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permutações de Titulos desconhecidos inteiramente no mundo commercial, e digo mais, cousa que era inadmissivel. Sr. Presidente, como foi este negocio feito? O Governo pelo Decreto de 19 de Novembro de 1846 contractou com o Banco para fazer um emprestimo de 300 contos ao Contracto, quer dizer, interferiu em negocio que lhe devia ser estranho. É o Governo antes disso tinha consentido em que o Contracto do Tabaco podesse fazer a transferencia para a Companhia Confiança Nacional daquelle empretimo dos 4:000 contos, a que se tinha obrigado pela condição 72 do seu mesmo Contracto; e quem quizer vêr o que ha sobre esta transferencia, ha de vêr os Diarios do Governo n.ºs 170, 171, e 172 de 20, 21, e 22 de Junho de 1844.

Mas, Sr. Presidente, depois que aquella transferencia se fez, podia o Governo ser indifferente a que o pagamento se fizesse correntemente e em dia, e que se fizesse com toda a exactidão? Não podia, e não podia porque os Contractadores do Tabaco teem hoje duas condições que fazem unicamente a caução á Fazenda Publica, e vem a ser a condição 7.ª e 8.ª V. Exa. sabe, e todas as pessoas versadas n´aquillo, que são contractos, não desconhecem que, e especialmente desde o tempo da lei de 22 de Dezembro de 1761, § 34 Til. 2.º, a responsabilidade dos contractos é sempre solidaria, cada um por todos, e todos por cada um, mas é que é que aconteceu quando se sanccionou o Contracto com os actuaes Contractadores?.. Elles foram desobrigados da responsabilidade solidaria, quer dizer, estipulou-se que se fizesse o deposito de 200 contos, cujo deposito foi sempre considerado em todos os Contractos que se teem feito como deposito morto, e faz-se este deposito apenas está arrematado o Contracto, apenas se dá a certidão de arrematação, e antes de se proceder á ultima assignatura das respectivas condições, faz-se sempre este deposito de 200 contos: qual foi a condição 7.ª? Foi conceder aos actuaes Contractadores que elles fizessem o deposito de 200 contos divididos por mezadas em 12 mezes, uma em cada mez, até tantos de Abril de 1846: qual foi a 8.º Condição?.. A 8.º é que haveria um deposito de Inscripções no valor de 200 contos, entrando na Junta do Credito Publico um substituição á responsabilidade solidaria: por consequencia temos que a unica caução, que ha para solver a responsabilidade dos Contractadores para com a Fazenda Publica, vem a ser 400 contos, 200 contos em Inscripções pela responsabilidade solidaria, e 200 contos que são o deposito morto; pergunto, quando o alcance dos Contractadores exceder a 400 contos, n´um Contracto que não tem a responsabilidade solidaria, aonde vai o Governo buscar aquillo que o Contracto lhe possa dever?.. Sr. Presidente ha mais alguma cousa, não ha só a responsabilidade que os Contractadores teem para com a Fazenda Publica, ha a responsabilidade moral do Governo a respeito das obrigações rigorosas dos Contractadores para com os depositos de seus respectivos Administradores. O valor destes depositos é muito consideravel; e elles Contractadores apenas estão caucionados por 400 contos a respeito de seu comprometimento com todos os que possam vir a ter seus ligitimos credores.

Ora, Sr. Presidente, ha ainda outra cousa. Parece-me que a Camara convirá em que este é um motivo já sufficiente, e mais do que sufficiente para que este negocio se defina, e se ponha na verdadeira luz, em que deve ser posto; mas ha ainda um outro, e outro muito mais forte do que este, a escripturação regular que deve haver (Olhe V. Exa. que eu fallo da que deve ser, e não da que se faz, porque não sei mesmo como se faz, nem o posso saber) no Thesouro, porque ali deve haver uma Repartição Central aonde os Contractadores se acreditem todos os mezes por terem dado ao Banco de Portugal 25 contos de réis, porque não tem nada a transferencia do deposito com aquillo que é escripturação geral, para se mostrarem em estado corrente os mesmos Contractadores, aliás o Governo só pode saber aquillo que lá vai, quando o Banco vier a dizer - O Contracto deve-me 263 contos das prestações atrasadas - Ora a mim parece-me que é a lei de 13 de Junho de 1848 que estabeleceu que todos os Contractos que se haviam feito quando não havia pagamentos em Notas, pagassem os seus creditos em metal, e, Sr. Presidente, o Contracto paga no Banco 25 contos em cada mez, quer dizer 300 contos annualmente, paga com a 4.ª parte um Notas: ora pergunto eu o beneficio que resulta desta 4.ª parte em Notas, que ainda hoje estando a 20 por cento será 15 contos no anno, a favor de quem deve reverter? Não o direi; mas parece-me que deve ser definido por alguem (Uma voz: - Deu a hora).

Sr. Presidente, eu ouço dizer que deu a hora; desejo não amofinar a Camara por mais tempo; mas é preciso levar esta demonstração a um outro ponto mais extenso do que os que eu tenho tractado até agora, e é um dos assumptos a que eu desejo vir com especialidade, por isso peço a V. Exa. que me reserve a palavra para amanhã.

O Sr. Presidente: - Fica reservada a palavra ao Sr. Deputado. A Ordem do Dia para amanhã é a mesma de hoje. Esta levantada a Sessão. - Eram 4 horas da tarde.

O REDACTOR,

JOSÉ DE CASTRO FREIRE DE MACEDO.

N.º 4. Sessão em 6 de Fevereiro 1850.

Presidencia do Sr. Rebello Cabral.

Chamada - Presentes 49 Srs. Deputados.

Abertura - Á meia hora depois do meio dia.

Acta - Approvada sem discussão.

CORRESPONDENCIA. 1.º Do Sr. Deputado Lopes de Lima, participando que por incommodo de saude faltou á Sessão de hontem, e tem de faltar o mais algumas. - Inteirada.

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2.º - Do Secretario interino do Asylo de Mendicidade, acompanhando 25 exemplares do Relatorio e Contas da gerencia da Commissão Administrativa do mesmo Asylo, relativas ao anno economico findo. - Mandaram-se distribuir.

REPRESENTAÇÕES. - l.ª De 5 Capitães da Guarda Municipal do Porto, apresentada pelo Sr. Emilio Brandão, em que representam que considerando-se lesados nos seus vencimentos, comparados com os officiaes da sua classe no exercito, pela Carta de Lei de 26 de Agosto de 1848, pedem uma lei que distinga o soldo, e gratificação nos seus vencimentos, em harmonia com o que está seguido no exercito a todos os respeitos. - Á Commissão de Guerra.

2.ª - Apresentada pelo Sr. Xavier da Silva, em que a Camara Municipal de Lisboa pede prorogação da moratoria, que lhe foi concedida por 5 annos em 28 de Abril de 1845, pelo tempo que for necessario para se effectuar a inversão total dos padrões de juros de Capitaes mutuados para serviço do Estado. - Á Commissão de Legislação, ouvida a de Fazenda sendo preciso.

3.ª - Apresentada pelo mesmo Sr. Deputado, em que José Pedro de Menezes, e Antonio Amancio de Azevedo, ex-Beneficiados da extincta Basilica de Santa Maria de Lisboa, subsidiados do Estado, o primeiro empregado como Ministro do Tribunal da Curia Ecclesiastica, e o segundo Membro da Junta das Congruas parochiaes do Bairro d´Alfama, pedem que na discussão do Orçamento do Ministerio da Justiça se vote verba para que elles possam receber o seu subsidio por inteiro, como succede com outros subsidiados dos mais Ministerios, quando empregados em serviço publico. - Á Commissão do Orçamento.

4.ª - Apresentada pelo Sr. J. L. da Luz, em que a Camara Municipal de Lisboa expõe a necessidade que ha de abastecer a Capital com a agoa sufficiente para os seus habitantes, e pede providencias e meios pecuniarios, para que possa concluir-se a obra do encanamento das agoas descobertas no sitio da Buraca, Salreu, e nas Francezas, de cuja obra já se acham feitos 15:276 palmos de aqueducto. - Á Commissão do Orçamento.

O Sr. Assis de Carvalho: - A Commissão de Pescarias pede que faça parte della o Sr. Palmeirim, em logar do Sr. Nery, que já não pertence a esta Camara; e por isso mando para a Mesa a respectiva requisição.

Foi approvada a requisição.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto. Não ha segundas leituras. Passa-se portanto á Ordem do Dia que é a continuação do Projecto n.° 70 e correlativos, sobre a organisação do Banco de Portugal; e continúa a palavra ao Sr. Roussado Gorjão, a quem ficou reservada.

ORDEM DO DIA.

Continúa a discussão do Projecto n.° 70, na sua generalidade.

O Sr. Roussado Gorjão: - Sr. Presidente, quando hontem deu a hora de findar a Sessão, fui obrigado a suspender o meu discurso: tractava eu ainda da deducção dos motivos fortes, graves e de muito seria ponderação, que me parecia que demandavam todos a maior circunspecção sobre o estado do negocio do Banco de Portugal em assumptos da maior importancia, e da mais séria ligação com os interesses da Fazenda Publica.

Sr. Presidente, quando eu entrei na discussão desta materia, já eu disse que fui chamado a ella pela inopinada occorrencia de se julgar que a Lei de 28 de Agosto de 1848 tinha resolvido definitivamente a confirmação do Decreto de 19 de Novembro de 1846, e já depois de eu estar dentto desta Sala se me mostrou em um Jornal, nos extractos, não digo bem, no Juiz que se fazia da Sessão de hontem, estas significativas palavras - O Sr. Deputado Roussado Gorjão, e Assis de Carvalho, continuam a insistir em que o Decreto de 19 de Novembro não é lei do Paiz. - Sr. Presidente, deploro o não ter sido entendido naquelle sentido, em que eu me expliquei, e voltarei a este assumpo para em muito poucas palavras definir qual é o meu pensamento a tal respeito; é preciso que se entenda que é minha opinião, que em quanto durar a observancia determinada na Lei de 28 de Agosto, todos os diplomas de execução permanente das Dictaduras teem força de lei, em quanto não forem alterados pelas Côrtes: agora accrescentarei definidamente qual é a minha opinião a tal respeito; entendo, Sr. Presidente, e muito solemnemente o declaro de uma vez para sempre, que entretanto que as Côrtes não teem alterado ou modificado ou não approvado o Decreto de 19 de Novembro, elle tem força provisoria de lei; porque foi mandado continuar em observancia; agora quando d´aqui se quer tirar que já está na razão de uma lei com força de confirmação definitiva como outra qualquer lei do Estado, e que constitua o Banco de Portugal no direito de reclamar do Governo qualquer responsabilidade pelas alterações que as Côrtes fizerem em quaesquer concessões que se continham no Decreto alterado, como falta de cumprimento de estipulações contractadas - é isso, Sr. Presidente, o que eu não posso admittir, e que eu creio que ninguem admittirá; porém essa é precisamente a idéa que emittiu o illustre Deputado, e que eu pertendi impugnar.

Sr. Presidente, se a Lei de Agosto importasse aquillo que se chama definitiva confirmação, parece que nós não teriamos de discutir agora o que estamos discutindo, porque não se poderia fazer senão passado o anno de 1876; por isso mesmo que as disposições do Decreto de 19 de Novembro dão de duração ao Banco o prazo de 30 annos. Começou em 1846, e deita por tanto a 1876: por consequencia mesmo por força dos nossos actos na actualidade, o que se prova é, que a Camara está convencida de que as disposições da Lei de 28 de Agosto de 1848 não tem a força de definitivamente ter confirmado o Decreto de 19 de Novembro. Mas, Sr. Presidente, digo ainda mais, esta e tambem, creio eu, a verdadeira opinião da illustre Commissão de Inquerito expressada no seu Relatorio, que forma parte do Parecer n.° 49 que está em discussão; pois não diz a mesma illustre Commissão alli, que o Decreto de 19 de Novembro está pendente da confirmação do Corpo Legislativo? Não recommenda ella muito circunspectamente que se attenda a que houve um accordo entre o Governo e o Banco, de que nasceram factos consumados que merecem ser bem apreciados no acto dessa confirmação? E fal-o hia ella assim em 1849, quando acreditasse que o Decreto de Agosto de 1848, havia definitivamente confirmado o Decreto de 19 de Novembro de 1846? Não o creio, Sr. Presidente.

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Sobre este assumpto não me demorarei; mesmo até porque o não reputo digno de merecer a attenção de pessoas competentes sobre a materia. Em assumptos de Legislação, Sr. Presidente, a terminologia, e o respectivo sentido litteral que lhe corresponde, são objectos que merecem a maior consideração (Apoiados). Terminando desde já com o que é relativo a esta materia, assegurarei a V. Exa. e á Camara que não tenho empenho algum em prolongar esta discussão, ao contrario desejaria muito pode-la abbreviar, e que ella terminasse no sentido mais util para o interesse publico do Paiz. Sr. Presidente, mas houve duas circumstancias especialissimas que eu pedirei á alta sabedoria da Camara que as peze, e que as peze com a sua natural benevolencia, e que as peze com a sua natural circunspecção.

Sr. Presidente, está dado o motivo porque eu pedi a palavra para entrar na discussão da generalidade; o Orador que encetou a discussão, mostrou-se um pouco resentido, e chamou até áquillo que eu disse, provocação; mas o Sr. Deputado na segunda vez que fallou, a Camara creio que se recordará, parece-me que interpretou aquillo que eu havia dicto, quero dizer, no seu sentido essencial, de uma maneira um pouco inexacta; e fez sentir que parecia que eu tinha offendido o melindre da illustre Commissão de Inquerito, e o melindre da illustre Commissão de Fazenda do anno de 1848, que me obrigou a fazer uma ratificação momentanea, que me parece que ella não produzira inconveniente: depois aconteceu que o illustre Presidente da Commissão do Inquerito querendo generosamente desculpar aquillo que chamou meus bons desejos, attribuiu a minha equivocação á desculpa de eu ver as cousas por um prisma que apresentando côres, ora vermelhas, ora amarellas tinha podido illudir a pureza das minhas intenções. O mesmo illustre Presidente da Commissão de Inquerito que teve a bondade e a benevola urbanidade de querer olhar com summa indulgencia os meus bons desejos, a minha logica e a minha grammatica, achou todavia que no Projecto que se acha lançado no Diario do Governo n.º 70 em data de 23 de Março de 1849, havia alta discordancia em genero, numero e caso entre o corpo do Projecto e aquillo que se achava no Relatorio: Sr. Presidente, ingenuamente o direi, e eu espero achar desculpa em todos os que teem coração: parece, Sr. Presidente, que na idade perto de 73 annos, e cégo inteiramente como estava em 1849, não podia absolutamente ser illudido pela visualidade das côres de qualquer prisma, por isso mesmo que um cégo não póde distinguir côres; e tambem me parece que seria muito mais ingenuo (e que eu agradeceria muito mais) se o illustre Deputado franca e lealmente impugnasse em termos claros e francos o Projecto a que se referiu. Dados estes motivos sobre a razão que eu possa ter para mais alguma cousa me estender sobre a materia, vou entrar na questão essencial.

Quando hontem suspendi o meu discurso, Sr. Presidente, vinha eu dizendo os inconvenientes que resultavam de não estar bem definida a situação do Contracto do Tabaco com a Companhia do Banco de Portugal, e qual era verdadeiramente o estado da sua situação, e do corrente da sua conta, com este Estabelecimento, e com a Fazenda Publica.

