e comparados entre si denotam da parte do governo um procedimento que não quero classificar, para que o sr. ministro da fazenda não tenha motivo de defeza e de justificação, visto que não póde ter outro, em dizer que nós levantamos questões pessoaes ou nos dirigimos pessoalmente a s. exa.

Como deputado, tenho direito de perguntar ao sr. ministro da fazenda porque foi que em 5 de dezembro manda officiar á primeira casa bancaria que ao governo convinha receber a prata e em 13 lhe mandou outra vez officiar dizendo que lhe convinha vendel-a. (Apoiados.) Como é que se explica esta mudança tão radical de opinião, apenas no praso de oito dias?

Quaes são as rasões que podem explicar contradições d'esta natureza, em assumptos de negocios, como estes são? E, sr. presidente, para que foi a pressa em querer escripturar até 31 de dezembro, na nota da divida fluctuante externa, as letras que o thesouro de facto não recebeu senão em janeiro, e que não se venciam senão a 20 de fevereiro, que estavam caucionadas com a prata?!

Senão era pela impostura de fingir que tinha diminuido a divida fluctuante externa, ter depois ensejo de poder vir ao parlamento, como fez em resposta ao sr. conselheiro Dias Ferreira, gabar-se d'essa diminuição, para que é que o governo foi, sem vantagem absolutamente alguma para o thesouro, engrossar os lucros dos contratadores com mais esses bonus, que outra cousa não é pagar-lhe mez e meio adiantado, tendo já deixado 4 1/2 de juro pelas letras, que com elle tinha firmado até ao dia 20 de fevereiro, porque os contratadores, devido a essa impostura com que o sr. ministro entendeu dever confirmar os seus actos de homem publico, com aquella recommendação do seu livro de que era indispensavel muita publicidade e lisura nos documentos da a administração da fazenda publica, que já tinham recebido 6 1/2 por cento até 20 de fevereiro, só restituiram 2 por cento ficando com 4 1/2 por cento, obtendo assim um novo juro.

Que vantagens tirou o governo d'esta operação?

A vantagem de poder vir, no momento em que se convocavam os credores externos, em que se lhe enviavam circulares e as propostas de accordo concebidas pelo actual governo, dizer que as circumstancias do paiz tinham ficado tão favoraveis o que o ministro que estava á frente dos negocios publicos era um administrador tão habil que conseguira, em poucos mezes, diminuir a divida fluctuante externa, aquella que, pelo seu pagamento em oiro, mais importancia assume aos olhos de quem estuda a nossa situação financeira e economica. (Apoiados.)

Eu não sei se o governo irá ou não a essa reunião de credores. O sr. ministro da fazenda diz que sim, mas os factos demonstram palpavelmente que não.

Eu não quero oppor um desmentido às suas palavras, para que s. exa. não veja proposito pessoal de o aggravar, e não o proposito de não deixar que o paiz seja illudido com affirmações menos exactas.

Mas se for, o sr. ministro da fazenda, com estes diplomas, vae perfeitamente bem recommendado para combater os pedidos de administração estrangeira n'um paiz que não só se administra por esta fórma, mas que, quanto a lisura e verdade nos seus documentos officiaes, usa d'estes subterfugios para poder demonstrar que houve diminuição na divida fluctuante estorna, quando o que houve foi diminuição de capital. (Apoiados.)

Tanto este era o fim do sr. ministro da fazenda, tanto o sr. ministro da fazenda n'este momento grave se preoccupa com cousas minimas e ridiculas, que não foi só d'este subterfugio que lançou mão para fingir que diminuia a importancia da divida fluctuante externa.

Em 7 de novembro lavrou um contrato com a Banque de Paris et des Pays Bae e o banco Lisboa e Açores, para um supprimento de 100:000 libras. Este supprimento, que é contratado em libras, que é feito tres quartas partes pelos bancos estrangeiros, o que é pago em libras, comprando-se papel cambial ao cambio do dia, devia figurar, como qualquer outro supprimento da mesma natureza, na divida fluctuante externa, mas o sr. ministro, no documento que aqui temos, e que qualquer membro da camara poderá examinar, se quizer, e o sr. ministro contestará a verdade do que affirme, se for capaz, n´este documento em que vem relacionada a divida fluctuante entre 7 de fevereiro e 31 de dezembro não figura este contrato.

Mas não figura porque? Porque era inconveniente que se soubesse que a divida fluctuante externa tinha augmentado?

Ora, sr. presidente, o que é inconveniente é que ella augmente. (Apoiados.)

Tudo se sabe. É questão de tempo, como se viu com a questão da prata. (Apoiados.)

E quando o sr. ministro da fazenda outro dia tão garbosa e tão galhardamente se dirigia ao sr. Dias Ferreira, increpando-o pela inconveniencia das suas palavras e appellando para a confiança de todos, esquecia-se a pouco trecho de que este facto mostrava quem é que tinha direito a pedir a confiança e quem tem obrigação de negar-lh´a.

Aggrava ou não este supprimento a divida fluctuante externa, supprimento que até em Paris devia ser conhecido, porque tinha sido contratado com um dos estabelecimentos de lá? (Apoiados.)

O sr. ministro o que quiz foi lançar poeira nos olhos do publico, que outra cousa não era isto, fingindo que tinha desaggravado a divida fluctuante externa, quando, pelos documentos mandados a camara, se via que n'ella não figurava tudo aquillo que devia figurar.

Sr. presidente, é possivel que depois de tudo isto s. exa. fique ainda muito contente e satisfeito e muito convencido de que com s. exa. ao leme, como é vulgar dizer-se, a questão de fazenda vá melhorando dia a dia; que a questão dos credores se encaminha para uma solução agradavel para o paiz e que todas aquellas nuvens negras, que aos olhos dos menos perspicazes e menos pensadores se avolumam no horisonte do paiz, desappareçam; que nada d'isto existe, e que isto representa apenas processos de

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fazer politica e opposição a s. exa., miseravel e mesquinho, porque eu não conheço nada de mais miseravel e mesquinho, nas circumstancias actuaes, do que estar a carregar as cores da nossa situação financeira e internacional para simplesmente tirar d´ahi resultados politicos. (Apoiados.)

Eu digo isto muito intencionalmente, porque nunca o fiz. (Apoiados.)

Mandei para a mesa uma nota de interpellação ao governo para poder dizer tudo aquillo que entendo do meu dever dizer ao governo, e em circumstancias e em situação, como já tive occasião de dizer aqui uma vez, que todos os membros da maioria possam conhecer realmente qual é a situação que o paiz atravessa e que não a vejam atravez das palavras côr de rosa do sr. presidente do conselho, do sr. ministro da fazenda e do sr. ministro dos negocios estrangeiros. (Apoiados.)

Dizia eu que póde o sr. ministro da fazenda ir a essa reunião de credores, que vae bem diplomado. Com estes documentos publicados no Diario do governo, vae s. exa. bem preparado para poder responder que um paiz que se administra por fórma que compra prata sem a receber, perdendo n´isso 650 contos de réis, e que tendo prata comprada já n´estas circumstancias, vae comprar outra mais cara para a vender mais barata, para assim triplicar os beneficios pagos á custa d´esta operação, (Apoiados.) não precisa de tutella nem de curatella de ninguem; que não ha melhor collocação na Europa para as economias dos estrangeiros do que este rincão do occidente, do que este paiz, que se administra pela fórma como acabamos de ver. Apoiados.)

E quando lhe peçam uma commissão para poder fiscalisar e acompanhar os actos da nossa administração, elle poderá dizer que não é preciso, porque com estes documentos se vê com quanta lisura, imparcialidade o escrupulo publicamos tudo quanto diz respeito á situação da fazenda publica, e por tal fórma, que quando se affirma que a divida fluctuante desce é porque ella realmente desce á custa dos rendimentos do thesouro e não á custa dos capitaes que esse thesouro possue!