Sr. Presidente, de que este assumpto ainda não está solidamente definido, existe a prova em uma circumstancia muito especial, por que não haverá ninguem hoje que possa dizer a respeito dos 4$000 contos de réis, se é o Governo que deve ao Banco, ou se é o Contracto do Tabaco quem lhe deve. Foi uma antecipação estipulada com o Contracto do Tabaco; obrigação muito explicita que vem consignada na condição n.º 72, e que como tal constitue desde logo verdadeiramente uma forma de pagamento; por que o Contracto era conservado por 12 annos, e os Contractadores obrigados a pagar 1:0521 contos de rs., por cada um desses annos, com obrigação de fazer um emprestimo de 4$000 contos de réis a que se destinou desde logo juros e competente quota de amortisação no valor de 300 contos de réis annuaes. Creio que enunciado o assumpto deste modo, todo o mundo verá que esta transacção voluntaria existe, e, se existe, existe entre o Contracto do Tabaco e não entre o Governo e o Banco; e que o Governo não póde ser obrigado senão a respeito d´aquillo que contractou com o Contracto do Tabaco, porque na transacção que veiu a haver, ainda que appareceu uma expressa conclusão da parte do Thesouro Publico, essa é aquella que é estabelecida em tudo quanto são Contractos daquella natureza, mas que de modo nenhum sujeita o Governo como ao devedor ao Banco, quero dizer, não muda em nada a obrigação que tem o devedor, nem a qualidade do credor. Consentiu-se e até o digno magistrado Procurador da Fazenda disse mesmo que entendia que não ha inconveniente, por isso mesmo que a Fazenda Publica ficava mais segura com aquelle reforço.

Mas, Sr. Presidente, quando aquelle deploravel cazo que nos levou ao estado em que nos achamos, veiu apresentar a calamidade monetaria que o Paiz soffreu, appareceu desde logo uma versão e disse-se - o Governo deve ao Banco a quantia de 13$000 contos de réis, e na parte dos 13$000 contos de réis entravam esses 4$000 contos de réis. Ora, Sr. Presidente, agora tractarei eu de ver as circumstancias especiaes que devem merecer todo o cuidado do Governo sobre este assumpto: - o Contracto do Tabaco pela sua arrematação tem um prazo definido de 12 annos; e o prazo para a solução do pagamento dos 4:000 contos estende-se a 23 annos, que excede de 11 ao prazo da arrematação. Ora agora notarei eu, vem no Parecer da illustre Commissão de Inquerito notada a bonificação de 85 contos de réis cada anno que recebe o Banco de Portugal, pela transferencia desse emprestimo.

Eu tenho ouvido, e não posso asseverar até que ponto seja exacto (porque não vi a escriptura celebrada nas Notas do Tabellião desta Cidade Antonio Simão de Noronha, e quaes foram as condições desse Contracto) que os Contractadores do Tabaco tinham verificado a transacção com a Companhia Confiança Nacional, offerecendo o juro de 5 por cento que recebiam do Governo, e dando mais 2 por cento sobre esse juro que eram 7 por cento: entretanto aqui hade haver necessariamente uma equivocação, por que se foram só 2 por cento que se offereceram de bonificação, então recebe 80 contos de réis: mas a illustre Commissão faz menção de uma bonificação de 85 contos de réis, o que já é differente para o que tinha a tractar.

Perguntarei eu agora, desde que o Contracto terminar os 12 annos, como é que continua a haver o pagamento de juros, e amortisação daquelle empres-

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timo? Será só pelo pagamento dos 5 por cento que o Governo tinho contractado com o Contracto do Tabaco! Será pelos 7 por cento que se contractaram com a Companhia Confiança Nacional? Se forem os 7 por cento, a Fazenda Publica fica prejudicada em 2 por cento, e 2 por cento é alguma cousa n´um ponto como são 4:000 contos de réis.

Perguntarei ainda, se acaso tem tenção o Contracto quando findar, de distractar a sua transacção com o Banco de Portugal, será o Governo obrigado a continua-la? Se for obrigado a continua-la, naturalmente ha de ser pela convenção sublocataria entre os Contractodores e o Banco de Portugal, e então é prejudicada a Fazenda Publica em 80 contos de réis em cada anno: se acaso terminar a transacção com os Contractores; se os Contractadores estão apenas cancionados no Thesouro Publico pelos 400 contos de réis, que a tanto montam os 200 contos de deposito, e 200 contos de Inscripções, pergunto, como póde ser obrigado o Contracto do Tabaco á promptificação deste pagamento nos 11 annos que excede o seu Contracto? Parece-me que este assumpto é digno da maior consideração.

Eis aqui o motivo porque eu entendia que além do grande serviço que provém dos trabalhos da illustre Commissão de Inquerito, deveria haver alguma outra cousa que não fosse só fazer o que houvesse de fazer em virtude da sua incumbencia, mas fosse fazer tambem o que não era da sua incumbencia, e que por isso o não quiz fazer.

Este objecto chamava-me desde já a ir tractar do outro assumpto que hontem tractou o illustre Presidente da Commissão de Inquerito, que hoje é o illustre Presidente da Commissão de Fazenda, sobre o Projecto de Lei que tive a honra de apresentar no anno de 1848, que se acha impresso no Diario do Governo n.° 70 de 23 de Março de 1849.

Disse o illustre Presidente da Commissão de Inquerito, que a Commissão de Fazenda então tinha sido de opinião que não podia, ser admittido aquelle Projecto (e exactamente é isto que se verificou) por tres motivos expendidos pela mesma Commissão: primeiramente - porque a admissão naquella occasião importaria um adiamento indefinido: segundo - porque esse adiamento iria prejudicar a pressa que o Governo tinha de fazer discutir o Projecto n.°,100, que tinha ido a reconsiderar á Commissão do Orçamento: terceiro e finalmente - porque era escusado que ao Governo se désse uma auctorisação para objectos para que estava auctorisado por suas proprias attribuições, e porque não tinha querido fazer uso dessas attribuições. Farei algumas observações sobre estes motivos da illustre Commissão.

Poderia argumentar-se com o motivo que teve a illustre Commissão, julgando que importava um adiamento indefinido, se se dissesse que effectivamente dentro em 15 dias ou um mez, o Parecer fosse discutido, e estivesse decidida definitivamente a organisação do Banco de Portugal: porém, Sr. Presidente, o Projecto não foi aqui lido, não foi discutido porque não veiu á discussão, e foi peior que o adiamento, porque ainda hoje está por organizar o Banco de Portugal. - A pressa que tinha o Sr. Ministro da Fazenda naquella época, pedia uma resolução definitiva; sobre esse objecto farei a mesma observação que tinha acabado de fazer.

Agora sobre ser um pouco inconsequente, que o Governo fosse auctorisado para uma cousa que nas suas proprias attribuições tinha auctoridade para fazer; ha agora uma observação a fazer, e vem a ser, que o Governo antes de trazer ás Côrtes aquelle assumpto, antes de pedir ás Côrtes que o Parecer n.º 100 fosse reconsiderado, estava nas suas attribuições o ter feito nomear uma Commissão externa, e fazer com que esses trabalhos desta Commissão se apresentassem ao Corpo Legislativo para este assumpto ser decidido definitivamente: mas desde o momento em que esse negocio passou a ser affecto a esta Camara, parece-me que já não estava então nas attribuições do Poder Executivo o fazer nomear essa Commissão, para preparar elementos para uma decisão que viria a ser tomada com muita precipitação.

Agora passarei ao terceiro motivo; dizer que o Governo não quiz usar dessas attribuições para que estava auctorisado, porque não achava necessario; peço que me seja disculpado, e peço perdão ao illustre Presidente da Commissão de Inquerito para lhe dizer, que ha um motivo que me parece contraproducente com esta opinião, e esse é que quando a illustre Commissão de Inquerito foi incumbida do exame que foi fazer ao Banco de Portugal, foi ella mesma quem sollicitou ao nobre Ministro da Fazenda então, o Sr. Lopes Branco, que officiasse á Associação Mercantil de Lisboa, e á Associação Mercantil do Porto, para darem a sua opinião sobre objectos concernentes a este assumpto.

As respostas destes dois Estabelecimentos acham-se appensas ao Relatorio do Parecer n.° 49, e tem alli o numero 24 e 25. Ora, Sr. Presidente, pois o Governo não achava conveniente consultar opiniões de fóra, e dá-se a inconsequencia de uma cousa, que é, a illustre Commissão que achou que não era digno de vir á discussão o Projecto de Lei que eu apresentei, diz em 15 de Março, que julga que o Governo linha na sua mão poder fazer uma cousa que nunca julgou necessaria, ao mesmo tempo, que no dia 26 de Fevereiro (dez ou doze dias antes) tanto se julgou isto necessario que se pediu ao Sr. Ministro da Fazenda para officiar a estas duas Associações para darem o seu parecer? Por consequencia parece-me que os motivos principaes apresentados pela illustre Commissão de Fazenda para não ser admittido á discussão o Projecto que tive a honra de apresentar, não podem subsistir na presença das observações que acabo de fazer.

Agora, admirou-se o illustre Presidente da Commissão de Inquerito, de que eu dissesse que tinha sido a minha opinião no momento em que apresentei aquelle Projecto, e que ainda hoje mesmo era essa minha opinião, de que aquillo era conveniente; admirou-se muito disto; pois, Sr. Presidente, torno a confirmar o que disse, e digo mais, que aquelle numero de 14 Membros, que foi considerado como umas pequenas Côrtes, se hoje eu o fizesse, ou se se vier a fazer alguma cousa que seja simllhante áquella, farei com que sejam mais dois Membros, porque, por um fatal esquecimento, não meu, porque não podia então escrever, deixou de se metter alli mais dois commissionados pelo Banco Commercial do Porto; e se houvesse de se fazer obra por esse Projecto, eu pediria que em logar de serem 14 os Membros, fossem 16.

Direi mais alguma cousa que me parece que vem muito em favor da minha opinião a este respeito. Sr. Presidente, eu tinha apresentado o meu Projecto de

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Lei em Março de 1849; aquí assentou-se que elle devia ser rejeitado, e não vir á discussão, e o que vimos nós no paiz visinho logo no mez de Abril? O que se fez alli a respeito do Banco de S. Fernando? Não foi reformada a sua instituição, e reforçado talvez em 240 milhões de reales? Não foram chamados, convidados e convocados para entrar neste assumpto tudo quanto eram associações de Cadiz, Valencia e Barcelona? Pois quando nós estamos a ver, que no paiz visinho, e note-se bem, que alli nunca a calamidade monetaria chegou ao ponto a que chegou aqui, porque os papeis do Banco nunca excederam a 13 por cento de perda, e isso não durou quatorze dias, - e quando se tractou de estabelecer o Banco em ordem de poder prestar os serviços que prestam taes Estabelecimentos, nas Notas do Banco não se perdiam senão 2 por cento. Alli não se julgou que era indecoroso ouvir as pessoas que eram competentes para entrar nestes assumptos; competentes lhes chamo eu, não é porque não repute competentes para conhecer da materia os Membros da illustre Commissão de Inquerito, muito longe disso, sou o primeiro a respeita-los, mas competentes para aquillo que eu queria. Para que se formou o Banco de Portugal, não foi para evitar os males, e regular a circulação, melhorar o credito, e prestar soccorros ao Governo e a particulares? De certo; ora o que eu queria era que se conhecesse, se effectivamente o Banco de Portugal estava na razão adequada de poder desempenhar este pensamento, e desde que se assentasse que não desempenhava, procurar remedio para o fazer. Ora pergunto eu, como se havia de fazer isto, não era procurando capitaes e meio circulante? E o Banco de Portugal tinha esse meio circulante? Não tinha; não tinha senão uma massa forte, mas uma massa de activo, e nada mais. Eis-aqui o motivo porque eu queria que essa questão aqui viesse. E não se diga que as Companhias das Lesirias, e Alto Douro não eram competentes para este assumpto; em Hespanha foram chamadas todas as Associações, que deviam ser monetarias, e que deviam ter capitaes, porque, se os não tivessem, muito mal iriam; porque o resultado que as esperava, era o mesmo que aconteceu ao Banco de Lisboa.

Creio pois Sr. Presidente, que tenho demonstrado que as razões que moveram a illustre Commissão de Fazenda a achar que não podia ser admittido á discussão o meu Projecto de Lei, não podem subsistir, por isso mesmo que não importa um adiameto indefinido, nem era prejudicial á não discussão do Projecto, que effectivamente se não discutiu até hoje, nem era mesmo admissivel que o Governo não quizesse o que era mais util.

Parece-me pois que tenho demonstrado que aqui não ha aquillo que podiam ser as reflexões; de um visionario, nem falta de concordancia em genero, numero e caso entre o Relatorio e o Projecto. Entendo que a Camara me fará a devida justiça de acreditar que tudo aquillo que tenho apresentado, é com a maior puresa de intenções; entendo que o negocio é da mais alta importancia para o Paiz, e desde que digo isto: digo tambem que hei de votar sempre pelo que entender que é melhor e mais util para o bem geral da Nação (Apoiados)

O Sr. D. Prior de Guimarães: - Peço a V. Exa. que consulte a Camara se a materia está discutida.

Julgou-se discutida.

O Sr. Roussado Gorjão: - Peço a V. Exa. que proceda á contra-prova.

Achou-se que se tinha julgado discutida, por 51 votos contra 1

E pondo-se logo á votação o

Projecto n.° 70 na sua generalidade - foi approvado por 56 votos contra 2.

O Sr. D. Prior de Guimarães: - Peço a V. Exa. que consulte a Camara se dispensa o Regimento para se entrar já na discussão da especialidade deste Projecto, porque está dado ha tanto tempo para ordem do dia, que a Camara deve de certo ter já formado a respeito delle a sua opinião.

Decidiu-se affirmativamente por 57 votos contra 2.

O Sr. Meneses e Vasconcellos: - A Commissão de Legislação requer que lhe sejam aggregados, unicamente para o objecto da Lei da Liberdade de Imprensa, os Srs. Corrêa Caldeira, Pereira dos Reis, Eugenio de Almeida, e José Ricardo; e para isso mando para a Mesa a respectiva requisição.

Foi approvada.

E passando-se logo á especialidade do Projecto n.° 70, pôz-se á discussão o

Art. 1.° "É confirmada a incorporação do Banco de Lisboa com a Companhia Confiança Nacional, formando um novo Estabelecimento com a denominação de Banco de Portugal."

O Sr. Costa Lobo: - Sr. Presidente, d´aqui mesmo discutirei, porque tenho em vista, com especialidade, combater os argumentos do illustre Deputado que acaba de fallar, e para que S. Sa. possa observar, e mesmo advertir-me no caso de algum equivoco meu, por isso eu conservarei este logar durante este meu discurso, que não será longo, espero eu. Esta disposição primeira do Projecto (leu) qnasi que é uma these que comprehende todas as differentes disposições do mesmo Projecto, e a ella podem ser chamadas todas as questões que depois teem de ser trasidas. Por consequencia eu escolhi este primeiro artigo, por isso que assim me julgo em um estado de mais liberdade na discussão, e enumeração dos meus argumentos.

É com prazer que eu vi que este Projecto não foi adiado; confesso que as razões que os illustre Deputados apresentaram para o seu adiamento, não tiveram em meu espirito força bastante para me levarem á convicção da conveniencia da sua Proposta. Se o Banco de Portugal fosse instituido com o unico fim de fazer emprestimos ao Governo, então muito colheriam os argumentos da conveniencia de primeiro ser organisada a Fazenda Publica; mas o Banco de Portugal não tem só em vista fazer emprestimos ao Governo, mas antes o beneficíar a industria commercial, fabril, e agricola, e tendo esta questão estado nesta casa desde o principio desta Legislação, isto é, ha tres annos consecutivos, não póde ser conveniente aos interesses do Paiz espaçar-se ainda por mais tempo (Apoiados)

O Banco de Londres tambem foi instituido n´uma crise desgraçada da Fazenda Publica, e foi instituido quasi que principalmente para fazer emprestimos ao Governo, com o fundo primitivo de 1:200$000 libras sterlinas, e não obstante precedeu o estabelecimento do Banco a essa organisação da Fazenda (data este Banco de mais de 150 annos) era ella desgraçada naquelle hoje felicissimo, e de ha muito riquissimo

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Paiz. Este exemplo vem tambem para a minha opinião de que não devia ser adiada a definitiva organisação deste Estabelecimento, do qual se discute e se tracta aqui já ha tres Sessões Legislativas.

Sr. Presidente, o activo do Banco de Portugal não é como disse o illustre Deputado que me precedeu, nem um só real effectivo, sonante em caixa, não era assim quando foi instituido por Decreto de 19 de Novembro, nem hoje o é. Permitta-me S. Sa. que eu lhe diga - em todos os Estabelecimentos Commerciaes e a practica não conservar o dinheiro improductivo; o dinheiro quando muito existe alli para fazer face ás Notas que andam em circulação, que quando os portadores cheguem ao Banco, possam receber o numerario effectivo; e infelicidade seria para os accionistas se nas Caixas dos Bancos estivessem tantas sommas em metal como o valor das Notas, porque então os seus lucros não podiam deixar de ser pequenissimos, por isso que descontando estes Bancos, sendo da essencia delles o descontarem a um juro pequeno para favorecerem a Industria e o Commercio (se descontassem a um juro forte, sem duvida deixariam de prestar este auxilio) então fazendo dobrar por um tal auxilio os seus capitaes podem a um juro modico dar bastante interesse nos seus Accionislas, e favor ás diversas industrias.

O Banco de Portugal instituido pelo Decreto de 19 de Novembro: (disse um digno Director daquelle Estabelecimento) tem de facto favorecido a Industria commercial, fabril, o agricola. Eu dou documento disso, e dou documento em abono da verdade. Eu sou gerente do Estabelecimento mais antigo que tem o Paiz, da Companhia Geral dos Vinhos do Alto Douro, este Estabelecimento por muito tempo deveu sommas de muitas importancia, muitissimo fortes ao Banco de Lisboa, e depois ao Banco de Portugal; a Companhia nunca foi inquietada, absolutamente nada, nunca foi inquietada pela administração do Banco de Portugal a este respeito. Esta justiça que, eu faço, deve ser tanto mais apreciada, quanto hoje este Estabelecimento tendo podido satisfazer ao Banco de Portugal todas as quantias que lhe devia, não póde levar-me a captar benevolencias; (Apoiados) mas se lhe satisfez e entregou essas quantias, foi porque teve meios e lhe foi conveniente fazer esse pagamento, e não que a Administração do Banco de Portugal, violentasse cm cousa alguma aquelle Estabelecimento. Digo mais pela minha casa, como particular tive varias vezes negocios com a Caixa Filial do Banco de Lisboa na Praça do Porto, e fui sempre perfeitamente bem tractado. Não digo isto por dependencia, porque de ha muito felizmente eu não tenho alli dividas passivas, dividas sobre mim, por conseguinte esta minha confissão é insuspeita. Mas digo mais, gerindo eu por varias vezes e por muito tempo os primeiros Estabelecimentos Commerciaes do Porto, e tendo varias relações com negociantes particulares, de nenhum delles sei que fosse mal tractado, antes pelo contrario, de todos sei terem sido favorecidos pelo estabelecimento do Banco de Portugal. Esta é a verdade, e é do meu dever dar aqui um testemunho desta verdade.

Por consequencia ja vê illustre Deputado que effectivamente o Banco de Portugal tem favorecido as Industrias commerciaes e agricolas, e tanto as tem favorecido que esta verdade que acabo de relatar, o demonstra completamente.

Mas não tinha um real sonante, insiste o illustre Deputado; e eu respondo - todos os Estabelecimentos Commerciaes teem a mesma sorte, o numerario que teem nas suas Caixas, é apenas parte das Notas que trazem em circulação; porque um Banco de Deposito, um Banco de Emprestimos, um Banco de Descontos, um Banco de Circulação ha de emittir papel superior ao dinheiro que tem nos cofres, para assim tirar o duplicado juro, para que emprestando dinheiro a prego modico, favorecendo assim as industrias, possa tirar algum interesse para os seus Accionistas (O Sr. Roussado Gorjão: - Peço a palavra, Sr. Presidente) Mas tinha papeis que tinham valor no mercado, tinha papeis, porque tinha credito sobre o Governo que orçavam por 7:000 contos, tinha Inscripções que podia reduzir a dinheiro, tinha Letras de particulares de que podia dispôr, e tinha a receber a annuidade do Contracto de Tabaco, de 300 contos, que effectivamente tem recebido.

Isto foi uma pequena divagação, e eu entrarei na questão a fundo, porque ella é sem duvida importantissima, e eu desejo profundal-a quanto minhas forças moraes mo permittirem.

O illustre Deputado diz - Eu apresentei um Projecto. É verdade; esse Projecto foi apresentado por S. Sa. em 1848, eu tinha a honra de ser Membro da Commissão de Fazenda, e lá foi muito discutido, é verdade, eu li com a maior attenção as suas reflexões que me convenceram (se tanto eu carecesse, mas já o não carecia) de que o illustre Auctor do Projecto tem um talento vasto e conhecimetos profundos sobre a materia. Mas permitta-me o illustre Deputado que eu diga que elle estava um pouco alheio dos factos, e que se collocou fóra da esfera delles, se acaso se collocasse dentro da esfera dos factos, havia de tirar conclusões diversas, porque teria visto que os principios que S. Sa. estabelecia, não eram adequados a epoca em que os apresentava.

Sr. Presidente - o Decreto de 19 de Novembro - esta era a these que agradava muito ao illustre Deputado que se tomasse para a discussão: S. Sa. sabe perfeitamente que este Decreto comprehende a circulação, comprehende a organisação definitiva do Banco, e comprehende o Fundo de Amortisação, a primeira parte uma das mais interessantes - a Circulação da Moeda - essa esta definitivamente determinada pela Lei que passou em Côrtes de 13 de Julho de 1848, era a questão das Notas; era a questão das Notas; era Presidente, em cuja discussão aqui entrei por varias vezes, eu tinha assignado um Projecto apresentado pelo illustre Deputado o Sr. Agostinho Albano, em que differia um pouco do Parecer apresentado pela Commissão; e permitta-me a Camara que eu diga, que ainda hoje estou pelas ideas que alli se apresentaram, tive não obstante, e por muitas vezes, e sustentar o Projecto da Commissão. De mais todas as pessoas que differiam em alguma cousa do Projecto da Commissão, hoje attribuem a si a gloria, e dizem - Se tivessem seguido o que eu então indiquei, as cousas teriam a este respeito corrido melhor: posso tambem eu gosar a mesma sorte. Eu disse por varias vezes, e ha de estar consignado nas paginas do Diario da Camara, que aquillo que a Lei estabecia, era completamente providente, em quanto á Amortisação, que mesmo eu julgava que podia ser ainda menor a Amortisação, mas em fim que aquillo se se estabelecia a este respeito, o era muito bem,

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se acaso as forças do Paiz comportavam aquella Amortisação em escala tão grande; porém que a Circulação alli não era favorecida quanto eu desejava, era alguma cousa favorecida, mas não tanto quanto eu desejava, e quanto entendia que era preciso ella ser favorecida. Disse eu então que o Agio das Notas não havia de melhorar tanto, como eram e deviam ser as nossas esperanças, porque ainda que a Amortisação era o remedio radical, por isso que deixava de existir esse Papel depreciado, era certo que ella actuava muito pouco sobre o valor das Notas, e que o remedio prompto e de acção immediata era o estender a Circulação. Não obstante eu ter visto que a minha opinião (infelizmente em meu pensar) não podia vingar, eu sustentei com a maior lealdade as diversas provisões do Projecto que foi approvado, por isso que se eu não podia obter tudo, segundo as minhas idéas tudo o que era necessario, obtinha quanto podia; e entendia que não podia por mais tempo ficar n'um estado de incerteza aquelle Papel - as Notas - para que não succedesse o mesmo que succedera ao Papel-Moeda. Disse eu então isto, não sei se pude dize-lo claramente, de maneira que fosse sufficientemente entendido, se o não consegui, o defeito foi todo meu; mas digo agora como muitos outros Srs. Deputados o dizem - Se fora seguido o meu arbitrio, teriam as cousas corrido melhor. Se isto é defeito, arrogar-me esta gloria, estou no mesmo defeito em que estão outros muitos. A providencia que tomou o Sr. Ministro da Fazenda, porque melhorou o Agio das Notas? Foi porque augmentou a Circulação. E porque augmentou a Circulação? Porque se apresentou como um comprador no Mercado a comprar 50 contos, ou 60, mensaes, e um comprador tanto mais valioso, que guardava este Papel, ainda que a final tenha de ser vendido, e augmentava a procure e Circulação delle, e é isto o que augmentava o valor de uma moeda Papel.

Sr. Presidente, nessa época tive mais a lamentar que apresentando o Projecto originario como regra - Que os pagamentos, tanto do Estado, como entre Particulares fossem um quarto em Notas, infelizmente em meu entender passou que a regra geral fosse que os pagamentos entre particulares se fizessem todo em metal, e como excepção sómente o quarto em Notas, podia ser um quarto em Notas, metade ou tudo porque ficava isso em completa liberdade entre o particulares. Isto limitou ainda mais a Circulação das Notas. Quando foi apresentada esta emenda, eu não estava na Casa, se estivera, tinha esperança de apresentando as minhas razões, poder levar a Camara conservar o que estava no Projecto.

Sr. Presidente, isto não é opinião minha destaca da: tem-se fallado aqui muito na Praga do Porto ninguem a respeita mais, ninguem deve mais do que eu áquella Praça; mas digo com orgulho ao illustre Deputado - que eu tive um voto unanime de agradecimento da Associação Commercial daquella Praça pelas idéas que apresentei no Parlamento ácêrca de Notas, e que este é o Titulo com que mais me honro durante toda a minha vida, a vida, que tenho percorrido, é o Titulo com que mais me ufano, e que reputo o mais valioso (seja-me permittida esta vaidade) o de ter como tive um voto unanime de agradecimento daquella Praça; e não me consta que outro tenha sido concedido igual favor: e orgulho nobre, eu devo ser desculpado (Apoiados) (O Sr. Presidente do Conselho: - Apoiado.) Mas disse eu que uma das partes principaes do Decreto de 19 de Novembro já estava determinada ultimamente, já tinha passado a ser Lei, tinha sido discutida nas duas Casas do Parlamento, e sanccionada pelo Poder Moderador; e como havia de ser apresentado como thema de discussão um Decreto que já estava reduzido a Lei?

Sr. Presidente, quando se deu o curso forçado ás Notas, todos gritaram, ninguem queria tal medida, ninguem queria o curso forçado as Notas, nem os Estabelecimentos commerciaes reunidos, ninguem queria isso assim; mas eu disse que daria muitos louvores a quem refrendou esta medida, e dou muitos louvores ao Ministerio de Maio neste ponto, porque deu curso forçado ás Notas, e vou demonstrar se devo ou não dar louvores ao Governo que assim procedeu.

Sr. Presidente, quando houve esse movimento de Maio, que é o que tinham os Bancos? Tinham Notas: que tinham os capitalistas que descontavam letras? Tinham Notas. Como haviam de os Negociantes solver os seus vencimentos senão se désse o curso forçado as Notas? Não podiam por modo nenhum. O Banco do Porto com um fundo especial de 1:500 contos, mas empregados no giro do seu commercio na maxima parte, tendo perto de 500 contos de Notas na circulação, como as havia satisfazer trocando-as por metal? Não podia. Eu chegando em 25 de Maio ao Porto fui chamado por seus Directores, e eu tambem fazia parte da Direcção nessa occasião, e disseram-me -Aqui estão correndo todos os possuidores de Notas para que lhes sejam pagas; que havemos de fazer a isto? - Eu fiz vêr as difficuldades em que estavamos, e em minha opinião, o que convinha fazer, e então dissemos aos portadores das Notas - Nós não temos metal para vos pagar, temos Notas do Banco de Lisboa; mas já dissemos isto, porque sabiamos que não podiam ser protestadas as novas Notas, offerecendo em pagamento Notas do Banco de Lisboa, a vista da medida que o Governo tinha tornado. Por consequencia, o Banco do Porto lucrou com essa medida; e os commerciantes do Porto? Elles não achariam quem lhes descontasse uma letra geralmente fallando, se as Notas não tivessem o curso forçado, e em quanto essa medida não appareceu, todas essas casas tiveram que temer, e temer muito.

Ora vamos a vêr o mal que veiu aos possuidores das Notas com essa medida. Não lhe veiu mal nenhum, porque se o Banco de Lisboa fosse ao Tribunal de Commercio, os possuidores das Notas haviam de ter muito mais prejuizo do que tiveram naquella época, porque o desconto das Notas até Outubro foi muito insignificante (Apoiados) Digo mais, Sr. Presidente, se a Legislação sobre Notas não fosse alterada, e por mais de uma vez, o seu agio não diminuiria tanto o valor dellas, não diminuiria como diminuiu (Apoiados) foi uma grande calamidade para o Paiz as alterações que se apresentaram aquelle respeito; senão fossem essas alterações, as Notas nunca chegariam ao estado de depreciação a que chegaram (Apoiados) Sr. Presidente, eu ouvi dizer a varios Negociantes muito entendidos, e da melhor boa fé, que até as Letras de Cambio de Paizes Estrangeiros não deviam ser exceptuadas, até essas deviam ser pagas em Notas; mas desgraçadamente as

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opiniões eram diversas, e tiveram muito pêso no espirito do Governo, e d´ahi resultaram os grandes inconvenientes que se seguiram de se alterar a disposição que regulava este artigo. Por consequencia o Decreto de 19 de Novembro estabelecendo por um modo permanente a Legislação a tal respeito, foi, na minha opinião uma medida muito salutar, e de muita utilidade, e por isso eu dou, como Deputado da Nação Portugueza, muitos louvores ao Ministerio dessa época, que referendou esse Decreto (Apoiados}

Sr. Presidente, em 1797 quando o Banco de Inglaterra se achou em estado de crise, foi dispensado pelo Governo de fazer o pagamento de suas Notas, e não houve para isso discussão. Eu comparo muito as discussões que teem havido com o Banco de Portugal, com as que houve em 1836 e 1837 com a Banca dos Estados Unidos: eu vi que um dos primeiros economistas, que ainda hoje vive, dizia -quanto se enganam; a Banca dos Estados Unidos tem sido o primeiro motor da felicidade daquelles Estados - e dizia - que os Directores daquelle Estabelecimento não deviam ir a polemicas, porque ainda que tivessem duas vezes razão, haviam de encontrar somente injustiça. - Cita o mesmo auctor o seguiate facto: os veteranos da independencia, estando pelas Leis do Congresso a cargo da Banca o pagamento dos seus soldos, recebiam quando e como queriam, até com um cheque sobre a Caixa da Banca; o Poder Executivo exigiu a entrega dos Livros respectivos para fazer este pagamento, os Directores recusaram-se, os Destractores da Banca gritavam, e diziam - é necessario tirar os dinheiros desta Banca, porque ella quer ficar com os que pertencem aos illustres militares que verteram o seu sangue pela independencia! - Entre nós procede muita paridade neste objecto. Por consequencia, dou os devidos louvores ao Ministerio que marchou como devia marchar, publicando o Decreto de 19 de Novembro, reunindo os diversos Estabelecimentos, e conseguindo assim dar a existencia a um Banco, que, espero eu, será fonte de riqueza para o Paiz, e interesse para os seus accionistas.