Sr. presidente, formulei uma pergunta ao sr. ministro da fazenda, e com ella concluo esta minha interpellação:

Qual foi o motivo por que o governo, possuindo prata com prada em 20 de fevereiro de 1897, em logar de se dirigir ao contratador para lhe entregar essa prata, foi compral a a outra casa mais cara, e em condições mais onerosas para o thesouro do que seriam se se tivesse dirigido á casa com quem primeiro contratou?

Depois de feita esta pergunta e de ouvir o sr. ministro da fazenda, eu usarei ou não, outra vez da palavra, conforme julgue mais conveniente, mas não precisarei talvez de o fazer, porque outros membros d´este lado da camara tomarão parte no debate, visto que é necessario que ella tenha o fim que deve ter, mostrar o que tem sido aadministração do actual governo e ver se effectivamente é o sr. ministro da fazenda quem tem o direito de accusar a opposição de provocar escandalos ou se, pelo contrario, a opposição que tem o direito de dizer ao sr. ministro da fazenda que s. exa. não tem auctoridade nem valor para gerir, n´este momento, os negocios publicos.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado.}

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Eu começarei, sr. presidente, por appellar para a camara, que em ultima instancia ha de julgar, não só á vista da aggressão e das allegações apresentadas pelo sr. João Franco, mas principalmente em relação á defeza, e ainda mais á explicação dos factos que s. exa. deixou no escuro, não digo propositadamente, mas que omittiu, não obstante elles serem essenciaes para o exame e esclarecimento d´esta questão. (Apoiados.}

Eu não volto ao assumpto a que s. exa. se referiu no principio do seu discurso, não quero seguir esse exemplo, mas apenas dizer á camara, como justificação, que a iniciativa não partiu de mim, que veiu de ahi a aggressão, e que eu não podia deixar de dizer, em poucas palavras, o que sentia e quanto eram injustas as accusações que se me faziam; foi isso o que fiz, e só com esse fim.

Para a camara ver, desde já, o modo como o illustre deputado, que acaba de fallar procedeu n´esta questão, eu contarei apenas um facto. Referiu-se s. exa. ao contrato de 20 de fevereiro de 1897, e intitulou o contrato de compra de prata feito pelo governo. Ora esse contrato não é de compra de prata, é um contrato de liquidação de negociações muito anteriores á minha entrada no ministerio, negociações que s. exa. não podia desconhecer, por isso que durante os annos que esteve no governo, não obstante as repetidas instancias do contratador, nunca as resolveu, adiando sempre a sua conclusão. Eu posso, portanto, dizer á camara, apresentando-lhe este facto, despido de toda e qualquer apreciação, que quando a questão se apresenta pela fórma como s. exa. o fez, é porque faltam argumentos serios e falta a rasão. (Apoiados.)

Ignora, porventura s. exa. que esta questão nasceu em 1891? Não ignora, porque os documentos estão publicados, e s. exa. tem, com certeza, conhecimento d´elles.

Em 1891, sendo ministro da fazenda o illustre parlamentar sr. Marianno de Carvalho, em virtude de circumstancias extremamente extraordinarias que se produziram no paiz, o governo acceitou uma proposta para compra de prata, exportação de vinhos e uma serie de operações tendentes a obstar á grande crise que se apresentava e fazer acceitar as notas do banco de Portugal á circulação publica, porque o numerario tinha desapparecido.

S. exa. ignora isso? Não o ignora, como o não ignora ninguem.

Subiu depois ao poder o sr. Dias Ferreira, e, referindo-me a este illustre parlamentar, aproveito o ensejo para lhe declarar que nas palavras que ha dias proferi quando lhe respondia, não tive o menor intuito de o aggravar, pois tenho por s. exa. a maior consideração, e não só de agora, mas de ha muito, me prezo de ser seu amigo.

Nos debates parlamentares, porém, quando vemos que são mal apreciados os serviços que prestâmos, que não se reconhece o esforço que empregâmos, que dedicâmos toda a nossa intelligencia e por assim dizer a nossa vida á resolução de questões importantes, sentimo-nos magoados, doe-nos, ver que o nosso esforço é amesquinhado e que as cousas se apresentam por modo que até certo ponto póde prejudicar todo o esforço que se empregou.

Quando vemos que, não digo inconscientemente, mas sem prever o alcance das palavras que se empregam, se póde lançar diante do governo, peior ainda, diante do paiz, porque o governo nada vale, maiores difficuldades de que as que já existem, as nossas palavras não podem deixar de ser repassadas de um sentimento de magoa. Foi isso, e não o sentimento de aggressão ao illustre deputado, ou prova de menos consideração para com s. exa. que fez com que eu fallasse pela maneira por que o fiz.

Agora, porém, tenho muito prazer em dizer isto publicamente a s. exa..

S. exa. era presidente do conselho, e póde dizer-se uma das primeiras difficuldades que teve a resolver não foi essa.

Os documentos estão publicados, e o illustre deputado conhece-os. Porque não se referiu a elles, porque não disse que foi necessario fazer intervir o banco de Portugal, fazer novos contratos? Porque o não disse, visto que d´ahi é que resultou a questão que esteve pendente até que foi resolvida pelo meu amigo, o sr. Ressano Garcia, e a respeito da qual já tinha sido mesmo acceita uma arbitragem?

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O sr. Ressano Garcia não fez mais do que terminar uma questão pela fórma porque julgou mais util para o paiz, e o peor de tudo, em qualquer situação, mesmo n'aquella em que se encontra o thesouro, é deixar por liquidar operações como aquella, envolvendo e complicando ainda mais as questões.

Foi isso o que fez o governo do que fez parto o illustre deputado, pois encontrando a questão pendente, e achando-se em uma situação em que a podia ter resolvido, legou-a aos seus successores, como lhe deixou tambem em successão factos igualmente gravissimos. A situação progressista é que a resolveu.

Esta é que é a verdade.

O illustre deputado appella para os factos. Pois estes factos são perfeitamente averiguados.

Quando o nobre presidente do conselho, e meu amigo de muitos annos, subiu ao poder, sabia-se, não só dentro do paiz, mas no estrangeiro, que o governo era chamado a resolver gravissimas difficuldades que se haviam accumulado mais ainda na ultima gerencia, e o illustre deputado vae ver como n'esta questão se encontraram tambem difficuldades enormes, que o governo conseguiu resolver.

Eu mostrarei á camara como o meu procedimento foi correcto e como não tenho que arrepender-me do que fiz.

Lendo attentamente todos os documentos, porque têem de ler-se todos, adquiri o socego da minha consciencia, a segurança absoluta de ter cumprido o meu dever. (Apoiados.)

O que está publicado e o que vou dizer, para explicar tudo, ha de destruir por completo as allegações do illustre deputado, que são inteiramente destituidas de fundamento, como vou provar á camara, porque eu tenho a convicção de que se não tivesse procedido assim, debellando a crise que encontrei ao entrar para o ministerio, o deveria ter feito por essa fórma. (Apoiados.)

Fallou o illustre deputado em escandalos, em irritações parlamentares!

Eu lamento que a paixão partidaria, que é a peor das irritações, obcurecesse um espirito tão illustrado como é o de s. exa., obrigando-o a proceder por esta fórma, tanto mais que s. exa. sabia que a difficuldade maior que o governo encontrava no estrangeiro era a falta de confiança na administração, e essa falta de confiança não a creámos nós, herdámol-a. (Muitos apoiados.)

O illustre deputado, vindo apreciar de um modo inexacto os documentos que foram publicados, e julgando que não era facil um desmentido, truncou parte d'esses documentos, occultando os mais essenciaes.

Se as palavras de s. exa. fossem acreditadas, o que se diria lá fóra?