Sr. Presidente, não era hoje possivel estabelecer um Banco de descontos, e porque não era possivel? Quem havia de querer concorrer com os seus capitaes, depois do que o Paiz tem experimentado, para a dotação de um grande Estabelecimento Commercial? Ninguem. Tenho visto grandes offertas para realisar pequenas quantias, e para pequenas cousas, como, por exemplo, para a obra da Barra do Porto, e tenho visto que ninguem quer prestar os seus capitaes; e porque? Pela falta absoluta de confiança (Apoiados)

Sr. Presidente, eu quero que o Banco de Portugal organisado mesmo como meio de ordem. Eu vejo neste Paiz muito poucos elementos de ordem (Apoiados). Como se tem salvado todos os paizes hoje? Com grandes massas disciplinadas de tropas? É com dinheiro. O que seria da Hungria se não fosse o papel do seu Banco? Kossuth e Georgei sustentariam a guerra que sustentaram, se não fosse este papel? E quem prestava os meios pecuniarios? Era o Banco pelas suas Notas que representavam dinheiro, e foi o Banco com as suas Notas que fez com que essas massas enormes de tropas não entrassem nas cazas dos particulares e as roubassem todas. Em Roma o que seria se não fosse o Banco de Roma? A Austria, esse grande gigante do Norte, como sustentaria os seus poderosos exercitos? O Banco de França, aquelle emprestimo que elle fez ao Governo na revolução de Fevereiro, não lhe foi tão proveitoso? Não habilitou o Governo a pegar nessas grandes massas que lhe pediam pão, não as tirou da Guarda Nacional, e não as metteu na Guarda movel pagando-lhes? Ninguem o pode negar; e porque o fez? Porque deu o curso forçado ás Notas, juntou os Bancos parciaes, ninguem lhe disputou isso, e assim teve meios para satisfazer ás suas despezas. O que fez o Brasil? etc. Não quero ser mais longo com isto. E hoje; se o Governo quizer levantar dinheiro em metal sonante, aonde hade ir buscal-o? Havia de crear papel, e ningue o queria, e todos diriam é para acontecer como aconteceu como papel moeda, que se não paga, e que ainda hoje muita gente geme com esse mal? E isto não importa a menor queixa contra Srs. Ministros, porque tenho visto em S. Exa. a maior promptidão para auxiliarem e minorarem quanto podem esta desgraçada calamidade, e ainda que a ninguem é licito invocar o fado, eu invoco o fado, porque assim e só assim eu posso explicar os nossos infortunios.

Não é hoje possivel, disse, organisar-se um novo Banco; temos dois estabelecimentos unidos para formar o Banco de Portugal, e estes dois estabelecimentos apresentaram a enorme sommade 11:000 contos de fundos; e se não são 11:000 contos, se o illustre Deputado quer que o não sejam, se quer abater 10, 20, 30, 40, ou 50 por cento, ainda assim lhe ficam fundos muito fortes, porque, realisados nessa proporção, que o illustre Deputado diz, a 50 por cento, ainda são 5:500 contos; mas está-se-me affigurando ouvir, não são os exercitos os primeiros elementos d´ordem, pois é o dinheiro o primeiro e principal elemento d´ordem? Peço aos illustres Militares que me permittam dizer: eu conheço que é muito difficil organisar um Exercito, mas é mais difficil ainda organisar o dinheiro; ha sempre muita gente que observa a disciplina, quando se lhe paga, e com a educação militar, depressa se fazem bons soldados; mas o dinheiro não se organisa com essa facilidade.

Continuando no objecto principal, digo eu ao illustre Deputado, querendo S. Sa. entrar na analyse da reunião dos dois Estabelecimentos, o do Banco de Lisboa, e o da Companhia Confiança, o resultado que lhe dá? Não é sempre um Estabelecimento a bem do Commercio, da Industria, e da Agricultura? Não será tambem um elemento de ordem para prestar á auctoridade publica os meios de a conservar? S. Sa. não póde dizer o contrario. Convirá a S Sa. dizer - eu quero o statu quo, antes da juncção para discutir o interesse da Nação? Não pode ser; depois de juntos os haveres, depois dos Accionistas da Companhia Confiança terem entrado com 1:200 contos para esse novo Estabelecimento, era impossivel voltar-se ao statu quo... (O Sr. Roussado Gorjão: - Já retirei isso). O Orador: - Então se S. Sa. já retirou esta parte do seu Projecto, que era, no meu modo de vêr, a base principal delle, o mais não tem que discutir. Sr. Presidente, é impossivel que deixe; de ter existido o que existiu. Tendo, como disse, os Accionistas da Confiança Nacional entrado já com 1:200 contos, tendo e Banco de Portugal pago já obrigações á Confiança Nacional, como era possivel distinguir agora esses dois Estabelecimentos? Não entro na

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questão se a Confiança Nacional perdeu, se o Banco perdeu, isso pertence ao Accionista, e não ao Legislador, os interessados em um e outro Estabelecimento accordaram na juncção, é cousa acabada; o que me pertence é olhar a juncção das duas Companhias em relação ao Paiz.

Eu vendo que a Companhia Confiança Nacional devia 3:000 contos de letras promissorias; o Banco perto de 4.000 contos em Notas, via que aos dois Estabelecimentos devia o Governo 7:000 contos, quando a Companhia Confiança Nacional não podia pagar as suas Notas, quando tudo estava ferido do mesmo mal, eu dou parabens aos Directores daquelles Estabelecimento, de terem feito a reunião, e dou ao Paiz os parabens; eu conheço que ha effectivamente um Banco, mais do que uma esperança. Mas, Sr. Presidente, argumenta-se- O Decreto de l9 de Novembro não é Lei do Paiz - Pois a Lei de 28 de Agosto de 1848, não é Lei? Não foi aqui discutido, não se disse aqui - A Dictadura resume todos os poderes o Legislatorio, o Executivo, e o Moderador? Passou taes Decretos que contem materia Legislativa, elles são por conseguinte Leis do Estado: ha a questão se essas Leis devem continuar depois de aberto o Parlamento; entendem muitos que são Leis, e que só podem e devem ser derogadas por um Projecto de Lei, seguindo todos os tramites. Outros de um direita constitucional mais restricto querem que as Leis da Dictadura fiquem, aberto o Parlamento, suspensas até, á Sancção Legislativo: este direito mais restricto foi, applicado ao objecto em questão; o Decreto de 19 de Novembro foi confirmado para o effeito de continuar a ser Lei do Estado, até que pelas Côrtes fosse alterado.; tem elle por conseguinte a unção Legislativa: o illustre Deputado podia fazer uma Proposta para derogar uma Lei existente, mas seguindo todos os tramites, como já disse.

Sobre o Fundo de Amortisação, outra parte do Decreto de 19 de Novembro, não tenho que responder; porque o illustre Deputado nada objectou a tal respeito.

Tractou-se aqui muito o negocio do Contracto do Tabaco, não vem aqui semilhante cousa no Projecto, não sei como foi pelo illustre Deputado aqui trazido. O Contracto do Tabaco tem alguma cousa de fabuloso do canto das Serêas, é necessario agarrar-se ao mastro, e tapar os ouvidos aos companheiros para senão perderem; o Contracto é muito appetecido, tem muitos attractivos, é a Serêa; os Contractadores poém, nem de todos são bem queridos; eu vejo bem, que o illustre Deputado é muito conhecedor da marcha e negocios do Contracto, eu vou porém analysar, se S. Sa. do actual Contracto sabe como dos antecedentes. Os Contractadores do Tabaco são os Caixas Geraes, eu sou Supplente, felizmente ainda, foi necessario eu servisse o logar de Caixa - Deixemos isto, vamos á cousa em si "O Contracto do Tabaco" Seria uma grande fortuna a quem tomou essa empresa; eu fui um dos socios daquella Companhia, e dos installadores della, tenho alli fundos de consideração, no em tanto dava ao illustre Deputado, querendo, os meus direitos e acções sobre o Contracto do Tabaco, recebendo simplesmente as sommas com que entrei naquella Companhia: ora o illustre Deputado não sabe que os interessados ainda não receberam dividendos, nem ainda de 5 por cento ao anno!? E que succedeu aos outra Contractos? Perderam os socios

o todo, ou a maior parte do capital com que entraram; estava toda afortuna reservada para o actual? Diz-se, o Contracto do Tabaco não tem agora responsabilidade individual: oh! Sr. Presidente, pois as condições foram publicas, deu-se á Companhia, ou á pessoa moral, que offereceu um preço maior; houve basta publica, houve lanço; não foi só isso, as condições do Contracto foram convertidas em Lei passada por todos os tramites; e póde trazer a esta Casa o illustre Deputado questão sobre a legitimidade do Contracto, condições, organisação de Companhia e segurança para o Thesouro??

Mas o Governo que tem a suprema inspecção, deve olhar por este objecto, diz, o illustre Deputado; e como tal deve conhecer se os Administradores das Comarcas estão seguros dos seus depositos; mas S. Exa. não póde entrar nos negocios particulares dos Caixas; o illustre Deputado com a probidade que tem, de certo se enganou, quando foi a casos particulares; mas posto isto de parte, o illustre Deputado tão versado na materia, não sabe que os Administradores das Comarcas, sendo responsaveis pelos seus Estanqueiros e pelas suas dividas, e que estas excedem muito o deposito, não sabe que de generos tem elles muito mais sempre que o seu deposito?

Outro ponto "Não sei quem deve 4:000 contos." O illustre Deputado deve vêr o que está escripto: uma das condições é, que o Contracto do Tabaco ha de dar 4:000 contos em 23 annos, nos primeiros 12 annos é o actual Contracto se o usofruir por esses 12 annos, entregando 300 contos cada anno; o Governo recebeu do Contracto os 4.000 contos; o Contracto obteve-os da Companhia Confiança Nacional pelos ajustes que com aquella Companhia pôde realisar; que tem o Governo com a questão em si, se elle Governo recebeu os 4:000 contos?... Quem tem a pensar nisto é a Companhia Confiança Nacional ou quem a represente, que emprestou ao Contracto os 4:000 contos. Mas deu-lhe mais 80 ou 85 contos; sim, Senhor, e annuaes pelo espaço de 12 annos como premio, isso é um caso particular, foi um negocio que fez; o illustre Deputado é Procurador do todos os interesses nacionaes, é verdade, mas não dos negocio particulares do Contracto; todavia para o tranquillisar, direi - Esses 80 ou 85 contos estão seguros para a Companhia Confiança Nacional, os Caixas deram Titulos na sua importancia, que lhe garantem o seu effectivo pagamento; masque tem com isto S. Sa.? Mas diz o illustre Deputado - E depois quem ha de pagar o resto? O premio dos 85 contos, acaba com o actual Contracto; os 300 contos porém, a Lei diz quem os ha de pagar, a Lei lá está, a Lei lá o diz; é aos novos Contractadores a quem passa este encargo até a final amortisação que deverá realisar-se no fim de 23 annos. Se o actual Contracto, deixasse de usofruir este exclusivo, está claro que elle não podia ser obrigado a pagar os 300 contos annuaes; é bem claro que elle os paga como parte do preço do Contracto, pois que os 4:000 contos não foi mais que um adiantamento; mas se acaso o goso do seu exclusivo lhe fosse tirado, como podia o actual Contracto ser obrigado ao seu pagamento! Da mesma fórma passados os 12 annos da arrematação, esta obrigação passa para o novo Contracto. São estas cousas os primeiros rudimentos do direito: quem está em uma casa, póde ser obrigado á renda, quando o senhorio priva o arrendatario do

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uso da mesma casa? O que o arrendatario póde é ainda pedir-lhe indemnisações e prejuisos, além do direito de coegir o senhorio a fazer-lhe bom o seu direito.

Dizia tambem o illustre Deputado - Devia como em outro tempo haver uma Repartição no Thesouro que dantes era a 3.ª Repartição para examinar, se os Contractadores pagavam as suas mesadas: - Não sei se ha uma Repartição no Thesouro para esta arrecadação,, para que não deixem os Contractadores de pagar essas mesadas, das o que posso dizer é que o dinheiro, é em grande parte para a Junta do Credito Publico, e se o Contracto lhe não pagar, ella lá está, e fará o que lhe convier.

Sr. Presidente, terei sido um pouco mais extenso, desculpe-me V. Exa. e a Camara; eu terei ainda quando se discutirem os outros artigos, em algum de tomar a palavra, e reservo-me para essa occasião no que me resta. (Vozes.- Muito bem, muito bem - O Sr. Deputado foi cumprimentado pelos seus amigos).

O Sr. Roussado Gorjão: - Sr. Presidente, estive esperando ouvir alguma cousa, que podesse ser impugnação áquillo, que eu tinha proferido no meu discurso, e apenas agora quasi no fim é, que eu acho alguma cousa, a que devo responder. Devo dizer, que quando eu pedi a palavra foi para rectificar uma opinião, que me era attribuida, e que eu não tinha proferido de modo nenhum; tracto da reunião dos dois Estabelecimentos, a que eu por modo nenhum me oppuz, e pelo que eu hei de votar: eu nada disse absolutamente que podesse. ter relação com isto. Agora quando eu pedi a palavra foi sobre um assupto, que parecia, que em alguma cousa ia tocar com aquelle objecto: eu tinha dito, que era no momento da reunião destes dois Estabelecimentos: isto foi o que eu disse, digo e repetirei sempre. O nobre Deputado tocou n´um outro ponto que foi, o statu quo que estava no meu Projecto de Lei que offereci á camara e que tem hoje o n.° 91; declaro que podia reputar este Projecto opportuno naquelle momento, mas que o considero hoje fóra da discussão: este Projecto está impresso, e as pessoas competentes que o lerem, reconhecerão se tinha ou não fundamento aquillo que eu propunha. De mais esse statu quo não era para prejudicar interesses individuaes; quando eu propunha aquelle meio, era por dois principios, haviam dus alternativas que eu queria precaver; a primeira era, se o Decreto de 19 de Novembro não viesse á discussão, e a outra era, se viesse tão tarde que não podesse ser discutido amplamente, podia eu que se com effeito as Notas do Banco subissem a um ponto que fosse de intoleravel gravame para o Paiz, então o Governo ficasse auctorisado para fazer certas cousas que resalvavam tudo que póde ser em prejuiso do Estabelecimento e dos individuos. Disse o meu Collega que reputava um beneficio o ter apparecido o Decreto da Dictadura de Maio; e eu entendo o contrario; e muitas outras pessoas entendem que naquella epoca era o momento opportuno para se acudir com remedio a este gravame. Quando se falla no grande beneficio que veiu d´ahi, e se diz - que se perdeu com os successos que depois se seguiram, é necessario advertir que se este beneficio se perdeu, foi por que em logar do gravame ter diminuido em virtude do Decreto de 19 de Novembro, pelo contrario augmentou: e era para evitar que elle fosse a mais que eu fiz aquelle Projecto; e foi ainda por outra, razão muito semples, porque desejava que então se evitasse isto a que se chama -- consummação de factos - que continuaram a apparecer e que hoje muito nos opprimem. Eu respeito quanto devo (mas rasoavelmente) isto a que se chama - factos consummados; - mas desejo que d´uma vez para sempre se ponham os maiores obstaculos possiveis para que se não venham a consummar outres factos daquella natureza (Apoiados).

Ora quando eu tractei dos assumptos respectivos ao Contracto do Tabaco, sinto que não me tivesse explicado tão claramente que fosse entendido pelo nobre Deputado. O Illustre Deputado chamou a questão para um outro lado, e eu não tenho remedio se não seguilo-o no caminho que trilhou. O que disse eu? Eu notei por ventura que se fizesse a transferencia? Não certamente: o que disse foi - que sentia que depois della se ter feito, por parte do Corpo Legislativo e do Poder Executivo, se não tratasse de conhecer a situação daquele negocio e do modo de se precaver tudo que podesse ser em prejuiso da Fazenda Publica. Eu entendo que o Contracto do Tabaco podia muito bem ter dado á Companhia Confiança o dinheiro com que ha de entrar para a antecipação dos 4:000 contos; mas quando vejo que esta divida se quer considerar como divida do Governo, quando vejo que os Contractadores teem um praso limitado de 12 annos, e que sobre este numero de annos hão-de vir a accrescentar-se mais 11 annos; quando vejo que os Contractadores do Tabaco deram á Companhia Confiança mais 2 por cento do que Governo dá; quando vejo que se diz esta divida encorporada hoje na divida do Governo, pergunto - qual ha de ser a solução que se ha de dar a este negocio passados os 12 annos que dura o Contracto? É isto a que eu desejava ouvir responder. Eu não digo que em quanto o Contracto está dentro do seu praso, não possa fazer o que bem lhe agradar para sua utilidade; mas entendo que o Governo não póde deixar passar este negocio; sem que fique bem definida qual a sua situação entre os Contractadores do Tabaco e o Banco do Portugal. O que é certo é que o Governo dá 300 contos por 23 annos, para se pagarem os juros de 5 por cento dos 4:000 contos, e a quota de amortisação correspondente a estes 23 annos: os Contractadores do Tabaco disseram á Companhia Confiança - eu dou-vos mais 2 por cento - depois esta Companhia encorporou-se com o Banco de Lisboa, e chamaram-lhe, Banco de Portugal: fez-se por consequencia esta encorporação, e agora diz-se - que a Nação deve ao Banco 4:000 contos; o Contracto do Tababo acaba nos 12 annos, e depois quem ha de pagar o resto que falta! Eis aqui o que desejo vêr definido.

Disse-se tambem que o Contracto hoje não devia ser considerado em relação ao que foi n´outro tempo; eu não queria vir a esta questão, mas espero que a Camara me faça a justiça de conhecer que eu fui acarretado a elle. Peço que se note: o Contracto que principiou no 1.º de Maio de 1834 e que findou no ultimo de Abril de 1837, dividiu entre os seus Socios 106 por cento de interesse sobre as capitaes com que tinham entrado; e como é possivel que logo no triennio seguinte apparecesse uma perda de 90 por cento? Pois ha alguem que tenha entrado em

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interesses do Contracto que não saiba, que havia a condição 26.ª que obrigava a um balancete trimestral, a que assistiam todos os socios, por onde se sabia todos os tres mezes qual a maneira por que corria a transacção, e qual a perda e o ganho que tinha havido? O que aconteceu depois que foi extincta a Junta Geral do Tabaco, por ventura depois de 1837 houve mais alguma reunião destas? Não: no fim o que se disse foi - perdemos 90 por cento - e houve outro Contracto que disse - perdemos 75 por cento.

Agora voltando ao assumpto digo: eu pedi aqui no anno de 1848 que fossem mandados certos Mappas daquillo que eram despachos na Alfandega, e aquillo que era respectivo aos registros das emmentas; estou persuadido que todos os nobres Ministros da Fazenda que teem havido desde então até hoje, teem dado as suas ordena as mais terminantes para que estes Mappas sejam remettidos a esta Camara, mas a verdade é que até ainda hoje não vieram: ainda que eu não preciso delles para mim, preciso delles para as demonstrações; porque eu gosto mais de demonstrar do que de fallar. Mas na falta desses Mappas direi o que é hoje o Contracto em relação ao que foi nos tempos antigos. Haverá alguem que ignore que antes dos pórtos do Brazil ae abrirem a todas as Nações, e de se estabelecer em Gibraltar um Deposito franco de todos os generos coloniaes, ignora alguem que o tabaco que vinha então, custava entre 8$500 réis e 13$500 réis: o que fez com que se estabelecesse o preço medio em 9$600 réis: base esta que foi a estabelecida para se regular o preço das denuncias (uma terça parte) em 3$200 réis?

Veja-se agora qual é o preço porque actualmente o Contracto realisa suas compras de tal genero. Pode assegurar-se que talvez não seja a 2$000 réis por arroba o que então era entre os mencionados 8$500 e 13$500 réis

Peço que se calcule quantas mil arrobas se consomem no Contracto do Tabaco; quero que sejam por exemplo 100:000; 110:000, 150:000; pois algum dia custava este genero, preço medio 9$600 réis, hoje talvez não haja nenhum que custe mais de 2$000 réis, a não ser alguma folha escolhida. Calcule-se agora a differença de interesse que o Contracto acha nas compras actuaes, em que de certo lucra em cada arroba tanto quanto vai do preço actual ao que era naquelle tempo.

Ainda ha mais: creio que não ha ninguem por mais tenra que seja a sua idade, que não conheça que de dia para dia se augmenta o consumo; e pessoas mais antigas sabem que em 1793, antes da nossa Divisão ir para a Hespanha para a guerra do Roussilhão, pode dizer-se que em Portugal só fumariam marujos; depois de 1795 adoptaram isso os militares, e hoje digo que não ha ninguem que se não veja fumar. Eu peço que se observe o que se vê nas ruas, nas praças, e nos Theatros; por outra, peço que se observe se tem alguma comparação os consumidores de hoje com os que havia então. E não é isto um principio donde se deduz uma conclusão muito natural, a qual é, que os interesses do Contracto estão na razão directa de seu consumo? Parece-me que sim; é necessario que haja uma de duas cousas para que assim não seja; é necessario que haja um contrabando medonho, ou que o Contracto seja administrado menos convenientemente; porque a verdade é, que sendo o Tabaco um exclusivo, ninguem o pode vender, nem o pode fabricar, senão o respectivo Contracto. Direi mais desde 1837 que existe o augmento do preço addicional, e esse augmento pode aqui verse quando vieram os Mappas respectivos; e sabe V. Exa. em quanto se calcula? Talvez em mais de 697 contos.

Ora existe outra cousa, eu pergunto se é ou não é das attribuições do Poder Legislativo o attender ás seguintes considerações: vem a ser definir bem o estado em que se vê hoje o Contracto com o Governo, porque isto entende muito com a sorte da Fazenda publica. Sabe V. Exa. quanto se quer de abatimento nisso a que se chama hoje primeiro triennio do Contracto; pede-se mil cento e vinte e sete contos seiscentos e tantos mil réis. Eis-aqui o que se pede pelo abatimento, e diz-se que este abatimento por causa da diminuição que houve no consumo por occasião da guerra civil, pelos generos, dinheiro, ou valores, que lhe foram tirados nesse tempo, por só haver abatido o preço de alguns generos primitivamente contractados, e pela não fruição do Contracto da Polvora, cuja entrega se tem retardado.

Sr. Presidente, pois quando todos os funccionarios publicos, quando a Nação, quando todos, estão contribuindo com a quarta parte, ha de haver certas indemnisações a titulo de perdas, que a não ser um desgraçado ferromeno como eu tenho demonstrado, o Contracto não as póde ter de maneira nenhuma? Isto é até contra as Leis, porque taes indemnizações, taes abatimentos não os póde haver, embora elles venham nas condições.

Eu quero mostrar uma cousa, talvez explicar um fenomeno: nas condições, ha a 5.ª que se refere á Lei de 22 de Dezembro de 1761, a qual exprssasamente prohibe abatimentos, e compensações por quaesquer casos solitos ou insolitos; mas a esta 5.ª segue-se logo a 6.ª que é inexplicavelmente contradictoria com aquella em quanto que faz excepção pelo que fossem perdas occasionadas por força maior, como guerras, e outras cousas.

Perguntarei agora, haverá ou não haverá antinomia entre uma e outra condição? Mas nessa mesma condição numero 6, vem a palavra a final, e este afinal é muito bem entendido. Em um Contracto de 12 annos, póde ser que em o primeiro e que em todos os outros viessem a ganhar; a Lei previne; porque diz - Quando o Contracto for de completa ruina, então o Poder Soberano acudirá com medidas de equidade; mas não é de modo nenhum para esta questão.

Agora é necessario saber, que ha as condições chamadas do corrente: ha condições que foram as genuinas com que se arrematou o Contracto do Tabaco. No Diario do Governo de 27 de Dezembro de 1844 está a Consulta sobre essa arrematação, e diz que o Contracto do Tabaco é arrematado á Companhia que melhores interesses offereceu, porque havendo uma Companhia, a dos Barões da Folgosa e da Junqueira, que tendo offerecido mil quinhentos e desabeis contos, com o juro destinado ao emprestimo dos 4:000 contos computado na razão de 6 porcento, o Tribunal entendeu que devia arrematar a quem dava 1:121 contos fazendo o mesmo emprestimo, e recebendo 5 por cento em quanto os outros queriam 6; tinha de mais a mais outra conveniencia, que era, os arrematantes terem se obrigado explicita-

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mente á restricta observancia das condições que estão publicadas nos Diarios do Governo n.ºs 171, 172 e 173 de Julho de 1844. Ora nestas condições acha-se a 5.ª que expressamente determina que essas abonações (hoje estranhamente concedidas) sejam liquidadas a final.

Já foi um grande favor a expressão - liquidados - porque, a Lei apenas faz menção de um acto de equidade, e já as condições por esse acto, servindo-se da expressão - liquidados - excedem o sentido genuino da Lei, visto que um acto de equidade não dá o direito de se exigir valôr algum que possa ser liquidado. Assim mesmo além deste favor existe a suppressão da palavra = a final =que aliàs se acha nas condições publicadas nos supra mencionados Diarios, e maravilhosamente foi supprimida nas impressas condições, chamadas - de correr. - Estas condições de correr tenho eu aqui; creio que na Secretaria haverá os Diarios do 2.º semestre de 1844: se quizerem que se realise a conferencia, podem vir esses Diarios, e desde já eu me responsabiliso pela exactidão do que tenho enunciado.

Ora aqui está provavelmente o motivo porque na resposta que veiu da Secretaria d´Estado dos Negocios da Fazenda, onde foram os meus Requerimentos, se faz referencia ao final do primeiro triennio, com o motivo talvez de aproveitar a opportunidade que nas condições genuinas offerece a palavra = a final. = Eu, preciso explicar isto. O Contracto foi arrematado, por espaço de 12 annos: tem sido administrado pelos proprios Contractadores: não sublocaram, e corre por sua conta. O fim deste Contracto é no fim dos 12 annos; o fim desse Contracto não se reputa senão no fim do praso. marcado, e não por triennios. Houve um exemplo em contrario, foi o Contracto que foi arrematado pelo Conde do Farrobo, que teve auctorisação para sublocar; e que effectivamente sublocou quatro triennios successivos. O fim de cada um desses quatro triennios, podia ser muito legitimamente considerado final de triennio, por isso mesmo que os sublocatarios celebraram condições com o Governo a respeito de cada um delles. Note V. Exa. que esta sublocação não dispensou de modo algum o Contractador originario de ser responsavel por tudo quanto fossem falhas, porque a responsabilidade solidaria não mudou.

Eu pedirei ao illustre Ministro da Fazenda que calcule isto com aquella circumspecção com que o costuma fazer em todos os negocios, e que deve ver que no fim de cada 3 annos não se póde legitimamente admittir a idéa desse = a final - que só póde competir com propriedade á ultimação do praso contractado e administrado pelos mesmos Contractadores. Em prova desta minha asserção está o acontecido com o Contracto (chamado dos 9 annos) começado em 1803, e que findou em 1812.

Sr. Presidente, eu não desejo entreter a Camara com mais longa demonstração. Peço ao illustre Deputado que teve a benevolencia de dizer que tinha de responder-me, que apresente os seus argumentos, contra os principios e idéas que eu expuz, porque se forem impugnadas, eu estou prompto obtendo a palavra de novo a sustenta-las.

O Sr. Agostinho Albano: - Sr. Presidente, tenho notado, e parece-me que toda a Camara será nisto accorde, que não se tem discutido a materia do art. 1.º mas sim se tem discutido o Contracto do Tabaco (Apoiados) Pedi pois a palavra para rogar a V. Exa. que tenha a bondade de chamar a questão aos seus devidos termos. Muitas cousas se tem dicto a respeito do Contracto que são muito uteis, boas e muito bem dictas; mas non erat his locus, e na verdade não veem nada para a questão de que nos devemos occupar, que é a materia do artigo: e eu poderia desde já responder a muitas das reflexões que foram feitas pelo Orador que acabou de fallar; mas na qualidade de Relator, e até mesmo na de Membro da Commissão entendo que não devo encarregar-me dessa tarefa por não ser esta a occasião propria de tractar similhante questão: não entendo que se deva ou possa agora discutir o Contracto do Tabaco nas suas actuaes condições ou nas que de futuro possa vir a ter; estou certo que essa materia no ponto alludido ha devir á discussão desta Camara, mas ha de ser na occasião propria; agora deve estar completamente fóra do debate (Apoiados). Pedia pois que fossemos ao ponto da questão, que é o art. l.° que tracta de ser confirmada a incorporação do Banco de Lisboa com a Companhia Confiança Nacional formando um novo Estabelecimento com a denominação de Banco de Portugal. A unica cousa que podia aqui entrar em questão, era se sim ou não e Lei de 19 d´Agosto de 1848 tinha já resolvido esta ponto: quanto a mim já estava resolvido, e escusado era traze-lo á discussão, ou fazer parte deste Projecto, porque a união destes dois Estabelecimentos já estava muito expressamente confirmada pela disposição daquella Lei, que não fez excepção a respeito do Banco de Portugal, e que é Lei permanente em quanto se refere a Contractos estabelecidos, sendo aliás esta união um Contracto findo, um facto consummado, e ponto que não podia ser alterado sem destruir a essencia da mesma união: portanto, existisse aqui ou não existisse este art. 1.°, o caso da união ficava salvo, porque a confirmação della já está na Lei de 19 d´Agosto de 1848. Entretanto por deferencia a alguns Srs. Deputados, e para tirar todos os escrupulos, repetiu-se neste art. 1.º o que já está dicto por Lei existente.