Dir-se-ha que a administração era, peor do que dantes e o descredito augmentaria. (Apoiados.}

Embora a politica o leve para outro campo, s. exa. depois de me ouvir, estou certo que ha de concordar commigo, porque eu vou explicar com a maior brevidade, sem ser prolixo, mas não omittindo facto algum, porque não tenho interesse em occultar e quer que seja, e antes pelo contrario muito desejo que a camara conheça a situação em que se encontra o governo, o modo como foram resolvidas as difficuldades e se houve prejuizo para o thesouro.

Suppoz o illustre deputado que o contrato de 20 de fevereiro de 1897 era um contrato que se fez para comprar prata, para o que o governo não estava auctorisado, quando a final esse contrato não foi senão a liquidação do contrato de 1891, feita pela fórma que o ministro da fazenda julgou mais conveniente para os interesses publicos.

Eu peço á camara que não veja, nas explicações que vou dar, o meio de illudir a questão na apresentação de outro facto, porque eu não quero senão expor, do modo mais resumido que poder, tudo quanto se passou em relação a este assumpto desde o dia 3 de setembro.

Não sei se os illustres deputados...

Vozes da esquerda: - Não se ouve.

O sr. Oliveira Matos: - Os senhores estão sempre a fazer barulho. Se estivessem com a attenção com que foram ouvidos, já não tinham de que se queixar.

(Áparte.)

Uma voz na esquerda: - Os srs. deputados occupem os seus logares que já se ouve. Assim, com todos em volta do ministro, é que é impossivel ouvir-se.

O sr. Presidente: - Peço ordem.

O Orador: - Eu peço a attenção da camara. (Apoiados.) Não fui eu que trouxe para aqui este debate, foram os illustres deputados. Eu ouvi o illustre deputado que me interpellou, sem fazer um áparte, com toda a tranquillidade, e tenho, portanto, o direito de exigir que de igual fórma se proceda para commigo.

Uma voz na esquerda: - Ninguem o interrompe.

O que se diz é que não se ouve.

Outra voz na direita: - Não foi assim que procedemos quando fallava o sr. João Franco.

Uma voz na esquerda: - Os senhores o que querem é provocar.

Vozes da direita: - Ordem, ordem.

O sr. Presidente: - O sr. João Franco foi ouvido com toda a attenção pelo sr. ministro da fazenda, e o sr. ministro interpellado tem os mesmos direitos de que s. exa. (Muitos apoiados.) Peço, pois, aos srs. deputados que não interrompam o orador.

O Orador: - Esquece o illustre deputado o que se passou no mez de setembro em Lisboa, e em todo o paiz, por causa da falta de numerario? Esquece s. exa. que o commercio de Lisboa e Porto se viu em grandes difficuldades, que o banco de Portugal não podia fornecer á industria os recursos de que ella carecia e que todos appellavam para o governo, pedindo-lhe instantemente medidas extraordinarias, dictatoriaes até para debellar uma crise que se afigurava a muitos quasi sem remedio, se não se adoptassem providencias extraordinarias que o governo por fórma alguma queria tomar? (Apoiados.)

O illustre deputado leu alguns documentos, mas apreciou-os ligeiramente, e eu vou fazer o que s. exa. devia ter feito e que a imparcialidade pedia que fizesse. (Apoiados.)

Em primeiro logar, direi que, chegando a Lisboa no dia 3 de setembro, a primeira preoccupação que tive foi exactamente esta, debellar a grande crise monetaria que havia no paiz.

Visto que o illustre deputado se esqueceu absolutamente d'essa circumstancia, que devia pesar enormemente nas resoluções do governo, visto que s. exa. não fez referencia alguma a um facto d'esta ordem, que todavia preoccupou a attenção publica durante muito tempo, eu vou ler á camara apreciações insuspeitas dos jornaes d'essa epocha, tendo o cuidado de se citar aquelles que são insuspeitos, porque não pertencem ao partido progressista, nem ao partido regenerador, para que a camara veja qual era a situação quando eu assumi a gerencia da pasta da fazenda.

Sabe v. exa. o que se dizia em 3 de outubro, fazendo-se referencia ao mez de setembro? Dizia-se isto.

(Leu.)

No dia 3 de outubro, relatando os jornaes a conferencia que teve logar entre os srs. Gomes Netto e Matheus dos Santos, directores do banco de Portugal e o ministro da fazenda, diziam:

(Leu.)

No dia 6 solicitava-se o mesmo.

As difficuldades eram instantes, e pedia-se sempre ao governo que interviesse.

(Leu.)

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A crise que durava desde o principio de setembro, aggravou-se nos ultimos dias d'esse mez, e eu, prevendo que as difficuldades que se apresentavam se aggravariam com o tempo, pedi n´essa occasião á firma com que se tinha feito o contrato de 20 de fevereiro de 1897 que entregasse a prata que pertencia ao thesouro, como consta do seguinte officio que em 9 de setembro enviei a essa firma.

«Ministerio dos negocios da fazenda - Direcção geral da thesouraria - l.ª Repartição - Copia. Illmos. e exmos. srs. - Convindo ao thesouro tratar, desde já, de amoedar a prata, que está caucionando, em parte, os supprimentos d´essa casa com vencimento em fevereiro proximo, venho rogar a v. exas. se dignem dizer-me se concordam na substituição do penhor por titulos da divida interna, e com que margem, a fim do poder realisar-se, sem demora, a mencionada amoedação.

«Deus guarde a v. exas. - Direcção geral da thesouraria, 9 de setembro de 1898. - Illmos. e exmos. srs. Henry Burnay & C.ª = O director geral da thesouraria, (a.) L. A. Perestrello de Vasconcellos.»

Já vêem os illustres deputados que a preocupação do ministro da fazenda era exactamente rehaver a prata, que pertencia ao thesouro.

O governo instou junto da firma, a que me refiro, pelo cumprimento do contrato, e essa firma, em resposta, offereceu um emprestimo novo e, ao mesmo tempo, propoz a venda de fundos publicos.

Assim, em 13 de setembro...

O sr. Conde de Burnay: - Antes d'esse ha um documento.

O Orador: - Em 13 de setembro recebeu o thesouro esta resposta. É um telegramma:

«Londres, 13, setembro, á 1 e 40 minutos, tarde. - Thesouraria geral - Lisboa. - Recebi telegramma, 12, vou tentar substituição indicada, embora difficil, por titulos internos. Se prestamistas titulos externos realizassem opção, excesso poderia ser applicado resgate prata; rogo telegraphar se remessa prata poderia ser escalonada e em que qualidades e prasos. = Burnay.»

Respondi em relação á prata, mas não respondi sobre os fundos externos, porque n'aquella occasião desconhecia esse assumpto.

O telegramma que depois recebi, diz o seguinte:

«Londres, 14, setembro, ás 5 e 55, manhã. - Thesouraria geral - Lisboa. - Recebi telegramma, 13. Em consequencia, natureza, novo penhor e ausencia alguns interessados, resposta adiada. Parto hoje Paris. = Burnay.»

As associações commerciaes de Lisboa e do Porto instavam, entretanto, junto do governo para a solução da crise monetaria.

Em 29 de setembro dirigi á mesma casa bancaria um officio, em termos para que, em virtude do contrato lavrado em 1897, restituisse a prata que pertencia ao thesouro.

Aqui perguntou o illustre deputado porque era que o governo...

O sr. João Franco: - Se v. exa. me dá licença, eu repito a pergunta.

O Orador: - Sim, senhor.

O sr. João Franco: - Eu perguntei, qual a rasão que levou o governo a comprar prata, tendo ainda outra para receber.

O Orador: - A rasão é simples.

A situação exigia remedio urgente, e o governo, instantemente, como consta dos documentos publicados, reclamava da casa contratadora que lhe entregasse a prata que tinha em seu poder, sem obter resultado, e assim, apesar dos seus esforços, chegou-se a 29 de setembro sem ter obtido absolutamente nada, que não fosse uma proposta de novo emprestimo para comprar a mesma prata ou outra de igual valor, e para que alem d'isso se contrahisse um emprestimo, por uma fórma, que eu entendia que não era conveniente aos interesses do estado, pois que o que mais convinha era liquidar a operação, que estava pendente desde 1891, em logar de a aggravar com uma nova operação. (Apoiados.) Este é que é o facto.