Concluindo peço na qualidade de Relator, que V. Exa. chame a questão aos seus devidos termos. Desculpe-me V. Exa. de eu assim entrar d´algum modo no que são attribuições da Mesa; mas era indispensavel fazer este pedido a bem da discussão (Apoiados)

O Sr. Presidente: - Ao Sr. Deputado pertence por certo o direito de chamar a questão á ordem, ou aos seus devidos termos; não é isso direito só privativo da Mesa; comtudo considerando que este art. 1.° tem disposições importantes que dão logar a amplas considerações, como na verdade deram, e tendo ellas sido apresentadas por um illustre Deputado que mais parte tem tomado nesta discussão, e vendo a Mesa que os Srs. Deputados Costa Lobo, e Roussado Gorjão se quizeram encarregar de dar algumas explicações para esclarecimento da materia trazida na discussão geral deste Projecto, a Mesa entendeu que, não restringindo os Senhores que tinham tocado nesses pontos, não devia restringir agora nem o Sr. Deputado Costa Lobo, nem o Sr. Debutado Roussado Gorjão, na parte relativa a esclarecer devidamente os pontos em que se tinha tocado a respeito do Contracto do Tabaco (Apoiados) com ligação á materia deste art. 1.º.

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No entretanto a Mesa adverte que os Srs. Deputados terão occasião propria para tractar dessa questão.

Por agora peço-lhes que se restrinjam á questão do art. 1.°, para que a discussão possa progredir convenientemente (Apoiados) O que se disse a respeito do Contracto do Tabaco, de certo que veiu por incidente; mas não é objecto que sirva de base principal para decidir a questão involvida na disposição do utt. 1.º (Apoiados)

O Sr. Costa Lobo: - Direi muito pouco, e não entrarei na questão ainda novamente sustentada pelo illustre Deputado, fallo do que diz respeito ao Contracto do Tabaco; cantes, devo repetir, que nem por palavras, nem por cousas me parece ter offendido o Sr. Deputado Roussado, nem faltado para com S. S.ª á urbanidade devida (Apoiados}; repito, nem em palavras, nem com cousas me parece ter offendido o illustre Deputado; não lhe respondi como mesmo calor com que S. S.ª me respondeu.

O Sr. Deputado sabe melhor que eu que ás Notas que os Bancos costumam trazer em circulação, não corresponde o metal em caixa bastante para as pagar, e todas ellas no momento; se fora assim, nem os Bancos podiam representando os seus capitães tirar um juro dobrado, em virtude do dobro dos valores que trazem na circulação, nem poderiam mutuar os seus capitães a um pequeno interesse, o qual sómente repetido e dobrado e que póde supprir as despezas destes Estabelecimentos, e proporcionar um favoravel dividendo uns seus Accionistas. Esteja o illustre Deputado certo, que nenhum Banco emitte sómente as Notas para que tem metal nas suas caixas, e se assim fizera, que interesse retiravam os Bancos deste expediente? Seria isto sómente então para utilidade dos portadores das Notas, que lhes não pezasse o dinheiro nos bolsos. O que porém costuma ser determinado nos Estatutos destes Estabelecimentos, ou pelo immediato conhecimento do Governo ácerca do estado monetario e outras circumslancias, é o quanto deva ser emittido; o Banco do Porto, por exemlo, está auctorisado a emittir tres quartos do seu capital, isto é, do seu fundo constitutivo, mas nunca o numerario em caixa é requerido para a determinação da somma do papel que possa ser emittido; se o illustre Deputado pensa outra cousa, está completamente enganado. (O Sr. Roussado Gorjão: - Não disse isso). O Orador: - Então não procede a questão; não direi móis nada a este respeito; fui eu certamente que ouvi mal.

Á duvida em que o Sr. Deputado está a respeito da segurança para a Fazenda Nacional, limitar-me-hei a lêr a disposição d'um artigo do Decreto de 30 de Julho de 1844, esse artigo diz o seguinte (Leu). Nada mais direi porque não quero entrar na materia; tambem queria lêr ao illustre Deputado os Estatutos da Companhia do Tabaco que foram approvados pelo Governo, mas isso seria inutil, no entretanto com isso respondia ao illustre Deputado. É sabido que os Contractadores actuaes são responsaveis pelo que diz respeito ao emprestimos dos 4.000 contos pelo juro e amortisação sómente respectiva aos 12 annos do seu contracto, e se gozarem nesse espaço o mesmo Contracto, e quando findarem os 12 annos do seu Contracto, é responsavel o Contracto futuro, isto é de lei, e a tal respeito não deve apparecer a menor duvida, por isso que nas condições do Contracto approvadas por uma Lei, está com clareza esta duvida resolvida.

Disse tambem S. S.ª - que o Contracto tem ganho muito - não sei se tem ganho muito, se tem ganho pouco, o que sei é que como Accionista d'esse Contracto actual não tenho recebido nem o juro do meu capital de 5 por cento ao anno: oxalá que o Contracto lucre muito, bem o desejava eu, como particular; mas é certo que até ao presente na qualidade de Accionista eu não tenho como disse experimentado essa fortuna.

O consumo deste genero, tabaco, está muito longe de ser o que foi em tempos felices, está muito longe disso eu posso asseverar, e debaixo de minha palavra de honra que não costumo retirar em qualquer campo = Que as relações de consumo que tenho visto são muito infelizes.

Sr. Presidente, a alguns outros pontos em que tocou o illustre Deputado, eu devia responder; porém como póde dar-se nova occasião de eu poder elucidar os objectos em questão, e como V. Exa. fez a advertencia de que se restringisse a discussão ao art. 1.°, por isso não irei mais longe, e fico aqui.

O Sr. J. I. Guedes: - Sr. Presidente, eu direi tambem poucas palavras; acho muito justa a advertencia feita por V. Ex.a: em verdade ás vezes apparecem divagações taes sobre objectos alheios á questão principal, que a prejudicam inteiramente. Tratarei pois de dizer duas palavras a respeito das observações apresentadas pelo Sr. Roussado relativamente ao emprestimo dos 4:000 contos de réis.

Sr. Presidente, não ha duvida nenhuma que o Contracto do Tabaco é responsavel directamente para com o Banco de Portugal pelo emprestimo dos 4:000 contos, a respeito do que cessou a acção do do Governo, vindo a sua obrigação como subsidiaria ao Contracto do Tacaco. Mas o Contracto do Tabaco com o emprestimo dos 4:000 contos, fez esse adiantamento ao Governo, e pagou-lhe essa quantia da receita que o Governo hade tirar desse rendimento do Estado: o Governo não tem nenhum direito, nem tem nenhuma obrigação, para receber, em quanto a esse negocio, nem mais nem menos do que já recebeu do Contracto; sendo aliás o mesmo Contracto responsavel directamente para com o Banco de Portugal pelo complemento das obrigações que dizem respeito a esse emprestimo: nem o Governo póde jamais lançar mão deste direito que pertence ao Banco e só ao Banco. O Banco é que tem direito de exigir dos Contractadores actuaes o cumprimento das suas obrigações, e de o exigir igualmente dos Contractadores futuros, os quaes não se podem negar ao pagamento do que faltar, quando terminarem os 12 annos da existencia actual do Contracto; nem o Governo tem direito para lhes dizer = não pagueis = porque o Governo já recebeu a parte desses rendimentos: e portanto se ha obrigação quanto aos Contractadores actuaes, se elles são responsaveis para com o Banco (ou para com os Portadores dos Titulos dos 4:000 contos, porque o Banco póde vende-los, pois é propriedade sua), os Contractadores futuros tem a mesma responsabilidade, e esta hade necessariamente fazer parte das condições do seu Contracto. (O Sr. Carlos Bento: - Não é assim). O Orador: - Assim está determinado por lei, e nas condições do actual Contracto do Tabaco: eu vou ler as condições, aqui estão (Leu).

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Já vê pois o illustre Deputado, e a Camara, que os futuros Arrematantes do Contracto do Tabaco fincam obrigados a pagar directamente, e do mesmo modo que os do actual Contracto; os juros, e amortisações dos Titulos provenientes do emprestimo, até seu final embolso; para certeza ou firmeza do que, o Governo já está obrigado a inserir esta condição nas com que forem arrematados os futuros Contractos do Tabaco. Por tanto devem ficar desvanecidas todas as duvidas que se apresentem a tal respeito, e sobre este campo direi de passagem, que quando se tractar desta questão, que desejo venha ao Parlamento, e desejo ardentemente entrar, nella, eu hei de ter occasião de responder ao illustre Deputado o Sr. Roussado, hei de aprovar sem grande custo, hei de provar com muita facilidade, não direi as inexactidões que S. S.ª apresentou, mas que as conclusões que tirou são contradictorias; e não são exactas: estou certo que as reflexões feitas por S. S.ª o são na mais pura boa fé, mas não são exactas.

Porém ha uma censura muito grave, a respeito da qual devo dizer duas palavras: ella foi aqui lançada o anno passado, mas eu não tive conhecimento disso senão muito tempo depois porque não tive o gosto de então ouvir o illustre Deputado; agora que elle a repetiu, julgo do meu dever dizer que o illustre Deputado está completamente em erro, quando julga que foi um lapso, um descuido que a palavra final não ficasse nas condições do Contracto. Não ha duvida que nas condições do Contracto primeiramente apresentadas vinha a palavra final; mas os Contractadores antes de acceitarem o Contracto conseguiram que se fizessem algumas alterações nas mesmas condições, e entre ellas foi a eliminação da palavra final.

Sr. Presidente, fui talvez mais longo do que queria ser, mas peço a V. Exa. desculpa e á Camara, porque não podia deixar de fazer algumas reflexões sobre o que se aqui tinha dito.

O Sr. Carlos Bento: - Sr. Presidente, vi-me obrigado a entrar nesta questão porque uma denegação que me julguei obrigado a fazer, foi tractada pelo meu illustre amigo que se senta no banco superior, de um modo que eu não esperava.

Sr. Presidente, esta posição é difficil a posição que eu occupo na Camara, é difficil; para a manter como entendo que devo, sacrifiquei interesses; mas uma cousa peior ainda, Sr. Presidente, mais difficil para a conservação de uma posição é sacrificar sentimentos; e muitas vezes quando tracto uma questão, quando estou discutindo, vejo-me obrigado a fazer esse para mim o maior de todos os sacrificios, porque entendo que não ha para homem nenhum sacrificio maior do que quando para sustentar principios se vê obrigado a fazer calar a expressão dos seus sentimentos, e os meus sentimentos, Sr. Presidente, me levariam a estar de accordo em todas as occasiões com o meu illustre amigo, porque temos além da fraternidade da amisade, e amisade em occasiões difficeis, as mesmas opiniões politicas. Por consequencia, Sr. Presidente, todos os meus sentimentos me levariam a estar de accordo com o illustre Deputado que se senta nos bancos superiores. Mas note V. Exa. e a Camara: eu realmente tive por fim com a minha denegação o comprimir o sentimento que me dominava nessa occasião, querendo dizer que esta questão não podia desde já ficar aqui só pela declaração do illustre Deputado; e S. Exa. mesmo esperando que esta questão voltaria á Camara, deu a entender que uma discussão ainda era necessario que tivesse logar sobre ella; sabendo tambem o illustre Deputado que não é uma questão tão simples que não tenha havido opiniões encontradas, sobre ella; o illustre Deputado sabe que ha opiniões diversas, e opiniões de pessoas muito auctorisadas sobre este ponto. Ora eu, Sr. Presidente, com a denegação não quiz mais de que conservar a minha liberdade para na occasião competente poder emittir a opinião que quizesse. E, sem desde já me pronunciar, tomo a liberdade de dizer ao illustre Deputado, que a simples invocação dos termos de um Contracto, invocação sagrada, não pode ter força contra o facto de que o Governo tantas vezes tem querido de alguma maneira modificar os Contractos existentes. Eu bem sei que é uma grande injustiça, mas é o que se tem feito: eu entendo, por exemplo, que os possuidores dos Titulos da divida fundada tinham direito a receber integralmente o juro desta divida, e principalmente depois de se lhes ter atrazado o pagamento della da maneira por que se atrazou, devendo-se-lhes tres semestres, e o que succedeu, Sr. Presidente! Sujeitaram-se os juros dos individuos, que emprestaram e sacrificaram os seus capitaes, a uma deducção de duas decimas, que se elevou a 30 e tantos por cento? Eis-aqui tem o nobre Deputado como nesta terrivel época da realidade nos vemos obrigados a sacrificar o mais santo de todos os principios! Por isso eu digo: não podemos desde já prejudicar a questão da maneira absoluta porque o meu illustre amigo me parece que entendeu que esta se devia resolver: e bem que ella tem uma relação indirecta com o artigo que está: em discussão, parece-me com tudo que não é está a occasião de se poder tractar. Pela minha, parto reservo a minha plena, liberdade para a poder tractar em occasião competente como entendo, e votar.

Nada mais tenho a dizer.

O Sr. Presidente: - Não ha mais ninguem inscripto.

O Sr. Cunha Solto Maior: - Se S. Exa. O Sr. Ministro da Fazenda está habilitado para responder á minha interpellação, parece-me que poderia ter aqui logar segundo o Regimento, que determina que sejam as interpellações meia hora antes de se fechar a Sessão.

O Sr. Presidente: - Depois da votação se tractará desse objecto.

Julgou-se logo discutida a materia por 63 votos contra 2. - E pondo-se á votação o

Art. 1.º - foi approvado por 65 votos contra 1.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Cunha Sotto Maior acaba de pedir a observancia do Regimento, para verificar a interpellação que tinha annunciado a S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda sobre ponto parcial a alguns Servidores do Estado nos pagamentos de 1848. Se S. Exa. está habilitado para responder, vou dar a palavra ao Sr. Deputado.

O Sr. Ministro da Fazenda: - Sim, Senhor, estou.

O Sr. Presidente: - Por consequencia tem a palavra o Sr. Cunha Sotto Maior.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Sr. Presidente, a minha interpellação limita-se a muito poucas palavras. Desejo que S. Exa. declare - qual é a rasão porque mandou sustar, ou se esta palavra não é do agrado de S. Exa., qual a rasão porque não tem continuado o pagamento do mez de Agosto de 1847.

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O Sr. Ministro da Fazenda: - Sr. Presidente, n'uma occasião em que tomei a palavra nesta Camara, respondi á interpellação do nobre Deputado; porque o nobre Deputado teve nessa occasião a bondade de dizer, que eu tinha feito ponto a respeito dos pagamentos de 1847. Eu disse ao nobre Deputado, que esta medida não é minha; mas não tenho difficuldade nenhuma de tomar sobre mim a responsabilidade della, porque em iguaes circumstancias têla-ia adoptado. O nobre Deputado deve saber, que a lei de 23 de Maio de 1848, estabeleceu tres diversos modos para o pagamento de dividas ao Estado, anteriores a 1847, essa lei auctorisou o Governo a cobrar as dividas anteriores a Junho de 1845 em Notas do Banco de Lisboa, e de 1845 a Julho de 1847... Aqui a tenho, e vou vêr o praso exacto (Leu).

" § 3.° O Beneficio concedido nos dois paragrafos antecedentes sómente poderá verificar-se quando o pagamento se effectuar dentro de sessenta dias, contados da publicação da presente lei. "

" Art. 2.º Aos devedores á Fazenda Nacional, que não havendo pago no prazo do artigo antecedente, quizerem com tudo satisfazer suas dividas dentro de cento e vinte dias, desde a publicação desta lei, é permittido faze-lo, entregando duas terças partes em Notas do Banco de Lisboa, e um terço em dinheiro de metal, se as dividas forem antecedentes ao 1.° de Julho de 1845; e metade em Notas do Banco de Lisboa, e outra metade em dinheiro de metal, se as dividas forem posteriores ao 1.º de Julho de 1845, e não excederem a 30 de Junho de 1847.