O gerente da casa, quando me foi fallar e eu insisti com elle, verbalmente, pela compra da prata, offereceu-me desde logo um emprestimo para isso, ao que eu respondi: que liquidassemos primeiro as operações anteriores, porque depois, a fazer-se outra operação, ella seria inteiramente nova.

Creio que n'este ponto todos procediam pela fórma como eu procedi. (Apoiados.) O que eu desejava era liquidar uma operação que datava de longos annos, e não embrenhar-me em novas operações. (Apoiados.)

Sabe o illustre deputado o que eu recebi em 6 de outubro, com a designação de urgente, e que explica e justifica o que eu tinha feito em 3?

Em 3 de outubro quando me convenci de que não havia possibilidade de receber a prata por simples substituição, sabendo, porque este assumpto fôra tratado, que não havia recursos, nem na conta corrente do thesouro, nem mesmo nas disponibilidades do banco, para se occorrer de prompto ao pagamento da prata pela fórma por que s. exa. queria, entendi que devia proceder a uma operação, que não tinha nenhum d'estes inconvenientes, e que me daria immediatamente a solução das difficuldades. (Apoiados.)

Mas, dirá s. exa., porque não entregou um adiantamento n'aquella epocha? É porque eu, n'aquella occasião, procurando fazel-o, vim no conhecimento de que a firma contratadora tinha já declarado ao governo, em junho ou julho, que não consentia que o governo adiantasse o pagamento, porque não era justo que os prestamistas se considerassem obrigados a dar um emprestimo ao governo pelo contrato de 20 de fevereiro, e que ao mesmo tempo o governo julgasse ter a faculdade de adiantar esse pagamento. Não o fiz, portanto, porque aquella casa se recusava absolutamente ao pagamento adiantado.

O sr. Conde de Burnay: - Não é exacto.

O Orador: - Não podia o ministro, repito, realisar esse pagamento, porque se encontrou diante de uma resposta em que, em vez de se responder precisa e definitivamente às perguntas que se faziam, se adiava a solução da questão, e porque ao mesmo tempo sabia que na thesouraria havia a declaração formal de que não se admittia o pagamento adiantado.

O sr. Conde de Burnay - Não é exacto.

O Orador: - N'esta situação, entendi que devia immediatamente proceder á acquisição da prata em quantidade absolutamente igual, adiantando assim a sua amoedação e convertendo-a em metal circulante.

A justificação do meu procedimento está n'um officio que aqui tenho. Nos primeiros dias do mez dizia-se que tinha havido desconfianças sobre a situação apertada do paiz e aconselhava-se o governo a adoptar medidas de caracter extraordinario, dizendo-se que era absolutamente necessario o alargamento das notas do banco de Portugal, e mais ainda o emprego de outros meios extremos, que se o governo os tivesse posto em pratica reduziriam o paiz á maior desgraça e acarretariam, sobre nós uma grande vergonha. (Apoiados.)

Se alguma culpa ha, pois, da minha parte, é de não attender ás instancias que se me faziam e de, acima de tudo, considerar que os interesses do estado devem ser superiores a quaesquer outros interesses.

Diziam-me ainda mais, que era necessario que se estabelecesse um principio variavel para a circulação da nota e a esta opinião contrapunha eu a minha, que era a de que emquanto a nota fosse inconvertivel não se augmentaria nem em um real a circulação.

Era n'isto que assentava a base da nossa administração e o governo tinha toda a esperança de vencer, sem o emprego de meios extremos, as difficuldades que se apresentavam.

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Sem essa esperança, aliás fundada, do governo, sem a sua reluctancia em ceder ás instancias que lhe eram feitas repetidamente, o descredito do paiz seria o resultado inevitavel dos conselhos que lhe davam.

O sr. Marianno de Carvalho: - Se s. exa. me desse licença, pedir-lhe-ia o obsequio de me mandar esse officio a que v. exa. se referiu, e que já a deu a ler a um outro sr. deputado.

O Orador: - Não tenho a menor duvida em facultar ao illustre deputado este officio.

O sr. João Franco: - E a resposta á minha pergunta?

O Orador: - Esta é a justificação do meu procedimento. Agora vou responder á pergunta do illustre deputado, porque é que o governo n´essa occasião não tomou o expediente de pagar.

S. exa. sabe de certo, e se não sabe póde ler os jornaes d'esse tempo, que por elles verá que o banco de Portugal pretendia regularisar a circulação da nota, e que para esse fim entabolára negociações com o governo. O sr. conselheiro Julio de Vilhena, governador do banco, entrou n'essas negociações, e eu aproveito a occasião para declarar á camara que muitas vezes recorri no seu conselho e tive occasião de avaliar a sinceridade e rectidão das suas opiniões. Alem d'isso, devo tambem dizer, que s. exa. era talvez o unico que, no banco de Portugal, pensava como eu, pelo menos d'aquelles que estão mais ao facto dos negocios d'esse estabelecimento.

Desde que nós examinámos a situação, pozemo-nos logo facilmente de accordo, e elle prestou sempre, constantemente, o maior auxilio e coadjuvação ao governo.

Este facto, porém, não destroe o outro, de que os administradores do banco e alguns membros do conselho fiscal íam ao ministro da fazenda dizer que não havia meio nenhum de debellar as difficuldades senão augmentando a emissão das notas até cem mil contos.

Se não se procedesse assim, diziam elles, ao difficuldades com que luctavam as praças de Lisboa e Porto não se poderiam debellar, nem a situação do governo melhorar, porque, n´essa occasião, havia pagamentos que inadiavelmente se haviam de fazer no estrangeiro até 31 de dezembro, e que orçavam por milhares de contos, independentemente do contrato com o Anglo Foreing Banking.

Ouvi-os mais de uma vez, e persisti sempre na mesma idéa. N´essa occasião nem o banco de Portugal me podia, ainda que quisesse, pôr no estrangeiro o dinheiro de que eu carecia para pagar a prata, se esse pagamento tivesse sido adoptado e acceite, e eu já disse que esse pagamento seria rejeitado, como eram tantos os encargos, que eu não me poderia abalançar a uma operação d'essas, que importava um emprestimo novo e um pagamento em oiro no estrangeiro.

Recorri, portanto, a uma casa commercial e recebi uma proposta que, devo dizer, não acceitei logo, e fui consultar uma pessoa que está perfeitamente ao facto dos negocios da praça de Lisboa, para que, conscienciosamente, por isso que eu estava no começo da minha gerencia, me dissesse se eu poderia encontrar facilidades de trazer prata a Lisboa, pagando-a eu só com o producto d´essa propria prata, e essa pessoa disse-me que acceitasse aquella proposta, porque, n'aquella occasião, era a mais conveniente que o governo podia acceitar.

Foi este o motivo por que tratei com a casa Torlades.

Agora quer a camara saber qual foi o auxilio que o banco de Portugal me prestou? Foi receber os conhecimentos na sua agencia em Londres.

Isso, porém, foi no fim de outubro.

No dia 3 o banco não podia nem queria acceitar a transacção nos termos em que lhe era proposta, e acceitou-a no fim de outubro, conforme declara no seu relatorio.

Vou dizer agora a v. exa. e á camara como é que foi paga a prata.

Os conhecimentos eram recebidos em Londres e remettidos á casa da moeda, que retirava da alfandega a prata, consignando-a ao banco e entregando depois ao mesmo banco, em moeda circulante, o producto da amoedação das barras que era cunhadas por conta do mesmo banco.

Não houve juros a pagar, nem se compraram cambiaes na praça.