" Art. 5.° Findo o prazo marcado no art. 2.°, os devedores á Fazenda Nacional, além de perderem o direito aos beneficios concedidos pelo mesmo artigo, ficam obrigados ao pagamento em moeda corrente, e a seu juro de 5 por cento ao anno, calculado sobre a importancia total de suas dividas. "

Quando se discutiu o Projecto, que deu logar a esta lei, o pagamento principal da Commissão de Fazenda (e fallo diante de todos os seus membros, ou quasi todos) não foi o pagamento da divida de 1847, o pensamento principal desta lei foi o diminuir o agio consideravel das Notas do Banco de Lisboa, para o que não só se estabeleceu uma mais larga circulação para essas Notas, admittindo-as no pagamento desta divida; mas de mais a mais se mandou amortisar uma parte dessas Notas; porém nessa occasião quiz ao mesmo tempo provêr a uma outra necessidade, e foi ao pagamento da divida atrasada aos Servidores do Estado desde 1847, e então determinou-se expressamente nessa lei o seguinte:

" Art. 8.º As Notas do Banco de Lisboa, que se receberem em execução desta lei, serão applicadas no Continente do Reino ao pagamento dos Servidores do Estado, e dos Pensionistas pertencentes ás classes denominadas de consideração pelos seus respectivos vencimentos, posteriores ao mez de Maio de 1847, que estão em atraso, ou estiverem no 1.° de Julho proximo futuro. "

Já vê o Sr. Deputado por consequencia, que se mandaram applicar a esse pagamento unicamente as Notas que resultassem desta lei, e que esta lei está derogada, isto é tinha um praso além do qual não podia continuar, e está marcado no § 3.° do art. 1.° e no art. 2.º que acabei de ler. Por consequencia quando acabou o praso da lei, não podia o Governo applicar Notas que proviessem de outra receita, ao pagamento dessa divida; e sendo o pensamento da lei diminuir o agio das Notas, dando-lhes maior circulação, fazendo-as entrar no pagamento dessa divida, marcou por tanto um praso para que este beneficio tivesse logar, porque se a sua disposição fosse permanente, então é claro que não se poderia conseguir o que queria o Governo, que era convidar os contribuintes a pagarem de prompto as suas dividas, e por conseguinte não só pagar aos Empregados o que se lhes devia, mas de mais a mais fazer desapparecer uma parte das Notas do Banco de Lisboa Esse praso porém acabou, e tendo acabado, o meu illustre antecessor, que me está ouvindo, desconfiando, e desconfiando bem, de que já pelos pagamentos que se estavam effectuando, se applicaram Notas, que não eram o resultado desta lei, mas resultado da receita corrente, a pagamentos atrasados, mandou sustar esses pagamentos; sendo o ultimo que se ordenou a 8 de Março de 1849. Quando eu entrei no Ministerio subsistiam as mesmas rasões, e então digo ao nobre Deputado: - posto que este objecto não esteja ainda liquido, porque não me teem vindo dos differentes Districtos todos os esclarecimentos que pedi, eu tenho graves suspeitas de que se pagou mais do que se devia pagar; e se contasse que a interpellação tinha logar hoje, eu apresentaria ao nobre Deputado um Mappa da receita proveniente desta lei, e da sua applicação; mas eu poderei citar as cifras de cór, sem receio de me enganar, e esse Mappa virá: o producto da Lei de 23 de Maio foi 718 contos, e creio que os pagamentos á divida atrasada, á sombra dessa lei, são 590 contos pouco mais ou menos. Dirá o nobre Deputado - " Mas então ha um excesso na receita, ha um excedente da receita á despeza. " - Não é assim, porque a Lei de 23 de Maio não manda applicar todo o producto da receita; mas unicamente as Notas, só as Notas, e uma grande parte dessa receita foi metal. Eu sei já com certeza qual foi o metal que se cobrou em quatro Districtos, e é superior ás Notas. É isto um facto, e parecerá absurdo; porque dir-se-ha: - "Mas então até 1845 pagavam-se as dividas na sua totalidade em Notas, de 1845 a 1847 dois terços em Notas, e um terço em metal, como é possivel que haja um Districto em que a parte metalica seja superior á parte Notas." Por uma razão muito simples; porque havendo contribuições pequenas que não podiam ser pagas em Notas, eram pagas em metal com o beneficio competente, e d'ahi resultou que dos quatro Districtos, de que sei já com certeza o que se recebeu em metal, e o que se recebeu em Notas, a parte metal é superior á parte Notas. Ora, se isto acontecer em todos os outros Districtos, de que ainda não tenho conhecimento, resulta d'ahi, que o Governo desejoso de pagar a divida atrazada posterior a Maio de 1847, applicou para esse fim mais Notas do que aquellas que recebeu em virtude da Lei de 23 de Maio de 1848, o que não podia fazer porque não esta vá para isso auctorisado. Eis aqui pois porque o pagamento não tem continuado. Mas não basta isto, é preciso saber com certeza a receita em metal e a receita em Notas, e a despeza em metal, e a despeza em Notas, porque só assim é que se pode saber se as Notas recebidas foram todas appliradas para o fim disposto na Lei, ou

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se sobejaram algumas para se dever continuar o pagamento, e é isto o que eu estou tractando de liquidar. Eis aqui o que tenho a dizer a este respeito.

Mas, Sr. Presidente, sem eu querer attribuir a pensamento nenhum máo, algumas expressões do nobre Deputado, e fallando em geral, peço, que todas as vezes que se tractar de qualquer questão de Fazenda, se não lance a esmo esta palavra ponto, porque quando se emprega, parece que tem por fim assustar os interessados de que ha tenção da parte do Governo, de assim o fazer, quando não ha tal idéa, e quando, pelo contrario, o Governo tem dito por mais de uma vez que não faz tal ponto (Apoiados).

São estas as razões, repito, porque o pagamento não tem continuado, nem póde continuar em quanto o Governo não tiver todos os esclarecimentos que está tractando de colher, para saber exactamente o que ha a este respeito. Se depois deste objecto liquidado, se conhecer que a parte Notas recebida é inferior ao que se tem pago, tomar-se-ha alguma providencia a este respeito, e se for superior, que quasi posso assegurar que não é, o Governo mandará continuar o pagamento Antes disto nada se póde fazer.

O Sr. Cunha Sotto Maior: - Eu confesso, Sr. Presidente, que não sei já que nome heide dar ás cousas visto que se não quer que se chamem pelo seu verdadeiro nome. O pagamento do mez de Agosto de 1847, foi annunciado em todo o Reino; abriu-se este pagamento a todas as classes comprehendidas nelle, e só em Lisboa ficaram exceptuados alguns possuidores desses titulos. Se sustar o pagamento não é fazer ponto, declaro que não sei o que quer dizer ponto, e peço ao Sr. Ministro da Fazenda, que faça uma terminologia sua, e que nos ponha ao facto d'ella. O pagamento foi annunciado em 3 de Março de 1849, e parou no estudo maior de Arlilheria.

Diz o Sr. Ministro, que não parou o pagamento, que o não sustou, mas elle não continuou, e essa não continuação é em todo o rigor da palavra um ponto. Declara mais, S. Exa. que a medida não é sua; não era, mas S. Exa. acceitou o Relatorio do seu antecessor (Riso). Este e o facto. Eu queria vêr nessas Cadeiras mais dignidade... (Vozes: - Ordem, ordem).

O Sr. Presidente: - Convido o Sr. Deputado a explicar o sentido em que acaba de proferir essa expressão, que não é Parlamentar.

O Orador: - Sr. Presidente, desejava que quando um Deputado accusa um Ministro sobre um facto importante, esse Ministro não recebesse essa accusação com risadas; mas sempre que responder com risadas áquillo que se lhe diz, dá-me direito para dizer que não tem dignidade.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado foi o primeiro que sendo arguido uma vez por se rir quando fallava um Ministro, fez um discurso para dizer que a ninguem podia ser prohibido deixar de se rir.

O Orador: - Muito bem, eu continúo. O Sr. Ministro da Fazenda não póde negar que acceitou o Relatorio do seu antecessor; eu peço a attenção da Camara, não farei um discurso, mas farei um syllogismo. Eu vou lêr o Relatorio (Leu).

" Assim os ordenados e soldos, que se achavam em divida em Lisboa e nas Provincias no referido dia 29 de Janeiro importavam em 619:977$000 réis, que no fim de Fevereiro sommaram réis 949:627$000. Mas se juntarmos a estes encargos os de Agosto e Setembro de 1847, e as quinzenas de Outubro de 1847 a Junho de 1848, e outras obrigações, teremos uma divida a descoberto na importancia de 2:078:352$ réis aproximadamente.

Os encargos tambem das classes inactivas, tanto as de consideração, como as de não consideração, montam no fim de Fevereiro a 391:700$000 réis, e deste modo a somma total, de que são credores os servidores e pensionistas do Estado, era no fim de Fevereiro de réis 2:470:052$000.

Feita agora a conta a estes mesmos encargos, no espaço que decorre do 1.° de Março até ao fim do actual anno economico, na importancia de réis 2:300:745$930, teremos que a somma tatal de uns e outros sóbe portanto a 4:770:797$930 réis no 1.º de Junho futuro."

O Sr. Ministro acceitou a situação como a encontrou, assim o declarou nesta Camara; tinha por consequencia obrigação de satisfazer aos encargos a que se tinha compromettido o seu antecessor; mas S. Exa. querendo delocar a questão do seu verdadeiro ponto de vista, vem com um sofisma, e diz que a Lei de 23 de Maio de 1848 está derogada, e repele isto com um sangue frio admiravel! Peço licença para dizer a S. Exa. que não é exacta esta sua asserção: a Lei não está derogada; nem S. Exa. nem a Camara é capaz de me provar que a Lei está derogada; não o está, e S. Exa. não me póde provar. O que está derogado é o art. 5.º da Lei. Vejamos esse art. 5.º da Lei de 23 de Maio de 1848, e a Lei de 9 de Julho de 1849, que o substitue.

"Artigo 5.º da Lei de 23 de Maio de 1848.

" Findo o prazo marcado no art. 2.° (as dividas contraidas desde o 1.° de Junho de 1845 a 30 de Junho de 1847 poderão ser satisfeitas duas terças partes em Notas do Banco de Lisboa pelo seu valor nominal e um terço em dinheiro de metal. Os devedores á Fazenda Nacional além de perderem o direito aos beneficios concedidos pelo mesmo artigo, ficam obrigados ao pagamento em moeda corrente, e a um juro de 5 por cento calculado sobre a importancia total de suas dividas.

Lei de 9 de Julho do 1849.

" Aos devedores á Fazenda Publica por contribuições ou impostos vencidos desde o 1.º de Agosto de 1833 até 30 de Junho de 1846, que se não aproveitaram dos beneficios concedidos pela Lei de 23 de Maio de 1848 não serão exigidos os juros de 5 por cento que pelo art. 5.º da mesma Lei se mandaram addicionar á importancia total das suas dividas. "

Quem dirá que está derogada a Lei de 23 de Maio de 1848? Não insisto mais sobre este ponto: o absurdo cáe de per si.

O antecessor do Sr. Ministro da Fazenda apresentou a esta Camara uma Proposta para ser auctorisado a levantar a somma de dois mil contos sobre as decimas e impostos annexos, e quaesquer receitas atrazadas e vencidas até ao fim do anno de 1848, que não tenham uma applicação especial. Esta Proposta do illustre Deputado por Vizeu, o Sr. Lopes Branco, foi acceita pelo Sr. Ministro actual, e convertida na Lei de 30 de Junho de 1849. Para supprir o deficit foi auctorisado o Governo a levantar sobre as decimas e impostos annexos em atrazo a somma de 1:500 contos.

Sobre a Lei de 23 de Maio lenho ainda uma observação a fazer. Na Sesão de 28 de Janeiro disse

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S. Exa. "a Lei especial que tinha marcado a receita para esta despeza, produziu 719 contos, e segundo o que tenho examinado, a applicação dessa receita para o fim marcado na Lei, sóbe apenas a 600 contos. " Pois se S. Exa. diz que a Lei especial que tinha marcado esta receita, tinha produzido 719 contos, como é que diz hoje uma cousa differente do que disse em 28 de Janeiro? Mas esteja este Ministerio obrigado pela Lei a pagar ou não este mez de Agosto de 1847, esteja incluido ou não na Lei de 23 de Maio, o facto é que a Proposta do Sr. Lopes Branco adoptada pelo Sr. Ministro da Fazenda se comprometteu a esse pagamento; e que a Lei de 30 de Juinho do anno passado auctorizando o Governo a levantar 1:500 contos teve em vista esse pagamento. Porque é que S. Exa. não levantou estes 1:500 contos? S. Exa. já disse que os não tinha levantado. Eu entendo que S. Exa. tendo necessidade de occorrer as despezas correntes devia levanta-los; porque não o fez? Eu queria que S. Exa. me respondesse a este dilemma; ou S. Exa. considera esta divida activa, ou inactiva; se a considera activa, tem de a pagar em metal, se a considera inactiva tem de a pagar em Notas; escolha S. Exa. o que quizer. O Sr. Ministro tem demasiado orgulho e sem o menor direito para tal: era melhor que S. Exa. désse razões e não divagasse tanto, que se explicasse, e que não embrulhasse a questão (O Sr. Ministro da Fazenda:- Eu o explico) O Orador: - Não explica tal; diz que a Lei está derogada, e a Lei não está tal derogada. A minha obrigação é accusar estas faltas; o Governo recebeu pela Lei de 23 de Maio 719 contos, de réis para pagamento das dividas atrazadas posteriores a 1847; pagou 600 contos; restam ainda 119 contos. É preciso que S. Exa. diga porque não continúa esse pagamento, e que prove como é que a Lei está derogada; não basta só dize-lo, é necessario prova-lo.

Eu já uzei duas vezes da palavra, e não uzarei terceira, porque para mim ha sempre todo o rigor do Regimento. Declaro desde já que condemno as intenções do Sr. Ministro da Fazenda, e que a resposta que der, não me hade satisfazer (Riso).

O Sr. Ministro da Fazenda: - Parece-me inutil que eu responda ao nobre Deputado, porque elle já declarou que a minha resposta não o hade contentar. Eu quizera outra cousa, e a Camara me permittirá que exprima com franqueza este meu desejo; desejaria que esta interpellação saisse dos limites d'uma interpellação, e que fosse permittido aos meus Collegas o entrar nesta discussão, e que dissessem ao Governo se estavam ou não contentes com as minhas explicações. Como o nobre Deputado fallou a meu respeito com bastante liberdade, peço-lhe licença para lhe fazer uma observação: eu posso perdoar ao nobre Deputado uma lingoagem menos propria do que aquella que devia empregar relativamente a um Membro d'esta Camara o Membro do Ministerio, mas intenda-se que se o faço, é por generosidade, por consideração para com a Camara e para não faltar a mim: porém não consinto ao nobre Deputado que na discussão, referindo-se a mim, torne a empregar os termos de que usou.