Esses pagamentos fizeram-se ao cambio de 35 1/2 como diz o banco no seu relatorio.

iz mais o banco, no seu relatorio, posteriormente ao dia 3 de novembro, o seguinte.

(Leu.)

A crise não datava só de setembro, como a camara vê, era anterior.

Note-se que as disponibilidades do banco não lhe permittiam que elle saísse por si só, sem o concurso do governo, do estreito limite de acção em que se havia collocado.

(Continúa lendo.}

Isto quer dizer, chamo para o facto a attenção do illustre deputado, que a disponibilidade em notas já não chegava para satisfazer a conta corrente do governo.

(Continúa a leitura.)

Está bem claro, é a affirmação insuspeita do banco.

Dizia elle que, sem o concurso que o governo lhe tinha offerecido não podia vencer as difficuldades. Isto é importante.

O banco não sabia quaes as transacções que o governo fazia. Eu não podia pedir ao banco que viesse mais tarde passar um documento que é da iniciativa do proprio banco, dizendo que se o governo tivesse recusado aquelles meios teria sido forçado a augmentar a circulação de notas e forçado assim a contribuir para um desastre sem limites.

Quanto á pergunta de s. exa. relativamente a augmentar o meio circulante, porque não insistiu o governo com o banco para que elle pozesse em circulação a prata que tinha na sua reserva, respondo facilmente, como o banco, que não podia fazel-o.

O illustre deputado reconhece isso, mas no mesmo tempo critica o governo por fazer aquillo que n'aquellas circumstancias unicamente podia ter feito.

Ora o relatorio do banco de Portugal, que aqui foi citado, diz a este respeito o seguinte.

(Leu.)

A conclusão é clara e positiva: a circulação das notas do banco de Portugal não se alargou, (Apoiados.) apesar de se dizer que era imprescindivel e indispensavel, e que sem isso nem o governo nem o commercio podiam livrar-se de uma poderosissima crise.

Vou referir-me a um outro facto que se prende tambem com este e que tem igualmente muito importancia.

O illustre presidente da camara sabe muito bem a que me quero referir.

Nas ilhas ha fabricas de distillação de alcool, que ha muitos annos n'isso se empregam, e o banco de Portugal e algumas casas commerciaes de Lisboa fornecem adiantadamente a essas fabricas o numerario de que ellas carecem para a sua laboração. As difficuldades das praças de Lisboa e Porto complicaram-se com as dos Açores, e eu para não cansar a camara não leio documentos a esse respeito, de fórma que ás instancias que faziam junto do banco de Portugal para que elle lhe fizesse esses adiantamentos, como era costume nos annos anteriores, o banco respondia que os não podia fazer, sem que fosse auctorisada uma nova emissão supplementar de notas; e isto, em primeiro logar, porque não podia augmentar a circulação, e em segundo logar, porque não podia distrahir a prata que já tinha recebido, o que queria manter intacta.

Por mais esforços que o governo empregasse, não ponde

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censeguir nem do banco de Portugal, nem de outro, porque todos elles receiavam a crise, que esses adiantamentos se fizessem, e o governo viu-se obrigado a destinar para esse fim uma parte da prata que se amoedeu, e que entregue ao banco de Portugal, mandou para as ilhas.

O nosso illustre presidente sabe muito bem que por esta fórma se debellou uma crise de primeira ordem, o que se conseguiu sem o menor sacrificio, unicamente com o auxilio do estado e com o producto da amoedação das barras que se tinham adquirido.

Digo ao illustre deputado, com toda a franqueza, que depois de se ter cunhado a prata, não me julgava habilitado a fazer a emissão em quantia igual á que já tinha sido cunhada. O illustre deputado sabe de certo que n´essa epocha havia na cotação da praça de Londres um factor importante, a prata comprada pela Hespanha para amoedar. Dizia-se; e isso encontra o illustre deputado nos jornaes financeiros d´essa epocha, que a Hespanha recorria a esse meio, e todas as probabilidades eram, portanto, de que a prata diminuisse.

Eu pedi a prata em 5 de dezembro, porque queria entrar na posse d'ella para a depositar nas agencias do estado, e mais tarde auctorisei a sua venda, porque não tendo conseguido a entrega até essa data, achei opportuno não reformar as letras que se venciam, dando para pagamento d'ellas a prata.

Aonde está o crime de ter aproveitado a primeira occasião que se me offerecia para entrar na posse d'esses valores, para supprimir não por inteiro, porque não podia fazel-o, mas a parte mais importante dos juros.

O illustre deputado arguiu o governo de ter pago com inscripções, perdendo o juro e deixando a prata improductiva. Pois devia louval-o por ter aproveitado a primeira occasião para diminuir o prejuizo que teve. Se eu podesse fazer a liquidação completa, gostosamente a faria, mas desde que isso se me tornava impossivel, aproveitei essa occasião para fazer uma parte da liquidação, pedindo depois á firma contratadora que continuasse a fazer o mesmo, ao que ella se prestou de tão boa vontade que eu entendi que não devia perder a occasião de liquidar antes do fim do anno todas estas contas do thesouro. Entendi que era muito melhor liquidar tudo até 31 de dezembro, do que deixar esta operação para o anno, porque o 31 de dezembro é uma data certa, sobre a qual muitas vezes se baseiam calculos para liquidação de contas.

Perguntou o illustre deputado qual a rasão por que o governo comprou prata por um preço e a vendeu por outro. Permitta-me o illustre deputado que lhe diga que não fez bem os seus calculos, não obstante os documentos estarem publicados. Pelas contas que se publicaram vê-se que o prejuizo não foi o que s. exa. disse, mas de 4:650 libras, por isso que é preciso excluir das contas publicadas tudo que seriam igualmente despezas do estado se fosse adquirida a outra prata que não se recebeu.

E agora pergunto á camara se não saiu barato o serviço que o governo prestou ao paiz salvando-o de uma crise temerosa? (Apoiados.) Foi baratissimo. (Apoiados.)

Eu comprei a prata, sujeitando-me ao preço da bolsa de Londres, e, devo dizel-o, sr. presidente, não me preoccupei com o preço por que a comprava, nem com aquelle por que a vendia, pois com o que eu me preoccupei antes, e mais do que tudo, foi com a situação do paiz.

As associações commerciaes de Lisboa e do Porto pediam ao governo que acudisse rapidamente A situação financeira, que n'aquelle momento era muito grave, augmentando a emissão das notas, mas o governo conseguiu debellar essa crise, melhorar a situação, sem recorrer ás disponibilidades do banco de Portugal, que n'aquella occasião eram inferiores em oitocentos e tantos contos ás do mesmo banco em epochas anteriores, como o proprio banco o confessa, dizendo:

(Lê.)

O meu fim, como v. exas. vêem, era não só facilitar ao banco todos os meios...

O sr. Presidente: - V. exa. dá me licença?

É para lhe dizer que terminou a hora regimental, durante a qual v. exa. podia usar da palavra, mas conforme tambem o regimento determina, v. exa. tem ainda mais um quarto de hora para terminar o seu discurso.

O Orador: - Eu entendo que as explicações que dou á camara são necessarias e indispensaveis, (Apoiados.) e que a camara não terá a menor duvida sobre o que eu digo, porque tem todos os documentos para poder apreciar com imparcialidade e sem favor, que eu não peço nem desejo, o que eu fiz. (Apoiados.)

Repito o que disse quando comecei. Depois de ter examinado todos os documentos, convenci-me de que se eu tivesse procedido de outra fórma, tinha procedido mal. O que eu fiz, é o que devia ter feito. (Apoiados.) E felicito-me a mim proprio por ter conseguido, mais por acaso do que por qualidades pessoaes, o resultado a que se chegou.

Esta é que é a verdade, digo-o com toda a sinceridade.

Nada tenho de que me arrepender, antes pelo contrario. (Apoiados.)

Apresento estes factos á camara, para que ella veja quanto é necessario, muitas vezes, que o ministro da fazenda seja superior a tudo quanto se passa junto d'elle, (Apoiados.) porque os interesses individuaes são sempre os que dominam. Infelizmente, no nosso paiz ha milhares de exemplos que são a prova de que é necessario que o governo tenha sempre em vista que os interesses do estado são superiores a todos os outros, embora haja interesses particulares respeitaveis, (Apoiados.) e que é necessario separar o que é de verdadeiro interesse para o paiz, d'aquillo que não representa senão ás vezes especulação de interesse particular. (Apoiados.)

A consciencia de ter procedido assim tenho-a eu. (Apoiados.) Não me abalou nada o que se passava em roda de mim. (Vozes: - Muito bem.)

Eu via o alargamento da circulação das notas com todos os prejuizos e resultados nocivos que de ahi podiam advir, e que era a tendencia e o desejo bem manifesto de uma grande parte das pessoas que vinham insistentemente pedir ao governo resoluções extremas; via que de ahi não resultaria senão desprestigio enorme para a situação do paiz e uma crise similhante á de 1891, e isto preoccupou por tal fórma o meu espirito, que me obrigou a resistir.

Eu tinha lido com attenção o que se tinha passado anteriormente, pelo menos o que estava publicado, quando o sr. Marianno de Carvalho era ministro, e eu via approximar-se uma situação quasi similhante. Pelo menos, de longe, parecia-me isto. Era necessario resistir, e foi o que eu fiz. (Vozes: - Muito bem.)

Já o illustre deputado vê que eu não procuro em politica mesquinha argumento para a minha defeza (Apoiados.)

E se eu ha pouco me referi a ella quando respondi ao sr. Teixeira de Sousa, a culpa não foi minha, mas de s. exa. que tão aggressivo foi. (Apoiados.)

Parece-me ter respondido ao illustre deputado.

O sr. Marianno de Carvalho: - V. exa. dá-me licença para lhe pedir um esclarecimento antes de concluir?

V. exa. disse ainda agora, se é que não ouvi mal por causa das condições acusticas da sala, mas parece-me que não, que em junho ou julho, a casa primeira vendedora da prata tinha declarado, por um modo qualquer, que não se prestava a nenhum pagamento por antecipação.

Ha algum documento escripto sobre isto?

O sr. Ministro da Fazenda (Affonso de Espregueira: - Eu não sei se os tenho aqui.

O sr. Marianno de Carvalho: - No caso de haver, pedia a v. exa. para os mandar publicar, ou mandar para a mesa, ou ainda para m´os communicar pessoalmente.

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SESSÃO N.º 26 DE 9 DE MARÇO DE 1899 19

O sr. Ministro da Fazenda (Affonso de Espregueira: - Isto prende com questões de outra ordem, mas eu ponho á disposição de v. exa. todos os documentos.

E direi que me suprehendeu o que disse o sr. João Franco quando se referiu á falta de documentos e, á minha absoluta negação em prestar á camara esclarecimentos.

Eu não fiz senão dizer á thesouraria do ministerio da fazenda que mandasse copiar immediatamente todos os documentos. Se elles não vieram mais cedo á camara a culpa não é minha, mas de que inevitavelmente ha de haver demora em os copiar.

Para s. exa. verem como é difficil satisfazer de prompto todos os pedidos da camara, basta dizer-lhe que só um illustre deputado pediu copia de cento e quarenta documentos.

Eu preferia que, n'estes casos de urgencia de documentos, s. exas. fossem consultar os proprios originaes, que lhes seriam promptamente facultados, porque assim deixaria de soffrer accusações injustas e immerecidas.

Peço desculpa á camara de me ter alongado tanto n'esta resposta, mas creio ter respondido às accusações que me foram feitas pelo illustre deputado interpellante.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado.)

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Luciano Monteiro: - Ao sr. ministro da fazenda ensinaram-lhe má lição, e s. exa. aprendeu-a peor.

Estamos agora a ver como foi inexacta a affirmação de s. exa. feita n'uma das sessões passadas, e como o illustre chefe do seu partido o atraiçoou.

Quando lhe perguntavamos a rasão por que estava sentado n´essa cadeira, quando lhe perguntavamos o motivo porque estava superintendendo nos negocios do ministerio da fazenda, s. exa. que podia ter dado provas de ser um grande engenheiro, mas que nunca tinha dado sequer o vislumbre de que tinha sido um réles financeiro, s. exa. disse-nos: - «Estou aqui no cumprimento de um dever, como um soldado que é chamado ás fileiras para defender o seu paiz. Chamaram-me, vim, e aqui estou para cumprir o meu dever.»

É certo, mas s. exa. praticou um erro, confundiu a hypothese com o facto.

Chamaram-o para soldado, mas quando aqui chegou fizeram-o general de divisão, e o seu dever de consciencia, era consultar-se, perguntar a si mesmo se tinha competencia para o alto cargo em que queriam investil-o. O seu dever não consistia em acceitar, se entendia que não podia tomar sobre si a responsabilidade d'esse posto superior.

Não recusou, e hoje temos a prova de que s. exa. nem para cabo de esquadra serve.

Vozes: - Ordem, ordem.

Uma voz: - Esteve a aprender o recado com o banqueiro.

O sr. Presidente:- Eu considero a expressão de v. exa. como menos correcta e peço-lhe que a explique.

O Orador: - Sr. presidente, o direito de defeza é absoluto. V. exa. acaba de soltar da sua bôca a affirmação de que a minha palavra é incorrecta. V. exa. não póde fazer-me uma accusação sem me auctorisar a explicar o motivo por que empreguei essa palavra. V. exa. dá-me essa licença?

O sr. Presidente: - Eu peço a v. exa. que explique a sua phrase, por fórma que fique satisfeita a dignidade da camara, a de v. exa. e a do sr. ministro da fazenda.

O Orador: - Sr. presidente, ou soltei a phrase de que - s. exa. nem para cabo de esquadra serve - (Sussurro.) precisamente para me manter na technologia militar em que se collocára o sr. ministro da fazenda. S. exa., querendo explicar a rasão por que fôra chamado aos conselhos da corôa, que arranjar um simile, um parallelo com a disciplina militar e disse-nos - assim como o soldado acorre por dever ás fileiras, assim estou eu aqui, por disciplina. Chamaram-me, vim.

Já v. exa. vê, sr. presidente, que desde que s. exa. empregou a technologia militar, eu tinha o direito de tambem, empregando essa technologia, dizer que s. exa. não servia mesmo para cabo de esquadra.

O sr. Presidente: - Positivamente, a intenção de v. exa. não era offensiva.

O Orador: - Não era, sr. presidente, e tanto que eu dando-lhe a graduação de cabo de esquadra, fui mais alem da posição em que o sr. Espergueira queria manter-se. Elle queria manter-se em simples soldado, e eu elevei-o a cabo de esquadra.

Vozes: - Ordem, ordem.

O Orador: - Eu estou na ordem. Sou o mais ordeiro que é possivel, mas em todo o caso o mais obediente ás ordens da presidencia.

Eu comecei por dizer que o sr. ministro da fazenda tinha ouvido má lição e que a tinha recitado peor ainda.

Quer v. exa. saber a rasão d'esta minha these? Eu explico.

É que s. exa. referiu-se aos contratos de 1891 e de 1897 demonstrando, por uma fórma bem patente, que não sabia o que significava nem um nem outro.

Disse s. exa. que o contrato de fevereiro de 1897 era uma liquidação de contas. É um erro completo, e eu digo a v. exa. qual é o significado do contrato de 1891 posto em confronto com o de 1897.