O nobre Deputado antes de fazer a interpellação devia ter estudado a Lei de 23 de Maio de 1848, e hade permittir-me lhe diga que não a leu. Nesta Lei ha uma unica disposição permanente que é o art. 5.°. cuja derogação foi proposta pelo Sr. Lopes Branco. Diz este artigo (Leu.) Portanto foi este o artigo que se derogou, entrando na regra geral todos os contribuintes que não se aproveitaram dos beneficios da Lei de 23 de Maio. Mas esta Lei tinha um prazo fatal que estava marcado no § 3.° do art. 1.° (Leu.) Por consequencia estando esta Lei revogada por sua propria natureza, e tendo acabado o prazo além do qual nenhum Ministerio podia passar, é claro que não podia continuar o beneficio que a Lei concedia aos contribuintes: por isso hoje a questão é de liquidação. Pergunta-se, as Notas que a Lei produziu, foram applicadas na forma que ordenava esta mesma Lei? Se o foram, o Governo não tem nada a fazer; e se não foram applicadas segundo a Lei, o Governo deve dar-lhe applicação que lhe cumpre. Quando ainda agora disse, que esta Lei estava revogada, queria dizer com isto, que tendo acabado o beneficio que ella concedia, não se estava cobrando estas Notas, e não tendo por consequencia o Governo todos os dias estas Notas, é claro que as não podia applicar para esses pagamentos atrazados. A Lei de 23 de Maio foi uma Lei de excepção; esta acabou, e os contribuintes entraram todos na regra geral dos mais contribuintes.

Mas diz o nobre Deputado " Vós confessastes que tinheis recebido 718 contos, e não pagastes senão 600!" Ainda agora expliquei isto, mas vejo que o nobre Deputado não comprehendeu: a Lei não mandava applicar ao pagamento desta divida todo o producto que entrasse no pagamento das contribuições, mandava, applicar sómente a parte Notas: quando fallo da receita que a Lei creou, entenda-se que é toda a receita em que entra metal e Notas: e já se conhece que a porção em metal que entrou em certos Districtos, é superior áquella que entrou em Notas, porque houve muitas contribuições que não admittiam Notas; e se calcularmos o que entrou nos Districtos de que não tenho conhecimento, por aquillo que entrou nos outros de que o tenho, podemos dizer que a parte metal excede a parte que entrou em Notas: donde se póde concluir que os pagamentos que se fizeram, excedem muito a parte Notas que se recebeu em virtude da Lei de 23 de Maio. Foi por esta lazão que o meu antecessor suspendeu estes pagamentos. E quando este negocio estiver liquidado, então se achará que se pagou mais do que se devia pagar.

Disse o nobre Deputado que eu tinha aceitado o Relatorio do meu antecessor: dar-me-hia por muito honrado se eu fosse o auctor do Relatorio do meu amigo; mas eu não declarei que fazia meu aquelle Relatorio que foi apresentado em circumstancias differentes das em que eu estava; por que o meu antecessor descreveu a situação em que achou o Thesouro quando foi chamado aos Conselhos de Sua Magestade, e por consequencia não o podia applicar para a época em que entrei no Ministerio no fim de Junho de 1849.

Ha mais alguma cousa, eu nem mesmo fiz minhas as Propostas de S. Exa., entre as quaes havia um Projecto que comprehendia todo o seu pensamento financeiro; quando entrámos no Ministerio o que dissemos, foi - visto que não temos tempo para apresentar um Projecto completo de organisação de Fazenda, contentamo-nos com a Lei de Meios, e a auctorisação para cobrar a decima; e promettemos dis-

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tribuir com imparcialidade a receita que se cobrar (Apoiados). Mas diz o nobre Deputado - para que pedistes a auctorisação para levantar 2:500 contos de réis? Outra inexactidão; pois eu pedi á Camara esta auctorisação? Quem apresentou a Proposta neste sentido, foi a Commissão de Fazenda. Mas insta o nobre Deputado - por que não fez o Governo uso desta auctoriação? - Eu já expliquei a razão disto ao Parlamento; e hei de explicar mais claramente quando der contas de tudo que fiz; então verá o nobre Deputado e a Camara com toda a clareza não só os motivos que me levaram a tornar esta medida, mas os dados que para isso tive: ainda hoje sustento que fiz muito bem de não usar desta auctorisação; por que se tivesse feito uso della, o resultado que tinha havido, era que a Fazenda Publica estava hoje defraudada de todos os interesses que não podiam deixar de ser dados aos prestamistas. Havia ainda uma outra circunstancia; dizia-se que todas as receitas vencidas e não pagas eram de difficil cobrança; porem o resultado provem que todo o mundo estava em erro; e este erro podia ser fatal á Fazenda Publica, se se fosse abrir uma transacção sobre esta auctorisação, por que dizendo-se que estas receitas eram de difficil cobrança, não podia resultar senão uma transacção desfavoravel para o Thesouro: o que era um grande golpe no credito publico, cuja situação o Governo devia melhorar por todos os meios ao seu alcance (Apoiados). Por consequencia o Ministerio tomou a resolução a mais previdente que se podia tomar nestas circumstancias, que foi não fazer uso da auctorisação para o levantamento dos 2:500 contos; mas procurou realisar a receita corrente por meio d'uma operação similhante áquella que só adopta em todos os Paizes, em que a Fazenda Publica está organisada: o Gono optou por esta operação e pôde obte-la pela efficaz cooperação que encontrou na Direcção do Banco de Portugal. O Governo deu pois este passo para melhorar a situação da organisação da Fazenda, e a situação não está hoje tão compromettida como podia estar se o Governo tivesse feito uso desta auctorisação (Apoiados). Portanto parece-me que tenho explicado a razão por que esta Lei não foi cumprida; e se algum dos meus Collegas tem a este respeito o menor escrupulo, eu peço á Camara consinta que elle tome a palavra, e exponha qual esse escrupulo é, porque eu estou prompto a dar todas as explicações.

O Sr. Lopes Branco: - Eu desejava dar explicações a Camara sobre este assumpto; por isso requeria que me fosse permittido tomar parte nesta interpellação.

Foi-lhe permittido.

O Sr. Lopes Branco: - Sr. Presidente, sinto ter de dar explicações sobre os actos da minha Administração, e ver-me obrigado a fazer termo de comparação com os de outrem; entretanto, sempre que o fizer, fique-se entendendo, que sejam as comparações quaes forem, nenhuma tenção tenho de fazer opposição ás medidas do meu illustre successor no Ministerio da Fazenda, ás quaes, pelo contrario, darei o meu apoio, e o que sinto, é, que este não seja bastante forte, para que o nobre Ministro podesse levar a effeito todo o seu pensamento da organisação da Fazenda, como a entende.

E agora fallando sobre o objecto da Interpelação devo dizer, que a respeito dos pagamentos de que se tracta, não houve salto, nem ponto, e tambem alguma verdade ha no que expoz o Sr. Ministro da Fazenda. Quando entrei no Ministerio achei a pagamento o mez de Agosto de 1847, e levado do desejo que sempre tive de adiantar os pagamentos, mandei-o continuar; mas tendo vindo em algum escrupulo, se por ventura havia ou não receitas, ainda produzidas pela Lei de 23 de Maio, e suppondo que não, (e tractei deste negocio quando respondi á Interpellação de um illustre Deputado sobre este objecto) consultei a similhante respeito a Commissão de Fazenda; e ahi, depois de algumas considerações rainhas, e em vista do direito dos interessados, que reclamavam o pagamento de seus vencimentos, assentou-se que o pagamento das quinzenas se continuasse pela mesma fórma, isto é, em notas, applicando-se para isso aquellas que crescessem das despezas do serviço; e a respeito dos mezes que se lhe seguiam, para estes tinha eu resolvido applicar os recursos da auctorisação dos 2:000 contos; e invoco para isto todo o testimunho dos Cavalheiros da mesma Commissão, que me ouviram (Apoiados): sendo certo que ácerca desta operação dos 2:000 mil contos, eu declarei algumas vezes na Commissão, e peço tambem o testimunho dos mesmos Cavalheiros que me ouvem, que já se me tinham feito algumas Propostas; devendo declarar, que era nella que eu fundava principalmente todas as esperanças da organisação da Fazenda, segundo o pensamento que tinha.

Sr. Presidente, eu rendo todos os elogios ao nobre Ministro da Fazenda em levar a effeito as suas duas operações dos 400 contos com os juros, que tem dito; mas tambem quero, que se faça a mesma justiça relativamente á operação, que fiz da conveniencia da qual estou ainda convencido; porque foi nessa operação, que pela primeira vez se admittiram Titulos de divida corrente, os quaes para o Governo representavam dinheiro effectivo, visto que eram encargos de receita, que se hypothecava; e daqui resultavam duas vantagens ao mesmo tempo, uma para o Thesouro, porque nesses Titulos é, que estava somente o interesse dos mutuantes, e nas outras operações por mais modico, que o juro fosse, a somma delle era uma diminuição na receita, e um desfalque nos recursos para as despezas do serviço; a outra para os Servidores do Estado; porque excluindo-se estes Titulos, diminuiam de preço no mercado com prejuiso dos interessados que precisassem de os descontar.

Sr. Presidente, outras explicações terão ainda de dar-se, mas só com o fim de cada um mostrar o pensamento, que o dirige, porque intenções todos tem as do maior bem publico (Apoiados).

O Sr. Xavier da Silva: - Peço a V. Exa. que tenha a bondade de consultar a Camara sobre se permitte que eu tome parte nesta Interpellação.

Foi-lhe permittido.

O Sr. Xavier da Silva: - Sr. Presidente, eu serei muito breve; pedi para tomar parte neste debate, porque me parece que S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda acaba de manifestar uma opinião a respeito da Lei de 23 de Maio de 1848, em ralação aos pagamentos por conta do Governo em atrazo posteriores a Maio de 1847, que me persuado não ser a mais conforme com a disposição d'essa lei. Sr. Presidente, pelo art. 8.º de Lei de 23 de Maio de 1848 determina-se que as Notas do Banco de Lisboa que se receberem em virtude desta lei, sejam applicadas

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no Continente do Reino, ao pagamento dos Servidores do Estado, e assim como tambem dos Pensionistas pertencentes ás classes denominadas de consideração, pelos seus respectivos vencimentos posteriores ao mez de Maio de 1847, que estão em atraso, ou estiverem no 1.° de Julho proximo futuro, e que o pagamento destes vencimentos seja feito na sua totalidade em Notas do Banco de Lisboa, pelo seu valor nominal; já se vê pois, Sr. Presidente, que a Lei estabeleceu o modo porque se deviam fazer esses pagamentos; eu vou lêr á Camara, não só a disposição do art. 8.º como do § unico deste mesmo artigo, diz elle (Leu).

Ora eu entendo que em vista desta disposição seja qualquer que fôr a época em que se receba a parte em Notas, que entrar no pagamento das contribuições de que falla esta Lei, seja esse pagamento das quotas dos contribuintes pagas na 1.ª 2.ª ou 3.ª época; o que se obtiver de receita em Notas por virtude desta Lei, essa receita na sua totalidade deve, em todo o tempo, ser applicada para o pagamento por conta do Governo, dos vencimentos dos Servidores do Estado que estão em atraso posteriores ao mez de Maio de 1847; assim é que eu entendo a Lei, e esta e que foi a mente da Commissão de Fazenda, quando confeccionou o Projecto que deu origem á Lei de 23 de Maio de 1847. Repito, para que se entenda bem: estes vencimentos em atraso posteriores a Maio de 1847 não de ser pagos em Notas na sua totalidade, que entrarem por virtude desta Lei, seja qual fôr o praso em que essas Notas se recebam. E se este negocio não é claro, se S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda o não entende assim, se fôr necessario para bem, e uniformemente se entender, exija-se da Camara a competente declaração sobre este assumpto; mas não se persuadam lá fóra, que o Sr. Ministro da Fazenda tem em vista deixar de pagar esta divida: o Sr. Ministro da Fazenda está examinando o que tem recebido em Notas, e o que tem pago em Notas; se se tem pago mais do que se tem recebido, verá como resolver este caso, se se tem pago menos ha de satisfazer o que falta; é tudo objecto de liquidação. Mas o que é muito preciso é que fique bem expresso que nem é mente da Commissão de Fazenda, nem do Sr. Ministro fazer ponto nesta divida; que o Governo não tem em vista parar de modo algum estes pagamentos; que devem ser satisfeitos pela receita em Notas que entrar em resultado do pagamento das contribuições ou dividas de que falla a Lei de 23 de Maio de 1848; e que se essa receita não chegar, o Governo virá propôr á Camara os meios que julgar proprios para satisfazer essa divida (Apoiados}

O Sr. Ministro da Fazenda: - Direi muito poucas palavras - Primeiro que tudo permitta-me a Camara que eu de um testemunho de respeito ás opiniões de S. Exa. o Sr. Lopes Branco com relação ao seu systema adoptado para regularisar a Fazenda Publica; se eu fosse Ministro da Fazenda na occasião em que S. Exa esleve á frente dos negocios daquella Repartição, teria pensado como S. Exa., porém a minha situação quando entrei para o Ministerio, foi differente, e portanto differente caminho me cabia seguir, e por esta occasião devo dizer em abono de S. Exa. que era impossivel ter gerido os negocios publicos da Repartição de Fazenda com mais inteligencia, e com melhor vontade de acertar do que S. Exa. (Apoiados) Digo que quando S. Exa. entrou para o Ministerio a situação era uma, e quando eu entrei era outra, a minha situação era mais favoravel, tive essa fortuna; e para essa situação mais favoravel muito contribuiram as medidas que S. Exa. adoptou.

Agora, Sr. Presidente, quanto á observação feita pelo Sr. Deputado Xavier da Silva, a respeito de querer que ficasse bem claro, que o Governo não queria pôr de lado esta divida, que anão despresava, eu devo dizer, que o Governo entende que o primeiro elemento de que muito se precisa neste Paiz, é o credito, e o credito não se póde obter senão pagando fielmente o Governo tudo aquillo a que está obrigado (Apoiados) por consequencia digo ao nobre Deputado, e á Camara, que com quanto eu possa discrepar do nobre Deputado quanto á interpretação que quer dar á Lei de 23 de Maio de 1848, comtudo estou em perfeito accôrdo com S, S.ª em quanto á satisfação desta divida; e muito terminantemente declaro, que não é, nem póde ser intenção do Governo o deixar esta divida no esquecimento (Apoiados) Se os meios que se applicaram para o pagamento della não chegarem, o Governo ha de trazer este negocio á Camara, e pedir-lhe providencias, a fim de que esta divida seja completamente satisfeita (Apoiados)

O Sr. Presidente: - A Ordem do Dia para ámanhã são trabalhos em Commissões, e estes teem de recair sobre o exame de negocios sujeitos á Camara tanto nos dois annos passados como já neste anno. A Camara pois ámanhã dividir-se-ha em Commissões depois do expediente; e a Ordem do Dia para sexta feira é a mesma de hoje. Está levantada a Sessão.

Eram quasi quatro horas e meia da tarde.

O 1.° RKDACTOR,

J. B. CASTÃO.

N.º 5. Sessão em 7 de Fevereiro 1850.

Presidencia do Sr. D. Prior de Guimarães.

Chamada - Presentes 48 Srs. Deputados.

Abertura - Á Meia hora depois do meio dia.

Acta - Approvada sem discussão.

CORRESPONDENCIA.

OFFICIOS: - Um Officio do Ministerio da Marinha, acompanhando uma nota dos direitos differenciaes, que differentes mercadorias da Asia Portugueza, ou de outras Provincias, ou mesmo estrangeiras pagam na Alfandega de Moçambique, extrahida da Pauta geral, que está em pratica n'aquella Provincia, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Jeremias Mascaranhas. Para a Secretaria.

O Sr. Costa Lobo: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa uma Representação da Ordem 3.ª do Carmo da Cidade do Porto, a qual pede, que

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