Em 1891 entendeu se que era necessario favorecer a praça do Porto dando-se-lhe capital para as suas operações, mas qual foi o processo de que o ministro da fazenda d'aquella epocha imaginou dever recorrer-se para esse fim! De uma fórma simples, nós tinhamos um producto nacional acceitavel no estrangeiro, o vinho do Porto, e então, comprava-se vinho do Porto com moeda nacional, transferia-se para o estrangeiro, vendia-se ali, e com o oiro resultante d´essa venda comprava-se a prata de que se carecia, e que seria enviada para o paiz. Eis o contrato de 1891.

O sr. Marianno de Carvalho: - Não houve bem um contrato, houve uma proposta que foi acceite por mim e que constituiu contrato, dando-se a transmissão rapida da prata para Portugal. O que eu, porém, não imaginava, era que isso que eu fazia em 1891, me havia de apparecer agora em 1899.

O Orador: - No contrato de 1891, o ministro de então não encarregava ninguem de comprar nem de desembolsar prata, mas de transferir vinhos do Porto para Londres, realisar a sua venda, e com o seu producto comprar prata; mas, note v. exa., que o ministro subscreveu isto por mera proposta, accrescentando uma phrase caracteristica e boa para pôr em parallelo com aquelle contrato Torlades O´Neill, que eu mais tarde classificarei.

No final d´essa proposta, dizia o ministro, concordo com essa proposta, mas não pagando commissão de especie alguma. Agora pagaram commissão de 2 por cento. A seu tempo mostrarei porque é que se pagou a commissão de 2 por cento.

Tal era a operação de 1891. O governo não tomava para si a obrigação de receber prata do sr. Burnay, porque não o tinha encarregado de a comprar, mas de vender pipas de vinho e de com o producto d´essa venda comprar prata.

A condição sine qua non da proposta, era a realisação da venda do vinho do Porto, e emquanto ella não se realisasse não assistia a esse contratador o direito de vender a prata.

Depois de acceite o contrato de 1891, no anno de 1892, precisamente com estes delineamentos geraes, remetteu-se para Londres uma porção apenas d'aquelle quantum de vinho do Porto, que constituia a operação, e transformou-se o producto em prata que entrou no paiz.

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20 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

se vendeu mais vinho do Porto, mas não obstante não se ter vendido, a firma negociadora levantou uma questão, imaginando que tinha direito de impor ao governo o recebimento do saldo da prata. O governo, porém, recusou-se terminantemente a acceitar essa imposição affirmando o seu direito de recusa.

Foi n'estas condições que a outra parte disse e bem, que desde que ha um contrato, e uma das partes contratantes suppõe ou presume ter um direito que lhe é recusado pela outra, o mais natural é dirimir-se o negocio perante o tribunal, e no caso actual perante o juiz arbitral.

O que constituia o objecto d'esse juizo arbitral, e para esta parte chamo a attenção de v. exa. e da camara, não era uma liquidação de contas, esse é o erro do sr. ministro da fazenda, quero suppor involuntario, que s. exa. nem se quer leu o contrato, porque se o tivesse lido tinha a perspicacia necessaria para chegar á analyse e á critica da substancia do mesmo contrato, como eu agora chego, e é isso que me doe, que em assumpto tão grave, tão serio e importante como este é, s. exa. venha para aqui formular uma defeza que não chega a ser sua, que é a repetição do que lhe foi ensinado hontem á noite, mas por um mau preceptor, (Riso.)

Em que consistia o objecto do juizo arbitral? Não era uma liquidação de contas; a liquidação de contas é a sequencia do contrato. O objecto do litigio era por parte da firma Burnay & C.ª ou da firma negociadora, a obrigação que ella queria impor ao estado relativamente á questão da prata.

Chegada esta situação a fevereiro de 1897, o que vemos nós no contrato? Deslocar-se a questão dos seus limites naturaes, arranjar-se um enredo que eu me dispenso de classificar, collocando logo na cabeça d'esse contrato, como facto averiguado e assente, o que realmente não o era. Quando em 1897 se fallava em liquidação de contas, não era este o objecto da questão. Porque é que encontrando o governo em 1897 constituido o tribunal arbitral, deixou de formular o objecto da questão, que consistia em libertar o estado d´essa imposição que lhe queria fazer a firma Burnay & C.ª? Porque não se manteve o juizo arbitral? A manutenção d'esse juizo e a conservação n'elle do pleito, aguardando os seus resultados, era uma vantagem para o estado.

Pois havendo um contrato com a consulta da procuradoria geral da corôa, com as informações do ministerio e da casa da moeda, affirmando o direito do governo em recusar a imposição que se lhe queria fazer, é n'estas condições que, querendo affirmar um certo direito por parte do estado, o governo, representado pelo partido progressista, dá como não existente o tribunal arbitral, desvia a questão dos seus tramites naturaes e arranja um enredo, uma chicana transparente, para affirmar que quando houvesse pleito não era para affirmar esse direito. Onde está aqui a seriedade? (Apoiados.)

Disse o sr. ministro da fazenda que o sr. conselheiro João Franco na sua interpellação tinha sonegado á analyse e á critica d'esta camara um documento valiosissimo, o contrato de 1891, que explicava esta situação. Foi o sr. ministro que o não leu ou não o comprehendeu. O sr. João Franco não o sonegou, nem tinha necessidade de o sonegar, porque não acudia á mente de ninguem que o sr. ministro tivesse a debilidade de espirito de apresentar o contrato de 1891 como explicação do de 1897, quando a confrontação dos dois é a indicação mais clara e positiva d'aquillo que presidiu ao contrato de 1897.

Porventura o facto de não nos referirmos ao contrato de 1891, póde importar censura para nós? Essa censura só póde ter uma explicação. Diz-se que se nos não fallâmos no contrato de 1892 para nos referirmos ao contrato de 1897, é porque procurâmos fazer favor ao sr. Ressano Garcia. Não é verdade. O sr. Ressano Garcia não nos pede favores...

O sr. Ressano Garcia: - Apoiado.

O Orador: - Nem nós lh´o offerecemos. Estamos no nosso campo, nós aqui e s. exa. ali.

E referindo-me ao sr. Ressano Garcia, gosto de lhe fazer justiça. Todos ainda se lembram de que antes do sr. Espregueira, o ministro que ali se sentava, era um luctador de primeira ordem. (Apoiados.) Quem. o aggredisse tinha a certeza de que a aggressão não ficava sem resposta immediata (Apoiados.) e resposta interessantissima, mas tinha uma vantagem, é que na subtileza do seu espirito e no conjuncto da sua imaginação, encontrava processos habilidosos para illudir a questão, para enredar e não responder, mas, em todo o caso, collocava-se sempre em posição, que, quando ao cabo da discussão se impozesse um facto, tinha meio de dizer: «eu não contrariei esse facto», tal era a habilidade do seu espirito.

Mas hoje encontrâmos ali um ministro da fazenda, que ainda bem. não faz uma affirmação, encontra logo quem he diga: isso é falso!

A situação é a mais deprimente que se póde imaginar !... Eu comprehendo que o sr. ministro da fazenda, em convivio particular entre amigos, n'uma sala, entre pessoas que se conhecem, que têem entre si intimidade, ouça a sangue frio essa phrase, mas não comprehendo que um ministro da corôa, que representa a delegação de um poder do estado, que o acompanha a confiança da corôa, o que quer dizer que confia em s. exa., porque superintende em negocios publicos com a seriedade e elevação necessaria para esse logar, não comprehendo, repito, que esse ministro, quando faz uma affirmação, ouça a sangue frio dizer o sr. conde de Burnay: Isso é falso!

Uma voz: - Elle disse: - Não é exacto!

O Orador: - Sou advogado e como tal emprego rabulices e arteirices no interesse dos meus constituintes, mas aqui sou deputado e não faço questão de palavras. Dizer que não é exacto, é o mesmo que dizer que é falso. Não ha differença, é uma e a mesma cousa. (Apoiados.)

Disse s. exa. - empreguei todos os esforços possiveis, todos os meios, dirigindo-me aos negociadores primitivos dos contratos de 1891 e 1897 para resgatar a prata que lá havia, por qualquer fórma - mas quando o sr. ministro dizia esta phrase, em voz alta, forte e com tonalidade especial para colher applausos, que alcançou, terminado o echo d'esses applausos, o sr. conde de Burnay, que tinha sido a outra parte n'esse contrato, dizia - não é exacto. (Apoiados.}

E agora, sr. presidente, trato de perguntar a mim mesmo, qual das duas affirmações tem mais valor, se a do sr. Espregueira, se a do sr. conde de Burnay.

Quando me encontro nesta situação, quando não tenho rasões para me esclarecer ácerca do caracter das pessoas com quem lido, a minha presumpção é que são ambos homens honestos.

Pois um ministro da corôa é convidado a publicar documentos sobre um caso grave, importante, não digo mais...

Pois é natural que cousas insignificantes, de menor valor, obrigassem a esta correspondencia que se trocou entre o ministro da fazenda e a firma Burnay para o resgate da prata, e não haja um unico documento, uma carta, um officio, sobre este assumpto capitalissimo, e da acceitação do resgate?

Se houve negociações n'esse sentido, se o sr. ministro da fazenda se dirigiu ao sr. Burnay, e o sr. Burnay se recusou, evidente e fatalmente haviam de existir documentos para este facto importantissimo, como existem para outros que são de um valor relativamente insignificante.

Pediram se ao sr. ministro esses documentos. Onde estão elles?

Não quero, pela segunda vez, ouvir a s. exa. a decli-

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natoria; quando apertado pela verdade dos factos indicativos e incontestaveis da falta de documentos, de lançar as responsabilidade sobre os empregados da sua secretaria. Não faça isso, sr. ministro; recorra a todos os expedientes, empregue todos os esforços da sua imaginação, procure no seu espirito todos os recursos para justificar o facto, mas não reuna á sua inaptidão para o cargo que exerce, um acto que é desagradavel para os seus subordinados.

Se foi esse o facto a que recorreu o sr. ministro da fazenda, com a intenção de nos fazer capacitar que o contrato Torlades teve logar porque a firma Burnay & C.ª se recusou a negociar uma emissão anterior da prata que o sr. Burnay diz que não recusou, este facto é importantissimo, e se os documentos que o provem não existem, para onde pende a balança?

Em consciencia lhe digo que acceito a defeza do sr. Burnay.

Não nos devemos admirar de acontecimentos d'esta natureza, porque já estamos acostumados, desde que o sr. Espregueira só senta n'aquellas cadeiras, a ouvir fazer affirmações categoricas e positivas, com entono e enthusiasmo que parece estar dizendo a verdade para, a breve trecho, ver desmanchar-se esse castelinho de cartas, e encontrarmos que s. exa. estava completamente enganado.

São seis horas e meia e estou alguma cousa fatigado. Como não posso utilisar-me de toda a hora que o regimento me concede, na sessão de hoje, tenho o direito de continuar na immediata. Se v. exa. me permitte eu fico com a palavra reservada.

Vozes da direita: - Tem ainda meia hora. Falle, falle.

O sr. Presidente: - A sessão acaba ás sete horas. Se s. exa. está tão fatigado que não póde continuar eu dou a sessão por finda. Não quero fazer violencia sobre ninguem. V. exa. começou a fallar ás seis horas e doze minutos, e se o que tem que dizer vão alem das sete é evidente que não póde concluir hoje o seu discurso e que póde ficar com a palavra reservada. Entretanto, eu deixo ao sr. deputado o resolver como houver por melhor.

Vozes na direita: - Falle, falle.

O Orador: - Sr. presidente, n'estes assumptos sou sempre o mais obediente.

Quando um deputado d'aquelle lado da camara quer fallar, mesmo com infracção do regimen se dependesse do meu voto a concessão da palavra a esse deputado, eu saltava por cima do regimento e concedia-lh´a.

Quando um ministro se encontra na mesma situação e quer fallar, eu, apesar de haver muitas vozes vantagem partidaria em que elle não falle, sou o primeiro a levantar a minha voz e dizer: falle, falle.

Todos os dias, como v. exa. sabe muito bem, as sessões têem sido encerradas ás seis horas e meia da tarde.

O sr. Marianno de Carvalho: - Á excepção de uma só, que fechou ás sete horas e dez minutos.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - V. exa. dá-me licença?

O Orador: - Imaginam v. exa. que eu não tenho no meu espirito, nem na minha imaginação inventiva faculdades para entreter a camara por mais meia hora? Oh! sr. presidente, não me façam essa injuria. Bastava que eu fizesse um ligeiro commentario a cada linha d'estes documentos, qual d'elles o mais interessante para a historia da administração publica do nosso paiz, para que eu tivesse com que occupar-lhes a attenção por bastante tempo.

Não estou, portanto, falto de recursos para consumir mais meia hora, o que, na realidade estou é fatigado por incommodo de saude.

(S. exa. não reviu)

O sr. Presidente: - Effectivamente, na maior parte dos dias as sessões têem sido encerradas ás seis horas e meia da tarde. Com excepção de duas ou tres, que foram alem das sete horas, a maior parte das vezes, ás seis e meia dão-se por terminados os trabalhos parlamentares, e como o sr. deputado declara que está fatigado, entendo que não deve deixar de ter esta attenção para com s. exa.

Dou, portanto, por encerrada a sessão e marco a proxima para ámanhã, 1O, sendo a ordem do dia a mesma que estava dada para hoje e mais o projecto n.º 6 relativo á responsabilidade dos editores.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e trinta e cinco minutos da tarde.

Documentos enviados para a mesa n'esta sessão

Proposta de lei n.° 9-A

Senhores. - As cartas de lei de 24 de agosto de 1848 e de 5 de agosto de 1854 dispensam da exhibição da sentença de habilitação judicial os credores do estado por quantias provenientes de heranças ou legados inferiores a 240$000 réis em effectivo e a 400$000 reis em inscripções.

Como a fortuna publica tem augmentado sensivelmente desde aquella epocha, cessando tambem as despezas com os processos judiciaes, parece justo fixar em 500$000 réis effectivos o valor dos creditos sobre o estado aos quaes possam aproveitar a referida disposição.

N'estes termos, havendo ouvido sobre o assumpto o conselheiro procurador; geral da corôa e fazenda, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a, seguinte proposta de lei em additamento á proposta apresentada em sessão de 23 do corrente:

Artigo 1.º Os credores do estado por quantias provenientes de legados ou heranças inferiores, em relação a cada interessado, a 500$000 réis em effectivo ou ao correspondente em titulo da divida publica consolidada ou amortisavel pelo valor do mercado na occasião da abertura da herança, serão dispensados de exhibir sentença de habilitação judicial para a cobrança dos seus creditos.

Art. 2.º As habilitações para a cobrança de que trata o artigo antecedente correrão, nos termos do artigo 2.° da carta de lei de 265 de agosto de 1848, pela repartição onde estiverem registados os creditos em divida.

Art. 3.° Fica revogada a legislação contraria a esta.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, 9 de março de 1899. = Manuel Affonso de Espregueira.

Representações

Do povo do concelho da Feira representado no comicio que se effectuou no dia 5 do corrente, adherindo á representação da camara municipal do mesmo concelho apresentada em sessão d'esta camara de 28 de fevereiro ultimo, contra o projecto de lei para a constituição de um novo concelho na freguezia de Espinho.

Apresentada pelo sr. presidente da camara, Poças Falcão, e, enviadas á commissão de administração publica.

De alguns cidadãos do concelho de Moura, pedindo que seja permittido o uso de isca de productos naturaes.

Apresentada pelo sr. deputado Visconde da Ribeira Brava, e enviada á commissão de fazenda.

Justificação de falta

Declaro a v. exa. e á camara que tenho faltado ás suas sessões por motivo de enfermidade. = O deputado, J. a. de Sepulveda.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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